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“Nem todos os magros comem pouco nem muito menos de um modo saudável
e nem todo gordo come em grande excesso e de modo não saudável. Essa
generalização é uma das fontes do grande preconceito contra o gordo e deve ser
prontamente abandonada”.

As implicações da obesidade para a vida cotidiana

A obesidade

A obesidade tem atingido níveis epidêmicos:

Em 2005:

1,6 bilhões de pessoas acima de 15 anos com excesso de peso (IMC ≥ 25


kg/m2) e 400 milhões de obesos (IMC ≥ 30 kg/m2).

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Em 2015:

2,3 bilhões de pessoas com excesso


Estima-se que em 2015 existirão cerca de

de peso e 700 milhões de obesos.

O que é a obesidade?

Doença crônica e grave, definida como um acúmulo excessivo de gordura


corpórea numa magnitude tal que traga prejuízos à saúde, com altos índices de
mortalidade e morbidade e de caráter multifatorial, que torna seu tratamento ainda
mais complexo.

Diagnóstico da Obesidade

Existem diversas técnicas para classificação de


indivíduos com sobrepeso, sendo a mais utilizada delas
uma avaliação por meio indireto, correlacionando peso-
altura – Índice de Massa Corporal (IMC), calculado
dividindo o peso (em quilos) pela altura (em metros) ao
quadrado, na seguinte fórmula: IMC = PESO / ALTURA2.

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De acordo com o IMC, as pessoas podem ser subdividas em seis categorias:

Classificação IMC

Obesidade grau III (Mórbida) > 40.0 kg/m²

Obesidade grau II Entre 35.0 e 39.9 kg/m²

Obesidade grau I Entre 30.0 e 34.9 kg/m²

Sobrepeso Entre 25.0 e 29.9 kg/m²

Normalidade Entre 18.0 e 24.9 kg/m²

Abaixo do normal < 17.9 kg/m²

Etiologia da obesidade

Por ser uma doença de caráter multifatorial, devemos levar em conta um grupo de
fatores que provocam o surgimento e o desenvolvimento da doença.
Tais fatores podem ser fisiológicos ou não (comportamentos, hábitos, estilo de vida
e personalidade).

Fatores fisiológicos:
 Regulação metabólica do gasto energético;
 Tamanho e número dos adipócitos (células gordurosas);
 Alterações endócrinas;
 Suscetibilidade genética (gene da obesidade/leptina).

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Fatores não fisiológicos:
 Contexto sociocultural:

o A evolução da tecnologia estimula uma vida mais sedentária e o


incentivo ao consumo torna o acesso aos alimentos mais fácil;
o Mudança no padrão de beleza – pressão social no sentido do
emagrecimento.
 Consumo alimentar:

o Estudos não apontam diferenças significativas entre os hábitos


alimentares dos obesos e não obesos;
o No entanto, alguns estudos mostram que os obesos frequentemente
apresentam dificuldades para diferenciar os estímulos internos
(fome/saciedade) dos externos (emocionais) ao alimentar-se;
o Há, também, uma distorção da percepção da quantidade de alimentos
ingeridos na população obesa – os obesos tendem a subestimar sua
ingestão alimentar em até 40%.

Para ilustrar:

Dificuldade de percepção da real quantidade ingerida de alimentos: “Ontem eu não


jantei, eu só comi três pastéis porque na hora de dormir eu estava com fome...”.

Alimentação motivada por fatores externo-emocionais: “Se eu ficar sozinha corro pra
geladeira mesmo... Se meu marido brigar comigo então, aí qualquer tentativa de dieta
vai por água abaixo!”.

 Aspectos psicológicos:

o Importante diferenciar a hiperfagia (comportamento de comer


excessivo) da obesidade, que, ainda que muitas vezes relacionadas, não
são sinônimos.

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Hiperfagia como produto do hábito

A hiperfagia pode ser entendida como um produto do hábito, ou seja, um


comportamento aprendido socialmente que se repete à medida que é reforçado pelas
consequências que produz. As condutas alimentares muitas vezes são transmitidas
dentro da família.

“Toda vez que eu vou ao cinema, vou assistir um


filme, eu preciso comer alguma coisa... Sempre pego
um baldão de pipoca, uns docinhos, algo pra beliscar
durante o filme. Como é que eu vou ver um filme sem
comer nada?”.

“Lá em casa a gente tá sempre comendo, se tem festa a


gente come, se não tem nada pra fazer a gente come.
Sábado então, é dia de pizza. Sem pizza parece que nem
teve sábado!”.

A hiperfagia como forma de defesa psicológica

A hiperfagia também pode ser compreendida como uma defesa psicológica. Há


um consenso na área da psicologia que compreende o significado da comida e do ato
de alimentar-se além da mera satisfação de necessidades fisiológicas.
Alguns autores defendem a hipótese de que o exagero alimentar seria uma
forma de defesa diante de sentimentos de inadequação pessoal e tentativa de
evitação de angústia.

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A dificuldade de entrar em contato com a angústia: “Vou ser sincera,
tem horas que eu nem sei mais o que estou comendo, mas me sinto
angustiada e preciso colocar qualquer coisa para dentro, nem me
importo se é gostoso. Dá uma vontade de gritar, eu pego um pacote
de bolacha, não sei nem te dizer o sabor... Como inteirinho e pronto,
gritei”.

Utilizar a hiperfagia como resposta a tensões emocionais está frequentemente


relacionado ao ver no alimento uma satisfação substitutiva ou um equivalente de afeto
ou recompensa. A origem para esta relação, para a maioria dos autores, está na
infância, mais especificamente no momento da amamentação, quando afeto e comida
se combinam.

A fome do bebê

“O bebê se angustia quando tem fome não apenas pela


sensação desagradável, mas porque vive a fome como
morte iminente, ou seja, a sensação de fome é
acompanhada de angústias de aniquilamento. A mãe
tem a função de desintoxicar a fome de sua
acompanhante angústia de morte. Quando a fome é
representada como “mera” fome, e não como morte,
ela se torna tolerável e pode ser integrada”.

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Relação Mãe-bebê:

Quando a mãe interpreta o choro ou desconforto do


bebê apenas como fome e lhe oferece alimento para
aplacar esta angústia, deixa uma marca neste bebê,
informando que todas as más sensações podem ser
resolvidas com comida.
Este comportamento irá interferir também na
aprendizagem dos mecanismos de reconhecimento da
saciedade.

Aspectos psicológicos subjacentes à obesidade

Obesidade também pode ser entendida como uma defesa psicológica ou


reação a um evento estressante.
Obesidade reativa – resposta a uma situação crítica traumática que mobilize
sentimento de desproteção e vulnerabilidade, sendo a comida experimentada como
objeto “tranquilizador” (por exemplo, as ‘comfort foods’).

Gordura como capa protetora: “Eu me sinto um guerreiro, e


minha gordura é como uma armadura muito pesada, mas frágil
ao mesmo tempo. Eu estou batalhando, mas não aguento mais
meu próprio peso. Preciso entender, porque essa armadura?”.

Obesidade X Afecções psicológicas:

Não há consenso se a obesidade é causa ou consequência de afecções


psicológicas (depressão, ansiedade, dentre outras).

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“Provavelmente, a obesidade em si seja uma expressão através do corpo de
algo que realmente não pode ser expresso pela via da fantasia e nem pela do
pensamento ou da linguagem” (LOLI, 2000, p.78).

As implicações da obesidade para a saúde física:

A obesidade possui etiologia multifatorial - os impactos do excesso de gordura


no corpo traz prejuízo para diversos sistemas do nosso organismo. São as chamadas
“comorbidades”, ou seja, as doenças secundárias associadas à doença crônica da
obesidade.

As implicações da obesidade na saúde social:

Além das implicações na saúde física, a obesidade irá atingir as esferas sociais e
psíquicas do sujeito. As considerações feitas até o momento sobre a etiologia da
obesidade nos possibilitam desconstruir o estigma que cerca o obeso, frequentemente
visto como alguém incapaz de se controlar, preguiçoso e responsável por sua própria
doença.
Observa-se nestes pacientes uma dificuldade de transformar conhecimento em
prática, o que pode gerar nos profissionais que o atendem um sentimento de
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impotência e até mesmo de raiva frente ao cliente que, no seu entender, não se
empenha em colaborar com o tratamento.
Atualmente, vivemos em uma sociedade que privilegia o símbolo e que coloca
como padrão o corpo magro. Somos constantemente confrontados com a imagem de
um corpo ideal, magro e saudável, que não comporta qualquer tipo de falha. Os
avanços tecnológicos da medicina e da farmacologia parecem ter deslocado este ideal
como algo possível e atingível a todos, como se o corpo perfeito, utopicamente sem
falhas, dependesse apenas de esforço e vontade: a perfeição está logo ali.

Neste contexto, o obeso, com seu corpo de grandes


dimensões, encarna o excesso ao colocar-se na contramão dos
ideais sociais exigidos; carrega o estigma de preguiçoso, de
incapaz, de descontrolado. O corpo excessivamente visível do
obeso denuncia assim sua humanidade, em oposição à imagem
quase mítica das modelos nas passarelas: o obeso expõe suas
“falhas”.

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O estigma que acompanha a obesidade tem grande impacto para a organização
da identidade do obeso, já que a construção identitária se dá também na relação com
o outro, na forma que o outro reage ao seu corpo.

O impacto da suposta deformação do


caráter do obeso, implícito no discurso social e
na medicina, deixa marcas na identidade do
sujeito, podendo excluí-lo do ambiente social.
É frequente que os obesos sintam-se culpados
por sua doença, envergonhados de sua
dificuldade de autocontrole e são postos em
tal situação que, ao mesmo tempo em que
sofrem discriminação, são induzidos a
sentirem-se merecedores dela.

Existem pesquisas que apontam que obesos encontram maiores dificuldades


afetivas e profissionais, bem como uma prevalência de quadros ansiosos e depressivos
entre os obesos mórbidos.

As implicações da obesidade na saúde psicológica:


O processo de subjetivação é fortemente influenciado por nossas relações,
sejam elas intrafamiliares ou sociais. Estar inserido em uma cultura que culpabiliza e
estigmatiza o sujeito obeso inscreve uma marca profunda em sua
subjetividade/identidade.

O que sentimos e pensamos a respeito de nós mesmos influencia nossas


relações sociais e é influenciado por elas. A condição física do obeso e suas
consequentes avaliações sociais negativas repercutem em uma autoimagem negativa.
Faz-se necessária a compreensão dos significados atribuídos à obesidade e ao
ser obeso para apreender a sua influência na organização subjetiva. Traremos alguns
exemplos sobre a condição de ser obeso, baseando-nos nos casos clínicos atendidos
pela psicóloga e descritos na literatura.

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O significado de ser obeso

Em nossa experiência, a obesidade é sempre


vivenciada pelo obeso como uma experiência ruim,
com diversos impactos na vida cotidiana.

A própria dimensão corpórea do obeso traz complicações que o afasta da ideia


de “normalidade” prevalente em nossa sociedade.

“Eu nunca fui um cara realizado, assim, de poder ir a


qualquer lugar e comprar roupa, de não ser
observado como um cara obeso. Nunca fui. Outro
exemplo: cruzar as pernas: eu nunca tinha conseguido
cruzar mais que isso aqui, olha. Hoje eu cruzo as
pernas. E isso são só alguns exemplos, porque o fato é
que ser obeso é uma droga!”

“Você sabe o que é ter que ir numa loja só pra gordo porque você não
cabe numa roupa normal? Ter que entrar pela porta de trás do ônibus
porque não passa na catraca como uma pessoa normal? Ficar em pé
porque não sabe se a cadeira não vai quebrar com o seu peso e ficar
com dor, mas a dor é menor que a humilhação de quebrar uma
cadeira de gente normal. É isso, é tanta coisa ‘normal’ que a gente
não pode fazer que eu me sinta uma aberração, um monstro”.

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“Quando você é gordo você perde as coisas mais básicas.
Não consegue amarrar um sapato, não consegue nem se
lavar direito. Sexo então, deus me livre! Eu queria sair mais
de casa, mas tenho muita vergonha”.

Esta vergonha e a dificuldade de se engajar em


certas atividades (caminhadas, por exemplo) trazem
frequentemente o isolamento social, o que pode iniciar
ou agravar um quadro depressivo.

Muitos pacientes apresentam tendência a não revidar agressões, adotando


uma postura mais passiva e “engolindo tudo”, o que por vezes pode se expressar na
forma de uma agressividade direcionada para si mesmo.

Observa-se ainda nestes pacientes uma relação muito peculiar com a comida,
muito dependente das emoções, podendo o alimento ocupar lugar de “válvula de
escape”, de gratificação substitutiva (“meu único prazer é comer”), de gratificação,
companhia ou mesmo forma de expressão desta agressividade voltada para si mesmo,
uma espécie de mecanismo de autodestruição.

“Eu sei que no momento que estou comendo um prato de


salgadinhos fritos estou contribuindo pro prejuízo da
minha saúde... Sei que é péssimo pra minha pressão e que
obeso morre mais cedo que a população geral... E, mesmo
assim, eu não consigo parar de comer... Eu não consigo me
controlar”.

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Não me resta muita coisa na vida... Aí eu como. Como
bastante, como qualquer coisa. Meu jeito de me machucar é
pela comida, eu como até doer, como até sangrar minha boca,
às vezes até passar mal, não consigo nem me mexer, tenho
que deitar e ficar imóvel. Eu não preciso me matar, eu não
quero morrer, mas assim eu me machuco aos pouquinhos”.

Intolerância à frustração e dificuldade de adesão ao tratamento

A comida traz uma satisfação imediata, e a prevalência desta satisfação em


vários casos aponta para uma dificuldade de lidar com a frustração, o que faz com que
alguns obesos operem em um sistema de “tudo ou nada”, o que pode dificultar a
adesão ao tratamento da obesidade e aumentar a sensação de descontrole, tão
comum nesta população.
“Nestas pacientes, quando fazem algo errado dentro do que estabelecem como
dieta (por exemplo, comer um bombom), o erro acaba por desencadear a compulsão
alimentar através do seguinte raciocínio: ‘já quebrei a dieta mesmo, vou comer
desenfreadamente’; ou seja, não conseguem lidar com a condição de uma falha, é o
tudo ou nada, acreditam que ou é o perfeito ou não é possível prosseguir em dieta”
(LOLI, 2000, p. 96).

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Obesidade X Normalidade:

O obeso não se sente normal pelos parâmetros de nossa sociedade e tal vivência
traz diversas formas de sofrimento psíquico.

A consciência de que seu descontrole alimentar foge


dos padrões de normalidade pode levar ao hábito de
comer escondido, seja por vergonha ou por uma
voracidade expressa na vontade de não dividir a comida
com outras pessoas.

“Eu comia de um jeito diferente de todo mundo, eu comia tudo


o tempo todo. Não era normal, mas eu não conseguia fazer
diferente”.

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“Agir feito gordo é assim: é você ter uma caixa de bombons,
enfiar a caixa de baixo do braço e quanto não tem ninguém em
casa, sentar no sofá pra comer sozinha e não ter que dividi-la
com ninguém”.

“Uma vez eu comecei a comer e quando vi tava com a boca toda


sangrando, não sei se mastiguei minha boca, se arrebentei minha
gengiva, nem sei. Só sei que demorei um tempão pra perceber o
gosto de sangue, isso não pode ser normal”.

“Eu às vezes me sinto que nem um drogado sabe? Fico ‘na


fissura’ pra ir comprar comida, vou meio de cabeça baixa
pensando que todo mundo tá me olhando e pensando ‘por isso
que é gordo desse jeito’! Depois eu vou pra casa e como bem
rápido, duas ou três mordidas e já comi tudo, como até no
banheiro pra não ter encheção de saco”.

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As indicações para a Cirurgia Bariátrica

O caráter multifatorial da obesidade torna seu tratamento mais complexo e nos


alerta para a necessidade de superar a compreensão tradicional da obesidade como
uma doença a ser eliminada a qualquer custo, buscando compreendê-la como uma
expressão de um sofrimento psíquico, na qual se expressa a singularidade de um
sujeito, cuja relação com o comer revela a forma como ele se relaciona consigo e com
o mundo.

Terapêutica

No entanto, a obesidade, como doença crônica, traz vários prejuízos à saúde física,
social e mental. Até o presente momento, as principais abordagens de tratamento
existentes são:
a) controle da dieta;
b) aumento da atividade física;
c) intervenção medicamentosa;
d) intervenção psicoterapêutica;
e) intervenção cirúrgica.

Controle da dieta

Embora eficazes para a manutenção de um peso saudável, para a tratativa da


obesidade relevante, sobretudo a mórbida, é necessária a prescrição de dieta
altamente hipocalórica.
Uma revisão de literatura (BENEDETTI, 2003) aponta a tendência a recuperar peso
quando empregado apenas a dieta alimentar; outros estudos indicam que os longos
períodos de restrição alimentar dispõem esta população a compulsões alimentares
que tendem a piorar o quadro (“efeito sanfona”).

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B) Aumento da Atividade Física

Destacamos que, isoladamente, a atividade física não garante o


emagrecimento, devendo ser associado à reeducação alimentar. Em obesos mórbidos,
as dificuldades respiratórias, a falta de mobilidade e presença de doenças articulares
são obstáculos para o emprego da atividade física como tratamento principal.

C) Intervenção medicamentosa

O tratamento medicamentoso ainda é bastante controverso. Atua em três


possíveis frentes: anorexígenos (diminuem o apetite e a ingestão alimentar),
termogênicos (aumentam o gasto energético) e disabsortivos (afetam a partição de
nutrientes ou seu metabolismo).

Ainda que possivelmente eficazes tais medicamentos


possuam grandes limitações, como, por exemplo, os
efeitos colaterais, sobretudo no uso em longo prazo
(necessário para tratamento da obesidade crônica).

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Tabela 1 – Características dos medicamentos para o tratamento da obesidade

Mecanismo de Ação Efeitos Colaterais Nome Comercial


Catecolaminérgicos
Fantermina Diminui a ingestão Boca seca, insônia, USO NÃO
alimentar por taquicardia, ansiedade RECOMENDADO
mecanismo
noradrenérgico
Fenproporex Diminui a ingestão Boca seca, insônia, USO NÃO
alimentar por taquicardia, ansiedade RECOMENDADO
mecanismo
noradrenérgico
Anfepramona Diminui a ingestão Boca seca, insônia, USO NÃO
alimentar por taquicardia, ansiedade RECOMENDADO
mecanismo
noradrenérgico
Mazindol Diminui a ingestão Boca seca, insônia, USO NÃO
alimentar por taquicardia, ansiedade RECOMENDADO
mecanismo
noradrenérgico e
dopaminérgico
Fenilpropanolamina Atua aumentado a ação Sudorese, taquicardia, USO NÃO
adrenérgica eventualmente RECOMENDADO
aumenta a pressão
arterial
Serotoninérgicos
Fluoxetina Inibição da receptação Cefaleia, insônia, Prozac
da serotonina ansiedade, sonolência
e diminuição da libido
Sertralina Inibição da receptação Cefaleia, insônia, -
da serotonina ansiedade, sonolência
e diminuição da libido
Serotoninérgicos e Catecolaminérgicos
Sibutramina Inibição da recaptação Boca seca, Reductil, Plenty
da serotonina e da constipação,
noradrenalina, central taquicardia, sudorese,
e perifericamente, eventualmente
diminuindo a ingestão aumento da pressão
e aumentando o gasto arterial
calórico
Termogênicos
Efedrina Agonista adrenérgico Sudorese, taquicardia, USO NÃO

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eventualmente RECOMENDADO
aumento da pressão
arterial
Cafeína Aumento da ação da Gastrite e taquicardia USO NÃO
noradrenalina em RECOMENDADO
terminações nervosas
potencializando o
efeito da efedrina
Aminofilina Aumento da ação da Gastrite e taquicardia USO NÃO
noradrenalina em RECOMENDADO
terminações nervosas
potencializando o
efeito da efedrina
Inibidor da absorção intestinal de gorduras
Orlistat Atua no lúmen Esteatorréia (diarreia Xenical
intestinal inibindo a gordurosa),
lipase pancreática que incontinência fecal,
é uma enzima interfere na absorção
necessária para a das vitaminas A, D, E e
absorção de K.
triglicerídeos

D) Intervenção Psicoterapêutica

Atuam de duas maneiras: foco na mudança de comportamentos e hábitos de


vida; buscam compreender o significado e a historicidade da obesidade na vida deste
paciente, resinificando suas relações e proporcionando mudanças.
A principal limitação da intervenção psicoterapêutica é a questão do tempo,
por se tratar de um processo contínuo, que não tem por objetivo a perda rápida e
acentuada de peso.

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E) Intervenção Cirúrgica

Pelas dificuldades encontradas para o tratamento clínico da obesidade mórbida, a


cirurgia bariátrica surge, então, como o principal tratamento para a perda de peso
substancial e duradoura que a medicina oferece atualmente.
De acordo com Oliveira, Linardi e Azevedo (2004), as cirurgias bariátricas (CB) ou
antiobesidade podem ser divididas didaticamente em três categorias: os
procedimentos restritivos, que diminuem a capacidade do estômago; os mal
absortivos, que modificam a digestão; ou os mistos, uma combinação de ambas as
técnicas.

Requisitos médicos

É preciso realizar uma avaliação global do paciente candidato a CB. Os critérios


médicos que devem ser atendidos são:
IMC maior que 40 kg/m² ou IMC acima de 35 kg/m², associado com doenças
com, no mínimo, cinco anos de evolução e que melhorem com a perda de peso, como
diabetes melito e hipertensão arterial, doenças osteoarticulares (principalmente de
membros inferiores), apneia do sono, histórico de falha de tratamentos conservadores
prévios e ausência de doenças endócrinas como causa da obesidade (Oliveira et al.,
2004, p. 200).

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Requisitos Psicológicos

A Avaliação Psicológica (AP) é obrigatória para a


realização da CB. Os objetivos principais da AP são
observar a motivação, aceitação e conhecimento sobre os
riscos da cirurgia; avaliar a presença de contraindicações
psíquicas; evidenciar a disponibilidade para mudanças e a
capacidade de aderência às orientações médicas e
nutricionais pós-cirúrgicas.

Contraindicações psíquicas?

 São consideradas contraindicações psíquicas:

 Dependência de álcool ou drogas ilícitas;

 Doenças psiquiátricas graves sem controle;

 Pacientes com limitações intelectuais significativas sem apoio familiar


adequado;

 Pacientes com dificuldades de compreender os riscos, benefícios e mudanças


de vida requeridos com a CB sem apoio familiar adequado.

Sinais de Alerta

Alguns quadros, embora não configurem contraindicações, podem sinalizar


dificuldades no pós-operatório, diminuindo a adesão às orientações da equipe, a
probabilidade de sucesso na cirurgia, devendo ser sinalizados para o paciente com o
objetivo de aumentar a adesão no acompanhamento pós-cirúrgico.
 Histórico de transtornos alimentares, incluindo o Transtorno de Compulsão
Alimentar Periódica (TCAP);

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 Histórico de abuso de álcool e drogas ou histórico de comportamentos
compulsivos (compras, jogos, sexo, dentre outros);
 Transtornos de personalidade acompanhados por uma equipe especializada;
 Pouca motivação para a mudança – por exemplo, indisponibilidade para
efetuar mudanças no seu estilo de vida antes da CB.

Avaliação Psicológica

Momento de propiciar ao paciente breves reflexões sobre suas decisões para


que a CB não seja um ato de impulsividade (LOLI, 2007).
A AP é um processo de coleta de dados e interpretação de informações a
respeito dos fenômenos psicológicos, utilizando de estratégias diversas – métodos,
técnicas e instrumentos.
Avaliação Psicológica (AP) - MACHADO E MORONA, 1997:

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA É AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA NÃO É


Um processo dinâmico. Um trabalho mecânico.
Um processo global de conhecimento do outro. Somente avaliar determinadas
características.
Um processo científico. Sinônimo de aplicação de testes.
Um trabalho especializado. Um processo simples e rápido.
A obtenção de amostras do comportamento (em Um conhecimento definitivo sobre o
um determinado momento). comportamento observado.

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O objetivo neste primeiro momento é compreender a história do paciente, o
significado de seu engordar e suas estratégias de enfrentamento para as dificuldades
que imergirão no período pós-cirúrgico;
As perguntas-chave são:
 A quais recursos o paciente poderá recorrer quando impossibilitado de comer
em excesso como via de resolução de seus problemas?
 Ele será capaz de se ater às orientações médicas e nutricionais?

É um momento de observar a estabilidade emocional do paciente, sua capacidade


criativa de lidar com as mudanças rápidas que a cirurgia impõe. Também pode ser um
momento de avaliar as expectativas e motivações relacionadas à CB.

Psicólogo não é juiz!

A AP é apenas um dos laudos que serão levados em


consideração no momento de decisão pela CB, decisão
esta que o paciente tomará em conjunto com o cirurgião.

“As informações fornecidas ao médico farão parte de um todo maior e, nesse


caso, entendo que cabe ao médico a decisão final sobre a indicação ou não de cirurgia;
só ele terá em mãos todas as informações necessárias, além de ser o profissional
competente para avaliar tecnicamente todas as informações colhidas por todo o
processo pré-cirúrgico” (FRANQUES; LOLI, 2006).
É o cirurgião que irá avaliar os riscos e benefícios envolvidos em cada caso;
cada profissional apresentará sua visão, compondo, portanto, uma visão global de
cada paciente em sua especificidade.

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A metáfora do cristal:

“ Assim como uma corda ou um cristal, que, quando submetido a uma pressão

específica, romper-se-á em seus pontos de maior fragilidade funcionam assim também

os nossos arranjos emocionais ” .

Trazer estes pontos de fragilidade à consciência ajuda o candidato a CB a estar


atento a eles e criar ferramentas e possíveis formas de enfrentamento.

A possibilidade de “ver o inimigo”:


O marido de uma paciente de Loli (2007) faz uma comparação do
acompanhamento psicológico pré-operatório com o filme Monstros S.A. (Disney-
Pixar).
“Um dos monstros era atacado por um inimigo invisível.
Ao ser atacado por esse inimigo que não se enxergava
não se sabia quando tomaria um murro na cara, quando
seria puxado pelas pernas, quando levaria um soco no
estômago... E apanhava a todo o momento...”.

“... Porém, quando um amigo lança um ovo e o quebra sobre o corpo do inimigo
invisível, este se torna algo possível de ser localizado e, assim, pode atacá-lo em cheio.
Você lançou ovos sobre alguns dos problemas da minha esposa nos possibilitando
permanecer atentos para eles e não sermos surpreendidos por eles”.

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A Psicologia na preparação e acompanhamento perioperatório na
CB

O papel do psicólogo na equipe de cirurgia bariátrica

Anteriormente foi descrita a atuação do psicólogo no momento de tomada de


decisão a respeito da cirurgia bariátrica: a avaliação psicológica. Este momento é de
curta duração e possui um tempo limitado (aproximadamente 6 a 8 encontros), bem
como o psicólogo deve se haver com as limitações de sua atuação nesta fase.
A avaliação psicológica é diferente do
acompanhamento pré-cirúrgico – embora algumas
questões possam ser superficialmente trabalhadas no
momento da AP, o acompanhamento do paciente no
momento pré-operatório é mais intenso, constante e
profundo, com o objetivo de preparar o paciente para as
mudanças, muni-lo de informações, alertá-lo para suas
possíveis dificuldades, trabalhar suas expectativas e
idealizações.

O psicólogo dispõe de possibilidades de atuação em todas as etapas da cirurgia


bariátrica – pré-operatório, pós-operatório imediato (ainda no hospital), pós-
operatório mediato (primeiros seis meses) e pós-operatório tardio (seis meses a dois
anos, podendo prolongar-se indefinidamente).
Por motivos didáticos, iremos abordar separadamente os principais aspectos
trabalhados em cada uma destas fases e como este trabalho pode impactar o
resultado (positivo ou negativo) da Cirurgia Bariátrica (CB).
Inicialmente, iremos refletir sobre os aspectos relativos à preparação para a CB
(após a etapa de avaliação) e ao pós-operatório imediato, referente à saída do centro
cirúrgico e ao primeiro mês de recuperação.

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O acompanhamento pré-operatório: momento de orientação

Os momentos que antecedem a CB são marcados pela ansiedade e por grande


expectativa com relação ao procedimento. Grande parte dos pacientes vê na CB uma
espécie de “milagre”, um “último sacrifício” ou mesmo “a última chance de recuperar
a vida”.

Cabe ao psicólogo trabalhar as expectativas do


paciente e fornecer a ele as informações necessárias,
esclarecendo dúvidas e buscando desmitificar o “poder
mágico” da cirurgia.
É importante que o paciente tenha em mente que a cirurgia é uma ferramenta no
processo de perda de peso, e não uma solução mágica para todos os problemas da
vida. O sucesso da cirurgia depende do paciente e da sua capacidade de empreender
mudanças.
Despertar a consciência do paciente e sua responsabilidade por suas escolhas é
uma das ferramentas mais importantes para um pós-operatório de sucesso – cabe
destacarmos que responsabilidade é diferente de culpa; como vimos o obeso não deve
ser visto como culpado por sua condição, mas adotar uma postura ativa diante de suas
escolhas.
Outro aspecto importante é avaliar como o paciente lida com as perdas e
frustrações, e, caso sua via principal de lidar com os problemas seja por meio da
alimentação, buscar novas ferramentas de apoio – o que pode aumentar o
engajamento do paciente no acompanhamento pós-cirúrgico.
Reconstruir junto com o paciente a história de sua obesidade e de sua relação com
a comida possibilita uma observação de suas escolhas de vida, possibilitando que ele
se responsabilize por suas escolhas e se comprometa com a adoção de um novo estilo
de vida.

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O acompanhamento pré-operatório: momento de mudança

Uma forma de engajar o paciente e avaliar sua motivação para mudanças é


propor mudanças de estilo de vida no momento que antecede a cirurgia, como, por
exemplo, inserir o café da manhã, observar a quantidade e qualidade dos alimentos
escolhidos, suas emoções e o ambiente no qual realiza suas refeições.

A observação do ambiente é muito importante para preparar o paciente para o


surgimento de novas sensações após a cirurgia, como vômitos ou entalamentos,
geralmente decorrentes de mastigação inadequada ou por comer rápido demais,
distraído por conversas ou televisão, dentre outros.

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A aliança com o nutricionista responsável aqui é vital:
orientar o paciente a mastigar melhor seus alimentos, a reservar
tempo adequado para alimentação e prestar atenção em sua
própria alimentação pode prevenir ou diminuir a ocorrência dos
vômitos e entalamentos pós-cirúrgicos.

“Minha rotina é muito corrida... Eu preciso estar no trabalho


muito cedo, não dá tempo de comer nada. Nem mesmo no
almoço, às vezes eu como durante o trabalho mesmo. Sei que não
devia, mas como é que eu vou parar?”.

Não se mostrar disposto a mudanças antes da CB é um sinal de alerta; devemos


incentivar e reconhecer os progressos do paciente na direção de um estilo de vida
menos mórbido e mais saudável.
Muitas vezes, é recomendado ao paciente a perda de determinada
porcentagem de peso antes da cirurgia. As dificuldades que irão emergir neste
momento devem ser acolhidas pela equipe e trabalhadas em conjunto com o paciente,
visando o sucesso do procedimento cirúrgico.

Transtornos alimentares e cirurgia bariátrica

Os transtornos alimentares (TA) são transtornos psiquiátricos que afetam, na sua


maioria, adolescentes e adultos jovens do sexo feminino, podem levar a grandes
prejuízos biológicos e psicológicos e ao aumento da morbidade e mortalidade.
Observar a existência de transtornos alimentares também é importante,
alertando o paciente para os impactos destes transtornos após a cirurgia. Pacientes
com histórico de bulimia, por exemplo, podem apresentar maior incidência de vômitos
após a CB com consequente diminuição da qualidade de vida, possibilidade de reganho
de peso e de complicações nutricionais.

30
A tendência à grandes períodos sem se alimentar pode acarretar picos de
hipoglicemia após a cirurgia, bem como complicações nutricionais. A preparação para
a cirurgia deve, então, orientar o paciente a alimentar-se em intervalos constantes.
Pesquisas associam a presença de TCAP no paciente candidato à CB com
possível reganho de peso e surgimento de comportamentos compulsivos após a
cirurgia.

O pré-operatório imediato: momento de ansiedade

A opção pela cirurgia traz um conflito ao paciente: com esperança de começar


uma “vida nova” após a cirurgia, ele deve enfrentar a possibilidade de morrer ao
submeter-se à cirurgia.
Os pacientes internados frequentemente sentem um misto de ansiedade e
esperança, além da ameaça à sua integridade, confrontando-se com a sua
mortalidade, medo da dor, insegurança com relação à sua escolha, dentre outras
angústias.
O medo cirúrgico mistura-se com o medo de passar sede e fome e diversos
questionamentos sobre a sua escolha. A cirurgia constitui um marco importante em
sua história, vivenciado como um “renascimento”. Neste momento, a presença de
membros conhecidos da equipe pode ajudar o paciente a se sentir seguro e acolhido.

“É muito duro pensar que pra viver, primeiro você tem que
morrer”.

“Eu estava apavorada com a possibilidade de morrer, mas pra


viver assim eu não aguentava mais, então me joguei de cabeça, é
quase como um suicídio... Tipo roleta-russa, arriscar querendo
viver”.

31
“O dia seguinte da cirurgia foi meu pior dia. Só conseguia chorar
e pensar que eu ia ter que parar de comer pelo resto da vida.
Ficava pensando, o que eu fiz? Era uma sensação de que eu
podia ter feito mais... É uma sensação de fracasso, sabe? Eu
achava que tava passando por aquilo porque tinha fracassado,
como se se eu tivesse força de vontade não ia precisar ter feito
algo tão radical. Mas aí já tinha feito né, tinha que me adaptar.
Mas que deu medo, deu.”

A saída do hospital: momento de recomeço

Após a saída do centro cirúrgico, o paciente passa por três fases:

 A constatação de que sobreviveu a cirurgia;

 Recobrar o estado de alerta;

 Sentir as incisões.

Alguns pacientes vivenciam sensação de desamparo e arrependimento no


momento da internação (“Eu era só gordo, o que é que eu fui fazer?”). O apoio do
psicólogo neste momento auxilia o paciente a se responsabilizar por sua escolha e
enfrentar as consequências dela, escutando suas angústias, ansiedades e temores.
Martinez e Renteria (2005) destacam os aspectos a serem trabalhados nesta fase:

 Transtornos do estado de ânimo (depressão, mania, ansiedade);

 Transtornos do sono;

 Preocupação por desconforto físico (dores, medo de “desfazer a cirurgia” ao se


movimentar ou ao se alimentar).

32
A saída do hospital e entrada na dieta
líquida, ainda que acompanhada de
ansiedade e frustração pela restrição
alimentar, traz também o início do
emagrecimento, fase que costuma ser
bastante motivadora para os pacientes.

A dieta líquida – momento de reaprender

A dieta inicial do pós-operatório é vivenciada por muitos pacientes como um


retorno a uma fase inicial da infância, uma possibilidade de reaprender a comer,
redefinir sua relação com a alimentação.
Neste momento, a privação alimentar e a vontade de mastigar são percebidos
como as maiores dificuldades pela maioria dos pacientes, ainda que não haja a
sensação física da fome.

“Os primeiros dias são os mais difíceis por causa da


vontade de mastigar. Você não tem noção a angústia que
é ver comida e ter que passar na peneira, não poder
mastigar nadinha. Eu coava a sopa chorando, olhando
para as batatas e chorava”.

“No primeiro mês é aquele negócio de líquido. Aquilo é


uma coisa que você não tá mais aguentando olhar.
Então eu acho que a gente chega ao extremo do limite
da gente em tudo. Vai ao extremo. Você pensa que
chegou ao limite, mas vai mais um pouquinho. É onde
você trabalha tudo”.

33
O retorno à alimentação

Passada essa fase inicial, a maior liberdade para a


alimentação marca o real início do aprendizado de novos
hábitos alimentares. É uma fase na qual os pacientes
passam a testar os limites do novo estômago, conhecem
novas sensações (boas e ruins) e descobrem que
alimentos fazem “bem” ou não. Inicia-se então um
período de adaptação à nova condição de vida.

A realidade da cirurgia bariátrica

Diferente de outros procedimentos cirúrgicos, a cirurgia bariátrica é uma


modificação para a vida toda. Após o período inicial de recuperação e descoberta dos
novos limites, é preciso que o paciente se adapte a sua nova condição, que irá durar o
resto de sua vida.

O emagrecimento sob uma perspectiva psicológica

A psicologia reconhece os benefícios da perda de peso para a saúde física e


mental, mas vê com ressalvas a rapidez que este processo ocorre após a cirurgia
bariátrica.
Algumas linhas da psicologia entendem a obesidade como uma manifestação
sintomática de uma psicopatologia latente, e a eliminação deste sintoma em alguns
casos pode acarretar em outros sintomas, se não houver o acompanhamento
adequado.

34
“Eu sempre fui muito de comer doce. Logo depois da
cirurgia, percebi que cada vez que eu comia doce eu
passava muito mal, parecia que ia morrer. Mas descobri
que com vinho eu não passava mal... E quando vi tava
tomando duas garrafas de vinho toda noite”.

Outra preocupação da psicologia é relativa à imagem corporal, destacando que


o emagrecimento não garante uma imagem corporal positiva, já que esta é uma
construção psicológica que não tem, necessariamente, relação direta com a realidade
objetiva.

No caso da CB, a mudança da estrutura do corpo não é sempre acompanhada


por uma modificação da imagem corporal. Alguns pacientes retém de si mesmos uma
imagem de sobrepeso, denominada como “gordura fantasma”; outros pacientes
perdem a noção de seu tamanho momentaneamente, já que a autoimagem é
elaborada com o passar do tempo.

35
“Eu perdi metade do meu peso nos primeiros meses. Sabe
qual foi minha sensação? Que eu tinha perdido metade
de mim. Foi como chegar em casa e perceber que metade
da minha casa tinha desmoronado não tava mais lá.
Levei um tempo pra me acostumar.”

“Vou te falar uma coisa, comprar roupa ainda é uma dificuldade


pra mim. Eu chego na loja e nunca sei que tamanho pedir. Peço
um tamanho que acho que é e a roupa fica gigante. Olho a
roupa fora do corpo e parece roupa de criança, e quando visto,
serve. Não que eu esteja reclamando, mas é estranho. Eu olho
uma coisa no espelho e não sei se o que eu vejo é o que os outros
estão vendo.”

Em suma, o processo de adaptação é lento, mas as alterações impostas pela


cirurgia exigem uma grande capacidade de adaptação para situações novas, uma
demanda de mudança em condutas sedimentadas por anos, muitas vezes por uma
vida inteira.

“Mudando o tamanho do corpo, mudam também as


aptidões do indivíduo, o jeito de se relacionar com o
mundo e consigo próprio, mas o simples fato de ter um
corpo mais magro não garante que esta relação seja
qualitativamente melhor”.

É preciso que o paciente aprenda a lidar com as novas situações de seu


cotidiano, redefinir sua maneira de lidar com os problemas.

36
A capacidade de adaptação está orientada para o futuro, ou seja, a atenção e as
expectativas voltam-se para as recompensas que podem ser obtidas – neste contexto,
a expectativa do obeso em relação aos benefícios que o emagrecimento lhe trará tem
papel fundamental no enfrentamento das dificuldades inerentes ao tratamento.

Aspectos a serem trabalhados – período mediato

O período mediato (iniciado após o retorno a dieta sólida e que dura até seis
meses a um ano após a CB) é o momento de maior perda de peso e também de
maiores transformações, o que traz diversos aspectos a serem trabalhados junto ao
paciente.

Martinez e Renteria (2011):

Insegurança sobre as Começa uma nova Tolerância à Reconhece a


mudanças futuras relação consigo frustração inconformidade que
mesmo e com o sentia pela
mundo discriminação
Diminui a ansiedade Aprende a ficar cheio Aprende a Percebe se se sente
e vazio reconhecer a satisfeito ou
sensação de fome insatisfeito
Aprende a impor Aceita a nova Preserva o bem Maior
limites à comida imagem corporal dentro de si mesmo responsabilidade
O afeto deve ser Satisfaz-se ao se dar Promove mudanças Medo de ganhar peso
separado do conta de que pode de hábitos ou mesmo de não
alimento ser capaz de perder emagrecer
peso

37
Momento de adaptação

Este momento é vivenciado por muitos pacientes com certa euforia, uma espécie
de “lua de mel”. A acentuada perda de peso reduz/compensa a percepção das
dificuldades inerentes ao processo.
É marcado pela melhora da qualidade de vida, diminuição ou eliminação das
comorbidades, melhora das relações sociais e da autoimagem.

“Eu não fui operado pra ficar diferente. Eu era diferente e fui
operado pra ser normal”.

“Minha expectativa em relação à cirurgia? Eu queria chegar a


dois dígitos como qualquer pessoa normal. Queria chegar num
supermercado e comprar uma cueca, ir a qualquer lugar que eu
quisesse passar pela roleta de um ônibus... Tudo isso foram
coisas que eu imaginei”.

Alguns pacientes utilizam objetos externos para mediar sua capacidade


alimentar, comendo em pratos de sobremesa, medindo líquidos ou mesmo
“decorando” a quantidade que conseguem comer sem passar mal. Tais ferramentas
proporcionam melhor qualidade de vida, já que a percepção da qualidade de vida para
grande parte dos pacientes relaciona-se diretamente com o ‘parar de vomitar’.

“Hoje eu como de tudo e não vomito, mas eu tenho meu limite.


Chegou naquele ponto eu sei que tenho que parar. Não adianta
querer tomar um copo inteiro de suco, é sempre metade. Se vou no
restaurante por quilo, sei que é no máximo uns 300g. Às vezes me
empolgo e faço um pratão, mas aí é minha cabeça que tá mandando,
porque a cabeça leva mais tempo pra gente mudar”.

38
A “cabeça de gordo”

Para alguns pacientes, “pensar como gordo” inclui


os comportamentos de comer além do limite, comer
muito depressa, tender ao descontrole e “comer com os
olhos”.

Os desvios que prejudicassem o ajustamento às imposições da cirurgia são


caracterizados como resquícios de pensamentos ou comportamentos ainda não
dominados. A “cabeça de gordo” remete os pacientes à sua forma de agir no período
anterior a CB.

“O negócio é a gente ir se educando. Agora, uma coisa:


eu ainda tenho cabeça de gordo. Tem dia que eu vou num
rodízio e pego tudo. Aí, quando chego na mesa eu falo:
peraí, eu peguei demais, não vou comer tudo isso. Mas
isso só depois que eu chego na mesa”.

39
É importante que a equipe acolha os ‘deslizes’ do paciente sem julgamento.
Não é esperado do paciente perfeccionismo ou adesão ao programa sem eventuais
falhas – quebrar a ideia de “tudo ou nada” é fundamental para uma adaptação ao
novo estilo de vida sem sofrimentos ou angústias excessivas.
Se a “cabeça de gordo” domina os pensamentos e comportamentos do
paciente operado, pode trazer sentimentos de frustração, de fracasso, de vazio e
depressão.
Já nesta fase o medo de engordar e a estabilização do peso podem mobilizar no
paciente uma angústia que o pressiona para o retorno aos “velhos hábitos”, podendo,
por exemplo, adotar o comportamento de “beliscar” o dia todo ou optar por alimentos
calóricos e com pouco valor nutricional.

“Eu nem tenho fome, mas fico o dia todo comendo alguma
coisa. Eu não consigo comer muito de uma vez, mas às vezes
fico duas, três horas na mesa comendo. Estou engordando de
novo e me dá um desespero, porque eu já fiz tudo, já fiz até a
cirurgia e nem isso foi capaz de me controlar... Eu fiz tudo
errado”.

É fundamental que este momento seja vivenciado de forma positiva pelo


paciente, deslocando o prazer de comer (muitas vezes prejudicado pela alteração
fisiológica da cirurgia) para outras atividades, enriquecendo suas relações sociais e,
sobretudo, mobilizando comportamentos de cuidar de si, adotando hábitos saudáveis
de vida.
Várias pesquisas apontam que os pacientes que vão para a cirurgia bem
preparados e informados conseguem lidar melhor com as mudanças de hábitos e
possuem maior aderência ao tratamento com a equipe no pós-operatório, o que
aumenta as chances de sucesso na próxima etapa: o momento de estabilização.

40
A responsabilidade do paciente na perda e manutenção do peso

A cirurgia bariátrica é uma ferramenta para a perda de peso ao incentivar a


adoção de hábitos de vida saudáveis, ferramenta esta que traz bons resultados para a
maioria dos casos e se consolida como a opção mais eficaz para o tratamento em
longo prazo da obesidade mórbida e crônica.
No entanto, a cirurgia é apenas uma ferramenta. O sucesso do tratamento
depende do paciente – a forma como irá utilizar as limitações fisiológicas, a motivação
para adoção de novos hábitos e novo estilo de vida e a disposição para rever e mudar
sua relação consigo mesmo, com o alimento e com os outros.

A CB é uma cirurgia para a vida inteira

A CB é uma cirurgia que demanda um compromisso vitalício com o cuidado de


si: visitas constantes aos profissionais da equipe, acompanhamento psicoterápico e
nutricional, exames, reposição de nutrientes.

Momento de estabilização

Passada a fase de “lua de mel” e de adaptação, o peso começa a estabilizar e o


reforço pelas mudanças implementadas (ou seja, a perda de peso) começa a cessar.
Além disso, o medo – e a possibilidade real – de voltar a engordar mobiliza intensa
angústia em vários pacientes.
A estabilização do peso volta a atenção do paciente para a percepção das
dificuldades do “novo estômago”, como, por exemplo, os desconfortos digestivos.
Alguns pacientes relatam queda na percepção de qualidade de vida após o primeiro
ano de cirurgia, quando param de emagrecer.
Em alguns casos, a diminuição da qualidade de vida é sentida pelo fato de a cirurgia
não ter correspondido às expectativas do paciente, o que reforça a importância de
trabalharmos em conjunto com ele suas expectativas, buscando aproximá-lo do que de
fato a CB pode proporcionar.

41
Expectativas:
Muitos pacientes procuram a CB com a expectativa de resolver problemas de
outras esferas que não o seu peso, acreditando, por exemplo, que sua vida social e
profissional mudará dramaticamente após o emagrecimento.
Ainda que em alguns casos esta mudança se efetue, ela é fruto da mudança de
postura e comportamento do indivíduo, mas não apresenta relação direta com a
cirurgia em si.

Responsabilização:

“Eu fui pra cirurgia achando que tudo na minha vida ia


mudar que eu ia arranjar um namorado que me amasse,
um bom emprego, praticamente que ia estar tudo
resolvido assim que saísse do centro cirúrgico. Já faz oito
anos que eu operei e essas coisas ainda não se
resolveram... Já emagreci e já recuperei quase todo o peso
que eu tinha perdido e ainda continua tudo ruim”.

Neste caso, a paciente não teve o suporte necessário para efetuar as mudanças
em sua própria vida, se mantendo em uma posição de passividade e esperando “que
as coisas se resolvessem por si”.
Entendemos que, por diversos fatores, paciente não conseguiu se
responsabilizar por seu próprio tratamento.
Loli (2000) destaca que alguns pacientes utilizam-se de racionalizações para
explicar o fato de não aderirem aos tratamentos propostos, colocando a culpa “nos
outros” como justificativa para a não adesão ao tratamento.
“Enquanto o obeso continuar neste processo de delegação de sua
responsabilidade de emagrecer para outros, certamente inviabilizará qualquer
tratamento de emagrecimento” (LOLI, 2000).

42
Responsabilização X Culpabilização:

Lembramos que responsabilidade é diferente de culpa: o paciente que não


consegue aderir ao tratamento e se responsabilizar por suas escolhas o faz por
vicissitudes de seu psiquismo.
Cabe ao profissional lidar com sua própria frustração diante do paciente
refratário ao tratamento, acolhendo-o sem julgamento e avaliando individualmente
que mudanças são possíveis naquele momento e o que a equipe pode oferecer.

Aspectos a serem trabalhados no pós-operatório tardio

Neste período (após o primeiro ano da cirurgia), o psicólogo irá trabalhar junto
com o paciente:

 As mudanças em suas relações interpessoais;


 As mudanças em sua autoestima;
 As mudanças em sua aparência física e vida sexual;
 Incentivo à prática de atividades físicas e desejo de continuar com o novo estilo
de vida.

Sucesso cirúrgico?
Por vezes o paciente encontra-se frustrado com os resultados de sua CB.

43
O que é considerado sucesso quando tratamos de
CB?
Em geral, a remissão de doenças metabólicas ou de comorbidades, a melhora na

qualidade geral de vida e a perda de peso que fica entre 60% e 90% do excesso
de peso são índices que marcam o sucesso do procedimento cirúrgico.
Ferramenta para avaliação de resultados

Moorehead (1998) criou uma ferramenta padronizada que auxilia na avaliação


do progresso do paciente operado, o Bariatric Analysis and Reporting Outcome System
(BAROS).
Esta ferramenta inclui não apenas a porcentagem de perda de peso, mas
considera, de maneira padronizada, a melhora das comorbidades e a percepção do
paciente com relação à qualidade de vida, indicando problemas e orientando o
tratamento.

44
É um questionário de auto percepção, no qual o paciente avalia seis aspectos,
em uma escala de 1 a 10.
Os aspectos abordados são:
1. Geralmente eu me sinto...
2. Eu gosto de atividades físicas...
3. Eu tenho relações sociais satisfatórias...
4. Eu sou capaz de trabalhar...
5. O sexo me é prazeroso...
6. O jeito que eu vejo a comida é... (Vivo para comer ou como para viver?).

A percepção do paciente sobre sua própria qualidade de vida é fator de


motivação para aderência ao tratamento.
Tal fator é particularmente importante neste momento, pois o confronto entre
as expectativas e a realidade do tratamento, a possibilidade de reganho de peso e a
consolidação de uma nova identidade (ser magro é diferente de ser obeso) podem
sobrecarregar o paciente e diminuir sua motivação.
A diminuição da motivação e da aderência ao
tratamento traz algumas questões referentes às possíveis
dificuldades enfrentadas pelos pacientes no decorrer do
processo da cirurgia bariátrica. Tais questões servem
como alerta e norteadores para o trabalho da equipe
junto ao paciente.

VENÂNCIO, CONCEIÇÃO E MACHADO, 2011:


1. Procura da CB em um estado sentido como limite, quando é atingido o peso máximo
e o paciente teme o descontrole total;
2. A dificuldade em pedir e aceitar ajuda e fazer o follow-up em consultas de
psicologia, nutrição, só recorrendo aos profissionais em situações de limite;
3. A influência dos acontecimentos de vida no prosseguimento do projeto de perda de
peso;

45
4. Maior preocupação com a perda de peso do que com os padrões alimentares;
5. Ingestão alimentar excessiva e vinculada a estados emocionais intensos;
6. Dificuldades de implementar mudanças no estilo de vida duradouras, devido à
passividade ou dificuldade de organização pessoal;
7. Procura de ajuda para perder mais peso, não na equipe multidisciplinar, mas em
clínicas estéticas ou chás, revelando uma contínua procura por soluções de controle
externo do peso;
8. Atribuição das mudanças apenas à restrição imposta pela cirurgia e não a um maior
autocontrole, o que pode alimentar o medo do descontrole caso “a cirurgia se
desfaça” e reforça a falta de responsabilização pelo seu processo de emagrecimento.

O insucesso da cirurgia

A dificuldade em implicar-se e responsabilizar-se pelas mudanças podem levar


ao insucesso do procedimento cirúrgico.
Este insucesso geralmente é sentido pelo paciente quando há reganho de peso,
queda na qualidade de vida, sentimentos de depressão ou compulsão e dificuldade de
se controlar.
Alguns pacientes mantém a relação mórbida com a comida mesmo após a
cirurgia, “burlando” as restrições fisiológicas de maneiras diversas.
Grazing (comer pequenas quantidades de alimentos em longo tempo);
“beliscar” ao longo do dia; ingerir grandes quantidades de líquidos hipercalóricos;
opção por alimentos hipercalóricos e de baixo valor nutricional.
Vimos que a estrutura psicológica do obeso mórbido coloca-o diante de
grandes dificuldades para lidar com a frustração, resultando em atitudes aditivas ou
depressivas.
Uma rede de apoio capacitada que o auxilie a identificar e elaborar a intensa
carga de afetos, bem como a percepção do elemento compulsivo em sua estrutura
pode ajudar a modificar a culpa pelos seus deslizes em responsabilidade, mantendo o
foco no objetivo principal da cirurgia bariátrica: a facilitação da adoção de novos
hábitos de vida, não mais mórbidos, mas sim, voltados para a qualidade de vida.

46
Recuperando o controle da própria vida: “É muito
complicado... Você tem que se adaptar sempre, à comida,
ao emocional, aos outros, até a você mesmo. E não é
pouco, é uma montanha de coisas e tudo de uma vez,
tudo ao mesmo tempo. Teve dias que eu fiquei
sobrecarregada, dava vontade de largar tudo, até teve
dias que eu comia mais do que devia... Mas uma hora
você percebe que é você que tem que fazer, tem que ver o
que tá acertando e o que tá errando, tem que cuidar de
você, mas cuidar mesmo, não só brigar consigo mesma o
tempo todo. Não adianta querer só que os outros mudem.
A gente tem que mudar também”.

47
As marcas da cirurgia plástica

Sinto-me bonita (?):

“Eu me sinto mais bonita. É muito gostoso pôr uma roupa


e ela ficar bem em você; além de servir, ficar bem em você.
E as pessoas notam. Mas às vezes eu me sinto mais feia
que antes. Eu me sinto mais bonita para as pessoas,
quando eu estou de roupa. Mas, enquanto não faço a
plástica, eu tenho vergonha da pele, de ficar pelada. Então
eu vejo que antes eu não tinha aquele corpo bonito, mas
estava tudo firme, grande, mas firme e isso me afeta”.

O excesso de um corpo anteriormente excessivo:

Quando o peso estabiliza, surge um novo problema: o excesso de pele,


resultante da perda de grande quantidade de peso em ritmo acelerado. O excesso de
pele é motivo de vergonha, descontentamento com o próprio corpo e muitas vezes,
dependendo da magnitude de peso perdido, extrapola a dimensão estética e constitui
empecilho para a mobilidade e para a prática de atividades físicas.

48
“Se eu pudesse, eu apagava todas as fotos de mim
gorda, apagava da memória das pessoas, tudo.
Minhas roupas de gorda já doei tudo. As pessoas
que eu conheço hoje que emagreci, tento nem
contar que eu era gorda, mas às vezes o assunto
surge... Daí eu falo sobre a cirurgia e tudo que
passei. Não me arrependo da cirurgia, mas me
arrependo de ter sido gorda. Queria ter sido
sempre assim, não magra, mas normal. Queria ter
sido sempre normal”.

O corpo “normal”

O desejo de “apagar” a obesidade de sua história entra em conflito com a


realidade do paciente que passou por uma CB. As expectativas de “ser normal” e “ter
um corpo normal” muitas vezes estão próximas de uma idealização.
Estas expectativas irreais com relação ao próprio corpo são condizentes com o
funcionamento psíquico que encontramos com frequência em obesos mórbidos, um
funcionamento “de extremos”, no qual se não é possível ter “um corpo perfeito”, não
é bom o suficiente.
É preciso realizar, junto com o paciente, uma desmistificação da expectativa
referente a sua imagem corporal após a cirurgia, pois um corpo emagrecido tem
diferenças significativas de um corpo que sempre foi magro.
Sem este trabalho, a cirurgia plástica pode ocupar um lugar anteriormente
ocupado pela cirurgia bariátrica: uma “solução mágica”, que irá resolver problemas de
várias esferas.

49
“Eu fui pra cirurgia achando que tudo na minha vida ia
mudar que eu ia arranjar um namorado que me amasse,
um bom emprego, praticamente que ia estar tudo resolvido
assim que saísse do centro cirúrgico. Já faz oito anos que
eu operei e essas coisas ainda não se resolveram... Já
emagreci e já recuperei quase todo o peso que eu tinha
perdido e ainda continua tudo ruim”.

A procura por objetos externos para resolver problemas


internos: “Eu agora tô determinada a fazer uma plástica.
Porque se com a cirurgia bariátrica eu não resolvi meu
problema, a plástica deve resolver. Eu sei que só
emagrecendo eu vou conseguir resolver as minhas coisas,
só emagrecendo que eu vou conseguir me relacionar e
mudar a minha personalidade. Eu sei que eu pensava isso
da cirurgia bariátrica também, que o pote de ouro tava
ali, depois do arco-íris. Mas a plástica o resultado é mais
rápido, né? Assim pelo menos eu vou ter certeza se meu
problema tem solução ou não”.

Expectativa e realidade

A questão da expectativa x realidade da cirurgia plástica guarda semelhanças


importantes com a cirurgia bariátrica. Ainda que (como a própria paciente destacou)
na cirurgia plástica o resultado e a recuperação sejam mais rápidos e demandem um
engajamento menor do paciente, por vezes as cicatrizes do processo cirúrgico são
fonte de frustração para o paciente, se suas expectativas são irreais ou idealizadas.
Magdaleno Jr. (2011) conduziu um estudo com mulheres submetidas à cirurgia
bariátrica e observou repercussões emocionais relacionadas à percepção de que seu

50
corpo, apesar de emagrecido, mantém as marcas da obesidade (flacidez, sobras de
pele e cicatrizes).
“A mesma questão da vergonha que antes era atribuída à obesidade passa
agora a ser articulada com a flacidez, as sobras de pele e com as cicatrizes”
(MAGDALENO JR, 2011).

O autor alerta para o risco de isolamento


nesta fase, pois a desilusão e a perda da sensação
de triunfo sobre a obesidade pode engendrar no
paciente um desinteresse pelo seguimento e
manutenção dos cuidados pós-cirúrgicos.

A cirurgia plástica pode ser benéfica para o paciente operado, desde que este a
encare como mais uma ferramenta para a manutenção de sua qualidade de vida e não
como garantia de felicidade.

É possível se amar sem ser perfeito?

É possível gostar de si, de sua história, em toda a


sua imperfeição?

51
Normalidade

“Já faz cinco anos da minha bariátrica e quase


três da minha plástica, e minha autoestima ainda é
uma montanha russa. Tem dias que eu me arrumo,
escolho uma roupa bonita, saio com meu namorado e
me sinto bem comigo mesma, mas tem dias que cada
marca, cada estria, mesmo a cicatriz da plástica me dá
vontade de me esconder. Mas atualmente eu tô bem.
Ainda tem dias que eu não gosto de mim, mas acho
que é assim pra todo mundo, né? É só mais um
monstro no armário. No final das contas, eu tanto
quis a normalidade, então agora tenho que aceitar
que vida real não tem photoshop.”

52
REFERÊNCIAS:
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