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Introdução
De Homero a Aristóxeno e os teóricos alexandrinos, o termo
harmonía veio a ser empregado basicamente em três esferas de atividade: 1) na
maçonaria e carpintaria as harmoníai eram “presilhas” ou “encaixes”, 2) na
poesia e/ou filosofia, Harmonia/ harmonía era uma Deusa, personificação ou
força, 3) na terminologia musical, harmoníai eram as antigas “escalas” e, mais
tarde, o sistema de escalas.2 Esses significados se acumularam e, após certo
período, passaram a coexistir.
A deusa Harmonia (em Hesíodo e no Hino Homérico a Apolo) e a
harmonía mais material da carpintaria e da maçonaria representam desenvolvi-
mentos paralelos, enquanto os musicólogos, conforme um procedimento que
se observa nos primeiros teóricos, emprestaram o termo técnico dos artesãos.
Primeiro, as harmoníai musicais denominavam o conjunto de notas que de fato
ocorria em uma determinada melodia e, posteriormente, as possibilidades te-
óricas (escalas) – não mais registrando as notas que realmente eram tocadas em
canções específicas.
Não é raro que uma palavra possua, em grego ou em qualquer ou-
tra língua, significados abstratos e concretos (lato senso). E se, no caso de
harmonía, há pelo menos quatro séculos entre a ocorrência do termo com o
sentido de “presilha” ou “encaixe” maçônico e o sistema de escalas musicais,
isso não significa que houve, necessariamente, um desenvolvimento do conceito,
do mais concreto ao abstrato.
1
Este texto é a tradução de minha dissertação de mestrado: Harmoniai and Nomoi (MA in Classical Studies,
RHBNC, University of London, 1987), com algumas alterações e o acréscimo da introdução.
2
Cf. infra e, para a abstração do sistema de escalas de Aristóxeno, SZABÓ, 1977, p. 122-123.
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3
As dificuldades de tal perspectiva e das teorias que postulam a evolução, na Grécia antiga, do primitivo ao mais
civilizado, a “descoberta do espírito” e de outras instituições sociais e políticas no breve período que separa
Homero dos líricos arcaicos, já foram devidamente criticadas por LLOYD-JONES, 1971, p. 168, 207, 306,
FOWLER, 1987, p. 4-13 e CORRÊA, 1998. Talvez um dos maiores equívocos do método – dada a escassez de
material remanescente – seja afirmar que um conceito não existia em determinada época caso não se encontre
nos textos do período uma palavra que o expresse.
4
Cf. WEST, 1966, p. 40 ss.
5 2
Cf. KIRK, RAVEN & SCHOFIELD, 1983 , p. 181, 182, 280, 281.
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8
Cf. BURKERT, 1985, p. 184-5, para antropomorfismo e personificação, e RAMNOUX, 1983, p. 112, que julga
que, nas personificações, são usados nomes tradicionais para novos conceitos: “Il devient loisible de faire
‘correspondre’ aux catégories des noms divins: un Eros ou une Philia pour rassembler; un Neikos ou un Polémos
pour diviser. Que de divinités ‘abstraits’ ont été ainsi enfantées!”.
9
Cf. BOLLACK, 1969, III.1, p. 134 e KIRK, 1983, p. 295.
10
RAMNOUX, 1983, p. 158-9.
11
RAMNOUX, 1983, p. 161.
12
BOLLACK, 1969, III.2, p. 388.
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nomeu=si de\ ou)de\n cre/wntai e)/swqen de\ ta\j a(rmoni/aj e)n w)=n e)pa/ktwsan th|=
bu/blw|.
20
“Não usam vigas mas, por dentro, calafetam as junções com papiro.”
20
Harmonía se emprega mais tarde com esse mesmo sentido de “junção” também com referência a outras es-
truturas, tal como a do corpo humano (cf. LSJ).
21
CHANTRAINE, 1968. v. 2.
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22
JOUAN, 1980, p. 113-22.
23
Teogonia (935-36): deinou/j, oi(t/ ) a)ndrw=n pukina\j klone/ousi fa/laggaj e)n pole/mw| kruo/enti su\n A /) rhi
ptolipo/rqw|.
24
Em Tirteu (fr. 10.15-16W) e na Ilíada (13.124-33), as fileiras são tão compactas que nem Ares é capaz de penetrá-las.
25
Cf. JOUAN, 1980, p. 121 e DUCHEMIN, 1980, p. 1-14.
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(Philía e Neíkos) da Física. Os nomes para o amor na Física são Philótes, Afrodite,
Kýpris e Gethosýne.26 A Harmonia do fr. 27, que mantém o sol imóvel e uno, é
ainda um princípio de coesão, enquanto Neíkos, o princípio oposto e com-
plementar de separação, é descrito como sendo “destruidor, pernicioso e furi-
oso” (ouloménos, lygrós, mainoménos).27
A união de fogo, terra, água e ar no fr. 96 de Empédocles é obra de
Harmonia. Simplício, a fonte do fragmento, comenta que Harmonia é outro
nome para Philía, “a artesã das coisas vivas e de suas partes”. A artesã que
vemos trabalhar em outros fragmentos é Afrodite,28 que combina os quatro
elementos para construir as formas e cores de compostos temporários (fr.
71): “[seres mortais]: todas as coisas que, tendo sido compostas (synarmosthénta)
por Afrodite, agora existem.”29 Wright30 observa que o particípio synarmosthénta
“reforça a noção de que não se trata de uma mistura, mas de um ajuste das partes
para fazer o todo”. O mesmo vale para o fragmento 23 onde não se trata de uma
“mistura” de cores a fim de se obter, com harmonía, diversas tonalidades, mas de
uma justaposição de cores diferentes.31
3. Harmonía em Heráclito
Se, em Empédocles, Harmonia já não é mais deusa nem heroína,
(pois não recebe culto, não possui genealogia, nem localização precisa), em
Heráclito, ela nem sequer é personificada. Trata-se, segundo Jouan32, de uma
noção abstrata. Harmonía encontra-se em dois fragmentos de Heráclito com o
significado original de “conexão”, “ligadura”. Mas, no fragmento 54, se faz
uma distinção entre a harmonía aparente e a não-aparente:
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mas pela pronúncia, cujas sutilezas os acentos escritos são incapazes de regis-
trar”.37 O ritmo baseava-se na quantidade silábica natural, sendo que a dife-
rença entre a duração da nota (ou notas) conferida às sílabas longas e às bre-
ves era geralmente o dobro.38
Uma tripartição de dialetos e de práticas musicais já havia se desen-
volvido, por volta do século VIII a. C., em três tradições distintas: a eólica na
Tessália, Beócia e na ilha de Lesbos, a dórica no Peloponeso e a jônica na
Ática e na Jônia.39 Afinações específicas também parecem ter variado regional-
mente, contribuindo para a caracterização dos “estilos musicais” aos quais os
poetas fazem alusão.
Os poetas mais antigos não mencionam os seus processos de afina-
ção. Mesmo quando entravam em contato com outras melodias e aprendiam
as afinações diferentes e exóticas, necessárias para a reprodução das canções,
eles não faziam referência a escalas abstratas, mas à melodia particular que era
cantada. Quando Álcman disse (fr. 126PMG):
37
WINNINGTON-INGRAM, 1955, p. 64. Na poesia estrófica, porém, a melodia não acompanharia os acentos
e, como grande parte da poesia era estrófica até o século V a. C., isso limitaria a importância dos acentos às
melodias da poesia épica.
38
Em certos ritmos, uma sílaba longa poderia equivaler a três breves. Cf. WEST, 1982, p. 22.
39
WEST, 1973, p. 78-87.
40
Cerbésio é o nome de uma tribo que Estrabão (12.8.21) não consegue identificar. É possível que fosse também
o nome de um nómos aulético para uma divindade ctônica (cf. infra).
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5. Laso de Hermíone
É significante que a primeira ocorrência do termo harmonía entre os
músicos encontre-se em Laso de Hermíone que, de acordo com o léxico Suda,
“foi o primeiro a escrever sobre a música”. Além de ser considerado o primei-
ro teórico, Laso teria sido também o primeiro a tornar o ditirambo competitivo
(Suda s.v.), o que pode estar associado à instituição do ditirambo nos festivais
dionisíacos de Atenas.44 Pseudo-Plutarco atribuiu a Laso inovações no ritmo e
na melodia do ditirambo (De Mus. 1141c):
La=soj de\ o/( (Ermioneu\j ei)j th\n diqurambikh\n a)gwgh\n metasth/saj tou\j
r(uqmou/j, kai\ th|= tw=n au)lw=n polufwni/a| katakoluqh/saj, plei/osi te fqo/ggoij
kai\ dierrimme/noij crhsa/menoj, ei)j meta/qesin th\n proupa/rcousan h)g/ agen
mousikh/n.
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45
Estas hipóteses encontram-se respectivamente em PICKARD-CAMBRIDGE, 1962, p. 19, BARKER, 1984, p.
235-236 e EINARSON DE LACY, 1956, p. 419.
46
Cf. MACRAN, 1902, p. 226.
47
BURKERT, 1972, p. 378.
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ti/ e)sti to\ e)n Delfoi=j mantei=on; tetraktu/j. o(/per e)sti\n h( a(rmoni/a, e)n h(=| ai(
Seirh=nej.
6. Harmonia e os pitagóricos
Akýsmata, ou sýmbola, eram máximas que Pitágoras, baseando-se
em antigos conceitos e ordenanças cultuais, teria transmitido oralmente aos
seus discípulos. No sýmbolon citado acima, o Tetraktýs (a tétrade sagrada) são
os números 1, 2, 3 e 4 que formam o “triângulo perfeito” que possui quatro
unidades de cada lado e cuja soma é dez:
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.
. .
. . .
. . . .
189
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19.15), “nos tempos antigos, os próprios homens livres participavam dos co-
ros e era difícil para um grupo grande cantar de maneira competitiva, portan-
to, eles cantavam as canções em uma só harmonia”. Provavelmente, o mesmo
se aplica ao coro de meninas de Álcman.50
A “harmonia das esferas” da República (617a-d) de Platão não requer
uma explicação musical tão difícil: sentadas sobre as esferas que giravam em fre-
qüências diferentes, cada uma das oito Sirenas emitia uma nota e, juntas, elas
formavam uma oitava: “e de todas oito, em uníssono, uma só harmonía soava”.
Muito pouco restou do fragmento 70LP de Safo mas, assim como
em Álcman, Pitágoras, Platão, e no Hino Homérico a Apolo, os coros de Musas,
Sirenas ou Plêiades cantam em uma só harmonía, e Harmonia geralmente se
encontra no contexto de um coro:
...]n d ) ei)m
= ) e[.........] a(rmoni/aj d[..........polug]a/qhn co/ron, a)/ a [...........] de li/
gha.[
50
Cf. ANDERSON, 1966, p. 22, n.23 e WEST, 1967, p. 14: “Alcman’s lyre only provided the accompaniment, the
more important element in his music was the singing of the choir (...). It is the choir that represents itself in
our Parthenion as singing not quite as well as the Sirens. They strive after the eleven divine tones (...).”
51
Cf. WINNINGTON-INGRAM, 1963, p. 60.
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utilizado, mas fornece uma base racionalista para classificá-las segundo o seu
éthos, que era o que lhe interessava. Por exemplo, Heraclides revela forte pre-
conceito com relação ao caráter dos eólicos (“insolentes, arrogantes, intrépi-
dos e orgulhosos”), que ele transfere para a harmonía eólica, citando Pratinas
(cf. fr. 712bPMG infra) como confirmação de seu julgamento (Ath. Deipn.
624e-625).
As antigas harmoníai exibiam preferências por determinadas gamas
tonais às quais as melodias se restringiam. Até a época de Laso, pelo menos,
elas eram associadas a um tom característico (tessitura). Mais tarde, com a
sistematização dos teóricos e os aperfeiçoamentos técnicos que aumentaram
a gama dos instrumentos, era possível tocá-las em tons diferentes, e a modu-
lação entrou em voga nas performances de solistas. Esse fato está possivel-
mente relacionado à expansão das harmoníai (hýpo-/hýper-) e à alteração da
nomenclatura das mais antigas.52
As conotações “éticas” convencionais de uma harmonía deviam ser
afetadas quando o tom tradicional não era observado pois, embora não fosse
o único, o tom era um elemento importante para a sua caracterização. Laso
qualificou a harmonía eólica como sendo barýbromos (fr. 702PMG):
52
Cf. HENDERSON, 1942, p. 93-103, e WINNINGTON-INGRAM, 1963, p. 12-16: segundo Riemann os modos
hýpo-/hýper seriam, respectivamente, uma quinta acima e abaixo de suas oitavas fundamentais enquanto, para
Laloy, a mudança de nomenclatura teria ocorrido em um periodo no qual o crescente uso da modulação tendia
a eliminar os modos individuais por meio de sua fusão. WINNINGTON-INGRAM, 1963, p. 13, afirma que
havia certamente algum motivo para tais mudanças, mas que “este estágio da transição na nomenclatura das
escalas gregas está envolto de mistério”. Um exemplo é a citação de Laso por Ateneu (Deipn. 624d-625a), que
considera a harmonía eólica como equivalente à hipodórica.
53
A Moça (Ko/rh) é Perséfone e o Célebre (Klu/menoj), um eufemismo para Hades.
54
EDMONDS, 1928, HENDERSON, 1942, p. 99 e WEST, 1981, p. 126.
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pa=sa ga\r bakce/ia kai\ pa=sa h (toiau/th ki/nhsij ma/lista tw=n o)rga/nwn
e)sti\n e)n toi=j au)loi=j, tw=n d ) a(rmoniw=n e)n toi=j frugisti\ me/lesi lamba/nei
tau=ta to\ pre/pon, oi(=on o( diqu/ramboj o(mologoume/nwj ei)=nai dokei= Fru/gion,
kai\ tou/tou polla\ paradei/gmata le/gousin.
b) Pratinas
Em vista disso, como teria Aristóteles classificado a canção de
Pratinas (fr. 708PMG)? Ateneu (Deipn. 617b-f) define-a como sendo um
hiporquema, mas não é claro o que isto seja. De qualquer maneira, assim
como o fragmento de Laso, os versos de Pratinas seriam necessariamente
incluídos na categoria de “todo frenesi báquico”. Não é, porém, admissível
que a prática de Pratinas fosse julgada simplesmente “imprópria” ou “inade-
57
Para a associação desses instrumentos a Dioniso e Deméter, veja também as Bacantes (55-63, 120-34, 151-67), o
Ciclope (63-70, 203-5), Helena (1308-14, 1358-65) e os Heráclidas (777-851) de Eurípides.
58
PICKARD-CAMBRIDGE, 1962, p. 14-15.
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quada”, como a de muitos inovadores dos séculos V-IV a. C., pois o seu pro-
testo (“que barulho é este?”) é conservador e coincide com uma das maiores
críticas feitas por Platão e Aristóteles aos músicos de seu tempo: a inversão da
antiga supremacia da letra sobre a música (Pratinas fr. 708.3-7PMG):59
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b) pre/pei
pa=sin a)oidolabra/ktaij
Ai)oli\j a(rmoni/a.
b) “Convém a todos,
que em canções se vangloriam,
a harmonía eólica.”
64
Para GULLICK, 1951, p. 369, as duas harmonías “extremas” seriam a dórica “tensa” (sýntonos) e a jônia “relaxada”
(epaneiméne), ao passo que a eólica seria a harmonía intermediária. ANDERSON, 1966, p. 48, aponta para o fato
de que, mais tarde, a harmonía eólica foi chamada de “hipodórica” e a iástia, de “hipofrígia”, e ele sugere que a
harmonía “tensa” poderia ser a mixolídia (uma das harmoníai “tensas”). Segundo Laloy (in ANDERSON, 1966,
p. 277), a comparação não seria de tom (“grave”/”agudo”) mas, a seu ver, “epaneiméne, sýntonos, e khalará” seriam
termos referentes a uma alternância de intervalos.
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kai\ i(/na dh\ mh\ makrologi/a pollh/ tij gi/nhtai peri\ tau=q ) h(mi=n a(/panta,
a(plw=j e)/stw ta\ me\n a)reth=j e)co/mena yuch=j h)\ sw/matoj, ei)/te au)th=j ei)/te
tino\j ei)ko/noj, su/mpanta sch/mata/ te kai\ me/lh kala/, ta\ de\ kaki/aj au)=,
tou)nanti/on a(/pan.
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por uma série de razões, mas uma delas ilumina esta questão: quando a músi-
ca não tem letra, ela é difícil de ser julgada quanto ao seu caráter pelos juizes.65
Outros fatores que também devem ter contribuído para a caracterização das
harmoníai seriam a sua ocasião de performance (religiosa ou convival) e os precon-
ceitos étnicos que existiam acerca dos povos entre os quais determinadas
harmoníai eram mais praticadas, ou aos quais suas origens eram atribuídas. Por
exemplo, a prática musical dos espartanos do quinto século a. C. teria compar-
tilhado a sua reputação: severa, conservadora e viril.
Portanto, é possível que as harmoníai tenham adquirido um caráter
específico associadas:
1) ao conteúdo da composição literária;
2) aos “traços étnicos” convencionalmente atribuídos aos seus poe-
tas e músicos;
3) ao propósito ou à função da performance.
Para saber se as caracterizações das harmoníai encontradas nas obras
dos filósofos correspondem a uma prática real, corrente entre poetas e músi-
cos, estudaremos as odes pindáricas nas quais as harmonías empregadas são
mencionadas. Assim, poderemos averiguar, primeiro, se o uso de uma deter-
minada harmonía pelo poeta era puramente arbitrário, ou se seguia algum crité-
rio significativo de escolha. Por fim, se tais associações realmente existiam,
veremos se a caracterização das harmoníai feita por Píndaro era semelhante à
que encontramos na filosofia, isto é, se a caracterização dos teóricos espe-
lhava-se na prática.
a) A harmonía eólica
Píndaro faz referência à harmonía eólica em três de suas odes epiní-
cias - harmonía essa à qual Platão, curiosamente, não faz sequer menção. Não
se pode supor que Platão tenha classificado a harmonía eólica com a sinto-
nolídia, a mixolídia e as demais harmoníai semelhantes a essas porque ela não
era uma harmonía trenódica ou “enervada”. A harmonía eólica não pertenceria
tampouco ao grupo das harmoníai “afrouxadas” (Platão, Rep. 398e-399a). Nes-
se caso, a eólica deve ter sido formalmente semelhante à dórica.
65
A música instrumental exigia uma especialização (não permitindo a participação do cidadão comum como
integrante de um coro) e foram nestas competições que surgiram as primeiras inovações virtuosísticas. Um
outro motivo que pode ter dificultado o julgamento do éthos da música instrumental competitiva era o uso
freqüente que nela se fazia da modulação.
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pelo culto; na ilha, os ‘filhos de Aíaco’ permaneceram por muito tempo próxi-
mos ao altar do pai da tribo helênica, Zeus Helânio”.69
69
FARNELL, 1921, p. 310.
70
Aqui, porém, não se trata de um nómos aulético, mas citaródico, cantado ao acompanhamento de uma forminge
de sete cordas. Mas, como a ode de Píndaro não tem função militar, ela pode ter sido uma adaptação literária
do nómos original.
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“mas a dórica
forminge, do gancho,
toma”
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“a mim, coroá-lo
com o nómos hípio
em canção eólica,
é preciso.”
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b) A harmonía lídia
Na classificação das harmoníai feita por Platão, dois são os grupos
excluídos do currículo dos guardiães (Rep. 398e):
1) a mixolídia, a sintonolídia (= a lídia “tensa”), e todas as demais
harmoníai semelhantes “que nem servem para as mulheres”
2) a lídia e a frígia que são frouxas (khalaraí), suaves e convivais.
As harmoníai do primeiro grupo são classificadas como trenódicas e
lamentativas, as do segundo, como convivais, e essas últimas são excluídas
porque a embriaguez, a suavidade e o lazer não são próprios para os guardiães.
Pseudo-Plutarco tem por base essa passagem quando elabora uma
descrição das harmoníai, fazendo alusão aos seus mitos de origem (1136c-e):
“A lídia é aguda, própria para lamentações e, segundo Aristóxeno, o canto
fúnebre de Olimpo para o Pítio foi composto nessa harmonía”.74 Em seu Peã
12, Píndaro nos conta como a harmonía lídia foi ensinada pela primeira vez aos
gregos durante as bodas de Niobe. Filha de Tântalo e esposa de Anfião, Niobe
é freqüentemente representada na iconografia lamentando sobre suas crian-
ças mortas. Nos rituais fúnebres, o treno era geralmente executado por um
coro de mulheres que, arrancando os cabelos e rasgando as suas roupas, can-
tavam um refrão em resposta a um líder do coro que, por sua vez, cantava um
solo, como Andrômaca na Ilíada (24.719-76).75 Na versão de Pausânias (9.5.7),
Anfião, o músico lendário, ergueu a muralha de Tebas com sua música e apren-
deu de Tântalo, e dos próprios lídios, a harmonía lídia.76
Assim como Platão, Pseudo-Plutarco uniu a harmonía lídia “frouxa”
e dos simpósios à jônia, em oposição à mixolídia “tensa” pois, segundo ele,
74
Essa harmonía lídia deve corresponder à sintonolídia de Platão.
75
Ritos funerais e formas de lamentação violentos são habitualmente associados às práticas orientais. A música é
aguda (oksýs) e os modos são “tensos” (sýntonoi): o mixolídio, lídio e jônio tensos. Cf. ÉSQUILO, Pers. 935-40,
1038-77; Supp. 57-72, 112-16; Ag. 705-12; Ch. 423-28; SÓFOCLES, Aj. 624-34; EURÍPIDES, Hel. 164-90, Supp.
798-801.
76
Segundo Pausânias (loc. cit.), é Anfião quem cria a lira de sete cordas, adicionando três cordas à forminge de
quatro. Uma harmonía maçônica criada por uma harmonía musical é uma imagem interessante, presente também
nas Fenícias (vv. 821-25) de Eurípides: os deuses vêm para as bodas de Harmonia, e as muralhas de Tebas
erguem-se sozinhas ao som da lira de Anfião. Para outros mitos acerca da introdução do modo lídio na Grécia,
veja Ateneu (Deipn. 626a).
202
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essa lídia é grave. Aristóteles concorda com alguns musicólogos que critica-
ram o Sócrates da República (398e) por não ter admitido as harmoníai mais
“frouxas”: por causa de seus tons mais graves, as harmoníai “afrouxadas” são
próprias para os idosos que não são mais capazes de cantar nas harmoníai
“tensas” (agudas). Aristóteles também as julga próprias para as crianças, espe-
cialmente a lídia (Pol. 1342):
h(/ pre/pei tV= tw=n pai/dwn h(liki/v dia\ to\ du/nasqai ko/smon t ) e)/cein a(/ma kai\
paideia/n, oi(=on h( ludisti\ fai/netai peponqe/nai ma/lista tw=n a(rmoniw=n.
Ludw|= ga\r A
) sw/picon tro/pw|
e)n mele/taij a)ei/dwn e)/molon
203
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e Eco é enviado ao Hades para dar as boas novas ao pai, para contar-lhe que
o menino “coroou seus cachos com as asas dos jogos gloriosos”.
Bowra77 afirma que nessa ode e na Oitava Ode Neméia “pode não
haver paixão, mas há certamente a emoção de um encanto cativante”. Com
certeza, as Graças (especialmente a Talia erasímolpe), como espectadoras, estão
mais do que encantadas com o coro de pés ligeiros (15-18).
77
BOWRA, 1964, p. 391.
78
FARNELL, 1932, p. 264.
204
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79
Para a imagem do amor que vem dos olhos, cf. Teogonia (910-11) e o comentário de West (1966: 409-10).
205
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do caráter da harmonía lídia, quanto ao fato das harmoníai poderem ser apropri-
adas a idades diferentes. Para cantar a vitória desses meninos, Píndaro uniu a
harmonía lídia ao tom alegre e jovial das odes.80 Um outro fator também pode
estar relacionado à escolha dessa harmonía: a Décima-Quarta Ode Olímpica e a
Quarta Ode Neméia são consideradas odes processionais e formalmente seme-
lhantes.81 Portanto, nessas duas odes não apenas o destinatário, mas também a
performance pode ter sido um elemento que contribuiu para a escolha da harmonía.
c) A harmonía dórica
Não há em Píndaro, pelo menos no que nos restou de sua obra,
nenhuma referência explícita à harmonía dórica.82 Mas, segundo um escólio à
Primeira Ode Olímpica (26g), aparentemente, o poeta a caracterizou com um dos
termos que, mais tarde, os teóricos do éthos musical usavam para descrevê-la:83
*
Raras são as indicações nos poemas antigos das harmoníai específi-
cas empregadas pelos poetas, e se, por um lado, os fatores que parecem deter-
80
A moda, em Lesbos e em Esparta do século VII a. C., eram os produtos lídios: “A riqueza e o luxo no vestir são
freqüentemente atribuídos aos lídios, cuja moda era imitada pelos jônios da Ásia Menor no tempo em que
Sardes era a capital do reino de Creso” (Pearson, 1917. p. 32). Essa reputação ou, pelo menos, a sua memória,
sobreviveu até os séculos VI-V a. C., cf. Xenófanes (Ath. Deipn. 526a), Ésquilo (fr. 59) e Sófocles (fr. 45). Por
meio da imagem, Píndaro sugere que sua ode (N. 8) seja comparável a tais produtos.
81
Cf. FARNELL, 1932, p. 263-264. Não é certo, porém, que a Oitava Ode Neméia seja de fato uma ode neméia.
82
Cf. a discussão sobre a “lira dórica” na Primeira Ode Olímpica (17) supra.
83
Em outros poemas, Píndaro refere-se a um ritmo dórico (Ol. 3. 5) e a um “caminho dórico de hinos” (fr. 191:
Ai)oleu\j e)b/ aine Dwri/an ke/leuqon u(m
/ nwn). Nesse último caso, a referência é bastante vaga, a alusão podendo
ser tanto a um estilo musical, a uma melodia, à harmonía, ou ao ritmo dórico. Para os teóricos, cf. PSEUDO-
PLUTARCO, 1136f, segundo o qual uma das razões pelas quais Platão preferia a harmonía dórica era por nela
haver uma gravidade nobre (polu\ to\ semno/n e)n tV= Dwristi/).
206
PAULA DA CUNHA CORRÊA
minar a opção de Píndaro pelas harmoníai nas odes sejam vários,84 vimos como
ele atribuiu a cada um caráter convencional que, pelo menos nos casos exami-
nados, foi compartilhado pelos teóricos posteriores.
Embora esse levantamento ofereça uma amostragem de algumas
maneiras com que Píndaro (e outros poetas) pode ter trabalhado as conotações
das harmoníai musicais em suas composições, não há, evidentemente, como
traçar as origens dessas caracterizações. Se Píndaro contribuiu para a elabora-
ção dessas convenções, ele não foi o primeiro a fazê-lo. Algumas já haviam
sido estabelecidas e eram correntes entre poetas do sexto século a. C.
Portanto, embora não se saiba ao certo como e quando os caracteres
convencionais das harmoníai foram criados, é interessante que as primeiras
evidências de sua existência encontrem-se entre poetas da tradição dórica, do
Peloponeso e das colônias dóricas do oeste: Pratinas, Laso e Píndaro. É pro-
vável que a prática desses poetas/músicos tenha sido divulgada e, posterior-
mente, formalizada (talvez um pouco alterada) pelos teóricos interessados na
paidéia musical.
9. A paidéia musical
Segundo Platão (Rep. 399a), a harmonía dórica admitida por ele na
paidéia dos guardiães, “imita as expressões de homens valentes, empenhados
na guerra ou em ações forçadas” (biaía ergasía). Ela engendra a sobriedade:
jovens educados com uma dose certa de ginástica e dessa “música simples”
serão sóbrios e valentes, obedecerão às leis e não cometerão atos injustos
(Platão Rep. 410a).
Todos, de acordo com Aristóteles (Pol. 1342b), concordavam que a
harmonía dórica era, quanto a seu caráter, a mais estável (stasimotáte), viril
(andreîon) e, formalmente, uma harmonía intermediária.85 Em Ateneu (Deipn.
624d), Heraclides afirma que a harmonía dórica não é relaxada nem alegre,
mas severa e violenta; não é variada (poikílos) nem de muitos torneios (polýtropos),
mas viril (andródes) e magnífica (megaloprépes). Pseudo-Plutarco (1136e-f) julga
que Platão incluiu a harmonía dórica em sua paidéia ideal por ela ser solene e
84
As harmoníai podem estar relacionadas ao conteúdo narrativo, ser dependentes da escolha do nómos, ou adequadas
ao destinatário ou, ainda, à ocasião e à forma de performance.
85
Além de ocupar a posição central no Sistema Perfeito de Aristóxeno, a harmonía dórica foi eleita como sendo a
harmonía “padrão”. Isto é, todos os tónoi do Sistema Perfeito repetiam o mesmo padrão de intervalos (a estrutura
da harmonía dórica) em tons diferentes. Cf. WINNINGTON-INGRAM, 1963, p. 78 e BARKER, 1984, p. 168.
207
HARMONIA: M I TO E MÚSICA N A GRÉCIA ANTIGA
o( d ) e)n tV= Politei/v Swkra/thj ou) kalw=j th\n frugisti\ mo/nhn katalei/pei
meta\ th=j dwristi/, kai\ tau=ta a)podokima/saj tw=n o)rga/nwn to\n au)lo/n. e)/cei
ga\r th\n du/namin h( frugisti\ tw=n a(rmoniw=n h(/nper au)lo\j e)n toi=j o)rga/noij.
a)/mfw ga\r o)rgiastika\ kai\ paqhtika/. dhloi= d ) h( poi/hsij.
86
PSEUDO-PLUTARCO, 1136e-f: th\n Dwristi\ w(j polemikoi=j a)ndra/sin kai\ sw/frosin a(rmo/zousan.
87
Cf. ANDERSON, 1966, p. 107 e BARKER, 1984, p. 168.
88
Embora sempre fosse possível tocar outras harmoníai reafinando a lira ou a cítara, era obviamente mais fácil
modular em instrumentos pan-harmônicos.
89
Cf. ANDERSON, 1966, p. 107-108 e BARKER, 1984, p. 168.
208
PAULA DA CUNHA CORRÊA
e)/sti de\ a)mfote/roij me\n a)mfo/tera a)na/gkh kateco/mena a)podido/nai, [ta\ de\
tw=n qhleiw=n] au)tw|= tw|= th=j fu/sewj e(kate/rou diafe/ronti, <ta\ de\ tw=n
qhleiw=n> tou/tw| dei= kai\ diasafei=n. to\ dh\ megaloprepe\j ou)=n kai\ to\ pro\j
th\n a)ndrei/an r(e/pon a)rrenwpo\n fate/on ei)=nai, to\ de\ pro\j ko/smion kai\
sw=fron ma=llon a)pokli=non qhlugene/steron w(j o)\n paradote/on e)/n te tw|=
no/mw| kai\ lo/gw|.
209
HARMONIA: M I TO E MÚSICA N A GRÉCIA ANTIGA
temperança, deve ser aceito como feminino, tanto em lei, quanto em discurso.”
e)n gou=n ta=ij u(p “ au)tou= paradedome/naij tw=n ferome/nwn fqo/ggwn o(te\ me\n
tou\j qh/leij, o(te\ de\ tou\j a)/rrenaj e)/stin eu(rei=n h)/toi pleona/zontaj h)\ e)p “ e)/
latton h)\ ou)d) o(/lwj pareilhme/nouj, dh=lon w(j kata\ to\ h)=qoj yuch=j e(ka/sthj
kai\ a(rmoni/aj crhsimenou/shj.
210
PAULA DA CUNHA CORRÊA
“Tal homem parece-me ser o músico perfeito: não o que afina a lira ou um
instrumento infantil na mais bela harmonía, mas aquele que realmente afina a
sua própria vida, as palavras em sinfonia com os atos, apenas na harmonía
dórica: não na jônia, nem na frígia ou na lídia, mas na única harmonía que é
92
helênica”.
Laques (189b) declara que odeia travar discussões com homens afina-
dos na harmonía contrária e que só permite que Sócrates fale porque ele já
havia dado provas anteriores de sua coragem. Quando pedem-lhe que defina
a coragem, Laques (190e) crê que seja algo muito simples, mas acaba repro-
duzindo uma velha fórmula. Laques (191-6) nem consegue seguir os argu-
mentos de Sócrates e, portanto, para dar continuidade ao diálogo, Sócrates
recorre a Nícias (197b), um general mais equilibrado e ágil, que afirma ser
temeridade o que Laques definiu como coragem. Pois Nícias havia sido edu-
cado por Dámon, professor também de seu filho e que, a seu ver (180d)
a)ndrw=n carie/staton ou) mo/non th\n mousikh/n, a)lla\ kai\ t ) a)lla o(po/sou bou/lei
a)/xion sundiatri/bein thlikou/toij neani/skoij.
91
Essas últimas duas práticas são, justamente, as de homens em tempo de paz (PLATÃO, Rep., 399a-d).
92
É interessante que o argumento de Láques, que recusa as demais harmoníai (a jônica, a lídia e a frígia) por não
serem “gregas”, coincide com a definição das harmoníai feita por Heraclides (Ath. Deip. 624d) - noção com a
qual Platão, obviamente, não concordaria.
211
HARMONIA: M I TO E MÚSICA N A GRÉCIA ANTIGA
212
PAULA DA CUNHA CORRÊA
w(j h( me\n a(rmoni/a a)o/rtaton kai\ a)sw/maton kai\ pa/gkalo/n ti kai\ qei=o/n
e)stin e)n tV= h(rmosme/nV lu/rv.
“como a harmonía, é invisível, incorpórea, algo muito belo e divino que existe
na lira harmonizada”,
ao passo que a lira e suas cordas são comparadas aos corpos mortais.
A concepção da alma como uma harmonía e do corpo como o ins-
trumento é muito antiga e um dos fundamentos do éthos musical. Macróbio a
atribuiu a Pitágoras e Filolau e, embora isto possa ser uma inferência a partir
do Fédon, Símias foi discípulo de Filolau (Fédon 61d-e) e tem sido considerado
um dos matemáticos pitagóricos.96 Sócrates (Fédon 86c), porém, faz objeção a
esta comparação da alma com uma harmonía, porque ela entra em conflito
com a sua crença na imortalidade e na transmigração da alma
95
Cf. GOMME, 1956, II, p. 298 e MURRAY, 1933, p. 48.
96
BURKERT, 1972, p. 92, 198, 272.
213
HARMONIA: M I TO E MÚSICA N A GRÉCIA ANTIGA
a(rmoni/a, dh=lon o(/ti, o(/tan calasqV= to\ sw=ma h(mw=n a)me/triwj h)\ e)pitaqV=
u(po\ no/swn kai\ a)/llwn kakw=n, th\n me\n yuch\n a)na/gkh eu)qu\j u(pa/rcei
a)polwle/nai.
“Pois, se a alma é como uma harmonía, é evidente que, quando nosso corpo é
excessivamente relaxado ou distendido por doenças, ou por outros males, é
97
forçoso que a alma logo pereça.”
“Essa estende-se simplesmente por toda a cidade, fazendo com que todos
cantem em uníssono, os mais fracos, os mais fortes e os do meio”,
quanto pelas partes da alma tripartite, que harmonizam-se como as três notas
(ou cordas) básicas da oitava (Rep. 443d):
w(/sper o(/rouj trei=j a(rmoni/aj a)tecnw=j ne/athj te kai\ u(pa/thj kai\ me/shj,
kai\ t a)/lla a)/tta metaxu\ tugca/nei o)/nta.
97
Cf. Cavaleiros (531-33) de Aristófanes, onde Cratino é comparado a uma lira gasta pela idade.
98
O escoliasta interpretou essa harmonía como sendo formada a partir de duas oitavas – o que talvez fosse uma
tentativa de vê-la como a conjunção das harmoníai dórica e frígia. LEVIN, 1961, p. 305, identificou essas cordas
como a hýpathe hýpathon, mése e néthe diezdeugménon. No entanto, podem ser compreendidas simplesmente como
sendo as cordas básicas de uma lira de sete cordas:
hypáthe (parypáthe, likhános)
mése (tríthe, paranéthe)
néthe.
214
PAULA DA CUNHA CORRÊA
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