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Marcelo Viana da Costa1, George Dantas Azevedo2, Maria José Pereira Vilar3
DOI: 10.1590/0103-11042019S105
Federal do Rio Grande ABSTRACT The theoretical-conceptual and methodological frameworks of Interprofessional
do Norte (UFRN), Escola Education in Health (IPE) have been widely recognized throughout the world as useful for the
Multicampi de Ciências
Médicas, Programa de Pós- development of collaborative competences for effective teamwork. This article aims to explore
Graduação em Educação, the perceptions of nursing and medical students regarding the institutional factors that interfere
Trabalho e Inovação em
Medicina – Caicó (RN), in the adoption of IPE initiatives in their training contexts. It is a case study, which adopted the
Brasil. qualitative approach and the exploratory perspective. The research participants were nursing and
3 Universidade Federal medical students from two public universities from a Brazilian Northeastern state – one state and
do Rio Grande do one federal. The focus group was chosen for data collection, and the categorical content analysis
Norte (UFRN), Centro
de Ciências da Saúde, technique was used, observing the phases of pre-analysis, material exploration and treatment of
Programa de Pós- results. Three thematic categories were built a posteriori: the importance of teamwork, the institu-
Graduação em Ensino na
Saúde – Natal (RN), Brasil. tional contexts for the adoption of the IPE and challenges for the adoption of the IPE. Although the
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative
Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer
SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 43, N. ESPECIAL 1, P. 64-76, AGO 2019 meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja corretamente citado.
Aspectos institucionais para a adoção da Educação Interprofissional na formação em enfermagem e medicina 65
realities researched present advances in curricular changes, such as the approximation of teaching
with the reality of services, the adoption of more active methods for the formation of critical and
reflexive subjects, the gaps in the development of collaborative competences are still notorious.
compartilhada, e que acaba por determinar compreender o fenômeno para além das suas
práticas também separadas e isoladas6. características mensuráveis e a capacidade de
Discutir educação e o trabalho interprofissio- compreender, discutir e explorar sensações e
nal retoma a reflexão sobre a centralidade dos experiências existentes nas relações sociais8. A
usuários na elaboração e execução das ações em perspectiva exploratória justifica-se pela inten-
saúde, mostrando-se coerente com o propósito ção de explorar aspectos de um determinado
de fortalecer os sistemas de saúde por meio de fenômeno, principalmente quando ainda não
respostas mais efetivas aos problemas de saúde. se conhece bem os aspectos que o constituem9.
Reaviva o debate em torno do diálogo necessário O estudo foi desenvolvido em duas universi-
entre os diversos campos de conhecimento e dades de um estado do Nordeste – uma estadual
de práticas para o enfrentamento de problemas e outra federal. Entre as duas, há importantes
e necessidades de saúde que se tornam com- diferenças na estrutura, organização, interiori-
plexos em uma dinâmica social que também zação e em relação aos processos de pesquisa,
precisa de múltiplos olhares e ações. ensino e extensão. A escolha foi motivada pelo
Tomando por base a relevância da EIP para fato de que as duas universidades têm tradição
a formação de profissionais de saúde mais na participação em políticas de reorientação da
aptos à colaboração e ao efetivo trabalho em formação profissional em saúde.
equipe, a elaboração deste estudo foi orientada Os participantes da pesquisa foram estudantes
pela seguinte questão norteadora: como estu- de enfermagem e medicina de duas universidades
dantes de enfermagem e medicina percebem públicas localizadas no Nordeste brasileiro. Para
os aspectos institucionais para a adoção da assegurar a confidencialidade dos participan-
EIP em seus contextos de formação? tes, foram utilizados códigos compostos pelas
Dessa forma, o artigo tem como objetivo letras EE – para Estudantes de Enfermagem – e
explorar as percepções de estudantes de en- pelas letras EM – para Estudantes de Medicina
fermagem e medicina sobre os fatores institu- – seguido de um numeral.
cionais que interferem na adoção de iniciativas O grupo focal foi escolhido para coleta de
de EIP em seus contextos de formação. dados por levantar questões relacionadas
com a disponibilidade para a aprendizagem
compartilhada, estereótipos profissionais,
Material e métodos limitações ou dificuldades para o aprendiza-
do interprofissional. Os grupos focais foram
Fundamentado na natureza do problema pes- homogêneos, e esse formato permitiu aos
quisado e nos objetivos estabelecidos, trata-se participantes a oportunidade de fornecer
de um estudo de caso. Embora o estudo tenha informações mais concretas em seus pontos
acontecido com participantes de diferentes de vista sobre estudantes de outras áreas
instituições de ensino, adotam-se como caso profissionais10.
para estudo os aspectos institucionais que A discussão no grupo focal foi conduzida
influenciam na adoção da interprofissiona- pelo moderador, coordenador da pesquisa, e
lidade na formação em enfermagem e medi- por um observador, responsável pelo registro
cina. Dessa forma, considera-se o contexto de atitudes e gestos que possam complementar
institucional como “um sistema delimitado e a observação e análise de conteúdo11-13. Com o
contemporâneo da vida real”7(32). intuito de problematizar a realidade dos ser-
Considerando a classificação em relação à viços de saúde e levantar questões referentes
abordagem e ao alcance dos objetivos, trata-se aos aspectos institucionais que interferem na
de uma pesquisa tanto qualitativa quanto adoção da EIP na formação em saúde para
exploratória. A abordagem qualitativa se o desenvolvimento de competências para o
mostrou adequada na medida em que permite trabalho colaborativo, a discussão nos grupos
foi orientada por algumas questões iniciais: que obedeceu a critérios precisos de escolha,
qual a importância do trabalho em equipe assegurando que os dados se referissem ao
para o trabalho em saúde? Que aspectos da mesmo tema, coletados por meio de técnicas
realidade da formação se aproximam da EIP? iguais em indivíduos semelhantes; e pertinên-
Quais aspectos institucionais facilitam ou di- cia, que possibilitou reconhecer que o corpus
ficultam a EIP? foi adequado aos objetivos do trabalho14.
Em relação ao tamanho e à duração do Na terceira etapa, foi realizada a ‘formu-
grupo, a média foi de oito participantes, e a lação de hipóteses e objetivos’ que assegu-
duração variou de 50 a 80 minutos. A escolha rou realizar algumas afirmações provisórias,
de um pequeno grupo justifica-se pela possi- a partir das fases anteriores. A formulação
bilidade de viabilizar maior interação entre dos objetivos foi feita a partir da seleção das
os participantes, facilitar a comunicação e unidades de análise, por meio do processo
discussão das questões levantadas. de categorização, a posteriori ou empírico,
Foram realizados quatro grupos focais na em que as categorias que emergiram foram
universidade estadual, sendo dois grupos em descritas e discutidas a partir do referencial
cada curso, com um total de 33 participantes. teórico existente12,14.
Na universidade federal, foram realizados dois Já a última etapa foi a preparação do mate-
grupos focais em enfermagem (primeira e rial, antes da análise propriamente dita. Nesse
segunda metade) e um grupo focal com estu- momento, foi feita a numeração dos elemen-
dantes da primeira metade do curso de me- tos do corpus, assim como a identificação das
dicina, totalizando três grupos focais, com 25 unidades de análise, que, para este estudo, foi
participantes nesses grupos. Os grupos focais destacada com cores diferenciadas.
foram gravados e, em seguida, transcritos, As etapas de exploração do material, trata-
compondo o corpus de análise da pesquisa. mento e interpretação dos resultados foram
A realização da técnica de análise respeitou facilitadas pelas etapas, e suas fases, que as
as fases de pré-análise, exploração do material precederam. As unidades de análises foram
e tratamento dos resultados. Na pré-análise, codificadas, decompostas e enumeradas, fa-
foi realizada a leitura flutuante que permitiu cilitando a interpretação desses resultados a
o contato inicial com os documentos, o con- partir dos objetivos propostos pela pesquisa.
teúdo obtido, a partir das falas dos grupos Este estudo foi registrado e aprovado pelo
focais e entrevistas. As transcrições de cada Comitê de Ética do Hospital Universitário Onofre
grupo focal e entrevista foram lidas para obter Lopes da Universidade Federal do Rio Grande
uma imersão no discurso, tendo uma primeira do Norte, por meio do parecer de nº 16.652, que
aproximação das mensagens, argumentações observou os objetivos da pesquisa, riscos e bene-
e justificativas que têm contribuído para uma fícios a que os participantes foram submetidos.
maior clareza das hipóteses, permitindo maior
clareza das principais mensagens12.
Em seguida, procedeu-se à ‘constituição Resultados
do corpus’. Nessa etapa, foi observada a regra
de exaustividade, e foram organizados os Os dados dos grupos focais trouxeram ca-
dados para responder a padrões de validade, racterísticas importantes sobre a realidade
contemplado todos os aspectos levantados na da formação em saúde para a adoção da EIP.
discussão, sem omissão de nenhum aspecto; Assim, o corpus da pesquisa permitiu agrupar
representatividade, que assegurou que os os resultados em categorias temáticas de
dados (mensagens, falas, expressões) fossem análise, subcategorias e unidades de análise,
representativos da totalidade; homogeneidade, conforme sumarizado na tabela 1.
Eu acho que nenhum trabalho que você vai fazer, ao trabalho multiprofissional. Um pequeno
envolvendo qualquer área, você não consegue fa- grupo de estudantes de medicina afirmou co-
zer sozinho, é preciso que todos colaborem um nhecer o tema, no entanto, durante o debate,
pouco, que todos se comuniquem. Eu acho que demonstraram confusão conceitual, apontan-
a questão fundamental também do trabalho em do o entendimento da multiprofissionalidade,
equipe é a comunicação e uma boa convivência. multidisciplinaridade e interdisciplinaridade
(EM6). como termos sinônimos.
Embora tenha sido possível identificar a ma- Educação Interprofissional?! Este tema, eu nunca
turidade dos estudantes no debate, o diálogo ouvi. (EE5).
como um elemento importante para permitir o
trabalho colaborativo apareceu de forma mais O que vem à mente é a interação entre as profis-
enfática em apenas um grupo. A capacidade sões. (EE3).
de diálogo surge na discussão enquanto com-
petência que varia de acordo com a abertura Trabalho interdisciplinar a gente já escutou [...],
individual e independentemente da categoria mas realmente sermos educados todos juntos de
profissional. Os participantes relataram que há forma interprofissional não! (EM4).
deficiências nas relações entre os diferentes
profissionais, dificultando o trabalho em equipe A pouca aproximação com a discussão não é
na perspectiva da colaboração. suficiente para assegurar que na realidade pes-
quisada não seja adotada nenhuma iniciativa na
A classe médica de uma forma geral [...] é colo- direção do desenvolvimento das competências
cada num pedestal de um lado e os demais pro- colaborativas. Partindo desse pressuposto, os
fissionais do outro lado. Então tem um embate participantes foram estimulados a falar sobre as
muito grande entre os profissionais médicos e as estratégias/ações que tentaram trazer estudantes
demais categorias. (EM8). de cursos diferentes no processo de formação,
como forma de qualificar os estudantes para o
Na equipe, cada profissional tem o seu ponto de trabalho em equipe.
vista. O profissional vê o problema do seu ponto Atividades de ensino e projetos de pesquisa
de vista e cada membro da equipe pode acumu- e de extensão foram citados como experiências
lar o que ele pensa com o que os outros pensam, que aproximam estudantes de diversos cursos.
e eles vão chegar a um bem comum. Porque às Nas falas, foi possível identificar importante
vezes nós somos muito focados no que fazemos variedade de ações e de objetivos. Em alguns
e deixamos de considerar as contribuições dos relatos, percebe-se a intencionalidade da inte-
outros dentro da equipe. (EE6). ração, da troca de experiências e aproximação
entre os sujeitos.
Contextos institucionais para adoção Nós temos duas disciplinas que são feitas para essa
da EIP integração. São estudantes de fisioterapia, nutrição,
farmácia, medicina e enfermagem e serviço social às
A maioria dos participantes afirmou nunca ter vezes. Estes estudantes se encontram em um esta-
ouvido falar sobre a EIP. Quando instigados belecimento de saúde e pensam juntos sobre como
a falar sobre a aproximação com o debate da agir nessa comunidade. (EE1).
EIP, os estudantes, apesar de mostrarem pouco
conhecimento da discussão, tentaram explicá- Um dos lugares que a gente mais aprendeu [...]
-la a partir do prefixo ‘inter’. Na discussão, foi participar do Programa de Educação pelo
fizeram referência à interdisciplinaridade e Trabalho em Saúde (PET), que tinha alunas de
enfermagem também. A gente teve que se unir, esperando eles terminarem e então começamos
teve que colaborar um com o outro e nisso algu- nosso atendimento. (EE11).
mas visões foram quebradas, tanto deles quanto
da gente. (EM6). Na semana passada nós estávamos fazendo uma
intervenção com uma criança no leito e chegaram
As iniciativas sistematizadas de aprendiza- estudantes de fisioterapia. Eles ficaram esperan-
gem compartilhada mencionadas pelos parti- do terminarmos a intervenção para entrar. Os co-
cipantes ainda estão fundamentadas na lógica nhecimentos de enfermagem estavam conosco e
multidisciplinar e multiprofissional, refletindo o conhecimento de fisioterapia estava depois da
as grandes dificuldades para realizar a inte- porta e não conseguimos articular. (EE14).
ração entre as diferentes profissões. A inexis-
tência de ações intencionais e sistematizadas Durante a faculdade de medicina não é explora-
podem ser entendidas como barreiras para a do, eu sinto essa necessidade gritante no nosso
incorporação dos marcos teórico-conceituais curso, trabalhar mesmo de uma forma mais in-
e metodológicos da EIP. tegrada. (EM7).
Eu estava pensando... Eu não vejo nenhum mo- Também apareceu nas falas que nos mo-
mento de nossa formação contribuir para este mentos em que os estudantes se encontram
trabalho em equipe... (EE11). por acaso ou coincidência, por dividirem os
mesmos espaços de aulas práticas, a intera-
Eu não vejo uma preocupação, desde o início da ção encontra fortes barreiras estruturais e
faculdade, em trabalhar em equipe. Na verdade culturais. Mencionaram também que, quando
[...] você passa a considerar o ser humano de acontece, é por iniciativa individual dos estu-
uma forma geral, de uma forma holística, mas dantes. Destacam o interesse que essa intera-
em nenhum momento passaram pra gente como ção acontecesse como um processo natural na
trabalhar em equipe. (EM7). efetivação do trabalho em saúde.
E o que eu acho também, em relação ao currí- Realmente, se não fosse a minha iniciativa, não
culo da gente, que falta muito. A gente é muito haveria articulação. Não teria essa interação mú-
ignorante sobre o que o outro faz, sobre o que tua. (EE2).
o fisioterapeuta faz, quais são as atribuições do
fisioterapeuta, do enfermeiro, do fonoaudiólogo. A interação que existiu foi iniciativa dos estudan-
(EM8). tes. (EM7)
Os estudantes expõem dois aspectos da rea- Essa articulação é muito mais favorecida em
lidade: dificuldades na implementação de ini- estágio supervisionado. Mas depende de cada
ciativas sistematizadas e ausência completa de aluno. (EE12).
ações que objetivem a interação de estudantes
de diferentes cursos para desenvolver compe- A realidade apresentada pelos participantes
tências colaborativas. Os participantes relatam dos grupos focais é complexa e chama a atenção
que o encontro com outros estudantes, muitas para a atuação docente no processo de formação.
vezes, acontece por acaso e sem planejamento, As relações entre os professores de diferentes
dificultando ainda mais o fortalecimento das departamentos apareceram como um aspecto
relações interpessoais e interprofissionais. que caminha na contramão da formação de com-
petências para o trabalho colaborativo.
No leito quando chegamos, o paciente esta-
va com os estudantes de medicina, ficamos Eu acho que o grande problema é que não
maneira de entender como as profissões ad- variedade de definições para esse tipo de
quirem identidades que acabam definindo, trabalho. Em todas as definições, entretanto,
também, as possibilidades de relações com reiteram a interação entre os profissionais
outras profissões. como prerrogativa para atender às comple-
Estudantes do Curso de Medicina reco- xas e dinâmicas necessidades de saúde, em
nhecem que há uma barreira cultural para tempos atuais16.
o diálogo com outros grupos profissionais. A essência desse trabalho, em que a colabo-
Essa barreira é legitimada tanto pela categoria ração assume papel central, coloca o usuário
como por usuários que atribuem à ação uni- dos serviços, e suas necessidades, como funda-
profissional, segundo relatos, maior confiança mental no processo de produção dos serviços
no atendimento. Estabelecer diálogos com de saúde. A complexidade e a natureza dos pro-
outros profissionais pode expressar insegu- blemas e necessidades dos usuários sugerem a
rança profissional. necessidade de complementariedade, a partir
Estudantes de enfermagem também referem da comunicação, para compartilhar experiên-
a existência de resistências entre os estudan- cias e conhecimentos, capazes de orientar a
tes de medicina e enfermagem. Eles também tomada de decisões, para o enfrentamento dos
afirmam que a naturalização da hierarquia e problemas apresentados17. Pesquisas recentes
de relações verticais existe na própria equipe indicam que o trabalho em equipe na pers-
de enfermagem. pectiva de colaboração favorece a segurança
do paciente, a partir da centralidade de suas
Nós não vamos negar que existe entre os médi- necessidades5,18.
cos um certo preconceito de dizer que precisa de Tomando por base essa problemática,
uma segunda opinião de outro profissional que estudos e experiências vivenciadas em diver-
não seja médico. Isso é fato. (EM2). sos países defendem a EIP como importante
instrumento para a mudança do foco das prá-
Existem certas formações que isola o profissional, ticas profissionais, superando modelos cen-
como se apenas o trabalho de uma categoria pro- trados em suas especificidades, como forma
fissional fosse melhor. Nós encontramos resistên- de possibilitar processos de aprendizagem
cias. Isso é uma visão limitada que não permite a compartilhados, capazes de estimular a me-
articulação do nosso trabalho. (EE3). lhoria das competências colaborativas19.
A EIP em saúde almeja criar, no processo de
aprendizagem, condições para melhorar as re-
lações entre membros de diferentes profissões,
Discussão superando a dificuldade histórica de comuni-
cação, possibilitando a formação de sujeitos
Embora se reconheça a necessidade de estabe- aptos a trabalharem de forma colaborativa, na
lecer limites às profissões, o cenário atual, de atenção à saúde das pessoas. A EIP se cons-
grandes e importantes transformações, demanda titui, então, como proposta de superação do
um novo profissionalismo em que os profissionais modelo de formação, pautado da perspectiva
estejam aptos ao trabalho em equipe e compro- multiprofissional ou uniprofissional5, que tem
metidos com o fortalecimento dos sistemas de apresentado muitas limitações na formação de
saúde e capazes de estabelecer novas relações profissionais capazes de atender às demandas
entre os usuários dos serviços de saúde15. que emergem no contexto atual.
O entendimento dos participantes de- Dentre as barreiras ou desafios, está a ne-
monstra a aproximação com a literatura cessidade de pensar a logística e o reconhe-
em torno dos benefícios e necessidade cimento da importância de um planejamento
de trabalho em equipe, embora haja uma rigoroso e a necessidade de recursos para a
obtenção dos resultados esperados; os dese- de atividades muito distintas e que são
nhos curriculares se apresentam como outra construídos no interior das faculdades ou
barreira, na medida em que estão organizados, a departamentos21, sem a necessária articu-
partir das necessidades de formação específica lação ou diálogo, o que pode ser visto nas
de cada profissão, exigindo maior esforço para duas universidades estudadas.
a negociação e flexibilidade desses desenhos; a A realidade estudada indica a existência
cultura atual que reforça os limites profissionais de momentos, planejados e não planejados,
e o diálogo e interação entre as diferentes cate- nos quais estudantes de diferentes cursos se
gorias profissionais e as relações de aprendiza- unem, mas que têm se aproximado muito mais
gem muito focadas em perspectivas tradicionais da perspectiva multiprofissional. As inicia-
que pouco contribuem para a efetivação da tivas existentes são poucas, ou inexistentes,
colaboração e interação20. e sofrem com a falta de planejamento, que
Ponto fundamental para discutir o con- culmina na reprodução do modelo tradicio-
texto das realidades pesquisadas para a nal de formação, formando indivíduos pouco
adoção da EIP é o apoio institucional às comprometidos com a transformação do atual
iniciativas que se estimulam mudanças nos cenário da educação e da atenção à saúde.
níveis macro, meso e micro da realidade21. As atuais políticas de reforma do processo
Aspectos dos domínios micro e médio podem de formação dos profissionais de saúde têm
comprometer seriamente as iniciativas imple- possibilitado a inserção dos estudantes de
mentadas, o que aponta para a compreensão todas as áreas nos serviços de saúde, consi-
de que as mudanças devem acontecer em um derando espaço adequado para a formação
processo articulado e planejado, em exaustão, de profissionais mais críticos e reflexivos.
para garantir impacto nos problemas da for- No entanto, a realidade marcada pela forte
mação profissional em saúde20,22. divisão do trabalho não estimula, na aca-
Da mesma forma, apesar da existência demia, a construção de competências para
de políticas (nível macro) que incentivem o trabalho colaborativo. O professor pode
a reorientação da formação profissional em aproveitar os espaços da realidade concreta
saúde, há importantes lacunas na adoção para criar um espaço adequado para a cola-
de estratégias (domínio médio) capazes de boração entre os estudantes. Para tanto, o
superar as relações estabelecidas no traba- professor precisa incorporar a importância
lho em saúde, como relatado pelos partici- da EIP para a obtenção das transformações
pantes da pesquisa, que podem minimizar necessárias23, nas realidades estudadas.
as barreiras impostas pelas estruturas físicas Já em relação à dimensão micro, merece
nos contextos pesquisados. discussão o processo de construção de iden-
Percebe-se, então, a importância dos as- tidades profissionais que acaba por delinear
pectos do domínio meso21 para a efetivação papéis, valores e atitudes que vão muito
das mudanças. Estudantes sentem a neces- além da educação e processos de formação24.
sidade de maiores estímulos à construção A sociedade incorpora essas identidades,
de novas competências, a fim de avançar fortalecendo ainda mais as barreiras ao
na formação interprofissional. No entanto, diálogo. Este processo contribui para que
não é tarefa simples elaborar atividades o diálogo e a interação se tornem cada vez
interprofissionais porque envolve grandes mais difíceis. As identidades profissionais,
esforços para superar não apenas a barreira historicamente construídas, edificam bar-
física, mas também pensar em estratégias reiras fortes para a interação interprofis-
possíveis, diante das especificidades de sional25,26. É interessante notar que as falas
cada curso: número de estudantes, dife- dos estudantes mantêm aderência com a
rentes desenhos curriculares, cronograma literatura.
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Recebido em 03/01/2019
Washington, DC: The National Academies Press; 2013. Aprovado em 07/05/2019
Conflito de interesses: inexistente
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