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M I S T I C I S M O l C I Ê N C I A l A R T E l C U L T U R A

VERÃO 2013
Nº 283 – R$ 10,00
GRUPO 2

GRUPO 1

Entre os dias 16 e 31 de outubro e 9 e 25 de novembro de


2012, mais dois grupos de rosacruzes do Brasil e Portugal
realizaram a tradicional Viagem Místico-Iniciática ao Egito. Eles
desfrutaram de momentos de sublime elevação e enriqueceram-se de conhe-
cimento e elevação ao visitar os numerosos templos e edificações da terra dos faraós.
n MENSAGEM

Prezados Fratres e Sorores,


© AMORC

Saudações em todas as pontas do nosso Sagrado Triângulo!

O misticismo prático dos textos do nosso Imperator, Frater Christian Bernard,


sempre nos impulsiona a progredir no caminho espiritual. Nesta edição ele nos
fala de três grandes atributos da pessoa que possui firmeza de caráter: Lealdade
– Fidelidade – Gratidão. Ele nos situa no contexto de nossa própria vida, permi-
tindo uma auto-avaliação.
O Parque Rosacruz na Califórnia – texto e fotos, é uma pesquisa-documentário do
Frater Luís Fábio Miranda. O Parque foi criado pelo primeiro Imperator da Ordem
Rosacruz, Harvey Spencer Lewis, quando definiu a cidade de San Jose como sede da
Suprema Grande Loja. Por sua história e seu significado para os rosacruzes de todo
mundo e para a Ordem Rosacruz, o Parque foi e é muito visitado e apreciado. Foi
naquele lugar aprazível que o Frater Lewis realizou seu trabalho, bem como seu suces-
sor, o Frater Ralph M. Lewis. Lá pode-se conhecer, entre outros importantes monu-
mentos, o Relicário de Akhenaton, que abriga as cinzas dos dois precursores do rosacrucianismo em seu segundo ciclo.
O Terceiro Olho é o tema em que o Frater Ralph M. Lewis, ex-Imperator da AMORC, aborda e explica com de-
talhes interessantes os três aspectos considerados: a tradição, as possibilidades anatômico-fisiológicas e a função ou
finalidade do terceiro olho.
O grande místico rosacruz Raymund Andrea sempre busca o âmago dos assuntos que escreve. Aqui, com Neofitismo
Místico ele nos informa que um neófito descobre logo no início que entrar na Senda é sair do caminho batido que já se co-
nhece. Este tem que começar a andar por si mesmo e às vezes enfrentar correntes contrárias. Aconselha que não se atenha ao
passado, cultive a força presente e tenha coragem e iniciativa para usar com confiança o que lhe é cosmicamente oferecido.
O que está errado no Mundo? Esta é uma pergunta intrigante feita com frequência ao Fórum Rosacruz. Diz o
texto que muitas pessoas “sabem” o que está errado e até apontam soluções. No livro A Vós Confio é feita uma adver-
tência ao pobre, para que se console e regozije por não ter as preocupações dos abastados, isto é, que procure ser feliz
dentro de sua condição. Aponta alguns assuntos presumidos: superpopulação, êxodo do campo, liberalidade dos pais
para com os filhos entre outros.
Deus e o Big Bang, qual deles criou o homem e o Universo? O Frater Daniel Marlo Margarida vai além dessas duas
possibilidades, apresentando uma terceira hipótese. Se o nada não origina coisa alguma, antes da Grande Explosão já ha-
via um começo. Essa abordagem é motivo para reflexão e pode despertar para uma visão mais ampla da origem de tudo.
Em O corpo co-manda, o Frater José Eliezer Mikosz nos adverte: Estamos na época de ultrapassar as fronteiras
entre as áreas da cultura que vivemos. As limitações devem dar lugar à chamada “Consciência do átomo”. Essa nova
postura seria buscada de forma interdisciplinar, ou seja, um novo paradigma seria adotado pela Biologia, Psicologia,
Antropologia, Linguística e outras disciplinas. Teorias especulativas servem para acelerar e aprofundar descobertas
cada vez mais complexas. Segundo o autor, “ainda compreendemos pouco do que somos”.
Além do conflito de gerações, do Frater Bertilo F. Becker, aborda um assunto que interessa a todos nós: pais ou edu-
cadores que com frequência se deparam com o conflito entre gerações. As origens, os motivos, os limites e os valores
agregados à liberdade são tratados com sensibilidade, visando a busca de soluções. Conclui o autor que os conflitos
tendem a desaparecer à medida que a consciência humana se aproxima da Consciência Cósmica.
Fratres e Sorores, planejem a sua participação na Convenção Nacional no próximo ano de 2014, de 25 a 28 de outu-
bro no Teatro Guaíra, com o tema: “CONSCIÊNCIA EM EVOLUÇÃO: Os Desafios do Místico no Século XXI”.

Com meus melhores votos de Paz Profunda, sou,


Sincera e Fraternalmente,
AMORC-GLP

Hélio de Moraes e Marques


Grande Mestre

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


1
n SUMÁRIO

nesta edição
04 Lealdade – Fidelidade – Gratidão
Por CHRISTIAN BERNARD, FRC – Imperator da AMORC
04
10 O Terceiro Olho
Por RALPH M. LEWIS, FRC

18 O que está errado no Mundo?


FÓRUM ROSACRUZ

22 Neofitismo Místico
Por RAYMUND ANDREA, FRC
18
28 O corpo co-manda
Por JOSÉ ELIÉZER MIKOSZ, FRC

35 Credo Espiritual

28
Por JUREMA FRANCO CAMARGO, SRC

36 O Parque Rosacruz na Califórnia


Por LUIS FABIO MIRANDA, FRC

48 Deus e o Big Bang


Por DANIEL MARLO MARGARIDA, FRC

52 Além do conflito de gerações


Por BERTILO FREDERICO BECKER, FRC
48
2 O ROSACRUZ · VERÃO 2013
Propósito da O Rosacruz é uma publicação trimestral
da Juris­dição de Língua Portu­guesa da
Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis. As
Ordem Rosacruz demais juris­dições da Ordem Rosa­cruz
editam uma revista do mes­mo gênero:
A Ordem Rosacruz, AMORC é El Rosacruz, em espanhol; Rosicru­cian
uma organização interna­cio­nal de Digest e Rosicrucian Beacon, em inglês;
Rose+Croix, em francês; Crux Rosae, em
caráter templário, místico, cul­tural
alemão; De Rooz, em holandês; Ricerca
e fraternal, de homens e mulheres Rosacroce, em italiano; Barajuji, em
dedicados ao estudo e aplicação japonês e Rosenkorset, em línguas nórdicas.
prática das leis naturais que regem Seus textos não representam a palavra oficial da AMORC,
o universo e a vida. salvo quando indicado neste sentido.
O conteúdo dos artigos representa a palavra e o pensa­mento dos pró-
Seu objetivo é promover a evolu- prios autores e são de sua inteira respon­sabilidade os aspectos legais e
ção da huma­nidade através do de- jurídicos que possam estar interrelacionados com sua publicação.
senvolvimento das potencia­lidades Esta publicação foi compilada, redigida, composta e impressa na Ordem
de cada indivíduo e propiciar ao Rosacruz, AMORC – Grande Loja da Jurisdição de Língua Portuguesa.
seu estudante uma vida harmo- Todos os direitos de publicação e repro­dução são reservados à
Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis, AMORC – Grande Loja da
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Neste mister, a Ordem Rosacruz n Coordenação e Supervisão: Hélio de Moraes e Marques, FRC
oferece um sistema eficaz e com- n Editor: Mercedes Palma Parucker, SRC – MTb-580
provado de instrução e orientação n Colaboração: Estudantes Rosacruzes e Amigos da AMORC

para um profundo auto­conheci­ n Assinaturas: Ligue para (0xx41) 3351-3060

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Essa antiga e especial sabedoria
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nossa capa
Rua Nicarágua 2620 – Bacacheri Egito, Karnak. Desenho de autoria de Jacques Martin, do álbum “Les
82515-260 Curitiba, PR – Brasil voyages d’Alix – l’Égypte (1)” (As viagens de Alix – O Egito (1)), de
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www.amorc.org.br Rafael Morales. Publicado por Casterman – Bélgica.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


3
n ROSACRUCIANISMO

S
egundo os dicionários, a definição
oficial de lealdade é a seguinte: “Fide­
lidade aos compromissos, obedecendo
às regras da honra e da probidade”.
A noção de lealdade é frequentemente
atribuída aos Cavaleiros, assim como tam-
bém ocorre com a fidelidade e a gratidão.
Ser leal é não mentir a quem espera de nós
um conselho sincero. É também respeitar
um compromisso assumido face a um ter-
ceiro. Ser leal é respeitar o Mestre, o com-
panheiro de trabalho, o cônjuge ou o amigo
que escolhemos ou por quem aceitamos ser
escolhidos. Mas é também, e mesmo sobre-
tudo, ser verdadeiro consigo mesmo. É dito
que “A caridade começa em casa”, mas po-
de-se transformar este adágio afirmando-
-se que “A lealdade começa sempre perante
si mesmo”. É mais fácil ensinar aos outros
aquilo que já sabemos, mais fácil ser respei-
toso para com outrem se respeitamos a nós
mesmos e, portanto, ser mais leal com o
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outro se já manifestamos a lealdade perante


nosso próprio eu interior.

Lealdade
Fidelidade
Gratidão
Por CHRISTIAN BERNARD, FRC – Imperator da AMORC

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Ser leal não significa perder todo o senso e que devemos romper o compromisso, é
crítico e nem tampouco ser submisso a al- preciso então fazê-lo com calma, sem raiva e
guém, a alguma coisa ou a uma ideia. Ser leal com tal convicção que o fato seja definitivo.
não implica seguir cegamente uma estrada Sem compromisso e sem arranjos complica-
perigosa porque a ela se é infelizmente con- dos. Nada mais que a simplicidade, a força e
duzido. Não, isto não significa ser leal, mas a determinação.
antes ser inconsciente, ou mesmo estúpido. Permitam-me insistir na importância de se
Se algumas pessoas naturalmente rápidas de assegurar pessoalmente da veracidade dos ar-
espírito podem assumir um compromisso gumentos que nos teriam sido transmitidos e
inofensivo ou importante em alguns segun- que estariam na origem de nossa desistência.
dos, outras deveriam absolutamente se abster Há um sinal que em geral não engana, pois
de falar rápido demais e de alardear promes- ele vem do mais profundo de nós mesmos:
sas inconsequentemente, sem ter refletido, pe- é o sentimento, a impressão de desconforto
sado e medido bem as consequências de seus que sentimos face a tal pessoa ou situação.
compromissos. Uma vez assumido o compro- Isto é simplesmente “usar sua intuição”. Mas
misso, devemos fazer tudo para respeitá-lo. quanto a isso também não devemos formular
Certamente, é dito também que “Não se pode julgamentos precoces, pois muitos fatores
exigir de ninguém o impossível” e é exatamente podem nos induzir ao erro e ludibriar nossas
aí que intervém a noção de lealdade. faculdades, mesmo as psíquicas. Portanto, é
Se, por diversas razões, não podemos nos preciso sempre analisar bem e, como eu dizia
adequar ao que foi acordado, então devemos antes, pesar e medir. Acautelem-se do canto
ter a coragem de reconhecer nossa incapa- das sereias, pois ele pode ser pérfido.
cidade de efetuar aquilo que estava previsto, Em síntese, renunciar ao compromisso
de consentir a ajuda prometida ou, simples- não significa ser desleal, mas é preciso fazê-
mente, de dar sequência a uma relação insa- -lo com honestidade, sentido de respon-
tisfatória. Os exemplos são múltiplos, tanto sabilidade e sem recriminar a outra parte
quanto as circunstâncias ou os problemas envolvida pela escolha que havíamos feito,
inesperados que podem nos impedir de fazer nem pela que fazemos agora. Não nos sinta-
o que havíamos prometido. mos obrigados, para justificar nossa eventual
Neste caso, é preciso ter a honestidade fraqueza ou nossa incompreensão, a denegrir
moral e intelectual de se reconsiderar pesso-
almente, de reconhecer que o problema pode
vir de nós, da nossa má avaliação do serviço
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pedido ou mesmo de nossa fadiga ou pre-


guiça. Certamente eu não me refiro ao caso
extremo de termos sido abusados por um ser
ou grupo perverso, maquiavélico ou manipu-
lador. Neste caso, assim que nossos olhos se
abrem, é preciso, antes de tudo e o mais bre-
vemente possível, afastar-se do perigo, recuar,
refletir, meditar e pedir ao Cósmico para ser
esclarecido ou guiado na escolha a ser feita.
Assim que tenhamos pessoalmente a cer-
teza de que íamos por um caminho errado

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n ROSACRUCIANISMO

aquilo que um dia quisemos, seguimos e fiéis na amizade e no amor. Não se forçam.
amamos. Portanto, é possível ser leal mesmo Não consideram a traição, conservam suas
na renúncia. É uma questão de nobreza, de convicções e não se deixam impressionar ou
retidão e de honra. influenciar por um discurso muito belo, uma
Ser leal não é mudar de opinião a todo moda ou qualquer pressão.
instante ou, como dizemos familiarmente, Uma vez que é sob a égide da AMORC
“virar a casaca”. Certamente, eu sei que tam- que esse texto é publicado, permitam-me
bém é dito que “somente os tolos não mudam tomar o exemplo da afiliação rosacruz. As
de opinião”, mas esta frase não nos deve in- pessoas fiéis por natureza, uma vez tendo
citar ao abandono de nossas convicções e de encontrado a senda que lhes convêm, a ela
nossa fé, e nem tampouco nos servir de des- se ligam e se afeiçoam.
culpa para uma eventual traição, uma atitude Se elas encontram satisfação na leitura de
hipócrita, nociva e, logo, desleal. suas monografias ou livros, se são felizes por
A lealdade pode ser também uma forma se sentirem membros de uma Fraternidade
de gratidão. Assim que tenhamos recebido como a nossa e se sentem as benesses e a
uma benesse, grande ou pequena, segundo força mística de sua Egrégora, por pouco
nossa apreciação e nossa capacidade de ava- que tenham possibilidade de participar nos
liar o impacto positivo dela, devemos dar trabalhos de uma Loja, de um Capítulo ou de
prova de gratidão a Deus, à vida e à nossa um Pronaos, e por conseguinte se têm a pos-
mãe-Terra, sem esquecer a coisa, o fato ou a sibilidade de oferecer o melhor de si mesmas
pessoa que está na origem da dádiva recebida. pelo serviço, então por que – sim, por que –
À lealdade pode-se acrescentar a fideli- elas a abandonariam?
dade. Por certo, estas qualidades são irmãs, Porque buscariam outra coisa, outro
mas podemos ainda assim perceber algu- caminho, se estão bem na senda rosacruz?
mas nuances. A fidelidade talvez seja mais Estas pessoas permanecem, portanto, fiéis e
suave que a lealdade. Com isso quero dizer sustentam o ideal que escolheram e que lhes
que ela se manifesta naturalmente em algu- convêm, apesar dos inevitáveis pequenos im-
mas pessoas. Ela faz parte de seus tempe- previstos, de algumas pequenas decepções de
ramentos e elas não imaginam que poderia amizade, de um pouco de fadiga e desalento
ser de outro jeito. Eu diria que esta forma de quando elas devem, por exemplo, aceitar pela
fidelidade não se comanda e nem se racio- décima ou vigésima vez, ou mais ainda, uma
naliza. Ela simplesmente “é”. função de Oficial ou de responsável de comis-
Há pessoas que não gostam de mudar de são no seu Organismo. Uma porta que encon-
hábitos. São fiéis a marcas, comerciantes, res- tra fechada por causa de um atraso, um irmão
taurantes, autores etc. São também em geral ou irmã que não pensa em lhe devolver um

“ Se nós somos leais e fiéis, a princípio não


somos ingratos. A gratidão pode se exprimir
de muitas maneiras: inicialmente na sua
forma mais simples e mais leve.

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livro ou objeto emprestado, uma palavra mais

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forte que a outra, um mal-entendido ou uma
decepção: nada altera sua fé e sua fidelidade.
Estas pessoas são simplesmente sábias
e continuarão a apoiar a AMORC até o fi-
nal de sua encarnação, pois mesmo se não
puderem se deslocar para uma Convenção
ou convocação, elas continuam a trabalhar
espiritualmente em seu lar, na discrição de
seu Sanctum, e depois mais tarde, em sua
poltrona ou leito, e enfim, quando for chega-
do o momento de, segundo a um tanto ver-
dadeira e consagrada expressão, “entregar a
alma a Deus”, é sob os auspícios da Rosacruz
que elas preparam sua última viagem e dei-
xam seu corpo com a esperança, e mesmo
a certeza, de que reencontrarão, ainda na
mais tenra idade, a Senda rosacruz. Sim, leve. Ela consiste em se contentar por ser
estes fratres e sorores são fiéis e a questão feliz e se lembrar de tempos em tempos que
da lealdade não lhes tange verdadeiramente, este ou aquele benefício nos adveio por meio
pois eles são naturalmente leais. desta ou daquela pessoa. Em geral, é um
Pode-se considerar a lealdade como uma acontecimento ou problema exterior a nós
virtude mais ativa do que a fidelidade, pois que provoca esta lembrança. Este não é um
ela gera compromissos deliberados, a pres- ato voluntário, pensado e desejado. É apenas
tação de juramentos e, às vezes, tomada de a circunstância do momento, e esta lembran-
posição. Ela se obriga a ser sincera, a dar ça involuntária já é por si muito louvável,
prova de força moral e às vezes mesmo física. pois atesta que nossa memória e nosso cora-
Devemos recusar a intriga e desdenhar as ção não apagaram nada.
fofocas. Devemos permanecer de pé e firmes Em sua forma ativa, o reconhecimento
diante das provações e das tentações do “dia- é mais presente, mais palpável e mais de-
bo” que infla nosso ego e se aproveita de nos- monstrativo. Ele recusa o esquecimento e
sas fraquezas. É preciso não se deixar colher precisa se manifestar mais visível e concreta-
pelas forças obscuras que podem conduzir mente. Ele pode se dirigir a Deus, à Grande
à traição, às mentiras, às falsas acusações, à Consciência Cósmica, à natureza etc. Além
negação de sua fé, à destruição daquilo que disso, o Código de Vida Rosacruz evoca este
construímos e ao abandono daquilo que conceito em diversas oportunidades. Caso
amamos, dos amigos ou da família. não o conheçam, saibam que existe uma ver-
Renegar o outro é renegar a si próprio. são internacional dele, já que foi editado um
Esta referência à negação leva-me a refletir livro trazendo esse texto em diversas línguas,
sobre a injustiça e a ingratidão frequente- inclusive o esperanto.
mente resultantes. Se nós somos leais e fiéis, É o reconhecimento puro, pela vida que
a princípio não somos ingratos. A gratidão nos é concedida, pelas experiências vividas e
pode se exprimir de muitas maneiras: ini- pela inevitável evolução que delas deriva. Este
cialmente na sua forma mais simples e mais pensamento cotidiano é deliberado, posto em

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n ROSACRUCIANISMO

ação; é uma gratidão ativa. Mas se também


se trata de sua manifestação mais perfeita, a
gratidão não deixa de se mostrar sob outras
formas. Em todos os locais de culto do mun-
do preces são ditas; incensos, círios e óleos
são queimados; oferendas são feitas na forma
de frutas, dinheiro ou serviço. Neste estado, o
reconhecimento se manifesta materialmente
por um ato ou dádiva concreta e tangível. Mas
mais uma vez é um reconhecimento geral à
intenção do princípio divino, mesmo se diz
respeito a uma dádiva particular. Em nossa
Ordem, chamamos isso de Lei de Amra.
[…] A Lei de Amra era uma prática cor-
rente no Egito antigo, notadamente entre
os adeptos que frequentavam as Escolas de © PHOTOS.COM

Mistério. Sob uma forma um pouco diferen-


te, ela foi perpetuada no Judaísmo e em nos-
sos dias podemos encontrar alguns aspectos
dela na religião cristã. Ela consiste simples-
mente em exprimir de um jeito ou de outro resultado daquilo que o Cósmico nos per-
o reconhecimento por uma dádiva recebida, mitiu conseguir, pois é a Inteligência divina
entendido que esta dádiva não corresponde que trabalha através de cada indivíduo e lhe
necessariamente a uma aquisição material consente receber Suas bênçãos. […]
ou a um ganho financeiro. Efetivamente, te- Antes de considerar o modo como pode-
nhamos consciência disso ou não, devemos mos aplicar a Lei de Amra, devemos insistir
ao Cósmico tudo aquilo que contribui para a no fato de que ela não é, de forma nenhuma,
nossa felicidade. É por isso que alguns apli- uma obrigação. Isto significa que a aplicação
cam a Lei de Amra quando simplesmente desta lei deve ser livremente consentida e
tiveram a alegria de passar um momento deve ser operada sem a menor reserva men-
agradável na companhia de pessoas interes- tal. Se este não for o caso, aquilo que for dado
santes. Outros o fazem por terem sido auxi- em Amra não tem nenhum valor no plano
liados por uma terceira pessoa em certas pro- místico. Por outro lado, aquilo que é feito
vações físicas ou morais. Outros ainda põem no âmbito dessa lei não deve ser matizado
esta lei em aplicação por terem recebido o com nenhuma forma de superstição. Em
apoio do Conselho de Solace. Neste particu- outras palavras, não se deve imaginar que,
lar, cada qual tem suas próprias razões para se não aplicarmos a lei, não receberemos
participar em Amra, pois aquilo que alguns mais benesses. É fato que a ingratidão não
consideram como sendo uma graça vinda do traz sorte, mas não deve ser o medo de nos
céu para outros não é senão o fruto de seus tornarmos azarados a nos obrigar a aplicar a
próprios méritos. Não obstante, deveríamos Lei de Amra. Por outro lado, também não se
sempre considerar que toda graça, mesmo deve pensar que, para beneficiar-se de uma
se a atribuirmos ao que pensamos, dizemos ajuda espiritual, basta, antes mesmo de havê-
ou fazemos, não é em última forma senão o -la recebido, exprimir seu reconhecimento ao

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Cósmico praticando esta lei. Tal procedimen- e “modernas”, consome-se constantemente
to está, ele próprio, tingido de superstição. sem se pensar que atrás de certas coisas há
Assim como uma ventura não corres- muito trabalho e devotamento. Em suma,
ponde necessariamente a dinheiro ou a infelizmente somos, demasiada e habitual-
qualquer outra coisa material, Amra não se mente, insensíveis, cegos e surdos.
aplica sistematicamente por meio da doação Assim, atrás de seu agradecimento é
de uma certa quantia em dinheiro ou de um preciso haver um sincero reconhecimento.
bem material. Em outras palavras, podemos Não hesitem em exprimi-lo pois, para além
aplicar esta lei prestando serviço a pessoas do ato de polidez, vocês experimentarão o
que necessitem, ocupando nosso tempo sentimento leve e alegre de não ter dado uma
confortando aqueles que estão em estado de prova de ingratidão. Aproveitem uma festa
privação, fazendo esforços para melhorarmos de família, uma reunião de amigos ou ainda
em nossas relações e, de maneira geral, nos de trabalho para exprimir sua gratidão a uma
dedicando a fazer o bem ao redor de nós pela ou mais pessoas presentes que a mereçam.
utilização de nossos talentos e de nossas qua- Digam todo o bem que vocês pensam delas e
lidades. Podemos fazê-lo também participan- pelo que são reconhecedores. Afirmem e ofi-
do o mais regularmente possível do trabalho cializem este reconhecimento na presença de
da Comissão Silenciosa, pois tal trabalho testemunhas: isto só dará mais impacto.
contribui para o bem de outrem. […]* De que vale amar em segredo e em si-
Eis então a definição rosacruz da Lei de lêncio, se aquele que é objeto deste afeto o
Amra e exemplos de sua aplicação. ignora? Alguns de vocês talvez tenham ouvi-
Ainda a propósito da gratidão, creio que do meu texto sobre a felicidade. É na conti-
deveríamos expressá-la mais frequentemente nuidade dela que eu lhes encorajo a desvelar
às pessoas que nos fazem o bem, que nos con- seus bons sentimentos. Isto tornará felizes
sagram seu tempo, que nos prestam inúmeros aqueles e aquelas que se beneficiarão desta
serviços ou que nos oferecem presentes. Na atitude gentil e positiva e você mesmo co-
linguagem humana, em todos os idiomas, até nhecerá uma felicidade verdadeira, pois após
mesmo no menor dialeto, existe a expressão ter recebido você terá dado. Resumidamente,
“Obrigado”. Por palavras, gestos ou sorrisos, ser grato é bom; exprimir este reconheci-
o agradecimento é universal e tão antigo mento é ainda melhor.
quanto a humanidade. Se assim é, é porque o Lealdade, fidelidade, gratidão: três virtudes
sentimento de gratidão é bem mais profundo a se desenvolver, três princípios a se aplicar,
que a simples polidez ou que o gesto de con- três ideias a se aprofundar, mas um único es-
veniência que o homem pôde inventar com o pírito! Possam estas qualidades lhes animar ao
passar do tempo e dos modos. longo de toda a sua vida e que vocês possam
Depois de séculos, o recato, a discrição e estar em contato unicamente com as pessoas
a dissimulação dos sentimentos tornaram- que as possuam. Se este não puder ser o caso,
-se pouco a pouco uma segunda natureza que então vocês possam ter lucidez, força e
no ser humano. Se a isto acrescentarmos o sabedoria suficientes para se preservar. 4
acúmulo de bens, de facilidades e a abun-
dância de lazeres, só poderemos constatar
que muitas coisas se revelam irrisórias e
sem importância, como um débito eviden- * Excerto do Liber 888.
te. Em nossas sociedades ditas “civilizadas”

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n AUTOCONHECIMENTO
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o Terceiro Olho
Por RALPH M. LEWIS, FRC

A
o falar sobre o Terceiro Olho pre- terísticas que permitem perceber o duro, o
cisamos considerar três aspectos: mole, o frio, o quente etc.
primeiro, a tradição; segundo, as A visão, porém, possibilita, ao mesmo
possibilidades anatômicas e fisio- tempo, por sugestão e associação de ideias,
lógicas da existência desse órgão e, terceiro, a a sensação das outras inúmeras qualidades
função ou finalidade do mesmo. dos nossos sentidos objetivos sem que esses
De todas as nossas percepções sensoriais sentidos interfiram no processo. Por exem-
ou faculdades objetivas, a visão nos parece a plo, quando vemos uma bela flor a uma certa
mais preponderante e importante. Isso é par- distância, não percebemos apenas sua forma
ticularmente verdadeiro no que diz respeito e seu colorido, mas também, por sugestão,
ao número de qualidades que a visão atribui lembramo-nos de outras belas flores, cuja
aos objetos. Das cinco faculdades físicas, fragrância já tenhamos sentido. Assim sen-
somente a visão e o tato proporcionam a do, pensamos nessa flor também com um
idéia de dimensão. A visão dá ainda a ideia agradável perfume. Ao observarmos uma
das formas, configurações e proporções que maçã de cera muito bem feita, ignorando
conferimos às coisas. O tato apresenta carac- tratar-se de um modelo, não percebemos

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apenas sua forma e seu colorido, mas as humanas intensas, a despeito de quão imó-
sensações visuais extraem da memória a ex- veis permaneçam os músculos faciais ou se
periência do sabor adocicado de uma maçã mantenha inerte o corpo.
verdadeira, semelhante àquela. Portanto, a Na antiguidade, séculos antes que as
visão confere mais qualidades aos objetos doutrinas da telestesia ou telepatia mental
que percebemos, direta e indiretamente, do de Mesmer fossem conhecidas, acreditava-se
que o fazem as sensações que nos chegam que os pensamentos que geravam emoções
através dos demais sentidos. ou sentimentos intensos produziam uma
Certos instintos humanos primários são substância etérea, invisível, que se irradiava
mais facilmente despertados pela visão do da pessoa. Assim, afirmava-se que certos
que por qualquer outra de nossas faculdades sentimentos e paixões eram projetados atra-
externas. Isso nem sempre ocorre com os vés dos olhos. O ódio se salientava entre
animais. Um cão, por exemplo, não confia essas paixões transmissíveis. Ainda persiste
em seu sentido da visão para determinar se a expressão comum: “Se olhar matasse…”,
um indivíduo é amigo ou inimigo; antes, re- que sugere que um certo olhar foi malévolo.
corre ao seu sentido do olfato, especialmente Esta expressão não era apenas analogia para
se houver algo visualmente estranho na apa- os antigos egípcios, nem o é ainda hoje para
rência da pessoa. alguns povos do Oriente.
Como as emoções humanas são desper- Os olhos de um homem odioso ou mau
tadas mais facilmente pela visão, os anti- eram considerados destrutivos para todas
gos consideravam os órgãos visuais canais as pessoas que se pusessem em seu campo
diretos para a alma, pois acreditavam que visual. Ter alguém esses olhos dirigidos para
a alma era a sede das emoções. Demócrito si era tornar-se fadado à má sorte. Após a
afirmava, em sua doutrina das imagens, que transição, esses “olhos maus” se apartavam
nossas percepções visuais se deviam a que do corpo, segundo se acreditava, continuan-
os objetos exteriores projetavam imagens ou do a existir. As pessoas supersticiosas viviam
cascas de si mesmos, as quais penetravam sob o terror constante de que o olho mau as
em órgãos preparados para recebê-las. Essas fitasse. Segundo as práticas teúrgicas ou má-
imagens, segundo sustentava Demócrito, gicas dessa época, os amuletos e talismãs, que
após penetrarem nos olhos, faziam com que se acreditava possuírem propriedades sobre-
a alma se tornasse agitada e, por consequên- naturais, eram usados para afastar o “olho
cia, o homem experimentava as sensações ou mau”. Até mesmo uma cor foi escolhida para
percepções sensoriais.
Com pouca alteração, esta doutrina das
imagens persistiu até a época de Locke. Os
olhos eram e são considerados “as janelas
da alma”, segundo a clássica expressão de
Leonardo da Vinci. Não eram eles tidos
apenas, pelos antigos, como passagens para
a admissão de objetos ou influências exterio-
res, mas também permitiam a saída de forças
© PHOTOS.COM

ou estranhos poderes provindos da alma. Isto


parecia verossímil, porque os olhos, em suas
expressões, revelam efetivamente as emoções

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


11
n AUTOCONHECIMENTO

a suprema visão de Deus, – que tudo envol-


ve e contém e fora da qual nada existe, e da
qual nada se oculta.
Simultaneamente com esses poderes atri-
buídos ao olho, havia as histórias e lendas de
seres de um olho só, ou com vários olhos, que
se afirmava terem perambulado pela Terra, em
determinada época. A maioria de nós já ouviu
falar dos Ciclopes, personagens da mitologia
grega. De acordo com a cosmologia grega an-
tiga, Eros, o espírito do amor, reuniu muitos
pares de coisas durante a criação do mundo.
O Olho de Hórus Duas dessas coisas reunidas foram Uranus (o
Céu) e Gea (a Terra). Por sua vez, povoaram
a Terra com grande número de seres. Alguns
proporcionar imunidade. Em muitos países deles eram os Titãs e os Ciclopes. Havia três
islâmicos, o viajante pode observar, na super- Ciclopes: Brontes, com seu trovão; Steropes,
fície externa das tendas nômades ou pintadas com seu relâmpago; e Arges, com seu raio de
nos tetos, listras de uma tonalidade especial luz. Dizia-se que eles tinham um só olho, si-
de azul. Essa cor é usada nos camelos para tuado na junção do nariz com a sobrancelha.
protegê-los, e às cargas, dos efeitos funestos Tratava-se, todavia, de um grande e cintilante
de um eventual “olho mau”, ou mau olhado. olho, apropriado aos que eram personificações
Entretanto, nem todas as influências do da nuvem tempestuosa, com seus lampejos de
olho eram nefastas, pois ele podia ser ins- destrutivos raios e estrépitos de trovão.
trumento do bem, um fator construtivo, es-
pecialmente no caso dos olhos dos deuses e
dos sábios. O deus egípcio Hórus, da primi-
© PHOTOS.COM

tiva religião egípcia, segundo a mitologia,


era filho de Ísis e Osíris. Conta-se que ele
possuía olhos que irradiavam um tremendo
poder, sendo o olho direito particularmente
eficaz. Tão respeitado e temido tornou-se
esse olho direito de Hórus que foi finalmen-
te separado da figura do deus e divinizado;
isto é, passou, o próprio olho, a ser adorado,
não como um deus, mas, como um símbolo
da onisciência e onipotência de Deus.
O Olho-Que-Tudo-Vê, como é denomi-
nado, é um dos mais antigos símbolos do
homem, ainda mantido em uso constante
e com um significado que tem persistido
quase continuamente durante séculos. Para
os rosacruzes e os místicos de modo geral,
significa a Consciência que tudo penetra, – O Olho-Que-Tudo-Vê

12 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


Pinturas primitivas representam um raio
de luz emanando desse olho único. Isto in-
dicava que esse olho não só podia enxergar
como tinha também a propriedade de irra-
diar um certo poder. As lendas do Terceiro
Olho estão também relacionadas com os an-

© COMMONS.WIKIMEDIA.ORG
tigos Lemurianos. Relata-se que esse Terceiro
Olho constituía uma grande proeminência,
exatamente acima do nariz, pela qual era o
indivíduo capaz de discernir a existência de
coisas invisíveis para os outros dois olhos.
Assim sendo, a palavra “olho” não seria
realmente aplicável, caso existisse um órgão
como o que descrevemos, pois, embora tives-
se ele o poder da percepção, não se trataria da
visão com significado tal como ordinariamen-
Ciclope, ser mitológico de um olho só
te compreendemos esta palavra. Suponhamos
que a faculdade da imaginação estivesse
confinada a um órgão mais ou menos do ta- tipo de olho. Na realidade, esses pontos vi-
manho de um pequeno ovo de galinha, que suais são células fotossensíveis. A Natureza
formasse uma saliência no centro da testa. colocou-as em uma depressão em forma de
Por seu intermédio, formaríamos os quadros cova, preparando-lhes, assim, uma cavidade
mentais das imagens associadas à imaginação. ótica. Essas simples células já são prepara-
É bastante compreensível o fato de que esse das para a percepção de direção. Com isto,
órgão, por confusão, poderia ser identificado queremos dizer que são capazes de dirigir
como um olho, embora não o fosse, fisiologi- para a luz o organismo de que fazem parte.
camente. É bastante provável que tenha exis- As medusas, as estrelas-do-mar e alguns
tido esse terceiro órgão, como um verdadeiro vermes anelídeos possuem essa cavidade
olho, ou uma faculdade extra-sensorial. visual, ou seja, a pequena depressão em que
Façamos uma breve digressão sobre os se localizam as células sensíveis à luz. Em
olhos primitivos, ou seja, os olhos de animais outras espécies de seres viventes, dotados de
e organismos simples. Nessa denominação mais complexos órgãos visuais, podem-se
de olhos incluímos os órgãos especialmente encontrar ainda vestígios dessas primitivas
adaptados para a percepção da luz. A sen- cavidades visuais. As células fotossensíveis,
sibilidade à luz pode ser frequentemente que outrora as ocuparam, foram eliminadas
demonstrada em animais nos quais não se pela natureza, no processo evolutivo.
observa a existência de olhos. Nesses casos, Também o homem, em seu desenvolvi-
somos forçados a presumir que ou toda a mento físico, pode ter sido dotado de uma
superfície da pele é sensível à luz, ou células espécie de Terceiro Olho, em alguma épo-
sensoriais simples, estruturalmente difíceis de ca, para servi-lo especialmente quando o
distinguir, encontram-se espalhadas pela pele. cérebro se demonstrasse incapaz de o pro-
Há ainda aquilo que recebe o nome de teger pelo uso da razão. Como essa outra
pontos visuais, que se observam em muitas espécie de órgão era frequentemente em-
espécies e constituem talvez o mais simples pregada, pode ter se salientado, chegando

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


13
n AUTOCONHECIMENTO

“ Há diferentes
tipos de visões
que servem de
© PHOTOS.COM

vários modos aos


seres vivos.

ser ligada e desligada, em sua presença, sem
que eles aparentemente o percebam. Existem
animais, principalmente entre os que vivem
no subsolo, que não são afetados por formas
nem por movimentos. Somente uma varia-
ção na intensidade da luz, ou das sombras,
produz sensações em seu interior. Assim, se a
a ser tão facilmente observado quanto hoje luz é diminuída, ou parcialmente obstruída,
o são os nossos olhos e as nossas orelhas. seus olhos o percebem e eles ficam alarma-
Contudo, isto não significa que esse olho dos. A percepção visual de direção é possível
fosse sensível à luz ou consistisse de célu- entre muitos animais, que são capazes de
las fotossensíveis. Conforme razões que te- seguir na direção de sua percepção, evitando
mos para acreditar e saber, era ele sensível caminhar em círculos.
a outros estímulos externos e internos que Conhecemos o princípio da percepção
afetam o homem. humana de direção. O homem escolhe um
Enxergamos porque a luz torna possível à objeto à sua frente, na trajetória de sua per-
nossa consciência a percepção da existência cepção visual, encaminha-se para ele e, ao
de manifestações naturais essenciais à nossa alcançá-lo, escolhe um outro objeto mais
existência, quer devam ser assimiladas ou distante. A maioria dos animais escolhe um
evitadas. Todavia, há diferentes tipos de vi- outro objeto mais distante. A maioria dos
sões que servem de vários modos aos seres animais inferiores, especialmente muitos
vivos. Muitos animais inferiores são dotados insetos, não segue objetos, e sim trajetórias
exclusivamente de percepção do movimen- de luz. Mantêm-se à direita ou à esquerda da
to. Não podem ter percepção de um objeto luz, viajando paralelamente à mesma. Alguns
nem reconhecê-lo, a menos que este se mova. insetos são positivamente fototáticos, isto é,
Uma coisa imóvel não é absolutamente per- são atraídos pela luz. Por exemplo, a abelha
cebida por alguns animais. Uma lebre não voa diretamente na direção de uma janela
demonstrará pânico na presença de um caça- aberta. Por outro lado, a barata é negativa-
dor, se ele permanecer imóvel; porém, se ele mente fototática, evita a luz e dela se afasta.
se mover, a lebre captará o movimento e fu- Existem, no universo, muitos fatores
girá. Existem insetos cujos olhos estão cons- que são importantes para o nosso bem-
tituídos de modo a não serem afetados senão -estar, como seres físicos e seres de origem
pela percepção do movimento. Uma luz pode espiritual. Fomos providos, pelo Cósmico,

14 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


de meios para a utilização desses fatores. as podemos interpretar. É uma ponte pela
As glândulas endócrinas, centros psíquicos, qual passa a Divina Consciência do Cósmico
são alguns dos instrumentos que nos são para a mente objetiva do homem.
dados, em acréscimo às nossas faculdades Isto, enfim, é o Terceiro Olho.
sensoriais comuns, como partes integrantes Proporciona-nos visão do Cósmico, percep-
de nós mesmos para o controle e a direção ção de Deus e penetração nos reinos divinos
das forças necessárias à saúde, à intelectua- que muito se distanciam do físico. É o verda-
lidade e à compreensão espiritual. deiro olho da alma. O filósofo Descartes e a
Um desses instrumentos é a glândula pi- escola que se originou de seus pensamentos
neal. Está situada próximo ao centro do cére- afirmavam que a glândula pineal era a sede
bro, em linha reta partindo do centro da tes- da ação recíproca entre a mente e o corpo.
ta, bem acima do nariz. Quando é expandida, De vez em quando, segundo suas afirmações,
conforme aprendem os rosacruzes a fazê-lo, a alma, através da glândula pineal, afetava as
ocorrem sensações físicas dessa expansão, delicadas partículas do sangue que, por sua
tais como pulsações aceleradas, ligeiro late- vez, provocavam os movimentos mecânicos –
jamento ou, ainda, uma sensação de calor. as ações físicas do corpo.
Essas sensações se transferem com frequên- Algumas histórias de detetives e tramas
cia para uma área da parte anterior da cabe- de filmes cinematográficos desenvolveram
ça, em um ponto situado entre os olhos. a ideia, e muitas pessoas ficaram pensando
Antes que o homem conhecesse a localiza- se seria verdadeira, de que a última imagem
ção exata da glândula pineal, imaginava que vista e compreendida pelo olho humano em
ela se encontrava na parte anterior do córtex,
mais ou menos no centro da testa. Trata-se de
um órgão muito pequeno, tendo aproximada-
© PHOTOS.COM

mente o tamanho de um grão de trigo; con-


tudo, é um órgão vital. É ele, por assim dizer,
um transformador da Consciência Cósmica,
da inteligência do Cósmico, para um certo
nível vibratório, ou seja, para uma forma de
energia perceptível pela nossa mente objetiva.
Para explicar melhor e por analogia, podemos
dizer que a pineal atua como uma pequena
válvula que em certas ocasiões, dependendo
de nosso pensamento, de nossa meditação
e de certos exercícios psíquicos, abre-se e
permite que as inspirações Cósmicas e a
Sabedoria Divina tenham livre passagem e
sejam reduzidas a uma forma que o cérebro
pode traduzir como noções e conceitos com-
preensíveis. Ou, ainda, podemos compará-la
a um receptor de rádio que reduz as irra-
diações elétricas de alta frequência a ondas
sonoras às quais nossos ouvidos reagem e que Esquema de funcionamento da glândula pineal
podem ser transferidas para o cérebro, onde segundo Descartes (1641)

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


15
n AUTOCONHECIMENTO

mais lógico do que a afirmação de que foi


encontrada uma imagem na retina do olho.
Além disso, mesmo que a retina fosse como
a tela de cinema, é preciso lembrar que nada
fica permanentemente registrado nessa tela;
assim que a luz que passa pelo filme é desli-
gada, cessa de aparecer qualquer cena na tela,
de modo que, observando-a imediatamente
após, nada mais se pode perceber.
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Uma palavra de advertência. Muitas pes-


soas, ao iniciarem o estudo dos fenômenos
ocultos ou psíquicos, ficam tão entusiasmadas
e desejosas de obter resultados que tendem a
interpretar experiências comuns, de natureza
puramente fisiológica, como Cósmicas ou
uma cena que pudesse ser observada imedia- psíquicas. Assim, qualquer som incomum é
tamente antes da transição, ficaria firmemen- uma “mensagem” e circunstâncias ou con-
te gravada na retina, como um quadro inde- dições singulares representam um “sinal” ou
lével. Essa ideia foi usada por um escritor em uma “impressão”. Esse exagero toca as raias da
uma novela, há muitos anos; contudo, todos superstição e constitui uma aberração.
os testes científicos provaram que ela estava É lamentável que muitos estudantes de
errada. De qualquer forma, um pequeno ra- misticismo e ocultismo não tenham rece-
ciocínio de nossa parte tornará claro que se bido, como preparação, alguma instrução
trata de uma falácia. básica em psicologia, fisiologia e física,
A retina do olho, embora seja comumente antes de penetrarem os aspectos mais ele-
comparada a uma tela de cinema na qual são vados da existência humana.
projetadas as cenas, não é, afinal de contas, Com muita frequência, vemos cores
uma superfície lisa e as imagens não são ou imagens que não têm correspondentes
projetadas com a forma e o brilho que apre- reais fora de nós mesmos e que, naquele
sentam na tela, mas sob a forma de pulsações momento, podem não estar relacionadas
e sensações luminosas, captadas pela retina com qualquer impressão visual externa; no
e transferidas para a área cerebral relativa à entanto, elas não são psíquicas, no verda-
consciência da visão. deiro sentido da palavra.
Se alguma imagem verdadeira é produ- Há, por exemplo, aquilo que é conhe-
zida em alguma parte, isto ocorre na área cido como pós-imagens, que consistem na
do cérebro relativa à consciência da visão, e ocorrência de sensações visuais idênticas
não na retina. Teria sido muito mais lógico ou parecidas, após ter sido removido o ver-
que esse escritor de ficção tivesse afirmado dadeiro estímulo. As pós-imagens podem
que do seu personagem foi aberto o crânio, ser divididas em duas categorias: negativas
extraída a parte do cérebro correspondente e positivas. As negativas são as mais co-
à consciência visual e, graças a algum tipo muns. Podem ser produzidas, por exemplo,
de manipulação, tivesse obtido a revelação olhando-se fixamente para um objeto colo-
de uma imagem na superfície do cérebro. rido, por uns trinta segundos, e dirigindo-
Isto, como já afirmamos, teria sido muito -se depois os olhos para um fundo neutro.

16 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


Sobre o fundo neutro, parecerá existir essa tonalidades brilhantes, tais como lavanda,
mesma imagem, porém com uma tonalidade vermelho-escuro e verde cintilante. Súbitas
diferente. Essas pós-imagens negativas per- mudanças de temperatura e repentinos movi-
manecerão durante alguns segundos, antes mentos do corpo podem fazer uma imagem
de desaparecerem completamente. As pós- permanecer como uma sensação por algum
-imagens positivas assemelham-se, em bri- tempo após a cessação do estímulo.
lho e tonalidade, à percepção visual original. Você pode tentar fazer a seguinte experi-
Além disso, conservam todo o brilho do ori- ência: olhar fixamente para uma luz elétrica,
ginal, enquanto duram. Uma pós-imagem em seu quarto, após ter fechado as janelas e as
negativa de um objeto amarelo aparecerá na portas de modo a evitar a penetração de qual-
cor azul; mas uma pós-imagem positiva terá quer outra luz; concentrar-se nessa luz duran-
a mesma cor, isto é, será amarela. te pelo menos trinta segundos e depois apagá-
As pós-imagens positivas duram apenas -la subitamente, de modo que o quarto fique
dois ou três segundos. As negativas são pro- em escuridão total. Se fizer essa experiência,
vocadas por intenso estímulo do nervo ótico, notará a ocorrência de pós-imagens negati-
tal como ocorre na concentração em uma luz vas (a imagem da lâmpada elétrica em seus
brilhante e próxima dos olhos. A sensação olhos). Essa imagem persistirá por alguns
produzida se mantém por vários segundos segundos. Ao seu redor, perceberá um res-
após a cessação do estímulo. Em outras pa- plendor colorido que não corresponde à cor
lavras, as pós-imagens negativas são produ- observada realmente na lâmpada. Tudo isto é
zidas pela persistência da excitação original, bastante compreensível; contudo, as pessoas
qualquer que tenha sido. que assim não o consideram tomam essas coi-
As pós-imagens positivas são muitas vezes sas por sinais de fenômenos psíquicos.
causadas por estimulação artificial, isto é, não Todavia, existem verdadeiramente cores
são produzidas por verdadeiras impressões e imagens que vemos, ou aparentemente ve-
visuais. Assim, uma pressão excepcional mos, psiquicamente, sem que tenham qual-
sobre as pálpebras pode produzir nos olhos quer origem fisiológica e que serão tratados
figuras ou padrões geométricos, em várias em outra oportunidade. 4

Calendário da Hierarquia para 2013


para membros do 12º Grau de Templo
– Quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013 – 20h (horário de Brasília)
– Quinta-feira, 16 de maio de 2013 – 20h (horário de Brasília)
– Quinta-feira, 15 de agosto de 2013 – 20h (horário de Brasília)
– Quinta-feira, 21 de novembro de 2013 – 20h (horário de Brasília)

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


17
n REFLEXÃO

© PHOTOS.COM

O que está errado


no Mundo?
U
ma das mais frequentes afirma- Já parou o leitor para pensar em que
ções feitas ao público é esta: “Algo muitas pessoas, isolada ou coletivamente,
está errado no mundo! Nosso sabem o que está errado no mundo? O pró-
grande progresso científico não prio leitor provavelmente o sabe. Pelo menos,
diminuiu o sentimento de insegurança da talvez tenha algumas das respostas. Isto é
humanidade. A civilização aproxima-se verdadeiro, pois muitas pessoas sabem o que
hoje da autodestruição. Que está faltan- é que está errado e algumas delas conhecem
do na educação e na instrução religiosa? até mesmo as soluções! Pois bem, será que
Estarão agora perdidos ou suprimidos os isso não o impressiona como um grande e
secretos elementos de caráter que outrora resplandecente farol de esperança, nestes
dotaram os homens de autodomínipo?” tempos tumultuosos?

18 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


Impressionaria, se apenas por outro lado A grande fortuna geralmente traz consigo
não houvesse esta cega arremetida das mas- responsabilidades que preocupam e estas
sas que, irrefletida ou inadvertidamente, tendem a tirar a alegria de viver. Em geral, a
deixam-se levar pela busca de bens e prazeres pobreza traz consigo a doença e o desconfor-
terrenos. Nesta atmosfera de quase pânico, a to, e estas coisas são igualmente infelicitantes.
voz daqueles que sabem dificilmente é ouvida Porém, entre estas duas situações, a grande
e seus conselhos são desdenhados. classe das pessoas pobres, que mal fazem
Na situação em que nos encontramos, a os dois extremos se tocarem, encontra uma
humanidade está à beira de sua própria des- alegria de viver dificilmente superada. Seu
truição; não porque não possa ser de outro ambiente as leva a despender um mínimo de
modo, nem porque não haja líderes capazes horas ociosas. Devido à falta de coisas, elas
de “desviar o estouro da boiada” e, certamen- inventam. Graças à falta de fundos, ficam em
te, não porque as pessoas não desejem ser casa. Quando precisam de companhia, visi-
salvas. É quase pura e simplesmente devido tam os vizinhos. Devido ao seu orçamento
à confusão reinante, com quase todo mundo limitado, mantêm dieta que as conserva es-
empurrando e dando encontrões para entrar beltas. Suas preocupações são mínimas como
na fila e ganhar seu pedaço de torta. as coisas com que têm de se preocupar. Há
Lembra-se de quando era uma bênção ser poucas coisas que se podem negar e, portan-
pobre? Ou, pelo menos, uma virtude, visto que to, sofrem menos tentação.
Deus encarava os pobres amorosamente, de Daí deve o abastado aprender, não ne-
modo que eles deveriam herdar a Terra? E qual cessariamente a dar aos pobres, mas a reger
era a chance de um homem rico? Seria mais sua vida de tal forma que sua abundância
fácil que um camelo passasse pelo fundo de não interfira nas boas coisas da vida. O rico
uma agulha do que um rico entrar no paraíso. deve exercer a autonegação e resistir a muitas
Assim rezam os velhos mandamentos e tentações. Deve buscar meios de tornar-se
provérbios. Quase ninguém entende mais coi- criador e produtivo, pois somente estas coisas
sa alguma literalmente; a maioria das pessoas produzem satisfação e prazer duradouros.
reage a essas máximas antigas com um dar No livro A Vós Confio, há a seguinte
de ombros, sugerindo que elas simplesmente advertência:
não se aplicam ao mundo de hoje, ou que Que o pobre se console e mesmo se regozije,
significavam na realidade algo inteiramente pois para isto tem ele muitas razões.
diferente. Entretanto, para aqueles dentre nós Em paz senta-se para comer, porque sua mesa
que se encontraram entre os bem-aventurados não está cheia de aduladores e consumidores.
pobres em alguma época, há muito que dizer Não é embaraçado por um séquito de
em favor dessas frases históricas. subordinados, nem irritado pelos clamores
Não acredito que a máxima bíblica que de reclamações.
mencionei fosse dirigida ao rico ou ao pobre. Privado dos requintes do rico, escapa tam-
Ela apenas lançava um ponto básico (talvez o bém de suas enfermidades.
de que é tão mais difícil ser feliz rico quanto feliz O pão que o alimenta não será acaso
pobre). Acho também que se deve estabelecer doce ao seu paladar? A água que bebe
uma diferença entre pobre e miserável, indigen- não é agradável ao lhe saciar a sede?
te. Não é tão fácil ser feliz quando se é extrema- Certamente, muito mais deliciosa do que os
mente pobre, embora saiba Deus que há pesso- licores dos voluptuosos.
as muito pobres com fisionomias venturosas. Seu labor preserva-lhe a saúde e garante o

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


19
n REFLEXÃO


Ele sempre a buscará, em algum grau, porque
Não há grande ela está intimamente associada à sobrevi-
mistério quanto ao vência. A abundância implica em segurança
contra a extinção. Por conseguinte, uma ma-
que está errado nifestação acalorada contra a abundância não
tem realmente cabimento. O que tem cabi-
no mundo. E não é mento é que reconheçamos as tentações que
a abundância provoca e tomemos a iniciativa
grande o mistério de resistir às mesmas. Devemos aprender a
quanto ao que viver com a abundância, a ser os seus mestres,
e não sucumbir como escravos dos seus ardis
pode ser feito ou nos deixar derrotar em vã dissipação.


Sim, há os que conhecem respostas.
para corrigir. Por toda parte são erguidos sinais contra
a superpopulação. A superpopulação ameaça
estrangular as massas. Os recursos do mundo
repouso, para o qual a macia cama do pregui- só têm capacidade para um certo número de
çoso é um estranho. sobreviventes. Qual é exatamente esse ponto
Com humildade, limita seus desejos e a paz de saturação? Não podemos dizer com segu-
do contentamento é mais doce à sua Alma do que rança, mas é certo que existe.
todas as aquisições da fortuna e da grandeza. O rápido e irrefreado crescimento de ci-
Desejamos salientar que a abundância, dades, sem o devido planejamento quanto ao
em si mesma e por si mesma, não deve ser número de pessoas que deverão viver juntas
desprezada como uma condição indesejável em pequenas áreas, resulta em impostos
ou imprópria; porém, abre caminho a muitas pesados, abuso de poder e mau emprego de
tentações e, portanto, deve ser acompanha- fundos públicos. Perde-se o controle quando
da de disciplina e moderação. Esse controle
é desenvolvido com o passar dos anos, ao
longo dos caminhos normais de enriqueci-
mento; mas, em períodos de rápidos surtos
de profusão que afetam grandes massas da
sociedade, não há controle, não há rédeas, e
M

se verifica um total desvio do comportamen-


© PHOTOS.CO

to judicioso, moral e ponderado. Basta-nos


examinar o passado para ver este mesmo
fenômeno ocorrendo repetidas vezes ao lon-
go da história. Portanto, voltamos ao mesmo
ponto: a sociedade abastada, com todos os
seus consequentes males.
A abundância de que falamos é difícil de
evitar por muito tempo. Nasce da organização
e produtividade de um povo. Mesmo que seja
dissipada e desperdiçada, surgirá novamente.
A luta pela abundância é inerente ao homem.

20 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


os tentáculos do crescimento se expandem a tudo o que ela implica, é a herança de todos
partir do centro da cidade. A abundância é os jovens. Eles terão a sua oportunidade. Não
um elemento destacado do êxodo do campo há como duvidar de que a juventude será ou-
para a cidade, decorrendo daí um desequilí- vida. Porém, o momento de ouvi-la é quando
brio entre o suprimento agrícola e a demanda. ela já sazonou e mergulhou na idade adulta.
Destacados e dinâmicos planejadores es- Pode-se notar a reação da sociedade a este
tão soando o alarme. Ouvem-se relatórios so- estado de coisas em toda parte, à medida que
bre o assunto em muitas reuniões que tratam aqueles que sabem as respostas estão pondo
de questões cívicas. Ainda recentemente, um seu conhecimento em ação. A escola mais
destacado financista falou de modo seme- próxima serve de exemplo. Ela estabelece as
lhante aos homens de negócios de uma pro- linhas de conduta e as regras. Aceita respon-
gressista comunidade.“Diminuam o passo”, sabilidade pelas crianças (e não afasta de si
disse ele. É preciso restringir. Planejem antes a responsabilidade deixando os estudantes
de exortar a mais indústrias, mais pessoas e livres para fazer o que querem). As crianças
mais crescimento. O crescimento irrefreado é aprendem e fazem aquilo que os pais e pro-
canceroso e pode destruir uma cidade. fessores acham que é o melhor com base em
A abundância tende a afastar as pes­soas sua experiência e maturidade. Há uma longa
do lar (a separar os pais dos filhos). Isto lista de restrições que leva a criança a apren-
não precisa necessariamente ocorrer, mas der o que pode e não pode fazer.
ocorre. O lar é uma das primeiras vítimas da Não há grande mistério quanto ao que está
abundância. A mobilidade é então acentua­ errado no mundo. E não é grande o mistério
da. Seguem-se o alheamento e o divórcio. quanto ao que pode ser feito para corrigir.
Os pais tornam-se demasiadamente liberais. Ao invés de ficar fazendo essas perguntas dia
Tendem a partilhar sua abundância. Usam- após dia, deveríamos estar fazendo aquilo
na para fugir a responsabilidades. Engolfados que acreditamos ser o melhor a fazer: a nossa
na onda da busca de prazer, hesitam em pro- parte. Isto é tudo o que se espera de nós e será
vocar atrito dizendo “Não!” aos seus filhos. suficiente, desde que simplesmente o façamos.
Mas há pessoas que conhecem as respos- Devemos viver uma vida exemplar ao máxi-
tas. Um artigo exatamente sobre este assunto mo da nossa capacidade. Devemos viver como
foi publicado num dos maiores jornais de Rosacruzes, observando as antigas máximas e
circulação interna do mundo: “Diga NÃO leis que regem o comportamento humano, tais
aos seus filhos!” E num suplemento semanal como se encontram nos princípios de nossos
noticioso foram claramente enunciadas as grandes códigos morais. Devemos praticar
principais causas da delinquência. aquilo que pregamos (viver a Regra de Ouro).
As inacreditáveis exigências da juventude, Em nossa própria e crescente abundância, não
no sentido de ser co-regente com os adultos, devemos simplesmente pensar e falar acerca
estão afinal sendo abordadas de maneira do que está errado no mundo, e sim em nos-
resoluta. Os jovens têm agido como se cons- sos pensamentos e atos, fazer o que é certo,
tituíssem uma espécie vivente à parte, com pois certamente o que está errado no mundo é
todo o direito e a sabedoria para dirigir não o que está errado com as pessoas. 4
somente os seus próprios direitos, mas tam-
bém os direitos dos outros. No entanto, são
apenas botões na mesma vinha de seus cor- * Extraído do Fórum Rosacruz (outubro 1970).
respondentes adultos. A idade adulta, com

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


21
n M I S T I C I S MO

Por RAYMUND ANDREA, FRC


© AMORC

22 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


E
ntrar nos estudos místicos de nosso Através de um consciente treinamento de
trabalho significa para um neófito alma, ele vai elevar suas atividades para uma
um novo início de vida. Ele às vezes nova dimensão. A literatura, a arte e a ciência
considera isso como simplesmente vão revelar numa percepção mais profunda,
mais um interesse, um experimento mental, novos significados e relações. Seja lá o que
como muitos outros que já experimentou, tenha e valorize profundamente, isso pode
mas logo descobre que não pode simples- ser recriado e se tornar uma coisa de maior
mente entrar nos trilhos e seguir o caminho beleza e valor à luz da alma. Nada de valor do
batido que já conhece. Tem que começar passado se perde; muita coisa é acrescentada
a andar por si mesmo e, às vezes, enfren- a ele. Aquilo pelo que se esforçou através dos
tar correntes contrárias. Ele não consegue anos não precisa ser rejeitado. A única mu-
progredir encostando-se ao passado; deve dança que vai enfrentar vai ser o fato de que
cultivar sua própria força presente. Deve ter todas as suas conquistas no plano mental vão
coragem e iniciativa para usar com confiança ser justamente avaliadas e seu poder de ser-
aquilo que lhe é oferecido. viço e utilidade aumentados através da com-
A primeira descoberta que faz é que os preensão das leis da evolução superior.
estudos o iniciam em um mundo de pensa- O neófito vai perceber que as criações de
mento bem diferente daquele com o qual está arte e descobertas da ciência se originam nas
familiarizado e que necessita de humildade e mentes de homens excepcionais e são crias da
paciência para reconhecer e aceitar esse fato. inspiração. Se ele alguma vez espera de fato
Tem que aceitar um currículo de estudo e me- apreciá-las corretamente, deve se aproximar
ditação que o faz voltar a atenção para dentro delas num nível mais elevado do que aquele
de si mesmo, de sua constituição e de suas do mundo diário. Esses criadores trabalham
possibilidades como ser espiritual e psíquico. de dentro do mundo das forças místicas e é
Muito disso vem de linhas de pensamento para esse mundo que o neófito deve olhar para
muito opostas – em princípios e promessas – alcançar qualquer compreensão real deles.
àquelas com que ele está acostumado. As coisas mais belas da vida são elabora-
Quanto mais firme sua aderência ao pa- das em uma escola severa, com suas próprias
drão mundano de conhecimento e realização, leis distintivas, e aguardam serem descobertas
maior a dificuldade que vai ter para se ajustar pelo neófito em seus estudos e meditações.
à nova escala de valores com a qual a vida Pode-se notar que escrevo tendo em mente
mística o confronta. principalmente o neófito em nossos estudos.
É bom lembrar que a vida mística, não Aqueles estudantes de idade madura e avança-
importa qual possa ser a sua linha de abor- dos no trabalho praticamente não vão precisar
dagem, oferece a única esperança de avançar desse tipo de encorajamento. Eles percebem o
além dos padrões aceitos de pensamento e de valor de seu esforço e progresso na Senda. Sua
ação, mesmo aqueles dos mais recentes gênios perspectiva e garra em suas diversas atividades
científicos, a menos que ele se preocupe cons- da vida foram ampliadas e fortalecidas através
cientemente com os fatores da alma, latentes da disciplina do período de treinamento.
por serem irreconhecíveis, no pano de fundo Essa disciplina pode inicialmente ser es-
de suas atividades. De fato, um novo mundo tranha a eles e talvez pareça prometer pouco,
de pensamento, emoção e ação aguarda por mas sua astúcia e desejo por conhecimento e
ele, mas sua existência tem que ser acreditada realização rapidamente superam qualquer di-
e batalhada por um longo período de tempo. ficuldade inicial. Em alguns casos, um hábito

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


23
n MISTICISMO

mental longo os cristalizou de alguma forma


dentro dos confins do intelecto, mas sob nova
direção do pensamento e a emergência de
possibilidades mais elevadas do desenvolvi-
mento da alma, a influência de uma consciên-
cia expandida se espalhou por toda a vida.
Sentir-se predestinado, em um tempo
não distante, a assumir este lugar entre
aqueles que têm a capacidade de exercer
uma influência especial na vida, deveria ser
uma inspiração para o aspirante ambicioso.
Nessa nova empreitada, o ritmo de vida es-
tabelecido pode ter que dar lugar a um novo
ritmo e se o neófito vive uma perturbação
em sua vida pessoal, isso é apenas uma indi-
cação de seu crescimento e avanço, e requer
compreensão e ajustes.
Mudanças devem seguir o conhecimento
© PHOTOS.COM
crescente em qualquer esfera e estes dias de
muitos ajustes necessários e obrigatórios nas
circunstâncias não deveriam causar surpresa
em nossa jornada pela Senda.
Alguns aspirantes são testados exatamente
nesse ponto. Eles querem avançar e sua pró-
pria atitude obriga a isso. Eles imediatamente são as únicas que lhe servem de suporte, são
se percebem no meio de um campo de bata- removidas pelos próprios esforços do aspiran-
lha pessoal com influências opostas de vários te no sentido de transcendê-las, a experiência
tipos os confrontando. Tudo bem para eles resultante pode não ser muito estimulante.
quando reconhecem e aceitam plenamente a Contudo, esta é apenas uma fase da biogra-
situação em nome do progresso e do serviço. fia do eu pessoal. Desse ponto de vista, ele busca
Alguns de fato olham para trás e ficam em desdobrar a biografia do homem espiritual.
dúvida. Mas existe o teste para o voluntário. Acho que muitas dificuldades eventuais e
Se ele perceber que essa pequena revolução preliminares do aspirante nada mais são do
em sua vida pessoal é o momento exato para que uma fase da biografia do eu pessoal e que
uma ação sábia, uma elevação de consciência ele deveria agora olhar para frente e desdobrar
vai ocorrer e ele terá uma nova força. a biografia do homem espiritual e psíquico. É
Até este ponto, tudo foi compreendido: o aí que alguns dos motivos comuns para a ação
aspirante estava em relativa paz consigo mes- vão gradualmente mudar, pois ele tem que
mo. Tinha certeza de sua força, porque ne- pensar nos outros tanto quanto em si mesmo.
nhum elemento desconhecido a tinha testado. O neófito, e muitas vezes aqueles mais
Perspectivas limitadas direcionadas para fins avançados, quando se sugere que exerçam
pessoais têm força sedutora e ilusória próprias, sua influência sobre outras vidas, pensam
muitas vezes excessivamente confiantes e in- por si sós e estendem seu conhecimento a
tolerantes, e quando as barreiras estreitas, que eles. Não conseguem ver qualquer conexão

24 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


entre o autodesenvolvimento e o interesse no as efemeridades da biografia pessoal durante
desenvolvimento dos outros. Pelo fato de se o empreendimento místico que tem que ca-
referir aos Mestres da Vida como servos dos minhar, gradativamente, silenciosa e quase
homens, eles acham que a Lei do Serviço não que imperceptivelmente.
se aplica até que eles mesmos estejam bem A exigência com que tantas vezes temos
avançados nos Graus de estudo. que lidar nos escritos sobre a vida mística, de
Isso é um erro, mas bem compreensível, que o neófito deve aprender através de longa
pois muitos sistemas de educação superior provação a servir eficientemente, muitas ve-
não avaliam ou defendem de forma alguma a zes recebe uma interpretação estreita demais.
importância do serviço, e sim a ideia de po- Ele fica inclinado a limitar o tipo de serviço
der pessoal como único objetivo, e o aspiran- que deve prestar e acaba pensando que todo
te se concentra principalmente nisso. esforço pelos outros deve necessariamente
Isso pode ser legítimo e possível e promete ser de uma natureza excepcional.
resultados dentro de uma esfera bem limita- Mas felizmente nos dias de hoje, o neófi-
da. Todavia, afasta o eu interior essencial para to, cujo conhecimento e perspectiva de vida
o pano de fundo e seus verdadeiros valores e deveriam ser constantemente crescentes em
possibilidades permanecem um território não profundidade e visão, está sendo iluminado
descoberto, ao passo que a ascensão da cons- através das experiências da própria vida que
ciência é a meta do aspirante no sentido de se move rapidamente, e esperamos que ele
devoção a um propósito elevado e de tornar manifeste um sentido próprio de humildade
essa força visível e ativa em seu ambiente. na abordagem e aplicação de seus estudos. E,
Ele não deveria simplesmente viver em seu para dizer a verdade, é longa a jornada que
ambiente, mas fazer-se sentir nele. É apenas aí existe entre o estudante mediano e o Mestre.
que a vida da alma revela sua Lembrando o exemplo inspi-

“ …é longa
natureza mais profunda e o rador da realidade e do retrai-
aspirante começa a desdobrar mento que o Mestre pode lhe
a biografia do homem interno
e invisível.
a jornada que proporcionar, com o tempo
o neófito chega a avaliar com
O objetivo central e força
atrativa do Ideal Rosacruz
existe entre mais precisão a distância entre
os dois.
sempre foi o serviço. O o estudante Um Mestre deu uma dica
Mestre é aperfeiçoado no sobre isso a um aspirante que
serviço e não pode haver mediano e o esperava demais, em seus
Mestre.

qualquer associação íntima ou próprios termos, uma espécie
contato místico com ele em de serviço que conviesse à sua
seu trabalho mundano até que idade e merecimento pessoal:
o neófito tenha aprendido, através de longa “Mas que melhor causa para recompensa e que
provação, a servir eficientemente. melhor disciplina do que o desempenho da obri-
É a disposição ao autoenvolvimento, o gação dia a dia e hora a hora?” Isso faz o neófi-
interesse concentrado no Eu, sem a finalida- to se voltar decisivamente para seus primeiros
de de trazer qualquer satisfação permanente princípios – para o lugar onde ele está no mo-
nem paz duradoura, que nem satisfaz o pro- mento – e lhe ordena que seja produtivo nesse
pósito da vida nem revela em expressão a local e nessas circunstâncias. Isso pode não
verdadeira dignidade do homem… são essas parecer muito atraente para o iniciante se ele

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


25
n MISTICISMO


É muitas vezes surpreendente notar como
Algumas das um neófito pode estar atrasado em reconhe-
cer as diferenças em perspectiva mental, e os
verdades mais valores que provêm delas, quando sua aten-
profundas do ção e o interesse estão periodicamente focali-
zados nessas leves mudanças que acontecem
misticismo chegam dentro de sua consciência e de sua vida ma-
nifesta. Pode realizar diversos experimentos
a nós disfarçadas e passar de um para outro, mas deixar des-
percebido, pela falta de introspecção adequa-
de grande da, a forma como esses fatos externos estão


mudando gradativamente o teor de sua vida
simplicidade. diária. Muitas vezes, os outros notam essas
mudanças mais rápido do que ele.
Porém essa sensibilidade sempre crescen-
estiver procurando e esperar algo importante te deve ser buscada e cultivada em cada pas-
e incomum já de início, algo diferente da obri- so da Senda. É um sinal certo de progresso
gação de vida do homem mediano. interno. A biografia do homem interno está
Se a exigência do serviço traz consigo sendo escrita e, quando é escrita com inten-
uma ideia forte demais de retraimento, não é ção e propósito forte, o homem externo, ativo
a ideia que está errada ou irrelevante, mas o e pessoal, vai revelar seu conteúdo em cores
conceito que o neófito tem sobre a tarefa que e força vibracional mais fortes. Ele também
tem diante de si, pois a Lei que pertence ao deveria perceber isso, pois os outros frequen-
caminho interno de desenvolvimento é justa temente vão perceber e fazê-lo se confrontar
e exigente da mesma forma que é no mundo com isso para o bem ou para o mal.
externo. Essa Lei, interpretada de maneira O mal pode apenas produzir uma atitude
bem simples, estabelece que há um preço de crítica da parte de alguns que observam
a ser pago pelo avanço, como acontece em uma abordagem diferente a eles e à vida, mas
qualquer outra esfera da vida. uma certa indiferença deveria capacitá-lo a
É durante os anos de serviço que o ne- superar qualquer crítica insignificante em
ófito se compromete com a construção da favor de seu próprio desenvolvimento. Sua
estrutura de sua vida interior e com a escri- tarefa é forjar as coisas olhando para frente
ta, de forma invisível, da biografia da alma. e apresentar iniciativa em seu progresso, até
Todo verdadeiro ato de serviço é uma pedra que o caráter de vida de sua alma seja tal
de construção na edificação de um caráter que ele possa confiar implicitamente em sua
que ele tem que adquirir na Senda. Ele pode orientação, assegurar sua influência em sua
não prestar atenção a isso. Ao aliviar – ou vida pessoal e provar seu valor e capacidade
ao tentar aliviar – a carga de outras almas, de irradiar luz e liderança em seu ambiente.
de qualquer natureza que possa ser, desde a Eu dou a entender que, muitas vezes bem
mais simples até a mais oculta e espiritual, inconsciente de si mesmo, o neófito que está
segue-se um refinamento e uma intensifi- fazendo progresso firme no sentido de au-
cação de sua própria qualidade vibracional, mentar o conteúdo e a força de sua vida in-
uma ascensão gradativa em intuição e um terior vai logo perceber uma nova influência
reforço do crescimento da alma. sobre os outros em seu ambiente. Não existe

26 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


mágica em relação a isso. Trata-se simples- cer do intelecto e subir do coração. Neófito
mente de uma reação à Lei de Causa e Efeito algum pode esperar ter a percepção de que
que estabelece que a intenção firme da vonta- o coração contata todas as sensações do
de centralizada deve se declarar. Cosmos. Ele só consegue dar passos lentos
Vamos nos aprofundar um pouco mais em direção a isso. A cultivada vida do cora-
nisso e nos basearmos na declaração de ção do Adepto pode sentir tudo sem impe-
que “o coração contata todas as sensações do dimento, mas para perceber tal variedade de
Cosmos”. Acho que poucos de nós percebem contatos o coração deve estar aberto e sensí-
a profundidade do significado contido nessa vel a impressões muito além dos níveis físico,
fértil sentença, mas podemos tentar ler um mental e psíquico de existência.
pouquinho dela. Algumas das verdades mais Contudo, este é o trabalho em que o neó-
profundas do misticismo chegam a nós dis- fito está envolvido, por menos que perceba:
farçadas de grande simplicidade e significam uma extensão gradual de irradiação de sua
muito pouco para o intelecto ocupado. natureza sensível interna para que possa res-
Este é um fato que se deve notar: o mo- ponder mais prontamente a impressões da
mento em que o coração diz para si mesmo Vida Cósmica que o rodeia e que continua-
que é hora de o intelecto se retirar. Ambos mente se impõe ao coração sensível.
podem falar ao mesmo tempo. E, paradoxal- Não queremos proferir uma palavra crí-
mente, há ocasiões em que precisamos des- tica sobre o intelecto, pois devemos muito a
ele. Mas, sem dúvida, durante nosso progres-
so na Senda, ele pode distorcer a visão com
muitas ilusões sutis. É por isso que o hábito
do silêncio interno é imposto a nós. O inte-
lecto é um fazedor de discursos. Ele adora
ser ouvido, fala incessantemente, mas muitas
vezes em detrimento do coração.
Tudo isso precisa mudar e a escolha é
entre a gama mais limitada do intelecto e o
horizonte cada vez mais amplo de sensações
e impressões do Cosmos. Repito aqui a pas-
sagem bíblica sobre o coração feita numa
gravação alguns anos atrás:

“Observar com os olhos do coração; ouvir


com os ouvidos do coração o rugido do mun-
do; espreitar o futuro com a compreensão do
coração; lembrar a acumulação do passado
através do coração; assim se deve avançar
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impetuosamente no caminho da ascensão.” 4

* Extraído do livro “A Flor da Alma”, de Raymund


Andrea, publicado pela AMORC-GLP.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


27
n CULTURA

Uma reflexão sobre genética,


linguagem e cultura
Por JOSÉ ELIÉZER MIKOSZ, FRC1

H
á muita discussão a respeito da influência dos aspectos meramente biológicos quanto ao co-
mandar, criar ou alterar comportamentos, ou sobre o modo como pensamos e percebemos
o mundo. À guisa de ilustração rudimentar, podemos fazer um paralelo das características
do ser humano usando o modelo computacional: o corpo como hardware, sua capacidade
de memória, e a mente como software, como, por exemplo, as formas de linguagem capazes de “pro-
gramar” o ser humano. Não queremos com isso dizer que as pessoas sejam como máquinas, muito
longe disso, mas tal comparação serve como ponto de partida para as nossas reflexões.

Os limites do corpo imaginação, ideias iluminadas e nossa


espiritualidade vêm dessas experiências
Mesmo que imaginemos que o cérebro no mundo, mesmo que algumas delas nos
não traz nenhuma informação prévia, pareçam insólitas ainda.
nenhuma tendência ou talento inato e que Algumas respostas dos organismos vivos
a genética não influencie em nada o com- em geral mostram que temos, no mínimo,
portamento das pessoas, somos obrigados mecanismos automáticos inatos para conse-
a admitir que ele recebe torrentes de in- guir sobreviver. Uma bactéria submetida a
formações do mundo externo de um jeito condições agressivas no seu meio ambiente
bastante particular, com os limites de seus se contrairá, dará sinais de desconforto e de-
sentidos. Os insights, nossa criatividade, senvolverá ou utilizará meios para escapar de

28 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


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tal situação.2 Esta mesma bactéria em CNTP3 nas uma excitação tátil das papilas filiformes
ficará relaxada e cumprirá normalmente suas da língua? Sabemos que existem cores bási-
funções de alimentação e metabolismo. Ao cas como no arco-íris. O índigo entra como
admirarmos uma bela paisagem ou ao sen- uma variação do azul, mas quais outras cores
tirmos a atração agradável por uma pessoa existem? Quantos nomes existem para a cor
apenas estamos respondendo a mecanismos azul e quantos desses nomes seriam enten-
naturais que não somos livres para escolher: didos de forma igual por pessoas de uma
apenas fomos feitos para ser assim. Nosso mesma cultura? Sim, pois se considerásse-
hardware tem essa predisposição. mos culturas diferentes, verde-limão talvez
A base biológica de nossos limites não não faça sentido para os esquimós, como
pode ser desconsiderada. Verificamos que, tampouco faça sentido para nós os 24 nomes
em média, ouvimos frequências sonoras en- usados por eles para a cor branca.
tre 20hz e 20khz. Nossa visão também perce- Nossos sentidos recebem um fluxo
be um espectro de luz limitado. Ainda temos desordenado de impressões e o cérebro
os sensores para as impressões táteis, as do tem que dar conta filtrando, selecionando,
paladar e as do olfato. Didaticamente descre- reduzindo a experiência, rotulando tudo e
vemos, por exemplo, que nosso paladar iden- “resolvendo” então o problema. E com to-
tifica quatro sabores típicos: doce, salgado, dos os limites naturais de nossos sentidos,
amargo e azedo/ácido. Mas que sabor tem a nossa pretensão em conhecer a “verdade”
pimenta? Doce ou salgado? E o picante é ape- é mais como uma criação de verdades

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29
n CULTURA

temporárias adaptadas à nossa capacidade

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humana de compreensão no momento.
Os sentidos parecem tão limitados, mas
será que não estamos imersos e em contato
com algo não tão óbvio? O inconsciente co-
letivo junguiano e seus arquétipos universais
e imutáveis ou o inconsciente social de Eric
Fromm4 e a incompreensível mente coletiva
estudada por Frank Natale5 são formas de
contato com algo além dos sentidos? Nossa
mente pode ser influenciada por essa imersão
no coletivo? Hoje temos ainda as redes ele-
Nossos sentidos nos trazem informações que
trônicas mundiais formando uma espécie de nosso cérebro processa.
inteligência coletiva.6 Tudo isso influenciando
o relacionamento entre os indivíduos e destes
com a biosfera. impostas pela linguagem – que o homem
seja esmagado pela torrente de informa-

A função da ções a que sua “onisciência” potencial


estaria sujeita.

linguagem As cores não existem no mundo e, sim,


Benjamin Whorf (in FAY 1999, p. 78) de- internamente em nosso cérebro. São estí-
fende a tese de que o que sentimos é função mulos vibratórios luminosos que excitam
de um sistema linguístico dentro do qual células na retina do olho. No ser humano
nós operamos como seres cognitivos: “E é essas células estão divididas em dois grupos:
isto precisamente o que o sistema linguís- os cones, responsáveis pelas sensações de
tico faz: ele fornece os princípios básicos cor; e os bastonetes, responsáveis pela sen-
no qual os fluxos indiscriminados de es- sibilidade luminosa. Os estímulos recebidos
tímulos são organizados em uma experi- pelas células são enviados através de impul-
ência de sentido verdadeiro”. Dessa forma, sos nervosos pelo nervo ótico passando pelo
a linguagem cria significados recortando quiasma ótico e pelo trato ótico, terminando
– filtrando – a realidade. No prefácio do no corpo geniculado lateral, dali se esten-
livro Portas da Percepção (HUXLEY 2001), dendo em filamentos nervosos, chamados
Costa Pinto comenta: radiação ótica, pelo tubérculo quadrigê-
meo anterior. A área visual no cérebro, de
À diferença de Heidegger, porém, Huxley todas as áreas corticais, é a que tem dado
considera que tanto o esquecimento da mais exatas e mais fecundas observações
totalidade do ser quanto seu oposto – a experimentais no domínio de diagnóstico
abertura da consciência para a irrupção e especulação. Ela apresenta nitidamente
dos acontecimentos – são um fenômeno a zona de projeção ou de sensação, a zona
do mundo biológico. Para ele, o cérebro de percepção e a de reconhecimento ou de
e o sistema nervoso seriam uma “válvula gnosia (DELMAS 1973, p. 193). Porém, isso,
redutora” que evita – por meio do cará- por si só, não explica quem está observando
ter seletivo da memória e das restrições dentro de nós ou o que é a consciência.

30 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


Temos um corpo físico altamente espe- ge etc. A cultura pode mudar alguns hábitos
cializado, com funções vitais trabalhando naturais e criar válvulas sublimadoras de
independentemente de nossa intervenção. instintos considerados pouco úteis ou amea-
Além disso, reflexos puramente orgânicos, çadores para a sociedade. Ela pode ser canali-
como por exemplo frear o carro numa emer- zada de forma saudável através dos esportes e
gência, piscar antes de ser atingido por um das artes, mas às vezes usa mecanismos con-
cisco ou girar a cabeça em direção a um som troladores autoritários e supersticiosos.
alto repentino (cefalogiria), independem de Muitas terapias trabalham na integração
nossa decisão e não passam pelo cérebro. entre intelecto, emoção e corpo7 por per-
Ademais, não teríamos tempo de pensar. ceber a interdependência entre eles. O ser
São reflexos de um observador atento e ágil: íntegro é o que possui menos conflitos entre
o próprio corpo. essas partes. Um dos terapeutas pioneiros
Nossos sentidos nos trazem informações que percebeu a enorme importância de
que nosso cérebro processa. A linguagem trabalhar com o corpo foi Wilhelm Reich,
filtra essas informações dando sentido a elas. introdutor da Bionergética. Reich, discípulo
Podemos dizer que nossa base epigenética de Freud, viu que diversos desvios da per-
é que nos capacita a criar essa linguagem. sonalidade e neuroses estavam relacionados
Toda informação é um recorte na realidade. a repressões e a traumas. Reich descobriu
A informação completa está no caos, incog- que o organismo cria tensões para se prote-
noscível para nós. ger. Essas tensões criam diversas couraças,
como anéis, em torno de regiões corporais
Educação e cultura específicas. O trabalho da bioenergética é
dissolver essas couraças, devolvendo a indi-
No seu livro Consciência pelo Movimento, vidualidade natural e saudável do paciente.
Feldenkrais (1977, p. 19) diz: “Nós agimos de Mesmo Freud percebeu que seriam inevitá-
acordo com a nossa autoimagem. Esta, que veis terapias envolvendo o corpo:
por sua vez governa todos os nossos atos, é
condicionada em graus diferentes por três Em uma reunião do círculo mais íntimo de
fatores: hereditariedade, educação e autoedu- analistas, Freud uma vez aconselhou-nos a
cação.” Não podemos fazer muito a respeito ser prudentes. Tínhamos, disse, que estar
da hereditariedade e da educação que rece- preparados para esperar perigosos desafios
bemos. Somos educados e “programados” de uma futura organoterapia à terapia psí-
dentro de uma cultura e dificilmente conse- quica da neurose. (…) A psicanálise deverá
guiremos nos adaptar a outra muito diferen- um dia estabelecer-se sobre uma base orgâ-
te depois de adultos. nica. (REICH, p. 104)
Somos diferentes hereditariamente e nem
sempre, em nome da igualdade, essas dife- Fica a impressão de que um software ina-
renças são respeitadas. Isso gera conflitos, dequado que impede determinadas funções
muitas vezes suprimindo necessidades vitais naturais, isto é, o funcionamento do har-
do indivíduo por causa das convenções so- dware, pode prejudicá-lo. Certos discursos e
ciais. Esse é o resultado negativo da educação sugestões têm poder de produzir crenças e fé,
e cultura. Porém, há os elementos positivos persuasão, como no caso das religiões, das te-
que mantêm a sociedade identificada com rapias psicológicas e de integrar socialmente
valores comuns a todos, que organiza, prote- o indivíduo desorientado ou em sofrimento.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


31
n CULTURA

Os genes pal ponto fraco da genética comportamental


humana e sociológica humana contempo-
Pode alguma forma de comportamento rânea é que apenas um pequeno número de
estar associada aos genes? Quem observou genes e regras epigenéticas relevantes foram
filhotes de cães ou gatos deve saber como identificados. (…) A razão é que a genética
são diferentes os seus comportamentos já ao comportamental humana é tecnicamente
nascer. Uns são mais calmos e dorminhocos, muito difícil nesse nível”.
outros brincalhões e alguns mal-humorados
e mais agressivos. Do mesmo modo, filhos de
humanos nascem com um tônus particular O centésimo
de temperamento, antes que algum tipo de
influência externa atue nesse sentido: “Os macaco e o conceito
animais possuem sistemas de comunicação
às vezes impressionantemente sofisticados, de Zeitgeist
mas não os inventam, nem os ensinam para Uma espécie de macaco japonês, Macaca fus-
os outros (…) são rigorosamente prescritos cata das ilhas do norte do Japão, foi observa-
por genes e não podem ser alterados pelo da em seu habitat natural durante 30 anos.
aprendizado” (WILSON 2003, p. 124). O que Cientistas jogavam batatas-doces na areia
nos leva a crer que não temos a mesma base da praia para os macacos. Estes as comiam
genética como seres humanos? mesmo sujas de areia. Porém, uma fêmea de
Lembrando-nos de nossa metáfora, a cul- 18 meses chamada Imo solucionou a questão
tura chegará através de informações – sof- lavando a batata num riacho perto e ensinou
tware – que serão processadas e guardadas seu truque à sua mãe. Outros macacos jo-
na memória do cérebro – hardware, da for- vens, amigos da Imo, aprenderam também a
ma como esse hardware for capaz de assim se livrar da areia nas batatas. Essa inovação
fazer, ligado a determinações genéticas, mes- gradualmente se espalhou entre 1952 e 1958,
mo que estas sejam extremamente flexíveis, sempre observada pelos cientistas.
com infinitas possibilidades e que se alterem Numa das manhãs do outono de 1958,
com o tempo numa co-evolução gene-cultura um determinado número de macacos lava-
conforme teorizado por Edward Wilson va suas batatas. Vamos supor que fossem
(2003, p. 129). Genes e cultura se comple- 99 macacos. Ao final da manhã, mais um
mentam interagindo de forma criativa na aprendera, o centésimo macaco. Então
experiência do indivíduo. aconteceu! Nessa noite quase todos na tri-
Portanto, os genes estão ali antes da cul- bo lavavam batatas antes de comê-las. A
tura, capacitando o ser humano a interagir energia adicionada deste centésimo macaco
com o mundo dentro de um código específi- criou, de algum modo, uma quebra cultural.
co que varia de pessoa para pessoa. Segundo Macacos de outras ilhas Takasakiyama co-
Sayer (1992, p. 15) “uma criança aprende meçaram a lavar suas batatas doces. Assim,
muito antes de adquirir uma linguagem essa teoria diz que quando um determinado
(…) nem todos os nossos comportamentos número crítico de seres consegue uma cons-
sociais são adquiridos ou mediados pela ciência, esta consciência nova pode ser co-
linguagem (…)”. Os estudos sobre genética municada aos demais.8 Pode ser que a histó-
comportamental estão apenas no início. ria não seja verdadeira. De qualquer forma,
Wilson (2003, p. 147) nos diz que: “O princi- temos na nossa sociedade alguns indícios

32 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


parecidos de uma ressonância de ideias.

© PHOTOS.COM
Algumas invenções, manifestações artísticas
e culturais, moda, descobertas e invenções
científicas, entre outras ideias criativas,
podem acontecer em diversos lugares ao
mesmo tempo, sem que exista comunicação
entre as pessoas. Esse fenômeno tem sido
chamado de zeitgeist, o “espírito do tempo”.
Esses dois fenômenos foram descritos
aqui para exemplificar uma ideia dentro dos
conceitos de inconsciente coletivo de Jung e
dos campos morfogenéticos dos biólogos.

Campos
morfogenéticos
Esses campos são uma teoria além dos ge-
nes. Todas as células vêm de outras células e
todas as células herdam campos de organi-
zação. Os genes são parte desta organização.
Têm um papel essencial, mas não explicam a
própria organização. Graças à biologia mo-
lecular, sabemos o que os genes fazem, como
capacitar o organismo a produzir e sintetizar
determinadas proteínas. Genes e culturas se complementam interagindo de
Muitos organismos são células livres, in- forma criativa na experiência do indivíduo
cluindo fungos, bactérias e amebas. Alguns
dão forma a esqueletos minerais complexos,
como nas diatomáceas (algas microscópicas) evolução biológica, mas também a evolução
e nos radiolários. Produzir proteínas certas física, a química, a cósmica, a social, a men-
no tempo certo não explica os complexos tal e a cultural.” 9
esqueletos de tais estruturas sem que haja A teoria dos campos morfogenéticos se
outras forças atuando no jogo. Essas forças parece com algumas explicações da quarta
são os campos morfogenéticos. Esses campos dimensão. Podemos usar a geometria des-
estão relacionados, por exemplo, com o fato critiva para dar uma ideia. Um ponto, sem
de certas estruturas microtubulares da célula dimensão alguma, é a projeção ortogonal
solidificarem enquanto outras não. de uma reta (unidimensional). Essa, por sua
Rupert Sheldrake comenta que os hábi- vez, a projeção de um plano (bidimensio-
tos dos organismos são de importância cen- nal). O plano a projeção de um sólido com
tral para o desenvolvimento biológico: “Eu três dimensões. Um objeto tridimensional
acredito que a seleção natural dos hábitos pode ser a projeção de outro tetradimensio-
tem papel essencial em toda a teoria inte- nal (talvez como os campos morfogenéticos),
grada da evolução, incluindo não apenas a não percebido por nós ainda, somente pelos

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


33
n CULTURA

seus efeitos nesse mundo tridimensional.


Faz lembrar, de certa maneira, Platão e seu *Referências: DELMAS, A. Vias e Centros Neurais.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1973; FAY,
mundo de aparências, a matéria e o mundo Brian. Contemporary Philosophy of Social Science.
divino das ideias. A Multicultural Approach. London: Blackwell,
1999; FELDENKRAIS, Morse. Consciência pelo
Movimento. São Paulo: Summus Editorial, 1977;

Somos estrelas FROMM, Erich. Meu Encontro com Marx e Freud.


Rio de Janeiro: Zahar, 1979; HUXLEY, Aldous.
As Portas da Percepção/Céu e Inferno. Rio de
Muitas das teorias aqui apresentadas estão Janeiro: Editora Globo, 2001; POPPER, Karl R.
Ciência: Conjecturas e Refutações. Brasília: Editora
mais para especulações científicas. De fato, Universidade de Brasília, 1974; REICH, Wilhelm. A
quanto mais se aprofunda, mais complexas Função do Orgasmo. São Paulo: Editora Brasiliense,
1983; SAYER, Andrew. Method in Social Science,
se tornam as descobertas e maior necessi- A Reallistic Approuch. London: Routledge, 1992;
dade de trabalhar com abordagens inter e SLOTERDIJK, Peter. Regras para o Parque Humano.
Uma Resposta à Carta de Heidegger sobre o
transdisciplinares envolvendo a integração Humanismo. São Paulo: Estação Liberdade, 2000;
entre ciências naturais e humanas. Popper, WILSON, Edward O. A Unidade do Conhecimento.
Consiliência. São Paulo: Editora Campus, 2003.
(1974) em seu livro Ciência: Conjecturas e
Refutações, afirma que o que não pode ser Notas: 1. Artigo publicado nos Cadernos de
Pesquisa do PPGICH da UFSC, reduzido e adaptado
testado, verificado e refutado é pseudoci- para a presente publicação; 2. Como no caso
ência, como, por exemplo, a psicologia e a da bactéria Escherichia coli que desenvolve um
flagelo sintetizando uma molécula de AMP cíclico
astrologia. Porém, afirma que alguns mitos que se liga ao DNA, permitindo que a bactéria
podem se desenvolver e se tornarem “tes- se locomova para um ambiente mais favorável; 3.
Condições Normais de Temperatura e Pressão;
táveis”. Muitos mitos estão na base do que 4. A diferença entre a expressão de JUNG,
será uma teoria aceitável ou verificável. “inconsciente coletivo”, e o “inconsciente social”
aqui empregada é a seguinte: o “inconsciente
Compreendemos que considerar o coletivo” indica diretamente a psique universal,
corpo, nosso hardware, como separado grande parte da qual não pode nem mesmo tornar-
se consciente. O conceito de inconsciente social
de nossa mente, nosso software, mostra parte da noção do caráter repressivo da sociedade
que ainda sabemos pouco do que somos. e se refere àquela parte específica da experiência
humana que uma determinada sociedade não
Sendo honestos, tememos a morte, por- permite que atinja a consciência; 5. Frank Natale é
tanto, evitamos nos identificar com algo criador do The Natale Institute (TNI) que trabalhou
com desenvolvimento da consciência criativa
que sabemos ter um fim como o corpo. baseado em diversas pesquisas como os Campos
Mas talvez nada morra, numa concepção Morfogenéticos (SHELDRAKE), Inconsciente
lavoisieriana;10 nosso corpo apenas retor- Coletivo (JUNG), Sincronia ou Série (KAMMERER
& PAUL BEING), Cognição (MASLOW), Iluminação
nará para a natureza, da mesma forma (BUCKE), Autolembrança (GURDJIEFF) e estudos
como surgiu dela e, assim, talvez essas das religiões Budistas e Hindus; 6. Coordenada por
Pierre Lévy, pesquisa comunidades como sistemas
outras dimensões do nosso ser tenham cognitivos, aumentando a cooperação intelectual,
também seu papel e continuidade nesse principalmente as de natureza digital. Maiores
informações: http://michaelnielsen.org/blog/
universo. Somos deuses com corpo físico, collective-intelligence-by-pierre-levy/ acessado
mas temos o consolo de carregarmos em em 31/10/2012; 7. Essa divisão, também “didática”,
deixa de fora o que poderíamos chamar do lado
nosso corpo os átomos de carbono que há espiritual do ser humano, sua “alma”, apesar de ser
milhões e milhões de anos participaram a ênfase das terapias atuais ditas de Nova Era; 8.
Informações tiradas do site: http://www.wowzone.
do “Big Bang” e das estrelas que se desen- com/monkey.htm. Há diversos estudos reais sobre
volveram a partir dali. Carregamos em o assunto, não necessariamente essa história em
particular; 9. Textos traduzidos e parafraseados do
nosso corpo a história e o mistério desse site www.sheldrake.org; 10. “Na natureza nada se
universo. É de se pensar: não deixa de ser cria, nada se perde, tudo se transforma” (Antoine
Lavoisier).
um privilégio… 4

34 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


n POESIA

Credo Espiritual
Creio na paz que conduz a Deus
Creio na alma que Deus criou
Creio no dom de orar e fazer a alma vibrar
Creio na vibração que as faz curar.

Creio na bondade do homem que pensa


Creio na força da bondade e do amor
Creio no amor como seara bendita
Creio no trabalho que o amor constrói.

Creio na tarefa que o médico faz


Creio no voto de solidão do asceta
Creio na paz que o trabalho traz
Creio na vida que a bondade encerra.

Creio no homem que traz o pão


Creio na mulher que dá a vida
Creio no jovem que vibra e acredita
Creio na criança amada e querida.

Creio no céu que está dentro de nós


Creio em Deus que está nesse céu
Creio nas forças que nele habitam
Creio na paz que seus seres trazem.

Creio sobretudo no amor e com ele encerro


O Credo que agora acabo de dizer
Creio em vós que agora me ouvis
Como creio na força que me faz viver. 4

Por JUREMA FRANCO CAMARGO, SRC


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VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


35
n PESQUISA

O Parque Rosacruz, na Califórnia


Por LUIS FABIO MIRANDA, FRC*

Com seus edifícios em estilo egípcio e mourisco, o Rosicrucian Park, em San Jose, atrai milhares
de visitantes de todo o mundo. Hoje, aos 85 anos, é um lugar de encantamento para o público e
motivo de grande orgulho para os Rosacruzes.

E
m 1927, o Parque Rosacruz, em São José (Califórnia), nos Estados Unidos, tornou-se a
sede mundial da Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis, AMORC. Criado pelo Primeiro
Imperator da Ordem Rosacruz do atual ciclo, Dr. Harvey Spencer Lewis, é um sonho
que se tornou realidade: uma grande área verde, com vegetação escolhida espécie a es-
pécie, pontilhada por estatuária ao ar livre, várias fontes, recantos para meditação e imponentes
edifícios, todos em estilo mourisco ou egípcio, lembrando assim a origem histórica da Ordem no
Oriente e mais especificamente no Antigo Egito.
O Dr. Lewis desenvolveu o Parque até 1939, ano em que passou pela transição. Foi sucedido
no cargo pelo seu filho, Ralph Maxwell Lewis, que dali administrou e expandiu a AMORC en-

36 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


quanto permaneceu fisicamente entre nós, A partir de então, a Suprema Grande Loja
até 1987. Durante seu mandato, foi fundada a funcionou em Nova Iorque, transferindo-se
Grande Loja de Língua Portuguesa, no Brasil, para a costa oeste, San Francisco, no outono
em 1956. As cinzas de ambos – pai e filho de 1918, onde permaneceu até 1925, quando
– estão depositadas no coração do terreno desceu para Tampa, na Flórida, por um curto
(Relicário de Akhenaton), como um tributo à período de tempo. Retornou definitivamente
enorme realização de suas vidas. à Califórnia, em dezembro de 1927, agora
O Parque continua sendo legalmente a para uma cidade pequena, próxima de San
sede da Suprema Grande Loja da Ordem Francisco, chamada San Jose.
Rosacruz, e nosso atual Imperator, o francês
Christian Bernard, tem por hábito abrir ofi- 1927 – O Início: Ali, em uma área a certa
cialmente ali, no Templo Supremo, cada Ano distância do centro, ocupada previamente
Novo Rosacruz, no mês de março. por fazendas e pomares, o Dr. Lewis adquiriu
Extremamente bem cuidado, sempre re- apenas um lote e construiu o primeiro edifí-
novado e conservado através das décadas, este cio, porém já começara a chamar o local de
lugar é muito especial para os rosacruzes do “Parque Rosacruz”.
mundo inteiro, que sonham visitá-lo ou retor- Questionado inúmeras vezes sobre tal de-
nar ao seu ambiente acolhedor. Para os que já nominação – pois então ainda se tratava de
estiveram no Parque, eis aqui um documento um terreno pequeno com um único prédio – o
que lhes permitirá reviver o local em seus Dr. Lewis sorria e afirmava: “Vocês devem ver
corações e mentes. E, para aqueles que ainda o futuro…”. E quando lhe perguntavam o que
não tiveram a oportunidade de visitá-lo, es- era uma pequena estatueta egípcia que tinha
peramos que seja o estímulo para ir conhecer, sobre a sua escrivaninha, ele explicava: “Este é
ver e sentir in loco toda a sua beleza, força, o Museu Egípcio Rosacruz.” Novamente, ante
harmonia e valor histórico para a Ordem a expressão incrédula de seus ouvintes, ele
Rosacruz e seus membros, assim como, indi- repetia: “Olhem para o futuro…”
retamente, para toda a humanidade.
Com seus edifícios em estilo egípcio e
mourisco, o Rosicrucian Park, em San Jose,
atrai milhares de visitantes de todo o mundo.
Hoje, aos 85 anos, é um lugar de encanta-
mento para o público e motivo de grande
orgulho para os rosacruzes.

Antes do Parque: O Dr. Harvey Spencer


Lewis, iniciado na Rose-Croix da Europa
no dia 12 de agosto de 1909, recebeu auto-
ridade para implantar o Segundo Ciclo de
atividades Rosacruzes na América. Durante
alguns anos, estudou e planejou aquela que
seria a Missão Cósmica da sua vida. Em 1º
de abril de 1915, na cidade de Nova Iorque,
o Supremo Conselho da “Ancient and
Mystical Order of the Rose Cross” (AMORC)
reuniu-se, emitiu e assinou o seu Primeiro
Manifesto Americanop.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


37
n PESQUISA

O Supremo Grande Templo (acima) e a Universidade Rose-


Croix (abaixo), o Planetário, à direita, e o Museu Egípcio
no canto inferior da página são alguns dos edifícios
cercados por amplos gramados e rica vegetação, em um
terreno pontilhado por fontes e estátuas ao ar livre, com
inúmeras e belíssimas roseiras, formando um conjunto
sereno e harmonioso, tão apreciado pelos visitantes.

38 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


Passo a Passo, Construindo o Futuro
– Nos anos seguintes, mais e mais lotes fo-
ram sendo adquiridos pela AMORC, até que
praticamente toda a grande quadra ficou
integrada no que hoje é o Parque Rosacruz, e
apenas duas residências (esquina da Randol
Avenue com a Park Avenue) permaneceram
na área sem pertencer à Ordem Rosacruz.
Elas não foram ocupadas pelos Imperatores
anteriores, que moraram na Naglee Avenue,
1295 (Dr. Lewis) e imediatamente ao lado, na
Chapman Street (Ralph).

O primeiro edifício do Parque (dezembro de 1927),


em estilo oriental, com a Administração no térreo e o
Templo no andar superior (consagrado em 02.12.1928).
Este prédio foi substituído por dois outros: o Supremo
Grande Templo (consagrado em 17.07.1949) e o edi-
fício da Administração (inaugurado em 1970), ambos
em estilo egípcio, conforme fotos abaixo.

A Fonte de Águas Vivas, em frente à Universidade,


decorada com símbolos Rosacruzes, vendo-se
também, à direita, ao fundo, o Relicário.

Randol avenue
ET

ue
STRE

aven

Administração (acima)
PMAN

e Supremo Grande Templo (abaixo)


park
CHA

NAGLEE avenue

Desenho do Parque Rosacruz, em escala e perspectiva,


que utilizaremos como referência para todo este artigo.
Os edifícios e estatuária estão numerados em preto (de
45 a 67) e a vegetação – árvores, arbustos, ervas – com
círculos brancos (de 01 a 44). Assim, o Supremo Grande
Templo, visto ao lado, é o número 59, enquanto que o
edifício da Administração, acima dele, é o número 64.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


39
n PESQUISA

85 Anos de História: Ao longo do tempo, o Parque Rosacruz passou por muitas mudanças,
algumas devido à necessidade de renovação dos prédios, outras porque a modernização dos tra-
balhos demandou outro arranjo espacial. Assim sendo, as construções remanescentes do perío-
do original são quatro: o Auditório Francis Bacon (1931), o edifício da Universidade Rose-Croix
(1934), o Planetário (1936) e a Biblioteca de Pesquisa (1939). Vamos apresentar e comentar cada
um desses prédios, citando sempre o seu número de localização no desenho em perspectiva.

O Auditório Francis Bacon, completamente


lotado durante uma das palestras do Dr. Harvey
Spencer Lewis, em uma noite de domingo dos
anos 30.

O Auditório Francis Bacon (65) – foi projetado levando-se em conta os melhores princípios
de acústica, construído e decorado em estilo oriental, e inaugurado em 22 de julho de 1931, com
o objetivo inicial de abrigar as Convenções da Ordem Rosacruz na América. Este talvez seja o
mais significativo dos edifícios originais do Parque, pois era onde, nas noites de domingo, prin-
cipalmente durante o outono e o inverno de cada ano, o Dr. Lewis proferia suas famosas pales-
tras públicas, com entrada franca, que lotavam completamente o local. No passado, o prédio era
ocupado também pela Livraria Alexandria (que oferecia livros rosacruzes e suprimentos) e por
uma cafeteria. Ali, ao longo de décadas, aconteceram inúmeras Convenções, conferências, cursos,
apresentações teatrais, encontros e seminários. O espaço era de uso prioritário para as atividades

Duas esfinges guardam a entrada do pré-


dio da Universidade, uma de cada lado,
sendo que esta, a da direita, possui uma
particularidade especial: contém um do-
cumento, ali depositado pelo Dr. Harvey
Spencer Lewis, com a relação de quinze
princípios místicos Rosacruzes.

40 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


da Ordem, porém também podia ser alugado para terceiros, fato que aumentou a circulação de
pessoas no Parque e contribuiu para a divulgação da AMORC.

O Edifício da Rose-Croix University (49) – foi a primeira construção em estilo egípcio


do Parque e ainda é um dos mais apreciados pela sua imponência e beleza. Inaugurado em 11 de
julho de 1934, com laboratórios de Física e de Química, salas de aulas e demonstrações, além de
um anfiteatro. Posteriormente, em 1939, a Biblioteca de Pesquisas foi construída nos fundos (po-
rém com a frente para a Randol Avenue), formando um conjunto com este prédio e ampliando
seu espaço com mais uma sala de aulas e um laboratório de Biologia. Na Universidade, ao longo
de décadas, foram desenvolvidas pesquisas para comprovação científica de Princípios Rosacruzes,
e oferecidos cursos de extensão durante o verão. Hoje, ela funciona internacionalmente (URCI),
e este edifício está vazio. Ele será ocupado brevemente por um Museu e um Laboratório de
Alquimia, abertos ao público. Será uma das mudanças que os participantes da Convenção
Mundial da AMORC em San Jose, no ano de 2015, poderão apreciar no Parque Rosacruz.

Acima, vista frontal do Planetário e à direita, nos fundos deste


edifício, a estátua ao ar livre de Augusto César, rara cópia em bron-
ze do original em mármore, que se encontra no Museu Palatine
de Roma. Augusto – imortalizado inclusive pelo nome do mês
“Agosto” – foi o Primeiro Imperador Romano e é tido como aquele
que trouxe o conhecimento das Escolas de Mistério Egípcias para
o ocidente. Seu tutor, Sêneca, contribuiu para o desenvolvimento
da filosofia Rosacruz.

O Planetário (54) – Inaugurado em 13 de julho de 1936, foi construído em estilo mourisco,


em memória dos astrônomos árabes que preservaram a antiga Astronomia grega durante a Idade
Média. Foi o quinto planetário dos Estados Unidos, e o primeiro a ter um projetor fabricado na
América, equipamento esse que foi desenhado e montado no Parque Rosacruz pelo próprio Dr.
Harvey Spencer Lewis. O atual projetor é um Spitz Modelo 512, com capacidade para 2.100 estrelas,
os planetas e fenômenos celestiais. Ele pode ainda alterar a visão do céu ao longo do tempo, avan-
çando ou retroagindo 13.000 anos em relação à data atual. No lobby do Planetário há também um
Pêndulo de Foucault, o famoso instrumento que demonstra a rotação do nosso planeta.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


41
n PESQUISA

A Biblioteca de Pesquisa (58) – Inaugurada em 19 de junho de 1939, no dia de abertura dos


cursos de verão da Universidade Rose-Croix, podemos considerá-la como o último edifício da épo-
ca do Dr. Lewis. Contêm milhares de volumes relativos a Misticismo e assuntos correlatos, docu-
mentos da Ordem e livros raríssimos, como edições originais dos Manifestos Rosacruzes do século
XVII. Uma área já existente nos fundos do prédio está sendo remodelada para oferecer uma exposi-
ção permanente dos volumes e documentos mais raros, devidamente protegidos contra danos físi-
cos e atmosféricos. Notem os canteiros centrais do caminho que leva até à porta da Biblioteca, com
a plantação de papiro, a planta que, no Egito antigo, foi utilizada na confecção de papel para livros,
que eram depois montados na forma de cartuchos com rolos de até sete metros de comprimento e
seis centímetros de diâmetro. A palavra “livro” vem desse processo, pois o papel constituía a parte
que era “liberada” do restante da planta (em latim, “libere” e “liber, libri”). O Egito chegou a expor-
tar papel para todo o Mediterrâneo. À direita, uma visão da parte esquerda interna da biblioteca,
mostrando apenas algumas das estantes do grande acervo e mesas para consulta, pesquisa e leitura.

A Era do Rádio – Todos que observam antigas fotografias do Parque, como a que incluímos no início
deste artigo, notam as torres com antenas de transmissão de rádio ali instaladas, hoje não mais existentes.
O Dr. Harvey Spencer Lewis gostava muito de trabalhar com tecnologias novas e o rádio era, na sua
época, uma delas. Programas com música e mensagens místicas eram transmitidos do Parque para toda
a região, cujas características geográficas encantavam o Dr. Lewis pelo alcance que as ondas conseguiam
atingir, muito maior do que na Flórida, onde ele havia iniciado essa forma de divulgação da Ordem.

42 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


O Relicário de Akhenaton (45) – Sua construção original foi terminada em abril de 1931,
com a finalidade de celebrar a Iniciação pela qual passaram mais de 70 rosacruzes no Egito, no
Templo de Luxor, em 14 de fevereiro de 1929, bem como a memória do Faraó Amenhotep IV
(Akhenaton) da XVIII Dinastia Egípcia, reorganizador das Escolas de Mistérios, considerado tra-
dicionalmente o Primeiro Grande Mestre Rosacruz. Esta edificação é uma réplica de uma parte
do Templo de Luxor, utilizada por Akhenaton e conhecida como “Templo de Amenhotep”. Ela foi
reformada em 1965, e, hoje, é um marco das realizações do Dr. Harvey Spencer Lewis e de Ralph
Maxwell Lewis, cujas cinzas foram depositadas neste local, juntamente com as de outros dez digni-
tários da Ordem Rosacruz, AMORC, do século XX. As cinzas do Dr. Lewis estão na parte central,
sob uma pequena pirâmide que contém, em cada um de seus lados, as palavras latinas LUX, VITA,
AMOR. Na quarta face, que pode ser vista no centro, acima, está a inscrição: XII 95º, indicando a
última Monografia oficial (da série antiga) preparada pelo primeiro Imperator Rosacruz deste ciclo.

O Supremo Grande Templo (59) – Construído como uma réplica, com algumas alterações,
do Templo de Hathor, em Dendera, no Egito, e consagrado no dia 17 de julho de 1949. Optamos
por apresentar aqui uma imagem interna do Templo, pois este artigo já incluiu duas fotos exter-
nas deste edifício (uma noturna e outra diurna). Ele é aberto diariamente, ao meio-dia, para o
trabalho de Auxílio Espiritual (Conselho de Solace), inclusive aos não-Membros da Ordem.

O Museu Egípcio Rosacruz (57) – Este edifício, inaugurado em 26 de novembro de 1966,


substituiu o “Museu Egípcio e Oriental” da época do Dr. Lewis, que havia se tornado pequeno para
o tamanho da coleção. Sua construção foi feita tendo por modelo o Templo de Amon em Karnak.
Hoje, ele possui o maior acervo de artefatos Egípcios, Assírios e Babilônicos em exibição no oeste
da América do Norte, bem como a reprodução em tamanho real de uma tumba de um nobre, de
Beni Hasan, com 4000 anos de idade. O Museu é visitado por milhares de estudantes, inclusive
crianças, durante o ano todo, de quartas-feiras a domingos. Interessados na história antiga ali en-
contram múmias e peças originais (87% do acervo), incluindo uma das raras estátuas de Cleópatra
existentes no mundo.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


43
n PESQUISA

O Edifício da Administração (64) – A partir de 1970, os trabalhos administrativos da


Ordem Rosacruz nos Estados Unidos passaram para este prédio, aberto ao público oficialmen-
te no dia 5 de abril. Sua arquitetura foi baseada no Grande Templo de Medinet Habu no Alto
Egito, construído por Ramsés III (XX Dinastia). Duas estátuas do deus falcão Hórus (63) foram
adicionadas à arquitetura autêntica, nas laterais do edifício. Inscrições egípcias e a figura de um
sol alado adornam sua entrada. Além da Suprema Grande Loja, estavam centralizadas aqui tam-
bém as atividades da AMORC dos idiomas inglês e espanhol, demandando um espaço que levou
à necessidade de ter, nos fundos, um Anexo.
Posteriormente, a Jurisdição Inglesa foi des-
membrada em três Grandes Lojas:

1. Américas, cuja sede permaneceu no Parque;


2. Europa, África e Oriente Médio, na Inglaterra;
3. Austrália, Nova Zelândia e Ásia, na Austrália.

O mesmo processo ocorreu com a Jurisdição


Espanhola, porém com divisão em duas partes:

1. Américas, com sede no México;


2. Europa, África e Australásia, na Espanha.

Com tal descentralização, conseguiu-se redu-


zir a imensa carga de trabalho em San Jose e ao
mesmo tempo aproximar os Membros de Língua
Inglesa e Espanhola de suas respectivas Grandes
Lojas. Iniciaram-se assim novos ciclos, com ex-
pansão e um ganho expressivo em muitos outros
aspectos, inclusive financeiro e de tempo.

44 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


O Jardim da Paz (47) – Trata-se da última obra
inaugurada no Parque Rosacruz (30 de junho de
2004), e ocupa hoje o espaço onde era o Anexo,
nos fundos do Edifício da Administração, demo-
lido devido a não estar mais sendo utilizado. Aqui
temos uma reprodução – a partir das ruínas da
cidade de Akhetaton (chamada agora Amarna)
– de jardins da XVIII Dinastia. Um tanque, com
lótus e peixes, fornece ambiente de reflexão e re-
laxamento, enquanto pequenas construções, para abrigo e meditação, misturam-se a palmeiras,
parreiras de uvas, plantas medicinais e flores.

O Futuro Labirinto (66) – Os três prédios do antigo “Learning Center”, não utilizados há
muitos anos, serão demolidos para dar lugar a uma nova atração do Parque: um labirinto, tam-
bém aberto ao público. Com 5000 anos de história, nas mais diversas culturas do mundo, labi-
rintos são construídos não para nos perdermos, mas sim com a finalidade de nos auto-encon-
trarmos. Trata-se de um caminho para transformação, a ser percorrido com o coração recepti-
vo, aquietando a mente e o corpo. Assim, dá-nos a oportunidade de encarar nossas dificuldades
na busca de objetivos ou realização de
uma missão, porém com a alegria do
aprendizado e da evolução; atingir equi-
líbrio, obter insight, celebrar. Um dos
labirintos mais conhecidos no mundo é
o de Chartres, na França, do ano 1201,
infelizmente o único que permaneceu
com sua forma original, dos 22 labirin-
tos das 80 catedrais góticas construídas
na Idade Média.

Senet: o jogo egípcio, que tem


mais de 5.000 anos (67) –conhecido
também como “Senat”, ou “o jogo da
passagem da alma”, este tabuleiro ao ar O jogo Senet, ao ar livre. Uma placa no local contém as regras
livre, com 30 casas, é bastante procurado que devem ser seguidas pelos jogadores individuais ou times.

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


45
n PESQUISA

pelas pessoas que frequentam o Parque, adultos e


crianças, para disputar partidas em duplas ou dois
times. Há dez peças, e cada jogador (ou time) fica
com metade delas. Ganha quem conseguir remover
todas as suas peças antes do oponente. Este jogo,
tão antigo, hoje tem versões para computador, mui-
to conhecidas pelos apreciadores dos “games”, que
o disputam até mesmo on-line. Era praticado por
egípcios de todas as classes sociais e aparece com
frequência em ilustrações da época. No túmulo
de Tutancâmon, por exemplo, foram encontrados
quatro tabuleiros de Senet, decorados com pedras
preciosas, e peças maciças de ouro e prata.

Estatuária ao ar livre – Há muitas,


mas podemos destacar a imponente es-
tátua de Tutmósis III (62), o criador das
Escolas de Mistérios do Egito, na esquina
da Naglee Avenue com a Chapman Street
(abaixo), e o belíssimo portal (53), na es-
quina das Avenidas Naglee e Park,com as
esfinges e o obelisco, este uma reprodução
no tamanho ¾ do que se encontrava em
frente à “casa do Sol”, em Heliópolis, no
ano 2.300 AC.

A Vegetação do Parque – o desenho


em perspectiva que está no início deste
artigo localiza e identifica inclusive árvo-
res e arbustos existentes no terreno, al-
guns deles conhecidos pelas suas proprie-
dades medicinais. Esse cuidado especial
com o que é plantado no Parque abrangeu
a recente renovação dos gramados, utili-
zando agora a espécie de grama nativa da
Califórnia (que possui folhas finas, agu-
Portal na esquina da Naglee Avenue com a Park Avenue,
que leva diretamente ao obelisco com as esfinges (foto
lhadas) e que demanda uma quantidade
acima, à direita) muito menor de água, economizando as-

46 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


sim milhares de litros na sua manutenção. Os Rosacruzes parecem ter influenciado bastante toda
essa região de San Jose, pois a presença de roseiras na vizinhança é realmente notável. Duas qua-
dras à frente, na própria Naglee
Avenue, está o Municipal Rose
Garden, com área maior do que
a do Parque Rosacruz, onde são
cultivadas praticamente apenas
roseiras, de todos os tipos, cores
e tamanhos.

Visite o Parque Rosacruz –


San Jose dispõe de um aeroporto
local, rodovias excelentes, além
de transporte público muito
bem organizado. Uma linha
de trem de ótima qualidade
(CALTRAIN) serve toda a re-
gião, partindo de San Francisco.
Se possível, faça sua viagem coin-
cidir com o chamado “Final de
Semana Místico” (mensal). Templo da Suprema Grande Loja

Próxima Convenção
Rosacruz Mundial – será em
San Jose, de 29 de julho a 2 de
agosto de 2015. Tendo em vista
o grande número de pessoas
previsto para esse evento, ele não
será realizado no Parque, mas no
Hotel Fairmont, área central da
cidade. No entanto, durante os
dias da Convenção todos terão,
com certeza, a oportunidade
de visitar o Rosicrucian Park.
Espera-se uma grande partici-
pação brasileira nesse próximo
encontro Mundial, que come-
morará os cem anos da Ordem
Rosacruz em seu Segundo Ciclo
de atividades na América. 4 Sanctum e Shekinah no centro do Templo

* O Frater Luis Fabio Miranda é membro da AMORC desde 1964, tendo se dedicado, nos últimos 35 anos, a ministrar Pales-
tras Públicas e Cursos para divulgar a Ordem Rosacruz. Recentemente, aposentou-se da atividade de Engenheiro e tornou-se
Escritor, no idioma inglês, com seu primeiro romance “The Girl Who Discovered America” – já à venda em todo o mundo.

Maiores informações: www.luisfabiomiranda.com

VERÃO 2013 · O ROSACRUZ


47
n OPINIÃO

eo
© PHOTOS.COM

Por DANIEL MARLO MARGARIDA, FRC

48 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


A “ Deus ou Big
verdade é que, desde os tempos
mais remotos, o homem deixa
transparecer uma curiosidade
aparentemente infindável a res-
Bang. Qual deles foi
peito de sua origem. o criador do homem


Pergunta ele, constante e incessantemen-
te, qual a sua exata origem, qual o verda- e do Universo?
deiro lugar de onde veio e qual o propósito
de sua criação. Aliás, esta parece ser uma
característica intrínseca dos seres humanos, Para se compreender melhor esta nova
ou seja, a curiosidade. possibilidade, será necessário examinar-
Podemos dizer que num todo generali- mos brevemente cada uma destas duas
zado a humanidade se divide em dois gran- teorias. Começaremos, pois, pela teoria
des grupos para buscar a resposta a estas in- científica, a teoria do Big Bang.
dagações. No primeiro grupo encontramos Os cientistas atualmente admitem que
os cientistas, físicos, químicos, astrônomos, o Universo e tudo o que nele está contido
cosmológos etc, estudando leis e princípios (planetas, estrelas, água, homens, plantas
e procurando evidências cada vez mais con- etc.) tenha surgido de uma Grande
cretas que provem suas teorias. Explosão que teria ocorrido há cerca de
No outro grupo temos os religiosos e 15 bilhões de anos.
adeptos das mais variadas religiões, socie- Essa Grande Explosão (Big: grande;
dades e organizações, quer sejam de caráter Bang: explosão) era, em seu passado, uma
conservador ou iniciático, afirmando com enorme quantidade de matéria concen-
veemência que não somente os homens, trada em um único ponto. Em outras
mas também todo o Universo, devem sua palavras, toda a matéria do Universo que
existência a uma Força Criadora, que alguns conhecemos hoje estava compactada na-
chamam de Deus. quele ponto, que teria mais ou menos o
Mas seja qual for o aspecto abordado diâmetro de nosso Sistema Solar atual.
para este assunto, científico ou espiritual, Esta matéria estava tão concentrada
o fato é que ambos os lados demonstram neste ponto que passou a se aquecer as-
uma certa preocupação para a solução sustadoramente e, não podendo mais su-
deste impasse. De um lado, os cientistas portar tanta energia fornecida pelo calor,
afirmando que o Universo e o homem são explodiu. E a partir desta grande explosão
frutos de uma grande explosão ocorrida há surgiu tão vasto e complexo Universo, que
aproximadamente 15 bilhões de anos, a qual nada mais é do que uma evolução daquela
denominam Big Bang. Do outro lado, os mesma explosão e que continua se expan-
religiosos propondo que Deus é o Criador. dindo a uma velocidade inacreditável.
Deus ou Big Bang. Qual deles foi o cria- Bem, chegamos agora ao término
dor do homem e do Universo? desta interessante teoria mas, para po-
Aparentemente, duas soluções são possí- dermos passar à teoria espiritual, deve-
veis: ou Deus é o Criador ou o Big Bang é o mos observar um problema com o qual
criador. Mas uma terceira solução é possível, os cientistas estão se defrontando, que é
e esta tentarei demonstrar. o destino do Universo.

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49
n OPINIÃO


encontravam-se em Deus. Deus e os homens
Deus e os eram entidades distintas, porém, em conjunto,
homens eram era como se fossem um único Ser. Era como se
Pai e Filhos vivessem sob o mesmo teto.
entidades distintas, Porém, em um determinado momento,
a grande maioria dos homens que estavam
porém, em conjunto, no âmago de Deus, decidiu afastar-se Dele.
Decidiram conhecer novos horizontes,
era como se fossem novos mundos e novas experiências; deci-


diram expandir-se.
um único Ser. E assim aconteceu. Os homens saíram
(aparentemente) do seio de Deus, lá perma-
necendo apenas algumas entidades (em com-
Com a ocorrência do Big Bang há 15 bi- paração à grande maioria de personalidades-
lhões de anos e posteriormente a criação de -alma que se afastaram Dele), as quais alguns
planetas, estrelas e galáxias, também passou chamam de Anjos.
a existir a gravidade destes corpos celestes. A Consequentemente, os homens toma-
partir desta constatação, os homens de ciên- ram-se seres encarnados e passaram por
cia se questionam a respeito do destino do experiências totalmente novas, como o
Universo: o Universo continua se expandin- sofrimento, a dor e a morte.
do para sempre, impulsionado pela forma de Segundo ainda nos afirma esta teoria, a
expansão da Grande Explosão, ou iria per- partir do momento em que os homens saí-
dendo sua força de expansão em decorrência ram de Deus, eles encetaram uma jornada
da força atrativa da gravidade dos planetas, evolutiva que, em seu ápice, levaria nova-
estrelas etc. Em outras palavras, os corpos mente estas personalidades-alma ao âmago
celestes começam a se atrair mutuamente uns de Deus. E Dele não sairiam novamente, pois
para os outros, ou seja, o Universo se con- teriam aprendido a lição que Deus é nosso
vergiria para um único ponto em função da Pai e nos ama, não havendo mais necessidade
gravidade de seus planetas e estrelas, e o que de expansão. Sendo assim, Deus e os homens
restaria seria um novo concentrado de maté- tornar-se-iam UNOS mais uma vez.
ria, perdido em algum lugar do nada. Chegando ao fim da leitura das duas prin-
Os cientistas estudaram o problema e ob- cipais teorias aceitas hoje como explicação
tiveram a conclusão (através de cálculos ma- para o surgimento do homem e do Universo,
temáticos complexos) de que qualquer uma eu lhes pergunto: há alguma semelhança en-
das duas possibilidades pode vir a ocorrer. tre as duas hipóteses? Eu diria que elas são tão
Acabamos por conhecer a Teoria cientí- parecidas que se poderia dizer que são a mes-
fica da Criação Universal. Esta concepção é ma teoria, apenas transmitidas em linguagem
particularmente interessante no que diz res- diferentes. Observem.
peito à sua semelhança com a segunda teoria Ha três pontos principais nas duas teo-
que agora iremos conhecer, a Teoria de Deus. rias que coincidem totalmente. Primeiro:
Segundo nos afirmam a maioria das religi- na teoria do Big Bang, sabemos que todo o
ões e organizações místicas, no início dos tem- Universo estava inicialmente concentrado em
pos todos os homens, ou personalidades-alma, um único ponto; era uma coisa apenas, ou

50 O ROSACRUZ · VERÃO 2013


seja, um grande compactado de matéria. Na de Deus. Portanto, sendo apenas uma
teoria espiritual, diz-se a mesma coisa, embo- representação, não é Deus. Seria mais sá-
ra em linguagem diferente: no início dos tem- bio de nossa parte considerarmos o
pos, os homens e Deus estavam juntos, como que os cientistas chamam de Big
em uma mesma casa – um único ponto. Bang como o meio pelo qual
Segundo: com o advento da Grande Deus criou o Universo, lugar
Explosão (ou saída dos homens que se en- este onde as personalida-
contravam em Deus), aquele ponto de maté- des-alma poderiam iniciar
ria passou a se expandir mais e mais. E o que sua evolução. O Universo
notamos hoje é este vastíssimo Universo). é, pois, um presente de
Novamente, repetem-se as mesmas afir- nosso Pai.
mações: vários seres decidiram afastar-se de Podemos considerar
Deus (por analogia, o Big Bang) e dirigiram- também a analogia feita
-se para vários lugares (saíram do ponto cen- aqui como mais uma
tral e expandiram-se, tal qual o Universo). aplicação da célebre
Terceiro: há a possibilidade do Universo frase do eminente sábio
se retrair, extinguindo a si mesmo, sob a Hermes Trismegistro:
força gravitacional dos corpos celestes, “Tudo o que está em-
vindo a ser novamente um concentrado de baixo e como o que
matéria: o novo encontro dos homens com está em cima, e tudo
Deus – o caminho de volta. o que está em cima
Na teoria espiritual, a mesma coisa: os e como o que
homens podem evoluir até um ponto em que, está embaixo”.
tendo atingido o apogeu de sua jornada evo- Em outras
lutiva, retornariam ao Interior de Deus (por palavras, o
consequência, a retração do Universo). que ocorreu
Notaram as semelhanças? Surpreen­ no plano espiri-
dente, não? Podemos resumir os três pon- tual refletiu-se de
tos acima considerados em concentração, forma semelhante
expansão e retração, e que estes se refle- no plano material.
tem em ambas as teorias. Creio que assim deve ser o
Mas o mais surpreendente é sabermos comportamento do místico, não
que Deus e o Big Bang não são a mesma se atendo apenas aos aspectos
entidade, como um raciocínio dedutivo espirituais da existência. Ele tam-
poderia presumir. bém é um cientista por natureza,
Nosso comportamento deveria ser, como pois é no mundo material que se
místicos que somos, o de considerar, acima de encontram as evidências de leis e
tudo, como Deus o nosso Criador. Neste par- princípios do mundo espiritual. Seu
ticular, considero as duas teorias como verda- comportamento deve ser tal que,
deiras, mas com uma diferença: sendo Deus o quando ele chega a alguma conclu-
nosso Criador, o que seria então o Big Bang? são que partiu de sua própria inte-
Ora, aquele advento ocorrido há tanto ligência, seja capaz de satisfazer a
tempo é a representação suprema e material ambas as teorias. 4

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n EDUCAÇÃO

.COM
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Além do conflito de
gerações
Por bertilo frederico becker, FRC

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O
conflito de gerações é um pro- adultos. Quando duas pessoas que convivem
blema antigo – talvez tão antigo no dia-a-dia olham e andam em direções
quanto a própria humanidade. diferentes, certamente acontecerá de esbar-
Em épocas passadas, quando as rarem uma na outra. Isso gera ocasionais
atividades eram principalmente agro-pastoris, desencontros de opiniões, desencontros de
as mudanças sociais eram lentas, no ritmo gostos e desencontros de interesses.
anual das estações. Naquele tempo, as diferen- A necessidade de auto-afirmação que faz
ças entre uma geração e outra eram pequenas parte do processo de construção da identida-
e a bagagem cultural era transmitida oralmen- de faz com que os desencontros inevitáveis
te na própria família, muitas vezes de avô para se tornem mais do que incidentes passa-
neto. Na era industrial, o ritmo se acelerou, geiros no convívio das pessoas. A criança,
as coisas passaram a acontecer no período do ainda mais que o adolescente, tem grande
mês, quando a colheita passou a ser em forma agilidade mental e aguda consciência me-
de contracheque. Muito mais opções profis- tacognitiva, isto é, tem grande clareza em
sionais surgiram e a velha tradição de herdar relação ao que sabe e o que não sabe, e se dá
o empreendimento paterno enfraqueceu. As conta disso rapidamente. Isso lhe dá tam-
diferenças entre gerações se acentuaram, au- bém a humildade intelectual, intrínseca ao
mentando as ocasiões de conflito. instinto de aprender, que lhe permite aceitar
Na era da informação, quando os negó- rapidamente a opinião de quem ela confia
cios cobrem os vinte e quatro fusos horários que sabe mais que ela. Portanto, raramente
pela globalização, nem mesmo o período de haverá desencontros nas áreas relacionadas a
um dia marca claramente o ritmo das mu- conhecimento. O conflito surgirá sempre que
danças. Este se acelerou de tal maneira que o território psicológico de um for invadido
a eclosão da identidade individual começa pelo outro. Os mais jovens precisam cons-
muito cedo na infância. As ocasiões de con- truir esse seu território, abrindo espaço para
flito de gerações se multiplicaram por mil. suas opiniões, seus gostos e seus interesses. E
Analisam-se, a seguir, as origens desse isso pode restringir o território dos adultos
conflito, as ocasiões mais frequentes de eclo- com que elas convivem.
são e algumas indicações de solução para o Além da curiosidade intelectual que leva
problema de superá-lo. Essa solução passa a criança a perguntar e aceitar o conheci-
necessariamente pela educação e pela expan- mento transmitido pelos adultos, cresce
são da consciência. nela a curiosidade de testar as estruturas.
Isso se acentua fortemente na adolescência.
Origens do conflito Questiona o porquê das regras e exige o di-
reito de experimentar fazer as coisas do seu
A busca da própria identidade, por parte dos jeito, pois, é claro, ela já enxerga as coisas
adolescentes, talvez seja a fonte principal do numa nova direção. Ela não só acompanha
conflito de gerações. Como diz Teilhard de a curva da História, mas pressiona para que
Chardin, a História não se desenvolve em seja mais rápida.
linha reta e, ao fazer a curva, existe inércia. Do outro lado há as certezas dos mais ve-
Ora, essa inércia é maior nos adultos que nos lhos. A vida lhes ensinou que nem tudo pode
jovens porque estes têm menos bagagem. ser como a gente quer. Lembram dos machu-
Consequentemente, os mais jovens estarão cados e das cicatrizes que a vida lhes propor-
olhando na nova direção mais rápido que os cionou. Eles consideram as regras como pa-

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53
n EDUCAÇÃO

redes protetoras e querem evitar sofrimentos valores. Este é com certeza o mais frequente
desnecessários para os mais jovens. Estes, por gatilho que dispara as situações de conflito.
sua vez, consideram as regras como indicati- Mesmo quando a criança é educada em
vos do caminho, resultado da experiência dos um ambiente em que os valores são mantidos
mais velhos, mas sentem a necessidade de consistentemente, quando são intelectual e
extrapolar as margens do caminho e explorar emocionalmente reforçados, quando os limi-
os territórios além. tes são bem definidos, ainda assim em geral
A criança pequena, sem outros parâmetros ocorrem eventuais conflitos. Acontece que os
que o ambiente em que cresce, aceita a se- valores, embora sejam os mesmos, têm di-
gurança proporcionada pelo colo da mãe e o ferentes prioridades. Isso decorre do fato de
exige sempre que se sente insegura. À medida que existe uma diferença no sentido de vida
que cresce, testa seus limites e explora o am- entre as duas gerações, o que induz diferentes
biente. Para que ela adquira segurança nesse escalas de prioridade para esses valores. Ora,
ambiente em expansão, ela precisa ter con- a busca de um sentido é mais importante que
fiança nas estruturas. Quando as atitudes dos o sentido em si. Por isso os mais velhos pre-
adultos são incongruentes, quando ela perce- cisam deixar que os valores que transmitem
be brechas na estrutura do ambiente, é natural sejam usados na escala definida pelos mais
que ela busque ali novos limites. Em caso jovens. Intransigência nesse ponto é outro
extremo, a criança ou o adolescente alcança a gatilho para conflitos.
rua e vai construir seu mundo longe de casa. O mais forte conflito entre duas gerações
é desencadeado pelo desencontro de pers-
Gatilhos pectivas de vida. Em muitos casos ele fica
latente porque ao jovem não se deu no devi-
dos conflitos do tempo a liberdade de expressar sua dis-
cordância. Essa inibição pode dar-se de duas
Quando Teilhard de Chardin fala da cur- maneiras: ou por excesso de autoridade ou
va da História, o conceito de direção a que por excesso de argumentação. No primeiro
ele se refere é a construção de um sentido de caso, a criança é coagida a aceitar a posição
vida. A busca do sentido é, segundo Danah do adulto por força da emoção, expressa num
Zohar, o principal indicativo da inteligência tom de voz ou com gestos que não permitem
espiritual. A nova geração de hoje é, com contestação. No outro caso, os argumentos
certeza, espiritualmente mais inteligente que apresentados para justificar a posição mais
as anteriores. Seu senso de busca de um sen- forte ultrapassam a capacidade de contra-
tido mais forte para a vida supera em muito o -argumentação da criança. A maneira mais
das gerações que a precederam. Os que con- comum de ocorrer esse conflito é a escolha
vivem e acompanham o desenvolvimento de da profissão pelos pais. São eles que devem
crianças e adolescentes podem perceber isso pagar a escola, e são eles, portanto, que esco-
muito claramente. lhem a escola, ou sua falta.
Quando a vida tem sentido, o ambiente se
torna polarizado nessa direção e induz auto-
maticamente uma escala de valores. Com isso Limites da liberdade
fica claro que os mais jovens têm uma escala A busca de um sentido se dá pela impo-
de valores diferente daquela dos mais velhos, sição de limites. É preciso canalizar as
o que inevitavelmente leva ao choque de energias para que se tornem efetivas. É

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preciso definir um propósito e traçar metas.
Paradoxalmente, só existe liberdade onde … os mais
há limites. Já se disse que a torrente espre-
mida entre as rochas da montanha é mais
jovens têm uma
livre que o pântano. Limites à liberdade
implicam em restrições ao território. Por
escala de valores
isso é importante, ao delimitar o território diferente daquela
psicológico da criança, definir claramente o
conceito de liberdade. Haverá muito maior dos mais velhos, o
chance de conflitos se a liberdade for defi-
nida em termos individuais, do que se a ela que inevitavelmente
for dado um sentido coletivo. Se a liberdade leva ao choque de


de um termina onde começa a do outro,
então haverá constante pressão sobre esses valores.
limites. Se o território é compartilhado,
então os limites de cada um vão até onde
estão os limites de todos.
Num território compartilhado, a li-
berdade individual e a liberdade coletiva
são exteriormente a mesma. Então abre-se
um novo território psicológico: um terri-
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tório interior justamente onde o sentido


da vida e o propósito são definidos. Por
isso a autodisciplina é considerada a chave
mestra do sucesso pessoal e profissional.
É a liberdade interior de canalizar todas
as energias em direção ao ideal. Definir
um propósito condizente com o sentido de
vida construído, e disciplinar-se na busca
desse propósito, polariza as energias cós-
micas e desencadeia processos criativos
que conduzem à meta.

Ultrapassando
as limitações
A disputa de território segue o princípio
de exclusão da física quântica que não per-
mite que duas partículas ocupem o mesmo
estado quântico. É graças a esse princípio
que é possível à matéria formar átomos e
moléculas e assim construir todos os obje-
tos do mundo, inclusive as células do nosso

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55
n EDUCAÇÃO

corpo. Mas é possível achar dois, oito, ce e se manifesta como alegria no conví-
dezoito ou mais elétrons compartilhando vio harmonioso. A liberdade de buscar
uma mesma órbita dum átomo, porque eles com alegria as próprias metas se valoriza
têm internamente a liberdade de apresen- ainda mais com o entusiasmo que brota
tar outras propriedades quânticas, além dos resultados crescentes.
da energia que define a órbita. No caso das Não há maior expansão dos espaços
pessoas, compartilhar o território implica interiores em que está a verdadeira liber-
em tolerância mútua, o que exige a valori- dade do que as grandes virtudes huma-
zação da dimensão interior, ou seja, a cons- nas: a fé, a esperança e o amor. O cultivo
ciência da dualidade do ser. dessas virtudes proporciona o espaço in-
Assim, a tolerância que permite ex- terior que ultrapassa todos os limites que
pandir o território para além dos limites poderiam levar a conflitos entre as pes-
individuais decorre do autoconhecimento. soas. É o espaço ilimitado da consciência
Este leva, por sua vez, ao conhecimento psíquica que se expande sempre mais em
do outro e assim à compreensão mútua. direção à Consciência Cósmica, onde não
Aplicando-se isso ao conflito de gerações, mais haverá espaço para conflitos, e sim
significa que só se pode superá-lo com completa harmonia.
educação adequada. Não só educação de Como toda realidade, o conflito de
crianças e jovens, mas educação de todos, gerações tem uma causa ativa, uma cau-
pois não resolve tornar tolerantes os mais sa passiva e um padrão de manifestação.
jovens se não se lhes dá espaço para que se Inúmeras abordagens são possíveis, pois
desenvolvam em todos os sentidos. se trata de um problema complexo, isto
A educação de todos, crianças e adultos, é, podem ser feitos muitos cortes dife-
precisa dar-se no sentido de uma expansão rentes para efetuar a análise. O que aqui
da consciência. Expansão da consciência se fez foi abordar as origens, ou as condi-
objetiva, pela instrução e pelo desenvol- ções que o propiciam, e as ocasiões que o
vimento das habilidades físicas e mentais. ativam. Como todo problema desse tipo,
Expansão da consciência psíquica, pelo a solução está em eliminar uma das cau-
desenvolvimento da intuição e das emo- sas necessárias. Um dos passos é, pois,
ções superiores. Com isso se cria o hábito minar as bases do problema, expandindo
de uma atitude mental positiva. Essa ati- os territórios psicológicos das partes
tude, por sua vez, se reflete no amor e no envolvidas pela construção de novas di-
respeito mútuos. mensões de liberdade. O outro é superar
as ocasiões de conflito, pela tolerância,
Valor agregado pela compreensão, pelo respeito e pelo
amor mútuos.
à liberdade Tanto um como o outro desses pas-
sos exige uma atenção redobrada às di-
Quando a liberdade ultrapassou os limi- mensões interiores da personalidade e à
tes individuais e não mais está restrita dualidade do ser. Os conflitos se tornam
ao ego, a ela se agregam novos valores. menos profundos e tendem a desaparecer
Quando ambos os lados do conflito ex- na medida que a consciência humana se
pandem assim seu território, a liberdade aproximar da Consciência Cósmica. Que
se valoriza com a paz. A paz interior cres- assim seja! 4

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PARA CHEGAR
A DEUS
Tanto Teresa de Ávila quanto João da Cruz colocavam Deus –
que estava lá em cima – no centro do coração humano. Assim,
já não é o místico que deve chegar a Deus que habita lá nos
céus. Deus está aqui. Temos é que nos abrir a Ele, deixando-o
entrar no âmago do nosso coração.

Não é mais a ideia de um Deus inacessível que só pode ser


desvendado pelo conhecimento. É a ideia de um Deus amoroso
que, como a imagem do Sol, se derrama; basta abrirmos o
coração para desfrutarmos desse Amor...

***

O primeiro princípio para identificarmos e atingirmos nossa


meta com êxito é sermos receptivos à inspiração Divina;
o segundo é SERVIR...

– S.I.

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