Sei sulla pagina 1di 93

1

FACULDADE VALE DO CRICARÉ MESTRADO PROFISSIONAL EM


CIÊNCIA, TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO

CRISTIANE BARRETO PEREIRA

O ENSINO DA EDUCAÇÃO FÍSICA EM UMA COMUNIDADE QUILOMBOLA:


NARRATIVAS, PRÁTICAS E SABERES

SÃO MATEUS
2020
2

CRISTIANE BARRETO PEREIRA

O ENSINO DA EDUCAÇÃO FÍSICA EM UMA COMUNIDADE QUILOMBOLA:


NARRATIVAS, PRÁTICAS E SABERES

Dissertação apresentada à Faculdade


Vale do Cricaré para obtenção do título de
Mestre em Ciência, Tecnologia e
Educação.

Orientadora: Profª. Drª. Juliana Martins


Cassani

SÃO MATEUS
2020
3

Dedico este trabalho à minha mãe, Nely de Carvalho Barreto, que sempre esteve ao
meu lado, dando todo o apoio que precisei, incondicionalmente. Uma mulher
dedicada, lutadora, lutou com toda sua força pra que eu e minha irmã sempre
fôssemos alguém na vida. Não mediu esforços para que nós duas estudássemos e
sempre colocou sabor nas nossas vidas.
4

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar quero agradecer a Deus por me dar força e coragem para seguir
sempre em frente.

Agradeço minha mãe maravilhosa, que sempre ficou ao meu lado nos piores e
melhores momentos da minha vida, Dona Nely de Carvalho Barreto.

Ao meu esposo, Jairo Alvarenga de Souza,.por sempre confiar em mim, me


ajudando e cuidando dos meus filhos, quando não estou por perto.

À minha filha, Janine Pereira de Souza, por ser amiga, por cuidar do seu irmão e
nunca me dar trabalho algum. Obrigada, filha maravilhosa!

Ao meu filho, Luiz Miguel Pereira de Souza, por ser um filho extraordinário. Sem
palavras para te agradecer. Você é um filho exemplar!

À minha irmã, Fabíula de Carvalho Barreto, por sempre estar ao meu lado, me
dando força e me apoiando no meu sucesso. Obrigada irmã, te amo!

À professora Juliana Martins Cassani, pessoa organizada, inteligente e, sobretudo,


humilde. A você, que me guiou até a conclusão do meu Mestrado, meu muito
obrigada. Você direcionou com sensatez e sabedoria minha jornada e sempre me
incentivou buscar mais e não desistir nunca de minha jornada.

Meus agradecimentos à Escola Jiboia, aos professores e, em especial, aos alunos


da EJA, pois foram excepcionais na minha pesquisa de campo.

Agradeço à prefeitura de Presidente Kennedy, à secretaria de Educação e ao


Prodes, que me proporcionaram concluir este Mestrado.

Agradeço à Comunidade Boa Esperança ao abrir as portas, ajudando na pesquisa


de campo.

Aos moradores, meus agradecimentos, pois a colaboração com as fotos, livros e


instrumentos da capoeira e do jongo foram essenciais para abrilhantar a pesquisa.

Em especial, agradeço toda minha família, pois a família é o pilar do nosso sucesso,
sobretudo, pois é com ela que podemos sempre contar!
5

“A educação é um processo social, é


desenvolvimento. Não é a preparação
para a vida, é a própria vida.”

(John Dewey)
6

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Lata d’água na cabeça.......................................................................... 53

Figura 2 – Soltando pipa, brincando de boneca e roda.......................................... 54

Figura 3 – Igreja Nossa Senhora das Neves.......................................................... 54

Figura 4 – Pulando corda e na praia....................................................................... 55

Figura 5 – Lembranças de Elza – fogão de barro................................................... 55

Figura 6 – Galopando no pangaré.......................................................................... 56

Figura 7 – Carlinhos e suas contações de história................................................. 57

Figura 8 – Saudades dos velhos tempos (I)........................................................... 57

Figura 9 – Tereza puxando o cavalo...................................................................... 58

Figura 10 – Jogando bola (jogo de futebol)............................................................ 59

Figura 11 - Saudades dos velhos tempos (II)......................................................... 59

Figura 12 – Carlinhos pulando fogueira.................................................................. 59

Figura 13 – Festa junina – quadrilha caipira........................................................... 59

Figura 14 – Jogando futebol com os vizinhos......................................................... 60

Figura 15 – Brincando de pique-esconde............................................................... 60

Figura 16 - Brincando de.malha............................................................................. 60

Figura 17 - Brincando de.pula corda...................................................................... 61

Figura 18 – Carlinhos aos oito anos no forró (casa de estuque)............................ 61

Figura 19 – Maria retratando o jongo (I)................................................................. 62

Figura 20 - Maria retratando o jongo (II)................................................................. 62

Figura 21 – Representação do jongo – alunos da EJA.......................................... 63

Figura 22 – Painel com fotografias antigas............................................................. 63

Figura 23 – Alunos prestigiando a exposição fotográfica....................................... 63

Figura 24 – Alunas nas exposição de fotos........................................................... 63


7

Figura 25 – Fotografias e instrumentos.................................................................. 64

Figura 26 – Carlinhos batendo tambor................................................................... 64

Figura 27 – Roda de conversa............................................................................... 64

Figura 28 – Alunos conhecendo o portfólio............................................................ 65

Figura 29 – Expondo os livros aos alunos da EJA................................................. 65

Figura 30 – Resultado positivo: aluno feliz............................................................. 65

Figura 31 – Representação do jongo..................................................................... 66

Figura 32 – Alunos jongueiros na EMEFP “Jiboia”................................................. 66

Figura 33 – Alunos da EJA representando o jongo................................................ 66

Figura 34 – Alunos e alunas da EJA, instrumentos utilizados no jongo e painel.... 67


8

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Audiências realizadas no Brasil........................................................... 33

Quadro 2 – Distribuição de escolas quilombolas no Brasil..................................... 38


9

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AFE’s Atividades Físicas e Esportistas


CADARA Comissão Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos
Relacionados à Educação dos Afro-Brasileiros
CEB Câmara de Educação Básica
CEE/ES Conselho Estadual de Educação/Espírito Santo
CMEI Centro Municipal de Educação Infantil
CNE Conselho Nacional de Educação
CNE/CP Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno
CONAE Confederação Nacional de Educação
CONAQ Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras
Rurais Quilombolas
COOQUIBA Cooperativa Agrícola Familiar Quilombo de Batalha
EJA Educação para Jovens e Adultos
EMEF Escola Municipal de Ensino Fundamental
EMEFP Escola Municipal de Ensino Fundamental Pluridocente
EMEIEF Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental
EPG Escola de Primeiro Grau
FCP Fundação Cultural Palmares
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ID’s Identificador de Desenvolvimento do aluno
IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MEC Ministério da Educação
NEAB’s Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros
OIT Organização Internacional do Trabalho
PNE Plano Nacional Educacional
PPP Projeto Político Pedagógico
QUIPEA Quilombos no Projeto de Educação Ambiental
RT-ECV Relatório Técnico-Empresas Credenciadas de Vistorias
10

SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade


SEPPIR Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da
Presidência da República
UFES Universidade Federal do Espírito Santo
11

RESUMO

PEREIRA, Cristiane Barreto. O ensino da Educação Física em uma comunidade


quilombola: narrativas, práticas e saberes. 2020. 93 p. Dissertação (Mestrado
Profissional em Ciência, Tecnologia e Educação) - Faculdade Vale do Cricaré, São
Mateus – ES.

Esta pesquisa investiga o ensino da educação física numa comunidade quilombola


do município de Presidente Kennedy, relacionando-a às narrativas, práticas e
saberes, abordando uma pesquisa bibliográfica. Este estudo apresenta como
objetivo principal problematizar as práticas corporais no contexto da comunidade
quilombola Boa Esperança, considerando a existência de uma relação entre essa
comunidade e a disciplina de Educação Física na apropriação de cultura. Esta
pesquisa é de natureza qualitativa, onde dialoga-se com Geertz (1989), e se propõe
trabalhar com os significados das práticas corporais, pois respondem às
particularidades da cultura quilombola. Embora comunidade quilombola tenha sido
divulgada através de documentários e trabalhos acadêmicos, ainda não tem sido
pesquisada tendo como análise as práticas corporais nas aulas de Educação
Física. Para a realização desta investigação, optou-se por realizar um levantamento
bibliográfico do estado da arte sobre comunidades quilombolas na Educação
Física, com a finalidade de construir um embasamento teórico sobre o tema e de
conhecer as publicações sobre práticas corporais nas comunidades quilombolas.
Acredita-se que essa também se constitua como forma de fortalecimento da cultura
quilombola, identificando questões culturais, e possibilitando a repensar o papel
das escolas quilombolas enquanto lócus de continuidade e descontinuidade da
cultura.

Palavras-chave: Boa Esperança. Cultura. Identidade. Presidente Kennedy.


Quilombo.
12

ABSTRACT

PEREIRA, Cristiane Barreto. Physical Education teaching in a quilombola


community: narratives, practices and knowledge. 2020. 93 p. Dissertation
(Professional Master in Science, Technology and Education) - Faculdade Vale do
Cricaré, São Mateus - ES.

This research investigates the teaching of physical education in a quilombola


community in the municipality of Presidente Kennedy, relating it to narratives,
practices and knowledge, addressing a bibliographic research. This study has as
main objective to problematize the corporal practices in the context of the quilombola
community Boa Esperança, considering the existence of a relationship between this
community and the discipline of Physical Education in the appropriation of culture.
This research is of a qualitative nature, where it dialogues with Geertz (1989), and
proposes to work with the meanings of bodily practices, as they respond to the
particularities of quilombola culture. Although the quilombola community has been
disseminated through documentaries and academic works, it has not yet been
researched with the analysis of body practices in Physical Education classes. In
order to carry out this investigation, it was decided to carry out a bibliographic survey
of the state of the art on quilombola communities in Physical Education, in order to
build a theoretical foundation on the theme and to get to know the publications on
body practices in quilombola communities. It is believed that this is also a way of
strengthening quilombola culture, identifying cultural issues, and making it possible
to rethink the role of quilombola schools as a locus of continuity and discontinuity in
culture.

Keywords: Good Hope. Culture. Identity. President Kennedy. Quilombo.


13

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................14
2 COMUNIDADE QUILOMBOLA BOA ESPERANÇA E SUA RELAÇÃO COM A
EMEFP “JIBOIA” ..................................................................................................18
2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA ESCOLA PLURIDOCENTE JIBOIA......................20
2.2 APLICAÇÃO DA EJA EM PRESIDENTE KENNEDY........................................21
3 JOGOS E BRINCADEIRAS - PRÁTICAS CORPORAIS VIVENCIADAS NAS
COMUNIDADES QUILOMBOLAS........................................................................23
3.1 BRINCADEIRAS E JOGOS .............................................................................24
4 PARALELO ENTRE EDUCAÇÃO FÍSICA E EDUCAÇÃO QUILOMBOLA........25
4.1 PRÁTICAS CORPORAIS NA EDUCAÇÃO FÍSICA.........................................27
5 MARCOS LEGAIS PARA A EDUCAÇÃO QUILOMBOLA NA ELABORAÇÃO
DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS...............................................31
6 DIÁLOGOS COM A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE A EDUCAÇÃO
QUILOMBOLA.......................................................................................................40
7 REFERENCIAL TEÓRICO E METODOLÓGICO................................................46
7.1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS........................................................................47
8 INTERVENÇÃO EM FAVOR DA EDUCAÇÃO CULTURAL...............................50
8.1 ENTRADA NO CAMPO DA PESQUISA..........................................................50
8.1.1 CATEGORIA: INFÂNCIA...............................................................................51
8.1.2 CATEGORIA: JOGOS E BRINCADEIRAS....................................................57
8.1.3 CATEGORIA: DANÇAS – DESENHOS.........................................................61
8.2 EXPOSIÇÃO DOS DESENHOS E FOTOGRAFIAS.........................................62
9 DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS DADOS.............................................................68
9.1 DISCUSSÃO SOBRE ESTA PESQUISA..........................................................68
9.2 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS DURANTE A PESQUISA DE
CAMPO..................................................................................................................69
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................72
REFERÊNCIAS......................................................................................................75
APÊNDICES..........................................................................................................80
14

1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa compreende a cultura como patrimônio de um povo, uma


herança passada entre as gerações. Nesse sentido, um povo sem cultura é um
povo sem história, um povo sem história é um povo esquecido. Anular a história
de um povo é como aleijar, mutilar um corpo, tentar impossibilitar que o mesmo
siga adiante. Deste modo, ao colocarmos o foco desta pesquisa em uma
comunidade quilombola situada no Estado do Espírito Santo, reconhecemos a
necessidade de contextualizarmos historicamente uma sociedade, pois este
movimento nos permitirá conhecer o seu passado, por meio de fatos, narrativas,
realidades de outrora que implicam e reverberam nas configurações e modos de
subjetivação de determinados povos, simbolismos e papéis sociais
desempenhados em sociedades contemporâneas (HERNANDES, 2016).

Assim, damos visibilidade ao modo como essas comunidades se


construíram, no Brasil, compreendo-as em um contexto cultural mais amplo,
inseridas em uma sociedade marcada por uma cultura de escravidão, de injustiça
e sofrimento aos africanos, que deixaram em nossa história páginas escritas com
resistência e luta por liberdade (FIGUEREIDO, ET AL., 2017).

Sob uma perspectiva histórica, é preciso compreender que os negros que


fugiam dos senhores, durante o período colonial e imperial, se agrupavam em
espaços chamados de quilombos e eram esses locais que se configuravam
refúgios para aqueles que escapavam de engenhos e fazendas. Nesses locais,
os escravos passavam a viver em liberdade, criando novas relações sociais.
Muitos quilombos existiram no Brasil e centenas deles ainda existem, formando o
que hoje é chamado de comunidades quilombolas as quais "[...] vêm retomando
e transmitindo memórias, saberes e referências culturais, para demarcar modos
de vida comunitários em seus territórios" (OLIVEIRA, 2011, p. 142).

No cenário brasileiro e em outros países da América do Sul e da América


Central, ocorreram, em meados dos anos de 1980 e 1990, múltiplos processos
políticos que buscavam consciencializar e valorizar as culturas étnicas, o que
implicava na luta por direitos territoriais de povos de descendência indígena e
africana. Conforme Oliveira (2011), tais movimentos sociais se fizeram
necessários para garantir direitos de expressão cultural e também reconhecer,
15

nas esferas políticas e jurídicas, a existência de determinados agrupamentos


sociais e seus territórios, configurados por suas particularidades culturais.

Nesse contexto, é possível inferir que as comunidades quilombolas, no


Brasil, ainda têm enfrentado problemas no que se refere à obtenção de sua
autonomia, haja vista os interesses dos grandes empreendimentos econômicos
que sucederam os regimes escravocratas. Assim, a criação de políticas públicas
direcionadas a essas comunidades faz-se necessária para assegurar-lhes os
direitos constitucionais (saúde, moradia, trabalho e educação), mas sobretudo
para lançar-lhes um olhar minucioso, por meio do qual são reconhecidos os seus
simbolismos e os valores culturais (GOMES; RAINHA; HERNANDES, 2018).

É sob essa perspectiva que assumimos, fundamentados em Santos et al.


(2019), a educação quilombola como política de que impacta a sociedade tanto
em aspectos científicos como sociais, haja vista que ela reconhece as
especificidades dos grupos étnicos raciais existentes em nosso país, em um
movimento que valoriza as suas práticas culturais. Contudo, na conjuntura da
educação brasileira, percebe-se a necessidade em implementar e fortalecer
políticas públicas que tenham como público alvo as comunidades
remanescentes de quilombos, com o intuito de incluir a educação quilombola em
cada uma dessas comunidades existentes no Brasil.

Cabe-nos enfatizar que a implantação da Educação Escolar Quilombola


é uma conquista recente no campo da Educação Básica, garantida pela
Resolução nº 08, de 20 de novembro de 2012, a qual define as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação
Básica. Conforme o documento, a organização dessas instituições deve tomar
como referência, sobretudo, a memória coletiva das pessoas inseridas nessas
comunidades, as suas línguas reminiscentes (que se conservam na memória),
os seus marcos civilizatórios (conjunto de elementos materiais, intelectuais,
espirituais e artísticos característicos de uma sociedade) e as suas práticas
culturais (RODRIGUES; FONTES, 2018).

Diante desse contexto, compreendemos que a Educação Física


potencializa a cultura dessas comunidades quilombolas, valorizando as suas
especificidades em relação às práticas corporais, tais como danças, esportes,
jogos e brincadeiras que, de alguma forma, marcam as experiências das pessoas
16

que ali se encontram. Conforme sinalizam Silva; Falcão (2012), esse modo de
sistematizar o ensino da Educação Física não impede o docente de compartilhar
diferentes possibilidades de aprendizagem, mas, é necessário privilegiar práticas
pedagógicas que contribuam para o fortalecimento das culturas locais.

Nesse sentido, as diferentes práticas corporais são formas legítimas de


manifestação cultural dessas comunidades, cujo objetivo é proporcionar a sua
valorização étnica. Assim, experiências de ensino e de aprendizagem como as
folias, as danças (forró, catira), a capoeira, os jogos e brincadeiras, além do
futebol, são algumas das mais frequentes práticas corporais vivenciadas nesses
espaços que, de acordo com Carvalho (2014), são quase sempre marcadas por
um hibridismo, em que a cultura dos grupos considerados urbanos se fundem
com as suas próprias formas de experiência corporal, reconstruindo suas
tradições, a fim de reafirmarem sua identidade cultural. E é neste cenário que a
presente Dissertação se insere.

Diante do exposto, levantamos como problematização desta pesquisa


compreender por meios dos processos de rememoração, a vivencia dos jogos e
das brincadeiras contribuiu para a constituição cultural da comunidade
quilombola Boa Esperança, situada no município de Presidente Kennedy, no
Estado do Espírito Santo?

Para responder ao problema assumimos como objetivo geral desta


pesquisa compreender por meios dos processos de rememoração, como a
vivência com os jogos e das brincadeiras contribuiu para a constituição cultural
da comunidade quilombola Boa Esperança, situada no Município de Presidente
Kennedy, Estado do Espírito Santo.

Para alcançarmos o objetivo geral, anunciamos, como objetivos


específicos desta pesquisa:

a) compreender, por meio das narrativas, as relações que os alunos estabelecem


com os jogos e as brincadeiras, alcançando-as como práticas culturais que
constituem suas trajetórias de vida;

b) analisar a compreensão do corpo pedagógico da instituição no que se refere à


elaboração de materiais que visem o resgate da cultura da comunidade Boa
Esperança, no município de Presidente Kennedy/ES;
17

c) apresentar à escola, ao corpo docente e à comunidade, uma exposição dos


trabalhos realizados pelos alunos onde onde traz à tona o resgate de suas
vivências culturais;

d) elaborar, como produto final, um capítulo de livro que dê visibilidade às


experiências narradas pelos alunos da EJA com jogos e brincadeiras de suas
infâncias na constituição cultural da comunidade quilombola Boa Esperança, no
município de Presidente Kennedy/ES.

Esta pesquisa se justifica, pois, compreendemos que a educação é um


campo marcado por desafios dentre eles, a necessidade de lidar com a
diversidade cultural presente no Brasil. A educação quilombola faz parte desta
diversidade e, pensar em uma educação que considere os povos remanescentes
requer práticas profissionais fundamentadas em conhecimentos sobre as
legislações que nortearão as suas práticas de ensino, mas sobretudo, que
compreendam as especificidades das culturas quilombolas, a fim de produzir
práticas que valorizem-nas e contribuam para o seu fortalecimento.

Neste sentido, a presente pesquisa se faz relevante, pois ela analisa as


políticas públicas voltadas para a educação quilombola, considerando os seus
avanços e retrocessos. Ao mesmo tempo, ela irá colaborar para a consolidação
das culturas locais de uma comunidade quilombola de Presidente Kennedy/ES,
em um processo que assume as narrativas como possibilidade de rememoração
e resgate histórico, organizando e divulgando os saberes e as práticas corporais
para as futuras gerações.

No próximo capítulo será apresentada a comunidade quilombola Boa


Esperança, localidade onde se abriga a Escola Municipal de Ensino
Fundamental Pluridocente (EMEFP) “Jiboia”, bem como a contextualização do
educandário e a aplicabilidade a Educação para Jovens e Adultos (EJA).
18

2 COMUNIDADE QUILOMBOLA BOA ESPERANÇA E SUA RELAÇÃO COM A


EMEFP “JIBOIA”

O município de Presidente Kennedy está localizado ao extremo sul do Espírito


Santo, com limites a leste com o Oceano Atlântico e com os municípios capixabas de
Mimoso do Sul, Atílio Vivácqua, Itapemirim, Marataízes, além de São Francisco de
Itabapoana, no Estado do Rio de Janeiro. Sua população foi estimada em 11.574
pessoas no ano de 2019, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).

O Projeto Político Pedagógico (PPP) da Escola Municipal EMEFP “Jiboia” não


contempla a educação quilombola na instituição de ensino, embora Boa Esperança e
Cacimbinha tenham sido certificadas como Comunidades Remanescentes de
Quilombos, pela Fundação Cultural Palmares em 23 de agosto de 2005, conforme
atualização da Portaria Nº 104/2016, publicada no Diário Oficial da União em
20/05/2016.

O processo de registro da certificação das comunidades quilombolas de


Presidente Kennedy é o 01420.001981/2005/47 e as ID’s (Indicador de Desempenho)
de Boa Esperança e Cacimbinha são 1.068 e 1.069, respectivamente, junto à
(Fundação Cultural Palmares (FCP) – instituição pública fundada em 22/08/1988 pelo
Governo Federal, portanto, vinculado ao Ministério da Cidadania, para fomentar a
promoção e preservação dos valores culturais, históricos, sociais e econômicos
decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira.

Embora o município não ampare, em suas unidades de ensino, por meio dos
PPP’s, a educação quilombola, como informado, a cultura e a tradição das
comunidades rurais, formado por descendentes de africanos escravizados, em
Presidente Kennedy, são mantidas vivas pelas comunidades quilombolas, localizadas
em Cacimbinha e Boa Esperança. Estes locais abrigam, aproximadamente, 700
famílias.

Boa Esperança é formada, em sua maioria, por negros descendentes de


escravos que, com a libertação, migraram do Rio de Janeiro para o Espírito Santo, mais
precisamente, em Presidente Kennedy, especialmente Boa Esperança e Cacimbinha.
Suas casas eram construídas de tábuas.
19

Segundo a tradição oral, os primeiros moradores eram remanescentes de


quilombolas formados por escravos que fugiam do estado fluminense, possivelmente,
dos engenhos de cana-de-açúcar de Campos dos Goytacazes, contudo, há outra
vertente: a de que estes habitantes (escravos alforriados) teriam recebido terras como
recompensa pelos serviços prestados aos seus senhores, o que constituiria a
comunidade.

Através de projetos, as comunidades conseguiram verbas para melhoria da


alimentação escolar, desenvolveram um projeto de Cooperativa Agrícola Familiar
Quilombo de Batalha (Cooquiba), criaram a Associação de Moradores Quilombola e
também a Lei Municipal que torna o dia 20 de Novembro o Dia da Consciência Negra
em Presidente Kennedy.

Na gastronomia destacam-se a comida típica da roça e a presença de


comunidades de origem quilombola, com suas tradições culinárias e manifestações
culturais como o jongo. A produção da farinha é feita de modo artesanal nas
comunidades quilombolas, por mulheres farinheiras, que utilizam o método de
fabricação nos "quitungos" ou casas de farinha, que são locais abertos com cobertura
simples, do tipo palhoça, onde a mandioca vira farinha depois de ser exprimida e cozida
num forno de barro.

Para Oliveira (2016), Boa Esperança, que é reconhecida pela FCP do Ministério
da Cultura como única comunidade quilombola desde 2004, não obteve resultado
positivo quanto ao processo de reconhecimento do território quilombola por parte do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), devido ao desinteresse da
maior parte da comunidade.

As comunidades Boa Esperança e Cacimbinha possuem forte


identificação com sua ancestralidade, definindo-se a partir de seus moradores,
como lugar de origem comum. Em Boa Esperança os moradores se
autoidentificam como sendo 72,18% negros, 23,31% pardos e 4,51% brancos.
Os negros em Cacimbinha atingem 82,33%, os pardos 13,33% e os brancos
4,44%, segundo Relatório Técnico – RT-ECV-007/13 - Revisão 02 – Julho/131.

De acordo com o Art. 2º do Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003,


são consideradas comunidades remanescentes de quilombos os grupos étnico-

1
http://licenciamento.ibama.gov.br/Porto/Porto%20Central/EIA/fscommand/pdf/capitulo13.pdf.
20

raciais que se auto-reconhecem tendo trajetória histórica própria, relações


territoriais específicas e marcas da ancestralidade negra relacionada à
resistência e opressão histórica vivenciada por estes grupos.

A Sociedade Brasileira de Antropologia define a população quilombola


como se constituindo de grupos que desenvolveram práticas de resistência na
manutenção e reprodução de seus modos de vida característicos num
determinado lugar (BRASIL, 2009).

2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA ESCOLA PLURIDOCENTE JIBOIA

Presidente Kennedy conta com 21 escolas da Educação Básica, que totalizam


3.788 estudantes regularmente matriculados, sendo 2005 alunos e 1783 alunas. Três
destas escolas estão inseridas em comunidades quilombolas. São elas: Creche “Bem-
Me-Quer” (Boa Esperança), EMEF “Orci Batalha (Cacimbinha) e EMEFP “Jiboia”, lócus
desta pesquisa, localizada em Boa Esperança e abriga 117 alunos.

A clientela da EMEFP “Jiboia” é formada pela Educação Infantil, EJA e Ensino


Fundamental de 9 anos, sendo: 15 alunos do Pré I e 30 do Pré II, subtotalizando 45
alunos; sete da EJA – primeira etapa e 28 no 1º segmento, além de quatro na segunda
etapa e quatro na 4ª etapa, que subtotalizam 43 estudantes, bem como, outros 15 no
1º ano e 14 no 2º ano, totalizando 117 estudantes.

A EMEFP “Jiboia” foi fundada em 1955 pelo Decreto Nº 2.098/55 e Ato de


Aprovação – Resolução CEE/ES nº 41/1975, atendendo estudantes da comunidade
local e adjacentes como: Santa Feliz, Pedra Q Mela e Liberdade, na Educação Infantil,
Ensino Fundamental I e EJA no primeiro segmento, como informado anteriormente.

Segundo dados do Censo/2018, a escola oferece alimentação escolar para os


alunos, bem como, água filtrada e da rede pública, energia elétrica, fossa e o lixo
coletado periodicamente. A instituição conta com duas salas de aulas, 14 funcionários,
cozinha, banheiro dentro do prédio, refeitório, pátio descoberto, TV, DVD, impressora
e aparelho de som.

Sua primeira escola tinha do nome grafado com a letra “G”, em homenagem à
primeira professora e mentora de sua construção, Gemelice Silva, Dona Gegê, que
leciona nas casas dos pais dos alunos. Também era de responsabilidade das
21

professoras, a merenda escolar, tanto o cozimento quanto a arrecadação de alimentos


juntos aos moradores naquela época, uma vez que a prefeitura não ofertava.

As primeiras casas de Boa Esperança eram construídas de tábua, segundo


relatos, mas construção da EMEFP “Jiboia” foi de tijolos e telhas, num terreno doado
inicialmente, pelo Sr. Romildo Costa. Tempos depois, o Sr. José Hora também doou
um pedaço de terreno para ampliar a escola, construindo assim um banheiro e mais
uma sala de aula.

Atualmente Boa esperança recebe apoio do Projeto de Educação Ambiental da


Shell do Brasil (QUIPEA), o que fortalece as lideranças comunitárias, além de ser uma
condicionante para a licença de exploração de petróleo, exigida pelo Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

2.2 APLICAÇÃO DA EJA EM PRESIDENTE KENNEDY

Buscando assegurar o pleno exercício do direito à educação primária


(obrigatória e acessível gratuitamente a todos), a Câmara de Educação Básica (CEB)
do Conselho Nacional de Educação (CNE) teve aprovados o Parecer CEB nº 4 em 29
de janeiro de 1998 e o Parecer CEB nº 15 de 1 º de junho de 1998, sendo aprovado
em 10 de maio de 2000, o Parecer CNE/CEB nº 11/2000 que dispõe sobre as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a EJA.

A partir de 2009, as Diretrizes da EJA emanadas da Secretaria de Estado da


Educação (Espírito Santo), para as escolas da rede estadual de ensino, exceto na parte
referente à idade de ingresso no Ensino Fundamental e Ensino Médio, foram
aprovadas pelo Conselho Estadual de Educação (CEE), através da Resolução CEE nº
1902/2009.

As instituições de ensino que aplicam a modalidade EJA em Presidente


Kennedy são as CMEI “Bem me Quer”, CMEI “Eliane Quinta”, CMEI “Menino Jesus”,
CMEI “Santa Lucia”, EMEIEF “Vilmo Ornela Sarlo”, EMEIEF de Jaqueira “Bery Barreto
de Araujo”, EMEIEF “São Salvador”, EMEIEF “Água Preta”, EMEIEF Unidocente
“Galos”, EMEIEF Unidocente “Gromogol”, EMEIEF Pluridocente “Mineirinho”, EMEIEF
“São Paulo”, EMEIEF “Orci Batalha”, EMEIEF Pluridocente “Barra de Marobá”,
EMEIEF “Santo Eduardo”, EMEIEF “Santa Fé”, EMEIEF “São Bento”, EMEIEF “Santa
22

Lúcia”, EMEIEF “Santana Feliz”, EMEIEF “Bom Jardim”, EMEI “Gente Miúda”.

Dentre todas, três são escolas polos do município, são elas: "E.P.G. de
Jaqueira'', localizada em Jaqueira ", E.P.G. "São Salvador'', localizada em São
Salvador e "E.E.F. “Vilmo Ornelas Sarlo'', localizada na sede do município. Essas
recebem alunos de todas as localidades. A rede municipal atende as três modalidades
de ensino, sendo elas: Educação Infantil, Ensino Fundamental e EJA.

Em relação ao total de alunos, na rede de ensino de Presidente Kennedy, estão


matriculados na educação infantil 1.135 alunos, no ensino fundamental 2,075 alunos e
no EJA 578 alunos. Totalizando 3.788 alunos matriculados na rede de ensino no
município de Presidente Kennedy/ES, em 2019

A EJA ofertada na EMEF Pluridocente “Jiboia” é destinada ao Ensino


Fundamental - Anos Iniciais (1º ao 5º) e as aulas são aplicadas no período da noite
para uma turma de 14 alunos, presencialmente, com as seguintes disciplinas: Artes
(Educação Artística, Teatro, Dança, Música, Artes Plásticas e outras), Estudos Sociais,
Estudos Sociais ou Sociologia e Educação Física.

A educação oferecida pela rede municipal de Presidente Kennedy é a


terceira mais bem avaliada no Estado, segundo o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb). Os dados divulgados recentemente pelo Ministério da
Educação, referentes a 2015, apontam que os investimentos da Prefeitura na
área têm alcançado os objetivos.

A Secretaria Municipal de Educação também lançou o Projeto Kennedy Educa


Sempre, aprovado pela Lei Nº 1.398/2019, destinado exclusivamente à EJA,
ampliando a oferta para todas as Unidades de Ensino da Rede Municipal.

O Projeto Kennedy Educa + é um projeto de inclusão social e digital, que visa


identificar fraquezas e potenciais de alunos das escolas municipais, estadual e
Pestalozzi e, através disso, promover reforço e auxilio escolar no contraturno das aulas.
23

3 JOGOS E BRINCADEIRAS - PRÁTICAS CORPORAIS VIVENCIADAS NAS


COMUNIDADES QUILOMBOLAS

Jogos e brincadeiras tradicionais são referências importantes para essa


dimensão e podem ser entendidos como um conjunto de hábitos e práticas que
têm uma relação simbiótica entre corpo e mente, uma vez que os jogos
tradicionais exigem uma explicação mitológica para sua realização (ALMEIDA;
ALMEIDA; GRANDO, 2010).
Segundo Huizinga (2004), o jogo ajuda a estruturar as instituições que
organizam a sociedade. Ele também tem uma função importante de incluir
significado em uma cultura, ou seja, possui um elemento imaterial em sua
essência.
No nível prático, há uma analogia entre o rito e o jogo, uma vez que cada
jogo possui um conjunto de regras que foram previamente definidas e acordadas
por seus praticantes, o que torna provável que seja contestado várias vezes.
"Mas o rito praticado parece ser mais um jogo privilegiado que é mantido por
todo tipo de pessoa, porque essa é a única maneira de alcançar um certo
equilíbrio entre os dois campos" (LÉVI-STRAUSS, 1970, p. 52).
Os ritos são acompanhados por jogos de habilidade ou jogo, que à
primeira vista se assemelham a competições esportivas, mas são permeados
por sentidos e significados rituais. Os jogos das sociedades tradicionais são
práticas endógenas que trabalham juntas para assimilar valores, costumes,
normas sociais e comportamentos desejados com base em suas tradições
através do corpo do indivíduo (ALMEIDA, 2008).
O jogo leva à criação de figuras, símbolos e materiais necessários para a
sua prática. Está cheio de vários elementos, da maneira como eles funcionam,
você pode gravar inúmeras situações. Ele combina as ideias de limitação,
liberdade e criação, baseadas em regras e convenções aplicáveis e que devem
ser desconfortavelmente respeitadas para terminar o jogo. Desse ponto de vista,
várias restrições são voluntariamente acordadas e aceitas por todos os
jogadores, para que um comando seja estabelecido sem a presença obrigatória
de uma pessoa que o esteja usando.
No jogo, emergem estruturas abstratas que permitem melhorar as
habilidades físicas e mentais e desenvolver atitudes psicológicas que contribuem
24

para a vida em sociedade e a continuidade de uma cultura. É um meio de


apresentar a vida das pessoas em geral e melhorar sua capacidade de resolver
problemas que surgem do contexto em que vivem.

3.1 BRINCADEIRAS E JOGOS

brincadeiras tradicionais e jogos nas comunidades quilombolas


gradualmente perderam espaço para brinquedos industriais e foram limitados à
memória dos idosos. Segundo Falcão; Pedroza (2011) foram identificados jogos
de bicicleta, narrativa, recitação, quebra-cabeças, casinhas, bonecas de pano e
materiais artesanais, petecas e brinquedos artesanais.
Embora esses jogos e jogos coexistam com as novas experiências de jogo
da mídia, os idosos temem que, por exemplo, o videogame possa esquecer as
formas tradicionais de jogar. Em épocas anteriores, os jogos estavam mais
intimamente relacionados às formas de produção da vida material, ou seja, o
ambiente rural e sua importância para a tradição cultural.
Falcão; Pedroza (2011) afirmam que um jogo chamado cavalo de pau
pode ser identificado no grupo social e até serve como representação social do
uso do cavalo nas atividades de trabalho de grupos familiares de Quilombolas.
Os jogos e brincadeiras das crianças quilombolas permeiam uma mistura de vida
no campo, mundo do trabalho e relações sociais construídas na cidade.
Wiggers; Flausino (2011) identificou os jogos de caça como uma dessas
atividades relacionadas ao hibridismo, uma vez que a construção e o uso do
estilingue para tiro, bem como o uso de espingardas de balas na imaginação das
crianças, permitem a representação do mundo do trabalho que requer
experiência de campo de um adulto.
25

4 PARALELO ENTRE EDUCAÇÃO FÍSICA E EDUCAÇÃO QUILOMBOLA

Para conceituar a Educação Física no componente curricular da escola,


González; Fraga (2012) relatam que a Educação Física escolar não possui os
mesmos conhecimentos daqueles que envolvem práticas corporais relacionados
as escolinhas de futsal, escolinhas de ginástica entre outros. Bem como
destacam os autores, a importância de sabermos os diversos conhecimentos da
Educação Física na sociedade, podemos ressaltar que a mesma tem propósito
de formar cidadãos capazes de serem críticos e que poderão agir de forma
adequada perante a cultura corporal de movimento, participando da construção
de uma sociedade melhor.
Para praticar a educação física como disciplina, o professor deve planejar e
desenvolver suas aulas, levando em consideração a realidade em que seus alunos
estão envolvidos. Na sua prática pedagógica, ele deve levar em consideração as
relações que os alunos mantêm fora da escola, a cultura em que estão envolvidos e
a visão dos alunos nas aulas ministradas e a visão da cultura a que pertencem.
A educação quilombola é uma combinação de conhecimento popular e
conhecimento científico que é transmitido aqui na escola, como: ervas medicinais,
tradições em histórias que foram contadas dos avós aos pais, de pais para filhos, de
costumes que já duraram séculos Conhecimento cruzado, misturado com novos
conhecimentos. Essas influências diárias nos permitem ver a cultura de pessoas de
origem africana com olhos diferentes.
A educação é o meio pelo qual os alunos podem mudar o curso de suas
histórias. É um movimento cheio de significados que surgiu do desejo de conhecer e
recuperar conhecimentos que antes eram amputados pela história dos fatos e
deserdados das verdades sobre a trajetória dos povos trazidos pelos africanos ao
Brasil. No país, o processo de conquista de direitos ainda está presente e a luta por
justiça e educação está relacionada à história da educação social brasileira.
No contexto da primeira constituição da república, o cidadão ainda dependia
da “política de favor". Segundo Carvalho (2006), o país nasceu sob a aniquilação dos
povos, e isso contribuiu para o fato de que, mesmo após a independência, o país
ainda não definia claramente o objetivo de introduzir a cidadania como pré-requisito
para sua existência.
A escola não pode mais atuar diante de seus alunos, ideologicamente
26

como se todos fossem iguais, reproduzem um ideal abstrato das disciplinas e,


ao mesmo tempo, conferem neutralidade em seu conteúdo de ensino. Um dos
avanços nessa direção é realizado no âmbito das Diretrizes de Confirmação,
com a aprovação da Decisão nº 8, de 20 de novembro de 2012, que define as
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Escolar Quilombola no Ensino
Básico:
Uma proposta de educação quilombola necessita fazer parte da
construção de um currículo escolar aberto, flexível e de caráter
interdisciplinar, elaborado de modo a articular o conhecimento escolar
e os conhecimentos construídos pelas comunidades quilombolas. Isso
significa que o próprio projeto político-pedagógico da instituição escolar
ou das organizações educacionais deve considerar as especificidades
históricas, culturais, sociais, políticas, econômicas e identitárias das
comunidades quilombolas, o que implica numa gestão democrática da
escola que envolve a participação das comunidades escolares, sociais
e quilombolas e suas lideranças. Por sua vez, a permanência deve ser
garantida por meio da alimentação escolar e a inserção da realidade
quilombola em todo o material didático e de apoio pedagógico
produzido em articulação com a comunidade, sistemas de ensino e
instituições de Educação Superior (Brasil, 2012, p. 26).

Segundo Miranda (2012, p. 374):


A implantação da modalidade de educação quilombola insere-se no
conjunto mais amplo de desestabilização de estigmas que definiram,
ao longo de nossa história, a inserção subalterna da população negra
na sociedade e, consequentemente, no sistema escolar.
Os desafios da educação escolar para os alunos quilombolas são amplos
e contraditórios, pois o reconhecimento da especificidade já emerge da criação
do DCN para atender as crianças da comunidade.
Não há estudos que examinem a conexão entre atividade física e certos
grupos populacionais ou grupos populacionais socialmente vulneráveis, como os
quilombolas. Nessa situação, é difícil desenvolver estratégias que levem em
consideração a especificidade sociocultural, econômica e étnica dos
quilombolas, bem como a etiologia, distribuição e associação entre atividade
física e incapacidade (SERON et al, 2012).
Embora os quilombos contemporâneos representem grupos com fortes
traços étnico-raciais de ascendência negra, associados ao trabalho rural ou às
culturas de subsistência e à manutenção de manifestações culturais e religiosas,
eles diferem dos quilombos históricos por não terem necessariamente
descendentes de negros antes da guerra. Fugir da escravidão. Apesar de alguns
avanços na história, as comunidades quilombolas ainda sofrem com negligência
política, social e científica (MUSSI et al., 2015).
27

Precisamos entender que “a educação física é uma questão de ensino e


que sua presença traz consigo uma perturbação agradável, benéfica e relaxante
na escola. Seu distúrbio é portador de sua própria ordem interior, que pode criar
ou criar outra ordem na escola” (SOARES, 1996, p. 7). E como a educação física
na escola está ligada à cultura física, ela possui diferentes níveis de
conhecimento, e seremos claros sobre isso
[...] a Educação Física não é uma ciência, como propõe a matriz
cientifica, mas uma área de conhecimentos relativos à cultura corporal
de movimento, que sistematiza e critica conhecimentos científicos e
filosóficos, recebe e envia demandas à prática, às ciências e à filosofia.
Concebemos a Educação física como um campo dinâmico de pesquisa
e reflexão. Os problemas e as questões emergem da prática, e sua
articulação vem a constituir uma problemática que questiona as
ciências e a filosofia (BETTI, 1998, p. 18).

Como destaca Betti (1998), a Educação Física está voltada a cultura


corporal de movimento e a mesma se volta a pesquisa e reflexão que envolve a
área. Diante disso a Educação Física passa a
[...] introduzir e integrar o aluno na Cultura Corporal de Movimento,
formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la,
instrumentalizando-o para usufruir do jogo, do esporte, da dança e das
ginásticas em benefício de sua qualidade de vida (BETTI; ZULIANI,
2002, p. 75).

Sendo assim, a Educação Física como as outras disciplinas, possui um


conhecimento a ser transmitido aos alunos. Nesse sentido
[...] a Educação Física trabalhada na escola visa à sistematização de
situações de ensino e aprendizagem que permitem ao aluno o contato
com conhecimentos práticos e teóricos, tornando-se capaz de produzir
seus próprios conhecimentos (BIANCHIN, 2011, p. 14).

Ainda no âmbito da Educação Física escolar, porém, no próximo tópico,


será descrita uma breve explanação sobre as práticas corporais que se tornam
importantes ao desenvolvimento das aulas de Educação Física.

4.1 PRÁTICAS CORPORAIS NA EDUCAÇÃO FÍSICA

As culturas tradicionais, especialmente os quilombolas, cultivam relações


interetnicas definidas em modos de vida nos quais a territorialidade molda suas
representações coletivas. Todo grupo étnico, grupo ou povo tem seu próprio
modo de criar vida coletiva, pois todo contexto sociocultural é determinado por
relações ecológicas e sociais vividas e vivenciadas em sua fisicalidade.
28

Observa-se, portanto, que as formas de produção de atividades físicas e


esportivas (AFE’s) são diferentes, o que, nesse sentido, é mais geralmente
compreendido pelo conceito de prática corporal. As práticas corporais são parte
integrante da cultura de qualquer grupo social. É precisamente por meio das
práticas físicas que esses grupos constroem relações sociais que expressam
significados forjados em sua consciência coletiva.
Por serem construções socioculturais, as práticas corporais dependem
das oportunidades de mediação que cada grupo experimentou em sua prática
(BOURDIEU, 2000). O fato é que as comunidades tradicionais diferem ou se
identificam das outras através da linguagem, corpo e práticas corporais.
Dentre os exercícios físicos mais importantes no contexto de uma comunidade
quilombola, a prática lúdica de jogos e brincadeiras também pode ser enfatizada em
Boa Esperança, considerando que existe uma relação entre essa comunidade e a
disciplina de educação física na apropriação da cultura como jongo, dança brasileira
de origem africana, que geralmente é praticada ao som da tambores.
Por ser a expressão mais tradicional e artística de Presidente Kennedy, o jongo
pode ser descrito como a manifestação cultural dos quilombolas, que mais se destaca
na comunidade de Boa Esperança e se tornou um processo de construção e
verificação de identidade local. A escolha de um campo empírico justifica-se porque,
segundo Bragatto (1999), a prática do jongo era um elemento muito adequado da
comunidade no processo de auto-atribuição como quilombola. Segundo Mattos et
al. (2009), comunidades que têm o jongo como patrimônio cultural reafirmam
sua trajetória histórica e sua autenticidade étnica, ganhando visibilidade política
e novas perspectivas de sobrevivência coletivas.
O jongo é uma performance corporal presente entre comunidades
quilombolas do estado do Rio de Janeiro, sendo compreendido como
manifestação de uma cultura de resistência, de reorganização política e de
afirmação da identidade negra. A participação dos jovens nas rodas de jongo,
proibidas em um passado recente pelo seu caráter mágico, reinventou-se como
tradição para aproximar as novas gerações dos saberes, mitos e valores
transmitidos no e pelo corpo na roda de jongo.
Segundo Maroum (2014), esse movimento deu a esses grupos sociais
visibilidade étnica e perspectivas de sobrevivência coletiva e superou os fortes
preconceitos que os Jongo sofreram no início do século XX a ponto de serem
29

marginalizados ou socialmente menos poderosos, sendo designados pela


sociedade branca.
Sua dança coletiva, tambores e canto, é imbuída de traços da cultura
afro-brasileira e representa o corpo como elemento central. Nas irmandades
negras de Minas Gerais, o jongo é conhecido como caxambu, também
conhecido como círculo de dança com canto e tambor. Nos dois casos, temos
a influência da ascendência africana da nação banta, uma vez que a memória
é transmitida através da tradição oral para construir esse conhecimento.
O jongo é praticado no Espírito Santo nos municípios de Anchieta,
Itapemirim, Presidente Kennedy e São Mateus. Em outras comunidades, o que
é praticado é o caxambu, o que geralmente é confundido com o primeiro. De
acordo com Mion (2017),
Vale ressaltar que em Itapemirim, assim como em São Mateus do Sul,
em Anchieta e Cacimbinha, Presidente Kennedy, os grupos de jongo
utilizam três tambores. São eles: tambu, caxambu e candongueiro. O
tambu é o maior e mais grave; seguido do caxambu, um pouco menor
e menos grave e; por último, o menor, denominado candongueiro, cujo
som é mais agudo. Usam-se apenas as mãos para percuti-los, sem
auxílio de baquetas. Todos eles são afinados com o calor do fogo. Por
isso é que se acende uma fogueira quando da apresentação de jongo
(MION, 2019. p. 230).

Alvarez et al. (2011) afirmam que as danças podem representar um


espaço privilegiado para a expressão da memória e da identidade. Silva; Falcão
(2011) apresenta uma coleção de artigos que tratam do diagnóstico da relação
entre prática física e construção de identidade em cinco comunidades
quilombolas no estado de Goiás.
Lara et al. (2009) analisaram práticas físicas/culturais (principalmente em
relação ao esporte e lazer) na comunidade quilombola de Paiol de Telha
(reconhecida como quilombola desde 1988) e abordaram os sentidos de uma
companhia de música e dança chamada "Kundun Balê".
Na visão de mundo africana, a fisicalidade também se expressa na
celebração do corpo, como local de representação cultural e histórica, como
gerador de percepções e valores. Refere-se à existência, trabalho, lazer e
tempo dedicados a cada uma dessas funções.
De acordo com Oliveira:
É preciso ler o texto do corpo para vislumbrar nele a cosmovisão que
dá sentido à história dos africanos e afrodescendentes espalhados no
planeta. Como o corpo é um texto dinâmico e a tradição de matriz
africana é um dinâmico movimento, é no movimento do corpo que
30

vislumbro a possibilidade de uma leitura do mundo a partir da matriz


africana (2003b, p. 101).

Entende-se, portanto, que o movimento corporal no processo educativo,


para ser significativo, requer um relacionamento profundo com a vida dos
alunos, de modo que a educação física não possa ignorar as perguntas e
preocupações físicas de seus alunos, mas apenas prescreve regras que
incluem medidas para seu corpo durante Atividades, mas quando você fala
sobre esse corpo que se move, manifesta ações, muda, tem valores, tem
dúvidas sobre suas ações, ou seja, a educação física não pode se limitar a
ações físicas, mas através de eles despertam um ato educativo que agora não
é necessário para reproduzir movimentos, mas principalmente porque permite
atos conscientes e reflexivos dos movimentos que realizam.
Para Freire (1992), a criança que brinca cria suas atividades organizando
suas atividades corporais, porém ao chegar à escola é impedida de manifestar
sua corporeidade, isto contraria os objetivos educacionais da Educação Física,
que tanto preza pela manifestação corporal como meio educacional, tratando o
educando como um intruso.
31

5 MARCOS LEGAIS PARA A EDUCAÇÃO QUILOMBOLA NA ELABORAÇÃO


DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS

No ano de 2010, a Conferência Nacional de Educação (CONAE),


realizada com o tema “Construindo o Sistema Nacional de Educação: Plano
Nacional de Educação”, mobilizou diferentes seguimentos da sociedade em
âmbito nacional, com o objetivo de discutir as diretrizes na elaboração de um
novo Plano Nacional Educacional (PNE). O debate proposto deu ênfase à
valorização da educação, igualdade, inclusão e diversidade, erguendo bandeiras
em distintos contextos, tais como: a educação ambiental, inclusiva, no campo,
para jovens e adultos, indígenas, quilombolas e demais povos remanescentes.

Nesse sentido, propomo-nos a apresentar as diretrizes que instituem e


normatizam as práticas de ensino da educação quilombola em território nacional,
como previsto pelas políticas educacionais. Cumpre ressaltar que a elaboração
das Diretrizes Curriculares para Educação Escolar Quilombola está
fundamentada nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para Educação
Básica. Conforme o documento, a educação quilombola deve ser desenvolvida
em comunidades reconhecidas e inscritas nos termos da lei, a partir de práticas
pedagógicas específicas que valorizem e respeitem as tradições culturais dos
diferentes povos. Por isso, cada comunidade possui um quadro docente
especifico, com base nos parâmetros constitucionais que orientam a Educação
Básica brasileira.

Em cumprimento à CONAE de 2010, a União, os Estados, o Distrito


Federal e os Municípios são responsáveis por:

A - Garantir a elaboração de uma legislação específica para a


educação quilombola, com a participação do movimento negro
quilombola, assegurando o direito à preservação de suas
manifestações culturais e à sustentabilidade de seu território
tradicional.
B - Assegurar que a alimentação e a infraestrutura escolar quilombola
respeitem a cultura alimentar do grupo, observando o cuidado com o
meio ambiente e a geografia local.
C - Promover a formação específica e diferenciada (inicial e
continuada) aos/às profissionais das escolas quilombolas, propiciando
a elaboração de materiais didático-pedagógicos contextualizados com
a identidade étnico-racial do grupo. D - Garantir a participação de
representantes quilombolas na composição dos conselhos referentes
à educação, nos três entes federados.
E - Instituir um programa específico de licenciatura para quilombolas,
32

para garantir a valorização e a preservação cultural dessas


comunidades étnicas.
F - Garantir aos professores/as quilombolas a sua formação em serviço
e, quando for o caso, concomitantemente com a sua própria
escolarização.
G - Instituir o Plano Nacional de Educação Quilombola, visando à
valorização plena das culturas das comunidades quilombolas, à
afirmação e manutenção de sua diversidade étnica.
H - Assegurar que a atividade docente nas escolas quilombolas seja
exercida preferencialmente por professores/as oriundos/as das
comunidades quilombolas (C0NAE, 2010, p. 131-132).

Dentre os marcos legais que contribuíram para construção das Diretrizes para
Educação Quilombola no Brasil, é importante destacar a Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais. A partir
deste evento, foram expedidos dois Decretos de Lei, a saber: o primeiro, assinado em
19 de abril do ano de 2004, Decreto de Lei nº 5.051; o segundo, em 7 de fevereiro de
2007, Decreto nº 6.040. Ambos instauram a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, reconhecendo que:

[...] os quilombolas são considerados comunidades e povos


tradicionais. Isso porque são grupos culturalmente diferenciados e que
se reconhecem como tais, possuidores de formas próprias de
organização social, utilizam conhecimentos, inovações e práticas
gerados e transmitidos pela tradição, são ocupantes e usuários de
territórios e recursos naturais como condição à sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica (BRASIL, 2013, p. 426).

Em novembro de 2010, foi realizado o primeiro o 1º Seminário Nacional


de Educação Quilombola, preparado pelo Ministério da Educação (MEC) e em
parceria da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade
(SECAD), tendo colaboração da Secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR/PR), entre outros
colaboradores. Neste dia, foi forjada uma comissão quilombola para assessorar
à comissão especial da Câmara de Educação Básica, constituída por meio de
representantes recomendados pela Coordenação Nacional de Articulação das
Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) (BRASIL, 2013).

No ano de 2011, foram realizadas três audiências públicas coordenadas


pela CEB para auxiliar a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais,
juntamente com Ministério da Educação (SECAD e SEB), SEPPIR, Fundação
Cultural Palmares, Secretarias Municipais e Estaduais de Educação, Governos
de Estados, Prefeituras Municipais locais e alguns Núcleos de Estudos Afro-
Brasileiros (NEABs). Os dois primeiros estados foram eleitos mediante o
33

expressivo número de comunidades quilombolas, possibilitando articulações


políticas com as Regiões Norte e Nordeste. E o segundo, em virtude de estar
localizada a sede do CNE, e também permitir aproximações das Regiões Centro-
Oeste, Sudeste e Sul do país, para possíveis diálogos (BRASIL, 2013). As
audiências tiveram como tema “A Educação Escolar Quilombola que temos e a
que queremos”, e foram realizadas nas seguintes datas, cidades, horários e
públicos descritos no quadro abaixo:

Quadro 1 – Audiências realizadas no Brasil


Público (número de
Audiência Dia e hora Cidade/ estado pessoas que
participaram)

5 de agosto de
Itapecuru-Mirim, MA
1ª Audiência 2011, das 9h às 368 participantes
13h.

30 de setembro
São Francisco do
2ª Audiência de 2011, das 9h 433 participantes
Conde, BA
às 13h.

7 de novembro de
3ª Audiência 2011, das 9h às Brasília, DF 110 participantes
13h.

Fonte: a autora

Todas as audiências tiveram, além de “militantes” de comunidades


quilombolas, gestores, docentes, discentes, assim como movimentos sociais,
representantes de Organizações não Governamentais, bem como de fóruns
estaduais e municipais de educação e de diversidade étnico-racial. Nas
audiências também houve a participação de pesquisadores interessados pela
temática apresentada.

Ainda no ano de 2011, foi divulgado no site do CNE, o “Texto-Refêrencia


para elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Escolar
Quilombola”. Este documento contribuiu para o debate, recebendo sugestões e
críticas, por meio de mensagens enviada para o e-mail:
34

audienciaquilombola@mec.gov.br, ampliando a participação de vários


seguimentos sociais sobre o debate da Educação Escolar Quilombola. Com base
nessas observações, foi elaborado pela comissão especial da CEB o folheto
“Diretrizes Curriculares para Educação Escolar Quilombola: algumas
informações” (BRASIL, 2013).

Neste sentido, as problematizações acerca da Educação Escolar


Quilombola, foram colocadas em pauta por outros estados e municípios
promoveram de maneira independente suas próprias audiências públicas.

A título de exemplo, a audiência que aconteceu na cidade de Vitória,


capital do Estado do Espírito Santo no dia 29 de março de 2012, teve como
colaboradores a comissão quilombola, a Assembleia Legislativa do Estado do
Espírito Santo e a comissão especial da Câmara de Educação Básica.
Participaram deste evento um total de 150 pessoas, profissionais da educação,
estudantes e gestores de cidades do Espírito Santo, com expressivo número
populacional quilombola. Também houve representatividade da Universidade
Federal do Espírito Santo (UFES), na pessoa de sua vice-reitora (BRASIL, 2013).

Além destes eventos, no dia 2 de maio de 2012 na sede do CNE em


Brasília, foi realizada uma reunião técnica com a participação da Comissão
Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos Relacionados à Educação dos
Afro-Brasileiros (CADARA), também da SECADI/MEC, Fundação Cultural
Palmares, e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Neste encontro,
foi apresentada a minuta do projeto na construção das diretrizes curriculares, em
que todos os itens foram colocados em pauta sendo estes avaliados e revisados
um por um, pelo olhar dos técnicos presentes. Após 14 horas de reunião chegou-
se a um consenso (BRASIL, 2013).

No dia 25 de maio de 2012, os mesmos técnicos presentes na reunião


técnica fizeram-se presentes para participarem do seminário “Educação e
Relações Étnico- Raciais” realizado pelo CNE, reunindo cerca de 260 pessoas.
Estas iniciativas foram fundamentais para elaboração da Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, por meio
da promulgação do Decreto Legislativo nº 143/2003 e do Decreto nº 6.040/2007
(BRASIL, 2013).
35

Cumpre ressaltar que a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável


dos Povos e Comunidades Tradicionais possui como objetivos:

I – orientar os sistemas de ensino e as escolas de Educação Básica da


União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na
elaboração, no desenvolvimento e na avaliação de seus projetos
educativos;
II – orientar os processos de construção de instrumentos normativos
dos sistemas de ensino visando garantir a Educação Escolar
Quilombola nas diferentes etapas e modalidades, da Educação Básica,
sendo respeitadas as suas especificidades;
III – assegurar que as escolas quilombolas e as escolas que atendem
estudantes oriundos dos territórios quilombolas considerem as práticas
socioculturais, políticas e econômicas das comunidades quilombolas,
bem como os seus processos próprios de ensino-aprendizagem e as
suas formas de produção e de conhecimento tecnológico;
IV – assegurar que o modelo de organização e gestão das escolas
quilombolas e das escolas que atendem estudantes oriundos desses
territórios considere o direito de consulta e a participação da
comunidade e suas lideranças, conforme o disposto na Convenção 169
da OIT;
V – fortalecer o regime de colaboração entre os sistemas de ensino da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na oferta da
Educação Escolar Quilombola;
VI – zelar pela garantia do direito à Educação Escolar Quilombola às
comunidades quilombolas rurais e urbanas, respeitando a história, o
território, a memória, a ancestralidade e os conhecimentos tradicionais;
VII – subsidiar a abordagem da temática quilombola em todas as
etapas da Educação Básica, pública e privada, compreendida como
parte integrante da cultura e do patrimônio afro-brasileiro, cujo
onhecimento é imprescindível para a compreensão da história, da
cultura e da realidade brasileiras (BRASIL, 2013, p. 428).
Os quilombos brasileiros possuem características bem diferentes se
comparadas aos quilombos africanos. Em todos países em que houve
escravidão de povos africanos, formaram-se quilombos, entretanto conhecidos
por outros nomes, de acordo os países em que estavam. A título de exemplo
pode-se mencionar nomes diferentes para os territórios afro descentes que, no
Brasil, conhecemos como quilombos, tais como: os cimarrones, em países de
colonização espanhola; os palenques, nas regiões de Cuba, Colômbia e
Venezuela; os maroons, na Jamaica; e o guianas localizados nos Estados Unidos
da América (BRASIL, 2013).

Nesse sentido, a elaboração de Diretrizes para Educação Quilombola no


Brasil consoante à Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos
e Comunidades Tradicionais é de suma importância para estes povos
remanescentes escravizados em nosso país, afinal “O direito à uma educação
escolar que respeite e reconheça sua história, memória, tecnologias, territórios
e conhecimentos têm sido uma das reivindicações históricas dessas
36

comunidades e das organizações do movimento quilombola” (BRASIL, 2013, p.


429).

No cenário brasileiro, os quilombos não se restringem às zonas rurais, mas


também existem em zonas urbanas. Os quilombos urbanos configuravam-se em
dormitórios dos negros fugitivos que buscavam sobreviver em trabalhos
informais em feiras, mercearias e em portos de embarque e desembarque. Os
mesmos também eram utilizados como estratégias de defesa para manter
informados os quilombos mais afastados da vida urbana. Estes eram localizados
em províncias, em forma de precaução contra opressões dos adeptos da Coroa
portuguesa (BRASIL, 2013).

Diante disto, as Diretrizes Curriculares para Educação quilombola


reconhecem que:

Ao longo dos anos, juntamente com outros povos e comunidades


considerados tradicionais e em articulação com outros movimentos
sociais, os quilombolas, por meio de suas ações e atuação política, têm
contribuído no processo de mudança no próprio campo jurídico, na
aplicação e interpretação das leis, pressionando o Estado e o próprio
Direito a realizar a devida relação entre os princípios da igualdade e da
pluralidade. Questionam a tendência ainda hegemônica do Estado e
do campo do Direito de aplicarem a lei de maneira neutra e indagam
por que em sociedades reconhecidamente diversas e pluriculturais,
como é o caso do Brasil, ainda é possível encontrar tanta resistência à
garantia dos direitos dos coletivos sociais considerados diversos. É
nesse campo que a discussão do “direito étnico” começa a ocupar mais
espaço. E é também nesse campo que os quilombolas, enquanto
coletivo étnico-racial e social, adquirem maior visibilidade na arena
política (BRASIL, 2014, p. 433).
As conferências nacionais articuladas com a internacionais fortalecem o
movimento na garantia de direitos para povos afro descentes e indígenas, entre
outros povos tradicionais. Nesse contexto, a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), reverberou no Brasil na promulgação do Decreto
Legislativo nº 143, reconhecendo as “terras tradicionalmente ocupadas” como
herança cultural e patrimonial deixada por seus antepassados.

Dentre as conquistas que se deram para as comunidades quilombolas a


partir desta convenção destaca-se o compromisso de todos os governos em
prover meios, para que os povos e comunidades tradicionais participem de todas
as decisões em âmbito legislativo e administrativo, fiscalizando e tendo acesso
a recursos públicos para desenvolver trabalhos possíveis na melhora da
qualidade de vida em comunidade e na preservação da cultura local (BRASIL,
37

2013). Reitera-se que:

Dessa forma, o Estado deverá condicionar suas políticas e programas


às ações dos grupos sociais, estruturar-se de forma diferenciada para
o atendimento das demandas que são múltiplas e complexas,
determinando “novas” maneiras de pensá-las. Isso acarreta uma
mudança do Estado na forma de organizar e operacionalizar suas
ações, que não pode ficar restrita às competências administrativas
firmadas previamente (BRASIL, 2013, 436).
Com isso, possibilita-se maior participação social das comunidades
quilombolas e mostra-se que as Diretrizes Curriculares para os povos
Quilombolas consistem em um importante marco político na garantia de direitos
de uma cultura que, durante anos de escravidão, buscou-se suprimir.

Sobre este aspecto, o Decreto nº 6.040, que instituiu a Política Nacional


de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, em
seu artigo 3 inciso I, prevê que:

I – Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente


diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas
próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e
recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social,
religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações
e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

Tendo em vista o reconhecimento desta cultura, urge possibilitar uma


educação na qual a mesma possa estar inserida. No dia 20 de novembro de
2012, por meio do parecer do Conselho Nacional de Educação que aprovou a
Resolução 08/2012, foram homologadas as Diretrizes Nacionais para Educação
Escolar Quilombola, nas seguintes atribuições:
§1º A Educação Escolar Quilombola na Educação Básica: I-organiza
precipuamente o ensino ministrado nas instituições educacionais
fundamentando-se, informando-se e se alimentado:
a) da memória coletiva;
b) das línguas reminiscentes;
c) dos marcos civilizatório;
d) das práticas culturais;
e) das tecnologias e formas de produção do trabalho;
f) dos acervos e repertórios orais;
g) dos festejos, usos, tradições e demais elementos que conformam
o patrimônio cultural das comunidades quilombolas de todo país; da
territorialidade.
II-compreende a Educação Básica em suas etapas e modalidades, a
saber: Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio,
Educação do Campo, Educação Especial, Educação Profissional
Técnica e Nível Médio, Educação de Jovens e Adultos, inclusive na
Educação a Distância. III-destina-se ao atendimento das populações
quilombolas rurais e urbanas em mais variadas formas de produção
cultural, social, política e econômica (BRASIL, 2012).

Sob essa perspectiva, a legislação assegura que a educação nas


38

comunidades quilombolas deve ser articulada com os saberes tradicionais e com


as práticas socioculturais, em que as singularidades destes povos sejam
contempladas e valorizadas, reconhecendo suas identidades étnico- raciais.

As instituições de ensino que seguem estas diretrizes encontram-se


distribuídas em todo território brasileiro, conforme consta no quadro a seguir:

Quadro 2 - Distribuição de escolas quilombolas no Brasil


REGIÃO NÚMERO DE ESCOLAS
Norte 385
Nordeste 1.568
Centro-oeste 275
Sudeste 87
Sul 61
Total 2.376
Fonte: Inep (2015)

Esses dados nos levam ao estudo realizado por Miranda (2012, p. 374),
que afirma que “[...] a modalidade de educação quilombola insere-se no conjunto
mais amplo de desestabilização de estigmas que definiram, ao longo de nossa
história, a inserção subalterna da população negra na sociedade e,
consequentemente, no sistema escolar”.

Os dados apresentados por Miranda (2012) persistem em indicadores que


apontam para a precariedade no atendimento aos estudantes, realizado em
espaços de pequeno porte e tendo apenas duas salas de aula. Apenas 15,3%
dos estabelecimentos têm mais de seis salas, enquanto no total da educação
básica, 51,5% têm esse mesmo porte (e 22% contam com mais de dez salas).

Conforme o documento Educação escolar quilombola no Censo da


Educação Básica (IPEA, 2015), dos estabelecimentos em áreas quilombolas,
apenas 783 informaram utilizar materiais específicos (35% do total). De acordo
com o relatório da SEPPIR, cerca de 1.912 escolas situadas nas comunidades
remanescentes receberam materiais didáticos.

Carril (2017) salienta que um dos fatores para estes dados pode ser em
razão da existência de estabelecimentos em territórios quilombolas, que não se
identificaram como tais, do mesmo modo, há aqueles situados fora de territórios
39

quilombolas que recebem estudantes e não fazem uso do material específico. É


preciso ressaltar que, menos da metade das escolas situadas em áreas de
quilombos afirmam fazerem uso desse tipo de material didático. Autora ainda
adverte que:
A formulação de uma proposta pedagógica para a educação
quilombola certamente carece de pesquisas que envolvam aqueles
saberes comunitários e um intercâmbio de conhecimentos entre
diversas áreas. A interdisciplinaridade torna-se necessária para a
abertura de diálogos entre sociologia, história, geografia, antropologia
e outras ciências que venham a contribuir com a elaboração de um
currículo pertinente a essa realidade. Essa possibilidade, no atual
momento, encontra limites nos diversos fatores dados pela própria
cultura institucional e na organização das práticas pedagógicas nos
cursos de formação de professores (CARRIL, 2017, p. 554).
Neste sentido, a implementação das Diretrizes Curriculares para
educação quilombola em áreas remanescentes permanece como um desafio
para educação, pois embora haja diretrizes que orientem o professor a organizar
a sua prática pedagógica, observa-se que os territórios possuem suas
singularidades, de maneira que se faz necessário que o profissional tenha que
se reinventar e fazer uso de outras estratégias para realizar seu papel de
mediador no processo de ensino e aprendizagem.
Do mesmo modo, Arruti (2006, p. 238) afirma que:
Se o território é mais evidentemente suporte e matéria da memória,
respondendo aos interesses sociais e políticos da recordação, ele
também acaba por operar como um condicionante sociocultural dos
modos de lembrar, um meio de convencionalização da memória, isto
é, de modelagem que a situação evocada sofre no contexto das ideias
e valores que a evocam.

Percebe-se que a educação quilombola traz consigo um conteúdo afetivo,


no qual o intuito é manter o aluno próximo das suas heranças culturais e dos
significados identitários de sua comunidade, dando a ele conhecimentos para
manter vivos os saberes e as tradições quilombolas.
Botelho (2007, p. 35) ainda afirma que “[...] no caso específico da
população remanescente de quilombos, precisamos avançar muito mais, posto
que, entre os afro-brasileiros, esse grupo soma os maiores índices de exclusão
educacional”.

A seguir serão abordado o respaldo para a educação quilombola e Plano


Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana.
40

6 DIÁLOGOS COM A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE A EDUCAÇÃO


QUILOMBOLA

A Lei 10. 639/03 foi regulamentada pelo Parecer CNE/CP 03/2004 e pela
Resolução CNE/CP 01/2004 que instituem as Diretrizes Curriculares Nacionais
para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-brasileira e Africana. No ano de 2009, o MEC aprovou o Plano
Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação das Relações Étnicos-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-brasileira e Africana.
A referida legislação diz respeito prioritariamente à parcela da população
considerada negra, como também, à presença histórica, social e cultural
africana recriada e ressignificada no Brasil. Refere-se ainda a todos os
brasileiros de todo e qualquer pertencimento étnico-racial e aos seus direitos
por uma educação de qualidade (RODRIGUES; FONTES, 2018).
Cumpre ressaltar que a resolução nº 8, de 20 de novembro de 2012,
encontra-se em sintonia com o Art. 28 da LDB (9.394/96), ao afirmar que “[...]
na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino
promoverão adaptações necessárias a sua adequação às peculiaridades da
vida rural e de cada região” (BRASIL, 2012).
Para Miranda (2018), as diretrizes para uma educação diferenciada para
as comunidades quilombolas possuem como finalidade intensificar a
participação das comunidades nas definições curriculares e a incorporação da
sua cultura como saber. Contudo, a autora ainda problematiza o desafio em
romper com uma cultura eurocêntrica e priorizar as heranças culturais dos
povos remanescentes.
Nesse contexto, Carril (2017, p. 549) afirma que a proposta de uma
educação quilombola deve estar atenta para a premissa de que a instituição
escola não pode atuar na reprodução de conhecimentos absolutos, que não
fazem sentido para os alunos, haja vista as suas realidades sociais. Assim, a
proposta de se pensar em uma educação que priorize a dimensão cultural de
um grupo não pode estigmatizá-lo ou segregá-lo, mas sim buscar a valorização
de sua história, possibilitando que a mesma seja transmitida de geração para
geração.
41

A proposta de educação quilombola, portanto, requer a construção de


um currículo escolar receptivo, flexível e de natureza interdisciplinar, buscando
articulações entre os conteúdos ensinados e os conhecimentos existentes nas
comunidades quilombolas, ou seja, o projeto político-pedagógico da instituição
escolar precisa trabalhar com os saberes sob diferentes aspectos: históricos,
culturais, sociais, políticos, econômicos e indenitários das comunidades
quilombolas, o que consiste em uma gestão democrática, que envolve a
participação das comunidades escolares, sociais e quilombolas (BRASIL,
2012).
Autores como Gomes; Pereira (1988) localizam as comunidades
quilombolas como celeiros de uma tradição cultural de valorização dos
antepassados, calcada numa história cuja identidade comum, com normas de
pertencimento e consciência de luta pelos territórios que habitam e usufruem;
daí a referência a quilombos contemporâneos.
Nesse contexto, ressaltamos a Educação Física como componente
curricular importante em comunidades quilombolas, que possui a tarefa singular
de resgatar práticas corporais, apropriando-se do saber popular historicamente
construído naquele grupo, expressos pelas danças, jogos e brincadeiras
(FILHO et. al, 2010).
Segundo Dias (2017) ao se pensar na prática da educação física em
comunidades quilombolas, é preciso refletir sobre as representações da cultura
tradicional, não em uma perspectiva minoritária, mas das particularidades de
uma territorialidade. O autor problematiza a relação que essas práticas possuem
com as condições de vida e os modos de existência das pessoas, pois elas são
compartilhadas pelos povos remanescentes.
Para Silva; Freitas; Galvão (2009, p. 99), o papel das comunidades
quilombolas está em garantir uma educação que priorize as culturas
tradicionais, inclusive problematize preconceitos que esses grupos sofrem,
relacionados sobretudo com as religiões de origem africanas como o
Candomblé, dos quais muitos são devotos, e com o misticismo em torno de suas
heranças culturais. Esses elementos, para os autores, fazem com que as
práticas corporais relacionadas com essas manifestações culturais sejam
discriminadas e, com isso, deixem de ser praticadas, como as danças e os
folguedos.
42

Corroborando com os autores supracitados, Dias (2015) adverte que as


“mudanças nos modos de vida dessas populações já não são tratadas apenas
corno mudanças, senão como a triste e inevitável caminhada na direção da
extinção cultural”, portanto, a educação de modo mais amplo tem o papel
primordial no processo de preservação cultural das comunidades quilombolas.
Nesse contexto, Grando (2006) afirma que as práticas corporais para
povos tradicionais explicitam os múltiplos sentidos e significações da
“fabricação da pessoa”. Deste modo, o autor menciona a cultura como uma forma
de comunicação, o que abrange também as práticas desportivas e de lazer.
Ao pensarmos o ensino da educação física nas comunidades quilombolas
como um fenômeno cultural, assumimos a ideia de que é necessário
desenvolver práticas em comunidades quilombolas que não menosprezem a
sua dinâmica cultura, caso contrário, o profissional desumanizará a sua própria
prática e os objetos de ensino da Educação Física (DAOLIO, 2004). Além disso,
diante do recente interesse da área pela educação quilombola, é preciso,
conforme anuncia Lara (2009, p. 38), de interlocutores que possam debater o
tema, problematizá-lo e legitimá-lo, de acordo com as especificidades culturais
dessas comunidades.
Nesse sentido, o estudo realizado por Falcão; Silva; Tucunduva (2011)
sobre as práticas corporais em cinco comunidades quilombolas no estado de
Goiás, mostra que ausência de políticas públicas resulta na desvalorização da
cultura, e consequentemente de serviços prestados na área da educação.
Devido a esse distanciamento em relação às suas necessidades, grande parte
dos moradores anseiam se mudar para a zona urbana, em busca de
oportunidades de emprego e melhores condições de vida.
Segundo Silva; Souza Neto; Benevides (2009, p. 881) a capoeira é uma
das principais práticas corporais tradicionais da cultura quilombola, inseridas
nas aulas de educação física. Na visão dos autores, ainda há necessidade de
se investir em estudos voltados para os efeitos sociais da capoeira na educação
e em como essa prática vem contribuindo para o bem-estar dessas
comunidades.
Contudo Heine; Carbinatto; Nunomura (2009), tecem críticas sobre a
didática do ensino de capoeira, pois consideram deficientes, no que tange a
parte pedagógica. Para os autores o ensino dessa prática não pode apenas
43

englobar conteúdos técnicos da luta, que sabem o como fazer que ocupam os
espaços destinados a aprendizagem da Capoeira. Urge que o processo de
ensino possa oferecer muito mais do que simplesmente conhecimentos sobre
a técnica.
Na esteira deste pensamento, Figuereido et. al (2017) assinalam que a
educação traz consigo afetos e que estes são capazes de potencializar vidas,
quando a educação se torna uma tarefa mecânica estes deixam de existir. Deste
modo, podemos pensar que uma educação voltada para povos tradicionais,
principalmente no que tange as comunidades quilombolas os afetos no lecionar
precisam estar presentes, pois cada prática corporal seja em sua modalidade
de lazer ou desportiva, traz consigo uma herança cultural, uma história que
precisa ser valorizada, e os afetos são os elementos que possibilitam isso.
Outro estudo realizado por Lara (2012) em comunidades quilombolas no
estado do Paraná identificou como as danças e as brincadeiras estão
relacionadas com a interação dos membros dessas comunidades com a
natureza e com os animais. A sua principal forma de lazer está associada à
religião, as festividades e cultos aos santos, bingos comunitários e procissões.
Ainda permanecem tradições como banhos de ervas para cura.
Durante a realização deste estudo Lara (2012, p. 47) adverte que:
O desenvolvimento da pesquisa em comunidades quilombolas no
Paraná no intuito de estudar as políticas públicas relacionadas a
espor_te/lazer (sua efetividade e possibilidades reais de
implementação e/ou aperfeiçoamento) leva_nos a concluir pela
necessidade de que as co_munidades sejam inseridas num conjunto
de ações estatais que possam dar alicerce para que elas
recomponham suas próprias estratégias de luta e reconheçam suas
necessidades em termos de esporte e lazer. Em complemento, é
fundamental que essas ações não estejam isoladas, mas interligadas
a outras esferas que promovam melhorias no campo do trabalho, da
habitação, do transporte, da saúde, da educação e segurança pública.

Diante do exposto a autora salienta que se faz necessária a participação


do estado para a valorização da cultura quilombola, e de mais investimentos
financeiros e de materiais humanos para o desenvolvimento de uma educação
física que trabalhe com as práticas culturais desses grupos. Assim, seria
preciso “[...] dar sequência a políticas interventoras, as quais incluem o diálogo
com setores municipais, estaduais e federais no sentido de propiciar condições
adequadas de esporte e lazer” (LARA et al., 2012, p. 48). Os autores ainda
sinalizam que:
44

As políticas públicas perpassam a garantia de sobrevivência humana.


Delas, emanam as leis que protegem e estimulam os modos de se
produzir a vida, voltadas às necessidades de
brancos/ricos/proprietários e, portanto, dos inseridos e aceitos
socialmente. A partir daí a cultura dos quilombolas, dos negros, situa-
se à margem/excluída do padrão cultural, social e econômico. Suas
políticas, portanto, também para sobrevivência, não atendem aos
requisitos elitizadores, sendo, discriminadas (LARA et al., 2012, p.
11).

Diante do exposto, os autores nos levam a refletir acerca que os modos


de vida de comunidades quilombolas distanciam-se do ideal de vida posto em
uma sociedade capitalista, portanto não há como se inserir uma educação
eurocêntrica, práticas esportivas e de lazer em um contexto das quais elas não
possuem sentido, pondo em demérito toda uma cultura local.
Conforme o Relatório Nacional de Desenvolvimento Humano do Brasil
(2017, p.09), aborda AFE’s e populações tradicionais no Brasil: indígenas,
quilombolas e ribeirinhos, reconhece que:
A relação corpo-natureza entre as comunidades tradicionais se
constrói no cotidiano e nas práticas corporais dos sujeitos de forma
que, como atores sociais, eles se investem de sentidos e significados
em suas ações, ao mesmo tempo em que definem suas demandas e
travam estratégias de luta pela sobrevivência no espaço-tempo por
eles reconhecido como seu. Esses mecanismos de luta, entretanto,
materializam-se em práticas cotidianas de resistência – de maneira
direta, por meio do enfrentamento, ou, de modo indireto, por meio do
camuflar ou da omissão –, mas que, no fim, atendem ao mesmo
propósito, a saber, a luta pela legitimação desses sujeitos no espaço
por eles reconhecido como seu.
Neste sentido as práticas corporais giram em torno de um movimento de
liberdade, pois historicamente estas verbalizavam aquilo que estes povos eram
impedidos de falar como no caso dos escravos. Tais praticas corporais
expressam a dor e poesia de um povo cujo os direitos de serem reconhecidos
como seres humanos lhes foi negado. Esta luta por reconhecimento de direitos
permanece até os dias atuais. Ademais a Constituição Federativa em seu Artigo
215 faz saber:
Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais
e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a
difusão das manifestações culturais.
§ 1º. O Estado protegerá as manifestações das culturas populares,
indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo
civilizatório nacional.
§ 2º. A lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas de alta
45

significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais.


§ 3º. A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração
plurianual, visando ao desenvolvimento cultural do País e à integração das
ações do poder público que conduzem à:
I – defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro;
II – produção, promoção e difusão de bens culturais;
III – formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas
múltiplas dimensões;
IV – democratização do acesso aos bens de cultura; V – valorização da
diversidade étnica e regional.
Cumpre ainda ressaltar o Artigo 216 da Constituição Federal que trata
da proteção aos documentos e sítios históricos possuidores de conhecimentos
históricas dos antigos quilombos, consta na referida legislação que as
comunidades quilombolas instituem “patrimônio cultural brasileiro os bens de
natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,
portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira”.
Segundo Santos et al. (2019, p. 56) assinalam que “para pensar a
educação para os quilombolas faz-se necessário reconhecer a identidade e a
cultura quilombola, percebendo seus elementos para construí-los enquanto
conteúdos escolares, a partir do diálogo com a comunidade”. Sobre este
aspecto Freitas; Silva; Falcão (2009, p. 97-99) afirmam que:
A tensão entre a cultura dominante, cultura de massa e cultura
popular levou, com o passar do tempo, ao esquecimento de muitas
festas, jogos, danças e brincadeiras tradicionais, que possibilitavam o
encontro entre famílias e o estabelecimento de redes cooperativas via
momentos de descontração Percebemos também um contraste com
os valores lúdicos da cultura negra, uma vez que há um certo
distanciamento das práticas culturais tradicionais dos descendentes
afro-brasileiros (FREITAS, SILVA, FALCÃO, 2009, p. 97-99).

Diante do exposto, Mussi et. al (2015) afirmam que a cultura brasileira


exerceu efeitos sobre modos de vida no quilombo, influenciando formas de lazer
e práticas esportivas. O futebol é uma das atividades esportivas mais praticadas
nos quilombos, isso se dá pelo fato de não precisar grandes investimentos e
infraestruturas. Diferente do futebol explorado pela mídia, para o autor o futebol
no quilombo é meio de integração entre os membros das comunidades.
46

7 REFERENCIAL TEÓRICO E METODOLÓGICO

Como método, o panorama bibliográfico foi escolhido com uma análise


das histórias sobre as experiências dos quilombolas, destacando a cultura local
que contribuiu para a identificação e constituição dos negros. A autora dialogo
com Geertz (1989) para entender o contexto atual da interpretação da cultura em
relação à educação. Para problematizar o cotidiano da escola quilombola,
buscou apoio teórico e lidou com processos de territorialidade e cultura popular.
Seguiu a linha proposta por Geertz (1989) de que as etnografias das
motos Jongo acumularam um material rico para esta pesquisa; Entrevistas com
restos mortais de Quilombola e consulta de livros, revistas e artigos de outros
teóricos que lidam com este tópico.
Como metodologia na pesquisa de campo, decidiu-se dialogar com
Minayo (1996); Bardin (2002); Gil (1991), este último trabalhando com o trabalho
para discutir a classificação desta pesquisa aplicada. qualitativa, explicativa e
participativa. Também uso pesquisa documental para analisar a importância das
práticas físicas incluídas no PPP e no curso de disciplina esportiva do EMEFP
“Jiboia”.
Nesse contexto, trata-se de uma pesquisa qualitativa em que entro em
diálogo com Minayo (1996) e me proponho a trabalhar com os significados das
práticas corporais, uma vez que abordam as peculiaridades da cultura
quilombola. Nesse sentido, é importante entender as relações que se constroem
a partir da dimensão corporal nas comunidades quilombolas de Monte Alegre em
diferentes ambientes escolares.
Para listar as fases básicas da análise dos dados, ela é usada como
referência Bardin (2002) enquanto trabalho com a descrição do material. É
importante ressaltar que a opção por essa técnica de pesquisa ocorre porque
acredita que o texto é uma forma de expressar o tópico.
Nesse contexto, as palavras e / ou frases repetidas são categorizadas
após os textos das entrevistas serem divididos, derivados, reagrupados, os
significados da comunicação serem trabalhados e depois divididos em
categorias.
Conforme sugerido por Bardin (2002), são executadas as seguintes
47

etapas: pré-análise que é realizada no momento em que o material é explorado;


Codificação na qual o conteúdo é dividido, análise das categorias encontradas.
Os requisitos foram relevância e objetividade. A etapa final, por outro lado, será
a preparação dos resultados e a interpretação dos registros, agrupando-se de
acordo com as semelhanças e características distintivas que contribuíram para
a constituição da análise reflexiva do conteúdo coletado.
É importante ressaltar que para classificar a pesquisa como qualitativa,
optou-se por dialogar com Gil (1991), por acreditar que há uma relação dinâmica
entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo insociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade, sendo que o processo das práticas corporais e seus
significados são os nossos focos principais de abordagem.
As visitas à comunidade serão planejadas após consulta à associação da
comunidade e aprovação da coleção. Ao entrar em contato com os participantes
pela primeira vez, eles leem o termo de consentimento livre e esclarecido, que
contém informações de pesquisa a serem assinadas pelo alfabetizado ou a
impressão digital pelo analfabeto que concordou em participar. A partir daí, é
utilizado um questionário semiestruturado.

7.1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

O referencial teórico para a conceituação da cultura é baseado em autores


como Laraia (2004), Chauí e nos estudos antropológicos de Clifford Geertz
(1978). De acordo com este último, a cultura permite conhecer todas as
configurações sociais, subjetivas, políticas e econômicas nas quais um povo está
organizado para viver e entrelaçar suas ideologias, ética e valores morais
pertencentes a um determinado grupo.
De acordo com o autor:
[...] o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele
mesmo teceu, [por isso compreendo] a cultura como sendo essas teias
e sua análise; portanto não como uma ciência experimental em busca
de leis, mas como uma ciência interpretativa à procura de significados
(GEERTZ, 1978, p. 15).
Grosso modo, como a totalidade das atividades humanas (materiais e
imateriais) que o homem constrói na sociedade, a cultura compreende uma série
de crenças, ritos, línguas, conhecimentos, conhecimentos, costumes,
expressões populares, identidades, técnicas e tecnologias, formas de
48

Comportamento coletivo, direitos, regras morais e manifestações artísticas em


geral, portanto "cultura é tudo o que as pessoas na sociedade fazem e adquirem
para determinar o tempo histórico e o espaço geográfico" (LARAIA, 2004, p. 49).
O autor salienta que o homem é o resultado do meio cultural em que foi
socializado:
Ele é um herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o
conhecimento e a experiência adquiridas por numerosas gerações que
o antecederam. A manipulação adequada e criativa desse patrimônio
cultural permite inovações e invenções. Essas não são, pois o produto
da ação isolada de um gênio, mais resultado de um grande esforço de
toda uma comunidade (LARAIA, 2004, p. 45).
Chauí (2008), ao defender a relação entre políticas culturais e suas
consequências para a ampliação de uma democracia efetiva, entende que,
numa sociedade de classes, de exploração, dominação e exclusão
social, a cultura é um direito do cidadão, direito de acesso aos bens e
obras culturais, direito de fazer cultura e de participar das decisões
sobre a política cultural (CHAUÍ, 2008, p. 61).
Com base em uma análise crítica da política cultural no país, o autor
posiciona o papel da cultura - assim como da política e gestão cultural - nos
conflitos sociais, a fim de entender e defender sua função emancipatória a partir
de agora.
Segundo a autora, a cultura popular não deve ser vista como outra cultura
ao lado (ou no final) da cultura predominante, mas como algo que ocorre na
mesma cultura, mesmo que se oponha:
(...) Nossa atenção estará voltada para manifestações dos dominados
em uma sociedade autoritária e por isso nos aproximaremos da Cultura
Popular como cultura plebéia, no sentido que o Direito Romano dava
ao conceito de plebe: aqueles desprovidos de cidadania e que se
fazem representar por meio de outros (cidadãos), encarregados de
apresentar e defender direitos na cena pública. Mas também no sentido
de Espinosa e de E. P. Thompson. isto é, capaz de organizar-se,
reivindicar direitos tácitos e preparar-se para penetrar no universo dos
direitos políticos e culturais explícitos (CHAUÍ, 2008, p. 24-25)
Chauí (2000) afirma que o homem, para demonstrar seu poder, cria uma
diferenciação entre as demais classes sociais.
Uma comunidade cria a mesma cultura para todos os seus membros,
mas numa sociedade isso não é possível, e as diferentes classes
sociais produzem culturas diferentes e mesmo antagônicas. Por esse
motivo é que as sociedades conhecem um fenômeno existente nas
comunidades: a ideologia. Esta é resultado da imposição da cultura,
embora vivendo em condições sociais diferentes. A ideologia é uma
das maneiras pelas quais as sociedades históricas buscam oferecer a
imagem de uma única cultura e de uma única história, ocultando a
divisão social interna (CHAUÍ, 2000, p. 297).
Nesse sentido, Geertz (1989) sustenta esta pesquisa e explica que "a
cultura é a mediação entre poder e o objetivo de sua ação". Começa a contar
49

como um conjunto quando os significados são traduzidos historicamente, ou


seja, através de símbolos que se manifestam em comportamentos. Sem
homens, certamente não haveria cultura, mas sem cultura também não haveria
homens. O autor comenta as etnociências, nas quais a cultura é composta de
estruturas psicológicas através das quais indivíduos ou grupos orientam seu
comportamento
[...] a cultura que é mais bem vista não como complexos de padrões
concretos de comportamento-costumes , usos, tradições ,feixes de
hábitos, com tem sido agora, mas como um conjunto de mecanismos
de controle- planos receitas, regras, instruções ( o que os engenheiros
de computação chamam (GEERTZ, 1989, p. 56).
Geertz (1989) embasa em teorias da semiótica para formular o conceito
de cultura. Para o autor, o termo cultura é como uma teia de significado que é
passada de geração em geração, é internalizada na forma de sistemas
simbólicos, é compartilhada em todos os grupos e pode ser interpretada.
Segundo o autor, a cultura é como um contexto que pode ser interpretado a partir
das ações e perspectivas simbólicas dos nativos. Porque as ações sociais dos
nativos correspondem a pequenos eventos ligados a grandes questões.
Segundo Geertz (1989, p. 26), a interpretação do pesquisador será
sempre incompleta, pois apenas os nativos são capazes de agir e dizer
corretamente o papel de certos elementos culturais em suas vidas. Portanto,
"textos antropológicos são, eles próprios, interpretações e, de fato, são de
segunda e terceira mão". O foco do trabalho está em dados descritivos e
pesquisa bibliográfica. As entrevistas abertas são usadas para analisar a
realidade social de maneira complexa e contextualizada e para examinar os
discursos e rituais falados sobre/do/no local em diferentes tempos e espaços.
No local, observa-se a idéia dos quilombolas do mundo sobre o meio
ambiente e a relação entre sentimento e solo, entre pertença e reprodução
material da existência, para que, com base nos resultados, possamos contribuir
para a educação física em uma quilombola. Comunidade através de histórias,
práticas e conhecimentos.
50

8 INTERVENÇÃO A FAVOR DA EDUCAÇÃO CULTURAL

Durante o desenvolvimento desta intervenção tivemos como principais


objetivos demonstrar a importância do desenvolvimento de aulas, enfatizando o
ensino da Educação Física por meio de narrativas, práticas e saberes,
sobretudo, a jogos e brincadeiras, tendo por clientela, alunos da EJA na EMEFP
“Jiboia”, da Comunidade Boa Esperança, para bem analisar o nível de
conhecimento destes sobre essa temática, buscando despertar o sentimento de
pertencimento e consequentemente preservação dos patrimônios histórico e
cultural local.
A preservação do Patrimônio Cultural é importante para o
desenvolvimento e enriquecimento cultural de um povo. Os bens
culturais envolvem informações, significados, mensagens, registros
das histórias humanas – traduzem ideias, crenças, costumes, gosto
estético, conhecimento tecnológico, condições sociais, econômicas e
políticas de um grupo em determinada época (GUIA DA
PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL, 2008, pag. 04).
É nesse contexto que se defende a importância dos alunos estarem em
contato com esses conteúdos, a fim de levar conhecimento e fazer com que os
mesmos se sintam partes integrantes dessa conjuntura, desenvolvendo um
sentimento de cuidado com bem coletivo.

Por meio dessa intervenção pretende-se aflorar nos alunos o interesse


pela cultura e história local, utilizando como parâmetros os patrimônios históricos
culturais presentes em sua cidade, no caso de Presidente Kennedy, o jongo e as
brincadeiras lúdicas ou que rememoram à infância. Durante a visita com os
alunos, os motivamos a manterem contato com as obras e características
histórias presentes na memória, propondo-lhes retratarem suas lembranças por
meio de desenhos e pinturas, buscando aguçar neles um olhar crítico sobre os
aspectos visuais, históricos e culturais, além de sensibilizá-los para o
entendimento da memória coletiva.

8.1 ENTRADA NO CAMPO DA PESQUISA

Para dar início ao trabalho de pesquisa optamos pela EMEFP “Jiboia” por
ser uma instituição bem próxima ao patrimônio que selecionamos como base de
nossos estudos, neste caso, os jogos e as brincadeiras. Optamos por
desenvolver nossa pesquisa com duas turmas da EJA, uma com oito alunos, às
51

terças-feiras e outra, com seis alunos, às quintas-feiras, ambas no turno noturno.


Elaboramos um questionário que contou com dez perguntas, o que nos
possibilitou extrair dos alunos, dados referentes ao conhecimento dos mesmos
em relação às lembranças da infância e as principais características de suas
memórias. Ao aplicarmos o questionário, foi bastante produtiva a experiência,
que durou duas horas na terça-feira e outras duas horas na quinta-feira.
Em 18 de fevereiro de 2020 realizamos o primeiro dia da intervenção. Os
alunos nos receberam com muito entusiasmo, pois já aguardavam a nossa
presença. Iniciamos a aula com a dinâmica “quebra gelo” que nos possibilitou
conhecer melhor cada aluno como seu nome, sua idade, e o que gosta de fazer
nas horas vagas. Em seguida aplicamos o questionário que aconteceu da
seguinte maneira: Realizamos leitura das perguntas, uma por vez, em voz alta,
e os alunos foram respondendo. Não houve dificuldade durante a aplicação.
Alguns tiveram dúvidas, porém, de fácil esclarecimento.
Cheguei à Escola e me apresentei aos oito alunos da turma e conversei
com eles sobre as perguntas que faria. Como informado, as perguntas foram
individuais. Alguns responderam todas as perguntas, outros alunos falaram que
não participaram de danças e nem de brincadeiras. Acredito até, que seja por
questão de religião, pois quando eram pequenos participavam, porém, agora
são membros igrejas e acham errado falar sobre danças, brincadeiras e jongo,
por exemplo. Em suma, o encontro foi ótimo, pois alcancei o objetivo: obter
informações para a dissertação
Observei que nomes das danças e as brincadeiras relatadas por eles são
muito parecidos, inclusive, a forma como aprendera, praticamente foi a mesma:
eles olhavam as pessoas dançando e aprendiam dançar. Ficaram meio ansiosos
ao responder as perguntas.

8.1.1 Categoria: Infância

Na data agendada para a segunda intervenção, o desenho, nos dirigimos


à escola. Conversamos com os professores, com a direção e com os seis alunos.
Distribuímos papel A4, lápis de cor, giz de cera e solicitamos que desenhassem
as brincadeiras que os remetiam à infância.
Fomos muito bem recebidas, principalmente, pelos alunos que se
52

mostraram o tempo todo interessados, curiosos e muito atenciosos em relação


à atividade proposta, neste caso responder o referido questionário.
Entrei na sala de aula, organizei os alunos e entreguei várias folhas de
papel A4, bem como lápis de cor, giz de cera, pincel, tinta guache e pedi que ali
desenhassem, individualmente, sobre sua história, brincadeiras antigas de
quando eram crianças e, danças que conheciam, bem como, algo que tivesse
marcado as vidas deles.
Dessa vez eles se sentiram mais a vontade. Por meio dos desenhos
lembraram de novas brincadeiras e relembraram de outras histórias de sua vida.
Alguns nunca tinham desenhado, outros relataram as brincadeiras e danças e
sua história. Uns tiveram dificuldades para desenhar, eu mesma me propus a
desenhar no quadro negro para incentiva-los. À medida que eu desenha, eles
replicavam em seus papeis. Desenhei no formato de quadro, pois eles queriam
fazer quadros e desenhar dentro, mas não sabiam.
Houve interatividade e ajuda mútua. Eles ficaram tão felizes com os
desenhos, que entre si, se ajudaram. Ao final questionei qual teria sido a
motivação para a elaboração daquele desenho? Também ajudei na hora de
falarem sobre as brincadeiras e danças e registrei o momento com uma foto
oficial onde todos seguraram seus desenhos. O aluno Rubens informou que
aquele foi o primeiro desenho que ele tinha feito na vida.
Realizamos a terceira intervenção no dia 27 de fevereiro, numa quinta-
feira, onde também precisei de ajudar na montagem dos desenhos que alguns
alunos no conseguem fazer sozinhos. À medida que eles foram relatando, eu os
ajudava a construirem seus desenhos.

Nesta terceira intervenção percebi que, colocando os alunos em duplas,


eles ficaram muito mais à vontade para falar. Eles riram muito, lembraram de
danças e acontecimentos esportivos diferentes. Foi muito produtivo esse
encontro.
A história de vida e superação desse povo heroico e batalhador é
encantadora. Essa fase foi intitulada: categoria danças. Rememorar e ativar as
lembranças os fez mais produtivos e participativos. A interatividade entre eles os
auxiliou em relembrarem fatos e “causos” de tempos vividos na infância.
Ao chegar na EMEFP “Jiboia” ainda chovia. Nesse dia compareceram à
53

escola, quatro alunos. Conversei com eles e eles me informaram que parte do
desenho que estavam fazendo, finalizariam naquele dia. Pedi que caprichassem,
porém, o foco dos desenhos era brincadeiras antigas, ou seja, categoria jogos e
brincadeiras.

Na Figura 1, Tereza de Paula relata que se desenhou com uma lata


d’água na cabeça e também pescando. Ela narra também se desenhou com seu
irmão na gongorra, pulando corda e brincando de anel. Desenhou também um
peixe grudado em seu pé e uma vaca correndo atrás dela, além de um pedaço
do vestido agarrado na cerca.

Figura 1 – Lata d´água na cabeça

Fonte: Tereza de Paula


54

Tereza, conforme demonstra a Figura 2, enfatizou que tentou desenhar


uma santinha na Igreja das Neves, mas acabou desenhando que estava pulando
uma fogueira.

Figura 2 – Igreja Nossa Senhora das Neves

Fonte: Tereza de Paula

A Figura 3 certifica Adelma com muitas outras crianças brincando de roda.


A aluna menciona que “’ajuntava’ eu e um monte de menina e a gente fazia uma
roda, fazia tipo uma fila e cada uma pulava uma vez, até cansar”.

Figura 3 – Pulando corda e na praia

Fonte: Adelma da Conceição Silva


55

Em seu segundo desenho, conforme Figura 4, Adelma também desenhou


um garoto brincando de pipa, sua casa na infância e uma boneca, além de uma
árvore e do sol, mas descreve que esqueceu-se de desenhar o balanço, um de
seus brinquedos preferidos quando era criança.

Figura 4 – Soltando pipa, brincando de boneca e roda

Fonte: Adelma da Conceição Silva

Elza Maria retratou suas lembranças desenhando um fogão de barro,


conforme demonstrado na Figura 5, mas preferiu não relatar verbalmente, o que
foii por todos respeitado. Falante durante as intervenções, optou por apenas
desenhar e ficar em silêncio, ao relembrar sua infância.

Figura 5 – Lembranças de Elza – fogão de barro

Fonte: Elza das Neves Neto


56

O aluno Rubens informou que aquele foi o primeiro desenho que ele tinha
feito na vida, representado na Figura 6. Ao rememorar sua infância, o aluno
desenhou-se montado num cavalo, segurando-o pela crina. Rubens conta que
desenhou-se montado no pelo do animal, sem rédeas e sem arreio, apenas com
o cabresto.

Figura 6 – Galopando no pangaré

Fonte: Rubens Barreto Fontão

A Figura 7 apresenta Carlinhos, quando criança, jogando bola, segundo


ele próprio. O aluno comenta ainda que desenhou-se com outras crianças
brincando de pipa, pulando fogueira e pescando.

Figura 7 – Carlinhos e suas contações de história

Fonte: Carlinhos Silva Evangelista


57

8.1.2 Categoria: Jogos e brincadeiras

Saudade dos velhos tempos – primeira parte! Este é o tema que define o
desenho do Ricardo, conforme Figura 8, onde ele se desenhou jogando bola,
pulando corda, brincando de corrida do saco, jogando boleba e brincando de
carrinho

Figura 8 – Saudade dos velhos tempos (I)

Fonte: Ricardo de Souza


58

Noutro momento, conforme Figura 9, Tereza disse que está meio cega,
mas que havia tentado desenhar umas árvores e um rodeio. Ela afirma ter
tentado desenhar algéum da sua família montada no cavalo e ela estaria a puxá-
lo dentro da arena.

Ambas, ela e a pessoa montada, eram crianças à época. No mesmo


desenho lembrou-se de outro animal, um cachorro, e também o desenhou, como
que a farejar algo. Normalmente nas festas de rodeio há muitas sobras de
comidas, o que poderia atrair os cães famintos.

Figura 9 – Tereza puxando o cavalo

Fonte: Tereza de Paula


59

Joaci, conforme Figura 10, desenhou-se jogando bola e dentro de um


círculo, mas não explicou seus desenhos. Já a Figura 11 é a sequência dos
desenhos de Ricardo, que disse ter participado da Festa das Neves na infância.

Figura 10 – Jogando bola (jogo de futebol) Figura 11 – Saudade dos velhos tempos (II)

Fonte: Joaci das Neves Fonte: Ricardo de Souza

Na Figura12, Carlinhos se desenhou pintando uma aquarela e Adelma, na


Figura 13, retratou as festas juninas que participava quando era criança,
relatando muita saudade.

Figura 12 – Carlinhos pulando fogueira Figura 13 – Festa junina e quadrilha caipira

Fonte: Carlinhos Silva Evangelista Fonte: Adelma Conceição Silva


60

Nas Figuras 14 e 15, Rubens disse que desenhou-se jogando futebol e


brincando de pique-esconde com vizinhos, durante sua ‘meninice’, mas que
gostava mesmo era de sair galopando no pangaré.

Figura 14 – Jogando futebol com vizinhos Figura 15 – Brincando de pique esconde

Fonte: Rubens Barreto Fontão Fonte: Rubens Barreto Fontão

Carlinhos, conforme Figura 16, desenhou um de seus brinquedos


preferidos - a malha, por ele assim relatada: “A malha era redonda assim, aí cê
botava lá um... chamava um vinte. Um vinte que se tratava e era um pé de pau.
Aí botava sim, um botava o dinheiro na pedra, embaixo já tava o outro botava
em cima do 20, o outro botava a malha, se dirrubasse, dava 20, se o dinheiro
caísse ali, dentro da malha, a gente ganhava. Se você rompesse a malha, perdia
ponto”.
Figura 16 – Brincando de malha

Fonte: Carlinhos Silva Evangelista


61

A brincadeira de pular corda sempre foi a predileta da garotada e na


Figura 17 Tereza comprova o fato. Uma das brincadeiras mais marcantes, pois
se reunia com suas amigas para passarem horas neste entretenimento.

Figura 17 – Brincando de pula corda

Fonte: Tereza de Paula

8.1.3 Categoria: Danças – desenhos

Tão tradicional quanto as brincadeiras de roda no campo, é o baile,


retarado na Figura 18 por Carlinhos, que o rememora com muita saudade.

Figura 18 – Carlinhos, aos oito anos, no forró (casa de estuque)

Fonte: Carlinhos Silva Evangelista


62

Maria gosta tanto do jongo que, em seus dois desenhos, retratou esse
dança tão notável na sua vida, conforme as Figuras 19 e 20. Apesar de seus 62
anos de idade, Maria tem a ginga e o embalo dessa dança tradicional originária
da África até hoje.

Figura 19 – Maria retratando o jongo (I) Figura 20 – Maria retratando o jongo (II)

Fonte: Maria da Penha Fonte: Maria da Penha


Foi gratificante ver esse resultado tão positivo! Amei realizar essa
pesquisa de campo junto com alunos de Jiboia. Fiz um vídeo dos alunos
desenhando. Pediram que mostrasse o vídeo e riram demais. Amaram as
novidades de desenho, fotos e o vídeo, que trazem à tona, o resgate da cultura
deles.

8.2 EXPOSIÇÃO DOS DESENHOS E FOTOGRAFIAS

Após as visitas à EMEFP “Jiboia” concluímos nosas intervenções com


uma Exposição Artística das atividades desenvolvidas em desenhos e
fotografias, realizadas pelos alunos, pois acreditamos que ter seus trabalhos
expostos para apreciação por parte de outras pessoas, traz sentido e significado,
além de valorizar e contribuir para a autoestima dos estudantes.
63

Fazê-los experimentarem distintos papéis, de artista (propositor de uma


obra) e de apreciador (apreciar as atividades dos colegas), trouxeram
experiências inigualáveis para os alunos, visto que há um enriquecimento
estético, crítico, de trabalho em grupo, advinda das vivências que lhes foram
ofertadas, conforme pode-se notar nas Figuras 21 e 22.

Figura 21 – Representação do jongo alunos Figura 22 – Painel com fotografias antigas

Foto: Acervo da autora Foto: Acervo da autora

Os alunos EJA da Escola Jiboia ficaram entusiasmados com os próprios


resultados. Muitos deles não sabiam que conseguiriam desenhar. Prova deste
contentamento podem ser observados nas Figuras 23 e 24. Por duradouros
minutos eles contemplaram fotos antigas que os remetiam à infância, trazendo à
lembrança os velhos tempos.

Figura 23 – Prestigiando a exposição fotográfica Figura 24 – Alunas na exposição de fotos

Foto: Acervo da autora Foto: Acervo da autora


64

Os instrumentos usados na capoeira, como o berimbau e, principalmente


no jongo, também foram expostos na Exposição Fotográfica como adereços e
decoração. Além de conhecer (para quem ainda não conhecia), eles puderam
tocar no tamor e tocar os tambores, conforme Figuras 25 e 26.

Figura 25 – Fotografias e instrumentos Figura 26 – Sr. Carlinhos batendo tambor

Foto: Acervo da autora Foto: Acervo da autora


Antes de dançarem o jongo, esta autora exlicou aos alunos da EJA que
apresentaria a eles um portfólio contendo os desenhos por eles confeccionados,
bem como, com fotografias antigas. Para isso os colocou sentados numa roda,
conforme Figura 27.

Figura 27 – Roda de conversa com os alunos da EJA

Foto: Acervo da autora


65

Os alunos puderam, um por um, ver de perto, suas obras e fotos. A


emoção contida em cada indivíduo foi perceptível e gratificante. As Figuras 28,
29 e 30 confirmam o entusiasmo e/ou a concentração deles.

Figura 28 – Alunos conhecendo portfólio Figura 29 – Expondo os livros aos alunos da EJA

Foto: Acervo da autora Foto: Acervo da autora

Figura 30 – Resultado positivo: aluno feliz

Foto: Acervo da autora


66

Como o jongo é cultura de matriz africana e tradicional na comunidade


quilombola Boa Esperança, convidamos os alunos, que no passado foram
jongueiros, a reviverem e a representarem este folguedo tão importante e
enraizado em Presidente Kennedy. Ainda que nos primeiros encontros tenham
afirmado que não jongam mais, por causa da religião, aceitaram o convite e
apresentaram lindamente, conforme as Figuras 31, 32 e 33 demonstram.

Figura 31 – Representação do jongo Figura 32 – Alunas jongueiras

Foto: Acervo da autora Foto: Acervo da autora

Figura 33 – Alunas da EJA representando o jongo na EMEFP “Jiboia”

Foto: Acervo da autora


67

Ao final de nossa Exposição Fotógráfica, conforme Figura 34, os alunos


posaram para um registro oficial da conclusão de nossas intevenções e de nossa
pesquisa de campo. Finalizamos a pesquisa certos de que há ainda, um universo
a explorar e muitas descobertas, pois essa temática é rica e os dados requerem
diligência na análise. Apresentamos questões importantes para reflexão sobre a
importância das práticas corporais na Comunidade Quilombola Boa Esperança,
ensinando educação física por meio de narrativas, práticas e conhecimentos.
Apontamos reflexões, como professores e pesquisadores, sobre nosso papel na
formação de objetos que possam contribuir para a valorização da cultura afro-
brasileira.

Figura 34 – Alunos e alunas da EJA, instrumentos utilizados no jongo e o painel

Foto: Acervo da autora


68

9 DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS

9.1 DISCUSSÃO SOBRE ESTA PESQUISA

Após a conclusão da intervenção na EMEFP “Jiboia”, assim como


realizado antes do projeto, aplicamos entrevistas e um roteiro para o processo
de criação dos desenhos com os alunos da EJA com o intuito de realizar um
paralelo dos resultados, e assim, chegarmos a resultados mais detalhados e
acertados.
Utilizamos as mesmas perguntas nos questionários (entrevista) e o
mesmo método de aplicação no processo de criação e, como esperado, os
resultados muito positivos. Para analisar os dados desta pesquisa faz-se opção
pela análise de conteúdo, pois ela perfaz um conjunto de instrumentos
metodológicos, que se encontra em construção e constante aperfeiçoamento, e
que se aplica a discursos diversificados.
É uma série de técnicas de análise de comunicação projetadas para
fornecer procedimentos sistemáticos e objetivos para descrever o conteúdo das
mensagens (BARDIN, 2011). Para o mesmo autor, trata-se de "analisar notícias",
ler duas vezes e deduzir o significado do que foi dito e "não dito".
Para Monte Alto (2012), o principal interesse desta ferramenta de
pesquisa, a análise de conteúdo, reside no fato da "observação convincente", na
escuta atenta entre o estímulo noticioso (palavra indutiva do entrevistador) e a
reação interpretativa do entrevistado.
Através de palavras faladas e não ditas, através de escuta e observação
cuidadosas, foi possível conhecer os conhecimentos e ações que estavam
presentes na tradição oral da comunidade quilombola de Boa Esperança na
comunidade Presidente Kennedy. Ao entrar nessa comunidade, os demais
quilombolas apresentaram sua sabedoria, que foi construída e constituída
através da descida.
Por sua vez, isso se manifesta na oralidade, que repassa o conhecimento
adquirido através da experiência vivida e é reprocessada a partir do ato da
linguagem em que ocorre a magia da palavra. A palavra que tornou possível o
que Carvalho (2008) possibilitou: compreender o caminho e a relevância do
trabalho em identidade, pertencimento, incluindo a oralidade do povo quilombola
69

e o conhecimento popular desse povo.


Após visitar e identificar os alunos, o próximo passo foi a narrativa oral.
Começamos com a história local, pois é importante apreciar e redescobrir a
história por conta própria e lembrar sua infância. Os eventos mais próximos do
aluno também devem ser apresentados, discutidos e avaliados, a fim de melhor
compreender a sociedade em que vivem (SILVA, 2015).
Narrativas orais, observações na comunidade e na escola, o grupo focal
mostra como os quilombolas se educam e como constroem sua história,
conforme enfatizado por Delgado (2006). Os tópicos que contam histórias são
líderes comunitários, trabalhadores, jovens, mulheres, pessoas com diferentes
profissões e ativistas de movimentos étnicos.
A escola sempre foi valorizada pela comunidade e sua institucionalização
foi resultado das demandas dos idosos pela prefeitura. No entanto, é claro que
os resultados no grupo focal e na observação dos participantes mostram uma
mentalidade pedagógica do departamento de educação da comunidade para
todas as escolas com realidades diferentes.
Deve-se notar, no entanto, que Santana (2005) enfatiza a distância entre
a escola e a área de Quilombola, ou seja, uma escola racista e, portanto, a exclui,
pois existe uma lacuna entre o conhecimento da escola e o conhecimento de
Quilombola e ambos são importantes e precisam ser contextualizados.
Para Castilho (2008) a prática educacional contextualizada de uma escola
que utiliza a educação escolar quilombola ajuda a fortalecer a identidade e, Hall
(2006), por sua vez, coopera com a discussão quando informa que esse
conhecimento, essas práticas e costumes da comunidade, integram laços de
identidade.

9.2 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS DURANTE A PESQUISA DE


CAMPO

Aos alunos pesquisados foi proposta uma intervenção cultural,


objetivando aguçar as lembranças do passado, por meio do desenho, em três
momentos, dos quais classificamos por categorias: infância, jogos/brincadeiras
e dança. Os encontros presenciais com a turma foram realizados na EMEFP
“Jiboia”, localizada na comunidade quilombola Boa Esperança, no município de
70

Presidente Kennedy, Estado do Espírito Santo, com os alunos Adelma


Conceição da Silva, Carlinhos Silva Evangelista, Elza das Neves Neto, Joaci das
Neves, Maria da Penha, Ricardo de Souza Laurindo e Tereza de Paula,
estudantes da EJA, turno noturno, nos dias 18, 20, 27 de fevereiro e 04 de março
de 2020.
O roteiro para o processo de criação dos desenhos teve por base as
seguintes indagações: sua infância deve ter sido inesquecível. Consegue relatá-
la para mim?, Você brincou muito na sua infância? Vamos relembrar algumas
brincadeiras daquela época?, Toda família tem sua história, você relataria um
pouco da história da sua família para mim?, Como era sua convivência com sua
família?, Você consegue me informar quais danças são praticadas na sua
comunidade?, Você participa ou participou de alguma dessas danças?, Como
aprenderam a dançar esses passos e ritmos?, Existe alguém na comunidade
que ensina essa dança? Como se chamam essas pessoas?, Você só dançava
ou também aprendeu a tocar algum instrumento? E, pode me informar o nome
desses instrumentos que são utilizados nessas danças?
As perguntas padrões para auxiliá-los na reprodução dos desenhos
foram: Qual é o seu nome completo e idade? O que você desenhou? Há
brincadeiras que você não esqueceu de desenhar? Tem alguma dança? Cite
algum acontecimento que tenha te causado impacto: Das brincadeiras e danças
que você participou na sua infância, alguma te marcou? Sobre questões
religiosas, eventos na comunidade ou fora dela, você participava no seu tempo
de criança?
Os resultados esperados foram alcançados com sucesso. As respostas
relacionadas às perguntas descritas foram, em sua maioria, para os homens,
que as brincadeiras mais comuns eram andar a cavalo, jogar bola, soltar pipa e
brincar de bola de gude e, para as mulheres, a maioria se lembrou de ter brincado
com bonecas, casinha, passar anel e chicotinho queimado. Comum aos gêneros:
tiveram uma infância feliz; brincaram muito; relataram saudade do passado com
familiares, amigos e vizinhos; tiveram a melhor convivência possível; por
unanimidade o nome de Jorginho foi lembrado como mestre de jongo e; nenhum
aprendeu a tocar instrumentos musicais.
Para para representar a categoria Infância, os alunos Tereza, Adelma,
Elza, Rubens e Carlinhos desenharam 23 obras compartilhadas em sete
71

quadros, sendo quatro no dia 18 de fevereiro, dois em 20 de fevereiro e um no


dia 27 de fevereiro. Quanto à categoria Jogos e Brincadeiras, foram produzidos
10 quadros, desenhados por Ricardo, Tereza, Joaci, Carlinhos, Adelma e
Rubens, nos dias 18 de fevereiro (02), 20 de fevereiro (03), 27 de fevereiro (01)
e 04 de março de 2020 (04). A categoria Dança foi desenhada nos dias 20 e 27
de fevereiro de 2020, por Maria da Penha e Carlinhos, com dois e um quadro,
respectivamente.
A alegria, o contentamento e a convicção de terem tido seus obstáculos
superados eram nítidos no rosto de cada aluno. Foi um resgate! Idosos e negros,
vencendo desafios, rompendo barreiras do preconceito, conquistando o sonho
de retomarem os estudos e, acima de tudo, assumindo seu espaço na dignidade
humana tão confiscada ao longo dos séculos.
Para finalizar foi elaborado um portfólio reunindo todos os desenhos, e
apresentado aos alunos que celebraram o sucesso da pesquisa. Como a
comunidade é remanescente de escravizados e, a influência da cultura de matriz
negra está enraizada há séculos na localidade, foi realizada uma Exposição de
Fotografias Antigas e de Instrumentos Musicais, além da apresentação do jongo,
folguedo de origem africana que atravessa gerações.
A exposição fotógráfica contou com a participação destes mesmo alunos
em todos os momentos propostos: desenho, presentando a infância, os jogos e
brincadeiras, as fotos rememorando os velhos tempos e a dança, representada
pelos instrumentos de capoeira e jongo, onde os estudantes da EMEFP “Jiboia”
bateram tambor (homens) representaram a dança de umbigada (mulheres),
demonstraram, por meio de narrativas, práticas e saberes, que o ensino da
Educação Física também é possível numa comunidade quilombola.
72

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos ao final da pesquisa com a sensação de que ainda há muito a


explorar, o tópico é rico e os dados requerem cuidado e entusiasmo na análise.
Este trabalho apresenta questões importantes para reflexão sobre a importância
das práticas corporais na Comunidade Quilombola Boa Esperança, ensinando
educação física por meio de narrativas, práticas e conhecimentos. Também
sugere a importância da reflexão, como cpesquisadores e professores, sobre o
papel de cada um de nós na formação de sujeitos capazes de contribuir para a
valorização da cultura afro-brasileira.

O objetivo deste trabalho foi realizar uma pesquisa com alunos EJA da
Escola Municipal Pluridocente Municipal "Jiboia" para entender através de
processos de memória como a experiência com jogos e diversão contribuiu para
a constituição cultural da comunidade quilombola Boa Esperança, localizada no
município de Presidente Kennedy, no sul do estado do Espírito Santo. Entre os
muitos desafios estão profissionais, estudantes e comunidades envolvidos nessa
proposição de ensino, ensino e aprendizagem.

Somam-se ao objetivo principal deste trabalho, problematizar as práticas


corporais no contexto da comunidade quilombola Boa Esperança, considerando
a existência de uma relação entre essa comunidade e a disciplina de Educação
Física na apropriação de cultura, buscando refletir como as memórias dos idosos
quilombolas podem auxiliar os professores da educação física a desenvolver,
juntamente com seus estudantes, a releitura da identidade negra e a valorização
da história e cultura local.

Ao mapear as práticas corporais de trabalhar com os alunos durante as


aulas de educação física de uma escola da comunidade de Boa Esperança, que
são essencialmente jongo e futebol, encontrei contradições importantes para
pensar sobre o local onde a educação física e a escola estavam treinando os
alunos. Deve-se discutir a Lei 10.639/03, questionando sua aplicação e
propostas, sem esquecer que a escola está conectada e conectada com a
comunidade e a sociedade.

Graças a relatos das memórias dos alunos, conseguimos reinterpretar o


73

que contribuiu para esta investigação e me convenceu de que, à luz desse


entendimento, é necessário repensar o ensino de educação física, porque o
trabalho realizado em Boa Esperança indica nossa pesquisa sobre quantas aulas
na educação física, contribuem para a importância das práticas corporais e a
apropriação dos elementos culturais da comunidade quilombola.

Como sou professora de Educação Física numa escola situada em


comunidade quilombola, minha trajetória com o tema de pesquisa se inicia pela
aproximação que tenhos com essas instituições. O que me chamou atenção
sobre os alunos pois, são senhores sobretudo - a maioria com experiências de
muitas décadas, e o que mais eles gostavam eram das brincadeiras antigas.
Através dessas observações percebi a necessidade de usar práticas
pedagógicas para resgatar a cultura nessa comunidade.

A grande problemática no começo das minhas aulas foi aceitarem realizar


atividade física. Eles não conheciam a disciplina de Educação Física, nunca
tinham visto e estavam ali na escola para estudar. Queriam somente ler e
escrever e não queriam participar das aulas. Percebi que precisava fazer alguma
coisa e para obter sucesso nas aulas, comecei a levar coisas que gostavam,
como brincadeiras: amarelinha, peteca, passa anel, etc. Percebi que deu certo e
pretendo trazer esse resgate histórico, sobretudo, respeitando a cultura desses
alunos.

Isso me aproxima da compreensão da cultura como uma rede que é tecida


e tecida. Em diálogo com a comunidade representada pela escola, ela fortalece
sua cultura, influenciando professores e alunos a vivenciar essa cultura e, ao
mesmo tempo, fortalecendo a cultura quilombola na escola. Outro ponto
importante a ser observado é que os alunos mencionaram frequentemente o
futebol em seus estudos de campo. Além do futebol, na infância eles
mencionaram jogos de pular corda, lúcio e pele, cavalos a galope e dança de
jongo, além de forró.

Essa pergunta me permite entender os dados coletados nos quais o


futebol é apresentado como favorito dos homens (meninos, quando suas
memórias são citadas aqui) e pular nas cordas das mulheres (na época
meninas). Acredito que esses jogos tenham sido apresentados e ainda se
apresentem nas relações sociais moldadas nos quilombolas da vida social, pois
74

são importantes para a comunidade de Boa Esperança como elemento cultural


que promove as relações sociais.

Analisando os dados coletados, percebo a influência do Sr. Jorginho nos


alunos estudados, porque ele foi unânime, reconhecendo-os como um mestre
do jongo, ensinando essa dança e cultura herdada de seus ancestrais,
provavelmente os restos de pessoas escravizadas que viviam nessa
comunidade e que ele era o principal craque. O principal impacto que este
trabalho proporcionou à comunidade é perceptível na estreita relação entre
escola e comunidade que foi vista na pesquisa e me permitiu ver o papel
significativo que a escola desempenha na comunidade quilombola na
apropriação de elementos culturais, pois busca destacar as manifestações que
mais afirmam a cultura afro-brasileira.

A realização desta pesquisa me fez pensar sobre a importância desse


trabalho para a comunidade, que, apesar de divulgado em documentos e papéis
científicos, ainda não foi estudado, levando em consideração suas práticas
corporais. Acreditamos que essa também é uma maneira de fortalecer essa
cultura; portanto, enviaremos uma cópia desse trabalho para a escola.

Reconheço os limites de minha pesquisa e acredito que ainda há muito o


que discutir e pesquisar, e é por isso que sugiro que esse seja apenas um dos
muitos estudos realizados neste programa para problematizar práticas
relacionadas aos corpos quilombolas.

Essa pesquisa tornou-se relevante porque se pode pensar em tópicos


que, num futuro próximo, podem ser introduzidos no currículo escolar, porque a
possível contribuição da cultura quilombola para a sala de aula também pode
ajudar os professores a desenvolver estratégias pedagógicas para capacitar os
alunos em um contexto sociocultural.
Diante do exposto, concluimos que os objetivos desta pesquisa foram
auferidos e, assim sendo, finalizamos este estudo com a proposta de
prosseguirmos esta investigação no futuro com a finalidade de melhorarmos
nossos fundamentos e cooperar para com outros acadêmicos e/ou fornecermos
novas informações aos profissionais da Educação Física.
75

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Arthur José Medeiros; ALMEIDA, Dulce Maria Filgueira de; GRANDO,
Beleni Salete. As práticas corporais e a educação indígena: a contribuição do
esporte nos jogos dos povos indígenas. Revista Brasileira de Ciências do
Esporte, Florianópolis, v. 32, n. 2, pp. 59-74, 2010.

ALVAREZ, Gabriel Omar et al. Tradição cultural e práticas corporais em


comunidades quilombolas de Goiás: notas para uma política de esporte e
lazer. In: SILVA, Ana Márcia; FALCÃO, José Luiz Cerqueira. (Org.). Práticas
corporais em comunidades quilombolas de Goiás. Goiânia, Goiás: Ed. da PUC
Goiás, 2011.

ARRUTI, J. M. Mocambo. Antropologia e história do processo de formação


quilombola. Bauru: EDUSC, 2006.

BARBIER, R. A pesquisa-ação. Trad. Lucie Didio. Brasília: Liber Livro, 2002.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2002.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BETTI, M. A janela de vidro: esporte, televisão e educação física. São Paulo:


Papirus, 1998.

BETTI, M; ZULIANI, L. R. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte.


V.I, n.1, p. 73-81, 2002.

BIANCHIN, J. F.; KOENEMANN, J. G. & CHIVA, E. Q. Mamíferos Não


Voadores Encontrados em Três Áreas do Parque Estadual do Espinilho,
Barra do Quaraí, Rio Grande do Sul, Brasil. Biodiversidade Pampeana –
Uruguaiana, Vol. 9, nº 1, pp. 44-49. 2011.

BOTELHO, Maria do Socorro Quirino; NASCIMENTO, Elis Lopes Garcia;


FARIAS, Ana Márcia Ferreira. Quilombos alagoanos contemporâneos: uma
releitura da história. Recife, PE: Bagaço, 2007.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: Difel, 1989.

BRAGATTO, Sandra. Laudo antropológico da Comunidade Remanescente


de Quilombo de Santa Rita do Bracuhy. Parecer nº004/FCP/MinC, 1999.

BRASIL, Resolução CNE/CEB n. 8, de 20 de novembro de 2012. Define as


Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na
Educação Básica. Diário Oficial da União, Brasília, DF: MEC/CNE/CEB, 21 nov.
2012.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília, DF, Senado, 1998.
76

BRASIL. Decreto n. 4887 de 20 de novembro de 2003. Disponível em:


www.planalto.gov.br. Acesso em 02.mai.2012.

BRASIL. Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial –


SEPPIR. Programa Brasil Quilombola: Comunidades Quilombolas Brasileiras:
regularização fundiária e políticas públicas. 2009.

CARRIL, Lourdes de Fátima Bezerra. Os desafios da educação quilombola no


Brasil: o território como contexto e texto. Revista Brasileira de Educação , v.
22, p. 539-564, 2017.

CARVALHO, Francisca Edilza Barbosa de Andrade. Educação escolar


quilombola na comunidade Baixio - Barra do Bugres/MT: avanços e desafios
(dissertação). UFMT, 2016.

CARVALHO, J. M. Os bestializados da República. 3. ed. São Paulo:


Companhia das Letras, 2006.

CASTILHO, Suely Dulce de. Quilombo contemporâneo: educação, família e


culturas. Cuiabá: EDUFMT, 2008.

CHAUÍ, Marilena. “Cultura e democracia”, Crítica y Emancipación – Revista


Latinoamericana de Ciencias Sociales, 1(1), 53-76. 2008

CHAUÍ, Marilena. Um Convite a Filosofia. São Paulo: Ática, 2000.

CONAE. Conferência Nacional de Educação. Construindo o Sistema Nacional


de Educação: O Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias de
Ação. Brasília: MEC, SEA, 2010.

CONAE. Conselho Nacional De Educação. Parecer CNE/CEB nº 14/2012, que


atualiza e sistematiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Profissional Técnica de Nível Médio aos dispositivos da Lei nº 11.741/2008.
Brasília: CNE/CEB, 2012.

DAOLIO, J. Educação física e o conceito de cultura/Jocimar Daolio. -


Campinas, SP: Autores Associados, 2004. (Coleção polémicas do nosso tempo).
2004

DECRETO nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007. Institui a Política Nacional de


Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. In:
FERREIRA NETO, A.; NASCIMENTO, A. C. S. Periódicos científicos da
educação física: proposta de avaliação. Revista Movimento, UFRGS. Porto
Alegre, v. 8, n. 2, p. 35-49, maio/agosto 2002.

DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. História oral, memória, identidades.


Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

DIAS, Maria Helena Tavares. Entre memórias e narrativas dos festeiros das
festas de santo do território quilombola Vão Grande (dissertação). UFMT,
2017.
77

DIAS, T. S. Educação escolar quilombola no censo da educação. Rio de


Janeiro: IPEA, abr. 2015.

FALCÃO, José Luiz Cirqueira; SILVA, Ana Márcia. Organizadores. Práticas


corporais em comunidades quilombolas de Goiás. Goiânia: PUC-Goiás,
2011.

FIGUEREIDO, T. A. M. ; COQUEIRO, J. M. ; HERNANDES, L. F. ; SOUZA, A.


C. Crianças e adolescentes no contexto escolar: Ações Afirmativas Conta o
racismo. In: Túlio Alberto Martins de Figueiredo; Jandesson Mendes Coqueiro.
(Org.). RIZOMAS SAÚDE COLETIVA E INSTITUIÇÕES. 1ed.Jundiaí: Paco
Editorial, 2017.

FILHO, Ari Lazzarotti et al. O termo práticas corporais na literatura científica


brasileira e sua repercussão no campo da Educação Física. In: Revista
Movimento, v. 16, n. 1, p. 11-29, jan-mar, 2010.

FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: Teoria e prática da


educação física. 3ª edição. São Paulo: Scipione, 1992.

FREITAS, D. B.; SILVA, J. M.; GALVAO, E. A relação do lazer corn a sade nas
comunidades quilombolas de Santarém. Revista Brasileira de Ciências do
Esporte, Campinas, vol. 30, n.° 2, jan., 2009.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara


Koogan, 1989.

GEERTZ, Clifford. Um jogo absorvente: Notas sobre a Briga de Galos Balinesa.


IN: A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1978

GIL, Antônio C. Métodos e técnicas em pesquisa social. São Paulo: Atlas,


1991.

GOMES, Flávio dos Santos. Quilombo do Rio de Janeiro no século XIX. In:
REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos (Org.). Liberdade por Um Fio:
história dos Quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

GOMES, R. C. ; RAINHA, L. C. ; HERNANDES, L. F. Uma breve análise sobre


as desigualdades sociais a partir de dois casos públicos. In: Madalena
Santana Gomes; Pedro Machado Ribeiro Neto; Pitiguara de Freitas Coelho.
(Org.). Política de Desenvolvimento Alternativas e Tendências em PK-ES.
1ed.Vitória: Editora EMESCAM, 2018, v. 1, p. 91-102.

GRANDO, B. corpo e cultura: a educação do corpo em relações de fronteiras


étnicas e culturais e a constituição da identidade bororo em Meruri-MT. Pensar a
Prática, v. 8, n. 2, p. 163-180, 15 nov. 2006.

HALL, Stuart. Identidade, cultura, na pós-modernidade. Rio de Janeiro DP &


A. 2006.

HEINE, V.; CARBINATTO, M.; NUNOMURA, M. Estilos de ensino e a iniciação


da capoeira para crianças de 7 a 10 anos de idade. Pensar a Prática, v. 12, n.
78

1, 22 abr. 2009.

HERNANDES, L. F. Internação Compulsória e a vida em cena. [Mestrado em


Políticas Públicas e Desenvolvimento Local]. Vitória: Escola Superior de Ciências
da Santa Casa de Misericórdia de Vitória – EMESCAM, 2016.

HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo:
Perspectiva, 2004.

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.


Censo escolar da educação básica 2013: caderno de instruções. Brasília:
INEP, 2013.

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Educação escolar


quilombola no Censo da Educação Básica. IPEA, Rio de Janeiro, abr. 2015.
Texto para discussão organizado por Tatiana Dias Silva. Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/agencia/ images/stories/PDFs/TDs/td_2081.pdf.>.
Acesso em: 14 outubro de 2019

LARA, Larissa Michele et al. Esporte e lazer na comunidade quilombola


Invernada Paiol da Telha: realidade, perspectivas e desafios. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 16., Salvador, 2009. Anais...
Salvador, 2009.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura - um conceito antropológico. 17 ed. Jorge


Zahar: Rio de Janeiro. 2004.

LÉVI-STRAUSS, Claude. O Pensamento Selvagem. São Paulo: Editora da


USP, 1970.

MAROUM, Kalyla. A construção de uma identidade quilombola a partir da


prática corporal/cultural do jongo. Movimento, Porto Alegre, v. 20, n. 01, pp.
13-31, jan./mar. 2014.

MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa Social: Teoria, Método e


Criatividade. 6ªEdição. Petrópolis: Editora Vozes, 1996.

MION, José Geraldo Oliveira. Jongo de Itapemirim e sua relação com a


educação. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as
Negros/as (ABPN), [S.l.], v. 11, n. 27, p. 230-254, fev. 2019.

MIRANDA, S. A. Educação escolar quilombola em Minas Gerais: entre ausências


e emergências. Revista Brasileira de Educação,Rio de Janeiro: ANPEd;
Campinas: Autores Associados, v. 17, n. 50, p. 369-498, maio/ago. 2012.

MIRANDA, Shirley Aparecida de. Quilombos e Educação: identidades em


disputa. EDUCAR EM REVISTA , v. 34, p. 193-207, 2018.

MONTE ALTO, Rosana Lacerda. Saberes e fazeres quilombolas: diálogos com


a educação do campo. Uberaba, 2012.136f. Dissertação de Mestrado em
Educação- Universidade de Uberaba/ MG, 2012.
79

MUSSI, R. F. F; MUSSI, L. M. P. T; BAHIA, C. S; AMORIM, A.M. Atividades


físicas praticadas no tempo livre em comunidade quilombola do alto sertão
baiano. Licere 2015.

OLIVEIRA, Eduardo David de. Cosmovisão Africana no Brasil: elementos para


uma filosofia afrodescente. Fortaleza: LCR, 2003

OLIVEIRA, Osvaldo M. Quilombos e demarcadores de identidades análise


sucinta de três casos no estado do Espírito Santo. Revista Ambivalências.
V.4 N.7 p. 10 – 41 Jan-Jun/2016

OLIVEIRA, Osvaldo Martins. Comunidades quilombolas no Estado do


Espírito Santo: conflitos sociais, consciência étnica e patrimônio cultural.
Revista do Centro de Estudos Rurais (RURIS). Campinas, v. 05, n. 02, 2011.

SANTANA, Carlos Eduardo carvalho. Processos educativos na formação da


identidade em comunidades remanescentes de quilombo: um estudo sobre
Barra, Bananal e Riacho das Pedras. Salvador: UNEB, 2005.

SANTOS, Jean M. C. T. ; OLIVEIRA, E. J. ; MARTINS, G. P. C. Educação


quilombola e currículo escolar: olhares sobre a prática educativa no contexto
escolar. Educação,Cultura e Sociedade , v. 9, p. 51-66, 2019.

SERON, B. B. et al. Prática de atividade física habitual entre adolescentes com


defi ciência visual. Rev. bras. Educ. Fís. Esporte, v. 26, n. 2, p. 231-9, 2012.

SILVA, A. M.; FALCÃO, J. L. C. Práticas corporais na experiência quilombola: um


estudo com comunidades do estado de Goiás/Brasil. Pensar a Prática, v. 15, n.
1, 1 abr. 2012.

SILVA, Ana Márcia; FALCÃO, José Luiz Cirqueira. Práticas corporais em


comunidades quilombolas de Goiás. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2011.

SILVA, Luzineide Ribeiro da. Ressignificar a cultura local através do diálogo


e da experiência no Colégio Municipal Antônio Marculino Vieira no contexto
apresentado pelas comunidades quilombolas. 2015. 87f. Dissertação
(Mestrado) – Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2015.

SILVA, Mellissa Fernanda Gomes da; SOUZA NETO, Samuel de; BENEVIDES,
Larissa Cerignoni. A Capoeira como Escola de Ofício. Motriz rev. educ. fís.
v.15-n.4 - 2009.

SOARES, C. L. Educação física escolar: conhecimento e especificidade. Rev.


Paul. Educ. Fís., São Paulo, supl. 2, p. 6-12, 1996.
80

APÊNDICE A - ENTREVISTA

Escola: Municipal de Ensino Fundamental Pluridocente “Jiboia”


Endereço: Boa Esperanca, Presidente Kennedy/ES CEP: 29350-000
Alunos: Adelma Conceição da Silva, Carlinhos Silva Evangelista, Elza das Neves
Neto, Joaci das Neves, Maria da Penha, Ricardo de Souza Laurindo e Tereza de
Paula
Turma: EJA – Terça-feira
Turno: Noturno
Data: 18/02/2020

Item Entrevista
01 Sua infância deve ter sido inesquecível. Consegue relatá-la para
mim?

02 Você brincou muito na sua infância? Vamos relembrar algumas


brincadeiras daquela época?

03 Toda família tem sua história, você relataria um pouco da história


da sua família para mim?

04 Como era sua convivência com sua família?


05 Você consegue me informar quais danças são praticadas na sua
comunidade?
06 Você participa ou participou de alguma dessas danças?
07 Como aprenderam a dançar esses passos e ritmos?

08 Existe alguém na comunidade que ensina essa dança? Como se


chamam essas pessoas?

09 Você só dançava ou também aprendeu a tocar algum instrumento?


10 Pode me informar o nome desses instrumentos que são utilizados
nessas danças?
81

APÊNDICE B - ROTEIRO PARA O PROCESSO DE CRIAÇÃO

Escola: Municipal de Ensino Fundamental Pluridocente “Jiboia”


Endereço: Boa Esperanca, Presidente Kennedy/ES CEP: 29350-000
Alunos:
Adelma Conceição da Silva
Carlinhos Silva Evangelista
Maria da Penha
Ricardo de Souza Laurindo
Rubens Barreto Fontão
Tereza de Paula
Turma: EJA – Quinta-feira
Turno: Noturno
Data: 20/02/2020

Item Roteiro para o processo de criação


01 Qual é o seu nome completo e idade?

02 O que você desenhou?

03 Há brincadeiras que você não esqueceu de desenhar?

04 Tem alguma dança?


05 Cite algum acontecimento que tenha te causado impacto:
06 Das brincadeiras e danças que você participou na sua infância,
alguma te marcou?
07 Sobre questões religiosas, eventos na comunidade ou fora dela,
você participava no seu tempo de criança?
82

APÊNDICE A - PRODUTO FINAL

MESTRADO PROFISSIONAL EM CIÊNCIA, TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO

CRISTIANE BARRETO PEREIRA

PRODUTO FINAL

MOSTRA CULTURAL “A HISTÓRIA DE UM POVO QUILOMBOLA SENDO


CONTADA E RECONTADA POR ALUNOS DA EJA”

Produto final obtido da dissertação de mestrado com o


título - O ensino da educação física em uma
comunidade quilombola: narrativas, práticas e
saberes, defendida no dia XX de abril de 2020, orientada
pela Profª. Drª. Juliana Martins Cassani, na Faculdade
Vale do Cricaré – FVC.

Área de concentração: Educação

Linha de pesquisa: L1 – A Educação e a Inovação

SÃO MATEUS
2020
83

APRESENTAÇÃO

Prezada Professora

O presente projeto constitui o produto final obtido da dissertação de


mestrado, cujo o título é: O ensino da educação física em uma comunidade
quilombola: narrativas, práticas e saberes, a qual foi desenvolvida durante o
curso de Mestrado Profissional em Ciência, Tecnologia e Educação ofertado pela
Faculdade Vale do Cricaré, sob a orientação da Profª. Drª. Juliana Martins
Cassani.

A pesquisa referente a este produto final foi desenvolvida na Escola


Municipal de Ensino Fundamental Pluridocente Jiboia, na comunidade
quilombola Boa esperança, município de Presidente Kennedy/ES.

Nossa intenção com o presente projeto final é oferecer uma ferramenta de


ensino e aprendizagem aos professores de Educação Física do ensino
fundamental, relatando a experiência dos alunos e apresentado novas maneiras
de como trabalhar com o conteúdo na sala de aula.
84

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 4
2 OBJETIVOS ........................................................................................................5
2.1 OBJETIVO GERAL ...........................................................................................5
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .............................................................................5
3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................6
4 METODOLOGIA ..................................................................................................7
5 CRONOGRAMA ..................................................................................................9
6 ORÇAMENTO ...................................................................................................10
7 RESULTADOS ..................................................................................................11
REFERÊNCIAS ....................................................................................................12
85

1 INTRODUÇÃO

No Brasil, como país misto, a escola deve levar em consideração as


diferenças étnicas e raciais na formação da população. A educação formal
desempenha um papel significativo em ajudar os alunos a reler a história e a
cultura dos quilombolas, porque as práticas e os costumes culturais dos
quilombolas devem ser apreciados nas práticas pedagógicas cotidianas.

A escola desempenha um papel significativo na formação do assunto. E


se as práticas pedagógicas demonstrarem no cotidiano escolar a importância da
origem do quilombol, isso contribuirá para fortalecer as referências culturais dos
outros jovens quilombolas e também contribuirá para a sustentabilidade étnica e
cultural da nação, tão inferior à sociedade dominante.

Este trabalho confirma os depoimentos de idosos da comunidade


quilombola Boa Esperança em Presidente Kennedy/ES. Aqui discutimos como
as narrativas dos idosos podem promover a releitura de algumas das tradições
culturais da comunidade no espaço escolar. Além disso, apresentamos as
memórias como um meio para o professor desenvolver atividades pedagógicas
que valorizam a história e a cultura local a partir da voz do idoso, propiciando
reflexões apropriadas sobre o conhecimento sobre quilombola que não existe na
biblioteca da escola, mas na memória do idoso.

Este trabalho, portanto, teve o objetivo de refletir como as memórias dos


idosos quilombolas podem ajudar os professores, juntamente com os alunos, a
reler sua identidade negra e valorizar a história e a cultura local.
Essa pesquisa se torna relevante porque, com base nisso, podemos
pensar em tópicos que podem ser introduzidos no currículo escolar, porque a
possível contribuição da cultura quilombola para a sala de aula também pode
ajudar os professores a desenvolver estratégias pedagógicas para capacitar os
alunos em um contexto sociocultural.
86

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

Refletir como as memórias dos idosos quilombolas podem auxiliar os


professores da educação física a desenvolver, juntamente com seus estudantes,
a releitura da identidade negra e a valorização da história e cultura local.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Considerar as experiências e raízes culturais das comunidades


quilombolas no Brasil como forma de valorização da história e cultura
quilombola na escola.
87

3 JUSTIFICATIVA

A restruturação do currículo escolar numa perspectiva de valorização


étnico racial é essencial para se inserir no âmbito escolar a história e cultura da
comunidade Boa Esperança, uma vez que as tradições culturais da comunidade
precisam ser trabalhadas na escola para favorecer o processo de ensino e
aprendizagem.

Charlot (2000, p. 72) argumenta que:

[...] qualquer relação com o saber comporta também uma dimensão de


identidade: aprender faz sentido por referência à história do sujeito, às
suas expectativas, às suas referências, à sua concepção de vida, às
suas relações com os outros, à imagem que tem de si e à que quer dar
de si. Várias crianças e jovens não conhecem a história da sua
comunidade. Isto implica não reconhecer a imagem que se tem de si e
aquela que deseja dar de si.
Nesse panorama, o que se aprende na escola está diretamente ligado à
a dimensão de identidade. E quando essa identidade é estereotipada na maioria
dos livros didáticos e nos meios de comunicação, o estudante não tem prazer
em aprender. Conforme defende Charlot (2013), só aprende quem encontra
alguma forma de prazer no fato de aprender, não o prazer contrapondo o esforço.

Para o estudante de comunidade quilombola, é importante mostrar que a


história do seu povo não foi constituída apenas de sofrimento e humilhações,
pois a valorização da história e cultura local contribuirá para uma aprendizagem
prazerosa. Assim, torna-se importante que os professores desenvolvam em suas
práticas a valorização das tradições culturais da comunidade, as quais são tão
significativas, como, por exemplo, o jongo, que representa atividade corporal,
além de ser uma cultara secular na região.

É certo que o idoso, quando expressa suas lembranças, faz uma releitura
do seu passado. Os velhos têm a possibilidade de refletir sobre certas
passagens, detalhes e, dessa forma, reinventar a identidade. Então, a memória
dos idosos quilombolas possibilita uma nova versão de sua história, rica em
detalhes que foram silenciados pela sociedade colonizadora.

Bosi (1994) afirma que, na maioria das vezes, lembrar não é reviver, mas
88

refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as experiências do


passado. Pois a memória trabalha, e a dúvida de reconstruir “tal como foi” o que
está no passado se daria no inconsciente.

Freire (2014) afirma que a escola tem o dever não apenas de respeitar os
saberes com os quais os educandos chegam ao espaço escolar, mas, sobretudo,
discutir com os estudantes esses saberes com os conteúdos. Bresciani; Naxara
(2004), por sua vez, ressaltam que há muito tempo os historiadores, literatos e
cientistas sociais têm se dedicado à apreensão da memória facultativa
intelectual, memória conhecimento, que submete a história documental
importante para suas narrativas.

Logo, reconheço a relevância da memória como meio de evidenciar


acontecimentos, histórias, culturas por quem realmente as vivenciou, dando voz
àqueles que, por um longo período, não tiveram a oportunidade de narrar seus
feitos, suas tristezas, angústias, vitórias, ou seja, de contar sua história de vida.

Desse modo, ratifico a importância da memória dos idosos para a


valorização da história e cultura de Boa Esperança e, principalmente, trabalhar
essas memórias no espaço escolar como meio de evidenciar no cotidiano
escolar a história e a cultura quilombola.
89

4 METODOLOGIA

Para a Mostra Cultural “A história de um povo quilombola sendo


contada e recontada por alunos da EJA” a ocorrer no dia 12/03/2020, às
19h, na Escola Jiboia, procederemos com apresentação de uma apostila
encadernada que contém os desenhos produzidos pelos alunos no
decorrer da pesquisa de campo realizada na Comunidade Quilombola Boa
Esperança, zona rural de Presidente Kennedy/ES.

O resultado das intervenções será apresentado também por meio


de fotos ao corpo docentes da escola e aberto aos moradores da
localidade. Neste mesmo dia encerramos a mostra com a dança do jongo
e a capoeira, porém, no decorrer do seminário, um painel estará
disponibilizado com as fotos para apreciação do público presente.
90

5 CRONOGRAMA

18/02/2020 Entrevistas com os alunos EJA da Escola Jiboia


20/02/2020 Confecção de desenhos
27/02/2020 Confecção de desenhos
03/03/2020 Confecção de desenhos
10/03/2020 Exposição de fotos, desenhos e instrumentos utilizados
no jongo e na capoeira
12/03/2020 Mostra Cultural “A história de um povo quilombola sendo
contada e recontada por alunos da EJA”
91

6 ORÇAMENTO

Comidas típicas R$ 50,00


Lápis de cor R$ 5,00
Lembrancinhas R$ 20,00
Papel fotográfico R$ 38,00
Pincel R$ 6,00
Tinta guache R$ 18,00
Total R$ 137,00
92

7 RESULTADOS

A mostra cultural foi um sucesso. Os alunos exibiram, via painel de


fotografias, contação de história, portfólios e da apostila, seus desenhos
retratando, através de jogos e brincadeiras, as práticas corporais vivenciadas
nas comunidades quilombolas.

Participaram da mostra todos os alunos da escola Jiboia, servidores da


secretaria de educação de Presidente Kennedy, moradores da comunidade Boa
Esperança, o coordenador do Projeto Educa Sempre, bem como, todo o corpo
docente escolar.

No decorrer da mostra os alunos dançaram o jongo, cultura tradicional na


comunidade quilombola Boa Esperança, e também foram apresentados ao
público, livros que contam a história de Presidente Kennedy.
93

BIBLIOGRAFIA

BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: Lembranças de velhos. São Paulo:


Companhia das Letras, 1994.

BRESCIANI, Stella; NAXARA, Márcia. Memória e (res)sentimento: indagações


sobre uma questão sensível. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2004.

CHARLOT, B. Relação com o saber na sociedade contemporânea: eflexões


antropológicas e pedagógicas. 1 ed. São Paulo: Cortez, 2013.

FREIRE. Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. 43. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2014.

Potrebbero piacerti anche