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Reflexões sobre o estado da arte do

conhecimento agroecológico

João Carlos Canuto*


Introdução

Esta conferência, proferida pelo Pesquisador João Carlos Canuto da Embrapa


Meio Ambiente, será apresentada no IX SEMINÁRIO INTERNACIONAL
SOBRE AGROECOLOGIA e X SEMINÁRIO ESTADUAL SOBRE
AGROECOLOGIA em Porto Alegre-RS em novembro de 2008.

Trata-se de uma fala desde dentro da academia, mas através de experiências


de trabalho em parceria com organizações da Sociedade e grupos de
agricultores. Não é um resgate sistematizado do estado do conhecimento
agroecológico no Brasil, mas uma reflexão sobre as opções que têm sido feitas
pelos diferentes atores sociais – academia e organizações sociais – e as
conseqüências sociais, ambientais e políticas destas escolhas. As idéias
apresentadas não representam obrigatoriamente uma posição oficial de
qualquer instituição.

Academia e autonomia da pesquisa

É fundamental destacar, desde logo, a Importância da liberdade para pesquisar


para o avanço da fronteira do conhecimento. Na mesma ordem de importância
está também o compromisso social da pesquisa. A liberdade para pesquisar é,
no entanto, a postura que geralmente predomina: liberdade para definir os
temas, os métodos e os “beneficiários” da pesquisa. Os critérios de validade
das pesquisas são internos à academia e dizem respeito mais ao cumprimento
de aspectos formais do que de avaliação do impacto das pesquisas na
Sociedade. Neste contexto, as dimensões social, cultural, econômica e política
são consideradas como “dadas”, não são objeto de maior atenção. Em
conseqüência, os resultados do trabalho de pesquisa atendem: primeiro, à
produção de publicações científicas especializadas, com aplicabilidade muito
restrita; segundo, à produção de tecnologias “densas de capital” com potencial
de adoção restrita a grandes proprietários; terceiro, e de forma minoritária, à
produção de conhecimentos aplicáveis para as maiorias populacionais
(agricultura familiar).

“Sociedade”, assim, aparece como conceito vazio: “a pesquisa trabalha para a


sociedade, trabalha para todos”. Mas há uma relação direta entre conteúdo
tecnológico e perfil econômico exigida para a adoção de determinada
tecnologia. Desdobrando um pouco mais: predomina o foco da pesquisa nos
que têm capacidade de adoção de tecnologias intensivas de capital. Por
exemplo, não se faz pesquisa em “agricultura de precisão” para resolver
problemas técnicos atuais dos pobres do campo. Além disso, na prática, os
orçamentos maiores da pesquisa são para monocultivos de exportação. Os
lobbies do agronegócio são organizados e mais eficientes do que a agricultura
familiar para demandar pesquisas do seu interesse.

Ainda há muitas barreiras em relação ao envolvimento da pesquisa acadêmica


com os agricultores pobres. Geralmente estes são considerados de
mentalidade tradicional, atrasada, sem um mínimo de recursos materiais
(financeiros, solo, infra-estruturas). Como conseqüência, estes agricultores não
teriam capacidade para inovar e, portanto, não seria prioritário investir neste
público (“não dão retorno à pesquisa”). E, de fato, os agricultores familiares têm
dificuldade de incorporar tecnologias desenhadas para o agronegócio. No
entanto adotam sem grandes problemas tecnologias ajustadas às suas
condições materiais e à lógica de vida da família.

Como conseqüência deste processo, ocorre um círculo vicioso entre


pensamento, prática e resultados: no nível do pensamento, tem-se como
suposto que a pesquisa tem valor em si mesma, a pesquisa é neutra; na
prática, a pesquisa é concebida em função de critérios internos das instituições,
frequentemente pautada pelas demandas de empresas e agricultores
capitalizados; quanto aos resultados, artigos de alta abstração são publicados,
circulando prioritariamente entre os próprios cientistas. Quando são produzidos

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resultados aplicados, estes se traduzem em tecnologias sofisticadas e
intensivas de capital “ofertadas ao mercado”.

Fontes do conhecimento agroecológico

As principais fontes do conhecimento agroecológico hoje disponível são o


saber dos nativos e colonos, os conhecimentos desenvolvidos pelos cientistas
internacionais pioneiros do início do Séc. XX e, mais atualmente, a releitura
contemporânea - anos1970-80. Estas últimas contribuições dizem respeito a
diversas origens, como os autores atuais, que conceberam a moderna
nomenclatura “agroecologia”, a agroecologia de natureza aplicada,
desenvolvida por agricultores, organizações e movimentos sociais e também os
aportes tecnológicos e científicos produzidos pelas instituições de pesquisa.

É importante assinalar diferenças fundamentais entre a perspectiva de


conhecimento da agricultura moderna e a da agroecológica. Na agricultura
moderna há um esforço de simplificação e, a seu modo de pensar simplificado
correspondem pacotes e receitas. Nela o papel da observação é acessório. Já
na agroecologia o conhecimento é de código aberto, livre acesso, modificação
e aplicação. São Infinitas as possibilidades de desenho e manejo de
agroecossistemas, onde a observação é essencial.

O conhecimento aplicado na área de agroecologia é majoritariamente de


origem popular. Foram quatro décadas de ensaios e adequações contínuas no
Brasil, resultando hoje em um estoque tecnológico disponível para vários
cultivos e criações, a partir de métodos menos rigorosos que o científico, mas
em um trabalho com marcado compromisso social.

A pesquisa científica tem se aproximado do tema nos últimos anos. Boa parte
das pesquisas acadêmicas tem tido inspiração em conhecimentos populares.
Muitos conceitos e métodos clássicos ainda predominam na pesquisa
agroecológica e os resultados muitas vezes refletem isso por se apresentarem
de forma muito pontual e desarticulada de outros conhecimentos que compõem
o sistema. Ainda assim, muitos conhecimentos clássicos podem contribuir para

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a pesquisa agroecológica, quando rearticulados para desenhar sistemas
complexos.

Temas recorrentes e contextos de aplicação da pesquisa agroecológica

Abaixo, apresentamos uma síntese dos principais temas de pesquisas na área


de agroecologia no setor acadêmico, procurando situar estas temáticas aos
possíveis contextos de aplicação:

TEMA DE SISTEMAS SIMPLIFICADOS SISTEMAS SIMPLIFICADOS


PESQUISA Enfoque predominante Enfoque predominante
Importante como momento de um
processo de transição, que visa
Fundamental para estratégias
Insumos biológicos também o desenho de sistemas
de substituição simples de
Preparados e complexos
inseticidas, fungicidas e outros
caldas Insumos biológicos entram como
insumos
reforço em casos específicos de
desequilíbrio
Estratégias para melhorar o
Solos, adubação equilíbrio do sistema, a saúde das
Práticas focadas na melhoria
orgânica e plantas, ciclagem de nutrientes,
da produtividade
adubação verde conservação da água e resposta
produtiva e baixo custo
Introdução de agentes Estímulo ao controle natural, com
Controle biológico
externos espécies espontâneas
Focado em respostas
Recursos Focado em respostas produtivas,
produtivas, para espécies
genéticos adaptabilidade, usos múltiplos
comerciais
De grande importância, base do
Pouca importância, ênfase na
Biodiversidade equilíbrio, segurança alimentar e
biodiversidade funcional
externalidades positivas
Importância de indicadores de
Quando se aplicam, estão abrangência ampla, visando a
Indicadores
centrados em parâmetros integração das dimensões
sustentabilidade
produtivos específicos ecológica, econômica e
sóciocultural
Combinações relativamente
Policultivos e
Combinações simples, complexas, que garantem
sistemas
especialização da produção segurança alimentar, restauração
agroflorestais
dos recursos e renda
Importante para estabelecer
Educação Pouca importância, estratégias
estratégias rurais de transição,
ambiental mais urbanas, escolas
além do diálogo com a sociedade
Mercados populares e venda direta
Mercados orgânicos e
ou mercado orgânico certificado
Mercados certificação principal por
por sistemas participativos de
auditoria
garantia
Não é foco fundamental de
Complexidade e biodiversidade
Serviços preocupação, embora gere
têm efeitos positivos fora da
ambientais mais benefícios que a
propriedade: água, ar, valos cênico
agricultura convencional

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O enfoque são os cultivos ou o Focaliza o agricultor, a família, a
Sistemas agrários
empreendimento comunidade

Cenários para o conhecimento agroecológico

Os principais cenários de desenvolvimento das agriculturas ecológicas deverão


determinar, em grande medida, os rumos da pesquisa agroecológica. Algumas
tendências são apresentadas a seguir:

A. Cenário de agricultura orgânica comercial

o Obtenção de produtos sem resíduos de agrotóxicos


o Forte desenvolvimento de insumos biológicos industriais
o Desenho ecologicamente simplificado, relativa especialização
o Produção certificada por auditoria
o Foco nos mercados especiais para grupos sociais mais abastados
o Mercantilização e exclusão

B. Cenário da agroecologia de aplicação socialmente ampla

o Insumos manejados pelos agricultores, articulados ao aumento da


biodiversidade
o Desenhos complexos, multifuncionalidade da agricultura
o Venda direta, sistemas participativos de garantia
o Foco no mercado e na segurança alimentar dos agricultores, acesso
social aos produtos mais amplo
o Tendência ao comércio solidário e segurança alimentar

Como estes cenários se refletem em diferentes estratégias de geração de


conhecimento? Em um cenário tipicamente de agricultura orgânica comercial,
há uma tendência ao “prolongamento” das práticas clássicas de pesquisa, com
o objetivo de obter tecnologias de aplicação genérica ou novos pacotes. A

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interação da pesquisa com agricultores e extensão seria secundária e o foco
central seria em pesquisas de laboratório e campos experimentais. Muito dos
esforços de investigação científica se orientariam ao desenvolvimento de
insumos biológicos e teríamos uma preferência pela simplificação dos manejos.

No cenário de uma visão agroecológica ampliada, seria dada ênfase à geração


de conhecimentos e não só de tecnologias. Teria fundamental destaque a
interação entre pesquisadores, agricultores e extensionistas, a orientação à
construção social do conhecimento, a construção de unidades e redes de
referência para a transição agroecológica, onde as aplicações validadas
localmente se transformam em novas referências. Nesta perspectiva, haveria a
necessidade de considerar a realidade complexa dos agricultores familiares e
estimular o manejo da biodiversidade e da complexidade. O foco principal
seriam, então, as necessidades dos agricultores e consumidores com menos
recursos.

Desafios para o diálogo de saberes

È de suma importância, considerando as contribuições da academia e a


valorização do conhecimento popular, construir pontos de convergência para
dar cada vez mais solidez ao conhecimento agroecológico. Para tanto, há a
necessidade de reconstruir conceitos, instituindo um distanciamento crítico em
relação aos conceitos, sem fundamentalismos. Aliado a isto, ressalta-se a
necessidade de compreender as conseqüências dos conceitos na definição dos
métodos. Igualmente, é interessante distinguir o que segue e o que não segue
válido da tradição científica, rearticulando conhecimentos dispersos, dentro de
uma visão mais “holística”. Paralelo a isto, deve-se revalorizar o conhecimento
tradicional para uma condição ”pós-moderna”.

O conhecimento científico clássico é suficiente para formar pessoas e resolver


os problemas técnicos mais importantes da produção orgânica. Entretanto,
para o entendimento e o desenvolvimento de sistemas agroecológicos ou
complexos são requeridas outras condições. Entre elas podem ser
mencionadas as seguintes:

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o Conteúdos e métodos de ensino mais integrados
o Pedagogia que tenha base na troca entre teoria e realidade
o Vontade política de fortalecer a pesquisa agroecológica
o Pesquisa agroecológica articulada aos grupos sociais mais necessitados
de conhecimento
o Esforços de comunicação entre disciplinas e temas
o Sistemas de avaliação que premiem o trabalho coletivo
o Sistemas de informação e divulgação de livre acesso
o Concepção de respostas a problemas reais, por meio da articulação
entre conhecimentos – ”garimpagem” de conhecimentos disponíveis,
composição entre conhecimentos complementares, desenho de
“protótipos”, testes em ambientes controlados, testes em campos de
produção, ajustes e aplicação prática.

Considerações finais

O conhecimento é um dos pilares da transição da agricultura a sistemas mais


sustentáveis, do ponto de vista técnico e produtivo e, igualmente, do ponto de
vista social, cultural, econômico, ambiental e político. Neste contexto, algumas
transformações importantes deverão ser estimuladas. No mundo científico, é
necessária uma integração entre especialistas e uma integração entre
especialistas e generalistas. Na atividade agrícola, há a necessidade de
garantir a criação de referências mais sólidas de conhecimento – registro,
sistematização, definição de necessidades e lacunas de conhecimento para a
pesquisa. Por último, entre estes dois mundos é básica a articulação entre as
diferentes experiências de construção do conhecimento, associando de forma
participativa os procedimentos científicos e os processos sociais.

*Doutor em Agroecologia, Campesinato e História. Pesquisador da Embrapa


Meio Ambiente.

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