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FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO

FACULDADE DE ARTES PLÁSTICAS


PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DA ARTE

SEMINÁRIO DE PESQUISA EM HISTÓRIA DA ARTE

CADERNO DE PESQUISA II

Organizadora
Maria Carolina Duprat Ruggeri

São Paulo
2008

1
Ficha catalográfica

RUGGERI, Maria Carolina Duprat (org.).

Seminário de Pesquisa em História da Arte – Caderno de Pesquisa II. Maria


Carolina Duprat Ruggeri (org.). Curso de Especialização em História da Arte –
FAAP – São Paulo, 2009.

ISBN – 978-85-98864-35-8

(Palavras Chave)
1. Conhecimento 2. História da Arte 3. Metodologia 4. Monografias Acadêmicas

A presente documentação é um desdobramento da Segunda Edição do Seminário de


Pesquisa em História da Arte, realizado nos dias 18, 20, 21, 22, 23 e 24 de outubro de
2008 – na Fundação Armando Alvares Penteado – FAAP, integrando o Curso de
Especialização em História da Arte.

2
FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO

CONSELHO CURADOR

Presidente
Sra. Celita Procopio de Araujo Carvalho

Membros do Conselho
Dr. Benjamin Augusto Baracchini Bueno
Dr. Octávio Plínio Botelho do Amaral
Dr. José Antonio de Seixas Pereira Neto
Sra. Maria Christina Farah Nassif Fioravanti
Emb. Paulo Tarso Flecha de Lima

DIRETORIA EXECUTIVA

Diretor Presidente
Dr. Antonio Bias Bueno Guillon

Diretor Tesoureiro
Dr. Américo Fialdini Jr.

Diretor Cultural
Prof. Victor Mirshawka

ASSESSORES DA DIRETORIA

Área Administrativa e Financeira


Dr. Sérgio Roberto de F. S. e Marchese

Área Acadêmica
Prof. Raul Edison Martinez

3
FACULDADE DE ARTES PLÁSTICAS
DIRETORIA
Prof. Silvio Passarelli

Coordenação

Coordenador do Curso de Educação Artística – Artes Plásticas


Prof. Marcos José S. de Moraes
Coordenador do Curso de Desenho Industrial
Prof. Milton Francisco Junior

Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo


Prof. José Renato Bicalho Kehl

Coordenador do Curso de Moda


Prof. Ivan Marcos Caminada Bismara

Coordenadora Pedagógica
Profª. Sonia Helena dos Santos

Coordenador das Oficinas


Prof. Vitor José B. Campos
Coordenadora de Pós-Graduação e Extensão
Profª. Teresa Maria Riccetti

Coordenadores de Área
Profª. Stela Maris Sanmartin
Profª. Ana Maria Antunes Farinha
Profª. Andréia B. de Sá Carneiro
Prof. Fábio Righetto
Prof. Ricardo Figueiredo Nascimento
Prof. Munir Buarraj
Prof. Luis Antonio Settanni
Profª. Sandra Harabagi

Secretária da Faculdade
Simone Andreia Stringhini

Coordenação
Silvia Cristina Castilho de Arantes

Apoio Coordenação
Selma Barboza
Cinthya Felix de Vasconcelos

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FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO

PÓS-GRADUAÇÃO

Diretoria
Prof. Victor Mirshawka Jr

Assistente da Diretoria
José Joanilso Bettio

Coordenador Pedagógico
Prof. Getúlio de Souza Nunes

Coordenador Administrativo
James Teixeira

Coordenação Técnica do Curso de História da Arte


Prof.ª Maria Carolina Duprat Ruggeri

5
O LIVRO DOS MORTOS DO EGITO ANTIGO

Antonio Brancaglion Junior

O “Livro dos Mortos”: Origem Histórica

O “Livro dos Mortos” foi o texto funerário mais “popular” do Egito Antigo. A sua
história começa quando os reis da XIII dinastia deixam a sua capital It-tawy7 sobem o
Nilo e retornam a Tebas (c. 1690 a.C). Nesta época os faraós e suas famílias deixaram
de ter acesso aos textos funerários produzidos em Mênfis e Heliópolis, conhecidos
como “Textos das Pirâmides”8, e forçados a adotar uma nova tradição do Alto Egito os
“Textos dos Caixões”9, cujo centro difusor pode ter sido o templo de Thot em el-
Ashmunein10. A mudança para Tebas criou a necessidade da redação de uma nova
literatura funerária que auxiliasse o destino póstumo do faraó e de sua corte.
Foi uma adaptação de antigos textos funerários às novas concepções,
aproximadamente 60% do texto é baseado nos “Textos dos Caixões”. O início desta
nova tradição surge pela primeira vez no caixão da rainha Montuhetep, esposa do
faraó Djehuty da XVI dinastia (c. 1648 a.C.), encontrado em uma tumba em Dra Abu el-
Naga. Atualmente desaparecido, o caixão, é conhecido somente pelas cópias de
Wilkinson. Outros achados indicariam que o “Livro dos Mortos” teve a sua origem no
Segundo Período Intermediário, os principais são o sudário da múmia da rainha
Ahmes11, filha de Taa II da XVII dinastia (c. 1558 a.C.), que trazia escrito uma de suas
fórmulas12 e os fragmentos do sudário do rei Inyotef13, também da XVII dinastia.

7
Atual el-Lisht a 56 Km ao sul do Cairo entre as localidades de Dahshur e Meidum.
8
Cerca de 759 fórmulas escritas nos corredores e câmaras das pirâmides de reis e rainhas da V e VI
dinastias que permitiriam uma vida póstuma ao morto.
9
Cerca de 1185 fórmulas escritas em caixões do Primeiro Período Intermediário cuja função era guiar e
sustentar o morto no Outro Mundo.
10
Capital do 15º nomo do Alto Egito. Outros centros religiosos importantes eram Assiut e Elefantina,
além de Deir el-Berchech no Médio Egito.
11
Encontrado por Schiaparelli na tumba no Vale das Rainhas (QV47) e atualmente no Museu de Egípcio
de Turim.
12
Capítulo 64 escrito em hierático.
13
Fragmentos de linho atualmente no British Museum BM EA 10706.

19
A julgar pelas evidências o “Livro dos Mortos” inicialmente foi destinado aos
sepultamentos de membros da família real, do final da XVII e início da XVIII dinastia,
escrito em hieróglifo cursivo sobre os sudários de linho que envolviam as múmias.
Curiosamente esta preferência pelo “Livro dos Mortos” com texto funerário das
rainhas e príncipes aparece séculos mais tarde na decoração das tumbas ramessidas
no “Vale das Rainhas”.
A evidência mais confiável do mais antigo “Livro dos Mortos” escrito em papiro
é o manuscrito de Nu14, datado do início da XVIII dinastia, não posterior ao reinado de
Amenhotep III (c. 1388 a.C.). A partir de então se tornou o principal texto funerário
para a elite, escrito preferencialmente em papiro. Somente nos reinados de
Hatshepsut e Thutmés III (c. 1479 a.C.) a prática de depositá-lo junto ao o corpo de
pessoas que não pertenciam à realeza tornou-se comum15. Nesta época as vinhetas
que “ilustram” os capítulos ganham importância tanto na qualidade artística como na
quantidade de vinhetas16.
Durante o Período Saíta (c. 664 a. C.) atinge a versão canônica sendo
estruturada em 165 fórmulas ou capítulos dispostos em uma ordem regular, conhecida
como Recensão Saíta, que permaneceu em uso até o Período Ptolomaico quando
atinge a sua forma completa com 192 capítulos. Esta padronização das fórmulas e
vinhetas (conteúdo e seqüência) não significou uma estagnação, surge o estilo menfita
e o tebano evidenciando uma ruptura entre o Alto e Baixo Egito, onde circulavam
versões diferentes para o mesmo capítulo e vinheta.
Todos os “Livro dos Mortos” são escritos em hieróglifos cursivos até a XXI
dinastia (c. 1070 a.C.) quando passam também a serem escritos em hierático; na Baixa
Época (c. 600 a.C.) emprega-se indiscriminadamente tanto o hierático como o
demótico até o Período Romano (c. II século a. C.), quando deixa de ser o principal
texto funerário sendo substituído pelo “Livro das Respirações” ou “Livro para Percorrer
a Eternidade”.

14
British Museum BM EA 10477, Günther Lapp. The Papyrus of Nu § 5. Segundo Jean Capart seria o
papiro de Bruxelas datado do Médio Império, que contém Cap. 125, 126V, 100, 102, 136A e B, contudo,
este papiro pode ser datado como sendo do final da XVII ou início da XVIII dinastia.
15
A múmia de Thutmés III estava envolta em um sudário com textos do “Livro dos Mortos”.
16
Papiro de Maiherperi Museu do Cairo CG 24095 reinado de Thutmés III.

20
As pesquisas sobre o “Livro dos Mortos” começaram com Jean François
Champollion, em 1827, a partir de alguns exemplares reproduzidos na Description de
l’Égypte17, principalmente o papiro Cadet. Segundo Champollion o título deste
manuscrito era “Livro das Manifestações à Luz”18.
A denominação “Livro dos Mortos” (Totenbuch)19 foi dada pelo egiptólogo
alemão Richard Lepsius, em 1842, após a sua publicação de um grande manuscrito
ptolomaico, o papiro de Iufankh20. Lepsius também foi o responsável pela divisão das
fórmulas em 165 capítulos21 que formavam a Recensão Saíta estabelecidos na Baixa
Época.
Willem Pleyte, em 1881, publica os “Capítulos Suplementares”22 utilizando
como ponto de partida a numeração de Lepsius, apresentado os capítulos 166 a 174
datados da Baixa Época. Finalmente em 1886, após 10 anos de trabalho, Henri
Édouard Naville23 apresenta a primeira compilação de 71 papiros da XVIII à XX dinastia,
guardados em coleções européias e do Museu Egípcio do Cairo. Naville mantém a
numeração de Lepsius, mas não a de Pleyte chegando a 186 capítulos da chamada
Recensão Tebana, isto é, aqueles utilizados durante o Novo Império.
Foi Sir E. A. T. Wallis Budge quem primeiro utilizou um título semelhante ao
original egípcio “Os Capítulos para Sair ao Dia”, em sua compilação de 189824, que
contou principalmente com os papiros do British Museum. Nela foram agrupados os
capítulos do Novo Império com aqueles dos Períodos Saíta e Ptolomaico em uma
mesma publicação, isto é, os capítulos de 1 a 190, acrescentando ainda um léxico. A
popularidade da obra de Budge deveu-se, em grande parte, às belas reproduções das
vinhetas dos papiros de Any e Hunefer que acompanhavam a sua tradução.
Atualmente de domínio público possui incontáveis traduções em vários idiomas a
despeito das inúmeras imprecisões e erros de sua tradução.

17
Antiquités tome II Pl.60-75, 1821.
18
Jean-François Champollion. Notice descriptive des monumens égyptiens du musée Charles
X. Paris: Imprimerie de Crapelet, 1827 p.148.
19
Do árabe Kitab al-Mayitun, denominação dada para todos os papiros encontrados junto às múmias.
20
Museu de Turim n.1791. Karl Richard Lepsius. Das Todtenbuch der Ägypter nach dem
hieroglyphischen Papyrus in Turin. Leipzig: Georg Wigand, 1842.
21
Por engano Lepsius separou a vinheta do Hino a Rê capítulo 15, criando o capítulo 16.
22
Willem Pleyte. Chapitres supplémentaires du Livre des Morts 164-174. Traduction et
commentaire. Leide: E. J. Brill, 1881.
23
Édouard Naville. Das Ägyptische Todtenbuch der XVIII. bis XX. Berlin: A. Asher & Co. 1886.
24
Sir Ernest Alfred Thompson Wallis Budge. The Book of the dead : The Chapters of coming forth by
day. London: Kegan Paul, Trench, Trübner & Co., Ltd, 1898.

21
Entre 1952 e 1960 Thomas George Allen, traduzindo os papiros do Oriental
Institute Museum da Universidade de Chicago25, incluiu os capítulos 191 e 192 a que
correspondem ao chamado “Primeiro Livro de Glorificação de Osíris”. Heerma van
Voss, em 1973, com o papiro Leyden T326 e Terence DuQuesne, em 1994, com o papiro
Cairo S.R.VII 1022827 incluíram a lista de capítulos conhecidos como 193 e 194
respectivamente.
Ainda são poucos os manuscritos traduzidos e analisados diante do número de
papiros guardados nos museus. Atualmente temos publicações sistemáticas que, de
certa maneira, continuam o trabalho de Naville, entre elas as coleções como a do
British Museum e o Museo Gregoriano Egizio du Vatican28 já deram início a um
programa de publicações de seus “Livros dos Mortos”.
Duas grandes séries são dedicadas à publicação de papiros completos ou
reunidos por períodos: Handschriften des Altägyptischen Totenbuches (HAT), Studien
zum Altägyptischen Totenbuch (SAT). Atualmente em preparação o
Totenbuchprojekt29, um banco de dados que pretende reunir os manuscritos
espalhados pelos museus de todo o mundo, estabelecido pelas Universidades de Bonn
e Colônia sob a direção de Ursula Rössler-Köhler e Heinz-Josef Thissen.
Temos traduções do “Livro dos Mortos” em edições de grande sucesso
editorial, além da já mencionada feita por Budge, a tradução de Raymond Oliver
Faulkner30 regularmente reeditada e sua edição fac-símile do papiro de Any31. As boas
traduções de referência usadas tanto por especialistas como por estudantes, além do
próprio Naville, são as de Paul Barguet32 com capítulos de épocas diferentes,
selecionados de papiros da coleção do Museu do Louvre; a tradução de Thomas

25
Os papiros Ryerson (OIM 9787R) e Milbank (OIM 10486M). Thomas George Allen. The Egyptian
Book of the Dead : Documents in the Oriental Institute Museum at the University of Chicago.
Chicago: The University of Chicago Press, 1960.
26
Heerma van Voss. Religion und Philosophie im Totenbuch des Pinodjem I, in Ursula Verhoeven.
Religion und Philosophie im Alten Ägypten: Festgabe für Philippe Derchain zu seinem 65. Geburtstag
am 24. Juli 1991. Leuven: Departement Oriëntalistiek - Uitgeverij Peeters, 1991.
27
Terence DuQuesne. At the Court of Osiris : Book of the Dead spell 194. A rare Egyptian judgment
text. London: Da'th Scholary Services/ Darengo Publications, 1994.
28
Giuseppina Lenzo Marchese. Manuscrits hiératiques du Livre des Morts de la Troisième Période
Intermédiaire: papyrus de Turin CGT 53001-3013. Genève: Société d'Égyptologie, 2007.
29
http://www.totenbuch-projekt.uni-bonn.de/
30
Raymond Oliver Faulkner. The Book of the Dead. New York: The Limited Editions Club, 1972.
31
Raymond Oliver Faulkner. The Egyptian Book of the Dead: The Book of Going Forth by Day. Beign
the Papyrus of Ani. San Francisco: Chronicle Books, 1998.
32
Paul Barguet. Le Livre des Morts des anciens Égyptiens: Introduction, traduction et
commentaire. Paris: Éditions du Cerf, 1967.

22
George Allen33 com textos de tradição tebana, saíta e variantes da XXI dinastia de
papiros de várias coleções; e a de Erik Hornung34 que utiliza papiros do Novo Império.
Recentemente foi lançada uma tradução compilada de vários papiros da
recensão tebana e saíta, feita por Claude Carrier35, que traz também a transliteração
do texto, mas que omite completamente das vinhetas e algumas rubricas importantes.

O “Livro dos Mortos”: Forma e Função

Para os egípcios antigos o “Livro dos Mortos” é de origem divina e foi escrito
pelo próprio deus Thot, que fala pela boca do morto. Embora a denominação “Livro
dos Mortos” ainda seja a mais usada, ela nada tem a ver com o título original em
egípcio prt-m-hrw “Livro para Sair ao Dia”.
A preposição m raramente possuiu o sentido de direção, na maioria das vezes
seu significado está ligado ao momento em que se realiza a ação, isto é, “durante”. A
palavra “dia” (hrw) significa o momento entre o nascer e o por do sol e não
necessariamente a “luz do dia”. Contudo, a luz do sol, levada ao Mundo dos Mortos
pelo deus Rê, é um dos elementos centrais nos textos funerários, principalmente a
partir do Novo Império. O sol é considerado não somente como fonte de luz e calor,
mas como fonte de vida, assim sendo, o título pode ser também traduzido como “Livro
para Sair à Luz do Dia”.
Essa busca pelo “sair ao dia” já está presente nos “Textos dos Caixões”, assim
como a capacidade de entrar e sair do Mundo dos Mortos segundo a vontade do
morto36.
A finalidade geral da obra, assegurar ao morto a inteira liberdade de
movimento e de ação fora da tumba, aparece resumida no título da primeira fórmula
ou capítulo: “Início das fórmulas para sair ao dia, e as glorificações (para) sair depois
de ter entrado na necrópole (e do) glorioso e Belo Ocidente. Fórmulas que devem ser

33
Thomas George Allen. The Book of the Dead or Going Forth by Day: Ideas of the Ancient Egyptians
Concerning the Hereafter as Expressed in their Own Terms. Chicago: The University of Chicago
Press, 1974.
34
Erik Hornung. Das Totenbuch der Ägypter. Zürich/München: Artemis Verlag, 1979.
35
Claude Carrier. Le Livre des Morts de l‟Égypte Ancienne. Paris: Cybele, 2009.
36
CT II 91a(B4C) e CT II 121a (T1L).

23
recitadas no dia do sepultamento (e pelas quais o morto) entrará depois de haver
saído” 37.
Herdeiro dos “Textos dos Caixões” no conteúdo e na forma, tinha os textos
escritos com tinta preta e os títulos das fórmulas e destaques escritos com tinta
vermelha. A grande inovação foi o uso do papiro, que se tornou o suporte material
característico para o “Livro dos Mortos”. Raramente utilizado antes para os textos
funerários, este material caro, mas prático, adequou-se para a redação desse novo
texto formando rolos que eram colocados próximo à múmia. O papiro permitia
concentrar em uma superfície reduzida um grande número de preces e
encantamentos, além de vinhetas ilustrativas que garantiriam a proteção do morto.
Estes rolos de papiro possuem uma altura entre 30 a 40cm e o comprimento que varia
de versões resumidas com 1 a 2m até as versões completas com 15 a 37m 38. O papiro
não foi, todavia, suporte exclusivo para o “Livro dos Mortos”, podendo suas fórmulas e
vinhetas aparecer também em paredes de tumbas e templos, sarcófagos, caixões,
bandagens de múmia, estelas, estatuetas funerárias, óstracos e rolos de couro.
O “Livro dos Mortos” se impôs como um dos principais textos funerários do
Egito Antigo. Para os primeiros egiptólogos era o equivalente à Bíblia dos antigos
egípcios e o primeiro livro ilustrado do Mundo, teria como função dar ao morto os
meios de obter três condições básicas para a sua sobrevivência no Mundo dos Mortos:
as preces dedicadas às grandes divindades, a regeneração e as transformações e o
domínio das forças divinas por meio do conhecimento de seus nomes secretos. Assim
o morto seria capaz de sair à luz do dia, de leste para oeste como o sol, continuando a
sua existência, podendo rever a sua casa, proteger os seus familiares e amigos, vingar-
se de seus inimigos, desfrutar das oferendas, adorar o deus sol e receber as bênçãos
dos deuses. Obtendo a liberdade de locomoção e de alimentação tendo: “a felicidade
no céu, a riqueza na terra e a vitória no Mundo Inferior”.
Dois grandes temas estão presentes no “Livro dos Mortos”: o primeiro é a
vitória do morto no tribunal de Osíris39, onde após negar as suas faltas, seu coração40 é

37
Papiro de Any British Museum BM EA 10470.
38
Papiro Greenfield British Museum BM EA 10554.
39
Capítulo 125.
40
O coração é o órgão do renascimento, onde está a memória e o intelecto. Ele faz a ligação entre os
elementos espirituais e físicos que compõem o ser humano.

24
pesado e ao ser confirmada a sua inocência, ele é declarado “justificado” ou “justo de
voz” esse epíteto significa que o morto satisfez as condições de Maat41. O outro grande
tema é a transformação do morto em um espírito glorificado (akh) diante do deus Rê42
tornando-o capacitado, assim como os deuses, a viajar na Barca Solar e a desfrutar dos
Campos dos Juncos.
Desde os primeiros exemplares, esse novo conjunto de textos aparece como
uma compilação de fórmulas, mais ou menos longas, repartidas em capítulos em uma
sucessão que varia de papiro para papiro. Cada capítulo é precedido por um título,
escrito em vermelho, que define os propósitos da fórmula. O texto é escrito em preto,
traz as noções expressas no título. No final de cada texto pode vir uma rubrica, escrita
também em vermelho, que especifica o modo de utilização do capítulo. Alguns
capítulos trazem após a rubrica um cólofon garantindo a sua eficácia: “funciona
verdadeiramente, um milhão de vezes”.
As vinhetas são outro grande destaque do “Livro dos Mortos”, elas ilustram o
aspecto mais importante descrito no texto ou na rubrica. Alguns papiros,
principalmente os da XIX dinastia, possuem vinhetas que são verdadeiras obras de arte
e possuem um destaque ocupando a altura total da folha, como a do capítulo 16 “Hino
em Louvor ao deus Rê”, do capítulo 110 “Os trabalhos nos Campos de Juncos”, do
capítulo 125 “A Pesagem da Alma” e do capítulo 148 “As Vacas Sagradas”. A sua
função não é meramente decorativa e muitas vezes ou pela falta de espaço ou para
encurtar o tamanho do livro servem como substituto do texto, fazendo com que
muitos exemplares do “Livro dos Mortos” sejam quase que exclusivamente
constituídos por ilustrações.
Existe uma grande disparidade tanto no conteúdo como na ordem dos
capítulos, a tal ponto que não existem dois papiros idênticos. Contudo, existe uma
preferência por determinados capítulo, considerados essenciais e que estão presentes
em praticamente todos os papiros43. Alguns capítulos funcionam como glosa onde são
apresentadas interpretações mitológicas ou teológicas o que demonstra a dificuldade
dos próprios egípcios em entender os textos.

41
O julgamento do morto (psicostasia) é realizado na “sala das duas Maat”, divindade que representa a
Ordem Divina e a justiça terrena.
42
Capítulos 100 a 102 e 129 a 136
43
Capítulos 1, 17, 64, 78, 99, 125, 144-149.

25
Somente por volta do VII século a.C é que surge uma versão “padronizada” para
o conteúdo e para a seqüência dos capítulos. Com base nesta padronização podemos
estabelecer as grandes divisões do “Livro dos Mortos” da seguinte forma44:
Nos capítulos 1 ao 16 temos a chegada do cortejo fúnebre à necrópole, a
passagem pelas Portas guardadas por “demônios” e os hinos a Osíris e ao sol poente.
Nos capítulos 17 a 63 a regeneração solar do Morto.
Nos capítulos 64 a 129 a transfiguração e a regeneração do morto, além do
ponto focal do “Livro dos Mortos” o julgamento da alma onde o morto ao negar as
suas faltas é justificado diante do tribunal divino, tornando-se capaz de sair à Luz do
dia.
Nos capítulos 130 a 161 onde, como conseqüência de ser um justificado, ele
pode desfrutar da glorificação e viajar na Barca Solar pelo Mundo Inferior, será
cultuado nos dias dos Festivais. Temos também uma descrição geográfica do Mundo
dos Mortos e como confeccionar os principais amuletos funerários. Em seguida temos
os capítulos suplementares, presentes principalmente na Recensão Saíta.
Os capítulos 162 a 192 são fórmulas de proteção mágica e homenagens a Osíris
e Rê no Mundo Inferior.
Os capítulos 163 a 167 são as “Amonianas” onde o deus-sol Rê aparece com o
nome de Ámun.
O “Livro dos Mortos” marca um momento decisivo na história não somente da
literatura funerária egípcia, mas do próprio ser humano diante de questões universais
como a existência de uma alma imortal, as conseqüências das ações terrenas em uma
vida póstuma onde os justos serão glorificados e desfrutaram da vida eterna.

44
Paul Barguet. Op cit pags. 15-16.

26
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALLEN, Thomas George. The Book of the Dead or Going Forth by Day. Illinois: The
Oriental Institute of the University of Chicago, 1974. (Studies in Ancient Oriental
Civilization 37).
BARGUET, Paul. Le Livre des Morts in Textes et langages de l'Égypte pharaonique : cent
cinquante années de recherches 1822-1972. Hommages à Jean-François
Champollion. Le Caire: Institut Français d'Archéologie Orientale, 1972-1974.
DE CENIVAL, Jean-Louis. Le Livre Pour Sortir le Jour. Le Livre des Morts des Anciens
Egyptiens. Paris: Réunion des Musées Nationaux, 1992.
HORNUNG, Erik. Das Totenbuch der Ägypter. Zürich/München: Artemis Verlag, 1979.
LAPP, Günther. The Papyrus of Nu. Catalogue of the Books of the Dead in the British
Museum Vol. I. Great Britain: British Museum Press, 1997.
NAVILLE, Édouard. Das Ägyptische Todtenbuch der XVIII. bis XX. Dynastie aus
verschiedenen Urkunden. Berlin: A. Asher & Co., 1886.
PARKINSON, R.;QUIRKE, S. The Coffin of Prince Herunefer and the Early History of the
Book of the Dead. In: Studies in pharaonic religion and society in honour of J. Gwyn
Griffiths. LLOYD, Alan B (ed.) London: The Egypt Exploration Society, 1992.

Antonio Brancaglion Junior - Pós-doutorado no Institut Française d'Archeologie


Orientale du Caire - Egito
Egiptólogo - Professor do Museu Nacional da UFRJ
Curador da Coleção Egípcia do Museu Nacional
Publicações: http://lattes.cnpq.br/2950445244723627

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