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Fichamento do texto: ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz.

A arte de inventar o
passado. São Paulo, 2007.

Apresentação

- Desde o texto que dá título ao livro, inclino-me pela defesa do caráter artístico da
História, do seu caráter poético e literário, e pensando com a Literatura e não contra ela, reflito
neste primeiro conjunto de textos sobre as implicações para a prática do historiador de pensá-la
como uma arte literária, sem que isto signifique necessariamente abandonar suas pretensões a
ser uma prática científica. Utilizo grandes obras literárias brasileiras para, a partir de suas
sugestões, pensar uma série de problemas afeitos à nossa prática profissional. (12/13)
Parte 1 – História e Literatura
- O que separaria a História da Literatura seria o compromisso que a primeira teria em dizer o
real, em ficar presa ao que realmente se passou, ao que realmente existiu. Mas o que é o real?
Em princípio, ele é uma palavra, é um conceito, com distintas definições, embora remeta para
algo da ordem do empírico, para algo da
ordem do sensível, do que está para além das palavras, do que se passa, inclusive,
independentemente da vontade humana; seria feito de fatos que se impõem como pedra dura,
algo do qual não se pode fugir, irremediável, palavras ditas pelo mundo. (44/45)
- A História, como discurso, tem tido receio de encarar a
realidade tal como ela é: caótica, turbilhonante, proliferante, para se situar na descrição,
inicialmente, e depois, na análise de territórios já cristalizados, já formados, de ordens já
estabelecidas, desconfiando de tudo aquilo que não vê; tendo medo de se situar neste lugar em
que, segundo Foucault,9 apenas as artes e a Literatura vieram se alojar, na modernidade; este
lugar de encontro direto com a desrazão, com o in-forme, com o ainda não objetivado, o ainda
não subjetivado, o ainda não-humano, o inumano, por isso o ainda não submetido, o indomado,
o ainda não dobrado pelo poder: as forças de fora. (45)
- Quando, a partir dos anos 1960, se reivindica a volta dos homens para a narrativa histórica;
quando se reclama que se tenha gente e agentes como sujeitos de seus acontecimentos, estes
ainda retornam mutilados, apartados de seus corpos e seus desejos, do devir-outro que nos
espreita em cada esquina. (48)
- Separação entre Literatura e História seria uma questão de gênero? Talvez a diferença entre a
História e a Literatura seja mesmo uma questão de gênero. Não
apenas de gênero discursivo, pois pertencem a ordens diversas do discurso, seguem regras e
normas diferenciadas; mas de gênero no sentido de que o discurso historiográfico pertenceria ao
que na cultura ocidental moderna se define como sendo o masculino, enquanto a Literatura
estaria colocada ao lado do que se define como sendo o feminino. A História seria discurso que
fala em nome da razão, da consciência, do poder, do domínio e da conquista. A Literatura
estaria mais identificada com as paixões, com a sensibilidade, com a dimensão poética e
subjetiva da existência, com a prevalência do intuitivo, do epifânico. Só com a Literatura ainda
se pode chorar. A História masculinamente escavaria os mistérios do mundo exterior, iria para a
rua ver o que se passa; a Literatura ficaria em casa, perscrutando a vida íntima, o mundo
interior, femininamente preocupando-se com a alma. (...) Os homens, como a História,
tenderiam a acreditar que a realidade é aquilo que vêem e se quedariam pacificados a
contemplar o mundo que construíram. Tudo o que perturba é afastado, dando origem a um
mundo de superfícies nítidas. 22 As mulheres, como a Literatura, intuem que a realidade está
sempre mais além ou aquém do que vêem e a buscam incessantemente, buscam um mundo que
ainda estaria por construir, pois só vêem ruínas onde os homens enxergam construção. 2
Capítulo 2

História: A arte de inventar o passado

-A própria Psicanálise, ao nos informar sobre o nosso universo inconsciente, põe em xeque o
império do realismo e da razão cartesiana. Descobrimos que, para além da consciência, nossas
ações e produções sociais são produtos de desejo, de suas maquinações e agenciamentos. Esta
cultura de massa instaura uma nova sensibilidade, aberta para o choque, a surpresa, o caráter
relacionai das identidades. O sujeito deixa de ser visto como uma totalidade fechada e fundante
das ações e
representações, para ser pensado como uma produção histórica, como um lugar que diferentes
pessoas vêm ocupar sucessivamente ou como a produção de uma identidade, em que vários
fluxos de subjetivação e forças de sujeição se encontram. A sociedade da serialização e do
indivíduo obriga a que os indivíduos assumam uma série de papéis, de identidades,
fragmentando-se. (58/59)
- Os homens descobrem o mundo como linguagem. Esta nova sensibilidade leva à
erosão das categorias modernas e à instauração de novos paradigmas no campo do saber. (59)
- O conhecimento histórico é perspectivista, pois ele também é histórico e o lugar ocupado pelo
historiador também se altera ao longo do tempo. Nem sempre se fez a História do mesmo jeito,
e ela serviu a diferentes funções no decorrer do tempo. O historiador não pode escamotear o
lugar histórico e social de onde fala, e o lugar institucional onde o saber histórico se produz. Por
isso, a História, como metanarrativa, está em crise. (61)
- O historiador conta uma história, narra; apenas não inventando os dados de suas histórias.
Consultando arquivos, compila uma série de textos, leituras e imagens deixadas pelas gerações
passadas, que, no entanto, são reescritos e revistos a partir dos problemas do presente e de novos
pressupostos, o que termina transformando tais documentos em monumentos esculpidos pelo
próprio historiador, ou seja, o dado não é dado, mas recriado pelo especialista em História. (...)
O acontecimento, o evento em
História não é, pois, um dado transparente, que se oferece por inteiro, ou em sua essência, mas é
uma intriga, um tecido que vai ser retramado e refeito pelo historiador. (62/63)
- O conhecimento histórico torna-se, assim, a invenção de uma cultura particular, num
determinado momento, que, embora se mantenha colado aos monumentos deixados pelo
passado, à sua textualidade e à sua visibilidade, tem que lançar mão da imaginação para
imprimir um novo significado a estes fragmentos. A interpretação em História é a imaginação
de uma intriga, de um enredo para os fragmentos de passado que se têm na mão. Esta intriga
para ser narrada requer o uso de recursos literários como as metáforas, as alegorias, os diálogos,
etc. Embora a narrativa histórica não possa ter jamais a liberdade de criação de uma narrativa
ficcional, ela nunca poderá se distanciar do fato de que é narrativa e, portanto, guarda uma
relação de proximidade com o fazer artístico, quando recorta seus objetos e constrói, em torno
deles, uma intriga. A pós-modernidade, ao romper com o cientificismo e o racionalismo
moderno, instaura um
novo paradigma calcado nas artes. Diante, pois, da emergência de um paradigma ético-estético
na
pós-modernidade, o conhecimento histórico, a escrita da história mudam de estatuto. Podemos,
enfim, livrar-nos da exigência da cientificidade, entendida como produção de um conhecimento
capaz de apreender a verdade única do passado, das leis eternas e imutáveis, das organizações
estruturais, sistêmicas, o que já foi feito inclusive pelas chamadas ciências da natureza. (63)
- Tomar a História como arte de inventar o passado, a partir dos materiais dispersos deixados
por ele. Isto não significa esquecermos nosso compromisso com a produção metódica de um
saber, com o estabelecimento de uma pragmática institucional, que ofereça regras para a
produção deste conhecimento, pois não devemos abrir mão também da dimensão científica que
o nosso ofício possa ter. (63/64)
Capítulo
- Em diálogo com a obra de Manoel de Barros: “(...) História: o caráter fragmentário de
nossas experiências; a multiplicidade de temporalidades que se articulam num instante; o caráter
de fabricação do que chamamos de objeto e de sujeito; a espessura própria da linguagem,
inventora de nossas coisas e de nossos mundos; a necessidade de mudar a visada, de
redirecionar o olhar do grandioso, do heróico, do famoso, do grandiloqüente, para o ínfimo, para
o menor, para o abandonado, para o traste, para o infame, para o cisco (85/86).
- (...) penso ser tarefa do historiador arejar a memória coletiva; tornar irrespirável seu cheiro de
morte e a sua condição de lugar comum; não deixar as versões aceitas do passado se
petrificarem; buscando a contigüidade anômala entre os eventos; estabelecendo entre eles novas
relações; restituindo a eles a condição de novidade, a virgindade, a infância, corroídas e cariadas
pelas versões clichê; ensinando a encarar o passado com senso crítico e lúdico; aprendendo a
ver as coisas de várias posições; enverbando os acontecimentos de maneiras surpreendentes;
derrubando o insigne que há nas versões hegemônicas da memória dos vencedores e enfiando
nesta memória o ordinário, o menor, o pequeno, o abandonado; re-legando a memória
estabelecida às moscas. (86)
- A História, em nosso tempo, não pode ser discurso de construção, mas de desconstrução,
discurso voltado para compreender o fragmentário que somos, as diferenças que nos constituem,
o dessemelhante que nos habita.(...) Devemos aprender com outro poeta como tu, chamado
Michel Foucault, que a História deve tratar das descontinuidades que nos constituíram, da
multiplicidade de experiências disparatadas e sem roteiro prévio que tornou possível ser como
somos; que a História deve descrever as configurações, os desenhos, o relevo formado pelo
depósito constante de camadas de discursos, pela sedimentação das memórias em textos e em
todas as formas de linguagem, que, ao se acumularem, como o cisco se acumula em pés de
parede formando monturos, produzem uma geografia do passado, dão a ele consistência de
pedra, de bronze ou de granito, dificultando a percepção dos pequenos grãos, dos pequenos
sedimentos, dos pequenos gestos, de múltiplas ações, reações, conflitos, pelejas, sonhos, vidas
que o constituíram como unidade de fato e de sentido. (87)
- “(...) a História deve ser um discurso de contestação à memória dos poderosos, deve
injetar rebeldia nas palavras, deve desconstruir seus monumentos a marteladas. Deve dar
atenção a tudo "aquilo que a nossa civilização rejeita, pisa e mija em cima", a tudo aquilo que a
nossa civilização burguesa, utilitarista e pragmática, julga "que não nos leva a coisa alguma",
pois não se pode vender no mercado (...). Para ser capaz de falar destes seres e acontecimentos,
a História precisa escapar deste discurso racional, deve reintroduzir a arte em seu discurso,
tornar a sensibilidade, a imaginação e a intuição partes de seus instrumentos de trabalho, deve
reinstalar o corpo na escrita, como diz Michel de Certeau.” (88)
- Nós, os historiadores, que lidamos com os vestígios de antigas civilizações, com camadas de
memórias de antigas sociedades e pretéritos homens, devemos pensar que as palavras ou os
vestígios que nos chegam do passado são como "conchas de clamores antigos". As palavras e os
vestígios são signos que "possuem no corpo muitas oralidades remontadas e muitas
significâncias remontadas",14 que somente escovando-as a contrapelo, como queria Benjamin,
poderemos acessar as camadas de significação recobertas pelo tempo. Por isso, o historiador,
como o poeta, antes de ser um doutor, é um fraseador, 15 um homem que brinca com as palavras
(p.91).
- Tarefa de historiador é abrir as palavras que nos chegam do passado para novos sentidos, para
novas convivências com o presente, é se dedicar a encontrar achadouros de outros possíveis
passados, escavando a memória já petrificada, dementando e desmentindo as verdades
estabelecidas sobre os fatos e os feitos, 1 (...) É saber
que as coisas e pessoas do passado nos chegam aos pedaços e precisam ser montadas e
remontadas, para isso é preciso que tenhamos simpatia e empatia para com elas, encostemo-nos
nelas, procuremos fazer que se pensem em nós, e que continuarão, mesmo assim, sempre cheias
de recantos e de desvãos, nunca serão redondas e inteiriças, pois somos formados de
desencontros e as antíteses é que nos congraçam. 24 A melhor forma de nos conhecermos é entrar
em contato com o que foi ou é diferente de nós, com o nosso contrário, com o que deixamos de
ser, com a falta que tem presença em nós (...) (92)
Capítulo – Parte 2 – Michel Foucault e a História – Os maus costumes de Foucault
- As concepções de Foucault acerca de noções como de autor, obra e sujeito, ou quanto à escrita
biográfica, são inseparáveis de uma questão mais geral, tematizada por ele, a de como o singular
é inscrito em formas de linguagem e que estratégias presidem esta inscrição. As categorias de
indivíduo, identidade, sujeito, autor são correlatas do trabalho de disciplinarização do corpo
próprio, de que a biografização da vida e da própria escritura é um procedimento decisivo. Nem
sempre se escreveram biografias, nem sempre se considerou que uma vida tinha uma verdade a
contar, a revelar. O procedimento biográfico faz parte do processo de internalização da própria
idéia de "eu" no Ocidente, a idéia de que temos uma verdade interior, uma essência, um segredo
que pode ser apanhado, flagrado aos poucos, em cada atitude nossa, em cada marca que
deixamos no mundo. (116/117)
- Mais do que descrever continuidades e totalidades, a História deve torná-las
problemáticas, deve descrever suas fissuras, suas rachaduras, seus silêncios, seus desabamentos,
suas ruínas. A História não quer contribuir para a perenidade dos costumes, que a memória tenta
garantir, mas quer garantir a possibilidade de estabelecer novos costumes, a abertura de
possíveis. (127)

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