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1.

NOÇÕES BÁSICAS DE TEORIA SOBRE O TEXTO

O TEXTO

O texto, numa noção mais abrangente, caracteriza-se como qualquer manifestação da


capacidade textual do ser humano. Essa manifestação deve ser dotada de sentido,
permitindo que o discurso do autor seja entendido pelo menos para um determinado
grupo de pessoas, em uma determinada situação. Na tirinha, Calvin questiona os
significados das palavras como unidades independentes. O que ele não nota é que
quando as palavras fazem parte de um contexto – e, logo, de um texto – elas, juntas,
adquirem um significado amplo e único, esse mesmo que torna possível o discurso no
qual acontece a comunicação entre as pessoas. Esse discurso pode se manifestar por
meio de palavras faladas ou escritas, podendo ter uma extensão variável desde que
possua um contexto significativo para existir.

A importância dessa manifestação do discurso ocorre em diversos aspectos. Um deles é


o fato de que a leitura e a escrita são pontes incontestáveis para que haja uma inclusão
de qualquer indivíduo dentro da sociedade. Hoje em dia, a comunicação se dá de
diversas formas, como por meio da Internet, e-mail, fax, memorandos e cartas, e um
texto bem escrito pode ser fundamental em muitas situações. O estudante ou
profissional, seja ele de qualquer área, precisa conhecer bem seu idioma e as normas de
escrita para que assim possa elaborar textos concisos e bem estruturados, que
transmitam de forma clara seu objetivo, ponto de vista ou intenção.

Um profissional de qualquer ramo deve ser capaz de utilizar a linguagem como


instrumento de aprendizagem e trabalho, sabendo fazer uso de informações contidas nos
textos, bem como conhecer e analisar criticamente os usos da língua.

No contexto jurídico, essa capacidade se faz ainda mais necessária, pois a palavra, seja
ela falada ou escrita, é o principal instrumento de trabalho de um profissional do
Direito. Dessa forma, o texto torna-se parte desse instrumento, no qual as palavras
manifestam o discurso do autor e seus argumentos.

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1.1 GÊNEROS TEXTUAIS

Os gêneros textuais fundamentam-se em critérios sócio-comunicativos e discursivos, ou


seja, são uma questão de uso, não de forma. Eles referem-se aos textos materializados
em situações comunicativas recorrentes, da nossa vida diária, fortalecendo os
relacionamentos interpessoais por meio da troca de informações. Os gêneros são
definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente
realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.

Quando pensamos na importância dos gêneros textuais para a linguagem, podemos


tomar como base o conceito apresentado por Bakthin (1997). Nele, o linguista afirma
que os gêneros textuais são formas relativamente estáveis de enunciados que se definem
por aspectos relacionados ao conteúdo, à composição estrutural e aos traços linguísticos,
extremamente ligados aos contextos (condições e finalidades) nos quais estão inseridos.

É por esta dependência com relação ao contexto que eles são historicamente variáveis;
assim, podemos dizer que é a imensa diversidade de gêneros que forma a língua.

Trabalhar com gêneros textuais permite ainda a articulação das atividades entre as áreas
de conhecimento, contribuindo diretamente para o aprendizado significativo de prática
de leitura, produção e compreensão de texto.
Partindo dessa ideia de dependência com relação ao contexto, como dito anteriormente,
podemos ter um texto que está de acordo com um determinado gênero, porém está
inserido num contexto inadequado, gerando uma situação desagradável ou até mesmo
mudança no sentido original da mensagem.

Ex.:
Um aluno quer mandar um e-mail para seu professor, a fim de conseguir uma revisão de
seu conceito final em um trabalho acadêmico. Ele escreve o e-mail, porém utilizando
uma linguagem extremamente informal, como se falasse com um amigo ou colega. O
estudante utilizou o gênero de forma certa, porque um e-mail pode ser informal. No
entanto, o contexto pedia outro tipo de produção, pois além de se tratar de um pedido a
respeito de um processo acadêmico, o texto se dirigia a alguém superior ao aluno.
Sendo assim, a linguagem usada deveria ser formal. O estudante não apenas causou
constrangimento com a situação, como pode ter mudado o sentido de sua mensagem,
pelo fato dela poder ser entendida pelo professor como uma provocação.

Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta
pessoal, romance, bilhete, reportagem, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia
jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de
restaurante, instruções de uso, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada,
conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador e
assim por diante.

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1.2. TIPOLOGIA TEXTUAL

Os tipos textuais fundamentam-se em critérios linguísticos e formais. Eles se definem


por seus traços linguísticos predominantes: aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais,
relações lógicas. A tipologia textual é definida, de um modo geral, nos seguintes tipos
de texto: narração, descrição, dissertação/argumentação, exposição e injunção.

O texto narrativo é o texto no qual se conta um fato, fictício ou não, ocorrido em um


determinado tempo e lugar, que envolve personagens e um narrador. Há uma relação de
anterioridade e posterioridade entre os fatos narrados e, frequentemente, esses fatos
mantêm entre si uma relação de causa e efeito. Por isso, muitas vezes, a ordem em que
os fatos são enunciados é de relevante importância na sequência narrativa.
Ex.:
“Certo dia, minhas duas filhas e eu fomos passear pelo sítio. Na margem do rio havia
uma pequena canoa. O espírito de aventura falou mais alto. Entramos na canoa e, no
meio do leito, notamos a água infiltrando-se. Percebi o desespero das meninas, mas
tive de aparentar toda a calma e...”
Percebe-se que se trata de um texto narrativo devido aos aspectos mencionados, como
personagens (“minhas filhas”, “eu”), lugar (“sítio”, “margem do rio”), e,
principalmente, a relação de anterioridade/posterioridade e de causa/efeito: “fomos
passear... entramos... e notamos... percebi...”

O texto descritivo enumera aspectos físicos e/ou psicológicos de um lugar, uma pessoa,
um animal ou um objeto. Nesse tipo de texto, o uso dos adjetivos é grande, justamente
pela função caracterizadora dessa classe de palavras. Na descrição nenhum dos fatos, ou
informações, é necessariamente anterior a outro. Por isso, a inversão na ordem dos
enunciados não altera a imagem descrita.
Ex.:
“Fui criada numa casa simples, mas de cômodos bem amplos e confortáveis. Um
jardim colorido e aromático. Beija-flores por aqui não faltam. Tenho duas filhas. Ana,
uma menina alta, meio desengonçada, mas de um brilho especial nos olhos muito
pretos. Virgínia, uma menina muito magra, gestos e rosto delicados, tem uma cabeleira
tão ruiva que poderia ser confundida com uma dessas atrizes do cinema americano...”

Temos aqui um exemplo de texto descritivo, voltado para a descrição de aspectos físicos
e visuais dos elementos expostos. O uso de adjetivos se faz muito presente ao longo do
trecho apresentado, o que exemplifica uma das principais características desse tipo
textual.

O texto dissertativo tem como função persuadir o leitor a aceitar a ideia defendida pelo
texto, ou seja, aceitar a tese defendida pelo autor. Esse texto privilegia o discurso
indireto (3ª pessoa), embora também possa ser escrito na 1ª pessoa. Costuma abordar
temas polêmicos e que gerem discussão.

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Ex.:
“A vida de uma mulher não é fácil em parte alguma deste mundo. A sociedade machista
impõe-lhe regras e destinos que ela jamais pode escolher. A mulher será sempre uma
escrava totalmente submissa ao marido, às tradições, aos costumes e à hipocrisia
chauvinista dos...”

Este é o exemplo clássico do texto dissertativo, pois nele está inserida uma tese –
afirmação inicial (“A vida de uma mulher não é fácil em parte alguma deste mundo”) –
e logo depois o autor dá início aos argumentos com os quais irá sustentar essa tese.

O texto expositivo é o texto que oferece informações e conhecimento a respeito de


algum assunto, e está relacionado com os outros tipos textuais, pois ao fornecer as
informações, pode se utilizar de meios narrativos, descritivos e até dissertativos. Como
exemplos desse tipo textual temos o relatório, o texto didático, o artigo enciclopédico,
reportagem, etc.
Ex.:
“Dando continuidade ao projeto meio ambiente, oitenta alunos dos 6º aos 9º anos da
nossa escola, acompanhados da coordenadora e professora Luciane, tiveram
oportunidade de conhecer a diversidade da fauna e da flora brasileira no zoológico de
São Paulo, o maior zoológico do Brasil. A excursão aconteceu no dia 05 de outubro
com saída em dois ônibus, com saída da escola às 7h30min. A viagem foi tranquila. Os
motoristas fizeram uma parada de 15 minutos no rancho Pamonha, na cidade de Santa
Isabel e depois seguiram direto para o zoológico, chegando lá às 11h50min.”

Nesse exemplo, o texto tem por principal objetivo relatar como se deu uma excursão, ou
seja, oferecer as informações a respeito do acontecido. Veja que, para tanto, também são
utilizados recursos de descrição e narração.

O texto injuntivo é o texto que indica como realizar uma ação, ou seja, tem
características de uma instrução. Geralmente utiliza linguagem objetiva e simples, além
de verbos no imperativo. Como exemplos temos receitas culinárias, manuais, regras,
leis, etc.
Ex.:
“Bolo de Banana.
Caramelize uma forma com açúcar, corte 10 bananas no sentido do comprimento,
coloque-as na forma, bata 4 ovos com uma xícara de leite, duas de farinha de trigo e
uma colher de fermento. Despeje a massa na forma, polvilhe (a gosto) com canela e
açúcar e leve ao forno pré-aquecido em 180ºC. Deixe...”

Nesse exemplo, o uso do verbo no imperativo marca bem a tipologia textual do texto
injuntivo, além das instruções para realizar a ação (fazer o bolo de banana). É um texto
simples e bem objetivo, com função e propósito específicos.

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2. ELEMENTOS GRAMATICAIS E LINGUÍSTICOS

2.1 COESÃO

Coesão é a conexão interna que existe dentre os vários segmentos presentes em um


texto. Um texto é coesivo quando seus vários enunciados estão articulados entre si por
meio de elementos de coesão, pois são eles que colocam em evidência as relações de
sentido existentes entre os enunciados.

O uso adequado dos elementos de coesão, ou conectores, confere unidade ao texto e


contribui para a clareza na expressão das ideias. Podemos classificar a coesão como
referencial e sequencial.

2.1.1. Coesão Referencial

2.1.1.1. Coesão por substituição


- Consiste em fazer uso de conectivos ou expressões para sintetizar e retomar
substantivos, verbos, expressões e partes de textos já referidos.

Exemplos:
*O temporal destruiu o telhado da escola. Em vista disso, as aulas foram suspensas.
*Marcos, Tiago e Mateus compraram um Fiesta, um Corsa e um Gol, respectivamente.

Nesses exemplos, as expressões grifadas retomam informações já ditas, sintetizando o


texto e aprimorando-o estilisticamente.

2.1.1.2. Coesão por referência


- Consiste na referência de elementos do próprio texto. Para isso, utilizam-se pronomes
pessoais, possessivos, demonstrativos ou advérbios e expressões adverbiais que indicam
a localização desses elementos.

Exemplos:
*Ana é uma excelente funcionária. Ela sempre cumpre as metas propostas.
*Prefiro Bento Gonçalves a Porto Alegre. Esta é mais violenta, aquela é mais calma.
Ambas oferecem boas perspectivas profissionais.
*Paulo aplica seu dinheiro na poupança e Joaquim o aplica em ações.
Veja que nesses exemplos a ideia é retomar o elemento recém mencionado, a fim de
mostrar a proximidade desse item lexical.

2.1.1.3. Coesão lexical


- Trata-se da retomada de ideias e partes delas por meio de palavras já ditas, sinônimos,
hiperônimos, nomes genéricos ou palavras do mesmo campo semântico.

*A criança caiu e chorou. Também, o menino não fica quieto! (sinônimo)


*Pedro desenhou quadrados, retângulo e losangos. Os quadriláteros estavam corretos.
(hiperônimo)

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*O fogo acabou com tudo. A casa estava destruída. Da casa não sobrou nada.
(repetição)

Aqui vemos a retomada de elementos do texto tanto por meio de palavras diferentes,
quando pela própria palavra, sem nenhum comprometimento da estilística do texto.

2.1.1.4. Coesão por elipse


- Consiste na omissão de certas palavras, expressões e até frases para evitar a repetição
desnecessária, mas preservando o sentido. A elipse pode aparecer substituindo qualquer
elemento linguístico.

*Eles acordaram e viajaram. (elipse de pronome – eles)


*Eu comprei camisas. Minha irmã, saias. (elipse de verbo – comprou)

Os exemplos mostram como esse recurso é útil e bastante utilizado no dia-a-dia, por sua
capacidade de sintetizar o texto, porém preservando seu sentido, ou seja, mesmo com as
elipses, você é capaz de entender a informação que o texto quer passar.

2.1.2. Coesão Sequencial

2.1.2.1. Sequenciação temporal


- Em um texto, certas expressões podem indicar uma ordenação temporal.
Exemplos:

Levantou cedo, tomou banho e saiu. E não: Saiu, tomou banho e levantou cedo.

Os capítulos anteriores tratam da eletrostática; agora falaremos da eletrodinâmica,


deixando os problemas de eletromagnetismo para os próximos.

Em textos jurídicos essa característica coesiva é bastante importante, pois além de fazer
parte do texto em si (narração e exposição dos fatos), esse recurso também traz uma
melhora estilística considerável na apresentação textual.
Veja nos exemplos:

“Nessa linha de evolução, tendo-se em conta, de outra parte, que já há algum tempo
vêm sendo consolidadas experiências de estabelecimento de cotas raciais para ingresso
em universidades...”
“É de se pontuar, de início, que, ao contrário do que, de regra, se afirma, a matéria em
foco já não é tão nova e vem sendo objeto de debates há muitos anos.”
(Processo n.° 8350-10.00/12-0, Parecer n.° 15.703/12)

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2.1.2.2. Sequenciação por conexão
- O texto funciona por meio da interligação entre os enunciados, que gera sua
compreensão. Essa interdependência é expressa por meio de conectivos – conjunções,
preposições e outros itens gramaticais – que são responsáveis pela articulação de
elementos linguísticos (palavras, frases, orações, períodos), podendo carregar ou não
significado para as relações que fazem. As conjunções, assim como as preposições, não
desempenham função sintática, o que ressalta seu papel de elementos conectores.
Veja como os conectivos estão presentes nos diferentes gêneros textuais do nosso
cotidiano:

Dados também de 2000 e 2001 sobre educação, produzidos pelo IPEA, sistematizados por
Ricardo Henriques e apresentados por José Jorge de Carvalho16:

- 57% dos adultos brancos não completaram o ensino fundamental, enquanto 75,3% dos
adultos negros não completaram o mesmo período de ensino.
- 63% dos jovens brancos de 18 a 23 anos não completaram o ensino médio, enquanto 84%
dos jovens negros não completaram o ensino médio.
- 12,9% dos brancos completaram o ensino médio, enquanto apenas 3,3% dos negros
completaram o ensino médio.

Além das conclusões tradicionais da desigualdade de ensino - como decorrência da pobreza


mais acentuada entre a população negra - o relatório do PNUD ainda aponta práticas
pedagógicas perpetuadoras do racismo no espaço escolar, tendo em vista que, frequentemente,
constata-se procedimentos ou reprodução de argumentos ou de abordagens que tendem a
reafirmar estereótipos.

(...)
As desigualdades educacionais, por sua vez, se refletem no mercado de trabalho. Com baixa
escolaridade e precisando trabalhar mais cedo, restam cargos de menor qualificação em
proporção maior aos negros.

(Processo n.° 8350-10.00/12-0, Parecer n.° 15.703/12)

Podemos notar como as conjunções funcionam bem como elemento de ligação entre as
informações apontadas. A conjunção temporal “enquanto” ocupa função contrastiva no
texto, fazendo uma comparação acerca dos dados. Temos também conjunções aditivas
(além das... ainda...), causais (tendo em vista que) e alternativa (ou... ou...), assim como
nos exemplos abaixo:

7
(Tirinha do Calvin e Haroldo retirada do site http://deposito-de-tirinhas.tumblr.com)

8
(reportagem de O Globo Online, publicada em 26/07/2008)

Veja como o uso inadequado de algum desses elementos coesivos pode acarretar
problemas na transmissão de uma mensagem, como nessa publicação do jornal Folha de
São Paulo:

ERRAMOS.
Trecho da carta “Ética na imprensa” publicada no Painel do Leitor em 1/1, teve seu
sentido alterado. Em vez de “Mesmo que tivesse sido sedução por parte de uma garota
de 10 anos – idade dela na época -, teria sido estupro”, leia-se “mesmo que tivesse sido
sedução em uma garota de 10 anos (idade dela na época), teria sido estupro”.

2.2 COERÊNCIA

A coerência textual diz respeito à possibilidade de estabelecer, no texto, alguma forma


de unidade ou relação. Está ligada com a rede de sintonia entre as partes e o todo, ou
seja, estabelece relações entre os seus elementos (palavras, expressões, frases,
parágrafos, capítulos). Permite identificar o texto como uma unidade de sentido.

A textualidade é constituída por meio da coerência, fazendo, de uma sequência


linguística, um texto completo e não um amontoado aleatório de frases ou palavras.
Sendo assim, podemos dizer que ela está ligada ao texto como um todo, pois se refere à
macroestrutura do mesmo.

Para haver uma boa coerência em um texto existem alguns fatores importantes a serem
seguidos:

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Continuidade: para que um texto seja coerente, é preciso que ele contenha, no seu
desenvolvimento linear, elementos de recorrência. Uma sequência que trate a cada
passo de um assunto diferente certamente não será aceita como texto.
Exemplo de um texto sem continuidade:

“Fomos ao show, por isso o carro não pegou. Ela então brigou com o namorado, logo,
a comida esquentou.”

No exemplo, apesar do texto fazer uso de elementos coesivos, como conjunções, não
existe uma continuidade linear lógica entre os fatos apresentados.

Progressão: deve haver no desenvolvimento do texto uma ampliação do sentido


constantemente renovada, ou seja, é necessário que novas informações sejam
apresentadas com relação aos elementos que são retomados. O sentido do texto progride
a partir desses acréscimos semânticos, que podem ser novos comentários sobre um
mesmo tópico, ou uma transformação dos comentários em novos tópicos.

Exemplo de um texto sem progressão:


“O menor abandonado preocupa a população porque a marginalidade acaba levando-
o ao crime. Dessa forma, notamos que a marginalização se caracteriza como um
motivo para a inclusão do menor no mundo do crime. Logo, a população fica
preocupada diante desse fato.”

Veja que o texto segue bem estruturado, no entanto não existe o desenvolvimento da
ideia principal, pois não há inclusão de novas informações. Dessa forma, não temos
progressão, o que dá a impressão de que o texto não sai do lugar.

Não-Contradição: no desenvolvimento do texto é preciso que não se introduza nenhum


elemento que contradiga o que já foi enunciado anteriormente.
Exemplo de um texto incoerente por conter contradição:

Veja que nesse caso temos uma incoerência no anúncio. Será que eles trabalham
enquanto descansam?

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Articulação: é preciso que os fatos expostos, no mundo representado pelo texto, estejam
articulados entre si. Nesse caso, são dois aspectos a serem verificados: a presença e a
pertinência dessas articulações entre os fatos e conceitos apresentados. O texto pode
apresentar elementos relacionáveis sem que eles estabeleçam ligações entre eles, ou
pode estabelecer relações não pertinentes entre os fatos apresentados.

Exemplo: Na defesa de uma tese, uma pessoa pode pensar em utilizar como argumentos
insultos, ironias ou sarcasmos relacionados ao assunto discutido, no entanto esse tipo de
escolha não é pertinente ao tipo de argumentação requerida.

Outros fatores de coerência que devem ser levados em conta na construção de um texto
são:

- elementos linguísticos (itens lexicais, estruturas sintáticas)


Ex.: elementos de coesão (já vistos anteriormente).

- conhecimento de mundo (conhecimento do interlocutor sobre a temática do texto)


Ex.: “Sarney compara a operação da PF ao caso Watergate.” (SARNEY compara a
operação da PF ao caso Watergate. Folha de S. Paulo, São Paulo, 14 mar. 2002, p.
A5).
O exemplo mostra a necessidade de conhecer o assunto para a compreensão da
manchete. Se o interlocutor não tiver a informação do que seja o caso Watergate
(espionagem que provocou a renúncia do presidente norte-americano Richard Nixon),
não terá elementos para relacioná-lo com a candidatura de Roseana Sarney à presidência
da República, filha de José Sarney, ex-presidente da República (denúncia de grande
quantidade de dinheiro encontrado no escritório de seu marido
leva à renúncia de sua candidatura).

- implícitos (inferência e pressuposição)


Inferência – pode ser negada pelo texto
Ex.: - A mãe vai comprar doce de leite?
- Está na lista de compras.
Veja que a resposta é dada de modo a entender que o doce de leite será comprado, pois
consta na lista de compras. No entanto, a compra não é uma certeza.

Pressuposição – não pode ser negada pelo texto


Ex.: João parou de jogar.
Note que na frase, o verbo parou traz a pressuposição que João jogava.

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- intertextualidade (uso de conteúdos referidos direta ou indiretamente de outros textos)
Ex.:

No meio do caminho tinha uma pedra “No meio do caminho


Carlos Drummond de Andrade tinha uma pedra...
E uma ponta de cigarro
“No meio do caminho tinha uma pedra E uma lata
Tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma E um saco plástico
pedra E até cacos de vidro.”
No meio do caminho tinha uma pedra.”

O primeiro texto é um famoso poema do poeta Carlos Drummond de Andrade; o


segundo é um poema anônimo que se utilizou de um dos conteúdos do primeiro para
sua construção, a frase principal do poema. A partir desse “empréstimo”, o segundo
autor foi capaz de produzir um novo texto, inclusive com certa crítica social (a sujeira
urbana), diferente do poema de Drummond. Essa é a chave da intertextualidade: não se
trata de copiar a produção de alguém, mas sim de utilizá-la como base ou referência
para uma nova produção, dotada de novos sentidos e concepções.

3. O TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO

Dissertação

A dissertação é a exposição ou explanação de ideias, que pode conter traços de


argumentação. É uma modalidade de composição que visa analisar, ou comentar
expositivamente conceitos ou ideias sobre um determinado assunto. Possui uma
natureza reflexiva que consiste na ordenação dessas ideias a respeito de um determinado
assunto contido em uma frase-tema, um conjunto de textos verbais, não verbais, ou até
mesmo uma mescla de textos.

Dissertar é debater. Para discutirmos questões dos variados assuntos que a sociedade
nos apresenta precisamos da dissertação. É com ela que desenvolvemos nossas opiniões,
principalmente quando queremos nos fazer ouvir. Se quisermos que nossas reflexões
sejam levadas em conta por nossos ouvintes ou leitores, temos que saber utilizar nossa
capacidade dissertativa a nosso favor, aprimorando-a e exercitando-a sempre que
possível.

Uma das principais justificativas para o porquê de dissertarmos, é o fato de que


opinamos o tempo todo sobre tudo e, com isso, nos sentimos ativos e relevantes.

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Dissertar e argumentar são manifestações prazerosas da nossa racionalidade e, portanto,
são atitudes tão naturais para nós seres humanos.

A dissertação em forma de texto costuma ter um papel mais objetivo nas nossas vidas.
Geralmente surge como uma prova para testar nossas habilidades de redação, como em
vestibulares, concursos e testes em geral. Por essa razão, começamos a exercitar essa
habilidade desde o ensino escolar, e seguimos trabalhando com ela ao longo de nossas
experiências acadêmicas e profissionais.

A dissertação escrita é dividida em três partes básicas: introdução, desenvolvimento e


conclusão.

- Na introdução é apresentada a ideia central (tese) que será discutida, informando o


leitor sobre o assunto que vai ser abordado no texto. Nessa primeira parte, os
argumentos podem ser citados ou não, de acordo com o tamanho do texto (textos curtos
dispensam citações de argumentos na introdução). Em geral, a introdução corresponde a
um parágrafo.

- No desenvolvimento são desdobrados os argumentos, em parágrafos únicos para cada


um dos que forem discutidos. Nele são inseridos dados concretos e científicos (fatos),
exemplos, ilustrações, palavras de autoridades, etc.

- A conclusão encerra o texto. Nela aparece uma confirmação da tese inicialmente


apresentada, podendo também sintetizar os principais aspectos discutidos no
desenvolvimento. Além disso, pode propor de solução para o problema apresentado ou
uma reflexão. Em textos curtos, a conclusão costuma ser constituída de um parágrafo.

Veja algumas redações de alunos que servem de exemplos de dissertação e que mostram
as qualidades da habilidade discursiva, como organização de ideias, precisão
argumentativa e reflexão questionadora.

Universalização com informação

Devido à sua natureza social, o ser humano, durante toda a sua história, dependeu dos
relacionamentos para conviver em comunidade e assim transformar o mundo. Hoje, as
redes sociais na internet adquirem extrema importância, visto que são os principais
meios através dos quais as pessoas se relacionam diariamente. Além de universalizar o
acesso a elas, devemos também conhecer esse novo ambiente em que agimos.

As inovações tecnológicas, em sua maioria, buscam criar soluções que facilitem cada
vez mais as nossas tarefas do cotidiano. Uma dessas tarefas, imposta pela sociedade, é a
de mantermo-nos presentes e participativos em nossos círculos de relacionamentos,
principalmente no dos amigos. Tarefa árdua em meio ao agito e falta de tempo do nosso
estilo de vida contemporâneo, tornou-se muito mais simples com o advento das redes
sociais digitais, como o "Facebook" e "Orkut", por exemplo.

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O sucesso dessas inovações é notado pela adesão maciça e pelo aumento considerável
no número de acessos.

Porém, um ponto importante a ser analisado é a questão do futuro da privacidade. O fato


de acessarmos essas redes até mesmo do conforto do nosso lar, isolado contato físico do
convívio social, nos faz esquecer de que a internet é um ambiente público. Nele as
outras pessoas podem, e vão julgar comportamentos, criticar idéias, acompanhar os
"passos" dos outros e inclusive proporcionar constrangimentos.

A velocidade com a qual as redes virtuais foram inseridas em nossa sociedade ainda não
permitiu que as pessoas assimilassem e reconhecessem os limites que separam o

ambiente público do privado. Mediante esse descompasso, é importantíssimo que os


governos incluam na agenda da universalização do acesso às redes, também ações
educativas — palestras ou cursos — a fim de orientar os cidadãos, novos atores, sobre o
que é e como funciona esse novo palco de relações. Atitudes como essa é que vão
garantir, com dignidade, o acesso a esse mundo virtual de relações.

Redação de Wellington Gomes de Souza, São Paulo (SP)

Veja que no primeiro parágrafo, encontra-se o tema e apresenta-se a tese de que é


preciso conhecer melhor o ambiente das redes sociais. Ao longo do desenvolvimento
(segundo e terceiro parágrafos), apresentam-se os argumentos para justificar os aspectos
positivos e os negativos dessa tecnologia. Por fim, na conclusão (quarto parágrafo),
retoma-se o tema, insistindo na ideia de que as pessoas ainda não reconhecem os limites
entre o público e o privado. Apresenta-se, então, a proposta de que é preciso orientar os
cidadãos por meio de ações educativas. Embora tenha sido pouco desenvolvida, a
proposta é coerente com a tese apresentada no texto. Além disso, o tema é desenvolvido
de forma clara, os argumentos selecionados são consistentes e justificam a tese de que é
preciso conhecer melhor esse ambiente virtual. O texto recorre a vários conectores
responsáveis por expressar relações lógicas e promover o encadeamento textual. Por
exemplo, no primeiro parágrafo, a locução "visto que" introduz uma causa em relação à
ideia anterior.

Quinze minutos de fama (ou a eternidade)

Estar em todos os lugares sem sair de casa, acesso rápido às informações e contato com
as pessoas em frações de segundo: são algumas das maravilhas do mundo moderno.
Porém é preciso cuidado ao lidar com tamanha facilidade de interação. Falta de
privacidade, demasiada exposição individual e até mesmo a perda de personalidade, são
fatores que andam na contramão da progressiva internet.

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Fazer parte de uma rede social hoje é, além de ferramenta de comunicação,
possibilidade de usar a web à seu favor, personalizando-a e adequando-a as suas
necessidades e preferências. Não raro acontecem exageros na hora de expor detalhes
sobre a vida, o que representa sério risco, visto que a internet é um meio público, de
fácil acesso e manipulação de dados. Sem autorização, é frequente o número de meninas
que se vê em fotos de sites pornográficos.

Ainda no contexto de exposição individual, há outra vertente: a falta de privacidade.


Embora todos queiram seus "quinze minutos de fama", esse tempo se torna
incontrolável quando há minúcias sobre a vida pessoal disposta na rede. Passivo de
críticas, preconceito e do tão famoso "bullying", está quem perde o controle de suas
informações, além de o problema extravasar da vida digital para a vida real.

Para os jovens, a maior dificuldade parece ser discernir o real do literário. Ainda em
formação moral, muitos deles assimilam as piadas e idéias alheias como suas, sem
prévia crítica. Acontecem assim, sem que haja controle, disseminações de brincadeiras
de mau gosto, de padrões comportamentais prejudiciais, muitas vezes, à vida e
sociedade e à construção de sua personalidade.

Diante das inúmeras discussões comportamentais que a nova era digital propicia, é
preciso repensar e nortear as ações individuais para que se mantenha agradável e
saudável a vivência coletiva. Órgãos públicos, agentes de educação e família devem
trabalhar na disseminação de informações sobre a vida online.

Nesse sentido, será possível percebê-la como qualquer outro ambiente social, que
implica respeito e reconhecimento de limites pessoais.

Redação de Manuela Marques Batista, Rio de Janeiro (RJ)

Nessa redação, a introdução (primeiro parágrafo) situa o tema: valoriza-se o progresso


da internet, apontando suas vantagens, mas alerta-se para alguns problemas. Logo
depois, o texto se desenvolve nos três parágrafos seguintes: assinalam-se os benefícios
do uso da rede social como ferramenta de comunicação, relatam-se algumas
consequências graves quando se expõe a privacidade na internet, e destaca-se o perigo
da falta de discernimento que pode ocorrer entre o real e o virtual. Na conclusão (último
parágrafo), identifica-se a proposta de intervenção para o problema abordado,
respeitando os direitos humanos: os órgãos públicos, os agentes de educação e a família
devem trabalhar em conjunto. Veja que a redação apresenta encadeamento lógico das
ideias e inúmeros recursos coesivos: pronomes, conectores e termos ou expressões para
retomar referentes do contexto anterior ("algumas das maravilhas do mundo moderno",
"Nesse sentido", "visto que a internet é um meio público"; "Diante das inúmeras
discussões").

Redações retiradas do site da Zero Hora. Reportagem: “Redações nota mil servem de
exemplo”.

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Argumentação

A argumentação visa a persuadir ou influenciar o leitor ou ouvinte. Procura


principalmente formar a opinião deste, tentando convencê-lo de que a razão está
conosco, de que nós estamos de posse da verdade. Mais além, retomaremos esse
conceito em conjunto com outros aspectos da argumentação.

3.1. ESTRUTURA DO TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO

Uma dissertação deve ser construída a partir de um projeto de dissertação, ou seja, uma
estrutura previamente projetada para que dê certo, apresentando lógica e unidade
temática. Dentro desse projeto é obrigatório existir dois elementos: tese e
argumentação. O emissor deve pensar com antecedência na tese, nos argumentos e nas
possíveis objeções que um ponto de vista pode suscitar, pois, assim, seu envolvimento
com o tema será mais aprofundado e, consequentemente, seu posicionamento estará
mais amadurecido, evitando contradição e evasão (fuga do tema).
O texto dissertativo pode conter também antítese, argumentos contrários e refutação.
Isso vai depender do tipo de assunto abordado e de quanta informação possui o leitor.
Se o texto fala de um tema polêmico e há possibilidade do público leitor ser bem
informado a respeito, podendo se posicionar no sentido contrário à tese, então é possível
utilizar os fatores mencionados.

O projeto de dissertação deve apresentar:

- um problema ou questão a ser analisado que orientará a perspectiva ou o


posicionamento do autor, ou seja, sua tese. Exemplo de problema: A pílula do dia
seguinte é um método abortivo?
- um emissor com um propósito persuasivo, ou seja, uma tese sobre o tema para ser
defendida. Exemplo: A pílula do dia
seguinte não é um método abortivo.
- argumentos transparentes e analíticos que tentem demonstrar a verdade da tese, a
partir de dados racionais, lógicos, morais, emocionais ou científicos. Exemplo: A pílula
do dia seguinte não é um método abortivo, pois a vida começa após a formação do
sistema nervoso, e não no dia seguinte à relação sexual.
- um receptor (sujeito real ou idealizado pelo receptor) que receberá a mensagem e será
o alvo da argumentação.

16
Vejamos um esquema argumentativo contendo esses itens de acordo com o exemplo
apresentado:

PROBLEMA OU QUESTÃO
A pílula do dia seguinte é um
método abortivo?

EMISSOR

Opinião sobre o problema


(TESE): A pílula do dia
seguinte não é um método
abortivo.

persuasão
ARGUMENTAÇÃO: A pílula do dia seguinte não é um
método abortivo, pois a vida começa após a formação
do sistema nervoso, e não no dia seguinte à relação
sexual.

Receptor

Tese

- É uma proposição avaliativa que orientará toda a argumentação numa dissertação.


- Em geral é enunciada na introdução do texto, para garantir maior clareza à mensagem.
- Deve ser uma frase afirmativa e de sentido completo, com sujeito, verbo e
complemento.
- É uma opinião sobre uma determinada questão que costuma ser polêmica, complexa e
delicada, que precisa ser comprovada por meio de elementos discursivos, como
exemplos, fatos, casos reais, etc.
- Se for fraca, insustentável ou inconsistente, acabará comprometendo todo o texto, pois
os argumentos estão ligados a ela.
- Antes de ser enunciada, deve ser questionada pelo próprio idealizador, refletindo a
respeito da sua opinião sobre o assunto, a fim de encontrar argumentos razoáveis que a
sustentem.

Uma boa dica para saber se uma ideia pode ser considerada tese é completar a expressão
“Pretendo mostrar que...” com ela. Se não fizer sentido, não é tese, mas apenas um
tema.

17
Exemplo:
Tema: Globalização
Questão: Qual a relação existente entre a globalização e o desemprego?
Tese imaginada: A globalização contribui para o aumento do desemprego.
Teste para a tese: Pretendo mostrar que a globalização contribui para o aumento do
desemprego, alegando que (...)

A tese deve apresentar um ponto de vista questionável, pois a necessidade de


argumentar surge quando há dúvidas acerca de uma afirmação. Dessa forma, a tese não
pode ser óbvia demais ou não proporcionará um bom desenvolvimento, já que não será
possível encontrar argumentos novos ou informativos para sustentá-la.

Ex. O gelo é frio.

Veja que, no caso, em princípio, não há argumentos novos ou bastantes para demonstrar
esta “tese”, porque ela é óbvia, ou mesmo difícil de ser negada.

Argumentos

- São elementos de persuasão que pretender levar o receptor a aderir à ideia proposta.
- Os argumentos, por serem justificativas da tese, são ligados a ela pela pergunta “por
quê?”

Exemplo:
Tese: (pretendo mostrar que...) A educação de qualidade é condição primeira da
cidadania.
Argumento: (por quê?) pois é o conhecimento que possibilita o acesso democrático ao
mercado de trabalho.

- Os argumentos devem se referir a algo próximo ou conhecido do receptor; assim, a


tese terá mais chances de ser aceita.

Antítese e refutação

- A antítese é a opinião de quem discorda da tese defendida. Sua inclusão no texto se dá


para que as objeções presentes na mente do leitor sejam eliminadas, e assim ocorra mais
facilmente o convencimento.
- Se o tema é controvertido e há grandes chances do receptor pensar de modo contrário à
tese, o uso da antítese é uma boa estratégia.
- Ao introduzir uma antítese no texto, é necessário colocar um conectivo adversativo
(“mas”, “porém”, “contudo”) e citar a opinião de outra pessoa (um especialista, uma
autoridade, um grupo de pessoas) para que o texto não seja contraditório com a tese
defendida, o que causaria um erro de coerência na dissertação.
- A antítese também requer argumentos que a defendam, mas é importante não
confundir o argumento da tese com o da antítese. Nesse caso, chamamos este de
argumento contrário.

18
- Depois de inseridos a antítese e o argumento contrário, o emissor deve apresentar a
refutação, ou seja, a frase que elimina a dúvida introduzida pela antítese.
- Caso o emissor use a antítese, é obrigatório que exista a refutação, ou o texto ficará
contraditório e incoerente.
- Ao apresentar a refutação, o emissor tenta tornar a antítese insustentável, evidenciando
como os argumentos são ilógicos, frágeis, superados, etc. Destruindo as dúvidas (ideias
contrárias), ele confirma e reforça sua tese.

Vejas abaixo um modelo de um projeto de dissertação completo, com todos os


elementos citados:

Tese (direção do
(pretendo mostrar pensamento) O sorvete é um bom alimento.
que...)
Argumento
porque é refrescante e nutritivo.
(por quê?)
Porém, segundo alguns nutricionistas, seu
Antítese
consumo não é recomendado.
Argumento
pois é um alimento que engorda.
contrário
Todavia, existem as versões light e diet,
Refutação
também saborosas e pouco calóricas.

Essas características são amplamente vistas em textos jurídicos, em defesas de teses,


especialmente no que diz respeito aos argumentos. Veja um exemplo de antítese,
argumento contrário, refutação e argumentos nesse parecer que se posiciona a favor das
cotas raciais:

“Por fim, os argumentos no sentido de que as cotas revitimizam os negros e agridem


a dignidade da pessoa humana (antítese) ao reforçar estereótipos de inferioridade e
de incapacidade (argumento contrário) é, mais uma vez, ignorar que efetivamente
os negros foram e são vítimas da discriminação e da desigualdade social fundada
em conteúdo de preconceito de cor (refutação). De outro lado, tais fatores
discriminatórios é que agridem a dignidade da pessoa humana das pessoas negras
e é também na perspectiva de proteger essa dignidade que as ações afirmativas
como sistema de cotas podem ser implementadas (refutação e argumentação)”.
(Processo n.° 8350-10.00/12-0, Parecer n.° 15.703/12)

19
3.2. QUALIDADES DO TEXTO DISSERTATIVO

Unidade Temática

Essa estratégia diz respeito ao aspecto temático do texto, no qual todo texto deve
apresentar uma ideia predominante. Esta deve ser fixada antes da produção e
desenvolvida ao longo do texto. Se um texto aborda muitas ideias ao mesmo tempo, por
mais simples ou complexo que ele seja, corre o risco de ficar confuso, desordenado,
além de fugir do tema.

Concretude

Para um texto ser considerado relevante e persuasivo, ele deve ser capaz de produzir
uma clara definição com os conceitos com as quais trabalha. A isso damos o nome de
concretude. Ela acontece por meio do uso de exemplos, ilustrações, analogias,
comparações, especificidades, diferenças e tudo mais que auxilie na construção de um
conceito. A partir de um bom conceito e suas definições, encaminha-se seu raciocínio e
sua argumentação. A falta de concretude se dá pelo uso de lugares-
comuns, expressões vagas e genéricas, noções confusas, etc.

Exemplo de texto sem concretude:

“Eu

Um jovem de dezessete anos, incerto de seu futuro. Alguém que sempre busca o melhor
para todos, mas às vezes tropeça e faz o pior de tudo. Uma pessoa que se emociona e
para chorar na distância de outro alguém.
Às vezes inconstante, incerto, indeciso. Idealista, acredita que todas as histórias podem
ter um final feliz; desilude-se a cada derrota, seja de quem for, mas irradia-se de
felicidade com uma pequena vitória. Teimoso, toma por certo o que muitos lhe dizem
ser absolutamente errado, traça os mais absurdos caminhos. Muitas vezes egoísta,
individualista: abandona suas convicções para não perder algo que conquistou
materialmente.”

Veja como esse texto é confuso e pouco concreto. O autor tenta montar um conceito de
si mesmo, mas se perde em meio às expressões vagas e confusas que utiliza. Ao final,
não é possível alcançar tal definição, o que faz o texto perder seu propósito.

Exemplo de texto com concretude:

“Quando crescer (trecho)


É interessante como as cabeças das pessoas mudam com o passar dos anos. Quando
criança, só desejava sair viva da escola, e poder chegar em casa sem levar uma surra
por ser a mais feia e moreninha dentre meus colegas. Após vinte e seis anos desejo
coisas diferentes. O motivo com certeza é a vida que tive, esse modo de viver que me
moldou.

20
Filha única de pais separados, tive muito pouco contato com meu pai, viajava
esporadicamente para visitá-lo, e minha mãe, preocupada em dar tudo que podia para
sua filha, vivia mais no trabalho do que em casa. Resultado: cresci acompanhada pela
televisão. Meus gostos foram influenciados pelos filmes e os personagens que eu
gostaria de ser na vida real, até o modo de falar eu procurava trabalhar, para ficar
cada vez mais refinado. As roupas, então, eu não tinha muita opção. A falta de recursos
impossibilitava a imitação, mas determinou meu estilo.”

Aqui, podemos ver um texto cujo conceito proposto está sendo construído de forma
adequada, com novos elementos a cada nova oração, interligados entre si. Mesmo sendo
apenas um trecho, podemos ter uma ideia bastante clara do conceito que o autor deseja
definir e temos uma boa compreensão a respeito deste. Este texto também pode ser
considerado uma produção com unidade temática e objetividade.

Objetividade

Trata-se de uma das principais características de um texto. Ser objetivo é ir direto ao


ponto, bem como estabelecer um gancho bem claro sobre a ideia central do texto, para
que o leitor saiba por que deve se dedicar a ele.

Exemplo de texto sem objetividade:

“Considero-me uma pessoa otimista, apesar de que muitas situações e acontecimentos


que se sucedem, não somente comigo, diretamente, mas com outras pessoas, e mesmo
alguns de âmbito mundial me forcem, não raras vezes, a pensar de uma maneira
negativa a respeito dos mesmos ou de suas possíveis consequências. Sou otimista,
apesar de tudo, pois acredito que uma pessoa pode, muitas vezes, escolher qual o
caminho a seguir. Sendo assim, há, não raro, opções; cabe a cada um escolher o
melhor entre elas.”

Veja que nesse exemplo o texto não é claro quanto ao seu tema ou sua proposta. Há
muitas quebras desnecessárias no discurso e muitas palavras que designam conjuntos
muito amplos e gerais de conceito (“acontecimentos”, “pessoas”, “tudo”), o que torna o
trecho pouco específico e de difícil compreensão por parte do leitor.

Questionamento

O texto necessita apresentar uma questão que de certa forma afete, incomode ou agrade
o leitor a ponto dele ser envolvido. A partir dessa questão, procure meios de solucioná-
la, equacioná-la ou denunciá-la, levando o leitor consigo nessa caminhada. O texto deve
apresentar como tema um problema a ser resolvido, que carrega um questionamento, e
este, por sua vez, deve afetar o leitor de modo a envolvê-lo com o texto.

21
Exemplo de texto com questionamento:
“Uma tarefa a cumprir sempre faz com que busquemos uma série de alternativas para
concluí-la. Acredito que, quanto mais desafiador é o trabalho, maior é o número de
hipóteses levantadas para sua realização ou maior o tempo durante o qual nos
ocupamos em devaneios à procura da solução mais criativa ou da ideia mais segura.
Em resumo, apresentar-se não tarefa das mais simples, considerando-se, além do
constrangimento evidente, o fato de que esta mão esquerda habituada aos exercícios de
caligrafia, sente-se muito desconfortável no exercício de juntar estes signos para falar
da pessoa a que pertence.”

No exemplo, o problema apresentado pelo autor carrega uma questão com a qual o
leitor muito provavelmente se identificará, pois todo mundo, em algum momento da
vida, precisa se identificar e falar de si mesmo. Nesse caso, a empatia com o texto pode
se dar por aspectos da situação que são familiares a todos. Além disso, o autor leva o
leitor a fazer os mesmos questionamentos a respeito de tal situação, envolvendo-o ao
longo do texto a partir da reflexão proposta.

(Todos os exemplos foram retirados do site http://www.lendo.org/as-4-qualidades-


essenciais-de-um-texto/)

4. ARGUMENTAÇÃO

Como já dito, a argumentação é uma manifestação natural do ser humano, pois por meio
dela nos sentimos ativos e relevantes em nosso meio de convivência. A argumentação
empregada na dissertação pode ser de dois tipos: demonstrativa ou retórica.

Argumentação demonstrativa

Trata-se da argumentação baseada no raciocínio, que se baseia no encadeamento lógico


de duas ou mais afirmações no qual a tese é defendida por meio de argumentos que a
fundamentam. Ela obedece à lógica formal e é baseada em dados, fatos e verdades
inquestionáveis.
Veja alguns exemplos de argumentação demonstrativa:

- A água ferve a 100°C no nível do mar (lei da química)


- Mamífero não bota ovo (lei da biologia)
- O calor dilata os metais (lei da física)

Como podemos observar muito da argumentação demonstrativa se manifesta em


dissertações e textos científicos, como nas ciências exatas e biológicas, porém ela
também pode (e deve) ser empregada nos demais textos argumentativos, já que
raciocínios lógicos geralmente proporcionam argumentos poderosos na defesa de um
ponto de vista.

22
Argumentação retórica

A argumentação retórica admite como válidos não apenas os argumentos lógicos


(técnicos), mas também as opiniões, ideias e sentimentos (argumentos não técnicos).
Nela, o envolvimento emocional do receptor também é um fator a ser levado em conta.
Segundo a retórica, o lógos (argumento racional) e o páthos (afetividade) são
inseparáveis. Emoção e razão conciliam-se na construção de uma boa persuasão. Dessa
forma, a argumentação precisa atingir esses dois alvos para ser eficaz, pois o emissor
convence não apenas quando apresenta algo verdadeiro de fato, mas também quando faz
o receptor acreditar em algo que pareça razoável e justo. Veja esse exemplo:

Tese: Fetos sem cérebro não devem ser abortados.


Argumento técnico: Alguns bebês anencéfalos sobrevivem por meses, demonstrando
que têm possibilidade de vida (argumento lógico).
Argumento não técnico:
- O direito à vida é sagrado (argumento sentimental)
- O homem deve encarar a morte e o sofrimento com resignação (argumento
sentimental).

Observe como o argumento técnico pode ser comprovado por ser verdade, ao passo que
os dois últimos são totalmente subjetivos, por exprimirem uma opinião valorativa,
sujeita a crenças pessoais, religião etc. Ainda assim, todos os componentes do
raciocínio, tanto lógicos quanto sentimentais, são questionáveis: as crianças sem cérebro
realmente sobrevivem ou apenas “existem”? Sem atividade cerebral existe vida? O que
significa a expressão “sagrado”? Dependerá da habilidade argumentativa do emissor
convencer os leitores a aceitar sua posição, pois, nesse caso, existem posicionamentos
contrários, ou seja, antíteses.

Na argumentação retórica as objeções são sempre admissíveis, pois só merece o esforço


da argumentação aquilo que pode ser contrariado. Para o óbvio não existe necessidade
de uma defesa com argumentos. Dessa forma, no caso do exemplo, existem objeções
possíveis sobre o aborto do feto sem cérebro. Veja no exemplo:

Tese: Fetos sem cérebro devem ser abortados.


Argumentos técnicos:
- Existem riscos para a saúde da mulher na gestação e uma considerável estatística de
mortalidade materna (argumento lógico/racional);
- Sem atividade cerebral, não há vida. Tanto é que os aparelhos de manutenção artificial
da vida são desligados para a retirada dos órgãos quando um ser humano tem decretada
sua morte cerebral (argumento lógico/racional).
Argumentos não técnicos:
- É tortura obrigar uma mulher a gerar um ser durante nove meses, vendo a barriga
crescer, sentindo os movimentos fetais, para enterrá-lo ao nascer. Isso é indigno e
injusto (argumento retórico – pode ser acompanhado da narrativa de fatos e da descrição
do sofrimento materno).

23
Podemos observar como a razão e a emoção se fundem nas duas argumentações.
Um exemplo de uso da argumentação retórica seria um caso no qual um advogado
defende a tese de que é justo que uma pessoa roube um pacote de pão para alimentar o
filho faminto. Nesse caso, ele não está empregando a lógica ou a razão em sua
argumentação (pois, segundo a lei, o ladrão cometeu um crime), porém, o argumento
suscita a piedade e pode até ser aceito pelo juiz e pela sociedade por parecer benigno e
razoável. Assim, o defensor estará se valendo apenas de argumentos retóricos, de
misericórdia, com muita força emocional, para sustentar sua tese, o que não significa
que não obterá êxito com a mesma.

A publicidade também se vale da argumentação retórica, já que consumidores são


facilmente persuadidos pela emoção. As pessoas compram o que não precisam, com um
dinheiro que não têm, porque foram persuadidas pela ideia (mágica, e não lógica) de
que, se possuírem certo produto, serão mais importantes, mais bonitas ou mais
inteligentes. Veja exemplos de como a publicidade se utiliza de argumentos retóricos
para conquistar o consumidor:

Note como as propagandas apelam para o lado sedutor do produto, que aponta
principalmente para aspectos que atinjam a imagem e a auto-estima do consumidor.

24
Observe agora dois esquemas que ajudam no entendimento a respeito do uso da
argumentação retórica e demonstrativa:

ARGUMENTAÇÃO

DEMONSTRATIVA RETÓRICA
Argumentos técnicos Argumentos técnicos e não
Baseada em argumentos lógicos. técnicos
Recorre a raciocínios exatos, Baseada e, argumentos lógicos e
regras explicativas e dados não lógicos: subjetivos, emotivos,
científicos. Utiliza Fatos, dados valorativos. Recorre a arte,
e verdades. Atinge a razão do imagens, elogios etc.
receptor. Utiliza opiniões, valores e crenças.
Atinge a razão e a emoção do
receptor.

ARGUMENTAÇÃO
ARGUMENTAÇÃO RETÓRICA
DEMONSTRATIVA
Textos acadêmicos Textos publicitários e de
Textos científicos marketing
Textos jornalísticos (notícias) Textos político-eleitorais e
Textos técnicos jurídicos
Textos religiosos e de intenção
moral
Textos de opinião (editoriais)

4.1. ARGUMENTOS, EVIDÊNCIA, PREMISSAS E FALÁCIAS

Argumentos

Na formulação dos argumentos, o autor deve procurar provas convincentes para


justificar seu ponto de vista. Para isso, ele deve utilizar de fatos concretos e autênticos,
como gráficos, exemplos, estatísticas, estudos, comparações etc.

A ordem em que as provas são apresentadas é muito importante, de modo que são
apresentadas, na maioria das vezes, em ordem crescente, ou seja, da menos convincente
àquela que seja capaz de mais impressionar o leitor. Além disso, é importante que o
autor dê ênfase nos pontos principais, e antecipe possíveis repostas para objeções do
leitor.

25
A argumentação baseia-se em dois elementos principais:
- a consistência do raciocínio
- a evidência de provas

Evidência

É a certeza manifesta, que se chega pelo raciocínio (evidência da razão) ou pela


apresentação dos fatos (evidência de fato), independentemente de toda teoria. São
cinco os tipos mais comuns de evidência:
- os fatos propriamente ditos,
- os exemplos;
- as ilustrações;
- os dados estatísticos (tabelas, números, gráficos etc.);
- o testemunho.

Veja exemplos de dados estatísticos e fatos nessa argumentação jurídica a favor das
cotas raciais:

Os dados disponíveis demonstram comparativamente a desigualdade racial em que vive a


população brasileira. Vejamos alguns números gerais.

a) Pesquisas que se debruçaram sobre a realidade da pobreza no Brasil apontaram que:

- A população total brasileira, segundo a PNAD de 200611, é de aproximadamente 187 milhões


de pessoas. Destas, 49,7 são brancas e 49,5 são negras (pretos e pardos).
- Do grupo dos 10% mais pobres, os negros correspondem a 73,2%, enquanto que são apenas
12,4% do grupo do 1% mais rico.
- Segundo relatório do PNUD12, o IDH-M13 da população branca brasileira, em 2000, era 0,814,
considerado alto, enquanto que o da população negra era 0,703, de desenvolvimento médio.
- Conforme o relatório, apesar de haver queda da mortalidade infantil entre 1980 e 2000, a taxa
das crianças negras era ainda 66% maior que a das crianças brancas entre 1991 e 2000.
- Segundo dados compilados de 2001 e 2002, 25 milhões de pessoas no Brasil vivem abaixo da
linha de pobreza. Desses 25 milhões, 70% são negros.
- De acordo com os mesmos dados, 58 milhões de brasileiros vivem na pobreza (um mínimo de
200 reais por mês), dos quais 63% são negros.

Tais dados são suficientes para demonstrar que a pobreza no Brasil está concentrada na população
negra e a riqueza na população branca. Mais do que isso, os estudos esta pobreza acompanha
crianças até a fase adulta, do seguinte modo:

- Na faixa do nascimento até os 6 anos, 51% das crianças são pobres, das quais 38% são brancas e
65% são negras.
- Entre 7 e 14 anos, o percentual de pobres entre os brancos é de 33%; entre os negros, 61%.
- Entre 15 e 24 anos, a proporção é de 22% entre os brancos e 47% entre os negros.

26
No campo educacional, os efeitos da pobreza acentuada na infância refletem em outros aspectos
da condição social da população, principalmente em relação à educação. Vejamos as taxas de
analfabetismo e média de anos de estudo colhidas pelo IBGE, referentes a 2006:
- 6,5% dos brancos com mais de 15 anos são analfabetos, enquanto que o são 14,1% dos pretos e
14,7% dos pardos.
- 16,4% dos brancos com mais de 15 anos são analfabetos funcionais, enquanto que o são 27,5%
dos pretos e 28,6% dos pardos.
- Média de anos de estudo para brancos de 15 anos ou mais é de 8,1 anos, enquanto para pretos é
de 6,4 e para pardos 6,2 anos.

c) Mercado de trabalho:

As desigualdades educacionais, por sua vez, se refletem no mercado de trabalho. Com baixa
escolaridade e precisando trabalhar mais cedo, restam cargos de menor qualificação em proporção
maior aos negros.

Alguns números da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE18, referente a setembro de 2006:

- Rendimento médio real habitualmente recebido no trabalho principal: pretos e pardos R$ 660,45;
brancos R$ 1.292,19. Diferença de 51,1%.
- Rendimento/hora habitualmente recebido no trabalho principal: pretos e pardos 4,15; brancos
8,16.
- Rendimento domiciliar per capita: brancos 950,46; pretos e pardos 417,23.
- Diferença de rendimento médio real habitualmente recebido no trabalho principal para a
população ocupada masculina, com 18 a 49 anos de idade e 11 anos ou mais de estudo: na
indústria, 96,6%; na construção, 105,6%; no comércio, 85,6%; educação saúde e administração
pública, 45,7%. Sempre em favor dos brancos.
- Rendimento médio real habitualmente recebido no trabalho principal segundo a cor ou raça e
anos de estudo:
1 a 3 anos: pretos e pardos 431,01; brancos 514,23.
4 a 7 anos: 499,02 pretos e pardos; brancos 617,05.
8 a 10 anos: 556,63 pretos e pardos; brancos 691,62.
11 ou mais anos: 899,64 pretos e pardos; brancos 1728,38.

Em estudo para o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) com dados até 1999,
SERGEI SOARES atribui três etapas para processo que determina diferenciação salarial entre
brancos e negros (homens e mulheres): formação, inserção e definição salarial19. Conclui que a
maior diferença entre salários finais em condições iguais - que podem indicar de forma mais clara
discriminação direta - está entre homens brancos e mulheres brancas. Sobre a relação salarial entre
homens brancos e negros, diz: "Já os homens negros também sofrem alguma discriminação na
hora do contra-cheque - recebem algo em torno de 5% a 20% menos que os homens brancos,
sendo que esse diferencial cresce com a renda do homem negro. Os homens negros perdem algo
em torno de 10% por trabalharem em setores ou terem vínculo com o mercado de trabalho
inferiores aos dos homens brancos. O restante do preço da cor é pagamento pela discriminação
sofrida durante os anos formativos - é na escola, e não no mercado de trabalho, que o futuro de
muitos negros é selado"20.

27
Vejamos as principais conclusões, com base nas 500 maiores empresas do país:

- Cargos de chefia são 94% ocupados por brancos e apenas 3,5% ocupados por negros.
- Cargos de supervisão são 80,1% ocupados por brancos e 17,4% ocupados por negros.
- Quadro funcional: mesmo aqui, os negros são apenas 25,1%; os brancos, 73%.

Os negros também são sub-representados entre Juízes, Desembargadores, Procuradores,


Defensores Públicos, nos cargos da máquina administrativa do Estado e nos cargos de poder do
Estado, de acordo com o PNUD22.
(Processo n.° 8350-10.00/12-0, Parecer n.° 15.703/12)

Podemos notar que a utilização desses dados se constituem de grande relevância para a
argumentação do emissor, pois tais fatos comprovam a situação difícil na qual pessoas
negras vivem, e tal comprovação (de fatos) sempre se constituirá como boa sustentação
para qualquer tese.

Premissas

Uma premissa é uma proposição que ajuda a se chegar a uma conclusão, ou seja, é um
princípio no qual se baseia a conclusão de um raciocínio ou de um estudo. Sendo assim,
podemos concluir que as premissas geram conclusões lógicas e são de extrema
importância para a tomada de decisões e atitudes, inclusive quando se trata da escrita.
Quando discorremos numa dissertação acerca de um raciocínio ou estudo, chegamos às
nossas conclusões a partir das inúmeras ideias e fatos iniciais que nos levaram a discutir
determinados assuntos. Essas ideias e fatos nada mais são do que premissas.

Veja um exemplo de premissa do mesmo parecer usado no exemplo anterior:

“A questão que se apresenta consiste, mais especificamente, na indagação acerca da


necessidade e da possibilidade de ser adotada política afirmativa consistente na
utilização do sistema de cotas raciais em sede do serviço público estadual, fixando
percentual de vagas em cargos de provimento efetivo nas diversas carreiras da
Administração Pública Estadual direta e indireta, a serem providos por pessoas negras,
objetivando dar efetividade a regras e princípios constitucionais e internacionais, bem
como à legislação infraconstitucional.”

(Processo n.° 8350-10.00/12-0, Parecer n.° 15.703/12)

28
Falácias

Uma falácia é um argumento logicamente inconsistente, inválido, ou que falhe de outro


modo no suporte eficaz do que pretende provar. Argumentos que se destinam à
persuasão podem parecer convincentes para grande parte do público apesar de conterem
falácias, mas não deixam de ser falsos por causa disso. Reconhecer as falácias é por
vezes difícil. Os argumentos falaciosos podem ter validade emocional, íntima,
psicológica, mas não validade lógica. É importante conhecer os tipos de falácia para
evitar armadilhas lógicas na própria argumentação e para analisar a argumentação
alheia.
Também é importante observar que o simples fato de alguém
cometer uma falácia não invalida toda a sua argumentação. A falácia invalida
imediatamente o argumento no qual ela ocorre, o que significa que só esse argumento
específico será descartado da argumentação, mas pode haver outros argumentos que
tenham sucesso. Por exemplo, se alguém diz:
"O fogo é quente e sei disso por dois motivos: 1. ele é vermelho; e 2. medi sua
temperatura com um termômetro".
Nesse exemplo, foi de fato comprovado que o fogo é quente por meio da premissa 2. A
premissa 1 deve ser descartada como falaciosa. Ainda assim, a argumentação como um
todo não está totalmente destruída, pois parte dela se constitui como verdadeira.

5. SÍNTESE DE TEXTO

5.1. RESUMO

Conceito:

“O resumo constitui na apresentação concisa e frequentemente seletiva do texto,


destacando-se os elementos de maior interesse e importância, isto é, as principais
ideias do autor da obra, permitindo a quem o ler resolver sobre a conveniência ou não
de consultar o texto completo.” (Lakatos, 1986, p. 67).

Resumos são textos que recuperam a informação de um texto maior, facilitando o


trabalho de busca de um pesquisador, pois este pode decidir se vale a pena ou não a
leitura do texto original a partir da leitura de seu resumo. No entanto, o resumo não deve
ser confundido como um mero apêndice de outro texto, pois ele é um novo texto, que
possui lógica e vocabulários próprios, mesmo sendo um documento referencial. O autor
do resumo expressa seu próprio estilo e redação para conseguir mostrar o conteúdo
principal do texto original, de forma que o resumo não pode ser confundido com o
original, nem mesmo depender da leitura deste para ser compreendido.

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Funções:
Podemos dividir os objetivos de um resumo em:

Objetivos gerais:
• ajudar o leitor a decidir se lhe convém ou não ler o documento;
• oferecer o máximo de informação sobre o documento, dispensando a sua leitura;
• realizar buscas por computador.

Objetivos específicos:
• indicar a natureza da informação contida no documento original;
• sugerir a conveniência de se obter o documento para um estudo intensivo;
• proporcionar ao leitor um meio rápido de manter-se informado em sua área de
interesse;
• guiar o leitor para uma leitura mais inteligente do trabalho original, destacando seus
aspectos mais significativos.

O resumo também possui várias características. Algumas das principais são:

Síntese ou Concisão
O conteúdo do resumo deve ser expresso por meio de frases completas, logicamente
ordenadas e relacionadas, procurando sempre ter um máximo de uniformidade e
concisão, sem perda de matéria útil. Além disso, ele também deve ser capaz de
aproveitar totalmente o espaço requerido, se caracterizando como uma composição
compacta.

Seletividade
A seletividade se refere à capacidade do resumo de oferecer ao leitor os aspectos e as
ideias principais do texto original, ou seja, deve ser um texto no qual o documento
original está representado em sua essência. Para isso, deve evitar o uso excessivo de
palavras, as explicações detalhadas e a repetição de resultados conhecidos, devendo-se
reter apenas resultados novos e mais importantes, além das informações mais
relevantes.

Clareza
A clareza é o que proporciona ao texto a facilidade de interpretação e a rapidez na
apreensão de seu conteúdo. Sendo assim, é necessário evitar pontos obscuros,
contradições ou vocabulário não condizente com o público a que se destina.

Abaixo, vejamos uma proposta de produção de resumo:

5.1.1. PROCEDIMENTOS
Análise
• Ler rapidamente o documento original
• Sublinhar as unidades de significação
• Ler profundamente as referidas partes
• Não extrair frases textuais

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Síntese
• Reorganizar as proposições conceitualmente significativas
• Situar a proposição tópica na posição principal
• Reajustar a coerência e a estrutura textual
• Reler o resumo, filtrando a informação em caso de ruído

5.1.2. APRESENTAÇÃO
• O resumo deverá ser composto por parágrafos que contenham frases curtas, mas
coerentes
• Sua extensão será variável e dependerá do documento a ser resumido e do tipo de
resumo almejado

5.1.3. ESTILO
• Precisão
• Omissão de expressões vagas e ambíguas
• Emprego de conectores entre orações
• Supressão de toda e qualquer redundância

5.2 EMENTA

Conceito

“A ementa deve facilitar o trabalho de pesquisa quando da procura ou busca da


informação, possibilitando, também, o conhecimento do assunto que está sendo objeto
de pronunciamento judicial, dando uma idéia geral do que o documento contém.”
(ATIENZA, 1981, p. 31).

Podemos dizer que a ementa é uma condensação documentária relacionada à área


jurídica, ou seja, é um resumo especializado, de natureza técnico-científica. Seu caráter
de síntese está intimamente ligado aos conceitos de especificidade e informatividade.
Partindo de uma conceituação mais ampla, podemos simplesmente dizer que uma
ementa é o resumo de um acórdão, documento jurídico que contém um pronunciamento
judicial.

Função

A função principal da ementa está em atuar como produto documentário facilitador do


processo de recuperação da informação. Como ela se constitui como um documento
gerado a partir de outro – o acórdão –, são as informações contidas neste que ela irá
recuperar, além de possibilitar o conhecimento do assunto presente no pronunciamento
judicial, a ponto de dar uma ideia geral e inteligível do que o documento contém.

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Estrutura

A ementa, vista como texto representativo do acórdão, apresenta-se, em sua estrutura,


dividida em duas partes: o cabeçalho e o dispositivo. Veja no exemplo abaixo:

Cabeçalho:
MANDADO DE SEGURANÇA. ODONTÓLOGOS. FUNDAÇÃO
NACIONAL DE SAÚDE. EQUIPARAÇÃO AOS MÉDICOS DE SAÚDE PÚBLICA.
IMPOSSIBILIDADE
Dispositivo:
Os odontólogos da FNS, conquanto exerçam atividades ligadas à
área da saúde pública, não podem ser equiparados aos médicos da
saúde pública, para efeito de aplicação do § 3º da Lei n. 8.216

- Cabeçalho:
O cabeçalho consiste na parte superior e introdutória da ementa. É composto de um
conjunto de palavras-chave que representam o tema geral do acórdão. O cabeçalho tem
por função servir de guia de consulta para o leitor/pesquisador e, para que obtenha êxito
nesse quesito, deve ser elaborado com especial atenção nos seguintes aspectos:

Controle de vocabulário

Por vezes, ocorrem erros nos cabeçalhos de ementas relacionados ao vocabulário. Isso
ocorre pela existência de verbetes muito semelhantes ou um mesmo Instituto Jurídico
(ou certa ideia veiculada no âmbito do acórdão) que pode ser verbetada de diferentes
formas. Veja os exemplos abaixo:

Mesmo Instituto Jurídico representado sob duas formas diferentes:


- acidente in itinere / acidente de percurso.
- safrista / safreiro / trabalhador sazonal / bóia-fria.
- sindicato / entidades sindicais.
- honorários de advogado / honorários advocatícios.

Variação quanto à construção dos termos do verbete, como utilização de adjetivos e


complementos nominais com função de substantivo:
- rescisória / ação rescisória.
- periculosidade / adicional de periculosidade.

É preciso que o ementarista faça uma boa pesquisa acerca da temática principal do
acórdão e da estrutura utilizada por este, a fim de produzir uma ementa que tenha plena
relação com seu documento de origem e, assim, não cause confusão quando consultada.

Previsão de uma sintaxe (ordem de citação) do cabeçalho como um todo

- embriaguez – justa causa / falta grave – empregado que se apresenta embriagado.


- colusão – ação rescisória / ação rescisória – supressão de instância.

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- suplente da CIPA, membro da CIPA – reintegração / estabilidade provisória – CIPA –
suplente.

Especificidade quanto à representação dos Institutos Jurídicos

Muitas vezes, verbetes genéricos, designativos de áreas do Direito, são utilizados como
ponto de entrada do cabeçalho. Esse tipo de erro gera problemas relacionados
principalmente com a precisão de busca. Veja o exemplo:

- Direito Administrativo, Licitação

O problema está na recuperação de informação da qual a ementa se propõe, que fica


prejudicada. Uma busca automatizada que tenha como ponto de entrada Direito
Administrativo vai ser muito menos precisa e específica do que uma que busque por
Licitação. Outro problema de um cabeçalho com ambos verbetes seria a redundância,
pois a Licitação se constitui como um instituto jurídico do Direito Administrativo
(partindo do pressuposto de que o pesquisador seria um conhecedor da área).

- Dispositivo:
O dispositivo é a parte da ementa na qual se encontra, de modo sintético, lógico e claro,
a tese jurídica que respalda o Entedimento argumentado que proporcionou o nexo entre
um Fato e um Intituto Jurídico. Estruturalmente, ele é apresentado logo depois do
cabeçalho, mas possui importância muito maior que este, pois é nele que se encontra o
resumo do documento original. Sendo assim, pode-se dizer que o dispositivo em si
constitui-se como a ementa.
A estrutura mais adequada para um dispositivo seria a de um enunciado único que
contivesse:
- a questão jurídica (o que ocorreu / o que se discute)
- o posicionamento do judiciário (decisão)
- as razões que levaram a tal posicionamento.

Tipologia das ementas jurisprudenciais

A ementa pode ser dividida tipologicamente a partir de alguns aspectos específicos de


sua estrutura:

- Tipo temático:

Ementa de direito material: o posicionamento do judiciário se


dá a partir de uma questão substantiva do Direito, tal como férias, estabilidade
provisória etc.
Ex.:
ESTABILIDADE – AVISO PRÉVIO
O aviso prévio confere ao contrato de trabalho feições de contrato a prazo
determinado, o que, por analogia, não admite a estabilidade sindical.

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Ementa de direito processual: a questão discutida é de natureza processual, ligada a
requisitos, trâmites e formalidades exigíveis de um processo.
Ex.:
AÇÃO RESCISÓRIA – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – VIOLAÇÃO LEGAL
CARACTERIZADA
O órgão Colegiado de Segunda Instância não pode, ao reconhecer o vínculo
empregatício entre as partes, julgar procedente a reclamatória sem que o juízo de
primeiro grau tenha examinado os itens que compunham o pedido do reclamante.
Caracterização de supressão de instância, legitimando a procedência da ação
rescisória.

- Volume temático:

Ementa simples: é aquela que contém um só dispositivo, proveniente de um ponto


convertido, e que deve ser redigida em um único parágrafo.
Ex.:
O adicional de periculosidade, instituído pela Lei n. 7.369/85, não é de cabimento
restrito aos empregados de empresas produtoras e distribuidoras de energia, sendo
devido a todo empregado, independentemente da atividade preponderante da empresa,
que fique em contato permanente com instalações elétricas, desde que comprovado o
trabalho nas atividades e nas áreas de risco previstas na norma regulamentar.

Ementa composta: é aquela que contém dois ou mais dispositivos, sendo necessário um
parágrafo distinto para cada um.
Ex.:
As entidades sindicais, com o advento da atual Constituição Federal, podem promover
em seu próprio nome a defesa dos interesses coletivos ou individuais da categoria.
O adicional de insalubridade deve ser calculado com base no piso nacional de salários.
Inviável que o adicional em causa, dada sua natureza tipicamente salarial, incida sobre
o salário mínimo de referência, inferior àquele que representa o mínimo a ser
empregado.

- Esfera de abrangência

Ementas genéricas: são aquelas de estrutura meramente normativa, que têm por
característica serem impessoais, estabelecendo uma regra de conduta geral.
Ex.:
CAMBISTA DE JOGO DO BICHO
É empregado e não autônomo o cambista de jogo do bicho subordinado e assalariado
em atividade tolerada pelo Poder Público. Não se assemelha ao vendedor de bilhetes
de loteria, ao agenciador autônomo de seguros e ao franqueado que, por conta própria,
exercem atividade assumindo o risco do empreendimento.

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No exemplo, a ementa aponta um posicionamento genérico da instância julgadora no
sentido de que todo cambista de jogo de bicho pode ser considerado empregado. Desse
modo, essa ementa pode ser utilizada como elemento de argumentação em outras peças
processuais.

Ementas específicas: são aquelas aplicadas apenas na dependência das ocorrências


daquele determinado processo, aplicando-se apenas aos aspectos dos processos em que
foram geradas.
Ex.:
SUCESSÃO EMPRESARIAL
Contratados que foram pelo encarregado do Porto quando o mesmo não era mais da
responsabilidade da PORTOTEC (nome fictício), resta responsabilizar a LINDOMAR
(nome fictício) pelos atos praticados pelo representante do Terminal do Porto de Juraci
(nome fictício).

Características da ementa jurisprudencial

A ementa, para se constituir como resumo completo de um acórdão, deve possuir alguns
requisitos básicos, porém essenciais.

- Clareza

Nesse quesito, o dispositivo da ementa deve possuir um único sentido que permita seu
perfeito e inteiro entendimento, para que assim obscuridades e ambiguidades que
possam gerar interpretações díspares sejam evitadas. Veja um exemplo de um
dispositivo sem clareza:

A identidade de demandas que caracteriza a litispendência e a identidade jurídica,


quando idênticos os pedidos, visam ambos o mesmo efeito jurídico. Agravo regimental
a que nego provimento.
Campestrini (1994, p. 38)

O exemplo não deixa claro a quais das situações apresentadas a palavra “ambos” está se
referindo.

- Objetividade

Esse quesito é sempre primordial em qualquer tipo de produção de texto. Para a ementa,
é de extrema importância que o texto seja objetivo, principalmente no quesito de
manter-se fiel ao conteúdo temático preponderante no acórdão. Sendo assim, é
necessário que a ementa se atenha a um método que reflita esse conteúdo de forma
integral. Veja um exemplo de ementa sem objetividade:

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EMBRIAGUEZ – JUSTA CAUSA
O alcoolismo constitui freqüentemente uma doença e atinge indivíduos tanto da classe
operária quanto da classe patronal. É tempo de o legislador tratar com maior cuidado
científico essa matéria, a fim de inclusive evitar excessiva severidade de certos
empregadores que, aliás, com seus próprios costumes de consumo alcoólico são quase
sempre muito benevolentes.

No exemplo, temos o cabeçalho dando a entender de que a embriaguez enseja a


dispensa por justa causa, porém, o dispositivo, do modo que se apresenta, aparenta
descaracterizar essa situação.

Além disso, no quesito da objetividade, também é necessário atentar para o uso de


termos ou expressões de teor subjetivo, pois estes podem comprometer o caráter técnico
do documento. Do mesmo modo, igual cuidado é preciso no emprego de adjetivos, pois
se estes podem ter efeito retórico no âmbito da fundamentação, o que pode tornar vaga
uma afirmação do dispositivo.

Observe no exemplo anterior o uso das seguintes expressões:


- frequentemente; muito benevolentes.
Não é possível saber com maior especificidade qual é a frequência referida; assim como
não sabemos o quão benevolente são os empregadores, além de não existir nenhum
parâmetro para caracterizar uma atitude como benevolente.
Termos muito genéricos também devem ser evitados, pelo alto risco de tornarem-se
vagos.
Ex:
A jurisprudência vem reconhecendo que a gorjeta integra-se à remuneração.

O exemplo mostra a dificuldade em saber a qual jurisprudência se refere o dispositivo.


Pode ser do TRT que gerou o acórdão, ou do TST, ou tratar-se de uma matéria
uniformizada – e, se o for, seria necessário saber quais os precedentes jurisprudenciais
que conduzem a tal afirmação.

- Concisão

Nesse quesito, é esperado que a ementa permita a compreensão do conteúdo básico do


acórdão, constituindo-se como ponte informacional de leitura rápida e fluente. Na
redação da ementa, todas as palavras que compõem o dispositivo devem ser essenciais;
as que visam apenas um efeito retórico devem ser excluídas.
Ex.:
SALÁRIOS – DESCONTOS – CONVÊNIO MÉDICO
No mínimo, o que se verifica em tais hipóteses é um ajuste tácito, sem que se revê a sempre
alegada coação. A dinâmica do Direito do trabalho não pode ser estancada por dispositivos
legais que, embora visem a salvaguarda do alimento via trabalho, também, necessitam de
adequação à agilização e modernização da sociedade. Há que se ter presente a expectativa ou
mesmo o usufruto de tais benefícios enquanto durou a relação de emprego, transparecendo
injusta a condenação na devolução destes descontos após o rompimento do vínculo.

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Além disso, a ementa também deve conter concisão no que diz respeito às referências,
não sendo condizente o uso de referências a passagens muito específicas dos autos.

- Afirmação

Esse quesito diz respeito a conceituação ou estabelecimento de uma regra geral de


conduta na ementa, as quais não é adequado o uso de duplas negações, como nada obsta
que, nada veda que, não é ilegal etc.
Sendo assim, veja o exemplo:

A existência de concubinato não exclui a possibilidade de


vínculo empregatício quando este, além de vir aos autos por
prova documental, ainda pode ser depreendido de confissão ficta imposta ao
demandado.

Aqui temos um exemplo de dupla negação. Seria mais adequado, partindo do que seria
uma melhor estrutura para uma ementa, uma construção afirmativa, como essa:

Reconhece-se o vínculo empregatício quando da existência de concubinato, uma vez


havendo prova documental nos autos e depreendido de confissão ficta imposta ao
demandado.

- Proposição

Esse quesito pede que a ementa constitua-se de um enunciado completo, contendo


sujeito, verbo e complementos. Além disso, também é aconselhável evitar adjetivos
com função de verbo, já que nesse caso a ação principal (o Entendimento) fica oculta
em um qualificativo.
Ex.:
Incabível, sob a égide do atual Código de Processo Civil, qualquer alteração da
petição inicial após o ajuizamento da reclamatória.
(art. 294).

Nesse caso, uma melhor opção seria:

Não é cabível qualquer alteração da petição inicial após o ajuizamento da


reclamatória, conforme o art. 294 do CPC.

A ação principal fica mais clara quando desmembrada na proposição. Note que o uso do
adjetivo não destaca a ação que está presente no mesmo.

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- Precisão

No âmbito da precisão, o foco está nas diferentes expressões que podem e não podem
ser usadas na ementa.
Devem ser utilizadas:
- expressões consagradas pela técnica jurídica, preferencialmente as de uso dominante e
generalizado seja territorialmente ou doutrinariamente.
- vocábulos que contenham a exata acepção em que constam nos dicionários, sejam eles
filológicos ou técnicos.

Não devem ser utilizadas:


- sinonímia. Na redação de uma ementa, as palavras utilizadas deverão ser idênticas
quando se destinarem a exprimir uma mesma ideia.
- uso de abreviaturas ou siglas nas referências a pessoas jurídicas. É mais adequado
utilizar a expressão por extenso, seguida de sigla entre parênteses.
- metáforas e prosopopéias, pois estas constituem-se em fatores de imprecisão, o que
prejudica a inteligibilidade e objetividade do texto.

Exemplo:
A irregularidade na contratação do obreiro não possui o condão de eliminar as
garantias mínimas asseguradas ao mesmo pela legislação laboral, inclusive CF/88. O
Poder Público deve arcar com o ônus da contratação irregular, servindo-se
posteriormente da Ação Regressiva contra o responsável pelo ato inquinado de
nulidade, nos termos dos parágrafos segundo e sexto do art. 37 da Lei Maior.

Nesse caso, o mais adequado seria uma construção desse tipo:

A irregularidade na contratação do empregado não elimina as garantias mínimas


asseguradas ao mesmo pela legislação trabalhista, inclusive a Constituição Federal de
1988. O Poder Público deve arcar com o ônus da contratação irregular, servindo-se
posteriormente da ação regressiva contra o responsável do ato nulo, nos termos dos
parágrafos segundo e sexto da Constituição Federal.

A ementa, por ser um documento técnico, deve ser composta por vocábulos técnicos,
pois assim assegura a precisão da linguagem jurídica, uma das principais características
do Direito.

- Correção

A redação da ementa jurisprudencial deve estar de acordo com as regras gramaticais da


língua portuguesa, devendo ter especial atenção para aspectos como concordância
verbal, concordância nominal e regência verbal. Também é necessário atentar para os
estrangeirismos, pois quando não estão integrados ao vernáculo, seu uso é inadmissível
em documentos técnicos; quando integrados recentemente, seu uso deve ser cauteloso.
Ex.: lesionar, obstaculizar, oportunizar, otimizar etc.

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- Independência (inteligibilidade fora do texto original)

A independência da ementa se constitui pela inteligibilidade do dispositivo, ou seja,


pela capacidade do dispositivo ser inteligível por si só, sem necessidade de leitura
integral do acórdão, ou mesmo do cabeçalho.

Veja um exemplo de dispositivo sem inteligibilidade:

Imputações de superfaturamento, inexistência de faturas comerciais e falta de


recolhimento de imposto devedor. Comprovação da inexistência das infrações. Remessa
improvida.

Note que esse dispositivo só faria sentido a partir da leitura de seu cabeçalho:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO.

- Coerência

É essencial que o dispositivo da ementa possua lógica, nexo, coesão e harmonia entre as
partes, de modo a evitar contradições e incongruências. Além disso, deve-se ter especial
atenção para o uso de preposições, pois estas quando indevidamente utilizadas, podem
induzir a entendimento contrário do pretendido.
Veja um exemplo que mostra essa contrariedade:

Procede culposamente o motorista que, em via pública, dotada de iluminação, no


perímetro urbano, estaciona o veículo para em seguida, passar sobre a vítima
embriagada e caída na rua, causando-lhe lesões gravíssimas.

A preposição para passa uma ideia de finalidade. Nesse caso, o sentido veiculado pelo
dispositivo é o de que alguém estacionou um veículo com a finalidade de, em seguida,
passar sobre a vítima. Esse tipo de atitude caracterizaria dolo e não culpa, como afirma
a ementa – pois se essa era a finalidade, claramente havia intenção de fazê-lo. Desse
modo, seria adequado utilizar a preposição e, que tem função aditiva e passa o sentido
de continuidade.

- Análise Prévia

Para a produção da ementa, é necessária uma análise prévia a partir do acórdão, na qual
sejam selecionados os aspectos mais importantes deste, visando sua completa
condensação. A partir
dessa análise, a ementa deve ser produzida como um novo documento, dotado de início,
meio e fim, e não como uma mera transcrição de trechos de voto. Esta última costuma
ser um procedimento adotado na área, pela praticidade. No entanto, salvo raras exceções
na qual o relator consegue produzir um parágrafo síntese ao final do voto, esse tipo de
prática geralmente não contém os fatores necessários para a produção de uma ementa
completa. Nesses casos, a prática da análise documentária do texto é indicada.

39
- Seletividade

A seletividade diz respeito a escolha do que é mais relevante dentro do assunto do


acórdão, ou seja, da questão fundamental deste, a fim de produzir maior precisão na
ementa em seu caráter de documento de pesquisa.

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41
PROJETO PGE-RS EAD
PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

Governador do Estado
Tarso Genro

Procurador-Geral do Estado
Dr. Carlos Henrique Kaipper

Realização
Procuradoria de Informação, Documentação e Aperfeiçoamento Profissional - PIDAP

Coordenação
Dr. Juliano Heinen

Organização
Jessica Aguirre da Silva

Elaboração do Manual
Jessica Aguirre da Silva
Vanessa Gasperin Carini

Revisão textual
Jessica Aguirre da Silva

Arte gráfica
Vanessa Gasperin Carini

Plataforma
Equipe/EAD/PGE

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