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A Divisão de Tarefas
Domésticas entre Homens
e Mulheres no Cotidiano do
Casamento1
The Division of Household Labor Between
Men and Women in Everyday Marriage Life
Bernardo Jablonski
Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro
Artigo
Resumo: O presente trabalho visa a investigar como se dá a negociação de tarefas dentro do lar face às
novas demandas impostas a reboque do movimento de emancipação feminina e do ingresso maciço das
mulheres no mercado de trabalho. Procuramos avaliar atitudes e comportamentos acerca de diversos
tópicos relativos ao cotidiano da vida em comum entrevistando 20 membros de casais heterossexuais de
classe média, com idades entre 30 e 40 anos, com pelo menos 5 anos de união e ao menos um filho.
Entre os principais resultados, destacamos que, apesar da existência de uma dupla jornada de trabalho e
das dificuldades demonstradas pelos homens em compartilhar de forma igualitária as tarefas domésticas –
recaindo sobre a mulher o peso maior (cuidar da casa e das crianças, fazer compras, arrumar, lavar e passar,
etc.) – não observamos, como seria esperado, um aumento considerável de conflitos na relação marital.
Palavras-chave: Gênero. Atitudes. Tarefas domésticas. Casamento.
Abstract: The current article investigates how housework negotiations occur inside the home, due to the
new demands that emerged with the women’s lib movement and the increase of women in labor-force
participation. We evaluated attitudes and behaviors regarding several topics in a couple’s life by interviewing
20 heterosexual middle-class couples, with ages between 30-40 years, with at least 5 years of marriage
and at least 1 child. Among our major results, we highlight the fact that despite the existence of a double
working schedule and the difficulties expressed by men in sharing household chores in an egalitarian fashion
– which greatest weight relies upon women (caring for the house and the children, shopping, organizing,
doing laundry, ironing, etc.) – we did not observe, as could be expected, a great increase in conflicts in
marital relationship.
Keywords: Gender. Attitudes. Housework. Marriage.
Resumen: El presente trabajo visa a investigar cómo se da la negociación de tareas dentro del hogar frente
a las nuevas demandas impuestas a remolque del movimiento de emancipación femenina y del ingreso
macizo de las mujeres en el mercado de trabajo. Procuramos evaluar actitudes y comportamientos acerca
de diversos tópicos relativos al cotidiano de la vida en común entrevistando a 20 miembros de parejas
heterosexuales de clase media, con edades entre 30 y 40 años, con por lo menos 5 años de unión y al
menos un hijo. Entre los principales resultados, destacamos que, a pesar de la existencia de una doble
jornada de trabajo y de las dificultades demostradas por los hombres en compartir de forma igualitaria las
tareas domésticas – recayendo sobre la mujer el peso mayor (cuidar de la casa y de los niños, hacer compras,
arreglar la casa, lavar y planchar, etc.) – no observamos, como sería esperado, un aumento considerable
de conflictos en la relación marital.
Palabras clave: Género. Actitudes. Tareas domésticas. Casamiento.
Rocha Coutinho, 2003, 2004, 2007; Thistle, nas culturas onde não há esse tipo de mão de
2006; Vaitsman, 1994), que esse movimento obra disponível, ao contrário do Brasil e de
veio transformar profundamente as relações outros países da América Latina.
de gênero, aliado à entrada maciça da
mulher de todas as classes sociais no mercado Araújo e Scaflon (2005), após ampla pesquisa
de trabalho e de suas consequências – realizada em 2003, que contou com 2000
casamentos mais tardios, diminuição no domicílios em 24 Estados brasileiros,
número de filhos, maior independência por chegaram à mesma conclusão, ao constatar
parte das mulheres e aumento de conflitos que a maior parte do trabalho doméstico entre
gerado pela busca da igualdade de direitos. nós ainda continua sendo majoritariamente
uma atribuição feminina. Assim, para essas
Assim, parecem cada vez menos frequentes os autoras, o ingresso das mulheres no mercado
arranjos matrimoniais em que apenas um dos de trabalho não implicou uma divisão mais
parceiros se encarrega sozinho do sustento igualitária dos trabalhos domésticos, ainda
da família. As mulheres se voltam, mais e que haja indícios de maior participação
mais, para o trabalho fora de casa, não só masculina no que diz respeito ao cuidado
porque ele possibilita atingir melhor padrão com os filhos (mas não nas tarefas domésticas).
de vida para a família mas também pelo
fato de o sucesso profissional ser encarado
Rocha-Coutinho (2003, 2004, 2005) observa
como uma forma de realização pessoal e
igualmente em suas pesquisas que – a par
social (Goldenberg, 2000; Rocha-Coutinho,
de um discurso social igualitário – tanto
2003; Thistle, 2006), além de assegurar maior
homens como mulheres cariocas parecem
independência financeira, algo importante
endossar o ponto de vista (com diferentes
em tempos nos quais o casamento nem
níveis de consciência) de que a casa e os
sempre é duradouro. Em consequência, o
filhos são ainda responsabilidade maior da
número de horas despendido nas tarefas
mulher, cabendo ao homem o provimento
de casa diminuiu sensivelmente nos Estados
financeiro. Artis e Pavalko (2003) lembram
Unidos, no Canadá e na Europa (Jacobs &
que, em consonância com a perspectiva de
Gerson, 1998; Sayer, 2005), pari passu a um
troca social, ao aumento da taxa de mulheres
aumento da quantidade de horas dedicadas
na força de trabalho deveria corresponder
ao trabalho fora de casa por pessoas na
uma queda em seus níveis de atividade dentro
faixa etária compreendida de 25 a 45 anos,
do lar, somada a uma divisão de trabalhos
normalmente, pais com filhos pequenos
intralar mais equilibrada entre homens e
(Amato et al., 2007; Daly, 2003).
mulheres. Mas as mudanças nesse sentido têm
se mostrado muito pequenas e insatisfatórias,
No Brasil, babás e empregadas domésticas
do ponto de vista feminino, em que pese
fazem uma diferença, no sentido de suprir em
a observação de que entre gerações mais
parte a ausência das mães que se dedicam
jovens estaria havendo uma distribuição mais
mais intensamente ao trabalho fora de casa,
igualitária de afazeres e responsabilidades
ainda que haja dúvidas acerca do número
domésticas, a reboque de concepções de vida
real de lares que incluem a presença de
ideologicamente alinhadas com uma visão de
empregadas domésticas. Para o IBGE (2000),
papéis de gênero mais igualitária (perspectiva
apenas 11% dos domicílios brasileiros
de gênero).
contam com a presença de uma empregada
doméstica, morando ou não na residência,
o que nos leva, sem dúvida, a contextualizar Por outro lado, na França, em 2000, segundo
os resultados das pesquisas e estudos feitos pesquisa levada a cabo pela CNSR (reportado
no jornal Le Monde), 80% dos pais, apesar por inúmeras tarefas domésticas tidas como
do discurso igualitário, na prática, não essencialmente femininas.
participam em quase nada no que diz
respeito à educação e aos cuidados infantis
Pleck (1997) confirma, em suas pesquisas,
e muito menos aos afazeres domésticos. A
que a mulher tem convocado – ou ao menos
pesquisa em questão, após entrevistas com
tentado – cada vez mais seu companheiro
mil pais, confirma a noção de que, entre as a participar dos cuidados com os filhos. O
bem intencionadas atitudes igualitárias e a autor encontrou fatores que podem ajudar o
prática do dia a dia, a distribuição de tarefas envolvimento do pai, como, por exemplo, a
dentro de um lar ainda é bastante marcada idade (filhos pequenos sensibilizam mais do
pela divisão sexual, e as mulheres arcam com que adolescentes), o sexo dos filhos (meninos
a maior parte delas. também parecem receber mais atenção dos
pais) e o dia da semana (fins de semana
Da mesma forma, para Coltrane (2000), parecem o período mais apropriado para que
embora a contribuição masculina nos o pai exerça a sua função).
afazeres dentro do lar esteja aumentando, as
mulheres ainda trabalham pelo menos duas Em nossos estudos anteriores, notamos
vezes mais que os homens cumprindo as igualmente (Brasileiro, Jablonski, & Féres-
tarefas rotineiras do lar: cuidar das crianças, Carneiro, 2002; Jablonski, 1988, 1996,
lavar e passar roupas, fazer compras no 2001, 2003), no que diz respeito às atitudes,
supermercado, limpar a casa, etc. Para esse um crescente interesse dos homens em
autor, as consequências dessa injusta divisão participar, cada vez mais, dos cuidados com
são vistas, frequentemente, em sentimentos os filhos. Porém, ao passarmos para o campo
de injustiça, sintomas de depressão e de dos comportamentos, ou seja, da ação
insatisfação com o casamento por parte das propriamente dita, isso não se daria, como
mulheres. Por outro lado, maior participação se houvesse uma promessa de mudança que
não é cumprida, circunstância que tende a
masculina nessas tarefas seria um excelente
gerar frustração nas mulheres.
preditor de satisfação marital. A percepção de
que estaria havendo uma injusta divisão de
Na citada pesquisa de 2005, do IBGE,
tarefas levaria, pois, a um sensível aumento
constatou-se igualmente que a crescente
de conflitos e à diminuição da satisfação
participação das mulheres no mercado de
marital (Blair, 1988; Greenstein, 1996; Kluver,
trabalho não tem reduzido substancialmente
Heesink, & Van de Vliert, 1996; Lavee &
a sua jornada nos afazeres domésticos. Assim,
Katz, 2002).
o tempo dispensado nestes é de 9,1 horas
semanais para os homens e de 21,8 para as
Fuwa (2004) lembra que, de fato, houve
mulheres. Para as mulheres casadas com filhos
progressos na área, de vez que a participação
menores de 14 anos, os números chegam a
feminina nas tarefas domésticas vem caindo
29 horas semanais.
substancialmente. Assim, por exemplo,
entre os anos 60 e 90, o número de horas
Essa situação de disparidade de papéis seria
despendidas nesse tipo de tarefas teria caído
vivenciada pelas mulheres, aparentemente,
pela metade para as mulheres e dobrado para
de forma dolorosa, uma vez que há uma
os homens norte-americanos (Bianchi et al.,
promessa no ar de igualdade de funções,
2000). Concomitantemente, no entanto,
alimentada por atitudes dos próprios homens,
persiste a noção de segregação por gênero,
o que ocasiona uma expressiva fonte
já que caberia à mulher a responsabilidade
Bernardo Jablonski
Doutor em Psicologia Social - Fundação Getúlio Vargas. Professor assistente da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ – Brasil.
ROTEIRO DE ENTREVISTAS
Anexo I
Grupo 1: (informações gerais sobre o entrevistado)
1. Qual a sua idade? 2. Há quanto tempo você está casado(a)? 3. Você tem filhos? Quantos e
de que idades? Eles moram com você? 4. Qual a sua profissão? 5. Quantas horas por dia você
normalmente trabalha?
Grupo 3: (lazer)
9. Vocês costumam sair juntos? Sós ou com os filhos? Com que frequência? 10. O que vocês
costumam fazer normalmente?
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