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R E L A T Ó R I O T É C N I C O 12

FUNDO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE


MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE
GOVERNO DO ESTADO RIO GRANDE DO SUL
SECRETARIA DO TRABALHO, CIDADANIA E AÇÃO SOCIAL
CONSELHO ESTADUAL DOS POVOS INDÍGENAS
SECRETARIA DO PLANEJAMENTO

DESENVOLVIMENTO ETNO-SUSTENTÁVEL DOS POVOS KAINGANG E GUARANI NO


SUL DO BRASIL

TERRA INDÍGENA DE CACIQUE DOBLE

INTRODUÇÃO
Território, cosmovisão e cultura Kaingang no
Planalto Meridional

Ilustração do mito da origem. Desenho de Jorge Hermann, Orientação técnica, Rualdo Menegat.

Rualdo Menegat
Professor IG/UFRGS

PORTO ALEGRE, DEZEMBRO DE 2002


T E R R A I N D Í G E N A D E L I G E I R O 13

1. INTRODUÇÃO: TERRITÓRIO, COSMOVISÃO E CULTURA


KAINGANG NO PLANALTO MERIDIONAL

1.1. CONHECIMENTO E DIÁLOGO INTERCULTURAL


Nenhuma história pode ser mais interessante do que aquela que desvenda o lugar da humanidade
no mundo. É quando se descobre que cada cultura em qualquer tempo está enraizada num
determinado ecossistema onde homens e mulheres travam seu esforço diário para sobreviver. É
quando se descortina não uma civilização, mas tantas quantas são as possibilidades da
humanidade viver na diversidade de ecossistemas do planeta Terra.
A história humana quando desliza sobre a paisagem que nos cerca é diferente daquela narrada
pela história oficial. Nela descobrimos virtuosismo e epopéia nas atividades humanas para além
de vilões e príncipes. Nela procuramos entender como a humanidade pode ocupar um
ecossistema e desenhar sua cultura. Tecer seus costumes testando cada elemento da paisagem e
extraindo coisas dela sem, no entanto, desestruturá-la. Entender profundamente o mundo ao seu
redor e como foi possível transformar esse saber numa ordem universal das coisas.
É somente quando consideramos as mais de 2.000 etnias indígenas que viviam no Brasil antes do
descobrimento, que podemos ter uma tênue idéia da capacidade humana de construir culturas
encravadas na diversidade paisagística desse território continental. Há apenas pouco tempo a
cultura ocidental passou a considerar o esforço humano de viver nas florestas o resultado de uma
cultura e não o “estado selvagem do homem”. Quantas culturas foram perdidas? E perdidas não
porque foram culturas que fracassaram diante do desafio de conhecer e sobreviver no
ecossistema em que se desenvolviam, mas porque foram destruídas por outros que a
consideravam selvagem?
A cultura Kaingáng é sobrevivente. Ainda é portadora da riqueza cultural ímpar daqueles que
durante milhares de anos se estabeleceram no vasto ecossistema do Planalto Meridional, coberto
por matas de araucária, matas mistas e campos. Daqueles que aprenderam por si a construir casas
encravadas no subsolo tão ecologicamente sustentáveis que desafiam e desconcertam a suposta
supremacia dos brancos que vieram ocupar esse território. Daqueles que aprenderam por si a
reconhecer as leis da paisagem. Ao observar que no Planalto a maior parte dos rios corre sobre
rochas nuas, desde o bordo leste para o imenso interior no oeste. Daqueles que aprenderam a
resistir numa sociedade que mais do que marginalizá-los, procurou de todas as formas tirar-lhes
o essencial: seu território. Nele, suas raízes estão de tal sorte profundamente arraigadas que se
torna extremamente difícil separar o ecossistema deles mesmos. Poderíamos dizer que esse
ecossistema sem eles não passaria de uma terra estéril e inóspita. Que o fato de ter uma cultura
que se erigiu extremamente afeiçoada aos ventos e rios, aos pássaros e frutas, às plantas, solos e
rochas do Planalto Meridional faz dela uma cultura única no planeta Terra. Assim como é única
cada parcialidade Jê e Guarani. Assim como são únicos os Incas, os Maias, os Astecas, os Inuits,
os Chineses, os Malis, os Egípcios e tantos outros. Assim como são imprescindíveis para o
entendimento humano as culturas que conseguiram se estabelecer nas montanhas, nos desertos,
nas planícies aluviais, na tundra, no gelo.
Nesse trabalho, encontra-se um pouco do esforço de estabelecer um diálogo intercultural.
Esforço mútuo, dos Kaingang, Guarani e da cultura brasileira, para reconhecer as diferenças
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como forma de garantir a identidade indígena e, assim, dialogar sem submissão à cultura
dominante. Como forma de cultivar o respeito mútuo e, assim, incluir como relevante a
sabedoria milenar daqueles que se tornaram sinônimo do ecossistema em que vivem. Como
forma de entender a paisagem e a humanidade e construir o desenvolvimento etno-sustentável,
não apenas dos índios, mas de todos os que habitam as paisagens desta porção meridional da
América do Sul.

1.2. OBJETIVOS DO PROJETO


O presente Relatório Técnico contém os resultados do projeto Desenvolvimento etno-sustentável
dos povos Kaingang e Guarani no sul do Brasil: Terra Indígena de Cacique Doble, Município
de Cacique Doble, RS. O objetivo principal do projeto foi o de diagnosticar os sistemas
antropológico-cultural e natural da Terra Indígena de Cacique Doble (ver mapa de localização e
bloco-diagrama da região no final desta introdução) e elaborar, de forma participativa, as
diretrizes iniciais de um planejamento etno-sustentável para a comunidade indígena. Para tanto,
foram estabelecidos dois eixos estratégicos: (i) a articulação institucional e de financiamento,
capaz de dar suporte a (ii) um diagnóstico de novo tipo, promotor da integração das áreas de
conhecimento e de um profundo diálogo dos saberes técnico-científico com o indígena.
O primeiro eixo estratégico foi possível graças a uma parceira da instituição proponente-
executora, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, por meio das secretarias do Trabalho,
Cidadania e Assistência Social (STCAS) e de Coordenação e Planejamento (SCP), com o Fundo
Nacional do Meio Ambiente (FNMA), financiadores do projeto, a Prefeitura Municipal de
Charrua e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER). A partir desse núcleo,
cuja coordenação foi feita pelo Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI), foi possível
articular uma rede de apoios e parcerias formada pela Escola Estadual Indígena de Cacique
Doble, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
O segundo eixo, desenvolvido em termos de uma pesquisa de campo para efetuar o diagnóstico
dos sistemas antropológico-cultural e natural, considerou a articulação de sete áreas de
conhecimento e suas técnicas: história indígena, antropologia, geologia e paisagem, botânica,
fauna, agronomia e fotografia. A integração entre essas áreas ocorreu em seis momentos: (i)
seminários da equipe de pesquisa para planejar e detalhar os objetivos gerais e específicos, bem
como desenvolver uma estratégia metodológica, quando foram realizadas quatro sessões; (ii)
seminário da equipe de pesquisa com a comunidade indígena de Ligeiro no início dos trabalhos
de campo, onde houve a exposição dos objetivos gerais e específicos e da metodologia e dos
resultados esperados; (iii) durante os trabalhos de campo, onde houve a troca de dados, saídas
comuns e construção de modelos preliminares; (iv) durante os cursos de formação de agentes
ambientais indígenas, onde houve troca de informações e, mesmo, aulas comuns, como, por
exemplo, geologia e história; (v) seminário da equipe de pesquisa com a comunidade indígena de
Ligeiro no final dos trabalhos de campo, onde houve a exposição resultados do diagnóstico feito
em cada tema; (vi) oficinas temáticas e seminário de planejamento participativo.
Os objetivos específicos estabelecidos para cada equipe de pesquisa estão apontados na tabela
abaixo.
TABELA 1 – Tabela dos objetivos específicos de cada equipe de pesquisa.
OBJETIVO EQUIPE
1. Recuperar a história do grupo kaingang na Terra Indígena; História indígena
2. Analisar a organização social atual, formas de apropriação coletivas e
familiares dos recursos naturais, produção econômica e atividades Antropologia
culturais ainda existentes;
3. Elaborar mapas temáticos da geologia, geomorfologia e hidrografia; Geologia e paisagem
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4. Analisar a qualidade da água e determinar a origem das possíveis


contaminações existentes;
5. Elaborar mapas temáticos das classes de solos e identificar formas de
Agronomia
manejo agrícola;
6. Realizar inventário preliminar das espécies vegetais e mapa de uso do
Botânica
solo;
7. Realizar inventário preliminar das espécies animais; Fauna
8. Registrar a utilização dada pela comunidade indígena aos recursos
Todas equipes
naturais: formas de coleta e distribuição comunitária;
9. Diagnosticar as condições de saneamento básico, como esgotamento
Oficinas
sanitário e disposição de resíduos sólidos;
10. Elaborar Plano de desenvolvimento etno-sustentável participativo visando
o resgate do sistema de manejo próprio dos aborígenes, contribuindo para
a geração de renda, preservação dos recursos naturais, apropriação e Oficinas e Seminário
valorização das culturas Kaingang e Guarani pelos aldeões como um valor
inseparável de sua terra.
11. Formação de agentes etno-ambientais indígenas Cursos em todas as áreas

1.3. METODOLOGIA GERAL DO PROJETO


O processo de aculturação das comunidades indígenas, em particular na Terra Indígena de
Cacique Doble, tem sido um fator de desestruturação de suas atividades originais, perda da
cultura e da integridade etno-territorial. Para as gerações atuais, nem as raízes dos ancestrais,
nem a cultura no modo em que foi adquirida são suficientes para ler o mundo e ajudá-los na sua
sobrevivência digna. Assim, o propósito do projeto foi o de contribuir para que a comunidade
pudesse construir uma visão de seu território, incluindo a paisagem natural e a construída, num
embate permanente entre a leitura naturalista do mundo e a leitura das culturas indígenas
Kaingang e Guarani, para que, com base na síntese adquirida, tenham elementos para resgatar a
cultura original e serem os intérpretes de ambas.
A metodologia do projeto foi a de gerar conhecimento sobre a terra indígena de forma dialógica
com comunidade local para que, nesse processo, o saber produzido fosse utilizado como
parâmetro para resgatar e sistematizar a própria cultura tradicional. Isso foi possível na medida
em que (i) a pesquisa de campo, cursos e seminários contou com a participação da comunidade
indígena em todas as etapas; e (ii) a participação foi continuamente informada por um intenso
intercâmbio cultural nas diferentes áreas por meio de cursos que foram proferidos pelas equipes
de pesquisa para alunos e alunas Kaingang e Guarani que se voluntariaram a partir da divulgação
do projeto na comunidade.
Os cursos foram organizados para atender um programa de conteúdos teórico-práticos
específicos para a aplicação no diagnóstico científico-etno-cultural participativo. Esses cursos
foram oferecidos como extensão universitária em parceria com a Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, por meio da Pró-Reitoria de Extensão, tendo os alunos e alunas recebido um
certificado de conclusão.
Os cursos foram realizados na Escola Estadual Indígena Faustino Ferreira Doble, onde houve um
profundo envolvimento da comunidade escolar. Tanto professores indígenas como o alunado
dessa escola participaram dos cursos. Dessa forma, os conhecimentos acumulados, de ambas as
culturas, poderão ajudar na estruturação conteudística da Escola Indígena. Os métodos
educacionais da mesma poderão ser enriquecidos ao tornarem as experiências de ensino-
aprendizagem mais significativas na medida em que partem do conhecimento do lugar que os
indivíduos possuem e que eles mesmos podem construir no próprio processo de aprendizado.
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Além disso, os conhecimentos adquiridos permitiram refazer leituras dos costumes e culturas,
dos bens naturais e uso do solo, de sorte a agregar valores aos produtos locais e reconhecer
formas genuínas de geração de renda e gestão ambiental da aldeia. Esse reconhecimento das
possíveis formas de uso dos bens naturais e culturais pode vir a reforçar e recuperar valores
identitários étnico-territoriais e, com eles, ajudar no processo de sustentabilidade da aldeia.
Esse modelo que torna importante uma epistemologia do lugar foi adotado pelo Atlas Ambiental
de Porto Alegre1, que registrou o conhecimento territorial local feito com base na cosmovisão
dos naturalistas, mas com o uso das tecnologias atuais. Essa obra de referência apresenta um
roteiro temático que abrange desde a geosfera, a hidrosfera, a biosfera, a atmosfera até a
antroposfera para traçar a história natural de uma localidade. É essa história que possibilita o
entendimento de como a evolução da ocupação territorial da humanidade em um ecossistema
instrui essa cultura humana. Portanto, esse saber permite visualizar a caminhada da humanidade
em seu território, numa perspectiva espacial e temporal, para fins de entender e prognosticar
melhor não apenas a gestão social-ambiental, mas para estruturar sua cultura em termos de uma
etno-sustentabilidade.

1.4. METODOLOGIAS ESPECÍFICAS


Os trabalhos de campo de cada área de pesquisa foram realizados de forma integrada com os
cursos de formação de agentes ambientais indígenas. Foram estruturados em quatro etapas: (i)
introdução e trabalho de campo regional; (ii) trabalho de campo 1; (iii) trabalho de campo 2; (iv)
seminário de conclusão.
Na etapa de introdução e trabalho de campo regional foi organizado um seminário de três dias
com todos os participantes: equipe de coordenação geral do projeto, equipe de pesquisadores e
alunos indígenas. O programa desenvolvido abordou os seguintes itens: a) apresentação dos
objetivos gerais do projeto; b) apresentação das instituições participantes; c) exposição dos
aspectos infra-estruturais e cronograma; d) breve exposição temática dos contextos regionais e
objetivos de cada área de pesquisa; e) levantamento de transectos geológicos, geomorfológicos,
hidrográficos, pedológicos, florísticos e faunísticos regionais da área de estudo por parte dos
pesquisadores do sistema natural, e reconhecimento da aldeia por parte dos pesquisadores do
sistema cultural. O seminário foi realizado no salão comunitário e as refeições foram feitas no
refeitório da escola.
As etapas de trabalho de campo 1 e 2 foram feitas com até cinco dias cada uma, dependo da área
de estudo, sendo a primeira a partir do mês de maio e, a segunda, a partir do mês de agosto. Cada
área de pesquisa organizou um curso e fez o diagnóstico de campo juntamente com os alunos
participantes. A infra-estrutura de deslocamento em campo contou com viaturas do Governo do
Estado e, eventualmente, também por viaturas do Posto Indígena e do Instituto de Geociências
da UFRGS. A base logística de apoio das operações de campo e laboratórios de campo foram
sediados na Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental. As condições do trabalho de
campo foram, em geral, muito boas, com excelente apoio logístico garantido pelo governo do
Estado. Todavia, durante a etapa de campo 2, as fortes e continuadas intempéries inviabilizaram
a coleta de amostras de água para análise da contaminação. A coleta de água deveria ser feita em
período vazante e não teria leitura técnica se feita em período de enchente, como ocorreu. Além
disso, as intempéries adversas obrigaram a uma mudança de estratégia da forma de coleta de
dados para a fauna. Os detalhes metodológicos tanto dos cursos como das técnicas de
levantamento de dados de cada área de pesquisa estão respectivamente especificados em cada
capítulo.

1
MENEGAT, R., PORTO, M.L., CARRARO, C.C., FERNANDES, L.A.D. 1999. Atlas Ambiental de Porto
Alegre. Porto Alegre : EDUFRGS. 256 pp.
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O seminário de conclusão, onde houve a exposição dos resultados de cada equipe de pesquisa
para a comunidade e participantes dos cursos, foi realizado durante os dias 23 e 24 de setembro
no salão comunitário com a presença de representantes das instituições envolvidas. Cada área de
pesquisa apresentou os resultados finais, bem como foram anunciados os formandos de cada
turma de agentes ambientais. Em cada turma, houve oradores que expressaram o significado do
projeto e do evento sendo, alguns deles, pessoas de grande liderança e idosos que narraram a
história de sua gente. No final, grupos de alunos fizeram várias apresentações culturais num
evento deveras significativo e memorável.

1.5. PLANEJAMENTO PARTICIPATIVO


A construção do Plano de Desenvolvimento Etno-sustentável Participativo envolveu os alunos
capacitados nos cursos, os professores indígenas locais, técnicos do Estado e do município e
representantes da comunidade. Foi realizado em três etapas: (i) cursos de formação de agentes
ambientais e diagnóstico cultural-ambiental da Terra Indígena, como descrito no item 1.2. acima;
(ii) oficinas temáticas preparatórias do seminário final, onde foram abordados os temas de saúde
e meio ambiente, produção e venda de produtos tradicionais indígenas, direitos humanos e
direitos indígenas; (iii) seminário final para elaboração do plano.

1.6. APRESENTAÇÃO DO RELATÓRIO


Este relatório técnico está organizado em quatro seções:
I – Relatório gerencial de atividades, com o capítulo 2;
II – Sistema sócio-cultural, com os capítulos 3, 4 e 5;
III – Sistema natural, com os capítulos 6, 7, 8 e 9; e
IV – Elementos para o planejamento etno-sustentável, com os capítulos 10 e 11.

O capítulo 2, intitulado Relatório gerencial e de atividades, versa de forma pormenorizada e


circunstanciada sobre as ações do projeto. Nele, a coordenadora executiva, Maria da Glória
Lopes Kopp, da Secretaria da Coordenação e Planejamento, apresenta, além do cronograma do
projeto, as circunstâncias do desenvolvimento da complexa articulação institucional e logística
que, nesse caso, envolveu vários órgãos da administração pública dos três níveis – federal,
estadual e municipal – além de autarquias e outras instituições. Não bastasse essa complexidade
institucional, esse capítulo revela também como foi possível integrar vários objetivos num único
projeto: (a) formar agentes ambientais indígenas, (b) produzir um diagnóstico interdisciplinar
numa Terra Indígena que dialogasse com a comunidade local, (b) promover o diálogo das
instituições locais – escola, prefeitura, Emater, Posto da Funai, entre outros – com a comunidade
indígena e a de pesquisa, (c) construir um processo participativo na comunidade indígena para
que discutissem e elaborassem um plano estratégico de etno-sustentabilidade para a Terra
Indígena de Cacique Doble. As dificuldades em se desenvolver essas duas frentes do projeto
foram imensas, mas graças ao empenho e determinação da equipe envolvida, os resultados foram
apreciáveis, como se pode depreender na leitura desse capítulo.
No capítulo 3, intitulado História indígena, é apresentada pela professora Maria Cristina dos
Santos, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, os resultados do curso e da
pesquisa desenvolvida no período do projeto. A autora contextualiza a evolução histórica da
cultura Kaingang e seu território utilizando como fio condutor o tema “os indígenas no mapa”.
Fazendo uso de vários mapas em diversas escalas, desde a nacional até a da Terra Indígena, em
grande parte produzidos pelos alunos indígenas em sala de aula, é possível entender todo o
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problema do conflito territorial-cultural a que foram sendo submetidas as etnias Kaingang e


Guarani ao longo da história do Brasil. Mas, além disso, a autora narra a busca de estruturas de
sítios arqueológicos.
No capítulo 4 – Antropologia –, desenvolvido pelo professor José Otávio Catafesto de Souza e
pela acadêmica Daniele de Menezes Pires, do Núcleo de Antropologia das Sociedades Indígenas
e Tradicionais da UFRGS, pode-se encontrar um minucioso programa do curso de formação de
agentes antropológicos de etno-sustentabilidade bem como um texto sobre os condicionantes
estruturais e conjunturais da realidade interétnica da região em questão. A caracterização sócio-
cultural dos kaingang e guarani em Cacique Doble é minudente e típica de quem estudou com
afinco o tema durante vários anos. Longe de ter sido um curso centrado na teoria, o autor
demonstrou a importância dos agentes antropológicos indígenas em fazerem a recuperação
cultural das tradições e costumes de sua gente. Resultante disso, os alunos produziram várias
entrevistas gravadas em fitas e vídeos documentando três temas: saúde, artesanato e terra/resgate
cultural. Certamente esse capítulo é paradigmático de uma concepção ao mesmo tempo teórica e
prática da antropologia no sul do Brasil.
O capítulo 5 – Fotografia –, elaborado pelos fotógrafos Paulo Backes e Bárbara Aguiar, registra
o desenvolvimento de um interessante curso onde os alunos indígenas ao mesmo tempo em que
aprenderam a técnica básica da arte fotográfica, registraram em imagens os aspectos culturais e
ambientais da paisagem da sua terra. Assim, foi possível, segundo os autores, desmistificar a
técnica fotográfica, realizando a ponte entre o mundo real e o imagético. O resultado das
imagens pode ser encontrado no CD-ROM em anexo.
A Seção sobre o Sistema Natural inicia no capítulo 6, intitulado Geologia e Paisagem da Terrra
Indígena de Ligeiro, apresentado pelo professor Rualdo Menegat e geóloga Rosemeri Siviero, do
Instituto de Geociências da UFRGS. Nele, há a exposição do programa do curso que abordou
desde a evolução da Terra e da humanidade até as classes de rochas, minerais e formas da
paisagem. Os autores destacam a surpreendente capacidade dos alunos em lidarem com cartas
topográficas, sendo apresentados mapas feitos pelos mesmos onde foram reconhecidas as feições
geomorfológicas da Terra Indígena. Também há a referência de um painel feito pela turma em
sala de aula que resume as principais características da geologia e da paisagem. Esse painel foi
redimensionado pelos autores e encontra-se encartado em formato A3. Foram acrescentados
ilustrações em aquarela feitas pelo artista Jorge Hermann, bloco-diagramas e mapas. Além disso,
esse capítulo é acompanhado por uma vasta cartografia, onde se incluem mapas da geologia, do
meio físico, da hidrografia, das sub-bacias hidrográficas, da toponímia e, inclusive, uma carta
imagem da área. O diagnóstico encontra-se bem ilustrado, com pranchas de fotomicrografias das
rochas e fotografias dos afloramentos, feições morfológicas da superfície e rios. O trabalho
revela um intenso diálogo entre as cosmovisões dos Kaingang e Guarani e da Ciência em
respeito à paisagem e o planeta Terra. Uma prancha com ilustrações feitas por Jorge Hermann
sobre o mito da origem, sob orientação técnica dos autores, mostra um paralelo entre a
cosmovisão Kaingang e a visão científica da paisagem.
O capítulo 7, de autoria do eng. agrônomo Júlio Cezar Inácio, do Instituto Warã, versa sobre
Solos e suas aptidões e usos e trata da apresentação do curso de agronomia, seus conteúdos e
métodos. Além disso, apresenta os resultados do diagnóstico participativo, contendo a descrição
das unidades de solo e os mapas de solos e de uso dos solos, este, feito em parceria com Rogério
Both, que também atuou na equipe de botânica. Neste relatório, encontram-se relacionados os
sistemas de cultivo utilizados na área.
O capítulo 8 traz o relatório de Etno-botânica desenvolvido pela professora Maria Luiza Porto e
pelos biólogos Rodrigo Gastal Magalhães, Rumi Regina Kubo e Rogério Both. Nele está
apresentado o curso de formação de agentes ambientais em botânica bem como os resultados de
um interessante diagnóstico etno-botânico na forma de uma relação de espécies utilizadas pela
cultura Kaingang e Guarani por ambiente. Também foi diagnosticada uma relação de espécies
por tipo de uso. Durante a realização do curso, os alunos tiveram a oportunidade de aprender a
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organizar um herbário. O relato finaliza com um mapa de declividade e uma importante


discussão sobre a flora do Planalto Meridional.
O capítulo 9 apresenta os resultados do diagnóstico da Fauna feito pela professora Sandra Maria
Hartz e bióloga Maria de Fátima Maciel dos Santos. O capítulo inicia com o detalhamento do
curso onde estão incluídos os conteúdos e participantes. A seguir, destaca as metodologias
utilizadas para diagnóstico de campo e, posteriormente, relaciona os resultados. Por fim, discute
de forma mais abrangente a fauna do Planalto Meridional no Rio Grande do Sul.
O capítulo 10 relata as três Oficinas que antecederam o seminário final de planejamento. A
primeira oficina versou sobre legislação indigenista e foi relatada pela advogada Lucia Fernanda
Inácio Belfort e bacharel em direito Susana Andréa Inácio Belfort. A oficina seguinte abordou a
produção e venda dos produtos tradicionais indígenas e foi pela Geceli Vivan. Por fim, a oficina
sobre saúde e meio ambiente foi proferida pela agente de saúde Ângela Inácio, pela professora
do IG/UFRGS, Maria Lidia Vignol Lelarge, e pela geóloga Rosemeri Soares Siviero.
O capítulo 11 apresenta os resultados do seminário de planejamento. Ele é relatado pela diretora-
substituta do DDRU/SCP, Maria da Glória Kopp e pelo diretor de cidadania da STCAS, Mozar
Dietrich. Nesse capítulo, encontram-se as importantes proposições da comunidade nos mais
diferentes temas.

FIGURA 1 - Mapa de localização e bloco-diagrama da região da Terra Indígena de Cacique Doble feito
em aquarela por Jorge Hermann a partir de esquemas e orientação técnica de Rualdo
Menegat. (ver na próxima página).
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