Sei sulla pagina 1di 84

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ


DEPARTAMENTO DE DIREITO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CÉLIO TORQUATO DE ARAÚJO JÚNIOR

AS VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS NO CONTROLE DA CRISE


HUMANITÁRIA NA EUROPA EM 2015 À LUZ DO SISTEMA REGIONAL
EUROPEU DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS

CAICÓ/ RN
2016
CÉLIO TORQUATO DE ARAÚJO JÚNIOR

AS VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS NO CONTROLE DA CRISE


HUMANITÁRIA NA EUROPA EM 2015 À LUZ DO SISTEMA REGIONAL
EUROPEU DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS

Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito


da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em
Direito.

Orientador: Prof. Ms. Bruno Jorge Rijo Lamenha Lins.

CAICÓ/ RN
2016
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ensino Superior do Seridó - CERES
Caicó

Araújo Júnior, Célio Torquato de.


As violações de direitos humanos no controle da crise
humanitária na Europa em 2015 à luz do Sistema Regional Europeu
de Proteção aos Direitos Humanos / Célio Torquato de Araújo
Júnior. - Caicó, 2016.
84 f.

Monografia (Graduação) Universidade Federal do Rio Grande do


Norte, Centro de Ensino Superior do Seridó, Bacharelado em
Direito, Caicó, 2016.
Orientador: Bruno Jorge Rijo Lamenha Lins.

1. Refugiados - Síria - Monografia. 2. Síria - Guerra Civil -


Monografia. 3. Europa - Monografia. 4. Direitos humanos -
Monografia. 5. Direito internacional - Monografia. I. Lins,
Bruno Jorge Rijo Lamenha. II. Título.

RN/UF/Biblioteca Setorial do CERES Caicó CDU 341.43(569.1)


CÉLIO TORQUATO DE ARAÚJO JÚNIOR

AS VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS NO CONTROLE DA CRISE


HUMANITÁRIA NA EUROPA EM 2015 À LUZ DO SISTEMA REGIONAL
EUROPEU DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS

Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito


da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como
requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em
Direito.

Aprovada em: ____/____/____.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________
Prof. Ms. Bruno Jorge Rijo Lamenha Lins – Orientador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_____________________________________________
Prof. Esp. Saulo de Medeiros Torres – Examinador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_____________________________________________
Profª. Esp. Luísa Medeiros Brito – Examinadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Aos meus pais, Célio Torquato de
Araújo e Dalvina da Silva Araújo, por
todo esforço e dedicação a mim
dispensados.
AGRADECIMENTOS

Esta monografia representa a realização de um sonho e a prova de que alcancei


mais um objetivo em minha jornada, o mais desejado em minha vida. Foram muitas
horas a ele dedicadas, sejam de planejamento, leituras, resumos e de produção textual
propriamente dita, muitas delas durante madrugadas, feriados e fins de semana, sempre
regadas de muito orgulho e gratidão, principalmente as pessoas que ao meu lado
estiveram ao longo dos meus anos de Faculdade de Direito.

Às minhas amigas e aos meus amigos, agradeço pela compreensão da minha


ausência nas últimas semanas, e, principalmente, pela paciência em lidar com meus
momentos de felicidade, tristeza, apreensão e ansiedade; vocês não sabem o quanto cada
mensagem de apoio que recebia me fortificava ainda mais para continuar trilhando no
caminho dos meus objetivos, e, se hoje estou aqui, é porque sempre tive ao meu lado
pessoas incríveis e que sei que posso contar sempre.

Aos mestres dos Cursos de Direito da UFRN, de Natal e Caicó, com os quais tive a
honra de aprender os pilares básicos do Direito, ensinamentos que me acompanharão
por toda vida, meu agradecimento mais singelo, em especial ao meu orientador, Prof.
Ms. Bruno Jorge Rijo Lamenha Lins, por ter me auxiliado na concretização deste
trabalho.

Aos servidores da 2ª Vara Cível e das Promotorias de Justiça da Comarca de


Caicó/RN, onde fui estagiário, agradeço por terem me ensinado, além da técnica e
práxis forenses, como me tornar um profissional capacitado e humanizado, tendo
sempre no bem-estar do ser humano à luz do Direito, o objetivo principal da minha
carreira profissional. Graças à vocês, meus horizontes foram ampliados e minha jornada
ficou ainda mais completa.

Por fim, mas não menos importante, agradeço a minha família, e principalmente
aos meus pais, que jamais mediram esforços para me proporcionar a melhor educação,
sempre acreditaram no meu potencial e nos meus sonhos, me dando apoio e amor
incondicionais, estando sempre ao meu lado para me ajudar a superar os obstáculos da
vida, me levantando das quedas e comemorando minhas vitórias como se deles fossem.
“A garantia dos direitos humanos no
plano internacional só será
implementada quando uma jurisdição
internacional se impuser concretamente
sobre as jurisdições nacionais, deixando
de operar dentro dos Estados, mas contra
os Estados e em defesa dos cidadãos”.
(Norberto Bobbio)
RESUMO

A Comunidade Internacional assiste diariamente à penúria e ao descaso aos quais os


refugiados sírios são submetidos em sua árdua luta para sair daquele país arrasado por
uma Guerra Civil que já se encaminha para o quinto ano consecutivo. Apesar de terem
uma legislação internacional especifica que trata de sua condição de refugiados, grande
parte dos grupos que rumam para Europa, emaranhados pela esperança de reconstrução
de sua vida, passa por momentos de violação plena de seus direitos e garantias que lhe
são conferidos não só por sua condição de refugiado, mas também inerentes à condição
de ser humano, por parte de algumas das nações integrantes do Conselho da Europa, as
quais são signatárias da Convenção Europeia de Direitos Humanos, que por sua vez visa
garantir proteção integral aos direitos humanos. Assim, faz-se necessária a explanação
detalhada e comprobatória de tais descumprimentos, à luz do Sistema Regional Europeu
de Proteção aos Direitos Humanos, instituído pela Convenção mencionada, devendo
para tanto levar a cabo as medidas resolutivas empreendidas, como também esclarecer a
real efetividade do Sistema Regional Europeu.

Palavras-Chave: Refugiados; Europa; Sistema Regional Europeu de Proteção aos


Direitos Humanos; Guerra Civil Síria; Direito Internacional dos Direitos Humanos.
ABSTRACT

International community watchs everyday the penury and disregard that Syrian's
refugees are submitted on their hard struggle to leave that country, devastated by a civil
war headed for almost five years. Although they have an specific internacional law, that
comes to their status as refugees, many of their groups, going to Europe, dreaming
about reconstruction the hope in their lifes, undergoes situations of violation of their
rights and guarantees, conferred on not just by their refugee' status, but also inherent on
the condition of being human, by some member nations of the Council of Europe which
are signatories to the European Convention on Human Rights, which in turn seeks to
ensure full protection of human rights. Thus, becomes necessary the detailed
explanation and supporting of such breaches in light of the European Regional System
for the Protection of Human Rights, established by that Convention, and to carry out the
remedial measures undertaken, as well as prove the actual effectiveness of European
Regional System.

Key-words: Refugees; Europe; European Regional System for the Protection of Human
Rights; Syrian's Civil War; International Human Rights Law.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12
2 REFUGIADOS ....................................................................................................................... 13
2.1 CONCEITO....................................................................................................................... 13
2.2 TRATADOS INTERNACIONAIS ................................................................................... 15
2.3 DIREITOS E DEVERES .................................................................................................. 18
2.4 ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS (ACNUR) 19
3 GUERRA CIVIL SÍRIA ........................................................................................................ 23
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................... 23
3.2. CAUSAS .......................................................................................................................... 24
3.3 CONSEQUÊNCIAS ......................................................................................................... 26
3.4 DADOS HUMANITÁRIOS ............................................................................................. 30
3.5. ESTADO ISLÂMICO ...................................................................................................... 32
4 CRISE HUMANITÁRIA ....................................................................................................... 36
4.1 CONCEITO....................................................................................................................... 36
4.2. EMIGRAÇÃO DA SÍRIA ............................................................................................... 36
4.3 ROTAS DE FUGA ........................................................................................................... 37
4.4 COMPORTAMENTO DOS LÍDERES EUROPEUS ...................................................... 38
4.5 ATUAÇÃO DE ORGANISMOS INTERNACIONAIS ................................................... 40
5 O SISTEMA REGIONAL EUROPEU DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
..................................................................................................................................................... 42
5.1 TEORIA GERAL DA PROTEÇÃO INTERNACIONAL DE DIREITOS HUMANOS . 42
5.2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O SISTEMA REGIONAL EUROPEU DE
PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS (SEDH) ............................................................ 46
5.3 COMPOSIÇÃO ORGÂNICA DO SEDH ........................................................................ 47
5.3.1 Convenção Europeia de Direitos Humanos (1953) .................................................... 48
5.3.2 Comissão Europeia de Direitos Humanos (1954-1998) ............................................. 48
5.3.3. Comitê de Ministros do Conselho da Europa (1953) ................................................ 49
5.3.4. Corte Europeia de Direitos Humanos (1998) ............................................................ 50
5.4 PROCEDIMENTOS PERANTE O SEDH ....................................................................... 52
5.4.1 Extinto Procedimento Bifásico ................................................................................... 52
5.4.2. Procedimento Unitário vigorante .............................................................................. 55
5.5 CASO “HIRSI JAMAA, e outros, vs. ITÁLIA”. .............................................................. 57
6 VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS ......................................................................... 63
6.1 DIREITO À VIDA ............................................................................................................ 63
6.2 DIREITO À DIGNIDADE HUMANA E INTEGRIDADE FÍSICA ................................ 65
6.3 DIREITO À LIBERDADE ............................................................................................... 67
6.4 DIREITO À IGUALIDADE E OS IMPACTOS DOS ATENTADOS TERRORISTAS À
PARIS ..................................................................................................................................... 68
7 MEDIDAS RESOLUTIVAS ................................................................................................. 73
7.1 POLÍTICAS: O PAPEL DOS CHEFES DE ESTADO .................................................... 73
7.2 JUDICIAIS: O PAPEL DO SEDH NA RESOLUÇÃO DA CRISE HUMANITÁRIA ... 75
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 78
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 79
12

1 INTRODUÇÃO

Atualmente, a Europa se vê diante de mais uma crise, desta vez relacionada ao


controle dos refugiados que para lá migram fugindo descontroladamente da Guerra
Civil Síria, originada da Primavera Árabe de 2011. O presente trabalho visa expor uma
visão geral da situação dos refugiados que se dirigem a Europa, bem como demonstrar
as violações de direitos humanos decorrentes da falta de um controle eficiente desta que
se mostra a maior crise humanitária dos últimos tempos.
No entanto, importa salientar que para se ter uma noção mais precisa de como a
situação dos refugiados na Europa é delicada, precisa-se entender o motivo pelo qual a
Síria chegou ao nível de periculosidade e ausência de condições mínimas de segurança
para se viver, desta maneira, um breve histórico do conflito é apresentado, como
também considerações acerca do Direito Internacional dos Refugiados, que trata de seus
direitos e garantias, bem como das obrigações dos Estados que os recebem.
Após a saída do território sírio, os refugiados se encontram diante de uma série
de possíveis rotas de fuga, aqui expostas com dados obtidos junto a organizações
internacionais competentes para coordenar a situação dos refugiados. Depois de
superarem as condições quase que sub-humanas das rotas, os refugiados se deparam
com o cerceamento de sua liberdade: ficando presos nas fronteiras fechadas por alguns
países, ou então sendo obrigados a deixarem seus familiares seguirem em trens lotados
rumo a outros países, ou ainda a serem obrigados a permanecerem em regiões
delimitadas nas fronteiras, pois os países não dispuseram de uma infraestrutura capaz de
atender as necessidades dos refugiados, apesar de serem consideradas economias de
“primeiro mundo”.
É neste ponto, de atitudes desregradas, ausência de infraestrutura ou pessoal
capacitado, que se monta terreno fértil para uma série de violações de direitos humanos
previstos na Convenção Europeia de Direitos Humanos (1953), núcleo normativo do
Sistema Regional Europeu de Direitos Humanos, cujo funcionamento e organização são
explicitados no presente trabalho. Tais violações que são cabalmente provadas e
demonstradas mais adiante, junto com as medidas resolutivas que estão sendo e
deveriam ser tomadas pelos países europeus, além de como o Sistema Regional Europeu
pode ser utilizado para tentar minimizar os efeitos drásticos desta crise humanitária.
13

2 REFUGIADOS

2.1 CONCEITO

O primeiro conceito de refugiado encontra-se delimitado no art. 1º, A, §2º da


Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 19511, que assim dispõe:

Art. 1º - Definição do termo "refugiado"


A. Para os fins da presente Convenção, o termo "refugiado" se aplicará a
qualquer pessoa:
2) Que, em consequência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro
de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de
sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-
se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora
do país no qual tinha sua residência habitual em consequência de tais
acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.

Da análise do aludido dispositivo, conclui-se que ele impõe uma limitação


temporal, haja vista que apenas poderiam ser refugiados aqueles que se enquadram nas
condições do §2º em razão de acontecimentos anteriores a 1º de janeiro de 1951, ou
seja, o instituto do refúgio não poderia ter uma aplicação ulterior a essa data, logo
bastante ilógico. Ademais, o texto original do art. 1º impunha uma nova limitação, desta
vez geográfica, senão vejamos:

Art. 1º. Definição do termo “refugiado”.


B.1. Para os fins da presente Convenção, as palavras "acontecimentos
ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951", do art. 1º, seção A, poderão ser
compreendidas no sentido de ou
a) "acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 na Europa";

Desta feita, apenas pessoas oriundas da Europa em razão de acontecimentos que


lá se desdobravam poderiam conseguir o status de refugiados nos termos da Convenção,
mais uma disposição no mínimo incontroversa, já que impõe diferenciação em razão da
nacionalidade as vítimas de conflitos e perseguições que poderiam se valer do status de
refugiado. Ocorre que tais limitações não mais se encaixavam nos anseios da

1
Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados. 28 jul. 1951. Disponível em:
<http://www.acnur.org/t3/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_
Refugiados.pdf>. Acesso em: 16 out. 2016.
14

Comunidade Internacional, motivo pelo qual foi aprovado ao Protocolo Adicional de


19672 à Convenção de 1951, ampliando o conceito de refugiado da seguinte forma:

Artigo I – Disposições Gerais


(...)
2. Para os fins do presente Protocolo o termo "refugiados", salvo no que diz
respeito à aplicação do parágrafo 3 do presente artigo, significa qualquer
pessoa que se enquadre na definição dada no artigo primeiro da Convenção,
como se as palavras "em decorrência dos acontecimentos ocorridos antes de
1º de janeiro de 1951 e..." e as palavras "...como conseqüência de tais
acontecimentos" não figurassem do parágrafo 2 da seção A do artigo
primeiro.
3. O presente Protocolo será aplicado pelos Estados Partes sem nenhuma
limitação geográfica; entretanto, as declarações já feitas em virtude da alínea
a do parágrafo 1 da seção B do artigo primeiro da Convenção aplicar-se-ão,
também, no regime do presente Protocolo, a menos que as obrigações do
Estado declarante tenham sido ampliadas de conformidade com o parágrafo 2
da seção B do artigo primeiro da Convenção.

Com a incidência do Protocolo, considera-se refugiado qualquer pessoa que,


temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou
opiniões públicas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em
virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem
nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual, não pode
ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.
Ademais, o atual conceito de refugiado imposto pela Convenção parte do
princípio do non-refoulement (não devolução), norte basilar do Direito Internacional dos
Refugiados, o qual prega que nenhum refugiado assim reconhecido pode ser devolvido,
contra sua vontade, em qualquer situação, para país em que sofra perseguição, em
decorrência disso, é que surgem os direitos de documentos especiais para refugiados,
como passaporte específico.
É a partir deste novo conceito vigente de refugiado que se pode traçar
discrepâncias bem definidas entre os institutos do refúgio e do asilo, ambos pertencentes
a seara do Direito Internacional Público e que, deveras, são muitas vezes confundidos
por lidarem com a questão do fluxo emigratório de um determinado Estado. O refúgio
tem suas normas elaboradas pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para
Refugiados (ACNUR), diferentemente do asilo que é regulado por uma grande
quantidade de tratados multilaterais de caráter regional.

2
Protocolo de 1967 Relativo ao Estatuto dos Refugiados. 31 jan. 1967. Disponível em: <
http://www.acnur.org/fileadmin/scripts/doc.php?file=fileadmin/Documentos/portugues/BD_Legal/Instru
mentos_Internacionais/Protocolo_de_1967>. Acesso em: 16 out. 2016.
15

Não obstante a isso, o refúgio deriva de uma natureza mais humanitária, ao


passo que o asilo é ligado a questões políticas, por isso que o refúgio pode ser
concedido ainda que haja apenas um temor, diferente do asilo que só pode ser
concedido caso já houvesse violação e uma eventual perseguição já se encontra em
curso. Outra diferença gritante está na questão do preenchimento dos requisitos de
concessão, uma vez que o asilo é medida discricionária do Estado que recebe o asilado,
ao passo que no refúgio, preenchidos os requisitos, a concessão deve ser efetivada3.
Por fim, outra diferença bastante clara entre os institutos em comento está no
fato da motivação, isso porque o asilo é aplicado em casos de perseguição decorrente de
crimes políticos ou ideológicos, ou seja, uma pessoa individualizada está sendo
perseguida por violar dispositivos estatais ligados a pensamento político e ideologia.
Caso diferente do que acontece com o refúgio, uma vez que os motivos determinantes
envolvem perseguições de nível racial, social e religiosa, por exemplo, sem falar que
envolvem uma coletividade generalizada face a sua incidência mais complexa. Como
bem assevera Valério de Oliveira Mazzuoli4:

Portanto, quando se trata do refúgio propriamente dito, não se cuida de


situações “individuais” em que pessoas buscam asilo em dado país para
salvaguarda de sua vida, mas de situações em que vários seres humanos saem
dos seus respectivos Estados – por razões econômicas, ou geradas por uma
guerra civil, ou baseadas em perseguições por motivos de raça, religião,
nacionalidade, etc. – em direção a outro local onde possam viver sob manto
de um sistema mais protecionista e não arbitrário. (MAZZUOLI, Valério de
Oliveira. 2012. p. 761).

Assim, não restam dúvidas de que os imensos grupos de pessoas que saem da
Síria em razão da Guerra Civil que lá se desdobra, intensificada pelas ameaças e
dominações do grupo terrorista “Estado Islâmico” se enquadram perfeitamente no
conceito de refugiados determinado pela Convenção Relativa ao Estatuto dos
Refugiados de 1951, bem como de seu Protocolo Adicional de 1967.

2.2 TRATADOS INTERNACIONAIS

Não é novidade que após a Segunda Guerra Mundial, a Europa iniciou um duro
processo de reestruturação culminando numa série de alterações decorrentes do

3
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Indivíduos e o Direito Internacional. In: _____. Curso de Direito
Internacional Público. 6. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 760-761.
4
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Op. cit, p. 761.
16

estabelecimento da Nova Ordem Mundial materializada na bipolaridade exercida pelos


Estados Unidos e pela extinta União Soviética. Num mundo que aos poucos descobria
os horrores do holocausto e os porões do nazismo, a máxima que ecoava no Velho
Mundo era a de se evitar novos episódios como esses.
As feridas mal cicatrizavam quando muitos tratados internacionais foram
celebrados entre os Estados vitoriosos do conflito mundial que há pouco acabara, entre
os principais acordos relativos a economia e política, emergiram os primeiros acordos
internacionais ligados a proteção integral e irrestrita do ser humano, detentor de direitos
e cumpridor de deveres que passavam a ser elencados em documentos como a
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, um verdadeiro marco inicial do
Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Entre tais acordos, líderes reunidos na cidade de Genebra em julho de 1951
aprovaram a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, conhecida apenas como
Convenção de Genebra de 1951, visando apresentar uma nova regulamentação da
situação dos povos refugiados na nova era que se iniciava, tomando por base os ideais
da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Tal Convenção foi adotada em 28 de julho de 1951 pela Conferência das Nações
Unidas de Plenipotenciários sobre o Estatuto dos Refugiados e Apátridas, convocada
pela Resolução n. 429 (V) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 14 de dezembro
de 1950, entretanto só entrou em vigor em 22 de abril de 1954. Os países signatários
levaram em consideração, para se reunirem e acordarem, a preocupação externada pela
recém-criada Organização das Nações Unidas pelos refugiados, uma vez que tal
organização buscava sem precedentes a preocupação na efetivação dos direitos e
liberdades fundamentais destes povos que estão à beira da extrema penúria.
Da análise minuciosa do texto da Convenção, tem-se que ela é um verdadeiro
compendio que elenca todos os direitos, deveres e garantias inerentes aos refugiados,
inclusive constando quais os requisitos para caracterização do status de refugiado, logo
dispõe sem precedentes sobre como se dar o acolhimento destes povos, demonstrando
as expectativas que os Estados recebedores devem ter para que o texto deste importante
tratado internacional seja integralmente cumprido e efetivado em relação aos povos que
ele dispõe.
Não obstante ao texto da Convenção, e tendo em vista as mudanças decorrentes
na Comunidade Internacional desde a sua vigência, foi aprovado, em 1967, um
Protocolo Adicional que visava atualizar algumas determinações da Convenção e inserir
17

no plano internacional novas determinações no tratamento da questão dos refugiados. A


reunião para tratativa deste Protocolo foi dada pela Resolução 1186 (XLI) de 18 de
novembro de 1966 do Conselho Econômico e Social (ECOSOC) e pela Resolução 2198
(XXI) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de dezembro de 1966, sendo
assinado em Nova Iorque em 31 de janeiro de 1967, entrando vigor em 4 de outubro de
1967.
Sem dúvida alguma, a maior contribuição que o protocolo de 1967 trouxe para o
Direito dos Refugiados foi à ampliação da incidência dos requisitos para garantia do
refúgio5, anteriormente limitados temporal e geograficamente, garantindo a uma maior
parcela de grupos as garantias e direitos dispostos na Convenção de 1951. Não obstante
a isso, o Protocolo de 1967 tratou de regulamentar a cooperação das autoridades
nacionais, que recebem refugiados, com as Nações Unidas (art. 2º), a forma de solução
de controvérsias envolvendo seu texto, bem como criou a Cláusula Federal, dispondo da
seguinte forma:

Art. 6º - Cláusula Federal


No caso de um Estado Federal ou não-unitário, as seguintes disposições serão
aplicadas:
§1. No que diz respeito aos artigos da Convenção que devam ser aplicados de
conformidade com o §1 do artigo1 do presente Protocolo e cuja execução
depender da ação legislativa do poder legislativo federal, as obrigações do
governo federal serão, nesta medida, as mesmas que aquelas dos Estados
Membros que não forem Estados federais.
§2. No que diz respeito aos artigos da Convenção que devam ser aplicados de
conformidade com o §1 do artigo 1 do presente Protocolo e aplicação
depender da ação legislativa de cada um dos Estados, províncias, ou
municípios constitutivos, que não forem, por causa do sistema
constitucional da federação, obrigados a adotar medidas legislativas, o
governo federal levará, o mais cedo possível e com a sua opinião
favorável, os referidos artigos ao conhecimento das autoridades
competentes dos Estados, províncias ou municípios.
§3. Um Estado federal Membro no presente Protocolo comunicará, a
pedido de qualquer outro Estado Membro no presente Protocolo, que lhe
for transmitido pelo Secretário Geral da Organização das Nações Unidas,
uma exposição de sua legislação e as práticas em vigor na federação e suas
unidade constitutivas, no que diz respeito a qualquer disposição da
Convenção a ser aplicada de conformidade com o disposto no §1 do
artigo 1 do presente Protocolo, indicando em que medida, por ação
legislativa ou de outra espécie, foi efetiva tal disposição.

Importante esclarecer que a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de


1951 juntamente com seu Protocolo de 1967 formam o complexo normativo conhecido
por Direito Internacional dos Refugiados, entretanto não apenas tais dispositivos

5
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Op. cit., p. 762.
18

internacionais completam essa seara jurídica, haja vista ser perfeitamente possível que
instrumentos regionais tratem da questão dos refugiados, inclusive ampliando as
motivações para refúgio, por exemplo, para abranger ameaça de violência ou agressão
interna. Entre os dispositivos regionais a esse respeito pode-se citar a Convenção
Relativa aos Aspectos dos Refugiados Africanos de 1969, no âmbito da União Africana,
e a Declaração de Cartagena, de 1984, no âmbito da Organização dos Estados
Americanos6.

2.3 DIREITOS E DEVERES

A Convenção sobre Refugiados de 1951 traçou os direitos inerentes aos


refugiados bem como os deveres que os Estados devem ter com relação aos que se
encontram em situação de refúgio, bem como os deveres dos refugiados em razão de
sua condição como tal, para com o Estado em que são recepcionados.
Segundo a ACNUR, os refugiados devem usufruir, pelo menos, dos mesmos
direitos e da mesma assistência básica que qualquer outro estrangeiro, residindo
legalmente no país, incluindo determinados direitos fundamentais que são inerentes a
todos os indivíduos. Portanto, os refugiados gozam dos direitos civis básicos, incluindo
a liberdade de pensamento, a liberdade de deslocação e a não sujeição à tortura e a
tratamentos degradantes. De igual modo, os direitos econômicos e sociais que se
aplicam aos refugiados são os mesmos que se aplicam a outros indivíduos. Todos os
refugiados devem ter acesso à assistência médica e nenhuma criança refugiada deve ser
privada de escolaridade.7
Com relação aos deveres, a Convenção dispõe em seu art. 2º quais são os
deveres que os refugiados devem ter com relação ao Estado que os recebem como forma
de evitar eventuais conflitos inerentes a não correspondência de normas legais, por isso
devem respeitar irrestritamente o ordenamento jurídico pátrio, in verbis

Artigo 2º - Obrigações Gerais

Todo refugiado tem deveres para com o país em que se encontra, os quais
compreendem notadamente a obrigação de se conformar às leis e
regulamentos, assim como às medidas tomadas para a manutenção da ordem
pública.

6
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Op. cit. p. 763.
7
ACNUR. Quais os direitos de um refugiado. Disponível em:
<http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/perguntas-e-respostas/>. Acesso em: 10 out. 2016.
19

Não obstante a isso, a própria Convenção, nos artigos seguintes, elenca os


deveres dos Estados para com os refugiados, levando em consideração o respeito mútuo
entre o refugiado e o Estado que o recebe, de forma a garantir que não seja formalizada
uma relação desproporcional em termos de direitos e deveres, haja vista tanto
refugiados como os Estados possuírem obrigações a serem cumpridas. A Convenção
elenca alguns deveres dos Estados, in litteris

Artigo 3º - Não discriminação

Os Estados Contratantes aplicarão as disposições desta Convenção aos


refugiados sem discriminação quanto à raça, à religião ou ao país de origem.

Artigo 4º - Religião

Os Estados Contratantes proporcionarão aos refugiados em seu território um


tratamento ao menos tão favorável quanto o que é proporcionado aos
nacionais no que concerne à liberdade de praticar a sua religião e no que
concerne à liberdade de instrução religiosa dos seus filhos.

Assim, conclui-se que a sistemática dos direitos e deveres dos refugiados


encontra-se em total consonância com os preceitos de proporcionalidade e
razoabilidade, haja vista que a Convenção não extrapola os limites na imposição dos
direitos dos refugiados, tampouco quando elenca os deveres dos Estados com relação a
estes. Tal situação leva a crer que o objetivo primordial da Convenção ao estabelecer
tais pontos não é apenas o de racionalizar a relação entre Estado e refugiado, mas sim
tornar a nação que os recebe terreno fértil para uma reestruturação do ponto de vista
econômico e social, preservando e garantindo as prerrogativas básicas e fundamentais
do ser humano.

2.4 ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS


(ACNUR)

Como já explicitado anteriormente, a Convenção de 1951 surgiu para atender


aos anseios da ONU para regulamentar a situação dos povos refugiados que
encontravam-se a míngua de uma nova formulação de um Estatuto, tendo em vista as
grandes modificações que se operaram no mundo no pós-guerra. E é no seio da ONU
que se encontra a principal entidade internacional ligada a questão dos refugiados: The
United Nations High Commissioner for Refugees (UNHCR), em português, o Alto
20

Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), muitas vezes citado
apenas como Agência da ONU para Refugiados.8
Este importante mecanismo internacional foi criado em 14 de dezembro de
1950, por força de uma resolução a Assembleia Geral das Nações Unidas, iniciando
suas atividades em janeiro de 1951 com o objetivo de auxiliar as famílias europeias que
ainda sentiam os efeitos diretos da Segunda Guerra Mundial. A ONU determinou ao
ACNUR a condução e coordenação de ações internacionais visando proteger os
refugiados, bem como solucionar seus problemas.9
Cabe ao ACNUR assegurar os direitos e o bem-estar dos refugiados, garantindo
a qualquer pessoa o exercício de seu direito de buscar e usufruir de refúgio seguro
noutro país, inclusive se regressar ao seu de origem se assim preferir. O Conselho
Executivo dessa Agência da ONU atuando em conjunto com a Assembleia Geral das
Nações Unidas autorizam a atuação voltada para outros grupos, como por exemplo, os
apátridas e as pessoas com nacionalidade controversa.10
Outro objetivo da Agência da ONU para Refugiados é o de reduzir os casos de
deslocamento obrigado de modo a incentivar que outros países e instituições criem
condições condignas para proteger os direitos humanos e solucionar de modo pacífico
seus conflitos, neste sentido, o ACNUR busca consolidar a reintegração de refugiados
que optaram por retornar a seus países de origem, buscando evitar situações que
imponham nova concessão de refúgios.
Ademais, o ACNUR oferece proteção e assistência de forma absolutamente
imparcial, não levando em consideração nas suas atuações raça, sexo, religião,
tampouco opinião política, entretanto, procura dar atenção especial às necessidades de
crianças e visa promover a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres, para
isso, atua estreitamente com governos, organizações regionais ou internacionais, e
ONGs. Um ponto interessante na atuação dessa agência das Nações Unidas é a
participação dos refugiados na tomada das decisões que diretamente influem e suas
vidas, um principal primordial.
Em razão da sua atuação humanitária, apolítica e social, tomando por base os
ditames da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e de seu Protocolo

8
ACNUR: Agência da ONU para Refugiados. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/o-
acnur/>. Acesso em: 16 out. 2016.
9
ACNUR. Informação Geral. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/informacao-geral/>.
Acesso em: 16 out. 2016.
10
ACNUR. A missão do ACNUR.. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/informacao-
geral/a-missao-do-acnur/>. Acesso em: 16 out. 2016.
21

de 1967, o ACNUR repassa os princípios da Carta das Nações Unidas: manutenção da


paz e segurança internacionais; desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,
bem como o encorajamento do respeito pelos direitos humanos e liberdades
fundamentais.
Desde sua instalação, o ACNUR já auxiliou mais de 50 milhões de pessoas, e
atualmente figura como uma das principais agências humanitárias em atuação perante a
Comunidade Internacional, tendo em vista seus pilares básicos: a) proteção de
refugiados e b) busca por soluções duradouras para que eles (os refugiados) possam
reconstruir suas vidas num ambiente normal. Atualmente, estima-se que esta Agência
das Nações Unidas tem interesse em mais de 43 milhões de pessoas, sendo mais do que
evidente a preocupação direcionada a questão dos refugiados sírios.11
Um ponto interesse a mencionar é que diferentemente do que acontece com
outras agências ligadas a ONU, o ACNUR não possui um orçamento direcionado pela
Organização, mas sim se mantém somente por donativos ofertados por Estados,
instituições e pessoas ao redor do mundo, razão pela qual realiza diversas campanhas
para captação de recursos.
O ACNUR possui um caráter de desenvolvimento pleno e constante do Direito
Internacional dos Refugiados, razão disso foi a elaboração de um Manual de
Procedimentos e Critérios para Determinação da Condição de Refugiado12, o qual é
deveras importante para um entendimento detalhado e específico da concessão do
instituto do refúgio, fato é que no referido manual encontram-se as diferenças essenciais
dos requisitos para concessão, senão vejamos:

B. INTERPRETAÇÃO DOS TERMOS.


(...)
2. “fundamento temor de perseguição”
(a) análise geral
37. A expressão “fundado temor de perseguição” é o elemento chave da
definição, refletindo o ponto de vista dos autores da declaração em relação
aos elementos constitutivos do conceito de refugiado. Com ela, substitui-se o
método anterior de definição de refugiado por categorias (i.e., pessoas de
uma certa origem não gozando da proteção do seu país) pelo conceito
geral de “temor” em razão de um motivo relevante. Por se tratar de conceito
subjetivo, a definição contempla um elemento subjetivo que deve ser

11
ACNUR. Breve histórico do ACNUR. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/informacao-
geral/breve-historico-do-acnur/>. Acesso em: 16 out. 2016.
12
ACNUR. Manual de Procedimentos e Critérios para Determinação da Condição de Refugiado.
Disponível em: <
http://www.acnur.org/fileadmin/scripts/doc.php?file=fileadmin/Documentos/portugues/Publicacoes/2013/
Manual_de_procedimentos_e_criterios_para_a_determinacao_da_condicao_de_refugiado>. Acesso em:
16 out. 2016.
22

considerado a partir da pessoa solicitante de refúgio. Assim, a determinação


da condição de refugiado fundamentar-se-á, principalmente, não em um
julgamento da situação objetiva do país de origem do solicitante, mas na
avaliação das declarações por ele prestadas.
38. Ao elemento “temor” – que é um estado de espírito e uma condição
subjetiva – é acrescentado o requisito “fundado”. Isso significa que não basta
averiguar apenas o estado de espírito do solicitante para que seja
reconhecida a condição de refugiado, mas se esse estado de espírito
encontra fundamento em uma situação objetiva. A expressão “fundado
temor” contém, portanto, um elemento subjetivo e um outro objetivo, e, para
determinar se esse receio fundado existe, ambos os elementos deverão ser
levados em consideração

(...)

(b) perseguição
51. Não existe uma definição universalmente aceita de “perseguição” e as
diversas tentativas de se formular essa definição obtiveram pouco sucesso.
Do Artigo 33 da Convenção de 1951 pode-se inferir que a ameaça à vida ou à
liberdade em virtude da raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou
pertencimento a um grupo social específico é sempre caracterizada como
perseguição. Outras violações graves aos direitos humanos – pelas mesmas
razões – também poderiam caracterizar perseguição.
52. Para avaliar se outras ameaças ou ações prejudiciais podem configurar
uma perseguição, é preciso analisar as circunstâncias específicas de cada
caso, incluindo o elemento subjetivo a que se fez referência em parágrafos
anteriores. O caráter subjetivo do temor de perseguição exige uma apreciação
das opiniões e sentimentos da pessoa em questão.

Assim, conclui-se que o ACNUR não detém uma tarefa fácil, haja vista possuir
um direcionamento orçamentário fixo pela ONU, além do dever de atuar em diversas
frentes para garantir a proteção integral ao ser humano refugiado 13 e a busca pela
soluções eficientes para evitar que o contingente de refugiados continue elevado.
Atualmente, e sem sombra de dúvidas, a agência das Nações Unidas para Refugiados
encontra-se diante de mais um grande teste de sua atuação com o imenso fluxo de
refugiados da Guerra Civil Síria para Europa, conflito que será explicitado no capítulo
seguinte.

13
ACNUR. Quem ajudamos?. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/quem-ajudamos/>.
Acesso em: 16 out. 2016.
23

3 GUERRA CIVIL SÍRIA

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Em 2011, o Mundo Árabe teve seus pilares sacudidos com uma série de revoltas
populares encabeçadas pela juventude cansada dos velhos governos ditatoriais que
estavam no poder desde a década de 1960, ou seja, remontando o período de
independência da maioria desses países. Entretanto, o que parecia ser um movimento
isolado com focos nas capitais de países do norte da África, acabou tomando dimensões
sem precedentes, impulsionadas principalmente pelas redes sociais, como Twitter e
Facebook, chegando até mesmo aos governos quase intocáveis, em razão da forte
tradição islâmica, do Oriente Médio, como foi o caso do Iêmen.
Em menos de seis meses, desde o início do estopim das revoluções, que ficou
conhecida como Primavera Árabe, no norte africano, mais de cinco países tiveram seus
governos derrubados pela força do manifesto popular em busca de novos anseios
políticos, econômicos e sociais, como foi o caso do Egito e da Líbia, cujos Chefes de
Estado foram protagonistas de perseguição popular e de julgamento televisionado.
Desta forma, a juventude árabe, em sua maioria islâmica, passou a tecer os
novos caminhos em busca da redemocratização, entretanto, muitos acabaram se
entrelaçando com novos Golpes de Estado e até mesmo com o agravamento de conflitos
que evoluíram rapidamente para verdadeiros massacres civis, como é o caso da Síria
que desde 2013 vive uma destruição regrada de suas instituições políticas, econômicas e
sociais, protagonizando o maior banho de sangue da nova década do século XXI.
Em razão disso, não se deve analisar a Guerra Civil Síria como um evento
isolado e com características específicas e tensões particulares deste país, mas sim como
um dos alhures da Primavera Árabe que acabou se desgarrando dos princípios básicos
dos movimentos que clamavam por democracia, paz e prosperidade social, acabando
por mergulhar uma nação inteira no palco de um circo de horrores onde famílias são
dizimadas diariamente, milhões buscam refúgio noutro país e cidades inteiras são
destruídas por ataques militares sem precedentes.
24

3.2. CAUSAS

Na onda de manifestações ligadas a Primavera Árabe na Síria, bandeiras de


corrupção e nepotismo por parte do presidente Bashar Al-Assad eram levantadas,
sempre pacíficas, até que se iniciou uma onda de pichações com ideais revolucionários
que tomou o pais, principalmente pela juventude. O estopim para a intensificação das
manifestações na Síria foi quando ocorreu a prisão e a tortura de um jovem na cidade de
Deera, no sul da Síria, que, dentro do espírito revolucionário da Primavera Árabe, foi
flagranteado pichando mensagens contra o governo em uma escola da região14.
No momento em que a notícia das medidas tomadas pelas forças do Governo se
tornou pública, em março de 2011, diversas manifestações ocorreram na Síria,
entretanto a represália das forças do Governo Al-Assad foi ainda mais violenta15, a
ponto da polícia abrir fogo contra os manifestantes visando dispersar e frear as
manifestações, contudo, essas verdadeiras marchas contrárias ao abuso da força
acabaram tomando viés cada vez mais político de modo que as pessoas clamavam pela
queda do Governo de Bashar Al-Assad.
Porém, não havia relativização do uso da força pelas tropas governamentais. A
medida em que as passeatas e marchas aumentavam, maiores eram as tiranias aplicadas
pelas forças armadas contra a população. Em razão disso, os manifestantes opositores
do governo, em sua maioria militares desertos e membros da Irmandade Mulçumana,
passaram a pegar em armas para se defender quando protestavam, posteriormente, se
somaram a estas forças opositoras radicais do grupo Al-Nursa, uma verdadeira sucursal
da Al-Qaeda na Síria, contudo a utilização passou a ser direcionada, posteriormente,
para derrubar o Governo Al-Assad e os conflitos internos se tornaram mais fortes e
frequentes.
Em questão de meses, a Síria mergulhou numa Guerra Civil sem precedentes,
com barricadas nas ruas, onde tropas governistas e opositoras passaram a se enfrentar
em busca do controle de cidades no interior, não tardando para que, já em 2012, os
conflitos armados chegassem na capital, Damasco, e na maior cidade do país, Aleppo.
Com a intensificação do conflito, Assad se recusou a renunciar a presidência, apesar de

14
G1. Entenda a guerra civil da Síria. Disponível em: < http://g1.globo.com/revolta-
arabe/noticia/2013/08/entenda-guerra-civil-da-siria.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
15
G1. ONU condena governo sírio por morte em Hula e pede investigação. Disponível em:
<http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2012/06/onu-condena-governo-sirio-por-mortes-em-hula-e-
pede-investigacao.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
25

tentar fazer algumas concessões com os manifestantes, como encerramento do Estado


de Emergência, promulgação de uma nova Constituição e convocação de eleições
multipartidiárias, mas não foi o suficiente para retardar os conflitos armados internos.
Com a proporção bélica do conflito, não tardou para que os métodos
diplomáticos passassem a ser invocados para tentar por fim ao banho de sangue,
entretanto todas as tratativas foram infrutíferas16, e as concessões governistas cessaram
sob a justificativa de que com a infiltração dos grupos terroristas junto as forças de
oposição, objetivando implantar o caos, o governo não pode se abater17. Foi a
declaração final para Guerra Civil, a qual passou a ostentar números desastrosos,
segundo a BBC18, em julho de 2013 a ONU afirmou que 90 mil pessoas haviam
morrido no conflito, um ano depois, esse número era de 191 mil e, atualmente, é de
250mil.
Em 2013 e 2014, as motivações para Guerra Civil deixaram claramente de ser
inteiramente políticas e revolucionárias, passando a ser enraizadas em disputas étnico-
religiosas, onde a maioria sunita enfrenta a ala xiita que apoia o presidente, somando-se
a isso, ainda, a interferência direta de grupos terroristas, como o Estado Islâmico 19.
Porém, o que não se esperava era que a Síria seria palco para uma releitura da Guerra
Fria20, uma vez que Estados Unidos e Rússia passaram a interferir, com interesses
próprios a frente, no conflito e apoiando lados opostos: EUA apoia certos grupos de
rebeldes opositores enquanto a Rússia apoia o governo.
Em 2015, o conflito não demonstrou sinais de fraqueza em momento algum,
somente havendo intensificação de ações que violam diretamente o ius in bellum21, e

16
G1. Negociações entre governo e oposição são suspensas na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/02/negociacoes-entre-governo-e-oposicao-da-siria-sao-
suspensas.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
17
G1. Regime sírio não fará concessões na negociação de paz. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/regime-sirio-nao-fara-concessoes-na-negociacao-de-
paz-diz-ministro.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
18
British Broadcasting Corporation. Oito capítulos para entender a crise na Síria, que dura mais de
quatro anos. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151012_crise_siria_entenda_rb>. Acesso em: 16 out.
2016.
19
G1. Al-Qaeda desautoriza grupo terrorista que atua na Guerra da Síria. Disponível em:
<http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/02/al-qaeda-desautoriza-grupo-jihadista-que-atual-na-
guerra-civil-da-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
20
G1. Entenda a disputa de potências por trás da Guerra Civil na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/entenda-disputa-entre-potencias-por-tras-da-guerra-
civil-na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
21
Terra Notícias. ONU: governos e rebeldes cometeram crimes de guerra na Síria. Disponível em: <
https://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/onu-governo-e-rebeldes-cometeram-crimes-de-guerra-
na-siria,0badec09b57da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
26

com a interferência ainda maior de Rússia e EUA nos conflitos, a busca diplomática
pela solução que irá por fim ao conflito e trazer novamente a estabilidade mínima para
Síria tardará a acontecer, apesar das insistências por parte da ONU que já passou por
três secretariados sem conseguir chegar ao liame resolutivo do conflito sírio.

3.3 CONSEQUÊNCIAS

Os resultados de um conflito desta magnitude atingem vários setores da Síria,


desde a política até a economia, sem falar no meio social que atualmente encontra-se
defasado, seja pela quantidade de médicos insuficiente para atender a imensa demanda
de feridos, seja pelo ano escolar que é dilacerado diante das várias suspensões em razão
dos conflitos armados e bombardeios, sem falar na destruição de comércios e empresas
industriais que acabam por aumentar consideravelmente a evasão da mão-de-obra
trabalhista.
Em um país assolado por um conflito armado interno com potencial bélico
avançado e que se arrasta por quatro anos, até mesmo o ordenamento jurídico é vítima
dos estragos, uma vez que opera-se uma ausência de obediência para com os ditames
legais vigentes, tornando a Síria uma verdadeira terra sem lei, aliás, apenas uma lei é
vigente: a da autotutela.
É em situações como estas que se forma um terreno fértil para ocorrência de
diversas violações ao direito humanitário, inclusive as agências de notícias
internacionais estão repletas de casos concretos que claramente afrontam os direitos
inerentes à condição de ser humano22, fato é a constante divulgação de vídeos pelo
grupo terrorista Estado Islâmico nas redes sociais exibindo execuções públicas23 e
castigos severos.
Não obstante a isso, também se opera um cenário favorável à prática de crimes
de guerra que violam diretamente os preceitos internacionais do ius in bellum, é o caso
de desobediência em cessar fogo, ataque a equipes médicas, ou a escolas, situações que
ocorrem sem qualquer repressão na Síria, segundo as Nações Unidas.

22
G1. Dezenas de corpos com tiro na cabeça são achados na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2013/01/dezenas-de-corpos-com-tiros-na-cabeca-sao-achados-
na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
23
UOL Notícias. Estado Islâmico divulga vídeo de execução de cristãos egípcios. Disponível em:
<http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2015/02/15/ei-divulga-video-de-execucao-de-cristaos-
egipcios.htm>. Acesso em: 17 out. 2016.
27

Segundo uma Resolução exarada pelo Conselho de Segurança da ONU em


201424, no âmbito da Guerra Civil Síria, estabeleceu o fim do uso de armas em regiões
habitadas por civis, entretanto, os dados apontam que mais de 4 mil civis morreram em
decorrência de bombas lançadas pelas tropas do governo em áreas ocupadas pelos
rebeldes. Importante esclarecer que nesses dados não estão inseridos os ataques
perpetrados pelo Estado Islâmico que já é recorrente na violação às normas
internacionais por se tratar de um grupo terrorista em intensa atividade e ascensão.
Outra consequência do conflito interno sírio é a utilização desgarrada de seu
arsenal bélico químico25, um dos maiores do mundo desde antes do conflito armado.
Apesar de todas as garantias dadas pelo governo Assad de que jamais as armas químicas
seriam voltadas para o próprio território sírio, não tardou para tal declaração virar uma
das maiores contradições da história recente, uma vez ser sabido que ataques químicos
aconteceram diversas vezes, muitos deles advindos das tropas governistas.
Agências de notícias internacionais tratam desta questão química com total
convicção, senão vejamos o que uma reportagem de 2015 da BBC26 afirma:

O governo insistia que seu arsenal estava seguro e nunca o usaria "dentro da
Síria", mas relatos de ataques com armas químicas começaram a vir à tona no
início de 2013.
Mais tarde, em agosto do mesmo ano, foguetes carregados com gás sarin
foram disparados em diversos subúrbios do cinturão agrícola de Damasco,
matando entre 300 e 1,4 mil pessoas, número que varia de acordo com a fonte
consultada.

Neste sentido, as potências ocidentais afirmaram cabalmente que apenas as


tropas governistas têm acesso a tal armamento bélico, por isso, não pairavam dúvidas de
que o governo era responsável pelos ataques químicos, apesar do governo alegar que a
responsabilidade pelos ataques deve recair sobre os rebeldes. Diante da incidência de

24
UNRIC. Aprovada por unanimidade, resolução do Conselho de Segurança exige acesso a ajuda
humanitária na Síria. Disponível em: < http://www.unric.org/pt/actualidade/31400-aprovada-por-
unanimidade-resolucao-do-conselho-de-seguranca-exige-acesso-a-ajuda-humanitaria-na-siria->. Acesso
em: 17 out. 2016.
25
G1. Oposição fala em 1.300 mortos; Síria nega uso de armas químicas. Disponível em: <
http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2013/08/oposicao-fala-em-1300-mortos-siria-nega-uso-de-
armas-quimicas.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
26
British Broadcasting Corporation. Oito capítulos para entender a crise na Síria, que dura mais de
quatro anos. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151012_crise_siria_entenda_rb.>. Acesso em: 16 out.
2016.
28

um avivamento de ameaça química, EUA e Rússia celebraram, ainda em 2013, acordo


para destruir as armas químicas da Síria27.
Porém, Al-Assad negou inicialmente aceite desta determinação internacional, só
indo a aceitá-la diante das constantes ameaças de intervenção militar direta pelos EUA
no território sírio, ocasião em que formalmente se comprometeu em eliminar o arsenal
químico da Síria em conjunto com a Organização para Proibição de Armas Químicas
(OPAQ)28. Ainda assim, tais esforços internacionais não surtiram efeito, pois ainda
segundo a BBC:

(...) Depois desta operação [eliminação de armas químicas], a OPAQ


documentou outros ataques com componentes tóxicos, como o cloro e o
amoníaco, de forças do governo contra grupos rebeldes no norte do país em
2014, quando morreram 13 pessoas.

Com o acirramento dos conflitos, as entidades internacionais que analisam as


atuais configurações da Guerra Civil Síria já concluíram que somente uma negociação
tem poder para colocar um termo nesse cenário de horrores, isso porque nenhuma das
partes beligerantes tem condições de se impor de forma definitiva, sendo, portanto, a
exaustão diplomática uma consequência direta do conflito29.
Apesar de ser a única solução em pauta, não se pode dizer que ela ainda não foi
colocada em cheque, pois desde o agravamento dos conflitos entre 2013 e 2014,
diversos encontros entre líderes regionais e internacionais foram realizados, entretanto
sempre acabavam frustrados, principalmente entre a Liga dos Estados Árabes e a ONU.
Diante da ausência de soluções amistosas entre os diretamente envolvidos nos conflitos,
as potências internacionais que atuam diretamente na Guerra Civil Síria – EUA e Rússia
– iniciaram uma tentativa de acordo chamada de Comunicado de Genebra, a despeito,
ainda de acordo com a reportagem da rede britânica BBC:

Em maio de 2013, americanos e russos começaram em uma conferência na


Suíça a trabalhar para implementar o Comunicado de Genebra de 2012, um

27
British Broadcasting Corporation. Acordo entre Rússia e EUA prevê destruição de arsenal químico
sírio. Disponível em: <
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/09/130914_siria_arsenalquimico_dg>. Acesso em: 17 out.
2016.
28
G1. Síria aceita por arsenal químico sob controle internacional. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2013/09/siria-aceita-colocar-armas-quimicas-sob-controle-
internacional-diz-agencia.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
29
British Broadcasting Corporation. ONU vê base para paz na Síria após fracasso de negociações.
Disponível em: < http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/01/140131_siria_conferencia_pai>.
Acesso em: 17 out. 2016.
29

acordo internacional apoiado pela ONU que pede o estabelecimento de um


governo de transição de unidade nacional.
O diálogo começou em janeiro de 2014, mas foi interrompido no mês
seguinte depois de duas rodadas de negociação. O então enviado especial da
ONU, Lakhdar Brahimi, culpou o governo sírio por ter se negado a discutir
as demandas da oposição e por sua insistência em centrar-se na luta contra os
"terroristas", um termo empregado a todos que oponham a Assad.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, afirmou que o objetivo de longo
prazo da organização é encontrar uma solução política baseada na Convenção
de Genebra.

Da análise da atual situação diplomática, tem-se que a exaustão de tratativas


frustradas acaba por perdurar ainda mais o conflito que a cada dia toma proporções de
massacre civil, assim, se os líderes envolvidos e as organizações internacionais atuantes
apenas observam a saída diplomática como solução para crise síria, deve-se caminhar a
passos rápidos no reavivamento da solução pacífica e, a partir daí, organizarem-se novas
conferências visando por termo este conflito. Assim sendo, a consequência da exaustão
diplomática é a que se está acessível a retroceder.
Por fim, outra consequência direta da Guerra Civil na Síria é um impacto
indireto ainda mais frequente entre as potencias mundiais que acaba por tornar a
situação do país ainda mais desastrosa, face aos apoios secretos que ocorrem longe dos
holofotes das conferências e reuniões diplomáticas. Em reportagem30 veiculada em
2014, o G1 explanou, ainda que de forma genérica, como o conflito na Síria acabou se
tornando um cenário típico da Guerra Fria, senão vejamos:

Estados Unidos: da tentação de bombardear a uma retirada progressiva


O governo americano exigiu durante muito tempo a saída do presidente sírio
Bashar al-Assad. Foi levantada inclusive a possível entrega de armas aos
rebeldes sírios, como o país fez com os rebeldes afegãos na década de 1980.
A pressão de Estados Unidos, França e Grã-Bretanha foi aumentando sem
pausa, e chegou ao seu auge em agosto de 2013, após o ataque químico
realizado perto de Damasco. Desde o início da crise síria, os países ocidentais
não haviam estado tão perto de bombardear a Síria.
No entanto, no último momento, o presidente americano Barack Obama
preferiu não fazê-lo. Desde então, os Estados Unidos parecem ter
abandonado a opção militar e matizam suas críticas ao regime de Assad. Este,
mais forte em terra, envia a Genebra uma delegação importante.

Rússia: a recuperação da influência no Oriente Médio


A crise síria permitiu à Rússia a recuperação de um papel de protagonista no
cenário internacional. Fragilizada após a queda da URSS, em 1991, e desde
então em grande medida incapaz de se opor aos caprichos ocidentais, a
Rússia de Vladimir Putin cuidou pacientemente da situação, bloqueando toda
intervenção militar na Síria com mandato da ONU e prosseguindo com suas

30
G1. Entenda a disputa de potências por trás da Guerra na Síria. Disponível em:
<http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/entenda-disputa-entre-potencias-por-tras-da-guerra-
civil-na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
30

entregas de armas a este país, estrategicamente crucial para sua influência no


Oriente Médio.
No paroxismo da crise, quando as potências ocidentais estiveram a um passo
de bombardear Damasco, Putin conseguiu impor a todo o mundo, em
setembro de 2013, um acordo para o desmantelamento do arsenal químico da
Síria sob a supervisão da ONU, freando, com isso, o desejo ocidental de
intervenção, estratégia que permitiu à Rússia desempenhar o papel de
protagonista no controle da situação.

Assim, com a atuação dessas potenciais ocidentais, o conflito na Síria acaba


tomando proporções internacionais tendo em vista utilização do tráfico de influências e
de financiamento de grupos armados para atuarem na ocupação de territórios, o que
torna o potencial bélico ainda maior. Inclusive, faz-se necessário destacar que não
apenas EUA e Rússia somam forças às tropas governistas e rebeldes, mas também
países da região do Oriente Médio, como Arábia Saudita, Kuwait e Irã acabam se
envolvendo (in) diretamente no conflito armado.

3.4 DADOS HUMANITÁRIOS

De todas as consequências que o conflito na Síria poderia ter jamais se pensou


que a quantidade de refugiados fosse chegar a tal ponto que se viu em 2015. Muitos
desses refugiados foram obrigados a assumir tal condição em decorrência da violência
exacerbada, bem como das perseguições impostas pelos grupos terroristas que acabam
ocupando regiões do país, tornando a vida, que já era dura em um país instável em
vários níveis, um bem volátil que podia ser retirado a qualquer momento. De acordo
com dados da ACNUR, no ano de 201431, aproximadamente 59,5 milhões de pessoas
foram forçadas a deixar seus países devido à violência. Já no corrente ano, a expectativa
é de que o número seja ainda maior.
A Síria dispara como um dos países com maior número de refugiados que saem
de seu país em direção, principalmente, aos países da União Europeia. Diante disso, os
países com maior fluxo de procura tem tido uma postura que beira à ilegalidade,
chegando ao ponto de fecharem as fronteiras e efetuarem ações que coíbam a chegada
de refugiados, promovendo ainda o estabelecimento de cotas rígidas de entrada dos
mesmos, o que viola expressamente diversos pactos e convenções assinados e
ratificados pelos referidos países.

31
2014 Global Trends Report. Disponível em: <
http://www.unhcr.org/statistics/country/556725e69/unhcr-global-trends-2014.html>. Acesso em: 18 out.
2016.
31

Calcula-se que como desdobramento da crise interna, aproximadamente 4,5


milhões de sírios fugiram do país desde o começo do conflito, a grande maioria deles
sendo mulheres e crianças. Os países fronteiriços tiveram que abarcar a pior parte da
crise de refugiados, com Líbano, Jordânia e Turquia lutando para receber as ondas de
refugiados que chegavam. Assim sendo, percebe-se que a Guerra Civil Síria acaba
produzindo impactos diretos nos países vizinhos em decorrência do elevado fluxo de
refugiados.
Segundo estatísticas da ACNUR, o número de refugiados atingiu os maiores
índices da história, haja vista a superação da marca de 60 milhões, principalmente em
decorrência da Guerra Civil Síria. O “Global Trends” é o relatório anual da Agência da
ONU para Refugiados que analisa a quantidade de pessoas em situação de deslocamento
forçado mediante dados enviados pelos governos. Até o final de 201532, 65,3 milhões de
pessoas encontravam-se em deslocamento forçado pelo mundo, o que representa um
aumento significativo de 10% quando comparado aos números de 2014. Atualmente, o
ACNUR registra uma média de 24 pessoas deslocadas a cada minuto.
Esses dados são ainda mais precisos quando da análise do total de 65,3 milhões
de pessoas em deslocamento forçado, senão vejamos o que o relatório de 2015 informa:

Do total de 65,3 milhões, 12,4 milhões são novos deslocados por conflitos e
perseguições apenas em 2015. Esse conjunto se divide entre 8,6 milhões de
pessoas forçadas a abandonar seus lares e a mudar-se para outros lugares de
seu país e 1,8 milhões que tiveram de cruzar as fronteiras. O universo de 65,3
milhões inclui 21,3 milhões de refugiados ao redor do mundo, 3,2 milhões de
solicitantes de refúgio e 40,8 milhões deslocados que continuam dentro de
seus países. Com o aumento de 2,6 milhões de casos apenas em 2015, na
comparação com os dados de 2004, conclui-se que o mundo assiste a um
recorde de deslocados internos.

A Síria figura como sendo o país que perfaz o maior número de refugiados (4,9
milhões), além disso, tem destaque nos números relativos a pessoas em deslocamento
interno (6,6 milhões) fazendo com que seja o país que concentra o maior número de
pessoas em situação de interesse por parte das atividades da agência. O relatório da
referida agência informa, ainda, que a Turquia é o país que mais recebe refugiados no

32
2015 Global Trends Report. Disponível em: < http://www.unhcr.org/576408cd7.pdf> Acesso em: 18
out. 2016.
32

mundo (2,5 milhões), e o Líbano a maior concentração de refugiados em território,


tendo 183 refugiados para cada mil habitantes.33
Mediante essa análise estatística, e levando em consideração a proximidade da
Síria com o Líbano e a Turquia, pode-se concluir que as estatísticas entabuladas pelo
ACNUR em relação a esses dois países tem ligação direta com o conflito sírio, uma vez
que tais países são rotas intermediárias no fluxo principal dos refugiados,
principalmente rumo à Europa, como será demonstrado mais a frente.

3.5. ESTADO ISLÂMICO

O surgimento do Estado Islâmico (EI) remonta à intervenção militar norte-


americana no Iraque em 2003 sobre o pretexto de combater o terrorismo e evitar que as
armas nucleares que Saddam Hussein possuía pudessem ser utilizadas. Neste sentido, a
ocupação americana que não foi nenhum pouco pacífica acabou encontrando resistência
por parte de grupos armados iraquianos, haja vista que o país mergulhou numa
decadência político-econômica desde os anos 199034.
Dentre estes grupos, destacou-se o liderado pelo jordaniano Abu Musab al-
Zarqawi, responsável por diversos ataques às tropas da coalizão e promover uma série
de ações suicidas contra civis iraquianos. Este grupo estava em atividade desde 1999 e a
presença dos americanos no território iraquiano acabou por catalisar a aliança firmada
com a Al-Qaeda, em 2004, a partir dai, o grupo de al-Zarqawi passou a ser conhecido
como “Al-Qaeda no Iraque”.
Entretanto, em 2005 e 2006, uma série de dissidências internas em razão de erros
cometidos pela facção principal da Al-Qaeda acabou dando espaço para que o braço
iraquiano do grupo terrorista se fundisse com outros grupos menores, neste interim, o
então líder al-Zarqawi faleceu num atentado, o que acabou conduzindo Abu Omar al-
Baghdadi a liderança da facção, que passou a se chamar, em outubro de 2006, “Estado
Islâmico do Iraque”, tendo como objetivo estabelecimento de um estado islâmico nas
áreas de maioria sunita.

33
ACNUR. Estatísticas. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/recursos/estatisticas/> Acesso
em: 18 out. 2016.
34
O Globo. Cinco pontos para entender o Estado Islâmico. Disponível em: <
http://infograficos.oglobo.globo.com/mundo/cinco-pontos-para-entender-o-grupo-isis.html>. Acesso em:
18 out. 2016.
33

Daí em diante, os episódios de violência gratuita contra a população do Iraque


desencadearam a falta de apoio populacional, sendo necessária uma reorganização da
facção, iniciada em 2010, quando os líderes que ocupavam tais cargos neste momento
foram mortos dando espaço para que o atual líder, Abu Bakr al-Baghdadi assumisse a
liderança. A partir daí, as tropas americanas organizavam sua saída do Iraque,
entregando o poder a um grupo xiita responsável pela reestruturação do país.
Porém, além do fato dos dissidentes que integravam o Estado Islâmico do Iraque
serem sunitas, as transformações políticas acabaram gerando um terreno fértil para que
bombardeios voltassem a ser rotina, a maioria deles perpetrados pelo grupo terrorista
que passou a avançar rumo ao norte do país, sempre com os olhares distantes das tropas
americanas, até chegar a fronteira com a Síria.
A partir de então, o contexto da Primavera Árabe acaba se tornando essencial
para os desdobramentos que culminaram com a configuração atual do EI. Na Síria
governada por al-Assad desde 2000, a população se revoltava contra as sérias restrições
econômicas, desemprego, e pela violação constante de direitos humanos, situações que
passaram a ser mais frequentes quando as tropas governistas passaram a reprimir
violentamente manifestações populares, pois o presidente consideravam-nas ilegítimas e
organizadas por terroristas35.
Com a instabilidade na Síria e o avanço maior até a fronteira, desde que al-
Baghdadi assumiu o comando do grupo, os cruzamentos na fronteira do Iraque com a
Síria cresceram vorazmente, de modo que o EII enviou diversos militares para combater
as invasivas do governo sírio visando a formação do braço do EII na Síria (Jabhat al-
Nusra), a partir daí, os ataques patrocinados pelo grupo terrorista em cidades sírias
cresceu consideravelmente, até que em 2013, as intenções de al-Baghdadi se
concretizaram acontecendo a fusão entre a Jabhat al-Nusra com o Estado Islâmico do
Iraque, passando a se chamar Estado Islâmico do Iraque e Síria (EIIS) ou ISIS, em
inglês.
Não tardou para que um conjunto de fatores políticos internos culminassem com
a evolução maciça do grupo, chegando ao ponto de em 29 de junho de 2014, ter
anunciado a criação de um califado nas terras por ele dominadas no Iraque e na Síria,
consequentemente o al-Baghdadi se autodeclarou autoridade máxima para toda

35
Revista Super Interessante. Sete coisas que você precisa saber sobre o Estado Islâmico. Disponível em:
< http://super.abril.com.br/blogs/superlistas/7-coisas-que-voce-precisa-entender-sobre-o-estado-
islamico/> Acesso em: 18 out. 2016.
34

comunidade mulçumana mundial. O califado é uma forma de governo onde o


governante é tido como sucessor do profeta Maomé, reunindo em si toda fé mulçumana
sem limites geográficos. Tal acontecimento acabou gerando um mal estar entre o líder
do braço sírio com a facção central, culminando com a separação do EIIS que passou se
chamar apenas Estado Islâmico (EI)36.
A partir daí, a expansão do EI virou prioridade do grupo, tendo em vista que o
califado além de não reconhecer fronteiras políticas tem uma característica
expansionista, diante disso, os ataques a cidades sírias e iraquianas aumentaram,
consequentemente, houve expansão no território do EI, o que, segundo dados dos
serviços americanos de inteligência, já abarcam mais de 31.500 pessoas, atingindo as
características que possui atualmente.
Com o EI em pleno avanço, não demorou muito para que a Comunidade
Internacional reagisse de diversas formas em relação ao desenvolvimento pleno de um
dos grupos terroristas mais articulados e bem financiados da história. Ainda em 2014, os
EUA demonstraram interesse em intervir nas regiões dominadas pelo EI, o que a
princípio poderia ser apontado como uma controvérsia política da Era Obama, uma vez
que tal presidente iniciou sua campanha prometendo mudanças na Guerra ao Terror
empreendida pelo seu antecessor, fato que chamou atenção na população americana.
Outro ponto que merece destaque é o nível de violência utilizada pelo “califado”
amplamente divulgada pelas redes sociais do grupo terrorista, principalmente a partir de
2014. Vídeos de decapitação de estrangeiros, estupros de mulheres e crianças,
execuções em massa e até mesmo crucificação são marca registrada do EI, causando
temor internacional em razão da frieza e calculismo de tais atos. Apesar de ser um grupo
majoritariamente sunita, ou seja, da vertente mais aberta à transformações, o EI se
destaca pela aplicação direta da Sharia, código de leis baseados no Alcorão que acabam
legitimando tais atos, tanto judicialmente como religiosamente.
Ademais, interessante apontar que o EI declara que seus ataques, como os de
janeiro e novembro de 2015 em Partis, são o inicio dos fins dos tempos, pois acreditam
numa grande batalha contra infiéis que dará início ao julgamento final, segundo profecia
constante em seus livros sagrados. Segundo reportagem da Revista Super Interessante37:

36
Mundo Educação. Estado Islâmico. Disponível em:
<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/estado-islamico.html>. Acesso em: 18 out. 2016.
37
Revista Super Interessante. Sete coisas que você precisa saber sobre o Estado Islâmico. Disponível em:
<http://super.abril.com.br/blogs/superlistas/7-coisas-que-voce-precisa-entender-sobre-o-estado-islamico/>
Acesso em: 18 out. 2016.
35

Após decapitar o agente humanitário Peter Kassig, em 2014, o executor disse


“aqui estamos enterrando o primeiro cruzado americano em Dabiq e
esperando avidamente o resto de seus exércitos chegarem”. A mensagem
deixa claro que o grupo quer atrair o inimigo até o seu território par a batalha
final invoca a morte de um falto messias. “Quando o inimigo de Alá vir
Jesus, ele se dissolverá, assim como o sal se dissolve a água”, diz no Hadiz.

Esse comportamento peculiar do EI com relação ao ocidente, segundo os


próprios terroristas, decorre de uma sucessão cronológica, remontando até os tempos da
Cruzadas Medievais, quando os católicos europeus espalharam terror no território
islâmico. No decorrer da história, diversos episódios de materialização da influência
europeia e norte-americana nos problemas locais, inclusive intervenções visando
desestabilizar governos locais em busca de monopólio de petróleo, gás natural e pedras
preciosas.
Logo, um dos objetivos do EI é dominar o Oriente Médio, impedindo que os
países ocidentais continuem manipulado a região à seu favor e desvirtuando os preceitos
islâmicos, razão pela qual seus ataques também possuem um viés axiológico: destruir os
preceitos de democracia e liberdade, bases dos Estados Ocidentais.
Assim sendo, tem-se que o EI representa uma total ameaça não só para todo
mundo, mas, principalmente, para situação crítica que encontram-se Iraque e Síria,
principalmente, despontando como o grupo terrorista mais rico e influente e alcançando
atualmente um território ocupado de aproximadamente 90 mil km², inclusive cidades
como Mosul, Tikrit, Faluja, no Iraque, e Raqqa, na Síria, bem como cerca de 8 milhões
de pessoas que vivem nessas regiões ocupadas. Tais números pretendem ser superados,
haja vista interesse expansionista do EI que pretende, até 2020, ocupar o Norte da
África e até países europeus, como Portugal e França38.

38
Revista Super Interessante. O que o Estado Islâmico quer? Disponível em:
<http://super.abril.com.br/historia/o-que-o-estado-islamico-quer> Acesso em: 18 out. 2016.
36

4 CRISE HUMANITÁRIA

4.1 CONCEITO

De maneira geral, uma crise humanitária se processa quando um grande


contingente de pessoas acaba sendo inserido em situação de emergência máxima face a
ausência de subsídios básicos para sua sobrevivência, como alimentação, saúde e
moradia, e, em contrapartida, os esforços governamentais para sanar tal situação são
ineficientes, de modo que a vida de toda essa população se encontra em risco.
Em razão disso, situações de crise humanitária estão sempre relacionadas a
eventos naturais trágicos, como foi o caso do terremoto no Haiti em 2010, que assolou o
país que até hoje sofre com uma reestruturação lenta, bem como a instabilidades
políticas que acabam mergulhando países inteiros em zonas de abandono e negligência
para com necessidades humanas básicas, é o caso, da Guerra Civil Síria que produz um
imenso fluxo de refugiados, como será adiante explanado.

4.2. EMIGRAÇÃO DA SÍRIA

A emigração de refugiados cresceu desenfreadamente após o início de 2013,


quando as condições de vida no país se deterioraram de forma drástica. Estima-se que
outras 7,6 milhões de pessoas tenham sido forçadas a deixar suas casas dentro do país,
muitas sem acesso a ajuda, o que aumenta para 11 milhões o número de desabrigados
aproximadamente metade da população.
Em setembro passado, o drama dos refugiados sírios voltou a chamar atenção
com a chegada de milhares de cidadãos às ilhas gregas, o que desencadeou uma crise na
União Europeia. Depois, vários países europeus e americanos se comprometeram a
receber quantidades determinadas de asilados sírios. Em dezembro de 2014, a ONU
conseguiu arrecadar US$ 8,4 milhões (R$ 32,3 milhões) para ajudar 18 milhões de
pessoas. Isso sem contar as perdas geradas pelo conflito, que já superam os US$ 200
bilhões, com quatro em cada cinco sírios vivendo na pobreza, 30% deles na pobreza
extrema.
37

Dados fornecidos pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados
mostram que, chegaram à Turquia cerca de 1.9 milhão de sírios nos últimos anos. Já no
Líbano foram 1,1 milhão, e na Jordânia, 629,6 mil. Ao passo que a União Europeia
debate e estuda onde colocar os 120 mil beneficiários de requisições de refúgio que
pretende receber nos próximos dois anos, os outros três países citados acima já
receberam aproximadamente 3,6 milhões de sírios, bem mais que a União Europeia.
Porém, apesar desses dados, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude
Junker, pediu aos países da UE que recebam 160 mil refugiados e adotem ações
corajosas para responder à mais grave crise migratória em décadas na Europa. Diante do
Parlamento Europeu, Junker disse ainda que vai avançar com uma proposta que prevê a
distribuição urgente e com caráter obrigatório de mais 120 mil refugiados, além dos 40
mil já propostos, que hoje estão espalhados pela Húngria, Itália e Grécia39.

4.3 ROTAS DE FUGA

Devido ao caos que a região do Oriente Médio está passando, provocado por
conflitos armados, pobreza extrema e violência, o número de refugiados e pedidos de
asilo tem crescido de maneira acentuada; os refugiados não hesitam em buscar rotas de
risco, pela terra ou pelo mar, tendo em vista que enxergam na migração a última chance
de buscar uma nova perspectiva de vida, onde possam viver em paz, com acesso a
saúde, educação e oportunidades de trabalho para trilhar um novo caminho em suas
vidas.
Antes de tentarem rotas de fugas, milhares de refugiados fazem o pedido de asilo
aos países europeus, os destinos que mais recebem pedidos de asilo até o fim do mês de
julho de 2015 são: Alemanha, Hungria, Turquia, Suécia, Itália, França, Áustria, Grécia e
Grã-Bretanha.
De acordo com números divulgados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados, a Alemanha continua sendo o destino mais procurado por imigrantes
que chegam à Europa. Foi o país que recebeu o maior número de pedidos de asilo, com
mais de 188 mil até o fim de julho de 2015 – 15.416 a mais do que em 2014.
Tendo em vista o insucesso dos pedidos de asilo, os refugiados acabam por
buscar rotas alternativas de fuga perigosas, pondo em risco as suas vidas e dos
39
British Broadcasting Corporation. Refugiados na Europa: a crise em mapas e gráficos. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150904_graficos_imigracao_europa_rm>. Acesso em:
18 out. 2016.
38

familiares. As principais rotas de fuga por quais os refugiados estão chegando a Europa
pelo Mar Mediterrâneo são: Mediterrâneo Ocidental - partindo da Argélia e entrando na
Espanha (estimativa de 6.698 refugiados, sendo 3.789 sírios); Mediterrâneo Central –
partindo da Tunísia e entrando na Itália (estimativa de 91.302 refugiados, sendo 23.878
eritreus, 10.747 nigerianos e 9.766 da África subsaariana); Mediterrâneo Oriental –
partindo da Turquia e entrando na Grécia (estimativa de 132.240 refugiados, sendo
78.190 sírios).40
As principais rotas de fuga pelas quais os refugiados estão chegando a Europa
por terra são: Da Albânia à Grécia – os refugiados atravessam a fronteira por terra
(estimativa de 4.622 refugiados, sendo 4.608 albaneses, 8 georgianos e 6 macedônios);
Balcãs Ocidental – os refugiados partem da Macedônia em direção a Hungria
(estimativa de 102.342 refugiados, sendo 29.245 afegãos, 28.749 sírios e 23.260
kosovar); Fronteiras Orientais – estimativa de 717 refugiados, sendo 183 vietnamitas,
175 afegãos e 68 georgianos.
Tanto por terra quanto pelo mar, os refugiados correm grande perigo no caminho
que eles trilham para chegar a Europa. A travessia pelo mar Mediterrâneo é feita em
botes ou em embarcações sem estrutura e superlotadas, sem o mínimo de segurança a
oferecer aos passageiros, que são transportados por traficantes de pessoas.
A precariedade das embarcações e o perigo da viagem resultaram em desastres
horrendos. Em outubro de 2013 um naufrágio próximo à ilha de Lampedusa matou 360
pessoas, em setembro de 2014 traficantes assassinaram 300 pessoas, pois essas se
recusaram a ir para uma embarcação menor. Os desastres se estendem a este ano, de
fevereiro a abril de 2015 morreram 1.400 imigrantes em naufrágios.41
As mortes não se resumem apenas em travessias marítimas, em agosto de 2015
foram encontrados 71 corpos de imigrantes que tentavam fazer a travessia dentro de um
caminhão de frango, as vítimas morreram asfixiadas e os seus corpos foram encontrados
por patrulheiros, após dois dias, em estado de decomposição.

4.4 COMPORTAMENTO DOS LÍDERES EUROPEUS

40
Revista Época. Seis perguntas para entender a crise humanitária de refugiados na Europa. Disponível
em: <http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/09/seis-perguntas-para-entender-crise-humanitaria-de-
refugiados-na-europa.html>. Acesso em: 18 out. 2016.
41
G1. Entenda a arriscada travessia de imigrantes no mediterrâneo. Disponível em:
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/04/entenda-arriscada-travessia-de-imigrantes-no-
mediterraneo.html >Acesso em: 19 out. 2016.
39

Um dos motivos da crise e eclosão dos refugiados é a omissão das autoridades


europeias no planejamento de soluções plausíveis e eficazes, que ao invés de
procurarem alternativas para acelerar as concessões de asilos, investem na tentativa de
impedir a chegada dos refugiados ao seu território.
As ações dos líderes europeus visam o combate aos traficantes de pessoas e
gangues de coiotes, que transportavam os refugiados por terra ou por mar, além disso, o
governo italiano reduziu as suas operações de resgate no mar Mediterrâneo, para não ter
o encargo de resgatar as embarcações de refugiados que pedem socorro, tendo em vista
que a lei marítima internacional os obriga ao resgate.
Apesar de ainda não haver uma resposta unificada dos governos acerca da
situação conturbada na Europa, alguns países já estão se posicionando, uns
negativamente, como a Hungria e Reino Unido, que defendem um número limite de
refugiados e a deportação destes, e a Dinamarca assim como outros países, aconselham
os refugiados a não se destinarem ao país, pois não estão preparados estruturalmente
para receber e asilar os imigrantes.
Por outro lado a Alemanha e Suécia tem se mostrado países receptivos aos
refugiados, abrindo suas portas. No fim do mês de agosto de 2015, a Alemanha
começou a registrar os refugiados vindos de outros países e no mês seguinte o vice-
chanceler da Alemanha, Sigmar Gabriel, proclamou que o país estava estruturado para
acolher cerca de 500 mil refugiados por ano por vários anos, incentivando ainda mais a
ida de imigrantes para a Europa.
Os críticos dizem que o interesse da Alemanha não é de ajudar os imigrantes por
solidariedade ou humanidade e sim por interesse nacional. As afirmações críticas são
fundamentadas na atual situação de envelhecimento que se encontra a população alemã,
atualmente com 82 milhões de pessoas e estará entre 68 milhões e 73 milhões em 2050.
Logo, o país necessita de uma estabilidade populacional, para garantir a proteção do
mercado de trabalho consequentemente o crescimento econômico, assim é necessário à
chegada de refugiados.42
De acordo com o jornal inglês Financial Times, a União Europeia buscou manter
um entendimento sobre a questão dos refugiados, Jean-Claude Juncker, presidente da
Comissão Europeia, pediu aos países da União Europeia que recebam 160 mil

42
Carta Capital. Na crise de refugiados a Alemanha abala a União Europeia. Disponível em:
http://www.cartacapital.com.br/internacional/ao-lidar-com-refugiados-alemanha-abala-a-uniao-europeia-
2547.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
40

refugiados e adotem ações corajosas para responder a mais grave crise migratória em
décadas na Europa. Diante do Parlamento Europeu, ele disse que vai avançar com uma
proposta que prevê a distribuição com “urgência” e com caráter “obrigatório” de mais
120 mil refugiados, além dos 40 mil já propostos, que hoje estão espalhados pela
Hungria, Itália e Grécia. A proposta irá prever multas para os países que rejeitem a sua
quota. Segundo a ONU, a Europa deveria receber 200 mil refugiados43.

4.5 ATUAÇÃO DE ORGANISMOS INTERNACIONAIS

A situação das rotas de fugas e o fluxo sem precedentes de refugiados imigrando


para os países europeus acabaram chamando à atenção de vários organismos
internacionais ligados a proteção dos direitos humanos, uma vez que como já
demonstrado anteriormente, a taxa de mortalidade elevada e a precariedade dos meios
de transporte utilizados acabaram tornando o fluxo uma verdadeira via crucis.
Em razão disso, alguns organismos resolveram iniciar campanhas internacionais
para angariação de fundos para utilização no auxílio dos refugiados, sejam resgatados
em plenas rotas de fuga, ou então já em solo europeu, visando amenizar a extrema
pobreza que tais pessoas acabam tendo que lidar. Principalmente após o episódio
dramático da morte do menino Aylan Kurdi em 2015, várias entidades passaram a
intensificar ainda mais essas campanhas, abrindo os olhos da Comunidade Internacional
para questão dos refugiados44.
A UNICEF, agência das Nações Unidas para Infância e Juventude, iniciou
campanha para receber doações financeiras que serão aplicadas na compra de
medicamentos para combate de sarampo, material escolar, cobertores, e de
micronutrientes em sachês para auxiliar na nutrição das crianças e adolescentes
refugiados.45
Por sua vez, a ONG Rescue International, que tem um dos principais grupos de
apoio aos grupos que ainda se encontram nas rotas de fuga, como no Mar Mediterrâneo,
também iniciou campanha de doações financeiras em sua página na internet que serão

43
Carta Capital. Perguntas e respostas: crise imigratória na Europa. Disponível em:
<http://www.cartacapital.com.br/internacional/perguntas-e-respostas-crise-imigratoria-na-europa-
9337.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
44
British Broadcasting Corporation. Como os brasileiros podem ajudar os refugiados sírios. Disponível
em: <http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150904_sirios_brasil_ajuda_rm>. Acesso em: 19
out. 2016.
45
UNICEF. Ajude as crianças da Síria. Disponível em: <
https://secure.unicef.org.br/Default.aspx?origem=siria>. Acesso em: 19 out. 2016.
41

utilizadas na compra de itens de higiene para famílias refugiadas, bem como latrinas e
gêneros alimentícios46.
A Save the Children é uma entidade internacional reconhecida no auxílio direto
à crianças vítimas de conflitos armados, razão pela qual é bastante atuante nas regiões
da Síria e nas rotas de fuga, auxiliando mais de 6 mil crianças que acabam chegando a
seus postos de apoio sozinhas47.
Por fim, o ACNUR possui várias campanhas direcionadas aos refugiados
simultaneamente, uma vez que sua atuação não se limita apenas as situações da Síria,
mas sim aos refugiados de modo geral. O dinheiro arrecadado é direcionado para
compra de itens de cozinha e utensílios que evitam doenças transmitidas por mosquitos,
como a malária. Entretanto, com o intenso fluxo para Europa nos últimos tempos, boa
parte das doações está sendo direcionadas para compra de cobertores térmicos e
barracas, devido ao intenso e rigoroso inverno na região europeia48.

46
Rescue International. Support people in crisis. Disponível em: < https://donate.rescue-uk.org/support-
people-in-crisis>. Acesso em: 19 out. 2016.
47
Save the Children. Child Refugee Crisis Appeal. Disponível em: <
http://www.savethechildren.org.uk/about-us/emergencies/child-refugee-crisis-appeal>. Acesso em: 19
out. 2016.
48
ACNUR. As famílias refugiadas precisam da sua ajuda agora. Disponível em: <
https://doar.acnur.org/acnur/donate.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
42

5 O SISTEMA REGIONAL EUROPEU DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS


HUMANOS

5.1 TEORIA GERAL DA PROTEÇÃO INTERNACIONAL DE DIREITOS


HUMANOS

A proteção de direitos humanos está intimamente ligada ao fenômeno de


internacionalização dos direitos humanos, que remonta o período pós 2ª Guerra
Mundial, a partir do qual a Comunidade Internacional demonstrou seu maior interesse
em valorizar o ser humano como detentor de direitos que lhe são inerentes apenas por
tal condição, bem como evitar que novos episódios de desrespeito a tais direitos voltem
a acontecer, como o Holocausto. Neste sentido que surgem a Declaração Universal dos
Direitos Humanos (1948), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966) e
o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966).
Tais tratados internacionais instituíram o chamado “Sistema Global de Proteção
aos Direitos Humanos”, contudo, não adianta apenas iniciar uma série de tratados
internacionais reconhecendo tais direitos, pois a simples declaração não garante que
suas disposições sejam respeitadas pelos Estados que os ratificaram, em razão disso, a
criação de um órgão internacional de natureza jurisdicional com capacidade para exarar
sanções vinculantes, aos Estados, nos casos que lhe são submetidos se mostra mais do
que necessária. É desta premissa que surge a questão da “justicialização” dos direitos
humanos na ordem internacional.
Essa questão parte da evolução do comportamento, pelos Estados, do “direito da
força” para “força do Direito”49, no qual os Estados passam a reconhecer a jurisdição de
um verdadeiro Tribunal Internacional, permanente e imparcial, o qual detém
procedimentos próprios e analisa os direitos e obrigações adquiridos pelas partes,
exarando decisões de natureza vinculantes às mesmas. A importância da
“justicialização” é reconhecida por Norberto Bobbio50, senão vejamos:

A garantia dos direitos humanos no plano internacional só será implementada


quando uma jurisdição internacional se impuser concretamente sobre as
jurisdições nacionais, deixando de se operar dentro dos Estados, mas contra
os Estados e em defesa dos cidadãos.

49
PIOVESAN, Flávia. Internacionalização dos direitos humanos e humanização do direito internacional.
In: _____ Direitos Humanos e Justiça Internacional. 6 Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 74.
50
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro, Campus, 1992.
p. 25-47.
43

Da análise da conclusão de Bobbio, percebe-se que o estabelecimento de


verdadeiras Cortes Internacionais de Direitos Humanos seria um estágio mais avançado
da “justicialização”, a qual ainda caminha à passos lentos face a resistência por parte
dos Estados. Para Bobbio, a criação de uma Justiça Internacional pressupõe uma série
de atividades, as quais podem ser classificadas em: promoção, controle e garantia.51
A promoção seria o aperfeiçoamento dos direitos humanos pelo Estado, uma
verdadeira indução, materializada em relatórios, petições individuais e até visitas in
loco52. O controle é a cobrança, a exigência de que os Estados cumpram os dispositivos
ratificados nos tratados internacionais. Já a garantia é a criação da jurisdição
internacional propriamente dita, materializada no estabelecimento de uma Corte de
Direitos Humanos.
Outro ponto que merece destaque é a delimitação das funções dos mecanismos
internacionais de apuração de violações de direitos humanos, as quais foram
estabelecidas por Pieter Van Djik como sendo: verificação, correção e interpretação. A
primeira objetiva analisar a compatibilidade entre a conduta e a norma internacional. A
segunda propõe a tomada de uma nova conduta estatal para sanar o comportamento
violador, visando cessar a conduta ilícita e o retorno ao status quo ante. A terceira visa
estabelecer o real alcance e sentido da norma internacional de direitos humanos.53
Tomando por base o Sistema Global de Proteção, pode-se concluir que o mesmo
atua no âmbito da promoção e do controle apenas, haja vista que estabelece órgãos
(Comitês) para monitorar o comportamento dos Estados, integrados por profissionais
com elevado conhecimento de direitos humanos, competindo a eles, após as diligências
necessárias, exarar decisões de natureza meramente recomendatória (ordem moral e
política), e não jurídico-vinculante. Neste sentido, conclui Flávia Piovesan54:

Não há no sistema global, até o momento, um Tribunal Internacional de


Direitos Humanos que, na qualidade de órgão jurisdicional, tenha
competência para julgar casos de violações de direitos humanos, enunciados
em tratados internacionais de âmbito global, proferindo decisões
juridicamente vinculantes. (PIOVESAN, Flávia. 2015. p. 89).

51
BOBBIO, Norberto. Loc. cit.
52
RAMOS, André Carvalho. A constatação internacional coletiva da violação de direitos humanos. In:
____ Processo Internacional de Direitos Humanos. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 74.
53
RAMOS, André Carvalho. Ibid. p. 75.
54
PIOVESAN, Flávia. Op. cit. p. 89.
44

Ocorre que internacionalização e “justicialização” dos direitos humanos não são


resumidas apenas ao Sistema Global. Paralelamente à ele, foram surgindo Sistemas
Regionais de proteção fincados em tratados específicos e de alcance limitado de
proteção a direitos humanos, levando em consideração particularidades de natureza
cultural, linguística e hitórico-política, inclusive os sistemas regionais estão em uma
situação de desenvolvimento e progresso de “justicialização” mais avançada que o
próprio Sistema Global, haja vista estabelecimento de Cortes Regionais de Direitos
Humanos.
O primeiro Sistema Regional de Proteção a ser criado foi o europeu, no âmbito
do Conselho da Europa, em 1950, com a aprovação da Convenção Europeia de Direitos
Humanos. Em 1969, foi a vez da América dar um passo decisivo rumo a
internacionalização dos direitos humanos, quando fora aprovado o Pacto de San José da
Costa Rica que instituiu a Convenção Americana de Direitos Humanos, núcleo
normativo do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Até então, não havia
qualquer pretensão da ONU em fomentar o desenvolvimento de tais sistemas regionais,
haja vista ausência de previsão a esse respeito na Carta de São Francisco.
No entanto, face aos acontecimentos retro mencionados na Europa e na América,
na 32ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, foi aprovada aos 16/12/1977 a
Resolução nº 32/127, em sede da qual a ONU assumiu a linha de frente na disseminação
e fomentação para encorajar os Estados a firmarem acordos regionais de proteção aos
direitos humanos, consequentemente criando novos Sistemas Regionais, visando
estabelecer um mecanismo regional para promoção e proteção dos direitos humanos55.
Nesse sentido, foi assinada em 1981 a Carta de Banjul que instituiu o Sistema Regional
Africano de Proteção aos Direitos Humanos, o terceiro a ser estabelecido.
As vantagens dos Sistemas Regionais de Proteção residem no fato de serem
menos Estados, o que facilita o consenso em natureza política para sua criação, não
obstante a isso, algumas regiões do mundo possuem uma certa homogeneidade de
cunho histórico, cultural e linguístico, logo podem refletir mais verdadeiramente as
peculiaridades e valores dos povos daquela região. Ademais, com a proximidade
geográfica entre os Estados componentes de um Sistema Regional, este pode exercer
com mais eficácia uma pressão em face aos Estados vizinhos.56

55
General Assembly Resolutions 32nd. Session. Disponível em: <
http://www.un.org/documents/ga/res/32/ares32r127.pdf> Acesso em: 30 out. 2016.
56
PIOVESAN, Flávia. Op. cit. p.100-101.
45

Além disso, fazendo uma análise mais precisa dos núcleos normativos dos
Sistemas Global e Regionais, é possível identificar que o primeiro traça bases mínimas
a serem cumpridas por todos os Estados, ao passo que os Regionais, mediante tais
bases, acabam por contextualizar as normas globais à realidade regional, levando em
consideração as peculiaridades de cada região, ampliando o rol de direitos humanos
protegidos. Assim, é possível concluir que a relação entre os Sistemas é útil e
complementar, pois são conciliadas numa base funcional: os valores e princípios da
Declaração Universal dos Direitos Humanos.57
Esse comportamento de utilidade e complementaridade nos conduz a ideia de
coexistência pacífica e harmônica entre esses sistemas, ampliando e fortalecendo a
proteção dos direitos humanos, levando a evidência o grau de eficiência desta proteção,
materializado no fato da “justicialização” dos direitos humanos nos sistemas regionais
já ter alcançado um patamar mais avançado que o global, em razão da obtenção de
poder e capacidade sancionatórios pelas Cortes de Direitos Humanos.
A esse ponto, convém esclarecer que no Sistema Global o estabelecimento de
uma Justiça Internacional foi feito no âmbito penal com a criação de Tribunais ad hoc,
para ex-Iugoslávia (1993) e Ruanda (1994), e do Tribunal Penal Internacional (1998),
reconhecendo, assim, que a responsabilização internacional em termos penais alcança
indivíduos que cometeram crimes internacionais. Em contrapartida, as Cortes Regionais
de Direitos Humanos assumem papel relevante na proteção de direitos humanos, pois
atuam neste sentido quando as instituições nacionais dos Estados são falhas e omissas.
Nesse sentido, no âmbito dos Sistemas Regionais, a “justicialização” abarcou a
seara cível, pois os Estados são responsabilizados pelas violações dos direitos humanos
dispostos nos tratados internacionais que instituem tais Sistemas, impondo pagamento
de indenização pecuniária às vítimas em certos casos. Ora, não é duvidoso de que a tal
modo não se comporta o Sistema Global, pois além de não possuir uma Corte de
Direitos Humanos, tem sua atuação pautada pelos Comitês impõem medidas
recomendatórias de natureza política e moral, mas nunca sancionatória e vinculante.
Porém, os Sistemas Regionais sofrem atualmente com a resistência estatal para
ampliação da capacidade internacional postulatória, bem como do reconhecimento de
indivíduos e ONGs como sujeitos internacionais aptos a postular perante os mecanismos
regionais de proteção, principalmente por meio de petições individuais. Noutras

57
PIOVESAN, Flávia. Ibid. p.105.
46

palavras, deve-se fomentar o acesso à Justiça Internacional, tarefa esta que apenas o
Sistema Regional Europeu conseguiu realizar em 1998 com o Protocolo nº 11, mais
adiante demonstrado.
Por fim, outro ponto de dificuldade que os Sistemas Regionais atualmente lidam
é com a efetivação das decisões de suas Cortes pelos Estados submetidos à sua
jurisdição, uma vez que falta atitudes internas para implementar tais decisões,
consequentemente de nada adiantaria a existência de um órgão jurisdicional que vê
como resposta a sua determinação o silêncio e a indiferença dos Estados. Em razão
disso, devem os Estados respeitaram e cumprirem as decisões exaradas pelas Cortes de
Direitos Humanos a que se submetem, sob pena de afronta ao princípio da boa-fé, norte
do Direito Internacional.58

5.2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O SISTEMA REGIONAL EUROPEU DE


PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS (SEDH)

A base para o surgimento do Sistema Regional Europeu foi à criação do


Conselho da Europa, o qual, inicialmente, reuniu dez Estados59 europeus que
endossaram como seus objetivos primordiais a garantia de direitos humanos,
democracia e o Estado de Direito. Nesse período, a Europa ainda vivia as crises
decorrentes das cicatrizes da 2ª Guerra Mundial, tentando se reestruturar após a batalha,
agora diante de um mundo bipolarizado por EUA e URSS.
Neste sentido, cientes de que deveriam reconstruir seu posicionamento perante a
nova ordem mundial, alguns países da Europa Ocidental optaram pela cooperação para
se impor diante da nova era nascente, uma vez que não havia como somente um país
fazer frente ao mundo bipolarizado, e, assim, surgiram uma série de acordos
multilaterais com finalidades militares (União da Europa Ocidental em 1948),
econômicas (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço em 1951) e políticas, esta
última representada no Conselho da Europa, o qual deveria mostrar ao mundo os
valores que conduziam a Europa Ocidental, claramente contrapostos ao bloco socialista.
Interessante mencionar que, a partir de uma análise geopolítica, é possível
concluir que o Conselho da Europa foi a resposta necessária para evitar ameaças do

58
PIOVESAN, Flávia. Op. cit. p. 110.
59
O Conselho da Europa foi criado em 05 de maio de 1949, em Londres, quando da assinatura de seu
tratado institutivo por Bélgica, Dinamarca, França, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Noruega,
Suécia e Reino Unido. Sua sede é em Estrasburgo, na França.
47

cenário mundial da Guerra Fria, quais sejam: forte pressão do bloco socialista que
avançava pelo Leste Europeu estabelecendo a “Cortina de Ferro”, e subordinação direta
aos interesses do bloco capitalista, representado pelos EUA.60
Com a criação do Conselho, as democracias ocidentais da Europa firmaram sua
contraposição a URSS, reforçando suas premissas políticas liberais, as quais foram
materializadas com a aprovação da Convenção Europeia de Direitos e Liberdades
Fundamentais, em Roma em 1950, mais conhecida como Convenção Europeia de
Direitos Humanos (CEDH), que entrou em vigor em 1953, formalizando o
estabelecimento do Sistema Regional Europeu de Proteção aos Direitos Humanos.
Essa originalidade da CEDH, além de ser oriundo do desejo de diferenciação
para com o bloco socialista, advém do fato de estabelecer mecanismos internacionais de
proteção aos direitos humanos: Comissão Europeia de Direitos Humanos (encarregada
de investigação e conciliação, extinta em 1998), Comitê de Ministros do Conselho da
Europa (órgão político para análise de responsabilização), além da Corte Europeia de
Direitos Humanos61 (órgão jurisdicional).
Atualmente, de toda a Europa, apenas Bielorrússia, Cazaquistão e Kosovo não
ingressaram no Conselho da Europa e ratificaram a CEDH, bem como seus protocolos
adicionais, logo tem-se uma lista extraordinária de 47 Estados ratificantes,
consequentemente os direitos previstos na Convenção se estende a mais de 820 milhões
de pessoas. Importante mencionar que qualquer país com território na Europa tem
autorização para ratificar a CEDH e seus protocolos, integrando o Conselho da Europa.
Entretanto, a ousadia da CEDH mostrou suas consequências logo nas tratativas
iniciais, pois foram constatados vários percalços entre a Corte Europeia de Direitos
Humanos e as Constituições, mais especificamente as Supremas Cortes, dos Estados-
Parte, sendo necessárias várias técnicas para evitar violações de soberania. Não obstante
a isso, o procedimento inicial, que era bifásico, no Sistema Regional Europeu era
complexo, além de moroso, até que em 1998, com a aprovação do Protocolo Adicional
nº 11 (P-11), houve a fusão da Comissão Europeia com a Corte Europeia, originando a
atual Corte Europeia de Direitos Humanos (Corte EDH) de caráter permanente.

5.3 COMPOSIÇÃO ORGÂNICA DO SEDH

60
RAMOS, André Carvalho. Op. cit. p. 162.
61
Também conhecida como “Corte de Estrasburgo” em razão da sua sede funcional.
48

Para melhor entendimento do funcionamento e dos procedimentos do Sistema


Regional Europeu, faz-se necessária uma análise geral tanto da Convenção Europeia de
Direitos Humanos como dos órgãos previstos pela mesma, inclusive das modificações
que passaram ao longo da aprovação dos 16 protocolos adicionais.

5.3.1 Convenção Europeia de Direitos Humanos (1953)

A Convenção Europeia elenca fundamentalmente, além dos direitos


fundamentais clássicos como o direito à vida, proibição da escravidão e tortura,
liberdade de expressão e dignidade humana, um rol de direitos civis e políticos, tendo
em vista o momento de ideal democrático-liberal no qual foi celebrada, além de direitos
econômicos, culturais e sociais, posteriormente implementados no texto original nos
durante a década de 1960, graças a Carta Social Europeia, visando inserir
gradativamente direitos dessa natureza na aludida Convenção. Além disso, no decorrer
dos anos, foram adotados diversos protocolos adicionais ao instrumento em comentos,
dos quais faz-se mister salientar o Protocolo nº 11 que instituiu a Corte Europeia de
Direitos Humanos, como atua hoje, em Estrasburgo aos 11 de maio de 1994.
Assim sendo, percebe-se que a Convenção Europeia guarnece todo o espírito
liberal e democrático, espírito este que serviu de base para que o continente assolado
com os horrores e destroços da Segunda Guerra Mundial pudesse despontar, em termos
jurídicos, com a inovação de implantar no ordenamento internacional um instrumento
forte, eficaz e suficiente para garantir a paz e a ordem entre os signatários, de maneira
que até hoje, a Convenção Europeia e o Sistema Regional que dela derivou, com todos
seus mecanismos de controle, serviram de base para os demais Sistemas Regionais:
Interamericano e Africano.

5.3.2 Comissão Europeia de Direitos Humanos (1954-1998)

Era órgão imparcial e independente, tendo número de membros equivalente ao


número de países que compunham o Conselho da Europa, os quais eram eleitos para um
mandato de seis anos e escolhidos pelo Comitê de Ministros. Os comissionários deviam
possuir as mesmas qualificações exigidas de um juiz da Corte Europeia de Direitos
49

Humanas, do qual herdava também as garantias, como independência funcional, a qual


era reforçada pela independência da própria Comissão Europeia, como um todo.
A Comissão Europeia atuava em oito sessões anuais de duas semanas, existindo
a possibilidade de sessões suplementares, logo era órgão não permanente, e as suas
decisões eram coletivas, sendo tomadas após deliberações sigilosas de seus membros,
visando a garantia da independência e imparcialidade. Tinha como funções básicas a
investigação, conciliação e era a titular da ação de responsabilização internacional de
um Estado-membro perante a Corte Europeia de Direitos Humanos, em razão disso era
muitas vezes comparada a figura do Ministério Público.62
Sua atuação era iniciada com a provocação por meio de petições que podiam ser
de um Estado-membro denunciado violações perpetradas por outro Estado-membro
(demanda interestatal) ou então petição individual oriunda da vítima de uma violação
cometida pelo Estado que ela denunciava (demanda individual). Após um procedimento
interno, marcado por uma conciliação, a Comissão poderia, caso não restasse exitosa a
chegada a um acordo, apresentar o caso perante a Corte Europeia.
Entretanto, em 1998, devido a morosidade e complexidade do procedimento
bifásico ante ao intenso fluxo de casos submetidos, principalmente após o ingresso dos
países do Leste Europeu após o fim da Guerra Fria63, entrou em vigor em 1998 o P-11
que extinguiu a Comissão Europeia de Direitos Humanos, fundindo-a com a então Corte
Europeia de Direitos Humanos, de modo que os comissários viraram juízes, tornando o
procedimento unitário e mais célere, permitindo inclusive atuação direta de indivíduos e
organizações não governamentais, uma verdadeira ampliação da capacidade postulatória
internacional, como será mais adiante demonstrado.

5.3.3. Comitê de Ministros do Conselho da Europa (1953)

Órgão principal do Conselho da Europa, tendo cada Estado-membro direito a um


representante, geralmente, seu Ministro de Relações Exteriores. Até a aprovação do P-
11, possuía uma competência decisória residual automática nos casos submetidos ao
Sistema Regional Europeu, ou seja, caso a Corte não fosse acionada pela Comissão,
automaticamente deveria decidir sobre o caso concreto.64

62
RAMOS, André Carvalho. Op. cit. p. 166.
63
RAMOS, André Carvalho. Ibid. p. 167-168.
64
RAMOS, André Carvalho. Op. cit. p. 169.
50

Entretanto, quando da submissão ao Comitê, os Estados tinham uma vantagem


discrepante perante a parte autora, uma vez que não somente o fato do Estado-réu
participar da votação ligada ao mérito do caso era preciso maioria qualificada de dois
terços para constatar a violação de direitos humanos. Ocorre que a atuação do Comitê
dependia do comportamento da Comissão de não acionar a Corte, entretanto, a decisão
da mesma neste sentido não era motivada, o que dava menos transparência ainda ao
procedimento.
Após decidir sobre o caso, o Comitê determinava que o Estado-réu tomasse
medidas reparatórias dentro de um determinado prazo, caso assim não o fizesse, cabia
uma reanálise do caso, gerando estabelecimento de novas obrigações, estas, sim, se não
fossem cumpridas, importavam em sanções severas para o Estado descumpridor:
suspensão ou expulsão do Conselho da Europa.
Contudo, a natureza imposta ao Comitê pela CEDH é a de órgão político, em
razão disso, sua atuação não era pautada pela independência e rigor jurídico adequados
para exarar decisões em casos concretos, por isso, suas deliberações não podiam ser
reconhecidas como verdadeiras decisões, neste sentido, André de Carvalho Ramos65
conclui:

Tais situações de não decisão representavam verdadeira denegação de justiça


e eram aptas a desacreditar tal opção política de aferição da responsabilidade
internacional do Estado, sendo verdadeiro exemplo negativo para outras
regiões do globo. Por isso, veio em boa hora a supressão da função
contenciosa do Comitê de Ministros pelo Protocolo nº 11. (RAMOS, André
Carvalho. 2015. p. 170).

Em decorrência dessa ausência de requisitos mínimos necessários para atuação


decisória residual por parte do órgão político do Conselho da Europa, o P-11
implementou, ao Comitê de Ministros, o papel de restrito supervisor da execução pelos
Estados das decisões exaradas pela Corte EDH, não havendo mais do que se falar em
“papel anômalo de julgamento de violações de direitos humanos”.

5.3.4. Corte Europeia de Direitos Humanos (1998)

No que concerne a Corte, cabe salientar que sua consolidação, nos moldes que
hoje a temos, teve como consequência a extinção da Comissão e da Corte Europeia que

65
RAMOS, André Carvalho. Ibid. p. 170.
51

atuavam a tempo parcial, no aguardo, justamente, de ser estabelecida uma entidade


jurisdicional permanente capaz de processar e julgar as demandas, de natureza
consultiva ou contenciosa, emergidas da analise do instrumento material do Sistema
Regional Europeu.
Ora, da análise dos procedimentos que decorriam da Convenção, e levando em
consideração a então organização jurisdicional bicameral – Comissão Europeia e Corte
Europeia – percebe-se que a consolidação da Corte Europeia gerou a extinção das duas
formas de acionar o Sistema Regional Europeu que havia antes do Protocolo nº 11,
cabendo salientar a alusão feita por Michael O’Boyle66:

O Protocolo nº 11 estabeleceu uma Corte que funciona em período integral,


em substituição aos órgãos [Comissão e Corte] até então existentes. É visto
como uma resposta ao problema da demora de procedimentos, causada pelo
aumento de casos submetidos à Comissão e à Corte Europeia ao longo dos
anos, bem como uma forma de preservar as conquistas decorrentes da
Convenção considerando o aumento de seus Estados-partes, especialmente
no âmbito da Europa Central.(O’BOYLE, Michael. 2000. p.176).

Diante da modificação empreendida pelo Protocolo submetido em 1994, a Corte


teve que se adaptar para que pudesse administrar de maneira eficiente e célere o grande
aumento da demanda processual, tendo em vista que com a extinção do anterior método
procedimental, tornou-se um verdadeiro desafio, consequente do avanço, lidar com a
demanda crescente razão pela qual foi submetido o Protocolo n. 14, no qual, a partir de
1º de junho de 2010, a Corte passou a exigir mais requisitos de admissibilidade às peças
protocoladas, consequentemente garantiu um filtro que poderia driblar a válvula
desenfreada da submissão, podendo dar maior celeridade na prolação de sentenças.
Ademais, faz-se mister constar que a Corte conta com um número de juízes
equivalente ao número de Estados signatários da Convenção, sendo eleitos, para um
mandato de nove anos, pelo Parlamento Europeu, em Assembleia, levando em
consideração a lista enviada por cada um desses Estados, bem como o preenchimento
dos requisitos exigidos pela CEDH. Além disso, a Corte Europeia de Direitos Humanos
tem sua atuação centrada em duas bases jurisdicionais: consultiva e contenciosa.
Na primeira, a Corte elabora pareceres, por solicitação do Comitê de Ministros,
sobre questões interpretativas da Convenção e Protocolos Adicionais, ao passo que a

66
O’BOYLE, Michael. Reflections on the effectiveness of the European System for Protection of Human
Rights, In: ___ Anne F. Bayefsky (ed.), The UN Human Rights Systems in the 21st. Century. The Hague-
London-Boston Kluer Law International. p. 176.
52

contenciosa abarca a competência da Corte para processar e julgar denúncias de


violação, que podem ser realizadas pelas partes tratadas no art. 34, aos direitos
garantidos na Convenção e seus Protocolos, de modo que suas sentenças são
juridicamente vinculantes e de natureza declaratória.
Internamente, a Corte EDH é composta por cinco Seções (chambers),
compostas, cada uma, por sete juízes, dos quais um deve ser o Presidente e outro seu
Vice. As Seções da Corte também constituem os Comitês (comittees), formados por três
juízes, os quais tem atuação por período determinado. Por fim, existe o Tribunal Pleno
(Grand Chamber) composto por dezessete juízes. Os idiomas oficiais da Corte EDH são
inglês e francês, mas a mesma aceita petições redigidas em qualquer idioma oficial de
seus membros.
Por fim, importa salientar que a Corte Europeia ocupa uma posição impar no
cenário internacional da proteção dos direitos humanos, tendo em vista o alto nível de
vinculação às decisões, nível este reconhecido por todos os signatários da Convenção
Europeia, por força do art. 34, o que garante que tal Casa de Justiça seja vista como uma
instância ulterior à mais alta do país de origem, motivo pelo qual entende-se que a Corte
é tida como a instância máxima do Direito Constitucional Europeu, por conta não só
dessa vinculação das nações signatárias da Convenção, mas também por abarcar todos
os membros da União Europeia, maior bloco econômico da atualidade.

5.4 PROCEDIMENTOS PERANTE O SEDH

5.4.1 Extinto Procedimento Bifásico

Antes da entrada em vigor do P-11, as petições (individuais ou interestatais)


contendo denúncias de violações de direitos humanos por Estados-membros eram
direcionadas para Comissão Europeia de Direitos Humanos. Diante do recebimento de
tais demandas, a Comissão deliberava acerca da sua competência 67 em relação a ela,
após se assumir competente, iniciava-se o chamado procedimento de conciliação68, com
base na redação antiga do art. 28 da CEDH.
Nesse momento, era realizada uma análise acerca dos fatos objetivando
constatação de violação ou não, sempre pelos princípios do contraditório e da ampla-

67
Procedimento de Admissibilidade.
68
RAMOS, André Carvalho. Op. cit. p. 166.
53

defesa. Isto posto, era aprazada uma audiência com os representantes das partes
envolvidas para, tendo a Comissão como mediadora, chegarem a um consenso na
solução pacífica do impasse, tendo como limite para tanto o caráter intransigível dos
direitos humanos. Caso tal acordo restasse exitoso, a Comissão analisava requisitos para
sua homologação e, assim fazendo, não podiam mais as partes discutir a questão perante
o Sistema Europeu.
Caso não restasse frutífera a proposta de conciliação, a Comissão Europeia
deveria elaborar um relatório final sobre o caso, conforme previa o art. 31 da CEDH
(por isso era conhecido como “Relatório 31”), levando em consideração os fatos
ventilados e a possibilidade de responsabilização internacional do Estado acusado. Em
razão disso, era tido como documento conclusivo e que demonstrava a decisão da
Comissão sobre o caso, sendo remetido ao Comitê de Ministros, ao Estado acusado,
bem como aos representantes das vítimas.
Entretanto, apesar de representar peça chave na apuração da violação ante o
crivo da Comissão, o Relatório 31 não possuía força vinculante necessária para impor
sanções ao Estado, motivo pelo qual era quase sempre necessário ajuizá-lo perante a
Corte EDH ou adjudicá-lo ao Comitê de Ministros, quando este ainda detinha papel
decisório residual.69
Ora, diante da falta de força vinculante do documento decisório, era inevitável
recorrência direta à Corte de Estrasburgo na maioria dos casos, consequentemente o
Sistema Europeu possuía duas análises de um mesmo caso por órgãos distintos, logo de
uma complexidade tremenda e morosidade incontestável, principalmente após o fim da
Guerra Fria quando os antigos países europeus que integravam a extinta URSS
ingressaram no Conselho da Europa, no início da década de 1990.
Diante disso, não restou alternativa para permanência do aludido procedimento,
o que levou os membros do Conselho a aprovarem o P-11 em 1994, o qual em 1998 ,
fundiu as então existentes Comissão e Corte Europeias de Direitos Humanos, surgindo a
Corte Europeia Permanente de Direitos Humanos, consequentemente tornando o
procedimento unitário, pois a nova Corte de Estrasburgo poderia processar e julgar
demandas individuais, interestatais ou movidas por ONGs.

69
RAMOS, André Carvalho. Ibid. p. 167.
54

Interessante reflexão faz André Carvalho Ramos70 acerca da evolução do


procedimento perante o mecanismo coletivo europeu de averiguação de violação de
direitos humanos, senão vejamos:

Porém, do meu ponto de vista, a derrocada final da Comissão e do


procedimento bifásico europeu ocorreu com a queda do Muro de Berlim e
com o ingresso de novos membros da Europa do Leste (inclusive a própria
Rússia), no Conselho da Europa. Desde 1990 até hoje, 23 membros
ingressaram no Conselho da Europa, quase todos do antigo bloco comunista.
Não foi coincidência que, novembro de 1990, foi aberto à assinatura dos
Estados o Protocolo n. 9, dando o direito de ação ao indivíduo, ainda com a
concorrência da Comissão. E, depois, 11 de maio de 1994, foi aberto à
assinatura dos Estados o Protocolo n. 11, que extinguiu a Comissão tout
court, fundindo-a com a Corte e dando o direito de ação aos indivíduos e
vítimas de violações de direitos humanos. (RAMOS, André Carvalho. 2015.
p. 167-168).

Dessa forma, para o aludido autor, a extinção do procedimento bifásico estaria


mais ligada à evolução e reerguida do capitalismo no Leste Europeu, do que a própria
demonstração de incapacidade produtiva do então vigente procedimento, ou seja, foi
uma constatação mais geopolítica do que judiciária, fato é que o mesmo chega ao
seguinte ponto:

O filtro da Comissão e o papel anômalo do Comitê de Ministro protegiam


obviamente os Estados europeus ocidentais. Com o ingresso dos membros
ex-socialistas, não havia desejo algum de protegê-los. Pelo contrário, havia o
desejo dos Estados capitalistas de estimular os indivíduos a questionarem o
“entulho autoritário” do antigo bloco comunista perante a Corte de
Estrasburgo. Por isso, rapidamente foram engendradas modificações na
Convenção para facilitar o acesso do indivíduo ao sistema europeu de direitos
humanos. (RAMOS, André Carvalho. 2015. p. 168).

Por fim, chega-se a conclusão de que o real motivo para conversão do modelo do
sistema de processamento de petições perante o SEDH foi mais de cunho geopolítico,
visando impor aos ex-países socialistas as consequências, do ponto de vista capitalista,
de seus governos autoritários, retirando qualquer vantagem processual ofertada pela
Convenção aos Estados-membros. Entretanto, tal alteração também importou em maior
facilidade das demandas contra os próprios Estados capitalistas, haja vista que não há
diferenciação neste sentido.

70
RAMOS, André Carvalho. Op. cit. p. 167-168.
55

5.4.2. Procedimento Unitário vigorante

Como já exposto anteriormente, com a entrada em vigor do P-11, a Corte EDH


passou a receber as petições iniciais relatando violações de direitos humanos por parte
dos Estados-membros do Conselho da Europa. Neste ponto, convém esclarecer que a
Corte aceita petições direcionadas por indivíduos ou organizações não-governamentais
vítimas das violações (logo há vedação de uma ONG acionar a Corte em razão de
violação à terceiros), bem como por Estados-membros (estes sim, podem atuar em favor
de terceiros). Não obstante a isso, o procedimento perante a Corte EDH sofreu
alterações consideráveis com o Protocolo n. 1471
Protocolada a petição, a mesma é direcionada a uma das cinco Seções da Corte,
e, dentro delas, é distribuída para um juiz singular (relator), o qual deverá decidir
monocraticamente sobre a admissibilidade da petição ou arquivamento da mesma,
levando em consideração os requisitos impostos pelos seguintes artigos da CEDH, in
verbis:

Artigo 35º- Condições de Admissibilidade


1. O Tribunal só pode ser solicitado a conhecer de um assunto depois de
esgotadas todas as vias de recurso internas, em conformidade com os
princípios de direito internacional geralmente reconhecidos e num prazo de
seis meses a contar da data da decisão interna definitiva.
2. O Tribunal não conhecerá de qualquer petição individual formulada em
aplicação do disposto no artigo 34° se tal petição:
a) For anônima;
b) For, no essencial, idêntica a uma petição anteriormente examinada pelo
Tribunal ou já submetida a outra instância internacional de inquérito ou de
decisão e não contiver fatos novos.
3. O Tribunal declarará a inadmissibilidade de qualquer petição individual
formulada nos termos do artigo 34° sempre que considerar que:
a) A petição é incompatível com o disposto na Convenção ou nos seus
Protocolos, é manifestamente mal fundada ou tem caráter abusivo; ou
b) O autor da petição não sofreu qualquer prejuízo significativo, salvo se o
respeito pelos direitos do homem garantidos na Convenção e nos respectivos
Protocolos exigir uma apreciação da petição quanto ao fundo e contanto que
não se rejeite, por esse motivo, qualquer questão que não tenha sido
devidamente apreciada por um tribunal interno.
4. O Tribunal rejeitará qualquer petição que considere inadmissível nos
termos do presente artigo. O Tribunal poderá decidir nestes termos em
qualquer momento do processo.

Artigo 37º - Arquivamento


1. O Tribunal pode decidir, em qualquer momento do processo, arquivar uma
petição se as circunstâncias permitirem concluir que:
a) O requerente não pretende mais manter tal petição;
b) O litígio foi resolvido;

71
Aprovado em 2004, entrando em vigor apenas em 2010. Instituiu, no procedimento, a figura do juiz
singular, bem como novos requisitos de admissibilidade.
56

c) Por qualquer outro motivo constatado pelo Tribunal, não se justifica


prosseguir a apreciação da petição.
Contudo, o Tribunal dará seguimento à apreciação da petição se o respeito
pelos direitos do homem garantidos na Convenção assim o exigir.
2. O Tribunal poderá decidir - se pelo desarquivamento de uma petição se
considerar que as circunstâncias assim o justificam.

Interessante mencionar que o juiz singular não pode decidir monocraticamente


sobre petições em face de seu país de origem, entretanto não há qualquer impedimento
para que este integre a Seção que julgue demanda em face de seu Estado.
Após decisão reconhecendo a admissibilidade, a petição será direcionada para
um Comitê ou para uma Seção, levando em consideração a matéria tratada, se já for
matéria pacificada pela Corte, a petição é remetida para um Comitê, tendo um
julgamento mais rápido, conforme art. 28, 1, da CEDH72, caso não seja uma matéria que
a Corte já tenha se manifestado, será a petição remetida para uma Seção.
Na Seção, a petição é distribuída aos juízes somente com as manifestações do
Estado-violador, sendo o contraditório e ampla-defesa exercidos com a oposição oral de
réplicas em sede de audiência própria para este fim. Como resquício da Comissão
Europeia, a Corte EDH também é responsável por fomentar a solução amistosa do
conflito entre os envolvidos, levando em consideração que os direitos humanos, além de
intransigíveis, são reflexos de obrigações objetivas adquiridas pelos Estados quando da
ratificação.
Além disso, mister esclarecer que a Corte EDH tem competência para adoção de
medidas cautelares, nos termos do art. 39 de seu Regulamento Interno, quando se vê
diante de atos estatais irreversíveis, como execução, deportação, entre outras. Ademais,
caso haja necessidade de uma maior instrução do feito, a Corte EDH pode determinar
diligências e produção de provas, sendo pertinente esclarecer que toda espécie de prova.
Inclusive, a Corte reconhece, em seu art. 3673, a figura do amicus curiae representado

72
Artigo 28 - Competência dos Comitês
1. Um comité que conheça de uma petição individual formulada nos termos do artigo 34° pode, por voto
unânime:
a) Declarar a inadmissibilidade ou mandar arquivar a mesma sempre que essa decisão puder ser tomada
sem posterior apreciação; ou
b) Declarar a admissibilidade da mesma e proferir ao mesmo tempo uma sentença quanto ao fundo
sempre que a questão subjacente ao assunto e relativa à interpretação ou à aplicação da Convenção ou dos
respectivos Protocolos for já objeto de jurisprudência bem firmada do Tribunal.
73
Artigo 36º - Intervenção de Terceiros
1. Em qualquer assunto pendente numa secção ou no tribunal pleno, a Alta Parte Contratante da qual o
autor da petição seja nacional terá o direito de formular observações por escrito ou de participar nas
audiências.
57

por um terceiro interessado ou então, como geralmente ocorre, o Comissário de Direitos


Humanos do Conselho da Europa assume tal papel.74
Em seguida, estando o feito plenamente instruído, a Seção prolata sua decisão,
da qual cabe recurso, dentro do prazo de três meses, ao Tribunal Pleno, órgão que após
analisar a admissibilidade do recurso deve decidir em duplo grau de jurisdição. Da
decisão do Tribunal, ainda cabe recursos de interpretação ou revisão, neste último caso,
somente se houver preenchimento dos requisitos impostos pelo art. 80 do Regulamento
Interno da Corte.
Deste modo, percebe-se que o novo procedimento impôs dois novos filtros as
petições protocoladas perante a Corte de Estrasburgo: o juiz singular e os Comitês, os
quais visam dar maior agilidade no posicionamento da Casa de Justiça acerca das
demandas, dentro de suas atribuições conforme demonstrado. Nesse sentido, se
posiciona André de Carvalho Ramos75:

Para a vítima, há dúvida sobre uma filtragem excessiva, uma vez que o juiz
singular decide de modo definitivo e sem recurso. Já o Comitê – de três
juízes – decidirá por unanimidade para rejeitar sumariamente a demanda, o
que dá maior segurança às vítimas. (RAMOS, André Carvalho. 2015. p. 178).

Por fim, pode-se concluir que o atual sistema de processamento de petições


perante a Corte EDH acabou dando maior celeridade a pretensão das vítimas quanto da
resposta do SEDH acerca das violações que lhe são apresentadas, haja vista atuação
massiva dos relatores e dos Comitês, desafogando a Casa de Justiça dos vários casos
que lhe são submetidos diariamente. Ademais, com a nova atuação do Comitê de
Ministros do Conselho da Europa, após o P-11, percebe-se maior coordenação no
processo de análise da implementação das decisões prolatadas pela Corte de
Estrasburgo.

5.5 CASO “HIRSI JAMAA, e outros, vs. ITÁLIA”76.

2. No interesse da boa administração da justiça, o presidente do Tribunal pode convidar qualquer Alta
Parte Contratante que não seja parte no processo ou qualquer outra pessoa interessada que não o autor da
petição a apresentar observações escritas ou a participar nas audiências.
3. Em qualquer assunto pendente numa secção ou no tribunal pleno, o Comissário para os Direitos do
Homem do Conselho da Europa poderá formular observações por escrito e participar nas audiências.
74
A Comissão de Direitos Humanos do Conselho da Europa foi criada em 1997, devendo o Comissário,
conforme Protocolo n. 14 apresente sua opinião em qualquer demanda em trâmite na Corte.
75
RAMOS, André Carvalho. Op cit. p. 178.
76
European Court of Human Rights. Case HIRSI JAMAA AND OTHERS V. ITALY. Disponível em: <
http://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001-109231#{"itemid":["001-109231"]}> Acesso em: 31 out. 2016
58

Trata-se de um precedente simbólico da Corte de Estrasburgo na efetivação do


Direito Internacional dos Refugiados, levando em consideração supremacia dos
princípios da dignidade da pessoa humana e do non-refoulement77. O caso
supramencionado envolvia 24 imigrantes africanos (11 somálios e 13 eritreus) que
tentaram, junto a um grupo maior de 200 pessoas, atravessar o Mar Mediterrâneo,
fugindo da Líbia para chegar à Itália em 2009. Porém, em 06 de maio do mesmo ano,
eles foram interceptados, ainda em alto mar, nas proximidades da Ilha de Lampedusa,
por navios da Guarda Costeira Italiana78.
Conduzidos às naus de bandeira italiana, os imigrantes não receberam qualquer
informação por parte dos agentes estatais italianos, tampouco foram questionados
acerca de sua identidade, o que os levou a crer que iriam ser direcionados para Itália e,
lá sim, iriam ser questionados neste ponto. Contudo, após uma viagem desgastante e
marcada pela incerteza e ansiedade, os africanos chegaram ao porto de Trípoli, na Líbia,
sendo entregues às autoridades líbias, pelos agentes italianos, sem qualquer
fundamentação ou justificação para tal atitude.
Segundo as autoridades italianas, essa atitude decorreu de um acordo bilateral
firmado entre Itália e Líbia em 2007 que entrou em vigor em fevereiro de 2009
objetivando obstruir e combater a imigração ilegal, a qual servia de base para tráfico
internacional de drogas e pessoas na região, em decorrência do aludido tratado, a atitude
da marinha italiana estaria resguardada legalmente, inclusive após a entrada em vigor do
acordo, várias operações de interceptação de imigrantes clandestinos, semelhantes ao do
caso ora em comento, foram realizadas com sucesso.
Insatisfeitos com o tratamento a que foram submetidos pelos agentes de Estado
italianos, e após insucesso dos pedidos perante a jurisdição interna da Itália, o grupo dos
24 imigrantes resolveram acionar a Corte de Estrasburgo, protocolando petição de
denúncia, em 26 de maio de 2009, relatando violação, por parte da Itália, ao artigo 3º da
Convenção Europeia, ao artigo 4º do Protocolo IV, bem como do artigo 13º da
Convenção combinado com os artigos anteriores.79 Deste modo, percebe-se que a

77
Proibição de devolução de refugiado à país em que sofra perseguição.
78
European Court of Human Rights. Press Release - Forthcoming Grand Chamber judgment in the case
of Hirsi Jamaa and Others v. Italy 23.02.2012. Disponível em: <
http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["003-3847021-4421058"]}> Acesso em: 31 out. 2016.
79
Artigo 3º da CEDH - “Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos
ou degradantes”.
Artigo 4º do Protocolo IV – “São proibidas as expulsões coletivas de estrangeiros”
59

denúncia elencava quatro violações: a) proibição a tratamento degradante; b) proibição


de expulsão coletiva de estrangeiros; c) proibição de impedimento de recurso às
autoridades competentes; e d) princípio do non-refoulement.
Instado a se manifestar acerca dos fatos ventilados, o Estado italiano apresentou
preliminares de ilegitimidade na representação das vítimas80 e não esgotamento dos
recursos internos. Em seguida, a defesa das vítimas replicou querendo desconsideração
das preliminares, haja vista que a questão da representação era apenas um erro formal
que poderia ser sanado sem qualquer interferência na análise meritória. Posteriormente,
a Corte rejeitou as preliminares arguidas pelos procuradores italianos, dando
prosseguimento ao feito, e, em 15 de fevereiro de 2011, a Seção para qual o caso foi
distribuído reconheceu competência do Tribunal Pleno para analisar o caso.
Interessante mencionar que durante o trâmite regular do feito na Corte, os 24
peticionários obtiveram status de refugiado perante o ACNUR, no escritório que
possuía em Trípoli, na Líbia, o qual fora fechado no início de 2011 em decorrência das
manifestações ligadas a Primavera Árabe no país, as quais tiveram efeitos incidentes
também no acordo bilateral sobre imigração clandestina, haja vista que em 26 de
fevereiro de 2011 o mesmo fora suspenso.
Em 26 de junho de 2011 foi realizada a audiência instrutória do presente caso,
oportunidade em que foram ouvidos, na qualidade de amicus curiae, vários
representantes de organismos internacionais ligados a proteção de direitos humanos,
como o Human Rights Watch, o Comissariado de Direitos Humanos do Conselho da
Europa e o ACNUR. No ano seguinte, em 26 de fevereiro, a Corte Europeia de Direitos
Humanos prolatou sua sentença81 dando procedência o pedido dos refugiados e
reconhecendo, por unanimidade, a responsabilização internacional da Itália por violação
aos direitos humanos elencados na denúncia.
No mérito82, a Corte reconheceu que os acontecimentos narrados aconteceram
dentro da jurisdição italiana, ainda que em águas internacionais, foram agentes de

Artigo 13º da CEDH - “Qualquer pessoa cujos direitos e liberdades reconhecidos na presente Convenção
tiveram sido violados tem direito a recurso perante instância nacional, mesmo quando a violação tiver
sido cometida por pessoas que atuem no exercício de suas funções oficiais”
80
Os erros formais eram em decorrência das procurações que não constavam identificação suficiente do
outorgante, local e data da assinatura, bem como ausência de referência ao número do procedimento.
81
European Court of Human Rights. Grand Chamber – Case “Hirsi Jamma and others vs. Italy –
Judgement. Disponível em: < http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["001-109231"]}> Acesso em: 31
out. 2016.
82
European Court of Human Rights. Information Note on the Court’s case-law No. 149. Disponível em:
< http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["002-102"]}> Acesso em: 31 out. 2016.
60

Estado italianos, dentro de uma embarcação de bandeira italiana, que perpetraram os


atos violadores, logo não há motivo para se considerar que a atuação fora de território
contínuo exime o Estado da responsabilidade por atos de seus agentes.
Com relação a violação ao artigo 3º da CEDH, marcada pela exposição a riscos
de tratamento degradante quando da devolução aos refugiados à Líbia, bem como na
hipótese de repatriação dos mesmos, a Corte reconheceu as dificuldades que os Estados
europeus enfrentavam com relação as formas de se evitar o fluxo desenfreado de
imigrantes ilegais, os quais muitas vezes davam margem para cometimento de delitos,
como tráfico de drogas, entretanto tais dificuldades não podem ser utilizadas para
justificar devolução de pessoas à locais que poderiam oferecer risco as suas integridades
físicas.
Neste ponto, a Corte levou em consideração o fato da Líbia não ter ratificado a
Convenção dos Refugiados (1951), logo não poderia se esperar do governo líbio
atendimento aos direitos que tal tratado garante aos refugiados, consequentemente a
devolução imediata dos refugiados às autoridades líbias os expôs a riscos de tratamento
degradante ou desumano. Interessante mencionar que o Estado italiano alegou, nos
autos, que entendia que a Líbia era uma destinação segura para os refugiados, por isso
optou por removê-los diretamente para lá. Em decorrência disso, a Corte entendeu que a
Itália sabia ou deveria saber que direcionados para Líbia os refugiados seriam expostos
a possíveis tratamentos desumanos.
A Corte também reconheceu, levando em consideração o artigo 3º da
Convenção, que a Itália incidiu em dupla violação ao presente dispositivo, pois ante a
nacionalidade dos refugiados (somálios e eritreus), e o fato de terem sido direcionados
para país estranho (Líbia), eles se viam obrigados a retornar para seus países de origem,
tentando repatriação. Contudo, como tiveram status de refugiado reconhecido pela
ACNUR, a atitude do governo italiano somada com a possibilidade de tentativa de
violação configurou, além de exposição a risco de tratamento desumano, violação direta
ao princípio do non-refoulement.
Não obstante a isso, a Corte de Estrasburgo também reconheceu que a devolução
dos refugiados à Líbia pela Itália configurou expulsão coletiva de estrangeiros, proibida
por força do art. 4º do Protocolo IV, aqui se faz necessário expor que a Casa de Justiça
fez uma reanálise da figura e da aplicabilidade do dispositivo violado mediante
61

comparação com um julgado anterior83, pois, até então, a expulsão coletiva era
reconhecida como ato praticado dentro do território contínuo do Estado e contra várias
pessoas sem prévia análise de particularidades entre elas.
Ora, se já havia reconhecido que a nau que conduziu os refugiados à Líbia estava
sobre jurisdição italiana e, levando em consideração o artigo 91, item 184, da Convenção
das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1982)85, a embarcação em questão era
extensão do território italiano, logo a atitude de devolução sumária dos refugiados, sem
qualquer análise prévia acerca da situação internacional e identificação dos mesmos,
configurou-se como expulsão coletiva.
Com relação a violação ao artigo 13º da Convenção Europeia, a Corte entendeu
que como os refugiados não foram informados para onde estavam sendo conduzidos
pelas autoridades italianas, tampouco estas procederam com uma avaliação individual
da situação de cada um deles, e, ainda, a devolução deles já havia sido realizada,
qualquer recurso cabível perante a jurisdição italiana não obteria efeito prático, pois as
consequências da devolução já haviam produzido seus efeitos irreversíveis, como foi o
caso da exposição ao risco de tratamento humano e degradante e violação ao princípio
do non-refoulement. Em razão disso, reconheceu como procedente o pedido neste ponto.
A Corte condenou ainda, conforme art. 41 da CEDH, o governo italiano ao
pagamento das custas processuais e de indenização, no montante de quinze mil euros,
para cada peticionante em razão das violações perpetradas. Posteriormente, o Comitê de
Ministros atuou perante o caso no sentido de verificar o real cumprimento da sentença
pelo governo italiano, apresentando seu relatório86 em 14 de setembro de 2016, o qual
conclui pelo cumprimento integral da sentença por parte da Itália, requerendo o
arquivamento definitivo do caso.
Assim sendo, do julgamento do caso “Hirsi Jamaa, e outros, vs. Itália”, a Corte
EDH entendeu que a proteção internacional aos direitos humanos assumida pelos
Estados-membros do Conselho da Europa é superior ao cumprimento do princípio do

83
Caso Čonka vs. Bélgica (2002), único em que a Corte reconheceu a violação ao artigo 4º do Protocolo
IV.
84
Todo estado deve estabelecer os requisitos necessários para a atribuição da sua nacionalidade a navios,
para o registro de navios no seu território e para o direito de arvorar a sua bandeira. Os navios possuem a
nacionalidade do Estado cuja bandeira estejam autorizados a arvorar. Deve existir um vínculo substancial
entre o Estado e o navio.
85
Assinada em Montego Bay, Jamaica, em 1982. Disponível em:
<https://www.egn.mar.mil.br/arquivos/cursos/csup/CNUDM.pdf> Acesso em: 31 out. 2016.
86
European Court of Human Right. Execution of the judgment of the European Court of Human Rights –
Case “Hirsi Jamaa and others vs. Italy. Disponível em: <http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["001-
167228"]}> Acesso em: 31 out. 2016.
62

pacta sunt servanta, no presente caso direcionado ao acordo bilateral entre Itália e
Líbia, reconhecendo também a incidência do princípio do non-refoulement, o qual busca
prevenir danos à integridade física e psicológica dos refugiados.87

87
CLARO, Carolina Batista de Abreu. O caso Hirsi Jamaa e outros vs. Itália e a responsabilidade estatal
no tratamento de estrangeiros. Revista de Estudos Internacionais, João Pessoa, v.1, n.2, p. 167-168.
2010. Disponível em:
<http://www.revistadeestudosinternacionais.com/uepb/index.php/rei/article/view/31/pdf>. Acesso em: 31
out. 2016.
63

6 VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS

O controle da crise humanitária decorrente dos efeitos da Guerra Civil Síria


acabaram por gerar reiterados episódios de violação à direitos fundamentais a
personalidade humana, muitos deles assegurados na Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948, inclusive reproduzidos nos mais diversos instrumentos de proteção,
como é o caso da Convenção Europeia de Direitos Humanos.
Não obstante a isso, cabe salientar que os refugiados acabam por ser submetidos
a tratamento degradante que começa na própria ideia de retirar-se de suas casas para
buscar uma ambiente melhor e que proporcione condições mínimas para sobrevivência
e subsistência, isso porque é nesse momento em que decidem migrar para outros países,
o percurso acaba por expô-los a vários momentos de perigo e degradação, que só
pioram à medida que chegam mais próximo do destino escolhido pela maioria: Europa.
Antes de iniciar a explanação mais específica das principais violações ocorridas
no cotidiano momento de tentativa de controle dos refugiados provenientes da Guerra
Síria, importa salientar que tomar-se-ão por base para justificar as mesmas a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (1948)88, Convenção Relativa ao Estatuto dos
Refugiados (1951) e a Convenção Europeia de Direitos Humanos (1953), cuja força
vinculante é demonstrada em seu artigo 1º.89

6.1 DIREITO À VIDA

Trata-se do mais fundamental direito de todos, também chamado de direito


primário, sem o qual nenhum dos outros remanesce, e com o qual, qualquer um é
passível de se desenvolver e merecer resguardo, razão esta que o faz estar elencado
sempre no inicio dos tratados internacionais que versam sobre a proteção dos direitos
humanos, como é o caso da Declaração Universal dos Direitos Humanos que o dispõe
em seu art. III.90
Em consonância com tal dispositivo, encontra-se o art. 2º da CEDH, in litteris:

88
Não tem força vinculante reconhecida pelos países signatários. Disponível em: <
http://www.dudh.org.br/wp-content/uploads/2014/12/dudh.pdf>. Acesso em: 31 out 2016.
89
Artigo 1º. As Altas Partes Contratantes reconhecem a qualquer pessoa sob sua jurisdição os direitos e
liberdades definidos no titulo I da presente Convenção.
90
Artigo III – Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
64

Artigo 2º. Direito à vida.


1. O direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei. Ninguém
poderá ser intencionalmente privado da vida, salvo em execução de uma
sentença capital pronunciada por um tribunal, no caso de o crime ser punido
com esta pena pela lei.[grifo nosso]

Sem dúvida, interessante salientar que é o direito a vida o mais ameaçado pela
situação que atualmente se presencia na Europa, tendo em vista os dados alarmantes que
demonstram a periculosidade do percurso e das modalidades de fuga empreendidas
pelos refugiados, além disso, mais alarmante é o total de mortes diretas ocasionadas
pela falta de infraestrutura e planejamento no controle da saída dos refugiados sírios91,
ausência essa que já ceifou milhares de vidas, como foi o caso do caminhão encontrado
na Áustria contendo vários corpos de refugiados em agosto de 2015.
O caminhão que pertencia a uma empresa frigorífica estava abandonado às
margens de uma rodovia no estado de Burgenland há alguns dias, entretanto o que
chamou a atenção dos policiais fora o líquido mau cheiroso que jorrava pela porta
traseira do veículo, o qual fora identificado posteriormente como sendo fluídos
corpóreos, e, ao abrir o caminhão, a polícia austríaca se deparou com mais de 71 corpos
em estado de decomposição, incluindo crianças.
Iniciadas as investigações, a polícia austríaca chegou a três suspeitos, de
nacionalidade húngara e afegã, que as pessoas foram mortas por sufocamento e
depositadas no caminhão há cerca de dois dias antes da abertura do caminhão, razão
pela qual o mau cheiro e os fluídos estavam latentes.
Outro caso que reflete muito bem as consequências diretas dos conjuntos de
fatores acima mencionados é o do menino Aylan Kurdi92, que tomou proporção
internacional imediata se tornando símbolo das duras condições que os refugiados sírios
se submetem para alcançar o continente europeu. Em 02 de setembro de 2015, algumas
embarcações sírias que rumavam para ilha grega de Kos acabaram naufragando no Mar
Mediterrâneo devido às péssimas condições de infraestrutura das embarcações aliadas à
quantidade de pessoas à bordo, vários corpos foram encontrados em praias turcas e
gregas, entre eles, o de uma criança: Aylan Kurdi, cujo impacto na política internacional
acabou intensificando a celeridade nas reuniões internacionais tratando da crise.

91
G1. Número de corpos encontrados em caminhão na Áustria passa de 70, diz polícia. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/08/n-de-corpos-em-caminhao-achado-na-austria-passa-de-70-
diz-policia.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
92
G1. Foto chocante de menino morto vira revela crueldade de crise migratória. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/09/foto-chocante-de-menino-morto-vira-simbolo-da-crise-
migratoria-europeia.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
65

6.2 DIREITO À DIGNIDADE HUMANA E INTEGRIDADE FÍSICA

Trata-se de um direito corolário ao direito fundamental à vida, sendo essencial


para manutenção do estado normal do ser humano nos âmbitos físico e psicológico, de
maneira que garante expressamente a proibição a qualquer exposição ou submissão de
qualquer ser humano a situações que causem desgaste físico, emocional, psicológico,
afetando assim a essência de qualquer ser humano.
De modo geral, ainda que o direito a vida seja assegurado, se não houver
dignidade suficiente para que o ser humano consiga desenvolver suas atividades, resta-
se violado a dignidade humana, cujas consequências são gradativas e complexas, pois
podem afetar tanto o psicológico como a integridade física, razão pela qual restou
assegurada proteção tanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos93, como na
Convenção Europeia de Direitos Humanos94.
Não restam duvidas da situação que a Europa como um todo se encontra,
ausente de medidas de controle para recebimento e distribuição dos refugiados, como
também extremamente descomposta em termos de politicas e estratégias eficientes para
evitar uma degradação maior à pessoa do refugiado, que já é submetido a tratamento
desgastante e degradante no local de origem, razão pela qual se viu obrigado a sair de
tal ambiente.
O que se observa é que nos países-membros do Conselho da Europa,
especialmente nos do Leste Europeu, como Croácia e Sérvia, a falta de infraestrutura e
planejamento para conter a grande quantidade de refugiados sírios leva os governos a
tratarem-nos de maneira negligente95 e em total dissonância com o disposto nos artigos
dos tratados supramencionados. Tal tratamento é materializado no fechamento arbitrário
de fronteiras, como o ocorrido em outubro de 2015, visando obstruir o fluxo
desenfreado de refugiados que chegam em grandes grupos objetivando residir
temporariamente, e em certos casos até definitivamente naqueles países.

93
Artigo V – Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou
degradante.
94
Artigo 3º. Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou
degradantes.
95
Deustche Welle. Refugiados na Sérvia enfrentam situações sub-humanas. Disponível em: <
http://www.dw.com/pt/refugiados-na-s%C3%A9rvia-enfrentam-condi%C3%A7%C3%B5es-sub-
humanas/a-18808608>. Acesso em 31 out 2016.
66

Contudo, tais Estados declaram que não possuem infraestrutura suficiente para
garantir as condições necessárias de vida digna para esses grupos, isso porque a
quantidade de pessoas que já se encontra em seus territórios já superlota o maquinário
estatal, impedindo que novas concessões e destinações à eles sejam destinadas. Munidos
de tais justificativas, os Chefes de Estado acabaram determinando o fechamento, ainda
que temporário, das fronteiras.
Inicialmente, importa esclarecer que tal medida não é vista de maneira razoável
pelas instâncias europeias de direitos humanos, bem como judiciárias no geral, haja
vista sua incidência direta e de maneira contrário às disposições vigentes. Ademais,
levando em consideração que o período em que as fronteiras da Sérvia e Croácia foram
fechadas correspondem a de intensa instabilidade climática, um número sem precedente
de refugiados foram submetidos à temperaturas extremamente frias por um longo
período de tempo, sem qualquer auxílio prestado pelos estados fronteiriços.
Não obstante a isso, os agentes governamentais que monitoravam a fronteira
utilizaram jatos d’água para tentar obstruir a multidão, sem qualquer relativização da
intensidade, somente parando quando as crianças que acompanhavam os grupos foram
levantadas, mas ainda assim foram atingidas pelos canhões d’água. E, ainda com a
posterior abertura das fronteiras, os refugiados iniciavam mais uma longa caminhada
rumo ao destino que melhor pensassem, geralmente as grandes metrópoles europeias, o
que faziam sem qualquer apoio ou contribuição por parte dos Estados.
Além disso, nem as crianças estão à salvo das barbaridades que momentos de
pânico como este proporcionam, muitas delas acabam sendo vendidas e destinadas a
prostituição96, restando, assim, mais uma vez violadas disposições não só da Convenção
Europeia, mas também da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Tais situações
ocorrem principalmente na Itália, isso porque nesse país o número de crianças e
adolescentes vindas do Oriente Médio desacompanhadas dos país é extremamente alto,
decorrente das mortes que ocorrem na guerra ou nas rotas de fuga aliada a uma difícil
escolha tomada pelos pais: deixarem seus filhos irem sozinhos para terem uma
expectativa de vida maior e melhor que a deles.
Contudo, tais anseios não são realizados, vez que nos abrigos aos quais são
encaminhadas, falta pessoal capacitado para atende-las e iniciarem uma integração no

96
British Broadcasting Corporation. Prostituídas e exploradas: a dura realidade das crianças imigrantes
abandonadas na Europa. Disponível em: <
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150921_criancas_refugiadas_rm.shtml>. Acesso em:
31 out. 2016.
67

país, consequentemente, não possuem a vigilância necessária e acabam fugindo dessas


instituições, quer pela ausência de subsídios quer pela ideia de que possam encontrar
algo melhor fora dali. Nas ruas italianas, sem qualquer auxílio ou fiscalização estatal, os
infantes acabam sendo alvo fácil para atuação de quadrilhas ligadas a tráfico de pessoas,
drogas e até órgãos, utilizando-se da negligência do estado italiano para intensificar
negociações ilícitas. Já os infantes não visualizam outras perspectivas de sobrevivência
senão acatar e ingressar nesse mundo obscuro.

6.3 DIREITO À LIBERDADE

Também integrante do rol dos direitos fundamentais, o direito a liberdade prega


que todo ser humano é livre para ir e vir sem ser obstruído por questões de natureza
política ou religiosa, inclusive é um direito imprescindível para que o desenvolvimento
humano justamente por trazer no seu seio o ideal de não impedimento do afloramento
de ideias, argumentos, pensamentos, como também de garantir que ninguém seja
privado de se dirigir ou adentrar determinado lugar por motivos não abarcados pela lei,
sendo esta ultima característica o núcleo desta explanação.
Diante da prerrogativa de que ninguém será impedido de ir e vir, adentrar ou se
retirar de determinada localidade, essencial à natureza humana como já demonstrada
anteriormente, é que a Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe que:

Artigo III – Toda pessoa tem direito à vida, a liberdade e a segurança pessoal.
Artigo XIII
1. Toda pessoa tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das
fronteiras de cada Estado.
2. Toda pessoa tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a
ele regressar.

Em total consonância com o contido na aludida Declaração, a Convenção


Europeia dispõe, em seu art. 5º, que a liberdade é direito de qualquer pessoa, não sendo
passível sua privação de modo arbitrário e contrário às determinações da própria
Convenção.
Contudo, tais disposições expressas não foram levadas em consideração por
grande parte dos governos dos países cujas fronteiras ou portos nos quais os refugiados
do conflito sírio estão se destinando, muito pelo contrário, vários foram os que
68

determinaram o fechamento de suas fronteiras97, como foi o caso da Sérvia e da


Croácia, impedindo não só o direito de ir e vir, como também violando expressamente
normativas contidas na Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados (1951)98, senão
vejamos:

Art. 21. No que concerne ao alojamento, os Estados Contratantes darão, na


medida em que esta questão seja regulada por leis ou regulamentos ou seja
submetida ao controle das autoridades públicas, aos refugiados que residam
regularmente no seu território, tratamento tão favorável quanto possível
e, em todo caso, tratamento não menos favorável do que o que é dado,
nas mesmas circunstâncias, aos estrangeiros em geral. [grifo nosso].

Art. 26. Cada Estado Contratante dará aos refugiados que se encontrem
no seu território o direito de nele escolher o local de sua residência e de
nele circular, livremente, com as reservas instituídas pela regulamentação
aplicável aos estrangeiros em geral nas mesmas circunstâncias. [grifo nosso].

Ora, se tais países estão vinculados não só aos instrumentos internacionais de


proteção aos direitos humanos citados anteriormente, como também às obrigações
derivadas da própria Convenção de Genebra de 1951 acerca da questão dos refugiados,
deveriam proceder com uma série de medidas que visem dar melhor assistência e
garantias às pessoas que se encontram nesta situação, e não, arbitrariamente,
simplesmente fechar a fronteira para evitar que mais, frise-se, seres humanos que estão
fugindo de uma situação de penúria extrema e perigo iminente, consigam transitar para
chegar aos seus destinos escolhidos, ou então naquelas nações residirem.
Assim, mais uma vez os países europeus se colocam numa situação de violação
plena e expressa, tão amplamente veiculada pelos meios de comunicação, aos tratados
internacionais que tão solenemente celebraram outrora, os quais parecem que
atualmente sequer possuem validade diante das políticas e medidas governamentais que
acabam por rechaçar ainda mais os refugiados que buscam no continente uma
oportunidade para melhorar de vida e fugir dos horrores do conflito que perdura há
quase meia década.

6.4 DIREITO À IGUALIDADE E OS IMPACTOS DOS ATENTADOS


TERRORISTAS À PARIS

97
British Broadcasting Corporation. Após fechamento de fronteira, refugiados enfrentam frio e mar de
lama em “Terra de Ninguém”. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/videos_e_fotos/2015/10/151020_europa_refugiados_hb>. Acesso em:
31 out. 2016.
98
Sérvia e Croácia ratificaram a referida Convenção.
69

Trata-se de uma das máximas utilizadas nos tempos da Revolução Francesa que
eclodem até hoje em vários instrumentos internacionais que versam sobre a garantia de
direitos básicos, inerentes a própria natureza humana. O direito a igualdade é corolário
do direito à liberdade no sentido de que não há mais restrição desta última pelo motivo
de se pensar que os seres humanos não são todos iguais perante a sua natureza, ou seja,
tais instrumentos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, conferem a
igualdade acima de raça, cor, religião, sexualidade, nacionalidade, ou ideologia de
qualquer natureza.
Desta forma, os países signatários dos instrumentos, cujos dispositivos abaixo
fazem parte, se comprometeram internacionalmente a evitar e a punir severamente toda
e qualquer modalidade de discriminação por consequência de reconhecer a igualdade
entre os seres humanos, senão vejamos o que dispõe a Convenção Europeia de Direitos
Humanos a esse respeito:

Artigo 14. O gozo dos direitos e liberdades reconhecidos na presente


Convenção deve ser assegurado sem quaisquer distinções, tais como as
fundadas no sexo, raça, cor, língua, religião, opiniões políticas ou outras, a
origem nacional ou social, a pertença a uma minoria nacional, a riqueza, o
nascimento o qualquer outra situação. [grifo nosso].

Tendo em vista que a referida Convenção toma por base a Declaração Universal
de Direitos Humanos, mais uma vez encontra-se respaldado neste ultimo instrumento a
proteção ao direito a igualdade bem como a proibição de qualquer tipo de
discriminação, senão vejamos o que a aludida Declaração reza acerca desse ponto:

Artigo VI – Toda pessoa tem o direito de ser, em todos os lugares,


reconhecida como pessoa perante a lei. [grifo nosso].

Artigo VII – Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer
distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção
contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra
qualquer incitamento a tal discriminação. [grifo nosso].

Diferente do que acontece com o comportamento de membros do Conselho da


Europa frente aos outros direitos humanos explanados nos itens anteriores, o direito a
igualdade muitas vezes, e quase que diariamente, é rechaçado por diversos países
70

membros do bloco, situação essa que não poderia ser diferente com relação aos
refugiados. Ora, já é de notório conhecimento internacional que os casos de xenofobia e
racismo nos países que compõem o bloco econômico mais poderoso da atualidade
tendem somente a crescer, influenciados não só por tradicionalismos arcaicos e
descabidos, como também por organizações sociais de direita exacerbada, como é o
caso do neonazismo.
Mais especificamente com relação à crise humanitária na Síria, e o grande
conglomerado de refugiados que de lá rumaram para os países europeus, uma série de
movimentos e protestos eclodiram em algumas capitais e metrópoles europeias
cobrando do governo medidas austeras para evitar que mais refugiados sejam
incorporados nos países europeus, inclusive com mensagens extremamente xenofóbicas
e preconceituosas, como aconteceu na Alemanha99, um dos principais países procurados
pelos refugiados devido a sua econômica forte e em constante desenvolvimento, sendo
organizados pelo chamado “Movimento PEGIDA” principalmente na cidade de
Dresden.
Não obstante as violações expressas a Convenção Europeia e a Declaração
Universal de Direitos Humanos, tais movimentos e protestos sociais que visam inibir a
entrada de refugiados, hostilizando-os ainda mais, violam expressamente o art. 3º100
dispositivo da Convenção de Genebra sobre Refugiados101.
Ocorre que a atuação maciça do Estado Islàmico, principalmente em 2015,
acabou se tornando um catalisador para que tais movimentos de cunho xenofóbico
tomassem conta da Europa. Não obstante todas as dificuldades que os refugiados vêm
passando, para buscar uma reconstrução de suas vidas no continente europeu, mais uma
barreira acabam de ser imposta aos 13 de novembro de 2015, com uma série de
atentados terroristas praticados na capital francesa, deixando mais de 120 mortos e
pouco mais de 350 feridos102
Na manhã de sábado (14 de novembro), ainda quando não se sabia a autoria da
carnificina que entra para história da Comunidade Europeia, a maior desconfiança da

99
G1. Protesto contra refugiados na Alemanha deixa ferido. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/10/protesto-contra-refugiados-na-alemanha-deixa-ferido.html>
Acesso em: 31 out. 2016.
100
Artigo 3º. Os Estados Contratantes aplicarão as disposições desta Convenção aos refugiados sem
discriminação quanto à raça, à religação ou ao país de origem
101
Alemanha ratificou a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951.
102
CNN International. Paris massacre: At least 128 killed in gunfire and blasts, French officials say.
Disponível em: <http://edition.cnn.com/2015/11/13/world/paris-
shooting/index.html?iid=ob_lockedrail_topeditorial&iref=obnetwork>. Acesso em: 31 out. 2016.
71

população mundial se tornou realidade, com as fronteiras fechadas e com um país em


estado de alerta máximo de segurança, o grupo terrorista Estado Islâmico assumiu a
responsabilidade pelos ataques e expôs os motivos por ter atacado a capital francesa,
deixando o mundo boquiaberto.103
Diante da nota divulgada pelo grupo terrorista, todos os refugiados entraram em
pânico temendo novas represálias por parte dos governos europeus que, imbuídos pela
necessidade de segurança, dificultassem ainda mais a presença dos mesmos, mas o que
mais temem os refugiados é a onda de preconceito, aversão e discriminação que os
atentados intensificaram principalmente depois que as investigações demonstraram que
um dos terroristas, envolvido nos atentados à Paris, entrou, na França, como
refugiado.104
Inclusive, importa esclarecer que a ocorrência desta discriminação, denominada
“xenofobia” já se mostrou presente numa Paris enlutada pelos atentados, tendo em vista
que foram encontrados, em alguns pontos da capital francesa, uma série de cartazes com
ofensas aos muçulmanos, grupo este que compõem a maioria dos refugiados que se
dirigem a Europa. Diante disso, muitos refugiados muçulmanos iniciaram uma
campanha onde demonstraram seu repúdio aos atentados e pugnaram contra o estigma
religioso, visando que as pessoas tivessem o bom senso de entender que os atentados
são fruto de uma dissidência e não do islamismo em geral.105
Ora, em menos de 48 horas dos atentados, já restou perceptível que as
repercussões dos atentados à França assolaram a situação dos refugiados que já se
encontram dentro do território europeu, como também dos que para lá se dirigem, tendo
em vista que não só a França, como vários países ao redor da mesma fecharam as
fronteiras e intensificaram a atuação das polícias e exército, o que por sua vez impede e
obstrui o fluxo dos mesmos pela Europa.106
Assim sendo, restou claro que os ataques acabaram por intensificar os casos de
violação ao direito da igualdade, em face dos refugiados sírios, já explicitada

103
CNN International. Paris attacks: Suicide bomber identified; ISIS claims responsibility for 129 dead.
Disponível em: <http://edition.cnn.com/2015/11/14/world/paris-attacks/index.html>. Acesso em: 31 out.
2016.
104
CNN International. Paris attacks: Authorities hunt for a French national. Disponível em:
<http://edition.cnn.com/2015/11/15/world/paris-attacks/index.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
105
Fantástico. Líderes religiosos e celebridades condenam ataques a Paris. Disponível em:
<http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2015/11/lideres-religiosos-e-celebridades-condenam-ataques-
paris.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
106
British Broadcasting Corporation. Paris attacks: Impact on border and refugee policy. Disponível em:
<http://www.bbc.com/news/world-europe-34826438> Acesso em 01 nov. 2016.
72

anteriormente, o que os líderes europeus e os próprios refugiados, junto com entidades


internacionais ligadas aos direitos humanos e a questão dos refugiados, buscam evitar
para que os refugiados não sejam submetidos a um tratamento de maneira diferenciada
motivada pela lógica errônea de que “todo refugiado é um grande suspeito a terrorista”.
Por fim, importa salientar que diante deste temor, a violação ao direito da
dignidade humana, bem como o da integridade física também pode sofrer
intensificação, diante da alta discricionariedade que foi conferida aos órgãos de controle
social, como polícia, e ao exercito que visa monitorar o comportamento da população e
das fronteiras, garantindo terreno fértil para que os refugiados sejam submetidos a uma
situação ainda mais degradante, já havendo relatos de tratamento brutal aos mesmos107.

107
Globo News. Bulgária acusada de tratar refugiados com brutalidade. Disponível em:
http://g1.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/videos/v/bulgaria-e-acusada-de-tratar-refugiados-
com-brutalidade/4605877/. Acesso em: 01 nov. 2016.
73

7 MEDIDAS RESOLUTIVAS

7.1 POLÍTICAS: O PAPEL DOS CHEFES DE ESTADO

Não é para menos que diante de um quadro tão grave, com uma circulação de
pessoas desenfreada, que os governos europeus tentam a qualquer custo buscar uma
solução emergencial de natureza cautelar para evitar que a situação da crise humanitária
que assola os pilares da Europa fique ainda mais grave e acabe por revelar não só mais
violações a direitos humanos, como também demonstre a total ineficácia e despreparo
daqueles que figuram como os maiores líderes mundiais.
Após a situação assumir nível emergencial, com a quantidade enorme de pessoas
optando pela rota do Mediterrâneo, além da utilização da rota Ártica, alguns premiers
europeus se reuniram108 em Luxemburgo para discutir os rumos que a União Europeia
tomaria para evitar que a crise humanitária na Síria continuasse a ceifar mais vidas dos
refugiados, bem como causar dissídios com os nacionais europeus. Inclusive, vale
salientar que a ONU já havia se pronunciado duramente acerca das medidas pouco
eficientes que a União Europeia vem tomando com relação às diversas pessoas que se
aventuraram pelas rotas de fuga, senão vejamos o depoimento do chefe de Direitos
Humanos, Zeid Ra'ad Al Hussein:

“União Europeia deveria buscar uma aproximação mais sofisticada, mais


corajosa e menos insensível. A Europa está dando as costas para alguns dos
migrantes mais vulneráveis no mundo e arrisca tornar o mediterrâneo um
grande cemitério".

Além da ONU, várias organizações internacionais relacionadas, como o Human


Rights Watch (HRW), Cruz Vermelha, Anistia Internacional e Organização
Internacional para Migração, esta última visando auxiliar os mecanismos de controle
das rotas de fuga, bem como apresentando relatórios diários acerca da situação dos
refugiados na Europa, corroboram com as declarações da ONU, tendo inclusive criado
estratégias para tentar amenizar a crise humanitária109, além de contribuir com a

108
G1. Comissão Europeia define planos para aliviar a crise de imigrantes. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/04/comissao-europeia-apresenta-plano-para-aliviar-crise-de-
imigrantes.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
109
EBC Brasil. Anistia Internacional divulga plano para combater a crise de refugiados. Disponível em: <
http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2015-10/anistia-internacional-divulga-plano-para-
combater-crise-de-refugiados>. Acesso em: 01 nov. 2016.
74

divulgação do meio para angariar doações controladas pelo Alto Comissariado da ONU
sobre Refugiados.
De fato, as várias reuniões empreitadas pelas lideranças europeias dos países
mais procurados pelos refugiados gerou a criação de algumas medidas a serem seguidas
pela União Europeia para que novos episódios não venham a acontecer, dificultando
ainda mais a situação já crítica, e piorando a visibilidade do bloco econômico perante a
Comunidade Internacional que já vê com maus olhos a falta de atitude eficaz do bloco.
Assim, faz-se necessário expor os pontos cruciais do chamado “Plano de Emergência”:

1 - Reforçar as operações de controle e salvamento - chamadas Triton e


Poseidon - implementadas pela Frontex, a agência europeia de controle das
fronteiras, aumentando os seus recursos financeiros e materiais. O seu
âmbito, atualmente restrito às águas territoriais dos países da UE, deverá ser
aumentado.
2 - Apreensão e destruição de embarcações utilizadas para transportar os
migrantes, à imagem da Operação Atalanta contra a pirataria na costa da
Somália.
3 - O reforço da cooperação entre as organizações Europol, Frontex, EASO e
Eurojust para reunir informações sobre o modo como operam dos traficantes.
4 - Implantação de equipes do Gabinete Europeu de Apoio ao Asilo (EASO)
na Itália e na Grécia para ajudar com a gestão dos pedidos de asilo.
5 - Registro sistemático das impressões digitais de todos os migrantes logo
após sua chegada em território dos Estados membros.
6 - Revisão das opções para uma distribuição mais equitativa dos refugiados
entre os Estados membros da UE.
7 - Programa de reinstalação nos países da UE de pessoas que receberam o
status de refugiado junto o Acnur. Os Estados membros são convidados a
participar deste programa de forma voluntária. Não há números citados na
proposta. Mas de acordo com a Comissão, a expectativa é que beneficie
5.000 pessoas.
8 - Programa para deportação rápida dos candidatos à imigração não
autorizados a permanecer na UE. Ele será coordenado pela Frontex, com os
Estados membros na linha da frente para chegadas no Mediterrâneo.
9 - Ação com os países vizinhos da Líbia para bloquear as rotas utilizadas
pelos migrantes. Por exemplo, o Níger é um país de trânsito e onde a
presença europeia será reforçada.
10 - O envio de oficiais da imigração para as delegações da UE em um
número de países terceiros. Eles serão responsáveis por recolher informações
sobre os fluxos migratórios.

Apesar de parecer que os líderes estão chegando a um consenso acerca das


melhores medidas a serem tomadas com urgência para conter a crise, alguns pontos
ainda restam controvertidos, entre eles a distribuição dos refugiados entre os países da
europeus, tendo em vista que já foi confirmado que a maioria deles buscaram nos
últimos meses a Alemanha, por sua economia forte, a Itália, devido a facilidade de
acesso pelo Mediterrâneo, além dos países do Leste Europeu, como Croácia, Sérvia e
Macedônia, devido a rota de fuga via Turquia.
75

O núcleo da controvérsia reside no fato de que são nesses países em que os


refugiados estão se concentrando no momento que eclodem as revoltas sociais acerca
dos pronunciamentos de seus lideres, muitas vezes em prol dos refugiados, o que gera
insegurança para população local que vê nos refugiados concorrência ferrenha para o
mercado de trabalho, pois representam mão-de-obra barata, além da instabilidade que
causam nos países que, em decorrência da Convenção Relativa ao Estatuto dos
Refugiados (1951) não podem simplesmente expulsá-los do território nacional, pois
estariam violando o constante no item 1 do art. 32.110
Diante disso, criou-se uma intensa discussão entre os lideres da União Europeia,
encabeçada pela chanceler alemã Ângela Merkel, sobre a necessidade de elaboração de
uma estratégia eficiente que vise distribuir os refugiados111 entre os países do bloco
econômico para que estes não causem encargos à apenas uma nação, bem como cuja
distribuição aliviaria os pontos de concentração desafogando capitais e centros urbanos
que não dispõem de infraestrutura suficiente para dar assistência aos refugiados,
restando claro que as medidas resolutivas, apesar de muito bem planejadas, ainda
carecem de uma certa efetividade prática, devendo ser sempre revistas devido a
volatilidade da situação.

7.2 JUDICIAIS: O PAPEL DO SEDH NA RESOLUÇÃO DA CRISE


HUMANITÁRIA

Não subsistem dúvidas quanto às violações de direitos humanos perpetradas


pelos Estados europeus contra os refugiados, os quais, como demonstrado
anteriormente, têm a seu favor uma gama de dispositivos constante em tratados
internacionais, inclusive no núcleo normativo do Sistema Regional Europeu:
Convenção Europeia de Direitos Humanos.
Tendo em vista a necessidade de esgotar os recursos internos para acionar a
Corte Europeia, os refugiados podem se dirigir, inicialmente, às entidades
internacionais, como ACNUR, HRW, OIM (Organização Internacional de Migração),
entre outras, denunciando as práticas abusivas contra eles empreendias por estarem em
situação de refugiados, ou até mesmo violações aos seus direitos e garantias básicos.

110
Artigo 32 – Expulsão. 1. Os Estados Contratantes não expulsarão um refugiado que se encontre
regularmente no seu território senão por motivos de segurança nacional ou de ordem pública.
111
Zero Hora. Distribuição de refugiados entre os Estados-membro da União Europeia. Disponível em: <
http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/09/distribuicao-de-refugiados-nos-estados-membros-da-
ue-4853761.html>. Acesso em 01 nov. 2016.
76

Tais organismos, atuando com seus métodos específicos, podem chegar a ajuizar
ações perante as Cortes nacionais do Estado violador buscando reparação dos danos
causados por ele aos refugiados que representam. Nestes casos, se a jurisdição interna
não for suficiente, podem os refugiados, auxiliados por tais órgãos, ajuizar denúncias
perante a Corte de Estrasburgo objetivando a responsabilização internacional de um
membro do Conselho da Europa.
Como já demonstrado na análise do caso Hirsi Jamma e outros vs. Itália, a Corte
EDH possui entendimento consolidado acerca das práticas estatais de seus membros
quanto a violação de direitos dos refugiados, fato é que a mesma reconheceu a
supremacia da CEDH e da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados ao acordo
bilateral entre Itália e Líbia. Ademais, a Casa de Justiça também reconheceu violação
clara ao princípio do non-refoulement e de outras garantias básica asseguradas aos
refugiados, assegurando seu papel jurisdicional na proteção aos direitos humanos.
Sem falar que nos casos ajuizados perante a Corte de Estrasburgo, é admissível a
atuação de organismos internacionais de direitos humanos ligados as causas defendidas
pelos denunciantes, na condição de amicus curiae, fato é que o HRW e ACNUR
atuaram como tal no caso supramencionado, contribuindo consideravelmente para que o
pedido das vítimas tivesse procedência in totum, o que expressa reconhecimento da
necessidade de auxílio na parte instrutória por parte dos denunciantes, os quais muitas
vezes não tem acesso facilitado à determinadas provas.
Não obstante a isso, a atuação do Comitê de Ministros em averiguar a execução
da sentença por parte do Estado condenado reflete a preocupação que o SEDH tem com
a plena efetivação de suas sentenças, muitas vezes ligadas ao pagamento de indenização
pecuniária à título reparatório, como forma de demonstrar aos Estados membros que a
proteção internacional aos direitos humanos por eles assumida é de natureza obrigatória
objetiva. Importante esclarecer, também, que o SEDH possui métodos punitivos à
descumprimentos de suas sentenças bem eficientes, como a suspensão ou expulsão de
Estados do Conselho da Europa, plenamente disposta no texto da CEDH.
Assim sendo, o SEDH, principalmente após o reconhecimento da capacidade
postulatória do indivíduo vítima de violação de direitos humanos por parte de um
Estado membro, aliado a possibilidade de intervenção de organismos internacionais de
direitos humanos, ou não, como amicus curiae durante a instrução processual, se
demonstra como meio efetivo para resolução de casos envolvendo violação à direitos
77

humanos apresentados à Corte de Estrasburgo, logo torna-se uma eficiente ferramenta


para minimização dos efeitos da crise humanitária.
78

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mediante o exposto, percebe-se que a crise humanitária ocasionada pela chegada


descontrolada de um contingente sem precedentes de refugiados vindos do conflito sírio
está longe de ser resolvida, tendo em vista que ainda falta por parte dos governos
europeus uma solução mais eficaz para evitar que episódios como o do menino Aylan
Kurdi ou do caminhão lotado de corpos de refugiados, já mostrados anteriormente,
tornem a acontecer, como também permitam novos episódios horrendos de total
negligência do ser humano, é situação das fronteiras fechadas, ou dos protestos
empreitados por alguns movimentos nos países europeus.
Como bem demonstrado neste artigo, apesar da Comunidade Europeia estar num
elevado grau de evolução e desenvolvimento jurisdicional, materializado no Sistema
Regional Europeu de Direitos Humanos, a realidade mostrada pela mídia internacional
revela o outro lado dos países que compõem o mais potente bloco econômico do
planeta, no qual a falta de infraestrutura, a ausência de respeito para com o próximo,
além de várias outras atitudes egoístas enraizadas nos costumes de alguns Estados-
membros intensificam os casos de violação aos direitos e garantias fundamentais dos
refugiados, como bem explicitado anteriormente, o que se mostra mais forte do que a
própria atuação do Sistema Europeu na proteção dos direitos humanos.
Por fim, importante salientar que a atuação das entidades internacionais, sejam
elas de natureza filantrópica, como o “Médicos Sem Fronteiras” ou relacionadas à
própria condição dos refugiados, como é o caso do ACNUR, são de extrema
importância no combate a essas violações motivadas pelos sentimentos e motivos
citados anteriormente. Cabe a tais entidades preservar e resguardar os direitos básicos
dos refugiados e representá-los, defendendo os interesses destes, perante as autoridades
europeias competentes para evitar que novas barbaridades venham a acontecer nesta
crise que se mostra longe de ser resolvida.
79

REFERÊNCIAS

2014 Global Trends Report. Disponível em: <


http://www.unhcr.org/statistics/country/556725e69/unhcr-global-trends-2014.html>.
Acesso em: 18 out. 2016.
2015 Global Trends Report. Disponível em: < http://www.unhcr.org/576408cd7.pdf>
Acesso em: 18 out. 2016.
ACNUR Quais os direitos de um refugiado. Disponível em:
<http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/perguntas-e-respostas/>. Acesso
em: 10 out. 2016.
ACNUR. A missão do ACNUR. Disponível em: <
http://www.acnur.org/portugues/informacao-geral/a-missao-do-acnur/>. Acesso em: 16
out. 2016.
ACNUR. As famílias refugiadas precisam da sua ajuda agora. Disponível em: <
https://doar.acnur.org/acnur/donate.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
ACNUR. Breve histórico do ACNUR: Agência da ONU para Refugiados. Disponível
em: < http://www.acnur.org/portugues/informacao-geral/breve-historico-do-acnur/>.
Acesso em: 16 out. 2016.
ACNUR. Informação Geral. Disponível em: <
http://www.acnur.org/portugues/informacao-geral/>. Acesso em: 16 out. 2016.
ACNUR. Manual de Procedimentos e Critérios para Determinação da Condição de
Refugiado. Disponível em: <
http://www.acnur.org/fileadmin/scripts/doc.php?file=fileadmin/Documentos/portugues/
Publicacoes/2013/Manual_de_procedimentos_e_criterios_para_a_determinacao_da_con
dicao_de_refugiado>. Acesso em: 16 out. 2016.
ACNUR. Quem ajudamos?. Disponível em: < http://www.acnur.org/portugues/quem-
ajudamos/>. Acesso em: 16 out. 2016.
ACNUR: Agência da ONU para Refugiados. Disponível em: <
http://www.acnur.org/portugues/o-acnur/>. Acesso em: 16 out. 2016

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro,
Campus, 1992. p. 25-47.

British Broadcasting Corporation. Acordo entre Rússia e EUA prevê destruição de


arsenal químico sírio. Disponível em: <
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/09/130914_siria_arsenalquimico_dg>.
Acesso em: 17 out. 2016.
British Broadcasting Corporation. Após fechamento de fronteira, refugiados enfrentam
frio e mar de lama em “Terra de Ninguém”. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/videos_e_fotos/2015/10/151020_europa_refugiados_
hb>. Acesso em: 31 out. 2016.
80

British Broadcasting Corporation. Como os brasileiros podem ajudar os refugiados


sírios. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150904_sirios_brasil_ajuda_rm>.
Acesso em: 19 out. 2016.
British Broadcasting Corporation. Oito capítulos para entender a crise na Síria, que
dura mais de quatro anos. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151012_crise_siria_entenda_rb.>.
Acesso em: 16 out. 2016.
British Broadcasting Corporation. ONU vê base para paz na Síria após fracasso de
negociações. Disponível em: <
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/01/140131_siria_conferencia_pai>.
Acesso em: 17 out. 2016.
British Broadcasting Corporation. Paris attacks: Impact on border and refugee policy.
Disponível em: <http://www.bbc.com/news/world-europe-34826438> Acesso em 01
nov. 2016.
British Broadcasting Corporation. Prostituídas e exploradas: a dura realidade das
crianças imigrantes abandonadas na Europa. Disponível em: <
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150921_criancas_refugiadas_rm.shtm
l>. Acesso em: 31 out. 2016.
British Broadcasting Corporation. Refugiados na Europa: a crise em mapas e gráficos.
Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150904_graficos_imigracao_europa
_rm>. Acesso em: 18 out. 2016.
Carta Capital. Na crise de refugiados a Alemanha abala a União Europeia. Disponível
em: http://www.cartacapital.com.br/internacional/ao-lidar-com-refugiados-alemanha-
abala-a-uniao-europeia-2547.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
Carta Capital. Perguntas e respostas: crise imigratória na Europa. Disponível em:
<http://www.cartacapital.com.br/internacional/perguntas-e-respostas-crise-imigratoria-
na-europa-9337.html>. Acesso em: 19 out. 2016.
CLARO, Carolina Batista de Abreu. O caso Hirsi Jamaa e outros vs. Itália e a
responsabilidade estatal no tratamento de estrangeiros. Revista de Estudos
Internacionais, João Pessoa, v.1, n.2, p. 167-168. 2010. Disponível em:
<http://www.revistadeestudosinternacionais.com/uepb/index.php/rei/article/view/31/pdf
>. Acesso em: 31 out. 2016.
CNN International. Paris attacks: Authorities hunt for a French national. Disponível
em: <http://edition.cnn.com/2015/11/15/world/paris-attacks/index.html>. Acesso em:
01 nov. 2016.
CNN International. Paris attacks: Suicide bomber identified; ISIS claims responsibility
for 129 dead. Disponível em: <http://edition.cnn.com/2015/11/14/world/paris-
attacks/index.html>. Acesso em: 31 out. 2016.
CNN International. Paris massacre: At least 128 killed in gunfire and blasts, French
officials say. Disponível em: <http://edition.cnn.com/2015/11/13/world/paris-
81

shooting/index.html?iid=ob_lockedrail_topeditorial&iref=obnetwork>. Acesso em: 31


out. 2016.
Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar. 1982. Disponível em:
<https://www.egn.mar.mil.br/arquivos/cursos/csup/CNUDM.pdf> Acesso em: 31 out.
2016.
Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados. 28 jul. 1951. Disponível em:
<http://www.acnur.org/t3/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_a
o_Estatuto_dos_Refugiados.pdf>. Acesso em: 16 out. 2016
Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948. Disponível em: <
http://www.dudh.org.br/wp-content/uploads/2014/12/dudh.pdf>. Acesso em: 31 out
2016.
Deustche Welle. Refugiados na Sérvia enfrentam situações sub-humanas. Disponível
em: < http://www.dw.com/pt/refugiados-na-s%C3%A9rvia-enfrentam-
condi%C3%A7%C3%B5es-sub-humanas/a-18808608>. Acesso em 31 out 2016.
EBC Brasil. Anistia Internacional divulga plano para combater a crise de refugiados.
Disponível em: < http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2015-10/anistia-
internacional-divulga-plano-para-combater-crise-de-refugiados>. Acesso em: 01 nov.
2016.
European Court of Human Rights. Grand Chamber – Case “Hirsi Jamma and others
vs. Italy – Judgement. Disponível em: < http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["001-
109231"]}> Acesso em: 31 out. 2016.
European Court of Human Rights. Press Release - Forthcoming Grand Chamber
judgment in the case of Hirsi Jamaa and Others v. Italy 23.02.2012. Disponível em: <
http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["003-3847021-4421058"]}> Acesso em: 31
out. 2016.

European Court of Human Rights. Case HIRSI JAMMA AND OTHERS V. ITALY.
Disponível em: < http://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001-109231#{"itemid":["001-
109231"]}> Acesso em: 31 out. 2016
European Court of Human Rights. Execution of the judgment of the European Court of
Human Rights: Case “Hirsi Jamaa and others vs. Italy. Disponível em:
<http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["001-167228"]}> Acesso em: 31 out. 2016.
European Court of Human Rights. Information Note on the Court’s case-law No. 149.
Disponível em: < http://hudoc.echr.coe.int/eng#{"itemid":["002-102"]}> Acesso em: 31
out. 2016.
Estatísticas. ACNUR. Disponível em: <
http://www.acnur.org/portugues/recursos/estatisticas/> Acesso em: 18 out. 2016.
Fantástico. Líderes religiosos e celebridades condenam ataques a Paris. Disponível em:
<http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2015/11/lideres-religiosos-e-celebridades-
condenam-ataques-paris.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
82

G1. Oposição fala em 1.300 mortos; Síria nega uso de armas químicas. Disponível em:
<http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2013/08/oposicao-fala-em-1300-mortos-
siria-nega-uso-de-armas-quimicas.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
G1. Al-Qaeda desautoriza grupo terrorista que atua na Guerra da Síria. Disponível em:
<http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/02/al-qaeda-desautoriza-grupo-jihadista-
que-atual-na-guerra-civil-da-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
G1. Comissão Europeia define planos para aliviar a crise de imigrantes. Disponível em:
<http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/04/comissao-europeia-apresenta-plano-para-
aliviar-crise-de-imigrantes.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
G1. Dezenas de corpos com tiro na cabeça são achados na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2013/01/dezenas-de-corpos-com-tiros-na-
cabeca-sao-achados-na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
G1. Entenda a arriscada travessia de imigrantes no mediterrâneo. Disponível em:
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/04/entenda-arriscada-travessia-de-imigrantes-
no-mediterraneo.html >Acesso em: 19 out. 2016.
G1. Entenda a disputa de potências por trás da Guerra Civil na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/entenda-disputa-entre-potencias-por-
tras-da-guerra-civil-na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
G1. Entenda a disputa de potências por trás da Guerra na Síria. Disponível em:
<http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/entenda-disputa-entre-potencias-por-
tras-da-guerra-civil-na-siria.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
G1. Entenda a guerra civil da Síria. Disponível em: < http://g1.globo.com/revolta-
arabe/noticia/2013/08/entenda-guerra-civil-da-siria.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
G1. Foto chocante de menino morto vira revela crueldade de crise migratória.
Disponível em: < http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/09/foto-chocante-de-menino-
morto-vira-simbolo-da-crise-migratoria-europeia.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
G1. Negociações entre governo e oposição são suspensas na Síria. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/02/negociacoes-entre-governo-e-
oposicao-da-siria-sao-suspensas.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
G1. Número de corpos encontrados em caminhão na Áustria passa de 70, diz polícia.
Disponível em: < http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/08/n-de-corpos-em-
caminhao-achado-na-austria-passa-de-70-diz-policia.html>. Acesso em: 01 nov. 2016.
G1. ONU condena governo sírio por morte em Hula e pede investigação. Disponível
em: <http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2012/06/onu-condena-governo-sirio-
por-mortes-em-hula-e-pede-investigacao.html>. Acesso em: 16 out. 2016.
G1. Protesto contra refugiados na Alemanha deixa ferido. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/10/protesto-contra-refugiados-na-alemanha-
deixa-ferido.html> Acesso em: 31 out. 2016.
G1. Regime sírio não fará concessões na negociação de paz. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2014/01/regime-sirio-nao-fara-concessoes-na-
negociacao-de-paz-diz-ministro.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
83

G1. Síria aceita por arsenal químico sob controle internacional. Disponível em: <
http://g1.globo.com/mundo/siria/noticia/2013/09/siria-aceita-colocar-armas-quimicas-
sob-controle-internacional-diz-agencia.html>. Acesso em: 17 out. 2016.
Globo News. Bulgária acusada de tratar refugiados com brutalidade. Disponível em:
http://g1.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/videos/v/bulgaria-e-acusada-de-
tratar-refugiados-com-brutalidade/4605877/. Acesso em: 01 nov. 2016.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. Ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
Mundo Educação. Estado Islâmico. Disponível em:
<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/estado-islamico.html>. Acesso em:
18 out. 2016.
O Globo. Cinco pontos para entender o Estado Islâmico. Disponível em: <
http://infograficos.oglobo.globo.com/mundo/cinco-pontos-para-entender-o-grupo-
isis.html>. Acesso em: 18 out. 2016.
O’BOYLE, Michael. Reflections on the effectiveness of the European System for
Protection of Human Rights, In: ___ Anne F. Bayefsky (ed.), The UN Human Rights
Systems in the 21st. Century. The Hague-London-Boston Kluer Law International.
2000.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional. 6 Ed. São Paulo:
Saraiva, 2015.
Protocolo de 1967 Relativo ao Estatuto dos Refugiados. 31 jan. 1967. Disponível em: <
http://www.acnur.org/fileadmin/scripts/doc.php?file=fileadmin/Documentos/portugues/
BD_Legal/Instrumentos_Internacionais/Protocolo_de_1967>. Acesso em: 16 out. 2016
RAMOS, André Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos. 4. Ed. São
Paulo: Saraiva, 2015.
Rescue International. Support people in crisis. Disponível em: < https://donate.rescue-
uk.org/support-people-in-crisis>. Acesso em: 19 out. 2016.
Revista Época. Seis perguntas para entender a crise humanitária de refugiados na
Europa. Disponível em: <http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/09/seis-perguntas-
para-entender-crise-humanitaria-de-refugiados-na-europa.html>. Acesso em: 18 out.
2016.
Revista Super Interessante. O que o Estado Islâmico quer? Disponível em:
<http://super.abril.com.br/historia/o-que-o-estado-islamico-quer> Acesso em: 18 out.
2016.
Revista Super Interessante. Sete coisas que você precisa saber sobre o Estado Islâmico.
Disponível em: < http://super.abril.com.br/blogs/superlistas/7-coisas-que-voce-precisa-
entender-sobre-o-estado-islamico/> Acesso em: 18 out. 2016.
Save the Children. Child Refugee Crisis Appeal. Disponível em: <
http://www.savethechildren.org.uk/about-us/emergencies/child-refugee-crisis-appeal>.
Acesso em: 19 out. 2016.
84

Terra Notícias. ONU: Governo e Rebeldes cometeram crimes de guerra na Síria.


Disponível em: <https://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/onu-governo-e-
rebeldes-cometeram-crimes-de-guerra-na-
siria,0badec09b57da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso em: 17 out.
2016.
UNICEF. Ajude as crianças da Síria. Disponível em: <
https://secure.unicef.org.br/Default.aspx?origem=siria>. Acesso em: 19 out. 2016.
United Nations. General Assembly Resolutions 32nd. Session. Disponível em: <
http://www.un.org/documents/ga/res/32/ares32r127.pdf> Acesso em: 30 out. 2016.
UNRIC. Aprovada por unanimidade, resolução do Conselho de Segurança exige acesso
a ajuda humanitária na Síria. Disponível em: <
http://www.unric.org/pt/actualidade/31400-aprovada-por-unanimidade-resolucao-do-
conselho-de-seguranca-exige-acesso-a-ajuda-humanitaria-na-siria->. Acesso em: 17 out.
2016.
UOL Notícias. Estado Islâmico divulga vídeo de execução de cristãos egípcios.
Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2015/02/15/ei-divulga-
video-de-execucao-de-cristaos-egipcios.htm>. Acesso em: 17 out. 2016.
Zero Hora. Distribuição de refugiados entre os Estados-membros da União Europeia.
Disponível em: < http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/09/distribuicao-de-
refugiados-nos-estados-membros-da-ue-4853761.html>. Acesso em 01 nov. 2016.

Potrebbero piacerti anche