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Espinosa

TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO

Edição em latim e português

o
UNIVERSIDAD E ESTADUAL DE CAMPI NAS

Reitor
]OSÉ TADEU ]ORGE
Tradução
Coordenador Geral da Universidade
ALVARO PENTEADO CRÓSTA Cristiano Novaes de Rezende

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O 1 T O R

Conselho Editorial
Presidente
EDUARDO GUIMARÃES

ELINTON ADAM! CHAIM - ESDRAS RODRIGUES SILVA


GUITA GRIN DEB ERT - Juuo CESAR HADLER NETO
Lurz FRANCISCO DIAS - MARCO AURÉLIO CREMASCO
RICARDO ANTUNES - 5EDI HIRANO

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Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa de 1990. Em vigor no Brasil a partir de 2009.

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELO


SISTEMA DE BIBLIOTECAS DA UNICAMP
DIRETORIA DE TRATAMENTO DA INFORM AÇÃO

SP47c Spinoza, Bencdictu s de, 1632-1677.


Tratado da emenda do intelecto/ Espinosa; traduçáo: Cristiano Novaes de Rezende. -
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 20 15.

(Coleçáo Fausto Castilho Multilíngues de Filosofi a Unicamp)

Edição em latim e português.

!. Ciência - Metodologia. 2. Filosofia. 3. Ética. a. 4. Felicidade. 5. Verdade. !. Rezende, SUMÁRIO


Cristiano Novacs de. II. Título.

CDD 501
100
170
158.1
ISBN 978-85-268-1233-8 121

Índices para catálogo sistemático:


NOTA INTRODUTÓRIA .... ... ··· ··· ·· · · ·· ····· ··· ···· ···· ······ ······· ···· ·· ... .. .. .... ....... 7
1. C iência - Metodologia 50 1 •
2. Filosofia 100
3. Ética 170 1 TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO .. . .. .... .. . 23
4. Felicidade 158.1
5. Verdade 121
- ADVERTÊNCIA AO LEITOR .. .... ... . ...... ......... ..... .. ..... .. ............... ... 25

Título original : Tractatus de intellectus emendatione TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO, E DA VIA


PELA QUAL ELE SE DIRIGE DA MELHOR MANEIRA
Copyright © da tradução by Fundo Fausto Castilho
AO VERDADEIRO CONHECIMENTO DAS COISAS. 27
Copyright © 2015 by Editora da U nicamp

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É proibida a reprodução total ou parcial sem autorização,
por escrito, dos detentores dos direitos.

Printed in Brazil.
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NOTA INTRODUTÓRIA

A presente tradução do Tractatus de Intellectus Emendatione (TIE) foi


elaborada diretamente do texto latino estabelecido por Carl Gebhardt e publi-
cado no volume II de sua edição em cinco volumes das obras completas de
Espinosa: Spinoza Opera 1• Embora tenha sido essa a estrita base de tradução
aqui adotada e disponibilizada no formato bilíngue, também foram consul-
tados: o texto latino apresentado e discutido por Bernard Rousset (/)pinoza
- Traité de la Réforme de l'Entendement2) e o texto latino estabelecido por
Filippo Mignini no primeiro volume da recente edição crítica francesa das
obras completas de Espinosa (Spinoza - Oevres 1 - Premiers Écrits 3 ). É com
base nesta última edição, mais precisamente na Introduction au Tractatus de
lntellectus Emendatione4, elaborada por Mignini, que se organiza o subse-
quente resumo, brevíssimo, da história editorial do texto, o que se justifica
não só em razão da minúcia com que Mignini aí recuperou essa história, mas
também pelo fato de haver sido ele próprio o iniciador da atual fase de reno-
vada discussão sobre o tema, não somente narrando, mas tomando parte
dessa história editorial.

1 i111 /\11lir:1g dn 1 kidclb<:rgcr Akademie der Wissenschafren, hrsg. v. C. Gebhardt, Hei-


d"llwrg l 1') ' '> 1. 19'/ h; .\'11/'{'lmm1/,r, vol. V, hrsg. v. C. Gebhardt, C. Winter, H eidelberg,
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TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO NOTA INTRODUTÓRIA

Depois da morte de Espinosa, aos 44 anos, em 21 de fevereiro de 1677, magna. Uma reconstrução das peripécias pelas quais passou o texto da KV
seus amigos mais próximos tiveram em mãos o baú em que o filósofo conser- excede os limites desta nota introdutória, bastando aqui informar que a obra,
vara seus manuscritos, inclusive os ainda inéditos. Após a leitura do material desprovida da forma geométrica da Ethica e considerada, quando de sua pri-
ali guardado, foi tomada pelo grupo a decisão de selecioná-lo, revisá-lo e meira recepção, como uma expressão ainda incipiente da filosofia de Espino-
publicá-lo em duas edições, organizadas principalmente por Jarig Jelles sa, teria sido presumivelmente escrita em latim, mas tendo sido por fim con-
e Lodewijk Meijer: (a) uma em latim (B. d. S. Opera Posthuma, Quorum series servada apenas na forma de dois manuscritos vertidos para o holandês, eivados
post Praefationem exhibetur, 1677), contendo, na seguinte ordem, as obras de diferenças recíprocas e cercados, durante muito tempo, de inúmeras incer-
Ethica, Tractatus Politicus, Tractatus de Intellectus Emendatione, Epistolae e tezas históricas.
Compendium grammatices linguae Hebreae; e (b) uma tradução em holandês, Apesar dessas "fragilidades" editoriais que acometiam o texto da KV, sua
elaborada provavelmente por J. H. Glazemaker (De Nagelate Schriften van publicação teve grande impacto sobre a compreensão do lugar do TIE no
B. d. S. Ais Zedekunst, Staatkunde, Verbetering van't Verstant, Brieven em interior do corpus spinozanum. Com efeito, terminada quase no mesmo ano
Antwoorden. Uit verscheide Talen in de Nederlandsche gebragt. Gedrukt in da edição de Ginsberg do conjunto das obras de Espinosa8 , uma nova edição
't Jaar 1677) , de mesmo conteúdo. No entender de Mignini, ambas foram das obras completas - e não mais apenas um suplemento - foi publicada pelo
produzidas paralelamente com base nos originais autógrafos. Como se nota, mesmo Johannes van Vloten e por J. P. N . Land9, contendo a KV em seu in-
as obras publicadas em vida por Espinosa - os Renati Des Cartes Principiorum terior e colocando, assim, o problema de saber onde ela deveria ser situada:
Philosophiae, acompanhados do apêndice CogitataMetaphysica, e o Tractatus antes ou depois do TIE? Enquanto as edições anteriores, inclusive a de Gins-
Theologico-Politicus - não foram aí incluídas. A partir dessas duas edições berg, não se preocupavam tanto com o problema da disposição interna das
seiscentistas das obras de Espinosa, seguiram-se, no século XIX, as edições obras, a edição Van Vloten-Land, além de muitos outros méritos, valeu-se dos
"completas" de Paulus 5, Gfoerer 6 e Bruder7, tendo sido nesta última que se debates específicos sobre a KV (notadamente os estudos de Sigwart, Tren-
introduziu no TIE uma nova paragrafação numerada, ainda hoje em uso - não delemburg e Scaarschmidt) e organizou-se conforme a tese de que esse Breve
sem críticas, mas com boa funcionalidade para fins de referência - e que se Tratado seria a primeira obra escrita por Espinosa, ao passo que o TIE, sendo
encontra indicada inclusive no corpo da presente tradução (sinalizada com ainda um de seus primeiros escritos, seria uma obra um pouco mais madura,
colchetes em negrito). principalmente porque poderia ser interpretado como uma introdução
Porém, em 1862, é dado a público pela primeira vez, por Johannes van metodológica à Ethica, devendo, portanto, ser posicionado imediatamente
Vloten, um Suplementum ao conjunto de obras espinosanas até então pu- antes da obra magna na ordenação interna do corpus. Através dos posteriores
blicadas. O suplemento continha, além de algumas cartas inéditas e de um estudos de Freudenthal - bastante restritivos quanto ao valor da KV -, essa
pequeno tratado científico sobre o cálculo algébrico da produção ótica do t csc se reforça nos últimos anos do século XIX e ganha o início do século XX.

arco-íris (Stelkonstige Reeckening van den Reegenboog), o texto em holandês Em 1905, Carl Gebhardt, aluno de Kuno Fischer, escreve uma mono-
da Korte Verhandeling van God, de Mensch en deszelvs Welstand (KV), acom- grafia na qual começa a ser preparada a primeira inflexão de maior relevância
panhado de sua versão para o latim. Esse "Breve Tratado de Deus, do Homem 11cssa tese dominante. Com efeito, uma das principais referências usadas pelos
e de seu Bem-Estar", cujo escopo temático e ordem das matérias lembravam "spccialistas no debate sobre a datação e a composição do TIE e da KV sem-
a Ethica, não era desconhecido do círculo de amigos de Espinosa, mas foi 111l· li>i · e ainda é - a Carta 6, de Espinosa a Oldenburg, sem data, mas que
deixado de fora das duas edições seiscentistas, em proveito justamente da obra 11·>po11dc ;'1 prccnkntc, do missivista inglês, enviada de Londres a Espinosa

1<'11.1. IX<P IX0.1.


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TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO
NOTA INTRODUTÓRIA

cm 21 de outubro de 1661, acompanhada do livro Physiological Essays, de pêutica epistemológica, voltada para objetivos éticos (o Homem e o seu Bem-
Robert Boyle. Depois de um longo comentário sobre os experimentos de -Estar). Importa notar, a propósito, que Mignini entende que a expressão
Boyle com o nitro, Espinosa termina sua resposta retomando algumas questões emendatio inteilectus, mencionada na Carta 6, poderia ser assumida como
de metafísica que Oldenburg lhe fizera e escrevendo que "compus um opús- equivalente da expressão medicina mentis, a qual, por sua vez, não apenas
culo inteiro" (integrum opusculum composui) sobre "o modo pelo qual as corresponderia - conforme o uso dessa expressão na época - à terapêutica
coisas começaram a ser" (quomodo res coeperint esse) "e também sobre a emen- epistemológica praticada na segunda parte da KV, como também seria clara-
da do intelecto" (et etiam de emendatione intellectus). Ora, enquanto Freu- mente evocada pelo subtítulo dessa obra, no qual se diz que a KV pretende,
denthal argumentava que a obra referida pela Carta 6 não correspondia à KV, entre outras coisas, curar os homens cujo intelecto está doente.
mas sim ao TIE (embora neste a reflexão epistemológica prevalecesse sobre a Ademais, Mignini também procura demonstrar, por um lado, que a KV
metafísica), Gebhardt, por seu turno, defendia, influenciado por Kuno Fischer, não estaria filosoficamente tão afastada daEthica, como até então se supusera.
que o integrum opusculum corresponderia, de uma só vez, tanto à KV quanto Por exemplo, na KV o conhecimento é caracterizado como uma passividade
ao TIE, sendo este como que uma conclusão daquela, além de uma funda- (e esta é uma das principais razões pelas quais essa obra foi considerada mais
mentação metodológica para a ordem geométrica a ser posteriormente em- distante daEthica do que o TIE, obras nas quais o conhecimento é claramente
pregada na construção daEthica. Entretanto, em 1925, quando da publicação uma atividade); entretanto, segundo Mignini, a noção de pura passividade
de sua Spinoza Opera, Gebhardt passa a defender a tese original de que o TIE corresponde a um ente de razão no sistema espinosano, de modo que, enquan-
não seria uma conclusão, mas, na verdade, uma introdução à KV, muito em- to conhecimento dos objetos, essa passividade também poderia ser retradu-
bora houvesse sido escrito depois dela. Segundo essa nova tese, as referências zida como uma atividade representativa. Além disso, há na KV uma atividade
que Espinosa faz amiúde no TIE à mea Philosophia teriam por objeto não a do intelecto como conhecimento das próprias ideias (consciência da presen-
h'thica mas sim a KV. Teríamos, assim, um opusculum bipartitum, no qual a ça e da formação das ideias na mente), bem como uma atividade da mente
composição da introdução seria cronologicamente posterior à composição da nos desdobramentos cognitivos decorrentes da posse de ideias adequadas.
obra a que ela introduz. Isso engenhosamente explicaria a já alegada maior Ora, todos esses tipos complexos de passividade/ atividade estão presentes na
1naturidade do TIE em relação à KV, mas preservaria também a unidade e a Ethica, mas não se encontrariam no TIE de forma tão expressa. Na mesma
conexão dos conteúdos mencionados na Carta 6 como pertencentes a uma linha argumentativa, Mignini ainda propõe outros indícios suplementares,
sú e mesma obra: a emenda do intelecto articulada com a metafísica espino- tais como: a KV, diversamente do TIE, apresenta uma crítica ao uso da noção
sa na já esboçada ao final de 1661 ou início de 1662.
de genus em contexto definicional, consistente com a filosofia madura de
A engenhosidade e a erudição de Gebhardt, que soube valer-se do ar- Espinosa; na KV, podem-se encontrar elementos de uma teoria da mente como
c.iliouço pregresso de conquistas históricas e filológicas sobre o corpus spino- ideia do corpo, presente na Ethica mas supostamente ausente no TIE; a KV,
. .11111111, fizeram com que sua interpretação das relações entre a KV, o TIE e a
l' não o TIE, implicaria uma doutrina da imortalidade da alma, semelhante-
F!l1il'11 prevalecesse durante boa parte do século XX. É apenas a partir de 1979 mente ao que se passa na Ethica (de forma que a anterioridade do TIE seria
'1111 · j11sramcnte Filippo Mignini - pela primeira vez, mas com bons argumen-
'ondizentc com a suposição histórica de que Espinosa, a exemplo de Juan de
1' >.·;, 1.111ro externos quanto internos à análise conceitua! da filosofia espinosa- Prado, até 16')9 teria sustentado que a alma morre com o corpo).
11 .1 1<>111pc com a tradição precedente e passa a defender a tese da anteriori- De 111odo co1nplcmcntar, Mignini também procura demonstrar como,
11.11 k , rnnol<'>gica do TIE cm relação à KV. Para Mignini, o integrum opuscu- por 011 t ro l.11 lo, '1 'J' 1F 1i;io l"Sta ri a fllosoficamcnte tão afinado com a Ethica,
/11111 11w111 io1i;1do pela ( :aru 6 corresponderia apenas às duas partes compo-
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TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO NOTA INTRODUTÓRIA

de que Espinosa reprovara em Bacon, na Carta 2, a Oldenburg, de setembro assim dizer, o conjunto da experiência intelectual do filósofo" 12 , contendo,
de 1661). No TIE, as formas básicas do conhecimento humano são apresen- por isso, diversas camadas de redação.
1adas como quatro "modos de percepção" (modi percipiendi), ao passo que na Antes de tudo, porém, cumpria apresentar aqui, sumariamente, o estado
Fthica e na KV elas são nomeadas diversamente e apresentadas em número da arte, no intuito de situar esta tradução no contexto mais amplo das prin-
de três (com vestígios de uma quadripartição mais antiga). Ademais, naEthi- cipais problemáticas concernentes às edições do texto latino ora traduzido,
1d é feita explícita recusa do termo perceptio - por conotar passividade - na inclusive no sentido de justificar o recurso à edição Gebhardt, para além da
dc:signação da atividade cognitiva em que as ideias consistem. Apenas no TIE mera comodidade de seu uso por questões de direitos autorais. Como nota
1' conhecimento "por ouvir dizer" é introduzido antes da "experiência vagante" Pierre-François Moreau, nalntroduction Générale aux Oevres de Spinoza, com
e apenas nessa obra o conhecimento racional ("terceiro modo de percepção", a qual se abre o primeiro volume da edição crítica francesa já referida 13 ,
rnrrespondente ao "segundo gênero" da Ethica), conquanto certeiro, não é
rido como propriamente adequado. No TIE, a teoria sobre as ficções estaria [... ] o interesse da edição de Gebhardt, assim como, em certa medida, o da
;1ssentada sobre uma concepção de vontade supostamente de inspiração carte- edição de Van Vloten e Land, é que ela é herdeira e contemporânea do desen-
siana e, enquanto tal, incompatível com a Ethica. O funcionamento passivo volvimento da pesquisa espinosana especialmente na Alemanha e nos Países
da imaginação no TIE por vezes pareceria 10 , aos olhos de Mignini, supor uma Baixos. E isso a torna incomparável com as precedentes. Ela se beneficia dos
imeração causal entre mente e corpo, o que é recusado pela filosofia madura esforços de pesquisadores do final do século XIX e do início do século XX.
de Espinosa. O TIE valoriza o conceito de genus no contexto da teoria da Nesse sentido, ela é a edição que corresponde ao desenvolvimento de uma
definição do singular 11 , de maneira aberrante em comparação com as críticas pesquisa espinosana que se quer, enfim, científica.
.'1 definição aristotélica por gênero e diferença específica, pervasivas no res-
1;111tc: do sistema. Por fim, Deus é tratado no TIE como causa sui apenas em Não é por acaso, portanto, que, no amplo quadro histórico acima apre-
sn1tido negativo (o incausado) e, assim, como presumivelmente refratário a sentado, ela tenha se firmado como edição canônica, por mais de cinco déca-
11111a compreensibilidade integral do ser em termos causais. das, junto a todos os especialistas que escreveram sobre a filosofia de Espino-
Em razão da necessária brevidade desta nota, não será possível discutir sa no período, até que esse mesmo esforço ciendfico produzisse as próprias
.1gora, um por um, os pontos filosóficos da tese de Mignini. Pretendo retomá- teses defendidas por Mignini .
los oportunamente - junto com muitos outros pontos levantados pelo pre- Quanto a estas últimas, cabe observar, em linhas muito gerais, que elas
..,,.,lll' trabalho de tradução - em um detalhado estudo teórico em preparação parecem minimizar a especificidade da perspectiva metodológica em que o
-;ohrc o TIE. Não obstante, avançarei logo mais, nesta introdução, uma ou TIE foi escrito. Se esse tratado pode ser considerado como uma introdução
d11.1s considerações gerais contra as alegadas incompatibilidades do TIE com :1 Ethica, isso se deve menos à sua posição na cronologia e muito mais ao fato
.1 1'.'1hic1z, embora não discorde da pura tese da anterioridade defendida por
de que, numa ordem analítica, começando como que pela Parte IV da obra
f\ 1Í)',t1i11i. Com efeito, dentro da própria tipologia delineada pelo comentador,
magna ("Da Servidão"), ou melhor, começando por uma historio/a da condi-
1·11t t111rro -111e entre os que, não recusando que o TIE tenha começado a ser 1,<io humana sob o jugo heterônomo dos afetos, o TIE narra como é possível
• ·,, ri 1o antes da KV e sido planejado como uma introdução ao sistema, consi- chegar à Parte 1 ("De Deus") e, finalmente, ter em vista a Parte V ("Da Liber-
1 ln.1111 ,·sse tratado como "uma obra que não exprime a filosofia de Espinosa dade"). A fim de bem compreender o TIE, é crucial, portanto, levar em
··111 11111 111011Knto preciso de sua evolução, mas uma obra que acompanha, por l·onta a d íst itll1 ;\o q11e ele próprio faz 14 entre o "método perfeitíssimo", que

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NOTA INTRODUTÓRIA
TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO

1•.1rlc da reflexão sobre a ideia do Ente Perfeitíssimo, e o "bom método", ração do autor da "Advertência ao leitor" do TIE (provavelmente J. Jelles),
de que Espinosa sempre conservou, até o dia de sua morte, a intenção de
•p 1c parte da reflexão sobre uma ideia verdadeira qualquer, já disponível, já
concluir e publicar esse tratado (como, aliás, também fica sugerido pela con-
d.ida. Ora, as ideias verdadeiras dadas - explica o tratado, em uníssono com
servação de algumas de suas teses metodológicas centrais na última troca
o Apêndice da Parte I da Ethica - são exemplarmente aquelas geradas pela
epistolar entre Espinosa e Tschirnhaus, datada do ano de 1676, isto é, apenas
101\·a nativa do intelecto humano no exercício da matemática, portadoras de
um ano antes que a morte arrebatasse nosso filósofo e deixasse inconcluso o
11111:1 norma imanente da verdade (mais exatamente, no caso de Espinosa, ideias
tratado). Adernais, no âmbito estritamente biográfico, é sabido que, um dia
!'.n:tdas no exercício de uma matemática de tipo construtivista, inspirada na
antes de seu falecimento, Espinosa passara algum tempo queimando papéis ...
!'."' •metria grega, mas reformulada, no século XVII, no contexto dos confron-
1<is L'lltre geômetras e algebristas a propósito do caráter científico-causal de Obviamente, o manuscrito do TIE não estava entre eles.
É inegável a presença de um ar paradoxal na ideia de urna introdução
sn 1.s conhecimentos).
a uma filosofia da imanência, visto que tal imanência seria incompatível com
Ainda no sentido de caracterizar essas peculiaridades da perspectiva
uma introdução que já não fosse - com aparentes redundância e inutilidade -
111nodológica do TIE, é oportuno mencionar também a Carta 37, de Espi-
ela própria. Mas o que o TIE ensina é que é preciso descobrir isso mesmo. Ou
11osa a Bouwmeester, de 10 de junho de 1666, que permite compreender que,
.1,, IH>llto de vista de quem ruma em direção ao conhecimento de Deus (como seja, existe um esforço, um trabalho, um movimento de descobrir que o que
se busca como meta a ser encontrada alhures já se encontrava, desde sempre,
110 'l'IE), e não de quem parte dele (como na Ethica), não é mister - nem
junto de nós, restando, porém, eliminar preconceitos e outros impedimentos
-;ni :t correto - procurar conhecer a mente e suas forças cognitivas a partir de
extrínsecos, para que o que é evidente de direito se automanifestasse também
s11.1 causa primeira (quer dizer, em última instância, a partir de Deus), sob
como evidente de fato. Nesse sentido, o método espinosano não se presta a
1'<'11ª de patente circularidade. Sintomaticamente, é por minimizar a espe-
nos "levar" à ideia verdadeira e a Deus, mas a garantir que não nos alienemos,
' if icidade dessa perspectiva que se chega a ver no TIE uma situação aporética,
afastando-nos deles ao buscá-los na distância em que não estão (lá onde eles
.1'>.rnmida até mesmo como razão intrínseca do inacabamento do tratado:
são apenas imaginados, mas não inteligidos). Entretanto, nessa exata medida,
"rnquanto o discurso sobre o método parece ser reconhecido como um pre-
quando o homem já se encontra em certo regime afetivo e cognitivo de hete-
1i111i11ar necessário à constituição da filosofia, seu desenvolvimento mostra que
ronomia (que é, segundo Espinosa, o estado mais frequente do homem em
.1f i1, •S< lha efetivamente constituída é o fundamento de um método possível" 15 •
sua vida comum), também é cabível falar, sem contradição, da descoberta da
< h.1, :1suposta aporia circular dissipa-se assim que se compreenda que o TIE
imanência corno um movimento rumo a Deus e à verdade, desde que se con-
l'r.-s.-rcve o "método perfeitíssimo" corno devendo ser adotado tão logo seja
«eda que esse movimento é antes um retorno do que uma partida: "emendar
1"•ssívc l, mas descreve e põe em prática o "bom método", organizado segundo
16 o intelecto (emendandum intellectum) e torná-lo apto (reddendum aptum)
.1 "ordem lJUC naturalmente temos" , que começa pelo recenseamento do que
1•ara que as coisas sejam inteligidas (ad res intelligendas) do modo tal que é
.-·;1.'1 .!:ido (mostrando-o), para depois reconstruí-lo (demonstrando-o). O
11,.'· todo que pode ser tido, em certa medida, como "preliminar" à filosofia é mister, etc." 17 • Que o intelecto intelija, preservando e ampliando sua potência
• .,., .. dv que fala a Carta 37, ou seja, o "bom método" de que fala o TIE, ao .11 iva essencial, ou seja, que ele se torne o que é: eis, pois, a tarefa da terapêu-
1i1 a epistêmíc1, da medicina da mente, que se denomina, com tal especifici-
11.1 -;·;o que aquele que supõe o conhecimento filosófico de Deus como funda-
111.-1110 j.'1 «<>t1stituído é o "método perfeitíssimo", de maneira que o método é .!.11k, "cnH·n,h do intelecto".
.1111 n Í<>I' e posrerior :\ filosofia, mas não no mesmo sentido ou relação. Por
1""'" 11 .10 l1.1vl'J 1do p:t r;dogismo inrrí nseco, é perfrítamc1irc aceí távcl a de da-
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TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO NOTA INTRODUTÓRIA

A presente tradução do Tratado da Emenda do Intelecto não é a primei- latentes nas notações originais, assim também, a cada nova tradução de um
ra em português. Muito pelo contrário, o leitor lusófono já contava, desde o texto da tradição filosófica, o esforço de captação do sentido revela possibili-
final dos anos 60 do século passado, com duas traduções desse texto: ( 1) uma dades interpretativas, nuanças, acentos, tons, que vivificam a letra do texto
feita diretamente do latim (Tratado da Reforma da Inteligência 18 ), muito conforme o espírito de quem o traduz. Traduzir é interpretar; afinal, é o
importante no Brasil, sobretudo pela frutífera sensibilidade filosófica da in- sentido - e não o signo - o que traslada de um idioma a outro.
trodução e das notas do tradutor, Lívio Teixeira, e (2) outra, portuguesa, Ora, não sendo a primeira e não pretendendo tampouco ser a última
feita a partir da tradução francesa de A. Koyré (Tratado da Reforma do En- entre nós, a presente tradução, portanto, se beneficia do fato de que já não
tendimento19). Logo em seguida, (3) uma tradução direta do latim foi produ- é mais necessário apresentar o TIE - ou mesmo as obras completas de Espi-
zida em Portugal por Antônio Borges Coelho (Tratado Sobre a Reforma do nosa - aos leitores de língua portuguesa, permitindo que sejam aqui perse-
Entendimento 20 ). Não muito tempo depois desta última, foi lançada no Bra- guidos objetivos bem mais delimitados. Publicada por uma editora universi-
sil, na coleção Os Pensadores, (4) uma nova tradução brasileira, de Carlos tária e desde o início planejada para um formato final bilíngue, esta tradução
Lopes Matos, que discute e revê a de L. Teixeira e incorpora, nas notas, resul- foi, assim, concebida como uma ferramenta especialmente voltada para o
tados de pesquisas produzidas durante o intervalo de tempo que as separa trabalho acadêmico - de docência, pesquisa ou estudo - em história da filo-
(Tratado da Correção do Intelecto 21 ). Por fim, no século XXI, (5)]. Guinsburg sofia moderna. Ela seguiu, destarte, o ideal regulador - nunca perfeitamente
e N. Cunha traduzem novamente o tratado - a partir de várias fontes, inclu- obtenível - de máxima estabilidade lexical, de modo que, sempre que possível,
sive Gebhardt - e o publicam no volume I da primeira edição das obras foi adotado um e somente um equivalente português para cada termo latino,
completas de Espinosa em português, organizada pelos referidos tradutores não somente em se tratando de verbos, substantivos, adjetivos e outros ele-
juntamente com R. Romano (Tratado da Correção do Intelecto 22 ). E como é mentos frasais de primeira grandeza, mas também de elementos sincatego-
saudável em todos os países que cultivam com seriedade as letras filosóficas, remáticos (mais discretos e difíceis, mas não menos decisivos). Particular
ainda outras traduções do mesmo texto encontram-se em preparação, aos atenção foi semelhantemente concedida à contribuição da sintaxe na produ-
cuidados de colegas que também se dedicam aos estudos espinosanos no ção do sentido das frases latinas, esperando que a tradução refletisse aproxi-
Brasil. O público leigo por vezes estranha essa proliferação de traduções de mações, subordinações e contraposições que a movimentação interna à frase
um mesmo texto para uma mesma língua. Há de ser útil, portanto, uma ana- original pareceu tornar relevantes. Aspectos concernentes ao estilo de Espi-
logia esclarecedora: assim como, partindo das mesmas partituras, uma sinfo- nosa, tais como um recorrente uso de negações encadeadas (e.g. nemo non
nia ou um concerto, importantes para o repertório erudito, recebem, de uidet: "ninguém não vê"), foram respeitados, mesmo quando foi tentador usar
tempos em tempos, novas execuções por novos intérpretes, registradas em l<'lrmulas afirmativas diretas. Em suma, buscou-se aqui não apenas trazer para
novas gravações, pois cada nova interpretação revela inauditas possibilidades o português o sentido do texto latino, mas obter, ademais, certo espelhamento
'lo texto latino pelo texto português, de forma que este funcionasse como
11111a via de acesso àquele. Por outras palavras, tentando não incorrer no erro

18
de propor uma tradução legível apenas por quem já pode compreender dire-
1ª ed. 1969. Tradução, introdução e notas de Lívio Teixeira. São Paulo, Cia. Editora
1;1mente o idioma original, procurou-se, não obstante, convidar o leitor - e
Nacional. Col. Biblioteca Universitária.
19
lª ed. 1969. Edição bilíngue: latim/português. Tradução de Abílio Queiroz. Prefácio e d.ir lhe co1Hli1;ôcs para isso - a consultar o texto latino tendo por guia o
notas de Alexandre Koyré. Lisboa, Edições 70, Col. Textos Filosóficos. 1n to olc:t"l"cido em portugul'.s. O resultado - estou absolutamente consciente
20
l" ed. 1971. Tradução, prefácio e notas de A. B. Coelho. Lisboa, Livros Horizonte. Col. di-;so .'1s vn.1·s 11.10 (·o de 111;1is llucntc lcirura e nem sempre corresponde às
Razão e diálogo.
-.nl111 ocs 111.11" ckr,.1111l's, 111.1s, 1·11110111r;q1;1r1i1h, procura permitir ao leitor
n I ·' ed. 197.~. Tradw;fo e notas de ( :. L. Matos. Sio Paulo, Abril! '1d1111;d. 1

.ilj',lllll.I VIVt'lll 1.11l11 t1»<> ]>1t'1]1ilt> tjl1t 11 .ltllt>J fr1 tk l<'llll<IS, 1<1<'11<,0CS, ]',ll'IÍlll
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TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO NOTA INTRODUTÓRIA

de uso (conforme reconhece o próprio Espinosa no Capítulo XII de seu Em certas passagens, porém, quando pareceu crucial fazer ver certos sintag-
Tractatus Theologico-Politicus). mas, foi admitido o emprego do símbolo "-", funcionando como um parên-
Por fim, como o mencionado espelhamento, do ponto de vista da expe- tese fraco, mas que não existe no original. Antecipações ou posposições de
riência de leitura, é uma via de mão dupla, a presente tradução também foi palavras no final ou no início das páginas foram assinaladas, respectivamen-
concebida como uma forma de interferência nos usos correntes do idioma te, com os símbolos "/ .. ./" (indicando que o termo pertence à página seguin-
para o qual se traduziu. A tarefa de traduzir foi, assim, pensada como ocasião te) e"\ ... \ " (indicando que o termo pertence à página anterior). Por vezes
privilegiada para contribuir com o desenvolvimento do português como lín- necessárias ou úteis, as incisões de palavras que não estão presentes no origi-
gua filosófica. É nessa chave que se devem compreender, por exemplo, apre- nal seguiram a prática convencional de destacar entre colchetes os elementos
ferência pelo termo "emenda" para traduzir emendatio, ou o uso sistemático exógenos ao texto. Já as incisões, feitas pelo próprio Gebhardt, de expressões
de "intelecto" para intellectus (mesmo onde o hábito faria esperar "entendi- holandesas oriundas dos Nagelate Schriften, seguem o mesmo padrão por ele
mento" e "entender"), bem como o uso do verbo "inteligir", mesmo em formas adotado:"< ... >".
defectivas em nosso idioma. Com esse mesmo intuito, foi dada especial aten- Respeitando o perfil da Coleção Multilíngues, não foram introduzidas
ção ao vocabulário fabril {jàcio,fabrica, opifex,fictio,fingo, conficio, cudo, instru- as mais de cem notas - filológicas e filosóficas - geradas pelo trabalho de
mentum, operatio, labor etc.), ligado à cultura seiscentista do homo faber e às tradução (a serem recuperadas no já anunciado estudo em preparação sobre
influências baconianas sobre o TIE, presenças marcantes em seu repertório o TIE). Uma única exceção foi aberta para a introdução do subtítulo ho-
terminológico e que irradiam a ideia de atividade produtiva por todo o texto, landês do tratado, presente nos Nagelate Schriften. Nela, além da apresentação
cooptando para esse campo semântico inclusive expressões tradicionais do e da tradução de tal subtítulo, breves referências a outras obras justificam que
latim, tais como operam dare, aqui traduzida por "dedicar trabalho"; mag- o TIE seja considerado corno a Medicina Mentis e a Logica de Espinosa, o que
nopere, traduzida por "com grande trabalho"; ou opus est, traduzida por "é se faz relevante sobretudo à luz das considerações de Mignini, mencionadas
mister" (esta última opção tendo, aliás, a vantagem de não introduzir impró- mais acima, que transferem essas designações à segunda parte da KV. Ora,
pria ou precocemente a ideia de modalidades lógicas, como muitas vezes sem prejuízo da pertinência da caracterização desta última como também
ocorre com o uso da tradução "é necessário"). De modo geral, evitou-se que sendo urna sorte de Medicina da Mente, a tese - defendida pelo mesmo Mig-
termos filosoficamente mais carregados se sobrepusessem aos que só vão ga- 11 ini - de que o TIE é a primeira obra de Espinosa acaba por conferir a esse

nhando mais densidade conceituai conforme Espinosa, pouco a pouco, os tratado, mais do que a qualquer outro texto do sistema espinosano, as creden-
emprega em contextos argumentativos variados (evitou-se, por exemplo, subs- ciais para receber tais títulos (Lógica e Medicina da Mente), visto que, como
tituir dari por "existir"). Por isso mesmo, foi um tanto a contragosto que se lê no próprio tratado, o trabalho que distingue, purifica e aperfeiçoa a
inúmeras vezes lançou-se mão do substantivo plural "coisas" para suprir em .11ividade intelectual, a fim de que o intelecto bem intelija a si mesmo, as
português a falta de recurso equivalente ao tradicional uso do neutro plural , oisas e Deus, não é e não pode ser a segunda parte de um raciocínio já ini-
latino. Sempre que possível, isso foi evitado. • i;1do pela metafísica ou ontologia, pois é o que deve ser feito ante omnia.
Foi preservada a paginação de Gebhardt, cuja numeração se exibe no Além das edições do texto latino (muitas delas acompanhadas de tradu-
canto superior direito da página da tradução, contendo primeiramente o '·-' ws) e ths tr;1d 11</les para o português já indicadas, foram também consul-
número da página do volume e, em seguida, o número da página na sequên- 1.u hs ;1 s scg11i11tcs p11hlicaçõcs: (i) a tradução para o francês, de Michelle
cia integral das obras. Sua paragrafação também foi mantida, embora, como J\qss.11 k, h:1sc.1d.1 11" texto hri 110 estabelecido por Mignini e, juntamente com
jJ mencionado anteriormente, tenham sido introduzidos também os núme- , .. 1,-. p11l1li• .ul.1 11<> 111it1H'iro v .. 111111<' da j;Í rdt-rid;t cdi~·ão crítica francesa das
ros da 11sual paragra!-';u_:ão de Bruder. Jí a pontuação foi frcqucnremcnte al- .. 111.1". «>11q1l.-1.1" ,k 1:_ .,11111<10,.1°': (11 1 .11r;1.l111,;10 ,k Bnnanl f\;1utr;11, L1111htm
1<'LHh l'lll 1"1111(;.1<• dc ('xigt11.-i;1s pr<'>pri :1s ;( IH>SS:I lí11g11.1, ( llll<jll.lll(Cl ·"J'.11111.IS

idi .. o:o:i11, r.1 -: Í.10, l<'llli.1111 .,j,j., t<1ln .1d.1'. .1 lw111 ''" ,..,,,..!11.1111. ·111 .. I"' 1. ·11.lad .. ' 'f' , li 'IH 1"
TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO

cm edição bilíngue (Traité de l'amendement de l'intellecfA); (iii) a tradução,


em semelhante formato, de Alexandre Koyré ( Traité de la reforme de l'enten-
demeni25); (iv) a tradução para o inglês, elaborada por Edwin Curley, dispo-
nibilizada no comentário de H. De Djinn ao TIE (Spinoza - The Uáy to
26
Wisdom ); (v) a tradução espanhola de Atilano Dominguez (Tratado de la
reforma de! entendimiento. Princípios de Filosofia de Descartes. Pensamientos
27
Metaflsicos ); e (vi) a clássica tradução francesa de Charles Appuhn, publi-
cada no primeiro volume de sua edição das Oevres (Spinoza)2 8•
A presente tradução também se beneficiou de traduções parciais que fiz
do TIE como participante do Grupo de Estudos Espinosanos da USP, entre TRATADO DA EMENDA
1996 e 2006, a cujos membros agradeço pelas contribuições que me foram
dadas à época. Agradeço, ademais, aos colegas da Fafil-UFG, que em tempos
DO INTELECTO
mais recentes contribuíram direta ou indiretamente para esta tradução, bem
como aos alunos das disciplinas de Tópicos de Filosofia Moderna, que, entre
2013 e 2014, ajudaram-me a testar os protótipos deste resultado final. In-
fdizmente, seria por demais extenso nomear a todos. Contudo, dentre estes
últimos, agradecimentos especiais devem ser dados a Elliot Santovich Sca-
ramal, por sua generosa ajuda na revisão do texto. Também agradeço a An-
tônio Muniz de Rezende e Ulysses Pinheiro, pelas correções e sugestões
que me fizeram na fase final da revisão.
Dedico o presente trabalho, in memoriam, a minhas filhas, Anna e Nina,
nascidas e falecidas precocemente em dezembro de 2013.

Cristiano Novaes de Rezende

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TRATADO DA EMENDA
TRACTATUS DO INTELECTO,
De E d a via pela qual ele se dirige d a melhor man eira ao
verdadeiro conhecimento d as coisas*.
INTELLECTUS
Emendatione,
Et de viâ, quâ optime in veram rerum
Cognitionem dirigitur.

* Em De Nagelate Schriften van B. d. S. (op. cit. supra) , ocorre o segu inte suli1 í111ln : ·· 1 11 1.
gelijk van de Middel om het zelfd volmaakt te maken", ou seja, "E ta111 li é111 snl n«" f\ lo '"
de fazê-l o perfeito". Somado ao su b título da parte I d os Cogitílftz !vfri,ip/, 111/i .t ,. ·'' • I '·' ·.... •
do prefácio de Ethica V sobre as relações entre lógica e medi cina, o s11hlÍ11do l 1nl.11 '' J, ·. •1..
prese n te trat ad o o caract eri za como uma Me d icina da Mc nr" "'l' i11 n.'.. 11 1.1 , "" ·.0·1.1. • 111
·" c p,·:1<> usua l 110 sén ilo '\V 11 . ,·.. 1110 a 1/1g i,·a de l'.spi1" '"1. ( N . .i .. 'I'.)
ADMONITIO ADVERTÊNCIA AO LEITOR.

L E C TOREM.
Ad
l
T perf
Ractatus, quem de I ntellectús Emendatione, &e. im-
ectum htc tibi damus, Benevole Lector, jam mul-
O Tratado da Emenda do Intelecto, etc., que, inacabado, aqui te damos,
Benévolo Leitor, foi escrito há já muitos anos pelo Autor. Ele sempre manteve
tas ante annos ab Auctore fuit conjcriptus. ln animo Jemper em seu ânimo acabá-lo, mas, impedido por outros negócios e finalmente ar-
habuit eum perficere: At, aliis negotiis prcepeditus, & tan- rebatado pela morte, não pôde levá-lo ao fim pretendido. Todavia, como
dem morte abreptus, ad optatum finem perducere nón potuit.
Cum vero multa prceclara, atque utilia contineat, quce Veri- contém muitas coisas preclaras e úteis, que sem dúvida não serão de pouco
e
tatis fincero indagatori non parum re futura ejJe, haudqua- proveito ao sincero indagador da Verdade, não quisemos privar-te delas. E
quam dubitamus, te iis privare noluimus; &, ut etiam multa também para que não te pese perdoar as muitas coisas obscuras, ainda rudes
objcura, rudia adhuc, & impolita, quce in eo hinc inde occur-
runt, condonare non graveris, horum ne injcius ejJes, admo- e impolidas, que ocorrem aqui e ali, foi que quisemos deixar-te advertido, de
nitum te quoque ejJe voluimus. V ale. modo que delas não ficasses desavisado. Adeus.

24
25
TRACTATUS
De TRATADO DA EMENDA DO INTELECTO, E DA VIA
PELA QUAL ELE SE DIRIGE DA MELHOR MANEIRA
INTELLECTUS AO VERDADEIRO CONHECIMENTO DAS COISAS.

EMENDATIONE,
Et de viâ, quâ optime in veram rerum Cogni- [§1] Depois que a exper~ência me ensinou que tudo aquilo que frequen-

~
tionem dirigitur.

Ostquam me Experientia docuit, omnia, qure in


•• communi vitâ frequenter occurrunt, vana, & fu-
temente ocorre .~'.1: ~~da_ comum é vão e fútil ; e como eu visse que tudo o que
eu temia e o que me levava a temer n ada tinha em si mesmo de bom nem de
mau, senão enquanto por isso o ânimo fosse movido, pus-me finalmente a
t
tilia erre: càm viderem omnia, à quibus, & inquirir se dar-se-ia algo que fosse um bem verdadeiro e comunicável de si,
Ili qure timebam, nihil neque boni, neque mali in fe somente pelo qual, rej eitados todos os demais, o ânimo fo sse afetado; mais
habere, nifi quatenus ab iis animus movebatur, ainda, se dar-se-ia algo que, descoberto e adquirido, me fizess e fruir, pela
conftitui tandem inquirere, an aliquid daretur, eternidade, uma contínua e suma alegria. [§2] Digo que finalm ente tomei
quod verum bonum, & fui communicabile eITet, & à quo folo, posição; pois, ao primeiro olhar, parecia inconsulto querer deixar uma coisa
rcjectis creteris omnibus, animus afficeretur; imô an aliquid da- certa por outra então incerta. Via, é claro, as comodidades que são adquiridas
• r, rctur, quo invento, & acquifito, continuá, ac fummâ in reternum
fruerer lretitiâ. Dico, me tandem conflituiffe: primo enim intuitu da honra e das riquezas e que eu seria coagido a abster-me de buscá-las se
inconfultum videbatur, propter rem tunc incertam certam amit- quisesse seriamente dedicar trabalho a outra coisa nova; e percebia que, se
tere velle: videbam nimirum commoda, qure ex honore, ac di- porventura a suma felicidade se situasse nelas, eu dela deveria carecer, mas Sl'.,
vitiis acquiruntur, & quôd ab iis qurerendis cogebar abftinere, fi fe- em verdade, nelas não estivesse situada e somente por tais coisas eu trabalhas
_,., riam rei alii novre operam dare vellem: & fi forte fumma felicitas se, então também haveria de carecer da suma felicidade. [§3] Revolvia, pois.
in iis eITet fita, perfpiciebam, me eâ debere carere; fi verô in iis non
no ânimo se porventura seria possível chegar ao novo instituto, ou ao 11w11< '"
dTet fita , eifque tantum darem operam, tum etiam fummâ care-
rcm felicitate. Volvebam igitur animo, an forte eITet poffibile ad à certeza quanto a ele, ainda que sem mudar a ordem e o comum insti11111••1.
novum inftitutum, aut faltem ad ipfius certitudinem pervenire, licet minha vida, o que muitas vezes tentei frustradamente. Pois tudo '''11111 .. •111•
.i s ordo, & commune vitre mere inftitutum non mutaretur; quod frepe no mais das vezes ocorre na vida e que junto aos homens é csti111.11l11 • "'""
frufirà tentavi. Nam qure plerumque in vitâ occurrunt, & apud sumo bem, como é lícito coligir a partir de suas obras, se rcd11z .1 • ·.1. " 11°
homines, ut ex eorum operibus colligere licet, tanquam fum-
saber: as riquezas
mum bonum reftimantur, ad h::ec tria rediguntur; divitias fcilicet,

26 27
h•>11 .. 1.-111, .dq1w l1!.1d11w111. Ili., tnl111s ;11fl·Ú dillr;d11t.11r 1111 ·11 -., 11t. .1 111 >111.1 ,. "j>Ll't.n. 1'01 ,.""·"·" 11< -.-. .1 111<·1111· <'· di s1r;dda ;i tal po11lo que ela 11;10
111111i111<'· poflit d1· alio alíq11n ho110 cog-it:arc. Nam quod acl líhidí- l""k 1'"11s.1r 11.-111 11111 11111110 u11 alg11111 outro bem. l§4J Com efeito, no ati-
1w111;11t111d, 1·;) ;11Jn'> f11fpc11ditur a11ímus, ac Ii iu aliquo bono quie-
111·1111· .10 pr;11.cr, por de o ;"111imo é suspenso, como se repousasse em algum
ltl'11·f; q110 111axi1111': irnpcditur, nc de alio cogitet; fed poft illius
fr11i1 io1w111 fumma fcquitur trifütia, qu;:e, fi non fufpendit mentem, 1"·111, ;1 ral ponto que fica maximamente impedido de pensar cm algum outro;
1
L1nw11 pertiirbat, & hebctat. , , •· ' ," 111;1s, depois de sua fruição, segue-se uma suma tristeza, a qual, se não suspen-
l lo11ores, ac divitias perfequendo non parum etiam difirahitur : de a mente, no entanto a perturba e hebeta.
8
llJl'W;, pf;efertÍm 1 UbÍ hre ll0ll nifi propter fe (jUéeruntur, Perseguindo as honras e as riquezas, não pouco a mente também é distraí-
• p11a turn fupponuntur fummum e/Te bonum; honore verô
da, principalmente quando ªelas não são buscadas senão por si mesmas, porque
11111ltú adhuc magis mens difirahitur: fupponitur enim femper 10
1101111111 e/Te per fe, & tanquam finis ultimus, ad quem omnia então se supõe que sejam o sumo bem. [§5] Em verdade, porém, a mente é
dirig1111tur. Deinde in his non datur, ficut in libidine, pre- ainda muito mais distraída pela honra, pois sempre se supõe que é um bem
111k11tia; fed quô plus utriufque poffidetur, eô magis augetur por si, tal como um fim último a que tudo se dirige. Além disso, nelas [se. nas
Lt-t itia, & confequenter magis ac magis incitamur ad utrum- ·'
1
"' : honras e riquezas] não se dá, como no prazer, o arrependimento; mas quanto
q11c au~cndum: fi autem fpe in aliquo cafu fruílremur, tum fum- 15
111;1 oritur triílitia. mais possuímos de uma das duas, tanto mais aumenta a alegria e, consequen-
Ffl denique honor magno impedimento, eô quôd, ut ipfum temente, mais e mais somos incitados a aumentá-las; entretanto, se em algum
•dfrquamur, vita nece!Tariô ad capturo hominum efi dirigenda, , "·,.}·c aso nos frustramos nessa esperança, então uma suma tristeza se origina.
f11g-iendo fcilicet, quod vulgo fugiunt, & qmerendo, quod vulgô f Por fim, a honra tem um grande impedimento, pelo fato de que, para
q11;1•nmt homines.
20 . ,1 1 1 consegui-la, é necessário que a vida seja dirigida conforme a compreensão dos
C1'11n itaque viderem, hrec omnia adeô obfiare, quominus ope-
\ homens, a saber, fugindo do que vulgarmente os homens fogem e buscando
1;1111 novo alicui inftituto darem, imo adeô e/Te oppo!ita, ut ab º\ · •
111111, aut altero nece!Tario e!Tet abílinendum, cogebat. inquirere, , ">hfo que vulgarmente buscam.
q11id mihi e/Tet utilius; nempe, ut dixi, videbar bonum certum ..
·-.J .J
[§6] Assim, como eu visse que todas essas coisas a tal ponto obstavam a
pro incerto amfttere velle. Sed poftquam aliquantulum huic rei in- 25 (~~/que eu trabalhasse por algum novo instituto e, mais ainda, que [lhe J eram
• ubueram, inveni primô, fi, hifce omiffis, ad novum inílitutum '. )' opostas, a ponto de que eu necessariamente haveria de abster-me ou dele ou
.1ccingerer 1 me bonum fuâ naturâ incertum, ut dare ex dictis pof- J ,,
1
\ ,/ C> delas, fui coagido a inquirir o que me seri~i~-ú~i!; afinal, como disse, eu
fu111us colligere, omilTurum pro incerto, non quidem fuâ naturâ
(fixum enim bonum qu.:erebam), fed tantum quoad ipfius confe- parecia querer deixar um bem certo por um incerto. Mas, depois que me
' utionem: Affiduâ autem meditationc eô perveni, ut viderem, 30 deb~~~eí"uiii pouco sobre este assunto, descobri primeiramente que se, dei-
•111iid tum, modo po/Tem penitus deliberare, mala certa pro bono xadas aquelas coisas, eu me cingisse ao novo instituto, deixaria um bem in-
• nt:o omitterem. Videbam enim me in fummo verfari perículo, & certo de sua natureza - como claramente podemos coligir do que foi dito - por
• l'ot,.if/mt hac latius, & di/tinctius e:rplicari, di/tinguendo fcilicel divitias, quai qucerunlur um [outro] incerto, não de sua natureza, é claro (pois buscava um bem fixo),
,,,z propler /•, vel propter honorem, vel propter libidinem, vel propler vaktudinem, & au- mas somente quanto à sua obtenção. [§7] Contudo, por urna assídua medi-
1:m•ntum /cientiarum & artium; /ed hoc a.d /uum locum refervaJur, quia hufus Zoei non eft,
li ..e ade<) accurale inquirere. tação cheguei assim a ver que, então, desde que pudesse deliberar profunda-
mente, eu deixaria males certos por um bem certo. Via-me, pois, às voltas com
um sumo perigo e

ª Essas coisas poderiam ser explicadas mais ampla e distintamente, a saber, distinguindo as
riquezas que são buscadas por si mesmas, ou então pela honra ou pelo prazer, ou ainda pela
saúde e pelo aumento das ciências e das artes. Mas isto fica reservado ao seu devido lugar;
porque aqui não é o lugar de inquirir tais coisas tão acuradamente.

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111r- l'o~:r, n·111nl111111, q11a111vi '.-; i11n·rt11111, f11111111is virib11s qu<erc- • '"'l'.'do.1 !>11 ~;, .11111111n1u'·di11 , .1i11d.111111· i111n111,111111111;Íxi111;1s l(Hi;as,
tal Llual
r.-; vd111 i ;q,:-1-r ld liali morho lahorans, qui ubí mortem ccrtam 11111 1lon11.- so!'rn1do de do1·11,·a letal, 1p1c, l]llando prevê morte certa caso não
pr:rvídl't, ui adliíhcatur rcmedium, illud ipfum, quamvis incer-
.. . I·' ,11l111i11is1rado 11111 remédio, é coagido a buscá-lo, ainda que incerto, com
111111, l11111111is viribus cogitur qucerere, nempe in eo tota ejus fpes
~; dt lita; ilia autem oumia, qure vulgus fequitur, non tantum nul- 111.'1xi111:1s l(1n;as, já l]lle nele situa-se toda sua esperança. Todas as coisas, porém,

111111 coufcrunt remedium ad noftrum erre confervandum, fed 'I'"' 11 vulgo segue não somente não conferem remédio algum para a conser-
<'liam id impediunt, & frequenter funt caufa interiti'is eorum, qui 1·.11,.10 de nosso ser, mas também a impedem e frequentemente são causa da
1·a poffident <(indien men dus mag spreken)>, b & femper caufa 11111rtc daqueles que as possuem eb, <por assim dizer>, sempre causa da mor-
iotcritus eorum, qui ab iis poffidentur. Permulta enim exftant 1 e daqueles que por elas são possuídos. [§8] Existem, com efeito, muitos
'" exempla eorum, qui perfecutionem ad necem ufque paffi funt
ncrnplos dos que sofreram perseguição até a morte por causa de suas riquezas,
propter ipforum divitias, & etiam eorum, qui, ut opes compa-
e também dos que, para acumular recursos, expuseram-se a tantos perigos que,
rarent, tot periculis fefe expofuerunt, ut tandem vitâ prenam lue-
rent fure ftultitire. Neque eorum pauciora funt exempla, qui, por fim, pagaram com a vida a pena de sua esrultícia. Nem são poucos os
ut honorem affequerentur, aut defenderent, miferrime paffi funt. exemplos dos que, para conseguir honra ou defendê-la, sofreram miseravel-
••; 1nnumeranda denique exstant exempla eorum, qui prre nimiâ , \mente. Existem, por fim, inúmeros exemplos dos que, por desmedido prazer,
libidine mortem fibi acceleraverunt. Videbantur porro ex eo :·".Keleraram para si mesmos a morte. [§9] Ademais, tais ~ales p_~reci8:m origi- \
h:rc orta efTe mala, quod tota felicitas, .aut infelicitas in hoc
bar-se do fato de que toda felicidade ou infelicidacl;-está situada apenas no ...--· .
folo fita eft; videlicet, in qualitate objecti, cui adhreremus
amore. Nam propter illud, quod non amatur, nunquam seguinte, a saber, na qualidade do objeto ao qual aderimos por amor. Pois, 1J (1, '-
10 orientur lites, nulla erit trifütia, fi pereat, nuHa invidia, fi ab por aquilo que não é amado, nunca se originarão litígios, nem haverá tristeza ( 1-,,,: ,
alio poffideatur, nullus timor, nullum odium, &, ut verbo alguma caso i~so pereça, ~enhuma inveja caso seja possuído por outro, nenhum -j ·< (·J e--
dicam, nullre commotiones animi; qure quidem omnia contin:- temor, nenhum ódio e, numa palavra, nenhuma comoção do ânimo: tudo que j ,_- f.:..
g-unt in amore eorum, qure perire polfunt, uti hrec omnia, de seguramente acontece no amor daquelas coisas que podem perecer, como são ;l 11':7. 1~1. t, ~· .
quibus modo locuti fumus. Sed amor erga rem reternam, & infi-
todas aquelas de que falamos há pouco. [§10) Mas o amor para com uma ..1~ .. , • •_,
,~ nitam folâ lretitiâ pafcit animum, ipfaque omnis trifütire eft ex- - - - -· ···· --.. -- - ·· .. . - f ( {i. <.··
coisa eterna e infinita alimenta o ânimo só de alegria, a qual é isenta de toda L/~
1
·· ·
pcrs; quod valde eft defiderandum, totisque viribus qurerendum.
Verum non abfque ratione ufus fum his verbis: modQ poffem ferio tristeza, o que muito é de se desejar e que se há de buscar com todas as forças.
deliberare. Nam quamvis hrec mente adeo clare perciperem, non Mas, em verdade, não sem razão usei estas palavras: desde que pudesse seria-
poteram tamen ideo omnem avaritiam, Iibidinem, atque gloriam mente deliberar. Pois, conquanto eu percebesse essas coisas com a mente de
.10 deponere.
maneira tão clara, no entanto, eu não podia, por isso, depor toda avareza,
Hoc unum videbam, quod, quamdiu mens circa has cogitatio-
prazer e glória.
11cs verfabatur, tamdiu illa averfabatur, & ferio de novo cogita-
bat infiituto; quod magno mihi fuit folatio. Nam videbam illa [§11] Unicamente isto eu via: que enquanto a mente voltava-se para
mala non erre talis conditionis, ut remediis nollent ceclere. Et perto desses pensamentos, ao mesmo tempo afastava-se daquelas coisas e se-
11 riamente pensava no novo instituto; o que foi para mim de grande consolo.
llau accuratius /unt demon/lranda.
Pois via que aqueles males não eram de tal condição que não aceitassem ceder
a remédios. E,

b Essas coisas hão de ser demonstradas mais acuradamente.

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l 1>1\'fll.11110 llt) lllÍt lu c• ,·,1 ·•, llllt ' I v. dn-; lu'. '. t ' l ll 1.ll() ', t ' 1!111.1·, ·,clll 1n•I 11111 1· ·, , 1,1t, 11

quamvis in initio hrec intervalla e1Tent rara, & per admodum exi- .! .- 1<' 11'1"' l"X lrl"lll.lllll.lll l" C\Í )',1111 , 1111 Clll.1111<1 , dq 1<1i ~ 11111· li Vl" t<l.11!.-llll 111 Ili
guum temporis fpatium durarent, pofiquam tamen verum bo- 111.1is e 111;1is se llH' d .1v;1 ;1 co1il1 nT r, esses i11tl·r v;il o s 1;,r.1111 111.1i ~; lrn p1n111 " '
num magis ac magis mihi innotuit, intervalla ifta frequentióra, & 111.1i s lo11go s; pri11cip;tlrnc11tc depois qu e vi que a aqui si,·ao d l' di11lll'1111 "11"
longiora fuerunt; prreíertim pofiquam vidi nummorum acquifi-
11r;1:1.n e a glú ria s;io obstáculos a penas enquanto si"w buscad11s 1H1r si 111!'·: 111••'.
tionem, aut libidinem, & gloriam tamdiu obetre, quamdiu pro- s
pter íe, & non, tanquam media ad alia, qureruntur; fi verõ "11 ao como m eios para outras co isas; mas, cm verdade. se s:io IH1 sc;1dos ' 11111"
tanquam media qureruntur, modum tunc habebunt, & minime 111 c io s, então t erão m oderação e não obstarão nem um poun1, 111;1 :; :.i111. ·"'
oberunt, íed contrà ad finem, propter quem qureruntur, rnul- 1·o ntrário, muito conduzirão ao fi m pelo qual são buscados, co mo rnmt r.nn 11• '"
tum conducent, ut fuo loco oíl:endemus .
Hic tantum breviter clicam, quid per verum bonum intelligam, lo 11 0 seu devido lugar.
& fimul quid fit fummum bonum. Quod ut recte intelligatur, notan- [§ 12] Aqui apen as direi brevemente o que ent endo p o r vcrdadci r11 1" 111
dum eft, quõd bonum, & malum non, nifi refpective, dicantur; adeõ e, simultan eamente, o que seja o sumo b em . Para que isso st:ja rcL1111 c1111· 111
ut una, eademque res poffit dici hona, & mala secundum diveríos tdigido, é de notar que " bom" e "mau" n ão se dizem senão rchti v;1111 <' 11I <' , .1
refpecttls, eodem modo ac perfectum, & imperfectum. Nihil enim, po nto de u ma só e m esma co isa poder ser dita b oa e má st:gu11do di v.-1 ·.. 1"
in fuâ naturâ fpectatum, perfectum dicetur, vel imperfectum; 15
relações , e do mesmo m odo "perfeito" e "imperfeito". Nada, pois, co11:;id1 1.11 I•,
pr::efertim poíl:quam noverimus, omnia, qure fiunt, fecundum
reternum ordinem, & .fecundum certas Naturre leges fieri. Curo em sua próp ria n atu reza será dito p erfeito ou imperfeito , pri11 c ip .il1111 111•
autem humana imbecillitas illum ordinem cogitatione fuâ non af- d ep o is de sab ermos que tudo o que é feiro se faz segundo uma otd1·111 ,·1, 111.1
fequatur, & interim homo concipiat naturam aliquam humanam e segundo leis cerras d a Natureza. [§13] Como , p orém , a ddlilid.1d c 1111111.111.1 •
fuâ multo firmiorem, & fimul nihil obftare videat, quominus 2 0 n ão alcança com seu p en sament o aquela.°.r.~~_lE;, m as, nesst: íntn i111 , '• l 1• "'" 111
talem naturam acquirat, incitatur ad media qurerendum, qure
con cebe uma natureza humana muito m ais firme que a sua t:, si1111tl1.111« .1111o 11
ipfum ad talem ducant perfectionem: & omne illud, quod poteíl:
e1Te medium, ut eõ perveniat, vocatur verum bonum; fummum t e, vê que n ad a obst a a que adquira tal n atureza, é incitado , poi s, ,1 l 111 " ' .11

autem bonum eft eõ pervenire, ut ille cum aliis individuis, fi fieri m eios que o conduzam a tal p erfeição ; e tudo aquilo que pod e .-;n 1111 I li I '·" ·'
poteft, tali naturâ fruatur. Qurenam autem illa fit natura, often- 25 aí chegar chama-se verdadeiro bem; o sumo b em, contudo, t ;IÍ 1 111·1'. ·11 .i.
demus íuo loco, nimirum e1Te e cognitionem unionis, quam f m odo a que ele [i.e. o h o m em) frua tal n atureza com outros indi ví.!111 •" · "'
mens cum totâ Naturâ habet. Hic eft itaque finis, ad quem tendo,
\ p ossível. Qual seja, p o rém, aquela natureza, mostraremos, em seu dc vi1I• • 1111'. ·1 1.
talem fcilicet naturam acquirere, &, ut multi mecum eam ac-
quirant, conari, hoc eft, de meâ felicitate etiam eíl: operam dare, "que sem d úvid a é co co nhecimento da união que a mente tem com ;1 N .11 111'
ut alii multi idem, atque ego intelligant , ut eorum intellectus, 30 za inteira. [§14] A qui está, então, o fim ao qual t endo, a sab er: adq11i111 1.11
& cupidi~as prorfUs cum meo intellectu, & cupiditate conveniant; n atureza e esforçar- me para que muitos a adquiram comigo; isto é, 1;1 111lw111
utque hoc fiat, dnece1Te eíl: <Vooreerft> tantum de Naturâ intelligere, p ertence à minha felicidade trabalhar p ara que m uitos o utros intl·lij .1111 li

o n,., fu/irls /uo loco uplicantur. m esmo que eu e p a ra que o intelecto e o d esejo deles convenham inte ir;11111 11

d Nota, quàd ktc tantum curo enumerare /cienlias ad no/trum /copum nece/farias, licel ad t e com m eu intelec to e meu d esejo. E p ara que isso se faça, é dnecess;í ri o n11
earum feriem non altendam.
primeiro lugar> inteligir sobre a Natureza somente

e Essas coisas são explicadas mais dilatadam ente em seu devido lugar.
d No ta que aqui somente cuido de enumerar as ciências necessárias ao nosso escopo . s 1·111 ,,11 .

eu dê atenção asua série.


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'' '1'1.111111 <'· s1dÍ1i1·1111 · 11.11.1 .11l1p1i1i1 t.tl 11.11111'1'1.. 1; n11 '.<')',11i1l.1 . l111111.11 1.tl :.111 ti'
q11;111t 11111 foflicit, ad talem nat11ra111 acquircnda111; •h·111dc for- 'l.11 k .. 1q11 ;.I 1i;\ de ser dcscj;1d;1 t;t 111 () p.1 r;1 q 11c 11111it1 ,, .1 í ,·l1cg11c111 q11.1111 o l 11.11 .1
111arc talem focietatem, qualis cfi defideranda, ut qmu11plurimi '1"" o L1,-.1111\ L1cílirna e st:g,11r;u11n1tc. l§15l lkpois, <c1111nn-irn l11g.1r 11.'1
quàm facillimc, & fccure eo perveniant. Porro <, tcn darden,> •l'W se dedicar trabalho à i:ilosofia Moral, bem como !t I )ourrina 1Li Fd11t.•\·'"
danda efi opera Morali Philofophire, ut & Doctrinre de puerorum
1l.1s nianc,:as; e porque a Saúde não é um meio menor par;H]llC aqudc li111 sl'j.t
s Educationc; &, quia Valetudo non parvum eft medium ad hunc
finem afiequendum, concinnanda eft (, ten vierden,) integra • 1111scguido, deve-se <cm quarto lugar> compor uma Mcdiri11;1 i111ci1.1;"
Medicina; & quia arte multa, qure difficilia funt, facilia red- porque pela arte muitas coisas que são difíceis são tornadas fáceis, e por 11wi"
duntur, multumque temporis, & commoditatis in vitâ eâ lu- .kla podemos lucrar na vida também muito de tempo e de cornodid;"k, 1"'1
crari poffumus, ideo (ten vijfden,) Mechanica nullo modo eft isso, <cm quinto lugar> a Mecânica de modo algum deve ser dcsprn.1d .1.
10 contemnenda. Sed ante omnia excogitandus eft modus meden-
dí intellectO.s, ipfumque, quantum initio licet, expurgandi, ut 1§16) Antes de tudo, porém, há que se excogitar um modo de rc111nli ;11 "
feliciter res abfque errore, & quàm optime intelligat. Unde quif- intelecto e expurgá-lo, o quanto permite o início, para que intclija :is , .. i·;.1:.
~ '
que jam poterit videre, me omnes fcientias ad unum finem e, & , om felicidade, sem erro e da melhor maneira. Donde qualqm:r 11111 j;'t podn.'1
li h'
fcopum velle dirigere, fcilicet, ut ad fummam humanam, quam r,ver que quero dirigir todas as ciências a um único fim" e escopo. :1 s.1lw1, qw
1 s diximus, perfectionem perveniatur; & fie omne illud, quod in
11 se chegue à suma perfeição humana de que falamos; e assim, rndo ª'I" ilo 11111·.
fcientiis nihil ad finem (et fcopum) noftrum nos promovet, tan- 1'
1
'" nas ciências, em nada nos faça avançar em direção ao nosso fim · e c ;1"I '"
quam inutile erit rejiciendum, hoc eft, ut uno verbo clicam, omnes
noftrre operationes, fimul & cogitationes ad hunc funt dirigendre haverá de ser rejeitado como inútil, isto é, em uma palavra, roda s ;1s 11.,·;.,,1.,
finem. Sed quia, dum curamus cum coilfequi, & operam damus, operações e, simultaneamente, nossos pensamentos, hão de ser dirigido·. 11.11.1
:w ut intellectum in rectam viam redigamus, necelTe eft vívere, prop- esse fim. (§17] Mas, porque é necessário viver enquanto cuidamos dl', <>li"'
terea ante omnia cogimur quafdam vivendi regulas, tanquam gui-lo e [enquanto) trabalhamos para reconduzir o intelecto à reta via , si 11111 •··.
honas, fupponere, has fcilicet.
pois, antes de tudo coagidos a supor como boas algumas regras de vid.1 .. 1
1. Ad capturo vulgi loqui, & ilia omnia operari, qure nihil
impedimenti adferunt, quominus noftrurn fcopum attingamus. saber, as seguintes:
25 Nam non parum emolumenti ab eo polTumus acquirere, modo I - Conforme a compreensão do vulgo falar e fazer tudo aquilo que 11;11!.1
ipfius captui, quantum fieri poteft, concedamus; adde, quod ofereça de impedimento para que atinjamos nosso escopo. Pois não po11L1
tali modo amicas prrebebunt aures ad veritatem audiendam. gratificação podemos adquirir disso, se fizermos concessões, tanto quanto se
II. Deliciis in tantum frui, in quantum ad tuendam valetudi-
possa fazer, à sua compreensão; acrescente-se que, desse modo, hão de se
nem fufficit.
30 III. Dcnique tantum nummorum, aut cujuscunquc altcrius apresentar ouvidos amigos para ouvir a verdade.
rei qmerere, quantum fufficit ad vitam, & valetudinem fuften- li - Fruir dos deleites somente o tanto quanto seja suficiente para man
tandam, & ad mores civitatis, qui nofirum fcopum non oppu- ter a saúde.
gnant, imitandos. III - Por fim, buscar dinheiro ou qualquer outra coisa somente o quan
Hifce fie pofitis, ad primum, quod ante omnia faciendum eft, to baste para que a vida e a saúde sejam sustentadas e para que sejam imitados
35 me accingam, ad emendandum fcilicet intellectum, eumquc
os costumes da cidade que não se oponham ao nosso escopo.
e Finis in /cientiis eft unicus, ad q~m omnes /u"t dirigendr:e.
1
(§18] Uma vez postas tais coisas, cingir-me-ei ao primeiro, que é a fazn
antes de tudo, a saber, a emendar o intelecto e

e É único o fim nas ciências, ao qual todas devem se dirigir.

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;1J'f 11111 1<'<ld1·11d11111 ;1d IT:; t;di lllodo i11tclligcndas, q110 opus dl, 1•>111.1 !., .11'1" 1•.11.1 •jll< .1·. ""'"'" ·.• 1.1111 1111cl1g1d.1.s do 111odo t.il q11l' ('. inist('r
11t 111dlr11111 Ji1w111 alkqu:1mur. Quod ut fiat, exigit ordo, quem 1•.11.1 'I"" «lll~d)',·1111<>'; 11"~·"" 11111. 1'.11.1 q11" isso S(' Lu,·a, a ord"m qu" natural-
11;1t 11r;ilit.t-r Iialwmus, ut hic refumam omnes modos percipiendi, 11w11I!' 1"111os l·xigl' q11l' n1 rl's11111;1 ;1qui todos os modos de perceber de que
q110~; l111cul'quc habui ad aliquid indubie affirmandum, vel ne- .11"· .1gora dispus para afirmar ou negar algo independentemente de dúvidas,
g:111d11m, quô omnium optimum eligam, & fimul meas vires, & s I '·'' ;1 (111c d"ͪ o melhor de todos e simultaneamente comece a conhecer minhas
11:1t.11r;1111, quam perficere cupio, nofcere incipiam.
f, 11\as e natureza, que desejo aperfeiçoar.
Si accuratô attendo, pofTunt omnes ad quatuor potiffimum re-
duci. [§ 19] Se atento acuradamente, todos [esses modos] podem ser reduzidos
1. Efr Perceptio, quam ex auditu, aut ex aliquo figno, quod 11rincipalmente a quatro.
vocant ad placitum, habemus. 10 I. Há uma Percepção que temos a partir do ouvir ou a partir de algum
II. Eft Perceptio, quam habemus ab experientiâ vagâ, hoc ·;igno, como se diz, arbitrário.
dt, ab experientiâ, qme non determinatur ab íntellectu; fed tan- II. Há uma Percepção que obtemos da experiência vagante, isto é, da
t 1'11n ità dicitur, quia cafu fie occurrit, & nullum aliud habemus
nperiência que não é determinada pelo intelecto, mas que é chamada dessa
1·xperimentum, quod hoc oppugnat, & ídeà tanquam ínconcu1Tum
;1pud nos manet. 15 maneira porque, assim, ocorre por acaso e não possuímos algum outro expe-
III. Eíl: Perceptio, ubi e1Tentia rei ex alíâ re concluditur, fed rimento que se lhe oponha, de modo que ela permanece como inconcussa
11011 adrequate; quod fit, t cum vel ab aliquo effectu caufam col- junto a nós.
ligimus, vel ciun concluditur ah aliquo univerfali, quod femper III. Há uma percepção em que a essência da coisa é concluída a partir
;tliqua proprietas concomitatur.
de outra coisa, mas não adequadamente; o que se faz tquando coligimos a
IV. Denique Perceptio eft, ubi res percipitur per folam fuam 20
1·ffentiam, vel per cognitionem fure proximre caufre. causa a partir de algum efeito, ou quando se conclui a partir de algum uni-
Qme omnia exemplis illufirabo. Ex auditu tantum feio meum versal que sempre é acompanhado de alguma propriedade.
na talem diem, & quàd tales parentes habui, & fimilia; de qui- IV. Por fim, há uma Percepção em que a coisa é percebida através de sua
hus nunquam dubitavi. Per experíentiam vagam feio me moritu- essência tão somente, ou através do conhecimento de sua causa próxima.
rum: hoc enim ideà affirmo, quia vidi alios mei fimíles obii1Te 25 [§20] Ilustrarei tudo isso com exemplos. A partir do ouvir tão somente,
mortem, quamvis neque omnes per idem temporis fpatium vixe- sei meu dia de nascimento, que tive tais pais e coisas semelhantes, das quais
rint, neque ex eodem morbo obierint. Deinde per experientiam
nunca duvidei. Por experiência vagante sei que vou morrer, o que, com efeito,
vagam etiam feio, quàd oleum fit aptum alimentum ad nutrien-
assim afirmo porque vi outros semelhantes a mim encontrarem a morte, em-
bora nem todos tenham vivido pelo mesmo espaço de tempo, nem tenham
r lloc cum jit, nikil de caujd intelligimus pra!ler id, quod in e/fectu con/ideramus: quod falis
apparet ex eo, quàd tum cau/a non ni/i generalif/imis terminis explicetur, nempe kis, Ergo
morrido pela mesma doença. Além disso, por experiência vagante também
datur aliquid, Ergo datur aliqua potentia, &e. Vel etiam ex eo, quiJd ip/am negative expri- sei que o óleo é alimento apto a nutrir
mant, Ergo non eft hoc, vel illud, &e. ln fecundo caju aliquid cau/aJ tribuitur propter ejfec-
tum, quod dare toncipituY, ut in exemplo oftendemus; verum nikil praJter propria, non vero
rei ef/entia particularis.

Quando isso se faz, nada inteligimos da causa além do que consideramos no efeito. Isso
aparece suficientemente a partir do fato de que, então, a causa não é explicad1i senáo por
termos generalíssimos, quais sejam, estes: "Portanto, dá-se algo'; "Portanto, dá-se 11<~11111,r
potência'; etc. Ou também a partir do fato de que a exprimem negativamente: "Pm·/.111!0,
a
não é isto ou aquilo'; etc. No segundo caso, algo é atribuído causa devido ao e/éito, o 1111.d
é claramente concebido, como no exemplo mostraremos; mas, em verdade, nacLz / lh1· / ,r1n
buído} além de próprios, mas não, em verdade, a essência particular da coisa.

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.1, li.1111.1 , lin11 "'"'" '\" " .1 .'•r."·' {· .1pt.1 ;1 cx1i11 g11i l.1; sl·i 1;1111\it'.· rn q11 c o c io t'.:
cla111 f1 :1111111:i111, q111'ul1'1w· aq11a ad cam exti11guc11d:1m apta lit.; feio 11111 .111i111;d q11C l..1,- l. qtll' o hom c111 [t'.: l um animal racional; e assün conheci
d i;un, qw'icl c:i nis iit: animal latrans , & homo anima l rationale, q11.1 sc tudo que se faz par<t o uso da vida. [§21] Entretanto, concluímos a
•"< fie fcr(: omnia novi, qure ad ufum vitre faciunt. Ex aliâ verô re 1•.1 ni r de o urra coisa do seguinte modo : depois que claramente nos percebemos
lloc modo concludimus: poíl:quam clare percipimus, nos tale sentir tal corpo e nenhum outro, a partir disso, digo, claramente concluímos
:; rnrpus fcntire, & nullum aliud, inde, inquam , clare concludi-
qu e a alma está unidagao corpo, a qual união é a causa de tal sensação ; mash,
11111s animam unitam g eíTe corpori, quce unio eíl: caufa talis fenfa-
.1 p< trtir disso absolutamente, não podemos inteligir o que seja aquela sensação
tionis; fcd 11 qurenam fit illa fenfatio, & unio, non abfolute inde
poffumus intelligere. e un ião.
Vel poftquam novi naturam vifUs, & fimul, eum habere talem Ou então, depois que conheci a natureza da visão e simultaneamente
'" proprietatem, ut unam, eandemque rem ad magnam difiantiam que ela possui uma propriedade tal que, a grande distância, vemos uma só e
minorem videamus, quàm fi eam cominus intueamur, inde con- mesma coisa menor do que se a víssemos de perto , concluímos daí ser o Sol
dudimus Solem majorem eíTe, quàm apparet, & alia his fimi-
maior do que parece, e outros casos semelhantes. (§22] Por fim , uma coisa é
lia. Per folam denique rei eíTentiam res percipitur; quando ex
co, quôd aliquid novi, feio, quid hoc fit aliquid noffe, vel ex percebida tão somente através de sua essência quando, pelo fato de que co-
••; co, quod novi effentiam animre, feio eam corpori effe unitam. nheci algo, sei o que seja conhecer algo; ou pelo fato de que conheci a essên-
Eâdem cognitione novimus duo & tria effe quinque , &, fi dentur cia da alma, sei que ela está unida ao corpo. Po r este mesmo conhecimento
dme linere uni tertire parallelre, eas etiam inter fefe parallelas, &e. soubemos que dois e três são cinco ; e que, se são dadas duas linhas paralelas
Ea tamen, qme hucufque tali cognitione potui intellígere, per- a uma terceira, elas são paralelas entre si, etc. Essas coisas, porém, que até aqui
pauca fuerunt.
pude inteligir por tal conhecimento, foram muito poucas.
l o Ut autem hrec omnia melius intelligantur, unico tantum utar
[§23] Mas, para que tudo isso sej a mais bem inteligido, usarei somente
exemplo, hoc fcilicet. Dantur tres numeri: qurerit quis, quar-
tum, qui fit ad tertium, ut fecundus ad primum. Dicunt hic paf- um único exemplo, a saber, este: dados três números, buscar um quarto que
fim mercatores, fe feire, quid fit agendum, ut quartus invenia- esteja para o terceiro assim como o segundo para o primeiro. O s mercadores
tur, quia nempe eam operationem nondum oblivioni tradiderunt, dizem, aqui e em qualquer outro caso, saber quais ações devem ser feitas para
is quam nudam fine demonftratione à fuis magiftris audiverunt; alii que o quarto [número1seja descoberto, decerto porque ainda não se esque·
11 E x hoc exemplo clare vider1 id eft, quod modà notavi. N am per illam unionem nihil intelli· ceram daquela operação que, nua, sem demonstração, ouviram de seus mestres.
i;imus prt11ler /en/alionem i p/am, c//ectas f cilicel, ex quo caufam, de quâ nihil Ítltelligim14s,
Outros,
concludebamus.
h T alis conclu/io, quamvis certa fit, non tamen fatis luta e/t, ni fi maxime caventibus. Nam
nifi optime caveant /ibi, in errores /latim incidmt: ubi enim res ità abftracte concipiunl,
''°" autem per veram ef/entiam, /tatim ab ímaginatione con/unduntur. Nam id, quod in
fe unum eft, multiplex ef/e imaginantur homines. Nam iis, quCB ab/lracte, / eor/im, & con/u/e g A partir deste exemplo, claramente se vê aquilo que agora há pouco notei. Pois, por aqud.1
concipi!4nt, nomina impo11!4nt, qut11 ab ipfis ad alia magis familiaria /igni/icandum u/ur· união nada in teligimos além da própria sensação, ou seja, do efeito, a partir do qual m11

pantur; quo fit, ut haJc ímagínentur eodem modo, ac eas res imaginari f olent, quibus primum cluíamos a causa, da qual nada inteligimos.
h~c nomina impofuerunl . h Tal conclusão, embora seja certa, não está, porém, suficientemen te p rotegida, a ri,io stT /•.1r.1
os maximamente cautelosos. D efa to, se não se acautelam, incidirão imediatamcn t1· m1 "1 1·1" ;
pois, quando concebem as coisas assim abstratamente e não p ela verdadein r 1·.v· '11 11.1. ,, 11•
imediatam ente confundidos pela imaginação. Com efeito, isso que em si W"-'"'" • 11111 . ....
homens imaginam ser múltiplo; p orque aquelas coisas que concebem 11hstr.1!.1. "'/'·"·',/.' '
confusamente, eles impõem nomes, os quais (já} são por eles usados /hl" I 'i,<'./11/1•.u " ' ""'.
coisas mais fa m iliares, o que faz com que aquelas sejam imagina1/,1s tio '""'m" ,,,,., /,. ·/" '
estas coisas que soem imaginar, as quais p rimeiramente haviam iw/111.,/0 ""''' 111" // • '.

39
38
1'"''·111, l"'I 1· x1H - lll'll• 1.1 ,j.,., \• .1."''-"I .s11111'k·' · '111.1i ~; s q.1111 .. 1q1wk.·. .-111 •111··"
•p1.1r111 1u'1111l·rn l- p.11n1tc por si, Li·1.l'l11 11111 a.\i11111;1 1111i vc rs. il , tolll" 111·.. 11 ··.
vn•'> ;1b 1·xp1·ri1·11ti:1 litnplicium faciunt axioma univerfalc, fcilicet
11hi quartus numcrus per fe patet, ut in his 2, 4, 3, 6, ubí expe- \ 111'1111n11sl: },, · I, _\,(>,nos qu;1is cx1H:ri111c11L1111qt1L'11111ltipli ca1nlo si· o :,1·1'.1111
rimit:ur, quôd dueto fecundo ín tertíum, & producto deinde per ,lo pelo rncciro e dividindo-se, t:ntão, o resultado pelo pri111L·Írll, L11. :,1· • >
primum divífo fiat quotiens 6; & cum vident eundem numerum q11ocic11tc 6; e como veem ser produzido o mesmo número que j;\ n111lin i.1111
produci, quem fine hac operatíone noverant erre proportíonalem, 5 sn proporcional sem essa operação, concluem daí que a opcraçao l- 1)();1 p.11 .1
iode concludunt operationem erre bonam ad quartum numerum
que o quarto número proporcional sempre seja descoberto. [ §2/i 1 f\l.1s ""
proportionalem femper inveniendum. Sed Mathematici vi demon-
firationis Prop. 19. lib. 7. Euclídis fciunt, quales numeri inter fe Matemáticos sabem, pela força da demonstração da Prop. 19 Livro '/ de h1
fint proportionales, fcilicet ex naturâ proportionis, ejufque proprie- elides, quais números são proporcionais entre si, ou seja, [sabcm-1101 .1 p.11111
tate, quod nempe numerus, qui fit ex primo, & quarto requalis 10 da natureza da proporção e de sua propriedade, pela qual, de fato, o 111'1111,· 1• •
fit numero, qui fit ex fecundo, & tertio; attamen adrequatam que se faz do primeiro e do quarto é igual ao número que se foz do Sl')',•111<\n
proportionalitatem datorum numerorum non vident, & fi videant,
e do terceiro; entretanto, não veem a adequada proporcionalidade dos 111'111w
non vident eam vi illius Propofitionis, fed intuitive, <of) nullam
operationem facientes. Ut autem ex his optimus eligatur modus ros dados, e caso vejam, não a veem por força daquela Proposiçáo. 11 i;1s i111111
perci.piendi, requiritur, ut breviter enumeremus, qure fint ne- 15 tivamente, <ou> não fazendo operação alguma. [§251 Mas, para q1w, 1!.-11111
ccffaria media, ut noftrum finem arrequamur, hrec fcilicet. esses modos de perceber, se eleja o melhor, requer-se que enumerc111m l11n•·
I. Nofiram naturam, quam cupimus perficere, exacte norre, mente quais sejam os meios necessários a que consigamos nosso fi111, .1 s. il11 1.
& fimul tantum de rerum naturâ, quantum fit necerre.
II. Ut inde rerum differentias, convenientias, & oppugnantias estes:
I. Conhecer exatamente nossa natureza, que desejamos apcrl ;_.Í\11.11 , .
recte colligamus. 20

III. Ut recte concipiatur, quid poffmt pati, quid non. simultaneamente, tanto da natureza das coisas quanto seja necessário,
IV. Ut hoc conferatur cum naturâ, & potentiâ hominis. Et II. para que daí colijamos retamente as diferenças, conveniências l' 111 u •
ex iftis facile apparebit fumma, ad quam homo poteft pervenire,
sições das coisas,
perfectio. III. para que retamente se conceba o que podem ou não padecer,
His fie confideratis videamus, quis modus percipiendi nobis fit 25
IV. para que isso seja comparado com a natureza e a potência do ho11n·111.
eligendus.
Quod ad primum attinet. Per fe patet, quod ex auditu, prreter- E, a partir disso, facilmente aparecerá a suma perfeição a que o homem pod1·
quam quod fit res admodum incerta, nullam percipiamus eITen- chegar.
tiam rei, ficuti ex noftro exemplo apparet; & cum fmgularis exi- [§261 Tais coisas assim consideradas, vejamos qual modo de pcrn-IH"r
ltentia alicujus rei non nofcatur, nifi cognitâ e1Tentiâ, uti poftea 30
há de ser por nós elegido.
videbitur: hinc clare concludimus omnem certitudinem, quam ex No atinente ao primeiro, é patente por si que por ouvir, além dl' s1·r
auditu habemus, à fcientiis eITe fecludendam. Nam à fimplici au-
coisa extremamente incerta, não percebemos essência alguma da coisa, co1\l1,
ditu, ubi non prreceffit proprius intellectus, nunquam quis pote-
rit affici. aparece a partir de nosso exemplo; e como a existência singular de algu111.1
coisa não é conhecida a não ser que seja conhecida a essência, como sL·t.1
visto depois, daqui claramente concluímos que toda certeza que temos .1
partir do ouvir há de ser excluída das ciências. Pois, pelo simples ouvir, qu;111
do o próprio intelecto não precede, nunca poderá alguém ser afetado.

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40
\ ~27 \ '()11.11110 .111 "'T."'"'"· 1.111111<"111 11.'1 q11l' Sl' din1 q1w 11i11)•,11<'·111 \<'til
1
<J11oad frc1111d11111. Nultus etiam diccndus dt, quô<I habeat 11111.1 idl'i;1 da propon,.111 q11l' l111 s<.1. /\IL-111 de ser coisa cxue111.1111l'llll' i111 n1.1 ,.
ídcam iltius proportiouis, quam qurerit. Prreterquam quôd fit res .... 111 li111, 11u11c1 algul'm, llll'SlllO assim, por tal modo pcrccbn;'i, 11:1s ,·ois.1·;
admodiun incerta, & fine fine, nihil tamen unquam tali modo quis 11.1111rais, algo alón d<.: acid<.:nt<.:S, os quais nunca são intdigidos a nao sn <pw
in rebus naturalibus percipiet prreter accidentia, qure nunquam
s clare intelliguntur, nifi prrecognitis effentiis. Unde etiam & ille fe-
~;cjam pré-conhecidas as essências. Donde também ele h.í. tk s<.:r nduído.
[§28] Do terceiro, contudo, cumpre dizer que, de algum modo, 1"1110•,
cludendus eft.
De tertio autem aliquo modo dicendum, quõd habeamus ideam 11rna ideia da coisa, além de que também concluímos sem perigo dl' ,·no;
rei, deinde quôd etiam abfque periculo erroris concludamus; mas, no entanto, não será por si mesmo um meio para que adquiramos 11< 1ss.1
fed tamen per fe non erit medium, ut noftram perfectionem acqui-
1ierfeição.
10 ramus. [§29] Só o quarto modo compreende a essência adequada da coisa l' sl'111
Solus quartus modus comprehendit e1Tentiam rei adrequatam, perigo de erro, e por isso há de ser maximamente usado. Portanto, cuidarn110•.
& abfque erroris periculo; ideoque maxime erit ufurpandus. Quo- de explicar de que modo ele há de ser usado para que coisas desconhn id.1·•
modô ergo fit adhibendus, ut res incognitre tali cognitione à nobis
sejam por nós inteligidas com tal conhecimento e para que, ao mesmo rrn q ><>.
intelligantur, fimulque, ut hoc quàm compendiofe fiat, curabimus
15 explicare: (dat is) poftquam novimus, qurenam Cognitio nobis fit isso se faça o mais compendiosamente; <isto é>, [§30] depois que co11linc11111·;
neceliaria, tradenda eft Via, & Methodus, quâ res, qure funt co- qual conhecimento nos seja necessário, há que se trazer agora a Via e o !Vl\·11 >
gnofcendre, tali cognitione cognofcamus. Quod ut fiat, venit prius do pelo qual conheceremos as coisas que, por tal conhecimento, cumpr" '' •
confiderandum, quôd hic non dabitur inquifitio in infinitum; fci- nhecer. Para que isso se faça, impõe-se primeiramente a consideraç:io dl' q11<
licet, ut inveniatur optima Methodus verum invelligandi, non opus
não se dá aqui uma inquirição ao infinito; ou seja, para que se descuhr.1 ',
20 eft aliâ Methodo, ut Methodus veri inveftigandi inveftigetur; &, ut

fecunda Methodus inveftigetur, non opus eft aliâ tertiâ, & fie in infi- melhor Método de investigar o verdadeiro não é mister um outro Método p;11.1
nitum: tali enim modo nunquam ad veri cognitionem, imõ ad nul- que se investigue o Método de investigar o verdadeiro; e para que se investig11c
lam cognitionem perveniretur. Hoc verõ eodem modo fe habet, este segundo Método, não é mister um outro terceiro, e assim ao infinito, \H >Í.~.
ac fe habent inftrumenta corporea, ubi eodem modo liceret argu.:. de tal modo, nunca se chegaria ao conhecimento do verdadeiro, mais ainda, ;1
25 mentari. Nam, ut ferrum cudatur, malleo opus eft, & ut malleus
conhecimento algum. Mas, na verdade, o caso aqui se comporta do 11Ks111<>
habeatur, eum fieri neceITum eft; ad quod alio malleo, aliifque
modo pelo qual se comportam os instrumentos corpóreos, sobre os quais sni;1
inftrumentis opus eft, qure etiam ut habeantur, aliis opus erit
inftrumentis, & fie in infinitum; & hoc modo fruftrà aliquis pro- lícito argumentar da mesma maneira. Porque, para forjar o ferro, é mister u111
bare conaretur, homines nullam habere pote.fia tem ferrum cuden- martelo, e para que se tenha um martelo, é necessário fazê-lo, para o que {
30 di. Sed quemadmodum homines initio innatis inftrumentis quredam mister outro martelo e outros instrumentos, para cuja obtenção também havc
facillima, quamvis laboriofe, & imperfecte, facere quiverunt, rão de ser mister outros instrumentos, e assim ao infinito; e desse modo algut'·111
iifque confectis alia difficiliora minori labore, & perfectiils confe-
frustradamente se esforçaria em provar que os homens não têm poder alg11111
1 Hic aliquantà proli:cius agam de experimtid; & Empiricorum, & recenlium Philo/ophorum
de forjar o ferro. [§31] Mas, do mesmo modo pelo qual os homens, de iníci11,
procedendi Methodum e:caminabo. foram capazes de fazer com instrumentos inatos algumas coisas facíli111:1s .
ainda que laboriosa e imperfeitamente, e uma vez confeccionadas estas, co11
feccionaram outras mais difíceis com menor labor e mais perfeitamente,

i Aqui tratarei um pouco mais prolixamente da experiência e examinarei o Método de p1·01t"


der tanto dos Empíricos quanto dos Filósofos recentes.

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42
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,'\/ :1h i111ln1111(·111is ad alia opera, & i11llrumcnta pergcudu, ('Ô pcr- 1
11.il1;dlio 1;111L1s e tau dil"keis coisas, assi111 ramhl-111oi111cln10. ·,.,111 .. 11.1 1111
vcucrunt, ut tot, & tam difficilia parvo labore perficiant; fie
; 1,.1 11ativa, Lu. para si instn1mt:ntos i11tdt:ctuais, com os quais ;1dq11i1" 01111 .1·.
<'liam iutdlectus k vi fuâ nativâ facit fibi inftrumenta intellectua-
1~ in;as p;tra outras obr;ts 1intclectuais, e com essas obras, outros i11s1r111111"111' '" .
lia, quibus alias vires aequirit ad alia opera 1 intellectualia, &
ex iis operíbus alia iníl:rumenta, feu poteftatem ulteríus inveftigan- ou seja, um poder de investigar mais adiante; e assim, gradariv:1111e111 '" .1v.111•, .1
di, & fie gradatim pergit, donec fapientire culmen attíngat. Quod .1té que atinja o cume da sabedoria [§32] Que o intelecto assim se' <lllll"111•.
autem intellectus ita fefe habeat, faeile erit videre, modo intelliga- sed. fácil de ver desde que se intelija o que é o Método de invt:stig:ir ., v"1 'l.1
tur, quid fit Methodus verum inveftigandi, & qurenam fint ilia dóro e quais são aqueles instrumentos inatos, unicamente os <pi:1 is .. i.- n IJ','
innata inftrumenta, quibus tantum eget ad alia ex iis inftrumenta 10
para confeccionar, a partir destes, outros instrumentos a fim de qu(' 111"' • •l.1
eonficienda, ut ulterius procedat. Ad quod oftendendum fie pro- ,j
cedo. adiante. Para mostrar isso, procedo da seguinte maneira.
Idea m vera (habemus ením ideam veram) eft diverfum quid à
fuo ideato: Nam alíud eft círeulus, aliud idea eirculi. ldea enim
i
~
[§33] A ideia mverdadeira (pois temos uma ideia verdadeira ) .... d)'," d1
verso de seu ideado: de fato, algo é o círculo, algo outro é a ideia do' ír, 1il• •
circuli non eft aliquid, habens perípheriam, & eentrum, uti circu- 15 Pois a ideia do círculo não é algo que tem periferia e centro, co1110 o ' í '' 1d·"
Jus, nec idea corporis eft ípfum corpus: & eum fit quid diverfum nem a ideia do corpo é o próprio corpo; e como é algo diverso de s1· 11 "l.-.11 lc •.
à fuo ideato, erít etiam per fe aliquid intelligibile; hoe eft, idea,
será também, por si mesma, algo inteligível; isto é, a ideia, q11;1111., .'1 -.11.1 •"
quoad fuam eIIentiam formalem, poteü eIIe objeetum alterius eITen-
tire objeetivre, & rurfus hree altera eIIentia objeetiva erit etíam in fe sência formal, pode ser objeto de outra essência objetiva, e cst;1 ou11.1 , ...... 11< 1.1
fpectata quid reale, & intelligibile, & fie indefinite. Petrus ex. gr. 20 objetiva, por sua vez, em si mesma considerada, também será al go '"·il • 1111°
eft quid reale ; vera autem idea Petri eft eITentia Petri objectiva, & ligível, e assim indefinidamente. [§34] Pedro, por exemplo, é algo 1... il . 111.1.
in fe quid reale, & omnino diverfum ab ipfo Petro. Cum itaque a ideia verdadeira de Pedro é a essência objetiva de Pedro, em si 111c :; 111.1 .ilr.• •
idea Petri fit quid reale, habens fuam e1Tentiam peeuliarem, erit
real e totalmente diverso do próprio Pedro. E como a ideia de l\:dro ,.. il )',• •
ctiam quid intelligibile, id eft, objectum alterius idere, qure idea
habebit in fe objeetive omne id, quod idea Petri habet formaliter, 25 real, que possui sua essência peculiar, será também algo inteligível. 1.-;10 • .
& rurfus idea, qme eft ide::é Petri, habet iterum fuam eITentiam, objeto de uma outra ideia, ideia que terá objetivamente em si tudo aq11il,•'p1•
qure etiam poteíl: effe objeetum alterius idere, & fie indefinite. a ideia de Pedro tem formalmente; e, por sua vez, a ideia que é da idci.1 'k
Quod quifque poteft experíri, dum videt fe feire, quid fit Petrus, Pedro tem de novo sua essência, a qual também pode ser objeto de ou rr;1 i, 1, ·1.1.
& etiarn feire fe feire, & rurfüs fcit fe feire, quod fcit, &e. Unde e assim indefinidamente. O que qualquer um pode experimentar qu;111dn v· ·
eonftat, quôd, ut intelligatur e1Tentia Petri, non fit neee1Te 30
que sabe o que é Pedro e também que sabe que sabe, e mais uma vez sahc q w
k Per vim nativam intelligo ill11d, quod in nobis à caufis externis non ca11fatu{, quodqut po/tea sabe que sabe, etc. Donde consta que, para que se intelija a essência de Pnlr1"
in m eâ Philofophiâ explicabimus. \
1 Iifr vocantur opera: in meâ Philofophiâ, quid fint, explicabitur.
não é necessário
m Nota, qui>d híc non tantum curabimus oftendere id, quod modo dixi, fed etiam nos hucufque
recte />roceffi/ /e, & f im ui alia fcilu vai de 1Zeceffaria.

k Por força nativa intelijo aquilo que em nós não é causado por causas externa>) o 'flli' d1'f'''''

explicaremos em minha Filosofia.


1 Aqui são chamadas "obras"; em minha Filosofia será explicado o que sejam.
m Nota que aqui não cuidaremos somente de mostrar isto que acabo de dizei~ mas tamf"'1111/ll•
nós, até ag ora, prosseguimos retamente, e ao mesmo tempo outras coisas muito neces.dri.r< ,/,.

saber.

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1111•·111'.il .1111 <'•1•11.11. 1•• .• •1. 1· . •1.... ,. 11111i111111< ' 1111~.. 11d1 ·1.11l.1 i1k1.1 d, · 1·, ·,11 .. . "
ipL1111 idl'a111 Pctri i11tdligcrc, & multo mi nus idc:m1 idc:J'. l'ctri;
quo<l idem dt, ac li diccrem, non effe opus, ut fciam, quôd
fciam me feire, & multo minus efie opus feire, quôd fciam me
feire; non magis, quàm ad intelligendam efTentiam trianguli
5 opus fit e1Tentiam circuli º intelligere. Sed contrarium datur in
1 q1w "' º 111 L·s1110 q1w .li·l l' 1 'l"'·· l'·'r.1 q1n· n1 s.1il1.1,11.10 ( 111i.s1t·1q11,· 1·11 :;.1il1.1 'I" '
:;e i, e 11111ito menos t 111 is1n s:i licr que sei que sei , 11 ;io 111 :1 is d11 '11 ''. 1''' r.1 i1111 ·l q', 11
'' essê nc ia do t riâ ngulo é. mi st <..: r "intdigir a <..:ssl: 111.: ia do d rn1 lo. f\il.i.s •" '• ' '111
trário que se d á n essas id eias. Pois, para que eu saiba qu<..: s<..:i, 11 n Ts.s;1 ri .111w111'
his ideis. Nam ut fciam me feire, neceITariô debeo prius feire. devo primeiro saber. [§35] D aqui fica p at ente que a cnt<..:za 1wh (: .tl,'·111 'l.1
Hinc patet, quôd certitudo nihil fit prreter ipfam eITentiam obje- própria essência obj etiva ; isto é, o modo pelo qual sentimos a essl'·1H·i.1 f, 11111.11
ctivam; id eft, modus, quo fentimus eITentiam formalem, eft é. a própria certeza. Donde, de n ovo, fica patente que para a cerh·1.a d .1 v1 ·1'l.1
ipfa certitudo. Unde iterum patet, quôd ad certitudinem verita- d e não é mister nenhum outro signo senão ter uma ideia vnda1kir:1. 1'.. 1-. .
10 tis nullo alio figno fit opus, quàm veram habere ideam: Nam,
co mo mostramos, não é mister, para que eu saiba, que eu saiba q1 w s<·i. 1: .1
uti ofteridimus, non opus eft, ut fciam, quôd fciam me feire.
Ex quibus rurfUm patet, neminem poITe feire, quid fit fumma p artir disso , m ais uma vez, fic a p at ente que ninguém pode saber o q11c ·;q .1 .1
certitudo, nifi qui habet adrequatam ideam, aut e1Tentiam obje- suma certeza a não ser quem t em uma ideia ad equada ou essêná1 ohj 1· 1i v.1,1.
ctivam alicujus rei; nimirum, quia idem eft certitudo, & eITen- alguma co isa; é claro, porque são o m esmo a certeza e a essê11•Í ;1 nl>í1 ·11 1".1
15 tia objectiva. Cum itaque veritas nullo egeat figno, fed fufficiat [§36] Consequentem ente, como a verdade não exige signo al g u111, 1n.1 :: ,· ·;1111
habere effentias rerum objectivas, aut, quod idem eft, ideas, ut ciente ter as essências o bjetivas d as coisas ou, o que é o mesmo, as i.l .. i.1 \ . 11.11.1
omne tollatur dubium, hinc fequitur, quôd vera non eft Metho-
que se elimine roda dúvida, segue-se disso que o verdadeiro l'vkt<"I" 11 .1.. '
dus fignum veritatis qu::erere poft acquifüionem idearum, fed
quôd vera Methodus eft via, ut ipfa veritas, aut eITentire objecti- buscar um signo da verdad e d ep o is d a aquisição d as ideias , mas qw " vn' l.1
20 vre rerum, aut ide::e (omnia illa idem fignificant) debito ordine d eiro Método é a via para que a própria verdade, ou as essências olij .. 1iv.1 -. 'l.1 ·.
º qu::erantur. Rurfüs Methodus nece1Tariô debet Ioqui de Ratio- co isas, ou as ideias (tudo isso significa o m esmo), sej am busud :1s "11.1 d, 1· 1· l.1
cinatione, aut de intellectione; id eft, Methodus non eft ipfum ordem. [§37] O M étodo, ainda uma vez, necessariamente d <..:vc hl.11 .111 H .1
ratiocinari ad intelligendum caufas rerum, & multo minus eft
"º intelligere caufas rerum; fed eft intelligere, quid fit vera idea, ciocínio ou d a intelecção , isto é, o M étodo não é o próprio racim i11.11 !'·" .1
inteligir as causas das coisas, e muito meno s é < 1:0> o [próp rio! i1lld11'.11 ·' "
25 eam à creteris perceptionibus diftinguendo , ejufque naturam in-
veftigando, ut inde noftram intelligendi potentiam nofcamus, causas das coisas, m as é inteligir o que seja uma ideia verdadeira, di sti11g11i11• 1, • .1
& mentem ità cohibeamus, ut ad illam normam omnia intelli- d as demais percepções e investigando sua n atureza, p ara que daí conhn .111111 -. 1

gat, qure funt intelligenda; tradendo, tanquam auxilia, certas nossa potência de inteligir e assim coibamos a mente p ara que eh i111..I i1.1
regulas, & etiam faeiendo, ne mens inu tilibus defa tigetur. U n-
conforme aquela norma to d as as coisas que são a inteligir, trazendo '0111"
30 de colligitur, Methodum nihil aliud efTe, nifi cognitionem refie-
aux ílios regras certas e t ambém fazendo com que a mente não se fati g ue '' "11
n Nota , quiJd hic non inquirimus, quomodo prima ef/entia objectiva nobis innata fit. Nam
inutilidades. [§38] D o nde se colige que o Método n ada m ais é que o rn11l11
id pertinet ad inveftigationem natura, ubi hac fufius explicantur, & fimul o/f.(,nditur, quàd
prater ideam nulla datur alfirmatio, neque negatio, neque ulla voluntas. \ cimento reflexivo
0 Quid quarere in anima fit, explicatur in med PhilofopMd.

n Nota que aqui não inquirimos de que modo a primeira essência objetiva é inatti m1. 111i.1. / ,/ ,, .
a
com efeito, pertence investigação da Natureza, na qual serão explicadas essas mi.1,i.1 m.111
dilatadamente e, ao mesmo tempo, será mostrado que, afora a ideia, não se dd ,ij/n11.i, .1, •
nem n egação alguma, nem qualquer vontade.
0 O que seja buscar na alma, será explicado em minha Filosofia.

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x1v;1111, :1111.
• lct ur
ufc·a111 iclC";c; & quia 11011 datur idca irka-, uifi prit1s
idc·a, 1Tgu Mcthudus 11ou dabitur, nifi prius dctur idca.
1l11cle ilia hona crit Methodus, qme oíl:endit, quomodc) mens di-
r; 1111 id .. i.r d.1 i,ki.1; ,. l'"r'flll' 11.111 o;" d.'1 idl'i.1 d.1 idl'i.1 ;1 11;10 sn que l'ri111ciro se
,Lir:í, portalllll, Método, a 1úo ser que primeiro se dê
d," 11111;1 idl'ia, 11;10 se
1>onde scr~'1 um bom Método aquele que mostra de que modo a
rig1·11da fit ad data~ vene idere normam. Porrõ cum ratio, qure eíl:
~ 11111a i<kia.
111rntc há de ser dirigida conforme a norma de uma ideia verdadeira dada.
i11tc-r duas ideas, fit eadem cum ratione, qure eft inter elfentias s
lonnales idearum illarum, inde fequitur, quõd cognitio reflexi- Ademais, como a razão que há entre duas ideias é a mesma que a razão que
v:1, qua~ cíl: idere Entis perfectiffimi, prreftantior erit cognitione re- há entre as essências formais daquelas ideias, segue-se daí que o conhecimen-
lkxiva c:eterarum idearum; hoc eft, perfectiffima ea erit Metho- to reflexivo que é da ideia do Ente perfeitíssimo será superior ao conhecimento
dw;, qure ad datre idere Entis perfectiffimi nonnam ofiendit, reflexivo das demais ideias; isto é, será perfeitíssimo o Método que mostra de
q1unnodõ mens fit dirigenda. 10
que modo a mente há de ser dirigida conforme a norma da ideia dada do Ente
Ex his facile intelligitur, quomodõ mens, p1ura intelligendo,
perfeitíssimo.
:dia fimul acquirat infirumenta, quibus facilius pergat intelligere.
Narn, ut ex dictis licet colligere, debet ante omnia in nobis [§39] A partir disso facilmente se intelige de que modo a mente, inteli-
n;iftere vera idea, tanquam innatum infirumentum, quâ intellectâ gindo mais coisas, simultaneamente adquire outros instrumentos, pelos quais
i11ti-Jligatur fimul differentia, qure eft inter talem perceptionem, 15 mais facilmente prossegue a inteligir. Pois, como é lícito coligir do que foi
,'\: c:eteras omnes. Quâ in re confifiit una Methodi pars. Et dito, deve existir em nós, antes de tudo, como um instrumento inato, uma
c·[1m per fe clarum fit, mentem eõ melius fe intelligere, quõ plura
ideia verdadeira, que, sendo inteligida, simultaneamente [faz com que] se
de: Naturâ intelligit, inde confiat, hanc Methodi partem eõ per-
intelija a diferença que há entre tal percepção e todas as outras. E é em tal
kctiorem fore, quõ mens plura intelligit, & tum fore perfectiffi-
mam, cum mens ad cognitionem Entis perfectiffimi attendit, 20 coisa que consiste uma parte do Método. E como é claro por si que a mente
fivc reflectit. Deinde, quõ plura mens novit, eõ melius & fuas tanto melhor se intelige quanto mais intelige da Natureza, consta daí que tal
vires, & ordinem Naturre intelligit: quõ autem melius fuas vires parte do Método haverá de ser tão mais perfeita quanto mais coisas a mente
iutelligit, ec) faci1ius poteft feipfam dirigere, & regulas fibi pro- inteligir, e haverá de ser, então, perfeitíssima quando a mente atentar ou re-
ponere; & quõ melius ordinem Naturre intelligit, eõ facilius poteft
fletir sobre o conhecimento do Ente perfeitíssimo. [§40] Consequentemente,
fc ab inutilibus cohibere; in quibus tota confiftit Methodus, ut~ 25
quanto mais coisas a mente conhece, tanto melhor intelige também suas
diximus. Adde quõd idea eodem modo fe habet objective, ac
iplius ideatum fe habet realiter. Si ergo daretur aliquid in Naturâ, forças e a ordem da Natureza; mas, quanto melhor intelige suas forças, tanto
Hihil commercii habens cum aliis rebus, ejus etiam fi daretur mais facilmente pode dirigir a si mesma e propor regras para si; e quanto
c:ffentia objectiva, qure convenire omninõ deberet cum forma1i, melhor intelige a ordem da Natureza, tanto mais facilmente pode coibir-se
nihil etiam P commercii haberet cum aliis ideis, id eft, nihil 30 de inutilidades, no que consiste todo o Método, como dissemos.
de ipfâ poterimus <verstaan noch) concludere; & contrà, qure habent
[§41] Acrescente-se que a ideia comporta-se objetivamente do mesmo
commercium cum aliis rebus, uti funt omnia, qme in Naturâ exi-
lhmt, intelligentur, & ipforum etiam elfentire objectiv::e idenr-ha- modo que o próprio ideado comporta-se realmente. Se, portanto, na Natu-
licbunt commercium, id eft, alire idere ex eis deducentur, qure reza se desse algo que não tem comércio algum com outras coisas, e se disso
também se desse uma essência objetiva, que devesse convir totalmente com a
1' Commercium habere cum aliis rebus eft produd ab aliis, aul alia producere.
formal, [então J nenhum Pcomércio tampouco ela teria com outras ideias, isto
é, nada poderíamos concluir <nem inteligir> dela; e inversamente, aquelas
[coisas] que têm comércio com outras coisas, como são rodas as que existem
na Natureza, serão inteligidas e também suas essências objetivas terão o mes-
mo comércio, isto é, outras ideias serão deduzidas a partir delas, as quais,

P Ter comércio com outras coisas é ser produzido por outras ou outras produzir.

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. .
~ - ~ ~ -· - - ·
,, ,k 11uvo, 1c1.10 «•111'·· 11111 «•t11111111.1.-;;" ,1<;-;i111 , ' t<' ~·' "11111'. it1 '. tt1111w11l<>'o 1"11.1
itcrum hahcbuut comnwrcium cum aliis, & Jic inflrumcnta, ad proccdn 111ais ;1dia11l<'. Fr.1 11 q11c 11os ,-sl~>t\·.'1 v.1111os c111 dn11011 s11.11. 1~·1.'.I
proccdendum ulterii.ts, crefcent. Quod conabamur demoníl:rare. /\dnn:1is , a partir disso que dissemos por t'tlti1110. a salll'r. 'l"" .1 i,ln.1 dn···
Porrõ ex hoc ultimo, quod diximus, fcilicet quôd idea omninô convir totalmente com sua essl:ncia (orrnal , fa:r. se patente. 111;1 is 11111.1 vn, '1"' .
cum fuâ eJTentiâ formali d.ebeat convenire, patet iterum,
para que a mente reproduza totalmente o modelo da Nallll'l''l.a, deve P" ><111111
s quõd, ut mens noftra omninô referat Naturre exemplar, debeat
omnes fuas ideas producere ab eâ, qure refert originem, & fon- rodas as suas ideias a partir daquela que reproduz a origem e a ((,111c d.1 N.1
tem totius Naturre, ut ipfa etiam fit fons creterarum idearum. rureza inteira, para que ela também seja a fonte das d<.:mais ideias.
Hic forte aliquis mirabitur, quôd nos, ubi diximus, bonam [§43) Aqui talvez alguém se admire de que, quando dissemos que" liu1n
Methodum eam efie, qure oftendit, quomodõ mens fit dirigenda Método é aquele que mostra de que modo a mente hi de st.:r dirigida' otil 01
10 ad datre verre idere normam, hoc ratiocinando probemus: id quod
me a norma de uma ideia verdadeira dada, tenhamos provado isso raci•>< i11.111
oftendere videtur, hoc per fe non eITe notum. Atque adeô qureri
poteft, utrum nos bene ratiocinemur? Si bene ratiocinamur, de- do, o que parece mostrar que isso não é conhecido por si mesmo. 1:. \ 1:1l tH 'S \• 1.1 \
bemus incipere à datâ ideâ, & curo incipere à datâ ideâ egeat de- pode perguntar, tanto mais, se nós raciocinamos bem. St.: racioci11a111u.·; lll'111,
moníl:ratione, deberemus iterum. noftrum ratiocinium probare, devemos começar de uma ideia dada, e como começar de 11111.1 idci.1 ,l.11!.1
15 & tum iterum illud alterum, & fie in infinitum. Sed ad hoc re-
exige demonstração, deveríamos, de novo, provar nosso r:1ciod11iu " · n1L111 ,
fpondeo: quôd fi quis fato quodam fie proceffiITet, Naturam in-
vefügando, fcilicet ad datre verre idere normam alias acquirendo de novo, este outro, e assim ao infinito. [§44] Mas a isto rcspo11d<> 'I"'" "'
ideas debito ordine, nunquam de fuâ veritate q dubitafiet, eô quôd alguém, por algum acaso, prosseguisse da seguinte 111a11cira ,10 111v1 ",1q•,. 11 .1
veritas, uti oftendimus, fe ipfam patefacit, & etiam fponte omnia Natureza, a saber, adquirindo, conforme a norma de 11111;1 i< ki.1 v• '' l.111. 11.1
1
20 ipfi affluxi1Tent. Sed quia hoc nunquam, aut raro contingit, ideô dada, outras ideias na devida ordem, ele nunca duvidari;1 'k ... 11 .1 ,.,." l.11 I• ' 1.1
coactus fui illa fie ponere, ut illud, quod non po1Tumus fato, que a verdade, como mostramos, a si mesma manifesta "111do 1.1111111111 111•
prremeditato tamen confilio acquiramus, & fimul, ut appareret,
afluiria espontanean1ente. Mas, porque isso nunca ou r;ir;1111c11t ,. .1• ••111 • • • , l 111
ad probandam veritatem, & bonum ratiocinium, nullis nos ege-
re inftrumentis, nifi ipfâ veritate, & bono ratiocinio: Nam bo- destarte coagido a pôr as coisas assim, para que aquilo LJll" 11.1" I'"' k' """ I" •1
25 num ratiocinium bene ratiocinando comprobavi, & adhuc pro- acaso, adquiramos, porém, por um plano premeditado, L' si1111tlt.11ll .1111• til•
bare conor. Adde, quôd etiam hoc modo homines aJTuefiant me- para que aparecesse que, para provar a verdade e o bom raciod 11 io. 11.1" 1111·. •
ditationibus fuis internis. Ratio autem, cur in Naturre inquifitio-
exigido instrumento algum senão a própria verdade e o bom ra' i<" i 11 i• >. I'• ""
ne raro contingat, ut debito ordine ea inveftigetur, eft propter
o bom raciocínio eu comprovei bem raciocinando, que é corno ai11d.1 .11'.111.1
prrejudicia, quorum caufas poftea in noftrâ Philofophiâ explicabi-
30 mus. Deinde quia opus eft magnâ, & accuratâ diftinctione, ficut me esforço em provar. [§45] Adicione-se também que, desse modo, os lio111<·11 "
poftea oftendemus; id quod valde eft laboriofum. Denique pro- se acostumam às suas meditações internas. Entretanto, a razão pela q11.1I, 11.1
pter ftatum rerum humanarum, qui, ut jam oftenfum eft, pror- inquirição da Natureza, raramente acontece que ela seja investigada 11;1 d cv i•l.1
fus eft mutabilis. Sunt adhuc alire rationes, quas non inquiri-
ordem, encontra-se nos prejulgamentos, cujas causas depois explicarc111os ""'
mus.
nossa Filosofia. Em seguida, como também mostraremos depois, porq 111 · •"
q Sicut etiam htc non dubitamus de no/trd veritate. -~......
mister uma grande e acurada distinção, o que é muito laborioso. Final111c111<,
por causa do estado das coisas humanas, o qual, como já está mosLr;1do. i
inteiramente murável. Há aqui outras razões, sobre as quais não inquiri tT 11 ,, '" -

q Assim, também aqui não duvidamos de nossa verdade.

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l§ ·l(ll S1· .tl)',111··111 t.ilVl'/ 1•«1)',11111.11 . \H>I '\li<' 1·11 1111"·111<1 llll>',111 .I 11111 .11.1
Si quis forll''. q11a'.r;1t, cur ipfc 1latim ante onmia veritatcs 1.111w11tc, .111tt·s de lll<lo, .1s v<" rd.1d!' s ,l.1 N.1t11n·1.. 111«~.t.1111d .. 111, 1.'1 'I"" .1 \'11tl.1
Natura: ilto ordine oíl:enderim: nam veritas fe ipfam patefacit '( Ei 'k ;1si t lll' S I 11 ;1 111~11li1 ~:SLI '! /\ dc l'l' Sl'Ot ldo, (' si11111 lt.11 H".l l lll'l lt" .1d Vi ti"' ., 111 · 11.I<'
refpondeo, fimulque moneo, ne propter Paradoxa, qme forte paf-
qu eir;i rejei rar essas coisas como falsas por ca11s:1 do s p:1t':lllo xos ')til' 1'"1'"11
fim occurrent, ea velit tanquam falfa rejicere; fed prius dignetur
ordinem confiderare, quo ea probemus, & tum certus evadet, tura ocorrerào aqui e ali, mas que primeiro se dig11c consi,ln.1r .1 .. 11k111 I" l.1
nos verum afTequutos fuiffe, & hrec fuit caufa, cur hrec prremí- qual as provamos, e então ele sairá certo de que nós seguimos o vcnl.1,ln111 I·
ferim. essa foi a causa pela qual estabeleci previamenti.: ess;1s cois;1s.
Si poftea forte quis Scepticus & de ipfâ primâ veritate, & de [§47) E se, depois disso, talvez algum Cético ainda ;1ssi1n pt·1111.1111 •, 1
omnibus, quas ad normam primre deducemus, dubius adhuc ma-
em dúvida, tanto acerca da própria primeira verdade quanlo ;HTl'l .1 (k 1rn l.1 ·.
neret, ille profecto aut contra confcientiam loquetur, aut nos fa- 10
tebimur, dari homines penitus etiam animo occrecatos à natívitate, as que deduziremos conforme a norma da primeira, ou d e d~:ti v.11111· 1111· l.11.1
aut à prrejudiciorum caufâ, id eft, aliquo externo cafu. Nam ne- contra a consciência, ou nós confessaremos h aver homens prol111Hl.1111"1111
que feipfos fentiunt; fi aliquid affirmant, ve1 dubitant, nefciunt fe cegados também no ânimo, de nascença ou por causa dos pt'l"j11lg.11111 ·11111".
dubitare, aut affirmare: dicunt fe nihil feire; & hoc ipfum, quod isto é, por algum acaso externo. Com efeito, sequer selllcl\l ,, si 11 wo;11111" "1
nihil fciunt, dicunt fe ignorare; neque hoc abfolute dicunt: nam 15
afirmam ou duvidam de algo, não sabem que estão a duvidar <>li .tlirn1.11 ; .1111 111
metuunt. fateri, [e exiftere, quamdiu nihil fciunt; adeo ut tan-
dem debeant obmutefcere, ne forte aliquid fupponant, quod ve- que nada sabem; e isso mesmo, que nada sabem, dizem q11" i)','""·1111; 1 '" 111
ritatem redoleat. Denique cum ipfis non eft loquendum de fcien- isso dizem absolutamente, pois têm medo de confessar q11t· n ,.,, .. 111' 11< p1.1111 ..
tiis: nam quod ad vitre, & focietatis ufum attinet, neceffitas eos nada sabem; a tal ponto que, finalm ente, devem cmudn n . 11.11.1 q111 . I ''" 1 ' 11
coegit, ut fupponerent, fe _efTe, & ut fuum utile qmererent, & 20 tura, não suponham algo que recenda a verdade. [§4 81Ftdi111.11 .10111 'I"' .•
jurejurando multa affirmarent, & negarent. Nam, fi aliquid ípfis falar com eles de ciências, pois, no atinente ao uso d;1 vid.1 " .l .1 ··'" 11 'l.11 I•
probetur, nefciunt, an probet, aut deficiat argumentatio. Si ne-
n ecessidade os coagiu a supor que são, a buscar o que lhcs "' 1'11 ti , .1 .ti 11111 11
gant, concedunt, aut opponunt; nefcíunt fe negare, concedere,
aut opponere; adeoque habendi funt tanquam automata, qure negar muitas coisas com juramento. Pois, se algo lhes(: pr .. v.1•1" . 11.1 •' .. ..1.. '"
mente omnino carent. 25 se a argumentação prova ou se é defeituosa. Se negam,. ronn·d .. 111 "" "' • '1"" 111
Refumamus jam noftrum propofitum. Habuimu;; hucufque não sabem que estão a negar, conceder ou se opor; a tal po111" q111 l 1.1< • '1, " 1
primo finem, ad quem omnes noftras cogitationes dirigere ftude-
tidos como autômatos que carecem por completo de mente.
mus. Cognovimus fecundo, qurenam fit optima perceptio, cujus
(§49) Resumamos agora nosso propósito. Até aqui tivc1110.o;, <" 111 I" 1111• 1
ope ad noíl:ram perfectionem pervenire poffimus. Cognovimus
tertio, qurenam fit prima via, cui mens infiftere debeat, ut bene 30 ro lugar, o fim para o qual nos empenhamos em dirigir rodos os """'·" " I" "
incípiat; qure eíl:, ut ad normam datre cujuscunque verre idere per- sarnentos. Em segundo lugar, conhecemos qual seja a melhor P"'' q ", .11 •. I""
gat, certis legibus inquirere. Quod ut recte fiat, hrec debet Me- cujo recurso podemos chegar à nossa perfeição. Conhecemos, ,·111 11 11' 11 •
thodus prreftare: Primo veram ideam à creteris omnibus perceptio- lugar, qual a via primeira em que a mente deve insistir para bcn1c11111t'<,.11.•111 .
nibus diilinguere, & mentem à creteris perceptionibus cohibere.
seja, inquirir com leis certas para que prossiga conforme a norma de q11.tl• t"'
Secundo tradere regulas, ut res incognitre ad talem normam perci- 35
ideia verdadeira dada. E para que isso se faça retamente, o método 1ln·1 .
prestar às seguintes coisas: primeiro, distinguir a ideia verdadeira de t •" l.1 "
\ demais percepções e coibir a mente de tais p ercepções. Segundo, tra 1.n '' 1»1.
para que coisas desconhecidas sejam p ercebidas conforme aquela nDrnt. 1.

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' l~· n cHll. ,. úl1111111 , '1111:;1111111 11111.1 u1<ln11 11.11.1 11.1" 1111:. l.111)',·1111111'.
piautur. Tcrtii'> (en < ~ inddijk > ordiuem confütucre, ne inutilibus ( ()ll\ i11111ilid ;Hks. 1 >qH>t :; ')IH' (\ltilll'<"l'lll<>S l'SSl' fv\(·11HI<> . vi111<>S , 1·111 q11.lllll
defatigemur. PoHquam hanc Methodum novimus, vidimus quarto l11gar, que r;i\ rnérodo sn:1 pcrfcidssi1110 q11a11do 1ivn1nos ;1 i1ki.1 ,\., F1111 ·
hanc Methodum perfectiffimam futuram, ubi habuerimus ideam pl'l+l:idssimo. Desde o início, portanto, isto havL·r:1 de ser 111:1;; i111.1111c11t .- •.ti
Entis perfectiffimi. Unde initio illud erit maxime obfervandum, scrvado, para que cheguemos, o mais rápido, ao conhcci111c1110 dl' 1;.l l'11tc.
s ut quanto ocius ad cognitionem talis Entis perveniamus. (§50) Iniciemos, assim, pela primeira parte do Método. q11,· (·. • """'
lncipiamus itaque à primâ parte Methodi, qu<E eft, uti diximus, dissemos, distinguir e separar a ideia verdadeira das demais pcl'l'l'\l\"n •
diftinguere, & feparare ideam veram à creteris perceptionibus, & co-
coibir a mente para que não confunda as falsas, fictícias e dúbias l'o111 .1s v1 ·1
hibere mentem, ne falfas, fictas, & dubias cum veris confundat:
quod utcunque fufe hic explicare animus eft, ut Lectores detineam dadeiras, o que, em todo caso, é [minha) intenção explicar aqui, dibt.1.l.11111·11
10 in cogitatione rei adeo nece1Iarire, & etiam, q~ia multi funt, qui vel te, para que os Leitores se detenham no pensamento de coisa úo ncn·ss.'1ri.1 ,
de veris dubitant ex eo, quôd non attenderunt ad dillinctionem, e também porque há muitos que duvidam até mesmo das [ideias\ vcnl.idcit .1·.,
qure eft inter veram perceptionem, & alias omnes. Adeo ut fmt vel- pelo fato de que não atentaram à distinção que há entre a pc1n·p\;1u vc11l.1
uti homines, qui, cum vigilarent, non dubitabant fe vigilare; fed deira e todas as outras. A tal ponto que são assim como homens q11l·, q11.1111l11
poíl:quam femel in fomniis, ut Crepe fit, putârunt fe certo vigilare,
15 quod poftea falfum c1Ie reperiebant, etiam de fuis vigiliis dubitarunt:
estavam em vigília, não duvidavam de sua vigília, mas depois qtll' . 11111.1 vn.
quod contingit, quia nunquam distinxerunt inter fomnum, & vigili- em sonhos, como muitas vezes se faz, julgaram que certanK111c cst.1v.1111 1·111
am. Interim moneo, me hlc effentiam uniuscujufque perceptionis, vigília, o que em seguida reconheceram ser falso, duvithra111 1;1111ht'·111 .i, "11.1"
eamque per proximam fuam caufam non explicaturum, quia hoc vigílias; o que acontece porque nunca distinguiram enttT so110 ,. vi1".íl i.1 1~">1 I
ad Philofophiam pertinet, fed tantum traditurum id, quod Metho- Entrementes, advirto que aqui não explicarei a essência de' .111.1 \' .. " • \",.1• '·
20 dus poftulat, id est, circa qure perceptio ficta, falfa, & dubia verfe-
nem a [explicarei) por sua causa próxima, porque isso pnll'll«. :1 i :it""' .!1.1.
tur, & quomodô ah unâquâque liberabimur. Sit itaque prima
inquifitio circa ideam fictam. mas apenas trarei aquilo que pede o Método, isto é, versarei ;1ffn .1, l.1 \" " ' I'
Cum omnis perceptio fit vel rei, tanquam exifientis confidera- ção fictícia, falsa e dúbia e do modo de nos libertamos de l;1d .1 11111.1 ',. 11.
tre, vel folius eíl'entire, & frequentiores fictiones contingant circa assim, acerca da ideia fictícia a primeira inquirição.
25 res, tanquam exiftentes, confideratas, ideô prius de hâc loquar; (§52] Como toda percepção ou é da coisa considerada lº'''º n1 .. 111111
fcilicet ubi fola exiftentia fingitur, & res, qure in tali actu fingitur, ou da essência tão somente, e as mais frequentes ficções acontt:lc111 ;11 ,., , .1 •l.1"
intelligitur, five fupponitur intelligi. Ex. gr. fingo Petrum, quem coisas consideradas como existentes, falarei, assim, primeiramc11ll' 1k·.1.1" .. 1
novi, ire domum, eum me invifere, & r fimilia . Hic qurero, circa
saber, quando só a existência é fingida e a coisa, que em tal ato se li 11 1·;·. ,· 111
qure talis idea verfetur? Vídeo eam tantilm verfari circa poffibilia,
30 non ver<'> circa nece1Iaria, neque circa impoffibilia. Rem impoffibilem teligida ou se supõe ser inteligida. Por exemplo: finjo que Pedro, que' 01111, ·
voco, cujus natura (in exiftendo> implicat contradictionem, ut ea ço, vai para casa, vem visitar-me, e 'coisas semelhantes. Aqui pergu 11 to: .1• n
exiftat; neceITariam, cujus natura implicat contradictionem, ut ca do que versa tal ideia? Vejo que ela versa somente acerca de coisas \H issí v1 ·1·.,

r Vide ulterius id, quod de hypothe/ibus notabimus, quce à nobis ,zare intelliguntur; /ed in mas não, em verdade, acerca de necessárias nem acerca de impossíveis. \ §<:; 1 ~
eo e/t /i&tio, quad dicamus, eas tales in corporibus cfE!le/tibus exi/tere. Chamo de coisa impossível aquela cuja natureza implica contradiç:lo par.1 qw
ela exista; necessária, aquela cuja natureza implica contradição /para q111 · 'l.1

-·- não exista/;

' Vide adiante o que notaremos sobre as hipóteses, que são por nós claramente peri·,./Jitf,,,: "'·''
nisto consiste a ficção: em dizermos que nos corpos celestes elas existem tais qutlis.

55
54
c·;i 111111 <'xillat; pollil,ik111, l·ujus quid('lll cxifü:11Li;1, ipf:1 fo :1 na- l'"'"·"ívd .. 1q1wl.1, 1q .1, \I" ' ' '" 1.1, l'"l.1 pri'1pri:1 11.1111n ..1.a ,lch, sq.>,11r;1111L'lll L' 1uo
1 ur!l,
11011 i111plicat co11tradi.cti.oucm, ut exiltat, aut nou exiftat, i111plic;1 Lo111r.11li1 .10 1'·11.1 'I"" l' XÍS Ll ou 1úo ex ist;i, mas cuja necessidade ou
1

frd rnju s cxilh:ntia.: ucccffltas, aut impoffibilitas pendet à caufis no- i1nposs ihilid :1dl' de ex is1i·11 cia depende de causas po r nós ignoradas enquanto
his ig110tis , quamdiu ipfius exiíl:entiam fingimus; ideoque fi li11gimos sua ex istê11ci a; por isso, se sua necess idade ou impossibilidade, que
iplius ncccffitas, aut impoffibilitas , qu::e à caufis externis pendet,
depende de causas externas, nos fosse conhecida, também a respeito dela nada
11obis efict nota, nihil etiam de eâ potuifiemus fingere. Unde fe-
ttuitur, fi detur aliquis Deus, aut omnifcium quid, nihil prorfüs poderíamos fingir. [§54] Donde se segue que, se fo r dado algum Deus ou algo
cum poffe fingere. Nam, quod ad Nos attinet, poftquam 9 novi de onisciente, absolutamente nada, por sua vez, ele poderá fingir. Pois, no
m e exiíl:ere, non poffum fingere me exiftere, aut non exiftere; atinente a Nós, dep ois que eu 5soube que exist o, não posso fingir que exist o
ll CC etÍam po1Jum fingere e}ephantem, qui tranfeat per aCUS fora- IO ou que não existo ; nem t ampouco posso fingir um elefante que passe pelo
m en; nec po1Tum, poftquam ' na turam Dei novi, fingere eum furo de uma agulha ; nem posso, depois que co nheci a 'natureza de D eus,
exiftentem, aut non exiftentem: idem intelligendum eft de Chi-
fingi-lo existente ou não existente ; e o mesmo há que se inteligir da Quimera,
m:erâ, cujus natura exiftere implica t. Ex quibus patet id, quod
dixi, fcilicet quod fictio, de quâ hic loquimur, non contingit 1
cuja natureza implica [contradição] existir. A partir desses [cx c111pl m l, fic a
circa retemas u verita tes. Sta tim etiam oftendam, quod nulla 15 patente o que eu disse, a saber, que a fic ção de que falamos aqui 11;10 :11011 tece
fictio verfetur circa ::eternas veritates. Sed antequam ulterius acerca de "verdades eternas. E logo a seguir também mostrarei ljlll' 11rnl11111u
pergam, hk obiter notandum eft, quod illa differentia, qure eft ficção versa acerca de verdades eternas. [§55] Mas, antes que cu sig:1 .1,li.1111 L·,
inter effentiam unius rei, & e1Tentiam alterius, ea ipfa fit inter
é de notar aqui, de passagem, que aquela d iferença que há entre a cso,n1< i.1d"
actualitatem, aut exiftentiam ejufdem rei, & inter actualitatem,
aut exiíl:entiam alterius rei . Adeo ut fi exiftentiam ex. gr. 20 uma coisa e a essência de outra é a mesma que há entre a atualidad" 1111 ' " "
Adami tantum per generalem exiftentiam conciper e velimus, t ência dessa coisa e a atualidade ou exist ência d aquela outra coisa. /\ 1.1 I I" 111
idem futurum fit, ac fi, a d concipiendam ipfius e1Tentiam, ad to que, se quisermos conceber a exist ência, por exemplo, de Adao , .qu·11.1·.
na turam entis attendamus, ut ta ndem definiamus, Adamum através da existência geral, será o mesmo que se, para conceber a essl-111 i.1'i..t • .
erre ens. !taque quô exiftentia generalius concipitur, eõ etiam atentarmos à natureza do ente, para, por fim , definirmo s que Adão <.- L·1111 ·. I'• ''
confufius concipitur, faciliusque unicuique rei poteft affingi: 25
econtra, ubi particularius concipitur, clarius tum intelligitur, & conseguinte, quanto mais geralmente se co ncebe a existência, assim 1;111d1<"111
mais confusamente ela é concebida, e mais fac il mente pode ser fi11gid:1 <' 111
• Quia res, modo ea intelligatur, /e íp/am manife/tat, ideà tantum egemus exemplo fine alid qualquer coisa ; pelo contrário, quando é co ncebida mais particulan11rn 11 ·.
demon/tratione. ldemque erit hujus contradictoria, quce ut appareat e//e /alfa, tantum
opus recen/eri, uti ftatim apparebit, quum de fíctione circa e//entiam loquemur. mais claramente, então, é inteligida, e
t Nota. Quamvis multi dicant /e dubitare, an Deus exi/tat, illos tamen nihil prceter nomen
habere, vel aliquid /ingere, quod Deum vocant : id quod rnm Dei naturd non convenit, ui
po/tea /uo loco o/tendam.
u Per aternam veritatem talem intelligo, quce, fi e/t af/irmativa, nunquam polerit e//e negativa.
Sic prima, & ceterna veritas eft, Deum efíe, non autem e/t celerna verilas, Adamum
cogitare. Chimreram non eííe, eft ceter11a veritas, non autem, Adamum non cogitare.
' Porque o assunto, tão logo seja inteligido, manifesta a si mesmo, precisamos, por isso, ,1111·11. 11
de um exemplo, sem outra demonstração. E o mesmo será de sua contraditória, a tjtüd, /'"';'
que apareça como falsa, é mister tão somente que seja recenseada, como imediizt,11111·111<'
aparecerá quando falarmos da ficção acerca da essência.
' Nota que, embora muitos digam que duvidam que Deus exista, eles, contudo, 11 ,/fl.1
··------- possuem senão um nome, ou fingem algo que chamam Deus: o que não convém mJ11"
natureza de Deus, como depois mostrarei em seu devido lugar.
u Por verdade eterna intelijo uma tal que, se é afirmativa, nunca poderá ser ru;<!,11li1•.1.

Assim, a primeira e eterna verdade é "D eus é"; não é, porém, uma verdade etenttZ ·:U.111
pensa''. "A Quimera não é" é uma verdade eterna, não, porém, "Adão não pem11 ·:

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57
Ili.li~; ,ltli< j\11Kllll" ,·. !ill)',l1l.1 <' Ili .il!'," .1 1\.1<1 S\'I 11.I \'1 .'11 >1'1 .I 1 <>l~ .. I . q11.1111lo li.Ili
.11c11LllllOS :1 onk111 d.1N.111110.. 1. \)que\- di)',110 de sn 11ot.lll<>.
difficili1'1s alirni, uili rei ipli, uhi non attendimus ad Naturre
1§56\ ( '. urnprc ;1t,or;1 considerar ;1q11i as sct,ui11tcs t'ois:1s: ;1s q1w v1il)•,.11
ordinem, affingitur. Quocl notatu clignum eíl:.
Veniunt jam hk ea confiderancla, qure vulgo dicuntur fingi, 111c1Hc se di:r. st:n.:m tingidas, t:mbora cbr:unentc intdija111os que ;1 «•i.·.. 1 11.111
quamvis dar~ intelligamus, rem ità fefe non habere, uti eam fingi- se comporLt como a fingimos. Por exemplo: embora t:U saiba que .1 '1(·11.1 .'·
s mus. Ex. gr. quamvis fciam terram erre rotunclam, nihil tamen rt:donda, nada, entretanto, veta que eu diga a alguém qut: a '((:rra l: 11111 111c111
vetat, quominus alicui clicam terram meclium globum erre, & globo, assim como meia laranja em um prato, ou que o Sol se rnovc .10 1n\0 1
tanquam medium pomum auriacum in fcutellâ, aut folem circum da Terra, e coisas semelhantes. Se atentamos a elas, nada vert:mos qtK 11.111 sq.1
terram moveri, & fimilia. Acl hrec fi attenclamus, nihil viclebimus,
coerente com o que já foi dito, desde que primeiramente advirtamos qw .d
quod non cohrereat cum jam clictis, modo prius advertamus, nos
10 aliquando potuiífe errare, & jam errorum noíl:rorum effe confcios;
guma vez pudemos errar e que agora estamos cônscios de nossos rrros; n11
deinde quod poffumus fingere, aut ad minimum putare, alios ho- seguida, que podemos fingir, ou pelo menos julgar que outros homrns c•a .10
mines in eoclem eífe errore, aut in eum, ut nos antehac, poífe in- no mesmo erro, ou que, como nós antes disso, nele podem incidir. Isso, ,li1'."·
cidere. Hoc, inquam, fingere poífumus, quamdiu nullam vi- podemos fingir, enquanto não vemos impossibilidade alguma e 11c11·ssid.1d1
demus impoffibilitatem, nullamque neceffitatem: Quando itaque alguma; assim, quando digo a alguém que a Terra não é n.:do11da . 1·11 .. 11.11 \.1
15 alicui clico, terram non eífe rotunclam, &c., nihil aliud ago, quàm
mais faço do que revocar na memória o erro, o qual porvL·111111.1 11v" .. 11
dil~º
in memoriam revoco errorem, quem forte habui, aut in quem
labi potui, & poftea fingo, aut puto eum, cui hoc clico, aclhuc no qual pude cair, e depois finjo ou julgo que aquele a quem i·.·,o .111111.1
erre, aut poITe labi in eundem errorem. Quod, ut dixi, fingo, está ou pode cair no mesmo erro. Isso, como eu disse, finjo cnq11:111t •111.111 '" 1• •
quamdiu nullam vídeo impoffibilitatem, nullamque neceffitatem: impossibilidade alguma e necessidade alguma; mas, em vnd:11k. ·;1· ·'" \ 1011
20 hanc vero fi intellexiITem, nihil prorfüs fingere potuiITem, & tan- vesse inteligido, nada absolutamente eu poderia fingir, t: diri;1 so 11H·1111 •pi•
tum dicendum fuiífet, me aliquid operatum eífe.
Supereíl: jam, ut ea etiam notemus, qure in Qureíl:ionibus fuppo- produzi algo.
(§571 Resta agora que também notemos aquelas coisas que 11;1s \)w·.t •" "
nuntur; id quod paffim etiam contingit circa impoffibilia. Ex. gr.
quum dicimus: fupponamus hanc candelam ardentem jam non ar- são supostas, o que por vezes também acontece a propósito de i111\"'s"il11\1
25 dere, aut fupponamus eam ardere in aliquo fpatio imaginario, five dades. Por exemplo, quando dizemos: "suponhamos que essa vela ardn1t« 11.111
ubi nulla dantur corpora: Quorum fimilia paffim fupponuntur, quam- arde agora, ou a suponhamos arder em algum espaço imaginário 011 11111\..
vis hoc ultimum clare intelligatur impoffibile eífe; fed quando hoc não se dá corpo algum". Supomos, por vezes, coisas semelhantes a css;1s. c111
fit, nil prorfüs fingitur. Nam primo nihil aliud egi, quam quõcl x in hora claramente se intelija que esta última é impossível; mas, quando isso ""
x Po/tea cum de fictione, quce ver/all<r circa e//entias, loquemur, clare apparebit, quàd fictio faz, absolutamente nada é fingido. Pois, no primeiro caso, nada mais li 1. .\o
nunquam aliquid novi facit, aut menli p1·cebet; fed quàd tantum ea, qu<e /uni in cerebro,
aut i1t imaginatione, revocantur ad memoriam, & quàd con/t•/e ad omnia /imul n1cns atten- que x;revocar/
dit. Revocantur ex. gr. in memoriam loque/a, & arbor; & cum mens cott.fu/e attendit fine
di/tinctiont', pulai arborem loqui. Idem de e.~iftentitS Ílttelligitur, prce/ertim, uti diximus
cum adeo generaliler, ac ens, concipitur: quia tum /acile applicatur omnibus, quce /imu
x Depois, quando falarmos da ficção que versa acerca das essências, claramente ap1trl'<'t'1'Í •!""
iu memoritS occurrunt. Quod nolatu valde dignum e/t.
a ficção nunca Jaz ou apresenta amente algo de novo, mas que essas coisas que está o 110 • ' ;' •
bro ou na imaginação são apenas revocadas amem6ria e que a mente atenta em si11111/t.l11<"
a todas confusamente. São revocadas na memória, por exemplo, a fala e a árvore, t' ""///'' .1
mente {a elas] atenta confusamente, sem distinção, julga que a árvore fala . O mesmo /i.i 'Í"'
~ se inteligir da existência, principalmente, como dissemos, quando é concebida tão geriil111m ''"
como ente, porque entãofacilmente é aplicada a tudo que em simultâneo ocorre na 111m11in.1

Isto é muito digno de nota.

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111<·111ori;1111 n·voc;1vi aliam ca11d1·lam 11011 anlentem (aut lia11c t '. a11- \ 11.1 \ llll "lll<', ll.1 <>1111.1 \ ' o l.1 11.I" ·" ' ' ' 11(1· (11111 <>Ili cl11'1 .1'111«1.I llll'",111.I •;1'111.11 l1.1
d!'m rn11ccpi fine flamrnâ), &, quo<l cogito de eâ candelâ, id ipfum 111.1) ,. o que pn1 sn d .1•111· ·1.1 \"l·l.1 , isso 111cs1110 i111..lijo dcsLI , n1q11.1111n 11.111
de hâc intelligo, quamdiu ad flammam non attendo. ln fecundo ;11n1to :1du111a. No sq~ 1111d<> , .1 s11, llada 111ais se fo z do t]llC ahstra ir os pn 1s;111 w11
nihil aliud fit, quàm abfirahere cogitationes à corporibus circumja-
tos dos corpos circunjacelltes, para que a nH.: ntc volva-se apenas p;1r;1 .1 1011
centibus, ut roens fe convertat ad folam candelre, in fe folâ fpecta- s
templação d a vela, considerada em si mesma t ão somente, a flm de qm· dq 111i-.
tre, contemplationem, ut pofl:ea concludat candelam nullam habere
caufam ad fui ipfius defl:ructionem. Adeô ut fi nulla eifent corpora conclua que a vela não possui [em si] causa alguma para sua própria dc~1111 i
circumjacentia, candeia hrec, ac etiam flamma manerent immuta- ção. A tal ponto que, se não houvesse quaisquer corpos circunjacemcs, ª'11w
biles, aut fimilia: N ulla igitur datur hic fictio, fed Y verre, ac la vela, e também a chama, permaneceriam imutáveis; ou coisas semdli;1111«".
merre a!Tertiones. 10
;Í Portanto, não se dá aqui ficção alguma, mas Yverdadeiras meras assc1\<W~.
Tranfeamus jam ad fictiones, qure verfantur circa e!Tentias fo- [§58] Passemos agora às ficções que versam acerca das essência s 1.1"
las, vel cum aliquâ actualitate, five exifientiâ fimul. Circa quas
somente ou simultaneamente com alguma atualidade ou existência . /\n·n .1
hoc maxime venit confiderandum: quàd, quô mens minus intel-
ligit, & tamen plura percipit, eô majorem habeat potentiam fin- delas cumpre maximamente considerar o seguinte: que quanto menos a 11w11
gendi, & quô plura intelligit, eô magis illa potentia diminuatur. 15 te intelige e, no entanto, percebe muitas coisas, tanto maior potência te111 par.1
Eodem ex. gr. modo, quo fuprà vidimus, nos non po!Te fingere, fingir; e quanto mais intelige, tanto mais aquela potência é diminuíd:1. 1'111
quamdiu cogitamus, nos cogitare, & non cogitare, fie etiam, exemplo, do mesmo modo que, como vimos acima, nós não podemos fi11gi1.
pofl:quam novimus naturam corporis, non poffumus fingere muf- enquanto p en samos, que estamos a pensar e a n ão pensar, assim r;111ilH'- 111,
cam infinitam; five poftquam novimus naturam z animre, non
depois que conhecemos a natureza do corpo, não podemos fingir uma 11111·:1 .1
po!Tumus fingere eam eife quadratam, quamvis omnia verbis pof- 20
infinita, ou depois que conhecemos a natureza da "alma, não podemos fi 111'.''
fimus effari. Sed, uti diximus , quà minus homines nôrunt Natu-
ram, eô facilius multa po!Tunt fingere; veluti, arbores loqui, que ela é quadrada, embora possamos dizer todas essas coisas com pal:t v1·'"
homines in momento mutari in lapides, in fontes, apparere in Mas, como dissemos, quanto menos os homen s co nhecem a Naturcz;1, 1;11.11 • •
fpeculis fpectra, nihil fieri aliquid, ctiam Deos in befüas, & ho- mais facilmente podem fingir muitas coisas, tais como, árvores falarem , hrn111 ·11-.
mines mutari, ac infinita ejus generis alia. mudarem num instante em pedras e em fontes, espectro_s apareccren1 1111 \
25
espelhos, o nada fazer-se algo, e também Deuses mudarem em bestas 011 ,·111
Y Idem eliam de hypolhe/ibus inle/ligcnd um, qt<rlJ fiunl ad certos motús ex plicandum, qui
homens, e infinitas outras coisas desse gênero.
conveniunt cum cadorum phamomenis, ni/i quod ex iis, /i motibus C(IJ/eftibu s applicentur,
naturam c(IJ/orum concludant, qu(IJ tamen alia poteft e/fe, prcefertim cum ad explican dum ta-
les motús mu/t(IJ a/i(IJ cauf<E poffint concipi.

z S cepe contingit, hominem hanc vocem ani ma ad /uam memoriam revocare, (?' fimul aliquam
corpoream imaginem /ormare . Cum vero h<Ec duo fimul repr<E/e11tantur, /acile putat /e
Ímagínari, & / i ngere animam corpoream : quia nomen à re ip/a non di/tinguit. lifc po/lulo, Y O mesmo há que se inteligir também das hipóteses, que são feitas para que sejam expfii',fl l1"
ut lectores non /int pr<Ecipites ad hoc re/ulandum, quod, ut /pero, non fa.cient, m odo ad certos movimentos que convêm com os fenômenos celestes; a não ser que a p artir de/11.". (.! " '
exempla quàm accurate a!lendant, & f im ul ad ea, f}U<E fequuntur .
sejam aplicadas aos m ovimentos celestes, se conclua a natureza dos céus, a qual, porbn . /11"/, ·
ser outra, principalmente quando, para explicar tais movimentos, muitas outras caus11s po1!1·111
ser concebidas.
z Muitas vezes acontece que o homem revoca essa palavra "alma" para sua memória l' si11111!
taneamente forma alg uma imagem corpórea. M as, em verdade, como essas duas s1io 1·1pn ·
sentadas simultaneament e, facilmente ele j ulga que imagina e.finge uma alma w1 pú1 ·,·.1 ,
'---------.. porque não distingue o nome da própria coisa. Aqui peço que os leitores não se preápito 1J . 1
refutar isso, o que, como esp ero, não farão, desde que atentem acuradamente aos exn 11pf,, , ,.
simultaneamente às coisas que se seguem.

60 61
1~s<>l 1\lr,11;-1111.1t"' / pil 1.,.11.·, 'I"' .:-·' "''•'''·" 11.l'• .11111"1.-..,.1 ... 'I"" ,i.t.
11111.1 .1 lin .11i; isto\·, ,\,-l'oi:, 1p11· 11111',i ;i\)-',o e, t'Olll .d)-',11111.1 li!H'r1l.1dl·, q11i·.. 1· .
Aliquis forte putabit, quod fictio fictionem terminat, kd non
.,,·111ir que1 isso L·xistc assilll 11.1 11a1urc'f.a das coisas, isso i'a'f. lOlll q11l·, 1k·,1l1 ·
intellectio; hoc eft, poftquam finxi aliquid, & quâdam liberta te
volui a1Ientiri, id fie in rerum naturâ exiftere, hoc efficit, ut po- 1·111;10, 11;10 possamos pcns:1-lo de outro modo. Por exemplo: depois que li1q',1
ftea non poffimus id alio modo cogitare. Ex. gr. poftquam fi.nxi ( p.1ra falar com essas pessoas) tal natureza do corpo, e quis pcrsuad ir ;1 t11i111
s (ut cum iis loquar) naturam corporis talem, mihique ex meâ li- 111csmo, a partir de minha liberdade, que da realmente existe assim, nan 111.1 i·,
bertate perfuadere volui, eam fie realiter exiftere, non amplius :;c rá possível fingir, digamos, uma mosca infinita; e depois que tin)-',i 11111;1 e•.
licet: mufcam v. g. infinitam fingere, & poíl:quam finxi efTentiam »l-ncia da alma, não a posso [fingir} quadrada, etc. (§60) Mas há que se 0.1
animre, eam quadrare non po1Ium, &e. Sed hoc examinandum.
111inar isso. Primeiro: ou negam ou concedem que nós podemos inrdi)-',ir ;ilJ',º-
Primo: vel negant, vel concedunt nos aliquid poíTe intelligere.
10 Si concedunt, neceíTariõ id ipfum, quod de fictione dicunt, etiam·
Sc concedem, isso mesmo que dizem da ficção necessariamente havcr;'1 de s <'I
de intellectione dicendum erit. Si vero hoc negant, vídeamus dito também da intelecção. Mas se, em verdade, negam, vejamos nús, q11«
nos, qui fcimus, nos aliquid feire, quid dicant. Hoc fcilicet di- sabemos que sabemos algo, o que dizem. E o que dizem é o seguinte: qw .1
cunt, animam po1Ie fentíre, & multis modis percipere non fe alma pode sentir e perceber de muitos modos, não a si mesma, nem as ,·ois.1·;
ipfam, neque res, qure exiftunt, fed tantum ea, qure nec in fe,
que existem, mas apenas aquelas que não estão nela nem em parte alt,11111.1.
15 nec ullibi funt, hoc eft, animam poíTe folâ fuâ vi creare fenfatio-
nes, aut ideas, qure non funt rerum; adeõ ut ex parte eam, tan- isto é, que a alma pode, por sua força tão somente, criar sensaçôcs 011 i1ki .1·.
quam Deum, confiderent. Porrõ dicunt, nos, aut animam no- que não são das coisas; a tal ponto que, em parte, a consideram crn110 11111
ftram talem habere libertatem, ut nosmet, aut fe, imo fuam Deus. Ademais, dizem que nós ou nossa alma temos uma tal libcr1Luk q111
ipfam libertatem cogat: Nam poftquam ea aliquid finxit, & af- nós ou que ela coage até mesmo sua própria liberdade: porque, dL:pois qtw •·1.1
20 fenfum ei prrebuit, non poteft id alio modo cogitare, aut fingere,
fingiu algo e prestou assentimento a isso, não pode pensá-lo ou lingi \,, .11
& etiam eâ fictione cogitur, ut etiam alia tali modo cogitentur, ut
outro modo; e ainda [dizem} que por essa ficção ela é coagida a pensar 1;1111)i."111
prima fictio non oppugnetur; ficut hic etiam coguntur abfurda, 1

qure hic recenfeo, admittere propter fuam fictionem; ad qure ex- outras coisas de um modo tal que estas não se oponham à primeira tin a11 . ,.
plodenda non defatigabimur ullis demonftrationibus. Sed eos in assim também são aí coagidos, por causa de sua ficção, a admitir L:ssas l oi·,.1"
25 fuis deliriis linquendo, curabimus, ut ex verbis, qure cum ipfis fe- absurdas que ora recenseio, e para cuja refutação não nos fatigaremos e• i111
cimus, aliquid v.eri ad noftram rem hauriamus, nempe hoc ª: Mens, quaisquer demonstrações. (§61) Mas, deixando-os em seus delírios, cu id ;111·
com ad rem fictam, & fuâ naturâ falfam attendit, ut eam penfi-
mos para que, a partir das palavras que com eles trocamos, possamos hamit
tet, & intelligat, bonoque ordine ex eâ deducat, qure funt de-
ducenda, facile falfitatem patefaciet; & fi res ficta fuâ naturâ fit algo de verdadeiro para nosso assunto, mais precisamente istoª: que a Mcnt 1·,
quando atenta à coisa fictícia e falsa de sua natureza, para que a sopese, i 111 c
a Quamvis hoc experientid videar concludcre, & quis dicat id nil e/fe, quia deficit demott· lija e dela deduza, em boa ordem, aquilo que se há de deduzir, facil rnn 11"
ftratio, eam, /i quis de/iderat, fie habeat. Cum in natura 11ihil poffit dari, qt4od eius leges tornará patente a falsidade. E se a coisa fictícia for, de sua natureza,
oppugnet, /ed cum omnia f ecundum certas eius leges fiant, ut certos, certis legibus, /uos
producant e//ectüs irre/ragabili concalenatione: hinc /equilur, quod anima, ubi rem vere
concipit, perget objective eo/dem cffectüs formare. Vide i11frà, ubi de ided fal/6 loquor.

ª Ainda que eu pareça concluir isso por experiência e que alguém diga que é nulo porql/l'ftl1.1
demonstração, esta, se alguém a desejar, assim se comporta: como na Natureza nadil 1111rl" '"
dar que se oponha as suas leis, mas como todas as coisas se fazem segundo suas leis ffl'Íil-'· ,/,-
modo que essas coisas produzam seus efeitos certos, com leis certas, em irrefragável ro111 .11.-
nação, daqui segue-se que a alma, quando concebe verdadeiramente uma coisa, pro.1.11g111· .i
formar objetivamente os mesmos efeitos. Vide infra, onde falo da ideia falsa.

63
62
\Tl;i, 11'1111 lllt'll:, :1d 1':1111 :1lln1di1. llf. <':1111 i11f.l'ffig:1f; ,'\: l'X ··:I ho-

110 online i111:ipit dcdunT(', qu;t~


inde fequuntur, frlicitu P<'rgct li- vc nL1dnr.1 , q11.111do .1 1111 '111 c .11 c111.1 .1 d .1, p.11.1 •Ili" .1 1111dq.1 ,.- 1lcl.1 111111 .-1"1 .1
lic ullú intcrruptionc, li cut vidimus, quõd ex falfú fictione, modõ dl'd11 :r. ir l' lll lio;t ordn11 ,1s 1ois:1s q111' d:tí se scg11n11 , pr11s:;cr,11iLÍ frli l.111n11 .-
allatã, Jlatim ad ofiendendam ejus abfunfüatem, & alia, inde
deductas, pnebuit fe intellectus. s se111 intcrrup ~;to alg11111a, ass i111 011110 vimos q11c, a partir da fÍ1 \·ao Lil s.1.. 1g• •1 .1
há pouco referida , imediatamente o intelecto se apresenta para qu e .o;cj.1 111< •.\
Nullo ergo modo timendum erit, nos aliquid fingere, fi modõ
clare, & difiincte rem percipiamus: nam fi forte dicamus homines trada a absurdidade dela e das outras coisas daí deduzidas.
in momento mut.,; in befü.,, id valde generaliter dicitur; adeô [§62] De modo algum, portanto, h á que se temer que finjamos ;tlg11 . ""
ut nullus detur conceptus, id eíl:, idea, five cohrerentía fubjecti, & percebermos a coisa de modo claro e distinto: pois, se porventura di :r.rn111·;
prredicati in mente: fi enim daretur, fimul videret medium, & lo que homens num instante mudam em bestas, isso é dito de modo muito gn,11,
caufas, quo, & cur tale quid factum fit. Deinde nec ad naturam
fubjecti, & prredicati attenditur. a ponto de n ão se d ar qualquer conceito, isto é, ideia, ou seja, coerl- 11 .- i.1 do
Porrõ, modõ prima idea non fit ficta, & ex eâ creterre omnes sujeito e do predicado n a mente ; porque, caso se d esse, ela simult;llH';111w111.-
idere deducantur, pau latim prrecipi tan tia fingendi evanefoet; veria o [termo] m édio pelo qual e as causas por que isso se faz. Ak 111 di·;·;o,
deinde cllm idea ficta non poffit e!Te clara, & diftincta, fcd '5 tampouco se atenta à natureza do sujeito e do predicado.
folummodô confufa, & omnis confufio inde procedat, quôd [§63] Ademais, d esde que a primeira ideia não seja fictícia e a 1i;1r1ir1 l, ·l.1
mens rem integram, aut ex multis compofitam, tantum ex
parte nofcat, & notum ab ignoto non diftinguat: prreterea quõd todas as ideias sejam deduzidas, paulatinamente esvanece a propensao .1 fi11r,11 .
ad multa, qure continen tur in unâquâque re, fimul attendat fine em seguida, como a ideia fictícia não pode ser clara e distinta, mas s1111 w111 .-
ullâ diftinctione, inde fequitur primô, quôd fi idea fit alicujus " confusa, e toda confusão procede de que a mente conheça somcn te c111 l"11 11
rei fimpliciffimre, ea non nifi clara, & difüncta poterit e!Te: Nam uma coisa inteira ou composta de muitas e não distinga o conhecido d<>' k.•,1••
res illa non ex parte, fed tota, aut nihil ejus innotefcere debebit. nhecido, e tam bém de que atente simultaneamente, sem distinção alg11111.1 .. 1• •
Sequitur fccundó, quôd fi '"· qure componitur ex mulfo, in
partes omnes fimpli ciffimas cogitatione dividatur, & ad unam- múltiplo contido em cada coisa, segue-se d aí, em primeiro lugar, que se ;1 i.!< '1.1
quamque feorfim attendatur, omnis tum confulio evanefcet. '5 é de alguma coisa simplíssima, ela não poderá ser senão clara e distinta; p11i:.
Sequitur tertiô, quód fi ctio non poffit e!Te fimplex, fed quôd essa coisa n ão d everá dar-se a conhecer em p arte, mas tudo ou nada dela . ! §6·1I
fiat ex comPofitione dimfarum idearum confufarum, qua: funt Segue-se, em segundo lugar, que se a coisa que é composta de muitas for d i
diverfarum rerum, atque actionum, in Naturâ exillentium; vd
vidida pelo pensamento em todas as p artes simplíssimas, e a cada uma Sl'
meliUs ex attentione 'fimul fine a!Ten[u ad tales divecfas idea,,
atentar em separado, toda confusão, então, esvan ecerá. Segue-se, em tcrn·i ro
Nam fi e!Tct fimp/ex, e!Tet dara, & difüncta, & per confequens Jo
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vera. Si ex compofitione idearum difiinctarum, cffet etiam earum lugar, que a ficção n ão pode ser simples, m as que se faz a partir da composiç1• >

" NB. º'"' /i,N, io /• /p,;,.,,, "'" """'• di//,,,.; ó /• • •io, oi/i qoM io ''"""' "'"
de diversas ideias confusas, as quais são d e diversas coisas e ações existellrl's
o//erantur cau/ce, quce vigilantibus ope / en/ uum o//eruntur: ex quibus col/igu111 ilia reprce- na Natureza, ou melhor, [ela se faz] a partir da atenção bsimultânea, s1· 111
/ entamina illo lempore non reprce/en/ari à rebus extra /e conftitutis , Error autem, ui /latim assentimento, a essas tais ideias diversas; p o is, se fosse simples, seria clara l'
apparehit, e/i vigilando /om niare; &, /i /it admodum· mani/e/tus, dc/irium vocalur,
distinta e, por conseguinte, verdadeira. Se fosse a partir da composição d,,
ideias distintas, t ambém / a composição / delas

b Nota bem que a ficção, em si mesma considerada, não difere muito do sonho, a não ser ptf,,
fato de que, nos sonhos, não se oferecem as causas que se oferecem, pelo recurso dos sentir/11.1,
aos vigilantes, a partir das quais eles coligem que aquelas representações não são represcnlil
das, naquele momento, como constituídas pelas coisas fora deles, Mas o erro, como !11,1~"
aparecerá, é sonhar estando em vigília; e caso seja extremamente manifesto, chama-se delíritJ.
64
~
65
1011q1nlilio da.-:1, & dill.i11cta, ac proindc V•Ta . IO: x. ~:r. pollquam sni11 l.11.11· d 1'.11111 .1, . ,·111.1•" v1· nladcira. Por exemplo: depois que conhecemos
1111vim11s 11aturarn circuli, ac etian1 naturam quadrati, jam non pof- .1 11aturo.a do, ín 1110 ,. 1.1111111'.· 111 a do quadrado, já não podemos compor essas
fomus ca duo componcre, & circulum facere quadratum, aut ani- duas e fazer 11111 drc11lo cp1adrado, ou uma alma quadrada, e coisas semelhantes.
mam quadratam, & fimilia.
[§65) Concluamos, mais uma vez, brevemente, e vejamos como de ne-
s Condudamus iterum breviter, & videamus, quomodô fictio nullo
modo fit timenda, ut ea cum veris ideis confundatur. Nam quoad nhum modo há que se temer que a ficção seja confundida com as ideias ver-
primam, de quâ prius locuti fumus, ubi fcilicet res clare conci- dadeiras. Pois, quanto à primeira de que inicialmente falamos, a saber, [aque-
pitur, vidimus, quôd fi ea res, qure clare concipitur, & etiam ipfius la] na qual a coisa é claramente concebida, vimos que, se a coisa que se con-
exiíl:entia fit per fe retema veritas, nihil circa talem rem poterimus cebe claramente, e também sua existência, for por si mesma uma verdade
10 fingere; fed fi exiíl:entia rei conceptre non fit retema veritas, tantum
eterna, nada acerca de tal coisa poderemos fingir ; mas se a existl:ncia da coisa
eíl: curandum, ut exiíl:entia rei cum ejus eJTentiâ conferatur, &
fimul ad ordinem Naturre attendatur. Quoad fecundam fictionem, concebida não for uma verdade eterna, há que se cuidar apenas de comparar
quam diximus eJTe fimul attentionem fine aiTenfu ad diverfas a existência da coisa com sua essência, e simultaneamente atentar ;\ ordem
ideas confufas, qure funt diverfarum rerum, atque actionum, in da Natureza. Quanto à segunda ficção, que dissemos ser a atc111;;lo si11111ldnca,
15 Naturâ exiíl:entium; vidimus etiam rem fimpliciffimam non poJTe sem assentimento, a diversas ideias confusas, que são de diversas e• >is;1s e ;11;<ics
fingi, fed intelligi, & etiam rem compofitam, modo ad partes
existentes na Natureza, vimos também que uma coisa simplíssi111.1 11:111 po1k
fimpliciffimas, ex quibus componitur, attendamus; imo nec ex
ipfis ullas actiones, qure verre non funt, nos poJTe fingere: Nam ser fingida mas sim inteligida, e também a coisa composta, desde q11c .11rn
fimul cogemur contemplari, quomodo, & cur tale quid fiat. temos às partes simplíssimas das quais se compõe; mais aind.1, 1.111q•""'"
20 His fie intellectis, tranfeamus jam ad inquifitionem idere falf<e, podemos fingir, a partir destas, quaisquer ações que não sejam vnd.1d111.1".
ut videamus, circa qure verfetur, & quomodõ nobis poffimus ca- pois somos coagidos a simultaneamente contemplar de que modo,. l '"1 •I"'
vere, ne in falfas perceptiones incidamus. Quod utrumque non
erit nobis jam difficile poft inquifitionem idere fictre: Nam inter isso se faz.
ipfas nulla alia datur differentia, nifi quod hrec fupponat aJTenfum, [§66) lnteligidas assim tais coisas, passemos agora à inquirit,ao d.1 1d• 1.1
25 hoc eft (uti jam notavimus), quõd nullre offeruntur caufre, dum falsa, a fim de que vejamos acerca do que ela versa e de que modo 111111<'111<•"
reprcefentamina ipfi offeruntur, quibus, ficut fingens, poffit col- nos acautelar para que não incidamos em falsas percepções. Isso, 11m ""'"
ligere, ea non oriri à rebus extra fe, & quôd fere nihil aliud fit, casos, já não nos será difícil, depois da inquirição da ideia fictícia, pois rnt 11
quàm oculis apertis, five dum vigílamus, fomniare. Verfattir
elas nenhuma outra diferença se dá exceto que aquela [se. a ideia fak1 \ :,111""
itaque idea falfa, vel (ut melius loquar) refertur ad exiftentiam rei,
30 cujus eITentia cognofcitur, five circa eJTentiam eodem modo, ac
assentimento, isto é (como já notamos), que, enquanto as represe111;11111c :. ,,, .
idea ficta. Qure ad exifientiam refertur, emendatur eodem modo, oferecem a alguém, não se oferecem quaisquer causas pelas quais, co11111 n.1 ••
ac fictio: nam fi natura rei notre fupponat exiftentiam neceITariam, caso do fingidor, ele possa coligir que elas não se originam das coisas for:1 dei.-.
impoffibile efi, ut circa exiftentiam illius rei fallamur; fed fi exi- o que quase não é senão sonhar de olhos abertos, ou seja, enquanto esr.11111 >s
ftentia rei non fit <eterna veritas, uti eft ejus eITentia, fed quôd ne-
em vigília. Assim, a ideia falsa versa ou (para dizer melhor) se refere, do 1111·s
35 ceffitas, aut impoffibilitas exiftendi pendeat à caufis externis, tum
mo modo que a ideia fictícia, ou à existência de uma coisa cuja essl:11ci;1 ,·.
conhecida ou à sua essência. [§67] Aquela que se refere à existência se e1nrn
/ da do mesmo modo que a ficção, pois, se a natureza da coisa conhecida su1H 11·
existência necessária, é impossível que nos enganemos acerca de sua existl:nc i.1 ;
mas se a existência da coisa não for uma verdade eterna, como é sua essl:.nl·i:1,
de modo que a necessidade ou impossibilidade de existir dependa de c111sas
externas, então,

66 67
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n•lllpDlit i11 dara, & dill.i11da, ac. proínd1·. v1-ra.
IO:x. gr. p1>llq11am .111.1t11ff'/.. I1lo 1ín11\,, ,. 1.1111hl-111 .1 d1> q11.ulr:1d11, j.'1 11.111 p1nln11<>:; < <>111\"'' """·I"
11ovimus naturam circuli, ac ctiam naturam quadra ti, jam 11011 pof- 1h1.1s e h zn 11111 dn11lo qu :1dr.1do, 0111111u al111:1 q11adr;1da , ,. «ois.is sc11wll1.111l<"•.
fumus ea duo componere, & circulum facere quadratum, aut ani- 1§65\ ( '. 011d11a11w.-;, 111ais urna vez. brevemente. e vejamos "ºli"' d«""
11h111n modo h (t quc se temer que a 11cç~o seja confundida co111 as idei.1 s vn
mam quadratam, & fimilia.
s Concludamus iterurn breviter, & videamus, quomodo fictio nullo
modo fit timenda, ut ea curo veris ideís confundatur. Nam quoad 1l.1dciras. Pois, quanto à primeira de que inicialtlll:ntc fabrnos. a s:1lin, 1.11 p w
primam, de quâ prius locuti fumus, ubi fcilicet res clare conci- h 1 na qual a coisa é claramente concebida, vimos que, se a coisa que se 11>li
pitur, vidimus, quod fi ea res, qure clare concipitur, & etiam ipfius n-hc claramente, e também sua existência, for por si mesma 11111:1 vnd.11k
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10 fingere; fed fi exiftentia rei conceptre non fit reterna veritas, tantum
n>ncebida não for uma verdade eterna, há que se cuidar apenas de cn1111>.11 .11
eft curandum, ut exiftentia rei cum ejus elTentiâ conferatur, &
fimul ad ordinem Naturre attendatur. Quoad fecundam fictionem, a existência da coisa com sua essência, e simultaneamcnn.: ate11r:1r :1 onk111
quam diximus elTe fimul attentionem fine alTenfu ad diverfas da Natureza. Quanto à segunda ficção, que dissemos ser a atcn.; ;10 si111ul1.11 ""' ·
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ser fingida mas sim inteligida, e também a coisa composL1, desde 'I"" ·''""
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temos às panes simplíssimas das quais se compõe; 111 :1is :1i11d.1. 1.1111j'""'"
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itaque idea falfa, vel (ut melius loquar) refertur ad exiíl:entiam rei,
oferecem a alguém, não se oferecem quaisquer causas pelas quais,"' 11111, ,·1.1 1,
30 cujus dfentia cognofcitur, five circa elTentiam eodem modo, ac
idea ficta. Qure ad exiftentiam refertur, emendatur eodem modo, caso do fingidor, ele possa coligir que elas não se originam das coisas li ia.11 kl' .
ac fictio : nam fi natura rei notre fupponat exiftentiam neceffariam, o que quase não é senão sonhar de olhos abertos, ou seja, enquanto cst.11110-.
impoffibile eíl:, ut círca exiíl:entiam illius rei fallamur; fed fi exi- em vigília. Assim, a ideia falsa versa ou (para dizer melhor) se refere. do 1111·•.
íl:entia rei non fit reterna veritas, uti eíl: ejus eífentia, fed quod ne- mo modo que a ideia fictícia, ou à existência de uma coisa cuja cssi:·1Hi.1 '
35 ceffitas, aut impoffibilitas exiíl:endi pendeat à caufis externis, tum
conhecida ou à sua essência. ( §67) Aquela que se refere à existência se n 11<· 11
da do mesmo modo que a ficção, pois, se a natureza da coisa conhecida su1" '"
existência necessária, é impossível que nos enganemos acerca de sua cxisti:·1" i.1 :
mas se a existência da coisa não for uma verdade eterna, como é sua essi:·1H i.1 ,
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..tkt : 11:1111 1·rnk111 111odo t:mc11datt1r. 1§68 \ N" .1l i11c111c :10111r;1, que se rcfen.: :ts cssências, ou também às ações,
<Juud atti11et ad alteram, qure ad effentias refertur, vel etiam ..,;, prn·cp\"" ""'"ª'·óamcntc '"º ;cmp<' confus.,, compostas a parti< de
ad actioncs, tales pcrceptiones necelTario femper funt confufre, corn- ,\;,ma' l'"·,·cp\Ú<' cunfus"' das coisas existtnt<S na Nacuteza, como quando
pofitre ex diverfis confufis perceptionibus rerum in Naturâ exiften- '>s homcns se pcrsuadcm de que há numes nas selvas, nas imagens, nos animais,
tium, ut cum hominibus perfuadetur, in filvis, in imaginibus, in
etc., dc que. há corpos de cuja composição, sem mais, se faz o intelecto, de que
brutis, & creteris adelTe numina; dari corpora, ex quorum folâ
compofitione fiat intellectus; cadavera ratiocinari, ambulare, loqui; <adáveres raciocinam, andam, falam, de que Deus engana, e coisas semelhan-
Deum decipi, & fimilia; fed idere, qure funt clarre, & diftinctre, tes. Mas as ideias que são claras e distintas nunca podem ser falsas. Pois as
nunquam po1Iunt effe falfre: N am idere rerum, qme clare, & diftin- 10 ideias das coisas, que são concebidas clara e distintamente, são ou simplíssimas
etc concipiuntur, funt vel fimpliciffimre, vel compofitre ex ideis ou compostas a partir de ideias simplíssimas, isto é, deduzidas de ideias sirn-
fimpliciffunis, id eft, à fimpliciffimis ideis deductre. Quõd verõ idea
p\issimas. Que, cm verdade, uma ideia simplis<ima não consiga ser fal"'·
limpliciffima non queat erre falfa, poterit unusquifque videre, modo
qualquer um poderá ve<, d<'de que saiba o que é o vccdadeirn, ou seja, o in·
fciat , quid fit verum; five intellectus, & fimul quid falfum.
Nam, quod id fpectat, quod formam veri conílituit, certum 15 telecto, e simultaneamente o que é o falso.
cft, cogitationem veram à falfâ non tantum per denominationem l§691 Pois, no que diz respeito ao que constitui a forma do verdadeiro,
cxtrinfecam, fed maxime per intrinfecam diílingui. Nam fi quis é certo que o pensamento verdadeiro não se distingue do falso apenas por
faber ordine concepit fabricam aliquam, quamvis talis fabrica uma denominação extrínseca, mas acima de rndo por uma intrínseca. ( '.o ni
nunquam exfüterit, nec etiam unquam exíl:itura fit, ejus nihilo-
efeito, se algum conmutot concebeu otdenadamentt uma consttuçáo, a;'" h
minus cogitatio vera eft, & cogitatio eadem eft, five fabrica exi- 20
Hat, five minus; & contrà fi aliquis dicit, Petrum ex. gr. exifiere, que tal constrnção nunca tenha existido e tambóm nu oca venha a existó', "'"
nec tamen fcit, Petrum exiftere, illa cogitatio refpectu illius falfa pensamento, não obstante, ó verdadeito, e o pensamento é o mrnno, qun ·'
cft, vel, fi mavis, non eft. vera, quamvis Petrus reverâ exiftat. construção exista, quer não; e ao contrário, se alguém diz, por exemplo, qw
Nec hrec enunciatio, Petrus exiftit, vera eft, nifi refpectu illius, qui Pedro existe, mas não sabe que Pedro existe, esse pensamento é falso <0111
certo fcit, Petrum exiftere. Unde fequitur in ideis dari aliquid reale, 25
cespeito àq uek [se que diz J, ou, se pttÍer", não ó vetdadtito, ainda que p,,I•"
per quod verre à falfis diftinguuntur: quod quidem jam inveftigan-
dum erit, ut optimam veritatis normam habeamus (ex datâ enim exista deveras. Nem esta enunciação "Pedro existe" é verdadeira, a não st:r <oll•
verre idere normâ nos noftras cogitationes debere determinare dixi- '"peito àquele que sabe tom cctteza que Pedto existe. [ §70l Dondosc se~'"
mus, methodumque cognitionem effe reflexivam), & proprieta- que há nas ideias algo real. atravós do qual as vccdadeiras se distinguem ,J,,,
tes intellectus nofcamus; nec dicendum hanc differentiam ex eo 30 falsas; o que seguramente haverá de ser agora investigado, para que tenh;1111o>s
oriri, quod cogitatio vera eft res cognofcere per primas fuas cau- a melhor norma da verdade (pois dissemos que nós devemos detcnni11;1r
fas , in quo quidem à falfâ valde differret, prout eandem fuprà
cxplicui: Cogitatio enim vera etíam dicitur, que.e effentiam alicu- ºº"ºs pensamentos a pattit da noema dada da ideia vecdadeita. e que o mi
jus principii objective involvit, quod caufam non habet, & per todo é o conhecimento reflexivo) e conheçamos as propriedades do intckd' •.
fe, & in fe cognofcitur. Quare forma verre cogitationis in eâdem 35 Nem se diga que essa diferença se origina do seguinte: que o pensa1nc111"
verdadeiro é conhecer as coisas por suas causas primeiras, no que seguranH·111t·
/
1
ele muito diferiria do falso, conforme o mesmo que acima expliqut:i, poi~;
' também é dito pensamento verdadeiro aquele que envolve objetivamente .1
essência de algum princípio que não tem causa e que é conhecido por si l ' c111
si. l§711 Por isso, a forma do p ensamento verdadeiro

69
68
,lcv<' <'SL1r si111.1d .1 \ 11• ··"' \ l""l'no pu1s;1111c1110. st·111 rd.1\.I" '<1111 <11111""·'
ipfâ cogitationc fine relationc ad alias <lcbet cffc lita; 111T ohj1Tt11111
1;1111po11co rcco11'1n <' "ol1jc10 co1110 causa, 111as deve dcpc11dcr d.1 po1i··11< 1.1
tanquam caufam agnofcit, fed ab ipfâ intellectUs pokntift, & na-
turâ pendêre debet. Nam fi fupponamus, intellectum ens aliquod do intelecto tão somente e de lsua] natureza. Pois, se s11pusern1os que" 11111
novum percepifTe, quod nunquam exftitit, ficut aliqui Dei intel- lccto percebeu algum ente novo? que nunca existiu, assim como alg1111 s • 1>11
5 lectum concipiunt, antequam res crearet (qme fane perceptio à n:bem o intelecto de Deus antes de haver criado as coisas (pcrcqi,_.111 •1111
nullo objecto oriri potuit), & ex tali pereeptione alias legitime dc- obviamente não pôde originar-se de objeto algum), e que de tal pcrn-1 '« .1• • I••
ducere, omnes ilfae cogitationes verre efTent, & à nullo objecto intelecto] deduz legitimamente outras, todos esses pensamentos scri:1111 v1·1
externo determinatre, fed à folâ intellectus potentiâ, & naturâ de-
penderent. Quare id, quod formam verre cogitationis eonfütuit, in dadeiros e não determinados por qualquer objeto externo, mas deprndni.1111
10 ipfâ eâdem cogitatione eft qurerendum, & ab intellectús naturâ de- apenas da potência do intelecto e de sua natureza. Daí resulta que i:;so 'Ili<
ducendum. Hoc igitur ut inveftigetur, ideam aliquam veram ob ocu- constitui a forma do pensamento verdadeiro há de ser buscado ncsst.· 111cs111•'
·los ponamus, cujus objcctum maxime certo fcimus à vi noftrâ cogi- pensamento e deduzido da natureza do intelecto. [§72] Portanto, para •I"'
tandi pendêre, nec objeetum aliquod in Naturâ habere : in tali enim isso seja investigado, ponhamos diante dos olhos alguma ideia vcnbdl'i 1.1 .
ideâ, ut ex jam dictis patet, facilius id, quod volumus, invefti-
cujo objeto sabemos com máxima certeza depender de nossa força de 1H·11 ·;.11.
15 gare poterimus. Ex. gr. ad formandum eoneeptum globi fingo ad
libitum caufam, nempe femieirculum cirea eentrum rotari, & ex não tendo qualquer objeto na natureza, pois em tal ideia, como tica p;11n111
rotatione globum quafi oriri. Hrec fane idea vera eft, & quamvis fcia- a partir do que já foi dito, poderemos mais facilmente investigar o q11.- qw
mus nullum in Naturâ globum fie unquam ortum fuifTe, eft hree ta- remos. Por exemplo: para formar o conceito de globo, finjo arbinari ;1111nt1•
men vera perceptio, & faeillimus modus formandi globi conce- uma causa, a saber, que um semicírculo roda em torno do centro. " .1 1•.1~111
20 ptum. Jam notandum bane perccptionem affirmare femicireulum
da rotação o globo como que se origina. Essa obviamente é uma it.ki.1 v.- 1.l .1
rotari, qure affirmatio falfa efTet, fi non efTet juneta conceptui
globi, vel caufre talem motum determinantis, fivc abfolute, f1 hrec deira, e embora saibamos que globo algum nunca foi originado .1 ss 1111 11.1
affirmatio nuda elTet. Nam tum mens tantum tenderet ad affirman- Natureza, essa é, contudo, uma percepção verdadeira e o modo 111;1 is 1.'11 d .j,
dum folum femicirculi motum, qui nec in femicireuli conccptu formar o conceito de globo. É de notar, desde já, que essa perccp,·;10 .d11111.1
25 eontinetur, nee ex conceptu caufre motum determinantis oritur. que o semicírculo roda, afirmação que seria falsa se não fosse juntada .10 • ""
Quare falfitas in hoe folo confiftit, quod aliquid de aliquâ re affir-
ceito de globo ou à causa que determina tal movimento, ou seja, ali.·><il111.1
metur, quod in ipfius, quem formavimus, conceptu, non conti-
netur, ut motus, vel quies de femicirculo. Unde fequitur fimplices mente, se essa afirmação fosse nua. Pois, então, a mente tenderia a ali1111.11
cogitationes non polTc non effc veras, ut fimplex femicirculi, mo- apenas o só movimento do semicírculo, que nem está contido no c011n·i1 •• ,j,
30 tO.s, quantitatis, &c. idea. Quiequid hre affirmati-onis continent, semicírculo, nem se origina do conceito da causa que determina o m< >vi 1111·11
carum adrequat conceptum, nec ultra fe extendit; quare nobis li- to. Por isso, a falsidade consiste apenas no seguinte: que se afirme de alg11111.1
cet ad libitum fine ullo erroris fcrupulo ideas fimpliccs formare. Su- coisa algo que não está contido no conceito dela que nós formamos, co1 11•' ••
pereft igitur tantum qmercre, quâ potentiâ mens noftra cas formare
movimento ou o repouso [afirmados J do semicírculo. Donde se segue q• 1c •'"
poffit, & quoufque ca potentia fe extendat: hoc enim invento fa-
35 cile videbimus fummam, ad quam poffumus pervenire, cogni- pensamentos simples não podem não ser verdadeiros, como a ideia si11q 1l1"
de semicírculo, movimento, quantidade, etc. O que quer que elas contc11li.1111
de afirmação adéqua-se ao conceito delas e não se estende além; por isso. 1111.
// é lícito formar ideias simples arbitrariamente, sem qualquer receio dt.· "n., _
[§73] Resta, portanto, somente buscar [saber] por qual potência nossa 111<·11
te pode formá-las e até onde essa potência se estende; pois, descobt:rto i:;·.•1.
facilmente veremos o sumo conhecimento a que podemos chegar.

70 71
l 11•1w111. 1·1·1t11111 1·11i111 ..ti l1:11w Pj11s pot1·11t 1:1111 k 111111 •·x l 1·111h·n: i11
11di11it 11111: N:1111 cirm :iliquid de aliqu;l n: aflir111:111111s, quod in 1:. • n I•>. • 1>111d.-i111,1pw ,·ss.1 .s11.11><>ll-11< i.1 11.10 sL· cslc11dc ao i1di11ito: pois,
1·011e.. pt11, <fucm de câ fonnamus, non continctur, id defectum '111.1111 lo ;d i rn 1;1111os de .ilg11111;1cois;1 algo tp1c nao csd contido no conceito que
110/lra: JHTccptionis indicat, five quôd mutilatas quafi, & trunca- ,lcLi 1;m11;1111os, isso indica 11111 ddcito de nossa percepção, ou seja, que temos
L1s habcmus cogitationes, five ideas. Motum enim femicirculi fal- s pcnsa111rntos, isto é, ideias, como que mutilados e truncados. Pois o movimen-
fum cffc vidimus, ubi nudus in mente eft, eum ipfum autem ve-
to do semicírculo vimos que é falso quando está nu na mente, mas que ele
n1m, fi conceptui globi jungatur, vel conceptui alicujus caufre ta-
mesmo [é] verdadeiro se juntado ao conceito de globo ou ao conceito de al-
km motum determinantis. Quôd fi de naturâ entis cogitantis fit,
uti primã fronte videtur, cogitationes veras, five adrequatas for- guma causa que determina tal movimento. Assim, se é da natureza do ente
mare, certum eft, ideas inadrequatas ex eo tantum in nobis oriri, 10 pensante, como parece à primeira vista, formar pensamentos verdadeiros, ou
quôd pars fumus alicujus entis cogitantis, cujus quredam cogita- seja, adequados, é cerro que as ideias inadequadas se originam em nós apenas
tiones ex toto, quredam ex parte tantum noftram mentem confti- a partir do faro de que somos parte de algum ente pensante, cujos pensamen-
tuunt.
tos, às vezes no todo e às vezes apenas em parte, constituem nossa mente.
Sed quod adhuc venit confiderandum, & quod circa fictionem
non fuit operre pretium notare, & ubi maxima datur deceptio, eft, 15 [§74] Mas, o que ainda cumpre considerar - que acerca da ficção não
quando contingit, ut quredam, qure in imaginatione offeruntur, valeu o trabalho de notar, e onde se dá um máximo engano - é quando acon-
fint etiam in intellectu, hoc eft, quôd clare, & diftincte conci- tece de algumas coisas que se oferecem na imaginação estarem também no
piantur, quôd tum, quamdiu diftinctum à confufo non diftingui- intelecto, isto é, serem clara e distintamente concebidas, de maneira que,
tur, certitudo, hoc eft, idea vera cum non diftinctis commifce-
então, enquanto não se distingue o distinto do confuso, a certeza, isto é, a
tur. Ex. gr. quidam Stoicorum forte audiverunt nomen animre, & 20
ideia verdadeira, se mistura com as não distintas. Por exemplo: alguns dos
ctiam quôd fit immortalis, qure tantum confufe imaginabantur;
imaginabantur etiam, & fimul intelligebant corpora fubtiliffima estoicos porventura ouviram o nome de alma e também que ela é imortal, o
e<etera omnia penetrare, & à nullis penetrari. Cum hrec omnia fi- que apenas confusamente imaginavam; também imaginavam e simultanea-
znul imaginabantur, concomitante certudine hujus axiomatis, fta- mente inteligiam que corpos sutilíssimos penetram todos os demais e por
tim certi reddebantur, mentem elTe fubtiliffima illa corpora, & 25 nenhum são penetrados. Como imaginavam todas essas coisas simultanc;1-
fubtiliffüna illa corpora non dividi, &c. Sed ab hoc etiam libera-
mente, concomitante com a certeza desse axioma, imediatamente se tornaram
mur, dum conamur ad normam datre verre idere omnes noftras
perceptiones examinare cavendo, uti initio diximus, ab iis, quas certos de que a mente é esses corpos sutilíssimos, e que esses corpos sutilíssi-
c:x auditu, aut ab experientiâ vagâ habemus. Adde quôd talis de- mos não podem ser divididos, etc. [§75] Mas também disso nos libertamos
ceptio ex eo oritur, quod res nimis abftracte concipiunt: nam per 30 quando nos esforçamos para examinar rodas as nossas percepções segundo a
fe fatis clarum eft, me illud, quod in fuo vero objecto concipio, al- norma da ideia verdadeira dada, acautelando-nos, como dissemos no início,
teri non polTe applicare. Oritur denique etiam ex eo, quôd prima
destas que temos a partir do ouvir ou da experiência vagante. Adicione-se q uc
dementa totius Naturre nou intelligunt; unde fine ordine proce-
tal engano origina-se do seguinte: eles concebem as coisas abstratamente
dendo, & Natur:m:i cum abftractis, quamvis fint vera axiomata,
confundendo, fe ipfos confundunt, ordinemque Naturre perver- 35 demais, pois é suficientemente claro por si mesmo que aquilo que concebo
em seu verdadeiro objeto não posso aplicar a outro. Por fim, origina-se também
do seguinte: não inteligem os primeiros elementos da Natureza inteira; don-
de, procedendo sem ordem e confundindo a Natureza com abstrações, que
são contudo axiomas verdadeiros, confundem a si próprios e pervertem a
ordem da Natureza.

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infinitum: Nam cinn aliquid de aliquâ rc affirmamus, quod in
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tas habemus cogitationes, five ideas. Motum enim femicirculi fal- s pensamentos, isto é, ideias, como que mutilados l'. truncados. Pois o 1110vi1111·11
fum effe vidimus, ubi nudus in mente efi:, eum ipfum autem ve- to do semicírculo vimos que é falso quando está nu na mente, ma.s qut· ele
rum, fi conceptui globi jungatur, vel conceptui alicujus caufre ta- mesmo [é] verdadeiro se juntado ao conceito de globo ou ao conceito d(' .d
lem motum determinantis. Quôd fi de naturâ entis cogitantis fit,
guma causa que determina tal movimento. Assim, se é da naturl'.Z.a do rn1"
uti primâ fronte videtur, cogitationes veras, five adrequatas for-
mare, certum efi:, ideas inadrequatas ex eo tantum in nobis oriri, 10 pensante, como parece à primeira vista, formar pensamentos verdadeiros, 011
quôd pars fumus alicujus entis cogitantis, cujus quredam cogita- seja, adequados, é certo que as ideias inadequadas se originam em nós :1pn1.1•;
tiones ex toto, quredam ex parte tantum noftram mentem confü- a partir do fato de que somos parte de algum ente pensante, cujos prnsa1w11
tuunt.
tos, às vezes no todo e às vezes apenas em parte, constituem nossa mente
Sed quod adhuc venit confiderandum, & quod circa fictionem [§74) Mas, o que ainda cumpre considerar - que acerca da ficç;io 11:1<1
non fuit operre pretium notare, & ubi maxima datur deceptio, eft, 15
quando contingit, ut quredam, qure in imaginatione offeruntur, valeu o trabalho de notar, e onde se dá um máximo engano - é quando au>11
fint etiam in intellectu, hoc eft, quôd clare, & diftincte conci- tece de algumas coisas que se oferecem na imaginação estarem tambélll 110
piantur, quôd tum, quamdiu difünctum à confufo non difüngui- intelecto, isto é, serem clara e distintamente concebidas, de manl'.ira q11c,
tur, certitudo, hoc eft, idea vera cum non difünctis commifce- então, enquanto não se distingue o distinto do confuso, a certeza, isto t'- •• 1
tur. Ex. gr. quidam Stoicorum forte audiverunt nomen animre, & 20 ideia verdadeira, se mistura com as não distintas. Por exemplo: alg1111s d,"·
etiam quôd fit immortalis, qure tantum confufe imaginabantur;
estoicos porventura ouviram o nome de alma e também que ela é i1110r1.d. "
imaginabantur etiam, & fimul intelligebant corpora fubtiliffima
cretera omnia penetrare, & à nullis penetrari. Cum hrec omnia fi- que apenas confusamente imaginavam; também imaginavam e simult.111c.1
mul imaginabantur, concomitante certudine hujus axiomatis, fia- mente inteligiam que corpos surilíssim9s penetram todos os demais e I'"'
tim certi reddebantur, mentem elTe fubtiliffima illa corpora, & 25 nenhum são penetrados. Como imaginavam todas essas coisas simul1;1111·.1
fubtilifiima illa corpora non dividi, &c. Sed ab hoc etiam libera- mente, concomitante com a certeza desse axioma, imediatamente se tornar.1111
mur, dum conamur ad normam datre verre idere omnes nofiras
certos de que a mente é esses corpos sutilíssimos, e que es~es corpos sutilís•;i
perceptiones exaininare cavendo, uti initio diximus, ab iis, quas
ex auditu, aut ab experientiâ vagâ habemus. Adde quôd talis de- mos não podem ser divididos, etc. [§75) Mas também disso nos liberta1110.\
ceptio ex eo oritur, quôd res nimis abftracte concipiunt: nam per 30 quando nos esforçamos para examinar todas as nossas percepções scgundt >.1
fe fatis clarum efi, me illud, quod in fuo vero objecto concipio, al- norma da ideia verdadeira dada, acautelando-nos, como dissemos no i11Ílio,
teri non polTe applicare. Oritur denique etiam ex eo, quôd prima destas que temos a partir do ouvir ou da experiência vagante. Adicionl'.-sc q tH·
elementa totius Naturre non intelligunt; unde fine ordine proce- tal engano origina-se do seguinte: eles concebem as coisas abstratamc1 li<'
dendo, & Naturnll). cu~ abftractis, quamvis fint vera axiomata,
demais, pois é suficientemente claro por si mesmo que aquilo que concclio
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de, procedendo sem ordem e confundindo a Natureza com abstrações, q11<"
são contudo axiomas verdadeiros, confundem a si próprios e pervertc111 .1
ordem da Natureza.

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111111. Nohis a11t1·111, li qu;'11n mi11i111e :ihtlract1\ pnict'lla111us, & à 1•nH-ctlcr111os () llll'li<>S .1\i·.11.11.111\Cl\IL' l' êOlllL\artllUS, () q11;111lo ;\111<'.S iss<> \'"'•
primis clcnwntis, hoc elt, à fonte, & origine Naturre, quàrn pri- sa ser kito, dt.:sde os pri11H·iros dementos, isto é, Lksde a fonte e oriµ,nll d.1
rnum fieri poteft, incipiamus, nullo modo talis deceptio erit me-
tuenda. Narnreza.
[§761 Ora, no atinente ao conhecimento da origem da Naturaa. 11t·111
s Quod autem attinet ad cognitionem originis Naturre, minime
um pouco há que se temer que o confundamos com abstrações: pois, q11a11.l1 •
eft timendum, ne eam cum abfuactis confundamus: nam cum
aliquid abfuacte concipitur, uti funt omnia univerfalia, femper algo é concebido abstratamente, como são rodos os universais, esses sc111p1T
latius comprehenduntur in intellectu, quàm reverâ in Naturâ são compreendidos mais amplamente no intelecto do que seus panirnhrc s
exiftere poIJunt eorum particularia. Deinde cum in naturâ dentur podem existir deveras na Natureza. Em seguida, como na narnro.a dao s«
10 multa, quorum differentia adeõ eft exígua, ut fere intellectum ef- .1
• 1 muitas coisas, cuja diferença é tão exígua que quase foge ao intelecto, rnt.10
fugiat, tum facile (fi abftracte concipiantur) poteft contingere, 1 (se são concebidas abstratamente) facilmente pode acontecer que sejam co11
ut confundantur; at curo origo Naturre, ut poftea videbimus,· nec
fundidas; mas, uma vez que a origem da Natureza, como depois veremos, 11 :1•,
abfuacte, five univerfaliter concipi poffit, nec latius poffit exten-
di in intellectu, quàm reverâ eft, nec ullam habeat fimilitudinem pode ser concebida abstratamente ou universalmente, nem pode estender se
15 cum mutabilibus, nulla circa ejus ideam metuenda eft confufio, mais amplamente no intelecto do que é deveras, nem tem semelhança alt!,11111.1
modo normam veritatis (quam jam oftendimus) habeamus: eft com as coisas mutáveis, nenhuma confusão há de ser temida acerca da idci .1
nimirum hoc ens, unicum, s infinitum, hoc eft, eft omne dela, desde que tenhamos a norma da verdade (que já mostramos); sq~11r.1
erre, & prreter quod a nullum datur eIJe. mente este ente é único, z infinito, ou seja, é todo o ser, para além do q11 ;tl 11.1• •
Hucufque de ideâ falfâ. Supereft, ut de ideâ dubiâ inquiramus,
20 hoc eft, ut inquiramus, qurenam fint ea, qure nos poITunt in du- se dá ser ªalgum.
bium pertrahere, & fimul quomodo dubítatio tollatur. Loquor (§771 Até aqui sobre a ideia falsa. Resta que inquiramos sobre ;i i1ki.1
de verâ dubitatione in mente, & non de eâ, quam paffim videmus dúbia, isto é, que inquiramos quais sejam aquelas coisas que podem 11os .11
contingere, ubi fcilicet verbis, quamvis animus non dubitet, di- rastar para a dúvida, e simultaneamente de que modo o duvidar é cli111i11.1.lo
cit quis fe dubitare: non eft enim Methodi hoc emendare; fed po- Falo do verdadeiro duvidar na mente, e não daquele que muitas vezes Vl'llll •~·
25 tius pertinet ad inquifitionem pertinacire, & ejus emendationem.
acontecer, a saber, quando por palavras, ainda que o ânimo não duvide, alt!,11<'.·111
Dubitatio itaque in animâ nulla datur per rem ipfam, de quâ dubi-
diz que duvida; não cabe ao método emendar isso, mas isso pertence ann·s :1
tatur, hoc eft, fi tantum unica fit idea in animâ, five ea fit vera, five
falfa, nulla dabitur dubitatio, neque etiam certitudo: Sed tantum inquirição sobre a pertinácia e à sua emenda. (§781 Assim, na alma, nenl111111
talis fenfatio. Eft enim in fe nihil aliud nifi talis fenfatio; fed dabi- duvidar se dá pela própria coisa da qual se duvida; isto é, se houver apc11;1s
30 tur per aliam ideam, qure non adeõ clara, ac diftincta eft, ut poffi- uma única ideia na alma, quer ela seja verdadeira, quer falsa, não se dará d11
mus ex eâ aliquid certi circa rem, de quâ dubitatur, concludere, vidar algum , nem tampouco certeza, mas apenas tal sensação. Pois, cm si
z Haç non /unt attributa Dei, qua1 o/tendunt ip/ius e//entiam, ui in Philo/ophill o/tendam. mesma, [a ideia1 nada mais é que tal sensação; mas ele [se. o duvidar) sl' 11.'t
a Hoc /uprà fam demon/tratum efC--Si enim tale ens non exi/teret, nunqu<1m po//et produ&i; por outra ideia, que não é tão clara e distinta a ponto de podermos, a partir
adeoque mens plus po//11 intelligere, quàm Natura pra1/tare, quod /uprà fal/um efle ton·
/titit. dela, concluir algo de certo acerca da coisa da qual se duvida;

z Esses não são atributos de Deus, que mostram a essência dele, como mostrarei na Filo.wfi,1.
ª Isto já está demonstrado acima. Pois, se tal ente não existisse, nunca poderia ser prod11~.irlo.
de modo que mais coisas poderia a mente inteligir do que a Natureza apresentar, 11 'f/I(

acima constou ser falso.

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,, 1.·;111 ... .. t 11k1.1 '!"" 111•" l.111\.1 11.1 ,\1'1v11\.1 11.111 ... 'l.11.1" .\1·.11111.1. l'"t "''·11q1l11 ·.i
.tl)',llt.'·111 111111< .I \H'l\S<lll •;t)ltl<" <l S \'11!',·lltll~ d1>S sc111idos, s1·j.1 1wl.1 ('\lll"I i1 ·111 1.1,
hoc dl, idca, qua~ nos in dubium conjicit, uon dt clara, .~ diHi1wta.
Ex. gr. fiquis nunquam cogitaverit de fcnfuum fallacià, tive cxpc- scj;1 do 1\\mlo quc t"or, 1111111;1 duvitbr;'i se o Sol ._'- 111.iior •lll 111c11<lr 1l1> q1 li"
rientiâ, five quomodocunque fit, nunquam dubitabit, an foi major, ap;n-ccl". 1bí que os Rústicos muitas vezes sl" adrnire111 q11;1n1lo 1>11 v1·111 q11" 11
aut minor fit, quàm apparet. Inde Ruftici paffim mirantur, cum au- Sol é muito n1;tior que o globo da' krra, mas, pensando sobre os c1ig.111"-;•1 .. .,
diunt folem multo majorem elTe, quàm globum terrre, fed cogitan- sentidos, origina-se o duvidar. Isto é, alguém sabe que :1s vezes •>S s1·111 i1lt1·.
do de fallaciâ fenfuum oriturdubitatio. Id est, scit fenfUs aliquando
fe decepilTe; fed hoc tantum confufe fcit: Nam nefcit, quomodo enganam; mas sabe isso apenas confusamente, pois não sabe de q11c Ili"""""
fenft1s fallant, & fi quis poft dubitationem acquifiverit veram cogni- sentidos enganam; e se alguém, depois do duvidar, houver adquiri.lo vn1l.1
tionem fenfuum, & quomodo per eorum iníl:rumenta res ad diíl:an- deiro conhecimento dos sentidos e do modo como, por seus i11srr111m·111 n•; , .1 ..
tiam reprrefententur, tum dubitatio iterum tollitur. Unde fequitur, 10 coisas são representadas a distância, então o duvidar é outra vez di111i11.11lo .
nos non polTe veras ideas in dubium vocare ex eo, quod forte aliquis [§791 Donde se segue que nós não podemos colocar as ideias vcnLHkir.1·: .-111
Deus deceptor exiíl:at, qui vel in maxime certis nos fallit, nifi
quamdiu nullam habemus claram, & diftinctam Dei idearn; hoc eíl:, dúvida como se talvez existisse algum Deus enganador, que att" 11H·s1111> 11.1·.
fi attendamus ad cognitionern, quarn de origine ornnium rerum coisas maximamente certas faz com que nos enganemos, a 11:\0 sn c11q11.11\lu
habemus, & nihil inveniarnus, quod nos doceat, eum nonelTedecep- 15 não temos qualquer ideia clara e distinta de Deus; isto é, < o d11vid.1r 1)(·1111.1
torem eâdem illâ cognitione, quâ, cum attendimus ad naturam tri- nece> se, pelo mesmo conhecimento com o qual atentamos ;'1 11.1111n"1..1 .1 ..
anguli, invenimus ejus tres angulos requales elTe duobus rectis (, triângulo e descobrimos que seus três ângulos são iguais a doi s rei"-"· .111·111.11
zo blijft de twijffeling); fed fi talem cognitionem Dei habemus,
mos ao conhecimento que temos da origem de todas as cois;1s ,. 11.1< l.1 'i...,, ••
qualem habemus trianguli, tum omnis dubitatio tollitur. Et eo-
dem modo, quo polTumus pervenire ad talem cognitionem trian- 20 brirmos que nos ensine que ele não é enganador. Mas, se temo·; 1\.- 1),11·. 1.tl
guli, quamvis non certo fciamus, an aliquis fummus deceptor nos conhecimento que temos do triângulo, então todo duvidar.:: .-li111111.1.l11. 1·
fallat, eodem etiam modo polTumus pervenire ad talem Dei co- do mesmo modo pelo qual podemos chegar a tal conhecimento do \l 1.t ll)',11 I.. .
gnitionem, quamvis non certo fciamus, an detur quis fummus dece-
embora não saibamos ao certo se algum sumo enganador faz co111 q111 """
ptor, &, modo eam habeamus, fufficiet ad tollendam, uti dixi,
omnem dubitationem, quam de ideis claris, & diftinctis habere 25 enganemos, também do mesmo modo podemos chegar a tal conl1n 11111 11111
po!Tumus. Potro fi quis recte procedat inveftigando, qure priUs funt de Deus, embora não saibamos ao certo se se dá algum sumo .. 1. c.11~:111.11\
inveftiganda, nullâ interruptâ concatenatione rerum, & fciat, desde que o tenhamos, ele bastará para que seja eliminado, como 1·11 ,li·,.,1.
quomodô qureftiones fint determinandre, antequam ad earum co- todo duvidar que podemos ter sobre as ideias claras e distintas. (§80 \ J\dc111.11~ ..
gnitionem accingamur, nunquam nifi certiffimas ideas, id eft, cla- se alguém proceder retamente investigando as coisas que primeiro s:10 .1 i 11
ras, & diftinctas habebit: Nam dubitatio nihil aliud eíl:, quàm 30
fufpenfio animi circa aliquam affirmationem, aut negationem, quam vestigar, sem que qualquer concatenação das coisas seja interrompida, c s<111
affirmaret, aut negaret, nifi__oecurreret aliquid, quo ignoto co- ber de que modo as questões hão de ser determinadas antes que nos cinj:111t""
gnitio ejus rei debet elTe imperfecta. Unde colligitur, quõd dubi- ao conhecimento delas, nunca terá senão ideias certíssimas, isto é, cbr.1 \ '
tatio femper oritur ex eo, quôd res abfque ordine inveftigentur. distintas: pois o duvidar nada mais é que a suspensão do ânimo acno 1\..
alguma afirmação ou negação que ele afirmaria ou negaria se não ocorr<·~;·;··
Hrec funt, qure promifi tradere in hâc primâ parte Methodi. Sed 35
algo que, ignorado, [faz com que1deva ser imperfeito o conhecimenro •l.1
quela coisa. Donde se colige que o duvidar sempre se origina de que as cois.t"

são investigadas sem ordem.


(§811 Essas são as coisas que prometi trazer nesta primeira pant· d"

Método. Mas,

77
76
ut nihil 0111it.ta111 eor11m, qua~
ad n>gnitioncm i11tdh·l'I íb, & 1·j11s
vires poffuut conduccrc, tradam etiam pauca de memoriâ, &
~
i. l
I'·"·' 'I"' '" "·'"" '"""" ,l."I'" '"" 'i'" I'""'"' """'"'·" "' ,,,,,,,,., ""' '"" ,i,,
;, "' '"'"" ' ,k """ '"' """· """; """"'"" "'"·" P""' '" ,,,,,,,. " mcmlu·ó» " •
csq11ccime11to, onde n111qlrc 111aximamente considerar que a 111c111">ri.11'· 1·111

oblivione; ubi hoc maxime venit coníiderandum, quod memo- rnhorada com o recurso do intelecto e também sem o recurso do i111 dei 11 >.
ria corroboretur ope intellectus, & etiam abfque ope intellecttls.
Pois, a propósito do primeiro caso, quanto mais a coisa é intdiµ,ívd. 1.1111"
5 Nam quoad primum, quo res magis eíl: intelligibilis, eo facilius
retinetur, & contrà, quô minus, eô facilius eam oblivifcimur. mais facilmente é retida; e ao contrário, quanto menos, tanto mais hcil11w11
Ex. gr. fi tradam alicui copiam verborum folutorum, ea multo te nós a esquecemos. Por exemplo: se eu trouxer a alguém uma po1\;1" d ..
difficilius retinebit, quàm fi eadem verba in formâ narrationis tra- palavras soltas, ele muito mais dificilmente as reterá do que se eu trm 1xcssl· . 1~;
dam. Corroboratur etiam abfque ope intellectus, fcilicet à vi, mesmas palavras na forma de uma narração. (§82] [A memórial ta111ht'·111 {
10 quâ imaginatio, aut fenfus, quem vocant communem, afficitur
corroborada sem o recurso do intelecto, a saber, pela força através da 1111.tl .1
ab aliquâ re fingulari corporeâ. Dico fingularem: imaginatio enim
imaginação - ou, como se diz, o sentido comum - é afetada por alguma t• >i .... 1
tantum à fingularibus afficitur: Nam fi quis legerit ex. gr. unam tan-
tum Fabulam amatoriam, eam optime retinebit, quamdiu non lege- singular corpórea. Digo singular: a imaginação, com efeito, é afetada aprn;1~.
rit plures alias ejus generis, quia tum fola viget in imaginatione: fed por singulares; pois se alguém houver lido, por exemplo, apenas uma h '1\lll l.1
15 fi plures fint ejusdem generis, fimul omnes imaginamur, & facile de amor, haverá de retê-la otimamente enquanto não ler muitas outras tkssc
confunduntur. Dico etiam corpoream: nam à folis corporibus affi- gênero, porque, então, ela vige sozinha na imaginação, mas se são muitas do
citur imaginatio. Cum itaque memoria ab intellectu corroboretur,
mesmo gênero, imaginamos todas ao mesmo tempo e facilmente elas silo ru11
& etiam fine intellectu, inde concluditur, eam quid diverfum erre
ab intellectu, & circa intellectum in fe fpectatum nullam dari me- fundidas. Digo também corpórea: pois a imaginação é afetada apc1i;1s 11111
20 moriam, neque oblivionem. Quid ergo erit memoria? Nihil aliud, corpos. Ora, como a memória é corroborada pelo intelecto e tambt'·111 sc111 ••
quàm fenfatio impreffionum cerebri, fimul cum cogitatione ad de-- intelecto, daí se conclui que ela é algo diverso do intelecto, e que no intTk• 1••.
terminatam durationem d fenfationis; quod etiam ofl:endit remi- em si mesmo considerado, não se dá memória alguma, nem esqucci11K111 " ·
nifcentia. Nam ibi anima cogitat de illâ fenfatione; fed non fub (§83] O que será, portanto, a memória? Nada mais que a sensação das i111p1n
continuâ duratione; & fie idea iftius fenfationis non efl: ipfa dura-
sões do cérebro, simultaneamente com o pensamento em determinada du1 .1
25 tio fenfationis, id eft, ipfa memoria. An verô idere ipfre aliquam
patiantur corruptionem, videbimus in Philofophiâ. Et fi hoc ali- ção dda sensação, o que a reminiscência também mostra. Pois nesta íilri111 .1 .1
cui valde abfurdum videatur, fufficiet ad noíl:rum propofitum, ut alma pensa sobre aquela sensação, mas não sob uma duração contínua; e assi111.
cogitet, quôd, quô res eu- fingularior, eõ facilius retineatur, a ideia dessa sensação não é a própria duração da sensação, isto é, a prúpri.1
ficut ex exemplo Comredire modo allato patet. Porrõ quô res in- memória. Mas se, em verdade, as próprias ideias sofrem alguma corrupÇH >, 1."
algo que) veremos na Filosofia. E se a alguém isso parece muito absurdu.
d Si vero duratio /it indeterminata, memoria ejus rei e/t imperfecta, quod qui/que etiam vide- basta ao nosso propósito que pense que, quanto mais singular é a coisa, t;u11"
tur à natur8 didicilfe. Sape enim, ui alicui melius credamus in eo, quod dicit, rogamus1
mais facilmente será retida, como fica patente a partir do exemplo da Co111t'·
quando, (Jr ubi id contigerit. Quamvis etiam idea ipfa fuam habeant durationem in mente,
tamen &Um af/ueti /imus durationem determinare ope alícujus men/ura motas, quod etiam dia agora há pouco referido. Além disso, quanto mais a coisa é /inteligívc 1/ .
ope imaginationis /it, ideo nullam adhuc memoriam obfervamus, qua /it pura mentis.

d Mas se, em verdade, a duração é in determinada, a memória dessa coisa é imperfeit11, o •/W
também parece que cada um aprendeu da natureza. Pois, muitas vezes, para que 1miho1
creiamos em alguém sobre o que diz, perguntamos quando e onde isso aconteceu. Ai111/,r 1fW
as próprias ideias também tenham sua duração na mente, no entanto, como estamo.i "'"'
t umados a determinar a duração com recurso a alguma medida de movimento -- o 1111··
também se faz com recurso a imaginação - , não observamos, por isso, memória alg11111t1 'fll<'

seja da pura mente.

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·"':.1111 1.1111\1«·111 "· 11i.11:. l.11 111111·111<' 1<"1i,\.1. 1><>11<k, ;1 111:1~i111:1111c111c sint,uhr e
tdli~:1híl1rn· , '"" .-11:1111 l:wili1'1s rt'l.indur. ll11d1· 111axim1\ li11~11la- 1111r.1111c111c i111dit,Ív•·l 11.10 pmkrcrnos n:to n.:tcr.
1T111, .'X la11t.11mmo<lll i11t:clligihilcm 11011 potcrimus 11011 rcti- \ §8 Í \ /\ssirn, d islingu imos dessa maneira entre a ideia verdadeira e as
1
Hl'rc. demais pcn:cpçõcs, e mostramos que as ideias ficticias, as falsas e as demais
Sic itaque difiínximus inter ideam veram, & creteras perceptio- tl:rn sua origem na imaginação, isto é, em algumas sensações fortuitas e (por
ncs, oftendimusque, quod idere fictre, falfre, & creterre haheant 5
fuam originem ah imaginatione, hoc. eft, à quibusdam fenfatio-
nibus fortuitis, atque (ut fie loquar) folutis, qure non oriuntur
ah ipfâ mentis potentiâ, fed à caufis externis, prout corpus, five
fomniando, five vigilando varios accipit motús. Vel fi placet, hic
assim dizer) soltas, que não se originam da própria potência da mente, mas
de causas externas, na medida em que o corpo, seja sonhando, seja em vigilia,
recebe vários movimentos. Ou, se for preferível, compreende aqui por ima-
ginação o que tu quise<es, desde que seja algo divmo do intelecto e onde a
t
per imaginationem, quicquid velis, cape, modo fit quid diver- 10 alma tenha a razão de paciente, pois é indiferente o que quer que compreen-
fum ab intellectu, & unde anima haheat rationem patientis; per- das, depois que conhecemos que ela é algo vagante e pelo qual a alma padece,
inde enim eft, quicquid capias, poftquam novimus eandem quid \1
e que conhecemos simultaneamente também de que modo, pelo recu<'o do
vagum erre, & à quo anima patitur, & fimul etiam novimus, quo-
modo ope intellectús ab eâdem liheramur. Quare etiam nemo mi- intelecto, nos libertamos dela. Por isso, ninguém também se admire de que
retur, me hic nondum prohare, dari corpus, & alia neceiTaria, & ta- 15 1 ainda não provei aqui que há corpo e outras coisas necessárias e, no entanto,
men loqui de imaginatione, de corpore, & ejus conftitutione. Nem- falei da imaginação, do corpo e de sua constituição. Afinal, como eu disse, é
pe, ut dixi, eft perinde, quid capiam, poftquam novi erre quid indiferente o que eu compreenda, depois que conheci ser algo vagante, etc.
vagum, &e. (§851 Já a ideia verdadeira, mostramos que ela é simples, ou composta a
At ideam veram fimplicem eiTe oftendimus, aut ex fimplicibus
partit de simples, e que ela mostra de que modo e pot que algn é ou é feiro , e
compofitam, & qure oftendit, quomodo, & cur aliquíd fit, aut 20
factum fit, & quod ipfius effectús objectivi in animâ procedunt ad [também] que os efeitos objetivos dela prncedem na alma confonn e a ,,·úo
rationem formalitatis ipfius ohjecti; id, quod idem eft, quod ve- da formalidade de seu objeto; o que é o mesmo que disseram os antigos, :1
teres dixerunt, nempe veram fcientiam procedere à caufâ ad effe- saber, que a verdadeira ciência prncede da causa pata os cfotos. a nio ""' pdo
ctús; nifi quod nunquam, quod fciam, conceperunt, uti nos hic, fato de que nunca, que eu saiba, conceberam, como nós aqui. a.alm" "~i,nlo
animam fecundum certas leges agentem, & quafi aliquod automa 25 segnndo leis certas e assim como um autômato espiritual. [§86\ llondc"
fpirituale. Unde, quantum in initio Jicuit, acquifivimus noti-
quanto permitiu o início, adquirimos alguma noção de nosso intckcro ,. 11111.1
tiam noftri intellectús, & talem p.o-rmam verre idere, ut jam non
vereamur, ne vera cum falfis, aut fictis confundamus; nec etiam norma da ideia verdadeira tal que já não mais receamos confundir a vcrd:1dvi
mirabimur, cur quredam intelligamus, qure nullo modo fub ima- ra com as falsas ou as fictícias. Nem tampouco nos admiraremos por i111di
ginationem cadunt, & alia fint in imaginatione, qure prorfUs op- 30 gitmos algumas coisas que de nenhum modo caem sob a imaginaçio i""
pugnant intellectum; alia denique cum intellectu conveniant; passo que] outtas estáo na imaginação e se opõem inteiramente ao intck<"'·
quandoquidem novimus operationes illas, à quibus imaginatio-
e outras, por fim, convêm com o intelecto -, uma vez que conhecemos que
nes producuntur, fieri fecundum alias leges, prorfUs diverfas à
legihus intellectús, & animam circa imaginationem tantum hahe- aquelas operações pelas quais as imaginações são produzidas se fazem segun ·
re rationem patientis. Ex quo etiam confiat, quàm facile ii in 35 do outras leis, inteiramente diversas das leis do intelecto, e que a alma, no qm:
diz respeito à imaginação, tem apenas a razão de paciente. (§871 Pelo que

também consta o quão facilmente

81
80
magnos errores poffunt delabi, qui non acx:urate dill:inxerunt in-
'I
1 1'"1lt-111 <.111 \ n11 \ )', 1.111<1• ·., 11"·· .1q11 .. k :; q11c 11.10 1li s1i11r,1111.1111.11111.1.l.11111·1111
ter imaginationem, & intellectionem. ln hos ex. gr. quod exten- l'llll'l' i111agi11.1.,.1., 1· 11111 ·!1·1 .... 111. l'11r <,'H'lllfJlu, lll'Sll'S [erros!: q111· .1 1·\t1·11·.. 1"
fio debeat erre in loco, debeat erre finita, cujus partes ab invicem dcv;t t:star e111 u111 l11g.11, que dcv;t sc.:r finita, colll partes que Sl' di .-;1 i11)',ll• ·111
difiinguuntur realiter, quàd fit primum, & unicum fundamen-
rt:almente umas das outras, LJLLC [da] seja o primeiro e linico f'u11d;1111e1110 .i.
s tum omnium rerum, & uno tempore majus fpatium occupet,
quàm alio, multaque ejusmodi alia, qure omnia prorfUs oppug- todas as coisas, que ocupe mais espaço em um tempo do quc n11 0111111 . '

t nant veritatem, ut fuo loco ofiendemus. muitas outras da mesma modalidade, todas as quais se opôc.:m inrcir.11111·11t<' .' 1
Deinde cum verba fint pars imaginationis, hoc eft, quôd, prout verdade, como em seu dévido lugar mostraremos.
vage ex aliquâ difpofitione corporis componuntur in memoriã, [§88] Em seguida, como as palavras são uma parte da imagi11;11;ao, i.\ I" 1' .
10 muitos conceptus fingamus, ideô non dubitandum, quin etiam
fingimos muitos conceitos na medida em que elas se compõem na mrn1c'1ri.1 'k
verba reque, ac imaginatio, poffint erre caufa multorum, magno·
maneira vagante a partir de alguma disposição do corpo, por isso, 11ao li.'1 qw
rumque errorum, nifi magnopere ab ipfis caveamus. Adde quôd
fint confütuta ad libitum, & captum vulgi; adeõ ut non fint nifi duvidar que também as palavras, igualmente à imaginação, possam ser c;111s. 1, 11 ·
figna rerum, prout funt in imaginatione, non autem prout funt muitos grandes erros, a não ser que com grande trabalho nos acautc.:lctllos dcl.1....
1 s in intellectu; quod clare patet ex eo, quõd omnibus iis, qure [§89] Adicione-se que são constituídas arbitrariamente e conforme a rnlllptn-11
tantum funt in intellectu, & non in imaginatione, nomina impo- são do vulgo; a tal ponto que não são senão signos das coisas na 111cdid;1 1·111
fuerunt frepe negativa, uti funt, incorporeum, infinitum, &c. que estas estão na imaginação, mas não na medida em que estão no i111 cin 1" ·
& etiam multa, qure funt reverâ affirmativa, negative exprimunt,
Isso claramente fica patente a partir do fato de que a todas aquc.:las cois.1s •1w
& contrà, uti funt increatum, independens, infinitum, immor-
20 tale, &e. quia nimirum horum contraria multo facilius imagina-
estão somente no intelecto, e não na imaginação, impuseram no111cs 11111í1.1"
mur; ideoque prius primis hominibus occurrerunt, & nomina po- vezes negativos, como são "incorpóreo': "infinito", etc., e também de qu(' 111111
fitiva ufurpârunt. Multa affirmamus, & negamus, quia natura ver- tas coisas que são deveras afirmativas [eles] exprimem negativamrntl', ,. v11 •
borum id affirmare, & negare patitur, non verõ rerum natura; -versa, como são "incriado", "independente", "infinito", "imortal", etc., d,·,' ·111 •
adeoque hâc ignoratâ facile aliquid falfum pro vero fumeremus.
porque imaginamos muito mais facilmente os contrários delas; por iss1 •. 1" •11
25 Vitamus prreterea aliam magnam caufam confufionis, & qure
reram primeiramente aos primeiros homens e usurparam os nomes l"1s111,·· '"
facit, quominus intellectus ad fe reflectat: nempe, cum non diftin-
guimus inter imaginationem, & intellectionem, putamus ea, qure Muitas coisas afirmamos e negamos porque a natureza das palavras aU"il .1 .il11
facilius imaginamur, nobis erre clariora, & id, quod imaginamur, mar ou negar isso, mas não, em verdade, a natureza das coisas; l' a ui 1"111111
putamus intelligere. Unde qure funt pofiponenda, anteponimus, & que, ignorada esta última, facilmente assumimos algo falso como vc.:nhdl'i 111,
30 fie verus ordo progrediendi pervertitur, nec aliquid legitime con- [§90] Evitamos, além disso, outra grande causa de confusões e L]Ue 1:r1., •1111
cluditur.
que o intelecto não reflita sobre si mesmo, qual seja: quando não disti11g11i111• '"
• Porrõ, ut tandem ad fecundam partem hujus Methodi perve-
entre imaginação e intelecção, julgamos que aquelas coisas que mais facil1111 ·1111
e Pra?cipua hujus parlis R~gula e/t;·,11 ex primá parte /equitur, recen/ere omnes ideas, quas imaginamos nos sejam mais claras, e isso que imaginamos, julgamos i11tdi1»11
ex puro intellectu in nobis invenimus, ui ea? ab iis, quas imaginamur, di/linguanlur; quod
tx proprielatibus uniuscuju/que, 11empe imagi11ationis, & intellectio11·is, erit l'lz'ciendum. Donde, aquelas que hão de ser pospostas, antepomos; e assim é pcrvcrt i1 l.1 .1
verdadeira ordem para progredir e tampouco algo se conclui legitima111rn1 ..
[§91] cAdemais, para que finalmente cheguemos à segunda parte dc.1 1
Método,

e A regra precípua desta parte é, como se segue da primeira parte, recensear todas as id1ú.' '/""·
[provenientes} do puro intelecto, descobrimos em nós, para que elas sejam distinguirf.1, ,/,,
quelas que imaginamos; o que haverá ele ser eliciado a partir das propriedades ele c,ir/,111111.1.
designadamente, da imaginação e ela intelecção.

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83
llll""" • ' · " ' i ' " 1·111 1.ii f\kl<Hill l', <Ili •,q',11111.I, li', 1111 '1"" 1"11.1
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nia 111us, propo11am pri m\1 11ollrum fcopu111 i 11 li:'"' M d l11 >do, ac
deiudc media, ut cum attingamus. Scopus itaque dt daras, & q11c <>.li i1q.1111<>s. ()e,, "i'"· ··111.lll, \· t•·r i.l('Ll S< l.11.1·; ,. .lí st 1111.1~;. 1.1í " 'I"'" < Plll"
difünctas habere ideas, tales videlicet, qure ex purâ mente, & Sl' pmk vn, Sl'j .1111 kit.I S .1 p.11tir d:1 p11LI llH'llll' l' 11 ;10 dl' lllllVÍllll'lllllS 1;111111
11011 ex fortuitis motibus corporis factre fint. Deinde, omnes idere tos do corp<>. F111 sq~ui(b, par;1 que totbs as idei ;1s sc ja111 rn·o1Hltr1.itLis .111111.1,
ad unam ut redigantur, conabimur eas tali modo concatenare, & s csforçar-nos .. e111os p;1r;1 as concatenar e ordenar de tal modo l\lll" 11oss;111H·111< · .
ordinare, ut mens noftra, quoad ejus fieri poteft, referat objecti- o quanto possa fazê-lo, reproduza objetivamente a formal idade d:1 1i;1t111n.. 1,
ve formalitatem naturre, quoad totam, & quoad ejus partes.
Quoad primum, ut jam tradidimus, requiritur ad noftrum ul- tanto no todo quanto cm suas partes.
timum finem, ut res concipiatur vel per folam fuam efientiam, [§92) Quanto ao primeiro, como já colocamos, requer-se para 11<1ss< • li111
vel per proximam fuam caufam. Scilicet fi res fit in fe, five, ut 10 último que a coisa seja concebida através de sua essência t:io so11H·111 (' "'1
vulgo dicitur, caufa fui, tum per folam fuam efientiam debebit através de sua causa próxima. A saber, se a coisa é em si mesma, ou seja. co111"
intelligi; fi verô res non fit in fe, fed requirat caufam, ut exiftat, vulgarmente se diz, é causa de si, então deverá ser inteligida através de ~;11.1
tum per proximam fuam caufam <lebet intelligi: Nam reverâ 1 co-
essência tão somente; entretanto, em verdade, se a coisa não é cm si 11H·s111.1
gnitio effectús nihil aliud eft, quàm perfectiorem caufre cognitio-
nem acquirere. Unde nunquam nobis licebit, quamdiu de Inqui- 15 mas requer uma causa para que exista, então deve ser inteligida através ,k s11.1
fi:tione rerum agimus, ex abftractis aliquid concludere, & magno- causa próxima. Pois o fconhecimento do efeito nada mais é, deveras, q11 c .1.I
pere cavebimus, ne mifceamus ea, qure tantum funt in intellectu, quirir um mais perfeito conhecimento da causa. [§93) Donde nunca nos sn.'1
cum iis, qure funt in re. Sed optima conclufio erit depromenda ab lícito, enquanto tratamos da Inquirição das coisas, concluir algo a partir .lc
efientiâ aliquâ particulari affirmativâ, five à verâ & legitimá defini- abstrações; e haveremos de nos acautelar com grande trabalho para q11!' 11.1"
tione. Nam ah axioma ti bus folis univerfalibus non poteft intellectus 20
misturemos aquilo que está somente no intelecto com aquilo que (·st.'1 11.1
ad fingularia defcendere, quandoquidem axiomata ad infinita fe
extendunt, nec intellectum magis ad unum, quàm ad aliud fingulare coisa. Mas a melhor conclusão haverá de ser derivada de algu111a ,·ss,·11• 1.1
contemplandum, determinant. Quare recta inveniendi via eft ex da- particular afirmativa, ou seja, de uma verdadeira e legítima definiç10. I'"'"· . 1
tâ aliquâ definitione cogitationes formare: quod eõ felicius & fa- partir tão somente dos axiomas universais, o intelecto não pode dc;( (' I .1 ..
cilius procedet, quõ rem aliquam melius definiverimus. Quare car- 25 coisas singulares, uma vez que os axiomas se estendem a infinitas coi sas,. 11.1< •
do totius hujus fecundre Methodi partis in hoc folo verfatur, nem- determinam o intelecto a contemplar mais um singular do que outro. 1~9· 1 I
pe in conditionibus bonre definitionis cognofcendis, & deinde in mo-
Por isso, a reta via da descoberta é formar pensamentos a partir de al g11111.1
do eas inveniendi. Primo itaque de conditionibus definitionis agam.
Definitio ut dicatur perfecta, debebit intimam effentiam rei definição dada, o que se processará tanto mais feliz e facilmente quanto mdli<>1
explicare, & cavere, ne ejus loco propria quredam ufurpe- 30 houvermos definido alguma coisa. E, por isso, o fulcro de toda esta sq.>,1111.l.1
mus; ad quod explicandum, ut alia exempla omittam, ne videar parte do Método consiste apenas no seguinte: justamente em serem co11lw
aliorum errores velle detegere, adferam tantum exemplum alicu- cidas as condições da boa definição e, em seguida, no modo de as desrnl11i1.
jus rei abftractre, qure perinde eft, quomodocunque definiatur,
Assim, tratarei primeiro das condições da definição.
! Nota, quod hinc appareat nihil nos de Jfftlur4 po/fe (wettelijk, of behorelijk) in· [§95) A definição, para que seja dita perfeita, deverá explicar a csst·11<i.1
le/ligere, quin /imul cognitionem primce cau{ce, /ive Dei ampliorem reddamus.
íntima da coisa e precaver-nos para que não usemos no lugar desta algu11c;
próprios. A fim de explicar isso - de maneira que eu omita outros exempl<>s.
para não parecer que quero pôr a descoberto os erros de outras pessoas - 1;,,
necerei apenas o exemplo de alguma coisa abstrata, que é indiferente ;1 s!·j.1
qual for o modo pelo qual é definida,

N ota que aqui aparece que nós nada podemos inteligir <legítima ou devidamente > d, 1 N.11 11
reza sem que simultaneamente ampliemos o conhecimento da causa primeira, ou sej1z, rfr I >m '.

85
84
~ 1\wr, \o cx•·111pl11\ .l11 < Íl< 1i\<1; l"'I ~. q111·. •,1 · ,·. 1kl111ul11<11111<1•,1·111\1111111.1 li1•,11
,l ..

l'Ín:uli fcilicet: quôd fi ddiniatur, cffc figuram aliquam, cujus li- r.1 n 1jas 1i1i11.1s '011.\ 1r1.id.ts do , \' 11t1<1 I'·' 1.1 .1 , il\111 il n(·1 ll i.1s.10 ig11.1 i,,, 111ll)','1<'.111
ue;;e, à centro ad circumferentiam ductre, funt requalcs, nemo nao v(: qut· r;tl ddi11i\ªº d\' maneira alt,1111u \'X plica;\ l·sst'.·1H·i;11!0 dr, 11\<1, 111.1·.
non videt talem definitionem minime explicare effentiam circuli; apenas uma propriedade ddc. E embora, como eu disse, isso pou\·o i111pnrt•
fed tantum ejus aliquam proprietatem. Et quamvis, ut dixi, circa
1 5 figuras, & cretera entia rationis hoc parum referat, multum tamen
refert circa entia Phyfica, & realia: nimirum, quia proprietates
;tcerca de tiguras e demais olteS de razio, importa muito, contudo, ;Kn,·.1 1k
entes Físicos e rl'.ais; o que não é de admirar, posto qul'. as prnprieda\ks .!., ..
rerum non intelliguntur, quamdiu earum effentire ignorantur; fi coisas não são intdigidas enquanto suas essências são ignoradas; mas S\' 1w
autem has prretermittimus, neceffario concatenationem intelle- gligenciamos estas, necessariamente perverteremos a concatcnaçào do i11t('
ctus, qme Naturre concatenationem referre debet, pervertemus, & lecto, que deve reproduzir a concatenação da Natureza, e afastar-nos-\'li",,.,
10 à nofiro fcopo prorfüs aberrabimus. Ut itaque hoc vitio liberemur,
inteiramente de nosso escopo. (§96] Assim, para que nos libertemos dcssc
erunt hrec obfervanda in Definitione.
I. Si res J1t creata, definitio debebit, uti diximus, comprehen- vício, o seguinte haverá de ser observado na Definição:
dere caufam proximam. Ex. gr. circulus fecundum hanc legem fie l. Se se trata de coisa criada, a definição deverá, como dissemos, co111
eITet definiendus: eum effe figuram, qure defcribitur à lineâ quâ- preender a causa próxima. Por exemplo, o círculo, segundo esta lei, haveri;1 ,k
15 cunque, cujus alia extremitas eft fixa, alia mobilis, qure definitio ser definido assim: ele é uma figura descrita por uma linha qualquer, da q11.il
dare comprehendit caufam proximam. uma extremidade é fixa e a outra é móvel, definição que claramente \0111
II. Talis requiritur conceptus rei, five definitio, ut omnes pro-
prietates rei, dum fola, non autem cum aliis conjuncta, fpecta- preende a causa próxima.
II. É requerido um conceito ou definição da coisa, tal que, a partir dck.
tur, ex eâ concludi poffint, uti in hâc definitione circuli videre eft.
20 N am ex eâ clare concluditur omnes lineas à centro ad circumferen-
rodas as propriedades da coisa - quando esta é considerada sozinha l' 11.1"
tiam ductas requales eITe; quodque hoc fit neceITarium requifitum conjugada com outras - possam ser concluídas, como é de ver nessa deli 11i1,.1•,
definitionis, adeô per fe eft attendenti manifeftum, ut non videa- do círculo. Pois, a partir desta claramente se conclui que rodas as linhas' 011
l\
tur operre pretium in ipfius demonftratione morari, nec etiam often- 1. <luzidas do centro para a circunferência são iguais; e que isso seja um rn l' 11
dere ex hoc fecundo requifito omnem definitionem debere effe affir- sito necessário da definição é a tal ponto manifesto por si mesmo a q11<'111
25 mativam. Loquor de affirmatione intellectivâ, parum curando
atenta, que não parece valer o trabalho de demorar em sua demonsrr;u,.11 '·
verbalem, qure propter verborum penuriam poterit fortaffe ali-
quando negative exprimi, quamvis affirmative intelligatur. nem tampouco de mostrar, a partir desse segundo requisito, que roda ddi111
Definitionis vero rei increatre hrec funt requifita. ção deve ser afirmativa. Falo da afirmação intelectiva, pouco cuidando d.1
I. Ut omnem caufam fecludat, hoc efi, objectum nullo alio verbal, a qual, por causa da penúria das palavras, talvez possa porventura s!'1
30 prreter fuum effe egeat ad fui explicationem. expressa alguma vez negativamente, embora seja inteligida afirmativamcnt ..
II. Ut datâ ejus rei definitione nullus maneat locus Qureftioni, (§97] Da definição da coisa incriada, porém, são estes os requisitos:
An fit?
I. Que exclua toda causa, isto é, que além de seu próprio ser, o olij('I <>
III. Ut nulla, quoad mentem, habeat f ubftantiva, qure pof-
fint adjectivari, hoc efi, ne per aliqua abfiracta explicetur. não exija qualquer outro para sua explicação.
35 IV. Et ultimo ( quamvis hoc notare non fit valde neceffarium) II. Que, uma vez dada a definição dessa coisa, não permaneça lugar \l'" ·'
- "se el a e.
a Questao: '">".

I III. Que não tenha quaisquer substantivos que, quanto à mente, p\ iss.1111
ser adjetivados, isto é, que ela não seja explicada por algumas abstraçôcs.
IV. E, por último (embora notar isso não seja muito necessário)

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;. rnp1ni,lo q11c, .1 1•.11111 ,1, ·.11.1 ,klt11i< .1<>, tod.1·.. 1:. .•;11 .l.'; \ll")"l'"l.1.I•"· ""I·""
1

req11i1ítur, ut ab cjus ddi11itione 01n11cs ejus proprictates conclu- cond11íd:1s. '\;,d.is , ..;:,.1.,, .,,· .. 1.·; 1.1111\i;·111 SL' fazem 111 ;111iks1;1s ;\q1wk q11c .111 111.1
dantur. Qmc etiam 01nnia attendenti accurate fiunt' manifefia.
Dixi etiam, quôd optíma conclufio erít depromenda ab elTentiâ acuradarnente.
(§98) Eu também disse que a melhor conclusão havcr;'i de ser ,kriv.1.l.1
aliquâ partículari affirmativâ: Quõ enim fpecialior eft idea, eô di-
de alguma essência particular afirmativa; pois, quanto mais cspn:í IÍ<";1 «· 11111.1
ftinctior, ac proinde clarior eft. Unde cognitio particularium quàm
maxime nobis qurerenda eft. ideia, tanto mais distinta e, por isso, mais clara ela é. Donde, o co11hL·Li111c111 •>
Quoad ordinem vero, & ut omnes noftrre perceptiones ordinen- dos particulares é o que maximamente há de ser buscado por nós.
tur, & uniantur, requiritur, ut, quàmprimum fieri poteft, & (§991 Mas, em verdade, quanto à ordem, e para que todas as 11ms.1 ·.
ratio poftulat, inquiramus, an detur quoddam ens, & fimul percepções sejam ordenadas e unidas, requer-se que - o quanto antes se 1" 1:;•.. 1
quale, quod fit omnium rerum caufa, ut ejus eiientia objectiva fit 10 fazer, e a razão o postula - inquiramos se se dá algum ente, e simulunc1111<·111,-
etiam caufa omnium nofirarum idearum, & tum mens noftra, uti
dixímus, quàm maxime referet Naturam: Nam & ipfius eiien- qual [ele é], que seja causa de rodas as coisas, a fim de que sua esst:nci;1 o\.j1·
tiam, & ordinem, & unionem habebit objectíve. Unde poiiumus tiva seja também a causa de rodas as nossas ideias e, então, nossa mente, ,·111111 •
videre, apprime nobis e.ITe nece.ITarium, ut femper à rebus Phyfi- dissemos, venha a reproduzir maximamente a Natureza, pois ted. obje1iv.1
cis, five ab entibus realibus omnes noftras ideas deducamus, pro- 15 mente tanto sua essência, quanto sua ordem e união. Donde podemos v,·r 'l"' ·
grediendo, quoad ejus fieri poteft, fecundum feriem caufarum ab nos é necessário, desde o início, sempre deduzir nossas ideias a partir ,k
uno ente reali ad aliud ens reale, & ità quidem, ut ad abfiracta, &
coisas Físicas, ou seja, de entes reais, progredindo, o quanto se possa Ll'l.<"I.
univerfalía non tranfeamus, five ut ab iis aliquid reale non conclu-
damus, five ut ea ab aliquo reali non concludantur: Utrumque
l' segundo a série das causas, a partir de um ente real para outro ente rc;1 l, , !, ·
enim verum progrelTum intellectus interrumpit. Sed notandum, 20 \ modo que seguramente não passemos a [ideias] abstratas e univers;iis. .·;q.1
me hk per feriem caufarum, & realium entium non intelligere fe- para que não concluamos algo real a partir delas, seja para que não as co11< l11.1
riem rerum fingularium mutabilium, fed tantummodõ feriem re- mos a partir de algo real, pois tanto uma coisa como a outra interro11qw111 •>
rum fixarum, reternarumque. Seriem ením rerum fingularíum
verdadeiro progresso do intelecto. [§100) Mas é de notar que eu aqui 11.1•'
mutabílíum impoffibile foret humanre imbecillitati afTequi, cum
propter earum omnem numerum fuperantem multitudínem, tum 25 intelijo por série das causas e dos entes reais a série das coisas singulares 11111
propter infinitas circumftantias in unâ & eâdem re, quarum una- táveis, mas exclusivamente a série das coisas fixas e eternas. Pois seria i111po:;
qureque poteft efTe caufa, ut res exifiat, aut non exiftat; quando- sível à debilidade humana seguir a série das coisas singulares mutáveis, 1;1111' >
quidem earum exiftentia nullam habet connexionem cum earun- por causa de sua multidão, que supera todo número, quanto por caus;1 d.1 .·;
dem e.ITentiâ, five (ut jam diximus) non eft <eterna veritas. Ve-
infinitas circunstâncias de uma e mesma coisa, qualquer uma das quais P' >
rumenimverõ neque etiam opus eft, ut earum feriem intelligamus: 30
dendo ser causa de que a coisa exista ou não exista, uma vez que a existt'IH i;1
fiquidem rerum fingularium mutabilium eíTentire non funt depro-
mendre ab earum ferie, five ordine exiftendi; cum hic nihil aliud no- delas [se. das coisas singulares mutáveis] não tem conexão alguma com s11.1
bis prrebeat prreter denominationes extrinfecas, relationes, aut a<l essência, ou seja (como já dissemos), não é uma verdade eterna. [§101] l\!hs,
fummum circumfiantias; qure o_pnia longe abfunt ab intimâ ef- a bem da verdade, nem sequer é preciso que intelijamos a série delas, visto quc
fentiâ rerum. Hrec verõ tantum eft petenda à fixis, atque c:eternis re- 35 as essências das coisas singulares mutáveis não são derivadas de sua sériL'. '111
seja, da ordem do [seu] existir, uma vez que aí nada mais se nos apresenta ak-111
de denominações extrínsecas, relações ou, no máximo, circunstâncias, rod.1:,
as quais estão longe da essência íntima das coisas. Esta, em verdade, so1m·111"
há de ser pedida às coisas fixas e eternas,

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1· :; \ll\ldl.lill'.1111<·111 .. .I '• 1, I".. 111 ',t 111.1'. ll \",',,I'. <111 ·.. 1·, t <>111<1 1·111 '. l li'· \'1·111.11\<li•"·
hus, & limul ;\ lcgibus in iis rcbus, tanquam in fuis VPrÍs (·mlici- '"'din·s, sq~11111lo ,1 s q11.11 :, 1111l.1 s .1 s 1ois.1s si1q•,11l.1r<· s se l.11c 111 ,. ~;,· 1111ln1.1111.
bus, infcriptis, fecundum quas omnia fingularia, & fiunt, & or- 111ais ai111b, css;1 s ,·oi s;1s si11g11bn·s 11111L ;'1vci s dqK111k111 (por .1ss i111 di ·1.n) 1.111
dinantur; imõ h<ec mutabil ia fingularia adeõ intime, atque effen- íntima e essencialmente d ;1s li xas, qu e sem das 11ào podc111 IH ' lll sn 1w111 .. ,.,
tialiter (ut fie clicam) ah iis fixis pendent, ut fine iis nec effe, nec concebidas. Donde essas coisas fixas e eternas, embora se ja111 si1 ').',li L1 r("s, :;1·1.1• •
s concipi poffint. Unde hrec fixa, & retema, quamvis fint fingula-
para nós, contudo, em razão de sua ubíqua presença e \atíssima po1l'111i.1 ,' '1111• •
ria, tamen oh eorum uhique prrefentiam, ac latiffimam poten-
tiam erunt nohis, tanquam univerfalia, five genera definitionum que universais ou gên eros das d efiniçõ es das coisas singubl'L's 111111.'1 v,·i·; '
rerum fingularium mutahilium, & cauf;e proximre omnium causas p róximas de rodas as coisas.
rerum. (§102) Mas, como isso é assim, parece subsistir uma 1üo pcq111·11.1 di11
lo Sed, cum hoc ità fit, non parum difficultatis videtur fubeffe, ut culdade para que possamos chegar ao conhecimento desses singuhrL·s, 1•uí·.
ad horum fingularium cognitionem pervenire poffimus : nam conceber rodos simultaneamente é coisa muito acima das forças do i111 cln 10
omnia fimul concipere res eft longe fupra humani intellectus vires.
Ordo autem, ut unum ante aliud intelligatur, uti diximus, non humano. A ordem, porém, para que um seja inteligido antes do outro, '' >11 '' •
eft petendus ah eorum exiftendi ferie, neque etiam à rebus reternis. dissemos, não há d e ser pedida à série de seu existir, nem tampouco :1s 1·11i s .1 "
15 Ihi enim omnia hrec funt fimul naturâ. Unde alia auxilia neceffariõ eternas. Nestas, com efeito, todas elas são simultâneas por natureza. 1).,11d1
funt qurerenda prreter illa, quibus utimur ad res retemas, earum- outros auxílios são requeridos além daqueles que utilizamos para i11tdigi1 .1·;
que leges intelligendum; attamen non eíl: hujus loci ea tradere, ne- coisas eternas e as suas leis; entretanto, n ão é este o lu gar de os tct·1.n , 11<·111
que etiam opus eft, nifi poíl:quam rerum reternarum, earumque
tampouco é mister [fazê-lo), a n ão ser depois que adquirimos suíi,·i,·111(","
infallihilium Jegum fufficientem acquifiverimus cognitionem, fen-
20 fuumque nofuorum natura nohis innotuerit.
nhecimento das coisas eternas e d e suas leis infalíveis e [depois\ qw .1 11.1111
Antequam ad rerum fingularium cognitionem accingamur, tem- reza de nossos sentidos se nos deu a conhecer.
pus erit, ut ea auxilia tradamus, qure omnia eõ tendent, ut no- (§103) Antes de nos cingirmos ao conhecim ento das coisas si11g11l.11• "·
ftris fenfihus fciamus uti, & experimenta certis legihus, & ordine será t empo d e trazer esses auxílios, rodos os quais t enderão a [fazer L·o111 •I"' \
facere, qure fufficient ad rem, qure inquiritur, determinandam, saibamos usar n o ssos sentidos e realizar, segundo leis e ordem certas, 1 1:. ' · '
25 ut tandem ex iis concludamus, fecundum quafnam rerum reterna-
perimentos que são suficientes para que a coisa que se iO:quire sej a ,k1 c11111
rum leges facta fit, & intima ejus natura nohis innotefcat, ut fuo
loco oftendam. Hic, ut ad propofitum revertar, tantum enitar tra- n ada, de maneira que, por fim , concluamos segundo quais leis d as coi ~.. 1"
dere, qure videntur necelfaria, ut ad cognitionem rerum reterna- eternas ela se faz , e sua natureza íntima se nos dê a conhecer, como most r.11 c1
rum pervenire poffimus, earumque definitiones formemus condi- em seu devido lugar. Aqui, para retornar a [nosso propósito, empen har 11w ,·1 1
30 tionibus fuprà traditis. em trazer apenas as coisas que p arecem necessárias a que possamos chq.',;1r .1• •
Quod ut fiat,-revocandum in memoriam id, quod fuprà dixi- conhecimento das coisas eternas e formemo s as definições delas sob ;1s '' i11
mus, nempe quôd, ubi mens ad aliquam cogitationem attendit, ut
ipfam perpendat, honoque ordine ex eâ deducat, qure legitime dições trazidas acima.
funt deducenda, fi ea falfa fuerit, falfitatem deteget; fin autem (§104) Para que isso se faç a, há que revocar n a memória aquilo qw
35 vera, tum feliciter perget fine ullâ interruptione res veras inde de- dissemos acima, a saber, que quando a m ente atenta a algum pensa11K11111.
para que o pondere e dele d eduza em boa ordem as coisas que h ão de sn k
gitimamente deduzidas, ela porá a descoberto a falsidade se ele for fol su. 111.1 ·.
se, pelo contrário, [for) verdad eiro, então com felicidade prossegnicí . sn11
interrupção alguma, a deduzir dele coisas verdadeiras;

91
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d.,, .,.,-..; Iro .. , 111q11:r111, ;1d 1101ic1111 n·111 rcquirit:ur. N;1111 ex 111111 .. :1ho
fu 11d;1111c11t:o cog'Íta tioncs uoHra: detcn11inari q ucun t. Si igi tur rc111 is.'> •>. .l11n. /. Ji-<jil('Jid•> p.11.1 111>.~ .~o ,1.o;s1111to. Pois .1 p;trlir de 11•·111111111 1>11!1<>
om11ium primam invefl:igarc velimus, nece!Ie cfi dari aliquod fun- r1111da111n1to podn11 110.~SOS f>CllS:tlllClllOS ser determinados.
darnentum, quod noftras cogitationes eo dirigat. Deinde quia l § 105 I Portanto, caso q uciramos investigar a primeira de todas as coisas,
Mcthodus eH ipfa cognitio reflexiva, hoc fundamentum, quod no- é necessário dar algum fundamento que dirija nossos pensamentos para isso.
Hras cogitationes dirigere debet, nullum aliud potefi e!Ie, quàm
Em seguida, porque o Método é o próprio conhecimento reflexivo, esse fun-
cognitio ejus, quod formam veritatis confütuit, & cognitio inte1-
lcctt1s, ejufque propri,e tatum, & virium: hâc enim acquifitâ fun- damento que deve dirigir nossos pensamentos não pode ser qualquer outro
damentum habebimus, à quo noftras cogitationes deducemus, & senão o conhecimento daquilo que constitui a forma da verdade e o conhe-
viam, quâ jnte11ectus, prout ejus fert capacitas, pervenire pote- 10 cimento do intelecto, de suas propriedades e forças: adquiridos esses [conheci-
rít adintellectt'.ts.
rium rerum reternarum cognitionem, habitâ nimírum ratione vi- mentos), teremos o fundamento a partir do qual deduziremos nossos pen-
samentos, bem como a via pela qual o intelecto, na medida em que sua capa-
Quõd fi verõ ad naturam cogitationis pertineat veras formare cidade suporta, poderá chegar ao conhecimento das coisas eternas, tendo em
idcas, ut in primá parte oftenfum, hic jam inquirendum, quid per
vires & potentiam inte11ectus intelligamus. Quoniam veró prreci- 15 conta, é claro, as forças do intelecto.
pua nofirre Methodi pars eft vires intellectüs, ejusque naturam [§106) Ora, se pertence à natureza do pensamento formar ideias verda-
optime inte11igere, cogimur nece1Tariõ (per ea, qure in hâc fecun- deiras, como foi mostrado na primeira parte, aqui, porém, há de ser inquirido
dâ parte Methodi tradidi) hrec deducere ex ipfâ cogitationis, & ín- desde já o que inteligimos por forças e potência do intelecto. Mas, em verdade,
tellectus definitione. Sed hucufque nullas regulas inveniendi defi- uma vez que a parte principal de nosso Método é inteligir da melhor maneira
nitiones habuimus, & quia eas tradere non po!Iumus, nifi cognitâ 20
as forças do intelecto e sua natureza, somos coagidos necessariamente (por
naturâ, five definitione intellectCzs, ejufque potentiâ, hinc fequi-
tur, quôd vel definitio intellectus per fe debet elTe clara, vel nihiJ conta daquilo que eu trouxe nesta segunda parte do Método) a deduzi-las a
intelligere po!Iumus. Ilia tamen per fe abfolute clara non e/1; atta- partir da própria definição do pensamento e do intelecto [§107) Mas até aqui
men quia ejus proprietates, ut omnía, qure ex intellectu habemus, não tivemos regra alguma para descobrir definições e, porque não as podemos
clare, & diftincte percipi nequeunt, nifi cognitâ earum naturâ: ergo 25 trazer a não ser que seja conhecida a natureza ou definição do intelecto e de
definitio intellectus per fe innotefcet, fi ad ejus proprietates, quas sua potência, segue-se daí que ou a definição do intelecto deve ser clara por si
dare, & difüncte intelligimus, attendamus. Intellectus igitur pro-
mesma, ou nada podemos entender. Ela, porém, não é clara absoluta111l'l 1tc I'' >r
prietates hic enumeremus, eafque perpendamus, deque noftris
innatis « inftrumentis agere incipiamus. si mesma; entretanto, porque as propriedades dele, corno tudo qt1\' rrn1m ;1
IntellectCzs
ligo, hce funt. proprietates, quas prrecipue notavi, & clarc intel- 30 partir do intelecto, não podem ser percebidas clara e distinta111c1ttL· a 11ao sn
que seja conhecida a natureza delas, então, a definição do i11tdccto por si 111cs
I. Quõd certitudinem invoJvat, hoc eft, quõd fciat res ità effe ma dar-se-á a conhecer, se atentamos às suas propriedades, q uc d:tra e d i .~ t i11
formaliter, ut in ipfo objective continentur.
tamente inteligimos. Enumeremos aqui, portanto, as propriedades do i111dn
II. Quõd quredam percipiat, five quasdam formet ídeas abfo-
g v;"e fuprà pag. 13. 14, & /eqq. to e as ponderemos, e comecemos a tratar de nossos ginstrumentos inatos.
[§108) As propriedades do Intelecto que principalm<.:nte notei e dar;1
mente intelijo são as seguintes.
I. Que envolva a certeza, isto é, que saiba que as coisas são fornul 111n11 e
assim como estão contidas objetivamente nele próprio.
II. Que perceba algumas coisas - ou seja, forme algumas ideias ;1l)m
lutamente,

g Vide supra pag. 13/3 65, 141366 ss.


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93
I 1
l11t1\ qu:isd;1111 ex aliis. N<'lll/W qua11t:it:1tis idc:i111 lor111:il ahfol11 -
e .ilg11111a .\ ,, p.1r1i1.k1>1111 .1·.. l'.11 • .-ri••, { .il>.\ 01111 .11111·1111· •pw 1·11 · f,>1111.1.11.!1 ·1.1
t(~, nec ad alias attendit cogitationes; motús verõ ideas no11 nili
attendendo ad ideam quantitatis. 1 tk 1111a11ti1hdc l' 11,10 .11n1t.1 .1 0111ros pc11.s:1111c111os; 111as, 11.1 vnd.11k, .1•; 1dn.1·.
III. Quas abfolute format, infinita tem exprimunt; at deter- de movimento, 1J;to 1as l(1rnial senão atentando;\ ideia de q11:1111id.1dc.
5 minatas ex aliis format. Ideam enim quantitatis fi per caufam III. Aquelas que forma absolutamente exprimem a infi11idad1·; 111.1s .1·.
percipit, tum eam per quantitatem determinat, ut cum ex motu determinadas, ele [as] forma a partir de outras. Com efeito, a ideia d,, q11.111
alicujus plani corpus, ex motu linece vero planum, ex motu denique
tidade, se ele a percebe através de uma causa, então por ela determina :1q11;111
puncti lineam oriri percipit; qure quidem perceptiones non infer-
viunt ad intelligendam, fed tantum ad dt;terminandam quantita- tidade, como quando percebe o corpo originando-se a partir do 111ovi11H·111 o
rn tem. Quod inde apparet, quia eas quafi ex motu oriri concipimus, de algum plano, mas o plano, a partir do movimento da linha, e a linli:1, po1
curn tamen motus non percipiatur, nifi perceptâ quantitate, & fim, a partir do movimento do ponto; as quais percepções, é claro, não snv1·111
moturn etiam ad formandam lineam in infinitum continuare pof- para inteligir mas apenas para determinar a quantidade; o que fica, daí, j lirn1 I
fumus, quod minime poffemus facere, fi non haberemus ideam
infinitre quantitatis. aparente, porque as concebemos como que se originando a partir do 11111
15 IV. Ideas pofitivas prius format, quàm negativas. vimento, quando, no entanto, o movimento não é percebido a 1üo sn •[•li'
V. Hes non tam fub duratione, quàm fub quâdam fpecie reter- seja percebida a quantidade, e também [porque] podemos continuar o 111ovi
nitatis percipit, & numero infinito; vel potius ad res percipien- mento ao infinito para formar uma linha, o que de maneira nenhuma fH 11 lc
das, ncc ad numerum, nec ad durationem attendit: cum autem res ríamos fazer se não tivéssemos a ideia da quantidade infinita.
imaginatur, eas fub certo numero, determinatâ duratione, &
20 quantitate percípit. IV. Forma as ideias positivas primeiro que as negativas.
VI. Idcre, quas claras & diíl:inctas formamus, ità ex folâ nc- V. Percebe as coisas não tanto sob a duração quanto sob algu 111 asp.-1 lo
ceffitate noftrre naturre fequi vidcntur, ut abfolute à folâ nofüâ da eternidade e em número infinito; ou melhor, para perceber as coi s.1s. 11.10
potentiâ pendêre videantur; confufre autem contrà. No bis enim atenta nem ao número, nem à duração; mas, quando imagina as coi.\,1.·;, ck
invitis icepe formantur.
as percebe sob um número certo e sob uma duração e uma quant id.Hk .i.
25 VII. Ideas rerum, quas intellectus ex aliis format, multis
terminada [s].
modis mcns determinare poteft: ut ad dcterminandum ex. gr. pia-
num ellipfeos, fingit ftylum chordre adhccrentem circa duo centra VI. As ideias que formamos claras e distintas parecem, assim, scg11i1 ··•
moveri, vel conàpit infinita puncta eandem femper, & certam da necessidade de nossa natureza tão somente, de maneira que parnT111 1k
rationem ad datam aliquam rectam lineam habentia, vel conurn pender absolutamente de nossa potência sozinha, mas [com] as co111'11·.. 1"
-'º plano aliquo obliquo fectum, ita ut angulus inclinationis major fit [ocorre] o contrário; pois muitas vezes são formadas malgrado nós 111cs111m
angulo vertíeis coni, vel aliis infinitis modis.
VII. As ideias das coisas que o intelecto forma a partir de outras, :1 111< · 11
VIII. Idece, quo plus perfectionis alicujus objecti exprimunt,
cõ perfectiores funt. Nam fabrum, qui fanum aliquod excogita- te as pode determinar de muitos modos: de maneira que, por exemplo, p.11 .1
vit, non ità admiramur, ac illum, qui templum aliquod infigne determinar o plano da elipse, ela finge um lápis preso a uma corda, movc11do
35 excogita vit.
-se ao redor de dois centros; ou concebe infinitos pontos tendo sempre .1
mesma razão certa com alguma linha reta dada; ou um cone cortado por 11111
plano oblíquo, tal que o ângulo de inclinação [deste] seja maior que o ;"111~11 I• •
do vértice do cone; ou de outros infinitos modos.
VIII. As ideias, quanto mais exprimem da perfeição de algum objeto.
tanto mais perfeitas são. Pois, o construtor que excogitou uma capela 11;10 /·
admirado da mesma maneira que aquele que excogitou um templo insigw.

94
95
11 1~ 10') 1 N.1·. 1C'.l .111 I •
Hdiqua, qu:r ad cogitationem rcfcruutur, ut a111or, la~tí­ '. • • 11'.,I '. <p IC .,,. 1<·k11 ·111 .I< • 1w11'.,l l I WI 1I <•. <<>111< • <• .1111< •1.
tia, &e. nihil rnoror: narn nec ad nofirum infütutum pr:rfens fa- a;ilcgri.1, l'l< ., 11.1" Ili<' 1k111llLllTÍ lll'lll 11111 I'"''' li, pois d.is 11<·111<01111111111 111
ciunt, nec etiam poffunt concipi, nifi percepto intellectu. Nam para 11 osso p rl'sc 111 e i11s1 i111 to, 1H.' lll podem 1:1111po11 co ser co 111d li d .1 s .1 11.1" ·,11
perceptione omnino fublatâ ea omnia tolluntur. que seja percebido o i11tclccto. Pois, suprimida complct:1111ullc a IH'l'<Tjl\ .1•"
ldere falfre, & fictre nihil pofitivum habent (ut abunde ofiendi- s
todas das são eliminadas.
mus), per quod falfre, aut fictre dicuntur; fed ex folo defectu cogni-
tionis, ut tales, confiderantur. Idere ergo falfre, & fictre, quate- [§110] As ideias falsas e fictícias nada têm de positivo pdo q11c s.10 d i "'"
nus tales, nihil nos de effentia cogitationis docere poffunt; fed falsas ou fictícias (como abundantemente mostramos), mas (: a partir 1.1"
hrec petenda ex modo recenfitis proprietatibus pofitivis, hoc efi, somente de uma deficiência de conhecimento que são consideradas u llll< • t .11'>.
jam aliquid commune fiatuendum e.íl:, ex quo hre proprietates ne- 10 Logo, as ideias falsas e fictícias, enquanto tais, nada podem nos e11si11;1r soli1"
ceffario fequantur, five quo dato hre neceffario dentur, & quo a essência do pensamento, mas esta deve ser pedida às propriedadl's pmit i v.1·.
fublato hrec omnia tollantur.
agora há pouco recenseadas, isto é, há que se estatuir, desde já, algo de n li 1111111,
Reliqua defiderantur. a partir do qual essas propriedades sigam-se necessariamente, ou seja, .ill'."
que, uma vez dado, [faz com que] elas necessariamente sejam dadas,,.'!""·
uma vez suprimido, [faz com que] todas elas sejam eliminadas.

Falta o rcslo.

l 96 97
Título Tratado J,t emenda do intdn._"lo

Autor Espinosa

Tradução C ristiano Novacs de Rczi:ndl'

Assistente técnico de direção José Emílio Maiorino


Coordenador editorial Ricardo Lima
Secretário gri fico Ednilson Tristão
Preparação dos originais Lúcia Helena Lahoz Mordi i
Revisão G ustavo Menassi
Edito ração eletrônica Silvia Helena P. C. Gonçalves
\ Assessora de projetos gráficos
Formato
Lygia Arc uri Eluf
16 x 23 cm
Papel Offset 90 g/ m' - miolo
Carrão supremo 250 gi m' - capa
Tipologia Garamond Premier Pro
Número de páginas 104

ESTA OBRA FOI IMPRESSA NAJLE GRÁFICA & EDITORA


PARA A EDITORA DA UNICAMP EM JULHO DE 2015.

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