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Uma publicação da fundação Nawawi
Por Dr. Umar Faruq Abd-Allah
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Islam e o Imperativo Cultural
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Islam e o Imperativo Cultural
definido como "o animal que fala", "o resultado de valores culturais
animal político", "o animal religioso", particulares e hábitos cívicos, como
etc. Mas tanto a linguagem como a produto de constituições ou órgãos
política, a religião e outras administrativos. Em nossas mesquitas,
características essencialmente humanas escolas e casas, muitos dos problemas
são componentes fundamentais da diários são exemplos claros da
cultura e, acima de tudo, o ser humano dissonância e da confusão culturais.
é um "animal cultural." Geralmente têm pouco a ver com o
A cultura entrelaça tudo o que Islam per se, e muito a ver com o
valorizamos e que precisamos saber - choque de atitudes e expectativas do
crenças, moralidade, expectativas, velho mundo - geralmente autoritárias e
habilidades e conhecimento - dando- patriarcais -, com as complexidades,
lhes uma expressão funcional ao realidades e necessidades bem
integrá-las em uma série de padrões diferentes de nossa sociedade atual.
tradicionalmente eficazes. A cultura Um parâmetro chave para
tem suas origens no mundo da avaliar a cultura é a sua capacidade de
expressão, da linguagem e dos transmitir um sentido unificado do
símbolos. Mas também está relacionada indivíduo e da comunidade e padrões
com as atividades mais rotineiras de de comportamento consistentes e bem
nossas atividades, tais como a coesos. Uma cultura tem "sucesso"
vestimenta e a culinária, e vai muito quando transmite uma identidade
além do mundano, incluindo a religião, operacional, produz coesão social e
a espiritualidade, e as dimensões mais dota os seus membros de conhecimento
profundas das nossas psiques. A cultura e habilidades sociais que lhes permitem
inclui aspectos fundamentos sociais atender com eficácia5 suas necessidades
como a produção de alimentos e individuais e sociais. A identidade e a
distribuição de bens e serviços, a forma coesão social são produtos
como gerimos os negócios, o sistema fundamentais da cultura. Comunidade e
bancário e o comércio; o cultivo da autodeterminação também contribuem
ciência e da tecnologia, bem como para a concretização de uma cultura
todos os ramos do aprendizado, do "bem-sucedida". Na ausência de uma
saber e do pensamento. A vida em cultura islâmica americana integrada e
família e os costumes que cercam o dinâmica, falar sobre nós mesmos
nascimento, o casamento e a morte vêm como uma verdadeira comunidade -
à mente como elementos culturais apesar de nosso imenso talento
óbvios, mas o mesmo vale para as individual e do grande e crescente
relações entre os gêneros, os hábitos número de muçulmanos - ou de
sociais, as habilidades para lidar com as podermos um dia ser capazes de
circunstâncias da vida, a tolerância e a desempenhar um papel efetivo na vida
cooperação - ou a falta delas, e inclui social ou política, é pouco mais do que
superestruturas sociais, como retórico e ilusório.
organização política. Uma democracia Ao definir limites claros do
funcional, por exemplo, é tanto o indivíduo e fornecer uma ideia firme e
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unificada da identidade, uma cultura - nem entre os árabes nem entre os não-
islâmica norte-americana forte árabes - como uma visão de mundo
permitiria uma participação mais culturalmente predatória e estrangeira.
dinâmica entre nós mesmos e com o Em vez disso, a mensagem profética foi
mundo que nos rodeia. Também baseada, desde o início, na distinção
cultivaria a habilidade de lidar com entre o bem, o benéfico e o
realidades sociais complexas e negociar autenticamente humano nas outras
de forma produtiva os papéis que a vida culturas, ao mesmo tempo em que
na sociedade moderna nos obriga a buscava alterar somente o claramente
desempenhar, ao mesmo tempo, prejudicial. A lei profética não destruiu
sustentando um senso unificado, digno e nem eliminou a distinção sobre os
e seguro do que somos e um outros povos, mas tentou polir, cultivar
compromisso consistente com os e nutrir, criando assim uma síntese
valores que defendemos. As pessoas islâmica positiva.
podem se arrepender de regras não Muito do que se tornaria a
cumpridas, mas não de psiques Sunna do Profeta (modelo profético)
fragmentados. A criação de uma psique foi composto de normas culturais
muçulmana sólida nos Estados Unidos árabes pré-islâmicas e o princípio de
está sujeita à criação de uma cultura tolerar e flexibilizar essas práticas -
nativa próspera e bem integrada. Uma tanto entre os árabes como entre os
psique bem integrada e um senso não-árabes em toda a sua diversidade -
unificado de identidade farão da pode ser considerado como uma Sunna
religiosidade islâmica, da verdadeira essencial e suprema do Profeta. Neste
espiritualidade e da perfeição moral sentido, o famoso jurista medieval Abu
autênticas, uma possibilidade Yusuf, compreendeu o reconhecimento
normativa no contexto americano. de normas culturais locais positivas
como uma das marcas da Sunna. O
O Respeito por Outras Culturas: uma jurista de Granada do século XV, Ibn
Sunnah Profética Suprema al-Mawaq, fez uma abordagem
semelhante ao destacar, por exemplo,
O Profeta Muhammad e seus que os códigos de vestimenta do
companheiros não estavam em conflito Profeta não pretendiam se impor sobre
com outros grupos étnicos e culturas do a integridade cultural dos muçulmanos
mundo, mas mantiveram uma não-árabes, que eram livres para
perspectiva honesta, flexível e desenvolver ou manter as suas próprias
geralmente positiva da ampla provisão vestimentas dentro dos parâmetros
social de outros povos e lugares. O gerais da lei sagrada.6
Profeta e seus companheiros não O Alcorão ordenou ao Profeta
concebiam a cultura humana em termos Muhammad aderir às boas práticas e
de polos opostos, nem tampouco costumes dos povos e tomá-los como
faziam uma divisão drástica das referências fundamentais na legislação:
sociedades humanas nas áreas do bem e "Toma-te, Muhammad de indulgência e
do mal absolutos. O Islam não se impôs ordena o que é conveniente e dá de
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princípio: "Os costumes culturais são a tradicionais. Ele insistiu que a arte de
segunda natureza", o que implica uma ditar julgamentos em harmonia com os
grande dificuldade para o povo agir aspectos positivos da cultura local
contra os costumes estabelecidos, pois satisfazia o objetivo jurídico
seria como desafiar seus instintos fundamental do Islam de garantir o
naturais. Portanto, a aplicação sábia da bem-estar geral da sociedade. No
lei exigia uma ampla adaptação às mesmo espírito, uma autoridade
normas do lugar, que só deveriam ser jurídica posterior, al-Tusuli afirmou: "É
modificadas ou bloqueadas quando obrigatório permitir que as pessoas
absolutamente necessário. Respeitar as mantenham seus costumes, tradições e
regras do lugar significa encontrar aspirações gerais na vida. Promulgar
soluções intermediárias e leva leis que se oponham a isso seria um
necessariamente a amplas semelhanças desvio sério e uma tirania."
culturais. Neste sentido, o direito Os tempos mudam e as
islâmico distinguia entre a imitação culturas viáveis se adaptam. Era um
submissa dos demais (tashabbuh), o consenso entre os pensadores jurídicos
que reflete um senso problemático da islâmicos que as decisões judiciais dos
própria identidade e geralmente era primeiros tempos deviam estar sujeitas
considerada proibida ou censurável, e a a uma constante revisão para garantir
simples ocorrência de semelhança que se mantivessem em linha com as
exterior (mushhabaha), que era exigida, épocas. Um aforismo jurídico
recomendável, ou apenas neutra declarava: "Que ninguém se oponha à
conforme o caso. 13
mudança de regras com a mudança dos
Abd al-Wahhab al-Baghdadi, tempos." Da mesma forma, esse
um juiz de renome e autoridade jurídica consenso legal islâmico renunciava à
importante do século XI, afirmou: "A aplicação sistemática da lei pela
rejeição dos costumes culturais não faz repetição irrefletida dos textos
sentido. Seguir os costumes bons é uma normativos. O jurista sírio ilustre do
obrigação." Al-Sarakhsi, jurista famoso século XIX, Ibn Abidin, advertiu que
da mesma época, enfatizou: "Aquilo qualquer jurista que se apegava
que é estabelecido por bons costumes, cegamente às decisões jurídicas de sua
também é igualmente estabelecido pela escola, sem levar em conta a mudança
prova jurídica sólida", significando dos tempos e das circunstâncias, estaria
assim que a lei islâmica reconhecia destruindo direitos fundamentais e
implicitamente todos os bons aspectos benefícios abrangentes, causando danos
da cultura local. O famoso jurista do que excediam em muito o bem que
século XIV de Granada, al-Shatibi - poderiam realizar. Ibn Abidin afirmou
sem dúvida, uma das mentes mais também que tal cegueira constituía um
brilhantes da história jurídica do Islam ato de opressão e uma grande injustiça.
- advertiu que a incompetência jurídica Al-Qarafi, um jurista de renome do
não poderia impor uma pena mais século XIII, também disse:
severa para uma pessoa do que exigir a Aqueles que ditam sentenças cegamente
renegação de seus costumes e práticas agarrando-se aos textos que aparecem nos
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Taj Mahal, por exemplo, foi uma das Criar uma identidade
principais causas do declínio e queda muçulmana própria nos Estados Unidos
do Islam. Sua forma de pensar é o é uma tarefa árdua e complicada, que
reflexo do mal-estar geral da era requer integridade pessoal e um
moderna e da desintegração das profundo conhecimento e compreensão.
culturas islâmicas tradicionais, Mas a tarefa não pode ser ignorada sem
deixando em seu rastro uma alienação grandes riscos e os perigos de um
existencial crônica e uma disfunção fracasso são extremamente
cultural. Tal fobia cultural é devastadores. O fracasso ao criar uma
inadmissível à luz da jurisprudência cultura islâmica próspera nos Estados
islâmica clássica e é a antítese de mais Unidos não só ameaça a nossa
de um milênio de culturas islâmicas existência futura, mas também constitui
nativas prósperas e de uma civilização uma traição indesculpável à confiança
universal. divina e a perda de uma oportunidade
Devemos insistir na sabedoria histórica única de fazer o Islam
tradicional da lei islâmica e funcionar nos Estados Unidos. Nossa
desconstruir a paranoia contracultural lei sagrada exige que assumamos esta
entre nós. Se não controlarmos e tarefa. O trabalho que temos pela frente
reorientarmos a religião de identidade é uma questão de ijtihad verdadeiro,
contracultural que está se compromisso moral e criatividade
desenvolvendo inconscientemente em dinâmica. No espírito dos grandes
torno de muitas das nossas mesquitas, juristas do passado, qualquer falha de
escolas, casas e câmpus universitários, nossa parte seria uma "injustiça e
ela comprometerá a ascensão do Islam desobediência a Deus," exceto que, no
nos Estados Unidos. Quanto àqueles nosso caso, o "grande erro" que
que estão imersos neste paradigma cometemos não pertence a uma
contracultural, explicar a jurisprudência disposição jurídica isolada ou a casos
islâmica tolerante em relação a cultura muito particulares, mas ao declínio de
e falar sobre a criação de uma cultura toda uma comunidade. Há um dito
islâmica nos Estados Unidos, mandinga que proclama: "O mundo é
geralmente desperta uma profunda antigo, mas o futuro brota do passado."
ansiedade, medos subconscientes e Precisamos engendrar uma cultura
dúvidas implacáveis. A convicção de islâmica americana que nos dê a
que a lei islâmica estabelece liberdade de ser nós mesmos. E para
parâmetros para que se possa produzir sermos nós mesmos, devemos ter um
um desenvolvimento cultural nativo senso adequado de continuidade com o
raramente dissipa estes receios, porque que existiu no passado, o que existe, e
não estão enraizados na racionalidade, o que provavelmente continuará a
mas em um substrato do subconsciente existir. Apenas no contexto de uma
que foi treinado - às vezes desde a presença cultural viável podemos
infância - em noções erradas e em confiar em um futuro islâmico brilhante
falsos valores universais de uma nos Estados Unidos que brote da
ideologia estrangeira. riqueza de nosso passado.
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à cultura. De acordo com a escola Maliki, podemos muçulmanos tentem uma aproximação com os judeus
aceitar a autoridade de normas culturais para e os cristãos, muitas vezes ouvimos muçulmanos hoje
especificar ou restringir as disposições legais gerais citando o seguinte versículo do Alcorão: "Nem os
contrárias com base na preferência jurídica (istihsan). judeus, nem os cristãos, jamais estão satisfeitos
Nas terras islâmicas orientais durante o período contigo, a menos que abraces os seus credos."
clássico, um homem que aparecia em público com a (Alcorão 2: 120). O versículo foi dirigido ao Profeta
cabeça descoberta mostrava uma falta de virtude e pessoalmente no período de formação da revelação e
geralmente sua declaração perante o juiz era rejeitada. faz referência aos sentimentos das comunidades
No entanto, a norma cultural na zona ocidental árabes de judeus e cristãos em relação a ele e a sua
(Andaluzia) era que os homens aparecessem em insistência de que ele os seguisse e não fundasse uma
público com a cabeça descoberta. De acordo com esse nova dispensação universal. Fazer generalizações
costume, a lei Maliki na Península Ibérica não sobre este versículo para excluir todas as relações
considerava aparecer em público com a cabeça positivas entre as fés abraâmicas em todos os
descoberta como uma violação da integridade pessoal. contextos possíveis é errado e desmente relações
11. Uma aceitação cega de normas culturais não só é harmoniosas que normalmente existiram entre as três
contrária à lei islâmica, mas também se opõe à criação religiões na civilização islâmica.
cultural na qual devemos nos engajar. Tanto na lei 14. Estas duas citações são de Adil Quta, al-Urf , 1: 64-
islâmica quanto na antropologia moderna, não é 65.
possível a aceitação de novos modos culturais sem
fazer uma análise crítica das mesmas, com base na
nossa concepção de cultura e nos objetivos que
queremos alcançar por meio dela.
12. As cinco máximas (al-qawaid al-kulliyyat al-khams)
foram o resultado de um consenso entre todas as
escolas, e são as seguintes:
- "As questões são julgadas pelos seus objetivos” (al-
umur bi-maqasidiha).
- "A certeza não pode ser eliminada pela dúvida" (al-
yaqin la yazul bi-'l-shakk), geralmente invocada como
referência especial a princípios islâmicos, tais como
algo é considerado como permitido a menos que se
prove o contrário, que se supõe a inocência até que a
culpa seja provada, etc.
- "A dificuldade levará ao alívio” (al-mashaqqa tajlib
al-taysir), significando que a lei não poderá exigir de
maneira válida qualquer coisa que as pessoas sejam
incapazes de realizar sem dificuldade excessiva.
- "O dano será removido" (al-darar yuzal), que
invalida as regras que levam a danos, mesmo que
sejam tecnicamente legítimas.
- "Os usos culturais têm força de lei" (al-ada
muhakkama). Esta máxima é também lida como “al -
ada muhkama", ou seja, “os usos culturais são
definitivos", o que implica que o costume tem
autoridade semelhante aos preceitos textuais
fundamentais da lei.
13. As injunções relativas a diferenciação de judeus e
cristãos se incluíam nesta categoria e se enquadravam
em um contexto histórico particular. Já se fez
referência à opinião de Ibn al-Mawaq. Como prova
baseada em premissas de que é inútil que os
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