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Independência e arte!

Quando se pensa sobre o Paleolítico, na História Pré-Literária, tem-se a impressão


equivocada de que vivia-se de maneira exclusivamente voltada à formas básicas de
sobrevivência. No entanto, uma observação mais cuidadosa percebe que a arte rupestre,
surgida nas paredes rochosas de cavernas antigas daquele momento, já sinalizava para uma
necessidade humana de expressão e de entendimento da própria subjetividade, seja ela bela
ou não. Esse fato notável, nascido em meio a novas técnicas de cocção e construção de
moradia, desenvolveu-se e refinou-se, ora alinhado aos paradigmas da sociedade, como a
homofobia explícita na marchinha de carnaval “Maria Sapatão”, ora imprescindivelmente
questionador do espírito do seu tempo, como o “Guernica”, de Picasso. Tais exemplos ilustram
que a arte não só aponta para aspectos sociais muitas vezes problemáticos, como, por isso,
ela deve gozar de liberdade para exercer um papel provocativo que instrui e esclarece.
De início, é importante entender que a ideia de liberdade por si só não é irrestrita. Como
qualquer atividade humana, a autonomia artística esbarra em princípios éticos característicos
do seu momento de produção, constituindo-se de acordo com a compreensão da sociedade
sobre o que inflige sofrimento, ou é ofensivo, por exemplo. Um caso bastante emblemático
referente a essa questão é o circo que, em sua trajetória, agrupou artistas saltimbancos e
animais. Ao longo do tempo, as suas peculiaridades, que envolviam a exposição de anomalias
genéticas com anões e a “mulher barbada” e o uso de animais treinados por vias de maus
tratos, passaram a ser severamente questionadas. Hoje, essas práticas foram banidas e a arte
circense precisou remodelar-se, o que mostra, em certo sentido, que as expressões artísticas
revelam valores que dialogam com o seu presente e, ao serem revisitados no terreno da
fruição, podem ser readequados a normas sociais mais apropriadas.
Contudo, nem sempre isso acontece facilmente, sobretudo quando a arte toca no
universo do gênero e da sexualidade. Esses conceitos, caros a uma moralidade patriarcal e
cristã hegemônica, são insistentemente enrijecidos e transformados em tabus. O “beijo gay”,
protagonista antigo de inúmeras polêmicas artísticas - filmes, novelas, livros -, talvez seja o
exemplo mais ilustrativo disso. Uma controvérsia recente referente a esse assunto aconteceu
na última bienal do livro no Rio de Janeiro, em que figurava em um HQ dos “Vingadores”, um
casal de rapazes se beijando. O prefeito Marcelo Crivella, conhecido pelo seu posicionamento
homofóbico, considerou a revista como pornografia e declarou a sua censura; todavia, o caso
repercutiu mal em parte da opinião pública, e teve como desfecho a venda de todos os
exemplares. Mesmo diante dessa modesta vitória, a sociedade ainda perpetua valores
preconceituosos em relação à comunidade LGBTQI; mas, se considerarmos que beijos
heterossexuais eram cortados do cinema no início do século XX, como mostra o sensível
“Cinema Paradiso”, compreenderemos o papel fundamental da arte não só para aprimorar o
autoconhecimento, como para a construção de uma sociedade mais justa.
Fica claro, portanto, que impor limites à arte seria esvaziá-la de sua essência: a de ser
um poderoso instrumento humano na busca pelo esclarecimento sobre a própria humanidade.
Como esse é um processo contínuo e, por vezes doloroso, é possível que haja ganhos e
perdas. Logo, resta torcer para que os ganhos sobressaiam, e que a arte continue a contribuir
para um caminho de emancipação.

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