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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica.

Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

CURSO LIVRE DE GRADUAÇÃO


BACHAREL EM TEOLOGIA ECLESIÁSTICA

DISCIPLINA: INTRODUÇÃO A TEOLOGIA

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

1. INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
Assim diz o SENHOR: "Não se glorie o sábio em sua sabedoria nem o forte em sua força nem o
rico em sua riqueza, mas quem se gloriar, glorie-se nisto: em compreender-me e conhecer-me, pois
eu sou o SENHOR e ajo com lealdade, com justiça e com retidão sobre a terra, pois é dessas
coisas que me agrado", declara o SENHOR Jr 9. 23-25 (NVI)

No mundo pós-moderno não se trabalha com verdades absolutas, mas sim com a relatividade de
conceitos. Não há verdade, mas “verdades”. O apelo emocional em muitos casos leva ao
esvaziamento da razão, logo, o mais importante é sentir e não pensar. Neste contexto social,
precisamos entender o que é a Teologia? Qual a sua natureza? Quais suas
fontes? Como tem sido pensada na contemporaneidade? Quais são suas divisões e campos de
trabalho? Quais são suas abordagens? Diante disso, esse estudo buscará trabalhar estes conceitos
fundamentais do estudo da Teologia.

1.1 O conceito de “religião”


Segundo o professor Vilella (2007), Mestre em Filosofia Moral, professor de Filosofia e Filosofia da
Educação na Universidade Guarulhos – SP, afirma que, etimologicamente, a versão mais comum
[sobre sua origem] diz que a palavra religião vem do termo latino religare (religar). Assim,
entendemos à luz da revelação de Deus e da observação sobre a
existência humana, como bem disse Freire (1996) que, a consciência do mundo e a consciência de
si como ser inacabado, necessariamente inscrevem o ser consciente de sua
inconclusão num permanente movimento de busca. Na verdade, seria uma contradição se,
inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse em movimento (p.57,58).
Tal inconclusão e conseqüente movimento de busca, revelam este “religar” do homem na direção
de sua completude. O homem como ser finito, tendo em si, o que Calvino chamou de sensus
religionis (senso da religião) e sensus divinatatus (sendo da divindade) através de suas expressões
religiosas nas mais diversas culturas, busca a volta a suas origens. Desde a queda, onde
aconteceu o “desligamento”, o ser humano busca por meio dos sacrifícios, penitencias,
autoflagelação, boas obras, conhecimento, filosofias, viagens astrais, etc, a busca de seu
“religamento”.

1.2 Racionalidade e Estudo Teológico


Questões problematizadoras:
1. Por que e para que estudar Teologia?
2. É possível equacional o uso da razão com a revelação? Como?
3. O estudo da Teologia nos deixa “frios espiritualmente”, impedindo a ação do Espírito Santo?
4. Como podemos entender esta questão à luz da Bíblia?

Exibição de vídeo: FÉ E CIÊNCIA (RICHARD DAWKINS)


CIÊNCIA FÉ
1. Investigação e dúvida construtiva, usando lógica e racionalidade para tirar conclusões
2. Criação de hipóteses, idéias, modelos e então tenta contestá-los (ceticismo)
3. Desafios (testa, compara e confirma as evidências = atualização de teorias)
1. Suspensão da capacidade crítica?
2. Transforma crenças não testadas em verdades inabaláveis, pelo poder das instituições e pela
passagem do tempo (TRADIÇÃO + AUTORIDADE + REVELAÇÃO)?
3. Mistérios (mito)?

POR QUE DEVEMOS USAR NOSSAS MENTES?1


1. Argumento da CRIAÇÃO2: Deus fez o homem à sua própria imagem, e um os

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aspectos mais nobres da semelhança de Deus ao homem é a capacidade de pensar (p.


13); 1 Este material está baseado em STOTT, John. Crer é também pensar. São Paulo: ABU
Editora, 2001. 2 Pv 6.6-11; Is 1.3; Jr 8.7; Ef 4.18; Rm 1.18-23; 8.5-8.

2. Argumento da REVELAÇÃO3: Os fatos simples e gloriosos que Deus é um Deus que


se revela a si próprio, e que Ele se revelou ao homem – demonstram a importância de nossas
mentes (p. 17); Deus se revelou por intermédio de palavras às menos humanas (p. 19 – Grifo do
autor)

3. Argumento da REDENÇÃO:4 De fato, a proclamação do e – também feita por palavras dirigidas


às mentes humanas – é o principal meio provido por Deus para dar salvação aos pecadores (p. 20)
Apresentação racional Apresentação não – racional Sabedoria humana Sabedoria divina

4. Argumento do JUÍZO DE DEUS:5 (...) Deus nos julgará pelo nosso conhecimento e pela nossa
atitude em resposta (ou pela falta desta) à sua revelação (p. 23). É um pensamento solene o de
que, com o nosso anti-intelectualismo, tanto nos opondo como não nos incomodando com o ouvir a
palavra de Deus, poderemos estar preparando para nós o juízo do Deus todo – poderoso (p. 25)

A MENTE NA VIDA CRISTÃ


Qual a importância da mente na vida cristã?
a) O Culto Verdadeiro
Somente quando de novo ouvimos sobre o que Deus já fez encontramo-nos em condições de
retribuir-lhe com a nossa adoração e o nosso culto. É também por este motivo que a leitura e a
meditação da Bíblia são uma parte muito importante na devoção pessoal do cristão. Todo culto
cristão, seja ele público ou pessoal, deve ser uma resposta inteligente à auto-revelação de
Deus, por suas palavras, e suas obras registradas nas Escrituras (p. 32)

b) Fé: uma crença Ilógica no que não se pode provar?


- Fé não é credulidade. A fé e a visão são postas em oposição, uma á outra, nas Escrituras, mas
nunca a fé a razão. Pelo contrário, a fé verdadeira é essencialmente racional, porque se baseia no
caráter e nas promessas de Deus. O crente em Cristo é alguém cuja mente medita e se firma
nessas certezas (p. 33 – Grifos meus).
- Fé não é otimismo
3 Sl 19.1-4; Rm 1.18-21
4 I Co 1.21
5 Jr 44.4-5; Jo 12.48
6 At 17.23; Jo 4.24; Lc 10.27; Sl 103.1-2; Rm 12.2)

AUTOREVELAÇÃO DIVINA
USO DA MENTE
LEITURA
MEDITAÇÃO
CULTO CRISTÃO

Fé em Deus Fé em si mesmo. Fé é uma confiança racional que, em profunda reflexão e certeza,


conta com o fato de que Deus é digno de todo o crédito (p. 36)

c) A busca da santidade
- Precisamos saber o que precisamos ser
· O conhecimento da verdade e a santidade (Jo 8.32)
· “Está escrito” e “também está escrito” (Mt 4.4, 7, 10)
· O autocontrole é, antes de tudo, o autocontrole da mente (p. 40)

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- Precisamos saber o que pela graça já somos Não basta sabermos o que deveríamos ser,
entretanto. Temos de ir mais além, resolvendonos, em nossas mentes, a alcançá-lo. A batalha é
quase sempre ganha na mente. É pela renovação de nossa mente que nosso caráter e
comportamento se transformam (p. 39-40 – Grifos do autor). Temos que considerar não somente o
que deveríamos ser, mas também o que, pela graça de Deus, já somos (p. 40-41)

d) A direção dada ao cristão


Vontade Geral de Deus Vontade Particular de Deus
Vontade do Senhor para com todo o seu povo, em todas as épocas.
Vontade do Senhor para com pessoas em particular em ocasiões específicas.
Fonte Escrituras Princípios Gerais das Escrituras e o bom senso Passagens Bíblicas Gn 17.2; Rm
12.2; Ef 5.17; Rm 8.29; I Ts 4.3; I Pe 2.15; Sl 32.8-9
É, pois, pelo uso de nosso próprio entendimento, iluminado pela Escrituras e pala oração,
recebendo o conselho de amigos, que Deus nos guiará para conhecermos Sua vontade particular
para nós (p. 44 – Grifos meus)

VONTADE PARTICULAR DE DEUS


Conselhos de amigos segundo as Escrituras Razão iluminada pelas Escrituras e pela oração

VONTADE GERAL DE DEUS


e) A apresentação do evangelho11
Qual o lugar da mente na evangelização?
7 I Sm 30.16
8 Rm 12.2; Fl 4.8
9 Rm 6.3,16; I Co 3.16; 6.9,15; I Co 5.6; 6.2-3, 16, 19.
10 Pv 3.6; Ef 5.17; Cl 4.12
11 Rm 10.13-14; 17
· RAZÃO 1: Exemplo dos apóstolos (II Co 5.11; At 17.2-4)
· RAZÃO 2: A conversão, não poucas vezes, é descrita em termos da resposta de
alguém não a Cristo propriamente, mas à ‘verdade’ (Rm 6.17)
Objeções:
1. Será que esta evangelização não está a serviço do orgulho intelectual das pessoas?
R: Precisamos fazer diferença entre adular a vaidade intelectual x respeitar a integridade
intelectual (I Co 8.1);
2. Será que esta evangelização não discrimina as pessoas de baixo nível intelectual
impedindo que elas ouçam o evangelho?
R: Precisamos fazer diferença entre apresentação racional e apresentação acadêmica do
evangelho (Rm 1.14; II Tm 2.15; Mt 13.19);
3. Será que esta evangelização não usurpa o trabalho do Espírito Santo?
R: Precisamos proclamar o evangelho TODO (Cristo encarnado, crucificado, ressurreto,
soberano, sua segunda vinda e muito mais ainda) à pessoa TODA (mente, coração e
vontade), sabendo que nosso papel é a proclamação o do Espírito Santo a regeneração (Jô
16.7-11);

6. O ministério e seus dons


O ministério ‘pastoral’ é essencialmente um ministério de ‘ensino’ (At 20.28; Cl 1.28; Tt 1.9
Cf. I Tm 4.13; II Tm 2.15; I Tm 3.2 Cf. II Tm 2.24; II Co 6.6)

APLICANDO O NOSSO CONHECIMENTO


Precisamos conhecer mais para Adorar mais (Rm 11.33; Lc 24.32)
Crer mais (Sl 9.10; Hb 4.2)
Santificar-nos mais (Sl 119.34; Jô 13.17; Fl 4.9; Tg 1.22-

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25; 2.14-26)
Amar mais (I Co 8.1; 13.2)
1.3 O que é Teologia e qual a necessidade de estudá-la?
Em primeiro lugar, precisamos entender que o vocábulo ‘teologia’ contém o termo logos.
Teologia é logia, lógica, logística fundamentalmente possibilitada e definida pelo theos (BARTH,
1996, p. 18 – Grifos do autor). Fazer teologia é buscar conceituar sobre Deus em sua natureza e
pessoa, sua criação na direção da compreensão do processo de redenção na história da salvação.
Assim, a pergunta nos conduz a resposta: De que se trata a teologia? De Deus e tudo o que se
refere a ele, isto é, o mundo universo: a criação, a Salvação e tudo o mais. E isso está já na palavra
mesma de “teologia” estudo de Deus. Mas como Deus é o determinante de tudo, então, qualquer
coisa pode ser objeto de consideração do teólogo. Deus, com efeito, pode ser definido como a
realidade que determina todas as realidades (MEDRADO, 2009)
Quem produz a teologia é o conhecido como teólogo, ou seja, aquele que busca entender
as bases doutrinais de uma religião, normalmente a religião a que pertence. Teólogo profissional é
uma pessoa com instrução avançada e que geralmente atua como professor e escritor
(ERICKSON, 1991, p. 162). Contudo, é preciso dizer que todos fazemos 12 I Co 12.7 teologia pois
todos temos um conceito de Deus e de sua obra na história da humanidade. Logo, até mesmo o
ateu é teólogo, pois faz juízo sobre seu posicionamento quanto a divindade. Em segundo lugar,
podemos perguntar: porque estudar teologia? Seria possível o finito conceituar sobre o infinito, o
temporal sobre o atemporal, o mortal sobre o eterno? Vale ressaltar que o conhecimento de Deus é
também possível somente porque ele fez o homem à sua própria imagem, de forma que há um
ponto de contato entre os dois, a despeito da transcendência de Deus (CHEUNG, 2001,2003, p. 7).
Podemos conhecê-lo porque somos sua imagem e se auto-revelou a nós.
Contudo, como somos limitados, será necessária a busca do conhecimento de Deus para que
entendamos nossas origens. Conhecer a Deus é conhecer a nós mesmos. Por isso, uma das
maiores razões para se estudar teologia é o valor intrínseco do conhecimento sobre Deus. Cada
outra categoria de conhecimento é um meio para um fim, mas o conhecimento de Deus é um fim
digno em si mesmo. E, visto que Deus Se revelou através da Escritura, conhecer a Escritura é
conhecê-lo, e isto significa estudar teologia (CHEUNG, 2001,2003, p. 10) No entanto, há um
repúdio hoje em dia no tocante ao estudo da teologia. Alguns dizem que a teologia é puro
academicismo e não tem nada a ver com a vida cotidiana de fé. Há uma dicotomia entre ser teólogo
e ser cristão. O primeiro tem como base a doutrina. O segundo, a vida. Entretanto, um repúdio à
teologia é também uma recusa de conhecer a Deus por meio do modo por ele prescrito. O
conhecimento da Escritura — conhecer sobre Deus ou estudar
teologia — deve estar cima de tudo da vida e pensamento humano. A teologia define e dá
significado a tudo que alguém possa pensar ou fazer. Ela está cima de todas as outras
necessidades (Lucas 10:42); nenhuma outra tarefa ou disciplina se aproxima dela em significância.
Portanto, o estudo da teologia é a atividade humana mais importante (CHEUNG, 2001,2003, p. 11)
Segundo Erickson (1997, p. 17), o estudo teológico é importante por três razoes: (1)
Crenças doutrinárias corretas são essenciais no relacionamento entre o cristão e Deus; (2) A
doutrina é importante por causa da ligação entre a verdade e a experiência; e (3) A compreensão
correta da doutrina é importante porque hoje há muitos sistemas de pensamento religiosos e
seculares que disputam nossa devoção. Sendo assim, frente os falsos ensinos e necessidade do
crescimento espiritual de todo cristão, faz-se necessário a teologia.

1.4 A natureza da Teologia


Neste momento gostaríamos de fazer uma reflexão sobre a natureza da teologia. Tendo
Deus como “objeto de estudo”, compreendemos que a doutrina cristã é apenas a declaração das
crenças mais fundamentais do cristão: crenças sobre a natureza de Deus; sobre sua ação; sobre
nós, que somos suas criaturas; e sobre o que Deus fez para nos trazer à comunhão com ele (...) A
doutrina lida com verdades gerais ou atemporais sobre Deus e sobre o restante da realidade. Não é
apenas um estudo de eventos históricos específicos, tais como o que Deus fez, mas da própria

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natureza do Deus que atua na história. O estudo da doutrina é conhecido como teologia
(ERICKSON, 1997, p. 15-16)
Diferentemente das Ciências Exatas e semelhantemente às Ciências Humanas, a
Teologia trabalha com conceitos abstratos e eternos para serem compreendidos concretamente na
temporalidade. Por isso, a teologia representa um dos empreendimentos humanos
costumeiramente qualificados de ‘científicos’ que têm por finalidade perceber um objeto ou uma
área do fenômeno, compreendê-lo em seu sentido e tematizá-lo em todo o alcance de sua
existência – e isso, dentro do caminho indicado pelo próprio objeto em questão. O termo ‘teologia’
parece indicar que ela, por ser uma ciência particular (e muito particular!) visaria perceber,
compreender e tematizar a ‘Deus’ (BARTH, 1996, p. 9) Apesar disso, a Teologia pode ser
considerada uma ciência. Entendemos a concepção de Ciência como algo que possui um objeto de
estudo delimitado, um problema e uma hipótese, um método lógico e rigoroso de pesquisa e
variáveis a serem comparadas, comprovadas e comunicadas. Nesta direção, a Teologia pode ser
considerada como Ciência, pois (1) Aceita as mesmas regras da lógica que as outras disciplinas.
Surgindo dificuldades, a teologia não invoca simplesmente um paradoxo ou incompreensibilidade.
(2) Ela é comunicável – pode ser expressa em forma verbal proposicional. (3) Até certo ponto, ela
emprega métodos usados por outras disciplinas específicas, especialmente a história e a filosofia.
(4) Ela partilha alguns objetos de estudo com outras disciplinas. Portanto, existe a possibilidade de
pelo menos algumas de suas proposições serem confirmadas ou refutadas
por outras disciplinas, tais como a ciência natural, a ciência do comportamento ou a história
(ERICKSON, 1997, p. 18)

1.5 As fontes da Teologia


Para que aconteça a produção da teologia, é preciso levar em consideração quais são as suas
fontes. Em que o teólogo se baseia para fazer teologia? Assim, podemos citar as seguintes fontes
das quais a teologia faz uso:
1. Teologia natural. O universo criado é estudado para determinar certas verdades acerca de Deus
e da natureza humana (...) [Cf. Sl 19.1; At 14.15-17; Rm 1.18-21; Rm2.14-15 –

REVELAÇÃO GERAL
2. Tradição. Pesquisa-se o que vem sendo adotado e ensinado por indivíduos e organizações que
se identificam como cristãos. Assim, o que tem sido crido torna-se norma para o que deve ser crido.

3. As Escrituras. A Bíblia é tida como o documento definidor ou a constituição da fé cristã. Portanto,


ela específica em que se deve crer e o que se deve fazer [Cf. Dt 29.29;
II Tm 3.16-17 –

REVELAÇÃO ESPECIAL]
4. Experiência. Considera-se que a experiência religiosa de um cristão hoje provê informações
divinas autorizadas (ERICKSON, 1997, p. 19 – grifos do autor) Das quatro fontes citadas acima, a
mais objetive confiável é a das Escrituras. Assim, teologia, então, refere-se ao estudo da Escritura
ou à formulação sistemática das doutrinas dessa. Uma doutrina verdadeiramente bíblica é sempre
autorizada e obrigatória, e um sistema de teologia é somente autorizado até onde ele reflita o
ensino escriturístico (CHEUNG, 2001, 2003, p. 5). Assim, (...) em sua palavra Deus revela o seu
agir no horizonte de sua aliança com o ser humano [Revelação do Deus do ser humano] e na
história da constituição, manutenção, realização e conclusão desta aliança ele se revela a si
mesmo [Revelação do ser humano como ser humano de Deus] (...) (BARTH, 1997, p. 19) Em
suma, Deus é o objeto da teologia. Efetivamente, o objeto está para uma ciência como está para
uma faculdade ou hábito. A teologia, como função da igreja cristã, deve servir às necessidades da
igreja. Um sistema teológico deve satisfazer suas necessidades básicas. A teologia se move para
trás e para diante entre dois pólos: a verdade eterna de seu fundamento e a situação temporal na
qual a verdade eterna deve ser recebida. Não foram muitos os sistemas teológicos capazes de se

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equilibrar perfeitamente entre essas duas exigências. Por isso, o assunto da teologia evangélica é
Deus – Deus na história de suas ações (... e) A teologia evangélica deixaria de ser ela mesma se,
em vez de proclamar os ‘grandes feitos de Deus’ se dispusesse a constatar e a proclamar um Deus
coisificado ou quaisquer coisas ou objetos divinos (BARTH, 1997, p. 12).

1.6 Divisões da teologia


TEOLOGIA EXEGÉTICA: (...) usando a técnica da exegese, analisa profundamente a Bíblia, cujos
princípios de interpretação são estudados pela hermenêutica bíblica.

TEOLOGIA BÍBLICA: (...) usa e organiza os resultados da teologia exegética e estuda também a
evolução e o desenrolar da Revelação progressiva de Deus à humanidade, passando obviamente
pelo Antigo Testamento e Novo Testamento.

TEOLOGIA SISTEMÁTICA: Com o encontro e o conhecimento das verdades reveladas na Bíblia e,


no caso católico, em outras fontes válidas da Tradição, toda essa verdade bíblica é estudada,
refletida, debatida, explicada e posteriormente reunida num grande sistema explicativo unificado.
Esse trabalho é reservado à teologia sistemática (1. Dogmática; 2.
Moral; 3. Ascética).

TEOLOGIA APOLOGÉTICA: As verdades, os princípios e os dogmas explicados e estudados pela


teologia sistemática iriam ser depois defendidos pela Apologética perante a sociedade, as
heresias, os ateus e as outras religiões.

TEOLOGIA PRÁTICA: Depois do estudo puramente teórico, a teologia prática pretende aplicar as
conclusões teológicas ao quotidiano e também estudar o modo como a Igreja comunica a sua fé e
as suas verdades, bem como as variadas ações de santificação ou de
outra natureza da Igreja no mundo. Neste contexto, a teologia moral tem simultaneamente aspectos
sistemáticos e práticos.

TEOLOGIA HISTÓRICA: Finalmente, a evolução da teologia ao longo dos tempos e a História do


Cristianismo são estudadas pela teologia histórica, que dá especial destaque à recepção e
compreensão das verdades reveladas e à evolução na formulação da doutrina ao longo da História.
Esta teologia estuda também, como por exemplo, a Patrística, a Escolástica e outras correntes e
movimentos teológicos.

1.7Abordagens das Teologias Sistemática, Bíblica e da História da Religião


ABORDAGEM Fonte dos Dados Metodologia Hermenêutica
Teologia Bíblica Cânon das Escrituras Exegética e Teológica
Organização: Conceitual, Tópica e Histórica. Descritiva e Normativa

Teologia Sistemática
Escrituras Sagradas, Tradição Histórica, Razão (filosofia) e Experiência Humana.

Teológica e Filosófica. Organização sistemática e lógica. Normativa e Construtiva História da


Religião. Escrituras, documentos de outras religiões, literatura e arqueologia. Fenomenológica e
Histórica: Organização: Cronológica e Genética. Descritiva (SAYÃO, 2008)

1.8 O contexto contemporâneo da Teologia


Veja as seguintes charges e textos abaixo (BOTELHO, 2009):

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O PAI NOSSO EMPRESARIAL


Pai nosso, que estais nos céus, Comercializado seja o vosso Nome. Venha a nós muito dinheiro.
Seja feita a nossa vontade: Mansões na terra e um lar no céu. O milhão nosso de cada dia, nos dai
hoje. Perdoai as nossas sonegações, Assim como nós as cobramos dos nossos devedores. Não
nos deixeis cair em nossas armações, Mas livrai-nos da fiscalização. Porque este reino, e este
poder, São a nossa glória para sempre. Amém. SANTOS, Levi B. O pai nosso empresarial.
15/04/2009. Disponível em:<http://jasielbotelho.blogspot.com/search/label/Teo.%20Prosperidade>
Acesso em:
02 dez. 2009.

Reflexão 1
Enquanto que uma teologia errônea leva a um desastre espiritual e prático, uma teologia
acurada conduz a uma adoração genuína e a um viver piedoso (CHEUNG, 2001, 2003, p.
11) Em relação ao contexto da Teologia hoje, como você enxerga a Igreja Brasileira? Quais são
seus pressupostos doutrinários? Quais sãos as ênfases? Estão de acordo com a Palavra de Deus?
Justifique sua resposta com bases bíblicas.

2. CONHECENDO A DOUTRINA DE DEUS


2.1 A revelação de Deus na história

AS ALIANÇAS SEMINAIS
ALIANÇA ADÂMICA – Deus promete redimir a humanidade através da semente da mulher (Gn
3.15). ALIANÇA NOÉICA – Deus promete não mais destruir a terra por águas (Gn 9.1-17)
O PACTO CENTRAL ALIANÇA CENTRAL ABRAÂMICA – Quatro promessas de bênçãos a
Abraão e através dele (Gn 12.1-7):
1.Benção pessoal – um grande nome
2.Benção territorial – vasta extensão de terra prometida à sua semente
3.Bênção nacional – uma grande nação
4.Benção espiritual – todas as nações seriam abençoadas na semente de Abraão

AS ALIANÇAS ESPECÍFICAS
1. ALIANÇA MOSAICA – Bênçãos pessoais prometidas a Israel sob condição de obediência (E Ex
20-23).
2. ALIANÇA PALESTÍNICA – A terra da Palestina é prometida a Israel, mas a permanência nela
fica sob condição de obediência (Dt 28-30)
3. ALIANÇA DAVÍDICA – O trono de Israel prometido como possessão perpétua (II Sm 7.10-16)
4. ALIANÇA ESPIRITUAL – A “Justificação pela Fé” oferecida através da semente de Abraão (Gl
3.8)

ALIANÇA SECUNDÁRIA
NOVA ALIANÇA COM JEREMIAS – Estabelecida a fim de substituir a aliança mosaica no que diz
respeito às bênçãos pessoais na nova dispensação de Israel.

2.2 A Existência de Deus (GRUDEM, 1999)


“Como sabemos que Deus existe? A resposta pode ser dada em duas partes: primeira,
todas as pessoas têm uma intuição íntima de Deus. Segunda, cremos nas provas encontradas nas
Escrituras e na natureza”. Todas as pessoas de qualquer lugar têm uma profunda intuição íntima de
que Deus existe, de que são criaturas de Deus e de que ele é seu Criador. Paulo diz que mesmo os
gentios descrentes tinham “conhecimento de Deus”, mas não o honravam como Deus nem lhe
eram gratos (Rm 1.21). Na vida do cristão essa íntima consciência de Deus se torna mais forte e
mais distinta. Além da consciência íntima de Deus, que dá claro testemunho do fato de que ele
existe, encontramos claras evidências da sua existência nas Escrituras e na natureza. As provas de

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que Deus existe se encontram, logicamente, disseminadas por toda a Bíblia. De fato, a Bíblia
sempre pressupõe que Deus existe.
ELLISEN, Stanley A. Conheça melhor o Antigo Testamento: esboços e gráficos interpretativos. São
Paulo: Vida, 1991, p. 23.

A visão do autor parte de um pressuposto dispensacionalista como a maioria dos teólogos


americanos. Contudo, o autor dessa apostila não partilha da mesma visão, sendo adepto a teoria
epigenética, ou revelação progressiva. Além das provas encontradas na existência dos seres
humanos, há outra excelente evidência na natureza. Quem olha para o céu, de dia ou de noite, vê o
sol, a lua e as estrelas, o firmamento e as nuvens, todos declarando continuamente pela sua
existência, beleza e grandeza que foi um Criador poderoso e sábio quem os fez e os sustém na sua
ordem. As “provas” tradicionais da existência de Deus, arquitetadas por filósofos cristãos (e alguns
não cristãos) de várias épocas da história, são de fato tentativas de analisar as evidências,
especialmente as evidências da natureza, de modos extremamente cuidadosos e logicamente
precisos, a fim de convencer as pessoas de que não é racional rejeitar a idéia de que Deus existe.
A maior parte das provas tradicionais da existência de Deus pode ser classificada em quatro tipos
importantes de argumento:

1. O argumento cosmológico considera o fato de que toda coisa conhecida do universo tem
uma causa.
2. O argumento teleológico é na verdade uma subcategoria do argumento cosmológico. Como o
universo parece ter sido planejado com um propósito, deve necessariamente existir um Deus
inteligente e determinado que o criou para funcionar assim.
3. O argumento ontológico parte da idéia de Deus, definido como um ser “maior do que qualquer
coisa que se possa imaginar”.
4. O argumento moral parte do senso humano do certo e do errado, e da necessidade da imposição
da justiça, e raciocina que deve necessariamente existir um Deus que seja a fonte do certo e do
errado e que vá algum dia impor a justiça a todas as pessoas. Como todos esses argumentos se
baseiam em fatos sobre a criação que realmente são verdadeiros, podemos dizer que todas essas
provas (quando cuidadosamente formuladas) são, num sentido objetivo, provas válidas porque
avaliam corretamente as evidências e ponderam com acerto, chegando a uma conclusão
verdadeira: de fato, o universo realmente tem Deus como causa, realmente dá provas de um
planejamento deliberado, Deus realmente existe como ser maior do que qualquer coisa que se
possa imaginar e ele realmente nos deu um senso do certo e do errado e um senso de que seu
juízo virá algum dia. Mas noutro sentido, se “válido” significa “capaz de conseguir que todos
concordem, mesmo aqueles que partem de falsos pressupostos”, então é claro que nenhuma das
provas é válida, pois nenhuma delas é capaz de fazer que todos aqueles que as ponderam acabem
concordando. Finalmente, é preciso lembrar que neste mundo pecador Deus precisa possibilitar
que nos convençamos, senão jamais creríamos nele. Lemos que “o deus deste século cegou o
entendimento dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de
Cristo” (2Co 4.4).

2.2 O Conhecimento de Deus (GRUDEM,1999)


Se pretendemos conhecer a Deus, antes é necessário que ele se revele a nós. Paulo diz que o que
podemos conhecer sobre Deus está claro às pessoas “porque Deus lhes manifestou” (Rm 1.19).
Quando falamos do conhecimento pessoal de Deus, que vem pela salvação, essa idéia fica ainda
mais explícita. Disse Jesus: “Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai,
senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11.27). A necessidade de Deus revelar-
se a nós também se percebe no fato de que o pecador interpreta erroneamente a revelação de
Deus encontrada na natureza. Portanto, precisamos das Escrituras para interpretar corretamente a
revelação natural. Por conseguinte, dependemos da ativa comunicação divina nas Escrituras para
alcançar verdadeiro conhecimento de Deus. Como Deus é infinito, e nós, finitos e limitados, jamais

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poderemos compreender plenamente e exaustivamente a Deus. Diz o salmo 145: “Grande é o


SENHOR e mui digno de ser louvado; a sua grandeza é insondável” (Sl 145.3). Jamais seremos
capazes de medir ou conhecer plenamente o entendimento de Deus: é imenso demais para que o
igualemos ou entendamos. Assim, podemos conhecer algo do amor, do poder, da sabedoria, etc.,
de Deus. Mas jamais poderemos conhecer completa ou exaustivamente o seu amor. Jamais
poderemos conhecer exaustivamente o seu poder. Jamais poderemos conhecer exaustivamente a
sua sabedoria, etc. Essa doutrina da incompreensibilidade de Deus tem muita aplicação positiva
para nossa vida. Significa que jamais seremos capazes de conhecer “demais” sobre Deus, pois
jamais nos faltarão coisas para aprender sobre ele, e assim nunca nos cansaremos de nos deleitar
com a descoberta de mais e mais coisas da sua excelência e da grandeza das suas obras. Se
desejássemos um dia nos igualar a Deus em conhecimento, ou se desejássemos encontrar prazer
no pecado do orgulho intelectual, o fato de que jamais cessaremos de crescer no conhecimento de
Deus seria para nós fator desencorajador — poderíamos sentir-nos frustrados pelo fato de Deus se
revelar um objeto de estudo que jamais poderemos dominar! Mas se nos deleitamos no fato de que
só Deus é Deus, de que ele é sempre infinitamente maior do que nós, de que somos criaturas dele,
que lhe devemos culto e adoração, então essa nos será uma idéia bastante encorajadora. Embora
não possamos conhecer exaustivamente a Deus, podemos conhecer coisas verdadeiras sobre ele.
De fato, tudo o que as Escrituras nos falam sobre Deus é verdadeiro. É verdade dizer que Deus é
amor (1Jo 4.8), que Deus é luz (1Jo 1.5), que Deus é espírito (Jo 4.24), que Deus é justo ou reto
(Rm 3.26) e assim por diante. Podemos conhecer alguns pensamentos de Deus — até muitos deles
— com base na Bíblia, e quando os conhecemos, como Davi, os consideramos “preciosos” (Sl
139.17). Ainda mais significativo é perceber que conhecemos o próprio Deus, e não meramente
fatos sobre ele ou atos que ele executa. Aqui Deus diz que a fonte da nossa alegria e da nossa
noção de importância deve vir não das nossas capacidades ou posses, mas do fato de conhecêlo.
O fato de conhecermos o próprio Deus é demonstrado ainda pela percepção de que a riqueza da
vida cristã envolve um relacionamento pessoal com Deus. Falamos com Deus em oração, e ele fala
conosco pela sua Palavra. Temos comunhão com ele na sua presença, entoamos seus louvores e
temos consciência de que ele pessoalmente habita no meio de nós edentro de nós para nos
abençoar (Jo 14.23). De fato, pode-se dizer que esse relacionamento pessoal com Deus Pai, com
Deus Filho e com Deus Espírito Santo é a maior de todas as bênçãos da vida cristã.

2.3 Os Atributos de Deus (FERRAZ,1997)


A) Naturais e Morais:
Também chamados de "intransitivos e transitivos", "incomunicáveis e comunicáveis", "absolutos e
relativos", "negativos e positivos" ou "imanentes e emanentes".

B) Atributos Naturais:
1) Vida: Deus tem vida; Ele ouve, vê, sente e age, portanto é um Ser vivo (Jo.10:10; Sl.94:9,l0;
IICr.16:9; At.14:15; ITs.1:9). Quando a Bíblia fala do olho, do ouvido, da mão de Deus, etc., fala
metaforicamente. A isto se dá o nome de antropomorfismo. Deus é vida (Jo.5:26; 14:26) e o
princípio de vida (At.17:25,28).

2) Espiritualidade: Deus, sendo Espírito, é incorpóreo, invisível, sem substância material, sem
partes ou paixões físicas e, portanto, é livre de todas as limitações temporais (Jo.4:24;
Dt.4:15-19,23; Hb.12:9; Is.40:25; Lc.24:39; Cl.1:15; ITm.1:17; IICo.3:17)

3) Personalidade: Existência dotada de auto-consciência e auto-determinação (Ex.3:14;Is.46:11).


a) Volição ou vontade = querer (Is.46:10; Ap.4:11).
b) Razão ou intelecto = pensar (Is.14:24; Sl.92:5; Is.55:8).
c) Emoção ou sensibilidade = sentir (Gn.6:6, IRs.11:9, Dt.6:15; Pv.6:16; Tg.4:5)

4) Tri-Unidade:

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a) Unidade de Ser: Há no Ser divino apenas uma essência indivisível. Deus é um em sua natureza
constitucional. A palavra hebraica que significa um no sentido absoluto é yacheed(Gn.22:2), isto é,
uma unidade numérica simples. Essa palavra não é empregada para expressar a unidade da
divindade. A unidade da divindade é ensinada nas palavras de Jesus: Eu e o Pai somos um.
(Jo.10:30). Jesus está falando da unidade da essência e não de unidade de propósito.
(Jo.17:11,21-23, IJo.5:7).

b) Trindade de Personalidade: Há três Pessoas no Ser divino: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A
palavra hebraica que significa um no sentido de único é echad que se refere a uma unidade
composta. Esta palavra é empregada para expressar a unidade da divindade. Esta palavra é usada
em Dt.6:4; Gn.2:24 e Zc.14:9 (Veja também Dt.4:35;32:39; ICr.29:1; Is.43:10;44:6;45:5; IRs.8:60;
Mc.10:9;12:29; ICo.8:5,6; ITm.2:5; Tg.2:19; Jo.17:3; Gl.3:20; Ef.4:6).

c) Elohim: Este nome está no plural e não concorda com o verbo no singular quando designativo
de Deus (Gn.1:26;3:22; 11:6,7;20:13;48:15; Is.6:8)

d) Há distinção de Pessoas na Divindade: Algumas passagens mostram uma das Pessoas


divinas se referindo à outra (Gn.19:24; Os.1:7; Zc.3:1,2; IITm.1:18; Sl.110:1; Hb.1:9).
5) Auto-Existência: Jerônimo disse: Deus é a origem de Si mesmo e a causa de Sua própria
substância. Jerônimo estava errado, pois Deus não tem causa de existência, pois não criou a Si
mesmo e não foi causado por outra coisa ou por Si mesmo; Ele nunca teve início. Ele é o Eterno
EU SOU (Ex.3:14), portanto Deus é absolutamente independente de tudo fora de Si mesmo para a
continuidade e perpetuidade de Seu Ser. Deus é a razão de sua própriaexistência (Jo.5:26;
At.17:24-28; ITm.6:15,16).

6) Infinidade ou Perfeição: É o atributo pelo qual Deus é isento de toda e qualquer limitação em
seu Ser e em seus atributos (Jó.11:7-10; Mt.5:48). A infinidade de Deus se contrasta com o mundo
finito em sua relação tempo-espaço.
a) Eternidade: A infinidade de Deus em relação ao tempo é denominada eternidade. Deus é Eterno
(Sl.90:2; 102:12,24-27; Sl.93:2; Ap.1:8; Dt.33:27; Hb.1:12). A eternidade de Deus não significa
apenas duração prolongada, para frente e para traz, mas sim que Deus transcende a todas as
limitações temporais (IIPe.3:8) existentes em sucessões de tempo. Deus preenche o tempo. Nossa
vida se divide em passado, presente e futuro. mas não há essa divisão na vida de Deus. Ele é o
Eterno EU SOU. Deus é elevado acima de todos os limites temporais e de toda a sucessão de
momentos, e tem a totalidade de sua existência num único presente indivisível (Is.57:15).
b) Imensidão: A infinidade de Deus em relação ao espaço é denominada imensidão ou
imensidade. Deus é imenso (Grande ou Majestoso; Jó.36:5,26; Jó.37:22,23; Jr.22:18; Sl.145:3).
Imensidão é a perfeição de Deus pela qual Ele transcende (ultrapassa) todas as limitações
espaciais e, contudo está presente em todos os pontos do espaço com todo o seu Ser PESSOAL
(não é panteísmo). A imensidão de Deus é intensiva e não extensiva, isto é, não significa extensão
ilimitada no espaço, como no panteísmo. A imensidão de Deus é transcendente no espaço
(intramundano ou imanente = dentro do mundo - Sl.139:7-12; Jr.23:23,24) e fora do espaço
(supramundano = acima do mundo; extramundano = além do mundo; emanente = fora do mundo -
IRs.8:27; Is.57:15).
c) Onipresença: É quase sinônimo de imensidão: A imensidade denota a transcendência no
espaço enquanto que a onipresença denota a imanência no espaço. Deus é imanente em todas as
Suas criaturas e em toda a criação. A imanência não deve ser confundida com o panteísmo (tudo é
Deus) ou com o deísmo que ensina que Deus está presente no mundo apenas com seu poder (per
portentiam) e não com a essência e natureza de ser Ser (per essentiam et naturam) e que age
sobre o mundo à distância. Deus ocupa o espaço repletivamente porque preenche todo o espaço e
não está ausente em nenhuma parte dele, mas tampouco está mais presente numa parte que
noutra (Sl.139:11,12). Deus ocupa o espaço variavelmente porque Ele não habita na terra do

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mesmo modo que habita no céu, nem nos animais como habita nos homens, nem nos ímpios como
habita nos piedosos, nem na igreja como habita em Cristo (Is.66:1; At.17:27,28; Compare Ef.1:23
com Cl.2:9).
7) Imutabilidade: É o atributo pelo qual não encontramos nenhuma mudança em Deus, em
sua natureza, em seus atributos e em seu conselho.
a) A "base" para a imutabilidade de Deus: É Sua simplicidade, eternidade, auto-existência e
perfeição. Simplicidade porque sendo Deus uma substância simples, indivisível, sem mistura, não
está sujeito a variação (Tg.1:17). Eternidade porque Deus não está sujeito às variações e
circunstâncias do tempo, por isso Ele não muda (Sl.102:26,27; Hb.1:12 e 13:8). Auto-existência
porque uma vez que Deus não é causado, mas existe em Si mesmo, então Ele tem que existir da
forma como existe, portanto sempre o mesmo (Ex.3:14). E perfeição porque toda mudança tem que
ser para melhor ou pior e sendo Deus absolutamente perfeito jamais poderá ser mais sábio, mais
santo, mais justo, mais misericordioso, e nem menos. Por isso Deus é imutável como a rocha
(Dt.32:4).
b) Imutabilidade não significa imobilidade: Nosso Deus é um Deus de ação (Is.43:13).
c) Imutabilidade implica em não arrependimento: Alguns versículos falam de Deus como se Ele
se arrependesse (Ex.32:14, IISm.24:16, Jr.18:8; Jl.2:13). Trata-se de antropomorfismo (Nm.23:19;
Rm.11:29; ISm.15:29; Sl.110:4).
d) Imutabilidade de Deus em Sua natureza: Deus é perfeito em sua natureza por isso não muda
nem para melhor nem para pior (Ml.3:6).
e) Imutabilidade de Deus em Seus atributos: Deus é imutável em suas promessas (IRs.8:56;
IICo.1:20); em sua misericórdia (Sl.103:17; Is.54:10); em sua justiça (Ez.8:18); em seu amor
(Gn.18:25,26).
f) Imutabilidade de Deus em Seu conselho: Deus planejou os fatos conforme a sua vontade e
decretou que este plano seja concretizado. Nada poderá se opor à sua vontade. O próprio Deus
jamais mudará de opinião, mas fará conforme seu plano predeterminado (Is.46:9,10; Sl.33:11;
Hb.6:17).

8) Onisciência: Atributo pelo qual Deus, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e
a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples. O conhecimento de Deus tem
suas características:
a) É arquétipo: Deus conhece o universo como ele existe em Sua própria idéia anterior à sua
existência como realidade finita no tempo e no espaço; e este conhecimento não é obtido de fora,
como o nosso (Rm.11:33,34).
b) É inato e imediato: Não resulta de observação ou de processo de raciocínio (Jó.37:16)
c) É simultâneo: Não é sucessivo, pois Deus conhece as coisas de uma vez em sua totalidade, e
não de forma fragmentada uma após outra (Is.40:28).
d) É completo: Deus não conhece apenas parcialmente, mas plenamente consciente
(Sl.147:5).
e) Conhecimento necessário: Conhecimento que Deus tem de Si mesmo e de todas as coisas
possíveis, um conhecimento que repousa na consciência de sua onipotência. É chamado
necessário porque não é determinado por uma ação da vontade divina. (Por exemplo: O
conhecimento do mal é um conhecimento necessário porque não é da vontade de Deus que o mal
lhe seja conhecido (Hc.1:13) Deus não pode nem quer ver o mal, mas o conhece, não por
experiência, que envolve uma ação de Sua vontade, mas sim por simples inteligência, por ser ato
do intelecto divino (veja IICo.5:21 onde o termo grego ginosko é usado).
f) Conhecimento livre: É aquele que Deus tem de todas as coisas reais, isto é, das coisas que
existiram no passado, que existem no presente e existirão no futuro. É também chamado visionis,
isto é, conhecimento de vista.
g) Presciência: Significa conhecimento prévio; conhecimento de antemão. Como Deus pode
conhecer previamente as ações livres dos homens? Deus decretou todas as coisas, e as decretou
com suas causas e condições na exata ordem em que ocorrem, portanto sua

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presciência de coisas contingentes (ISm.23:12; IIRs.13:19; Jr.38:17-20; Ez.3:6 e Mt.11:21)


apoia-se em seu decreto. Deus não originou o mal mas o conheceu nas ações livres do homem
(conhecimento necessário), o decretou e preconheceu os homens. Portanto a ordem é:
conhecimento necessário, decreto, presciência. A presciência de Deus é muito mais do que saber o
que vai acontecer no futuro, e seu uso no N.T. é empregado como na LXX que inclui Sua escolha
efetiva (Nm.16:5; Jz.9:6; Am.3:2). Veja Rm.8:29; IPe.1:2; Gl.4:9. Como se processou o
conhecimento necessário de Deus nas livres ações dos homens antes mesmo que Ele as
decretasse? A liberdade humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, solta no ar, que
pende numa ou noutra direção, mas é determinada por nossas próprias considerações intelectuais
e caráter (lubentia rationalis = auto-determinação racional). Liberdade não é arbitrariedade e em
toda ação racional há um porquê, uma razão que decide a ação. Portanto o homem
verdadeiramente livre não é o homem incerto e imprevisível, mas o homem seguro. A liberdade tem
suas leis - leis espirituais - e a Mente Onisciente sabe quais são (Jo.2:24,25). Em resumo, a
presciência é um conhecimento livre (scientia libera) e, logicamente procede do decreto,
"...segundo o decreto sua vontade" (Ef.1:11).
h) Sabedoria: A sabedoria de Deus é a Sua inteligência como manifestada na adaptação de meios
e fins. Deus sempre busca os melhores fins e os melhores meios possíveis para a consecução dos
seus propósitos. H.B. Smith define a sabedoria de Deus como o Seu atributo através do qual Ele
produz os melhores resultados possíveis com os melhores meios possíveis. Uma definição ainda
melhor há de incluir a glorificação de Deus: Sabedoria é a perfeição de Deus pela qual Ele aplica o
seu conhecimento à consecução dos seus fins de um modo que o glorifica o máximo (Rm.ll:33-36;
Ef.1:11,12; Cl.1:16). Encontramos a sabedoria de Deus na criação (Sl.19:1-7; Sl.104), na redenção
(ICo.2:7; Ef.3:10) . A sabedoria é personificada na Pessoa do Senhor Jesus (Pv.8 e ICo.1:30;
Jó.9:4; veja também Jó 12:13,16).

9) Onipotência: É o atributo pelo qual encontramos em Deus o poder ilimitado para fazer
qualquer coisa que Ele queira. A onipotência de Deus não significa o exercício para fazer aquilo
que é incoerente com a natureza das coisas, como, por exemplo, fazer que um fato do passado não
tenha acontecido, ou traçar entre dois pontos uma linha mais curta do que uma reta. Deus possui
todo o poder que é coerente com Sua perfeição infinita, todo o poder para fazer tudo aquilo que é
digno dEle. O poder de Deus é distinguido de duas maneiras: Potentia Dei absoluta = absoluto
poder de Deus e potentia Dei ordinata = poder ordenado de Deus. Hodge e Shedd definem o poder
absoluto de Deus como a eficiência divina, exercida sem a intervenção de causas secundárias, e o
poder ordenado como a eficiência de Deus, exercida pela ordenada operação de causas
secundárias. Chanock define o poder absoluto como aquele pelo qual Deus é capaz de fazer o que
Ele não fará, mas que tem possibilidade de ser feito, e o poder ordenado como o poder pelo qual
Deus faz o que decretou fazer, isto é, o que Ele ordenou ou marcou para ser posto em exercício; os
quais não são poderes distintos, mas um e o mesmo poder. O seu poder ordenado é parte do seu
poder absoluto, pois se Ele não tivesse poder para fazer tudo que pudesse desejar, não teria poder
para fazer tudo o que Ele deseja. Podemos, portanto, definir o poder ordenado de Deus como a
perfeição pela qual Ele, mediante o simples exercício de Sua vontade, pode realizar tudo quanto
está presente em Sua vontade ou conselho. E' óbvio, porém, que Deus pode realizar coisas que a
Sua vontade não desejou realizar (Gn.18:14; Jr.32:27; Zc.8:6; Mt.3:9; Mt.26:53). Entretanto há
muitas coisas que Deus não pode realizar. Ele não pode mentir, pecar, mudar ou negar-se a Si
mesmo (Nm.23:19; ISm.15:29; IITm.2:13; Hb.6:18; Tg.1:13,17; Hb.1:13; Tt.1:3), isto porque não há
poder absoluto em Deus, divorciado de Sua perfeições, e em virtude do qual Ele pudesse fazer
todo tipo de coisas contraditórias entre Si (Jó.11:7). Deus faz somente aquilo que quer fazer
(Sl.115:3; Sl.135:6).
a) El-Shaddai: A onipotência de Deus se expressa no nome hebraico El-Shaddai traduzido
por Todo-Poderoso (Gn.17:1; Ex.6:3; Jó.37:23 etc).
b) Em todas as coisas: A onipotência de Deus abrange todas as coisas (ICr.29:12), o domínio
sobre a natureza (Sl.107:25-29; Na.1:5,6; Sl.33:6-9; Is.40:26; Mt.8:27; Jr.32:17; Rm.1:20), o

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domínio sobre a experiência humana (Sl.91:1; Dn.4:19-37; Ex.7:1-5; Tg.4:12-15; Pv.21:1; Jó.9:12;
Mt.19:26; Lc.1:37), o domínio sobre as regiões celestiais (Dn.4:35; Hb.1:13,14; Jó.1:12; Jó 2:6).
c) Na criação, na providência e na redenção: Deus manifestou o seu poder na criação (Rm.4:17;
Is.44:24), nas obras da providência (ICr.29:11,12) e na redenção (Rm.1:16; ICo.1:24).
10) Soberania ou Supremacia: Atributo pelo qual Deus possui completa autoridade sobre
todas as coisas criadas, determinando-lhe o fim que desejar (Gn.14:19; Ne.9:6; Ex.18:11;
Dt.10:14,17; ICr.29:11; IICr.20:6; Jr.27:5; At.17:24-26; Jd.4; Sl.22:28; 47:2,3,8; 50:10-12; 95:3-5;
135:5; 145:11-13; Ap.19:6).
a) Vontade ou Auto-determinação: A perfeição de Deus pela qual Ele, num ato sumamente
simples, dirige-se à Si mesmo como o Sumo Bem (deleita-se em Si mesmo como tal) e às Suas
criaturas por amor do Seu nome (Is.48:9,11,14; Ez.20:9,14,22,44; Ez.36:21-23). A vontade de Deus
recebe variadas classificações, pois à ela são aplicadas diferentes palavras hebraicas (chaphets,
tsebhu, ratson) e gregas (boule, thelema). Vontade Preceptiva: Na qual Deus estabeleceu
preceitos morais para reger a vida de Suas criaturas racionais. Esta vontade pode ser
desobedecida com freqüência (At.13:22; IJo.2:17; Dt.8:20).
Vontade Decretória: Pela qual Deus projeta ou decreta tudo o que virá a acontecer, quer pretenda
realizá-lo causativamente, quer permita que venha a ocorrer por meio da livre ação de suas
criaturas (At.2:23; Is.46:9-11). A vontade decretória é sempre obedecida. A vontade decretória e a
vontade preceptiva relacionam-se ao propósito em realizar algo. Vontade de Eudokia: Na qual
Deus deleita-se com prazer em realizar um fato e com desejo de ver alguma coisa feita. Esta
vontade, embora não se relacione com o propósito de fazer algo, mas sim com o prazer de fazer
algo, contudo corresponde àquilo que será realizado com certeza, tal como acontece com a
vontade decretória (Sl.115:3; Is.44:28; Is.55:11).
Vontade de Eurestia: Na qual Deus deleita-se com prazer ao vê-la cumprida por Suas criaturas.
Esta vontade abrange aquilo que a Deus apraz que Suas criaturas façam, mas que pode ser
desobedecido, tal como acontece com a vontade preceptiva (Is.65:12). A vontade de eudokia não
se refere somente ao bem, e nela não está sempre presente o elemento de deleite (Mt.11:26). A
vontade de eudokia e a vontade de eurestia relacionam-se ao prazer em realizar algo.
Vontade de Beneplacitum: Também chamada Vontade Secreta. Abrange todo o conselho
secreto e oculto de Deus. Quando esta vontade nos é revelada, ela torna-se na Vontade do
Signum ou Vontade Revelada. A distinção entre a vontade de beneplacitum e a vontade de signum
encontra-se em Deuteronomio.29:29. A vontade secreta é mencionada em Sl.115:3;
Dn.4:17,25,32,35; Rm.9:18,19; Rm.11:33,34; Ef.1:5,9,11, enquanto que a vontade revelada é
mencionada em Mt.7:21; Mt.12:50; Jo.4:34; Jo.7:17; Rm.12:2). Esta vontade está mui perto de nós
(Dt.30:14; Rm.10:8). A vontade secreta de Deus pertence a todas as coisas que Ele quer efetuar ou
permitir, tal como acontece na vontade decretória, sendo portanto, absolutamente fixa e irrevogável.
b) Liberdade: A perfeição de Deus no exercício de Sua vontade. Deus age necessária e
livremente. Assim como há conhecimento necessário e conhecimento livre, há também uma
voluntas necessária = vontade necessária e uma voluntas libera = vontade livre. Na vontade
necessária Deus não está sob nenhuma compulsão, mas age de acordo com a lei do Seu Ser, pois
Ele necessariamente quer a Si próprio e quer a Sua natureza santa. Deus necessariamente se ama
a Si próprio e Suas perfeições. As Suas criaturas são objetos de Sua vontade livre, pois Deus
determina voluntariamente o que e quem Ele criará; e os tempos, lugares e circunstâncias de suas
vidas. Ele traça as veredas de todas as Suas criaturas, determina o seu destino e as utiliza para
Seus propósitos (Jó.ll:10; Jó.23:13,14; Jó.33:13. Pv.16:4; Pv.21:1; Is.10:15; Is.29:16; Is.45:9;
Mt.20:15; Ap.4:11;Rm.9:15-22; ICo.12:11).
C) Atributos Morais:
1) Santidade: É a perfeição de Deus, em virtude da qual Ele eternamente quer manter e mantém a
Sua excelência moral, aborrece o pecado, e exige pureza moral em suas criaturas. Ser Santo vem
do hebraico qadash que significa cortar ou separar. Neste sentido também o Novo testamento
utiliza as palavras gregas hagiazo e hagios. A santidade de Deus possui dois diferentes aspectos,
podendo ser positiva ou negativa (Hb.1:9;Am.5:15; Rm.12:9).

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a) Santidade Positiva: Expressa excelência moral de Deus na qual Ele é absolutamente perfeito,
puro e íntegro em Sua natureza e Seu caráter (IJo.1:5; Is.57:15; IPe.1:15,16; Hc.1:13). A santidade
positiva é amor ao bem.
b) Santidade Negativa: Significa que Deus é inteiramente separado de tudo quanto é mal e de
tudo quanto o aborrece (Lv.11:43-45; Dt.23:14; Jó.34:10; Pv.15:9,26; Is.59:1,2; Lc.20:26; Hc. 1:13;
Pv.6:16-19; Dt.25:16; Sl.5:4-6). A santidade negativa é ódio ao mal. Além de possuir dois aspectos
a santidade de Deus possui também duas maneiras diferentes de manifestar-se:
c) Retidão: Também chamada justiça absoluta, é a retidão da natureza divina, em virtude da qual
Ele é infinitamente Reto em Si mesmo (santidade legislativa). Sl.145:17; Jr.12:1; Jo.17:25;
Sl.116:5; Ed.9:15.
d) Justiça: Também chamada justiça relativa, é a execução da retidão ou a expressão da justiça
absoluta (santidade judicial). Strong a chama de santidade transitiva. A retidão é a fonte da
Santidade de Deus, a justiça é a demonstração de Sua santidade.A justiça de Deus pode ser
retributiva e remunerativa. A justiça retributiva se divide em punitiva e corretiva. A justiça punitiva é
aquela pela qual Deus pune os pecadores pela transgressão de Suas leis. Esta justiça de Deus
exige a execução das penalidades impostas por Suas leis (Sl.3:5;11:4-7 Dt.32:4; Dn.9:12,14;
Ex.9:23-27;34:7). A justiça corretiva é aquela pela qual Deus "pune" Seus filhos para corrigi-los
(Hb.12:6,7). Aqueles que não são Seus filhos, Deus pune como um Juiz Severo (Rm.11:22;
Hb.10:31), mas aos Seus filhos, Deus "pune" (corrige) como um Pai Amoroso (Jr.10:24;30:11;46:28;
Sl.89:30-33; ICr.21:13) A justiça remunerativa é aquela pela qual Deus recompensa, com Suas
bênçãos, aos homens pela obediência de Suas leis (Hb.6:10; IITm.4:8; ICo.4:5;3:11-15; Rm.2:6-10;
IIJo.8)
e) Ira: Esta deve ser considerada como um aspecto negativo da santidade de Deus, pois em Sua
ira Deus aborrece o pecado e odeia tudo quanto contraria Sua santidade (Dt.32:39-41; Rm.11:22;
Sl.95:11; Dt.1:34-37; Sl.95:11). Podemos, então, dizer que a ira é a manifestação da santidade
negativa de Deus (Rm.1:18; IITs.1:5-10; Rm.5:9 etc). A ira é também designada de severidade
(Rm.11:22).
2) Bondade: É uma concepção genérica incluindo diversas variedades que se distinguem de
acordo com os seus objetos. Bondade é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo
(Mc.10:18; Lc.18:18,19; Sl.33:5; Sl.119:68; Sl.107:8; Na.1:7). A bondade implica na
disposição de transmitir felicidade.
a) Benevolência: É a bondade de Deus para com Suas criaturas em geral. E' a perfeição de Deus
que O leva a tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas (Sl.145:9,15,16;
Sl.36:6;104:21; Mt.5:45;6:26; Lc.6:35; At.14:17). Thiessen define benevolência como a afeição que
Deus sente e manifesta para com Suas criaturas sensíveis e racionais. Ela resulta do fato de que a
criatura é obra Sua; Ele não pode odiar qualquer coisa que tenha feito (Jó.14:15) mas apenas
àquilo que foi acrescentado à Sua obra, que é o pecado (Ec.7:29).
b) Beneficência: Enquanto que a benevolência é a bondade de Deus considerada em sua intenção
ou disposição, a beneficência é a bondade em ação, quando seus atributos são conferidos.
c) Complacência: É a aprovação às boas ações ou disposições. É aquilo em Deus que aprova
todas as Suas próprias perfeições como também aquilo que se conforma com Ele (Sl.35:27;
Sl.51:6; Is.42:1; Mt.3:17; Hb.13:16).
d) Longanimidade ou Paciência: O hebraico emprega a palavra erek'aph que significa grande de
rosto e daí também lento para a ira. O grego emprega makrothymia que significa ira longe. Portanto
longanimidade é o aspecto da bondade de Deus em virtude do qual Ele tolera os pecadores, a
despeito de sua prolongada desobediência. A longanimidade revela-se no adiamento do merecido
julgamento (Ex.34:6; Sl.86:15; Rm.2:4; Rm.9:22; IPe.3:20; IIPe.3:15)
e) Misericórdia: Também expressa pelos sinônimos compaixão, compassividade, piedade,
benignidade, clemência e generosidade. No hebraico usa-se as palavras chesed e racham no
grego eleos. É a bondade de Deus demonstrada para com os que se acham na miséria ou na
desgraça, independentemente dos seus méritos (Dt.5:10; Sl.57:10; Sl.86:5; ICr.16:34; IICr.7:6;
Sl.116:5; Sl.136; Ed.3:11; Sl.145:9; Ez.18:23,32; Ex.33:11; Lc.6:35; Sl.143:12; Jó 6:14). A paciência

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difere da misericórdia apenas na consideração formal do objeto, pois a misericórdia considera a


criatura como infeliz, a paciência considera a criatura como criminosa; a misericórdia tem pena do
ser humano em sua infelicidade, a paciência tolera o pecado que gerou a infelicidade. A infelicidade
e sofrimento deriva-se de um justo desagrado divino, portanto exercer misericórdia é o ato divino de
livrar o pecador do sofrimento pelo qual ele justamente e merecidamente deveria passar, como
conseqüência do desagrado divino.
f) Graça: É a bondade de Deus exercida em prol da pessoa indigna. Portanto graça é o ato divino
de conceder ao pecador toda a bondade de Deus a qual ele não merece receber (Ex.33:19). Na
misericórdia Deus suspende o sofrimento merecido, na graça Deus concede bênçãos não
merecidas. Todo pecador merece ir para o inferno; assim Deus exerce Sua misericórdia livrando o
pecador da condenação. Nenhum pecador merece ir para o paraíso; assim Deus exerce a Sua
graça doando ao pecador o privilégio de ir gratuitamente para o paraíso. Essa diferença entre
misericórdia e graça é notada em relação aos anjos que não caíram. Deus nunca exerceu
misericórdia para com eles, posto que jamais tiveram necessidade dela, pois não pecaram, nem
ficaram debaixo dos efeitos da maldição. Todavia eles são objetos da livre e soberana graça de
Deus pela qual foram eleitos (ITm.5:21) e preservados eternamente de pecado e colocados em
posição de honra (Dn.7:10; IPe.3:22).
g) Amor: A perfeição da natureza divina pela qual Ele é continuamente impelido a se comunicar. É,
entretanto, não apenas um impulso emocional, mas uma afeição racional e voluntária, sendo
fundamentada na verdade e santidade e no exercício da livre escolha. Este amor encontra seus
objetos primários nas diversas Pessoas da Trindade. Assim, o universo e o homem são
desnecessários para o exercício do amor de Deus. Amor é, portanto, a perfeição de Deus pela qual
Ele é movido eternamente à Sua própria comunicação. Ele ama a Si mesmo, Suas virtudes, Sua
obra e Seus dons.
3) Verdade: É a consonância daquilo que é asseverado com o que pensa a Pessoa que fez a
asseveração. Neste sentido a verdade é um atributo exclusivamente divino, pois com freqüência os
homens erram nos testemunhos que prestam, simplesmente por estarem equivocados a respeito
dos fatos, ou então por pura incapacidade fracassam em promessas que fizeram com honestas
intenções. Mas a onisciência de Deus impede que Ele chegue a cometer qualquer equívoco, e a
Sua onipotência e imutabilidade asseguram o cumprimento de Suas intenções (Dt.32:4; Sl.119:142;
Jo.8:26; Rm.3:4; Tt.1:2; Nm.23:19; Hb.6:18; Ap.3:7; Jo.17:3; IJo.5:20; Jr.10:10; Jo.3:33; ITs.1:9;
Ap.6:10; Sl.31:5; Jr.5:3; Is.25:1). Ao exercê-la para com a criatura, a verdade de Deus é conhecida
como sua veracidade e fidelidade.
a) Veracidade: Consiste nas declarações que Deus faz a respeito das coisas, conforme elas são, e
se relaciona com o que Ele revelou sobre Si mesmo. A veracidade fundamenta-se na onisciência
de Deus.
b) Fidelidade: Consiste no exato cumprimento de Suas promessas ou ameaças. A fidelidade
fundamenta-se na Sua onipotência e imutabilidade (Dt.7:9; Sl.36:5; ICo.1:9; Hb.10:23; Dt.4:24;
IITm.2:13; Sl.89:8; Lm.3:23; Sl.119:138; Sl.119:75; Sl.89:32,33; ITs.5:24; IPe.4:19; Hb.10:23).
2.4 Evidências do Conhecimento de Deus (PACKER)
1. Os que conhecem a Deus têm grande força por meio dele (Dn 11.32) Os homens que conhecem
seu Deus são, antes de tudo, homens de oração, e o primeiro ponto
em que seu zelo e sua força para a glória de Deus são expressos é nas orações (p. 32)
2. Os que conhecem a Deus pensam grandes coisas sobre ele (Dn 4.25; 5.21)
3. Os que conhecem a Deus são ousados por causa dele (At 5:29; 20:24);
4. Os que conhecem a Deus têm grande alegria nele (Rm 5.1; Dn 3.15-18) A extensão de nosso
contentamento é outro critério pelo qual podemos julgar se conhecemos a Deus de verdade (p. 25)
Reflexão 2
1. Pode-se saber bastante sobre Deus sem conhecê-lo muito. (...)
2 Pode-se saber bastante sobre piedade sem ter muito conhecimento de Deus. J. Packer
a) Como você provaria para um ateu que Deus existe?
b) Qual a definição bíblica de Deus?

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c) Fale sobre o caráter e os atributos de Deus à luz da Bíblia


d) Como você entende a Trindade?

3. CONHECENDO A DOUTRINA DE CRISTO (GRUDEM,1999)


A. A HUMANIDADE DE CRISTO
1. O nascimento virginal.
Quando falamos na humanidade de Cristo, convém iniciar com uma consideração do nascimento
virginal de Cristo. As Escrituras afirmam claramente que Jesus foi concebido no ventre de sua mãe,
Maria, por obra miraculosa do Espírito Santo e sem um pai humano.
2. Fraquezas e Limitações Humanas
a. Jesus possuía um corpo humano.
O fato de que Jesus possuía um corpo humano exatamente como o nosso é visto em muitas
passagens das Escrituras. Ele nasceu assim como nascem todos os bebês humanos (Lc 2.7). Ele
passou da infância para a maturidade assim como crescem todas as outras crianças: “Crescia o
menino e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele” (Lc 2.40).
b. Jesus possuía uma mente humana.
O fato de Jesus ter crescido em sabedoria (Lc 2.52) significa que ele passou por um processo de
aprendizado assim como acontece com todas as outras crianças — ele aprendeu a comer, a falar,
a ler e a escrever, e a ser obediente a seus pais (veja Hb 5.8). Esse processo normal de
aprendizado fazia parte da genuína humanidade de Cristo.
c. Jesus possuía alma humana e emoções humanas.
Vemos várias indicações de que Jesus possuía alma humana (ou espírito). Logo antes de sua
crucificação, ele disse: “Agora, está angustiada a minha alma” (Jo 12.27). João escreve um pouco
depois: “Ditas estas coisas, angustiou-s e Jesus em espírito” (Jo 13.21). Em ambos os versículos a
palavra angustiar representa o termo grego tarassÜ, palavra muitas vezes empregada em
referência a pessoas ansiosas ou que de repente são surpreendidas por um perigo.
d. As pessoas próximas de Jesus consideravam-no apenas humano.
Mateus registra um incidente assombroso no meio do ministério de Jesus. Ainda que Jesus
tivesse ensinado por toda a Galiléia, “curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo”,
de modo que “numerosas multidões o seguiam” (Mt 4.23-25), quando chegou à própria cidade de
Nazaré, o povo que o conhecia havia muitos anos não o recebeu (Mt 13.53- 58).
3. Impecabilidade. Ainda que o Novo Testamento seja claro em afirmar que Jesus era plenamente
humano exatamente como nós, também afirma que Jesus era diferente em um
aspecto importante: ele era isento de pecado e jamais cometeu um pecado durante sua vida.
Alguns objetam que se Jesus não pecou, então não era verdadeiramente humano, pois todos os
humanos pecam. Mas os que fazem tal objeção simplesmente não percebem que os seres
humanos estão agora numa situação anormal. Deus não nos criou pecaminosos, mas santos e
justos. Adão e Eva no jardim do Éden eram verdadeiramente humanos antes de pecar, e nós
agora, apesar de humanos, não nos conformamos ao padrão que Deus deseja que preenchamos
quando nossa humanidade plena, impecável, for restaurada.
4. Jesus poderia ter pecado?
Às vezes levanta-se esta questão: “Cristo podia ter pecado?” Alguns defendem a impecabilidade de
Cristo, entendendo por impecável “não sujeito a pecar”. Outros objetam que se Jesus não fosse
capaz de pecar, suas tentações não teriam sido reais, pois como uma tentação seria real, se a
pessoa que estivesse sendo tentada não fosse mesmo capaz de pecar? Para responder a essa
pergunta, precisamos distinguir, por um lado, o que as Escrituras afirmam claramente e, por outro
lado, o que é mais uma inferência de nossa parte. (1) As Escrituras afirmam claramente que Cristo
jamais pecou de fato (veja acima).
Não deve haver nenhuma dúvida a esse respeito em nossa mente. (2) Elas também afirmam que
Jesus foi tentado e que as tentações foram reais (Lc 4.2). Se cremos na Bíblia, precisamos insistir
que Cristo foi “tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.15). (3)
Também precisamos afirmar com as Escrituras que “Deus não pode ser tentado pelo mal” (Tg

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1.13). Mas aqui a questão torna-se difícil: se Jesus era plenamente Deus e também plenamente
humano (e vamos argumentar adiante que as Escrituras ensinam isso várias vezes e de maneira
clara), então não somos obrigados também a afirmar que (em algum sentido) Jesus também “não
pode ser tentado pelo mal”?

5. Por que era necessário que Jesus fosse plenamente humano?


Quando João escreveu sua primeira epístola, circulava na igreja um ensino herético, segundo o
qual Jesus não era homem. Essa heresia tornou-se conhecida como docetismo.
Essa negação da verdade acerca de Cristo era tão séria que João podia dizer que se tratava de
uma doutrina do anticristo: “Nisto reconheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que
Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não procede de
Deus; pelo contrário, este é o espírito do anticristo” (1Jo 4.2-3). a. Para possibilitar uma obediência
representativa. Conforme observamos no capítulo acima sobre as alianças entre Deus e o homem,
Jesus era nosso representante e obedeceu em nosso lugar naquilo que Adão falhou e
desobedeceu. Vemos isso nos paralelos entre a tentação de Jesus (Lc 4.1-13) e a ocasião da prova
de Adão e Eva no jardim (Gn 2.15– 3.7). Também reflete-se claramente na discussão de Paulo
sobre os paralelos entre Adão e
Cristo, na desobediência de Adão e na obediência de Cristo (Rm 5.18-19).
b. Para ser um sacrifício substitutivo. Se Jesus não tivesse sido homem, não poderia ter morrido em
nosso lugar e pago a penalidade que nos cabia. O autor de Hebreus nos diz: “Pois ele,
evidentemente, não socorre anjos, mas socorre a descendência de Abraão. Por isso mesmo,
convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e
fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do povo”
(Hb 2.16-17; cf. v. 14).
c. Para ser o único mediador entre Deus e os homens. Porque estávamos alienados de Deus por
causa do pecado, necessitávamos de alguém que se colocasse entre Deus e nós e nos levasse de
volta a ele. Precisávamos de um mediador que pudesse representar-nos diante de Deus e que
pudesse representar Deus para nós. Só há uma pessoa que preencheu esse requisito: “Porquanto
há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). Para
cumprir essa função de mediador, Jesus tinha de ser plenamente homem e plenamente Deus. d.
Para cumprir o propósito original do homem de dominar a criação. Como vimos em nossa
discussão sobre o propósito para o qual Deus criou o homem, Deus colocou o ser humano sobre a
terra para subjugá-la e dominá-la como representante divino. Mas o homem não cumpriu esse
propósito, pois caiu em pecado. O autor de Hebreus percebe que Deus pretendia que tudo fosse
sujeitado ao homem, mas reconhece: “Agora, porém, ainda não vemos todas as coisas a ele
sujeitas” (Hb 2.8). Então, quando Jesus veio como homem, foi capaz de obedecer a Deus e, assim,
teve o direito de dominar a criação como homem, cumprindo o propósito original de Deus ao
colocar o homem sobre a terra. Hebreus reconhece isso quando diz que agora “vemos [...] Jesus”
em posição de autoridade sobre o universo, “coroado de glória e de honra” (Hb 2.9; cf. a mesma
frase no v. 7).
e. Para ser nosso exemplo e padrão na vida. João nos diz: “... aquele que diz que permanece nele,
esse deve também andar assim como ele andou” (1Jo 2.6), e nos lembra que “quando ele se
manifestar, seremos semelhantes a ele” e que essa esperança de futura conformidade com o
caráter de Cristo confere mesmo agora pureza moral cada vez maior à nossa vida (1Jo 3.2-3).
Paulo nos diz que estamos continuamente sendo “transformados [...] na sua própria imagem” (2Co
3.18), avançando, assim, para o alvo para o qual Deus nos salvou: sermos “conformes à imagem
de seu Filho” (Rm 8.29). Pedro nos diz que, especialmente no sofrimento, temos de considerar o
exemplo de Cristo: “pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixandovos exemplo para
seguirdes os seus passos” (1Pe 2.21).
f. Para ser o padrão de nosso corpo redimido. Paulo nos diz que quando Jesus ressuscitou dos
mortos, ressuscitou num novo corpo “na incorrupção [...] ressuscita em glória [...] ressuscita em
poder [...] ressuscita corpo espiritual” (1Co 15.42-44). Esse novo corpo ressurreto que Jesus

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possuía quando ressurgiu dos mortos é o padrão do que será nosso corpo quando formos
ressuscitados dos mortos, porque Cristo é “as primícias” (1Co 15.23) — uma metáfora agrícola que
compara Cristo à primeira amostra da colheita, que demonstra como será o outro fruto daquela
colheita.
g. Para compadecer-se como sumo sacerdote. O autor de Hebreus lembra-nos de que “naquilo que
ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados” (Hb 2.18; cf.
4.15-16). Se Jesus não tivesse existido na condição de homem, não teria sido capaz de conhecer
por experiência o que sofremos em nossas tentações e lutas nesta vida. Mas porque viveu como
homem, ele é capaz de compadecer-se mais plenamente de nós em nossas experiências.
6. Jesus será um homem para sempre.
Jesus não abandonou a natureza terrena após sua morte e ressurreição, pois apareceu aos
discípulos como homem após a ressurreição, até com as cicatrizes dos cravos nas mãos (Jo 20.25-
27). Ele possuía carne e ossos (Lc 24.39) e comia (Lc 24.41-42). Posteriormente, quando
conversava com os discípulos, foi levado ao céu, ainda em seu corpo humano ressurreto, e dois
anjos prometeram que ele voltaria do mesmo modo: “Esse Jesus que dentrevós foi assunto ao céu
virá do modo como o vistes subir” (At 1.11).
B. A DIVINDADE DE CRISTO
Para completar o ensino bíblico acerca de Jesus Cristo, precisamos declarar não só que ele era
plenamente humano, mas também plenamente divino. Embora a palavra não ocorra de maneira
explícita na Bíblia, a igreja tem empregado o termo encarnação para referir-se ao fato de que Jesus
era Deus em carne humana. A encarnação foi o ato pelo qual Deus Filho assumiu a natureza
humana. A comprovação bíblica da divindade de Cristo é bem ampla no Novo Testamento. Vamos
examiná-la sob várias categorias.

1. Alegações bíblicas diretas.


Nesta seção, examinamos declarações diretas da Bíblia de que Jesus é Deus ou de que é
divino. a. A palavra Deus (theos) atribuída a Cristo . Apesar de a palavra theos, “Deus”, ser em
geral reservada no Novo Testamento para Deus Pai, há algumas passagens em que é também
empregada em referência a Jesus Cristo. Em todos esses trechos, a palavra “Deus” é empregada
com um sentido denso em referência àquele que é Criador do céu e da terra, o governante de tudo.
b. A palavra Senhor (kyrios) atribuída a Cristo . Às vezes a palavra Senhor (gr. kyrios) é
empregada simplesmente como tratamento respeitoso dispensado a um superior (veja Mt 13.27;
21.30; 27.63; Jo 4.11). Às vezes pode simplesmente significar “patrão” de um servo ou escravo (Mt
6.24; 21.40). Ainda assim, a mesma palavra é também empregada na Septuaginta (a tradução
grega do Antigo Testamento, de uso comum na época de Cristo) como uma tradução do hebraico
yhwh, “Javé”, ou (conforme traduzido com freqüência) “o SENHOR” ou “Jeová”.
c. Outras fortes alegações de divindade. Além dos usos da palavra Deus e Senhor em referência a
Cristo, temos outras passagens que defendem com vigor a divindade de Cristo. Quando Jesus
disse a seus opositores judeus que Abraão vira seu dia (o dia de Cristo), eles o contestaram: “Ainda
não tens cinqüenta anos e viste Abraão?” (Jo 8.57). Aqui uma resposta suficiente para provar a
eternidade de Jesus teria sido: “Antes que Abraão fosse, eu era”. Mas não foi isso que Jesus disse.
Antes, ele fez uma declaração muito mais estarrecedora: “Em verdade, em verdade eu vos digo:
antes que Abraão existisse, EU SOU” (Jo 8.58).

2. Sinais de que Jesus possuía atributos de divindade.


Além das afirmações específicas da divindade de Jesus vistas nas muitas passagens citadas
acima, vemos muitos exemplos de atos na vida de Jesus que indicam seu caráter divino. Jesus
demonstrou sua onipotência quando acalmou a tempestade no mar com uma palavra (Mt 8.26-27),
multiplicou os pães e peixes (Mt 14.19) e transformou a água em vinho (Jo 2.1-
11). Alguns podem objetar, dizendo que esses milagres só mostraram o poder do Espírito Santo
agindo por intermédio dele, assim como o Espírito Santo poderia agir por meio de qualquer outro
ser humano e, assim, isso não comprova a divindade de Jesus.

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3. Teria Jesus desistido de algum atributo enquanto estava na terra (a teoria da kenosis)?
Paulo escreve aos filipenses:
Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em
forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou,
assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura
humana... (Fp 2.5-7). Partindo desse texto, alguns teólogos da Alemanha (a partir de 1860-1880) e
da Inglaterra (a partir de 1890-1910) passaram a defender uma idéia de encarnação que jamais
fora defendida na história da igreja. Essa nova idéia foi chamada “teoria da kenosis”, e a posição
geral representada por ela foi chamada “teologia kenótica”.
4. Conclusão:
Cristo é plenamente divino. O Novo Testamento, em centenas de versículos explícitos que
chamam Jesus de “Deus” e “Senhor” e empregam alguns outros títulos de divindade em referência
a ele, e em muitas passagens que lhe atribuem ações ou palavras aplicáveis somente ao próprio
Deus, declara repetidas vezes a divindade plena e absoluta de Jesus Cristo. “Aprouve a Deus que,
nele, residisse toda a plenitude” (Cl 1.19) e “nele, habita, corporalmente, toda a plenitude da
Divindade” (Cl 2.9).
5. Seria a doutrina da encarnação “compreensível” hoje?
Ao longo de toda a história levantam-se objeções ao ensino neotestamentário da plena divindade
de Cristo. Um ataque recente a essa doutrina merece menção aqui por ter criado
grande controvérsia, pois os que contribuíram para o texto eram todos líderes eclesiásticos de
renome na Inglaterra. O livro era chamado The Mith of God Incarnate [o mito do Deus encarnado],
editado por John Hick (London: SCM, 1977). O título apresenta a tese do livro: a idéia de que Jesus
era “Deus encarnado” ou “Deus vindo em carne” é um “mito” — uma
história que talvez se adequasse à fé das gerações anteriores, mas que não merece crédito
hoje.

6. Por que é necessária a divindade de Jesus?


Na seção anterior alistamos alguns motivos pelos quais era necessário que Jesus fosse
plenamente humano para obter nossa redenção. Aqui cabe reconhecer que é também crucialmente
importante insistir na plena divindade de Cristo, não só porque ela é ensinada de maneira clara nas
Escrituras, mas também porque
(1) só alguém que fosse Deus infinito poderia arcar com toda a pena de todos os pecados de todos
os que cressem nele — qualquer criatura finita não seria capaz de arcar com tal pena;
(2) a salvação vem do Senhor (Jn 2.9 ARC), e toda a mensagem das Escrituras é moldada para
mostrar que nenhum ser humano, nenhuma criatura, jamais conseguiria salvar o homem — só
Deus mesmo poderia; e (3) só alguém que fosse verdadeira e plenamente Deus poderia ser o
mediador entre Deus e homem (1Tm 2.5), tanto para nos levar de volta a Deus como também para
revelar Deus de maneira mais completa a nós (Jo 14.9). Assim, se Jesus não é plenamente Deus,
não temos salvação e, por fim, nenhum cristianismo. Não é por acaso que ao longo da história os
grupos que abandonaram a crença na plena divindade de Cristo não têm permanecido muito tempo
na fé cristã, desviando-se logo para
um tipo de religião representada pelo unitarismo nos Estados Unidos e em outros lugares. “Todo
aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus; o que permanece
na doutrina, esse tem tanto o Pai como o Filho” (2Jo 9).

C.A ENCARNAÇÃO: DIVINDADE E HUMANIDADE NA ÚNICA PESSOA DE CRISTO


O ensino bíblico sobre a plena divindade e plena humanidade de Cristo é tão amplo que se
vem crendo em ambos desde os primeiros tempos da história da igreja. Mas um entendimento
preciso de como a plena divindade e a plena humanidade poderiam ser combinadas em uma
pessoa só foi formulado gradualmente na igreja e não chegou à forma final antes da Definição de
Calcedônia em 451 d.C.

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1. Três concepções inadequadas da pessoa de Cristo


a. O apolinarismo. Apolinário, que se tornou bispo em Laodicéia em cerca de 361 a.C., ensinava
que a pessoa única de Cristo possuía um corpo humano, mas não uma mente ou um espírito
humano, e que a mente e o espírito de Cristo provinham da natureza divina do Filho de Deus.
b. O nestorianismo. O nestorianismo é a doutrina de que havia duas pessoas distintas em Cristo,
uma pessoa humana e outra divina, ensino diferente da idéia bíblica que vê Jesus como uma só
pessoa.
c. O monofisismo (eutiquianismo). Uma terceira concepção inadequada é chamada monofisismo, a
idéia de que Cristo possuía só uma natureza (gr. monos, “um”, e physis, “natureza”). O primeiro
defensor dessa idéia na igreja primitiva foi Êutico (c. 378-454 d.C.), líder de um mosteiro em
Constantinopla. Êutico ensinava o erro oposto do nestorianismo, pois negava que as naturezas
humana e divina em Cristo permanecessem plenamente humana e plenamente divina.
2. A solução da controvérsia:
A Definição de Calcedônia em 451 d.C. Para tentar resolver os problemas levantados pelas
controvérsias em torno da pessoa de Cristo, convocou-se um amplo concílio eclesiástico na
cidade de Calcedônia, perto de Constantinopla (atual Istambul), realizado de 8 de outubro a
1.
O de novembro de 451. A declaração resultante, chamada Definição de Calcedônia, previne contra
o apolinarismo, o nestorianismo e o eutiquianismo. Ela tem sido tomada desde então como a
definição padrão, ortodoxa, do ensino bíblico sobre a pessoa de Cristo igualmente pelos ramos
católicos, protestantes e ortodoxos do cristianismo.

3. Agrupamento de textos bíblicos específicos sobre a divindade e a humanidade de


Cristo.
Quando examinamos o Novo Testamento, conforme fizemos acima nas seções sobre a
humanidade e a divindade de Jesus, há algumas passagens que parecem difíceis de encaixar.
(Como Jesus podia ser onipotente e ainda assim fraco? Como podia deixar o mundo e ainda estar
presente em todos os lugares? Como podia aprender coisas e ainda ser onisciente?) a. Uma
natureza faz algumas coisas que a outra não faz. Teólogos evangélicos de gerações anteriores não
hesitaram em fazer distinção entre coisas feitas pela natureza humana de Cristo, mas não pela
natureza divina, ou pela natureza divina, mas não pela humana. Parece que temos de fazer isso se
quisermos reafirmar a declaração de Calcedônia de que “é preservada a propriedade de cada
natureza”. Mas poucos teólogos recentes dispõem-se a fazer tal distinção, talvez por causa de uma
hesitação em afirmar algo que não conseguimos compreender.
b. Tudo o que uma das naturezas faz, a pessoa de Cristo faz. Na seção anterior mencionamos uma
série de coisas feitas por uma natureza, mas não pela outra na pessoa de Cristo. Agora precisamos
afirmar que tudo o que diz respeito à natureza humana ou divina de Cristo diz respeito à pessoa de
Cristo. Assim Jesus pode dizer: “antes que Abraão existisse, EU SOU” (Jo 8.58). Ele não diz:
“Antes que Abraão existisse, minha natureza humana existia”, porque ele é livre para falar de
qualquer coisa feita só por sua natureza divina ou só por sua natureza humana como algo feito por
ele.
c. Títulos que nos lembram de uma natureza podem ser empregados em referência à pessoa,
mesmo quando a ação é realizada pela outra natureza. Os autores do Novo Testamento às vezes
empregam títulos que nos lembram ou da natureza humana ou da natureza divina para falar da
pessoa de Cristo, ainda que a ação mencionada possa ter sido realizada apenas pela Noutra
natureza e não pela que pareça estar implicada no título. Por exemplo, Paulo diz que se os
governantes deste mundo tivessem compreendido a sabedoria de Deus, “jamais teriam crucificado
o Senhor da glória” (1Co 2.8).
d. Uma breve frase de resumo. Às vezes no estudo da teologia sistemática, a seguinte frase tem
sido empregada para resumir a encarnação: “Permanecendo o que era, tornou-se o que não era”.
Em outras palavras, enquanto Jesus “permanecia” o que era (ou seja, plenamente divino), ele

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também se tornou o que não fora antes (ou seja, também plenamente humano). Jesus não deixou
nada de sua divindade quando se tornou homem, mas assumiu a humanidade que antes não lhe
pertencia.
e. A “comunicação” de atributos. Depois de decidirmos que Jesus era plenamente homem e
plenamente Deus, e que sua natureza humana permaneceu plenamente humana e sua natureza
divina permaneceu plenamente divina, podemos ainda perguntar se algumas qualidades ou
capacidades foram dadas (ou “comunicadas”) de uma natureza a outra. Parece que a resposta é
sim.
(1) Da natureza divina para a natureza humana Ainda que a natureza humana de Jesus não tenha
mudado em seu caráter essencial, porque ela foi unida à natureza divina na pessoa única de Cristo,
a natureza humana de Jesus obteve (a) dignidade para ser cultuada e (b) incapacidade de pecar,
elementos que não pertencem, de outra maneira, aos seres humanos. (2) Da natureza humana
para a natureza divina A natureza humana de Jesus lhe deu (a) a capacidade de experimentar o
sofrimento e a morte;(b) a capacidade de ser nosso sacrifício substitutivo, o que Jesus, só como
Deus, não poderia ter feito.
f. Conclusão. Ao final desta longa discussão, pode-nos ser fácil perder de vista o que de fato é
ensinado nas Escrituras. Trata-se, de longe, do milagre mais maravilhoso de toda a Bíblia — muito
mais maravilhoso que a ressurreição e até que a criação do universo. O fato de o Filho de Deus,
infinito, onipresente e eterno tornar-se homem e unir-se para sempre a uma natureza humana, de
modo que o Deus infinito se tornasse uma só pessoa com o homem finito, permanecerá pela
eternidade como o mais profundo milagre e o mais profundo mistério em todo o universo.

A EXPIAÇÃO
Podemos definir a expiação como segue: expiação é a obra que Cristo realizou em sua vida e
morte para obter nossa salvação. Essa definição indica que usamos a palavra expiação num
sentido mais amplo em que às vezes é utilizada. Ela é empregada de vez em quando para se referir
apenas ao fato de Jesus morrer e pagar nossos pecados na cruz.

A. A CAUSA DA EXPIAÇÃO
Qual foi a causa última que levou Cristo a vir para este mundo e morrer pelos nossos pecados?
Para encontrá-la, devemos pesquisar o assunto em alguma coisa no caráter do próprio Deus. E
aqui as Escrituras apontam para duas coisas: o amor e a justiça de Deus. O amor de Deus como
uma das causas da expiação é descrito na passagem mais conhecida da Bíblia: “Porque Deus
amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não
pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). Mas a justiça de Deus também exigia que ele
encontrasse um meio pelo qual a pena pelos nossos pecados fosse paga (pois ele não podia
aceitar-nos em comunhão consigo mesmo a menos que a penalidade fosse paga).

B. A NECESSIDADE DE EXPIAÇÃO
Havia alguma outra maneira de Deus salvar os seres humanos além de enviar seu Filho para
morrer em nosso lugar? Antes de responder a essa pergunta, é importante entender que Deus não
tinha nenhuma necessidade de salvar ninguém. Quando nos conscientizamos de que “Deus não
poupou anjos quando pecaram, antes, precipitando-os no inferno, os entregou a abismos de trevas,
reservando-os para juízo” (2Pe 2.4), percebemos que Deus poderia também ter escolhido com
perfeita justiça deixar-nos em nossos pecados, esperando o julgamento; ele poderia ter escolhido
não salvar ninguém, assim como fez com os anjos pecaminosos. Assim, nesse sentido a expiação
não era absolutamente necessária.

C. A NATUREZA DA EXPIAÇÃO
Nesta seção, considero dois aspectos da obra de Cristo: (1) a obediência de Cristo por nós,

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

pela qual obedeceu às exigências da lei em nosso lugar e foi perfeitamente obediente à vontade de
Deus Pai como nosso representante, e (2) os sofrimentos de Cristo por nós, pelos quais recebeu o
castigo pelos nossos pecados e, em conseqüência, morreu pelos nossos pecados.

1. A obediência de Cristo por nós (às vezes chamada “obediência ativa”).


Se Cristo tivesse conseguido só o perdão dos pecados por nós, não mereceríamos o céu. Nossa
culpa teria sido removida, mas estaríamos simplesmente na posição de Adão e Eva antes de terem
feito qualquer coisa boa ou má e antes de terem passado um tempo de provação com sucesso.
Para serem estabelecidos em justiça para sempre e ter assegurada a sua eterna comunhão com
Deus, Adão e Eva tinham de obedecer a Deus de modo perfeito por um período de tempo. Então,
Deus teria olhado para sua obediência fiel com prazer e deleite, e eles teriam vivido em comunhão
com o Senhor para sempre.

2. Os sofrimentos de Cristo por nós (às vezes chamados “obediência passiva”).


Além de obedecer à lei de modo perfeito por toda a sua vida em nosso favor, Cristo tomou
também sobre si mesmo os sofrimentos necessários para pagar a penalidade pelos nossos
pecados. a. Sofrimento por toda a sua vida. Num sentido mais amplo a pena que Cristo suportou ao
pagar nossos pecados foi um sofrimento tanto em seu corpo como em sua alma ao longo da vida.
Embora os sofrimentos de Cristo tenham culminado em sua morte sobre a cruz (veja abaixo), toda
a sua vida num mundo caído envolveu sofrimento. Por exemplo, Jesus suportou tremendo
sofrimento durante a tentação no deserto (Mt 4.1-11), quando foi submetido por quarenta dias aos
ataques de Satanás.

b. A dor da cruz. Os sofrimentos de Jesus se intensificaram à medida que ele se aproximava da


cruz. Ele compartilhou com os discípulos algo da agonia que estava vivendo quando disse: “A
minha alma está profundamente triste até à morte” (Mt 26.38). Foi especialmente sobre a cruz que
os sofrimentos de Jesus por nós atingiram seu clímax, pois foi ali que ele suportou o castigo pelo
nosso pecado e morreu em nosso lugar. As Escrituras nos ensinam que havia quatro diferentes
aspectos da dor que Jesus experimentou:
(1) Dor física e morte Não precisamos sustentar que Jesus sofreu mais dor física do que qualquer
ser humano jamais sofreu, pois em nenhuma passagem a Bíblia faz tal alegação. Mas ainda não
podemos esquecer que a morte por crucificação era uma das formas mais horríveis de execução
que o homem já inventou.

(2) A dor de carregar o pecado Mais horrível que a dor do sofrimento físico que Jesus suportou foi a
dor psicológica de carregar a culpa pelo nosso pecado. Em nossa própria experiência como
cristãos conhecemos um pouco da angústia que sentimos quando sabemos que pecamos. O peso
da culpa nos oprime o coração, e há um amargo sentimento de separação de tudo que é correto no
universo, uma consciência de algo que num sentido bem profundo não devia existir. Na verdade,
quanto mais crescemos em santidade como filhos de Deus, sentimos de modo mais intenso essa
repugnância instintiva diante do mal.
(3) Abandono A dor física da crucificação e a dor de carregar sobre si mesmo o mal absoluto de
nossos pecados foram agravadas pelo fato de Jesus ter enfrentado essa dor sozinho. No
Getsêmani, quando Jesus levou consigo Pedro, Tiago e João, confidenciou-lhes um pouco de sua
agonia: “A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e vigiai” (Mc 14.34). Esse é
o tipo de confidência que se faz a um amigo íntimo e implica um pedido de apoio em sua hora da
maior provação. Porém, quando Jesus foi preso, “os discípulos todos, deixando-o, fugiram” (Mt
26.56).

(4) A dor de suportar a ira de Deus


Mais difícil ainda que esses três aspectos da dor de Jesus foi a dor de suportar sobre si a ira de
Deus. Como Jesus carregava sozinho a culpa de nossos pecados, Deus Pai, o poderoso Criador, o

23
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Senhor do universo, derramou sobre ele a fúria de sua ira: Jesus se tornou objeto do intenso ódio e
da vingança contra o pecado que Deus tinha guardado com paciência desde o início do mundo.
c. Outras reflexões sobre a morte de Cristo

(1) O castigo foi infligido por Deus Pai


Se perguntarmos “Quem exigiu que Cristo pagasse a pena pelos nossos pecados?”, a resposta
dada pelas Escrituras é que o castigo foi aplicado por Deus Pai como representante dos interesses
da Trindade na redenção. Foi a justiça de Deus que exigiu que o pecado fosse pago, e, entre os
membros da Trindade, era Deus Pai quem tinha o papel de exigir esse pagamento. Deus Filho
voluntariamente assumiu o papel de suportar o castigo pelo pecado.

(2) Não um sofrimento eterno, mas um pagamento integral Se tivéssemos de pagar a pena de
nossos próprios pecados, teríamos de sofrer eternamente separados de Deus. Porém, Jesus não
sofreu eternamente. Existem duas razões para essa diferença: (a) Se sofrêssemos pelos nossos
próprios pecados, nunca seríamos capazes de nos colocar novamente em condição correta com
Deus por nós mesmos. Não haveria nenhuma esperança, pois não poderíamos viver de novo e
conseguir justiça perfeita diante de Deus, e não haveria nenhum modo de desfazer nossa natureza
pecaminosa e torná-la justa diante de Deus.
(b) Jesus era capaz de receber toda a ira de Deus contra nosso pecado e sofrê-la até o fim.
Nenhum homem comum poderia jamais fazer isso, mas em virtude da união das naturezas divina e
humana em sua pessoa, Jesus era capaz de receber toda a ira de Deus contra o pecado e sofrê-la
até o fim. Isaías predisse que Deus “verá o fruto do penoso trabalho de sua alma e ficará satisfeito”
(Is 53.11).
(3) O significado do sangue de Cristo O Novo Testamento muitas vezes liga o sangue de Cristo
com nossa redenção. Por exemplo, Pedro diz: “... sabendo que não foi mediante coisas
corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos
pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o
sangue de Cristo” (1Pe 1.18-19).
(4) A morte de Cristo como “substituição penal” A concepção da morte de Cristo apresentada aqui
tem sido chamada com freqüência a teoria da “substituição penal”. A morte de Cristo foi “penal”
pelo fato de ter ele cumprido uma pena quando morreu. Sua morte foi também uma “substituição”
pelo fato de ter ele sido nosso substituto quando morreu.
d. Termos do Novo Testamento que descrevem diferentes aspectos da expiação. A obra expiatória
de Cristo é um evento complexo que tem vários efeitos sobre nós. O Novo Testamento usa
diferentes palavras para descrevê-los; vamos examinar quatro termos mais importantes. Eles
mostram como a morte de Cristo atendeu a quatro necessidades que temos como pecadores:
(1) Sacrifício
Para pagar a pena de morte que merecemos por causa de nossos pecados, Cristo morreu como
sacrifício por nós. Ele “se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo,
o pecado” (Hb 9.26).
(2) Propiciação Para nos livrar da ira de Deus que merecemos, Cristo morreu como propiciação
pelos nossos pecados. “Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em
que ele nos amou e enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados” (1Jo 4.10).
(3) Reconciliação Para vencer a nossa separação de Deus, precisávamos de alguém que
proporcionasse reconciliação e dessa forma nos trouxesse de volta à comunhão com Deus. Paulo
diz que Deus “nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da
reconciliação” (2Co 5.18-19).
(4) Redenção Uma vez que como pecadores estamos escravizados ao pecado e a Satanás,
precisamos de alguém que nos proporcione redenção e, dessa forma, nos “redima” de nossa
servidão. Quando falamos em redenção, entra em foco a idéia de “resgate”. Resgate é o preço
pago para redimir alguém da escravidão ou cativeiro. Jesus disse de si mesmo: “Pois o próprio

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Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos”
(Mc 10.45). [...]

D. OS OFÍCIOS DE CRISTO
Os três cargos mais importantes que poderiam existir para o povo de Israel no Antigo Testamento
eram: o profeta (como Natã, 2Sm 7.2), o sacerdote (como Abiatar, 1Sm 30.7) e o rei (como Davi,
2Sm 5.3). Esses três ofícios eram distintos. O profeta falava as palavras de Deus ao povo; o
sacerdote oferecia sacrifícios, orações e louvores a Deus em favor do povo; e o rei governava o
povo como representante de Deus. Esses três ofícios prefiguravam a própria obra de Cristo de
várias maneiras.

A. CRISTO COMO PROFETA


Os profetas do Antigo Testamento transmitiam a palavra de Deus ao povo. Moisés foi o primeiro
grande profeta e escreveu os cinco primeiros livros da Bíblia, o Pentateuco. Depois vieram outros
que falaram e escreveram as palavras de Deus. Mas Moisés predisse que um dia viria outro profeta
como ele.

B. CRISTO COMO SACERDOTE


No Antigo Testamento, os sacerdotes eram designados por Deus para oferecer sacrifícios. Eles
também ofereciam orações e louvores a Deus em favor do povo. Ao agir assim “santificavam” as
pessoas, ou tornavam-nas aceitáveis à presença de Deus, se bem que de forma limitada durante o
período do Antigo Testamento. No Novo Testamento, Jesus tornou-se nosso grande sumo
sacerdote. Esse tema é bem desenvolvido na carta aos Hebreus, na qual vemos que Jesus atua
como sacerdote de duas maneiras.

1. Jesus ofereceu um sacrifício perfeito pelo pecado.


O sacrifício que Jesus ofereceu pelos pecados não foi o sangue de animais como touros ou
bodes: “... porque é impossível que o sangue de touros e bodes remova pecados” (Hb 10.4). Em
vez disso, Jesus ofereceu a si mesmo como sacrifício perfeito: “... ao se cumprirem os tempos, se
manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado” (Hb 9.26).

2. Jesus nos aproxima continuamente de Deus.


Os sacerdotes do Antigo Testamento não apenas apresentavam sacrifícios, mas também
compareciam de modo representativo na presença de Deus, de tempos em tempos, em favor do
povo. Mas Jesus faz muito mais do que isso. Como nosso perfeito sumo sacerdote, ele
continuamente nos conduz à presença de Deus, de forma que não temos mais a necessidade de
um templo em Jerusalém nem de um sacerdócio especial que se coloque entre nós e Deus.

3. Como sacerdote, Jesus ora continuamente por nós.


Outra função sacerdotal no Antigo Testamento era orar a favor das pessoas. O autor de
Hebreus nos diz que Jesus também cumpre essa função: “... também pode salvar totalmente os
que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles” (Hb 7.25). Paulo afirma a
mesma coisa quando diz que Cristo Jesus é aquele que intercede por nós (Rm 8.34).

C. CRISTO COMO REI


No Antigo Testamento o rei tinha autoridade para governar a nação de Israel. No Novo
Testamento, Jesus nasceu para ser o Rei dos judeus (Mt 2.2), mas recusou todas as tentativas
feitas pelo povo para fazê-lo um rei terreno com um poder militar e político terreno (Jo 6.15). Ele
disse a Pilatos: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus
ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos judeus; mas agora o meu
reino não é daqui” (Jo 18.36).

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

D. NOSSO PAPEL COMO PROFETAS, SACERDOTES E REIS


Se olharmos para a situação de Adão antes da queda e para a nossa situação futura com Cristo no
céu por toda a eternidade, poderemos ver que esses papéis de profeta, sacerdote e rei têm paralelo
com a experiência que Deus originariamente pretendia que o homem tivesse e serão cumpridos na
nossa vida no céu.
Reflexão 3
Qual o significado prático da encarnação de Cristo à luz de João 1 e I João 1.1-4?
_________________________________________________________________________

CURSO LIVRE DE GRADUAÇÃO


BACHAREL EM TEOLOGIA ECLESIÁSTICA

DISCIPLINA: BIBLIOLOGIA

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

CONCEITO GERAL DE BIBLIOLOGIA

O nosso assunto é o estudo introdutório e auxiliar das Sagradas Escrituras, para sua melhor
compreensão. Um ponto saliente nele é a história de como a Bíblia chegou até nós. A necessidade
desse estudo é que, sendo a Bíblia um livro divino, veio a nós por canais humanos, tornando-se,
assim, divino-humano, como também o é a Palavra Viva: Cristo, que se tornou também divino-
humano (Jo 1.1; Ap 19.13).

A Igreja cristã, desde as suas origens, tem descoberto na mensagem do evangelho o mesmo valor
da palavra de Deus e a mesma autoridade do Antigo Testamento (Mc 16.15-16; Lc 1.1-4; Jo 20.31;
1Ts 2.13), por isso, em 2Pe 3.16, se equiparam as epístolas de “nosso amado irmão Paulo” (v.15)
às “demais Escrituras”. Gradativamente, a partir do século II d.C., foram sendo reconhecidos os 27
livros que formam o Novo Testamento a sua categoria de livros sagrados e, em conseqüência, a
plenitude da sua autoridade definitiva e o seu valor religioso.

Tal reconhecimento, que implica o próprio tempo da presença, direção e inspiração do Espírito
Santo na formação das Escrituras, não descarta, em absoluto, a atividade física e criativa das
pessoas que redigiram os textos. Elas mesmas se referem a essa atividade em diversas ocasiões
(Ec 1.13; Lc 1.1-4; 1Co 15.1-3,11; Gl 6.11). A presença de numerosos autores materiais é,
precisamente, a causa da extraordinária riqueza de línguas, estilos, gêneros literários, conceitos
culturais o reflexões teológicas que caracterizam a Bíblia.

A expressão “a palavra de Deus” (também “a palavra do Senhor”, ou simplesmente “a palavra”)


possui várias aplicações na Bíblia. Obviamente, refere-se, em primeiro lugar, a tudo quanto Deus
tem falado diretamente. Quando Deus falou a Adão e Eva (Gn 2.16,17; Gn 3.9-19), o que Ele lhes
disse era, de fato, a palavra de Deus. De modo semelhante, Ele se dirigiu a Abraão (Gn 12.1-3), a
Isaque (Gn 26.1-5), a Jacó (Gn 28.13-15) e a Moisés (Êx 3-4). Deus também falou à totalidade da
nação de Israel, no monte Sinai, ao proclamar-lhe os dez mandamentos (Êx 20.1-19). As palavras
que os israelitas ouviram eram palavras de Deus.

Além da fala direta, Deus ainda falou através dos profetas. Quando eles se dirigiam ao povo de
Deus, assim introduziam as suas declarações: “Assim diz o Senhor”, ou “Veio a mim a palavra do
Senhor”. Quando, portanto, os israelitas ouviam as palavras do profeta, ouviam, na verdade, a
palavra de Deus.

A mesma coisa pode ser dita a respeito do que os apóstolos falaram no Novo Testamento. Embora
não introduzissem suas palavras com a expressão “assim diz o Senhor”, o que falavam e
proclamavam era, verdadeiramente, a palavra de Deus. O sermão de Paulo ao povo de Antioquia
da Pisídia (At 13.14-41), por exemplo, criou tamanha comoção que, “no sábado seguinte, ajuntou-
se quase toda a cidade a ouvir a palavra de Deus” (At 13.44). O próprio Paulo assegurou aos
Tessalonicenses que, “havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não
como palavra de homens, mas (segundo é, na verdade) como palavra de Deus” (1Ts 2.13; At 8.25).

Além disso, tudo quanto Jesus falava era palavra de Deus, pois Ele, antes de tudo, é Deus (Jo
1.1,18; 10.30; 1Jo 5.20). Lucas, escritor do terceiro evangelho, declara explicitamente que,
quando as pessoas ouviam a Jesus, ouviam na verdade a palavra de Deus (Lc 5.1). Note como, em

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

contraste com os profetas do ANTIGO TESTAMENTO, Jesus introduzia seus ditos: Eu “vos
digo...” (Mt 5.18, 20, 22, 23, 32, 39; 11.22, 24; Mc 9.1; 10.15; Lc 10.12; 12.4; Jo 5.19; 6.26; 8.34).
Noutras palavras, Ele tinha dentro de si mesmo a autoridade divina para falar a palavra de Deus. É
tão importante ouvir as palavras de Jesus, pois “quem ouve a minha palavra e crê naquele que me
enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação” (Jo 5.24). Jesus, na realidade, está tão
estreitamente identificado com a palavra de Deus que é chamado “o Verbo” [“a Palavra”] (Jo 1.1,14;
1Jo 1.1; Ap 19.13-16; Jo 1.1). A palavra de Deus é o registro do que os profetas, apóstolos e Jesus
falaram, isto é, a própria Bíblia. No Novo Testamento, quer um escritor usasse a expressão “Moisés
disse”, “Davi disse”, “o Espírito Santo diz”, ou “Deus diz”, nenhuma diferença fazia (At 3.22; Rm
10.5, 19; Hb 3.7; 4.7); pois o que estava escrito na Bíblia era, sem dúvida alguma, a palavra de
Deus.

Mesmo não estando no mesmo nível das Escrituras, a proclamação feita pelos autênticos
pregadores ou profetas, na igreja de hoje, pode ser chamada a palavra de Deus. Pedro indicou que,
a palavra que seus leitores recebiam mediante a pregação, era palavra de Deus (1Pe 1.25), e
Paulo mandou Timóteo “pregar a Palavra” (2Tm 4.2). A pregação, porém, não pode existir
independentemente da Palavra de Deus. Na realidade, o teste para se determinar se a palavra de
Deus está sendo proclamada num sermão, ou mensagem, é se ela corresponde exatamente à
Palavra de Deus escrita.

O que se diz de uma pessoa que recebe uma profecia, ou revelação, no âmbito do culto de
adoração (1Co 14.26-32)? Ela está recebendo, ou não, a palavra de Deus? A resposta é um “sim”.
Paulo assevera que semelhantes mensagens estão sujeitas à avaliação por outros profetas.
Todavia, há a possibilidade de tais profecias não serem palavra de Deus (1Co 14.29 “E falem dois
ou três profetas, e os outros julguem”). É somente em sentido secundário que os profetas, hoje,
falam sob a inspiração do Espírito Santo; sua revelação jamais deve ser elevada à categoria da
inerência (1Co 14.3).

1 - A BÍBLIA - ORIGEM E VOCÁBULOS

1.1 Origem da Escrita

Tem sido difícil determinar com exatidão, onde, como e quando a escrita teve a sua origem. A
escrita se originou quando o ser humano sentiu a necessidade de guardar seus feitos para que a
posteridade os conhecesse. A escrita primitiva foi pictográfica onde figuras representavam objetos.
Logo a seguir aparece a ideográfica, assim chamada pelo fato das figuras representarem idéias.
Num terceiro estágio aparece o fonograma – figuras representando sons. Dos povos antigos, os
dois que mais se destacaram, no desenvolvimento da escrita, foram os babilônicos e os egípcios.
Cada um destes teve a sua destacada e particular escrita: os babilônicos criaram a escrita
cuneiforme, assim denominada por consistir de pequenas cunhas, feitas especialmente em pedras;
enquanto os egípcios usavam pequenas figuras para representar objetos e idéias, os famosos
hieróglifos. A história nos relata que a decifração dessas escritas exigiu muito esforço e
concentração. A escrita cuneiforme foi decifrada pelo oficial inglês Henrique Rawlinson, após 18

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

anos de labores intensos. Quanto à escrita hieroglífica, todos sabem, que foi Champollion, o notável
egiptólogo francês, o primeiro a desvendar-lhe os mistérios.

1.1.1 A Escrita Cuneiforme

A princípio, certa espécie de marca representava uma palavra inteira, ou uma combinação de
palavras. Desenvolvendo-se a arte de escrever, passou a haver 'marcas' que representavam partes
de palavras, ou sílabas. Era este o gênero de escrita em uso na Babilônia no alvorecer do período
histórico. Havia mais de 500 marcas diferentes, com umas 30.000 combinações. Geralmente, essas
marcas se faziam em tijolos ou placas de barro macio (úmido), medindo de 2 a 50 centímetros de
comprimento, uns dois terços de largura, e escritos de ambos os lados; depois eram secados ao sol
ou cozidos no forno. Por meio dessas inscrições cuneiformes, em placas de barro, é que chegou
até nós a vasta literatura dos primitivos babilônios.

1.1.2 Origem do Alfabeto

Tem sido um assunto bastante controvertido a origem do alfabeto. Em geral se aceita que o
alfabeto de 22 letras foi inventado pelos fenícios e por eles levado aos gregos e depois aos latinos.
Até há pouco afirmava-se que a descoberta do alfabeto tinha sido pelos séculos XII ou XI a.C.,
sendo este argumento apresentado para provar que Moisés não podia ter escrito o Pentateuco,
visto que em seu tempo não tinham ainda inventado a arte de escrever.

1.2 Materiais Usados para Escrever

1.2.1 Manuscritos

Vulgarmente os dicionários registram MANUSCRITO como "escrito à mão". Em sentido técnico,


esse nome refere-se à volumosa bagagem de rolos ou fragmentos escritos à mão com textos das
Escrituras Sagradas. Em um sentido mais particular, alude aos escritos do Antigo e Novo
Testamentos, desde os tempos patriarcais até à invenção da imprensa, na metade do século XV.

De conformidade com o Prof. Antonio Gilberto (1996, p.74,75), “desde os tempos mais remotos o
homem tem usado vários materiais e técnicas sobre as quais tentava de alguma forma passar
idéias, fatos de geração a geração”, alguns dos materiais usados foram:

a) Pedra. Os caracteres eram gravados nas colunas dos templos, como os de Lúxor e
Camaque, no Egito; ou em cilindros, como o código de Hamurabi; ou nas rochas, como em
Persépolis; ou mesmo em lápides, como a pedra Roseta, decifrada por Champolion, nos
dias de Napoleão.

b) Cerâmica. Material usado desde tempos imemoriais na região da Mesopotâmia. Dois tipos
de cerâmica têm sido encontrados pelos arqueólogos: seca ao sol e seca ao forno.

29
Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

c) Linho. Tem sido encontrado nas descobertas arqueológicas.

d) Tábuas recobertas de cera (Is 8.1; Lc 1.63).

e) Papiro. O papiro se destaca como o principal material antigo usado para escrever. Planta
originária do Egito, muito comum nas margens lodosas do Nilo, e usada abundantemente na
preparação de uma espécie de papel. Ele só cresce em terrenos alagadiços, por isso em Jó
8.11 há a seguinte pergunta: Pode o papiro crescer sem lodo? Normalmente se escrevia só
de um lado do papiro e as folhas mais longas eram enroladas. Estes rolos recebiam o nome
de volumes, palavra do latim – volvere que significa enrolar. Os egípcios guardavam
ciosamente o segredo da preparação do papiro para a escrita. No século VI a.C. começaram
a exportá-lo para a Grécia e depois para outros povos que habitavam nas margens do
Mediterrâneo, onde se criou um importante comércio desta especialidade, mormente na
cidade da Biblos. Quem hoje chega ao Cairo, capital do Egito, pode visitar, às margens do
rio Nilo um navio-escola, onde se prepara o papiro com finalidades culturais e turísticas, mas
não comerciais. The Interpreter's Dictionary of the Bible, vol. 3, p. 649, diz o seguinte sobre
o papiro: "O papel, palavra derivada de papiro, era preparado de finas faixas da parte
interior da folha do papiro arranjadas verticalmente, com outra camada aplicada
horizontalmente em cima. Um adesivo era empregado (Plínio diz que era água do Nilo!) e
pressão aplicada para ligá-las formando uma folha. Após secar, era polida com instrumentos
de concha ou pedra; depois as folhas eram atadas, formando rolos".

f) Pergaminho. A preparação do pergaminho para receber a escrita tem uma interessante


história. De acordo com a História Natural de Plínio, o Velho (Livro XIII, capítulo XXI), foi o
rei Eumene de Pérgamo, uma cidade da Ásia Menor, quem promoveu a preparação e o uso
do pergaminho. Este rei planejou fundar uma biblioteca em sua cidade, que se rivalizasse
com a famosa biblioteca de Alexandria. Esta ambição não agradou a Ptolomeu do Egito,
que imediatamente proibiu a exportação de papiro para Pérgamo. Esta proibição forçou
Eumene a preparar peles de carneiro ou ovelha para receber a escrita, dando-lhe o nome
do lugar de origem – pergaminho. O pergaminho era muito superior ao papiro, por causa da
maior durabilidade. Os principais manuscritos bíblicos estão escritos em Pergaminhos.
Paulo na sua segunda Epístola a Timóteo (4.13) roga ao jovem ministro para que lhe
trouxesse os pergaminhos. Em grego a palavra não é pergaminho mas membrana. O
pergaminho continuou a ser usado até o fim da Idade Média quando o papel inventado pelos
chineses e introduzido na Europa pelos comerciantes árabes tornou-se popular,
suplantando todos os outros materiais da escrita. Os judeus eram bastante cuidadosos com
a preparação de manuscritos destinados a receber os escritos sagrados, exigindo que a
pele fosse de animal limpo e preparada por um judeu.

g) Palimpsesto. Em virtude de crises econômicas o pergaminho tornava-se muito caro, era


então raspado, lavado e usado novamente. Estes manuscritos eram chamados
palimpsestos (do grego palin = de novo e psesto = raspado). Um famoso manuscrito – o
Códice Efraimita está escrito em um palimpsesto. Por meio de reagentes químicos e raios
ultravioletas eruditos têm conseguido fazer reaparecer a escrita primitiva desses

30
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palimpsestos. Dos 250 manuscritos unciais conhecidos hoje, do Novo Testamento, 52 são
palimpsestos.

1.2.2 Caracteres dos Manuscritos

Na antiguidade havia dois tipos distintos de escrita em grego: o cursivo e o uncial. O cursivo, escrita
rápida, empregado em escritos não literários, tais como: cartas, pedidos, recibos. Neste tipo de
escrita eram comuns as contrações e abreviações. O uncial, usado mais em obras literárias,
caracterizava-se por serem as letras maiores e separadas umas das outras. Assemelhar-se-iam às
nossas letras maiúsculas. Os manuscritos bíblicos apresentam estes dois tipos de escrita, porém,
não nos devemos esquecer que os principais se encontram em letras unciais.

1.2.3 Manuscritos gregos

a) Papiros. O texto do Novo Testamento continuou sendo escrito sobre papiro até ao século
VII. Mas sabemos que a partir do século IV já se usava o pergaminho. Há nada menos de
76 papiros que contêm porções do Novo Testamento.

b) Unciais e Cursivos. Existia uma variedade de escritos unciais e cursivos. Há 252 cópias
unciais, atribuídas de 4 a 9 e mais ou menos 2646 cópias em cursivos, de 9 a 11 d.C.

c) Lecionários. Igualmente escritos em pergaminho. Há 1997 cópias. Eram leituras escolhidas


do texto do Novo Testamento, para serem lidas nas reuniões públicas nas igrejas. Portanto,
há nada menos de cinco mil manuscritos gregos. De todas as obras literárias antigas,
nenhuma é tão bem documentada como o Novo Testamento.

d) Ostracas. Eram pedaços de jarros quebrados, grafados com pequenas porções do Novo
Testamento ou de outras obras literárias. Do Novo Testamento há apenas vinte e cinco,
com os seguintes textos: Mt 27.31,32; Mc 5.40,41; Lc 12.13-16; Jo 1.1-9,14-17; 18.19-25 e
19.15-17.

e) Amuletos. Também chamados "talismãs da sorte." Eram pedaços de lança, madeira, barro,
pergaminho e papiro, com inscrições, algumas com breves porções do Novo Testamento,
inclusive a oração do Pai Nosso. Pertencem aos séculos IV à XIII.

1.2.4 Manuscritos Importantes do Antigo Testamento

Muitos dos manuscritos medievais do Antigo Testamento exibem uma forma positivamente
padronizada do texto hebraico. Essa padronização reflete o trabalho de copistas medievais
conhecidos pelo nome de massoretas (500-900 d.C.). O texto resultante desse trabalho é
denominado texto massorético. A maioria dos manuscritos importantes, datados do século XI d.C.
ou posteriores reflete essa mesma tradição textual básica. Mas, visto que o texto massorético não
se firmou até bem depois de 500 d.C., muitas questões relacionadas ao seu desenvolvimento nos
séculos precedentes não podiam ser respondidas. Então, a primeira tarefa para os críticos textuais
do Antigo Testamento foi comparar as testemunhas antigas, a fim de descobrir como o texto
massorético surgiu e como ele e os testemunhos antigos da Bíblia hebraica estão relacionados, o

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

que nos leva à primeira tarefa da crítica textual: a compilação de todos os registros possíveis dos
escritos bíblicos.

Todas as fontes primárias das Escrituras hebraicas são manuscritos (grafados à mão), geralmente
escritos em peles de animais, em papiros ou, às vezes, em metais. O fato de serem escritos à mão
é fonte de muitas dificuldades para o crítico textual. O erro humano e a interferência editorial são
freqüentemente culpados pelas muitas leituras variantes nos manuscritos do Antigo e do Novo
Testamento. Pela razão de os antigos manuscritos estarem escritos em peles ou em papiros, gera-
se outra fonte de dificuldades. Devido à deterioração natural, a maioria dos antigos manuscritos
subsistentes está fragmentária, difícil de ler [...] Há muitas testemunhas secundárias para o texto
primitivo do Antigo Testamento, incluindo traduções para outras línguas, citações usadas tanto por
amigos quanto por inimigos da religião cristã e evidências dos primeiros textos impressos. Grande
parte das testemunhas secundárias passou por processos similares às testemunhas primárias. Elas
também contêm numerosas variantes por causa de erros, não só intencionais como também
acidentais, e estão fragmentárias como resultado da degeneração natural. Considerando que as
leituras variantes realmente existem nos antigos manuscritos que subsistiram, estes devem ser
compilados e comparados. O trabalho de comparar e alistar as leituras variantes é conhecido por
colação (COMFORT, 1998, p. 215).

1.2.5 O Texto Massorético

A história do texto massorético é um relato por si mesmo significativo. Esse texto da Bíblia hebraica
é o mais completo que existe. Forma a base para nossas modernas Bíblias hebraicas e é o
protótipo pelo qual todas as comparações são feitas no estudo textual do Antigo Testamento. É
chamado massorético porque, em sua presente forma, foi baseado na Massora, a tradição textual
dos eruditos judeus conhecidos como os massoretas de Tiberíades (local dessa comunidade, no
mar da Galiléia). Os massoretas, cuja escola de erudição prosperou entre 500 e 1000 d.C. padroni-
zaram o tradicional texto consonantal, adicionando pontos vocálicos e notas marginais (o antigo
alfabeto hebraico não tinha vogais).

O manuscrito massorético de data mais antiga é o Códice Cairense (895 d.C. atribuído a Moisés
ben Aser. Esse manuscrito compreende os livros tanto dos primeiros profetas (Josué, Juízes,
Samuel e Reis) quanto dos últimos (Isaías, Jeremias, Ezequiel e os 12 Profetas Menores). O resto
do Antigo Testamento está faltando no manuscrito [...] Outro importante manuscrito subsistente
atribuído à família Ben Aser é o Códice Alepo. De acordo com nota conclusiva encontrada no
manuscrito, Aron ben Moisés ben Aser foi responsável por escrever as notas massoréticas e
colocar os pontos vocálicos no texto. Esse manuscrito continha todo o Antigo Testamento e data da
primeira metade do século X d.C. De acordo com notícias divulgadas, foi destruído em um tumulto
antijudaico em 1947, porém mais tarde tal informe comprovou-se ser apenas parcialmente
verdadeiro. Uma grande parte do manuscrito subsistiu e será usada como base para uma nova
edição crítica da Bíblia hebraica a ser publicada pela Universidade Hebraica de Jerusalém [...] O
manuscrito conhecido como Códice Leningradense, atualmente guardado na Biblioteca Pública de
Leningrado, é de especial importância como testemunha ao texto de Ben Aser. Segundo nota
contida no manuscrito, esse códice foi copiado, em 1008 d.C., de textos escritos por Aron ben
Moisés ben Aser. Visto que o mais antigo texto hebraico completo do Antigo Testamento (o Códice

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

Alepo), não estava disponível aos eruditos no início do século XX, o Códice Leningradense foi
usado como base textual para os populares textos hebraicos de hoje: a Bíblia Hebraica, editada por
R. Kittel, e sua revisão, a Bíblia Hebraica Stuttgartensia, editada por K. Elliger e W. Rudolf [...] Há
um número muito grande de códices de manuscritos menos importantes, que refletem a tradição
massorética: o Códice de Petersburgo dos Profetas e os Códices de Erfurt. Também há vários
manuscritos que não existem mais, embora tenham sido usados pelos eruditos no período
massorético. Um dos mais distintos é o Códice Hillel, tradicionalmente atribuído ao rabino Hillel ben
Moisés ben Hillel, de aproximadamente 600 d.C. Esse códice era dito como muito exato e foi usado
para a revisão de outros manuscritos. Leituras desse códice são repetidamente citadas pelos
antigos massoretas medievais. O Códice Muga, o Códice Jericó e o Códice Jerusalmi, também não
mais subsistentes, foram igualmente citados pelos massoretas. [...] A despeito da perfeição dos
manuscritos massoréticos da Bíblia hebraica, um importante problema ainda permanece para os
críticos do Antigo Testamento. Os manuscritos massoréticos, antigos como são, foram escritos
entre um e dois mil anos depois dos autógrafos originais. (COMFORT, 1998, p. 215-219).

1.2.6 Manuscritos do Mar Morto

Num dia de verão, em 1947, o pastor beduíno árabe, Muhammad ad Dib, da tribo dos Taa'mireh,
que se acampa entre Belém e o mar Morto, saiu a procura de uma cabra desgarrada nas ravinas
rochosas da costa noroeste do referido mar, e encontrou um inestimável tesouro bíblico. Estava o
pastor junto à encosta rochosa do uádi Qümramo Ao atirar uma pedra numa das cavernas ouviu um
barulho de cacos se quebrando. Entrou na caverna e encontrou uma preciosa coleção de MSS
bíblicos: 12 rolos de pergaminho e fragmentos de outros. Um dos rolos era um MS de Isaías do ano
100 a.C., isto é, mil anos mais antigo que os exemplares até então conhecidos. Os rolos estão es-
critos em papiro e pergaminho e envolvidos em panos de linho. Outras cavernas foram vasculhadas
e novos MSS foram encontrados.

Novas luzes estão surgindo na interpretação de passagens difíceis do Antigo Testamento.


Exemplos: em Êxodo 1.5, o total de pessoas é 75, concordando assim com Atos 7.14. (O hebraico
não tem algarismos para os números e sim letras; daí, para um erro não custa muito) Em Isaías
49.12, o novo MS de Isaías diz "Siene" e não "Sinin". Ora, Siene era uma importante cidade
fronteiriça do Egito, às margens do Nilo, junto à Etiópia. É hoje a moderna Assuam, com sua
extraordinária represa.

Ezequiel 29.10 e 30.6 referem-se a essa cidade; a versão ARC grafa "Sevené". Muitos eruditos
pensavam até agora que o termo "Sinin" de Isaías 49.12 fosse uma alusão à China. É muito
confortante saber que os textos desses MSS encontrados concordam com os das nossas Bíblias.
Pesquisas revelam que os MSS do mar Morto foram escondidos pelos essênios - seita ascética
judaica - durante a segunda revolução dos judeus contra os romanos em 132135 d.C. Os
responsáveis por um grande mosteiro agora descoberto, ao verem aproximar-se as tropas
romanas, esconderam ali sua biblioteca! Nas 267 cavernas examinadas, foram encontrados

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fragmentos de 332 obras, ao todo. Encontraram, inclusive, cartas do líder dessa revolta: Bar
Kochba, em perfeito estado, estando sua assinatura bem nítida. Nos MSS encontrados há trechos
de todos os livros do Antigo Testamento, exceto Ester.

1.2.8 Formato dos Livros

O livro, através da sua longa existência, apresentou duas formas bem distintas: o rolo e o códice.

(a) Rolo. Entre o povo judeu, bem como no mundo grego-latino, os livros eram normalmente
publicados em forma de um rolo feito de papiro ou pergaminho. Formava-se o rolo
colocando várias folhas de papiro ou couro uma ao lado da outra. O tamanho médio de um
rolo entre os gregos era de 11 metros. Alguns rolos chegaram a ter o comprimento de 30
metros. O maior rolo de papiro, conhecido, é uma crônica do rei egípcio Ramsés II, com a
extensão de 40 metros, conhecido como o Papiro Harris. O comprimento médio de um rolo
bíblico estava entre 9 e 11 metros. Livros longos como Reis, Crônicas e Isaías eram
divididos em dois rolos. Os dois maiores livros do Novo Testamento, Lucas e Atos, cada um
preencheria um rolo de mais ou menos 10 metros de comprimento. O manuseio de um rolo
era mais difícil do que o de um livro atual, porque o leitor necessitava empregar as duas
mãos, uma para desenrolá-lo e a outra para enrolá-lo. Além disso, as comunidades cristãs
primitivas, em breve descobriram que era difícil encontrar específicos tópicos das escrituras
num rolo. Diante dessas dificuldades, o engenho humano idealizou o livro nos moldes em
que o temos hoje. Estes livros em seus primórdios eram chamados códices.

(b) Códices. A palavra códice vem do latim "codex", que designava primitivamente um bloco de
madeira cortado em várias folhas ou tabletes para escrever. O códice era formado de várias
folhas de papiro ou pergaminho sobrepostas e costuradas. Estes códices começaram a
substituir os primitivos rolos no segundo século a.D. A afirmativa de que as comunidades
cristãs, começaram a usar os códices nas igrejas, para diferençar dos rolos, usados nas
sinagogas, pode ser verdadeira, levando-se em conta o seguinte. Dos 476 manuscritos não
cristãos descobertos no Egito, copiados no segundo século a.D., 97% estão na forma de
rolo. Em contrapartida, dos 111 manuscritos bíblicos cristãos dos primeiros 4 séculos da Era
Cristã, 99 estão na forma de códice.

As vantagens dos códices sobre os rolos, no caso dos manuscritos bíblicos, são evidentes pelas
seguintes razões: Permitia que os quatro Evangelhos, ou todas as Epístolas paulinas se achassem
num livro; era bem mais fácil o manuseio do livro; adaptava-se melhor para receber a escrita de
ambos os lados, baixando assim o custo do livro; a procura de determinadas passagens era mais
rápida.

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1.3 O Vocábulo "Bíblia"

Este vocábulo não se acha no texto das Sagradas Escrituras. Consta apenas na capa. De onde,
pois, vem? Vem do grego, a língua original do Novo Testamento. É derivado do nome que os
gregos davam à folha de papiro preparada para a escrita - "biblos". Um rolo de papiro de tamanho
pequeno era chamado "biblion" e vários destes eram uma "Bíblia". Portanto, literalmente, a palavra
“Bíblia” quer dizer "coleção de livros pequenos". Com a invenção do papel, desapareceram os rolos,
e a palavra “biblos” deu origem a "livro", como se vê em biblioteca, bibliografia, bibliófilo etc.

É consenso geral entre os doutos no assunto que o nome Bíblia foi primeiramente aplicado às
Sagradas Escrituras por João Crisóstomo, patriarca de Constantinopla, no Século IV. E porque as
Escrituras formam uma unidade perfeita, a palavra Bíblia, sendo um plural, como acabamos de ver,
passou a ser singular, significando o Livro, isto é, o Livro dos livros; o Livro por excelência. Como
Livro divino, a definição canônica da Bíblia é "A revelação de Deus à humanidade". Os nomes mais
comuns que a Bíblia dá a si mesma, isto é, os seus nomes canônicos, são: Escrituras (Mt 21.42);
Sagradas Escrituras (Rm 1.2); Livro do Senhor (Is 34.16); Palavra de Deus (Mc 7.13; Hb 4.12);
Oráculos de Deus (Rm 3.2).

1.4 Nomes atribuídos a Palavra de Deus

a) Bíblia. A palavra Bíblia, usada com referência às Escrituras Sagradas desde o IV século, é
a forma latina da palavra grega Bíblia, plural neutro de Biblion, que por sua vez é diminutivo
de Biblos – nome grego para a planta da qual se fazia o papel – papiro Pelo uso que se fez
do papiro é que biblos veio a significar livro e biblion um livro pequeno. Os fenícios se
ocupavam grandemente do comércio de papiro, por isso no segundo século a.C. deram o
nome de Biblos ao seu principal porto, passando depois à cidade, e conservado até hoje
para as suas ruínas. A palavra Biblos encontra-se em Marcos 12.26 como referência a um
livro de Velho Testamento, ou a um grupo no plural para designar os livros dos profetas –
Daniel 9.2. O plural usado no Velho Testamento passou à Igreja Cristã e as Escrituras são
designadas por livros, livros divinos, livros canônicos. O nome Bíblia para o conjunto dos
livros sagrados, foi usado pela primeira vez por Crisóstomo, no IV século. Alguns pais da
Igreja denominaram as Escrituras de Biblioteca Divina.

b) Escrituras. O Novo Testamento, que ocupa menos da terceira parte do Velho, usa a
expressão – Os Escritos ou as Escrituras para os livros do Antigo Testamento, em Mateus
21.42 e João 5.39.

c) Outras Expressões: A Palavra de Deus (Hb 4.12); A Escritura de Deus (Êx 32.16); As
Sagradas Letras (1Tm 3.15); A Escritura da Verdade (Dn 10.21); As Palavras da Vida (Atos
7.38); As Santas Escrituras (Rm 1.2).

d) Nomes figurativos: Uma luz. "Uma luz para o meu caminho" (Sl 119:105); Um espelho (Tg
1.23); Ouro fino (Sl 19.10); Uma porção de alimento (Jó 23.12); Leite (1Co 3.2); Pão para os
famintos (Dt 8.3); Fogo (Jr 23.29); Um martelo (Jr 23.29); Uma espada do Espírito (Ef 6.17).

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e) Pentateuco. Etimologicamente, Pentateuco significa cinco estantes, onde se colocavam os


livros e depois, por metonímia, os próprios livros. Pesquisando um pouco mais se tem a
impressão de que as estantes eram aqueles pedaços de madeira que sustentavam os rolos,
vindo depois a designar os próprios rolos. O termo pentateuco, de origem grega,
significando cinco rolos tem sido usado para os cinco livros de Moisés, enquanto o nome
hebraico para estes mesmos livros é Torá. Este vocábulo começou a ser usado para os
primeiros cinco livros da Bíblia depois da tradução da Septuaginta. Estes livros constituem a
primeira divisão do Cânon Hebraico, que é formado, como é do conhecimento geral, da Lei,
dos Profetas e dos Escritos. Eruditos modernos têm usado o termo "Hexateuco" em vez de
Pentateuco, por adicionarem aos primeiros livros da Bíblia o livro de Josué, por notarem
muita afinidade entre os seis. Nenhuma razão plausível existe para a aceitação desta nova
nomenclatura, desde que o termo tem sido usado por críticos que não admitem tenha sido
Moisés o autor do Pentateuco.

f) Testamento. Este vocábulo não se encontra na Bíblia como designação de uma de suas
partes. Sabemos que toda a Bíblia se divide em duas partes chamadas Antigo Testamento
e Novo Testamento. Contendo a primeira, os escritos elaborados antes de Cristo, a
segunda registra o que foi redigido no primeiro século da nossa era. A palavra portuguesa
testamento corresponde à palavra hebraica "berith" – aliança, pacto, contrato, e designa
aquela aliança que Deus fez com o povo de Israel no Monte Sinai, aliança sancionada com
o sangue do sacrifício como vemos em Êxodo 24.1-8; 34.10-28. Sendo esta aliança
quebrada pela infidelidade do povo, Deus prometeu uma nova aliança (Jr 31.31-34) que
deveria ser ratificada com o sangue de Cristo. (Mt 26.28). Os escritores neotestamentários
denominam a primeira aliança de antiga (Hb 8.13), contrapondo-lhe a nova (2Co 3.6,14). Os
tradutores da Septuaginta traduziram "berith" para "diatheke", embora não haja perfeita
correspondência entre as palavras, desde que berith designa aliança (compromisso
bilateral) e diatheke tem o sentido de "última disposição dos próprios bens", "testamento"
(compromisso unilateral). Pela figura de linguagem, conhecida como metonímia, as
respectivas expressões "antiga aliança" e "nova aliança" passaram a designar a coleção
dos escritos que contém os documentos respectivamente da primeira e da segunda aliança.
O termo testamento veio até nós através do latim quando a primeira versão latina do Velho
Testamento grego traduziu diatheke por testamentum. São Jerônimo revisando esta versão
latina manteve a palavra "testamentum", eqüivalendo ao hebraico "berith" – aliança,
concerto, quando a palavra como já foi visto não tinha essa significação no grego. Afirmam
alguns pesquisadores que a palavra grega para contrato, aliança deveria ser suntheke, por
traduzir melhor o hebraico "berith". As denominações Antigo Testamento e Novo
Testamento, para as duas coleções dos livros sagrados, começaram a ser usadas no final
do II século a.D. quando os evangelhos e outros escritos apostólicos foram considerados
como Escrituras. O cristianismo distinguiu duas etapas na manifestação do dom de Deus à
humanidade: A antiga – feita por Deus ao povo de Israel (2Co 3.14); A segunda ou nova
designa a união que o próprio Deus, tomando a forma humana, selou com o homem pela
oblação de Cristo (2Co 3.6).

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g) Torah. Palavra derivada do verbo Yarah, que no "hifil" significa lançar, jogar (Êx 15.4, 1Sm
20.36) e de modo especial lançar flechas para se conhecer a vontade divina (Js 18.6; 2Rs
13.17). O mesmo verbo é usado no sentido de mostrar com a mão, apontar com o dedo (Gn
46.28; Êx 15.25). A significação fundamental de yarah é, portanto; indicar uma direção. O
substantivo cognato tem o sentido bíblico mais corrente: ensinamento, instrução, como se
deduz da leitura de Isaías 30.9; 42.4; Mq 4.2; Ml 2.6; Jó 22.22, onde esta palavra aparece.
Do estudo desta palavra conclui-se que o termo português "lei" não traduz o vocábulo
hebraico em toda a sua extensão. A torah é o ensinamento que inspira bom procedimento
em nosso viver.

h) O termo “Palavra”. No Antigo Testamento, a palavra dãbhãr de Deus é usada por 394 vezes
para designar alguma comunicação divina provinda da parte de Deus aos homens, na
forma de mandamento, profecia, advertência ou encorajamento. A fórmula usual é “a
palavra de Yahweh veio (literalmente, foi) a ...”, ainda que algumas vezes a palavra de Deus
seja vista como uma visão (Is 2.1; Jr 2.31; 38.21). A palavra de Yahweh é uma extensão da
personalidade divina, investida de autoridade, e deve ser ouvida tanto pelos anjos como
pelos homens (Sl 103.20; Dt 12.32). A palavra de Deus permanece para sempre (Is 40.8), e
uma vez proferida não pode deixar de ser cumprida (Is 55.11). É usada como sinônimo da
lei, tôrah, de Deus, em Sl 119, onde a referência é à mensagem escrita e não à mensagem
falada da parte de Deus. No Novo Testamento, “palavra” geralmente traduz dois termos
gregos, logos e rhema, a primeira é usada supremamente para designar a mensagem do
evangelho cristão (Mc 2.2; At 6.2; Gl 6.6), embora a última esteja revestida da mesma
significação (Rm 10.8; Ef 6.17; Hb 6.5 etc.). Nos pontos seguintes veremos maiores
detalhes

2 - LÍNGUAS, CARACTERÍSTICAS E AUTORIDADE

2.1 Línguas em que a Bíblia Escrita

Quase todos os estudantes da Bíblia sabem que o Velho Testamento foi escrito em hebraico, e o
Novo, em grego, mas muitos desconhecem o fato de que há uma terceira língua na Bíblia – o
aramaico.

2.1.1 Aramaico

O aramaico foi sem dúvida, desde muito tempo, a língua popular de Babilônia e da Assíria, cuja
linguagem literária, culta e religiosa era o sumero-acadiano. Documentos assírios mencionam o
aramaico desde 1100 a.C. Durante o reinado de Saul e Davi, os estados aramaicos ou sírios são
mencionados na Bíblia (1Sm 14.47; 2Sm 8.3-9; 10.6-8). O aramaico foi trazido para a Palestina
porque os assírios seguiam costume de transplantar os povos das nações subjugadas, por isso
depois de terem vencido o reino de Israel, trocaram as pessoas e as espalharam através de todo o
seu império. 2Rs 17.24 menciona explicitamente que entre os povos trazidos para Samaria a fim de

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repovoarem a terra devastada, encontravam-se aramaicos de Hamate. Esta língua dotada de


grande poder de expansão, tornou-se usual nas relações internacionais de toda a Ásia, e na própria
Palestina propagou-se tão largamente, que venceu o próprio hebraico.

O lar original do aramaico foi a Mesopotâmia. Algumas tribos arameanos viviam ao sul de
Babilônia, perto de Ur, outras tinham seus lares na alta Mesopotâmia entre o rio Quebar (Khabúr) e
a grande curva do Eufrates, tendo Harã como centro. O fato de os patriarcas Abraão, Isaque e Jacó
terem conexões com Harã é provavelmente responsável pelo estatuto feito por Moisés de que Jacó
era "arameano". Dt 26.5. Deste seu lar ao norte da Mesopotâmia o aramaico se espalhou para o sul
de toda a Assíria.

Tudo indica que o aramaico foi preferido pelos assírios e babilônicos por ser mais simples do que a
complicada escrita cuneiforme. A prova de sua simplicidade está relatada em 2Rs 18.26, quando
Senaqueribe invadiu Judá no fim do VIII século a.C. os oficiais judeus que dominavam tão bem o
hebraico quanto o aramaico, pediram ao general assírio que lhes falasse em aramaico. Esta ainda
a razão porque durante os setenta anos do cativeiro babilônico os judeus se esqueceram muito do
hebraico, adotando em seu lugar o aramaico. Ao voltarem do cativeiro continuaram falando o
aramaico, como se depreende da leitura de Neemias 8.1-3 e 8. O aramaico era a língua usada por
Jesus (Mc 5.41; 7.34; 15.34), pela maioria das pessoas na Palestina, bem como pelas primeiras
comunidades cristãs. Segundo outros estudiosos entre os quais se destaca Robertson, Jesus
falava aramaico na conversação diária, mas no ensino público e nas discussões com os fariseus a
língua usada era o grego.

Já antes da Era Cristã suplantou totalmente o hebraico que se tornou a língua morta e
exclusivamente religiosa. Na Ásia Ocidental, a língua aramaica se difundiu largamente, assumindo
naquelas regiões e naquele tempo o mesmo papel que assumem em nossos dias o francês e o
inglês. O aramaico, embora ainda utilizado em certas regiões, vai cedendo lugar ao árabe, e corre o
perigo de desaparecer como língua falada, pois hoje é falada somente em algumas povoações da
Síria. O aramaico desapareceu sob o impacto cultural do grego e do latim, já que deixou de ser
conhecido pelos cristãos.

Quem conhece o hebraico pode com facilidade ler e entender o aramaico, dadas as suas
marcantes semelhanças. As partes do Velho Testamento escritas em aramaico são as seguintes: A
expressão "Jegar-Saaduta" de Gênesis 31.47; O verso de Jeremias 10.11; Alguns trechos de
Esdras 4.8 a 6.18; 7.22-26; Partes do livro de Daniel, entre os capítulos 2.4 a 7.28.

2.1.2 Hebraico

A língua hebraica foi a língua dos Hebreus ou israelitas desde a sua entrada em Canaã. A sua
origem é bastante misteriosa, porque além do Velho Testamento só possuímos escassos
documentos para o seu estudo. O mais provável é que o hebraico tenha vindo do cananeu e foi
falado pelos israelitas depois de sua instalação na Palestina. A atual escrita hebraica (chamada
"hebraico quadrado") é cópia do aramaico e entrou em uso pouco antes da nossa era, em
substituição ao hebraico arcaico. Os Targuns o denominam de "língua sagrada" (Is 19.18); e no
Velho Testamento é chamado "a língua de Canaã" ou a língua dos judeus (Is 36.13, 2Rs 18.26-28).

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Salmo 114.1 mostra a grande diferença entre o hebraico e o egípcio. Israel por estar cercado de
povos que falavam uma língua cognata – o aramaico – foi se esquecendo do hebraico, até que este
veio a extinguir-se como língua falada. Era ainda a língua de Jerusalém no tempo de Neemias
(13.24), cerca de 430 a.C., mas muito antes do tempo de Cristo foi substituída pelo aramaico.

O alfabeto hebraico consta apenas de consoantes, em número de 22. O hebraico é escrito da


direita para a esquerda como o árabe e algumas outras línguas semíticas. Sua estrutura
fundamental é, como em todas as línguas semíticas, a palavra raiz, composta de três consoantes.
É uma língua bastante simples, seus melhores conhecedores sublinham sem hesitação a sua
pobreza, quando comparado com o grego ou com línguas modernas, como o inglês e o português.
De acordo com a Pequena Enciclopédia Bíblica o vocabulário hebraico na Bíblia conta com apenas
7.704 vocábulos diferentes. A Academia do Idioma Hebraico tem registrado o uso de cerca de
30.000 palavras. Quase não possui adjetivos nem pronomes possessivos, porém, é rica em
advérbios. É uma língua quase indigente em termos abstratos.

Quase sempre os pronomes pessoais são ligados às formas verbais como se fossem sufixos ou
prefixos. Com raras exceções não faz uso de palavras compostas. O alfabeto hebraico possui letras
com sons bem próprios, por isso não apresentam nenhuma semelhança com o nosso alfabeto. Os
dois exemplos mais característicos se encontram no "alef" e no "ayin". Se língua é um organismo
vivo que se transforma, o hebraico quase pode apresentar-se como exceção, como comprovam os
escritos de Moisés e de alguns profetas mil anos depois, cujas diferenças lingüísticas são
insignificantes. Este fato tem levado a "alta crítica" a dogmatizar que os escritos do Velho
Testamento foram produzidos num espaço de tempo bem pequeno.

Seus processos sintáticos são muito simples, usando pouco as orações subordinadas, preferindo
sempre as coordenadas, quase sempre unidas pela conjunção "e" como inegável influência do
hebraico. Os tempos do verbo, a exemplo do grego, indicam mais o "aspecto" da ação, conforme
ela seja momentânea, prolongada ou repetida. Como língua semítica não classifica os fatos em
passados, presentes e futuros, mas em realizados ou de ação acabada (perfeito), e não realizados
ou de ação inacabada (imperfeito).

Uma das peculiaridades da língua hebraica com respeito ao sistema verbal é esta: a simples troca
de um sinal vocálico determina uma mudança nas formas verbais. Não possui o verbo "ter",
enquanto o verbo "ser" é ativo e significa existir eficazmente. Quando os judeus sentiram que o
hebraico estava em declínio como língua falada, e que sua leitura correta ia perder-se, criaram um
sistema de vocalização. Este trabalho foi feito pelos massoretas, por isso o texto hebraico usado
hoje chama-se massorético.

2.1.3 Grego Bíblico

Como é do conhecimento geral, o Novo Testamento foi escrito na Koinê, língua na qual também foi
traduzido o Velho Testamento hebraico pelos Setenta. O termo Koinê significa a língua comum do
povo entre os anos 330 a.C. e 330 a.D. Com exceção da Epístola aos Hebreus e da linguagem de
Lucas (Evangelho e Atos) que se encontram num Koinê mais literário, os outros escritos pertencem
à língua mais comum ou Koinê vulgar. O insigne erudito Gustav Adolf Deissmann foi quem primeiro
mostrou a identidade do grego do Novo Testamento, salientando que o grego da Bíblia era o Koinê,

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e não o grego erudito, nem a chamada "linguagem do Espírito Santo" ardorosamente defendida por
alguns autores.

2.1.3.1 Características da Linguagem do Novo Testamento

Se fosse possível caracterizar o Koinê, língua em que foi escrito o Novo Testamento, sintetizando-a
em uma palavra, a melhor seria "simplificação". Esta conclusão é facilmente deduzida estudando-
lhe as características: Substituição dos casos pelas preposições; tendência para simplificar a
morfologia e a sintaxe; uso escasso de orações subordinadas, tendo preferência pelas
coordenadas ligadas pela conjunção "e"; eliminação do dual e uso parcimonioso do modo optativo,
aparecendo apenas 67 vezes no Novo Testamento; uso mais freqüente do artigo; simplificação das
riquíssimas formas verbais do grego clássico; mudança de sentido de muitas palavras do grego
clássico, por influência religiosa, tais como: batizar, justiça, graça, amor, glória, carne, cruz, mundo,
crer, espírito, cálice, dia, etc.; as formas diminutivas se tornam mais comuns; emprego mais
generalizado de construções perifrásticas nos verbos; os adjetivos são mais usados no grau
superlativo do que no comparativo; preferência pela ordem mais direta, pois no grego clássico
predomina a ordem inversa; emprego freqüente dos pronomes sujeitos, em casos dispensáveis, por
estarem eles subentendidos nas desinências verbais; idêntico valor fonético para as vogais gregas;
emprego de vários latinismos, tais como: legião, centurião, denário, colônia e flagelo; uso freqüente
do presente histórico nas narrativas; aparecimento generalizado da parataxe, com prejuízo da
hipotaxe.

2.2 A Sobrenaturalidade da Bíblia

A Bíblia é um fenômeno que só é explicável de um modo: é a Palavra de Deus. Ela não é o tipo de
livro que o homem escreveria se pudesse, ou que poderia escrever se quisesse. Outros sistemas
religiosos também têm seus desvios excêntricos do curso comum do procedimento humano,
desvios esses que não são muitos, e são de pequena importância; e estes, realmente, são de se
esperar, considerando que o homem está sempre determinado a crer em um Deus, ou deuses,
quer sua crença seja baseada em fatos ou não. O estudante da verdade sempre será convidado a
reconhecer contra reivindicações extra-bíblicas e intrabíblicas. Aquilo que é extrabíblico encampa
todo o campo das religiões humanamente arquitetadas e especulações filosóficas. O que é
intrabíblico encampa todos os cultos e declarações parciais da verdade divina que, embora
professem edificar seus sistemas sobre as Escrituras, fazem-no, entretanto, através de falsas
ênfases ou negligência da verdade, provocando uma confusão de doutrina que é parente ou talvez
até mais desencaminhadora do que o erro sem mistura. Embora não seja possível apresentar uma
lista exaustiva, enumeramos aqui alguns dos muitos aspectos sobrenaturais da Bíblia:

2.2.1 O Livro de Deus

Com este título queremos chamar a atenção para a reivindicação que a Bíblia apresenta de que é a
mensagem de Deus ao homem e não uma mensagem do homem aos outros homens, muito menos

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uma mensagem do homem a Deus. Neste Livro, Deus é apresentado como o Criador e Senhor de
tudo. É a revelação dele próprio, o registro do que Ele tem feito e vai fazer, e, ao mesmo tempo, a
revelação do fato de que cada coisa está sujeita a Ele e que só descobre suas vantagens mais
elevadas e seu destino quando se conforma à Sua vontade. Cada palavra da Bíblia é o resultado
de sublimes declarações como esta: "Não há Deus como tu, em cima nos céus nem em baixo da
terra" (1Rs 8.23), e, novamente: "Tua, Senhor, é a grandeza, o poder, a honra, a vitória e a
majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu, Senhor, é o reino, e tu te exaltaste
por chefe sobre todos" (1Cr 29.11). "Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo, e
grande em misericórdia e fidelidade" (Êx 34.6). "As suas ternas misericórdias permeiam todas as
suas obras" (SI 145.9). Quem, entre a humanidade cega, seria o escritor de ficção capaz de criar os
conceitos de um Deus triúno de toda a eternidade que se encontra nas páginas das Escrituras?
Quem, entre os homens, planejou o peculiar e perfeito equilíbrio das partes de cada Pessoa da
Divindade na redenção, ou o caráter divino na sua consistente e inalterável exibição de santidade
infinita e amor infinito: os juízos divinos, a avaliação divina de todas as coisas, inclusive das hostes
angélicas e dos espíritos do mal? Quem, entre os homens, já foi capaz de conceber a criação de
tais noções interdependentes, além de expressá-Ias perfeitamente numa história em andamento, a
qual, sendo acidental, afinal não passa de imitação: uma imitação hipócrita e dissimulada da
verdade? Que absurda é a presunção de que o homem sozinho poderia escrever a Bíblia, se assim
o quisesse! Mas se o homem não deu origem a Bíblia, Deus o fez, e por causa disso sua
autoridade tem de ser reconhecida.

2.2.2 A Bíblia e o Monoteísmo

O fato de que Deus é supremo implica em que não há nenhum outro que se lhe compare; mas
quase universalmente a humanidade tem praticado, com uma contumácia que está longe de ser
acidental, as abominações da idolatria. O povo judeu, de quem, considerando o lado humano,
vieram as Escrituras, não ficaram imunes a esta tendência. Desde os dias do bezerro de ouro,
através dos séculos seguintes, os israelitas estiveram sempre revertendo à idolatria e isto apesar
da abundância de revelação e castigo. A história da igreja está manchada pelo culto de imagens
esculpidas assimiladas do paganismo. Com que insistência o Novo Testamento adverte os crentes
a fugir da idolatria e da adoração dos anjos! À luz destes fatos, como poderíamos supor que os
homens (até mesmo Israel) pudessem, à parte da direção divina, dar origem a um tratado que, com
os olhos apenas na glória de Deus, estigmatiza a idolatria como um dos primeiros e mais ofensivos
crimes e insultos contra Deus? A Bíblia não é o tipo de livro que o homem escreveria se pudesse.

2.2.3 A Doutrina da Trindade

Embora defendendo o monoteísmo sem modificação, a Bíblia apresenta o fato de que Deus
subsiste em três Pessoas ou modos de ser. A doutrina bíblica da Trindade consiste em que Deus é
um em essência, mas três Pessoas em identificação. Sem dúvida, este é um dos grandes mistérios.
A doutrina vai além do alcance da compreensão humana, embora seja fundamental na revelação
divina. Quando consideradas separadamente, as Pessoas individuais da Divindade apresentam as
mesmas evidências indiscutíveis quanto à origem sobrenatural da Bíblia.

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Deus Pai. Vasto realmente é o campo das Escrituras que apresenta as atividades e as
responsabilidades distintivas que são características da Primeira Pessoa. Dizemos que Ele é o Pai
de toda a criação, o Pai do Filho eterno (a Segunda Pessoa) e o Pai de todo aquele que crê para a
salvação de sua alma. Esta revelação estende-se a todos os detalhes do relacionamento paternal e
inclui a dádiva do Filho para que a graça de Deus pudesse ser revelada. Nenhuma mente humana
poderia dar origem ao conceito de Deus Pai como Ele é revelado na Bíblia.

Deus Filho. O registro referente à Segunda Pessoa, que, de acordo com a Palavra de Deus, é o
Filho desde a eternidade, que sempre é a manifestação do Pai e que, embora esteja agora sujeito
ao Pai, é o Criador das coisas materiais, o Redentor e Juiz final de toda a humanidade, oferece as
evidências mais extensas e mais incomensuráveis da origem divina das Escrituras. A Pessoa e a
obra do Filho de Deus com Sua humilhação e glória é o tema dominante da Bíblia; mas o Filho, em
troca, dedica-se à glória do Pai. As perfeições do Filho não podem nunca ser comparadas ao mais
sábio dos homens, nem compreendidas por ele. Se, afinal, esta revelação ilimitada do Filho não
passa de ficção, não seria um desafio razoável (mesmo para a mente não regenerada) que este
suposto autor fosse descoberto e, com base no truísmo de que a coisa criada não pode ser maior
do que o seu criador, fosse adorado e reverenciado acima de tudo o que é chamado de Deus?

Deus Espírito. O Espírito Santo que é apresentado na revelação como igual em cada particular ao
Pai e ao Filho, é, não obstante e para a promoção dos atuais empreendimentos divinos, retratado
como sujeito a ambos, o Pai e o Filho. Do mesmo modo, Seu serviço é considerado como
complemento e administração da obra do Pai e do Filho.

Assim o Deus triúno revelou-se ao homem em termos que o homem, mesmo quando ajudado pelo
Espírito, só pode compreender debilmente; e que pueril é a intimação de que estas revelações são
o produto dos homens que sem exceção desde os dias de Adão são depravados, degenerados e
incapazes de receber ou conhecer as coisas de Deus à parte da iluminação divina! Tal conceito
propõe nada menos que a presunção de que o homem deu origem à idéia de Deus, e que o Criador
é um produto da criatura.

2.2.4 A Continuidade da Bíblia

A continuidade da mensagem da Bíblia é absoluta em sua inteireza. Ela se mantém coesa por sua
seqüência histórica, tipos e antítipos, profecias e seu cumprimento e por antecipação,
apresentação, realização e exaltação da Pessoa mais perfeita que jamais andou sobre a terra e
cujas glórias são o resplendor do céu. Mas a perfeição desta continuidade se mantém contra o que
para o homem seriam impedimentos insuperáveis; pois a Bíblia é uma coleção de sessenta e seis
livros que foram escritos por mais de quarenta diferentes autores: reis, camponeses, filósofos,
pescadores, médicos, políticos, mestres, poetas e lavradores, que viveram suas vidas em diversos
países e não experimentaram nenhum contato ou concordância entre si, e durante um período de
não menos que mil e seiscentos anos de história humana. Por causa destes obstáculos de
continuidade, a Bíblia seria naturalmente a coleção mais heterogênea, mais desigual, mais

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inconsonante e contraditória de opiniões humanas que o mundo já viu; mas, pelo contrário, ela é
exatamente o que pretende ser, isto é, uma narrativa homogênea, ininterrupta, harmoniosa e
ordeira de toda a história do relacionamento de Deus com o homem.

Este livro contendo muitos livros não recebeu a impressão idiossincrática de muitas mentes. Sua
harmonia não é a de trombetas tocadas em uníssono, mas, antes, uma orquestração em que,
embora absolutamente afinada distingue-se perfeitamente os instrumentos. Em que base esta
continuidade plenária poderia ser explicada se afirmássemos que a Bíblia não é a Palavra de
Deus?

2.2.5 Profecia e seu Cumprimento

Um grandíssimo número de profecias foram feitas pelos escritores do Antigo Testamento


relativamente à vinda do Messias e foram centenas, algumas vezes milhares de anos antes da
vinda de Cristo. Essas predições que no propósito divino deveriam se cumprir no primeiro advento
de Cristo cumpriram-se literalmente nessa ocasião. Muitas mais permanecem sem cumprimento até
que Ele volte e, temos motivos para crer, elas se cumprirão com a mesma precisão. Bastariam dois
vaticínios feitos e cumpridos, como os do nascimento virginal de Cristo que aconteceu em Belém de
Judá, e o caráter sobrenatural das Escrituras estaria comprovado pela história que registra sua
realização; mas quando estas predições chegam a milhares relativamente às Pessoas da
Divindade, aos anjos, às nações, às famílias, aos indivíduos e aos destinos, sendo cada uma delas
executada exatamente no tempo e lugar prescritos, a evidência é incontestável quanto ao caráter
divino das Escrituras.

2.2.6 Tipos com seus Antítipos

Um tipo é um esboço divino que descreve um antítipo. E a ilustração de uma verdade divina feita
pela própria mão de Deus. O tipo e o antítipo estão relacionados entre si pelo fato de que a verdade
ou o princípio conectivo encontra-se incorporado em cada um deles. Não é prerrogativa do tipo
estabelecer a verdade de uma doutrina; antes, ele realça a força da verdade apresentada no
antítipo. Por outro lado, o antítipo serve para destacar o tipo no seu lugar comum, colocando-o
naquilo que é transcendental, investindo-o com as riquezas e os tesouros até então não revelados.
O tipo do Cordeiro Pascal transborda da graça redentora de Cristo com riqueza de significado,
enquanto a própria redenção investe o tipo do Cordeiro Pascal de todo o seu maravilhoso
significado. A continuidade das Escrituras, a profecia e o seu cumprimento, e os tipos com os seus
antítipos, são os três fatores principais que não só servem para apresentar a unidade dos dois
Testamentos, como fios entretecidos que passam de um Testamento para outro, ligando-os em um
único material, mas também servem para traçar o desenho que pelo seu maravilhoso caráter
glorifica o Desenhista. Assim, a tipologia conforme se encontra na Bíblia demonstra que a Bíblia é
um livro que o homem não poderia escrever se quisesse. É divina em sua origem como é
sobrenatural em seu caráter.

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2.2.7 Revelação e Razão

A Teologia Sistemática extrai o seu material tanto da revelação quanto da razão, embora a porção
fornecida pela razão seja incerta quanto à autoridade e, quando muito, restrita a um ponto
insignificante. A razão, como aqui está sendo considerada, indica as faculdades intelectuais e
morais do homem exercitadas na busca da verdade e à parte de ajuda sobrenatural. Desde que
Adão andou e falou com Deus (revelação essa que ele sem dúvida comunicou à sua posteridade),
nenhum homem na Terra poderia ficar totalmente alheio à revelação divina. Dentro dos limites
circunscritos daquilo que é humano, a razão é predominante; mas, quando comparada com a
revelação divina, ela é falível e limitada.

2.2.7.1 Revelação

Entendemos que revelação é a manifestação que Deus faz de Si mesmo e a compreensão, parcial
embora, da mesma manifestação por parte dos homens. Este modo de definir a revelação acentua
que o que se revela é o próprio Deus, e não apenas alguma coisa a respeito de Deus. Na
revelação, Deus faz-se conhecido dos homens na sua personalidade e nas suas relações. Revelar
é informar, e isto é justamente o que Deus há feito. “Fez conhecidos os seus caminhos a Moisés, e
os seus feitos aos filhos de Israel” (Salmos 103.7). Deus informou ao homem acerca de Sua
Pessoa e das Suas relações com a criação. Não nos esqueçamos de que o centro de toda a
revelação é a pessoa de Deus. Jesus frisou bem esta verdade quando disse que veio revelar o Pai:
“Quem me vê a mim, vê o Pai”.

A revelação não tem por fim simplesmente informar o homem acerca de Deus, mas também
descobrir Deus ao homem. Deus quer que o homem o conheça; daí a razão de ele se revelar. “Os
céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia faz
declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Não há linguagem nem fala
onde se não ouçam as suas vozes. A sua linha se estende por toda a terra, e as suas palavras até
o fim do mundo” (Salmos 19.1-4).

2.1 - INSPIRAÇÃO

O primeiro grande elo da cadeia comunicativa “de Deus para nós” chama-se inspiração. Há diversas teorias a
respeito da inspiração. Algumas delas não se coadunam com o ensino bíblico sobre o assunto. Nosso
propósito, portanto, neste capítulo, tem dois aspectos: primeiro, examinar as teorias a respeito da inspiração
e, segundo, apurar com a máxima precisão o que está implícito no ensino da Bíblia a respeito de sua própria
inspiração.

 As várias teorias a respeito da inspiração

Ao longo da história, as teorias a respeito da inspiração da Bíblia têm variado segundo as características
essenciais de três movimentos teológicos: a ortodoxia, o modernismo e a neo-ortodoxia. Ainda que essas
três perspectivas não se limitem a um único período, suas manifestações primordiais são características de
três períodos sucessivos na história da igreja.

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Na maior parte dessa história, prevaleceu a visão ortodoxa, a saber: a Bíblia é a Palavra de Deus. Com o
surgimento do modernismo, muitas pessoas vieram a crer que a Bíblia meramente contém a Palavra de Deus.
Mais recentemente, sob a influência do existencialismo contemporâneo, os teólogos neo-ortodoxos têm
ensinado que a Bíblia torna-se a Palavra de Deus quando a pessoa tem um encontro pessoal com Deus em
suas páginas.

Ortodoxia: a Bíblia é a Palavra de Deus

Por cerca de 18 séculos de história da igreja, prevaleceu a opinião ortodoxa da inspiração divina. Os pais da
igreja, em geral, com raras manifestações menos importantes em contrário, ensinaram firmemente que a
Bíblia é a Palavra de Deus escrita. Teólogos ortodoxos ao longo dos séculos vêm ensinando, todos de comum
acordo, que a Bíblia foi inspirada verbalmente, i.e., é o registro escrito por inspiração de Deus. No entanto,
tem havido tentativas de procurar explicação para o fato de o registro escrito ser a Palavra de Deus ao
mesmo tempo que o Livro obviamente foi composto por autores humanos, dotados de estilos pessoais
diferentes uns dos outros; essas tentativas conduziram os estudiosos ortodoxos a duas opiniões divergentes.
Alguns abraçaram a idéia do “ditado verbal”, afirmando que os autores humanos da Bíblia registraram
apenas o que Deus lhes havia ditado, palavra por palavra. De outro lado, estão os estudiosos que preferiam a
teoria do “conceito inspirado”, segundo a qual Deus só concedeu aos autores pensamentos inspirados, e os
autores tiveram liberdade de revesti-los com palavras próprias.

Ditado verbal. Na obra de John R. Rice, Our God-breathed book — the Bible [Nosso livro soprado por Deus —
a Bíblia),[1] encontramos uma apresentação clara e bem ordenada do ditado verbal. O autor descarta a idéia
de que o ditado verbal seja mecânico, sustentando que Deus ditou sua Palavra mediante a personalidade do
autor humano. É que Deus, por sua atuação especial e providência, foi quem formou as personalidades sobre
as quais posteriormente o Espírito Santo haveria de soprar seu ditado palavra por palavra. Assim, argumenta
Rice, Deus havia preparado de antemão os estilos particulares que ele próprio desejava, a fim de produzir as
palavras exatas, ao usar estilos e vocabulários predeterminados, encontráveis nos diferentes autores
humanos.

.O resultado final, então, foi um ditado palavra por palavra da parte de Deus, as Escrituras Sagradas.

Conceitos inspirados. Em sua Systematic theology [Teologia sistemática], A. H. Strong apresenta uma visão
que vem sendo denominada inspiração conceitual.[2] Deus teria inspirado apenas os conceitos, não as
expressões literárias particulares com que cada autor concebeu seus textos. Deus teria dado seus
pensamentos aos profetas, que tiveram toda a liberdade de exprimi-los em seus termos humanos. Dessa
maneira, Strong esperava evitar quaisquer implicações mecanicistas derivadas do ditado verbal e ainda
preservar a origem divina das Escrituras. Deus concedeu a inspiração conceitual, e os homens de Deus
forneceram a expressão verbal característica de seus estilos próprios.

Modernismo: a Bíblia contêm a Palavra de Deus

Ao surgir o idealismo germânico e a crítica da Bíblia (v. cap. 14), surgiu também uma nova visão evoluída da
inspiração bíblica, a par do modernismo ou liberalismo teológico. Opondo-se à opinião ortodoxa tradicional
de que a Bíblia é a Palavra de Deus, os modernistas ensinam que a Bíblia meramente contém a Palavra de

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Deus. Certas partes dela são divinas, expressam a verdade, mas outras são obviamente humanas e
apresentam erros. Tais autores acham que a Bíblia foi vítima de sua época, exatamente como acontece a
quaisquer outros livros. Afirmam que ela teria incorporado muito das lendas, dos mitos e das falsas crenças
relacionadas à ciência. Sustentam então que, pelo fato de esses elementos não terem sido inspirados por
Deus, devem ser rejeitados pelos homens iluminados de hoje; tais erros seriam resquícios de uma
mentalidade primitiva indigna de fazer parte do credo cristão. Só as verdades divinas, entremeadas nessa
mistura de ignorância antiga e erro grosseiro, é que de facto teriam sido inspiradas por Deus.

O Conceito da iluminação. Defendem alguns estudiosos que as “partes inspiradas” da Bíblia resultam de uma
espécie de iluminação divina, Mediante a qual Deus teria concedido uma profunda percepção religiosa a
alguns homens piedosos. Tais percepções teriam sido usufruídas com diferentes gradações de compreensão,
tendo sido registradas com mistura de idéias religiosas errôneas e crendices da ciência, comuns naqueles
dias. Daí resultaria um livro, a Bíblia, que expressa vários graus de inspiração, dependendo da profundidade
da iluminação religiosa experimentada por qualquer dos autores.

O conceito da intuição. Na outra extremidade da visão modernista estão os estudiosos que negam
totalmente a existência de algum elemento divinos na composição da Bíblia. Para eles a Bíblia não passa de
um caderno de rascunho em que os judeus registravam suas lendas, histórias, poemas etc., sem nenhum
valor histórico.[3] O que alguns denominam inspiração divina não seria outra coisa senão intensa intuição
humana. Dentro desse folclore judaico a que se deu o nome de Bíblia, encontram-se alguns exemplos
significativos de elevada moral e de gênio religioso. Todavia, essas percepções espirituais são puramente
naturalistas. Em absolutamente nada, passam de intuição humana; não existiria inspiração sobrenatural,
tampouco iluminação.

Neo-Ortodoxia: a Bíblia torna-se a Palavra de Deus

No início do século xx, a reviravolta nos acontecimentos mundiais e a influência do pai dinamarquês do
existencialismo, Soren Kierkegaard, deram origem a uma nova reforma na teologia européia. Muitos
estudiosos começaram a voltar-se de novo para as Escrituras, a fim de ouvir nelas a voz de Deus. Sem abrir
mão de suas opiniões críticas a respeito da Bíblia, começaram a levar a Bíblia a sério, por ser a fonte da
revelação de Deus aos homens. Criando um novo tipo de ortodoxia, afirmavam que Deus fala aos homens
mediante a Bíblia; as Escrituras tornam-se a Palavra de Deus num encontro pessoal entre Deus e o homem.

À semelhança das outras teorias a respeito da inspiração da Bíblia, a neo-ortodoxia desenvolveu duas
correntes.

Na extremidade mais importante estavam os demitizadores, que negam todo e qualquer conteúdo religioso
importante, factual ou histórico, nas páginas da Bíblia, e crêem apenas na preocupação religiosa existencial
sobre a qual medram os mitos. Na outra extremidade, os pensadores de tendência mais evangélica tentam
preservar a maior parte dos dados factuais e históricos das Escrituras, mas sustentam que a Bíblia de modo
algum é revelação de Deus. Antes, Deus se revela na Bíblia nos encontros pessoais; não, porém, de maneira
proposicional.

Visão demitizante. Rudolf Bultmann e Shubert Ogden são representantes característicos da visão
demitizante. Ambos diferem entre si, uma vez que Ogden não vê nenhum cerne histórico que dê consistência
aos mitos da Bíblia, embora Bultmann consiga enxergar isso. Ambos concordam em que a Bíblia foi escrita

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em linguagem mitológica, a da época de seus autores, época já passada e obsoleta. A tarefa do cristão
moderno é demitizar a Bíblia, ou seja, despi-la de seus trajes lendários, mitológicos, e descobrir o
conhecimento existencial a ela subjacente. Afirma Bultmann que, a partir do momento que a Bíblia é despida
desses mitos religiosos, a pessoa encontra a verdadeira mensagem do amor sacrificial de Deus em Cristo.
Não é necessário que a pessoa se prenda a uma revelação objetiva, histórica e proposicional, a fim de
experimentar essa verdade pessoal e subjetiva. Daí decorre que a Bíblia torna-se a revelação de Deus aos
homens, mediante uma interpretação adequada (i.e., demitizada), quando a pessoa depara com o amor
absoluto, exposto no mito do amor

altruísta de Deus em Cristo. Por isso, a Bíblia em si mesma não é revelação alguma; é apenas uma expressão
primitiva, mitológica, mediante a qual Deus se revela pessoalmente, desde que demitizado da maneira
correta.

Encontro pessoal. A outra corrente da neo-ortodoxia, representada por Karl Barth e Emil Brunner, nutre uma
visão mais ortodoxa das Escrituras. Barth reconhece que existem algumas imperfeições no registro escrito
(até mesmo nos autógrafos) e, no entanto, afirma que a Bíblia é a fonte da revelação de Deus.[4] Afirma ele
que Deus nos fala mediante a Bíblia-que ela é o veículo de sua revelação. Assim como um cão ouve a voz de
seu dono, gravada de modo imperfeito na gravação de uma fita ou disco, assim também o cristão pode ouvir
a voz de Deus que ressoa nas Escrituras. Afirma Brunner que a revelação de Deus não é proposicional (i.e.,
feita por meio de palavras).[5] Assim, a Bíblia, como se nos apresenta deixa de ser uma revelação de Deus,
passando a ser mero registro da revelação pessoal de Deus aos homens de Deus em eras passadas. Todavia,
sempre que o homem moderno se encontra com Deus, mediante as Escrituras Sagradas, a Bíblia torna-se a
Palavra de Deus para nós. Em contraposição à visão ortodoxa, para os teólogos neo-ortodoxos a Bíblia não
seria um registro inspirado. Antes, é um registro imperfeito, que apesar dessa mesma imperfeição, constitui
o testemunho singular da revelação de Deus. Quando Deus surge no registro escrito, de maneira pessoal, a
fim de falar ao leitor, a Bíblia nesse momento torna-se a Palavra de Deus para esse leitor.

O ensino bíblico a respeito da inspiração

Muitas objeções têm sido levantadas contra as várias teorias da inspiração, as quais partem de diferentes
concepções, tendo variados graus de legitimidade, dependentemente do ângulo de observação da pessoa
que as formula. Visto que o objetivo deste estudo é levar o leitor a compreender o caráter da Bíblia, o
critério analítico que escolhemos visa a avaliar todas essas teorias, levando em consideração o que as
Escrituras revelam a respeito de sua própria inspiração. Comecemos com o que a Bíblia ensina formalmente
sobre essa questão e, depois, examinemos o que se acha logicamente implícito nesse ensino.

O que a própria Bíblia ensina a respeito de sua inspiração

No capítulo anterior examinamos de modo genérico o ensino de dois grandes textos do Novo Testamento a
respeito da inspiração (2Tm 3.16 e 2Pe 1.21). A Bíblia declara ser um livro dotado de autoridade divina,
resultante de um processo pelo qual homens movidos pelo Espírito Santo escreveram textos inspirados
(soprados) por Deus. Vamos agora examinar em minúcias o que significa essa declaração.

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A inspiração é verbal. Independentemente de outras afirmações que possam ser formuladas a respeito da
Bíblia, fica bem claro que esse livro reivindica para si mesmo esta qualidade: a inspiração verbal. O texto
clássico de 2Timóteo 3.16 declara que as graphã, i.e., os textos, é que são inspiradas. “Moisés escreveu todas
as palavras do Senhor…” (Êx 24.4). O Senhor ordenou a Isaías que escrevesse num livro a mensagem eterna
de Deus (Is 30.8). Davi confessou: “O Espírito do Senhor fala por mim, e a sua palavra está na minha boca”
(2Sm 23.2). Era a palavra do Senhor que chegava aos profetas nos tempos do Antigo Testamento. Jeremias
recebeu esta ordem: “… não te esqueças de nenhuma palavra” (Jr 26.2).

No Novo Testamento, Jesus e seus apóstolos ressaltaram a revelação registrada ao usar repetidamente a
expressão “está escrito” (v. Mt 4.4,7; Lc 24.27,44). O apóstolo Paulo testemunhou: “… falamos, não com
palavras de sabedoria humana, mas com as que o Espírito Santo ensina…” (1Co 2.13). João nos adverte
quanto a não “tirar quaisquer palavras do livro desta profecia” (Ap 22.19). As Escrituras (i.e., os escritos) do
Antigo Testamento são continuamente mencionadas como Palavra de Deus. No célebre sermão da
montanha, Jesus declarou que não só as palavras, mas até mesmo os pequeninos sinais diacríticos de uma
palavra hebraica vieram de Deus: “Em verdade vos digo que até que a terra e o céu passem, nem um jota ou
um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido” (Mt 5.18). Portanto, o que quer que se diga como teoria
a respeito da inspiração das Escrituras, fica bem claro que a Bíblia reivindica para si mesma toda a autoridade
verbal ou escrita. Diz a Bíblia que suas palavras vieram da parte de Deus.

A inspiração é plena. A Bíblia reivindica a inspiração divina de todas as suas partes. É inspiração plena, total,
absoluta. “Toda Escritura é divinamente inspirada…” (2Tm 3.16). Nenhuma parte das Escrituras deixou de
receber total autoridade doutrinária. A Escritura toda (i.e., o Antigo Testamento integralmente), escreveu
Paulo, “é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em
justiça” (2Tm 3.16). E foi além, ao escrever: “… tudo o que outrora foi escrito, para o nosso ensino foi escrito”
(Rm 15.4). Jesus e todos os autores do Novo Testamento exemplificam amplamente sua crença firme na
inspiração integral e completa do Antigo Testamento, citando trechos de todas as Escrituras que eram para
eles de autoridade, até mesmo os que apresentam ensinos fortemente polêmicos. A criação de Adão e de
Eva, a destruição do mundo pelo dilúvio, o milagre de Jonas e o grande peixe e muitos outros
acontecimentos são mencionados por Jesus deixando bem clara a autoridade deles (v. cap. 3). Todo trecho
das Sagradas Escrituras reivindica total e completa autoridade. A inspiração da Bíblia é plena.

É claro que a inspiração plena estende-se apenas aos ensinos dos autógrafos, como já afirmamos (cap. 1).
Todavia, tudo quanto a Bíblia ensina, quer no Antigo, quer no Novo Testamento, é integralmente dotado de
autoridade divina. Nenhum ensino das Escrituras deixou de ter origem divina. O próprio Deus inspirou as
palavras usadas para exprimir os ensinos proféticos. Repitamos: a inspiração é plena, a saber, completa e
integral, abrangendo todas as partes da Bíblia.

A inspiração atribui autoridade. Fica, pois, saliente o fato de que a inspiração concede autoridade indiscutível
ao texto ou documento escrito. Disse Jesus: “… a Escritura não pode ser anulada…” (Jo 10.35). Em numerosas
ocasiões o Senhor recorreu à Palavra de Deus escrita, que ele considerava árbitro definitivo em questões de
fé e de prática. O Senhor recorreu às Escrituras como a autoridade para ele purificar o templo (Mc 11.17),
para pôr em cheque a tradição dos fariseus (Mt 15.3,4) e para resolver divergências doutrinárias (Mt 22.29).
Até mesmo Satanás foi repreendido por Cristo mediante a autoridade da Palavra escrita de Deus: “Está
escrito […] Está escrito […] Está escrito…”. Jesus contra-atacou as tentações de Satanás com a Palavra de
Deus escrita (Mt 4.4,7,10).

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Algumas vezes, Jesus declarou o seguinte: “… era necessário que se cumprisse tudo o que de mim estava
escrito na lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (Lc 24.44). Todavia, é em outra declaração de Jesus que
encontramos apoio ainda mais forte do Senhor à autoridade inquestionável das Escrituras: “É mais fácil
passar o céu e a terra do que cair um til sequer da lei” (Lc 16.17). A Palavra de Deus não pode ser anulada.
Provém de Deus e está envolta na autoridade divina que o próprio Deus lhe concedeu

2.2.7.2.1 Teoria evangélica da inspiração

Com este título queremos dizer que nos ocuparemos do conceito de revelação tal como este é em
geral entendido nos meios evangélicos, sem que isto signifique, entretanto, um acordo total na
terminologia e na exposição do assunto. Lacy, por exemplo, afirma "que a inspiração como
Escrituras foi sobrenatural, dinâmica e plena”. Grau, por sua vez, sustenta que positivamente a
inspiração bíblica é orgânica, plena e verbal. Mas, apesar das diferenças, existe, de modo geral,
acordo sobre este tema, como destacamos a seguir.

O Espírito Santo trabalhou nos escritores de acordo com a sua maneira de ser, aproveitando a
idiossincrasia pessoal e cultural. Iluminou suas mentes, guiou sua memória e controlou a influência
do pecado e do erro para que seu trabalho não malograsse. Não obstante, deixou-os expressar-se
à sua maneira em tudo, segundo o seu estilo e vocabulário e de acordo com o seu tempo. Não se
pode negar que haja, nos diferentes autores, diferenças de estilo e peculiaridades que os
caracterizam. Não há erros nem defeitos, mas as características são percebidas na expressão de
cada autor.

A personalidade do escritor não foi anulada. Muitos dos livros da Bíblia contêm passagens que
revelam que a preparação prévia e as características pessoais do autor foram utilizadas pelo
Espírito Santo. Não podemos discordar dessas afirmações, visto que há evidências nas Escrituras
de que isto se deu desta forma. É claro, por exemplo, que o estilo literário de Isaías difere do de
Amós; o estilo do Evangelho de Lucas difere do de Marcos; e a epístola de Tiago difere sob este
aspecto da de João. Aliás, no mesmo autor, em circunstâncias diferentes, encontramos também
estilos diferentes. Para verificar isto, basta comparar Romanos com Filipenses.

Essa combinação do divino com o humano não é algo que apareça apenas na composição das
Escrituras, afirmam os teólogos; vemo-Ia, igualmente, na pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo:
verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus. Assim, as Escrituras são obra de Deus, sem
deixar de mostrar, por ele mesmo, a particularidade do instrumento humano.

A posição adotada pelos teólogos protestantes mais antigos e importantes é que, seja qual for a
definição que se dê à inspiração, todo o cânon atual, como o temos, participa dela. O sentido
original grego da expressão "toda escritura", encontrada em 2 Timóteo 3.16, refere-se a cada um
dos escritos sagrados. [...] E esta Sagrada Escritura, em cada uma de suas partes e livros, é
inspirada. Essa inspiração para a totalidade do conteúdo da Bíblia é o que o autor denomina
"inspiração plena". Este conceito de que a inspiração divina protege a totalidade dos livros bíblicos
de erros não nos deve levar a pensar, disse Hammond, que não haja diferença alguma nos
propósitos da inspiração. Trata-se, em verdade, de entender que, enquanto todas as Escrituras são

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plenamente autorizadas por Deus, diferem no tocante à aplicação e ao propósito para o qual foram
inspiradas. Diferem sobretudo quanto à aplicação essencial, mais do que em relação ao grau da
inspiração. O estudioso deve manter-se prevenido contra uma observação como esta: "O
Evangelho de João é mais inspirado do que Eclesiastes".

2.2.8 A iluminação

É aquela influência ou ministério do Espírito Santo que capacita todos os que estão num
relacionamento correto com Deus para entender as Escrituras. Acerca de Cristo se escreveu que
Ele "abriu" o entendimento deles em relação às Escrituras (Lc 24.32-45). O próprio Cristo prometeu
que, quando o Espírito viesse, Ele "guiaria" em toda a verdade.

Finalmente, tanto a revelação como a inspiração pode ser diferenciada da iluminação em que a
última é prometida a todos os crentes; que ela admite graus, uma vez que aumenta ou diminui; que
não depende de escolha soberana, antes, de ajustamento pessoal ao Espírito de Deus; e sem ela
ninguém nunca seria capaz de aceitar a salvação pessoal (1Co 2.14), ou o conhecimento da
verdade revelada de Deus.

2.3 A Autoridade da Bíblia

Podemos dizer que no passado Deus se revelou aos homens; inspirou os homens para que
tenhamos hoje um testemunho digno de fé de sua revelação. No passado, Deus dirigiu o processo
pelo qual sua revelação chegou até nós sob a forma de uma bíblia. É evidente que de tudo isto
surge claramente a autoridade da Bíblia como Palavra de Deus nos assuntos de fé e prática. Ou,
como diz o pacto de Lausanne: "Afirmamos a inspiração divina, a veracidade e a autoridade de
ambos os Testamentos, o Antigo e o Novo, em sua integridade, como a única Palavra de Deus
escrita, e a única e infalível regra de fé e prática".

A obra de Hammond trata este assunto recordando que há três fontes possíveis da autoridade em
assuntos de religião: a razão, a igreja e a Bíblia. Estas três fontes têm de ser necessariamente
incompatíveis, mas, como exceção, às vezes se combinam. Da razão, "em alguns casos a
manipulação racionalista de certos aspectos da fé tem gravemente desviado os homens"
(HAMMOND, 1978, p. 51) da igreja, afirma que "tem um lugar de autoridade, mas só em
subordinação à Palavra de Deus" (HAMMOND, 1978, p. 52) da Bíblia, conclui que "não há palavras
suficientes para destacar a importância de acatar, bem longe de toda dúvida, a autoridade
insubstituível das Escrituras Sagradas em tudo o que se refere à religião, quer se trate da doutrina,
quer da prática" (HAMMOND, 1978, p. 53). Nossa última palavra sobre este assunto é uma citação
de Donald G. Bloesch. Esse autor afirmou que a autoridade final não é da Escritura em si, mas do
Deus vivo que, por meio de Jesus Cristo, é quem nos fala; e afirma:

Devemos, sem dúvida, continuar dizendo que a autoridade absoluta de fé, o próprio Cristo vivo,
identificou-se de tal maneira com o testemunho histórico concernente à sua auto-revelação, mais

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precisamente as Escrituras Sagradas, que estas participam, necessariamente, da autoridade de


seu Senhor. A Bíblia deve ser distinguida de seu fundamento e de sua meta, mas não pode
separar-se deles. E por isso que Forsyth afirmou: “A Bíblia não é meramente um registro da
revelação; é parte da revelação. Não é uma pedreira de dados para o historiador; é uma fonte de
vida para a alma”. (BLOESCH, 1978, p. 63).

2.4 A Interpretação da Bíblia

Tem-se dito que a Bíblia necessita, pela dificuldade de entender o seu conteúdo, de uma
interpretação infalível que evite que o estudioso não especializado incorra em erro em sua
interpretação. A posição que, desde o tempo da Reforma, os evangélicos têm sustentado é a de
que o cristão é um juiz idôneo para julgar o conteúdo da revelação bíblica. Disse Hammond:
"Sustentamos que as Escrituras são capazes de oferecer seu significado correto em todas as
idades e circunstâncias em que se encontre o homem, sempre que este esteja disposto a ser
ensinado pelo Espírito Santo e a obedecer-Ihe" (BLOESCH, 1978, p. 46). Não podemos colocar
uma instância superior à clara mensagem da Bíblia, seja esta um teólogo, uma igreja ou uma
denominação. Isto não significa que não façamos uso de todas as informações possíveis à nossa
disposição para não nos enganarmos ao interpretar a Palavra de Deus. Um princípio de saudável
hermenêutica, sem entrar nas complicadas considerações que a teologia atual tem a respeito deste
tema, é que um texto se esclarece por seu contexto, seja ele imediato ou mediato. E o contexto
mediato, ou distante, de um texto, é, em última análise, a própria Bíblia, o conteúdo total da
revelação. Em outras palavras, a Bíblia contém em si a informação necessária para interpretar de
forma correta qualquer passagem que ofereça dificuldade. E conquanto usemos a ajuda humana
para entender o conteúdo da Bíblia, não nos esqueçamos de que, em última instância, é a Bíblia
que julga tal ajuda.

03 - O CÂNON BÍBLICO

11.1 O Cânon Bíblico do Antigo Testamento

A palavra "cânon" é de origem cristã e derivada do vocábulo grego "kanon" que por sua vez
provavelmente veio emprestado do hebraico "kaneh", que significa “junco” ou “vara de medir”; (Ez
40.5) daí tomou o sentido de norma ou regra. Mais tarde veio a significar regra de fé e, finalmente,
catálogo ou lista (Gl 6.16)

A palavra cânon, usada para designar a coleção dos livros que integram as Sagradas Escrituras,
não aparece até o século IV, com Atanásio. Dão-se à palavra dois usos distintos, mas de certo
modo relacionados: “Em primeiro lugar, ela é usada para indicar uma coleção daqueles livros aos
quais se tenha aplicado determinada prova e que foram reconhecidos como autênticos e
'canônicos'. Logo, aplica-se o termo a toda a coleção de escritos, posto que ela constitui o cânon ou
'regra de fé' mediante a qual toda doutrina deve ser provada" (HAMMOND, 1978, p. 36).

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O cânon do Antigo Testamento ainda não havia sido fixado no tempo do Novo Testamento, mas
quando os judeus da Palestina, em fins do século I, fixaram o cânon de suas Escrituras, este incluía
todos os livros que atualmente temos em nossas versões. O uso que se fez desses livros nos
tempos do Novo Testamento permaneceu testemunhado em cada página deste último livro; e uma
rápida olhada nas referências de nossas Bíblias nos dará uma idéia de quão profundo e sistemático
foi esse uso. Mas essas Escrituras não eram suficientes "para o bem-estar da Igreja, para a pureza
do evangelho e para a direção do crente; por isso, aprouve a Deus chamar à existência uma graphé
cristã, o cânon do Novo Testamento que a Igreja acrescentou à graphé do Antigo Testamento"
(RAMM, 1967, p. 177).

11.2 Divisões do Antigo Testamento

O próprio Senhor Jesus Cristo deu seu apoio de legitimidade a todo o Antigo Testamento; fez
citações de cada uma de suas divisões; porém, nunca citou qualquer outro livro, nem deu a
entender que existam outros livros inspirados. Sabemos que existiam muitos outros livros escritos
na língua hebraica, dos quais cerca de 15 ou mais são mencionados no Antigo Testamento mesmo
(o livro dos Justos, em Js 10.13; 2Sm 1.18; o livro das Guerras do Senhor, em Nm 21.14).

Como foram escolhidos os 39 livros do meio de tantos outros? A verdadeira prova é sua inspiração.
Se Deus falou pelo Espírito por intermédio de algum escritor humano, então o tal livro é inspirado e
útil para os propósitos de Deus. Os livros que têm esse selo divino foram reconhecidos como
divinos tanto pelo povo comum como pelos líderes e sacerdotes, e o tempo mostrou gradualmente
que a seleção fora bem feita.

Tais livros foram escritos entre 2000 e 400 a.C. O livro de Jó, com muita probabilidade, data do
tempo dos próprios patriarcas, e o livro de Malaquias foi escrito entre 425 a 400 a.C. Muitos outros
escreveram depois de Malaquias, mas os judeus consideravam esses escritos tão somente como
histórias humanas.

Entre os judeus, o Antigo Testamento tem três divisões, as quais Jesus citou em Lc 24.44 – Leis,
Profetas, Escritos -, algumas traduções trazem Salmos por ser o primeiro livro dos Escritos. O
cânon hebraico apresenta unificação de alguns livros: 1,2 Samuel; os dois dos Reis; os dois
Crônicas; Esdras e Neemias; os doze profetas menores, são um livro cada.

A ordem dos livros no cânon hebraico é também diferente da nossa. Há uma tríplice divisão como
já mencionamos (Lei, Profetas e Escritos). Lei: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
Profetas: Primeiros Profetas - Josué, Juízes, Samuel e Reis; últimos Profetas - Isaías, Jeremias, os
Doze. Escritos: Divididos em Livros Poéticos - Salmos, Provérbios e Jó; os Cinco Rolos - Cantares,
Rute, Lamentações, Eclesiastes, Ester. Livros Históricos: Daniel, Esdras, Neemias e Crônicas.

Os Cinco Rolos eram assim chamados porque eram rolos separados, lidos anualmente em festas
distintas: Cantares, na Páscoa, em alusão ao Êxodo. Rute, no Pentecoste, na celebração da

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colheita, em seu início (Primícias). Ester, na festa do Purim, comemorando o livramento de Israel
da mão do mau Hamã. Eclesiastes, na Festa dos Tabernáculos – festa de gratidão pela colheita.
Lamentações, no mês de Abibe, relembrando a destruição de Jerusalém pelos babilônicos.

No cânon hebraico os livros não estão em ordem cronológica. Os judeus não se


preocupavam com um sistema cronológico.

Já a nossa divisão do Antigo Testamento em 39 livros vem da Septuaginta oriunda da


Vulgata Latina. A Septuaginta foi à primeira tradução das Escrituras, feita do hebraico para o grego,
cerca de 290 a.C. Nela a ordem dos livros está por assunto: Pentateuco, Históricos, Poéticos e
Proféticos.

11.3 A Formação e Desenvolvimento do Cânon do Antigo Testamento

O Cânon do Antigo Testamento foi formado num espaço de um pouco mais de mil anos e
corresponde o período de Moisés a Esdras. Moisés escreveu as primeiras palavras do Pentateuco
por volta de 1491 a.C. Esdras entrou em cena em 445 a.C. Esdras não foi o último escritor na
formação do cânon do Antigo Testamento. Os últimos escritores foram Neemias e Malaquias, no
entanto, de acordo com os escritos históricos, foi Esdras que, na qualidade de escriba e sacerdote,
reuniu os rolos canônicos, ficando também o cânon encerrado em seu tempo (GILBERTO, 1986, p.
52).

A doutrina da inspiração da Bíblia foi completamente desenvolvida apenas nas páginas do Novo
Testamento. Mas, muito antes disso, já encontramos na história de Israel certos escritos
reconhecidos como autoridade divina e como regra escrita de fé e conduta para o povo de Deus.
Identificamos isso na resposta do povo, quando Moisés leu para eles o livro do concerto (Êx 24.7),
ou quando o Livro da Lei, achado por Hilquias, foi lido primeiro para o rei e depois para a
congregação (2Rs 22-23; 2Cr 34), ou ainda quando Esdras leu o Livro da Lei para o povo (Ne 8.9,
14-17; 10.28-39; 13.1-3). O Pentateuco é tratado com a mesma reverência em Josué 1.7, 8, 8.31 e
23.6-8; 1 Reis 2.3, 2 Reis 14.6 e 17.37, Oséias 8.12, Daniel 9.11,13, Esdras 3.2, 4, 1 Crônicas
16.40, 2 Crônicas 17.9, 23.18, 30.5,18, 31.3 e 35.26. Apresenta-se basicamente como obra de
Moisés, um dos primeiros e certamente o maior profeta do Antigo Testamento (Nm 12.6-8; Dt
34.10-12). Deus comumente falava por Moisés de viva voz, como também fez mais tarde com os
profetas, mas a atividade de Moisés como escritor também é mencionada muitas vezes (Êx 17.14;
24.4, 7; 34.27; Nm 33.2; Dt 28.58, 61; 29.20-27; 30.10; 31.9-13, 19, 22, 24-26).

A razão de Moisés e os profetas registrarem por escrito a mensagem de Deus, não se contentando
apenas em entregá-Ia oralmente, era que às vezes a enviavam a outros lugares (Jr 29.1; 36.1-8;
51.60, 61; 2Cr 21.12). Mas, na maioria das vezes, era para preservá-Ia para o futuro, como um
memorial (Êx 17.14) ou uma testemunha (Dt 31.24-26), a fim de que ficasse escrita para o tempo
vindouro (Is 30.8). Portanto a forma permanente e durável da mensagem de Deus não era sua
forma falada, mas sua forma escrita, e isso explica o surgimento do cânon do Antigo Testamento.

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Vemos conforme o caso do livro do concerto, cuja alusão reporta-se a Êxodo 24.7, que foi possível
um documento pequeno, como Êxodo 20-23, tornar-se canônico antes que toda a obra estivesse
concluída. Deuteronômio também já era considerado canônico mesmo no tempo em que Moisés
vivia (Dt 31.24-26), pois foi colocado ao lado da arca do concerto. Contudo, a parte final de
Deuteronômio foi escrita depois da morte de Moisés. Notamos também numerosas referências ao
Pentateuco (no todo ou em parte) como canônico, em outros livros do Antigo Testamento, que
continuaram a ocorrer na literatura existente entre os dois Testamentos. Sem dúvida, a causa disto,
deve-se à sua importância fundamental. Entretanto, outra possível razão para tantas referências ao
Pentateuco, é o fato de ter sido a primeira seção do Antigo Testamento a ser escrita e reconhecida
como canônica.

Ninguém duvida que, pela época de Esdras e Neemias (século V a.C.), o Pentateuco já estava
completo, como também já era canônico, sendo há muito considerado como tal. Foi traduzido para
o grego no século III a.C., tornando-se desse modo na primeira porção da Septuaginta. Desde mea-
dos do século II a.C., temos evidências que comprovam que todos os cinco livros, já eram
atribuídos a Moisés.

11.3.3 Do Cânon Judaico ao Cristão

No Novo Testamento, encontramos Jesus reconhecendo as Escrituras judaicas pelos seus diversos
títulos conhecidos e aceitando as três seções do cânon judaico e a ordem tradicional de seus livros.
Descobrimos também que para a maioria dos livros é individualmente imputada autoridade divina -
mas não para qualquer um dos livros apócrifos. A única exceção evidente encontra-se em Judas 9
(que cita a obra apócrifa a Assunção de Moisés) e 14 (que cita o Livro de Enoque). As citações que
Judas faz dessas obras não significa que cria serem elas divinamente inspiradas, assim como a
citação de Paulo de diversos poetas gregos (vide At 17.28; 1Co 15.33; Tt 1.12) não atribui ins-
piração divina à poesia deles. O que evidentemente aconteceu nos primeiros séculos do
Cristianismo foi isto: Jesus passou para seus seguidores, como Escrituras Sagradas, a Bíblia que
Ele havia recebido, contendo os mesmos livros da Bíblia hebraica dos dias atuais. Os primeiros
cristãos compartilharam com seus contemporâneos judeus um conhecimento completo da
identidade dos livros canônicos. Entretanto, a Bíblia ainda não estava entre duas capas: era uma
lista memorizada de rolos. A ruptura com a tradição oral judaica (em alguns casos, uma ruptura
muito necessária), a alienação entre judeus e cristãos e a ignorância geral das línguas semíticas
nas igrejas fora da Palestina e da Síria fizeram com que surgisse dúvida no que dizia respeito ao
cânon entre os cristãos, o que foi acentuado pelo preparo de novas listas de livros bíblicos,
organizadas de acordo com outros princípios, e pela introdução de novos lecionários. Essa dúvida
acerca do cânon somente pode ser resolvida como na reforma por um retorno aos ensinamentos do
Novo Testamento e ao pano de fundo judaico, sobre o qual tais ensinamentos devem ser
compreendidos.

11.3.4 Data do Reconhecimento e Fixação do Cânon do Antigo Testamento

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Em 90 d.C. Em Jâmnia, perto da moderna Jope, em Israel, os rabinos, num concílio sob a
presidência de Johanan Ben Zakai, reconheceram e fixaram o cânon do Antigo Testamento. Houve
muitos debates acerca da aprovação de certos livros, especialmente dos "Escritos". Note-se, porém
que o trabalho desse concílio foi apenas ratificar aquilo que já era aceito por todos os judeus
através de séculos.

11.4 O Cânon do Novo Testamento

Há consenso entre teólogos que o Novo Testamento foi escrito dentro de um período de cinqüenta
anos, vários séculos depois que o Antigo Testamento foi completado. Em relação ao tempo, o
Antigo Testamento está tão distante de nós que sua formação como corpo escriturístico poderia ser
considerado longínquo demais para a atestação de seu conteúdo. Tal não é o caso. Em certo
sentido, temos atestações muito maiores para o cânon do Antigo Testamento do que para o cânon
do Novo Testamento. Referimo-nos ao fato do próprio imprimátur (do lat. imprimatur, 'imprima-se')
de nosso Senhor Jesus Cristo, pela maneira como fez uso das Escrituras hebraicas como a Palavra
autoritária de Deus.

Não obstante, há um sentido no qual Jesus Cristo realmente oficializou o conteúdo ou cânon do
Novo Testamento: pela via da antecipação. Foi Ele quem nos fez essas promessas: o “Consolador,
o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar
de tudo quanto vos tenho dito e ele vos guiará em toda a verdade” (Jo 14.26; 16.13).

A partir disto podemos inferir, ao mesmo tempo, o princípio básico da canonicidade para o Novo
Testamento. É idêntico ao do Antigo Testamento, visto que se restringe à questão da inspiração
divina. Quer pensemos nos profetas dos tempos do Antigo Testamento ou nos apóstolos e seus
companheiros dados por Deus nos dias do Novo Testamento, o reconhecimento na própria época
de seus escritos de que eram autênticos porta-vozes de Deus é o que determina a canonicidade
intrínseca de seus registros. Podemos estar certos de que os livros em questão foram recebidos
pela Igreja dos tempos apostólicos, precisamente no momento em que foram atestados por um
apóstolo como sendo dessa maneira inspirados. A variação evidente relativa à área geográfica, no
reconhecimento de algumas das epístolas do Novo Testamento, pode muito bem ser o reflexo do
simples fato de que, em princípio, essa atestação era por sua própria natureza localizada. De
maneira inversa, o fato de cada um dos 27 livros do Novo Testamento hoje universalmente aceitos
ter recebido aprovação definitiva é prova de que a atestação apropriada era dada somente depois
de rigorosa investigação.

Tertuliano, notável escritor cristão das primeiras duas décadas do século lll, foi um dos primeiros a
chamar as Escrituras cristãs de "Novo Testamento". Esse título havia aparecido antes (c. 190) em
uma composição feita contra o montanismo, de autor desconhecido. Esse fato é significativo. Seu
uso colocou as Escrituras do Novo Testamento em um nível de inspiração e autoridade igual ao do
Antigo Testamento.

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O processo gradual que conduziu ao completo e formal reconhecimento público de um cânon


estabelecido em 27 livros, formando o Novo Testamento, leva-nos ao século IV de nossa era. Isso
não significa necessariamente que antes desse período estivesse faltando reconhecimento para a
integridade destas Escrituras, mas que a necessidade de uma definição oficial do cânon não foi
premente até então.

Em relação ao Antigo Testamento um período de tempo muito mais curto esteja envolvido nos
escritos do Novo Testamento, o alcance geográfico de sua origem é muito mais amplo. Essa
circunstância já é suficiente para justificar a falta de reconhecimento espontâneo ou simultâneo da
extensão precisa do cânon do Novo Testamento. Por causa do isolamento geográfico dos vários
destinatários das porções do Novo Testamento, houve espaço para algum atraso e incerteza de
uma região para outra no reconhecimento de alguns dos livros.

O princípio que determina o reconhecimento da autoridade dos escritos canônicos do Novo


Testamento foi estabelecido dentro do próprio conteúdo desses escritos. Há repetidas exortações
para a leitura pública das mensagens apostólicas. No fim da Primeira Epístola aos
Tessalonicenses, possivelmente o primeiro livro do Novo Testamento a ser escrito, Paulo diz: "Pelo
Senhor vos conjuro que esta epístola seja lida a todos os santos irmãos" (1Ts 5.27). Três capítulos
antes, na mesma epístola, Paulo os recomenda a aceitarem suas palavras faladas como "palavra
de Deus" (1Ts 2.13) e, em 1 Coríntios 14.37, o apóstolo fala de modo semelhante acerca de seus
"escritos" (COMFORT, 1998, p. 97).

ORIGEM E SIGNIFICADO DA PALAVRA CÂNON

A palavra cânon não é mencionada na Bíblia, embora a raiz da qual se deriva apareça em 1Rs 14.15 e Jó
40.21. Originalmente significava "junco" ou "talo" de papiro, capim-limão ou calado. Pelo fato dos juncos
serem usados como réguas ou instrumentos para fazer linhas retas, "cânon" passou a significar "medida" ou
"haste de medição". O termo cânon foi empregado pela primeira vez como expressão teológica referente às
Escrituras, por Atanásio, bispo de Alexandria, na carta pascal às igrejas em que descreveu o conteúdo do
Novo Testamento (307 d.C.).

A questão de quais livros pertencem à Bíblia é chamada questão canônica e, refere-se à coleção de livros que
passaram pelo teste de autenticidade e autoridade; significa ainda que esses livros são nossa regra de vida. 

Nosso conhecimento do processo de formação resultante no cânon fixo ainda é obscuro. Infelizmente não
dispomos de documentos antigos dos escribas detalhando os diversos passos do procedimento que culminou
na Bíblia hebraica. Dois comentários são relevantes. O processo foi longo e complicado e, provavelmente
deu-se em fases ao longo de vários séculos da história dos hebreus. O esboço genérico da formação do
cânon a seguir organiza os dados disponíveis sobre o assunto:

FASE 1: Pronunciamentos detentores de autoridade.


Inicialmente a revelação de Deus aos hebreus era transmitida de forma oral na maioria dos casos.
Mensagens como "Assim diz o Soberano Senhor" e "Ouçam a Palavra do Senhor" no Antigo Testamento,
foram ditas por Isaías (1.10), Ezequiel (5.5), oralmente como receberam de Deus. Esses pronunciamentos
foram passados às gerações seguintes com "Palavra do Senhor" na forma tradicional oral recebida.

FASE 2: Documentos formais escritos.

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Em determinado ponto, palavras adágios e discursos divinamente inspirados foram registrados e preservados
pela comunidade hebraica na forma escrita. Em certas ocasiões o pronunciamento e a escrita ou registro
eram quase simultâneos, como o Livro da Lei, em Êxodo 24.3-4; Josué 1.8, e o oráculo de Jeremias para o rei
Jeoaquim em Jr 36. Em outros casos o documento da revelação divina acontecia certo tempo após o
acontecimento ou a circunstância que inspirou a Palavra do Senhor.

FASE 3: Coleção de documentos escritos:


O processo de coleção provavelmente foi extenso e abrangente, sabe-se que os Salmos foram reunidos
durante o período de mais de 500 anos. Reunir os escritos de experiências hebraicas com Javé em antologias
e livros era em parte, questão de conveniência para a comunidade, permitindo acesso fácil e a conservação
garantida dos documentos. Acima de tudo, representava o valor, a importância e a autoridade das obras
reunidas para a vida religiosa da comunidade. Esses livros exigiam atenção especial do povo hebreu (Dt
31.24-27).

FASE 4: Seleção de documentos escritos e fixação do cânon:


Os detalhes do procedimento de seleção de documentos são obscuros, mas podemos discernir os critérios
básicos aplicados com o propósito de escolher e delinear o cânon. Basta dizer que o consenso entre líderes
religiosos hebreus orientados pelo Espírito Santo de Deus durante o decorrer da história israelita resultou no
cânon hebraico das Escrituras Sagradas.

OS TESTES DE CANONICIDADE
Em primeiro lugar é importante lembrarmos que certos livros já eram canônicos antes de qualquer teste lhes
ser aplicado. Isto é como dizer que alguns alunos são inteligentes antes mesmo de se lhes ministrar uma
prova. Os testes apenas provam aquilo que intrinsecamente já existe. Do mesmo modo, nem a Igreja nem os
concílios eclesiásticos jamais concederam canonicidade ou autoridade a qualquer livro; o livro era autêntico
ou não no momento em que foi escrito. A Igreja ou seus concílios reconheceram certos livros como Palavra
de Deus e, com o passar do tempo, aqueles assim reconhecidos foram colecionados para formar o que hoje
chamamos de Bíblia.

QUE TESTES A IGREJA APLICOU?

1) Havia o teste da autoridade do escritor. Em relação ao Antigo Testamento, isto significava a


autoridade do legislador, ou do profeta, ou do líder em Israel. No caso do Novo Testamento, o livro
deveria ter sido escrito ou influenciado por um apóstolo para ser reconhecido. Em outras palavras,
deveria ter a assinatura ou aprovação de um apóstolo. Pedro, por exemplo, apoiou a Marcos, e
Paulo a Lucas.

2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e
autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer
outro livro por comunicar a revelação de Deus.

3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica dos livros era importante. Na verdade, houve
uma surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas quanto aos livros que mereciam lugar
entre os inspirados. Embora seja fato que alguns livros bíblicos tenham sido recusados ou
questionados por alguma minoria, nenhum livro cuja autenticidade foi questionada por um número
grande de igrejas veio a ser aceito posteriormente como parte do cânon.

A FORMAÇÃO DO CÂNON

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Curso de Graduação Livre – Bacharel em Teologia Eclesiástica. Disciplina: Introdução a Teologia e Bibliologia

O cânon da Escritura estava se formando, é claro, à medida que cada livro era escrito, e completou-se
quando o último livro foi terminado. Quando falamos da “formação” do cânon estamos realmente falando
do reconhecimento dos livros canônicos pela Igreja. Esse processo levou algum tempo. Alguns afirmam que
todos os livros do Antigo Testamento já haviam sido colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto
século a.C. Referências nos escritos de Flávio Josefo (95 d.C.) indica a extensão do cânon do Antigo
Testamento com os 39 livros que hoje aceitamos. A discussão do chamado Sínodo de Jamnia (70-100 d.C.)
parece ter partido deste cânon. Nosso Senhor delimitou a extensão dos livros canônicos do Antigo
Testamento quando acusou os escribas de serem culpados da morte de todos os profetas que Deus enviara a
Israel, de Abel a Zacarias (Lc 11.51). O relato da morte de Abel está, é claro, em Gênesis; o de Zacarias se
acha em 2 Crônicas 24.20,21, que é o último livro na disposição da Bíblia hebraica (em lugar de nosso
Malaquias). Para nós, é como se Jesus tivesse dito: “Sua culpa está registrada em toda a Bíblia - de Gênesis a
Malaquias”. Ele não incluiu qualquer dos livros apócrifos que já existiam em seu tempo e que continham
relatos das mortes de outros mártires israelitas.

O primeiro concílio eclesiástico a reconhecer todos os 27 livros do Novo Testamento foi o concílio de
Cartago, em 397 d.C. Alguns livros do Novo Testamento, individualmente, já haviam sido reconhecidos como
canônicos muito antes disso e a maioria deles foi aceita como canônica no século posterior ao dos apóstolos
(Hebreus, Tiago, 2 Pedro, 2 e 3 João e Judas foram debatidos por algum tempo). A seleção do cânon foi um
processo que continuou até que cada livro provasse o seu valor, passando pelos testes de canonicidade.

OS LIVROS APÓCRIFOS
Os doze livros apócrifos do Antigo Testamento jamais foram aceitos pelos judeus ou por nosso Senhor, no
mesmo nível de autoridade dos livros canônicos. Eles eram respeitados, mas não foram considerados como
Escritura. A Septuaginta (versão grega do Antigo Testamento produzida entre o terceiro e o segundo século
a.C.) incluiu os apócrifos com o Antigo Testamento canônico. Jerônimo (340 - 420 d.C.), ao traduzir a Vulgata,
distinguiu entre os livros canônicos e os eclesiásticos (que eram os apócrifos), e essa distinção acabou por
conceder-lhe uma condição de canonicidade secundária. O Concílio de Trento (1548) reconheceu-os como
canônicos, embora os reformadores tenham rejeitado tal decreto. Em algumas versões protestantes dos
séculos XVI e XVII, os apócrifos foram colocados à parte.

O TEXTO QUE DISPOMOS É CONFIÁVEL?


Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas primeiras cópias foram escritos em pergaminhos ou
papiro, desde o tempo de Moisés (1450 a.C.) até o tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional
descoberta dos Rolos do Mar Morto em 1947, não possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a 895
d.C. A razão de isto acontecer era a veneração quase supersticiosa que os judeus tinham pelo texto o que os
levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam gastas demais para uso regular. Na verdade, os massoretas
(tradicionalistas), que acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização entre 600 e 950 d.C.,
padronizando em geral o texto do Antigo Testamento, engendraram maneiras sutis de preservar a exatidão
das cópias que faziam. Verificavam cada cópia cuidadosamente, contanto a letra média de cada página, livro
e divisão. Alguém já disse que qualquer coisa numerável era numerada. Quando os Rolos do Mar Morto ou
Manuscritos do Mar Morto foram descobertos, trouxeram a luz um texto hebraico datado do segundo século
a.C. de todos os livros do Antigo Testamento à exceção de Ester. Essa descoberta foi extremamente
importante, pois forneceu um instrumento muito mais antigo para verificarmos a exatidão do texto
Massorético, que se provou extremamente exata.

Outros instrumentos antigos de verificação do texto hebraico incluem a Septuaginta, os targuns aramaicos
(paráfrases e citações do Antigo Testamento), citações em autores cristãos da antiguidade, a tradução latina
de Jerônimo (Vulgata, 400 d.C.), feita diretamente do texto hebraico corrente em sua época. Todas essas
fontes nos oferecem dados que asseguram um texto extremamente exato do Antigo Testamento.

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Mais de 5.000 manuscritos do Novo Testamento existem ainda hoje, o que o torna o mais bem documentado
dos escritos antigos.

Além de existirem muitas cópias do Novo Testamento, muitas delas pertencem a uma data bem próxima à
dos originais. Há aproximadamente setenta e cinco fragmentos de papiro datados de 135 d.C. até o oitavo
século, possuindo partes de 25 dos 27 livros, num total de 40% do texto. As muitas centenas de cópias feitas
em pergaminho incluem o grande Códice Sinaítico (quarto século), o Códice Vaticano (também quarto
século) e o Códice Alexandrino (quinto século). Além disso, há cerca de 2.000 lecionários (livretos de uso
litúrgico que contêm porções das Escrituras), mais de 86.000 citações do Novo Testamento nos escritos dos
Pais da Igreja, antigas traduções latinas, siríaca e egípcia, datadas do terceiro século, e a versão latina de
Jerônimo. Todos esses dados, mais o trabalho feito pelos estudiosos da paleografia, arqueologia e crítica
textual, nos asseguram possuirmos um texto exato e fidedigno no Novo Testamento.

_______________________________________________________________________________ORIGEM E
SIGNIFICADO DA PALAVRA CÂNON

A palavra cânon não é mencionada na Bíblia, embora a raiz da qual se deriva apareça em 1Rs 14.15 e Jó
40.21. Originalmente significava "junco" ou "talo" de papiro, capim-limão ou calado. Pelo fato dos juncos
serem usados como réguas ou instrumentos para fazer linhas retas, "cânon" passou a significar "medida" ou
"haste de medição". O termo cânon foi empregado pela primeira vez como expressão teológica referente às
Escrituras, por Atanásio, bispo de Alexandria, na carta pascal às igrejas em que descreveu o conteúdo do
Novo Testamento (307 d.C.).

A questão de quais livros pertencem à Bíblia é chamada questão canônica e, refere-se à coleção de livros que
passaram pelo teste de autenticidade e autoridade; significa ainda que esses livros são nossa regra de vida. 

Nosso conhecimento do processo de formação resultante no cânon fixo ainda é obscuro. Infelizmente não
dispomos de documentos antigos dos escribas detalhando os diversos passos do procedimento que culminou
na Bíblia hebraica. Dois comentários são relevantes. O processo foi longo e complicado e, provavelmente
deu-se em fases ao longo de vários séculos da história dos hebreus. O esboço genérico da formação do
cânon a seguir organiza os dados disponíveis sobre o assunto:

FASE 1: Pronunciamentos detentores de autoridade.


Inicialmente a revelação de Deus aos hebreus era transmitida de forma oral na maioria dos casos.
Mensagens como "Assim diz o Soberano Senhor" e "Ouçam a Palavra do Senhor" no Antigo Testamento,
foram ditas por Isaías (1.10), Ezequiel (5.5), oralmente como receberam de Deus. Esses pronunciamentos
foram passados às gerações seguintes com "Palavra do Senhor" na forma tradicional oral recebida.

FASE 2: Documentos formais escritos.


Em determinado ponto, palavras adágios e discursos divinamente inspirados foram registrados e preservados
pela comunidade hebraica na forma escrita. Em certas ocasiões o pronunciamento e a escrita ou registro
eram quase simultâneos, como o Livro da Lei, em Êxodo 24.3-4; Josué 1.8, e o oráculo de Jeremias para o rei
Jeoaquim em Jr 36. Em outros casos o documento da revelação divina acontecia certo tempo após o
acontecimento ou a circunstância que inspirou a Palavra do Senhor.

FASE 3: Coleção de documentos escritos:


O processo de coleção provavelmente foi extenso e abrangente, sabe-se que os Salmos foram reunidos
durante o período de mais de 500 anos. Reunir os escritos de experiências hebraicas com Javé em antologias

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e livros era em parte, questão de conveniência para a comunidade, permitindo acesso fácil e a conservação
garantida dos documentos. Acima de tudo, representava o valor, a importância e a autoridade das obras
reunidas para a vida religiosa da comunidade. Esses livros exigiam atenção especial do povo hebreu (Dt
31.24-27).

FASE 4: Seleção de documentos escritos e fixação do cânon:


Os detalhes do procedimento de seleção de documentos são obscuros, mas podemos discernir os critérios
básicos aplicados com o propósito de escolher e delinear o cânon. Basta dizer que o consenso entre líderes
religiosos hebreus orientados pelo Espírito Santo de Deus durante o decorrer da história israelita resultou no
cânon hebraico das Escrituras Sagradas.

OS TESTES DE CANONICIDADE
Em primeiro lugar é importante lembrarmos que certos livros já eram canônicos antes de qualquer teste lhes
ser aplicado. Isto é como dizer que alguns alunos são inteligentes antes mesmo de se lhes ministrar uma
prova. Os testes apenas provam aquilo que intrinsecamente já existe. Do mesmo modo, nem a Igreja nem os
concílios eclesiásticos jamais concederam canonicidade ou autoridade a qualquer livro; o livro era autêntico
ou não no momento em que foi escrito. A Igreja ou seus concílios reconheceram certos livros como Palavra
de Deus e, com o passar do tempo, aqueles assim reconhecidos foram colecionados para formar o que hoje
chamamos de Bíblia.

QUE TESTES A IGREJA APLICOU?

1) Havia o teste da autoridade do escritor. Em relação ao Antigo Testamento, isto significava a


autoridade do legislador, ou do profeta, ou do líder em Israel. No caso do Novo Testamento, o livro
deveria ter sido escrito ou influenciado por um apóstolo para ser reconhecido. Em outras palavras,
deveria ter a assinatura ou aprovação de um apóstolo. Pedro, por exemplo, apoiou a Marcos, e
Paulo a Lucas.

2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e
autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer
outro livro por comunicar a revelação de Deus.

3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica dos livros era importante. Na verdade, houve
uma surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas quanto aos livros que mereciam lugar
entre os inspirados. Embora seja fato que alguns livros bíblicos tenham sido recusados ou
questionados por alguma minoria, nenhum livro cuja autenticidade foi questionada por um número
grande de igrejas veio a ser aceito posteriormente como parte do cânon.

A FORMAÇÃO DO CÂNON
O cânon da Escritura estava se formando, é claro, à medida que cada livro era escrito, e completou-se
quando o último livro foi terminado. Quando falamos da “formação” do cânon estamos realmente falando
do reconhecimento dos livros canônicos pela Igreja. Esse processo levou algum tempo. Alguns afirmam que
todos os livros do Antigo Testamento já haviam sido colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto
século a.C. Referências nos escritos de Flávio Josefo (95 d.C.) indica a extensão do cânon do Antigo
Testamento com os 39 livros que hoje aceitamos. A discussão do chamado Sínodo de Jamnia (70-100 d.C.)
parece ter partido deste cânon. Nosso Senhor delimitou a extensão dos livros canônicos do Antigo
Testamento quando acusou os escribas de serem culpados da morte de todos os profetas que Deus enviara a
Israel, de Abel a Zacarias (Lc 11.51). O relato da morte de Abel está, é claro, em Gênesis; o de Zacarias se
acha em 2 Crônicas 24.20,21, que é o último livro na disposição da Bíblia hebraica (em lugar de nosso

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Malaquias). Para nós, é como se Jesus tivesse dito: “Sua culpa está registrada em toda a Bíblia - de Gênesis a
Malaquias”. Ele não incluiu qualquer dos livros apócrifos que já existiam em seu tempo e que continham
relatos das mortes de outros mártires israelitas.

O primeiro concílio eclesiástico a reconhecer todos os 27 livros do Novo Testamento foi o concílio de
Cartago, em 397 d.C. Alguns livros do Novo Testamento, individualmente, já haviam sido reconhecidos como
canônicos muito antes disso e a maioria deles foi aceita como canônica no século posterior ao dos apóstolos
(Hebreus, Tiago, 2 Pedro, 2 e 3 João e Judas foram debatidos por algum tempo). A seleção do cânon foi um
processo que continuou até que cada livro provasse o seu valor, passando pelos testes de canonicidade.

OS LIVROS APÓCRIFOS
Os doze livros apócrifos do Antigo Testamento jamais foram aceitos pelos judeus ou por nosso Senhor, no
mesmo nível de autoridade dos livros canônicos. Eles eram respeitados, mas não foram considerados como
Escritura. A Septuaginta (versão grega do Antigo Testamento produzida entre o terceiro e o segundo século
a.C.) incluiu os apócrifos com o Antigo Testamento canônico. Jerônimo (340 - 420 d.C.), ao traduzir a Vulgata,
distinguiu entre os livros canônicos e os eclesiásticos (que eram os apócrifos), e essa distinção acabou por
conceder-lhe uma condição de canonicidade secundária. O Concílio de Trento (1548) reconheceu-os como
canônicos, embora os reformadores tenham rejeitado tal decreto. Em algumas versões protestantes dos
séculos XVI e XVII, os apócrifos foram colocados à parte.

O TEXTO QUE DISPOMOS É CONFIÁVEL?


Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas primeiras cópias foram escritos em pergaminhos ou
papiro, desde o tempo de Moisés (1450 a.C.) até o tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional
descoberta dos Rolos do Mar Morto em 1947, não possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a 895
d.C. A razão de isto acontecer era a veneração quase supersticiosa que os judeus tinham pelo texto o que os
levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam gastas demais para uso regular. Na verdade, os massoretas
(tradicionalistas), que acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização entre 600 e 950 d.C.,
padronizando em geral o texto do Antigo Testamento, engendraram maneiras sutis de preservar a exatidão
das cópias que faziam. Verificavam cada cópia cuidadosamente, contanto a letra média de cada página, livro
e divisão. Alguém já disse que qualquer coisa numerável era numerada. Quando os Rolos do Mar Morto ou
Manuscritos do Mar Morto foram descobertos, trouxeram a luz um texto hebraico datado do segundo século
a.C. de todos os livros do Antigo Testamento à exceção de Ester. Essa descoberta foi extremamente
importante, pois forneceu um instrumento muito mais antigo para verificarmos a exatidão do texto
Massorético, que se provou extremamente exata.

Outros instrumentos antigos de verificação do texto hebraico incluem a Septuaginta, os targuns aramaicos
(paráfrases e citações do Antigo Testamento), citações em autores cristãos da antiguidade, a tradução latina
de Jerônimo (Vulgata, 400 d.C.), feita diretamente do texto hebraico corrente em sua época. Todas essas
fontes nos oferecem dados que asseguram um texto extremamente exato do Antigo Testamento.

Mais de 5.000 manuscritos do Novo Testamento existem ainda hoje, o que o torna o mais bem documentado
dos escritos antigos.

Além de existirem muitas cópias do Novo Testamento, muitas delas pertencem a uma data bem próxima à
dos originais. Há aproximadamente setenta e cinco fragmentos de papiro datados de 135 d.C. até o oitavo
século, possuindo partes de 25 dos 27 livros, num total de 40% do texto. As muitas centenas de cópias feitas
em pergaminho incluem o grande Códice Sinaítico (quarto século), o Códice Vaticano (também quarto
século) e o Códice Alexandrino (quinto século). Além disso, há cerca de 2.000 lecionários (livretos de uso
litúrgico que contêm porções das Escrituras), mais de 86.000 citações do Novo Testamento nos escritos dos

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Pais da Igreja, antigas traduções latinas, siríaca e egípcia, datadas do terceiro século, e a versão latina de
Jerônimo. Todos esses dados, mais o trabalho feito pelos estudiosos da paleografia, arqueologia e crítica
textual, nos asseguram possuirmos um texto exato e fidedigno no Novo Testamento.
______________________________________________________________________
03 - APÓCRIFOS, PSEUDOPÍGRAFOS E PERGAMINHOS

12.1 Escritos Apócrifos

Nas Bíblias de edição da Igreja Católica Romana, o total de livros é de 73, porque essa igreja,
desde o Concílio de Trento, em 1546, incluiu no cânon do Antigo Testamento 7 livros apócrifos,
além de 4 acréscimos ou apêndices a livros canônicos, acrescentando, assim, ao todo, 11 escritos
apócrifos.

A palavra apócrifo significa, literalmente, escondido, oculto, isto em referência a livros que tratavam
de coisas secretas, misteriosas, ocultas. No sentido religioso, o termo significa "não genuíno",
"espúrio", desde sua aplicação por Jerônimo. Os apócrifos foram escritos entre Malaquias e
Mateus, ou seja, entre o Antigo e o Novo Testamento, numa época em que cessara por completo a
revelação divina; isto basta para tirar-Ihes qualquer pretensão de canonicidade. O Historiador Flávio
Josefo rejeitou-os totalmente. Nunca foram reconhecidos pelos judeus como parte do cânon
hebraico. Jamais foram citados por Jesus nem foram reconhecidos pela igreja primitiva.

Jerônimo, Agostinho, Atanásio, Júlio Africano e outros homens de valor dos primitivos cristãos,
opuseram-se a eles na qualidade de livros inspirados. Apareceram pela primeira vez na
Septuaginta - tradução do Antigo Testamento feita do hebraico para o grego. Quando a Bíblia foi
traduzida para o latim, em 170 d.C., seu Antigo Testamento foi traduzido do grego da Septuaginta e
não do hebraico.

Quando Jerônimo traduziu a Vulgata, no início do Século V (405 d.C.), incluiu os apócrifos oriundos
da Septuaginta, através da Antiga Versão Latina, de 170 d.C., porque isso lhe foi ordenado, mas
recomendou que esses livros não poderiam servir como base doutrinária.

12.1.1 Livros Apócrifos do Antigo Testamento

Os 7 livros apócrifos constantes das Bíblias de edição católico-romana são: TOBIAS (Após o livro
canônico de Esdras), JUDITE (após o livro de Tobias) SABEDORIA DE SALOMÃO (após o livro
canônico de Cantares), ECLESIÁSTICO (após o livro de Sabedoria), BARUQUE (após o livro
canônico de Jeremias), 1 MACABEUS, 2 MACABEUS (ambos, após o livro canônico de Malaquias).
Os 4 acréscimos ou apêndices são: ESTER (a Ester, 10.4 -16.24), CÂNTICO DOS TRÊS SANTOS
FILHOS (a Daniel, 3.24-90), HISTÓRIA DE SUZANA (Daniel, cap.13), BEL E O DRAGÃO (a Daniel,
capo 14). Os livros rejeitados são: 3 ESDRAS, 4 ESDRAS, A ORAÇÃO DE MANASSÉS. A Igreja
Católica Romana aprovou os apócrifos em 18 de abril de 1546, para combater o movimento da
Reforma Protestante, então recente. Nessa época, os protestantes combatiam violentamente as

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novas doutrinas romanistas: a doutrina do Purgatório, a doutrina da oração pelos mortos, a doutrina
da salvação mediante obras etc. A Igreja Católica Romana via nos apócrifos base para essas
doutrinas, e, apelou para eles, aprovando-os como canônicos.

12.1.2 Razões da Rejeição dos Livros Apócrifos

A razão porque 66 livros da Bíblia se harmonizam entre si é que a mesma mente divina inspirou a
cada escritor. Se, por exemplo, João tivesse escrito algo que não concordasse com as obras de
Moisés, seríamos obrigados a rejeitar seu Evangelho, as Epístolas e o livro do Apocalipse. Os
primeiros livros constituem o critério para todos os outros chamados inspirados. Se as doutrinas
dos livros apócrifos não concordam em cada ocasião com aquilo que Moisés escreveu, não devem
achar-se no Cânon da Palavra Inspirada. Os livros apócrifos ensinam doutrinas que são contrárias
ao que Moisés e outros profetas escreveram. Por essa razão não foram colocados entre os outros
livros do Velho Testamento, nos dias de Esdras. Nem Cristo nem os apóstolos citaram os livros
apócrifos. S. Jerônimo os rejeitou da Bíblia Latina, por não estarem escritos em hebraico.

12.1.2.1 Ensino da Arte Mágica

Tobias 6.5-8. "Então, o anjo lhe disse: toma as entranhas deste peixe e guarde para ti seu coração,
o fel e seu fígado. Pois são necessários para medicinas úteis [...] Logo, Tobias perguntou ao anjo e
lhe disse: Eu te rogo, irmão Azarias, para quais remédios são boas essas coisas, que tu pediste
separar do peixe. E o anjo, respondendo, lhe disse: Se puseres um pedacinho do seu coração
sobre as brasas, seu fumo há de espantar toda a espécie de demônios, seja de um homem ou de
uma mulher, de modo que não possam mais voltar a eles."

121.2.2 Dar Esmolas Purifica do Pecado

Tobias 12.8,9. "A oração é boa como o jejum e esmolas; é melhor do que guardar tesouros de ouro,
pois, esmolas livram da morte, e é o mesmo que espia os pecados e conduz à misericórdia e vida
eterna". Se ofertas caridosas pudessem expiar os nossos pecados, não teríamos necessidade do
sangue de Jesus Cristo.

12.11.2.3 Pecados Perdoados pela Oração

Eclesiástico 3.4. "Quem amar a Deus, receberá perdão de Seus pecados pela oração". Os pecados
não se perdoam pela oração. Se fosse assim, não teríamos necessidade de Jesus. Todos os povos
pagãos fazem orações, mas os pecados não se perdoam somente pela oração. Pv 28.1; 1Jo 1.9.
Só Cristo, nosso Advogado, pode perdoar o pecado.

12.1.2.4 Orações pelos Mortos

2 Macabeus 12.42-46, "E, fazendo uma arrecadação, mandou doze mil dracmas de prata a
Jerusalém para ser oferecido um sacrifício pelos pecados dos mortos, e fez bem em pensar
religiosamente na ressurreição, (pois, se não tivesse esperança que os que haviam sido mortos
ressuscitassem novamente, haveria de ser supérfluo e em vão orar pelos mortos). E considerava
que, os que haviam adormecido no temor de Deus, alcançaram para si muita graça." A Igreja
Católica afirma que estes versículos lhe autorizam a doutrina do purgatório. Orações e missas

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pelos mortos são aceitas e o devoto católico crê nelas. Excede a imaginação a quantidade de
dinheiro que aflui todos os anos aos cofres da igreja pelas missas em favor dos mortos.

12.1.2.5 O Ensino do Purgatório

Sabedoria 3.1-4. "Mas, as almas dos justos estão na mão de Deus; e o tormento da morte não as
tocará. Aos olhos dos ignorantes pareciam eles morrer e sua partida foi considerada desgraça. E,
sua separação de nós, por uma extrema perda. Mas, eles estão em paz. E, embora aos olhos dos
homens sofram tormentos, sua esperança está plenamente na imortalidade." A Igreja Católica
baseia a sua crença da doutrina do purgatório nestes versículos citados: "Embora aos olhos dos
homens sofram tormentos, sua esperança está plenamente na imortalidade". "Os tormentos" nos
quais se acham os "justos", diz a Igreja, referem-se ao fogo do purgatório, onde os pecados estão
sendo expiados. "Sua esperança está plenamente na imortalidade", pois a igreja interpreta isso,
declarando que após suficiente tempo de sofrimento no meio do fogo, poderão passar para o céu.
1Jo 1.7. Esse ensino aniquila completamente a expiação de Cristo. Se o pecado pudesse ser
extinto pelo fogo, não teríamos necessidade do nosso Salvador.

12.1.2.6 O Anjo Relata uma Falsidade

Tobias 5.15-19. "O anjo disse-lhe (a Tobias): Guiá-lo-ei para lá (o filho de Tobias) e o farei voltar a
ti. E Tobias lhe disse (ao anjo): Eu te rogo, dize-me, de que família ou de que tribo és tu? E Rafael,
o anjo, respondeu: [...] Eu sou Azarias, o filho do grande Ananias. Respondeu-lhe Tobias: Tu és de
uma grande família". Se um anjo de Deus mentisse acerca de sua identidade, tornar-se-ia culpado
de violação do nono mandamento. Lc 1.19. Confrontando esta declaração com o que está
registrado no livro de Tobias, compreenderemos logo porque Cristo nunca Se referiu aos livros
apócrifos.

12.1.2.7 Uma Mulher Jejuando Toda Sua Vida

Judith 8.5,6. "E ela fez para si um aposento separado no andar superior de sua casa no qual vivia
com suas servas. Seu vestido era de cabelo de crina e ela jejuava todos os dias de sua vida, com
exceção dos sábados, das luas novas e demais festas da casa de Israel." Esta passagem é
parecida a outras lendas católicas romanas, com respeito a seus santos canonizados. Uma mulher
dificilmente jejuaria toda sua vida, com exceção de um dia da semana e algumas outras ocasiões
durante o ano. Cristo jejuou quarenta dias, porém não toda a Sua vida. A igreja católica apega-se a
estes livros não inspirados porque eles sancionam alguns de seus falsos ensinos, como: oração
pelos mortos, salvação pelas obras, a doutrina do purgatório, dar esmolas para libertar as pessoas
do pecado e da morte.

12.1.3 Apócrifos do Novo Testamento

Trata-se de Evangelhos, Atos de Apóstolos e Epístolas, todos lendários e espúrios, que começaram
a aparecer no século II. Foram forjados, na maior parte, e assim reconhecidos desde o princípio.

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São tão cheios de estórias ridículas e indignas a respeito de Cristo e dos apóstolos, que nunca
foram reconhecidos como divinos, nem incorporados à Bíblia. São tentativas deliberadas de
preencher lacunas na história de Jesus, como é apresentada no Novo Testamento, com o fim de
fomentar idéias heróicas através de falsas afirmações. Sabe-se que houve uns 50 "Evangelhos"
espúrios, além de muitos "Atos" e "Epístolas". A grande quantidade desses escritos forjados fez a
Igreja Primitiva ver quanto era importante distinguir entre os falsos e os verdadeiros. Dizem que
Maomé tirou largamente desses livros as idéias que tinha acerca do cristianismo. Neles está a
origem de alguns dogmas da Igreja Romana. Não devem ser confundidos com os escritos dos “Pais
Apostólicos". Vai, aqui, uma lista de alguns dos livros apócrifos mais conhecidos:

Evangelho de Nicodemos. Inclui os "Atos de Pilatos", pretenso relatório oficial do julgamento de


Jesus ao imperador Tibério. Foi produzido entre os séculos II e V. Puramente imaginário.

Proto Evangelho de Tiago. Narrativa que vai do nascimento de Maria ao massacre dos inocentes.
Contos que começaram a circular no século II. Foi completado século V.

O Passamento de Maria. Repleto de milagres ridículos culmina com a remoção do "seu corpo
imaculado e precioso" ao Paraíso. Escrito no século IV, com o aparecimento do culto à Virgem.

Evangelho Segundo os Hebreus. Adições aos Evangelhos canônicos, com algumas frases
atribuídas a Jesus. Meados de 100 d.C.

Evangelho dos Ebionitas. Compilado dos Ev. Sinópticos, no interesse da doutrina ebionita.

Evangelho dos Egípcios. Conversas imaginárias entre Jesus e Salomé. Entre 130 e 150 d.C.
Usados pelos sabelianos.

Evangelho de Pedro. Meados do Século II. Buscado em Evangelhos canônicos. Escrito no


interesse de doutrinas docetistas e anti-judaicas.

Evangelho de um Pseudo-Mateus. Século V. Falsa tradução de Mateus, repleta de milagres da


infância de Jesus.

Evangelho de Tomé. Século II. Vida de Jesus, dos 1 aos 12 anos. Apresenta-o operando milagres
para satisfação de seus caprichos infantis.

Natividade de Maria. Obra de ficção Século VI, premeditada, para fomentar o culto à Virgem.
Histórias de visitas diárias de anjos a Maria. Com o surto do papado, tornou-se imensamente
popular.

Evangelho Arábico da Infância. Século VII. História de Milagres operados durante a estada no
Egito.

Evangelho do Carpinteiro José. Século IV. Originou-se no Egito. Dedicado à glorificação de José.

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Apocalipse de Pedro. Pretensas visões do céu e do inferno concedidas a Pedro. Eusébio chamou-o
"espúrio".

Atos de Paulo. Meados do Século II. Romance que aconselha a continência. Contém a suposta
Epístola aos Coríntios que se perdeu.

Atos de Pedro. Fim do século II. Um caso de amor com a filha de Pedro. Conflito com Simão, o
Mago. Contém a história do "Quo Vadis".

Atos de João. Fim do século II. História de uma visita à Roma. Puramente imaginária. Contém um
quadro revoltante de sensualismo.

Atos de André. História de André, que persuade Maximila a evitar relações com o marido, o que
resultou no martírio dele.

Atos de Tomé. Fim do século II. Como os Atos de André, foi criado com interesse da abstinência de
relações sexuais.

Carta de Pedro a Tiago. Fim do século II. Ataca violentamente Paulo. Pura invenção no interesse
dos ebionitas.

Epístola de Laodicéia. Diz ser a que é referida em Colossenses 4.16. Um aglomerado de frases de
Paulo.

Cartas de Paulo á Sêneca. E outras deste àquele. Invenção século IV. Objetivo: ou recomendar o
cristianismo aos seguidores de Sêneca, ou recomendar este aos cristãos. A principal característica
destes escritos é o fato de serem obras de ficção, que se apresentam como história, mas em sua
maior parte são absurdos por tal forma que a falsidade deles evidencia-se por si mesma.

Cartas de Abgar. Estas podem ter alguma base, Eusébio assim pensava. Conta que Abgar, rei de
Edessa, estando enfermo, ouviu falar do poder de Jesus. Escreveu-lhe uma carta pedindo que
fosse curá-lo, ao que Jesus respondeu por escrito: "...é necessário completar aquilo para o que fui
enviado; depois disso serei recebido em cima, por aquele que Me enviou. Quando, pois, Eu for
recebido no céu, enviarei um dos Meus discípulos que te curará". Contam que foi Tadeu o enviado,
a quem mostraram as Cartas a que ficaram arquivadas em Edessa. Possivelmente, Jesus mandou
um recado verbal, que eles registraram.

12.2 Os Pseudopígrafos

São os livros escritos sob um nome fictício. Para outros são os escritos judaicos, extra bíblicos, não
inspirados do Antigo Testamento. São considerados de valor no estudo do cânon, e alguns
estudiosos os incluem no mesmo grupo dos apócrifos. Dentre os pseudopígrafos destacam-se:

O Livro de Enoque. A crítica textual não tem condições de localizá-lo exatamente em determinada
época, mas deve pertencer ao período de 200 a.C. e as primeiras décadas do primeiro século da
nossa era.

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A Assunção de Moisés. Deve ter sido publicado no tempo de Cristo e procura narrar a história do
mundo, em forma de profecia, desde Moisés até ao tempo do autor.

Os Oráculos Sibilinos. São obras judaicas que, à imitação das profecias pagãs de Sibila, pretendem
divulgar o pensamento hebraico entre os gentios.

O Livro dos Jubileus. É um comentário sobre Gênesis, frisando que a Lei foi observada desde os
mais remotos tempos. Recebe este nome pelo fato de dividir a história em períodos jubileus, isto é,
quarenta e nove anos (sete semanas de anos).

O livro dos Segredos de Enoque (2 Enoque). Descreve pormenorizadamente os sete céus e


antecipa em mil anos o reinado de Deus na terra.

O Apocalipse de Baruque. Alguns o atribuem ao escriba de Jeremias. Foi escrito, segundo os


críticos, nas últimas décadas do primeiro século da nossa era.

O Apocalipse de Abraão. É uma obra judaica com passos de literatura do cristianismo. Pertence ao
século I da nossa era.

Os Salmos de Salomão. Coletânea de dezoito salmos, escrita por um fariseu, que viveu na
segunda metade do primeiro século da era cristã. O estilo é bastante semelhante ao dos Salmos
que temos na Bíblia.

A Carta de Aristéias. É interessante por informar-nos das supostas circunstâncias em que foi feita a
tradução do Velho Testamento hebraico para o grego.

Macabeus, 3 e 4. No III encontramos uma tentativa de massacre dos judeus no reinado de


Ptolomeu Filopator. O 4 é um tratado filosófico ilustrando a tese do autor no caso dos mártires
macabeus. Embora haja referências a estes livros na Bíblia (2Tm 3.8; Jd 9 e 14) não necessitamos
aceitá-los como canônicos.

A literatura pseudopígrafa foi produzida entre 200 a.C., e 200 a.D. com o objetivo de encorajar e
consolar a nação judaica durante as invasões dos sírios e romanos.

12.3 Os Rolos do Mar Morto

No verão de 1947, tiveram início na Palestina, por obra de casual descoberta de um jovem beduíno,
chamado Moâmede ad-Dib, encontros arqueológicos de excepcional importância: os chamados
manuscritos do Deserto da Judéia, do Mar Morto ou ainda Manuscritos de Qunran. Ele tinha
perdido uma cabra, por isso subiu penosamente a encosta, chamando pelo animal que continuava
a elevar-se, a procura de alimento. Nesta sua busca ele deparou com uma cavidade, atirou para
dentro dela uma pedra, apurando o ouvido para escutar a queda, a fim de determinar a sua
profundidade. Qual não foi a sua surpresa, quando em vez do esperado ruído, seu ouvido percebeu
um típico som de louça. Com esforço conseguiu olhar para dentro, notando com surpresa a
existência de vários objetos cilíndricos, de grande tamanho. Amedrontado pela superstição, o moço

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fugiu rapidamente daquele sítio, e, à noite, comentou com um amigo a inusitada descoberta da
caverna. No dia seguinte os dois se dirigem à gruta, e ao entrarem nela, encontram sete rolos.
Levaram alguns para a tenda e ao desenrolarem ficaram surpresos com a sua extensão e por não
entenderem nada do que neles estava escrito.

Os beduínos, indo regularmente a Belém para vender leite e queijo, certo dia, levaram também os
pergaminhos, vendendo-os a um cristão sírio, dono de um armazém, conhecida pelo nome de
Kando, que também por ignorar totalmente o valor deste achado, abandonou-os no chão da loja por
vários dias, sendo estes pisados pelos que nela entravam. Certo dia, atentando melhor para
aqueles pergaminhos, ocorreu-lhe a idéia de levá-los a Jerusalém para os vender no Convento
Sírio de São Marcos. O superior do convento procura pessoas entendidas que estudassem os
manuscritos, a fim de que ele pudesse ter uma idéia de seu real valor, assim sendo, um dos
pergaminhos foi enviado ao Professor E. L. Sukenik, da Universidade Hebraica. Sukenik
analisando-o, em profundidade, concluiu que o documento apresentava grande valor pelo seu
conteúdo e considerável antigüidade. A caverna na qual foram encontrados os manuscritos fica na
região desolada e quente do Deserto de Judá dos dias bíblicos, cerca de doze quilômetros ao sul
de Jericó, na altura do Uadi Qunran. Os sete rolos retirados desta gruta eram bem diferentes, pois
dois eram manuscritos do livro de Isaías, um completo e outro incompleto, um manual de Disciplina
da Seita, uma coleção de Salmos e Ações de Graça, uma ordem de batalha para uma guerra
apocalíptica entre os Filhos da Luz e os Filhos das Trevas, um Comentário ao livro de Habacuque.
Todo este material foi publicado por Sukenik e pelos americanos. Além dos manuscritos já citados
ainda foram encontrados documentos os mais diversos conto contratos de casamento, cartas do
líder judeu Bar Cocheba, um hinário de mais ou menos quarenta salmos, cópias dos apócrifos de
Eclesiástico e Tobias, além de trechos de pseudepígrafos como o de Enoque.

A gruta em que aqueles pastores entraram, e que marcou o início de uma fase histórica da
arqueologia, recebeu o n.º 1. Não longe dela, encontrou-se, em fins de 1951, a gruta a que se deu o
n.º 2. Continha fragmentos dos Salmos, os livros de Isaías, do Êxodo, de Rute, um documento
litúrgico e o livro apócrifo dos Jubileus, que é uma paráfrase do Gênesis, recompilada pelos
fariseus. Descobriu-se, depois, a gruta n.º 3, onde se encontraram 2 rolos de chapas de cobre, com
textos gravados.

A gruta que deu colheita mais rica foi a de n.º 4. Continha 380 manuscritos, dos quais mais ou
menos uma centena são de ordem bíblica. Seguiram-se as de n.º 5 e 6, que deram manuscritos de
pouca importância bíblica e histórica. Em fins de 1955, revistaram-se as grutas que receberam os
nos 7, 8, 9 e 10, todas contendo ora pergaminhos, ora papiros, tudo de pouca importância. Logo
após, nos últimos dias de 1955, encontram-se outras duas séries de grutas, uma à margem do Uadi
Murabaat, e outra à margem do Uadi Mird, sempre nos arredores do Mar Morto.

12.3.3 Valor dos Rolos do Mar Morto

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Embora o valor desta descoberta ainda não possa ser avaliado em toda a sua plenitude, há certos
fatos já conhecidos que são os seguintes: Estes manuscritos são pelo menos 1000 anos mais
velhos do que o mais antigo manuscrito hebraico que possuímos – O Códice Petropolitano escrito
em 912 a.D; os manuscritos de Qumran são mais antigos do que os mais velhos fragmentos da
Septuaginta existentes, quanto à história da evolução da escrita, fornecendo, portanto precioso
material à Paleografia. Estes manuscritos foram copiados entre os séculos III a.C. e o primeiro
século a.D.; antes desta descoberta pouco se sabia a respeito do judaísmo pré-cristão. Através do
Manual de Disciplina conhecemos hoje muito dos seus costumes e maneira de viver; estes
manuscritos, vieram desfazer afirmações infundadas, concernentes ao trabalho dos copistas pré-
massoréticos e ainda de que a Bíblia Hebraica de hoje fora organizada e emendada pelos
massoretas.

Os estudantes da Bíblia não puseram tanto em dúvida as mudanças no texto quando foram
acrescentadas as vogais e a pontuação para formar o texto Massorético, séculos depois de Cristo,
pois sabiam que os copistas depois daquele tempo, preservaram com cuidado extremo cada jota e
til do texto. Alguns críticos opinavam que os mais antigos copistas por não serem tão escrupulosos
trataram o texto com mais liberdade, portanto havia diferenças consideráveis em nossa Bíblia.

Quando o texto hebraico de hoje foi comparado com os manuscritos de Qumran verificou-se
surpreendente identidade de conteúdo. Os rolos do Mar Morto comprovam a validade do texto
hebraico, tão cuidadosamente transmitido através dos séculos. O descobrimento destes rolos e de
outros manuscritos mostrou a fragilidade dos argumentos da Alta Crítica, comprovando que o
trabalho dos copistas e tradutores por dois mil anos não mudou a Palavra de Deus. Eles
comprovaram que a maioria das variações de um manuscrito para outro são simplesmente
questões de letras, palavras ou frases que não modificam suficientemente o sentido para influenciar
alguma doutrina importante.

12.3.4 Fragmentos de Papiros em Qumran

Numa das cavernas de Qumran foram encontrados muitos fragmentos de papiros e entre estes, o
papirólogo espanhol, José O'Callaghn descobriu um trecho do Evangelho de São Marcos –
correspondente aos versículos 52 e 53, do capítulo 6. Após este encontro, em março de 1972, o
erudito espanhol, recorrendo a métodos técnicos, conclui que se trata de um manuscrito do ano 50
a.D. A história nos confirma que o General Vespasiano, no ano 68 a.D, tomou posse do mosteiro
essênio de Qumran, ocasião em que seus habitantes esconderam os rolos nas cavernas, pensando
em regressar mais tarde para recuperá-los.

12.3.5 Conclusões

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Todo o cuidado e todos os avanços feitos pela ciência têm sido utilizados, quer na determinação
das datas deste valioso material, quer na sua leitura e conservação. Assim foi descoberto um
método com base na ciência atômica, para determinar a idade do material orgânico. Foi usando
esse método, com o isótopo, "Carbono 14", que o Instituto Nuclear da Universidade de Chicago
pode confirmar com precisão a opinião dos arqueólogos, segundo a qual o pano que envolvia os
rolos, descobertos em 1947, datava do I século da era cristã. No Museu de Jerusalém, onde se
encontra boa parte do material descoberto, documentos, à primeira vista ilegíveis, são decifrados
graças à fotografia infravermelha que traz à luz, letras que normalmente não podem ser
distinguidas pelos olhos humanos. Inegavelmente, esta foi a descoberta arqueológica mais
sensacional dos últimos tempos, porque veio provar a autenticidade da Bíblia e a sua maravilhosa
conservação através dos séculos.

04 - VERSÕES, TRADUÇÕES E REVISÕES

13.1 Conceituação

Tradução é simplesmente a transposição de uma composição literária de uma língua para outra.
Por exemplo, se a Bíblia fosse transcrita dos originais hebraico e grego para o latim, ou do latim
para o português, chamaríamos esse trabalho tradução. Se esses textos traduzidos fossem vertidos
de volta para as línguas originais, também chamaríamos isso tradução.

A tradução literal é uma tentativa de expressar, com toda a fidelidade possível e o máximo de
exatidão, o sentido das palavras originais do texto que está sendo traduzido. Trata-se de uma
transcrição textual, palavra por palavra. O resultado é um texto um tanto rígido.

A transliteração é a versão das letras de um texto em certa língua para as letras correspondentes
de outra língua. É claro que uma tradução literal da Bíblia fica sem sentido para uma pessoa de
pouca cultura.

Versão, tecnicamente falando é uma tradução da língua original (ou com consulta direta a ela) para
outra língua, ainda que comumente se negligencie essa distinção. O segredo para a compreensão
é que a versão envolve a língua original de determinado manuscrito.

Revisão, ou versão revista, é termo usado para descrever certas traduções, em geral feitas a partir
das línguas originais, que foram cuidadosa e sistematicamente revistas, cujo texto foi examinado de
forma crítica, com vistas em corrigir erros ou introduzir emendas ou substituições.

Paráfrase é uma tradução "livre" ou "solta". O objetivo é que se traduza a idéia, e não as palavras.
Daí que a paráfrase é mais uma interpretação que uma tradução literal do texto. O comentário é
simplesmente uma explicação das Escrituras. O exemplo mais antigo desse tipo de trabalho é o
“Midrash”, ou comentário judaico do Antigo Testamento.

13.2 Versões e Traduções mais Antigas

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As traduções mais antigas apareceram antes do período dos Concílios da Igreja (350 d.C.),
abarcando obras como Pentateuco Samaritano, os Targuns Aramaicos, o Talmude, o Midrash e a
Septuaginta (LXX).

13.2.3 O Talmude

O Talmude basicamente representa as opiniões e as decisões de professores judeus de cerca de


300 a 500 d.C., consistindo em duas principais divisões: o Midrash e a Gemara. A Mishna
(repetição, explicação) completou-se perto de 200 d.C., como se fora um digesto – publicação
composta de artigos, livros condensados - hebraico de todas as leis orais, desde o tempo de
Moisés. Era altamente considerada como a segunda lei, sendo a Tora a primeira. A Gemara
(término, finalização) era um comentário ampliado, em aramaico, da Mishna. Foi transmitida em
duas tradições: a Gemara palestina (c. 200) e a Gemara babilônica, maior, dotada de mais
autoridade (c. 500).

13.2.5 Septuaginta (LXX)

Bastante conhecida através da sigla LXX, é a mais importante tradução grega do Velho
Testamento. Seria interessante pensar por alguns instantes qual a razão de um livro hebraico ser
traduzido para o grego numa cidade do Egito? A História nos confirma que Alexandre Magno, com
suas extraordinárias conquistas levou o grego a quase todas as partes do mundo conhecido. Sua
morte prematura em 323 a.C. fez com que seu império fosse dividido. Cabendo a Ptolomeu I (323-
285) governar o Egito, iniciando assim a dinastia dos reis gregos no Egito. Calcula-se que no tempo
de Ptolomeu II, a cidade de Alexandria era composta por um terço de judeus. Como era de se
esperar esses imigrantes judeus facilmente adotaram a língua dos gregos.

Dias Gomes citando Flávio Josefo, fornece-nos pormenores úteis sobre a origem desta antiga
tradução. Eis uma síntese de suas palavras:

Demétrio Palério, bibliotecário de Ptolomeu Filadelfo, trabalhava com extremo cuidado e grande
curiosidade para reunir de todas as partes do mundo os livros de mérito e que julgava serem
agradáveis ao príncipe. Certo dia o príncipe perguntou-lhe quantos livros já havia na Biblioteca e
soube que mais ou menos 200.000. Notificou também ao rei a existência entre os judeus de livros
dignos de figurarem na soberba biblioteca, mas dariam muito trabalho traduzi-los para o grego.
Acrescentou que este trabalho poderia ser feito porque sua majestade não olhava a gastos. O rei,
persuadido pelo ilustre bibliotecário, fez um apelo ao sumo-sacerdote de Jerusalém para que lhe
enviasse os livros e pessoas capacitadas para os traduzir. O pedido foi imediatamente atendido,
talvez, porque acompanhando-o havia grande soma de dinheiro e pedras preciosas. Ptolomeu,
recebeu através de uma carta a seguinte notificação: "Escolhemos, Senhor, seis homens de cada
tribo para vos levar as santas leis e esperamos da vossa bondade, quando não tenhais mais
necessidade deles, que vos dignareis remetê-los com os que vão em sua companhia." Eleazar.
Quando a obra foi acabada (segundo alguns em 72 dias), Demétrio reuniu todos os judeus para

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que ouvissem a leitura da tradução, na presença dos 72 tradutores. A tradução foi aprovada e
Demétrio elogiado por ter concebido um desígnio que lhes era tão vantajoso. (JOSEFO, Flávio.
Apud. GOMES, Dias. Bíblia Poliglota Portuguesa, p. 26-28).

Para alguns esta história é lendária, sendo a verdadeira razão para a origem da Septuaginta a
seguinte: Havendo em Alexandria muitos judeus que não podiam ler o Velho Testamento no original
hebraico, uma tradução em grego lhes foi preparada. Por causa do número de tradutores essa
extraordinária tradução se tornou conhecida (um tanto inexatamente) como Septuaginta.

05 - VERSÕES LATINAS E INGLESAS

14.1 Versões Latinas

O latim era um idioma dominante nas regiões ocidentais do Império Romano desde muito antes dos
dias de Jesus. Foram nas regiões ocidentais ao sul da Gália e na África do Norte que apareceram
as primeiras traduções da Bíblia em latim. Segundo Philip W. Confort (1998, p. 235) “em cerca de
160 d.C., Tertuliano notoriamente usou uma versão das Escrituras em latim. Não muito tempo
depois, o texto em latim antigo parece ter estado em circulação, o que nos é evidenciado pelo uso
de Cipriano antes de sua morte, em 258 d.C.”. A versão em latim antigo era uma tradução da
Septuaginta. Manuscritos completos do texto em latim antigo não subsistiram. Depois que a versão
latina, a Vulgata, foi completada por Jerônimo, o texto mais primitivo caiu em desuso.

14.1.1 A Vulgata latina

Segundo Philip W. Confort (1998, p. 236) “por volta do século III d.C., o latim começou a substituir o
grego como língua de ensino no vasto mundo romano. Um texto uniforme e confiável era
extremamente necessário para uso teológico e litúrgico”. Para preencher essa necessidade, o papa
Dâmaso I (336-384 d.C.) encarregou Jerônimo, eminente erudito no latim, grego e hebraico, de
fazer a tradução. Jerônimo começou o seu trabalho com uma tradução da Septuaginta em grego,
considerada inspirada por muitas autoridades da Igreja, inclusive Agostinho. Contudo, mais tarde, e
sob risco de grande crítica, voltou-se para o texto hebraico que então estava em uso na Palestina,
como texto base para sua tradução. Durante o período de 390 a 405, Jerônimo fez sua tradução
latina do Antigo Testamento hebraico. Não obstante, a despeito de ter se voltado para o original
hebraico, Jerônimo dependia grandemente das diversas versões gregas como auxílio à tradução.
Por conseguinte, a Vulgata espelha as outras traduções gregas e latinas tanto quanto o texto
hebraico fundamental.

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15.2.2 Tradução de João Ferreira de Almeida

A Edição Comemorativa do Terceiro Centenário da Tradução da Bíblia em língua portuguesa,


apresentou para João Ferreira de Almeida as seguintes informações: "Nascido em Torres de
Tavares, Conselho de Mangualde, Portugal, em 1628, faleceu, João Ferreira de Almeida, em 1691”.
Temos aqui 63 anos que se dignificaram na vida do consagrado servo de Deus. É consagrado no
campo da cultura secular, versado na lingüística, incansável na comparação das línguas que
aprendeu e usou, valeu-se de sua língua nativa, a portuguesa, para a expressão geral e ampla de
suas obras principais, destacando-se, dentre elas, a tradução que fez da Bíblia, dos originais
hebraico e grego para a língua portuguesa. João Ferreira de Almeida foi quem primeiro traduziu a
Bíblia para o nosso vernáculo. Português ele, de três séculos idos, é certo que ainda falando e
escrevendo corretamente, com segura inteligência das proposições, das frases e das palavras teve
linguagem que hoje seria distante e até, não raro, diferente para as sucessivas edições da Bíblia,
segundo ele a traduziu, porque a evolução semântica da linguagem, por vezes, impõe mudanças
de palavras para que se não mude o sentido das mensagens. Há 300 anos (1681) João Ferreira de
Almeida traduziu o Novo Testamento, em Amsterdã; e daí avante, sua publicação (Batávia, 1693),
novamente em Amsterdã (1712); em Trangambar,1760; e outra vez em Batávia, 1773. Incansável
no trabalho, traduziu também o Antigo Testamento, mas até o versículo 12 do capítulo 48 de
Ezequiel. Em 1656, Almeida foi ordenado pastor da Igreja Reformada, mas sempre desejoso de
promover a Reforma em Portugal. De 1656 até 1658 foi missionário no Ceilão, depois na Índia, e foi
o primeiro ordenado a pregar em português. De volta a Batávia, pastoreou a comunidade
portuguesa ali existente. Faleceu, dissemos, em 1691, todavia João Ferreira de Almeida até hoje
influi com as traduções que deixou da Bíblia. A mais antiga versão usual no Brasil, entre os
evangélicos, mereceu da Sociedade Bíblica do Brasil certa atualização na linguagem, pois dista três
séculos a tradução do Almeida. Na seção de Livros Raros da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro,
há um exemplar do Novo Testamento impresso em Amsterdã (1712).

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