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Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Capítulo 13

Propriedades do concreto no estado fresco

Roberto Cesar de O. Romano,


Fábio A. Cardoso,
Rafael G. Pileggi
Universidade de São Paulo

13.1 Importância do estado fresco


O concreto é o material de construção mais consumido no mundo. Sua ampla
utilização é decorrente de uma combinação positiva de fatores tecnológicos e econômicos,
destacando-se sua natureza fluida inicial e o subseqüente processo de endurecimento (cura)
decorrente das reações de hidratação do cimento. Estas características permitem que a
moldagem de corpos com elevada resistência e geometrias variáveis seja realizada de
maneira simples e com custos relativamente reduzidos (MEHTA & MONTEIRO, 1994).
A evolução tecnológica dos processos de aplicação dos concretos tem possibilitado
sua instalação por métodos diferentes da tradicional conformação sob auxílio de vibração
e/ou compactação, sendo que o emprego de materiais auto-adensáveis, bombeáveis, de
projeção, compactados por rolo, entre outros, tem se tornado uma prática freqüente nos dias
de hoje (BEAUPRÉ et al., 1994).
Em seu estado fluido anterior à cura, os concretos podem ser compreendidos como
suspensões bifásicas compostas por uma fração de partículas grosseiras (agregados
graúdos e miúdos) imersas em uma matriz de partículas finas reativas (cimento Portland,
pozolanas) e água em teor suficiente para que as mesmas sejam aplicadas no estado fluido
(HU e LARRARD, 1995). Em certos casos, finos inertes (calcário moído, argilominerais),
aditivos químicos (incorporadores de ar, aceleradores/retardadores de pega, dispersantes,
modificadores reológicos da fase líquida, etc.) e fibras (poliméricas, metálicas) são ainda
incorporados às composições.
Sendo, portanto, uma suspensão fluida reativa, cuja consistência é, sobretudo
modificada pela atuação do cimento, as características reológicas dos concretos em função
do tempo (trabalhabilidade) determinam a eficiência de sua aplicação, afetando assim o
desempenho final das peças moldadas.
Desperdício de materiais, baixa produtividade operacional e falhas de dosagem ou de
moldagem são exemplos de problemas tradicionalmente reportados em concretos, cujas
causas primárias decorrem da inadequação dos mesmos ainda no estado fluido em relação
às demandas de aplicação. Por sua vez, a necessidade de adequação da consistência dos
concretos, usualmente obtida aumentando-se o consumo de água e de cimento, tem
provocado desajustes secundários, como fissuração, retração diferenciada, permeabilidade
elevada, alteração no módulo de elasticidade, entre outros.
A discussão acima evidencia que o desempenho final de um concreto é bastante
complexo. O desenvolvimento sistemático de uma composição deve, portanto, garantir que a
obtenção da natureza reológica adequada às condições de aplicação não resulte em
características microestruturais que afetem a atuação dos mesmos no estado endurecido.

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Desta forma, as técnicas de caracterização reológica têm um papel fundamental no


desenvolvimento desta tecnologia, permitindo a adequação do comportamento reológico dos
materiais às demandas associadas aos diferentes processos.

13.2 Conceitos Básicos de Reologia


Por definição, reologia (rheos = fluir e logos = estudo) é a ciência que estuda o fluxo e
a deformação dos materiais quando submetidos a uma determinada tensão ou solicitação
mecânica externa, sendo usualmente empregada na análise do comportamento de fluidos
homogêneos, como os líquidos, as emulsões e as suspensões de partículas (WATANABE,
ISHIKAWA, WAKAMATSU, 1989).
A viscosidade () e a tensão de escoamento (0) são as duas grandezas básicas que
definem o comportamento dos fluidos. A primeira é a constante de proporcionalidade que
relaciona a taxa ( ) com a tensão de cisalhamento () aplicada, enquanto a segunda indica a
tensão mínima para início do escoamento.
Os fluidos ideais (newtonianos) apresentam viscosidade constante e tensão de
escoamento nula, como por exemplo, a água, o álcool e as suspensões de partículas diluídas
(concentração de sólidos < 5 % em massa). Contudo, os fluidos de interesse tecnológico
apresentam, em sua maioria, características reológicas que se desviam da idealidade. A
Figura 1 ilustra esquematicamente os diversos comportamentos reológicos independentes do
tempo.

Figura 1 - Comportamento reológico dos fluidos: (1) newtoniano; (2) de Bingham; (3) pseudoplástico;
(4) pseudoplástico com tensão de escoamento; (5) dilatante e (6) dilatante com tensão de
escoamento (WATANABE, ISHIKAWA, WAKAMATSU, 1989).

Como visualizado, além do ideal, os fluidos podem apresentar os seguintes


comportamentos independentes do tempo:
 Pseudoplástico: a viscosidade aparente, definida como a razão entre a tensão e a
taxa de cisalhamento, diminui com o aumento da taxa de cisalhamento;
 Dilatante: a viscosidade aumenta com o aumento da taxa de cisalhamento.
Variações destes comportamentos básicos podem gerar três outros tipos de
comportamento, onde o fluido requer uma tensão mínima de cisalhamento para iniciar o
escoamento:

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 Fluido de Bingham: semelhante ao newtoniano com tensão de escoamento;


 Pseudoplástico com tensão de escoamento;
 Dilatante com tensão de escoamento.
Além desses, também podem ocorrer comportamentos reológicos dependentes do
tempo, denominados tixotropia e reopexia:
 Tixotropia: a viscosidade do fluido/suspensão diminui em função do tempo sob
ação de uma taxa (ou tensão) de cisalhamento constante;
 Reopexia: a viscosidade do fluido / suspensão aumenta em função do tempo sob
ação de uma taxa (ou tensão) de cisalhamento constante.
Os desvios na idealidade usualmente verificados no comportamento reológico de
suspensões decorrem das interações físico-químicas ditadas pela proporção e natureza da
fase líquida (viscosidade, tensão de escoamento, perfil reológico, densidade, etc.), com as
características individuais e o teor das partículas (distribuição granulométrica, porosidade,
densidade, solubilidade, morfologia, etc.) e outros constituintes que compõe a fase sólida
(OLIVEIRA et al., 2000). Em certos casos, os sistemas podem ainda manifestar a influência
de aditivos químicos utilizados para modificar as interações fluido/partículas, além de
modificações introduzidas pela presença de ar incorporado.

13.3 Trabalhabilidade e Consistência

A adequação do comportamento de um concreto no estado fluido às demandas da


aplicação tem sido tradicionalmente definida através do subjetivo conceito de
trabalhabilidade, definido de maneira distinta por diferentes entidades ligadas à tecnologia de
concreto, como sintetizado a seguir:
 Association of Concrete Engineers (Japão): facilidade com a qual o material
pode ser misturado, lançado e adensado devido à sua consistência, além da
homogeneidade do concreto e do grau de resistência a separação de materiais.
 American Concrete Institute (ACI): facilidade e homogeneidade do material na
mistura, lançamento, adensamento e acabamento.
 American Society for Testing and Materials (ASTM): a propriedade que
determina o esforço necessário para manipular uma quantidade de concreto fresco
com uma perda mínima de homogeneidade.
 British Standards Institution: facilidade de manipulação e adensamento do
material.
Os conceitos de consistência e trabalhabilidade surgem da necessidade de sejam
explicitadas, mesmo que de maneira sensorial, as características desejáveis dos concretos
durante suas etapas de mistura, transporte, lançamento, consolidação e acabamento,
conforme ilustrado na Figura 2. Sob esta ótica, é comum o surgimento de termos subjetivos
como “concreto pesado, mole, sopa, farofa, seco, chicletoso, liguento, etc.”
De maneira geral, consistência tem a ver com a facilidade de escoamento do material
e com a coesão do mesmo, enquanto trabalhabilidade está relacionada com a adequação do
concretos a todas as etapas de mistura, transporte, lançamento e acabamento. Sendo assim,
consistência está contida dentro do conceito maior de trabalhabilidade, sendo relacionada
diretamente com as características de lançamento do concreto. A maioria das técnicas de
caracterização do concreto no estado fresco avalia sua facilidade de fluxo em diferentes
condições, o que permite inferir que as mesmas estão avaliando a consistência do material.

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Figura 2 - Ilustração esquemática do conceito abrangente de trabalhabilidade, envolvendo as etapas de mistura,


transporte, lançamento e acabamento.

Contudo, o desenvolvimento de uma metodologia sistemática para a formulação e


controle tecnológico de concretos requer que tais conceitos sejam convertidos em grandezas
reológicas mensuráveis. Para tanto, é condição fundamental a utilização de técnicas de
caracterização que quantifiquem os parâmetros reológicos dos materiais nas diferentes
solicitações físicas impostas pelos processos de aplicação (manual, projeção mecânica,
vibração, etc.).

13.4 Caracterização Reológica no Estado Fresco


As técnicas de caracterização reológica têm como princípio básico submeter os fluidos
a esforços ou deformações controlados (STEIN, 1986). Na área dos concretos, os inúmeros
métodos descritos em literatura são classificados, segundo o NIST - National Institute of
Standards and Technology - USA (BROWER & FERRARIS, 2003), em quatro categorias de
acordo com o procedimento de medida de fluxo ou de cisalhamento:
 Testes de fluxo livre: o material flui devido ao seu peso próprio sem nenhum
confinamento ou um objeto penetra o material em decorrência da força
gravitacional.
 Testes de fluxo confinado: o material flui em decorrência do seu peso próprio ou
sob aplicação de pressão através de um orifício restrito.
 Testes de vibração: o material flui sob a aplicação de vibração.
 Testes de cisalhamento sob fluxo rotacional: o material é cisalhado entre um
sistema placa-placa, por rotação.
O Quadro 1 apresenta os principais métodos de caracterização reológica segundo a
classificação do NIST, identificando os parâmetros reológicos fundamentais com o qual o
ensaio está relacionado. O Quadro 1 apresenta ainda uma segunda forma de classificação
desses métodos baseada na quantidade de taxas de cisalhamento avaliadas durante os
ensaios (monoponto e multiponto).

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Quadro 1 – Principais métodos para caracterização reológica do concreto fresco baseado na classificação do
NIST (Koehler & Fowler, 2003).

Classificação Principal Parâmetro


Ensaio Tipo de medida
NIST Mensurado
Abatimento de
Tensão de Escoamento
tronco de cone
Fluxo Livre
Abatimento Tensão de
Modificado EscoamentoViscosidade
V-Funnel Test
Viscosidade Monoponto
Fluxo Orimet Test
Confinado Habilidade
Viscosidade
Enchimento
Remoldagem
Vibração Viscosidade
de Powers
Reômetro Tensão de Escoamento
Reômetros Multiponto
Rotacional Viscosidade

A seguir são apresentados os métodos de ensaio mais comuns, sabendo que os


mesmos foram desenvolvidos com a lógica de simular de maneira simples condições de
aplicação dos concretos na prática. A sessão seguinte explica em detalhes as limitações
conceituais associadas à utilização dos mesmos como ferramenta de obtenção de
parâmetros reológicos dos concretos, o que justifica o emprego dos mesmos em ensaios
tecnológicos e de controle de qualidade.

Fluxo Livre
O ensaio de abatimento no tronco de cone (Figura 3) é o mais empregado na
tecnologia de concretos, sobretudo devido à sua grande simplicidade de execução. O mesmo
consiste na medição direta do deslocamento vertical do topo do cone de concreto após a
retirada do molde, sendo que quanto maior essa medida, mais fluido é o material.
Usualmente, o valor de abatimento é utilizado na especificação do concreto e esse é o
ensaio utilizado no recebimento do concreto nas obras, conforme norma ABNT NBR NM
67:1998.

(a) (b)
Figura 3 – (a) Fotografia de um dispositivo de ensaio de abatimento no tronco de cone (b) medição do
abatimento após o escoamento de um concreto no ensaio realizado no tronco de cone.

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Uma variação deste método é o ensaio modificado no qual se mede a velocidade com
que o concreto escoa. O equipamento modificado, Figura 4, possui um disco que desliza
sobre um eixo vertical acompanhando o escoamento do concreto. O ensaio permite medir o
tempo de escoamento do concreto no estado inicial (molde) até o abatimento de 100 mm,
quando o disco não mais acompanha o escoamento do material, em virtude de uma restrição
no eixo de suporte, e o concreto segue escoando até atingir o abatimento final. A restrição
deste método está no abatimento mínimo de 120 mm para permitir a leitura correspondente
ao abatimento de 100 mm. A medição do tempo permite ter uma idéia da viscosidade do
concreto, enquanto a altura final é relativa à tensão de escoamento do mesmo.

Figura 4 - Ilustração esquemática do ensaio de abatimento modificado.

Embora seja possível determinar os parâmetros reológicos fundamentais com o


ensaio de abatimento, há restrição quanto ao abatimento mínimo, abatimento máximo e
tensão de escoamento máxima. Com isso restringe-se a gama de concretos que podem ser
avaliados através deste método, além de se inserir fatores extrínsecos, como a habilidade do
operador em cronometrar o tempo de escoamento, as possíveis interferências ao livre fluxo
do disco que acompanha o escoamento do concreto, etc.

Fluxo Confinado
Concretos fora da faixa de fluidez possível de ser avaliada através de abatimento
requerem a utilização de outras técnicas. No caso de composições com elevada fluidez,
como os concretos auto-nivelantes se utilizam ensaios de fluxo confinado e de habilidade de
enchimento, demonstrados na seqüência.
Nos ensaios de fluxo confinado a viscosidade do concreto determina o tempo
necessário para o esvaziamento de um reservatório. Quanto maior o tempo, maior a
viscosidade. A tensão de escoamento do material deve ser menor que gerada pelo peso
próprio da amostra para que o sistema entre em regime de fluxo.
No ensaio V-funnel test (Figura 5), indicado para concretos auto-nivelantes, ensaia-se
o material duas vezes. Na primeira vez, logo após o enchimento do equipamento, mede-se o
tempo para que o concreto escoe através do funil (normalmente inferior a 10 segundos). No
segundo teste, preenche-se o molde e deixa-se o concreto em repouso durante 5 minutos,
procedendo-se então a liberação do fluxo (Lachemi et al., 2004; Safawi et al., 2004).

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Figura 5 - V-Funnel test para ensaio de fluxo em orifício livre.

Embora a literatura associe o incremento no tempo de escoamento à segregação do


material, haja vista que o repouso permite a sedimentação do agregado graúdo vinculado à
viscosidade da pasta, outros fenômenos podem alterar o tempo de escoamento do sistema.
No ensaio Orimet (Figura 6), que consiste em lançar o concreto, sem adensar, dentro
de um tubo de 10 cm de diâmetro e 60 cm de altura, quantifica-se o tempo de fluxo através
de orifícios de dimensões padrão acoplados na base do tubo (normalmente está entre 1,5 e 6
segundos para concretos com grande fluidez). O orifício normalmente empregado possui 8
cm de diâmetro e permite ensaiar concretos com agregado de diâmetro máximo de 20 mm.
No caso de concretos coesivos, o tempo de fluxo pode superar 60 segundos. A quantidade
de amostra é de 7,5 litros e essa quantidade deve ser ensaiada de 2 a 3 vezes para a
obtenção do resultado final.

(a) (b)
Figura 6 – (a) Orimet test para ensaio de fluxo em orifício livre; (b) ensaio realizado utilizando o acessório J-ring.

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A ação da gravidade sobre o concreto deve ser suficiente para vencer a tensão de
escoamento do material, porém com o fluxo a massa diminui gradativamente e a tensão de
cisalhamento aplicada também diminui. Assim sendo, o peso do concreto deve ser sempre
superior à tensão de escoamento. No caso de concretos propensos à segregação, o
agregado graúdo pode acumular-se entorno do orifício de saída e assim, diminuir ou até
mesmo impedir o fluxo do material (Sonebi, 2004).
Junto com o ensaio Orimet, pode-se utilizar o acessório J-Ring, de diâmetro 30 cm e
altura das barras de 10 cm, espaçadas de dimensão 3 vezes o diâmetro máximo do
agregado graúdo, para avaliar a capacidade do concreto em contornar as barras – simulando
a armadura – sem segregar, porém não resulta em informações suficientes para sanar
comportamentos atípicos aos esperados.
Existem ensaios destinados a avaliar a capacidade de enchimento das fôrmas de
concretos auto-adensáveis, sem a utilização de adensamento, ou seja, pela potencialidade
do concreto escoar em função do seu peso próprio, sem segregar, transpondo obstáculos
(simulação das armaduras) e preencher adequadamente o molde. Como não há aplicação de
energia de vibração, o escoamento depende exclusivamente do peso próprio do concreto e,
se a consistência – tensão de escoamento – for superior à tensão gerada pela coluna
montante de concreto, o fluxo não ocorrerá.
Embora esses ensaios estejam atrelados indiretamente à viscosidade, a tensão de
escoamento limita os concretos que podem ser ensaiados, ou seja, a tensão de escoamento
apresenta valor máximo, a partir do qual não é mais viável ensaiar os concretos por esta
técnica. No ensaio segundo o modelo francês (Figura 7), o concreto é lançado através de um
funil, com altura de queda de 40 cm, enchendo-se o compartimento principal. Em seguida
libera-se o fluxo e avalia-se o tempo para o enchimento do molde, mensurando-se a altura
final no compartimento principal e a altura final na extremidade oposta do molde. Há,
perpendicularmente ao sentido de fluxo do concreto, malhas de ferro de diâmetro 5 mm com
espaçamento de 5 cm, com o intuito de simular a armadura.

Figura 7 - Ensaio de enchimento – França (HOPPE FILHO, CINCOTTO, PILEGGI, 2007).

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Já no enchimento do compartimento principal, através do funil (meramente


esquemático/ilustrativo na Figura 7), há a imposição de fluxo confinado que pode influenciar
o comportamento do concreto. A altura de queda até o fundo do equipamento pode induzir
maior concentração de agregado graúdo nas camadas subjacentes do concreto, em função
da viscosidade do mesmo.
Durante o ensaio propriamente dito, ao liberar o fluxo para que o concreto escoe
através das barras, a coesão e a viscosidade devem apresentar comportamento otimizado
para que haja capacidade de preencher o molde e também, sob fluxo, carrear os agregados
graúdos de forma que os mesmos fiquem homogeneamente distribuídos por toda a extensão
do concreto. Essa verificação pode ser feita deixando-se o concreto consolidar no molde
(equipamento) e, posteriormente, proceder cortes para avaliar a disposição tridimensional do
agregado graúdo.
Já na caixa L (Figura 8) mensura-se o tempo que o concreto leva para escoar 20 e 40
cm, além da altura final no compartimento principal e a altura final na extremidade oposta,
determinando-se a relação H2/H1 (entre 0,80 e 0,85). Há como simulação da armadura, 3
barras de 12 mm de diâmetro espaçadas entre si de 3,5 cm.
Para avaliação de concretos auto-adensáveis, os métodos anteriormente citados são
capazes de permitir um controle tecnológico referente à qualidade final do produto, porém,
não englobam/discernem as causas/efeitos que repercutem na trabalhabilidade das
composições ensaiadas.

Figura 8 - Ensaio Caixa L – Japão.

Vibração
Os ensaios de remoldagem envolvem a capacidade do concreto de fluir e assumir a
forma desejada sob vibração. Portanto, a intensidade da vibração deve superar a tensão de
escoamento e aplicar uma tensão de cisalhamento responsável pelo escoamento do
concreto.
O tempo obtido para que a forma cilíndrica seja atingida relaciona-se com a
viscosidade do concreto embora não se tenha uma correlação direta entre os parâmetros.
Esse tipo de ensaio pode ser utilizado para simular a moldagem do concreto sob vibração,
sendo um ensaio dinâmico. É indicado para concretos com baixo valor de abatimento (menor
que 5 cm).
No ensaio proposto por Powers (1932), conforme a Figura 9, o tronco de cone é
moldado dentro de um molde cilíndrico (30 cm de diâmetro e 20 cm de altura), sobre o qual

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insere-se outro cilindro de menor diâmetro (20 cm) que irá restringir a movimentação
horizontal do concreto, induzindo linhas de fluxo para o material, que terá que contornar o
obstáculo para preencher o molde. Sobre o tronco de cone de concreto coloca-se um disco
transparente que, sob queda livre restringida pelo escoamento do concreto, servirá como
parâmetro para a determinação do tempo de remoldagem. Esse tempo será atingido quando
o material sob a placa, que está sendo vibrado, preencher totalmente a área visível do disco.

Figura 9 - Representação esquemática do equipamento de remoldagem de Powers.

Os ensaios de remoldagem permitem avaliar o comportamento sob fluxo de concretos


que possuem baixo abatimento (alta tensão de escoamento) mas que ao entrarem em
movimento fluem com certa facilidade, preenchendo o molde. Podem ser empregados em
concretos com baixa relação água/materiais cimentícios e com a utilização de aditivos que,
muitas vezes, apresentam baixo abatimento, porém, quando sob vibração, passam a ser
perfeitamente moldáveis.
Os ensaios de remoldagem são adequados para concretos distintos dos ensaiados
pelos métodos de fluxo confinado e habilidade de enchimento (auto-adensáveis). Na
remoldagem, a tensão de escoamento dos concretos é elevada e a viscosidade pode variar
significativamente em função da vibração imposta.

13.4.1 Ensaios Monoponto: Métodos tradicionais para avaliar a


trabalhabilidade

Esta categoria engloba a maioria dos ensaios tradicionais normalmente empregados


no controle de consistência dos concretos, como visualizado no Quadro 1, além do “Vane
test” (AMZIANE et al., 2005). De uma maneira geral, caracterizam os materiais em uma única
condição de tensão ou taxa de cisalhamento. Nos ensaios de fluxo livre e confinado, a
tensão aplicada é proporcional à densidade do material, enquanto nos ensaios de vibração, a
taxa de cisalhamento aplicada é definida pela freqüência e amplitude do elemento móvel. Por
sua vez, o “Vane test” é um ensaio que quantifica a tensão de escoamento das composições.
Os resultados obtidos por esses métodos não fornecem, portanto, uma caracterização
reológica completa dos concretos, podendo resultar em interpretações equivocadas sobre o
comportamento dos mesmos no estado fluido em diferentes condições de aplicação. Para

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ilustrar esse conceito, a Figura 10 apresenta uma representação esquemática de três fluidos
de Bingham distintos. O diagrama superior descreve os perfis de tensão x taxa de
cisalhamento e o inferior as respectivas viscosidades calculadas pela razão entre a tensão e
a taxa de cisalhamento.
Como observado, os sistemas A e B apresentam a mesma tensão de escoamento,
mas os níveis de tensão e de viscosidade do fluido B são superiores aos do sistema A nas
demais taxas de cisalhamento. Por outro lado, a viscosidade do fluido C é inferior às outras
nas menores taxas de cisalhamento, mas acima das taxas de cisalhamento T1 e T2 supera
as viscosidades dos fluidos A e B, respectivamente.
A B C
Tensão de Cisalhamento
C

Taxa de cisalhamento
A B C
Viscosidade

C
B
T1 T2
A
Taxa de cisalhamento

Figura 10 - Ilustração esquemática do comportamento reológico de três fluidos de Bingham distintos. O


diagrama superior ilustra os perfis de tensão x taxa de cisalhamento, enquanto o inferior ilustra as respectivas
viscosidades calculadas pela razão tensão/taxa de cisalhamento. Obs: círculos em laranja destacam a tensão
de escoamento, enquanto as linhas pontilhadas ressaltam as taxas de cisalhamento com viscosidades
equivalentes.

Além das incertezas intrínsecas do conceito de caracterização em um único ponto, os


métodos de ensaio apresentados não isolam os parâmetros reológicos fundamentais,
excetuando-se o ensaio de tensão de escoamento pelo “Vane test”. De maneira geral, esses
métodos fornecem resultados influenciados tanto pela viscosidade como pela tensão de
escoamento dos materiais, conforme demonstrado na Figura 11 para fluidez determinada
através de ensaio de consistência semelhante ao abatimento do tronco de cone.
Os resultados de simulação por elementos finitos confirmam que os valores de
consistência apresentam relação inversa com as duas constantes reológicas, tensão de
escoamento e viscosidade.
Em realidade, a avaliação reológica de suspensões concentradas reativas com
elevada viscosidade cuja consistência se modifica ao longo do tempo devido a alterações
microestruturais irreversíveis (hidratação do cimento, polimerização, coagulação, etc.) é um
desafio no campo da reologia (MEETEN, 2000).

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Assim sendo, a identificação dos parâmetros reológicos associados ao


comportamento dos fluidos e suspensões deve ser realizada através de técnicas (multiponto)
que avaliem o comportamento dos materiais em diferentes taxas e tensões de cisalhamento,
como nos ensaios de reometria (PILEGGI et al., 2000).
150
150

Fluidez (mm)
Fluidez (mm) 100
100

50
50

00

Figura 11 - Relação entre o valor de fluidez e as constantes reológicas: tensão de escoamento (y) e
viscosidade () (WATANABE, ISHIKAWA, WAKAMATSU, 1989).

13.4.2 Ensaios Multiponto


Ensaios multiponto consistem na caracterização reológica de fluidos e suspensões em
diferentes condições de tensão e taxa de cisalhamento, possibilitando a identificação
simultânea dos parâmetros reológicos fundamentais (tensão de escoamento, viscosidade e
perfil reológico). Ensaios deste tipo aplicados em concretos são predominantemente
baseados em reometria rotacional (FERRARIS, 1999).

13.4.3 Reometria Rotacional


Reômetros são equipamentos dedicados à avaliação de propriedades reológicas de
fluidos e suspensões. Permitem estudar o comportamento da viscosidade e da tensão de
escoamento em função de outras variáveis, como tempo, temperatura, etc.
Os diversos reômetros para suspensões disponíveis comercialmente se baseiam em
apenas dois princípios básicos de funcionamento (STEIN, 1986): (a) reômetro em que o
torque (proporcional à tensão) aplicado ao fluido é controlado, sendo avaliado o cisalhamento
resultante; (b) reômetro em que o cisalhamento aplicado ao material é controlado, sendo
registrada a força necessária para tal. Reômetros de torque são indicados para avaliações
em que as solicitações de tensão controlam o fluxo do material, enquanto os equipamentos
de cisalhamento são mais indicados para avaliações do comportamento reológico em
diversas taxas de fluxo.
De uma maneira geral, os reômetros comerciais de precisão não se adequam a
materiais com granulometria extensa, como concretos e argamassas. Isto porque os mesmos

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atuam em faixas restritas de torque, sendo limitados a sistemas compostos por partículas
menores que 100 m. Adicionalmente, as geometrias de ensaio usualmente empregadas
(cilindros concêntricos, placa-placa, cone-placa, capilar, Vane, etc.) tendem a não serem
adequadas para a avaliação de sistemas concentrados ou com adição de macropartículas.
O primeiro reômetro especificamente desenvolvido para caracterização reológica de
concretos data da década de 1960. O modelo de Powers (POWERS, 1968) baseava-se no
modelo de cilindros concêntricos para aplicação de cisalhamento ao material. Nesta
concepção, o concreto previamente misturado é colocado em um recipiente cilíndrico no qual
um elemento rotativo, também cilíndrico é introduzido no centro da massa, sendo registrados
os esforços para movimentar o cilindro central.
Baseados nessa arquitetura, novos modelos foram desenvolvidos: Wallevik e Gjorv
(“Con Tec BML viscometer”); Coussot (“Cemagref-IMG”); Tattersall e Bloomer (“Two-Point
rheometer”) (BROWER, 2001). Além desses, a evolução tecnológica dos reômetros resultou
em equipamentos que utilizam outros conceitos para o cisalhamento do material, como o
sistema placa-placa desenvolvido por Larrard et. al. (“BTRHEOM”) e o planetário proposto
por Beaupré (“IBB rheometer”) (FERRARIS, 1999). Já o reômetro para argamassas e
concretos desenvolvido na Poli-USP permite a utilização de dois conceitos de aplicação de
cisalhamento (rotação concêntrica ou planetária). Os reômetros visualizados na Figura 12
são utilizados somente na caracterização de materiais previamente preparados com
consistência fluida, com exceção do equipamento Poli-USP, o qual permite também a
avaliação do comportamento de mistura de argamassas (CARDOSO, 2009).

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(a) ComTec BML (b) Cemagref-IMG (c) Two-Point rheometer

(d) BTRHEOM (e) IBB rheometer (f) Reômetro Poli-USP


Figura 12 - Reômetros de concretos: (a) Com Tec BML viscometer; (b) Cemagref-IMG; (c) Two-Point rheometer;
(d) BTRHEOM; (e) IBB rheometer (FERRARIS, BROWER, 2001); (f) Reômetro Poli-USP para argamassas e
concretos.

A utilização de reômetros tem conquistado espaço na comunidade internacional,


podendo-se destacar o trabalho publicado em 1998 pelo Instituto Norte Americano de
Tecnologia e Normas (NIST) (FERRARIS e LARRARD,1998). Neste, em seqüência a uma
revisão bibliográfica sobre caracterização reológica de concretos de construção, propõe-se a
utilização de reômetros na caracterização de concretos auto-escoantes de alto desempenho.
A importância da utilização de reômetros na caracterização reológica de concretos tem
sido reconhecida de tal maneira que em setembro de 2001 foi publicado, pelo NIST, um
relatório referente a um trabalho de cooperação internacional entre oito países denominado
Comparison of concrete rheometers: International tests at LCPC (Nantes, France), 2000
(FERRARIS e BROWER, 2001).
O objetivo principal do projeto foi comparar, pela primeira vez, o desempenho
operacional de reômetros distintos (Con Tec BML viscometer, Cemagref-IMG, Two-Point
rheometer, BTRHEOM e IBB rheometer), uma vez que ainda não existiam padrões e normas
para o funcionamento de equipamentos deste tipo. Para tanto, os cinco reômetros foram
transportados de seus países de origem para o Laboratório Central de Pontes e Casas
(LCPC) na França, sendo utilizados simultaneamente na avaliação do comportamento de
diversas composições de concretos.
Entre as observações contidas no relatório, a principal foi a constatação que, apesar
das diferenças absolutas entre os valores medidos, os reômetros avaliam e classificam de

14
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maneira semelhante o comportamento reológico de concretos distintos, como observado


pelos resultados de tensão de escoamento e de viscosidade na Figura 13, o que fornece
condições para um futuro estabelecimento de curvas de correlação entre os aparelhos.

2500 12 200 16
IBB IBB

Tensão de escoamento (N.m)


Cemagref 180 14
Tensão de escoamento (Pa)

10 Cemagref
2000 2 point 160 2 point

Viscosidade (N.m.s)
BML 12

Viscosidade (Pa.s)
8 140 BML
1500 BTRHEOM BTRHEOM 10
120
6 100 8
1000 80 6
4
60 4
500 2 40
20 2
0 0 0 0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Mistura # Mistura #
(a) (b)
Figura 13 -Tensão de escoamento (a) e viscosidade (b) das composições testadas. Obs.: Gráfico reproduzido
do trabalho “Comparison of concrete rheometers: International tests at LCPC (Nantes, France), 2000”
(FERRARIS e BROWER, 2001)

Este trabalho de cooperação internacional foi então considerado como o primeiro


passo em direção à elaboração de normas que possibilitem a utilização sistemática dos
ensaios de reometria para análise do comportamento no estado fresco de concretos.
Apesar das vantagens associadas à reometria, as dimensões elevadas dos reômetros
de concretos não permitem a portabilidade necessária para serem empregados como
controle tecnológico em obras, sendo, portanto indicados para o desenvolvimento de
composições em laboratórios e centrais concretos. Essa lacuna tecnológica tem sido
superada com o surgimento de reômetros portáteis, como visualizado nas Figuras 14 e 15,
os quais são versões simplificadas unicamente dedicados à execução de ensaios
padronizados de controle em obra.

Figura 14 - (a) reômetro portátil que opera a 5 velocidades; (b) reômetro portátil ergonômico que impõe maior
rigidez ao equipamento, diminuindo ( ruídos nas leituras (CULLEN( e WEST, 2004);
a) b)

15
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Figura 15 - Reômetro portátil ICAR (Vane test) utilizado em caminhão betoneira (AMZIANE et al., 2005).

Uma vantagem adicional da utilização de reômetros para caracterização de concretos


advém do fato que a identificação de seus parâmetros e perfis reológicos (ver exemplo
esquemático na Figura 1), em diferentes solicitações de cisalhamento, ocorre
simultaneamente. Desta forma, um único ensaio de reometria fornece subsídios para definir
a adequação das composições aos métodos de aplicação propostos.
A utilização dos reômetros tem possibilitado melhor compreensão dos fatores que
influenciam o comportamento dos materiais cimentícios. A Figura 16 apresenta o exemplo de
um diagrama esquemático baseado no trabalho de (BANFILL, 2005), sobre o impacto de
diferentes teores de água, ar, microssílica (partículas ultrafinas) e de dispersante sobre a
viscosidade e a tensão de escoamento de argamassas.
Como observado, o aumento dos teores de água e dispersante, representados pelo
sentido das setas, resultam na diminuição de ambos parâmetros reológicos. Contudo, o
aumento no teor de ar praticamente não afeta a tensão de escoamento, apesar de ter grande
impacto sobre a viscosidade. Por último, o aumento no teor de microssílica reduz a
viscosidade, mas eleva a tensão de escoamento.

16
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Teor de dispersante

Tensão de escoamento
Teor de água

Teor de Ar incorporado

Sílica ativa

Viscosidade
Figura 16 - Representação esquemática baseada em resultados de reometria rotacional (Viskomat NT) do
impacto de diferentes teores de água, ar, microssílica (partículas ultrafinas) e dispersante sobre a viscosidade e
a tensão de escoamento de argamassas. As setas indicam o aumento do parâmetro (BANFILL, 2005).

A utilização da técnica de reometria permite uma compreensão detalhada do impacto


que cada um dos componentes exerce sobre o comportamento dos concretos no estado
fresco. Assim sendo, essa ferramenta de caracterização é fundamental para a elaboração de
uma metodologia de formulação baseada em conceitos microestruturais / reológicos.

13.5 Categorias reológicas dos concretos


O domínio dos conceitos reológicos, mensuráveis através de reometria rotacional,
permite inferir os perfis reológicos adequados para as diferentes categorias de concretos. Os
diagramas conceituais apresentados nas Figuras 17 a 20 ilustram tais perfis básicos para
concretos vibrados, bombeáveis, auto-nivelantes e de projeção, sendo que nessa
representação esquemática não se consideram os comportamentos dependentes do tempo.
Esses diagramas são válidos em condição de fluxo homogêneo isento de separação entre as
fases pasta e agregados.

13.5.1 Concretos vibrados


O emprego de vibração está associado a concretos com valores de tensão de
escoamento elevados e com viscosidade (calculada pela razão tensão/taxa de cisalhamento)
suficiente alta nas elevadas taxas de cisalhamento aplicadas durante a vibração para evitar
fenômenos de segregação. A utilização deste tipo de energia de compactação torna o
processo de moldagem pouco sensível ao perfil reológico. Contudo, concretos do tipo
Bingham conceitualmente se adequam melhor à vibração devido à maior estabilidade de sua
viscosidade nas taxas mais elevadas. A Figura 17 ilustra esquematicamente perfis reológicos
possíveis para concretos moldados sob vibração.

17
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VIBRADO

cisalhamento (Pa)
Tensão de

Bingham Pseudoplástico Dilatante


Taxa de cisalhamento (s -1)
Figura 17 - Esquema dos possíveis comportamentos reológicos de concretos moldados com vibração.

13.5.2 Concretos bombeáveis


Bombeamento é uma técnica de transporte onde um concreto é inicialmente
submetido a elevadas tensões de cisalhamento na saída da bomba, as quais decrescem ao
longo da distância até atingir o equilíbrio com a pressão atmosférica na saída da tubulação.
O nível de tensão é ainda afetado pelo cisalhamento interno do material e pelo o atrito com
as paredes do duto. A Figura 18 ilustra esquematicamente perfis reológicos possíveis para
concretos transportados por bombeamento.

BOMBEÁVEL
cisalhamento (Pa)
Tensão de

Bingham Pseudoplástico
Taxa de cisalhamento (s -1)
Figura 18 - Representação esquemática dos possíveis comportamentos reológicos de concretos bombeáveis.

Para escoar com facilidade dentro de uma tubulação com volume confinado, o
concreto deve apresentar algumas características:
a) Tensão de escoamento moderada: o fluxo ocorrerá enquanto o nível de tensão de
cisalhamento for maior que a de escoamento do concreto. Sendo assim, quanto
menor for a tensão de escoamento, maior a distância bombeável;
b) Comportamento reológico preferencialmente pseudoplástico, mas com
possibilidades para fluido de Bingham. Nesse cenário a viscosidade aparente do
concreto diminui com o aumento da taxa de cisalhamento, como ilustrado na Figura
1, reduzindo assim a dissipação de energia no processo. Importante destacar que
esse comportamento deve ser mensurado em condição de fluxo confinado;
c) Coesão para evitar separação de fases: sistemas em que a viscosidade seja muito
baixa tendem a permitir a separação da pasta dos agregados durante o transporte,

18
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uma vez que a densidade dos grãos é geralmente maior que da fase líquida. Tal
desajuste resulta no lançamento heterogêneo do concreto e num maior potencial
de bloqueios e entupimentos da tubulação.

13.5.3 Concretos autoadensáveis1

Concretos autoadensáveis são aqueles que escoam sob ação do peso próprio, sendo
a gravidade a força motriz deste fluxo. O material fluirá tanto mais quanto menor for sua
tensão de escoamento. O valor de viscosidade estará associado à velocidade e à dissipação
de energia no fluxo. Quanto menor for a viscosidade, menor a dissipação de energia e mais
rápido o sistema se movimentará, o que resultará em sistemas com melhores características
de moldagem. Contudo, se a viscosidade da pasta for muito reduzida, o concreto poderá
sofrer fenômenos de separação de fases tanto no lançamento, como no interior da fôrma
após moldagem. O valor de viscosidade da pasta deve ter relação direta com a densidade
dos agregados.
Os três perfis reológicos apresentados na Figura 19 são possíveis em concretos auto-
nivelantes, sendo o comportamento pseudoplástico o mais indicado para concretos
autoadensáveis que devam ser transportados por bombeamento. O perfil dilatante não é
indicado para lançamento com bomba, mas tem a vantagem conceitual de minimizar eventos
de segregação, pois a viscosidade da pasta se eleva quando um agregado tentar se acelerar
no sistema.

AUTO-NIVELANTE
cisalhamento (Pa)
Tensão de

Bingham Pseudoplástico Dilatante

Taxa de cisalhamento (s -1)


Figura 19 - Esquema dos possíveis comportamentos reológicos de concretos auto-nivelantes.

13.5.4 Concretos projetados2


O processo de projeção consiste em aplicar o concreto na forma de spray sobre
superfícies, formando camadas na ordem de vários centímetros. Os concretos, previamente
misturados com a água, são bombeados à úmido (“shotcrete”) em uma tubulação que
culmina em um bocal de projeção no qual o material é acelerado com ar comprimido,
podendo ainda receber a adição de algum tipo de aditivo que favoreça sua consolidação na

1
Para mais detalhes sobre este tipo de concreto consultar o Capítulo 48
2
Para maiores detalhes sobre este tipo de concreto consultar o Capítulo 38

19
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superfície. Outra técnica de projeção consiste no transporte à seco (“gunning”) da


composição no interior da tubulação, recebendo a água somente no bocal de projeção.
Concretos projetados constituem uma categoria reológica bastante peculiar, pois
podem ser tratados como dois materiais distintos durante suas etapas de transporte e
lançamento. No caso dos concretos de projeção à úmido, a etapa de bombeamento
demanda o perfil reológico dos concretos bombeáveis. Contudo, após a aceleração no bocal
de projeção e lançamento do spray, o material tem que mudar de perfil reológico, como
visualizado na Figura 20, para permitir sua estabilização e consolidação na superfície.

cisalhamento (Pa)
PROJEÇÃO
Tensão de

Taxa de cisalhamento (s -1)


Figura 20 - Representação esquemática dos possíveis comportamentos reológicos de concretos de projeção.

Neste caso, o material precisa adquirir quase instantaneamente elevada tensão de


escoamento na condição estacionária sobre a superfície para suportar o peso próprio nas
camadas aplicadas, mas deve reduzir de viscosidade aparente de maneira acentuada no
instante dos impactos a elevadas taxas de cisalhamento das novas camadas de material
aplicado. Desta maneira, sucessivas camadas podem ser aplicadas e misturadas evitando a
ocorrência de laminação, sendo que quanto maior a tensão de escoamento, maior espessura
potencial que o concreto pode atingir.
A descrição sintética dos diferentes perfis reológicos para as diferentes categorias de
concretos é suficiente para demonstrar a complexidade envolvida nas etapas de aplicação
destes materiais. Associado a isto, não se pode esquecer que o momento reológico do
destes materiais é apenas nas primeiras horas, pois após o endurecimento os concretos
trabalharão endurecidos por muitos anos. Sendo assim, há a necessidade de se discutir
como controlar a reologia destes materiais sem perder de vista a microestrutura adequada
para o desenvolvimento das propriedades endurecidas.

13.6 Abordagem Microestrutural / Reológica dos Concretos

A abordagem microestrutural / reológica tem como objetivo primário a formulação de


composições com desempenho adequado no estado endurecido, cujo comportamento
reológico no estado fresco seja compatível com o método de aplicação empregado, sem que
isso implique em aumentos de custos.
A condição essencial para implementação desta abordagem reside no conhecimento
de como cada um dos fatores intrínsecos (granulometria, composição química, teor de água,
ar incorporado, aditivos, etc.) e extrínsecos (condição de mistura, temperatura, umidade
relativa do ambiente, etc.) influenciam tanto a reologia, como o desempenho dos concretos
no estado endurecido. Além disso, é necessário conhecer as solicitações físicas presentes

20
Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

tanto nos processos de aplicação, como o ambiente físico-químico a que os materiais


estarão expostos após a sua moldagem.
Um exemplo para ilustrar a abordagem proposta é a discussão dos conceitos
aplicados no desenvolvimento de um concreto projetado. Os materiais desta classe devem
apresentar comportamento reológico pseudoplástico no estado fluido, associando reduzida
viscosidade no bocal de projeção para garantir a formação do jato (“spray”), com elevada
tensão de escoamento para evitar o escoamento da massa sobre a superfície. Se a redução
de viscosidade for obtida através do aumento no consumo de água, a tensão de escoamento
será baixa. Os sistemas desse tipo devem, portanto, possuir um maior teor de finos
desaglomerados para obter o comportamento desejado (PILEGGI et. al, 2003). Os benefícios
da redução no teor de água seriam também verificados no estado endurecido, através da
diminuição da permeabilidade e do aumento da resistência mecânica das composições.
Contudo, no estado endurecido, problemas decorrentes de retração plástica e módulo
elástico elevados poderiam ocorrer caso o aumento no teor de finos resultasse de um
elevado consumo de cimento.
Fica então evidente que além do uso de técnicas de caracterização reológica precisas,
a elaboração de uma abordagem microestrutural / reológica requer uma descrição elaborada
da natureza microestrutural das argamassas, de forma a permitir a compreensão dos
diversos fenômenos físico-químicos que influenciam seu comportamento no estado fresco.

13.6.1 Natureza bifásica dos concretos

Sob a ótica microestrutural / reológica os concretos podem ser descritos de maneira


genérica, em seu estado fluido anterior à cura, como suspensões bifásicas heterogêneas
com grande extensão granulométrica (partículas na faixa de 0,1 m a 4 mm), cujo
comportamento reológico é bastante complexo devido à presença de forças com naturezas
distintas no sistema.
A fração de partículas grosseiras maiores que 100 m (agregados), submetida com maior
intensidade à ação do efeito das forças de natureza mássica (atrito, impacto, etc.), encontra-se
imersa em uma matriz aquosa de partículas finas reativas ou inertes menores que 100 m (HU,
LARRARD, 1995) onde predominam as forças superficiais (atração/repulsão, capilaridade, etc.),
como visto na Figura 21.

Figura 21 - Representação esquemática da estrutura bifásica de uma argamassa.

21
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O conceito de que estes materiais possuem natureza bifásica resulta da coexistência


de partículas em ambos os domínios de forças resulta (OLIVEIRA et al., 2000). Segundo
esse modelo, um concreto pode ser definido como um material cujas propriedades são
determinadas pela interação do conjunto de grãos grossos imersos na matriz fluida.
Do ponto de vista microestrutural, o comportamento reológico de sistemas bifásicos
está intimamente relacionado com a distribuição espacial das partículas de cada fase e com
as características do meio líquido que as afasta.
É fundamental, portanto, conhecer a distância de separação entre partículas (D), a
qual é definida como sendo “a distância média entre duas partículas adjacentes quaisquer na
mistura, admitindo que todas as partículas são entidades separadas, ou seja, que não
existem aglomerados” (OLIVEIRA et al., 2000). O valor de D é calculado supondo-se que o
fluido adicionado deve inicialmente preencher os vazios existentes entre as partículas e
recobrir suas superfícies, para depois separá-las, como apresentado esquematicamente na
Figura 22.

partículas
fluido
D
(a) (b)
Figura 22 - Representação esquemática do conceito de distância média de separação entre partículas (D): (a)
partículas em contato sem nenhum fluido, ou com o mesmo preenchendo exatamente o vazio entre estas e (b)
partículas separadas pelo fluido (OLIVEIRA et al., 2000).

Modelos teóricos, como os de De Hoff e Rhines (AGARWALA, PATTERSON,


CLARCK, 1992) e de Funk e Dinger (Interparticle Separation Distance - IPS) (OLIVEIRA et
al., 2000), foram desenvolvidos para cálculo de D em suspensões.

13.6.1.1 Matriz

O modelo de IPS é particularmente interessante para o cálculo da distância de


separação interparticular por considerar o efeito da distribuição granulométrica e prever que
as partículas ficam em contato (D = 0) quando o teor de fase líquida for inferior à porosidade
do sistema empacotado. Os demais modelos, por serem baseados em relações entre a
concentração e a área superficial das partículas na suspensão, somente consideram as
partículas em contato quando o teor de líquido for nulo, o que é irreal. Esses atributos fazem
do IPS um parâmetro com maior potencial de utilização e é expresso através da Equação 1.
2 é 1 æ 1 öù
IPS = ´ê -ç ÷÷ú
VSA ë VS çè 1- Pof øû (1)

22
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Onde: IPS é a distância de separação interpartículas (m); VSA é a área superficial


volumétrica (m2/cm3), calculada a partir do produto entre a área específica medida (m 2/g) e a
densidade do sólido (g/cm3); VS é a fração volumétrica de sólidos na mistura e P of é a fração
de poros no sistema, quando todas as partículas estão em contato na condição de máximo
empacotamento.
O IPS influencia significativamente o comportamento reológico de uma suspensão. Se
o teor de fluido for inferior ou igual à porosidade do sistema de partículas, a mistura não flui,
pois as partículas encontram-se em contato mútuo. Somente quando o teor de água for
suficiente para exceder a porosidade e recobrir a superfície das partículas, provocando uma
significativa separação entre as mesmas, é que se pode esperar boa fluidez em suspensões.
A porosidade do sistema é controlada ajustando-se a distribuição granulométrica. No
entanto, granulometrias distintas que resultam em corpos com porosidades similares podem
apresentar uma diferença significativa na área superficial, de forma que a adição de uma
mesma quantidade de água não resulta no mesmo IPS, nem na mesma fluidez. Partículas
com área superficial elevada requisitam maior teor de líquido para seus recobrimentos,
reduzindo o volume disponível para o afastamento das mesmas (SMITH, HAERLE, 1995).
Para aumentar IPS, e conseqüentemente reduzir a viscosidade de suspensões, faz-se
necessário diminuir a porosidade da distribuição ao mínimo valor possível, o que é obtido
utilizando-se modelos otimizados de empacotamento de partículas, como os de Andreasen
ou de Alfred (OLIVEIRA et al., 2000).

13.6.1.2 Agregados

Apesar da minimização da porosidade, o máximo empacotamento resulta em uma


proximidade maior entre os grãos grossos e um baixo volume de matriz nos sistemas. Esta
condição inibe o escoamento (PILEGGI, 1996) devido à grande interferência física entre os
agregados.
Com base nestas considerações poder-se-ia pensar existir uma certa incoerência
entre o conceito de IPS e a fluidez, uma vez que o que maximiza IPS, provoca efeito
contrário no escoamento. Na realidade, se for admitido que as argamassas são materiais
bifásicos (TOPCU, KOCATASIN, 1995) onde as partículas grosseiras são regidas pelas
forças gravitacionais e pelos efeitos de massa, enquanto as partículas finas sofrem ação
predominante das forças superficiais, tal conflito não se justifica.
O conceito embutido na maximização de IPS é diretamente aplicável a suspensões de
partículas finas, onde a água é o fluido que as separa. O predomínio de forças superficiais
atrativas e repulsivas nessa faixa granulométrica faz com que, quanto maior IPS, mais fácil a
movimentação entre as partículas.
Nos concretos essa situação não se repete devido à presença de partículas
macroscópicas (agregados) que impõem ao sistema acentuada influência de forças
mássicas. Portanto, para que a movimentação entre tais partículas ocorra com facilidade é
necessário que a distância entre as mesmas seja maximizada.
Uma vez que o fluido que afasta os grãos grossos é a matriz do concreto e não
apenas a água, os coeficientes de distribuição que proporcionam valores elevados de fluidez
são aqueles que propiciam elevado teor de matriz, os quais são inferiores aos que promovem
alta densidade de empacotamento (coeficiente de distribuição de máximo empacotamento
q = 0,37) (OLIVEIRA et al., 2000).
Um parâmetro que expressa a distância entre agregados da argamassa denomina-se
Espessura Máxima de Pasta (MPT) (POWERS, 1968). Sendo assim, para se elevar a fluidez

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de uma argamassa é necessário que se maximize o valor de MPT, propiciando o menor


contato possível entre os grãos grossos.
A equação original para cálculo de MPT foi desenvolvida admitindo-se partículas
esféricas. Por isso, não inclui diretamente a área específica das partículas grossas (HU,
LARRARD, 1995), mas o diâmetro das partículas. No entanto, seria interessante considerar a
verdadeira área superficial no cálculo de MPT. Para isso pode-se utilizar a equação original
de IPS (Equação 2), modificada pela seguinte alteração de seus parâmetros: VSA g sendo a
área superficial volumétrica da fração grossa; Pofg sendo a porosidade da distribuição das
partículas grossas e VSg sendo a concentração volumétrica dos grossos no concreto,
resultando em:
2 é 1 æ 1 öù
MPT = xê -ç ÷ú (2)
VSA g ëê VSg çè 1- Pof g ÷øûú
Essa abordagem de duas fases permite então projetar a granulometria de um concreto
considerando cada uma delas individualmente. Assim, o controle do escoamento de uma
composição pode ser efetuado através do conhecimento de IPS da matriz e de MPT dos
grãos grossos.
Contudo, para que a natureza bifásica de suspensões ou de concretos se manifeste, é
necessário atribuir às partículas finas a condição de fluido perante os grãos maiores. Para
isso, a suspensão dos finos deve, além de ser homogênea, não apresentar nenhum tipo de
interferência física com as partículas maiores.
Para que as partículas finas não exerçam interferência física à movimentação dos
grãos grossos, as maiores partículas da matriz devem apresentar uma diferença de tamanho
de dez vezes em relação às menores dos agregados, respeitando a condição demonstrada
por Farris (FARRIS, 1968), para que não haja interferência entre a movimentação das
partículas. Cabe mencionar que esse conceito é intuitivamente aplicado no desenvolvimento
dos concretos autoadensáveis com granulometria descontínua (MYHRE, 1994).

13.6.2 Natureza multifásica reativa dos concretos


Concretos contendo outros constituintes, como as fibras e/ou com elevado teor de ar,
apresentam maior complexidade microestrutural, estendendo sua definição para materiais
multifásicos (Figura 23). Nesse caso, as novas fases estão sujeitas a fenômenos distintos
daqueles observados nos componentes básicos das argamassas.

24
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Figura 23 - Representação esquemática da estrutura multifásica de uma argamassa.

O ar exerce grande influência na viscosidade de uma argamassa, tendo menor


impacto sobre a tensão de escoamento. Analisando esse resultado sob a ótica da
abordagem microestrutural / reológica, é possível inferir: (a) uma vez que o ar é incorporado
na água, o incremento em seu teor provoca aumento no volume de matriz, resultando no
afastamento entre os agregados. Assim sendo, a interferência física entre os mesmos é
reduzida, justificando a queda na viscosidade do material; (b) a tensão de escoamento
decorre fundamentalmente das forças superficiais de atração entre as partículas finas
(OLIVEIRA et. al, 2000). Sendo a mesma pouco sensível à incorporação de ar, é possível
inferir que essa fase exerce pouco influencia no comportamento da matriz.
No caso específico das fibras, a adição das mesmas eleva tanto a viscosidade quanto
a tensão de escoamento das composições. Contudo, essa análise não pode ser feita de
maneira direta, pois algumas fibras acentuam a incorporação de ar nas composições (SILVA
et. al, 2005).
A complexidade associada à reologia aumenta ainda mais no caso de suspensões
reativas, como os concretos, onde o comportamento do fluido passa a ser também
dependente da cinética de reação do agente de consolidação (cimento, cal, pozolanas, etc.)
e dos aditivos (dispersantes, retardadores, tensoativos, gelificantes, etc.) presentes no
sistema.
Por último, fatores extrínsecos, como a história de cisalhamento (processo de mistura,
transporte e aplicação), a temperatura e a umidade ambiente, também afetam a consistência
dos concretos exercendo influência sobre o desempenho na aplicação e no recobrimento de
superfícies.

13.7 Fatores que afetam a trabalhabilidade e a homogeneidade dos


concretos
A abordagem microestrutural/reológica aplicada no desenvolvimento de concretos
possibilita decompor a influência de diversos fatores que podem afetar as características do
material no estado fresco e endurecido. Considerando-se que os fatores granulométricos e o
teor água entram diretamente no cálculo do IPS e do MPT, o presente tópico visa discutir, de
maneira sintética, outros fatores que contribuem no comportamento dos concretos, mais

25
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especificamente: condição de mistura; dispersão das partículas; incorporação de ar;


separação de fases; alterações reológicas no tempo (cinética de consolidação e cura).

13.7.1 Condição de mistura

Os concretos são produzidos através da mistura de matérias-primas granulares com


extensa faixa granulométrica (0,1m - 30mm) e água que, durante o estado fresco, podem
ser descritos como suspensões multifásicas formadas por agregados macroscópicos inertes
(areia e brita) imersos em uma matriz cimentícia reativa (formada por água, cimento, finos
inertes, diferentes aditivos e, em alguns casos, significativo teor de ar incorporado ou mesmo
fibras).
A mistura é a etapa inicial e, também, essencial do processamento dos concretos,
pois, apesar da aparente simplicidade, é o ponto de partida para o desenvolvimento
microestrutural do material. O processo de mistura visa transformar um sistema particulado
descontínuo em um sistema homogêneo (do ponto de vista de distribuição de fases) e
contínuo, através da mistura com um fluido (água), distribuição das fases presentes e
desaglomeração dos finos devido ao cisalhamento ou mesmo à ação de aditivos
dispersantes.
A desaglomeração é fundamental para promover um processo de mistura efetivo, uma
vez que as partículas finas têm uma grande tendência à aglomeração devido às forças de
van der Walls e, também, às forças capilares na presença de água (PILEGGI et al., 2001).
Uma das funções do processo de mistura é a quebra destes aglomerados, pois além de
facilitar a homogeneização dos materiais, a redução do tamanho das unidades móveis tem
grande influência no comportamento reológico. Sistemas contendo unidades móveis
menores movimentam-se mais facilmente, resultando em suspensões com menor
viscosidade (OLIVEIRA et al., 2000). Este fato foi observado em pastas de cimento (YANG e
JENNINGS, 1995), argamassas (BANFILL, 1991) e também em concretos (PILEGGI, 2001;),
promovendo o fluxo e resultando em materiais mais facilmente aplicáveis.
Em muitas situações é recomendável o uso de aditivos para promover a dispersão e
estabilização de suspensões, permitindo assim a redução da quantidade de água necessária
para obtenção da fluidez necessária à aplicação. Nestes casos, a quebra dos aglomerados
durante a mistura expõe a área superficial das partículas finas à ação dos dispersantes,
potencializando seu efeito. A individualização das partículas é também importante para as
propriedades no estado endurecido, pois o desenvolvimento da microestrutura é decorrente
de reações dos ligantes e a maior exposição de área reativa permite um melhor
aproveitamento desses materiais na composição. Desta forma, um processo de mistura
eficiente favorece a obtenção de propriedades melhores e mais homogêneas, ou ainda a
redução nos teores dos onerosos ligantes, como o cimento, que além do alto custo tem
elevado impacto ambiental.
O processo de mistura é influenciado por fatores intrínsecos à própria formulação de
concretos, argamassas, grautes e pastas ou, então, relacionados ao método utilizado, ambos
com grande impacto tanto no comportamento reológico quanto nas propriedades no estado
endurecido. Em relação à composição do sistema destacam-se principalmente: as
quantidades de pasta, argamassa e água presentes e, também, tipo e teores de aditivos;
características físico-químicas das matérias-primas utilizadas (distribuição de tamanho de
partículas, área superficial, natureza química de superfície quando em sistema aquoso)
(PILEGGI, 2001). Já em relação ao método de mistura, além do tipo de equipamento

26
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utilizado e dos parâmetros de funcionamento do mesmo (tempo, velocidade de rotação ou


intensidade de mistura) (ROMANO et al., 2009) são fatores de significativo impacto a forma
de adição de água (CARDOSO, 2009) e, também, a seqüência de adição dos materiais,
sendo que o processo pode ser realizado em uma ou mais etapas (REJEB, 1996).
Estudos em concretos refratários (PILEGGI, 2001) utilizando um reômetro rotacional
capaz de quantificar a energia transmitida ao sistema durante a mistura, demonstraram que a
forma de adição de água altera significativamente o processo e o comportamento reológico
resultante. A adição de água de forma lenta ou fracionada intensifica a resistência do sistema
ao cisalhamento devido ao surgimento de forças capilares durante o tempo de mistura com
teor de água inferior ao teor de água da virada. Esta é a quantidade de água suficiente para
recobrir todas as partículas e preencher os vazios da distribuição, ponto no qual as forças
capilares são máximas e, conseqüentemente, a resistência ao cisalhamento também.
Qualquer quantidade a mais de água do que o teor da virada causa a redução repentina das
forças capilares, bem como, da resistência ao cisalhamento da suspensão, conforme
demonstrado na Figura 24. Após o ponto de virada na mistura, o sistema passa a se
comportar como um fluido e não mais com um sistema descontínuo. Durante o processo,
altos níveis de energia de cisalhamento podem ser fornecidos à pasta aglomerada, tanto pelo
próprio atrito interno da matriz, quanto pela movimentação dos agregados através do efeito
de “moinho de bolas” (WILLIAMS; SAAK; JENNINGS, 1999).

Figura 24 - Representação esquemática do processo de mistura em função do teor de água. Camadas


adsorvidas de ligação e das pontes líquidas de ligação entre duas partículas (laranja) imersas num meio líquido
(azul). Azul claro – líquido de recobrimento da superfície e afastamento das partículas; Azul escuro – líquido de
preenchimento dos vazios (PILEGGI, 2001).

Diversos tipos de misturadores, com diferentes níveis de eficiência são empregados


na mistura de concretos. As betoneiras (Figura 25), tanto as fixas, como as móveis
(caminhão betoneira) utilizam a força centrífuga de seu movimento rotativo para elevarem a
mistura até um ponto superior, a partir do qual a mesma cai devido a ação da gravidade.
Neste movimento de tombo o cisalhamento é gerado garantindo a mistura da massa. O
aspecto negativo deste procedimento é que a eficiência do mesmo é limitada, e somente
concretos que possuam baixa energia de mistura são adequadamente produzidos neste tipo
de misturador.

27
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(a) Betoneira (b) Caminhão Betoneira (c) Misturador de eixo vertical


Figura 25 – Equipamentos de mistura de concretos (a) betoneira; (b) caminhão betoneira; (c) misturador de eixo
vertical.

Por sua vez, misturadores forçados, como os de eixo vertical (Figura 25), são mais
eficientes uma vez que a movimentação de seus elementos de cisalhamento força a mistura
e desaglomeração das partículas em seu interior, sendo mais efetivos que betoneiras. Este
tipo de equipamento é, portanto, menos sensível à energia de mistura dos concretos.
Contudo, materiais que apresentem curvas de mistura mais longas sempre demandarão
maior tempo dentro do misturador.

13.7.2 Dispersão das partículas


O primeiro uso de dispersante em material cimentício data do início da década de 30
quando um pavimento de concreto foi feito nos Estados Unidos utilizando um ácido naftaleno
sulfônico. Entretanto, devido ao elevado custo, a partir da década de 40 passou-se a utilizar
dispersantes a base de lignosulfonato. Este aditivo, apesar de ser mais viável
economicamente, retardava a pega já que era um resíduo da produção de papel e não havia
controle da quantidade de açúcar em sua composição.
A partir de 1960, foram desenvolvidos na Alemanha dispersantes a base de melamina
sulfonada, os quais permitiam melhorar a trabalhabilidade dos concretos sem mexer na
relação água/cimento, mas atualmente, os aditivos mais utilizados na indústria concreteira
são baseados em moléculas de policarboxilato devido à maior eficiência em relação aos
demais.
Conhecidos também como redutores de água, superplastificantes, ou ainda
plastificantes de 1ª, 2ª ou 3ª gerações, os dispersantes são agentes ativos de superfície que
atuam impedindo, ou pelo menos dificultando, a aproximação das partículas mais finas da
composição dos concretos (OLIVEIRA, et al., 2000).
Independente do tipo de dispersante, a forma de atuação dos aditivos ocorre conforme
apresentado na ilustração da Figura 26. A esquerda é mostrado o fenômeno de aglomeração
das partículas de cimento em suspensões isentas de dispersantes e a direita, a dispersão
das partículas devido ao aditivo adsorvido na superfície das mesmas.

28
Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Partículas de cimento sem dispersante Partículas de cimento com dispersante


(aglomeração) (estabilização)
Figura 26 - Ilustração computacional da aglomeração das partículas de cimento em pasta isenta de dispersante
(esquerda) e com o aditivo adsorvido na superfície (direita) (adaptação de LafargeGroup).

Os dispersantes modificam a superfície do cimento ao serem adsorvidos, criando uma


barreira que impede a aproximação das partículas, reduzindo o atrito entre elas e a energia
requerida para induzir o fluxo no sistema. Partículas isoladas perturbam menos o fluxo do
que as aglomeradas (RIXON, 1999).
Distintas eficiências de dispersão são obtidas a partir da utilização dos diferentes tipos
de aditivo, e são dependentes do tipo de cimento. Os policarboxilatos são mais eficientes que
as melaminas que, por sua vez, são mais eficientes que os lignosulfonatos, conforme
ilustrado na Figura 27, em uma representação esquemática de um ensaio de slump.

29
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EFEITO DA UTILIZAÇÃO DE DIFERENTES DISPERSANTES


policarboxilato

melamina sulfonada

lignosulfonato
sem aditivo

(a)

ÁGUA NECESSÁRIA PARA MANUTENÇÃO DA MESMA CONSISTÊNCIA

sem aditivo lignosulfonato melamina sulfonada policarboxilato

(b)

COM SP SEM SP
Figura 27 - (a) Efeito do tipo de dispersante na fluidez de concretos e na potencial redução da quantidade de
água para manutenção da consistência; (b) exemplos de concretos com diferentes níveis de fluidez, obtidos
com a utilização ou não de aditivos dispersantes (superplastificantes).

Geralmente, concretos aditivados com dispersantes têm sua viscosidade e tensão de


escoamento reduzidas, devido ao predomínio das forças de natureza repulsiva. Assim, é
possível a redução da quantidade de água utilizada no amassamento e do teor de
aglomerante da composição, possibilitando a produção de concretos de alto desempenho,
com alta trabalhabilidade, fácil manipulação, aplicação e adensamento, aliado a alta
resistência e boa durabilidade.
A variação do teor do aditivo também resulta em alteração das propriedades dos
concretos sob condição de fluxo, podendo afetar o transporte e a aplicação do mesmo. Na
Figura 28 é apresentado um exemplo prático do efeito da alteração do teor de policarboxilato
comercial nas propriedades reológicas, onde foi observado que com o aumento do teor do
aditivo tanto a viscosidade quanto a tensão de cisalhamento e a área de histerese (área
inscrita entre as curvas de tensão vs taxa) foram reduzidas, mostrando a capacidade de
dispersão do aditivo. Por isso, é prática comum nas concreteiras a redução da quantidade de
água de amassamento para manutenção da consistência do concreto, impactando na
relação água/cimento.

30
Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

10
0
0,05%
8

Viscosidade (Pa.s)
0,15%
0,25%
6 0,35%

0
600 0 20 40 60 80 100 120 140 160
Tensão de cisalhamento (Pa)

Taxa de cisalhamento (s -1)


500

400

300

200

100

0
40 60 080 20 100 120 140 160
Taxa de cisalhamento (s -1)
Figura 28 - Efeito da variação do teor de dispersante na viscosidade (acima) e na tensão de cisalhamento
(abaixo) de pastas cimentícias misturadas com a mesma relação água cimento.

Mesmo com os benefícios no estado fresco, a grande maioria dos superplastificantes


pode retardar o início de pega, mas com a perda de eficiência do aditivo, as reações de
hidratação ocorrem de forma mais acentuada e o material como um todo, passa de um
comportamento de fluido viscoso para sólido elástico. Assim, é comum ser constatado o
retardo do endurecimento inicial de concretos aditivados, de modo que se torne impraticável
esperar para desenformar e descimbrar a estrutura acarretando em atraso no cronograma da
obra.
Apesar de já ter sido apresentado um capítulo sobre a hidratação do cimento, um
exemplo prático do efeito do teor de policarboxilato na reação química do cimento é
apresentado na Figura 29.

31
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0,005
Variação do teor de policarboxilato 0.00
0.15%
0,004

Fluxo de calor (W/g)


0.35%
0.45%
0,003 0.65%
1.00%
0,002

0,001

0,000
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Tempo (h)
Calor total
Teor de Tempo de início Final do período Tempo no período
acumulado após
policarboxilato da indução de indução de indução
48 horas
(%-p) (h:min) (h:min) (h:min) (J/g)
0,00 2:10 1:10 281
0,15 4:00 3:00 278
0,35 7:05 6:05 272
1:00
0,45 8:40 7:40 268
0,65 11:00 10:00 259
1,00 12:30 11:30 246

Figura 29 - Acompanhamento da reação de hidratação de pastas de cimento CPIIE aditivadas com diferentes
teores de dispersante (LYRA, 2010).

O teor do policarboxilato de sódio foi alterado de 0,15% a 1,0% em peso e foi


observada uma alteração na cinética de reação em mais de 8 horas. Isso mostra que a
aditivação excessiva do superplastificante pode ser um veneno para a qualidade do concreto,
para o desenvolvimento da resistência mecânica e para a produtividade da obra.
Os resultados apresentados foram comparativos e valem para a interação entre o
cimento e o aditivo específicos. Porém, não quer dizer que para o caso da utilização de
outros insumos, as mesmas tendências serão seguidas, visto que cada aditivo apresenta
suas peculiaridades e diferente interação com cada tipo de cimento.

13.7.3 Incorporação de ar
A incorporação de ar em concretos foi inicialmente utilizada em meados de 1930 e
desde então o conceito tornou-se regra para aplicação em locais onde a temperatura é muito
baixa, devido ao aumento da resistência a ciclos de gelo-degelo (KOSMATKA, 1994). A
saturação de água nos poros e o seu posterior congelamento submetem o concreto a
tensões de fadiga, levando à sua ruptura, mas a inclusão de vazios faz com que, no
momento do congelamento, a água encontre espaço livre para se expandir, reduzindo as
tensões sobre o concreto (MARTIN, 2005).
Normalmente, concretos convencionais apresentam densidades entre 2200 e
2600 kg/m³, enquanto os concretos aerados podem ser obtidos com densidades entre 300 e
1850 kg/m³ (NEVILLE, 1982). Em obra, seu peso próprio representa uma carga muito grande
atuante sobre a estrutura e, por isso, a redução da massa específica é de grande interesse

32
Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

prático, pois permite reduzir a dimensão das fundações, as formas podem suportar menores
pressões, facilita o manuseio, aumenta a produtividade e pode tornar o concreto mais eco-
eficiente devido a desmaterialização da obra.
Entretanto, apesar de ser importante para diversos fins, a presença de vazios na
estrutura pode também, gerar vários problemas, como dificuldade de controle do volume, da
homogeneidade e da estabilidade das bolhas no estado fresco (POWERS, 1954), separação
de fases (finos/agregados), fissuração, redução da resistência mecânica e do módulo de
elasticidade e aumento da permeabilidade no estado endurecido, tornando o concreto menos
resistente e durável. Isso ocorre porque uma série de variáveis práticas pode interferir no
processamento, como temperatura, tipo de cimento ou adições, tipo e teor de incorporador
de ar, presença de outros aditivos, forma de geração de porosidade, entre outras (DU e
FOLLIARD, 2005).
Várias técnicas para obtenção de concretos porosos são reportadas em literatura, mas
na grande maioria das vezes os materiais leves são obtidos a partir de duas rotas: adição
direta de incorporador de ar na formulação ou injeção de espuma aquosa.
A primeira delas, mais simples, consiste na adição de incorporadores de ar
diretamente na formulação, sendo os poros gerados durante a mistura. A segunda rota
consiste no processamento separado de um concreto convencional e uma espuma aquosa,
gerada em equipamentos apropriados, a partir da mistura de incorporador de ar e água. Na
Figura 30 são apresentados os esquemas ilustrativos salientando a diferença entre ambas as
rotas de processamento dos concretos porosos.
brita
areia
Adição de incorporador de ar
cimento + H2O

cal
adições
Injeção de espuma
+ H2O

Figura 30 - Ilustração de duas rotas de processamento de concretos porosos. Rota I: utilização de incorporador
de ar na formulação e, Rota II: adição de espuma aquosa gerada separadamente do concreto convencional.

Independente da técnica, a geração dos poros nos concretos ocorre basicamente pela
ação dos incorporadores de ar, substâncias que apresentam na mesma molécula uma
porção hidrofóbica (apolar) e uma porção hidrofílica (polar) sendo, portanto, conhecidas
como anfifílicas (ROMANO, 2005). A parte apolar da molécula é, freqüentemente, uma
cadeia hidrocarbônica enquanto que a porção polar pode ser iônica (catiônica ou aniônica),

33
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não-iônica ou anfótera. A seguir são ilustradas na Figura 31 diferentes moléculas de


incorporadores de ar com as distintas características dissociativas.
H3C CH3
CH3

H3C

CH3 O OH
O n

Não-iônico - Alquil Fenol Etoxilado


H

N+
H3C NH3+
H
Catiônico - Sal de Diamina

SO3-
H3C O
Aniônico - Lauril sulfato

H2N O
C CH3

N+
CH2COO-
H3C
Anfótero - Amidobetaína
Figura 31 - Exemplos de moléculas de incorporadores de ar de acordo com o caráter dissociativo.

Devido à peculiaridade das moléculas, os incorporadores de ar mostram uma forte


tendência de migrar para interfaces, de forma que seu grupo polar se encontre em contato
com a fase líquida e o seu grupo apolar se encontre orientado para o ar, solvente orgânico
ou partícula (SALAGER, 2002), originando propriedades físico-químicas e químicas especiais
com larga aplicação prática.
Nos concretos, quase 100% dos incorporadores de ar utilizados apresenta caráter
dissociativo aniônico devido à melhor interação com as cargas superficiais iniciais do cimento
e maior capacidade de geração de bolhas.
Quando adicionados nas composições, esses aditivos são responsáveis por alterar as
propriedades do concreto no estado fresco que, por conseqüência, afetam o transporte, a
aplicação e as características após o endurecimento. Na Figura 32 são ilustrados exemplos
do: (a) efeito da concentração de incorporador de ar (AIA) no volume de ar incorporado (para
diferentes composições), (b) efeito do ar nas características reológicas (viscosidade vs
rotação, f(teor de aditivo)) e (c) impacto da alteração do volume de ar incorporado no módulo de
elasticidade.

34
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Ar incorporado
(a)
comp A
comp B
comp C
comp D

Concentração de AIA

Variação do teor de AIA 0,0


0,2g/L
1,0g/L
Viscosidade

2,0g/L

(
b)

Rotação
Módulo de elasticidade

( R² = 0.81
c)

Ar incorporado
Figura 32 - Ilustração das tendências observadas com a variação da concentração de aditivo incorporador de ar
no volume de ar incorporado (a), nas propriedades reológicas (b) e, do teor de ar incorporado (no estado fresco)
no módulo de elasticidade de concretos.

A variação do teor de incorporador de ar aumenta o volume de ar incorporado no


concreto até uma concentração crítica, onde incrementos do teor do aditivo não alteram mais
a geração das bolhas. Esse ponto de saturação é conhecido como concentração micelar
crítica (CMC) e depende do tipo de aditivo, tipo de cimento, presença de eletrólitos,
quantidade de água etc. (SALAGER, 1992).
No estado fresco, a utilização do incorporador de ar aumenta a coesão e melhora a
trabalhabilidade dos concretos, mas ainda não há um consenso sobre o efeito do ar na
viscosidade e na tensão de escoamento, pois as interações entre os insumos utilizados nas
composições dependem de muitas variáveis. São encontrados em literatura trabalhos onde o

35
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aumento no teor de ar promove redução da viscosidade (ou tensão de escoamento) ou em


outros casos, causa aumento (ROMANO, 2011a).
Independente disso, o que é consenso geral é que a presença das bolhas facilita o
fluxo e o bombeamento sem ocorrência de separação de fases, visto que torna o concreto
mais leve e coeso.
Após o endurecimento, a presença das bolhas de ar torna o concreto poroso,
aumentando a freqüência de vazios e, conseqüentemente, reduzindo a resistência mecânica
e o módulo de elasticidade.
Partindo do pressuposto de que o concreto seja composto por um conjunto de
agregados graúdos imersos em uma argamassa que, por sua vez, é definida como um
conjunto de agregados miúdos imersos em uma pasta cimentícia, a qual é composta por uma
suspensão de partículas finas em água, o ar deve ser incorporado nos concretos na fase
pasta, aumentando o volume de argamassa e a distância de separação entre os agregados
graúdos.
Segundo essa lógica, pode-se inferir que a incorporação de ar nesses materiais tem
sua cinética primeiramente atrelada à interação desses aditivos com a água, seguida dos
fatores relacionados com as partículas da pasta e de sua interação com os agregados
miúdos da argamassa e com os graúdos do concreto. Portanto, para que se entenda a
incorporação de ar em materiais cimentícios, sendo o concreto o caso mais geral, é
necessário avaliar desde os princípios fundamentais da fase aquosa.

13.7.4 Separação de fases


Os concretos e argamassas são materiais heterogêneos, multifásicos e reativos por
definição. Contudo, quando o termo homogeneidade é aplicado, ele refere-se à uniformidade
da distribuição das diferentes fases, e o conceito de estabilidade à manutenção da
uniformidade frente às etapas de processamento (também conhecido como robustez ou
“robustness”) (DACZKO, 2002; SHEN et al., 2007).
Após a mistura, o teor volumétrico, as características de cada fase 3 presente e a
distribuição das mesmas determinam o comportamento reológico e as propriedades no
estado endurecido do material. Entretanto, os concretos e argamassas são posteriormente
submetidos a diferentes etapas como de espera, transporte (caminhão betoneira, queda,
bombeamento, etc) e aplicação (manual, projeção, auto-escoamento, vibração, etc), estando
sujeitos a diversas solicitações. Assim, a distribuição de fases uniforme (homogeneidade)
obtida originalmente (supondo uma mistura eficiente) pode ser desestabilizada através da
ocorrência de separação causada por forças relacionadas a uma ou mais etapas do
processo.
A separação de fases ocorre em diferentes níveis de escala nos materiais de
construção, de acordo com a dimensão das partículas em questão:
 pasta (m), separação água-finos ou exsudação;
 argamassa (mm), separação pasta-areia;

3
Uma fase pode ser definida como uma porção de matéria que é química e fisicamente uniforme em toda sua
extensão.

36
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 concreto (cm), separação argamassa-agregado graúdo.

Os tipos de segregação podem ser causados em situações estáticas ou dinâmicas. No


primeiro caso, o material é submetido às ações da gravidade e do tempo, causando
sedimentação das partículas durante etapas intermediárias de espera ou nas primeiras horas
após a aplicação. Enquanto no segundo, a segregação é induzida durante o fluxo do material
seja em etapas de transporte, lançamento, preenchimento, ou mesmo, em ensaios
reológicos.
A separação de fases altera o comportamento reológico e compromete a qualidade
e/ou produtividade das etapas de transporte e aplicação, sendo uma das causas de
problemas de processo (entupimento de tubulações, baixa velocidade de bombeamento,
“plug-flow” (fluxo intermitente), quebra de bomba de projeção, spray heterogêneo, perdas por
rebote, etc). As propriedades no estado endurecido são afetadas indiretamente devido à
alteração do comportamento reológico (que pode comprometer a qualidade da aplicação
através da formação de vazios de concretagem ou de defeitos de interface na aplicação de
argamassa) e, também, diretamente devido à própria não uniformidade na distribuição das
fases após endurecimento, que gera microestrutura heterogênea e gradientes de
propriedades, conseqüentemente aumentando a incidência de patologias.
A relevância do fenômeno nas aplicações em que é mais freqüente e intenso, como,
por exemplo, em composições autoadensáveis ou vibráveis, levou ao desenvolvimento e à
utilização de aditivos específicos que reduzem a tendência à segregação (como
modificadores de viscosidade e incorporadores de ar). A presença do ar incorporado em
quantidades significativas, como é comum em muitas argamassas e concretos celulares,
aumenta a complexidade dos comportamentos reológico e de estabilidade. Além de estarem
sujeitas à migração, como as fases sólidas e líquidas, as bolhas de ar incorporado podem
coalescer, colapsar ou mesmo se formar dependendo das condições do processo e das
características da formulação (BANFILL, 2006; ROMANO et al., 2007).
Em decorrência do surgimento das tecnologias de aplicação por vibração e,
principalmente, autoadensáveis, além da utilização de composições com fibras de aço e
poliméricas, as demandas reológicas tornaram-se mais complexas e específicas (conforme
Figura 33), sendo também acompanhadas de preocupação quanto à segregação (PETROU
et al., 2000; SHAH, 2008). Conseqüentemente, surgiu a maioria dos métodos de avaliação.
Reologia ótima para
resistência a segregação
y
Dr

Baixa trabalhabilidade
Segregação
Zona de auto-adensamento
Reologia ótima para
auto-adensáveis

Dr
Figura 33 – Ilustração esquemática de regiões de comportamento reológico de pastas com diferentes
desempenhos em composições autoadensáveis (SHAH, 2008).

37
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13.7.5 Métodos de medida da separação de fases

13.7.5.1 Métodos gravimétricos

 Coluna de segregação - Figura 34a - (ASTM C1610): avalia a segregação estática


do concreto após 15min de repouso. Volumes iguais de amostras, provenientes de
diferentes alturas da coluna, são peneirados com água e, então, é quantificado o
teor de agregados acima de 4,75mm em cada amostra.
 Resistência a segregação estática por peneiramento: após amostra de 10L de
concreto repousar por 15min, a metade superior é deixada sobre uma peneira de
malha 5mm. Após 2min, a quantidade de material passante é pesada.

(a) (b) (c)

(d) (e) (f)

Figura 34 – (a) Coluna para teste de segregação estática; (b) Concreto sem segregação de acordo com índice
visual de estabilidade; (c) Concreto com elevada segregação; (d) Detalhes do dispositivo e (e) execução do
teste de penetração; (f) Teste de capacidade de passante (“passing ability”) Anel J (DACZKO, 2002; EL-
CHABIB & NEHDI, 2006; FANG & LABI, 2007; SHAH, 2008; SHEN et al., 2007).

13.7.5.2 Métodos visuais

 Teste visual de estabilidade após o “slump flow” - Figura 34b/c - (ASTM C1611):
consiste na avaliação visual do concreto fresco após o fluxo e utiliza como critério
um índice de estabilidade subjetivo. A avaliação visual pode ser similarmente
aplicada em argamassas submetidas ao ensaio de mesa de consistência.
 Análise visual de corpos-de-prova cilíndricos endurecidos (
 Figura 35): através da avaliação visual da seção transversal pode se realizar 2
análises. A primeira é a medida entre topo e primeira brita e, a outra, é a utilização
de um índice visual de estabilidade no estado endurecido, efetuando uma
avaliação subjetiva baseada em padrões pré-definidos.

38
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 Análise de imagens de corpos-de-prova cilíndricos endurecidos: a seção


transversal também pode ser avaliada por análise computacional de imagens
utilizando software para quantificar a distribuição de agregados ao longo da seção
transversal.

Classificação 1 (estável) 2 (estável) 3 (instável) 4 (instável)

Imagem

Figura 35 – Exemplos de padrões de estabilidade utilizados durante a análise visual da seção transversal de
cilindros de concreto endurecidos (FANG & LABI, 2007).

13.7.5.3 Métodos indiretos

 Teste de penetração - Figura 34d/e - (ASTM C1712) – avalia qualitativamente a


sedimentação, através da penetração de dispositivo no topo de uma amostra de
concreto fresco após repouso de alguns minutos. O resultado é comparado a
valores padrões que definem o grau de segregação.
 Avaliação da capacidade passante (“passing ability”):
 Anel J - Figura 34f - (ASTM 1621), caixa L, caixa U e funil V – são métodos que
avaliam a capacidade do concreto fluir através de detalhes de formas e armaduras
e manter a homogeneidade, pois o bloqueamento dos agregados nos obstáculos
gera segregação.

13.7.5.4 Exsudação

 No caso de pastas e argamassas, o ensaio de retenção de água avalia a


segregação água-finos, baseado na filtragem da água através de aplicação de
vácuo em funil de Büchner (ABNT NBR 13277:2005). É um ensaio normalizado,
comumente efetuado como parte da caracterização no estado fresco.
 Já, a exsudação do concreto fresco é determinada através da pesagem da água
coletada após períodos de vibração do material (ASTM C232 e ABNT
NBR15558:2008).

39
Instituto Brasileiro do Concreto – Livro CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA

13.8 Alterações reológicas no tempo (cinética de consolidação e cura)

A natureza reativa dos ligantes presentes no concreto, associada com a efetiva


estabilidade dos aditivos, provoca alterações no comportamento reológico em função do
tempo, levando à consolidação e endurecimento dos sistemas. Tais alterações são
manifestadas diretamente por aumento na viscosidade e na tensão de escoamento dos
concretos. A Figura 36 apresenta resultados de alterações nas características reológicas de
concretos com o tempo devido à adição tardia de um mesmo teor de superplastificante, 15,
30 e 60 minutos após a mistura do concreto. Como se observa, os níveis de torque se
elevaram simplesmente pelo atraso na colocação do aditivo, resultando em materiais menos
fluidos. Importante lembrar que esse caso ilustra o usual transporte de concreto em
caminhão betoneira, cuja adição do superplastificante é feita na obra.
2.5
15 minutos
30 minutos
2.0
60 minutos
Torque (N.m)

1.5

1.0

0.5

0.0
0
100 200 300 400 500 600 700 800 900 1000
Rotação (rpm)
Figura 36 – Ilustração do efeito do tempo no comportamento reológico de concretos aditivados com dispersante
[DAMINELLI et al, 2010].

Como as forças de aglomeração podem aumentar à medida que a hidratação do


cimento prossegue, devido ao aumento da força iônica e à formação dos produtos
hidratados, qualquer fenômeno que afete a cinética de dissolução e formação dos compostos
hidratados, altera as características reológicas dos concretos. Além disso, os aditivos
dispersantes podem sofrer alteração em sua capacidade repulsiva, reduzindo sua eficiência
com o tempo, mesmo em cenários onde a hidratação possa estar inibida. Em ambos os
casos, o comportamento reológico dos concretos poderia se alterar com o tempo.
Estudos recentes têm questionado como a hidratação de fato afeta a consolidação,
uma vez que as alterações nos grãos de cimento alteram tanto características físicas, como
químicas das partículas. A quantificação da componente física da consolidação, realizado a
partir de ensaios de reometria oscilatória (com freqüência e deformação constantes, sem
rompimento da estrutura gerada pelas reações de hidratação do cimento) é uma maneira de
avaliar a cinética de consolidação das suspensões.
Neste caso, a resposta para a condição de ensaio é o aumento do módulo de
armazenamento de energia elástica do material (G’) em função do tempo, visto que o
cimento apresenta tendência natural de aglomerar-se quando em contato com a água devido
as interações de van der Waals e as forças eletrostáticas de atração (já que é composto por
várias fases com cargas superficiais contrárias).

40
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Dois exemplos comprovando a consolidação provocada pela cinética de consolidação


são ilustrados na Figura 37, referente ao efeito da variação do teor de dispersante (a) ou da
utilização de incorporador de ar (b) na composição cimentícia.
10000
(a)
1000
100

G' (x104Pa) 10
1
0.1
0.00
0.01
0,45%
0.001 0,65%
Variação do teor de dispersante
0.0001
10000 0 30 60 90 120
(b) Tempo (min)
1000

100
G' (x103 Pa)

10

0.1 Pasta Pura


Pasta com 0,05% de incorporador de ar
0.01
0 6030 90 120
Tempo (min)
Figura 37 – Exemplos do acompanhamento da cinética de aglomeração de pastas cimentícias aditivadas com
dispersante (a) ou incorporador de ar (b) (LYRA, 2010; ROMANO 2011b)

No entanto, a avaliação isolada das cinéticas de consolidação e de reação química


permite somente compreender separadamente a característica física ou química de cada
sistema durante o endurecimento do concreto, mas uma avaliação conjunta dos resultados
pode permitir a compreensão da relação CAUSA-EFEITO do processo de consolidação.
Exemplos de acompanhamentos da relação CAUSA-EFEITO durante o processo de
consolidação de materiais cimentícios aditivados são ilustrados na Figura 38. Na parte
superior da figura são apresentados os resultados de composições com superplastificante e
abaixo as composições com incorporador de ar (avaliados em diferentes temperaturas). A
CAUSA foi avaliada pelo calor acumulado durante a reação química do cimento, enquanto
que o EFEITO foi quantificado pelo módulo de armazenamento elástico (G’) em função do
tempo (LYRA, 2010).

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0.00 Componente química

Componente física
Módulo de armazenamento de

SUPERPLASTIFICANTE
0,15%

energia elástica - G' (Pa)


0,35%
0,45%
0,65%
1,00%

Calor acumulado
25 C SEM incorporador
Módulo de armazenamento de

de ar

INCORPORADOR DE AR
40 C
enrgia elástica - G' (Pa)

Calor acumulado (g/L)


Figura 38 - Relação CAUSA-EFEITO do processo de consolidação de materiais cimentícios aditivados com
superplastificante (acima) (LYRA, 2010) ou incorporador de ar (abaixo). Nas pastas com incorporador de ar a
relação foi quantificada em diferentes temperaturas (ROMANO, 2011).

Seja com a utilização de superplastificante ou de incorporador de ar, a relação


CAUSA-EFEITO no processo de consolidação não é linear, visto que podem ser obtidos
semelhantes níveis de aglomeração para diferentes níveis de reação de hidratação, ou seja:
 aumentando o teor de policarboxilato na composição, o impacto na cinética de
hidratação é maior que na de aglomeração das partículas, visto que a presença do
aditivo gera o mecanismos de estabilização que dificulta a aproximação entre as
partículas de cimento, mesmo quando a liberação de calor for elevada;
 aumentando a temperatura, a aglomeração das suspensões é intensificada para
uma mesma quantidade de calor liberado, tanto nos sistemas sem aditivos (linhas
pontilhadas), como na presença do incorporador de ar;
 Nos sistemas com incorporador de ar, a presença do aditivo eleva o grau de
coesão (> G´) em relação à pasta pura com o aumento do calor liberado no tempo.
Pode-se dizer que a análise das alterações reológicas em função do tempo não são
triviais, já que vários fenômenos físico-químicos estão ocorrendo ao mesmo tempo e a
estrutura do cimento é alterada a todo instante. Por isso, a correta avaliação dos fenômenos
que ocorrem durante o estado de transição entre um comportamento de fluido viscoso para
um sólido elástico é de extrema importância para o desenvolvimento de concretos com
melhores propriedades e mais duráveis.

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13.9 Retração
Mesmo sendo o enfoque principal deste capítulo o comportamento reológico dos
concretos no estado fresco, um assunto também associado a este estágio da vida dos
concretos é a retração que o material pode apresentar devido a diferentes fatores, como
evaporação de água e hidratação dos compostos do cimento.
O primeiro tipo de retração, plástica, ocorre devido à rápida perda de água de
amassamento, seja por absorção pelas fôrmas, pelos agregados, ou pela evaporação para o
ambiente. Assim, logo após o adensamento e acabamento do concreto, pode-se observar o
aparecimento de fissuras na sua superfície, as quais podem ser facilmente eliminadas pela
passagem da colher de pedreiro ou por revibração.
Como a retração é oriunda da movimentação da água, que pode sair por evaporação
ou entrar por capilaridade, quanto maior for o fator água/cimento maior será, evidentemente,
a retração plástica.
Nos concretos moldados com grande área exposta, tais como pisos, pavimentos ou
lajes, a perda de água para o ambiente ocorre de maneira muito rápida, resultando em uma
estrutura mais vulnerável e suscetível à retração plástica.
Da mesma forma, a condição climática também pode afetar esse tipo de a retração,
visto que altera a taxa de perda d’água e a velocidade de formação dos compostos
hidratados do cimento. Os principais fatores climáticos que seqüestram a água do concreto
são a alta temperatura, a baixa umidade relativa do ar e a velocidade do vento que incide
sobre a estrutura. Por exemplo, um concreto moldado em um dia com temperatura do ar em
25ºC, umidade relativa do ar de 40%, e velocidade de vento de 15 km/h pode perder até
1litro/m²/hora de água por evaporação, o que é suficiente para provocar considerável grau de
retração plástica (Portland Cement Association, 1995).
Já a retração gerada pela hidratação dos compostos do cimento, conhecida como
retração química, ocorre porque após a mistura com água o volume de produtos da
hidratação é menor que o volume dos reagentes iniciais.
No entanto, esse tipo de retração é menos intensa e se restringe basicamente ao
período de cura do concreto. Em curas submersas, por exemplo, ocorre a expansão da peça,
(fenômeno contrário à retração) decorrente do fluxo de água do interior para o exterior da
peça, em direção aos poros formados pela retração química.
Dentre os fatores que mais influenciam na retração podem ser citados:
 Composição química do cimento: cimentos mais resistentes e/ou de endurecimento mais
rápido geram maior retração.
 Teor de cimento na composição: a retração é proporcional a quantidade de cimento
 Quantidade de água de amassamento: quanto maior a relação água/cimento, maior a
retração;
 Condição climática:
o O aumento a umidade ambiente dificulta a evaporação e, conseqüentemente, reduz a
retração;
o O aumento da temperatura aumenta a retração;
 Espessura do corpo-de-prova: a retração aumenta com a diminuição da espessura do
corpo-de-prova. Quanto maior a superfície de contato com o ambiente em relação ao
volume da peça, possibilitando maior evaporação.

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As explicações sobre retração aqui apresentadas são bastante superficiais, mas fica a
mensagem que este assunto é crítico para a tecnologia dos concretos, pois fissurações
resultantes de retrações excessivas afetarão o desempenho no estado endurecido.

13.10 Considerações Finais

O presente capítulo discutiu o comportamento dos concretos do estado fresco através


de uma abordagem microestrutural/reológica. Os conceitos básicos de reologia foram
apresentados, assim como a contribuição da granulometria, do estado de dispersão, da
eficácia da mistura, do teor de ar e da separação de fases, também foram discutidos em
relação aos impactos no estado fresco. As mudanças reológicas em função do tempo que
resultam na consolidação dos concretos foram discutidas segundo a moderna de cinética de
aglomeração x hidratação da fase ligante da pasta cimentícia.
A principal conclusão que se pode tirar deste assunto é que todas as propriedades dos
concretos que se manifestarão posteriormente à fase fluida são definidas nesta fase inicial do
material. Sendo assim, falta de domínio tecnológico e de controle dos materiais no estado
fresco vão impactar diretamente no teor de água dos concretos. Um exemplo clássico desta
afirmação está na prática usual de mercado de misturar e transportar concreto em caminhão
betoneira, onde o tempo de trajeto pode afetar a fluidez do material no instante da aplicação,
havendo necessidade de se adicionar uma quantidade extra de água para recuperar a
consistência ideal. A simples necessidade de aumentar o teor de água impactará diretamente
nas características finais dos concretos, como retração, porosidade, resistência mecânica,
durabilidade, entre outras.

13.11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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