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Rio de Janeiro
abr./jun. 2014
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I – ARTIGOS E ENSAIOS
ARTICLES AND ESSAYS
Resumo: Abstract:
Neste artigo, pretende-se analisar como Hipó- In this article we intend to analyze how Hipólito
lito da Costa e Francisco Solano Constâncio da Costa and Francisco Solano Constâncio
narraram a história contemporânea de Portugal narrated the contemporary history of Portugal
no contexto da transferência da Corte portugue- in the context of the transfer of the Portuguese
sa. Explora-se como estes letrados, residentes Court to Brazil. We explore how these scholars,
respectivamente em Londres e em Paris, pro- residing respectively in London and Paris, char-
curaram caracterizar a decadência em vigor no acterized the decadence of the reign of Maria I.
reinado de D. Maria I. Analisaremos o capítulo We analyze the chapter written by Hipólito da
escrito por Hipólito da Costa na reedição da Costa in the new edition of História de Portu-
obra História de Portugal composta em inglês gal composta em ingles por uma sociedade de
por uma sociedade de literatos (1809) e o artigo literatos (1809) and Constâncio’s article On the
de Constâncio, On the state of Portugal during state of Portugal during the last thirty years,
the last thirty years, escrito em 1808 para um written in 1808 for a French review, to dem-
periódico francês, a fim de demonstrar como, onstrate how these men of letters historicized
ao escreverem a história contemporânea des- the present time of Portugal. It is argued that
te reinado, os letrados historicizaram o tempo despite being involved in different politic proj-
presente de Portugal. Argumenta-se que apesar ects, both mobilized discursive strategies with
dos letrados estarem envolvidos em projetos po- the intention to archaize the experience of Por-
líticos distintos, ambos mobilizaram estratégias tugal history. Finally, we explore how Hipólito
discursivas com o intuito de arcaizar a experiên- da Costa criticized Constâncio’s perspectives in
1 – Agradecemos a leitura de Valdei Lopes de Araujo e ao financiamento da CAPES.
2 – Doutorando em História. Programa de Pós-Graduação de História da Universidade
Federal de Ouro Preto. E-mail: andramos7@yahoo.com.br
3 – Mestranda em História. Programa de Pós-Graduação de História da Universidade
Federal de Ouro Preto. E-mail: thamara_rodrigues@yahoo.com.br
cia da história de Portugal. Ao fim, analisaremos the Correio Brasiliense in 1810, in order to map
uma crítica de Hipólito ao texto de Constâncio the opposing solutions designed for the Luso-
publicada no Correio Brasiliense em 1810, Brazilian Empire after 1808. We intend to dem-
buscando mapear as soluções distintas projeta- onstrate how these solutions emerged entangled
das para o futuro do Império Luso-Brasileiro a in the narrativization of the decadence of Portu-
partir dos acontecimentos de 1808. Pretende-se gal, which assumed different degrees of intensity
demonstrar como estas soluções emergiram en- in the texts of the authors discussed.
redadas à narrativização da decadência de Portu-
gal, que assumiu graus distintos de intensidade
nos textos dos autores abordados.
Palavras-chave: História da Historiografia. Keywords: History of Historiography. Historic-
Historicidade. Decadência ity. Decadence.
Introdução
É consenso em meio aos recentes estudos produzidos no âmbito da
história da historiografia brasileira a necessidade de se pensar a formação
da nação e a constituição de culturas históricas no Brasil no século XIX
a partir do estudo das permanências e continuidades discursivas que re-
montam ao passado de unidade do Império português. De fato, a forma-
ção da nação e a sedimentação de possibilidades de constituição de práti-
cas historiográficas modernas comprometidas com a tessitura de grandes
narrativas capazes de explicar a evolução e a singularidade nacional não
se processaram de forma teleológica. Dessa forma, pode-se verificar a
importância da tematização dos diversos universos nos quais emergiram
práticas de crítica histórica e possibilidades de narrativização dos eventos
no Império português, tanto na metrópoles, quanto na América portugue-
sa. Neste aspecto, destaca-se a contribuição dos estudos produzidos no
âmbito da história da historiografia brasileira que restituíram a complexi-
dade das práticas historiográficas em vigor no século XVIII, especialmen-
te na Academia Real de História Portuguesa e Academias Luso-Brasílicas
dos Esquecidos e Renascidos, demonstrando as interpenetrações ecléticas
entre crítica erudita, retórica e providencialismo (KANTOR, 2004; NI-
COLAZZI, 2010; SILVEIRA, 2012).
[...] não há maior prova que pode ser dada a essa afirmação [de que
não havia um espírito de revolução em Portugal], que a fuga recente
do Regente, que foi discretamente permitida para levar uma grande
parte da propriedade da nação e, sua marinha, sem a menor tentativa
de oposição à sua partida (CONSTÂNCIO, 1808, pp. 306-307).8
8 Tradução nossa. No Original: “No greater proof can be given of this assertion, that
the recent flight of the Regent, who was quietly allowed to carry away a great part of the
property of the nation, and their navy, without the smallest attempt to oppose his depar-
ture” (CONSTÂNCIO, 1808, pp. 306-307).
9 – Tradução nossa. No original: “John carried with him all the prejudices and corruption
of the mother country, and hardly a man of real merit followed him. Most of those who
accompanied him are in the English interest, and under the administration of men like Al-
meida, the Brazils can be nothing but a British colony; and in the richest and most fertile
country of the world, the Portuguese may still continue to be a poor and unhappy nation!”
(CONSTÂNCIO, 1808, p. 320).
das narrativas modernas, por outro, eles também eram um risco se não
trabalhados adequadamente e com prudência (PHILIPS, 1997). É a partir
desta compreensão que Hipólito criticou Constâncio, tendo em vista que
o segundo, baseado em uma linguagem sentimental bastante negativa,
não apresentava de forma satisfatória solução ou esperança clara para o
destino do Império Português, pois ao
[...] pintar o estado deplorável da nação com toda a negridão das cores,
que talvez lhe pudessem convir, mas que se acham ali sem aqueles
claros, que podendo introduzir-se sem faltar a verdade serviriam de
aliviar a dor, que naturalmente deve causar a um Português a leitura de
tão sombria e lúgubre descrição (COSTA, 1810, p. 71).
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