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SONHO

Muitas vezes não sonho durante as noites. E quando sonho, poucas vezes
lembro sobre. Já tive pesadelos assustadores que me fizeram acordar suado; outras
vezes, sonhos hilários, daqueles que, quando observamos outra pessoa dormindo,
ouvimos um leve murmúrio, curto e seco, e reparamos que, num dos cantos de sua
boca, desenha-se um leve contorno do que poderia ser um sorriso que só se
completa na sua cena mental. Mas, na maior parte das vezes, logo que acordo,
esqueço. Por mais que forçe a lembrança, ela não vem, ou, quando vem, surge em
minha mente uma narrativa cheia de buracos que não diz respeito ao sonho original
- ou talvez eu seja muito inseguro para dizer que sim. Refletindo sobre isso,
cheguei a uma conclusão (dessa vez não em sonho, pois nunca consegui refletir
sobre o sonho dentro do sonho): que o sonho é ilógico e que ele pode existir
somente enquanto for ilógico. Quando tentamos narrá-lo a nós mesmos, isto é,
quanto tentamos enquadrar sua ação em uma estrutura lógica espaço-temporal, ele
se perde, pois seu cerne é a falta de lógica. Talvez a conclusão anterior seja uma
desculpa que articulei para mim mesmo a fim de desviar minha atenção do árduo
trabalho que é tentar entender um sonho. Até porque fui criado para ser um homem
lógico e racional - sonhos são besteiras, brincadeiras da mente.
Mas mesmo sendo um ser racional, mesmo sabendo da existência da
gravidade, mesmo sabendo que não respiro embaixo d’água, ou que não sei voar,
ou que não atravesso paredes, ou que não leio mentes, ou que não prevejo o futuro,
ou que não consigo mudar o passado, mesmo sabendo de tudo isso - e é melhor
parar por aqui, pois temo que o leitor esteja ficando entediado ou triste pela extensa
lista de coisas que não sabemos fazer - ainda assim sonho.
Dito isto, gostaria de compartilhar a experiência de um sonho que tive
recentemente. Não porque gostaria de o entender melhor, mas porque acredito que
compartilhar nossas experiências pode salvar-nos da apatia gelada que é a
ignorância. Sei o que muitos de vocês, mentes racionais como eu, estão pensando
agora (posso ouvir o sussurro por entre seus dentes): “mas, se você acabou de
dizer que o sonho é irracional e que não se pode narrá-lo, como então pretende
concluir a empreitada a que se propõe?” Ora, simples: pretendo narrá-lo tal como
está em minha mente, sem derramá-lo sobre o funil da lógica - jogo-o em seu colos
com os buracos no enredo e todo o resto. Sinto que os sussurros aumentam,
“Surrealista”, diz alguém com um certo quê de dúvida, “Não, metido a kafkiano”,
responde o outro com um ar sabido (tudo sussurrado, claro, pois as mentes
racionais não se atrevem a jogar esses coisa na cara nossa cara, sabem que é falta
de decoro). Mas, não! Controlem-se, eu imploro! Antes de sussurrarem, ouçam
minha história, ou melhor, meu sonho.
Estava de olhos abertos (pisquei para certificar-me), mas não via nada.
Estava em minha cama, pois senti o colchão embaixo de mim (ou em algum colchão
qualquer). Com o tempo, meus olhos se acostumaram com a escuridão e, aos
poucos, fui discernindo alguns objetos do meu quarto (agora já podia discernir os
contornos de meu quarto), tão familiares quanto estranhos objetos escuros podem
ser.
Mas o que é isto? Por que o piso está repleto de água? Algas verde-musgo
boiam na água escura (era esgoto?). Com o susto, tentei me mover, mas não pude.
Estava grudado na cama. Levantei a cabeça até onde pude para mirar o que
acontecia, meu grito estancou-se na garganta: fungos formavam-se em volta do
meu corpo, saiam de minha pele e fundiam-se a cama a tal ponto que não era
possível discernir o que era pele, osso, musgo, nervo, fungo, espuma, sangue - tudo
uma coisa só. Ao tentar me mexer sentia dores como se estivesse acorrentado por
ganchos. Sentia sede. A garganta ardia em brasa e, ao salivar, sentia uma dor
aguda, como se expulsasse um tijolo do peito.
Mas por que isso? O que eu fiz? É isso uma penitência? Se for, sinto muito.
“Me desculpem!”, foi a lamúria que não saio da minha boca, ao invés disso se ouvia
somente pálidos sons roucos de gargarejos. Fiquei lá por dias, ou horas, ou não sei
quanto tempo, pois nunca clareava.
Até que uma forma surgiu da água. Primeiro, uma bolha negra cresceu diante
de mim. Depois, conforme a água foi escorrendo, pude perceber que era uma
pessoa. Algumas das algas grudaram-se em seus ombros. Era uma mulher, pois
lentamente percebi a forma dos seios. No entanto, não conseguia ver seu olhos, já
que os longos cabelos lisos e escuros escorriam-lhe por sobre todo o rosto. Olhando
melhor percebi marcas escuras e arroxeadas por todo o corpo, misturadas com
cortes e sangramentos alarmantes. Estavam por toda a parte, quase não se via pele
alguma. Entretanto, (e aos poucos pude perceber, pois ela não fazia nenhum
movimento, existia somente, respirando o suficiente para manter-se viva) algum
estranho ressentimento, uma culpa que escalava pelo meu peito e engatinhava
através da minha garganta, deu-me a certeza de que estas marcas eram velhas,
quase pintas de nascença; talvez ela nem às note mais, ou talvez já tenha nascido
assim.
Mas, e acima de tudo, estava grávida.
A grande barriga apontava em minha direção, molhada e brilhando. O umbigo
estava estufado, olhando diretamente para mim, me desafiando, atento a todos os
meus movimentos, não movimentos do corpo, mas movimentos da mente. Aquele
umbigo lia meus pensamentos sem nenhum pudor. Ele atravessava todas as
barreiras que criei durante anos com muito esforço para que ninguém visse,
entendesse ou demonstrasse o mínimo de compressão - qualquer sinal que fosse -
de que meus sentimentos poderiam ser decifrados. Àquele umbigo eu era um livro
aberto. E tudo o que ele lia, tudo o que entendia sobre mim sem nenhuma restrição,
resumia-se na única frase que fez com a confiança e a ironia de quem faz uma
pergunta já sabendo da resposta: “você tem medo dessa mulher, não tem?”
De repente, algo saiu por entre suas pernas e caiu na água. Com todo o
esforço possível na minha situação, estiquei-me para agarrar o cordão rosa
banhado em sangue que ligava seu corpo ao objeto submerso. No entanto, a ação
não foi tão dolorosa quanto eu esperava; talvez porque meu segredo já tinha sido
revelado pelo umbigo.
Puxei o cordão e, na outra ponta, pendia um telefone celular.

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