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NOIVA DE ALUGUEL

Jessica Steele

Whitney despertou ao lado de um fascinante desconhecido!


Whitney lutava com todas as forças para impedir que uma esperança se instalasse em
seu coração. Precisava ser realista! Como alimentar a ilusão de que Sloan poderia amá-la se
ela destruíra o noivado dele? Jamais se esqueceria daquela cena: Gleda entrando no quarto e
os surpreendendo seminus na cama. E agora Sloan lhe pedia que representasse uma farsa para
ajudá-lo, mas como conseguir isso se estava perdidamente apaixonada por ele?

Copyright: Jessica Steele


Título original: When the loving stopped
Publicado originalmente em 1988 pela Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra
Tradução: Nara Chuffi Barros
Copyright para a língua portuguesa: 1990
EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.
Av. Brigadeiro Faria Lima, 2000 — 3° andar
CEP 01452 — São Paulo — SP — Brasil
Caixa Postal 2372
Esta obra foi composta na Editora Nova Cultural Ltda
Impressa na Divisão Gráfica da Editora Abril S.A.
CAPÍTULO I
A vida tinha estado um tanto monótona ultimamente. Whitney Lawford não
conseguia se divertir naquela festa e pela centésima vez desejou ter recusado o convite de
Toby Keston para acompanhá-lo. Afastando-se do barulho, refugiou-se no vestiário e
considerou que talvez devesse se sentir feliz com sua existência tranqüila.
— Vamos — ele implorara. — Sei que você tem motivos para não querer se
envolver com os homens, mas prometo que não vou aborrecê-la.
Trabalhavam na mesma firma, tinha vinte e três anos, mas para Whitney parecia que
ele era bem mais novo. Todos gostavam desse rapaz simpático que estava sempre disposto a
ajudar e a agradar as pessoas.
— Por favor — Toby insistiu, e Whitney já começava a aceitar a idéia quando,
parecendo um menino perdido, ele continuou com voz assustada: — Val prometeu apresentar-
me a uma de suas amigas se eu não comparecer acompanhado.
Não sabia por que Toby não queria conhecer uma amiga da irmã; ficou comovida e
concordou:
— Está bem, eu irei. Em que bairro de Londres sua irmã mora? — Whitney percebeu
que Toby ficara aliviado e que ela já estava irremediavelmente comprometida.
— A festa não é na casa de Val.
— Não?
Ele balançou a cabeça.
— É uma espécie de festa-surpresa para o noivo de uma garota chamada Gleda
Caufield, que está voltando à Inglaterra depois de três meses no exterior. Ele é um magnata da
indústria e tem negócios em quase todos os países. Gleda e minha irmã estão se esforçando
para recebê-lo com uma festa de arromba!
— Será que ele vai gostar? — Whitney perguntou. Em sua opinião, qualquer homem
que estivesse três meses longe da noiva, gostaria de encontrá-la a sós quando regressasse.
— Gleda acha que sim, e Val também — Toby respondeu. — E a governanta de
Heathlands vai ajudar.
— Heathlands? — Whitney repetiu.
— A casa de Sloan Illingworth, em Berkshire — o rapaz informou de imediato.
O nome do proprietário não lhe chamou a atenção, mas ela ficou preocupada com a
distância.
— Berkshire!
— Não fica longe indo pela rodovia — ele assegurou-lhe. — E Val vai nos levar em
seu carro até lá. Assim não precisarei controlar a bebida...
Whitney escolheu um vestido leve, decotado, com alças bem finas, para usar nessa
noite quente de maio.
Quando Toby e a irmã vieram buscá-la, ela percebeu que não havia semelhança
alguma entre os dois. Além de serem diferentes fisicamente, o rapaz era caloroso e gentil,
enquanto Valerie Keston parecia ter saído do congelador. Chegaram a Heathlands sem que
Whitney mudasse de opinião.
— Fiquem à vontade — ela falou ao irmão, assim que chegaram. Em seguida gritou:
— Querido! — e foi em direção a um homem corpulento que se aproximava. Apoiando-se em
seu braço, afastou-se e deixou que Toby apresentasse Whitney à dona da festa.
— Que prazer recebê-los! — Gleda, uma loira muito elegante, sorriu para Whitney.
Em sua mão esquerda se destacava um magnífico anel de noivado com safiras e brilhantes
incrustados. Ela acenava em todas as direções para pessoas que se serviam de bebidas. Quase
ao mesmo tempo se voltava para mais alguém: — Querido, que prazer em recebê-lo!
Whitney ouviu o refrão.
— Que prazer recebê-los! — e fez uma careta em frente ao espelho do toalete. Tinha
a impressão de que se passara um século desde que ouvira Gleda Caufield recitar sua fútil
saudação. Mas fazia apenas três horas...Rezou para que o tão esperado industrial logo
aparecesse e ela pudesse manifestar o desejo de voltar para casa. De repente, verificou que
não ficaria escondida por muito tempo. Alguém entrou no toalete e Whitney tocou seus
longos cabelos castanhos com os dedos, como se acabasse de penteá-los.
Esforçando-se por colocar um pouco de alegria nos grandes olhos verdes,
cumprimentou a outra pessoa e voltou à festa. Suspeitou que todos já estivessem bêbados.
Agora as pessoas aglomeravam-se num enorme hall. Não viu sinal de Toby. Deveria
estar no toalete. Com a intenção de procurá-lo, caminhou e se afastou para dar passagem a um
carrinho de bebidas que vinha em ziguezague. Ficou irritada. Aquelas pessoas só se divertiam
espremendo-se umas contra as outras.
O homem que empurrava o carrinho estendeu-lhe uma mão trêmula com um copo.
— Obrigada, já experimentei. — Ela pretendia ser gentil.
— Este não, tem sabor de caramelo — ele gaguejou, ofendido, e seguiu, quase
atropelando as pessoas.
Então Whitney enfrentou uma verdadeira maratona. Cinco minutos depois ela ainda
estava tentando abrir caminho entre a massa humana que dançava ao som que vinha de algum
tape-deck.
Alguns homens, bem alegres, dirigiram-lhe gracejos. Contudo, sua irritação atingiu o
limite quando, encontrando um espaço livre e tentando passar por ele, foi agarrada por um
indivíduo com a face vermelha e suada.
— Ei, doçura, vamos dançar? — Ele a olhou maliciosamente e colocou as mãos
úmidas e pegajosas em seus ombros nus, fazendo-a sentir-se mal.
Só depois de alguns segundos conseguiu desvencilhar-se ao atingi-lo no estômago
com o cotovelo, fazendo-o urrar de dor. Vendo-se livre, fugiu sem se desculpar.
Whitney se chocou com alguns pares que dançavam. Ao se afastar da multidão,
chegou perto de uma escada onde não havia ninguém. Então percebeu que a luta contra o
bêbado teve uma conseqüência: a estreita alça do vestido sobre seu ombro direito estava solta.
Para sua surpresa, o acesso à escada estava bloqueado por barreiras. Lembrou que a
governanta ajudaria na recepção e tivera a preocupação de isolar o andar superior. Achou que
fora uma boa idéia. Poucos convidados, àquela hora, mantinham-se firmes e teriam condições
de enfrentar os degraus.
Tentou colocar a alça arrebentada para dentro da blusa. Deu alguns passos, espreitou
a festa e viu que a animação era geral. Esperava localizar Toby, mas, para seu desânimo, foi
um palhaço com rosto vermelho e suado que se destacou em primeiro lugar. — Oh, que
droga! — praguejou, percebendo que ele procurava alguém. — Não serei sua vítima de novo.
Prefiro qualquer outra coisa. Só não quero aquelas mãos pegajosas me segurando outra vez.
Então retrocedeu e contornou o canto da escada. Silenciosamente, desviou-se das barreiras e
começou a subir os degraus.
Atingindo o andar superior, permaneceu num canto mal iluminado e reviu a situação.
— Aqui está bem melhor — falou para si mesma. — Não há nenhuma pessoa com
quem eu gostaria de conversar. Até Toby já estava diferente quando o vi pela última vez.
Descansando seu corpo contra a parede, desejou de todo o coração que Sloan
Illingworth chegasse o mais rápido possível.
Ela não saberia dizer quanto tempo permaneceu ali.
Se demonstrasse desejo de voltar para casa, com certeza Valerie Keston a
consideraria louca. Heathlands estava situada numa região isolada e, sem condução própria,
teria de esperar até que a irmã de Toby resolvesse ir embora.
Cansaço e chateação tomaram conta dela.
Já passava de seu horário de dormir e Whitney voltou-se para olhar a porta de um
quarto do outro lado do corredor.
— Deve haver um banco ou uma cadeira lá dentro — pensou. Ela se esforçava para
resistir à tentação de abrir a porta. Certamente a governanta chaveara os quartos como fizera
com outros cômodos no andar inferior.
Sua educação determinava que ela não poderia ficar escondida até ouvir alguém
gritar: "Surpresa! Surpresa!" Suspirou e afastou-se da parede com a intenção de juntar-se à
algazarra. Porém, contra sua vontade, viu sua mão segurar o puxador da porta do quarto. Seus
dedos foram incapazes de soltá-lo antes de experimentar e... ele não estava trancado. Abriu a
porta vagarosamente; apenas a luz da escada iluminava o aposento. Nessa semi-escuridão, não
conseguia observar todos os detalhes do quarto. Mas, bem no centro, havia uma cama.
— Uma cama! — lembrou saudosa, e tentou dominar o impulso de entrar e passar ali
alguns momentos calmos. De repente, uma risada estridente ecoou pelos ares, anunciando que
a festa continuava ainda mais selvagem.
Whitney agiu instintivamente, e depois de alguns segundos refugiava-se naquele
quarto. "Vou dar um tempo. Farei uma pausa", pensou. "Não sei a quem pertence este quarto,
mas ficarei só alguns minutos... ninguém vai saber..."
Deixando a porta encostada, entrou e sentou numa extremidade da cama para
espairecer por alguns minutos.
Era agradável sentir a escuridão calma. Tardiamente concluiu que nunca deveria ter
concordado com Toby. A movimentação que acontecia no primeiro andar parecia mais uma
anarquia do que o tipo de festa que costumava freqüentar.
Inconscientemente, tirou os sapatos e colocou os pés sobre o colchão. Outros
pensamentos assaltaram sua mente: a culpa dessa situação seria da festa ou dela mesma? Seria
diferente se estivesse acompanhando Dermot, e não Toby?
Dermot...
Suas lembranças pousaram em fatos ocorridos há seis meses, quando ainda
trabalhava na empresa Implementos Hobson. Numa segunda-feira, fora apresentada a Dermot
Selby. Ao cumprimentá-lo, Whitney ouviu:
— Tenho certeza de que vamos nos entender bem!
Ela soube por intuição que sua vida nunca mais seria a mesma. E estava certa. Em
pouco tempo ela e Dermot estavam saindo juntos, regularmente, conforme ele determinava. E
justificou:
— Se não fosse por este novo emprego e pelo fato de que ainda tenho muito a
aprender, eu a veria todas as noites, querida, mas...
— Não precisa dizer nada, eu posso entender — ela interrompeu. Estava satisfeita
encontrando-o duas vezes por semana. Além disso, gostaria de ser sua secretária para
trabalhar com ele até mais tarde. Simplesmente, já o amava.
Já se viam há dois meses e um dia. Aproveitando a hora do almoço, Whitney fora
fazer algumas compras. Entrava numa galeria quando viu Amanda Clarice, a mulher que tinha
a sorte de ser a secretária de Dermot. Elas não se conheciam muito bem e Whitney
cumprimentou-a com um movimento de cabeça. Percebeu que Amanda hesitava, e parou para
saber o que ela tinha a dizer. O que ouviu deixou-a completamente abalada:
— É verdade que você tem se encontrado com Dermot Selby? A primeira idéia que
lhe veio à cabeça foi de que a secretária estivesse com ciúme.
— Sim, já saímos juntos algumas vezes.
Whitney procurava palavras que pudessem aliviar alguma dor que Amanda sentisse.
Contudo, para sua surpresa, ouviu-a dizer:
— Não pense que estou enciumada. Estou preocupada, e preocupada com você.
A princípio, Whitney nada entendeu, mas a secretária de Dermot continuou:
— Você sabe que ele é casado, não sabe?
— Casado? — Essa pergunta revelava que ela desconhecia o fato. — Não pode ser!
Você está enganada. Você...
— Então pergunte a ele — Amanda interrompeu com calma, e saiu.
Atordoada, Whitney não queria acreditar naquelas palavras.
De volta ao escritório, não conseguiu se concentrar no serviço.
"Ele não pode ser casado", continuou pensando. "Talvez tenha se casado, mas agora
está divorciado."
Sabia que Dermot passaria a tarde toda fora, senão iria lhe perguntar diretamente.
Teria de esperar até a noite, quando se encontrariam para jantar.
Mais tarde, em seu apartamento, Whitney recordou os últimos tempos. Certa vez
comprara dois ingressos para um show que ele pretendia assistir. Queria lhe fazer uma
surpresa, mas fora ela quem ficara surpreendida com sua reação:
— O que você está pensando? — Dermot quase gritava. — Já tenho compromisso.
Sábado vou buscar minha tia no aeroporto.
Agora ela se lembrava de que nunca ouvira falar dessa tia antes. Será que um homem
solteiro, com trinta anos, ocuparia suas noites de sábado esperando por uma tia no aeroporto?
Ou não saía nos fins de semana porque tinha uma esposa?
Whitney sofria com esses pensamentos. Em outra ocasião, quando se despediam, ele
exclamou, alarmado:
— Não deixe minha camisa marcada de batom!
— Ora, você é um rabugento. Eu nem estou usando batom agora.
Sem dar conta de seus atos, Whitney saiu da beirada da cama onde estava sentada,
em Heathlands, e deitou-se com a cabeça sobre o travesseiro; seus pensamentos voltaram
àquela noite quando abriu a porta para Dermot.
— Boa noite, querida — ele a cumprimentou. — Você está tão pálida!
— Entre — ela convidou. Não esperou chegar até o apartamento e, escapando das
mãos que queriam abraçá-la, perguntou bruscamente: — Você é casado?
— O quê?... Quem foi que te falou...
— Adeus, Dermot — ela se expressou com voz fria e manteve a porta aberta.
Quando se recuperou, ele falou:
— Não é como você está pensando.
— Você é ou não é casado? — ela persistiu na pergunta. E essa moça que falava
friamente era uma estranha para ela, pois Whitney sempre se mostrava calma e compreensiva.
— Sim... sou casado — Dermot foi forçado a admitir. — Mas eu amo você!
As pernas de Whitney tremiam. Ela desejara que Dermot a amasse. Ouvir essa
declaração seria o coroamento de todos os seus sonhos.
— E você ainda vive com sua mulher? — a voz soou menos seca. Talvez o aceitasse
se ele e a esposa estivessem separados.
Mas a resposta de Dermot não foi aquela que esperava ouvir:
— Eu preciso viver com ela por enquanto...
— Precisa?
— As crianças ainda são muito pequenas — ele argumentou, chocando-a mais ainda.
Não passara pela sua cabeça que ele tivesse filhos. — Mas logo que elas crescerem, eu a
deixarei e nós...
Whitney procurou se controlar. Desapontada, interrompeu-o antes que tentasse
qualquer outra explicação:
— Nós... coisa nenhuma. Nunca! — ela gritou, ofendida. Abrindo mais a porta,
recusou-se a ouvir mais detalhes.
Aquela noite, chorara por um homem que não merecia suas lágrimas.
Mais tarde imaginou se essas lágrimas foram derramadas porque terminara com
Dermot ou se, por causa dele, recordara-se do sofrimento de sua mãe.
Quando tinha vinte anos, morava com os pais e eram muito felizes. Certo dia,
atendeu à porta e cumprimentou uma mulher de aproximadamente trinta e cinco anos.
Mandou-a entrar quando soube que ela desejava ver o sr. Lawford.
— Desculpe-me, mas não ouvi seu nome — Whitney lembrou quando ia apresentá-la
à mãe.
— Meu nome não é importante — ela replicou, e deixou as duas sem fala ao
informá-la de que, há cinco anos, ela era a sra. Lawford.
A princípio, Whitney se recusou a acreditar e ia indicar a porta para que a mulher se
retirasse. Nesse instante, Lawrence Lawford entrou na sala e três pares de olhos voltaram-se
para ele.
— O que... — começou a esbravejar. Seus olhos moviam-se da estranha que dizia ser
sua amante até a face muito pálida da esposa.
— Eu tinha de vir...
Whitney ficou horrorizada. A expressão daquela mulher revelava que seu pai
prometera abandonar a família e ela não queria esperar mais.
Mas as coisas não aconteceram assim. Lawrence Lawford não tinha a intenção de
deixar sua confortável casa.
Whitney nunca conseguiu saber o que acontecera entre os pais depois daquele dia.
Sua mãe tornara-se uma pessoa fechada e distraída, que nunca concluía as coisas que
começava a fazer. Certo dia, quando dirigia o carro, sem nenhuma razão aparente, chocou-se
com um caminhão parado. Nunca mais se recuperou, e veio a falecer. Ela não havia superado
o choque, nem conseguira esquecer a traição do marido.
Whitney ainda amava o pai, mas esse fato afastou-os um pouco. Tempos depois ele
se casara novamente, mas não com a antiga amante. Ela então saiu de casa.
Em Londres foi morar num pensionato e conseguiu um emprego na firma
Implementos Hobson. Estava lá havia quatro meses quando se instalou no apartamento. Ao
terminar com Dermot, pediu demissão. Um mês após era admitida na Plásticos Alford e logo
conheceu o inofensivo Toby Keston.
— Vai fazer alguma coisa esta noite? — ele quis saber logo no primeiro fim de
semana.
— Vou. — Ela fora agressiva, sem se importar se feria os sentimentos do rapaz.
Essa indelicadeza não a deixou satisfeita. Agredindo-o, agrediu a si mesma.
Começou a entender que nem todos os homens eram iguais.
Com Toby em seu pensamento, Whitney imaginou se não deveria enfrentar a festa e
procurar por ele. Entretanto, sentia-se mais confortável ali, sozinha, do que em qualquer outro
lugar da casa.
Não saberia dizer quanto tempo se passou. Calculava que já fossem mais ou menos
duas horas da manhã. E o barulho continuava intenso no andar inferior.
Uma sonolência tomou conta dela quando fechou os olhos para se decidir procurar o
rapaz. Mas, se não descesse, não presenciaria a chegada do noivo.
Sentindo frio, puxou inconscientemente um acolchoado e acomodou-se sob ele.
— Que delícia! — sussurrou, e anotou mentalmente que precisava alisar a coberta
antes de deixar o quarto.
E onde estaria Sloan Illingworth? Seu vôo estaria atrasado?
A idéia de vôo lembrou-lhe Dermot esperando a tia no aeroporto. De repente,
começaram a passar pela sua cabeça as figuras de seu pai, de sua mãe, de Dermot, e de um
desconhecido Sloan Illingworth. Uma imagem seguia a outra rapidamente ao som de uma
música longínqua e Whitney adormeceu.
Despertou do sono acreditando que estava no meio de um pesadelo. Primeiro, uma
voz aguda e penetrante gritava:
— Venha, idiota, você sabe que não pode ir à parte superior da casa!
Depois, antes que fizesse idéia de onde pudesse estar, alguém invadiu o quarto,
encontrou o interruptor e iluminou o cômodo inteiro. A claridade fez com que ela acordasse
de uma vez. E foi quando o pesadelo começou.
Deitada de um lado da cama, subitamente viu um braço nu que surgia de baixo do
mesmo acolchoado que a cobria. Então, abriu bem os olhos. Não soube como, mas não estava
sozinha naquela cama.
Antes que pudesse relaxar os músculos, o companheiro, visivelmente irritado,
resmungou e sentou.
Whitney estava para se sentar também quando uma voz vinda da porta atingiu-lhe os
ouvidos. Seus olhos perceberam seu próprio braço nu. Com as idéias confusas, não foi capaz
de saber se estava totalmente sem roupas, como aquele homem parecia estar. Ela se voltou
vagarosamente para a porta e viu a gritaria começar:
— Seus cretinos! Miseráveis! — Uma multidão contemplava os dois na mesma
cama. — Pensar que durante todos esses meses eu confiei em você — a voz reclamava outra
vez.
Então Whitney se arrepiou. À frente do grupo, a mulher que ralhava com o homem a
seu lado não era outra senão Gleda Caufield! Ela ainda não conhecera seu noivo. Porém, ao
observar o homem com trinta e poucos anos, de boa aparência e que balançava a cabeça para
espantar o sono, teve a certeza de que estava acabando de ter o prazer de conhecê-lo...
CAPÍTULO II
Whitney não teve muito tempo para analisar seu anfitrião de cabelos lisos e olhos
cinzentos. Gleda Caufield parou de importuná-lo, mas começou a lançar sua fúria contra ela.
— E quanto a você, sua sem-vergonha — insultou-a com a voz bem alta —, espero
que esteja satisfeita, agora que meu noivado terminou.
Whitney tinha certeza de que não fizera nada errado. Devia ser mesmo um pesadelo.
Para seu alívio, Sloan Illingworth vestiu um roupão que misteriosamente aparecera
ao pé da cama e levantou-se para resolver a situação.
Ela o fitava, ainda atordoada, quando ele se dirigiu à noiva. Como por milagre, as
pessoas haviam sumido. Segurando o braço de Gleda, ele a conduziu para fora do quarto.
Verificando que, como era seu desejo, estava totalmente vestida, saltou da cama
também. Entretanto, para onde iria? Sloan com certeza estaria fazendo a noiva entender que
as aparências enganavam. Se alcançasse seu objetivo, não haveria problema em encarar Gleda
Caufield outra vez. Seu rosto parecia pegar fogo; resolveu esfriá-lo no banheiro particular
cuja porta estava entreaberta.
Dez minutos depois ela já recuperara sua abandonada compostura. Não sabia se
deveria aparecer antes que Gleda e o noivo tivessem esclarecido as coisas; já havia feito muito
por uma noite.
Por um momento ficou cismada com o fato de Sloan Illingworth ir para a cama
quando sua noiva o esperava com uma festa. Então lembrou-se de que Valerie dissera alguma
coisa sobre negócios no exterior.
"Ele deve ter enfrentado um vôo prolongado, por isso chegou atrasado. Quis dormir
porque se sentia exausto."
Agradeceu aos céus por não ter visto Toby nem a irmã dele na porta do quarto.
Contudo, era certo que logo eles tomariam conhecimento do fato.
Whitney ficou no banheiro por mais dez minutos. Era tempo suficiente para Sloan
convencer Gleda de que não a estava traindo. Curiosa, abriu uma fresta na porta para ouvir
alguma coisa.
Ali reinavam uma paz e um silêncio impressionantes. Não acreditando que a casa
pudesse ter se tornado esse paraíso depois de parecer uma torre de Babel, ela abriu a porta um
pouco mais. E alguém rompeu o silêncio:
— Se você pretende sair desse banheiro, por favor, saia logo. Eu gostaria de dormir
agora!
Whitney abriu totalmente a porta e, com os nervos à flor da pele, respirou fundo
antes de enfrentar o dono daquela voz agressiva.
— Você é... Sloan Illingworth? — indagou, tomando ciência do peito largo, peludo e
nu do homem que estava sentado na cama.
— Em carne e osso — ele retrucou sem nenhum humor. Seu olhar percorreu o corpo
de Whitney do alto de sua cabeça morena até os dedos de seus pés descalços. — Vejo que
conseguiu encontrar suas roupas.
Whitney levou um susto, mas um segundo depois conseguiu responder:
— Elas não estavam perdidas. — Rapidamente compreendeu que ele a analisara,
concluindo que estivera tão nua quanto ele. E acrescentou: — Na verdade, um sujeito
indecente arrancou a alça do meu vestido esta madrugada. Mas eu não me separei de minhas
roupas enquanto estive aqui. Apenas de meus sapatos.
— Você está se vangloriando ou se lamentando? — ele zombou.
Ela não gostou de Sloan Illingworth. Tentou ignorá-lo e começou a procurar os
sapatos. Encontrou-os sob a cama e calçou-os imediatamente. Era um pouco mais alta que a
maioria das moças, mas diante daquele homem, mesmo sentado, sentiu-se melhor com uns
centímetros a mais.
Ele só esperava que ela saísse do quarto para tornar a dormir, mas Whitney lembrou
que lhe devia desculpas.
— Sinto muito — dirigiu-se a ele com sinceridade, e acrescentou enquanto
caminhava para a porta: — Sei que não deveria ter vindo aqui e me deitado em sua cama,
mas...
— Você estava sozinha? — ele interpelou-a, olhando-a de um modo devastador.
— Claro que estava sozinha — ela se defendeu.
— Não estava se divertindo na festa?
— Não... é o tipo de festa que costumo freqüentar — ela explicou de um modo
polido, uma vez que fora sua noiva quem organizara a recepção.
— E por isso você resolveu ir para a cama?
— Não tive intenção — negou. — E não ouvi você entrar...
— Não quis incomodá-la — ele gracejou.
Whitney poderia jurar que vira um sorriso ao final de sua irônica observação.
— Você sabia que eu estava deitada — ela exclamou, dando um sentido real àquela
ironia.
— Honestamente, não! — ele exclamou.
Whitney se espantou. Ele devia estar pensando que ela era uma pessoa insensível,
que não percebera seu humor.
— Bem, de todo modo — ela dava um outro passo em direção à porta —, sinto muito
sobre isso. E é natural que Gleda tenha ficado furiosa. Agora que tudo já está esclarecido e
vocês estão noivos outra vez, eu...
— Agora... — Sloan interrompeu-a — De onde você tirou essa idéia? Pensa que
ainda estou noivo e que vou me casar?
— Você não está? — Whitney gaguejou, detendo-se bruscamente e voltando um
passo para dentro do quarto.
Ele balançou a cabeça:
— Não!
Ela ficou angustiada. Com certeza Gleda se aborrecera e não quis ouvir suas
explicações.
— Sinto muito mesmo. — Whitney poderia ficar repetindo que sentia muito até não
ter mais voz, mas isso não faria Gleda reatar o noivado. — Irei falar com Gleda. Ela ficará
sabendo que você não tem culpa de nada, que nem sabia que eu estava na cama... — Diria
isso à mulher que era apaixonada por ele?, pensou. — Agora vou me retirar — falou com
firmeza e voltou-se em direção à porta.
— Posso saber aonde você vai? — a voz de Sloan Illingworth era baixa.
— Para o andar térreo, naturalmente. Falarei com Gleda e...
— Se acha que vai encontrar minha ex-noiva lá embaixo, receio que fique
desapontada — ele a interrompera outra vez. — Ela já foi embora...
— Foi? — Whitney ficou atônita. — Mas...
— E todos os seus amigos também.
— Todos? — ela gaguejou, pois isso a afetava diretamente.
— A festa, como diz aquela canção — ele falava-lhe com calma — a festa acabou!
— Acabou?
— E, por favor, pare de parecer um papagaio! — Sloan murmurou sarcasticamente.
Só então Whitney se deu conta de que repetia todas as suas palavras. Então quis
mostrar que não era ingênua. Ele não era tão esperto quanto pensava.
— Nem todos devem ter saído. As pessoas que me trouxeram devem estar me
esperando para voltarmos a Londres.
Sloan Illingworth nem desejou saber com quem ela viera.
— Acredite-me. Não há mais ninguém — ele usou um tom baixo em resposta a suas
maneiras petulantes.
— Como você pode ter certeza? — ela o questionou com hostilidade.
— Eu vi o último carro partir! — ele finalizou.
Ele deixou de ser amável, Whitney pensou. Agora está demonstrando uma
impaciência que até posso compreender. Afinal, ela tinha sido a causa do rompimento de seu
noivado. Mas, para o momento, Whitney tinha um problema mais urgente.
— Então — gritou —, se Toby e sua irmã já foram, como poderei voltar para casa?
O olhar que recebeu de Sloan Illingworth lhe informava que ele não era responsável
por Toby, ou por sua irmã, ou por ela mesma. Deixou claro que seu apuro nada tinha a ver
com ele. O sono dominava-o.
— Pelo amor de Deus — estava irritado ao máximo. — Eu quero dormir. —
Conscientizando-se de que ele mesmo teria de encontrar a solução para o problema, deu um
último conselho: — Vá fazer qualquer coisa. Ouça música, caminhe pelo jardim. Ou, melhor
ainda, limpe tudo. Acabe com os vestígios da festa. Quando acordar, pensarei em seu caso.
— Você está sugerindo que eu faça uma limpeza?
— Não vejo por que ela deva ser feita só pela minha governanta.
Desanimada, Whitney concluiu que não iria a lugar nenhum antes que aquele bruto
dormisse e descansasse. Nem passara pela sua cabeça que teria de limpar a casa quando
aceitou o convite de Toby. A aurora já começava a invadir o céu escuro quando ele ordenou:
— Apague a luz quando sair. — Virou-lhe as costas, encerrando a conversa. Estirou-
se e com certeza fechou os olhos.
A esperança de Whitney era que ele acordasse com bom humor.
— Idiota — murmurou entre dentes.
As barreiras colocadas na escada tinham sido removidas. Com certeza foram
afastadas por ele quando entrou, ela imaginava enquanto descia os degraus.
Whitney ficou espantada com o estado da casa, agora que a festa terminara. Claro
que não pretendia limpar nada. Mas teve de concordar com o bruto que agora dormia:
nenhuma governanta teria obrigação de pôr ordem numa confusão daquelas. Não havia um só
espaço sem que se encontrassem sobras da folia daquela noite.
Verificou que um corredor levava até a cozinha. Então encontrou um carrinho e
começou a reunir copos, pratos usados e guardanapos amassados.
Durante aproximadamente uma hora, o estado de espírito de Whitney sofreu várias
transformações. Pensou em Sloan Illingworth como uma miserável criatura. Depois de três
meses de ausência, rompera o noivado na própria festa de boas-vindas e não demonstrava a
menor preocupação com o fato.
Quando acabou de organizar os cômodos onde os convidados se divertiram, Whitney
decidiu lavar os pratos e os copos na cozinha. Não ligara a lava-louças, pois temia apertar
errado algum botão e deixá-la encrencada.
Estava com espuma até os cotovelos quando começou a sentir-se inconformada outra
vez. Quem, em seu juízo perfeito, ficaria junto a uma pia de cozinha às cinco horas da manhã
de um domingo? Pensando assim, passou as mãos pela água da torneira e enxugou-as.
Depois de cinco minutos, ela se encharcava de espuma novamente.
Bem que gostaria de castigar Sloan lllingworth e deixar que ele mesmo lavasse a
louça...
Não havia sinal da governanta, mas Whitney poderia apostar que a limpeza sobraria para ela
se tudo não estivesse no lugar. E, como aquele indivíduo que dormia lá em cima havia
declarado, por que só a governanta deveria se encarregar disso?
Whitney também não via motivo para ela mesma assumir a tarefa. Talvez fosse
porque, além do antagonismo, havia um forte sentimento de culpa. Foi por sua causa que
Sloan Illingworth perdera a mulher que amava. E ela sabia como era doloroso perder a pessoa
amada. Só que ela mandara Dermot embora, e Sloan fora desprezado pela noiva... De
qualquer modo, uma separação era sempre triste.
Já estava tudo lavado e Whitney começou a trabalhar na sala de visitas. Removeu o
último sinal deixado por um copo molhado numa mesa, levantou a cabeça e admirou a
mobília da sala. Estranhou que a governanta permitisse que aquele pessoal mal-educado
circulasse livremente naquele ambiente fino. Porém, imediatamente lembrou que ela não tinha
escolha. Se as coisas continuassem como estavam, Gleda Caufield seria a dona de Heathlands.
Ela daria as ordens e a governanta teria de acatá-las.
Faltavam dez para as oito quando Whitney foi à cozinha preparar um chá. Tomava
sua primeira xícara quando uma mulher de mais ou menos cinqüenta anos entrou
inesperadamente. Ao ver a jovem saboreando a bebida com tranqüilidade, parou assustada.
— Bom dia — Whitney sorriu. — Espero que a senhora não se importe por ter me
utilizado de sua chaleira. Meu nome é Whitney Lawford.
— Prazer em conhecê-la — a mulher respondeu e também se apresentou: — Sou a
sra. Orton, governanta do sr. Illingworth. — E, cautelosamente, interrogou: — Há ainda
outros... convidados aqui?
— Não, apenas eu — ela se apressou a acalmar a governanta. Para disfarçar o que
havia acontecido, acrescentou: — Todos se retiraram e se esqueceram de mim...
— Eu entendo — a sra. Orton murmurou, dando a impressão de que não acreditava.
Whitney quis dar uma satisfação:
— O sr. Illingworth prometeu me levar para casa depois que descansasse um pouco.
— Ele é realmente um homem muito gentil.
Talvez ele tratasse sua governanta com gentileza, Whitney ponderou, e resolveu
mudar de assunto:
— Eu quis tomar uma xícara de chá antes da limpeza...
— Oh, não posso deixar você fazer isso — a sra. Orton protestou, sem saber que essa
tarefa já estava sendo feita havia três horas. — Além disso, acabei de dar uma olhada e a casa
não está tão desarrumada como eu imaginava.
Demonstrando que ficaria mais feliz se estivesse sozinha na cozinha, começou a
colocar os pratos limpos no lugar.
— Tomarei meu chá na sala de visitas — Whitney avisou. Não queria perturbar a
governanta.
— Posso lhe preparar o café da manhã? — a sra. Orton estava mais simpática.
— Obrigada, sra. Orton — Whitney replicou. — Não tenho vontade de comer nada.
Tudo o que queria eram oito horas de sono! Terminou o chá e sentou-se no
confortável sofá. De repente sentiu um cansaço enorme. Colocou a xícara e o pires numa
mesinha, tirou os sapatos e estendeu-se no sofá. A sra. Orton estaria ocupada em outro lugar e
Sloan Illíngworth não deveria aparecer antes do meio-dia. Portanto, não havia razão para não
tentar dormir um pouco também.
Desta vez, quando acordou, não observou ombros largos e nus a seu lado. Viu uns
olhos cinzentos que a fitavam intensamente. Aquele homem parado, alto, com os ombros
cobertos por uma camisa xadrez, fez seu coração acelerar.
— Que horas são? — desejou saber enquanto se sentava e empurrava os pés para
dentro dos sapatos. Sentiu uma perturbação muito grande ao vê-lo vestido. Nem fora capaz de
consultar seu próprio relógio.
— Falta pouco para as dez.
Whitney achou que ele estava sendo amável, considerando que ela havia arruinado
seu futuro.
— Gleda, sua noiva, ou ex-noiva, já telefonou?
— E por que ela deveria telefonar? — ele zombou. Ela pensou que ainda não
estivesse bem acordada.
— Sinto muito — desculpou-se.
Imediatamente ficou irritada consigo mesma e com ele também. Tinha a impressão
de que ele gostava de vê-la se desculpando o tempo todo. E, para evitar algum comentário que
pudesse humilhá-la, ela arriscou sem rodeios:
— Agora podemos ir?
— Ir para onde? — ele perguntou, também sem rodeios.
— Você me prometeu uma carona...
— Agora eu vou tomar café. — Caminhava a passos largos quando acrescentou: —
É melhor você fazer o mesmo. Vamos!
Whitney estava a ponto de lhe dizer que não queria café nenhum.
Ele se aproximou, tomou-lhe o braço, obrigando-a a acompanhar seus passos
rápidos. Sua respiração começou a falhar e ela estava consciente de que ele a dominava.
No momento em que recuperou seu equilíbrio, eles atravessavam o corredor.
Whitney sentiu fome e desistiu de mandá-lo tomar o café sozinho.
Entraram numa saleta que ficara trancada durante a noite.
Para sua surpresa, Sloan Ilingworth tornara-se muito amável. Puxou-lhe uma cadeira
e esperou que ela se acomodasse.
— Obrigada — Whitney agradeceu em voz baixa.
A sra. Orton trouxe-lhes dois pratos com ovos e bacon e retornou à cozinha. Agora
ambos saboreavam uma deliciosa refeição.
Pouco antes, ao se referir à carona, Whitney o deixara nervoso. Levá-la a Londres
não estava em seus planos. Dali para a frente seria bem diplomata.
— Posso? — perguntou gentilmente, oferecendo-se para colocar café em sua xícara.
Ele concordou com um simples movimento de cabeça. Ficou mais difícil tentar um
diálogo. Whitney detestava pedir favores. Não queria ficar mais tempo naquela casa e com
certeza ele não a queria por perto. Esforçando-se para sorrir, entregou-lhe a xícara com café.
— Sr. Illingworth — sua voz era tão suave que ele se surpreendeu.
Os olhos cinzentos se estreitaram e se fixaram em seu rosto. Um brilho diferente
tomou conta deles.
— Sr. Illingworth — repetiu especulativamente. Ele não era bastante conhecido para
receber um tratamento menos formal. Mas ficou espantada quando, imitando seu tom de voz,
ele quase murmurou:
— Mesmo depois de dormir comigo continuo sendo "sr. Illingworth" para você?
— Você... eu... — Nesse momento ficou satisfeita porque ninguém estava ouvindo
aquela conversa.
— Ora, vamos, srta... Desculpe-me, estou sendo negligente. Diga-me, qual é o nome
da mulher com quem recentemente tive o prazer de compartilhar minha cama?
Aquele brilho estranho ainda permanecia nos olhos cinzentos! Para Whitney ele só
tocava nesse assunto por vingança. Gleda não devia sair de sua cabeça! A idéia da noiva
parada à porta do quarto, assustada e ofendida, devia mexer com todos os seus nervos. Ela
havia organizado uma festa-surpresa para ele, mas a surpresa fora encontrá-lo na cama com
uma das convidadas.
— Meu nome é Whitney Lawford — informou-lhe com voz grave. Tentou se
dominar e não apresentar mais nenhuma desculpa. Acabou dizendo: — Eu realmente sinto
muito.
— Você sente muito porque achou a festa insuportável? Porque se decidiu esconder
onde pensou que ninguém fosse encontrá-la?
Whitney ficou vermelha de raiva. Ela se desculpara pelo choque que causara a sua
noiva. Todavia, ele fizera uma observação que estava bem próxima da verdade.
— Eu não pretendia dormir — falou um pouco envergonhada —, e também não
sabia de quem era aquele quarto.
— Você não teve a menor preocupação em saber de quem era aquele quarto — Sloan
replicou com desprezo na voz. — Nem com as conseqüências que poderiam resultar de seu
ato.
Novamente lembrou seu sofrimento quando rompera com Dermot. Ela não tinha
defesa e baixou os olhos. Não era sua culpa, porém o amor havia acabado para ele.
Whitney pretendia apresentar arrependimento, e responsabilizou seu orgulho por ter
levantado os olhos sem humildade:
— Sei que meus atos resultaram num desastre para você. Por isso não me queixo por
você obviamente ter segundas intenções quanto a me ajudar a voltar para Londres. —
Devagar e com dignidade ela colocou o guardanapo sobre a mesa. — E como amanhã cedo
serei novamente uma secretária, eu... agradeço a hospitalidade e vou...
— Eu disse que tinha segundas intenções? — ele cortou sua frase.
— Não, mas...
— Então, por favor, tenha a gentileza de não tirar conclusões sobre o que penso, ou
como penso, ou qualquer coisa a mais sobre mim — ele redargüiu com voz firme. — Eu lhe
falei que encontraria um modo de você voltar para casa. Essa é a minha única intenção.
Whitney não gostou da sensação de que acabara de ser repreendida pelo atrevimento.
— Certo — ela falou meio sem jeito. — Mas ontem à noite, quando escolhi este
vestido, não pensei que passaria o domingo todo com ele. Por esse motivo, você poderia, por
favor, me dar uma idéia de quanto tempo ainda precisarei para chegar em meu apartamento,
tomar um banho e trocar de roupa?
A resposta de Sloan foi atirar seu guardanapo sobre a mesa também. Não parecia
amigável.
— Dê-me dez minutos para apanhar uns papéis, e sairemos daqui!
— Você vai a seu escritório! — ela exclamou.
Sem dizer mais nada, Sloan Illingworth deixou a sala.
Whitney voltou a seus pensamentos amargos. Levantou-se e ficou andando pelo hall.
Como havia prometido, Sloan voltou em dez minutos. A pasta de couro confirmava
que iria ao escritório depois que a deixasse em casa. Saíram mudos, e silenciosamente ele
abriu a porta do seu magnífico carro preto.
Em pouco tempo Heathlands ficava para trás. Whitney esperava esquecer os
acontecimentos dessa noite desagradável.
Apenas um profundo silêncio vinha do homem atrás do volante, e ela não tinha como
censurá-lo. Além do mais, ele estava resolvendo o problema de uma pessoa desconhecida e
impertinente como ela.
Ao se aproximarem de Londres, Whitney forneceu-lhe o endereço, sem ouvir
nenhum comentário. Whitney olhou para fora da janela e esforçou-se para odiá-lo. Um
sentimento de culpa a invadia e não conseguia desprezá-lo.
Achava que, embora não demonstrasse, Sloan estava sofrendo por Gleda. Seu
próprio sofrimento fez seu coração entristecer-se por ele.
Ainda sofria por ele quando, depois de indicar-lhe algumas direções, Sloan encostou
o carro em frente a seu apartamento. Podia ler-lhe no rosto que ficaria agradecido se Whitney
se apressasse em saltar.
— Sloan — sussurrou. O "sr. Illingworth" se perdera em algum lugar.
Friamente ele voltou a cabeça para olhá-la.
— Sloan — repetiu, e, com voz emocionada, quase implorou: — Se houver alguma
coisa que eu possa fazer...
Com uma sobrancelha levantada, ele respondeu secamente:
— Garanto-lhe, srta. Lawford, que você já fez muito mais do que possa perceber.
CAPÍTULO III
Toby Keston esperava por Whitney no escritório na segunda-feira. Sentia-se
envergonhado e precisava pedir desculpas por tê-la abandonado na festa.
— Posso jurar que não pretendi fazer isso — afirmou com sinceridade. — Não sei
lhe dizer quanto bebi. Algum idiota teve a idéia de completar meus drinques a todo instante.
Ontem à tarde, quando acordei em meu apartamento, nem conseguia me lembrar direito da
festa.
— Você deve ter ficado numa situação... — Whitney murmurou cuidadosamente.
Imaginava se ele ficara sabendo que Sloan Iilingworth não estava mais noivo, e por sua culpa.
—- Fiquei desesperado ao saber que vim para casa com minha irmã, e você não
voltara conosco. Senti-me um imbecil quando Valerie explicou que chamara alguém para me
colocar dentro do carro. Você havia desaparecido e ela achou que estivesse com outra pessoa.
Você não teve problema, teve? — perguntou ansioso.
— Não, nenhum — Whitney respondeu, ainda imaginando se ele sabia alguma coisa.
— Ainda bem! — Ele sentiu um alívio e acrescentou: — Quase fui até sua casa para
ver se estava tudo bem. Mas, para falar a verdade, fiquei com uma terrível dor de cabeça e não
tinha certeza se você me receberia com prazer. — Toby fez uma pausa. Em seguida, para
assegurar o próprio sossego, indagou: — O sujeito que lhe ofereceu carona foi correto, não
foi? Quero dizer... ele não tentou...
— Ah, sim, ele foi ótimo — Whitney tranqüilizou-o. Resolveu não informá-lo de que
voltara para Londres com o dono da casa onde acontecera a festa. — A que horas você saiu de
Heathlands? — tentou descobrir mais alguma coisa.
— Não sei ao certo. Deve ter sido antes da chegada do noivo. Ontem fui obrigado a
ouvir um sermão. Segundo Valerie perdemos a melhor parte da festa por minha culpa.
— Quê! — Whitney ficou decepcionada. Não seria capaz de perguntar o que a irmã
quis dizer com aquilo. Será que "a melhor parte da festa" fora a chegada do noivo? Ou teria
sido quando o homenageado fora surpreendido na cama com outra mulher?
Nesse momento o chefe de Whitney passou por eles.
— Bom dia, sr. Parsons — Toby cumprimentou-o com o tom normal que usava com
todas as pessoas. — Falo com você mais tarde — sorriu para Whitney. Deixou a sala, pois o
sr. Parsons não apreciava funcionários que perdiam tempo em longas conversas.
O trabalho que Whitney desenvolvia para a empresa era agradável, porém não lhe
exigia muito esforço. Naquela segunda-feira ela teve muito tempo para deixar a imaginação
voar. A cada instante os acontecimentos do fim de semana retornavam a sua mente.
Estava curiosa para saber se Sloan Illingworth fizera as pazes com a noiva. Porém,
não tinha como se informar, a não ser que lhe perguntasse diretamente. Ela não iria fazer isso
e continuou aflita. Duas pessoas que se amavam agora estavam separadas devido a seu
procedimento imprevidente!
Às onze horas da noite, quando se preparava para dormir, ela ainda pensava no
assunto. Mas uma vizinha bateu à porta com o toque característico que usava.
Érica Fane estava sempre bem-humorada. Tinha trinta e dois anos, um ótimo
emprego, e à noite fazia um curso de graduação na universidade. Embora fosse eficiente em
seu trabalho e em seus estudos, ela se preocupava menos com outros assuntos.
Whitney já se acostumara com o horário especial de Érica e foi abrir-lhe a porta.
— O que... — começou, mas parou quando a vizinha levantou uma lata de sardinhas
no ar.
— Não tenho aula esta noite...
— Entre, já que está livre.
Foram até a cozinha onde Whitney preparou duas xícaras de chocolate.
— Estou louca para descobrir onde você esteve sábado quando, com estas sardinhas
na mão, vim bater a sua porta e...
— Bem, sente-se, que vou lhe contar.
— Céus! — Érica exclamou depois que Whitney lhe fez um minucioso relatório.
Agora já sabia como a amiga fora descoberta na cama com um industrial milionário. — Você
não é desse tipo!
— Fico muito lisonjeada com isso — Whitney ironizou. — Mas o que posso fazer?
— Nada. Absolutamente nada, querida. Você se ofereceu para fazer tudo o que fosse
possível. Honestamente, se eu encontrasse meu noivo na cama com outra mulher, a última
pessoa que eu desejaria ver seria essa mulher. Esqueça isso — Érica aconselhou.
Ela fora a única pessoa para quem Whitney fizera confidências sobre Dermot. E
concluiu:
— O amor, você sabe, é uma emoção poderosa. Eles estarão juntos novamente, tenho
certeza, se já não estiverem.
Whitney não se esquecera do conselho da amiga quando foi trabalhar na manhã
seguinte. Tentava se convencer de que tudo voltara ao normal com Sloan e Gleda. Às onze
horas foi até a máquina de café e encontrou Toby, que lhe enviou um sorriso:
— Preciso falar com você.
A consciência pesada advertiu-a de que o rapaz já tinha conhecimento de que Sloan
Illingworth a surpreendera.
— Gostaria de sair novamente com você, só receio que não aceite meu convite.
O alívio que sentiu foi responsável por sua resposta:
— Se você não estiver pensando em convidar-me para outra festa...
A face de Toby acendeu-se como uma fogueira, e ele vibrou entendendo que era uma
resposta positiva.
Saíram juntos várias vezes nas duas semanas seguintes. Ele somente tentou beijá-la
na despedida do terceiro encontro. Whitney, entretanto, desviou a cabeça e o beijo pousou em
sua face.
— Não? — ele perguntou.
— Não, Toby — ela repetiu com firmeza. — Eu lhe disse...
— Sim, eu sei que por enquanto você não quer se comprometer com nenhum
homem. Mesmo assim eu quis tentar — ele confessou e continuou, desajeitado: — Você pode
me perdoar e sair comigo outra vez se eu lhe prometer me comportar?
Whitney soube então que gostava muito de Toby. Ele não perguntou por que ela
evitava os homens; ele a aceitava como ela era.
— Quem consegue resistir a você? — ela sorriu.
— Minha mãe diz que eu sou uma gracinha — ambos riram.

No encontro seguinte, Toby tentou apenas segurar-lhe a mão. Ela percebeu que, de
um modo fraternal, estava gostando cada vez mais dele.
Três semanas após a festa, numa manhã de sexta-feira, ela pôs de lado um
documento que acabara de datilografar. Em seguida fixou o espaço a sua frente. Começava a
pensar que aquele incidente iria perturbá-la até o último de seus dias. Aquele industrial não
lhe saía da cabeça. Esforçando-se para expulsá-lo dos pensamentos, ela se dedicou ao trabalho
novamente. Puxa! Ele tivera tempo para explicar o caso a Gleda pelo menos uma dúzia de
vezes! Nesse momento tudo já devia estar esclarecido entre eles. Whitney jurou que não
perderia mais um segundo pensando nele.
Uma hora depois, Slon Illingworth não povoava mais seus pensamentos.
Quando o telefone tocou, ela estava mais preocupada em fornecer informações do
que em saber quem estava do outro lado da linha.
Subitamente, tudo sumiu da sua frente. O tom profundo de uma voz masculina
balançou-a quando perguntou:
— Como vai, Whitney?
Nunca antes conversara com ele pelo telefone, mas nem por um segundo duvidou de
quem era aquela voz.
— Eu... eu vou bem! — replicou tão serenamente quanto seus sentidos abalados
permitiram.
— Ótimo... Aqui é Sloan Illingworth. — Ele se apresentou e foi direto ao assunto: —
Gostaria de me encontrar com você!
— Oh! — ela exclamou. Ainda não conseguira se refazer completamente e já
balançava outra vez. — Você quer dizer... — A voz desaparecera. Suas idéias se confundiam.
Se ele queria vê-la, e não falar-lhe por telefone, o assunto devia ser estritamente pessoal. Só
poderia se referir ao noivado desfeito. E, num piscar de olhos, veio-lhe à lembrança o
compromisso de ajudá-lo. Portanto, não poderia recusar o convite. — Tudo bem, eu... — Ia
explicar que estava livre na hora do almoço, da uma às duas horas, mas não teve
oportunidade. Sloan Illingworth era um homem de negócios muito ocupado. Não perdeu
tempo e interrompeu-a assim que ela concordou.
— Então encontro você às oito. Jantaremos em algum lugar.
Um instante depois Whitney estava boquiaberta. Não conseguia acreditar no que
havia acontecido. O fone estava mudo em sua mão. "— Meu Deus! — exclamou em voz alta,
e recolocou o fone no lugar. Com os pensamentos já organizados, percebeu que havia
recebido uma ordem. O sr. Illingworth nem quis saber se ela estaria livre. "Encontro você às
oito", repetiu mentalmente. No íntimo ela fervia de raiva. — Que sujeito presunçoso! —
enfureceu-se. Mas o que poderia fazer? Ela mesma o deixara em maus lençóis com a noiva.
Porém ele ficaria sabendo que estava arruinando um romance que surgia em sua vida.
Um romance... Essas palavras remeteram-na até Dermot. Ele havia sido seu caso
mais sério, e ela não se achava em condições de partir para uma nova experiência.
Whitney pegou o fone para chamar o ramal de Toby. Não podia fazer diferente.
Sloan Illingworth não daria a mínima importância a um "possível romance" em seu horizonte.
— Toby, é Whitney.
— Alô! — ele exclamou. — Ela podia sentir satisfação em sua voz.
— É sobre hoje à noite — começou a falar e hesitou. Já o conhecia suficientemente
bem para saber que ele não mencionaria o fim do noivado de Sloan Illingworth e o papel que
ela representava no caso. Mesmo assim achou melhor não lhe contar por que não iria a seu
encontro. — Desculpe-me, Toby. Algo aconteceu e não poderei vê-lo esta noite.
— Você não está com problemas, está?
Essa preocupação fez com que Whitney gostasse ainda mais desse rapaz que sempre
pensava primeiro nos outros.
— Não há nada errado — rapidamente ela respondeu. Ficou constrangida por não
explicar a verdade, e por isso acabou dizendo: — Sinto por hoje, mas amanhã é sábado e, se
você estiver livre, gostaria que fosse jantar em meu apartamento.
— Que maravilha! — Toby pulava de alegria. — Por um minuto imaginei que você
não quisesse me ver nunca mais!
— Você está muito sensível por causa da sua avançada idade — brincou com ele, e
aproveitou a ocasião: — Por acaso você sabe como posso entrar em contato com Sloan
Illingworth?
— Ora, você sabe onde ele mora — respondeu animado, e acrescentou: — Conhece
a Illingworth International? Experimente ligar para lá. Ele é o presidente da empresa.
Whitney colocou o fone sobre o aparelho em estado de choque. Sloan Illingworth era
presidente daquela vasta companhia multinacional! E ela iria encontrá-lo à noite...
À hora do almoço ela ainda não se havia recuperado totalmente. Embora soubesse
que ele era um grande industrial, não relacionara seu nome com a poderosa Illingworth
International.
À tarde, voltou para casa lembrando as informações de Toby. Ela vibrava com suas
descobertas.
De repente como um raio caindo do céu, uma pergunta sem resposta deixou-a
preocupada: ela descobrira onde o sr. Illingworth trabalhava, mas como ele havia conseguido
o telefone da firma onde ela trabalhava?
Meia hora mais tarde, sua imaginação ainda funcionava enquanto se ensaboava sob o
chuveiro. Ela se lembrava muito bem sobre o que haviam conversado. Contara-lhe que era
secretária, mas não mencionara o nome da firma.
— O que importa isso agora? — perguntou a si mesma quando saiu do banho. —
Sloan podia não saber onde trabalho, mas sabia onde moro. Teria me encontrado com
facilidade...
E ele não esquecera onde ficava seu apartamento. Iria buscá-la em casa à noite e não
pedira o endereço quando falaram ao telefone.
Escolhia a roupa que iria usar quando um corpo alto e um belo rosto vieram-lhe à
mente. Whitney subitamente foi tomada por uma sensação peculiar, uma ansiedade
desconhecida.
— Ridículo — falou baixinho. — Não estou nervosa só porque vou sair em sua
companhia — concluiu. Alisou as pregas da saia do vestido de seda cor de creme e calçou os
sapatos de saltos bem altos. Caprichou na maquiagem, respingou um perfume suave e colocou
suas belas bijuterias de marfim e prata.
Às oito horas já estava sentada esperando por ele. Às oito e cinco a campainha da
porta do prédio soou. No mesmo instante ela se levantou e pegou a bolsa. Saiu do
apartamento, fechando a porta com a chave; respirou fundo, desceu a escada e chegou à porta
do prédio. Respirou novamente para manter o controle antes de alcançar a maçaneta.
— Que mulher pontual! — Sloan elogiou antes que ela o cumprimentasse. Pelo
modo como Whitney segurava a bolsa, ele percebeu que não seria convidado a entrar. — Uma
mulher bela e pontual — repetiu o elogio.
Como ela estava satisfeita, essas palavras não lhe pareceram falsas.
Sloan segurou seu cotovelo e conduziu-a até o luxuoso carro estacionado em frente.
Aquela sensação peculiar apoderou-se dela novamente.
"Tudo bem", ela pensou, e tentou se acalmar, quando já estava dentro do carro.
"Talvez eu esteja mesmo ansiosa, mas o que está errado?"
Então dirigiu-se a ele fazendo uma pergunta que logo depois acharia muito idiota.
— Aonde vamos? — Ficou deprimida quando reconheceu que só se sentira daquela
maneira quando saía com Dermot.
Sloan dirigia com atenção e pronunciou o nome de um restaurante elegante e muito
caro.
— Está bem para você?
— Para mim está ótimo — Whitney replicou. Teve a impressão de que, se dissesse
uma palavra contra, ele a levaria a um outro lugar.
Era o homem mais sofisticado e atencioso que já conhecera! Ele a fizera
compreender que poderia escolher outro restaurante sem falar abertamente sobre o assunto.
Whitney estava se sentindo bem naquele ambiente luxuoso e em sua companhia.
"Acho que faz parte da educação dele deixar as pessoas à vontade", ela pensou,
quando já estavam frente à frente na mesa redonda, num dos cantos do restaurante.
Mas não era ingênua. Ele estava sendo polido apenas para que falasse bastante sobre
si mesma e lembrasse que prometera ajudá-lo e a Gleda também. Whitney não viu problemas
em lhe dar satisfação:
— O que posso lhe dizer? Trabalho na Plásticos Alford, onde sou secretária do sr.
Parsons. — Subitamente parou e mudou de assunto: — A propósito, como você ficou sabendo
que eu trabalho lá? Tenho certeza de que nunca lhe disse...
— Realmente, você não disse — Sloan confirmou. — Você apenas se referiu a Toby
e sua irmã.
— Você conhece Toby Keston? — perguntou e imaginou por que ele não dissera que
Sloan pedira o número do telefone de seu serviço. E ela lhe fizera quase a mesma pergunta:
"Onde posso encontrar Sloan Illingworth?"
Mas não fora Toby quem informou onde Whitney poderia ser encontrada.
— Conheço o jovem Keston tão bem quanto sua insípida irmã — Sloan contou-lhe, e
Whitney ficou admirada quando ele explicou: — Imagino que Valerie Keston não faça parte
de seu círculo de amigos. Então só lhe resta ser amiga do irmão dela. E onde, eu me
perguntei, poderia um homem como ele encontrar uma mulher como você?
— E concluiu que ele me encontrara no lugar onde trabalhava? — ela sugeriu
levemente. — Você lhe telefonou...
— Eu concluí que vocês dois deviam trabalhar juntos. O problema foi lembrar em
qual firma.
— Então você ligou para perguntar...
— Eu liguei para a Plásticos Alford e pedi para falar com a srta. Whitney Lawford.
Depois de pensar no que acabara de ouvir, ela encarou-o e, com um sorriso, falou:
— Não é de admirar que você seja a pessoa mais importante de uma empresa
internacional!
— Penso que isso é um elogio, mas não tenho certeza — ele retrucou com bom
humor, e pela primeira vez Whitney observou um sorriso encantador.
Seus olhos se abaixaram, e, nesse momento, o garçom veio até a mesa. O prato já
havia sido servido quando ela encarou Sloan novamente:
— Por que você acha que não sou amiga de Valerie Keston? A princípio Whitney
pensou que ele não fosse responder. Mas um olhar afetuoso surgiu nos olhos cinzentos que
fitavam sua face:
— Vocês são tão diferentes quanto um anão e um gigante — replicou com seriedade.
Whitney também o fitava e, encorajada por aquele olhar, não resistiu e retrucou:
— Acho que isso é um elogio, mas não tenho certeza... Estranhamente seu coração
vibrou quando Sloan deu uma gargalhada.
— Você tem razão — Sloan concluiu. E, enquanto Whitney se alegrava por ele achá-
la diferente da fútil Valerie Keston, ele continuou:
— Nenhuma outra mulher naquela festa estragaria as unhas pintadas para limpar
tudo como você fez.
Agora ele a atingia duas vezes. Primeiro, ele se referia as outras mulheres, menos a
sua ex-noiva. Segundo, se a própria governanta não sabia da limpeza que ela fizera, como foi
que ele ficara sabendo? Morta de curiosidade, interpelou-o:
— Sem considerar as ordens expressas que recebi para não deixar que a sra. Orton
fizesse tudo sozinha, como você soube que eu arrumei sua casa?
— Primeiramente, considerei que, se você quisesse, teria me falado o que fazer com
minhas "ordens expressas". Mas soube que você trabalhara bastante quando a sra. Orton me
informou que os convidados da srta. Caufield deixaram tudo em ordem antes de partirem...
Era a primeira vez que ele mencionara a ex-noiva, e Whitney continuou ouvindo-o:
— Depois que todos foram embora, parecia que minha casa tinha sido varrida por um
furacão. Ninguém deixara nada em ordem.
— Oh! — ela murmurou quando compreendeu a dedução. Então procurou uma
justificação para desculpar sua atitude: — Bem, eu não podia deixar tudo para a sra. Orton
fazer...
— Percebe o que eu quero dizer? — ele sussurrou, e Whitney entendeu que ele
reforçava o elogio. Valerie Keston nunca levantaria uma pena para ajudar a governanta.
Em seguida Sloan indagou:
— Agora você trabalha na Plásticos Alford. E antes?
Ele voltava no tempo como se estivesse mesmo interessado em saber tudo sobre sua
vida.
— Antes eu tinha um emprego na firma Implementos Agrícolas Hobson — ela
informou com vivacidade. — E antes ainda eu morava em Cambridge com minha família.
Apenas... — sua voz falhou — quando minha mãe faleceu e meu pai tornou a se casar, achei
que era hora de me sustentar com meu próprio esforço. E vim para Londres.
— Você não se dá bem com sua madrasta? — ele quis saber. De repente Whitney
parou. Ela não sabia o que havia com Sloan Illingworth. Sempre fora uma pessoa discreta, e
agora relatava toda sua história.
— Eu me dou muito bem com ela, sim! — respondeu-lhe friamente. — Mas —
suavizou a voz — nossa casa nunca mais foi a mesma...
Ela falava e ao mesmo tempo não acreditava que estava falando. Apenas Érica havia
sido sua confidente até aquele jantar. Encerraria suas informações pessoais e perguntaria
como poderia ajudá-lo no problema com a ex-noiva. Entretanto, nesse instante Sloan a
surpreendeu com uma observação:
— Quem era ele?
— Ele? — Whitney hesitou, e ficou mais confusa quando ouviu a resposta:
— O homem que trabalha na Implementos Hobson e que machucou você...
— Como você sabe? — ela começou a enrubescer. Mesmo admitindo que ficara
machucada, levantou o queixo orgulhosamente: — Quem ele era não tem importância. Não o
vi mais desde que deixei aquela firma e...
— Gostaria de vê-lo novamente? — Sloan questionou com voz áspera.
— Não — ela negou com firmeza. Melancolicamente lembrou que já amava Dermot
quando descobriu mais coisas sobre ele. Voltou sua raiva contra Sloan, explicando no mesmo
tom: — Descobri muito tarde que já era casado e que morava com a família. Como poderia
querer um homem como ele? Eu vi como minha mãe sofreu com a traição de meu pai. —
"Oh, Deus!" Whitney pensou. "O que há com este homem que acabo lhe revelando meus
segredos mais íntimos?" Ela lançou-lhe um olhar, mas não pôde ler nada em sua face rígida.
— Você deixou o emprego na Hobson por causa dele? — ele quis saber com uma
voz tão fria quanto seu olhar.
— Naturalmente — ela replicou, tentando emitir uma voz tão fria quanto a dele.
— Há quanto tempo você está na sua firma atual?
— Não tenho visto Dermot há quatro meses, se é isso que você quer saber —
Whitney disparou, e devia ter mordido a língua antes. Ela continuava falando demais. Agora
ele já sabia até o nome do homem que ela amava.
— E onde entra o jovem Keston no seu esquema? — Sloan perguntou, e sua voz
estava rouca.
Agora ele já sabia sobre Dermot, e seu orgulho determinou que não devia deixá-lo
pensando que ainda estava sofrendo pelo ex-namorado casado.
— Toby — ela falava devagar — tornou-se em pouco tempo um amigo muito
querido. Tanto que agora vamos praticamente a todos os lugares juntos.
Fitando Sloan com o canto dos olhos, achou que ele já estava cansado daquela
conversa. E, esperando aborrecê-lo mais um pouco, recomeçou:
— Foi por isso que ele me convidou para acompanhá-lo à festa em sua casa.
— E foi por isso — Sloan retrucou com ironia —, porque vocês praticamente vão a
todos os lugares juntos, que ele não se lembrou de levá-la de volta a Londres quando deixou a
festa...
Whitney esquecera-se de que Toby não tinha condições de se recordar de nada
daquela noite. Valerie o levara para casa, mas, convenientemente, a deixara em Heathlands.
O garçom veio servir o último prato e os dois permaneceram em silêncio. Whitney
ficou pensando nesse detalhe que acabara de lembrar e imediatamente começou a mudar de
idéia. Sloan conhecia Valerie muito bem. Agora podia entender por que ele parecia tão
amargo. Estava se esforçando para proporcionar-lhe uma noite agradável! Toda a raiva se
transformou em simpatia.
Contudo, não devia ser fácil para ele solicitar seu auxílio.
— Tem visto a srta. Caufield ultimamente? — Whitney tocou no assunto para
facilitar-lhe as coisas.
— Não! — A resposta foi seca, e Sloan encarou-a como se perguntasse: o que lhe
interessa quem eu vejo ou deixo de ver?
Como ela sabia o que era ter o orgulho ferido, não ficou ofendida. Iria falar com
Gleda ou fazer qualquer outra coisa que ele precisasse.
— Sloan — disse suavemente. Talvez fosse melhor dizer sr. IIlingworth, mas já era
tarde. — Estou aqui com você porque... se eu puder fazer alguma coisa para ajudar... —
Observou a surpresa que sua boa vontade causou. Sorriu e continuou: — Você não vai me
dizer por que me convidou para sair?
— Por que não poderia convidá-la simplesmente para vê-la outra vez? — ele a
interrompeu friamente.
Whitney tentou não dar importância ao rubor que as palavras dele trouxeram a sua
face. Sloan Illingworth era o homem mais orgulhoso que ela já conhecera. Por um lado, devia
ser contra seus princípios pedir qualquer favor; por outro, devia estar desesperado para voltar
para Gleda.
— Porque tenho a impressão de que você nunca faz nada sem um motivo. Sei que
sou culpada por Gleda ter terminado o noivado. Foi só por isso que você quis se encontrar
comigo. E se eu puder fazer alguma coisa...
Sloan encarou-a por um longo tempo. Whitney não podia saber o que ele estava
pensando, mas ficou feliz por não ter misturado as coisas. Teve a impressão de que foi depois
de um século que ele resolveu admitir isso.
— Você tem razão — concordou com um sorriso fraco. — Na verdade, eu quis vê-la
por razões que, bem, são um pouco diferente do normal.
— Gleda... — ela interferiu, já pronta para ajudá-lo.
— Não, não é Gleda! — Sloan balançou a cabeça para apresentar-lhe alguma
novidade.
Whitney ficou totalmente confusa, e ele esclareceu:
— Tenho de admitir que minha ex-noiva e eu não significamos mais nada um para o
outro, e...
— Mas... —ela iniciou um protesto. — Não pode ser! Vocês pertencem um ao outro.
Se não acontecesse aquele lamentável incidente, vocês ainda estariam noivos.
— Pode acreditar, srta. Lawford, quando digo que Gleda Caufield e eu nunca nos
casaremos.
— Mas... — ela tentou replicar, e ele não a deixou continuar.
— Não tenho mais uma noiva, porém tenho outra preocupação maior.
— Qual? — ela quis saber instantaneamente.
Sloan meneou a cabeça parecendo hesitar, e então, calmamente, falou:
— Minha mãe!
— Sua mãe? — Os olhos de Whitney se arregalaram. Ele contraiu os lábios antes de
explicar:
— Minha mãe ficou tão feliz quando lhe contei sobre meu noivado que eu não tenho
coragem de lhe dizer que está tudo terminado.
Whitney achou que deveria haver pouca coisa que ele não tivesse coragem de fazer e
ficou atônita por um segundo.
— Quer dizer que sua mãe gostava muito de Gleda e...
— Na verdade — Sloan a interrompeu —, as duas nunca se encontraram. Mas minha
mãe espera há tanto tempo por uma filha que ficaria muito desiludida comigo. — Fez uma
pausa e prosseguiu: — O problema, Whitney, é que um dia antes de minha volta à Inglaterra
ela... sofreu um acidente de carro...
— Oh, sinto muito — lamentou. Pelo modo hesitante com que ele falava, devia ser
difícil tocar no assunto. E, lembrando do acidente de sua mãe, ela começou nervosamente: —
E como ela está?
— Ela está se recuperando fisicamente — ele apressou-se a explicar. — Mas, como
sei que ficará preocupada quando souber que não estou mais noivo, eu... não vou lhe contar.
Pelo menos por enquanto.
— Claro, não deve mesmo — Whitney afirmou. Seu coração se entristeceu não
apenas por Sloan, que enfrentava um problema por sua culpa, mas também por sua mãe.
Então lembrou que ainda estava sem saber por que Sloan a convidara para jantar. Ele
não precisava de sua ajuda para voltar para Gleda e tinha razões diferentes das normais.
— Sloan — falou vagarosamente e viu que ele olhava diretamente para ela —, por
que, se posso saber, você me convidou para sair esta noite?
Por um longo momento, ele continuou com o olhar fixo nela. Então replicou com
firmeza.
— Preciso de uma noiva para apresentar a minha mãe quando ela sair do hospital. E
como foi você, Whitney, quem me fez perder uma noiva legítima, eu proponho que você tome
o lugar dela...
CAPÍTULO IV
Whitney se arrependera imensamente de ter pronunciado as palavras "...se eu puder
fazer alguma coisa". Por este motivo concordara em enganar a mãe de Sloan e agora se
atormentava. Aquela ridícula proposta não lhe saía da cabeça.
Na manhã daquele sábado, ela tentou se concentrar na limpeza do seu já limpíssimo
apartamento. Mas esse trabalho físico não impedia seu cérebro de funcionar.
Relembrando os fatos da noite anterior, ela não via como poderia ter agido diferente.
Afinal, a sra. Illingworth sofrera um acidente e estava preocupada com o filho. Tomar
conhecimento do noivado desfeito poderia causar-lhe maiores problemas. Iria sofrer ainda
mais.
Whitney pensou em como Sloan conseguia esconder a dor que sentia interiormente.
— Oh, Sloan... — ela havia murmurado no restaurante, como se estivesse se
desculpando.
Foi então que ele cobrara a promessa.
— Mas eu só estava pensando em Gleda — ela protestou.
— E isso tudo não está relacionado com ela? — Sloan retrucou. Whitney poliu os
móveis e colocou as almofadas nos lugares.
Se pelo menos a sra. Illingworth tivesse conhecido Gleda, não haveria como
representar aquela farsa.
Sloan não explicara por que as duas nunca se encontraram. Talvez tivessem ficado
noivos pouco antes daquela viagem ao exterior, sem tempo para apresentá-las. Ele apenas
participara à mãe que em breve ela conheceria a futura nora.
Whitney continuou sensibilizada com os sentimentos da sra. Illingworth. Contudo,
por que Sloan julgou necessário levá-la para jantar? Teria sido mais fácil contar-lhe
diretamente o que queria. Se não quisesse falar pelo telefone, poderia ter ido até seu
apartamento.
"Talvez ele quisesse ter certeza da minha reação antes de pedir para fingir ser sua
noiva."
Sloan iria lhe avisar quando sua mãe tivesse condições de recebê-la.
Não conseguindo livrar-se desses pensamentos, Whitney guardou o material de
limpeza, lavou as mãos e subiu até o apartamento de Érica.
— Se você estiver estudando, eu volto depois — foi falando enquanto a vizinha abria
a porta.
— Nossa! O feijão que emprestei de você a semana passada — Érica exclamou. —
Esqueci-me totalmente dele. — E esclareceu: — Agora não estou estudando. Por favor, feche
os olhos para a bagunça. Só arrumo as coisas quando não consigo mais passar entre elas —
brincou. — Vamos tomar um café que tenho novidades para contar.
Whitney riu e entrou. Estava mesmo precisando de um pouco do entusiasmo de
Érica.
— Deixe que eu me ajeito — falou quando a amiga foi desocupar um espaço na
mesa da cozinha e retirou uma pilha de livros de uma cadeira.
— Então, não adivinha? — Érica sorriu, incapaz de esperar mais tempo. — Já sou
titia!
— Nikki já teve bebê? — Whitney sabia que a irmã mais nova de Érica, que morara
em Liverpool, estava para dar à luz.
— Recebi um telefonema há cinco minutos. Não é uma beleza? Mãe e filho estão
passando bem, mas premiaram o coitadinho com o nome de Eric no meio.
— Foi em sua homenagem — Whitney concluiu. — Isso é maravilhoso!
— Sentimentalmente, sim — Érica concordou.
Ficaram conversando ainda alguns minutos sobre o recém-nascido, James Eric. Em
seguida a nova titia anunciou sua outra novidade: estava namorando.
— Só Deus sabe quando terei tempo de vê-lo. Gostaria que ele me levasse a
Liverpool no próximo fim de semana. Assim estaremos juntos e conheceremos o bebê. —
Então repentinamente, mudou de assunto: — Desculpe, querida, estou sendo grosseira. O que
há de novo com você?
— Eu, bem saí para jantar ontem à noite. — E confessou: — Com Sloan Illingworth.
— Sloan... — Érica repetiu com os olhos bem abertos. — Aquele que dormiu na
mesma cama?
— Ele mesmo — Whitney disse rapidamente.
Ao voltar a seu apartamento, em vez de deprimida ela estava confusa. Contou
detalhadamente a Érica onde jantara, o que comera etc. Entretanto, relutara em mencionar a
proposta de Sloan. Descobriu depois que evitara o assunto porque a companhia do sr.
Illingworth não era apenas estimulante, mas também muito agradável.
Estava perplexa, pois nem sabia se gostava dele, quando se lembrou de que
convidara Toby para jantar àquela noite.
— Socorro! — suspirou, pegou a bolsa e foi comprar alguma coisa para oferecer
durante a refeição.
O jantar com Toby em seu apartamento transcorrera sem incidentes. Ele era tão
amável que Whitney nem sentiu as horas passarem.
Entretanto, no domingo, pensou mais no jantar de sexta-feira do que no amigo que
viera sábado a sua casa. Percebeu que, pensando em Sloan e em sua idéia, esquecera-se de
Dermot. Era a primeira vez que acontecia alguma coisa que apagava suas dolorosas
lembranças.
Pelo fim de semana, contudo, a decepção que Dermot lhe causara misturou-se à
decepção que ela iria causar à mãe de Sloan. Ele não lhe telefonara outra vez.
Na sexta-feira, depois do expediente, Whitney voltou para casa certa de que a sra.
Illingworth ainda estava no hospital. Quanto tempo Sloan, um executivo com tantos
compromissos, estava passando ao lado da mãe acidentada, ela pensou, admirada.
Se não era Sloan, era Dermot quem dominava a sua mente; porém nenhum deles a
entusiasmava.
Às onze horas estava para se deitar. Às onze horas e dois minutos, Érica bateu na
porta com seu toque característico.
— Acabei de me lembrar — ela respirava com dificuldade. Havia um lápis sobre sua
orelha demonstrando que ela estivera no meio dos estudos. — Você tem uma mala decente
para me emprestar?
— Entre — Whitney convidou, e como sempre se alegrou com a vizinha.
Érica explicou que sua mala estava em péssimo estado. Chris, seu namorado,
concordou em levá-la até a casa da irmã e ela não queria que ele se envergonhasse quando se
oferecesse para carregar sua bagagem.
— Sinto muito, mas não posso ficar — respondeu logo que Whitney, trazendo sua
melhor mala, perguntou se gostaria de tomar uma bebida quente. — Chris é uma pessoa
pontual; eu preciso aprontar as coisas ainda esta noite, quando terminar minhas pesquisas.
Whitney saiu com Toby no sábado e o domingo transcorreu tranqüilamente.
À medida que os dias se passavam, ela começou a pensar que a idéia de representar a
noiva de Sloan devia ser fruto de sua imaginação. Eles jantaram juntos havia duas semanas e
não se comunicaram mais.
Quis me assustar, ela cismava enquanto retirava a capa da máquina de escrever.
Suspirou aliviada e sentou-se em sua escrivaninha. Tudo indicava que não precisaria mais
mentir para a mãe dele. Alguma coisa acontecera e ele mudara de idéia. O mais provável era
que ele e Gleda tivessem se reconciliado.
Whitney franziu a testa; estranhamente descobriu que essa hipótese não a agradava.
Ela acabara de tomar uma xícara de café, como fazia todas as manhãs, quando teve a
certeza de que aquele alívio fora precipitado. Sloan ligara para o escritório.
— É melhor você me dar o número do telefone de sua casa — falava com voz baixa
e seca.
O choque de ouvi-lo, com aquela voz desagradável, fez Whitney responder antes
mesmo que pudesse pensar em alguma coisa.
— Como vai? — ela queria saber sobre sua mãe, mas de repente a ligação fora
cortada. Era a segunda vez que recebia um telefonema dele e acabava falando com o ar. Uma
raiva surda apoderou-se dela. — Dane-se! — esbravejou e soltou o fone.
No minuto seguinte, lamentou ter fornecido o número de seu próprio telefone. Parou
um momento e respirou para acalmar-se. Quem ele pensava que era para chamá-la e, sem lhe
dar tempo de pensar, encerrar a conversa? Com certeza não queria discutir seu plano ridículo
ao telefone para que ninguém em seu escritório pudesse ouvir.
Começou a se tranqüilizar achando que esse plano não era tão ridículo assim. Talvez
fosse necessário naquele momento. A qualquer instante, atenderia ao telefone em sua casa e
ouviria Sloan Illingworth no outro lado da linha.
O fim de semana passara sem que Whitney falasse com ele, embora não tivesse
ficado em casa o tempo todo.
Na noite de segunda-feira, o som do telefone interrompeu-lhe os pensamentos. Seu
coração batia descompassadamente quando foi atender. Seus nervos se abalaram, pois
adivinhara de quem era a voz que estava prestes a ouvir. Depois de esperar alguns segundos,
ergueu o fone:
— Alô!
— Onde você esteve à noite passada? — Sloan gritava em seus ouvidos, causando-
lhe dor.
— Saí. Fui namorar! — Whitney, enfurecida com suas palavras e tom de voz,
devolveu do mesmo modo. Porém ficou mais enfurecida ainda com a resposta:
— De agora em diante você pode esquecer seu namorado e saídas com amigos — ele
falou violentamente. — De agora em...
— Espere um pouco! — Whitney revoltou-se. — Quem você pensa que é? Sairei
com qualquer homem que me agradar. Eu...
— Enquanto estivermos noivos, não! — ele revidou.
— Acontece que eu não estou noiva de ninguém...
— Para a tranqüilidade de minha mãe, sim, você está — ele a interrompeu
rapidamente.
Whitney calou-se por um momento. Lembrou-se de que, por causa de sua mãe,
combinaram que seriam noivos. Ela se concentrou para perguntar, tão calma quanto fosse
possível:
— E como está ela?
— Ela está bem — foi a resposta seca, e Sloan parou como se também estivesse se
concentrando. — Brevemente deixará o hospital e irá a Heathlands convalescer. E isso
significa que você e eu temos de discutir alguns detalhes.
— Discutir alguns detalhes? Como assim?
— É simples — ele falou com firmeza. — Por exemplo, somos obrigados a conhecer
os mesmos lugares.
— Somos obrigados? E por quê? — ela perguntou com a voz alterada. O sangue
fervia em suas veias. Nenhum homem lhe diria "somos obrigados" e a levaria a qualquer parte
contra a sua vontade.
— Ora, por favor — Sloan continuou —, minha mãe pode estar um pouco perturbada
neste momento, mas ela não é tola. Logo desconfiará de que nosso noivado é falso se nem
você nem eu falarmos sobre os lugares que costumamos freqüentar juntos. E isso poderá
trazer conseqüências trágicas para ela.
— Mas... — Whitney começou a protestar. O fato de que a sra. Illingworth não
estava bem não alterava o seu desejo de discutir o assunto. — Mas... e quanto a meu
namorado?
Queria fazer Sloan entender que não podia sair com ele. Descobriu que seu pânico a
tornava tão falsa como aquele absurdo esquema. Por mais que se esforçasse, jamais
conseguiria imaginar Toby como seu namorado no verdadeiro sentido da palavra.
— O que ele vai dizer? — ela o provocava. — Garanto que não vai gostar quando
souber que não posso sair com ele porque tenho de sair com você.
— Garanto que ele gostará menos ainda — Sloan retrucava em voz baixa e
vagarosamente — quando souber como minha noiva encontrou você em minha cama.
— Você é... um miserável — Whitney vociferou ao telefone.
— Também te amo muito, querida... — Sloan murmurou sarcasticamente, e disse
apenas uma coisa antes de desligar: — Nós iremos ao teatro amanhã. Fique pronta.
Whitney estava fuzilando quando o telefone foi desligado. Da próxima vez, ela
desligaria bruscamente antes dele. Ela se enforcaria se não fizesse isso. Furiosa diante da
chantagem que ele fazia, recolocou o fone no lugar. "Miserável é uma palavra muito suave
para ele", ela pensou com raiva. Será que teria mesmo coragem de falar com Toby sobre a
noite da festa? Sloan sabia, ou havia concluído, que o rapaz ignorava a forma como a festa
terminara?
Na meia hora seguinte, Whitney continuou metralhando o "sr. Illingworth" em
silêncio.
Aos poucos foi se acalmando.
Na verdade, ao lado de Sloan, ela era a parte mais fraca e ficava sempre um pouco
medrosa.
"Mas sentia medo do quê?" perguntou a si mesma.
— Medo de sair machucada outra vez — ela mesma respondeu.
Entretanto, logo em seguida Whitney lançou sua teoria pela janela. Se ainda amava
Dermot, como poderia se machucar saindo com Sloan?
Passou uma noite inquieta. Esses pensamentos ficaram martelando em sua cabeça.
Na manhã seguinte, levantou admitindo que a sra. lllingworth realmente nunca
acreditaria que eles eram noivos, se não comentassem sobre os lugares que costumavam
freqüentar. Para o bem da mãe de Sloan, só por isso, ela se via na obrigação de sair com ele.
À tarde voltou do escritório gostando ainda menos dele. Ele a chantageava porque
sabia que Whitney temia que ele fosse conversar com Toby.
Sloan não havia dito a que horas passaria para pegá-la, e ela, é claro, não telefonaria
para perguntar. Para provar a si mesma que estava dominando o medo, aprontou-se com
bastante antecedência. Entretanto, quando a campainha soou, estava tão nervosa que pulou do
sofá. Pegou a bolsa, passou a chave na porta do apartamento e desceu. Iria começar uma
representação para a qual tinha muito pouco talento. Tinha certeza de que não gostava nada
daquilo. Por isso não entendeu por que um arrepio muito peculiar percorreu seu corpo
quando, ao cumprimentar Sloan, ele observou com simpatia:
— Você está muito bonita, Whitney.
Desejou ardentemente responder que dispensava o elogio, mas isso não seria
verdade. Embora não pretendesse se divertir, ela demorou escolhendo a roupa que iria usar,
caprichando no penteado e na maquiagem. Por isso disse um simples "obrigada".
Whitney estava determinada a permanecer fria e distante, mas não podia negar que
sentia algo parecido com orgulho quando caminhou a seu lado do estacionamento até o teatro.
— Espero que você goste de história de mistério — ele murmurou quando já estavam
sentados.
— Prefiro mistério à farsa ou comédia — retrucou secamente, e voltou seu rosto para
o palco. Esperava que Sloan tivesse entendido a indireta que ela lhe lançava, deixando claro
que não apreciava a farsa que ele montara para a própria mãe.
Logo o espetáculo começou. Era uma peça famosa, com atores importantes. Whitney
tentou se concentrar apenas na encenação, mas era difícil esquecer o homem a seu lado.
Durante o intervalo, foram tomar refresco. Tudo corria normalmente, ela
respondendo com atenção e delicadeza às perguntas que Sloan lhe fazia. Porém, permanecia
distante.
Ainda mantinha essa atitude quando deixaram o teatro e se dirigiram até o carro. Já
com o motor ligado, ele esperava uma oportunidade para entrar no tráfego, congestionado
com a saída de todos ao mesmo tempo. Whitney quis aproveitar o momento para agradecer.
— Muito obrigada — falou gentilmente, sem emoção. Sloan replicou com frieza:
— A noite ainda não acabou. — Seu tom de voz demonstrava que não estava
gostando daquele comportamento indiferente.
— Não? — ela repetiu sem interesse e sem se importar com o que ele pensava.
— Foi o que eu disse. Vamos a uma boate!
— Boate! — ela exclamou, surpresa, esquecendo da distância por um momento.
Entretanto, logo vestia o manto da indiferença outra vez, quando, sem ter intenção de ir a
qualquer outro lugar, discordou da proposta: — Não somos obrigados a ir a qualquer boate.
Sloan voltou a cabeça e fitou-a no momento em que passavam por uma área bem
iluminada. Whitney notou que a frieza dos olhos dele quase se materializava. Conseguira
irritá-lo, e até deixá-lo furioso.
Ele retrucou:
— Não somos obrigados a ir esta noite. — Ela sentiu-se aliviada. Porém ele
concluiu: — Iremos a uma boate numa outra ocasião! — Conseguira irritá-la e deixá-la
furiosa! Desviou o olhar e continuou dirigindo na corrente de trânsito.
Chegaram ao apartamento em silêncio. Whitney não via a hora de descer do carro.
Esperava que Sloan também ansiasse por se livrar dela; porém, ele saltou do automóvel e
acompanhou-a até o prédio. Seu comportamento era educado e, apesar de contrariado, como
certamente estava, parecia fazer o máximo para acalmar a situação.
— Permita-me — pediu gentilmente, e, tomando-lhe a chave, abriu a porta.
Encontrou o interruptor, acendeu a luz do hall e devolveu-lhe a chave.
— Obrigada — agradeceu com igual gentileza. A noite estava terminando como ela
havia imaginado: fora educada e atenciosa, mas conseguira manter a distância. Whitney deu
um passo para dentro e se voltou para despedir de seu acompanhante.
Mas agora as coisas não estavam acontecendo como ela desejava. Sloan ficara
parado do lado de dentro do hall e, até que ele se afastasse, não seria possível fechar a porta.
Whitney encarou-o com uma expressão interrogativa, e não acreditou no sorriso que
se apresentava em sua face quando sugeriu com um charme especial:
— Para que nosso noivado possa parecer autêntico, você não acha que eu deveria
conhecer o interior de seu apartamento?
Se Whitney pronunciasse o que estava pensando, os ouvidos de Sloan estariam em
brasa. Apenas retrucou secamente:
— Numa outra ocasião!
Imediatamente se deu conta de que usava as mesmas palavras dele.
Sloan não parecia desconcertado, o que a aborreceu um pouco, mas deixou-a irritada
ainda mais quando murmurou sorrindo:
— Agora você está jogando com as minhas cartas. Boa noite, Whitney — despediu-
se atrevidamente.
Se não acordasse os moradores dos outros apartamentos, ela teria batido a porta atrás
dele com toda força que tivesse.
Enquanto subia conscientizou-se de que, prometendo recebê-lo numa próxima vez,
sem querer concordava em sair com ele novamente.
Não demorou a se aprontar para dormir. Meia hora depois já estava deitada em sua
cama.
— Homem desprezível! — ela o excomungava mentalmente. Enquanto o sono
chegava de mansinho, a raiva que sentia por Sloan começou a desaparecer. Ainda pensava
nele e em seu cinismo na hora da despedida quando, com um sorriso aflorando nos cantos de
seus lábios, adormeceu...
CAPÍTULO V
Naquela tarde de sábado, Whitney meditava profundamente sobre quando e como
começara a gostar de Sloan Illingworth. Recordava quantas vezes saíra com ele desde a noite
em que foram ao teatro e se recusara a ir a uma boate. Agora tinha de admitir que gostava de
ficar junto dele. Fizeram os mais diferentes programas e muitas vezes esticavam a noite em
boates da moda. Ficara conhecendo os lugares mais badalados da cidade.
Ela havia jurado que, enquanto fosse obrigada a sair, não se esforçaria para ser uma
companhia agradável. Porém não houve uma só vez em que não se divertisse ao lado de
Sloan. Era forçada a reconhecer que não fazia nenhum sacrifício em acompanhá-lo. Como,
em tão pouco tempo, aconteceu essa mudança radical?
Sem querer, começou a sorrir. Um pouco alarmada, percebeu que sorria mais
freqüentemente nos últimos tempos.
Outras dúvidas surgiram: por que a vida agora lhe parecia mais vibrante? Por que
sentia entusiasmo pelas mínimas coisas?
As lembranças de Dermot já não eram tão freqüentes. Mas isso ela podia
compreender: ultimamente não estava conseguindo pensar em tudo; Sloan e os passeios com
ele eram os responsáveis.
Nunca se esqueceria da terceira vez que se encontraram. Recebera um telefonema na
noite seguinte a que foram ao teatro.
— Gostaria de jantar comigo amanhã? — Sloan perguntou suavemente.
Com a mãe doente, e sem Gleda para consolá-lo, Whitney não soube como recusar.
— Não há nada que eu mais deseje neste mundo — respondeu com ironia.
— Sabia que você gostava profundamente de mim! — ele replicou.
Whitney quis socá-lo; ele não entendera sua ironia. Novamente ele desligou sem que
ela conseguisse falar mais uma palavra. Pensando melhor nessa conversa, ela teve de sorrir.
Sloan poderia ser qualquer coisa, menos tolo. Claro que percebera que ela tinha sido
sarcástica.
Teria começado a amá-lo nesse dia?
De qualquer modo, ela perdera a frieza inicial. As maneiras formais desapareceram
quando ele veio buscá-la na noite seguinte.
— Alguém já lhe disse que você tem uns olhos verdes maravilhosos? — ele
comentou, ao levá-la para casa depois de um jantar magnífico.
— Já, muitas vezes — declarou com orgulho, e propositadamente arregalou os olhos.
Notou que um sorriso surgia nos cantos dos lábios de Sloan. — Boa noite! — despediu-se
rapidamente.
— Boa noite! — ele repetiu com calma e se afastou. Saíram juntos outra vez no
sábado seguinte. Foi a noite em que a levou a uma boate pela primeira vez. Foi também nessa
noite que Whitney descobrira algumas de suas preferências. E ele, por sua vez, descobrira
mais coisas sobre ela.
Alguns dias se passaram sem que ela tivesse notícias de Sloan. Não ficara
preocupada, pois ele precisava dela e iria procurá-la. A sra. Ulingworth e seu bem-estar
vinham em primeiro lugar. Para Whitney, ele era um homem muito ocupado e já era obrigado
a passar muito tempo visitando-a no hospital.
Quis aproveitar o fato de não ter marcado um encontro com ele para sair com Toby.
Em sua opinião, não era correto agradar um homem e desprezar outro, principalmente porque
Toby era mais seu amigo do que Sloan.
— Quer ir a uma galeria de arte esta noite? — ele ligara após cinco dias de silêncio.
— O que não faço por você... — Ela pretendia ser azeda, mas ficou horrorizada.
Achou que sua voz transmitia impaciência porque ele havia demorado para telefonar. — A
que horas? — continuou em seguida, esperando que ele não percebesse o quanto estava
ansiosa.
Que bobagem! Sloan desejava sua companhia apenas para fingir um noivado
autêntico. E Whitney só saía com ele em virtude do estado de saúde da mãe dele. Portanto,
não precisava ficar preocupada.
Convencida disso, ela se aprontou tendo a certeza de que não tinha o mais remoto
interesse nele. Ainda sentia as marcas da experiência com Dermot, e levaria bastante tempo
para que se impressionasse com outro homem. Nem mesmo queria Sloan como amigo.
Apesar dessas indecisões, foi nessa noite que seu relacionamento com ele se tornou
mais amigável.
Na galeria de arte, as pinturas estavam dispostas conforme os temas, paisagens ou
cenas domésticas. Depois de apreciar cada uma delas, eles foram a um salão que apresentava
quadros de arte moderna. Whitney ficou junto a Sloan enquanto analisavam uma tela com
tons azul-marinho, alaranjado e vermelho. Consultou o catálogo que ele lhe dera e leu que a
pintura exibida intitulava-se Alegria. Seus olhos voltaram-se para a gravura e, de repente, ela
se sentiu tocada. Procurou por ele, mas pela sua expressão de espanto Whitney entendeu que
estava sozinha em sua descoberta.
— É maravilhoso! — exclamou, quando, já se dirigindo para o próximo quadro, ele
tomou seu braço para que ela o seguisse.
— O que você está dizendo? — ele quis saber, detendo o passo, mas conservando a
mão em seu cotovelo.
— Você não percebe? — ela perguntou, dirigindo outra vez seu olhar para a pintura.
— Você se refere a esta coisa horrorosa azul-marinho e alaranjado que se disfarça
sob o nome de arte? — ele indagou e, apertando os lábios, desviou o olhar da pintura para os
olhos verdes que brilhavam de excitação.
— Veja de novo — ela o estimulou. — Observe a parte vermelha. É uma boca
vermelha e risonha. — No início, a figura lhe parecera misteriosa, mas agora ela compreendia
todo seu significado. — Bem, eu gosto dela — falou para finalizar, e eles seguiram em frente.
Sloan sorriu quando se aproximaram da tela seguinte. Seus olhos moviam-se dos
olhos verdes para a boca delicada.
— Eu gosto mais de você!
Whitney não fez comentário, mas seu coração vibrou de emoção.
— Concentre-se nas obras de arte — ela repreendeu-o com suavidade. De repente os
dois estavam rindo.
O coração de Whitney já batia normalmente outra vez quando ele a levou para casa.
Porém alguma coisa acontecera e o relacionamento entre ambos tornou-se mais caloroso. Ela
percebera que conversava mais livremente e se sentia bem à vontade com ele.
Certamente a mãe de Sloan ainda se encontrava hospitalizada, ou ele já a teria
convidado para ir até Heathlands. Ao se aproximarem do apartamento, ela resolveu se
informar.
— Sua mãe está melhor?
— Ela está... na mesma — ele falou, e voltou-se como se precisasse de toda atenção
para enfrentar o trânsito.
Whitney calou-se por um momento, decidida a insistir no assunto. Já que seria
apresentada à sra. Illingworth como sua futura nora, ela também tinha seus direitos. Após
alguns minutos, quando julgou que o movimento dos carros não estava tão intenso,
interpelou-o:
— Você uma vez me falou que sua mãe estava um pouco perturbada...
— Eu falei isso? — Sloan parecia duvidar que tivesse dito algo tão pessoal sobre sua
mãe.
— Suas idéias estão mais claras agora? Quero dizer, eu sei — ela insistia
compreensivamente — que muitas vezes as pessoas idosas... — Fez uma pausa. Não sabia a
idade da mãe de Sloan. Se quando ele nasceu ela não fosse muito nova, poderia estar agora
com uns setenta anos. E no acidente poderia ter batido a cabeça.
— A última vez que a vi, ela estava bem, parecia às vezes distante — ele falava
como se fosse muito difícil conversar sobre isso.
— Oh, sinto muito — Whitney consolou-o com sinceridade. Seu coração se condoía
pela pobre senhora, enquanto a cabeça se inundava com as lembranças da própria mãe. Ela
também tivera lapsos de memória antes de falecer. Como Sloan relutasse em continuar
falando sobre isso, decidiu não fazer mais perguntas.
Chegaram até o apartamento e, ainda sensibilizada, convidou-o para subir e tomar
um café. Sloan recusou, explicando que ainda teria de terminar um trabalho quando chegasse
em casa. Whitney novamente considerou que ele era um homem muito ocupado. Não ficaria
surpresa se só voltasse lá depois de cinco dias. Mas ele telefonou logo no dia seguinte e foram
jantar outra vez.
A partir de então saíram constantemente, e cada vez iam a um lugar diferente. Tudo,
é claro, porque deviam conversar espontaneamente com a sra. Illingworth sobre o que faziam
juntos. Se ela ainda se encontrava hospitalizada, era porque o acidente que sofrera fora
realmente grave. Havia pessoas que passavam pelas piores cirurgias e ainda assim recebiam
alta dentro de duas ou três semanas.
Com o passar do tempo, Whitney calculou que talvez Sloan sugerisse que ela fosse
ao hospital para conhecer a futura sogra. Como não tocou nesse assunto, imaginou que sua
mãe ainda estivesse perturbada. Seria melhor deixar as apresentações para quando estivesse
em casa.
Whitney deixou seus devaneios ganharem altura naquele sábado. Teria notícias de
Sloan nesse fim de semana? Não o via desde quinta-feira, e ele fora à Suíça a negócios na
sexta. Voltaria no domingo.
Foi até a cozinha preparar uma xícara de chá. Não via Dermot há meses. Subitamente
estranhou o fato de não se lembrar dele como antes. Seus pensamentos agora se ocupavam
com Sloan, com certeza porque saíram juntos muitas vezes nos últimos dias.
A imagem de Gleda surgiu em sua mente. Será que Sloan ainda pensava nela? Não
pronunciara seu nome uma única vez, nem deixara transparecer nenhum ressentimento pelo
fato de não ser mais seu noivo. Sua tranqüilidade foi interrompida quando Érica bateu à porta
com seu toque familiar.
— Você adivinhou que eu estava tomando chá — Whitney falou, recebendo a
vizinha com um sorriso.
— Já vou avisando que não posso ficar. — Érica estava ofegante. — Hoje é um
daqueles dias que eu deveria ter acordado às três da manhã para dar conta de tudo. — Parou
um segundo e prosseguiu: Eu lhe disse que serei madrinha de James Eric, não? Pois bem, o
batizado é amanhã e... — respirou apressadamente — como é uma ocasião especial, será que
você poderia me emprestar um dos seus chapéus? Não tenho nenhum em condições...
— Claro, acho que tenho dois que podem servir. — Ia levá-la até o quarto para
escolher um deles quando a campainha soou. O coração de Whitney se acelerou ao imaginar
que Sloan já pudesse estar de volta e viesse até o apartamento para vê-la. "Que ridículo",
pensou um segundo depois. Ele não apenas estava a quilômetros de distância, na Suíça, como
teria telefonado antes de aparecer.
— Espere um pouco enquanto vou ver quem é — Whitney rapidamente se dirigiu a
Érica. — Eu...
Mas a amiga se levantou com rapidez:
— Você se importa se eu voltar depois? Cada minuto é muito precioso para mim,
hoje.
Elas se separaram no corredor, Érica subiu e Whitney desceu. Não fazia idéia de
quem seria. Abriu a porta e se viu diante de Toby. Logo percebeu que ele estava diferente.
— Pensei que não fosse encontrá-la em casa. — Um traço de culpa atingiu Whitney.
Ela teve de recusar vários convites de Toby recentemente, e então saudou-o com a maior
amabilidade.
— Acabei de preparar um chá. Gostaria de tomar uma xícara?
— É uma boa idéia — concordou. Estava estranhamente quieto enquanto subiam a
escada.
— Então... — ela o encorajou enquanto lhe entregava o chá e sentava para
acompanhá-lo na bebida. — A que devo o prazer de sua visita?
— A você, você mesma — respondeu timidamente.
— Eu? — Whitney começou a desconfiar que ouviria alguma coisa desagradável.
— Bem — ele parecia perdido no meio do caminho. — Você não sabe como fiquei
ensaiando o que queria dizer a você. E agora, na sua frente, esqueci tudo...
Ele estava mesmo desgostoso, e Whitney prometeu mentalmente que faria tudo para
ajudá-lo.
— O que você quer me contar que precisa de tanto ensaio, Toby? — perguntou-lhe
calmamente.
— Eu... não posso — parou, mas logo prosseguiu: — Primeiro, eu quis lhe escrever.
Depois, bem, depois, vi que não podia esperar pela sua resposta. Poderia levar um século
antes de você resolver me escrever também, dizendo que gostava de mim tanto quanto eu de
você. — De repente calou-se. Estava todo atrapalhado, e continuou desajeitadamente: —
Pronto, já falei. Acabei de dizer que gosto de você. É isso que eu queria... — Parou outra vez
quando verificou que sua alegria por ter encontrado as palavras certas não estava refletida na
expressão de Whitney. — Você não gosta de mim... — ele começou.
Whitney tentava se recuperar da mais inesperada declaração, se é que podia
considerar assim.
— Eu não sei o que você quer dizer com isso, Toby — ela o interrompeu. Era difícil
acreditar que ele estivesse falando sério. — Antes de começar a sair com você, eu lhe
expliquei...
— Eu sei — ele a interrompeu e respirou profundamente. — Você não queria se
envolver com nenhum homem, você me disse. Então imaginei que havia se desiludido com
alguém. E foi por isso que eu não toquei logo no assunto. Mas agora você está saindo com
outro homem, e comigo também, de modo que não quer mais distância deles como antes. E,
para ser franco, fiquei preocupado que ele se declarasse para você antes de mim.
Declarasse? Whitney ficou atônita com essa palavra e não sabia como contornar o
assunto. Com facilidade, Toby ligara os fatos e concluíra que, se ela recusava seus convites,
era porque estava saindo com outro homem. E ela sabia, por experiência própria, como
alguém pode sair machucado de um amor não correspondido! Não queria nem pensar em
machucá-lo!
— Oh, Toby, Toby — ela pronunciou desconsoladamente. Ele pôde entender tudo
vendo o olhar infeliz de Whitney.
— Você... você não me ama — falou lentamente.
— Gosto muito de você, sim, mas como amigo — ela replicou sem satisfação. —
Apenas como amigo, Toby.
— Não pensei que tivesse muita chance, mesmo.
Whitney sentia o coração se partir em mil pedaços.
Depois de alguns momentos, ele se esforçou para colocar um brilho em seu olhar
tristonho.
— Suponho que já é muita coisa ter você como amiga. — Suspendeu a xícara e o
pires e tomou um prolongado gole de chá como se realmente precisasse dele. Então, sentindo-
se mais seguro de si, comentou: — Você saiu com alguém nos últimos três sábados, Whitney.
É demais pedir para sair com um amigo um sábado por mês?
— Você é o máximo, Toby — Whitney exclamou suavemente, enquanto percebia
com surpresa que, no que se referia à chantagem emocional, ele era igualzinho a Sloan.
— É pedir muito? — insistiu, e sua expressão de garoto perdido ressurgia.
— Eu — ela hesitou. Deveria sair com Toby essa noite? Sloan ainda estava na
Suíça... Não que fosse obrigada a reservar as noites de sábado para ele. Provavelmente ele
estaria aproveitando seu tempo em Zurique com alguma suíça elegante. Inexplicavelmente,
sentiu uma hostilidade contra ele, e tomou uma decisão: — Acho que podemos sair hoje — e
fitou Toby, cuja face se iluminava com um sorriso. Agora ela não podia mais voltar atrás.
Toby foi embora, e um segundo depois Whitney ficou imaginando o que estaria
acontecendo com ela. Aceitaria o convite por causa de um absurdo ciúme. Pensar em Sloan
flertando com alguma "Gleda suíça" era tão cômico que ela começou a rir. Então tentou
transferir sua atenção de Sloan para Toby. Seria bom para ele continuar se encontrando com
ela? Não poderia evitá-lo no serviço, mas...
Depois de pensar muito, concluiu que não faria mal ver Tob além das horas de
trabalho.
O fato era simples: ele não a amava como estava pensando. Ela sim, já havia amado,
e por isso percebia as coisas. Apenas recentemente ele lhe contara como as amigas ultra-
sofisticadas de sua irmã o amedrontavam. Nos últimos tempos ele passava longe do
apartamento de Valerie.
"A meu lado se sente tranqüilo e feliz, e está convencido de que isso é amor. Está
claro que deseja se casar e se fixar num lugar seu", Whitney raciocinou. Falaria com ele
aquela noite.
Nesse instante lembrou-se de Érica e já ia apanhar os dois chapéus que havia
prometido quando o telefone tocou. Não saberia explicar o que sentiu ao reconhecer a voz de
Sloan.
— Já voltou?
— Resolvi meus negócios mais depressa do que esperava. "Que bom que ele não
estava flertando com nenhuma suíça atraente!", Whitney pensou. Sloan continuou com voz
macia:
— Se tudo correr bem, passarei pelo seu apartamento às oito. Nós...
— Espere um minuto!
Whitney se enfureceu por dois motivos. Primeiro, consigo mesma: ele que se
encontrasse com quantas suíças quisesse que ela não tinha nada a ver com isso. Segundo,
porque era muita insolência da parte dele imaginar que, agora que estava de volta, bastaria
apanhar o telefone para que ela se jogasse em seus braços. Por isso falou com voz áspera:
— Sinto lhe dizer que não estou livre hoje.
Houve uma pequena pausa do outro lado.
— Por quê? — Sloan perguntou com voz abafada.
Com satisfação, Whitney explicou:
— Tenho um compromisso para esta noite. — Sua respiração ficou suspensa quando
ele exigiu saber:
— Com quem?
Ela ficou indignada! Como se lhe devesse alguma satisfação!
— Já que você quer saber — replicou gravemente, fazendo desaparecer seu tom
gentil —, vou sair com Toby Kes... — Não terminou de pronunciar o nome do amigo. Antes
que pudesse piscar um olho, a voz de Sloan retrucou através da linha.
— Bem que eu sabia! Você costuma esquentar a cama de um homem enquanto está
saindo com outro...
Agora já estava feito. Whitney prometera que algum dia teria o prazer de bater-lhe o
telefone. E foi exatamente o que fez. Furiosa como ficara, nem pensou no que fazia até que
desligou o aparelho antes que ele terminasse de falar.
— Miserável! Cretino! Um palhaço perfeito! — Agora ela estava satisfeita! Nunca,
nunca mais sairia com aquele convencido sr. Illingworth outra vez! Ela o acompanhava
somente por causa do problema de sua mãe e, entretanto... Oh!
Ela fervia de raiva, mas lastimou ter se lembrado da pobre mãe de Sloan, acamada
por causa de um acidente...
Obstinada, Whitney passou os dez minutos seguintes convencendo-se de que não era
problema seu se a mãe de Sloan estava desnorteada ou não. Ela nem mesmo conhecia aquela
senhora...
Entretanto, não conseguia pensar na sra. Illingworth sem relacioná-la com a própria
mãe e os problemas que enfrentara antes de falecer. Desde que conhecera a amante do marido,
a sra. Lawford permanecera num quase estado de choque até o último momento. Whitney
enxugou as lágrimas que vieram com essas lembranças e perdera o estímulo da raiva que
sentia contra Sloan. Quanto mais queria estar furiosa com ele, mais se culpava por ter se
deitado em sua cama. Se não tivesse feito isso, Sloan estaria noivo e ela não seria obrigada a
participar daquela representação.
Era estranho que ele nunca lamentasse o fim do noivado. Como homem, guardava
seus sentimentos só para ele. Apenas sentia pesar no que se referia a sua mãe. Provavelmente
fora essa preocupação que o fizera apressar-se e voltar da Suíça antes da hora marcada.
Com os pensamentos mais uma vez centralizados na mãe hospitalizada de Sloan,
Whitney esforçou-se novamente para se enfurecer com ele. Como não conseguiu, apanhou o
telefone e discou o número de Toby. Ele iria odiá-la, mas...
— Alô, Toby — ela se apressou a dizer quando o sinal de chamada parou. — Aqui
é...
— Whitney! — ele exclamou, não deixando que ela mesma se anunciasse. — Acabei
de sair de sua casa. Aconteceu alguma coisa com você?
— Eu estou... — Diante do tom de agradável surpresa que transparecia na voz do
rapaz, Whitney sentiu-se pior do que nunca. Não estava conseguindo se explicar. Num
ímpeto, prosseguiu: — Sinto muito, Toby. Sinceramente. Mas receio não poder me encontrar
com você esta noite.
— Você não pode...
"Oh, que pena", Whitney pensou, e quase pediu a ele que esquecesse aquele
telefonema, que eles fariam tudo como haviam combinado.
— É por causa de alguma coisa que eu falei esta tarde, não é? Você teve tempo para
pensar e decidiu que...
— Toby, Toby — interrompeu-o antes que ele fizesse seu coração em pedaços. —
Não é nada pessoal. Apenas... por um motivo particular... não poderei vê-lo. Mas não tem
nada a ver com a nossa amizade.
— Você ainda é minha amiga?
— Vamos almoçar juntos na segunda-feira, está bem? — ela tentou alegrá-lo.
— Ótimo — ele se animou.
Whitney desligou. A vida estava se tornando muito complicada. Procurou o número
do telefone de Sloan. Porém hesitou em ligar-lhe, lembrando que ainda não tinha se
comprometido e estaria livre à noite.
Pensou também que, do modo como batera o telefone, teria de engolir o próprio
orgulho se quisesse falar com Sloan. Ficou mais alguns momentos refletindo se queria mesmo
sair, ou se preferia sua própria companhia.
— Oh, que homem! — resmungou. Um segundo depois estava ocupada discando o
número da casa dele.
Pareceu-lhe que se passaram anos antes que alguém respondesse.
Suas mãos estavam úmidas, talvez porque não engolisse seu orgulho todos os dias.
Quando ia desligar e consolar-se com o fato de que havia tentado, o fone foi levantado.
— IIllingworth. — A voz de Sloan vibrou em seu ouvido, e imediatamente Whitney
teve consciência de que seu coração disparava.
— Sl... — não concluiu a palavra. Contudo, conseguiu encontrar a frieza que
desesperadamente procurava para usar quando fosse enfrentá-lo. Com voz calma continuou:
— Pode se preparar. Estarei pronta às oito!
E tranqüilamente desligou o telefone.
CAPÍTULO VI
Assim que desligou o aparelho, Whitney já se sentia mais calma. Tentava se
convencer de que as batidas de seu coração se aceleraram porque fora forçada a engolir seu
orgulho, e não porque ouviu a voz de Sloan respondendo a sua chamada.
Estava meio desconcertada por ter voltado atrás e começou a se irritar, primeiro com
Sloan, depois consigo mesma. Lamentava o dia, a hora e o minuto em que concordara em ir
àquela festa horrível. O telefone ao lado era uma tentação: faria uma nova ligação e explicaria
que mudara de idéia, desmarcando o encontro daquela noite. Logo percebeu que isso apenas
faria com que se sentisse mais tola ainda.
Por isso foi escolher a roupa que deveria usar. Estava a ponto de resolver tudo de
uma vez e acabar com aquela comédia. Ela nunca mentira para a própria mãe e não fazia idéia
de como iria se comportar diante da mãe de Sloan, sendo obrigada a fingir o tempo todo.
Suspirando, separou um de seus vestidos favoritos e concluiu que o problema não era
de fácil solução. Analisando bem os fatos, viu que não havia escolha. Era inútil lutar contra o
óbvio: ela era culpada. Ela fora àquela festa, refugiara-se no quarto e dormira na cama de
Sloan. Acordara com ele a seu lado despido sob as cobertas e, pior de tudo, foram descobertos
pela própria noiva que, pelas evidências, imaginou que ambos estivessem sem roupa.
Whitney não sabia o que causava o calor em seu rosto, se eram esses últimos
pensamentos, ou se era a lembrança das costas largas e nuas de Sloan sentado na cama.
Naquelas circunstâncias, ela teria feito a mesma coisa que Gleda: terminaria o noivado. Só
que essa atitude deixou Sloan numa posição difícil: sua mãe poderia ficar ainda mais
perturbada se ele não lhe apresentasse a noiva quando saísse do hospital.
Enquanto tomava banho, pensava com desânimo em tudo isso, e voltou ao ponto de
partida. Por motivo nenhum causaria sofrimento a uma senhora idosa, se o noivado era tão
importante para ela.
Escolhera um vestido vaporoso, de linho verde, que lhe caía bem e combinava com
seus olhos. Quando Sloan chegou, ficou claro que não estava sentindo mais satisfação do que
ela.
"Olá, obrigada, estou bem e feliz por ter me esmerado para parecer apresentável",
Whitney pensou amargamente quando, cumprimentando-a com má vontade, ele desceu os
degraus que davam para a rua e retornou ao carro.
— Obrigada — falou em voz alta quando, numa inesperada cortesia, ele abriu a porta
para que ela entrasse no automóvel.
Sentada a seu lado, Whitney calculava que poderiam passar a noite inteira calados,
mas ela não seria a primeira a iniciar uma conversa.
Um silêncio sepulcral pairava sobre eles. Depois de cinco minutos, virou um pouco a
cabeça e viu que Sloan ainda conservava os lábios contraídos. Decidiu que levaria em conta
sua expressão, porém lembrou que ele poderia ter recebido más notícias de sua mãe.
— E sua mãe... você a viu depois que voltou?
Por um longo momento Whitney achou que tinha razão; demorou bastante tempo
antes que ele lhe dirigisse a palavra.
— Há pouco falei com ela por telefone — respondeu como se resmungasse.
— Oh, eu entendo — Whitney murmurou. Ele devia ter feito a ligação logo que
desembarcou no aeroporto.
Certamente não tivera tempo de visitá-la no hospital. Esperou em vão por mais
alguma notícia; Sloan continuava mudo.
Para que pudessem descrever livremente os diversos locais que freqüentavam, cada
vez que saíam Sloan a levava a um lugar diferente.
Nessa noite foram a um restaurante que seguia o mesmo padrão dos anteriores.
Parecia um ambiente agradável, porém não apresentava a mesma classe dos outros onde já
haviam jantado. A essa altura ela já sabia que Sloan era um conhecedor profundo dos bons
vinhos e da boa comida, e com certeza reservara uma mesa ali porque conhecia a habilidade
do chef da cozinha.
Essa mesa ficava isolada num canto, de tal forma que, embora fosse possível
observar quase todo o salão, eles mesmos não poderiam ser vistos facilmente por outros
fregueses.
Whitney tomou seu lugar imaginando como aquela noite seria divertida se
continuasse aquele silêncio entre eles. Logo, porém, descobriu que esses pensamentos foram
precipitados.
Estava saboreando o prato que fora servido como entrada, peras recheadas com
queijo Roquefort, quando Sloan, com uma voz nada agradável, interrogou-a:
— Devo ficar agradecido por você ter cancelado seu encontro com Keston?
Ela fitou-o admirada. Não precisaria de muita imaginação para descobrir que ele
estava disposto a discutir. Ficou tão irritada com ele que não viu motivo para evitar a
discussão.
— Jamais esperaria que você ficasse agradecido por qualquer coisa — replicou com
voz grave, e, embora lhe custasse algum esforço, tentou aparentar calma e domínio de si
mesma, voltando sua atenção para as peras au Roquefort.
Ondas de raiva vinham até ela por cima da mesa, mas Whitney as devolvia, e ignorou
totalmente Sloan quando o prato seguinte foi servido.
Sua opinião era que, desde que conheceram o restaurante e experimentaram o
cardápio juntos, cumpriram o objetivo e podiam voltar para casa. Mas Sloan repentinamente
quebrara o silêncio:
— Não há dúvida de que você lhe ofereceu alguma coisa.
Whitney levantou a cabeça do prato:
— Ofereceu a quem?
— A Keston! — ele investiu. — Uma vez que você quer mantê-lo sob controle, com
certeza prometeu vê-lo numa outra ocasião quando cancelou o programa para esta noite.
Impressionada com seu raciocínio lógico, e também com a agressividade com que ele
a tratava, Whitney encarou-o friamente. Nunca pensara em manter Toby sob controle, mas
tinha de admitir que a outra parte era impressionantemente correta.
— E então? — ele a pressionou, visivelmente aborrecido porque ela não lhe dera
resposta. — Você vai vê-lo de novo, não vai?
— Se você quer saber, iremos almoçar juntos na segunda-feira. — E se apressou a
acrescentar: — Agora, respondendo àquela observação suja que você fez ao telefone, eu não
estou esquentando a cama de ninguém enquanto saio com você.
— Ah! — Sloan grunhiu e fez uma pausa, deixando-a sem saber se acreditava ou
não. — Você tem se encontrado com ele durante todo o tempo que tem saído comigo?
— E se for assim?
— Acontece que você é minha noiva! — ele estava quase gritando.
— Acontece — ela empregou o mesmo tom — que eu estou fingindo que sou sua
noiva. E — procurou suavizar a voz — apenas enquanto sua mãe não estiver em condições de
receber más notícias.
Ficou alarmada. Não deveria ter se referido à mãe de Sloan. Pensar na sra.
Illingworth fazia com que seus nervos se acalmassem, e ela não queria isso. O presunçoso
Sloan Illingworth avançaria sobre ela, se tivesse chance. Tudo bem. Ela se comprometera com
ele, mas isso não lhe dava o direito de impedi-la de sair com seus outros amigos.
— Pensei — ele continuou falando sobre o mesmo assunto — que, em vista de tudo
o que aconteceu, você preferisse evitar que minha mãe soubesse de suas saídas com outros
homens!
— Toby não é "outro homem"! — Whitney se exasperou. Tentava manter a voz
baixa, mesmo que, naquele canto isolado e com o burburinho das conversas dos outros
fregueses, ninguém pudesse ouvi-la. — E sua mãe não é... — Ela suspendeu a voz. A sra.
Illingworth bem podia conhecer Toby. E quem poderia provar que o dedo da coincidência não
teria se intrometido nesse caso? Toby poderia ter se encontrado com a mãe de Sloan e
conversado sobre o que estava fazendo ultimamente. Respirando profundamente, ela
recomeçou: — Para sua informação, Toby e eu somos apenas ótimos amigos.
— Você me espanta! — Sloan comentou com cinismo.
— Realmente somos...
— Agora você vai me dizer que ele nunca pegou em sua mão...
— Sim, mas...
— E agora você vai me dizer que ele nunca lhe deu um beijo!
Whitney recordou que Toby acabara lhe dando um beijo no rosto.
— Bem, ele realmente... — Ela precisava acabar com aquela expressão carrancuda
na face de Sloan. — Mas...
— Então quem você pensa que está enganando? — ele explodiu, e seu olhar se
tornou mais sombrio do que nunca. — Agora você vai me dizer que ele nunca lhe propôs
casamento? — Sua voz estava sinistramente calma.
O que ela poderia fazer? Naquele momento desejou de coração nunca ter posto os
olhos em Sloan Illingworth nem em Toby, e recriminou-se por não ter seguido o impulso de
ligar cancelando aquele jantar.
— Ele lhe propôs casamento, não propôs? — ele a pressionou. — E o que você
respondeu?
— Respondi que não! — Whitney enfureceu-se. Nunca antes sentira a menor
vontade de bater em alguém, mas naquela hora desejou atingir Sloan. Não costumava revelar
os sentimentos que nutria por outra pessoa, e ele a obrigara a fazer isso!
Ela ainda queria socá-lo quando, depois de descobrir que Toby lhe propusera
casamento e fora rejeitado, sorriu desdenhosamente:
— E você ainda tem coragem de dizer que são "apenas bons amigos"?
O tom de sua voz era enervante. Whitney quis lançar algo quente ou pesado sobre
ele. Porém controlou-se quando percebeu que esse último diálogo fazia com que parecesse
uma perfeita mentirosa. Talvez assim perdesse pontos no conceito de Sloan e ele não a
procurasse mais. Sua impressão era de que ele não tinha tempo para mentiras, com exceção
deste momento, quando iria iludir a mãe por uma justa causa.
Tentando não se importar com a grosseria do acompanhante, Whitney se concentrou
para saborear um pouco do prato principal. Quando experimentava uns cogumelos, percebeu
que não encarara de frente o fato de Sloan se apresentar tão mal-educado aquela noite. Será
que não resolvera satisfatoriamente seus negócios na Suíça? Logo descartou essa hipótese.
Era difícil imaginá-lo sem alcançar o objetivo a que se propusera. Por outro lado, era um
homem que guardava os insucessos consigo, de tal modo que ninguém mais tomaria
conhecimento deles.
Seria algo relacionado com sua mãe? Ela estaria pior do que ele deixava
transparecer? Afastou essa teoria também, e prazerosamente apreciou um bocado de sua
salada. Se ela não estivesse bem, Sloan não sairia para jantar com uma moça por quem não
sentia nenhuma paixão, e permaneceria a seu lado o tempo todo.
Convenceu-se de que a sra. Illingworth não sofrera uma recaída, mas seu coração
repentinamente deu um salto. Ressentida com o pensamento de que Sloan nada sentia por ela,
reverteu a idéia e concluiu o contrário: ele estava agindo como se odiasse o mundo porque
estava com... ciúme!
Imediatamente levantou a cabeça e em seguida a abaixou. Nesse rápido instante fitou
diretamente o olhar duro e frio de Sloan, e leu neles uma total antipatia. Achou isso muito
bom.
Tendo colocado esses pensamentos de lado, Whitney deu um giro completo. Sloan
era um homem que não se escondia atrás de mentiras e fraudes, e devia odiar as pessoas que
tivessem esses defeitos. Pensando que ela tivesse mentido a respeito de Toby, sentia uma
grande decepção.
— Sloan... — começou uma frase, fitando o homem que estava a sua frente, quando
a risada estridente de uma mulher que acabava de entrar no restaurante chamou-lhe a atenção.
Whitney desviou o olhar em sua direção, e imediatamente seu coração disparou.
Segundos depois ela não sabia mais o que ia dizer a Sloan. Talvez fosse algo
relacionado com o fato de que estava sendo sincera a respeito de Toby. Todos os pensamentos
desapareceram de sua mente.
Embora ela não fosse culpada de nada, sentiu que suas faces se ruborizaram. No
momento em que reconheceu a mulher que trabalhava na Implementos Hobson, seu emprego
anterior, seus olhos pousaram em seu acompanhante, que não era outro senão Dermot Selby!
— O quê?... — Sloan começou a falar e notou o rubor do rosto de Whitney.
Estranhou o modo como desviara o olhar para alguma coisa à esquerda. Notou-lhe a confusão
e o mal-estar. Sem perceber que os olhos de Sloan acompanhavam os seus até o casal recém-
chegado, Whitney dirigiu-se a ele com aflição.
— Podemos... ir? — ela perguntou hesitante. Estava muito agitada para se lembrar da
deliciosa sobremesa que tinham pedido.
A expressão séria e indagadora de Sloan demonstrava que ele havia entendido tudo.
Inicialmente pareceu a Whitney que iria insistir para que terminassem a refeição. Contudo, ele
se levantou:
— Para mim também já basta! — resmungou, e Whitney estava certa de que ele não
apreciara a noite mais do que ela.
Sloan veio até ela e tomou-lhe o braço possessivamente. Whitney estava satisfeita
com a altura e a força masculinas que a protegiam enquanto caminhavam para a porta.
Dermot e a secretária ainda aguardavam o maitre para lhes indicar onde sentar. Sem
se importar com o tom de voz alta, ele sugeria à mulher a seu lado que, embora o restaurante
fosse caro, apenas o melhor servia para ela.
Whitney estremeceu e sentiu uma dor no estômago enquanto lembrava com que
entusiasmo ouvira Dermot lhe dizer a mesma coisa. De repente, ele e sua companheira
extraconjugal estavam em sua frente, bloqueando a passagem.
— Por favor — a voz fria e educada de Sloan interrompeu os olhares amorosos de
Dermot —, minha noiva e eu queremos sair.
Imediatamente ele se afastou e avistou Whitney. Esquecendo-se do modo como
haviam se separado, e também de que naquele momento estava acompanhando outra mulher,
dando a impressão de que estava satisfeito por encontrá-la, exclamou:
— Whitney!
Ela nem teve tempo de pensar se iria ou não responder-lhe, pois Sloan rapidamente a
conduziu para a saída. Dermot, que também era alto, foi encoberto por Sloan, e ela não pôde
mais ver o antigo namorado.
— Espere no carro — Sloan ordenou, e entregou-lhe as chaves. Ela conseguira se
acalmar um pouco e lembrou que ninguém podia sair de um restaurante sem pagar a conta.
Sentada no carro dele, Whitney empalideceu recordando seu comportamento
constrangedor. Começou a se sentir embaraçada pelo que havia feito e, enquanto suspirava
aliviada, desejou pela centésima vez não ter telefonado e concordado em sair.
Entretanto, enquanto se lembrava do modo como ele se dirigira a Dermot: "Minha
noiva e eu gostaríamos de passar", ela sentiu um pouco de ternura por Sloan. Ele havia
percebido que seu orgulho precisava ser levantado, e "noiva" foi a primeira palavra que lhe
ocorrera.
Sua gratidão era total. Depois de fitá-la por apenas um segundo, ele não perdera
tempo para retirá-la do restaurante. E nem fizera perguntas! Whitney estava pronta para
esquecer todas as outras coisas. O fato de que ele estivera intratável a maior parte do tempo
não significava mais nada.
Ela se preparava para um sorriso e um agradecimento sincero pelo apoio total que
recebera, mas não sorriu nem disse muito obrigada. Ele voltou, entrou no carro e colocou-o
em movimento sem pronunciar uma única palavra. Sua expressão gelada foi suficiente para
revelar que nada havia mudado. Agora, lembrando do que ele dissera, notou que continuava
intratável. Seus sentimentos afetuosos tornaram-se indiferentes e distantes.
Sem trocarem nenhuma sílaba, chegaram ao apartamento. Do modo como as coisas
estavam acontecendo, Whitney não ficaria admirada se Sloan, abandonando sua habitual
cortesia, não a acompanhasse até a entrada do prédio. Não esperou até que viesse abrir-lhe a
porta, e saltou tão logo ele estacionou.
A primeira surpresa aconteceu antes que Whitney pudesse desejar-lhe o formal "boa
noite"; ele desceu do carro e ficou na calçada a seu lado.
A segunda surpresa foi quando, depois de subir os degraus de concreto que davam
para a calçada, ele lhe tomou as chaves, devolvendo-as depois que abriu a porta. Ela já estava
para pronunciar o ensaiado "boa noite" quando ele, com um brilho especial nos olhos, falou
objetivamente:
— Ainda é cedo, e já está na hora de eu conhecer o interior de seu apartamento. —
Com isso, tirou a chance de Whitney se desculpar dizendo que já era tarde, e criou-lhe alguns
dramas de consciência ao pedir: — Você pode fazer o café que não tomamos no restaurante.
Havia muitas coisas que Whitney gostaria de fazer, mas um café para Sloan não era
uma delas. O que mais queria era ir direto para a cama e enterrar a cabeça no travesseiro;
pretendia levantar no dia seguinte sem as lembranças perturbadoras de seu comportamento no
restaurante. Mas Sloan tinha ainda um longo percurso pela frente, e se desejava um café...
— Claro... vamos subir — convidou, seguindo à frente dele na escada. — Entre —
disse, quando chegaram à porta do apartamento.
Não saberia explicar por que não estava sendo capaz de manter um diálogo normal
com ele. Sempre saíam e conversavam animadamente, mas nesse momento isso não estava
acontecendo.
— Sente-se, por favor — ela tentou ser simpática, agora que teria de desempenhar o
papel de anfitriã.
Sloan estava mais interessado em olhar os quadros pendurados nas paredes do que
em sentar-se.
— Com ou sem creme?
— Sem — ele respondeu com tranqüilidade, desviando os olhos de uma gravura que
ela conseguira comprar depois de ter economizado durante meses.
Whitney, um pouco assustada, dirigiu-se à cozinha. Era impressão sua, ou Sloan
também estava tenso?
Dizendo a si mesma que isso era bobagem, preparou duas xícaras de café e se
esforçou para manter a calma. Nunca tivera receio de ficar ao lado dele, mas agora sentia-se
desconcertada.
Quando entrou na sala carregando a bandeja com as xícaras, Sloan continuava em pé. Ele se
aproximou, tomou a bandeja de suas mãos e Whitney puxou uma mesinha para perto de duas
poltronas.
— Pode colocá-la aqui — falou educadamente. Sentiu-se mais à vontade quando,
deixando a bandeja sobre a mesinha, ele esperou até que ela sentasse para ocupar a outra
poltrona. Entretanto, embora estivesse agradecida por ele ter saído do restaurante sem fazer
perguntas, logo percebeu que essa compreensão muda iria terminar naquele instante. Sloan
era o tipo de homem que fazia questão de saber os mínimos detalhes de tudo. Ela acabara de
lhe entregar uma xícara quando, inesperadamente, ele perguntou:
— O que significa tudo isso?
— Tudo o quê? — Ela não entendeu no início, mas um olhar para a expressão hostil
no rosto de Sloan foi suficiente para fazê-la lembrar que já sabia do que se tratava.
— Se não pode existir mais nada entre nós, deixe que pelo menos exista honestidade
— ele retrucou friamente.
Nesse ponto Whitney reconheceu que ele era realmente a honestidade em pessoa;
apenas não estava sendo sincero com sua mãe por um justo e forte motivo.
— Aquele cara lá do restaurante estava pronto para voar sobre você se não tivesse
sido desprezado.
De repente ela entendeu que, não tendo respondido ao cumprimento de Dermot,
deixara-o mesmo humilhado.
— Vai me dizer que você nunca viu aquele homem? — Sloan insistia
sarcasticamente.
Ela ainda não havia falado sobre Dermot, nem respondera a sua pergunta. Por isso
ele estava ficando furioso.
— Agora vai tentar me convencer de que quis sair do restaurante porque, de um
minuto para o outro, você começou a detestar a decoração...
Naquele instante Whitney só detestava um monstro que respondia pelo nome de
Sloan Illingworth.
— Você sabe que não é nada disso! Eu simplesmente... foi apenas... — Sua voz
desapareceu. Suas emoções deveriam pertencer somente a ela. Sloan a colocara contra a
parede e parecia que não iria sossegar até que ela dissesse tudo o que queria saber. Whitney o
odiava intensamente. — Ora, pare com isso! — explodiu, quando o silêncio que aguardava
suas palavras deixou-a nervosa. — Você já sabe tudo sobre Dermot Selby! Eu lhe falei sobre
ele. Eu sei que lhe falei.
— Ah, sim! É o homem que a deixou machucada — Sloan afirmou com voz calma,
quase rouca. Mas, como Whitney já esperava, ele voltou a agredi-la. — E por que fugir? Por
que não ficar e enfrentá-lo? — Parou um segundo e, antes que ela pudesse dizer qualquer
coisa, continuou: — Talvez seja o medo de que ele a machuque de novo? — Sua expressão se
fechou mais ainda e então atirou para ferir: — Quer dizer que você pensa que ainda o ama?
Whitney estava tão atordoada que não sabia mais por que quis deixar o restaurante,
nem se havia mesmo falado a Sloan sobre sua paixão por Dermot. Só tinha certeza de que
estava farta do sr. Illingworth. Propositalmente, ignorou que ele concordara em sair
apressadamente do restaurante quando ela quase entrou em pânico. Em vez disso preferiu
lembrar o modo agressivo com que a tratara durante quase toda a noite. Sendo ou não sua
noiva, não iria tolerar mais nenhuma ofensa.
Ela se levantou da cadeira e, com voz gelada, sugeriu:
— Se você já terminou de tomar seu café...
Aquele brilho que não a agradava surgiu de novo nos olhos cinzentos. Demonstrando
que não estava com pressa, Sloan descruzou as pernas e ficou em pé. Whitney intimidou-se
um pouco quando ele parou a seu lado, muito próximo. Se desse um passo para se afastar,
estaria demonstrando um sinal de fraqueza. Então, permaneceu imóvel perto dele.
— Obrigada — começou a falar educadamente. Ia acrescentar outras coisas, e parou
para pensar um pouco. Dificilmente poderia agradecê-lo por uma noite agradável, e as
palavras se perderam em sua garganta. — Dirija com cuidado. — Ela se expressou de um
modo vulgar e encarou-o. Quase entrou em pânico outra vez. O olhar penetrante que
encontrou fez com que suspendesse a respiração; parecia querer avisá-la para tomar cuidado,
mas Whitney teimou em não se mover um centímetro.
Ele não dera a menor importância a seu "obrigada" e certamente não apreciou sua
vulgaridade.
Whitney estava mais chocada do que abalada quando os braços de Sloan se
levantaram e a abraçaram fortemente.
— Você esteve pedindo por isto a noite toda — ele murmurou.
De repente ela ficou totalmente paralisada, imaginando todo tipo de ataque. Quis se
mover, porém a cabeça de Sloan foi se aproximando e o único ataque que recebeu foi um
beijo agressivo em seus lábios.
Por um desconcertante segundo, Whitney permaneceu tão quieta que nem mesmo
respirava. Inesperadamente, foi dominada por uma fúria intensa e reagiu como um animal
selvagem.
— Você não.... — Ela estava ofegante enquanto tentava afastar a boca e interromper
o beijo. Foi tudo o que conseguiu fazer. Uma das mãos de Sloan passou a apoiar a parte de
trás de sua cabeça, obrigando-a a ficar quieta. Com o outro braço ao redor de sua cintura, ele a
trazia para mais perto. Novamente seus lábios se encontravam.
Ela se esforçava para se libertar, de todas as maneiras. Logo descobriu que era tempo
perdido tentar atingir suas canelas, pois só conseguia fazer movimentos, obrigando Sloan a
abraçá-la com mais firmeza. Recorrer a murros e pancadas era impossível, pois com os braços
presos não poderia fazer muita coisa.
De repente sentiu uma confusão total. Ao mesmo tempo que se enraivecia e perdia a
vontade de lutar, percebeu que inconscientemente estava gostando e queria aproveitar a
situação.
Os beijos de Sloan se tornaram gentis e o cérebro de Whitney a aconselhava a não se
soltar; estava feliz em seus braços.
Quando os lábios dele finalmente deixaram os seus, ela estava calma. Em outra
ocasião o teria chamado de monstro, e uma série de outros nomes. Contudo, fixando os olhos
cinzentos que antes lhe pareciam tão frios, só conseguiu pronunciar:
— Sloan! — e não saberia explicar qual a mensagem que havia enviado.
Gentilmente ele continuou beijando-a, dos cantos dos lábios levemente separados até
o pescoço.
— Oh, Sloan! — ela murmurou, e soube que queria permanecer abraçada a ele para
sempre.
Ouvindo seu nome outra vez, Sloan tornou a pousar sua boca sobre a dela. Enquanto
a pressão dos lábios aumentava, Whitney se comprimia toda contra ele, querendo se
aproximar cada vez mais. Ela ouviu um gemido quando seus corpos pareceram moldados em
uma tremenda onda de desejo. Encontrava-se num paraíso quando as mãos de Sloan desceram
acariciando suas pernas. A pressão sobre seu corpo continuava mais firme ainda.
— Oh, Sloan! — gritou ofegante e, beijando-o novamente, soube que ele a desejava.
Não podia negar, também ansiava por ele. Queria que fizessem amor. Quase lhe
pediu para... mas alguma coisa a perturbou.
Pensou que fosse um som, e teve certeza de que era quando reconheceu o toque
característico de Érica. O coração de Whitney batia como um trem expresso quando percebeu
que Sloan também fora atingido por aquele som.
Enquanto dava um passo para trás e os braços dele a libertavam, estava muito longe
de lembrar o que havia acontecido para que estivessem tão fortemente abraçados. Talvez por
isso o choque tenha sido tão grande quando ouviu Sloan dizer com voz gelada:
— Acredite-me, querida, se você consegue se comportar assim com um outro
homem, é porque não está nem um pouco apaixonada por um cara chamado Selby.
Ela estava no mesmo lugar observando-o atravessar a sala e abrir a porta. Ainda
estava paralisada quando escutou Érica se desdobrando em desculpas.
— Sinto muito, não sabia que Whitney tinha companhia.
Whitney caminhou a passos largos para estar perto quando ele retrucasse alguma
coisa. Com uma satisfação que não havia apresentado durante toda a noite, Sloan respondeu:
— Eu já estava de saída.
Miserável! Ela odiava Sloan quando foi até a porta e o viu pelas costas enquanto
descia as escadas.
— Érica, que bom que você veio — gritou alegremente, esperando que ele pudesse
ouvir.
Em seguida teve de se controlar e demonstrar que não havia se esquecido nem por
um minuto de que Érica viria buscar o chapéu.
Miserável!
Whitney ainda não se acalmara quando foi deitar-se àquela noite. Sloan não
precisava lembrar que não estava mais apaixonada por Dermot Selby. E como poderia, se
soube desde o momento em que se encontrara em seus braços que o único homem que amaria
era Sloan Illingworth?
CAPÍTULO VII
Naquela manhã de sábado, Whitney abriu os olhos e fechou-os em seguida. Uma
lembrança perturbadora acordara com ela e não seria esquecida mesmo se permanecesse no
escuro. Abriu novamente os olhos para assumir que estava apaixonada por Sloan Illingworth.
Saiu da cama estabelecendo a diferença entre o que havia sentido por Dermot e a
presente emoção que tomava conta dela, agora que estava amando de verdade. Com Dermot
criara-se um limite. Com Sloan não havia barreiras, e ela não queria que houvesse. Enquanto
preparava uma xícara de café, lembrou que não conseguira manter o autocontrole quando
esteve nos braços de Sloan. Tempos atrás, ela se preocupava em ter consciência de tudo o que
fazia. Na noite anterior, só sabia que iria para onde Sloan a levasse. E se não fora para a cama
com Dermot era simplesmente porque nunca o amara.
Sloan também a desejara, ela tinha certeza disso. Pensou no modo grosseiro como ele
saíra sem se despedir, e no olhar sarcástico com que a fitava enquanto dizia "...você não está
apaixonada por um cara chamado Selby. Então agradeceu a Érica a oportuna interrupção. Se a
amiga não batesse à porta naquele instante, Whitney não fazia idéia do que poderia ter
acontecido. Queria acreditar que não se entregaria totalmente. Porém era honesta e, com sua
resistência reduzida a zero, com Sloan teria chegado até o fim. Tomava sua quarta xícara de
café quando passou-lhe pela cabeça uma outra idéia. Sloan somente a beijara para provar que
ela não amava Dermot. Sentindo uma pontinha de raiva, Whitney jurou que faria o possível
para que ele nunca soubesse quem ela realmente amava.
Estava satisfeita quando foi trabalhar na segunda-feira. Sloan continuava ocupando
todos os seus pensamentos. Por isso não se lembrou que combinara almoçar com Toby até
que ele surgisse à porta de seu escritório, pouco antes da uma hora.
— Você se esqueceu! — ele começou a acusá-la quando viu a surpresa que os olhos
verdes transmitiam.
— É claro que não me esqueci — ela retrucou com firmeza, e teve de puxar pela
memória para saber como fora o último encontro entre eles. — Só vou terminar esta ficha e
depois poderemos ir. — Indicou uma folha de papel na máquina de escrever.
Toby estava simpático como sempre. Ainda sorria quando, depois de convidá-la para
sair, Whitney confessou que não poderia vê-lo durante toda a semana.
— Nem mesmo no sábado? — ele quis saber, chateado.
Especialmente sábado, Whitney pensou, e lembrou das observações ofensivas de
Sloan ao telefone quando ela lhe dissera que já tinha um compromisso.
— Receio que não — respondeu com voz triste.
Whitney esperou até quarta-feira por um telefonema que não veio.
Começou a imaginar que talvez não visse Sloan outra vez. Lamentou não ter
combinado sair com Toby quando, na quinta-feira à noite, foi preparar um chá para tomar
antes de deitar.
Sozinha em seu apartamento, ela formulava todo tipo de desculpa que justificasse o
silêncio de Sloan. Seu orgulho desabou quando imaginou que ele não queria mais vê-la por
causa da forma ansiosa com que respondera a seus beijos. Claro que ele não desejava
nenhuma ligação emocional e encontraria outra solução para o problema de sua mãe. Porém
sabia que a saúde da sra. Illingworth era mais importante do que tudo. Quando a água ferveu,
já havia recuperado o orgulho e tinha certeza de que ele iria procurá-la. Então lhe informaria
com calma e firmeza que, embora sentisse muito por sua mãe, ela não queria mais o papel de
sua noiva.
Tendo tomado essa decisão, Whitney agradeceria qualquer companhia quando Érica
bateu à porta.
— Um chapéu — começou a falar quando foi convidada a entrar — e um pedaço de
bolo de batizado. E, como estou morta de fome, podemos experimentá-lo com qualquer
bebida que você tiver para oferecer.
Whitney não havia comido muito naquele dia, e achou que essa era uma ótima idéia.
Em vez de chá serviu chocolate quente. Entre o bolo e o chocolate, Érica foi contando todos
os detalhes do batismo, e também que o chapéu fora muito admirado. De repente mudou de
assunto.
— Procurei colocar rapidamente minhas coisas em ordem para vir conversar com
você, mas só agora terminei de arrumar tudo. — Sua voz tornou-se muito séria: — Por favor,
diga apenas que eu não interrompi nada entre você e aquele sujeito bonitão quando martelei
sua porta sábado à noite. Nunca me perdoaria se...
— Como Sloan lhe falou — Whitney a interrompeu —, ele já estava de saída quando
você...
— Então aquele era Sloan Illingworth! — Érica exclamou. — Fiquei muito curiosa e
queria ter perguntado naquela mesma noite, só que, bem, você parecia estar com um mau
humor... Senti-me uma verdadeira intrusa e...
— Adivinhe — Whitney a interrompeu animada — por que eu estava um pouco
calada. — Para que Érica se sentisse mais tranqüila, ela lhe contou o encontro com Dermot no
restaurante.
— Oh, querida! — a amiga demonstrava simpatia. — Tenho certeza de que logo
você vai esquecer, e não vai mais ficar magoada.
Embora Whitney agora estivesse furiosa e não magoada com Dermot, foi obrigada a
aceitar o consolo de Érica. Não queria explicar que estava chateada porque descobrira sua
paixão por Sloan.
O amor que sentia por ele naquele momento era particular.
Mais tarde foi sem sono para a cama. Mil e uma idéias passaram pela sua mente,
todas relacionadas com Sloan. Primeiro, quis saber por que entrara em pânico quando vira
Dermot no restaurante. Logo encontrou a resposta: acabara de descobrir que se apaixonara por
Sloan. Por isso ficou totalmente confusa quando viu o homem que imaginava que tivesse
amado no momento em que jantava com aquele que era seu verdadeiro amor. Dermot a
decepcionara deliberadamente. Agora que sabia que ele era casado e que tinha filhos, iria se
sentir culpada porque saíram juntos algumas vezes? E ela tivera oportunidade de ir para a
cama com ele! Será que isso lhe causara aquela aflição e a vontade irresistível de sair do
restaurante?
Whitney dormiu consciente de que Sloan não seria capaz de decepcioná-la. Acordou
cedo, sabendo que nunca mais iria vê-lo, e seria melhor não pensar mais no assunto.
Mas isso era mais fácil falar do que fazer. Ela passou a maior parte da sexta-feira
tentando expulsá-lo da sua cabeça. O telefone novamente permaneceu mudo aquela noite, e
ela novamente foi se deitar pensando em Sloan.
Às dez e meia da manhã do sábado, Whitney estava concentrada lavando o chão da
cozinha. Subitamente o telefone tocou. Seria ridículo sair correndo para atendê-lo, e ela não
teve pressa de enxugar as mãos antes de ir para a sala.
Como se estivesse hipnotizada, encarou o aparelho e, com as pernas trêmulas,
levantou o fone. Ia dizer "alô" quando sentiu a garganta tão seca que não conseguiu emitir
nenhum som. Também não ouviu nada vindo do outro lado, e chegou a pensar que a outra
pessoa estivesse com o mesmo problema. Seu coração começou a bater aceleradamente
quando escutou a voz serena de Sloan:
— Já estava pensando que você tivesse saído.
Apertando o fone, Whitney precisou respirar fundo para conseguir falar.
— É que eu estou limpando a cozinha.
Agradeceu aos céus aquela conversa simples. Se ele estivesse falando de um modo
sofisticado, com certeza ela começaria a gaguejar.
— Na verdade — Whitney procurava desesperadamente alguma coisa para dizer —,
vou sair mais tarde. — Imediatamente se arrependeu do que dissera. O homem que estava do
outro lado da linha era responsável por seu cérebro ter diminuído de tamanho. Não conseguia
mais raciocinar com clareza, e para seus próprios ouvidos ela soava um pouco mais cretina a
cada minuto que passava.
— Entendo — Sloan continuava com a voz serena. — Você ficará fora o dia inteiro
ou estará livre à noite?
O coração de Whitney quase saltou do seu peito. Ela se lembrou do sábado anterior,
quando ele praticamente exigira que ela estivesse livre para sair com ele. Agora, com toda
aquela compreensão, ela se sentia atordoada. Mas será que ele iria convidá-la para sair?
— Oh, não! Apenas vou fazer algumas compras — esclareceu, e sentiu o coração
saltar novamente quando ele continuou.
— Gostaria que você viesse até Heathlands hoje à noite.
Heathlands! Ele queria que ela fosse a Heathlands! No mesmo segundo Whitney
calculou que a sra. Illingworth deveria ter saído do hospital. Não passou pela sua cabeça que,
quando Sloan lhe telefonasse, ela deveria dizer com calma e firmeza que não queria mais
desempenhar o papel de sua noiva. Só estava pensando em sua mãe quando respondeu:
— Bem... e como eu chegaria aí?
Se seus ouvidos estivessem funcionando bem, ela poderia jurar que Sloan suspirava
aliviado quando concluiu:
— Eu irei buscá-la, naturalmente. Às seis horas, está bem?
A alegria que tomou conta dela era infinita. Levou um tempo até que se acalmasse
depois desse telefonema.
Terminou o serviço no apartamento e saiu para fazer as compras. Seu espírito estava
voando longe, e só nesse instante percebeu como ficara desolada durante a semana porque não
se comunicara com ele.
Sentia-se mais leve quando voltou ao apartamento. Estava claro que Sloan não
entrara em contato com ela porque tivera de tomar muitas providências quando sua mãe
deixou o hospital. Ainda bem que ele não estava desconcertado com a resposta ansiosa que
ela dera a seus beijos e suas carícias! Naturalmente não iria permitir que isso acontecesse de
novo!
Alguém deveria ter ficado com sua mãe enquanto conversavam ao telefone, por isso
ele fora rápido. Whitney ficou muito entusiasmada porque veria Sloan logo mais. Porém, ir a
Heathlands significava encontrar-se com a sra. Illingworth...Com a satisfação que sentia,
descobriu que passar por noiva do filho dela não era tão desonesto assim. Afinal, ela o amava,
e esqueceria tudo o que tinha contra ele em função desse amor. Se ela não representasse bem
seu papel, seria desculpada porque estava fingindo apenas por amor.
Pensou em levar algumas flores para a sra. Illingworth. Seria uma atitude natural em
uma futura nora. E se ela não gostasse de flores? Ou, pior ainda, se achasse que Whitney
estaria sendo atrevida ou ambiciosa? Então desistiu da idéia.
Às cinco e meia já estava pronta, sofrendo a agonia da espera. Às quinze para as seis
imaginou que tinha os nervos sobre controle. Mas, quando cinco minutos depois a campainha
soou, ela saltou da cadeira como se fosse um elástico.
Uma olhada rápida pela janela provou que era mesmo Sloan. Pelo menos o luxuoso
carro preto estava estacionado perto da calçada, confirmando que era ele quem colocara o
dedo na campainha.
Whitney examinou pela última vez sua figura elegante ao espelho. Vestira uma saia
cor-de-rosa que contrastava com o conjunto de blusa e casaquinho em branco e rosa. Como
iria a um encontro informal, decidira-se por uma maquiagem leve. Todavia, caprichara na
sombra e no contorno dos olhos verdes, de modo a realçá-los ainda mais: lembrara que Sloan
já os havia elogiado.
Apanhou sua bolsa e saiu do apartamento.
Sentiu uma onda de calor subir à face. Tentou esconder o fato de que estar com ele
outra vez era motivo da maior alegria. Procurou alguma coisa inteligente para dizer, mas só
lhe ocorreu perguntar:
— Como está o trânsito hoje?
— Como sempre aos sábados à tarde — Sloan respondeu, admirando a belíssima
figura que ela compunha com sua roupa cor-de-rosa e branca, e os cabelos lisos atingindo
livremente seus ombros. — Podemos ir?
Whitney respondeu afirmativamente com um movimento de cabeça.
Ele tomou-lhe o braço e, lado a lado, desceram os degraus até o carro. Seu corpo
ainda vibrava com esse toque quando Sloan ligou a chave da ignição e partiu em direção a
Heathlands.
Resolvera permanecer em silêncio, mesmo porque Sloan não estava disposto a
conversar. Ela se obrigou a sentir-se satisfeita estando apenas a seu lado.
Entretanto, ficou alarmada no momento em que chegavam a Heathlands. Whitney
refletiu que deveria ter passado as últimas semanas se preparando para esse encontro. Teria
sido bom se procurasse saber outras coisas sobre Sloan, mas não fizera nada disso.
Tudo parecia calmo quando ele abriu a porta da frente e se afastou para que Whitney
entrasse primeiro.
— Você sabe onde fica a sala de estar.
Whitney não teve certeza se ele dissera isso porque talvez sua mãe estivesse ouvindo,
ou se simplesmente quis lembrá-la de que já estivera em sua casa. Agora ela devia se preparar
para pagar por aquela desastrada noite.
— Sim, claro — ela replicou, e pela primeira vez não se rebelou com essa referência
mal-educada.
Imaginando que a sra. Illingworth estivesse na sala de estar, Whitney sentiu uma
grande tensão enquanto caminhava para lá. Entretanto, não encontrou ninguém.
— E sua mãe? — indagou, voltando-se para observar Sloan. Ele pareceu hesitar, sem
entender exatamente o que ela desejava saber.
— Ela... está bem — respondeu depois de alguns momentos, talvez percebendo que
ela se referia à saúde dela. E continuou rapidamente: — Quer beber alguma coisa?
— Bem, por enquanto não — Whitney agradeceu, enquanto Sloan lhe indicava uma
daquelas confortáveis poltronas. Queria fazer algum outro comentário sobre a saúde da sra.
Illingworth, mas sua intenção desapareceu no ar quando Sloan pediu que o desculpasse por
um ou dois minutos.
— Jantaremos dentro de meia hora, só que antes devo obedecer às instruções da sra.
Orton e ligar o forno.
Ele se ausentou por um breve momento, e nesse tempo Whitney concluiu que a
governanta estaria colaborando como enfermeira. Certamente estava ajudando a mãe de Sloan
a se aprontar para descer por uns instantes, ou para recebê-la no quarto.
Quando Sloan voltou, ela soube que estava redondamente enganada.
— Tudo certo? — perguntou suavemente, enquanto ele ocupava uma outra cadeira.
— Tudo — replicou. Enquanto a analisava, um esboço de sorriso surgiu em seus
lábios, como se estivesse aprovando o que via.
Whitney gostava do olhar que ele lhe lançava. Gostava também daquele sorriso que
provocava sensações agradáveis em seu íntimo. Com seus olhos ainda fitando a boca que a
havia beijado tão ardentemente, percebeu que seu coração batia mais forte. Seu amor era tão
grande e ela estava ficando tão agitada que, para disfarçar, falou a primeira coisa que lhe veio
à cabeça:
— Não tinha certeza se devia ou não trazer umas flores.
Por um segundo, Sloan encarou-a impassível. Então, de repente, apresentou aquele
sorriso suave que Whitney sabia que era um dos motivos de ter se apaixonado por ele.
— Não precisava se incomodar — falou com malícia na voz. — Foi a sra. Orton
quem preparou o jantar. Eu apenas liguei o forno.
O riso de Sloan fez com que ela corasse. Ele mexia com seu íntimo de uma forma tão
deliciosa, e ela se sentia muito à vontade.
— Deixe de ser convencido. Não eram para você — ela respondeu com desdém, e,
rindo, continuou: — Pensei em trazer algumas flores para sua mãe.
A expressão no rosto de Sloan se modificou. Um brilho diferente surgiu em seus
olhos, e parecia dizer que ela se enganara em alguma coisa.
— Você pensou que minha mãe estivesse aqui?
Whitney concordou, e, dando-se conta de que a sra. Illingworth não se encontrava lá,
começou a imaginar se alguma coisa mais séria não havia acontecido com ela. Logo lembrou
que Sloan lhe informara que a mãe estava bem. Do contrário não estaria rindo tão jovialmente
naquela sala de estar.
— Oh! — exclamou com delicadeza, e revelou seu pensamento ao explicar: —
Quando me convidou para vir até aqui, achei que ela já estivesse fora do hospital.
Sloan só fez um movimento com a cabeça. Whitney prosseguiu rapidamente,
esperando que ele não pensasse que ela fosse uma tola:
— E, quando você foi ligar o forno, imaginei que a sra. Orton estivesse com ela.
— A sra. Orton neste momento está ajudando a própria filha, enquanto brinca com a
neta. Elas moram perto daqui.
— Oh! — Whitney exclamou novamente, e viu que se apressara em tirar conclusões.
Por isso pensou um pouco mais antes de concluir: — Quer dizer que, antes de ir embora, a
sra. Orton fez o jantar...
— E deixou tudo pronto para nós. Ela explicou que eu só precisaria ligar o forno na
temperatura certa meia hora antes de servir.
Ela já ia dizendo "oh!" outra vez, porém não chegou a fazer nenhum comentário. As
palavras dele soaram maravilhosamente em seus ouvidos.
— Talvez seja melhor eu dar uma olhada na cozinha — sugeriu. Quando Sloan sorriu
novamente, Whitney soube por que estava tão enamorada!
— Estava esperando que você se convidasse para fazer isso!
Seu charme era tão grande que ela se arrepiou toda. Quase falou que não havia nada
neste mundo que não fizesse por ele!
Lembrava bem daquela cozinha: era a maior que já vira. Com suas idéias formando
um turbilhão, Whitney teve dificuldade em concentrar sua atenção na caçarola que estava
sendo aquecida sobre um prato de ferro.
Sloan a teria convidado antes de saber que sua mãe não viria a Heathlands? Ele lhe
telefonara de manhã e durante a tarde teria tomado conhecimento de qualquer mudança.
Tivera tempo de mudar de idéia. Por que não cancelara o convite se a sra. Illingworth não
estaria em casa?
— Parece que está uma delícia — ela se dirigiu a Sloan quando desviou os olhos do
forno. Recebeu de volta um olhar tão carinhoso que não se preocupou mais com o motivo que
a levara até Heathlands.
Ela estava lá com o homem que comandava todas as suas emoções, "...e eu gosto
mais de você", ele lhe dissera na galeria de arte. "Talvez goste um pouco de mim..."
Pensando assim, decidiu aproveitar aquela noite o melhor que pudesse. Não faria
mais perguntas cujas respostas só lhe causavam preocupações.
Durante a refeição conversaram despreocupadamente. Sloan escutava com o maior
interesse qualquer coisa que ela tivesse para dizer. Quando não estava ouvindo, ele a divertia
contando piadas ou histórias que lhe provocavam risos o tempo todo.
Saboreavam uma torta de maçã com creme quando Whitney levantou os olhos. Sloan
interrompeu a sobremesa e a observava fixamente. Ela sorriu, simplesmente porque teve
vontade de sorrir. Viu os olhos cinzentos detendo-se em sua boca e depois desviarem-se até
seus olhos verdes. Um sorriso amável surgia vagarosamente nos lábios de Sloan.
O coração de Whitney começou a disparar outra vez. Ela abaixou a cabeça e viu com
o canto do olho que Sloan recomeçara a comer.
— Mais um pouco? — ele ofereceu quando a viu depositar a colher sobre o prato
vazio.
— Mais nada — ela recusou delicadamente.
— Então vamos tomar café na sala de estar. — Quando Whitney se ofereceu para
prepará-lo, ele fez que não ouviu. — Vamos até a sala de estar — repetiu seriamente. Os
cantos levantados de sua boca negavam a severidade. — Não era para você fazer nada hoje, e
mesmo assim você supervisionou tudo.
— Que exagero — Whitney retrucou carinhosamente. E, em seguida, foi feliz para a
sala de estar, sabendo que Sloan não a deixaria fazer mais nada.
Dez minutos depois ele voltou carregando uma bandeja.
— Não derramei uma gota — ele se vangloriou, tão agradável que ela o amou mais
ainda.
A noite transcorria num clima tranqüilo, perfeito. Whitney nunca se sentira tão feliz.
Depois de lhe entregar uma xícara, Sloan ligou o aparelho de som e escolheu um
disco de música suave. Em silêncio, sentaram um ao lado do outro e tomaram o café ao som
de uma melodia romântica. Logo em seguida, uma de suas piadas fez Whitney engasgar de
tanto rir.
Naquele instante ele não dizia nada, apenas a fitava como se também estivesse muito
feliz. Whitney teve vontade de chorar de felicidade e emoção. Queria que esse momento não
terminasse nunca.
Mas, infelizmente, ele teria um fim. Quase levou um susto quando, olhando seu
relógio, viu que já eram dez e meia. Como o tempo passara rápido! E Sloan teria de levá-la a
Londres e retornar a Heathlands antes de se deitar.
— Vou lavar a louça.
— Lavar a louça? — ele repetiu espantado, sem muito entusiasmo.
— Está chegando a hora de voltar para casa, e eu não posso deixar a cozinha naquele
estado para a. sra. Orton limpar.
Sloan hesitou, e parecia que ia proibi-la de lavar qualquer colher. De repente mudou
de atitude.
— Bem, então vamos lavar juntos — falou de uma forma grave, mas seu olhar
brilhante desmentia a seriedade. — Embora eu tenha certeza de que a sra. Orton gostaria de
desocupar tudo quando chegasse amanhã.
— Eu também tenho. — Whitney riu e, enquanto carregava a bandeja de café para a
cozinha, Sloan foi até a sala de jantar recolher os pratos usados que ficaram lá.
Outra vez Whitney preferiu não usar a máquina de lavar. Sloan também não sabia
apertar os botões corretos e logo a pia estava cheia de espuma. Ela nunca pensara que lavar
louça fosse uma atividade tão maravilhosa.
Depois de enxaguar cada prato, entregava-o para Sloan enxugá-lo. Com essa
atividade coordenada ao lado do homem amado, Whitney estava se sentindo num mundo
mágico. Para ela, o paraíso era a cozinha da casa de Sloan.
Quando lhe entregou a última peça de porcelana, ela foi apanhar a caçarola e o prato
de ferro.
Aquele era um reino de sonhos e Sloan era realmente seu noivo. Sua atenção naquele
momento estava em qualquer outro lugar, menos naquilo que fazia.
Encontrava-se assim distraída quando a voz de Sloan, soando estranhamente tensa
como se ele estivesse nervoso, repentinamente a assustou.
— Whitney — ele começou. — Eu...
Suas palavras foram interrompidas por um grito de susto e o prato de ferro
inquebrável escorregou das mãos cheias de espuma de Whitney.
Enquanto tentava negar a impressão de que Sloan parecia nervoso, ela segurava com
firmeza a caçarola. Mas, no segundo em que Sloan a encarou e foi interrompido, o prato
escorregou por entre seus dedos, caindo na água e fazendo com que ela recebesse as gotas
espumosas que se espalhavam...
— Ah! — exclamou quando a água penetrou no tecido de sua blusa, atingindo sua
pele. Ela apenas riu, e com bom humor procurou uma toalha.
— Você está ensopada! — Sloan comentou quando veio em sua direção com a
toalha. Impensadamente, esticou a mão para secar a umidade de sua blusa rosa e branco.
Mudou de idéia, entregou-lhe a toalha e tomou uma decisão: — Ela precisa secar. Venha, eu
lhe arranjarei uma camisa.
— Não é necessário — Whitney tentou protestar, esfregando ela mesma a toalha.
Concordou que sua roupa levaria um século para secar. Já se imaginava uma palhaça dentro
da camisa larga de Sloan. E ela queria ter a melhor aparência para ele.
Como se tivesse ouvido seus pensamentos, ele acrescentou:
— Você sabe que fica bem vestindo qualquer roupa. Não precisa ficar embaraçada.
— Bem, é você quem está dizendo isso... — Whitney retrucou. Ele já a conduzia
pela mão para fora da cozinha. Ambos riam, enquanto se dirigiam para o andar superior. Ele
se divertia com o modo engraçado como tudo aconteceu, e Whitney porque estava amando
tudo o que acontecesse ao lado dele.
À porta daquele quarto que ela já conhecia, Sloan soltou sua mão, girou a maçaneta e
entrou. Os olhos de Whitney seguiam-no, mas não conseguiram evitar a grande cama de casal.
Ele abria uma gaveta e tirava uma camisa de dentro dela. Whitney sentiu seu corpo todo se
arrepiar quando pensou que, se não tivesse invadido aquele cômodo na noite da festa, nunca
teria encontrado Sloan.
— Não fique aí — ele disse calmamente. Então se voltou para ver por que ela estava
parada à porta. — Você pode se trocar aqui. Eu irei... — e interrompeu a frase quando
Whitney entrou com uma expressão sonhadora.
— Foi aqui que tudo começou — falou com suavidade. Imediatamente desejou
retirar o que dissera, pois Sloan poderia se lembrar do noivado rompido, e de Gleda, a mulher
que ele ainda devia amar.
Porém, para sua suprema alegria, descobriu que não havia necessidade de disfarçar.
Enquanto caminhava para o centro do quarto, Sloan se aproximou e parou bem a sua frente. E
ela pôde ouvi-lo replicar:
— E eu, de minha parte, não posso dizer que sinto muito... Alguns segundos se
passaram. Ela olhou bem no fundo dos olhos cinzentos que pareciam enviar-lhe uma
mensagem calorosa. Whitney imaginou que ele queria dizer que não estava triste por não ser
mais o noivo de Gleda.
— Oh, Sloan! — murmurou.
— Meu amor!
Como só poderia acontecer, ele lançou aos pés da cama a camisa que ainda segurava
e tomou Whitney em seus braços. Beijou-a de um modo quase reverente, e com um abraço
gentil puxou-a para mais perto de si.
Whitney estava extasiada.
— Sloan, Sloan, meu amor! — Ela queria ficar murmurando sem parar, para que ele
ouvisse.
Ele interrompeu o beijo e abaixou a cabeça para beijar sua mão. Havia tanta ternura
nesse gesto que Whitney desejou pronunciar seu nome outra vez. Mas não pronunciou. O que
disse, entretanto, quando ele se voltou para olhar sua face foi quase chocante:
— Sua camisa ficará tão molhada quanto minha blusa se...
— E eu estou reclamando? — ele ironizou num sussurro. Whitney logo esqueceu
esse detalhe porque Sloan a beijava de novo, e um beijo só não seria suficiente. Seus braços a
enlaçaram fortemente quando sentiu as mãos dele sob sua blusa. O toque de Sloan era tão
suave enquanto acariciava seu ventre, movendo-se até suas costas. Sentiu que ele alcançava o
fecho de seu sutiã. Antes de soltá-lo, perguntou.
— Está tudo bem com você?
Whitney conseguia amá-lo mais ainda. Não faria objeções; ao contrário, encorajava
seus movimentos. Estava muito enlevada para falar, e então concordou com gestos. Viu que
sua resposta fora compreendida quando sentiu as mãos de Sloan diretamente sobre sua pele.
Um toque quente e suave extasiou seu corpo, e ele acariciou cada um de seus seios. Ela
consentiria em tudo o que ele pedisse.
— Sloan, Sloan — murmurava deliciada. O desejo aumentou quando os dedos
masculinos atormentaram os bicos endurecidos que ele mesmo havia provocado.
— Quero você, minha doce Whitney! — Ele arfava. — O que você me diz?
— Você sabe minha resposta — retrucou roucamente, oferecendo-lhe os lábios.
Sentiu um lance de timidez quando ele começou a desabotoar-lhe a blusa. — Podemos apagar
a luz? — pediu, e achou que, mesmo que Sloan não soubesse a razão de seu pedido, ele
satisfaria sua vontade. E, deixando-a por um breve segundo, mergulhou o quarto na escuridão.
Quando voltou, estava sem a camisa.
Whitney vibrava com a liberdade que se permitiam. Suas mãos se aventuravam sobre
os ombros largos, e acariciavam-lhe o peito em movimentos circulares. Então, com um
mínimo de voz ele pedira.
— Levante os braços, querida. — Em poucos segundos sua blusa estava no chão e
seu sutiã foi logo juntar-se a ela. O peito peludo de Sloan encobria sua pele sedosa.
Whitney quis gritar seu nome novamente, mas de repente os lábios de Sloan exigiam
os dela. Foi um beijo prolongado. Ela soube que seu desejo intensificava o desejo de Sloan
por ela, e que eles não voltariam atrás.
Na escuridão permaneciam juntos, e nessa escuridão ele tirou-lhe a saia. Whitney
agarrou-se a Sloan enquanto ele removia o resto de suas roupas.
Acariciando-a e beijando-a languidamente, ele se levantou e se livrou das próprias
roupas. Whitney só lembrava que estava amando loucamente, portanto não havia nada errado
no que fazia.
— Doce Whitney — ele sussurrou, e sua boca pousava sobre a dela, e eles retiraram
as cobertas da cama.
Nessa magia toda ela só percebia a sensação do toque do homem que amava
enquanto ele distribuía beijos por seu pescoço e seios.
— Sloan — falou num fio de voz enquanto seus dedos traçavam desenhos estranhos
em sua espinha. — Sloan! — gritou, quando o desejo foi maior do que ela podia acreditar. Ele
iria possuí-la!
Porém seu grito de prazer foi sufocado ao primeiro sinal de dor. Não precisou
chamá-lo pelo nome, ou dizer qualquer coisa. Sloan imediatamente soube a razão de seu
lamento, a mesma que a fez querer as luzes apagadas.
— Oh, meu D..! — ele exclamou numa voz que traduzia espanto. — Oh, querida,
você ainda é virgem!
Whitney, com seu desejo maior do que sua dor, repentinamente sentiu receio de que
Sloan não a quisesse mais.
— Por favor — implorou. — Você não pode me deixar agora. Eu quero você.
Preciso de você...
— Oh, meu amor — Sloan declarou.
Whitney apertava-o e o trazia para mais perto de seu corpo nu, temerosa de que ele a
deixasse.
— Whitney, minha querida — falou com voz rouca e respirou profundamente. E,
gentil e calmamente, tornou-a sua.
CAPÍTULO VIII
A aurora estava surgindo quando Whitney despertou. Em qualquer outro domingo
ela teria se virado para o outro lado e tentado dormir novamente. Mas naquela manhã uma
sensação diferente fez com que ela abrisse os olhos.
Um leve rubor surgiu em suas faces quando deparou com o peito masculino que
estava bem próximo ao seu. Um sorriso suave surgiu em seus lábios. Levantou um pouco a
cabeça e encontrou os olhos cinzentos do homem que a observava enquanto ela dormia.
Não ficou envergonhada. Aos poucos foi se lembrando de que haviam deitado nus e
ainda se encontravam assim, e sentiu-se um pouco tímida.
Essa timidez parecia agradar a Sloan, pois, enquanto a fitava, ele apresentava um
sorriso carinhoso e um brilho especial no olhar.
— Olá, meu amor — ele murmurou.
Foi nesse momento que Whitney, transbordando de felicidade, soube que ele a
amava.
— Olá — ela sussurrou. Começou a se arrepiar outra vez, pois, sob as cobertas, o
braço de Sloan a enlaçou pela cintura, trazendo-a para mais perto.
A boca de Sloan mantinha seus lábios separados com beijos delicados, e Whitney
mais se deliciava do que se preocupava com a nudez de ambos.
— Oh, Sloan — falou com voz fraca, e se sentiu mais enlevada enquanto as mãos
dele acariciavam seu corpo, levando-a ao ápice do desejo.
— Posso olhar para o seu corpo agora? — ele perguntou com ternura, e Whitney
lembrou que havia pedido para apagar a luz.
Não conseguindo responder com palavras, ela ofereceu os lábios, retardando uma
resposta. Com gentileza e sem nenhuma pressa, Sloan recomeçou a beijá-la, primeiro na boca,
depois no pescoço, nos seios, descendo até o ventre, e então fez o caminho de volta, chegando
à boca novamente.
— Você é bela demais! — elogiou-a, beijando-a sem parar. Seus corpos tocavam-se
totalmente e Sloan, fitando-a dentro dos olhos, prometeu:
— Será melhor para você desta vez, meu amor!
Ainda era cedo quando ela acordou pela segunda vez naquela manhã. Sloan não se
apoiava sobre o cotovelo, observando-a satisfeito, como antes. Também sua cabeça não estava
sobre o travesseiro a seu lado.
De repente ouviu um som vindo de algum lugar, e calculou que fosse seu bem-amado
movimentando-se no andar de baixo.
Ficou um pouco mais na cama, extasiada com o modo como entregaram-se um ao
outro. Nunca pensara que pudesse se sentir tão à vontade, tocando-o sempre que tinha
vontade, enquanto ele a tocava também.
Por um momento Whitney ficou um pouco alarmada, pois não imaginava que
passaria a noite fora do seu apartamento. E, além disso, fora para a cama com Sloan
Illingworth! Mas não estava se sentindo culpada, pois o amava intensamente. Na verdade,
sentia-se radiante e bem protegida pelo amor que recebia dele.
Ele ainda não dissera claramente que a amava. Porém, quando deixou a cama para ir
até o banheiro tomar uma ducha, Whitney calculava que ele deveria amá-la. Bastava que
lembrasse a maneira como fizeram amor de madrugada. Dessa vez fora vibrante e espetacular.
Agora ela entendia que, devido a sua inexperiência, ele havia reprimido a própria
paixão. Pensara mais nela do que no próprio prazer. E isso significava que ele a amava!
Whitney tomou um banho rápido. Precisava ver Sloan e confirmar que estava certa,
que ele a amava. E isso ela só iria conseguir quando o fitasse. Então se enxugou e logo estava
vestida, mas sem a blusa branca e rosa que havia molhado enquanto lavava a louça. Segurava
a blusa quando notou no chão, ao pé da cama, a camisa que ele escolhera para ela pouco antes
de tomá-la em seus braços. Inconscientemente, Whitney lançou sua blusa sobre a cama e
vestiu a larga camisa de Sloan. Enquanto arregaçava as mangas, deixou o quarto e desceu
apressadamente a escada para encontrá-lo.
Quando chegou ao hall, um ruído vindo da sala de estar chamou sua atenção. Sentiu-
se um pouco acanhada e sem querer diminuiu o passo. Ao se aproximar da sala, viu que a
porta estava aberta, e o desejo de vê-lo se tornou maior que a timidez. Caminhou
silenciosamente e parou espantada quando chegou à porta: a sra. Orton estava lá, trabalhando
com o aspirador de pó. E Whitney, que antes nunca havia saído da cama de um homem para
se encontrar com uma governanta, ficou totalmente sem jeito. O olhar que a sra. Orton lhe
lançou deixou claro que sabia que Whitney havia dividido a cama com o patrão, embora não
soubesse até aquele momento que a moça se encontrava na casa.
— Bom dia, sra. Orton — cumprimentou, tentando criar um clima leve.
— Bom dia — a sra. Orton resmungou, e não acrescentou mais nada.
Whitney se sentiu mais atrapalhada do que nunca. Não sabia o que dizer. De repente
se deu conta que vestia a camisa de Sloan, e qualquer esforço para disfarçar a situação seria
inútil.
Desejou que ele, com sua simplicidade, viesse e a salvasse naquele momento
embaraçoso. Ela agora não estava tão certa se realmente a amava. Começou a justificar sua
presença na casa desde a noite anterior:
— Eu esperava encontrar a sra. Illingworth aqui — falou espontaneamente.
A governanta a encarou, dando a impressão de que não sabia por que ela estaria
pensando que a mãe de seu patrão estivesse lá.
— Tudo bem, sra. Orton. — Riu. — Eu sei que a sra. Illingworth está doente.
— Doente? — a governanta repetiu espantada.
Whitney refletiu que ela era uma pessoa muito leal. Talvez Sloan não quisesse que os
outros soubessem do problema de sua mãe. A sra. Orton, porém, logo insinuou que algo
estava errado.
— Se você está se referindo à mãe do sr. Illingworth, ela agora é a sra. Eastwood —
explicou.
Whitney tentava entender que a mãe de Sloan se casara novamente quando a
governanta acrescentou:
— Não sei de onde você tirou essa idéia de que está doente. Tenho certeza de que
não está. Eu mesma falei com ela ontem quando telefonou para o filho. Não conversamos
muito, mas estava tão saudável e esperta como sempre.
— Oh, entendo — Whitney disse com calma, tentando assimilar a surpresa que
acabava de ouvir. Ficou alegre, pois parecia que a mãe de Sloan estava melhorando, e
depressa. — Bem, estou contente que a sra. Illing..., isto é, a sra. Eastwood esteja se
recuperando daquele acidente. Eu...
— A sra. Eastwood não sofreu nenhum acidente! — a sra. Orton informou,
parecendo admirada com esse pensamento.
Impassível, Whitney se recusou a escutar o que sua inteligência estava tentando lhe
explicar.
— Ela deve ter ligado do hospital — insistiu.
— Hospital?
Whitney estava mais espantada do que a governanta. Na verdade, estava estarrecida
quando ela esclareceu:
— A mãe do sr. Ulingworth não telefonou de nenhum hospital. Ela estava em sua
própria casa, nos Estados Unidos.
— Estados Unidos? — Whitney repetiu inconscientemente. Uma parte de seu
cérebro se recusava a aceitar o que estava ouvindo.
— O marido da sra. Eastwood é americano, e eles resolveram morar lá.
A outra parte do cérebro de Whitney começou a perceber que Sloan havia mentido.
Seu coração ficou em pedaços.
Para seu consolo, seu orgulho se apresentou firme. Sofrendo com uma dor que antes
nunca sentira, jurou que apenas ela ficaria sabendo disso.
A sra. Orton era muito educada para continuar a limpeza da sala enquanto a hóspede
de seu patrão conversasse com ela.
Whitney estava caindo de dor. Vendo sua bolsa sobre o sofá, disfarçou e foi pegá-la.
— Deve ter havido algum mal-entendido quanto ao acidente da sra. Eastwood.
— Sim, deve ter sido isso — a governanta concordou. E, como Whitney não se
apressasse em sair, continuou: — Eu a conheci apenas quando comecei a trabalhar para seu
filho, mas nunca soube que a sra. Eastwood estivesse doente um só dia. — E acrescentou
enquanto Whitney se preparava para deixar a sala: — Ela só telefonou para avisar que seu
marido e ela resolveram fazer um cruzeiro marítimo durante dois meses, para o caso de
acontecer alguma coisa com qualquer um deles.
— Não vai acontecer nada — Whitney concordou desanimada. Embora
aparentemente estivesse calma e segura, tremia por dentro. Só por orgulho sorriu para a
governanta enquanto avisava: — Vou deixá-la agora.
Além do orgulho, uma fúria começava a se apoderar dela, e pensamentos estranhos a
assaltavam.
— A senhora sabe onde Sloan está?
— As portas da garagem estavam abertas e o carro não estava lá quando meu genro
me deixou antes de ir pescar — a sra. Orton respondeu.
— Então ele saiu — Whitney disse, apenas para concordar. Não podia se conformar
que, com uma atitude tipicamente machista, Sloan fizera com que ela se sentisse uma "garota
de só uma noite". Atormentada com esse pensamento, a fúria de Whitney momentaneamente
desapareceu e ela queria apenas sair dali o mais rápido possível. — Tive muito prazer em vê-
la novamente — falou com voz rouca, embora duvidasse de que a governanta a tivesse
reconhecido. Esperava que se esquecesse desse encontro também.
Whitney preparava-se para deixar Heathlands quando, chegando à porta da frente,
seus confusos sentimentos tornaram a pressioná-la. Começava a se sentir furiosa outra vez
quando, ao colocar a alça da bolsa sobre o ombro, percebeu que ainda vestia a camisa de
Sloan. Então ficou realmente furiosa. Lembrou como se sentira animada quando vestira
aquela camisa. Sem saber como, subiu a escada e se encontrou no andar superior. Caminhou
atormentada até o quarto e seus dedos tremiam enquanto desabotoava a camisa. E era
impossível não notar aquela cama larga...
Seus olhos soltavam faíscas quando lançou ao chão a camisa de Sloan. Apanhou e
vestiu sua blusa branca e cor-de-rosa sem se importar com as manchas ou com o fato de estar
toda amassada.
Sem que recebesse o mesmo amor que sentia por ele, Whitney se entregara àquele
monstro! Para Sloan, ela serviria apenas para uma noite. Seu olhar enraivecido pousou nos
travesseiros onde suas cabeças haviam descansado e, repentinamente, tudo se transformara
apenas em passado!
Num único lance Whitney apanhou a bolsa, abriu-a e pegou o batom. Não pensou em
mais nada, e no minuto seguinte estava à cabeceira da cama.
Pouco depois ela se afastou para observar o que havia escrito: "Não o perdoarei
jamais". Muito bom, refletiu, e esperava que essa frase que havia rabiscado nunca
desaparecesse das fronhas!
Whitney tinha apenas uma remota lembrança de como conseguira chegar a seu
apartamento aquele dia. Fazia uma vaga idéia de ter caminhado mais ou menos meio
quilômetro e depois ter conseguido uma carona com um motorista de caminhão. Mas, se o
motorista se parecia com alguém, ou se chegaram a conversar sobre alguma coisa, ela não
saberia dizer. Só podia lembrar que tudo não passava de mentira.
Ela pensara que havia compartilhado um sentimento mútuo com Sloan. Porém, não
fora assim. Para ela não era necessário falar de amor porque o modo como eles haviam
pertencido um ao outro já era uma verdadeira declaração. Só que Whitney estava errada. Tudo
fora mentira. Tudo.
Whitney foi trabalhar na segunda-feira pensando em como fora ingênua e tola.
Não se espantava de Sloan nunca ter pedido para acompanhá-lo até o hospital: sua
mãe jamais estivera doente. Nem mesmo se encontrava na Inglaterra.
Chegando ao escritório, cumprimentou secamente os companheiros. Não estava
interessada em saber como fora o fim de semana de cada um, muito menos queria falar sobre
o seu, como costumavam fazer.
Toby Keston teve a infeliz idéia de ir até sua sala.
— Sim? — perguntou com má vontade quando o rapaz parou a sua porta aquela
manhã.
— Oh, sinto muito — ele se desculpou, apesar de não ter feito nada. Olhou-a tão
desanimado que Whitney se envergonhou. — Eu disse algo errado?
— Não, Toby, claro que não — apressou-se em afirmar. — Eu é que devo me
desculpar, não você. E então? — Ela resolveu lhe dispensar alguns minutos. — O que posso
fazer por você?
— Gostaria de sair com você hoje. Poderíamos ir a...
— Sinto muito, Toby — interrompeu-o. — Eu não seria uma companhia agradável
esta noite. Você se importaria em deixar para uma outra vez?
— Você não está doente, está? — ele perguntou com ansiedade. Whitney apenas
queria ficar sozinha.
— Não, não é isso. — Ela se esforçava para ser paciente e compensar a intolerância
que apresentara um pouco antes. — É que eu tenho algumas coisas para pôr em ordem.
Esperava que Toby ficasse convencido. Quando voltou para casa depois do
expediente, seus pensamentos continuaram a atormentá-la. Sua amargura não diminuíra nem
um pouco. Como Sloan pudera agir daquela maneira?
As lembranças perseguiram-na a noite toda. Dermot fora um miserável por tentar
conquistá-la sendo um homem casado, mas as mentiras que Sloan lhe contara eram bem
piores. Ele era um monstro.
Ela odiava fraudes, e apenas justificava a decepção que causaria à mãe de Sloan
porque era uma causa justa, relacionada com sua saúde abalada. Porém, quando pensava em
como Dermot e Sloan a decepcionaram, ela odiava todos os homens.
E Sloan tivera a coragem de dizer anteriormente: "...pelo menos deixe que entre nós
haja honestidade".
A cabeça de Whitney ainda fervia quando foi ao escritório na manhã da terça-feira.
Retornou à noite, aceitando o fato de que ele havia propositadamente se vingado.
Por sua culpa não estava mais noivo de Gleda, e fizera com que ela se apaixonasse
para saber como alguém se sente quando o amor acaba.
Como fora esperto! Não a beijara nos primeiros encontros. Fazia apenas dez dias que
lhe dera o primeiro beijo, e imaginou que estivesse apaixonada. Ele devia saber que ela o
amava!
Em seu apartamento, Whitney se encolhia interiormente enquanto reconhecia que tinha sido
muito ingênua.
Sloan ficara uma semana sem manter contato, e tinha certeza de que ela correria para
ele quando lhe telefonasse.
E o que ela fez? Nada além do que ele esperava: fora para a cama com ele. Sloan
quis que fosse assim, e aproveitou a oportunidade.
Era certo que ele não podia prever que se molharia toda enquanto lavava a louça,
precisando ir até o quarto para vestir a camisa. Mas Whitney não tinha dúvida de que ele
alcançaria seu objetivo de alguma outra forma.
Suspirou levemente ao recordar que mencionara aquele quarto como o início de tudo.
"...e de minha parte não posso dizer que sinto muito", Sloan retrucara, e Whitney concluíra
que ele não estava mais apaixonado por Gleda.
Contudo, amando Gleda ou não, ele não caíra de amores por Whitney Lawford
também. Mesmo lançando seu ódio contra Sloan, imagens dele e de seu quarto traziam a sua
memória toda a ternura que recebera. Porém, nesse estado de espírito, seria capaz de negar um
milhão de vezes que ele, por um instante, dominara o próprio desejo para diminuir ao mínimo
a dor que ela sentiria.
Ele era um covarde, e Whitney duvidou que pretendesse trazê-la de volta a seu
apartamento aquela noite. Agora percebia claramente que desde o começo Sloan tivera a
intenção de passar a noite em Heathlands, na cama com ela. Se a frase "Não o perdoarei
jamais" que havia escrito com seu batom sobre os travesseiros não sugerisse que ela estava
apaixonada, então esperava apenas que o destino fosse generoso e lhe desse outra chance de
passar nova mensagem.
E o destino estava a seu lado, ela descobrira em seu quarto aquela noite, embora não
entendesse o fato imediatamente. Sloan ainda estava em sua cabeça, e ela já temia que
permanecesse por muito tempo ainda, quando alguém bateu à porta. Não era Érica, pois
aquela não era sua batida típica; teria de ser algum outro morador do prédio, pois a porta da
entrada estava fechada.
— Alô, Joseph — ela cumprimentou o vizinho, um professor de mais ou menos
cinqüenta anos que morava no primeiro andar.
— Whitney, querida amiga — ele mostrava-se contente. — Desculpe não ter vindo
antes, mas estou às voltas com uma série de palestras. — Dizendo isso, entregou-lhe um
pacote grande muito bem embrulhado. — Chegou como encomenda registrada quando eu
chegava em casa esta noite. Espero que meu atraso não lhe traga problemas.
— Tenho certeza de que não — ela replicou. Não esperava encomenda nenhuma, e
não se entusiasmou mesmo recebendo uma correspondência registrada. — E suas palestras?
Serão apresentadas no colégio onde o senhor trabalha?
— Não. Falarei depois de amanhã para os alunos da Escola Industrial — informou, e
passou mais alguns minutos com uma conversa banal antes de acrescentar: — Bem, vou
voltar aos meus papéis.
Whitney, um pouco curiosa, entrou no apartamento e analisou a etiqueta
corretamente preenchida com o seu endereço, porém sem ansiedade.
Como havia apenas uma maneira de descobrir o que estava dentro do embrulho e
quem o enviara, pegou uma tesoura e cortou o papel que estava por fora, depois estava rígida.
Sensibilizada, sentiu lágrimas umedecendo seus olhos. Fixava o olhar diretamente na tela
vermelha, azul e alaranjada que se chamava Alegria e que havia admirado em companhia de
Sloan quando foram à galeria de arte. Nem precisaria ler a assinatura do bilhete que caíra no
chão. Enquanto se abaixava para apanhá-lo, seu coração, negando que desprezava Sloan,
começou a bater de uma maneira furiosa. De repente quis saber o que estava escrito, e não
demorou muito para ler o que Sloan escrevera: "Comprei-o algum tempo atrás. Penso que
você vai gostar".
Quando, porém, entendeu o significado das palavras, Whitney ficou furiosa e o odiou
mais do que nunca.
Seu primeiro impulso foi responder objetivamente: "Você pensou errado!", e
devolver a tela.
Quanto mais refletia, mais enfurecida se tornava. Como ele pôde? Como ousou?
Quem pensava que era?
Quando tramou a história da doença de sua mãe com o objetivo de castigar a mulher
responsável pelo fim de seu noivado, ele mostrou que era um homem vingativo. Nunca se
sentira tão ofendida em sua vida. Estava claro que nunca perdoava ninguém.
Ele a colocara contra a parede, e Whitney ficara sem escolha, com chance de sair
apenas com ele. Sloan preparara tudo para que ela se apaixonasse, para depois levá-la para a
cama. E, desaparecendo na manhã seguinte, ele a rejeitara. Só que não podia prever que ela
ainda era virgem, e Whitney sabia que o choque que ele levara não era fingimento.
Pegando novamente a tesoura, olhou para a gravura que tanto havia admirado.
Recordando a última mentira de Sloan, "comprei-o algum tempo atrás", quando na verdade
deveria tê-la adquirido na tarde anterior, empregou toda a fúria e energia necessárias para
cortá-la de ponta a ponta. E, como ainda tivesse energia para gastar, cortou novamente a tela
em sentido contrário.
Sabia que ele pagara quinhentas libras por ela. Mas, enquanto segurava a tela nas
mãos e analisava o resultado de sua atitude, estava pouco se importando, mesmo que custasse
vinte vezes mais.
Assim, Sloan Illingworth não devia mais nada para ninguém. Ele pensou que
acalmaria a própria consciência só porque lhe enviara um prêmio de consolação que valia
quinhentas libras? Bem, que pendurasse o quadro em sua consciência, e ela ficaria feliz se
fosse bem pesado.
Whitney avisou que chegaria atrasada no escritório na manhã seguinte. Naquele
momento era mais importante devolver aquela tela como uma encomenda registrada.
Os dias se passaram e ainda havia amargura em seu coração.
Duas semanas após Sloan tê-la convidado para ir até Heathlands, ela sentou em seu
apartamento e ficou imaginando quando iria conseguir tirá-lo de sua mente. Não soubera mais
nada sobre ele desde que devolvera a gravura. E, em todo o caso, prometeu a si mesma que
lhe daria respostas curtas e secas se ousasse telefonar. Essa seria sua reação se Sloan tentasse
entrar em contato com ela.
Porém, o que poderia fazer com seu olhar que encarava o telefone implorando para
que tocasse?
Whitney sentiu-se melhor quando ouviu os passos de Érica descendo a escada e
depois batendo à porta. Estava precisando de companhia.
— Percebi que muito dever e pouco lazer transformaram Érica numa garota
monótona. — Sorriu enquanto Whitney a convidava para entrar. — Preciso de tempo para
mim mesma, você não acha? — perguntou quando se dirigiram à cozinha e observava a amiga
colocar uma caneca com leite para ferver.
— Acho que isso depende do que você espera da vida — Whitney replicou, sentindo
que Érica falava sério por trás daquele sorriso.
— Eu também acho — concordou, e confessou: — Sempre pensei que sabia o que
queria, e então encontrei Chris...
— Ah! — murmurou Whitney.
— Ah mesmo! — Érica suspirou.
O chocolate estava pronto e elas voltaram para a sala. Érica começou a se lamentar.
Sentia-se solitária nas noites em que não podia ver o namorado porque precisava estudar.
— E o que ele acha disso? — Whitney perguntou.
— Esse que é o problema. Eu não sei, e desejaria saber. Ele é tão compreensivo que
não posso me queixar. Se eu quiser fazer as coisas desse ou daquele modo, para ele sempre
está bem. E parece que gosta dos lugares aonde vamos juntos. Oh, eu não sei — ela falou
aborrecida.
— Talvez você esteja trabalhando muito — Whitney sugeriu — e precise de um
descanso, de um tempo para analisar melhor as coisas.
— Você tem razão — Érica concordou e sorriu, e perguntou mais animada: — E a
sua vida amorosa? Não vejo sinal de Toby esta noite. Ele não apareceu?
— Eu o vi a noite passada.
— Vocês se encontram regularmente? — Érica questionou e acrescentou: — Se você
fica assim, enfastiada, querida, obviamente ele não é o homem certo. E, a propósito, havia
uma fotografia daquele ricaço com quem você saiu algumas vezes no jornal de hoje.
Whitney saíra com Sloan muitas, e não algumas vezes. Mas como não estava
disposta a se abrir, como fizera com os outros namorados, Érica não ficara sabendo. E
demorou alguns segundos para replicar:
— Oh, você se refere a Sloan Illingworth? — Tentou fazer sua voz soar como se não
se interessasse pelo assunto, acrescentando: — O que aconteceu? Não li os jornais de hoje.
Já passava da meia-noite quando Whitney, depois de lavar as xícaras que usaram,
deitou-se e ficou acordada pensando em Sloan. Não queria supor que talvez ele telefonasse
para falar sobre a gravura devolvida.
Ela seria tão incoerente a ponto de imaginar que ele fosse ligar? E que iria censurá-
la, pois ninguém poderia destruir uma obra de arte? Todavia, ela se lembrava de que Sloan
não ficara nem um pouco impressionado com aquela pintura.
Deixando de lado a ilusão de que apenas comprara a tela porque ela havia gostado,
Whitney nem por um minuto se arrependeu de sua atitude. Esperava que ele ficasse com peso
na consciência. Entretanto, como Érica comentara, ele fora fotografado no aeroporto a
caminho do Oriente. Estava tranqüilo, de modo que não parecia ter nenhum problema de
consciência. De acordo com os jornais, Sloan não tinha idéia de quando estaria de volta.
Outra semana se passou, durante a qual Whitney tentara se convencer de que odiava
Sloan, mas não conseguia. Sabia que desejava atender à campainha e encontrá-lo parado à
porta. Porém, da última vez ficara três meses viajando.
Quatro semanas depois que o viu pela última vez, Whitney sentou-se para
repreender-se. Ela não podia continuar assim, sem comer nem dormir. Sloan lhe mentira de
propósito e depois a abandonara.
Tendo chegado a essa conclusão, foi trabalhar, na segunda-feira, determinada a
expulsar Sloan Illingworth de sua cabeça definitivamente.
Entretanto, os fatos não estavam a seu favor.
Animada, cumprimentou Toby com um sorriso largo quando se cruzaram no
corredor. Porém, não ouviu sua resposta, pois nesse instante tudo começou a girar. Ela tentou
gritar, mas mergulhou numa escuridão total.
Voltou a si quando o rapaz, apavorado, colocara um braço sobre seus ombros e uma
mão sobre sua cabeça. Duas outras pessoas discutiam se era melhor abaixar sua cabeça entre
suas pernas, ou se ela deveria pousar os pés sobre alguma coisa.
— Eu estou bem — ela explicava para quem quisesse ouvir, sentindo-se mais
embaraçada que doente.
— Eu a levarei para casa — Toby analisava sua face e se ofereceu para acompanhá-
la.
— Não preciso ir para casa — respondeu. — Eu estou bem — e disfarçou que suas
pernas tremiam enquanto tentava se levantar.
Agradeceu a Toby, que ainda a amparava com seu braço. Entretanto, manteve um
duelo verbal com ele quando queria ir direto a seu escritório e o rapaz queria deixá-la no
estacionamento.
— Se você não quiser ir para a casa, então pelo menos deixe que a leve até a
enfermaria.
— Oh, Toby — ela exclamou impaciente e ainda embaraçada. Calculou que esse
desmaio fora um protesto de seu corpo contra a falta de interesse pela alimentação que teve
nos últimos dias.
Em silêncio, prometia engolir o café da manhã a partir do dia seguinte, mesmo que
fizesse o maior sacrifício para isso.
Nesse momento seu chefe passou pelo local. Toby, vendo o olhar espantado do sr.
Parsons diante de seu braço ao redor da cintura de Whitney, explicou:
— Ela acabou de desmaiar!
Quanta agitação, pensava irritada, quando, constrangida, se afastou dos dois homens.
Toby logo estava a seu lado outra vez, segurando seu braço, amparando-a. Na verdade ela não
sabia para onde estava indo, e viu de repente que aquele era o caminho da enfermaria.
— A srta. Lawford acabou de desmaiar — ele se dirigiu à enfermeira Baker, uma
senhora alta e forte e de aparência séria.
— Há quanto tempo? — quis saber. — Bem, não precisamos do senhor por
enquanto.
Pobre Toby! Whitney viu que ele estava totalmente surpreso. Ela riu de sua
expressão depois que ele saiu.
Quando, quinze minutos mais tarde, ela também deixava a enfermaria, sentia-se
aturdida.
Foi diretamente a sua sala, depois de garantir ao sr. Parsons que estava muito bem.
Sentou-se a sua mesa, refletindo sobre a importância das perguntas que estavam martelando
sua cabeça após a conversa com a sra. Baker.
A enfermeira abandonara suas maneiras ríspidas quando as duas ficaram sozinhas.
Contudo, as perguntas inesperadas deixaram Whitney numa situação que ela nunca parara
para considerar. Seus pensamentos sempre voavam para outra direção. Em todo o caso, logo
concluiu que não era má idéia fazer um teste de gravidez. Às três horas da tarde, aproveitando
que o sr. Parsons estava ausente, Whitney procurou o número do serviço de Testes de
Gravidez, levantou o fone e pediu uma linha para a telefonista.
Aquela não foi uma boa semana para Whitney. Voltou para casa na sexta-feira
consciente de que estava grávida.
Procurou alguém para conversar aquela noite. Não havia ninguém em quem pudesse
confiar.
Ela não sabia se estava feliz ou infeliz porque seu caso de amor com Sloan resultara
nessa gravidez. Enquanto a noite avançava, começou a se sentir muito nervosa. Quase correu
ao apartamento de Érica para perguntar-lhe o que ela achava de ser madrinha outra vez. Mas
conseguiu se acalmar e colocar as coisas dentro de outra perspectiva.
Tinha de admitir que essa descoberta tinha sido um choque. O fato de que estava
pensando em Érica como madrinha significava que ela queria ter o filho.
Talvez estivesse errada e devesse se preparar para fazer um aborto. Porém essa
palavra fez com que se sentisse mal e imediatamente parou de pensar nesse assunto.
Sentiu uma satisfação muito grande imaginando que agora tinha uma vida dentro
dela para proteger, e ela a protegeria com todas suas forças. Ficou bem mais feliz. Deitou
cedo e teve o melhor sono de sua vida.
Durante o café da manhã no dia seguinte, com Sloan ainda sendo sua maior
preocupação, não teve vontade de comer nada, mas o sentimento de proteção falou mais alto
outra vez. Ela carregava o filho de Sloan, e pelo amor da criança ela deveria iniciar uma dieta
saudável e não perder nenhuma refeição. Então pegou uma torrada e, como se mudasse um
hábito alimentar deficiente, tomou uma xícara cheia de leite.
Sempre que engolia qualquer coisa seus pensamentos pousavam no pai de seu filho,
no próprio bebê e no que ela deveria fazer a esse respeito. Deveria contar-lhe?
Sua honestidade advertiu-a claramente que ele deveria saber. Contra isso existia uma
dúvida: ele iria querer saber?
Por longos minutos ela se debateu com essa questão. Quando considerou que ele
havia mentido por tanto tempo, não chegou a uma conclusão.
Tendo terminado seu copo de leite, já estava lavando a louça quando descobriu que
mudara de opinião. Porém, queria mesmo que Sloan soubesse ou simplesmente desejava ouvir
sua voz? Este era um bom motivo para entrar em contato com ele. Sua honestidade estaria se
tornando confusa pelo desejo de vê-lo ou de ouvi-lo?
Com estes últimos pensamentos, Whitney apanhou sua bolsa para sair e comprar
algumas coisas. Faria um estoque de leite. Entretanto, lembrou que nada aconteceria nos
próximos meses e não havia necessidade de tomar qualquer decisão rápida.
Não iria mais sair de casa. Aquela era apenas uma reação ao choque que levara no
dia anterior. E com Sloan ainda no exterior, devendo permanecer fora por mais alguns meses,
ela teria tempo para superar esse choque e calmamente resolveria o que fazer.
Naquela mesma manhã percebeu que estava enganada.
Encontrava-se na cozinha mudando a disposição de algumas peças no armário
quando o telefone tocou. Desejou que fosse Toby, pois na atual circunstância ela teria mesmo
que lhe dar alguma explicação. Mas descobriu que não seria naquela hora que iria contar-lhe
sua novidade. A voz que perguntou pelo seu nome enquanto levantava o fone não era a de
Toby.
— Whitney?
Incapaz de respirar pela surpresa de ouvir Sloan, ela não conseguiu coordenar suas
idéias e responder de um modo educado, porém indiferente. Queria dizer qualquer coisa que
escondesse que só o fato de ouvi-lo provocava-lhe um colapso.
— Sim! — Mesmo falando com frieza, essa resposta jamais pareceria inteligente.
Poucas semanas antes ela teria respondido sarcasticamente e desligado o telefone
sem se despedir. Agora o desejo de escutar aquela voz fez com que conservasse o fone no
ouvido. As mentiras que ele lhe contara estavam a quilômetros de distância de sua mente. Não
se lembrava que havia escrito "Não o perdoarei jamais" no travesseiro. Nem estava pensando
que ainda não decidira contar ou não sobre o bebê. Nesse momento ela se esquecera de que
estava grávida.
Mas, segundos depois, ela se lembrava de todos esses fatos. Fora impertinente, não
tinha dúvida. Uma fúria inesperada apoderou-se dela quando, depois de uma longa pausa,
Sloan tivera o atrevimento de retrucar sua pergunta arrastando arrogantemente a voz:
— Já me perdoou por ter tirado sua virgindade?
Então aquela raiva orgulhosa que já deveria ter se apresentado antes invadiu-a.
— Minha virgindade em troca de uma gravidez indesejada dificilmente parece um
bom negócio! — ironizou, e fez o que deveria ter feito desde o início: desligou o telefone.
Que homem!
Estava muito irritada para permanecer parada, lamentando cada palavra que
pronunciara ao telefone.
Nada daquilo importava. Depois de meia hora ela ainda estava fervendo, caminhando
pela sala.
Havia prometido pensar bastante antes de fazer qualquer coisa. Tudo fora culpa dele.
Acreditar nele fizera-a perder a cabeça.
Aos poucos Whitney se acalmou, compreendendo que aquela conversa não faria
nenhuma diferença. O simples fato de que a engravidara não o faria perder nenhuma noite de
sono.
Whitney se acomodou numa poltrona enquanto o tempo passava e seus pensamentos
não se desviavam de Sloan. Ocorreu-lhe que, tendo participado que iria ter um bebê, com
certeza não o veria outra vez.
Ela escolhera aquele dia para fazer tudo errado, e naquele instante a campainha
tocou.
É Toby, pensou, e não viu melhor hora do que aquela para contar-lhe que estava
grávida. Desceu as escadas, preparada para torná-lo a primeira pessoa a saber de sua
condição.
Chegou até a porta, girou a chave e abriu-a. Quase desmaiou pela segunda vez
naquela semana: seu visitante não era aquele que esperava. Seu visitante não era Toby.
CAPÍTULO IX
Whitney não saberia explicar como conseguia se manter sobre os próprios pés.
Apoiando-se na porta, ela respirou fundo e recuperou-se da sensação de que iria desmaiar.
Ouviu Sloan perguntar preocupado:
— Você não se sente bem? Está tão branca...
— Estou perfeitamente bem — respondeu, secamente, e se afastou quando ele deu
um passo à frente com a intenção de ampará-la. Olhava para ele com indiferença, embora ele
não tivesse feito nenhum movimento para voltar para trás; naquele instante deixou os braços
caírem.
— Nós precisamos conversar — replicou tranqüilamente. Como ela não se
preocupasse em convidá-lo para entrar, indagou um tanto agressivo: — Você prefere que
conversemos aqui na porta?
Sem pronunciar uma palavra, ela se voltou, e ambos subiram as escadas. Ainda
estava perturbada com sua chegada inesperada. Porém, ele estava lá. Como tomara
conhecimento de sua gravidez, talvez quisesse assumir sua parte na responsabilidade.
Ao entrarem no apartamento, Sloan tinha um olhar firme e fechou a porta com
determinação. Whitney começou a conversar com hostilidade:
— Pensei que você estivesse no exterior.
— Voltei ontem — informou. — Você tentou entrar em contato comigo?
— Não seja pretensioso — falou com altivez. Concluiu tarde demais que, como
estava esperando um filho dele, seria natural que fosse procurá-lo. Com mais cuidado, embora
ainda hostil, perguntou:
— Há quanto tempo você estava em seu escritório?
— Por que está me perguntando isso?
— Suponho que, para chegar aqui em tão pouco tempo, você deve ter ligado de seu
escritório. Não que tenha qualquer importância o lugar onde você estava — ela declarou para
disfarçar, pois o ciúme avisava que se ele não telefonara do escritório era porque estava em
Londres, na casa de alguma amiga.
— Como você mesma acabou de dizer, não tem a menor importância o lugar de onde
eu chamei. Agora, para deixar tudo bem claro, eu liguei de Heathlands.
— De Heathlands? — repetiu, espantada. Ele devia ter dirigido como um louco para
chegar tão rápido, ou então estava mentindo novamente.
Sloan balançou a cabeça para confirmar o que dissera, e um pensamento
desagradável atingiu Whitney. Até aquele momento imaginara que ele havia se apressado para
assumir sua responsabilidade. Mas a única razão pela qual arriscaria quebrar o pescoço,
saindo tão depressa de sua casa, era para dizer que não concordava com sua situação.
Certamente pediria para interromper a gravidez, o mais rápido possível.
Antes que pudesse abrir a boca para atacá-lo, ela teve de voltar atrás porque, sem
concordar oralmente com sua última pergunta, Sloan interpelou-a com seriedade:
— É verdade?
Ela não tinha a intenção de deixá-lo confuso, mas o fato de ele ter duvidado de sua
palavra deixou-a irritada.
— Entre nós dois — falou com petulância —, você é o mais indicado para o título de
mentiroso.
— Mentiroso! — Ele ficou indignado.
— Oh, meu Deus! — Whitney abriu fogo. — Não sei onde você encontra nervos
para... — As palavras desapareceram. — Sim — gritou —, é verdade. Minha gravidez foi
confirmada ontem. — E estava lançando lenha na fogueira quando o fulminou: — E se você
bateu todos os recordes de velocidade para chegar aqui e me convencer a fazer um aborto
você pode...
— Oh, Deus! — Sloan ficou exasperado. — Seria a última coisa que eu... — Ele
parou, porque percebeu que, se um se enfurecesse com o outro, nada seria resolvido.
Entretanto, Whitney não sabia o que ele queria resolver. Nem estava preocupada
quando, controlando sua irritação, Sloan a encarou dizendo com convicção!
— Acho que é melhor você se sentar.
Essa opinião e as mãos tocando seu braço para conduzi-la até uma cadeira deixaram-
na nervosa. Mas, quando ele a afundou sobre uma poltrona enquanto se acomodava na outra,
ela se conscientizou de que suas pernas tremiam desde que abrira a porta e encontrou-o
parado do lado de fora. Sabia que isso não tinha nada a ver com sua gravidez.
— Agora — ele falou depois de passar alguns instantes observando-a —, vamos
manter a calma, sim?
— Muito bem — Whitney retrucou de um modo afetado, e procurou permanecer
tranqüila. E, como se estivesse coordenando alguma reunião de negócios, Sloan começou a
dizer:
— Você me contou que está esperando um filho meu. E pelas suas palavras deduzi
que, como eu, você não quer fazer um aborto. Estou certo?
Ela não tinha certeza se ele desejava realmente o filho, e como estava esperando sua
resposta afirmou um pouco tensa:
— Sim, você está certo.
Um leve sorriso apareceu nos cantos da boca de Sloan quando Whitney concordou
com ele. Fascinada, ela o encarava. Porém, ele não continuou sorrindo. De repente sentiu que
aquele homem a sua frente, que já devia ter dirigido com firmeza centenas de reuniões
importantes, agora se sentia tão abalado por dentro quanto ela: Todas as idéias absurdas foram
esquecidas quando Sloan, fitando-a intensamente, propôs-lhe com tranqüilidade e firmeza:
— Então, minha querida Whitney, só existe uma coisa a ser feita: você e eu devemos
nos casar.
— Casar?
Atordoada ao máximo, Whitney quase caiu da cadeira quando se levantou, surpresa.
Se suas pernas não estivessem firmes para sustentá-la, ela teria caído mesmo. Ficara
totalmente confusa diante daquela proposta. Só conseguiu encará-lo com um espanto total.
Porém, seu contentamento acabaria quando Sloan, vendo que ela não iria dizer mais
nada, não entendeu que ela estava atordoada e continuou, como se tudo já estivesse resolvido:
— Hoje é sábado — falou como se Whitney, além de muda, tivesse se esquecido do
dia da semana. — Desde que não devemos perder tempo, providenciarei imediatamente para
que possamos nos casar com uma licença especial. Com sorte, talvez na terça-feira...
— Espere um pouco — Whitney procurou interrompê-lo antes que ele decidisse tudo
e a envolvesse em seus planos.
— Algo está errado? — Estava intrigado com a áspera interrupção.
— Tudo está errado — ela explodiu.
— Sei que o ideal seria primeiro casar para depois constituir família. Mas esta é uma
situação especial e, embora você não tenha culpa — ele explicava com simpatia —, você se
encontra no que chamam de "estado interessante". Por isso, acho que deveríamos nos apressar
para...
— Se não fosse por causa de meu "estado interessante" — Whitney recuperou-se um
pouco e começou a provocá-lo —, sem dúvida nenhuma você não falaria em casamento. E,
apesar de meu "estado interessante", não tenho nenhuma intenção de me casar com você.
Sem conseguir tirar os olhos dele, percebeu que agora ele ficara intrigado e parecia
que perdera toda a cor de seu rosto.
— Você me odeia tanto que vai permitir que meu filho enfrente a vida sem um pai?
— Sloan se recuperou e dirigiu-se a ela transtornado.
Odiá-lo? Oh, meu Deus! Como ela poderia?! Sentindo que estava fraquejando, e
sabendo que não podia fraquejar, Whitney reuniu todas as suas forças para encará-lo:
— Eu não odeio você, Sloan — disse com firmeza. — Talvez eu devesse odiar o
artista que existe em você.
— Artista? — Ele não entendeu, do mesmo modo que não soube por que ela o
chamara de mentiroso.— Quando foi que eu menti? — ele parou, pois se lembrou de alguma
coisa. — Ah!
— Surpreso? — ela perguntou rudemente, observando que ele balançava a cabeça,
como se explicasse que não concordava com isso.
— Não sei como, mas, de alguma forma, você descobriu sobre minha mãe, não foi?
— Certo — Whitney rebateu. — Meu Deus, foi tão desagradável. Que modo de
exigir vingança!
— Vingança? — Sloan repetiu incrédulo. — Não sei do que você está falando.
— Por favor, não finja de novo. — Ela sabia que fora ingênua e que ainda era, pois
queria acreditar em todas as mentiras que ele contava. — Você me procurou tão logo soube
que eu estava...— Sua voz falhou, porém voltou com mais força quando recomeçou com
determinação: — Não sei até onde você teria chegado. Contudo, agora que você já me honrou
com a proposta de casamento, poderia fazer o favor de se retirar?
Whitney estava ofegante quando terminou de falar; abaixou a cabeça, olhando, mas
sem realmente ver, o tecido da saia que estava usando. Para seu desgosto, Sloan se levantou,
não para ir embora, apenas para trazer sua cadeira mais perto da dela. E declarou
tranqüilamente:
— Whitney, querida. Agora existem muitas coisas entre nós para que eu vá embora
assim.
Ela se recusava a fitá-lo quando, ainda com o mesmo tom de voz, ele acrescentou:
— Eu disse lá fora que nós precisávamos conversar...
— Se vai me contar mais mentiras, então quanto mais cedo você for, melhor.
— Não menti mais para você — Sloan falava com sinceridade, ela queria acreditar.
— Você planejou sua vingança porque eu fui a causa do rompimento de seu
noivado...
— Rompimento? — Ele parecia assombrado.
Whitney levantou a cabeça e observou uma expressão que parecia sincera enquanto
ele murmurava:
— Oh, querida, é isso que você quer dizer com vingança?
Whitney sentiu a garganta seca. Sloan a chamava de "querida" e isso não contribuía
para aliviar a tensão que a dominava.
— Não posso imaginar por que você me contou tantas mentiras sobre sua mãe. Ela
sempre esteve bem de saúde, longe dos hospitais e nem se encontrava na Inglaterra.
— No momento ela está em Heathlands — informou. — Eu juro que ia esclarecer
tudo dentro de pouco tempo. Por enquanto, acredite que nada que eu possa ter dito ou feito
com relação a você tenha qualquer semelhança com um ato de vingança.
O coração de Whitney disparava devido à sinceridade que percebia em sua voz. Mas
ela fora tão enganada anteriormente!
— Você me surpreende...
— Às vezes eu surpreendo a mim mesmo — Sloan confessou. Whitney levantou os
olhos e ele perguntou em voz baixa:
— Quando soube sobre minha mãe?
Esse fato era tão perturbador que parecia que ela sabia há muito tempo, quando na
verdade fazia pouco mais de um mês.
— Desde a segunda vez que estive em Heathlands. Quando deixei o quarto, fui até a
sala de estar e comecei a conversar com a sra. Orton.
— Ela já havia retornado da casa da filha! — ele exclamou. Whitney estranhou que,
embora ele se lembrasse perfeitamente daquela ocasião, dava a impressão de que não sabia
que a governanta estava de volta. Saíra de casa antes que ela tivesse regressado e não tomara
conhecimento do horário em que ela chegara.
— Seu genro levou-a até Heathlands antes de ir pescar — Whitney explicou, e
continuou com amargura: — De que outro modo eu ficaria sabendo que, longe de estar
doente, como você me fizera acreditar, ela não sofrera nenhum acidente? E que telefonara dos
Estados Unidos no dia anterior?
Whitney enfatizara as últimas palavras e lançou-lhe um olhar penetrante. Esperava
que ele se defendesse ou desculpasse por fazê-la acreditar naquelas mentiras. Mas, em vez de
ficar envergonhado, foi ela quem ficou na defensiva quando, com ternura, Sloan murmurou:
— Oh, meu amor! Como você deve ter ficado magoada! — Um brilho diferente
surgiu em seu olhar. — Foi por isso que você escreveu que nunca me perdoaria? Por ter
ficado decepcionada comigo e não por pensar que tirei vantagem da situação?
O coração de Whitney começou a trabalhar vigorosamente e com pesar. Ela foi
incapaz de dizer uma palavra. Então Sloan continuou:
— Foi a dor por ter sido iludida, e não por ter sido seduzida que fez você deixar
aquela mensagem e fugir de Heathlands!
— Por favor, Sloan — ela o interrompeu. Sentia uma enorme agitação interior, e sua
raiva começou a aumentar. Estava duplamente enfurecida: com ele, porque achou que
estivesse tão magoada que quisesse fugir de sua casa; e com ela mesma, porque teve medo de
que ele soubesse que ela havia se entregado por amor. — O que você queria que eu fizesse
quando descobri que você ensaiara todas aquelas mentiras? Deveria ficar esperando você
voltar e aplicar mais uma vingança?
— Vingança?
— Sim, vingança! — Whitney o fulminou. Seus sentidos estavam alerta, e ela não
queria deixar de esclarecer nada. — Como deveria reagir quando, com as informações da sra.
Orton, comecei a entender a situação e imaginei que você só me quisesse daquela vez?
— Ora, por favor — Sloan explodiu, inconformado com o modo como ela analisava
os fatos. — Não...
Whitney não se preocupou com o que ele pensava, e não permitiu que dissesse
nenhuma palavra. Estava nervosa demais para permanecer sentada.
— Você nunca me perdoou por ter usado sua cama na noite da festa. — Falava com
rapidez, em pé. Em sua fúria não percebeu que Sloan se levantou e que a observava
atentamente. — Quando sua noiva nos viu na cama e desfez o noivado acreditando que nós
éramos amantes, você imaginou uma vingança. Você...
— Por favor, Whitney — Sloan gritou, pois era o único meio de interromper seu
discurso. — Por que eu me vingaria quando meu relacionamento com Gleda terminara antes
que eu caísse na cama a seu lado aquela noite?
— Antes? — gaguejou. Porém teve uma rápida visão de Gleda parada à porta do
quarto, acusando-a pelo fim do noivado. Whitney o desprezava, e sentiu uma irresistível
vontade de atingi-lo. — Essa é apenas a sua maior mentira.
— Eu não estou mentindo — Sloan esbravejou. — Eu estou... — De repente
percebeu que aquela fúria contrastava com a calma que havia pedido anteriormente. Então
colocou as mãos sobre os ombros de Whitney. — Assim não chegaremos a nenhuma
conclusão — falou tranqüilamente. — Você não quer se sentar de novo e deixar que eu me
explique?
Ela o brindou com um olhar de desprezo, pois não tinha a intenção de ouvir outra
mentira. Enquanto o encarava com frieza, ia se convencendo de que Sloan estava tolerando
demais sua arrogância. Desejou saber por que ele se mostrava tão paciente.
Whitney desviou o olhar e sentou na cadeira de onde havia levantado pouco antes.
Como previra, Sloan acomodou-se na outra poltrona a sua frente. Em seguida trouxe-a para
mais perto ainda, e ela imaginou que, assim tão próximos, não perderiam nenhum movimento
da face um do outro.
Começou a se sentir um pouco apreensiva. Quando Sloan se voltou para ela, a
apreensão transformou-se em irritação. Procurou esconder seus sentimentos sob uma capa de
sarcasmo e disse:
— Tenho certeza de que você começará sua explicação assim: Era uma vez...
Pelo modo como Sloan comprimiu os lábios, Whitney percebeu que não agradara e
que ele não iria contar nenhum conto de fadas.
— Talvez eu mereça isso!
— Talvez? — ela continuou zombando.
— Muito bem. — Sloan levou alguns minutos pensando no que iria dizer. — Em
vista de eu não ter esclarecido certos detalhes, e de uma ou outra mentira ocasional, agora eu
lhe peço que tenha bom senso.
— Oh, eu acredito em você — Whitney mentiu, consciente de que ele percebia isso.
— Mas foi uma pena que, sabendo que não estava mais noivo, você se esquecesse de contar à
própria noiva.
— Eu não esqueci — Sloan retrucou, ríspido. Logo depois, um pouco mais educado,
lembrou: — Aquela festa, como você sabe, seria uma surpresa que minha noiva queria me
fazer depois que fiquei três meses fora. O que você não sabe, porque ela esqueceu de contar, é
que ela fora avisada por um telefonema internacional, fora comunicada por uma carta
expressa logo depois, e informada pessoalmente assim que cheguei a Heathlands àquela noite.
Gleda sabia muito bem que não estávamos mais comprometidos.
Whitney só conseguiu respirar quando ele acabou de falar. Não perdeu tempo para
dizer como recebia essa sua última e formidável mentira:
— Você está perdendo seu charme, Sloan — falou cinicamente. — Das outras vezes,
você foi muito mais convincente. — Ela parou por um instante e continuou em seguida: —
Não é que eu não esteja querendo acreditar nas coisas que você está dizendo. Mas se uma
mulher tem o trabalho de organizar uma festa de boas-vindas para seu noivo, depois de ter
sido informada por duas vezes que ele terminara tudo... — Ela tentava desacreditá-lo.
— Gleda nunca me amou, nem eu a amei. — Ele mudara de assunto e Whitney ficou
surpresa, observando-o.
Bem que gostaria que seu coração enciumado acreditasse que ele nunca se
apaixonara pela ex-noiva. Contudo, isso não mudaria nada do que acontecera entre eles.
— Agora você vai me dizer que nunca esteve noivo de Gleda — ela ironizou. Nesse
momento já aceitava que ele era um homem desprezível, mas que não podia deixar de amá-lo.
— Não — ele desmentiu brandamente. — Eu fui seu noivo. — Sua voz era amena
quando acrescentou: — Estava no exterior quando chegou ao meu conhecimento que ela não
era a noiva fiel que deveria ser. Apenas quando percebi que ficava chateado, e não machucado
com seu comportamento, é que soube que nunca me casaria com ela. Não estava partindo o
coração dela quando fiz aquele telefonema.
— Foi você quem telefonou para romper o noivado?
— Sim — ele confirmou. — E, assim que entendeu o motivo daquela chamada,
Gleda fingiu que não conseguia me ouvir direito, mas ficou sabendo que nosso noivado não
existia mais.
Ele não dava a menor importância ao fato de que sua ex-noiva não o amara, e o
coração de Whitney deu um alegre salto.
— E, para que não ficasse nenhuma dúvida, escrevi uma carta comunicando que não
estávamos mais comprometidos.
— Oh! — Whitney disse outra vez. Porém já passara o tempo em que ela acreditava
em tudo sem contestar. — Então, por que organizou a festa como se vocês ainda estivessem
juntos? — indagou com um olhar acusador.
Sloan tolerava muito bem esse olhar, ela pensou. Não se mostrava impaciente com
sua curiosidade. Ao contrário, dava a impressão de que iria permanecer ali sentado até que ela
fizesse a última pergunta.
— Gleda jurava que não havia compreendido o que eu dissera ao telefone e que nem
havia recebido minha carta.
— Talvez não tivesse recebido mesmo — Whitney sugeriu.
— Tudo isso aconteceu no início de minha viagem. E você não é ingênua, Whitney.
Se ela ainda se considerasse minha noiva, jamais deixaria passar dois meses e meio sem
nenhuma notícia. No mínimo teria ido a meu escritório para que enviassem um telex.
Lembrando aquela loira confiante, Whitney só podia concordar com ele.
— Talvez você esteja certo — ela admitiu, esquecida de que não deveria acreditar
nele.
Sloan riu.
— Eu estou certo — garantiu carinhosamente.
— Você ficou nervoso quando viu que havia uma festa em sua casa?
— Eu estava cansado e sem disposição para encontrar a entrada e o gramado de
minha casa apinhados de gente e de carros. Nem para ouvir a gritaria que vinha lá de dentro.
Tudo o que eu queria era minha cama.
Whitney enrubesceu.
— Oh, sinto muito! — murmurou, lembrando que ele teria companhia na própria
cama. — E logo você encontrou Gleda...
— Bem depressa. Ela deve ter lido em meu rosto que eu não estava satisfeito, pois
pediu insistentemente que eu não aprontasse nenhuma confusão.
— Você concordou e foi se deitar.
Sloan lançou-lhe um olhar que sugeria que ela sabia disso muito bem, e continuou:
— Felizmente a sra. Orton trancara alguns cômodos. Eu abri meu escritório e levei
Gleda até lá. Foi então que expliquei tudo muito bem, para que ela não tivesse nenhuma
dúvida de que nosso noivado estava terminado.
Ele falava com segurança, e Whitney perguntou com ansiedade:
— Ela ficou preocupada?
— Fingiu que ia chorar. — Ele deu de ombros e sorriu daquela maneira que ela
adorava. — Porém ficou muito feliz quando falei que poderia ficar com o anel que eu havia
lhe dado.
Whitney se lembrou do anel com safiras e diamantes no dedo de Gleda, que devia ter
custado uma fortuna.
— Mas ela ainda pensava que era sua noiva quando parou à porta do quarto e
gritou...
— Sei muito bem o que ela gritou. Aquilo era representação!
— Representação! — Whitney repetiu, escandalizada.
— Com certeza. — E, diante dos admirados olhos verdes, explicou: — Já estava
terminando minha conversa no escritório quando ela me pediu para não envergonhá-la na
frente de seus amigos. Insistiu para deixá-la contar que não éramos mais noivos.
— E você? — ela perguntou, sabendo que ele tinha deixado.
— Como já disse, sentia-me exausto. Estava mais interessado na minha cama do que
na história que ela inventaria para seus convidados. Concordei em não dizer nada, contanto
que ela desaparecesse imediatamente com aquelas pessoas.
— Só que ela não desapareceu.
— Não, ela não desapareceu. Deitei-me e nem mesmo me lembro de ter tirado a
roupa. — Parou um momento e continuou com voz rouca: — Não fazia a menor idéia de que
uma parte de minha cama já estava ocupada...
— Eu sinto muito. — Whitney enrubescia outra vez.
— Mas eu não! — ele replicou imediatamente.
Whitney desviou o olhar de Sloan para se concentrar; ele tinha tanto charme que lhe
tirava as forças.
— E você também não precisa sentir tanto — ele continuou suavemente. Contudo,
vendo que ela ainda não estava em condições de enfrentá-lo novamente, completou: — Eu
devia estar tão desligado como você. Adormeci assim que encostei a cabeça no travesseiro.
Logo fui acordado por minha ex-noiva fazendo aquela cena dramática. Foi o modo que ela
encontrou para participar a seus amigos que não havia mais nada entre nós.
— Livrou a própria face deixando a culpa para você.
— E deixando para eu mesmo me livrar daquela multidão se quisesse descansar um
pouco aquela noite — ele concluiu.
— Quer dizer que, quando deixou o quarto, você foi dispersar os convidados de
Gleda? Pensei que tivesse saído para fazer as pazes com ela.
— Dispensei Gleda e seus amigos. Queria a casa para mim!
— Mas não teve sua casa só para você...
— Porque seu amigo se esqueceu de você, e eu me tornei um mentiroso.
— Oh! — Whitney respirou profundamente. Logo se deu conta de que estava
acreditando em tudo o que ele dizia. — Devo ser mesmo a mulher mais ingênua do mundo.
Eu acredito em você. Mesmo sabendo que você mentiu tanto para mim, acredito nos
disparates que você me apresentou.
— Não foi nenhum disparate, meu bem. Com sinceridade, todas as palavras que
pronunciei desde que entrei aqui hoje são sinceras — falava rapidamente, pois quanto mais
depressa esclarecesse as coisas, melhor.
Entretanto, Whitney continuou discutindo:
— Muito bem. Seu compromisso fora rompido antes que você voltasse para casa
àquela noite. Por que, então, se não foi por vingança, você telefonou para meu escritório
semanas depois? E por que, se eu concordei em jantar com você só para ajudá-lo, você me
comoveu com aquela terrível história do acidente de sua mãe?
— Passei as duas semanas seguintes me perguntando a mesma coisa.
As batidas do coração de Whitney se aceleraram quando ele revelou:
— Até nosso primeiro encontro, suas lembranças se misturavam com minhas
preocupações. Já era tempo de você estar fora de minha cabeça. Decidi que o melhor seria
procurá-la outra vez.
— Você faz tudo parecer tão frio... — ela falou, contrariando o sangue quente que
corria em suas veias.
— Não foi assim — Sloan murmurou. — Eu a convidei para jantar simplesmente
porque queria vê-la de novo.
— Só por isso? — Whitney não acreditou que pudesse se expressar com tanta
clareza, parecendo só um pouco interessada.
— E eu levei um choque — ele concordou e prosseguiu: — Você não se esforçou
para dizer que queria me ver.
— Agora entendo que foi sincero quando me contou que Gleda e você nunca iriam se
casar.
Whitney desejou que seu coração se comportasse tão corretamente como sua cabeça.
Ficaram alguns segundos se entreolhando, quando Sloan rompeu o silêncio:
— Se lhe serve de consolo, passei as duas semanas seguintes preocupado com o
mentiroso em quem você me transformara.
— Eu sabia que seria culpada — ela ironizou.
— Em quem mais eu poderia botar a culpa? — ele brincou, deixando-a nervosa
quando segurou suas mãos e fixou diretamente seus olhos. — Por sua causa e por orgulho,
comecei a mentir. Nunca havia feito isso antes.
— Esse é o tipo de elogio que eu adoro — Whitney falou com voz trêmula.
Ela tentou libertar as mãos que ele apertava com força, mas não conseguiu.
— Você dominou todos os meus sentidos, Whitney Lawford, de tal modo que não
fico admirado por ter feito tudo errado.
Whitney encarou-o surpreendida. Sabia que aquilo se aplicava a ela, não a ele.
Queria dizer alguma coisa que pudesse encobrir o fato de que suas cicatrizes começavam a
desaparecer.
Sloan ameaçou dizer alguma coisa, porém hesitou. Parecia que não estava muito
confiante. E ela nunca havia conhecido uma pessoa tão segura de si como ele, com tanto
autodomínio.
— Reconheço que estive o tempo todo sentindo um misto de alegria, ansiedade e
apreensão desde que a vi pela primeira vez.
Whitney estremeceu toda. Não conseguia fazer nenhum comentário, nem vulgar,
nem inteligente, nem irônico. Só conseguiu dizer:
— Você sentiu tudo isso?
— A princípio fiquei irritado. Cheguei cansado e encontrei minha casa invadida por
estranhos. Depois de acordar de um merecido sono, desci e vi você dormindo num sofá.
— Eu me lembro — ela comentou sem jeito diante do suave sorriso que surgiu nos
lábios de Sloan. Lembrou também que ficara constrangida quando ele a encontrou deitada, e
se erguera no mesmo instante.
— Observando-lhe a fisionomia calma enquanto dormia — Sloan comentou —,
soube que alguma coisa estava acontecendo comigo.
A idéia de que ele pudesse estar mentindo desapareceu enquanto Whitney fitava os
sinceros olhos cinzentos.
— E conseguiu descobrir o que era?
— Naquele momento, não. Ia buscar um cobertor quando você se mexeu e abriu os
olhos. Eram os fabulosos olhos verdes que pensei que tivesse visto em sonhos. Então desejei
conhecê-la melhor.
De repente, Whitney perdeu a sensação de estar hipnotizada.
— Não percebi isso — ela replicou rapidamente. — Pelo que me lembro, logo após
ter aberto os olhos, você estava martelando minha cabeça.
— Você também deve se lembrar, querida — ele disse, de maneira estranha, sem
alterar a voz — que logo após ter aberto os olhos, enquanto eu planejava passar o dia em sua
companhia, você só queria voltar para o seu apartamento, para se livrar de mim! — Após
alguns segundos de silêncio, continuou: — Diante dessa atitude, eu deveria resistir e não
procurar você.
— Você telefonou, entrando em contato comigo...
— Mudei de idéia porque vinte dias depois você ainda permanecia em minha cabeça.
— Você queria mesmo me ver? Pensei que só quisesse que eu o ajudasse... — Ela
parou e refletiu um pouco. — Mas foi você quem terminou tudo, não Gleda. Portanto, não iria
querer reatar o noivado. Então... — fez uma pausa e concluiu: — Você desejava mesmo sair
comigo.
— Acho que já sabia que é muito especial. Você é tão especial para mim que eu nem
sei mais onde estou...
Whitney ficou comovida com essa declaração. Sua voz estava calma quando
experimentou dizer num tom frio, distante:
— É verdade?
— Sim, é verdade — Sloan confirmou numa voz fria também, embora um calor
começasse a surgir enquanto prosseguia: — E o que eu deveria fazer? Lá estava eu jantando
com uma mulher cuja companhia era agradável, cuja beleza eu admirava e cuja conversa e
humor deixavam-me cada vez mais fascinado. Entretanto, essa mulher deixou bem claro que
apenas tentava me reconciliar com outra mulher.
Whitney admitiu que isso não era agradável para ele.
— Você não pode me acusar por isso.
Ela estava satisfeita porque Sloan admirava sua beleza e apreciava sua companhia,
mas resolveu insistir em outros pontos:
— Eu acreditava que tinha sido a causa do rompimento de seu noivado. Você não
desmentiu, e quis guardar a verdade só para você... Por que continuou mentindo sobre sua
mãe?
— Orgulho, eu acho — Sloan replicou diretamente. — O orgulho me fez contar a
primeira mentira, que provocou todas as outras. Mas você demonstrou tanta má vontade que
eu decidi que não a procuraria novamente.
— Foi por isso que estava tão desagradável quando ligou para o escritório e exigiu o
número do telefone de casa?
Whitney estava caída de amores quando ele concordou:
— Desculpe, eu não resisti. Devo admitir que fui assaltado por um terrível ciúme
quando liguei e soube que na noite anterior você havia saído com outro homem.
— Ciúme? — O coração de Whitney batia tão violentamente que ela respirava com
dificuldade.
— Fiquei quase louco — ele confessou. — Meu orgulho não me permitia ver, porque
estava com ciúme. Contudo, eu queria ter certeza de que você não se encontrava com mais
ninguém.
— Oh, Sloan! O que você está dizendo?
— Estou dizendo que continuei mentindo porque tive medo de que você se recusasse
a sair comigo novamente.
Os olhos de Sloan ainda estavam fixos nela. Como se quisesse receber apoio,
procurou as mãos de Whitney e declarou:
— Simplesmente estou dizendo que te amo!
— Oh! — ela suspirou profundamente. — Você não... — ela começou a perguntar
num tom rouco, entrecortado pela emoção. — Você não mentiria sobre uma coisa como essa,
não?
— Isso significa que meu amor é importante para você — ele exclamou, feliz. Agora
precisava convencê-la de seus próprios sentimentos: — Whitney, por favor, se você não
acreditar em mais nada, acredite que eu te amo!
Ele se expressava com tanta sinceridade que Whitney não resistiu. Uma tremenda
alegria se apoderou dela. Ela não queria acreditar, mas todos seus sentidos diziam que podia
confiar nele.
— Oh, Sloan! — ela falou, tremendo. — Não sei o que dizer.
Fitando seriamente os brilhantes olhos verdes, Sloan tomou suas mãos.
— Você poderia começar dizendo que não me odeia.
— Não odeio você — murmurou.
— Poderia me dizer que você gosta um pouquinho de mim.
— Eu gosto de você... demais — falou, aumentando a voz.
— Você poderia dizer... que você me ama, só um pouquinho.
Whitney percebeu que ele hesitava porque estava nervoso.
— Oh, Sloan! — ela gritou, e estava tão emocionada que queria chorar. — Eu amo
você com toda minha força!
Ela não saberia dizer o que aconteceria em seguida, mas não esperava que Sloan
apertasse seus dedos até causar dor.
— Você não mentiria para mim apenas para me punir? — ele indagou hesitante.
Whitney suportava com bravura a pressão sobre seus dedos. No silêncio tenso que se
seguiu, pôde ver o tormento em seus olhos enquanto ele aguardava a resposta.
— Eu nunca mentiria a ninguém sobre uma coisa como essa, querido — ela garantiu.
— Oh, meu amor, minha vida!
De repente as mãos de Whitney estavam livres. Mas, num rápido movimento, Sloan
a trouxe até sua cadeira, fazendo-a sentar-se em seu colo e apertando-a contra seu coração.
Alternadamente ele a abraçava, com força, e a afastava um pouco para observar seu rosto.
— Quando você soube?
— Naquela noite em que você me beijou pela primeira vez.
— Fui um monstro naquela noite!
— A noite toda foi um desastre — ela afirmou com meiguice. Estava no sétimo céu
quando o fabuloso sorriso de Sloan surgiu em seus lábios.
— Você está amenizando as coisas — ele murmurou. — Tudo foi culpa minha.
Trabalhei como nunca para concluir meus negócios na Suíça, de modo que pudesse voltar
rápido para você — ele recordava. — Porém, quando telefonei, você respondeu que tinha um
encontro com Keston. E no restaurante, quando eu já superava meu ciúme, seu ex-amante
apareceu.
— Dermot nunca foi meu amante — Whitney retrucou. — Bem, não no verdadeiro
sentido da palavra. Pensei que tivesse me apaixonado por ele, sem saber que ele era casado.
Mas não sabia o que era sentir-se apaixonada até que... — sua voz começou a falhar
—..encontrei você!
— Meu amor! — Sloan estava ofegante. Tudo ficou calmo e ele espalhava beijos
pela face de Whitney; depois seus lábios se encontraram.
O tempo passava enquanto estavam felizes um nos braços do outro.
— Quando você soube? — Whitney desejou saber, interrompendo um beijo.
— Que estava apaixonado por você? Soube há algum tempo. Entretanto, não queria
me envolver outra vez com o amor tão cedo. Porém, também descobri que não sabia o que era
estar apaixonado até que encontrei você! Na noite em que a beijei e descobri que você não
estava apaixonada por Selby...
— Você soube que me amava! — ela completou empolgada.
— Acho que já sabia, mas não estava pronto para aceitar. E eu me preparava para o
escândalo que você iria fazer quando soubesse a verdade sobre o acidente de minha mãe.
— Você pretendia me dizer?
— Claro! Quando a convidei para ir a Heathlands, eu estava decidido.
— Estava mesmo?
Sloan meneou a cabeça enquanto continuava:
— Uma parte de mim estava inclinada a guardar na memória sua reação favorável a
meus beijos. A outra parte temia que não encontrasse oportunidade para desmentir toda
aquela história. No final, eu somente sabia que deveria confessar tudo a você e ver como as
coisas ficariam depois.
— E me convidou para jantar em Heathlands...
— Sim, pois quando subi pela primeira vez até seu apartamento, sua vizinha
começou a tamborilar na porta, apesar da hora. Então decidi levar você para onde ninguém
nos pudesse interromper!
— Felizmente sua governanta iria passar a noite fora.
— Eu lhe dei folga aquela noite.
— Você estava tão quieto no caminho...
— Pensava em muitas coisas, inclusive em como iria lhe contar tudo — explicou
quando interrompeu um beijo. — Mas eu me tornava mais encantado com você com o passar
das horas, e não queria arruinar aquela que parecia ser a noite perfeita. Logo você falou em
lavar a louça e voltar para casa, e eu soube que não poderia adiar por mais tempo.
— Mas você adiou — Whitney falou gentilmente.
Agora ela era capaz de sentir as coisas como tinham acontecido.
— Não era o que eu queria fazer — ele revelou. Desejava você em minha casa, e
essa foi a única razão pela qual concordei em lavar a louça. — Ele a beijava continuamente.
— O resto você já sabe — murmurou. — Foi errado fazer amor com você antes que tudo
estivesse esclarecido. Mas a situação estava fora de meu controle. Eu não podia pensar e ter
você em meus braços era enviar todos os pensamentos lógicos para longe!
Gentilmente, Whitney encontrou os lábios de Sloan e beijou-o.
— Estou perdoado?
— Você sabe que sim — ela murmurou, mas ainda queria saber: — Por que você me
deixou acordar sozinha naquela casa enorme?
— Oh, querida! Você deve ter ficado tão magoada? E eu não queria que você se
magoasse de modo algum. Nós havíamos feito amor ao amanhecer e você adormecera
novamente. Parecia tão bonita dormindo quanto acordada. — Ele a olhava com admiração e
ternura. — Desejei acordar você, mas alguma coisa me impediu. Por minha causa, por nosso
amor, você estava exausta. Achei que deveria descansar. Calculando que você não fosse
acordar por algumas horas, tive a idéia maluca de sair e voltar com uma rosa vermelha!
— Você foi procurar uma rosa vermelha?
— Queria que você despertasse e encontrasse uma rosa vermelha no travesseiro a seu
lado. Queria estar lá para ver se você daria aquele sorriso cálido que dera pouco antes. E, se
você sorrisse, eu falaria do meu amor e pediria para você casar comigo.
— Você ia pedir... Oh, Sloan querido! — ela se afligia.
— Está tudo bem agora — ele a acalmou.
— Mas eu magoei você...
— Como mereci ser magoado — concordou. — Levou algum tempo até que eu
encontrasse a rosa. Fiquei arrasado quando, na ponta dos pés, entrei em meu quarto e não vi
você. E no travesseiro onde eu pretendia colocar a rosa estava escrito...
— Oh, como você vai me perdoar? — Whitney atormentava-se.
— Facilmente, meu amor. Assim... — e a beijou com paixão. Explicou que saíra de
carro para procurá-la, mas mudou de idéia. — Fui tomado por um sentimento que não
conhecia: o medo de que você me rejeitasse mais rapidamente. Você escreveu que nunca me
perdoaria...
— Posso ter me lamentado quando a sra. Orton contou-me aquelas coisas. Mas eu
me entreguei a você consciente, por amor!
— Querida Whitney — ele respirou fundo e depositou beijos sobre seus olhos. —
Deus sabe onde estive o resto daquele dia, porque eu não faço a mínima idéia. No dia
seguinte, eu lhe enviei a gravura que você havia gostado muito, esperando estabelecer algum
contato. Porém, quando a recebi de volta, toda cortada...
— Como lamento isso! — ela murmurou. — Você havia realmente adquirido aquele
quadro algum tempo atrás?
— Sim, meu amor. Você estava tão excitada, os olhos verdes brilhavam tanto que no
dia seguinte voltei à galeria para comprá-lo. Foi a primeira vez na minha vida que percebi que
meu coração disparava.
Ela não duvidava mais de sua sinceridade.
— Não queria admitir que tinha me apaixonado por você naquela noite porque não
estava pronto para me envolver de novo.
— E agora você está?
— Você me faz suar muito, minha jovem — ele falou entre severo e gozador. — E
não faz idéia de quantas vezes eu me aproximei do telefone para chamá-la quando a gravura
voltou. Mas não suportaria ouvir "eu odeio você — Fez uma pausa, mas logo continuou: —
Então fui ao exterior a negócios. Tão longe e tão infeliz que compreendi que não poderia
viver mais um mês como aquele. Tinha de fazer alguma coisa.
— Então me telefonou quando voltou à Inglaterra — Whitney recordou, adorando o
conforto daqueles braços musculosos.
— Sim, porém antes telefonei para minha mãe no navio, pedindo que viesse
urgentemente a Londres.
— O quê? — Whitney se espantou. — E por quê?
— Precisava de um motivo para entrar em contato com você. Um motivo que não
fizesse você desligar o telefone assim que soubesse quem era. Então ensaiei as palavras:
minha mãe está em Heathlands e quer conhecer você. E disquei seu número.
Os olhos de Whitney estavam arregalados e ele continuou:
— Mas logo que ouvi sua voz tão seca, esqueci tudo. Com o coração palpitando, não
me lembrei de nenhuma palavra que havia estudado. Inconscientemente, a razão me ordenava
que não mentisse mais. Então perguntei o que era mais importante, se você já havia me
perdoado. E sua resposta, meu amor, deixou-me chocadíssimo. — Parou e tomou fôlego. —
Você falou qualquer coisa como indesejado sobre o nosso bebê. Fiquei louco, imaginando que
você quisesse fazer um aborto. Eu precisava vê-la rapidamente, ou minha única chance de
convencê-la a se casar comigo estaria perdida.
— Oh, meu amor! — Whitney sentiu lágrimas de emoção surgirem em seus olhos.
— Você não precisa casar comigo...
— Por favor, não comece a provocar pesadelos outra vez — ele avisou severamente.
Apenas prometa que você se casará comigo tão logo eu consiga uma licença especial.
Prometa-me — insistiu, quando ela não respondeu imediatamente.
— Se você quer assim, meu amor. Prometo solenemente que... — Sorriu,
simplesmente porque Sloan sorria também.
— Agora me beije — ordenou.
— Espero que depois de nos casarmos você não seja tão autoritário como agora —
ela falou carinhosamente.
— Você sabe que eu estarei em suas mãos — Sloan murmurou, e exigiu seus lábios.

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