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Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas curriculares no


PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e resistências. | De 5 a 7
de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
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ANAIS
De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil

Ana Cláudia da Silva Rodrigues


Ângela Cristina Alves Albino
Maria Luiza Süssekind
Maria Zuleide da Costa Pereira
Rafael Ferreira de Souza Honorato
Organização

João Pessoa – PB
2019

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas curriculares no


PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e resistências. | De 5 a 7
de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
AVALIADORES | AVALIADORAS

Adriana Regina De J.Santos Juarez Melgaço Valadares


Adriana Valéria Santos Diniz Júlio Afonso Sá De Pinho Neto
Alexandra Garcia Laura Cristina Vieira Pizzi
Alfredo Veiga-Neto Lebiam Tamar Gomes Silva
Alvaro Moreira Hypolito Lenilda Cordeiro De Macêdo
Ana Cláudia Da Silva Rodrigues Lígia Silva Leite
Ana Paula Furtado Soares Pontes Livia Freitas Fonseca Borges
Andréia Ferreira Da Silva Luciana Rosa Marques
Angelica Vier Munhoz Luciana Venancio
Antonia Sueli Da Silva Gomes Temoteo Luciola Licinio Santos 3
Antonio Hilario Aguilera Urquiza Lusival Antonio Barcellos
Aristóteles De Paula Berino Mara Rejane Osório
Arlete Ramos Dos Santos Márcia Aparecida Lima Vieira
Aurinéia Maria De Oliveira Marcia Maria De Oliveira Melo
Beatriz De Basto Teixeira Marcia Serra Ferreira
Carlos Eduardo Ferraço Marcio Rodrigo Vale Caetano
Carmen Teresa Gabriel Marco Antonio De Moraes
Claudia De Oliveira Fernandes Marcos Antonio Pinto Ribeiro
Cleriston Izidro Dos Anjos Maria Cecilia Lorea Leite
Débora Maria Do Nascimento Maria Da Conceição Silva Soares
Deise Juliana Francisco Maria Do Socorro Xavier Batista
Denise Da Silva Braga Maria Edgleuma De Andrade
Deyse Morgana Das Neves Correia Maria Ines G F Marcondes Souza
Edilene Da Silva Santos Maria Manuela Alves Garcia
Edimilson Antônio Mota Mariana Soledade Barreiro
Edineide Jezine Marilene Salgueiro
Edivone Meire Oliveira Marineuma Oliveira Costa Cavalcanti
Edmerson Dos Santos Reis Marinilson Barbosa Da Silva
Edna Cristina Do Prado Mauro Sérgio Da Silva
Eduardo Jorge Lopes Da Silva Nádia Jane De Sousa
Elisabete Dos Santos Freire Nagela Aparecida Brandão
Elisete Medianeira Tomazetti Nanci Helena Rebouças Franco
Elizabete Conceição Santana Neide Cavalcante Guedes
Fernando Ilídio Da Silva Ferreira Neide Pena Cária
Filomena Maria Cordeiro Moita Nilza Da Silva Martins De Lima
Francisca Terezinha Oliveira Alves Oscar Emerson Zúñiga Mosquera
Geralda Macedo Patricia Maria Uchôa Simões
Giselly Lima De Moraes Paula Batista Lessa
Graciele Fernandes Ferreira Mattos Rafaela Reis De Azevedo De Oliveira
Hamilton Perez Soares Correa Raimundo Lenilde De Araújo
Idelsuite De Sousa Lima Rita De Cassia Dias Pereira Alves
Inês Barbosa De Oliveira Rosane Michelli De Castro
Isabel Marinho Da Costa Rosanne Evangelista Dias
Iure Coutre Gurgel Rosiane De Fátima Ponce
Ivanalda Dantas Nóbrega Di Lorenzo Ruth Pavan
Ivanildo Amaro De Araujo Sandra Alves Da Silva Santiago
Ivone Maria Dos Santos Gomes Sandra Cristina De Souza Reis Abreu
Jacqueline De Fatima Dos Santos Morais Sandra Lucia Escovedo Selles
Janete Magalhães Carvalho Sérgio Rogério Azevedo Junqueira
Janssen Felipe Da Silva Simone Natividade
Jarbas Santos Vieira Sislândia Maria Ferreira Brito
Jean Carlos Miranda Talita Vidal Pereira
Jociano Coêlho De Souza Teodoro Adriano Costa Zanardi
Jorge Nassim Vieira Najjar Valeria Moreira Rezende
José Eduardo Da Fonseca Vândiner Ribeiro
José Carlos Morgado Verônica De Souza Fragoso
José Licínio Backes Virgínio Isidro Martins De Sá

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ANAIS
De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil

Ana Cláudia da Silva Rodrigues


Ângela Cristina Alves Albino
Maria Luiza Süssekind
Maria Zuleide da Costa Pereira
Rafael Ferreira de Souza Honorato
Organização

João Pessoa – PB
2019

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas curriculares no


PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e resistências. | De 5 a 7
de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
Copyright © 2019 by Autores
Todos os direitos reservados. Texto de acordo com o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, exceto em citações. O
texto é de responsabilidade exclusiva de seu autor.

Título da obra
Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: textos completos

Organização
Ana Cláudia da Silva Rodrigues, Ângela Cristina Alves Albino, Maria Luiza Süssekind, Maria Zuleide da Costa Pereira,
Rafael Ferreira de Souza Honorato

Publicação eletrônica.

Catalogação na Publicação
Seção de Catalogação e Classificação

C719p Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares (8:


2018: João Pessoa – PB).
Políticas curriculares no PNE (2014-2024) e desdobramentos
(neo)conservadores: tensões, desafios e resistências [Anais] /
Organizadores: Ana Cláudia da Silva Rodrigues... [et al.]. –
João Pessoa: Editores UFPB, 2019.
1077p. : il.

ISBN 978-85-237-1438-3

1. Políticas curriculares – Educação. 2. Plano Nacional de


Educação (PNE). I. Rodrigues, Ana Cláudia da Silva. II.
Seminário Nacional do Grupo de Pesquisa Currículo e Práticas
Educativas (3: 2018: João Pessoa – PB).

UFPB/BC CDU 37.016:32

Índices para catálogo sistemático:


Políticas educacionais – Currículo – Plano Nacional de Educação

Impresso no Brasil | Impreso em el Brasil | Printed in Brazil |


Imprimé au Brésil | Gedruckt in Brasilien | Stampatp in Brasile

Foi feito o depósito legal | Primeira edição: Agosto de 2019.

Para citar esta obra:


RODRIGUES, Ana Cláudia da Silva et al. Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares:
Textos completos. João Pessoa (PB): EDITORA UFPB, 2019.

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SUMÁRIO

07 APRESENTAÇÃO

09 GT 1 – POLÍTICAS CURRÍCULARES PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL 6

136 GT 2 – POLÍTICAS CURRÍCULARES PARA O ENSINO


FUNDAMENTAL

279 GT 3 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO


322 GT 4 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA O ENSINO SUPERIOR
397 GT 5 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA AS DIFERENÇAS
558 GT 6 – POLÍTICAS CURRICULARES E FORMAÇÃO DOCENTE
872 GT 7 - POLÍTICAS CURRICULARES E A EDUCAÇÃO NOS
ESPAÇOS NÃO ESCOLARES

936 GT 8 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA A GESTÃO ESCOLAR


948 GT 9 – POLÍTICAS CURRICULARES E AS PERSPECTIVAS
EPISTEMOLÓGICAS

1010 GT 10 – POLÍTICAS CURRICULARES E EDUCAÇÃO DE JOVENS


E ADULTOS

1097 GT 11 – POLÍTICAS CURRICULARES E ENSINO RELIGIOSO

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APRESENTAÇÃO
Ana Cláudia da Silva Rodrigues | Ângela Cristina Alves Albino | Maria Zuleide
da Costa Pereira | Rafael Ferreira de Souza Honorato

Os primeiros dez anos da realização do Colóquio Internacional de Políticas e


Práticas Curriculares, realizado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB),
Campus I, João Pessoa, Paraíba, Brasil foi um espaço que visou proporcionar tanto
a democratização quanto a consolidação desse evento, o qual, constitui-se um dos
espaços importantes de interlocuções e trocas de saberes entre as comunidades de
pesquisadores/as iniciados e iniciantes do Brasil e do exterior. Nesta fase de
consolidação plena que foi iniciada em 2013 estamos angariando esforços dos
órgãos de fomento da pesquisa para continuar realizando bianualmente esse
evento.
O evento em suas edições vem buscando construir um espaço onde as
reflexões, críticas, análises e ações que envolvem as políticas para a Educação
Básica sejam enfatizadas através dos múltiplos olhares de pesquisadores nacionais
e internacionais. A dimensão que o evento tomou, no cenário brasileiro e
internacional, fez desse evento um dos mais importantes da Região Nordeste. Essa
importância está trazendo à Paraíba uma oportunidade de discutir com ícones dos
estudos das políticas e do currículo as nossas demandas emergentes de práticas
desenvolvidas nos espaços escolares.

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Dito isso, o Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares
compreende que tem um compromisso com a formação inicial por meio dos diálogos
que estabelece com a graduação com valores acessíveis. Como também,
destacamos a atenção que damos a formação continuada com a oferta de vagas
gratuitas para docentes das Redes de Educação Básica de João Pessoa/PB, dando-
lhes a possibilidade de dialogar sobre políticas, currículo e áreas afim com
estudiosos e pesquisadores renomeados no cenário nacional e internacional.
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O evento é organizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas
Curriculares (GEPPC), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação
(PPGE) da UFPB, o qual se articulou ao Grupo de Pesquisa Currículo e Práticas
Educativas (CCHSA/UFPB). GEPPC, grupo que desenvolve estudos e pesquisas
ancorando-se em diferentes perspectivas e tem contribuído para a produção teórica
e para a construção de práticas no contexto educacional. Nesse ano de
2018, realizaremos a oitava edição do evento no período de 05, 06 e 07 de
dezembro, com o tema POLÍTICAS CURRICULARES NO PNE (2014-2024) E
DESDOBRAMENTOS (NEO)CONSERVADORES: TENSÕES, DESAFIOS E
RESISTÊNCIAS. O objetivo do evento é refletir, analisar e contribuir com os debates
em torno dessas novas políticas curriculares dialogando com a comunidade
acadêmica dos Programas de Pós-Graduação em Educação e demais Programas
que desenvolvem estudos e pesquisas acerca das políticas curriculares e seus
nexos com o processo de formação docente no Brasil. Por outro lado, esse evento
tem como objetivo relevante analisar as mudanças recentes nas políticas
educacionais brasileiras, em razão da recente aprovação do Plano Nacional de
educação (2014-2024), e do seu desmonte, da Base Nacional Comum Curricular
(20/12/2017) e de todas as mudanças que ele demanda para a educação brasileira
em todos os níveis e modalidades. Assim, a nossa intenção maior é dar
continuidade a todo um processo de comprometimento com o campo das políticas
do currículo, desta feita indo ao encontro de critérios mais aperfeiçoados que
possam gradativamente valorizar a pesquisa tanto na sua socialização quanto na
sua densidade teórica.

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GT 1 – POLÍTICAS CURRÍCULARES PARA A
EDUCAÇÃO INFANTIL

A UTILIZAÇÃO DE JOGOS E BRINCADEIRAS NA EDUCAÇÃO


INFANTIL: UMA ANÁLISE CURRICULAR E PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS NO CONTEXTO EDUCACIONAL DE SURUBIM-PE.
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1
Gilberto Ramos Vieira

RESUMO: O presente trabalho é fruto de uma pesquisa de campo realizada no


primeiro semestre de 2018 e apresentada na disciplina “Educação Física Escolar 1 –
Infantil”, do Curso de Licenciatura em Educação Física do CAV/UFPE. A tarefa
consistia em entrevistar duas professoras da cidade sugerida, as quais
desenvolvessem atividades que representassem aulas de Educação Física no
ensino infantil. Este tem por objetivo, entender melhor como as professoras
trabalhavam os conteúdos da Educação Física em suas aulas, em duas escolas na
cidade de Surubim-PE. O presente trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa,
do tipo exploratória, realizada em Surubim-PE. Os sujeitos da pesquisa foram duas
professoras que trabalham na educação infantil, sendo elas uma pedagoga e a outra
professora de Educação Física. Como instrumento de coleta de dados, foi utilizado
um questionário com perguntas objetivas e subjetivas a respeito das aulas de
Educação Física, ministradas por elas. Sendo assim, espera-se que existam
semelhanças e diferenças entre a forma de ensino dos conteúdos da Educação
Física escolar, visto que ambas utilizam os jogos e brincadeiras, contudo suas
formações são distintas.

Palavras-chave: Jogos, Brincadeiras, Ensino, Educação Infantil, Educação Física.

INTRODUÇÃO

Atualmente, grande parte das atividades pedagógicas vêm sendo


direcionadas para as disciplinas que trabalham conteúdos de modo fragmentado,
visando apenas a progressão cognitiva e esquecendo que as crianças têm seu

1
Graduando do Curso de Licenciatura em Educação Física – CAV- UFPE;
gilberto_r.2010@hotmail.com

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tempo e seu mundo distinto do adulto. Essa transmissão do saber tem ocorrido na
maioria das vezes de modo rígido, imposto e autoritário. Isso acontece, por existir
uma grande valorização social em relação à progressão rápida de ler, escrever e
calcular que está ligeiramente ligado ao processo de desenvolvimento cognitivo da
criança (SURDI, 2016).
Esse processo de valorização supracitada existe porque a educação está
ligada e faz parte de uma sociedade que tem seus anseios e interesses, uma vez
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que a educação existe de diversas maneiras e por esse motivo ela sobrevive aos
sistemas que por ela passam. Assim, Brandão (2007, p.100) afirma que

Determinados tipos de homens criam determinados tipo de educação, para


que, depois, ela recrie determinados tipos de homens. Apenas os que se
interessam por fazer da educação a arma de seu poder autoritário tornam-
na “sagrada” e o educador, “sacerdote”. Para que ninguém levante um
gesto de crítica contra ela e, através dela, ao poder de onde procede.

Desta maneira, percebemos que o processo de educação, está ligado aos


interesses da sociedade, contudo precisamos saber e respeitar os limites e o
processo de formação da criança durante seu processo de amadurecimento e
descoberta do mundo o qual está inserida. Devemos ainda, andar na direção do
desenvolvimento do ser humano, uma vez que a imaginação aflora na criança com
uma capacidade estruturadora, construtora e originaria, possibilitando que a
comunidade habite a criança e a criança habite o mundo em que vive, explorando a
cultura da sociedade da qual está inserida (ZIMMERMANN, 2014).
Refletir sobre a educação nos faz pensar sobre a realidade e o mundo no qual
estamos inseridos, nos levando a vê-la enquanto um projeto de vida e sociedade a
qual desejamos alcançar de modo individual e ou coletivo. Dessa forma, a educação
pode ser considerada como processo de potencialização do desenvolvimento das
capacidades humanas, possibilitando que as trocas de experiências entre alunos e
professores e entre os próprios estudantes sejam compreendidas como produto das
relações sociais (SANTOS, 2012).
Então como estratégia pedagógica de ensino, podemos utilizar dos jogos,
brinquedos e brincadeiras para estimular e subsidiar o aprendizado dos alunos da
educação infantil, uma vez que as brincadeiras e os brinquedos populares são
elementos que constituem e fundamentam a cultura de um povo. Eles também
expressam os saberes, o lúdico, as experiências vivida e adquirida por uma
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determinada sociedade, visto que estão presente no cotidiano, festas tradicionais,
comemorações e na educação daquela sociedade (FERREIRA & MARCELINO,
2007).
Segundo Leão Junior (2013 p. 22) podemos definir brincadeira como sendo
“qualquer atividade espontânea, com regras simples e/ou modificáveis a medida que
se desenvolve a atividade, tendo como objetivo proporcionar prazer e divertimento”.
Assim percebemos que a brincadeira não objetiva um vencedor, estando ligada
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apenas na realização da atividade de modo espontâneo. Já o brinquedo é um objeto
que dentro de uma brincadeira se torna protagonista da mesma, onde vai estimular a
imaginação dos indivíduos e corrobora diretamente ou indiretamente para a
realização das atividades.
O brinquedo e as brincadeiras populares estão presentes na educação física
escolar dentro do conteúdo jogos, onde de acordo com o Coletivo de Autores (1992),
o jogo é uma construção do homem, cuja suas intenções e curiosidades estimulam o
surgimento de um processo criativo para mudar imaginariamente, a realidade em
sua volta. Tal prática oferece situações de aprendizagens ricas e interessantes,
promovendo o desenvolvimento físico/motor, a interação entre os participantes,
permitindo o confronto de percepções de esquemas, comparações, troca de
informações, modificações de conceitos e conhecimentos diversos e formação
cultural. Para Santos (2012, p. 40),

O jogo é praticado dentro de limites de tempo e espaço, de acordo com


certas regras. E são justamente essas regras as únicas restrições possíveis
na realização do jogo. As pessoas nele envolvidas decidem as atitudes que
executam, de acordo com os resultados que lhes interessam. A
preocupação final do jogo está na autossatisfação e no prazer. Quem não
almeja esses sentimentos não quer participar do jogo.

De acordo com Ferreira (2013), os debates acerca da Educação Física na


Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino fundamental vêm tendo um destaque
maior, desde a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB
- Lei n°9394/96) que define a disciplina como componente curricular obrigatório da
Educação Básica. Porém, apesar de garantir que a disciplina deva estar presente
nos anos iniciais, não assegura que está seja ministrada por profissionais
especializados, como é o caso do licenciado em educação física cujos estudos são
centrados na cultura corporal do movimento construído historicamente pelo homem

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(COLETIVO DE AUTORES, 1992), pudendo ser ministrada pelos professores
pedagogos, que para Ferreira (2013) pode ser chamado ainda de professores
unidocente, polivalente ou de referência da turma.
Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo, descrever uma
pesquisa realizada com uma professora pedagoga e uma professora de educação
física, que ministram os conteúdos da Educação Física na educação infantil. Bem
como, apresentar os jogos e brincadeiras como uma ferramenta pedagógica para
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subsidiar no processo de ensino aprendizagem dos alunos da educação infantil de
modo lúdico.
Este texto é fruto de um trabalho acadêmico, realizado para a disciplina
“Educação Física Escolar 1 – Infantil”, do Curso de Licenciatura em Educação
Física, do Centro Acadêmico de Vitória/UFPE, no semestre 2018.1.
A pesquisa realizada foi de natureza qualitativa e, considerando o principal
objetivo traçado, ela se enquadra como pesquisa exploratória, buscando entender
melhor como as professoras trabalhavam os conteúdos da Educação Física nas
aulas de Educação Infantil, em duas escolas na cidade de Surubim-PE.
De acordo com Gil (2008), a pesquisa exploratória busca proporcionar maior
familiaridade com o problema, tornando-o mais explícito. Em outras palavras, quer
dizer que se trata de um caminho investigativo para aprimorar ideias e
conhecimentos sobre um determinado objeto de estudo, perpassando pelas etapas
de levantamento bibliográfico, entrevistas com sujeitos que fazem/fizeram parte do
problema pesquisado e a análise de exemplos que ajudem na compreensão.
Participaram do estudo duas escolas (uma pública e outra particular) da
cidade de Surubim-PE, localizada no agreste setentrional do estado de Pernambuco.
Ambas possuem um número de turmas e alunos equivalentes. Tanto a escola
pública como a particular possuem um total de 07 (sete) professoras atuantes na
Educação Infantil. Desse universo, optamos por trabalhar com uma amostragem de
15% (de cada escola), o que corresponde a 01 (uma) professora de cada escola. A
partir daí buscamos realizar análise do perfil profissional docente, bem como sua
forma de atuação com o conteúdo jogos nas aulas de educação física infantil.
Uma das professoras é pedagoga e atua como professora unidocente da
escola pública visitada, no turno matutino. A outra entrevistada foi uma professora

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de educação física, que atua como professora especialista também na educação
infantil, no período vespertino da escola particular.
As mesmas foram escolhidas considerando: a) serem graduadas em
Pedagogia ou Educação Física; b) serem professoras na educação infantil com
aulas de Educação Física; c) desenvolver atividades com o uso de jogos e
brincadeiras; d) aceitar participar da pesquisa.
Como instrumento de coleta de dados, foi utilizado um questionário com
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perguntas objetivas e subjetivas a respeito das aulas de Educação Física,
ministradas por elas. Buscamos coletar dados sobre a contribuição dessas aulas
para o desenvolvimento dos seus alunos. Também questionamos se tais aulas
deveriam ser ministradas por profissionais especializados ou se apenas as
intervenções dos professores pedagogos seriam suficientes para o desenvolvimento
total do aluno da educação infantil.
Após a finalização da coleta, os dados foram analisados e agrupados de
acordo com as respostas discursivas e ideias principais, como uma forma de
concluirmos a opinião dos participantes. Para resguardar a identidade das docentes,
no decorrer do texto iremos nos referir a professora pedagoga como “unidocente”,
enquanto que a professora de Educação Física chamaremos de “especialista”.

DESENVOLVIMENTO
Sobre a Educação Física na Educação Infantil

Segundo Ferreira (2013) o Conselho Nacional de Educação reafirma a


presença da disciplina de Educação Física nas séries iniciais, o que perpassa pela
educação infantil, contudo permite que a mesma seja ministrada por professores
unidocentes, sendo optativa a escola e órgão público escolher entre quem deverá
ministrar tais aulas seja o pedagogo ou o professor de Educação Física.
Para Marques (2011), o ambiente e os recursos disponibilizados por meio dos
adultos para a criança desenvolver suas atividades, expressa sua intencionalidade,
expectativas e percepção acerca da atividade. Sendo assim, na educação infantil
quando o professor utiliza-se dos jogos e das brincadeiras com finalidade

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pedagógica, este tem por finalidade tratar o conhecimento da Educação Física
escolar com seus alunos de uma forma mais lúdica.
Ao realizarmos a pesquisa com os professores de realidades distintas,
percebemos semelhanças e diferenças entre a forma de ensino dos conteúdos da
educação física escolar. Então, quando perguntamos sobre as rotinas pedagógicas
das educadoras, percebemos uma semelhança, pois ambas fazem uso de jogos e
brincadeiras durante sua rotina escolar. Porém, enquanto a unidocente utiliza dos
14
jogos e brincadeiras após o horário do lanche (recreio), apenas com fins recreativos
e ou passatempo, a professora especialista aplica esse tipo de atividade durante o
tempo de sua aula, como subsidio para ensinar e trabalhar a cultura corporal do
movimento.
Nesse contexto, o uso dessas brincadeiras e jogos na aula de educação
física, possibilita a ampliação do desenvolvimento dos alunos, não apenas
influenciando um ao outro, mas também oportunizando mais aprendizagens de uns
com os outros. Nessa fase da infância, o professor de Educação Física precisa estar
atento aos processos de desenvolvimento motor da criança uma vez que, o
desenvolvimento motor é uma mudança constante e gradativa do comportamento
motor durante o ciclo da vida, provocada pelo diálogo entre as exigências e as
tarefas motoras do cotidiano, individualidade biológica e as condições ambientais as
quais o individuo está inserido (GALLAHUE, 2005).
Quando perguntamos quais atividades elas mais utilizavam e quais davam
mais certas, então ambas responderam que utilizam as atividades lúdicas, pois elas
unidas com atividades de movimentos corporais costumam melhorar o interesse das
crianças e prender sua atenção. Atividades mais paradas e sem movimentos
corporais, costumam ser frustrantes se realizadas com um período de tempo longo.
Quando falamos de espaços utilizados, equipamentos, materiais pedagógicos
e maiores dificuldades, percebemos uma disparidade entre as escolas analisadas,
uma vez que a professora pedagoga (da rede pública de ensino) relata suas
dificuldades para realizar as atividades em espaços adequados. Vivencia tudo em
sala de aula e não dispõe de muitos materiais pedagógicos (apesar de solicitá-los à
escola) e tão pouco equipamentos como parques e brinquedos.

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Como sabemos, existe uma grande dificuldade financeira por parte das
prefeituras, tendo essa uma grande demanda com recursos escassos, bem como a
falta de conhecimento sobre tema e os problemas oriundos dessa não realização da
educação física correta na educação infantil (CAVALARO, 2009), o que dificulta um
acesso dos alunos da Educação Infantil a uma Educação Física mais eficiente, com
professores especializados.
Já a professora de educação física (da rede privada), dispõe de mais espaços
15
como quadra, pátio, sala de dança, parques entre outros, bem como uma gama de
materiais esportivos e pré-desportivos a sua disponibilidade. Todavia, esta relata
que tem dificuldade de corrigir a postura corporal e dos movimentos de todos os
alunos, necessitando de uma auxiliar. Além disso, também afirmou perceber um
preconceito por parte dos pais e dos alunos em praticar determinados jogos e
esportes, como dança, ginásticas entre outros.
Por fim, ao perguntarmos sobre as experiências negativas que lhe marcaram
durante sua vivência em sala de aula, a pedagoga relata que na rede pública de
ensino, existe uma grande falta de comprometimento dos pais, em fazer o
acompanhamento escolar de seus filhos. Já a professora de educação física da rede
privada de ensino relata que sua maior dificuldade é a falta de interesse dos alunos
e o mau comportamento por parte dos mesmos.

Sobre o uso dos jogos e brincadeiras na educação infantil

Sabe-se que o jogo no ambiente escolar pode proporcionar o aprendizado


das normas sociais, a experimentação de atividades recreativas e seu uso como
recurso pedagógico e conteúdo curricular (SANTOS, 2012), objetivando a ampliação
dos conhecimentos dos alunos por meio de ações práticas. Nesse sentido

Educar, então, é entendido como ato de ensinar e de fazer aprender, [...]


para se fazer aprender ou para que haja aprendizagem é preciso que o
sujeito compreenda os conhecimentos que estão sendo abordados em suas
diversas perspectivas[...] compreender as relações estabelecidas por
determinado conteúdo de acordo com o contexto ao qual está sendo
ensinado; é ter condições de elaborar outras hipóteses que possam ser
testadas e avaliadas para solucionar certos problemas (SANTOS, 2012,
p.37-38).

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Assim, defende-se a ideia de que o aprendizado deve ir além de ensino dos
fundamentos e regras, devendo ser combinados a uma prática, permitindo a
recriação de novas regras e ou formas de efetivação das atividades. Em outras
palavras, deve andar na direção do desenvolvimento do ser humano, uma vez que a
imaginação surge na criança com uma capacidade estruturadora, construtora e
originária, possibilitando que a comunidade habite a criança e a criança habite o
mundo em que vive, explorando os costumes da sociedade da qual está inserida
16
(ZIMMERMANN, 2014).
Podemos ver os jogos como sendo o resultado de um processo social de
longa duração, representando as relações de determinado tempo ou sociedade e ou
ainda como uma possibilidade de formar cidadãos para viver e interagir na
sociedade, visto que o homem quando joga, está representando um acervo cultural
de um povo ou sociedade que está ou foi inserido no jogo, uma vez que algumas
atividades podem ser vista como jogo ou brincadeira para uns e outros não,
podendo ser considerada como um ato de preparação para a vida adulta, como
afirma (KISHIMOTO, 2011, p.108)

“Dessa forma, enquanto fato social, o jogo assume a imagem, o sentido que
cada sociedade lhe atribui. É este o aspecto que nos mostra por que o jogo
aparece de modos tão diferentes, dependendo do lugar e da época. Em
certas culturas indígenas, o "brincar" com arcos e flexas não é uma
brincadeira, mas preparo para a arte da caça e da pesca. Se em tempos
passados, o jogo era visto como inútil, como coisa não séria, depois do
romantismo, a partir do século XVIII, o jogo aparece como algo sério e
destinado a educar a criança.”

Diante disso, é através do incentivo ao brincar, que evitamos limitar a prática


do lúdico a apenas passatempo da disciplina da Educação Física. Para além dessa
possibilidade, seu uso deve também cuidar da formação integral da criança, em
quaisquer espaços de interação (RAMOS, 2014). É brincando que as crianças
conseguem ampliar seu vocábulo, capacidades motoras, de reflexão, criticidade e
complementa seu desenvolvimento anato-fisiológico (FARIA JUNIOR, 2011).
Assim, podemos destacar a que a educação física desempenha um papel
fundamental no desenvolvimento da criança, pois é nessa fase que ela está em
pleno desenvolvimento das suas funções motoras, cognitivas, emocionais e sociais,
deixando de ser mais individualismo para ser mais coletiva, e é durante as aulas de
educação física por intermédio dos jogos e das brincadeiras que as crianças vão se

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dando conta e amadurecendo essa visão de grupo e sociedade a qual ela está
sendo inserida (MAGALHAES, 2007).

CONCLUSÕES

Percebemos então que apesar da educação física estar inserida na grade


curricular da educação básica formalmente, a sua realização prática está um pouco
17
comprometida, pois apesar do esforço da professora unidocente em ministrar suas
aulas, inserindo os conteúdos da educação física, estas não possuem aporte técnico
e ou teórico para realizar as atividades numa perspectiva de desenvolvimento
cognitivo e motor mais ampliada e aprofundada.
Os dados apresentados aqui, por meio da pesquisa exploratória, deixaram
claro uma diferente aplicabilidade dos jogos e brincadeiras, conforme as diferentes
realidades escolares, perfil de alunos, espaços, materiais e equipamentos, entre
outros. Contudo, não podemos esquecer que as crianças também são cidadãs,
donas de uma cultura social, capazes de se transformar e transformar tudo ao seu
redor, ou seja, se quisermos um futuro social melhor, devemos dar uma realidade
melhor para nossos alunos da educação básica.
Ainda trouxemos à discursão do uso desses jogos e brincadeiras enquanto
método e recurso pedagógico para serem utilizados em sala de aula, nas aulas de
educação física infantil, uma vez que sabemos que podemos ensinar a criança os
diversos conteúdos programáticos de uma forma lúdica, descontraída e divertida,
estimulando assim, suas capacidades cognitivas, perceptivas, reflexiva, motora e
social. Sabemos que é através da brincadeira que a criança começa a interagir com
outras, falar, trocar experiências e saberes, deixar de ser mais egocêntrica e
desenvolver suas capacidades criativas.
É interagindo com outras crianças que elas saem de seu mundo e juntas
perpassam por vários outros. Através desses jogos e brincadeiras que os alunos
criam afetos e sentimentos entre eles, bem como podem desenvolver seu
aprendizado corporal por meio de diferentes experiências motoras vivenciadas nos
jogos e brincadeiras.

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Nossas indagações não vão parar por aqui, sabemos que devemos realizar
inúmeras outras pesquisas e submeter estratégias de ensino, objetivando melhorar o
cenário o qual nos deparamos. A partir da pesquisa exploratória realizada foi
possível conhecer, analisar e construir uma compreensão sobre esses dois recortes
de realidade escolar, coletados na cidade de Surubim-PE e que ajudaram a ilustrar
um pouco da rotina do uso de jogos e brincadeiras em sua educação infantil. A
continuidade da pesquisa e seu aprofundamento poderão revelar outros
18
desdobramentos e permitir mais análises.

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, C. R. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 2007.


CAVALARO, A. G.; MULLER, V. R. Educação Física na Educação Infantil: uma
realidade almejada. Curitiba: Educar, n. 34, p. 241-250, 2009.
COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino da Educação Física. São
Paulo: Cortez, 1992.
FARIA JUNIOR, A. Niterói: jogos e brinquedos cantados. Corpus et Scientia, ano 7,
vol. 7, n. 1, p. 82-97, maio 2011;
FERREIRA, M. P. A.; MARCELLINO, N. C. (Org). Brincar, jogar, viver: Programa
Esporte e Lazer da Cidade Volume I. 2007.
FERREIRA, H. S.; TORRES, A. L. Educação física na educação infantil e no ensino
fundamental na percepção de pedagogos: um estudo de caso. Teresina, Revista
FSA, v. 10, n. 4, art. 10, p. 183-194, Out./Dez. 2013
GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. - São Paulo :
Atlas, 2008;
GALLAHUE, D.; OZMUN, J. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês,
crianças, adolescentes e adultos. São Paulo: Phorte, 2005.
KISHIMOTO, T. M. O jogo e a educação infantil. 6ª. ed. São Paulo: Cengage
Learning, 2011.
LEÃO JUNIOR, C. M. Manual de jogos e brincadeiras: atividades recreativas para
dentro e fora da escola. Rio de Janeiro: WAK Editora, 2013.

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MAGALHAES, J. S.; KOBAL, M. C.; GODOY R.P. Educação Física na Educação
Infantil: uma parceria necessária. Campinas: Revista Mackenzie de Educação
Física e Esporte. V. 6 n. 3 p. 43-52, 2007.
RAMOS, S. L. V. Jogos e brincadeiras na escola: Orientação psicopedagógica.
São Paulo: Editora Rapel, 2014.
SANTOS, G.F.L. Jogos tradicionais e a Educação Física. Londrina: EDUEL,2012.
SURDI, A.C.; MELO, J.P.; KUNZ, E. O brincar e o se-movimentar nas aulas de
19
educação física infantil: Realidades e possibilidades. Porto Alegre, Movimento v. 22,
n. 2, 459-470, abr./jun. de 2016.
ZIMMERMANN, A. C.; SAURA, S. C. Jogos Tradicionais. São Paulo: Pirata, 2014.

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A EDUCAÇÃO INFANTIL E SEUS DESAFIOS EM SALA: UMA PROPOSTA
PEDAGÓGICA PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA.

Hildegard Ramos de Oliveira2 | Celene Silva de Azevedo3 | Mirian Marta da Silva


Cavalcante4

RESUMO: O presente artigo foi contextualizado para abordar propostas ofertadas


aos professores de Educação Infantil que lecionam em creches com crianças de
uma faixa etária entre 2 a 3 anos de acordo com as propostas curriculares do
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil o documento foi elaborado 20
através do Ministério da Educação em 1998 não sendo de uso obrigatório; o artigo
tem como objetivo construir conceitos através das observações nos berçários,
portanto foi realizado um processo de investigação com acompanhamento e
questionamentos. Trata-se de uma pesquisa qualitativa etnográfica, obtendo
respostas através de questionários, tendo como universo de investigação uma
creche da rede pública, foram questionados quatro professores da rede, e dentro
desta pesquisa observou-se que as propostas oferecem uma amplitude nas
metodologias utilizadas pedagogicamente com os alunos, sendo possível concluir
que o processo de aprendizagem através das atividades norteadas pelos
referenciais constrói um estímulo no planejamento do professor garantindo um
melhor aproveitamento do rendimento da sala.

Palavras-chave: Currículo. Desafios. Creche. Professor. Berçário.

1 INTRODUÇÃO

Sabemos que a Educação Infantil cresceu consideravelmente em nosso país,


é notório que cada dia mais a mulher empodera-se no mercado de trabalho
ganhando espaços onde até então eram administrados pelos homens; com essa
participação cada vez maior das mulheres no mercado de trabalho, foi necessário
formular uma nova organização para as famílias e através desta postura aumentou a
procura por instituições que atendessem as crianças de zero a seis anos.
Com a aprovação do (artigo 208, inciso IV), a Constituição Federal,
(BRASIL,1987) determinou como dever do Estado oferecer espaços que

2
Graduada em Letras e Pedagogia (FAMASUL/UNOPAR). Doutoranda em Ciências da Educação,
Atenas, ACU.
3
Graduada em pedagogia (Universidade Vale do Acaraú – UVA). Doutoranda em Ciências da
Educação, Atenas, ACU.
4
Graduada em Letras (Universidade Vale do Acaraú – UVA). Doutoranda em Ciências da Educação,
Atenas, ACU.

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garantissem a Educação Infantil em creches e pré-escolas assumindo como direito
legalizado da criança; facilitando assim a vida de muitas famílias que dependem de
espaços como este para favorecimento dos seus ritmos de trabalho. Porém, os
professores dependiam de um documento norteador que favorecesse sua prática em
sala de aula, permitindo que a criança não ficasse ociosa no seu cotidiano escolar,
ela precisava também garantir seu conhecimento dentro das diversas experiências
de vida, sendo elas emocionais, afetivas, sociais e cognitivas, baseando-se em
21
princípios que exercem o direito ao respeito e a dignidade do fator econômico,
social, religioso, cultural entre outros.
Sabemos que práticas e metodologias de aprendizagem são desafios a serem
vivenciados todos os dias dentro de uma creche, torna-se necessário que o
professor abdique a este tipo de realidade e construa planejamentos adequados
para um bom rendimento dentro dos limites dessa idade. A Educação Infantil, por
várias décadas, enfrentou transitórias situações de propostas de ensino, uma vez
que não retém o aluno, nem tão pouco era obrigatório à entrada com menos de sete
anos na escola em tempos atrás. Não sendo muito consideradas como parte
integrante do processo educativo as crianças passavam a ser tratadas apenas de
forma a serem cuidadas por suas professoras. O currículo não existia de forma que
o cuidar era mais importante que o educar, a proposta elaborada dessa nova forma
de ensino para esses pequenos causou muita problemática dentro da própria
categoria devido as divergentes opiniões.
Sabemos que a criança aprende com facilidade, os RCN’s passaram a
favorecer um direcionamento dentro dos conteúdos para essa modalidade, de forma
que a criança fosse cuidada e educada, mas também não fosse abstraída do seu
brincar, em sua fase de aprendizagens com ludicidade e inocência. Com isso a
modalidade da Educação Infantil cresceu dentro do seu espaço social apresentando
nos últimos anos, todo potencial que deveriam ser mostrados, ergueu-se diante de
uma sociedade, ponderando-se dos seus direitos em uma nação que não tem nada
de igualitário.

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2 A CONCEPÇÃO DE LETRAMENTO DENTRO DO CURRÍCULO ESCOLAR DA
EDUCAÇÃO INFANTIL

Para discutir letramento, alfabetização ou mesmo avaliação dentro da


Educação Infantil é necessário compreender que tal ação não deverá ser traumática
ou punitiva, alfabetizar letrando deve ser algo prazeroso para todas as crianças
nessa fase.
22
De acordo com Brandão (2010), permite-nos compreender que:

Se não há sustentação teórica ou empírica para a ideia de pré-requisitos


para alfabetização, por que esperar até os seis ou sete anos para
alfabetizar as crianças? Os que adotam esse modo de pensar defendem,
portanto, que as crianças concluam a Educação Infantil já dominando certas
associações grafofonômicas, copiando letras, palavras e pequenos textos,
bem como lendo e escrevendo algumas palavras e frases. (BRANDÃO,
2010, p.16).

Acreditamos que cada criança tem uma condição de adquirir conhecimentos


por disposição própria, não seja por conta da idade que esteja impedida de se
apropriar do conhecimento alfabético. Para muitos professores avançar a escrita e o
reconhecimento das letras, os sons e a grafia, dentro da Educação Infantil são de
fundamental importância para que os alunos cheguem aos Anos Iniciais avançados
dentro desse descritor de aprendizagem. Portanto o currículo vai mais além do que
meros conteúdos transmitidos; como salienta Brandão (2010 p. 31) “Na Educação
Infantil, a leitura de histórias em voz alta, pela professora, mostra, assim, as marcas
gráficas no papel (que são diferentes do desenho) também comunicam alguma
coisa”. Com estes fundamentos pedagógicos vimos como acontece à aprendizagem
da transcrição da escrita e da leitura. Para Teberosky e Colomer (2003, p. 17) “a
criança pequena assiste à transformação das marcas gráficas em linguagem”, assim
a mesma vai associando o conceito de transformação da aprendizagem e
conhecimento de mundo.
O professor também trabalha de forma lúdica diante do seu planejamento
escolar inserindo cantigas e brincadeiras na roda de aprendizagens, a criança se
sente envolvida e permite a aproximação do conhecimento sem bloqueios, cada dia
mais ganhando confiança da professora em sala. É comum ouvirmos o choro das
crianças nos primeiros dias de aula, porém com o acalentar das professoras diante

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de sua prática cotidiana submetem os alunos ao costume da rotina, fazendo-os
perceber que aquele espaço é favorável, confortável e prazeroso para todos que
estão ali. Dessa maneira, Abramowicz (2013) em suas pesquisas defende que:

A educação de crianças pequenas as coloca no espaço público, que deveria


ser um espaço não fraternal, não doméstico e nem familiar. Queremos
dizer com isso com o espaço público é aquele que permite múltiplas
experimentações. É o espaço, por excelência, da criação em que se
exercitam formas diferentes de sociabilidade, subjetividade e ação, o que
não é possível em espaços familiares, que priorizam a segurança material e 23
imaterial. (ABRAMOWICZ, 2013, p.11).

Dentro deste espaço a criança evoluíra em aprendizagem, sociabilização e


juntamente com os outros aprenderá muitas instruções de vida. Para ela é a
novidade da vida, começa a distanciar-se dos pais, do seio familiar e ganhar sua
própria autonomia como ser social, regrando-se diante das normas que lhes são
acrescentadas dentro da escola. Não poder bater no coleguinha, saber entrar na fila,
ter horário para refeição, aprender a controlar as necessidades fisiológicas e muito
mais. Dessa maneira Goldschmied e Jackson (2013) reforçam que:

Nos primeiros dois anos, a criança passa de uma situação de dependência


quase total para uma de relativa independência, de quatro maneiras, em
termos gerais: por meio do movimento e da habilidade da manipulação, ao
alimentar-se sozinha, no desenvolvimento da linguagem pré-verbal precoce
até a fala propriamente dita, bem como no cuidado corporal que leva ao
controle dos esfíncteres. O ritmo com que a criança avança por essas
diretrizes tem conexões claras com o modo com que seus adultos próximos
percebem seu progresso e com a qualidade da sua relação com eles.
(GOLDSCHMIED e JACKSON, 2013, p.131).

A partir do momento que ela se sente confortável dentro do espaço escolar a


mesma começará a fluir com seus conhecimentos, e produzirá como forma de
escrita seus rascunhos e construção de atividades realizadas em sala. A professora
tem grande atribuição em mediar estes alunos de forma correta e tranquila, fazendo
com que a cada dia eles aprendam um novo conhecimento alfabetizador e de vida.
Referendando-se nas teorias de Brandão (2010 p. 32), “A observação da roda de
leitura com crianças pequenas também evidencia que elas aprendem a distinguir,
progressivamente, a leitura em voz alta e a contação de uma história sem o suporte
do livro ou de outro impresso”.

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A roda de leitura estimula nas crianças o prazer da própria leitura, fazendo
com que as mesmas despertem através da entonação da voz do professor que
conta a história, tornando-a interessante e prazerosa aos ouvidos dos alunos. Muitos
deles depois da história contada e vivenciada, vão até o livro e constroem a
pseudoleitura, da forma como lhes convém compreender as gravuras dentro de um
contexto totalmente literário. Percebemos com isso que na elaboração do Projeto
Político e Pedagógico das escolas devem-se considerar os princípios básicos de sua
24
elaboração, com tudo determinando culturas, com critérios e reflexões tomadas por
indivíduos que irão usufruir do mesmo.
Apresentar um currículo não é tão fácil; é necessário que a equipe
pedagógica esteja consciente do que é fundamental para o crescimento cognitivo de
cada aluno; não depende apenas de propor um plano de conteúdos e colocar em
prática, vai muito mais além, construir um currículo é proporcionar um conhecimento
de mundo que o aluno defenderá por toda sua existência.
Sava (1975 apud MOYLES, 2002, p. 4) afirma que:

O fato desenvolvimental importante é que estimular as mentes infantis,


através de atividades não regularmente oferecidas em casa, reforça sua
capacidade cognitiva de lidar com as tarefas cada vez mais difíceis com as
quais elas vão se deparar nas décadas futuras.

A partir do que for oferecido para cada aluno será este o entendimento de
vida que eles acreditarão como correto; selecionar conteúdos não se trata de uma
atribuição tão simples, pois a responsabilidade do aprendizado para a vida de quem
vai estudá-lo cabe a quem está selecionando para a aplicação dos mesmos, não só
em sala, mas para uma vida toda de conhecimentos. Uma das habilidades bastante
tendenciosas para crianças da Educação Infantil é o trabalho com musicalidade, é
inevitável não inserir no currículo a música; pois a cada dia percebemos o ambiente
escolar mais tranquilo e prazeroso ao ouvirmos uma melodia. Dentre a rotina desta
fase a hora do banho, do sono e da recreação são repertórios diferenciados a cada
estratégia de ensino.
Não deve colocar uma música com um ritmo acelerado na hora dos pequenos
dormirem, assim tiraria o sono de muitos deles, a organização da rotina tem todo um
planejamento calculado como será vivenciado esses repertórios, nas datas
comemorativas do dia das mães, dia das crianças, festas natalinas, todo processo é

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bem selecionado para que os mesmos entendam e participem do momento que
estão vivendo em foco social.
A escola não tende a colocar uma marchinha carnavalesca em pleno natal,
geraria uma perturbação na cabeça da criança, pois com o ensino da música a
criança também aprende muitos fatores de aprendizagem. Goldschmied e Jackson
(2013) defendem a teoria musical de uma forma construtiva afirmando que:

A música é uma área que tende a ser bastante subdesenvolvida nos centros 25
de primeira infância, e a maior parte do que é escrito, sobre o assunto tem
como foco grupos etários mais velhos. No entanto, a música é um veículo
para a expressão e a comunicação, da mesma forma que a linguagem, de
modo que nenhuma criança é nova demais para se beneficiar de
experiências musicais. (GOLDSCHMIED e JACKSON, 2013, p.170).

Através da música a criança também aprende para toda a vida, compartilha


com os pais quando chega em casa e em sua memória fica guardada a construção
de qualquer conhecimento que no momento estiver no roteiro para ser trabalhado.
Para Goldschmied e Jackson (2013, p. 171), afirma que “havendo uma sala que seja
razoavelmente fechada acusticamente e um adulto atento e interessado, um
pequeno grupo de crianças, [...] pode aprender a tocar ritmos diferentes, escolher os
instrumentos, ter cada uma sua vez de tocar, e com a ajuda de um adulto”.
Ferreira (2002, p. 13) confirma que:

Considerada em todos os seus processos ativos (a audição, o canto, a


dança, a percussão corporal e instrumental, a criação melódica) a música
globaliza naturalmente os diversos aspectos a serem ativados no
desenvolvimento da criança: cognitivo/ lingüístico, psicomotor, afetivo/
social.

Interessante é desvendar como as crianças pequenas aprendem tão


subitamente, um currículo bem elaborado, planejamentos, roteiros, rotinas e outras
estratégias de ação pedagógicas constroem o saber de forma prazerosa e eficaz,
sem traumas, sem atrasos de conhecimentos cognitivos. Quem acompanha percebe
como é rico o espaço da Educação Infantil; seria muito limitado se não ensinassem o
letramento nesta fase, limitar a criança apenas ao brincar seria castrá-lo de garantir
aprendizagens para toda uma vida.
Esse universo nunca deve ser subestimado, a aprendizagem acontece na
proporção das estratégias que são oferecidas, se você oferece didaticamente

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metodologias que fundamentam aquela fase com certeza a criança surpreende com
a rapidez que executa suas competências dentro das suas habilidades de
aprendizagem. As crianças gostam de manusear areias, pintar, colar, rabiscar, pular,
sentir com o tato com a boca, o sabor, as cores, o som tudo se torna um encanto em
seu mundo de descobertas, no banho a brincadeira com água e livros de banho que
são plastificados para estimular a leitura com o prazer do banho. Conforme
Goldschmied e Jackson (2013, p. 173) “ao usar tintas, a criança [...] faz experiências
26
com as cores, passando o pincel de uma mão para outra, [...] depois começa a
pintar figuras e a combinar as cores primárias, e pode ainda “nomear” aquilo que
pinta”. São com esses experimentos e sensibilidades que a criança vai evoluindo
dentro dos seus conhecimentos de mundo, desenvolvendo seus sentidos e
raciocínio lógico de aprendizagens significativas da interação com o outro.
Para Abraamowicz e Vandenbroeck (2013) concordam que:

As crianças aprendem através da diversidade étnica, cultural, de gênero, de


composição familiar, habilidades e outros, no entanto, o consenso de que a
diversidade importa não implica necessariamente um consenso sobre como
ela é percebida ou tratada, muito menos um consenso sobre como se deve
lidar com ela. (VANDENBROECK, 2013, p.14)

Oferecer um currículo para a primeira infância deve ser muito bem elaborado
e planejado no currículo estão inseridas atribuições de contribuição da própria
identidade dos alunos que fazem parte de uma sociedade, aonde cada um irá se
destacar por seus próprios méritos, através dele o aluno elevará sua potencialidade
e criticidade. Nas palavras de Ferreiro (1993) enfatizam que:

[...] não é obrigatório dar aulas de alfabetização na pré-escola, porém é


possível dar múltiplas oportunidades para ver a professora ler e escrever;
para explorar semelhanças e diferenças entre textos escritos; para explorar
o espaço gráfico e distinguir entre desenho e escrita; para perguntar e ser
respondido; para tentar copiar ou construir uma escrita; para manifestar sua
curiosidade em compreender essas marcas estranhas que os adultos nos
põem mais diversos objetos. (FERREIRO; 1993, p.39).

Para muitos professores ainda é um absurdo alfabetizar na primeira infância,


porém é tão natural quanto ensinar a criança a pedir um copo com água, ele já sabe
associar os sabores, se é azedo, ou doce, faz gesto se gosta de alguma coisa ou se
repudia, emite sentimentos perceptíveis de sono, fome ou dor; isto prova o quando a
mentalidade desta criança está desenvolvida em seu contexto social, e nada impede

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de que a mesma experimente um lápis e desenhe com sua coordenação ainda não
muito fina, mas descubra as cores, com o dedo na tinta e os sabores com a mão na
fruta que saboreia o gosto do que é levado ao paladar.
Ela descobre um mundo além do ventre, com outros sons, formatos e tudo
que possa imaginar, desenvolver seus conhecimentos alfabéticos são só mais um
de seus conceitos de mundo, ela é capaz de produzir rabiscos e desenhos através
da sua imaginação de criança voluntária no mundo em que está exposta. Dessa
27
maneira observamos que a Educação Infantil é uma modalidade valiosa dentro da
educação, sem uma base estruturada, o ser humano tende a obter problemas
sociais, cognitivos e afetivos no decorrer de sua trajetória de vida, para tanto o
currículo da Educação Infantil sendo bem elaborado juntamente com as atualidades
propostas em novos documentos oferecidos dentro do contexto escolar garantirá
uma plenitude nos conhecimentos desta modalidade.

3 METODOLOGIA- MATERIAL E MÉTODOS

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA

A pesquisa foi vivenciada em uma creche da rede de ensino municipal,


localizada em espaço urbano sendo este de ponto estratégico, e considerada de
grande porte. Os participantes, investigados foram professores da rede pública da
primeira infância, os mesmos serão identificados por letras e números para assim
garantir proteger a imagem dos pesquisados.

3.2 CONTEXTO DE ESTUDO

A referida creche atende uma comunidade carente do município,


comportando uma média de 220 crianças, nos dois turnos, matutino e vespertino,
enquadra também duas turmas de berçário e quatro turmas de educação infantil do
nível I ao III, que são crianças que vão de zero ao quinto ano de vida.
O espaço da creche está referente ao modelo “B”, das creches construídas
através do PAR, (Plano de Ações Articuladas) do Ministério da Educação no

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governo Dilma Rousseff, foi inaugurada em 11 de junho de 2012, está totalmente
legalizada com sua documentação; a estrutura da mesma compõe uma secretaria,
uma sala de professores, um almoxarifado, um pátio aberto, dois berçários quatro
salas de aula, sete banheiros e uma cantina, onde são realizadas cinco refeições por
dia, possui quarenta funcionários entre efetivos e contratados, nas áreas
pedagógicas, administrativa e serviços gerais.

28

3.3 COLETA DE DADOS

Para o questionamento dos professores foi composta uma série de


perguntas sobre o tema visado. “Para cada uma dessas perguntas, oferece-se aos
interrogados, uma opção de respostas, definindo a partir dos indicadores, pedindo-
lhes que assinalem o que correspondem melhor sua opinião” (LAVILE; Dione, 2011,
p.183).

3.4 ANÁLISE DOS DADOS

O estudo do avanço da Educação Infantil e seus desafios em sala: uma


proposta pedagógica para a primeira infância, foi abordado através de uma pesquisa
qualitativa de cunho etnográfico com questionários abertos, incorporando a questão
da evolução dos significados da aprendizagem pedagógica através dos RCNEI’s no
direcionamento curricular na elevação do ensino e da aprendizagem escolar com
seus rendimentos de aprendizagem.

4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Os resultados serão apresentados através de gráficos e tabelas (quando


necessário), alinhadas nas questões correspondentes.

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Quadro 1 – Resultado abordado dentro da 1ª questão do questionário e
respostas da pesquisa qualitativa etnográfica através de questionário aberto.
Questão Respostas dos Professores
1-Descreva como é elaborado o P1- Nosso planejamento é diferenciado dos alunos
planejamento anual da Educação Infantil dos Anos Iniciais, no ínicio não participávamos das
dentro de uma creche. formações depois começamos a fazer parte,
elaborando através dos livros didáticos.
P2- A educadora de apoio senta conosco e traz
muitos materiais para que possamos organizar a
rotina das crianças.
P3- A educadora de apoio vai pra uma reunião e traz 29
propostas para toda a creche.
P4-Através dos referenciais da Educação Infantil, e
da proposta pedagógica da creche recebida pela
secretaria.
Fonte: dados da pesquisa de campo

O primeiro professor queixa-se que antes não fazia parte do processo de


planejamento da escola, tinha as crianças com um olhar apenas do cuidar e não
educar; porém o segundo explana que através de suporte pedagógico realiza a
construção do planejamento; o terceiro percebe que a educadora da escola tem uma
rotina de participação na reunião mensal da secretaria de educação com as técnicas
e sempre que participa trás suporte pedagógico; a quarta professora reconhece que
os referenciais da Educação Infantil e a proposta entregue através das técnicas da
secretaria de educação facilitam sua elaboração do planejamento.

Quadro 2 – Resposta da 5ª questão do questionário aplicado com as professoras do


berçário.

Questão Respostas dos Professores


5- Como você compreende que deve ser P1- Diversificada, sem ser apenas brincadeiras.
uma proposta pedagógica para as P2-Com um ensinamento que ele aprenda o som e as
crianças do berçário?
noções das coisas.
P3- Eles precisam saber dominar suas vontades,
libertando-se das fraudas.
P4-Desenvolver a segurança de si, sem choros com o
convívio dos coleguinhas.

Fonte: dados da pesquisa de campo

O primeiro professor compreende que com o quite de livros que as crianças


ganharam por parte do município, elas vão despertar para a aprendizagem com os
livros de banho que as mesmas brincam na hora do banho; porém a segunda

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professora acredita que uma proposta deva contemplar musicalidade, onde
desenvolve a coordenação motora da criança e a sociabilidade com o outro; a
terceira aborda que as crianças devem em primeiro lugar ganhar autonomia com seu
corpo, sabendo dominar o xixi e outras vontades; por fim a quarta professora
compreende que estimular a segurança dos pequenos será de certa forma uma
aprendizagem construtiva, pois evitará um ambiente estressante sem choros.

30
Quadro 3 – Resposta da 9ª questão da entrevista dos professores.

Questão Respostas dos Professores


6- Você concorda que a criança dentro da P1- Sim, as crianças são muito inteligentes elas
modalidade da Educação Infantil deve ser aprendem com facilidade.
alfabetizada e letrada antes dos Anos
P2-Sim, se a criança domina o letramento dentro do
Iniciais? Justifique sua resposta.
seu nível não tem motivo para esperar que ela saia da
primeira infância para ser alfabetizada.
P3- Sim, eu vejo nas escolas particulares crianças
lendo com cinco anos, então os nossos também
podem conseguir.
P4- Sim, o letramento também deve fazer parte da
nossa rotina.
Fonte: dados da pesquisa de campo

A primeira professora concorda que as crianças dominam o letramento devido


sua inteligência independente de sua escolaridade; a segunda não enxerga qual
razão deveria esperar uma criança chegar às séries iniciais para iniciar o processo
de alfabetização; a terceira professora não subestima a capacidade das crianças de
creche pública aprender o letramento tanto quanto as crianças de rede privada e por
fim, a quarta concorda que o letramento deve sim fazer parte da primeira infância,
pois a mediação de aprendizagem acontece em todo momento da vida dos
pequeninos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das experiências compartilhadas analisamos que as crianças da


Educação Infantil dependem totalmente de um professor que consigam norteá-las a
passar de uma fase de vida para outra, crianças que não dominam o xixi, que não
tem coordenação motora refinada, não conseguem falar apenas balbuciar, como
também não sabem caminhar, são crianças que precisam de professores

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preparados para seu contexto de realidade. Professores que não tem perfil para
berçário não se identificam com a rotina do que é proposto; o brincar, o cuidar e o
educar são os pilares que estão inseridos dentro do currículo da Educação Infantil, e
não cabe apenas o professor brincar sem educar dentro de um contexto de
letramento, pois é visto que a criança aprende dentro de suas fases de vida através
de um direcionamento de um adulto, dirigindo de forma coerente seus anseios e
construindo a evolução de seus conhecimentos através dos seus pensamentos.
31
As crianças dentro da creche estão submetidas a sentir saudades da família,
do cheiro da mãe, do peito que a alimenta, do contato com seu espaço, a princípio
choram ao encontrar pessoas que nunca avistaram antes, crianças que no brincar
podem morder empurrar de forma agressiva refletindo suas influências familiares,
assustando ainda mais seus coleguinhas que ainda não superaram a distância da
família. O desafio é um pouco maior que se imagina, gerar a conquista do afeto
nessas crianças depende totalmente da habilidade do professor, que depois de
algumas orientações por parte da equipe técnica pedagógica da escola, que
proporciona direcionamentos pedagógicos referentes a estas crianças dentro desta
faixa, a partir daí a experiência do cotidiano leva aos profissionais cuidadores de
berçário identificar, os choros, os dengos, o olhar, o balbuciar quando se quer
alguma coisa.
Portanto a primeira infância dentro da creche é naturalmente enriquecedora,
tanto os pais são beneficiados em seu trabalho, com tempo oportuno para dedicar-
se sem preocupar-se com seus filhos, com todo conforto de alimentação, banho,
aprendizagem, sociabilidade e evolução de conhecimento, como também contam
com a aprendizagem cognitiva para quando a criança ingressar nos Anos Iniciais já
estão bem avançadas, compreendendo as competências e habilidades a serem
desenvolvidas durante o ano letivo.

REFERÊNCIAS

ABRAAMOWICZ, Anete; VANDENBROECK, Michel. Educação Infantil e


Diferença. Campinas - SP: Papirus, 2013.

BRANDÃO, A. C. Perrusi. Ler e Escrever na Educação Infantil. Belo Horizonte:


Autentica, 2010.

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BRASIL, Ministério da Educação do. Referencial Curricular para a Educação
Infantil. v. 3. Brasília-DF: MEC/SEB, 1997.

FERREIRA, Danielle. A importância da música na educação infantil.


Universidade Cândido Mendes. Rio de Janeiro, 2002. Disponível em
<http://www.avm.edu.br/monopdf/6/DANIELLE%20FERREIRA.pdf >Acesso em: 25
out 2018

FERREIRO, Emilia. Com todas as letras.In: BRANDÃO, A. C. Perrusi. Ler e


Escrever na Educação Infantil. Belo Horizonte: Autentica, 2010. 32

GOLDSCHMIED, Elinor; JACKSON, Sonia. Educação de 0 a 3 anos: O


atendimento em Creche: Porto alegre: Grupo A, 2006.

LAVILLE, Crhistian; DIONE, Jean. A construção do saber: Manual de metodologia


em pesquisa em ciências. Porto Alegre: Artmed, 2011.

MOYLES, Janet R. Só brincar? O papel do brincar na Educação Infantil. Trad.


Maria Adriana Veronese. Porto Alegre: Artmed Editora, 2002, p. 31-45.

PRADO, Iara, SANTOS, Marilene. Referencial Curricular Nacional para


educação. Disponível em< http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd... > Acesso em:
24 out. 2018.

TEBEROSK, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e escrever; uma proposta


construtivista. In: BRANDÃO, A. C. Perrusi. Ler e Escrever na Educação Infantil.
Belo Horizonte: Autentica 2010.

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O CURRÍCULO POR LINGUAGENS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ALGUMAS
REFLEXÕES SOBRE A PROPOSTA DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
BELÉM/PA
Ana Cláudia da Silva Magalhães5 | Antonia Suely Oliveira da Paz6 | Celita Maria
Paes de Sousa7

RESUMO: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa em andamento,


desenvolvida numa Unidade de Educação Infantil da Rede Municipal de Belém. O
objetivo geral da pesquisa é investigar e analisar a prática pedagógica da professora 33
de uma turma com crianças entre 4 e 5 anos de idade no desenvolvimento do
currículo por linguagens. A pesquisa tem como base a abordagem qualitativa e
como, aporte teórico-metodológico, o estudo de caso. A pesquisa encontra-se na
fase embrionária, desse modo, neste trabalho pretende-se apresentar um breve
desenvolvimento da primeira etapa da pesquisa. A referida etapa, objeto desse
trabalho, consiste em apresentar e problematizar a implantação da proposta do
currículo por linguagens na educação infantil. Para tanto, recorremos à pesquisa
documental com intenção de compreender os aspectos legais da proposta, assim
como outros registros pertinentes às discussões de caráter pedagógico. A partir
desse primeiro movimento da pesquisa, foi possível compreender que a proposta do
currículo por linguagens possibilita a construção coletiva do projeto pedagógico; a
criança enquanto protagonista do planejamento; e, por último, a função do professor
enquanto mediador nas situações de aprendizagens significativas para a criança.

Palavras-chave: Currículo por linguagens; educação infantil; prática docente.

INTRODUÇÃO

No Brasil, o atendimento às crianças de zero a seis anos em creches e pré-


escolas constitui direito assegurado pela Constituição Federal de 1988; consolidado
pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/1996 (LDB), que estabelece
em seu artigo 29 a educação infantil enquanto primeira etapa da educação básica, e
tem como finalidade o desenvolvimento integral das crianças até os cinco anos de
idade em diversos aspectos – físico, psicológico, intelectual e social.
A partir dessas determinações, a LDB fixou as normas mínimas que
assegurassem o desenvolvimento das diretrizes para a educação infantil em todo

5
Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Educação, na linha de pesquisa Currículo e Gestão da
Escola Básica, na Universidade Federal do Pará – UFPA, claudiamag68@hotmail.com
6
Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Educação, na linha de pesquisa Currículo e Gestão da
Escola Básica, na Universidade Federal do Pará – UFPA, suelydapaz@hotmail.com
7
Doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica da São Paulo, Brasil(2010)
Professor Associado da Universidade Federal do Pará , Brasil, celtps@hotmail.com

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território nacional. Nesse contexto político e educacional, alguns documentos foram
aprovados pelo Conselho Nacional de Educação com a intenção de orientar e
fomentar o debate sobre a política curricular para educação infantil. Entre os
documentos que subsidiaram as principais mudanças ocorridas nos sistemas de
ensino no país, temos o Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil
(RCNEI), aprovado em 1998, posteriormente, as Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Infantil (DCNEI), Resolução n.5 de 2009. E, mais recentemente, a Base
34
Nacional Comum Curricular, regulamentada em 2017, tendo sido aprovada a terceira
versão referente aos níveis da educação infantil e ensino fundamental, enquanto
ainda se aguardam os debates e consolidação dos aspectos legais definidos para o
ensino médio.
Com esse novo cenário para organização e regulamentação de etapas da
educação infantil brasileira, os municípios, em especial, tiveram que construir e
implementar projetos em que dessem conta das novas orientações e demandas
previstas para a organização do currículo na primeira infância.
Nesse trabalho, apresentaremos e problematizaremos o Currículo Organizado
por Linguagens, projeto este adotado pela Secretaria Municipal de Educação de
Belém (Pará) desde 2007 ao período atual. O texto ora apresentado faz parte de um
recorte da pesquisa em andamento, realizada em uma Unidade de Educação
Infantil, vinculada à prefeitura de Belém. Temos a intenção de apresentar e
problematizar três aspectos iniciais: 1) O processo de discussão e implantação do
Currículo Organizado por Linguagens para etapa da educação infantil; 2) A
organização e os elementos constitutivos do Currículo por linguagens; 3) E, por
último, trazer uma breve discussão de autores que subsidiam a discussão atual da
educação infantil, considerando o encontro com a concepção adotada na referida
proposta.
A pesquisa tem como base a abordagem qualitativa, possuindo como enfoque
metodológico o estudo de caso. Neste trabalho, apresentaremos um pouco da
dinâmica do currículo por linguagens e as nossas primeiras análises parciais
apoiadas nos documentos oficiais da Secretaria Municipal de Educação de Belém e
de autores que fomentam a discussão sobre a infância na atualidade.

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O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO CURRÍCULO POR LINGUAGENS NO
MUNICÍPIO DE BELÉM/PA

A partir de 1997, após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases, Lei


9.394/96, várias políticas de atenção aos direitos da criança começaram a ser
implementadas pela Prefeitura Municipal de Belém. 35
As Creches receberam uma nova nomenclatura, passaram a ser chamadas
de Unidades de Educação Infantil - UEI, ficando sob a responsabilidade da
Secretaria Municipal de Educação – SEMEC, que começou a vivenciar um
movimento coletivo de reorientação curricular, visando à construção de uma política
educacional que expressasse os anseios das classes populares.
Surge, então, o Projeto Político Pedagógico da Escola Cabana, através dos
princípios da Inclusão Social e da Construção da Cidadania, que se refletem nas
diretrizes: Democratização do Acesso e Permanência com sucesso, Gestão
Democrática, Valorização Profissional e Qualidade Social da Educação, na busca
por efetivar uma política educacional de qualidade, democrática e popular.
Nesse contexto, a criança é compreendida como alguém que tem uma
história e que se caracteriza nessa história que, independentemente de sua idade,
influência e é influenciada pelo meio social em que vive. Essa criança que pertence
a uma determinada classe social, e que tem na sua cultura o suporte para a
construção de sua identidade, é considerada sujeito de direitos, cidadã.
Consolidando o pensamento de Kramer e Souza (1991) ao afirmar que a criança já
nasce com uma história. Assim, as mesmas fazem e se fazem na cultura, pertencem
a uma classe social e vão se fazendo nessa história, cidadãs de pouca idade que
são.
Na condição de primeira etapa da educação básica, a educação infantil passa
a ter função específica no sistema educacional: a de iniciar a formação necessária a
todas as crianças para que possam exercer sua cidadania. Por sua vez, a definição
da finalidade da educação infantil como sendo o “desenvolvimento integral da
criança até cinco anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e
social, complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, 2017),

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evidenciou a necessidade de ver a criança na sua totalidade para promover seu
desenvolvimento e implicou compartilhamento da responsabilidade familiar,
comunitária e do poder público.
As Unidades de Educação Infantil passaram a ser vistas como um espaço
sociocultural, onde as ações são organizadas e sistematizadas com a finalidade de
contribuir com a formação integral da criança, na busca da apropriação do
conhecimento infantil e do mundo onde estão inseridas. Nessa perspectiva, o
36
conceito de criança englobou de maneira integrada dois princípios básicos: o
“cuidar” e o “educar”, que partem de concepções de desenvolvimento que
consideram as crianças em seus contextos sociais e culturais.
Essas mudanças exigiram clareza de concepção e dos direitos das crianças,
bem como, dos pressupostos da educação infantil, ponto de partida para a
construção de uma prática pedagógica consistente que se inicia no planejamento do
professor.
Após uma década da implantação da primeira proposta elaborada para
educação infantil em Belém, temos uma nova gestão municipal assumindo a
secretaria de educação. Neste cenário, a história da organização do Currículo por
linguagens na educação infantil se iniciou em 2007, quando a Secretaria Municipal
de Educação de Belém assumiu a tarefa de construir uma proposta para creches e
pré-escolas que viesse ao encontro do debate atual para a primeira etapa da
educação básica, de modo a atender as especificidades locais e regionais do
sistema de educação para primeira infância. A intenção não era negar os avanços
da proposta anterior, nem impor uma nova proposta curricular sem a participação
dos profissionais da educação, mas avançar ao encontro dos debates atuais para
infância e das perspectivas curriculares para educação infantil.
Nesse processo, a secretaria teve o cuidado de construir a proposta junto à rede
pública de ensino, pois os docentes já vinham desenvolvendo a prática pedagógica
desde 1997, apoiada em outra perspectiva teórica e metodológica para a educação
infantil. Desse modo, o primeiro ano se configurou no movimento de apropriação,
discussão e estudos de autores que discutiam o currículo por linguagens, dentre
eles Loris Malaguzzí, Carolyn Edwards, Lella Gandini, Gabriel Junqueira Filho,
Marcia Gobbi, entre outros. Nesse contexto, a Secretaria Municipal de Educação

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promoveu as primeiras formações para professores, juntamente a esse movimento,
a equipe técnica da secretaria organizou sessões de estudos para um
aprofundamento sobre as questões pertinentes ao currículo por linguagens.
A ideia inicial da proposta curricular se configurou a partir da representação
de uma “teia”, onde as linguagens infantis se entrelaçavam. Essa imagem teve um
caráter simbólico, na medida em que se buscava expressar, nessa representação
gráfica, as diversas linguagens do currículo da educação infantil, e assim o desenho
37
curricular inicial era deflagrador de um desejo, no qual o currículo fosse um
movimento vivo e dinâmico a partir das manifestações expressivas das crianças,
oportunizando desse modo a construção coletiva com a participação de
professores(as), coordenadores(as) e toda a equipe técnica da educação infantil.
Deste modo, esse movimento de construção e implantação da proposta curricular foi
cuidadoso e gradual.
Nesse período, já possuíamos no país inúmeras propostas curriculares
municipais que buscavam atender as prerrogativas legais e teóricas que
subsidiavam a discussão em torno da temática da educação infantil versus
qualidade e os direitos das crianças. As discussões e estudos sobre currículo na
educação infantil já apontavam a necessidade dos sistemas reverem a política
curricular para este nível. Com a efervescência de debates em torno do currículo e
das propostas pedagógicas, um dos pressupostos teóricos e metodológicos que se
destacavam era o currículo por linguagens na educação infantil, como já
mencionamos anteriormente.
É importante ressaltar que, ao longo da construção da proposta curricular e o
seu amadurecimento, cada UEI e sua equipe tiveram autonomia e flexibilidade para
construir sua identidade quanto àquilo que era intitulado de “teia” das linguagens no
desenvolvimento do projeto pedagógico.
Desse modo, as Unidades de Educação Infantil organizam a sua rotina e o
seu trabalho pedagógico visando ao encontro das necessidades das crianças,
garantindo o desenvolvimento integral das mesmas. Partindo das situações de
aprendizagens apoiadas nas demandas que surgiam do contexto social e cultural
delas. A seguir, comentaremos um pouco dos elementos que constituem o Currículo

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por linguagens e os aspectos centrais da proposta. Ressaltamos que essa forma de
organização curricular permanece atendendo a mesma lógica nos dias atuais.

O CURRÍCULO POR LINGUAGENS E ALGUMAS REFLEXÕES INICIAIS

Para a materialização do currículo por linguagens, a secretaria de educação


de Belém vem optando por trabalhar numa perspectiva da pedagogia de projetos,
desse modo, o currículo é sistematizado por meio dos projetos pedagógicos, 38
cabendo a cada UEI o planejamento e construção do mesmo. Esse desenho
curricular possibilita a construção da “teia” das linguagens que vão fazer parte do
projeto. Algumas linguagens são sugeridas no documento, entretanto, não se
esgotam como a única opção na construção do projeto pedagógico na UEIs.
Para a construção dos projetos pedagógicos nas UEIs, inicialmente é
escolhida a linguagem impulsionadora, essa linguagem deve partir da observação e
registros das professoras com as crianças. Conforme apontam os documentos,
nessa construção é necessário verificar qual ou quais são as demandas das
crianças naquele período. A partir dessa observação é definida a linguagem central,
a impulsionadora do projeto. E ainda, nesse processo, essa linguagem aponta o
caminho inicial do projeto pedagógico da UEI, havendo posteriormente outros
desdobramentos para se trabalhar outras linguagens que sustentam a construção da
“teia” e seus conteúdos/linguagens.
A “teia” da linguagem assume o lugar central, enquanto espinha dorsal de
sustentação pedagógica do currículo, oportunizando o surgimento das linguagens
emergentes, apontando os caminhos e escolhas do projeto no desenvolvimento das
situações de aprendizagens nos diversos espaços da UEI. As linguagens
emergentes são outras linguagens selecionadas pela professora para o
desenvolvimento do projeto, onde se oportuniza a construção de experiências e
atividades que serão desenvolvidas com as crianças ao longo de aproximadamente
três meses.
Para organizar o trabalho, é necessário que se tenha em mente que, ao
chegar às UEIs, as crianças já trazem uma história de vida construída na família
e/ou na comunidade em que estão inseridas. Contudo, fica evidente que a
responsabilidade pela formação das crianças em sua integralidade é

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responsabilidade de todos os envolvidos no processo educativo, ou seja, da família,
da comunidade, do Estado e das instituições de Educação Infantil.
Para conhecer melhor essa criança, é necessário um acompanhamento
próximo e diário pelos professores, a partir de uma proposta de trabalho intencional,
elaborada e coordenada em primeiro plano por eles. No momento do planejamento,
também são consideradas as informações coletadas na unidade, no ato da pré-
matrícula, quando ocorre uma rápida entrevista com o responsável da criança.
39
O projeto é estruturado a partir de um modelo já preestabelecido pela equipe
técnica da educação infantil da SEMEC, o mesmo apresenta uma organização
padrão, a saber: 1) Capa: apresentando informações gerais, como identificação da
UEI, título e tema; 2) Justificativa; 3) Referencial teórico; 4) O objetivo geral e os
específicos – que são elaborados a partir das bases das linguagens emergentes,
tendo como foco os movimentos dessas linguagens. A proposta não tem uma lista
rígida de linguagens para serem trabalhadas, entretanto, a secretaria tem uma lista
com sugestões. Apresentamos as principais linguagens trabalhadas: linguagem oral;
linguagem musical; linguagem plástico-visual; linguagem da acolhida e a linguagem
intra e interpessoal.
Os procedimentos metodológicos são divididos por período de tempo, isto é,
por quinzena ou por mês; sendo que cada unidade tem liberdade de definir sua
forma mais adequada.
Diante deste processo, são organizados os espaços, ou seja, as salas
ambientes, de acordo com a proposta metodológica envolvendo as diversas
linguagens, elencando a linguagem impulsionadora do dia, aquela verificada pelo
professor a partir das observações registradas nos diversas atividades e
experiências desenvolvidas com as crianças.
A discussão da qualidade das práticas pedagógicas oferecidas na educação
infantil está intimamente ligada à configuração desses elementos, uma vez que as
Unidades de Educação Infantil da rede municipal de Belém buscam aperfeiçoar tais
práticas que delimitam dilemas e possibilidades, abrindo um leque de desafios
encorajadores que levam os professores a refletir sobre sua prática em meio à
diversidade, almejando chegar a um objetivo comum por meio do currículo por
linguagens.

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As estratégias utilizadas pelos professores buscam articular-se às atividades
lúdico-pedagógicas intencionais, preocupando-se com cada faixa etária,
considerando que cada criança tem que ser vista em sua particularidade e
individualidade. Desse modo, as práticas educativas, conforme destaca Kramer e
Nunes (2013), devem respeitar e acolher as crianças em suas diferenças,
entendendo que são cidadãs de direitos à proteção e à participação social, a
experiências culturais nas quais combinam saberes vividos no cotidiano.
40
Quando falamos de currículo, estamos descrevendo a concretização das
funções da própria escola e a forma particular de enfocá-lo num momento histórico e
social determinado, para um nível ou modalidade de educação. Compreendendo
que currículo é o mecanismo através do qual o conhecimento é distribuído
socialmente (SACRISTÁN, 2000).
O trabalho pedagógico passou a ser desenvolvido com base na organização
curricular por linguagens, onde as crianças se expressam/comunicam com o meio de
maneira diversa e, assim, interagem, ressignificam e compreendem o meio social,
cultural e material em que vivem, como é proposto por Junqueira Filho (2005).
A partir das linguagens na educação infantil, Vasconcelos (2000) considera a
infância como uma sucessão de etapas de desenvolvimento e cada uma tem suas
particularidades. O desenvolvimento é contínuo, e cada etapa constitui um processo
decisivo para a etapa seguinte. O que ocorre globalmente, na medida em que a
criança cresce e desenvolve suas potencialidades nos planos afetivos, intelectual,
social, cultural e ambiental.
O movimento de deslocar o olhar sobre a criança no sentido de percebê-la
como sujeito-relacional convoca o educador a redimensionar, também, seu papel no
projeto educativo. Coparticipantes, parceiros, os dois polos da díade criança-adulto
extrapolam as posições hierarquizadas do antigo par aluno-professor para se inserir
na cultura como aprendizes, construtores/desveladores da realidade científica e
estética.
Nesta perspectiva, o currículo da Educação Infantil que vem sendo
desenvolvido no Município de Belém, pela Secretaria Municipal de Educação, junto
às UEI’s, deve ser entendido enquanto concepção e materialização nas práticas

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pedagógicas, tendo como objetivo principal o desenvolvimento integral da criança a
partir das diversas linguagens.
Essa proposta de currículo na educação infantil favorece a busca de
construção da identidade, da organização e da gestão do trabalho de cada
instituição educativa. Os projetos construídos e desenvolvidos pelas professoras, no
decorrer do ano, reconhecem e legitimam a instituição educativa como histórica e
socialmente situada, constituída por sujeitos culturais que se propõem a desenvolver
41
uma ação educativa a partir de uma unidade de propósitos.

Assim, são compartilhados desejos, crenças, valores, concepções, que


definem os princípios da ação pedagógica e vão delineando, em um processo de
avaliação contínua e marcado pela provisoriedade, suas metas, seus objetivos, suas
formas de organização e suas ações.
A partir da compreensão dessa definição, podemos construir um significado
para a prática pedagógica, entendendo-a como a busca de organização do trabalho
de cuidar e educar de crianças em creches e pré-escolas, complementando a ação
da família e da comunidade.
Moreira e Candau (2006, p.86) definem currículo,

como as experiências escolares que se desdobram em


torno do conhecimento, em meio às relações sociais, e
que contribuem para a construção de identidades de
nossas estudantes (crianças). Currículo associa-se,
assim, ao conjunto de esforços pedagógicos
desenvolvidos com intenções educativas.

A partir dessas discussões e definições, conceituamos currículo na Educação


Infantil como um conjunto de experiências culturais do cuidado e educação,
relacionadas aos saberes e conhecimentos, intencionalmente selecionadas e
organizadas pelos professores, para serem vivenciadas pelas crianças, na
perspectiva de sua formação humana (JUNQUEIRA FILHO, 2005).
E ainda as DCNEI, em seu art.3º, definem currículo da Educação infantil
como:

(...) um conjunto de práticas que buscam articular as


experiências e os saberes das crianças com os
conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural,
artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a

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promover o desenvolvimento integral da criança de 0 a 5
anos de idade (BRASIL, CNE/CEB, 2009, p.1).

Desse modo, o professor, ao considerar as experiências e saberes das


crianças no currículo por linguagem, realiza movimento que oportunizará pistas para
o seu planejamento e reflexão das atividades diárias. Além de considerar as
escolhas e desejos das crianças, assim oportunizando sujeitos mais críticos e
reflexivos. 42

CONCLUSÃO

A partir da análise dos documentos oficiais da Secretaria Municipal de


Educação de Belém que subsidiam o currículo por linguagens na educação infantil e
de outros documentos que fazem partem do planejamento pedagógico das Unidades
de Educação Infantil, temos algumas considerações provisórias em relação a essa
proposta curricular. Em primeiro lugar, destacamos a importância desse currículo,
por enfatizar as potencialidades das crianças, ao considerar as suas demandas e
seu saberes para a construção do mesmo; o segundo aspecto fundamental diz
respeito à flexibilização do processo, na medida em que prevê alterações ao longo
do desenvolvimento do trabalho pedagógico, não estabelecendo de forma rígida
uma sequência de atividades; o terceiro aspecto compreende o currículo enquanto
manifestação das crianças, considerando as formas de expressão por meio das
diversas linguagens, fugindo da lógica tradicional de currículo de listagem de
conteúdos pré-definidos pelo professor.
Apesar desses avanços no currículo por linguagens, alguns desafios precisam
ser enfrentados. Entre eles, as condições de infraestrutura e materiais com as quais
a maioria das UEIs convivem, afinal, são poucos os recursos disponibilizados pela
secretaria para dar conta dos projetos pedagógicos; outro aspecto diz respeito aos
espaços que nem sempre são adequadas para atender às crianças, quanto à
estrutura, ventilação e tamanho. Sabemos da importância desses fatores para que
as práticas curriculares possam ser efetivadas em todo seu potencial. E, por último,
a necessidade de formação continuada que possibilite ao professor atualizar-se e
rever a sua prática docente.

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REFERÊNCIAS

BELÉM. Secretaria Municipal de Educação. Portaria nº 0071/2015, 20 de março de


2015.
______. Câmara Municipal de Belém; Resolução nº 29 – CME, de 1 de fevereiro de
2017.
43
_______. Lei nº 9.129, de 24 de junho de 2015; Plano Municipal de Educação do
Município de Belém, 2015-2025; Câmara municipal de Belém; 2015.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica. Brasília: MEC; 2013.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei nº 9.394, 20 de
dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional; 14ª
ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2017.
BRASIL. Plano Nacional de Educação 2014-2024; Lei nº 13.005, de 25 de junho
de 2014; Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2014.
JUNQUEIRA Filho, Gabriel. A. Linguagens Geradoras: seleção e articulação de
conteúdos em educação infantil. Porto Alegre: Mediação, 2005.
KRAMER, Sonia; NUNES, Maria F.; CARVALHO, Maria C. (Orgs). Educação
Infantil: formação e responsabilidade. 1ª ed. Campinas – SP: Papirus, 2013.
KRAMER, Sonia et al. (org). Infância e educação infantil. Campinas – SP: Papirus,
1999.
MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa. e CANDAU, Vera Maria. “Currículo,
conhecimento e cultura”. In: MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa e ARROYO,
Miguel. Indagações sobre currículo. Brasília: Departamento de Políticas de
Educação Infantil e Ensino Fundamental, nov. 2006
SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ª ed. Porto
Alegre: ArtMed, 2000.
SOUZA, Solange Jobim; KRAMER, Sonia; O debate Piaget!Vygotsky e as
políticas educacionais. IN: Cadernos de Pesquisa nº 77. São Paulo: Cortez, FCC,
1991,
VASCONCELOS, Celso dos Santos. Avaliação concepção dialética – libertadora
do processo de avaliação escolar. 11ª ed. São Paulo: Libertad, 2000.

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A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL POR MEIO DE JOGOS CULTURAIS: UMA
EXPERIÊNCIA LÚDICA EM BANANEIRAS/PB

Vivian Galdino de Andrade - UFPB/Campus III

RESUMO: Bananeiras traz em seu patrimônio marcas indeléveis de seu


passado, talhadas no Centro Histórico tombado pelo IPHAEP no ano de 2009. Desta forma,
este artigo traz a intenção de expor os trabalhos desenvolvidos em torno da Educação
Patrimonial (EP) nesta cidade, metodologia definida por Horta (1999, p.4) como "um 44
instrumento de alfabetização cultural que possibilita ao indivíduo fazer a leitura do mundo
que o rodeia, levando-o a compreensão do universo sociocultural e da trajetória histórico
temporal em que está inserido". Desenvolvemos desde a coleta de dados acerca do
patrimônio arquitetônico do centro histórico à produção e aplicação de jogos culturais
através de oficinas. Vivenciamos essa dinâmica pedagógica em duas escolas apoiadoras,
com crianças entre a faixa etária de 5 a 8 anos. Por meio destes jogos apresentamos as
histórias trazidas em alguns prédios/espaços históricos, como a Igreja Matriz Nossa
Senhora do Livramento, o Complexo da Estação, o Coreto, a Casa da Pedra entre outros.
Confeccionamos desde jogos de memória, quebra cabeça, diagramas, caça-palavras, cara-
a-cara com patrimônio à jogos de representação. Acreditamos ter proporcionado momentos
de sensibilização e de educação do olhar, que circundam a constituição de uma identidade
cultural e o pertencimento do sujeito como parte integrante da própria tessitura da história.

Palavras-Chaves: Educação Patrimonial. Jogos Culturais. Ludicidade.

Desde o ano de 2015 que desenvolvemos trabalhos em torno da História e do


Patrimônio Cultural (arquitetônico e documental) em Bananeiras, desde projetos de
iniciação científica a trabalhos de ensino e extensão, frutos de ações que visam
estimular a comunidade escolar em torno da sensibilização e da preservação do que
é histórico na cidade.
Bananeiras é uma cidade do brejo paraibano que está localizada a 141km da
capital João Pessoa. De clima agradável, a cidade possui atrativos históricos que a
emolduram, como os casarões históricos e os Sítios Arqueológicos. Seu Centro
Histórico foi tombado pelo IPHAEP conforme Decreto 31.842/ 2010, que em seu Art.
1.º decreta:

Fica homologada a Deliberação N.º 0021/2010 do Conselho de Proteção


dos Bens Históricos Culturais – CONPEC,do IPHAEP, na 1099 "Sessão
ordinária realizada em 30 de junho de 2010, Declaratória do Tombamento;
da delimitação da poligonal de
proteção rigorosa e de entorno; classificação quanto ao grau de
preservação dos imóveis e orientações técnicas normativas do Centro

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Histórico da Cidade de Bananeiras, Paraíba pela sua importância cultural,
histórica, política e arquitetônica. (Acervo do projeto, 2017)

O tombamento que aqui mencionamos é um ato administrativo realizado pelo


Poder Público, nos níveis federal, estadual ou municipal. Esse ato é o
reconhecimento da importância histórica e do valor cultural de um bem, e é
fiscalizado tanto por uma instância federal (IPHAN) quanto estadual (IPHAEP). O
polígono de tombamento de Bananeiras não referencia o patrimônio existente nos
45
distritos da cidade (Vila Maia, Roma e Tabuleiro). Quanto aos sítios arqueológicos,
são considerados como "bens patrimoniais da União", e devem ser protegidos pelo
IPHAN.

F1: Polígono de Tombamento de Bananeiras. Acervo do projeto, 2017

Conhecidos em Bananeiras como 'Umari', 'Pedra Preta' e 'Gruta dos


Morcegos', estes sítios remontam as discussões sobre a pré-história e contemplam,
respectivamente, as tradições Itacoatiara (“Integrada por gravuras representando
figuras que não permitem nenhum reconhecimento"), Agreste (“Caracterizada pela
predominância de grafismos reconhecíveis, particularmente da classe das figuras
humanas, sendo raros os animais”) e Geométrica (“Caracterizada por pinturas que
representam uma maioria de grafismos puros, figuras humanas e algumas mãos,
pés e répteis extremamente simples e esquematizados”) 8. Sobre eles menciona o
IPHAEP:

Deve-se, naturalmente, pensar na proteção total do sítio, pois constatamos


ação antrópica negativa - a danificação de um dos painéis. Para evitar
impactos no meio ambiente e maiores danos ao patrimônio arqueológico

8
Definições disponíveis na Revista eletrônica do Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da
UEPB. Campina Grande, Ano I – Vol. 1 - Número 01 – Setembro de 2010.

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seria interessante transformar a área em um Parque Arqueológico Municipal
(ou RRPPN - Reserva Particular do Patrimônio Natural). Isso, porém, seria
apenas uma medida cautelar para conter as várias agressões que vem
sofrendo o entorno do sítio... (Momentos decisivos da História de
Bananeiras, p.29. Acervo do projeto, 2017)

As ações antrópicas, acima mencionadas, são caracterizadas como as


alterações realizadas pelo homem à natureza. Elas sempre aconteceram, no
entanto, neste último século de maneira bem mais intensificada e não sustentável do
que antes. Ainda sobre Bananeiras, a cidade é narrada em seus anos 20 (do século 46
passado), como uma das maiores produtoras de café da Paraíba, sendo neste ramo
a segunda maior do Nordeste, é o que aponta Almeida (1980, apud Momentos
decisivos da História de Bananeiras, p.09). O autor ainda anuncia que este surto
econômico foi fruto de um episódio curto, devido a uma praga conhecida como
Cerococcus Parahybensis, que devastou grande parte desta cultura no Brejo.
Mesmo passageira, esta economia edificou sua história em patrimônio, deixando
marcas significativas de sua passagem, visíveis nas diversas construções senhoriais
existentes no centro da cidade, bem como nos seus aspectos rústicos que
remontam os traços da imponência dos grandes produtores do café.

F1- Residências do Centro Histórico. Fonte: Domínio Público, 2017

Esse casario se inscreve no polígono de tombamento, composto por mais de


80 imóveis. Este número consta numa lista produzida pelo IPHAEP, que em 2009
realizou um levantamento destes imóveis, em grande maioria associados ao tempo
áureo do café na cidade:

O café criou aqui uma aristocracia territorial, social e dinheiruda (...). É o


tempo dos terraços de ladrilho dos secadores que dão a paisagem
bananeirense este aspecto próprio, uma nota mista e de renovação no
ângulo em que se divide, dum golpe, o passado e o presente do vosso
cenário rústico. A prosperidade das fazendas vinha refletir-se na cidade. É o
tempo das construções senhoriais, vastas residências de quatro janelas,
varandas e azulejos, das ruas do Livramento, Rio Branco e outras próximas

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a Matriz. Para li vinham os magnatas do café estadear a importância de
suas posições e distrair do feudalismo do campo, por dias ou semanas, os
espíritos cheios, vigorosos, tranquilos de quem tinha juntos no corpo, na
consciência e na gaveta muitas saúde, muito prestígio e muito dinheiro
(Mariz, 1985 apud Momentos decisivos da História de Bananeiras, p.09.
Acervo do projeto, 2017,)

Essa breve trajetória, tecida pelo café, aponta um dos diversos olhares
históricos que podem ser direcionados à cidade e à sua história local. Muito ainda há
para se apontar, e nesse percurso seguiremos em trabalhos futuros a fim de mais se 47
discutir sobre o patrimônio e a história local desta cidade do Brejo paraibano. Se
estas informações suscitaram em você - caro leitor - curiosidades, acesse o
repositório digital HEB - História da Educação do Município de Bananeiras9, criado
com a colaboração dos discentes do Curso de Pedagogia do Campus III, uma
espécie de memória digital sobre a história de Bananeiras.

JOGOS CULTURAIS: UMA ESTRATÉGIA LÚDICA PARA A EDUCAÇÃO


PATRIMONIAL

A Educação Patrimonial (EP) é uma abordagem metodológica que favorece


aos sujeitos uma melhor compreensão do patrimônio histórico de um determinado
lugar, incentivando por meio de atividades educativas a valorização da história, da
memória e da cultura. No Guia Básico de Educação Patrimonial Horta, Grunberg
e Monteiro (1999, p. 6) declaram que a EP é um instrumento de:
[...] alfabetização cultural que possibilita ao indivíduo fazer a
leitura do mundo que o rodeia,levando-o à compreensão do
universo sociocultural e da trajetória histórico-temporal em que
está inserido. Esse processo elava ao reforço da auto-estima
dos indivíduos e comunidades e á valorização da cultura
brasileira, compreendida como múltipla e plural. [...] O princípio
básico da Educação Patrimonial é a experiência direta dos
bens e fenômenos culturais, para se chegar à sua
compreensão e valorização, num processo contínuo de
descoberta.

Neste sentido, a educação patrimonial desperta um sentimento de


pertencimento nas pessoas em relação ao patrimônio que as cerca, suscitando o
entendimento do valor inestimável dos bens materiais e não materiais e o que estes
representam para a perpetuação da história de uma região. A prática educativa

9
Disponível em: <www.cchsa.ufpb.br/heb>.

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orientada por esta metodologia possibilita o regaste identitário da comunidade,
mobilizando uma sensação de descoberta e contato com a herança cultural.
A educação patrimonial tem, assim, a pretensão de ensinar/sensibilizar o
sujeito, educando seu olhar em espaços formais ou não formais para a relevância de
se conhecer e preservar os bens culturais. Ela desperta uma relação afetuosa entre
o sujeito e o patrimônio cultural, a partir do estabelecimento de um vínculo que o
torna próximo, conhecido e integrante da história dos habitantes da cidade.
48
Essa concepção metodológica consiste em um processo educativo
permanente e sistemático, estruturado em aspectos como a observação, o registro,
a exploração e a apropriação de conhecimentos e descobertas acerca do patrimônio
cultural. Esses passos são aprofundados no Manual de Atividades Práticas em
Educação Patrimonial (GRUNBERG, 2007), que busca desenvolver a percepção e o
senso crítico através de uma metodologia de trabalho que propicia experiência e
contato significativo com a cultura.
Foi nessa vertente que desenvolvemos, na segunda versão de nosso projeto
de extensão (pelo Programa UFPB no Seu Município - Projeto: "Pensando de forma
lúdica a educação patrimonial em Bananeiras") e de ensino (PROLICEN -
"Trabalhando a educação patrimonial em Bananeiras por meio de jogos
educativos"), atividades lúdicas baseadas no patrimônio arquitetônico da cidade a
partir da construção de jogos culturais.
Pensando nos "jogos" como estratégias pedagógicas lúdicas, e no "cultural"
como aquilo que compreende o patrimônio histórico-arquitetônico de uma cidade,
nos apropriamos da concepção de "jogo cultural" disponível no livro Homo Ludens,
de Huizinga (2000, p.24) que define Jogo como:

[...] uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e


determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente
consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si
mesmo,
acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e uma consciência
de ser
diferente da vida cotidiana. Assim definida, a noção parece capaz de
abranger
tudo aquilo a que chamamos “jogo” entre animais, as crianças e os adultos:
jogos
de força e de destreza, jogos de sorte, de adivinhações, exibições de todo
gênero.
(p.33)

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O autor busca analisar o jogo em sua forma significante, tendo uma função
social. Produtos culturais, esse jogos são ainda caracterizados basicamente pelo
fato de serem livres e de não figurarem como 'vida real'. No entanto, despertam em
quem joga sensações de experimentação e percepção, levando os sujeitos a se
perceberem e a se analisarem enquanto jogam. Além disso, o jogo perpassa os
interesses materiais imediatos e a satisfação individual das necessidades biológicas
como o prazer e a diversão. Estes elementos competitivos tornam o jogo ainda mais
49
apaixonante, despertando o desejo de ganhar, mas também a obediência às regras
do jogo.
Seguindo estes orientações, passamos a trabalhar com jogos culturais em
duas escolas-colaboradoras de Bananeiras: 1. a Escola Municipal de Ensino
Fundamental Antônio Coutinho Medeiros, onde atendemos 20 crianças na faixa
etária entre 8-10 anos, que cursavam o terceiro e o quinto ano do turno da manhã; e
2. a Creche Donzinha Bezerra Cavalcante, que possuía mais de 20 crianças na sala
do pré II, com idades entre 5-6 anos, também no turno da manhã. Nosso objetivo
permeava a aplicação de jogos culturais (por nós confeccionados) para trabalhar o
patrimônio arquitetônico da cidade com vistas a sensibilizar as crianças ao
conhecimento e a preservação do que é histórico.
Para tanto, pesquisamos desde as concepções teóricas que orientam a
produção de jogos e seus efeitos para uma aprendizagem interdisciplinar na
perspectiva da EP à realização de um levantamento de jogos culturais (em seus
vários formatos) que tomassem o patrimônio histórico como focos de sua discussão.
As histórias dos prédios já haviam sido construídas em nosso projeto anterior, que
desenvolveu por meio da história oral e do acesso a documentos históricos fichas
catalográficas de vinte prédios históricos do Centro Histórico da cidade:

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50

Fonte: Repositório Digital HEB


Disponível em: <http://www.cchsa.ufpb.br/heb/contents/arquivos/educacao-patrimonial/patrimonio-
arquitetonico-1>

A partir desse levantamento, passamos a personalizar os jogos com o que


compõe e caracteriza historicamente a cidade e seu patrimônio cultural. Alguns
destes jogos já foram utilizados, outros estão em fase de confecção, e ainda existem
outros que devido a falta de financiamento dos projetos entraram no mapeamento
mas não foram produzidos.

JOGOS MODO DE JOGAR


Uma observação detalhada. O participante volta-se a um prédio observando
Uma edificação, uma atentamente os seus detalhes e depois, virados de costas, eles tentam
descoberta representar através de desenho o que foi observado. A partir dessa
atividade poder ser trabalhada a reflexão acerca do ver e do olhar;
Quebra Cabeça Produzido com peças irregulares e com a imagem de algum Patrimônio da
Cidade.
Partindo das edificações do Centro histórico de Bananeiras, duas fotos são
Jogo de sete erros trabalhadas, uma será manipulada (por meio da adição ou exclusão de 7
elementos estéticos) e a outra será mantida sem alterações. A comparação
e a observação das imagens levará o jogador a descobrir os sete erros.
Utilização de massa de modelar (artesanalmente produzida) levará os
Jogos de discentes a elaboração de representações sobre o patrimônio histórico da
Representação cidade. Tal jogo ainda pode ser realizado por meio de desenhos ou pinturas.
Árvore Genealógica Esta atividade consiste em conhecer todas as funções sociais que os
do Patrimônio prédios tiveram ao decorrer dos anos, permitindo que o discente pesquise e
compreenda o percurso e a importância histórica que eles ocupam na
cidade.
O jogo é constituído por tabuleiros e conjunto de cartões com imagens de
De Cara a cara com o bens patrimoniais. As partidas podem ser em dupla ou entre dois grupos.
Patrimônio Cada jogador sorteia secretamente uma carta do conjunto. O objetivo da
partida é concluir qual o bem contido na carta que seu adversário sorteou,
fazendo perguntas que podem ser em nível de tombamento, características
como detalhes dos ornamentos e etc. O vencedor é aquele que descobrir o
bem sorteado pelo adversário.
Jogo que exige um período maior para realização. A intenção é aguçar a

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curiosidade e a interação entre os participantes, levando-os a conhecerem o
Álbum de figurinhas patrimônio edificado onde ele está inserido. Para trabalhar com esse jogo, é
preciso elaborar pacotinhos de figuras variadas, sendo a distribuição das
figuras atreladas a construção da história ou das lendas que cercam as
edificações.
A caixa será criada com informações que tematizam, por diversos meios
Caixa de Jogos lúdicos, o patrimônio arquitetônico da cidade a partir de uma estratégia
(Contém um livro, geográfica. É uma espécie de kit que levará o jogador a se aprofundar na
jogo da memória e um história e a percorrer um circuito onde se localizam os patrimônios
jogo de tabuleiro) trabalhados. 1.O livro contemplará um discurso sobre a história da cidade
contado por um habitante conhecido; 2. O jogo da memória trará em
imagens essa história arquitetônica; E 3. No jogo de tabuleiro o discente
percorrerá essa história pela cidade. 51
Jogos Digitais ou de Desenhos feitos por plataformas digitais com percepções espaciais (Jogos
simulações prontos a serem vivenciados em Laboratórios de Informática com acesso a
Internet. Ex. Trilha Cultural)
Vivenciar a experiência de ser um arqueólogo. Consiste em quebrar um
Caça ao Tesouro objeto de louça em pedaços grandes e enterrá-los. A medida que dicas
serão entregues sobre a história e a localização desta determinada peça.
Essa experiência provocará as sensibilidades dos discentes, levando-os à
observações e troca de ideias.
São dadas pistas das edificações tais como: data de fundação, a quem
pertence ou pertenceu, características físicas, elementos que o compõem,
Jogo do Detetive cor, etc. Até que os participantes descubram qual é a edificação tematizada.
A cada pista acertada o participante avança uma casa. Para que esse jogo
ocorra é preciso estipular o número de participantes, pois se fará
necessário desenhar um tabuleiro no chão com o número de casas de
participantes e casas que serão avançadas para se ganhar o jogo.
Em um tabuleiro impresso em lona, os discentes serão considerados os
pinos do jogo. Vinte e quatro casas existem no tabuleiro, representadas por
alguns bens materiais e imateriais de Bananeiras. Além destas, existirão
Caminhada - outras casas contendo perguntas acerca de conhecimentos sobre a história
conhecendo os local ( tais respostas quando não acertadas estimularão os participantes a
patrimônios cantarem, dançarem ou representarem alguma música ou ação relacionada
ao Patrimônio Cultural da cidade). Além destas, o tabuleiro ainda contará
com 'casas de avanço', que representam as boas práticas de preservação
do patrimônio, e também 'casas de retroceda no jogo' que referendam ações
que degradam o patrimônio.
Fonte: Acervo dos Projetos, 2018.

Nas escolas apoiadoras trabalhamos com um público distinto, com faixas-


etárias diferentes. Duas equipes foram organizadas e atuaram produzindo e
adaptando os jogos por idade e série. No entanto, em ambas as experiências
tentamos estimular a sensação da imaginação, conduzindo as crianças ao que
assinala Huizinga (2000, p.14), quando aponta a vivência de outras realidades e
contextos por meio do jogo:

[...] sabemos que as exibições das crianças mostram, desde a mais tenra
infância, um
alto grau de imaginação. A criança representa alguma coisa diferente, ou
mais
bela, ou mais nobre, ou mais perigosa do que habitualmente é. Finge ser

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um
príncipe, um papai, uma bruxa malvada ou tigre. A criança fica literalmente
“transportada” de prazer, superando-se a si mesma a tal ponto que quase
chega a
acreditar que realmente é esta ou aquela coisa, sem, contudo perder
inteiramente
o sentido da “realidade habitual”. Mais que uma realidade falsa, sua
representação é a realização de uma aparência: é “imaginação”, no sentido
original do termo.

Os encontros se deram em torno dos sentidos e da experimentação, pelo


52
estímulo à memória e a vinculação do sujeito à sua história local. Durante a
produção deste texto tais ações ainda estavam em fase de desenvolvimento, e entre
os patrimônios arquitetônicos trabalhados estavam a Igreja Nossa Senhora do
Livramento, datada de 1861. A sua construção durou em torno de 20 anos, sendo
concluída no dia 1° de janeiro de 1861. Externamente bem conservada ainda
preserva a mesma linha arquitetônica, com suas torres gêmeas, sinos e o relógio de
bronze (de origem alemã), portas e janelas conservadas no mesmo estilo. Já no seu
interior sofreu modificações, tanto nos altares laterais, como no piso. Para discuti-la
nos utilizamos da produção de uma massa de modelar caseira (feita com a ajuda
das crianças) e de jogos de quebra cabeça.

Fonte: Acervo dos Projetos, 2018.

O "Túnel da Viração"10, foi outro patrimônio por nós discutido com o recurso
da imaginação. Esse prédio constitui o Complexo da Estação, constituído pelo Túnel
da Viração, o antigo armazém (onde atualmente se encontram os quartos da

10
"O Trem chegou em Bananeiras em 22 de setembro de 1922, após a construção do túnel da Serra
da Viração. Fruto de uma ação do Governo de Sólon de Lucena, filho da terra, que na época era
presidente do estado da Paraíba". Disponível em:
<http://www.cchsa.ufpb.br/heb/contents/arquivos/educacao-patrimonial/patrimonio-arquitetonico-1>.
Acesso em: 20/08/2018.

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Estação Bananeiras Pousada), a plataforma de embarque e desembarque
(atualmente Restaurante e recepção da pousada) e a casa do fiscal (espaço onde se
situa propriamente o Museu Simeão Cananéia). Por meio de caixas construímos um
túnel e conduzimos as crianças a brincaram de "trem humano", ao som da cantiga
de "roda do trem".

53

Fonte: Acervo dos Projetos, 2018.

Outros jogos como o de caça-palavras e o de cruzadinhas11 foram utilizados


com as crianças do ensino fundamental, e apontam para as inúmeras possibilidades
de se trabalhar o patrimônio de maneiras interdisciplinar, associados também a
outros conteúdos curriculares.

Fonte: Acervo dos Projetos, 2018.

11
Produzidos no seguinte endereço eletrônico: <https://www.geniol.com.br/>.

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Já com as crianças da creche, trabalhamos com um piquenique patrimonial.
Essa atividade aconteceu no Coreto da Cidade. Construído em 1921, o Coreto
abrigou momentos históricos relevantes, sendo um espaço de socialização, de
eventos políticos e apresentações de banda de musicais. Na década de 1960, o
prefeito José Rocha Sobrinho transformou o Coreto no Bar do Seixo e lá funcionou
durante décadas. No ano de 2017 o bar foi demolido e no seu lugar foi construído
um novo Coreto. Como o Bar (antigo Coreto) estava dentro da área tombada do 54

Centro Histórico de Bananeiras, a sua demolição rendeu uma multa compensatória a


Prefeitura Municipal da cidade.

Fonte: Acervo dos Projetos, 2018

Através deste trabalho foi possível perceber que as crianças - de diferentes faixas
etárias - se interessam pela história da sua cidade, desde que elas se vejam como
partes integrantes dela. A constituição deste vínculo fortalece a identidade cultural,
sensibilizando os sujeitos a conhecerem e a preservarem o patrimônio histórico da
cidade.
As atividades até então desenvolvidas foram instrumentos importantes para
fomentar o conhecimento crítico, a apropriação e a experimentação da comunidade
escolar acerca de seu patrimônio cultural, contribuindo para o desejo de preservação
sustentável desses bens, assim como para o fortalecimento dos sentimentos de
identidade e de cidadania.

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REFERÊNCIAS

GRUNBERG, Evelina. Manual de atividades práticas de educação patrimonial. Brasília,


DF: IPHAN, 2007. Disponível em:
<https://moodle.ufsc.br/pluginfile.php/558606/mod_resource/content/0/GRUNBERG_Evelina.
pdf>. Acesso em 02/03/2017
HORTA, Maria de Lourdes Parreiras; GRUNBERG, Evelina; MONTEIRO, Adriane Queiroz.
Guia básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, Museu Imperial, 1999.
HUIZINGA, Johan. Homo ludens: 4. ed. São Paulo: Perspectiva S.A, 2000. 55
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Educação Patrimonial:
histórico, conceitos e processos. Brasília, DF: IPHAN , 2014. (p.19-27). Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Educacao_Patrimonial.pdf>.

Documentos/ Acervo dos Projetos:


Decreto 31.842/ 2010
AZEVEDO, Carlos Alberto. Momentos decisivos da História de Bananeiras. Subsídios para o
tombamento da cidade de Bananeiras.

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A EDUCAÇÃO CIENTÍFICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA PERSPECTIVA
CURRICULAR PARA A ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA
Ednalva Ambrosio da Silva 12 | Eliene Santos de Faria Costa13

RESUMO: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa em andamento, desenvolvida em


uma Unidade de Educação Infantil vinculada à Secretaria Municipal de Educação de
Belém/PA. A pesquisa tem como objetivo principal analisar as perspectivas docentes sobre
a educação científica na educação infantil a partir das atividades propostas a respeito do
mundo físico e natural. A pesquisa de abordagem qualitativa do tipo estudo de caso
encontra-se em fase inicial. Neste trabalho, será apresentado algumas reflexões a partir 56
autores Chassot (2003) e Demo(2010) entre outros, que discutem a importância da
educação cientifica enquanto mola propulsora para a alfabetização científica, e também o
que trazem os documentos legais enquanto proposta que direcionam à prática de educação
científica para a educação infantil, a partir da análise do Referencial Curricular Nacional para
a Educação Infantil (RCNEI) de 1998 e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI) de 2009. Nessa fase inicial da pesquisa, a partir da análise dos
documentos e dos autores citados, foi possível considerar a relevância da educação
cientifica na educação infantil, ao contribuir para o desenvolvimento integral da criança,
assim como para a alfabetização cientifica. Ficou evidente também nesse processo, a
importância da formação docente como um fator determinante para que a proposta
curricular voltada para a prática da educação científica comtemple o resultado esperado.

Palavras-chave: Educação Científica. Educação Infantil. Proposta Curricular. Alfabetização


Científica.

INTRODUÇÃO

Este trabalho, como recorte da pesquisa em andamento, sustentado pelo


objetivo principal em que consiste analisar as perspectivas docentes sobre a
educação científica na educação infantil a partir das atividades propostas a respeito
do mundo físico e natural, busca evidenciar neste momento da pesquisa a
importância da educação cientifica na educação infantil, sua relevância para a
alfabetização cientifica e seus desafios, considerando a análise do Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) de 1998 e as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) de 2009, enquanto marcos

12
Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola
Básica, na linha de Currículo da Educação Básica, do Núcleo de Estudos Transdisciplinares em
Educação pela Universidade Federal do Pará- UFPA, nalvaambrosio@hotmail.com
13
Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola
Básica, na linha de Currículo da Educação Básica, do Núcleo de Estudos Transdisciplinares em
Educação pela Universidade Federal do Pará- UFPA, eliene.smile@yahoo.com.br

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regulatório e direcionador para a elaboração de propostas curriculares que atendem
a especificidade da educação infantil, assim como, normatizam critérios de garantia
da função sociopolítica e pedagógica desta primeira etapa da educação básica.
Com a promulgação da Lei 9.394 de 20 de e dezembro de 1996, que
estabelece as Diretrizes e Base da Educação Nacional- LDBEN, a educação infantil
passou a ser reconhecida pela legislação como a primeira etapa da educação básica
e um direito de toda criança, tendo como finalidade o desenvolvimento integral da
57
criança de até 06 anos de idade, abrangendo os seus aspectos físico, psicológico,
social e intelectual, complementando assim a ação da família e da comunidade. Vale
destacar, que posteriormente com a Lei 11.274 de 06 de fevereiro de 2006, que
altera os artigos 29, 30, 32 e 87 da LDBEN/96, regulamentando o ensino
fundamental de 09 anos com a matrícula a partir dos 6 anos de idade. A educação
infantil passou a ser oferecida em creches atendendo crianças de 0 a 3 anos e em
pré-escolas de 4 a 5 anos de idade.
A partir desse momento a educação da criança passa a ser reconhecida
como direito social e, enquanto sujeito de direitos e necessidades, propostas
pedagógicas foram pensadas e criadas na eminencia de comtemplar seu
desenvolvimento integral, com o desafio de cuidar, educar e ensinar, assim como
redirecionar a concepção de educação para as crianças pequenas. Como o RCNEI
constituído por um conjunto de referências dividido em três volumes, que visam
contribuir com a implantação ou implementação de práticas educativas com o intuito
de promover e ampliar as condições necessárias para o exercício da cidadania das
crianças brasileiras. E também as DCNEI trazendo as concepções de currículo, de
criança, assim como os princípios e eixos norteadores para a prática educativa.
As DCNEI no que tange a educação científica, em suas propostas
pedagógicas sistematizam elementos como a observação, experiências,
questionamentos, construção do conhecimento, relação com a natureza, entre
outros, ao explorar esses elementos com as crianças na educação infantil, busca a
valorização de uma das suas principais motivações, a sua curiosidade.
Nesse sentido, a educação cientifica no contexto da educação infantil é vista
como uma possibilidade de aproximação da criança à ciência. Para Ghedin et al.
(2013) não há uma teoria geral que supra os diversos questionamentos a respeito do

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processo de educação em ciências, porém é necessário a existência de uma
epistemologia fundamentada na educação científica para então propor estratégias
de ensino para o seu desenvolvimento na educação infantil. Além da aproximação
da criança à ciência, a educação científica possibilita também trabalhar os conceitos
e observações científicas, despertando assim o olhar cientifico desde cedo, porém, é
necessário pensar na utilização de métodos que facilitem a compreensão de tais
conceitos, uma vez que um dos grandes desafios, é trazer esses conceitos para a
58
sociedade, principalmente, para as crianças na educação infantil com o intuito de
promover uma alfabetização cientifica.
Este trabalho está organizado da seguinte forma, a princípio aborda uma
discussão a respeito da relevância da educação científica para promover a
alfabetização científica, no segundo momento, trata da especificidade do currículo
da educação infantil e os desafios a respeito da educação cientifica, finaliza com
algumas considerações sobre as temáticas que nortearam este estudo.

EDUCAÇÃO CIENTÍFICA E SUA RELEVÂNCIA PARA A ALFABETIZAÇÃO


CIENTÍFICA

Diante do intenso desenvolvimento tecnológico que a sociedade está inserida,


emerge a necessidade de se pensar em uma proposta curricular voltada para a
educação científica. Segundo Demo (2010), um dos desafios na atualidade é a
produção do conhecimento estreitando assim a ideia de mera transmissão, o autor
considera a educação científica como uma habilidade do século XXI, uma vez que
este século é marcado por uma ‘sociedade intensiva do conhecimento’, nesse
sentido é necessário tomar a educação cientifica como parte da formação da
criança.
A Educação Cientifica para Chassot (2003) e Demo (2010), instrumentaliza o
sujeito para viver numa sociedade que está em constantemente mudança, nessa
perspectiva, no que abrange a Educação Infantil, tende a ser uma oportunidade de
contribuir para os avanços cognitivos da criança, tornando-a construtoras do próprio
conhecimento desde o início de sua escolaridade.
De acordo com Arce, Silva, Varotto (2011) apud Botega (2015), apontam que
a educação cientifica voltada para a educação infantil, está relacionada com a

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exploração do mundo real fazendo com que a criança o compreenda,
desenvolvendo habilidades de raciocínio, estimulando sua imaginação e criação. Os
autores consideram ainda que o conhecimento cientifico resulta do desenvolvimento
de ideias, conceitos e teorias, pois tais conceitos são assimilados, organizados e
relacionados pelas crianças no decorrer de suas vivencias e experiências.
Nesse sentido, no que se refere a formação dos conceitos pela criança,
Vygotsky (1987) traz uma grande contribuição ao estudar o processo de
59
aprendizagem por compreensão. Segundo Moysés (1995), Vygotsky fornece bases
teóricas importantes para entender como se dá tal processo, destacando
particularmente três aspectos:

O primeiro, sua contribuição sobre a formação de conceitos e, em


especial, dos conceitos científicos. O segundo, seus estudos sobre o
desenvolvimento da consciência e o papel que o sistema organizado
de conceitos desempenha na direção desses processos. E o último,
a sua contribuição sobre o papel do professor como mediador no
processo de ensino/aprendizagem (VYGOTSKY, 1987, apud
MOYSÉS, 1995,p.21).

Tais aspectos, ajuda-nos a refletir que a aprendizagem perpassa em torno da


formação de conceitos, enunciados e definições, é importante considerar que a
utilização desses elementos como ponto de partida, contribui na direção sobre o que
se quer ensinar.
Vale ressaltar, que além da formação dos conceitos científicos Vygotsky
aponta também o conceito cotidiano ou espontâneo, definindo-os como:

Os conceitos cotidianos referem-se aqueles conceitos construídos a


partir da observação, manipulação e vivencia direta da criança [...].
Os conceitos científicos se relacionam aqueles eventos não
diretamente acessíveis à observação ou ação imediata da criança:
são os conhecimentos sistematizados, adquiridos nas interações
escolarizadas (REGO,2014, p.77).

Apesar da origem que difere os conceitos espontâneos e científicos, os


mesmos estão diretamente relacionados, uma vez que se conformam de um único
processo, o de formação de conceitos, um proveniente do campo das experiências
trazidas pelas crianças, das suas relações sociais e culturais fora do ambiente
escolar e o outro construído no campo que perpassa o processo de escolarização.

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Moysés (1995) chama atenção para o movimento entre esses dois conceitos, em
que os conceitos científicos descem na direção da realidade concreta e os
espontâneos se elevam buscando uma sistematização, abstração e generalização
mais ampla.
A educação cientifica fundamentada a partir da compreensão desses dois
conceitos formados pela criança, os quais são fundamentais para o processo de
alfabetização cientifica, para entender qual o sentido em que se configura tal
60
processo, os estudos de Goulart (2005) parte do princípio do conceito de
alfabetização e letramento utilizados na compreensão do acesso à linguagem
escrita. A noção de alfabetização científica se refere a articulação da produção do
conhecimento com a produção de vida das pessoas, uma vez que:

A compreensão de que não se trata de empurrar o estudante para


dentro do mundo dos cientistas, mas sim de ajudá-lo a utilizar o
conhecimento científico para lidar melhor com seu mundo, ainda se
apresenta como um debate restrito. Na maioria das vezes o
problema se resume em listar os conteúdos que devem ser ofertados
e as formas de colocá-los à disposição do aluno (GOULART,
2005,p.28).

A partir dessa compreensão, alfabetizar-se cientificamente, significa construir


conhecimentos básicos que auxiliem o indivíduo a compreender melhor sua
realidade social e a tomar decisões sobre questões importantes para a comunidade.
Segundo Goulart (2005) tendo como base os termos letramento e
alfabetização, fundamentado nos estudos de Ferreiro (1986), Teberosky (1986) e
Soares (1991), para melhor compreender o sentido da alfabetização cientifica,
enquanto ferramenta cultural fundamental para expandir o acesso aos bens
culturais, é necessário pensarmos a educação cientifica diante da lógica desses dois
termos, e saber diferenciar dois processos complementares pelos quais perpassam
o letramento e a alfabetização cientifica, o primeiro enquanto processo de
questionamento do mundo natural e da produção tecnológica e o segundo seria a
apropriação pela criança, pelo adolescente, de conceitos científicos.
Para Chassot (2003) fazer ciência é elaborar e explicar o mundo natural a
partir da elaboração de um conjunto de conhecimentos adquiridos de maneira

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metódica, ou seja, é descrever a natureza em uma linguagem dita científica,
enquanto a alfabetização cientifica é proporcionar a leitura dessa linguagem.
Nessa perspectiva, ser alfabetizado cientificamente teria similaridade com os
processos envolvidos no letramento e alfabetização, ou seja, significa ter
competência para encontrar o que se necessita, e também a resolver problema que
envolva o conhecimento científico, promovendo assim o desenvolvimento social e
consequentemente o exercício da cidadania.
61
Contudo, a discussão no campo da educação infantil, a respeito de se
trabalhar a educação científica desde a tenra idade, com a finalidade de promover a
alfabetização científica, é preciso nesse percurso a superação de muitos desafios,
principalmente, pela singularidade que demarca o currículo desta etapa de educação
básica.

A ESPECIFICIDADE DO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO INFANTIL E OS


DESAFIOS DA EDUCAÇÃO CIENTÍFICA

Embora historicamente o currículo tenha sido utilizado como ideia de um


plano organizador de atividades e, tenha marcado os processos educativos em
diferentes civilizações, no entanto, o termo currículo no contexto escolar e o seu
vínculo relacionado as atividades educativas é recente, o qual sofreu e sofre
modificações para que possa se adequar aos contextos históricos e culturais
distintos. No que se refere ao sentido etimológico da palavra currículo, o mesmo é
derivado do termo latino currus, com o significado de carruagem, um lugar no qual
se corre, seu uso de maneira metafórico em educação seria a busca de um
caminho, uma direção que orienta o processo para atingir certa finalidade
(WIGGERS, 2012).
Pensar em uma proposta curricular para a educação infantil a partir desta
perspectiva de currículo enquanto um lugar, uma direção, como elemento que
possibilita um direcionamento para um determinado caminho, na tentativa de
alcançar na prática determinados objetivos.
Nesse movimento, criou-se documentos como o RCNEI e as DCNEI que
norteiam as práticas pedagógicas direcionadas para a educação infantil. Com a

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elaboração desses documentos é importante destacar enquanto proposta
pedagógica o RCNEI no terceiro volume traz como tópico ‘Conhecimento de Mundo’
no eixo ‘Natureza e Sociedade’, traçando um caminho pelo qual é possível trabalhar
a educação científica, ao elencar para as crianças com faixa etária de 0 a 3 anos os
seguintes objetivos “explorar o ambiente, para que possa se relacionar com
pessoas, estabelecer contato com pequenos animais, com plantas e com objetos
diversos, manifestando curiosidade e interesse (p.163,1998)” e propõe como alguns
62
dos objetivos para as crianças de 4 a 6 anos:

Interessar-se e demonstrar curiosidade pelo mundo social e natural,


formulando perguntas, imaginando soluções para compreendê-lo,
manifestando opiniões próprias sobre os acontecimentos, buscando
informações e confrontando ideias; estabelecer algumas relações
entre o modo de vida característico de seu grupo social e de outros
grupos; estabelecer algumas relações entre o meio ambiente e as
formas de vida que ali se estabelecem, valorizando sua importância
para a preservação das espécies e para a qualidade da vida humana
(BRASIL. RCNEI,p.163,1998).

Esses objetivos, os quais visam a valorização da curiosidade, a


imaginação a fim de contribuir para que a criança possa questionar e compreender a
importância do ambiente natural, dos seres vivos e suas relações com o meio que
estão inseridos, potencializando assim tais mecanismos inato a criança sendo
essenciais para direcionar atividades sobre educação científica.
As DCNEI, compreende o currículo na perspectiva de comtemplar o
desenvolvimento integral da criança, uma vez que:

Art. 3º O currículo da Educação Infantil é concebido como um


conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os
saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do
patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de
modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5
anos de idade [...] (BRASIL, DCNEI, 2009).

Com base nessa compreensão de currículo, as DCNEI para articular as


propostas às práticas voltadas à educação cientifica como possibilidade de garantir
as crianças por meio dos eixos norteadores ‘interações e brincadeira’, experiências
que incentivem a sua curiosidade, que elas possam explorar, questionar, indagar, e

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também conhecer o mundo físico, social e natural, sensibilizando-as para o seu
pleno desenvolvimento.
Diante das propostas curriculares de tais documentos e da complexidade do
mundo em que vivemos, cujas discussões perpassam por diferentes áreas do
conhecimento, como a Ciência e a Tecnologia, ambas amplamente disseminadas e,
a educação científica ao transitar por essa discussão, no contexto da educação
infantil, se configura como uma experiência educativa e de emancipação (DEMO,
63
2001).
Tendo em vista, os pressupostos que define, conceitua e contextualiza a
educação científica, Demo (2010) se reporta fazendo uma análise de como vem
sendo observada na sociedade a “Educação científica é, naturalmente, tributo ao
conhecimento dito científico. Conhecimento científico, ainda que seja,
aparentemente, a grande obviedade por trás desta discussão, está longe de ser
noção consensual e tranquila (DEMO, 2010,p.3).”
Conforme o autor analisa, a educação científica não é algo facilmente
consensual, por mais que cresça o consenso em torno de sua importância curricular,
uma vez que este consenso se nutri mais pela percepção do baixo desempenho das
crianças na escola, do que pela própria convicção formada em relação ao
desenvolvimento científico enquanto um processo decisivo para o futuro do país.
Pois, na tentativa de superar esta maneira de ver a educação cientifica, é necessário
dá maior atenção como parte integrante do processo formativo da criança.
Vale ressaltar nesse processo, de acordo com Kramer (2003), a educação
infantil não deve ser vista como um preparatório para os níveis escolares mais
avançados, porém, isso não impede de considerar que a criança, desde a tenra idade,
tenha direito às diversas formas de conhecimento, e dentre elas, às temáticas ligadas ao
conhecimento científico, pois, ensinar ciências desde a educação infantil é contribuir
com o fato de perceber a criança como cidadã, como sujeito histórico e social, que
produz cultura e nela é produzida.
A partir desta perspectiva, a educação cientifica vista enquanto um viés pelo
qual a criança se aproxima à ciência, se constituem de um conhecimento relevante
para os diferentes níveis de ensino, incluindo a educação infantil. Nesse segmento,
há a necessidade de refletir a respeito dos desafios enfrentados nas suas práticas
pedagógicas.

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Os autores Ghedin et al. (2013), Demo (2010), apontam a formação docente
como um dos principais desafios para trabalhar a educação científica na educação
infantil, considerando que o professor, neste contexto, seja um pesquisador, se
qualifique, pesquise, busque informação e que produz conhecimento.

Na educação científica o professor não toma o papel absoluto da


sala de aula, mas age como um professor aberto aos conhecimentos
prévios dos alunos. Ele sempre questiona os alunos para assim,
estimular a curiosidade destes. Se antes, a ordem para criança era
64
cala a boca menino, você pergunta muito, na educação científica isso
se reverteu, uma vez que o papel do professor hoje é justamente
estimular o aluno a abrir a boca e perguntar intensamente sobre
aquilo que o cerca. Na educação em ciências o professor não dá a
resposta pronta, ou seja, o professor deve agir como um mediador na
aquisição da autonomia do aluno (GHEDIN, et al., 2013,p.4).

O professor em sua prática deve valorizar o conhecimento prévio das


crianças, uma vez que trazem consigo experiências do seu cotidiano que podem ser
compartilhadas favorecendo o enriquecendo do processo educacional. Essas
experiências podem contribuir também como um caminho de possibilidades para
questionamentos, indagações, colaborando para o processo de aprendizagem.
Ghedin ao ter como ponto de partida, a formação docente, pondera que tal
formação “deveria preocupar-se com uma formação alicerçada na educação
científica de tal maneira que o professor fosse incentivado a continuar pesquisando
e produzindo os textos que ele trabalha em sala de aula e não apenas reproduzir ou
somente ministrar aulas” (GHEDIN, 2013.p.5).
Desta maneira, Demo (2010) apud Ghedin (2013) enfatiza que estas questões
que envolvem a formação docente refletem diretamente na criança, ou seja, para
que a criança aprenda a produzir conhecimento, é necessário antes resolver a
questão do professor. O Professor precisa desde a sua formação inicial ser instigado
a investigar, produzir e publicar o resultado das pesquisas que realizou durante a
sua formação, refletindo como uma espécie de injeção de ânimo mostrando que ele
é capaz.
Com a educação científica mais presente na formação docente, torna-se um
caminho favorável para o professor propor e desenvolver atividades que valorize as
experiências, os questionamentos e a curiosidade da criança. Nesse sentido, a
educação científica abriga a pretensão forte de motivar um salto de qualidade nos

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processos escolares de aprendizagem, em particular, é necessário refazer, por
completo, de alto a baixo, a formação docente.
Na busca por essa qualidade, o fazer da educação científica deve ser um
compromisso do processo de aprendizagem escolar, orientado por professores
capazes de produzir conhecimento científico, tendo em vista que uma das
transformações mais desafiadora e efetiva é a transformação docente, por sua vez:

65
Para que haja avanços nesse contexto, é necessário oportunizar
formações para os docentes referentes ao ensino de ciências,
reconhecer a Educação Cientifica como um aparato de construção
no desenvolvimento integral da criança pequena, compreender
que o início da formação escolar é tão importante quanto o ensino
superior, uma vez que insere o estudante no mundo científico
(AMOEDO, et al., 2016).

Evidencia a partir dos documentos e teóricos estudados, que mesmo com os


desafios a serem superados em relação ao trabalho com a educação científica, em especial,
na educação infantil, é possível avançarmos com propostas que considere a formação
docente em relação ao domínio dos conceitos científicos, a singularidade do trabalho nesta
etapa da educação, a relevância da educação científica para uma efetiva alfabetização
científica.

CONCLUSÃO

Diante de tal estudo considerando que a educação cientifica na educação


infantil é vista como uma possibilidade que favorece a criança o seu
desenvolvimento de maneira integral, e que deve ser respeitado os direitos
garantidos pelo RCNEI e pelas DCNEI. Ficou evidente nos documentos ao trazerem
em suas propostas elementos como a observação, experiências, questionamentos,
construção de conhecimentos, relação com a natureza, entre outros, elementos que
sistematizam e direcionam para o ensino de ciências na educação infantil.
A abordagem de ensino da educação científica nesta etapa da educação
básica, requer que alguns fatores sejam contemplados, como o ensino dos conceitos
científicos para crianças, a formação docente voltado para a pesquisa, a
compreensão da educação científica no sentido de possibilitar a construção de
conhecimentos a partir da experiência da criança. Uma vez que ao sistematizar

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essas experiências a criança se instrumentaliza e a torna mais participativa para que
seja capaz de elaborar, criar e transformar cada vez mais o material que lhe for
oferecido de modo que enriqueça assim a sua experiência.
Foi possível perceber também que o professor deve por meio de práticas
pedagógicas que se comprometa em conhecer e valorizar o processo de
aprendizagem a partir da formação dos conceitos espontâneos e cientifico pela
criança, se configurando como um fator positivo para que se promova uma
66
educação científica voltada para a alfabetização científica desde a educação infantil.

REFERÊNCIAS

AMOEDO, F.K.F., et al. Educação científica: o desafio de ensinar


cientificamente no contexto educacional infantil. Disponível em:
<http://www.pos.uea.edu.br/data/area/publicacoes/download/16-4.pdf > Acesso
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BOTEGA, M.P. Ensino de Ciências na Educação Infantil: formação de


professores da rede municipal de ensino de Santa Maria. Tese (Doutorado em
Educação em Ciências)- Universidade Federal de Santa Maria. RS, p. 137. 2015.

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da Educação. Secretaria de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, 2010.

__________. Lei nº 9.394 de 20 de Dezembro de1996. Lei de Diretrizes e Bases


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PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e resistências. | De 5 a 7
de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
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O PACTO NACIONAL PELA AFABETIZAÇÃO NA IDADE CERTA E SUAS
PERSPECTIVAS PARA A PRÁTICA CURRICULAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Maria Mônica Ferreira Mendes 14 | Lyanny Araújo Francês15 | Amélia Maria Araújo
Mesquita16

RESUMO: Este artigo teve como objeto de estudo o Pacto Nacional pela Alfabetização na
Idade Certa (PNAIC) e a Educação Infantil, e como objetivos: conceptualizar criança,
infâncias e Educação Infantil e problematizar as perspectivas do Pacto e a sua repercussão 68
na prática curricular reservada às crianças. A partir de uma abordagem qualitativa, realizou-
se a revisão de literatura e análise de conteúdos concernentes aos documentos legais que
abordam o tema à luz os contributos da Sociologia da Infância. Como resultado,
depreendeu-se a importância em contemplar as especificidades da Educação Infantil diante
dos motes de implementação do PNAIC, tendo em vista que a antecipação da escolarização
merece um olhar cauteloso para que não se descaracterize o brincar, o processo de
interação, a avaliação entre outras singularidades que envolvem as práticas curriculares
nessa primeira etapa da educação básica. Primeiramente, discorreu-se a respeito das
concepções de criança, infância(s) e o papel da Educação Infantil, em seguida, assinalou
como o PNAIC se apresenta para a essa etapa educacional e, ao final, apresentou
elementos de tensionamentos entre as perspectivas do Programa e as práticas curriculares
no atendimento às especificidades infantis.

Palavras-chave: Educação Infantil. PNAIC. Práticas Curriculares.

INTRODUÇÃO

Este estudo tem por objetivo problematizar as concepções de criança,


infância(s) e o papel da educação infantil na formação das crianças, com destaque
para as lutas e conquistas legais no que concerne ao direito à educação para todas
as crianças. Em seguida, expor como o Pacto Nacional da Alfabetização na Idade
Certa (PNAIC) se apresenta para a Educação Infantil, e problematizar as

14
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica-Núcleo de
Estudos Transdisciplinares em Educação Básica, da Universidade Federal do Pará-UFPA, linha de
pesquisa Currículo da Escola Básica. E-mail: monica_breves@yahoo.com.br
15
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica-Núcleo de
Estudos Transdisciplinares em Educação Básica, da Universidade Federal do Pará-UFPA, linha de
pesquisa Currículo da Escola Básica. Professora da Secretaria Municipal de Educação de Belém. E-
mail: lyanny.araujo@gmail.com
16
Doutora em Educação pela Universidade Federal do Pará (UFPA)-PA. Brasil. Professora da
Universidade Federal do Pará. http://lattes.cnpq.br/9074927290515299. E-mail:
amelia.mesquita05gmail.com

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perspectivas desta política pública para a prática curricular no atendimento às
crianças.
Este estudo se desenvolveu por meio de uma pesquisa qualitativa, a partir da
revisão bibliográfica de livros, artigos e documentos normativos, e para o tratamento
dos dados, foi realizada a análise de conteúdo. As principais referências deste
trabalho foram os documentos legais: Diretrizes Curriculares para a Educação
Infantil (2009), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 9394/96),
69
Portaria nº 826/ 2017 (BRASIL, 2017), Documento Orientador do PNAIC (BRASIL,
2017), os quais regulamentam a inclusão deste Programa na Educação Infantil em
2017, e para o referencial teórico, Corsaro (2011), Lobo (2013), e Sacristán (1999).
Adicionalmente, foram analisadas pesquisas em âmbito estricto sensu sobre a
implementação do PNAIC no Ensino Fundamental que apontam importantes pistas
para problematizar as perspectivas do Pacto para a prática curricular na Educação
Infantil.
Para discorrer acerca desse objeto, inicialmente serão apresentadas as
concepções de criança, infâncias e Educação Infantil; a contextualização do PNAIC,
apresentando um breve histórico sobre sua origem, finalidades e perspectivas para a
Educação Infantil e, por fim, apresentar elementos de tensionamentos sobre sua
implementação face às singularidades que envolvem as práticas curriculares no
atendimento às crianças enquanto agentes sociais, protagonistas, criativas e
produtoras de cultura.

CONCEPÇÕES DE CRIANÇA, INFÂNCIA(S) E EDUCAÇÃO INFANTIL

A compreensão das concepções de criança e infâncias como construções


histórias, sociais e culturais e a importância da Educação Infantil na formação
humana das crianças são indispensáveis para um atendimento educacional que
respeite suas especificidades e favoreça a sua formação mais ampla. Assim, faz-se
necessário abordar tais conceitos e o quanto são relevantes, entre outras questões,
para a superação das influências do assistencialismo e de compreensões
equivocadas que marcaram a origem do atendimento às crianças em creches e pré-
escolas no Brasil.

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Segundo Lobo (2013, p. 98), infância é um conceito historicamente construído
e muito relacionado ainda à ideia de “[...] carência, falta e incompletude, na qual a
criança vem ocupando um espaço de subordinação em relação ao adulto”. Isso faz
com que a infância seja enxergada como uma simples fase e não como uma
concepção construída socialmente.
Nessa linha de pensamento, Corsaro (2011, p. 15) realizou pesquisas sobre a
infância de forma criteriosa com base na sociologia, rompendo com a ideia de
70
criança como um vir a ser e a infância como uma simples etapa preparatória. Desse
modo, o autor mostra a importância de superar essas concepções, pois “[...] as
crianças são sujeitos ativos e criativos que produzem suas próprias culturas infantis,
enquanto simultaneamente, contribuem para a produção das sociedades adultas”
(Corsaro, 2011, p. 15). Um excelente exemplo sobre essa questão apontado pelo
autor são as brincadeiras de faz de conta, onde as crianças retiram ideias
vivenciadas em seu contexto social e as transformam criativamente.
Ainda de acordo com Corsaro (2013), a criança e a infância compõem a
sociedade. Dessa forma, infância para o autor em questão é:

[...] uma categoria ou parte da sociedade, como classes sociais e grupos de


idade. Nesse sentido, as crianças são membros ou operadoras de suas
infâncias. Para as próprias crianças, a infância é um período temporário.
Por outro lado para a sociedade, a infância é uma forma estrutural
permanente ou categoria que nunca desaparece, embora seus membros
mudem continuamente e sua natureza e concepção variem historicamente
[...] (CORSARO, 2011, p. 15-16).

Nesta direção, Lobo (2013, p 98) afirma que a ideia de infância que
conhecemos hoje foi construída por meio de fortes influências históricas e sociais,
ou seja, de acordo com a organização da sociedade e sua estrutura econômica e
social. E as escolas, em especial as de Educação Infantil, surgem com a mesma
perspectiva, o que influenciou a “[...] intervenção dos governos e da filantropia para
transformar as crianças (principalmente da classe baixa) em sujeitos úteis [...]”
(LOBO, 2013, p. 98).
A autora em tela realça que as políticas públicas para a Educação Infantil
ganharam força somente a partir da Constituição Federal de 1988, do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA, 1990) e também após várias mobilizações da
sociedade civil em defesa dos direitos das crianças, do aumento na produção

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intelectual e de pesquisas na área da infância. Esse movimento fortaleceu as
tentativas de creches e pré-escolas em buscarem superar o caráter assistencial para
se tornarem “[...] um espaço educacional e de formação para a cidadania” (LOBO,
2013, p. 106).
Não obstante, o reconhecimento da Educação Infantil como parte integrante
da Educação Básica, consolidada no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN nº 9394/96), garantindo a Educação Infantil como direito à
71
educação de todas as crianças e dever do Estado, a obrigatoriedade da matrícula
das crianças da pré-escola (4 e 5 anos), só ocorreu por meio da Emenda
Constitucional nº 59/2009, incluída na LDBEN em 2013.
Sobre a ampliação da concepção de Educação Básica no texto da Lei
9394/96 na qual passou a englobar Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino
Médio, Pereira e Teixeira (2008, p. 5) chamam a atenção para a necessidade de
reflexão sobre as singularidades pedagógicas que envolvem cada um desses níveis
de ensino, de forma que nenhum se sobreponha ao outro. Com a finalidade de
compensação de carências sobre Educação Infantil e apoiados nos Parâmetros de
Qualidade para a essa etapa de educação (2006) sublinham a relevante
necessidade de:
Superação da visão assistencialista ou compensatória de carências
culturais que, historicamente, tem caracterizado as ações governamentais
nesse setor. A educação infantil deixa de desempenhar o papel de “guarda
das crianças” ou de “preparatória” para o ensino regular. Na perspectiva
atual, o trabalho pedagógico tem por objetivo atender as necessidades
determinadas pela especificidade da faixa etária, a partir de uma visão de
criança como criadora, ser histórico, sujeito de direitos, capaz de
estabelecer múltiplas relações e produtora de cultura (PEREIRA e
TEIXEIRA, 2011, p. 25).

A despeito disto, Oliveira (2010, p. 1) também pontua que as conquistas em


termos legais, como a inclusão de creches e pré-escolas no sistema de ensino,
provocaram alguns avanços nessa área, em especial no nível de formação docente;
mas ainda são necessários, segundo a autora, instrumentos para melhor
desenvolvimento do trabalho pedagógico na Educação Infantil no sentido de
considerar as especificidades das crianças e não mais se configurar como uma
etapa de preparação da criança para o Ensino Fundamental. Nessa posição destaca
que:

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[...] as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEIs)
aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação em 2009 (Parecer
CNE/CEB nº 20/09 e Resolução CNE/CEB nº05/09), representam uma
valiosa oportunidade para se pensar como e em que direção atuar junto às
crianças a partir de determinados parâmetros e como articular o processo
de ensino-aprendizagem na Escola Básica (OLIVEIRA, 2010, p. 1).

As DCNEIs (2009) estimularam uma intensa revisão de concepções no que


se refere à visão de criança, à identidade da educação infantil, aos princípios para
melhor organização do currículo e outras questões relacionadas às propostas
72
pedagógicas que consequentemente orientam um melhor planejamento e
implementação de ricas, desafiadoras e significativas práticas curriculares para as
crianças, que considerem suas histórias de vida, seus interesses e ritmos de
aprendizagem.
Com base no exposto é oportuno demarcar a partir da Portaria de nº
826/2017, (BRASIL 2017), Documento Orientador do PNAIC (BRASIL, 2017), e os
Cadernos do Pacto para a Educação Infantil, como o Programa em tela se apresenta
para essa etapa da educação básica.

PNAIC NA EDUCAÇÃO INFANTIL

O PNAIC, de acordo a Portaria nº 826 de 07 de julho de 2017 (BRASIL,


2017a), é uma política pública criada em 2012 com foco no Ensino Fundamental
e se desenvolve por meio de um compromisso assumido e vinculado entre os
governos Federal, Estaduais e Municipais, com vistas a atender à meta 5 do
Plano Nacional de Educação (2014/2024) que versa sobre a “[...] obrigatoriedade
de alfabetizar todas as crianças no máximo até o 3º ano 17 do ensino
fundamental” (BRASIL, 2014, p. 57).
O PNAIC tem como finalidades: “[...] reduzir a distorção idade-série na
Educação Básica; melhorar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica -
IDEB; e contribuir para o aperfeiçoamento do desempenho dos professores”
(BRASIL, 2017a, p. 2). Considerando tais finalidades, no período de 2013 a 2016,

17
Alfabetizar todos os alunos até no máximo 08 anos de idade também está estabelecido pela Base
nacional Comum Curricular – BNCC (Resolução CNE/CP nº 02, de 22 de Dezembro de 2017) e pelo
Programa Mais Alfabetização instituído por meio da Portaria nº 142/2018, que visa fortalecer e apoiar
as escolas no processo de alfabetização ( para fins de leitura, escrita e matemática para alunos do 1º
e 2º ano do Ensino fundamental).

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o PNAIC buscou potencializar a formação continuada aos professores
alfabetizadores do Ensino Fundamental. Assim, o Programa realizou no referido
período as seguintes formações:
Em 2013, foram capacitados, em linguagem 313.599 professores
alfabetizadores em curso com carga horária de 120 horas; em 2014,
311.916 profissionais e a ênfase da formação foi matemática, em curso
com carga horária de 160 horas; em 2015 foram capacitados 302.057
professores em temáticas como Gestão Escolar, Currículo, a criança do
ciclo de alfabetização e interdisciplinaridade; e, em 2016, foram 248.919
alfabetizadores e 38.598 coordenadores pedagógicos atendidos em
cursos com carga horária mínima de 100 horas e com ênfase em leitura,
73
escrita e letramento matemático (BRASIL, 2017b, p. 3-4).

De acordo com o referido Documento Orientador do PNAIC (BRASIL,


2017b), alguns problemas prejudicaram o foco dessas formações, merecendo
destaque: o processo de alfabetização que necessitava ser trabalhado de forma
progressiva foi sendo mais efetivado no 3º ano, a desarticulação entre escolas
formadoras e redes de ensino, além da falta de uma maior responsabilidade local
em relação ao ensino fundamental em razão de “[...] uma visão equivocada sobre o
papel do MEC que é redistributivo e supletivo, com oferta de apoio técnico e
financeiro” (BRASIL, 2017b, p. 4).
O documento em questão ainda ressalta que, em 2013 e 2014, os
resultados da Avalição Nacional da Alfabetização (ANA) evidenciaram essa
problemática, pois houve um baixo rendimento das crianças em língua portuguesa
e matemática, fato que, adicionado aos problemas destacados anteriormente, fez
com que o Ministério da Educação (MEC) instituísse mudanças no PNAIC.
Considerando que os resultados desejados ainda estão longe de serem
alcançados e visando a potencializar o processo de alfabetização, a educação
infantil foi incluída no Programa. (BRASIL, 2017b, p. 5).
A inserção do Pacto na Educação Infantil induz que nesta etapa da
educação já se construa práticas de avaliação para a aferição o que contraria as
perspectivas de formação humana das crianças orientadas pelas DCNEIs (2009),
tendo em vista que as avaliações em larga escala constituem-se como um dos
principais eixos de regulação no contexto educacional, pois:

[...] os parâmetros e instrumentos de avaliação adotados seguem a lógica


do quase mercado, pois coloca em destaque princípios e critérios de
eficiência, produtividade e competitividade, priorizando a aferição pontual
do desempenho dos alunos. Privilegiam os produtos e resultados em

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detrimento dos processos de construção. Nesse sentido, não consideram
os fatores que estão intrínsecos a escola e as classificam em função do
mérito (SILVA; CARVALHO, 2014, p. 220).

Infere-se, portanto, que a questão da qualidade em educação por meio de


avaliações em larga escala tem como referência aspectos quantitativos, já que em
nenhum momento se questionam, por exemplo, as condições de trabalho
oferecidas aos docentes para o desenvolvimento das atividades pedagógicas e as
políticas de formação inicial e continuada de professores, as quais necessitam ser 74
mais efetivas. Dessa forma, os resultados negativos dos alunos na Avaliação
Nacional da Alfabetização ANA influenciaram diretamente as mudanças no PNAIC
em 2017.
Para a educação infantil, o PNAIC ofereceu 08 cadernos de estudos e 01 de
apresentação, com base em leitura e escrita, elaborados por meio do projeto
intitulado: Leitura e Escrita na Educação Infantil, que iniciou em 2013 e foi
coordenado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal do Estado do Rio de
janeiro (UNIRIO) e MEC, que publicaram os cadernos no ano de 2016 (BRASIL,
2017b, p.18).
Assim, o lançamento do Pacto na Educação Infantil ocorreu em 2016, mas
devido ao cenário político – mudanças no governo – o PNAIC só foi efetivamente
implementado, na Educação Infantil, em 2017, focalizando além dos alunos do
Ensino Fundamental, as crianças da pré-escola. Ademais, imputando aos “[...]
professores, coordenadores pedagógicos, gestores escolares e gestores públicos
uma responsabilidade compartilhada no alcance do direito da criança de escrever,
ler com fluência e dominar os fundamentos da matemática no nível recomendável
para a sua idade” (BRASIL, 2017a, p. 2).
Especificamente sobre o papel dos professores alfabetizadores da pré-
escola, o Documento Orientador do PNAIC (BRASIL, 2017b, p. 33) alude a
respeito das avaliações diagnósticas, que os docentes necessitam acompanhar os
avanços de cada criança e desenvolver diversas atividades pedagógicas na
perspectiva da alfabetização de cada uma e, além disso:

[...] organizar sua sala de aula e o tempo pedagógico a fim de que as


crianças tenham um ambiente motivador para diariamente, aprimorar a

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leitura, a comunicação e práticas colaborativas; o domínio dos
fundamentos da matemática em uma perspectiva interdisciplinar que
incorpora outros campos de conhecimento afetos a essa etapa da
educação [...] (BRASIL, 2017b, p. 33).

Nesse ínterim, ressalta-se a necessidade da prática curricular da Educação


Infantil em considerar a criança como sujeito histórico, protagonista na construção
de seus conhecimentos, daí a relevância em conhecer as infâncias e histórias de
vida das crianças, bem como o papel singular da Educação Infantil na formação
física, psicológica, intelectual e social (LDBEN nº 9394/96, Art. 29). Partindo desses 75

pressupostos e da forma como o PNAIC se apresenta na Educação Infantil, é


extremamente importante problematizar as perspectivas deste Programa para as
práticas curriculares no atendimento às crianças.

PROBLEMATIZAÇÕES SOBRE O PNAIC NA EDUCAÇÃO INFANTIL


A forma como o PNAIC está sendo implantado interpela e reverbera na
organização do trabalho pedagógico junto às crianças, não somente a questão da
formação docente, mas, sobretudo, as práticas curriculares, avaliação, planejamento
e organização dos tempos, espaços, materiais, concepções sobre criança, infância e
o próprio papel da educação nesse movimento.
Considerando os baixos rendimentos dos discentes nos dados da Avalição
Nacional da Alfabetização (ANA), em 2013 e 2014, o PNAIC não vem apresentando
resultados favoráveis se tomar-se como referência a ANA. Nessa perspectiva, as
pesquisas de Assis (2016); Melo (2015) e Alfares (2017), evidenciam que embora o
Pacto se constitua em uma política abrangente, disponibilize materiais, garanta a
participação das universidades públicas na elaboração do material e a formação
baseada em várias linhas teóricas como construtivismo e a teoria sócio-histórica, o
Programa propaga uma perspectiva de alfabetização de forma frágil e mecânica.
Esses estudos levam a pensar que a implementação do Pacto na Educação
Infantil pode ser temerário para o desenvolvimento do trabalho pedagógico, uma
vez que nessa primeira etapa da educação básica se faz imprescindível focar o
atendimento às especificidades infantis por meio de um trabalho que reconheça as
múltiplas linguagens.
Silva (2016) destaca que o processo de alfabetização na perspectiva do
PNAIC para as crianças de seis anos está descaracterizando o brincar, pois as

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atividades pedagógicas do Programa estão demasiadamente focadas em um
tempo estabelecido como certo para aprender e por práticas educativas
fragmentadas que não consideram as diversas linguagens no trabalho com as
crianças e suas infâncias, fato que pode trazer sérias consequências para o seu
desenvolvimento, como diminuição ou desvalorização do tempo importantíssimo da
infância e “[...] (re) produção de mais fracassos na escola, e, para os professores, a
adoção de práticas formativas massificadas, produzidas e gerenciadas por
76
especialistas, distantes do cotidiano dos sujeitos da escola” (SILVA, 2016, p. 9).
Ademais, o fato de o PNAIC focar dois campos de conhecimentos: Língua
Portuguesa e Matemática, pode produzir mecanismos de antecipação da
escolarização no sentido de reduzir o currículo a ler, escrever e calcular e isso
pode comprometer a definição, organização, construção ou ressignificação de
práticas curriculares voltadas ao favorecimento da formação mais ampla das
crianças.
Mello (2015) destaca que a infância é um tempo muito rico para o
desenvolvimento humano das crianças, assim ao invés da implementação de
práticas focadas na escolarização que geram o encurtamento da infância é
necessário “[...] aperfeiçoar o conteúdo e os métodos educativos, para assegurar,
em cada idade da criança, as vivências necessárias para o desenvolvimento
harmônico de sua personalidade e da inteligência em formação já na idade pré-
escolar” (MELLO, 2015, p. 10).
Nessa lógica, o currículo na Educação Infantil necessita ser compreendido
como: “um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os sabres
das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural,
artístico e tecnológico [...]” (BRASIL, 2009, p. 6). Assim, é crucial a intencionalidade
pedagógica no planejamento de práticas curriculares com ênfase na criança como
ponto de partida, o que inclui a superação de práticas homogeneizadoras pela
indispensável consideração de diferentes infâncias, dificuldades, potencialidades e
ritmos de aprendizagem das crianças.
Assim, é relevante compreender, conforme enfatiza Sacristán (1999), que a
prática educativa não se constitui exclusivamente como produto individual, mas é
resultado de um traço cultural compartilhado. Sob tal perspectiva, sofre influência

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de outras práticas externas às salas de aula que estão no âmbito político,
econômico, social e histórico. Especificamente sobre as influências das políticas
curriculares, o autor acentua que:

Existem regulamentos curriculares, formas de produzir e distribuir


materiais para o currículo alheias à ação dos professores, procedimentos
de controle que incidem no que “é tolerado que façam”, modos de
organizar o tempo, o espaço e os recursos, que dependem de estruturas
organizacionais e de usos muito estabelecidos; existem programas de
inovação escolar; estabelecem-se mecanismos de participação social que
condicionam o que ocorre nas aulas e etc (SACRISTÁN, 1999, p. 92).
77

Para exemplificar essa questão, o referido autor destaca duas questões que
muito influenciam no que ocorre dentro das salas de aula: os efeitos das práticas
de avaliações em larga escala e a prestação de contas sobre as práticas de
ensino, pois apresentam mecanismos de controle sobre os sistemas de ensino e
de modo consequente à prática curricular dos docentes (SACRISTÁN, 1999, p.
92).
Partindo dessa premissa, no contexto do PNAIC, a avaliação surge como
um dos elementos fundamentais no sentido de interpelar quais perspectivas – em
termos de avaliação, o Programa apresenta para a Educação Infantil.
Considerando que, além das avaliações nacionais aplicadas pelo Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o Pacto também
orienta por meio de seus documentos normativos a realização de:

Avaliações periódicas, aplicadas pelas próprias redes de ensino, a partir


de instrumentos padronizados e o registro em sistema adequado ao
monitoramento das ações aprovadas no Plano de Gestão; [...] avaliação
de aprendizagem realizada periodicamente pelas próprias escolas, para
orientar ações de apoio e reforço pedagógico aos alunos nas dimensões
de leitura, escrita e matemática (Brasil, 2017a, p. 3).

É importante compreender de que forma essas orientações do PNAIC sobre


avaliação na perspectiva de reforço escolar serão aplicadas no contexto da
Educação Infantil pelas redes de ensino, tendo em vista que segundo a LDBEN nº
9394/96, a avaliação na educação infantil será feita “[...] mediante
acompanhamento e registro do desenvolvimento das crianças, sem objetivo de
promoção, mesmo para o ensino fundamental” (BRASIL, 1996, ART.31). Essa
questão vai ao encontro das DCNEIs ao orientarem que a avaliação nessa etapa
não tem finalidade de promoção e necessita garantir “[...] a observação crítica e

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criativa das atividades, das brincadeiras, e interações das crianças no cotidiano
[...]” (BRASIL, 2009, p. 4-5).
A face do exposto é fulcral desconfiar de conceitos expressos nas reformas e
políticas curriculares, pois a antecipação da escolarização pode ser arriscada e um
aspecto que colabora para isso, em especial no PNAIC, é a notoriedade atribuída
pelo Programa a duas áreas específicas do conhecimento – língua portuguesa e
matemática – e as avaliações em larga escala.
78

CONCLUSÃO

As pesquisas apresentadas sobre o PNAIC, ainda que direcionadas ao


Ensino Fundamental, sinalizam importantes questões de análise sobre a
implementação deste Programa e suas repercussões para as práticas curriculares
na Educação Infantil no sentido de produzir mecanismos de antecipação da
escolarização, por meio do reducionismo ao currículo em ler, escrever e calcular, e
isso contraria as orientações das DCNEIs (2009) e o papel da Educação Infantil na
formação humana das crianças, uma vez que induz a práticas de avalição
padronizadas.
Portanto não se pode negar que é indispensável apresentar a cultura escrita
para a criança na Educação Infantil, no entanto, é necessário atenção e
desconfiança as inovações educacionais, tendo em vista que existem muitos
tensionamentos e desafios para que não se propague na Educação Infantil uma
antecipação da escolarização focada apenas em resultados e comprometa os
pressupostos norteadores das práticas curriculares na Educação Infantil: as
interações e brincadeiras. Nesse sentido, ressalta-se o imprescindível investimento
na formação cultural dos professores e a realização de mais pesquisas sobre a
implementação do PNAIC na Educação Infantil.

REFERÊNCIAS

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O CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO INFANTIL: uma construção coletiva no
Consórcio de Educação – COGIVA

Rejane de Barros Cavalcante

RESUMO: Este artigo realiza um exercício de apresentação e análise da Matriz de


Referência Curricular da Educação Infantil, elaborado pelo consórcio de educação dos
municípios do Baixo Rio Paraíba, tendo como objetivo apresentar a experiência da
construção coletiva da Matriz de Referência Curricular da Educação Infantil pelo COGIVA.
Este estudo foi organizado com base no caminho percorrido para essa construção, a 81
estrutura da Matriz e de que forma norteia o trabalho dos professores, a partir das
mediações didáticas construídas coletivamente. Constata-se que as atividades propostas
na Matriz por meio dos jogos, brincadeiras e interações com seus pares podem ampliar o
processo de aprendizagem pelas crianças.

Palavras-Chave: Matriz. Educação Infantil. Proposta curricular. Campo de experiência.

INTRODUÇÃO

Promover um trabalho que aprimore os conhecimentos infantis e que


simultaneamente busque assegurar uma educação de qualidade na Educação
Infantil (EI) é função da instituição escolar, visto que os profissionais dessa etapa da
educação Básica têm que pensar na criança como sujeito de sua aprendizagem.
Nesse contexto, é cabível que o (a) Professor (a) da Educação Infantil se atente ao
planejamento, organização e aplicação das atividades que propiciem o
desenvolvimento biopsicossocial da criança.
Portanto, educar a criança na faixa etária de zero a cinco anos pressupõe
também um (a) Professor (a) com competência pedagógica para fornecer à criança
experiências diversificadas de aprendizagem, situações que lhe desperte o interesse
e envolvimento para “aprender a aprender”.
Diferente dos escolares de outras etapas de ensino, a criança da EI está em
processo contínuo de desenvolvimento humano, apresenta particularidades que
devem ser atendidas e respeitadas pelo(a) Professor(a). Ela tem necessidade de
brincar, de interagir socialmente com seus pares para gradativamente ir

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conquistando a sua autonomia, aspecto essencial para a progressão e conquista de
novos saberes nas demais modalidades e níveis da educação.
Para isso, é imprescindível construir uma proposta curricular que contemple
um trabalho voltado ao desenvolvimento integral da criança, sendo necessário
oferecer um processo educativo que considere a apropriação da realidade
vivenciada, por meio das diversas linguagens, utilizando os recursos lúdicos que
lhes são oferecidos a partir das “interações e as brincadeiras”.
82
Com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a EI passou a demandar
atuações que requerem aprofundamentos teórico-metodológicos e atualizações
didático-pedagógicas para que se possam ter ações eficientes que considerem a
condição das crianças nos mais distintos processos, visto que a base contempla
competências que possibilitam a formação integral dos escolares. Portanto, o (a)
professor (a) da EI deve considerar ações pedagógicas que contribuam na garantia
dos objetivos de aprendizagens e desenvolvimento, ou seja, propiciar significação e
contextualização nas atividades trabalhadas com as crianças.
Considerando que a BNCC é um documento normativo, devendo ser
implantada em todos os estados brasileiros, este artigo tem como objetivo,
apresentar a experiência da construção coletiva da Matriz de Referência Curricular
da Educação Infantil pelo Consórcio Intermunicipal de Gestão Pública Integrada nos
Municípios do Baixo Rio Paraíba-COGIVA. Essa experiência contou com a
participação dos coordenadores e professores dos municípios integrantes do
consórcio para elaborar a Matriz em consonância com a BNCC.

2 A EXPERIÊNCIA DE UM CONSÓRCIO DE EDUCAÇÃO

Uma das ações na agenda do COGIVA refere-se ao atendimento da EI com


qualidade. A agenda surgiu nos eventos formativos promovidos pela Oficina
Municipal com a Câmara Técnica, composta por técnicos e secretários de Educação
dos municípios integrantes do consórcio, quais sejam: Cruz do Espírito Santo,
Caldas Brandão, Gurinhém, Ingá, Itabaiana, Juripiranga, Mari, Pilar, Riachão do
Poço, São José dos Ramos, Salgado de São Félix e Sobrado.
Considerando as condições comuns aos municípios sobreditos no tocante à

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educação, uma das ações da Câmara técnica foi a aplicação de um instrumento
diagnóstico a partir dos Indicadores da Qualidade da Educação Infantil, com vistas a
identificarem as reais necessidades dos profissionais que atuam na EI para serem
inseridas como temáticas no plano formativo em 2018.
As evidências constatadas no supracitado diagnóstico apontaram para
necessidade de uma formação de profissionais com abordagem nas dimensões de
planejamento institucional e multiplicidades de experiências e linguagens, as quais
83
abrangiam: o planejamento, avaliação e organização do ambiente; a organização do
tempo das atividades nas áreas externas e internas; o auxílio às crianças na
transição de uma atividade para outra; nas condições para que as crianças
expressem suas opiniões; crianças expressando-se por meio de diferentes
linguagens plásticas, simbólicas, musicais e corporais; e crianças tendo experiências
agradáveis, variadas e estimulantes com a linguagem oral e escrita.
Todos esses aspectos são contemplados nos objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento abordados na BNCC da Educação Infantil. Considerando a
necessidade de nos apropriarmos desse documento oficial com vistas a
implementação nos municípios, decidimos partir da formação dos coordenadores
para elaboração da nossa Matriz da EI em consonância com a BNCC.
É sabido que as secretarias não têm a função de elaborar propostas
pedagógicas para as instituições, porém faz parte de seu papel colaborar e orientar
as equipes escolares para construção dos documentos normativos necessários para
seu funcionamento. Partindo desse pressuposto, realizamos cinco encontros
formativos com os coordenadores que atuam na EI dos municípios do referido
consórcio, os quais eram os multiplicadores da formação para o (a) professor (a).
Cada encontro acontecia em um município diferente, sendo o primeiro no
município de Pilar, o segundo em Juripiranga, Sobrado, Itabaiana e novamente em
Pilar. Os encontros promovidos tinham duração de 8h de efetivo trabalho e de
relevante discussão e partilha de saberes e experiências.
Nesses encontros foram pesquisados, discutidos e elaborados, para cada
campo de experiência, mediações didáticas com detalhamento. Mediações, que as
professoras contribuíam alterando, excluindo e acrescentado conforme suas
experiências na abordagem das distintas linguagens. Conforme o Referencial

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Curricular Nacional para Educação Infantil-RCNEI, o movimento é considerado como
uma linguagem, pois permite que as crianças possam agir sobre o meio físico e
também atuar sobre o ambiente humano (Brasil, 1998, p.15).
Destarte, a linguagem do movimento enfatizado no Campo “Corpo, gestos e
movimentos” apresenta-se como uma condução relevante para o desenvolvimento
das crianças no processo da aprendizagem na Educação Infantil.
Outrossim, o profissional que atua na EI deve estimular a criança com base
84
em conceitos e processos de desenvolvimento nas atividades lúdicas, intenções
despertem a imaginação e a criatividade. Assim, o espaço de vivência precisa ser
um ambiente favorável ao desempenho dos professores, visto que reúne as
singularidades das crianças que este profissional deve conhecer possibilitando uma
multiplicidade significativa de atividades para desenvolver os objetivos esperados
nessa etapa da Educação Básica. Conforme o RCNEI (1998, p.30),

A intervenção do professor é necessária para que, na instituição de


educação infantil, as crianças possam, em situações de interação social ou
sozinhas, ampliar suas capacidades de apropriação dos conceitos, dos
códigos sociais e das diferentes linguagens, por meio da expressão e
comunicação de sentimentos e ideias, da experimentação, da reflexão, da
elaboração de perguntas e respostas, da construção de objetos e
brinquedos etc. Para isso, o professor deve conhecer e considerar as
singularidades das crianças de diferentes idades, assim como a diversidade
de hábitos, costumes, valores, crenças, etnias etc. das crianças com as
quais trabalha respeitando suas diferenças e ampliando suas pautas de
socialização.

Nessa etapa, as interações e brincadeiras a partir dos objetivos da BNCC nos


espaços de vivências devem ser bem conduzidos com as crianças propiciando a
aprendizagem. Para isso, é imprescindível que os profissionais da EI estejam
preparados para desempenhar suas funções.

3 A MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL DOS MUNICÍPIOS DO


BAIXO RIO PARAÍBA

A ausência de uma proposta curricular para Educação Infantil deixava os


municípios trabalhando individualmente e com orientações pedagógicas distintas.
Isso não era positivo, pois não havia uma orientação pautada nos documentos

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oficiais destinados para esta fase, ocasionando, muitas vezes, um trabalho voltado a
atividades mecânicas e brincadeiras livres. Assim, não havia uma preocupação do
trabalho desenvolvido com os eixos interações e brincadeiras, sobretudo, dos bebês
que não tinham suas habilidades desenvolvidas na instituição por falta dos estímulos
apropriados e atividades aplicáveis aos contextos práticos de suas vivências. Não se
trata aqui de impor nenhuma metodologia, mas de sustentar um princípio político-
pedagógico que possa nortear o trabalho do (a) professor (a) da EI.
85
Nesse prelúdio, buscamos elaborar mediações didáticas para a Matriz com o
objetivo de mobilizar os conhecimentos do professor em relação as estratégias a
serem utilizadas em sala de aula, facilitando o processo de aprendizagem ou
reforçando conhecimento da criança. Portanto, a Matriz norteia o trabalho do
professor no tocante ao que a criança nas três faixas etárias deve desenvolver e o
detalhamento subsidia o desenvolvimento das atividades, dando clareza na
proposta de atividades, além de propiciar na criatividade de outras, conforme o
interesse do professor.
Vale salientar que a Matriz em evidência não representa o limite para o
professor, uma vez que não esgota as possibilidades que devem ser abordadas em
cada Campo de Experiência, pois indica apenas uma referência de mediações
didáticas. Cabe ao professor verificar todos os objetivos que devem fazer parte do
currículo da EI, evidenciando-se assim suas necessidades, condições e desejos no
que se refere a seus saberes.
A forma como a Matriz de Referência foi organizada pode ser considerada
bastante eficiente no processo de aprendizagem porque igualmente a Base,
contempla todos os Campos de Experiência e seus objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento, além de considerar as particularidades dos municípios
participantes.
Os cinco campos de experiências na Base se articulam aos conhecimentos
com vistas a alcançar determinados objetivos. Esses campos permitem colocar a
criança no centro do processo de aprendizagem, abordando uma proposta de
organização de objetivos que permitem o desenvolvimento integral da criança.
Conforme Salles e Faria (2012, p. 78), essa opção se deve ao fato de que as
crianças no seu dia a dia, desde o momento em que chegam à Instituição de

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Educação Infantil (IEI) e participam de interações com as pessoas e com o
ambiente, estão vivenciando experiências diversas que podem “formá-las” ou
“deformá-las”. Esses aspectos vão depender de como serão desenvolvidas com as
crianças as experiências lúdicas de respeito, de autonomia, de cooperação, de
investigação e de leitura.
Partindo da premissa de que a instituição educativa deve se comprometer
com tudo que faz, é imprescindível que seus professores reflitam sobre o fazer
86
docente, conscientizando-se das experiências que estão propiciando as crianças no
ato de cuidar e educar, haja vista a necessidade de suas intencionalidades de forma
planejada e organizada em um currículo.
Para a elaboração da Matriz, além de Base, foram consideradas as
orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil- DCNEI,
em seu artigo 9º, em relação aos eixos estruturantes, as interações e as
brincadeiras, vivências nas quais as crianças podem construir e apropriar-se de
conhecimentos por meio de suas ações e interações entre si e com os adultos, o
que propicia aprendizagens, desenvolvimento e socialização. E ainda,

A interação durante o brincar caracteriza o cotidiano da infância, trazendo


consigo muitas aprendizagens e potenciais para o desenvolvimento integral
das crianças. Ao observar as interações e a brincadeira entre as crianças e
delas com os adultos, é possível identificar, por exemplo, a expressão dos
afetos, a mediação das frustrações, a resolução de conflitos e a regulação
das emoções (BRASIL,2017, p.35).

Consideramos também, os seis direitos de aprendizagem e


desenvolvimento assegurados para EI na BNCC, são eles: conviver, brincar,
participar, explorar, expressar e conhecer-se, tendo em vista que são “condições
para que as crianças aprendam em situações, nas quais possam desempenhar um
papel ativo em ambientes que as convidem a vivenciarem desafios e a sentirem-se
provocadas a resolvê-los, nas quais possam construir significados sobre si, os
outros e o mundo social e natural” (BRASIL,2017, p.35).
Ademais, as escolhas explicitadas na BNCC e planejada nas atividades
propostas da referida Matriz se sustentam na concepção de que as crianças vão
aprendendo e se desenvolvendo nas relações que estabelecem a sua volta a partir
das experiências com adultos e seus pares, utilizando-se de distintas linguagens.
Partindo dessa concepção integradora, foram elaboradas mediações didáticas

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relacionadas aos saberes e conhecimentos que considerem as relações das
crianças nas múltiplas linguagens, mas que não esgotam outras possibilidades de
trabalhos com as crianças. Porém, acreditamos que para os professores terem maior
consciência do seu fazer pedagógico se faz necessário dar visibilidade aos aspectos
que compõem o todo.
Na Matriz, acatamos o que estabelece a Base em relação ao trabalho a partir
dos cinco Campos de Experiência, fundantes para o desenvolvimento das crianças,
87
quais sejam: o Eu, o outro e o nós; Corpo, gestos e movimentos; Traços, sons,
cores e formas; Escuta, fala, pensamento e imaginação; e Espaço, tempo,
quantidades, relações e transformações.
Assim como na Base, para cada Campo foram estabelecidos objetivos de
aprendizagem divididos em três grupos etários: bebês, crianças bem pequenas e
crianças pequenas. Os Campos de Experiência e objetivos nos auxiliaram na
seleção e organização das mediações didáticas e, por conseguinte, na elaboração
da Matriz, no tocante ao que desenvolver em cada fase sobredita.
As atividades em cada Campo apontam como as crianças em seu processo
de apropriação dos saberes podem aprender e se desenvolver, uma vez que os
objetivos foram delineados nas experiências vivenciadas por elas.
Vejamos como foi elaborada a estruturação da Matriz de Referência
Curricular da Educação Infantil. No presente trabalho, focalizamos em cada Campo
apenas um objetivo de aprendizagem referente a uma faixa etária para aprofundar
nossas discussões.

MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Bebês (zero a 1 ano e 6 meses)
Campos de experiência “O EU, O OUTRO E O NÓS”
Objetivos de
aprendizagem e Mediações didáticas Detalhamento
desenvolvimento
(EI01EO01) Perceber Estimulação na perspectiva da Construção do autorretrato com
que suas ações têm formação da identidade o uso do espelho, conhecimento
efeitos nas outras de imagens, objetos pessoais.
crianças e nos adultos.
Bater palma e chamar pelo
nome da criança; utilizar
músicas que envolvam o nome
da criança.
Fonte: Arquivo do autor.

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No Campo “o eu, o outro e o nós”, a criança será estimulada a aprender
estabelecendo vínculos e criando relações que colaborem o conhecimento sobre si e
sobre o outro, produzindo uma cultura infantil, de acordo com sua faixa etária,
propiciando as relações de amizade com outras crianças, visto que ela aprende pela
interação com o outro. Somado a isso, temos o entendimento de que o (a)
Professor (a) deve possibilitar situações nas quais as crianças participem e se
apropriem de práticas culturais de autocuidado e auto-organização, considerando
88
espaços, tempos e atividades em grupo. Além disso, deve estar atento as
necessidades delas, aproveitando situações cotidianas que contribuam no processo
de seu autoconhecimento, percebendo seus limites, possibilitando na construção da
identidade autônoma e positiva de si.

MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses)
Campos de experiência “CORPO, GESTOS E MOVIMENTOS”

Objetivos de
aprendizagem e Mediações didáticas Detalhamento
desenvolvimento
(EI02CG01) Utilização de bola em diversas
Apropriar-se de Desenvolvimento da brincadeiras, remetendo a variadas
gestos e linguagem oral e cantigas.
movimentos de gestual, por meio de Uso de danças e músicas regionais
sua cultura no jogos, brincadeiras e (quadrilha, coreografia, etc.)
cuidado de si e danças folclóricas. Dinâmica de grupo orientada.
nos jogos e Brincadeiras com objetos, como empurrar
brincadeiras. pneus, pular entre os pneus, caminhar no
túnel, pular corda, jogar bola.
Apresentar cantigas de roda, mimicas e
danças regionais.

Utilizar jogos em duplas e coletivamente.

Desenvolver atividades com mimicas.

Resgate de brinquedos e brincadeiras


antigas.

Vivência de danças populares com seus


movimentos básicos como forma e
conhecimento da cultura popular e sua
diversidade de ritmos.
Fonte: Arquivo do autor.

O Campo “corpo, gestos e movimentos” permite o desenvolvimento da


exploração e valorização das brincadeiras de faz de conta, das narrativas infantis.

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Nelas, as crianças podem representar situações do cotidiano ou interagir com as
narrativas literárias ou teatrais, vivenciando experiências com as várias linguagens,
de forma a valorizar a sua cultura e a do outro, ampliando possibilidades de se
expressarem, de criarem movimentos a partir de ritmos e estilos que caracterizam
nossa região.
As mediações propostas na Matriz para esse Campo, permite a criança
expandir seus movimentos a partir dos jogos e brincadeiras nos espaços das
89
instituições. Assim, o professor deve organizar espaços e materiais que possibilitem
a vivência do corpo no espaço, como obstáculos, rampas, colchões, caixas, entre
outros. Organizando o espaço da sala de aula, incentivando-as nesse espaço a
criarem lugares imaginários e reais.

MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses)
Campo de Experiência- TRAÇOS, SONS, CORES E FORMAS”

Objetivos de Mediações didáticas Detalhamento


aprendizagem e
desenvolvimento

(EI03TS01)Utilizar Manipulação de materiais Brincadeiras, encenação de peças


sons produzidos concretos e instrumentos que teatrais, de contos e histórias infantis
por materiais, produzam diferentes tipos de utilizando instrumentos que
objetos e sons. produzam diferentes sons.
instrumentos
musicais durante Danças e brincadeiras que explorem
brincadeiras de faz movimentos corporais livres e
Utilização da linguagem corporal coordenados.
de conta, para consolidar diferentes
encenações, conhecimentos em seu Reconto de histórias utilizando
criações musicais, processo de aprendizagem diferentes instrumentos que
festas como forma de expressão. produzam sons presentes nas
histórias.
Usos de gêneros e estilos musicais
de diferentes épocas e culturas,
identificando suas características
Atividades que conduzam as
crianças a brincarem sozinhas, em
grupo, com crianças da mesma faixa
etária e de idades diferentes.

Fonte: Arquivo do autor.

A proposta para o Campo “traços, sons, cores e formas” tem como ênfase as

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experiências com as manifestações artísticas e culturais voltada a linguagem
musical e visual, com foco da escuta ativa, de produção musical, destacando nas
experiências corporais, a intensidade dos ritmos e sons das músicas.
Esses aspectos são enfatizados nas DCNEI, art. 9º, quando apregoa que na
EI deve-se promover: o relacionamento e a interação das crianças com
diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema,
fotografia, dança, teatro, poesia e literatura.
90
Esses são aspectos também valorizados na Matriz a partir de experiências
que visam promover a sensibilidade investigativa nos campos visual e sonoro, com
valorização da produção nas diversas situações que participam, como pintura,
desenho, colagem, modelagem, escultura entre outros.

MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Bebês (zero a 1 ano e 6 meses)
Campo de Experiências- “ESCUTA, FALA, PENSAMENTO E IMAGINAÇÃO”

Objetivos de
aprendizagem e
desenvolvimento Mediações didáticas Detalhamento

(EI01EF01) Confecção de chamadinha com nome e


imagem para ser utilizada diariamente.
Reconhecer quando
é chamado por seu Apresentação de música que envolva o
nome e reconhecer Desenvolvimento de nome da criança e de seus colegas.
os nomes de projetos com a temática
pessoas com quem Identidade e Autonomia. Ex: A canoa virou...
convive. O sapo não lava o pé...

Brincadeiras com o uso do espelho, em


grupo vendo a imagem, chamando pelo
nome e do colega.

Brincadeira de cuca-achou ou achou-


sumiu com o bebê, cobrindo seu rosto
com o pano, chamando pelo nome e
levando-a a retirar o pano.
Expor com ajuda da criança fotos em
sala com identificação do nome.
Músicas que tragam o nome das
crianças, atividades que exploram o
peso, a altura e as características de
todos.
Fonte: Arquivo do autor.

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As mediações propostas para o Campo “escuta, fala, pensamento e
imaginação” enfatizam as experiências com a linguagem oral nas distintas formas
sociais de comunicação presentes na nossa cultura, tais como: as conversas,
cantigas, brincadeiras, jogos. Experiências com materiais a serem manipulados e
explorados conforme os interesses das crianças, como forma de favorecer a
aprendizagem da leitura e escrita espontânea.
91
No documento, as propostas consideram as experiências com as práticas
sociais de uso da escrita em contextos significativos e cheio de significados, tendo a
oportunidade de imitar, dramatizar atos escritos em situações de faz de conta, de ler
e escrever convencionalmente apoiadas por um escriba, que as engajem em
reflexões para organizarem suas ideias sobre hipóteses de escrita.

MATRIZ DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses)
Campo de Experiência- “ESPAÇOS, TEMPOS, QUANTIDADES, RELAÇÕES E
TRANSFORMAÇÕES”
Objetivos de
aprendizagem e
desenvolvimento Mediações didáticas Detalhamento

(EI03ET01) Atividades que Utilizar a régua para medir espessura de


Estabelecer relações explorem medidas, carteiras, tamanhos do pé, mão,
de comparação entre utilizando régua e comparando-os com de outras crianças e
objetos, observando outros materiais de elaborando gráfico de tamanhos.
suas propriedades. medidas.

Observar no meio natural e social as formas


geométricas existentes, descobrindo
semelhanças e diferenças entre os objetos
Reconhecer figuras no espaço, estabelecendo relações
geométricas, formas e espaciais e temporais, combinando forma,
contornos, superfícies, nas situações que envolvam descrições
bidimensionalidade e orais.
tridimensionalidade e
suas relações.
Utilização de uma caixinha surpresa, com
material concreto para as crianças
classifica-las e seriá-las.

Fonte: Arquivo do autor.

O Campo de Experiência “espaços, tempos, quantidades, relações e


transformações” abrange os conhecimentos habituais e os “historicamente

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acumulados pela humanidade” referentes às relações de quantidades, espaços,
tempos, relações e transformações, grandezas e medidas, as formas, ao conceito de
números e o tratamento da informação. Devem ser trabalhados por meio de
situações problemas em contextos lúdicos, de forma que a criança possa ampliar,
aprofundar e compreender procedimentos de contagem a partir de situações reais
que os permita conhecer a sequência numérica verbal e escrita, mesmo que não
convencional.
92

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao elaborar uma Matriz Curricular para a Educação Infantil tomando como


referência os documentos oficiais e os objetivos neles propostos, temos que
considerar a criança enquanto sujeito de sua aprendizagem, que descobre, que faz
opções e inventa distintas possibilidades durante as atividades propostas.
Seguindo essa linha de pensamento, o documento em questão é relevante e
imprescindível, no que se refere à função norteadora para coordenadores e
professores na elaboração da proposta pedagógica, do planejamento, da formação
continuada, bem como aperfeiçoamento da avaliação do trabalho educativo e da
aprendizagem das crianças.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília:


MEC/SEF, Vol.1, 1998.
________, Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília:
MEC/SEF, Vol.2, 1998.
________. Ministério da Educação. Resolução nº5/2009 de 17 de dezembro de
2009.Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília:
Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica-CEB.2009.
________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Indicadores da
Qualidade na Educação Infantil. Brasília: MEC/SEB,2009.

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________. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília:
Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica-CEB.2017.
SALLES, Fátima; FARIA, VITÓRIA. Currículo na Educação Infantil -
Diálogo com os demais elementos da Proposta Pedagógica . 2 Ed.
São Paulo. Ática,2012.

93

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CURRÍCULO E EDUCAÇÃO INFANTIL: OS DESAFIOS DE UMA PRÁTICA
DOCENTE DIANTE DA VIVÊNCIA DA INFÂNCIA

Joelma Miriam de Oliveira

RESUMO: Este trabalho é fruto do estágio supervisionado realizado numa turma da pré-
escola de uma escola pública localizada numa Vila do município de Riacho das Almas – PE,
no qual serão abordadas questões voltadas para os desafios no contexto escolar da
educação infantil no contexto campesino, com objetivo de conhecer os desafios de uma 94
prática docente diante da vivência da infância, como também, identificar a prática docente;
conhecer a concepção de infância. Como percurso metodológico foi utilizado à técnica da
observação, entrevistas semiestruturadas e conversas informais com alunos, professora e a
gestora. Para assim, conhecer como essa prática atende as especificidades próprias da fase
da infância, que são essenciais para o desenvolvimento das crianças. Desenvolvemos um
projeto de intervenção, abordando questões voltadas para higiene e saúde, utilizando
recursos que possibilitam desenvolver a ludicidade na prática docente, tendo em vista que, a
metodologia da professora se pautava num modelo tradicional, no qual ela utilizava
atividades impressas e cópia nos cadernos. Durante o trabalho em campo, identificamos na
prática pedagógica e no contexto escolar, alguns fatores que dificultam a interação dos
elementos essenciais para se trabalhar na educação infantil.
Palavras Chaves: Educação do Campo. Concepção de Infância. Educação Infantil. Prática
Docente.

INTRODUÇÃO

A educação infantil vem sendo bastante discutida nos últimos anos, na


medida em que são desenvolvidos estudos e pesquisas que abordam essa temática,
nos quais se pode perceber a necessidade de pensar nas especificidades próprias
da infância no contexto escolar. Assim, se faz necessário que na prática docente
seja considerado a condição na qual a criança se encontra sujeito em
desenvolvimento, onde as atividades lúdicas e o brincar são essenciais no processo
de aprendizagem da criança. “O lúdico é, sem dúvida, um dos caminhos para o
trabalho pedagógico, que encontra, assim, um meio de manifestação e expressão”
(LEONOR E SANTOS,1999, p. 205).
Então, as crianças precisam de um ambiente adequado, que atenda suas
necessidades, para que haja interação com os diversos sujeitos, a mesma por está
em fase de desenvolvimento construindo sua identidade, precisa de um ambiente
que promova à exploração do lúdico, em que os tempos escolares sejam adequados

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aos ritmos da aprendizagem (OLIVEIRA, 2002). Ressaltamos que cada criança é um
ser único com suas particularidades, não podemos homogeneizar os sujeitos da
educação infantil, como se eles não tivessem sua cultura.

CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA

A infância atualmente tem uma nova concepção, na qual a criança é um ser


social com seus direitos assegurados. Um ser ativo com cultura e que tem muito a
95
contribuir com o processo de aprendizagem. No entanto, mesmo com seus direitos
assegurados, ainda há casos que não acontece à efetivação dos direitos das
crianças na educação infantil, mesmo com a existência do Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil, segundo o qual:

Considerando-se as especificidades afetivas, emocionais, sociais e


cognitivas das crianças de zero a seis anos, a qualidade das
experiências oferecidas que podem contribuir para o exercício da
cidadania deve estar embasada nos seguintes princípios:
• o respeito à dignidade e aos direitos das crianças, consideradas
nas suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais,
étnicas, religiosas etc.;
• o direito das crianças a brincar, como forma particular de
expressão, pensamento, interação e comunicação infantil;
• o acesso das crianças aos bens socioculturais disponíveis,
ampliando o desenvolvimento das capacidades relativas à
expressão, à comunicação, à interação social, ao pensamento, à
ética e à estética;
• a socialização das crianças por meio de sua participação e inserção
nas mais diversificadas práticas sociais, sem discriminação de
espécie alguma;
• o atendimento aos cuidados essenciais associados à sobrevivência
e ao desenvolvimento de sua identidade (BRASIL, 1998).

Pensar o contexto da Educação Infantil requer atenção para os fatores


essenciais para o desenvolvimento da criança, dos quais ressaltamos a rotina que é
um fator importante no desenvolvimento das aulas e no planejamento das mesmas,
mas devem ser preparadas levando em consideração as especificidades das
crianças. Para Barboza (2006), as rotinas podem ser vistas como produtos culturais
criados, produzidos e reproduzidos no dia-a-dia, tendo como objetivo a organização
da cotidianidade.
Então, as rotinas não podem ser estabelecidas de maneira que torne a
aprendizagem da criança monótona. Elas são um meio pelo qual se pode estruturar

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o trabalho no cotidiano escolar, nesse caso específico na educação infantil, que
necessita de um cuidado especial.

LUDICIDADE E O BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL

A brincadeira e a ludicidade fazem parte do universo infantil, sendo assim,


ressaltamos a importância desses elementos se fazerem presentes nas práticas
96
docentes da Educação Infantil. Por meio das brincadeiras as crianças interagem
com as pessoas, objetos e com o mundo ao seu redor, o que colabora para o seu
desenvolvimento enquanto sujeito social.
No campo de estudo, um fator que chama a atenção é a falta de ludicidade,
não há um tempo, nem espaço para que haja brincadeiras livres e significativas, que
contribuam para o desenvolvimento cultural dos estudantes da Educação Infantil. As
crianças brincam apenas na hora do recreio e mesmo assim, não aproveitam bem
esse tempo, porque elas têm que dividir o pouco espaço do pátio da escola, com os
alunos das séries mais avançadas. E
As brincadeiras de faz-de-conta, os jogos de construção, e aqueles
que possuem regras, como os jogos de sociedade (também
chamados de jogos de tabuleiro), jogos tradicionais, didáticos,
corporais e etc., propiciam a ampliação dos conhecimentos infantis
por meio da atividade lúdica. (BRASIL, 1998)

O jogo é uma atividade simples que pode contribuir para o processo de


desenvolvimento da criança, por meio deste a criança demonstra conhecimentos a
respeito das regras, como também, a relação de respeito para com o outro,
aprendendo assim, os valores sociais. Então, é no comportamento e nas expressões
das crianças que entendemos a importância e o valor desses momentos de
brincadeiras, os quais não podem ser negados as crianças.
Um fato muito interessante, que particularmente nos despertou atenção na
sala de aula, campo de estudo, foi o fato de um dos alunos possuir problema de
vista muito avançado, e fazer questão de fazer tudo o que as outras crianças faziam,
mesmo sendo visto como alguém incapaz de desenvolver as atividades propostas
na sala de aula. Como toda criança esse aluno gosta muito de brincar e traz sempre
um brinquedo em sua bolsa, para brincar na hora do recreio, pois além da falta de
espaço para tantas crianças ele não pode correr com as demais, devido ao seu

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problema de vista ele é tratado diferente e não o deixam correr, porém ele faz
questão de participar das brincadeiras.

O brincar apresenta-se por meio de várias categorias de experiências


que são diferenciadas pelo uso do material ou dos recursos
predominantes implicados. Essas categorias incluem: o movimento e
as mudanças da percepção resultantes essencialmente da
modalidade física das crianças; a relação com os objetos e suas
propriedades físicas assim como a combinação e associação entre
eles; a linguagem oral e gestual que se referem à forma como o
97
universo social se constrói; e finalmente, os limites definidos pelas
regras, constituindo-se em um recurso fundamental para brincar.
(BRASIL; 1998)

Além do brincar que extremamente importante para que as crianças


desenvolvam suas habilidades, identidade e autonomia. A presença da família nesse
processo junto com a escola contribui para o desenvolvimento das crianças, porém
durante as observações percebemos que o contato mais próximo da família é levar
as crianças até a porta da sala, mal falam com a professora e se despedem das
crianças. Na hora da saída os pais ou outro membro da família que vem buscar a
criança chamam a criança e saem rapidamente.
A interação entre a escola e os pais ou responsáveis pela criança é de
extrema importância, eles devem sempre ser informados sobre tudo o que acontece
com a criança, como também, a forma de trabalho e a proposta pedagógica
desenvolvida em sala de aula, para que assim possam contribuir para a
aprendizagem das crianças.
As relações estabelecidas entre as crianças são amigáveis, porém existem os
grupinhos que se formam com base nas condições financeiras de cada criança, as
crianças que possuem os melhores brinquedos, trazem lanche sempre ficam mais
tempo juntas, esporadicamente formam grupos com as crianças que não trazem seu
lanche ou possuem um brinquedo. Dentro desse contexto se dá a exclusão das
crianças, podemos perceber que a segregação devido às condições financeira se
faz presente no contexto da Educação Infantil. Sendo assim, ressaltamos a
importância de fazer uso de brincadeiras no contexto da sala de aula, que trabalhem
o respeito para com as diferenças e a convivência com seus semelhantes,
independente das condições financeiras.

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A PRÁTICA DOCENTE

A prática docente desenvolvida por qualquer professor está permeada na


teoria que fundamenta o docente. “A prática docente diz respeito ao fazer do
professor, ou seja, ao trabalho que é inerente à atividade da docência” (MELO,
2014)
Se o ensino pode se transformar, então a prática docente que é
concernente à função do professor de ensinar igualmente se 98
altera, principalmente a partir do “envolvimento do professor em
processos reflexivos sobre si mesmo, no contexto profissional,
com previsíveis implicações no seu autoconhecimento, como
pessoa e como profissional” (SANTOS, S., 2005, p. 51). Assim,
a prática docente é resultado desse movimento de reflexão
sobre o ensino e a aprendizagem em diálogo constante com o
conhecimento teórico, sendo, pois, nesse movimento entre
reflexão do fazer e a teoria que ocorrem as mudanças (p. 42 ).

A prática docente está embasada num currículo e se dá numa instituição


escolar, em sua maioria, e não acontece isoladamente, pois, o professor segue
normas institucionais e também, está sempre atuando coletivamente, toma suas
decisões e concretiza sua prática, muitas vezes seguindo essas normas. Porém,
mesmo assim é preciso ter um olhar diferenciado para a educação infantil.
A prática docente não se inscreve apenas no âmbito da prática
entendida como institucionalizada, ou na ação que se refere
aos sujeitos, mas também abarca a teoria, esta entendida
como instrumentalizadora da prática (MELO, 2014, p. 43).

Então, a prática docente fundamenta-se numa teoria e mesmo sendo


concretizada num contexto institucional, seguindo normas que orientam o trabalho
docente, o professor estabelece em seu fazer docente uma relação teórico e prática,
esta deve atender as necessidades advindas do contexto da Educação Infantil.
Assim,

A prática docente se insere dentro dessas duas dimensões,


tanto é prática educativa como pedagógica. As práticas
pedagógicas são, então, aquelas com objetivos definidos, já as
práticas educativas podem não vir acompanhadas de uma
finalidade clara (MELO, 2014, p. 44).

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Dentro da sua prática docente, o professor está constantemente educando os
estudantes, dentro do contexto escolar da Educação Infantil, como também,
contribui para o desenvolvimento das crianças, para a vida em sociedade,
ensinando-as valores sociais que fazem parte da vida em sociedade, pois

O fazer do professor se insere em um fazer educativo, na


função de ensinar. Nesse sentido, a prática docente estaria
circunscrita na prática educativa, compreendendo por prática
educativa “as práticas sociais [que] só se tornarão educativas
99
pela explicitação/ compreensão/ tomada de consciência de
seus objetivos, tarefa da investigação científica na educação”
(Apud FRANCO, 2012, p. 152).

A professora elabora um planejamento que ela segue rigorosamente, tendo


em vista que a cada mês é trabalhado uma temática diferente, e é dentro dessa
temática que ela deve desenvolver seu planejamento. A maioria das atividades
observadas é voltada para a pintura de desenhos trabalhando algum número, animal
entre outros, estabelecimento de relações e o trabalho exaustivo de identificar letras
e escrever nomes. Portanto,

[...], a definição de uma proposta pedagógica deve considerar a


importância dos aspectos socioemocionais na aprendizagem e a
criação de um ambiente interacional rico de situações que
provoquem a atividade infantil, a descoberta, o envolvimento em
brincadeiras e explorações com companheiros. Deve priorizar o
desenvolvimento da imaginação, do raciocínio e da linguagem,
como instrumentos básicos para a criança se apropriar de
conhecimentos elaborados em seu meio social, buscando
explicações sobre o que ocorre a sua volta e consigo mesma
(OLIVEIRA, 2002. p, 50).

No contexto da sala de aula na Educação Infantil o lúdico é algo que deve ser
pensado e possibilitado com muita frequência, pois proporciona prazer,
descontração e interação, obtendo assim um resultado satisfatório no que se refere
à aprendizagem da criança.
O currículo que direciona a prática docente é permeado pelos conteúdos
voltados para Área de Linguagem que são o conhecimento e a escrita das vogais e
do nome próprio, em Matemática é o conhecimento dos numerais e a representação
quantitativa desse número por meio de desenhos nas atividades, nas áreas de

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Ciências da Natureza e da Sociedade são priorizados os conhecimentos referentes
a higiene do corpo, dos alimentos, os sentidos, sinais de trânsito, a família, a casa,
tipos de moradia e etc. Artes é uma área bastante presente, porém não é tão
explorada. As crianças realizam atividades predominantemente de pintura com lápis
em desenhos já prontos. Todas as atividades trabalhadas, principalmente as de
Linguagem, são marcadas pelo conhecimento das letras e dos números.
A metodologia adotada, não aborda a diversidades de elementos para se
100
trabalhar com as crianças, muito menos o desenvolvimento da criatividade, da
espontaneidade, da essência do ser criança e da infância. Não possibilita novos
olhares, devido muitas vezes à exigência da sociedade e também dos próprios pais
que querem ver seus filhos escolarizados cada vez mais precocemente.

VIVÊNCIAS OUTRAS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Nesta parte do trabalho vamos apresentar a análise do projeto de intervenção


que realizamos com as crianças durante o estágio. Então, após algumas
observações, e tendo em vista que a metodologia adotada pela professora é um
tanto tradicional, com base na temática do mês que era voltada para higiene e
saúde, desenvolvemos um projeto de intervenção voltado para a Higiene e Saúde,
utilizando uma metodologia lúdica, por meio do teatro com fantoches, para enfatizar
a importância da alimentação e dos hábitos de higiene para nossa saúde. Logo,

[..] a ludicidade, tão importante para a saúde mental do ser


humano é um espaço que merece atenção dos pais e
educadores, pois é o espaço para expressão mais genuína do
ser, é o espaço e o direito de toda a criança para o exercício da
relação afetiva com o mundo, com as pessoas e com os
objetos. (LEAL, 2011, p. 11).

Os alunos se envolveram bastante com o teatro de fantoches, respondiam as


perguntas acerca do tema abordado como: por que é importante tomarmos banho?
Manter as unhas limpas e cortar sempre? Se alimentar bem? Comer verduras e
frutas?
De acordo com Bellinaso, Santos, Moraes at all (2012), Estudos indicam que
ações de educação nutricional que combinam informação e motivação propiciam

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conhecimentos para a introdução do tema alimentação no contexto escolar e
familiar. Souza e Vilas Boas (2004), no seu estudo, concluíram que, apesar dos
responsáveis possuírem o conhecimento, muitas vezes não incorporam estes
alimentos nas suas refeições, reforçando a necessidade da utilização das atividades
no ambiente escolar.
Em um segundo momento foi formado um grande círculo, no qual explanamos
a respeito de se alimentar com comidas saudáveis e comer frutas e verduras, para
101
que na sequência todos pudessem se expressar, expondo suas opiniões. Na
Educação Infantil muitas vezes as crianças não podem expressar suas ideias e seus
conhecimentos adquiridos além dos muros escolares. Após a conversa no grande
grupo, elas assistiram a um vídeo com a música o que é que tem na sopa do
neném? (Palavra Cantada), todos cantaram e se divertiram muito, pois a música
pode ser uma ferramenta pedagógica muito importante.
Na sequência, para trabalhar matemática, com algumas frutas feitas de
emborrachado com velcro que confeccionamos, montamos um gráfico, as crianças
perguntavam qual a fruta preferida de um colega e a citada era colocada no cartaz
para montarmos o gráfico. Lellis e Imenes (1994) acreditam que os recursos
didáticos podem ser uma das possibilidades para trabalhar a Matemática que coloca
os alunos enquanto protagonistas da aprendizagem, promovendo reflexão e
autonomia, e propiciando aulas participativas, em que todos podem manipular e
realizar descobertas. (Apud Januário, 2008).
A experiência vivenciada com o projeto foi bastante significante, percebemos
o quanto pode ser eficiente inovar a metodologia de ensino fazendo uso da
ludicidade, com brincadeiras, jogos e músicas e acima de tudo permitir que as
crianças possam se expressar, pois além de aprender elas podem nos ensinar
muitas coisas.

CONSIDERAÇÕES

A partir do trabalho realizado, percebemos que são muitos os desafios que o


professor encontra para desenvolver sua prática docente na educação infantil. A
começar pela concepção de infância, na qual a criança é tida como um ser que

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precisa de cuidados, e assim, as potencialidades dela são desprezadas.
Percebemos também, que a prática docente desenvolvida na educação infantil,
preocupa-se mais com os conteúdos curriculares que o desenvolvimento da criança.
Então, consideramos que o principal desafio da prática docente na educação infantil,
consiste em não saber atender as especificidades das crianças, pela preocupação
em cuidar da criança, por vê-la como ser frágil. E, por estar num contexto onde é
cobrado que a criança aprenda os conteúdos curriculares, porém, falta formação,
102
para que o professor em sua prática docente possa dar conta dos conteúdos,
considerando as especificidades da infância. Como o currículo atende as
especificidades da infância? O currículo da Educação Infantil contempla as
necessidades advindas da infância?

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Maria Carmen Silveira; HORN, Maria da Graça Souza; Cap. 6


Organização do espaço e do tempo na escola infantil; Educação infantil: Pra
que te quero?/ organizado por Carmen Maria Craidy e Gladis Elise P. da Silva
Kaercher; Artmed, Porto Alegre 2001.
BARBOZA, Maria Carmem Silveira. Por amor e por força: rotinas na Educação
Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2006.
BRASIL; Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação
Fundamental. Referência curricular nacional para a educação infantil. Brasília:
MEC/SEF, 1998.
MELO, Maria Julia Carvalho de. Os sentidos partilhados sobre estágio
supervisionado e as contribuições para a prática docente do professor com
experiência docente. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de
Pernambuco, CAA, Programa de Pós-graduação em Educação Contemporânea. –
Caruaru, 2014.
OLIVEIRA, Zilma Ramos de, Educação Infantil: Fundamentos e Métodos. – São Paulo:
Cortez, 2002. (Coleção Docência em Formação)
SANTOS, Adriana Pereira dos, LEONOR, Maria Filomena Fernandes. Infância e
educação infantil. - Campinas, SP: Papirus, 1999. (Coleção Prática Pedagó

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EDUCAÇÃO INFANTIL: DIÁLOGO DAS POLÍTICAS CURRICULARES
NACIONAIS E A PROPOSTA CURRICULAR NO MUNICÍPIO DE
CAMARAGIBE/PE

Ana Cláudia Xavier da Silva18 | Hildegard Ramos de Oliveira19

Resumo: O presente artigo tem por finalidade analisar A Proposta Curricular da Educação
Infantil de Camaragibe, no Eixo Brincando, experimentando e aprendendo, de forma que a 103
aprendizagem das crianças seja desenvolvida com qualidade, e análise dos currículos
normativos nos documentos oficiais. Especificamos identificar pontos divergentes e o
impacto da normatização da BNCC na prática atual da educação infantil. Defendemos a
hipótese que as instituições de educação infantil devem propiciar um ambiente lúdico para
que haja aprendizagem de forma prazerosa. Antes, essa modalidade, passou muito tempo
sem ser contemplado pelas políticas públicas. Para entender melhor como se dar o currículo
nas instituições da educação infantil, dialogamos com A educação infantil no contexto
político nacional e a Proposta Curricular da educação infantil no município de
Camaragibe/PE. A partir dessas políticas, acreditamos que as normatizações recém
chegadas serão para adequar o currículo a realidade da rede e das instituições escolares
com foco no protagonismo infantil através de atividades lúdicas com competências e
objetivos que assegurem os direitos das crianças de se desenvolverem de forma integral
nos aspectos cognitivos, afetivos, motor, ético, estético e social. A partir deste estudo
realizado, é possível perceber que ainda há um distanciamento no que existe nos
documentos oficiais com a prática das instituições de ensino infantil.

Palavras-chave: Educação Infantil. Proposta Curricular. Políticas Públicas.

INTRODUÇÃO

O ser humano, em todas as fases da sua vida, está sempre descobrindo


coisas novas no meio que vive e no contato com as outras pessoas. Desde o
nascimento inicia o processo de aprender, de descobrir, de receber conhecimentos
novos para garantir viver e se interagir na sociedade como ser participativo, crítico e
criativo. Esse ato de busca, troca, apropriação, socialização e interação entre as
pessoas, que praticam o mesmo saber, é que damos o nome de educação. A
evolução do conceito da aprendizagem sugere que educar passe a ser ajudar a

18
Pedagoga-ÚNICAP/PE, Especialista em Administração Escolar-UFRPE, Mestra em Ciências da
Educação-UGF/RJ, Doutoranda em Ciências da Educação-Atenas College University-ACU. E-mail:
anaxavier15@hotmail.com
19
Graduada em Letras e Pedagogia – FAMASUL/UNOPAR, Doutoranda em ciências da Educação-
Atenas College University-ACU. E-mail: hilde.2009@hotmail.com

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desenvolver a criatividade e receber informações necessárias para sua vida, num
processo de aprender e não sobrecarregar a memória.
A escola necessita repensar o seu currículo, quando se depara na educação
de criança pequena, observando quem ela está educando, considerando a vivência,
o repertório e a individualidade, contribuindo para produtividade de seus alunos e
considerando-os protagonistas do seu próprio conhecimento, negando isso, a escola
contribui para o desrespeito a vida e a apropriação da cultura da criança.
104
Na Educação Infantil, as crianças compartilham um conjunto de situações
regulares que envolvem ações estruturantes para o bem estar da criança, para que
o desenvolvimento de seus valores tenham significados para o aprendizado das
interações sociais, para autonomia e cooperação. Assim, a escola de educação
infantil destaca como eixo estruturante da aprendizagem no segmento escolar, o
brincar como facilitador do crescimento. Para Lima (2004, p. 6), brincar é essencial à
saúde da criança em todos os aspectos. Por meio do brincar que a criança reproduz
muitas situações vividas em seu cotidiano, que serão reelaborados pelas
brincadeiras do faz de conta e pela imaginação e criatividade. A brincadeira é a
atividade principal da infância. Essa afirmativa se dá não apenas pela frequência de
uso que as crianças fazem do brincar, mas principalmente pela influência que este
exerce no desenvolvimento infantil.
As políticas educacionais da educação infantil vêm, cada vez mais, ocupando
espaço nas discussões e legislação oficiais. A educação infantil passou por muitas
mudanças, atreladas as transformações da sociedade nos aspectos políticos e
econômicos.
Portanto, se faz necessário, neste artigo, o diálogo da analise das Leis e
documentos oficiais que situaram a educação infantil no contexto político nacional,
para, em seguida, limitar na analise da Proposta Curricular da Educação Infantil do
Município de Camaragibe/PE, no Eixo 3: Brincando, experimentando e aprendendo.

A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO POLÍTICO NACIONAL

A educação infantil entra no contexto político nacional como indicador básico


de bom desenvolvimento no processo de escolaridade básica, desde a Constituição

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Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA (Lei 8069/1990) e a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96). Na CF 88, no Artigo
208, IV, já contempla as garantias do atendimento a crianças de 0 a 6 anos em
creches e pré-escolas, mas não torna obrigatório. Portanto,
A educação infantil – lugar por excelência de sistematização dos elementos
educativos indispensáveis à disponibilização dos mecanismos intencionais
de socialização, capaz de oferecer à criança pequena as condições de
interação e integração ao mundo que a cerca – coube apenas a inclusão
como Dever de Estado, sem uma clara definição da responsabilidade do
estado para com esse nível de ensino, principalmente no tocante aos 105
recursos necessários para sua implementação (DIAS, 2005, p. 15).

A Educação Infantil passou muito tempo sem ser contemplado nas políticas
públicas educacionais brasileiras, pois, mesmo na LDB instituía o Ensino
Fundamental como única etapa obrigatória.
O direito das crianças pequenas é assegurado para a esfera de poder a qual é
vinculada, que atualmente, a responsabilidade desta educação infantil é dos
municípios, que com a Lei 10.172/2001, instituiu o PNE - Plano Nacional de
Educação, como instrumento fundamental para efetivação das Políticas Públicas
direcionadas à educação, possibilitando para a Educação Infantil, um melhor lugar e
espaço na educação básica, iniciando inclusive, o recebimento de recursos
financeiros para estes municípios investirem na valorização e formação do professor
e manutenção e aquisição dos equipamentos para esta etapa de ensino. Pois a
educação infantil foi compreendida como função de cuidar e educar de forma
indissociável e complementar das crianças de 0 a 5 anos e 11 meses (data base em
31 de março), superando o caráter assistencialista dos anos anteriores a LDB
9394/96, mas que ainda é um desafio romper com esse cunho assistencialista e
torne uma educação infantil de qualidade, com crianças tratadas como sujeitos de
direitos e como pessoas com especificidade que precisam de respeito, atenção e
cuidados na sua capacidade de aprender e produzir cultura.
O próprio Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil – RCNEI –
1998, já foi proposto com o objetivo de implantar uma melhoria na Educação Infantil,
passou a proporcionar às crianças situações de cuidados, brincadeiras e
aprendizagens que possam contribuir para o desenvolvimento afetivo, emocional e
social. Outro documento desenvolvido foi o PNEI – Plano Nacional para a Educação

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Infantil, pelos direitos da criança de 0 a 6 anos (BRASIL, 2005) que apresenta as
diretrizes, objetivos, métodos, estratégias para a educação infantil.
Foi elaborado os Parâmetros Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(2006), para propor critérios curriculares para o aprendizado em creche e pré-
escolar, indicar capacidades a serem desenvolvidas pelas crianças e subsidiar
práticas presentes na escola de educação infantil. Além deste documento, também
os PNQEI-Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil, que
106
estabelece referências orientadoras para a organização e funcionamento das
instituições de educação Infantil (BRASIL, 2006). Entende por parâmetros, as
normas e padrão capaz de regular e ajustar o Sistema, que, neste caso, da
Educação Infantil. Os PBIEI (Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições
de Educação Infantil), pelos direitos das crianças de 0 a 5 anos e 11 meses à
Educação, contendo concepções, reforma e adaptação dos espaços de educação
infantil.
Os IQEI- Indicadores de Qualidade na Educação Infantil(BRASIL, 2006), por
sua vez, presumem a possibilidade de quantificação, servindo, portanto, como
instrumento para aferir o nível de aplicabilidade do parâmetro. São mais específico e
preciosos, pois neles contém a concepção de qualidade e na parte mais prática,
demonstrativa e explicativa em utilizar os indicadores para avaliar a qualidade das
instituições de educação infantil, realizados pelos professores, coordenadores e
funcionários como uma auto avaliação.
As diretrizes dos PCNEI- Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação
Infantil, foram elaboradas com o objetivo de orientar os educadores do ensino
infantil, por meio de normatização de metas para garantir a aprendizagem dos
conhecimentos necessários a esta faixa etária, fazendo parte da didática e do
cotidiano do professor por meio de uma educação infantil de qualidade. São ideias
sobre “o que quer ensinar”, como se quer ensinar” e “para que quer ensinar”. Os
PCNEI propõem critérios curriculares para o desenvolvimento da aprendizagem das
crianças de creche e pré-escola, que indicam capacidades de ordem física,
cognitiva, ética, estética, afetiva, de interação e socialização, especificados nos
campos de conhecimentos de si e do outro, do brincar, do movimento, da língua oral
e escrita, da matemática, das artes visuais, da música e do mundo.

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Outra concepção dos PCNEI é o desenvolvimento da autonomia, do ser crítico
e criativo, do ser capaz de transformar o meio que vive. Aborda, também, questões
como relação entre cuidar e educar e conteúdos necessários para esta fase de
desenvolvimento de 0 a 6 anos. Segundo a DCNEI (BRASIL, 2009), para organizar o
currículo da educação infantil, é preciso considerar os grandes eixos: as interações e
a ludicidade; os princípios éticos, políticos e estéticos e a dissociabilidade entre
cuidar e educar; a criança como ser integral.
107
Atualmente, foi aprovado a BNCC-Base Nacional Comum Curricular (aprovado
em dezembro de 2017), como documento mais democrático que os outros por ter
sido fruto de um processo de debate, negociação e discussão em diferentes atores
do campo educacional da sociedade brasileira, que apresenta os direitos e objetivos
da aprendizagem e desenvolvimento que devem orientar o currículo para diferentes
etapas de escolarização: Educação Básica (Educação Infantil e Ensino
Fundamental) e Ensino Médio, de caráter normativo ao que define o parágrafo 1º, do
Artigo 1º da LDB. A BNCC e currículos têm papéis de complementos para assegurar
as aprendizagens, essenciais para cada etapa da educação básica, através de
decisões para realizar o currículo em ação.
Essas decisões serão para adequar o currículo a realidade da rede e das
instituições escolares, considerando a cultura e as características dos educandos.
Na educação infantil essas decisões se referem a direitos de aprendizagem
essenciais ao desenvolvimento integral da criança (conviver, brincar, participar,
explorar, expressar, conhecer-se), assegurando estes direitos através de campos
de experiências com objetivos (o eu, o outro e o nós, corpo, gestos e movimentos,
traços, sons, cores e formas, oralidade e escrita, espaços, tempo, quantidade,
relações e transformações), considerando como eixos estruturantes as interações e
as brincadeiras. Esses objetivos serão ampliados e aprofundados no Ensino
Fundamental. O desafio para essa transição está na continuidade das
aprendizagens, evitando a fragmentação e a descontinuidade do trabalho
pedagógico.

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PROPOSTA CURRICULAR DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO MUNICÍPIO DE
CAMARAGIBE/PE.

Em 2009, a Secretaria de educação do município de Camaragibe, implantou


um documento norteador para a prática pedagógica da rede municipal de ensino,
adequando as Bases Curriculares Nacionais ao contexto vivenciado pelos
educandos das suas instituições públicas, resultado da participação dos professores,
108
coordenadores pedagógicos, diretores de escolas e equipe técnica da Secretaria e
assessoria de especialistas, mestres e doutores, da Universidade Federal de
Pernambuco.
De acordo com as propostas voltadas a Educação Infantil de creche (0 a 3
anos) e pré-escola(4 e 5 anos e 11 meses –data base em 31/03), a ação
educacional complementa a da família e da comunidade, pautando num currículo
que leve em consideração os aspectos físico, afetivo, intelectual e social das
crianças, partindo do conhecimento que cada uma traz, suas possibilidades motoras
e afetivas, suas curiosidades para manipular e atuar no mundo em que vive.
(PC/PMC,2009, p. 09). Assim, o currículo da Educação Infantil deste município,
elaborado de acordo com as Leis e diretrizes dos documentos oficiais, já citados,
também pelo Plano Nacional e Municipal de Educação, tem como base o conjunto
de práticas educativas, que buscam articular as experiências e os saberes das
crianças através das brincadeiras e dos conhecimentos artísticos, cultural,
ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral
das crianças. A Proposta Pedagógica tem como objetivo garantir a criança o acesso
a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos, bem como
direito a proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade, à
brincadeira, à convivência e a interação com outras crianças (Resolução CNE/CEB 20
nº 5/2009, art. 3º e 5º).
As ações pedagógicas de referência da Organização Curricular do município,
estão ancoradas na concepção sociointeracionista, pois considera que a
aprendizagem se processa por meio da interação do sujeito com os objetos do
conhecimento, através da mediação de pessoas e grupos sociais e da cultura. A

20
Parecer do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica, que fixa as DCNEI.

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avaliação da educação Infantil é feito através de registro de aprendizagem e
desenvolvimento pedagógico das crianças, observando os níveis de Introduzir;
Aprofundar; Consolidar. Nela, a concepção de criança é que ela seja um ser capaz e
autora do seu próprio desenvolvimento, proporcionando-lhe oportunidades de
interagir com o outro, ativando suas capacidades motoras, cognitivas, afetivas e
sociais. Um dos princípios subjacentes a essa atuação pedagógica é conceber à
criança como um ser interacional e ativa, construtora de relações com o outro,
109
protagonista de sua própria história e de invenções.
No Eixo 3 da Proposta Curricular da Educação Infantil no Município de
Camaragibe/PE, considera que a criança é motivada, prioritariamente para o brincar,
interagindo crianças da mesma idade ou de idades próximas, com atividades
estimuladoras de seu desenvolvimento. A criança utiliza a brincadeira para
compreender o mundo a sua volta e torna-lo concreto, por exemplo, ao brincar de
casinha, se apropria de papeis familiares com regras e valores que regem o espaço
família, imitando a forma de falar e agir das pessoas adultas da sua casa
(desenvolve a função de representação).
O ambiente físico da educação infantil deve ser lúdico, a partir de um projeto
pedagógico, voltado para o desenvolvimento das crianças, convidativo à exploração
e à brincadeira, com objetos a disposição que estimulem a fantasia e despertem a
curiosidade, criando suas próprias brincadeiras, sendo o professor, o facilitador
dessa aprendizagem, estimulando, protegendo e propondo outras atividades lúdicas
para que ela possa se desenvolver em todos os aspectos cognitivos, afetivos e
sociais. Portanto:

O papel do professor é crucial na criação de um ambiente psicológico


lúdico para a criança. A creche deve ser um lugar alegre, onde se
desenvolvam relações sociais prazerosas e profundas, deve se
constituir em um ambiente que convide a criança a nele permanecer.
(PROPOSTA CURRICULAR/PMCg, 2009, p 36)

O professor da educação infantil deve adquirir o hábito de vibrar com todas as


ações e conquistas das crianças, brincar com elas para interagir no reconhecimento
da brincadeira como espaço de atuação educacional e não como brincar para
passar tempo. A brincadeira deverá ser vista como espaço de ampliação de

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conhecimento da criança, de construção de regras, de interação, de resolução de
disputas e discussão e apropriação do mundo, desenvolvendo criatividade e
construção do conhecimento. Sendo assim, o papel do professor, proporcionando
essas diversas formas de ensinar através das brincadeiras, é exercer a atividade
pedagógica reorganizando essas atividades em estruturas que integram a linguagem
oral e escrita e as operações lógicas e matemáticas. Muitas vezes, o papel do
educador é exercido apenas pela observação das brincadeiras iniciadas pelas
110
próprias crianças, sem dar sentido pedagógico e de aprendizagem, mas essa
Proposta Curricular não dar espaço para que isso venha a acontecer.
Acompanhando a Proposta, os professores de educação infantil deste município,
planejam e desenvolvem as atividades pedagógicas em atividades lúdicas, que
estimulem a descoberta, exploração e aprendizagem.
Atualmente, as instituições de educação Infantil do município de
Camaragibe/PE, em especial no Centro Municipal de Educação Infantil – CMEI
Judith Maria Brasil da Rocha, além de realizar o currículo de acordo com o
documento da Proposta Curricular da rede, desenvolve o Projeto Político
Pedagógico(PPP) de forma participativa e ativa, como documento norteador das
atividades e resoluções pedagógicas, administrativas e financeiras, pois desde o ano
2015, com a aprovação do PME-Plano Municipal de Educação e com orientação do
Programa Primeiro a Infância, realizada pela Oficina Municipal (ONG financiada pelo
Instituto Arcor e C&A), a todas as escolas da rede, que a construção desde PPP,
vem sendo orientada, através de encontros com os técnicos e gestoras, para que
cada etapa deste documento houvesse a participação dos professores, alunos(com
a escuta das crianças dos seus desejos), funcionários e comunidade, de maneira
bem prática e estruturada.
Em 2016 iniciou o processo de conscientização de toda comunidade escolar
para elaboração do PPP de forma que todos participassem e utilizassem o
documento sempre que necessitasse, para não ser mais aquele que ficava guardado
e que só era visto pela Secretaria de Educação, quando essa solicitasse. O PPP
antes existente, foi reelaborado com toda a estrutura de um documento vivo:
caracterização do ambiente e da clientela; marco referencial: diagnóstico e
programação, marco situacional; marco teórico e operatório(plano de ação) e

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avaliação, utilizando-se de leituras e estudos dos documentos oficiais que regem a
educação infantil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O intuito desse estudo foi realizar um diálogo entre o currículo dos


documentos oficiais e o currículo do município de Camaragibe/PE na modalidade 111
Educação Infantil, observando que estão intimamente ligados a uma proposta
pedagógica que tem como foco o desenvolvimento da aprendizagem das crianças
através de atividades e ambientes lúdicos, para que as oportunidades de
convivência das crianças nas creches e pré-escolas estejam de acordo com uma
educação que garanta o protagonismo infantil. Na medida que as instituições de
educação infantil repensam e qualificam seus ambientes propício a prática de
atividades lúdicas, além de gerar aprendizagem e desenvolvimento integral infantil,
também gera aprendizagens profissionais.
No que diz respeito a educação infantil, muitos desafios ainda estão presentes
para consolidação dos direitos a educação infantil de qualidade, da ausência de
financiamento na educação infantil em todos os seus aspectos, na organização dos
sistemas, na necessidade das politicas públicas infantis se articularem às políticas
sociais, na formação dos profissionais da educação infantil e dos profissionais que
acompanham as crianças com necessidades especiais, chamadas de crianças com
inclusão.
Mesmo com a aprovação da Base Nacional Comum Curricular, normatizando
o que define a LDB e as Diretrizes Curriculares Nacionais, que direciona a educação
brasileira para uma formação integral do ser humano e para a construção de uma
sociedade mais justa, democrática e inclusiva, ainda há um distanciamento no que
existe nos documentos oficiais com a prática das instituições de ensino infantil. Há
um grande impacto no que veio nortear a Educação Infantil através da BNCC com a
realidade da maioria das práticas no interior das instituições, pela falta de políticas
públicas e comprometimento dos profissionais. É necessário mais investimento
pessoal, material, de manutenção e de formação, para que a educação infantil se
torne verdadeiramente de qualidade e sua transição para o Ensino Fundamental não

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seja sofredor pelas crianças e sim de direitos. Espera-se que esta discussão possa
suscitar novos desdobramentos no que se refere ao currículo na educação infantil.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394/96 , de 20 de dezembro


112
de 1996. Congresso Nacional, Brasília,DF. 1996.
_____.Ministério da Educação. Referencial curricular nacional para a educação
infantil. Brasília, DF:MEC/SEF, 1999.
_____. Conselho Nacional de Educação. Lei nº 10.639/03. Brasília. MEC/CNE.
2003.
_____. Ministério da Educação. Indicadores de Qualidade na Educação
Infantil/Secretaria da Educação Básica – Brasília, DF: MEC/SEB, 2009.
_____. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais para
educação infantil. Vol. 2. Brasília, DF: MEC/SEB, 2008.
_____. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular/Secretaria de
Educação Básica-Brasília, DF: MEC/SEB, 2017.
_____. Secretaria Municipal de Educação de Camaragibe. Plano Municipal de
Educação. Camaragibe/PE. 2015.
Camaragibe(PE). Proposta Curricular: educação infantil. Fundamental e
educação de jovens e adultos/Prefeitura Municipal de Camaragibe. Camaragibe,
PE: A Prefeitura, 2009.
FREIRE, P. Política e Educação. São Paulo: Cortez, 2001.
KRAMER, S. A Política da Pré-Escola no Brasil: a arte do disfarce. 7ª edição.
São Paulo: Cortez, 2009.
________. As crianças de 0 a 6 anos nas políticas educacionais no Brasil:
educação infantil. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, nº96, 2006.
SILVA, Ana Cláudia Xavier. Ludicidade na Educação Infantil: uma estudo de caso
em uma escola do município da Região Metropolitana de Pernambuco. Sarandi-PR:
FACNORTE, 2017.

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CURRÍCULO E GÊNERO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA ARTICULAÇÃO
NECESSÁRIA

Taciana Karoliny Soares dos Santos21 | Rafael Ferreira de Souza Honorato22

RESUMO: Esse texto é fruto dos estudos teóricos realizados no âmbito do Grupo de
Estudos e Pesquisas em Políticas Curriculares (GEPPC), em articulação com a disciplina de
Organização e Prática da Educação Infantil, onde tivemos interesse por fazer essa juntura a
partir das observações do nosso Estágio Supervisionado II, que tem como lócus a 113
aproximação com as práticas de docentes que trabalham nas pré-escolas e creches. O
objetivo do texto é problematizar sobre como está organizado o currículo da Educação
Infantil no que tange as relações de gênero e a reprodução dos modelos femininos e
masculinos. Assim, assumimos a infância, o currículo e o gênero como categorias de
investigação constituídas politicamente, nos levando a olhar para essas categorias por uma
perspectiva dos Estudos Culturais, tendo como marco teórico a abordagem pós-
estruturalista de análise. Essas características dão a ideia de delineamento bibliográfico,
todavia nosso olhar nas políticas vem a somar uma característica documental, uma vez que
nos utilizaremos dos Referenciais Curriculares Nacionais (RECNEI) e, por fim, nossos
apontamentos a partir dos estudos teóricos nos levam a uma pesquisa descritiva. Sendo
assim, nossos estudos apontam ao longo do texto que os discursos divulgados no currículo
investigado ensinam às crianças os modelos de feminilidade e masculinidade e como estes
devem proceder, a quem e como devem obedecer a fim de que haja efeitos concretos na
produção das identidades demandadas.
Palavras-chave: Currículo, Gênero, Educação Infantil.

INTRODUÇÃO

As nossas leituras sobre as categorias currículo e gênero, realizadas no


Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Curriculares (GEPPC), foram
fundamentais para nos dar um olhar crítico sobre as relações de poder presentes no
currículo escolar e reproduzidas pelas ações dessas instituições de ensino. A partir
das nossas compreensões dos estudos de Silva (2011), passamos a entender que o
currículo é fruto de uma construção de interesses em manter certa cultura
hegemonizada, ou seja, há uma intencionalidade em elencar os conhecimentos a
partir dos modelos estabelecidos como certos.

21
Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail:tacianakaroliny@gmail.com
22
Doutorando em Educação no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal
da Paraíba. E-mail: rafaelhono@gmail.com

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Assim, o presente texto tem por objetivo analisar como às políticas de gênero
estão chegando à escola, buscando elementos que reforcem as relações de gênero
e a reprodução dos modelos femininos e masculinos.
Os discursos contemporâneos a cerca de uma sociedade democrática, justa,
igualitária, tem adentrado a escola através dos seus agentes: professores,
professoras, alunos, alunas, supervisores, supervisoras, diretores, diretoras, enfim,
profissionais da educação. Esses discursos se organizam no espaço escolar com a
114
expectativa de formar cidadãos e cidadãs que respeitem as diversidades sexuais,
religiosas, de valores, culturais e etc. Esta inserção referente às diferenças se deve
as lutas do movimento feminista, assim começam a surgir nos currículos oficiais que
norteiam à educação no Brasil as questões de gênero tendo seu marco na
Constituição de 1988 em seguidas os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) e
dos Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (1998).
Pensar a aplicação dessas políticas educacionais nos currículos das escolas
é uma das formas de afunilar o diálogo sobre a sistematização e o aprofundamento
das questões de gênero na escola, que acaba por perpassar as perspectivas de
classes sociais, raça/etnia e sexualidade.
Essas políticas representaram um avanço, porém, segundo Vianna e
Unbehaun (2006)

“embora esses documentos constituam importantes instrumentos de


referência para a construção de políticas públicas de educação no Brasil, a
partir da ótica de gênero, contribuindo com a formação e com a atuação de
professoras e professores, essas políticas não são devidamente efetivadas
pelo Estado.” (p. 407)

A partir de Zotti (2004), nos deparamos com um percurso histórico onde o


currículo é constituído frente às demandas políticas, sociais, econômicas, culturais,
religiosas e etc. São esses apontamentos que, somados aos estudos de Silva
(2011), fortalecem a nossa ideia de que o currículo para a educação fundamental
não foge a regra.
Desde que nascemos somos educados de forma a cumprir um papel e viver
em sociedade, porém a definição do papel que vamos cumprir se dá através do
sexo. A partir do nosso crescimento vamos sendo inseridos em meio a atitudes,
gestos, modos de pensar e agir a partir das distinções masculinas e femininas. O

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currículo, assim como as demais práticas e/ou objetos culturais trabalha no sentido
de produzir os sujeitos.
Segundo da Silva (1995)

O currículo não é, assim, uma operação meramente cognitiva, em que


certos conhecimentos são transmitidos a sujeitos dados e formados de
antemão. O currículo tampouco pode ser entendido como uma operação
destinada a extrair, a fazer emergir, uma essência humana que pré-exista à
linguagem, ao discurso e à cultura. Em vez disso, o currículo pode ser visto
como um discurso que, ao corporificar as narrativas particulares sobre o 115
indivíduo e a sociedade, nos constitui como sujeitos – e sujeitos também
muito particulares. (p. 195)

O entendimento de gênero como uma produção social e cultural remete


inevitavelmente à instituição escolar, compreendendo o “gênero como constituinte
da identidade dos sujeitos” (LOURO, 1997). Essa afirmação de Louro está apoiada
nos estudos de Meyer (2003, p. 16), que por sua vez fundamenta seus estudos em
Michel Foucault e Jacques Derrida, entendendo o corpo “como um construto
sociocultural e linguístico, produto e efeito de relações de poder”.
Assim, enveredaremos por uma compreensão de que a construção de gênero
é realizada nas múltiplas instâncias sociais, nas diferentes práticas, espaços e
instituições, através de símbolos, normas, doutrinas, de intrincadas redes de
relações entre os sujeitos.

2. O MÉTODO

Nosso percurso teórico e metodológico está pautado na perspectiva da


abordagem pós-estruturalista da análise, apoiados nos estudos de Lopes e Macedo
(2011), que destacam que é nessa perspectiva que “a linguagem cria aquilo do que
fala, ao invés de simplesmente nomear o que existe no mundo. Como consequência,
não se pode pensar em conhecimento sobre o mundo nem um sujeito que conhece,
modificando-se a própria natureza da relação sujeito-objeto” (p.38).
Utilizamos tal viés de análise na leitura dos textos das políticas educacionais
Constituição Federal de 1988, Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e os Referenciais
Curriculares para a Educação Infantil.

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Reconhecendo que existem diferentes perspectivas de currículo ao longo da
educação, adotamos a perspectiva pós-crítica, segundo a qual o currículo possui
diferentes atravessamentos e se constitui em um espaço/tempo de “[...] produção de
sujeitos particulares” (SILVA, 1995, p. 192), ou seja, o currículo está envolvido na
produção de identidades e diferenças.
Na busca por classificar a nossa pesquisa hora realizada, utilizamo-nos dos
conhecimentos de Gonsalves (2003, p.64), definindo a pesquisa “segundo diferentes
116
critérios: os objetivos, procedimentos de coleta, suas fontes de informação e ainda
segundo as naturezas de seus dados”. Logo, podemos classificar a nossa pesquisa
como exploratória e explicativa segundo os nossos objetivos, bibliográfica e
documental de acordo com os procedimentos de coleta e as suas fontes de
informação, por fim qualitativa para a natureza de seus dados.

3. AS POLÍTICAS DE GÊNERO: NO CAMPO EDUCACIONAL

Construir políticas que busquem a equidade do gênero significa mobilizar


esforços para redistribuir de forma justa os recursos entre homens e mulheres, por
meio de reformas legais, de programas e serviços, significa estarem atentos a um
acesso mais igualitário aos recursos na sociedade.
Certamente a Constituição de 1988, foi um marco legal, onde foi afirmado o
direito de todos/as à educação e o dever do Estado de promovê-la e incentivá-la.
Incluindo “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação” (Título I, dos Princípios
fundamentais, Art. 3°, inciso IV). A Seção I- Da educação (Capítulo III do Título VIII,
da Ordem Social) em seu Art. 206, preceitua “igualdade de condições para o acesso
e permanência na escola”.
A LDB- Lei 9.394, de 20.12.1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, repete dispositivos que estão na Constituição.
O reconhecimento da maternidade, na Constituição de 1988, como:

Uma função social e do dever do Estado em garantir cuidado e assistência


extrafamiliares, por meio de creches e pré-escolas para crianças de zero a
seis anos, representou um significativo avanço enquanto política social e de
promoção de igualdade de gênero (Brasil, 2001, Art. 7, XXV, e Art. 208, IV),

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Em 1998, foi aprovado o Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil (Brasil, RCNEI, 1998), onde o mesmo propõe-se a servir como guia de
reflexão educacional sobre os objetivos, conteúdos e orientações didáticas para
profissionais que atuam diretamente com crianças de zero a seis anos.
A Educação Infantil assume um papel de grande responsabilidade social,
quando passa a ser considerada fundamentalmente importante para o
117
desenvolvimento integral da criança - em seus aspectos físicos, emocionais,
afetivos, cognitivos e sociais (RCNEI, 1998). Esse referencial defende a importância
de se transmitir valores de igualdade e respeito entre pessoas de sexos diferentes.
O RCNEI ressalta que a construção da identidade de gênero e da própria
sexualidade vai além da configuração biológica, defendendo que meninas e meninos
enxerguem as possibilidades relacionadas tanto aos papéis construídos socialmente
sobre o que é ser menino e o que é ser menina, ou seja, ir além da reprodução de
padrões estereotipados de gênero.

É importante possibilitar diferentes movimentos que aparecem em atividades


como lutar, dançar, subir e descer de árvores ou obstáculos, jogar bola, rodar
bambolê etc. Essas experiências devem ser oferecidas sempre com o cuidado
de evitar enquadrar as crianças em modelos de comportamentos
estereotipados, associados ao gênero masculino e feminino, como, por
exemplo, não deixar que as meninas joguem futebol ou que os meninos rodem
o bambolê. (Brasil, RCNEI, 1998, v. III)

Assim, como foi de grande importância o RCNEI para a educação infantil, é


imprescindível registrar que os Parâmetros Curriculares Nacionais é um marco
importante na inclusão da questão de gênero no currículo do ensino fundamental. Os
PCN’s foram publicados pelo MEC em 1997, os quais introduziam temas
transversais a serem incorporados em todas as matérias escolares. (BRASIL, 1998).
Na concepção do MEC, o PCN tratava-se de uma proposta de conteúdos que
deveria orientar e estruturar o currículo de todo o sistema educacional do país, tanto
na formação docente, como na prática de ensino. Apresentando temas que visariam
a resgatar a dignidade do ser humano, a igualdade de direitos, a participação ativa
na sociedade e a corresponsabilidade pela vida social.
É no tópico de Orientação Sexual que o gênero aparece explicitamente.
Buscava-se:

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“combater relações autoritárias, questionar a rigidez dos padrões de conduta
estabelecidos para homens e mulheres e apontar para sua transformação”,
incentivando, nas relações escolares, a “diversidade de comportamento de
homens e mulheres”, a “relatividade das concepções tradicionalmente
associadas ao masculino e ao feminino”, o “respeito pelo outro sexo” e pelas
“variadas expressões do feminino e do masculino” (Brasil, 1997, v. 10, p. 144-
146).

Os PCN inovaram ao introduzir a perspectiva de gênero como uma dimensão


118
importante da constituição da identidade de crianças e de jovens e de organização
das relações sociais.

4. CURRÍCULO COMO ESPAÇO DE PRODUÇÃO: MOCINHAS E RAPAZES?

A forma como as escolas se organizam para transmitir os seus processos,


onde são produzidos seus sentidos e criam-se seus significados, são chamados de
currículo, “afinal de contas, um currículo busca precisamente modificar as pessoas
que vão ‘seguir’ aquele currículo [...] No fundo das teorias do currículo está, pois,
uma questão de identidade ou de subjetividade.” (SILVA, 2007, p. 15).
O direito a uma educação de qualidade inclui a discussão das questões de
gênero. É vista a necessidade de pensar sobre as práticas, habilidades e também
sobre os modelos cognitivos nos quais o currículo está baseado, como é tratada as
relações sociais de gênero, como estas se configuram, se são reconhecidas e
valorizadas na cultura na qual se inserem. É importante perguntar como esses
mecanismos se fazem presentes na educação de meninas e meninos, como
normatizam, disciplinam, regulam e controlam seus comportamentos, verdades e
saberes.
As pesquisas atualmente estão voltadas para o caráter relacional dos
gêneros, entendendo que mulheres e homens, meninas e meninos são formados em
relação – uns com os outros e na relação de outras categorias, como classe social,
religião, etnia (Louro, 1997; Meyer, 1998; Felipe, 1997).
Assim, utilizamos o conceito de gênero para enfatizar que são frutos de uma
construção histórica, cultural e social, portanto, permeadas por relações de poder.
Nesse sentido, é mais do que supostas diferenças biológicas, a intencionalidade

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passa a mostrar como as diferenças e as identidades são construídas no espaço do
currículo.
Segundo Marina Subirats (1988, 1995), desde a escola infantil, a criança
aprende a desvalorizar todas as atividades consideradas femininas. Em sua
pesquisa, a autora analisou os discursos das professoras, constatando que o gênero
feminino era afetado, desde a linguagem até mesmo à negação sistemática,
advertindo os comportamentos considerados “femininos”. Os estudos de Naima
119
Browne e Pauline France (1988) enfatizam o quanto sexismo e racismo se
manifestam nas ações, na representação visual dos sexos e na utilização da
linguagem.
Fez-se necessário refletir sobre as questões de gênero na educação e
indagar a respeito da interferência e do papel da cultura nos processos de
socialização e de formação de meninas e meninos, desde suas primeiras
experiências de vida na instituição escolar.
Esse processo se reflete nos tipos de brinquedos que lhes são permitidos e
disponibilizados: orientando-os para brinquedos “próprios” para as mocinhas e
“próprios” para os rapazes, a fim de que estas crianças assimilem o modo singular
de masculinidade e de feminilidade, “(...) sendo o brincar muito do que as crianças
fazem de mais sério.”. (SARMENTO, 2000)
Os significados de gênero são construídos de acordo com as expectativas
colocadas diariamente nos alunos, na forma como as professoras interagem com
eles.
De acordo com as expectativas dos professores, os alunos seguem um
padrão socialmente imposto, uma vez que os conhecimentos que se oferecem aos
alunos são aqueles oriundos de uma concepção branca, machista, heterossexual,
cristã e ocidental, como afirma Silva (2007, p. 55):

O currículo envolve a construção de significados e valores culturais. O


currículo não está simplesmente envolvido com a transmissão de ‘fatos’ e
conhecimentos ‘objetivos’. Os significados estão estreitamente ligados a
relações sociais de poder e de desigualdade. Trata-se de significados em
disputas que são impostos, mas também contestados.

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O modelo binário masculino-feminino é apresentado diariamente para os
alunos, a manutenção desse modelo depende do ocultamento das masculinidades e
feminilidades alternativas.
Desconstruir internalizações arraigadas no nosso universo cultural é uma
tarefa difícil e também de responsabilidade da escola através das praticas escolares.
Os estudos e pesquisas de autoras como (FARIA, 1997, P. 21) e (LOURO, 1997, P.
57) entendem que a escola só tem reforçado a desigualdade entre homens e
120
mulheres.
Existe uma visão no campo da teorização curricular e da educação
institucionalizada de que o currículo, oficial ou não, é um processo de formação de
identidades. O currículo, como espaço de significação, está estreitamente ligado ao
processo de formação de identidades socioculturais.
De acordo com Sarmento (2000), “O mundo da criança é muito heterogéneo,
ela está em contacto com várias realidades diferentes, das quais vai aprendendo
valores e estratégias que contribuem para a formação da sua identidade pessoal e
social”.

5. CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS

Uma perspectiva de teorização curricular pós-crítica não pode ignorar as


estreitas conexões entre conhecimento, identidade de gênero e poder. O “[...]
currículo é, entre outras coisas, um artefato de gênero: um artefato que, ao mesmo
tempo, corporifica e produz relações de gênero [...]” (SILVA, 2007, p. 97).
É com a emergência do currículo pós-crítico (que problematiza as
identidades/diferenças de raça/etnia, gênero, sexualidade, crença, geração...), que
começa a problematizar os processos pelos quais o currículo legitima determinados
conhecimentos e desautoriza outros.
Portanto, analisar os materiais didáticos e paradidáticos voltados para os
alunos, bem como os diversos objetos culturais - brinquedos, filmes, gestos, rotinas,
etc, é fundamental para perceber de que forma estão sendo tratadas as relações de
gênero, sexualidade, raça/etnia, neste currículo. Em um mundo marcado pela
diversidade, é fundamental abrirmos um leque de possibilidades dentro de sala de

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aula para que meninos e meninas exercitem habilidades mais amplas,
experimentem, inventem e criem.

REFERÊNCIAS

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2ª ed., Rio de Janeiro:


Guanabara: 1973.
121
BRASIL< (1988). Constituição da República Federativa de 1988. Disponível:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3.%A7ao.htm Acesso
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ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
INTERFACES ENTRE DIRETRIZES OFICIAIS E PRÁTICAS EDUCATIVAS

Marcos Vinicius Sousa de Oliveira23 | Deidiane Costa Guimarães 24 | Maria Gorete


Rodrigues Cardoso25

RESUMO: Este artigo tem como objeto de estudo a organização do trabalho pedagógico no
contexto de uma unidade de educação infantil pertencente à Rede Municipal de Ensino de
Bragança-PA e procura responder a dois objetivos centrais: o primeiro é analisar as
articulações entre os documentos oficiais que consubstanciam a política brasileira para a 123
educação infantil, o Projeto Político Pedagógico e as práticas educativas de professoras
atuantes em turmas de berçário; o segundo é compreender as interfaces entre gestão
escolar, coordenação pedagógica e prática docente no que tange ao desenvolvimento do
princípio pedagógico do educar e cuidar na educação das crianças de 0 a 3 anos de idade.
Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa que se fundamenta na pesquisa empírica e
documental. Utilizamos como instrumentos de coleta de dados o questionário
semiestruturado, a entrevista aberta e a observação participante. A pesquisa documental
incide sobre documentos oficiais como as DCNEI (2009), os Parâmetros Nacionais de
Qualidade para as Instituições de Educação Infantil (2006), e o Projeto Político Pedagógico
da instituição escolar (2015). Os resultados indicam a existência de uma estreita relação
entre as recomendações contidas nos documentos oficiais e organização do trabalho
pedagógico desenvolvido. Conclui-se, mediante a pesquisa, que cada profissional tem papel
fundamental na organização do trabalho pedagógico o que contribui com o êxito dos
processos educacionais desenvolvidos nesta instituição.

Palavras-chave: Educação Infantil. Organização do trabalho pedagógico. Práticas


educativas Palavra.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objeto de estudo a organização do trabalho pedagógico


no contexto de uma unidade de educação infantil pertencente à Rede Municipal de
Ensino de Bragança-PA e procura responder a dois objetivos centrais: o primeiro é
analisar as articulações existentes entre os documentos oficiais que consubstanciam
a política brasileira para a educação infantil, o Projeto Político Pedagógico da
instituição de ensino e as práticas educativas de professoras atuantes em turmas de
berçário; o segundo é compreender as interfaces entre gestão escolar, coordenação
pedagógica e prática docente no que tange ao desenvolvimento do princípio

23
Graduando em Pedagogia na UFPA, bolsista PIBIC/Produtor 2017/2018. E-mail:
vynny13@hotmail.com
24
Graduanda em Pedagogia na UFPA, bolsista PIBIC/Interior 2017/2018. E-mail:
deidianeguimaraes5@gmail.com
25
Doutora em Educação, professora adjunta da UFPA. E-mail: goreterc@ufpa.br

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pedagógico do educar e cuidar na educação das crianças de 0 a 3 anos de idade.
Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa que se fundamenta na pesquisa
empírica e documental. Para a coleta dos dados empíricos utilizamos o questionário
semiestruturado, a entrevista aberta e a observação participante. O questionário foi
aplicado às professoras regentes de duas turmas de berçário (A e B), que serão
citadas no corpo do artigo como professoras P1 e P2. A entrevista foi utilizada para
coletar dados junto à gestora e à coordenadora pedagógica da instituição de ensino,
124
identificadas como G1 e C1, respectivamente.
A pesquisa documental realizada neste artigo se ancora nas concepções de
Chizzotti (2008), em que o autor assinala que todo documento é repleto de
significados e intencionalidades. Nesse sentido, analisamos 03 (três) documentos
oficiais que versam sobre a organização do trabalho pedagógico na educação
infantil, dentre os quais destacamos as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI), Resolução nº 5/2009, os Parâmetros Nacionais de
Qualidade para as Instituições de Educação Infantil (2006), e o Projeto Político
Pedagógico (PPP) da instituição investigada (2015). No processo de análise dos
dados procuramos perceber as relações existentes entre as concepções
identificadas nos discursos dos sujeitos da pesquisa, as práticas observadas e as
diretrizes prescritas nos documentos oficiais, articulando com as literaturas
especializada sobre o tema em que destacamos as concepções teóricas de autores
como Kishimoto (2009), Oliveira (2011), Kramer (2005), Libâneo (2001; 2009), Pinto
(2011), dentre outros.
No desenvolvimento do artigo, tratamos, inicialmente, da gestão democrática
na instituição pesquisada, apontando o papel do gestor e da coordenação
pedagógica no processo organizacional do trabalho pedagógico. Por fim, abordamos
as práticas pedagógicas dos docentes buscando analisar como estas se articulam
com os documentos oficiais que regulamentam a educação infantil e com o Projeto
Político-Pedagógico da instituição no que tange ao princípio do educar e cuidar.

2 A GESTÃO DEMOCRÁTICA E A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO


PEDAGÓGICO

A gestão democrática é uma atividade conjunta, que valoriza o trabalho


coletivo, a ação colaborativa entre os sujeitos que constituem a comunidade escolar

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e a participação nas tomadas de decisões, englobando o campo administrativo,
pedagógico e operacional, o que constitui um modelo indissociável de gestão
(LIBÂNEO, 2001).
Os Parâmetros Nacionais de Qualidade para as Instituições de Educação
Infantil – MEC/SEB (2006) especifica que gestão deve atuar em consonância com os
profissionais da educação, as famílias e a comunidade local, como forma de garantir
um trabalho de qualidade para as crianças que frequentam a instituição educacional
125
(BRASIL, 2006). Neste sentido, a gestão escolar democrática possibilita que o
coletivo contribua efetivamente no exercício e na organização do trabalho
pedagógico, concepção expressa no PPP da instituição investigada, “a natureza do
seu trabalho educacional e os novos paradigmas organizacionais exigem
habilidades do seu gestor mediante a uma prática de gestão compartilhada, a qual
depende da democracia para ser bem-sucedida” (2015, p.59). Esses conceitos
presentes no PPP são ressaltados no discurso tanto da gestora quanto da
coordenadora pedagógica no que tange à colaboração dos sujeitos para a
articulação das práticas pedagógicas que se efetivam na aprendizagem e
desenvolvimento das crianças atendidas pelo serviço educacional da creche. Nesta
perspectiva as mesmas ressaltam que:

G1: [...] tudo que a gente vai conversar na área pedagógica, a gente
conversa e a gente toma decisão junto.
C1: a organização do trabalho pedagógico da creche se volta para o
acompanhamento e o planejamento das atividades desenvolvidas pelos
professores ao longo do ano, e nós pensamos isso quando nos
organizamos para montar o projeto geral da escola.

Pimenta (2002), contribuindo na mesma perspectiva, ressalta que o trabalho


coletivo determina a prática pedagógica, pois esta não está vinculada somente à
sala de aula, mas perpassa as diferentes dimensões do trabalho educativo.
Inferimos, portanto, que um processo de gestão democrática permite a articulação
de gestores, coordenadores pedagógicos, corpo docente e equipe colaborativa da
escola. Através do trabalho conjunto entre a coordenação pedagógica, professores e
gestores, firma-se a eficácia das práticas pedagógicas e curriculares, levando em
consideração o princípio primordial da Educação Infantil que é o cuidar e o educar.
A interação entre a gestão escolar, coordenação pedagógica e a comunidade
precisa ser aberta para que haja diálogo. Pinto (2011) ressalta que a integração

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escola e família facilita a aproximação dos pais à vida escolar dos filhos, além de
contribuir para que o profissional viabilize as práticas e experiencias de alunos
fazendo a inter-relação entre o ambiente intra e extraescolar. Nesse sentido, o PPP
da instituição revela que: “a participação da família constitui espaços de
corresponsabilidade, [...] em que os pais e comunidade estejam engajados na rotina
escolar e nos eventos culturais, tornando-se sujeitos e parceiros no processo de
escolarização” (PPP, 2015, p. 52). Fica evidente que o documento se apresenta de
126
acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB- Lei nº
9.394/96) preconiza no Art. 12 no inciso VI, que dispõe acerca da articulação entre
escola e família, criando processos de integração da sociedade com a escola. Assim
vemos a ancoragem dos discursos tanto da gestora como da coordenadora
refletirem as recomendações legais que preconizam essa interação entre a
organização do trabalho pedagógico para atender a comunidade e os alunos, de
modo que essa relação crie vínculos que se refletem na educação ofertada. Nesse
contexto, a organização do trabalho pedagógico na creche, perpassa pelas práticas
desenvolvidas tanto pela gestora quanto pela coordenadora pedagógica, no que
compete o atendimento das crianças e da comunidade, como expressos a seguir:
G1: tento organizar o meu trabalho de forma que eu atenda a criança, mas
que satisfaça a comunidade. Não adianta atender a criança dentro de sala e
não atender a comunidade, o pai não está satisfeito, a comunidade não está
satisfeita.
C1: Aqui na Creche nós trabalhamos com estímulos, no qual damos suporte
para os professores nas orientações pedagógicas e para as crianças por
meio de estímulos pensando seu desenvolvimento [...].

De acordo com falas das entrevistadas, o fazer pedagógico, tanto da gestão


quanto da coordenação, se entrecruzam no sentido de ser uma relação de
cooperação para o sucesso do gerir enquanto uma prática democrática dentro da
instituição. Vemos a importância da articulação no que compete as práticas
desenvolvidas em parceria entre gestora e coordenadora na organização do trabalho
desenvolvido. Pinto (2011, p.144) ressalta que “uma aprendizagem significativa
ocorreria justamente como expressão dessa articulação”.
Assim, para avançarmos na melhoria da qualidade e do atendimento aos
educandos, torna-se importante a parceria entre a comunidade interna e externa da
escola, além de oferecer um serviço que vise suprir as necessidades educacionais
das crianças e, além de tudo, que efetive o direito à educação e respeite a

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diversidade de sujeitos presentes no contexto educacional. Corroborando nesta
perspectiva o Art. 8º, parágrafo 1º, inciso IV, das DCNEI (2009), ressalta acerca do
estabelecimento de uma relação efetiva entre a escola e a comunidade local, como
mecanismo que garante a gestão democrática, considerando os saberes da
comunidade.
Bittar e Oliveira (2004) enfatizam que uma administração educacional atua
principalmente para melhoria do desenvolvimento humano, da qualidade de vida na
127
escola e da participação da sociedade. Logo a viabilidade de tal administração se
constrói por meio da experiência real e se ancora em uma postura responsável de
gestão educacional participativa. Em consonância com o autor, a fala da gestora o
complementa no sentido de executar a função de gestora a partir do coletivo,
ressaltando que o fazer pedagógico com o apoio do coletivo é mais efetivo na
melhoria da educação e das práticas pedagógicas.
G1: A forma como você está em equipe. A forma como as coisas se dão
dentro da sala de aula, a harmonia que se dá, é determinante no trabalho
pedagógico. Por que tu não tens como fazer um trabalho pedagógico fluir se
a equipe não flui junto contigo.

A maneira como a escola se manifesta ressalta o trabalho que está sendo


realizado pela equipe escolar, ao qual está de acordo com o que prescreve a
Revisão das DCNEI (2013, p.89) quando ressalta sobre “a definição e o
aperfeiçoamento dos modos como a instituição organiza essas atividades são parte
integrante de sua proposta curricular e devem ser realizadas sem fragmentar ações”
e, principalmente, viabilizar o trabalho do gestor e do coordenador pedagógico em
parceria com demais colaboradores, integrando as diferentes práticas em função de
finalidades comuns. Desse modo, envolver na gestão todos os que trabalham na
escola exige normas e práticas que promovam a gestão participativa e a cultura
democrática, seja pela valorização das diferentes formas de participação
representativa, seja pelo exercício diferenciado e coletivo de funções de gestão
através de diversos mecanismos de participação direta (FERREIRA, 2006).
Uma escola democrática é uma instituição que favorece a troca de
experiências entre os diferentes setores da comunidade escolar interna e externa,
envolvendo-os nos diferentes processos de tomadas de decisões e negociação de
conflitos e as divergências. Luck (2000) destaca que o gestor é um viabilizador e
orquestrador de atores, além de um articulador da diversidade para dar-lhe unidade

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e consistência na construção do ambiente educacional e na promoção segura da
formação dos seus alunos. Enquanto a função do coordenador pedagógico “é
planejar e acompanhar a execução de todo o processo didático-pedagógico da
instituição” (PIRES, 2005, p. 182), o que nenhuma relação tem com a visão
pejorativa sobre este profissional que perdurou em décadas anteriores. Nesse
sentido para garantir o seu espaço de atuação, é necessário que esteja em
consonância com as responsabilidades e os limites da sua função. A importâncias
128
dos dois setores aliados contribui efetivamente na construção e organização de uma
instituição, e suas ações devem ser orquestradas democraticamente, refletindo
práticas que visem à valorização da diversidade atendida pelo sistema de educação.
Begot e Nascimento (2002) esclarecem que a gestão democrática é um
modelo novo de administração totalmente e integralmente da esfera pedagógica. Ou
seja, ela contribui significativamente para a escola e a comunidade, além de
estimular o talento de cada membro da equipe escolar, não esquecendo as metas
educacionais ou as mudanças sociais. Este modelo proporciona, ainda, a criação de
um ambiente de amizade e entusiasmo e, principalmente, a partilha do poder,
favorecendo a interdisciplinaridade entre todos os espaços que constitui a
instituição.
Nesse sentido, Barbosa et al (1995), descrevem que gerir uma determinada
organização institucional compete a promoção do relacionamento harmônico entre
os diferentes setores. Esta ação contribuirá para o alcance dos objetivos comuns.
Além do mais conduzir democraticamente possibilita que cada segmento ou área da
instituição escolar realizem seu trabalho de forma produtiva e integrada, visando a
consecução dos objetivos da escola. Suas ações devem consolidar o projeto da
escola e a sua função social. Não apenas no momento imediato, mas com
repercussão num projeto futuro (LUCK, 2000).
Embora as atuações destes sujeitos ocorram em âmbitos determinados, a
gestora e a coordenadora pedagógica demonstram conhecerem a especificidade
das suas funções. Assim, concebem o caráter pedagógico e social, em que uma não
anula a outra, compreendendo que suas atuações lhes exigem o desenvolvimento
de competência técnica, política e principalmente pedagógica. Articulando suas

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atribuições de modo que a organização da instituição (GADOTTI, ROMÃO, 2004)
obtenha êxito no trabalho desenvolvido e na qualidade da educação oferecida.
Evidenciamos que a gestão democrática no contexto pesquisado, visa
desenvolver a integração entre os diferentes setores e segmentos escolares, de tal
modo que todos os agentes colaboradores se sintam responsáveis pela organização
do trabalho pedagógico. Frente essa organização é possível garantir o
desenvolvimento pleno da criança e a valorização pessoal e profissional a todos os
129
envolvidos.

3 AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E CURRICULARES DOS DOCENTES: ENTRE


O CUIDAR E O EDUCAR
A elevação da educação infantil à etapa inicial da educação básica foi
determinante para o seu reconhecimento como uma prática importante para a
promoção do pleno desenvolvimento da criança, exigindo, assim, uma ampliação da
discussão teórica e curricular com vistas a enfrentar a lógica assistencialista
associada à educação das crianças pequenas na história da educação brasileira
(OLIVEIRA, 2011). A mudança de paradigmas referente à função social e
educacional das creches reestrutura as práticas pedagógicas realizadas nesses
estabelecimentos, promovendo a reorganização e ampliação da educação infantil e
exige a qualificação de profissionais para atuar nessas instituições, visando os
aspectos fisiológicos e intelectuais das crianças, assim, a LDB/96 recomenda, no
Art. 62, que a formação docente para atuar na educação básica dar-se-á em nível
superior, especificamente curso de licenciatura de graduação plena, em
universidades e/ ou institutos superiores de educação, admitindo-se como formação
mínima para exercer a docência na educação infantil o magistério em nível médio.
Desse modo, exige-se a formação adequada para a atuação em berçários e salas
da educação infantil visando o desenvolvimento integral da criança.
Compreendendo os novos rumos da educação voltada para a primeira
infância, assume-se a concepção do cuidar e do educar como prática essencial no
campo da educação infantil, o que tem fomentado práticas pedagógicas adequadas
e exitosas, a partir de propostas curriculares que ofereçam subsídios ao trabalho
docente.

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A reorganização da educação infantil na sociedade brasileira implica não
somente em práticas docentes, mas também em uma organização do trabalho
pedagógico que engloba todos os setores dos estabelecimentos de ensino infantil.
Nesse sentido, a organização pedagógica que se estabelece na creche investigada
tem ressonâncias diretas dentro dos berçários. Para Libâneo (2009) a organização
do trabalho pedagógico tem por objetivo contribuir com o processo de aprendizagem
dos alunos, pois os processos administrativos e pedagógicos que perpassam a
130
instituição de ensino contribuem para o aprendizado dos alunos.
Observou-se durante a pesquisa empírica como a articulação entre gestão e
coordenação pedagógica reflete diretamente na prática pedagógica do professor no
trato com as crianças do berçário A e B, lembrando a especificidade da instituição no
atendimento de crianças com idade de 01 a 03 anos, conforme assegura o PPP do
estabelecimento de ensino pesquisado. Desse modo, a organização do trabalho
pedagógico é pensada para o atendimento das crianças em tempo integral, exigindo
uma organização pedagógica e operacional minuciosa, de modo a atender as
particularidades de cada criança, objetivando o seu desenvolvimento motor, mental,
social, biológico e psicológico durante as sete horas diárias em que as crianças
passam na creche.
As ações desenvolvidas pelas professoras do berçário são articuladas junto
aos setores de limpeza, alimentação lavanderia e enfermaria da creche, possibilita
um atendimento integral e adequado às crianças. Segundo Oliveira (2011) a
organização institucional pedagógica engloba os mais variados profissionais que
constituem uma escola, sendo eles professores e não professores, envolvidos
diretos e indiretamente na colaboração do processo educativo, assim, o trabalho
conjunto entre os setores que constituem a creche contribuem como práticas
exitosas das professoras e cuidadoras.
A prática pedagógica das professoras em sala de aula tem como princípio o
desenvolvimento pleno das crianças e se relaciona a uma organização que atende a
rotina pré-estabelecida pela gestão da creche, que visa proporcionar o binômio do
cuidar e educar. A relevância de desenvolver práticas que articulem o cuidar e o
educar assume um lugar importante nas falas das professoras entrevistadas.

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P1: O cuidar e o educar são articulados em todos os momentos, dentro e
fora da sala, pois aqui na creche e principalmente no berçário o cuidar e
educar andam sempre juntos.
P2: Em todos os momentos, desde a entrada no portão já recebemos as
crianças com um bom dia, carinho e afeto, conduzindo-as a sala sempre
dialogando, na hora da higiene corporal, canta-se músicas referentes à
água e partes do corpo de forma lúdica e afetiva.

Como fica latente no discurso das professoras entrevistadas, o cuidar e o


educar são práticas indissociáveis (KRAMER, 2005), fazendo-se presentes em todas
as atividades desenvolvidas pelas professoras promovendo o desenvolvimento 131
integral das crianças. Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil (RCNEI) (1998, p. 24) o fazer pedagógico na educação infantil deve envolver
a “dimensão afetiva e [...] cuidados com os aspectos biológicos do corpo, como a
qualidade da alimentação e dos cuidados com a saúde” sendo importante também,
“[...] a forma como esses cuidados são oferecidos e das oportunidades de acesso a
conhecimentos variados”. Constata-se que as práticas desenvolvidas pelas
professoras visam promover o desenvolvimento pleno das crianças atendendo as
necessidades biológicas e educacionais e oferecem experiências necessárias ao
desenvolvimento infantil.
O discurso das entrevistadas articula-se com o que propõem o PPP da
instituição, ao deliberar que o cuidar não está desarticulado do educar e deve
receber total atenção na proposta pedagógica de modo a envolver o “amor,
afetividade, estudo, dedicação, cooperação, conhecimentos dos aspectos biológicos
e maturacionais da criança e respeito às necessidades e significados de cada um”
(PPP, 2015, p. 28), visando proporcionar o desenvolvimento das necessidades
integrais, tais como o conforto, a alimentação, socialização, repouso, os aspectos
individuais e emocionais (PPP, 2015).
As práticas desenvolvidas apresentam particularidades importante e
necessária ao desenvolvimento da criança. As atividades de cunho pedagógico
visam desenvolver as diversas linguagens gestuais, oral, plástica, matemática, visual
da criança, conforme recomenda os documentos oficias nacionais e o institucional.
Segundo o RCNEI (1998, p.41), o trabalho com a educação infantil requer que o
professor seja “polivalente”, ou seja, o professor deve articular “conteúdo de
naturezas diversas que abrangem desde cuidados básicos essenciais até
conhecimentos específicos provenientes das diversas áreas do conhecimento”. No

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que tange o cuidar, a prática desenvolvida pela professora P2 busca relacionar o
cuidar com práticas lúdicas que possam transformar essa ação em aprendizado,
objetivando desenvolvê-las também enquanto se realizam os cuidados com as
crianças, assim, nota-se a relação presente entre o cuidar e o educar, sendo uma
prática recorrente nas turmas observadas.
O processo de cuidar e educar se estrutura a partir de rotinas que não
engessa a prática do professor e nem a criança. A rotina observada é dinâmica e
132
visa possibilitar experiências de aprendizagem e o bem-estar dos sujeitos. A rotina
da sala de aula é organizada mediante a organização prévia estabelecida pela
coordenação junto aos projetos desenvolvidos pelas professoras, conforme o
discurso:

P1:A creche possui uma rotina especifica pré-determinada pela


coordenação que eu adequo a realidade da minha turma.
P2: É organizado mediante ao projeto a ser trabalhado, divide-se em etapas
e momentos. Ex: primeiro momento acolhimento (receber as crianças),
segundo momento roda de conversa e etc. também há uma lista com
atividades permanente, hora do lanche, banho etc.

Nota-se no discurso das professoras entrevistadas a articulação entre os


setores da instituição, que possui uma organização temporal e está articulada com
as atividades realizadas na turma. Na instituição, a jornada de tempo das crianças é
integral, todas as refeições são feitas na creche, por esse motivo é de suma
importância que a rotina desenvolvida em sala esteja em conformidade com a rotina
da cozinha, para que cada refeição seja produzida e servida no momento adequado.
Para Zabalza (1998), as rotinas assumem um lugar importante nas instituições de
ensino, é a rotina que promove a estrutura organizacional e possibilita a qualidade
no atendimento as crianças. A necessidade de se estabelecer uma rotina adequada
é prevista pelos documentos norteadores que regem esse estabelecimento. A rotina
na educação infantil é identificada na Revisão das DCNEI (2013) como um elemento
flexível, bem como na Estrutura Curricular para a Educação Infantil da Rede
Municipal de Bragança-PA do ano de 2015, que define as rotinas como práticas
saudáveis.
Ao observar as práticas desenvolvidas nos berçários, constatou-se que a
rotina assumida pelas professoras privilegia as interações e socialização entre as
crianças e atividades educativas lúdicas:

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P2: contação de histórias, músicas, pintura, massinha de modelar caseira,
atividades com sucatas, encaixar, empilhar, rasgar, rabiscar e amassar
papel, faz-de-conta (boneca, panelinha com água, carro), gostam muito de
subir, descer, arremessar, esconde-esconde, etc.

As atividades lúdicas são previstas no PPP da Creche investigada como um


importante meio para o processo de aprendizagem, assim, todas as atividades
desenvolvidas apresentam-se como princípio a ludicidade, as interações e as
133
brincadeiras, em consonância com o binômio do cuidar e educar, revelando que as
práticas pedagógicas desenvolvidas pelas professoras entrevistadas se alinham com
as recomendações postas pelos documentos norteadores, configurando-se como
práticas exitosas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação de crianças de 0 a 3 anos de idade sofreu processos de


mudanças significativas quanto a garantia do direito das crianças à educação de
qualidade. A partir dessas mudanças possibilitou a criação e efetivação de leis
educacionais que afirmasse a educação da primeira infância como necessária ao
desenvolvimento desse grupo geracional. As diretrizes e propostas curriculares que
regem a educação nacional oferecem subsídios necessários para que as creches
mantenham um nível de qualidade no atendimento e na oferta da educação pública.
Destacamos que esse conjunto de dispositivos legais visam proporcionar um
atendimento democrático, de modo a garantir o direito à educação de qualidade.
Entretanto, identificamos por meio deste estudo que o sucesso na qualidade de
ensino se constitui mediante a uma organização do trabalho pedagógico que articula
os diferentes campos de uma mesma instituição, garantindo a qualidade no
atendimento dos sujeitos.
Desse modo, as discussões privilegiadas neste estudo indicaram a relação
existente entre o que recomendam os documentos oficiais nacionais e os
documentos internos pesquisados, que se efetivam ao relacionar-se com os
discursos dos sujeitos entrevistados, concretizando o que consideramos como uma
prática exitosa na organização do trabalho pedagógico nesta instituição de ensino,
ressaltamos ainda que as práticas exitosas só ocorrem quando há a articulação
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entre os diferentes segmentos que compreendem a instituição investigada, gestão,
coordenação e docência, como afirma Libâneo (2009). Conclui-se mediante a
pesquisa realizada a importância de se promover o trabalho coletivo na escola,
levando em consideração a diversidade social e cultural de cada instituição de
ensino. A relevância do comprometimento de cada profissional pode contribuir de
forma determinante para o êxito dos processos educacionais vivenciados.

134
REFERÊNCIAS

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maio/ago. 2009. Acesso: 21 de Fev.2018 Disponível em:
<http://rbep.inep.gov.br/index.php/rbep/article/view/519/502>.
KRAMER, S. Profissionais de Educação Infantil: gestão e formação. São Paulo:
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seus gestores. Brasília: V.17, N.72, 11-33, Fev/ Junho, 2000.
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ZABALZA, M. A. Os Dez Aspectos-Chave de uma Educação Infantil de Qualidade.
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61.

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GT 2 – POLÍTICAS CURRÍCULARES PARA O
ENSINO FUNDAMENTAL

APLICANDO ATIVIDADES DE ENSINO NO EIXO NÚMEROS: ASSIMILANDO


CONCEITOS MATEMÁTICOS

Luciana Costa dos Santos | Mayara Dias de Araújo | Severina Andréa Dantas de 136
Farias

RESUMO: Este estudo teve como principal objetivo identificar as contribuições


metodológicas com relação à matemática escolar a partir da elaboração de atividades que
visam à assimilação da aprendizagem de conteúdos básicos do eixo Números. Para isso
nos baseamos em alguns autores como Talizina (2000), Farias, Azeredo e Rêgo (2010),
bem como nos documentos oficiais (BRASIL, 2013; 2017; Paraiba, 2010) onde utilizamos
atividades baseadas nos conceitos das quatro operações discutidas em livros didáticos,
textos e material concreto. No período da pesquisa foram utilizadas atividades que
priorizavam a leitura, a escrita e o cálculo de adição/subtração/multiplicação/divisão com
apoio de materiais concretos no intuito de que as crianças internalizem os conceitos das
operações apresentadas. A metodologia desta pesquisa foi de cunho qualitativo. A pesquisa
foi desenvolvida em duas instituições pública de Ensino Fundamental com alunos do 3° e 4°
ano do munícipio de João Pessoa – Paraíba. Iniciamos na primeira escola (escola 1) com
uma turma de 3º ano com 18 alunos regularmente matriculados que apresentavam idades
entre 8 a 10 anos, onde permanecemos a partir do mês de julho até o início do mês de
agosto do corrente ano. Iniciamos na segunda escola (escola 2) nos meados de agosto e
durante todo mês de setembro do corrente ano em uma turma de 4º ano com 15 alunos na
faixa etária entre 9 a 13 anos. Neste momento realizamos diversas tarefas envolvendo
conceitos de leitura, escrita e cálculo de anos anteriores. Podemos afirmar que os
resultados obtidos, nas duas instituições, foram satisfatórios, pois constatamos que houve
uma evolução de cunho conceitual, procedimental e atitudinal dos participantes ao
demonstrarem melhor desenvoltura na realização das tarefas, internalização de conceitos,
concentração e atenção no trabalho desenvolvido.

Palavras-chave: Ensino de Matemática, Uso de Material Concreto, Ensino Fundamental.

INTRODUÇÃO

A educação básica em nosso país vem sofrendo grandes avanços nas


modalidades de ensino, na busca de melhorias quantitativas e qualitativas através
da criação de novas leis, aperfeiçoamento dos professores e a valorização de

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currículos para que estes possibilitem a criação de projetos políticos-pedagógicos
capazes de proporcionar uma nova realidade educacional.
Documentos oficiais como a Constituição Federal, Lei de Diretrizes e Bases –
LDB (BRASIL, 1996), Conselho Nacional de Educação – CNE (BRASIL, 2010) e
Câmara de Educação Básica – CEB (BRASIL, 2010) tem como objetivo nortear as
leis que adequam a educação básica do nosso país.
E foi com a necessidade de ampliar a promoção da educação básica, no qual
137
é de direito, afirmada pela Emenda Constitucional nº 59/2009, que assegura “Uma
Educação Básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, inclusive a sua
oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria”
(BRASIL, 2009). Nesta perspectiva, o PNE (BRASIL, 2014) estruturou metas com
intuito de garantir o acesso a educação nos níveis de educação infantil, ensino
fundamental e ensino médio. Em sua segunda meta, que refere-se ao ensino
fundamental, o Plano Nacional de Educação pretende “Universalizar o ensino
fundamental de 9 (nove) anos para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze)
anos e garantir que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos alunos
concluam essa etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência deste
PNE”. (BRASIL, 2014).
Os estudantes nessa etapa passam por mudanças que interferem
diretamente no processo de aprendizagem, desde aspectos físicos, sociais e
emocionais que precisam ser desenvolvidos adequadamente devendo garantir a
aprendizagem curricular e desenvolvimento pleno no aluno (BRASIL, 2017).
É de responsabilidade da instituição de ensino assegurar condições
favoráveis para que haja o desenvolvimento pleno dos alunos, para que estes
dominem habilidades envolvendo domínio da leitura, da escrita e do cálculo
(BRASIL, 2010).
A Matemática é uma área que deve ser explorada durante todo o período
escolar. Ela está presente em tudo que nos cerca, sendo utilizada em resoluções
cotidianas das mais diversas complexidades (BRASIL, 2013; PARAÍBA, 2010).
Segundo a BNCC, ao longo do Ensino Fundamental, as habilidades de
matemática como contar, comparar, estimar, compor, decompor, resolver e elaborar
problemas, o sentido de juntar, acrescentar, separar e retirar, devem ser

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desenvolvidas de acordo com seus eixos: Números, Álgebra, Geometria, Grandezas
e Medidas, e Probabilidade e Estatística, relacionando-as com os anos específicos
do Ensino Fundamental (BRASIL, 2017).
Para o desenvolvimento do presente estudo nos detivemos aos
conhecimentos abordados no eixo Números apresentado pela BNCC com a
finalidade de “desenvolver o pensamento numérico, que implica o conhecimento de
maneiras de quantificar atributos de objetos e de julgar e interpretar argumentos
138
baseados em quantidades.” (BRASIL, 2017). Nos detivemos as quatro operações
com a utilização de materiais concretos que auxiliam na compreensão e no
desenvolvimento dos conceitos matemáticos, como afirmam Farias, Azeredo, Rêgo
(2016, p. 83): “Com ajuda desses materiais, podem ser desenvolvidas e discutidas
atividades matemáticas que poderão levar à construção de conceitos [...]”.
Aplicamos então atividades baseadas na assimilação da aprendizagem
escolar sugerida por Talizina (2000) que é compreendida como metodologia de
ensino que facilita a aquisição de conceitos matemáticos. Para que estes conceitos
sejam adquiridos, a autora sugere que estes, inicialmente, sejam representados
através de materiais concretos, em atividades experimentais na sala de aula, sendo
composto por cinco etapas hierárquicas: etapa de criação, material ou materializada,
linguagem externa, linguagem interna e por fim, a etapa mental.
Devido ao curto tempo da pesquisa de campo nos detivemos neste estudo
apenas as duas primeiras etapas: a criação e a material ou materializada. A etapa
da criação consiste na elaboração de atividades de acordo com os conteúdos
obrigatórios de ensino e com o nível cognitivo dos participantes. Já a etapa material
ou materializada aborda a correspondência da modificação da ação, ao possibilitar a
construção e execução de experimentos para aquisição de conceitos baseado na
etapa anterior.
Segundo Vigotsky (1991, 1998 apud FARIAS, AZEREDO, REGO, 2016, p.
21):

[...] a aprendizagem ocorre através da coordenação e reordenação


de ações, inicialmente efetuadas sobre objetos concretos,
aumentando-se, gradativamente, o nível de abstração e de
formalização. A interação social contribui para a efetivação do
processo, possibilitando aos alunos manifestarem seus pontos de
vista, e quando houver discordância, por falta de domínio conceitual

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ou de procedimentos, superem esta fase coletivamente, contando
com a mediação do professor.

Desta forma fica evidente que o uso de materiais concretos possui um papel
facilitador para a aquisição de conceitos matemáticos, os alunos iniciam as
atividades com a utilização destes materiais e, de forma gradativa, vão sendo
retirados para que se concretize o processo de abstração. Este processo, não ocorre
de rapidamente, é necessário que hajam repetições em um movimento de ida e
139
volta, onde se avança e a medida que se observa posteriores dificuldades
encontradas pelos alunos volta as atividades iniciais até que se concretize a
compreensão do conceito.
Neste processo, é importante que os alunos interajam e compartilhem as
dificuldades encontradas, assim, formulados seus pontos de vista a partir de
possibilidades de discussões e criação de estratégias e nos momentos de
discordância torna-se imprescindível a condução do professor.
Para isso propomos a investigação das seguintes problemáticas de estudo:
como as atividades didáticas de matemática podem ser propostas de modo a facilitar
a assimilação de conteúdos obrigatórios escolares? Como aplicar tarefas de
matemática que abordem o eixo Números, de forma a favorecer a aprendizagem dos
discentes nos conteúdos escolares obrigatórios voltados para o 3º e 4º anos? Quais
as contribuições didáticas o pedagogo pode vislumbrar no processo de ensino e
aprendizagem da Matemática, considerando-se a assimilação da aprendizagem
escolar, ao elaborar atividades de ensino?
Considerando a nossa temática e questão central de investigação do projeto,
delimitamos como Objetivo Geral: Aplicar atividades de ensino baseadas na
assimilação da aprendizagem de Matemática para os conteúdos obrigatórios do eixo
Números para o 3º e 4º anos do Ensino Fundamental.
Visando alcançar nosso Objetivo Geral, elencamos os seguintes Objetivos
Específicos: Identificar os conteúdos obrigatórios de matemáticas para o 3º e 4º
anos do Ensino Fundamental, indicados pelos documentos vigentes de nosso país;
Identificar atividades de matemática propostas na literatura atual para os anos
abordados; Estruturar atividades didáticas diversificadas, com níveis de
complexidade diferentes, baseado na assimilação da aprendizagem e nas propostas
oficiais vigentes para o Ensino Fundamental; Aplicar as atividades didáticas com os

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participantes do estudo; Avaliar as propostas elaboradas e sua aplicação nas
instituições escolares participantes.

DESENVOLVIMENTO

O presente estudo teve como intuito desenvolver atividades de intervenção


em instituições de ensino regular com alunos que apresentassem dificuldades de
140
aprendizagem. A metodologia desta pesquisa é de cunho qualitativo, que segundo
Gil (2008, p.30) “se caracterizam pelo envolvimento dos pesquisadores e dos
pesquisados no momento da pesquisa” e na análise de dados a partir de atividades
em sala de aula.
Nesta escola aplicamos 31 atividades didáticas envolvendo leitura, oralidade,
cálculo e escrita em uma turma de 3º ano de Ensino Fundamental, no turno da tarde,
durante 04 semanas, sendo realizada em três dias consecutivos (terças, quartas e
quintas-feiras).
Contamos com a participação de18 estudantes, na faixa etária entre 8 a 10
anos de idade da escola1. Antes de iniciarmos as atividades com os alunos,
realizamos uma atividade diagnóstica estruturada, com finalidade de identificar o
grau de desempenho dos alunos em relação a leitura, escrita e cálculo. A partir da
análise do perfil dos alunos, seguimos com a aplicação de atividades conduzidas
pelas pesquisadoras onde, inicialmente, estes alunos apresentavam resistência na
realização das atividades, indisciplina e desatenção.
A atividade diagnóstica era composta por sete questões que se apresentavam
da seguinte forma: A questão 1 trabalhava a escrita dos números antecessor e
sucessor. A questão 2 solicitava a organização sequencial dos números em ordem
crescente. A questão 3 envolvia a escrita do maior número que o aluno conhecia. A
questão 4 pedia que os alunos expusessem o menor número de seu conhecimento.
A questão 5 envolvia a resolução de operações de adição e subtração. A questão 6
solicitava a resolução de problemas e a questão 7 compreendia produção textual.
Os resultados da análise dos dados referente ao total de alunos, encontram-
se representada em percentuais, estruturada em uma tabela para que haja uma
melhor representatividade dos dados observados.

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Com base nos dados apresentados através da atividade diagnóstica, na
instituição 1, obtivemos os seguintes resultados:

Tabela 1: Percentual da atividade diagnóstica – Instituição1

Questão Responderam Acertos Acertos Erros 141


parciais

Questão 1 100% 80% 20% 0%

Questão 2 100% 40% 45% 15%

Questão 3 85% 80 0% 5%

Questão 4 75% 75% 0% 0%

Questão 5 95% 25% 50% 20%

Questão 6 60% 0% 0% 60%

Questão 7 55% 30% 15% 10%

Fonte: Construção das pesquisadoras

Os dados coletados através da atividade diagnóstica nos remetem a um


quadro preocupante. Constatamos que o descaso da instituição de ensino com estes
alunos promove e acentua suas dificuldades de aprendizagem, refletindo assim em
um baixo rendimento escolar. Esta afirmação pôde ser constatada com os seguintes
percentuais: todos os alunos apresentaram dificuldades nos conceitos matemáticos,
de interpretação e compreensão das questões propostas, 5% dos alunos não liam,
5% dos alunos não reconheciam o alfabeto, 25% dos alunos não dominavam a
leitura. Verificamos que a os estudantes desta turma encontram-se distante do nível
esperado para alunos de 3º ano de Ensino Fundamental.

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Partindo deste diagnóstico formulamos e adequamos às atividades da
escola1, tendo como base os conteúdos do 2º ano, visto que os alunos não
dominavam os conceitos essenciais para a realização das atividades de 3º ano.
As aulas planejadas contemplavam a realização diária de leituras, registros
escritos e atividades de matemática envolvendo o eixo Números como indicado pela
BNCC (BRASIL, 2017). Nas atividades de leitura fizemos uso de livros paradidáticos
e Gibis, buscando firmar a autonomia dos alunos e proporcionando-lhes
142
oportunidade crescimento.
As atividades com escritas ocorreram, juntamente, com a leitura e a
Matemática em atividades como: ditados numéricos e de palavras, construção de
frases e textos partindo das leituras e atividades registradas no caderno.
As realizações das atividades envolvendo os conteúdos matemáticos
desenvolveram-se de forma oral e escrita, através da utilização de materiais como:
caderno, atividade impressa e material manipulativo. Nas atividades que fizemos uso
do material manipulativo destacamos o uso do Material Dourado, realização do
“Jogo dos palitos”.
As atividades desenvolvidas com uso do Material Dourado como suporte
metodológico para a realização de todas as atividades. Como também, fizemos uso
metodológico da história do Material Dourado no início das aulas.
Após esta aproximação com Material Dourado, explicamos o Sistema de
Numeração Decimal (SND) de forma breve, para podermos introduzir a formação
das dezenas. Faz-se importante o domínio deste conteúdo para que os alunos
compreendam os algoritmos das operações aritméticas. (FARIAS, AZEREDO,
REGO, 2016; PARAÍBA, 2010).
Na escola 1 realizamos outra atividade que foi O Jogo dos Palitos, com intuito
de fixar os conteúdos de números decimais e adição. Aplicamos, também, atividades
contemplando sequências numéricas, ditados e resolução de problemas. Sempre
ressaltando o registro escrito e correção, adequando ao nível da turma, estimulando
a leitura e escrita.
A última atividade realizada na instituição 1, propomos duas questões onde a
questão 1 envolvia o conteúdo de adição aplicado na reta numérica propondo aos

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alunos a representação e a questão 2 contemplava realização de adições
envolvendo apenas unidades.

Tabela Percentual da atividade avaliativa – Instituição 1


2:

Questões Responderam Acertos Acertos Erros


parciais 143

Questão 1 100% 17,4% 8,7% 73,9%

Questão 2 100% 34,78% 8,7% 56,52%

Fonte: Construção das pesquisadoras

Relacionando estes resultados com a atividade diagnóstica, observamos uma


evolução na resolução e realização de tarefas, tendo em vista que todos
responderam a atividade, sem deixar nenhuma questão em branco. Fato que nos
possibilita afirmar que os alunos estavam começando a se adaptar com a rotina de
atividades com autonomia e desenvoltura.
Diante da impossibilidade da continuidade do projeto na escola 1, houve uma
necessidade de buscar outra instituição (intitulada de instituição/escola 2) de ensino
para darmos continuidade ao projeto, portanto foi feito um primeiro contato,
apresentando a proposta do projeto. Localizada no bairro do Cristo, no município de
João Pessoa-PB.
Aplicamos 33 atividades didáticas envolvendo leitura, oralidade, cálculo e
escrita em uma turma de 4º ano de Ensino Fundamental. Foi desenvolvido no turno
da tarde, com alunos que estudam no horário oposto, durante 6 semanas, sendo
realizada em três dias consecutivos (terças, quartas e quintas-feiras).
Cujo o primeiro contato, se deu com a direção escolar para apresentação do
projeto e sendo permitido, disponibilizou um espaço adequado para realização da
proposta na instituição. Após os ajustes com a direção escolar um segundo contato
foi realizado, a fim de esclarecer aos pais e a comunidade escolar.

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A partir disso o projeto desenvolveu-se com 10 estudantes, na faixa etária
entre 9 a 13 anos, no qual os pais permitiram a participação dos alunos nas aulas e
que se adequaram ao perfil estabelecido pela pesquisa.
Nessa instituição 2, iniciamos com a atividade diagnostica com finalidade de
verificar o nível de conhecimento da turma, contendo as mesmas questões aplicadas
e descritas na escola 1.

144

Tabela 3: Percentual da atividade diagnóstica – Instituição2

Questões Responderam Acertos Acertos Erros


parciais

Questão 1 100% 90% 0% 10%

Questão 2 100% 60% 30% 10%

Questão 3 100% 100% 0% 0%

Questão 4 100% 100% 0% 0%

Questão 5 100% 50% 50% 0%

Questão 6 100% 80% 0% 20%

Questão 7 100% 30% 60% 10%

Fonte: Construção das pesquisadoras

Os dados coletados através da atividade diagnóstica nos remetem a um


quadro satisfatório diante do fato dos alunos responderem todas as questões.
Porém, quando referimos as questões 1, 2 3 e 4sobre a antecessor e sucessor e
sequência numérica, analisamos que a maioria dos alunos tem esse conhecimento
consolidado. Porém se tratando das questões 5 e 6 que envolve cálculo e resolução
de problemas, percebemos que existe uma certa dificuldade na compreensão e
resolução envolvendo adição e subtração, sendo uma consequência detectada na
questão 7, uma falha na leitura e escrita, que reflete nitidamente na resolução das
questões anteriores.

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Na instituição 2 iniciamos com atividades propostas aos 3º anos, pois os
alunos não alcançavam o grau de dificuldade proposta aos 4º anos. Adequamos,
então, os conhecimentos prévios dos alunos nas atividades propostas com o intuito
de aproximá-los das aulas.
As aulas planejadas de forma que contemplasse leitura, escrita e atividades
de matemática envolvendo o eixo Números. Nas atividades de leitura fizemos uso de
Gibis e textos impressos como base para atividades de interpretação oral e
145
desenho.
As atividades com escritas ocorreram, juntamente, com a leitura e a
Matemática em atividades como: ditados numéricos e de palavras, interpretação de
textos partindo das leituras e atividades registradas no caderno.
As atividades matemáticas desenvolveram-se de forma oral e escrita, através
da utilização de materiais como: caderno, atividade impressa e material
manipulativo. Nas atividades que fizemos uso do material manipulativo destacamos
o uso do Material Dourado e utilização das Barras de Napier.
O Material Dourado foi utilizado como ferramenta metodológica para a
conceituação das quatro operações. De forma que iniciamos sua utilização fazendo
uso de sua história e partindo para a formação dos números decimais.
Posteriormente introduzimos o conteúdo de adição, subtração, multiplicação e
divisão. Sendo indispensável para a aquisição dos conceitos matemático.
Fizemos uso das Barras de Napier para introduzirmos as aulas de
multiplicação, que ainda se encontra em desenvolvimento. Iniciando através da
contação de sua história e introdução da operação da multiplicação e resoluções de
problemas, as barras foram um suporte na realização das atividades.
Nas atividades que envolviam as quatro operações, fizemos uso do algoritmo
usual, sequência numérica, resolução de problemas, com o uso de ferramentas
como reta numérica, quadro numérico, objetos, Material Dourado e Barras de
Napier.
Como o projeto encontra-se em andamento na instituição 2 realizamos uma
atividade avaliativa com 50% dos alunos participantes e presentes nesta pesquisa,
mas que estarão representados por 100% da análise.

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A avaliação contemplava quatro questões organizadas da seguinte forma:
Questão1 abordava os conteúdos de adição e subtração. A questão2 tratava-se de
uma resolução de problemas com multiplicação. A Questão3 abordava o conteúdo
de divisão e interpretação. A Questão4 tratava da resolução de multiplicação e
divisão.
Com base nesta, obtivemos os seguintes resultados:

146
Tabela 4: Percentual da atividade avaliativa – Instituição2

Questões Responderam Acertos Acertos Erros


parciais

Questão1 100% 10% 90% 0%

Questão2 100% 90% 0% 10%

Questão3 100% 10% 90% 0%

Questão4 100% 10% 90% 0%

Fonte: Construção das pesquisadoras

Ao analisar os dados coletados verificamos que, de forma geral, os alunos


conseguiram ou tentaram resolver os problemas propostos, visto que apenas um
aluno obteve erro em todas as questões propostas.
Apesar dos erros parciais apresentados na questão1, verificamos que os
alunos conseguiram realizar os cálculos de adição e subtração com mais
desenvoltura que na atividade diagnóstica mostrando compreensão dos conceitos
trabalhados. Na questão2 que envolvia resolução de problemas, vimos que a
dificuldade maior dos alunos foi à leitura e interpretação da questão. Na Questão3,
que apresentava uma divisão não exata para que os alunos a explicassem, de forma
escrita, seu desenvolvimento e observamos que os alunos não possuíam domínio de
conteúdo, apenas um aluno conseguiu responder corretamente esta questão. E a
Questão4, que contemplava uma conta de multiplicação e uma conta de divisão,
analisamos que apenas um alunos conseguiu resolver as contas propostas e a

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maioria dos alunos apresentaram dificuldade em desempenhar, principalmente, a
que envolvia divisão.

CONCLUSÃO

É sabido que a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) norteia os


conteúdos a serem trabalhados, em todas as áreas de conhecimento a fim de formar
147
cidadãos críticos e conscientes de suas responsabilidades sociais. Para o Ensino
Fundamental nos anos iniciais da disciplina de Matemática, especificamente no eixo
Números, deve-se desenvolver competências como raciocínio, compreensão,
argumentação e representação através atividades e situações que permitam o aluno
a desenvolver estratégias para obtenção dos resultados (BRASIL, 2017).
Percebe-se que os alunos, inicialmente, não haviam desenvolvido as
habilidades necessárias para desempenhar as atividades propostas para o 3º e 4º
ano do Ensino Fundamental fazendo com que adaptássemos as atividades para os
anos anteriores, e pudéssemos alcançar um resultado positivo e adequado aos anos
propostos.
Na última atividade realizada na escola 1 verificamos um alto percentual de
erros, pois o nível de abstração da atividade realizada não pode ser consolidado,
devido ao curto tempo de permanência na escola devido a reforma realizada na
instituição, o que veio a refletir na interrupção do desenvolvimento da pesquisa.
Contudo, verificamos um avanço considerável na participação das aulas e na
realização das atividades com empenho e autonomia.
Com relação a escola2 verificamos um grau de evolução em torno da
apropriação dos conceitos de adição e subtração. Já em relação a multiplicação e
divisão de parcelas analisamos que os alunos ainda apresentam dificuldade sobre a
compreensão destes conceitos, visto que o tempo disposto foi curto para que
conseguíssemos firmar tais conteúdos. Mais verificamos que os alunos conseguiram
criar estratégias para a realização destas operações através da evolução das
atividades aplicadas e do reflexo em seus rendimentos escolares.
Apesar do pouco tempo destinado em cada campo de estudo, percebemos a
evolução dos alunos, fato que nos permite afirmar que se nos fosse dado condições

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de permanência na escola1 teríamos obtido um percentual de acertos considerável.
Da mesma forma que, se tivéssemos destinado um período maior de permanência
na escola2 obteríamos um relevante avanço na internalização dos conceitos pelos
alunos.
A aproximação e possibilidades de aprofundar nossos conhecimentos no
ensino de Matemática tornou esta experiência enriquecedora e nos permitiu
reconhecer a sala de aula como um espaço de possibilidades e mudanças desde
148
que haja comprometimento e domínio de conteúdo, habilidades indispensáveis para
nossa formação como futuras pedagogas.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Lei n.º 9.394/1996: Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional. Brasília, 1996.
_________. Conselho Nacional de Educação. Direito de Educação pública para todos.
Ensino Básico, Brasília: MEC/ 2010.
_________. Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacional para o
Ensino Básico. Ensino Básico, Brasília: MEC/ 2013.
_________. Base Nacional Comum Curricular. Proposta preliminar. Terceira versão
revista. Brasília: MEC/ 2017.
FARIAS, S. A. D.; AZÊREDO, M. A.; RÊGO R. G.; Matemática no Ensino Fundamental:
Considerações teóricas e metodológicas. João Pessoa: SADF, 2016.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
PARAIBA, Estado. Referenciais Curriculares do Ensino Fundamental do Estado da Paraíba,
João Pessoa: SEE/PB, 2010.
TALIZINA, N. F. Manual de Psicologia Pedagógica. Universidade Autônoma de San Luis
Potosí. Mexico: Potosína, 2000.

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DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA LEITURA E ESCRITA, NAS SÉRIES
INICIAIS DO FUNDAMENTAL I

Celene Silva de Azevêdo26

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo apresentar as dificuldades de aprendizagem


no ensino de leitura e escrita, nas séries do fundamental I. Muitas dessas dificuldades
poderiam e deveriam ser resolvidas ou trabalhadas dentro da situação escolar. Porém, para
que isto ocorra de forma significativa é necessário que os processos de aquisição da leitura 149
e da escrita das crianças, sejam compreendidas de forma adequada. Para que se possa
distinguir as dificuldades que fazem parte da aprendizagem de modo geral, daquelas que
podem se configurar como dificuldades na leitura e na escrita. Com base na pesquisa
bibliográfica observa-se que o processo de ensino e leitura, precisa de uma avaliação
diagnóstica, com o objetivo de detectar os problemas de aprendizagem, para realizar
proposta de intervenção, minimizar as dificuldades encontradas. Como as novas
metodologias estão se aprimorando, os meios que levam aos conhecimentos eficazes e
coerentes as aprendizagens dos discentes. Todavia buscam-se novas praticas que envolva
os interesses em sala de aula, revestindo-os e contribuindo para superação do fracasso,
garantindo uma qualidade melhor de educação. Mesmo com a universalidade da educação
fundamental verificou-se com os resultados das pesquisas com os alunos de alfabetização e
segundo ano, salas de 23 e outra de 22 alunos, apontaram uma minoria que estão com
deficiência na leitura e na escrita mais no segundo ano o índice de déficit na aprendizagem
foi mais elevado. Com a constatação dessas realidades buscou-se ajuda aos grandes
teóricos que possam colaborar, cada um tem contribuição em prol das soluções almejadas
como: Paulo Freire afirma, que leitura não é decodificar palavras é fazer leitura de mundo.
Emília Ferreiro (1996) e Teberosky(1999) apontam em seus estudos e pesquisas que
alfabetização é um espaço de interação da criança com a produção e a escrita. Para
Fonseca em seu contexto fala (2004, p. 49) que essas dificuldades de aprendizagem em
leitura e escrita são diferenciadas levando em conta seu contexto histórico. Coelho(2009, p.
85, 88) relata que as dificuldades de aprendizagem podem acontecer no inicio da vida
escolar, como também surge em diferentes situações, mas para se confirmar tem que haver
averiguação onde se descubra onde está acontecendo a deficiência de aprendizagem.

Palavras Chaves: Leitura, Escrita, Dificuldades de Aprendizado.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho relata as dificuldades na aquisição de leitura e escrita nos


anos iniciais do ensino fundamental I, no cotidiano nos docentes e discentes, que
enfrentam em uma Escola Rural do Município de Cumaru PE. Em relação à leitura,
tem sido frequentemente nas aulas onde os professores, tentam resgatar o

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desenvolvimento do aluno para que os mesmos possam ter uma boa aprendizagem,
e recuperar sua autoestima. Foi feito pesquisa que busca compreender e atender as
questões, ligadas a essas dificuldades de aprendizagens em sala de aula, e verificar
o que fazer para sanar essas dificuldades.
No entanto, foi realizado um levantamento bibliográfico através de leituras e
seleções de textos, com formulação de um questionário aberto contendo 4 questões
sendo analisado o trabalho de 3 professores do 2º ano. Portanto, no decorrer da
150
pesquisa observamos que a questão da dificuldade de aprendizagem na leitura e na
escrita, tem sido uma questão bastante discutida, pelos que se preocupam com a
nossa educação. Sobretudo com os problemas relativos a aprendizagem dos
discentes.
“não é no silencio que os homens fazem, mas na palavra, no trabalho, na
ação reflexão”. (Paulo Freire). Não podemos deixar de valorizar o patrono da
educação brasileira, por si tratar de dificuldades de leituras e escritas. Nesse
sentido, busca-se para subsidiar o processo de ensino aprendizagem e no
desenvolvimento da classe discente. A questão norteadora é uma estratégia que
auxilie o docente a facilitar a aprendizagem do discente nos desafios que enfrentam
no processo de aprendizagem escolar.
É importante ressaltar, que há causas de negação de aprendizado que as
crianças vêm enfrentando, sendo mal diagnosticada e até ressaltada pelo processo
de ensino da escola. Segundo Fonseca (1995) afirma:

“Que a criança com dificuldades não deve ser rotuladas como


deficiente, trata-se de uma criança normal que aprende de
forma diferente apresentando uma discrepância entre o
potencial atual e o potencial esperado”.

Ela aparece ao longo do processo de aprendizagem, e a dificuldade na leitura


e na escrita tem sido reconhecida, como um dos fatores que interferem na
aprendizagem e na autoestima da mesma. Assim, a postura adotada pelos
professores em sala de aula, pode ter um papel determinante na superação desta
dificuldade. O professor deve repassar, à criança confiança e compreensão e evitar
transmitir aflição e agonia diante das dificuldades que o aluno apresenta.

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Reconhecendo que apropriar-se da leitura e da escrita é importante para o contexto
atual, social, cultural em que está inserido.
De acordo com esta realidade, descobrimos que a educação é a sustentação
de formação para o desenvolvimento, afetivo e social da criança. Portanto a
preocupação vem aumentando, diante das estratégias dos educadores infantis,
muitos não estão preparados profissionalmente. Devido a esta circunstância
percebe-se a importância da realização de atividades divertidas na educação infantil,
151
criando e desenvolvendo as competência da criança, e sua criatividade.
Percebendo a importância de se discutir sobre as dificuldades de
aprendizagens na leitura e a escrita, nas séries iniciais. Através deste estudo,
objetiva-se apresentar algumas estratégias significativas, voltadas ao estímulo da
capacidade do discente. Sabendo que a leitura e a escrita é um leque que se abre
ao indivíduo mostrando, uma visão diferente de mundo, com oportunidades de
compreensão e interpretação do que esta sendo apresentado.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. LEITURA
2.1 A LEITURA NO CONTEXTO ESCOLAR

A leitura na escola é uma atividade de suma importância, para a vida da


criança perante a sociedade. Em virtude dessa abordagem, muitas discussões têm
surgido, diante da importância para a formação de leitores e cidadãos críticos. Isso
se justifica devido ao fato de que a leitura possibilita a criança a inserção e
participação ativa no meio social e, por isso, essa prática deve ser desenvolvida
desde cedo, e principalmente, no âmbito escolar.
Segundo Delmanto (2009) “a escola deve ter a preocupação cada vez maior
com a formação de leitores”. Ou seja, a escola deve direcionar seu trabalho, para
práticas de ensino da leitura em si. Mas, desenvolver nos alunos a capacidade de
fazer uso da leitura e da escrita, para enfrentar as dificuldades da vida em
sociedade. Com o conhecimento adquirido através dessas práticas com suas

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experiências, continuar o processo de aprendizado, para ter um bom desempenho
na sociedade ao longo da vida.
A autora ainda acrescenta, que, diante das diversas transformações com as
quais convivemos, a escola precisa mais do que nunca, fornecer ao educando os
instrumentos necessários para que se busque, analisar, selecionar, relacionar,
organizar as informações complexas do mundo contemporâneo.
Solé (1996, p.33) expressa sobre essa problemática e esclarece que:
152
O problema de ensino da leitura, na escola não se situa no
nível do método, mas na própria conceituação do que é leitura,
da forma em que é avaliada pelas equipes de professores, do
papel que ocupa nos Projetos Curriculares da escola, dos
meios que se arbitram pra fortalecê-la, naturalmente, das
propostas metodológicas que se adotam para ensiná-la.

Nesse sentido, compreende-se que a leitura é um processo que não está


limitado apenas no âmbito escolar, ou somente no meio para obter informações.
Mas do que isso, deve ser uma prática que todos possam usá-la na própria
convivência com a sociedade.
Segundo Freire (1981, p.13) ninguém começa a ler a palavra, pois a primeira
coisa que temos a nossa disposição, para ler é o mundo, ao trazer conosco nossa
experiência de vida. Ainda ressalta a importância de realizarmos uma leitura crítica,
e afirma que o gosto pela leitura se desenvolve a partir do momento em que os
conteúdos estejam de acordo com nossos interesses e necessidades. Sendo assim
o autor nos leva a pensar que:

[...] de alguma maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer


que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do
mundo, mas, por uma certa forma de “ escrevê-lo”, ou de
“reescrevê-lo”, quer dizer, de transformá-lo através de nossa
prática consciente.

2.2 COMO CONVIVER COM AS DIFICULDADES DE LEITURA EM SALA DE AULA

O ensino deve proporcionar uma reflexão e conscientização, onde o aluno


formule, descubra as regras, e formas da língua, para se aprimorarem tornando-se
capazes para escrever corretamente. Utilizar estratégias de planejamento com
perguntas tipo: Porque você quer escrever esse texto? Você pensa em fazê-lo de

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forma para que outros entendam? Como escolhe as palavras relacionadas com o
tema?
De acordo com essas perguntas, podem ser realizadas atividades solicitando
mudanças, nos papeis dos personagens, para que possam escreverem um final
diferente. Enfim o professor possui um leque de estratégias para estimular e
direcionar a produção textual, e podem criar outras, dependendo de cada
necessidade dos alunos. O professor deve criar uma situação prazerosa, não porque
153
o mostre, mas que, eles possam escrever livremente, por exemplo, textos com
diários e cartas. O aluno deve perceber a importância de revisar, escrever, podendo
realizar atividades de reescrita, pegando um texto simples e transformando-o
através da troca, por palavras mais elaboradas. O professor tem função de interagir
com o aprendiz numa troca de experiências, não apenas ensinar a gramática, mas,
valorizar e ampliar suas atividades para que melhore seu discurso.
Evitar correções por meio de castigos, que poderá reprimir ou desestimular o
aluno, e não apenas apontar o erro, mas dar informações relevantes, para que eles
percebam as diferenças e não cometam ou pratiquem os mesmos erros. A leitura
pode ser uma ótima aliada, pois ela trás a compreensão, então trazendo textos,
livros que podem ser sugerido para os alunos criarem seus próprios textos. Primeiro
deve-se propor uma técnica de "Escrita livre" para que o aluno adquira certa fluidez
e convicção, de que é capaz de escrever, sobre o que sabe, depois nas revisões e
correções (com ajuda dos colegas e do professor). Para Emília Ferreiro: "...a minha
contribuição foi encontrar uma explicação segundo a qual, por trás da mão que pega o lápis,
dos olhos que olham, dos ouvidos que escutam, há uma criança que pensa" (Emília
Ferreiro)
A escrita deve ser motivada com, recortes, colagens, produções textuais,
murais ou outros meios, para que os alunos tenham sempre, bons motivos para
desenvolver suas atividades, não como uma atividade pavorosa que só trará
punições, mas algo divertido e que sua aprendizagem (escrita) servirá para toda vida
em diversos momentos.

2.3 LEITURAS: UMA NOVA CONCEPÇÃO


Como já foi citada, a leitura é essencial para o bom desenvolvimento
individual e social da criança. É pela leitura que podemos construir e reconstruir

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conceitos que servirão para a nossa formação enquanto sujeitos sociais.
Leffa (1996, p.17-18), ao propor uma definição de leitura, afirma que:

“A leitura é um processo feito de múltiplos processos, que


ocorrem tanto simultânea como sequencialmente, esses
processos incluem desde habilidades de baixo nível,
executados de modo automático na leitura proficiente, até
estratégias de alto nível, executadas de modo consciente.”

Diante desses esclarecimentos, a leitura é um processo amplo no qual o 154

leitor, precisa dispor de diversas estratégias, para chegar à compreensão do texto.


Em outras palavras, a leitura não estaciona na mera decodificação, assim Lajolo
comenta sobre Paulo Freire dizendo:

“para Paulo Freire (2003 p.5), leitura boa é a leitura que nos empurra
para a vida, que nos leva para dentro do mundo que nos interessa
viver e para que a leitura desempenhe esse papel, é fundamental
que o ato de leitura e aquilo que se lê, façam sentindo para quem
está lendo. Ler, assim, para Paulo Freire, é uma forma de estar no
mundo.”

Compreende-se que leitura é uma das maiores dimensões, que da condições


para o ser se desenvolver. Serve também como instrumento para o ato de ensinar.
Tanto da leitura, quanto da escrita é focado nas competências e nos
desenvolvimentos da leitura escolar. Um bom leitor é sem duvida um bom escritor.
Diante desse pressuposto, acredito que a leitura não é uma prática isolada, e para
que ela ocorra de forma satisfatória, faz-se necessário que o leitor defina, no
momento da leitura, os seus objetivos, e assim, possa chegar ao sentido do texto.
Assim, a escola deve propor ao aluno, durante as aulas de leitura, textos que
despertem o interesse da turma. A fim de que esta possa definir a leitura daquele
texto e, em consequência dessas pratica, sejam induzidos a ler outros textos. Assim,
é possível que diferentes leitores com finalidades diferentes, possam construir
sentidos diferentes ao lerem o conteúdo de um mesmo texto.
Além desses aspectos já apresentados, Kleiman explica que o conhecimento
prévio é outro elemento preponderante, no ato de ler, ou seja, é um dos caminhos
para se chegar à compreensão do texto. Para a autora, "a compreensão de um texto
é um processo que se caracteriza pela utilização do conhecimento prévio: o leitor

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utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento adquirido ao longo da
vida".(KLEIMAN, 2004, p.13)
Assim, compreende-se que, o sentido de um texto não esta em si mesmo,
mas sofre influências do conhecimento de mundo, de que o leitor dispõe, atribuindo
significado ao texto. Só um bom leitor adquire aptidões pelo hábito de ler tornando-
se um sujeito crítico, pensante, inserido no mundo social.

155
3 O LÚDICO COMO INSTRUMENTO DE TRABALHO

3.1 O LÚDICO NA SALA DE AULA

Antunes (2001) afirma:

“... que as brincadeiras dentro do lúdico se tornam um aliado e


instrumento de trabalho pedagógico super valorizado para se
conseguir alcançar os objetivos de uma construção de
conhecimentos onde o aluno seja participativo ativo.”

O lúdico como temática pedagógica, para os docentes deve ser usada em


sala de aula, para ampliar a metodologia, enriquecendo o ensino aprendizagem.
Visto que brincando também se aprende, de maneira dinâmica, prazerosa e
facilitando o trabalho, minimizando as dificuldades no processo de leitura e escrita.
A Criança, jogo e brincadeira estão intrinsecamente interligados, no entanto, o nosso
sistema escolar, não percebe essa interligação e receia a criança das suas necessidades de
movimento, expressão, de construção, de seu conhecimento, a partir do seu próprio corpo.
Apesar de estar inserida neste meio, a escola precisa perceber a criança como um ser em
constante desenvolvimento.
Parece estranho a muitas pessoas admitir, o lúdico como um recurso didático, para
uma aprendizagem mais eficaz. O brincar é uma forma de expressão da criança,
principalmente na escola, interagindo com os colegas, mas, se entende que brincando estão
aprendendo.
Vigotsky (1991), “justifica que o brincar é um necessidade básica, do sujeito
em processo de formação”. Além das brincadeiras se tornarem elementos
essenciais dos discentes, apresentam características próprias que ampliam a
imaginação no contexto da aprendizagem.
Brinquedos, são ferramentas que estrategicamente constrói conhecimentos,
no seu próprio mundo, e o mundo que querem e gostam.

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3.2 O LÚDICO COMO FACILITADOR DA APRENDIZAGEM

O brincar é vital para o desenvolvimento do corpo e da mente. Nele se


reconhece um meio, de proporcionar educação integral, em situações naturais de
aprendizagem que geram forte interesse em aprender, e garantem o prazer.
O lúdico viabiliza a construção do conhecimento, de forma interessante e
156
prazerosa, garantindo nas crianças a motivação intrínseca necessária para uma boa
aprendizagem. Até convertê-las em adultos maduros, com grande imaginação e
autoconfiança, mesmos aqueles que apresentam alguma dificuldade na
aprendizagem ou na aquisição do conhecimento.
Dar-se ênfase, às metodologias que se alicerçam no “brincar”, no facilitar as
coisas do aprender, através do jogo, da brincadeira, da fantasia, do encantamento. A
arte-magia do ensinar-aprender (ROJAS,1997), permite que o outro construa por
meio da alegria e do prazer de querer fazer.
O jogo e a brincadeira estão presentes em todos as fazes da vida dos seres
humanos, tornando especial a sua existência. De alguma forma o lúdico se faz
presente e acrescenta um ingrediente indispensável no relacionamento entre as
pessoas, possibilitando que a criatividade aflore.
Brincar é tão importante quando estudar, ajuda a esquecer momentos difíceis,
quando brincamos, conseguimos sem muito esforço encontrar respostas a varias
indagações. Podemos sanar dificuldades de aprendizagem, bem como interagirmos
com nossos semelhantes.
Além de muitas importâncias, o brincar, desenvolve os músculos, a mente, a
sociabilidade, a coordenação motora e além de tudo, deixa qualquer criança feliz.
Quando brincamos exercitamos nossas potencialidades, provocamos o
funcionamento do pensamento, adquirimos conhecimento sem estresse ou medo,
desenvolvemos a sociabilidade, cultivamos a sensibilidade, nos desenvolvemos
intelectualmente, socialmente e emocionalmente.
Toda criança que brinca vive uma infância feliz, além de tornar-se um adulto
muito mais equilibrado física e emocionalmente, conseguirá superar com mais
facilidade, problemas que possam surgir no seu dia-a-dia. A criança é curiosa e

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imaginativa, está sempre experimentando o mundo, e precisa explorar todas as suas
possibilidades. Ela adquire experiência brincando. Participar de brincadeiras é uma
excelente oportunidade para que a criança viva experiências que irão ajudá-las a
amadurecer emocionalmente, e aprender uma forma de convivência mais rica.

4 O PROFESSORES E SUAS PRÁTICAS


4.1 APRENDIZAGEM COM A PRÁTICA PEDAGÓGICA
157

“O aprender a ser professor, na formação inicial ou continuada, se pauta por


objetivos de aprendizagem, que incluem as capacidades e competências esperadas,
no seu exercício profissional.” (LIBÂNEO, 2002, p. 73). Observando as práticas
pedagógicas de um docente pautando, uma temática com domínio e globalização,
descobre-se que com suas eficiências, fica mais prático o fazer e o aprender. Nesta
visão, pode-se indicar que aquele que contempla os princípios, e processos de
aprendizagem válidos para os alunos, será denominado um bom mediador de
construção e conhecimentos.
Brito (2006) considera que a formação do professor deve fundamentar-se na
concepção, de um professor que repense constantemente, sua prática docente.
Dessa forma, siga estabelecendo um processo dinâmico, que possa romper a
mesmice, articulando o processo educativo com a realidade social.
A prática pedagógica pode ser considerada, como o trabalho de repassar, ou
transmitir, saberem específicos. Ou ainda, um processo que está intrinsecamente
ligado à teoria, e prática da docência. Nesse sentindo, torna-se importante
investigar, como os professores, estão compreendendo suas práticas, e quais suas
percepções sobre as mesmas.
A revolução tecnológica e o processo de reorganização do trabalho, docente
demandam uma completa revisão dos currículos, tanto da educação básica, quanto
da educação profissional. Uma vez que se exige dos docentes, conhecimentos
meios sociais para ampliar e enriquecer seus conhecimentos, com valorização das
capacidades, aumentando o raciocínio, a autonomia intelectual, pensamentos
críticos com iniciativas próprias e espirito empreendedor, bem como competências
de visualização e soluções de problemas.

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De acordo com Kenski (2011, p. 103):

“O uso criativo das tecnologias pode auxiliar os professores a


transformar o isolamento, a indiferença e a alienação com que
costumeiramente os alunos frequentam as salas de aula, em interesse e
colaboração, por meio dos quais eles aprendam a aprender, a respeitar,
a aceitar, a serem pessoas melhores e cidadãos participativos.”

É necessário aprender e criar, interagindo e planejando para que a aula


possa melhorar seja produtiva e eficaz, tendo como mediação as novas tecnologias
158
as quais, foram criadas para melhora e descobrir os conhecimentos e aprendizados.

4.2 EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE

Segundo o Ministério de Educação e Cultura (MEC, apud SENAC, 2008 b), a


concepção de Educação Profissional passa por mudanças profundas no mundo do
trabalho, a partir do momento em que se percebeu a necessidade de
profissionalização dos trabalhadores. Os desafios estão relacionados aos avanços
tecnológicos e às novas expectativas das escolas que agora enfrentam mercados
globalizados, extremamente competitivos. Com isso, surgem também novas
exigências em relação aos desempenhos dos profissionais.
Sobre a educação profissional atual, percebe-se que o professor age de
forma fluente na formação integral, do educando ao transmitir as informações
necessárias à sua formação. Logo, segundo Oliveira “[...] tem a extraordinária
oportunidade de partilhar com o aprendiz a experiência rica da busca e do saciar do
chamamento interior: a vocação profissional.” (OLIVEIRA JUNIOR, 2008, p. 8). Isso
dá ao docente da educação profissional, a vantagem da motivação elevada do
aluno, mas, ao mesmo tempo, aumenta enormemente a sua responsabilidade.
A educação por competências, na educação profissional não trata apenas de
qualificar a pessoa para o trabalho em si, mas formar para a vida na qual também se
insere o trabalho. O professor deverá cumprir com o seu papel de facilitador, da
aquisição de informações como mediador do processo de leitura e escrita,
conduzindo-o para uma sociedade contemporânea.

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4.3 PROFESSOR TRADICIONAL X MODERNIDADE

“O professor era o centro do processo de ensino aprendizagem expor


conteúdos no quadro, e usando o exaustivo livro didático, e
memorização e repetição para o aluno. (Campos e Numes, 2009)
põe fim no movimento tradicionalista de ensino, e se é que pode
afirmar que está acabado.”

Outras tendências passaram a dominar em cada época, com seus estudiosos


e pesquisadores, em suas respectivas ideologias teceram novas ideias, para se 159

refletir sobre os termos tradicionais, trazendo para as suas práticas novas formações
e novos métodos modernos, para uma aprendizagem transformadora e atuante.
Temos hoje um sistema educacional, no qual os professores estão acuados,
entre os inúmeros desafios, somados às suas obrigações, multiplicado pela
dificuldade de se lecionar em algumas escolas. O mais interessante é que se tudo
der errado, o culpado é o professor, pela falência educacional, sem se levar em
conta o contexto, por exemplo, familiar.
Faz-se importante compreender melhor o papel das tecnologias no ambiente
escolar. De tal maneira que, segundo o Filósofo Pierre Lévy (1998), nunca na
história, ocorreu o que estamos visualizando, a saber, que os conhecimentos
adquiridos, no inicio da carreira profissional serão obsoletos, no seu fim.
Ao professor não cabe mais, o papel de detentor da verdade absoluta, uma
vez que existe, uma nova relação com o saber, e, assim, o conhecimento não é mais
empilhado, simplesmente amontoado como se fosse um depósito no qual jamais
ocorreriam mudanças:

(...) o que deve ser aprendido não pode mais ser planejado, nem
precisamente definido de maneira antecipada. Os percursos e os
perfis de competência são, todos eles, singulares e está cada vez
menos possível canalizar-se em programas ou currículos que sejam
válidos para todo mundo. Devemos construir novos modelos do
espaço dos conhecimentos. (LÉVY, 1998, p.4)

Desta maneira a própria história se encarrega de mostrar que: “... o individuo


humano não é autossuficiente, e não pode ser autoconfiante. Não se pode condenar
a si mesmo: é preciso ser guiado, e dirigido, e informado do que fazer.” (BAUMAN,
1997, p. 228). Por isso é importante reescrever o papel do professor para guiar os

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alunos de uma nova maneira numa época onde há uma veloz mudança no fazer, no
pensar e no atuar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo pretendeu promover reflexões acerca do tema dificuldade


de leitura e escrita, compreendemos que ensinar a ler e escrever exige do professor
conhecimentos teóricos para poder realizar uma prática eficaz. Compreendemos 160

ainda que o professor necessita escolher método de ensino que leve o aluno a ser
um sujeito que lê e compreende o que leu e ainda que seja capaz de produzir textos.
Observamos também que o processo de ensino e leitura, precisa de uma
avaliação diagnóstica com o objetivo de detectar os problemas de aprendizagem
para realizar proposta de intervenção para minimizar as dificuldades encontradas.
Após encontrarem os professores devem sanar essas dificuldades com
metodologias que levem os alunos a sentirem prazer em ler e escrever.
Diante do estudo partimos da compreensão de que todo professor necessita
conhecer as teorias de Piaget e Vigotsk como subsídios norteadores para
compreender como ocorre o desenvolvimento humano e que a aprendizagem
depende de fatores internos e externos.
Sobretudo os jogos da criança, porque no jogo a criança representa e produz
muito mais do que aquilo que viu. O jogo, segundo Antunes (2000), é o mais
eficiente meio estimulador das inteligências, impõe desafios, e gera tensões
necessárias para a construção do aprendizado que se propõe obter com tais
atividades.
O educando desde que entra na escola, deverá participar de brincadeiras que
direcione para o ato de ler e escrever, na produção de textos coletivos e individuais.
Vivenciando momentos de leituras realizados pelo docente, tendo oportunidade de
participação explorar e confrontar suas hipóteses com o outro. Tendo oportunidade
de construir sua própria leitura e escrita, que são requisitos para as outras
aprendizagens escolares, que portanto devem ser priorizadas.

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Marlene A. (Org.). Formação de Professores e Práticas Docentes: olhares
contemporâneos. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. 161
CAMPOS, Tânia M.; NUNES, Terezinha. Concepções pedagógicas da Educação
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162

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UM OLHAR SOBRE A EVASÃO NO ENSINO FUNDAMENTAL NOTURNO NA
ESCOLA MUNICIPAL EDGAR TORRES

Maria Eliene Pessoa¹ | Maria Aparecida Dantas Bezerra² | Maria José Alves de
Souza

RESUMO: Objetivo desse estudo é investigar as taxas de evasão da Escola Edgar Torres 163
situada no município de Toritama-PE, entre os alunos do Ensino Fundamental noturno. A
primeira etapa do estudo versa sobre O Contexto Histórico da Evasão Escolar a luz dos
postulados teóricos. Na segunda parte serão apresentados os resultados da pesquisa
realizada na escola em tela, onde é possível verificar se os dados obtidos conduzem com as
pesquisas já divulgadas na área.

Palavras-chave: Educação, Escola e Evasão.

INTRODUÇÃO

A elaboração do presente documento para o VIII Colóquio Internacional


de política e Prática Curriculares, traz em seu cerne em estudo quanto o problema
da evasão no cotidiano da Escola Edgar Torres, no Ensino Fundamental, noturno. A
Escola pelo tema em estudo emana da necessidade do conhecimento das principais
causas que levam os alunos a se evadir, bem como situar em estudo quanto à
implantação do Plano de Intervenção.
Todos nós sabemos a dificuldade frente o gerenciamento do processo de
ensino aprendizagem de uma escola pública, o quanto é difícil. Frente esta busca de
alternativas para fins de compreensão e intervenção foram determinantes na
escolha do tema, face um possível contribuição e ressignificação das práticas de
acompanhamento da rotina do processo de ensino aprendizagem.
Quando aludimos à gestão da evasão escolar sobre a égide do processo
de evasão escolar no ensino fundamental noturno, nos deparamos com várias vias
de interpretação, face à busca da compreensão dos fatores que impedem a
formação de um modelo de permanência na escola de forma eficaz, para responder
as reais necessidades em prol da consolidação da elevação dos índices de
permanência na escola de forma eficaz.

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No atual cenário, atêm-se vários pesquisadores à busca para soluções
frente a uma transformação significativa que apontam mudanças em face a
permanência do aluno na escola onde este seja responsável pela sua formação e de
forma a interessar-se pelos estudos evitando a evasão como forma de negar as
suas próprias limitações quanto sua aprendizagem.
Faz-se oportuno frisar que esse contexto é de uma natureza ímpar para
uma ressignificação, por completo, da dinâmica da existência da aprendizagem. O
164
entanto para que tal contexto se efetive, é necessário que a mesma se dê em etapas
distintas.
Desta forma, evidenciar esforços, quanto Um Olhar Sobre a Evasão no
Ensino Fundamental Noturno, na Escola Edgar Torres, sediada no município de
Toritama- PE, nos propicia uma releitura do contexto teórico e prático, junto ao
controle dos elevados índices de evasão escolar: O que irá propiciar investigação
das principais causas que contribuem para evasão escolar, contribuindo assim, para
um processo de investigação.
No tocante aos objetivos da referida pesquisa, quanto o estudo da turma
supracitado, faz-se oportuno buscar conhecer os fatores que contribuem para
evasão escolar e quais as consequências da mesma para os alunos. Desta forma,
pretendemos descrever as principais causas que contribuem para a não conclusão
do Ensino Fundamental, mais especificamente dos alunos do turno noturno.
O nosso campo de estudo conforme mencionamos anteriormente é a
Escola Municipal Edgar Torres, que encontra-se sobre a égide da Secretaria
Municipal de Educação de Toritama – PE, a referida escola oferece da Educação
Infantil ao Ensino Fundamental II, a ênfase da nossa pesquisa são as seis turmas do
Ensino Fundamental do turno da noite.
O presente trabalho traz em seu cerne três eixos distintos: O primeiro eixo
alude o contexto teórico, os caminhos que norteiam a identidade normativa do
segmento em estudo. O eixo dois contempla o contexto metodológico e as
especificidades da escola em estudo. O terceiro eixo alude à análise dos dados e a
discussão dos mesmos, levando ao fechamento do trabalho.

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ANTECEDENTES HISTÓRICOS

A criação da instituição escolar, frente o funcionamento no horário


noturno, apresenta por objetivo assegurar o processo de alfabetização de Jovens e
Adultos, que por condições diversas não puderam estudar no horário diurno. No
entanto, não era suficiente a garantia da alfabetização do público em tela, mas
165
propiciar a continuidade dos estudos de forma a garantir a conclusão da educação
básica.
Sendo assim, vamos perceber que o ensino secundário, atualmente
denominado de ensino médio, foi introduzido no horário da noite, sem um
aprofundamento das reais necessidades da clientela. Sob o ensejo da Assembleia
Constituinte de 1988, foi assegurado pela nova Constituição Federal, o acesso à
escola noturna, visto eminente crescimento populacional bem como o contexto
sócio- econômico.
Passado o período de adaptação à luz da nova Constituição Federal,
vamos observar segundo os dados oficiais do Governo Federal via Ministério da
educação um assunto significativo de matrículas na educação de Jovens, por meio
da criação de projetos especiais de aceleração de estudos.
Conforme a Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 208 do
capítulo III: O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia
de: Inciso VI – oferta de ensino noturno regular adequada às condições do
educando.
Após a redemocratização do ensino noturno, houve uma alteração do
perfil sócio econômico dos cursos de ensino médio. Aumentou o número de alunos
filhos de trabalhadores, muitos já trabalhadores também, cursando o ensino noturno
(Togni, 2007).

PRINCIPAIS MOTIVOS QUE LEVAM OS ALUNOS A PROCURAR UM CURSO


NOTURNO.
Discorrer sobre os motivos que conduzem as pessoas a buscarem a
escola noturna enquanto meio para o processo de alfabetização e Conclusão dos

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estudos nos permite a conhecermos duas vertentes básicas de sustentação da
escola. O ensejo da entrada no mercado de trabalho atrelada uma política de
formação do quadro de mão – de – obra. Podemos encontrar na literatura
referenciais do perito abordado nos trabalhos de (Rodriguez e Hérom, 2000) que
apontam 57% dos alunos que buscam a escola noturna é por que já estão no
mercado de trabalho ou em busca de uma vaga nesse mercado.
A segunda vertente nos aponta a necessidade de uma ( ressignificação
166
do perfil, frente a consolidação de uma identidade própria; onde situa-se os fatores
de natureza econômica e de satisfação pessoal caso adentre-se na identificação do
perfil destes alunos atendidos pela escola noturna e será difícil de percebermos dos
mesmos um histórico de fracassos na escola diurna bem como alguns encontra-se
sobre conflitos de natureza familiar onde encontra na escola um espaço para
refugiar-se das tensões ou até mesmo para diversão segundo (Marques 1995)
“Sendo assim podemos de forma categórica e que não é apenas o trabalho que
fomenta o ingresso na escola noturna.
Uma vez fundamentados quanto às possíveis escolhas dos jovens e
adultos pela escola noturna, não é imprudente atrelar aos fatores as questões da
inserção da idade escolar.

EMPREGO: CONSTRUINDO UMA IDENTIDADE.

O simples fato de assegurar um emprego configura-se para a maioria dos


jovens um espaço que divide, ou seja, rompe com de suas fazes a vida delineada
pela passagem da adolescência para a vida adulta. Devemos atermos a esta
situação o contexto de um projeto de vida em que a busca pela estabilidade torna-se
meta principal deixando muitas vezes os estudos em segundo plano.
A inserção precoce dos Jovens no mercado de trabalho seja pela
necessidade ligadas a família ou da própria garantia do consumo, podemos
perceber que o mundo do trabalho não é mais uma referência única para os jovens
trabalhadores. No intuito de escolherem a escola como espaço de “melhoria de vida”
de “subir na vida” estes jovens estão construindo em suas vidas situações
propiciadoras de afirmação de suas identidades. (Marques, 1995).

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À luz das pesquisas anteriormente descritas podemos concluir que o
trabalho do jovem aluno da escola noturna faz parte da rotina das famílias pobres de
toda a sociedade brasileira, sob o ensejo de garantia do oferecimento de melhores
condições de vida.
Para alguns estudiosos o trabalho surge como uma maneira de estruturar
suas identidades individuais que estão em plena fase de construção nessa faixa
etária entre 16 e 22 anos. Trabalhar, mesmo sendo parte de sua obrigação de filho,
167
não deixa de garantir sua identidade, ou aflorar a possibilidade de conquistar um
espaço na tentativa de ter acesso a bens de consumo e a padrões de
comportamento que definem as marcas dos jovens nas grandes cidades, nos
centros urbanos: o som, o tênis, as roupas etc. Para os jovens, o trabalho não
significa apenas a garantia da sobrevivência no núcleo familiar e da capacidade de
consumo.

POSSÍVEIS CAUSAS DA EVASÃO ESCOLAR

No atual contexto identificamos os possíveis caminhos que contribuem


para o fracasso escolar nos possibilita não diagnosticar a realidade como intervir de
forma eficaz frente a situação.
Hoje temos estudos que evidenciam o fracasso escolar a partir de duas
situações especiais: a primeira centra esforços na explicação de interferência
externas a escola, e a segunda sob fulcro das interferências internas. Frente as
interferências externas pertinentes ao contexto do insucesso escolar é apontado,
segundo Magione(1994), o trabalho, as desigualdades sociais e o próprio
desinteresse do aluno. No tocante as especificidades internas, vamos atermos a
ausência da garantia do oferecimento de um padrão mínimo de qualidade.

QUESTÕES ALHEIAS À ESCOLA QUE LEVAM À EVASÃO

Faz-se necessário citar como principais questões: cansaço ligado ao


trabalho precoce, desinteresse intrínseco e desestruturação familiar e a própria
contexto da não valorização.

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O alunado noturno é na sua maioria provem da classe trabalhadora,
comumente, vem das camadas sociais mais desfavorecidas financeiramente tendo
que trabalhar durante o dia, cumprindo uma longa jornada de trabalho. Acaba por
chegar à escola, fadigado e sem motivação para os estudos. Esse fato leva à
diminuição do rendimento escolar. A oferta de trabalho é atraente na região onde a
escola está situada, fator que também contribui para o aumento dos índices de
abandono, por causa da confecção do jeans.
168
É oportuno aludirmos que a situação de muitos da modalidade da EJA,
estarem com idade superior aos dezoito anos, estarem inseridos em outras
responsabilidades, além do trabalho diurno, atrelado aos afazeres de natureza
doméstica, fatores estes que culmina com o fracasso escolar, sem falarmos nas
fragilidades do ensino noturno em cujos aspectos curriculares e metodológicos não
oferecem situações de aprendizagens significativas.
Como principal fator fomentador de evasão está o desinteresse intrínseco dos
alunos, frente ao exposto não podemos rotular esses alunos de incoerentes neste
contexto Souza (2004) afirma que:
Os saberes, construídos nos processos educativos (escolares ou não) podem
contribuir de maneira significativa para ressocialização de adolescentes, jovens,
crianças e adultos que participam de organizações sociais ou que iniciem sua
escolarização ou a retomem. A ressocialização, enquanto processo de recognição e
reinvenção permanentes, garante a educação ao longo de toda vida, isto é, a luta
pela construção da humanidade do ser humano. (p.139).
Entretanto a ausência de interesse e desmotivação por parte dos alunos
está na maioria das vezes atrelado a situação didática dos professores frente à
construção do conhecimento.
É salutar enumerar várias causas do desinteresse dos alunos observados
nas escolas atualmente: o uso de aulas expositivas, a atitude autoritária ou mesmo o
descaso de professores, a falta de incentivo e de exemplos dos pais, a falta de
estrutura da escola, ou a necessidade dos alunos trabalharem para ajudar nas
despesas familiares, entre outras. A situação é ainda pior no turno da noite, quando
trabalhadores cansados pela jornada de trabalho, são submetidos a aulas muitas
vezes distantes da vida cotidiana, e focadas em avaliações classificatórias.

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O aluno da noite é de modo em particular afetado por uma carência
material e afetiva. Se atermos um olhar mais preciso a questão afetiva atêm-se as
relações familiares, em algumas situações vamos encontrar alunos que estão
convivendo com seus pais, em condições precárias.
É importante concebermos que inúmeras situações de negligência do
sistema educacional culminam para a consolidação do insucesso escolar. Entre
elas:
169
 Uma carga horária muitas vezes superior as 8 horas diárias em
condições precárias;
 Professores sem domínio de estratégias metodológicas capazes de
assegurar aulas dinâmicas;
 Currículo fragmentado sem grande aporte teórico que vislumbrasse a
realidade da clientela;
 Fragilidade das avaliações frente à construção de habilidades e
competências;

Frente ao exposto faz-se oportuno frisar que as situações acima citadas


são impedimentos a construção do conhecimento de forma prazerosa.
Dentro do contexto sociocultural existem vários fatores preponderantes
que interferem na permanência escolar, devido à sobrecarga de trabalho extensivo,
professores sem uma qualificação adequada para atender os alunos noturnos, tem
contribuído mais para a exclusão social do que para a formação educacional.
Os alunos da noite preferem aprender atividades que possam ser experiência
dos conteúdos enlatados e a aplicabilidade imediata do conhecimento adquirido é
significativa para os alunos da noite (Prado et ali. 1986), buscam nas escolas
noturnas muito mais do que instrução; buscam igualdade de oportunidades e formas
de não-exclusão.

QUESTÕES INTERNAS QUE LEVAM À EVASÃO


Adentrarmos na rotina da escola no intuito de evidenciarmos possíveis
questões que contribuem para as elevadas taxas de evasão escolar, nos propicia
uma releitura do cotidiano a partir de vários enfoques dentro os quais destacamos:

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 A estrutura dos prédios na maioria das vezes nos deparamos com
escolas em condições precárias de funcionamento, salas superlotadas
e de péssima ambiência;
 As faltas constantes dos professores que na maioria das vezes não
fazem a reposição das aulas a fim de garantir os 200 dias letivos e 800
horas;
 Falta de tempo por parti dos alunos em casa na realização de suas
170
atividades complementares;
 Calendário escolar unificado município com estado sem contemplar a
realidade local.

A legislação educacional atual não prevê organização e funcionamento


diferenciado para o turno da noite (LDB, 1996), supondo que a realidade social nos
diferentes turnos é uma só. A rigidez dos horários de entrada e saída, a infrequência
dos professores, o elevado número de alunos por classe, a falta de pessoal
administrativo indispensável e mesmo a disposição das disciplinas no horário
representam barreiras de difícil superação para uma população estudantil que, na
maioria das vezes, encara as aulas noturnas como uma segunda ou terceira jornada
de trabalho (Rodrigues, 1994).
O currículo do ensino noturno, não tem identidade própria, é
inadequada às necessidades e interesses dos alunos e não considera o contexto
econômico, social e cultural de onde os alunos residem.
Capacitar os educadores não é o suficiente, é necessário que se faça
uma política econômica que possa ingressar cada cidadão no campo de trabalho,
pois a baixa estima destes jovens e adultos é um dos pontos mais negativos na
história de vida de cada um. A escola para muitos não tem sentido, pois já sofrem e
sentem-se excluídos da sociedade, sem perspectiva de vida futura. Alguns se
tornam dependentes de drogas ou comerciantes deste produto para sobreviverem e
terminam na marginalidade ou no mundo do crime; outros abandonam a escola e
buscam trabalho para sobreviverem de forma digna. Entretanto, por falta de tempo,
ou até mesmo por desconhecimento das atividades dos alunos e de suas
expectativas, esses conteúdos são trabalhados da mesma forma que nos cursos

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diurnos. São colocados os mesmos tipos de exercícios, e são utilizados os mesmos
livros didáticos, textos ou apostilas que nada trazem para o atendimento das
necessidades desses estudantes. Isso provoca desinteresse e incentiva a conversa
entre os alunos, não motivando situações de aprendizagem significativas.
A ausência do conhecimento, por parte dos professores, das situações
cotidianas vividas pelos alunos do ensino noturno, deixa de estabelecer a ponte
entre o conhecimento sistematizado da Escola e o conhecimento do cotidiano
171
impregnado do senso comum produzido pelo trabalho.
O fundamental é que professor e alunos saibam que a postura deles, do
professor e dos alunos, é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada,
enquanto fala ou enquanto ouve. O que importa é que professores e alunos se
assumam epistemologicamente curiosos ( Prado – 1986 - p.86)
O contexto metodológico e político do ensino para jovens e adultos tem
que ser contemplado com práticas que atendam as perspectivas de seus
educandos, estimulando-os e motivando-os de forma consciente. É preciso rever
alguns pontos do sistema de ensino da escola noturna, que necessita de uma
profunda avaliação tanto no que se refere às metodologias aplicadas, como também
os motivos que estão contribuindo pata o crescimento da repetência e evasão
escolar.

DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO

O processo de seleção pelo Campo de Investigação conforme foi descrito


anteriormente, tem seu cerne na compreensão dos elementos que impedem a
permanência dos alunos na escola no horário da noite. Trabalho foi elaborado tendo
em vista não só diagnosticar causas, mas compreender o fenômeno e apontar
situações de intervenção. Uma vez fundamentados nas concepções teóricas da
qualidade da educação e dos pressupostos metodológicos da investigação. Foi
criado todo um passo a passo para fins de direcionamento dos trabalhos. Quanto à
participação, devemos ressaltar que nosso trabalho ateve-se a pesquisa com alunos
das seis turmas do Ensino Fundamental do turno da noite.

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O tipo de investigação que se propõe é descritivo, observando-se a fala
dos autores e conceitos com relação ao estudo feito. A pesquisa traz um percentual
de 54% de alunos efetivamente matriculados de universo de 180 alunos, sendo o
percentual da amostra com histórico de evasão.
A abordagem metodológica visa percorrer o caminho da pesquisa
qualitativa, pois o meu interesse está voltado para o comportamento dos alunos.
De um universo de 05 unidades que oferece o Ensino Fundamental a
172
noite na cidade de Toritama - PE, optei por pesquisar apenas em uma escola. A
pesquisa será desenvolvida também com a equipe gestora.
A Escola Municipal Edgar Torres, encontra-se sediada no município de
Toritama-PE. Encontra-se sob à égide da Secretária Municipal de Educação,
atualmente atende a uma clientela de 720 alunos distribuídos pela educação infantil
e ensino fundamental do 1º ano ao 9º ano. Compõe o corpo técnico, uma Gestora,
uma Secretária cinco supervisores e 20 professores que atam frente o processo de
ensino aprendizagem.
O perfil da clientela atendida pela escola é formado pelos moradores
entorno da escola, na grande maioria filhos de pessoas com escolarização mínima,
ou seja, até a 4º série do antigo ensino fundamental.

ANÁLISE DOS DADOS E DISCURSÃO

No momento que passamos a investigar o cenário percebemos os seguintes


pontos:
 Uma vez analisado a idade- série, percebemos que 100% dos alunos
encontram-se com distorção idade-série;
 Em relação aos motivos que os levaram a estudar à noite 85% responderam
que o principal motivo foi o trabalho, enquanto 15% por vontade própria;
 Quanto ao mês mais propício ao abandono, 70% aludiram o mês de
novembro, 15% outubro, 10% dezembro, 5% outros. No mês de novembro os alunos
já fadados ao fracasso e preferem desistir a serem reprovados;
 No item faixa etária dos evadidos percebemos que 75% estão entre 15 e 16
anos, 15% com 17 anos e 10% maiores de idade;

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 Nos motivos principais da evasão foram evidenciados 50% ausência de
aprendizagem, 25% sem estímulo e 25% trabalho;
 Questionados sobre algumas estratégias para assegurar a permanência na
escola, 100% responderam que não tem conhecimento;
 Em relação à rematrícula no ano seguinte percebemos que 60% dos alunos
desejam prosseguir nos estudos, 30% pensam que o ano vai ser diferente e 10%
influência dos amigos;
173
 Questionados sobre o ambiente escolar temos o seguinte posicionamento:
50% organizado, 30% desorganizado e 20% regular;
 Indagados sobre o que é uma escola atrativa responderam: 70% aquela que
oferecer um bom ensino, 20% professores qualificados e 10% disciplina;
 Em relação à equipe gestora foi informado por meio de questionamento que:
100% informaram que existe no Projeto Político Pedagógico ação de combate a
evasão escolar;
 Frente ao monitoramento da frequência dos alunos, 100% informaram que
não há nenhuma prática de monitoramento;
 Indagados se há alguma cobrança por parte da Secretaria Municipal de
Educação para minimizar a evasão escolar, 100% informaram que sim.

CONCLUSÃO

O processo de evasão aparece como uma prática normal ao contexto da


escola desta forma pode visualizar o quanto a educação não é levada a sério por
algumas escolas.
Entre os fatores analisados a distorção idade-série culmina como um fator
decisivo no histórico de fracasso dos alunos. Percebemos que a clientela estudada
ampla maioria já trabalha o que leva de certa forma a uma autonomia. Porém uma
parte que merece destaque é que 60% dos alunos apontam a ausência de
aprendizagem como fator decisivo na hora de deixar a escola, seguido da ausência
de uma estratégia para assegurar a permanência na escola, segundo os alunos.
Quanto a análise das respostas da Equipe Gestora, percebemos que há no
Projeto Político Pedagógico, uma ação voltada para o combate a evasão, no

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entanto, a ausência do monitoramento favorece os altos índices de evasão, uma vez
que não há possibilidade de conversar em tempo hábil, com o evadido e possibilitar
uma volta a escola.
O Ensino Fundamental noturno é igualado ao diurno, quanto ao currículo, mas
em termos de estrutura psicopedagógica deixam a desejar, uma vez que os alunos
do turno noturno precisam do máximo de estímulos para vencer o cansaço e o
fracasso dos anos anteriores. Faz-se necessário de uma qualificação urgente dos
174
professores, uma ressignificação da prática pedagógica e a utilização de uma
sistemática de monitoramento do desempenho acadêmico dos alunos.
A referida pesquisa veio corroborar dados já levantados em pesquisas
anteriores de cunho bibliográfico. A Secretaria Municipal de Educação deveria traçar
um projeto de intervenção para fins de minimização dos elevados índices de evasão
no ensino fundamental noturno. Em nível de escola a utilização de momentos de
reflexão entre professores e alunos pode fomentar uma atmosfera otimista, seguido
de ações de correção de fluxos:

REFERÊNCIAS

Constituição da República Federativa do Brasil de 1998. Disponível em <


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/contituicao/constitui%C3A7ao,htm>.Acesso em:
20 mar. 2010.
CARVALHO, Célia Pezzolo de. Alternativas para o trabalho pedagógico voltado
ao ensino noturno.Série idéias, pp.75-89, São Paulo: FTD, 1998.
_____. Ensino Noturno: realidade e ilusão. Polêmicas do nosso tempo. 2° Ed.,
São Paulo, Cortez, Autores Associados, 1984.
MARQUES, Maria Ornélia da Silveira . Escola noturna e jovens (1995). Disponível
em <
http://www.anped.gov.br/redigital/rbde05_6_08_maria_ornelia_da_silveira_marques.
pdf>. Acesso em : 08 maio 2010.
PRADO, Edgar Aristides A.et al. Alguns aspectos da implantação do projeto
Noturno. Cadernos edes, São Paulo, Cortez,v.16,p 57-60, 1986.

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RODRIGUES, A. HÉRAN, C. A. (2000): A Educação Secundária no Brasil:
Chegou a hora. 1ª ed. Washington, D. C.: Banco interamericano e Desevolvimento
– Banco Mundial.
SOUZA, JOÂO FRANCISCO. E a Educação : O quê ?; a Educação na Sociedade
e / ou a Sociedade na Educação. Recife: Bagaço, 2004.
TOGNI, Ana Cecília. A Escola Noturna de Ensino Médio no Brasil (2007).
Disponível em http://www.rieoei.org/rie44a04.htm>. Acesso em: 24 abr. 2010.
175

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CULTURA POPULAR E LETRAMENTO: PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NOS

ANOS INICIAIS

Rozineide Iraci Pereira da Silva 27 | Nair Alves dos Santos Silva 28 | Maria Aparecida
Dantas Bezerra 29 | Diógenes José Gusmão Coutinho 30

RESUMO: O presente estudo retrata uma pesquisa realizada junto ao corpo de professores
176
que lecionam na educação básica dos anos iniciais em uma escola da zona rural de uma
cidade do agreste pernambucano, uma vez que há dificuldades na prática de leitura e na
aprendizagem nessa escola, pois o processo de construção da leitura das crianças dos anos
iniciais vem se tornando um grande desafio para os educadores. Os professores buscam na
cultura popular da localidade atividades motivadora para enriquecer as práticas do
letramento. Tem-se como objetivo geral analisar a cultura popular e as práticas do
letramento nos anos iniciais do ensino fundamental. A leitura e escrita enquanto objeto
sociocultural de conhecimento está presente nas mais diversas situações cotidianas que
circundam a vida da criança, e, por isso, desde muito cedo, a criança passa a refletir e a
formular hipótese sobre ambas, antes mesmo de lhe ser formalmente apresentado. Optou-
se por uma abordagem de estudo de caso, como coleta de dados a utilização de um
questionário semiestruturado, com respostas subjetivas sobre a temática. A análise dos
dados foi feita a partir da interpretação dos questionários e os resultados mostram que os
professores vivenciam a cultura popular com êxito nas suas práticas pedagógicas e alguns
alunos não leem bem, devido à falta de apoio familiar porque a maioria é analfabeta e o
processo de ensino e aprendizagem fica prejudicado, uma vez que para o processo de
conhecimento aconteça de forma eficaz, faz-se necessário promover práticas constantes de
leitura visando uma aprendizagem significativa dentro e fora da escola. Precisamos rever a
própria maneira de ver a educação, principalmente no que diz respeito a formar leitores
letrados. O estudo também revelou à necessidade de se trabalhar a expressividade, a
oralidade e outros instrumentos que ofereçam ações e atividades para os alunos estarem
aptos a atribuírem significados na aprendizagem, proporcionando na cultura popular práticas
educativas no cotidiano escolar.

Palavras-chave: Cultura Popular. Letramento. Prática Pedagógica.

27
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre em Ciências da
Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas
College University. Lattes: http://lattes.cnpq.br/6545566162309530, (neide-silva96@hotmail.com).
28
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre em Ciências da
Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas
College University. E-mail: bvnairalves@gmail.com
29
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre
em Ciências da Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da
Educação pela Atenas College University. E-mail: cidaraulinho@hotmail.com
30
Biólogo-UFRPE, Mestre em Biologia-UFPE, Doutor em Biologia-UFPE, Professor do
PPG/Faculdade ALPHA e do Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA, Recife-PE-Brasil. ORCID ID:
https://orcid.org/0000-0002-9230-3409. E-mail: gusmao.diogenes@gmail.com.

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INTRODUÇÃO

As dificuldades de leitura e escrita subsidiam o professor com elementos para


uma reflexão contínua sobre sua prática. O processo da cultura popular nas práticas
de leitura escrita das crianças nos anos iniciais da educação básica vem se tornando
177
um grande desafio para os educadores. O papel desempenhado pela escola para a
constituição de alunos letrados, especialmente aqueles oriundos das classes
populares, apontam estratégias de práticas de letramento presentes na sala de aula,
dirigidas as crianças de oito a dez anos de idade.
A motivação para esta pesquisa emergiu das atuais demandas para os usos
da escrita e da leitura e das crescentes dificuldades apresentadas por alunos diante
suas culturas. As culturas populares aos bens culturais, de forma geral, e a
tecnologia do ler e escrever, em particular, tem sido uma reivindicação histórica de
diversos setores sociais comprometidos com as transformações e a superação de
desigualdades ainda presentes na sociedade brasileira, onde o povo rico em cultura
popular e não letrados.
Vale dizer que, embora a escola seja o local privilegiado da apropriação do
conhecimento, mas ela não é o único na sociedade. Assim, as questões colocadas
pautam-se em investigar como as práticas letradas se fazem presentes nos meios
populares e de que forma as relações família e escola são tocadas por essas
práticas. O impacto dos estudos sobre o letramento para as práticas alfabetizadoras.
O resgate e o incentivo da leitura são sós o exercício para formar leitores que leiam
por prazer, proporcionando a aprendizagem da mesma, servindo de estímulo e
satisfação para que a criança perceba a importância da leitura para o processo do
letramento em sua vida.
O tema foi escolhido, diante da dificuldade de alguns alunos na hora de
interpretar ou redigir um texto, apontando para a não valorização da leitura nos
primeiros anos escolares, buscando na cultura popular uma base estrutural dessa
prática de leitura e escrita. Como grande número de alunos que chegam ao ensino
fundamental sem o domínio da leitura, o estudo visa investigar quais são os fatores

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causadores da defasagem do aprendizado da leitura e ainda reconhecer estratégias
facilitadoras na superação dessas dificuldades.
Justifica-se esta pesquisa através das dificuldades das práticas de leitura e
escrita na aprendizagem dos alunos dos anos iniciais em uma escola da zona rural
de uma cidade do agreste pernambucano, sendo observadas, na escola, as
dificuldades dos alunos de se expressarem diante sua cultura perante a comunidade
local, e muitos discentes com deficiência na leitura e escrita das palavras, devido à
178
maneira de falar no seu cotidiano no convívio social.
Na visão de Freire (2011), Soares (2009), Brandão (2006) educar alguém é
processo dialógico, um intercâmbio constante. A leitura é um objeto sociocultural de
conhecimento e, sendo assim, está presente nas mais diversas situações cotidianas
que circundam a vida da criança e, por isso, desde muito cedo a criança passa a
refletir e a formular hipótese sobre ambas, antes mesmo de lhe ser formalmente
apresentado, constantemente, a criança estará em contato com a leitura.

1. DESENVOLVIMENTO

1.1 CULTURAS POPULARES E EDUCAÇÃO

A escola contribui para a formação integral do indivíduo um dos seus papéis


em linhas gerais, formar leitores críticos e que compreendam o mundo em que vivem
o popular olhando pela riqueza cultural do folclore que se refere à tradição e
criatividade para a melhoria da educação a cultura popular apresentada muito
recentemente pelos folcloristas, atividades riquíssimas para a aprendizagem visando
valorizar a cultura popular da região buscando meios motivadores para educação.
Não se trata de aprender apenas a ler e escrever em uma língua, como nos
programas tradicionais de ensino, mas antes de aprender a ler o seu próprio mundo
através de sua própria cultura e a se comunicar-se com o outro como um sujeito
consciente perante a sociedade.
Segundo MONDIN (2005, p.195), “a cultura é um fenômeno múltiplo ao qual
podem ser proferidas várias definições. Contudo, o pensador italiano em questão
chama a atenção para duas concepções extraídas da Enciclopédia filosófica”. O

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autor destaca que a Cultura pode ser entendida tanto do ponto de vista subjetiva
quanto do ponto de vista objetiva.
São infinitas as possibilidades do uso da cultura nas práticas de letramento,
pois há várias alternativas de exploração desse território tão rico que envolve a
cultura em seus mais diversificados aspectos, seja ela qual for despertando na
criança o prazer e o contato com a leitura e escrita do ser humano através das
culturas populares de sua região. Este caminhar paralelo é inevitável, pois esta
179
variedade de grupos que enriquece o vocabulário popular nas diversidades de suas
manifestações culturais de cada região.
Segundo Freire:

O tema da linguagem é um dos temas da cultura e dos mais importantes,


porque a linguagem tem a ver com a gente mesmo, com a identidade
cultural, enquanto indivíduo e enquanto classe. Eu sou a minha linguagem
não tem dúvida disso. É indispensável que a professora testemunhe ao
menino popular que o jeitão dele dizer as coisas também faz sentido, é
bonito e tem sua própria gramática, ainda que ela lhe ensine outra forma de
escrever. (FREIRE, 2011, p. 15)

A educação popular almeja realizar em sua escala e ao longo de seu


currículo, a valorização dos conhecimentos adquiridos dos alunos no seu cotidiano.
A vocação reside a aprender, a saber, no partilhar o saber, no transformar vidas, nos
mundos sociais por meio de um saber tornado ação, e uma ação coletiva vivida
como projeto de transformação diante da cultura popular. É necessário descartar,
por outro lado, a visão naturalizada de família entendendo-a como uma construção
histórica e social, trata-se de uma questão ética construir juntamente com as famílias
das camadas populares práticas educativas que garantam às suas crianças a
permanência na escola e o sucesso escolar.
No entanto, lembra Burke:

Responder “não” é negar diferenças palpáveis, mas responder “sim” talvez


seja exagerá-las. Pode ser mais esclarecedor pensar em termos de culturas
ou ‘subculturas’ femininas mais ou menos autônomas ou demarcadas.
Serão mais autônomas sempre que as mulheres forem mais segregadas
dos homens; por exemplo, nos conventos, no mundo mediterrâneo
tradicional ou na cultura islâmica (BURKE, 2010, p. 41).

A escola cumpre um papel importante no processo de introdução das crianças


das camadas populares na cultura escrita que, embora não possa ser visto de forma

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dicção das culturas orais, se guia por regras diferentes. Aproveitar os conhecimentos
que os alunos já possuem e que costumam envolver o reconhecimento global de
algumas palavras caso contrário, a primeira tarefa da escola será a de proporcionar
oportunidades para que esse conhecimento seja valorizado e respeitado por todos.

1.2 CULTURAS POPULARES NAS PRÁTICAS DE LETRAMENTO

180
O que mais motiva uma criança a ler é ver um adulto lendo, daí a importância
do exemplo. O aluno precisa ser orientado a ler desde a infância, quando aprenderá
ler apenas interpretando gravuras, sequenciando fatos, identificando as ideias
contidas no texto representativo, observando a localização do ambiente, as cores
referentes à situação, delimitando as várias partes do texto como início, meio e fim.
A escola em seu cotidiano busca a valorização da cultura popular dos alunos para
explorar a valorização dessa cultura na educação. Esse tipo de leitura é importante
porque desperta a atenção da criança, faz com que ela exercite sua mente através
da percepção e da valorização cultural do meio social.
Segundo Soares:

[...]. Um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema


simbólico e enquanto tecnologia; em contextos específicos. As práticas
específicas da escola, que forneciam a parâmetros de prática social
segundo a qual o letramento era definido, e segundo a qual os sujeitos eram
classificados ao longo da definição apenas com tipos de práticas e forma de
utilizar o conhecimento sobre a escrita (SOARES, 1999, p. 19).

Que a escola deve ajudar os alunos a desenvolver a maturidade do leitor é


algo que se constitui através de um longo processo de aprendizagem Soares (1999).
A respeito das formas viáveis de leitura com o objetivo de pô-las em práticas no
cotidiano escolar, de modo a transformar a cultura do alunado em indivíduos
questionadores, situando assim na realidade que lhes é imposta.
As histórias alimentam as brincadeiras de faz de conta das crianças, pois
ampliam o vocabulário cultural. É como num passe de mágica, as crianças viram
reis, rainhas e demais personagens que ganham vida e contexto nas culturas
populares vivenciadas no espaço educacional.

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A escola deve adequar-se para criar programas, métodos e um ambiente
agradável onde o prazer em aprender seja mais forte que os sentimentos negativos
que acompanham o aluno, onde o respeito à diversidade e ao ritmo de cada um,
seja respeitado e avaliado para o replanejamento das ações educativas nas práticas
do letramento. Aprender ler e escrever implica não apenas em suas culturas, mas a
responsabilidade de usar esse conhecimento em benefícios de forma de expressão
e comunicação possíveis, reconhecidas, necessárias e legítimas em um
181
determinado contexto cultural.
A cultura popular é uma categoria do povo, que passa de geração em
geração. Vários autores refletem de forma crítica sobre as concepções e os estudos
relativos ao conceito de popular no século XX. Segundo Canclini (1989), destaca a
importância da desconstrução do popular para posteriormente reconstruir este
conceito. Para o autor a cultura popular foi excluída da sociedade que não têm
patrimônio ou não conseguem que ele seja reconhecido e valorizado para a
conservação da cultura de um povo. Portanto o popular, olhando pelo prisma do
folclore, é o que se refere à tradição cultural na educação popular.
Segundo Freire:

E o que dizer, mas, sobretudo que esperar de mim, se, como professor, não
me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao
gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos e
a própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem
não significa, na verdade que, porque professor me obriga a quere a todos
os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não me
assusta que não tenho medo de expressá-la. Significa esta abertura ao
querer bem a maneira que tenho de autenticamente selar o meu
compromisso com os educandos, numa prática específica do ser humano
(FREIRE, 2011, p. 141).

Dessa forma, a atualidade de cada cultura de sua localidade depende dos


conhecimentos adquiridos de cada geração cultural, pois a educação está a cada dia
buscando argumentos para a melhoria da aprendizagem dos estudantes partindo de
seus conhecimentos culturais para a atualização das culturas populares na
sociedade. O que equivale dizer que a cultura popular se explica pelo paradigma
temporal, isso não significa que o atual é o mais recente, mas o que persiste e faz
sentido na atualidade. Logo, o atual transcende a temporalidade do agora.
Neste sentido Brandão escreve:

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A educação popular emerge como um movimento de trabalho político com
as classes populares através da educação. Diante de um modelo oficial de
educação compensatória, a educação popular não se propõe originalmente
como uma forma ‘mais avançada’ de realizar a mesma coisa. Ela pretende
ser uma retotalização de todo o projeto educativo, desde um ponto de vista
popular (BRANDÃO, 2006, p. 75).

Nessa perspectiva, o pensamento de Brandão se faz atual entendido como


qualidade daquilo que acompanha o momento presente, sobretudo pelo quadro
182
social de opressão que permanece.
Do ponto de vista estrutural, conservam-se aspectos sociais, culturais,
políticos e econômicos que negam as potencialidades e o fortalecimento das classes
populares e seus reais interesses, onde a educação passa pela a cultura popular
nos seus conteúdos nas atividades escolares para alcançar com êxito a
aprendizagem social e cultural, buscando a atualização de cada cultura.

METODOLOGIA

Esse trabalho é o resultado de observações de pesquisas teóricas e práticas


pedagógicas em relação à cultura popular e letramento observando a aprendizagem
da leitura e escrita em duas salas de aula na zona rural, nos anos iniciais da
educação básica. Para a realização deste trabalho foram pesquisados o ambiente e
o contexto da escola, além de serem explorados conceitos, concepções e
fundamentação teórica relacionada à temática.
Tomando por base metodológica a pesquisa qualitativa, trata-se de um estudo
de caso com ação participativa realizada através de questionários que foi aplicado
na escola municipal da zona rural de uma cidade do agreste pernambucano,
destinando-se a apresentar o discurso de 2 (duas) professoras.
Foram escolhidas apenas essas educadoras porque a escola é da zona rural
e só trabalha essas professoras com turmas multisseriadas, foram entregues
questões no que diz respeito à cultura popular e letramento nas práticas
pedagógicas nos anos iniciais, bem como a contribuição da pesquisa na formação
de leitores letrados.

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O estudo de caso teve por objetivo o exame detalhado de um ambiente, ou de
um local, e de uma situação, de um determinado objeto, ou, simplesmente de um
participante de uma situação. Pode, então, ser conceituado como um modo de
coletar informação específica e detalhada, frequentemente de natureza pessoal,
envolvendo o pesquisador, sobre o comportamento de um indivíduo ou grupo de
indivíduos em uma determinada situação e durante um período dado de tempo.
Segundo Gil (2017), trata-se de uma forma de se fazer pesquisa investigativa
183
de fenômenos dentro do contexto real, em situações em que as fronteiras entre o
fenômeno e o contexto não estão claramente estabelecidas. Ainda de acordo com o
autor, o estudo de caso é caracterizado pelo estudo a permitir conhecimento amplo
e específico.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

As professoras relataram que o incentivo das práticas pedagógicas nos anos


iniciais diante a cultura popular e letramento, ocorre no cotidiano escolar perante as
atividades diversificadas em sala de aula. Que são através das atividades lúdicas,
revistas, livros didáticos e paradidáticos e principalmente partindo do conhecimento
do aluno que podem ser trabalhadas na sala de aula, textos diversos, utilizando
métodos atrativos buscando na cultura popular práticas motivadoras das gerações
para alcançar com êxito o letramento. Mostrando para o aluno que é importante o
uso da leitura, uma vez que a leitura e produção escrita caminham juntas. Paulo
Freire introduz uma questão importante que nos sinaliza como construir
possibilidades nesse sentido, na medida em que passamos a “dialogar sobre a
negação do próprio diálogo”. (FREIRE, 2011, p. 71). Contudo, a importância das
culturas populares nas práticas diárias das escolas está cada dia, mas exitosas na
aprendizagem do aluno. As professoras buscam dialogar com os estudantes seus
conhecimentos culturais para colocar em práticas nas produções textuais. A sala de
aula bem organizada e com acervo de qualidade para a formação do leitor, a leitura
e escrita como uma prática social e cultural a ser resgatada pela escola, a mediação
do professor na formação do leitor experiente e o dicionário como grande aliado para
as atividades de leitura na sala de aula e na vida em sociedade são fatores

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imprescindíveis para desenvolver o hábito de um bom leitor nas práticas
pedagógicas e a construção do seu saber crítico.
A cada dia as culturas populares estão sendo vivenciadas na escola para a
melhoria da qualidade da educação. Na visão de Brandão (2002) as práticas
pedagógicas devem ser construídas a partir do conhecimento do aluno, por meio de
diversas situações e instrumentos, do processo de um saber orgânico das classes
populares. O valor da essência de cada criança é o alicerce para a aprendizagem
184
escolar diante a sociedade. As culturas populares são de suma importância nas
atividades de leitura e escrita.
Segundo Burke (2005), a atenção do professor deve concentrar-se na
interação do meio e não na divisão entre elas. A escola precisa estimular a cultura
popular e buscar meios na valorização de cada aluno sem deixá-los fora de um
contexto social junto à sociedade letrada. A cultura do povo se apresenta sempre
como um conjunto misto que reúne para a vida social e cultural.
Os alunos relataram que as professoras trabalham com várias diversidades
de leitura vivenciada na escola e outras fontes que são trabalhadas na sala, textos
diversos, utilizando métodos atrativos sempre partindo do contexto que o aluno está
inserido, mostrando para o aluno que é importante o uso da leitura, uma vez que a
leitura e produção caminham juntas.
Verificamos que a maior parte dos educandos gosta de ter acesso a diversos
tipos de textos. O domínio da língua oral e escrita é fundamental para a informação,
expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz
seu próprio conhecimento e que todos os entrevistados citaram vários pontos
positivos da cultura popular da sua comunidade, que os professores vivenciam no
espaço aula para a valorização e a preservação das massas populares no contexto
escolar. Constatamos com a pesquisa que existem atividades criativas e atraentes,
onde todos participam da prática de leitura, tendo o professor intuito de envolver e
direcionar o aluno a essa prática.

CONCLUSÃO
Com esta pesquisa, os resultados mostram que as professoras vivenciam a
cultura popular com êxito nas suas práticas pedagógicas. Com atividades

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diversificadas no cotidiano escolar, a coleta de dados, revelou que há dificuldades
nos discentes, tanto na leitura quanto na escrita, relacionado ao convívio da
realidade interna e externa dos alunos, professor, escola, família e o meio. Sabe-se
que ensinar a ler e escrever é necessário, principalmente a crianças para a
valorização do meio social e cultural. Só aprendemos quando aquilo que
aprendemos tem significado para nós, partindo do conhecimento real do aluno como
nos aponta na visão Freiriana.
185
Os resultados permite perceber que o professor deve oportunizar situações
de ensino-aprendizagem que envolva a leitura e a escrita como objeto social do
conhecimento. Sempre partindo do conhecimento prévio dos alunos. A criança
desde que entra na escola deve participar de atos de ler e escrever na produção de
textos coletivos e individuais, vivenciar momentos de leitura realizados pelo
professor, tendo oportunidades de perguntar, explorar e confrontar suas hipóteses
com os outros, tendo oportunidades de construir sua própria leitura e escrita.
A realização dessa pesquisa demonstrou a necessidade de alguns
professores em trabalhar a cultura popular e letramento nas práticas pedagógicas
sua maneira de como aplicar práticas de leitura em sala de aula, pois os professores
precisam de apoio da família, coordenadores, comunidade local para expandir e
preservar a cultura popular através das danças, dramatizações teatrais, produções
de poesias e confecção de cordéis para expor na escola para a valorização do
acervo dessas culturas no mundo letrado.
Dificuldades sempre existiram e sempre existirão, mas que não sirvam de
estímulo para priorizar uma política efetiva de construção de leitores. Que essa
responsabilidade não fique apenas a cargo dos professores, sendo dever de todos
por uma educação de qualidade. Enfim, para que o processo de conhecimento
aconteça de forma eficaz, faz-se necessário promover práticas constantes de leitura
visando uma aprendizagem significativa.
Portanto, precisamos rever a nossa própria maneira de ver a educação,
principalmente no que diz respeito a formar leitores letrados. O estudo revelou a
necessidade de trabalhar a expressividade, a oralidade, para que os alunos possam
redigir e interpretar textos fluentemente, instrumentos que ofereçam ações e
atividades para os mesmos estarem aptos a atribuírem significados na

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aprendizagem, proporcionando atividades criativas e motivadoras para o prazer de
ler e escrever por prazer. O importante é que as crianças não percam o contato
prazeroso com o mundo da leitura e da escrita, onde as mesmas estejam ligadas
aos diferentes contextos de letramento.

REFERÊNCIAS

186
RANDÃO, Carlos Rodrigues. A educação popular na escola cidadã. São Paulo:
Editora Vozes, 2002.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação Popular. São Paulo: Brasiliense,


2006. (Coleção Primeiros Passos).

BURKE, P. O que é história cultural? Trad. Sérgio Góes de Paula. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2005.

BURKE, P. Cultura popular na Idade Moderna. Trad. Denise Bottmann. 2. ed. São
Paulo: Companhia das Letras, 2010.

CANCLINI, N. Culturas híbridas. São Paulo, Edusp, 1989.

FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a Liberdade e outros Escritos. 14. ed. São
Paulo: Cortez, 2011.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completem.


51. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. 43. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. 34. ed. São Paulo: Paz e
Terra, 2011.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 6.ed – São Paulo,
Atlas, 2017.

MONDIN, Batista. O homem: quem ele é? Elementos e antropologia filosófica. 12.


ed. São Paulo: Paulus, 2005, p. 195.

SOARES, Magda. B. Aprender a Escrever, Ensinar a Escrever. IN ZACCUR. É.


(ORG.). A Magia da Linguagem. Rio de Janeiro: DPEA, 1999.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 3.Ed.. Belo Horizonte:


Autêntica, 2009, p. 124.

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POLÍTICAS CURRICULARES E BNCC: NOVAS DIRETRIZES PARA O
TRABALHO PROFÍCUO DA LEITURA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL

Mirian Marta da Silva Cavalcante31 | Eliete Braz de Moura Melo32 | Margarete Maria
Gonçalves Tabosa de Oliveira33

RESUMO: O novo modelo da Política de Currículos atrelada à Base Nacional Comum


Curricular é uma asserção que está em evidência pela sua iminente implementação em 187
nosso País. O presente estudo objetiva uma retrospectiva em relação às políticas
curriculares que surgem desde a criação da Constituição Federal de 1988 quando
responsabiliza o Estado pela igualdade dos cidadãos no país. Assim, evidenciamos com
estudos e constatações os documentos geradores de uma proposta curricular que venha
atender a demanda de todos os estudantes. Essa pesquisa resultou em teorias sobre a
elaboração e aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) mostrando desde o
momento da sua necessidade de criação e expondo como ela trará benefícios nas aulas de
Língua Portuguesa por descrever o modelo de leitor que almejamos para o século XXI. Para
confrontar teoria e prática lançamos mão de uma pesquisa qualitativa com questionários
aplicados a três professores de escolas distintas em um município do Agreste de
Pernambuco e obtivemos respostas auspiciosas em relação à efetivação da Base em nossa
Nação.

Palavras-chave: Políticas Curriculares. Base Nacional Comum Curricular. Leitor proficiente.

1 INTRODUÇÃO

O debate sobre a precisão de se criar um documento legal no Brasil que


viesse nortear as políticas curriculares não é recente e nem surgiu agora no século
XXI. Temos uma retrospectiva exposta neste estudo que expõe diretrizes para a
educação desde a Constituição Federal de 1988 e culmina com a Base Nacional
Comum Curricular. O Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) é composto
por 20 metas e dentre elas, quatro fazem referência a melhoria da qualidade da
Educação Básica (MACEDO, 2015).
Por uma questão de validação do que está prescrito no plano, e com prazo,
houve a necessidade de fortificar a ideia de uma política curricular que contemple a
todos, escolas públicas, particulares, e dessa vez, de caráter obrigatório.

31
Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas College University.
32
Mestranda em Ciências da Educação pela Atenas College University.
33
Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas College University.

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O foco desta pesquisa é demonstrar com aportes teóricos que a ideia de uma
educação que privilegie a todas as classes já é um assunto bem debatido e que a
postulação pela materialização na qualidade e equidade do ensino só veio a fortificar
a implementação do documento (BNCC) que não é um currículo, mas os caminhos
para a formulação dele.
Adentrando pela aceitação da nova política curricular também deixamos,
baseados em autores e alicerçados nas respostas de três professores da Rede
188
Municipal de Ensino em um munícipio do Agreste de Pernambuco (o que julgamos
primordial como amostra pública em relação ao tema em evidência), contribuições
que a BNCC trará em relação à formação do leitor proficiente que almejamos para o
século XXI e que diante dos dias em que estamos vivendo precisamos desenvolver
esse senso crítico, autônomo e autêntico em nossos estudantes.
Iniciamos com uma discussão sobre as políticas curriculares, posteriormente,
enveredamos para o novo modelo de construção de currículo balizado na BNCC e
concluímos comprovando como essa nova abordagem curricular contribuirá para o
desenvolvimento da capacidade leitora.

2 O QUE SÃO POLÍTICAS CURRICULARES?

É bem verdade que há anos o Brasil vem sofrendo em seu cenário


educacional no que diz respeito a um ensino de qualidade. Vários foram os
documentos utilizados no objetivo de nos fornecer diretrizes para a elaboração do
currículo em nossas nossas escolas. Dentre eles estão os PCN’s e as DCN’s.
Conforme o exposto:

Alguns sistemas municipais de educação em nosso País foram durante a


década de 80 e 90 os que mais buscaram empreender alternativas de
mudanças significativas em suas políticas curriculares, tais como: São
Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Ceará e outros. Inclusive o próprio
governo federal ao propor os PCN’s engaja nessa busca de mudança da
escola e da política de currículo, justificado como uma das estratégias de
enfrentamento da baixa qualidade de da educação. (FERNANDES;
ANDRADE; e SILVA, 2011, p. 01)

Mas o que seria de fato uma educação de qualidade? Acreditamos que


enverede por uma política que possibilite a todos o mesmo direito de aprendizagem

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com habilidades unificadas, e para isso, há a necessidade de se pensar em um
currículo.
Para Espindola, Leite e Pereira (2012, p.103), “o currículo é aqui entendido,
como um campo amplo de conhecimento, centrado no tempo e espaço, perpassado
pelas relações de poder, sistematizado pelas políticas educacionais.”
Entende-se, portanto, que o currículo é um produto que tem em sua essência
a participação de pessoas de influência e a partir de diretrizes estabelecidas se
189
organiza como um documento que atenderá as demandas do sujeito social.
Essa discussão já é bem antiga, tudo ficou amparado em 1988 com a
Constituição Federal que em seu artigo 3º elenca o dever do estado em:

I- Construir uma sociedade livre, justa e solidária;


II- Garantir o desenvolvimento nacional;
III- Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
IV-Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988 apud
ESPINDOLA; LEITE e PEREIRA, 2012, p.105)

Dessa forma só obteremos êxito na garantia de direitos com o cumprimento


de um currículo que privilegie a todos e assegure o direito de aprendizagem
independente de qualquer fator.
Seguindo por este viés já pudemos constatar que o assunto em estudo é um
tema vigente que surge em meio ao século XXI com o mesmo interesse posto na
Constituição Federal, porém com uma nova roupagem que visa oportunizar por
nivelamento de ensino a todos os brasileiros.

3 UM NOVO MODELO DE CURRÍCULO PAUTADO EM COMPETÊNCIAS (BNCC)

Como enfatizado anteriormente, a preocupação pelo currículo vem sendo


discutida desde a Constituição de 1998. Só que com os documentos que surgiram
para direcionar este currículo, os estados, municípios e escolas ficaram
responsáveis para seguir habilidades que mais condiziam com a sua realidade. Por
essa razão, surge em meio à educação brasileira, um documento que será
obrigatório a inclusão de suas competências nos currículos. A Base Nacional
Comum Curricular não é algo novo. Como afirmam Aguiar e Dourado (2018, p. 15):

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A temática Base Nacional Comum Curricular não é um assunto novo. Está
prevista na Constituição de 1988 para o Ensino Fundamental e foi ampliada
para o Ensino Médio com a aprovação do Plano Nacional de Educação
(PNE), a partir da Lei 13.005/2014, em consonância com a Lei nº 9.394, de
20 de dezembro de 1996 – LDB, que define as diretrizes e Bases da
Educação Nacional.

Baseados em toda a discussão, faremos aqui um resumo de todas as


políticas públicas adotadas até a chegada da base.
190

Constituição Federal
(1988)
LDB (9.394/96) PCN’s (1998)

PNE e Diretrizes
Política Curricular Curriculares
Nacional (BNCC) Nacionais (2014)

Figura 1 – Linha histórica para se chegar à Base


Fonte: Brasil (2016, p.05) – adaptação da autora

Surge em meio a todo esse cenário uma base comum, ou seja, um


documento norteador que subsidiará os municípios e estados a falarem a mesma
língua. É além da igualdade promover a equidade na qualidade do ensino dos
nossos alunos.
Sabemos que no meio educacional nos deparamos com o fluxo de
transferências dos nossos educandos, com a base, o discente que migra de São
Paulo para Pernambuco, por exemplo, não irá se comprometer nos conteúdos por
seguirem uma mesma linhagem após a base entrar em vigor.
Em paráfrase Brasil (2016), a base é um documento a ser seguido e define
em sua essência aprendizagens essenciais que os alunos devem alargar no
decorrer da Educação Básica.

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Ela foi criada com o intuito de ressignificar o processo de ensino
aprendizagem balizando assim a qualidade na educação.
É importante destacar nessa discussão que a Base não é um currículo, ela
evidencia com veemência dez competências gerais (Brasil, 2016) que a partir daí os
currículos serão adequados, em outras palavras, o MEC (2017) enfatiza que a
BNCC é um norte para que os currículos perfaçam seus caminhos.
Outro ponto a ser enfocado é que se pautou em um marco legal para sua
191
criação. A Base foi criada buscando atender o que há em algumas metas do PNE,
inclusive na meta 7, que se refere aos direitos e objetivos de aprendizagem
(BRASIL, 2016).
Dessa forma é possível constatar que o interesse por um direcionamento
único na qualidade da educação já vem há anos, desde 1988, porém só com a
implantação da Base que já está em sua terceira versão é que se tentará cumprir
com o que foi acordado. A ideia de um novo currículo é propiciar a todos uma
mesma qualidade na educação.

4 A LEITURA NOS ANOS INICIAS DO ENSINO FUNDAMENTAL E A BASE


NACIONAL COMUM CURRICULAR

A leitura como fonte indispensável no desenvolvimento do intelecto humano é


algo que perpassa os muros da escola por granjear vastas habilidades que fazem do
discente um ser proficiente, autônomo e crítico para viver em sociedade.
Dessa maneira é função do educador, enquanto mediador, promover esse
momento de interação lançando mão das atuais concepções de leitura.
É bem verdade que a leitura vem repleta de significados no atual contexto
educacional brasileiro. Há anos atrás essa prática era trabalhada como um pretexto
para se aprender a gramática ou realizar a decodificação de palavras, Colello
(2010), enfoca que esse exercício servia apenas para ligar um termo a outro,
resultando na transposição de letras em fonemas.
Hoje, a leitura surge de um novo cenário, o interacionismo. Queremos
enredar por uma nova conversa e destacar os benefícios que a BNCC trará para
essa nova perspectiva de leitura em sala de aula. Nesse sentido, Souza e Baptista

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(2017, p.183), compreendem que “entender a linguagem como interação social é um
aspecto positivo do documento norteador da BNCC.”
É importante expor que os PCN’s de Língua Portuguesa já ancoravam por
esse modelo de formação leitora.

A língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem


significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as
palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos
pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a 192
realidade a si mesmas. (BRASIL, 1997, p.22).

E com o reforço da BNCC tivemos um amparo no que concerne à formação


de leitores competentes para o século em que vivemos. Vejamos abaixo, a
descrição das competências a serem inseridas nos currículos de Língua Portuguesa.

Quadro 1 – Descrição das competências específicas de Língua Portuguesa para o


Ensino Fundamental

1- Compreender a língua como fenômeno cultural, histórico, social, variável, heterogêneo e


sensível aos contextos de uso, reconhecendo-a como meio de construção de identidades de seus
usuários e da comunidade a que pertencem.

2. Apropriar-se da linguagem escrita, reconhecendo-a como forma de interação nos diferentes


campos de atuação da vida social e utilizando-a para ampliar suas possibilidades de participar da
cultura letrada, de construir conhecimentos (inclusive escolares) e de se envolver com maior
autonomia e protagonismo na vida social.

3. Ler, escutar e produzir textos orais, escritos e multissemióticos que circulam em diferentes
campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia, fluência e criticidade, de modo a se
expressar e partilhar
informações, experiências, ideias e sentimentos, e continuar aprendendo.

4.Compreender o fenômeno da variação linguística, demonstrando atitude respeitosa diante de


variedades linguísticas e rejeitando preconceitos linguísticos.

5.Empregar, nas interações sociais, a variedade e o estilo de linguagem adequados à situação


comunicativa, ao(s) interlocutor(es) e ao gênero do discurso/gênero textual.

6. Analisar informações, argumentos e opiniões manifestados em interações sociais e nos meios


de comunicação, posicionando-se ética e criticamente em relação a conteúdos discriminatórios que
ferem direitos humanos e ambientais.

7.Reconhecer o texto como lugar de manifestação e negociação de sentidos, valores e ideologias.

8. Selecionar textos e livros para leitura integral, de acordo com objetivos, interesses e projetos
pessoais (estudo, formação pessoal, entretenimento, pesquisa, trabalho etc.).

9. Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do senso estético


para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-culturais como formas de
acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento, reconhecendo o potencial
transformador e humanizador da experiência com a literatura.

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10.Mobilizar práticas da cultura digital, diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais para
expandir as formas de produzir sentidos (nos processos de compreensão e produção), aprender e
refletir sobre o mundo e realizar diferentes projetos autorais.

Fonte: BRASIL (2016, p.85)

Podemos constatar que esse é o modelo de leitor que almejamos, pois


segundo Martins e Sá (2008), é dever da escola a formação do sujeito leitor no
século em que vivemos tendo em vista o crescimento dos desafios a cada dia.
Por isso, não podemos ter uma escola do século XXI com o modelo do século 193

XX, ou que não acompanhe a modernidade.


Formar leitores críticos nos dias de hoje é um grande desafio, principalmente,
para os professores por encontrar em suas salas de aula discentes atuais com uma
nova visão de mundo e que esperam do docente competência e um bom
encaminhamento que permita “competir” de igual para igual na sociedade sem
receio algum.
Dessa forma defendemos aqui as competências a serem desenvolvidas no
currículo de Língua Portuguesa porque é por meio do ambiente escolar que os
educandos terão contato com essa nova roupagem dada a nossa língua por se
analisar o crescimento contínuo da sociedade garantindo a todos os mesmos
direitos.
Charmeux (2000), enfatiza que o progresso estudantil é fator determinante da
capacidade leitora articulada a autenticidade e autonomia cidadã.
Dessa forma o investimento em leitura deve garantir esse sucesso e ter o
princípio da equidade a fim de garantir a aprendizagem de todos.

5 METODOLOGIA- MATERIAIS E MÉTODOS

Nosso estudo está vinculado a teorias que sustentem de maneira positiva a


implantação da Base Nacional Comum Curricular em nosso País. Optamos por uma
análise qualitativa nos utilizando de um questionário aberto com três perguntas
sobre temas relevantes abordados no presente artigo e escolhemos três professores
de Língua Portuguesa que lecionam nos Anos Iniciais de três escolas de um
município no Agreste de Pernambuco. A escolha pelos professores deu-se no intuito
de confrontar teoria e prática.

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Os educadores entrevistados possuem especialização em Língua portuguesa
com faixa etária entre 23 a 35 anos e lecionam a mais de seis anos.

6 ANÁLISE DAS RESPOSTAS AOS QUESTIONÁRIOS

Nos quadros a seguir estão as respostas obtidas pelos professores


entrevistados neste estudo.
194

Quadro 2 – Apresentação da questão 1 aplicada no questionário, e das respostas


dadas pelos professores

Resposta dos professores


Questão
1- O que é a Base P1- A Base Nacional Curricular é um documento normativo para as
Nacional Comum redes de ensino, onde encontramos referências obrigatórias para
Curricular? elaboração dos currículos escolares e propostas pedagógicas para o
Ensino Infantil e Fundamental.

P2- É um documento com o objetivo de nortear os currículos dos


sistemas, redes de ensino, as propostas pedagógicas da Educação
infantil, Ensino Fundamental e

o Ensino Médio. Concebe conhecimentos, competências e habilidades,


e são desenvolvidas durante etapas e modalidades da Educação
Básica, para uma formação humana diante de uma construção social,
justa, democrática e inclusiva.

P3- A Base Nacional Comum Curricular é um documento que visa


orientar, organizar, sistematizar o currículo escolar. Por meio dela, os
estudantes das mais diversas partes do País têm acesso no cotidiano
educacional aos mesmos conteúdos, uma mesma base, acompanhada
da parte diversificada que aborda aspectos regionais no intuito de
trabalhar a sociedade e a cultura de cada local, enriquecendo,
ampliando e valorizando o contexto histórico, econômico, social e
cultural.

Fonte: dados da pesquisa de campo

Pudemos constatar que as professoras entrevistadas já ouviram falar na Base


e tem a definição de seus objetivos com clareza ao elencarem que “é um documento
normativo ( P1)’; “ norteará os currículos e as propostas pedagógicas (P2)’’ , é
importante ressalvar na fala desta educadora que o Ensino Médio ainda se encontra
em processo, no momento, de como será trabalhado na Base, “os estudantes das
mais diversas partes do País têm acesso no cotidiano educacional aos mesmos
conteúdos (p3)”.

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Quadro 3 – Apresentação da questão 2 aplicada no questionário, e das respostas
dadas pelos professores

Questão Resposta dos professores

2- Como você vê as P1-Temos que aprofundar o nosso entendimento na Língua oral e


competências da Base escrita como instrumento de interação social no meio da 195
dentro do Ensino da contextualização para trabalharmos com toda essa dimensão em sala
Língua Portuguesa nos de aula, para facilitar a compreensão dos discentes, propor aos
Anos Iniciais? discentes um conteúdo de Língua Portuguesa por meio da leitura e no
estudo de textos sejam considerados os papéis incentivadores as
produções de gêneros predominantes.

P2- As competências da Base de ensino da Língua Portuguesa, é um


desenvolvimento rico em análise e criticidade com um olhar integral na
formação dos alunos a partir dos eixos, prática de linguagens, objeto de
conhecimentos e habilidades.

P3- As competências assinaladas na Base buscam valorizar o


conhecimento que o estudante possui, articulando-os com os conteúdos
propostos na vivência escolar. Vejo como algo positivo, pois permite
uma maior aproximação com a realidade dos estudantes, estendendo o
conhecimento escolar às suas práticas diárias com o objetivo de
expressar, expor e valorizar as ações cotidianas, intelectuais e cidadãs
dentro do trabalho com linguagens.

Fonte: dados da pesquisa de campo

Debruçados sobre as respostas dos professores temos a ligeira impressão


que o quadro com as Competências Específicas para Língua Portuguesa ainda não
foram analisadas de maneira minuciosa, porém eles atribuem às competências um
valor positivo, ao frisarem que, “ o conteúdo deve ser visto por meio de gêneros
(P1)”, “essas competências desenvolverão um olhar crítico na formação integral dos
discentes (P2)”, “serão valorizados os conhecimentos trazidos pelos alunos como
ponte para um trabalho dentro do campo das linguagens (P3)”.

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Quadro 4- Apresentação da questão 3 aplicada no questionário, e das respostas
dadas pelos professores

Questão Resposta dos Professores

3- Você é a favor da P1- Sim, pois haverá um objetivo no processo de envolver várias
implementação da Base pessoas nessa ação que revisará os currículos, os materiais didáticos e
196
Comum Curricular? Por a formação continuada, terá mais alinhamento na avaliação.
quê?

P2- De acordo com a proposta da Base, sou a favor, pois é um


documento positivo que pretende orientar a formação de professores.

P3- Sim, porque a Base serve como um norteador para a prática


pedagógica docente, auxiliando-o de forma eficiente na execução do
trabalho com os conteúdos disciplinas. A implementação da Base
sinaliza um avanço com a sistemática e qualidade da educação em
nosso país, valorizando os conteúdos essenciais ao desenvolvimento
intelectual escolar unindo-os às vivências dos estudantes, tornando
assim a aprendizagem mais significativa.

Fonte: dados da pesquisa de campo

Baseados nas respostadas obtidas pelos questionamentos é notório que os


professores participantes desse estudo apoiam a implementação da Base em nosso
país ao afirmarem que “haverá um alinhamento nos moldes da avaliação e
propostas pedagógicas (P10)”, “haverá um norte a se seguir no que diz respeito à
formação de professores (P2)”, “há a sinalização de um avanço nos sistemas
educacionais com apreciação dos conteúdos essenciais para o desenvolvimento
intelectual do estudante (P3)”.
Grosso modo, em resumo à resposta dos três professores aos questionários,
é notório a aceitação da implementação da Base, por parte deles, defendido netas
entrelinhas como um material de apoio que subsidiará a prática docente no que diz
respeito a uma melhor oferta da educação em nosso país.

7 CONCLUSÃO

No decorrer deste artigo pretendeu-se demostrar que a ideia de


implementação de uma política curricular para todos não nasceu em 2015 com a

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primeira versão da Base, mas é algo que adveio desde 1988 e protelou-se até os
dias de hoje.
Seguindo por este parâmetro, abduzimos as primeiras conclusões de que a
Base Nacional Comum Curricular é um documento norteador atual para a
elaboração dos nossos currículos com eficiência. É possível garantir essa qualidade
por poder analisar competências específicas deliberadas a serem desenvolvidas na
área de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental. São habilidades que visam a
197
compreensão e utilização de diferentes linguagens, como também a atuação crítica
frente a questões do mundo contemporâneo (BRASIL, 2016).
É nesse cenário que se esculpe a necessidade de uma nova ótica para os
nossos currículos. Sendo assim, há a necessidade de vincular currículo para a
formação humana, pois este após ser “preparado” pela escola, atuará na sociedade.
E é o currículo que define que tipo de cidadãos queremos formar. Se estamos em
uma sociedade contemporânea, não podemos estar aquém do que ela exige de
cada um de nós.
Em resumo, este estudo qualitativo denotou de maneira sucinta
considerações sustentadas em argumentos teóricos e de opinião pública (respostas
dos professores aos questionários) que dão apoios positivos a implementação da
BNCC nos moldes do nosso currículo, ofertando ao sujeito que esteja em qualquer
lugar do Brasil, uma mesma qualidade de educação, principalmente, no
desenvolvimento leitor que é o nosso foco.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, Márcia Ângela da Silva; DOURADO, Luiz Fernandes. A BNCC na


contramão do PNE 2014-2024: avaliação e perspectivas. Recife: ANPAE, 2018.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa/ Secretaria de


Educação Fundamental. – Brasília: 1997, 144p.

______. Base Nacional Comum Curricular: Educação é a Base. Disponível em:


<basenacionalcomum.mec.gov.br> Acesso em: 24 de out. 2018.

CHARMEUX, Eveline. Aprender a Ler: Vencendo o fracasso. 5. ed. São Paulo:


Cortez, 2000.

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COLELLO, Silva. Concepções de Leitura e Implicações Pedagógicas. 2010.
Disponível em: < http://www.ipm.org.br/impb> Acesso em: 23 out. 2018.

ESPIDULA, Miriam.; LEITE, Janete de Carvalho Pessoa; PEREIRA, Maria Zuleide


da Costa. O campo das políticas curriculares no brasil: a trajetória histórica da
década de 90. Espaço do Currículo, v. 5, n. 1, p. 103-108, Dezembro 2012.

FERNANDES, Jorcelina Elizabeth; ANDRADE, Éderson; SILVA, Maria Eloísa.


Política Curricular e Escolas Públicas: diferentes contextos, estratégias e
processos. Disponível em : <
https://gtcurriculote2011.wordpress.com/2011/08/27/politica-curricular-e-escolas- 198
publicas-diferentes-contextos-estrategias-e-processos/>. Acesso em: 17 out. 2018.

MACEDO, Elizabeth. Base Nacional Comum para Currículos: direitos de


aprendizagem e desenvolvimento para quem? Educ. Soc; Campinas, v.36, n 133, p.
891-908, out- dez, 2015.

MARTINS, Maria da Esperança Oliveira; SÁ, Cristina Manuela. Ser Leitor no Século
XXI- a importância da compreensão na leitura para o exercício pleno de uma
cidadania responsável e activa. Saber (e) Educar, Porto: ESE de Paula Frassinetti,
n.13, dez. 2008.

MEC. Base Nacional Comum curricular. Brasília: MEC, 2017.

SOUZA, Danilo F. S.; BAPTISTA, Felipe Barreto. O ensino de Língua Portuguesa e


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v.1, n.17, p. 177-186, dez. 2017.

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A AFETIVIDADE NO PROCESSO ENSINO APRENDIZAGEM

Nair Alves dos Santos Silva34 | Rozineide Iraci Pereira da Silva35 | Maria Aparecida
Dantas Bezerra36 | Diógenes José Gusmão Coutinho37

RESUMO: O afeto tem grande valia para o progresso intelectual da humanidade. Dessa
maneira as relações emocionais que são estabelecidas a partir do início da vida desde
favorecendo aos aspectos construtivos da personalidade, em diversos ângulos de conceitos
e da autoestima do sujeito, favorecendo lhes mecanismos ferramentas fundamentais ao 199
desenvolver sua aprendizagem e sua preservação. Este artigo aborda as relações
estabelecidas entre o aspecto de ensinar e aprender e a afetividade que estão inteiramente
ligadas ao desenvolvimento psíquico do aluno. Sendo assim a temática reflete o
relacionamento dos aspectos afetivos com a sua desenvoltura intelectual, abordando a
obrigatoriedade do corpo docente no ato de conduzir e monitorar aspectos comportamentais
e também de aprendizagem no contexto escolar. Nessa concepção o ato afetivo é um forte
contribuinte afetividade das relações presentes no cotidiano escolar, porém muitas vezes
despercebidos e considerados como não tão importante em relação aos conteúdos
abordados. Considerando que a afetividade é uma forte contribuinte nas relações cognitivas
do sujeito é notório afirmar que os sentimentos relacionados a emoções, desejos propiciam
o ato de aprender do aluno.

Palavras-chaves: Aprendizagem. Afetividade. Relação professor x aluno.

INTRODUÇÃO

Ainda no ventre materno, a criança inicia sua vida historicamente, que de


maneira gradativa será enriquecida á medida que ela for evoluindo em seu
crescimento físico e intelectual, pois começará a participar do mundo que a cerca no
aspecto de construir sua própria história.
34
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre em Ciências da
Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas
College University. E-mail: bvnairalves@gmail.com
35
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre em Ciências da
Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas
College University. Lattes: http://lattes.cnpq.br/6545566162309530, E-mail: neide-
silva96@hotmail.com
36
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA. Especialista em
Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Faculdade Escritor Osman da Costa Lins- FACOL, Mestre
em Ciências da Educação pela Universidade Gama Filho-UGF. Doutoranda em Ciências da
Educação pela Atenas College University. E-mail: cidaraulinho@hotmail.com
37
Biólogo-UFRPE, Mestre em Biologia-UFPE, Doutor em Biologia-UFPE, Professor do
PPG/Faculdade ALPHA e do Centro Universitário Brasileiro – UNIBRA, Recife-PE-Brasil. ORCID ID:
https://orcid.org/0000-0002-9230-3409. E-mail: gusmao.diogenes@gmail.com

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Nessa concepção é necessário contemplar vários aspectos que contribuam
para o desenvolvimento psíquico da criança no tocante conhecimento em que a
mesma deseja e necessita ser aceita, acolhida, amada e ouvida para que possa
propiciar meios contundentes de desperta-la para a vida da curiosidade, da
criatividade e do aprendizado. (ALMEIDA, 2014, p.53).
Desse modo o professor nesse aspecto é um forte contribuinte na preparação
da criança para o mundo, organizando através de atuações bem elaboradas no
200
contexto educacional um novo olhar que proporcione o ato motivacional a criança e
interesse em fazer parte do processo de aprendizagem significativa.
Desse modo a primeira infância é uma fase de natureza útil e significativa ao
ato de aprender da criança sendo esse um período de amadurecimento intelectual,
físico e social no que diz respeito e disposição para novas experiências para as
crianças. (PIAGET, 2013, p. 47), “educar é adaptar o indivíduo ao meio social
ambiente”.
Nesse aspecto a afetividade direciona um papel de extrema importância nas
correlações psicossomáticas fundamentais, além de contribuir definitivamente a
percepção na área de entendimento, o pensamento, a memória, ao desejo e as
atitudes, e ser assim, um componente primordial da harmonização do equilíbrio da
personalidade humana.
Segundo (WALLON, 2016, p. 43), “A emoção é o primeiro e mais forte vínculo
entre os indivíduos. É fundamental observar o gesto, a mímica, o olhar, a expressão
facial, pois são constitutivos da atividade emocional.”.
Nessas condições a prioridade de um sistema educacional atrelado a políticas
públicas de relacionamento, reflexão e conduta, conduz à necessidade da implantar
da afetividade nas escolas objetivando a vivência totalitária da criança no processo
de ensino construindo o conhecimento que está interligado a reestruturação da arte
de criar, recriar, socializar-se aprender.
Nessas condições a criança precisa participar do contexto educativo para
assim dá amplitude ao seu conhecimento e, sobretudo aprendizagem objetivando
ainda desenvolver vínculos afetuosos os quais conduzirão novas propostas nas
relações interpessoais dando origem a sua emancipação segura e consciente de

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perspectivas futura no campo de aprender com significado. (FERNADES, 2016,
p.43).
Nessas condições a investigação busca realizar uma análise de fatores
pedagógicos de forma afetiva, construindo e favorecendo a descoberta de
paradigmas constitutivos a uma aprendizagem com propostas inovadoras
analisando a importância do ato de aprender através do incentivado do educador
através do afeto, conduzindo a criança ter satisfação em aprender e construir seu
201
próprio conhecimento.

1. DESENVOLVIMENTO

1.1. O QUE É AFETIVIDADE?

Afetividade são sentimentos, emoções, ações, histórias vividas, sonhadas,


marcas de dores, de felicidade e de paixão, ou seja, a afetividade está ligada a
sentimentos que envolvem a humanidade e as experiências vividas no decorrer do
tempo. Wallon em sua teoria fez a distinção entre emoção e afetividade: afetividade
é um conceito amplo, que inclui um componente cognitivo, representacional
(sentimentos) e um componente expressivo (comunicação) (ANDRADE, 2007 p.25).
Dessa forma a afetividade é um estado mental do ser humano podendo ou
não ser modificado em decorrência das situações cotidianas. Segundo Piaget, tal
estado mental é de extrema influência no ato comportamental e no aprendizado das
crianças em parceria com desenvolvimento intelectual. Nessas condições se faz
presente nesse processo desejos, sentimentos, interesses, valores e tendências, ou
seja, em todos as instancias da vida humana.
Assim intimamente ligada à emoção, a afetividade consegue determinar e
direcionar o modo com que as pessoas observam o mundo e também a forma com
que se posicionar dentro dele. Todos os acontecimentos e fatores que existe na vida
de uma pessoa trazem recordações e experiências por toda a sua história.
(FERREIRA, 2017, p.55).
Dessa forma, o afeto na vida humana está presente ou ausente determinando
a maneira de como se desenvolverá, levando em consideração ainda a autoestima

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dos sujeitos a partir da infância, que o recebimento do afeto nesse estágio tem como
retribuição o fortalecimento das relações que darão resultados positivos no
crescimento e desenvolvimento da criança como sujeito ativo, seguro e determinado.

1.2. TEORIAS DE HENRI WALLOW

O lado infantil para Wallon é fundamentalmente emocional e gradualmente vai


202
construindo significantemente novos paradigmas em um ser sócio- cognitivo.
Nesse aspecto a relação que fundamenta o ato de ensinar e o ato de
aprender transcorre a partir de vínculos entre as pessoas e começa no âmbito
familiar. A fundamentação desta relação vinculante é afetiva, que através de uma
maneira de comunicação emocional que ainda na primeira infância o bebê mobiliza
o adulto, que promove as garantias que necessita.
Dessa maneira contata-se que é o vínculo relacionado à afetividade entre o
adulto e a criança que fundamenta e corresponde a etapa principiante do processo
que corresponde à aprendizagem. (GOLEMAN, 2014).
Sendo assim é a partir do ato de relacionar-se que o vínculo afetivo toma
dimensões significativas nos anos iniciais, ou seja, na primeira infância aonde a
criança vai obtendo conhecimento ao mundo simbólico e, assim, conquistando
avanços em relação a suas descobertas no âmbito cognitivo.
Segundo Wallon, no decorrer do desenvolvimento cognitivo e social da
criança, a reciprocidade afetuosa vai ganhando espaço e a postura do professor
torna-se essencial nas relações de troca de experiências e no amadurecimento da
aprendizagem. “Para aprender, é necessário destacar dois personagens (ensinante
e aprendente) e um vínculo de troca de experiências e afetividade que fortalece a
aprendizagem que se estabelece entre ambos. (...) Não aprendemos de qualquer
um, aprendemos daquele a que outorgamos confiança e direito de ensinar”
(FERNANDEZ, 2016, p. 47 e 52). Toda aprendizagem está impregnada de
afetividade, já que ocorre a partir das interações sociais, num processo vincularem.
Desse modo a afetividade revela-se como essencial na função de estabelecer
vínculos, satisfação e prazer no ato de ensinar e aprender que estão atrelados ao
processo de desenvolvera personalidade da criança que se manifesta no ato
comportamental e em seguida na expressão.

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Assim sendo, é notório afirmar que o processo continua está vinculado ao
desenvolvimento, considerando que o ser nunca está pronto e acabado, por esta
razão que o aspecto cognitivo e ao crescimento orgânico estão intimamente ligados
detectando assim as características e finalidades comuns de uma faixa etária,
reconhecendo as individualidades.
Segundo (ALMEIDA, 2014, p. 44), A afetividade mantém vínculos de
influência com o meio, ou seja, manifesta-se em comportamentos e gesticulações
203
lançados no cotidiano que dão sentido a condutas emocionais que podem favorecer
ou não o crescimento intelectual da criança no decorrer de seu desenvolvimento,
dando sentido ao estágio emocional.
Dessa forma torna-se importante considerar que a afetividade, assim como a
inteligência, não está pronta muito menos imutável, pois ambas avançam ao longo
do desenvolvimento que são construídas e se modificam de uma fase a outro, pois,
à medida que o ser humano se desenvolve, as necessidades afetivas se
transformam em cognitivas.

1.3. A RELAÇÃO DA AFETIVIDADE COM A APRENDIZAGEM DOS ALUNOS NA


ESCOLA

A atenção dos alunos sejam eles, crianças ou adolescentes, muitas vezes


não são prendidas pelo professor, em virtude muitas vezes pelo seu
comprometimento metodológico, pela falta de apoio familiar ou pela falta de
interesse da criança.
Nessas condições o professor não pode se dizer que este seja o único
responsável, como também não pode se apenas culpar o aluno por falta de
interesse ou preguiça, pois existem vários fatores para justifiquem o comportamento
do aluno.
A escola em sua total conjuntura tem que participar na construção da atenção
voluntária do aluno para auxiliar no processo e aprendizagem. Segundo (SILVA,
2008, p.68), “O ser humano ao se apropriar dos conhecimentos, atribui significado
para as coisas, ampliando assim elementos geradores da atenção”.

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Por este motivo propõe-se nos dias atuais rever tais questões e reformular
conceitos ultrapassados sobre o ato de ensinar e aprender mostra intrinsecamente
fatores ligados à cognição, onde a afetividade constitui-se como fator primordial na
vida escolar, devendo, pois o professor, sobretudo das séries iniciais, ser
conhecedor dos problemas que pode enfrentar e estar preparado para resolvê-los ao
desenvolver uma visão holística sobre os acontecimentos. Considerando que muitas
crianças apresentam rejeição é escola devido a uma primeira infância tumultuada e
204
carente de afetividade, principalmente da figura materna.
Nesse aspecto tornou-se fundamental um meio sócio emocional, afetivo,
motor e cognitivo para o desenvolvimento da criança menor de três anos, pois é
nesta fase que ocorre o desenvolvimento da linguagem. Sendo assim as emoções
têm um importante papel no desenvolvimento do indivíduo, mas são nos primeiros
anos de vida que elas terão o papel de garantir a sobrevivência do bebê e progresso
da noção do EU.
Segundo Almeida (2014, p. 65), as “[...] relações afetivas se evidenciam, pois
a transmissão do conhecimento implica, necessariamente, uma interação entre
pessoas”. Assim, de acordo com o autor, entende-se que a afetividade como
substância que nutre as ações e não um puro ato de “melosidade” favorecem as
relações entre professor-aluno, pois os aspectos afetivos emocionais, cognitivos e
as dinâmicas manifestações da sala de aula e formas comunicativas que devem ser
caracterizadas como pressupostos básicos para o processo da construção do
conhecimento da aprendizagem e das condições organizativas do trabalho docente.
Assim, a afetividade está intimamente ligada à inteligência, por conseguinte, são
segmentos indissociáveis e influenciados pela socialização.
Dessa maneira, o indivíduo vai se desenvolvendo no seu espaço social e
cultural afastando-se da submissão, e aprendendo a transferir suas motivações para
outras situações e objetivos, aproveitando as relações vivenciadas.
Poe esta razão, a afetividade no âmbito escolar é se preocupar com os
alunos, é dá-lhes a atenção que merecem, é incentivá-los ao desempenho de suas
habilidades é reconhecê-los como indivíduos autônomos, com uma experiência de
vida diferenciada a dos demais, com direito a ter preferências, opiniões, desejos e
atitudes diferentes do professor.

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Partindo dessas premissas, as ações dos alunos começarão tomar um
espaço muito diferenciado e positivo no contexto educativo, pois a escola inicia
envolver o aluno em um aspecto favorável e satisfatório a seu progresso
educacional e social, objetivando prepará-los, pois para vida de maneira equilibrada
emocionalmente. Assim, torna-se importante salientar que o favorecimento do
equilíbrio emocional da criança é garantia de uma aprendizagem satisfatória que
segundo Piaget:
205

Para haver o desenvolvimento cognitivo é necessário antes o


desenvolvimento perceptivo, pois a percepção se refere ao conhecimento
que se tem dos objetos ou dos movimentos, obtidos através do contato
direto e atual com os mesmos. A inteligência, por sua vez possibilita o
conhecimento de outros aspectos dos objetos e movimentos e que subsiste
mesmo na ausência de contato direto com eles. (PIAGET, 2013, p. 66).

Nessa postura a afetividade no âmbito escolar começa a influenciar de forma


decisiva na vida do educando, em especial no aspecto da linguagem,
proporcionando-lhe condições de evolução e fator de interação social, onde a
apropriação das experiências de gerações precedentes servirá como assimilação de
conquistas alcançadas no decorrer dos tempos, organizando e orientando o
pensamento, abstraindo as propriedades e características fundamentais das coisas
e eventos a que se referem.
Dessa maneira, é dever da escola esforça-se para promover um ambiente de
estabilidade e segurança, onde as crianças se sintam bem, envolvendo-as de
maneira satisfatória através da harmonia e do afeto, que são revertidos em
autoestima e motivação, onde a atividade cognitiva fica facilitada.
Nesse contexto, vale salientar que existem duas principais emoções que
realizam ações na sala de aula são elas: o medo apresentado através de novas
situações no ato de responder algum exercício, ou na apresentação para o grande
grupo da sala entre outras atividades; a alegria, que traz movimento, satisfação
também pode trazer entusiasmo para a realização das atividades.
Nessa concepção é notório afirmar que através dos movimentos que podem
ser gerados emoções como forma de alegria, que ao ser produzido demonstra uma
significativa excitação motora, onde poderá ser considerada e trabalhada várias
situações com relação às atividades como: dinâmicas em grupo, teatro, entre outros

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recursos, possibilitando dessa forma atividades propiciem e sejam facilitadoras de
amadurecimento intelectual e, sobretudo de aprendizagem significativa.
Considerando que o mediador do conhecimento sendo ele o professor
considera que a apresentação pelos alunos dos estados emocionais no contexto de
sala de aula é em virtude do excesso ou a falta de movimento consiste em revelar a
frequente presença de um estado emocional, considerado bom ou ruim.
Nessa postura, o professor deve apresentar equilíbrio emocional em sala de
206
aula, pois a inteligência está intimamente ligada à emoção, tornando-se o grande
desafio atual na sala de aula manter o equilíbrio entre emoção e a razão, para que o
estado emocional não impeça o exercício da atividade cognitiva.
Nessa concepção, é importante ressaltar que os professores se revelam em
alguns momentos sua fragilidade e facilidade de ser atingido pelo aluno, sendo esse
um momento muito delicado nas relações entre professor e aluno no contexto
educativo, ocasionando a falta de aproximação entre o docente e a emoção
deixando-o não perceber as expressões na sala de aula.
Pode-se dizer que o âmbito escolar exerce um papel de extrema importância
no desenvolvimento da capacidade sócio afetivo da criança. Segundo (ALMEIDA,
2014, p. 99).
Desse modo é importante considerar que o meio social é contemplado âmbito
educacional, que é bastante propício ao seu desenvolvimento da criança, pois é rico
em interações diversificado, e propõe à criança estabelecer e priorizar relações
simétricas entre crianças da mesma idade e disparidade entre adultos.
Ao inverso da família, na qual a sua posição é determinante, fixa, na escola a
criança dispõe de uma maior flexibilidade, sendo possível a multiplicidade de papéis
e posicionamentos.
Dessa forma o professor é o interlocutor permanente tanto do
desenvolvimento cognitivo do caráter da criança, que será preenchido gradualmente
de maneira individual e social e coletiva.
Através da diversidade de interações entre família, escola, professor, o aluno
se predispõe a fazer parte de um meio que o proporciona experiências essenciais
para a construção de sua personalidade caracterizando como sujeito percussor do
afeto e conhecimento, possibilitando crescimento intelectual.

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Nessa concepção, a autoestima da criança é fator predominante na relação
ensino aprendizagem, pois a mesma necessita serem elogiados e reconhecidos,
fatores esses que nutrem a afetividade da criança diante do professor que deve
demonstrar carinho e atenção pela mesma, possibilitando a ela a satisfação no ato
de aprender.
É importante ainda considerar que a afetividade é algo amplo e de muita
satisfação aos seres humanos, pois as primeiras aprendizagens das crianças
207
acontecem na primeira relação com sua genitora (primeiros gestos e palavras...).
Nesse relacionamento à criança começa a construir seu estilo particular do to
de aprender, que acontecerão modificações à medida que a criança comece a se
relacionar com outros contextos. Segundo (ALMEIDA, 2014, p. 48). Assim sendo os
estágios da afetividade estão vinculados a sentimentos de muita emoção e paixão,
que condiz o desenvolvimento das capacidades que estão atreladas ao estado de
maturação que quanto mais habilidade e desempenho param se adquirir no campo
da racionalidade, grandioso será o desenvolvimento da afetividade. Sendo assim, as
aprendizagens acontecem a princípio no seio familiar logo após no setor no social e
no ambiente escolar. Pode-se ainda observar que existe uma grande dificuldade
quando ocorre a separação da criança no meio familiar para o meio escolar.
Constantemente os professores são incompreensivos fazendo com que os
alunos comprometam sua aprendizagem perdendo o estimulo de aprender e sendo
prejudicados posteriormente. Desse modo, inúmeros são os fatores que contribuem
para a lentidão do aluno e até mesmo a perda de vontade de estudar, pois no
contexto educacional entre elas a indisciplina que corresponde às crianças
executarem uma atividade quando tem vontade, deixando de fazer assim suas
atividades escolares, em outros casos os pais cobram dos filhos suas
responsabilidades através de condutas comprometedoras como ameaças.
(VYGOTSKY, 2014, p.56).
Por essas razões, os problemas vinculados à aprendizagem de leitura e
escrita correspondem ser sinais, causas e evidências de um aspecto educacional
que está sem função ao longo do processo histórico, tornando-se necessário um
novo planejamento do processo de ensino aprendizagem, ressaltando aos
professores e aos pais a indagação de entender a importância do afeto nas relações
de aprendizagem com relação aos problemas de leitura e a escrita.

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Nessa concepção, para que a integração professor-aluno possa levar a
construir conhecimentos, torna-se necessário que o professor seja um observante
ativo do comportamento dos alunos no decorrer do processo ensino aprendizagem
cuja afetividade torne a maneira de ensinar e aprender segura e prazerosa.

CONCLUSÃO

208
Refletir sobre uma sociedade mais humana, harmoniosa, justa e solidária é
considerar a afetividade como um elemento imprescindível na busca de resultados
satisfatórios ao ato de construir, aprender e discernir com sabedoria os elementos
de uma aprendizagem com propostas de objetivem o êxito. Sendo assim, a
afetividade na atualidade é a energia que impulsiona e direciona a aprendizagem,
sem ela se torna difícil motivar o aluno a desenvolver a construção de seu
conhecimento.
Nesta perspectiva, verificou-se que a afetividade familiar e educacional está
intrinsecamente interligada a aprendizagem prazerosa. A afetividade atua e
influência de forma significativa dando ênfase e respaldo pelos quais os seres
humanos resolvem os conflitos de sua natureza moral.
Nessa postura, o ato de organizar o pensamento corresponde o sentimento e
o sentir também formata a forma de pensar. Nesse sentido, a afetividade passa pelo
funcionamento psíquico, assumindo papel de organizar as ações demonstradas pelo
ser humano em sua vivencia.
Se o ser humano não se apresentar bem afetivamente ele não conseguirá em
sua plenitude desenvolvera sua aprendizagem, considerando que a afetividade tem
o poder de influenciar de maneira positiva e significativa a maneira pela qual os
seres humanos assimilam e aprendem.
É através da vivencia afetiva que o aluno edifica e produz com qualidade o
seu nível de aprendizagem. Contudo, a afetividade que possibilita ao educando a
força fundamental para superar os obstáculos que a vida lhe impõe, ele necessita
sentir-se seguro para resolver os conflitos que lhes são propostos pelo meio sociais
e isso será possível se ocupar a postura de emocionalmente seguro para assim

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atuar com altivez, consciência dos seus atos e ações a serem tomadas no decorrer
de sua vida educacional, familiar e social.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, A. R. S. emoção na sala de aula. Campinas, SP: Papirus, 2014.

ANDRADE. A. O Afeto em primeiro lugar. São Paulo, SP: Papirus, 2007.


209
FERNANDEZ, A. A Inteligência Aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica
da criança e sua família. Porto Alegre: Artes Médicas, 2016. .

FERREIRA, A. B. H. Novo Aurélio XXI: o dicionário da Língua Portuguesa. Três ed.


Totalmente revista e ampliada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017.

GOLEMAN, P. A afetividade como princípio da aprendizagem. Rio de Janeiro.


Cortez. 2014.

PIAGET, Jean e INHELDER, Bärbel. A Psicologia da Criança. São Paulo: DIFEL,


2013.

SILVA, A afetividade no contexto educacional. Rio de Janeiro, 2008.

VYGOTSKY, L. S. Teoria e método em psicologia. São Paulo: Martins Fontes,


2014.

WALLON, H. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70, 2016.

WALLON, H. A afetividade na família. Rio de Janeiro. Ática. 2016.

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QUAIS AS BASES PARA A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR?

Idelsuite de Sousa Lima38

RESUMO: O presente trabalho analisa apropriações de narrativas expressas na


institucionalização da Base Nacional Comum Curricular - BNCC, procurando entender como
a ideia de um currículo único é perpassada e que interesses gravitam em torno da defesa de
um conteúdo hegemônico, prescrito e estabelecido para ser efetivado nas escolas de todo o
País. Para tanto, a análise utiliza como fonte de investigação, alguns discursos que
corporificam a temática em questão e faz um contraponto com o texto do Apple (1995), na 210
tentativa de destacar similaridades e distanciamentos em torno da produção cultural
expressa em um currículo unificado. Para referendar a análise, o diálogo com teóricos do
campo do currículo, tais como: MACEDO (2014), BALL (2014), LOPES; MACEDO (2011),
entre outros, possibilita compreender múltiplas ações em torno do estabelecimento e
promulgação de um texto prescrito. Os resultados indicam que, em torno da deliberação da
unificação curricular expressam-se exclusões, conservadorismos, agendas políticas,
interesses diversos, assertivas e sentidos outros que compõem variados perfis advindos
dessa política cultural.

Palavras-chave: Currículo. Políticas de Currículo. Unificação Curricular. BNCC

INTRODUÇÃO

A institucionalização de uma política educacional congrega amplos significados


e diferentes modos de ser e de influir por tratar-se de uma política de cultura. Como
parte desta ação, a política curricular comporta proposições voltadas para a
formação de pessoas e exterioriza intenções sociais, políticas e culturais. Convém
então, questionar: que propósitos conduzem a elaboração e divulgação de um texto
curricular? A quem interessa a efetivação de uma determinada política de currículo?
Quais são, então, as bases para o texto curricular denominado Base Nacional
Comum Curricular?
Estas e outras interrogações direcionam o presente artigo, no sentido de
aprofundar a discussão em torno do ato de instituir, em nível nacional, um texto
curricular a ser veiculado em todos os espaços de escolarização deste País. Texto
este que coloca em posição de inferioridade o pensar e o fazer dos docentes e as
especificidades de cada espaço escolar e dos sujeitos que o compõem. Assim, a
pretensão deste trabalho é analisar aspectos da institucionalização da BNCC,

38
Doutora em Educação pela UNICAMP. Professora do DME/CE/UFPB. idel.lima@uol.com.br

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procurando identificar interesses que se aglutinaram na deliberação de um currículo
prescrito e os arranjos que foram consolidados para dar apoio à referida Base.
Questionar a elaboração e divulgação de um texto unificado advém da noção
de que o currículo é um espaço múltiplo de construção cultural, no qual emergem
diferentes saberes, fazeres, táticas, estratégias e manifestação de atores diversos.
Advém, sobretudo, da compreensão de que a escola é um espaço plural e como tal,
lugar de criação, de questionamentos, de apostas, de inventividades realizadas
211
pelos que nela transitam, na construção cotidiana do fazer escolar.
A existência de um currículo de abrangência nacional não é uma inovação e
não se restringe à educação brasileira. Tanto no Brasil quanto em outros Países, o
currículo é um elemento cultural de interesse da política educacional mais ampla,
dos que administram e querem colocar em prática suas agendas e seus preceitos.
De acordo com Popkewitz (1997), fazer currículo é fazer política. Daí porque este
objeto cultural ganha realce nas investidas de reafirmação de poder. Não é sem
razão que as instâncias de decisão miram seus objetivos na concretude de textos
curriculares. Com a BNCC não foi diferente e forças se aglutinaram para dar a este
texto a face dos seus intentos.

UM CURRÍCULO NACIONAL PARA TODOS: É DESEJÁVEL? É POSSÍVEL?

Por maiores que sejam os alardes em torno da promulgação e


institucionalização de uma padronização curricular, convém destacar que a
discussão sobre o currículo é maior e mais significativa do que a restrição em torno
de um texto prescrito, independente de intenções e conteúdos que se apresentem.
Porém, o fato de predeterminar em um texto o que vai ser ensinado nas
escolas ressoa um estranhamento. Por que padronizar o currículo? É possível um
currículo nacional para todas as escolas, todos os professores e todos os alunos?
Sendo possível, é desejável que isso aconteça? A defesa de um currículo nacional
não tem um único emissor e a aceitação desse texto unificado revela também outras
dimensões, concepções e proposições dos que estão em diferentes instâncias da
educação brasileira.

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Para ilustrar essa discussão utilizo como fonte o artigo denominado ‘A política
do conhecimento oficial: faz sentido a ideia de um currículo nacional?’, de autoria de
Michael W. Apple, publicado, no Brasil, em 1995, no livro Currículo, cultura e
sociedade, organizado por Antonio Flávio Barbosa Moreira e Tomaz Tadeu da Silva,
pela editora Cortez. Nesse artigo, o autor, discute essa questão tomando por base a
sociedade americana, mas com reflexões para além fronteira. Dentre os muitos
questionamentos que aponta no citado texto, Apple (1995) chama a atenção para os
212
riscos que permeiam a busca incessante pela institucionalização de um currículo
nacional.
Ainda que a escrita do referido artigo tenha mais de duas décadas da sua
publicação no Brasil, as questões abordadas mantém um nível de atualidade e de
semelhança com o momento sócio-histórico-político-educativo brasileiro, que
institucionaliza a padronização curricular. A exemplo disso, o documento
denominado Base Nacional Comum Curricular para a Educação Infantil e Ensino
Fundamental foi aprovado pelo Ministério da Educação, em dezembro de 2017 e,
comemorado em 06 de março de 2018, o chamado Dia D para discussão da referida
base, inclusive com instalação de um site para divulgação da mesma.
Essa opção do Brasil em oficializar um currículo único preteriza um conjunto de
diretrizes e propostas curriculares em vigor, inclusive os Parâmetros Curriculares
Nacionais, com muita similaridade em termos de conteúdo. Descaracteriza, por sua
vez, outras propostas construídas coletivamente pelos educadores de escolas e
redes de ensino, implementando um texto unificado e sem vínculo com as
especificidades das escolas e dos sujeitos que a constituem.
A elaboração e aprovação de um currículo nacional surgem da decisão de uma
instância deliberativa, mas também são respaldadas por outros canais
comunicativos. Para Apple (1995) o clamor por um currículo nacional tem origem em
gravíssimos conflitos em torno da política do conhecimento oficial, na qual interesses
entram em choque. O autor afirma que tal política traz em seu bojo um programa
maior de uma onda de restauração conservadora. De acordo com essa assertiva, há
nas palavras de Apple (1995, pág. 61), “uma perigosíssima investida ideológica (...)
cujos efeitos serão verdadeiramente perniciosos àqueles que já têm quase tudo a
perder nesta sociedade”.

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O autor chama a atenção para os riscos do estabelecimento de uma prescrição
curricular formalizada do ponto de vista legal, por entender que ‘os que já têm quase
tudo a perder’ serão novamente penalizados em virtude do arcabouço que pode ser
montado para veicular o ensino nas escolas. Ouso afirmar que esse delineamento
poderá vir a aprisionar em um texto o que mais se busca evitar no campo curricular,
que é a centralidade de um pensamento único, conservador, por isso autoritário,
dogmatizador. A investida de deliberar um currículo nacional intenta direcionar seus
213
objetivos sobre a escola, os professores e os alunos.
Com efeito, a onda conservadora opera sobre a política do conhecimento
oficial, buscando canalizar seus ideais e proposições na veiculação de uma
determinada cultura, alinhada aos seus interesses. Ainda que o currículo configure-
se como um campo composto por múltiplas dimensões e espaço de expressão
cultural, a promulgação de um texto curricular universalizado exerce uma frenagem
no entendimento do que seja currículo. O fato de estabelecer-se como texto nacional
já arbitra sobre o campo do currículo, por ser este um espaço de construção e de
criação de possibilidades, espaço político de manifestação de culturas, sempre
aberto às potencialidades e multidimensionalidades do fazer educativo.
No caso do Brasil, a unificação curricular alicerça-se na forma como grandes
grupos econômicos se empenharam, não apenas em participar, mas, sobretudo, em
influenciar e conduzir os processos de elaboração do currículo nacional. Ainda que
sob a coordenação do Ministério da Educação, vários grupos econômicos
participaram na linha de frente de condução das etapas de discussão acerca da
institucionalização da Base Nacional Comum Curricular. Vários agentes sociais
privados influenciaram as políticas públicas para a educação, buscando marcar
posição e controlar o processo de elaboração do texto curricular.
Ao ser lançado em 2015 o site da BNCC, diferentes proposições o
compunham, enaltecendo a defesa de um currículo nacional, apresentando seus
argumentos de positividade em torno deste documento. Além de órgãos como a
UNDIME (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), CONSED
(Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação), UNCME (União
Nacional dos Conselhos Municipais de Educação), havia também textos de

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empresas, institutos e fundações reforçando a necessidade de elaboração de um
currículo nacional.
Com a criação do site denominado Movimento pela Base essa ideia foi
ampliada. O site fazia ampla divulgação da necessidade da base e isso foi projetado
em diferentes veículos midiáticos, numa vultuosa ação. Os trâmites em torno da
base foram conduzidos pelo MEC, mas outros agentes estiveram presentes nessa
empreitada.
214
Nos sites dos agentes públicos que dinamizaram o debate sobre essa questão
havia a indicação de “parceiros” diversos para a consecução da Base. Esse formato
configura o que Ball (2014), em seus estudos sobre políticas educacionais no mundo
globalizado, chama de redes de políticas constituídas por instituições filantrópicas,
grandes corporações financeiras que deslocam impostos para suas fundações,
produtores de material didático, organizações não governamentais. Essas redes que
o referido autor chama de ‘comunidades políticas’ tomam alcances inimagináveis por
serem descentradas, fluídas e se articularem de diferentes formas em torno de
problemas sociais comuns.
Convém destacar que os agentes privados imbuídos da consecução da BNCC,
ao longo do processo, passaram a ter primazia na condução do movimento de
elaboração do documento. Dentre as instituições que participaram do
desenvolvimento do trabalho acerca da elaboração da BNCC, muitos agentes
sociais privados instauraram suas dinâmicas de inserção dos interesses
empresariais. De acordo com Macedo (2014), destacaram-se instituições financeiras
e empresas, como o Itaú [Unibanco], Bradesco, Santander, Gerdau, Natura,
Volkswagen; Fundações como Roberto Marinho, Victor Civita e Fundação Lemann; e
grupos educacionais, como CENPEC, movimento Todos pela Educação e Amigos
da Escola.
A elaboração do currículo nacional, nos moldes em que foi realizada a BNCC,
alinha-se a fins mercadológicos, numa concepção de educação produtivista, com
vistas à formação de um sujeito otimizador e competitivo, reforçando a lógica
empresarial. Não foi sem razão que houve empenho empresarial tão destacado na
defesa desse texto. Que interesses moveram as empresas, institutos e fundações a
ponto de a referida Base tornar-se agenda em seus empreendimentos? Por que, de

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repente, a questão curricular passou a congregar interesses e virar bandeira de luta
dessas empresas?
De acordo com Apple (1995), por trás das justificativas educacionais para um
currículo nacional, uma que se destaca é a de que um conjunto padronizado de
diretrizes e metas curriculares nacionais tornaria possível ‘elevar o nível’ do ensino,
concorrendo para que as escolas e seus professores sejam responsabilizados pelo
sucesso ou fracasso dos alunos. As questões que o autor levanta são perfeitamente
215
cabíveis, para o caso brasileiro, quais sejam: quem são os grupos que lideram esses
esforços reformistas? Quem ganhará e quem perderá com a legalização de um
currículo único?
Em sua argumentação, o referido autor acrescenta:

sustentarei que, infelizmente, quem está estabelecendo de fato a


pauta política na educação são grupos de Direita e que, em geral,
o mesmo padrão de benefícios que tem caracterizado quase todas
as áreas da política social – através dos quais os 20% mais ricos
da população ficam com 80% dos benefícios – será reproduzido
também nesta área (APPLE, 1995, pág. 64).

Os grupos empresariais anteciparam-se na definição de pautas políticas


vislumbrando, provavelmente, espaço de lucratividade econômica. Passaram então,
a investir em uma reforma educativa para garantir lucro e implementar suas ideias.
Grande parte dos ganhos pode ser facilmente receptada através de diferentes meios
considerados legítimos, como por exemplo, a produção e distribuição de material
educativo, a editoração e veiculação de manuais pedagógicos e de diferentes textos
didatizados para o ensino, a organização, sistematização e ministração de cursos de
formação continuada de professores, a publicação em larga escala de livros
didáticos, entre outros. Tudo isto, sintetizadamente, a partir de conteúdos muito
específicos, porque formalmente definidos na Base Nacional Comum Curricular.
Assim, a título de exemplo, poderia citar a produção de livros didáticos. Sem a
institucionalização da Base, as editoras utilizariam como estratégia de divulgação,
diferentes obras didáticas para que os docentes pudessem escolher os livros a
serem adotados por ocasião da seleção pelo Programa Nacional do Livro Didático.
Com a institucionalização de um texto único, no caso, a BNCC, este conteúdo a ser

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contido no livro didático seria infinitamente mais concentrado, minimizando os gastos
de editoração, portanto, o lucro da editora.
A intenção mercadológica passa subliminarmente para a sociedade como se
nada fosse vinculado à lógica da lucratividade. E alguns educadores, que pouco se
detiveram na análise do impacto que um currículo único congrega, de modo
semelhante, incorporam essa invisibilidade. Porém, a lógica mercadológica instala-
se de forma bastante intencional para fazer valer os vínculos com o capital. Para
216
Aplle (1995, pág. 73): “quando associado a um programa de políticas voltadas para
o mercado, tais como os planos de vale-educação e de ‘opções’, esse sistema
nacional de padrões, avaliações e currículos – ainda que instrinsecamente
inconsistente – é uma conciliação ideal dentro da coalização direitista”.
Há outra questão relacionada com a investida ideológica, referente à conotação
das narrativas incluídas na própria Base e nos materiais teórico-metodológicos
desenvolvidos para servirem de referências ao ensino. O fato de ser um texto pronto,
sentidos e significados são suprimidos, não abrindo espaço para a inclusão de
discussões relacionadas com o sentido de escola, pública, gratuita, laica, de
qualidade para todos, comprometida com o desenvolvimento social.
Obviamente, não é o fato de haver o estabelecimento de uma política do
conhecimento oficial, que garanta que ela seja fundamentalmente determinante.
Entretanto, uma investida tão marcante na produção do documento como a que se
efetivou em torno da BNCC, possibilita o fortalecimento de condições e meios para
implementação, no sentido, inclusive, de vincular o currículo nacional a um sistema
de avaliação que se respalde na mesma. Neste caso, o alcance dessa política do
conhecimento oficial poderá ser imensamente mais ampla do que se pode imaginar,
com consequências imensas para os professores, as escolas e os alunos.
Essa tentativa de homogeneização curricular contraria a perspectiva de
currículo como fluxo e movimento, por não reconhecer, nem contemplar as culturas,
as diferenças, a diversidade, a multiplicidade de saberes, as variadas formas do
fazer curricular. Além disso,

É preciso seguir lembrando que um currículo nacional não vai


melhorar a educação nem garantir desenvolvimento e melhor
distribuição de renda. O que ele tem a oferecer é apenas a
tentativa de controle do imponderável da qual depende, não o

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sucesso da educação, mas a hegemonia do imaginário
neoliberal de que é parte (MACEDO, 2014, p. 1553).

Com efeito, um currículo nacional não tem poder de garantir desenvolvimento e


muito menos de atender às perspectivas sociais de melhor distribuição de saber ou à
produção do conhecimento tão requisitada. Serve, por assim dizer, a um projeto de
nação situado no modelo hegemônico contrário às necessidades populares e dos
educadores, em particular.
217
Pois bem, sabendo-se que um currículo nacional não se porta como promotor
de avanços e não garante desenvolvimento, nem melhoria na promoção de vida das
pessoas, conclui-se que a sua institucionalização não traz validade, portanto, não é
benéfica. Mais que isso, essa oficialização atende a interesses bem específicos,
relacionados com a investida mercadológica, que em tudo pauta-se pela tentativa de
controle, mesmo que daquilo que é imponderável.
A possibilidade de controle corporifica-se através do que Appe (1995) chama
de coalizão direitista conservadora, muito em voga no mundo capitalista. Assim, a
política do conhecimento oficial, manifesta via institucionalização de um currículo
nacional, traz em seu bojo o propósito de um sistema de avaliação educacional e, de
acordo com o referido autor, não pode ser compreendida de forma isolada, de modo
que:

Todo esse contexto precisa ser ressituado em uma dinâmica


ideológica maior, na qual se verifica uma tentativa,
empreendida por um novo bloco hegemônico, de transformar
nossas próprias ideias acerca da educação. Essa
transformação envolve um brutal desvio (...), no qual a
democracia deixa de ser um conceito político para se tornar um
conceito econômico, e no qual a ideia de bem público é
sepultada de vez (APLLE, 1995, pág. 84).

Assim, os processos hegemônicos encontraram meios de fortalecimento. No


caso da BNCC houve interesses visíveis da iniciativa privada que tomou a frente do
seu encaminhamento, através de diferentes canais, reforçada por uma divulgação
massiva através da internet e da mídia de modo geral, criando condições de sua
legitimação. A ideia de uma cultura comum parece atuar na mútua dependência com
os parceiros, nas articulações políticas que criaram formas de regulação,
fortalecendo sistemas de avaliação, seguindo modelos privados de gestão. Sob este

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prisma, um currículo nacional ganha força. De acordo com Apple (1995, pág. 74),
“seu principal papel está sim em prover a estrutura que permitirá o funcionamento do
sistema nacional de avaliação”.
Como em toda reforma, convém sempre questionar a quem interessa, ou mais
que isso: quem ganhará e quem perderá com ela. Para Apple (1995, pag. 81): “o
sistema, uma vez implantado, fará com que se coloque mais culpa sobre os ombros
de alunos e pais pobres e, sobretudo, sobre as escolas que frequentam...”.
218
Certamente, a institucionalização de um currículo comum, no caso da BNCC, recai
sobre as escolas e principalmente sobre os professores, possíveis insucessos.
Além disso, o fato de o texto ser institucionalizado, certamente ganhou corpo a
ideia de currículo único como verdade inconteste, sendo colocado em segundo
plano quaisquer iniciativas relacionadas com o processo de produção de
conhecimento criativo e principalmente, a autonomia dos professores e da escola. O
cotidiano da sala de aula poderá tornar-se um mecanismo para um ensino
conteudista, antiplural, antidemocrático. Sem autonomia, o professor perderá sua
identidade e a escola não cumprirá a sua função social.

O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E A JUSTIFICATIVA PARA A BNCC

Dentre as defesas para a promulgação da BNCC intensificaram-se as que


relacionavam tal texto com o cumprimento de ações do Plano Nacional de Educação
– PNE . Tal plano, promulgado em 2014, consubstanciou-se como um conjunto de
ações interrelacionadas, com alcances muito amplos para respaldar as
possibilidades de subverter impasses na educação brasileira. A proposição de uma
base apresentava-se como possível, mas não nos moldes como a BNCC acabou
sendo configurada.
É inegável que dentre as ideias em torno de uma política curricular,
perpassaram noções diversas, dentre elas a de “ter um norte para o que vai ser
ensinado” e isso encontrou ressonância com a proposição da BNCC, quer
referenciada por profissionais da educação, quer por membros da sociedade mais
geral. Evidentemente, isso estava atrelado a uma ideia de um projeto de escola ideal
e serviu para justificar as pretensões do PNE. Porém, não é o fato de estabelecer

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um currículo único que a educação nacional seria promovida a um padrão de
desenvolvimento com qualidade para todos os estudantes matriculados nos
diferentes anos/turmas da Escola Básica.
Os defensores de um currículo nacional o vincularam à possibilidade de
melhoria da escola a partir da operacionalização de critérios objetivos. No entanto,
para Apple (1995, pág. 75):

Os critérios até poderão parecer objetivos, mas os resultados 219


não o serão, dadas as diferenças de recursos e classe social e
a segregação racial. Em lugar de coesão cultural e social, o
que surgirá serão diferenças ainda mais acentuadas,
socialmente produzidas, entre ‘nós’ e ‘os outros’, agravando os
antagonismos sociais e o esfacelamento cultural e econômico
delas resultantes.

Assim, a suposta objetividade e essa ilusória coesão, anunciadas como


possíveis elementos para melhoria na qualidade, servirão para aprofundar o fosso
das desigualdades sociais, culturais e sociais, estigmatizando os que já são
excluídos e impedindo o avanço da aprendizagem de alunos das classes populares.
Por outro lado, os textos produzidos por educadores em eventos e inúmeras
publicações científicas revelam o entendimento do currículo como construção, em
que sentidos são construídos, reconstruídos, recontextualizados, reterritorializados
(LOPES; MACEDO, 2011).
Em contraposição à ideia de unificação curricular, o currículo deve
fundamentar-se no reconhecimento das diferenças e desigualdades. É pelo
reconhecimento dessas diferenças que o diálogo deve ser aprofundado. Deve primar
pelo reconhecimento dos diferentes posicionamentos sociais e expressões culturais
nas salas de aulas. Para Apple (1995, pág. 77), o currículo “deve subjetivar-se
constantemente. Ou seja, deve ‘reconhecer as próprias raízes’ na cultura, na história
e nos interesses sociais que lhe deram origem”.
O fato de a indicação de uma base configurada como uma meta do Plano
Nacional de Educação mobilizou argumentos em sua defesa. Para que o referido
plano fosse minimamente alcançado, muitas outras medidas precisariam ter sido
realizadas antecipadamente. Das vinte metas estabelecidas no PNE 2014, várias
delas exigiam execução imediata ou em médio prazo com vistas a viablizar algum
avanço na educação do País.

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A institucionalização do texto curricular não era um elemento fundante para o
PNE Apresentou-se mais como um apêndice questionável desse projeto de
melhoria. Para tornar viável parte do que estabeleceu o referido Plano seriam
imprescindíveis insumos financeiros de grande monta, além de outros arranjos e
proposições, como recurso pedagógico, de formação, de ações democráticas
compatíveis com a equalização das oportunidades regionais e sociais.
Dentre as metas do PNE, algumas exigiriam imediata efetivação, por serem
220
básicas para quaisquer iniciativas de melhoria da qualidade do ensino. Dito de outra
forma, outras políticas precisariam ter sido encaminhadas de forma sistêmica, entre
elas, as metas voltadas para valorização da carreira docente, formação,
remuneração digna, boas condições de trabalho, entre outras. Tais metas ganhariam
potência para a elucidação da complexidade do fenômeno educativo, dada a
irrefutável importância das mesmas, incidindo sobre elas, proposições para o
enfrentamento das fronteiras como passaporte para o protagonismo da educação
nacional.
Todavia, como se não bastasse o fato de ter instituído um currículo único para
todo o País há, em tramitação, outros projetos paralelos ainda mais perversos, como
o que denomina-se Escola sem partido, uma iniciativa da extrema direita de tentativa
de amordaçar professores, de tornar a escola uma instituição circunscrita a não
pensar, a emudecer, a não refletir.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O estabelecimento de uma política do conhecimento escolar implementada na


educação brasileira é um ato fortemente relacionado à noção de um currículo
instituído cujas determinações centram-se em torno do que deve ser ensinado. A
Base Nacional Comum Curricular, como uma unificação do currículo, baseou-se
unicamente na questão do conteúdo, descaracterizando o campo curricular.
É inegável que as justificativas de alguns setores, inclusive de uma parcela de
docentes, pela determinação de texto unificado para todo o País trouxe consigo a
mera ilusão de que uma homogeneização curricular proporcionaria uma melhoria na
qualidade do ensino e que concorreria para o atendimento ao que estabelece o

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Plano Nacional de Educação. Tais argumentos apresentam-se sem a devida
consistência, uma vez que, para que o PNE alcançasse seus objetivos, outras ações
se antecipariam por serem imprescindíveis.
O fato de estabelecer um currículo único situou-se na contramão dos estudos
sobre o campo do currículo e do entendimento de este é um espaço político,
potencialmente aberto a atos de criação, de contestação e de produção cultural.
Qualquer iniciativa de engessamento das ações de professores e das escolas
221
constitui eminentemente, como receituário, contrapondo-se à formação crítica e
cidadã das pessoas e ao desenvolvimento do protagonismo docente.
As defesas em torno da hegemonização curricular constituem parte de um
dado projeto de currículo. Entretanto, na consolidação das políticas curriculares
gravitam inúmeras ações que se confrontam ao estabelecido, ao prescrito, ao que
tenta unificação, compondo forças para se contrapor ao instituído e defender um
currículo instituínte. É no chão da escola que o processo formativo se efetiva como
uma formação emancipadora e pluralista, uma produção cultural.

REFERÊNCIAS

APLLE, Michael W. A política do conhecimento oficial: faz sentido a ideia de um


currículo nacional? In: MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa; SILVA, Tomaz Tadeu da.
Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1995.
BALL, Stephen. Educação Global S. A.: novas redes de políticas e o imaginário
neoliberal. Tradução de Janete Bridon. Ponta Grossa: UEPG, 2014
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Proposta
encaminhada ao CNE. Terceira versão. Brasília: MEC, 20017. Disponível:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf. Acesso em: 02
mai 2017.
BRASIL. Lei 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação
- PNE e dá outras providências. Brasília, 2014.
FREITAS, L. C. de. BNCC: sob nova direção. Disponível em:
https://avaliacaoeducacional.com/2016/05/31/bncc-sob-nova-direcao/.Acesso em 05
dez 2016
LOPES, A. C.; MACEDO, E. Contribuições de Stephen Ball para o estudo de
Políticas de Currículo. In: BALL, S.; MAINARDES, J. (orgs). Políticas Educacionais.
São Paulo: Cortez, 2011
MACEDO, E. Base Nacional Curricular Comum: novas formas de sociabilidade
produzindo sentidos para educação. Revista E-Curriculum. São Paulo, v. 2, n. 3, p.
1530-1555, out./dez., 2014.

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_____. Base Nacional Comum para currículos: direitos de aprendizagem e
desenvolvimento para quem? Educ. Soc., Campinas, v. 36, nº. 133, p. 891-908, out.-
dez. 2015.
MATHEUS, D. S.; LOPES, A. C. Sentidos de qualidade na política de currículo
(2003-2012). Educação & Realidade, 2014. 39(2), p. 337-57
POPKEWITZ, T. S. Reforma educacional: uma política sociológica. Trad. Beatriz A.
Neves. Porto Alegre: Artmed, 1997.

222

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A VIVÊNCIA DA FEIRA LIVRE EXPLORADA NAS AULAS DE MATEMÁTICA

Rosaline Bezerra de Oliveira

RESUMO: A feira livre é um espaço comum e para boa parte dos alunos da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Ana Cavalcante de Albuquerque é também um espaço de
trabalho e vivências. Considerando que muitos ajudam seus pais na agricultura e vendem
na feira, outros trabalham ajudando a carregar as sacolas dos clientes, outros ainda atuam
como ajudantes na venda de verduras, sapatos, roupas, encontramos também quem vá 223
junto com seus pais para a feira fazer compras. Todo esse trabalho e vivência é dado na
tentativa de ajudar a família, seja no orçamento familiar, comprar suas roupas nos períodos
festivos, para sair, ou ainda para ajudar a carregar ou vigiar as sacolas de compras. A feira
livre, portanto é considerado relevante por provocar estímulos diversos que instigam a
aprendizagem de outra Matemática, aquela que faz parte da vida e que deve sim ser
correlacionada com a Matemática da escola. Este trabalho é fruto de uma experiência
promovida na Escola Municipal de Ensino Fundamental Ana Cavalcante de Albuquerque
que está localizada no bairro Sertãozinho, município de Mamanguape-PB. Teve-se como
objetivo construir situações-problemas na sala de aula para fortalecer o ensino em
Matemática tendo como ponto chave um espaço comum entre os alunos: a feira livre. A
pesquisa visa desenvolver práticas educativas com os alunos do Ensino Fundamental
voltadas para o ensino da Matemática com base no tema: ensino e aprendizagem em
Matemática por meio de situações-problemas refletidas a partir das vivências na feira livre
pelo alunado. Trata-se de uma investigação exploratória. Contempla uma abordagem
qualitativa com metodologia adequada para alcançar o objetivo e responder a questão
levantada: que práticas educativas poderão ser desenvolvidas com o alunado na escola por
meio da construção de situações-problemas refletidas a partir das vivências na feira livre de
Mamanguape-PB? Portanto, a pesquisa qualitativa e exploratória possibilitou compreender e
interpretar o objeto em estudo, com base na perspectiva dos sujeitos envolvidos. Como
instrumento de coleta de dados utilizamos um caderno de registros da qual foi feita uma
análise de conteúdo. Os resultados alcançados levam-nos a perceber que as práticas
educativas voltadas para o ensino-aprendizagem em Matemática por meio da construção e
resolução de situações-problemas vivenciados na feira livre fortalecem o gosto pelo estudar,
aprender, o aluno torna-se mais participativo e as aulas torna-se mais atrativas, ou seja, a
construção de um currículo que de fato seja vivo possibilita avanços quanto ao ato de
ensinar bem como de aprender. Foi relevante para os (as) alunos (as) participarem,
construírem, desenvolverem, sugerirem situações-problemas a serem desenvolvidos na sala
de aula com base em suas vivências na feira livre.

Palavras-chaves: Feira livre. Matemática. Situações-problemas.

INTRODUÇÃO

O foco principal deste artigo se insere no desenvolvimento de práticas


educativas voltadas para o ensino-aprendizagem da Matemática por meio do
trabalho com situações-problemas na sala de aula com base nas vivências do
alunado na feira livre de Mamanguape-PB. Temos como tema de pesquisa ensino e

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aprendizagem em Matemática por meio de situações-problemas refletidas a partir
das vivências na feira livre pelo alunado.

Schliemann (2006, p.82-83) aponta a estratégia de “ oferecer ao aluno


oportunidades de resolver problemas em contextos práticos” como uma
possibilidade de aprender de modo significativo. Assim, foi pensado trabalhar
Matemática ligado ao tema situações-problemas na feira livre de modo a fortalecer o
aprendizado, instigar para o aprender de uma maneira lúdica. É uma forma de 224
aproximar da construção da aprendizagem muitos alunos que possuem dificuldades
de aprendizagem e instigar a outros que se encontram desestimulados para o ato de
aprender, ao mesmo tempo é uma tentativa de aproximar as duas matemáticas: a da
vida e a da escola. Com o objetivo de construir situações-problemas na sala de aula
para fortalecer o ensino em Matemática tendo como ponto chave um espaço comum
entre os alunos: a feira livre. Buscou-se responder à questão levantada: que práticas
educativas poderão ser desenvolvidas com o alunado na escola por meio da
construção de situações-problemas refletidas a partir das vivências na feira livre de
Mamanguape-PB? Os (as) alunos (as) foram instigados e questionados a como o
trabalho seria feito.

Para a realização deste trabalho foi realizado uma pesquisa do tipo


exploratória contemplando uma abordagem qualitativa com observações indiretas
fazendo uso de um caderno de registro.

Tem-se a intenção de colaborar com o fomento à pesquisa de outros


estudantes, professores, pesquisadores de um modo geral a refletirem, discutirem e
construírem práticas educativas com situações-problemas nas aulas de Matemática
afim de se incluírem todos os estudantes, em especial, aqueles que se sentem
desmotivados aos estudos, aos que tenham dificuldades de aprendizagem.

Conforme Schliemann (2006, p.70) “estudos sobre o desenvolvimento do


raciocínio lógico-matemático no contexto do trabalho tem visado não somente
esclarecer como o conhecimento se desenvolve em contextos naturais, como
também determinar como a escolarização formal contribui para este
desenvolvimento”.

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O espaço escolar deve promover a oportunidade de um aprender prazeroso,
instigador, devem oportunizar a prática de autonomia no fazer ensinar e aprender
que não se esgotem ao caráter científico, mas, que perpasse essa perspectiva.

Conforme Moura (2006, p. 74): “A visão de que o ensino da Matemática


requer contribuição de outras áreas de conhecimento e de que o fenômeno
educativo é multifacetado é, para o professor de Matemática, algo recente e ainda,
infelizmente, pouco difundido e aceito. ” 225

De fato, ensinar Matemática hoje sem considerar elementos culturais envolta


do alunado seria o mesmo que acreditar numa ideia de aprendizagem fadada ao
fracasso por não relacionar o aluno como ser humano que processa, seleciona,
interpreta informações recebidas com aspectos ligados a vida, interesses, desejos.

De acordo com Melo Neto (1999):

É preciso preparar o conjunto da população para conviver com os


avanços tecnológicos e incorporá-los; se concordamos que é urgente
integrar a sociedade e diminuir a exclusão de ambos setores do
mercado de trabalho e de consumo, é para a escola básica que
temos que voltar os olhos. Verificar a qual distância o ensino aí
oferecido se encontra desses objetivos estratégicos, é indispensável
ao dimensionamento do esforço para reverter o quadro atual e
colocá-lo em compasso com o novo padrão de desenvolvimento.
(MELO NETO, 1999, p. 46).

Muitas vezes, o fracasso escolar é advindo dessa falta de conexão entre os


saberes vivenciados dentro e fora da escola. De fato, preparar o alunado para o
efetivo desenvolvimento da cidadania é pertinente, sendo assim, é necessário que
os educandos, por meio de sua formação educacional, compreendam a sociedade
da qual fazem parte, os espaços micro e macro e como estes se constituíram ao
longo dos tempos. E, a partir destas reflexões se vê no mundo, buscando atuar de
forma consciente.

Nesse sentido, Almeida (2000), destaca:

Pensar os vínculos entre educação e trabalho requer, primeiramente,


uma inversão dos termos desta relação, não como mera retórica mas
para sublinhar a centralidade ... O trabalho deve ser tomado como
importante ponto de inflexão nas discussões sobre o campo
educacional numa sociedade onde as formas de socialização, a
cultura, os processos de demarcação dos lugares e visões sociais

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tem como fator basilar as relações travadas no, e para o, mundo do
trabalho. (ALMEIDA, 2000, p. 66).

Como os alunos poderão aprender, correlacionar, fazer uso de alguma


informação para a vida se o que lhes repassam no âmbito escolar são informações
vazias, descontextualizadas, que não provocam interesse algum, que não
despertam ao aprender, refletir, pesquisar? É preciso construir uma proposta
226
pedagógica para o ensino da Matemática que promova de fato a aprendizagem, algo
que esteja correlacionado com suas vivências.

Construir uma educação pautada na igualdade, nos direitos vivenciados para


todos, trilhar caminhos para a construção das igualdades sociais apesar das
adversidades é uma máster. Como o professor na atualidade vem superando tais
adversidades e construindo no espaço escolar um caminho que de fato seja
educacional?

Segundo Freire (2006), a competência política e técnica do professor


libertador está pautada na sua sensibilidade quanto a necessidade de buscar novos
conhecimentos, estimulando o preparo científico e técnico do aluno para
protagonizar num espaço que de fato se direcione a transformação. E, de acordo
com Tardif e Lessard (2008, p. 27), “muitos professores permanecem amarrados a
práticas e métodos tradicionais de ensino”. Ou seja, não buscam por formações que
complementem o seu fazer, refletir. Apenas seguem.

Salientam, ainda, Tardif e Lessard (2008, p. 27), que “fechados em suas


classes, os professores não têm nenhum controle sobre o que acontece fora delas;
eles privilegiam, consequentemente, práticas marcadas pelo individualismo,
ausência de colegialidade, o recurso, à experiência pessoal como critério de
competência”.

Considera-se então a necessidade, a pertinência de um constante construir


de saberes e práticas para a construção de uma educação, de um trabalho
pedagógico contundente diante da contemporaneidade.

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Fazendo ainda aporte a Freire (2005), quanto a necessidade do professor
efetivar uma prática que fortaleça o aprender de modo significativo, temos:

Um professor que não leva a sério sua prática docente, que, por isso
mesmo, não estuda e ensina mal o que mal sabe, que não luta para
que disponha de condições materiais indispensáveis à sua prática
docente, se proíbe de concorrer para a formação da imprescindível
disciplina intelectual dos estudantes. Se anula, pois, como professor.
(FREIRE, 2005, p.83).
227

Spencer (1889) em seu livro, Lei e causa do progresso, aponta que a função
da educação é preparar o homem para a vida completa apud Pontes, Moreira e Silva
(2015). Assim sendo, considera-se pertinente fazer uso de uma constante busca
para atuar no espaço escolar, está bem informado, buscar formações diversas, está
em sintonia com a comunidade, família e alunado, são constituintes que fortalecem
práticas de sucesso na escola em conexão com a vida.

Trata-se de uma investigação exploratória. Contempla uma abordagem


qualitativa com metodologia adequada para alcançar o objetivo e responder à
questão levantada: Que práticas educativas poderão ser desenvolvidas com o
alunado na escola por meio da construção de situações-problemas refletidas a partir
das vivências na feira livre de Mamanguape-PB? Por meio da temática: Ensino e
aprendizagem em Matemática por meio de situações-problemas refletidas a partir
das vivências na feira livre. Portanto, a pesquisa qualitativa, e exploratória
possibilitou compreender e interpretar o objeto em estudo, com base na perspectiva
dos sujeitos envolvidos. O trabalho foi realizado com os (as) alunos (as) da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Ana Cavalcante de Albuquerque, bairro
Sertãozinho da cidade de Mamanguape-PB.

Como instrumento de coleta de dados utilizamos um caderno de registro.


Durante as atividades propostas o alunado teve a oportunidade de construir os
elementos que compunham as situações-problemas ora vivenciadas na feira livre de
Mamanguape-PB pelos próprios educandos. Dentre as atividades desenvolvidas
temos: jogo do eu pergunto e você responde, produção de história em quadrinhos
baseada em fatos reais com situações-problemas a se desenvolver, promoção de
debates sobre as situações vivenciadas envolvendo adição, subtração,

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multiplicação, educação financeira, planejamento familiar, formas de investimento,
etc.

É relevante destacar que desde a construção das ideias até a efetivação das
atividades executadas foi perceptível o processo de evolução do sucesso escolar
dos envolvidos, e o como uma prática educativa que se constitua envolvente no
processo de ensino-aprendizagem se direciona à aprendizagem significativa, que se
empenha para um aprender mais e melhor na construção do conhecimento por meio 228
da reflexão dos saberes, das vivências.

Como resultados alcançados temos que atualmente os (as) professores (as)


precisam efetivar práticas educativas que instiguem o alunado ao aprender de uma
forma envolvente, prazerosa. A falta de considerados recursos estratégicos torna-se
como um entrave para efetivar um ensino de qualidade e deve ser superado por
meio da criatividade, inovação, busca do novo. O uso de práticas educativas
baseadas nas vivências dos educandos é uma possibilidade a se instigar o desejo
por aprender bem como o de construir a superação de certas dificuldades de
aprendizagem em Matemática.

Percebe-se que as práticas educativas voltadas para o ensino-aprendizagem


da Matemática por meio de práticas direcionadas as vivências dos educandos
possibilitaram uma aprendizagem desejável. Foi notório um maior envolvimento e
interesse e consequentemente melhor aprendizagem.

Foi notório o quanto os alunos interagiam e ao mesmo tempo se divertiam


enquanto construíam as histórias em quadrinhos, desenvolviam as situações-
problemas e até mesmo a participação efetiva nos debates, suas autorreflexões
acerca da vida considerando o aspecto financeiro, as formas de ganhar dinheiro por
meio do trabalho, as formas de investimento, a importância de só se gastar o que se
ganha, aliás, menos do que se ganha.

Comentavam alguns alunos:

Vou fazer aqui exatamente o que vivi, quero só ver que acerta o resultado.

Eu não vou gastar mais do que ganho, vou investir meu dinheiro.

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Por menos que eu ganhe, eu sempre irei poupar para situações em que eu
precise ou queira fazer algo como viajar para Paris.

Meu primeiro carro será comprado à vista

Esta ideia de investir, de comprar à vista considerando consequências de se


comprar à prazo, a exemplo da questão dos juros, a ideia do economizar, constituem 229
uma educação financeira para a vida, na qual muito bem destacam-se Miranda
(2018), Vieira (2016), Eker (2006).

O uso da construção de situações-problemas desenvolvidos pelos próprios


alunos baseados em suas vivências foi pertinente por promover uma aprendizagem
para além da escola, não se trata apenas de saber somar, multiplicar ou dividir, e
sim do uso para sua vida no momento oportuno, também a escola não é apenas
este espaço onde se ensina de forma metódica, existem outras formas de se
construir um aprender e um ensinar, é preciso que busquemos estas novas
possibilidades para a fomentação de nossa prática.

O que coaduna com Morin (2017, p. 34) quando apresenta que“ O


conhecimento das informações ou dos dados isolados é insuficiente. Ou seja, é
preciso contextualizar, integrar, estabelecer conexões entre todos os saberes para
se construir uma educação interligada ao significativo, relevante, que faz e ou fará
uso para a vida.

Com esta experiência, percebeu-se o sentido do (a) professor (a) na condição


de ter um olhar direcionado as atividades propostas, a identificar a relevância do
modo específico ao qual está sendo posto a sua prática, por meio de diversas
decisões e ações.

CONCLUSÃO

O foco principal deste artigo se insere no desenvolvimento de práticas


educativas voltadas para o ensino-aprendizagem da Matemática por meio de
situações-problemas construídas a partir de vivências desenvolvidas na feira livre.

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Para isso, foi realizado a prática de construir histórias em quadrinhos, situações-
problemas a serem respondidas, autorreflexão, participação em debates.

As pesquisas empreendidas até aqui nos permitem chegar a algumas


conclusões provisórias a serem corroboradas ou contrariadas por outros estudos.
Com estas aulas os (as) alunos (as) puderam construir suas aprendizagens por meio
da matemática em consonância com situações-problemas de seu cotidiano. A
efetivação das atividades corroborou para um aprender tanto em conhecimentos 230
matemáticos como para a relação social entre os educandos, para a vida financeira.

A partir do uso de situações-problemas considerando as diversas vivências na


feira livre foi possível trabalhar alcançando-se melhores resultados e maior
participação.

Salientamos que é relevante conquistar melhores resultados no processo de


ensino e aprendizagem quando trabalhado com temas que despertem interesses. A
interação entre o alunado em consonância com as propostas ora utilizadas
baseadas nas experiências de vida dos educandos promovem sem dúvida um
melhor aprender.

Assim sendo, trabalhar com um currículo que de fato seja vivo, que atenda
aos interesses do alunado é primordial para a construção de um ensinar que vise
espaços libertadores, críticos.

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A CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO ESCOLAR A PARTIR DE TEMAS
GERADORES

Antonio Matheus do Rosário Corrêa39 | Maria Gorete Rodrigues Cardoso40 | João


Plínio Ferreira de Quadros 41

RESUMO: O objetivo da pesquisa é compreender as estratégias de construção do currículo


escolar, com base na proposta freireana de Temas Geradores, em uma escola pública da
rede municipal de ensino de Bragança-Pará e verificar a efetividade dessa proposta no
Projeto Político-Pedagógico (PPP), na Proposta Pedagógico-Curricular (PPC) e nos Planos 232
de Trabalho dos Docentes (PTD). A pesquisa se configura em abordagem qualitativa,
desenvolvida em duas etapas: análise documental, em que foram analisados o PPP, a PPC
e o PTD de cinco docentes; aplicação de um questionário semiaberto com perguntas sobre
o processo de construção da proposta curricular, de organização do trabalho pedagógico e
efetivação de práticas educativas. Os resultados indicam que o planejamento curricular
acontece de forma dialética, buscando profundidade nas abordagens relativas à realidade
local. De acordo com os planos de trabalho docente, as práticas dos professores visam
efetivação desta proposta curricular e a formação dos alunos enquanto sujeitos críticos e
reflexivos. Conclui-se que a escola construiu estratégias eficazes para desenvolvimento da
sua proposta curricular, em que a cultura da comunidade escolar é valorizada no processo
educativo. A tarefa de construir uma proposta curricular de forma mais autônoma num
contexto em que homogeneização e a negação da diversidade e da diferença tem sido a
tônica prevalecente nas orientações curriculares emanadas do governo central, demonstra
que há um importante exercício de enfrentamento e resistência por parte da escola.

Palavras-chave: Comunidade escolar. Currículo. Prática educativa. Tema gerador.

INTRODUÇÃO
O exercício de compreensão do contexto sociocultural no qual a escola está
inserida é de suma importância para o sucesso do ato educativo e para a construção
autônoma do currículo escolar. Isso não se refere apenas à valorização dos saberes
prévios dos educandos e a estratégias metodológicas de contextualização dos
conhecimentos escolares, mas, sobretudo, a atitude de resistência da escola às

39
Graduando em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Bolsista de Apoio à
Atividade Acadêmica do Núcleo de Assistência Estudantil da UFPA - Campus Bragança. E-mail:
<matheus.correa112@gmail.com>
40
Doutora em Educação pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Professora Adjunta II da
Universidade Federal do Pará, Campus Bragança, Faculdade de Educação. E-mail:
<goreterc@ufpa.br>
41
Graduado em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Especialista em Gestão
Escolar pela UFPA. Servidor Público pela Secretaria Municipal de Educação de Bragança - PA
(SEMED-Bragança) e Secretaria do Estado de Educação do Pará (SEDUC-PA). E-mail:
<joaoambiental2017@gmail.com>

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políticas curriculares homogeneizadoras e centralizadoras que procuram destituir os
atores escolares do poder de decisão sobre o que deve ser o currículo.
O objetivo central da pesquisa é compreender as estratégias de construção
do currículo escolar, com base na proposta freireana de Temas Geradores, em uma
escola pública da rede municipal de ensino de Bragança-Pará e verificar a
efetividade dessa proposta no Projeto Político-Pedagógico (PPP), na Proposta
Pedagógico-Curricular (PPC) e nos Planos de Trabalho Docentes (PTDs). Segundo
233
Freire (1987) o Tema Gerador é uma concretização encontrada por meio da própria
experiência existencial e da reflexão crítica das relações entre os indivíduos e destes
com o mundo. Pensar em uma proposta curricular é projetar as dimensões e campos
do conhecimento que serão trabalhados pela escola, em busca de uma trajetória
formativa que produza identidades sociais e culturais (SILVA, 2010). A efetivação do
currículo, no fazer educativo, requer práticas que possibilitem um ensino eficaz e
com eficiência da aprendizagem, com o devido acompanhamento da gestão escolar
e coordenação pedagógica no que concerne às estratégias e ações pedagógicas
dos docentes.
Metodologicamente a pesquisa se configura em abordagem qualitativa,
desenvolvida em duas etapas. A primeira etapa consistiu na análise documental, em
que foram analisados o PPP, a PPC e o PTD de cinco docentes; a segunda etapa
consistiu na aplicação de um questionário semiaberto com perguntas sobre o
processo de construção da proposta curricular, de organização do trabalho
pedagógico e efetivação de práticas educativas.
Os sujeitos da pesquisa foram o gestor escolar (nome fictício Fernando) e
duas docentes (nome fictício Sandra e Rosa) atuantes no Ensino Fundamental. A
pesquisa foi desenvolvida na Escola Municipal Josefa Alvão, localizada no perímetro
urbano do município de Bragança (Pará), a qual oferta os níveis de Educação Infantil
(Pré I e II) e Ensino Fundamental (1º ao 5º ano).

O PLANEJAMENTO DA PROPOSTA CURRICULAR PELA COMUNIDADE


ESCOLAR
A escola como instituição de ensino intenciona formar sujeitos que consigam
se inserir na sociedade de modo a transformá-la e contribuir positivamente para seu

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desenvolvimento. O ambiente escolar e o meio social devem manter uma relação
profícua para produção de uma educação que considere os saberes e
conhecimentos que são estabelecidos nos processos de ensino e aprendizagem, em
que a comunidade escolar participe integralmente da construção curricular.
Assim, a proposta de planejamento curricular da escola Josefa Alvão em 2016
seguia a perspectiva pedagógica de Complexo Temático, concebido como um
agrupamento de conhecimentos em torno de um tema, vinculado à trajetória de cada
234
estudante a transformação educacional e social (PISTRAK, 2000). No ano de 2017 a
escola modifica sua perspectiva de planejamento escolar e curricular para a Teoria
dos Temas Geradores de Freire, que visa conceber as propostas políticas,
pedagógicas, de trabalho docente e de ensino em torno de conhecimentos, saberes
e vivências advindas do meio social no qual a escola se insere (FREIRE, 1987).
Considera-se tal tendência curricular como mecanismo de valorização do
contexto sociocultural da escola, assim como mecanismos de resistência às políticas
curriculares que visam uma formação geralista, bem como tentam homogeneizar as
práticas curriculares, a exemplo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Segundo Lopes (p. 25):

Não é necessário que todas escolas tenham o mesmo currículo: o currículo


precisa fazer sentido e ser construído contextualmente, atender demandas
e necessidades que não são homogêneas. Sujeitos diferentes não
produzem nem mobilizam os mesmos saberes, não se inserem nas mesmas
experiências de vida, não constroem os mesmos projetos de futuro.

A diversidade curricular no contexto educacional brasileiro é dinâmica, pois


em cada região do país são permeadas de culturas, saberes, vivências, economias
e grupos sociais diferentes. Assim como as construções de conhecimento pelos
sujeitos sociais, que apresentam diferentes percepções, compreensões e leituras de
mundo.
Nesse sentido, a atual proposta curricular da escola Josefa Alvão foi
construída por meio de diagnóstico da realidade em reuniões com pais, professores,
gestão escolar, coordenação pedagógica, pessoal de apoio, assim como a
realização de desenhos e textos produzidos pelos discentes. Tal levantamento
contribuiu para a estruturação, seleção

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o e organização dos conteúdos em três Temas Geradores a serem
trabalhados entre os anos de 2017 a 2019, respectivamente: Africanidade: Traços
Culturais na Cidadania Bragantina; Meio Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia
Bragantina; O Mundo da Leitura nos Olhos de Escritores Bragantinos. Esses temas
estão representados em projetos, ações educativas, calendário escolar, práticas
pedagógicas, avaliação de aprendizagem e culminâncias.
Dada importância da participação da comunidade no planejamento curricular.
235
O ato de conhecer os sujeitos e suas relações sociais envolve intercomunicação e
intersubjetividade, mediada pelos objetos que são e devem ser conhecidos (SILVA,
2013). Assim, compreende-se que a comunidade integra a escola, pois nessa
relação se criam ações sobre as problemáticas sociais, econômicas, políticas e
culturais de modo a contribuir com a modificação da realidade escolar e social,
oportunizando a transformação crítica, reflexiva do ensino-aprendizagem.
Libâneo (2013) afirma que o planejamento escolar e curricular é mais que
previsões e seleção do que será ensinado, deve envolver situações concretas
(problemas sociais, econômicos, politicos e culturais) presentes nas relações entre
professores, alunos, comunidade e na integração do processo de ensino. Nessa
perspectiva, é perceptível a preocupação em integrar os agentes educativos à
problemática do contexto social na tentativa de solucioná-la, visando o
aperfeiçoamento escolar.
É necessário que a comunidade seja consciente de sua importância no
contexto escolar, podendo influenciar de maneira positiva nas mais variadas áreas
da educação. É indispensável que a instituição escolar esteja mais próxima da
comunidade, procurando envolvê-la efetivamente em ações, tanto pedagógica, como
administrativas, a fim de proporcionar aos alunos um plano educativo elaborado a
partir das suas realidades e vivências.
Percebe-se a relevância que tem a comunidade na escola, devemos
constantemente buscar articular o contexto escolar com os demais contextos de
vivência dos alunos, tornando-os principais sujeitos do desenvolvimento do ato
educativo. Nessa relação, faz-se necessário ressaltar algumas questões no âmbito
familiar, a citar: formas de relacionamento, motivação do aluno, caracterização
socioeconômica, dentre outros fatores.

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De acordo com Reis (2007, p. 6), “[...] a escola nunca educará sozinha, de
modo que a responsabilidade educacional da família jamais cessará. Uma vez
escolhida a escola, a relação com ela apenas começa. É preciso o diálogo entre
escola, pais e filhos”. Sendo assim a escola precisa da participação dos familiares
no decorrer do desenvolvimento de suas atividades, pois o trabalho em parceria da
família com escola se apresenta como elemento norteador na constituição do
currículo e das aprendizagens.
236
Nesse sentido, a escola desenvolve estratégias de construção curricular com
a participação da comunidade, de modo a valorizar seus saberes e experiências
sociais, assim como verificar as problemáticas que merecem destaque no PPP, na
PPC e no PTD.

ESTRATÉGIAS DIDÁTICO-PEDAGÓGICAS DE EFETIVAÇÃO DO CURRÍCULO


ESCOLAR A PARTIR DE TEMAS GERADORES
Quanto às estratégias de efetivação dos Temas Geradores, observa-se que
os documentos da escola relacionam os anseios da comunidade em conjunto com
os conhecimentos escolares, em que “[...] o tema gerador é o ponto de partida para
o processo de construção da descoberta, em especial por emergir das necessidades
e anseios de uma comunidade” (OLIVEIRA et al, 2017, p. 12). Os conteúdos que
são selecionados e desenvolvidos por meio da prática pedagógica estão
relacionados às vivencias sociais e culturais dos alunos. Dentre os fatores limitantes
da prática educativa, os sujeitos entrevistados apontam a relação entre família e
escola, a motivação dos alunos para os estudos e a necessidade de formação
continuada interna da escola.
Nesse sentido, para que ocorra a efetivação do tema gerador os professores
desenvolvem estratégias metodológicas de planejamento, execução e avaliação da
prática educativa que são assumidos como instrumentos facilitadores e motivadores
de aprendizagens contextualizadas e significativas (ZABALA, 1998). De acordo com
Costa e Pinheiro (2013, p. 39), “o grande desafio do professor é construir práticas
que propiciem aos alunos uma visão mais crítica do mundo que os rodeia”.
O planejamento curricular desenvolvido na instituição pesquisada busca
envolver no cotidiano as atividades em sala de aula, os conteúdos referentes aos
conhecimentos selecionados pela comunidade e aqueles orientados pelas diretrizes

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curriculares oficiais, os projetos temáticos que buscam relacionar os conteúdos das
diferentes áreas de conhecimento com os temas geradores definidos pela
coletividade. Ressalta-se que a escola busca desenvolver um ensino interdisciplinar,
de modo a relacionar e contextualizar os conhecimentos escolares com os saberes
experienciais, sociais e culturais dos discentes.
Sobre a disposição dos recursos pedagógicos na escola e a acessibilidade
das crianças a esses materiais, a gestão e coordenação apontam que “os recursos
237
ficam organizados na coordenação pedagógica e são disponibilizados às crianças
de acordo com as atividades que as professoras organizam” (FERNANDO, 2018,
questionário), em que “[...] estão organizados em armários e estantes a disposição
das docentes e alunos sempre que necessário. Estão organizados na coordenação
pedagógica (armários) e na sala de informática” (MARIA, 2018, questionário).
Percebe-se que as práticas curriculares dos docentes se baseiam em
projetos, ao qual proporciona uma educação crítica, com participação efetiva da
comunidade, visando fomentar a transformação social. Acerca das contribuições do
currículo com base em Temas Geradores, Oliveira et al (2017, p. 16) reiteram “[...]
que possibilita o rompimento com a compartimentalização dos conteúdos escolares,
além de se apresentar como proposta que vem ao encontro das necessidades locais
[...]”, no qual a integração dos conteúdos possibilita uma aprendizagem significativa
por meio da interdisciplinaridade.
Ao verificarmos os Planos de Trabalho Docente, percebemos que os
materiais curriculares são fornecidos pela escola e são construídos por professores,
coordenação pedagógica e gestão escolar, além disso, os docentes são motivados a
pesquisarem mais sobre os conteúdos e recursos que podem ser utilizados em sala.
De acordo com Costa e Pinheiro (2013, p. 39), “o grande desafio do professor é
construir práticas que propiciem aos alunos uma visão mais crítica do mundo que os
rodeia.
Para que os Temas Geradores desenvolvam aprendizagens de qualidade são
colocadas em ação diferentes estratégias didático-pedagógicas em sala de aula que
visam orientação e acompanhamento de atividades realizadas pelos alunos.
Corroborando, Chaer e Guimarães (2012) dizem ser necessário que o professor
produza atividades que incentivem a participação de todos, favorecendo a

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comunicação e interação entre os alunos, em ações que propiciem conversas,
músicas, leitura, entre outros.
Os PTDs das professoras destacam o trabalho com leitura, escrita e produção
de textos de modo coletivo e individual que possibilita a compreensão e construção
de conhecimentos no tocante a palavras, frases, elaboração de enunciados, dentre
outros. Soares afirma que “a sala de aula é um ambiente propício para promover
esse encontro entre os alunos e os textos, um lugar onde o aluno tem a
238
oportunidade de buscar e adquirir conhecimentos novos [...]” e principalmente:
manifestar suas construções sociais e culturais do meio social no contexto escolar.
Compreende-se que o ambiente de sala aula é propicio a novos
conhecimentos, visto que os textos enquanto instrumentos pedagógicos são
facilitadores para o entendimento da leitura e escrita, e compete ao professor
possibilitar que seja um momento de adquirir compreensões que envolvam o
encontro entre textos e alunos, contudo, é necessário que o docente produza em
sala de aula atividades que se originam de observações, mediante as necessidades
que são apresentadas pelos alunos.
Acerca das contribuições do currículo por Tema Gerador, Oliveira et al (2017,
p. 16) reiteram “[...] que possibilita o rompimento do saber ‘compartimentalizado’ dos
conteúdos escolares, além de se apresentar como proposta que vem ao encontro
das necessidades local [...]” assim, a integração dos diversos conteúdos possibilita
uma aprendizagem significativa, além de propiciar o conhecimento de características
do lugar onde está inserido, visto que as atividades não envolvem somente uma
disciplina, mas, que estão inter-relacionadas ao tema definido pela escola em
conjunto com a comunidade.
A respeito da avaliação na Proposta Pedagógico-Curricular, está explicito os
seguintes eixos: o primeiro, denominado critérios gerais, utiliza-se abordagem
qualitativa para verificar o desenvolvimento do educando em sua integralidade e
quantitativa por exigência do sistema, onde são aplicadas provas e testes, mas
considerando o aspecto qualitativo da avaliação de aprendizagem; o segundo,
denominado critérios avaliativos, apresentam os instrumentos de avaliação, a
saber: observação, participação, envolvimento, construção de registros e pareceres,

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dentre outros, que são consideradas pela comunidade escolar como relevantes ao
processo avaliativo.
Para Luckesi (2002, p. 172), a avaliação da aprendizagem do aluno “[...] tem
por base acolher uma situação, para, então (e só então), ajuizar sua qualidade,
tendo em vista dar-lhe suporte de mudança, se necessário”. Desse modo, a
avaliação não se limita apenas ao quantitativo, aos índices, as notas requeridas
pelos sistemas de ensino, mas sim a qualidade do aluno nas dimensões social,
239
afetiva e cognitiva, aferindo os aspectos mais desenvolvidos e os que necessitam de
progresso.
No que diz respeito aos aspectos e/ou critérios utilizados pelos professores
para planejar as ações realizadas com as turmas, a primeira docente planeja
“através da pesquisa sobre os conteúdos abordados no planejamento bimestral
respeitando a necessidade da turma onde estou inserida, por isso meu planejamento
é flexível” (SANDRA, 2018, questionário). A segunda, “A partir das necessidades
apresentadas pelos alunos, tento fazer atividades diferenciadas, para suprir tais
problemáticas, como a questão da leitura e escrita e cálculos” (ROSA, 2018,
questionário).
Nas incursões das professoras, se verifica dois eixos relevantes ao ato de
planejar: a flexibilidade da sistematização do ensino e percepção das necessidades
de aprendizagem dos alunos, que visam também à construção do ensino por Temas
Geradores, que pretende conhecer as necessidades sociais e de aprendizagem do
aluno, para torna-lo um sujeito crítico e reflexivo socialmente (FREIRE, 1987;
FREIRE, 2016).
Na aplicação do questionário, a professora Sandra informa que as atividades
mais desenvolvidas por ela são aquelas relacionadas aos textos, interpretação e
leitura, haja vista, que “[...] o mediador responsável pela aquisição da prática da
leitura – o professor – deverá elaborar estratégias significativas para que ocorra a
formação do leitor [...]” (KRUG, 2015, p. 2), enquanto a professora Rosa, utiliza as
mesmas atividades que a professora Sandra, porém, através de músicas para
trabalhar os movimentos corporais, sempre numa perspectiva interdisciplinar.
Segundo as professoras, os principais desafios enfrentados pela escola e no
processo de ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental se apresenta na “[...]

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falta de apoio pela Secretaria Municipal de Educação com material pedagógico para
suporte ao professor em sala com a necessidade de cada aluno e a falta de apoio da
família com seus filhos” (SANDRA, 2018, questionário). Outra professora elenca que
“O maior desafio para nós professores das séries iniciais é alfabetizar e ao mesmo
tempo ‘letrar’ esses alunos, pois alfabetização e letramento não podem ser
distanciados. Um complementa o outro” (ROSA, 2018, questionário).
Nos discursos das professoras, percebe-se a referência a necessidade da
240
esfera municipal de fornecer material didático-pedagógico para auxiliar processo
ensino-aprendizagem. Outra questão é o apoio da família no acompanhamento e
motivação do educando no processo de aprendizagem e permanência escolar, pois
o letramento desenvolvido pela escola permeia outros espaços, a exemplo do
familiar de modo a tornar a produção de conhecimento contínuo.
Tais práticas reverberam nas metas previstas no Projeto Político-Pedagógico,
a destacar a elevação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de
2,6 em 2013 para 4,3 em 2017 (BRASIL; INEP, 2018), demonstrando um aumento
de 1,7 pontos nos últimos cinco anos. Na instituição pesquisada o planejamento se
desenvolve de forma dialética, que possibilita uma aproximação entre escola e
comunidade ao demonstrar necessidades formativas dos alunos e estratégias que
oportunizam a transformação positiva da sociedade e comunidade escolar.
A proposta curricular da escola não nega as orientações presentes em
matrizes curriculares oficiais, mas assumi como desafio ressignificar tais orientações
a partir das demandas da comunidade local e dos significados que os sujeitos
procuram imprimir no currículo.

CONCLUSÕES

Esta pesquisa buscou compreender as estratégias de construção da proposta


pedagógica e curricular de uma escola municipal de Bragança-PA fundamentada em
Temas Geradores. Os achados de pesquisa nos a inferir que a relação de interação
entre escola e comunidade na elaboração, execução e avaliação da proposta
curricular e da prática educativa tem repercussões positivas na aprendizagem dos
alunos.

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Conclui-se que a escola construiu estratégias eficazes para desenvolvimento
da sua proposta curricular, em que a cultura da comunidade escolar é valorizada no
processo educativo. Constata-se, de acordo com os Planos de Trabalho Docente,
que a prática docente visa à efetivação desta proposta curricular e formação do
aluno enquanto sujeito crítico e reflexivo, bem como, agentes transformadores do
meio social que integram.
A tarefa de construir de forma mais autônoma uma proposta curricular, num
241
contexto em que a homogeneização e a negação da diversidade e da diferença tem
sido a tônica prevalecente nas orientações curriculares oficiais em nível macro,
demonstra o exercício de ousadia e de resistência praticado pela escola investigada.
Movimento possível somente numa sociedade democrática, em que o direto de
expressão e de decisão dos sujeitos e instituições sociais são respeitados.

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ZABALA, Antoni. A prática educativa como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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A PROPOSTA DE ENSINO DE ANÁLISE LINGUÍSTICA/SEMIÓTICA NA BNCC: A
NATUREZA DOS OBJETOS DE CONHECIMENTO E DAS HABILIDADES

Delane Cristina Galiza Lourenço42 | Denise Lino de Araújo (orientadora)43

RESUMO: A BNCC (BRASIL, 2017), no tocante ao ensino de língua portuguesa (LP), afirma
dialogar com documentos curriculares produzidos nas últimas décadas e assume uma
perspectiva enunciativo-discursiva da linguagem, na qual o texto é a unidade de trabalho na
definição de objetos de conhecimento e habilidades e leva em consideração a inter-relação 243
entre os eixos de ensino: leitura, oralidade, escrita e análise linguística/semiótica (AL). Esta
última foi tomada como objeto de estudo por ser um eixo constitutivo do ensino de LP e por
vir, na versão homologada desse documento, acompanhada da semiótica. Nesse sentido, o
presente trabalho tem como objetivo identificar a natureza dos objetos de conhecimento e
das habilidades do eixo AL/semiótica na BNCC no E.F. II. Para isso, selecionamos um
campo de atuação, o jornalístico/midiático (comum ao 6º e 9º anos) e consideramos as
dimensões: discursiva, textual, metalinguística e multimodal para empreender a análise. Os
resultados revelam a recorrência da multimodalidade seguida da discursividade e da
textualidade. Há pouco espaço para a metalinguagem, no que corrobora com a proposta do
ensino de LP na BNCC que toma como centralidade o texto e sua organização com as
diversas semioses.

Palavras-chave: Base Nacional Comum Curricular. Ensino Fundamental. Análise


linguística/Semiótica. Objetos de conhecimento. Habilidades.

INTRODUÇÃO

O termo “análise linguística” (AL) “surgiu para denominar uma nova


perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico e sobre os usos da língua, com
vistas ao tratamento escolar dos fenômenos gramaticais, textuais e discursivos”
(MENDONÇA, 2006, p. 205). Essa denominação cunhada por Geraldi (1984) trouxe
uma nova abordagem sobre o trabalho com a Língua Portuguesa, em especial no
que tange ao ensino de gramática e ao tratamento dado ao texto em diversas
instâncias. Essa nova proposta se contrapõe ao ensino da gramática tradicional
baseado na prescrição da língua. Nesse cenário (análise gramatical versus análise

42
Mestranda no Programa de Pós-graduação em Linguagem e Ensino da Universidade Federal de
Campina Grande (PPGLE-UFCG).
43
Professora associada da Unidade Acadêmica de Letras da UFCG, onde atua como docente na
graduação em Letras e no Programa de Pós-graduação em Linguagem e Ensino (PPGLE-UFCG).

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linguística), temos a convivência do “velho” e o “novo”, do “conservador” e o
“inovador”.
Conforme Bezerra e Reinaldo (2013), a repercussão da proposta de prática
de análise linguística nas pesquisas acadêmicas acabou influenciando os
documentos parametrizadores do ensino de Língua Portuguesa (PCNs, 1997, 1998;
OCEM, 2006) que sugerem a forma reflexiva como metodologia para o ensino de
português. Para que esse ensino ocorra, a língua é estudada nos eixos da oralidade,
244
da escuta, da leitura, da escrita e da análise linguística, essa entendida como
reflexão sobre a língua e a linguagem. Considerando a prática de AL como eixo
articulador dos demais eixos de ensino, esse componente está presente na Base
Nacional Comum Curricular (BNCC), documento curricular (MACEDO, 2018)
homologado em 20 de dezembro de 2017, que tem caráter normativo e que define
as aprendizagens para os alunos da educação infantil e do ensino fundamental.
Esse documento apresenta a análise linguística acrescida à semiótica, uma das
teorias, assim como a AL, que concebe o texto, e não a frase, como unidade de
sentido. Conforme Barros (2005, p. 7), o texto, no viés semiótico, deve ser entendido
como objeto de significação e de comunicação entre sujeitos, conforme a autora:
“um texto define-se de duas formas que se complementam: pela organização ou
estruturação que faz dele um ‘todo de sentido’ como objeto de comunicação que se
estabelecem entre um destinador e um destinatário”. Com isso, o documento prevê
o ensino de leitura e produção de textos (orais, escritos, não-verbal) em todos os
sentidos, uma vez que há vários aspectos que precisam ser observados e
trabalhados em benefício da eficiência da leitura e da produção de textos.
Portanto, pelo que foi exposto, parece relevante investigar o eixo análise
linguística/semiótica, assim como sua organização em objetos de conhecimento e
habilidades na BNCC, uma vez que há uma lacuna de conhecimento existente no
campo de pesquisa relativo aos estudos de currículo e ensino de língua portuguesa.
Em consulta nas plataformas científico-acadêmicas CAPES e SciELO, foram
inseridas as palavras-chave “currículo” e “ensino de língua portuguesa”, e obteve-se
como resultado, pouco mais que uma dezena de textos publicados nos últimos anos.
Além disso, a BNCC apresenta uma inovação ao propor o ensino de análise
linguística articulado à semiótica.

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Com isso, o presente artigo, que foi elaborado a partir do recorte de uma
pesquisa em andamento em nível de mestrado no programa de pós-graduação em
Linguagem e Ensino da Universidade Federal de Campina Grande, tem como
objetivo identificar a natureza dos objetos de conhecimento e das habilidades do
eixo análise linguística/semiótica na BNCC nos anos finais do ensino fundamental.
Além desta introdução, este artigo está dividido em quatro seções, a saber:
fundamentação teórica, metodologia e análise de dados e, por fim, considerações
245
finais.

1. A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: OBJETOS DE


CONHECIMENTO E HABILIDADES

De acordo com Macedo (2017), a BNCC configura-se como um documento


curricular, uma vez que “ela funcionará como currículo prescrito e como norteador da
avaliação, segundo o INEP e o próprio documento” (p. 31). Essa ideia vai ao
encontro à ideia de Silva (2017) no tocante à configuração do currículo como
conhecimento e valores orientados para uma determinada formação. Segundo o
autor:

O currículo é sempre o resultado de uma seleção: de um universo


mais amplo de conhecimentos e saberes seleciona-se aquela parte
que vai construir, precisamente, o currículo. As teorias do currículo,
tendo decidido quais conhecimentos devem ser selecionados, buscar
justificar por que esses conhecimentos e não aqueles devem ser
selecionados (SILVA, 2017, p. 15)

Referente a isso, a BNCC (BRASIL, 2017) foi elaborada com objetivo de


garantir os conteúdos disciplinares comuns a serem trabalhados em todas as
escolas brasileiras de educação infantil e ensino fundamental. O documento prevê
que os alunos matriculados em todas as escolas de ensino básico brasileiro tenham
acesso aos mesmos componentes curriculares (disciplinas escolares), a partir da
indicação de objetos de conhecimento (conteúdos disciplinares), de
competências e de habilidades a serem trabalhadas ao longo da escolaridade.
Esses três conceitos destacados surgem na BNCC sem uma conceituação
detalhada dos termos, como se esses já fossem de conhecimento dos leitores-alvo

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do documento. Na busca de referências que abordem esses termos, foram
identificados conceitos esparsos que os relacionam a outros termos. No tocante aos
objetos de conhecimentos, por exemplo, encontramos conteúdos de ensino
(SACRISTÁN, 1998) e conhecimento (APPLE, 1997 apud CURY, REIS e
ZANARDI, 2018) como expressão equivalente.
O conteúdo de ensino comumente é entendido como um conjunto de
assuntos que compõem determinada matéria ou a relação de temas a serem
246
estudados em uma disciplina. Os conteúdos, dentro do processo ensino-
aprendizagem, têm sido objeto de estudos por parte de vários autores e, às vezes,
até se encontram posições antagônicas sobre o seu papel nesse processo.
Os conteúdos são meios para concretizar a aprendizagem e envolvem
desenvolvimento de processos mentais e a expressão de valores e funções que a
escola num contexto sócio-histórico concreto:

Os conteúdos compreendem todas as aprendizagens que os


alunos/as devem alcançar para progredir nas direções que marcam os
fins da educação numa etapa de escolarização, em qualquer área ou
fora delas, e para tal é necessário estimular comportamentos, adquirir
valores, atitudes e habilidades de pensamento, além de
conhecimentos (SACRISTAN, 1998, p. 150).

Para Sacristán (1998), definir o conteúdo de ensino é um dos pontos


decisivos do pensamento educativo e da prática de ensino. Definir um conteúdo
requer saber que função se pretende que esse conteúdo cumpra em relação às
pessoas, à cultura, à sociedade atual e futura.
De acordo com Apple (1997), o conhecimento surge cercado de relações de
poder que envolvem “a definição de quem tem o direito de nomear o mundo” (p. 72).
Assim, os conteúdos, conhecimento passam a ter a gozar do aval dos que
têm poder para determinar sua validade; por isso, “a fonte do currículo é a cultura
que emana de uma sociedade” (SACRISTÁN, 1998, p. 155).
É nesse sentido que os objetos de conhecimento surgem na BNCC,
juntamente com as competências e habilidades. A primeira noção como se refere à
capacidade de agir eficazmente em determinado tipo de situação, apoiando-se em
conhecimentos, mas sem se limitar a eles (PERRENOUD, 1999). Já habilidade
refere-se, especificamente, ao plano objetivo e prático do saber fazer e decorre,

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diretamente, das competências já adquiridas e que se transformam em habilidades,
segundo Macedo (2009). Como vem ocorrendo no Brasil nos últimos 20 anos, a
linguagem da competência (ou de habilidades) tem sido central. Essa linguagem
tem, nos EUA, propiciado discursos curriculares não disciplinares, na medida em
que, como avalia Taubman (2009, p. 185 apud MACEDO, 2017, p. 543), o conteúdo
da aprendizagem se torna a aprendizagem mesma, estratégias “normalmente
agrupadas como metacognitivas se tornam o conteúdo”.
247
Conforme (MACEDO, 2017), embora Michael Young (2014) seja um nome
clássico no campo, desde sempre preocupado com o enquadramento acadêmico-
disciplinar do currículo, sua discussão mais recente surgiu, segundo o próprio autor,
da percepção de “uma incompatibilidade fundamental entre adquirir habilidades e
demonstrar competência e adquirir conhecimento” (YOUNG, 2014, p. 07 apud
MACEDO, 2017, p. 544).
Diferente do que acontece na tradição instrumental em sua versão migrante,
Young e Yates, 2010, denuncia que a teoria curricular tem respondido ao predomínio
“neoliberal no mercado, escolha e accountability”, na qual “a definição de conteúdos
disciplinares é substituída por uma ênfase em resultados genéricos como
‘habilidades de pensar’ e ‘aprender a aprender’” (YOUNG e YATES, 2010, p.6 apud
MACEDO, 2017, p. 544).

2. ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: ANÁLISE LINGUÍSTICA E


SEMIÓTICA
O trabalho com a prática de análise linguística encontra respaldo
metodológico nas obras de Geraldi ([1984], 2003). Segundo o autor, a análise
linguística remete à redação escolar e à análise gramatical, tomando a reflexão
epilinguística sobre as configurações textuais, afastando-se do foco da frase isolada
e aproximando- se da formulação do texto, considerando as relações interlocutivas
nele envolvidas.
A proposta de Geraldi (1984) não excluía um trabalho com situações
sistemáticas da língua, mas enfatizava o trabalho com a reescrita, com o propósito
de provocar, como ele mesmo disse, práticas reflexivas de AL. Segundo o autor:
A análise linguística inclui tanto o trabalho sobre as questões
tradicionais da gramática quanto amplas a propósito do texto, entre as

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quais vale a pena citar: coesão e coerência internas do texto;
adequação do texto aos objetivos pretendidos, análise dos recursos
expressivos utilizados (metáforas, metonímias, paráfrases, citações,
discurso direto e indireto etc.); organização e inclusão de informações
etc. Essencialmente, a prática de análise linguística não poderá limitar-
se à higienização do texto do aluno em seus aspectos gramaticais e
ortográficos, limitando-se a ‘correções’. Trata-se de trabalhar com o
aluno o seu texto para que ele atinja seus objetivos junto aos leitores
que se destina (GERALDI, 1984, p.74).

No tocante à articulação de análise linguística, o texto e outras práticas, o


248
trabalho de reflexão sobre a língua na perspectiva da AL busca compreensão dos
sentidos e a análise dos fatos na articulação textual e discursiva. Toda essa
articulação ocorre quando o sujeito usa a língua por meio de textos orais, escritos e
multimodais. Assim, o texto deve ser explorado em vários ângulos e perspectivas,
podendo-se discutir fenômenos relacionados ao sistema da língua, à composição
discursiva-textual e aos elementos não-linguísticos (GOMES e SOUZA, 2017).
Devido a essa multiplicidade de aspectos linguísticos, é impossível interpretar
textos focalizando exclusivamente a linguagem escrita, visto que esta consiste em
apenas um dos modos dos elementos representativos de um texto, que por sua vez,
é sempre multimodal (DIONÍSIO, 2014, FERNANDES, 2009; KRESS; VAN
LEEUWEN 1996; 2006; SANTOS e PIMENTA, 2014) e, por isso, deve ser lido a
partir da conjunção de todos os modos semióticos nele configurados. Como toda
imagem possui um significado, já não basta apenas identificá-la, mas ler e
interpretá-la para compreender as implicações discursivas.
Para Hodge e Kress (1988, p. 261), a semiótica é “o estudo da semiose, dos
processos e efeitos da produção, reprodução e circulação de significados em todas
as formas, usados por todos os tipos de agentes da comunicação”.
Dentro dessa perspectiva, para Kress (2010), vários Modos Semióticos
(linguagem, imagem, música, gestos, arquitetura, dentre outros) que são realizados
a partir de várias modalidades sensoriais (visual, auditiva, tátil, olfativa, gustativa e
cinética) passam a ser considerados como participantes do denominado fenômeno
multimodal.

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3. NATUREZA DOS OBJETOS DE CONHECIMENTO E DAS HABILIDADES
NA BNCC

De acordo com a BNCC, cabe ao componente Língua Portuguesa


“proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação dos
letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas
práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras
249
linguagens” (BRASIL, 2017, p. 65-66). Para isso, a BNCC vai ao encontro dos
documentos e orientações curriculares produzidos nas últimas décadas assumindo o
texto como unidade de trabalho numa abordagem enunciativa-discursiva. Com isso,
considera a integração dos eixos correspondente às práticas de linguagem:
oralidade, leitura/escuta, produção
(escrita e multissemiótica) e análise linguística/semiótica (que envolve
conhecimentos linguísticos – sobre o sistema de escrita, o sistema da língua e a
norma-padrão –, textuais, discursivos e sobre os modos de organização e os
elementos de outras semioses) (BRASIL, 2017, p. 69).
Os eixos relacionam-se com as práticas de linguagem situadas que, por sua
vez, se articula por campos de atuação (Campo artístico-literário, Campo das
práticas de estudo e pesquisa, Campo jornalístico midiático e Campo de atuação na
vida pública, esses voltados para os anos finais do ensino fundamental) que
direciona a contextualização do conhecimento escolar e em práticas situadas em
contextos supostamente significativos para os estudantes. Essa divisão por campos
tem “uma função didática de possibilitar a compreensão de que os textos circulam
dinamicamente na prática escolar e na vida social, contribuindo para a necessária
organização dos saberes sobre a língua e as outras linguagens, nos tempos e
espaços escolares”. (BRASIL, 2017, p. 83).
Para garantir o desenvolvimento das competências específicas, cada
componente curricular apresenta um conjunto de habilidades. Na BNCC, a
competência é definida como “a mobilização de conhecimentos (conceitos e
procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e
valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da
cidadania e do mundo do trabalho” (BRASIL, 2017, p. 08).

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Essas habilidades estão relacionadas a diferentes objetos de conhecimento –
aqui entendidos como conteúdos, conceitos e processos –, que, por sua vez, são
organizados em unidades temáticas (ou práticas de linguagem, termo utilizado
apenas no componente Língua Portuguesa).
Diante do que foi exposto, selecionamos para esse trabalho o campo
jornalístico/midiático (do 6º ao 9º anos), uma vez que os textos das esferas
jornalística e midiática com suas múltiplas linguagens são comumente inseridos no
250
ambiente escolar, como também as suas múltiplas linguagens. Com isso, para
identificar a natureza dos objetos de conhecimento e suas respectivas habilidades
do eixo análise linguística/semiótica, consideramos as dimensões discursiva, textual
e metalinguística referente à proposta de ensino da AL; e a multimodalidade no
tocante à semiótica. É importante frisarmos que, para identificar as dimensões, faz-
se necessário apontarmos as habilidades de cada objeto de conhecimento, visto que
essas apresentam descrições, procedimentos que nos dão uma visão mais clara das
dimensões apresentadas. Essa organização pode ser vista no quadro a seguir:

Quadro 1: Objetos de conhecimento e habilidades (BNCC, 2017)

CAMPO JORNALÍSTICO/MIDIÁTICO (p. 142)

Natureza dos objetos de conhecimento


Objetos de Discursividad Textualidad Metalinguage Multimodalidad Habilidade
conhecimento e e m e s

Construção X X EF69LP16
composicional

Estilo X X X X EF69LP17

X EF69LP18

Efeito de X X EF69LP19
Sentido

Com base no quadro acima observamos que os objetos de conhecimento da


AL/semiótica, comuns do 6º ao 9º anos, referem-se à organização do gênero
textual/discursivo no âmbito jornalístico/midiático. O primeiro objeto é apresentado
como Construção composicional que diz respeito à estrutura gera interna do texto

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(BAKHTIN, 1997). Nesse sentido, a partir desse elemento já podemos apontar que o
aspecto da textualidade está presente, contudo para saber se há outras dimensões
é necessário verificarmos a habilidade que corresponde a esse objeto, que no caso
é a de número 16 que propõe o seguinte:

(EF69LP16) Analisar e utilizar as formas de composição dos


gêneros jornalísticos da ordem do relatar, tais como notícias
(pirâmide invertida no impresso X blocos noticiosos hipertextuais
e hipermidiáticos no digital, que também pode contar com 251
imagens de vários tipos, vídeos, gravações de áudio etc.), da
ordem do argumentar, tais como artigos de opinião e editorial
(contextualização, defesa de tese/opinião e uso de argumentos) e das
entrevistas: apresentação e contextualização do entrevistado e do
tema, estrutura pergunta e resposta etc. (grifos nossos) (BRASIL,
2017, p. 143).

Conforme a habilidade descrita acima, podemos identificar que a natureza do


objeto Construção composicional tanto se apresenta na dimensão da textualidade,
pois remete às formas de composição dos gêneros jornalísticos da ordem do relatar,
do argumentar e das entrevistas, como também propõe um trabalho com a
multimodalidade ao considerar as múltiplas linguagens desses gêneros (imagens,
tipos, gravações de áudio).
O próximo objeto de conhecimento, Estilo, diz respeito aos recursos e
linguísticos (lexicais, fraseológicos e gramaticais) expressivos e discursivos
utilizados pelo enunciador no texto (Bakhtin, 1997). Como esse elemento faz parte
da estrutura composicional do texto e também das peculiaridades linguísticas,
expressivas e discursivas do autor podemos inferir as quatro dimensões –
discursiva, textual e metalinguística – que podem ser comprovadas nas duas
habilidades desse objeto:

(EF69LP17) Perceber e analisar os recursos estilísticos e


semióticos dos gêneros jornalísticos e publicitários, os aspectos
relativos ao tratamento da informação em notícias, como a ordenação
dos eventos, as escolhas lexicais, o efeito de imparcialidade do relato,
a morfologia do verbo, em textos noticiosos e argumentativos,
reconhecendo marcas de pessoa, número, tempo, modo, a
distribuição dos verbos nos gêneros textuais (por exemplo, as
formas de pretérito em relatos; as formas de presente e futuro em
gêneros argumentativos; as formas de imperativo em gêneros
publicitários), o uso de recursos persuasivos em textos argumentativos
diversos (como a elaboração do título, escolhas lexicais, construções
metafóricas, a explicitação ou a ocultação de fontes de informação) e

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as estratégias de persuasão e apelo ao consumo com os
recursos linguístico-discursivos utilizados (tempo verbal, jogos de
palavras, metáforas, imagens).
(EF69LP18) Utilizar, na escrita/reescrita de textos argumentativos,
recursos linguísticos que marquem as relações de sentido entre
parágrafos e enunciados do texto e operadores de conexão
adequados aos tipos de argumento e à forma de composição de
textos argumentativos, de maneira a garantir a coesão, a
coerência e a progressão temática nesses textos (“primeiramente,
mas, no entanto, em primeiro/segundo/terceiro lugar, finalmente, em
conclusão” etc.) (grifos nossos) (BRASIL, 2017, p. 143).
252
Ao observarmos essas duas habilidades, podemos afirmar que o objeto Estilo
abrange a dimensão discursiva ao propor “estratégias de persuasão e apelo ao
consumo com os recursos linguístico-discursivos”; a dimensão textual ao indicar,
por exemplo, operadores de conexão adequados aos tipos de argumento e à “forma
de composição de textos argumentativos, de maneira a garantir a coesão, a
coerência e a progressão temática nesses textos”; a metalinguagem no que diz
respeito à sistematização da língua ao indicar reconhecimento das marcas de
pessoa, número, tempo, modo, a distribuição dos verbos nos gêneros textuais;
e a multimodalidade descrita explicitamente na habilidade 17: “Perceber e analisar
os recursos estilísticos e semióticos dos gêneros jornalísticos e publicitários”
e “as estratégias de persuasão e apelo ao consumo com os recursos linguístico-
discursivos utilizados (tempo verbal, jogos de palavras, metáforas, imagens)”.
O último objeto de conhecimento – Efeitos de sentido – refere-se aos recursos
expressivos da língua que proporciona a construção de significados. Nesse sentido,
podemos inferir a discursividade, uma vez que esse elemento configura-se como
uma unidade linguística que tem carga significativa expressiva; e a multimodalidade,
considerando os recursos expressivos (que podem ser escrito, oral, gestual,
imagético) para a construção do texto. Podemos evidenciar esses elementos na
habilidade 19: “(EF69LP19) Analisar, em gêneros orais que envolvam
argumentação, os efeitos de sentido de elementos típicos da modalidade falada,
como a pausa, a entonação, o ritmo, a gestualidade e expressão facial, as
hesitações etc.” (grifos nossos) (BRASIL, 2017, p. 143).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista que o objetivo estabelecido para esse texto era identificar a
natureza dos objetos de conhecimento e das habilidades do eixo análise
linguística/semiótica na BNCC nos anos finais do ensino fundamental, verificando os
aspectos da análise linguística e semiótica – a discursividade, a textualidade, a
metalinguagem e a multimodalidade – percebemos uma recorrência equilibrada no
253
tocante à primeira e à segunda dimensão em relação aos objetos de conhecimento
certamente pelo fato de que esses objeto estão intrinsicamente vinculados à
estrutura organizacional do texto e, com isso, há pouco espaço para a
metalinguagem. Com relação à multimodalidade, constatamos sua presença em
todos os objetos de conhecimento e suas respectivas habilidades. Possivelmente,
isso se deve ao fato que a BNCC afirma que a prática de AL/semiótica “envolve
conhecimentos linguísticos – sobre o sistema de escrita, o sistema da língua e a
norma-padrão –, textuais, discursivos e sobre os modos de organização e os
elementos de outras semioses” (grifos nossos) (BRASIL, 2017, p. 69).
Portanto, considerando a BNCC como um documento de caráter curricular
(MACEDO, 2018), que seleciona os conteúdos de acordo com determinados valores
“configurada por processos e construções constituídos na relação com
conhecimento eleito como educativo” (MACEDO, 2012, p. 25) e considerando o
recorte do campo de atuação jornalístico/midiático, podemos concluir que esse
documento propõe o ensino de análise linguística/semiótica baseado no texto, a
partir dos elementos composicional, estilístico, linguístico e multimodal, conforme o
documento esclarece “tal proposta assume a centralidade do texto como unidade de
trabalho e as perspectivas enunciativo-discursivas na abordagem” (BRASIL, 2017, p.
65), relacionando os textos às habilidades, aos eixos de ensino e as diversas
semioses.

REFERÊNCIAS

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O PROGRAMA NOVO MAIS EDUCAÇÃO E OS DESDOBRAMENTOS DO PNE
ACERCA DA ATUAL CONJUNTURA POLÍTICA

Gabrielly Nayara Costa Coutinho | Vilma Helena Malaquias | Ana Claudia da Silva Rodrigues

RESUMO: Para implementação de políticas educacionais, criou-se o Plano Nacional de


Educação- PNE, com o intuito de desenvolver vinte metas e estratégias que discorram
dentro de dez anos, com o objetivo de proporcionar como resultado, a melhoria da qualidade
de ensino numa visão geral. Dentre estas metas, destacou-se o sexto plano, que busca
ofertar educação integral, em ao menos, 50% das escolas de rede pública municipal e 256
estadual. Em compatibilidade com meta seis proposta pelo PNE, realizou-se um estudo
teórico sobre o Programa Novo Mais Educação em 2018, ao qual se investigou a melhoria
da qualidade de ensino em três municípios do estado da Paraíba, com base na meta
direcionada para este recorte de estudo. O presente artigo foi escrito com o suporte
instrumental de análise bibliográfica e documental, ao qual possibilitou o diagnóstico mais
preciso, acerca da problemática investigada sobre se o Programa Novo Mais Educação, é
um prospecto indutor de educação integral no âmbito da rede pública de ensino. Artigos
científicos e textos do portal do governo subsidiaram a interpretação da problemática, numa
perspectiva qualitativa na utilização das técnicas do presente estudo. A coleta de dados se
deu através de entrevistas semiestruturadas que nos permitiu concluir as análises no campo
deste recorte investigativo.

Palavras-chave: Educação Integral. Novo Mais Educação. Políticas.

INTRODUÇÃO

Em todos os momentos na história do Brasil, a educação é pautada de forma


incessante, tendo debates do ponto de vista negativo, e ou positivo. Em todos os
casos, explicita-se a necessidade de suprir as demandas educacionais assim como
promover a melhoria da mesma, através de políticas, estratégias, formação
continuada para professores e novas propostas curriculares que sirvam como
premissa norteadora para educação do país, como é o caso da Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) instituída em 2016.

Diante da efervescência de discussões acerca da educação em um contexto


político atual, faz-se necessário compreender o desenvolvimento das estratégias
implementadas diante dos desafios impostos para direcioná-las. Questiona-se o
cenário educacional e seu percurso dentre as escolas e o dia-a-dia dos sujeitos que
nela buscam conhecimento, assim como a eficácia de suas ações institucionais.

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Para propor a melhoria educacional, criou-se em 1996 o Plano Nacional de
Educação (PNE) institucionalizado no Art. 214 da Constituição Federal de 1988 e
regulamentado com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
de 1996, com o intuito de indicar “diretrizes, metas e estratégias para a política
educacional dos próximos dez anos [...]” (MEC, 2014). O PNE se constitui como um
conjunto de objetivos que devem ser alcançados em uma década. Ou seja, com seu
início em 2014, perpetuando-se até o ano de 2024, verificou-se a possibilidade de
257
inserir formas de melhoria e desenvolvimento dos propósitos educacionais, através
da promoção de quatro categorias indicativas, cujo documento disposto, explana:

O primeiro grupo são metas estruturantes para a garantia do direito a


educação básica com qualidade, e que assim promovam a garantia
do acesso, à universalização do ensino obrigatório, e à ampliação
das oportunidades educacionais. Um segundo grupo de metas diz
respeito especificamente à redução das desigualdades e à
valorização da diversidade, caminhos imprescindíveis para a
equidade. O terceiro bloco de metas trata da valorização dos
profissionais da educação, considerada estratégica para que as
metas anteriores sejam atingidas, e o quarto grupo de metas refere-
se ao ensino superior. (MEC, 2014)

Dentre as quatro categorias citadas, ramificam-se vinte metas nacionais que


visam a melhoria da qualidade de educação, como também a universalização da
educação infantil, ensino fundamental, a valorização do profissional docente e a
pluralidade de saberes, como exemplo. Para acompanhar o desenvolvimento dessas
estratégias, fez-se necessário estabelecer uma série de indicadores a partir de
dados e relatórios, que acompanham as situações atualizadas e detalhadas do PNE
pelo Brasil.

Diagnosticando conceitos acerca do PNE, delimita-se a meta de número seis


que busca: “oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% (cinquenta
por cento) das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% (vinte e cinco
por cento) dos (as) alunos (as) da educação básica” (PNE, 2014) Neste artigo, o
objeto de análise discorre a partir do Programa Novo Mais Educação, como um
prospecto indutor de educação integral nas escolas de rede pública, do qual, se
caracteriza como um dos passos para a realização de uma das metas para o Plano
Nacional de Educação.

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ESCOLA INTEGRAL E DE TEMPO INTEGRAL

No ensino integral, o currículo pedagógico fica responsável por dialogar com a


multidiversidade de conteúdo e a interdisciplinaridade a partir das disciplinas 258
tradicionais, que sejam correlacionadas entre si e façam sentido numa visão ampla
de mundo e sociedade. Já na escola de tempo integral, uma de suas características
é a ampliação de horas ou contraturno escolar. Logo, subtende-se a permanência do
aluno estudante do turno matutino na escola para o turno seguinte vespertino, ou
vice-versa.

Salienta-se que apesar de existir uma correlação entre as duas modalidades


de ensino, as mesmas não podem ser consideradas sinônimos diante da perspectiva
de que pode existir uma educação integralizada, sem que, necessariamente ocorram
a ampliação de espaço e tempo. Porém, a demanda de um currículo adaptado faz-
se indispensável para a eficácia do trabalho pedagógico e a melhoria do ensino e
aprendizagem nas escolas, sendo elas ampliadas por espaço e ou tempo, ou não.

Para além do desenvolvimento pleno, a educação integral relacionada à


educação de tempo integral, permite expandir táticas de permanência do alunado na
escola. Mas, questiona-se até qual ponto, a escola através das políticas
educacionais, oferta tais possibilidades de permanência com estrutura física,
refeição e higiene minimamente adequadas. Logo, indaga-se a respeito de como as
políticas caminham até seus resultados e qual é o caminho percorrido. A política
educacional num primeiro momento é materializada através de sua implantação,
mas seu processo de desenvolvimento também a compõe enquanto política. O
modo como as implementações precisam se adaptar ao espaço também faz parte
do conceito de política como um todo. Ball, Maguire e Braun (2016, pag. 13)
salientam os passos na política educacional a partir da prática e de quem a
acompanha:

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[...] todos os outros momentos dos processos de política e atuação
das políticas acontecem dentro e em torno das escolas são
marginalizados ou passam despercebidos. As interações sociais
desordenadas, desarrumadas, ditas criativas e banais,- que
Colebatch (2002) chama de “atividade política das negociações e da
construção de coalizações que, de alguma forma, vincula textos á
prática-, são apagadas. Professores, e um elenco cada vez mais
diversificado de “outros adultos” que trabalham dentro e em torno das
escolas, sem mencionar os estudantes, são deixados de fora do
processo da política ou tomados simplesmente como cifras que
“implementam”, Enquanto muitas políticas “feitas” nas escolas são
“escritas” pelo governo, por suas agencias ou investidores influentes, 259
a formulação de políticas em todos os seus níveis e em todos os
seus locais também envolve “[...] negociação, contestação ou luta
entre os diferentes grupos que podem estar fora da máquina formal
da elaboração de política oficial (OZGA, 2000, P. 113).

A tradução das políticas educacionais no cotidiano divergem do documento


institucionalizado, visto que o mesmo não consegue atender a toda a demanda de
diversidades e desafios presentes nas escolas. Vale ressaltar que a política das
gestões governantes das cidades, estados e do país, também tem peso nas
decisões acerca da educação.
A escola é fonte de saberes inesgotáveis, portanto, deveria ser uma das
instituições que mais se destacam no plano de vida do sujeito, assim como nos
planos de governo, dos representantes políticos da sociedade. Mesmo
compreendendo o significado da escola para além das práticas de ensino-
aprendizagem com o alunado, ressalva-se o empoderamento da mesma, diante da
falta de recursos, que causa uma sensação de improviso no ano letivo escolar, ao
qual, diante das más governabilidades, carece de meios mínimos, para a realização
de programas e projetos educacionais indutores de metas e políticas públicas.
Em 2018, fez-se necessário realizar um estudo de caso no estado da Paraíba,
acerca de um desses programas indutores de políticas educacionais para a
complementação do PNE, e da ótica de educação integral para formação integral do
estudante. O projeto intitulado “O Novo Mais Educação e a Melhoria da Qualidade
de Ensino”, buscou compreender os índices de evasão, permanência e aprovação,
assim como a redução dos índices de desigualdade social através do PNME.

Os municípios selecionados foram João Pessoa, Santa Rita e Conde


(por ordem de entrevista). Nas escolas foram entrevistados um total

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de 6 alunos, 6 mediadores, 6 professores de ensino regular, 3
gestores, 6 pais e 1 coordenador do Novo Mais Educação das
escolas estaduais de João Pessoa. (COUTINHO E RODRIGUES,
2018)

O Programa Novo Mais Educação “criado pela Portaria MEC nº 1.144/2016 e


regido pela Resolução FNDE nº 17/2017” (MEC 2016) visa melhorar a aprendizagem
de disciplinas especificas de português e matemática no contraturno escolar através
260
da ampliação da jornada na escola, para alunos do ensino fundamental, além de
reduzir os números de evasão, desistência e reprovação. A pesquisa traz à tona, o
falho desenvolvimento do programa, mesmo se configurando como uma política
importante de educação integral. Um dos gestores entrevistados ressalta:

Ele já foi melhor, entendeu? Já foi melhor, ele realmente já foi uma
política pública de verdade. Hoje em dia ele não é mais, por que
como ele diminuiu o número, o valor dele, a gente não tem material
suficiente para se trabalhar, então aluno, o quadro, o giz, ele já tem
em sala de aula, as aulas devem ser mais diferenciadas, mais
lúdicas e a gente não tem como manter isso. Então ele perdeu um
pouco a essência. (GESTOR B, 2018)

Quando Ball, Maguire e Braun (2016) relacionam as relações complexas da


política a partir do contexto local, estrutural e social, percebe-se a realidade como
principal caminho para traçar o desenvolver dos resultados. Diante disto, seja feita
uma análise a partir da fala do Professor E, ao qual retrata o início do programa no
ano letivo, como atrasado:

Ela deveria ter um começo, meio e fim durante o ano todo, e a gente
nunca sabe quando vai começar o programa em cada ano, não tem
data especifica. Estamos em junho e não começou ainda, então não
pode ser considerado como uma educação integral, até por que, se
fosse, deveria ser incluído outras disciplinas que são tão importantes
quanto Português e matemática.
O PNME como uma política de educação, desempenha uma postura proativa
e não-linear (Ball, Maguire e Braun 2016) diante das reformulações ou acasos que
tendem a acontecer. As críticas da comunidade escolar como um todo, fazem-se
presente acerca dos questionamentos enquanto desenvolvimento do programa e
suas respectivas atividades. Observa-se portanto, o desempenho precário nas óticas

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de governo e organização do programa, visto que o mesmo tem uma carga horaria
de oito meses durante o ano letivo, mas que não se concretizou.

O próprio PNME não atende ás suas necessidades básicas de


funcionamento, como poderia então se desenvolver do ponto de vista de uma das
metas educacionais a serem cumpridas pelo PNE, a partir do óptica de política
indutora de educação integral?

Em meados de 2016, foi aprovada a Ementa Constitucional nº 95, cujo critério 261

foi estabelecer um limite de despesas referentes ao teto de gastos na educação e


saúde por vinte anos consecutivos. Ou seja, para economia dos gastos do país,
optou-se por congelar novos recursos financeiros essenciais para educação e
saúde, limitando-o, através da inflação do ano de 2017. Na prática, significa dizer
que os desafios serão cada vez maiores, os recursos serão cada vez mais limitados
e os resultados da ementa, do ponto de vista educacional, sofrerão altos déficits em
relação a sua melhoria na qualidade e na própria aprendizagem dos alunos de hoje
e dos que entrarão, tendo então, consequências a longo prazo.

Tendo em vista que o PNME é um programa regulamentando recentemente,


atenta-se a observar seu desenvolvimento diante do contexto político aqui presente.
Na pesquisa, através da fala de um dos gestores, observou-se o descumprimento de
seu pleno funcionamento a partir da sua data de início, mas as dificuldades não
param nesse quesito apenas. Pontuando a estrutura física das escolas pesquisadas,
em alguns casos, houve bons resultados:

[...] o governo estadual fez uma reforma na nossa escola, nossa


escola é uma escola tombada pelo patrimônio histórico, ela tem 98
anos e a tempo que não tinha uma reforma então foi feita essa
reforma, conseguimos mesmo sendo histórica mas, mas foi
autorizada construir uma sala de aula para o Novo Mais Educação,
com ar condicionado [...] (GESTOR. A)
Entretanto, concluiu-se que as reformas na infraestrutura não alcançam todas
as escolas. Em outros casos, além da reforma e ampliação/criação de ambientes, a
falta de banheiros com chuveiros para o aluno que passa o dia na escola, não
existe.

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[...] O que falta é banheiro pra que essas crianças possam tomar
banho né, por quê eles passam o dia aqui, é horrível ficar suado o
dia todo... (GESTOR B)
Observa-se que aos poucos o programa perde a essência de sua ideia inicial.
Quando o contexto local diverge dos papeis e as secretárias não cumprem com os
resquícios mínimos de andamento do programa, o desafio maior gira em torno da
realização e funcionamento do próprio PNME, ao invés de dialogar sucessivamente
com as questões relacionadas a aprendizagem, didática e comunidade escolar. Não 262
bastando a ineficácia da qualidade de educação, a insuficiência da formação
docente, que ao longo do tempo, vem fragilizando o educando, no momento em que
ele necessite demonstrar seus conhecimentos em níveis profissionais, o
atendimento educacional se torna uma ferramenta ineficiente.

Questionando o momento atual, a pergunta que fica é sobre a partir de qual


forma, o PNME se desdobrará a partir dos próximos anos, se, em sua atual
conjuntura, ele não tem suas necessidades totalmente supridas. Como então
poderia sobreviver ao congelamento do teto de gastos para a educação?

Sabe-se que a educação pública e de qualidade, gera bons resultados quanto


ao índice da redução das desigualdades sociais. Mas, a partir do momento em que a
educação foi colocada num posto de políticas que podem esperar por duas décadas
até seu investimento para a melhoria da qualidade de ensino a nível nacional, logo
se notou a verdadeira “preocupação” dos governos em proporcionar caminhos para
a emancipação do alunado do campo, da cidade, dos subúrbios, do quilombo, da
aldeia indígena. Optou-se por reduzir o financiamento do maior programa de
investimento educacional do país, o FUNDEB, causando um possível abismo na
educação e qualidade de ensino, em longo prazo.

Segundo Iosif (2007), a qualidade da educação nas escolas públicas tem


grandes impactos na formação dos estudantes, principalmente em vulnerabilidade
social e renda baixa, visto que o ambiente escolar se torna muitas vezes, o lugar
ideal na construção do entendimento dos direitos e deveres do sujeito no corpo
social. As dificuldades advindas do contexto social, cultural e local são fortes
indicadores no desenvolvimento do aluno em sua vida, mas as possibilidades que
uma escola bem estruturada podem oferecer em contrapartida, auxilia na concepção

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do ser humano emancipado, tomando consciência do seu meio comum e refletindo a
partir de sua realidade subjetiva, libertando-se da opressão através dos processos
educativos para a edificação das suas percepções.

O CAMPO EMPÍRICO A FAVOR DE MAIS EDUCAÇÃO: VOZES DA ESCOLA

263
Na pesquisa acerca do PNME, quando os alunos, mediadores e professores
foram questionados se o programa deveria permanecer, todos se posicionaram
positivamente a favor de sua continuidade.

Ah, além de ajudar muitos alunos que tem dificuldade na escola, é


um meio de, por quê as vezes eles, é, os alunos, eles ficam sozinhos
em casa e fica melhor ficar na escola do quê sozinho em casa,
interagindo, aprendendo mais coisas. (ALUNO B)
Deve, por que traz mudanças nas pessoas e é muito bom, queria que
continuasse. (ALUNO F)
Deve, é preciso sim, não só nessa escola como em todas, é preciso
sim por que veio pra ajudar, veio só pra somar, é, como te falei a
priori, a gente tem Novo Mais Educação aqui então a gente tá
segurando esses meninos, segurar não é obrigar, a família não
pode, a gente não pode obrigar a família a deixar a criança aqui
dentro, mas se ele tá aqui dentro, ele não tá ocioso, ele sempre tá
fazendo alguma coisa, a mente tá trabalhando, eles tão aprendendo
uma coisa diferente, então deve continuar sim, com todas as
parcerias e com a comunidade, sem dúvida. (PROFESSOR
REGULAR C)
Sim, por que tem ajudado muito né, em todos os sentidos, tanto
ensino-aprendizagem. Integração família e escola, e também tem
ajudado muito os alunos que ficam nesse projeto né, livrando,
protegendo de ficar na rua. (MEDIADORA B)

Os entrevistados ressaltam a importância da escola no cuidado com o aluno,


mantendo-o no âmbito escolar por mais tempo e sendo instigado ao estudo através
de atividades educativas. Uma das possibilidades para diminuição das
desigualdades é o estudo reflexivo e multidisciplinar, e a educação integral dialoga
muito na perspectiva das pluralidades e do fazer sentido na vida do estudante. Não
se deve fixar na utópica escola sem defeitos, já que o próprio governo de estado mal
tem recursos para mantê-la. Porém, deve-se a creditar no educador que busca as

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melhores ações baseadas na integração do aluno nas multifaces dos saberes. Frisa-
se a educação como componente importante para autonomia das pessoas, e
acentuando seu direito a partir da constituição federal, mais uma vez, evidencia-se
como uma etapa de resolução dos conflitos presentes no contexto histórico social
nos dias atuais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 264

Em virtude das evidências de nossos estudos, concluímos o presente artigo,


expressando nosso ponto de vista, referendado no estudo teórico, de que os
desafios em torno dos programas governamentais, enquanto políticas
compensatórias se inserem numa problemática de tensões que perpassa o anseio
da sociedade, que vislumbra por uma educação na perspectiva de suprir
conhecimentos fundamentais.

No contexto, de que a escola, e os programas compensatórios formam uma


cadeia de relações complexas acerca da sociedade, do ensino, da aprendizagem,
dos vínculos sociais e do próprio sujeito a quem se direciona tais processos,
compreenderam que, a educação apesar de construir grandes alicerces a favor da
liberdade individual e do direito a expressar-se e resistir, educar e ser educado, é de
fato, edificante, vestígios das falas dos entrevistados. Todos os processos e ações
que garantem passos importantes para cultivar variadas formas de aprender e
refletir sobre o que foi apreendido e utilizando o que foi compreendido para criticar a
sociedade e suas interações, negativas ou positiva, nos faz sentir que vale a pena
lutar por toda a melhoria ao qual, políticas bem desenvolvidas, podem nos
proporcionar.

As políticas no contexto educacional são formas de fortalecer e abranger a


educação para todas as camadas da sociedade mais precisamente possível. É
importante que sejam avaliadas, analisadas e estudadas, pois a crítica bem
elaborada proporciona a busca pela melhoria e a reflexão do fazer para alcançar
boas repercussões. A problemática é quando as políticas são mal distribuídas e
organizadas nas escolas, visto que o próprio cenário é adaptado conforme seu

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público alvo necessita, por que o documento institucionalizado não consegue
abranger a realidade em contexto.

O PNME obteve sucesso quanto ao fato de se caracterizar como ações


guiadas pela concepção de educação integral, o que ressalva-se é o modo
negligente como elas se desenvolvem. Ball (2016) conceitua as ações de
determinadas políticas de educação, como reordenadas pelo fato de sempre ou
quase sempre, serem redesenhadas na escola. Na atualidade, pode-se confirmar tal 265
desempenho, visto que a governabilidade dos políticos é falha no sentido de atender
às demandas. Ou seja, a escola se adapta, de fato, mas em certo ponto, tais
descuidos com sua implementação a obrigam a adaptar-se, reinventar-se e
reconstruir-se ou trabalhar com o pouco disponível, sendo então, adaptadas numa
visão positiva de pluralidades, ou pela falta de recursos, que a levam a dar
andamento precário às suas atividades.

Portanto, não basta existir, as políticas e seus respectivos programas e ações


devem fazer sentido. A mera existência não fortalece vínculos de mudança social e
tampouco favorece quem realmente necessita. O PNME em sua totalidade reforçou
a proposta de integralizar o sujeito, mas tais condições de permanência e pleno
funcionamento deixam a desejar. Enquanto o PNE, com suas políticas normativas
em andamento, sofrem risco de não serem cumpridos, acarretando ao menos,
processos administrativos e multas. No geral, o PMNE deixa a desejar, implicando a
incerteza da sua eficiência enquanto metal educacional para se atingir a educação
integral no Brasil.

Faz-se necessário entender que até os mais altos recursos não são
suficientes para a grandeza que proporciona a educação. A escola sempre está se
reinventando e se adaptando a partir de sua comunidade. Sendo assim, que
pensemos na educação como base para a construção de um futuro plural e integral
de relações e saberes.

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____. PROGAMA NOVO MAIS EDUCAÇÃO-PNME: Perguntas frequentes,
execução e monitoramento. 2017. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/docman/junho-2017-pdf/66561-perguntas-frequentes-
monitoramento-maiseducacao-pdf/file Acesso em outubro de 2018.

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas curriculares no


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A IMPLANTAÇÃO DA LEI 10.639/03 NOS ANOS FINAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL NAS ESCOLAS MUNICIPAIS DE MOGEIRO – PB

Efigênia Maria Dias Costa | Maria de Fátima Silveira | Fabrícia Sousa Montenegro

RESUMO: A trajetória do negro na educação brasileira foi marcada por dois eixos: exclusão
e abandono. Nesse contexto, após anos de luta, surge a Lei 10.639/03 que torna obrigatório 267
o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos da educação básica.
Assim sendo, esta pesquisa teve por objetivo analisar como a Lei 10.639/03 está sendo
implantada nos anos finais do Ensino Fundamental das escolas municipais de Mogeiro – PB
e de que forma está refletindo na aprendizagem dos alunos. Trata-se de uma pesquisa de
enfoque qualitativo do tipo descritiva, sendo a entrevista de grupo focal e a observação não
participante os instrumentos utilizados na coleta dos dados. As informações foram tratadas à
luz da técnica de análise de conteúdo. Os resultados indicaram que nos anos finais do
Ensino Fundamental das escolas municipais de Mogeiro, a Lei 10.639/03 está sendo
implantada parcialmente. O que existe de fato são os projetos pedagógicos realizados uma
vez por ano, envolvendo todas as disciplinas. No entanto, o resultado destes projetos está
refletindo de forma positiva, tendo em vista as mudanças de atitudes e comportamentos de
alunos e professores no que tange às relações étnico-raciais no âmbito escolar.

Palavras-chave: Lei 10.639/03, Currículo, Aprendizagem.

INTRODUÇÃO

Ao longo de sua história, o Brasil estabeleceu um modelo de educação


excludente para o povo negro, impedindo o acesso à escola, bem como a
permanência. Considerando esse contexto, após muita luta do Movimento Negro, é
possível registrar alguns avanços, no sentido de pensar em políticas educacionais
que viessem corrigir as injustiças sofridas por estes povos (BRASIL, 2004).
Uma das políticas educacionais com repercussão pedagógica que ganhou
visibilidade no país foi à criação da Lei 10.639/03 que altera a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação, Lei 9.394/96 – LDB/1996, incluindo dois novos artigos 26-A e
79-B que torna obrigatório o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
nos currículos da educação básica.
No entanto, sancionar uma Lei não é suficiente para mudar a realidade, é
preciso encontrar mecanismos que garantam sua efetivação. Segundo Rocha
(2009), embora o governo brasileiro já tenha tomado algumas iniciativas, essa Lei

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ainda não foi assumida pela maioria dos educadores e dos gestores públicos da
educação. Esta avaliação é corroborada pelo próprio Ministério da Educação, que,
após promover uma série de debates pelo país sobre o tema, lançou no dia 13 de
maio de 2009, o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares
Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana, visando orientar os sistemas de ensino e as
instituições correlatas na implementação da Lei 10.639/03.
268
É nesse contexto que se situa este estudo, buscando responder a seguinte
pergunta: O modo como está sendo sistematizada a implantação da Lei 10.639/03
nos anos finais do ensino fundamental das Escolas Municipais de Mogeiro tem
refletido na aprendizagem dos alunos, no sentido de desfazer atitudes
discriminatórias e preconceituosas?
Para responder a essa questão foram desenvolvidos os seguintes objetivos:
Geral: Analisar como a Lei 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade do Ensino
da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na educação básica, está sendo
implantada nos anos finais do ensino fundamental das escolas municipais de
Mogeiro – PB e de que forma está refletindo na aprendizagem dos alunos. E
específicos: Identificar em que perspectiva o currículo das escolas selecionadas
contemplam as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana,
conforme estabelecido na Lei 10.639/03; Identificar as estratégias utilizadas pelos
professores para trabalhar em sala de aula os conteúdos referentes à História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana e a Educação das Relações Étnico-Raciais.
Trata-se de uma pesquisa de enfoque qualitativo do tipo descritiva, tendo
como instrumentos de coleta de dados a entrevista de grupo focal e a observação
não participante. A pesquisa foi realizada com professores dos anos finais do ensino
fundamental das escolas João Vicente de Brito e Iraci Rodrigues de Farias Melo,
localizadas no município de Mogeiro – PB. As informações obtidas a partir da
entrevista de grupo focal foram tratadas utilizando-se da técnica da análise de
conteúdo (BARDIN, 2011).

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UM BREVE PERCURSO TEÓRICO

Fazendo um estudo bibliográfico do contexto educacional brasileiro é


perceptível que inúmeros estudiosos e pesquisadores compartilham com a ideia de
que a escola tem sido reprodutora de uma prática pedagógica homogeneizada,
padronizada e monocultural. Essa perspectiva assumida pela escola ainda nos dias
atuais, incentiva uma formação preconceituosa e discriminatória.
269
Tal realidade se constituiu um desafio para a sociedade e, instigou um
processo de reivindicação do movimento social negro ao longo do século XX.
Finalmente, no Brasil, como fruto dessa luta social,em janeiro de 2003, o Presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei 10. 639/03, que altera a LDB – Lei
9.394/96, tornando obrigatório o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira em
todos os estabelecimentos de ensino da educação básica. De acordo com Silva:

[...] o CNE formulou importante política curricular cujo objetivo é educar para
as relações étnico-raciais éticas, a partir do reconhecimento e valorização
da participação decisiva dos africanos e de seus descendentes na
construção da nação brasileira, do respeito e divulgação de sua cultura e
história. Trata-se, sem dúvidas, de política de reparação pelos sérios danos
que o racismo e políticas tácitas de exclusão dos negros da sociedade
brasileira vêm causando, há cinco séculos (2010, p. 38-39).

Mediante estas considerações, é importante destacar que a implantação da


Lei 10.639/2003 e os avanços nas políticas públicas da educação não garantem sua
efetivação na prática pedagógica. Desta forma, como afirma Candau (2013, p. 13) é
necessário reinventar a educação escolar de maneira que “possa oferecer espaços
e tempos de ensino-parendizagem significativos e desafiantes para os contextos
sociopolíticos e culturais atuais e as inquietudes de crianças e jovens”.
Para que essa mudança aconteça Candau (2013, p.13) propõe um olhar
indissociável entre educação e cultura, uma vez que a sociedade é multicultural.
Portanto, não é concebível uma experiência pedagógica ‘desculturalizada’, isto é,
desvinculada das questões culturais da sociedade. Essa posição assumida por
Candau (2013, p. 13) faz lembrar a construção histórica do povo brasileiro que se
caracterizou, desde o princípio pela pluralidade cultural. O Brasil é o país das
diferenças, no entanto, a escola através de suas práticas homogênicas legitimou
apenas a cultura imposta pela ideologia dominante. Essa realidade ratifica a

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necessidade apontada pela autora, no sentido de inserir no âmbito escolar, novas
experiências pedagógicas com foco nas diferenças culturais.
De acordo com Nascimento (2008, p. 52), “na educação escolar, assumir a
diversidade implica reconhecer e valorizar as diferenças étnico-raciais e, para isso,
deve-se fazer escolhas curriculares e pedagógicas coerentes com essa perspectiva
[...]”. Neste sentido, a pedagogia passa a ser fundamentalmente uma ‘ação de
produção de singularidades’. Mas, para isso é preciso estabelecer um permanente
270
diálogo sobre os preconceitos e discriminações, sobre as dimensões raciais da
desigualdade social e as relações de poder, visando sempre à superação do
racismo e do etnocentrismo. “Trata-se de uma pedagogia militante e constituinte, na
medida em que pretende contribuir para a produção de uma nova cultura, de um
novo jeito de ser, de uma nova visão estética e de novas relações socioculturais”
(NASCIMENTO, 2008, p. 52).

ALGUNS RESULTADOS DA REALIDADE INVESTIGADA

Com o objetivo de identificar em que perspectiva o currículo das escolas


investigadas contemplam as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana, conforme estabelecido na Lei 10.639/03, a partir dos discursos dos
professores nos grupos focais, será discutido a respeito das perspectivas de
currículo que orientam as ações pedagógicas voltadas para o trabalho com as
relações étnico-raciais, com a diversidade cultural e com as diferenças. Nesse
contexto, busca-se compreender ainda a concepção pedagógica que fundamenta a
proposta curricular, e se o currículo é um instrumento importante na construção de
uma educação antirracista.
A análise da fala dos professores indica que no início do ano letivo é feito um
planejamento anual, e posteriormente os bimestrais, junto com a equipe técnica da
escola. Neste planejamento é colocada a necessidade de incluir em cada disciplina
conteúdos voltados para o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e
Educação para as Relações Étnico-Raciais, tomando por base as DCNs. Mas, as
escolas ainda não tiveram a preocupação de elaborar sua proposta curricular,

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deixando transparecer em algumas falas, a angústia dos professores por não terem
um documento base construído de acordo com a realidade da instituição para
nortear e articular o trabalho do corpo docente. Durante as discussões ficou evidente
que estas escolas não seguem uma proposta de trabalho construída coletivamente.

A ausência do Projeto Político Pedagógico, e consequentemente, a falta de uma


proposta curricular torna nosso trabalho difícil. Seria importante que tivéssemos uma
proposta, não uma lista de conteúdos a serem seguidos, mas como um espaço onde 271

pudéssemos discutir sobre o que seria mais adequado para tornar os alunos
questionadores, problematizadores, principalmente quando se trata de uma temática
tão complexa como é a questão racial em nosso país (M2).
No caso, dos conteúdos proposto pela Lei 10.639/03, agente não tem uma proposta
curricular organizada pela escola. Agente segue as Diretrizes Nacionais, mas, o
interessante é que a escola tenha seu próprio documento adaptado a sua realidade
(G1).
É importante lembrar também que no início do ano quando a supervisora vai orientar
o planejamento, ela foca na necessidade de incorporar os conteúdos da História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana em todas as disciplinas... e todo ano a escola
desenvolve projetos para trabalhar o que a Lei sugere. Só não temos ainda o
documento base, mas, o fato da escola trabalhar na minha opinião é significativo
(P1).

Estas falas evidenciam uma questão fundamental, embora as escolas não


tenham uma proposta curricular própria, a maioria dos professores assume a
responsabilidade de trazer para sua disciplina conteúdos que abordam a temática
em questão. O discurso destes educadores estão alinhados, no sentido de terem
consciência da necessidade de incluir tais conteúdos em sua prática cotidiana.
Nesse sentido, cabem as escolas a tarefa de construírem suas propostas
curriculares articulada com as Diretrizes Curriculares Nacionais, uma vez que, de
acordo com o Plano Nacional de Implementação das DCNs é de responsabilidade
dos sistemas e instituições de ensino realizar revisão curricular para a implantação
da temática, quer nas gestões dos Projetos Políticos Pedagógicos, quer nas
coordenações pedagógicas e colegiadas, tendo a liberdade para “ajustar seus
conteúdos e contribuir no necessário processo de democratização da escola, da

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ampliação do direito de todos e todas a educação, e do reconhecimento de outras
matrizes de saberes da sociedade brasileira” (BRASIL, 2004).
De modo geral, a realidade apontada pelos professores também corrobora
com as ideias de Rocha (2009, p. 57) ao afirmar que o processo de implementação
da Lei 10.639/03 ainda é muito lento. É possível perceber iniciativas, no entanto, na
maioria dos sistemas de ensino, não há um trabalho consistente de efetivação da
legislação em tela. Após quatorze anos de assinatura da obrigatoriedade do Ensino
272
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, pouco se alterou na realidade das
escolas.
Importante destacar que um currículo que não considera o contexto social, a
relação de poder, de desigualdade, os diferentes valores culturais, não contribui para
uma educação antirracista. É apenas mais um documento que será engavetado sem
nenhuma utilidade diante do dinamismo da vida cotidiana que a escola precisa
contemplar.

Acho que um currículo bem elaborado pode ajudar para dar um norte no trabalho das
relações étnico-raciais que para nós é um desafio, porque nós somos frutos de uma
sociedade racista, preconceituosa. Não tem jeito por mais que se diga que não
somos racistas, nossas atitudes nos condenam. Então, eu considero o currículo um
instrumento importante para mudar essas atitudes preconceituosas. Mas, para isso,
precisa ser um currículo que reconheça e valorize as heranças históricas e culturais
de origem africana (H2).
Bem, o currículo é um instrumento de suma importância no trabalho contra o
racismo, a discriminação. Por isso, precisamos nos organizar já que nós professores
somos os agentes de transformação e construir o currículo da nossa escola. Entrar
em contato com a direção, com a Secretaria de Educação e tentar sistematizar aquilo
que agente já faz (P2).

No discurso destes professores percebe-se pontos importantes na construção


de uma proposta curricular preocupada com a superação do racismo. O primeiro
ponto marcante é o professor se reconhecer enquanto agente de transformação
social, e que por isso, eles precisam agir; o segundo ponto fundamental é a questão
do docente ter consciência do grande desafio que é desconstruir ideias racistas que

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já se encontram cristalizadas na sociedade, na escola, dentro de cada indivíduo; o
terceiro ponto é a questão de elaborar um currículo que valorize a diversidade, a
história e a cultura africana. Esses aspectos comungam com o pensamento de
Nascimento (2008, p. 49) quando se refere aos educadores como agentes principais
na implementação da Lei no sistema de ensino.
Os dados a seguir contemplados visam responder ao segundo objetivo da
investigação: Identificar as estratégias utilizadas pelos professores para trabalhar em
273
sala de aula os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e
a Educação das Relações Étnico-Raciais. Portanto, as discussões terão como foco
as estratégias utilizadas pelos professores das escolas Irací Rodrigues de Farias
Melo e João Vicente de Brito para trabalhar com os conteúdos proposto na Lei
10.639/03, bem como as estratégias utilizadas no diálogo com os alunos sobre
racismo, discriminação, preconceito.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-
Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, instituída
pela Resolução Nº 1, de 17 de junho de 2004, implementa um “conjunto de medidas
e ações com o objetivo de corrigir injustiças, eliminar discriminações e promover a
inclusão social e a cidadania para todos no sistema educacional brasileiro” (BRASIL,
2004).
Para realizar estas medidas e ações as DCNs apresentam bases filosóficas e
pedagógicas, no sentido de auxiliar os sistemas de ensino e os professores sobre os
princípios que devem orientar o trabalho na sala de aula. Pautado nestes princípios
buscou-se nos grupos focais discutir a respeito dos conteúdos que estão sendo
trabalhados.

Em Matemática no desenvolvimento do projeto, trabalhei estatística, porcentagem e


análise de gráficos. Como já falei inicialmente, os alunos do 9º ano realizaram uma
pesquisa dentro da própria escola, querendo saber quantos estudantes se
declaravam pardo, negro ou branco. Com os dados em mãos construímos os
gráficos mostrando a porcentagem dos alunos entrevistados que se declarou negro,
pardo ou branco. Finalizamos as atividades analisando e discutindo os resultados da
pesquisa baseados em alguns textos que tratava do preconceito, do receio de

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assumir a identidade negra por causa da discriminação. E no dia da culminância
apresentamos para toda comunidade. Foi um trabalho muito bom (M2).

Esta atividade trabalhou diferentes conteúdos: a construção da autonomia dos


alunos, na medida em que assumiram o papel de pesquisador, conceitos
matemáticos como porcentagem, construção e análise de gráficos, discriminação,
preconceito e construção da identidade. Trata-se de uma iniciativa relevante e
274
supera a ideia de que em Matemática trabalha-se apenas cálculos.

Eu também sou professor de Matemática e leciono nos 6º e 7º anos. Tive uma


experiência bem legal trabalhando Geometria a partir das pinturas africanas (M1).
Como professora de arte, procuro trabalhar conteúdos que explore as danças
primitivas africanas como capoeira, samba. Abordei também a culinária e as pinturas
africanas, a musicalidade. Antes de entrar na parte prática, eu trabalho a teoria
sempre mostrando a importância da cultura negra e porque ela é tão desvalorizada
(A1).

Estes conteúdos fazem um resgate da cultura africana através da dança, da


culinária, das pinturas. A princípio tem-se a impressão que o conteúdo é abordado
com um fim em si mesmo, no entanto, o professor não explora apenas a parte
prática, ele busca nas raízes históricas explicações para desvalorização desta
cultura. Conforme pontua Gonçalves (2009, p. 105), “o reconhecimento da produção
cultural dos grupos étnico-raciais que compõem a sociedade brasileira poderá ser
um caminho para a construção de um país verdadeiramente multicultural”.
O professor de Matemática de forma muito criativa explora a geometria
através das pinturas africanas. No entanto, tem-se a impressão de que essa
atividade não desencadeou outras discussões voltadas para as relações étnico-
raciais. Em outras palavras, as pinturas africanas foram usadas como pretexto para
ensinar conteúdo matemático.

Bem, em História eu elenquei alguns conteúdos que são importantes para sair um
pouco daquela história puramente factual, mas mostrando o lado positivo da história
dos africanos. Então, procurei trabalhar a escravidão, sendo que do ponto de vista

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dos escravos, trabalhei a história dos quilombos, as contribuições dos egípcios, etc
(H2).
Eu também sou professor de História, depois que estudei as DCNs procuro sempre
trabalhar com conteúdos que ajudem a mudar essa visão de inferioridade dos negros
(H1).

A fala destes professores exprime a consciência de que precisa-se lançar um


olhar refinado para os conteúdos de história, desconstruindo os mitos de uma 275
história negativa, de opressão do negro. Filho (2006, p. 105) contribui com essa
discussão, mostrando que é necessário trabalhar a história do Brasil buscando
desmistificar alguns mitos veiculados pelos portugueses, para justificar a
escravização dos negros africanos e que, ao serem incorporados à historiografia e à
literatura brasileira, sendo divulgados nas escolas através de materiais didáticos e
corroborados por professores sem autonomia crítica, influenciaram o imaginário
popular até os dias atuais.
Conforme está posto nos artigos 26-A e 79-B, as disciplinas de História,
Literatura e Educação Artística são os espaços principais onde deve se desenvolver
de forma sistemática o ensino da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira. No
entanto, os conteúdos sobre a África e a reeducação das relações étnico-raciais
podem ser trabalhados pelas demais disciplinas.

Na minha visão, os conteúdos sugeridos nas Diretrizes Curriculares Nacionais é


responsabilidade de todos os professores, independente da disciplina que leciona.
Por exemplo, eu como professora de Geografia tem muito conteúdo que é próprio da
disciplina que pode ser a ponte para introduzir as relações étnico-raciais. Explico
melhor, uma aula com o mapa mundi, por exemplo, nos leva a estudar o continente
africano, sua localização no mundo e, a partir daí podemos ir além da localização
geográfica e trazer a discussão das relações raciais (G1).

A colocação deste professor encontra respaldo nas ideias de Santos (2009, p.


111), ao afirmar que a Geografia tem relação direta com a constituição das relações
raciais. O autor trata o conceito de raça não do ponto de vista biológico, mas
enquanto constructo social que é o princípio de classificação que ordena e regula os
comportamentos e relações sociais. Assim, por exemplo, quando se fala em negro,

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remete diretamente a ideia de uma comunidade, se não biológica, de origem
histórico-geográfica, neste caso, a África. Embora, este referencial seja distorcido,
tendo em vista que boa parte da África também é habitada por grupos que não são
classificados como negros, se levar em consideração o padrão brasileiro de relações
raciais. Mas, estas construções servem exatamente para produzir visões de mundo,
visões do outro, orientar e regular comportamentos e relações.

276
CONCLUSÃO

Pode-se concluir que nos anos finais do Ensino Fundamental das escolas
municipais de Mogeiro, a Lei está sendo implantada parcialmente. Em outras
palavras, os conteúdos do Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e a
Educação para as Relações Étnico-Raciais ainda não foram totalmente incorporados
na prática pedagógica dos professores. O que existe de fato são os projetos
pedagógicos realizados uma vez por ano, envolvendo todas as disciplinas. No
entanto, o resultado destes projetos está refletindo de forma positiva, tendo em vista
as mudanças de atitudes e comportamentos de alunos e professores no que tange
às relações étnico-raciais no âmbito escolar.
A análise das discussões realizadas no grupo focal com professores das
escolas João Vicente de Brito e Irací Rodrigues de Farias Melo revelaram uma
realidade preocupante no que se refere à organização do currículo. Ou seja, as
escolas do ensino fundamental dos anos finais do Município de Mogeiro, funcionam
sem o Projeto Político Pedagógico – PPP, o qual deveria contemplar a proposta
curricular.
Na ausência deste documento que iria nortear o trabalho dos professores,
faz-se planejamento anual e bimestral, orientado pela equipe técnica pedagógica.
Assim sendo, foi possível detectar uma angústia vivenciada pelos professores por
não terem uma proposta curricular elaborada coletivamente, de forma que pudesse
direcionar o trabalho pedagógico nas escolas. Neste caso, para abordar os
conteúdos proposta na Lei 10.639/03 os educadores buscam orientações nas DCNs,
porém não deixam de incorporar em suas disciplinas tais conteúdos, através de
projetos.

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Embora as escolas não tenham uma proposta curricular elaborada, a maioria
dos professores, com apenas duas exceções, manifestaram interesse em construí-la
orientados por uma perspectiva crítica de currículo. Ao analisar a fala dos
educadores é relevante destacar o desejo de construir um currículo enquanto
espaço político que permita problematizar a realidade social. No caso, das ralações
étnico-raciais não basta conhecer e valorizar as diferenças, as diversidades, mas é
preciso compreender como as diferenças foram construídas considerando a relação
277
de poder.
Essa postura assumida pelos educadores pode ser constatada na dinâmica
das atividades que foram desenvolvidas nos projetos. São propostas que requer do
aluno participação ativa, capacidade de questionar, problematizar. Em resumo, as
escolas não têm uma proposta curricular, mas as atividades apresentadas pelos
professores demonstram que eles trabalham numa perspectiva crítica, embora
alguns educadores tenham expressado a necessidade de se aperfeiçoar mais, para
que possam intervir no processo ensino-aprendizagem com maior propriedade.
Conforme pode-se perceber o tema estudado é de grande relevância, tendo
em vista o descaso com que a educação do negro vem sendo tratada neste país ao
longo dos anos. Ademais, não basta a criar as leis, elas precisam ser efetivadas,
portanto, cabe aos sistemas de ensino repensar seus currículos e inserir as
questões raciais no cerne das discussões em sala de aula.

REFERÊNCIAS

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de dezembro de 1996. Brasília, DF: MEC/SEF, 1996.

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temática “História e Cultura Afro-Brasileira” no currículo oficial da rede de ensino.
Brasília: Diário Oficial da União, 2003.

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educação: repensando nossa escola. São Paulo: Selo Negro, 2009.

SILVA, P. B. G. Estudos afro-brasileiros: africanidades e cidadania. In:


ABRAMOWICZ, A. & GOMES, N. L. (Orgs.). Educação e raça: perspectiva políticas,
pedagógicas e estéticas. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

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GT 3 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA O
ENSINO MÉDIO

ENTRE A TELEVISÃO E A SUBJETIVAÇÃO: UMA REFLEXÃO SOBRE AS


PROPAGANDAS DA REFORMA DO ENSINO MÉDIO E SEUS REFLEXOS NA
OPINIÃO DOS ESTUDANTES.

Graciela Coelho Andrade de Souza 44 | Rayssa Feitoza Felix dos Santos 45 | Kátia
Silva Cunha46 279

RESUMO: Este trabalho discute as implicações das propagandas televisivas na


formação da opinião dos estudantes a respeito da proposta da Reforma do Ensino
Médio, um tema polêmico que está sendo abordado e discutido na área da
educação. Esta pesquisa de abordagem qualitativa, nasce a partir de tensões
surgidas nos debates abertos nas aulas da pós-graduação. Seu objetivo geral é
compreender a relação entre as mensagens apresentadas pelas propagandas
relacionadas à Reforma do Ensino Médio e os discursos apresentados pelos alunos
a seu respeito. Para tal, realizarmos entrevistas com alunos, e consideramos a teoria
da subjetivação de Deleuze. Concluímos que as propagandas têm um papel
influenciador de opiniões, mas cada indivíduo assume uma postura, às vezes
mesmo sem perceber, frente à tentativa de influência que recebe, podendo ou não
aceitar ser influenciado.

Palavras-chave: Reforma do Ensino Médio. Currículo. Subjetivação.

INTRODUÇÃO
A globalidade e os avanços tecnológicos facilitam o acesso à informação e
contribuem para a construção de ideias a respeito de diferentes temáticas discutidas
na sociedade. A proposta de Reforma do Ensino Médio é uma delas. Entretanto
muitos espaços também vêm contribuindo para a formação das opiniões sobre o que
de fato representa a Reforma. A universidade e a escola são exemplos destes
espaços. Uma vez que, uma proposta tem tamanha importância e alcance, deve de
fato ser pensada e repensada por todos.
Geralmente, na posição de professores, quando indagamos os alunos sobre
essa temática, alguns deles dizem, que pelo que vem sendo informado através da

44
Mestranda em Educação em Ciências e Matemática. gracinhasud@hotmail.com
45
Mestranda em Educação em Ciências e Matemática. rayyssa.felix@gmail.com
46
Doutora em Educação. kscunha@gmail.com

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televisão, a proposta parece ser boa, enquanto outros alunos dizem que não
acreditam que a proposta seja boa, mas também não conseguem estruturar uma
linha de defesa com argumentos satisfatórios. Alguns chegam a dizer que não
sabem opinar, e outros até dizem nunca ter ouvido sobre o assunto, e demonstram
pouco interesse na discussão. Assim, notamos a falta de conhecimento mais
aprofundado sobre o que seria de fato, a reforma do ensino médio.
As discussões não ficaram restritas à sala de aula com os alunos, mas
280
também foram suscitadas questões acerca das tensões causadas pela proposta de
reforma, durante a disciplina Currículo e Docência, do curso de Mestrado do
Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, da
Universidade Federal de Pernambuco.
Essas discussões nos instigaram a pesquisar e analisar a relação entre as
mensagens apresentadas pela mídia e os discursos apresentados pelos alunos
sobre a reforma do ensino médio. Pois, é de fundamental importância para o futuro
da educação em nosso país discutir a forma que esta está sendo apresentada nas
propagandas televisivas, salientando a necessidade de compreender se os alunos
constroem suas opiniões fazendo uso das linguagens e/ou símbolos apresentados
nestas.
Para contemplar nossa inquietação, elegemos como objetivo geral:
compreender a relação entre as mensagens apresentadas pelas propagandas
televisivas da Reforma do Ensino Médio e os discursos apresentados pelos alunos a
seu respeito. E como objetivos específicos: apresentar as principais concepções de
currículo e sua correlação com a Reforma do Ensino Médio; verificar as
propagandas como dispositivo de subjetivação sobre opiniões da Reforma; e,
analisar o posicionamento dos alunos a respeito das mudanças no currículo do
Ensino Médio.
Entendemos que esta pesquisa foi realizada com uma quantidade não muito
expressiva de estudantes, e que pesquisas mais aprofundadas e com maior
representatividade de alunos podem ser feitas na mesma direção. Também podem
ser realizadas pesquisas que englobem as opiniões dos professores. Como afirma
Minayo (2015, p. 27), “o ciclo da pesquisa não se fecha, pois, toda pesquisa produz
conhecimento e gera indagações novas”.

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Entretanto, mesmo limitado, este trabalho pretende contribuir com uma
reflexão acerca da influência que os alunos possivelmente têm recebido da mídia e o
que isso pode causar. Tendo em vista que o currículo está completamente envolvido
nessa discussão, abordaremos a seguir, o conceito, as mudanças propostas e como
este campo do conhecimento está entrelaçado com a temática da Reforma do
Ensino Médio.

281
O CURRÍCULO NA CONTEMPORANEIDADE
Embora o termo currículo seja usado há alguns séculos, não apresenta uma
única definição, sendo difícil defini-lo de forma objetiva. Muitos têm sido os sentidos
dados a este termo, na área educacional. Segundo Lopes e Macedo (2011 p. 19):
Indo dos guias curriculares propostos pelas redes de ensino àquilo que
acontece em sala de aula, currículo tem significado, entre outros, a grade
curricular com disciplinas/atividades e cargas horárias, o conjunto de
ementas e os programas das disciplinas/atividades, os planos de ensino dos
professores, as experiências propostas e vividas pelos alunos.

Outros autores corroboram, ao afirmar que a medida que esse termo se refere
a muitas partes de uma prática tão complexa, não é simples de ser compreendido.
Pina (2006, p. 19), afirma que
Currículo é uma conversa complicada. Estruturado por diretrizes, focado em
objetivos, excessivamente voltados para resultados, o currículo escolar luta
para permanecer conversa. É uma conversa — esforços de entendimento
por meio da comunicação — entre alunos e professores, indivíduos que
efetivamente existem em determinados lugares e dias, ao mesmo tempo
pública e privada.

Assim, compreendemos que o currículo é construído na interação, na prática


escolar. Grundy (1987, p. 5 apud SACRISTÁN, 2000, p. 14) afirma que “o currículo
não é um conceito, mas uma construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito
abstrato que tenha algum tipo de existência fora e previamente à experiência
humana. É, antes, um modo de organizar uma série de práticas educativas.”
Mesmo diante de tantas possíveis formas de compreendermos o currículo,
podemos perceber que permeado por todas elas, há uma ideia em comum - a de
organização, que no contexto educacional remete ao planejamento. Não há dúvidas
que é necessário planejar, e esse ato requer, entre outras coisas, selecionar as
atividades que serão desenvolvidas, os conteúdos ou a ordem que eles serão
ministrados, e quanto tempo será disponibilizado para cada um. Sacristán (2000, p.
28) vai mais além, ao descrever que,

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De alguma maneira pois, estão implicados com o currículo todos os temas
que têm alguma importância para compreender o funcionamento da
realidade e da prática escolar no nível de aula, de escola e de sistema
educativo. Atrever-me-ia a afirmar que são poucos os fatos da realidade
escolar e educativa que não têm "contaminações" por alguma característica
do currículo das instituições escolares.

Assim, o currículo é percebido impregnado em quase tudo que envolve


a realidade escolar e educativa. Essa compreensão torna bem clara a ideia de que,
sob esta perspectiva, a reforma do ensino médio está direta e intrinsicamente ligada
às questões curriculares, já que trata, entre outros temas, da carga horária dessa 282

modalidade de ensino e da seleção e distribuição de disciplinas.


Para além disso, as mudanças anunciadas pelo Ministério da Educação –
MEC – (Lei nº 13.415/2017) impactam diretamente o currículo, não só das escolas
de ensino médio, mas também, no currículo das universidades que possuem cursos
de formação de professores. Em relação às mudanças com impacto nas escolas
de ensino médio, anunciadas pelo MEC, podemos destacar como algumas das
principais: o aumento da carga horária, passando o ensino médio a ser de tempo
integral; a classificação das disciplinas como obrigatórias ou optativas, distribuídas
em cinco áreas do conhecimento e a possibilidade de cursar um ensino técnico
dentro da carga horária do ensino médio.
Com a alteração prevista, a carga horária passa das atuais 800, para 1400
horas, e o ensino médio passa a ser de tempo integral (Lei nº 13.415/2017). Em
relação a flexibilização das disciplinas, a reforma do ensino médio propõe que
disciplinas como português e matemática permaneçam obrigatórias durante os três
anos do ensino médio. Porém, outras disciplinas se tornem optativas, de modo que o
aluno escolha as disciplinas da área de conhecimento que ele deseje estudar.
Diante dessas e das demais mudanças previstas, como a possibilidade de
cursar o ensino técnico, em contraste à realidade das escolas brasileiras, críticas
surgem. Pois, se pensamos na realidade de nossas escolas, logo surgem questões
como: as escolas têm condições de espaço e infraestrutura, de logística, e
pedagógicas de abarcar cursos técnicos, mesmo com cortes previstos para a
educação? As escolas têm condições de funcionamento com todos os alunos em
jornada integral? Questões como estas parecem não ter sido consideradas ao serem
propostas as alterações no ensino médio. Sobre as limitações que as escolas

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brasileiras apresentam e que podem comprometer a implantação da Reforma do
Ensino Médio, Barbosa (2003, p. 333) afirma:
Tendo-se em vista as condições objetivas do país, a drástica redução dos
gastos sociais, em particular na educação, as condições precárias das
redes de ensino público, as reconhecidas deficiências na formação de
professores, parecem pouco realistas tanto as diretrizes curriculares para o
ensino médio quanto as que se referem ao ensino técnico. Quais as
condições objetivas para que as escolas dos sistemas públicos de ensino,
sabidamente sucateadas quanto à estrutura física, ao material didático e
aos recursos humanos e financeiros, ofertem uma educação de caráter
geral e técnico em condições de responder ao conjunto de 283
responsabilidades que os documentos lhes atribuem? Que projeto
pedagógico poderão construir tais escolas? Quais as possibilidades de
colocarem em prática propostas tão ambiciosas como as formuladas pelos
documentos examinados? E, se não o conseguirem, a quem caberá a
responsabilidade pelo insucesso? Os propositores das reformas sabem que
as escolas dos sistemas públicos de ensino não gozam de autonomia, seja
administrativa seja financeira (apesar do Fundef).

Assim, cabe uma reflexão sobre os próximos passos da educação em nosso


país, e quais consequências teremos, diante das escolhas que atualmente estão
sendo feitas.

PROPAGANDA E SUBJETIVAÇÃO
Não esquecendo as marcas negativas que a modernidade nos deixou de
herança, falaremos sobre um aspecto positivo que ela iniciou, a questão da indústria
e sucessivamente assim os avanços tecnologicos de um mundo globalizado, logo
precisamos refletir sobre nosso contato com elas. Dentre os diversos meis de
comunicação presentes na sociedade comtemporânea - muitos marcados pela
transmissão acelerada de informações e praticidade -, gostaríamos de abordar
apenas as propagandas transmitadas pela televisão e seu inexaurível fluxo de
imagens e símbolos, no qual, de modo instantâneo o telespectador constrói e
desconstrói ideias, pensamentos, crenças e conceitos. Propagandas essas,
relacionadas a Lei nº 13.415/17, que propõe a Reforma do Ensino Médio. Antes de
discutirmos sobre elas, gostaríamos de definir os conceitos referente a propaganda.
Segundo Pinho (2012, p.132) temos a propaganda como “o conjunto de
técnicas e atividades de informação e persuasão destinadas a influenciar, num
determinado sentido, as opiniões, os sentimentos e as atitudes do público receptor”.
É importante ressaltar que a propaganda é um intrumento que se caracteriza pela
capacidade de produzir subjetidades, e para isso se faz uso do marketing na criação

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de estratégias que permitam alcançar o objetivo desejado sobre o sujeito que
assiste. Deleuze (1992, p. 224) ressalta:
O marketing é agora o instrumento de controle social, e forma a raça
impudente de nossos senhores. O controle é de curto prazo e de rotação
rápida, mas também contínuo e ilimitado, ao passo que a disciplina era de
longa duração, infinita e descontínua.

Na intenção de entender as propagandas como instrumento capaz de


produzir subjetivações, sem muito aprofundar, pensaremos a propaganda como 284
sendo um dispositivo no qual diversas linhas de força perpassam na interação com
sujeito. Ao definir a propaganda como dispositivo fizemos uso de Agamben (2009,
p.40, apud SILVA, 2014, p. 148) para compreender que dispositivo é “qualquer coisa
que tenha de algum modo à capacidade de capturar, orientar, determinar,
interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os
discursos dos seres viventes”. Portanto ao pensar dispositivo como uma máquina
que produz subjetivações vinculada ao poder, definimos que a propaganda exerce a
mesma função. Ao integrar determinado dispositivo, o sujeito pode ser subjetivado
pelas ideias, conceitos e filosofias apresentadas.
Tal dispositivo cuja função é produzir no sujeito uma opinião sobre
determinado objeto apresentado, pode ser entendido como um instrumento para
manutenção do poder. Nesse processo sugerimos analisar como esses processos
de subjetivações acontece. Segundo Queiroz (2015, p.137):
Podemos categorizar os tipos subjetivação da seguinte forma: Não perceber
que está sendo subjetivado. Perceber, querer lutar contra as forças, mas
não conseguir. Perceber e aceitar. Perceber, lutar contra as forças que o
subjetivam e conseguir rejeitá-la.

Ao pensar nos tipos de subjetivação apresentados por Queiroz


compreendemos que na interação entre dispositivo e sujeito nem sempre há uma
subjetivação do sujeito (telespectador) quando ele decide continuar no dispositivo,
nesse caso assistindo a propaganda ele pode não perceber, porém suas ideias a
partir daquele momento tem referência ao que foi assistido. Pode acontecer de
perceber, lutar contra o que foi apresentado, porém não conseguir; perceber e
aceitar as ideias e símbolos apresentados ou simplesmente lutar contra o que é
apresentado procurando outras fontes de informação e rejeitar o que lhe foi

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apresentado incialmente. A partir das ideias apresentadas entendemos que o projeto
de subjetivação é essencial na construção do sujeito moral.
Nós enquanto sujeitos contemporâneos, somos bombardeados de informação
que recebemos de diversos veículos de comunicação, assim algumas informações
acabam sendo vistas de maneira superficial e não há uma reflexão diante do que é
apresentado.
Entre o anúncio da medida provisória referente a reforma do ensino médio
285
pelo Presidente Michel Temer em setembro 2016, até sua aprovação pelo Senado,
diversas propagandas de televisão, rádio e internet sobre a mesma, foram
disponibilizadas pelo Ministério de Educação, com bastante assiduidade. O objetivo
era explicar ao telespectador a importância da reforma do ensino médio, e as
contribuições para educação. “Durante esse período de aprovação da Reforma do
Ensino Médio, algumas propagandas foram ao ar em canais de rádio e televisão,
para transmitir o sentido que o governo federal queria que fosse disseminado à
população acerca da reforma.” (OLIVEIRA, 2017, p. 851).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para realização deste estudo, utilizamos a abordagem qualitativa por
entendermos que é a que melhor se adequa à finalidade de nosso trabalho, já que,
de acordo com Minayo (2015, p. 21), a pesquisa qualitativa:
Trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das
crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos
é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se
distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar
suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus
semelhantes.

A pesquisa foi realizada com 32 alunos, com a faixa etária 14 a 20 anos, que
cursam o ensino médio na rede Pública de Ensino em Pernambuco. O procedimento
metodológico utilizado foi aplicação de um questionário a estes estudantes, com
perguntas relacionadas ao seu posicionamento frente a reforma do ensino médio, e
quais meios utilizou como base, para construção de sua opinião. De acordo com Gil
(1999, p.128), o questionário pode ser definido “como a técnica de investigação
composta por um número mais ou menos elevado de questões apresentadas por
escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças,
sentimentos, interesses, expectativas, situações vivenciadas etc.”

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Para melhor compreensão de como foi elaborado o questionário, este foi
subdividido em três partes, a saber: A primeira, composta por duas perguntas com o
objetivo de saber o perfil do aluno (idade e série), a segunda, composta por uma
pergunta direcionada a avaliação da Reforma do Ensino Médio, a terceira parte foi
construída com duas perguntas direcionadas a identificar algumas das possíveis
influências da propaganda na formação de sua avaliação referente a proposta da
Reforma.
286
Portanto, após a coleta das informações a partir do instrumento descrito
acima, foi realizada a categorização, análise, e interpretação dos dados, com base
numa fundamentação teórica consistente, objetivando compreender e explicar o
problema pesquisado.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Com base nas discussões apresentadas por Oliveira (2017), apresentaremos
um resumo dos principais pontos elencados pelas propagandas sobre a reforma do
ensino médio, as quais foram apresentadas na televisão aberta.
A primeira, intitulada de MEC Novo Ensino Médio/01 com duração de um
minuto, tem como cenário a sala de aula composta por professor e aluno, durante a
suposta aula a professora com um discurso, curto, simples e objetivo chama a
atenção dos alunos com a fala “é hora de falar de educação” ela faz afirmações
sobre a necessidade de mudança do ensino médio, visto que nas avaliações
recentes foi verificado a necessidade de melhorá-lo, justificada pela diminuição nos
resultados dos alunos, em avaliações externas quanto aos índices de português e
matemática. Os estudantes escutam com semblante animado de conformidade a
tudo que a professora apresenta. A ideia principal da propaganda é consolidada com
a frase “Agora é você que decide seu futuro” convidando os jovens telespectadores
a participar das discussões.
Na segunda propaganda “MEC Novo Ensino Médio/02” com duração de um
minuto, o cenário também é uma sala de aula, porém quem é o ator principal é um
aluno que traz as ideias sobre a reforma do ensino médio. Incialmente ele vai ao
encontro da professora como que solicitasse permissão para falar com os alunos da
sala, ao se dirigir aos alunos ele inicia com uma frase que chama a atenção para as

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ideias que irá apresentar “Aí, galera! Vocês já conhecem o Novo Ensino Médio?”.
Percebemos que posteriormente haverá explicações sobre o novo ensino médio,
ressaltando que a reforma do ensino médio deixará o ensino ainda mais estimulante
e compatível com a realidade do estudante, tendo como referência países que
tratam a educação como prioridade, ao mesmo tempo aparece os nomes no quadro
branco da sala Coréia do Sul, França, Inglaterra, Portugal, Austrália.
A terceira propaganda “Com o Novo Ensino Médio, você tem mais liberdade
287
para escolher o que estudar!”, com duração de 30 segundos acontece em um
cenário que representa um auditório escolar composto por estudantes. Inicialmente
o narrador faz a afirmação “novo ensino médio quem conhece aprova”. Em seguida
os estudantes de forma individual se apresentam, levantando da cadeira, em meio
ao cenário escuro há uma luz que foca para o estudante que fala, e apresentam as
afirmações “Eu escolho o que eu vou estudar? Então é claro que eu aprovo!”, “Minha
vocação, sim, eu aprovo!”, “Eu quero!”, “Eu aprovo”, posteriormente outro estudante
finaliza a propaganda com “quem conhece o novo Ensino Médio aprova” ao mesmo
tempo mais uma vez aparece escrito na tela “Já é assim, 72% dos brasileiros”, e faz
um convite para que acessem o site do MEC e saibam mais sobre o assunto.
Podemos observar que as três propagandas acontecem em diversos cenários
educacionais representado por jovens estudantes, apresentando a reforma como
algo positivo sendo justificado por diversas falas dos autores.
Podemos observar na figura 1, em relação à denominada avaliação sobre a
reforma do ensino médio, que a metade dos entrevistados acreditam que a Reforma
do ensino médio é positiva porque é um importante avanço no sistema educacional,
31,3% dos participantes enxergam a reforma do ensino médio de forma negativa por
não haver tempo suficiente para ser debatida e 18,8% não conseguiram opinar
sobre a reforma do ensino médio.

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Figura 1: Avaliação Sobre a reforma do Ensino Médio

288

Fonte: As autoras

A partir das respostas obtidas constatou-se que em nossa amostra, um


percentual significativo de alunos que acreditam que a reforma seja positiva para o
sistema educativo podendo estabelecer uma possível relação ao pensar que as
propagandas demostram apenas os pontos considerados positivos da reforma.
Para compreender os resultados apresentados na figura 2, vale ressaltar que
dois alunos fizeram uso de mais de uma fonte de informação para construir sua
opinião sobre o tema, afirmando que acredita que a Reforma seja negativa diante
das Propagandas do Governo Federal e Medida Provisória nº 746 de 2016.
Podemos verificar na tentativa de entender como os alunos constroem suas opiniões
referente a Reforma do Ensino médio, que mais de 50% dos que acreditam que a
reforma é positiva, usaram como meio de informação na construção de sua opinião
as propagandas do governo federal, reafirmando os modos de subjetivações
proposto por Queiroz (2015) anteriormente, visto que a autora em sua obra faz
menção aos processos de subjetivações do sujeito, acreditando na relação de
poder-resistência que existe dentro de um dispositivo, o que permite ao sujeito
resistir ou ceder as forças que perpassam o dispositivo . Os demais através de
opiniões de amigos, professores, familiares etc. Segundo Foucault (1999), ao
adentrar um determinado dispositivo o sujeito é perpassado por múltiplas relações
forças. Linhas de forças essas, que pertencem ao dispositivo com a intenção de

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subjetivar o sujeito (poder), entretanto durante os movimentos que permeiam o
sujeito dentro do dispositivo, a resistência se apresenta quando o mesmo não se
deixa ser subjetivado, assim o poder agora se faz no sujeito. Nesses casos, o sujeito
pode não ter percebido que foi subjetivado pelas ideias das propagandas, ou ao
perceber. pode ter tentado lutar, porém, mesmo assim, ter sido subjetivado.

Figura 2. Mapeamento referente os meios utilizados na construção de opinião.


289
Qual(is) meio(s) você usou como base para construir sua opinião?
12
Número de alunos

10
8
6
4
2
0
Positivo
Propaganda do Leitura da Medida Opinião de amigos,
Governo Federal, Provisória nº 746 de professores, familiares, Negativo
informações 2016. etc.
Não sei
transmitidas pela TV,
rádio e/ou outras
mídias.
Meios de transmissão de informação
Fonte: As autoras

Conforme apresentado na figura 2, os que tem uma visão negativa sobre a


reforma utilizaram-se das opiniões de amigos, professores, familiares etc.,
observando-se que poucos fizeram uso da leitura da Medida provisória nº 746 de
2016 para esclarecer suas dúvidas. Entretanto, mesmo quando as propagandas têm
por objetivo construir uma ideia positiva sobre algo, como no caso das que tratam da
reforma do ensino médio, o receptor da mensagem pode não ver relação sobre o
discurso apresentado e a realidade vivida, uma vez consegue, a partir de sua
sensibilidade, estruturar outra linha de raciocínio. Como observado no mapeamento
dos dados, onde um aluno ao se posicionar de forma negativa sobre a reforma,
responde que construiu sua opinião através das propagandas do governo federal, ao
pensar na propaganda como dispositivo, o sujeito permanece nele, luta contra as
forças que subjetivam e consegue rejeitar. Outros acreditam que com o novo Ensino
Médio a escola pública diminuirá as disciplinas, e isso pode prejudicar o seu
desempenho no ENEM. Entre os que não conseguiram opinar tivemos resultados

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semelhantes, demostrando que diante de tantas afirmações, alguns ainda não
conseguem construir uma opinião sobre a reforma.
Através das discussões feitas inicialmente, pensar em subjetivação é pensar
na relação sujeito-produto - entendemos as propagandas como o produto -, quando
há interação entre o sujeito e produto simultaneamente perpassam diversas forças
que refletem o resultado dessa interação. Observamos que os sujeitos ao receberem
uma informação, antes de tomá-la como verdade estabelecem relações que
290
perpassam sua trajetória de cuidado de si, por onde sua subjetividade foi
desenvolvida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sendo o objetivo da pesquisa comprender a relação entre as mensagens
apresentadas pelas propagandas da Reforma do Ensino Médio e os discursos
apresentados pelos alunos a seu respeito, identificamos, que houve uma relação
direta entre as afirmações emitidas pelas propagandas e a opinião dos alunos, além
disso constatamos que uma minoria bastante significativa que busca outras fontes
de informações de cunho mais cientifico – artigos, leis –. A ausência de
conhecimento aprofundado, torna o sujeito frágil, por não possuir fundamentos não
consegue refletir e fazer concessões lógicas sobre o que é apresentado, ficando
suscetível a ser subjetivado pela mensagem que o perpassa durante seu cotidiano.
Com base nos dados da pesquisa, foi possível perceber que metade dos
alunos entrevistados se posicionam a favor da reforma. Podemos levar em conta as
facilidades que os meios de comunicação disponibilizam, e que muitos alunos fazem
uso dessa praticidade para aceitar as mensagens impostas. Entretanto, diante do
bombardeio de informações presentes nesse mundo tecnológico surge a
insegurança de construir uma opinião. Através da pesquisa concluiu-se que muitos
se mostram confusos referente a Reforma do Ensino Médio, e que mesmo sendo
algo de extrema relevância na sua vida acadêmica, poucos demostram estar
interessados em entender de fato o que muda com a Lei nº 13.415/17.
Podemos concluir que, apesar de uma grande maioria apresentar os
discursos da mídia como fundamentos de sua fala, também existe a possibilidade de
associar outros fatores na construção de uma ideia, ou até mesmo pensar na

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questão que através de um mesmo dispositivo cada sujeito será subjetivado de
maneiras diferentes, podendo aceitar ou não, o que é imposto.

REFERÊNCIAS
BARBOSA, R. L. L. Formação de educadores: desafios e perspectivas. Barbosa,
Raquel Lazzari Leite (org.). São Paulo: Editora Unesp, 2003.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Disponível em:


http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp- 291
content/uploads/2018/04/BNCC_EnsinoMedio_embaixa_site.pdf Acesso em 27 jul
2018.

BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Disponível em:


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PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e resistências. | De 5 a 7
de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
REFORMA DO ENSINO MÉDIO E CURRÍCULO: PRODUÇÃO DO
CONHECIMENTO ENTRE OS ANOS 2011 e 2018
Eudite Fernandes Carneiro47 | Benedito Gonçalves Eugenio48

RESUMO: Este artigo apresenta os resultados de um estado do conhecimento da


produção acadêmica sobre política curricular para o ensino médio no período 2011 e
2018. Para a seleção dos artigos para análise consultamos os periódicos disponíveis 292
na base do Scielo e classificados como Qualis A em educação. Estas publicações
foram complementadas com 8 textos publicados na 20ª. edição da Revista Retratos
da Escola dedicada à reforma do ensino médio. A pesquisa pretende dar uma maior
visibilidade acerca das políticas curriculares voltadas para o ensino médio, nos
últimos 7 anos, particularmente após a sanção da Lei nº 13.415/2017. As produções
analisadas mobilizam posições divergentes, moldadas pelos governantes, em
relações de poder, via controle do conhecimento. Contudo, outras possibilidades de
ressignificação do currículo apontam para novas possibilidades de análise e
compreensão dos diferentes contextos das políticas curriculares para o ensino
médio.

Palavras-chave: Ensino Médio. Currículo. Políticas Curriculares. Reforma do Ensino


Médio.

INTRODUÇÃO

A etapa final da educação básica ganhou destaque após a sanção da Lei nº


13.415/2017 (BRASIL, 2017), envolta pela perspectiva de um cenário de muitas mudanças e
margeada por discursões e pela desconfiança da sociedade quanto à sua real intenção.
De acordo com Oliveira (2016, p.190), ao longo da história do país, as políticas
públicas curriculares assumem um papel estratégico no desenvolvimento de uma pedagogia
voltada aos interesses do Estado, suscitando uma reflexão sobre como foram estruturadas
as políticas curriculares para o ensino médio no país, na última década, culminando com a
iminente reforma. “Mais relevante torna-se essa questão quando consideramos as
desigualdades entre regiões e estados do país, o que demonstra que a existência de um
padrão mínimo de qualidade, como um princípio constitucional que deveria ser assegurado,
está longe de ser isonômico.”
De acordo com Moll (2017, p.63): “[...] as desqualificadas condições do sistema
escolar, somadas a profundas desigualdades sociais, também impõem aos jovens

47
Eudite Fernandes Carneiro (mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ensino – PPGEn, da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. E-mail:
euditinha@hotmail.com.
48
Benedito Gonçalves Eugenio (professor do Programa de Pós-Graduação em Ensino – PPGEn, da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. E-mail:
beneditoeugenio@bol.com.br.

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brasileiros profundas desigualdades na realização dos percursos escolares, obstaculizando,
muito mais do que possibilitando, processos de desenvolvimento pleno [...]” .
Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa em andamento sobre a política
curricular para o ensino médio. Aqui apresentamos uma análise da produção acadêmica
brasileira sobre a reforma do ensino médio. Para isso, consultamos a produção sobre a
temática disponíveis em periódicos da área de Educação indexados na base do Scielo.
Complementamos com textos disponibilizados no Dossiê da Revista Retratos da Escola,
edição especial sobre a Reforma do Ensino Médio. O levantamento sobre o tema pode
permitir a compreensão de diferentes perspectivas e a identificação de possíveis
contradições e lacunas sobre as políticas curriculares para a última etapa da educação
básica. 293
O período demarcado para o inventário das produções é justificado pela intensidade
das mudanças, avanços e recuos das políticas curriculares para o ensino médio nos últimos
anos, tendo a intenção de compreender os estudos e o que pensam os pesquisadores ao
longo desse período.

METODOLOGIA
O artigo apresenta os resultados de uma pesquisa do tipo estado do conhecimento.
Realizamos o levantamento das produções sobre políticas curriculares para o ensino médio
no Brasil, em quatro periódicos do Portal Scielo e classificados como Qualis A na área de
Educação, a saber: Revista Educação e Sociedade, Educação & Realidade, Revista
Brasileira de Educação, Educação e Pesquisa. Além disso, consultamos também o Dossiê
especial da Revista Retratos da Escola, com temática especial sobre a Reforma do Ensino
Médio.
O período inicial selecionado justifica-se por ser o ano em que o Conselho Nacional
de Educação (CNE) aprova parecer que estabelece novas diretrizes curriculares nacionais
para o ensino médio no Brasil (DCNEM).
A presença dos descritores ensino médio e política curricular, ou ensino médio e
currículo, enquanto termos integrantes das palavras-chave de cada produção a ser
analisada, foi definida como um dos critérios de busca. Independente dos descritores, todas
as produções organizadas na parte específica do Dossiê da Revista Retratos da Escola
entraram no critério de inclusão, sendo selecionadas para análise.
Na Revista Educação e Sociedade, dentro do espaço de tempo determinado, foram
encontrados 30 (trinta) artigos versando sobre o ensino médio, todavia, somente quatro se
enquadraram na proposta de análise de currículo. Ainda considerando os critérios pré-
estabelecidos, tanto na revista Educação & Realidade, quanto na Revista Brasileira de
Educação, foram identificados apenas um artigo em cada um dos periódicos. Não foram
encontradas publicações na revista Educação e Pesquisa. Na Revista Retratos da Escola,
foram excluídos somente as produções não integrantes do Dossiê, posto que todos os
artigos, ao discutirem a Reforma do Ensino Médio, trazem à tona a reflexão sobre as
políticas curriculares para o ensino médio no Brasil. Ademais, todos os textos integrantes do
Dossiê foram escritos após sanção da Lei nº 13.415/2017, obedecendo a demarcação de
tempo proposta para o levantamento das produções.
O quadro 1 mostra as principais informações sobre autoria e ano da publicação, título
da publicação, palavras-chave dos textos identificados para análise, e indicação dos
periódicos:

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QUADRO 1 – Sistematização do corpus de análise das produções encontradas nos periódicos do
portal Scielo, entre os anos 2011 e 2018
AUTORIA E ANO TÍTULO DA PUBLICAÇÃO PALAVRAS-CHAVE PERIÓDICO
Hugo Heleno Camilo A contextualização do Contexto. Revista Educação
Costa e Alice conhecimento no ensino médio: Desconstrução. e Sociedade
Casimiro Lopes – tentativas de controle do outro Discurso. Ensino Médio.
2018 Política de currículo.

Celso João Ferreti e Reforma do ensino médio no Estado, currículo e Revista Educação
Monica Ribeiro Da contexto da medida provisória no hegemonia. Ensino e Sociedade
Silva – 2017 746/2016: estado, currículo e médio. Medida
disputas por hegemonia Provisória 746. Base
Nacional Comum
294
Curricular.

QUADRO 1 – Sistematização do corpus de análise das produções encontradas nos periódicos do


portal Scielo, entre os anos 2011 e 2018
Continuação
AUTORIA E ANO TÍTULO DA PUBLICAÇÃO PALAVRAS-CHAVE PERIÓDICO

Isabela Bastos de Currículo, racismo e o ensino de Currículo. Relações Revista Educação


Carvalho e língua portuguesa: as relações étnico-raciais. Ensino e Sociedade
Alexandre de étnico-raciais na educação e na Médio. Bakhtin. Língua
Carvalho Castro – sociedade Portuguesa.
2017

Marise Nogueira O currículo para o ensino médio Ensino médio. Ensino Revista Educação
Ramos - 2011 em suas diferentes modalidades: médio integrado. e Sociedade
concepções, propostas e Currículo do ensino
problemas médio. Currículo
integrado.

Sabrina Moehlecke – O ensino médio e as novas Ensino médio. Currículo. Revista Brasileira
2012 diretrizes curriculares nacionais: Políticas públicas. de Educação
entre recorrências e novas Diretrizes curriculares
inquietações nacionais.

Roberto Rafael Dias Estetização pedagógica, Práticas Curriculares. Educação &


Da Silva - 2018 aprendizagens ativas e práticas Conhecimento Escolar. Realidade
curriculares no Brasil. Ensino Médio. Brasil.

Fonte: Portal Scielo


No Dossiê da Revista Retratos da Escola, todas as produções foram selecionadas
para análise, conforme quadro 2.
QUADRO 2 – Sistematização do corpus de análise das produções encontradas na Revista Retratos
da Escola - v.11, n.20, janeiro a junho de 2017., entre os anos 2011 e 2018

AUTORIA TÍTULO DA PUBLICAÇÃO PALAVRAS-CHAVE


Monica Ribeiro da Silva Reforma do Ensino Médio: Reforma do ensino médio. MP 746/16. Lei
e Leda Scheibe pragmatismo e lógica mercantil 13.415/2017.
Nora Krawczyk e Celso flexibilizar para quê? Meias Política educacional. Ensino médio.
João Ferretti verdades da “reforma” Flexibilização. Desregulamentação.
Willian Simões O lugar das Ciências Humanas Ciências Humanas e potencial
na “Reforma” do Ensino Médio pedagógico. Subalternização das
Ciências Humanas no ensino médio.
Reforma empresarial da educação.
Jaqueline Moll Reformar para retardar: a lógica -------------------------
da mudança no em

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Lucília Augusta Lino As ameaças da reforma: Ensino médio. Política educacional.
desqualificação e exclusão Qualidade da educação. Formação.
Nelson Cardoso Amaral O “novo” Ensino Médio e o PNE: Ensino médio. Política de fomento.
haverá recursos para essa Orçamento.
política?
Dante Henrique Moura A Reforma do Ensino Médio: Ensino médio. Educação profissional
e Domingos Leite Lima regressão de direitos sociais técnica de nível médio. Reforma do
Filho ensino médio. Regressão social.
Reconfiguração de Estado.
Suzane da Rocha Vieira Interesses mercadológicos e o Ensino médio. Política educacional.
Gonçalves “novo” Ensino Médio Reforma educacional.
Fonte: Dossiê da Revista Retratos da Escola - v.11, n.20, janeiro a junho de 2017.
295

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Diretrizes Nacionais para o Ensino Médio


Aprovadas em 2011, as DCNEM, ao reconhecerem a relação entre trabalho (como
princípio educativo), ciência e cultura como o eixo integrador dos conhecimentos,
evidenciam a atenção que o currículo deve ter com a sua memória, contexto e trajetória.
Com isso, definem que toda a proposição curricular deve ser orientada pela compreensão
dos fundamentos científicos e tecnológicos dos processos sociais e produtivos (RAMOS,
2011). Tal concepção de formação humana revela a intenção de superação do caráter
educacional inteiramente correlacionado ao mercado de trabalho.

§ 1º O trabalho é conceituado na sua perspectiva ontológica de


transformação da natureza, como realização inerente ao ser humano e
como mediação no processo de produção da sua existência;
§ 2º A ciência é conceituada como o conjunto de conhecimentos
sistematizados, produzidos socialmente ao longo da história, na busca da
compreensão e transformação da natureza e da sociedade.
§ 3º A tecnologia é conceituada como a transformação da ciência em força
produtiva ou mediação do conhecimento científico e a produção, marcada,
desde sua origem, pelas relações sociais que a levaram a ser produzida.
§ 4º A cultura é conceituada como o processo de produção de expressões
materiais, símbolos, representações e significados que correspondem a
valores éticos, políticos e estéticos que orientam as normas de conduta de
uma sociedade. (Brasil, Parecer CNE/CEB 05/2011).

Não obstante, antes mesmo de serem amplamente conhecidas as proposições das


novas diretrizes, o ensino médio passou a ser alvo de contestações. Na visão de Silva e
Scheibe (2017, p. 21) “[...] há uma linha de argumentação, incorporada pela reforma atual,
mas que vem disputando o sentido do ensino médio, desde a LDB de 1996. [...] sustentada
na defesa da necessidade de adequação do ensino médio a requisitos postos pelo mercado
de trabalho [...].”
Atacando diretamente a concepção de formação humana integral, existe o interesse
mercadológico de que o a última etapa da educação básica esteja atrelada à preparação
para o trabalho. Essa visão empresarial da escola pública, como formadora de mão de
obra, contraria seu caráter social inclusivo para a formação de uma sociedade mais justa e
igualitária.
Segundo Gonçalves (2017, p. 137), ainda que o Brasil tenha avançado “[...] no
debate sobre educação integral, defendendo uma concepção que considere os estudantes
em suas multidimensões e que oportunize uma formação humana voltada para todos os

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aspectos do desenvolvimento humano”, os interesses capitalistas imprimem sempre uma
disputa acirrada pela sua manutenção.
Destarte, embora teoricamente a formação integrada pareça ser a direção das
políticas curriculares para o ensino médio, a discrepância entre o que está escrito nos
documentos oficiais e o que o acontece na prática da escola, da sala de aula, da sociedade,
como um todo; denuncia a existência de arranjos de interesse do capital.

Políticas Curriculares para o Ensino Médio – Contradições


Segundo Silva (2018, p. 557) “Em termos contextuais, talvez estejamos diante da
emergência de um novo arranjo capitalista, no qual as questões da estética, do design e da
inovação são potencializadas, inclusive em termos de novas tecnologias pedagógicas.” O 296
autor afirma que esses arranjos capitalistas estão apoiados na promessa de inovação,
atratividade, criatividade e flexibilidade nas práticas curriculares.
Interceptar as contradições existentes nas políticas curriculares elaboradas para o
ensino médio pode subsidiar uma compreensão das disputas e dos limites desse mesmo
tipo de política. E, mesmo que haja a presença de “pessoas comprometidas com os
interesses da classe trabalhadora.”, ou seja, intelectuais agregados ao governo, que se
importam com as demandas sociais, “[...] é na política oficial e no senso comum de seus
dirigentes que a concepção de educação comprometida com a classe dominante mais se
manifesta” (RAMOS, 2011, p. 784).
Análises de documentos curriculares, podem ser um bom exemplo disso. Em seus
estudos, Carvalho e Castro (2017) chamam atenção para as normas curriculares, no tocante
às relações étnico-raciais, ao passo que evidenciam que as propostas curriculares não são
capazes de propiciar a igualdade racial no Brasil, muito embora, nos discursos registrados
nos papeis oficiais, existam propostas curriculares versando a promoção dessa igualdade.
Outro vácuo foi deixado pela Medida Provisória (MP) nº 746/2016, divulgada logo
após o polêmico impedimento da ex-presidente Dilma Rousseff. O texto cobiça a alteração
da estrutura curricular e o financiamento de instituições privadas. Ainda tenta estruturar uma
controversa proposta curricular para o ensino médio, no qual dois pontos se destacam: a
não obrigatoriedade de disciplinas como a Sociologia, a Filosofia, as Artes e a Educação
Física e o reconhecimento de profissionais com notório saber, que possibilita o exercício da
docência também a pessoas com uma determinada especialidade técnico-profissional
(FERRETI; SILVA, 2017).

A Reforma do Ensino Médio


A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) está disponível para consulta pública, no
site do Ministério da Educação (MEC), ainda em fase de trâmite e aberta a sugestões e
críticas por parte da sociedade. No entanto, essa aparente abertura para discussão deve ser
minuciosamente analisada. Conforme Costa e Lopes (2018, p. 3),
[...] a política curricular, embora multifacetada, tende a se manter sob a
lógica logocêntrica de controle e cálculo sobre o conhecimento e o sujeito
(que se espera ser) produzido a partir dele, sobre o devir de distintos
contextos de práticas. As práticas, por sua vez, tendem a ser supostas
como aquilo que está restrito às ações de professores e estudantes no
ambiente escolar. Embora pautados em finalidades sociais distintas, os
registros curriculares tendem a comungar do senso de que a escola é um
contexto de aplicação de conhecimentos pressupostos e, portanto, passível
de controle e arrazoamento.

De acordo com Carvalho e Castro (2017, p. 145 apud Machado e Lockmann, 2014,
p. 1607) “[...] recentes estudos percebem a BNCC de modo negativo, entendendo que ‘o
alargamento da escola e o deslocamento das funções da docência são verdades que estão

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se naturalizando no interior de uma racionalidade política neoliberal’”. Moura e Filho (2017,
p. 120-121), são enfáticos em afirmar que a reforma proposta deteriora ainda mais a
qualidade do ensino médio, reforçando o histórico dualismo educacional e social existente
no país e “conduz o EM a uma lógica mercadológica”. Destacam ainda que “a reforma
promove a redução de conteúdos formativos em cada um dos itinerários formativos
propostos. Ou seja, é a negação do EM como etapa final da EB.”

RESULTADOS
Por meio do levantamento e análise das produções relacionadas nesta pesquisa,
como mostram os quadros 1 e 2, foi possível perceber que os textos selecionados
trabalham, em sua grande maioria, com a perspectiva estadocêntrica para a compreensão 297
da política curricular. O materialismo histórico-dialético é o método mais empregado para a
discussão, o que pode indicar que esta abordagem ainda é a que predomina entre os
pesquisadores de política. Essa visão amplamente centrada no Estado reduz todo o
processo de construção e desenvolvimento das políticas curriculares nacionais às esferas
governamentais. A partir desse contexto, surgem os questionamentos: Aonde estão as
escolas? Aonde estão os professores? Aonde estão os alunos e demais sujeitos que,
efetivamente, participam da prática das políticas curriculares?
O discurso atual configura-se na promessa de modernização da gestão dos sistemas
de ensino, com alegações voltadas à demanda de eficiência exigida pelo mundo
contemporâneo. A sociedade é desafiada pelas necessidades globais do capital. Ramos
(2011, p. 773) afirma que “[...] as dificuldades de se implantar uma proposta contra-
hegemônica não são somente de ordem conceitual, mas uma expressão da capacidade da
classe dirigente em manter seus princípios vigorando no senso comum da sociedade.”
Ainda não é possível fazer uma avaliação detalhada sobre a Reforma do Ensino
Médio, uma vez que a produção textual, ainda hoje, encontra-se em meio a um processo
contínuo de revisão e discussão. Somente a continuação das pesquisas poderá trazer
respostas aos muitos questionamentos. Todavia, os autores procuram demonstrar de que
forma os discursos acerca da Reforma do Ensino Médio procuram atender aos interesses do
sistema capitalista. Todavia, as produções integrantes do Dossiê compactuam de certa
singularidade em alguns debates críticos sobre a reforma. Os autores não vislumbram
avanços visíveis como resultado da reforma, configurando-a como um retrocesso (SILVA;
SCHEIBE, 2017; KRAWCZYK; FERRETTI, 2017; SIMÕES, 2017; MOLL, 2017; LINO, 2017;
AMARAL, 2017; MOURA; FILHO, 2017; GONÇALVES, 2017).
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CONCLUSÃO
De modo geral, as questões levantadas nos textos selecionados nos periódicos do
Portal Scielo mobilizam posições divergentes em torno das políticas curriculares para o
ensino médio, tratando-as como ações políticas envoltas em relações de poder, via controle
do conhecimento (RAMOS, 2011; MOEHLECKE, 2012; CARVALHO; CASTRO, 2017;
FERRETI; SILVA, 2017; COSTA; LOPES, 2018; SILVA, 2018).
Travestido de mudanças, o discurso oficial da reforma omite as verdadeiras
intenções, voltadas aos interesses do empresariado. Enquanto isso, a sociedade assiste,
com assombro, os vários retrocessos no campo da política educacional e a subordinação
irrestrita às demandas do mercado, marcadas pelos interesses elitistas e pela seletividade.
A maioria das produções expressa uma perspectiva estadocêntrica de análise das
políticas curriculares, reduzindo-as às esferas governamentais. Autores como Lopes (2005,
p. 56), apontam para a necessidade de perceber as políticas educacionais, dentro de uma
dinâmica complexa, que se desenrola em diferentes contextos, ou seja, “[...] uma mistura de
lógicas globais, locais e distantes, sempre recontextualizadas”, produzindo sentidos
diversos, nem sempre controláveis, do imaginado pelos sujeitos que disputam os

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significados das políticas. Esses autores apontam para outra perspectiva de análise, a teoria
do discurso.

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A PROPOSTA CURRICULAR DO EMPRESARIADO PARA O ENSINO MÉDIO EM
SANTA CATARINA: ALGUNS APONTAMENTOS
Fabrício Spricigo | Mariléia Maria da Silva

RESUMO: O presente estudo é parte integrante de pesquisa em andamento sobre a


indústria pela educação e a política educacional da FIESC para o Ensino Médio em
Santa Catarina. Com aporte no método-histórico dialético e considerando a
perspectiva analítica de Netto (2002) e Fontes (2010), optou-se neste artigo por 300
trazer alguns elementos que caracterizam a política curricular da FIESC para o
Ensino Médio, procurando identificar propostas para a formação do jovem
trabalhador. Nesse sentido, identificamos algumas determinações que incidem sobre
as mudanças curriculares na contemporaneidade, destacando-se, especialmente, as
demandas requeridas pelo mundo da produção econômica sob influência do capital-
imperialismo.

Palavras-chave: Política curricular. Ensino Médio. Santa Catarina. Capital-


imperialismo.

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo faz parte do projeto maior intitulado A indústria pela


educação: um estudo das políticas da Federação das Indústrias de Santa Catarina
(FIESC) para a educação pública no alvorecer século XXI. O recorte definido traz
alguns apontamentos sobre a política curricular para o Ensino Médio proveniente do
empresariado industrial em Santa Catarina.
A FIESC foi criada em 1950, sendo norteada por diretrizes muito semelhantes
a empresas do segmento privado. Uma ação importante da entidade para
disseminação de seus valores foi a criação do Movimento Santa Catarina pela
Educação. Lançado em 2012 pela FIESC e então nominado A Indústria pela
Educação, o movimento surge com a missão de estimular a indústria a investir na
escolarização básica e incentivar os jovens a serem protagonistas no processo de
melhoria da educação.
Nessa perspectiva, o presente ensaio visa a compreender alguns elementos
que caracterizam a política curricular da FIESC para o Ensino Médio, procurando
identificar algumas de suas propostas para a formação do jovem trabalhador, bem

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como sua aderência à atual reforma da educação secundária no Brasil (Lei
13.415/2017). Com aporte em Netto (2002), o ponto central do trabalho se evidencia
na expressão fenomênica da FIESC sintetizada em alguns de seus
depoimentos/proposições para a educação secundária na atualidade. Nesse sentido,
a aparência da realidade possui importância. Ela é uma espécie de “casca da maçã.
Porém, por si só, não revela a sua estrutura íntima, sua essência.
A abordagem teórico-metodológica que orienta o presente artigo está fundada
301
no método histórico-dialético, considerando o conhecimento como resultado da
atividade humana, gerado a partir da relação entre sujeito e objeto, prática e teoria,
não existindo conhecimento fora das práxis. (KUENZER, 2009). Assim, com o
propósito de refletir sobre alguns elementos da política curricular para o Ensino
Médio em Santa Catarina e sua conexão com o empresariado industrial, o presente
ensaio, além da introdução e conclusão, apresenta as seguintes seções, a saber: a
FIESC e a defesa pela mudança curricular do Ensino Médio; o mundo da produção
e o “canto da sereia” sobre a reforma curricular do Ensino Médio; e, por fim, o
capital-imperialismo e o contexto das mudanças curriculares.

2 A FIESC E A DEFESA PELA MUDANÇA CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO

De acordo com Astor Kist, vice-presidente da FIESC para o Extremo-Oeste,


em entrevista concedida no ano de 2016 ao portal institucional da entidade, “a
educação é o caminho para a recuperação do país. Pessoas formadas se viram
sozinhas, encontram saídas, acham o caminho e votam certo”. Na mesma
reportagem, o vice-presidente da FIESC para o Oeste, Waldemar Schmitz, defende
que é preciso “[…] integrar os valores, os conhecimentos da iniciativa privada à
gestão pública”. (FIESC, 2016).
São fortes os argumentos do setor ao enaltecer as exigências do mundo do
trabalho flexível, com urgência de pessoas que se adaptem aos desafios e situações
novas, com preparo para criar, inovar e avaliar riscos, conviver com as incertezas.
Para a indústria é importante que sua força de trabalho saiba atuar em situações

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não planejadas, dando respostas pertinentes à tarefa exigida, gerando lucro e
garantindo os resultados demandados pelas organizações.
Em artigo publicado no Jornal Diário Catarinense (2016), Glauco José Côrte,
presidente da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC), em
defesa e reconhecimento da Reforma do Ensino Médio, analisa que a nova
reestruturação da educação secundária colocada pelo Ministério da Educação
possui como vantagens a flexibilização da matriz curricular e a oferta de formação
302
profissional. Essas características, segundo ele, possibilitarão a escolha do itinerário
formativo pelo estudante de acordo com o seu projeto de vida. Tal constatação
denota o interesse cada vez maior do setor industrial catarinense pela educação
pública, especialmente com o Ensino Médio, última etapa formativa da educação
básica.
A FIESC frisa que a questão da educação acaba influenciando na
produtividade do trabalhador catarinense e na competitividade internacional.
Segundo o presidente da entidade, “[...] nós precisamos de cerca de quatro
trabalhadores para realizar o mesmo que um trabalhador americano produz. A
educação sem dúvida é o principal fator que inibe a competitividade do trabalhador
brasileiro”. Sob esse viés, enaltece que precisaremos de escolas completamente
diferentes das atuais, com propostas curriculares diferentes e preparo para atender
a nova realidade que se avizinha.

[...] até 2020 o Brasil irá perder cerca de sete milhões de empregos [...]
temos que nos preparar para um mundo completamente novo, sobretudo o
setor industrial que está diante do desafio da chamada indústria 4.0, como a
chamam os alemães, ou sistema de manufatura avançada como a chamam
os americanos, que é uma revolução completa. É a conexão entre todas as
máquinas e equipamentos substituindo, em muitos casos, a necessidade do
recurso e dos talentos humanos.

Côrte (2017) ressalta que, historicamente, o currículo escolar relegou a


necessidade de se trabalhar o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.
Justifica que os industriais, na maioria das vezes, contratam um trabalhador, um
executivo, pelas suas condições técnicas. Porém, demitem o profissional por sua
condição socioemocional.
Nesse sentido, o empresariado quer mobilizar o setor industrial para levar a
mensagem de que a qualidade da educação, principalmente no Ensino Médio, não é

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uma responsabilidade apenas do governo, mas de toda a sociedade. Ao pensar e
agir a partir de tais pressupostos, partimos do entendimento que a FIESC age como
entidade que fomenta o lucro de seus partícipes, sem ter para si o peso das
decisões governamentais. Contudo, faz uso do Estado e seu marco
legal/institucional para disseminar interesses e fabricar modos de pensar/agir
alinhados à expansão cumulativa de seus dividendos.

303
2.1 O MUNDO DA PRODUÇÃO E O “CANTO DA SEREIA” SOBRE A REFORMA
CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO

A cultura inerente ao mundo da produção, com a estipulação de metas e


aferição de seu resultado, está fortemente incorporada às políticas educacionais.
Desde a década de 1990, as Federações Industriais sinalizam a necessidade de
mudança e revisão curricular na Educação Básica para se desenvolver uma
indústria competitiva, aproximando a escola do “mercado” de trabalho.
Oliveira (2013), ex-secretário-executivo do MEC no ano de 1995 e presidente
do Instituto Alfa e Beto, Organização Não Governamental promotora de políticas
práticas de educação, em acepção orgânica ao capital, aponta como indispensável
uma mudança de concepção curricular do ensino médio, reduzindo o peso e número
de disciplinas acadêmicas e diversificando os cursos – profissionalizantes ou não –
para permitir currículos mais interessantes e saídas mais ajustadas ao mercado de
trabalho, cada vez mais flexível, sendo necessário um programa de ensino
detalhando o que os alunos devem aprender em cada série.
Com as novas tecnologias adentrando a produção a uma grande velocidade,
a “mão de obra” requerida pela indústria precisa estar apta a apreender
continuamente, ajustando-se às mudanças contemporâneas. Para atender tal
necessidade, o setor industrial vem requerendo das instituições educativas o papel
de assumir o desafio da formação de um novo profissional, que não tenha apenas
aprendido a executar o seu fazer, mas que tenha desenvolvido competência
profissional. Nesse sentido,

Os novos papéis desempenhados pelos trabalhadores demandam domínio


de conhecimentos, competências e habilidades essenciais para a
comunicação, a reflexão e o raciocínio. Nesse sentido, não se pode mais
conceber que um jovem, estudando para em seguida ingressar no mercado

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de trabalho, receba inadequada formação em língua portuguesa (leitura e
escrita) e matemática, os dois pilares básicos para o desenvolvimento das
demais dimensões da aprendizagem. Os diversos componentes do próprio
currículo escolar só podem ser bem apreendidos caso o domínio da língua e
da matemática seja adequado. Do contrário, toda a formação escolar será
insatisfatória. Novos métodos de trabalhar pedem novas competências
(CNI, 2013, p. 12)

O setor industrial registra que falta muito para que a formação do jovem
favoreça sua adequada inserção em um mercado de trabalho competitivo que se
modifica continuamente. Portanto, “é preciso implementar medidas urgentes e 304
criativas que permitam dar um salto de qualidade”. (CNI, 2013, p. 26). Há consenso
entre os intelectuais orgânicos da indústria de que as principais dificuldades para
melhorar a competitividade da indústria se encontram nas carências da educação
básica do trabalhador. Assim, é dada atenção especial para mudanças curriculares
que pretensamente visam à “melhoria” da educação.
Nesse contexto favorável ao amoldamento da educação às necessidades
requeridas pelo setor empresarial, Silva & Scheibe (2017) analisam que a Reforma
do Ensino Médio, estabelecida por meio da Lei Federal Nº 13.415/2017 e defendida
pela classe empresarial industrial traz consigo alterações significativas na
organização curricular desta etapa formativa. Segundo as autoras,

[…] as principais alterações dizem respeito à carga horária obrigatória


destinada à formação básica comum, a realização de parcerias público-
privadas passa a ser possível, além das previstas para a formação técnica e
profissional, também para a realização de convênios para oferta de cursos a
distância. Também aqui se faz presente a mercantilização da educação
básica, que passa a compor não apenas a definição das finalidades e
concepções que orientam os processos formativos escolares, mas também
o financiamento público para oferta privada da educação. Configura-se,
assim, a hegemonia de uma perspectiva pragmática e mercantilizada do
ensino médio público. (p.27)

Vislumbra-se, então, um destaque para a diversificação dos itinerários


formativos, em que a indústria se movimenta e almeja um sistema educacional que
aproxime esfera pública e iniciativa privada com a prerrogativa de melhorar os
índices de desempenho dos jovens no ensino médio e o consequente obstáculo à
competitividade e produtividade da indústria.
De acordo com Lima Filho (2002, p. 15) “reforma é uma destas palavras
‘mágicas’ ou uma das ‘vedetes’ dos tempos atuais. Assim, o caráter reformador
constitui as políticas curriculares na atualidade, principalmente nos países mais

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pobres e/ou de capitalismo tardio. Nessa perspectiva, o setor industrial catarinense
demonstra sua caminhada na direção da lógica de reforma curricular para o Ensino
Médio.
Conforme acepção de Gramsci (1999), a função dos reformistas intelectuais é
determinar e organizar reformas, tendo papel preponderante na disseminação de
ideologias. Nesse sentido, constituem-se em mecanismo para propagar sua visão de
mundo, ampliando-a de acordo com seus interesses econômicos corporativos.
305
Sandri (2016) explica que “a condição legal de representante do interesse público
contribui para que o Estado seja alvo de disputas por segmentos sociais e/ou por
grupos que buscam afirmar os seus projetos e os seus interesses pela via da
legitimidade, da abrangência e do financiamento próprios das políticas públicas”.
(p.28-29).
Tendo em vista a análise da autora e, considerando o atual período histórico
de profunda crise do capitalismo contemporâneo no Brasil e em Santa Catarina, o
domínio ideológico pela educação pública oferecida pelo Estado, cada vez mais,
torna-se alvo de disputas. Em meio a esse cenário, é lançado o Movimento Santa
Catarina pela Educação pelo setor empresarial catarinense como projeto para
estimular as necessidades do segmento, especialmente no que se refere à formação
do jovem no Ensino Médio.
Nessa perspectiva, alcunhas como aprendizagem ao longo da vida,
competitividade, flexibilidade, competência, indústria 4.0 e habilidades
socioemocionais aparecem de forma recorrente nas propostas educacionais
apresentadas para a formação do jovem trabalhador. Tal instrumental retórico
encontra inequívoca aderência com a Reforma do Ensino Médio, esta talhada para
formar sujeitos supostamente capazes de responder aos desafios que surgem a
partir das novas configurações de circulação do capital em escala nacional e
internacional.
Em exposição de motivos publicada no Portal da Presidência da República
para justificar a Reforma do Ensino Médio (Medida Provisória Nº 746/2016,
convertida em Projeto de Lei Nº 34/2016 e sancionada pela Lei nº 13.415, de 16 de
fevereiro de 2017), Mendonça Filho, Ministro da Educação do Governo Temer
(2016-2018), argumenta que o Ensino Médio não tem atingido os resultados

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previstos pelas avaliações em larga escala. Além disso, citando pesquisa realizada
pela Fundação Victor Civita, registra que os jovens de baixa renda não veem sentido
no que a escola ensina. Alega, ainda, que grande parcela de jovens está fora do
“mercado de trabalho”, e que a medida propõe oferecer um currículo atrativo,
alinhada com as recomendações do Banco Mundial.
As principais mudanças trazidas com a Reforma do Ensino Médio envolvem a
sua composição curricular, com supressão de disciplinas até então consideradas
306
obrigatórias e de suma importância para a formação crítico-reflexiva dos estudantes.
Entretanto, o texto legal não explicita qual o projeto de sociedade e educação está
em jogo, cenário historicamente marcado, segundo Kuenzer (2009), por dualidades
e abismos entre a educação dada às camadas mais ricas da população e a
educação dada aos pobres.
Os argumentos utilizados pelo Ministério da Educação trazem para o campo
curricular a resolução de problemas que são, nitidamente, de ordem econômica.
Porém, a escola, por si só, não é capaz de gerar empregos. Uma análise superficial
pode esconder os reais motivos que produzem a evasão no Ensino Médio,
estreitando seus problemas ao fato de se ter afinidade a determinado conteúdo
curricular, apelo extremamente sedutor à massa estudantil.
Nesse sentido, entender como se manifesta a lógica privada empresarial na
escola pública e suas consequências para formação do jovem trabalhador, constitui-
se, no contexto atual, instrumento de resistência às mudanças em curso, que
redefinem o papel do Estado e das políticas curriculares à força das relações entre o
público e o privado adequada à perspectiva do “mercado”.

3 O CAPITAL-IMPERIALISMO E O CONTEXTO DAS MUDANÇAS


CURRICULARES

Segundo Fontes (2010), na atualidade, aumenta o caráter irrefreável do


capital, havendo a permanente conversão de todos os recursos sociais disponíveis
em lucro, com dependência entre setores diversos movidos pelo interesse e
necessidade do capital. Desse modo, a pressão competitiva/luta ferrenha entre as
grandes massas monetárias busca garantir sua reprodução a partir de novas formas
de concentração. Essa característica acirrada se evidenciou nas reestruturações,

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com uma retórica de melhoria da “saúde” de empresas ao passo que ocorriam
demissões em massa.
O parasitismo das elites dominantes diante da grande massa populacional e a
disponibilização crescente de trabalhadores para o mercado de trabalho são a
marca essencial do capital-imperialismo (capitalismo predominantemente
monetário). Essa relação impulsiona um avassalador mecanismo de expropriação
em escala nacional e internacional. A subordinação econômica, nesse sentido,
307
define a dinâmica funcional do capital. “Ocorre a expansão acelerada da
expropriação de todas as certezas, garantias e formas de assegurar a existência”.
(FONTES, 2010, p. 204).
Assim, compreender, no presente, o projeto curricular desenhado pela
indústria em Santa Catarina para o Ensino Médio implica não perdermos o vínculo
com a base da vida real, permeada por aspectos objetivos e subjetivos. Para
entendê-lo, é importante perceber a natureza do capital e suas implicações para
todas as esferas de vida.
Tendo em vista a análise da autora citada anteriormente, a quantidade
crescente de trabalhadores disponíveis no mercado, que precisam vender sua força
de trabalho para subsistir, permite a busca seletiva por requisitos meritocráticos de
diferenciação do trabalhador, tendo por base sua capacidade de valorizar capital
(produção ampliada de lucros). Alinhada à intensificação da produtividade
tecnológica na indústria, as mudanças no perfil curricular para o Ensino Médio
sinalizam a necessidade incontrolável pela produção ampliada de lucros dos
grandes empresários industriais em Santa Catarina. Desse modo, os movimentos do
capital demandam o aumento contínuo de uma população dependente do mercado.
Nesse sentido, é preciso observarmos as lógicas que perpassam diversos
países do capitalismo ocidental na construção de uma “agenda globalmente
estruturada da educação. O currículo escolar, nessa perspectiva, não é uma escolha
de cada comunidade local, mas um padrão global sobre o que é necessário
ensinar/aprender, associada à propagação dos valores”. (FERREIRA, 2017, p.303).
Tais processos reformistas, segundo a autora, “confirmam os padrões de
governança internacional, cuja missão é reduzir a educação a funções mínimas de

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acordo com as necessidades imediatas da sociedade capitalista contemporânea”.
(p.304).
Importante mencionar que a ideia de “reforma” não possui uma delimitação
exata e perene. A sua compreensão pode sofrer alteração de acordo com o período
histórico e o contexto em que é utilizada ou, também, conforme o pertencimento de
classe dos sujeitos que a fazem uso. “No “senso comum” a noção de reforma tem
sido frequentemente associada à ideia de progresso”. (LIMA FILHO, 2002, p. 15).
308
Porém, para Freitas (2012, p. 380) há uma verdadeira ideologia coorporativa
em jogo. Isso “[...] reflete uma coalizão entre políticos, mídia, empresários, empresas
educacionais, institutos e fundações privadas e pesquisadores alinhados com a ideia
de que o modo de organizar a iniciativa privada é a proposta mais adequada para
“consertar” a educação”.
Segundo o autor, a ideologia dos reformadores empresariais, nessa esteira,
almejaria reduzir o papel do Estado quando conveniente para seus interesses, isto é,
quando na balança estivesse a rentabilidade das corporações educacionais e o
controle ideológico do sistema educacional para colocá-lo a serviço de interesses de
mercado.
Nessa perspectiva, ao utilizarmos esse modelo de política curricular no Brasil,
poderemos assumir uma série de riscos já registrados pela pesquisa educacional
como, por exemplo, estreitamento curricular, competição entre escolas e
profissionais, segregação socioeconômica e territorial, bem como a destruição do
sistema público escolar.
No que se refere à consequência do estreitamento curricular, argumenta-se:
“quando os testes incluem determinadas disciplinas e deixam outras de fora, os
professores tendem a ensinar aquelas disciplinas abordadas nos testes. Avaliações
geram tradições. Dirigem o olhar de professores, administradores e estudantes. Se o
que é valorizado em um exame são a leitura e a matemática, a isso eles dedicarão
sua atenção privilegiada, deixando os outros aspectos formativos de fora”.
(FREITAS, 2012, p. 389).
Desse modo, aparece com força para os reformadores privados a ideia de
enfatizar um currículo mínimo como horizonte. Propagam-se os possíveis benefícios
do que é cobrado nos testes pelo fato de se tratar do básico. Entretanto, o que se

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oculta é que a ênfase ao mínimo empobrece o currículo formativo dos jovens,
deixando à margem muito conhecimento essencial. Tal ideologia, segundo o autor
citado, é muito conhecida no contexto educacional, levando para um tempo que
nunca chega a possibilidade de educação de qualidade para o jovem, “retirando dela
elementos de análise crítica da realidade e substituindo-se por um “conhecimento
básico” suficiente para atender aos interesses das corporações e limitado a algumas
áreas de aprendizagem restritas, usualmente leitura, matemática e ciências”. (p.
309
389). Como resultado, tem-se

[...] o estreitamento curricular focado nas disciplinas testadas e o


esquecimento das demais áreas de formação do jovem, em nome de uma
promessa futura: domine o básico e, no futuro, você poderá avançar para
outros patamares de formação. Todos sabemos que a juventude mais pobre
depende fundamentalmente da escola para aprender, e se for limitada a sua
passagem pela escola às habilidades básicas, nisso se resumirá sua
formação. (FREITAS, 2012, p. 390).

Convém registrar que o apostilamento da educação a modelos pré-definidos


pode provocar a dependência docente a materiais didáticos fabricados previamente,
retirando dele a necessária autonomia para adequação metodológica, dadas as
especificidades de cada grupo estudantil. Corre-se o risco, tendo como referência o
viés reformador empresarial, de adotar uma formação docente exclusivamente
pragmática, opção essa já em execução em muitas instituições formativas,
restringindo a formação do professor aos aspectos instrumentais.

4 CONCLUSÃO

O capital, em respostas à sua crise estrutural, promove várias transformações


no próprio processo produtivo, seja por meio da constituição de novas formas de
acumulação, seja por novas formas de gestão organizacional ou em decorrência do
avanço tecnológico. Nesse contexto, intensifica o culto de um subjetivismo e de um
ideário fragmentador que faz apologia ao individualismo exacerbado. Com essas
mutações surge também as exigências de uma política curricular que se coadune à
formação de um trabalhador polivalente, multifuncional, mais qualificado. Princípios
esses também apontados para justificar a Reforma do Ensino Médio e defendidos
pelo setor empresarial em Santa Catarina. (ANTUNES, 1999)
Nessa perspectiva, o grande percentual de trabalhadores disponíveis

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(expropriados) abriu imensurável espaço para a criação de novas formas de
exploração. O empresariado industrial, nesse sentido, tende a atuar em redes de
governança corporativas, fabricando valores, princípios e valores educacionais
necessários à expansão de seus interesses corporativos.
Entendemos que o projeto de currículo difundido pela FIESC coloca para a
educação secundária a tarefa de intensificar a entrada dos jovens no circuito de
expropriação do capital. A nova estruturação curricular do Ensino Médio, desenhar-
310
se, desse modo, para oferecer as condições propícias para a formação de indivíduos
considerados “empregáveis” para o novo modelo produtivo demandado pelo
capitalismo contemporâneo.
Assim, a FIESC atua como aparelho privado de hegemonia (espinha dorsal
da sociedade civil conforme acepção de Gramsci, 1999), apresentando-se como
associatividade que se configura a partir da própria sociabilidade capitalista e dos
múltiplos embates que dela se originam. Logo, tem como elemento característico a
capacidade de organização, entremeando o Estado. Nessa trajetória, a atuação da
entidade pela defesa de reformas curriculares visa a criação das condições
favoráveis à expansão do lucro privado.

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<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101
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Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas curriculares no


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de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-237-1438-3
Disponível em:<http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/sobram-pedagogos-e-
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312

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ESTUDANTE DESINTERESSADO, APÁTICO E DESMOTIVADO PARA O
TRABALHO ESCOLAR: PODE SER!

Gustavo de Alencar Figueiredo | Fredy Enrique Gonzalez

RESUMO: Neste trabalho, apresenta-se, a partir da literatura e de diálogos em sala


de aula, as possíveis motivações concernentes ao desinteresse e a falta de
motivação dos/as estudantes da Educação Básica frente às aulas, conteúdos e
metodologias desenvolvidas ao longo do ano letivo; uma queixa frequentemente 313
escutada pelos/as professores/as no cotidiano de suas práticas. Realizado sob a
perspetiva da ação-reflexão-ação, foi realizada uma discussão sobre a temática,
abordada em sala de aula, junto à dezessete estagiários/as matriculados/as, no ano
de 2017, nas disciplinas de Estagio Supervisionado I, II e IV do Curso de
Licenciatura em Física (CFP/UFCG), Campus de Cajazeiras - PB. O trabalho gerou
um ensaio ancorado em teóricos que discutem a temática e abordará considerações
sobre as possíveis implicações que levam a apatia dos/as estudantes frente ao
processo de ensino e de aprendizagem que a escola planeja e executa — o seu
Projeto Pedagógico.

Palavras – chave: Indisciplina, Apatia, Estudantes, Educação Básica. Ensino-


Aprendizagem.

INTRODUÇÃO

Uma profunda inquietude tem tomado conta dos professores e das


professoras diante dos novos fenômenos de comportamento que têm sido
observados na sala de aula. As atitudes dos estudantes e das estudantes revelam
desmotivação e aparentemente não se interessam pelo processo ensino-
aprendizagem que a escola planeja e executa — o seu Projeto Pedagógico. Isso nos
leva a uma questão importante: Quais as razões para a existência da falta de
interesse/motivação e apatia do/as estudantes diante das atividades desenvolvidas
nas escolas, em especial, na área de ciências naturais?

Esse cenário muitas vezes tem levado a um “saudosismo” da escola que


existia no passado onde os estudantes e as estudantes tinham na escola momento
essencial de seus — ou de suas famílias — projetos de vida. Da mesma forma que o
número de casos de apatia e de desinteresse também o número de tentativas de
explicar esses fenômenos aumenta.

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Os discursos dos professores e das professoras — muitas vezes são
desabafos — imputam aos estudantes e às estudantes transgressões da disciplina
escolar de forma a confundirem ou exacerbarem conceitos bastante questionáveis
quando aplicados à analise dos casos em questão:

Bagunceiro, indisciplinado, desordeiro e violento. Estes termos, às vezes,


confundem-se por sua imprecisão e escondem dinâmicas completamente
diferentes para se referir tanto à violência como à incivilidade que os jovens
manifestam na escola. A literatura, consensualmente, considera a violência
como uma manifestação mais consistente de desordem social que pode ser 314
caracterizada criminalmente por se tratar de roubo, homicídio, tráfico e
consumo de droga, violência sexual e outros que envolvam violência física
como depredação do patrimônio e brigas. A incivilidade refere-se a um
conjunto de práticas de menor gravidade e mais invisíveis que se
materializam na quebra das regras de convivência por incidir diretamente
nas expectativas sociais que nutrimos uns pelos outros em nossas
interações sociais. Em um assalto, por exemplo, há uma intenção de dolo
do assaltante em usurpar um bem sob coação da vítima. Aqui a violência
pode ser caracterizada com clareza. Já em encontros casuais como, por
exemplo, um esbarrão não intencional na rua ou na compra de um saco de
pipocas, esperamos que a pessoa com quem nos esbarramos ou o
pipoqueiro reconheçam a impessoalidade de cada um dos atos. Um pedido
de desculpas no primeiro exemplo e um obrigado, após uma educada
solicitação no segundo exemplo, é o que se espera que aconteça. Quando
isso não acontece temos um ato incivil. (BRASIL, 2001, p.51)

Isso demonstra a necessidade de um tratamento muito cuidadoso das


possíveis explicações para os fenômenos relacionados ao comportamento, atitudes
e procedimentos dos estudantes e das estudantes no universo dos processos de
ensino-aprendizagem das Práticas Pedagógicas na escola.

Aparentemente existe um conjunto dessas tentativas de explicações que


confundem causas e motivos. A vida cotidiana colabora pouco para se promover
essa distinção, pois segundo Heller (1992, p.37-38),

A vida cotidiana, de todas as esferas da realidade, é aquela que mais se


presta à alienação. [...]. Quanto maior for a alienação produzida pela
estrutura econômica de uma sociedade dada, tanto mais a vida cotidiana
irradiará sua própria alienação para as demais esferas. Existe alienação
quando ocorre um abismo entre o desenvolvimento humano-genérico e as
possibilidades de desenvolvimento dos indivíduos humanos, entre a
produção humano-genérica e a participação consciente do indivíduo nessa
produção.

Dessa forma, pode-se dizer que a compreensão das causas exige uma busca
muito mais aprofundada, um pensamento “apurado” sobre as situações observadas
ou experienciadas (de experimento e de vivência) na sala de aula. A emergência, na
perspectiva do professor ou da professora, em buscar soluções para os eventos

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dessa natureza com o objetivo de promover um ambiente pedagógico adequado ao
desenvolvimento do ensino e das aprendizagens contribui para compreensões
apressadas. Esse pensamento “apurado” mostra a necessidade em se recorrer a
uma abordagem complexa, como sugere Edgar Morin:
Acontece que o problema da complexidade não é o da completude, mas o
da incompletude do conhecimento. Num sentido, o pensamento complexo
tenta dar conta daquilo que os tipos de pensamento mutilante se desfaz,
excluindo o que eu chamo de simplificadores e por isso ele luta, não contra
a incompletude, mas contra a mutilação. [...] De fato, a aspiração à
complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Ela não quer 315
dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas
diversas dimensões [...] Dito isto, ao aspirar a multidimensionalidade, o
pensamento complexo comporta em seu interior um princípio de
incompletude e de incerteza. (MORIN, 1998, p.176-177)

Uma “interpretação” do jovem ou da jovem, sem essa abordagem complexa,


pode ter como consequência processos produtores de desmotivação e desinteresse
de proporções ainda maiores do que os observados. “Interpretar” o outro é um risco
tremendo, por exemplo, pode-se tomar o caso relatado por Sales (1995) em que um
camponês, convidado a participar de uma reunião, recusou o convite alegando já
entrar na discussão interpretado. A compreensão das atitudes e procedimentos dos
estudantes e das estudantes exige ainda as suas participações como produtores e
produtoras de conhecimento sobre eles mesmos e elas mesmas. Essa compreensão
tem um limite bastante explícito quando se trata da escola, pois de acordo com
Delizoicov (2009),

A escola é outro espaço de sociabilidade, de inserção em relações sociais


externas ao âmbito familiar. Uma de suas finalidades principais é garantir a
possibilidade de acesso ao conhecimento sistematizado, e é em torno
dessa função que, ao menos em sua atribuição legal, deveriam estar sendo
organizadas as atividades escolares. (DELIZOICOV, 2009, p.141)

A essa limitação pode ser também imputada a compreensão reduzida da


desmotivação e do desinteresse pelo processo ensino-aprendizagem na escola
quando se circunscreve a ela os fenômenos. Nesse sistema, cujas paredes são os
“muros” da escola, há uma natural tendência em se tratar de motivos e não de
causas. No entanto, as paredes desse sistema são permeáveis a muitas influências
externas que permitem compreender as causas desses fenômenos e que podem
não estar recebendo a devida atenção.

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DO LUGAR DA ESCOLA

No nosso caso, a escola é uma instituição da sociedade capitalista. As formas


como ela é instituída no espaço-tempo (condições históricas e materiais) são
bastante claras quanto a isso. Ela tem funções oficialmente definidas (funções
políticas e sociais) e, no caminho dos questionamentos de Paulo Freire, fica claro a
quem serve, isto é, do lado de quem seu projeto pedagógico foi construído: a que
interesses atende. Longe de significar que as práticas pedagógicas sejam 316
determinadas por esse estado de coisas e assumir incontinenti a escola como
aparelho ideológico do estado como sugeriu Althusser (2008), é irresponsabilidade
não ver nela traços explícitos desses interesses analisando as políticas públicas de
educação. Assim, as causas devem ser buscadas na defesa dos interesses da
sociedade capitalista. Estudantes, professores e professores bem como a escola
estão no e com o universo da sociedade capitalista. As condições de vida de
homens, mulheres e crianças mantém relação essencial com esses interesses. As
inúmeras formas de exclusão da maioria dos povos da participação nos bens
(riqueza) produzidos e das decisões da sociedade não têm como poupar a escola.

Dessa forma, a motivação dos estudantes e das estudantes em entender o


mundo, já que, lembrando Paulo Freire, estão no mundo e com o mundo, participar
dele, transformando segundo valores diferentes daqueles que banalizaram a vida e
comprometeram a boniteza, o prazer de conhecer, já se encontra comprometida ao
chegarem à escola. Muitas de suas preocupações tornaram-nos em “presenteístas”,
pois se encontram solapadas as possibilidades de mudança, de perspectivas de vida
feliz no futuro. Deve-se enfatizar que entender a história como construção e não
como algo dado torna-se difícil numa sociedade como a capitalista que enfatiza
atitudes imediatas de consumo, produção em massa e lucros fáceis cada vez
maiores e obtidos sob quaisquer circunstâncias. Perspectivas futuras e
planejamento, inclusive com sofisticadas tecnologias sociais, acontecem nesse
sentido, promovidos pelas elites econômicas e, a inclusão da maioria da população
acontece segundo seus interesses na perspectiva de exploração e expropriação.
Aqui parece haver uma contradição, mas todos os homens e mulheres estão
incluídos e incluídas na sociedade capitalista seja no “grupo” dos explorados e ou
expropriados, ou seja, no “grupo” dos exploradores e expropriadores.

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No entanto deve-se tentar para não se tomar pólos absolutamente
antagônicos, pois, na perspectiva da dialética, as relações entre o opressor e o
oprimido não são tão simples quanto parece. Quando se lê nos documentos oficiais
que,

Art. 5º O direito à educação, entendido como um direito inalienável do ser


humano, constitui o fundamento maior destas Diretrizes. A educação, ao
proporcionar o desenvolvimento do potencial humano, permite o exercício
dos direitos civis, políticos, sociais e do direito à diferença, sendo ela
mesma também um direito social, e possibilita a formação cidadã e o 317
usufruto dos bens sociais e culturais.
§ 1º O Ensino Fundamental deve comprometer-se com uma educação com
qualidade social, igualmente entendida como direito humano.
§ 2º A educação de qualidade, como um direito fundamental, é, antes de
tudo, relevante, pertinente e equitativa.
I — A relevância reporta-se à promoção de aprendizagens significativas do
ponto de vista das exigências sociais e de desenvolvimento pessoal.
II — A pertinência refere-se à possibilidade de atender às necessidades e
às características dos estudantes de diversos contextos sociais e culturais e
com diferentes capacidades e interesses.
III – A equidade alude à importância de tratar de forma diferenciada o que
se apresenta como desigual no ponto de partida, com vistas a obter
desenvolvimento e aprendizagens equiparáveis, assegurando a todos a
igualdade de direito à educação.
§ 3º Na perspectiva de contribuir para a erradicação da pobreza e das
desigualdades, a equidade requer que sejam oferecidos mais recursos e
melhores condições às escolas menos providas e aos alunos que deles
mais necessitem. Ao lado das políticas universais, dirigidas a todos sem
requisito de seleção, é preciso também sustentar políticas reparadoras que
assegurem maior apoio aos diferentes grupos sociais em desvantagem.
§ 4º A educação escolar, comprometida com a igualdade do acesso de
todos ao conhecimento e especialmente empenhada em garantir esse
acesso aos grupos da população em desvantagem na sociedade, será uma
educação com qualidade social e contribuirá para dirimir as desigualdades
historicamente produzidas, assegurando, assim, o ingresso, a permanência
e o sucesso na escola, com a consequente redução da evasão, da retenção
e das distorções de idade/ano/série (Parecer CNE/CEB nº 7/2010 e
Resolução CNE/CEB nº 4/2010, que define as Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para a Educação Básica). (BRASIL, 2010, p.34)

Pode-se considerar, de imediato, uma leitura crítica. Considera-se leitura


crítica na perspectiva de Boaventura de Sousa Santos (2000):

A análise crítica do que existe assenta no pressuposto de que a existência


não esgota as possibilidades da existência e que, portanto, há alternativas
susceptíveis de superar o que é criticável no que existe. O desconforto, o
inconformismo ou a indignação perante o que existe suscita impulso para
teorizar a sua superação. (SANTOS, 2000, p. 23)

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A cidadania pressupõe exercício de poder. Não há cidadão sem isso. Numa
sociedade onde a principal característica é a acumulação e que, para que ela possa
existir, muitas condições devem ser satisfeitas, entre elas a concentração do poder,
a cidadania assume a forma de cidadania concedida ou tutelada. Como conquista a
cidadania não se desatrela das lutas populares pelas transformações da sociedade
no rumo de uma sociedade socialista. Não se pretende com essas afirmações negar
as memoráveis conquistas, desde o início da modernidade, conseguida pelos povos
318
para a construção da cidadania, mas elas se dão no domínio da sociedade
capitalista. As violações gritantes dos direitos humanos e civis, mesmo em nações
que se dizem terem consolidado seu estado democrático são flagrantes de que esse
domínio tem sido respeitado. Assim, as causas mais significativas das situações
experienciadas na sala de aula são, basicamente, externas, longe das condições
efetivas de atuação da escola. Em nenhuma hipótese isso significar, como fica claro
na concepção freireana quando se refere ao lugar da Educação nas transformações
sociais, que a escola nada pode fazer para enfrentar os fenômenos da desmotivação
e do desinteresse. Ela deve contribuir promovendo condições, as melhores
possíveis, para que os estudantes e as estudantes possam construir aprendizagens
significativas. Mas, para o professor e para a professora deve estar suficientemente
claro, da mesma forma, quais as suas contribuições possíveis. As suas práticas
pedagógicas estabelecem relações professor/a-estudante mediadas pelos objetos
de conhecimento. Isso implica que há também causas da desmotivação e do
desinteresse que têm origem nas práticas pedagógicas.

Muito se tem debruçado sobre as condições para se construir práticas


pedagógicas significativas em Ensino das Ciências Naturais no Ensino Fundamental.
Desde as necessidades formativas do professor e da professora até os
questionamentos do porquê os estudantes e as estudantes não aprendem as
Ciências Naturais que lhes são ensinadas. Nesse sentido, Guimarães (2009) nos
propõe que,

Ensinar Ciências é propiciar aos alunos situações de aprendizagem nas


quais eles poderão construir conhecimentos sobre diferentes fenômenos
naturais. É também potencializar a capacidade dos alunos de formular
hipóteses, experimentar e raciocinar sobre fatos, conceitos e procedimentos
característicos desse campo de saber. Além disso, o ensino de Ciências
deve possibilitar a compreensão das relações entre a ciência e a sociedade,

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sua influência nas suas produções e distribuição de diferentes tecnologias.
(GUIMARÃES, 2009, p. 12)

Construir práticas pedagógicas que favoreçam as aprendizagens significativas


e conceituais dos estudantes e das estudantes deve contribuir para manter e ou
produzir motivações para a aprendizagem. Não se pode deixar de perceber na sala
de aula, como práticas educativas improvisadas, construídas sob a égide de
concepções pedagógicas equivocadas — por exemplo, aprendizagem mecânica e 319
ou aprendizagem por aquisição conceitual, seleção de conteúdos estranha ao
contexto da produção da existência dos estudantes e das estudantes, concepção de
ciência eminentemente positivista, ausência de transposições didáticas pertinentes
— minam o interesse pela participação efetiva no processo ensino-aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As motivações dos jovens e das jovens da Educação Básica, em muitos


momentos, são conflitantes com aquelas propostas pelas nossas Práticas
Pedagógicas. Deve-se considerar que a escola contemporânea

É um espaço de intensa negociação entre os atores sociais. Professores e


alunos encontram-se frente à frente e devem negociar a sala de aula todos
os dias dos 200 previstos anualmente para cada série/ano de escolaridade.
Na maior parte das vezes, aqui se materializam os ritmos de
aprendizagem, as relevâncias pedagógicas e se minimizam ou
maximizam os desdobramentos das características extra-classe e
intra-classe dos sujeitos envolvidos: alunos e professores. Uma
proposta sensível aos jovens tem que resultar em um processo mais
educativo e mais rico de significados que redunde em mais educação para
todos. (BRASIL, 2001, p.50)

Assim, as Práticas Pedagógicas não podem desconsiderar os sujeitos do


conhecimento.49 No entanto, como se pode esperar dada à complexidade das
relações entre pessoas, que a negociação a que se referem os autores do trecho
destacado anteriormente e como já mencionamos não pode se basear na
“interpretação a priori” do estudante ou da estudante, pois

Ver “Aluno: sujeito do conhecimento” em DELIZOICOV, Demétrio et al. Ensino de ciências:


fundamentos e métodos. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2009, p.115-153.

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Muitas vezes, quando os alunos são chamados pelos professores de
desinteressados, apáticos e desmotivados para o trabalho escolar, eles
estão considerando o esforço desprendido pelo jovem em corresponder a
suas expectativas acerca do trabalho escolar ou, pelo menos, de ele
permanecer no ritmo médio do conjunto dos alunos. Aqui, a aprendizagem é
medida pelos ritmos previstos pela escola em suas temporalidades
recortadas por disciplinas, horas-aula, aula para exposição e aula para
avaliação, enfim, toda uma dinâmica em que se perde o processo e se
acumulam produtos como os deveres de classes, as provas, as atividades.
(BRASIL, 2001, p.53)

320
Diante das considerações apresentadas, pode-se concluir que existem sim,
em nossas salas de aula estudantes desinteressados e desinteressadas, apáticos e
apáticas e desmotivados e desmotivadas. Muitas das causas desse fenômeno estão
no universo da sociedade capitalista contemporânea e outras nos significados que,
para eles e elas, têm as nossas Práticas Pedagógicas. Garantir a existência de
Práticas Pedagógicas de qualidade que proporcionem condições de aprendizagem
considerando os sujeitos da aprendizagem como estando no mundo e com o mundo
pode contribuir para deixar claro para eles e elas o papel que a escola pode assumir
nas suas vidas.

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HELLER, Agnes. O cotidiano e a história. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
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321

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GT 4 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA O
ENSINO SUPERIOR

A CONTRIBUIÇÃO DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NA FORMAÇÃO DO


PROFESSOR DE GEOGRAFIA

Henrique Sabino da Silva Pereira | Josandra Araújo Barreto de Melo 322

RESUMO: O presente trabalho aborda a importância da Extensão Universitária na


formação docente, através do projeto “Educação geográfica, lugar e cidadania:
experiência a partir de escolas da rede pública de Campina Grande, PB, Pró-Reitoria
de Extensão - PROEX/UEPB cota 2016/2017. Através de aulas de Geografia em
escola pública da comunidade Mutirão, Bairro do Serrotão, Campina Grande, PB
foram trabalhadas estratégias lúdicas, realizando-se intervenções em sala de aula e
extra-sala, para o ensino da categoria geográfica lugar, utilizando-se o recurso
cartográfico dos mapas mentais e compreendendo um ensino-aprendizagem teórico
e prático. Conclui-se que o projeto de extensão assume a responsabilidade de
apresentar ao futuro docente as realidades sociais que ele estará inserido e as
diferentes realidades sociais encontradas no ambiente escolar. Além de permitir que
ele exerça sua futura profissão e represente o papel social da universidade a serviço
da comunidade.

Palavras-chave: Extensão Universitária. Geografia. Mapas Mentais.

INTRODUÇÃO

O Projeto de Extensão é idealizado e elaborado na Universidade e executado a


serviço da comunidade, desempenhando assim o seu papel social. Segundo Nunes
e Silva (2011, p.120), “a extensão universitária é o processo educativo, cultural e
científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a
relação transformadora entre universidade e sociedade”. Seguindo esse
pensamento, apresenta-se o projeto Educação Geográfica, Lugar e Cidadania:
Experiência a Partir de Escolas da Rede Pública de Campina Grande, PB,

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subsidiado pela Pró-reitoria de Extensão – PROEX, da Universidade Estadual da
Paraíba - UEPB.
As Instituições de Ensino Superior (IES) possuem grande importância para a
sociedade, uma vez que são responsáveis pela formação de profissionais
capacitados a atuarem com competência no mercado de trabalho. De acordo com
Rodrigues et al. (2013, p. 142), “a extensão surgiu na Inglaterra no século XIX, com
a intenção de direcionar novos caminhos para a sociedade e promover a educação
323
continuada”. Atualmente, as Instituições de Ensino Superior - IES desenvolvem o
ensino, a pesquisa e a extensão. No caso da extensão, o conhecimento produzido
na universidade é levado à comunidade.
Projetos de extensão na área de educação, de acordo com Rodrigues et al.
(2013) têm a função de socializar e democratizar o conhecimento, levando-o para
comunidades. Os alunos que desenvolvem a função de extensionista nessa área,
executam a sua futura profissão de educador. Como diz Oliveira (2002, p. 217),
“Ensina-se aprendendo e aprende-se ensinando”. De tal forma, o aluno percebe na
prática a relevância do seu papel para a sociedade, contribuindo para o
fortalecimento da sua formação.
Durante e após a sua formação, o professor que tem de buscar soluções para
ultrapassar os desafios enfrentados no que diz respeito à ciência geográfica. Com
um olhar sensível sobre a realidade em que está inserido, buscando desenvolver na
escola um projeto social de educação. De acordo com Cavalcanti (2014), o docente
precisa entender a complexidade do ambiente escolar e perceber que não há
fórmulas prontas para serem aplicadas em sala. Dessa forma, capacitar-se para os
prováveis desafios de sua profissão lhe é indispensável.
Nesse contexto, ao executar o trabalho de extensão, o professor de Geografia
precisa, após analisar a realidade social e o perfil da turma, buscar metodologias e
recursos para aplicação do conteúdo de forma que ele tenha o maior aproveitamento
possível pela turma. O que se sugere é o desenvolvimento de atividades lúdicas,
com recursos que vão além do livro didático, rompendo um pouco a rotina do aluno,
com o objetivo de despertar maior interesse sobre o assunto abordado.
O projeto referido foi desenvolvido durante as aulas de Geografia com a
produção de mapas mentais. Através da representação livre do lugar de vivência,

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cada aluno individualmente ilustrou o seu percurso de casa para a escola, nesse
caso o enfoque dos mapas mentais foi a categoria geográfica lugar. A escolha por
se trabalhar com escala local teve como um dos objetivos despertar a criticidade dos
alunos a respeito a questões sócio-ambientais e socioespaciais presentes na própria
comunidade e que são naturalizados por muitos moradores. A respeito da categoria
geográfica de lugar, Ferreira (2014, p. 25) afirma que: “[...] os mapas mentais
constituem-se de imagens espaciais para a representação do lugar e de suas
324
paisagens, posto ser ele uma ferramenta de organização, de pensamento, de
visualização e de integração de conhecimentos”.
Os mapas mentais, de acordo com Ferreira (2014), também podem ser
utilizados como ferramenta de alfabetização cartográfica, proporcionando ao
alunado o interesse pela leitura e interpretação de mapas. Já que os alunos, durante
o projeto, confeccionaram seus próprios mapas, para além de incentivá-los na
produção, se fez importante a valorização do seu trabalho, para que se vejam como
construtores do conhecimento e não apenas como receptores.
A comunidade beneficiada com o projeto foi a do Mutirão, localizada no bairro
do Serrotão, às margens da BR 230, na Alça Sudoeste que contorna a cidade de
Campina Grande, no estado da Paraíba. Esta comunidade convive com estigmas
como violência, segregação e vulnerabilidade ambiental e espacial. Segundo a
Associação de Moradores local, a população do Mutirão é 7250 habitantes e está a
8 km da área central de Campina Grande, o que dificulta a mobilidade da população
na cidade, sobretudo pela pobreza e dificuldade de acesso aos transportes públicos,
além de não ter poder aquisitivo para se inserir no mercado de consumo.
O Mutirão também enfrenta preconceito devido a sua localização no sítio
urbano campinense. Conforme aponta Freire (2014), devido sua posição geográfica
bem afastada da malha urbana do município e de sua proximidade ao presídio
regional do Serrotão e ao antigo Lixão Municipal, que hoje em dia está desativado, a
comunidade é vista com preconceito no contexto urbano. Além disso, como
agravante tem-se a falta de planejamento urbano local, que é perceptível por toda
comunidade, pois há falta de estrutura de serviços básicos como ruas pavimentadas
e rede de esgoto, problemas agravados pela presença de moradias na modalidade
de ocupação, o que representa iminentes riscos para quem nelas reside.

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Outro problema sério enfrentado pela comunidade trata-se da violência que em
muito se dá em virtude do tráfico de drogas, com frequentes disputas territoriais
entre traficantes e confrontos entre eles e policiais.
Mesmo com todos esses problemas, estão presentes no Mutirão três
estabelecimentos públicos de ensino: a Escola Municipal de Ensino fundamental
Paulo Freire; a Escola Estadual de Ensino Fundamental Nossa Senhora Aparecida;
e a Creche Municipal Vovó Adalgisa, o que despertou o interesse da equipe
325
extensionista em desenvolver o projeto ora em análise. Além disso, o Mutirão
também dispõe de outros equipamentos de uso público: de uma Unidade Básica de
Saúde da Família; o núcleo da Sociedade de Amigos do Bairro e o Clube do bairro,
dispostos nas redondezas do espaço conhecido como caixa d’água, que os
moradores o utilizam como área de vivência e lazer, nela estão à disposição dos
moradores alguns aparelhos de academia pública; uma Unidade de Polícia Solidaria;
e instituições religiosas, sendo uma igreja católica e outras três protestantes.
Mediante o exposto, o presente artigo tem como principal objetivo refletir sobre
a importância do projeto de Extensão Universitária no ensino de Geografia, sua
contribuição na formação docente e o desenvolvimento de intervenções didático-
pedagógicas com alunos de uma escola em uma comunidade do município de
Campina Grande, Paraíba. De forma específica, objetiva discutir a relevância do
projeto na formação do extensionista e sua contribuição no ensino de Geografia;
destacar a importância do recurso cartográfico: mapas mentais no ensino das
categorias geográficas; e, por fim, apresentar os resultados obtidos com os mapas
mentais, relacionando a sua importância com a educação geográfica.

METODOLOGIA

O projeto de extensão é resultado do projeto desenvolvido pela Coordenadora


lotada no Departamento de Geografia da Universidade Estadual da Paraíba e
aprovado pela Pró–Reitoria de Extensão (PROEX), da Universidade Estadual da
Paraíba (UEPB) e foi realizado na Escola Estadual de Ensino Fundamental Nossa
Senhora Aparecida, na comunidade Mutirão, localizada no bairro Serrotão, no
município Campina Grande, PB (Figura 01).

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Figura 01: Representação da localização da comunidade Mutirão, em relação ao Centro de
Campina Grande.

326

Fonte: Google Maps.

As ações foram executadas em duas turmas do nível fundamental, sendo elas


as turmas do 6º ano “C” e 7º ano “B”, no ano 2017. A parte teórica fundamentou-se
em pesquisas sobre a docência e a extensão universitária, além do referencial
teórico do componente curricular Geografia como base para o desenvolvimento das
atividades práticas.
As intervenções presenciais na escola ocorreram a partir da aplicação de
questionários diagnóstico das turmas participantes, aulas expositivas sobre o papel
do ensino de Geografia e sobre a categoria geográfica lugar, realização de grupos
focais com os alunos, apresentação de documentário, aula de campo pela
comunidade e duas oficinas de mapas mentais, sendo uma antes das intervenções
didático-pedagógicas e outra para finalizar o projeto, de forma a identificar como as
intervenções realizadas viabilizaram a ampliação do olhar geográfico dos alunos.
O conjunto de mapas mentais elaborados nas duas fases das ações foram
interpretados tomando por base o método fenomenológico, que, segundo Holzer
(1997), descreve minuciosamente o mundo vivido e suas interações humanas, sem
descartar a sua essência. Dessa forma, o extensionista ficou com a incumbência de
interpretar a percepção individual dos alunos acerca da comunidade e dos seus
problemas.

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RESULTADOS E DISCUSSÕES

As ações da extensão tiveram grande importância, pois foi o primeiro contato


do extensionista com a educação, na condição de mediador, de forma a executar na
prática o que aprendeu durante o curso de Geografia na universidade, interagindo
com as realidades sociais presentes na própria cidade em que vive e sobre as quais 327
ainda não tinha conhecimento. Em um primeiro momento, o extensionista realizou
uma observação em ambas as turmas, no intuito de conhecer o perfil dos alunos da
escola para o prosseguimento das ações, onde desenvolveu as atividades práticas
já mencionadas na metodologia.
Após as observações e realização de diagnóstico das turmas, as ações foram
iniciadas procurando-se compreender como os alunos das turmas participantes
percebiam a comunidade. Para tanto, foi constituído um grupo focal com 09 alunos
de cada turma participantes e solicitado que eles representassem o percurso casa-
escola, atentando para as principais problemáticas presentes na paisagem
representada e que, por conseguinte, têm implicações sobre o cotidiano do lugar. A
Figura 02 apresenta momento em que a atividade foi realizada, contando com o
apoio e participação dos discentes que prontamente se dispuseram a participar da
pesquisa.

Figura 02: Oficina de Mapas Mentais.

Fonte: PEREIRA, H. S. S., (2017)

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Após a primeira rodada de mapas mentais elaborados pelos alunos integrantes
dos grupos focais, a equipe extensionista desenvolveu um trabalho sobre a
Geografia escolar, qual a sua importância e a sua aplicação na realidade local, numa
relação multiescalar. Dessa forma, algumas problemáticas vivenciadas na
comunidade vieram à tona com o desenvolvimento da parte teórica, a exemplo dos
problemas de gestão de resíduos sólidos, da falta de saneamento básico na maior
parte das ruas da comunidade, da falta de espaços públicos para o lazer e
328
entretenimento, das obras inacabadas presentes na comunidade, a exemplo do
canal que foi construído para drenar as águas do sangradouro de um açude
construído à jusante da comunidade, porém a obra foi interrompida pela metade e
virou um escoadouro de esgotos. A Figura 03 apresenta a visita dos alunos junto
com a equipe extensionista ao referido canal.

Figura 03: Análise da obra inacabada do canal que atravessa a comunidade.

Fonte: ROSALES, A. F. A., (2017).

No que se refere a obra do canal, além de não ter sido coberta, viabilizando a
proliferação de vetores à saúde, cerca de 50% de sua extensão foi abandonada.
Além disso, pela figura 03 também é possível visualizar o abando do seu entorno,

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com falta de infraestrutura e resíduos sólidos descartados sem nenhuma
preocupação com os problemas ambientais futuros.
O conjunto de atividades desenvolvidas nas ações possibilitou o estudo do
lugar de vivência e a sua relação com a Geografia, problematizando questões
socioeconômicas e ambientais, em sua maioria relatadas pelos próprios alunos que,
através dos mapas mentais, puderam representar de forma livre como veem o
espaço. A seguir a Figura 04 apresenta alguns mapas mentais elaborados pelos
329
alunos.

Figura 04: Mapas mentais e a percepção de elementos geográficos na comunidade Mutirão


no percurso de casa para escola.

Fonte: Maria Aparecida e Hellem de Melo Alves, alunas do 6º ano “C” da Escola Estadual
Nossa Senhora Aparecida, (2017).

A autora do primeiro mapa trabalhou os elementos geográficos presentes no


percurso de casa para a escola, representando cuidadosamente o seu caminho
rotineiro, ligando assim os elementos, partindo de sua casa, ela passa pela casa dos
vizinhos, uma igreja também presente em sua rua, já na saída para a próxima rua a
presença de barracas, na rua seguinte se localiza uma lan house, seguindo o
caminho um mercado, colorido de roxo, em um tamanho maior que outros elementos

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apresentados anteriormente, logo depois a caixa d’água que é um dos poucos locais
públicos de lazer da comunidade, o ponto de ônibus, outro mercado, na cor laranja e
ilustra a Escola Nossa Senhora Aparecida, finalizando o mapa.
No segundo mapa, através da representação da aluna podemos perceber que
sua residência é mais afastada da escola, em relação a da aluna do primeiro mapa,
passando por um sítio, por um açude, além da distância, ela passa pela obra
inacabada do canal, representado na cor verde escuro, remetendo diretamente a cor
330
do esgoto que corre no interior da obra, assim como pontos coloridos referentes ao
lixo que é jogado no canal, ainda identificado por escrito que o canal é um lugar sujo.
Após as intervenções realizadas na primeira fase do projeto de extensão, os
alunos dos grupos focais foram convidados para a elaboração de mais uma rodada
de mapas, a partir das expectativas da equipe extensionista de que tenha havido um
incremento no olhar espacial dos alunos, a partir de todas as abordagens teóricas e
trabalho de campo realizado nas principais ruas da comunidade. A Figura 05
apresenta alguns mapas produzidos nesta etapa final das ações.

Figura 05: Mapas mentais na perspectiva dos problemas socioambientais.

Fonte: Tainá Chaves e Vitor Araújo, alunos do 7º ano “B” da EEEF Nossa Senhora
Aparecida, (2017).

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Nestes dois mapas, os alunos já tiveram um cuidado maior em descrever
detalhadamente o seu lugar de vivência. A construção desses mapas se deu nas
últimas semanas do projeto em cada turma, onde os alunos puderam representar a
partir do seu conhecimento geográfico o seu espaço de vivência.
No primeiro, a autora fez a representação de sua trajetória com a visão aérea
do espaço, partindo de sua casa, cujo telhado está colorido de rosa, passando pelas
residências dos vizinhos. Em seu trajeto ela também atravessa o canal, assim como
331
vários moradores da comunidade, que correm diariamente o risco de se acidentar e
contrair doenças. O canal foi colorido na cor verde escura, representando o esgoto e
com manchas pretas, representando a acumulação de lixo. Passando o canal, a
estudante teve o cuidado em representar minimamente detalhes como um morro de
areia, colorido de marrom e a deposição de resíduos sólidos, colorido de azul em um
tom escuro, nas proximidades desse morro que se localiza na frente da igreja
católica, finalizando com a chegada à Escola Nossa Senhora Aparecida, na cor azul .
No segundo mapa, o autor retratou o seu percurso de casa para escola
tentando reproduzi-lo da forma mais fiel possível, saindo de sua casa, ele passa
pelas casas vizinhas a bodega (na cor azul em um tom escuro), faz a representação
da sua rua, que começa com um trecho calçado e termina com um trecho de areia,
chegando à Rua Rafaela Souza e Silva, a principal rua da comunidade, que é
calçada e o caminho passa a ser mais acessível, ele representou os espaços que
estão dispostos, como a borracharia, na cor verde, o posto policial, na cor rosa e o
mercadinho, na cor azul. Mais à frente detalhou o espaço da caixa d’água, espaço
utilizado como área de lazer para muitos moradores, chegando à rua da escola, que
não é calçada, ele representou os esgotos das casas a céu aberto, que é um
problema socioambiental presente em todas as ruas da comunidade. Por fim,
ilustrou as casas que produzem esse esgoto e concluindo o mapa com a chegada à
escola Nossa Senhora Aparecida.
O intuito principal das ações extensionistas foi estudar a categoria geográfica
lugar, aproximando-o da escala local para facilitar o aprendizado, fazendo-se uso de
exemplificações, problematizações e recursos cartográficos. De tal forma, os alunos
puderam reforçar o conhecimento a respeito do lugar em que vivem, relacionando-o

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com a ciência geográfica, isso se deu ao ilustrarem em folhas de papel o percurso
de casa para escola, o que demonstrou sua interpretação do espaço de vivência.
Terminando as ações extensionistas a partir da segunda rodada de mapas,
ficou evidente o processo de aprendizado, tanto da equipe extensionista, pelo fato
de poder levar e aplicar o conhecimento teórico adquirido na academia, quanto dos
discentes, que tiveram a oportunidade de atribuir maior significado aos
conhecimentos da Geografia escolar, sobretudo no que concerne ao lugar, neste
332
caso, analisado nas duas acepções da Geografia: lugar de vivência e lugar social.

CONCLUSÃO

A extensão universitária, através do desenvolvimento de suas atividades,


contribuiu significativamente para a formação do estudante de licenciatura, uma vez
que permitiu a união entre teoria e prática, permitindo aplicar o conhecimento
adquirido na universidade para servir à população. Nesse contexto, a universidade
avança bastante no objetivo de cumprir o seu papel social.
Também é possível concluir a importância da utilização da linguagem
cartográfica, neste caso representada pelos mapas mentais, que podem ser
trabalhados em diversos conteúdos de Geografia. Esta e outras linguagens que
desenvolvam o conhecimento e a criatividade dos alunos devem ser cada vez mais
incorporadas ao ensino dessa disciplina, cabendo ao professor se renovar e buscar
novas formas de abordar os conteúdos, aproximando-os dos alunos, para que estes
também possam se ver como construtores do aprendizado, motivando-os em seu
cotidiano na escola.
Conclui-se que os benefícios do referente projeto de extensão são tanto para a
universidade que dialoga com a sociedade, oferecendo a ela o seu serviço, quanto
para o extensionista, que aprende na prática com a profissão docente e os alunos
das turmas contempladas com o projeto, que adquirem e produzem conhecimento,
bem como para a comunidade na qual o projeto se realizou.

REFERÊNCIAS

CAVALCANTI, L. S. A Geografia Escolar e a Sociedade Brasileira Contemporânea.


In. TONINI. I. M. et al. (org). O Ensino de Geografia e Suas Composições
Curriculares. Porto Alegre, Mediação, 2014, p. 77-98.

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FERREIRA, K. F. C. A Percepção do Lugar de Vivência Expressa Através dos
Mapas Mentais: experiência a partir do Subprojeto Geografia –
PIBID/CAPES/UEPB. 2014. 38 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) –
Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, 2014.

FREIRE, Z. B. Periferização e exclusão socioespacial: uma análise a partir da


comunidade Mutirão na cidade de Campina Grande, PB. 63 f. Trabalho de
conclusão de curso (Graduação em Geografia). Universidade Estadual da Paraíba:
Campina Grande, Centro de Educação, 2014.
333
HOLZER, W. A Geografia Humanista uma Revisão. Espaço e Cultura. n. 3, jan.
1992. Disponível em:
<http://www.epublicacoes.uerj.br/index.php/espacoecultura/article/viewFile
/6707/4783>. Acesso em: 6 out. 2018.

NUNES, A. L. P. F. N.; SILVA, M. B. C. A Extensão Universitária no Ensino Superior


e a Sociedade. Mal-Estar e Sociedade – Ano IV, Barbacena, n. 3, jan. 1997.
Disponível em:
< http://revista.uemg.br/index.php/malestar/article/view/60 >. Acesso em: 7 out. 2018.

RODRIGUES, A. L. L. et al. Contribuições da Extensão Universitária na Sociedade.


Cadernos de Graduação – Ciências Humanas e Sociais, Aracaju, n. 16, v. 3, p.
141-148, mar. 2013. Disponível em: < https://periodicos.set.edu.br/index.php/
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OLIVEIRA, L. O Ensino/Aprendizado de Geografia nos Diferentes Níveis de Ensino.


In. PONTUSCHKA, N. N.; OLIVEIRA, A. U. de (org), Geografia em Perspectiva:
ensino e pesquisa, São Paulo, Contexto, 2002, p. 217-220.

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UMA MUDANÇA AVALIATIVA NA UNIVERSIDADE PÚBLICA COM
GRADUANDOS DA PEDAGOGIA

Clia Regina Teixeira

RESUMO: O objetivo desta comunicação é apresentarmos os resultados da intervenção


pedagógica executada com discentes do curso de Pedagogia. Com base nas leituras
teóricas ofertadas na universidade foi proposta a escrita de cartas, para que debatessem e
verificassem quais as gerações se destacavam, quando o foco é a história deles discentes
sobre a avaliação da aprendizagem. Para tanto solicitamos que eles construíssem uma 334
Carta Pedagógica (Freire) discutindo a avaliação da aprendizagem. Utilizamos estudiosos
como Franco, Luckesi, Hoffmann, Abramowcz, Firme, Freire e Teixeira que defendem a
pluralidade de posicionamentos nas concepções avaliativas segundo a classificação da
avaliação em gerações. Neste cenário 78 Cartas Pedagógicas foram construídas por serem
objeto desta intervenção e, selecionamos 11 cartas para a presente discussão. Como
resultado da intervenção, analisamos as cartas, e anunciamos que há uma distância entre
os pressupostos avaliativos da 4ª Geração com a realidade das práticas avaliativas que
estão acontecendo no dia a dia das escolas que os discentes estudaram. E que somente
alguns anúncios de preocupação sobre os elementos das bases da 4ª Geração apareceram
nas cartas. Com isso afirmamos a incipiência ainda das discussões relacionadas a teoria e
prática avaliativa. E que intervenções relacionando teoria e prática avaliativa é emergente.

Palavras-chave: Cartas pedagógicas; Avaliação da aprendizagem; Práticas pedagógicas;


Ensino superior.

1 INTRODUÇÃO A BASE CONCEITUAL AVALIATIVA

Na contextualização histórica da trajetória da avaliação, ficou evidenciado que


os estudos sistematizados privilegiam a dimensão do rendimento escolar. Para
compreender o conceito de avaliação, bem como o seu desenvolvimento histórico e
conceitual, podemos dividir em quatro gerações, como foi sugerido por Firme (1994),
ao apontar as características da avaliação assim como o que as distingue e as
classifica em primeira geração, segunda, terceira e quarta geração. Para Firme
(1994) a primeira geração (datada do início do século XX, décadas de 20 e 30)
concebia a avaliação educacional tão somente associada à ideia de mensuração
(medir o que o discente sabe). Priorizava-se neste período a questão do produto, e
não dos processos. Foi nítido que os estudos focavam seus esforços na elaboração
de testes e de instrumentos que permitissem verificar o rendimento escolar do
discente. Os principais teóricos dessa geração foram: J. M. Rice, que desenvolveu
os primeiros estudos sobre o uso e a correção de testes objetivos e dissertativos e
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suas diferenças em medir, predizer, classificar e avaliar. H. Mann criou e aplicou o
sistema de testes objetivos em toda a rede de ensino público de Boston, propondo a
substituição das questões orais por objetivas, com especificidades do conhecimento
adquirido pelo discente. A segunda geração (décadas de 1930, 40 e 50) visava a
determinar em que medida os objetivos educacionais tinham sido obtidos,
superando os entraves da geração anterior. Esse período ficou conhecido como o
que trouxe a dimensão da avaliação descritiva, porque o papel do avaliador estava
335
centrado em descrever padrões e critérios, apesar de serem bastante técnicos.
Ralph Tyler ganhou destaque com sua teoria pautada em observar e descrever a
mudança de comportamento dos discentes e se os objetivos educacionais propostos
haviam sido atingidos. Bloom e colaboradores criaram a taxonomia do domínio
cognitivo e afetivo, que influenciou e influencia ainda o sistema educacional
brasileiro. A terceira geração (entre os anos 1960 e 70) aprofundava as limitações
das duas gerações anteriores e procurava ir além, em relação à dependência quanto
aos objetivos educacionais. Scriven e Stake reforçam a proposta de Cronbach de
juízo de valor. Segundo esses autores, a avaliação não pode prescindir de
julgamento, e os docentes precisam assumir o papel de juízes, sem desconsiderar
os pressupostos significativos das gerações anteriores, ou seja, mensuração e
descrição. A quarta geração (décadas de 1980 e 90) é marcada pela tentativa de
superação das gerações anteriores no que se refere aos conflitos de posições,
valores, decisões e dificuldades de consenso; e a ênfase deu-se no paradigma
científico, com a importação de modelos de pesquisa, oriundos das ciências exatas.
Essa geração se caracteriza fundamentalmente pela inserção do homem no
processo avaliativo, pela negociação, respeitando pessoas com diferenças de
valores, a participação de avaliadores. Essa geração considera importantes as
questões avaliativas, os métodos, a interpretação de resultados, a negociação, a
capacidade de respostas aos interessados e o objeto da avaliação. Para tanto, a
construção dos pressupostos avaliativos, nessa quarta geração, foi pautada na
interação e na negociação e, por ter um enfoque na responsabilidade, se
desenvolveu a partir das preocupações, proposições ou controvérsias. Segundo
Firme (1994, p. 9), a avaliação “[...] é construtiva em substituição ao modelo
científico, que tem caracterizado, de um modo geral, as avaliações mais prestigiadas

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neste século”. A avaliação, nessa geração, contempla também o que Hoffmann
(2003, p. 20) considera de extrema relevância: “[...] confiança na possibilidade dos
educandos construírem suas próprias verdades e a valorização de suas
manifestações e interesses”. Nesse sentido, a identificação dos interessados, cujos
interesses ocorrem via diálogo, e a construção dos critérios avaliativos advém via
responsabilidade e disponibilidade do avaliador e dos avaliados abertos a essa nova
modalidade discursiva. Essa quarta geração não despreza as propostas das
336
gerações anteriores, entretanto aponta uma evolução no conceito de avaliação, em
que o papel do avaliador é de comunicador e ator no processo dialógico e deve
incorporar os aspectos sociais, humanos, políticos e culturais.
A evolução no conceito de avaliação e a pluralidade pode ser detectada nas
quatro gerações. Entretanto, nas três primeiras, o paradigma positivista direcionou
seus pressupostos ontológicos, epistemológicos e metodológicos. A pluralidade de
posicionamentos nas quatro gerações, segundo Simões (2000), acontecem quando
as três primeiras gerações possuem pressupostos quantitativos, e a quarta
considera a avaliação enquanto um processo que envolve pessoas. A quarta
oportunizaria um olhar sensível para algumas questões do processo de ensino e
aprendizagem, uma vez que, ao desconsiderar essas questões focadas em
dimensões do aprender e ensinar, a perspectiva de acesso ao conhecimento sofreria
um entrave inestimável a quem quer aprender e não consegue. E foi com esta
singularidade — aprender e ensinar — que as Cartas Pedagógicas1 foram
implementadas no curso de Pedagogia, para que assim os futuros docentes rompam
com gerações que focalizam a mensuração e desconsideram todo o processo de
aquisição do conhecimento.

2 CARTAS PEDAGÓGICAS PARA ENTENDER NOVAS POSSIBILIDADES


AVALIATIVAS

A construção das Cartas Pedagógicas pressupõe que com a escrita


contribuímos para uma reflexão acerca da prática de comunicar aspectos da
Pedagogia, por meio da escrita. Na defesa de que as Cartas Pedagógicas
recolocam a educação no espaço do coloquial e do afetivo trazemos um

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experimento iniciado na Pedagogia e referenciado por Paulo Freire, ressignificada e
alastrada no meio popular segundo Camini (2012). Se atentarmos para a atualidade,
podemos verificar que a construção de cartas é uma prática um tanto nova e
desafiadora, pois a grande maioria dos discentes do curso de Pedagogia não teve
essa prática em seu cotidiano. Seguindo orientações de Camini (2012), a condição
prévia para escrever uma carta pedagógica é ter-se uma posição política e
pedagógica claramente definida. Isto é, consciência crítica sobre o fato, ou fatos que
337
se pretenda comunicar.
Segundo Camini (2012), sugerem-se, como método na construção de cartas,
os seguintes passos: Primeiro passo: escolher um fato, se A denominação de
Cartas Pedagógicas esta amparada nos escritos de Freire (1978; 1994; 2000; 2002,
2013), ligado diretamente à realidade do grupo para o qual se escreve a carta;
Segundo passo: descrever o fato e mostrá-lo como reflexo de uma realidade maior,
com incidência nas famílias, na escola, na sociedade; Terceiro passo: construir a
carta coletivamente, buscando refletir sobre a realidade escolhida, e intencionada a
provocar mudanças; Quarto passo: reler a carta, cuidadosamente, aprimorando as
ideias que não estão bem claras, especialmente aquelas que não dizem bem o que
se quer dizer. E como quinto passo, eu pesquisadora propus que: escolhessem o
colega que endereçará a carta e que irá receber dele a sua carta, ocorrendo uma
troca de correspondência – com a inclusão da escrita do endereço ao destinatário e
remetente nos envelopes.
Nesse processo de construção, muitas situações foram sendo desveladas
pelos discentes: não terem escrito cartas; não receberem cartas; não saberem o que
contém no corpo do texto de uma carta e não saberem escrevê-las. Com essas
questões levantadas, leituras e debates foram realizados com os discentes do curso
de Pedagogia sobre o cotidiano deles e os registros. Essas discussões foram
permeadas de muito interesse pelos discentes, talvez isso se justifique, pois, nos
Cursos de Formação de Professores, são poucas as práticas avaliativas atreladas
aos debates, em que os alunos são ouvidos e atentamente considerados.
Executar tais alinhavos no curso de Pedagogia foi um desafio, pois os
depoimentos que os discentes da graduação trazem quando trabalham e estagiam é
de que nas escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental ainda acontecem

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práticas somativas, construindo-se então um embate entre a teoria estudada e a
prática vivenciada. Este embate é um momento de muito crescimento tanto para nos
docentes quanto para os discentes, uma vez que precisam ser desconstruídas nas
salas de aulas do ensino superior as práticas somativas. Também, em seus relatos,
os discentes trazem na sua trajetória de escolaridade aspectos tradicionais da
dimensão da avaliação. Desta forma, muitos debates e leituras são emergentes para
rever esses pressupostos somativos direcionando os discentes para uma
338
(re)construção conceitual alinhavadas as leituras teóricas da área avaliativa. Romper
com esse desafio relacionado às questões teórico práticas é uma necessidade
imprescindível, uma vez que em espaço de formação de professores a
problematização deve permear durante todo o processo, especificamente sobre a
ação avaliativa, uma vez que a questão da avaliação ainda é um fato controverso na
relação pedagógica. Somente dessa maneira nos responsabilizamos para o tipo de
formação que estamos ofertando aos discentes que irão atuar nas escolas e que
poderão transformar as práticas avaliativas que foram protagonistas, em ações
afirmativas de aprendizagem.
Defendemos ainda que esses alinhavos romperiam com arquétipos
tradicionais de atuação docente e, com isso, originariam melhores condições de
aprendizagem para os discentes da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino
Superior. E foi com esse intuito que as Cartas Pedagógicas foram construídas,
atrelando questões de escrita, diversidade do gênero textual (cartas), referenciais da
área da Avaliação, com as práticas avaliativas vividas pelos discentes da Pedagogia,
rumo à construção de novas práticas pedagógicas enquanto futuros professores da
Educação Básica. Toda a pesquisa teve como subproduto um olhar atento para as
práticas avaliativas tradicionais com o propósito de superação e significação de
modelos vivenciados pelos discentes, referentes aos aspectos didático-pedagógicos.
Nesta pesquisa, o número de cartas está compreendido em 78 Cartas Pedagógicas.
Dessas Cartas tem as que compõem o relato inicial (quando o discente inicia o
diálogo sobre a avaliação e seus modelos enquanto discente protagonista na
Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio); seguido da Carta
Pedagógica do seu colega com seu parecer — que o discente com os referenciais

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da área avaliativa adquiridos durante as 60 horas das disciplinas de Avaliação
Educacional e Avaliação da Aprendizagem —, respondem ao seu colega do curso.
A dinâmica de escolha dos interlocutores (colegas da graduação) que irão
compor as escritas e leituras das Cartas Pedagógicas foi de livre escolha. Assim,
temos duas modalidades nas Cartas Pedagógicas, uma, em que o discente
descreve sobre suas histórias avaliativas; e a segunda, as Cartas Pedagógicas são
respondidas e elaboradas com o parecer do discente sobre as histórias avaliativas
339
de seu colega, referenciada na bibliografia avaliativa. Dentre o número de 78 Cartas
Pedagógicas, selecionamos 11 para compor este Ensaio. Na análise das Cartas
Pedagógicas, classificamo-las em dois blocos com relato, reflexão e anúncios de
propostas. Os blocos de análise estão assim organizados: o primeiro, nomeamos de:
Relatando as histórias avaliativas enquanto discentes; e, o segundo: Refletindo
sobre os espaços de superação de práticas avaliativas somativas para formativas.

3 RELATANDO AS HISTÓRIAS AVALIATIVAS ENQUANTO DISCENTES

Neste bloco, trazemos a análise das Cartas Pedagógicas sobre as histórias


avaliativas que os discentes do curso de Pedagogia foram protagonistas nos níveis
da Educação Básica e no Ensino Superior. Foi possível verificarmos que, com as
escritas contidas nas Cartas Pedagógicas, temos sistematizados um conjunto de
interesses, procedimentos e pressupostos que, para os discentes do curso de
Pedagogia estão amparados no princípio da articulação entre a teoria lida e a prática
vivenciada. Para isso, apresentamos as Cartas Pedagógicas de MCCP, WSB, RSM,
LMSF, JCA por terem dados muito importantes dos pressupostos e finalidades da
avaliação e por fomentar a discussão sobre a área avaliativa. A leitura aponta-nos
para a necessidade de entrelaçá-los, em vez de trata-los individualmente.
As Cartas Pedagógicas de MCCP, WSB, RSM, LMSF, JCA, verificamos que
há desafios a serem superados sobre a prática docente quanto à ênfase é na
avaliação da aprendizagem. Nas Cartas Pedagógicas citadas, os discentes
destacaram que a avaliação, no período que foram alunos, na maioria das vezes,
ocorria por meio de provas e testes, além dos vistos dados pelos docentes nos seus
cadernos de atividades realizadas em sala de aula. Eles também destacaram que,

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durante sua escolaridade, as provas constituíram-se no único instrumento de
avaliação pelos discentes, e, com isso, entenderam que são uma ameaça, pois
demandam situações de traumas e desistências.
O uso das provas indicaram que alguns discentes serão promovidos no
espaço da sala de aula e outros não. Isso fica perceptível quando estão atreladas às
questões de exclusão e daí o temor e a ansiedade que atrapalham o bom
desempenho em horas cruciais, como o Dia de Prova, a Semana da Avaliação,
340
dando o ‘branco’. Esses momentos cruciais desconsideram os processos de
aprendizagem no período escolar. Neste sentido, a prova é um instrumento de
‘verificação’ e não de ‘avaliação’ da aprendizagem, segundo Luckesi (2011). Ainda,
sobre as Cartas Pedagógicas, os discentes assinalam que a construção de saberes,
na maior parte do tempo, estava amparada unicamente na reprodução do conteúdo
do livro didático, por meio da “decoreba”. Apontam que quem não decorava as
questões tinha no dia da prova um momento tenso com muita angústia, pois seu
entendimento sobre o conteúdo programático era posto como segundo plano,
entendendo com isso que todo seu ofício de estudante perpassava por considerar
que a decoreba era que validava a nota.
Com esses relatos das Cartas Pedagógicas foi possível visualizar a crítica
feita de Scriven (1967), que defende que a avaliação precisa ultrapassar a dimensão
do momento, e considerar o processo, atentando que muitos dos dados coletados
nos instrumentos avaliativos como prova, teste, questionário, seminários, pesquisa
nos meios eletrônicos etc... indicam fotografias dos momentos de aprendizagem e
acontecem com os erros. Desse modo, é preciso considerar que esse erro é um
indício para docentes e discentes trabalharem em sala de aula, pois eles conduzem
para os acertos futuros. E é com esse olhar sobre o erro que devemos incorporar em
nosso cotidiano de sala de aula o que Cronbach (1970) assinala sobre avaliação,
uma vez que necessitam ser pautadas no processo de tomada de decisão e, para
alcançar essa meta, as ações avaliativas devem ter como premissa três objetivos: a)
determinar a eficiência de métodos de ensino e do material utilizados nos
programas; b) identificar as necessidades dos educandos ao planejar, para
contemplar as deficiências detectadas na avaliação e, com isso, intervir na

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perspectiva de incentivar o sucesso; e c) julgar a eficiência do ensino e dos
docentes, orientando a tomada de decisão perante os resultados.
Segundo Hoffmann (2003), enquanto docente, temos que atentar que avaliar
é estar preocupado com o processo de aprendizagem e, muitas vezes, o
desconsideramos por estarmos muito mais preocupado com o processo de ensino,
com o planejamento e metodologia e, não com a estratégia pedagógica adequada
ao interesse e à necessidade do discente que tem dificuldades. Ainda Hoffmann
341
(2003), o aparecimento de erros e dúvidas dos discentes, numa extensão educativa
é um elemento altamente expressivo ao incremento da ação educacional, pois
admitirá ao docente a observação e investigação de como o aluno se coloca diante
da realidade ao construir suas verdades. Ela distingue o diálogo entre docente e
discente como indicador de aprendizagem necessário à reformulação de alternativas
de solução para que a construção do saber aconteça. A reflexão do docente sobre
seus próprios posicionamentos metodológicos, na elaboração de questões e na
análise de respostas dos alunos, deve ter sempre um caráter dinâmico. E, ao valer-
se dos métodos tradicionais de ensino, especificamente na prática avaliativa, o
docente tem sua visão de que as dificuldades de aprendizagem de seus discentes é
exclusivamente deles, e não leva em consideração o olhar atento que deve
transversalizar sua prática sobre seus métodos e técnicas para ensinar.
Nas Cartas Pedagógicas, verificamos que, por mais que a teoria de avaliação
formativa date de 50 anos atrás, nós ainda estamos engatinhando nas práticas e
isso poderia ser amenizado com formação aos professores (formação inicial e
continuada) com fundamentação teórica e leitura na área avaliativa. Portanto,
sabemos que há uma vereda sem muitas reflexões sobre as concepções de erro nas
práticas avaliativas e um caminho sólido precisa ser construído por docentes, pois só
desta maneira romperemos com as experiências tradicionais ainda existentes nas
intuições educacionais narradas nas Cartas Pedagógicas. E neste contexto,
defendemos (Teixeira,2013) que a avaliação é um estado de atenção constante,
sobre o que nós estudiosos da área avaliativa, docentes e discentes desenvolvemos
em nossas atividades educativas e envolve um constante atentar sobre os caminhos
percorridos pelos discentes na aquisição do conhecimento.

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4 REFLETINDO SOBRE OS ESPAÇOS DE SUPERAÇÃO DE PRÁTICAS
AVALIATIVAS SOMATIVAS PARA FORMATIVAS

Nossas discussões presentes neste item têm a finalidade de oferecer uma


reflexão diante do fenômeno da avaliação da aprendizagem e sua superação,
aparados em estudiosos da área, mais as Cartas Pedagógicas escritas no bloco
342
anterior em que os discentes relatam sua história avaliativa experienciada na sua
escolaridade com suas argumentações, ideias e conceitos. Nessa análise, estamos
considerando que muitos são os discursos na perspectiva Somativa, entretanto
revisitar esses conceitos são emergentes, pois necessitam reconfigurar-se rumo à
dimensão formativa. Para isso, selecionamos as cartas de MCCP, RSC, WSB,
WOSA, GOS, MSL, DMS, JDAS. Neste bloco de análise, observamos que muitas
Cartas Pedagógicas com as respostas, trazem as críticas dos alunos sobre como
acontecia o processo de ensino aprendizagem em sua trajetória de escolaridade,
bem como sugerem alguns anúncios para se romper com essas práticas, pois
afirmam a reconfiguração dessas práticas na dimensão formativa. Utilizam Luckesi
(2011), Freire (2003), Abramowicz (1999, 2002) para referenciar que muitas práticas
avaliativas que foram protagonistas tinham como princípio ações tradicionais e que
precisam atualmente ser modificadas. Apontam também que era visível com esta
atitude a despreocupação com a questão da aprendizagem, uma vez que alguns dos
seus docentes tinham na docência um papel de reprodução de saberes. Para esses
autores, tal fato favorecia as questões do cumprimento de um planejamento, pois os
docentes não se atentavam se acontecia ou não a aprendizagem, o fundamental era
cumprir o planejado anual e orientar os alunos a reproduzir o que constava no livro
didático, levando-os a reproduzir.
Nas Cartas Pedagógicas com as respostas, muitos discentes trazem estes
relatos com muita constância, o que demanda para uma concepção de docência
como ato mecânico. Dessa forma, apontamos que a superação dessas questões
constantes nas Cartas Pedagógicas nos direciona a refletir sobre a finalidade da
avaliação, à luz das contribuições, advindas das bases conceituais de avaliação da
aprendizagem, os caminhos e descaminhos, avanços e retrocessos, pois

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acreditamos que os múltiplos olhares sobre as práticas avaliativas que acontecem
nos contextos das salas de aulas necessitam de (re)configuração na dimensão
formativa. Sendo assim, em quase todos as Cartas Pedagógicas nos possibilitou
observar a nítida preocupação e também a necessidade de compor nos espaços de
sala de aula qual o tipo de aprendizagem que a escola viabiliza aos alunos e se o
ato amoroso de aprendizagem é um ingrediente de auxílio para o ensinar e
aprender. Nesse sentido, podemos verificar que estamos nos preocupando com o
343
aluno e sua inclusão no processo e sua aprendizagem na dimensão formativa.
Também nas Cartas Pedagógicas com as respostas, quando o tema é o
“erro” do aluno, ele foi apontado como resultado final do processo de ensino
aprendizagem, necessitando por isso de revisão deste princípio se quisermos
transitar pela avaliação formativa, pois, com o conhecimento do erro, o docente, em
parceria com o discente, alavancaria em novas aprendizagens e, consequentemente
o inclui no processo de aprendizagem. Observamos que não é raro trazerem nas
Cartas Pedagógicas a urgência em romper com questões tradicionais de ensino,
metodologia e avaliação, uma vez que envolvem avaliar o educando no tempo
determinado e, como exemplo, dão a Semana da Avaliação e o uso de provas e
exames, como instrumentais de coleta de dados sobre o processo de aprendizagem.
Nesses fragmentos, também podemos destacar alguns elementos advindos de um
incômodo no âmbito escolar, nos remetendo para o compromisso dos discentes para
com o ensino e aprendizagem. O reconhecimento das práticas pedagógicas, com as
questões da ação reflexão ação, surgem em muitos fragmentos. A ação reflexão
ação é anunciada como um ingrediente que deve permear os espaços das salas de
aulas, pois este ato encaminha-nos para novas alternativas. E, com isso, elas vão
sendo anunciadas e construídas.
Nos relatos das Cartas Pedagógicas ficou visível as preocupações dos
discentes com a identidade docente, pois anunciam a modificação para com a
maneira que enxergam os educandos. Eles apontam a necessidade de enxergá-los
como sujeitos do seu próprio desenvolvimento, inseridos no contexto de sua
realidade social e política é emergente.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Discutir sobre a avaliação atualmente, com o volume de estudos da área da


Educação envolve considerar a importância da aprendizagem, sem, contudo,
desconsiderar que a avaliação precisa ser ponderada como um dos instrumentos
usados neste processo, pois deve “[...] reafirmar o compromisso com a produção da
vida humana” (ALBUQUERQUE, 2007, p. 3). Com esse princípio, buscamos
344
desvelar que fatores explicam as práticas avaliativas dos docentes, indicados pelos
discentes em suas Cartas Pedagógicas e que que ainda estão acontecendo práticas
tradicionais avaliativas (Somativas) em algumas escolas da educação básica.
Com base nas leituras das teorizações da área avaliativa e de muitos debates
em sala de aula com narrativas de suas experiências avaliativas, foi possível
observarmos os desejos dos discentes de mudar a avaliação que vivenciaram como
protagonistas em sua escolaridade quando forem professores.
No final do processo avaliativo com os discentes do curso de Pedagogia,
estes tiraram suas próprias conclusões. E, a partir das trocas reflexivas em sala de
aula, manifestaram suas dificuldades e facilidades no processo de ensino
aprendizagem e que maiores estudos demandariam para amenizar está dificuldade.
Consideraram em suas reflexões que a avaliação da aprendizagem só terá efeito
permanente sobre as tarefas trabalhadas no cotidiano da sala de aula quando for
problematizada a tal ponto que se transforme num ato educativo, num ato de ação,
de decisão, realizado pelos sujeitos inseridos no processo.
Paralelo a essas trocas das teorizações da área avaliativa, realizamos uma
série de atividades específicas em relação ao conteúdo, com estratégias
diversificadas para refletir com os discentes os conteúdos programáticos da área da
avaliação da aprendizagem. Todas essas fases tiveram como princípio a análise e
reflexão conjunta e compartilhada em sala de aula. Um destes momentos aconteceu
quando cada um dos alunos realizaram a leitura em voz alta das suas cartas. Sem a
pretensão de “acabar” com o assunto, dada a sua complexidade, acentuamos que
algumas estimativas acerca das Cartas Pedagógicas ainda são necessárias. A
primeira delas é sobre a relevância da escrita de Cartas, bem como a intimidade da
escrita com os depoimentos relatados. A segunda diz respeito ao envolvimento dos

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discentes na construção das Cartas para os colegas e que, ao responder as cartas
deles, esta ação foi vista como instrumento pedagógico reflexivo. Por isso, as cartas
aqui expostas, admitem a riqueza de uma comunicação correspondida, pois cada
carta construída e respondida pelos discentes do curso de Pedagogia viria a
alimentar uma reflexão atrelada às concepções avaliativas, articulando a parte
teórica com a parte pratica de uma área de conhecimento.
Verificamos também que à medida que os discentes construíram convicções
345
coletivas, maiores reflexões e diálogos aconteciam no espaço de sala de aula. Estes
fundamentos estão amparados também nos resultados de outras pesquisas (AVIZ e
COPPETE, 2016). Também verificamos que muitas Cartas Pedagógicas acentuam a
questão da avaliação e suas gerações. Nestes relatos das Cartas Pedagógicas,
muitos indícios de que ainda estamos compondo ora a 2ª Geração ora a 3ª Geração
é verificável. Questões como a natureza da avaliação, suas características e seus
pressupostos, a identificação das causas das dificuldades de aprendizagem, retro
informar esse processo, verificar os resultados alcançados, replanejar o trabalho,
favorecer o desenvolvimento individual dos sujeitos, conhecer melhor suas
dificuldades e capacidade de autoavaliar-se são aspectos muito importantes e, que
somente em algumas Cartas Pedagógicas foram atentamente considerados.
Nesta conjuntura, defendemos que uma avaliação da aprendizagem deve ser
tratada como um ingrediente de democratização de oportunidades escolares, numa
dimensão política, uma vez que as relações de poder, fator determinante das
dificuldades do processo de ensino aprendizagem, não dificultam somente ao
professor, mas também à escola na tomada de decisões quanto às modificações a
realizar e evitar, tanto nos procedimentos de ensino e avaliação quanto os
prejulgamentos que favorecem a discriminação do aluno em função de suas
atividades e comportamentos. Essa preocupação foi visível quando em muitas
Cartas Pedagógicas referentes aos alunos e sua aprendizagem, e ao professor e
sua prática pedagógica são elementos da 4ª Geração da avaliação. Nessa geração,
existe uma clara preocupação com o homem e sua inserção no processo avaliativo,
ou seja, o avaliado e o avaliador. E também na interação e na negociação dos
elementos advindos do processo avaliativo, como fórmula desencadeadora de
responsabilidades.

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A concepção de avaliação da aprendizagem construída ao longo deste
trabalho empírico e teórico, intrínseco ao estudo ora desenvolvido, é compreendida
enquanto elemento que possibilita desvelar percursos, conhecendo a realidade
avaliada, propondo momentos de reflexão e possíveis alternativas de intervenção.
Com isso justificamos que se faz necessário um diálogo entre quem avalia e é
avaliado. E assim, a construção de Cartas Pedagógicas atrelada as leituras de uma
área de conhecimento — a avaliação da aprendizagem — muito favorece essa
346
forma de se expressar, pois facilita lançar olhares sobre questões de fórum individual
articulado com a literatura atual.
Por fim, justificamos que o pretexto de escrever este breve relato sobre Cartas
Pedagógicas advém do crédito de que os aprendizados decorrentes de sua
construção se entrecruzam e se comunicam, servindo de exemplo e de reflexão,
conforme defende Paulo Freire.

REFERÊNCIAS

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reflexão. In: BICULO, A. V.; SILVA JUNIOR, C. A. da. (orgs.). Formação do
educador: avaliação institucional, ensino e aprendizagem. v. 4. São Paulo: Editora
da Universidade Estadual de São Paulo – UNESP, 1999.
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possibilidades. In: SEVERINO, A. J.; FAZENDA I. C. (orgs.). Formação docente:
rupturas e possibilidades. São Paulo: Papirus, 2002.
ALBUQUERQUE, Targélia de Souza. Ética e Avaliação: elos pedagógicos em
defesa da vida na escola. Editora Construir, 2007.
AVIZ, Roselete Fagundes de; COPPETE, Maria Conceição. As cartas e o motivo do
encontro na questão do currículo e avaliação. Currículo, tecnologias, conhecimento
escolar, gestão da escola e história social das disciplinas. Série Anais do XII
Colóquio sobre Questões Curriculares/ VIII Colóquio Luso-Brasileiro de
Currículo/II Colóquio Luso-Afro- Brasileiro de Questões Curriculares. (Org)
Antônio Flávio Barbosa Moreira; Márcia Ângela da S. Aguiar; Isabel Carvalho Viana.
[Livro Eletrônico]. Recife: ANPAE, 2016.

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______. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. 12. ed. São Paulo:
Olho D’Água, 2002.
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______. Cartas à Guiné-Bissau – registro de uma experiência em processo. Rio de
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Janeiro, Paz e Terra. 1978.
FIRME, Thereza Penna. Avaliação: tendências e tendenciosidade. In: Ensaio:
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v. 1., n. 2, p. 05 -12, jan./mar. 1994.
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TEIXEIRA, Célia Regina. Avaliação educacional: campo em (re)construção. João
Pessoa: Editora da UFPB, 2013.

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A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA EM UMA ESCOLA DE
BACHARÉIS: O QUE REVELA O CURRÍCULO DA UFPB

David Luiz Rodrigues de Almeida | Eliane Souza da Silva | Antonio Carlos Pinheiro

RESUMO: Este artigo apresenta reflexões desenvolvidas pelo Grupo de Estudos e


Pesquisas em Educação Geográfica (GEPEG) da Universidade Federal da Paraíba
(UFPB) que tratam sobre Projetos Pedagógicos Curriculares (PPC) para a formação
de professores de Geografia na Paraíba. Para esse tratado, analisamos a tardia 348
reformulação do currículo escrito ou prescrito do PPC do curso de licenciatura da
UFPB a partir das orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) de
2002, cumprida apenas no ano de 2016. Nosso objetivo é analisar a relação entre o
currículo escrito e o currículo praticado pelos professores do curso de licenciatura
em Geografia da UFPB para a formação dos licenciandos. Para isso, analisamos as
orientações curriculares e o PPC da UFPB, além da correlação da concepção de
quatro professores que ministram componentes curriculares ao curso de licenciatura.
Nossas conclusões apontam para uma formação de professores regida por um perfil
de curso de bacharelado, que na maioria das vezes, centra-se numa concepção
empirista e acrítica de formação desvinculada da realidade do campo de trabalho do
magistério.

Palavras-chave: Formação de professores. Educação Geográfica. Currículo escrito.


Currículo praticado. DCNs.

INTRODUÇÃO

Este artigo versa sobre a correlação entre o Projeto Pedagógico Curricular


(PPC) e a formação de professores de Geografia na Universidade Federal da
Paraíba (UFPB), campus I, João Pessoa-PB. Apresenta resultados da pesquisa
intitulada “Projetos de formação de professores de Geografia: 10 anos após as
Diretrizes Curriculares Nacionais” vinculada a rede do Núcleo de Pesquisa em
Educação Geográfica (NEPEG) da Universidade Federal de Goiás (UFG) e
desenvolvida, na Paraíba, pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação
Geográfica (GEPEG).
Em estudos anteriores, Pinheiro e Almeida (2017) analisaram os PPCs de
universidades paraibanas, em especial, a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)
e Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e seus respectivos campis que
ofertam o curso de licenciatura em Geografia. Todas elas seguiram as orientações

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das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) de 2002 voltadas à formação de
professores, embora cada uma a interpretasse ao seu modo; alguns, com mais
características de bacharelado do que licenciatura.
De todo modo, o curso de Geografia da UFPB, federalizado em 1960 através
da lei nº 3.835, é a única instituição pública no estado da Paraíba a possuir duas
modalidades apresentadas pelo Conselho Superior de Pesquisa, Ensino e Extensão:
licenciatura (Resolução nº 27/1980 CONSEPE) e bacharelado (Resolução 26/1980
349
CONSEPE). O projeto seguiu mediante reestruturação curricular de 1997. Essa
diretriz curricular indica apenas um conjunto de ementas disciplinares a serem
seguidas para a formação de bacharéis e professores.
A proposta curricular do PPC (UFPB, 1997) se remete a lógica integrada entre
as modalidades bacharelado e licenciatura. Nela os discentes cursam inicialmente
as disciplinas relacionadas aos conhecimentos específicos da Geografia e, de forma
complementar, inseri disciplinas disponibilizadas pelo Centro de Educação da UFPB
para os alunos interessados pelo magistério. Aspecto conhecido pela literatura de
formação de professores como modelo 3+1.
Segundo o Parecer CNE/ CP nº 9/2001 (BRASIL, 2001b) nos anos 2000, o
Ministério da Educação (MEC) remeteu ao Conselho Nacional de Educação (CNE)
proposta de diretrizes para a formação de professores da Educação Básica e
Superior. Indicava reformulação da perspectiva do trabalho docente a partir dos
debates constituídos, principalmente, nas décadas de 1980 e 1990 no sentido da
universalização do Ensino Fundamental obrigatório, da melhoria do fluxo de
matrículas e investimentos nesse nível escolar.
Ademais, indicava a ampliação da Educação Infantil e Ensino Médio, da
redemocratização do país a partir da Educação, do avanço das tecnologias,
informação e comunicação para a convivência social, organização do trabalho e
exercício da cidadania (BRASIL, 2001a).
A partir disso, dois pareceres e uma resolução indicaram as DCNs para a
formação de professores de Geografia. O primeiro, Parecer CNE/ CP nº 492/2001
(BRASIL, 2001b) com os indicativos para a formação do profissional geógrafo
(bacharel e professor); o segundo, Parecer CNE/ CP nº 9/2001 (BRASIL, 2001b)

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para o do magistério; o terceiro, Resolução 2/ 2002 (BRASIL, 2002) indicava a carga
horária dos cursos de licenciatura.
Todas as Instituições de Ensino Superior (IES) do Brasil tiveram 10 anos para
adequar a matriz curricular de seus cursos, em especial, e de nosso interesse nesse
estudo, de licenciatura em Geografia. Ou seja, do ano de 2002 a 2012, contudo duas
IES não cumpriram as DCNs de 2002 no prazo estabelecido: a Universidade de
Brasília (UnB) e a UFPB. Essa última cumpriu as DCNs apenas no ano de 2016
350
(UFPB, 2016).
Além do PPC da UFPB desenvolvido no ano de 1997 e 2016, há a proposta
desenvolvida pelo MEC que constitui a última DCN (2015) para a formação de
professores. Essa derradeira foi finalizada pelo curso de licenciatura da UFPB e
submetida ao CONCEPE da UFPB no dia 4 outubro de 2018. Desse modo há três
propostas de PPC no curso de licenciatura: a velha, de 1997; a nova, de 2016; e a
última, de 2018. Hoje, em vigência, há o currículo de 1997 e 2016 formando
professores de Geografia na UFPB.
Diante de todas as dificuldades, persistências e mudanças curriculares para a
formação de professores de Geografia da UFPB é apresentado o seguinte
questionamento: mesmo com as reformulações curriculares, ainda há resistências
relacionadas às práticas dos professores da Educação Superior que, na maioria dos
casos, formam professores a partir de orientação curricular dos bacharéis?
Nesse ínterim, esse artigo tem o objetivo de analisar a relação entre o
currículo escrito, PPC (UFPB, 2016), com base nas DCNs de 2002, e o currículo
praticado pelos professores do curso de licenciatura em Geografia da UFPB para a
formação dos licenciandos.
A metodologia utilizada para a realização desse trabalho caracteriza-se como
um estudo de caso, onde situamos: a) os procedimentos de pesquisa documental a
partir dos referenciais norteadores dos pareceres que dão base as DCNs de 2002;
b) o PPC (UFPB, 2016) na identificação das disciplinas pedagógicas em três
categorias: pedagógicas, específicas da Geografia e complementares; e c)
entrevistas realizadas com quatro docentes da UFPB no ano de 2018 que atuam
tanto no curso de licenciatura, quanto no de bacharelado.

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1. ORIENTAÇÕES CURRICULARES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
GEOGRAFIA NA UFPB

De acordo com Lopes e Macedo (2011) existem teorias de currículo que


coordenam representações, imagens, reflexões e signos que produzem e
descrevem a realidade formativa em um sistema formal de educação. De forma
sumária, podemos indicar duas teorias que dirigem a análise do nosso caso em
estudo: acrítica e crítica.
351
A teoria acrítica é constituída por uma concepção de currículo neutro, movido
preferencialmente pelos objetivos, procedimentos e métodos. Nela a passividade,
submissão e ausência de questionamento e senso crítico acerca do ato da formação
(de si e do outro) levam a alienação e reprodução da atividade docente. O
conhecimento é legitimado pelo atendimento às regras e aos métodos rigorosos no
âmbito acadêmico na perspectiva instrumental. O currículo é caracterizado por uma
divisão em disciplinas que orientam o curso.
A concepção crítica, por sua vez, não apenas seleciona e define o
conhecimento, mas realiza a análise dessa seleção e da validação do saber.
Segundo Macedo e Lopes (2011) essa concepção questiona alguns problemas
como: a oposição arbitrária do saber social, desconsiderando a hibridação
epistemológica, uma prática social de legitimação e produção de significados; a
existência de único projeto curricular relacionado a uma única categoria de
conhecimento; desconsideração das lutas políticas e dicotômicas entre prática e
teoria, conhecimento acadêmico e escolar entre outros.
De acordo com Goodson (2012, p. 17-18) a manifestação da concepção
acrítica ou crítica do currículo podem ser analisadas no nível do “currículo escrito” ou
“praticado”. O primeiro corresponde às tomadas de decisões referentes à formação
as quais seguem, ou não, os PPCs das IES. São regulados pelos dispositivos legais
como normatizações, resoluções ou mesmo um quadro de ementas. A dimensão
prescritiva do currículo pode indicar também seu projeto pedagógico, visão de
mundo e perspectiva de sujeito que pretende formar.
Por outro lado, segundo Goodson (2012) o nível do currículo praticado
apresenta as interpretações docentes frente à prescrição. Nessa perspectiva o
currículo é moldado e atribuído significados a partir dos conhecimentos, da formação

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acadêmica, cultural e social, do contexto institucional e também dos alunos. Logo,
não há neutralidade nesse processo. No tópico a seguir observaremos os
parâmetros desses currículos escrito e praticado para a formação de professores de
Geografia da UFPB.

2. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA: ENTRE O CURRÍCULO


ESCRITO E PRATICADO DA UFPB 352

A Resolução nº 1/2002 institui as DCNs e procura orientar as IES ao


enfrentamento de problemas históricos referentes à formação inicial de professores
de Geografia, a saber: qualidade desse ensino na Educação Básica, dicotomia
licenciatura e bacharelado, teoria e prática, universidade e escola entre outros
princípios.
A referida resolução se encontra fundamentada pelo Parecer CNE/ CP
09/2001 (BRASIL, 2001) que apresenta estratégias a serem exercitadas pelas IES,
sumariamente, indicam:
1. Desenvolver disposições e conhecimentos de Geografia para a atividade
docente;
2. Compreender a complexidade do ato educativo e suas implicações sociais;
3. Promover nova matriz curricular que considere: a organização institucional,
definição e estruturação dos conteúdos voltados ao magistério;
4. Desenvolver experiências de aprendizagem e competências vinculadas ao
sistema escolar.

No nível do currículo escrito do PPC (UFPB, 2016) é possível identificar seu


posicionamento epistemológico, pedagógico e social. Tais fundamentos
correspondem as DCNs para a formação de professores de Geografia, com todas as
suas potencialidades e antinomias. Por isso, decidimos realizar o contraponto entre
o próprio PPC, os pareceres e resolução e a concepção da prática curricular dos
docentes.
As DCNs de 2002 são contraditórias. Podem conduzir interpretações
equivocadas entre o conhecimento de Geografia e a formação do professor por sua

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incompreensão ou incoesão argumentativa e organizacional dos documentos que a
regem. Tal pressuposto é apresentado pela fragmentação na proposta de perfil de
professor, apresentada pelo Parecer CNE/ CP nº 9/ 2001, e do sujeito em formação
em Geografia (perfil de bacharelado), Parecer CNE/ CP nº 492/ 2001.
No que corresponde ao perfil do formando nos cursos de Geografia
(licenciatura e bacharelado), o Parecer CNE/ CP nº 429/ 2001 afirma que consiste
em:
353
Compreender os elementos e processos concernentes ao meio natural e ao
construído, com base nos fundamentos filosóficos, teóricos e metodológicos
da Geografia. Dominar e aprimorar as abordagens científicas
pertinentes ao processo de produção e aplicação do conhecimento
geográfico. (BRASIL, 2001a, p. 10. Grifo nosso).

Em contrapartida, as DCNs para o curso de Geografia admitem a


responsabilidade às IES em seguir, no caso da modalidade de licenciatura, o que
prescreve o Parecer CNE/ CP 9/ 2001. Expressa o documento que:
O desenvolvimento das competências profissionais do professor pressupõe
que os estudantes dos cursos de formação docente tenham construído os
conhecimentos e desenvolvido as competências previstas para a conclusão
da escolaridade básica. (BRASIL, 2001a, p. 37).

A partir dessas diretrizes, cada IES, em especial os cursos de licenciatura em


Geografia, interpreta, organiza e gestiona o seu PPC (UFPB, 2015, p. 9. Grifo
nosso) indicando o seguinte:
[...] o Licenciado em Geografia deve ter como base a capacidade de
compreender a construção do espaço geográfico pela sociedade. Além
disso, ele deve também dominar e aprimorar as abordagens inerentes à
docência, ou seja, conteúdos básicos que são relacionados ao ensino-
aprendizagem no Ensino Fundamental e Médio [...] o Licenciado em
Geografia é um educador dos assuntos acadêmicos na esfera da
Ciência Geográfica. Enfim, esse profissional deve possuir um domínio
sobre os aportes teóricos, filosóficos e metodológicos da ciência geográfica,
articulado a capacidade de domínio sobre métodos e técnicas pedagógicas.

O PPC (UFPB, 2016) é coerente na compreensão do campo de atuação


profissional dos seus alunos. Indica o trabalho do professor de Geografia no Ensino
Fundamental e Médio, da elaboração e análise de materiais didáticos, assessorias e
outras atividades relacionadas à educação. Todavia, tanto na resolução, quanto no
PPC é indicada centralidade no conhecimento científico da Geografia, o que pode
dirigir o conhecimento pedagógico à periferia do campo formativo.

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A preocupação aqui apresentada se sustenta na delimitação das habilidades
do profissional em Geografia. Entendemos que elas também abarcam a carreira do
bacharel em Geografia, porém o Parecer CNE/ CP nº 429/ 2001 é claro ao afirmar
que “[...] essas transformações no campo dos conhecimentos geográficos vêm
colocando desafios para a formação não apenas do geógrafo-pesquisador (técnico e
planejador) como também para o geógrafo-professor do ensino fundamental, médio
e superior.” (BRASIL, 2001b, p. 10).
354
Segundo o PPC (UFPB, 2016) são apresentadas competências e habilidades
gerais e específicas para a formação do profissional de Geografia. Delas, oito são
indicadas como necessidades gerais e sete específicas, direcionamentos para
ambas as modalidades.
Das 15 competências e habilidades apenas duas delas estão voltadas
diretamente a atividade docente. A geral, “Perceber e refletir sobre a peculiaridade
da ciência geográfica ser dotada de métodos e procedimentos das ciências
humanas e das naturais [...]; Projeto Pedagógico do Curso de Geografia –
Licenciatura”, e a específica, “Organizar o conhecimento espacial adequando-o ao
processo de ensino-aprendizagem em geografia nos diferentes níveis de ensino.”
(UFPB, 2016, p. 9-10).
Em entrevista com quatro professores do curso de licenciatura ou
bacharelado em Geografia da UFPB todos afirmam que houve mudanças da
proposta curricular do PPC de licenciatura de 2016 quando comparada ao de 1997.
Enquanto aspectos positivos mais presentes está à aproximação à formação do
magistério e do seu perfil de profissional, ao organizar a formação de professores
desvinculada, inclusive por entrada do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM),
do bacharelado; preocupação em inserir a experiência formativa na escola a partir
dos estágios supervisionados, a prática da pesquisa no ensino de Geografia na
licenciatura50 como o Trabalho de Conclusão de Curso entre outras.

50
O processo de pesquisa para formação de professores de Geografia na UFPB é um de seus
problemas. Esse curso possui Programa de Pós-Graduação em Geografia que incluiu as linhas de
pesquisa Cidade e Campo: espaço e trabalho, Gestão do território e análise geoambiental e
Educação Geográfica e que hoje realiza contribuições para se pensar o conhecimento geográfico
para a formação e atuação dos profissionais dessa área. Porém, ainda existe grande desproporção
entre o empenho e investimentos formativos dos professores universitários para com a formação dos
mestres e doutores, daqueles voltados à graduação, em especial, a licenciatura.

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Enquanto aspectos negativos dessa proposta o professor 2 apresenta
argumento importante:
A demora do Colegiado do Curso em fazer a reforma curricular que se
tornara obrigatória, desde a DCN de 2002, foi, sem dúvidas, uma perda de
oportunidade de se aperfeiçoar, mais rapidamente, a formação de
professores e o ensino de Geografia na Paraíba. E tal atraso pode ser
apontado como um dos fatores que influenciam na alta evasão de alunos
registrada pelo curso, nos últimos anos, assim como reproduz uma “tradição
bacharelesca” (que ainda é muito forte e presente nas licenciaturas do
Brasil!) de menosprezar a formação de professores que, por mais
contraditório que pareça, é o nosso principal campo de trabalho. (Professor 355
2).

Segundo o exposto, a compreensão de currículo obscurece ainda algumas


práticas empiristas no ensino de Geografia e na formação de professores. Para
Cavalcanti (2013, p. 52) essa abordagem de ensino:
[...] trata-se de ensinar os objetos, os fatos e acontecimentos, com o
objetivo único (ou principal) do ensino de Geografia, como se fossem dados
a serem constatados, memorizados, descritos, em si mesmos, como se
fossem “coisas” que tivessem sentido e significado neles mesmos, em sua
existência empírica, e que a ciência tivesse apreendido esse significado, em
seu todo. Trata-se, basicamente, do ensino factual.

Segundo essa diretriz, primeiro os sujeitos devem estar aptos a trabalhar com
os conhecimentos voltados a área específica e, posteriormente, os relacionados ao
conhecimento pedagógico. Ao discutir a formação de professor, Freitas (2016)
revela as dificuldades para a constituição da identidade docente, principalmente em
instituições onde há a relevância da formação do bacharel, em detrimento da
licenciatura em Geografia.
Acerca da formação inicial de professores de Geografia, Freitas (2016)
demonstra que ao analisarmos o modelo formativo 3+1 de professores destacamos
a relação de tempo e esquecemos a estrutura. Esse modelo agrega,
separadamente, dois conjuntos de conhecimentos a partir dos componentes
curriculares: “os conteúdos técnico-científicos (fiéis à ciência de referência) e os
conteúdos didático-pedagógicos (que instrumentalizam os conteúdos técnico-
científicos na produção do saber escolar).” (FREITAS, 2016, p. 78).
De acordo com as orientações das DCNs de 2002, os PPCs devem ser
organizados em três núcleos: (1) Núcleo básico: conteúdos da ciência geográfica;
(2) Núcleo complementar: conteúdos que visam auxiliar um tratamento
interdisciplinar com outras áreas de conhecimento, não excluindo a natureza

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geográfica; (3) Núcleo de opções livres: conteúdos selecionados pelos licenciandos
em Geografia (BRASIL, 2001b).
Todos os componentes curriculares específicos da Geografia e
complementares são disponibilizados pelo curso de Geografia e ainda dois
componentes pedagógicos (Metodologia para o Ensino de Geografia e Pesquisa
aplicada a Geografia); os oito componentes curriculares pedagógicos restantes
(Política e Gestão da Educação, Didática, Fundamentos Antropo-Filosófico da
356
Educação, Fundamentos Sócio-Histórico da Educação, Fundamentos Psicológico da
Educação e Estágios Supervisionados de Ensino I, II e III) são ofertados pelo
Departamento de Metodologia da Educação do Centro de Educação da UFPB.
Quando perguntado aos professores quais aspectos do PPC consideram
importantes para o desenvolvimento dos seus componentes curriculares, eles
argumentam sobre a atualização da ementa (professor 1); a importância dos
trabalhos de campo e o pouco investimento pela IES (professor 3); liberdade e
abertura para o trabalho que o docente achar mais interessante (professor 4) e a
possibilidade da construção da identidade docente o que ainda não é possível, com
rara exceções do PIBID e discentes que já ministram aula na Educação Básica
(professor 2).
Com a vigência da Resolução CNE/ CP 01/2002 (BRASIL, 2002, p. 6),
definiu-se que as IES promovam o “aumento nos cursos de formação da carga
horária de Prática de ensino e Estágio Supervisionado.” Logo, no caso da
licenciatura em Geografia da UFPB, essa carga horária ficou distribuída em 3.015
horas/ aula no sistema de 201 créditos. Sendo que os Estágios Supervisionados (27
créditos e 345 horas/ aula no total) são oferecidos pelo Departamento de
Metodologia da Educação do Centro de Educação, ficando sua prática curricular a
critério dos professores do referido departamento.
Como proposta de evitar dicotomias entre a teoria e prática na materialização
do currículo em sala, o Parecer CNE/ CP nº 9/2001 apresenta a ideia de articulação
entre eles. A IES deve propiciar momentos para que isso no currículo, ela é
consubstanciada na prática como componente curricular. Para os professores
entrevistados por nós, três deles, naquele momento, ministravam componentes

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curriculares a turmas da licenciatura. Explicam que essa relação se dava de
diferentes formas.
Para o professor 1, 3 e 4, que ministram componentes específicos da
Geografia, essa associação é realizada a partir dos conhecimentos geográficos ao
contexto de reconhecimento do espaço escolar e dos conteúdos a serem
ministrados no Ensino Fundamental. A proposta é desenvolver a criticidade dos
discentes referente aos conhecimentos geográficos e seu raciocínio.
357
Para o professor 4, responsável pelos Estágios, relata que:

Com o constante estímulo à articulação teoria-prática, universidade-escola,


pois considero que são instâncias complementares e indissociáveis da
prática pedagógica ou da práxis docente. Todos os procedimentos que
adoto nas minhas disciplinas buscam demonstrar aos alunos que os
saberes apreendidos na universidade, por mais “teóricos” que pareçam,
devem ter como foco a prática escolar; e essa, por mais interessante e
inovadora que pareça, só avança se ajudar o professor da escola a construir
suas próprias teorias (ou saberes da experiência) a partir da ação no
espaço escolar.

Apesar dos modos evidenciados de associar a prática e teoria por esses


professores, isso não é consensual entre o grupo de docentes do curso de
licenciatura. O próprio PPC (UFPB, 2016) não apresenta o que entende por prática e
teoria para a formação de professores. Ele indica a Resolução 46/2012 do
CONSEPE da UFPB que compreende a Prática Curricular como carga horária
distribuída em disciplinas obrigatórias e optativas (20 créditos, 300 horas/ aula).
O curso de licenciatura em Geografia da UPFB deve propiciar momentos para
que a prática e teoria ocorram no currículo de formação. O que o documento
consubstancia enquanto prática como componente curricular? Que o aluno pode
conhecer a prática, como se fosse possível estabelecer dia e horário para sair da
teoria (instituição) e entrar na prática (escola da Educação Básica), como
normalmente ocorre.
Esse modelo de formação de professores ainda é arraigado ao do
bacharelado o que demonstra, por parte dos professores que ministram
componentes curriculares ao curso de licenciatura a ausência de preparo, interesse
e compromisso com o curso de licenciatura.

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3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta das DCNs 2002 confere aos cursos de licenciatura de Geografia


momento de crescimento e desenvolvimento social de professores. Isso é entendido
como condição de melhoria dos sistemas educativos e do processo de ensino e
aprendizagem na Educação Básica. Ressalta que o trabalho docente tem grandeza
e complexidade tamanhas, que envolve pressupostos que consideram ações
vinculadas ao trabalho coletivo, à pesquisa e à formação permanente. 358

As DCNs de 2002 foram importantes para a compreensão acerca da


formação docente, dos objetivos, conhecimentos, habilidades e competências desse
perfil de profissional. Contudo, tais modificações se encontram em um campo de
conflito entre o seu significado simbólico e prático. Ou seja, do que se propõem e o
que realmente é desenvolvido para a formação docente (GOODSON, 2012).
A partir das análises e reflexões acerca do PPC (UFPB, 2016) verificamos
problemas referentes ao currículo praticado dos pareceres e resolução que dirigem
as DCNs de 2002. Coerência e sentido de integração para a formação dos
profissionais do magistério, em especial dos cursos de licenciatura em Geografia.
Isso conduz múltiplas interpretações referentes às necessidades de formação de
professores de Geografia.
Entre as principais dificuldades no cenário de formação de professores de
Geografia pela UFPB está a sua tardia reformulação curricular, quando separa as
entradas e programas curriculares entre licenciatura e bacharelado.
Apesar da nova proposta alcançada a partir de currículo escrito, o modelo de
bacharelado permanece no curso de licenciatura. O currículo praticado advém de
modelo acrítico da formação docente. Ela promove um ensino empirista da
Geografia onde o conhecimento teórico – não apenas dos conhecimentos da área,
mas também pedagógicos – prescrevem um modelo tecnicista de aplicação do
conhecimento geográfico na Educação Básica.
Vale ressaltar que dos professores entrevistados, cada um deles entende, ao
seu modo, como deveria ser articulada a relação teoria e prática em seus
componentes curriculares. Alguns contrariam a lógica de horas/aula da Resolução
46/2012 do CONSEPE da UFPB. Contudo, veremos que a maior aproximação nesse
sentido ainda se restringe aos Estágios Supervisionados na relação mais intrínseca

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entre Universidade e Escola. Porém, as orientações, planejamentos,
questionamentos e intercâmbios no curso de licenciatura em Geografia ficam a
cargo do Departamento de Metodologia da Educação do Centro de Educação, logo
tais fatores de aproximação entre a área específica e o conhecimento pedagógico
fica a critério das competências dos professores que ministram esses componentes
curriculares.

359
REFERÊNCIAS

BRASIL. Parecer CNE/CES 492/2001, de 3 de abril de 2001a. Disponível em: <


http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0492.pdf > Acesso em: 22 set. 2018.

BRASIL. Parecer CNE/CP 9/2001, de 8 de maio de 2001b. Disponível em: <


http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/009.pdf > Acesso em: 22 set. 2018.

BRASIL. Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de 2002. Disponível em: <


http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CP022002.pdf > Acesso em: 22 set. 2018.

CAVALCANTI, Lana de S. Geografia escolar e a busca de abordagens teórico/


práticas para realizar sua relevância social. In: SILVA, Eunice I. da; PIRES,
Lucineide M. (Orgs.). Desafios da didática da Geografia. Goiânia: Ed. Da PUC
Goiás, 2013. p. 45-65.

FREITAS, Anniele S. F. de. Formar professores-pesquisadores numa escola de


bacharéis: a cultura do PIBID de Geografia da UNICAMP. 2016. 164 f. Dissertação
(Mestrado em Geografia). Universidade Estadual de Campinas, Instituto de
Geociências, Campinas-SP, 2016.

GOODSON, Ivor F. Currículo: teoria e história. Tradução: Attílio Brunetta; Revisão


da tradução: Hamilton Francischetti. 12 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

LOPES, Alice C.; MACEDO, Elizabeth. Teorias do currículo. São Paulo: Cortez,
2011.

PINHEIRO, Antonio C.; ALMEIDA, David L. R. de. Currículo e formação de


professores de Geografia na Paraíba. In: SILVA, Anieres B. da; GUTIERRES,
Henrique E. P.; GALVÃO, Josias de C. (Orgs.). Paraíba: pluralidades e
representações geográficas. V. 2. Campina Grande: EDUFCG, 2017. p. 15-32.

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA (campus I, João Pessoa). Projeto


Pedagógico Curricular de Geografia. UFPB: João Pessoa-PB, 1997.

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA (campus I, João Pessoa). Projeto


Pedagógico Curricular de licenciatura Geografia. UFPB: João Pessoa-PB, 2016.

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CURRÍCULO PRESCRITO E CURRÍCULO VIVIDO NA FORMAÇÃO DO
BACHAREL EM TURISMO

Paula Dutra Leão de Menezes51 | Célia Regina Teixeira 52

RESUMO: O objetivo desse estudo é analisar a formação do currículo em turismo e


determinar a formação profissional desenvolvida nos cursos de turismo. Foi realizado uma
pesquisa qualitativa nos cursos de bacharelado em turismo de três universidades federais
localizadas na região Nordeste do Brasil. A referida investigação encontra-se dividida em
duas etapas: na primeira, foi realizada uma pesquisa documental, em que foram analisados 360
os Projetos Pedagógicos de Cursos de Bacharelado em Turismo vigentes dos cursos. Na
segunda etapa, realizou-se uma pesquisa de campo, como instrumento de coleta de dados
foram empregadas entrevistas de grupo focal com profissionais em turismo egressos dos
cursos das referidas instituições de ensino selecionadas para o estudo. Conclui-se que ao
longo do curso os alunos se sentem sem foco e, ao final, não obtêm o valor de uso, da
prática social nos objetivos e expectativas na formação profissional superior em turismo. Os
currículos prescritos nos Projetos Pedagógicos dos Cursos são efetivamente os currículos
vividos pelos egressos. Contudo, os relatos dos egressos demonstram as angústias quanto
à formação recebida e, no caso, da prática profissional. De acordo com os egressos deveria
ser ofertado no curso mais conhecimentos específicos das diversas áreas de atuação, uma
vez que existe uma lacuna na formação desenvolvida nas universidades e as práticas
solicitadas pelo mercado de trabalho.

Palavras-chave: Currículo. Formação Profissional. Ensino superior. Turismo.

INTRODUÇÃO

Os cursos de Bacharelado em Turismo no Brasil foram criados no início de


1970 e a grande expansão ocorreu entre 1990 e 2000. Peres, Menezes e Teixeira
(2016) explicam que os cursos de turismo apresentavam características
extremamente pragmáticas o que gerava uma preocupação corrente por parte dos
educadores em turismo. Em 2005 existia no país 476 cursos, entretanto, nos anos
seguintes os cursos começaram a fechar e, em 2017 existia 162, conforme dados do
Censo da Educação Superior - MEC/INEP (2005, 2017).
Nesse percurso, a sociedade, a educação e o trabalho passaram por
transformações. A sociedade passou a ser conectada com acesso as informações

51
Doutora em Humanidades Y Artes (Educação), Universidad Nacional de Rosario. Professora da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB); Centro de Comunicação Turismo e Artes (CCTA);
Departamento de Turismo e Hotelaria (DTH). E-mail:leaopaula@ccta.ufpb.br
52
Doutora em Educação: Currículo, PUCSP. Professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB);
Centro de Ciências Aplicadas e Educação (CCAE); Departamento de Educação (DED). E-
mail:cel.teix54@gmail.com

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mais rápidas e em tempo real, a educação passou a ter novas necessidades em
decorrência dessas mudanças e também da política educacional instituída em
meados de 1995 e, por último, o trabalho, passou a exigir novas posturas e novos
perfis dos seus colaboradores. Contudo, no que concerne aos cursos de turismo
parece que eles não acompanharam tais mudanças de modo a se adequar a essa
realidade. E, portanto, alguns desafios relacionados ao desenvolvimento dos
referidos cursos deixaram ser contemplados.
361
De tal modo e considerando que muitas são as questões que envolvem a
formação em turismo, o objetivo desse estudo é analisar a formação do currículo em
turismo e determinar a formação profissional desenvolvida nos cursos de turismo.
Para tanto, foi realizado uma pesquisa qualitativa nos cursos de bacharelado em
turismo de três universidades federais localizadas na região Nordeste do Brasil:
Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Federal do Rio Grande do
Norte (UFRN) e Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A referida pesquisa
foi dividida em duas etapas: na primeira, foi realizada uma pesquisa documental,
foram analisados os Projetos Pedagógicos de Cursos de Bacharelado em Turismo
vigentes dos cursos para determinar como se processa a organização curricular do
ensino superior em turismo. Na segunda etapa, realizou-se uma pesquisa de campo,
como instrumento de coleta de dados foram empregadas entrevistas de grupo focal
com profissionais em turismo egressos dos cursos das referidas instituições de
ensino selecionadas para o estudo.

BREVE NOTA SOBRE O ENSINO SUPERIOR EM TURISMO

Sobre as questões inerentes a educação em turismo, Cooper et al. (2001)


analisam os princípios gerais da educação em turismo e hospitalidade e aponta que
os problemas e as agendas são diferentes em cada país, contudo, que são
universais. De acordo com os autores a área possui uma abordagem fragmentada e
com uma ausência de padronização. Vários problemas enfrentados na educação em
turismo e pelos educadores em turismo são elencados pelos autores. Dentre eles os
de como o treinamento de turismo e não a educação em turismo; o turismo como
meio para um fim, no caso, enriquecer disciplinas tradicionais e matérias de outras
áreas; a educação em turismo multidisciplinar (o que pode ser uma desvantagem

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para estimular matérias mais tradicionais e faz com que se torne subserviente); e
sem uma base teórica que faça com que a matéria possa se desenvolver e crescer.
Nessa premissa, a base teórica em turismo tem sido o debate de autores da
área, uma vez que tem relação com a educação em turismo. Assim, falar de base
teórica e epistemologia permite clarear em que este se aporta e determinar como se
constrói o currículo acadêmico em turismo e, também, onde e como se dá a
formação científica.
362
Jafari e Richie (1994) indicam a interdisciplinaridade para o estudo do turismo,
uma vez que pode ser tema de estudo de diversas disciplinas. E então partir para a
formação de um corpo teórico que responda as questões inerentes ao turismo e seja
aceito pela comunidade. Jafari sugere que o turismo caminhará para a cientifização,
como já ocorreu com outras áreas.
Tribe (1997) também concorda com a interdisciplinaridade no estudo do
turismo, contudo, acredita que o turismo nunca chegará a ser disciplina. Para Tribe a
epistemologia aplicada ao turismo é importante por dois aspectos: ajuda a validação
do conhecimento produzido na área e ajuda a delimitar o campo do turismo, ou seja,
onde começa e onde termina o turismo, uma vez que existem muitos debates sobre
os limites do turismo. Analisa o modelo de Jafari e Richie e considera que os autores
não distinguem campo de estudo e disciplina.
Para Tribe (2008) o fenômeno turístico pode ser dividido entre os campos
empresariais e os campos não empresariais. Estando de um lado a visão do turismo
como aspecto empresarial a ser pesquisado por meio de estudos empresariais e, do
outro, a visão do turismo como aspectos não empresariais a ser investigado por
diversas abordagens de conhecimento em turismo. Esses seriam os dois campos do
turismo.
No Brasil, Panosso Netto tem sido o autor que mais tem se dedicado a
questão da filosofia do turismo e da epistemologia. No livro Filosofia do turismo -
teoria e epistemologia (2005) recomenda a fenomenologia como caminho e
ferramenta para o debate turístico e focaliza o ser humano como único sujeito do
fenômeno turístico. Segundo ele, a fenomenologia permitiria analisar aspectos
fundamentais do turismo e aprofundar os estudos na busca por respostas.

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Ainda sobre a educação em turismo, também no Brasil, Moesch (2000)
aborda o tema enfatizando que até então a área vem sendo estudada a partir da
perspectiva econômica, pragmática e consumista. Argumenta que a produção do
conhecimento do turismo está apenas no “saber fazer”, distante do “fazer saber” que
é à base das ciências sociais, e complementa que a academia não está integrada e
não partilha dos conceitos epistemológicos existentes, gerando uma confusão de
terminologias que dificultam na elaboração e evolução teórica das pesquisas em
363
turismo.
Nesse contexto, essas questões envolvem e comprometem a educação em
turismo. E corroborando com isso Evans (1988 apud COOPER et al. 2001) aponta
que afeta a credibilidade acadêmica do estudo da hospitalidade, e também a
questão da imagem da credibilidade acadêmica dos departamentos de
hospitalidade, baseadas no fato de que os programas de hospitalidade são
responsabilizados por ensinar aos alunos “como fazer” e “não como pensar”. E,
relacionando isto ao critério da disciplina, conclui-se que departamentos de
hospitalidade não são vistos como academicamente verossímeis.
Sem dúvida a educação em turismo ainda não possui marcos teórico sólido e,
os problemas assinalados refletem em maior ou menor grau em todos os aspectos
que se refere ao ensino e a pesquisa em turismo e, consequentemente, na formação
profissional desenvolvida no ensino superior.

A FORMAÇÃO DO CURRÍCULO E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL


DESENVOLVIDA

A análise documental dos PPC´s dos cursos de turismo nos permite inferir
que a educação superior em turismo está em consonância com as políticas públicas
educacionais do país. Os três PPC´s analisados remetem que para sua formulação
foram considerados o Parecer CNE-CES 288/2003, as DCN´s do curso de turismo
(2006) e a LDB (1996). Nesse sentido e, considerando as políticas educacionais os
PPC´s foram construídos buscando um padrão mínimo com os conteúdos em
harmonia com as DCN´s e com a proposta da formação de um profissional crítico
e polivalente.

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O PPC da UFPE explica que para atender às novas exigências e desafios
educacionais e do mercado, o projeto pedagógico do Curso de Graduação em
Turismo deve contemplar aspectos como
“Garantia de um padrão mínimo que equalize as diferentes escolas do país nos
conceitos e conteúdos educacionais que, por sua vez, propiciem a formação de um
profissional qualificado, crítico, polivalente e criativo” (PPC Turismo UFPE, 2011, p.
21). Também esclarece que o profissional deve se aprofundar depois: “Condições
364
para que o futuro profissional possa se aprofundar cada vez mais em suas áreas de
interesse” (PPC Turismo UFPE, 2011, p. 22).
Sobre se aprofundar na formação profissional no Grupo Focal da UFPE os
egressos descreveram:
Eu acho que também assim é o curso de turismo a gente vê de tudo um
pouco, nunca assim a gente realmente se aprofunda em alguma coisa, é um
pouco de economia, é um pouco disso, é um pouquinho daquilo e um pouco
daquilo, e fica assim superficial, geral. É geral, depende da pessoa, do perfil
de cada um se aprofundar naquela área (R.H.).

Ele não aprofunda (M.R.).

Em estudo realizado com alunos universitários de nível Bacharelado ou


Tecnólogo em Turismo das Universidades Federais, Garcia, Ávila, Strieder e Protas
(2015) detectaram que a grade curricular, a multidisciplinaridade das cadeiras, a
carga horária, e o tempo de duração do curso são os aspectos que se apresentam
negativos acerca da organização do curso. Os alunos mencionaram problemas
como disciplinas que possuem pouco aprofundamento de assunto, disciplinas
repetidas ou que não despertam o interesse, falta de disciplinas de línguas
estrangeiras entre outros.
O PPC da UFPB propõe que o profissional deve compreender o turismo para
tanto “o Curso oferece ao aluno uma fundamentação teórica sólida que tem por
objetivo compreender o lugar do Turismo” (PPC de Turismo UFPB, 2010, p. 7). E
corrobora que “o curso de graduação, no âmbito geral, deve contemplar a formação
teórica baseada na interdisciplinaridade de diversas correntes do pensamento
turístico como objeto de profundas reflexões sobre o fenômeno” (PPC de Turismo
UFPB, 2010, p. 8). Cristaliza a formação crítica e o treinamento de técnicas, além
da formação multi e interdisciplinar, defende que o graduando [...] deve receber
uma formação interdisciplinar que o prepare para ser um técnico com formação

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superior, em nível de graduação, apto a planejar e executar projetos turísticos da
iniciativa pública e privada, organizar e administrar empresas e instituições do setor
turístico em geral, e equipamentos de turismo particulares ou públicos (PPC Turismo
UFPB, 2010, p. 13).
Sobre a formação multi e interdisciplinar no Grupo Focal da UFPB os
egressos analisam que:
Eu acho que dá forma como ele se apresenta assim interdisciplinar, eu acho
que no meio do caminho você tem que se direcionar para escolher qual 365
área você quer aturar, entendeu? Hotelaria, agência que como ele oferece
uma gama muito grande, então como ele falou não tem foco, porque ele é
interdisciplinar, então ele tem muitas cadeiras assim variadas (M.M.).

Eu acho que é mais nas palavras do que de fato, gente teve um pouco
disso, teve não a gente teve um pouco disso, espera, vamos ser sincero de
vincular realmente, por exemplo, a gente teve uma aula de patrimônio
histórico não poderia ver isso vinculando, mas a gente não poderia ver
colocando mais no conceito de turismo [...] (D.L.).

Já o PPC da UFRN também direciona a formação para a interdisciplinaridade


e pensar o turismo e, confirma também, o estudo do fenômeno, os conhecimentos
técnicos e a visão crítica. O foco é direcionado para que o graduando seja capaz de
[...] articular o conhecimento interdisciplinar fundamental quando se trata de turismo
(PPC Turismo UFRN, 2015, p. 4). Defende ainda que a forma mais efetiva de
participação da Universidade neste processo é através da educação e qualificação
das pessoas, capacitando-as para pensar o turismo em sua complexidade e
importância (PPC Turismo UFRN, 2015, p. 4).
Sobre a interdisciplinaridade no Grupo Focal realizado na UFRN os egressos
consideram que:
Relacionado à educação a gente tem um curso, o curso de turismo é muito
interdisciplinar e multidisciplinar, a gente tem coisas voltadas só que são
diversas, desde a área de direito, a área de contabilidade, a área de
marketing, então tudo isso a gente consegue agregar no currículo, só que
por isso, por ser tão diverso assim, a gente acaba se perdendo um pouco,
poxa vida, como é que eu vou atuar com tudo isso? E o mercado como é
que vai acolher? (L. P.).

Só complementando o que a H.P. falou realmente as disciplinas por ser


multidisciplinar, se o aluno não tiver um foco desde o início do curso do que
ele quer fazer em turismo, ele vai se perdendo no meio do curso (C.K.).

[...] a gente tá meio que com estigma porque a gente ficou meio
ultrapassado mesmo nisso em pensar e não tem essa ...porque eu acho
realmente que falta esforço em quebrar essa imagem de turismólogo não ter
função. Eu acho que essa interdisciplinaridade, ela deve ser um pouco
reduzida e focar (A.L.).

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Sobre a educação em turismo Echtner (1995) afirma que o desenvolvimento
do ensino em turismo não é tarefa fácil em função da natureza da disciplina, que é
segmentada, inter e multidisciplinar, o que cria conflitos e dificulta seu entendimento.
Muitas propostas foram apresentadas em relação à disciplina; elas variam da
incorporação do turismo em áreas de estudo existentes como geografia,
administração ou sociologia, ao estabelecimento de programas interdisciplinares ou,
366
ainda, à criação de escolas específicas para o ensino em turismo.
Ao analisar os objetivos dos referidos cursos e o perfil de seus egressos
comprova-se que estes se encontram em conformidade com a Resolução Nº
13/2006 que institui as DCN´s do curso de turismo e, especificamente, com o Art. 3.
Nesse aspecto constatou-se a formação generalista instituída no Parecer CNE-CES
288/2003, que estabelece o delineamento de um perfil profissional almejado para os
egressos desses cursos.
Assim percebeu-se a necessidade de propor uma formação mais generalista,
que proporcionasse aos estudantes um conhecimento mais abrangente das
diferentes faces do turismo, em consonância com as Diretrizes Curriculares
Nacionais (PPC de Turismo UFRN, 2015, p. 9). A habilidade principal do graduado
é, genericamente, entender a totalidade dos processos do turismo, suas interfaces,
suas variáveis macro e micro ambientais e neles intervir criativamente [...] (PPC
Turismo UFPB, 2010, p. 15).
Estas duas linhas mestras do saber específico serão desenvolvidas ao longo
do Curso, em caráter genérico, e aprofundadas a critério da escolha do aluno, nos
últimos períodos, devendo esta escolha ser reforçada no estágio curricular
obrigatório (PPC Turismo UFPE, 2011, p. 23).
Essa formação generalista foi abordada pelos egressos dos cursos que
participaram dos Grupos Focais, que compartilham também suas angústias:

Ele se apresenta assim multidisciplinar. Então se ele já se apresenta assim


multidisciplinar já é uma coisa que[...] (A. P.).

O meu sentimento quando eu terminei o curso era que apesar de eu ter


certos conhecimentos, eu não era uma pessoa boa especificamente em
fazer nada, acho que pecou um pouco, pecou na formação, na construção
assim do turismólogo. Porque você sai daqui pronto para fazer o quê? [...]
eu sai do curso com essa visão assim, o que eu sei fazer? Eu não sei
exatamente o que eu sei fazer (F.E.).

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Quando eu terminei o curso, e agora eu estou pronta especificamente pra
que? A sensação que eu tinha era que não estava pronta pra nada (F.G.).

A gente não tem uma área assim, essa área a gente vai atuar (H. P.).

[...] numa comparação assim bem simples eu me coloco assim como um


pato que voa, nada e anda, mas ele não faz nada disso direito, ele nem é
especialista em andar, nem em nadar, nem em voar então você sai daqui
como um pato você vê um pouquinho de cada coisa, você tem uma visão
ampla, holística, mas falta especialidade e é isso que o mercado quer, é
muito genérico e o mercado ou o mercado quer um técnico que saiba fazer
aquilo ou quer um gestor, um gestor com profundidade, com bagagem, com 367
especialidade, não uma coisa assim ampla, geral (M. R.).

Caracteriza-se assim uma formação generalista com noção superficial do


setor turístico. Souza (2014) expõe que o caráter generalista da formação faz com
que seja necessário que o egresso busque cursos de especialização e invista
permanentemente no seu aperfeiçoamento cultural e profissional. Entretanto, essa
formação generalista atende ao paradigma da formação humanista e emancipatória
que não pode estar a serviço do pragmatismo de caráter profissionalizante.
Na análise da estrutura dos cursos objeto desse estudo, bem como nos
critérios para elaboração dos currículos prescritos, constata-se que existe em sua
concepção preceitos da racionalidade técnica. Sobretudo, ratifica-se a relevância
nesses currículos dos objetivos, da seleção e organização curricular e do sistema de
avaliação.
Nessa premissa, a matriz curricular dos cursos de bacharelado em turismo ao
instituírem pré-requisitos para determinadas disciplinas contribuem para a
fragmentação do conhecimento, tendo em vista que é indispensável o processo
classificatório traduzido em processos de avaliação.
Estes currículos podem colaborar para a fragmentação de conhecimentos
propostos e limitar a falta de integração do conhecimento o que pode influenciar o
aspecto fundamental determinado nos PPC´s para os cursos de turismo, a
interdisciplinaridade.
Isso porque no concerne em edificar a interdisciplinaridade proposta nos três
PPC´s à forma como é definida a estrutura dos cursos, permite pouca flexibilidade
dos currículos, contribuindo para que efetivamente essa interdisciplinaridade não
ocorra. Gallo (2007) aborda a imagem disciplinar e árvore do conhecimento e, ao
analisar a interdisciplinaridade expõe que a questão de fundo é se a prática

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interdisciplinar dá conta de resgatar essa totalidade ou se ela consegue apenas
colocar remendos nos retalhos que a disciplina criou e, propõe pensar o currículo
como rizoma.
No caso dos cursos de turismo analisar se a questão da interdisciplinaridade
está colocando remendos nos retalhos que a disciplina criou é um ponto que emerge
e deve ser observado. Tal fato se justifica considerando os relatos dos bacharéis em
turismo nos Grupos Focais:
368
Eu vou concordar com que B.R. dizia eu acho que a gente tem uma teoria
que agarra muito em outras para se justificar, a gente envolve questão de
planejamento, questão de custos, de pessoas, são várias coisas que se
agregam para a gente ter uma coisa de turismo (D. H.).

[...] porque a gente é muito colocado para estudar a gestão, o que eu acho
ótimo para a nossa área, no meu entendimento, só que a gente é ensinado
para a gestão, massa, gestão da administração, da contabilidade, do direito,
mas o turismo em si ele meio que se perde, ele vai aparecer em algumas
disciplinas optativas no final do curso. Então, a gente passa o curso todinho
patinando por outras áreas para chegar às disciplinas que são de turismo e
que aí a gente já vai tá com o tempo passado [...] (A. L.).

Assim eu acho que no curso de turismo a gente vê um pouquinho de cada


coisa, aprende um pouquinho de marketing, um pouquinho de
planejamento, um pouquinho de economia, um pouquinho de cada coisa
talvez não exista um foco, então se fosse focado, por exemplo, em
marketing a gente poderia sair daqui procurando um emprego focado em
marketing, mas o que a gente aprende em marketing não seja o suficiente
para o mercado de trabalho absorver, a mesma coisa planejamento a
mesma coisa economia, o conhecimento que a gente tem de economia
talvez não seja o suficiente pra a gente trabalhar no setor financeiro de uma
agencia de viagens. Eu acho que o problema é a formação e a gente
aprende um pouquinho de cada coisa, mas não o suficiente pra trabalhar (F.
E.).

Na mesma perspectiva de Gallo (2007), Lopes e Macedo (2005) questionam a


forma dominante de construir o conhecimento – a árvore – bem como a realidade
social que foi construída e apontam para um movimento que vem discutindo a
centralidade que se deu à racionalidade como única forma de aquisição do
conhecimento, questionando o papel central das disciplinas tradicionais bem como a
divisão do conhecimento que estabeleceram na escola.
Percebe-se assim que não se consegue resgatar essa totalidade através da
interdisciplinaridade e que ao longo do curso os alunos se sentem sem foco e, ao
final, não obtêm o valor de uso, da prática social nos objetivos e expectativas na
formação superior em turismo. Nessa vertente, dois aspectos devem ser

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considerados: primeiro, a educação em turismo buscando seu lugar na
epistemologia do turismo, em pensar o turismo, da institucionalização científica que
pode afetar a formação dos estudantes, uma vez que de acordo com Santos Filho
(2005) a ciência do turismo se produz no processo das contradições epistemológicas
dos seus saberes. E em segundo, o consequente afastamento das questões
relacionadas à prática e ao mercado de trabalho, bem como, a desmotivação do
discente¬/egresso em decorrência do descompasso entre a realidade da formação
369
profissional e a necessidade do mercado de trabalho, ou seja, “a pouca adequação
entre aquilo que é proposto pelos cursos de turismo e as reais necessidades do
mercado de trabalho resultam na baixa absorção desses profissionais” (GAIO;
FERNANDES, 2006, p. 12).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise dos PPC’s aliada à legislação em vigor e as declarações dos


egressos dos cursos de turismo permite detectar uma dualidade no que concerne à
formação humanista X formação tecnicista, em uma relação dialética que
recomenda uma mudança de paradigma, em que se deve passar da transmissão de
conhecimentos para gênese da reflexão crítica sobre a realidade em um processo
de aquisição de conhecimentos e desenvolvimento humano em sentido amplo.
Nesse contexto, consolida que os objetivos do curso e o perfil do egresso não
estão sendo atendidos e que estes se perdem ao longo do caminho em decorrência
da própria história da educação brasileira que ainda carrega a base filosófica de
sustentação da teoria tecnicista.
Os currículos estão em sintonia com a política educacional e a legislação
educacional. Cristaliza na formação do bacharel em turismo uma formação crítica,
multi e interdisciplinar, generalista, superficial, sem aprofundamento. Percebe-se que
não se consegue resgatar essa totalidade através da interdisciplinaridade e que ao
longo do curso os alunos se sentem sem foco e, ao final, não obtêm o valor de uso,
da prática social nos objetivos e expectativas na formação profissional superior em
turismo.

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Os currículos prescritos nos PPC´s dos cursos são efetivamente os currículos
vividos pelos egressos. Contudo, os relatos dos egressos demonstram as angustias
quanto à formação recebida e, no caso, da prática profissional. De acordo com os
egressos deveria ter mais conhecimentos específicos das diversas áreas de atuação
uma vez que existe uma lacuna na formação desenvolvida nas universidades e as
práticas de mercado de trabalho.

370

REFERÊNCIAS

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A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS NO PLANO NACIONAL
DE EDUCAÇÃO E SUA CORRELAÇÃO COM O ENSINO JURÍDICO: analisando
os currículos dos cursos de Direito no Estado de Alagoas.

Edna Cristina do Prado53 | George Sarmento Lins Júnior54 | Lana Lisiêr de Lima
Palmeira55

RESUMO: O presente estudo busca analisar como a Educação em Direitos Humanos está
consolidada no Plano Nacional de Educação vigente e a importância da correlação desses
372
postulados ao o ensino jurídico, investigando, de forma mais pormenorizada, a formação
propagada pelos cursos de Direito do Estado de Alagoas, intencionando observar se
atendem aos pressupostos da Educação em Direitos Humanos. Partindo-se da premissa de
que ainda impera a visão dogmática e tecnicista na formação dos futuros bacharéis, ficando
em condição secundária a preocupação com a formação humanística, elegeu-se como
opção teórico-metodológica a abordagem de natureza qualitativa, com ênfase na revisão de
literatura e na análise dos 18 (dezoito) currículos dos cursos de Direito ofertados em
Alagoas, procurando-se, ainda, analisar como estão incorporados no Plano Nacional de
Educação vigente os elementos da Educação em Direitos Humanos. Para a análise dos
dados utilizou-se a Análise de Conteúdo de Bardin, definindo como categorias a presença
da disciplina Direitos Humanos nos currículos dos cursos de Direito e a proporção das
disciplinas de Formação Humanística em relação às técnico-jurídicas. O referencial teórico
pauta-se em autores como Apple, Giroux, Tomaz Tadeu, Barbosa, dentre outros. Como
resultado, verificou-se a presença da disciplina Direitos Humanos, como obrigatória, em 10
(dez) currículos, como eletiva em 01 (um) currículo, chegando-se, ainda, a 07 (sete)
currículos que não apresentam, nem em caráter obrigatório nem eletivo, a disciplina Direitos
Humanos. Em termos percentuais, 39% das instituições não ofertam a disciplina Direitos
Humanos em seus currículos formais e, dentre as que a contemplam, a proporção da carga
horária a ela destinada atinge apenas 1,85% da carga horária global do curso. Quanto à
configuração da vertente humanística nesses currículos, percebeu-se que as disciplinas
consideradas como “de formação geral” são mais acentuadas nos dois períodos iniciais da
graduação. Nessa perspectiva, apenas 06 (seis) instituições apresentam número igual ou
maior a 05% de sua carga total, destinadas às disciplinas propedêuticas. Assim, pode-se
inferir que o ensino jurídico alagoano caminha em descompasso aos pressupostos

53
Pós-doutora em Educação pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, Doutora em
Educação Escolar pela UNESP e mestra em Educação Currículo pela PUC/SP. Licenciada em
Educação Física, Pedagogia e Letras. Bacharela em Linguística e em Direito pela Faculdade Maurício
de Nassau (FMN). Professora Associada da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) no curso de
Pedagogia e nos cursos de mestrado e doutorado do Programa de Pós-graduação em Educação -
PPGE. Líder do Grupo do Pesquisa Gestão e Avaliação Educacional - GAE do Centro de Educação
da Universidade Federal de Alagoas (UFAL/CNPq). E-mail: wiledna@uol.com.br
54
Pós-doutor em Direito pela Université DAix-Marseille (França). Doutor e mestre em Direito pela
Universidade Federal de Pernambuco.Graduado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas. É
professor associado da Universidade Federal de Alagoas, professor convidado da Universidade de
Montpellier 1 da Universidade dAix-Marseille (Sócio do CONPEDI. Coordenador do Programa de Pós-
graduação em Direito da UFAL (PPGD/UFAL). E-mail: george_sarmento@uol.com.br
55
Doutora e mestra em Educação pela UFAL. Graduada em Direito e Licenciada em Filosofia.
Professora Adjunta da Universidade Federal de Alagoas. Integrante do Grupo de Estudos em Gestão
e Avaliação Educacional – GAE do Centro de Educação da Universidade Federal de Alagoas
(UFAL/CNPq). E-mail: lanallpalmeira@outlook.com

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norteadores da Educação em Direitos Humanos, portanto, na contramão de uma formação
que se entende fundante para o profissional do Direito.

Palavras-chave: Educação em Direitos Humanos; Plano Nacional de Educação; Ensino


Jurídico; Currículo; Alagoas.

INTRODUÇÃO
373
A ideia que motiva o presente trabalho se guia pela necessidade de se
evidenciar a importância dos preceitos da Educação em Direitos Humanos, levando-
se em conta a percepção de que os cursos de Direito em Alagoas apresentam uma
formação baseada em currículos voltados, quase predominante, para o ensinamento
de disciplinas direcionadas à formação técnico-profissional de meros aplicadores da
lei, deixando como uma espécie de subformação a preparação humanística e,
consequentemente, a sensibilização e o envolvimento do futuro profissional com a
realidade concreta. Assim, entendeu-se pertinente desenvolver um estudo voltado à
criação e difusão do saber jurídico sistematizado nos currículos de graduação em
Direito do Estado de Alagoas, examinando suas referenciações aos Direitos
Humanos, bem como a forma pela qual o Plano Nacional de Educação vigente
aborda as questões alusivas à Educação em Direitos Humanos, a fim de realizar o
que Bardin (2016) chama de triangulação dos dados.
Assumindo o presente estudo a natureza qualitativa, optou-se por utilizar a
Análise de Conteúdo como método de análise que objetiva a inferência de
conhecimentos pertinentes às condições de produção e recepção das mensagens
enunciadas.
Para tanto, passou-se a trabalhar em cada fase na qual se baseia a Análise
de Conteúdo, selecionando-se os documentos objeto de análise, o chamado
“corpus” da pesquisa, aqui representado pelos 18 (dezoito) dos 19 (dezenove)
currículos dos cursos de Direito ofertados no Estado de Alagoas.
Ressalta-se que não foram analisados os 19 (dezenove) currículos pela
impossibilidade de acesso à matriz de uma instituição de ensino superior que, além
de não disponibilizar no sítio eletrônico da IES o aludido documento, recusou-se a

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fornecer o mesmo, sob o argumento de que aquele só era fornecido a alunos
regularmente matriculados na IES.
Não se pode deslembrar que, durante a interpretação dos dados, foi
necessário olhar com atenção os marcos teóricos ligados à investigação, o que foi
feito ao trabalhar os conceitos de currículo à luz de autores como Michael Apple,
Henry Giroux, Antônio Flávio Barbosa Moreira, assegurando sentido à interpretação
do estudo, permitindo as inferências.
374
Dessa forma, foi seguindo esse rastro de ideias que o presente estudo se
desenvolveu, resultando no trabalho aqui apresentado, com o qual se espera poder,
de alguma forma, contribuir para os meandros não só acadêmicos, mas também de
todas as esferas que se entrelaçam na busca de uma sociedade verdadeiramente
cidadã.

1 TEORIZANDO OS CONCEITOS DE CURRÍCULO

Como muito bem ensina Apple (1989), currículo é poder, ideologia e cultura.
Currículo é, antes de tudo, um substrato ideológico e político. E, ratificando tal
raciocínio, Moreira e Silva (1999) asseveram que o currículo não é visto apenas
como elemento implicado na produção de relações assimétricas de poder no
ambiente interno da instituição educacional e da sociedade, mas como uma área
contestada, “uma arena política”.
Não é forçoso ressaltar que em um complexo social segmentado em classes
o currículo passa a ser uma exteriorização das divergências oriundas do espaço
cultural, já que a cultura é indissociável das classes sociais. Moreira e Silva (1999,
p.26), ao abordarem esse liame entre currículo e cultura, diante do que é postulado
pela tradição crítica, afirmam que “o currículo e a educação estão profundamente
envolvidos em uma política cultural, o que significa que são tanto campos de
produção ativa de cultura quanto campos contestados.”
Ao trazer à cena a ideia de “relações de poder”, estabelecida fica nitidamente
a posição estratégica que os currículos assumem no presente trabalho, já que, ao se
defender a formação dos profissionais do Direito sob a perspectiva de um currículo
embasado nos ideais dos Direitos Humanos, desconstrói-se, de certa forma, a ideia
homogeneizadora que impera na atualidade de se ter uma formação altamente

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tecnicista, engessando os conhecimentos dentro de uma incubadora que reproduz
algo que parece já estar culturalmente naturalizado, que é uma educação voltada a
atender os anseios das classes dominantes, deixando-se em segundo plano a
formação cidadã que tanto se julga necessária e urgente.
Michael Apple (1997), ao se posicionar sobre o currículo, assume também a
perspectiva de que nele não há espaço para a neutralidade. Faz menção às
segregações, permitindo que as visões se elucidem no sentido de se pensar um
375
currículo emancipatório, em que se tenha a propagação da autonomia em seus
diversos aspectos.
Dentre os subsídios centrais trazidos por Apple, tem-se a supressão de
elementos repressivos, a possibilidade de uma prática curricular emancipadora e a
constante ligação ao binômio “como fazer e porque fazer”, por meio de uma visão
crítica do currículo
Importante mencionar que, em sua obra Ideologia e currículo, Apple (1982)
destaca veementemente que as escolas não controlam apenas pessoas, mas
também significados. Dentro dessa reflexão, fundamental ainda trazer à cena o
pensamento de Henry Giroux (1997), que, por apresentar suportes teóricos na
Escola de Frankfurt, realizou contestações ao positivismo e, por via de
consequência, ao reprodutivismo, defendendo que o homem é elemento ativo e a
sua presença no mundo deve dar conta de realizar uma transformação social.
Assim, Giroux se debruça sobre a importância da ideologia que é vinculada
na seara escolar como também aponta para a necessidade de uma ampla reforma
educacional, em que os docentes possam ser, de fato, protagonistas da construção
do conhecimento dos seus alunos, fazendo dos mesmos não apenas mero
reprodutores de ideias que lhe são entregues prontas e acabadas, mas sim agentes
dotados de consciência crítica e espírito reflexivo.
Nessa necessidade acima apontada, qual seja, de se formar alunos com
responsabilidade social e espírito crítico, repousa uma reflexão imediata e
improtelável diante da concepção vislumbrada nesse estudo, em que se entende
necessário preparar estudantes do Direito voltados à cidadania e não de
simplesmente se lançar no mercado meros “operadores do Direito”, eis que, guiados
muitas vezes por um viés preponderantemente tecnicista e reducionista, esses

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profissionais se limitarão a “operar” o Direito, quando, na verdade, mais do que
“operar” o Direito, é preciso “pensar” o Direito.
Assim, ao realizar uma breve análise acerca de currículo, bem como suas
implicações em torno de cultura, poder e ideologia, pode-se fazer a ampla
correlação de tais ideais com a formação propugnada pelo ensino jurídico, já que se
percebe haver ainda o predomínio cultural de uma reprodução sistemática de
conteúdos voltados às ideologias das maiorias.
376
Nesse sentido, para que se possa pensar em uma formação cidadã, é
imprescindível avançar de forma que se busque romper as inúmeras barreiras
existentes nos modos de se propagar o conhecimento, sejam essas barreiras
ideológicas, políticas, dentre tantas outras que se entrelaçam, quase que
imperceptivelmente, e exercem influência no processo educacional.
Seguindo essa vertente, após as reflexões teóricas aqui difundidas acerca do
currículo, passar-se-á a tecer considerações sobre os fundamentos da Educação em
Direitos Humanos.

2 RESGATANDO ALGUNS MARCOS NORMATIVOS DA EDUCAÇÃO EM


DIREITOS HUMANOS

Tendo por base teórica o que fora esboçado anteriormente, deve-se fazer
menção ao que é disposto pelo Programa Mundial de Educação em Direitos
Humanos, quando enfatiza que “a educação em direitos humanos promove uma
abordagem à educação em direitos e deve ser compreendida como um processo”,
que abarca:

(a)‘Direitos humanos através da educação’: assegurando que todos os


componentes e processos de aprendizagem, incluindo currículos, materiais,
métodos e treinamento, conduzam ao aprendizado dos direitos humanos;
(b) ‘Direitos humanos em educação’: assegurando o respeito aos direitos
humanos de todos os agentes e a prática dos direitos dentro do sistema
educacional. (ONU, 2005, p.7).

Assim, dentro dessa conjuntura, a Declaração das Nações Unidas sobre


Educação e Formação em matéria de Direitos Humanos, conceitua, em seu artigo
2º, a educação em direitos humanos como:

La educación y la formación em materia de derechos humanos están


integradas por el conjunto de actividades educativas y de formación,

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información, sensibilización y aprendizaje que tienen por objeto
promover el respeto universal y efectivo de todos los derechos humanos
y lãs libertades fundamentales, contribuyendo así, entre otras cosas, a
la prevención de los abusos y violaciones de los derechos humanos al
proporcionar a las personas conocimientos, capacidades y comprensión
y desarrollar sus actitudes y comportamientos para que puedan
contribuir a la creación y promoción de una cultura universal de
derechos humanos. (ONU, 2011).

Nesta visão, a metodologia em Direitos Humanos deve partir da realidade dos


alunos, ensiná-los a investiga-la, a problematiza-la de modo crítico, mas também
377
com afeto, com solidariedade, envolvendo todos os atores nessa educação.
Para tanto, o currículo volta a ser o grande desafio a ser vencido, ao se fazer
tal afirmação tem-se por base tudo que fora discorrido sobre as relações que o
circundam, tais como poder, força, ideologia etc... Afinal, como muito bem ressalta
Magendzo (2006, p.37):
Diseñar y elaborar currículum, em especial el referido a derechos humanos,
requiere “negociar saberes”, sin claudicar em princípios irrenunciables,
buscar consensos enlas diferencias, tarea que como todos sabemos no es
del todo sencilla, ya que está de por médio el poder y elcontrol sobre
elconocimento curricular. [...] Existe, por asídecir, uma heterogeneidade de
actores com percepciones, interesses y valores culturales diversos y a
veces antagónicos frente ala cultura que se expresan em e lcurrículum.

Ainda dentro dessa linha de raciocínio, oportuno se torna analisar o atual


Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005/2014, com vigência compreendida entre
2014 a 2024, mais especificamente o que diz respeito aos elementos da Educação
em Direitos Humanos, a fim de perceber se suas ações já refletem os postulados
aqui esboçados como fundantes a uma formação profissional cidadã.
Assim, logo no artigo 2º da supra referida lei que consubstancia o PNE, tem-
se que:
São diretrizes do PNE:
I − erradicação do analfabetismo;
II − universalização do atendimento escolar;
III − superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção
da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação;
IV − melhoria da qualidade da educação;
V − formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores
morais e éticos em que se fundamenta a sociedade;
VI − promoção do princípio da gestão democrática da educação pública;
VII − promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do país;
VIII − estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em
educação como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), que assegure
atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e
equidade;
IX − valorização dos(as) profissionais da educação;

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X − promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à
diversidade e à sustentabilidade socioambiental.

Percebe-se, dessa forma, a inserção e diálogo dos postulados centrais da


Educação em Direitos Humanos nas diretrizes do Plano Nacional de Educação.
Seguindo essa linha de análise e caminhando um pouco mais nas trilhas do
PNE, observa-se no § 1º do artigo 8º, que:

Os estados, o Distrito Federal e os municípios deverão elaborar seus 378


correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados
em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas
neste PNE, no prazo de um ano contado da publicação desta lei.
§ 1º Os entes federados estabelecerão nos respectivos planos de educação
estratégias que:
I − assegurem a articulação das políticas educacionais com as demais
políticas sociais, particularmente as culturais;
II − considerem as necessidades específicas das populações do
campo e das comunidades indígenas e quilombolas, asseguradas a
equidade educacional e a diversidade cultural;
III − garantam o atendimento das necessidades específicas na
educação especial, assegurado o sistema educacional inclusivo em
todos os níveis, etapas e modalidades;
IV − promovam a articulação interfederativa na implementação das políticas
educacionais.(Grifos dos pesquisadores).

Vê-se que no artigo acima há a remissão clara a pelo menos dois aspectos de
ampla discussão no contexto da Educação em Direitos Humanos, a saber: a
diversidade sócio-cultural e a educação inclusiva, o que já mostra a presença, pelo
menos no prisma normativo, desses elementos de importância ímpar ao cenário
educacional do país.
Todavia, imperioso se torna constatar se o que está normatizado é, de fato,
concretizado nos currículos, principalmente nos currículos dos cursos de Direito do
Estado de Alagoas, objeto central deste estudo.
Nesse escopo, não se pode deslembrar que incutir os direitos humanos no
segmento da educação formal em uma sociedade como a brasileira, com fortes
raízes de autoritarismo e escravidão, traz, inevitavelmente, a disputa que se atrela
aos campos do saber e do poder.
Dentro dessa ordem de ideais, vê-se que apesar de ser o currículo um campo
de disputa ideológica, política, cultural, não se pode abrir mão da sua construção
com elementos que subsidiem a visão holística embasado no gozo destes direitos,
que abrange tanto os direitos humanos no contexto educativo, isto é, conseguir que
todos os componentes e processos de aprendizagem, incluindo os planos de estudo,

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o material didático, os métodos pedagógicos e a capacitação, conduzam ao
aprendizado dos direitos humanos, por um lado, e a realização dos direitos humanos
na Educação, por outro lado, que consiste em fazer valer o respeito dos direitos
humanos de todos os membros da comunidade escolar. (UNESCO, 2006). Nesse
prisma, os currículos para o os cursos de Direito devem apresentar a sensibilidade
de conseguir contemplar as especificidades de cada área, sem deixar de dar conta
dos conhecimentos imprescindíveis àqueles que terão em mãos, muitas vezes, o
379
poder de decidir futuros e de julgar vidas.
De nada adianta uma formação estruturada nas vertentes mais modernas do
Direito e de todas as fragmentações daí decorrentes, se é esquecida ou minimizada
a preparação humanística dos profissionais que atuarão no cenário jurídico-social.
Assim como os currículos, as leis são redigidas e promulgadas em contextos
que se permeiam por interesses das mais variadas naturezas. Não é raro encontrar
julgados que estão em perfeita consonância com o que está “codificado”, mas que
não resistem a um olhar moral mais criterioso. E o cerne para se buscar ressignificar
essa realidade tem sua ligação à formação dos estudantes. Por tal razão, defende-
se um currículo para os cursos de Direito com as bases aqui declinadas, com um
olhar para o humano que o enxergue como humano, com uma visão da realidade
decalcada dos aportes que norteiam a verdadeira conjuntura, sem as ilusões de que
se preparar um bom profissional é apenas torná-lo apto a ocupar um cargo público
de grande magnitude ou ser um advogado bem sucedido em termos financeiros.

3 UMA ANÁLISE DOS CURRÍCULOS DOS CURSOS DE DIREITO DO ESTADO


DE ALAGOAS

A princípio, fundamental destacar que a primeira fase da análise se deu no


intuito de contemplar a presença ou ausência específica da disciplina Direitos
Humanos nos 18 (dezoito) currículos objeto de estudo. Após tal análise, buscou-se
contemplar se, nas instituições que apresentam a disciplina em seus currículos, a
oferta se dá como disciplina obrigatória ou eletiva, bem como a carga horária que é
dedicada a mesma. Por fim, ampliou-se a visão e, consequentemente a análise,
para cotejar a proporção que a disciplina representa em relação à carga total da

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matriz curricular, assim como a relação que as disciplinas humanísticas constituem
em contraponto às disciplinas chamadas de técnico-jurídicas.
Dessa forma, com tais critérios estabelecidos, chegou-se aos seguintes
dados: dos 18 (dezoito) currículos estudados, constatou-se a presença da disciplina
Direitos Humanos em 10 (dez), assim como se verificou a presença da disciplina
como eletiva em 01 (um) currículo, chegando-se, ainda, a 07 currículos que não
apresentam, nem em caráter obrigatório nem eletivo, a disciplina Direitos Humanos.
380
Os dados revelam que há um percentual alto de instituições que não incluíram
a disciplina Direitos Humanos em seus currículos formais. Dentre as que
contemplam a disciplina nos seus currículos, indispensável se torna avaliar qual a
proporção da carga horária destinada à mesma quando comparada ao montante da
carga horária total do curso.
Nesse sentido, constatou-se que há uma ínfima destinação de horas, para
não dizer desprezível, à disciplina Direitos Humanos por parte das instituições de
ensino superior que ofertam o curso de Direito em Alagoas. Os currículos mostraram
que a instituição que mais dimensiona a disciplina o faz em uma proporção de
apenas 1,85% de seu currículo global. Há, inclusive, instituições que não atingem
sequer 1% desse montante.
Partindo para um olhar mais amplo e buscando analisar também a forma
como se dá a configuração da vertente humanística nesses currículos, percebeu-se
que das 18 (dezoito) instituições estudadas, apenas 06 (seis) apresentam número
igual ou maior a 05% de sua carga total destinadas às disciplinas propedêuticas.
Assim, diante do alto quantitativo de disciplinas técnico-jurídicas encontradas em
todos os currículos, pode-se inferir que a proporção que dedicam à formação
humanística é insuficiente ao perfil profissional que se defende neste trabalho.

CONCLUSÃO

Após tudo que fora declinado, levando em conta o referencial teórico


esboçado no presente estudo, tanto em relação à Educação em Direitos Humanos
como no tocante especificamente ao currículo, e tendo ainda por base os dados
levantados nos 18 (dezoito) currículos dos cursos de Direito de Alagoas, pode-se, a

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partir do que Bardin (2016) chama de triangulação dos dados, inferir que o ensino
jurídico alagoano caminha em descompasso aos ditames da Educação em Direitos
Humanos, encontrando-se na contramão de uma formação verdadeiramente cidadã.
Tem-se assim uma verdadeira banalização curricular no ensino jurídico.
Como já fora acentuado, o transcurso do ensino jurídico no Brasil é consequência de
um modelo atrelado ao Estado e, consequentemente, o Estado, por sua vez, é
reflexo dos modelos políticos advindos das investidas modernas, o que acarreta um
381
perfil curricular positivista que, de forma geral, plasmou e plasma a maioria das
instituições de ensino superior, fazendo com que os direitos humanos se
apresentam nos currículos como um subtema da ciência jurídica, ou, um tema
“banal”. E por ser banalizado, o currículo se depara com o problema da justiça,
compreendida aqui como legitimidade dos direitos humanos.
Diante da referida “banalização”, os direitos humanos são apenas normas e a
Educação a transmissão de normas e conceitos. Assim, o educar não passa de uma
equação de fatos aplicados ao trivial mundo de papel, um discurso que pensa o
papel e não o mundo, é só um discurso pelo discurso, um esquecimento do ser que
se perde no papel.
O que se pensou nesse estudo não foi um processo que entende tão somente
o poder da letra nas linhas das leis e das ciências, mas que essas letras das leis e
das ciências são indubitavelmente humanas. Isso não significa uma exclusão do
tecnicismo jurídico, mas um deslocamento do seu eixo, a saber: primeiro o humano,
depois o científico e o técnico. Formar profissionais para exercício da cidadania e
repensar o ensino dos direitos humanos é uma abertura de reflexão, é fazer com
que a Educação seja capaz de tornar-se essencial nesse humano adormecido pela
técnica. É preciso compreender que o que motivou essa pesquisa foi a necessidade
de se pensar um outro pensar. E esse outro pensar dos direitos humanos é o pensar
pedagógico. A norma só é norma porque é ensinada, faz-se necessário
compreender que essa centelha não é uma “novidade” do ensino jurídico, mas o
contrário, é permitir que esse ensino seja o desvelamento do “outro”. Esqueceu-se o
outro para pensar-se o majoritariamente sobre o Direito Bancário, o Direito
Tributário, o Direito Administrativo, o Direito Penal, etc.... O “outro” tornou-se uma
máquina administrativa. O humano é um papel de um processo. E quando se

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defendem os direitos humanos na sua área mais sublime, que é o Direito, o mesmo
é esfacelado por muitos dos agentes do Direito, por alguns na sua totalidade, para
outros, na parcialidade. No Brasil, o pensar jurídico é o pensar da promoção
individual, da compreensão da norma para o exercício da advocacia ou para o tão
sonhado ingresso nas carreiras jurídicas.
O currículo torna-se banal por ser “inautêntico” no seu humanismo existencial,
como fora observado na análise dos currículos dos cursos de Direito do Estado de
382
Alagoas aqui exposta, que mostra que o que prevalece são os interesses dos grupos
dominantes que controlam os processos educativos e, em muitos casos, são
determinados pelas instâncias governamentais.
Assim, com essa reflexão, espera-se despertar novos olhares sobre a
educação jurídica alagoana, acreditando que é possível pensar o ensino dos direitos
humanos para além do direito positivo, já que o currículo, por ser produto da
atividade humana, pode e deve ser repensado.

REFERÊNCIAS

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Tomaz Tadeu. (Orgs.). Currículo, Cultura e Sociedade. 3. ed. São Paulo:Cortez, 1999.
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CURRÍCULO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA PARA O
ENSINO DAS TEMÁTICAS FÍSICO-NATURAIS NA UEPB

Dayane Galdino Brito56 | David Luiz Rodrigues de Almeida57

RESUMO: O presente artigo apresenta reflexões parciais desenvolvidas pelo Grupo de


Estudos e Pesquisas em Educação Geográfica (GEPEG) da Universidade Federal da
Paraíba (UFPB) que tratam sobre Projetos Pedagógicos Curriculares (PPC) para a formação
de professores de Geografia na Paraíba. Nesse trabalho, analisamos as orientações das
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) de 2015 para o desenvolvimento do Projeto
384
Pedagógico Curricular do curso de licenciatura da Universidade Estadual da Paraíba
(UEPB), campus I, Campina Grande-PB. Nosso objetivo é analisar o currículo prescrito
apresentado pelos CC da área física, em especial das temáticas físico-naturais (Climatologia
e Biogeografia, por exemplo), para a formação de professores do curso de licenciatura em
Geografia da UEPB. Para isso, realizamos analise documental das DCNs de 2015, assim
como do PPC da UEPB. Nossas análises indicam que houve avanços no projeto de
formação de professores e correlação das práticas pedagógicas em todos os CC. Contudo,
a prática e teoria ocorre de forma desvinculada limitando esse dialogo formativo a
momentos restritos dentro de cada CC.

Palavras-chave: Formação de professores. Currículo prescrito. Temáticas físico-naturais.


DCNs.

INTRODUÇÃO

O presente artigo apresenta resultados parciais de pesquisa sobre as


propostas curriculares dos cursos de licenciatura para a formação de professores de
Geografia realizada pelos membros do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação
Geográfica (GEPEG) da Universidade Federal da Paraíba, campus de João Pessoa.
Nosso recorte de estudo nesse tratado corresponde aos Componentes
Curriculares (CC) da área física no Projeto Pedagógico Curricular (PPC) do curso de
Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), campus I,
Campina Grande-PB. A orientação desse PPC é a Resolução CNE/ CP nº 2, de 1º

56
Professora de Geografia na E.E.E.F.M. professor Raul Córdula
E-mail:dayanegeografia@professor.pb.gov.br
57
Doutorando em Geografia pela Universidade Federal da Paraíba-UFPB.
Programa de Pós-Graduação em Geografia-PPGG
E-mail: david.ufpb3@gmail.com

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de julho de 2015, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação em nível
superior e para a formação continuada, DCN/2015 (BRASIL, 2015).
Na Paraíba, o curso de Geografia da UEPB, campus I, Campina Grande- PB
foi à primeira Instituição de Ensino Superior (IES) a reformular, para fins de
reconhecimento junto ao Conselho Estadual de Educação (CEE), a proposta
curricular para o curso de licenciatura com base nas DCNs 2015 em 2016.
Salienta-se que o curso de Geografia da UEPB, desde a sua criação em
385
1974, na época Fundação da Universidade Regional do Nordeste (FURNE),
Resolução 016/74, passou por três reformas curriculares: a primeira, no ano de
1997; a segunda iniciada no ano de 2007 e concluída em 2009; e a mais recente do
ano de 2016 (PPC/ UEPB, 2016). Esta última constitui foco das análises aqui
empreendidas.
Destacamos o estudo dos CC da área física do PPC da UEPB. Eles vinculam
o “[...] conhecimento geográfico e deve fornecer a base para o entendimento das
estruturas da natureza em sua dinâmica, enquanto condição e meio das relações
historicamente estabelecidas pela sociedade e natureza na produção do espaço;”
(PPC/ UEPB, 2016, p. 41). Nosso intuito é compreender os direcionamentos das
temáticas físico-naturais – aquelas cuja origem é desvinculada da ação humana,
contudo que é marcada (in)diretamente pela atividades sociais (relevo, rochas,
solos, clima etc.) – e as propostas de direcionamentos para formação de
professores.
A partir do exposto, a metodologia utilizada para o desenvolvimento da
pesquisa caracteriza-se como pesquisa documental. Sendo o texto estruturado a
partir dos seguintes eixos norteadores: a) análise das orientações propostas pelas
DCN/2015; b) análise das orientações do PPC da UEPB, buscando ressaltar: perfil
dos alunos e relação teoria e prática nos Componentes Curriculares; c) identificação
dos Componentes Curriculares da área física da Geografia, levando em
consideração: carga horária, ementa e referências bibliográficas.
Portanto, o objetivo desse artigo é analisar o currículo prescrito apresentado
pelos CC da área física, em especial das temáticas físico-naturais, para a formação
de professores do curso de licenciatura em Geografia da UEPB.

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1. ORIENTAÇÕES CURRICULARES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
GEOGRAFIA DA UEPB

A atividade profissional do magistério requer um conjunto de saberes a serem


mobilizados em sala de aula. De acordo com Tardif (2002, p. 36), o saber docente
constitui “[...] um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de
saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e 386
experienciais.”. Logo, a formação de um professor é processual, inicial e continuada.

A trajetória supramencionada é permeada por questões curriculares. De


acordo com Sacristán (2000, p. 15):

O currículo do ensino obrigatório não tem a mesma função que o de uma


especialidade universitária, ou de uma modalidade de ensino profissional, e
isso se traduz em conteúdos, formas e esquemas de racionalização interna
diferentes, porque é diferente a função social de cada nível e peculiar a
realidade social e pedagógica que se criou historicamente em torno dos
mesmos.

Nessa perspectiva, o currículo compreende diferentes relações de


conhecimentos, hábitos, valores, técnicas, recursos, procedimentos etc. de seleção,
sequenciação e organização da cultura a serem desenvolvidos em situações de
ensino e aprendizagem. Na atualidade, os PPCs dos cursos de licenciatura e
pedagogia são orientados pelas DCNs de 2015.
De acordo com Resolução CNE/ CP nº 2/ 2015 (BRASIL, 2015) há 13
considerações sobre a atual política de formação inicial e continuada de professores.
A primeira delas é compreender esse exercício como ato de “[...] formação de
profissionais do magistério para a educação básica [...]” (BRASIL, 2015, p. 1.
Grifo nosso). Esse ato de formação profissional é desenvolvido em duas esferas
imprescindíveis e complementares, subjetiva e objetiva.
Na esfera subjetiva existem condições ímpares que constituem a identidade
dos sujeitos como sua história de vida, crenças, experiências escolares, relações
familiares e sociais e capital cultural. Pimenta e Lima (2008), por exemplo, indicam a
importância dos Estágios Supervisionados para a construção dos saberes e

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posturas específicas no que corresponde ao exercício profissional, esfera objetiva da
formação. Elas afirmam que:
A identidade do professor é construída ao longo de sua trajetória como
profissional do magistério. No entanto, é no processo de sua formação que
são consolidadas as opções e intenções da profissão que o curso se propõe
legitimar. (PIMENTA; LIMA, 2008, p. 62).

Nesse aspecto os conhecimentos geográficos, em forma de CC, são


fundamentais. Somam-se a eles um conjunto de: valores como socialização,
construção da identidade sociocultural, cidadania, democracia e orientação para o
387
trabalho; atitudes, respeito à valorização da diversidade étnico-racial, tolerância à
ética, política e estética inerente ao ato de ensinar e aprender; e princípios
educacionais:
a) sólida formação teórica e interdisciplinar; b) unidade teoria-prática; c)
trabalho coletivo e interdisciplinar; d) compromisso social e valorização do
profissional da educação; e) gestão democrática; f) avaliação e regulação
dos cursos de formação; (BRASIL, 2015, p. 1-2).

Esses elementos correspondem a um pensamento acerca do perfil do


profissional do magistério que seja plural, flexível e mais articulado a realidade da
Educação Básica. Também as modalidades de ensino (do campo, quilombola,
indígena, Educação de Jovens e Adultos e educação à distância), articulando o
ensino à pesquisa e extensão, entendendo a escola enquanto espaço importante de
formação inicial e continuada dos professores.
Esses direcionamentos são expressos pelas DCNs de 2015 ao expressar
intencionalidades para a formação e prática dos professores e de um perfil de
egresso e profissional que materialize no PPC, entre outras questões o:
[...] II - desenvolvimento de ações que valorizem o trabalho coletivo,
interdisciplinar e com intencionalidade pedagógica clara para o ensino e
o processo de ensino-aprendizagem; [...] VI - leitura e discussão de
referenciais teóricos contemporâneos educacionais e de formação
para a compreensão e a apresentação de propostas e dinâmicas
didático-pedagógicas; VII - cotejamento e análise de conteúdos que
balizam e fundamentam as diretrizes curriculares para a educação básica,
bem como de conhecimentos específicos e pedagógicos, concepções e
dinâmicas didático-pedagógicas, articuladas à prática e à experiência
dos professores das escolas de educação básica, seus saberes sobre a
escola e sobre a mediação didática dos conteúdos; [...] (BRASIL, 2015, p. 7.
Grifos nossos).

O PPC (UEPB, 2016) segue as essas orientações apresentadas e entende que


o conhecimento de Geografia é basilar para a formação de profissionais do docente
na área. A relação teoria e prática têm como parâmetro a relação da realidade local
as demais escalas geográficas, a concepção crítica e leitura da realidade. Assim,

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apresenta que o objeto geral do curso é “[...] a formação de professores para o
exercício do magistério no ensino fundamental e médio, oportunizando condições
teórico-reflexivas necessárias às experiências interdisciplinares.” (PPC/ UEPB, 2016,
p. 34).
Neste sentido, espera-se que o egresso construa uma formação pautada em
um projeto pedagógico que proporcione ao longo das diversas experiências
formativas subsídio ao futuro exercício profissional. Isto é, uma intencionalidade
388
pedagógica nas diversas ações formativas, de modo que a articulação entre teoria e
prática dê-se constantemente incorporando referencias teóricos que sustentem
práticas e estratégias didático-pedagógica. Construindo, portanto, caminhos a
identidade docente.

2. A MATRIZ CURRICULAR: AS TEMÁTICAS FÍSICO-NATURAIS PARA A


FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA

Toda instituição de ensino – seja a escola, seja a universidade – deve


estabelecer as suas ações a partir do currículo prescrito. Esse define os objetivos
que se pretende alcançar, assim como os mecanismos necessários, de modo que a
função social da instituição seja efetivada. No contexto das IES, tais prescrições são
materializadas no PPC, sendo norteado por leis, regulamentos, resoluções,
pareceres e decretos, a nível federal ou institucional (SANTOS, 2013).
Segundo Pinheiro e Almeida (2017), as orientações propostas pelo CNE
através das DCNs para a formação dos profissionais do magistério, propõem
reformas curriculares que visam melhorar a formação de professores a partir de
apontamentos de caminhos e necessidades que deverão se materializar nos
currículos dos cursos. Ao mesmo tempo, são responsáveis por organizar e dirigir sua
proposta pedagógica, considerando as peculiaridades locais e dos grupos com os
quais trabalham.

A Resolução CNE/CP n° 2/ 2015 (BRASIL, 2015) indica diferentes alterações


para os PPCs de licenciatura no Brasil e atribui, inicialmente, o prazo de dois anos a
contar da data de lançamento do documento. Neste ínterim, podemos citar a
duração do curso, carga horária de formação e a sua distribuição dos CC.

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Os cursos de formação inicial em nível superior para o magistério devem
apresentar no mínimo oito semestres (quatro anos), totalizando 3.200 horas. Essa
carga horária deve ser distribuída da seguinte forma: 400 horas de prática como
componente curricular, distribuídas ao longo do processo formativo; 400 horas
dedicadas ao estágio supervisionado; 2.200 horas dedicadas às atividades
formativas estruturadas pelos núcleos de formação geral, das áreas específicas e
interdisciplinares, e do campo educacional, seus fundamentos e metodologias;200
389
horas de atividades teórico-práticas de interesse dos estudantes (BRASIL, 2015).
O PPC da UEPB estabelece às 3.200 horas propostas. Apresenta tanto para o
período matutino, quanto o noturno, nove períodos (4,5 anos). Contudo, tendo em
vista as peculiaridades dos discentes – muitos não residem em Campina Grande,
mas na região intermediária58, realizando migração pendular diária, outro composto
por grupos de trabalhadores – a UEPB incorpora, principalmente, ao período
noturno, 20% da carga horária (640 horas) em regime semipresencial ou à distância
(PPC/ UEPB, 2016).
De acordo com a referida proposta de matriz curricular, o curso de
licenciatura em Geografia, organiza os conhecimentos necessários à formação de
seus professores em quatro grandes áreas e integralizadas por cinco tipos de cargas
horárias (figura 1) distribuídas a depender das necessidades do CC.
No que compete à distribuição dos CC nesse PPC é apresentada dimensão
formativa que compõem cinco bases de formação: (1) comum; (2) específico do
curso; (3) específico de estágio; (4) específico de TCC; (5) complementar eletivo. De
todos os CC apresentados no gráfico a seguir (figura 2) todos têm a obrigatoriedade
na articulação entre o conhecimento da área com o pedagógico, com exceção dos
CC complementares eletivos (aqueles optativos pelos discentes).

58
Segundo o IBGE a Região Geográfica Intermediária de Campina Grande corresponde a
quatro regiões intermediárias do estado da Paraíba. É composta por 72 municípios, distribuídos em
quatro regiões geográficas imediatas. Sua população total estimada pelo IBGE para 1º de julho de
2017 é de 1 143 852 habitantes, distribuídos em uma área total de 22 463,249 km². Mais informações
disponíveis em: < https://cidades.ibge.gov.br/> acesso em: 13 out. 2018.

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FIGURA 1. ORGANIZAÇÃO DA MATRIZ CURRICULAR DO CURSO DE LICENCIATURA EM 390
GEOGRAFIA-UEPB.

Fonte: PPC (UEPB, 2016, p. 41. 51). Elaborado pelos autores


.

FIGURA 2. DISTRIBUIÇÃO DOS CC POR ÁREAS DE CONHECIMENTO

20
15
15
10 10
10 8 7 Obg.
5
5 2 Opt.
1
0
Área Física Área Humana Área Técnica Área Didática-
pedagógica

Fonte: PPC (UEPB, 2016). Elaborado pelos autores.

De acordo com Afonso e Armond (2009) e Morais (2011) geralmente os


elementos do meio físico-natural são trabalhados de modo superficial ou precário no
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Ensino Fundamental e Médio. Isso é devido a uma série de dificuldades oriundas da
formação do professor, a título de exemplos: a separação clássica de análise entre
os elementos sociais e naturais do espaço geográfico, alto grau de abstração dos
conteúdos, desconhecimento da produção científica e, sobretudo, dificuldades de
articulação à vida cotidiana.
Neste contexto, surgi propostas de abordagem das temáticas físico-naturais a
fim de propiciar uma compreensão dos elementos naturais articulados as dinâmicas
391
sociais (o que pode conduzir o estudo dos problemas ambientais), essa perspectiva
na ciência corresponde a uma perspectiva da análise sistêmica e do geossistema e,
na escola, nas teorias críticas, principalmente no socioconstrutivismo (MORAIS,
2011).
Sobre essa perspectiva das temáticas físico-naturais associadas ao ensino de
Geografia poucos referenciais se destacam. O primeiro corresponde à tese de
Roque Ascensão (2009). Ela propõe que o relevo e seus processos sejam
abordados para além das macroformas do relevo, como planaltos, planícies e
depressões, haja vista as grandes dimensões que assumem, aproximando do
desafio de aproximar tais temas ao processo de ocupação do relevo. Com isso,
propõe a valorização das mesoformas para que os discentes possam compreender
a relação do conteúdo estudado com seu cotidiano, assim como contribuir com uma
formação para a cidadania.
Morais (2011), por sua vez, em sua tese pesquisou o ensino das temáticas
físico-naturais na Geografia escolar, destacando os elementos do espaço: o relevo,
rochas e solos. Ela considera que essas temáticas devem contribuir com a formação
de cidadãos críticos, reflexivos e autônomos, buscando a partir do cotidiano dos
discentes abordá-los a fim de que compreendam as dinâmicas internas dos
elementos espaciais e entre eles, bem como estabeleçam sua relação com a
sociedade.
Embora haja uma ampliação das propostas para abordagem das temáticas
físico-naturais, Morais (2011) destaca que os professores têm dificuldades de
trabalhar os componentes físico-naturais com base nos referenciais cotidianos dos
discentes, pautando-se no livro didático de maneira acrítica e naturalista.

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Embora exista o direcionamento para o ensino de Geografia das temáticas
físico-naturais a partir das ementas dos CC do PPC (UEPB, 2016) isso é realizada
de forma mecânica e fragmentada. A estrutura é apresentada numa última frase na
maioria dos CC do eixo básico específico do curso que diz: “o ensino... na educação
básica: metodologia, recurso didáticos, avaliação...”, a exemplo do que segue:

Epistemologia da Biogeografia. Biogeografia Interpretativa. Relações entre


Sistemática, Ecologia e Biogeografia. Configuração da distribuição das
espécies. A Biosfera. Fatores ecobióticos. Áreas de endemismo. 392
Biogeografia ambiental. Características físicas e biológicas dos
ecossistemas. Ecossistemas Brasileiros. Atividade de campo. O ensino dos
biomas na educação básica: metodologias, recursos didáticos,
avaliação... (PPC/ UEPB, 2016, p. 84. Grifo nosso).

Sobre a estrutura supracitada apenas o CC de climatologia se distingue ao


apresentar: “o ensino-aprendizagem da Climatologia nas séries finais do Ensino
Fundamental e Médio” (PPC/ UEPB, 2016, p.86. Grifo nosso). De modo geral, no
contexto das dimensões formativas tais disciplinas apresentam no currículo 10
horas/aulas a reflexões didático-pedagógicas e práticas pedagógicas. Duas
questões se destacam: no processo de formação de professores, seriam suficientes
10 horas para o direcionamento e o tratamento dos conteúdos específicos da
Geografia a atividade docente? Qual a real contribuição e direcionamento
pedagógico desses CC para a formação dos professores?
Ao analisar as referências utilizadas para cada CC da área física, com ênfase
na bibliografia básica e complementar, percebe-se que estes apresentam obras
como livros, teses, artigos, dentre outros, pertinentes ao conhecimento específicos
de cada CC. Contudo, há ausência dos mesmos referenciais a dimensão
pedagógica. Apenas o CC de Climatologia dispõe de indicação bibliográfica
complementar (artigos, publicados em periódicos e em livros), de modo a
fundamentar as práticas pedagógicas para o ensino de Climatologia na escola
básica.
É importante ressaltar que a Resolução CNE/ CP nº 2/ 2015 (BRASIL, 2015)
tem como uma de suas características e dimensões a articulação teoria e prática a
partir do referencial teórico, contemporâneo e pautado em reflexões, propostas e
dinâmicas didático-pedagógicas. Esse elemento não é evidente na maioria das
ementas dos CC do PPC do curso de licenciatura em Geografia da UEPB.

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Todavia, essas diretrizes, mesmo quando apresentam a perspectiva do ensino
de Geografia, não expressam a articulação entre os elementos físicos e sociais do
espaço geográfico. Logo, nos questionamos em que medida essas relações naturais
e físicas são relacionadas para a formação de professores de Geografia.
Assim, a práxis, que conforme Cavalcanti (2012) deve ser o eixo central das
licenciaturas, está ausente na prescrição proposta pelo PPC (UEPB, 2016). Pois,
para a autora, ela corresponde a um movimento dialético de transformação da teoria
393
em prática e vice-versa mobilizando conhecimentos, experiências formativas e as
histórias de vida dos sujeitos implicados no processo de formação.
Acreditamos que a relação teoria e prática estão sempre presente no processo
de formação de professores, contudo nem sempre de forma articulada. Há indícios
dessa desarticulação na “avaliação do processo ensino aprendizagem” proposto
pelo PPC (UEPB, 2016, p. 53). A matriz curricular indica as propostas metodológicas
por meio de aulas expositivas e dialogadas, seminários ou trabalhos em grupo e
também a indicação a formação do tratamento pedagógico dos conhecimentos da
área, ao mencionar que:

Nesta mesma perspectiva, porém acrescida da preocupação com a


realização da transposição didática dos conteúdos, são realizadas as
micro-aulas. Estas constituem a parte prática, que deverá integrar 10%
da carga horária dos componentes, de qualquer dimensão formativa
do currículo. (PPC/ UEPB, 2016, p. 53. Grifo nosso).

Ao analisar tais diretrizes para a articulação dos conhecimentos específicos (as


temáticas físico-naturais, por exemplo) aos conhecimentos pedagógicos inquirimos:
qual será o papel do professor da universidade no direcionamento dos
conhecimentos do CC para a atuação dos licenciandos em Geografia na Educação
Básica? A responsabilidade para integração dos conhecimentos específicos,
metodologias, recursos e avaliações ficaram a cargo restrito do licenciando? Como
os 90% da carga horária dos CC poderão auxiliar os 10% das práticas pedagógicas?
A partir do PPC analisado verificamos avanço significativo à formação de
professores quando comparado à proposta anterior analisada por Pinheiro e Almeida
(2017). Torna-se claro o interesse dos professores formadores, responsáveis por
ministrar tais componentes, que seu curso de licenciatura é direcionado a formação
de professores de Geografia.

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Apesar disso, considerando as problemáticas relacionadas às temáticas físico-
naturais para a formação inicial dos professores de Geografia, é notória a ausência
de referenciais nos programas dos CC dedicados às questões pedagógicas. Além
disso, há certa controvérsia entre o projeto de formação estabelecido pelas diretrizes
gerais do PPC (UEPB, 2016) e as ementas dos CC do eixo básico específico do
curso de licenciatura em Geografia.

394
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As DCNs 2015 é resultado de políticas educacionais construídas de acordos


federativos e constitucionais nas últimas décadas. Elas congregam a ampliação e
melhoria na qualidade do serviço educacional do país nos campos de educação e do
financiamento para a educação pública das IES.
Os avanços principais dessas diretrizes para o PPC (UEPB) são: propor maior
articulação do projeto formativo de professores de Geografia em diferentes espaços
formativos como a universidade e a escola; o avanço e clareza da compreensão da
necessidade das práticas pedagógicas em todos os CC dos cursos de formação
para o magistério; e a necessidade do estabelecimento da identidade do curso de
licenciatura como de formadora de profissionais da educação.
Apesar de tais avanços, não é evidenciado como os conhecimentos de área
como as temáticas físico-naturais serão articuladas no projeto formativo de
professores a partir dos CC do PPC (UEPB, 2016). Sabemos que esse currículo
prescrito dirige a ação pedagógica dos professores em um plano de integralização
dos CC. Todavia, na prática, o direcionamento de tal “articulação” é visto de forma
fragmentada e momentânea, restrita a certo momento do plano de cada ementa
(10%) e dirigido por meio de micro-aulas pelos licenciandos em Geografia.
A estrutura básica de apresentação da correlação entre o conhecimento
específico do CC ao ensino de Geografia se repete não apenas aos componentes
da área física, mas também da humana. Além disso, a maioria desses CC não
disponibilizam uma bibliografia básica ou complementar voltada ao ensino de
Geografia. Isso nos faz questionar: houve uma reflexão das possibilidades e limites

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da relação entre os conhecimentos específicos desses CC ao plano de formação de
professores?
Esses resultados centram-se na análise documental das orientações
curriculares e da proposta do PPC (UEPB, 2016). Entendemos que no percurso
entre o currículo prescrito e prática há dissonâncias, complementações e
subjetividades a serem consideradas. Desse modo, temos como intuito o desejo de
continuar com essa investigação e contribuir com o processo de formação de
395
professores no estado da Paraíba.

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396

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GT 5 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA AS
DIFERENÇAS

REFLEXÕES ACERCA DOS PARADIGMAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO E AS


SUAS RELAÇÕES COM O CURRÍCULO

Raquel da Silva Freitas59 397

RESUMO: Este artigo tem como objetivo apresentar, de maneira introdutória, discussões
sobre os Paradigmas da educação do campo e as concepções de currículo engendradas na
escola do campo. Neste texto trataremos deste histórico conflituoso que atravessa a
educação nos territórios campesinos. Para tanto, organizamos a discursão nas seguintes
construções paradigmáticas: a) Paradigma da Educação Rural Hegemônico; b) Paradigma
da Educação Rural Contra-hegemônico; c) Paradigma Funcional da Educação do Campo; d)
Paradigma da Educação do Campo e a relação destes com o currículo. Têm-se como
fundamentos teóricos autores que auxiliam na discussão do papel da escola na
sociabilidade atual e do papel da escola do campo, como Arroyo (2017), Caldart (2002)
Molina (1999), Perripolli (2010), Torres (2013) e sobre o currículo Sacristán (2000,) Silva
(2000) e Veiga (1995). Este estudo tornou possível aferir que há a necessidade histórica da
construção de um currículo que compreenda a educação do campo expressa na ideologia e
força dos movimentos sociais do campo, na busca de um currículo que valorize a identidade
e a cultura dos povos do campo, numa perspectiva de formação humana e de
desenvolvimento local sustentável que coloca em questão os modelos hegemônicos
estabelecidos.

Palavras-chave: Paradigmas da Educação do campo. Educação do Campo. Currículo.

INTRODUÇÃO

Este trabalho parte da compreensão de que a escola do campo nem sempre


foi tratada da mesma forma na sociedade brasileira, tendo sido palco de constantes
embates históricos. Neste texto trataremos deste histórico conflituoso que atravessa
a educação nos territórios campesinos. Para tanto, organizamos a discursão nas
seguintes construções paradigmáticas: a) Paradigma da Educação Rural
Hegemônico; b) Paradigma da Educação Rural Contra-hegemônico; c) Paradigma

59
Graduanda em licenciatura em Pedagogia na Universidade Federal de Pernambuco/Campus
Agreste (UFPE/CAA) E-mail: raqueldasilvafreitas.ufpe@gmail.com

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Funcional da Educação do Campo; d) Paradigma da Educação do Campo e a
relação destes com o currículo.
Levantamos debates acerca das concepções hegemônicas que permeiam a
escola e a influencia das diversas lutas dos Movimentos Sociais pelo acesso a uma
educação pensada para o campo e pelos povos do campo. Nesse sentido, este
trabalho se organiza em uma revisão de literatura e apresenta discussões iniciais
sobre os paradigmas da educação do campo agregando as concepções de
398
currículo, bem como discuti e defende a necessidade histórica de construção de um
currículo próprio para a educação do campo.

DESENVOLVIMENTO

A escolarização para a população campesina começa a ganhar espaço no


Brasil no início do século XX, como plano de contenção do êxodo rural diante de um
intenso processo migratório, bem como de qualificação da mão de obra para a
modernização da agricultura. Em suma, para satisfazer as necessidades e a
ampliação da expansão industrial foram forjadas as primeiras iniciativas de
alfabetizar as populações que habitavam os territórios campesinos.

Os modelos de escolarização urbanos consistem em referências para a oferta


da Educação Rural e aparecem como colaboradores da visão estereotipada do
campo, que aborda a compreensão da escola do rural com lugar de secundarização.
Não obstante, essas políticas educacionais para os territórios campesinos, foram
organizadas de forma que coloca o sujeito do campo em submissão por parte do
sujeito que vive na área urbana. Nesse contexto, a educação é voltada para
manutenção dos lugares sociais,

Quando se ensejou promover algum tipo de escolarização a esses


povos, o fizeram nos moldes da educação urbana, onde, induzindo o
fracasso, forjam a comprovação de que não serve de nada oferecer
educação aos povos do campo, utilizando a educação como mais
uma forma de subalternizar e silenciar esses sujeitos (TORRES,
p.601).
Dessa forma, as relações entre campo e cidade se tornam tensionadas pela
relação de subordinação exercida da cidade para com o campo. Essas formas de

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pensar e propor a educação reforçaram ideias e práticas de escolarização forjando o
Paradigma da Educação Rural Hegemônico, que promove a ideia de uma educação
que deve atender apenas as necessidades do mercado sem priorizar o contexto dos
povos campesinos.

A delimitação do modelo do Paradigma da Educação Rural Hegemônico é


constituído a partir dos princípios do Paradigma do Capitalismo Agrário, em que os
camponeses não são protagonistas do processo, mas subalternos aos interesses do 399
capital. A escola pensada pelos interesses capitalistas acaba, “culminando na
negação de uma educação de qualidade, sob a alegação de que era desnecessário
e dispendioso investir recursos na manutenção de escolas distantes dos centros
urbanos e com poucos alunos” (TORRES, 2013, p. 600).

Esse modelo hegemônico de educação criado pela classe dominante coloca


os povos do campo com uma “espécie” em extinção com crenças, saberes e valores
ultrapassados e o urbano como civilizado, dessa forma há,

Uma idealização da cidade como o espaço civilizatório por


excelência, de convívio, sociabilidade e socialização, da expressão
da dinâmica política, cultural e educativa. A essa idealização da
cidade corresponde uma visão negativa do campo como lugar do
atraso, do tradicionalismo cultural. Essas imagens que se
complementam inspiram as políticas públicas, educativas e escolares
e inspiram a maior parte dos textos legais. O paradigma urbano é a
inspiração do direito à educação (ARROYO, 2007, p.158).
Logo, é necessário ter consciência das consequências de que a inspiração no
Paradigma da Educação Rural Hegemônico nos modelos de educação ainda
influenciam as realidades das escolas campesinas e a organização do currículo das
escolas do campo. Dessa maneira, “[...] produzem uma pedagogia que desumaniza
o homem, que despersonaliza a condição de pessoa do ser humano e que barbariza
as relações comunitárias em posturas individualistas que determinam a sacralidade
dessa sociedade capitalista na qual vivemos” (NASCIMENTO, 2009, p.40). Nessa
perspectiva,

[...] a escola procura homogeneizar os valores, os costumes, a


maneira de ver a realidade em seu entorno. Em outras palavras: tudo
passa a ser visto sob a ótica dos valores capitalistas. Portanto,
estamos falando de uma tentativa de padronização da cultura, ou
seja, da cultura burguesa. Mas o que caracteriza a cultura burguesa?
Aquela centrada na propriedade privada. Esta é vista como um

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direito sagrado e tudo passa a girar em torno dela. (PERIPOLLI,
2010, p.56).
A partir desse conceito compreendemos que, o Paradigma da Educação
Rural Hegemônico se expressa na concepção pedagógica e social, ou seja, os
paradigmas incorporam a compreensão de que no conhecimento, nas instituições e
nos sistemas educacionais sempre existiram intencionalidades políticas implícitas ou
explícitas que reforçam ou que resistem ao capitalismo. Dessa forma, esta educação
serve para gerar a legitimidade da superioridade da classe dominante e ao mesmo 400
tempo conformar as massas campesinas com um ensino precário. Nessa direção,
Saviani (2000) pontua que a construção do currículo escolar é um espaço de disputa
política, que exprime a correlação de forças que estão presentes na sociedade.

É importante destacar que, em meio a esse projeto de controle social da


organização capitalista sempre existiram resistências no Brasil e, dentre elas,
resistências da luta dos Movimentos Sociais do Campo. Que se constituiu a partir de
um conjunto de ações, que teve como uma de suas preocupações o enfrentamento
da concepção de Educação Ruralista dedicada à deixa explicita a necessidade de
promover a cidadania e a justiça social (TORRES, 2013). Os Movimentos Sociais
Campesinos constroem críticas ao modelo de educação escolar iniciando o
Paradigma de Educação Rural Contra-hegemônico que trouxeram questões para
discussões como a relação histórica da negação de condição epistêmica dos povos
do campo.

O Paradigma da Educação do Rural Contra-hegemônico inicia, nesse sentido,


trazendo propostas para que as necessidades educacionais das populações que
vivem no meio campesino fossem atendidas, adequando-se as particularidades da
vida de cada região. O campo tem diferentes sujeitos, são pequenos agricultores,
povos indígenas, quilombolas, assentados, entre muitos outros grupos, são
diferentes jeitos de viver e produzir, diferentes formas de entender a realidade.
Dessa forma, as discursões desse paradigma focaram no enfrentamento da
inferiorização e da invisibilização dos sujeitos e territórios campesinos e no que diz
respeito às construções teórico-práticas que sustentavam a hierarquia entre
cidade/campo.

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A escola, nessa perspectiva, tem o objetivo de contribuir para desconstrução
hierarquia, para tal proposta é imprescindível uma reestruturação na cultura
organizativa da escola com o intuito de ampliar a democratização do trabalho
pedagógico e, consequentemente o processo de construção do currículo
(CALDART, 2002). Assim, “a educação não poderá mais ser vista como processo
mecânico de desenvolvimento de potencialidades. Ela será necessariamente um
processo de construção, ou seja, uma prática mediante a qual os homens estão se
401
construindo ao longo do tempo” (SEVERINO, 2000, p.68). Dessa forma, a Educação
do Campo como uma política pública começa a se concretizar em todo Brasil,
caracterizada como uma luta histórica dos sujeitos do campo que,

[...] começa a ganhar outras nuances na década de 80, na esteira do


processo de redemocratização do Brasil, onde os movimentos
sociais campesinos também se tornam mais representativos. Como
resultado das lutas para a redemocratização do país é promulgada a
Constituição Federal (CF) de 1988, cuja oferta de educação firma‐se
como obrigatória e gratuita (Art. 205 e Art. 208). Nesse momento, o
trato com a educação no Brasil reforça e normatiza, entre outros
aspectos, a promoção de educação para todos, inclusive para os
povos campesinos. Contudo não há clareza quanto ao trato às
diferenças e especificidades que os povos do campo possuem
(TORRES, 2013, p.600).
Molina (2011) destaca que, a Educação do Campo compreende os processos
culturais, as estratégias de socialização e as relações de trabalho vividas pelos
sujeitos do campo em suas lutas cotidianas para manterem essa identidade como
elementos essenciais de seu processo formativo. O acesso ao conhecimento e a
garantia do direito à escolarização para os sujeitos do campo fazem parte dessas
lutas.

Algumas medidas legais são destacadas por Torres (2013) que trazem a
proposta de ampliação da oferta de educação aos povos do campo, em 2002 a
Resolução CNE/CEB nº 1/2002 institui as Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo. Em 2008, a Resolução CNE/CEB nº 2/2008
estabelece as Diretrizes Complementares, Normas e Princípios para o
Desenvolvimento de Políticas Públicas de Atendimento da Educação Básica do
Campo. Em 2010, é assinado o Decreto nº 7.352/2010 que dispõe sobre a política
de Educação do Campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
(PRONERA).

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Ao consultarmos a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96,
notamos determinadas melhorias em relação à educação do campo, consoante
expresso no artigo 28, ao propor que,

[...] os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias a


sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região,
especificamente: I - conteúdos curriculares e metodologias
apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona
rural; II - organização escolar própria, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições 402
climáticas; III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.
No entanto, “Se por um lado, abrem-se possibilidades de enunciações
epistemológicas, dentro da esfera da contradição entre povos originários e Estado
Uni-Nacional e Uni-Identitário, por outro lado há também apropriações funcionais
das diferenças culturais” (SILVA, 2015, p.111). Dessa maneira, o termo Educação
do Campo pode ser utilizado, porém não desvencilhando dos processos de
escolarização do interesse do capital, nem acabar com os processos de
silenciamento e subalternização dos povos campesinos, forjando o Paradigma
Funcional da Educação do Campo (SILVA, 2015).

Nesse ponto de vista, Silva (2015) aponta para que as teorias críticas da
modernidade que alicerçaram o surgimento do Paradigma da Educação do Campo
não conseguiram alcançar as soluções pretendidas pelos diversos coletivos sociais
que o compunham. O autor ainda acrescenta que, estas teorias privilegiam as
relações entre classes como explicação privilegiada das relações sociais, mas os
modos de vida, as relações com a natureza e com a sociedade se constituem não
apenas como objetos de investigação, mas também como enunciadores
epistêmicos.

Nessa lógica, muitos contextos campesinos no Brasil têm adotado práticas


que reforçam a reestruturação do capitalismo neoliberal, a não existência da
preocupação de um currículo com a articulação com os saberes socais produzidos
pela comunidade campesina possibilita que o sujeito não pense no significado de
suas atividades técnicas e culturais. Esse processo torna o currículo da Educação
do Campo um instrumento de controle da camada popular, proporcionando com uma
formação mínima gerando a reprodução das classes sociais, “esta tem a função de
disseminar, semear todo um conjunto de ideias que vão reproduzir e manter a

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ideologia dominante, este, por sua vez, apresenta-se como uma instituição acima de
qualquer interesse de classe” (PERIPOLLI, 2010, p.57).

Inconformados com essa organização da educação os sujeitos começam a


pensar na recuperação da condição epistêmica dos povos campesinos, partindo
para um projeto de Interculturalidade crítica. Nesse sentido, a compreensão de
educação a partir do Paradigma Da Educação do Campo começa a se estabelece
para além da lógica capitalista quando se funda na perspectiva da Educação 403
Popular, diretamente relacionada com as condições do modo de vida da
comunidade e a partir disso projeta o modelo de sociedade que se deseja. A
Educação Popular vem, nesse sentido,

[...] fortemente baseada no pensamento freiriano, possibilitou a


insurgência de contestações decoloniais, nas quais os sujeitos
epistêmicos contextualizam sua educação a partir de questões
inerentes ao seu lócus social, político, cultural e epistêmico. Desta
forma, o Paradigma da Educação do Campo lança mão da condição
epistêmica dos sujeitos culturais que são encarregados da
construção de uma educação contextualizada e comprometida com o
rompimento das estruturas do poder colonial (SILVA, 2015, p.118-
119).
Desta forma, reconhecer o campo com suas especificidades e uma escola
construída pautada sob a realidade e as necessidades dos que vivem no e do
campo possibilita enxergar que existem alternativas outras de se produzir e de se
fazer educação/escola, ou seja, que considera os sujeitos outros (ARROYO, 2017).
Surgem então, indícios da necessidade de reconfiguração da política educacional,
que cria a expectativa de uma formação dinâmica e articulada com a valorização e a
ressignificação das culturas das diversas realidades campesinas.

Diante do exposto, inúmeros questionamentos estão surgindo em relação à


realidade complexa, diversificada e heterogênea que envolve todas as configurações
sociais e as transformações decorrentes do crescimento tecnológico mundial que
resultou na mudança de comportamento, dos costumes e na forma de ser e pensar
dos sujeitos do campo. Começa a ser pensada na insuficiência da representação do
pensamento funcional da educação do campo, e são lançadas opções para
promoção de uma educação para além da “domesticação”, para sair da alienação,
uma educação para a liberdade, uma educação para o homem-sujeito (FREIRE,
1989). Torna-se indispensável refletir acerca das concepções políticas e

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pedagógicas que norteiam o processo de elaboração e vivencia do currículo da/na
escola do campo. Nessa perspectiva, defende Veiga (1995, p. 82),

[...] o currículo é um instrumento de confronto de saberes: o saber


sistematizado, indispensável à compreensão crítica da realidade, e o
saber de classe, que o aluno representa e que é resultado das
formas de sobrevivência que as camadas populares criam. Valoriza o
saber de classe e coloca como ponto de partida para o trabalho
educativo.
Em função dessas mudanças, a reconfiguração da política curricular cria a 404
perspectiva de currículo que projeta uma formação dinâmica e articulada com a
valorização e a ressignificação das culturas das diversas realidades, “a discussão
curricular que aqui se pretende travar está alinhada à necessidade de uma filiação
teórica que valorize o contexto social latino-americano em seus processos de
dominação colonial e de resistência” (SILVA, 2015, p.126). Neste sentido,
entendemos currículo como “resultado de uma seleção: de um universo mais amplo
de conhecimentos e saberes seleciona-se aquela parte que vai constituir,
precisamente, o currículo” (SILVA, 2000, p. 13). Essa seleção se constitui em meio a
uma disputa de poder, pois carrega consigo uma função social e cultural.

Dessa forma, é necessário que a escola do campo institua uma nova


dinâmica de construção de um currículo de forma participativa, que envolva de forma
coletiva os professores, alunos e os demais membros da comunidade para que seja
um currículo represente os interesses e expectativas daquela população. É
indispensável que o currículo para a Educação do Campo rompa com a ideia
enquanto processo de formação para o mercado e que “se torne força de
transformação da sociedade, contribuindo para extirpar do tecido desta todos os
focos da alienação” (SEVERINO, 2000, p.70). Nesse sentido, são lançadas
possiblidades de acabar com a lógica criada pelos modelos hegemônicos de
sociedade, superar os discursos que subalternizam e valorizar a participação de
todos na história.

Diante disso, há que se levar em consideração para a construção de um


currículo os diversos aspectos engendrados no funcionamento da escola e do meio
em que está inserida, partindo de uma análise crítica da realidade da escola do
campo. Trazer esses conhecimentos para escola significa romper com a

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universalização do conhecimento dominante despertando o sentimento de
pertencimento dos sujeitos. Nesse sentido entende-se que, a “Educação do Campo
compreende os processos culturais, as estratégias de socialização e as relações de
trabalho vividas pelos sujeitos do campo em suas lutas cotidianas para manterem
essa identidade como elementos essenciais de seu processo formativo “(MOLINA,
2011, p.19).

405

CONCLUSÃO

O debate sobre educação do campo não poderia esgotar-se neste artigo nem
a isso ele se propõe, pois ainda há muito que se avançar no que diz respeito às
politicas educacionais dos povos do campo. A revisão de literatura aqui exposta
permitiu avançar numa compreensão da educação e do currículo da escola do
campo como uma ferramenta indispensável na disputa por uma educação
emancipadora aos povos do campo. A escola do campo deve pensar acerca das
singularidades dos povos do campo e envolver os conhecimentos necessários à
educação dessas populações. Pensar o campo como espaço/território de construção
de conhecimento, cultura, saberes, identidades e formação humana, está qual
permite a construção de uma escola que considere as individualidades dos seus
alunos e de toda comunidade.

Dessa maneira, “dever ser educação, no sentido amplo de processo de


formação humana, que constrói referências culturais e políticas para a intervenção
das pessoas e dos sujeitos sociais na realidade, visando a uma humanidade mais
plena e feliz” (MOLINA, 1999, p. 24). Desse modo, o currículo não é neutro, pois é
dirigido a um fim que está inserido numa compreensão do mundo atual e da
sociedade que se quer construir, assim,

(...) frente ao desenfreado movimento do capital sobre o campo (e a


consequente proletarização dos trabalhadores), fazem-se
necessários novos/outros olhares sobre as novas necessidades que
aí estão sendo criadas, dentre outras, a de uma outra/ nova escola,
qual seja, construídas sob novas paradigmas. Estes, obviamente,
construídos pelos sujeitos que ali vivem, trabalham e estudam. Diria
que é preciso re/construir concepções outras sobre o campo e de
trabalhador rural/ do campo, levando-se em consideração,
necessariamente, os valores e os princípios estabelecidos e

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vivenciados pelos seus sujeitos, o homem do campo (PERIPOLLI,
2010, p.53).
Portanto, compreendemos a educação do campo expressa na ideologia e
força dos movimentos sociais do campo, na busca de um currículo que valorize a
identidade e a cultura dos povos do campo, numa perspectiva de formação humana
e de desenvolvimento local sustentável que coloca em questão os modelos
hegemônicos estabelecidos. O que torna possível o campo ser um espaço de
produção de pensamos o termo no/do campo representando uma reflexão que 406
reconhece o campo como lugar que não apenas reproduz, mas também se produz
pedagogia (CALDART. 2002).

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EDUCAÇÃO DO CAMPO E BNCC: POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES NO CURRÍCULO
DAS ESCOLAS DO CAMPO

Gleyssa Nayana Soares da Silva | Joelma Miriam de Oliveira | Douglas Ferreira da Silva

RESUMO: Este trabalho apresenta questões que permeiam a BNCC, Currículo e a


Educação do Campo. Então, por meio de uma consulta bibliográfica objetivamos
compreender as possíveis implicações da BNCC no currículo das escolas do campo. Para 408
tanto, vamos conhecer a discussão voltada para a BNCC; Identificar conceitos de Currículo;
Identificar as características e os princípios da Educação do Campo e analisar as possíveis
implicações da BNCC nos currículos das escolas do campo. Os resultados mostram que a
BNCC não comtempla as especificidades do contexto escolar do território campesino, pois
essa base curricular não tem considerado a diversidade cultural que está presente na sala
de aula.

Palavras-chave: BNCC. Currículo. Educação do Campo.

INTRODUÇÃO

A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) tem como objetivo instituir um


currículo único às instituições de ensino básico de todo o Brasil. Ela visa um modelo
formativo que unifica e padroniza os sujeitos dos diversos espaços, sem considerar
suas especificidades e características. Entretanto, precisamos refletir sobre as
possíveis implicações da BNCC no currículo das escolas do campo, tendo em vista
que, a Educação do Campo é pautada nos saberes outros dos campesinos.
Para pensarmos o currículo das escolas do campo no contexto da BNCC, se
faz necessário refletir sobre o significado do currículo. O qual é tido como
instrumento que direciona o ensino e a aprendizagem nas escolas e que representa
também, um espaço perpassado pelas relações de poder onde se geram tensões e
conflitos.

BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC)


Pensar políticas públicas voltadas à Educação do Campo, e mais
especificamente à elaboração de uma proposta curricular que atenda às
especificidades dos sujeitos campesinos, tem sido o objetivo de alguns espaços.

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Nesse sentido, emergem políticas curriculares de órgãos governamentais,
com uma proposta de “salvar a qualidade da educação brasileira”. Assim, surge a
BNCC (Base Nacional Comum Curricular), com o objetivo de oferecer um currículo
único a todas as instituições de ensino básico de todo o Brasil. De maneira
hegemônica e homogênea, a BNCC aposta em um modelo formativo que unifica e
padroniza os sujeitos dos diversos espaços, sem considerar suas especificidades e
características. Assim, a Base traz como prerrogativa o artigo 5º da CF-88
409
(Constituição Federal de 1988), garantindo que, “todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza”. Mas, o mesmo documento constitucional defende o
direito as diferenças de cada povo, assim como dos seus costumes e manifestações
(religiosas, culturais, entre outras). Nesta direção, Freire e Torres (1992) afirmam
que se faz necessário garantir o respeito às diferenças oriundas da
multiculturalidade dos povos brasileiros nas suas mais diversas formas de vida e de
organização, mais especificamente, nesse estudo, dos povos campesinos,
valorizando a cultura e saber local através de uma educação pautada nos princípios
filosóficos da educação popular.
Nos aproximamos ainda da CF-88 no artigo 210, afirmando que “serão
fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar
formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e
regionais”. Contudo, a Base visa universalizar o currículo, igualando os diferentes,
homogeneizando os heterogêneos, sem considerar as especificidades de cada
sujeito, e o ponto de partida de cada um frente à construção de aprendizagens.
Assim, iguala para manter a desigualdade sem considerar o que preconiza à Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (9.394/96) em seu artigo 28. A LDB aponta que,

Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de


ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação
às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural. (grifos nossos)

Na luta por Educação no e do Campo, partindo da concepção de Caldart


(2004), onde a autora afirma que “o povo tem direito de ser educado onde vive,

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pensada com a sua participação, vinculada a sua cultura e as suas necessidades”
(p. 149). Dessa forma, compreendemos que a BNCC através da sua
homogeneização dos currículos e desconsiderando as especificidades das diversas
esferas culturais e sociais, rompe com o projeto de Educação do Campo ao qual
diversas entidades civis, como os movimentos sociais do campo, grupos de estudos
e pesquisas sobre educação do campo, entre outros, têm se debruçado ao longo
dos anos.
410
Porém, a BNCC não corrobora em atender as especificidades dos sujeitos
atendidos por essa modalidade, para que assim, a educação do campo possa
proporcionar um desenvolvimento pleno dos sujeitos por ela atendidos e que esta
surja do reconhecimento destes que compõe os povos do campo como cidadãos de
direitos e deveres. Em síntese, Perez (2018) afirma que o texto da BNCC traz em
seu corpo
10 competências gerais; 117 objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento; 35 competências específicas por área; 49
competências específicas de componentes curriculares; 1.303
habilidades, agrupadas em 81 conjuntos; No total de 1.514
enunciados sobre aprendizagem e desenvolvimento (p. 56).

No entanto, sem trazer de forma explicita condições de acesso, permanência,


criticidade e reflexão sobre as condições de aprendizagens dos sujeitos do campo
que respeitem as suas características sociais, culturais, políticas e econômicas, a
BNCC desconsidera a história de vida dos educandos, mais especificamente, dos
sujeitos do campo.
Partindo desse pressuposto algumas instituições acadêmicas criticam
duramente a implementação da Base nacional Comum Curricular. Dentre eles o
Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES) e a
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED).
Diante das críticas advindas à implementação da BNCC, o Ministério da
Educação, na segunda versão da Base, se posiciona garantindo a necessidade de
tratar as modalidades da Educação Básica. Santos e Lemos (2016), apontam que a
implantação de um currículo nacional comum, demanda não apenas uma inserção
isolada de conteúdos e metodologias, mas afirmam que

Para além do tratamento dado, na BNCC, às temáticas afins às


modalidades da Educação Básica, a existência de uma base comum

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para os currículos demandará, posteriormente à sua aprovação, a
produção de documentos que tratem de como essa base se coloca
em relação às especificidades das modalidades da Educação Básica,
uma vez que essas modalidades têm diretrizes próprias, que as
regulamentam (p. 10).

As autoras evidenciam também que a ANPED e ABdC (Associação Brasileira


de Currículo) fazem oposição a BNCC através de documento enviado ao Conselho
Nacional de Educação (CNE), elencando 9 motivos para a não implementação da
411
Base, evidenciando o 2º motivo, intitulado “Nacional como homogêneo: um perigo
para a democracia”, que diz:

Entendemos que a qualidade da Educação Básica só pode ser


pensada socialmente e como direito público de todo e qualquer
cidadão. Conseqüentemente, qualquer proposta curricular precisa
considerar as adversidades e diversidades locais – de ordem étnica,
cultural, social, política e econômica – e individuais, relativas a
interesses e capacidades de aprendizagem, e aos direitos de
respeito aos conhecimentos construídos antes e fora da escola, para
além dos direitos de aprendizagem de conteúdos prescritos fora do
universo social dos alunos e organizados sem levar em conta que
estes são, e precisam ser, sujeitos de suas aprendizagens. As
desigualdades, diferenças e a diversidade social, cultural e
econômica existentes no Brasil exigem, portanto, flexibilidade na
norma curricular. Essa flexibilidade é incompatível com a definição de
uma base nacional comum idêntica para todos, sob pena de
entendimento do nacional como homogêneo e do comum como
único, contrariamente aos princípios de respeito e valorização da
pluralidade, fundamento da educação nas sociedades democráticas
(SANTOS e LEMOS, 2016, p. 11).

EDUCAÇÃO DO CAMPO: CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS

Nesta parte, abordarmos as questões que permeiam a Educação do Campo,


que é uma modalidade de educação advinda das lutas dos movimentos sociais, cujo
paradigma valoriza o contexto e as especificidades dos campesinos na produção do
conhecimento. A Educação do Campo é uma modalidade de educação oposta à
Educação Rural. Enquanto a Educação Rural é pensada a partir do meio urbano, a
Educação do Campo é pautada nos saberes outros dos campesinos.
O modelo de educação supracitado está voltado para uma produção de
conhecimento alicerçada nos valores da cultura camponesa, onde os sujeitos do

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campo são protagonistas no processo educacional. Logo, a Educação do Campo
“implica entender os processos educativos na diversidade de dimensões que os
constituem como processos sociais, políticos e culturais formadores do ser humano
e da própria sociedade” (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 13).
O povo do campo possui saberes e culturas outras. Para Caldart (2004): É
preciso compreender que por trás da indicação geográfica e da frieza de dados
estatísticos está uma parte do povo brasileiro que vive neste lugar e têm relações
412
sociais específicas que compõem a vida no e do campo, em suas diferentes
identidades e em sua identidade comum. Identidade esta, que na sociedade
hegemônica está associada a um estereótipo de sujeito atrasado e incapaz de
produzir conhecimentos por estar situado em um território campesino.
Para que os povos do campo tenham seus saberes reconhecidos e validados
na produção do conhecimento, se faz necessário estruturar um projeto educacional
que considere os saberes outros dos campesinos. Então, “uma escola do campo é a
que defende os interesses, a política, a cultura e a economia da agricultura
camponesa, que construa conhecimentos e tecnologia na direção do
desenvolvimento social e econômico dessa população” (FERNANDES, 1999, p. 51).
Assim,

A Educação do campo se coloca em luta pelo acesso dos


trabalhadores ao conhecimento produzido na sociedade e ao mesmo
tempo problematiza, faz a crítica ao modo de conhecimento
dominante e à hierarquização epistemológica própria desta
sociedade que deslegitima os protagonistas originários da Educação
do campo como produtores de conhecimento e que resiste a
construir referências próprias para a solução de problemas de uma
outra lógica de produção e de trabalho que não seja a do trabalho
produtivo para o capital (CALDART, 2009, p. 38).

A educação voltada para os povos do campo possui características próprias,


respeita as especificidades e necessidades advindas da realidade do contexto local.
Por isso, para que a educação ofertada aos povos do campo seja diferenciada e
atenda as especificidades dos campesinos, a Legislação Brasileira assegura os
direitos educacionais dos povos do campo.
A LDB em seu Art. 28º assegura à população rural que os sistemas de ensino
devem realizar adaptações necessárias às peculiaridades da vida rural de cada
região. Na Resolução CNE/CEB nº 2/2008 - Diretrizes complementares normas e

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princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação
Básica do Campo, é reafirmado o compromisso para com as especificidades dos
campesinos, como podemos perceber no caput do Artigo 7 inciso I: “a organização e
o funcionamento das escolas do campo respeitarão as diferenças entre as
populações atendidas quanto à sua atividade econômica, seu estilo de vida, sua
cultura e suas tradições” (BRASIL, 2008).
A Educação do Campo atende as necessidades advindas do contexto
413
campesino, a Resolução nº 4 de 03 de julho no Art. 35 “afirma que na modalidade de
Educação Básica do Campo, a educação para a população rural está prevista com
adequações necessárias às peculiaridades da vida no campo e de cada região”
(BRASIL, 2010).
Então, tendo em vista que os campesinos conquistaram direitos que estão
assegurados pela Legislação para a Educação do Campo. Ressaltamos que no
processo educacional voltado para os povos do campo, a inclusão e a valorização
de seus saberes, como também, o atendimento às especificidades é primordial, pois
se trata de um direito assegurado pela Legislação Brasileira.
No entanto, ainda há muitas questões a serem efetivadas e que impedem que
esta educação, de fato, atenda as particularidades dos sujeitos dos territórios
campesinos. Tendo em vista que, “a cultura hegemônica trata os valores, as
crenças, os saberes do campo ou de maneira romântica ou depreciativa, como
valores ultrapassados, como saberes tradicionais, pré-científicos e pré-modernos”
(ARROYO, 1999, p. 23). A perspectiva da Educação do Campo promove uma
formação que respeita o direto do campesino de ser protagonista de sua história e
de sua condição epistêmica no meio social.
Diante deste contexto, ressaltamos que a Educação do Campo possui
características próprias, pois ela está voltada para atender as necessidades
advindas do contexto campesino. Para tanto, a legislação voltada para essa
modalidade de educação vem assegurar os princípios da Educação do Campo. No
Decreto 7352, de 04 de Novembro de 2010, que dispõe sobre a política de educação
do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, o
Art. 2o apresenta os princípios da Educação do Campo que são:

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I - Respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais,
culturais, ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional e
de raça e etnia;
II - Incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos
específicos para as escolas do campo, estimulando o
desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de
investigação e articulação de experiências e estudos direcionados
para o desenvolvimento social, economicamente justo e
ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do
trabalho;
III - Desenvolvimento de políticas de formação de profissionais da
educação para o atendimento da especificidade das escolas do 414
campo, considerando-se as condições concretas da produção e
reprodução social da vida no campo;
IV - Valorização da identidade da escola do campo por meio de
projetos pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias
adequadas às reais necessidades dos alunos do campo, bem como
flexibilidade na organização escolar, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas;
V - Controle social da qualidade da educação escolar, mediante a
efetiva participação da comunidade e dos movimentos sociais do
campo (BRASIL, 2010).

Então, pensar em Educação do Campo é pensar numa proposta educativa


que identifique e valorize o contexto e o cotidiano do povo campesino. É, portanto,
possibilitar a esses povos que historicamente tiveram sua cultura e seus saberes
silenciados, o reconhecimento e a valorização da cultura e dos saberes outros que
fazem parte da identidade do povo camponês.

COMPREENSÕES SOBRE CURRÍCULO

Nessa parte do estudo percebemos que para pensarmos a BNCC e o


currículo da Educação do Campo, antes se faz necessário refletirmos sobre o
significado que se tem dado ao currículo enquanto instrumento que direciona o
ensino e a aprendizagem das escolas. O currículo como um conjunto de conteúdos
que circula nas escolas e que são voltados para o estudante, estando imbricados na
prática do professor em sala de aula.
O campo, a partir de suas especificidades e da diversidade campesina nos
conduz a repensar os currículos escolares do campo, tendo em vista que a área
campesina e seus sujeitos têm direito a uma educação que considere seus modos

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de viver e estar no mundo e na própria sociedade. Logo, considerando que vivemos
uma realidade perpassada por conflitos e por uma relação de poder, acreditamos
que estes fatores também estão refletidos no currículo escolar das escolas
campesinas.
Esses conflitos mobilizaram os movimentos sociais campesinos a lutarem por
uma escola que possa considerar estes sujeitos campesinos e seu próprio modo de
viver mediante um currículo que esteja articulado à sua realidade e que possa
415
fortalecer sua identidade, bem como seu lugar.
Então, para refletirmos sobre essa discussão, pontuaremos algumas
conceituações de currículo, compreendendo que o olhar para o mesmo é
polissêmico e, isso fez emergir diferentes elaborações discursivas sobre esta
temática. Esses conceitos foram sendo gerados ao longo do tempo como uma forma
de repensar e reelaborar seu próprio sentido. Sabemos que currículo se refere a um
conjunto de conteúdos que são selecionados para serem ensinados na escola de
acordo com cada nível das séries escolares. No entanto, trazemos alguns
questionamentos: o que está por trás dessa seleção de conteúdos? Quem realiza
essa seleção? Com que finalidade certos conteúdos são escolhidos para direcionar
o ensino e a aprendizagem escolar?
Nessa perspectiva, a fim de compreendermos melhor a dinâmica de
insurgência do currículo, iremos iniciar explanando a construção histórica curricular
descrita por Tomaz Tadeu da Silva, um dos intelectuais que discute as teorias do
currículo e como este vem sendo pensado enquanto objeto, a partir de
conceituações. E, em seguida, apresentaremos alguns conceitos que foram sendo
criados.
De acordo com Silva (1999), o currículo emergiu como objeto de estudo e
pesquisa nos Estados Unidos, nos anos vinte. Nessa época, ocorria o processo de
industrialização e os movimentos imigratórios que estavam focados em um grande
processo de massificação da escolarização, pelo qual a educação passou a se
preocupar com a construção, desenvolvimento e testagem de currículos que
pudessem atender às exigências das fábricas.
Nesse sentido, o currículo passa a ser criado com a intencionalidade de
escolarizar a massa popular que iria servir de mão-de-obra nas indústrias e fábricas.

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Para tanto, o currículo foi construído e inspirado com base na teoria de Taylor que
se preocupava em atender às necessidades da indústria. Por isso, o currículo tem
esse caráter de produção que pretende obter resultados mediante um processo
divisório e por meio de métodos.
Silva (1999) apoiado no discurso de Bobbitt assinala que “o currículo se torna
um processo industrial e administrativo” (p. 13) que está voltado para preparar o
trabalhador das indústrias e do comércio. Esse currículo que se desvia de sua
416
finalidade formativa para a vida e para uma formação pessoal, que conduza o sujeito
a pensar sobre a própria dinâmica social.
Pensar sobre os conteúdos que são selecionados no currículo é questionar
essa seleção dos conhecimentos e saberes que serão construídos e estudados. É
questionar por que alguns conteúdos e conhecimentos são selecionados e outros
não? Nessa direção, quando refletimos sobre os currículos das escolas do campo
também nos pegamos questionando o porquê de alguns conhecimentos e outros
não? Logo, quando pensamos nessa seleção, também podemos refletir sobre a
perspectiva pós-estruturalista apresentada por Silva (1999) que considera o currículo
também como um espaço de poder, ou seja, um campo de disputa, na medida em
que se seleciona um tipo de conhecimento, privilegiando uns em detrimento de
outros.
Questionamos a elaboração desse currículo que não reflete a identidade
daqueles estudantes campesinos, nem tão pouco sua realidade. Então, é nesse
sentido que Tomaz Tadeu da Silva (1999) sublinha que “[...] além de uma questão
de conhecimento, o currículo é também uma questão de identidade” (p. 16).
Outro aspecto a ser pensado se refere a função do currículo e da educação
na vida dos indivíduos. Nessa perspectiva, Arroyo (2007) nos ajuda a refletir, ao
fazer uma análise crítica da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDBEN. Ele questiona a finalidade da educação de garantir o pleno desenvolvimento
humano dos educandos, uma vez que essa finalidade não está alinhada aos
currículos escolares.
Segundo Arroyo (2007), currículos “[...] são uma construção e uma seleção de
conhecimentos, valores, instrumentos da cultura produzidos em contextos e práticas
sociais e culturais” (pp. 4-5). De acordo com essa afirmativa, desejamos fazer uma

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crítica aos currículos que estão aplicados nas escolas, uma vez que estes têm sido
pensados para atender aos interesses dos burgueses e têm servido como
instrumento que forma o trabalhador das empresas.
Nessa direção, concordamos com Silva (1999) que tendo refletido sobre os
estudos de Bernstein e Bourdieu concluiu que há um vínculo entre a organização da
economia e a organização do próprio currículo. Podemos notar essa conexão
quando observamos a forma como os conteúdos curriculares estão organizados e
417
sob qual intencionalidade, como está expresso nos discursos de qualificação na
escolarização para formar o profissional que futuramente estará contribuindo para o
acúmulo de capital do seu patrão.
O currículo escolar também produz identidades e por isso, ele representa um
campo de disputas. Sobre essa afirmativa, Moreira (2012) acentua que identidades
são produzidas via currículo e, esse último traz consigo um objetivo, uma intenção
educativa que em sua maioria está entrelaçada com o capitalismo e o mercado de
trabalho.
Pensando nessa perspectiva, questionamos como os currículos das escolas
do campo estão formados? E, sob qual intencionalidade? Será que as práticas
curriculares dos professores estão favorecendo e considerando os estudantes
campesinos? Ou será que se tem imposto um currículo urbano, totalmente
desvinculado da realidade do campo e dos seus estudantes, estando este
descontextualizado dos costumes e saberes desses povos?
Caldart (2009) nos convida a pensar em uma escola e um currículo escolar do
campo que estejam vinculados a “vida real” destes sujeitos, sobretudo no sentido de,
além de estar linear ao cotidiano e ao contexto campesino, possam estar também
em movimento com a comunidade escolar na própria construção do projeto político
pedagógico da escola em conjunto com os profissionais que atuam nestas escolas.
E, para tanto, se faz necessário que essa construção possa considerar o contexto, a
realidade, os sujeitos, a cultura e a própria luta campesina.

CONCLUSÃO

Compreendemos que a educação voltada para os povos do território


campesino, caracteriza-se por ser “do e no campo”. Uma educação baseada nos

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anseios do povo do campo, que atenda suas necessidades e especificidades
durante o processo de escolarização. Logo, é uma educação construída junto com
os sujeitos do campo, para que esta educação proporcione ao campesino se
reconhecer e vê sentido nas questões trabalhadas durante o desenvolvimento da
produção do conhecimento.
Nessa perspectiva, o currículo das escolas do campo necessita ser
repensado, reorganizado para que este esteja contemplando e representando esses
418
povos campesinos. Para tanto, a metodologia do professor também necessita estar
alinhada ao currículo e a própria realidade campesina. Então, precisamos refletir
como a BNCC contemplará as particularidades da Educação do Campo? Como
pensar um currículo para as escolas do campo diante da BNCC?

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AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO ESPECIAL: ASPECTOS LEGAIS E
ORIENTADORES

Vanessa Queiroz Ferreira¹ | Amélia Maria Araújo Mesquita² | Rosangela do Socorro


Nascimento Oliveira³

RESUMO: Este artigo tem por objetivo fazer uma análise das políticas curriculares que
discorrem sobre as dimensões avaliativas na educação especial, problematizando as
orientações previstas pelos textos legais acerca da especificidade avaliativa dos educandos 420
público alvo da educação especial. Em termos metodológicos, a partir de uma abordagem
qualitativa, utilizou-se a pesquisa documental e bibliográfica, com análise de documentos
legais e o diálogo com alguns pesquisadores contemporâneos que abordam a temática para
buscar responder o objetivo do estudo. Os resultados deste trabalho apontam que, apesar
dos avanços com o advento da inclusão escolar a partir das políticas curriculares na
perspectiva da educação inclusiva, ainda se perpetuam práticas avaliativas excludentes.
Tais discussões ainda se constituem desafios, pois a superficialidade dos discursos que as
políticas trazem precisam ser problematizados e aguçados.

Palavras-chave: Avaliação. Educação. Educação Especial. Educação Inclusiva. Políticas


Curriculares

INTRODUÇÃO

Estudos sobre avaliação na educação especial vêm ganhando destaque nas


discussões acadêmicas, temática esta que vem despertando o interesse científico
de alguns pesquisadores, dentre eles, Anache (2011), Anache e Resende (2016),
Bridi (2012), Fernandes (2010), Pletsch e Oliveira (2014), Tartuci (2012), etc.
Umas das questões que impulsionam o crescimento dos estudos nesta área,
diz respeito ao surgimento de políticas curriculares na perspectiva da educação
inclusiva que trazem prerrogativas referentes ao processo de avaliação da
aprendizagem do aluno público alvo da educação especial e a necessidade de
problematizá-las. Haja vista que, embora toda a discussão trazida pelas políticas,
ainda se perpetuam perspectivas de avaliação excludentes no cotidiano das redes
de ensino. Cabe ressaltar que tais discussões ainda se constituem desafios.
Historicamente a avaliação na educação especial se constituiu originalmente
a partir de um modelo médico ou clínico. Embora esta abordagem seja hoje bastante
criticada, é preciso considerar que foram primeiramente estes profissionais que

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tiveram a preocupação para a necessidade de escolarização de indivíduos com
deficiência (GLAT; FERNANDES, 2005).
Hoje, vivemos uma ressignificação da educação especial, a partir das
políticas curriculares vigentes. Com o advento inclusão escolar, mudanças
significativas foram observadas no âmbito da avaliação. Desse modo, fazendo o
levantamento de pesquisas relacionadas à temática, ao realizarmos o levantamento
no banco de dados de teses e dissertações da Coordenadoria de Aperfeiçoamento
421
de Pessoal de Nível Superior- CAPES, podemos perceber diferentes objetos de
estudo, dentro da temática avaliação na educação especial, sendo os mais
frequentes: a avaliação educacional dos estudantes com deficiência, avaliação para
o diagnóstico, encaminhamento e acompanhamento do público alvo da educação
especial, avaliação de larga escala de estudantes com deficiência, instrumentos e
procedimentos avaliativos na educação especial.
Assim, com o desenvolvimento das pesquisas de mestrado que vem sendo
realizadas no Programa de Pós-graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica
(PPEB) na Universidade Federal do Pará (UFPA) ao longo dos anos de 2017 e
2018, referente à Avaliação da Aprendizagem na Educação Especial, este trabalho
propõe problematizar acerca das orientações previstas pelas políticas curriculares
atuais referente à especificidade avaliativa dos educandos público alvo da educação
especial. Apontado ao longo do texto a discussão dos documentos legais em diálogo
com os pesquisadores que tecem considerações pertinentes à temática.
A retomada desse tema no âmbito da educação especial se faz necessária a
fim de se compreender por que, ainda hoje, em tempos de inclusão, observam-se a
perpetuação de uma visão clínica notadamente influenciada pelo discurso médico,
uma atenção acentuada ao distúrbio e uma preocupação constante com a
classificação dos alunos em detrimento de sua aprendizagem.
Para tanto, o presente texto percorre primeiramente por uma breve discussão
sobre os aspectos históricos da avaliação na educação especial e, posteriormente
adentra na discussão de algumas políticas da inclusão, finalizando com a conclusão.
Assim, em termos metodológicos utilizou-se a pesquisa bibliográfica e documental.

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AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO ESPECIAL: RESQUICIOS DA HISTÓRIA

A avaliação de pessoas com deficiência na segunda metade do século XIX


estava sob a responsabilidade da medicina em geral e da neurologia, associando a
deficiência à doença e enfatizando os aspectos biológicos e orgânicos em
detrimento do social e educacional (PESSOTI, 1984). Neste período a avaliação da
pessoa com deficiênciaera pautada em exames médicos e na rígida classificação
422
etiológica, com ênfase na deficiência.
A partir do início do século XX, os estudos sobre avaliação da pessoa com
deficiência sofreu forte influência da psicologia representada pelo psicólogo francês
Alfred Binet, através da psicometria, onde criou o primeiro teste de inteligência, o
que acabou influenciando posteriormente na criação de outros testes psicométricos
(PESSOTTI, 1984).
É necessário destacar que tais testes eram utilizados como instrumento de
“identificação dos anormais nas escolas”, servindo como um “processo seletivo” em
que Binet e outros auxiliares indicavam “os profissionais envolvidos a desconfiarem
dos comportamentos escolares das crianças”, pois, “camufladas entre outras
crianças, poderiam estar as anormais” (JATOBÁ, 2002, p. 83).
Neste viés, a própria política de Educação especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), retoma tais marcos histórico:

A educação especial se organizou tradicionalmente como atendimento


educacional especializado substitutivo ao ensino comum, evidenciando
diferentes compreensões, terminologias e modalidades que levaram a
criação de instituições especializadas, escolas especiais e classes
especiais. Essa organização, fundamentada no conceito de
Normalidade/anormalidade determina formas de atendimento clínico
terapêuticos fortemente ancorados nos testes psicométricos que definem,
por meio de diagnósticos, as práticas escolares para os alunos com
deficiência (BRASIL, 2008, p. 6).

Diante do exposto, observamos assim as grandes influencias da medicina e


da psicologia na avaliação da pessoa com deficiência e que demarcou
historicamente a educação especial. Com o advento da inclusão educacional, mudanças
significativas foram alcançadas a partir das políticas de inclusão escolar. Tais mudanças
ocorreram mais fortemente a partir da década de 1990, no Brasil.

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O movimento de educação inclusiva associado ao movimento de educação
para todos, vem se estabelecendo através das bases construídas no âmbito
internacional, que se nas declarações internacionais, bem como: a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (1948), a Declaração dos Direitos das Pessoas
Deficientes (1975), a Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação
das necessidades básicas de aprendizagem (1990), a Declaração de Salamanca
(1994), a DeclaraçãoInternacional de Montreal sobre Inclusão (2001) e a Convenção
423
dos Direitos das Pessoas com Deficiência (2007), etc. Tais movimentos foram mola
propulsora para adoção em nível mundial das ideias de uma educação inclusiva.
Observamos assim avanços significativos na educação especial que
possibilitou posteriormente uma própria ressignificação do próprio modelo e,
consequentemente nos seus processos avaliativos.

AS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL/INCLUSIVA E A AVALIAÇÃO DO


ALUNO PÚBLICO ALVO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
A proposta de conhecer os documentos legais em educação especial, bem
como as publicações desta área, com foco sobre a avaliação traz consigo os
benefícios de uma visualização maior sobre a temática estudada a fim de
problematizarmos.
Sendo assim, elencamos algumas das políticas que preconizam sobre como
deve ser conduzida o processo de avaliação da aprendizagem do aluno público alvo
da educação especial.

Quadro1 - Políticas de Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar que preconizam sobre
a Avaliação da Aprendizagem do Aluno Público Alvo da Educação Especial

Ano Tipo de Documento Descritor


2001 Resolução CNE/CEB Nº Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na
2 Educação Básica.
2006 Caderno Saberes e Avaliação para identificação das necessidades
Práticas da Inclusão educacionais especiais.
2008 Decreto Legislativo Nº A política de Educação Especial na perspectiva de
186/2008 Educação Inclusiva.
2010 Nota Técnica – Orientações para a institucionalização da Oferta do
SEESP/GAB/nº 11/2010 Atendimento Educacional Especializado – AEE em
Salas de Recursos Multifuncionais, implantadas nas
escolas regulares.

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2014 Nota Técnica Nº 04 / Orientação quanto a documentos comprobatórios de
2014/MEC/ SECADI / alunos com deficiência, transtornos globais do
DPEE desenvolvimento e altas habilidades/superdotação no
Censo Escolar.
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2018.

Um dos documentos analisados foram as Diretrizes Nacionais para


Educação Especial na Educação Básica de (BRASIL, 2001). A avaliação pedagógica
dos alunos neste documento aparece como “processo permanente de análise das 424
variáveis que interferem no processo ensino aprendizagem, para indicar
potencialidades e necessidades educacionais dos alunos e as condições da escola
para responder a essas necessidades” (BRASIL, 2001, p.34).
Notamos que o documento sugere procedimentos de como deveria ser
encaminhada a avaliação da aprendizagem da pessoa com deficiência, embora se
possa observar que o foco ainda está na identificação das necessidades educativas
especiais dos alunos com deficiência e poucas contribuições em relação ao
acompanhamento deste alunado ao longo do processo na Sala de Recurso
Multifuncional.
O outro documento que tece considerações sobre os processos avaliativos é
a coleção “Saberes e Práticas da Inclusão: avaliação para identificação das
necessidades educacionais especiais” (BRASIL, 2006), que apresenta com objetivo,
para além da identificação das necessidades educativas especiais dos alunos,
orientam os professores sobre os diferentes procedimentos e instrumentos para
avaliação, diferenciando-a das tradicionais praticas avaliativas classificatórias, mas
propondo uma ressignificação da prática a partir das suas diferentes concepções.
Assim descreve o documento:

A avaliação, enquanto processo, tem como finalidade uma tomada de


posição que direcione as providências para a remoção das barreiras
identificadas, sejam as que dizem respeito à aprendizagem e/ou à
participação dos educandos, sejam as que dizem respeito a outras variáveis
extrínsecas a eles e que possam estar interferindo em seu desenvolvimento
global (BRASIL, 2006, p. 19).

Como podemos analisar, a coletânea traz uma visão abrangente do


processo avaliativo junto aos alunos público alvo da educação especial, o seu foco
concerne na remoção de barreiras que dificultem o processo de aprendizagem e

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norteia o conjunto de intervenção a serem implementadas, adotando uma
compreensão da avaliação como prática inclusiva. Observamos um avanço em
relação ao primeiro documento analisado, pois traz a reflexão da avaliação como um
processo.
Nessa perspectiva, há uma pressuposição de que mudanças significativas
podem acontecer, pois, ao invés de se pensar o aluno como um problema, exigindo
que ele se adapte aos padrões de normalidade, exige-se que a escola forneça
425
condições para atender às diferenças de seus alunos, através da eliminação de
barreiras que possam interferir o processo de escolarização destes sujeitos. Mais do
que conhecer as patologias dos alunos e os limites de seu desenvolvimento, o
processo de inclusão enfatiza as condições de aprendizagem desses alunos e o seu
nível de competência curricular.

O mais recente documento que traz uma breve referência à avaliação é a


“Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva”
(BRASIL, 2008) que traz uma exposição a respeito do processo de avaliação,

A avaliação pedagógica como processo dinâmico considera tanto o


conhecimento prévio e o nível atual do desenvolvimento do aluno quanto às
possibilidades de aprendizagem futura, configurando uma ação pedagógica
processual e formativa que analisa o desempenho do aluno em relação a
seu progresso individual, prevalecendo na avaliação os aspectos
qualitativos que indiquem as intervenções pedagógicas do professor. No
processo de avaliação o professor deve criar estratégias considerando que
alguns alunos podem demandar ampliação do tempo para a realização dos
trabalhos e o uso da língua de sinais, de textos em Braille, de informática ou
tecnologia assistiva como uma prática cotidiana (BRASIL, 2008, p. 11).

Observemos que neste documento encontramos uma compreensão de


avaliação, bem como os procedimentos a serem realizados pelos docentes. Esta
perspectiva propõe de certa forma, uma ampliação de antigos modelos avaliativos
focados na deficiência do aluno, pois à medida que assegura a avaliação enquanto
prática capaz de identificar as possibilidades e avanços no aprendizado do sujeito,
também esclarece que a mesma não deve ocorrer como ato nivelador e medidor de
inteligência e sim como instrumento capaz de acompanhar o desenvolvimento
potencial do aluno, respeitando os diferentes tempos de aprendizagem e ressaltando
o aspecto processual e dinâmico.

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Outro documento que representou um marco na educação especial foi à
nota técnica Nº 4 do ano de 2014, que preconiza sobre a importância da avaliação
pedagógica a ser realizada pelo professor de educação especial, não aparecendo
mais a necessidade do diagnóstico clínico, considerado um marco na história da
educação especial. Uma avaliação e um parecer pedagógico do professor do
Atendimento Educacional Especializado são suficientes para garantir o acesso do
aluno aos serviços de educação especial,
426

[...] é necessário que o professor do Atendimento Educacional


Especializado – AEE, elabore o plano de AEE para, a partir de então,
organizar e ofertar o devido atendimento ao estudante público-alvo da
educação especial. Logo, elaborará pareceres que terão validade. [...] É
importante notar que o censo escolar é a base de dados da educação, cuja
ações não prescindem de laudo médico para serem efetivadas
(EDUCACENSO, 2011, p.6-11).

Observamos a importância que tal documento preconiza à prática avaliativa


do professor do AEE. Pois ao longo da história da educação especial, percebemos a
importância do laudo médico em detrimento da prática pedagógica do professor.
A Nota Técnica - SEESP/GAB nº 11, de 07 de maio de 2010 (BRASIL,
2010), orienta a respeito do que deve conter no plano de AEE dos alunos público
alvo da educação especial. Nota-se o papel primordial que a avaliação tem para o
planejamento das atividades a serem realizadas no AEE e no ensino comum:

Plano de AEE: identificação das habilidades e necessidades educacionais


específicas do aluno; planejamento das atividades a serem realizada
avaliação do desenvolvimento e acompanhamento dos alunos; oferta de
forma individual ou em pequenos grupos; periodicidade e carga horária; e
outras informações da organização do atendimento conforme as
necessidades de cada aluno (BRASIL, 2010, p.4).

Notamos a relevância da avaliação prévia ou diagnóstica como requisito


essencial na elaboração do Plano de AEE, na medida em que fornece subsídios
necessários para propor objetivos educacionais a serem alcançados pelo aluno com
deficiência no acompanhamento do AEE.
A Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(BRASIL, 2008) menciona a avaliação pedagógica como um “processo dinâmico”,
capaz de apontar o fundamento de onde a prática do AEE deve partir da percepção

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do “conhecimento prévio e o nível atual do desenvolvimento do aluno quanto às
possibilidades de aprendizagem” (BRASIL, 2008, p. 11).
O estudo de caso também aparece como uma possibilidade do professor do
AEE no processo de avaliação de aprendizagem do aluno,

O estudo de caso é apresentado como uma metodologia de avaliação que é


efetivada pelo professor do AEE em articulação com o professor do ensino
comum e outros profissionais que trabalham com esse aluno e visando
construir um perfil do aluno que possibilite elaborar o plano de intervenção 427
do AEE (BRASIL, 2010, p.9).

O estudo de caso é apresentado como base para a elaboração do Plano


Educacional Individualizado (PDI) e reforça a questão da não obrigatoriedade do
laudo médico para encaminhar o aluno para o AEE, uma vez que este atendimento
tem cunho pedagógico e não clínico. Ainda acrescenta que o direito das pessoas
com deficiência não pode ser restringido pela exigência do laudo médico (BRASIL,
2015).
Notamos assim, a partir destas políticas, avanços significativos referentes
aos processos avaliativos do aluno público alvo da educação especial. Podemos
destacar dentre eles, a importância que o professor do AEE ganha neste contexto.
Visto que, a avaliação pedagógica inicial para encaminhamento ao AEE passa a
ser atribuição do professor, já que esta avaliação historicamente estava
exclusivamente a cargo de profissionais da saúde, como médicos e/ou psicólogos.

Neste novo contexto, a ação do professor especializado passa a ser


primordial e envolve a construção de um trabalho coletivo, cooperativo e articulado
ao ensino comum. Em meio às atribuições realizadas por ele, a avaliação vem
ocupar um papel fundamental para direcionar a prática docente na construção
planejamento pedagógico.

Outros avanços que podem se destacados nas políticas é o caráter


processual e continuo da avaliação. Busca-se hoje por uma avaliação que
reconheça a diversidade e valorize as diferentes formas de aprendizado que os
estudantes possam apresentar.
Contudo, é importante problematizar que embora taisiniciativas do Governo
Federal em traçar alguma orientação no que tange aos procedimentos e concepções

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avaliativas no campo da educação especial, estas ainda se mostram contraditórias e
insuficientes para superação de antigas práticas avaliativas de caráter excludente e
focadas na deficiência e limitações do aluno. Como explicação para tal fenômeno,
podemos apontar dois obstáculos, primeiramente se refere o que Meneghel e
Kreisch (2009) denominam de cultura avaliativa herdada da escola tradicional e os
resquícios da avaliação clínica com enfoque na deficiência em detrimento das
potencialidades do aluno conforme apontam algumas pesquisas (ANACHE, 2011;
428
BRIDI, 2012; PLETSCH e OLIVEIRA 2014; TARTUCI, 2012, etc.).
Relacionado a este posicionamento, segundo Santiago, Santo e Melo
(2016), o “modelo” de avaliação preconizado e discutido nos documentos oficiais
não são garantias de mudanças na prática docente. É ainda perceptível que, a
despeito de todas as orientações e determinações legais existentes, os alunos com
deficiência são rotineiramente submetidos, a práticas avaliativas que atuam no
sentido de homogeneizar comportamentos e conhecimentos.
É possível assim problematizar que, embora as políticas preconizem sobre a
avaliação pedagógica do aluno público alvo da educação especial, ainda é de
maneira ligeira e não oferece subsídios suficientes para a mudança nas práticas
avaliativas. Além disso, também podemos considerar como uma das maiores
dificuldades encontradas no processo de escolarização e avaliação destes alunos
estaria também relacionada às atuais formas de organização (política) das nossas
redes educacionais que acabam dificultando as práticas de inclusão, haja vista que,
tanto as políticas do sistema educacional brasileiro e as políticas de inclusão
propriamente dita muitas vezes se contradizem e de alguma maneira mostram
brechas interpretativas, surtindo oportunidades de questionamentos. Sobre isso,
podemos citar as próprias políticas de avaliação em larga escala que traz uma
marca que segundo Afonso (2009, p. 85) “fazem apelo à excelência, à eficácia e
eficiência, à competitividade e produtividade e a outros aspectos do campo da
racionalidade econômica”. Se contradizendo com a própria proposta avaliativa
trazida pelas políticas de inclusão que se propõe processual, continua e que buscam
atender a diversidade.

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Também vale enfatizar que as discussões trazidas pelas políticas ainda se
mostram insuficientes para a transformação da prática docente, o que requer um
maior aprofundamento das mesmas.

CONCLUSÃO
Muitos avanços foram alcançados ao longo do tempo, porém, apesar das
rupturas paradigmáticas no campo da avaliação, influenciadas pelos princípios
429
orientadores, diretrizes e normas do sistema educacional brasileiro e das políticas de
educação inclusiva, pautados numa concepção de avaliação processual, cumulativa
e contínua, assim como outros documentos que regem a educação básica. Ainda se
perpetuam práticas avaliativas tradicionais e excludentes. O que implica a
necessidade de se investir em formação continuada sobre a temática abordada.
Cabe ressaltar também que tais discussões ainda se constituem desafios, pois a
leveza do discurso que as políticas trazem precisam ser problematizados e
aguçados.

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REFLEXÕES E NEGOCIAÇÕES: SENTIDOS DE AVALIAÇÃO, CURRÍCULO E
DIFERENÇA

Renata Leite de Oliveira

Resumo: O presente texto é fruto de reflexões sobre currículo, avaliação e diferença e tem
como objetivo abordar como sentidos atribuídos à avaliação, a diferença e ao currículo são
articulados e interferem nas práticas cotidianas. Enfatizo a necessidade de romper com
concepções cristalizadas referente ao campo curricular, onde o currículo é encarado como
conjunto de saberes a serem transmitidos; onde a avaliação é utilizada somente para 432
classificar e julgar; onde a diferença é silenciada e segregada a margem do processo
educacional. Nessa perspectiva rompo com discursos normativos que buscam estabelecer
critérios onde todos são avaliados da mesma maneira, desconsiderando as individualidades
de cada indivíduo. A escrita deste texto foi desenvolvida tomando como referência aportes
pós-estruturais e pós-coloniais, cujos princípios teóricos possibilitam o rompimento com
perspectivas verticalizadas de análise dos fenômenos sociais. O estudo foi orientado pela
crítica à ideia de um fundamento último, possível de ser acessado pela razão, a organizar e
orientar os fenômenos sociais.

Palavras-chave: currículo, avaliação, diferença.

INTRODUÇÃO

A avaliação educacional é um campo complexo que envolve alunos,


profissionais, instituições de ensino, sistemas educativos, projetos e programas, e
também, políticas públicas. Embora, a avaliação seja uma prática escolar desce a
universidade medieval (Afonso, 2014) isso não a naturaliza como algo que responda
as demandas educacionais, principalmente quando a avaliação possui um viés de
accountability (avaliação somativa) que adquire uma característica de
responsabilidade e prestação de contas, visando o alcance de metas.
De acordo com Perrenoud (1975) a avaliação surgiu por volta do século XVII
e a partir do século XIX associou-se ao ensino de massa. Desde então o ato de
avaliar estabelece hierarquias de excelência, pois valoriza uma norma ou padrão,
cria um perfil de aluno e segrega os que não se enquadram nessa normatização de
aluno aplicado, ou seja, aluno exemplar. Quando a avaliação se coloca a serviço da
seleção acaba por classificar, rotular, silenciar as diferenças, estabelecendo
hierarquias, onde “alunos são comparados e depois classificados em virtude de uma

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norma de excelência, definida no absoluto ou encarnada pelo professor e pelos
melhores alunos” (PERRENOUD, 1975, p.11).
A ampliação da avaliação60 a nível regional, nacional e/ou mundial, auxilia na
perda da noção do contexto local e passa a ser enfatizada uma ideia de igualdade
que negocia sentidos com a defesa de sistemas padronizados para que assim todos
tenham os mesmos direitos, porém não há espaço para as diferenças e não se
trabalha de maneira equitativa. A criação de hierarquias de excelência também
433
estabelece dicotomias, visto que visa “informar sobre a posição de um aluno em um
grupo ou sobre sua distância relativa à norma de excelência do que sobre o
conteúdo de seus conhecimentos e competências. Elas dizem sobretudo se o aluno
é “melhor ou pior” do que seus colegas” (PERRENOUD, 1975, p.12).
Fernandes (2009) também se debruçou sobre a temática da avaliação
distinguindo-a em quatro gerações e suas respectivas características. O autor
menciona que a primeira geração avaliativa baseava-se na medida, o ato de avaliar
era algo técnico que possibilitava medir com rigor e neutralidade as aprendizagens
dos estudantes, junto com esta geração os testes de coeficiência de inteligência
adquiriram significativa importância. Neste período “os testes acabavam por ter um
papel determinante para verificar, para medir, se os sistemas educacionais
produziam bons produtos a partir da matéria-prima disponível – os alunos”
(FERNANDES, 2009, p. 46).
Nessa perspectiva, os conhecimentos eram considerados os únicos objetos
avaliativos e a classificação e certificação eram as funções da avaliação. Os alunos
não participavam do processo e o contexto não integrava o ato de avaliar. O que
importava era quantificar, garantindo a neutralidade docente, o estabelecimento de
norma e/ou média a ser alcançada para que os resultados pudessem ser
comparados de maneira objetiva com outros grupos de estudantes.
A segunda geração considerava a avaliação como descrição, tal perspectiva
visava superar a primeira geração, pois “não se limita a medir, mas vai um pouco
mais além ao descrever até que ponto os alunos atingem os objetivos definidos. A
medida deixou de ser sinônimo de avaliação. Passou a ser um dos meios a seu
serviço” (FERNANDES, 2009, p. 47).

60
Entendo que as avaliações externas podem influenciar as avaliações internas. Porém, o foco desta
pesquisa são as avaliações internas, logo não aprofundarei o debate sobre as avaliações externas.

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De acordo com Fernandes (2009) avaliação como juízo de valor surge como a
terceira geração avaliativa. O interessante desta geração é a busca por um
desenvolvimento científico e tecnológico que respondesse e até se superasse ao
desenvolvimento tecnológico da União Soviética, principalmente após o lançamento
do Sputnik em 1957. Tal fato histórico provocou impactos no campo educacional
resultando em reformas educacionais com um viés mais atento ao campo da
matemática e das ciências.
434
Neste período, mesmo mantendo a função técnica e descritiva, a avaliação
também adquiria a característica de formular juízo de valor, e tal função era
designada aos avaliadores. Surgem os conceitos de avaliação somativa voltada à
certificação, quantificação, prestação de contas; e a avaliação formativa com um
viés voltado a regulação dos processos de ensino e aprendizagem. Assim, os
contextos começam a integrar o processo avaliativo, a avaliação passa a envolver
alunos, responsáveis e docentes, amplia-se o olhar para além dos resultados das
provas e testes evidenciando a importância de analisar outras informações que
participam do processo de ensino.
Não devemos encarar estas concepções de avaliação sem refletir também
sobre suas limitações como a falta de contextualização das avaliações, a ideia de
avaliação como medida, resultados como fatos inquestionáveis, uma suposta
neutralidade (visto a impossibilidade da mesma), a utilização de instrumentos
avaliativos considerados neutros e a grande dificuldade das avaliações em
considerarem as diferenças culturais que integram a sociedade.
A quarta geração de avaliação busca romper com os ideais que nortearam as
concepções anteriores, denominada como avaliação como negociação e construção,
almejava que os docentes partilhassem o processo avaliativo com os alunos
(avaliação como construção social) e que utilizassem de diferentes instrumentos
avaliativos, integrando a avaliação no processo de ensino aprendizagem, ou seja,
contextualizando-a. Esta perspectiva avaliativa considera a avaliação formativa
como importante na melhoria e na regulagem das aprendizagens, destaca a
importância e a variação de maneiras do feedback, a utilização de métodos
qualitativos e quantitativos (FERNANDES, 2009).

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Essas quatro gerações se apresentam de diferentes formas no campo
educacional e influenciam políticas públicas, interpretações dessas políticas,
concepções de currículo e de avaliação; e compreensões referentes ao processo de
ensino-aprendizagem. Destaco que embora a avaliação formativa tenha adquirido
visibilidade é necessário ressaltar de que ótica formativa falo, visto que existem
diferenciações entre avaliação formativa com um viés behaviorista mais voltada a
mensurações, quantificações e controle e de inspiração cognitivista, com uma
435
participação coletiva, qualitativa, baseada na construção social 61.
Em muitos espaços escolares ainda se faz presente uma concepção de
avaliação como verificação do acúmulo de conhecimentos adquiridos durante o
processo de aprendizagem. Tal concepção está ancorada em procedimentos
rotineiros e práticas descontextualizadas objetivando uma certificação que traz
pouca informação referente aos saberes apreendidos durante a trajetória escolar,
evidenciando-se a ênfase na mera fixação de conteúdos, sem que haja uma
aprendizagem capaz de conhecer, interpretar e relacionar um conhecimento com
outros já adquiridos.
Não considero a avaliação como algo negativo. Porém, quando a mesma é
utilizada somente para classificar instituições escolares, discentes e docentes, perde
seu caráter formativo. Uma avaliação com um viés formativo vai de encontro a uma
avaliação como medida, pois apesar das dificuldades em negociar sentidos com as
diferenças culturais das sociedades atuais, busca uma articulação significativa com
o ensino, auxiliando para uma aprendizagem mais eficaz refletindo também no
campo avaliativo (Fernandes, 2009).
Segundo salientado por Fernandes (2009) a avaliação formativa é
considerada como:
um processo eminentemente pedagógico, plenamente integrado ao
ensino e à aprendizagem, deliberado, interativo, cuja principal função
é a de regular e de melhorar as aprendizagens dos alunos. Ou seja,
é a de conseguir que os alunos aprendam melhor, com
compreensão, utilizando e desenvolvendo suas competências (p.
59).

De acordo com a perspectiva formativa o educador busca estabelecer um


clima de interação entre os alunos e também entre professor e aluno, o ensino está

61
Neste texto saliento a importância da avaliação como construção social.

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voltado às necessidades de seus educandos utilizando estratégias diversificadas e a
presença de feedback é importante para a regulação das aprendizagens. Os alunos
também possuem responsabilidades nesse processo, tais como: participar das
aprendizagens e avaliações e utilizar o feedback para melhorar seu
desenvolvimento. O que se almeja é que o processo de ensino seja organizado de
forma que se estabeleça um ambiente de apoio e aprendizagens.
A avaliação formativa vai de encontro à avaliação tradicional, por exemplo, no
436
caso da prova, como instrumento avaliativo,
uma prova escolar clássica suscita erros deliberadamente, já que de
nada serviria se todos os alunos resolvessem todos os problemas.
Ela cria a famosa curva de Gauss, o que permite dar boas e más
notas, criando portanto, uma hierarquia. Uma prova desse gênero
não informa muito como se operam a aprendizagem e a construção
dos conhecimentos na mente de cada aluno, ela sanciona seus erros
sem buscar os meios para compreendê-los e para trabalhá-los. A
avaliação formativa deve, pois, forjar seus próprios instrumentos, que
vão do teste criterioso, descrevendo de modo analítico um nível de
aquisição ou de domínio, á observação in loco dos métodos de
trabalho, dos procedimentos, dos processos intelectuais do aluno
(PERRENOUD, 1975, p. 15).

De acordo com Popkewitz (2013) “os mecanismos de mensuração dão


magnitudes e correlações a abstrações específicas (ficções) que permeiam a
conduta do mundo e têm o potencial de se materializar como aquilo que é aceito
como real em educação” (p. 27). Considero importante o questionamento desses
processos avaliativos em que classificar e promover escalas de proficiência se
revelam mais importantes do que análises contextuais, valorização das diferenças e
currículos praticados.
Embora ainda seja presente uma cultura escolar que visa estabelecer
condutas, definir conhecimentos e que busque nortear o campo curricular, assim
como, a homogeneização e controle de sujeitos; associando-se a concepção de
currículo “como expressão dessa seleção e de disciplina escolar como conjunto de
saberes selecionados a partir de um campo de saberes específicos e que são
impostos à escola porque atendem a determinados objetivos educacionais
padronizados e definidos fora dela” (PEREIRA, 2012, p. 73). Também é possível
observar mudanças na avaliação, vindo esta a se tornar mais descritiva, formativa e
com critérios estabelecidos. Ao nos distanciarmos de métodos tradicionais

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possibilitamos espaços para pedagogias diferenciadas, com um olhar
individualizado.

CURRÍCULO, AVALIAÇÃO E DIFERENÇA: CONSTANTES NEGOCIAÇÕES.

Ao elencarmos determinados conhecimentos como primordiais em detrimento


de outros e ao criarmos a necessidade de averiguar se tais conhecimentos foram
437
adquiridos, consolidados ou não, por intermédio de um instrumento avaliativo sem
que haja um feedback que auxilie no processo de aprendizagem, o que adquire
visibilidade é uma concepção avaliativa formal, geralmente individualizada, onde o
objetivo é dizer se o aluno aprendeu ou não. O que predomina, neste caso, é um
julgamento de valor sobre alguém sem que haja uma análise sobre o que ocorreu
em uma determinada situação, possibilitando uma tomada de decisão e estratégias
diferenciadas para retomar e avançar em alguns pontos da aprendizagem.
Neste caso é o conhecimento que adquire centralidade. Torna-se necessário
realizar uma reflexão sobre que relação estabelecemos com o conhecimento, ou
seja, de qual/quais conhecimentos estamos falando e como nossas práticas
estabelecem relações com distintas concepções de ensino, currículo, aprendizagem
e conhecimento. A centralidade do conhecimento legitima a escola como o lugar do
ensino (Macedo, 2012) e engessa o currículo associando-o somente ao aprendizado
de conteúdos.
Em muitos espaços escolares ainda se faz presente uma concepção de
avaliação como verificação do acúmulo de conhecimentos adquiridos durante o
processo de aprendizagem. Tal concepção está ancorada em procedimentos
rotineiros e práticas descontextualizadas, evidenciando-se a ênfase na mera fixação
de conteúdos sem que haja uma aprendizagem capaz de conhecer, interpretar e
relacionar um conhecimento com outros já adquiridos.
Nesta concepção a escola é vista como um local de transmissão de
conteúdos “que representam parte da herança cultural da humanidade” (PEREIRA,
2012, p. 73). Tal ideia está relacionada à concepção de currículo “como expressão
dessa seleção e de disciplina escolar como conjunto de saberes selecionados a
partir de um campo de saberes específicos e que são impostos à escola porque

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atendem a determinados objetivos educacionais padronizados e definidos fora dela”
(idem). Essa concepção curricular colabora para a compreensão de uma avaliação
meramente quantitativa, onde a medição rigorosa legitima o sucesso ou fracasso
revestido de uma suposta neutralidade que ignora as diferenças que compõem o
ambiente escolar.
De acordo com Fernandes (2009) “a consideração sistemática dos
conhecimentos extra-escolares e das aprendizagens paralelas poderia modificar
438
fundamentalmente a organização do trabalho em aula” (p. 96). Porém, “a maioria
dos métodos de ensino age como se todos os alunos reunidos em uma turma
tivessem de realizar as mesmas aprendizagens” (idem).
Enquanto educadora e aluna presenciei algumas situações, tais como: “hoje é
só filme ou é dia de passeio, não terá aula não”. Como se estas atividades não
fizessem parte do aprendizado. E outras falas, como: “hoje tem um texto importante
para ler e vai cair na prova” ou “este conteúdo será importante para a minha vida”.
Estas falas foram dando sentido as ideias que construímos ao longo da nossa vida
sobre nossas relações com a avaliação, conhecimento, currículo, escola e ensino.
Esses e outros sentidos estão em constante disputa na tentativa de definir,
mesmo que provisoriamente, o que é o currículo, avaliação, cultura, diferença. No
meu entendimento, currículo é mais do que um documento norteador, ele é algo em
construção diária que incessantemente se modifica na tentativa de atender as
diferentes demandas sociais e históricas.
Assim como Lopes e Macedo (2011) compreendo que

cada uma das tradições curriculares é um discurso que se


hegemonizou e que nesse sentido, constituiu o objeto currículo,
emprestando-lhe um sentido próprio. [...] Elas o constroem, criam um
sentido sobre o ser do currículo. São um ato de poder, na medida em
que esse sentido passa a ser partilhado e aceito. Aceitar, que essas
tradições definam o ser do currículo não implica assumi-las como
metanarrativas ou como produtoras da verdade sobre o currículo. Ao
contrário, a postura pós-estrutural nos impele a perguntar como
esses discursos se impuseram e a vê-los como algo que pode e deve
ser desconstruído. (LOPES; MACEDO, 2011, p.40,41)

De acordo com as autoras o currículo é uma prática discursiva, de poder e de


significação, que sempre negocia sentidos. O currículo é algo complexo, pois não
trabalhamos com algo fixo, trabalhamos imersos em um grande processo de

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significações, no qual a produção de sentidos é constante e híbrida. Segundo Lopes
e Macedo (2011) “o currículo, como tudo, seria cultural, na medida em que funciona
como um sistema de significações dentro do qual os sentidos são produzidos pelos
sujeitos”. (p.186) Considero importante romper com a concepção de currículo como
algo rígido, sistematizado e relacionado somente a conteúdos disciplinares. O
currículo é discurso, é produção cultural, ou seja, é um projeto que reúne distintos
sentidos em constante disputa.
439
A compreensão de que os saberes elencados como hegemônicos integram o
currículo, como uma verdade inquestionável, e que os números são respostas às
tentativas de medição da eficácia deste currículo e do processo de aprendizagem
são reflexos das avaliações e de suas produções apenas quantitativa que colaboram
na produção das ditas “verdades”, ou seja, os números vão se constituindo enquanto
regimes de verdade, influenciando o campo curricular e disseminando sentidos que
interferem na educação e na produção curricular. Os autores Bonnamino e Souza
(2012) alertam que múltiplos sentidos sobre currículo e avaliação auxiliam na
intensificação de políticas de responsabilização, visto que ao objetivarem
parâmetros de comparação, segregam as particularidades e seus distintos
contextos, ou seja, excluem as diferenças.
Muitas instituições escolares têm se organizado considerando a cultura como
algo dado, fixo, cabendo à adequação do diferente aos padrões culturais
socialmente e hegemonicamente estabelecidos. Nessas tentativas de adequação,
de padronização são reforçadas concepções binárias que procuram demarcar e fixar
fronteiras entre certo e errado; entre adequado e inadequado.
A intenção de padronizar alguns sentidos como pertencentes de uma cultura
legitimada de maneira hegemônica são processos de controle social que visam
silenciar ou enquadrar o que escapa ao que foi instituído como ‘certo’ ou ‘legítimo’.
Macedo (2014) aborda cultura a partir da abordagem pós-estrutural, considerando-a
como sistemas de significação que estabelecem sentidos. A autora considera toda
prática social, também, como prática cultural, como “um fluxo dinâmico de produção
de significados que nunca será concluído” (MACEDO, 2014, p. 92). Assim, ao
produzir sentidos os sujeitos sociais o fazem por meio “da reiteração e negação,
simultânea e ambivalente, de fragmentos de sentidos partilhados” (idem).

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Hall (1997) ao falar sobre a centralidade da cultura 62 expõe a preocupação
com os sistemas de regulação envolvidos nos processos culturais. Um processo
regulatório que não ocorre sem conflitos, nem de maneira harmoniosa. O que o
autor argumenta é que ao mesmo tempo em que a cultura regula, ela é regulada por
nós por intermédio de processos de significações constantes, pela linguagem e
pelas relações de poder. “Tanto a regulação da cultura quanto a regulação através
da cultura não conseguem podar completamente o excesso de sentidos próprios dos
440
sistemas discursivos que constituem a cultura. Há sempre sentidos que escapam e
garantem a possibilidade de mudança” (LOPES; MACEDO, 2011, p.198).
Nessas reflexões a linguagem assume um importante papel rompendo com
qualquer concepção reducionista ou idealista em relação à cultura, currículo e
diferenças. No pós-estruturalismo as concepções de linguagem e de cultura são
compreendidas por intermédio de sistemas simbólicos. As relações entre esses
elementos são consideradas mais importantes do que os elementos considerados
isoladamente, abarcando o contexto e a negociação de sentidos. As concepções de
linguagem e cultura são compreendidas “em termos de sistemas linguísticos e
simbólicos nos quais as inter-relações entre elementos que os constituem são vistas
como mais importantes do que os elementos considerados isoladamente” (PETERS,
2000, p.36).
De acordo com Lopes e Macedo (2011) considero o currículo como prática
cultural, compreendo que “o currículo, como tudo, seria cultural, na medida em que
funciona como um sistema de significações dentro do qual os sentidos são
produzidos pelos sujeitos” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 186). Desta forma, rompo
com a concepção de currículo como conjunto de conteúdos/conhecimentos que
devem ser transmitidos; e afasto-me da compreensão de cultura como algo
universal, como “um repertório de sentidos produzidos e partilhados por um grupo de
sujeitos” (MACEDO, 2014, p.89). Assim, pensar o currículo como prática de
enunciação cultural tem possibilitado repensar o ensino, a aprendizagem e a

62
Tal perspectiva rompe com a lógica de cultura como um repertório de conceitos partilhados, cuja
harmonia social prevalece mediante as diferenças culturais. Assim, a escola, entendida como espaço
social, cultural e discursivo, é posta em questão. Pois, não é possível atribuir a ela o papel de incutir e
partilhar um sentido como único para todos. Esse caráter idealista de uma universalização cultural é
posto em xeque, pois provoca exclusões e silenciamento das diferenças.

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educação; incorporando a ideia de culturas que interagem, sem que se possa
atribuir a nenhuma delas uma racionalidade capaz de legitimar qualquer privilégio
epistemológico a priori.
Também, abre espaço para a compreensão de “currículos escolares como
espaço-tempo de fronteira e, portanto, como híbridos culturais, ou seja, como
práticas ambivalentes que incluem o mesmo e o outro num jogo em que nem a
vitória nem a derrota jamais serão completas” (MACEDO, 2006, p. 289).
441
Compreendo a escola como um entre-lugar onde as relações de poder estão
presentes e em constante disputa de sentidos, onde há negociação e hibridização,
pois há trocas. Ao mencionar hibridismo compreendo-o, conforme Bhabha (2011)
como uma maneira desarticuladora que visa romper com a lógica binária,
essencialista e homogeneizante. Possibilitando novas e distintas compreensões
“sobre os trânsitos ambíguos que informam as práticas discursivas e políticas nos
lugares da cultura, que são também lugares de transformação social” (SCHMIDT,
2011, p. 24).
A partir destas contribuições debruço-me sobre a temática da avaliação
compreendendo-a para além de averiguação dos conteúdos apreendidos, mas sim,
como um processo de produção constante e incessante, onde o conhecimento por
mais que tentem o delimitar, assim como a diferença, sempre escapa. Escapa no
sentido de romper com a percepção de conhecimentos hegemônicos,
conhecimentos como tradição, como um acervo cultural que deve ser transmitido ao
aluno; escapa pela própria enunciação de conhecimento. Escapa, pois no ato da
nomeação do que é sempre há algo que fica de fora, que também é conhecimento.
Escapa pela impossibilidade de contenção das diferenças que o constroem
incessantemente.
Destaco a necessidade de refletir sobre as práticas da avaliação das
aprendizagens, visto que, conforme salientado por Fernandes (2009)

as formas de organizar a avaliação podem motivar ou desmotivar os


alunos, podem constituir importantes alavancas para superar
obstáculos ou ser, elas mesmas, mais um obstáculo a superar,
podem ajudar os alunos a estudar e a compreender bem suas
limitações e potencialidades ou, muito simplesmente, desinteressá-
los [...] A avaliação pode segregar ou pode integrar. Pode melhorar a
autoestima dos alunos, pode piorá-la ou, em casos extremos, pode
mesmo destruí-las (p. 40).

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A avaliação pode ser mais útil ao auxiliar no processo de desenvolvimento
das aprendizagens do que para classificar e julgar sujeitos. A avaliação formativa
possui a função de melhorar e regular as aprendizagens, tendo o feedback como um
fator importante no processo de desenvolvimento. Conforme salientado por
Fernandes (2009) a avaliação “é uma construção social, em que são levados em
conta os contextos, a negociação, o envolvimento dos participantes, a construção
social do conhecimento e os processos cognitivos, sociais e culturais na sala de 442

aula” (p. 56).


Nos ambientes escolares, muitas vezes, a cobrança por uma quantidade,
geralmente exagerada, de atividades acaba por enfatizar em um quantitativo de
tarefas que não, ou pouco, dialogam com a qualidade e com o desenvolvimento de
cada indivíduo. Muitas das práticas pedagógicas e/ou avaliativas acabaram se
instituindo como verdade fortalecendo um determinismo do que é ou não legítimo na
produção de conhecimento, tais discursos circulam e produzem efeitos de verdade
(FOUCAULT, 2002) no cotidiano escolar. Entretanto, é importante enfatizar a
existência de múltiplas possibilidades de “construções desenvolvidas pelas pessoas
através dos significados ou dos sentidos que atribuem aos fenômenos que as
rodeiam nos contextos em que vivem” (FERNANDES, 2009, p. 78).
Muitas das tentativas de responder aos problemas escolares tomam por base
uma ideia de qualidade63 excludente. Algumas chegam a propor ‘receitas’ para
serem copiadas e transplantadas. São propostas que normatizam os sujeitos,
padronizam culturas, processos e práticas. Propostas essas que, segundo Esteban
(2010), impõe a
exclusão da diferença, a negação da alteridade e tenta ajustar o
outro às identidades fixadas pelo modelo hegemônico e segregação
daqueles que não se conformam às normas (p. 48).

A temática da avaliação negocia múltiplos sentidos com o campo curricular.


Ao mesmo tempo em que os sentidos referentes às diferenças negociam sentidos
com avaliação e com o currículo em relação a uma educação para todos e todas,

63
A busca pela qualidade da educação se sustenta na pretensão de que é possível o
compartilhamento por todos de uma mesma cultura. Um ideal de igualdade que só pode se realizar
às custas de processos de exclusão das diferenças que não se deixam aprisionar nesse todos e
nesse comum.

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relacionando-se a um sentido de igualdade que acaba por silenciar as diferenças e
engessar os sentidos de currículo e avaliação.
Conforme salientado por Lopes e Macedo (2011) a necessidade de um
currículo aberto às diferenças

implica recusar a perspectiva da identidade, rechaçar as fixações que


criam as identidades como golpes de força sobre a possibilidade de
ampla significação. Um currículo marcado pela diferença é um
currículo concebido como cultura. [...] Trata-se de ver o currículo 443
como um processo de produção de sentidos, sempre híbridos, que
nunca cessa e que, portanto, é incapaz de construir identidades. O
que ele produz é diferença pura, adiamento do sentido e, portanto,
necessidade incessante de significação. (p.227)

Assumo o conceito de diferença como algo que não permite contenções ou


enquadramentos, algo que está em constante mudança. Lanço mão das
contribuições de Bhabha ao compartilhar que “a diferença cultural é um processo de
significação através do qual afirmações da cultura ou sobre a cultura diferenciam,
discriminam e autorizam a produção de campos de força” (Bhabha, 2003, p. 69). Em
uma visão pós-estrutural o currículo é visto como espaço da diferença que se
constitui na e pela diferença.
Neste texto busco romper com concepções realistas que sustentam as
tentativas de fixar sentidos na perspectiva de que eles possam ser partilhados por
todos. Considero que uma perspectiva universalista e qualquer dimensão de
universalidade se sustentam subalternizando a diferença. Assim, nego a fixidez de
significados e a possibilidade de partilhá-los apoiada em uma concepção de social
como texto.
A tecitura deste texto ocorre em negociação com sentidos de diferença. Não
utilizo diversidade, nem pluralidade como sinônimo de diferença, pois a noção de
diversidade relaciona-se ao entendimento de cultura como algo dado, previamente
fixado, que favorece as tentativas de enquadrar a diferença em um modelo
hegemônico visando garantir uma convivência sem conflitos. De acordo com
Macedo (2014), considero que “em uma perspectiva em que a diferença é diferença
em si ou diferença contra, não há diferentes a serem tornados iguais e noções como
reconhecimento e redistribuição deixam de fazer sentido” (MACEDO, 2014, p. 95).

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Bhabha (2003) tece críticas em relação aos sentidos de diversidade
articulados nos discursos liberais, visto que nestes discursos a diversidade está
relacionada à possibilidade de distintos grupos culturais, pensados em essência,
viverem em harmonia, sem conflitos, em uma sociedade pactuada. O autor
argumenta que todos esses discursos sobre a diversidade ainda estruturam a
diferença de maneira limitada; desta forma ao tentar estruturar um discurso há
limites, mesmo este sendo uma ficção. Ao trabalhar com a diferença, me afasto de
444
concepções de diversidade e compreendo, assim como Mantoan (2011), o “sentido
multiplicativo da diferença, que vaza e não permite contenções, porque está sempre
mudando e se diferenciando” (p. 104).
Assim, me aproprio da ideia de diferença como um processo de constante
significação, em que campos de força emergem constantemente em busca de uma
significação que sempre será provisória. A diferença rompe com as fronteiras
conceituais, pois é um fluxo contínuo de negociação e de busca por significação,
que será sempre contingente. Diferença como o ato de diferir, como um processo
permanente de produção de sentidos, como um algo a mais que não se constituirá
jamais em outro centro ou em mero complemento (DERRIDA, 2008).
Em concordância com Macedo (2014) concebo “a diferença e a cultura a
partir da perspectiva pós-estrutural e a diferença entre como uma limitação da noção
da diferença constituída no jogo político” (p. 89). A autora menciona que tal postura
implica em uma “mudança radical nas relações entre cultura e currículo e o
abandono da noção de identidade pré-constituída que tem estado na base das
políticas de formação e dos discursos de diversidade/diferença/pluralidade cultural”
(idem). Romper com o conceito de identidade é importante para trabalharmos com
as diferenças, visto que é “problemático falar de uma identidade existente como se
ela estivesse sempre já constituída. É mais apropriado falar de discursos” (BRAH,
2006, p. 372) e processos de identificações provisórias imbricados por relações de
poder, pois a produção de sentidos ocorre em um fluxo cambiante, assim toda
significação é produzida no interior da cultura, sendo estas significações, um
processo de diferimento (Macedo, 2014).
Em relação a uma concepção de avaliação que não valoriza a diferença, que
apoia e sustenta uma percepção de diferença como diversidade o que observamos é

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uma avaliação normativa e também comparativa, onde diferentes alunos realizam
uma mesma prova aonde

os desempenhos de alguns se definem em relação aos


desempenhos dos outros mais do que a domínios almejados ou a
objetivos. É igualmente uma avaliação muito pouco individualizada (a
mesma para todos no mesmo momento, segundo o princípio do
exame), mas onde cada um é avaliado separadamente por um
desempenho que supostamente reflete suas competências pessoais
(PERRENOUD, 1975, p.66).
445

Apesar das mudanças na avaliação, vindo esta a se tornar mais descritiva,


formativa, com critérios estabelecidos; ainda considero que a melhor parte da
energia dos alunos e dos professores é gasta em prol de uma avaliação mecânica e
não sobra muito para inovar, visto que o sistema clássico de avaliação favorece uma
relação utilitarista com o saber, onde o ato de dar notas/conceito a partir de uma
avaliação padronizada favorece uma transposição didática conservadora. Assim, “o
sistema tradicional de avaliação participa de uma espécie de chantagem, de uma
relação de força mais ou menos explícita, que coloca professores e alunos e,
geralmente, jovens e adultos, em campos opostos, impedindo sua cooperação”
(PERRENOUD, 1975, p. 66-67).
As padronizações das avaliações incorporam teses culturais sobre o que a
criança é e o que ela deveria ser, e quem essa criança não é. Neste sentido, tentam
criar ideias acerca do bom aluno, do bom professor, das boas práticas pedagógicas,
da boa instituição escolar, fortalecendo binarismos e exclusões. Para Popkewitz
(2013, p. 41), “a produção de tipos humanos nas escolas acarreta um processo
concomitante de exclusão e abjeção representado pelo impulso da inclusão”. Isso
ocorre por intermédio de elaborações de estereótipos relativos a gênero, classe,
bom/mau aluno, bom/mau professor que acabam por caracterizar e marcar o sujeito.
Segundo Esteban (2010),

a avaliação classificatória só pode se realizar tendo como referência


um único padrão de conhecimento e de percurso de aprendizagem
válido, constituído a partir do que é definido como cultura legítima.
Porém, ao lidar com a diferença, necessariamente presente no
cotidiano escolar, a avaliação emerge como discurso ambivalente
que atua no sentido da normatização proposta pelo projeto escolar e
como um dispositivo que pode expressar a diferença cultural (p. 66).

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Nenhum sistema educacional está isolado de contextos sociais, econômicos e
culturais a que ele atende, assim sendo, destaco a necessidade em romper com
tentativas que buscam regular e enquadrar a diferença a um padrão dominante,
excluindo quem foge à regra estabelecida. Desta maneira, refletir sobre o processo
educacional também é ressignificar o que entendemos por currículo, avaliação e
diferença. Se nossa orientação segue padrões avaliativos onde a nota é considerada
mais importante e o boletim adquire um status de reflexo da aprendizagem do aluno,
446
ainda estaremos atrelados a uma aprendizagem rígida, classificatória e
culpabilizante. Porém, se compreendemos o currículo para além de um conjunto de
disciplinas, considerando-o um espaço de construção coletiva de conhecimentos,
onde a avaliação tem seu espaço na medida em que auxilia docentes e educandos
nos processos de construção coletiva de aprendizagens, outro olhar se desenha.
Nele, “currículo e avaliação são entendidos como construção coletiva e inacabada e
valorizam-se as diferenças que nos constituem enquanto sujeitos sociais”
(ORTIGÃO; OLIVEIRA, 2017, p. 102).

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

A partir das reflexões suscitadas neste texto também é possível refletir sobre
a impossibilidade de uma única definição de escola, currículo, avaliação, diferença e
ensino. Embora existam tentativas de fixação e de definição, sempre haverá um
sentindo que escapará, é impossível fixar sentidos sobre o que é a escola e quais
são seus conteúdos essenciais. Pois, além dela ser constituída por diversos sujeitos
sociais, é primordial reconhecer que a escola é pura diferença, por mais que haja
campos de poder tentando doutrinar o ambiente educacional.
A importância da desconstrução de lógicas binárias favorece o
questionamento dos processos hierárquicos que promovem a exclusão dos que não
atendem aos padrões considerados mais adequados. Considero a escola como um
importante espaço de trocas culturais em que distintos discursos produzem
significados contingentes, formando redes simbólicas que integram o sistema
escolar. E, em concordância com Macedo (2014), acredito que “a educação tem a

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ver com a desconstrução de discursos hegemônicos como forma de ampliar as
possibilidades de outras significações” (MACEDO, 2014, p. 96).
Considero que currículo, avaliação e diferença estão em constante processo
de negociação e enunciação. O currículo é espaço-tempo de fronteira, prática de
enunciação cultural e um híbrido onde as diferenças podem encontrar espaço para
produzirem sentidos, dialogarem e negociarem, sempre dentro de um processo
articulatório no qual a criatividade adquire espaço e a avaliação rompe com
447
processos de hierarquização de conhecimentos e de somatório de notas
apoderando-se de um viés de responsabilidade e criatividade nos processos
educativos (Ortigão; Oliveira, 2017).
Borges (2010) compreende a escola como um espaço no qual as diferenças
se cruzam, se hibridizam e negociam. Desta forma, a escola não é mais vista como
o “único espaço de construção de saberes.” (BORGES, 2010, p.62). Apesar dos
discursos de avaliação como discursos de regulação; ao mesmo tempo em que
padroniza, também, produz diferença. Novamente, enfatizo o currículo e a avaliação
como um híbrido de constante negociação e enunciação, onde as diferenças podem
encontrar um espaço para produzirem sentidos, dialogarem e negociarem, sempre
dentro de um processo articulatório.

REFERÊNCIAS

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Campinas; Sorocaba, SP, v. 19, n. 2, p. 487-507, jul. 2014.
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38, n. 2, p. 373-388, abr./jun. 2012. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/ep/v38n2/aopep633.pdf>. Acesso em: janeiro de 2018.

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448
sobre a avaliação. São Paulo: Cortez, 2010.
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“ESCOLA DO CORPO?”: CURRÍCULO, DIFERENÇA E IMPLICAÇÕES DE
GÊNERO E SEXUALIDADE(S) NA PEDAGOGIZAÇÃO DE BAILARINOS/AS

José Rodolfo do Nascimento Pereira64

RESUMO: Este artigo é parte do meu projeto de dissertação de mestrado em curso que
objetiva refletir sobre os modos pelos quais o currículo produz, regula e (re)articula as
aprendizagens sobre corpo, gênero e sexualidade em uma Escola de Dança aqui da cidade 450
de João Pessoa (PB). Aqui neste texto o foco se direciona nas reflexões sobre o lugar da
diferença no currículo e como ela se implica nos sujeitos. As discussões a respeito de temas
como gênero e sexualidade tem sido muito potentes, principalmente quando eles ganham
“espaço” em lugares como a escola. Na conjuntura política atual, gênero e sexualidade
travam tensionamentos em meio a um cenário de intensa resistência, pois, estamos diante
de novas lutas sociais, ligadas à construção das novas configurações culturais por meio das
quais os sujeitos, a escola, a educação são hoje produzidos. Metodologicamente, esta
pesquisa inscreve-se como qualitativa, documental, empírica. Os instrumentos de coleta de
dados são a priori: a observação participante, diário de campo e entrevista semiestruturada.
Palavras-chave: Corpo. Gênero. Sexualidade(s). Currículo. Diferença.

INTRODUÇÃO

Há algumas décadas assuntos como corpo, gênero e sexualidade(s) tem


ganhado visibilidade na esfera social e com isso também espaço nas discussões
acadêmicas, na mídia, na escola e em outros espaços. Sendo objeto privilegiado de
olhares dos cientistas, religiosos, antropólogos, psicólogos e educadores, muitas
questões se travam sobre estes temas trazendo-nos muitos motivos para refletir,
dialogar e problematizá-los.
Desde criança fui participativo das festividades das escolas que estudei e dos
lugares aos quais eu me inseria, mesmo sendo um pouco retraído. Fiz teatro,
música, um pouco de artes marciais e por fim, dança. Essa última tem sido o motivo
das minhas implicações e atravessamentos. Desde que comecei a fazer balé, tenho
sido alvo de “olhares tortos”, pois, para a grande parte da sociedade, ser homem e

64
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) pela Universidade Federal da
Paraíba, membro do Grupo de Estudos de Gênero e Sexualidades (GESSEX) e do grupo de
Pesquisa Gênero, Educação, Diversidade e Inclusão vinculado ao CNPq.

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fazer balé são coisas que não “combinam”. Não combinam porque a sociedade
“decide” por mim que, nasci homem e balé é coisa de menina!
Já compondo o elenco de uma Cia de dança profissional e com registro oficial
de bailarino, ouvi uma ensaiadora que veio trabalhar conosco dizer que eu era
delicado e com muitos trejeitos! Trejeitos? De quê? De menina!! O fato de eu fugir
do estereótipo- norma ideal de homem forte valorizado no contexto social e no balé
fez com que eu fosse chamado atenção por ela, por outros e outras. O fato de ser
451
homem e exercer uma atividade associada às mulheres é uma questão que me
atravessa, que me inquieta.
Culturalmente, esse argumento de que existem lugares diferentes, assim bem
como atribuições predefinidas para homem e para mulheres e que elas se
diferenciam, são discursos que se (re)constroem em meio à sociedade com muita
potência e soam como verdade absoluta principalmente pela grande massa que
constitui a sociedade (ultra)conservadora brasileira.
As discussões a respeito de temas como gênero e sexualidade tem sido muito
potentes, principalmente quando eles ganham “espaço” em lugares como a escola.
Na conjuntura política atual, gênero e sexualidade travam tensionamentos em meio
a um cenário de intensa resistência, pois, estamos diante de novas lutas sociais,
ligadas à construção das novas configurações culturais por meio das quais os
sujeitos, a escola, a educação são hoje produzidos. A educação se torna ainda mais
frágil, tendo em vista que ela também se dá fora dos muros da escola aonde quem
chega traz consigo suas singularidades, peculiaridades, diferenças e isso precisa ser
levado em consideração pela escola. A diferença precisa ser um lugar de
aprendizagens.
O balé é uma experiência vivenciada em um corpo que é, ao mesmo tempo,
generificado e sexualizado. Implica que pensar o corpo como uma construção social
sexualizada e generificada nos permite dizer que os sentidos atribuídos a esse corpo
podem ser ensinadas e aprendidas. São os ato pedagógicos e educativos que
interpelam os corpos que me interessam neste momento por isso, eles tem sido
objetos de minhas pesquisas no mestrado em educação pela Universidade Federal
da Paraíba.

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JUSTIFICATIVA

Compreendendo a urgência e a relevância da discussão dos temas de corpo,


gênero e sexualidade(s), tendo em vistas também as minhas inquietações e
afetações pessoais, este artigo se constitui de parte do meu projeto de dissertação
de mestrado onde me insiro como pesquisador na linha dos Estudos Culturais da 452
Educação pela Universidade Federal da Paraíba.
Antes de seguir coma discussão que ora se anuncia, é preciso sinalizar
sinteticamente alguns conceitos que serão operados ao longo deste artigo.
O corpo que aqui se fala vai além do conjunto de músculos, ossos e
articulações que compõe o corpo humano. Não se pode negar a materialidade do
corpo, mas é preciso ampliar sua compreensão como um construto histórico, cultural
e político. O corpo seria, pois, uma ferramenta de projeção de sentidos, significados
e valores (LE BRETON, 2006).
Entendendo os desdobramentos do conceito de gênero como ferramenta
teórica, política e pedagógica (MEYER, 2004), compreendo que gênero “vai nos
constituindo como homens e mulheres, num processo que não é linear, progressivo
ou harmônico e que também nunca está finalizado ou completo” (LOURO, 2013). Ou
seja, existem formas plurais de ser homem e de ser mulher que não se limitam a
forma homem-machão e mulher-delicada e que isso é pedagógico, ou seja, pode ser
aprendido e ensinado. De maneira particular, acredito que o modelo de uma
educação binária e dicotômica ainda é muito potente. Portanto, problematizar e
refletir sobre as desigualdades de gênero e sexualidade (re)produzidas para reforçar
padrões e lugares socialmente construídos para homens e mulheres é uma maneira
de (re)pensar normas, transformando-as.
Compreendendo que a sexualidade não pode ser vista de modo reduzido,
levando em conta somente os componentes biológicos, pois “esses ganham sentido
através de processos inconscientes e formas culturais” (WEEKS, 1993). Desse
modo, entendo a sexualidade como uma construção social que é “tecida nas redes
de todos os pertencimentos sociais que abraçamos” (WEEKS, 1995, p. 88), que é
plural e, portanto, existem inúmeras formas de se vivê-la (GOELLNER, 2013) e

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expressá-la. Em virtude disso, decidi utilizar, nesta pesquisa, o termo sexualidades
no plural.
Entendo currículo como um campo cultural, como uma instância de produção
e circulação de discursos e práticas, na qual se travam lutas em torno da
significação sobre os sujeitos (PARAISO, 2004; SILVA, 2006).
Não existe novidade em dizer que estamos implicados “até o pescoço” em um
modelo de educação que é generificado, mas, acredito que seja importante
453
problematizar e desnaturalizar as práticas sexistas construídas cotidianamente como
uma forma de (re)pensar o modelo de educação que estamos trilhando, tendo em
vista promover um outro que seja inclusivo, plural e que a diferença seja um lugar de
aprendizagens. No âmbito de tais aprendizagens, Louro (2000) indica que “as
práticas escolares não são meros transmissores de representações sociais que
estão a circular em algum lugar, “lá fora”; são instâncias que carregam e
(re)produzem representações”, de corpo, gênero e sexualidade. Pensar o corpo
como uma construção social sexualizada e generificada nos permite dizer que os
sentidos atribuídos a esse corpo podem ser ensinadas e aprendidas.
Esta pesquisa se inscreve na interface do campo dos Estudos Culturais da
Educação, dos estudos de Gênero, Sexualidades e Currículo na medida em que
todos esses conceitos se articulam para dar corpus teórico à pesquisa que ora se
(re)constrói a todo instante.
Desse modo, a questão central que esta pesquisa busca responder é:
 Como o currículo produz, regula e (re)articula as aprendizagens sobre corpo,
gênero e sexualidade de uma Escola de Dança da cidade de João Pessoa
(PB)?

Aqui neste texto (des)articulo minha pergunta de pesquisa em outras, quais


sejam:
 Como se dão os processos de generificação dos currículos ofertados por uma
Escola de Dança da cidade de João Pessoa (PB)?
 Qual o lugar da diferença nos currículos da Escola de Dança?
 Como a diferença é produzida e quais os efeitos que elas têm sobre os
sujeitos?

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PISTAS METODOLÓGICAS
Assim como acontece na educação, fazer pesquisa se constitui de uma rede
de processos que nos permitem (des)construí-la a cada dia. E à medida que isso
acontece o pesquisador precisa se reinventar. Na educação existem processos nos
quais os alunos e alunas vivenciam para aprender, desaprender e reaprender a todo 454
instante como bem nos chama atenção Paraíso (2010). E fazer pesquisa é assim
também, um eterno ato de construção, desconstrução e reflexão.
Sendo assim, esta pesquisa se inscreve no campo dos Estudos Culturais da
Educação, de Gênero, Sexualidades e no âmbito das teorias pós-críticas.
Inicialmente, esta investigação inscreve-se como qualitativa, documental,
empírica. A pesquisa qualitativa pode ser pensada como “um conjunto de práticas
interpretativas que tornam o mundo “visível”, o transformam em uma série de
representações na forma de observações, anotações, gravações e documentos”
(SAMPIERE, CALADO & LUCIO 2013, p. 35).
Segundo Gil (2008, p. 46) a pesquisa documental vale-se de materiais que
não recebem ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados
de acordo com os objetos da pesquisa. Nessa tipologia de pesquisa os documentos
são caracterizados em dois tipos: os de primeira mão e os de segunda mão. Gil
(2008, p. 46) define os documentos de primeira mão como os que não receberam
qualquer tratamento analítico, como: documentos oficiais, reportagens de jornal,
cartas, contratos, diários, filmes, fotografias, gravações etc. Os documentos de
segunda mão são os que, de alguma forma, já foram analisados, tais como:
relatórios de pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, entre outros.
Nesta pesquisa como instrumentos de coleta de dados serão utilizados a
priori: a observação participante, diário de campo ou de observação e entrevista
semiestruturada.
Com a intenção de me interar cada vez mais aos sujeitos os quais
pesquisarei, decidi adotar a observação participante corroborando com Flick (2013)
quando ele diz nesse tipo de observação “a distância entre o pesquisador e a
situação observada é reduzida”. A observação participante pode ser entendida como

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um processo de duas partes segundo Flick (2013). A saber; primeiro, supõe-se que
o pesquisador se torne participantes e encontrem acesso ao campo e aos sujeitos,
segundo, a observação deve passar por um processo para se tornar cada vez mais
concreta e concentrada para as questões essenciais da pesquisa.
Segundo Flick (2013) podem-se distinguir três fases da observação
participante. São elas: observação descritiva , observação focalizada, observação
seletiva.
455
Como instrumento de coleta de dados, Macedo (2010) aponta que o diário de
campo é “utilizado como instrumento reflexivo para o pesquisador, o gênero diário é,
em geral, utilizado como forma de conhecer o vivido dos atores pesquisados,
quando a problemática da pesquisa aponta para a apreensão dos significados que
os atores sociais dão à situação vivida” (MACEDO, 2010, p. 134). Bogdan e Biklen
apontam que as notas ou anotações de campo consistem em dois tipos de
materiais: o primeiro é descritivo, em que a preocupação é captar uma imagem por
palavras do local, pessoas, acções e conversas observadas. O outro é reflexivo – a
parte que apreende mais o ponto de vista do observador, as ideias e preocupações.
(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 152). Sendo assim, no diário de campo serão
anotadas todas as experiências, vivências, impressões, afetações, dúvidas,
sentimentos e inquietações para com os sujeitos e o lócus a ser estudado.
Entre os mais diversos tipos de entrevista, optei pela semiestruturada, pois,
acredito que neste momento, este tipo é o que mais se associa aos objetivos
propostos da pesquisa. Segundo Olsen (2015) ela é chamada de “semiestruturada”
porque sua “estrutura básica que preenche o tempo alocado é definida previamente”
(OLSEN, 2015, p. 44). De modo geral é feito um roteiro semiestruturado de
entrevista que permite ao entrevistador uma organização prévia, mas, certa
flexibilidade nas perguntas a serem feitas.
Para a análise do material coletado durante a pesquisa, será adotado o
método da Análise Cultural, onde a mesma se apoia sobre as lentes dos Estudos
Culturais e principalmente do conceito de cultura buscando explorar seu alcance
epistemológico como sistema capaz de interpretar significados (COIRO-MORAES,
2011).

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Decidi escolher esse método de análise, pois, acredito que ele se associa de
forma mais articulada com os meus objetivos e objeto de estudo.
É possível afirmar que a análise cultural tem sua gênese no método
materialismo cultural, a ele oferecendo instrumental analítico alinhado aos padrões
formadores de suas concepções. Mas, para situar a análise cultural na prática
investigativa é preciso antes de tudo estabelecer a premissa na genealogia da
palavra cultura que pode ter vários significados dependendo do lugar que se fala.
456
A palavra cultura é um “registro de um número de reações importantes e
permanentes a [...] mudanças em nossa vida social, econômica e política, e que
pode ser visto, ele mesmo, como um tipo especial de mapa pelo qual a natureza das
mudanças pode ser explorada” (Williams, 2011 [1958], p. 18-19).
Como parte da metodologia, a análise cultural desloca o foco da estruturação
política, econômica da pesquisa para buscar contextualizar essa estruturação na
“vida real expressa pelo conjunto da organização” social (Williams, 2003, p. 58).
Neste caminho, Williams (2003) distingue três níveis de cultura:

1. a cultura vivida em um determinado período e lugar, que apenas se encontra


totalmente acessível para aqueles que vivem ou viveram em tal espaço-tempo;
2) a cultura registrada, desde a arte até os fatos mais cotidianos, isto é, a cultura
documentada de um período;
3) a cultura da tradição seletiva, fator vinculante entre a cultura vivida e os registros
da cultura em distintos períodos;
O que a análise cultural deve apontar, são as interpretações, as alternativas
históricas e os específicos valores contemporâneos através dos quais são trazidos
para o presente uma obra, o acervo ou a experiência dos sujeitos de determinado
período, de dado lugar. Costa (2010, p. 4) diz que “os indícios da emergência de
formas culturais novas, complexas e ainda de difícil inteligibilidade desafiaram-no a
tentar compreender e explicar os mistérios desses novos tempos”. Ou seja, existe
uma diversidade de formas culturais emergindo na contemporaneidade e isso
desestabiliza a existência de um conceito de cultura hegemônica passando a existir
culturas, no plural mesmo, pois, em meio a uma conjuntura temporal que trouxe
muitas transformações, surgiram outras maneiras de pensar e ver o mundo. O pós-
guerra, por exemplo, implicou em um momento que trouxe muitas transformações

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em diferentes ordens mundiais fazendo assim essa movimentação forjar novos
modos de viver e novas formas de pensar.
Um elemento de suma importância para a análise cultural é a linguagem e
seus modos de significar e dar sentido as práticas e as pessoas. Costa (2010, p. 5)
diz que “a linguagem, as narrativas, os textos não apenas descrevem ou falam sobre
as coisas, ao fazer isso instituem as coisas, inventando sua identidade”. A
linguagem tem um papel constitutivo nesse processo de significação. É importante
457
destacar que se entende, aqui, linguagem, não apenas como forma de comunicação
oral, ou como texto letrado. Linguagem diz respeito a toda forma de expressão, de
manifestação que atribui sentido e, assim, inventa, cria algo. O significado atribuído
aos indivíduos por meio da linguagem, do discurso e de suas práticas cotidianas,
bem com suas implicações e atravessamentos culturais constituem uma potência
para a análise cultural que procura a partir da cultura interpretar e dar significado a
discursos e práticas.
Com base nisso e sabendo que os Estudos Culturais são um campo de
investigação de caráter interdisciplinar que explora as formas de produção ou
criação de significados e de difusão dos mesmos nas sociedades atuais, a partir do
conceito de cultura trazido pelo campo dos Estudos Culturais da Educação, as
análises se construirão partindo dessas premissas, do conceito de cultura utilizado
pelos Estudos Culturais articulado as falas dos meus sujeitos de pesquisa. Partindo
desses pressupostos, faz-se pertinente refletir sobre o lugar na diferença no
currículo e o modo pelo qual a cultura (re)articula as discussões sobre cultura,
currículo e diferença na educação.

CURRÍCULO E CULTURA: QUAL O LUGAR DA DIFERENÇA?

Pensando em uma relação histórico-temporal, concordo com VEIGA-NETO


(2002) quando ele diz que, o currículo “engendrou – e de certo modo ainda
engendra – rotinas e ritmos para a vida cotidiana de todos aqueles que, direta ou
indiretamente, têm algo a ver com a escola”. O currículo como um artefato que se
articula as questões culturais e as suas relações de poder pode (re)criar, (re)articular

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e (re)produzir discursos bem como produzir-se por e em meio a elas. É importante
pensar também no currículo como uma arena de disputa, de contestação.

Na escola, o currículo funcionou e ainda funciona como uma ferramenta


pedagógica potente para “informar o “lugar” dos pequenos e dos grandes, dos
meninos e das meninas” (LOURO, 2014 p.62). Bem como para nomear, hierarquizar
corpos e ditar a partir de uma norma - geralmente hétero, branca e de grande poder
aquisitivo - o que vem a ser normal. Daí podemos pensar, e os/as que não se 458
enquadram nessa “norma”? Pensar as fronteiras que fazem limites entre os que são
normais e os outros é pensar na diferença, pois, tudo que fica a margem da norma é
o outro, é a própria diferença. A diferença no caso é sempre o outro.
De maneira pessoal, o que percebo hoje, é que algumas escolas já
conseguiram avançar, mas, penso que muito nos falta. A começar pelos
professores/professoras que estão na escola. Na verdade, a começar pelo processo
de formação que é pouco funcional e não prepara os sujeitos para mediar um
processo de aprendizagem diferenciado que leve em conta a(s) cultura(s), as
identidades, os diferentes espaços nos quais os sujeitos que chegam à escola
passaram. Sou formado em Pedagogia e posso dizer que o meu processo de
formação foi pouco relacionado com a prática tal como ela é. Culturalmente, fomos
negados. As nossas diferenças e singularidades ficaram fora dos nossos processos
formativos. Não posso generalizar, mas, penso que a medida que o processo de
formação de um ensino superior é frágil, o que chega a escola não será muito
diferente.
Segundo Woodward (2014) “a diferença é sustentada pela exclusão”. No
currículo escolar a exclusão ainda é um fator que age com muita potência nas
escolas. Às vezes de maneiras muito sutis, outras vezes de maneiras muito
ostensivas corroborando assim com que a exclusão seja o estopim de muitos
problemas ocasionados nos processos de ensino-aprendizagem na escola. É
preciso que os/as professores/as, comunidade escolar e todos os que fazem parte
da escola tenham um olhar sensível para a diferença, fazendo dela um lugar de
aprendizagens. Concordo com Paraíso (2010) quando ela diz que “o relevante para
a diferença é a singularidade, o fluir de forças, a transgressão.” Um currículo nunca
está pronto e suas linhas por vezes escapam, dessa forma, podemos experimentar

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as fissuras que existem em um currículo para se movimentar a partir da diferença.
Lidar com as singularidades e particularidades dos alunos/as pode ser um caminho
para valorização da diferença e da construção de uma escola com um olhar sensível
as questões que permeiam os processos educativos.

PRIMEIRAS IMPRESSÕES E CONCLUSÕES INICIAIS...


Como já mencionado, este artigo é parte do meu projeto de dissertação que 459
se encontra em curso, em fase de (re)(des)construção. Os procedimentos de coleta
de dados não foram iniciados e, portanto, não se tem ainda nenhum resultado
preciso sobre a pesquisa a não ser falar das primeiras impressões e de reificar a
necessidade de discutir, dialogar e problematizar temas como os que venho
desenvolvendo na minha pesquisa. Falar de gênero e sexualidade(s) no atual
cenário social se faz urgente, tendo em vista todos os atravessamentos que esses
temas causam, sobretudo na educação que é um lugar privilegiado onde os
processos de aprendizagens podem acontecer.
Diante do exposto, é preciso resistir diante de uma sociedade que ainda é
retrógrada em discussões como as que este artigo traz, engessando a sociedade e
acreditando que existem papeis sociais e lugares sociais para homens e mulheres.
Penso que seja válido refletir sobre questões contemporâneas de maneira a
(re)pensar a educação que temos feito diariamente.

REFERÊNCIAS

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Tradução Maria J. Alvarez, Sara Bahia dos Santos e Telmo M. Baptista. Porto,
Portugal: Porto Editora, LDA, 1994.

FLICK, Uwe. Introdução à Metodologia de Pesquisa: Um Guia Para Iniciantes.


Tradução: Magda Lopes. Porto Alegre: Penso, 2013. 256 p.

Le Breton, David. A sociologia do corpo. Petrópolis: Editora Vozes; 2006. 104 p.

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práticas escolares: um início de reflexão". In: Meyer, D. E. (org.). Corpo, gênero e
sexualidade. Porto Alegre, Mediação, pp. 5-6.
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: Uma perspectiva pós‐
estruturalista. 7ed. Petrópolis: Vozes, 2004.
______. Currículo, Gênero e sexualidade. Portugal: Porto, 2000.
LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes
(org.) O corpo educado – pedagogias da sexualidade, Belo Horizonte: Editora
460
Autêntica, 3a edição, 2013, p. 7-34.
LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho – ensaios sobre sexualidade e
teoria queer, Belo Horizonte: Autêntica, 2013, 92p.
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-
estruturalista. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2014, 184p.
OLSEN, Wendy. Coleta de dados: Debates e métodos fundamentais em pesquisa
social. Tradução: Daniel Bueno. Porto Alegre: Penso, 2015.
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curricular. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
PARAÍSO, Marlucy Alves. Contribuições dos estudos culturais para a educação.
Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v. 10, n. 55, p. 53-61, jan./fev. 2004.
PARAÍSO, Marlucy Alves. Diferença no currículo. Cadernos de Pesquisa, v.40,
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http://www.scielo.br/pdf/cp/v40n140/a1440140.pdf Acesso em: 15/03/2016
PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículo e relações de gênero: entre o que se ensina e
o que se pode aprender. Revista Linhas, Florianópolis, v.17, n.33, p.206-237,
jan./abr.2016. Disponível
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/pdf_102. Acesso em: 28/07/2017
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FEMINISMO E EDUCAÇÃO: ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE O SER DO
SEGUNDO SEXO NOS DOCUMENTOS OFICIAIS DO MEC

Yvisson Gomes dos Santos65

Resumo: o presente artigo pretende fazer uma trajetória, em forma de


apontamentos, sobre a mulher, o feminino e o feminismo endereçados à Educação.
Para tal, foram feitas investigações sobre a formação histórica, social e psicológica 461
dessa mulher que ora existe enquanto ser da natureza, ora participa de seu universo
no oîkos (privado) e ora luta por igualdade: enquanto ao homem coube-lhe a cultura
que se apoderou ontologicamente do ser mulher pela via histórica – descrita
verticalmente por ele. Para tal, se fez uma breve incursão dos documentos do MEC
e buscou-se ver e antever a presença e/ou ausência dessa mulher (des)construída,
amealhada no processo documental brasileiro. Concluímos que precisamos de
novas apostas para uma reflexão no que se objetiva a mulher que tornar-se mulher
dentro das linhas discursivas e pragmáticas da Educação no Brasil e de seus
documentos oficiais.

Palavras-chave: Feminismo. Educação. MEC. Gênero. Diferenças.

1. INTRODUÇÃO

A educação, ferramenta epistemológica e pragmática para os sujeitos, tem


uma história de entrecruzamentos. Ora uma Educação pautada na dimensão
masculina e branca, ora uma Educação alinhavada em linhas binárias.

Esse desmembramento do ser da educação, passível de regras


subjugadoras, calcadas em esferas patrilineares, veio a fazer com que o ser mulher,
o ser feminino inserido no corpus educativo tivesse uma delineação verticalizada
frente ao masculino.

O homem na sociedade ocidental determinava as idiossincrasias do modus


operandi de fazer a educação dentro da esfera pública. O papel da mulher,
minguado em regras de preconceitos ao ser ontológico desta, tornou-se uma
ossatura sem carne, sem vigor para se equiparar os gêneros masculino e feminino.
O que se prenominava era ou é os ditames dos costumes patrilineares. Coube a
65
Doutorando em Educação pelo PPGE/CEDU/UFAL. É professor de Filosofia da Secretaria de
Estado da Educação de Alagoas – SEDUC/AL. E-mail: yvissongomes@hotmail.com.

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mulher o espaço do oîkos (privado, em grego), e ao homem o espaço do público. O
oîkos significava um lugar hermeticamente fechado, um lar onde essa localização
detinha espaço físico delimitado, isso desde os gregos do período de Péricles (V
século antes de Cristo). Aos homens, a lancinante penetração nas esferas que se
interagiam com a sociabilidade, com o ser da política – ou seja, o ser aristotélico.

Na divisão do feminismo – termo que transcende ao feminino, porém também


o identifica – galgou-se uma longa jornada de empoderamento para no século 462
vigente falar em educação para a mulher. Sempre ao nos referimos ao ser da
mulher, observamos o livro O Segundo Sexo (1980), de Simone de Beauvoir, que
nos trouxe o tempero das discussões sobre o poder desse sexo frente à sociedade
machista e antropocêntrica.

Essa pesquisa versa sobre apontamentos do itinerário feminista, mas não


menos feminino, na localização epistêmica chamada de educação. O Martelo das
Feiticeiras (1991), parafraseando um livro alemão, ganhou acintosamente corpo e
lugar na esfera da publicização dos corpos mulher/feminino/feminismo. A educação,
fonte e matéria de inserção para os diferentes, para o outro que não é o semelhante,
transformou-se numa ferramenta lapidar de entender a fortaleza anímica do
feminismo dentro da sala de aula.

Mesmo que em voltas de retrocesso, tal como a Lei da Escola Livre ou Sem
Partido (2015) – ou da mordaça –, o tangenciamento da mulher expande-se, aflora-
se com o título de mulheres que são educadas para seres mulheres educadas. Elas,
de um Ocidente que consideramos fracassado, sem estrutura para se compreender
o diverso e o plurirreferenciado, se mostram esquecidas nas salas de aulas e no
absurdo do silêncio endereçado a elas: que é a sua invisibilidade no que se observa
a ausência das mesmas como personagens principais e autônomas nos recintos
escolares.

Propomos uma horizontalidade desse Segundo Sexo na Educação de


formação contemporânea, nos arredores e veredas do espaço escolar em forma de
apontamentos. Quem poderá ser essa mulher/feminina/feminista dentro do currículo
escolar? Há representatividade nesse currículo dentro dos documentos oficiais do
MEC? Eis o mote para a nossa discussão sobre o presente tema.

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2. NÃO SE NASCE MULHER, TORNA-SE MULHER: VISAGEM DE UM
PANFLETO

A frase/emblema de Simone de Beauvoir em seu livro “O Segundo Sexo”:


“Não se nasce mulher, torna-se mulher” (1980, p. 23), perfaz a nosso ver um libelo
de autonomia ao ser feminino. Quando se apega ao fraseado tem-se a impressão de
um contínuo, de um desferimento contra o tempo para o além, para o devir. Esse 463

último termo é heraclitiano, o vir-a-ser do homem (nota-se que falamos do gênero


masculino, pois o feminino não tinha pertencimento na sociedade grega – a mulher
não existia em sua representatividade política: tais como escravos e estrangeiros).

Desde teorias psicanalíticas à histórica, a mulher tem um espaço delimitado,


um gozo que não é fálico, ou seja, não é masculino. A inexistência desse “não ser
frente ao plallos” vem de Freud a Lacan. Algumas feministas de orientação
psicanalítica, como Julia Kristeva, vai adiante do determinismo psíquico do ser
feminino. Em uma obra de fôlego – La révolution du langage poétique (1974) –,
ainda não traduzido para o português, a búlgara Kristeva admite que a Chorá
platônica, uma entidade demiúrgica que trafegava entre nós, humanos e os deuses,
possuía o elemento feminino. Podemos dizer de uma hybris ou de uma desmesura
inerente à feminidade. Já o masculino é todo o rei fálico (Dura Lex Sed Lex – A Lei é
dura, mas é a Lei).

Nessa desmesura, temos essa entidade mítica, a Chorá, que para a filósofa e
semióloga predispõem-se em um recalque primitivo, antes do componente simbólico
e do imaginário. Kristeva adiantará que antes, com Jacques Lacan, tínhamos o
Simbólico e o Imaginário, agora temos o Simbólico e o Semiótico. Uma mulher,
determinante do desejo do outro, nasceu como função semiótica no
desenvolvimento psicossexual do sujeito (termo esse somente alcunhado na
modernidade). Desse modo, o feminino é Chorá e o masculino plallos.

Antes de prosseguirmos com nossas considerações, basta percebermos que


dentro do circuito psicanalítico não poderá existir o artigo definido “A” mulher. Seria
de uma onipotência se pensar assim. Somente ao homem esse significante fálico
tem destino (Anatomia é destino, segundo Freud e Napoleão Bonaparte).

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Com Simone de Beauvoir (1980) encontramos uma crítica à visão
essencialista da mulher. Quando se fala em essencialismo se diz que esse destino é
para a mulher, outro destino para o homem. Como se dará isto? Para a
existencialista, a mulher é coirmã da natureza (a priori).

Ela é elemento preponderante para se dizer um ser não cultural que é o


masculino ou o homem. Nas suas investigações no Segundo Sexo, a mulher tem a
maternidade, foi deixada ao cuidado do lar e o homem desbravou a natureza para 464
impor cultura. Esse termo cultura vem de cultivar, então podemos dizer que somente
ao homem foi possível o “desbravamento cultivado”, já para a mulher a manutenção
do oîkos (lar) em espaço delimitado: têm-se os filhos, o sangre menstrual de todos
os meses – um mistério que foi para o homem do neolítico.

É-nos importante pontuar a terminologia: mistério. Em linhas gerias, vem do


grego myo (fechado) e Hysteros (útero). Ou seja, o que não foi penetrado é
feminino, o oculto ou continente negro. Ela, a mulher e sua feminilidade escapam do
cultivo, da “Kultur”, para serem buracos escondidos e ainda não decifráveis. Em uma
conferência de Freud sobre a Feminidade (1933/1969), o pai da psicanálise se
perguntava: “O que quer uma mulher?” – não tendo obtido resposta em seu
transcurso de estudo e pesquisa sobre a psique humana.

Na vertente histórica, o ser da mulher (moderna) sempre fora visto como uma
estrangeira, uma estranha dentro da cópula ideológica ocidental. Raízes de
feminismo nasceram em função desse ser estranho que é ou era o ser da mulher.
Ao certo houve um momento matrilinear nas sociedades ditas primitivas.

Em Creta, antes de Sócrates, havia uma deusa sem nome. Mulher poderosa
que segurava uma serpente em suas mãos. Detinha poderes mágicos, aquele
mistério indecifrável, não penetrado. Um útero que com Platão, posteriormente em
sua obra O Timeu(1977), infligia às mulheres dores e obscenidades. Um útero
móvel, distendido ao corpo feminil e que lhe causava, agora nos séculos XVIII e XIX,
sintomas tétricos: a histeria.

Na histeria o corpo era objeto de estudo: consideradas loucas, desumanas,


dissimuladas – o corpo doente tinha prognósticos terríveis. As contraturas em seus
membros superiores e inferiores, os movimentos epileptoides, a bela indiferença
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histérica e o desejo incestuoso foram assombros para uma sociedade puritana e
vitoriana.

No século XIX houve o atear de fogo em 08 de março de 1875 às operárias


trabalhadoras americanas, tal como na Idade Média (a caça as bruxas). Essa data
simbolizou a ambiguidade de sofrimento e morte das mulheres que desejavam uma
jornada de trabalho justa e digna, bem como a necessidade de se reaver quem era
essa mulher e seu papel na sociedade ocidental. Grupos feministas foram formados, 465
desde o essencialismo existencialista (já citado) até as performatividades de gênero
de Judith Butler (2003).

Butler conseguiu armar a mulher com dentes e espadas, não masculinas, mas
femininas. O essencialismo de outrora foi substituído pela performatividade de
gêneros. Ainda permanece a premissa: “torna-se mulher” – entretanto essa premissa
torna-se maleável, contingencial, não necessária, tanto para homens como para o
sexo oposto. A condição de viver sob desdobramentos híbridos, sexuais, de
identidades humanas traçou o caráter metafórico e histórico da teoria sobre os
gêneros de Judith Butler.

Atualmente, ao sexo feminino houve alguns ganhos: pois agora ela possui
uma identidade significante e significada de sentidos múltiplos. O acordo entre a
possível igualdade – se há igualdade de fato entre os sexos masculino e feminino –,
é agora performática. Essa performance se distrai de assuntos pré-estabelecidos e
se dá antevisão de uma possibilidade do “tornar-se”, tal como tornar-se homem, ou
transexual etc. A americana falava de “estou mulher, estou homem, estou, gay,
estou trans” (BUTLER, 2003, p. 45) – indicando uma envergadura coerente para o já
falado vir-a-ser de Heráclito, porém com vistas aos gêneros não somente binários,
mas de referências diversas e não agora patrilineares, unicamente.

Para finalizar esse tópico, em nosso século XX e XXI tivemos a Lei Maria da
Penha (Lei 11340/06), e a caça aos predadores de mulheres através do disque 100.
Mulheres, feministas, negras emponderadas estão em construção. Um recente
debate sobre a “apropriação cultural” (MARTINS, 2018) reveste-se de um binarismo
cruel: a tentativa de um apartheid cultural, nas quais coisas de brancas serão
sempre de brancas, e de negras, idem. Estamos em devires, mas com uma

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Constituição de 1988 que possui seu artigo 5º a salvar, pelo menos no texto, a
igualdade de gênero, dentre outros. Contudo, as perseguições continuam: a mulher-
fetiche, objeto de prazer, recatadas e do lar, negras de senzalas revisitadas nos
casarões e prédios de redutos burgueses. Concluímos, nessa etapa, que a luta deve
e precisa continuar no sentido de ser emancipar e respeitar as idiossincrasias do
gênero feminino, dando-as autonomia e emancipação nas quais a história reclamará
em seus incrementos ulteriores: sincrônicos e diacrônicos.
466
3. A EDUCAÇÃO E A MULHER: O QUE OS DOCUMENTOS DO MEC TÊM A NOS
DIZER?

Ressaltamos no tópico anterior sobre a constituição cidadã de 1988 que versa


sobre a igualdade dos brasileiros. O artigo 5º nos diz algumas coisas que podemos
pontuar como importantes a este presente artigo. Ei-lo:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato (BRASIL, 1988).

Em um olhar atento ao artigo 5ª, detectamos o inciso “I – homens e mulheres


são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. Comemora-se,
no ano de 2018, 30 anos da Constituição Cidadã e o termo igualdade se encontra
em uso e vigência, pelo menos no aspecto documental. O ideário de igualdade
também se entrecruza com os artigos que versam sobre a Educação, desta mesma
Constituição.
Temos também o artigo 205 da Constituição Federal de 1988, lê-se: "A
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho" (BRASIL, 1988).

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No artigo acima, que consideramos emblemático, a educação se espraia para
todos, indistintamente. Tem como objetivos a qualificação do sujeito para um
horizonte cidadão e laboral, ou através da cidadania pela Educação que se
conquista o trabalho.
Esse tema está também em voga na LDB 9394/96, lê-se: “TÍTULO I – Da
Educação. Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem
na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e
467
pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais” (BRASIL, 1996).
Os aspectos da LDB 9394/96 se avizinham com a Constituição Federal de
1988, teoricamente. Avança na ideia de formação, ou de Bildung (termo alemão).
Essa formação equivale a dizer que estamos em construção epistemológica que nos
delineia nos sentidos da sociabilidade humana – ou seja, a interação entre os pares
e a sociedade –, bem como desde o núcleo familiar, às formas estéticas que
produzimos com a cultura: artes e/ou manifestações culturais.
Pergunta-se: esse termo cultura foi desenvolvido neste documento em sentido
amplo ou ainda na perspectiva da cultura como algo inerente ao homem, onde
somente ele poderia desbravar a mata virgem dos rincões terrestres?
Um problema a ser pensado e refletido. Se o texto prega igualdade como
ponto axial de sua escrita, podemos dizer que cultura compreende avanços
igualitários, a saber, comum a todos. O sentido do extrato do documento da LDB
9394/96 é, ao nosso entender, de estabelecer uma implicação textual sofística. E por
que falamos de sofisma? O motivo se coloca nos Parâmetros Curriculares Nacionais
– PCNS (1988) e as OCNS (2016 [não há citação sobre o tema proposto nesse
documento]) que não refletem essa igualdade. Sabemos que esses documentos são
basilares e disciplinadores para a Educação. E também a Base Nacional Comum
Curricular (2018). Vamos por partes.
Todos os PCNS se detêm no aspecto de produção de conhecimento cidadão,
emancipador e do trabalho. A presença da mulher, sendo demonstrada não aparece
em momento algum. Temos uma exceção: na orientação sexual (texto das PCNS).

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Nesse texto considerado transversal, o tema de reprodução biológica em um
momento diz: “evitar uma gravidez indesejada, procurando orientação e fazendo uso
de métodos contraceptivos” (BRASIL, 2006, p. 345).
A vertente sexualidade é considerada inteiramente biológica, não havendo em
todo o texto transversal o prenúncio de feminilidade, de menina e menino, bem como
de tratamento diferenciador (mas não excludentes) dos sexos. Recorrem-se nesse
texto do MEC, de passagem, as ciências da sociologia, da psicanálise etc, sem ao
468
menos fazer uma explícita citação ou pontuação do que falam essas seções das
ciências humanas.
Há uma hiância que perdura unicamente no aspecto biologicista e o que o
educador deverá fazer para lidar com situações imprevistas das crianças, tais como:

A Orientação Sexual na escola é um dos fatores que contribui para o


conhecimento e valorização dos direitos sexuais e reprodutivos.
Estes dizem respeito à possibilidade de que homens e mulheres
tomem decisões sobre sua fertilidade, saúde reprodutiva e criação de
filhos, tendo acesso às informações e aos recursos necessários para
implementar suas decisões. Esse exercício depende da vigência de
políticas públicas que atendam a estes direitos (BRASIL, 2006, p.
293).

Não estamos de encontro com o aspecto Lato sensu do termo “Orientação


Sexual”, contudo a ideia de universalizar o aspecto unicamente fiscalista do corpo,
sem fazer menção à ideia de liberdade feminina ou/feminismo dentro dessa
microrregião legislativa, nos força a dizer que o papel curricular endereçado ao
professor(a) e aluno (a) (da Educação Básica como um todo), dispensam os
aspectos ontológicos dos discursos sobre os sexos. No presente caso, sobre o papel
da mulher dentro do currículo escolar, especificamente.
Da mesma forma não encontramos citações sobre o tema: feminismo! Nem
nos outros manuais do MEC e nem na BNCC. Acreditamos que isto seja uma forma
de encobrir, dissuadir, o papel da construção das mulheres no arcano textual dos
documentos do MEC.
A Educação deve ser igual, compreendemos e ratificamos, mas a história
dessa igualdade passa por disparidades, extravios e “panos quentes” sobre a
percepção mulher/feminina/feminista, desconsiderada, e apenas sorrateiramente

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camuflada em aspectos biopsicossociais sem levar em conta os sociais, a nosso ver,
como uma historicização premente aos alunos e alunas da Educação Básica.
Não temos dúvidas de que esses temas transversais sobre a sexualidade
devem ser distribuídos entre as diversas disciplinas (ou Estudos e Práticas) ou áreas
do conhecimento. Alguns podem dizer que nas ciências, outros na biologia e assim
sucessivamente, se asseguram essa temática biológica.
O que nos salta aos olhos é essa ausência preponderante sobre a formação
469
da mulher dentro do espaço educacional brasileiro. E, principalmente, a exclusão de
seu real papel político e jurídico nos esteios da Educação normativa. Acreditamos e
sabemos que existem políticas públicas voltadas a esse nicho, entretanto o
acusamento dos documentos nas realidades escolares se distancia violentamente
das realidades de onde nasceu essa “igualdade documental”, essa “cidadania”, essa
“biologia generalizada”, dentre outras.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A muito se caminha na Educação do Brasil para uma efetivação da igualdade


entre os gêneros, mas não. A premissa que nos levou a esse artigo parte do
princípio que a história da mulher e de seus desdobramentos ontológicos sempre foi
eivada de masculinidade na sua construção epistemológica.
O homem, senhor e detentor do plallos fez história atávica de sua
testosterona cultural frente ao mundo natural da feminilidade. Apoderamo-nos do
tema com o sentido de igualar mulher/feminino/feminismo em um patamar único,
porém não menos polissêmico.
Na Educação brasileira e seus documentos oficiais, não encontramos a marca
significativa do ser mulher na construção histórica e educativa brasileiras. Nem se
precisa falar que os mesmos que compuseram tais textos do MEC partiram de
decisões masculinas, verticais e antropocêntricas. Não vemos um problema de
acentuação iminente, entretanto vemos um particular de dessemelhança com o
“desconhecido”, com o “estranho” que participa das relações sociais como um todo,
e é desacreditado quando se pensa sobre ele: esse ele é a mulher, o ser feminil.
Concluímos que precisamos de uma sincronia do feminismo na diacronia de
sua história secular. O poder da mulher ainda, em casos obscurantistas, continua

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imerso em um continente negro (palavras de Freud), e no abismo de um “útero
fechado” que não se dá passagem e translado a participação efetiva nas discussões
educativas, pelo menos documentais – foco de nosso estudo –, ao sexo considerado
anteontem na história, de “Segundo Sexo”.

REFERÊNCIAS

BEAUVOIR, S. O segundo Sexo: Fatos e Mitos. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1980. 470

BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação


Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Segunda versão revista. Brasília,
MEC/CONSED/UNDIME, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>>
Acesso em Outubro de 2018.
BRASIL. Lei Maria da Penha. Lei N.°11.340, de 7 de Agosto de 2006. Disponível em <<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>> Acesso em
Outubro de 2018.
BRASIL. Projeto de Lei 867/2015. Disponível em <http://www.camara. gov.br /sileg/ integras
/1317168.pdf.> Acessado Outubro de 2017.
BRASIL. Orientações curriculares para o ensino médio – OCN. Volume 3 – Ciências
Humanas e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação Básica, 2006.
BRASIL. Constituição de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2003.
FREUD, S. A feminilidade. Novas Conferências Introdutórias XXXIII. Rio de Janeiro: Edição
Standard Brasileira das obras completas, vol. XXII, [1933] 1969.
KRAMER, H. & SPRENGER, J. O Martelo das Feiticeiras: Malleus Maleficarum. Rio de
Janeiro: Rosa dos Tempos, 1991.
KRISTEVA, J. La révolution du langage poétique. L’avant-garde à la fin du XIXe siècle.
Lautréamont et Mallarmé. Paris: Seuil, 1974.
MARTINS, V. Apropriação Cultural: qual é o limite entre brancos e negros. Revista On-line
Alam Preta, 2018. Disponível em <<
https://www.almapreta.com/editorias/realidade/apropriacao-cultural-qual-e-o-limite-entre-
brancos-e-negros>> Acesso em Setembro de 2018.
PLATÃO. Timeu. Trad. Carlos Alberto Nunes. Pará: Universidade Federal do Pará, 1977.

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EDUCAR PARA AS DIFERENÇAS: RELAÇÕES ÉTNICOS RACIAIS E DE
GÊNERO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Anatália Martins da Silva66 | Ana Cláudia Xavier da Silva67

Resumo: O presente artigo é relato de experiência do projeto intitulado “Educar para as


diferenças: Relações Étnicos Raciais e de gênero na Educação Infantil”. Este projeto teve
por finalidade promover práticas pedagógicas que evidenciam a construção do respeito às
diferenças e construção da identidade de crianças do 3º e 4º ano Creche do Centro
471
Municipal de Educação Infantil Judith Maria Brasil da Rocha, situado no Município de
Camaragibe durante o ano de 2017 e 2018. Crianças entre 2 e 4 anos puderam amadurecer
integralmente, conhecendo, participando e valorizando as diferenças com respeito a elas,
percebidos a partir de depoimentos e mudança de comportamentos, também expressas por
seus familiares. A construção da identidade na educação infantil é imprescindível para a
valorização da diversidade étnica e de pertencimento e valorização dos diferentes grupos
que formaram a sociedade brasileira, estabelecidos pela normatização constitucional. Assim
as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil estabelecem que a identidade
étnica é um elemento de construção da criança. O referido projeto trabalhou vivências,
provocações e experimentações sobre aspectos étnico-raciais na Educação Infantil foi
amparado por um aporte legal, que orienta que é imprescindível que a criança já
compreenda, desde a primeira infância, que deve respeitar a diversidade e que, este
processo deve ocorrer através de experiências e vivências significativas na sala de aula. O
Estatuto da Criança e do Adolescente assegura a toda criança e adolescente o direito de
igualdade de condições para permanência na escola, devendo ser respeitada pelos
educadores, de ter sua identidade e seus valores preservados, sendo posta a salvo de
qualquer forma de discriminação, negligência ou tratamento vexatório. Cabendo às redes
pública e privada criarem mecanismos necessários na prevenção de quaisquer exposição a
forma de desrespeito, discriminação, estereotipação e exclusão.

Palavras-chave: Educação Infantil. Diferenças. Cultura. Afro. Indígena.

INTRODUÇÃO

O referencial curricular nacional para a Educação Infantil orienta que as


instituições de ensino e aprendizagem transformem o contato entre pares e entre
crianças e professores em relações de aprendizagem, a partir de vivências e

66
Graduada em Pedagogia pela UPE. Pós Graduada em Recursos Humanos na Educação pela
FAFIRE. E-mail: anataliamartins_1985@hotmail.com
67
Graduada em Pedagogia pela UNICAP-PE, Pós Graduada em Administração Escolar na UFRPE,
Mestra em Ciências da Educação e Multidisciplinaridade pela Universidade Gama Filho-UGF.
Doutoranda em Ciências da Educação pela Atenas College University. E-mail:
anaxavier15@hotmail.com

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experiências significativas pelas crianças, de ordem física, cognitiva, ética, estética,
afetiva, de relação interpessoal, de inserção social e fornecem os campos de ação.
Nesses campos são especificados: o conhecimento de si e do outro, o brincar, o
movimento, a língua oral e escrita, a matemática, as artes visuais, a música e o
conhecimento do mundo, ressaltando a construção da cidadania.
A educação é o fator de maior eficácia para contribuir para a promoção dos
excluídos. Por isso, precisamos desencadear mais experiências como a nossa em
472
outras escolas de Educação Infantil, no reconhecimento e valorização cultural dos
negros e índios.
A Lei 10.639/03, que altera a LDB 9394/96, já retrata a preocupação na
reflexão acerca do preconceito e da discriminação, democratizando o ensino,
garantindo a todos os alunos, o reconhecimento e valorização da cultura e
identidade do negro e assim combater o racismo e a discriminação, provocando nos
cidadãos orgulho e reconhecimento de seu pertencimento étnico racial.
Obedecendo ao que orienta a Constituição Federal, que estabelece três
conteúdos curriculares obrigatórios em todos os níveis de ensino: a língua
portuguesa, as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do
povo brasileiro e a educação ambiental. Alinhamos o projeto à proposta curricular
do município, utilizando referências e representatividade étnica cultural dos povos
primitivos brasileiros e dos povos sequestrados da África, e então despertar nas
crianças não brancas o sentir-se bem com seu corpo, seu rosto, seu cabelo.

REVISÃO TEÓRICA

As crianças, desde cedo, devem aprender a respeitar as diferenças e as


distintas culturas do povo brasileiro. Aprender que as diferenças no fenótipo entre
negros, pardos e brancos em nada seja motivo de exclusão, inferiorização. Brasil
(2005) traz o que acarreta quando as diferenças são entendidas como
desigualdades naturais:
[...] a existência do racismo, do preconceito e da discriminação raciais
na sociedade brasileira e, em especial, no cotidiano escolar
acarretam aos indivíduos negros: auto rejeição, desenvolvimento de
baixa auto estima com ausência de reconhecimento de capacidade
pessoal; rejeição ao seu outro igual racialmente; timidez, pouca ou
nenhuma participação em sala de aula; ausência de reconhecimento

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positivo de seu pertencimento racial; dificuldades no processo de
aprendizagem; recusa em ir à escola e, consequentemente, evasão
escolar. Para o aluno branco, ao contrário acarretam: a cristalização
de um sentimento irreal de superioridade, proporcionando a criação
de um círculo vicioso que reforça a discriminação racial no cotidiano
escolar, bem como em outros espaços da esfera pública. (BRASIL,
2005, p.12).

Educar para as diferenças tendo como base a educação das relações étnico-
raciais envolve processos educativos objetivando a superação de preconceitos
sociais, uma educação antirracista, estimulando práticas sociais livres de qualquer 473
forma de preconceito e discriminação. De modo que os variados povos e etnias
brasileiras se engajem na luta por equidade social, respeito e valorização das
tradições. Como trata o Parecer CNE/CP 003/04, quando introduz o termo
“educação das relações étnico-raciais”:
[...] a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens
entre brancos e negros, trocas de conhecimentos , quebra de
desconfianças, projeto conjunto para construção de uma sociedade
justa, igual, equânime (BRASIL, 2004, p.6).

Com a Lei nº 10.639/2003 (BRASIL, 2003), a primeira na educação que


realmente apresentou forte enfrentamento ao racismo, alterando a LDBEN (Lei nº
9.394/1996), determinou a introdução, no currículo de todos os níveis de educação
formal, o ensino sobre História e Culturas Afro-brasileiras e Africanas. Promulgada
em 2008, a Lei nº 10.639/2003 (BRASIL, 2003), incorporou a valorização da cultura
afro-brasileira, a história e a cultura dos povos indígenas.
Tais leis contribuem para uma educação que dá enfrentamento ao racismo
em âmbito escolar. Para, além disso, incorpora valorização de aspectos dos vários
grupos socioculturais, fomentando assim o respeito às diferenças. Ser diferente não
restringe-se apenas a um conteúdo que interessa apenas a negros ou indígenas:
tem a ver diretamente com a qualidade da educação, em formar um ser em sua
integridade, consciente de si, e, portanto, diz respeito a toda a sociedade. De acordo
com Gomes:
“não faz sentido que a escola, uma instituição que trabalha com os
delicados processos da formação humana, dentre os quais se insere
a diversidade étnico-racial, continue dando uma ênfase
desproporcional à aquisição dos saberes e conteúdos escolares e se
esquecendo de que o humano não se constitui apenas de intelecto,
mas também de diferenças, identidades, emoções, representações,
valores, títulos...” (GOMES 2005, p.154).

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Na educação infantil as crianças começam a conhecer e (re) conhecer seu
corpo, as diferenças e semelhanças entre os colegas do grupo, escolhem com quem
brincar e se relacionar, tem suas preferências por brinquedos, sendo, então
fundamental que o educador trabalhe questões sobre diferenças, e em especial, as
relacionadas ao pertencimento racial, não só com as crianças, mas com as famílias
e comunidade. (CEERT, 2011).
De 0 a 6 anos é a fase que se desenvolve a construção da identidade da
474
criança, por isso, em seu processo educativo deve constar a valorização da
diversidade e das diferenças expressas nas relações étnico raciais, promovendo
experiências e vivências no modo de vida, de brincar, de se alimentar da cultura dos
povos afro-brasileiros e primitivos do Brasil.
Nilma (2005) apud Novaes (1993), conceitua identidade como meio de
definição ao pertencimento em algo coletivo, pertencimento a algum grupo. De
maneira ampla e prática reivindica uma visibilidade social, enfrentando um
apagamento a qual esta mesma identidade foi exposta.
Temos como entraves nessa construção: o não enquadramento a um padrão
de beleza branco, no que se refere às características físicas; a falta de referência e
representatividade na sociedade, sobretudo através da mídia e nas instituições
educacionais; e podemos citar também a ausência nos brinquedos, brincadeiras,
repertório musical, entre outros. Com este projeto promovemos experiências,
vivências e provocações, dentro do ambiente de Educação Infantil, com as crianças
entre 2 a 4 anos.

METODOLOGIA E DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA

De acordo com a Proposta Curricular de Camaragibe (2009) creche é um


ambiente onde as crianças passam a ampliar suas experiências e conhecimentos,
ter ideias sobre o mundo, o comportamento do outro e sobre a cultura.
De modo a acompanhar o que dispõe as Diretrizes Nacionais para a
Educação Infantil (Parecer CNE/CEB 22/98), Camaragibe (2009) define que o
projeto pedagógico de cada unidade educacional:

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[...] deve contemplar situações instigadoras do desenvolvimento
infantil e promotoras de um pensar criativo e autônomo da criança,
pautadas em princípios éticos de solidariedade e justiça, e acolhedora
da diversidade de pessoas e de relações que caracterizam a
comunidade humana, posicionando-se contra a desigualdade, a
discriminação e o preconceito em todos os seus matizes. (2009,
p.23).

Além do aporte teórico e legal deste projeto já mencionado, utilizamos


também a Proposta Pedagógica da Rede Municipal de Camaragibe, com seus eixos
de aprendizagem no planejamento das atividades e acrescentamos esta ação no 475
PPP da escola, para quem ler este documento, saber que a escola está trabalhando
o respeito às diferenças.
Prevista na Constituição de 1998, na LDB de 1996 e no Plano Nacional de
Educação de 2014, a BNCC é um documento que estabelece o conjunto de
aprendizagens essenciais e indispensáveis para que crianças, jovens e adultos
tenham direito.
Portanto, o conjunto de atividades desenvolvidas no projeto “Educar para as
diferenças: Relações Étnico-Raciais na Educação Infantil” aplica metodologias e
estratégias didático-pedagógicas diversificadas, introduzindo a competência de n°3
da BNCC (2017) que é desenvolver o senso estético para reconhecer e valorizar e
fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, e também, por promover
práticas diversificadas de produção artístico-cultural.
No primeiro momento, trabalhamos a ambientação da sala de aula, realizando
atividades em cima de pedaços de chita, formando um tapete, tornando-a um
ambiente que despertou nas crianças o desejo em participar, a curiosidade, a
imaginação a criatividade, tendo na ambientação o primeiro passo, um convite à
participação.
A ambientação da sala foi realizada através de sua decoração construída por
artefatos culturais (chitas, instrumentos musicais utilizados pelos negros nas festas e
grupos de sambas e objetos produzidos pelas próprias crianças (instrumentos
musicais e brinquedos afro e indígena). Bento (2011, p.39) apud Abramowicz,
Levcovitz e Rodrigues afirmam que é necessário criar um ambiente de múltiplas
aprendizagens:
Cria condições para um ambiente que é “um lugar de vida infantil,
muito mais do que um lugar institucional concebido e finalizado para
objetivos do tipo didático”. As autoras chamam a atenção para o fato

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de que a educação de crianças pequenas as coloca no espaço
público, que é aquele que permite múltiplas experimentações.

Esse ambiente de múltiplas aprendizagens foi necessário também para


permitir a conquista da participação das crianças. Conquistada a participação, na
educação infantil, o estímulo à experimentação (sentir, tocar, cheirar, mexer-se) foi
indispensável para mantê-las participantes e desenvolver as atividades. Assim as 476

crianças brincaram, vivenciaram e aprenderam brincadeiras, rodas de verso e


brinquedos de origem afro-indígena; conversaram, entenderam e compartilharam
significados de histórias, cores e objetos de origem afro-indígenas e exploraram a
natureza e a cultura através de contação de histórias, repertório musical e alimentos
de origem afro-indígena.
Provocamos a aprendizagem com um ambiente de diversão, através da
ludicidade, e possibilitamos que as crianças construíssem uma autoimagem positiva,
cuidando dos aspectos estéticos e de decoração condizentes com a valorização da
diversidade étnica brasileira. Como afirma Silva (2017) sobre o ambiente de
educação infantil:
[...] deve ser, prioritariamente, um ambiente lúdico, tanto do ponto de
vista físico, convidativo à exploração e a brincadeira, quanto do clima
psicológico, desenvolvendo capacidades cognitivas, afetivas e
sociais, a partir de um projeto pedagógico voltado para o
desenvolvimento integral das crianças. (SILVA, 2017, P.16)

As propostas pedagógicas detalhadas a seguir foram organizadas a partir de


Eixos temáticos presentes na proposta curricular do município, os quais se
enquadram com alguns dos campos de experiências da Base Nacional Comum
Curricular na Educação Infantil.

1º Eixo - Quem sou eu? Quem é você? Construindo uma relação afetiva - as
crianças puderam explorar seu corpo e observar a si e aos colegas, que todos
somos diferentes; identificaram o que é seu, dos colegas e de uso coletivo;
reconheceram que o outro necessita de carinho e atenção, mesmo com as
diferenças. Ao trabalharem a afetividade, o carinho, utilizaram como recurso uma
boneca negra.

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2º Eixo - Conversando a gente se entende - trabalharam bastante com a oralidade,
se expressaram, enredaram-se e deixaram-se enredar, conheceram histórias como
Menina Bonita do Laço de Fita, Era uma vez um Gato Xadrez, Cadê Maricota e o
Cabelo de Lelê, e destas fizeram reconto, construíram cartazes coletivos e fizeram
desenhos, essas histórias sempre com personagens negros. Ainda neste eixo, as
crianças vivenciaram músicas e rodas de versos, como recursos para trabalhar as
cores, sobretudo a cor preta, desmistificando a cor como uma cor feia e ruim.
477
Abordamos o primeiro conteúdo previsto pela constituição, a língua portuguesa
através do reconto das crianças, participação de rodas de diálogo com estímulo à
oralidade.
Desenvolvemos atividades com compartilhamentos de significados através de
jogos com imagens; preenchimento de quadros com figuras de alimentos,
brincadeiras, artefatos culturais na apresentação dos alimentos; leituras de histórias
como com personagens indígenas e negros; plantio e observação de alimentos
como milho; apreciação de texturas e alimentos saudáveis, produção de cartazes e
produção de arte com pinturas, recortes e restos de verduras, cascas e sementes.
Todas as atividades eram registradas em diário e portfólio com fotos, tendo
participação de uma das crianças, o que foi uma forma de trabalhar tanto a
coordenação motora, como um protagonismo em realizar comandos e tarefas
simples além de apreciação do trabalho coletivo. Todas as fotos tiradas pelas
crianças e demais registro e materiais confeccionados, foram apresentados, por
meio de exposição, em Culminância Pedagógica no término do ano letivo, para que
todos os que participarem possam compreender a importância da diversidade
cultural na construção de nossa sociedade.
3º Eixo - Brincando, Experimentando e Aprendendo - proporcionou muito o
desenvolvimento, as crianças discriminaram cores, sons, ruídos, texturas; se
expressaram corporalmente e oralmente, exerceram o pedir ajuda, o fazer com o
outro. Encaixaram, misturaram, juntaram, procuraram, encontraram, balançaram,
pularam. Também puderam representar ações do mundo real usando a criatividade,
brincaram com mímicas. Com este eixo elas ampliaram seu repertório musical,
através de brincadeiras de roda e comandos reproduzidos.

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As brincadeiras de faz-de-conta também fizeram parte do repertório de
aprendizagem, com uma casa montada na sala de materiais reaproveitáveis, de
modo que pudemos abordar questões de gênero, higiene, organização de materiais
para brincar, cores, coordenação motora. Silva (2017) apud Kishimoto (2000), diz
que é nas brincadeiras do faz-de-conta que a criança se aproxima do mundo adulto,
toma atitudes que vão além do mundo adulto, garante a racionalidade do ser
humano.
478
4º Eixo – Explorando a natureza e a cultura - foi explorado para além de conhecerem
aspectos culturais da região, como alimentos, músicas, ritmos e indumentárias. As
crianças experimentaram: tocaram, sentiram o cheiro, o sabor, a textura,
compartilharam alimentos, aprenderam que “comer junto” é sinônimo de amizade,
uma sabedoria africana. Cantigas de roda, e ritmos regionais como:
frevo, coco, ciranda, caboclinho e maracatu e objetos de percussão como:
chocalhos, agogô e alfaias, possibilitaram trabalhar a coordenação motora e seguir
sequências simples.
Trabalhamos Música a partir da escuta e experimentação dos instrumentos.
De modo que as crianças puderam incorporar desenvolvimento motor, audição,
oralidade, domínio rítmico, consciência corporal a partir do reconhecimento de
exemplos da musicalidade brasileira, permitindo acesso a rica diversidade cultural,
as cores, os sons, a textura, as indumentárias, os ritmos, os personagens, e assim
futuramente não reproduzir discursos pejorativos e preconceituosos, valorizando a
cultura brasileira e suas raízes, como é orientado pelo Referencial curricular nacional
para a educação infantil, 1998:
A música está presente em diversas situações da vida humana. Existe
música para adormecer, música para dançar, para chorar os mortos, para
conclamar o povo a lutar, o que remonta à sua função ritualística. Presente
na vida diária de alguns povos, ainda hoje é tocada e dançada por todos,
seguindo costumes que respeitam as festividades e os momentos próprios a
cada manifestação musical. Nesses contextos, as crianças entram em
contato com a cultura musical desde muito cedo e assim começam a
aprender suas tradições musicais. (BRASIL, 1998, p.47)

Na abordagem de alimentação saudável, como o lema “comer frutas nos faz


fortes e crescer”, comeram frutas deitados em rede, herança dos povos indígenas,
se alimentaram de comidas que são de origem africana e indígena como as de
milho, participaram de um piquenique no jardim da escola, comendo as frutas e

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alimentos da cultura afro brasileira, vestidos com roupas de chitas e com turbante na
cabeça. Em outras situações da sala de aula, participaram de desfile de roupas afro.

RESULTADOS

Acredita-se que a escola e o professor sejam parceiros incondicionais da


diversidade, uma vez que o educador é o modelo para a criança, portanto
479
professores preconceituosos terão alunos preconceituosos, professores inclusivos,
terão alunos que reconhecem na diversidade o sentido do ser humano.
Ao trabalharmos a cultura afro-brasileira e indígena nos permitiu, enquanto
espaço escolar de educação infantil, promover um resgate aos seus costumes e
tradições, procurando abrir um leque de possibilidades a alimentos, brincadeiras e
músicas, entre outros aspectos, diferentes os quais são comumente apresentados,
ou apresentados de uma outra forma, sem preconceito e com experimentação,
apostando no sentir, no cheirar, no tocar, no provar. Tendo esses aspectos como
pano de fundo, contudo, as crianças vivenciaram várias situações de aprendizagem,
pudemos perceber que elas amadureceram de forma integral: o cognitivo, o afetivo,
o motor e o social.
Ao explorarmos obras de arte, danças, brincadeiras, músicas nossas crianças
se perceberem diferentes e se aceitarem como diferentes. Elas se permitiram
conhecer, participar, e valorizar diferença. Começaram a conhecer e reconhecer seu
corpo, as diferenças e semelhanças entre os colegas do grupo, e a escolher com
quem brincar e se relacionar, deixando de lado as diferenças e aproximando-se pela
relação de afeto.
Esse trabalho nos permitiu atender não só com as crianças, mas agregar
também toda a comunidade escolar, demais professores, funcionários, quando os
mesmos se sentiram estigmados a participação ou provocados a reflexão. Assim,
ouvimos depoimentos de familiares e educadores que refletiram a compreensão e
reconhecimento da influência e importância que a cultura africana e indígena foi
introduzido ao longo dos tempos em diversos setores de nossa sociedade, em
reuniões com os pais, ao serem informados sobre o que as crianças aprendem
brincando.

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A falta de representatividade existe, porém nossas crianças tiveram acesso a
vários exemplos de representatividade, brinquedos, brincadeiras, arte. Percebemos
uma mudança de comportamento, sobretudo a se permitirem ao diferente. Em tantas
rodas de verso ou de contação de histórias puderam se reconhecer “igual a mim” ou
“parece com meu pai”, “como minha mãe”, “como minha professora”, tais exemplos
nos mostraram o quanto que este projeto fortaleceu a construção da identidade
dessas crianças.
480
O projeto foi elaborado, inicialmente em 2017, e nos permitiu desenvolver
outros estudos e pesquisas para melhorar o acervo de livros na biblioteca,
colocando a ação no PPP 2018.
Durante o planejamento das atividades, houve dificuldade em conseguir livros
literários de educação infantil dentro da temática de relações étnico raciais e
valorização das diferenças, pois há poucos títulos na creche. Essa realidade nos
permitiu observar também que há uma grande necessidade de pulverizar e
compartilhar os projetos, atividades e indagações acerca da temática das relações
étnico-raciais para provocar as secretarias de educação de municípios e estados,
a incorporarem a temática em suas diretrizes, de maneira mais comprometida, para
assim chegar ao educador através da formação continuada.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a


Educação das Relações Étnicos-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e Africana. Brasília: MEC/CNE, 2004. Disponível em:
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Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização
e Diversidade, 2005. Disponível em:
<http://unesdoc.unesco.org/images/0014/001432/143283por.pdf>. Acesso em 12
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1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002;

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25 de junho de 2014 Aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras
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_____. Conselho Nacional de Educação. Lei nº 10.639/03. Brasília. MEC/CNE. 2003;
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Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil / Ministério da
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racista: caminhos abertos pela Lei federal nº 10.639/03. Brasília, MEC, Secretaria de
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<http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-content/uploads/2012/10/Alguns-termos-e-
conceitos-presentes-no-debate-sobre-Rela%C3%A7%C3%B5es-Raciais-no-Brasil-
uma-breve-discuss%C3%A3o.pdf>
Acesso em: 10 mai. 2017;
_____. Nilma Lino. Educação e Relações Raciais: Refletindo sobre algumas
estratégias de atuação. In: Superando o racismo na escola, 2ª Edição
Revisada/Kabengele Munanga, org. [Brasília]: Ministério da Educação, Secretária de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. Disponível em: <
http://ambientedetestes2.tempsite.ws/ciencia-para-educacao/publicacao/gomes-
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mec-2005-v-p-143-154/> Acesso em: 10 mai. 2017;

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RIBEIRO, Matilde. Apresentação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-brasileira e Africana. MEC/SEPPIR. Brasília. 2005;
SILVA, Ana Cláudia Xavier. Dissertação do Mestrado sobre Ludicidade na
Educação Infantil: uma estudo de caso em uma escola do município da Região
Metropolitana de Pernambuco. Sarandi-PR: FACNORTE, 2017.

482

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CURRÍCULO, SURDEZ E DIFERENÇA: SOBRE CÁLCULOS E MARGENS

Silvana Matos Uhmann – UFF | William de Goes Ribeiro – UFF

RESUMO: O currículo é tema de constantes problematizações, dentre elas a possibilidade


(ou não) da enunciação da diferença. O movimento pela Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) possibilita discussões no campo da educação, sobretudo ao problematizar os
discursos produzidos quanto à efetivação de uma parte comum e, outra, com a promessa
diversificada. Ao aproximar discussões com relação à surdez objetivando reafirmar a 483
existência da diferença, sempre entendida no devir, fora do cálculo e da normalidade,
apresenta-se o currículo como um lócus de jogos de poder na tentativa de instituir verdades
e conhecimentos a ser adquiridos universalmente, sob a discursividade de igualdade para
todos. Contudo, reiteramos a falsa ilusão pela busca de definições ou ações pré-
estabelecidas, organizadas, calculadas, mesmo por meio de uma base diversificada, mas a
necessidade de um currículo permanentemente flexível e receptível ao novo, à mudança, às
múltiplas possibilidades frente aos múltiplos sujeitos e realidades.
Palavras-chave: BNCC. Currículo. Surdez. Diferença.

INTRODUÇÃO

Não é novidade que o currículo costuma ocupar um lugar privilegiado nas


reformas educacionais em vários contextos nacionais nos últimos anos. No Brasil,
tem se articulado uma defesa pela centralização curricular como um caminho
inexorável rumo à qualidade da educação, sobretudo de acordo com modelos
internacionais.
Conforme diversos autores ressaltam (ALVES, 2014; MACEDO, 2014;
RIBEIRO e CRAVEIRO, 2017; FREITAS e RIBEIRO, 2018, dentre outros), o debate
remonta a uma antiga discussão que inclui vozes e movimentos dissonantes do
campo educacional que vem sendo obstaculizados no debate, por parte dos seus
defensores (cf. a linha de tempo da BNCC na página do Movimento pela Base).
Defensores da política, como a Fundação Lemann, insistem em tomar alguns países
como “inspiração”, o Chile, por exemplo. A nosso ver, tal produção de “modelos”
torna obscura uma série de questões, dentre elas a valorização docente e os planos
de carreira, uma das metas (17) do novo Plano Nacional de Educação (BRASIL,
2014). Consideramos tais aspectos indispensáveis para se discutir qualidade
educacional, assim como políticas públicas responsáveis, tal como enfatizam Alves

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(2014) e Macedo (2014). Além disso, explicitamos a diferença e a interculturalidade
como centralidade, algo que também é posto em questão ao analisarmos as
políticas de cunho nacional. Defendemos neste trabalho o argumento de que a
articulação da diversidade em tais propostas é estratégica, bem como a distinção da
política entre “parte central” (ou Base) e “diversificada”. Compreendemos como uma
forma de regulação que projeta a diferença para a margem, tal como defende
Macedo (2009), tomando como exemplo os Parâmetros Curriculares Nacionais
484
(PCN).
Neste texto, pretendemos argumentar que os silêncios desta política,
incluindo a surdez, dizem muito - como parte dela. Entendemos que tal silêncio é
constitutivo, isto é, diz respeito às demandas produzidas que estão postas em jogo,
focadas febrilmente em uma cultura de resultados a partir da qual se configura um
modelo de educação subsumido a ensino. Diferentemente, entendemos educação
como um processo intersubjetivo, a partir do qual se constitui um currículo, sempre
porvir. Esta não cabe em números, não se torna índice, não pode ser transformada
em moeda de troca e nenhuma política poderá, de maneira bem sucedida, prever
como cálculo. Trabalhando com pesquisadores do campo do currículo, sobretudo
Sandra Corazza (2003), Tomaz Tadeu da Silva (2002), Elizabeth Macedo e Alice
Casimiro Lopes (2011), ampliamos as possibilidades de sentido de educação, de
currículo e de diferença.
Considerando o exposto, começamos por ressaltar, neste ensaio, o campo de
debate em torno da surdez, como um elemento relevante para pensar a questão da
diferença, a qual compreendemos, a partir de um quadro teórico discursivo, pós-
estrutural e pós-colonial. Em tal quadro teórico, revemos o debate da diversidade
sob a ótica dos fluxos e do hibridismo (BHABHA, 1998), tomando a diferença como
prática discursiva e indispensável ao contexto escolar. Ou seja, esperamos enfocar
“o diferir” que antecede a identidade, quer dizer, jogar luz ao próprio processo
ambivalente e constitutivo da linguagem através do qual qualquer identificação é
produzida, sempre efeito performativo de elementos diferenciais a partir dos quais
atuam os jogos de poder. Estabelecemos, em seguida, uma leitura para currículo,
surdez e diferença, defendendo a dimensão hiperpolítica do debate, sem tomarmos
como absolutas as nossas, mas também nenhuma outra percepção. Não é a nossa

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proposta tecer uma meta de leitura e de análise, mas produzir uma abertura para
outros sentidos no campo. Assim, compreendemos que o nosso trabalho é parte do
jogo político, considerando que valores e posições em uma pesquisa precisam ser
constantemente revistos na relação com a alteridade.

OS SURDOS EM UM CONTEXTO DE EMANCIPAÇÃO DA DIFERENÇA

485
As discussões em torno da surdez apresentam contextos profícuos para
discutir a emancipação da diferença, sobretudo diante dos aspectos curriculares.
Isso porque a surdez está à frente de lutas políticas e educacionais que a
reconheçam na perspectiva da diferença, o que por sua vez tenciona propostas
curriculares tradicionalmente organizadas nas escolas.
Tradicionalmente, o currículo veio sendo pensado na centralidade de
concepções hegemônicas, discursivamente no objetivo de atingir a todos os alunos,
mas não necessariamente os contemplando. Um currículo fixo, pré-definido em
verdades que pouco eram contestadas. Aos surdos, muitas vezes eram pensadas
estratégias metodológicas de afirmação da deficiência auditiva e a necessidade de
atividades corretivas com relação à falta de audição - como treino auditivo, repetição
de treino oral - que, hegemonicamente, reforçava a necessidade de adequação à
maioria ouvinte. É como se o contexto estipulasse: caso o surdo não puder ser
‘curado’, que sobre ele fossem organizadas estratégias de correção a fim de o tornar
o mais próximo possível do aceitável, da regra, da norma - ouvinte.
O currículo nesta abordagem pode ser entendido como um dispositivo capaz
de constituir sujeitos e, no caso dos surdos, por muito tempo sob concepções de
deficiência. Ao entender que “todo currículo quer modificar alguma coisa em alguém,
o que supõe, por sua vez, alguma concepção do que é esse alguém que deve ser
modificado” (CORAZZA; TADEU, 2003, p. 38), entendemos que historicamente aos
surdos foram conferidas formas de governamentabilidade que, nas ideias de
Foucault (2005), apresenta a maquinaria escolar e suas artimanhas ao capturar e
normalizar os sujeitos. Em outras palavras:

Ao conceber um currículo, queremos que alguém passe a respeitar as leis


de trânsito, modifique sua atitude em relação à prevenção da Aids, torne-se
uma cidadã exemplar, transforme-se em uma trabalhadora produtiva. Da

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mesma forma, há uma série de pressupostos sobre a matéria sobre a qual
essas transformações se darão: processos mais ou menos conscientes;
matéria mais ou menos plástica; participação mais ou menos ativa; efeitos
de menor ou maior duração (CORAZZA e TOMAZ-TADEU, 2003, p. 38).

No entanto, a diferença “não pede tolerância, respeito ou boa vontade”, mas,


“desrespeitosamente, simplesmente difere” (SILVA, 2002, p. 66,). Ela é embaraçosa,
incômoda, pois nos põe de frente com um outro que não identificamos, não
podemos prever, definir ou enquadrar. Pelo contrário, traz à erupção um Outro que 486
historicamente foi produzido pelas malhas da discursividade Moderna e na
necessidade da mesmidade. Ou seja: “O outro em um único tempo, inscrito em um
único mapa, em uma única fotografia, em um único dia de festa do ano, o outro
condenado a uma única e última carteira” (SKLIAR, 2003, p.45). É nosso papel
tencionar a escola e a produção de um currículo que não “atropele” a diferença sem
que dê a ela possibilidades de existir. Nos perguntamos:

Será impossível a tarefa de educar na diferença? Felizmente, é impossível


educar se acreditamos que isto implica formatar por completo a alteridade,
ou regular sem resistência alguma, o pensamento, a língua e a
sensibilidade. Porém, parece atraente, pelo menos não para poucos,
imaginar o ato de educar como uma colocação, à disposição do outro, de
tudo aquilo que lhe possibilite ser distinto do que é, em algum aspecto. Uma
educação que aposte transitar por um itinerário plural e criativo, sem regras
rígidas que definam os horizontes de possibilidade (DUSCHATSKY;
SKLIAR, 2001, p. 137).

Tais tensionamentos nos fazem refletir sobre a hospedagem da diferença,


pois “hospedar um outro em uma pedagogia é cair em uma armadilha” (CAMATTI,
MORAES, p.5, 2014). Armadilha certeira que nos faz capturar, descrever e intervir
de formas diferentes a diferentes sujeitos, mas “por que devemos ter uma pedagogia
para negros, uma para índios, uma para surdos? Escola é escola para qualquer tipo
de raça, gênero, cor” (CAMATTI, MORAES, p.5, 2014). Estaria a escola apenas
querendo demonstrar a estética da sua hospedagem, mas pouco preocupada com
seus hospedes? (SKLIAR, 2003).
Ao que parece, a estética da hospedagem assegura-se nos aspectos éticos e
morais aos quais a inclusão é firmada e que não há possibilidade de contestá-la. No
entanto, sua teimosia em capturá-la para a enquadrar em uma norma, uma rotina,
uma metodologia, a transforma em diversidade, fácil de prever e caber em um único
currículo pensado e organizado previamente e sem a necessidade de revê-lo outras

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vezes. Ao currículo então, cabe a intenção de auxiliar na captura, adjetivação e
normalização da diferença. Sua estética apresenta um dia na semana para “o índio”,
para “o negro”, para a “pessoa com deficiência”, para “o surdo”, criando estratégias
para que sua diferença seja “tolerada”, “hospedada” e fixada pela normalidade como
diversidade, sempre em espaços pré-definidos, organizados e estruturados de
acordo com a norma e através de práticas previsíveis e de preferência longe de
questionamentos. É o que Santomé (1995) irá chamar de “currículos turísticos”. No
487
caso da surdez, sua inclusão:

(...) é mobilizada para as pessoas ouvintes adentrarem curiosamente no


mundo dos surdos, reconhecendo a sua língua e a sua cultura, porém
mantendo uma distância necessária que permite demarcar a fronteira entre
normalidade e anormalidade. Ou seja, uma distância segura a ponto de que
os surdos não se incorporem ao mundo dos ouvintes (CAMATTI, MORAES,
2014, p.14).

Assim, a diferença surda reafirma a necessidade de um currículo voltado para


o devir, para o improvável, o incerto, o existir independente do que se é. E, com isso,
a importância de estar aberto, flexível e receptível a ressignificações, (re)
organizações, (re) arrumações, afinal: “não há um currículo, que não abale as
próprias representações, arrastando-se até os seus limites, avesso ou fora. Não há
currículo que produza só invariantes. Não há um, que se repita, sem o fazer
diferentemente” (CORAZZA, 2012, p.02).

BNCC E “A PARTE DIVERSIFICADA DO CURRÍCULO”: POR QUE A


DIFERENÇA NÃO CABE NO CÁLCULO?

Como já foi dito, o processo de construção de uma BNCC no Brasil não é um debate
recente, mas ganha impulso com o novo Plano Nacional de Educação (2014-2024),
se dando em meio às turbulências políticas que têm gerado muitos debates,
embates e dúvidas, sobretudo após o impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
Embora a referida política curricular enuncie soluções ou mesmo caminhos
supostamente acertados – pela via do discurso em torno da garantia de qualidade e
de direitos de aprendizagem e de desenvolvimento, pairam questões ainda muito
obscuras, como as que envolvem outras políticas que não tem recebido a mesma
autoridade e enfoque, como a valorização docente e os planos de carreira dos

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professores, conforme já salientamos. Neste ensaio, defendemos especificamente
que a diferença não se restringe a um cálculo, o nosso enfoque - e que tal parte
diversificada da BNCC é uma política estratégica que reforça a centralidade de uma
concepção educacional reificada em uma Base.
Supõe-se um ficcional acordo generalizado e que se trata de um único e
homogêneo caminho, supostamente inquestionável. No entanto, uma questão que
ressoa a partir dos silêncios das propostas de centralização dos governos é: seria
488
mesmo necessária uma BNCC? (RIBEIRO e CRAVEIRO, 2017). Enquanto a
insistência em defesa da política centralizadora reitera que se trata de um processo
democrático que irá atender à luta contra a desigualdade e a favor da qualidade, nos
EUA, a cultura da testagem, a escolha da escola, a competitividade e a
responsabilização docente vem comprometendo a psique docente e restringindo o
currículo (TAUBMAN, 2009). A despeito da complexidade das distinções (sempre um
problema em comparações, o que gostaríamos de evitar) e a impossibilidade de
fechamento, a centralização e a padronização não reduziram as desigualdades entre
brancos e negros; entre pobres e ricos, o que provocou a mudança até mesmo de
quem era defensor da política (RAVITCH, 2011).
De qualquer forma, muitos acordos são supostos e elementos obliterados por
um afã pelo currículo– compreendido, não raras vezes, como um artefato a ser
produzido. Ou seja, um produto a ser construído com base na ideia de Base, dando
sequência à ideia de projetar uma identidade educada e desejada, conforme as
competências elencadas, cada vez mais próximas de outros documentos já
produzidos, como os PCN. Paradoxalmente, ao nos aproximamos mais de perto do
debate em torno dos sentidos “de base” e “de teto”, podemos compreender o
problema em dar tratamento supostamente “igual à diferença”, pleiteando alçar as
ditas melhorias, se tivermos clareza a respeito do que todos devem saber. Com isso,
transformamos o direito de aprender em dever de aprender o que está prescrito,
defendendo que se está atendendo à diversidade, à inclusão, à autonomia e à
democracia.
Nesse contexto, seria uma tarefa árdua e indubitavelmente parcial recuperar a
discussão crítica em torno da política curricular em questão, mas nos atrevemos, por
economia, a sintetizar alguns elementos que tem sido o mote da articulação em

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muitos contextos acadêmicos: 1) o debate em torno da metodologia de construção
da BNCC, sobretudo recentemente com o governo Temer, desconsiderando
elementos como a unidade da educação básica e a configuração de política de
Estado do CNE (AGUIAR, 2018), acelerando processos e descumprindo
mobilizações democráticas necessárias; 2) muitas críticas são tecidas a respeito de
questões como autonomia e valorização dos docentes neste processo; 3) outra
questão centra-se na discussão em torno da diversidade e da diferença (nem
489
sempre compreendida como intercambiáveis, mas aproximadas em alguns textos);
4) destacamos ainda as fragilidades em torno da relação público-privada, ampliando
os espaços para instituições e fundações de cunho mercadológico; 5) a significação
em torno da escola, da escolarização e do docente como o lugar da falta, da
incompetência, do fracasso, o qual a política irá “resolver”, contribuindo para
fragilizar ainda mais a relação do professor e do profissional da educação na
sociedade; 6) a desconsideração das experiências internacionais, dos debates
nacionais e internacionais no campo do currículo, insistindo em uma aproximação
com soluções simples em torno de prescrições que se supõe faltar ao professor.
Nesse contexto, defesa e critica se inserem de maneira ambivalente a partir
de processos de significação (LOPES e MACEDO, 2011), em análises e debates,
remobilizações discursivas e reconfigurações a respeito do que se espera para as
escolas. Trata-se de processos políticos nos quais este texto faz parte. Embora
articulada ao nome BNCC (CUNHA e LOPES, 2017), a política “em torno dos 40%
dos currículos” não recebe a mesma atenção e tem gerado o mesmo volume de
trabalhos (PEREIRA e SOUSA, 2016). Estamos nos referindo ao anúncio e aos
enunciados em torno da tal “parte diversificada”. Conforme as autoras citadas, o
debate em torno da diferença desloca-se no limite desta fronteira supostamente
calculável, (re) mobilizada pela BNCC (60%/ 40%). Embora a discussão em torno da
cultura e dos sentidos de cultura estejam ligadas à perspectiva de diferença,
lembremos que os sentidos para ambos são também produções discursivas.
Com a política em torno da PD dos currículos em relação à BNCC outra
estratégia – aparentemente distinta, mas bem semelhante – permanece deslocando
a diferença. Pereira e Sousa (2016) discutem as dificuldades desta política que se

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enuncia em “uma chuva” de problemas e sentidos obstaculizados. A BNCC funciona
como um dispositivo normatizador a partir do qual deverá haver adequação.
Ressaltamos que tal forma de pensar só é possível pelo sentido de cultura
calculável e previsto como “repertório de significados compartilhados” (LOPES e
MACEDO, 2011). Julgamos relevante nesta discussão lembrar ainda Derrida (2018)
quando este sinaliza que tratar da cultura, nomeando-a já é matá-la. Em outras
palavras, toda cultura já é uma “cultura da morte”, uma vez que se desconsidera a
490
alteridade bem como a dinâmica da mesma, subsumida em “uma retórica da
fronteira”, supostamente dada. Porém, para o filósofo, a aporia é constitutiva, não
havendo “puramente vida” e nem “puramente morte”; quer dizer, não há ausência de
cálculo e de morte, ou seja, de nomeações, definições, arquivos sobre uma cultura,
mas também não há só cálculo, apontando para a heterogeneidade de uma
identidade cultural.
Outro autor que contribui com a discussão é Homi Bhabha (1998), o qual
possibilita pensar a cultura como enunciação, a qual se dá por uma dupla dimensão:
a pedagógica e a performática. Para o autor, o discurso da diversidade é da ordem
da política, da ética, da etnologia comparadas. Trata-se de um enquadramento em
alguma medida já a priori que possibilita imaginar “identidades culturais”.
Diferentemente, o autor propõe pensar a cultura como significação, nos interstícios
ambivalentes que envolvem tanto a reiteração do pedagógico quanto o performático
em contextos circunstanciais que não estão dados (RIBEIRO, 2017).
Se compreendermos tais dinâmicas da cultura como um processo, se preferir
a aporia da vida-morte, isto é, envolvendo cálculo e abertura em uma relação de
ambivalência (abertura de sentidos, em movimento, mas também regulado pelo
cálculo, por aquilo que se espera ou pelo que se imagina possível como instituído
nesta ou naquela tradição, circunstancialmente), não há culturas puras, mas
híbridas, em interação constante. Nesse sentido, só há interculturalidade e
diferença. Definir uma cultura e suas fronteiras, portanto, já é por si só um ato de
poder. Assim, levando em apreço o debate em torno da alteridade, se trata sempre
de uma relação, com o Outro, nunca exatamente “o mesmo”, conforme explicita
Ribeiro (op. cit.). O Outro permanecerá um mistério, um enigma; já a projeção, uma

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fantasia. Se a diferença pudesse tornar-se cálculo (identidades previstas e
previsíveis), tal como a cultura, morreria.
Em suma, inferimos o seguinte: não há distinção possível entre Base e PD a
não ser como uma retórica ficcional de fronteiras que desloca a diferença para a
margem, prejudicando o debate em educação; a questão da interculturalidade é
política e não meramente epistemológica, se dá em múltiplos contextos; a diferença
entre culturas, no caso de surdas e ouvintes – dentre outras, se constitui como
491
enunciação, na ambivalência, como diferimento, não como meramente um cálculo,
como algo dado, apreensível tal como homogeneidades disponíveis à
racionalização; todo o volume de discussão em torno da Base tem silenciado a
questão da diferença surda, dentre outras, deslocando pensamentos das políticas
necessárias e responsáveis, pondo-a em um terreno difícil e postergado pela
ficcional PD dos currículos, uma política que se enuncia, mas que muito pouca
atenção vem recebendo; com a BNCC atendendo a anseios privatistas e agendas
neoliberais, passamos a lidar mais intensamente com a linguagem dos resultados,
supervalorizada por números, índices, metas, resultados. Este é o mote da
assimilação. A mensagem é para todos: o surdo terá então que igualmente se
adequar em um formato de inclusão-excludente no qual a cultura de referência é a
ouvinte, em uma relação de assimilação, embora, como aprendemos com os autores
anteriormente mencionados, a tradução seja impossível, fadada ao fracasso. Em
outras palavras, persiste o processo colonizador do outro, mas a dominação não tem
como ser completa, só é posta em ação porque é parcial.

CONCLUSÃO

Que currículo estamos dispostos a organizar? Currículo meramente


condizente com o ensino para uma suposta mesmidade? Ou aberto para a invenção
da própria diferença em meio aos seus contextos e relações? Estas inquietações
implicam entender os conhecimentos historicamente constituídos como necessários
ao currículo, as concepções de sujeito e subjetivações que se tem produzido, as
relações de poder por detrás das diferentes ações e entendimentos sobre a BNCC.
As mesmas inquietações ainda nos fazem refletir sobre a “necessidade de escapar

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dessa fixação primeira sobre o eu, dessa tentação de uma subjetividade partilhada
de maneira demasiadamente universal, aquela em que a busca sem saída da
identidade e a generalidade vazia se confundem” (SCHÉRER, 2005, p. 1186).
Ou seja, nossas preocupações voltam-se para a tentativa atual da produção
de um currículo universal, natural, verdadeiro, absoluto, do qual nenhuma parte
diversificada dará conta. Nosso papel é então problematizar políticas de
centralização curriculares que, mesmo fixando parte central e diversificada do
492
currículo, ainda podem estrategicamente tornar-se uma forma de regulação cultural.
E, a partir disso, a necessidade de modificar a subjetividade centrada no ‘eu’ para os
devires, múltiplos e singulares que acontecem fora do cálculo 60/40%, já descrito
anteriormente. Nosso interesse está em contestar a existência de princípios
universais capazes de garantir o acesso às verdades essenciais, práticas
totalizantes e, principalmente, na existência de um sujeito uno e de total
conhecimento.
Ainda, ao fabricar o currículo, somos não somente interpelados por ele, mas
também produzidos. O currículo que é um espaço de significação, também está
vinculado as nossas subjetividades, as subjetividades de quem os produzem e de
quem o recebe. Há um campo discursivo produzindo verdades constantemente, no
qual esse texto se insere. No entanto, ao nosso ver, verdades que não merecem ser
fixas, rígidas ou supervalorizadas, mas com objetivo de tencionar hegemonias e
apresentar a realidade fluida, intercultural e na perspectiva da diferença.
Contudo, não queremos fixar um modelo ideal de currículo, até porque
cairíamos na mesma tentação da diversidade e, sobretudo, de uma Base comum
e/ou sempre de exclusão, pois inevitavelmente deixará alguns de fora. O que
queremos é problematizar o quanto o currículo precisa estar constantemente aberto
ao porvir, sem se deixar iludir pela busca de definições ou ações pré-estabelecidas,
organizadas, calculadas, mas ser permanentemente flexível e receptível ao novo, a
mudança, as múltiplas possibilidades frente aos múltiplos sujeitos e realidades. Ao
nosso ver, qualquer tentativa fora desse entendimento é sinônimo de exclusão da
diferença e empobrecimento do que seria de fato currículo/educação de qualidade
para todos.

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O ENSINO DE HISTÓRIA NA CONTEMPORANEIDADE PELO VIÉS DAS
PRÁTICAS SAGRADAS INDÍGENAS: um estudo das fontes virtuais em
Pernambuco e na Paraíba

Roseane Maria de Amorim – UFPB | Rosângela Soares de Xavier – UFPB | Alba Cleide
Calado Wanderley – UFPB

RESUMO: Este artigo busca mapear e analisar as práticas sagradas indígenas tomando-as
como processos educativos que são passados de geração a geração. O estudo propõe, por
meio das fontes virtuais, desconstruir alguns conceitos preconcebidos sobre os povos 495
indígenas e suas culturas, desmistificando algumas de suas práticas através da análise da
nossa ancestralidade. A proposta é que a pesquisa possa contribuir com a educação básica
mostrando como os saberes desses povos podem repensar a educação escolar. O ensino
de História que conhecemos não nos proporciona a aproximação de nossa ancestralidade
nem a reflexão sobre ela. Na realidade, fazemos movimentos contrários, pois esses são
apresentados como inferiores sem nenhuma referência histórica com o qual possamos nos
identificar. Em termos metodológicos, a pesquisa é qualitativa, realizada por meio de fontes
bibliográficas e virtuais tais como vídeos, sites e blogs. Estamos filiados aos estudos
culturais que entendem os diversos modos de interpretar o mundo como formas de saberes
válidos para a transformação da realidade em que estamos inseridos.

Palavras-chave: Ensino de História. Práticas sagradas. Indígenas. Fontes virtuais.


Ancestralidade.

PARA INÍCIO DE CONVERSA

Estudar história e a relação das pessoas com o sagrado desperta em cada


um de nós curiosidade e inquietações. À medida que nos aprofundamos nas
temáticas por meio de pesquisas, entendemos como os fatos históricos são muitas
vezes distorcidos e interferem em nosso cotidiano, na forma como concebemos o
mundo (LINS, 2017). Percebemos a importância de nos aprofundarmos em
temáticas pouco estudadas mediante vários olhares ou perspectivas. Na história da
humanidade, muitos foram e continuam sendo os conflitos entre diferentes grupos e
desconhecimento sobre o contexto cultural e social de diferentes povos.
De acordo com Lins (2017, p. 11): “nossa formação escolar não nos prepara
para termos, como garante a Constituição de 1988: ‘pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania’ (BRASIL, 2016, art. 205).” Sendo
assim, cada vez mais ficamos frios e distantes do que realmente somos e nos
afastamos da essência humana.

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No dia a dia, os sentidos fragmentados, em meio a inúmeras tarefas e os
barulhos, advindos de todos os lugares, desorientam-nos e direcionam ao
imediatismo, além de uma gama de necessidades muitas vezes dispensáveis.
Estamos por demais ocupados para escutar, apreciar, reverenciar e viver. Perdemos
a conexão com aquilo que já fomos. Nossa inteireza foi fragmentada por ruídos
destoantes e frequências oscilantes.
A História que conhecemos e estudamos nos livros didáticos não nos
496
proporciona a aproximação com nossa ancestralidade indígena nem a reflexão
sobre ela. Tampouco o ensino religioso dado nas escolas proporciona a devida
reflexão. Na verdade, fazemos movimentos contrários, pois esses são apresentados
como inferiores sem nenhuma referência histórica com a qual possamos nos
identificar, seres distantes da nossa vida. Nesse sentido, indagamos: de que forma
as práticas sagradas indígenas podem ressignificar o ensino de História e como
seus saberes ajudam na construção de conhecimentos que nos permitam sermos
seres mais inteiros e integrados?
Metodologicamente, é um trabalho qualitativo, bibliográfico, com análise de
sites e blogs referentes ao estado de Pernambuco e da Paraíba sem deixar de fazer
conexões com a história do Brasil em sua totalidade. Para tanto, estamos analisando
como os povos indígenas utilizam os instrumentos musicais, seus diversos rituais e
sua cosmovisão sobre o mundo. Nosso intuito é desbravar caminhos que
possibilitem a quebra de antigos paradigmas e trazer novas contribuições para o
ensino de História e para a educação em sua integralidade. No primeiro momento,
estabelecemos um breve diálogo sobre o ensino de História na contemporaneidade
para depois adentramos a apresentação de alguns dados parciais que obtivemos até
agora.

O ENSINO DE HISTÓRIA NA CONTEMPORANEIDADE: DESAFIOS E


POSSIBILIDADES

Segundo Gondra e Schueler (2008), um dos objetivos da história é dialogar


com a experiência do outro. Em outras palavras, a história apresenta-se como
aquela que ajudará a expandir a experiência humana. Por isso, é necessário
combater o esquecimento, refletir sobre as lacunas existentes e, ao mesmo tempo,

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explorar a possibilidade de reflexão. A história pode ser escrita de diferentes
maneiras. Muitas vezes, o campo da historiografia adota marcos históricos em que a
sociedade é tomada em uma perspectiva homogênea, sem pensar na diversidade
de modos de vida e de formas de ser. Além disso, é possível dizer que a história não
é construída de forma linear, o mundo da experiência se dá por meio de idas e
vindas, de recuos, de contradições e conflitos diversos. Assim, analisar o que é dito,
o silêncio imposto exige entender que a história não é a história dos homens no
497
passado, e sim a história dos homens no seu tempo; e não se trata de uma
exposição apenas do passado ou do que foi contado sobre ele, o nosso olhar para o
presente interfere no questionamento sobre a realidade investigada (BLOCH, 2001).
O debate sobre o que e como ensinar História no Brasil não é novo. Desde os
primeiros momentos do processo de institucionalização da disciplina em nosso país,
especialmente a partir da segunda metade dos anos 1930 com a formação de
professores e professoras a partir das Escolas Normais, travamos intensas
discussões sobre tal questão. Nos anos 1980 e 1990, novos embates e
possibilidades são amplamente divulgados por diversos historiadores como Silva e
Freire (2014), entre outros autores que vêm discutindo esta problemática.
Pesquisas que tiveram como foco de trabalho o livro didático mostram a força
de um determinado modelo de organização curricular do ensino de História
marcadamente monucultural e eurocêntrica tendo como referência a cronologia
quadripartite de origem francesa.68 Em outras palavras, principalmente a partir do 6.º
ano do ensino fundamental, essa forma de organização do conhecimento não foi
rompida embora tenhamos grandes avanços no campo da pesquisa histórica
(ARAÚJO, 2015).
Dessa forma, é possível dizer que um desses grupos marginalizados em
nossa sociedade diz respeito aos povos indígenas. Os processos educativos vividos
por diversos grupos se deram no Brasil por meio de conflitos, de lutas diversas,
inclusive simbólicas, e ao mesmo tempo por diferentes tipos de resistência. Trazer
essas discussões para o âmbito da sala de aula é essencial, fazer com que o aluno
observe sua realidade e reflita sobre seus antepassados, é ponte para a construção
de valores culturais e históricos; afinal, um indivíduo informado é capaz de mudar

68
Estamos nos referindo à divisão da História em Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea.

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sua realidade social e a de outros. A importância da temática sobre esses povos nos
ajuda a resgatar nossas identidades no tempo e proporciona a ressignificação do
modo como olhamos para o outro e para nós mesmos. Vejamos o que diz uma
pesquisadora do campo da História.

Em vez de reforçar culturas e identidades de origem, resistentes à


mudança, mais ou menos ‘puras’ ou ‘autênticas’, proponho educar para a
compreensão e o respeito à dinâmica histórica das identidades
socioculturais efetivamente constituídas. Neste sentido, a história se
apresenta como disciplina-chave para construir esta possibilidade de 498
trabalho. (MATTOS, 2003, p. 129).

Na escola, conta-se narrativa sobre o outro e propõe reflexões seja por meio
da palavra escrita, seja por meio das imagens. Por isso, analisá-los no tocante à
problemática levantada é fulcral para a formação de um sujeito crítico e consciente
do seu papel na sociedade. Por outro lado, os licenciados devem aprender na sua
formação inicial que há muitas formas de contar sobre o passado, sobre os fatos e
sobre o outro.
Nem sempre nos estudos sobre História política se faz a crítica aos
problemas vividos, as contradições, os interesses dos diversos grupos sociais que
formam uma dada sociedade. Em outras palavras, a história narrada é vista e
pensada como resultado de sujeitos desinteressados. Todos nós sabemos que, no
passado como no presente, se busca reconhecimento, o domínio sobre o outro e
prestígio social. Sendo assim, não podemos desconsiderar esses elementos nas
aulas de História. Em nosso entender, a história produzida deveria ajudar-nos a
pensar e interpretar a realidade. Podemos dizer que o historiador junta os cacos
sobre o passado, buscando montar o quebra-cabeça em que a realidade passada se
encontra e está distante do pesquisador ou da pesquisadora.
O conteúdo histórico na sociedade brasileira nos remete a datas, fatos e feitos
de homens ligados à classe dominante. O positivismo se traduzia em uma
abordagem pedagógica de transmissão de conteúdos que usa como principal meio
de aprendizagem a memorização das informações.

Tais pressupostos, se presentes na disciplina História, marcam um processo


de ensino-aprendizagem onde o conteúdo histórico é veiculado
principalmente pelo texto-base ou pelo discurso do professor, tornando-se o
objetivo principal do ensino a recuperação de informações e a
memorização. (AZEVEDO; STAMATTO, 2010, p. 72).

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Os livros didáticos tornam-se um fornecedor de informações a serem
decoradas, sendo este a única linguagem a ser utilizada por professores do ensino
básico e no ensino superior os livros destinados ao campo de cada período histórico.
Por sua vez, no caso do ensino de História nas séries iniciais, ainda é mais
complicado, porque muitos professores e professoras acham que o mais importante
é ensinar a ler e escrever além do ensino das quatros operações. Não
499
compreendem que o ensino de História pode ajudar no processo de apropriação da
leitura e da escrita por parte dos educandos e ajudá-los na leitura do mundo. Por
outro lado no caso dos anos finais do ensino fundamental e Ensino Médio nem
sempre essas temáticas são discutidas com a criticidade que merecem.
Por meio do estudo das várias culturas, é que conseguimos compreender as
sociedades e as formas de ser e de viver de cada povo. Portanto, ao utilizarmos o
termo culturas estamos cientes de que há uma diversidade de formas de atuar no
mundo e de dar significados às coisas e aos acontecimentos, tanto no âmbito
individual como no âmbito coletivo. Em outras palavras, as culturas são plurais, são
diversificadas a partir dos diferentes modos de vida dos sujeitos e do processo de
construção da subjetividade de cada pessoa. Sendo assim, compreendemos que
pensar as práticas educativas sagradas de diversos grupos indígenas é de extrema
importância para pensar a educação hoje.
Por sua vez, Boas (2009) afirmou que as ideias existem por toda parte, mas
não da mesma forma, elas variam conforme as condições externas dos sujeitos,
como também em função de elementos internos, isto é, psicológicos de cada sujeito
ou grupos humanos.

Desse modo, reconhecemos que a suposição fundamental tão


frequentemente formulada pelos antropólogos modernos não pode ser
aceita como verdade em todos os casos. Não se pode dizer que a
ocorrência do mesmo fenômeno sempre se deve às mesmas causas, nem
que ela prove que a mente humana obedece às mesmas leis em todos os
lugares. (BOAS, 2009, p. 31).

Boas foi um dos pioneiros em mostrar o relativismo cultural. Ele mostrou


também que cada cultura segue os próprios caminhos em função dos processos
históricos traçados (LARAIA, 2002). Essa visão de Boas, de certa forma, rompeu
com o conceito de cultura originado do Iluminismo que associa a cultura a um

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processo secular geral de desenvolvimento e acaba por equivaler aos rumos
seguidos pelas sociedades europeias.
A partir dos estudos no campo da cultura, a História, enquanto ciência, ao
estudar as relações humanas ao longo do tempo passa a interpretar os documentos
de forma interdisciplinar. Esse fato proporcionou olhares para diferentes atores
sociais. A história, a partir desse momento, não é construída somente porque está
no poder. Todos nós somos sujeitos da História.
500
Enfim, o ensino de História, nessas últimas décadas, vem passando por um
processo de transformação que, muitas vezes, não é visível para os docentes. O
que consideramos importante sobre o passado é interpretado de outras formas, com
novas abordagens nas últimas décadas. Nesse sentido, um mesmo fato histórico é
visto de diversas formas dependendo do documento e da pergunta que o historiador
tem em mãos. Karnal (2003, p. 8) afirma algo parecido quando argumenta que “a
História está envolvida em um fazer orgânico: é viva e mutável”. Ainda segundo
Karnal (2003), não é só o fazer histórico que é mutável no tempo, o exercício
pedagógico também é. Embora a escola seja uma instituição social que muda de
forma muito lenta, os sujeitos históricos que estão envolvidos no processo
educacional como os professores, pais e alunos são outros e pertencem a um novo
tempo histórico. Entretanto, esse estudioso chama a atenção quando afirma que
mudar o ensino de História não conduz necessariamente à utilização de novas
tecnologias e de técnicas diversas. O que está por trás das mudanças é a
concepção que temos da História e de currículo (AMORIM, 2004).
Discutir sobre o sagrado nos povos indígenas ainda é algo muito intricado no
campo do ensino de História, principalmente em um país onde esses povos foram
dizimados. Mesmo com o avanço que tivemos, como a Constituição Federal, os
Direitos Humanos, o Movimento indígena (com suas histórias, conquistas e
polêmicas) e a Lei n.º 11.645/2008, ainda perduram na sociedade, e
especificamente nas escolas, a concepção de povos indígenas homogêneos do
século XVI, servindo como mão de obra, ou seja, para servir às vontades da classe
dominante (elite).
Infelizmente, os povos indígenas ainda sofrem os mais diversos tipos de
violência; além da violência física, por está excluído das condições de uma vida

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digna (direito a moradia, educação, saúde adequada) que nossa Constituição
garante, temos a violência psicológica e cultural. Bourdieu (2003) chamou de
violência simbólica.
A violência simbólica é essa coerção que se institui por intermédio da
adesão que o dominado não pode deixar de conceder ao dominante (e,
portanto, à dominação) quando ele não dispõe, para pensá-la e para se
pensar, ou melhor, para pensar sua relação com ele, mais que de
instrumentos de conhecimento que ambos têm em comum e que, não
sendo mais que a forma incorporada da relação de dominação, fazem esta
relação ser vista como natural; ou outros termos, quando os esquemas que
ele põe em ação para se ver e se avaliar, ou para ver e avaliar os
501
dominantes (elevado/baixo, masculino/feminino, branco/negro, etc.)
resultam da incorporação de classificações, assim naturalizadas, de que
seu ser social é produto. (BOURDIEU, 2003, p. 47).

Compreenda-se que essa violência está inserida em um contexto sutil de


exclusão social e cultural, isto é, mesmo não sendo visível quando comparada com
a violência física, impõe o processo de dominação. Isso se inicia desde cedo na
formação histórica e crítica dos sujeitos que estão inseridos na escola; trazemos
como exemplo um fator que reforça essa reprodução, o livro didático, tratado e
utilizado pela maioria dos professores como a única metodologia de ensino, e
quando não, eles reproduzem fielmente o que está nele, sem nenhuma reflexão e
indagação.
Diante disso, mesmo após a Lei n.º 11.645/2008, que constituiu a
obrigatoriedade do ensino de História da África e da Cultura Afro-Brasileira e a
cultura indígena, a invisibilidade continua a permear esse material; ainda que
apresentem diversas imagens dos indígenas, a sua relação com as suas práticas
sagradas, suas histórias e suas artes é pouco estudada.

ALGUNS RESULTADOS PARCIAIS DE FONTES VIRTUAIS ENCONTRADAS


SOBRE OS POVOS INDÍGENAS EM PERNAMBUCO E NA PARAÍBA

O estudo ora apresentado encontra-se filiado a uma pesquisa qualitativa


referente ao campo dos processos educativos, ligado especificamente ao ensino de
História e aos outros campos de saberes. Como não podia deixar de ser, estaremos
estudando as crenças, as representações e os dizeres produzidos pelas pessoas no
passado e presente por meio das fontes virtuais. Compreendemos que, de certa
forma, que a realidade do passado é quase inatingível. O historiador produz uma

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“ficção controlada” a partir da construção de sua narrativa, “compondo uma espécie
de ilusão ou versão sobre o passado” (PESAVENTO, 2003, p. 22). Pois o que
elaboramos sobre o passado é também uma produção cultural do homem e da
mulher no tempo presente. Sendo assim, estamos filiados à Nova História Cultural. A
cultura entendida como todo fazer humano tanto nos aspectos materiais como
simbólicos.
Nós a identificamos com a linha “História Cultural”, tendência historiográfica, a
502
qual afirma que um pesquisador é um detetive historiador que vai juntando as peças,
indo além das aparências e das primeiras impressões; “é preciso recolher os traços
e registros do passado, mas realizar com eles um trabalho de construção,
verdadeiro quebra-cabeças ou puzzele de peças, capazes de produzir sentidos.”
(PESAVENTO, 2003, p. 64). É pelas múltiplas combinações entre a análise das
fontes virtuais, os estudos bibliográfico e a contextualização histórica que
tentaremos fazer um estudo aprofundado com o objetivo de promover uma reflexão
acerca desses materiais no tocante à cosmovisão dos diferentes povos indígenas.
Em termos metodológicos, podemos afirmar que nesse primeiro momento de
pesquisa iniciamos a revisão da literatura referente à produção sobre os povos
indígenas e ao ensino de História. Começamos a buscar algumas fontes virtuais no
Brasil e nos estados estudados sobre a temática em tela conforme segue no quadro
que segue69:

69
Temos outros quadros com diversos blogs e site. Devido ao tamanho do artigo não foi possível
trazer neste trabalho.

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Quadro 1 – Fontes virtuais pesquisadas
Instrumentos sagrados

E
Link dos sites/blogs Descrição geral Instrumentos Significados Etnias
Estado

Vídeos nas aldeias: Um projeto precursor na área de produção audiovisual


http://www.videonasaldeias.or indígena no Brasil, com objetivo de apoiar as lutas dos
P
g.br/2009/index.php povos indígenas para fortalecer sua identidade e seu
PE
- - Várias etnias 503
patrimônio territorial e cultural através de recursos
audiovisuais. O projeto é realizado em Pernambuco

Flauta de grande importância para


os Enawenê-Nawê/
Povos Indígenas do Brasil: Blog criado com o intuito de transmitir conhecimentos MT, utilizada em rituais sagrados.
http://povosindigenasdobrasil. da cultura indígena para todos que por Flauta Enawenê-
GO Tem seu local específico dentro da
blogspot.com/2014/10/a- curiosidade/apreço desejem aprender mais sobre os Enawenê-Nawê Nawê/MT
aldeia, a Casa das Flautas. Estão
musica-indigena.html. povos originários da nossa terra intimamente ligadas a seres do
subterrâneo na formação dos clãs
dos Enawenê-Nawê

Povos Indígenas do Brasil: Instrumento de percussão, seu som


http://povosindigenasdobrasil. Blog criado com o intuito de transmitir conhecimentos
é semelhante ao barulho da chuva,
blogspot.com/2014/10/a- da cultura indígena para todos que por Enawenê-
GO Pau-de-chuva é muito utilizado em rituais de cura
musica-indigena.html curiosidade/apreço desejem aprender mais sobre os Nawê/MT
ou que envolvam o xamanismo em
povos originários da nossa terra.
geral

Povos Indígenas do Brasil: Considerado sagrado pelos


http://povosindigenasdobra Blog criado com o intuito de transmitir
indígenas e indispensável no
sil.blogspot.com/2014/10/a conhecimentos da cultura indígena para todos Enawenê-
GO Flauta Uruá ritual do Kwarup, a despedida
-musica-indigena.html que por curiosidade/apreço desejem aprender Nawê/MT
dos mortos realizada no Alto
mais sobre os povos originários da nossa terra.
Xingu.

Blog criado pelo líder Potiguara Sandro Gomes


https://indiospotiguaradapb Barbosa com a intenção de estar sempre
emfoco.wordpress.com/ PB - - Potiguaras.
informando tanto as tribos quanto a população
em geral

Fonte: As autoras.

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Fonte histórica é tudo que o homem e a mulher produziram a partir da
sua interferência, podendo assim mediar um acesso para a compreensão entre
o passado e o presente por meio de pesquisas em que o historiador conseguirá
analisar suas indagações. Existem diferentes tipos de fontes históricas. As
tradicionais são os documentos textuais, registros cartoriais, obras literárias,
etc. Incluem também documentos arqueológicos. Além disso, temos as fontes
verbais e orais, provas colhidas por meio de testemunhos de entrevistas
realizadas pelos historiadores. Em nosso trabalho, estamos pesquisando em 504
diferentes documentos que estão disponíveis em blogs, sites, etc. Tendo como
foco o que é considerado sagrado para os povos indígenas. O sagrado aqui
não está relacionado com a religião, e sim com a relação da pessoa com a
vida, a natureza e consigo mesmo.
O que temos analisado é que há muitos sites e blogs produzidos por
terceiros sendo bastante repetitivos. Porém, os vídeos denominam-se
produzidos por indígenas. O sagrado para o indígena está em todas as
instâncias, é indissociável da vida e da morte. Criando um equilíbrio.
O site www.indioeduca.org é de produção indígena com parceria da
sociedade civil com mais de 200 artigos. Ele tem o objetivo do resgate da
cultura indígena. O que chamou a nossa atenção foi a frase: “alguns dos idosos
da comunidade foram morrendo, levaram seus conhecimentos.” Essa frase traz
a dimensão da importância que este artigo tem, o peso da nossa pesquisa para
manutenção da cultura e intercâmbio de saberes entre os indígenas e não
indígenas. Tentando minimizar os desrespeitos à cultura indígena, a ONG
Thydêwá criou uma plataforma on-line para que os índios desenvolvam
materiais didáticos que contêm sua história e atualidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conhecer como os sagrados estão articulados com a vida desses povos


não é somente uma questão histórica, mas também uma questão identitária,
pois somos descendentes desses povos.

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A sistematização e organização dos dados poderão instigar novos
pesquisadores a se debruçarem sobre tais discussões e ajudar a esclarecer
lacunas sobre esses povos. Nessa perspectiva, podemos recuperar ações de
pessoas (anônimas) que fizeram história para além das ações do Estado. É
preciso conhecer melhor a história de grupos que, ao longo da história,
estiveram sempre em situação de vulnerabilidade. Há uma necessidade de
romper com uma história factual e linear, por isso, esta pesquisa é um
elemento-chave para entender melhor como o ensino de História vem sendo 505
ministrado no Brasil, no estado de Pernambuco e da Paraíba.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Roseane Maria. As implicações dos parâmetros curriculares


nacionais para a prática pedagógica dos professores de História do
ensino fundamental da rede municipal do Jaboatão dos Guararapes. 2004.
250 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em
Educação, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2004.

ARAÚJO, Chintia. O trabalho de tradução no saber histórico escolar: diálogos


interculturais possíveis. In: MOREIRA, Antônio Flávio; CANDAU, Vera Maria
(Org.). Currículos, disciplinas escolares e culturas. Petrópolis: Vozes, 2015.
p. 126-159.

AZEVEDO, Crislane Barbosa de; STAMATTO, Maria Inês Sucupira.


Historiografia, processo ensino-aprendizagem e ensino de História. Revista
Metáfora Educacional, on-line, v. 9, p. 70-89, dez. 2010.

BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de


Janeiro: J. Zahar, 2001.

BOAS, Franz. Antropologia cultural. Rio de Janeiro: J, Zahar, 2009.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 6. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,


2003.

GONDRA, José Gonçalves; SCHUELER, Alessandra. Educação, poder e


sociedade no Império brasileiro. São Paulo: Cortez, 2008.

KARNAL, Leandro. História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas.


São Paulo: Contexto, 2003.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro:


J. Zahar, 2002.

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LINS, Silvana Régia de Oliveira. Legitimando saberes: as práticas sagradas
indígenas como processo educativo. 2017. 54 f. Trabalho de Conclusão de
Curso (Graduação em Pedagogia) − Universidade Federal de Alagoas, 2017.

MATTOS, Hebe Maria. O ensino de História e a luta contra a discriminação


racial no Brasil. In: ABREU, Martha; SOIHET, Rachel (Org.). Ensino de
história: conceitos, temáticas e metodologia. Rio de Janeiro: Casa da Palavra,
2003. p. 127-136.

PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e história cultural. Belo Horizonte:


506
Autêntica, 2003.

SILVA, Denise Shirlei da; FREIRE, Eleta de Carvalho. Contribuições do texto


literário para aprendizagem dos conhecimentos históricos por crianças
dos anos iniciais do ensino fundamental. 2014. 27 f. Trabalho de
Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) – Centro de Educação,
Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2014.

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OS CONTEXTOS DAS PRÁTICAS SOCIAIS NO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA E AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS

Maria José Almeida do Nascimento70

RESUMO: Este trabalho discute a importância de desenvolver contextos significativos


para os povos indígenas na aprendizagem da Matemática no Ensino Básico. Trata-se
de um recorte de discussões que temos levantado, ainda em fase de desenvolvimento,
a partir de pesquisa realizada sobre os tipos de contextos nos livros didáticos de
Matemática do Ensino Médio. A relevância do ensino da Matemática nas escolas de 507
Ensino Básico é indiscutível no intuito de que os educandos desenvolvam habilidades
matemáticas que lhes propiciem maior autonomia em suas práticas sociais. O
processo de aprendizagem da Matemática, no entanto, tem se constituído um desafio
que tem levado educadores a procurar alternativas que favoreça a aproximação dos
estudantes com os conceitos matemáticos. Nessa ótica a contextualização da
Matemática tem ocupado um papel de destaque. Nesse sentido buscamos refletir os
contextos das práticas sociais considerando o público de estudantes que estão
envolvidos no processo de aprendizagem da Matemática no Ensino Básico.

PALAVRAS-CHAVE: Contextos. Matemática. Grupos indígenas.

INTRODUÇÃO

As discussões sobre a contextualização da Matemática não são recentes.


Documentos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais abordam a
importância de um ensino contextualizado (BRASIL, 1998, 2010).
Partimos de categorias de análise que mostram os contextos presentes
nos livros didáticos como sendo os contextos das práticas sociais, os contextos
de outras áreas do conhecimento escolar e contextos da própria Matemática
(NASCIMENTO, 2009).
Focamos os contextos das práticas sociais e levantamos algumas
questões quando nos detemos nos grupos de estudantes indígenas. Esses
tipos de contextos apresentados nos livros, em sua maioria, não expõem
situações que contemplem esses grupos ignorando seu pertencimento à
sociedade brasileira, que se caracteriza pela diversidade étnico-racial e social.
Nesse caso, temos o comprometimento da aprendizagem dos conceitos

70
Mestre em Educação, professora da Secretaria de Educação de Goiana/PE-
almeidamariajose@bol.com.br

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matemáticos, que estão veiculados em contextos que ‘falam’ pouco aos citados
grupos étnicos. Eles deixam de favorecer a aprendizagem dos conceitos de
uma disciplina que é muitas vezes motivo de ogeriza pelos estudantes no
Ensino Básico, uma vez que se afastam de contextos que apresentam
significado diante das suas vivências. De maneira mais abrangente, a escola
de Ensino Básico compromete sua função na formação de cidadãos quanto à
aprendizagem das habilidades matemáticas básicas que garantem autonomia
em resolver problemas matemáticos no cotidiano e também perpetuam um 508
cenário no qual os indígenas não se sentem representados em nossa
sociedade.

OS CONTEXTOS ABORDADOS NO ENSINO DA MATEMÁTICA NO ENSINO


BÁSICO

A fim de refletirmos a importância de promover um ensino da Matemática


contextualizado nos remetemos à origem etimológica da palavra contexto. Essa
palavra vem do latim contextus, que significa ‘um conjunto de circunstâncias
que cercam e esclarecem um fato’ (XIMENES, 2001, p.232). Assim, sempre
teremos um contexto, pois um fato nunca é isolado, mas está situado numa
conjuntura que o justifica e o influencia. Nesse sentido destacamos que o ponto
crucial ao contextualizar a Matemática reside no tipo de contexto que é
priorizado e no papel que esse desempenha na construção dos conceitos. A
partir dessa perspectiva defendemos que é essencial usarmos contextos
significativos no universo de nossos educandos. E preciso, então, que
consideremos que a Matemática pode ser explorada com o uso de contextos
diversos.
A ideia de contextualizar a Matemática está associada, muitas vezes,
apenas a conexões estabelecidas entre a Matemática e o cotidiano. Nesse
sentido autores como Santo e Silva (2004) e Godoy (2002) apontam que
professores têm compreendido a contextualização apenas na perspectiva do
cotidiano. Por sua vez, esse entendimento da contextualização como uma
possibilidade apenas com contextos voltados para situações reais do cotidiano

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do educando reserva à Matemática um ‘sentido prático’, restringindo-a como
corpo de conhecimento sistematizado. A dimensão utilitária alcançada pelos
conceitos matemáticos, nesse caso, é insuficiente no ensino da Matemática
(NASCIMENTO, 2009).
Segundo Gitirana (2004), os contextos no ensino da Matemática são os
mais diversos: contextos de outras áreas do conhecimento escolar; contextos
históricos da Matemática; contextos sócio-culturais; contextos econômicos;
contextos políticos; contextos do cotidiano extra-escolar e contextos da própria 509
Matemática.
Quando da interação entre as disciplinas ou áreas específicas estamos
nos referindo aos contextos usados no ensino da Matemática que trazem
conhecimentos, por exemplo, da Geografia, Física, Química, Biologia, Artes,
etc.
Ressaltamos que na abordagem interdisciplinar ampliam-se as
possibilidades dos tipos de contextos usados no ensino da Matemática. A
interdisciplinaridade favorece o diálogo entre as várias áreas do conhecimento
escolar, conduzindo-nos à compreensão do conhecimento como algo
articulado, sem fragmentações (FAZENDA, 1979).
A Matemática também pode oferecer contextos para a aprendizagem de
seus próprios conceitos. Em relação aos contextos da própria Matemática
aludimos à utilização de outros conteúdos matemáticos que não o selecionado
para ensino como também ao próprio conteúdo em estudo.
Os contextos ligados ao cotidiano dos alunos, ressaltados em nossa
reflexão, devem ser valorizados, priorizando o que é significativo em suas
práticas em família, escola, trabalho, etc., ou seja, em seus envolvimentos
sociais. Para entendermos a importância dos contextos ligados a práticas
sociais recorremos a Teoria Significativa de Ausubel. Essa teoria defende a
construção do conhecimento pautada em seu significado para o educando. Ele
reconhece que a interação só é possível quando a nova informação relaciona-
se com um aspecto da estrutura dos esquemas cognitivos já construídos, ou
seja, dos conhecimentos prévios. Os conceitos podem ser apropriados à

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medida que os conhecimentos prévios funcionam como base para os novos
conhecimentos (MOREIRA, 1999).
Destacamos que em meio aos atuais desafios para a superação das
dificuldades encontradas no ensino e aprendizagem da Matemática, o livro
didático continua em evidência. É notório como ele é utilizado de forma
marcante pelos professores de Matemática, veiculando os conceitos e
definindo, muitas vezes, a forma como os mesmos são trabalhados nas aulas.
Em face da influência do livro didático no trabalho do professor concordamos 510
com Belfort (2003), quando ela alude ao uso adequado desse recurso didático.
Para essa autora o uso adequado do livro texto implica a capacidade tanto da
utilização de outros livros textos, como também a capacidade de mudar a
abordagem de algum conteúdo sempre que a situação exigir. Assim, é preciso
considerar também que contextos estão sendo desenvolvidos nos livros que
servem de apoio ao professor durante as aulas de Matemática.

OS POVOS INDÍGENAS BRASILEIROS E A DIVERSIDADE DE SUAS


PRÁTICAS SOCIAIS

A análise dos tipos de contextos nos livros didáticos de Matemática do


Ensino Médio que desenvolvemos tem nos direcionado para outras pesquisas
relacionadas à temática, como o processo de aprendizagem da Matemática
priorizando os contextos das práticas sociais dos sujeitos. Por sua vez, também
temos nos inquietado sobre o respeito às identidades dos povos indígenas
brasileiros. Dessa forma temos procurado conhecer esses grupos e como os
mesmos são retratados em nossa sociedade.
O Brasil, conforme dados do IBGE 2010 (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística) apresenta uma população de 896 917 indígenas. Estudos indicam
a existência de mais de 230 grupos indígenas, com aproximadamente 180
línguas diferentes da língua portuguesa sendo faladas por eles. Algumas
dessas línguas são faladas por milhares de indígenas, como é o caso do
guarani, e outras são faladas por minorias, correndo o risco de desaparecer,
como o guató (SILVA E COSTA, 2018. p.25).

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As populações indígenas estão localizadas em diferentes regiões do
Brasil. A Amazônia é a região brasileira que mais concentra esses povos, além
de possuir grupos que têm pouco ou nenhum contato regular com os não
indígenas. Elas representam 40% da população indígena brasileira. E nessa
região que se observa também uma maior diversidade indígena. O Centro-Sul
possui a segunda maior população indígena brasileira, correspondente a 36%
do total. O Nordeste, por sua vez, apresenta o menor contigente de indígenas,
localizados em áreas e urbanas (SILVA E COSTA, 2018. p. 28-33). 511
Ainda hoje se conhece pouco da diversidade sociocultural das sociedades
indígenas brasileiras. Visões equivocadas são propagadas, como a de uma
identidade social coletiva genérica, que ignora as especificidades dos diversos
grupos (SILVA E COSTA, 2018, p. 34).

Durante séculos, os indígenas foram perseguidos, oprimidos,


violentados e seus saberes ficaram desconhecidos,
silenciados, recusados e desdenhados pelos poderes
instituídos no país. Contudo, desde a Constituição de 1988, os
direitos dos povos originários foram consolidados no novo
enquadramento pluriétnico e intercultural da sociedade
brasileira. As populações indígenas passaram a ser
reconhecidos como sujeitos capazes de autodeterminação e de
protagonismo em respeito aos seus valores e interesses
culturais específicos. Supera-se o modelo da incorporação dos
grupos indígenas à sociedade nacional (BERGAMASCHI,
DALLA ZEN E XAVIER, 2012, p. 18).

A APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA COM A VALORIZAÇÂO DOS


CONTEXTOS DAS PRÁTICAS SOCIAIS

Ao priorizarmos a aprendizagem da Matemática focando os contextos


das práticas sociais na exploração dos conceitos matemáticos buscamos
embasamento na Etnomatemática.
Para entendermos o alcance da Etnomatemática, é importante que
olhemos a Matemática sob duas perspectivas, conforme discute D’ Ambrósio
apud Velho e Lara, (2001, p. 4), a Matemática formal e a Matemática informal.
A Matemática formal é aquela praticada na escola, enquanto que a Matemática

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informal é aquela realizada pelos grupos sociais específicos, como sociedades
tribais nacionais, classes de profissionais, pela diversidade de grupos
indígenas. A Matemática informal, por sua vez, ramifica-se na diversidade
cultural, na mistura de saberes diferenciados oriundos das trocas de
experiências.
A partir da perspectiva da Matemática informal podemos compreender o
sentido da Etnomatemática. D’Ambrósio (1990, p. 5) ressalta o entendimento
dessa palavra a partir de sua etimologia. Etno refere-se ao contexto cultural e 512
compreende linguagem, jargão, códigos de comportamento, mitos e símbolos.
Matema é uma raiz que vai à direção de explicar, conhecer. Tica, é a arte de
explicar, conhecer, de entender os diversos contextos culturais.
Sob a ótica da Etnomatemática buscamos refletir a importância da
abordagem dos contextos das práticas sociais no processo de aprendizagem
da Matemática. De maneira geral, esses tipos de contextos não são os mais
presentes nos livros didáticos (NASCIMENTO, 2009, p. 95).
É importante destacarmos que quando refletimos a exploração de
contextos das práticas sociais que tenham significado na cultura indígena
estamos partindo da possibilidade de indígenas inseridos em espaços
escolares não indígenas. Destacamos isso, pois tem sido notório a luta de
grupos indígenas para o direito a educação escolar em seus próprios espaços
pautada em seus princípios. Nas últimas décadas, diferentes experiências de
organização escolar indígena forma surgindo em várias regiões do Brasil,
representando um grande avanço nas lutas dos movimentos indígenas na
sociedade brasileira pelo respeito às suas culturas e projetos de vida
(BERGAMASCHI, DALLA ZEN E XAVIER, 2012, p. 37). A criação dessa
categoria de escola evidencia a superação do modelo de escola planejada e
direcionada por não indígenas, a despeito da localização em espaços das
comunidades indígenas.
O cenário atual de lutas das sociedades indígenas após séculos de
opressão e indiferença aos seus direitos mostra a resistência desses povos e o
fortalecimento de suas epistemologias que foram negadas por uma
epistemologia dominante (SANTOS; PINHEIRO; FERREIRA 2014, p. 40).

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Nossa reflexão está pautada na condição de indígenas, que mesmo
assumindo suas raízes culturais, estão frequentando ambiente escolar não
indígena. Neste ponto levantamos a importância da valorização da diversidade
étnico-cultural nas escolas não indígenas. Temos feito o questionamento sobre
que é apresentado aos estudantes do Ensino Básico durante as aulas, seja o
que aparece nos livros ou o que o professor veicula em seus discursos, em
relação à diversidade. Mais especificamente, nas aulas de Matemática, como
estudantes indígenas e não indígenas trabalham os conceitos matemáticos em 513
contextos das práticas sociais.
Defendemos que a valorização e o respeito pela diversidade étnico-
cultural de nossa sociedade precisam envolver todo o trabalho escolar. Isso
inclui não apenas as aulas de disciplinas como História, Sociologia e Filosofia.
Isso também abarca o ensino da Matemática, compreendendo o que é
apresentado nos livros, nas atividades propostas e nas discussões que o
professor conduz durante suas aulas. Nessa perspectiva a visibilidade dos
povos indígenas precisa ser discutida.
Diante da importância dos contextos das práticas sociais a serem
priorizados na aprendizagem de habilidades matemáticas, gostaríamos de
ressaltar a relação de identidade com o saber, conforme Charlot (2000, p. 72).
Nesse sentido, aprender faz sentido a partir da história do sujeito, das suas
expectativas, de sua concepção de vida e de suas relações com os outros.
Nessa reflexão também consideramos as discussões a partir das
Epistemologias do Sul (SANTOS, MENEZES, 2010). Nessa perspectiva há o
rompimento com a universalidade conferida à Ciência. Esse campo teórico-
filosófico possibilita novos contextos para as ciências, tornando-as significativas
para diversos contextos socioculturais.
Sabemos que são muitos os desafios que a escola de ensino Básico no
Brasil precisa assumir no sentido de garantir aos educandos a aprendizagem
de habilidades básicas que lhes propiciem autonomia em seus espaços de
convívio. Nesse sentido é urgente quebrar modelos de ensino pautados numa
suposta superioridade de culturas.

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Por sua vez, as intensas lutas dos povos indígenas vêm lhes conferindo
espaço junto às políticas públicas, estabelecendo um movimento de
reconhecimento e valorização de suas identidades. Nesse sentido, a escola
pode ser uma aliada na tentativa de recuperar as dimensões ontológicas
dessas sociedades, retornando as elas os direitos de decidir. Dessa forma a
escola precisa estar alicerçada nas perspectivas dos diferentes contextos
específicos. Contudo, apesar dos avanços, sabemos que as políticas públicas
existentes nem sempre são efetivadas. Isso evidencia o resultado das relações 514
de poder que historicamente beneficiam o dominador. As minorias oprimidas
terminam sendo inferiorizadas e submetidas aos interesses daqueles que
detêm maior poder (SANTOS; PINHEIRO; FERREIRA 2014, p. 36-37).
É preciso, então, um novo olhar para que os contextos das práticas
sociais dos povos indígenas tomem lugar nas escolas não indígenas nas aulas
de Matemática, buscando facilitar a aprendizagem de conceitos matemáticos e
também assegurar o reconhecimento desses povos em nossa sociedade.
Finalmente, ressaltamos outra dimensão da inclusão de contextos das
práticas socais dos indígenas nas práticas escolares não indígenas. É preciso
que nossa sociedade, numa forma mais ampla, perceba que seus modos de
viver não são os únicos possíveis, nem tampouco os mais adequados. O
cotidiano escolar deve fomentar práticas que possibilitam aos estudantes a
compreensão de que não existe cultura superior ou inferior, e sim culturas
diferentes que devem ser respeitadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossas reflexões acerca de contextos das práticas sociais na


aprendizagem da Matemática pelos povos indígenas nos conduzem a ampliar
nosso olhar sobre a construção do conhecimento a partir de uma concepção
que supere a tradicional forma de conhecimento. Nossa investigação está em
fase inicial, contudo temos adentrado no estudo da cultura indígena e temos
sido surpreendidos com a riqueza que esses povos têm a compartilhar com a
sociedade não indígena. Entendemos que precisamos conhecer o modo de

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viver dos grupos indígenas para podermos analisar o que é veiculado nos livros
e nos debates na escola. Nesse sentido é preciso o rompimento com certos
paradigmas que rejeita o conhecimento proveniente de grupos que ao longo de
nossa história foram excluídos e considerados inferiores na ótica de uma
sociedade alheia à importância de valorizar sua diversidade étnico-racial e
cultural.

515
REFERÊNCIAS

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UM OLHAR SOBRE A EDUCAÇÃO ESCOLAR QUILOMBOLA
COMO POLÍTICA CURRICULAR NAS PRODUÇÕES CIENTÍFICAS DA
ANPED

Almir João da Rocha | Janssen Felipe da Silva

RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo elaborar um levantamento dos


trabalhos acadêmicos publicados na Associação Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Educação (ANPED) mais especificamente o Grupo de Trabalho (GT) 21
– Educação das Relações Étnico -Raciais. O período de levantamento das pesquisas
compreende os anos 2013 a 2017. O trabalho insere-se na pesquisa de monografia 517
(em andamento) sobre políticas educacionais antirracistas para os palenques da
Colômbia. Nesse sentido, buscamos compreender como estão sistematizadas as
discussões acerca das políticas públicas da Educação Escolar Quilombola no GT 21.
Para realizarmos a análise do levantamento proposto, tomamos como base teórica a
Análise de Conteúdo proposta por Bardin (1997, p. 95) que se organiza em torno de
três pólos cronológicos: 1) a pré-análise; 2) a exploração do material; 3) o tratamento
dos resultados. E como referencial teórico-metodológico a Teoria do Estudos Pós-
Coloniais, sob as inferências de Quijano (2005), Walsh (2008) e Grosfoguel (2007). Os
resultados apontam que mesmo sendo evidenciadas produções científicas com
descritor Educação Escolar Quilombola neste trabalho, ficou nítida a presença de um
silenciamento sobre este descritor, isso denota um racismo epistêmico e a
determinação da geopolítica do conhecimento.

Palavras-chave: Educação Escolar Quilombola. Comunidades quilombolas. Políticas


afirmativas. Currículo. Educação para a diferença.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é fruto de inquietações estabelecidas na monografia


(em andamento) intitulada: Políticas educacionais antirracistas, direcionadas
para as comunidades palenques (termo símile aos quilombos no Brasil),
presentes nas legislações da Colômbia. Essas inquietações surgiram no
momento em que vislumbramos poucos trabalhos voltados para nossa
temática, bem como para os quilombos e comunidades quilombolas no Brasil.
Nele, buscamos realizar um levantamento dos trabalhos acadêmicos
publicados pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação (ANPED), mais especificamente o Grupo de Trabalho (GT) 21 –
Educação das Relações Étnico - Raciais. Assim, buscamos compreender como
estão sistematizadas as discussões acerca das políticas públicas da Educação
Escolar Quilombola.

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Para isso, foram analisados os trabalhos publicados entre a 36ª e 38ª
reuniões, o que compreende as pesquisas apresentadas a partir do ano de
2013 ao ano de 2017. A justificativa por esse marco temporal está pautada no
fato do ano de 2013, ter completado dez anos da promulgação da Lei
10.639/03 (Lei que alterou a LDB (9.394/96) para incluir no currículo oficial da
Rede de Ensino, a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-
Brasileira).
E que no ano de 2012, a Câmara de Educação Básica (CEB) do 518
Conselho de Educação (CNE) instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica. Assim, esse marco
temporal permite uma maior produção acadêmica sobre as discussões da
nossa temática.
Nesse sentido, para realizarmos a análise do levantamento proposto,
tomamos como base teórica a Análise de Conteúdo proposta por Bardin (1997,
p. 95) que se organiza em torno de três pólos cronológicos: 1) a pré-análise; 2)
a exploração do material; 3) o tratamento dos resultados. E como referencial
teórico-metodológico a Teoria do Estudos Pós-Coloniais, sob as inferências de
Quijano (2005), Walsh (2008) e Santos (2007).
Para além da introdução, este trabalho está organizado da seguinte
forma: b) a Abordagem teórica dos Estudos Pós-Coloniais; c) Educação
Escolar Quilombola; e) análise do levantamento das publicações da ANPED e
a conclusão.

ABORDAGEM TEÓRICA DOS ESTUDOS PÓS-COLONIAIS

A abordagem dos estudos Pós-Coloniais nos condiciona, a entender a


relação de submersão imposta pelo padrão eurocêntrico de dominação
estabelecido nas colônias, ou seja, um padrão de poder capaz de silenciar a
voz dos colonizados durante o período das “descobertas” e que se mantem
como o legitimador do poder, do ser e do saber sobre os dominados,
transformando-se em um novo modelo hegemônico denominado por
“colonialidade/modernidade” (QUIJANO, 2005).

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Através dessa abordagem entendemos que, o processo de colonização
não se findou com a emancipação política das colônias latino-americanas, pelo
contrário, seu padrão de dominação foi ressignificado, rompeu-se com a forma
de dominação política e econômica das metrópoles sobre as colônias. Esse
fenômeno é denominado por Colonialidade.
Na perspectiva de Quijano (2005, p. 93), a Colonialidade, “se funda en la
imposición de una clasificación racial/étnica de la población del mundo como
piedra angular de dicho patrón de poder, y opera en cada uno de los planos, 519
ámbitos y dimensiones, materiales y subjetivas, de la existencia cotidiana y a
escala social”.
A colonialidade apresenta-se em quatro eixos interligados entre si, a
saber: Colonialidade do Poder do Ser e do Saber (QUIJANO, 2005) e
colonialidade da Natureza (WALSH, 2008). Estes eixos são formas que, o
poder hegemônico estabeleceu para manter a hierarquia entre os povos ditos
“superiores” e “inferiores”.
Assim, a colonialidade tem se configurado no novo padrão mundial de
poder como, “um processo arbitrário de dominação/exploração no qual o ideário
colonial penetra as estruturas sociais tanto na dimensão material quanto na
dimensão imaterial dos povos subjugados” (SARTORE, SANTOS e SILVA, 2015,
p. 93).
É nesse processo de dominação/exploração imposto pela colonialidade
do Poder que articulada com a colonialidade do Saber, do Ser e da Natureza,
baseada no pilar da racialização e da racionalização, tem hierarquizado e
classificado como inferiores as novas identidades culturais, a
desterritorialização e as epistemologias dos povos quilombolas como um grupo
historicamente silenciado.
Nessa perspectiva, os quilombolas são sempre estudados como seres
primitivos, iletrados e incapazes de produzirem conhecimentos válidos. Desse
modo, os quilombos quando são retratados nos materiais didáticos, são
sempre na perspectiva dos estereótipos e da folclorização destes espaços
apenas como lugar de escravos.

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Nesse viés, as marcas do silenciamento nos processos educativos
reforça a colonização também dos currículos, uma vez que “além de
colonizado, este currículo também é colonizador quando além da negação,
produz a inexistência do Outro enquanto sujeito histórico e cultural,
cristalizando por muito tempo a negatividade de tudo que se refere estas
culturas silenciadas” (FERREIRA, 2015, s.p.).
A negação do Outro colonizado nos currículos escolares, se dá devido a
imposição de um conhecimento tido como válido/eurocêntrico que torna as 520
epistemologias produzidas fora do eixo ocidental saberes subalternos e não
científicos.
Nessa perspectiva, o sociólogo Boaventura de Souza Santos (2007)
chama a atenção para o fato de que, na lógica eurocêntrica, no sul global “não
há conhecimento real; existem crenças, opiniões, magia, idolatria,
entendimentos intuitivos ou subjetivos, que na melhor das hipóteses podem se
tornar objeto ou matéria-prima de investigações científicas” (p. 73).
Compreendemos, através de Santos (2007), que existe um fosso gigante
no que tangem a produção do conhecimento no Norte global e no Sul global,
enquanto o primeiro é referenciado como o espaço lócus de enunciação, o
segundo é tido como o lugar que reproduz o conhecimento sistematizado.
A produção de conhecimento na configuração colonial está “marcada
geohistóricamente, geopóliticamente e geoculturalmente; tiene valor, color y
lugar “de origen” (WALSH, 2007, p. 28). Para esta autora, a geopolítica do
conhecimento reflete o “mantenimiento del eurocentrismo como la única o por
lo menos la más hegemônica perspectiva dominante del conocimiento[...]que
exalta la producción intelectual euro-americana como ciencia y conocimiento
universal, relegando el pensamento del sur al estatus de “saber localizado””
(WALSH, 2008, 28).
Nesse sentido, tratar da geopolítica do conhecimento, nos proporciona
uma reflexão sobre as políticas educativas ofertadas para as comunidades
quilombolas. Nesse movimento, avançamos na compreensão não só da
efetivação por parte do Estado, como também na consideração como essa

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Educação Escolar Quilombola tem sido discutida nos espaços de produções
científicas.

EDUCAÇÃO ESCOLAR QUILOMBOLA COMO POLÍTICA CURRICULAR

A discussão sobre direitos quilombolas no Brasil, a pesar de todo


processo histórico de lutas dos povos quilombolas e dos movimentos negros,
só ganha notoriedade a partir da promulgação da Constituição Federal no ano 521
de 1988, quando por determinação do artigo 68 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, este reconhece os territorios quilombolas como
espaços coletivos.
O reconhecimento por parte do Estado e a titulação das terras
quilombolas, implicou no reconhecimento de outros direitos negados por
séculos. Dentre estes, o direito a educação como uma política de Estado.
Sendo essa, específica e diferenciada reconhecendo os processos próprios de
vida de cada comunidade.
Assim, em termos concretos, as políticas educacionais para as
comunidades quilombolas surgem na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(LDB 9394/96), e da promulgação da Lei 10.639/03 que alterou a redação do
artigo 26‐A tornando obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e
africana. Ressaltamos que no ano de 2008 está redação foi novamente
alterada pela Lei 11.645/08 acrescentando o estudo dos povos indígenas
brasileiros.
Mesmo não fazendo referência explícita a questão quilombola, a Lei
10.639/03 criou condições para que outros instrumentos jurídicos fossem
criados em prol da Educação Escolar Quilombola. Um exemplo disso, foi a
homologação no ano de 2004 do parecer 003/2004 do Conselho Nacional de
Educação que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana.
Essas diretrizes além de proporem a reorganização do currículo escolar
tendo como fim, a contemplação da história e da cultura do povo negro, deu

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condições para que a temática relacionada aos quilombos de fato entrasse no
debate curricular. Determinando que “o ensino de História Afro-Brasileira
abrangerá, entre outros conteúdos, iniciativas e organizações negras, incluindo
a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de remanescentes de
quilombos”. (BRASIL, 2004, p. 21).
Essa importância dada, pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação das Relações Étnico-Raciais, ao ensino da história dos quilombos e
das comunidades quilombolas torna-se evidente, quando após a realização, no 522
ano de 2011, de três audiências públicas promovidas pela Câmara de
Educação Básica (CEB) e o Conselho Nacional da Educação (CNE), foi
institucionalizada, através da Resolução nº 8 de 20 de novembro de 2012, as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na
Educação Básica.
Nessas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar
Quilombola (DCNEEQ) estão presentes objetivos, principios, definição do que
escola quilombola, organização, etapas e modalidades, criação e implantação
do projeto político pedagógico nas escolas quilombolas, currículo gestão e
formação de professores quilombolas.
Segundo as DCNEEQ, a Educação Escolar Quilombola tem se
preocupado em requerer uma educação própria que respeite a diversidade
cultural presente em cada comunidade quilombola, para assegurar esse
processo, as diretrizes destacam a necessidade dos professores quilombolas e
não-quilombolas terem formação específica para atuarem frente as
comunidades.
Outro aspecto relevante no tocante a Educação Escolar Quilombola é a
necessidade de o currículo dialogar com as especificidades de cada
comunidade. Nesse sentido, “os currículos da Educação Básica na Educação
Escolar Quilombola devem ser construídos a partir dos valores e interesses das
comunidades quilombolas em relação aos seus projetos de sociedade e de
escola, definidos nos projetos político-pedagógicos” (BRASIL, 2012, p. 13).
Embora saibamos da necessidade da efetivação de uma escola
quilombola que implemente o que postula as diretrizes, é notório também a

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inoperância dessas diretrizes nas comunidades quilombolas, isso reflete o
processo de colonialidade descrito por Quijano (2005) e Walsh (2008), seja o
eixo do Poder, Saber, Ser ou da Natureza.

EDUCAÇÃO ESCOLAR QUILOMBOLA NAS PRODUÇÕES CIENTÍFICAS


DA ANPED

Nesta seção, apresentamos o quantitativo de trabalhos encontrados a 523


partir do descritor: Educação Escolar Quilombola, como também buscamos
traçar diálogos com os principais conceitos apresentados em cada trabalho.
Nessa direção, faremos uso do percurso teórico-metodológico que corresponde
às três fases da Análise de Conteúdo via Análise Temática (BARDIN, 1977;
VALA, 1999) 1) Pré-análise; 2) Exploração do Material e 3) Tratamento e
Inferências.
Na primeira fase realizamos o levantamento dos trabalhos que tratassem
sobre nosso descritor: Educação Escolar Quilombola. Nesse momento, nos
direcionamos às pesquisas com ênfase no tratamento da Pré-análise, ou seja,
realizamos a leitura dos títulos, resumos e palavras-chave de cada pesquisa.
Desse modo, apresentamos no quadro abaixo o resultado da nossa busca no
GT 21.

QUADRO 01 - Distribuição dos trabalhos sobre Educação Escolar


Quilombola
GT GT 21
Educação e Relações Étnico-Raciais

Total do GT Educação Escolar


Reunião/ Quilombola
Ano
36ª - 2013 18 03
37ª - 2015 29 00
38ª - 2017 30 01
Total 77 04

Fonte: Quadro construído a partir dos dados contidos no site da ANPED, disponível em:
http://www.anped.org.br

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Após este resultado realizamos a Exploração do Material com a leitura
dos títulos, resumos e palavras-chave dos 77 trabalhos selecionados. No
entanto ressaltamos que, apenas 04 trabalhos apresentaram discussões
voltadas para o campo da Educação Escolar Quilombola.
Nesse sentido, apresentaremos quais são as produções científicas que
nos colocam no cerne das discussões sobre o nosso descritor: Educação
Escolar Quilombola.
524
Quadro 2- Apresentação dos títulos, autores, instituições de vínculos e o
ano e a reunião de cada trabalho analisado.
Reunião Títulos Autores Vínculo
/Ano
Do quilombo ao canavial: Desafios e
perspectivas para a implementação da José Eustáquio de Brito UEMG
educação escolar quilombola numa comunidade
36° - do Médio Jequitinhonha
2013 Epistemologia da resistência quilombola em Jeanes Martins Larchert UESC/UFSCar
diálogo com o currículo escolar
Educação escolar quilombola: diálogos e Kalyla Maroun PUC-RIO
interfaces entre experiências locais e a Suely Noronha de
institucionalização de uma nova modalidade de Oliveira
educação no Brasil Edileia Carvalho
37ª- - - -
2015
Contribuições dos processos educativos José Eustáquio de Brito
38º - presentes em uma comunidade remanescente UEMG
2017 de quilombo para a construção de uma Agda Marina Ferreira
educação escolar quilombola Moreira
Fonte: Quadro construído a partir dos dados contidos no site da ANPED, disponível em:
http://www.anped.org.br

A partir da aproximação com os trabalhos selecionados, realizamos a


terceira fase da Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977): o Tratamento e as
Inferências.
Na leitura realizada dos 04 (quatros) trabalhos selecionados sobre a
Educação Escolar Quilombola, evidenciamos a presença de elementos da
pauta reivindicatória das populações quilombolas, em especial a necessidade
de se consolidar os objetivos e principios da Educação Escolar Quilombola.
O trabalho de Brito (2013) intitulado “Os desafios e perspectivas sobre a
Educação Escolar Quilombola no Vale do Jequitionha”, apresenta como
objetivo realizar uma reflexão sobre a configuração do mundo do trabalho na

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comunidade quilombola da Vila de Santo Isodoro, município de Berilo, Minas
Gerais.
Para alcançar tal objetivo, o autor se debruçou nas ações dos
movimentos sociais negros, pesquisadores, coletivos docentes e lideranças
quilombolas que buscavam através de manifestos, a aprovação das Diretrizes
Curriculares Nacionais para Educação Escolar Quilombola na Educação
Básica.
Os resultados do trabalho de Brito (2013) apontam para a necessidade 525
de que para além do que institui tais diretrizes, no campo da organização,
funcionamento e materialização da escola quilombola, é “necessário incorporar
no texto questões que aludissem a dinâmica do mundo do trabalho como parte
fundamental do processo de reprodução da vida” (p. 4).
No artigo de Maroun, Oliveira e Carvalho (2013) intitulado “Educação
Escolar Quilombola: diálogos e interfaces entre experiências locais e a
institucionalização de uma nova modalidade de educação no Brasil”, as autoras
têm como objetivo principal ilustrar o debate sobre a temática emergente da
Educação Escolar quilombola a partir dos processos educativos de duas
escolas localizadas nas comunidades quilombolas de Santa Rita do Bracuí e
Campinho da Independência, ambas no estado do Rio de Janeiro.
No trabalho, as autoras chamam a atenção para o fato do debate em
torno da Educação Escolar Quilombola, ser permeado por inúmeros conflitos,
principalmente pelo fato de que os conteúdos curriculares não dialogam com as
especificidades das comunidades. Existindo, assim, um tensionamento entre o
que se ensina na escola, com o que se vivencia no cotidiano da comunidade.
Na perspectiva das autoras, a escola deve estar a serviço das
comunidades quilombolas, materializada nas relações estabelecidas com os
povos quilombolas e rompendo com a “perpetuação de um silenciamento e a
negação de uma cultura que se encontra subalternizada e deslegitimada
histórica e socialmente no espaço escolar, tendo como respaldo o argumento
da heterogeneidade do público atendido” (MAROUN; OLIVEIRA E CARVALHO,
2013, p. 12).

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O artigo de Larchert (2013), intitulado “Epistemologia da resistência
quilombola em diálogo com o currículo escolar”. A autora apresenta o resultado
de uma pesquisa, na qual busca refletir sobre as práticas de resistência e os
processos educativos na comunidade quilombola do Fojo, localizada no
município de Itacaré na Bahia.
A autora não anuncia explicitamente sua filiação teórica. No entanto,
apresenta reflexões que se aproximam da Abordagem Teórico-Metodológica
dos Estudos Pós-coloniais Latino-americanos a qual nos filiamos. Ao 526
apresentar no corpo do texto reflexões de autores dessa Abordagem, como por
exemplo, Boaventura de Souza Santos, Anibal Quijano e Enrique Dussel.
Segundo Larchert (2013), na comunidade quilombola do Fojo, os
processos educativos delineiam dos conhecimentos elaborados nas estratégias
de vivência dos sujeitos quilombolas, conferindo-lhes competências cognitivas,
afetivas, sociais e políticas.
Para Larchert (2013), “esses conhecimentos são resultantes das
experiências de homens e mulheres epistêmicos quilombolas do Fojo que
ressignificam a cada dia as experiências dos seus antepassados e formulam as
estratégias de vida cotidiana provocando novas experiências” (LARCHERT,
2013. p. 12).
Para a autora, os conhecimentos produzidos nos espaços quilombolas
são invalidados pelo padrão hegemônico que, nega, subalterniza e silencia
toda forma de epistemologia produzidas pelos povos afrodiásporicos.
Desse modo, Larchert (2013, p. 13) assevera que, “os conhecimentos
oriundos desses paradigmas epistemológicos negam o conhecimento produzido nos
vários segmentos culturais de matriz africana[...] classificando-os em superiores e
inferiores”.
No tocante ao currículo escolar, a autora nos mostra que este representa
uma força epistemológica contraria ao movimento dialético da resistência
quilombola. Principalmente quando a “escola desconhece os conhecimentos,
saberes, processos educativos, lutas, histórias e memórias da comunidade
negra rural quilombolas do Fojo, mesmo com os professores e alunos
pertencentes à família Santos e Gomes” (LARCHERT, 2013, p. 13).

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Por fim, o trabalho de Brito e Moreira (2017), intitulado “Contribuições
dos processos educativos presentes em uma comunidade remanescente de
quilombo para a construção de uma Educação Escolar Quilombola”.
Nessa obra, os autores não apresentam explicitamente qual é o objetivo
do trabalho, porém expõe como meta: refletir sobre alguns aspectos do
processo formativo presentes na tradição quilombola, que tem como intenção
contribuir para implementação da Educação Escolar Quilombola.
Brito e Moreira (2017) destacam a importância da educação que 527
emergem dos movimentos sociais como uma ferramenta capaz de fazer os
sujeitos se enxergarem dentro de suas realidades, tendo nas tensões sociais,
sobretudo aquelas relacionadas às relações de produção no campo, o ponto de
partida para as problematizações do grupo no qual estão inseridos.
Segundo esses autores, “os processos educativos que emergem dos
espaços de mobilizações políticas[...]se dão de forma consciente, estruturada
enquanto projeto sociopolítico, com vistas a garantir o acesso a direitos e a
superação das invisibilidades sociais” (BRITO; MOREIRA, 2017, p. 9).
Assim, pautados nos elementos da identidade, memória e resistência, os
autores atentam para o fato da Educação Escolar Quilombola levar em
consideração esses aspectos na conformação dos currículos, uma vez que,
“apesar de uma exclusão secular do âmbito educacional, os negros
aquilombados desenvolveram pedagogias próprias que ainda hoje orientam
suas formas de reprodução sociocultural e sua atuação junto ao movimento
instituído [...] rompendo com estruturas rígidas vinculadas ao saber científico
(BRITO; MOREIRA, 2017, p. 14).
Após a análise dos trabalhos ressaltamos a importância da efetivação da
Educação Escolar Quilombola, como elemento de ressignificação e afirmação
da cultura e da identidade quilombola. No entanto, vislumbramos um ato de
preocupação quando olhamos o lugar de produção de cada trabalho analisado.
A concentração de trabalhos na região Sudeste evidência a geopolítica do
conhecimento que invizibiliza as produções acadêmicas das outras regiões do
Brasil.

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CONCLUSÃO

A partir da análise realizada, podemos perceber que mesmo sendo


evidenciadas produções científicas com o descritor utilizado neste trabalho,
ficou nítida a presença do silenciamento no campo educacional sobre a
Educação Escolar Quilombola.
Essa situação nos mostra que, o GT 21 da ANPED permanece eivado
pelo fenômeno da colonialidade do Poder, Saber e do Ser. (QUIJANO, 2005). 528
Gerando uma (in)visibilidade que “es particularmente evidente en el sistema
educativo (desde la escuela hasta la universidad) donde se eleva el
conocimiento y la ciencia europeos como EL marco científico-académico-
intelectual” (WALSH, 2008, p. 137).
Esta (in)visibilidade está ancorada no racismo epistêmico que privilegia
as políticas identitárias dos brancos ocidentais como verdades absolutas e trata
os conhecimentos dos não-ocidentais como folclore, mas nunca como
conhecimento.
Portanto, levando em consideração os aspectos apresentados nos
trabalhos analisados e as poucas produções cientificas sobre o nosso descritor
entendemos que apesar das reivindicações das comunidades quilombolas e
das implementações da Lei nº 10.639/03 e das Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Escolar Quilombola, o GT 21 ainda não se libertou
do processo Colonização/Colonialismo bem como da geopolítica do
conhecimento.

REFERÊNCIAS

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.


BRASIL. Lei nº 10639/2003. Presidência da República, Casa Civil, Brasília,
2003.
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação/Câmara de
Educação Básica. Resolução CNE/ CEB nº 8, de 20 de novembro de 2012.
Define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola
na Educação Básica. Brasília, DF, 2012.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e

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numa comunidade do Médio Jequitinhonha. 36ª Reunião Nacional da
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dos processos educativos presentes em uma comunidade remanescente
de quilombo para a construção de uma Educação Escolar Quilombola.
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529
conformação de currículos escolares (Des)colonizados no Brasil. 2015.
LARCHERT, Jeanes Martins. Epistemologia da resistência quilombola em
diálogo com o currículo escolar. 36ª Reunião Nacional da ANPEd – 29 de
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EDUCAÇÃO ATRAVÉS DO OLHAR: A INSERÇÃO DAS IMAGENS PARA
UM CURRÍCULO DE SENSIBILIDADES

Alcidesio Oliveira da Silva Junior

RESUMO: Este artigo aborda a inserção das imagens no currículo, visando a


formação dos conteúdos atitudinais dos alunos e alunas. Para tanto, recorremos a
uma pesquisa bibliográfica em Michel Foucault e Roland Barthes que nos servisse de
ferramenta analítica para três imagens, visando comprovar a funcionalidade das 530
fotografias como estimuladoras da reflexão crítica em três temas específicos:
machismo, LGBTfobia e racismo. Os resultados apontam para o previsto e contribuem
para uma amplitude de abordagem curricular imagética.

Palavras-chave: Currículo. Roland Barthes. Michel Foucault. Fotografia. Diversidade.

INTRODUÇÃO

Em um mundo repleto de imagens, difícil é escapar do seu contágio e de


sua potência como transformadoras de percepções, bem como fomentadoras
de identidades. A televisão, a internet, a publicidade massiva, as fotos perfeitas
do Instagram, os tão compartilhados memes nas redes sociais, os vídeo-clips
do mundo pop, as capas das revistas famosas que sinalizam o glamour e o
padrão estético da vez, transbordam diante dos nossos olhos construindo
significados diversos.
Necessário é que nos aprofundemos neste mundo onde cores, formatos
e signos diversos dialogam em harmonia, muitas vezes duelando em choque,
na produção de mensagens, podendo ser persuasivas ao gosto do Capitalismo,
arregimentando consumidores vorazes e insaciáveis, ditando a nova moda e
tendências para a juventude e até mesmo como ferramentas de educação,
ilustrativas na sua superficialidade ou arrebatadoras na sua capacidade de
gerar reflexões críticas e afetos coletivos diversos.
A grande questão que se coloca é de como somos bombardeados por
imagens a todo momento e de variadas formadas, acabamos não sendo
conduzimos a processos indagativos a respeito de sua formação discursiva e

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de suas reais intenções, aceitando todas as sugestões sutis (ou até mesmo
violentas) sem uma devida reflexão e compreensão da realidade a volta.
Esta pesquisa tem como problemática entender de que forma a
educação através de imagens pode contribuir para um currículo que trabalhe
sensibilidades ou os chamados conteúdos atitudinais, objetivando, de maneira
geral, apontar para possibilidades de diálogo e reflexão por meio do exemplo
de quatro imagens que serão analisadas por sua potencialidade como
instrumentos vivos de significados, capazes de fomentar debates construtivos e 531
educativos através da mediação do professor ou professora.
Para tanto, é necessário que recorramos à descrição destas imagens, da
sua contextualização e do seu encadeamento discursivo, a fim de traçarmos
caminhos que atinjam o objetivo maior aqui apresentado, bem como o
esclarecimento da problematização geral desta pesquisa. Vale aqui destacar a
importância deste trabalho, visto a necessidade das escolas e demais
instituições de ensino refletirem sobre um currículo que trabalhe a lógica desta
pós-modernidade cujo foco nas imagens é evidente.
Como metodologia, trata-se de uma pesquisa bibliográfica que centra
seus esforços nas reflexões da Análise do Discurso e da Semiótica
barthesiana. Como corpus, temos três imagens que apontam para
problemáticas sociais específicas (machismo, LGBTfobia e machismo) e seu
consequente debate em sala de aula objetivando o trabalho com conteúdos
atitudinais. Destacamos ainda que a teoria curricular que contribui para a
fundamentação deste trabalho é a pós-crítica, por entendermos a sua
aplicabilidade com as temáticas propostas.

A ANÁLISE DO DISCURSO E SEMIÓTICA – ELEMENTOS BASILARES

Muitas são as contribuições do filósofo francês Michel Foucault para


compreendermos a questão do discurso e de como este se entrelaça no
desenvolvimento das narrativas que conformam o pensamento, as práticas e a
ciência na sociedade por toda a sua história. Sua definição de discurso é muito

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apropriada para começarmos a discutir com mais afinco este campo de análise.
Para Foucault (1997, p. 139), discurso é:

Um bem – finito, limitado, desejável, útil – que tem suas regras de


aparecimento e também suas condições de apropriação e de
utilização: um bem que se coloca, por conseguinte, desde sua
existência (e não simplesmente em suas “aplicações práticas”), a
questão do poder; um bem que é, por natureza, o objeto de uma luta,
e de uma luta política.

Assim, a formação deste campo discursivo está diretamente ligada ao 532


jogo de poder que se instaura na sociedade, especialmente em benefício dos
grupos hegemônicos que orquestram através da linguagem e dos mais
variados saberes os próprios acontecimentos e a materialidade manifesta na
história da humanidade (FOUCAULT, 1996).
Para fazer esta análise, o filósofo rompe com a leitura histórica
tradicional, entendendo que os acontecimentos se desenvolvem marcados por
rupturas, descontinuidades e transformações, contrariando uma ordem
determinada por generalismos e diminuição de diferenças. Desta forma, “não é
preciso remeter o discurso à longínqua presença da origem; é preciso trata-lo
no jogo de suas instâncias” (FOUCAULT, 1997, p. 28), ou seja, destaca-se o
momento de acontecimento do discurso, mediante suas condições históricas,
sociais e culturais.
Segundo Santos (2013, p. 233):
Assim, a análise do discurso passa a ser entendida como uma
disciplina interpretativa, não mais presa ao “narcisismo da estrutura”,
como procedimentos e etapas fixas. O discurso é agora entendido
como uma eminência histórica e social, em que a linguagem é
apreendida não como mera unidade significativa, passível de
decodificações, mas como efeito de sentido entre sujeitos.

Esta eminência histórica e social da produção do discurso desloca a sua


análise não mais para uma análise linguística do texto, anteriormente focada
em sua estrutura, regras, repetições ou formas de repetição, mas para o
exterior do texto, suas condições de produção, a escolha de um enunciado ao
invés de outro, etc. Seguindo a reflexão de Foucault, podemos explicitar melhor
seu caminho analítico:
A análise do campo discursivo é orientada de forma inteiramente
diferente; trata-se de compreender o enunciado na estreiteza e
singularidade de sua situação; de determinar as condições de sua

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existência, de fixar seus limites de forma mais justa, de estabelecer
suas correlações com os outros enunciados a que pode estar ligado,
de mostrar que outras formas de enunciação exclui. Não se busca,
sob o que está manifesto, a conversa semi-silenciosa de um outro
discurso: deve-se mostrar por que não poderia ser outro, como exclui
qualquer outro, como ocupa, no meio dos outros e relacionado a eles,
um lugar que nenhum outro poderia ocupar. (FOUCAULT, p. 31,
1997).

Assim, nem a língua, nem o sentido podem esgotar os acontecimentos


de um enunciado, dando-se importância não ao que liga estreitamente as
palavras e as coisas ou o que remete-se à tentativa de descoberta das 533
intenções do autor do discurso, mas às formações discursivas que se dão entre
os enunciados e suas dispersões ou congruências, sejam conceituais ou
temáticas (ibid., 1997). Até porque, segundo o filósofo no seu livro A Ordem do
Discurso, “em toda sociedade, a produção do discurso é ao mesmo tempo
controlada, selecionada, organizada e redistribuída” (1996, p. 9), fortalecendo a
ideia do gerenciamento social por meio das práticas discursivas que atuam no
regramento dos corpos e mentes.
Em diálogo com a Análise do Discurso, podemos relacionar nesta
pesquisa as contribuições da Semiótica, ou Semiologia (nome convencionado
entre os primeiros teóricos da corrente francesa), como perspectiva de análise
muito apropriada para verificamos a produção de sentidos através dos signos,
neste caso em específico, dos signos materializados em imagens, em fotos,
estabelecendo comunicação e liberando gestos de interpretação através da
materialidade visual que se coloca diante do leitor, do espectador.
Segundo Barthes (1987, p. 11):
A Semiologia tem por objeto, então, qualquer sistema de signos, seja
qual for sua substância, sejam quais forem seus limites: imagens, os
gestos, os sons melódicos, os objetos e os complexos dessas
substâncias que se encontram nos ritos, protocolos ou espetáculos,
se não constituem “linguagens”, são, pelo menos, sistemas de
significação.

O filósofo francês, assim, inspira-se em Ferdinand de Saussure e seu


sistema de signo como resultado do esquema significante + significado,
ampliando o conceito de maneira que a linguagem pensada por Saussure no
âmbito estritamente da fala e da escrita, rompe-se, chegando às reflexões

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sobre cultura de massa e suas produções, como moda e fotografia, para
exemplificar ao modo barthesiano de análise semiológica.
Falando especificamente da imagem publicitária no seu texto A Retórica
da Imagem, Barthes reflete a respeito da intencionalidade por trás destas
imagens que acabam moldando seus signos visando retornos imaginados, pois
“estes significados devem ser transmitidos tão claramente quanto possível; se
a imagem contém signos, teremos certeza que, em publicidade, esses signos
são plenos, formados com vistas a uma melhor leitura” (1990, p. 28). Esta rede 534
de produções de sentidos, portanto, utiliza-se das cores, formas, sombras,
expressões, entre outros elementos, na sua formatação discursiva.
Para Barthes (1990), é necessário ler a imagem de maneira que seus
signos descontínuos sejam interpretados. Para tanto, lança mão de uma
tipologia, facilitando o caminho metodológico semiótico nas pesquisas,
especialmente em publicidade. Segundo ele, tem-se a mensagem linguística,
sustentadora e fixadora dos sentidos apresentados na imagem, visto que toda
imagem é polissêmica e uma “cadeia flutuante” de significados (1990, p. 32);
uma mensagem icônica codificada (imagem conotada), transpassada de
simbolismo e elementos culturais a serem interpretados; e uma mensagem
icônica não codificada (imagem detonada), relacionando os elementos vistos
de imediato na imagem em questão.
Este fascínio que as imagens causam nos sujeitos demonstra a sua
magnitude de possibilidades de sensibilização e a ausência de uma
compreensão totalizante de suas expressões, de suas formas. Segundo
Bergson (1999, p. 2), “por ‘imagem’ entendemos uma certa existência que é
mais do que aquilo que o idealista chama uma representação, porém menos do
que aquilo que o realista chama uma coisa – uma existência situada a meio
caminho entre a ‘coisa’ e a ‘representação’”.
Dialogando com as imagens conotativas barthesianas, carregadas de
elementos simbólicos e transpassadas por culturas diversas, importante é
mencionar a contribuição de Ranciére ao refletir sobre a diversidade de
interpretações que vão além do visível e que colorem de novos sentidos o

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conglomerado imagético que nos cerca cotidianamente. Assim, o mesmo
aponta:
[...] a arte é feita de imagens, seja ela figurativa ou não, quer
reconheçamos ou não a forma de personagens e espetáculos
identificáveis. As imagens da arte são operações que produzem uma
distância, uma dessemelhança. Palavras descrevem o que o olho
poderia ver ou expressam o que jamais verá, esclarecem ou
obscurecem propositalmente uma ideia. Formas visíveis propõem
uma significação a ser compreendida ou a subtraem. Um movimento
de câmera antecipa um espetáculo e descobre outro, um pianista
inicia uma frase musical “atrás” de uma tela escura. Todas essas
relações definem imagens. Isso quer dizer duas coisas. Em primeiro 535
lugar as imagens da arte, enquanto tais, são dessemelhanças. Em
segundo lugar, a imagem não é uma exclusividade do visível. Há um
visível que não produz imagem, há imagens que estão todas em
palavras (RANCIÈRE, 2012, p. 15-16).

Pensamentos em imagens, através de imagens e este lirismo que nos é


natural alcança o seu máximo esplendor na arte e nas suas mais diversas
formas visuais, seja na fotografia, na publicidade, nas telas do cinema, etc. A
visibilidade e o translúcido das significações dá a luz a novas subjetividades e
identidades em contínua reflexão e formação, sendo elementos destacáveis
nos processos educacionais por imagem.

FORMAÇÃO DE SENSIBILIDADES ATRAVÉS DAS IMAGENS

Objetivando a inserção das imagens no desenvolvimento de um currículo de


orientação pós-crítica para a formação de sensibilidades ou de conteúdos
atitudinais, apresentamos aqui quatro fotos que pelo seu teor discursivo podem
compor uma série de reflexões coletivas com os alunos e alunas a respeito das
temáticas em questão. Entendemos, com base nos apontamentos anteriores,
que as imagens servem não apenas como ato ilustrativo de uma aula, porém
como um fundamento de agitação e formação de subjetividades rumo a
comportamentos de tolerância e solidariedade.

Fotografia 1: Campanha contra o Machismo da Secretaria de Políticas para Mulheres da


Prefeitura Municipal de São Leopoldo/RS

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Fonte: Fanpage da SEPOM - Secretaria de Políticas para as Mulheres. Disponível em


<https://www.facebook.com/sepomsl > Acesso em 08 out. 2018.

Na Fotografia 1, retirada de uma Campanha contra o Machismo


organizada pela Prefeitura de São Leopoldo/RS, percebemos, de imediato,
alguns elementos realçados pela análise semiótica barthesiana. Quanto à
imagem denotativa, temos uma pessoa do sexo feminino com o rosto
machucado segurando um cartaz com uma letra de música da dupla Henrique
e Juliano. A foto em preto e branco, bem como o enquadramento da
personagem à direita completam a cena representada.
Quando aos aspectos conotativos, temos uma composição cujos signos,
especialmente o rosto machucado da mulher e seu semblante sério, apontam
para uma agressão. Tais elementos são “extraídos de um código cultural”
(BARTHES, 1990, p. 38), dando uma tonalidade a ser percebida por um
conjunto de elementos culturais e discursivos presentes na sociedade.
Reforçando a mensagem simbólica, percebemos a escolha da preto e branco
para na estética da imagem. Segundo Flusser (2011, p.54), “as fotografias em
Preto & Branco são a magia do pensamento teórico, conceitual (...) muitos
fotógrafos preferem fotografar em preto e branco, porque tais fotografias
mostram o verdadeiro significado dos símbolos fotográficos: o universo dos
conceitos”. Assim, a escolha se dá com uma intencionalidade: a real expressão
do conceito escolhido pelo fotógrafo.
Um dos elementos destacados por Barthes é a mensagem linguística
que serve para fixar um sentido (BARTHES, 1990) na imagem, evitando

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interpretações muito diferentes da esperada pelo fotógrafo. Nesta em questão,
temos um trecho de uma letra de música da dupla Henrique & Mariano que diz:
“Desculpa a visita/eu só vim te falar/to a fim de você/e se não tiver, cê vai ter
que ficar”. Percebemos que a intenção de colocar esta letra é reforçar o abuso
e a agressão acometida pela vítima que pede socorro, em linguagem simbólica,
através do cartaz escrito com letras manuscritas, apontando para uma
pessoalidade e um vínculo afetivo com os interpretantes. Ao revelar a voz do
outro/a que diz “to a fim de você e se você não tiver, cê vai ter que ficar”, a 537
mensagem linguística apoiando a imagem conotada denuncia a agressão
física, sexual e psicológica sofrida pela vítima, forçada a uma situação não
desejada por ela.
O enunciado acima explicitado revela uma relação de poder baseada no
gênero. Segundo Foucault (1997, p. 97), o enunciado é “uma função de
existência que pertence, exclusivamente, aos signos, e a partir da qual se pode
decidir, em seguida, pela análise ou pela intuição, se eles ‘fazem sentido’ ou
não, segundo que regra se sucedem ou se justapõem”. Assim, dentro de uma
ordem discursiva, estes elementos em conjunto apontam para as regras
anônimas que regem a sociedade patriarcal e o domínio do corpo das mulheres
pelos homens.
A imagem, portanto, pode auxiliar os professores e professoras a
debaterem com os alunos e alunas as normas de gênero impostas na
sociedade patriarcal que acabam conduzindo a práticas de opressão às
mulheres. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, documento
responsável pela reorientação dos conteúdos para a educação básica no
Brasil:
A discussão sobre relações de gênero tem como objetivo combater
relações autoritárias, questionar a rigidez dos padrões de conduta
estabelecidos para homens e mulheres e apontar para sua
transformação. A flexibilização dos padrões visa permitir a expressão
de potencialidades existentes em cada ser humano que são
dificultadas pelos estereótipos de gênero. Como exemplo comum
pode-se lembrar a repressão das expressões de sensibilidade,
intuição e meiguice nos meninos ou de objetividade e agressividade
nas meninas. As diferenças não devem ficar aprisionadas em
padrões preestabelecidos, mas podem e devem ser vividas a partir da
singularidade de cada um, apontando para a equidade entre os
sexos. (BRASIL, 1998, p. 99)

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Elencados como Temas Transversais nos documentos dos PCN’s, tais
direcionamentos auxiliam o corpo docente das escolas a elaborarem com
responsabilidade social seus planos de aula, sugerindo que “para os conteúdos
deste bloco as articulações privilegiadas são com as áreas de História,
Educação Física e todas as situações de convívio escolar” (BRASIL, 1998, p.
99). Desta forma, “ao tratar do tema Orientação Sexual, busca-se considerar a
sexualidade como algo inerente à vida e à saúde, que se expressa desde cedo
no ser humano. Engloba o papel social do homem e da mulher, o respeito por 538
si e pelo outro, as discriminações e os estereótipos” (Idem, p. 73).

Fotografia 2: Transexual Viviany Beleboni na 19º Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (Foto:
Reuters/Joao Castellano)

Fonte: Portal G1 (Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-


paulo/noticia/2016/06/transexual-e-intimada-depor-por-crucificacao-em-parada-gay-de-
2015.html> Acesso em 07 out. 2018)

A segunda fotografia escolhida foi alvo de muita polêmica e tirada na 19ª


Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (2015). Os elementos que se destacam
na leitura denotativa são: a cruz, a personagem com características físicas
femininas crucificada, o sangue, parte da bandeira LGBT no canto esquerdo da
imagem, uma placa, a coroa de espinhos e o céu azul no fundo.

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Para a interpretação desta foto é requerido um conhecimento cultural
que a associe de imediato com a iconografia cristã que a envolve, o que
Barthes chama de código cultural. Se fizermos uma análise conjunta da
imagem conotativa, teremos mais facilidade de compreender que não se trata
apenas de uma figura feminina na cruz, mas uma travesti/transexual
crucificada. A cruz e o sangue, bem como a coroa de espinhos, apelam à
tradição bíblica e o momento da crucificação de Jesus Cristo, tornando-se
espetáculo para seus malfeitores e redenção para seus seguidores. 539
A imagem anuncia não somente um sacrifício de uma inocente, marcada
com sutileza pelo olhar de entrega e resiliência, mas se fortalece pela
mensagem linguística que complementa o seu significado de denúncia de
violência aos LGBT’s. Segundo Barthes (1990, p. 32), “ao nível da mensagem
literal a palavra responde, de maneira mais ou menos direta, mais ou menos
parcial, à pergunta: o que é?”, fixando a mensagem na cadeia de sentidos
flutuantes que a polissemia das imagens carrega.
Qualquer dúvida quanto à personagem crucificada se esvai com o
reforço do texto da placa: “BASTA DE HOMOFOBIA COM GLBT”. Em ato de
denúncia, a dramatização aí representada se esboça em uma simbologia
extremamente visceral e polêmica por carregar elementos da cultura cristã em
um ato que vai de encontro ao que convencionalmente é pregado nestes
espaços religiosos, ocasionando em uma perturbação. Podemos também
elevar daí os conceitos envolvidos neste discurso imagético. Foucault afirma
que:
A maneira pela qual o campo de memória está ligado às formas de
hierarquia e de subordinação que regem os enunciados de um texto;
maneira pela qual estão ligados aos modos de aproximação e de
desenvolvimento dos enunciados e os modos de crítica, de
comentários, de interpretação de enunciados já formulados, etc. É
esse feixe de relações que constitui um sistema de formação
conceitual (FOUCAULT, 1997, p. 66).

Portanto, percebemos emergir conceitos como intolerância sexual,


LGBTfobia e preconceito através da imagem, associados de maneira intrínseca
ao composto visual, linguístico e de ordem discursiva, visto que há um domínio
discursivo que é tecido em torno deste entendimento face às agressões
regulares aos LGBT’s na sociedade brasileira.

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Tais sensibilidades tratadas em aula são previstas nos Parâmetros
Curriculares Nacionais que orienta que “os alunos, ao fim do ensino
fundamental, sejam capazes de: [...] identificar e repensar tabus e preconceitos
referentes à sexualidade, evitando comportamentos discriminatórios e
intolerantes e analisando criticamente os estereótipos” (BRASIL, 1998, p. 311).
Assim, como esperado no currículo das escolas, tratar de maneira transversal a
diversidade sexual é concebido como de grande importância para a formação
humana dos alunos e alunas rumo a uma sociedade tolerante e respeitosa. 540

Fotografia 3: Elizabeth Eckford indo ao seu primeiro dia de aula e a intolerância racial nos
Estados Unidos (Foto: Coleção Will Counts – Arquivos da Indiana University)

Foto: Revista Piauí (Disponível em < https://piaui.folha.uol.com.br/materia/odio-


revisitado > Acesso em 08 out. 2018)

Uma foto emblemática é que a expomos acima: a caminhada de


Elizabeth Eckford, 15 anos de idade, rumo à Central High School no dia 04 de
setembro de 1957 na cidade de Arkansas/EUA. Este seria o primeiro dia da
adolescente, escolhida junto a outros 8 jovens negros, para estudarem em uma
escola com predominância de brancos, por uma ordem judicial de integração
racial nos Estados Unidos.
De imediato, temos 15 pessoas brancas seguindo uma jovem negra de
óculos escuros, roupa de estudante de ensino médio e a coloração típica de
uma foto dos anos 50, bem como as roupas de todos os outros participantes do

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cenário em questão. A contextualização acima é deveras importante para
adentrarmos no mundo simbólico da foto, marcada por dois personagens
principais que compõem a temática da intolerância racional em questão: a
garota branca à esquerda com todo o ódio encravado no rosto, na boca aberta
e na testa que franze e Elizabeth à direita, tensa, apertando seu livro no peito,
rosto visivelmente angustiado sob os óculos escuros, compondo um semblante
desolado.
Não há texto. Não há explicação na imagem através de qualquer 541
palavra. Tudo é visivelmente escancarado no rosto das duas jovens, enunciado
através das expressões, dos corpos que duelam em visível desigualdade na
relação de forças. Uma do lado da maioria, a outra rompendo a pedra do seu
destino de minoria norte-americana. Este jogo de emoções que nos
transpassam através das imagens salta aos olhos em reflexão na imagem
acima.
Um conceito elaborado pelo filósofo francês para caracterizar algumas
imagens é a de punctum, a qual encaramos como válida para a fotografia que
trata do Apartheid norte-americano. Segundo Barthes (Idem., p. 33), “o
punctum de uma fotografia é esse acaso que nela me fere (mas também me
mortifica, me apunhala)”. É uma que carrega um detalhe, um pormenor, um
algo que surpreende não pelo terror, pela violência explícita, mas pelas marcas
e pontos que ferem. Na foto acima, não há como não se perturbar com o medo
estampado no rosto da jovem negra, sua boca comprimida, seu semblante
caído e a desolação doída da intolerância.
A imagem pode ser trabalhada nos currículos escolares para a reflexão
dos alunos e alunas. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, em seu
módulo que trata da Diversidade Cultural:

A tendência de abafar e encobrir os problemas vividos pela


diversidade, enquanto se dá destaque apenas à sua característica de
ser um dos potenciais mais férteis, tipicamente brasileiros, levou por
muito tempo a acreditar que o racismo era uma mazela social que o
Brasil soube evitar. A teoria da integração das raças, tradicionalmente
divulgada na maioria das escolas de ensino fundamental, deixou
pouco ou nenhum espaço para que se encarassem as reais
dificuldades das diferentes etnias no contexto social brasileiro
(BRASIL, 1998, p. 31).

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Importante é o destaque para a necessidade de tratarmos o racismo
como problema real e, como se apresenta estruturalmente, se faz presente
também nas escolas, sendo necessário um trabalho de formação humana e
ética continuada. Segundo os PCN’s (Idem., p. 35), “A escola deve posicionar-se
criticamente em relação a esses fatos, mediante informações corretas, cooperando no
esforço histórico de superação do racismo e da discriminação.” Este
comprometimento se atualiza diante das iniciativas de luta de diversos
movimentos sociais que desde a redemocratização atuam de maneira incisiva 542
para a ruptura discriminatória no sistema, fortalecendo as identidades e
empoderando os sujeitos diversos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estas primeiras impressões sobre as imagens e seus aspectos estéticos,


denotativos, conotativos e linguísticos, apontam para a real importância de os
professores utilizarem-nas não apenas como ilustração de aula, mas como
ferramentas de agitação e reflexão crítica, abordando temas diferenciados e,
conforme aqui exemplificado, elevando os conteúdos atitudinais a uma esfera
de produção de debates e argumentação.
As cores, as formas, as luzes, os ditos e os não ditos, nas fotografias,
tornam-se matéria-prima viva para um currículo aberto às sensibilidades e que
vise à formação humana centrada no respeito à diversidade. Em um mundo
mergulhado em imagens acríticas e, na sua grande maioria das vezes,
persuasivas para o consumo, estimular a leitura visual que problematize e
perturbe é fundamental para uma sociedade mais consciente de sua
pluralidade.

REFERÊNCIAS

BARTHES, R. Elementos de semiologia. São Paulo: Cultrix, 1987.


_________. A retórica da imagem. In: O óbvio e o obtuso. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1990.
BERGSON, H. Matéria e Memória: Ensaio sobre a relação do corpo com o
espírito. Tradução: Paulo Neves - São Paulo: Martins Fontes, 1999.

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BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares
nacionais: 3º e 4º ciclos: apresentação dos temas transversais. Brasília:
MEC/SEF, 1998.
FLUSSER, V. Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia da
fotografia. Apresentação de Norval Baitello Junior. São Paulo: Annablume,
2011
FOUCAULT, M. A Arqueologia do Saber. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1997.
_________________. A Ordem do Discurso: aula inaugural no Collège de
France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. 3. ed. São Paulo: Loyola,
1996.
543
RANCIÈRE, J. O espectador emancipado. Tradução de Ivone C. Benedetti.
São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012.
SANTOS, S. S. B. Pêcheux. In: OLIVEIRA L. A. (Org.) Estudos do Discurso:
perspectivas teóricas. São Paulo: Parábola, 2013, p. 209-233.

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PEDAGOGIA DA INCLUSÃO: EXPERIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Sandra Alves da Silva Santiago71

RESUMO: O PNE (2014-2024) reafirma o que diferentes pesquisas denunciam já há


algum tempo sobre o despreparo dos professores para lidar com as diferenças em
sala de aula. Tal preocupação é ainda maior no âmbito da Educação Infantil, pois as
instâncias formadoras ainda não conseguem formar o professor inclusivo, seja porque
não cumpre o que determina a legislação, seja porque não articula os conhecimentos
próprios da docência em educação infantil com aqueles em favor da inclusão. Nessa
544
perspectiva, por meio da metodologia de pesquisa-ação, foi possível estreitar o diálogo
entre a Educação Especial e a Educação Infantil, com o objetivo de identificar
necessidades e propor estratégias didáticas que promovam a inclusão de crianças da
Educação Infantil, tendo na formação continuada o melhor momento para o professor
construir tais competências. Os resultados demonstraram, por um lado, que os
professores da Educação Infantil ainda carecem de saberes que os instrumentalizem a
elaborar estratégias e recursos didáticos condizentes com as necessidades e também
potencialidades de cada educando\a, a fim de que a inclusão se efetive. E, por outro,
que quando se disponibilizam aos professores, oportunidades de formação
continuada, onde tais saberes são discutidos, progressivamente a partir de suas
próprias necessidades, os mesmos conseguem utilizar estratégias inclusivas que
culminam com experiências favoráveis a todos os estudantes, e não somente aos\as
alunos\as com NEE.

Palavras-chave: Educação Infantil. Inclusão. NEE. PNE. Projeto Aponte.

1 INTRODUÇÃO

Apesar de contabilizarmos um arsenal de instrumentos legais em favor


da inclusão; celebrarmos dez anos de construção de uma política inclusiva em
âmbito nacional e elaborarmos um PNE preocupado com a universalização do
atendimento educacional para os estudantes da Educação Especial (BRASIL,
2008; 2014), infelizmente pesquisas ainda denunciam o despreparo dos
professores para lidar com as diferenças em sala de aula, especialmente no
âmbito da educação infantil (PEREIRA, 2014; PRETSCH, 2009).
De fato, os cursos de licenciatura ainda não conseguem formar o
professor inclusivo, seja porque não cumprem o que determina a legislação, no
tocante a presença de componentes curriculares que ofereçam discussões,
estudos e pesquisas sobre o assunto, seja porque não articulam os

71
Professora da UFPB, Centro de Educação, DHP. E-mail: sandraassantiago@gmail.com

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conhecimentos próprios da docência em educação infantil com aqueles em
favor da inclusão. De um modo ou de outro, o acesso a este conhecimento tão
necessário ao desenvolvimento de uma prática inclusiva, não está garantido a
todos (BRASIL, 2002; 2008).
Nessa perspectiva, concordamos com o PNE (2014-2024) quando
reconhece no terceiro bloco de metas, especificamente as metas 15, 16, 17 e
18 a importância da formação docente “para o sucesso de uma política
educacional que busque a qualidade referenciada na Constituição Brasileira” 545
(MEC, 2014:12). Tal preocupação está presente noutros documentos em favor
da inclusão, como nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica (2002) ou na Política Nacional de Educação
Especial na perspectiva da Educação Inclusão (2008). Assim, pode-se admitir
que, apesar de já se registrar importantes avanços nesse campo, no tocante à
inclusão de estudantes com deficiências, transtornos globais de
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, especialmente na
Educação Infantil, contabilizamos mais desafios que conquistas.
Infelizmente, o descaso com a criança pequena é ainda mais notório
quando essa possui uma diferença que solicita um olhar diferenciado, como é o
caso das crianças que possuem deficiências, transtornos ou mesmo altas
habilidades. De fato, mesmo após quase duas décadas de intensa produção
normativa em favor da inclusão educacional, não se observam muitos avanços
junto às crianças pequenas, que na maioria das vezes, permanecem fora da
escola, especialmente se possuem sintomas ou suspeitas de algum tipo de
comprometimento.
No entanto, mesmo sem considerar as crianças pequenas com
deficiências, transtornos, etc., o diagnóstico já é bastante desanimador no
tocante à educação infantil, o que pode ser identificado na meta 1 do novo
Plano Nacional de Educação (2014-2024) quando explicita a necessidade que
se conquiste aspectos básicos como a universalização do atendimento de
crianças na faixa etária de 3 a 5 anos. O PNE pretendia “universalizar, até
2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 (quatro) a 5
(cinco) anos de idade”, e até 2024 “ampliar a oferta de educação infantil em

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creches, de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das
crianças de até 3 (três) anos” (BRASIL, 2014, p. 9).
Fica evidente que a situação de inclusão na Educação Infantil ainda é
um ponto nevrálgico da política brasileira e merece mais atenção dos órgãos
governamentais e das instancias formadoras e de pesquisa. A impressão que
se tem é que a Educação Infantil ainda é vítima do descaso e permanece
negligenciada nas políticas públicas (PEREIRA, 2014). Do mesmo modo,
ocorre com a Educação Especial que também é vista como uma intrusa naquilo 546
que se convencionou chamar de normalidade (SANTIAGO, 2011).
Desse modo, o fato é que essas duas “primas pobres” da educação
básica sequer são consideradas da família e, infelizmente, lutam separadas por
mais respeito e recurso. O resultado disso é que ambas ainda não
conseguiram estreitar suas relações e estabelecer um diálogo mais profícuo,
seja no espaço formativo ou nas próprias redes de ensino. Mas, de modo
bastante animador, identifica-se uma aproximação dessas áreas no PNE
(2014-2024), quando na meta que se volta para a Educação Especial, já se
consegue vislumbrar um olhar mais abrangente, quando inclui – pelo menos
em parte – a educação infantil. Na meta 4 do PNE se busca:

(...) universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17


(dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o
acesso à educação básica e ao atendimento educacional
especializado, preferencialmente na rede regular de
ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo,
de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou
serviços especializados, públicos ou conveniados
(BRASIL, PNE, 2014, p. 11) (grifos nossos).

Sob o ponto de vista da Educação Especial, desde a LDB (Lei de


Diretrizes e Bases da Educação), de 1996, se busca fazer com que se ascenda
ao status que lhe é devido, no entanto, essa compreensão necessita ser
reafirmada com mais constância do que se imagina. A Política Nacional de
Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI) de 2008
parece não ter sido suficiente nesse intento e diferentes documentos como o
Decreto 7.611 e 7.612, ambos de 2011, se encarregaram de reforçar a
importância dos serviços próprios e específicos da Educação Especial para que

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seu público alvo se inclua na escola (BRASIL, 2011a, 2011b), não sendo
bastante a mera matrícula, pois incluir exige muito mais do que estar presente.
Nesse contexto, fica claro que a garantia de sistema educacional
inclusivo exige estratégias de ensino, sejam em salas de recursos
multifuncionais, sejam em classes comuns, de modo que o estudante disponha
de serviços especializados que possibilitem sua plena participação com efetiva
aprendizagem e que para tanto, cabe ao educador identificar as NEE de seus
alunos (SANTIAGO, 2011). 547
Assim, apesar de se identificar avanços significativos em prol da política
inclusiva, o próprio PNE (2014-2024), em sua meta 4, reconhece que “há ainda
um grande desafio para promover a universalização, com acessibilidade ao
ambiente físico e aos recursos didáticos e pedagógicos” e que tais
necessidades estão intimamente relacionadas à formação docente (MEC,
2014; 25) (grifos nossos).
Considerando tais desafios é que, nesse estudo, se buscou estreitar o
diálogo entre a Educação Especial e a Educação Infantil, com o objetivo de
identificar necessidades e propor estratégias didáticas que promovam a
inclusão de crianças da Educação Infantil, tendo na formação continuada o
melhor momento para o professor construir tais competências. Esse, por sua
vez, não pode se furtar de garantir aos pequenos da educação infantil (com ou
sem NEE), o direito de aprender (KRAMER, 2008).

2 O CAMINHO METODOLÓGICO E SUAS REFLEXÕES


O presente artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla com duração de
um ano e que se encontra ainda em andamento, dentro do Programa Prolicen,
vinculado à UFPB. No entanto, para esse artigo, apresentamos parte dos dados
coletados e analisados até o momento. O referido estudo teve como referência a
pesquisa de natureza qualitativa, conforme sugere González Rey (2005), que
apontam como principais características o seu caráter explicativo e exploratório.
Como instrumento central fez uso da pesquisa-ação compreendida como uma
forma de intervir na realidade, enquanto reflete criticamente sobre sua própria
prática e busca melhorá-la (PIMENTA & FRANCO, 2008).

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O local de pesquisa foi a sede do Projeto Aponte, instituição filantrópica
que funciona há 4 anos e desenvolve uma proposta de educação infantil pautada
nos moldes inclusivos. Atualmente sua sede é no bairro das Indústrias, bairro que
possui muitas comunidades carentes e crianças em situação de vulnerabilidade
social. O Projeto atua especialmente com 10 voluntários, com formações variadas
(pedagogos, nutricionista, fisioterapeuta, psicopedagogo, arte-educador,
professores) que se alternam nas obrigações gerais do projeto, nos turnos da
manhã e tarde. No entanto, para esse estudo, nosso olhar voltou-se 548
especificamente para o turno da tarde, nas turmas de Educação Infantil, composta
por 3 grupos: grupo 1 (crianças de 3-4 anos), grupo 2 (4-5 anos), grupo 3 (5-
5anos e11 meses), totalizando 21 crianças.
Nossa pesquisa seguiu as seguintes etapas: a) estudos na área da
educação infantil e educação especial; b) observações participantes; c)
Intervenções junto aos Educadores; d) análise de dados e elaboração de
materiais.

2.1. OS ESTUDOS E AS OBSERVAÇÕES PARTICIPANTES

A etapa de estudos ocorreu durante os meses de maio, junho e


agosto\2018 e teve por base alguns documentos fundamentais das respectivas
áreas: Educação Infantil (RECNEI) e a Educação Especial (PNEEEI e textos
relativos ao público alvo da Educação Especial). Os estudos ocorreram em
encontros semanais, pautados na leitura prévia e discussão dos elementos
centrais do texto, buscando sempre uma articulação entre as duas áreas, a fim
de compreender as interfaces entre elas, superando a dicotomia existente.
Dos estudos muitas dúvidas foram suscitadas, especialmente no tocante: a)
identificação das NEE pertinentes aos sujeitos da Educação Especial; b)
planejamento semanal; c) rotina de atividades; d) acompanhamento do
desenvolvimento dos estudantes na educação infantil.
Além disso, os estudos na área da educação infantil e educação
inclusiva se inseriram na pauta de estudos dos educadores do Projeto Aponte e
tiveram por base a compreensão do desenvolvimento infantil nos seus

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múltiplos aspectos: cognitivo, perceptivo-motor, emocional, social, espiritual,
linguístico.
Entre os meses de maio e junho se deram as observações participantes,
por meio do acompanhamento das atividades desenvolvidas pelo Projeto, junto
à coordenadora e outros voluntários. Nessas ocasiões, além de fazer registros
de situações, dúvidas, necessidades específicas dos educandos, etc.,
assumíamos uma postura colaborativa com os demais voluntários, participando
ativamente das atividades propostas. Tais observações se deram de segunda a 549
sexta-feira, no horário das 13h às 16h.

2.2. AS INTERVENÇÕES JUNTO AOS EDUCADORES

A partir de tais registros fomos identificando as fragilidades das


educadoras para imprimir uma prática inclusiva, mesmo após os estudos
realizados. Desse modo, passamos a participar ativamente do planejamento
mensal do Projeto Aponte. Nestas ocasiões que ocorrem uma vez por mês,
sempre na primeira segunda feira de cada mês, propomos dinâmicas que
estimulassem a percepção e o respeito às diferenças no próprio grupo de
educadores, o que foi gerando paulatinamente uma postura mais aberta e
flexível entre eles.
Passo a passo, também propomos o uso de Temas Geradores (quadro
1) para o planejamento das atividades semanais e do estabelecimento de uma
Sequência Didática (quadro 2) para construir uma rotina diária que fomentasse
momentos coletivos e momentos individuais de aprendizagem para os
estudantes da Educação Infantil.

Quadro 1: Temas Geradores


MÊS TEMAS GERADORES

FEVEREIRO Férias, amigos, carnaval, escola.

MARÇO Água, natureza, páscoa, união.

ABRIL Ajuda, saúde, livro, indígena.

MAIO Mãe, família, trabalho, sol.

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JUNHO Festas juninas, comidas, danças\músicas,
artesanato.

AGOSTO João Pessoa, Deus – Pai de todos nós,


trânsito, folclore, soldado.

SETEMBRO Brasil, meio ambiente, amor, trânsito.

OUTUBRO Eleição, criança, música, idoso.

NOVEMBRO A escolher...

DEZEMBRO A escolher...

Fonte: dados da pesquisadora. 550

Tais temas, geralmente, eram desenvolvidos semanalmente (um por


semana) e norteavam a escolha das atividades que eram elaboradas pelos
educadores. De posse dos temas geradores de cada semana, os educadores
procediam o plano diário de atividades, seguindo uma determinada Sequência
Didática, conforme se vê a seguir:

Quadro 2: Sequência Didática


Momentos Objetivos

1. Acolhimento Estimular a interação, a linguagem oral, a


criatividade.

2. Meditação\espiritualização Estimular a concentração, atenção, emoção,


afetividade, amorosidade, sensibilidade.

3. Atividades dirigidas Desenvolver coordenação, linguagem,


atenção, memória, interação, percepção, etc.

4. Higiene\alimentação Estimular a percepção, concentração,


coordenação, autocuidado, autonomia.

5. Atividades livres Estimular iniciativa, auto-estima, criatividade,


coordenação, etc.

Fonte: dados da pesquisadora.

Cada momento teve duração aproximada de 20-30 minutos, onde as


crianças divididas por grupos participavam desses momentos que são, ora de
natureza coletiva (todos os grupos juntos), ora de natureza específica (grupos
separados por faixa etária e\ou nível de desenvolvimento). Os momentos de
acolhimento, meditação, higiene, lanche e recreio livre eram sempre coletivos,
enquanto as atividades dirigidas eram por grupo específico. Nessas últimas, as

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crianças são estimuladas a partir de suas necessidades e nível de
desenvolvimento global (cognitivo, linguístico, emocional, social, espiritual).
Os planos seguiam uma sequência lógica e dentro dos temas, mês a
mês, o que permitia acompanhar uma sequência de atividades que
encontravam harmonia entre si. Tais planos são elaborados a partir das
necessidades identificadas nos QD (quadros demonstrativos), e mais
recentemente, a partir dos QDDE. Desse modo, podemos, mais recentemente,
observar vários avanços no desenvolvimento das crianças atendidas. 551
Para a questão do acompanhamento do desenvolvimento dos
estudantes da Educação Infantil, solicitamos que cada educador registrasse as
suas percepções gerais sobre cada criança em particular, em Quadros
Demonstrativos (QD), durante os meses de maio, junho, julho, agosto e de
posse desses registros passamos a analisar os elementos destacados pelos
educadores, a fim de planejar atividades compatíveis com as NEE e
habilidades demonstradas por cada criança. Inicialmente, foi preciso dar
constantes orientações para que os educadores precisassem melhor suas
percepções a respeito dos estudantes e vissem não apenas as dificuldades,
mas, também as habilidades de cada criança. A primeira versão entregue não
apontava aspectos positivos. Mas, progressivamente, os educadores foram
demonstrando mais domínio e interesse no instrumento, como se pode ver no
quadro 1 a seguir:

Quadro 3: Quadro Demonstrativo – Mês: Maio.


ALUNOS DIFICULDADES HABILIDADES

A.B.A.S. Fala, socialização, criatividade, Memória, atenção,


compreensão, autonomia, concentração, sensibilidade.
motricidade fina.

M.H.S.A. Interação, emocional, Atenção, concentração,


Socialização, fala. Busca isolar-se memória.
com frequência. Assume
movimentos estereotipados e
tiques nervosos (suspeita de TEA
– transtorno do espectro
autista)72.

72
Segundo laudos apresentados pela família.

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R.S.S.A. Interação, comportamento, fala, Memória, criatividade,
atenção, concentração. curiosidade.

Não obedece comandos,


apresenta frequentes birras,
agressividade, falta de limite,
falas sem sentido. (suspeita de DI
– deficiência intelectual e TC –
transtorno de comportamento)73.

C.E.S.S. Compreensão, comportamento, Interação, autonomia,


criatividade, motricidade, curiosidade.
sensibilidade.
552
E.V.G. Fala, criatividade, autonomia. Memória, concentração,
atenção, motricidade ampla e
fina, interação, sensibilidade.

G.K.K. S. Emocional, comportamento, Memória, interação,


atenção, concentração, curiosidade.
percepção, motricidade fina,
sensibilidade.

J.V.A.C. Comportamento, criatividade, Autonomia, memória, atenção,


motricidade fina. concentração, interação,
sensibilidade, curiosidade.

K.K.C.S. Fala, autonomia, motricidade Interação, emocional,


ampla e fina. sensibilidade.

S.J.V.C. Motricidade ampla e fina, Interação, sensibilidade,


memória, atenção, criatividade.
comportamento, interação.

Fonte: dados da autora.

O uso de tais quadros ajudaram consideravelmente os educadores, de


modo que eles puderam acompanhar mais de perto o desenvolvimento de cada
criança e perceber aspectos que foram melhorados, bem como aspectos ainda
necessitando de intervenção mais direta, conforme se pode ver no quadro
abaixo (2):

Quadro 4: Quadro demonstrativo – Mês: Setembro


ALUNOS DIFICULDADES HABILIDADES

A.B.A.S. Motricidade fina, Memória, atenção, concentração, sensibilidade,


criatividade. melhorou na fala, socialização, compreensão.

C.E.S.S. Comportamento, Interação, autonomia, melhorou na motricidade


atenção, concentração. e sensibilidade.

73
Segundo laudos apresentados pela família.

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M.H.S.A. Emocional, curiosidade, Atenção, concentração, memória, interação,
criatividade. socialização, fala.

R.S.S.A. Comportamento, Memória, criatividade, curiosidade, interação,


atenção, concentração. fala.

E.V.G. Timidez. Memória, concentração, atenção, motricidade


ampla e fina, interação, sensibilidade. Melhorou
na fala e na autonomia.

G.K.K. S. Motricidade fina, Memória, interação. Melhorou no


sensibilidade. comportamento, atenção e concentração.

J.V.A.C. Motricidade fina. Autonomia, memória, atenção, concentração,


interação, sensibilidade. Melhorou no 553
comportamento e na criatividade.

K.K.C.S. Motricidade fina, Interação, emocional, sensibilidade. Melhorou na


atenção e concentração. fala, autonomia.

S.J.V.C. Motricidade fina, Interação, sensibilidade, criatividade.


memória, atenção.
Melhorou o comportamento e a interação.

Fonte: dados da autora.

Ao comparar o quadro 1 com o quadro 4, é possível observar os


inúmeros avanços conquistados por cada criança. Nesse momento
destacamos as mudanças observadas, principalmente em M.H.S.A e em
R.S.S.A, especialmente no tocante aos aspectos considerados importantes
para o diagnóstico de TEA, DI e TC, apontados em seus respectivos laudos.
Elementos como a socialização foram amplamente melhorados em M.H.S.A
que tem suspeita de transtorno do espectro autista, assim como sua própria
fala e comunicação, surpreendendo a todos. Do mesmo modo, R.S.S.A., com
suspeitas de deficiência intelectual e transtorno de comportamento vem
demonstrando melhoras significativas no seu desenvolvimento, com destaque
para a memória, interação e fala.

2.3. ANÁLISE DE DADOS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS

Nossa meta era montar um instrumento que facilitasse o


acompanhamento dos educadores, permitindo que, por si só, eles pudessem
acompanhar o desenvolvimento de cada aluno e a partir das NEE identificadas
propusessem recursos, materiais e estratégias que permitissem a

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aprendizagem de todos, sem excluir ninguém. Então, após receber os registros
feitos pelos educadores mês a mês, submetemo-los à análise e a
categorização, tomando por base os aspectos do desenvolvimento global. Em
seguida, construímos critérios avaliativos e organizamos um instrumento que
intitulamos Quadro Demonstrativo de Desempenho Escolar (QDDE). Os
registros diários dos educadores foram paulatinamente transformados em
QDDE semanais e, em seguida, QDDE mensais.
554
Quadro 5: QDDE mensal.
Nome do aluno\a:

Meses/ FE MA AB MA JU AG SE OU NO DE
V
Critérios observados R R I N O T T V Z

Atenção

Concentração

Compreensão

Organização

Motricidade ampla

Motricidade fina

Percepção

Memória

Linguagem
oral\comunicação

Criatividade

Curiosidade

Autocuidado

Autoestima

Iniciativa\autonomia

Interação\socialização

Afetividade\amorosidad
e

Sensibilidade

Respeito ao outro e às
regras

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Solidariedade

B = BOM R = REGULAR F = FRACO

Outras observações:

Fonte: dados da autora.

Para o preenchimento se utilizam marcadores (B, R e F), conforme o


desemprenho observado em diferentes atividades e situações de 555

aprendizagem, ao longo de cada mês. Conforme legenda instituída para rápida


leitura, os marcadores B, R e F significam: B = BOM desempenho; R =
REGULAR desempenho, F = FRACO desempenho, mas, os educadores
podem complementar com comentários no item aberto (outras observações),
no final do QDDE.
O QDDE passou a ser adotado em setembro\2018 e está em fase de
observação e aprimoramento, podendo sofrer alterações, caso necessário.
Mas, já foi recebido muito positivamente pelos educadores que manifestaram
satisfações no uso do quadro, indicando que o mesmo é bem mais completo
que o QD, não deixando escapar elementos importantes do desenvolvimento
global da criança pequena.

CONCLUSÕES

Até o momento, evidenciamos a importância que projetos dessa


natureza trazem para a formação continuada, conforme defende o PNE (2014-
2024). A reflexão sobre a prática a partir da própria inserção nela, conforme foi
vivenciado nesse projeto, possibilitou dentre outras coisas que crescêssemos
junto com os educadores do Projeto Aponte, possibilitando o desenvolvimento
de um olhar inclusivo sobre a Educação Infantil, a partir da interseção com a
Educação Especial, enquanto modalidade de ensino que nos permite identificar
as NEE dos estudantes desde cedo e atuar sobre elas.
Os estudos sobre Educação Inclusiva e Educação Infantil, a partir de
percepções in loco das NEE de alguns estudantes do Projeto Aponte, nos
fizeram refletir, ainda, sobre as lacunas deixadas pela formação inicial,

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especialmente se considerarmos o fato de que 100% dos educadores do
projeto possuem curso superior e até especialização. Mas, foi sem dúvida, na
formação continuada que pode se construir um novo olhar sobre a inclusão na
educação infantil. O PNE já preocupa-se com tal fato e manifesta na sua meta
16 a importância da formação continuada na consolidação de uma educação
de qualidade (BRASIL, 2014).
De posse desses conhecimentos, e guiados por uma formação
continuada em serviço, realizada no ambiente do próprio projeto, 556
especialmente nas reuniões de planejamento viabilizaram, pouco a pouco, a
construção de estratégias diretamente vinculadas as demandas reais
enfrentadas pelos educadores. E, cada contribuição que demos aos
educadores nasceram de suas próprias inquietações, dúvidas, necessidades, o
que faz com que ganhe muito mais significado e sentido para as práticas
docentes.
Ao mapear as principais necessidades dos educadores foi possível
pensar em estratégias compatíveis com o Projeto Aponte, tais como: o uso de
temas geradores, a organização de sequência didática, a elaboração dos
registros diários, construção dos Quadros de Desempenho (QD) e do Quadro
de Desenvolvimento do desempenho Escolar (QDDE), constituíram recursos e
estratégias educativas especiais para educadores e estudantes da educação
infantil, consolidando em certa medida uma Pedagogia da Inclusão.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei brasileira de inclusão. Brasília: MEC, 2015.


________. Política Nacional de Educação especial na perspectiva da
educação inclusiva. Brasília: MEC\SEESP, 2008.
_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei nº 9.394.
Brasília: MEC/SEE, 1996.
_______. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Especial na
Educação Básica. Brasília: MEC/SEESP, 2002.
_______. Decreto Lei 7.611. Dispõe sobre o atendimento Educacional
Especializado. Brasília: MEC/SEESP, 2011a.

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_______. Decreto Lei 7.612. Dispõe sobre a Educação Especial. Brasília:
MEC/SEESP, 2011b.
GONZÁLEZ REY, F. L. Pesquisa qualitativa e subjetiva e subjetividade: Os
processos de construção da informação. Tradução: Marcel Aristides Ferrada
Silva. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.
KRAMER, Sonia (Org.). Profissionais de educação infantil: gestão e
formação. São Paulo: Ática, 2008.
MEC. PNE. Planejando a próxima década: conhecendo as 20 metas do
plano nacional de educação. Brasília: MEC, 2014. 557
PEREIRA, C. D. Formação profissional e atuação no campo da educação
especial em Santa Catarina: alguns pontos de discussão. X ANPED SUL.
2014. Disponível em: http://xanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1313-0.pdf.
Acesso em 19 de março de 2016.
PLETSCH, D. M. A formação de professores para a educação inclusiva:
legislação, diretrizes políticas e resultados de pesquisa. Paraná: UFPR,
2009. Disponível em:
http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/educar/article/view/5233/10099. Acesso em:
23 de fevereiro de 2016.
PIMENTA, S. G.; FRANCO, M. A. S. [Orgs]. Pesquisa em educação:
Possibilidades investigativas/formativas da pesquisa-ação. Vol. 2. São Paulo:
Loyola, 2008.
SANTIAGO, S. A. S. A história da exclusão das pessoas com deficiência.
João Pessoa: Ed. Universitária, 2011.

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GT 6 – POLÍTICAS CURRICULARES E
FORMAÇÃO DOCENTE

EDUCAÇÃO DO CAMPO, CURRÍCULO E TEORIA FREIREANA:


conexões necessárias
558
74 75
Carlos Henrique de Andrade | Alisson Clauber Mendes de Alencar | Ismara
Milena Araújo de Sousa76

RESUMO: O referido estudo apresenta como objetivo analisar as relações existentes


entre o currículo do curso de Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo,
ofertado da Universidade Federal de Campina Grande no Centro de Desenvolvimento
Sustentável do Semiárido – UFCG – CDSA, e as bases epistemológicas da teoria
Freireana. Para sua materialização foram realizadas consultas em documentos oficiais
como o Projeto Pedagógico do Curso, os Marcos Normativos da Educação do Campo
e suas vinculações com pensamento de Paulo Freire e as implicações destas na
formação docente.

Palavras-chave: Currículo; Educação do Campo; Formação Docente; Teoria


Freireana.

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo enfatizar a contribuição de Paulo


Freire para a Educação do Campo, como também refletir a importância da sua
metodologia de pensar-fazer educação. Freire investiu em um método de
alfabetizar, letra e conscientizar diferente, atingindo a uma grande quantidade
de adeptos de suas concepções de ensino-aprendizagem. Inclusive, tencionou

74
Universidade Federal de Campina Grande – Centro de Desenvolvimento Sustentável do
Semiárido – UFCG - CDSA – Campus Sumé. Graduando em Licenciatura Interdisciplinar em
Educação do Campo. carlos-sume@hotmail.com
75
Universidade Federal de Campina Grande – Centro de Desenvolvimento Sustentável do
Semiárido – UFCG - CDSA – Campus Sumé. Graduando em Licenciatura Interdisciplinar em
Educação do Campo. alissonclauber@gmail.com
76
Universidade Federal de Campina Grande – Centro de Desenvolvimento Sustentável do
Semiárido – UFCG - CDSA – Campus Sumé. Graduanda em Licenciatura Interdisciplinar em
Educação do Campo. ismaramilena9@gmail.com

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esforços para que os sujeitos fossem os promotores/autores dos e nos
processos de transformação social, cultural, econômico e educacional.
Tornando-se senhores de seus destinos.
Entre os principais conceitos abordados em sua obra podemos
destacar: a Perspectiva da Educação bancária; a dialogicidade, Formação
Humana dos sujeitos, Autonomia, Esperança, Indagação, Libertação,
Experiência, Práxis, Revolução Cultural, Alfabetização de Adultos,
Transformação, Trabalho, Mudança Social, Docência, Criticidade, Ética, Utopia, 559
o conceito / categoria analítica de Conscientização e as questões que
envolvem o contexto onde os sujeitos estão inseridos.
Freire direcionou suas análises para um modus operandi de fazer-
pensar educação, realizando críticas às condições em que indivíduos
encontravam-se inseridos num contexto de opressores e, na outra extremidade
dessa situação, outro grupo se caracterizava como os oprimidos. Destacamos
que na época de seus primeiros escritos, os sujeitos do campo eram os mais
afetados pela falta de igualdade e subalternização, tendo como referência, o
dito “espaço urbano”, nas décadas de 60 e 70. Fato que em determinados
territórios perdura-se até os dias que seguem, com a vinculação do espaço
camponês ao sinônimo de atraso. Situação esta que merece nossa dedicação
para um processo de desconstrução desta concepção de campo construída
historicamente.
Vale salientar que nessa perspectiva de opressão, a população
camponesa foi afetada economicamente, por conta das desigualdades sociais,
mas um fator de extrema importância que acabou sendo atacado foi à cultura
desse povo, tornando-se seres restritos e que deveriam seguir o que era
imposto pela sociedade “urbanizada”, assim, perdendo parte de sua identidade
construída em sua trajetória de vida.
A relação dos povos campesinos com a educação,
urbanocêntrica e descontextualizada da realidade destes territórios,
ainda é marcada por imposições, pois, os currículos que estão sendo
inseridos nas escolas são amplamente desconexos da realidade.
Para tanto, faz-se necessário rever tais práticas
curriculares, sendo importantíssimo o desenvolvimento de reflexão a
respeito destas provocações, para que haja uma reformulação
curricular e que os povos do campo, tenham suas formas de se
fazer-pensar educação respeitadas e, que suas culturas e práticas

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sejam valorizadas. Sobre o conceito de Educação do Campo,
Caldart et al (2012, p. 13) ressalta que

A Educação do Campo está sendo entendida nesta obra como


um fenômeno da realidade brasileira atual que somente pode
ser compreendido no âmbito contraditório da práxis e
considerando seu tempo e contexto histórico de origem. A
essência da Educação do Campo não pode ser apreendida
senão no seu movimento real, que implica um conjunto
articulado de relações (fundamentalmente contradições) que a
constituem como prática/projeto/política de educação e cujo
sujeito é a classe trabalhadora do campo. 560

Sobre nosso entendimento em relação ao conceito de


Educação do Campo, podemos destacar que este está relacionado
diretamente a uma concepção e projeto de sociedade onde se
articulam sujeitos, territórios, tempos e formas de sociabilidade entre
indivíduos, formas de trabalho e práticas educativas que são plurais
na sua essência. Para que sejam efetivadas tais concepções é
primordial que estas condições sejam asseguradas legalmente.
Destacamos que as contribuições de Freire dialogam
diretamente com o que os estudiosos e defensores da Educação do
Campo trazem como arcabouço da práxis de pensar os sujeitos e
suas práticas de sociabilidade, pois, Freire em sua vasta obra traz
constantemente a importância de se articular educação ao contexto
onde o indivíduo está inserido.
Freire (1988) ressalta ser condição prioritária que os
sujeitos desenvolvam a capacidade de realizar uma leitura crítica da
realidade na qual estão imersos e, sempre que possível estabelecer
uma relação escalar com o intuito de promover conexões locais e
globais. É imprescindível compreender a realidade realizar ações de
questionar o que está aparente, e perceber-se como produtor de
uma determinada história e cultura, situado num dado contexto.
Entretanto, observa-se que o processo de globalização
afetou de certa maneira a vida dos povos campesinos, pois, ao longo
das últimas décadas e com esses “novos” meios tecnológicos, a
indústria e em principal o agronegócio, instituiu-se como se fossem
meros donos daquelas terras, investindo na produção de alimentos
tóxicos, causando uma série de preocupações e surgindo
emergências para serem combatidas diante dessa realidade que os
sujeitos do campo vêm vivenciando na contemporaneidade.
Os fatos supracitados incidem diretamente na vida dos
povos do campo, onde uma parcela significativa é imposta a migrar
para as cidades, com intuito de conseguirem melhores condições de
trabalho. Porém, isto se configura como uma realidade, a partir do
momento em que as políticas públicas não são efetivadas nos
territórios campesinos. E dentre as tantas reivindicações dos grupos
sociais situadas espacialmente no campo brasileiro, as que
envolvem a educação encabeçam a lista das solicitações, reclames,
sendo este direito negado ou suprimido. Uma vitória significativa dos
povos do campo foi implementação de Marcos Normativos, onde um
dos mais significativos expressa que

Um marco na consolidação da educação do Campo é a instituição


do Decreto nº 7.352 de 4 de novembro de 2010, que dispõe sobre a

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Política de Educação do Campo e o Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária – PRONERA. O Decreto destaca os princípios da
educação do campo, tais como o respeito à diversidade, a formulação
de projetos políticos-pedagógicos específicos, o desenvolvimento
de políticas de formação de profissionais da educação e a efetiva
participação da comunidade e dos movimentos sociais do campo. (BRASIL, 2012, p. 5
– 6).

Mas para que este Marco Normativo, assegurado via decreto, venha a
ser respeitado, outras medidas legais devem ser adquiridas, onde uma das
mais representativas trata da formação de professores para atuarem nestes 561
territórios, que historicamente foram invisibilizados e inferiorizados. Trazemos
ainda, como elemento importante deste pensar-fazer Educação do Campo a
partir das concepções Freireanas, a participação efetiva dos sujeitos
campesinos na organização dos processos que regem as práticas educativas,
os conteúdos programáticos, o currículo e as formas de avaliação.

Corroboramos com o entendimento de Freire (1979a, p. 14) quando o


mesmo discorre que “O homem deve ser o sujeito de sua própria educação.
Não pode ser o objeto dela.” Assim, torna-se imperativo sua participação e
autonomia nas tomadas de decisões que envolva as práticas educativas que os
mesmos vivenciam.
A partir destas questões iniciais apresentaremos nos tópicos seguintes nosso
referencial teórico que estabelece a relação entre as concepções da Educação do
Campo e as contribuições existentes na vasta obra de Paulo Freire que dialogam
diretamente com esta forma de pensar e fazer educação.

DESENVOLVIMENTO

Entendemos que para o desenvolvimento dos processos cognitivos e


construtivos dos indivíduos no âmbito escolar, um dos elementos fundantes é a
práxis. Mas a esta, outro processo deve ser somado, o de conscientização
sobre a realidade a qual os sujeitos estão inseridos, e sobre esta, Freire
(1979b, p. 15)
A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais
conscientização, mais se “desvela” a realidade, mais se penetra na essência
fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta

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mesma razão, a conscientização não consiste em “estar frente à realidade”
assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode
existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação – reflexão.
Baseando-se no que foi exposto, Freire (1979b) mostra que a
conscientização precisa está relacionada a práxis para que isso aconteça, pois,
nós seres humanos só conseguimos nos desenvolver se entramos em conjunto
com esse dois meios: teoria e prática.
Outro ponto que merece ser destacado nesta discussão diz respeito a 562
forma como Freire (1979b) enfatiza que: “Quanto mais refletir sobre a
realidade, sobre sua situação concreta, mais emerge, plenamente consciente,
comprometido, pronto a intervir na realidade para mudá-la.” Endossando as
palavras de Freire, trazemos as contribuições de Caldart (2004, p. 2) quando a
autora ressalta que “(...) a Educação do Campo como processo de construção
de um projeto de educação dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo,
gestado desde o ponto de vista dos camponeses e da trajetória de luta de suas
organizações.” Noutras palavras, os sujeitos camponeses devem participar
diretamente do processo de construção de suas propostas pedagógicas.
De acordo com a perspectiva citada, destacamos que tal concepção
instiga os sujeitos a pensarem e observarem a realidade do mundo o qual
vivem, para que tenham a consciência e opinião própria, com intuito de querer
mudança e de não se esquivar para os parâmetros que a sociedade impõem,
assim, tendo como total liberdade para sua vida.
Uma educação que procura desenvolver a tomada de consciência e a
atitude crítica, graças à qual o homem escolhe e decide, liberta-o em lugar de
submetê-lo, de domesticá-lo, de adaptá-lo, como faz com muita freqüência a
educação em vigor num grande número de países do mundo, educação que
tende a ajustar o indivíduo à sociedade, em lugar de promovê-lo em sua
própria linha. (FREIRE, 1979b, p. 19)
A educação construída por Paulo Freire tem como principal objetivo o de
formar sujeitos pensantes e conscientes para que tenham uma atitude crítica
perante a realidade. Assim sendo, trazemos como crítica que em muitas
instituições públicas da educação básica, tal concepção de educação ainda

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não se tornou possível, por conta das condições impostas via currículos e
programas, fato este que inviabiliza a tão idealizada autonomia docente, pois
são os índices e indicadores que atualmente regem os sistemas de ensino.
Estudar é, realmente um trabalho difícil. Exige de quem o faz uma
postura crítica sistemática. Exige disciplina intelectual que não se ganha a não
ser praticando-a. Isto é, precisamente, o que a “educação bancária” não
estimula. Pelo contrário, sua tônica reside fundamentalmente em matar nos
educandos a curiosidade, o espírito investigador, a criatividade. Sua “disciplina” 563
é a disciplina para a ingenuidade em face do texto, não para a indispensável
criticidade. (FREIRE, 1981, p.8).
Partindo desta citação, destacamos que as formas de pensar-fazer
educação estão condicionadas a modelos pré-estabelecidos, fabricados de
modo desconexo da realidade dos povos camponeses, fato este que poda
drasticamente a criatividade e a criticidade discente e docente, pois os
modelos/pacotes que são adquiridos possuem até os instrumentos de
avaliação, provas e exames.
Trazemos aqui como contribuição teórica que os documentos que
normatizam os cursos de formação inicial e continuada de professores
(Licenciaturas em Educação do Campo) dos docentes das escolas do campo,
ressalta em seu art. 13, incisos I e II das Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo, vem assegurar os componentes que precisam ser
observados pelos Centros Formativos na elaboração de suas propostas:

1) O respeito à diversidade cultural e aos processos de


interação e transformação existentes no campo brasileiro; 2) O
estudo sobre o efetivo protagonismo das crianças, dos jovens e
dos adultos do campo na construção da qualidade social de
vida individual e coletiva; 3) O acesso ao conhecimento
científico e tecnológico, tendo por referência os princípios
éticos e a democracia, isto supõe, entre outras coisas, superar
a cultura da reprovação, da retenção e da seletividade, centrar
a atenção nos níveis de desenvolvimento cognitivo, afetivo,
social, moral, ético, cultural e profissional. (UFCG – CDSA,
2011, p. 13 – 14).

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Para os sujeitos que irão atuar ou atuam nas escolas públicas situadas
em territórios campesinos, faz-se necessária uma formação que contemple e
acima de tudo respeite os aspectos culturais, sociais, profissionais, educativos
e as formas de sociabilidades destes povos.
Os cursos de Licenciatura em Educação do Campo, na função de
instituições formadoras, devem analisar as condições locais e perceber as
especificidades e singularidades para serem acrescidas a seus componentes
curriculares, ou seja, aproximar os aspectos históricos, geográficos, políticos, 564
econômicos e culturais. Estreitando as relações entre os aportes teóricos e
práticos no processo educativo dos futuros docentes das escolas do campo.
Sendo uma das palavras chaves desse estreitamento, a contextualização, que
na perspectiva de Silva (2010, p. 4) evidencia que
A contextualização do ensino favorece aprendizagens significativas
porque é um processo facilitador da compreensão do sentido das coisas, dos
fenômenos e da vida. Enfim; contextualizar é problematizar o objeto em estudo
a partir dos conteúdos dos componentes curriculares fazendo a vinculação com
a realidade situando-os no contexto e retornando com um novo olhar.
Os docentes, tanto os formadores nas licenciaturas quanto os das
instituições de educação básica, precisam conhecer as realidades as quais
seus discentes estão inseridos, sendo uma outra tarefa a
aproximação/conhecimento dos mundos individuais, onde seus aprendentes
estão inseridos e transitando, sendo esta última missão mais árdua, pois os
fatores tempo e quantidade tornam-se elementos complicativos, seja na
universidade ou nas escolas.
Contextualizar na perspectiva da Educação do Campo relaciona-se a um
modelo de transformação da educação que está atrelado a um projeto de
sociedade diferente do que está posto e que priorize uma metodologia ativa de
ensino de qualidade com foco no contexto.
Por outro lado, a contextualização que se pretende não é aquela que é
sempre feita pelos mesmos “intelectuais” ligados a narrativas hegemônica e a
sua indústria editorial, que quando pensa está “contextualizando” acaba por

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produzir adaptações que resultam em caricaturas [...] a questão do contexto, é
muito mais ampla. (MARTINS, 2006, p.44).
Promover contextualização no processo de ensino-aprendizagem é
construir pontes para uma intervenção na transformação social da realidade em
que os discentes estão inseridos, na condição de sujeitos históricos e que
pensam, agem, refletem e tornam-se autônomos em suas trajetórias educativas
e em seus múltiplos contextos.
Para o desenvolvimento deste estudo nos debruçamos sobre o Projeto 565
Pedagógico do Curso de Licenciatura em Educação do Campo bem como de
texto sobre os Marcos Normativos que regem essa proposta de educação e
articulando estes escritos com as concepções freiriana de educação.
Outro ponto que nos instigou a desenvolver este trabalho foram os
componentes curriculares cursados até o presente momento no referido curso,
pois todos dialogam com uma proposta de formação docente na perspectiva
humana e na condição de um sujeito que se construa enquanto crítico e
consciente de suas ações. Nos entendimentos de Silva (2009, p. 97), a autora
ressalta que
É preciso, sobretudo, que o cotidiano do professorado do campo, a cada
momento, seja confrontado com situações muito diversas, dizendo tomar
decisões pedagógicas cujos resultados são incertos, mais objetivamente
intencionados, dentro de um contexto de densa complexidade. Isso exige que
os centros formativos reconheçam que os saberes transbordam de muito dos
muros da escola e das instituições de ensino.
Pelo fato dos componentes curriculares dialogarem constantemente
com as obras e as teorias Freire, acreditamos ter conseguido estabelecer
relações entre o que foi proposto nos componentes e essa perspectiva de
educação que leva em consideração o espaço onde o sujeito está inserido, seu
contexto e suas práticas culturais.
No primeiro período do curso foram cursados 8 componentes
curriculares e destacamos em nosso entendimento que todos dialogavam com
as questões pensadas e materializadas por Freire, destacamos estes: Prática
de leitura e produção de texto; Psicologia da Educação; Laboratório de

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Pesquisa e Prática Pedagógica em Educação do Campo – I; Antropologia e
Educação; Fundamentos Históricos da Educação; Cultura Corporal; Educação
do Campo e Pedagogia da alternância.
Todos estes componentes curriculares estão diretamente ligados ao eixo
temático do primeiro período que foi Identidades no Semiárido. Pelo fato do
curso de Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo está situado no
Campus da Universidade Federal de Campina Grande, Centro de
Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, no município de Sumé – PB, uma 566
das premissas que se respeita é a condição temporal e espacial e nesta
condição espacial o semiárido entra como elemento articulador de conteúdos e
teorias, pois, os sujeitos devem acima de tudo respeitar e compreender o chão
que os sustenta em suas caminhadas.
No segundo período foram cursados 9 componentes curriculares:
Infância, Adolescência e Juventude no Campo; Pesquisa em Educação;
Informática Básica; Identidades e Territorialidades; Fundamentos Sócio -
Filosóficos da Educação do Campo; Política Educacional e Educação Básica
no Brasil; Educação de Jovens e Adultos; Questão Agrária e Campesinato e
Laboratório de Pesquisa e Prática Pedagógica em Educação do Campo – 2.
Tais componentes tencionaram esforços para abordar as questões territoriais,
pois esta direcionava o eixo de trabalho do referido período.
De acordo com o tipo de formação do futuro docente, inserido na
academia, tem-se um ciclo pedagógico direcionado, pois, este brevemente
estará a formar outros sujeitos nos territórios e comunidades em que por
ventura virá atuar. E para que tal atuação docente torne-se valorativa é
fundamental que o futuro educador participe, informe, construa possibilidades
de conhecimento e envolva-se na/com a realidade a qual ele está inserido.
Este modus de educar para o “desenvolvimento local” no entendimento
de Dowbor (2006) está relacionado à necessidade de formar sujeitos que
sejam capazes de participar de forma ativa da sua comunidade, seu território,
considerando que a inserção na realidade deve começar o mais cedo possível.
Assim sendo, os sujeitos irão se apropriar com mais afinco das formas de
sociabilidade e conhecimentos inerentes a sua ancestralidade, territorialidade e

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identidade. Sobre a importância na análise do território, Fernandes; Molina
(2004, p. 61), ressaltam que
Ter seu território implica em um modo de pensar a realidade. Para
garantir a identidade territorial, a autonomia e a organização política, é preciso
pensar a realidade desde seu território, de sua comunidade, de seu município,
de seu país, do mundo. Não se pensa o próprio território a partir do território do
outro. Isso é alienação.
E, sobre o último termo da citação, Freire e Shor (1986) ressaltam que a 567
alienação é um dos maiores problemas, desafios a serem enfrentados nas
instituições de ensino, e só pode ser superada, a partir da práxis, do processo
de ação – reflexão / reflexão – ação.

CONCLUSÃO

Neste artigo, buscou-se discutir as contribuições freireana para a o


Currículo da Educação do Campo, principalmente através das múltiplas
relações plurais vivificadas pelos variados povos camponeses, com todos os
processos de transformações sociais, educativos, trabalhistas e culturais
ocorridos no território campesino. Bem como a importância do pensar-fazer
educação respeitando os territórios onde os sujeitos estão construindo suas
relações de sociabilidade, pertencimento e conhecimento.
Discutiu-se, ainda, como os Projetos Pedagógicos dos Cursos de
licenciatura, de modo particular, o do curso de Licenciatura Interdisciplinar em
Educação do Campo da Universidade Federal de Campina Grande no Centro
de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido – UFCG/CDSA, vem
colaborando para uma formação docente que preze pela humanização dos
processos educativos, pautados numa perspectiva Freireana de ensino –
aprendizagem.
Relatamos ainda, como a práxis Freireana influencia as propostas
educativas seja nos territórios da academia, seja nas instituições de ensino da
educação básica. Onde trouxemos a importância das questões espaciais,
temporais e territoriais para a construção de uma pedagogia que compreenda

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as especificidades e singularidades dos povos campesinos. Pois, a partir do
momento que os sujeitos se reconhecem enquanto possuidores de uma
identidade, de uma ancestralidade e de uma territorialidade, podem ter suas
referencias comparativas para direcionar suas interpretações perante outros
territórios e outras identidades. Fato este que estudiosos da questão chamam
de alteridade.
Denunciamos também, que as transformações impostas aos territórios
camponeses provocam em muitos casos a expulsão dos povos do campo, 568
fatos este que inviabiliza o desenvolvimento de laços afetivos e culturais com o
território das comunidades campesinas. O avanço dos sistemas industriais
juntamente com o desenvolvimento do agronegócio, afeta diretamente a vida
cotidiana dos povos do campo.
Concluímos que os escritos Freireanos são de relevante importância
para a formação dos educadores e educadoras, que estão dentro das
instituições de ensino superior nas licenciaturas em Educação do Campo, na
condição de formadores de futuros professores e professoras de escolas do
campo. Escolas e sujeitos que foram invisibilizados outrora, mas agora
resistem e reclamam seus direitos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada,


Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI. Educação do Campo:
Marcos Normativos / Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão – Brasília: SECADI, 2012.
CALDART, Roseli Salete. Elementos para construção do projeto político e
pedagógico da Educação do Campo. Revista Trabalho Necessário, ano 2,
número 2, 2004.
CALDART, Roseli Salete. et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de
Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio,
Expressão Popular, 2012.
DOWBOR, L. Educação e desenvolvimento local. 2006. Disponível em:
<http://dowbor.org/2006/04/educacao-e-desenvolvimento-local-doc.html/>.
Acessado em 25 de julho de 2018.

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FERNANDES, B. M.; MOLINA, M. C. O campo da educação do campo. In:
MOLINA, M. C.; JESUS, S. M. S. A. (orgs.). Contribuições para a construção de
um projeto de educação do campo. Brasília, DF: Articulação Nacional Por uma
Educação do Campo, 2004.
FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 12ª Edição. Paz e Terra. Rio de
Janeiro, 1979a.
_______________. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma
introdução ao pensamento de Paulo Freire. Tradução de Kátia de Mello e
silva; Revisão técnica de Benedito Eliseu Leite Cintra. São Paulo: Cortez &
569
Moraes, 1979b.
_______________. Ação Cultural para a Liberdade e Outros Escritos. 5ª
ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
_______________. A importância do ato de ler: em três artigos que se
completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1988.
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1986.
MARTINS, Josemar da Silva. Anotações em torno do conceito de educação
para a convivência com o Semiárido. In: Educação para a Convivência com
o Semiárido: reflexões teórico-práticas. Juazeiro (BA): Secretaria Executiva da
Rede de Educação do Semiárido Brasileiro, Selo Editorial-RESAB, 2006.

SILVA, Adelaide Pereira da. O conceito de educação Contextualizada na


perspectiva do pensamento complexo – um começo de conversa. Curso
de Espacialização Em Educação Contextualizada para a Convivência com o
Semiárido Brasileiro ofertado pelo CDSA — Campus de Sumé (UFCG), 2010.
SILVA, Maria do Socorro. As práticas pedagógicas das escolas do campo:
a escola na vida e a vida como escola. 2009. Tese (Doutorado). Programa
de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Pernambuco,
Recife, 2009.
UFCG – CDSA. Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em
Educação do Campo. Campina Grande – PB, agosto de 2011.

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BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: DOCÊNCIA E VISÕES DE
COMPETÊNCIA

Amanda Rafaella Ferreira de Lima | Ângela Cristina Alves Albino | Sheila Costa
de Farias

RESUMO: A presente análise é parte de um projeto extensionista desenvolvido na


Universidade Federal da Paraíba – UFPB que busca compreender algumas
significações curriculares dos docentes no processo de implementação da Base 570
Nacional Comum Curricular. Neste estudo, buscamos destacar alguns elementos
históricos da BNCC articulados às análises de vozes docentes em torno do processo.
A BNCC é uma parte importante da construção do currículo escolar da educação
básica brasileira, assim como se apresenta como campo de disputas profundas entre
projetos distintos de sociedade e de educação que está, também, no centro da
discussão sobre o projeto de nação atual, bem como no cerne do debate das questões
atuais relativas ao desenvolvimento e à inclusão social. O desdobramento de uma
BNCC não só repercute nas disciplinas, mas também nas redes de conhecimento
vinculadas à gestão escolar, à formação docente e à própria recepção discente.
Assim, as vozes reveladas podem auxiliar no processo de implementação da política
curricular, bem como suscitar novas formas de produzir um currículo nacional.
Palavras-chave: Currículo. Docência. Escola.

INTRODUÇÃO

No campo de produção de políticas curriculares, a BNCC - Base


Nacional Comum Curricular - é uma política nacional de currículo que buscou
articular os entes federados e a sociedade, de um modo geral, para compor
uma proposta de Direitos e Objetivos de Aprendizagem e Desenvolvimento
para toda Educação Básica. Até o momento, temos a aprovação de duas
etapas da educação básica que são: Educação Infantil e Ensino Fundamental.
A base do Ensino Médio ainda está em tramitação por meio de conferências
regionais. O desenvolvimento de uma BNCC para as escolas brasileiras
repercute e tenciona não só o currículo, mas todas as questões capilarizadas
na proposição de saberes desse movimento de decisão que são as redes de
conhecimento vinculadas à gestão escolar, à formação docente e à própria
recepção discente. Na Paraíba, alguns seminários foram realizados sobre a
nova Base do Currículo, mas nos preocupa o fato de haver docentes que
desconhecem o processo de reformulação em curso e não se reconhecem
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como partícipes dessa proposição. Assim, o presente projeto busca analisar o
envolvimento e a participação docente na construção da BNCC, que em tese
deveria ser democrática e coletiva, bem como oferecer os seminários temáticos
às escolas.

A BNCC A PARTIR DE UM PROJETO EXTENSIONISTA

O currículo pode ser compreendido como campo de batalhas e produção 571

do conhecimento em torno da formação de um tipo de sujeito. Em tempos de


produção curricular, é preciso pensar ainda, conforme Giroux (1987, p.83), que
“O sistema escolar [...] é um terreno político e ideológico, a partir do qual a
cultura dominante produz, em parte, suas certezas ideológicas; mas também é
um espaço onde as vozes dominantes e subordinadas, por meio de constante
batalha e intercâmbio [...]”. Nesse processo, os professores definem-se, bem
como limitam-se a partir das condições sociohistóricas. As práticas dos
professores são determinantes da cultura escolar.

Ao longo do desenvolvimento do projeto, realizamos estudos em torno


da proposição da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Foi realizada uma
coleta de dados com aplicação de questionários endereçados aos docentes e
gestores da Educação Básica. A coleta dos dados ocorreu nos meses de maio
e junho de 2018, por meio de questionários estruturados, sem identificação dos
participantes, com questões objetivas e abertas. Foram aplicados 30
questionários nos municípios de Areia, Arara e Remígio que são municípios
paraibanos. Ao todo foram cinco instituições participantes.

Foi realizado um evento de formação docente com base nos dados


coletados como forma de intervenção/devolução à comunidade educativa por
meio de seminário temático na UFPB – Campus II, em 26 de setembro de
2018. Contamos com a participação de diversas instituições de ensino tanto da
cidade de Areia, bem como de municípios vizinhos. Vale ressaltar que o
número de estudantes dos cursos de licenciatura, principalmente dos que estão
inseridos na residência pedagógica, foi bastante significativo. Ao todo o

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seminário reuniu 156 participantes, entre professores da Rede Pública de
Ensino e licenciandos.

No credenciamento, os participantes recebiam um envelope que


continha: certificado com 4 horas de participação, as 10 competências gerais
da BNCC e um questionário estruturados sem identificação dos participantes,
com questões objetivas e abertas. Os agentes do projeto realizaram ações
importantes a convite de instituições universitárias e escolares para trabalhar a
572
temática da BNCC do Ensino Médio atrelada à Reforma. Uma aconteceu na
Escola Estadual Carlota Barreira em Areia – PB (julho de 2018) e a outra na
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB (agosto de 2018). O projeto já está
em sua terceira versão e entendemos, ainda, a temática da BNCC como eixo
fundamental da vivência docente na contemporaneidade.

A perspectiva de analisar os discursos docentes se desenvolve no intuito


de realizar, posteriormente, a cada processo de análise, os seminários
temáticos que colocam os professores em contato com suas próprias análises
(vozes) da Base Nacional Comum Curricular. Além de se apropriar da política
de currículo nacional, eles podem avaliar também o seu nível de participação
em todo processo de reformulação curricular.

RESULTADOS E DISCURSÃO

A primeira atividade desenvolvida foi a aplicação dos questionários nas


cidades de Areia, Arara e Remígio. Nela foram abordadas questões que
discutiam sobre: quais as maiores dificuldades de implantação de uma Base de
Currículo Nacional; se a BNCC pode reduzir as desigualdades educacionais no
Brasil e de qual forma será possível; o que significa autonomia docente, PPP,
entre outras. Vale destacar que selecionamos quatro das oito questões
aplicadas, as quais serão abordadas a seguir, sem necessariamente estarem
regidas pela sequência posta no questionário. A primeira buscava saber o que
para o/a docente significava um indivíduo competente em termos de
desenvolvimento humano e quais as características são fundamentais. Abaixo
algumas das respostas dadas:

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“Um indivíduo competente busca ter autonomia,
habilidades e conhecimentos que o levem ao melhor
desenvolvimento pessoal, profissional. As principais
características são justamente a capacidade de liderança,
auto formação, comprometimento, dedicação. Meu aluno
será competente se conseguir unir todas as
características acima mencionadas.”
“Meu aluno será competente se, ao longo dos anos de
ensino, desenvolver um pensamento autônomo, de modo
que possa analisar e discutir criticamente a realidade que
o cerca.”
573

Ao longo da vida o/a estudante irá se deparar com inúmeras situações


não apenas na área profissional que exigirá saber trabalhar em equipe, ter
autonomia para tomar decisões e resolver problemas, situações que envolvam
tanto o social quanto o profissional e, segundo as proposições da Base
Nacional, estas serão algumas das suas propostas a serem trabalhadas nas
escolas de todo o país. A terceira versão do documento conta com dez
competências gerais, a serem trabalhadas em todas as disciplinas.

De acordo com o documento da BNCC:

[...] essas competências serão fruto de uma construção


intencional de processos educativos que promovam
aprendizagens sintonizadas com as necessidades, as
possibilidades e os interesses dos alunos e, também,
com os desafios da sociedade contemporânea, de modo
a formar pessoas autônomas, capazes de se servir
dessas aprendizagens em suas vidas (BNCC, 2017, p.
17).

A segunda questão buscava averiguar quais são as maiores dificuldades


de implantação de uma Base de Currículo Nacional. Abaixo algumas das
respostas:

“A falta de conhecimento sobre a questão e recursos para


implementação do novo modelo.”
“As maiores dificuldades na implantação de uma base
comum está relacionada a grande extensão territorial do
país, como também as particularidades inerentes de cada
grande região.”

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“Uma das maiores dificuldades estar na identidade de
cada região, onde o professor tem de adaptar suas aulas
a um currículo padrão, mas não deve (pode) deixar a
realidade local em “segundo plano”. Geralmente, isso não
parece ser levado em conta, quando um currículo tão
estático é proposto.”

Com o documento elaborado de forma antidemocrática, a BNCC do


Ensino Médio aguarda sua aprovação enquanto inúmeros grupos de estudos
574
debatem sobre a sua construção. O texto traz pontos que preocupam em
diversos assuntos como, por exemplo, o respeito à diversidade e à pluralidade
do país, as limitações que cada região e cada escola possui. Outro ponto
preocupante é a falta de formação docente. Os estados e munícipios têm o
dever de realizar esses encontros de formação, no entanto, deixam a desejar.
Os estados realizaram os seminários, só que não socializaram o que foi
discutido e o que ficou definido nesses encontros. A realidade de alguns
municípios é reveladora quando professores e gestores relatam não terem
compreensão do documento da Base, e outros não terem conhecimento do
documento é bastante preocupante. De nada adianta aprovar um documento
de Base Curricular obrigatório, dizendo à escola o que e como ensinar os
conteúdos, sem que para isto haja formação e compreensão da BNCC.

Em 02 de julho desde ano, o presidente da Comissão da Base Nacional


Comum Curricular (BNCC), César Collegari, renunciou à função, deixando uma
carta destinada aos conselheiros e às conselheiras membros do Conselho
Nacional de Educação. Em um trecho da carta, ele menciona a reforma do
Ensino Médio:

Ao abandonar a atenção aos domínios conceituais


próprios das diferentes disciplinas, a proposta do MEC
não só dificulta uma visão interdisciplinar e
contextualizada do mundo, mas pode levar à formação de
uma geração de jovens pouco qualificados, acríticos,
manipuláveis, incapazes de criar e condenados aos
trabalhos mais simples e entediantes, cada vez mais
raros e mal remunerados. É isso que se quer para o
país? (COLLEGARI, 2018, p. 3).

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Para Collegari, a Reforma do Ensino Médio deve ser revogada e a
BNCC do Ensino Médio completamente reformulada. Isso porque ele considera
o texto falho em seus objetivos a serem alcançados e preocupante como
destino dos profissionais que serão formados a partir dessa Base.

A quinta questão pretendia verificar o que significa autonomia docente.


Algumas das respostas foram: 575
“O professor ter liberdade para escolher o que ensinar de
acordo com a realidade da turma.”
“Autonomia docente é o professor poder flexibilizar seus
conteúdos, tendo em vista que cada turma tem suas
peculiaridades. O professor precisa ter liberdade para
poder exercer sua função, desde que responsabilize
pelos seus atos.”
“Autonomia docente é o professor ter espaço para
trabalhar os conteúdos e metodologias adequadas para a
escola a qual pertence. Mesmo na Educação do setor
público, muitos direcionamentos não deixam esse espaço
para o professor e acaba toda uma equipe sendo
“apagada” no projeto escolar.”

Segundo Albino (2018, p. 83 - 84):

A liberdade é condição para emancipação do homem,


para a leitura do seu contexto histórico e politico e para
uma educação existencial que faça sentido com e para o
mundo [...]. Ao pensar nas compreensões freireanas de
liberdade, tenho percebido que é importante “dar voz” ao
professor, uma vez que boa parte das discussões até
então realizadas no chão da escola pública, têm
enfatizado a necessidade de um projeto que configure a
autonomia da escola, mas não deixam ressoar a voz
desse profissional, que apesar da quantidade de “pacotes
curriculares”, é responsável pelos rumos do próprio
trabalho pedagógico e pelo perfil da escola onde esse
trabalho se efetiva.

Ao logo da presente pesquisa, os docentes fizeram importantes falas


sobre a autonomia, relataram o desejo de serem ouvidos (as) pela gestão de
suas escolas. Reivindicam uma porta para discussões, tirar dúvidas,

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disponibilizam-se para ajudar até na produção do Projeto Político Pedagógico
(PPP), no entanto, ficam à margem de tudo. Outro ponto de dúvidas e
preocupação com relação à BNCC é se de alguma forma ela irá interferir na
autonomia docente.

Ao serem indagados sobre as suas compreensões de Currículo


verificou-se que, em sua maioria, as respostas eram que o Currículo tratava de
um conjunto de qualificações, chegaram, inclusive, a descrever como um
576
Currículo Lattes. Algumas outras respostas apresentadas foram:

Toda estrutura organizacional de temas, áreas e afins


que possibilitam o desenvolvimento do Ensino.
Currículo é o ato de nortear todo o processo
pedagógico, estabelecendo objetivos para atingir
determinados resultados.

A BNCC se apresenta como uma referência nacional obrigatória, mas


não é o currículo, segundo o discurso dos seus planejadores, o que não
corroboramos. Ela também estabelece os objetivos a serem alcançados e os
currículos dos estados e municípios se encarregam de definir como alcançar
esses objetivos. Para Goodson (1996), o currículo é entendido como um
percurso a ser seguido, como conteúdo apresentado para estudo. Percebemos
que o conceito tem sido entendido, por alguns especialistas, dentro da
dimensão de Ralph Tyler (1949), com a noção norte-americana de modelo
tecnicista e prescritivo, com preocupação em controlar e buscar eficiência a
partir de uma ideia de competência.

O primeiro V Seminário temático sobre a Base Nacional Curricular


Comum foi realizado em 26 de setembro de 2018, pela coordenação do projeto
em articulação com seus colaboradores, tendo a duração de quatro horas de
apresentação e como foco: “O jogo das competências na Base Nacional
Comum Curricular”. Recebemos 156 participantes vindos das cidades de Areia,
Arara, Remígio, Alagoa Grande, Esperança, Juarez Távora, entre outros, que
vieram para juntos discutirmos sobre esse momento importante de construção
do currículo no país. O V Seminário buscou problematizar o ensino por

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competências, a fim de que os professores compreendessem a história da
produção curricular, bem como os objetivos dessa abordagem. Os públicos
docente e discente tiveram a oportunidade de entender os aspectos
reducionistas ao pensar o objeto do conhecimento com foco, apenas, nas
competências básicas da BNCC.

Dos participantes neste evento, recebemos 88 questionários


respondidos. Os demais não informaram a razão, mas optaram por não
577
devolver o questionário que havia sido entregue no momento do
credenciamento do seminário. É fundamental destacar duas das quatro
questões dadas. A primeira era semelhante àquela primeira aplicada aos 30
docentes e gestores no início da pesquisa, nas diferentes escolas. Esta
questão buscava saber: Como você caracteriza um cidadão competente?
Quais são as competências necessárias? Seguem abaixo algumas das
respostas:

“Um cidadão competente que entenda a importância do


processo pelo qual o mesmo está sendo submetido...
Empatia e respeito tanto no social quanto ao ambiental...
Capacidade de trabalhar em grupo.”
“Aquele que tem a capacidade de resolver demandas
práticas do dai a dia, que consegue ser uma pessoa
politica e ética. Um currículo adequado à realidade do
aluno. Interdisciplinaridade do currículo.”
“É aquele que convive socialmente com autonomia para
tomar decisões importantes que envolvem o bem coletivo
e faz isso de maneira crítica... As competências
necessárias para formação de bons alunos dependem,
antes, da valorização do trabalho do professor; respeito
do professor para com o aluno e vice versa; respeito do
espaço escolar por parte de todos que a compõem.”
“Um cidadão competente é o ser que compreende as
interações do meio em termos, sociais, cientifico,
históricos, culturais, comuns e econômicos. As
competências necessárias para os alunos é os tornar
seres críticos, autônomos e reflexivos.”

Ficou claro ao longo da pesquisa que os docentes e gestores


compreendem o que significa um indivíduo competente, o que falta
compreender é como trabalhar essas competências dentro do cotidiano que

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cada um deles possui sem que haja planejamentos, discussões e formações
sobre a BNCC. No entanto, é preciso pensar melhor sobre essa noção de
competências. Ramos (2011, p. 39) destaca que a noção de competências
atende a pelo menos três propósitos:

a) reordenar conceitualmente a compreensão da relação trabalho-


educação, desviando o foco dos empregos, das ocupações e das tarefas
para o trabalhador em suas implicações subjetivas com o trabalho;
578
b) institucionalizar novas formas de educar/formar os trabalhadores e de
gerir o trabalho internamente às organizações e no mercado de trabalho
em geral, sob novos códigos profissionais em que figuram as relações
contratuais, de carreira e de salário;

c) formular padrões de identificação da capacidade real do trabalhador


para determinada ocupação, de tal modo que possa haver mobilidade
entre as diversas estruturas de emprego em nível nacional e, também,
em nível regional.

Nesse endereçamento das competências podemos perceber que há


muito a se refletir a partir dos fundamentos que colocam as competências
como matriz curricular sem, muitas vezes, considerar os contextos formativos e
sociais da docência e da discência.

A segunda questão era: O que deve privilegiar um bom currículo escolar


de Educação Básica? Abaixo algumas das respostas:

“A realidade do aluno, a realidade da escola, a politização


do aluno como pessoa cidadã política, desenvolver
competências praticas.”
“Deve privilegiar um ensino libertador, inclusivo e que
respeite a diversidade.”
“A flexibilidade, inter, multi e transdisciplinaridade. O
ensino integral de verdade, que não apenas tome o
tempo do aluno.”
“Formação e formação continuada de professores,
capacitação para adequação do espaço escolar

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específico, valorizar o pensamento critico do aluno
priorizando o ensino aprendizado.”
“Os conhecimentos prévios que os alunos já trazem pra
sala de aula e deveriam ser incluídos juntos aos
conteúdos escolares e a realidade do aluno.”
“Parti da realidade do educando a fim de garantir os
direitos do aluno estabelecidos na LDB e em outros
documentos oficiais. Uma educação mais encantadora.”

Em diversas respostas, encontramos falas em que os/as docentes e 579

gestores/as traziam como ponto fundamental, para privilegiar um bom currículo


escolar, o respeito às diversidades de cada região, a educação libertadora e o
conhecimento prévio de cada estudante, evitando assim uma hierarquia do
saberes. Segundo Freire (1987, p. 68): “Não há saber mais, nem saber menos,
há saberes diferentes”.

A socialização de uma pesquisa com esse endereçamento docente,


sobre uma política em curso, poderá subsidiar outras análises em torno do
currículo nacional e seus reflexos no fazer local dos sujeitos da educação
formal escolarizada.

CONCLUSÃO

No percurso do projeto, concluímos que para os gestores e professores


das escolas envolvidas e demais participantes do seminário, a Base Nacional
Comum Curricular mesmo se propondo como norteador ao que será
apresentado em sala de aula, ainda é pouco discutida e estudada com
participação efetiva dos docentes. Muitas dúvidas são expostas em torno do
próprio entendimento sobre competência e habilidade. Os professores
conseguem afirmar o que seria um aluno competente do ponto de vista
curricular, mas visualizam as competências da BNCC como algo novo para sua
prática educativa. Muitos anunciam a BNCC como novidade ou algo exterior ao
exercício e cotidiano docente. O projeto obteve ganhos significativos pelo
público participante e pelo envolvimento da comunidade para compreender o

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processo de implementação de um Currículo Nacional. Esta ação confirma a
importância do espaço universitário na relação com a comunidade mais ampla.

REFERÊNCIAS

ALBINO, Ângela Cristina Alves. Currículo e autonomia docente: enunciações


politicas. 1ª ed. Curitiba, Appris, 2018.
580
_______. Base Nacional Comum Curricular. Secretaria de Educação Básica,
Brasília – 3º versão, 2017. Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wpcontent/uploads/2018/02/bncc-20dez-
site.pdf. Acesso em: 01 ago. 2018.

COLLEGARI, Cesar. Carta aos conselheiros do Conselho Nacional de


Educação, 2018, p. 3. Disponível em:
https://avaliacaoeducacional.files.wordpress.com/2018/06/carta-
aosconselheiros-do-cne.pdf. Acesso em: 20 ago. 2018.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1987.

GIROUX, Henry. Escola crítica e política cultural. São Paulo: Cortez, 1987.

GOODSON, I. A construção social do currículo. Lisboa: Educa, 1996.

RAMOS, Marise Nogueira. A pedagogia das competências: autonomia ou


adaptação? São Paulo: Cortez, 2011.

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DOCUMENTOS OFICIAIS DA EDUCAÇÃO E A PRÁTICA PEDAGÓGICA NO
ENSINO DE MATEMÁTICA

Sarah Karolyne Vilarim Flôr da Silva | Severina Andréa Dantas de Farias

Resumo: A presente pesquisa teve como principal objetivo analisar como os


documentos oficiais governamentais tais como: DCN (BRASIL, 2013), PCN (BRASIL,
1997); BNCC (BRASIL, 2017); PNE (BRASIL, 2014); e LDB (BRASIL, 1996) subsidiam
o Ensino da Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Para isso nos
fundamentamos teoricamente nos documentos governamentais norteadores da 581
educação brasileira com ênfase na Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017),
nos estudos de Farias, Azerêdo e Rêgo (2016), entre outros. A metodologia do estudo
foi caracterizada por ser um estudo exploratório segundo os objetivos, do tipo
qualitativo segundo a aquisição e a análise de dados. A investigação ocorreu entre os
meses de agosto a outubro do ano de 2017, em uma escola privada, localizada no
município de Goiana – Pernambuco. Quanto aos instrumentos de investigação
adotamos neste estudo questionários semiestruturados (pré-teste e pós-teste) e a
observação em campo. Iniciamos a investigação em campo realizando o diagnóstico
com três professoras da escola participante que lecionavam os 1º, 2º e 3º anos do
Ensino Fundamental. Discutimos os conteúdos da Matemática à luz do livro didático
utilizado por cada professor e finalizamos apresentando sequências didáticas dos
anos investigados, a fim de verificar com os participantes o reconhecimento das
habilidades e competências de tais conteúdos. Como resultado, constatamos a falta
de conhecimento dos eixos da Matemática pelos investigados, bem como a dificuldade
no domínio dos conteúdos ministrados pelos professores nos três anos investigados. A
maior dificuldade enfrentada pelos profissionais nas aulas de matemática é com
relação aos conceitos das operações básicas. Essa dificuldade ocorre por diversas
lacunas, uma delas é desconhecimento de documentos norteadores da educação
brasileira e a falta de estímulo para realização de formação continuada em serviço.

Palavras-chave: Documentos Oficiais da Educação. Ensino de Matemática nos Anos


Iniciais. Base Nacional Comum Curricular. Ensino Fundamental. Prática Pedagógica.

INTRODUÇÃO

O ensino da Matemática, ao longo do tempo, vem sofrendo


modificações, a fim de superar as dificuldades existentes, buscando aproximar
o discente do docente, agregar os conhecimentos prévios apresentados pelos
alunos, visando torná-los autores de sua própria história. Ao ser utilizada na
vida prática das crianças, a Matemática torna-se compreensível a partir de
discussões que favoreçam o lúdico e o encantamento dos estudantes aos
novos meios de acesso ao aprendizado no processo educativo.

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É importante que o conhecimento matemático seja compreendido pelo
estudante desde o início de sua vida escolar, sendo aplicável em sua
comunidade. Ao ser percebido como aplicado em inúmeras situações que
circundam o mundo, o conhecimento matemático ajuda a desenvolver o
raciocínio lógico, a abstração, a argumentação e o modo de pensar dos
estudantes.
As discussões da Matemática quando bem direcionadas, permitem que
o estudante elabore um pensamento que estimula a criação e o 582
amadurecimento de ideias, o que traduz uma liberdade, fatores estes que estão
intimamente ligados à sociedade. Estas discussões favorecem e facilitam além
do conhecimento da própria Ciência, a interdisciplinaridade com outros
conhecimentos de áreas diversas como a Filosofia, a Sociologia, a Literatura, a
Música, as Artes, a Política, etc. (RODRIGUES, 2005).
Independendo da faixa etária ou objetivo pretendido pelos alunos, cabe
à escola, prepará-los para a aquisição de novos conhecimentos que auxiliarão
no seu progresso educativo e formativo. Mas a prática docente tem enfrentado
grandes dificuldades no processo de ensino e aprendizagem, resultando em
um ensino muitas vezes mecanizado e na formação de alunos fadados ao
fracasso, sendo este, um desafio a ser vencido.
Diante disso, esta pesquisa buscou analisar como os documentos
oficiais governamentais tais como: DCN (BRASIL, 2013); PCN (BRASIL, 1997);
BNCC (BRASIL, 2017); PNE (BRASIL, 2014); e LDB (BRASIL, 1996) subsidiam
o Ensino da Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei 9.394/96)
em seus artigos 12 e 13 estabelece que toda proposta pedagógica escolar seja
elaborada de forma coletiva (gestores, professores, alunos e comunidade).
Essa prática contribui para o desenvolvimento de toda comunidade escolar,
refletindo no ensino e nas ações curriculares.
Desde suas origens, o currículo tem se apresentado como uma invenção
reguladora do conteúdo e das práticas de ensino e aprendizagem, ou seja, é
um instrumento capaz de estruturar a escolarização, as práticas pedagógicas e
a vida nos centros educacionais, transmitindo, impondo e dispondo regras,

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normas e uma ordem que são determinantes. Seu potencial é revelado por
meio de seus usos e hábitos, incluindo o funcionamento da instituição escolar,
a divisão do tempo, a especialização dos professores e, principalmente, a
ordem da aprendizagem. (SACRISTÁN, 2013)
A pluralidade de experiências que um currículo escolar bem estruturado
pode proporcionar é imensa, refletindo em diversas áreas do ambiente escolar
incluindo o processo de ensino e aprendizagem. E, para a construção de um
currículo eficaz, torna-se necessário conhecer e aprofundar-se no 583
entendimento dos documentos norteadores governamentais que regem a
educação do país.
Com a oficialização da Constituição Federal em 1988, foi citada no artigo
210, a necessidade da criação de uma base curricular em que seriam fixados
conteúdos mínimos para o ensino fundamental que assegurassem a formação
básica no país. Em 1996 com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB)
o artigo 9º reforçou a utilidade de uma base como documento norteador dos
currículos escolares, assim, no ano seguinte as escolas começaram a ser
regidas por referenciais curriculares estaduais e municipais que são formulados
a partir das normas obrigatórias contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais
– DCN (BRASIL, 2013). Este documento tem como função fundamentar os
procedimentos da Educação Básica e assegura o estabelecimento de
competências e diretrizes em colaboração do estado, distrito federal e
municípios, que norteiem os currículos escolares. Fundamentados nisto, foram
criados os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN (BRASIL, 1997) que
também subsidiam a construção do currículo, mas não de forma obrigatória e
sim como orientações que apontam referências para o desenvolvimento das
práticas pedagógicas.
Em 2010 na Conferência Nacional de Educação (CONAE) foi discutida a
carência de uma Base Nacional Curricular e em 13 de julho deste mesmo ano,
foi aprovada a Resolução nº 4 do Conselho Nacional de Educação - CNE
(BRASIL, 2010) determinando as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais que
contemplam as etapas e modalidades da Educação Básica.

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Quatro anos depois, com a aprovação do Plano Nacional de Educação –
PNE (BRASIL, 2014), vinte metas foram criadas para a melhoria da educação
básica no país, e quatro delas referiam-se a Base Nacional. A primeira trata da
Educação Infantil pretendendo expandir e ampliar o acesso de crianças de 3 à
5 anos em suas respectivas redes de ensino, enquanto a segunda estabelece o
período de 9 anos para que os alunos do Ensino Fundamental concluam esta
etapa da Educação Básica. A quinta meta busca a garantia da alfabetização
dos alunos até o 3º ano e a sétima pretende impulsionar o fluxo escolar e de 584
aprendizagem. Os documentos até aqui apresentados alicerçaram a
implantação de uma Base Nacional Comum Curricular – BNCC (BRASIL,
2017), que deveria ser elaborada até o ano de 2016. (BRASIL, 2014)
A BNCC (BRASIL, 2017) foi estruturada a fim de abranger dois níveis da
educação básica: a Educação Infantil e Fundamental. Nela encontram-se as
habilidades que os alunos devem desenvolver em cada etapa de sua
escolaridade. Ela explicita dez competências gerais que de maneira
significativa, reflexiva e ética auxiliarão a construção do discente a fim de
transformar a sociedade, fazendo-a mais humana e socialmente justa.
A BNCC aponta no Ensino Fundamental as quatro áreas de
conhecimento, a saber, Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza e
Ciências humanas e seus componentes curriculares, especificando as suas
respectivas competências. Cada área de conhecimento tem sua função na
formação dos aprendizes e considera as especificidades destes, bem como as
necessidades pedagógicas nesse período de escolarização. Tais competências
deverão ser desenvolvidas ao longo de nove anos sendo agrupados em anos
iniciais e anos finais e aborda todas as unidades temáticas, objetos de
conhecimento e habilidades que estes anos deverão contemplar.
As unidades temáticas contidas na área de Matemática abordam o
educando como um ser que faz uso da Matemática em seu cotidiano e precisa
ter ciência disto, sendo essas umas das competências específicas contidas
nesta unidade temática. Além do uso da Matemática no cotidiano, encontra-se
a relação desta com as demais áreas de conhecimento utilizando-a sempre
com representações adequadas. A identificação da Matemática em aspectos e

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práticas socioculturais que produzam argumentos convincentes e sua
exploração através de gráficos, tabelas, esquemas e textos relacionados a
tecnologias e mídias digitais também compõem as competências que cada
aluno deverá conhecer. (BRASIL, 2017)
Destaca-se o reconhecimento da Matemática como uma ciência
humana, que abrange culturas e momentos históricos tendo parte na
construção histórica da modernidade. Assim, cada aluno deverá aprender a
utilizar a Matemática de maneira individual e coletiva unindo a princípios éticos, 585
democráticos, solidários e concluindo esta etapa com o domínio de tais
conhecimentos.
A BNCC (BRASIL, 2017) considera os campos diversos que integram a
Matemática como um acervo de conhecimentos que são indispensáveis na
formação dos educandos unindo equivalência, ordem, proporcionalidade,
interdependência, representação, variação e aproximação. Esses
conhecimentos são imprescindíveis para a evolução do saber matemático
devendo ser transformados em objetos de conhecimento.
Fundamentados nisto, foram criadas as unidades temáticas que
orientam as habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos na área de
Matemática sendo uma delas a Álgebra, que é responsável por desenvolver no
aprendiz um:

[...] tipo especial de pensamento – pensamento algébrico – que é


essencial para utilizar modelos matemáticos na compreensão,
representação e análise de relações quantitativas de grandezas e,
também, de situações e estruturas matemáticas, fazendo uso de
letras e outros símbolos. (BRASIL, 2017, p. 226)

Grandezas e Medidas aborda questões relacionadas ao estudo das


medidas contribuindo intensamente em unidades temáticas de outras áreas e
componentes curriculares como Ciências e Geografia. A Geometria estuda
conceitos e procedimentos presentes no contexto matemático enquanto,
Probabilidade e Estatística trata de conceitos e métodos que envolvem o
cotidiano. Números como quinta e última unidade temática pretende ampliar o

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pensamento numérico através de registros, usos, significados e operações
envolvendo os conceitos de quantidade, desenvolvendo ideias de ordem,
equivalência e a resolução de operações abordando os campos conceituais
aditivos e multiplicativos e as noções fundamentais da Matemática enfatizando
os registros dos conhecimentos adquiridos. (BRASIL, 2017)
Estudar Matemática requer o exercício do raciocínio e da lógica por isso
alguns alunos sentem dificuldade nesse processo. Os anos iniciais do Ensino
Fundamental constituem-se numa importante etapa da vida estudantil e a 586
construção de novos conhecimentos dependerá da utilização de livros didáticos
apropriados, professores competentes e outros fatores que serão abordados no
decorrer desta pesquisa.

DESENVOLVIMENTO

A investigação aconteceu em uma escola privada, na cidade de Goiana


– PE que atende alunos do maternal ao 5º ano do Ensino Fundamental.
Ocorreu entre os meses de julho à outubro do ano de 2017 e contou com a
colaboração voluntária de três professores da rede privada, que lecionam no
turno matutino e vespertino, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental (1º, 2º e
3º anos).
Esta pesquisa foi composta por três etapas: diagnóstico, intervenção e
verificação final. Iniciamos aplicando um questionário estruturado onde parte
das perguntas buscou analisar como os documentos oficiais governamentais
subsidiam o Ensino da Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
A primeira etapa do questionário foi composta por seis perguntas que
visavam identificar o perfil dos docentes. Elas versavam sobre algumas
informações como nome, idade, sexo, renda familiar, grau de instrução e em
quantas escolas lecionam atualmente, informando se moram próximo ou não,
do seu ambiente de trabalho.
A segunda parte procurou apontar dados, que pudessem demonstrar
facilidades e dificuldades presentes nos professores quanto ao ensino de
Matemática, e buscaram identificar o conhecimento dos docentes acerca de

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documentos governamentais vigentes, métodos de ensino e avaliação
aplicados nas aulas de Matemática, domínio do conteúdo ensinado e
expectativas ou necessidades que estes professores apresentavam.
A primeira pergunta abordava a seguinte questão: De que forma os
documentos oficiais apresentados pelo governo tais como: DCN (BRASIL,
2013), PCN (BRASIL, 1997); BNCC (BRASIL, 2017); PNE (BRASIL, 2014); e
LDB (BRASIL, 1996), subsidiam seu ensino de Matemática na escola?
A construção da BNCC (BRASIL, 2017) expõe a relevância dos diversos 587
documentos utilizados no país como subsídio para construção de propostas
metodológicas e currículos adequados para escolas brasileiras. Assim, essa
questão foi aplicada mediante a relevância que os documentos governamentais
norteadores para a Educação Básica apresentam para o trabalho docente e na
formação do aluno como cidadão, além de seu papel na instrução e construção
do seu conhecimento. As respostas indicaram que para a maioria dos
professores esses documentos não subsidiam seu ensino, apontando a
necessidade de uma formação continuada que inclua a discussão conceitual de
tais documentos.
Em seguida, foi interrogada a seguinte questão: Quais unidades
temáticas você tem mais e menos segurança em suas aulas?
É de suma importância que os professores sejam capacitados a
ministrarem as aulas a qual se propõem a aplicar. O domínio do conteúdo
revela o grau de competência que estes possuem, indicando a necessidade de
formação e maior reflexão quanto as suas práticas pedagógicas. Todos os
docentes afirmam ter maior segurança no eixo Números e possuem alto grau
de insegurança em Álgebra e Probabilidade e Estatística. Esta é uma evidência
que indica deficiência formativa nos docentes resultando em fracassos no
aprendizado do educando.
O próximo ponto abordou: Com quais unidades temáticas os estudantes
se identificam melhor? A resposta a essa indagação está implicitamente ligada
à segurança, planejamento e métodos com os quais os professores ministram
seus conteúdos. A BNCC traz em sua proposta competências socioemocionais,
que envolvem autoconhecimento, reconhecimento das emoções, diálogo e

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empatia, aspectos esses que o professor precisa considerar no processo de
ensino e aprendizagem. O desempenho do aluno está interligado a tais
aspectos, como a afetividade com o professor e ao método por ele utilizado, e
seu desenvolvimento decorre do preparo do docente quanto aos conteúdos
ministrados. Considerando que os professores apresentam maior segurança na
unidade temática números, os alunos consequentemente a ela se identificam.
O quesito seguinte questionou: Você utiliza o currículo oculto em suas
aulas? O currículo oculto compõe-se de ações decorrentes do meio social ao 588
qual o aluno está inserido, envolvendo assimilações, práticas, condutas e ainda
comportamentos presentes no ambiente escolar. A utilização do currículo
oculto foi unânime, sendo este um aspecto positivo na visão pedagógica do
ensino escolar.
Em decorrência disso foi interrogado: Caso o item anterior tenha sido
afirmativo, descreva a forma como você utiliza o currículo oculto em suas
aulas.
Apesar da afirmação na questão antecedente, a maioria dos professores
apresentou dificuldades para descrever as formas de utilização do currículo
oculto em suas aulas, revelando assim, desconhecer o significado de tal termo.
Considerando tal desconhecimento, percebemos que tais professores se
utilizam de um ensino mecanizado, desconsiderando o relacionamento
interpessoal dos alunos, bem como as influências por eles recebidas e
partilhadas através de gestos e atitudes que estes apresentam.
A pergunta seguinte tratou de métodos e práticas avaliativas: Que
métodos avaliativos são aplicados em suas aulas de Matemática?
Acreditamos que a avaliação se constitui uma importante ferramenta no
processo de ensino, pois:

Não podemos identificar a compreensão que um estudante possui de


um determinado conceito simplesmente solicitando dele a reprodução
de definições. O autor destaca que avaliar essa dimensão do
conhecimento não é tarefa fácil e sugere que essa avaliação se dê
com base na observação do uso que os estudantes fazem de cada

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um dos conceitos nas diversas situações de ensino [...]. (ZABALA,
1998 apud FARIAS, AZÊREDO, RÊGO, 2016, p. 101)

A maior parte dos professores avalia a aquisição de conhecimento de


seus alunos, utilizando métodos avaliativos decorrentes do método tradicional
de ensino, incluindo acertos nas atividades orais através da tabuada, na
resolução correta das operações escritas em caderno e/ou na lousa escolar, e
ainda através de avaliações escritas como testes e provas.
589
A última questão verificou o seguinte: Você sente necessidade de algo
que estimule a aprendizagem dos alunos em Matemática? Caso afirmativo,
descreva o que poderia ser.
Os professores, em sua maioria, informaram sentir necessidade de
estímulos de aprendizagem nas aulas de Matemática. Um afirmou necessitar
de aulas diferenciadas onde os alunos devem participar mais e utilizar a
internet como ferramenta de pesquisa. Outro apresentou a carência de ênfase
nas chamadas orais com uso da tabuada e sente a necessidade de um melhor
desempenho na leitura e escrita.

[...] A diversidade é uma característica do ser humano, pois todas as


pessoas são diferentes em suas particularidades físicas e psíquicas:
cada um recebe, por meio de herança, determinadas características
físicas e determinadas potencialidades, que se desenvolvem em um
determinado ambiente”. (BASSEDAS 1999, p.21)

Esta indagação foi realizada mediante o saber de que, diante de uma


necessidade de incentivo, cabe ao professor refletir sobre suas
responsabilidades e buscar os meios necessários para suprir qualquer
deficiência de estímulo em suas aulas, pois a diversidade é presente no
ambiente escolar e é incumbência do professor tomar as decisões que
minimizem tal situação.
A BNCC (BRASIL, 2017) é um documento que revela as competências e
habilidades que deverão ser alcançadas pelos alunos em cada etapa da
Educação Básica cabendo aos órgãos competentes planejar de forma coerente
o material didático que será direcionado as escolas, incumbindo aos

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professores juntamente com a escola escolher as práticas metodológicas e os
livros didáticos mais adequados para seus fins e métodos.
Alicerçados nisto, seguimos para a segunda etapa da pesquisa. Neste
momento, realizamos discussões com os participantes e a análise dos livros
didáticos utilizados em suas aulas, objetivando descobrir se estes compunham
empecilhos para o bom exercício da docência enquanto mediadores do
conhecimento matemático.
A partir da análise dos livros didáticos, verificou-se que o livro do 590
professor da coleção utilizada na escola, apresenta diversas orientações
didáticas que sugerem a aplicação de jogos matemáticos na sala de aula. Se
bem planejados e bem aplicados a utilização de jogos matemáticos na sala de
aula traz diversos benefícios a aprendizagem. Além de auxiliarem na
aprendizagem do aluno eles contribuem na identificação de dificuldades
conceituais, atitudinais e procedimentais, identificando se o aluno está apto
para aplicar os conhecimentos em situações diversificadas. Além de promover
aulas descontraídas, possibilita a exploração da concentração, paciência e
tolerância dos conteúdos específicos contidos no livro didático (FARIAS,
AZÊREDO, RÊGO, 2016).
Os diferentes significados das operações matemáticas, a saber, juntar,
separar, acrescentar, retirar, comparar e completar como cita a BNCC
(BRASIL, 2017) também estão presentes nos três livros analisados. O campo
multiplicativo permite ao discente utilizar e revisar a adição e subtração e,
dessa forma dominar as operações aritméticas estudadas com estes diferentes
significados possibilitando um melhor desempenho na aprendizagem da
matemática.
Os conteúdos com ênfase na unidade temática denominada Números,
apresentam-se adequados a grande parte dos pontos abordados na BNCC
(BRASIL, 2017), trazendo a discussão de algumas limitações e possibilidades
que ele concede.
Finalizada esta etapa, apresentamos aos professores de Matemática da
escola observada sequências didáticas baseadas nos estudos de Farias,

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Azêredo e Rêgo (2016) que apresentam os conteúdos obrigatórios de
Matemática para o primeiro, segundo e terceiro anos do Ensino Fundamental.
As sequências didáticas eram correspondentes ao ano em que
lecionavam e continham planejamentos diários com duração de duas semanas
com jogos, atividades, exercícios e procedimentos interligados que pretendem
tornar o Ensino de Matemática eficiente. Tais sequências objetivam averiguar
as informações obtidas no questionário aplicando-as teoricamente na sala de
aula com a pretensão de discutir as possibilidades e dificuldades enfrentadas 591
por eles e ao fim comparar os dois resultados.

CONCLUSÃO

Esta pesquisa buscou analisar como os documentos oficiais


governamentais subsidiam o Ensino da Matemática nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, pretendeu apontar o que se pode fazer para superar dificuldades
no processo de ensino de Matemática e verificou como ocorre o planejamento
das aulas dos anos iniciais, tomando como base a realidade executada em seu
currículo. Para isto, foram realizados questionários voluntários, várias
discussões e análises de livros didáticos, a fim de cumprir com o objetivo
traçado no início da investigação.
Para discussão foram utilizados como aporte teórico os documentos
oficiais vigentes que norteiam a educação brasileira e os escritos de Farias,
Azêredo e Rêgo (2016), que embasaram o questionário, a análise dos livros e
a entrevista informal com apresentação das sequências didáticas que,
aplicadas com os professores, auxiliaram em tal análise.
De acordo com a análise feita a partir dos dados coletados e relatados
na presente pesquisa, fica constatado que o corpo docente desconhece os
documentos norteadores que direcionam o ensino e expõe as competências e
habilidades dos discentes e docentes, resultando na falta de domínio dos
conteúdos ministrados e na desconsideração de aspectos básicos da
Matemática, como por exemplo, os eixos aos quais, a Matemática se atém.

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Para analisar se a realidade aos quais os professores se encontram está
de acordo com a legislação vigente, realizamos entrevistas onde foram
apresentadas sequências didáticas elaboradas de acordo com diversos
documentos oficiais do governo que buscavam relacionar a realidade dos
professores com esta legislação e/ou em atividades baseadas em tais
documentos. Nesta entrevista os professores expuseram suas suposições
quanto aos resultados da aplicação das sequências didáticas, baseando-se no
nível que supõe estarem suas turmas. 592
Como resultado, ficou constatado pelos professores que os alunos não
alcançariam solucionar diversas atividades, observando-se a partir disto as
consequências de professores despreparados. A fim de sanar esta situação, é
necessário que urgentemente se encontre um novo modelo de avaliação, a fim
de analisar os reais níveis de dificuldades dos alunos em compreender os
conteúdos ministrados na referida escola e que contemple atividades
adaptadas e adequadas que alcancem e corrijam as deficiências dos alunos no
que diz respeito ao ensino e entendimento da matemática.
Quanto aos professores, se faz necessário uma melhor visão de
valorização profissional acompanhada de um novo modelo de capacitações
continuadas que estimule o envolvimento com os documentos educacionais
norteadores tornando acessível aos mesmos o favorecimento de um alto
espírito de interesse do seu exercício profissional.
Concluindo esta reflexão, espera-se que tudo o que acima está transcrito
venha a servir de subsídio para um maior aprofundamento dos pontos
abordados e de estímulo para que novos estudos sejam manifestos por todos
aqueles que sintam a necessidade de ampliar seus conhecimentos e contribuir
para o bom andamento do exercício do ensino e da aprendizagem nas escolas
brasileiras.

REFERÊNCIAS

BASSEDAS, Eulália; HUGUET, Teresa; SOLÉ, Isabel. Aprender e ensinar na


educação infantil. Trad.Cristina Maria de Oliveira. Porto Alegre: Artmed, 1999.

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


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Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1934.
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_________. Ministério da Educação; Conselho Nacional de Educação. Direito
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_________. Ministério da Educação; Diretrizes Curriculares Nacionais
Gerais da Educação Básica. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de
Currículos e Educação Integral. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.
_________. Ministério da Educação; Planejando a próxima década:
Conhecendo as 20 metas do Plano Nacional de Educação. Brasília: MEC/
2014.
FARIAS, S. A. D.; AZÊREDO, M. A.; RÊGO R. G.; Matemática no Ensino
Fundamental: Considerações teóricas e metodológicas. João Pessoa: UFPB,
2016.
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Gimeno (Org.). Saberes e incertezas sobre o currículo. Porto Alegre: Penso,
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A FORMAÇÃO CONTINUADA DO/A PROFESSOR/A DE BIOLOGIA E
CIÊNCIAS: RELATO DE EXPERIÊNCIA DO ESTÁGIO DOCÊNCIA

Clemilson Cavalcanti da Silva77 | Karina Maria de Souza Soares78

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo relatar o desenvolvimento dos/as


alunos/as acerca do processo de ensino-aprendizagem, especialmente, as interfaces
existentes entre o Ensino de Citologia e a Lei nº 10.639/2003 na turma de Biologia e 594
Fisiologia Celular do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFPB no
estágio docência possibilitado pelo Programa de Pós Graduação em Educação desta
instituição de ensino a nível de doutorado. Nossas referências teóricas estão
alicerçadas no paradigma da afrocentricidade, que possibilita enxergamos a trajetória
da população negra e ressaltar toda contribuição e legado cultural, social, científico e
tecnológico proporcionado por estes povos à humanidade. No que tange a égide
teórico-metodológica, o trabalho se ancora na pesquisa-ação, a qual nos proporciona
adentrar na realidade a ser investigada de modo cooperativo e participativo. Após esse
alicerce, percebemos a importância do estágio docência em nossa formação docente
como processo de vivência prático-pedagógica, além disso, ressaltamos a viabilidade
da construção de um currículo afrocentrado nas disciplinas de Ciências e Biologia
como é pautado na Lei 10.639/2003, uma vez que, a proposta metodológica aplicada
na turma foi efetivada com a realização da “Primeira mostra de trabalhos para o
processo de ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº 10639/2003” factível para o
componente curricular Ciências e Biologia.

Palavras-chaves: Currículo. Afrocentricidade. Ciências. Biologia. Lei nº 10639/2003.

1 INTRODUÇÃO

O Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal


da Paraíba (PPGE/UFPB) segue a orientação do Conselho Superior de Ensino,
Extensão e Pesquisa (Consepe), o qual em sua Resolução nº 09/2016, Art. 23,
Parágrafo VII, determina que o aluno regularmente matriculado tanto em nível

77
Doutorando em Educação (PPGE/UFPB). Mestre em Educação (PPGE/UFPB). Especialista
em Educação Ambiental (FIP). Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas pela (UFPB).
Licenciado em Pedagogia pela (UFPB). Professor da Educação Básica. E-mail:
ccsbio@gmail.com
78
Doutoranda em Educação PPGE/UFPB, Mestra em Educação, PPGE/UFPB. Professora
Efetiva na Prefeitura Municipal de João Pessoa e Professora Mediadora na UFPB Virtual. E-
mail: Karina-mss@hotmail.com

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de mestrado, quanto em doutorado realizem “estágio de docência conforme
determinações específicas do PPGE” (BRASIL, 2016). Esse dispositivo legal,
em seu Art. 47, traz o regulamento de como deve ser a estrutura de créditos
obrigatórios nos Estágios, nesse sentido, o aluno de doutorado (que é o nosso
caso) deve realizar dois, sendo, um em cada período letivo. A referida atividade
acadêmica é obrigatória para o discente regularmente matriculado, desse
modo, em seu Art. 51, o Consepe ressalta que “os(as) alunos(as) regularmente
matriculados no PPGE deverão cumprir a atividade acadêmica denominada 595
Estágio de docência, visando ao aperfeiçoamento da formação de estudantes
de pós-graduação para o exercício da docência em nível do ensino superior”
(BRASIL, 2016).
Neste contexto, é de extrema importância que as atividades
desenvolvidas no Estágio de Docência contribuam para a formação do
doutorando, uma vez que é a oportunidade de trabalhar com o Ensino Superior
sendo supervisionado por um profissional que tem todas as atribuições legais e
acadêmicas para essa função. Ao refletir sobre o Estágio Docência, Cunha
(2010, p.109), ressalta que “a prática é condição da problematização do
conhecimento que os estudantes precisam produzir. Nessa perspectiva, a
prática não significa a aplicação e confirmação da teoria, mas é sua fonte”. É
importante perceber que a atividade docente é a práxis, assim sendo, deve ter
como objetivo transformar o professor e o aluno, consequentemente, o
processo de ensino-aprendizagem com vistas a uma educação libertadora
(FREIRE, 1996).
Segundo Morin (2011, p.25), devemos caminhar, enquanto profissionais
da educação, na tentativa de desconstrução de “paradigmas que constituem
axiomas e que determinam conceitos, comandam discursos e/ou teorias” que,
por vezes, marginalizam a população africana e afro-brasileira. Assim, para
conduzir uma discussão crítica e reflexiva acerca de modelos normatizados
pela sociedade, predominante há séculos, que determinam estereótipos
socioculturais, “torna-se necessário se inquietar diante de certos recortes ou
agrupamentos com que já nos são familiares” (FOUCAULT, 2009, p. 24).
Nesse sentido, podemos compreender a partir da concepção do autor que o

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discurso é visto como prática social que sublinha a ideia que sempre se
produziria em razão de relações de poder.
Nesses termos, o referido trabalho tem como objetivo relatar o
desenvolvimento dos/as alunos/as acerca do processo de ensino-
aprendizagem, especialmente, sobre as interfaces existentes entre o Ensino de
Citologia e a Lei nº 10.639/2003 na turma de Biologia e Fisiologia Celular do
Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da
Paraíba. Para tanto desenvolvemos as seguintes atividades: acompanhamos o 596
planejamento das atividades desenvolvidas na disciplina Biologia e Fisiologia
Celular; evidenciamos as interfaces com a Lei nº 10.639/03 realizada pelo
professor titular da disciplina acerca dos conteúdos ministrados; Orientamos
os/as discentes, conjuntamente com o professor da disciplina, na produção de
trabalhos que consigam relacionar os conteúdos específicos do componente
curricular com a Lei 10.639/2003 e coordenamos juntamente como o professor
a “Primeira mostra de trabalhos para o processo de ensino e aprendizagem de
citologia e a lei nº 10639/2003”.

2 A BASE TEÓRICA DO TRABALHO

Este trabalho está atrelado à construção de nossa pesquisa do


doutoramento, haja vista que um dos propósitos que pretendemos alcançar é a
reflexão acerca de um currículo afrocentrado para o ensino de Ciências e
Biologia, notadamente, na Educação Básica. Assim sendo, nossas referências
teóricas estão alicerçadas no paradigma da afrocentricidade, o qual segundo
Asante (2009, p. 93) é um tipo de pensamento, prática e perspectiva que
percebe os africanos como sujeitos e agentes de fenômenos atuando sobre
sua própria imagem cultural e de acordo com seus próprios interesses
humanos”. Nessa perspectiva, o conhecimento no viés afrocentrado não se
orienta simplesmente o conhecimento pelo conhecimento, mas sempre o
conhecimento pelo bem do ser humano, ou seja, da humanidade (KARENGA,
2003).

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Partindo desses princípios, Silva (2017) assinala a importância de
construirmos currículos de Ciências e de Biologia pautados nas orientações da
Lei 10.639/03, pois, a partir das demandas desse dispositivo legal, entendemos
que temos os atributos necessários para mudarmos a hegemonia eurocêntrica
que existe nos currículos desses componentes curriculares. Santos Junior
(2010) assinala alguns princípios gerais acerca de um currículo afrocentrado
em diferentes componentes curriculares da Educação Básica.
Desses apontamentos, destacamos o que se refere a Biologia e História, 597
haja vista que, segundo ele, esses componentes curriculares podem “ trabalhar
para a compreensão do uso do Carbono 14 para datação de artefatos e
estudo de civilizações da antiguidade (SANTOS JUNIOR, 2010, p.10). É
importante ressaltar o processo interdisciplinar que um currículo afrocentrado
exige para se concretizar. Enfim, estamos imbuídos na construção de
processos didáticos-pedagógicos que auxiliem os/as professores/as a
trabalharem a Lei 10.639/03 de modo que ressalte as africanidades existentes
nos currículos de Ciências e Biologia.

3 CAMINHOS METODOLÓGICOS

O referido trabalho se desenvolveu sobre a égide teórico-metodológico


da pesquisa-ação, a qual segundo Thiollent (1985, p. 14) “é um tipo de
pesquisa social que é concebida e realizada em estreita associação com uma
ação [...] no qual os pesquisadores e os participantes representativos da
situação da realidade a ser investigada estão envolvidos de modo cooperativo
e participativo”. Pinto (1989), afirma que a pesquisa-ação se assenta em três
momentos: investigação (ação do/a pesquisador/a), tematização (ação do/a
pesquisador/a) e programação/ação (pesquisador/a e alunos/as).
Para tanto, foi proposta a adoção de uma metodologia diferenciada na
tentativa de articular saberes da educação e saúde, especialmente, sobre as
interfaces existentes entre o Ensino de Citologia e a Lei nº 10.639/2003,
através da introdução de estratégias didáticas diferenciadas. Nessa
perspectiva, apresentamos a possibilidade de discussão da Biologia e da

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Fisiologia celular relacionando-as com a realidade cotidiana dos/as discentes,
além disso, evidenciamos os conteúdos específicos que tem pontos de
convergências com a Lei 10.639/2003 com vistas a cumprir a orientação do
referido dispositivo legal, qual seja, o plano de curso da disciplina, e, assim,
potencializar as discussões acerca das questões étnico-raciais no universo
acadêmico das Ciências Biológicas. Nesse sentido, o nosso trabalho seguiu
essa orientação para a construção de nossos objetivos.
598

4 REFLEXÃO SOBRE OS ACHADOS APÓS O DESENVOLVIMENTO DO


TRABALHO

As práticas didático-pedagógicas desenvolvidas nesse trabalho estão


associadas ao nosso estágio docência do doutoramento no Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE/UFPB). As atividades foram desenvolvidas no
componente curricular Biologia e Fisiologia celular do Curso de graduação em
Ciências Biológicas (Licenciatura) da Universidade Federal da Paraíba,
Campus I, João Pessoa, no período 2017.2.
A referida disciplina foi ministrada pelo professor vinculado ao
Departamento de Biologia Molecular no período de 17 de junho, a 04 dezembro
de 2017. Foram vários encontros, nos quais participamos de praticamente
todos, além destes, houve a “Primeira mostra de trabalhos para o processo de
ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº 10639/2003” que ocorreu no
período de 13 a 17 de novembro de 2017 (Manhã e tarde) no Hall da Reitoria
da Universidade Federal da Paraíba (imagem 1, 2, 3, 4 e 5).
As aulas teóricas seguiam a sequencia do plano de curso, porém de
forma inovadora, o Professor da disciplina fazia referência a Lei nº
10.639/2003, na tentativa de articular os conteúdos da disciplina ao referido
documento legal, como contribuição da Biologia no debate da educação
voltada às relações raciais. Diante deste propósito, nossa participação
enquanto estagiário/a, foi de proporcionar possibilidades aos graduandos de
vislumbrar os conteúdos ministrados sob nova perspectiva, qual seja, à luz da
interdisciplinaridade, complexidade e da sua pregnância (SILVA, 2016), uma

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vez que, o Conselho Nacional de Educação - CNE, por meio das “Orientações
e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais”, obra publicada pelo
Ministério da Educação, já propunha, em 2006, a entronização de áreas das
ciências naturais no debate da educação para as relações raciais. O
documento apresentava o seguinte texto: “A biologia, a matemática, a física e a
química destacam-se como disciplinas que, integradas, são capazes de
desconstruir conhecimentos que afirmam as diferenças como inferioridade e
que marcam a condição natural de indivíduos e grupos interétnicos” (Brasil, 599
2006, p. 196).
Segundo Silva (2016) apud (Duarte, 2006), durante todo o período dos
novecentos, a nova área do conhecimento se firmou tanto em práticas
científicas quanto em complexas relações sociais, como um campo específico
que mantém íntimo vínculo e sistematizações com a vida política e cultural.
Nesse contexto, observamos ao longo das aulas o total desconhecimento dos
discentes em relação à existência da lei, fato preocupante, embora motivante
para realização de um trabalho promissor. Fomos construindo, durante o curso,
possibilidades concretas que garantiam a visibilidade das relações étnicos
raciais através de um discurso interdisciplinar, apontando para aspectos
vulneráveis e culturais dos afrodescendentes (SILVA, 2016). Inicialmente
percebíamos a insegurança do/a aluno/a ao tentar enxergar caminhos para
articular conteúdos da disciplina com a Lei nº 10.639/2003. Em seguida,
discutiremos as observações realizadas no decurso da disciplina.

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Imagem 1. Mostra de algumas fotos feitas ao longo da “Primeira mostra de
trabalhos para o processo de ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº
10639/2003”.

600

Imagem A. Imagem B.

Imagem C. Imagem D.

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Imagem E. Imagem F. 601

Acervo do/a autor/a (2017)

4.1 OBSERVAÇÕES DO DECURSO DAS AULAS DE BIOLOGIA E


FISIOLOGIA CELULAR

As aulas do componente curricular Biologia e Fisiologia Celular foram


realizadas em dois momentos que se complementavam, o primeiro sob um viés
teórico, ministrado em aulas expositivas e dialogadas com exemplos que
remetiam ao cotidiano dos/as alunos/as, ao passo que, o segundo ocorreu sob
o viés teórico-prático, isto é, as aulas aconteciam no laboratório de Citologia
com intuito de despertar a curiosidade dos/as discentes para o mundo
microscópico do corpo humano. As principais referências utilizadas pelo
professor titular da disciplina foram: “A Célula” (CARVALHO e RECCO-
PIMENTEL, 2007); “Biologia celular e molecular” (JUNQUEIRA e CARNEIRO,
2012) e a Lei nº 10.639/2003 (BRASIL, 2003).
Nesse contexto, as aulas teóricas versaram sobre diferentes conteúdos
como, por exemplo, “Estrutura e fisiologia da membrana”, “Controle bioquímico
do ciclo celular”, etc. Então, sempre que possível, o professor fazia referência a
Lei nº 10.639/2003 mostrando a interdisciplinaridade que há entre os
conteúdos do componente e o referido dispositivo legal. Assim sendo, uma das
questões muito interessante que percebemos no decurso da disciplina foi o
desconhecimento total e/ou parcial dos/as discentes acerca da Lei nº
10.639/2003, haja vista que ela foi promulgada a mais de 14 anos e muitos não
a conhecia, ou seja, é fundamental que a discussão evidenciada na Lei, faça

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parte do cotidiano acadêmico dos/as discentes, pois é um passo fundante para
a erradicação do racismo.
As aulas teóricas, ministradas pelo professor, foi fundamental para a
construção da “Primeira mostra de trabalhos para o processo de ensino e
aprendizagem de citologia e a lei nº 10639/2003”, haja vista que em seu
desenvolvimento foi possível elaborar temáticas com intuito de orientar os/as
alunos/as na construção de artigos e, consequentemente, de banners para o
referido evento. Após elaboramos cerca de dez temáticas que versavam sobre 602
o conteúdo da disciplina relacionando-o com a lei nº 10639/2003, pedimos ao
professor para ministrar um seminário no qual tínhamos como objetivo
mostrar/ensinar como são construídos artigos e banners para eventos seguindo
as regras acadêmicas das normas da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT), uma vez que todos os trabalhos devem estar de acordo com
elas. Após a liberação do professor, ministramos um seminário que tivemos a
oportunidade de interagir com os/as discentes mostrando-os como são
construídos artigos e banners. Vale ressaltar que são alunos/as do primeiro
período do Curso, sendo assim, a grande maioria, não conhecia essa
discussão, ou seja, não tinham ideia de como ocorre a construção de trabalhos
acadêmicos.
Enfim, depois percebermos que eles/elas tinham grande dificuldades de
escrever e compreender as referidas normas, pedimos ao professor outros
momentos para discutir e dirimir algumas dúvidas que não foram sanadas na
aula que ministramos. A segunda parte da disciplina, as aulas teórico-prática,
seguimos as mesmas orientações das aulas teóricas, ou seja, o professor
ministrava as aulas e nós íamos construindo temáticas para auxiliar os/as
alunos na elaboração dos artigos e dos banners que seriam apresentados no
evento supradito. Com efeito, queremos ressaltar que as temáticas produzidas
nas aulas práticas foram fundamentais para a realização da “Primeira mostra
de trabalhos para o processo de ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº
10639/2003”. Pois vários trabalhos apresentados foram elaborados a partir das
aulas práticas.

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4.2 RELATOS DA “PRIMEIRA MOSTRA DE TRABALHOS PARA O
PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE CITOLOGIA E A LEI Nº
10639/2003”

As aulas teóricas e as teórico-práticas do componente curricular Biologia


e Fisiologia Celular foram fundamentais para o nosso processo de formação
enquanto aluno doutorado, além disso, queremos destacar a importância que a
603
“primeira mostra de trabalhos para o processo de ensino e aprendizagem de
citologia e a lei nº 10639/2003” teve nesse processo, haja vista que orientamos
a construção de nove trabalhos que foram apresentados no referido evento (ver
títulos dos trabalhos no quadro I) e que, certamente, nos ajudou a compreender
como ocorre os procedimentos de orientação de trabalhos acadêmicos, bem
como, na construção de um currículo afrocentrado para as disciplinas Ciências
e Biologia na Educação Básica.

Quadro I. Trabalhos apresentados na “Primeira mostra de trabalhos para o


processo de ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº 10639/2003”.

Trabalhos realizados por alunos/as da licenciatura em ciências biológicas


(noturno)

Nº Títulos dos trabalhos apresentados Equipes/alunos/as

1 “Henrietta lacks, mulher negra, e sua 1 (3 alunos/as)


contribuição para a biologia molecular:
uma abordagem a partir da lei nº
10639/03”

2 “A lei 10639/03 e suas implicações no 2 (2 alunos/as)


ensino de biologia e fisiologia celular”

3 “A técnica de diafanização e o ensino de 3 (4 alunos/as)


biologia e fisiologia celular: interfaces

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com a lei 10639/2003”

4 “Mumificação e sua relação com a lei 4 (3 alunos/as)


10.639\2003: relato de experiencia em
aulas de biologia celular”

5 “Técnicas para identificação de 5 (3 alunos/as)


portadores (as) de anemia falciforme:
interfaces entre o ensino de biologia e a 604
lei n º 10.639/03”

6 “A anemia falciforme e suas 6 (3 alunos/as)


implicações biológicas e sociais: uma
análise à luz da lei 10.639/03”
7 “O diabetes mellitus e a lei nº 7 (3 alunos/as)
10.639/03: relatos de experiencia em
aulas de biologia e fisiologia” celular”
8 “Cientistas e personalidades negras 8 (3 alunos/as)
acadêmicas:
uma história que precisa ser contada”
9 “Anemia hemolítica e a lei nº 9 (3 alunos/as)
10.639/2003: uma proposta
interdisciplinar”

Neste construto, ficou evidente a importância do estágio docência em


nossa formação, pois sem essa oportunidade, certamente, a nossa
aprendizagem seria incompleta, uma vez que a teoria sem a prática não se
“sustenta”, haja vista que aprendemos algo para torná-lo viável e útil na vida
das pessoas. Nesse sentido, acreditamos que estes meses de estágio nos
serviu para a construção da práxis pedagógica, ao passo que temos o escopo
de alcançar resultados no processo de ensino-aprendizagem (FREIRE, 1996).
Além disso, ressaltamos a viabilidade da construção de um currículo
afrocentrado nas disciplinas de Ciências e Biologia como é pautada na Lei
10.639/2003. Pois, os trabalhos que orientamos na “Primeira mostra de

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trabalhos para o processo de ensino e aprendizagem de citologia e a lei nº
10639/2003” são possíveis de serem trabalhados tanto no componente
curricular Ciências, quanto no de Biologia, desse modo, vislumbramos a
urgência de rompermos com a hegemonia eurocêntrica vigente nos currículos
da na Educação Básica.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
605
A formação docente deve ser vista como processo, pois só assim
entendemos que a aprendizagem ocorre ao longo da vida e que precisamos de
mediadores/as nessa construção. Para corroborar com essa afirmação, Morin
(2011, p.151) traz a seguinte reflexão “precisamos de mediadores, de pessoas
que saibam escolher o que é mais importante para cada um de nós em todas
as áreas da nossa vida, que garimpem o essencial, que nos orientem sobre as
suas consequências, que traduzam os dados técnicos em linguagem acessível
e contextualizada”. Ou seja, é fundamental para o doutorando (futuro
professor/a universitário/a) ser orientado/a por profissionais (professores/as)
que consigam transformar a difícil linguagem acadêmica em práticas acessíveis
e compreensíveis de serem trabalhadas em salas de aulas.
Neste contexto, acreditamos que o professor supervisor e orientador de
nosso estágio docência foi fundamental para compreendermos esse processo,
pois sua capacidade de transformar códigos técnicos difíceis em linguagens
acessíveis para os/as alunos/as nos serviu de grande demonstração de como
deve ser feito o fazer pedagógico, isto é, a práxis.
Enfim, queremos apenas destacar que o processo de ensino-
aprendizagem é feito através de uma relação indissolúvel entre professores/as
e aluno/as, pois, tanto o primeiro, quanto o segundo, aprendem e ensinam
juntos.

REFERÊNCIAS
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BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: A AUTONOMIA DOCENTE EM
JOGO NA CONJUNTURA DE IMPLEMENTAÇÃO

Geam Felipe Lima Santos, UFPB/CCA | Ângela Cristina Alves Albino,


UFPB//CCA/DCFS | Sheila Costa de Farias, UFPB/CCA/DCFS

RESUMO: Este trabalho faz parte do projeto inserido no Programa de Licenciaturas —


PROLICEN/UFPB/2018, intitulado BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR:
significações em torno da autonomia docente. Deste modo, tem como objetivo geral
analisar as significações discursivas de autonomia na voz docente, ou seja, como os 607
docentes representam o sentido de autonomia através da prática discursiva no seu
cotidiano. De cunho qualitativo, a análise dos dados se deu a partir da perspectiva da
Análise Crítica do Discurso (ACD), trabalhada por Fairclough (2001). Participaram da
pesquisa três escolas públicas, totalizando 21 professores. Estes demonstraram
conflitos, mas sobretudo resistência para assimilar uma política verticalizada de
currículo, ficando evidente a prática discursiva contra-hegemônica. O projeto
demonstra o seu potencial de diálogo com os docentes e o quanto é importante, nesse
movimento de reforma curricular, uma ação que pretenda ‘ouvir’ de forma efetiva os
docentes que estão no chão da escola.
Palavras-chave: Currículo. Autonomia Docente. Base Nacional Comum Curricular.

INTRODUÇÃO

A Base Nacional Comum Curricular foi homologada em dezembro de


2017, resultado das discussões vivenciadas com maior intensificação desde o
ano de 2015, e situando-a num contexto histórico, foi referendada pela
Constituição Federativa do Brasil (CFB/1988), Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN/1997-2000), Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional
(LDB/1996), Plano Nacional da Educação (PNE/ 2014-2024), Diretrizes
Nacionais para a Educação Básica (CNE\CEB\2010), Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCN\2013) e, mais recentemente, no Plano Nacional da Educação
(PNE/2014-2024).
No percurso construtivo houve diversas manifestações, favoráveis e
contra a Base Nacional Comum Curricular. Um dos movimentos que veio se
manifestando contra a Base Nacional Comum Curricular, trazendo suas
contribuições desde o processo construtivo, até hoje, é a Associação Nacional

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de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd). Segundo uma nota
publicada antes da homologação, pela diretoria, em 04 de outubro de 2017, a
proposta da BNCC fere a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB\1996)
quando denota os seguintes aspectos:
a) Não respeita o princípio do pluralismo de ideias e concepções
pedagógicas;
b) Fere o princípio da valorização da experiência extraescolar e a
formação para o exercício da cidadania;
c) Afronta o princípio da gestão democrática, a formulação
participativa do Projeto Pedagógico e o princípio da valorização
docente ao investir no controle externo da gestão e do fazer docente
608
(ANPEd, 2017).

Ademais, outro movimento vem se manifestando, sendo este favorável à


BNCC: é o Movimento pela Base Nacional Comum. Este movimento surge em
2013 e tem a parceria de inúmeras instituições financeiras e empresas —
Instituto Unibanco, Instituto Natura, Itaú BBA, entre outras, além das fundações
e associações— Lemann, Roberto Marinho, Todos pela Educação, Abrelivros
(Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares), entre outras, que estão
listadas no site, no espaço ‘quem somos’. Os números de parceiros que
apoiam o Movimento pela Base Nacional Comum são muitos, e não cabe aqui
listá-los.
O que chama atenção no site criado por este movimento é que no
espaço formulado para as ‘dúvidas frequentes’, eles anunciam que a BNCC
não é currículo, denotando uma visão numa perspectiva tradicional e limitada
do próprio conceito do que pode ser o currículo. Diante desse contexto, sob
uma base que ainda vem sendo resistida por muitos docentes, gestores,
especialistas das políticas educacionais e do currículo, é interessante refletir
sobre alguns questionamentos: O que é o currículo? Como é concebido? Por
que o próprio texto oficial nega que a Base Nacional Comum Curricular é
currículo? O que os docentes entendem por currículo? Quais as implicações na
autonomia docente?
Partindo dessas preocupações, é importante compreender como alguns
estudiosos se posicionam a respeito do conceito de currículo, levando em
consideração como a Base Nacional estar organizada. A própria Base Nacional
Comum Curricular em seu texto oficial nega que é currículo, afirmando que

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(...) é um documento de caráter normativo que define o conjunto
orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os
alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da
Educação Básica, de modo a que tenham assegurados seus direitos
de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que
preceitua o Plano Nacional de Educação (PNE) (BNCC, 2017, p. 7).

Deste modo, cabe especulação: afinal o que é currículo? O que os


teóricos desse campo de estudo têm afirmado? Tomaz Tadeu da Silva, um dos
estudiosos brasileiros que vem ressignificando os estudos no campo currículo,
em sua obra “Documento de identidade: uma introdução às teorias do 609
currículo” o conceitua de forma ampla. Para o autor:

O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder.


O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia,
nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O
currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de
identidade” (SILVA, 2011, p. 150).

É importante perceber nesse contexto de transformações, mudanças, que


o currículo é fluido, construído socialmente (SILVA, 2011). Por este motivo, o
autor que faz parte da história pós-crítica das teorizações do currículo chama a
atenção para a limitação de significados, uma vez que “o currículo tem
significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais nos
confinaram” (p. 150).
A partir da compreensão ampla sobre o currículo, nas palavras de Silva
(2011), “o currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de
identidade” (p. 150). Além disso, o autor clarifica que “um currículo busca
precisamente modificar as pessoas que vão "seguir" aquele currículo.” (SILVA,
2011, p. 15). Por esta razão, como não afirmar a Base Nacional como
currículo? Como não definir como currículo um documento que traz os direitos
às aprendizagens a serem desenvolvidas pelo educando ao longo da educação
básica nacional? Um documento que traz competências, habilidades e, de
certo modo, molda o tipo de sujeito que se quer formar? Um documento que
constrói identidades? Que, sobretudo, foi construído sob disputas políticas, das
quais as relações de poder estão abarcadas?
Haja vista que a política curricular incide diretamente nas práticas
docentes, muito tem preocupando aqueles que buscavam uma base mais
discutida, democrática, descentralizada, sobretudo que ouvisse e

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comtemplasse as sugestões daqueles que estão em cada canto do Brasil e
entendem de suas realidades, isto é, das necessidades das escolas onde
atuam.
Um dos vieses, dentre tantos que têm causado inquietação em alguns
estudiosos das políticas educacionais e de currículo durante o processo
construtivo e, até então, na conjuntura de implementação, é a autonomia
docente. Conforme Albino (2018) “a autonomia pode ser enfraquecida cada vez
mais se a política de formulação da Base Nacional Comum continuar 610
representando um currículo de forma polarizada entre os professores que estão
na base (chão da escola) e os especialistas que o elaboram” (p. 234).
Diante disso, buscando aprofundar os estudos em torno da autonomia
docente no atual processo de implementação curricular, focaremos no trabalho
desenvolvido pelo Programa de Licenciaturas — PROLICEN/UFPB/2018,
intitulado BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: significações em torno da
autonomia docente, analisar as significações discursivas de autonomia na voz
docente e no texto oficial que compõe a Base Nacional Comum Curricular.

DESENVOLVIMENTO

No percurso histórico, a terminologia da autonomia vem aparecendo


constantemente. Na Constituição Federal (1988), documento considerado um
marco importante para a política educacional brasileira, são instituídos em seu
Art. 206, a liberdade, a igualdade, a gestão democrática e a valorização
docente, considerando estes como princípios básicos para a prática do ensino,
sobretudo, para uma escola democrática, para todos e de qualidade.
Semanticamente falando, autonomia vem do grego autonomia, palavra
formada pelo adjetivo pronominal autos – que significa ao mesmo tempo “o
mesmo”, “ele mesmo” e “por si mesmo” e nomos, que significa
“compartilhamento”, “lei do compartilhar”, “instituição”, “uso”, “lei”, “convenção”.
Assim, a palavra autonomia significa propriamente a competência humana em
“dar-se suas próprias leis”.

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Nesse sentido, cabe enfatizar: Quais os riscos à autonomia docente frente
à reforma educacional do currículo em curso? O que os professores entendem
por autonomia docente? Como esses docentes têm assumido a participação?
Quais os sentidos de autonomia marcados nos discursos? Discurso
hegemônico ou contra-hegemônico?
A pesquisa foi desenvolvida em três escolas públicas de educação básica
do município de Remígio-PB, que atendem a alunos do Ensino Fundamental I,
II e do Ensino Médio. Compuseram a amostra um total de 21 professores de 611
formações diversas, haja vista que a política curricular afeta a todos.
De cunho qualitativo, a pesquisa busca compreender processos
discursivos dos professores. O levantamento de dados foi realizado por meio
de um questionário com oito questões abertas e fechadas. Após as aplicações,
a análise dos dados ocorreu por meio da perspectiva da Análise Crítica do
Discurso (ACD), a partir da prática discursiva trabalhada por Fairclough (2001)
como um “modo de luta hegemônica, que reproduz, reestrutura ou desafia as
ordens de discurso existentes”. (p. 126). O autor define hegemonia como

liderança tanto quanto dominação nos domínios econômico, político,


cultural e ideológico de uma sociedade. Hegemonia é poder sobre a
sociedade como um todo de uma das classes economicamente
definidas como fundamentais em aliança com outras forças sociais,
mas nunca atingido senão parcial e temporariamente, como um
‘equilíbrio instável’. Hegemonia é a construção de alianças e a
integração muito mais do que simplesmente a dominação de classes
subalternas, mediante concessões ou meios ideológicos para ganhar
seu consentimento (FAIRCLOUGH, 2001, p. 122).

Neste sentido, a Análise Crítica do Discurso (ACD) na perspectiva de


Fairclough (2001) pode ser entendida tanto como teoria, como método de
análise, pois em sua proposição as questões sociais, bem como políticas têm
um caráter parcialmente linguístico-discursivo. Dessa forma, percebemos a
teoria de Fairclough (2001) como dialética, uma vez que considera o discurso,
por um lado, moldado pela estrutura social e, por outro, constitutivo da
estrutura social.
Vale salientar que a pesquisa se limitou em analisar a partir da
perspectiva de Fairclough (2001) o discurso como constitutivo das práticas
sociais. Para o autor “o discurso é uma prática, não apenas de representação

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do mundo, mas de significação do mundo, constituindo e construindo o mundo
em significado” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91).
Conforme foi destacado anteriormente, as análises serão discutidas a
partir da perspectiva de Fairclough (2001) que afirma o discurso como
constitutivo das práticas sociais. Para o autor, “a constituição discursiva da
sociedade não emana de um livre jogo de ideias nas cabeças das pessoas,
mas de uma prática social, que está firmemente enraizada em estruturas
sociais materiais, concretas, orientando-se para elas” (p. 93). Portanto, 612
apresentaremos os resultados tecendo discussões em torno da concepção dos
professores sobre: currículo, o que é para o docente um indivíduo competente,
significações sobre o currículo nacional – Base Nacional Comum Curricular
(BNCC), bem como sobre o currículo local, articulando esses aspectos com
as representações discursivas de autonomia docente, assim como observando
de que forma esses termos se desdobram nos discursos dos docentes, se
numa ordem discursiva hegemônica ou contra-hegemônica.
A considerar o contexto de transformações constantes na sociedade, é
importante ressaltar, também, a fluidez do currículo frente às mudanças, uma
vez que o currículo é construído socialmente. Conforme Silva (2011), “o
currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias
tradicionais nos confinaram” (p. 150). Desse modo, o currículo é concebido a
partir das necessidades de cada sociedade que historicamente vem se
modificando. Ao buscar compreender a concepção dos professores sobre
currículo, perceberam-se significações relacionadas ainda a uma perspectiva
tradicional de teoria do currículo, quando os docentes ressaltaram com maior
expressividade o currículo como conjunto de conteúdo, disciplinas, técnicas a
serem ministrados no fazer pedagógico. Podemos verificar isso na íntegra
através dos seguintes discursos: “É o que é essencial para ser ministrado”
(Professor 7); “é um conjunto de conteúdo, o que deve ser aprendido pelos
estudantes em um determinando ano” (Professor 13); “programa ou plano a ser
desenvolvido no âmbito da escola” (Professor 16).
Entendemos que a percepção dos docentes ainda se encontra imersa
nas ideologias existentes no contexto das teorias de currículo tradicional, que

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restringe o currículo apenas aos conteúdos, disciplinas, planos, programas,
técnicas a serem desenvolvidos no âmbito escolar, denotando uma
preocupação nesse cenário de implementação. Conforme Fairclough (2001) “a
ideologia está localizada tanto nas estruturas (isto é, ordens de discurso) que
constituem o resultado de eventos passados como nas condições para os
eventos atuais e nos próprios eventos quando reproduzem e transformam as
estruturas condicionadoras” (p. 117).
O currículo não pode ser visto sob uma ótica limitante, pelo contrário, 613
deve ser vista de forma ampla, considerando dimensões outras, que se
encontram na maioria das vezes ocultas, marginalizadas. Afinal, o currículo na
perspectiva de Silva (2011) envolve relações de poder, que têm determinado o
currículo ao logo da história até hoje. Além disso, é necessário descontruir a
ideia de currículo como algo restrito apenas ao âmbito escolar. Se o currículo é
construído socialmente e vem se modificando ao longo do tempo, é importante
estar atento ao que vem determinando o currículo fora da escola, sobretudo as
ideologias enraizadas.
Levando em consideração a atual política curricular - BNCC e sua
organização por meio de competências, indagamos os professores: O que é
um indivíduo competente em termos de desenvolvimento humano? Que
características são fundamentais? Os docentes partiram do princípio de
desenvolvimento de um sujeito crítico, reflexivo, responsável, autônomo, que
sobretudo saiba enxergar e aplicar seus conhecimentos no cotidiano,
resolvendo problemas. Vejamos no discurso de um dos docentes quando
afirma: “um indivíduo capaz de pensar, se socializar, refletir e desenvolver um
espirito crítico, sobre os acontecimentos na sociedade. Pensador, crítico,
responsável” (Professor 8). A nosso ver, foram significações bastante positivas,
mesmo ficando marcado o sentido de currículo ainda restrito, os docentes
entendem de sua realidade, das competências necessárias para o
desenvolvimento dos seus alunos.
No que se refere ao sentido de autonomia docente na prática discursiva
dos professores participantes, percebemos, com maior expressividade nas
falas, o sentido de autonomia com respeito à democracia, à coletividade. Nesse

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caso, ficam circunscritos nos discursos dos docentes três polos distintos de
concepções — independência, liberdade, flexibilidade. A autonomia, a partir
destes polos, é assumida coletivamente quando alguns professores apontam a
autonomia associada a outros aspectos — “respeitando as condições regionais
e a participação de todos”, as “necessidades educacionais da turma”, “estando
pertinente ao sistema educacional”, “atendendo as necessidades da
comunidade”.
Por outro lado, corroborando com os estudos de Albino (2018), alguns 614
dos discursos ainda aparecem como: “Capacidade de executar um trabalho
sem interferências externas” (Professor 15), “autonomia docente será onde o
professor terá livre arbítrio para decidir e ampliar seus conhecimentos”
(Professor-Gestor 11). Para a autora, “a autonomia é compreendida, muitas
vezes, como liberdade total de fazer o que se quer, independente do outro” (p.
59) e, ainda, esclarece nessa perspectiva que é compreendida como “um direto
de escolha e liberdade que superpõe às dimensões éticas de convivência
humana” (p. 59).
Para os docentes, um currículo nacional comum, isto é, a BNCC, pode
atrapalhar sua autonomia completamente ou em parte e, em termos de
avaliações nacionais, podem em parte ou parcialmente subalternizar os
saberes locais, regionais e culturais que na base são apresentados como parte
diversificada, com parcela mínima de 40%. Outro aspecto que se apresenta
relevante em nossa pesquisa é a maior expressividade ao revelarem as
diferentes realidades locais e regionais como maiores dificuldades na
conjuntura implementativa.
Levando em consideração o Projeto Político Pedagógico (PPP) como
proposição importante para dinamizar a parte diversificada do currículo, ou
seja, os 40% destinados aos conhecimentos locais, regionais e culturais, os
professores afirmam unanimemente que não têm como implementar e
desenvolver estudos em torno da BNCC sem considerar o PPP da escola. Se
por um lado a BNCC nega que é currículo, por outro, amadurece a ideia de que
ela venha como movimento de regulação dos currículos já existentes nas
escolas, o que a meu ver compromete o principio de gestão democrática,

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sobretudo a autonomia docente, já que os professores, gestores e demais
atores do fazer pedagógico se curvam diante de uma política externa de
currículo.
Nesse sentido, os professores vêm se posicionando por meio da prática
discursiva de modo a negar alguns aspectos estabelecidos na BNCC, o que se
enquadra diante da teoria-método adotada de Fairclough (2001) como prática
discursiva contra-hegemônica, pois percebemos um discurso que desafia,
resiste e nega alguns sentidos existentes no documento oficial, nas 615
propagandas televisivas e nos movimentos favoráveis. Para Foucault (1996),
que também vem estudando a ordem discursiva “o discurso não é
simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas
aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nós queremos apoderar” (p.
10).

CONCLUSÃO

No processo de desenvolvimento do nosso projeto, entendemos que a


base nacional define que 60% dos currículos devem se basear no currículo
nacional, os outros 40% ficam à disposição das redes e escolas, isto é, para
atender as demandas regionais de cada estado. Porém, é importante
questionar: esses 40% são suficientes para atender as demandas locais,
regionais e culturais? O currículo local não deveria ter parcela máxima? Como
fica a autonomia docente diante disso?
Inferimos que o atual contexto de implementação da Base Nacional
Comum Curricular encontra-se permeado por resistências, desafios e
expectativas, amadurecendo cada vez mais a ideia de uma base imposta, (anti)
democrática. Percebemos alguns desencontros e até mesmo a negação da
BNCC nos discursos docentes, quando tecem críticas em torno do que está
estabelecido no documento oficial, apresentando como maior dificuldade na
implementação as diferentes realidades locais, regionais e culturais. Outros
docentes, talvez por esse motivo, parecem ainda não estar situados no

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processo implementativo. Portanto, afirmamos que alguns discursos seguem
numa ordem contra-hegemônica.
Vale salientar, portanto, que defendemos, diante da perspectiva de Silva
(2007), que a Base Nacional Comum Curricular é currículo. Advogamos,
também, pelo trabalho a partir de parâmetros e diretrizes, em que as diferenças
locais, regionais e culturais sejam respeitadas a partir dos projetos escolares. É
necessário, sobretudo, refletir sobre a autonomia dos docentes, que se
configura em nossa pesquisa como enfraquecida, desvalorizada desde o 616
processo construtivo, quando revela, a partir do discurso docente, os
silenciamentos no processo de produção/construção da BNCC, refletindo,
dessa forma, no atual cenário de implementação.
O projeto demonstra o seu potencial de diálogo com os docentes e o
quanto é importante, nesse movimento de reforma curricular, uma ação que
pretenda ‘ouvir’ de forma efetiva os docentes que estão no chão da escola. Os
professores demonstram conflitos, mas sobretudo resistência para assimilar
uma política verticalizada de currículo, inclusive isto pode ser sinalizado pela
decisão em não colaborar de forma efetiva com o questionário da nossa
pesquisa. A docência e sua interpretação precisam ser melhor contempladas
nas políticas curriculares.

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POLÍTICAS EDUCACIONAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
GEOGRAFIA: OS AVANÇOS DO CURRÍCULO E DA PRÁTICA
PEDAGÓGICA EM DOIS CURSOS DE LICENCIATURA DA PARAÍBA

Lenilton Francisco de Assis79

RESUMO: Neste trabalho analisamos os avanços do currículo e da prática pedagógica


em dois cursos de licenciatura em Geografia do estado da Paraíba. A pesquisa do tipo
qualitativa emprega a técnica de análise documental e bibliográfica para avaliar as
adequações dos projetos pedagógicos aos dispositivos legais que normatizam a 618
formação de professores no Brasil, especialmente em relação aos princípios e
componentes curriculares que buscam estabelecer as conexões teoria-prática,
universidade-escola. Compreender as mudanças das políticas curriculares e os
avanços formativos na valorização da prática pedagógica torna-se imperativo no
contexto atual das políticas educacionais do país, onde, de forma açodada e
autoritária, reformas têm sido aprovadas sem o devido diálogo com as universidades e
as escolas, cujas realidades são ainda afetadas por cortes de investimentos e de
programas que vinham produzindo significativas melhorias na formação inicial e
continuada de professores.
Palavras-chave: Formação de Professores. Ensino de Geografia. Políticas
Educacionais. Currículo. Prática Pedagógica.

INTRODUÇÃO

[...] Não existe, desde os anos de 1980, uma estratégia coerente e


contínua para a educação no Brasil, e muito menos uma ação
concreta para revalorizar a atividade docente. Todos nós
conhecemos as reviravoltas das políticas educacionais dos últimos 15
anos, tanto no âmbito federal quanto no estado. Tudo muda
constantemente a cada governo (novos guias ou “propostas
curriculares”, novas diretrizes pedagógicas, novas atividades
burocráticas, novas denominações etc.) e, no final das contas, tudo
continua praticamente igual ao que era.
VESENTINI, José William. Repensando a geografia escolar para o século XXI.
2009. p. 238

A epígrafe acima relata um desalento com as reformas educacionais no


Brasil. Sem dúvidas, são inúmeras as políticas que, desde os anos de 1980,
foram lançadas como propostas de diferentes governos, mas não como
políticas de Estado. Por isso, poucas delas dialogam, complementam-se ou se
mantém em torno do bem comum para o qual foram criadas: a melhoria da
educação.

79
Professor do Departamento de Metodologia da Educação e do Programa de Pós-Graduação
em Geografia da UFPB. Pós-Doutorando em Educação na UFPE. lenilton@yahoo.com

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


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237-1438-3
Sem ignorar os inequívocos avanços vivenciados nas últimas décadas
(comentaremos alguns adiante), podemos dizer que, no momento atual, a
sensação é ainda mais grave e mais desalentadora. As atuais políticas
educacionais não só definem um cenário de inflexão, mas também de
involução ou retrocesso. Em outras palavras, o que era ruim, tende a ficar pior.
Escola sem partido, Reforma do Ensino Médio, PEC do congelamento
dos gastos com educação e saúde, Base Nacional Comum Curricular, novo
PIBID, Residência Pedagógica entre outras. Desde a deposição da presidente
Dilma Roussef, em 2016, o Governo Federal adota, na educação e em todos
os setores da vida nacional, um receituário político que contraria, frontalmente, 619
as promessas e propostas de campanha escolhidas pela maioria dos
brasileiros na eleição presidencial de 2014. E, desse modo, interrompe um ciclo
de desenvolvimento social iniciado no país desde o fim do Governo de FHC,
em 2002, com a estabilidade econômica, e que se seguiu, a partir de 2003,
com as reeleições dos presidentes Lula e Dilma que criaram uma série de
políticas educacionais para melhorar a qualidade da educação básica e a
formação de professores – que será o foco desse estudo.
Cabe citar que a implantação das recentes políticas educacionais não tem
ocorrido sem a crítica e a resistência de professores, pesquisadores em
educação e das suas entidades representativas, tais como: ANPED-
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, ANPAE-
Associação Nacional de Política e Administração da Educação, ANFOPE-
Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação, AGB-
Associação dos Geógrafos Brasileiros, ANPEGE-Associação Nacional de Pós-
Graduação e Pesquisa em Geografia, entre outras.
Ainda assim, de forma célere e autoritária, reformas educacionais têm
sido aprovadas sob as frequentes críticas do novo Governo Federal e de
consultores educacionais de que as universidades públicas não sabem formar
professores ou de que elas oferecem uma formação inicial muito frágil e
descontextualizada da realidade da escola básica. De forma exclusiva e
intencional, esses discursos culpam as universidades públicas pelos problemas
da docência, desconsiderando a complexidade das conexões entre a formação
acadêmica e a prática profissional.
Portanto, diante das mudanças das políticas educacionais do país, urge
compreender os avanços das duas últimas décadas, sob o risco de não
mascararmos as lutas e conquistas de uma geração de formadores de
professores da universidade e da escola.
O recorte temporal da presente investigação é de 2002 a 2016, tendo
como marco inicial de reflexão as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)
lançadas pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), em 2002, para orientar
a revisão dos currículos dos cursos de licenciatura. Dentre as modificações
exigidas naquele documento, estavam a separação entre cursos de

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bacharelado e licenciatura, a oferta de 400 horas de estágio supervisionado e
de 400 horas de prática como componente curricular. Em 2015, novas DCNs
foram divulgadas pelo MEC ampliando o tempo mínimo de formação dos
professores da educação básica (de 2800 para 3200 horas) e ratificando a
carga horária definida para o estágio e para a prática curricular (BRASIL, 2002;
2015).
Além das DCNs, o MEC criou, em 2007, o Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) que promovia, por meio de diversas
atividades de ensino, pesquisa e extensão, maior interação entre a
universidade e a escola. O PIBID funcionava como incentivo à melhoria da 620
formação inicial dos alunos das licenciaturas, à formação continuada de
professores das escolas públicas e de professores universitários.
Embora o PIBID seja o mais conhecido e o mais estudado programa de
apoio à formação docente, outros programas semelhantes (e menos
investigados!) também foram implantados nos cursos de licenciatura do País,
nas últimas décadas, tais como: PRODOCÊNCIA-Programa de Consolidação
das Licenciaturas, PROLICEN-Programa de Licenciaturas, PARFOR-Plano
Nacional de Formação de Professores da Educação Básica, LIFE-Programa de
Apoio a Laboratórios Interdisciplinares de Formação de Professores, entre
outros.
Os diversos processos e experiências formativas desencadeadas pelas
DCNs e pelos citados programas geraram mudanças na epistemologia da
formação de professores no Brasil que precisam ser continuamente avaliadas.
Convém investigar se tais políticas, de fato, têm fomentado a valorização dos
saberes da prática e de ações colaborativas entre a universidade e a escola, a
fim de que elas possam cumprir sua missão com a formação de professores.
Nessa análise, não se pode desconsiderar as críticas e contrapontos
existentes à ênfase na formação prática que, segundo García (2016), consagra
a pedagogia das competências no Brasil e o submete à agenda internacional
para as reformas na formação de professores em países periféricos que
recebem auxílio técnico e financeiro de organismos como a Unesco, Banco
Mundial e a OCDE.
Porém, convém questionar: será mesmo que esses “reclames da prática”
só atendem a uma ideologia pedagógica imposta por organismos
transnacionais interessados em expandir políticas neoliberais em países em
desenvolvimento?
Há anos, diversas pesquisas constatam as críticas de estagiários e
professores em início de carreira de que são mal preparados na universidade e
desamparados na escola. Para eles, “na prática a teoria é outra” (PIMENTA;
LIMA, 2017; BEZERRA, 2017; ASSIS, 2018).
No campo da Geografia, tais questões suscitam investigações acuradas
em virtude das mudanças no seu ensino, nas pesquisas e na formação de

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professores nas últimas décadas. Ainda que não se possa duvidar da
permanência de práticas tradicionais no ensino de Geografia, no Brasil, a
pesquisa e o ensino dessa ciência vivenciam um momento de vigor, com
avanços bem à frente de outros países (VESENTINI, 2004).
Em estudo mais recente, Cavalcanti (2016, p. 405) constata que, “nas
décadas de 1990 e de 2000, consolidou-se a área de pesquisa no ensino [de
Geografia], na graduação, na pós-graduação e em rede com professores da
escola básica. Essa área ganhou espaço acadêmico, profundidade teórica e
amplitude temática”. Porém, a Autora ressalta que, entre 2010 e 2015, dentre
os temas das 430 dissertações e teses produzidas em 62 Programas de 621
Geografia, o eixo “Currículo e Políticas Públicas” congregava, apenas, 38
trabalhos, ou seja, 8,59% da produção da pesquisa da Pós-graduação em
Geografia.
No intuito de também contribuir com os estudos geográficos sobre as
políticas curriculares (que se tornaram mais relevantes na atual conjuntura
política e, por consequência, têm atraído, nos últimos anos, a atenção de vários
pesquisadores do campo do ensino de Geografia - RABELO; BUENO, 2015;
ALVES; KHAOULE, 2017), analisamos, neste trabalho, os avanços do currículo
e da prática pedagógica em dois cursos de licenciatura em Geografia da
Paraíba. Para essa primeira etapa da pesquisa de Pós-doutoramento que
estamos realizando junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação da
UFPE, avaliamos as adequações dos projetos pedagógicos aos dispositivos
legais que normatizam a formação de professores no país, especialmente em
relação aos princípios e componentes curriculares que buscam estabelecer as
conexões teoria-prática, universidade-escola.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

A formação para a docência centrada na prática e na investigação dessa


prática constitui um campo profícuo de pesquisas e publicações recentes que
reforçam a necessidade de aproximações entre a universidade e a escola. A
articulação dessas instâncias, segundo Zeichner (2010), possibilita a criação de
“espaços híbridos” na formação de professores e representa uma mudança de
paradigma na epistemologia dos programas de formação docente, nos quais o
conhecimento acadêmico e a prática escolar se integram de modos mais
democráticos e menos hierárquicos.
Obviamente ao se falar de prática, não se trata de reforçar a ideia de
prática dissociada da teoria ou baseada na observação e imitação de modelos
de como ensinar – assim como faziam os cursos de formação de professores
que orientavam a prática de ensino seguindo o paradigma da racionalidade
técnica ou da abordagem tradicional. Compartilhamos da visão de Sacristán
(2002, p. 22) para quem “a prática pedagógica é uma práxis, não uma técnica.
E investigar sobre a prática não é o mesmo que ensinar técnicas pedagógicas”.

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A prática pedagógica aqui entendida é portadora de uma unidade teórico-
prática (práxis) cujo estatuto epistemológico possibilita aos professores
mobilizar e ressignificar os conhecimentos aprendidos na universidade e
construir suas próprias teorias a partir da ação no espaço escolar. A teoria
deve estar associada à prática, pois a prática produz o conhecimento tácito que
deve ser valorizado pelo seu valor subjetivo e investigativo.
Freire (2013, p. 47) também defende uma formação docente baseada na
unidade teoria-prática, quando diz:

Como professor num curso de formação docente não posso esgotar 622
minha prática discursando sobre a Teoria da não extensão do
conhecimento. Não posso apenas falar bonito sobre as razões
ontológicas, epistemológicas ou políticas da Teoria. O meu discurso
sobre a Teoria deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria. Sua
encarnação. Ao falar da construção do conhecimento, criticando a
sua extensão, já devo estar envolvido nela, e nela, a construção deve
estar envolvendo os alunos.

Convém ainda esclarecer que a visão de prática pedagógica aqui adotada


não se restringe à prática docente ou à ação do professor de ensinar. No
debate que encetamos com as políticas educacionais, compreendemos que a
produção do currículo e suas reformulações na universidade e na escola não
ficam a cargo apenas das práticas dos docentes e discentes no cotidiano da
sala de aula. Elas também se efetivam nas ações dos professores que estão a
frente da gestão acadêmica, na supervisão pedagógica, no núcleo docente
estruturante, ou seja, de todos que pensam e fazem a prática pedagógica como
uma prática institucional, coletiva, intencional, articuladora de práticas docente,
discente, gestora e epistemológica (SOUZA, 2009; GUIMARÃES; SANTOS,
2017).
Para Santiago (2006), a prática pedagógica, por ser institucional, é
espaço de construção e de materialização de uma proposta curricular.
Sacristán (2000) também defende essa posição de que toda prática
pedagógica gravita em torno do currículo. E ele ainda acrescenta:

[...] O currículo faz parte, na realidade, de múltiplos tipos de práticas


que não podem reduzir-se unicamente à prática pedagógica de
ensino; ações que são de ordem política, administrativa, de
supervisão, de produção de meios, de criação intelectual, de
avaliação, etc., e que, enquanto são subsistemas em parte
autônomos e em parte interdependentes, geram forças diversas que
incidem na ação pedagógica (p. 22). [...] Por tudo o que foi dito, o
currículo, com tudo o que implica quanto a seus conteúdos e formas
de desenvolvê-los, é um ponto central de referência na melhora da
qualidade do ensino, na mudança das condições da prática, no
aperfeiçoamento dos professores, na renovação da instituição escolar
em geral e nos projetos de inovação dos centros escolares [e
universitários] (p. 32, Grifo nosso).

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Nesse sentido, a prática pedagógica provoca o pensar as políticas
educacionais, especialmente as políticas curriculares voltadas à formação de
professores a qual se converte em um campo de investigação em
desenvolvimento que não mais se confunde como mera prática ateórica de
instrução, treinamento, técnica, ensino, educação ou preparação de
professores.
De acordo com Marcelo (1999, p. 26):

A formação de professores é a área de conhecimentos, investigação


e de propostas teóricas e práticas que, no âmbito da Didática e da
Organização Escolar, estuda os processos através dos quais os 623
professores – em formação ou em exercício – se implicam
individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem
através das quais adquirem ou melhoram os seus conhecimentos,
competências e disposições, e que lhes permite intervir
profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do currículo e
da escola, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação que
os alunos recebem.

Ao apresentar o estado da arte da pesquisa sobre a formação de


professores, Marcelo (1998) destaca que a mudança que se vem produzindo
nas investigações sobre o “pensamento do professor” vai na direção de uma
pesquisa mais comprometida com os conteúdos que os professores ensinam,
ou seja, com o currículo e com o conhecimento prático dos professores.
Todavia, a formação de professores voltada para a valorização dos
conhecimentos da prática não pode desprezar o fato de que, além de
fundamental para a significação dos conhecimentos teóricos, o referencial da
prática contribui para mostrar que a ação docente também é impregnada de
elementos sociais, éticos, políticos, culturais, afetivos e emocionais que
precisam ser considerados, ponderados e refletidos na análise da prática
pedagógica ou do currículo que a direciona e a institucionaliza na universidade
e na escola.
Nessa perspectiva, o professor desenvolve conhecimentos ou saberes
teórico-práticos que são problematizados, refletidos e maturados na prática
pedagógica, ou seja, baseados na investigação da realidade em que atua. E
esta realidade não está circunscrita à sala de aula ou a sua disciplina, mas
engloba a escola e a comunidade que esta integra. Logo, é importante a
preparação de professores que adotem uma postura crítico-reflexiva em
relação a sua prática e às condições sociais que a influenciam. É essa
perspectiva que Cavalcanti (2012, p. 78-79) também defende para a formação
de professores de Geografia no Brasil, quando afirma:

O professor crítico-reflexivo é, dessa forma, aquele profissional que


tem competência para pensar sua prática com qualidade, crítica e
autonomia, tendo como base referenciais teóricos. A formação de
professores de geografia pode se pautar por essa concepção de

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profissional, entendida como aberta à possibilidade de discussão
sobre o papel da educação em várias dimensões, para a construção
da sociedade e para a definição do papel da geografia na formação
geral do cidadão.

Os procedimentos e as técnicas adotadas na pesquisa seguirão os


princípios da abordagem qualitativa que, segundo Lüdke e André (1986), tem a
descrição dos dados como uma de suas características predominantes. Nesta
primeira etapa da investigação, empregamos a técnica de análise documental e
bibliográfica para o estudo comparativo dos projetos pedagógicos de dois
cursos de Geografia da Paraíba, assim como das Diretrizes Curriculares
Nacionais para formação de professores (BRASIL, 2002; 2015). 624

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A formação inicial de professores de Geografia na Paraíba fica a cargo de


três instituições públicas de ensino superior que funcionam na capital do estado
e em cidades-polo do interior, a saber: Universidade Federal da Paraíba
(UFPB, campus João Pessoa-1); Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG, campus Campina Grande-2 e campus Cajazeiras-3) e a Universidade
Estadual da Paraíba (UEPB, campus Campina Grande-4 e campus Guarabira-
5).
Nos dois cursos selecionados (1 e 3) para essa primeira etapa da
pesquisa, identificamos situações bem díspares nas reformulações dos
currículos e nos avanços para valorizar a prática pedagógica. Na UFPB,
campus João Pessoa, o curso de Geografia forma bacharéis e professores,
porém reproduzindo um modelo formativo que dá pouca atenção à prática e
aos saberes docentes. Tanto é que, até 2015, o curso adotava um currículo
ainda de 1998 que privilegiava a formação do bacharel. Após mais de uma
década sem revisão, só em 2015, o curso de Geografia da UFPB foi obrigado a
se adequar às DCNs de 2002 e a separar a licenciatura e o bacharelado.
O currículo de 1998 dava ênfase aos estudos regionais e à gestão
ambiental e se propunha a formar, portanto, os dois profissionais: o geógrafo
(técnico bacharel) e o professor de geografia. Ao fixar os saberes disciplinares,
nos três primeiros anos do curso, e os saberes pedagógicos, só no final, a
velha matriz também reforçava a separação entre teoria e prática, entre
universidade e escola – esta apenas concebida como espaço de reprodução do
ensino e não da produção de pesquisas e de saberes docentes.
Atualmente, o curso vive a transição de um currículo de 1998 (ainda
vigente, com as últimas turmas) e um novo currículo implantado no início de
2015 que, logo em seguida, começou a ser revisado para sua adequação às
DCNs de 2015 – lançadas na metade daquele ano. O novo PPC da licenciatura
em Geografia (UFPB, 2016) propõe subverter a lógica da racionalidade técnica

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e contribuir para fortalecer a identidade profissional docente, especialmente
com a redistribuição das disciplinas pedagógicas, a ampliação das práticas
curriculares e dos estágios supervisionados cuja carga-horária obrigatória de
405h foi dividida em três componentes curriculares, sendo dois com 150 horas
e um com 105 horas.
Tais mudanças estão em sintonia com o que defendem Libâneo e
Pimenta (1999, p. 267-268) quando advertem:

Desde o ingresso dos alunos no curso, é preciso integrar os


conteúdos das disciplinas em situações da prática que coloquem 625
problemas aos futuros professores e lhes possibilitem experimentar
soluções. Isso significa ter a prática, ao longo do curso, como
referente direto para contrastar seus estudos e formar seus próprios
conhecimentos e convicções a respeito. Ou seja, os alunos precisam
conhecer o mais cedo possível os sujeitos e as situações com que
irão trabalhar. Significa tomar a prática profissional como instância
permanente e sistemática na aprendizagem do futuro professor e
como referência para a organização curricular.

No campus Cajazeiras da UFCG, situado no extremo oeste da Paraíba,


na mesorregião do sertão, a 477 da capital João Pessoa, foi implantado, em
2008, o novo Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Geografia, em
atendimento às DCNs de 2002. Embora fossem mais rápidos que os
professores da UFPB nas discussões dessas diretrizes e na reformulação da
matriz curricular que originou o novo projeto da licenciatura, vale destacar que,
desde 1979, quando o curso foi criado, até 2010, ano de conclusão da última
turma do velho currículo, a “grade curricular” para a formação de professores
de Geografia permaneceu praticamente intacta, sem uma proposta pedagógica
clara (PESSOA, 2017). Contudo, o novo PPC da licenciatura (UFCG, 2008)
apresenta avanços formativos no aumento da carga horária do curso, na
preocupação com a pesquisa na licenciatura, no acréscimo de disciplinas
direcionadas ao ensino e à prática pedagógica, especialmente com a oferta de
quatro estágios supervisionados e de quatro práticas como componente
curricular: 1) Prática de Ensino em Cartografia; 2) Prática de Ensino em
Geografia Regional e do Brasil; 3) Prática de Ensino em Geografia Humana; 4)
Prática de Ensino em Geografia Física.
No caso das práticas curriculares, valem destacar o formato flexível para
a sua oferta, o incentivo à integração de conteúdos específicos e pedagógicos,
além da distribuição das quatro práticas ao longo do curso, com o início a partir
do terceiro período. Essa proposta para a prática curricular na UFCG vai de
encontro ao modelo aplicacionista do conhecimento que era idealizado nas
licenciaturas sob a defesa de que, primeiro, deve ser aprendida a teoria e, só
no final, a prática.

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No novo currículo, tanto as práticas de ensino quanto os estágios
supervisionados apresentam ementas que reservam, cada uma, 405 horas de
atividades teórico-práticas e interdisciplinares que visam aproximar o aluno do
cotidiano da escola e fazer a articulação entre os saberes específicos e os
saberes pedagógicos por meio de oficinas de materiais didáticos, seminários,
planejamento de aulas, regências supervisionadas em turmas do ensino
fundamental e do ensino médio, palestras, trabalhos de campo, grupo de
estudo, pesquisas no espaço escolar para o trabalho acadêmico, entre outros.
Desse modo, o novo PPC da licenciatura em Geografia da UFCG busca
aproximar a formação acadêmica do campo profissional ao promover a maior 626
distribuição e articulação da prática curricular e dos estágios supervisionados
ao longo do curso. De acordo com o novo PPC:

A prática como estágio supervisionado, do mesmo modo que a


prática como componente curricular, além de ser condição para a
obtenção da licença para o exercício da docência, oportuniza a
vivência in loco e o conhecimento de situações reais diretamente em
unidades escolares dos sistemas de ensino. [...] As duas perspectivas
atribuídas à prática pelos documentos legais que regem a formação
dos professores pretendem uma abordagem mais integrada e flexível
que supere a fragmentação anterior e que atenda às diferentes
necessidades e especificidades na busca de uma maior qualidade
nos cursos de formação docente (UFCG, 2008, p. 17).

CONCLUSÃO
No caso do novo curso de licenciatura em Geografia da UFPB, é
necessário que não mais se reforce a separação entre os componentes
específicos e os componentes didático-pedagógicos – como ainda ocorre no
velho currículo em vigência. O novo PPC do curso apresenta bons avanços no
currículo prescrito e nas concepções formativas, mas que ainda precisam ser
implementados na prática dos professores formadores. A demora do Colegiado
do Curso em fazer a reforma curricular que se tornara obrigatória desde as
DCNs de 2002 foi, sem dúvidas, uma perda de oportunidade de se aperfeiçoar,
mais rapidamente, a formação de professores na UFPB. E tal atraso pode ser
apontado como um dos fatores que influenciam na alta evasão de alunos
registrada pelo curso nos últimos anos.
Na UFCG, campus Cajazeiras, os avanços formativos propostos nas
DCNs de 2002, já são realidade, há uma década, no novo PPC. Porém, ainda
há problemas na relação teoria-prática e na integração universidade-escola,
pois as reformulações do currículo prescrito não se transformam, rapidamente,
em mudanças na prática dos professores formadores e nem resolvem,
sozinhas, os problemas da profissão docente e das precárias condições de
trabalho (e de estágio) de muitas escolas.

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Por isso, compreender as mudanças das políticas curriculares e os
avanços formativos das últimas décadas torna-se imperativo no contexto atual
das políticas educacionais do país, onde, de forma açodada e autoritária,
reformas têm sido aprovadas sem o devido diálogo com as universidades e as
escolas, cujas realidades são ainda afetadas por cortes de investimentos e de
programas que vinham produzindo significativas melhorias na formação inicial
e continuada de professores, a exemplo do PIBID.

Analisar os impactos dos programas de iniciação à docência nos dois


cursos em apreço será o objeto da próxima etapa dessa pesquisa que terá os
627
professores formadores como sujeitos da investigação. Mesmo considerando o
escopo e as limitações dos resultados até aqui alcançados, convém advertir
que as pesquisas acadêmicas precisam olhar as políticas educacionais das
últimas décadas com lupas bem calibradas para que não continuem reiterando
o discurso hoje dominante de que não houve avanços formativos e as
universidades públicas continuam sem melhorar a formação de professores.
Sem desconsiderar as dificuldades ainda existentes nos centros universitários
de formação de professores, não se pode associar, de modo intencional e
irrestrito, seus problemas com as questões da profissionalização docente a
qual enseja ações efetivas (e diferentes) de políticas educacionais para
melhorar a remuneração salarial dos professores, as condições de trabalho, a
formação continuada e a carreira do magistério.

Por conseguinte, não podemos aceitar, sem luta e resistência, que novas
políticas curriculares façam retroceder os avanços formativos alcançados, sob
o risco de se confirmar a máxima da epígrafe que abre esse texto, ou seja, de
que “tudo muda constantemente a cada governo [...] e, no final das contas,
tudo continua praticamente igual ao que era”.
É preciso reconhecer, sem abrir mão da crítica e da reflexão, que de 2002
a 2016, vivemos um hiato no âmbito das políticas educacionais no Brasil,
especialmente das políticas curriculares voltadas à formação de professores e
à aproximação entre a universidade e a escola. E, diante desse duro momento
de “recuos” e “contra-sonhos”, cabe lembrar e seguir com o alerta de Freire
(2000, p. 26) de que:
Os sonhos são projetos pelos quais se luta. Sua realização não se
verifica facilmente, sem obstáculos. Implica, pelo contrário, avanços,
recuos, marchas às vezes demoradas. Implica luta. Na verdade, a
transformação do mundo a que o sonho aspira é um ato político e
seria ingenuidade não reconhecer que os sonhos têm seus contra-
sonhos.

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REFERÊNCIAS

ALVES, Adriana Olívia; KHAOULE, Anna Maria Kovacs (Orgs.). A Geografia


no cenário das políticas públicas educacionais. Goiânia: C&A Alfa
Comunicação, 2017.
ASSIS, Lenilton F. de. Estágio Supervisionado de Geografia: impressões e
estratégias de ensino-pesquisa. In.: ASSIS, L. F. de; SOARES JÚNIOR,
Francisco Cláudio (Orgs.). Ensino e pesquisa na educação geográfica.
Natal: EDUFRN, 2018. p. 19-47. Disponível em: 628
https://repositorio.ufrn.br/jspui/bitstream/123456789/25591/1/Ensino%20e%20p
esquisa%20na%20educa%C3%A7%C3%A3o%20geogr%C3%A1fica.pdf
Acesso em: 14 jul. 2018
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução
CNE/CP Nº 1/2002. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de
licenciatura, de graduação plena. Brasília: MEC, 2002.
______. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP Nº 2/2015.
Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e
Continuada de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de
licenciatura, de graduação plena. Brasília: MEC, 2015.

______. Programas do MEC voltados à formação de professores.


Disponível em: http://portal.mec.gov.br/component/content/article?id=15944
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BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E EDUCAÇÃO DO CAMPO:
implicações da BNCC na formação de professores/as campesinos/as

Douglas Ferreira Silva80 | Lucielma Bernardino C. de Arruda81

RESUMO: Atualmente, vivemos no Brasil, um movimento para a implantação de uma


base curricular para todas as escolas do território nacional. Essa base foi nomeada de
Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em dezembro de 2017, após três
versões preliminares. Nesse sentido, surge-nos o interesse de pesquisar sobre a 631
uniformização curricular proposto pela BNCC, observando a ênfase que é dada ao
descritor “formação docente”. Tendo em vista que, ao longo dos anos, o ensino
ofertado nos espaços campesinos sofre rupturas causadas pelos currículos formais,
perpetuando a negligência aos saberes próprios das comunidades as quais as escolas
estão localizadas. Nosso objetivo geral com esse estudo é compreender as
implicações da Base Nacional Comum Curricular na formação de docentes que atuam
na modalidade de Educação do Campo. Partindo da seguinte questão-problema: De
que forma a Base Nacional Comum Curricular implica na formação de professores/as
que atuam na modalidade de Educação do Campo? Assim nos ancoramos em alguns
autores que discutem Educação do Campo (CALDART, 2004; ARROYO, 2005; SILVA,
TORRES e LEMOS, 2012; SILVA e SILVA, 2017), e nos debruçamos sobre teorias
críticas à BNCC (DIAS, FARIAS E SOUZA, 2017; MARCHELLI, 2017; MACEDO,
2014), e sobre os documentos curriculares da BNCC. Nesta pesquisa, nos ancoramos
em Marconi e Lakatos (2011) para uso da pesquisa bibliográfica, e nos utilizamos da
Análise de Conteúdo (BARDIN, 2009) para analisarmos os dados construídos através
das leituras. Por fim, compreendemos com essa pesquisa que em todo o texto da
BNCC, o descritor “formação docente” aparece várias vezes, porém em uma
perspectiva voltada à formação de professores para o “alinhamento” à BNCC, e não as
especificidades de cada comunidade ou organização que a/a docente vier a atuar.

PALAVRAS-CHAVE: BNCC, Currículo, Formação Docente, Educação do Campo .

80
Mestrando do programa de Pós-Graduação em Educação Contemporânea do Centro
Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco – PPGEduC/CAA/UFPE;
Bolsista da Fundação de Amparo a Ciência e Tecnologia de Pernambuco – FACEPE; Membro
do LAPPUC (Laboratório em pesquisa de políticas públicas, currículo e docência); Graduado
em Pedagogia – CAA/UFPE; Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pelas
Faculdades Integradas de Patos – PB; Professor da Educação Básica do Município de Brejo da
Madre de Deus – PE; E-mail: douglasufpe@outlook.com
81
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática
(PPGECM) da Universidade Federal de Pernambuco/Centro Acadêmico do Agreste
(UFPE/CAA). Especialista em Ensino de Ciências pela UFPE. Especialista em Mídias na
Educação pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Especialista em
Programação do Ensino de Biologia pela Universidade de Pernambuco (UPE). Graduada em
Ciências com Habilitação em Biologia pela Autarquia Educacional do Belo Jardim (AEB).
Desde 2003 é professora efetiva da rede municipal de Santa Cruz do Capibaribe – PE. Desde
2005 é professora da rede estadual de Pernambuco e atualmente é professora do Instituto
Superior de Educação. E-mail: lucielmabernardino2@gmail.com

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INTRODUÇÃO

A Base Nacional Comum Curricular apresenta-se como uma base de


currículos mínimos para a educação básica de todo território nacional. Neste
sentido, além de propor uma base de currículos mínimos para a educação
básica, a BNCC influencia diretamente nas políticas para formação inicial nos
cursos de licenciatura, nos cursos de formação pedagógica, além de impactar a
docência através das formações continuadas, e dessa forma, implicando no 632
saber/fazer de docentes que atuam em espaços que se encontram fora dos
espaços urbano-centrais, a exemplo de escolas do campo.
Dessa forma, fizemos a opção por relacionar o que trazem os
documentos curriculares da BNCC com o paradigma da Educação do Campo,
de forma que pudéssemos dialogar entre os dois descritores, a fim de
identificar o lugar da docência que acontece em espaços campesinos, com as
novas propostas curriculares apontadas pelo Ministério da Educação (MEC)
através dessa nova Base Nacional Comum Curricular.
Nesse sentido, analisamos algumas produções científicas que se
aproximam da perspectiva de Educação do Campo ao qual nos aproximamos
para produção desse trabalho (CALDART, 2004; ARROYO, 2005; SILVA,
TORRES e LEMOS, 2012; SILVA e SILVA, 2017). Tais teorias fazem menção à
formação de professores que atuam em escolas do campo de forma específica
e diferenciada, contemplando possíveis demandas das comunidades
campesinas. E, a partir da análise dessas teorias, confrontamo-las com o que a
BNCC aponta como formação humana integral e qualidade social da educação.
Nesse sentido, objetivamos com a produção desse trabalho,
compreender as implicações da Base Nacional Comum Curricular na formação
de docentes que atuam na modalidade de Educação do Campo. Assim,
buscamos a partir da análise dos discursos presentes na BNCC, identificar qual
o lugar da Educação do Campo nos documentos curriculares da BNCC;
conhecer a discussão sobre formação presentes na BNCC; e, por fim, analisar
a perspectiva de formação docente nos discursos da BNCC. E, para atender
nossos objetivos, partimos da seguinte questão-problema: De que forma a

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Base Nacional Comum Curricular implica na formação de professores/as que
atuam na modalidade de Educação do Campo?

FORMAÇÃO DE PROFESSORES/AS E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE:


implicações de uma Base Nacional Comum Curricular
A Educação do Campo vem sendo objeto de diversos/as estudos e
pesquisas acadêmicas nos últimos anos (CALDART, 2004; ARROYO, 2005;
SILVA, TORRES e LEMOS, 2012; SILVA e SILVA, 2017). Estudos esses que 633
nos levam a entender que a modalidade de educação ofertada nos territórios
campesinos, demanda aspectos curriculares e estruturais específicos e
diferenciados, tendo em vista que a lógica à qual as escolas do campo estão
inseridas supera a mecanicidade do ensino formal que ainda faz parte das
escolas localizadas em espaços urbanos.
Nesse sentido, compreendemos que a Educação do Campo demanda
uma estrutura curricular que se adeque as necessidades dos povos
campesinos, como também atenda as demandas do campo numa lógica de
projeto que integre a vida escolar dos sujeitos aprendentes à vida no campo.
Outro aspecto importante de se observar na problemática que envolve a
discussão da Educação do Campo, é a formação inicial e continuada de
professores/as para atuarem no espaço campesino. Pois, por diversas vezes
esses/as docentes atuam nessas escolas sem sequer apropriarem-se das
demandas que envolvem as subjetividades e especificidades do campo.
Através dessa discussão, alguns teóricos apontam para a compreensão
do que, de fato, é a Educação do Campo. Arroyo, Caldart e Molina (2008)
apontam pra o conceito de educação do campo,
O nome Educação do Campo, já identifica uma reflexão
pedagógica que nasce das diversas práticas de educação
desenvolvidas no campo e/ou pelos sujeitos do campo. É uma
reflexão que reconhece o campo como lugar onde não apenas
se reproduz, mas também se produz pedagogia; reflexão que
desenha traços do que pode se constituir um projeto de
educação ou de formação dos sujeitos do campo (p. 154).

A partir da reflexão do/as autor/as, entende-se que o campo, não


somente se apropria de conhecimentos que foram produzidos em outros

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espaços, mas também produz conhecimentos diversos. E, nesse sentido, o
próprio campo apresenta-se como espaço educativo, onde os sujeitos se
apropriam de saberes próprios do território, que supera a ideia de espaço
geográfico, mas emerge com a ideia de território enquanto espaço de
pertencimento.
Assim, entendemos que essa atenção específica e diferenciada
demandada pelos povos do campo no seu trajeto formativo, se dá por inúmeros
fatores, e um deles é a incidência da evasão escolar, pois, por terem suas 634
subjetividades e características negadas e colocadas em segundo plano pela
escola, os sujeitos não se reconhecem como fazendo parte daquele espaço,
evadindo-se e abandonando os espaços escolares, muitas vezes antes mesmo
de serem alfabetizados.
Nesta direção, Arroyo (2005) enfatiza que a educação do campo é a
mais elementaríssima por que são vistos os povos do campo no nível mais
baixo da hierarquia social. E, diante dessas afirmações compreendemos que a
educação do campo, por diversas vezes, cumpre apenas com um papel de
instrução, ou seja, dá conta apenas do mais elementar possível da formação
dos sujeitos que ali estão, fazendo referência à educação que ocorre nos
espaços campesinos, como algo elementar, sem considerar a sua dimensão
social e política na formação dos povos.
Desta forma, (re)pensar a escola do campo e todo o processo educativo
que acontece no espaço campesino é um exercício necessário. E, a partir
disso, Arroyo (2005) continua afirmando que
Nesta trajetória de tentar construir uma escola diferente, o que
era um direito, passou a ser também um dever. Se queremos
novas relações de produção no campo, se queremos um país
mais justo e com mais dignidade para todos, então também
precisamos nos preocupar em transformar instituições
históricas como a escola em lugares que ajudem a formar os
sujeitos destas transformações (p. 5).

Arroyo (2005) exalta que essa negação histórica do campo como espaço
geográfico e cultural, negando os sujeitos que ali estão, provocou uma
resistência na concepção do espaço escolar, onde os mesmos passaram a vê-
la como algo desnecessária. A escola tem como um de seus papéis, fortalecer

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o vínculo entre as diversas formas de aprender e mediar os saberes, fazendo
com que o sujeito aprendente se sinta parte fundamental de sua formação, pois
é a partir do trajeto formativo que o sujeito organiza seus conhecimentos.
Assim, pensar políticas públicas para a formação do sujeito que atua
como docente no espaço campesino torna-se algo necessário, tendo em vista
que as formações de professores/as deve contemplar em seus projetos
pedagógicos e curriculares, práticas e teorias que permitam ao docente em
formação, atuar nos mais diversos espaços da sociedade, à exemplo do 635
campo, de comunidades indígenas, quilombolas, entre outras. Levando em
consideração, nessa formação, que o sujeito que não é formado nessa
perspectiva da diversidade e das diferenças, não consegue contemplar e ou
compreender as dinâmicas desses espaços outros.
Nesse sentido, ao discutirmos sobre as questões curriculares e
didáticas, mais especificamente àquelas que são desenvolvidas em escolas do
campo, surge a discussão acerca da implantação de uma Base Nacional
Comum Curricular, mais conhecida como BNCC. A BNCC apresenta-se como
uma proposta de unificação e uniformização curricular para toda a educação
básica, propondo a municípios e estados, currículos mínimos para serem
trabalhados. A BNCC ao tratar da formação docente, não direciona um olhar
específico à educação do campo, pois ao abordar as questões de formação de
professores o faz de forma genérica como destaca Marchelli (2017), ao afirmar
que:
A BNCC oferece uma expectativa de mudanças na preparação
inicial de professores realizada nos cursos de licenciatura,
cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de
segunda licenciatura, bem como para a formação continuada
após ingresso no magistério (p. 211).

Porém, essa expectativa de mudança não explicita o direcionamento que


será dado, nem tampouco aborda as especificidades culturais e regionais
brasileiras.
Diante da proposta de uma base curricular, repensar a formação de
docentes se torna algo extremamente necessário, tendo em vista que o
exercício da profissão está intimamente dialogando com aspectos estruturais,

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nesse caso, o currículo. Pois uma base comum de currículos tende a exigir
dos/as docentes conhecimentos que não fazem parte dos cursos de
licenciaturas (MARCHELLI, 2017). Segundo Marchelli (2017), a ideia de uma
formação de professores/as para atuação pautada em bases curriculares
comuns, demanda investimentos em ensino interdisciplinar, e, o mesmo ainda
afirma que,
O fracasso é atribuído à falta de profissionais capazes de
pensar interdisciplinarmente, pois as inúmeras tentativas de
que os cursos de licenciatura formassem professores aptos 636
para desenvolverem e aplicarem esse tipo de pensamento não
produziu bons frutos (p. 224).

Nesse sentido, compreendemos que o desafio da implantação de uma


base de currículos em todo território nacional não é algo tão simplista e/ou fácil
de realizar, tendo em vista que o território brasileiro é composto por diversas
culturas e os currículos devem se apresentar como fruto dessas vivências e
características de cada região. Assim, a BNCC acaba por tentar padronizar os
sujeitos que forem frutos dessa nova modalidade curricular que vem sendo
implantada no ensino básico.

Segundo as reflexões apontadas por Marchelli (2017), concluímos


entendendo que a lógica da formação interdisciplinar, demanda do/a
professor/a, a flexibilização do seu trabalho, tendo em vista que a docência por
si só já exige dos/as profissionais que a exercem, domínio de teorias e práticas
próprias do ensinar. Porém, com a possibilidade de uma formação
interdisciplinar, além de se apropriar dos conhecimentos da área específica em
que atuar, os/as docentes terão que se apropriar de outros conhecimentos para
que assim possam relacionar com sua área de atuação.
Dessa forma, Paulo Marchelli em outra obra, faz uma reflexão acerca
da formação de professores/as. Tendo em vista que a interdisciplinaridade
apresenta-se como uma possibilidade de integração curricular/disciplinar, o
autor apresenta a discussão do ForGRAD, que apresenta-se como uma crítica
à uniformização e a formação por competências, tendo em vista que a
docência não se caracteriza como uma atividade de transmissão de

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conhecimentos, mas como espaço de mediações, construções e reflexões
acerca do conhecimento.
Neste sentido, (re)pensar a formação docente, seja ela inicial, como os
cursos de graduação, e/ou continuada, a exemplo das formações em exercício
profissional, segunda licenciatura e ou cursos de aperfeiçoamento, são de
extrema relevância quando se pensa em uma formação plural, mas que rompa
com a perspectiva de interdisciplinaridade e performance, pois não deve-se o/a
professor/a ser submetido à racionalização da profissão e a flexibilização do 637
seu trabalho pedagógico. Mas, apresente-se em oposição a isso, uma
formação docente que possibilite ao docente atuar em espaços outros, a
exemplo de escolas do campo, indígenas, quilombolas, entre outras.
Nessa direção, Macedo (2015) faz críticas a uma formação integrada,
que visa formar para a docência de maneira interdisciplinar, através da
flexibilização da docência, afirmando que “a integração curricular acaba
descaracterizando as diferenças ao invés de promovê-las, pois não é possível
realizar a igualdade sem que haja alteração, nem é possível incluir o que não é
excluído [...]”.
Assim, entendemos que a autora considera que a integração tanto
disciplinar quanto curricular, apresenta-se enquanto campo de
desconsideração das diferenças e das singularidades de cada sujeito,
instituição escolar, região... E, desta forma, pensar em uma formação, seja ela
docente ou não, requer das instituições e classes uma análise mais
aprofundada sobre o contexto e a dinâmica ao qual está inserida.
Para facilitar nossa compreensão sobre as dinâmicas outras, e mais
especificamente, a dinâmica da Educação do Campo, nos aproximamos da
Constituição Federal de 1988, pois a mesma traz algumas prerrogativas que se
aplicam ao ensino. E, no artigo 210, a CF-88 afirma que “serão fixados
conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar
formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais
e regionais”. Nesse sentido, percebemos que a ideia de um currículo comum
não é algo que está exclusivamente na discussão da base, mas apresenta-se
aos sistemas de ensino há mais de 20 anos, o que nos revela que a

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implantação de um currículo único já vem amadurecendo nas discussões das
entidades governamentais.
Assim, percebemos que a CF-88 juntamente com a Base Nacional
Comum Curricular entram em contradição com a Lei de Diretrizes e Bases
(9.394/96). Pois a LDB em seu artigo 28 afirma aponta e orienta que

Na oferta de educação básica para a população rural, os


sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à
sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada 638
região, especialmente:
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às
reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
II - organização escolar própria, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural. (grifos
nossos)

Sendo assim, percebemos que a BNCC, apesar de ser um documento


produzido pelo Ministério da Educação (MEC) em parcerias com diversos
órgãos, e analisado pelo CNE, descumpre aquilo que o artigo 10 da LDB traz
como orientação aos sistemas de ensino para as populações do campo,
fragmentando e fragilizando ainda mais a formação dos sujeitos do campo, que
como acima afirma Arroyo (2005), apresenta-se como a mais elementar
possível.

PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS

Nesta pesquisa, nos ancoramos em Marconi e Lakatos (2011) para uso


da pesquisa bibliográfica, onde as mesmas afirmam que a pesquisa
bibliográfica “trata-se do levantamento de toda a bibliografia já publicada em
forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita. Sua finalidade
é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre
determinado assunto (p. 43-44)”.
Nesse sentido, para análise de todos os dados produzidos e
investigados ao longo do estudo, nos utilizamos da Análise de Conteúdo
(BARDIN, 2009). A autora afirma que a Análise de Conteúdo propõe ao

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pesquisador/a, debruçar-se sobre todos os dados produzidos, a fim de trazer
uma interpretação mais sólida e profunda acerca dos mesmos. Pois, de acordo
com (CHIZZOTTI, 2014): “É um tipo de análise da comunicação, que pretende
garantir a imparcialidade objetiva (P. 114)”.
Sendo assim, elencamos enquanto objetivos específicos do nosso
estudo: identificar qual o lugar da Educação do Campo nos documentos
curriculares da BNCC; Conhecer a discussão sobre formação presentes na
BNCC; e, por fim, analisar a perspectiva de formação docente nos discursos da 639
BNCC.
O Ministério da Educação disponibilizou para consulta pública, três
versões da Base Nacional Comum Curricular, o referido documento já vem
sendo “desenhado” desde a década de 1980, como podemos afirmar a partir
do Artigo 201 da Constituição Federal de 1988. Este estabelece que “serão
fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar
formação básica comum e o respeito aos valores culturais e artísticos,
nacionais e regionais” (BRASIL, 1988). Por se tratar de um documento que,
recentemente, teve divulgadas três versões; nós atentamos a terceira e última
versão para leitura e análise do conteúdo. E nesta direção, nos debruçamos
sobre a leitura dos textos que compõem a BNCC, além de mapear durante
essa leitura, possíveis apontamentos sobre Educação do Campo e formação
docente. Posteriormente, fizemos a análise do conteúdo textual da BNCC, para
que assim pudéssemos dar conta dos objetivos específicos que foram
elencados durante a produção deste artigo.

CONSIDERAÇÕES

Partindo das reflexões que foram despertadas desde o momento de


escolha dessa temática, como também durante a produção deste texto, muitas
inquietações – além das que já existiam – foram suscitadas. Em um primeiro
momento, nos apropriar dos textos que compõem a BNCC foi uma tarefa
extremamente significativa, pois a partir dessas leituras é que nossa pesquisa
foi desenvolvendo-se, ganhando forma.

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Neste sentido, compreendemos que além de uma base curricular, a
BNCC engloba diversos interesses de instituições que visam a base não como
um instrumento de melhoria da educação nacional, mas como uma
possibilidade de gerar lucros, tendo em vista que a implementação da base
demandará dos estados e municípios, investimentos financeiros para aquisição
de materiais e consultorias educacionais.
Além disso, pensar a base de forma isolada não nos fornece subsídios
suficientes para compreendermos que a implantação de um currículo único 640
para todos os sujeitos em território nacional significará uma uniformização do
ensino, mais especificamente da formação de professores, refletindo em um
instrumento de controle social, onde apenas o que é de interesse das agências
de financiamento envolvidas na criação desse currículo nacional comum, será
tido como prioridade, perpetuando a ensino voltado para atender a demanda do
mercado financeiro do atual mundo capitalista, e eliminando dos currículos,
aspectos que constituam a formação crítica, política e social do sujeito.
Dessa forma, após a análise das obras acima citadas e, comparando-as
ao que trazem os documentos da BNCC, entendemos que a Base Nacional
Comum Curricular surge com o intuito de fragilizar o currículo e padronizar o
ensino e à docência.
Por fim, concluímos esse artigo enfatizando a fragilidade que a BNCC
significa para o trajeto formativo dos sujeitos, mais especificamente para os/as
professores em formação. Dessa forma, respondendo a nossa questão-
problema e atendendo ao nosso objetivo geral, constatamos que em todo o
texto da BNCC, o descritor “formação docente’ aparece várias vezes, porém
em uma perspectiva voltada à formação de professores para o “alinhamento” à
BNCC, e não as especificidades de cada comunidade ou organização que o/a
docente vier a atuar.

REFERÊNCIAS
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.


Disponível em:

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


curriculares no PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e
resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
237-1438-3
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>.
Acesso em: 20 de Maio de 2018.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA EM NÍVEL DE
PÓS-GRADUAÇÃO: REFLEXÕES A PARTIR DO PNE 2014-2024

Ana Paula dos Santos Silva- PPGE/UFPB | Fernando Cézar Bezerra de


Andrade – DFE/PPGE/UFPB

RESUMO: Objetivamos refletir sobre a formação de professores da educação básica


em nível de pós-graduação a partir da meta 16 do Plano Nacional de Educação (PNE)
2014-2024, a qual enfatiza a formação de professores para esse nível de educação.
Os dados com os níveis de pós-graduação dos educadores foram coletados em
pesquisa documental no Observatório do PNE. Os resultados indicaram um baixo 642
índice de formação docente na pós-graduação stricto senso, com apenas 2,4 mestres
e 0,4% de doutores (nacionalmente para redes públicas, privadas e federais).
Verificamos, portanto que para atingir a meta nacional para 2024, de 50% dos
professores na pós-graduação, a considerar a partir de 2017, os governos precisam
atingir um crescimento de 1,99% ao ano até 2024; contudo, têm crescido anualmente
de 2014 a 2017 apenas 1,63%, inferior ao crescimento anual necessário até 2024.
Concluímos ser necessário que os governos evidenciem esforços para se atingir
números mais altos do que os atuais até o final de vigência do Plano, caso pretendam
cumprir tal Meta. Do contrário, docentes da Educação Básica continuarão privados dos
conhecimentos e habilidades proporcionados pelos cursos de pós-graduação,
importantes para o aperfeiçoamento de suas práticas pedagógicas e para sua
valorização profissional.

Palavras-chave: Formação de Docentes da Educação Básica. Pós-Graduação. PNE


2014-2024.

INTRODUÇÃO

A educação constitui um direito humano fundamental de todos os


cidadãos brasileiros. É por meio dela que nos tornamos humanos, nos fazemos
seres participantes dos frutos e da construção da civilização, dos progressos
da sociedade, resultado do trabalho dos homens. Com a educação somos
capazes de contribuir para o desenvolvimento econômico e social da nossa
nação, promovendo paz, tolerância e inclusão social. Ela é a chave para a
erradicação da pobreza, pois permite que crianças e jovens alcancem seu
potencial, desde que garantidas às condições mínimas para o seu
progresso.Todavia, a educação no mundo, em especial nos países detentores
de economias emergentes, como China, Rússia, Argentina, México, Índia e
Brasil, ainda caminha a passos lentos em relação a índices satisfatórios de
qualidade.

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Em muitos lugares, as crianças ainda são privadas desse direito, ou o
exercem com dificuldade. A Declaração Universal dos Direitos Humanos,
aprovada há 70 anos, reconheceu a educação como um direito fundamental,
assim como em nosso país, em que ele é garantido constitucionalmente,
conforme artigo 205 da Constituição: “A educação, direito de todos e dever do
estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” (BRASIL, 1988). 643
Apesar de o direito constitucional existir, não temos a garantia que seja
realizada uma educação para muitos brasileiros. Desde o final do século XX e
início do século XXI várias políticas públicas foram criadas com vistas a
garantir melhorias na qualidade da educação, buscando atender tanto à
educação básica, em suas várias modalidades, como à Educação Superior.
Um exemplo dessas políticas é o Plano Nacional de Educação (PNE), instituído
pela primeira vez em 2001 pela Lei nº 10.172/ 2001, o qual vigorou de 2001 a
2010, novamente reorganizado, reformulado e atualizado para o decênio de
2014 a 2024 pela Lei nº 13.005/2014. Seu objetivo é continuar articulando o
sistema nacional de educação em regime de colaboração, definindo diretrizes,
objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção
e desenvolvimento do ensino, em seus diversos níveis, etapas e modalidades,
por meio de ações integradas das diferentes esferas federativas.
O PNE, portanto, objetiva superar os enormes desafios da educação, os
quais dificultam o alcance de índices qualitativos satisfatórios, dentre eles a
valorização e a profissionalização docente, elementos de cunho significativo
para garantia do aumento na qualidade da educação.
A formação docente adequada constitui a base para uma educação que
objetiva alcançar sua meta, ou seja, o pleno desenvolvimento do educando.
Atualmente, em nosso país, ainda se admite a formação na modalidade normal
para professores da Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental,
conforme estabelece o art. 62 da Lei n.º 9.394/1996, de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional:
A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-
á em nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida,

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como formação mínima para o exercício do magistério na
educação infantil e nos cinco primeiros anos do ensino
fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade
normal (BRASIL, 1996).

Apesar de admitir a modalidade normal, a referida Lei também reafirma


a necessidade de formação docente superior para atuação na educação
básica, ao mesmo tempo em que também ressalta a formação continuada de
educadores:
644
Garantir-se-á formação continuada para os profissionais a que
se refere o caput, no local de trabalho ou em instituições de
educação básica e superior, incluindo cursos de educação
profissional, cursos superiores de graduação plena ou
tecnológicos e de pós-graduação (BRASIL, 1996).

A formação inicial prepara o profissional docente para seus primeiros


anos de experiência, seu contato inicial com a realidade escolar, enquanto a
formação continuada proporciona a atualização dos conhecimentos
profissionais, dando o suporte necessário para a renovação dos conteúdos e
habilidades necessários para o atendimento das diferentes e imprevisíveis
demandas do contexto escolar. De acordo com o Censo Escolar de 2017, o
percentual de professores do ensino fundamental com habilitação em
graduação foi de 82,1% e do ensino médio foi de 93,8% (INEP, 2018).Temos,
portanto, a partir desses dados, um índice positivo em relação à formação em
curso superior.
E quanto à pós-graduação? Quais os percentuais atuais para esse nível
de formação para os professores da educação básica? O que aponta o novo
PNE em relação à formação continuada em nível de pós-graduação?O que
representam o atendimento ou descumprimento dessa meta para a Educação
Básica? Diante de tais questionamentos, este trabalho tem como objetivo
refletir sobre a formação de professores da educação básica em nível de pós-
graduação, a partir da meta 16 do PNE 2014-2024, a qual enfatiza a formação
de professores em nível de pós-graduação.
A partir de tal proposta buscamos verificar o andamento do cumprimento
dessa Meta desde a implantação do PNE em 2014, observando dados
atualizados sobre o andamento do seu cumprimento, em pesquisa documental

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no Observatório do PNE, analisando os desafios a serem superados em
relação a tal Meta até final de vigência do Plano.

VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL E FORMAÇÃO DOCENTE:


PERSPECTIVAS A PARTIR DO PNE 2014-2024

A docência é caracterizada por vastas responsabilidades, uma vez que o


trabalho docente se constitui numa atividade social com repercussões no
conjunto de transformações da sociedade, mas ainda com pouca valorização 645
em seu status econômico e social.
Um dos grandes desafios da educação no Brasil é a valorização do
magistério da educação básica, tanto em termos salariais, como, sobretudo, na
formação de educadores em nível de pós-graduação stricto sensu, uma vez
que mestrados e doutorados em instituições particulares demandam
investimentos financeiros altos, que muitas vezes não correspondem ao padrão
econômico da categoria profissional docente.
Gatti e Barreto (2009), ao analisarem as políticas educativas no Brasil,
nos mostraram a importância de se considerarem esforços, por parte do
Estado, para melhorar as condições salariais e de carreira dos professores,
tendo em vista os inúmeros impasses e desafios a serem enfrentados, no
concernente à valorização salarial dos professores. Sobre esse aspecto
pontuam que, se comparados ao de outras profissões que exigem nível
superior, não são atraentes; quanto à carreira, afirmam que, apesar de a LDB
9.394/96 prever a valorização dos docentes da educação básica, verifica-se a
ausência de planos estruturados de modo a oferecerem horizontes promissores
aos professores, além da falta de perfil profissional claro. Para as autoras, as
condições de remuneração e carreira dos professores não correspondem à
formação exigida e nem às responsabilidades sociais implicadas em seu
trabalho.
Apesar do reconhecimento difundido de que os professores são chave
para atingir a educação de qualidade para todos, a profissão docente ainda não
é valorizada de forma ampla. Seu baixo prestígio impede esforços para recrutar
e manter professores, tanto nos países ricos como nos pobres. Para resolver

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essa questão, os governos devem tomar medidas impetuosas para melhorar a
qualidade da formação de professores novos, bem como quem já está em
atividade. Como lembra Barretto (2015), disso depende a motivação para
escolher a docência e nela permanecer: docentes devem receber uma
formação inicial de qualidade, bem como devem ter oportunidades para um
desenvolvimento profissional de alta qualidade em nível de pós-graduação,
para aprimorarem suas habilidades ao longo de suas carreiras.
Com efeito, observa ainda Barretto (2015, p.687), nem mesmo 646
específica relação entre formação na pós-graduação e aperfeiçoamento
profissional conseguirá dar conta, isoladamente, dessa adesão à docência na
Educação Básica: “Se permanecerem contextos profissionais com poucos
estímulos [...], provavelmente nem os cursos de mestrado profissionalizante
nas áreas específicas do magistério [...] conseguirão reter os docentes por
muito tempo em sala de aula”.
Logo, é preciso que os governos demonstrem à sociedade que a
profissão docente é importante, com pagamento de salários decentes, melhoria
das condições de trabalho em todos os níveis do sistema educacional, bem
como oportunizando docente a seguir seus estudos também na pós-graduação.
A Agenda 2030, com a qual a comunidade internacional se
comprometeu, destaca como meta a universalização da educação infantil,
primária e secundária. Para alcançar esse objetivo, os governos devem ampliar
o acesso à educação de qualidade para todas as crianças e para todos os
jovens, acabar com a discriminação em todos os níveis do sistema educacional
e melhorar de forma substancial a qualidade da educação e os resultados da
aprendizagem. Esses objetivos, por sua vez, exigirão um aumento da oferta
mundial de professores qualificados – cerca de 69 milhões a mais (UNESCO,
2018). No Dia Mundial dos Professores de 2018, comemorado todo dia 5 de
outubro, a UNESCO escolheu como tema “O direito à educação significa o
direito a um professor qualificado”. Tal temática reflete o anseio da meta da
Agenda 2030.
A fim de garantir que todas as crianças estejam preparadas para
aprender e ocupar seu lugar na sociedade, os professores devem receber

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formação e apoio efetivos, para qualificá-los a responderem às necessidades
de todos os estudantes, incluindo os mais marginalizados.Ter profissionais
devidamente qualificados em níveis de graduação e pós-graduação é condição
mínima para termos educação com resultados mais favoráveis.
Na busca de tais resultados, o novo Plano Nacional de Educação 2014-
2024 foi aprovado com força de lei em 2014, com novas metas e estratégias
para a próxima década, visando novos rumos para a educação brasileira.
Constitui um instrumento de planejamento do Estado democrático de direito, 647
que deve orientar a execução e o aprimoramento de políticas públicas do setor
educacional. Esse documento contém objetivos e metas para o ensino em
todos os níveis – infantil, básico e superior. (BRASIL, 2014).
O PNE 2014-2024 traz dez diretrizes, entre elas: a erradicação do
analfabetismo, a melhoria da qualidade da educação, além da valorização dos
profissionais de educação, um dos maiores desafios das políticas
educacionais, conforme já explicitado. Além dessas diretrizes, o Plano é
composto com 20 metas, cada uma contendo várias estratégias que visam
alcançar as referidas metas. Ora, a Meta 16 assume:

Formar, em nível de pós-graduação, cinquenta por cento dos


professores da educação básica, até o último ano de vigência
deste PNE, e garantir a todos(as) os(as) profissionais da
educação básica formação continuada em sua área de
atuação, considerando as necessidades, demandas e
contextualizações dos sistemas de ensino BRASIL,2014, p.79)

De acordo com o art. 7º dessa nova lei, a União, os estados, o Distrito


Federal e os municípios atuarão em regime de colaboração para atingir seus
objetivos e implementarem as estratégias previstas no texto. (BRASIL, 2014).
Ora, tal Meta foi pensada em função de supor-se que a elevação do número de
docentes da educação básica possibilitará a presença de profissionais com
melhor aperfeiçoamento, bem como a atuação de professores pesquisadores
no campo da educação básica. Tal perfil permite aos docentes a caracterização
de que Pimenta e Lima (2012) chamaram de “professor pesquisador”, ou seja,
aquele professor capaz fazer do seu trabalho uma verdadeira epistemologia da
prática, transformando seu fazer profissional em momentos de construção de
conhecimento por meio da reflexão, análise e problematização de sua prática.
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Discutindo a relação entre docência e pesquisa, que incide diretamente
sobre os índices de formação de docentes da Educação Básica na pós-
graduação, Corrêa e Ribeiro (2013), numa perspectiva bourdieusiana, fazem
uma incisiva crítica, que, mesmo originalmente pensada para a docência
universitária, aplica-se perfeitamente à análise aqui desenvolvida:
[...] a formação pedagógica não parece constituir-se como um
objeto de interesse para o campo científico, não se apresenta
como um capital relevante aos agentes, ou mesmo como um
habitus (pois que é geradora de práticas) que se ajustaria ao 648
campo, permitindo aos agentes alcançarem posições
importantes (p.325).

Logo, no que tange à pós-graduação de docentes da Educação Básica,


os indicadores explicam-se pela cisão e hierarquização entre ensino e
pesquisa, ficando esta última, na pós-graduação, com um lugar de prestígio
que não se transmite ao ensino – inclusive, como indicou Barretto (2015), nem
para agregar valor simbólico ou financeiro (valorização salarial por meio dos
planos de carreira) à carreira docente.

MÉTODO

Este estudo de natureza qualitativa apresenta dados de pesquisa


documental realizada no Observatório do PNE.

Caracterização do observatório do PNE e coleta de dados

O Observatório do PNE foi criado em 2013e constitui uma plataforma de


monitoramento do Plano Nacional de Educação. Esse site tem como objetivo
contribuir para que o Plano se mantenha “vivo”, atualizando constantemente o
andamento do cumprimento das metas e estratégias, tendo o papel de uma
agenda norteadora das políticas educacionais no País. A iniciativa conta com
um site (www.opne.org.br), que traz indicadores de monitoramento das metas e
estratégias do Plano, além de análises, um extenso acervo de estudos,
pesquisas, notícias relacionadas aos temas educacionais por ele contemplados
e informações sobre políticas públicas educacionais. O objetivo é que essa
ferramenta seja instrumento de controle social - para que qualquer cidadão
possa acompanhar o cumprimento de metas estabelecidas para o PNE ao

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longo do decênio - e também apoiar gestores públicos, educadores e
pesquisadores. Então, dessa Plataforma foram coletados, entre os dias 12 e 13
de outubro de 2018, dados referentes à Meta 16 do PNE, objeto deste estudo,
sendo interpretados seu andamento e percentuais a serem atingidos até o fim
da vigência do Plano.

RESULTADOS E DISCUSSÕES: FORMAÇÃO DOCENTE EM NÍVEL DE


649
PÓS-GRADUAÇÃO E OS DESAFIOS PARA PNE 2014-2024

A deficiência na formação inicial de nossos docentes é um dos grandes


entraves na melhoria da qualidade da educação. Nesse sentido, a formação
continuada representa uma grande aliada, na medida em que possibilita que o
professor supra lacunas na sua formação inicial, ao mesmo tempo em que se
mantém em constante aperfeiçoamento em sua atividade profissional. Segundo
Saviani (2001), o objetivo da pós-graduação consiste, sobretudo, na formação
de pesquisadores, sendo uma importante habilidade a ser desenvolvida em
muitos dos nossos docentes caso a Meta 16 seja cumprida.
Como lembram Corrêa e Ribeiro (2015, p. 324), “a pós-graduação stricto
sensu é caracterizada pelo mestrado acadêmico e profissional e pelo
doutorado acadêmico” e, nas práticas de formação docente em vigor, “não é
absurdo falar em um senso prático do jogo voltado para a pesquisa, um habitus
menos de professor do que de pesquisador”, de sorte a se explicar, então, o
cenário identificado a partir dos dados a seguir referidos.
De acordo com os dados do Conservatório do PNE, o indicador da Meta
16 do Plano Nacional de Educação (PNE) mostra que a porcentagem de
funções docentes da Educação Básica com pós-graduação está em constante
melhora, no país no período depois de 2009. Na tentativa de avançar ainda
mais, o novo PNE 2014-2024 traz em sua Meta 16 um conjunto de seis
estratégias que visa mudar a realidade nacional atual conforme dados do
Conservatório do PNE atualizados para o ano de 2017, indicados abaixo.

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Gráfico 1: Formação de professores em nível de pós-graduação e meta do PNE para o
decênio 2014-2024.

650

Fonte: http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/14-pos-graduacao

Os dados do Conservatório nos revelam que o percentual de


professores da Educação Básica com Pós-Graduação é de 36,2% em 2017,
com o valor absoluto de 813.923 docentes com prós-graduação, incluindo
especialização, mestrado e doutorado, com os seguintes dados para cada um
desses níveis, conforme Gráfico 2.

Gráfico 2: Números para cada nível de pós-graduação para o ano de 2017 dos professores da
educação básica
900.000
773.159
800.000
700.000
600.000
500.000
400.000
300.000
200.000
100.000 53.899
34,4 2,4 9.713 0,4
0
Especialização Mestrado Doutorado

Fonte: http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/14-pos-graduacao

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Os dados do Conservatório nos indicam uma baixa procura pela pós-
graduação por docentes da Educação Básica, o que pode ser interpretado em
três direções: a desvalorização socioeconômica da carreira docente
(BARRETTO, 2015) e a hierarquização interna que submete, nas
universidades, o ensino à pesquisa (CORRÊA; RIBEIRO, 2013); mas, também,
a considerável improbabilidade do cumprimento da Meta 16 do PNE, uma vez
que teria que elevar-se em 13,8% o número de professores da educação
básica com pós-graduação. Considerando os dados de 2017 até o fim do 651
plano, temos o equivalente a sete anos de vigência: dividindo-se o percentual
que falta (13,8%) pelo total de anos até o final do Plano, teremos uma média
anual de 1,97% até 2024. Ao observarmos o crescimento anual a partir da
implementação do PNE em 2014, verificamos que o índice para esse ano foi de
31,3%, chegando em 2017 com 36,2%, um crescimento em 4,9 pontos, com
média de crescimento anual de 1,63%, inferior ao crescimento anual
necessário até 2024.
Percebemos que os números diminuem conforme aumenta o nível de
pós-graduação, sendo o maior desafio estando na elevação do número de
professores doutores, que atualmente atinge, menos de 1% do total de
professores da educação básica, (0,4%). Os níveis de mestrado também ainda
representam um percentual mínimo, apenas 2,4% dos professores, o que
enfatiza também a necessidade de mais investimentos para esse nível com
vistas a melhores resultados. Os mestrados profissionais têm sido uma
alternativa Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(Capes) para elevar o número de mestres, principalmente na educação. Assim,
Silva Neto (2017) enfatiza que a partir de 2011, a Capes aprovou a implantação
de 4 (quatro) mestrados profissionais para professores da educação básica, em
parceria com universidades públicas no âmbito do Sistema UAB. Há também
outros 3 (três) mestrados, os quais foram lançados em 2014, nas áreas de
Artes, História e Administração Pública, mas, como já mencionamos através de
Barretto (2015), nem isso parece ser suficiente para garantir a consecução da
Meta 16 do PNE.

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A significativa diferença entre os índices e os níveis da pós-graduação
explica-se também pela viabilidade do acesso e conclusão das especializações
(que, além de serem mais curtas, muitas delas podem ser feitas em fins de
semana, distintamente de mestrados e doutorados). Docentes da Educação
Básica, desse modo, seja por desejarem manter-se nesse nível de trabalho
docente, seja por encontrarem dificuldades para chegar aos cursos stricto
sensu (com seleções mais rígidas, menos vagas, maior controle da qualidade
dos cursos), não ultrapassam esse nível inicial de pós-graduação. 652
A Especialização, embora apresente um percentual mais expressivo em
relação à formação de mestrado e doutorado, também ainda precisa elevar seu
índice para atingir a meta do PNE, uma vez que representa o percentual de
34,4% de docentes. As especializações são cada vez mais raras nas
instituições públicas, e o aumento desse índice em relação aos demais níveis
de pós-graduação (mestrado e doutorado) pode ocorrer, não pela demanda
pública, mas investimento financeiros dos próprios docentes, uma vez que,
várias instituições particulares oferecem pós-graduação com valores acessíveis
e há algum aumento salarial com essa titulação.
Uma forma para aperfeiçoar a meta em busca de melhores resultados
talvez esteja em seu melhor detalhamento, ou mesmo em acrescentar-se, em
suas estratégias, objetivos descritos numericamente para cada nível de pós-
graduação, uma vez que tal estratégia pode melhor o direcionamento no
cumprimento da meta, conforme feito em na Meta 14 quando se refere ao
aumento de doutores e mestres para todas as áreas de conhecimento: “elevar
gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de
modo a atingir a titulação anual de sessenta mil mestres e vinte e cinco mil
doutores” (BRASIL, 2014, p.76). Cabe ao poder público, portanto investir em
pós-graduações com ofertas gratuitas para os docentes, oferecendo não
apenas a oportunidade de novas aprendizagem, mas também valorização
profissional.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Refletimos sobre a formação de professores da educação básica em


nível de pós-graduação a partir da meta 16 do PNE 2014-2024, a qual
enfatizou a formação de professores em nível de pós-graduação. Observarmos
a partir de dados coletados em pesquisa documental no Observatório do PNE,
dados gerais dos índices de pós-graduação dos professores do Brasil e
verificamos que, a partir do quadro atual de 2017, o país precisará avançar 653
1,99% ao ano para atingir seu objetivo. Contudo, seu crescimento anual médio
desde a implantação do Plano em 2014 tem sido inferior àquele percentual, o
que evidencia a necessidade avançar nas políticas de pós-graduação para
professores, do contrário, provavelmente essa meta não será cumprida.
Observamos ser preciso melhor detalhamento da meta, principalmente,
destacando metas numéricas para cada nível de pós-graduação, uma vez que
tal estratégia pode melhor direcionar o cumprimento da meta.
A elevação dos níveis de pós-graduação stricto senso é fundamental,
sobretudo para essa valorização salarial dos professores, uma vez que cada
estado município possui seus planos de carreira, que dentre suas estratégias
está progressão salarial a partir dos níveis de estudo dos docentes. Aumentar
esses níveis constitui, portanto, um passo importante não apenas para a
atualização dos conhecimentos e habilidades docentes, mas também para a
valorização social e econômica da categoria, colaborando para a autoestima
docente e seu reconhecimento na sociedade.
Por fim, concluímos que o Plano Nacional de Educação avançou por
vislumbrar novos horizontes para a formação de professores, em especial na
pós-graduação. Todavia, ainda precisa focar mais impetuosamente em suas
metas e estratégias, para melhor atingir seu cumprimento, em especial a Meta
16, aqui analisada, a qual precisa acelerar seu ritmo anual para seu efetivo
cumprimento em 2024, ano final de vigência do Plano. Acima de tudo, porém,
cumpre reconhecer que a cultura de inferiorização da docência ajuda a
entender esse distanciamento entre Educação Básica e Pós-Graduação na
formação de docentes.

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REFERÊNCIAS

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no Brasil: embates contemporâneos. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, v.
20, n. 62, p. 679-701, set. 2015.

BRASIL. Lei Nº. 10.172, de 09 de Janeiro de 2002. Aprova o Plano Nacional de


Educação e dá outras providências. Jan.2001.
654
BRASIL. Lei Nº 13.005, de 25 de Junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de
Educação e dá outras providências. Jun.2014.
CORREA, Guilherme T.; RIBEIRO, Victoria M. B. A formação pedagógica no
ensino superior e o papel da pós-graduação stricto sensu. Educ. Pesqui.São Paulo,
v. 39, n.02, jun. 2013.
SAVIANI, Dermeval. A pós-graduação em educação no Brasil: pensando o
problema da orientação. São Paulo: Unicamp, 2001. Disponível em
https://www.fe.unicamp.br/dermeval/texto2001-3.html Acesso em 17 out. 2018.
INEP. Ensino Médio tem 93% dos docentes com ensino superior. Jul.2018.
Disponível em <http://www.brasil.gov.br/noticias/educacao-e-
ciencia/2018/07/ensino-medio-tem-93-dos-docentes-com-ensino-superior>.
Acesso em 12 out.2018.
SILVA NETO, Nathanael da Cruz e. A Capes e a política nacional de
formação de professores da educação básica no Brasil . 2017.97f.
Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Estadual Paulista, Marília,
2017.
GATTI, Bernadete A.;BARRETO, Ela Siqueira de Sá. Professores do Brasil:
impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009.
PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria do Socorro Lucena. Estágio e
Docência. 7ª ed. São Paulo: Cortez, 2012.
UNESCO. Mensagem conjunta para o Dia Mundial dos Professores.
Out.2018 Disponível em <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/about-this-
office/single-viewnews/joint_message_for_the_world_teachers_day/> Acesso
em 12 out.2018.

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A FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DOS CURSOS DE LICENCIATURA DA
UFPB: REPENSANDO A PRÁTICA COMO COMPONENTE CURRICULAR

Fábio do Nascimento Fonseca82 | Lenilton Francisco de Assis83

RESUMO: O artigo apresenta uma reflexão sobre o papel da Prática como


Componente Curricular (PCC) no âmbito da formação pedagógica dos cursos de
licenciatura da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Estudo de natureza
qualitativa, faz uso de análise documental para avaliar as definições conceituais e 655
normativas da PCC nos currículos das licenciaturas do país e sua regulamentação na
UFPB. Na sequência, coloca questões que confrontam os documentos normativos
nacionais e institucional, com as quais espera fomentar o debate e as revisões dos
projetos pedagógicos das licenciaturas da UFPB e de outras instituições onde a PCC
também suscita dúvidas e controvérsias.

Palavras-chave: Formação de Professores. Formação Pedagógica. Prática como


Componente Curricular. Currículo. Políticas Educacionais.

INTRODUÇÃO

Em vários países, a formação de professores suscita políticas e


reflexões constantes que buscam aprimorar a qualidade da educação que os
alunos recebem, especialmente nas escolas públicas. No Brasil, em 2002, o
Ministério da Educação e Cultura (MEC) instituiu políticas que alteraram de
forma significativa a formação de professores na universidade e ensejaram
maior articulação com o campo de atuação profissional - a escola básica.
Dentre as modificações exigidas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais
(Resolução CNE/CP Nº. 1/2002), estavam a separação entre cursos de
bacharelado e licenciatura, a oferta de 400 horas de estágio supervisionado e
de 400 horas de Prática como Componente Curricular (PCC). Em 2015, o MEC
aprovou novas DCNs que ampliaram o tempo mínimo de formação dos
professores (de 2800 para 3200 horas) e mantiveram a carga horária definida
para o estágio e para a PCC.

82
Professor Associado do Departamento de Habilitações Pedagógicas (DHP) e Assessor na
Coordenação de Currículos e Programas (CCP) da Pró-Reitoria de Graduação da UFPB. E-
mail: fabionfonseca@gmail.com
83
Professor Adjunto do Departamento de Metodologia da Educação (DME) e do Programa de
Pós-Graduação em Geografia da UFPB. Pós-Doutorando em Educação pela UFPE. E-mail:
lenilton@yahoo.com

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Para se adequar à nova legislação (Resolução CNE Nº. 2/2015), foi
deflagrada, na UFPB, a atualização dos projetos pedagógicos dos cursos de
licenciatura que, logo, tornou necessária a revisão da base curricular que
constitui a formação pedagógica. Nesse processo de debate e de construção
coletiva do currículo acadêmico, a PCC tem recebido especial atenção, após
suscitar críticas e sugestões sobre a concepção e o enquadramento curricular
atribuído a esse componente na instituição.
Qual o papel da PCC no currículo das licenciaturas? São componentes
da formação específica ou pedagógica? São obrigatórios ou optativos? Quais
as diferenças em relação à prática de ensino e ao estágio supervisionado? A 656
quem compete a oferta da PCC? Ao Centro ou Departamento de Educação?
Ou também aos Departamentos específicos que abrigam os cursos de
licenciatura?
No intuito de contribuir para o desenvolvimento de uma formação
pedagógica mais qualificada e coerente com as demandas contemporâneas
para a profissão docente, este estudo de natureza qualitativa faz uso de análise
documental para avaliar as definições conceituais e normativas da PCC, a
partir de uma breve revisão dos dispositivos legais que a instituíram nos
currículos das licenciaturas do país e a regulamentaram na UFPB.
Na sequência, são colocadas questões que confrontam os documentos
normativos nacionais e institucional com as quais se espera fomentar o debate
e as revisões dos projetos pedagógicos das licenciaturas da UFPB e de outras
instituições onde a PCC também suscita dúvidas e controvérsias.

1. PRÁTICA COMO COMPONENTE CURRICULAR: DEFINIÇÕES


CONCEITUAIS E NORMATIVAS

A prática e sua relação com a teoria sempre foi uma preocupação


presente nos cursos de licenciatura do Brasil e um problema de difícil solução.
Desde a década de 1970, educadores que trabalham na formação de novos
professores questionam o modelo de curso 3+1 que oferta, no início, três anos
de conteúdos “teóricos” específicos e, no final, um ano de Didática e Prática de
Ensino para a aplicação, “na prática”, dos conteúdos estudados.
Nas décadas de 1980 e 1990, as críticas a esse modelo formativo se
acentuam tendo como contraponto o consenso de que os professores
desempenham uma atividade teórico-prática articulada e indissociável que
precisa, assim, ser trabalhada ao longo da formação docente. Segundo
Libâneo e Pimenta (2009, p. 267):

É difícil pensar na possibilidade de educar fora de uma situação


concreta e de uma realidade definida. A profissão de professor
precisa combinar sistematicamente elementos teóricos com situações
práticas reais. Por essa razão, ao se pensar um currículo de

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formação, a ênfase na prática como atividade formadora aparece, à
primeira vista, como exercício formativo para o futuro professor.
Entretanto, em termos mais amplos, é um dos aspectos centrais na
formação do professor, em razão do que traz consequências
decisivas para a formação profissional.

Mas de que prática se está falando? Da Prática de Ensino que tem sido
substituída pelo Estágio Supervisionado? Ou da Prática como Componente
Curricular que se tornou obrigatória nas últimas décadas? Afinal, qual a
diferença entre elas na legislação que dispõe sobre a formação de professores
no país? 657
Até a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
LDBEN Nº. 9.394/1996, o estágio, nos cursos de licenciatura, era designado de
"Prática de Ensino sob a forma de Estagio Supervisionado". Noutras palavras,
a prática de ensino era concebida como estágio curricular supervisionado, cuja
única alteração significativa, a partir da LDBEN, foi a ampliação da carga
horária para trezentas horas.
A definição de "prática de ensino", nos termos do artigo 65 da LDBEN,
suscitou, todavia, da parte das instituições formadoras, incompreensão acerca
do alcance do seu significado. O que ensejou a necessidade de manifestação
do Conselho Nacional de Educação (CNE), através de sua Câmara de
Educação Superior, com o Parecer CNE/CES 744/97, para definir que a prática
de ensino:
Constitui o espaço por excelência da vinculação entre formação
teórica e início da vivência profissional, supervisionada pela
instituição formadora. A prática de ensino consiste, pois, em uma das
oportunidades nas quais o estudante-docente se defronta com os
problemas concretos do processo de ensino-aprendizagem e da
dinâmica própria do espaço escolar (BRASIL, 1997, p. 1).

Posteriormente, o Parecer CNE/CP Nº. 9/2001 referendou tal


compreensão, ao indicar que a prática deverá ocorrer ao longo do processo
formativo no curso de graduação, já a partir do primeiro ano, como uma ação
integrada e que não se limita apenas ao estágio supervisionado.
O mencionado parecer, que tratou das Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Formação de Professores da Educação Básica – em nível superior, em
cursos de licenciatura, de graduação plena –, ao discutir aspectos
problemáticos e desafios a serem enfrentados no campo da formação docente,
destacou, entre outros, a permanência de uma concepção restritiva de prática,
alicerçada numa visão dicotômica que segmenta o curso em dois polos
isolados entre si: um que caracteriza o trabalho na sala de aula e outro que
caracteriza as atividades de estágio.
No primeiro polo, como expressão de uma visão aplicacionista das
teorias no processo formativo, há uma supervalorização dos conhecimentos
teóricos e acadêmicos, com o consequente desprezo das práticas como fonte

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importante de conteúdos para a formação. No polo oposto, expressa-se uma
visão ativista da prática, sustentada na supervalorização do fazer pedagógico,
que desdenha da “dimensão teórica dos conhecimentos como instrumento de
seleção e análise contextual das práticas” (BRASIL, 2001, p. 22-23).
Desse modo, a formação em sala de aula se caracterizaria pela
apresentação de teorias prescritivas e analíticas, cabendo aos estágios, num
momento posterior, a tarefa de colocar tais conhecimentos em prática. Para o
enfrentamento da questão, o parecer propunha uma visão de prática que se
configuraria "mais como componente curricular”, entendendo que o
conhecimento se faz presente tanto na reflexão sobre a atividade profissional 658
em sala de aula, como durante a realização dos estágios, quando a atividade
profissional é exercitada. O referido parecer indicava a superação da ideia de
que a sala de aula é o âmbito de tratamento da teoria, enquanto ao estágio
cabe se encarregar da prática.
Ainda em 2001, O CNE, por meio do Conselho Pleno, aprovou o Parecer
CNE/CP 21/2001, que não chegou a ser homologado. Este parecer estabelecia
a duração e a carga-horária dos cursos de formação de professores da
educação básica, propondo o cumprimento de, pelo menos, 2.800 horas.
Dentro destas, foram incluídas 400 horas de prática de ensino, que deveriam
ser vivenciadas ao longo do curso; e 400 horas de estágio supervisionado, sob
forma concentrada, ao final do curso.
Também no mesmo ano, o Parecer CNE/CP Nº. 27/2001 apresentou
definições acerca do estágio supervisionado, dentre as quais a indicação de
que o mesmo deveria ser vivenciado em escolas de educação básica e ao
longo do curso de formação, de maneira a abordar as diferentes dimensões de
atuação profissional, contempladas no Projeto Político-Pedagógico. Ainda em
2001, no Parecer CNE/CP Nº. 28/2001, o CNE procurou explicitar a
compreensão assumida no que se refere à relação teoria e prática:

[...] há que se distinguir, de um lado, a prática como componente


curricular e, de outro, a prática de ensino e o estágio obrigatório
definidos em lei. A primeira é mais abrangente: contempla os
dispositivos legais e vai além deles. Esta correlação teoria e prática é
um movimento contínuo entre saber e fazer na busca de significados
na gestão, administração e resolução de situações próprias do
ambiente da educação escolar (BRASIL, PARECER CNE/CP Nº.
28/2001).

No início do ano de 2002, o CNE aprovou a Resolução CNE/CP Nº.


1/2002, que estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação
de Professores da Educação Básica, com base nos Pareceres CNE/CP 9/2001
e 27/2001. Nas diretrizes aprovadas pelo CNE, a prática apareceu não mais
como algo restrito ao estágio supervisionado, mas como dimensão que deverá
estar presente desde o início do curso. O estágio supervisionado, por sua vez,
passou a ser considerado um espaço interdisciplinar de formação, cujo
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propósito deve ser o de favorecer um maior conhecimento acerca da realidade
profissional, a partir de um processo de estudo, análise, problematização,
teorização, reflexão, proposição de alternativas, intervenção e
redimensionamento da ação.
No mesmo ano de 2002, com a finalidade de regulamentar a duração e a
carga horária dos cursos de licenciatura, o CNE aprovou, em fevereiro, a
Resolução CNE/CP Nº. 2, com fundamento no Artigo 12 da Resolução CNE/CP
Nº. 1/2002, e no Parecer CNE/CP Nº. 28/2001, estabelecendo a carga horária
de 400 horas para a prática como componente curricular, a serem vivenciadas
ao longo do curso, e, também, 400 horas de carga horária para o estágio 659
curricular supervisionado, a partir do início da segunda metade do curso.
A Prática como Componente Curricular (PCC), de acordo com a
Resolução Nº. 1/2002, deveria ser trabalhada no interior das áreas ou das
disciplinas que constituíssem os componentes curriculares da formação
docente e não somente nas disciplinas de cunho pedagógico. Noutras
palavras, todos os componentes, devem apresentar uma dimensão prática
(BARBOSA, 2014, p. 5, grifo nosso).
Não obstante o processo de construção de definições acerca da prática
como componente curricular e do estágio supervisionado, nos sucessivos
pareceres aprovados pelo CNE, entre meados da década de 1990 e início dos
anos de 2000, quando foram aprovadas as primeiras Diretrizes Curriculares
Nacionais para a formação de professores da educação básica, permaneciam,
ainda, dúvidas com respeito à distinção entre o estágio supervisionado e a
PCC. Tais dúvidas envolviam, sobretudo, as instituições formadoras e os
cursos de licenciatura, nos processos de adequação de seus currículos às
novas orientações emanadas das Diretrizes. A permanência destas dúvidas
ensejou manifestações de membros do CNE que, a exemplo de Silke Weber,
buscaram oferecer contribuições no esforço de interpretação das orientações
normativas. Para Weber, a PCC não tem o mesmo significado que prática de
ensino. De acordo com a então conselheira do CNE:

No que se refere à formação de professores, a necessária vinculação


entre teoria e prática expressa, entre outros aspectos, por intermédio
da definição da prática como componente curricular, é quase sempre
interpretada como sendo equivalente à prática de ensino. Trata‐se de
uma interpretação reducionista por não incluir como prática outras
atividades pedagógicas relevantes ao fazer escolar (2002, p. 95).

O próprio Conselho Nacional de Educação veio, à época, a se


pronunciar acerca da matéria, com o propósito de elucidar a questão em
definitivo, o fazendo através do PARECER CNE/CES Nº. 15/2005, no qual se
estabeleceu que:
[...] a prática como componente curricular é o conjunto de
atividades formativas que proporcionam experiências de
aplicação de conhecimentos ou de desenvolvimento de

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procedimentos próprios ao exercício da docência [...] As
atividades caracterizadas como prática como componente curricular
podem ser desenvolvidas como núcleo ou como parte de
disciplinas ou de outras atividades formativas [...] As disciplinas
relacionadas com a educação que incluem atividades de caráter
prático podem ser computadas na carga horária classificada
como prática como componente curricular, mas o mesmo não
ocorre com as disciplinas relacionadas aos conhecimentos
técnico-científicos próprios da área do conhecimento para a qual
se faz a formação (BRASIL, 2005, p. 3, grifos nossos).

Após mais de dez anos de vigência das primeiras diretrizes curriculares


660
nacionais para a formação de professores, o CNE aprovou, em julho de 2015,
através do Parecer CNE/CP Nº. 2/2015 e da Resolução CNE/CP Nº. 02/2015,
as novas diretrizes para a formação inicial e continuada de professores para a
educação básica. As diretrizes recém aprovadas estabelecem, em seu artigo
13, que os cursos de formação inicial, em nível superior, deverão ter carga
horária mínima de 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico. Quanto à
duração, os cursos de formação inicial distribuirão as 3.200 horas em, no
mínimo, oito semestres ou quatro anos, da seguinte forma:
 400 horas de prática como componente curricular, distribuídas ao
longo do processo formativo;
 400 horas dedicadas ao estágio supervisionado, na área de formação
e atuação na educação básica, contemplando também outras áreas
específicas, se for o caso, conforme o projeto de curso da instituição;
 Pelo menos 2.200 horas dedicadas às atividades formativas
estruturadas pelos núcleos definidos nos incisos I e II, do artigo 12;
 200 horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas
especifica de interesse dos estudantes, conforme núcleo definido no
inciso III do artigo 12.
Também foi mantida, para a prática como componente curricular e para
o estágio supervisionado, a mesma carga horária anteriormente definida pela
Resolução CNE/CP Nº. 2/2002, ou seja, 400 horas para cada um dos
componentes.

2. A PRÁTICA COMO COMPONENTE CURRICULAR NO ÂMBITO DA UFPB

Ao consolidar, num único dispositivo, o conjunto de normas existentes


para a graduação, a Resolução CONSEPE/UFPB Nº. 16/2015, que instituiu o
Regulamento dos Cursos Regulares de Graduação da UFPB, incorporou e
manteve as definições constantes nas Resoluções Nº. 04/2004 e Nº. 46/2002
do CONSEPE/UFPB. Assim, na modalidade licenciatura, nos termos do
regulamento, devem ser incluídos os conteúdos curriculares referentes à PCC,
com duração mínima de 420 horas, e os estágios supervisionados, com 405

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horas, devendo ser ofertados ao longo do curso e regulamentados pelos
Colegiados de Curso (artigo 21, parágrafo 3º, inciso II).
Vale salientar que essa carga-horária superior às 400 horas obrigatórias,
definidas nas DCNs, buscou atender ao sistema de equivalência de crédito por
hora de aula adotado na instituição em que um crédito corresponde a quinze
horas de aulas. Essa mesma lógica é seguida na definição da carga horária do
estágio supervisionado.
Nos termos do artigo 31 do referido regulamento da UFPB, a base
curricular para os cursos de licenciatura manteve-se, desse modo, constituída
pela prática curricular e pelo estágio supervisionado de ensino, os quais devem 661
ser oferecidos ao longo do curso, como observação e interlocução com a
realidade, como aprofundamento teórico-metodológico da práxis docente e
como iniciação e intervenção profissional acompanhada.
No tocante ao significado atribuído à PCC, o regulamento acima referido
a define, em seu artigo 32, como “o conjunto de atividades curriculares teóricas
e práticas que tem como objeto de trabalho os elementos comuns presentes
nas práticas profissionais dos docentes da Educação Básica”, reafirmando a
compreensão estabelecida desde as Resoluções Nº. 04/2004 e Nº. 46/2002 do
CONSEPE/UFPB.
Com respeito à distribuição dos conteúdos e da carga horária da PCC, o
Regulamento dos Cursos de Graduação da UFPB reproduziu o disposto na
Resolução CONSEPE/UFPB Nº. 04/2004, definindo os conteúdos curriculares
da PCC entre obrigatórios e optativos. Os conteúdos obrigatórios, totalizando
20 créditos, equivalentes a 300 horas-aula, foram distribuídos nos seguintes
eixos temáticos definidos pela Pró-Reitoria de Graduação (PRG):
 Eixo I: Pressupostos Antropo-filosóficos, Sócio-históricos e
Psicológicos - 12 créditos, correspondendo a 180 horas-aula;
 Eixo II: Pressupostos Sócio-políticos e Pedagógicos - 04 créditos,
correspondendo a 60 horas-aula;
 Eixo III: Pressupostos Didático-metodológicos e Sócio-educativo - 04
créditos, correspondendo a 60 horas-aula.
A carga horária restante, para compor as 420 horas da PCC, foi definida,
no mesmo Regulamento, em torno de conteúdos curriculares optativos que
totalizam 08 créditos, equivalentes a 120 horas-aula, devendo ser escolhidos
entre os componentes curriculares a serem definidos pela Pró-Reitoria de
Graduação (PRG), em portaria específica para este fim.

3. OBSERVAÇÕES E QUESTÕES

Com a aprovação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a


Formação Inicial e Continuada de Professores para a Educação Básica
(Resolução CNE Nº. 02/2015), deu-se início, no âmbito da UFPB, ao processo

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de revisão e adequação, tanto do Regulamento dos Cursos de Graduação
quanto dos Projetos Pedagógicos dos Cursos de Licenciatura.
Nesta discussão, de início, ao confrontar-se as definições do
Regulamento da Graduação da UFPB, com as bases normativas instituídas
pela Resolução CNE/CP Nº. 02/2015, verificou-se, a princípio, as diferenças no
tocante à carga horária estabelecida para o estágio supervisionado e para
prática como componente curricular, nos dois documentos. O Regulamento
dos Cursos de Graduação da UFPB (Resolução CONSEPE/UFPB Nº. 16/2015)
apresenta uma carga maior (420 horas para a prática como componente
curricular e 405 horas para o estágio supervisionado) que aquela proposta nas 662
novas Diretrizes (400 horas para a prática como componente curricular 400
horas para o estágio supervisionado). Neste aspecto, cumpriu-se a
necessidade de esclarecer que as Diretrizes estabelecem sempre a carga
horária mínima para estes componentes, não impedindo, portanto, que os
cursos, na composição da carga horária apresentada em seus PPC's,
ultrapassem o mínimo estabelecido nas Diretrizes.
Para além do aspecto da carga horária, a primeira questão de fundo a
ser tomada em consideração, na discussão acerca da adequação do
Regulamento da Graduação e dos Projetos Pedagógicos das Licenciaturas na
UFPB, girou em torno do próprio conceito de Prática como Componente
Curricular (PCC). Neste particular, observou-se que as atuais Diretrizes não
acrescentam aspectos novos na definição da PCC, mantendo-se, portanto, as
orientações já estabelecidas no Artigo 12 da resolução que lhe antecedeu
(Resolução CNE/CP Nº. 1/2002). Tais orientações indicam, no parágrafo 3º,
que “no interior das áreas ou das disciplinas que constituírem os componentes
curriculares de formação, e não apenas nas disciplinas pedagógicas, todas
terão a sua dimensão prática” (BRASIL, 2002, p. 5). Noutras palavras, ainda
que o Parecer CNE Nº. 15/2005 tenha admitido que “as disciplinas
relacionadas com a educação que incluem atividades de caráter prático podem
ser computadas na carga horária classificada como prática como componente
curriculares”, os termos da Resolução CNE/CP Nº. 01/2002 deixam claro que a
prática como componente curricular não pode se limitar apenas às mesmas.
Por outra parte, o parecer CNE Nº. 15/2005 afirma que o mesmo não
ocorre com as disciplinas relacionadas aos conhecimentos técnico-científicos
próprios da área do conhecimento para a qual se faz a formação”, as quais não
devem compor a Prática como Componente Curricular.
Ora, as definições do Regulamento da Graduação (Resolução
CONSEPE/UFPB Nº. 16/2015) restringem, todavia, a prática curricular às
disciplinas de natureza pedagógica. Tal configuração, conforme indica
investigação realizada por Barbosa (2014), envolvendo cursos de
licenciatura de instituições de ensino superior da Paraíba, incluída a
UFPB, contraria as orientações normativas vigentes, as quais, embora

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admitam a presença de disciplinas pedagógicas na composição da
prática como componente curricular, estabelece que tal composição não
pode se limitar a estas disciplinas.
Ao lado dessa evidência, no processo de discussão acerca da revisão e
adequação do Regulamento dos Cursos de Graduação e dos projetos
pedagógicos dos cursos de licenciatura, surgiram outros questionamentos, na
interlocução com Coordenadores de Cursos, em reuniões do Fórum das
Licenciaturas da UFPB ou mesmo em visitas aos Coordenadores, Chefes de
Departamento e NDE’s, em diferentes Centros de Ensino da instituição. Tais
questionamentos gravitaram em torno de queixas em relação à atual 663
configuração da PCC no âmbito da UFPB, bem como eventuais reivindicações
de flexibilização desta configuração, de modo que os cursos pudessem
participar da definição do que deveria ser a PCC ou, ainda, assumir
responsabilidades na sua formulação e na indicação de formas de oferta da
mesma.
Deste debate, surgiram, então, a seguintes questões: como construir
um processo de redefinição da prática como componente curricular no
âmbito da UFPB, considerando que a mesma não pode se restringir às
disciplinas pedagógicas, e, de outro lado, as disciplinas técnico-
científicas não podem compor a mesma? Como facultar aos cursos a
autonomia para definir, nos seus colegiados, suas formas de conceber e
ofertar a PCC, sem prejuízo ou sacrifício dos componentes pedagógicos
da formação docente, atualmente envolvidos na definição de prática
curricular vigente na UFPB?
Nesta direção, a busca de solução para estas questões indicou as
próprias Diretrizes recém aprovadas (Resolução CNE Nº. 02/2015) como
referência para a construção de respostas. As novas Diretrizes, em seu artigo
12, estabelecem, na definição dos núcleos de sua composição curricular, que
os conhecimentos do campo educacional, seus fundamentos e metodologias,
bem como das diversas realidades educacionais fazem parte do Núcleo de
estudos de formação geral, das áreas específicas e interdisciplinares
(Inciso I). De igual modo, inclui os conteúdos pedagógicos, ao lado dos
específicos, no Núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos das
áreas de atuação profissional (Inciso II). Desse modo, é possível conceber
uma base curricular que assegure o lugar dos conhecimentos educacionais e
pedagógicos nos projetos dos cursos de licenciatura, sem que os mesmos
estejam restritos à PCC e nem esta limitada à formação pedagógica ofertada
pelo Centro ou Departamento de Educação.

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4. POSSIBILIDADES E PROPOSTAS

No esforço para construir respostas às questões suscitadas e


considerando, ainda, as possibilidades indicadas nas novas diretrizes para a
formação de professores, pretende-se, aqui, o exame das configurações
existentes como ponto de partida para a indicação de propostas para a
definição da PCC nos currículos dos cursos de licenciatura da UFPB. Nesta
direção, contribuiu o já mencionado estudo de Barbosa (2014), que levantou o
modo como a PCC foi implantada e ofertada em instituições da Paraíba (UFPB
e UFCG), analisando também a experiências de outras instituições. Nesta 664
análise, Barbosa identificou pelo menos quatro situações distintas em termos
da oferta da prática como componente curricular:

a) quando a PCC é integrada com as disciplinas pedagógicas do


curso;
b) quando a PCC é trabalhada nas disciplinas específicas do curso;
c) quando a PCC é trabalhada tanto nas disciplinas pedagógicas
quanto nas disciplinas específicas do curso;
d) quando na matriz curricular dos cursos foram criadas disciplinas
próprias para a PCC ser trabalhada, essa normalmente recebe o
nome de “Prática de Ensino” (BARBOSA, 2014, p. 9).

Considerando as várias situações apontadas por Barbosa, assim como


as balizas estabelecidas pelas Diretrizes de 2002 e 2015, pelo Parecer CNE
Nº. 15/2015 e, ainda o contexto específico da UFPB, com o Regulamento dos
Cursos de Graduação, a revisão da definição da PCC, no marco normativo
para a oferta das licenciaturas na UFPB, poderia assumir as seguintes
configurações:
 A manutenção das definições atuais, com a PCC constituída pelas
disciplinas pedagógicas (o que, como já foi assinalado neste texto,
contraria o disposto na Resolução CNE/CP Nº. 2/2002 e que não foi
alterado pela Resolução CNE/CP Nº. 2/2015);
 O deslocamento das disciplinas pedagógicas para outros espaços dos
eixos curriculares, ficando a PCC a ser trabalhada nas disciplinas
específicas do curso (o que, por sua vez, contraria o que dispõe o
Parecer CNE Nº. 15/2015);
 A flexibilização da definição atual, mantendo-se a distribuição das 300
horas de componentes obrigatórios da PCC, flexibilizando-se as 120
horas de componentes optativos, cuja definição ficaria a cargo de cada
curso de licenciatura (o que não deixaria de ferir, em um ou outro
aspecto, disposições das normas mencionadas acima);
 Por fim, a criação, nos cursos, de espaço próprio para a PCC, com o
deslocamento das disciplinas pedagógicas para outros eixos curriculares
obrigatórios (o que significaria a criação de componentes curriculares

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próprios para a PCC) e, quando necessário, com a participação de
disciplinas pedagógicas na composição da carga-horária da prática
como componente curricular, porém sem se limitar a estas disciplinas.
Assim, o Departamento específico pode oferecer sozinho a PCC ou em
conjunto com o Centro ou Departamento de Educação.

Dentre as situações apontadas acima, a última alternativa pareceu


expressar uma resposta mais adequada, tanto no que toca ao atendimento
às prescrições normativas vigentes quanto na perspectiva de possibilitar a
definição, por parte dos cursos, dos elementos que comporiam a PCC, 665
assegurando, por outro lado, espaço próprio para o tratamento dos
componentes de natureza pedagógica. Essa alternativa também se adequa à
mudança vivenciada na oferta da formação pedagógica na UFPB que, antes
restrita ao Centro ou Departamento de Educação, hoje, gradativamente, tem
sido compartilhada pelos Departamentos específicos com a contratação de
professores especialistas em ensino. E essa é uma consequência da
separação dos cursos de licenciatura e bacharelado que foi uma das
exigências da Resolução CNE/CP Nº. 1/2002.
Porém, essa mudança tem sido gradual e com realidades muito díspares
entre as licenciaturas da UFPB. Há cursos que contrataram especialistas em
ensino e já assumiram a responsabilidade pela oferta dos estágios
supervisionados e de outros componentes voltados à formação pedagógica.
Mas, há outros, que sequer fizeram a revisão dos currículos exigida pelas
DCNs de 2002 e ainda reservam a formação pedagógica exclusivamente ao
Centro ou Departamento de Educação. Também, há aqueles cuja oferta já tem
sido compartilhada entre o Departamento específico e o Centro ou
Departamento de Educação.
Assim, como alternativa para essa diversidade de situações, propõe-se
que a prática como componente curricular deva ser trabalhada ao longo
do currículo, com a criação de componentes curriculares próprios pelos
Departamentos específicos que podem assumir a responsabilidade total
ou, porventura, compartilhada com o Centro ou Departamento de
Educação.
Vale lembrar que, conforme definição do Parecer CNE/CP, Nº. 28, de 2
de outubro de 2001, a PCC é uma “prática que produz algo no âmbito do
ensino” e, portanto, pode originar o conhecimento e a análise de situações
pedagógicas por meio de componentes integradores de conteúdos
específicos e interdisciplinares que problematizem situações de ensino e
fomentem a relação teoria-prática, universidade-escola, sem depender,
necessariamente, da observação direta ou da permanência no espaço
escolar – o que caracteriza o estágio supervisionado e o diferencia da PCC.

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Essa nova dimensão da PCC, na UFPB, oportuniza aos cursos de
licenciatura participar também da formação pedagógica e repensar os
conteúdos específicos tendo como referência a prática escolar. Tais
componentes podem ser ofertados em formatos flexíveis, como Disciplina,
Seminário ou Oficina.
Julgamos ser essa proposta mais adequada de que a opção de trabalhar
a PCC, nas disciplinas específicas do curso, por meio do aumento da carga-
horária reservada à “prática”, quando esta, geralmente, é menor de que o
restante do tempo destinado à teoria – a exemplo de uma disciplina de 90h em
que se destina 60h para teoria e 30h para a prática, reproduzindo o velho 666
modelo formativo que separa, primeiro, a teoria e, só depois, se “aplica” o
conhecimento na prática.
Espera-se, por fim, que os elementos trazidos pelo presente texto
contribuam para uma definição que preserve a prática como componente
curricular como espaço de reflexão coletiva das questões relacionadas ao
exercício da prática educativa, envolvendo a especificidade de cada área de
atuação e preservando, ao mesmo tempo, a necessária base de formação
pedagógica para o trabalho docente.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Alessandro Tomaz. A Prática como Componente Curricular nos


Projetos Pedagógicos dos Cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas. X
ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer


CNE/CP Nº 28/2001. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/028.pdf> Acesso em: 28 nov. 2001

______. Resolução CNE/CP Nº. 1/2002. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_02.pdf> Acesso em: 23 abr.
2002

______. Resolução CNE/CP Nº. 2/2002. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CP022002.pdf> Acesso em: 28 out.
2002

______. Parecer CNE/CES Nº. 15/2005. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/pces0015_05.pdf > Acesso: 16 nov.
2005

______. Resolução CNE/CP Nº. 2/2015. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-regulacao-e-supervisao-da-educacao-
superior-seres/323-secretarias-112877938/orgaos-vinculados-

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82187207/21028-resolucoes-do-conselho-pleno-2015 > Acesso em: 21 set.
2015

LIBÂNEO, José Carlos; PIMENTA, Selma Garrido. Formação de profissionais


da educação: visão crítica e perspectiva de mudança. Educação & Sociedade,
ano XX, N. 68, Dezembro, 1999. p. 239-277

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA. Conselho Superior de Ensino,


Pesquisa e Extensão. Resolução CONSEPE/UFPB Nº. 16/2015. Disponível
em: <https://sigrh.ufpb.br/sigrh/public/colegiados/filtro_busca.jsf> 23 set. 2017
667
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA. Resolução Nº. 01/2017 –
DME/CE/UFPB. Disponível em:
<https://sigaa.ufpb.br/sigaa/public/departamento/noticias_desc.jsf?lc=pt_BR&id
=1385&noticia=75525311> Acesso em: 02 nov. 2017

WEBER, Silke. Notas sobre o CNE e a qualidade do ensino superior.


Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n. 80, p. 91 – 96, 2002.

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RELATO DE EXPERIÊNCIA SOBRE AS CONTRIBUIÇÕES DO PIBID N A
FORMAÇÃO INICIAL: VIVÊNCIA DE BOLSISTA EM ESCOLA PÚBLICA NA
CIDADE DE CAMPINA GRANDE-PB

Ramon Marinho Gomes | Giusepp Cassimiro da Silva | Josandra Araújo Barreto


de Melo

RESUMO: Este trabalho versa sobre um relato de experiência acerca do Programa


Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) para a formação inicial, no
âmbito do subprojeto Geografia/UEPB na Escola Estadual de Ensino Fundamental e 668
Médio São Sebastião, localizada na cidade de Campina Grande-PB, com a tentativa
de expor e analisar as atividades desenvolvidas na escola durante a vigência do edital.
O programa tem como foco aproximar o campo profissional para estudantes de
licenciaturas e para isso, oferece uma bolsa renumerada. Foram feitas análises
através de questionário, intervenções envolvendo os mais diversos meios para mediar
o conhecimento de Geografia de forma mais diversificada. Diante do que foi
apresentado, os trabalhos foram feitos de maneira conjunta e resultaram em melhoria
na mediação do conhecimento, sendo elogiados pelos alunos e contribuindo para o
ensino público. O Programa em questão, alcança seus objetivos e incentiva os
bolsistas a pesquisarem e estabelecerem linhas de pesquisas para o desenvolvimento
da aprendizagem.
Palavras-chave: Docência. Formação. PIBID. Relato de Experiência.

INTRODUÇÃO
Este trabalho surge na perspectiva de divulgar as atividades
desenvolvidas no PIBID no campo da formação de professores de Geografia
como bolsistas e como futuros profissionais da área a fim de melhorar a
qualificação desses futuros profissionais. Tal programa é realizado através de
uma força tarefa que é composta por coordenadores, professores supervisores
e bolsistas em escolas públicas que tem baixas notas no índice da educação
básica. Dessa forma, é necessário compartilhar algumas atividades,
intervenções e a forma como o ensino está sendo tratado na escola pública.
A visão do formando em Geografia em alguns momentos fica restrita
somente a teoria e por horas de estágios, não totalizando a total
profissionalização, sendo necessários outros meios para aprimorar a formação.
Desta maneira, surge o programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência(PIBID), com a finalidade de oferecer bolsas de iniciação à docência à
alunos de cursos presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas públicas
e que, quando graduados se comprometam com o exercício do magistério na
rede pública (MEC,2018).
O exercício do professor é algo que causa ansiedade nos anos de
formação na universidade, não sabendo como realmente exercer o domínio de

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sala, como compreender as diferentes maneiras de pensar dos estudantes e
assimilação dos conteúdos. Assim, é necessário programas como o PIBID em
que bolsistas possam unir a prática a teoria e tenta a cada momento melhorar a
qualidade do ensino público em nosso país.
O relato a seguir retrata uma experiência vivida através do programa em
questão, na qual foi realizada escola estadual São Sebastião no Bairro Alto
Branco em Campina Grande-PB. A área que a entidade estudantil está
localizada é considerada como de classe média, entretanto os alunos que a
frequentam são de bairros periféricos e com poucas condições econômicas e
sociais. 669
METODOLOGIA
Este trabalho trata-se de um relato de experiência, abordando um
programa de bolsas em escola pública, com grande importância para as
escolas:
A relevância de um relato de experiência está na pertinência e
importância dos problemas que nele se expõem, assim como o nível
de generalização na aplicação de procedimentos ou de resultados da
intervenção em outras situações similares, ou seja, serve como uma
colaboração a práxis metodológica da área à qual pertence.
(Ferreira, 2010)

Dessa maneira, presente trabalho foi desenvolvido na E.E.E.F.M São


Sebastião, localizada no Bairro do Alto Branco em Campina Grande-PB,
conforme mostra figura 1:

Figura 1: Localização da Escola São Sebastião

Fonte: Ramos, T. O- 2017 ampliar o mapa

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O projeto realizado durou cerca de um ano letivo, sendo realizado em
uma turma do 1º ano do ensino médio com uma média de 20 alunos, no qual
foram responsáveis por participarem de atividades de intervenção que, com
ajuda de supervisor e bolsista, para melhorar o seu aprendizado e relatar isso
através de trocas de conversas na sala de aula.

DESENVOLVIMENTO
O Programa
Como forma de ampliar a profissionalização dos estudantes dos cursos de 670
licenciaturas, é necessário diminuir a distância entre o que vivenciado nas
universidades e a escola pública, desta maneira surge o programa em questão:
O programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência(Pibid) é
uma ação da Política Nacional de Formação de Professores do
Ministério da Educação (MEC) que visa proporcionar aos discentes
na primeira metade do curso de licenciatura uma aproximação
prática com o cotidiano das escolas públicas de educação básica e
com o contexto em que elas estão inseridas. O programa concede
bolsas a alunos de licenciatura participantes de projetos de iniciação
à docência desenvolvidos por instituições de educação superior (IES)
em parceria com as redes de ensino. (CAPES, 2008)

Assim, esse projeto vem a somar no que diz respeito a ampliação da


qualidade da educação básica no Brasil, abarcando escolas públicas e
desenvolvendo intervenções que busquem melhorar o aprendizado e o ensino,
cooperando para a aproximação entre teoria e prática necessárias à dos
docentes, abrangendo a qualidade das ações desenvolvidas nos cursos de
licenciaturas. Além disso, o programa fornece bolas renumeradas para que o
discente possa desenvolver o projeto com mais qualidade:
O programa oferece bolsas de iniciação à docência aos alunos de
cursos presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas públicas
e que, quando graduados, se comprometam com o exercício do
magistério na rede pública. O objetivo é antecipar o vínculo entre os
futuros mestres e as salas de aula da rede pública. Com essa
iniciativa, o Pibid faz uma articulação entre a educação superior (por
meio das licenciaturas), a escola e os sistemas estaduais e
municipais. (MEC, 2018)

O bolsista de iniciação à docência, é o aluno escolhido através de


avaliação prévia elaborada pelos coordenadores dos subprojetos. Sendo um
dos principais beneficiados com a prática na escola, ainda há o benefício de
elaborar projetos e textos científicos relatando atividades que ocorreram
durante o desenvolvimento do projeto e assim, enriquecendo o currículo
pessoal e aprimorando o exercício do magistério, conforme explica
Freire(2012):

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Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que
fazeres que se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino
continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque
indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar,
constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso
para conhecer o que ainda não conheço e comunicar a novidade.
(FREIRE, 2002. p 14)

Além dos bolsistas na sala de aula, o programa conta com o professor


supervisor que tem a função de orientar e estabelecer os rumos que o projeto
deve seguir, sempre presente em sala de aula e sendo o professor principal,
estabelece os conteúdos a serem trabalhados, estimula a prática de 671
aperfeiçoamento profissional, apresenta as normas e o plano político
pedagógico além de auxiliar nas intervenções propostas pelo universitário.
O principal beneficiado pelo PIBID é o bolsista, mas os alunos das
escolas públicas também são grandes beneficiados, no momento em que
contam com um futuro profissional motivado pelo aprimoramento, professores
supervisores que foram selecionados através de seu empenho para melhor o
ensino e com metodologias que visam o aperfeiçoamento da disciplina e da
maneira de intermediar o conhecimento, tudo isso atrelado a pesquisa
científica.
Com o desenvolvimento do projeto, os bolsistas tem que realizar leituras
e para que aconteça o embasamento crítico para reflexões que venham a
surgir na sala de aula, para o planejamento e para melhorar o conteúdo da
disciplina, a fim de ter domínio daquilo que está sendo transmitido, com o dever
de participar de congressos, palestres, debates e reuniões para se tornar um
diferencial entre os profissionais da área de Geografia, conforme explica
Freire(2002):não há docência sem discência, as duas se explicam e seus
sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de
objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina
ao aprender, quem ensina alguma coisa a alguém. Dessa maneira, é
necessário a pesquisa e o aprendizado também por parte dos bolsistas,
aprimorando a sua profissão e transmitindo com mais firmeza os conteúdos.

O SUBPROJETO

O PIBID/ Geografia UEPB/ Campus I conta com a coordenação da docente


Dra. Josandra Araújo Barreto de Melo, sendo desenvolvido em três escolas
estaduais da cidade de Campina Grande-PB : Professor Itam Pereira, Escola
São Sebastião e Escola Emília Oliveira de Almeida. O projeto contemplava
turmas do 6º ano do ensino fundamental ao 2º ano do ensino médio, contava
com 15 bolsistas e três supervisores. Atualmente, o subprojeto é desenvolvido,
em consonância com a Residência Pedagógica, por 20 (vinte) bolsistas e 3

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bolsistas de supervisão distribuídos em 3 (três) escolas da rede municipal e
estadual da cidade de Campina Grande-PB e Queimadas- PB.
As coordenadoras elaboram reuniões para discussão de textos, debates
e apresentação dos trabalhos desenvolvidos do subprojeto nas escolas.
Nesses encontros são trabalhados assuntos referidos à prática e
desenvolvimento do subprojeto: o que pode ser ampliado, o que não deve ser
feito, propostas para intervenções e avaliação do projeto desenvolvido. Além
disso, os bolsistas explanam suas dificuldades, anseios e aprendizados.
Dessa maneira, a partir desses encontros, vão sendo construídos o perfil
dos futuros profissionais da área de Geografia, estruturando análises e 672
métodos que na formação continuada servirão como base para progressão em
cursos pós-graduação. Ademais, pode-se melhorar o projeto para desenvolver
um trabalho cada vez mais qualificado nas escolas públicas e ofertar ensino de
qualidade.

O PIBID NA ESCOLA ESTADUAL SÃO SEBASTIÃO


O subprojeto vem sendo desenvolvido desde o ano de 2014 até o ano de 2017,
no entanto será discutida intervenções realizadas no ano de 2017. O
subprojeto era desenvolvido em três escolas, sendo focado o trabalho realizado
na Escola Estadual São Sebastião, situada no Bairro do Alto Branco, na Rua
Estelita Cruz. O bairro fica localizado em uma área considerada nobre, mas
seus alunos são de localidades periféricas próximas ao bairro, que no seu
cotidiano vivenciam problemas sociais, ambientais e convivência com
criminalidade. A escola contava com três bolsistas e com um professor
supervisor, que se reuniam bimestralmente para debater e propor ideias que
viessem a somar nas aulas. O projeto relatado foi trabalhado em uma turma do
1º ano do ensino médio, contando com cerca de 22 alunos e que estavam em
contextos sociais diferentes e de origens periféricas a nobres.

RELATANDO PROCEDIMENTOS

Antes de iniciar a prática docente, foi necessário estudar teóricos que


versavam sobre a formação de professores e de conteúdos que seriam
trabalhados na sala de aula para aprimoramento do conhecimento, surgindo a
seguinte questão: como trabalhar diversos conteúdos de maneira que venha a
aproximar a prática da teoria.
Foi aplicado um questionário para termos um norte sobre as
características dos estudantes, seus anseios para a disciplina e para o projeto,
críticas no ensino de Geografia no decorrer dos anos. Assim, percebeu-se que,
existia uma lacuna entre a teoria e a prática, sendo algo cobrado pelos

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estudantes, reivindicando propostas que suprissem essas necessidades. No
decorrer do tempo, foram surgindo ideias e textos que permeavam esse campo
e que estimulavam esse processo, partindo de autores que tratavam de
assunto referentes aqueles que estavam sendo ministrados na sala de aula.
Desse modo, partimos para o campo que estudava acerca da
alfabetização cartográfica, tendo em vista que o conteúdo ministrado era sobre
cartografia básica e a leitura de mapas. A princípio, para entender a forma de
ensinar baseado em autores, tomamos como ponto de partida os estudos de
Almeida(2015) que diz que, “ler mapas é um processo que começa com a
decodificação, envolvendo algumas etapas metodológicas as que devem ser 673
respeitadas para que a leitura seja eficaz”. Logo, sendo a Geografia uma
ciência que analisa o espaço geográfico, fica cada vez mais notório que tal
conteúdo deve ser trabalhado veementemente desde as séries inicias até o
ensino médio, revelando as particularidades, desafios, características e análise
do espaço e do lugar na qual o indivíduo está inserido.
Ainda nesse caminho, utilizamos os estudos de Castrogiovanni (2000),
partindo para o campo da utilização prática e visível do cotidiano dos alunos:
“A cartografia é a representação simbólica de um espaço concreto,
que emprega a linguagem semiótica complexa: signos, projetos e
escala. O próprio mapa compreende um signo. O mapa é um
símbolo que representa o espaço geográfico de forma bidimensional
reduzida. A elaboração de um mapa envolve o conhecimento do
espaço geográfico e sua codificação é que traduz em imagem o
significado, o conteúdo” (CASTROGIOVANNI, 2000, p. 39).

Isto posto, é necessário conciliar a alfabetização cartográfica com a


utilização de maquetes, na qual a primeira localizará o aluno no espaço
geográfico e o outro para representar de modo físico e visível o conteúdo que o
aluno está estudando, conforme analisa GALLO; et al. 2002:
Ao passar a mão, o dedo em uma maquete o aluno percebe algo
diferente e que lhe desperta certa curiosidade em aprender, além do
conteúdo a ser explicado e até mesmo qual a metodologia usada
para se confeccionar uma maquete. Com isso a partir do momento
em que as aulas expositivas ficam somente em explicações
abstratas, mediante a falta de inovação e aplicação, de outras
metodologias, percebesse a necessidade, de aplicarem-se vários
recursos didáticos diferenciados, na tentativa de sanar algumas
deficiências observadas no ensino da Geografia (GALLO; et al. 2002)

Além disso, procuramos aprofundar acerca dos estudos envolvendo as


tecnologias, partindo da premissa do era que estamos vivendo, com o avanço
da maneira de comunicar, utilizando ferramentas alternativas que visem
aumentar o espectro da forma de ensinar, não ficando preso, somente, aos
livros e a lousa. Assim, buscamos compreender os estudos de Levy (1993):

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237-1438-3
Os diversos agenciamentos de mídias, tecnologias intelectuais,
linguagem e métodos de trabalho disponíveis em uma dada época
condicionam fundamentalmente a maneira de pensar e funcionar em
um grupo vigente em uma sociedade. (LEVY, 1993, p.52).

Destarte, faz-se de maneira clara a relevância de análise da história e


mudanças políticas, geográficas e culturais do entorno do estudante para
compreender o seu presente e orientá-lo através dos mais diversos meios as
configurações sociais, climatológicas ou qualquer outro conteúdo programático
que estiver sendo ministrado em sala de aula.
Assim, foi possível ter outro olhar sobre a profissão do professor, sendo 674
importante explorar várias modalidades de ensino e entender que, cada vez
mais a escola vai se transformando e sendo necessário analisarmos e
propormos ideias e metodologias que acompanhem o avanço do capitalismo e
da globalização, na qual as concepções e informações mudam a cada dia de
maneira instantânea.

RELATANDO INTERVENÇÕES

Dentre as atividades desenvolvidas, foram escolhidas estas para servirem de


reflexão e análises:
Como primeira intervenção realizada foi proposto a utilização da biblioteca
local, selecionando cerca de sete mapas das mais variadas características,
como África-Físico, América- Físico, Brasil- Político e Mapa-múndi. Utilizou-se
como referencial teórico as autoras Almeida e Passini (2015), além da
utilização do próprio livro didático para assimilação de conteúdo visto em sala
de aula. A imagem a seguir mostra como foi trabalhado tal conteúdo de forma
coletiva:

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Figura 2: Alunos analisando as informações dos mapas

675

Fonte: GOMES, R.M. Junho -2017

Como mostra a imagem anterior, todos participaram de forma ativa e


pesquisando acerca do que um mapa pode ensinar. Foi proposto que deveria
ser analisado a escala dos mapas, título, legenda e que informações estavam
sendo repassadas através da análise. Todo o processo foi acompanhado pelo
bolsista e pelo professor supervisor, sanando as dúvidas e orientando para um
melhor embasamento e construção de uma atividade mais prática e lúdica.
Após essa análise, os alunos apresentaram os dados e informações
repassadas pelos mapas em forma de seminário, uma forma de melhorar a
dialética e perda de timidez em apresentação em público. A imagem a seguir
mostra um exemplo da apresentação na própria biblioteca.

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Figura 3: Figura 2: Apresentação dos resultados

676

Fonte: GOMES, R.M. Junho -2017

Como pode ser visto na imagem anterior, os alunos ficaram bem fixados
para observar a explicação e análise dos mapas estudados por seus colegas
de classe. No decorrer das apresentações, houve um debate e acréscimo de
informações por parte daqueles que se faziam presente na sala de aula. O
resultado foi bem alcançado, de maneira que nas aulas posteriores a atividade
foi bem comentada.
Como forma de levar a tecnologia para a sala de aula, foi proposto a
explanação de vários conteúdos através de recursos visuais e audiovisuais,
elaborando slides e amostra de vídeos advindos da plataforma Youtube, com a
elaboração de questionário acerca do que foi ministrado e debates críticos
sobre problemas econômicos, socais e ambientais que poderia estar
acontecendo em decorrência de alguns fenômenos estudados pela Geografia.
A imagem a seguir exemplifica uma dessas intervenções realizada na sala de
vídeo da instituição de ensino.

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Figura 4: Utilização de vídeo para o ensino e aprendizagem de Geografia

677

Fonte: GOMES, R.M. Julho -2017

Com a apresentação em vídeo, os discentes puderam perceber de forma


mais clara e objetiva alguns aspectos que antes não podia ser trabalhado na
tradicional sala de aula, analisando filmes e vídeos e vendo na prática a
importância de estudar aquele conteúdo, observando que a Geografia está
relacionada com os eventos que os cercam diariamente.
Outro recurso que foi utilizado para dinamizar o conteúdo programático
ministrado, foi a construção de maquete de vulcão. O assunto que estava
sendo estudado no terceiro bimestre tratava sobre processos endógenos e
exógenos e suas interferências no relevo terrestre, intensificando o
conhecimento sobre o processo de vulcanismo. Com a proposta de aproximar
o conteúdo com algo que diminuísse a escala global para uma escala local, foi
elaborado a confecção de material para a construção destes. A imagem a
seguir mostra a participação do alunado na construção dos vulcões:

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Figura 5: Confecção de maquete em sala de aula

678

Fonte: GOMES, R.M. Setembro -2017

Na situação em questão, os discentes trabalharam em grupo,


dinamizando a confecção e trocando sugestões entre seus colegas de classe.
Além disso, tiveram acesso total aos mais variados equipamentos e materiais
diversos, tendo total controle desde o início até o final e dando suas
características próprias na maquete. Sendo uma proposta elogiada e
comentada por parte daqueles que se fizeram presente em sala de aula. Foi
notória uma diferença na participação em sala de aula por parte dos alunos e o
aumento dos questionamentos críticos sobre os efeitos negativos e positivos
dos vulcões.
Dessa maneira, as intervenções vieram a suprir necessidades que, os
alunos estavam sentindo no que diz respeito à falta de proximidade do
conteúdo com o cotidiano e com aplicação prática da disciplina. Além disso, o
PIBD possibilitou uma interação com os alunos e melhorou a forma de ministrar
aulas, em que o bolsista era iniciante na profissão de professor.

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CONCLUSÕES

O PIBID enquanto programa público, contribui significativamente para a


formação dos futuros professores do país, possibilitando através das bolsas
renumeradas, um encontro entre a teoria trabalhada nas universidades e a
prática em escolas públicas que necessitem de maior assistência, além de
produzir novos significados e práticas que antes não eram possíveis.
Os aprendizados vão sendo construídos de maneira conjunta, com 679
auxílio de supervisores e coordenadores, que estimulam a valorização do
programa e a pesquisar ideias e metodologias que possam ser utilizadas de
maneira clara nas escolas. Assim, o bolsista tem a sus disposição um conjunto
de profissionais voltados para melhor atender alunos da rede pública e assim,
melhorar os índices da educação.
As intervenções são ações que melhoram a relação bolsista-aluno,
sendo um diferencial nas aulas e que, melhora a participação de todos os
alunos, inclusive daqueles que antes estavam distantes do conteúdo e
evitavam a participação na aula tradicional. Ademais, é necessária maior
colaboração da escola para aquisição de materiais e melhoria em laboratórios
e salas de projeção.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Rosângela Doin de; PASSINI, Elza Yasuko. O espaço


geográfico: ensino e representação. São Paulo: Contexto, 2015.

CAPES. Pibid- Programa Institucional de Iniciação à Docência. Disponível


em: <http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid/pibid>. Acesso em:
20 out. 2018.
CASTROGIOVANNI, Antonio. C. et al. Ensino de Geografia: práticas e
textualizações no cotidiano. Porto Alegre: Mediação, 2000.
EDUCAÇÃO, Ministério da. PIBID - Apresentação. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/pibid>. Acesso em: 20 out. 2012.

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FERREIRA, Elizabeth Marques. Diagnóstico das necessidades de
educação permanente nas estratégias de saúde da família do município de
Francisco Bodoró. 2010. 31 f. Tese (Especialização) - Curso de Especialização
em Saúde, Universidade Federal de Minas Gerais, Araçuaí, 2010.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à
prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

680

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ENCONTROS E DESENCONTROS: FORMAÇÃO DE PROFESSORES,
CURRÍCULO E AVALIAÇÃO NAS ESCOLAS PÚBLICAS

Graciane de Souza Rocha Volotão

RESUMO: Proponho com este artigo uma reflexão sobre a (s) função (ões) da escola,
a partir dos textos das políticas educacionais, documentos oficiais e legislações que
direcionam a educação nacional, dialogando com os autores Esteban (2002/2012),
Luckesi (2011), Oliveira e Jorge (2015), Dias (2016), Ortigão e Vidal (2016), Lopes
(2018) e Macedo (2014). Com a pretensão de analisar as marcas das políticas 681
neoliberais que dão centralidade a um currículo padronizado que atende a uma
avaliação classificatória e que impõem uma interferência na formação de professores,
cuja finalidade está em direcionar a prática pedagógica aos objetivos e metas que
servem ao desenvolvimento do sistema capitalista. Destaco o risco de retrocesso da
autonomia docente que ocorre com mecanismos de accountability que insere na
escola e nos sistemas educacionais uma rotina de responsabilizarem os professores
pelo desempenho dos estudantes. Apresento críticas em relação à recente
promulgação da Base Nacional Comum Curricular, que tem a visão reducionista
quanto a finalidade da educação Nacional, estruturada por um projeto excludente que
é justificado pelos discursos políticos que tentam hegemonizar os sentidos das
palavras: qualidade e justiça social, cuja defesa está na homogeneidade curricular e
direcionada a intervenção na formação dos professores.

Palavras-chave: Formação de Professores. Currículo. Avaliação. BNCC. Qualidade


da Educação.

1- INTRODUÇÃO

Na investigação sobre a função da escola e do que a define como de


qualidade, encontramos vários documentos oficiais e acadêmicos. Apresento
alguns nas linhas seguintes que investem nessa significação.

Considero como primeiro destaque documental a carta magna


constitucional brasileira em seu inciso VII, do artigo 206 que define como
princípio da educação a “garantia de padrões da qualidade”. Em seu artigo
210 determina que deverá fixar conteúdos mínimos para ensino fundamental,
assegurando uma formação básica “comum” que respeite os valores culturais
e artísticos, regionais e nacionais (BRASIL, 1988).

No artigo 4º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), destaco o


que está escrito como determinante de garantia de qualidade no país: o

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atendimento, o acesso, a permanência, a oferta, o fluxo, a progressão de
estudos e os padrões mínimos de qualidade de ensino. Para efeito de
esclarecimento, a legislação citada especifica em seu inciso IX que para a
qualidade da educação deve haver insumos indispensáveis para desenvolver
o ensino em variedade e quantidades mínimas por alunos.

Apresento como discurso que traz influência as políticas nacionais a


agenda do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que trata na
682
meta quatro sobre a educação como transformadora do mundo e orienta que
os países assegurarem uma educação ao longo da vida, para todos e todas,
em uma perspectiva de ensino inclusivo, equitativo e de qualidade.

A qualidade foi tratada no Documento de Referência (DR) da


Conferência Nacional de Educação (CONAE, 2014. p.86) e segue em vários
locais do texto com citações de legislações, dos programas de alimentação,
transporte, educação integral, custo aluno qualidade, insumos, piso salarial,
financiamento e por 10 vezes, adjetiva o termo como educação de qualidade
social. O DR no eixo VII trata sobre a questão do financiamento da educação
com transparência e controle social para que ocorra a garantia da escola
pública de qualidade. Assim, faz uma condição direta e para que a qualidade
possa ser alcançada, segundo o documento, existe a necessidade de
elevação dos recursos e a regulamentação do regime de colaboração entre os
entes federados. Sugere o texto que para uma educação democrática e com
qualidade social devem ocorrer processos de avaliação que favoreçam o
desenvolvimento e aprendizado dos conhecimentos “científicos, artísticos,
tecnológicos, sociais e históricos, compreendendo as necessidades do mundo
do trabalho, os elementos materiais e a subjetividade humana”.

Em diálogo com Oliveira (2015; p. 629), que analisa o documento


escrito na CONAE/2014 esclareço que esse se refere aos debates que
ocorreram durante a tramitação do Plano Nacional de Educação. Percebe-se
que os debates e lutas discursivas geraram contradições também no DR na
CONAE (2010). Para a autora, essas contradições são “melhor
compreendidas quando se analisa o Estado como uma relação social

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complexa que transcende as suas próprias estruturas”, esclarece que “mesmo
no interior de uma sociedade capitalista”, nas correlações de força e disputa
de hegemonia ora “podem ser mais ou menos favoráveis aos trabalhadores”
ora “aos capitalistas”, no entanto, sempre, em “defesa da permanência do
capitalismo”. (p.629)

Após conferências nacionais, estaduais e municipais que geraram o


documento de referência de 2014, foi promulgada a Lei 13.005/2014 que
683
aprova o Plano Nacional de Educação (PNE), onde percebemos claramente a
definição de prazos para cumprimento de metas até 2024. Faço aqui destaque
de algumas dessas, por avaliar serem as que tentam dar sentido à qualidade
do ensino em uma delimitação de prazos para serem alcançados com os
estudantes, iniciando pela meta 2, que reproduzo na íntegra, para não perder
sequer uma palavra: “a necessidade de garantir que pelo menos 95% dos
alunos concluam o ensino fundamental na idade recomendada até 2020”. Pela
estratégia 3.5 da meta 3, define-se a correção do fluxo, para reposicionar os
estudantes no que está estabelecido como idade adequada:

manter e ampliar programas e ações de correção de fluxo do ensino


fundamental, por meio do acompanhamento individualizado do aluno
com rendimento escolar defasado e pela adoção de práticas de aulas
de reforço no turno complementar, estudos de recuperação e
progressão parcial, de forma a reposicioná-lo no ciclo escolar de
maneira compatível com sua idade. (BRASIL; 2014)

Por última nessa análise parcial, cito a meta 7 que destaca a importância
do “aprendizado adequado na idade certa”, apontando a necessidade de
“fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades,
com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem” (BRASIL, 2014). Vemos
nessas metas e estratégias uma condução muito bem direcionada sobre o que
se espera da educação nacional para os estudantes.

Outra legislação que entendo ser importante citar neste texto, por
entender ser fundamental para que ocorram debates sobre os sentidos dados à
educação previsto como valorização docente no PNE é a chamada “Lei do
Piso” - Lei 11.738/2008, que pelo parágrafo 4º artigo 2º, instituiu tempo para a

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carga horária de professores com dedicação à formação continuada e
planejamento, definindo o período para a interação dos estudantes que deverá
ser no “máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das
atividades”. No entanto, essa lei enfrenta grandes dificuldades de
implementação pelos entes federados. Chamo a atenção de que as legislações
garantem direitos dos estudantes e dos professores, porém essa efetivação,
nas escolas públicas, é demasiadamente árdua e nas atuais conjunturas
políticas, tem sido impraticável em algumas redes. 684

Como um exemplo de direitos dos professores, o artigo 15 da LDBEN


garante a autonomia pedagógica às unidades escolares, promovendo uma
ruptura ao que antes só era permitido ao sistema educacional, assegurando:

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares


públicas de educação básica que os integram progressivos graus de
autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira,
observadas as normas gerais de direito financeiro público.
(LDBEN 9394/96)

A mesma Lei permite a organização da educação básica de forma


diversificada, focada no interesse ao processo de aprendizagem, prevendo
avaliação com prevalência aos aspectos qualitativos e estudos de recuperação
paralela, conforme artigo 23:

Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em séries anuais,


períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de
estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e
em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que
o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.
V – a verificação do rendimento escolar observará os seguintes
critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com
prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos
resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência
paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento
escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus
regimentos;

Em conformidade com as legislações vigentes, os tempos e os espaços


de formação para professores - e também estudantes- são garantidos, com
objetivo de proporcionar momentos de estudos e reflexões na ação aos
profissionais da educação, assegurando autonomia e propostas inovadoras de

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práticas educativas focadas na aprendizagem, com a real possibilidade de
diminuição da exclusão escolar, focada a qualidade desejada e
constantemente inalcançável por essência utópica. Entendo, portanto, que em
uma perspectiva de educação com justiça social, os docentes precisam refletir
sobre a (s) função (ões) da educação que ocorre por meio da avaliação
conceituada como mediadora do processo ensino-aprendizado, para que possa
atender às demandas de aprendizagens dos estudantes, com intervenção na
realidade e subordinada em constantes diagnósticos. 685

Em formação continuada, os profissionais podem discutir a avaliação,


norteados em uma prática inclusiva, formativa e emancipatória. São esses os
“Encontros” da teoria e das técnicas pedagógicas. Todavia, é nas salas de
aulas que surgem os “Desencontros” onde o que foi compreendido como
possível, sofre o embate das desigualdades educacionais intrínsecas as
condições humanas, em um constante processo de significações e de reflexão
na ação.

2- DESENVOLVIMENTO

Fora da compreensão sobre o cotidiano da escola, há um modismo


causado pela Nova Gestão Pública (NGP) que introduzem mecanismos de
responsabilização (accountability) submetendo questionamentos aos
profissionais da educação, desencadeando discursos de desvalorização
profissional pelos meios de comunicações, políticos e sociedade que se
baseiam em comparações entre as escolas e as redes, por estatísticas de
dados manipuláveis, que desconsideram o contexto social e educacional ao
apresentar resultados sobre taxas de aprovação e médias em avaliações em
larga escala de língua portuguesa e matemática, pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas (Inep) órgão responsável em mensurar a cada dois anos,
por meio do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), a
avaliação da aprendizagem dos estudantes das escolas públicas brasileiras.

Penso ser pertinente escrever que durante décadas a escola avalia, com

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demasiada preferência ao instrumento denominado Prova, em um ritual
tradicional de notas e/ou conceitos que quantificam o conhecimento adquirido
pelos estudantes. Percebo nos textos oficiais a persistência em unificar os
sentidos da palavra qualidade com as avaliações em larga escala, incentivando
a prática nas redes e as privilegiando como condutoras das políticas
educacionais. Uma escola igual, com discurso repetidamente invadido de
palavras como qualidade, equidade e justiça social, como se estes termos
fossem realmente possíveis de alcançar e fáceis de definir sentido. Afinal, 686
todas as escolas são iguais? É possível alcançar qualidade, equidade e justiça
social? O que essas palavras de fato significam? Não tenho a pretensão de
responder nenhuma das perguntas, mas trazê-las como reflexão.
Facilmente é possível perceber que as escolas estão frequentemente
inseridas em rotina de planejamento, avaliação, aprovação e reprovação.
Nesse espaço, denominado escola, há professores formados e em formação
continuadamente, que constroem seus saberes praticando, ensinando e
avaliando, como define Esteban (2002):

Na escola, como se pode perceber, todo dia é sempre igual. Mesmo


que esse igual seja recheado de diferenças, diferenças que acabam
sendo percebidas como iguais pelo nosso olhar constituído pela
lógica. A avaliação no processo ensino/aprendizagem da
homogeneidade. (ESTEBAN; 2002, p. 19)

Para complementar trago mais um escrito de Esteban (2012) sobre a


avaliação como elemento de inclusão e exclusão:

A avaliação, portanto, é um elemento importante da dinâmica de


inclusão e exclusão, escolar e social. Ainda que seja preciso
interrogar a linearidade das relações e a impossibilidade de pensar
inclusão e exclusão como processos opostos, já que se produzem
mutuamente criando entre-lugares em que podemos visualizar a
inclusão-excludente ou a exclusão-includente, é indiscutível a
urgência de se construir uma escola de nova qualidade (ESTEBAN;
2012, p.14)

Desse modo, cabe a reflexão sobre o currículo e a relação desse com a


avaliação dos estudantes em uma sociedade que produz exclusão social e que
sustenta discursos que garantem a permanência de uma única definição de
escola, cuja a finalidade é ser essencialmente classificatória. O currículo não
deve ser imposto e sim disputado e pactuado com a comunidade escolar na

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percepção, sempre renovável, do que acredita ser o sentido de qualidade,
discutido com alunos, responsáveis e profissionais da educação. A partir da
Base Nacional Comum Curricular, promulgada em dezembro de 2017, o
movimento de padronização do currículo, que antes já estava sofrendo um
processo de indução pelas avaliações externas, fica ainda mais forte submetido
aos argumentos de que a melhoria da educação é uma forma eficaz de
redução das desigualdades sociais, pronunciada como a forma de justiça
social, por gerar oportunidades de aprendizagem iguais a toda população 687
brasileira.

Com os discursos de homogeneização do currículo, as autoras Ortigão e


Vidal (2016) afirmam que a centralidade foi dada à avaliação pelos sistemas
educacionais brasileiros. Nessa concepção de avaliação, são promovidos
discursos autoritários de avaliações externas em larga escala para aferir a
qualidade da educação, em uma política de desqualificação dos docentes que
impõem políticas de currículo, com foco na padronização dos conhecimentos,
cujo objetivo é atender às demandas do mercado.

A centralidade das políticas, segundo Dias (2016), vem direcionando


para o docente por meio das agendas políticas que defendem que o professor
é o responsável pela implementação das reformas, logo, espera-se que esse
profissional tenha todo o compromisso e faça todo esforço para que as políticas
obtenham sucesso, responsabilizando-o pelo fracasso. No modelo de
competências para a formação docente no Brasil (p. 599) ocorre a influência da
eficiência social. O movimento de “formação do professor eficiente” serve para
atender às necessidades impostas pela sociedade. Afirma Dias (2016) que os

Modelos curriculares baseados nas competências e inspirados na


teoria da eficiência social tinham como propósito forjar uma formação
que tivesse como finalidade a eficácia do professor, com associação
estreita entre desempenho do aluno e do docente. Acreditava-se que
alunos com bom desempenho escolar possuíam bons professores ou
professores eficazes (DIAS; 2016, p. 599).

Destaco os autores Oliveira e Jorge (2015), Dias (2016) e Macedo


(2014) como fundamentais na discussão da formação de professores em uma
perspectiva crítica do contexto global de imposição das avaliações externas,

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que se volta para a mensuração da qualidade da educação a serviço das
políticas privatistas. As consequências dessa política que são encaminhadas
para accountability são vinculadas com: a performatividade, a perseguição da
eficiência/eficácia e a responsabilização dos resultados de desempenhos de
estudantes atribuídas aos professores. Explicam, esses autores, sobre a
importância que deve ser dada a esses mecanismos de controle, para que haja
a compreensão do que ocorre com os docentes nas escolas que se inserem na
trama discursiva da eficácia, que é entendida aqui como a capacidade de 688
interferir com positividade no desempenho dos estudantes, denominado como
“escola eficaz” as que promovem políticas e práticas pedagógicas que
alcancem a justiça social, defendida com meritocracia pela lógica mercantil.

Cabe esclarecer que as concepções de justiça e de como a escola


promove ou não a justiça social, sofreram transformações ao longo do tempo,
que passou pelas discussões de conceituar a justiça e a justiça escolar,
conforme colaboram Oliveira e Jorge (2014) para esclarecer esse projeto
hegemônico, que transforma a bandeira da igualdade de oportunidades, por
meio da meritocracia, em um eterno convencimento do que caracteriza as
sociedades democráticas, conciliando os princípios da igualdade entre os
indivíduos e a divisão do trabalho como necessidades fundamentais das
sociedades modernas. Portanto, o questionamento sobre o papel da escola
para a sociedade, se faz importante no cenário educacional brasileiro, visto que
há na definição da função educativa e consequentemente social uma
intencionalidade sobre o que fazemos e o que desejamos para os indivíduos e
para as futuras gerações.

Atualmente, os sistemas de ensino de todo o país estão realizando


estudos e movimentos como “O Dia D – da BNCC” para a implementação da
Base Nacional Comum Curricular (BNCC), iniciativa que orienta os entes
federados a divulgar e formar os professores para a aplicação dos conteúdos
organizados no documento. O Ministério da Educação (MEC) faz a proposição
de que as redes públicas construam e/ou atualizem os currículos e direcionem
os planejamentos pedagógicos das escolas, tomando por base a Base.
Sobre a BNCC, Lopes (2018) tem sido uma das diversas intelectuais do

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campo da Educação que tem firmado posicionamento contrário à Base
Nacional Curricular, afirmando que não há necessidade de um único currículo
para todas as escolas, como foi instituído, pois o currículo precisa fazer sentido
no contexto em que está inserido, atendendo às demandas da comunidade,
ressaltando que necessidades/demandas não são homogêneas, uma vez que
há diferentes sujeitos que não produzem os mesmos saberes e nem estão
inseridos “nas mesmas experiências de vida, não constroem os mesmos
projetos de futuro” (LOPES, 2018, p. 25). 689
A impossibilidade de uma homogeneidade curricular em todo território
brasileiro é fato, restando a certeza de que não haverá uma implementação de
currículo único. No entanto, precisa haver uma problematização sobre a
qualidade, vista nesse projeto educacional com uma redução da educação à
“assimilação de conteúdo, ao cumprimento de expectativas de aprendizagem
[...] aos resultados positivos nos exames e o currículo torna-se cada vez mais
dirigido pelas avaliações” (LOPES, 2018, p.26).
De acordo com Macedo (2014, p. 1551) o “vínculo entre a BNCC e
avaliação não pode ser negligenciado”. A autora avalia que se por ora há
tensão no sentido de qualidade da educação, nesse projeto de educação que
exige “metas, objetivos e controle externo” (p. 1551) traz desdobramentos
preocupantes, em especial, quando os discursos trafegam entre o público e o
privado, na proposição de construir sentidos para a educação, então, reforça
que:
É preciso seguir lembrando que um currículo nacional não vai
melhorar a educação nem garantir desenvolvimento e melhor
distribuição de renda. O que ele tem a oferecer é apenas a tentativa
de controle do imponderável da qual depende, não o sucesso da
educação, mas a hegemonia do imaginário neoliberal de que ele é
parte (MACEDO; 2014, p.1551).
Nesse cenário de arena curricular e de definições sobre o fazer e ser da
escola pública, temos o desmonte das políticas sociais com a promulgação da
Emenda Constitucional 95/2016, que congela o orçamento público, impedindo
os investimentos na área de educação e inviabilizando o financiamento para as
conquistas das demais pautas que poderiam de fato garantir a melhoria da
qualidade prevista no Plano Nacional de Educação, priorizando apenas as
ações que convém ao neoliberalismo, como base curricular e avaliações em

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larga escala, para responder às demandas de mercado. Cenário esse que
piora com o resultado das novas eleições, em especial, do novo presidente da
república, cujo plano de governo se insere nessa lógica de retrocesso,
reformas e crise econômica.

3- CONCLUSÃO

A Base Nacional Comum Curricular tem como pano de fundo a avaliação


690
da educação para atender a parâmetros de qualidade, porém enfatizo a
necessidade de uma reflexão mais ampliada sobre a avaliação em larga
escala, a prática indiscriminada da reprovação, bem como um
acompanhamento pedagógico aos estudantes com dificuldades/defasagem
curricular e um debate comparativo do discurso das intenções anunciadas nos
Projetos Políticos Pedagógicos com as práticas que precisam estar
alinhavadas, com o que afirma Luckesi (2011):

O Projeto Político-Pedagógico configura tanto a direção da prática


como os critérios da avaliação. Oferece a direção para a ação
pedagógica e, ao mesmo tempo, é guia e critério para a avaliação. O
que ensinado e aprendido é avaliado, para vir a ser melhor. Se
queremos compreender e atuar adequadamente em avaliação da
aprendizagem, necessitamos de iniciar por esse ponto de partida
(LUCKESI; 2011, p. 19).

Nessa perspectiva, insiro como de fundamental importância na


ressignificação dos espaços, o movimento em torno dos Projetos Políticos
Pedagógicos, documento indispensável para a democratização da escola e
com um importante papel de orientação das relações entre educadores e
estudantes, concordando com Luckesi (2011), por ser esse um instrumento
que promove um repensar sobre a atuação com avaliação, um ponto de partida
que guia todas as ações do educador, pois ao saber claramente quais os
propósitos que se tem com a avaliação, é possível definir a função social
daquilo que se se ensina e que se aprende.

Na prática de formação de professores, ocorrida no âmbito dos sistemas


e/ou nas escolas, chamo a reflexão sobre o papel social da escola por uma
busca fundamentada nos resultados positivos para a aprendizagem, em

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consonância com o pensamento de Esteban (2012), entendendo que a
formação dos professores produzirá “a melhora nas aprendizagens” que
“implica ampliação das possibilidades de professores e professoras atuarem de
acordo com a complexidade do processo pedagógico”, para além do que está
imposto por políticas de implementações autoritárias de currículo e de
avaliação de larga escala, que promovem ranqueamentos e competições
desnecessárias entre escolas e sistemas educacionais.
691
Pensar na escola pública como espaço de oportunidades de
aprendizado para todos e todas com equidade que prime pela qualidade
referenciada socialmente é um desafio à escola e consequentemente à gestão
das Secretarias Municipais, que precisam sempre se lançar em busca de
encontrar mecanismos que possam melhorar o cenário educacional, em
especial no que se refere à formação continuada de professores, iluminando a
criticidade, sem investir em mecanismos de accountability, priorizando o
movimento de resistência para que não prevaleça o discurso de uma formação
limitada aos estudantes e que ocorra uma formação docente inicial e
continuada, baseada em concepções que dialoguem e aprofundem os
sentidos dados ao currículo, a qualidade, a justiça social e a avaliação.

REFERÊNCIAS

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promulgada e publicada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Imprensa Oficial, 2001.

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2014.

________. Lei 11.738/2008. De 16 de julho de 2008. Regulamenta a alínea “e”


do inciso III do caput do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, para instituir o piso salarial profissional nacional para os
profissionais do magistério público da educação básica.

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A BRINQUEDOTECA UNIVERSITÁRIA E A FORMAÇÃO INICAL DO
PEDAGOGO: ESPAÇO DE COMPREENSÃO DO BRINCAR NA INFÂNCIA

Carlos Eduardo Maia da Silva | João Pedro Andrade da Silva | Jalmira Linhares
Damasceno

RESUMO: Este trabalho discuti ações de formação desenvolvidas no ano de 2017, na


Brinquedoteca, laboratório de ensino do Departamento de Educação do Centro de
Ciências Humanas, Sociais e Agrárias (CCHSA) da Universidade Federal da Paraíba 694
(UFPB). Nossa discussão tem como eeixo central a compreensão do brincar na
infância na formação inicial do pedagogo, caracterizando a brinquedoteca universitária
como espaço institucional de fomento dessa formação específica. O norteamento
teórico utilizado nas discussões apresentadas tem como referência, o campo da
pesquisa ação proposta por Barbier (2007), Brougére (2010), Aires (2013) e
Friedmann (2011). Os instrumentos empregados na construção deste trabalho foram a
observação participante, videogravações e questionários. Concluímos ao analisar as
ações de formação da brinquedoteca, que este é um dos espaços de formação do
pedagogo e interação das crianças, servindo como lócus de experimentação e
formulação da prática pedagógica no que se refere as expressões sensíveis da
criança.

Palavras-chave: Brinquedoteca. Laboratório. Formação. Pedagogo.

INTRODUÇÃO

A reflexão que apresentamos nesse artigo configura-se pelo diálogo


entre as discussões sobre o brincar na infância e a formação docente. A
especificidade das discussões tem ênfase na compreensão do brincar na
infância na formação inicial do pedagogo caracterizando a brinquedoteca
universitária como espaço institucional de fomento dessa formação específica.
Nosso lócus é a formação direcionada para estudantes de pedagogia
que atuam como bolsistas na Brinquedoteca, laboratório de ensino do
Departamento de Educação do Centro de Ciências Humanas e Sociais
(CCHSA) da Universidade Federal da Universidade Federal da Paraíba
(UFPB). As ações que serão discutidas, foram realizadas durante o ano de
2017.
Nossas proposições teóricas e metodológicas abordam o princípio da
escuta sensível, discutido por Barbier (2007), que implica um escutar/ver

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possibilitando uma percepção mais ampla dos sujeitos e suas relações. Os
estudos desenvolvidos por Brougére (2010) e suas formulações acerca do
brinquedo e da cultura lúdica da infância. Aires (2013) e suas discussões
sobre as práticas do brincar, Friedmann (2015) acerca da observação dos
brincares das crianças. Os instrumentos empregados na construção deste
trabalho foram a observação participante, videogravações e questionários.
A brinquedoteca universitária como campo de formação do pedagogo
nos aponta para a mediação sensível acerca da identificação dos brincares na 695
infância que viabiliza, no contexto da formulação da prática pedagógica
direcionada as crianças a construção de uma concepção mais ampla sobre a
brincadeira e o brinquedo vinculadas a expressões e interações das culturas
infantis.

A BRINQUEDOTECA E SUA CONSTITUIÇÃO NO ESPAÇO


UNIVERSITÁRIO

A criação de brinquedotecas data da década de 1930. Seu surgimento


tem uma relação com o direito de brincar da criança e o acesso a brinquedos.
Cunha (1996) relata que no ano de 1934, surge o que foi denominado de Toy
Loan. Um espaço que atendia a um serviço de empréstimo de brinquedo
criado a partir de uma situação de roubo desses objetos praticados por
crianças de uma escola municipal da cidade de Los Angeles no período da
crise econômica, na referida década, nos Estados Unidos.
No Brasil o surgimento da primeira brinquedoteca foi na década de 1980.
Segundo Cunha (1996) no nosso país sua característica mais comum é a
formalização de um espaço cujo objetivo é a atividade de brincadeira e o
contato das crianças com brinquedos diversificados para a mediação de
aprendizagens no percurso do desenvolvimento dessa fase da vida.
Kishimoto (2011) quando discute o contexto histórico da brinquedoteca
no Brasil aponta que entre a diversidade desses espaços no país há uma
peculiaridade que não encontra-se em outros países, a existência de
brinquedotecas no “interior de cursos de formação de professores para a

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infância”. Das 565 brinquedotecas registradas no território brasileiro, 212, que
corresponde a 37% do total, encontram-se localizadas nessas instituições.
A brinquedoteca do Centro de Ciências humanas, Sociais e Agrárias –
CCHSA, tem sido cenário para a experiência de interações de linguagem e
produção do brincar direcionado, aos anos iniciais do Ensino fundamental e
mais especificamente a crianças da Educação Infantil. Seu funcionamento
caracteriza-se pelo atendimento a comunidade por meio da visita agendada, da
formação inicial de estudantes de pedagogia, bem como a formação 696
continuada de professores da educação básica da região do Brejo paraibano.
Funciona cinco dias da semana, de segunda a sexta-feira nos turnos matutino
e vespertino. Dois dias são direcionados para as visitas de grupos de crianças
e os outros para as atividades de estudo, planejamento e produção de
brinquedos.
O espaço está organizado em 7 ambientes, a saber: o ateliê, a oficina
de brinquedo a sala de leitura e jogos, o salão de faz-de-conta e brinquedos da
cultura popular, a sala de movimento e imaginação, a sala de experimentações
narrativas, o gramado localizado na área externa.

Foto 01: Ateliê Foto 02: Oficina de Brinquedo

Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017. Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017.


:

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Foto 03: Sala de Leitura e Jogos Foto 04: Salão de faz-de-conta

697

Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017. Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017.

Foto 05: Sala Movimento e Imaginação Foto 06: Sala Experimentações Narrativas

Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017. Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017.

Foto 07: Gramado e Área externa da Brinquedoteca

Fonte: Acervo da Brinquedoteca, 2017.


Os ambientes da brinquedoteca possibilitam as interações e
experimentação de linguagem pelas crianças, caracterizadas na forma de
organização de seus espaços e brinquedos que viabilizam a criação e a

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imaginação materializando experimentações corporais, visuais, sonoras e
cênicas que permitem a manifestação e produção da cultura lúdica pelas
crianças, expressas nas relações com os brinquedos e as brincadeiras.

A BRINQUEDOTECA UNIVERSITÁRIA E A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO:


COMPREENSÃO SOBRE O BRINCAR NA INFÂNCIA

No contexto da brinquedoteca, a formação dos bolsistas que atuam no 698


espaço constitui uma das ações desenvolvidas. Essa formação é realizada
semanalmente em dois momentos: o grupo de estudo que contempla
conteúdos mais ontológicos referentes a infância, e um outro momento
referente a especificidade do brinquedo, da brincadeira e a produção do brincar
pela criança, constituído por proposições mais vivenciais. No âmbito da
discussão proposta nesse texto nossa análise tem como referência esse
segundo momento de proposição formativa que contabilizou uma carga horária
de 16 horas.
A discussão inicial foi direcionada para a apropriação do conceito de
cultura lúdica da infância. A mediação metodológica contemplou uma reflexão
na qual os estudantes pudessem inferir sobre o brincar a partir da leitura da
crônica “Brincar é difícil”, de Rubens Alves, texto norteador da discussão
introdutória. Esse momento foi perpassado pelas memórias de infância dos
estudantes, por suas lembranças brincantes e relações com as brincadeiras e
com os brinquedos, identificados como objetos construídos por eles quando
criança. Sobre essa relação com os brinquedos Alves (2011) em sua crônica
descrever que:
Para fazer brinquedos a gente tinha de desenvolver duas
habilidades. A primeira era um jeito especial de olhar para as
coisas. Tendo, na cabeça, o brinquedo que se queria, a gente
começava a olhar para os objetos à nossa volta, procurando
aqueles que poderiam ser usados para fazê-lo. Tudo podia se
transformar em brinquedo.
O sentido atribuído ao desafio, apontado na crônica estudada foi
relacionado com as próprias vivências de infância dos sujeitos. Esses
estudantes evidenciavam por meio da memória afetiva seus brincares e
relacionavam aos estados de busca e descobertas mencionados pelo autor.

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Percebemos nesse primeiro momento dois aspectos importantes. O
primeiro foi que: Brincar, brinquedo e brincadeira eram evidenciados nas falas
dos discentes, nas histórias que narraram, como conceitos associados um ao
outro. Aires (2013, p. 22) destaca acerca destes termos que “[...] todos estão
implícitos na ação anímica da criança. Não se dissociam ou se contradizem.
Não se especializam em funções próprias. Não se hierarquizam.” Apesar de
apresentarem algumas características distintas, brincar, brinquedo e
brincadeira se complementam na ação brincante da criança. O segundo 699
aspecto é que para compreender o brincar das crianças e refletir o texto
discutido, os discentes evocaram suas memórias e lembranças brincantes,
explicitando o que aponta Friedmann (2011) sobre a importância de nos
religarmos com o nosso ser profundo e aguçar a nossa essência, para que
assim possamos compreender os rituais de brincadeira das crianças de uma
forma mais sensível e complexa.
A etapa seguinte de nossa proposição se deu por meio de dois
momentos: Primeiramente, propomos a observação de um grupo de crianças
que visitou a brinquedoteca, no qual os pedagogos em formação tiveram a
oportunidade de vivenciar as brincadeiras com as crianças, observando seus
modos de relacionarem-se com o espaço, tendo como referência as primeiras
discussões realizadas. Um exercício de percepção dos aspectos dos brincares
daquele grupo e as relações dos sujeitos uns com os outros e com os espaços
brincantes.

Foto 08 e 09: Observação das Crianças.

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

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As imagens acima registram um aspecto importante da observação, a
interação entre crianças e estudantes, a aproximação do adulto com os
brincares das crianças, a imersão do observador no universo brincante dos
sujeitos observados. Num segundo momento, os elementos identificados pelos
alunos durante a visita foram refletidos e discutidos com base em uma
entrevista de Meirelles (ano), como também a partir do vídeo intitulado
“Natureza brincante”, produzido pelo projeto Território do Brincar. O aporte 700
teórico escolhido para a discussão evidenciava a importância de um brincar
livre e espontâneo, no qual as crianças pudessem ter autonomia, fugindo de
uma concepção adultocêntrica de regras e limitações pedagogizadas.
Após assistirmos o vídeo, fomos questionando ao grupo o que eles
identificaram e qual relação estabeleciam entre o material estudado com o
trabalho desenvolvido na brinquedoteca. Os discentes apontaram
principalmente a relação do adulto com o brincar da criança, “a gente deixa né
eles brincarem do jeito que eles sabem né assim, do jeito que eles querem, não
fica interferindo, não faz assim ou faça de outro jeito porque é assim que se
faz... [sic]”. A fala denota a relação que é estabelecida entre os educadores
brinquedistas com os grupos de crianças que visitam o espaço, não como
mediadores ou na função de propor o que as crianças devem fazer, mas de
realmente adultos que brincam, partindo do princípio da alteridade.
Apresentamos e discutimos com os sujeitos o princípio da escuta
sensível proposta por Barbier (2007), que sugere do observador uma empatia
no sentido de perceber o outro, brincar com as crianças e observar suas ações
brincantes sem pré-julgamentos e opiniões pré-concebidas.
Quando questionados sobre o que seria o brinquedo, um dos alunos
ressaltou que “para a criança pode ser qualquer coisa” e outra estudante
completou que “poderia ser um pedaço de madeira, uma folha, que eles podem
transformar no que eles quiser[sic].” Percebe-se nas falas dos estudantes uma
compreensão mais ampla acerca do brinquedo, que não se limita ao objeto
pronto ou a uma representação social, mas a qualquer material, artefato, ou
suporte que as crianças possam atribuir um sentido na ação brincante; pois,

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como afirma Brougére (2010, p. 14), no brinquedo, o valor simbólico é a
função.
Durante a discussão, houveram ainda algumas reflexões acerca do
brincar e sua importância para as crianças. Inicialmente, o grupo atribuiu aos
brincares um caráter de felicidade, questão que fomos problematizando a partir
do aporte teórico que vínhamos estudando e dos elementos que os próprios
estudantes identificaram na observação das crianças. A reflexão levou os
discentes a perceber a brincadeira num sentido mais amplo, que revela, além 701
de felicidade e diversão, imaginação, criação, tensão, fuga, desafio, medo,
como também evidencia uma necessidade intrínseca a criança em conhecer,
explorar e experimentar. Esse momento finaliza a segunda etapa da nossa
formação.
Após a realização das discussões teórico - metodológicas, planejamos
uma atividade que pudesse aguçar a sensibilidade dos estudantes para a
percepção do brincar e seus constituintes. Programamos como etapa final
desse módulo de formação uma oficina intitulada “vivenciando os detalhes do
imaginário”, cujo objetivo foi analisar como se dava as relações entre
observação e sensibilidade, a partir da experimentação estética, sensível, e
sinestésica na relação com o espaço externo da brinquedoteca, evocando a
recordação das infâncias por meio do jogo de percepção do movimento das
coisas, seus sons, seus sabores, relações de aguçamento da dimensão
estética do ser. Para Aires (2013, p.19) “qualquer recordação de infância é, em
si, um ato estético, pois a nostalgia da infância é a nostalgia do ser”.
Iniciamos a formação no espaço externo da brinquedoteca com um
alongamento e aquecimento, experimentando papéis a partir do faz-de-conta e
brincando com os movimentos do corpo. Após esse momento, os estudantes
foram convidados a sentar de olhos fechados em malhas previamente
colocadas sobre a grama e orientados a não falar, tentar ouvir os sons do
ambiente, sentir os cheiros. Enquanto isso, eram produzidos alguns sons com
instrumentos e sensações táteis em seus corpos, por meio de malhas e outros
objetos. Em seguida, ainda na ausência da fala, os participantes foram
orientados a deitarem-se para observar as nuvens, numa ação apreciativa, na

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qual teriam que imaginar as formas, os cheiros, sons, a textura, o gosto do que
denominamos de céu. Continuaram em silêncio, e na atividade seguinte se
dirigiram ao brinquedo nomeado de caixa de areia onde experimentaram as
sensações táteis e foram orientados a comparar textura, sons e gostos. As
imagens abaixo registram cenas da oficina:

Figura 10 e 11: Momentos vivenciados durante a oficina.


702

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

Na continuidade propusemos ao grupo a expressão das sensações


vivenciadas numa composição de modelagem com argila. A oficina foi
finalizada com uma apresentação das formas produzidas e uma reflexão
acerca dessas produções e das percepções de cada um sobre o vivido. O
processo formativo vivenciado por meio da oficina, além de nos permitir uma
compreensão ainda mais profunda sobre a observação da brincadeira pelo
pedagogo, nos fez refletir a importância de formações que possibilitem a
relação da brincadeira com aspectos íntimos do ser humano, como as
emoções, os sentidos, as lembranças.
Percebemos que o processo de formação proposto viabilizou uma
experimentação mais profunda com a ação brincante proporcionada a partir da
identificação dos elementos constituintes da cultura lúdica da infância, a
observação dos brincares como elemento da docência. Ao terem a
possibilidade de vivenciar um momento de intimidade consigo e com as coisas
a sua volta, os pedagogos se permitiram experimentar em plenitude e de corpo
inteiro, aspectos próximos aos da brincadeira para as crianças.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizar esse processo formativo com os estudantes bolsistas,


percebemos que as atividades realizadas lhes proporcionaram uma reflexão
acerca do brincar, brinquedo e brincadeira de uma forma mais ampla e
complexa, o que sugere a importância de uma observação sensível e
minuciosa para compreender os brincares das crianças sem julgamentos
703
prévios. Os estudantes estabeleceram relações entre o aporte discutido com os
aspectos que identificaram nas brincadeiras das crianças, bem como com os
espaços da brinquedoteca, possibilitando uma reflexão sobre o brincar no
espaço escolar.
No contexto das ações analisadas, evidenciamos que a brinquedoteca
universitária é lócus potencial para a formação do pedagogo e das percepções
de interação das crianças, podendo dessa forma, potencializar a prática
pedagógica no que se refere a organização do ambiente experiencial do brincar
na escola, viabilizando uma reflexão acerca da sua importância para a
compreensão da cultura lúdica da infância e suas expressões oriundas das
relações sensíveis com o mundo.

REFERÊNCIAS

AIRES, Jouberth Gandhy Maranhão Piorski. O brinquedo e a imaginação da


terra; um estudo das brincadeiras do chão e suas interações com o elemento
fogo. 138 páginas. Dissertação (Mestrado em Ciências das Religiões).
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa, 2013.

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no mundo. In: FRIEDMANN, Adriana et al. O direito de brincar. 3. ed. São
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curriculares no PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e
resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
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FARIA, Alessandra Ancona de. Contar histórias com o jogo teatral.
Dissertação. USP. São Paulo: 2002.

FRIEDMANN, Adriana. Paisagens infantis: uma incursão pelas naturezas,


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Sociais). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). São Paulo,
2011.

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pessoas e territórios. In:
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704
Paulo: Instituto Alana, 2015. p. 61 – 69.

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PROFESSORES INCLUSIVOS, ESTUDANTES INCLUÍDOS

Joeliton Francisco Sousa de Paulo | Sandra Alves da Silva Santiago

RESUMO: A garantia de educação de estudantes público alvo da educação especial


na rede regular de ensino segue alguns princípios previstos e defendidos no PNE
(2014-2024), o que pressupõe mais que a simples matrícula. Neste processo, em
contrapartida, o mesmo plano também prevê a presença de profissionais cada vez
mais qualificados na perspectiva inclusiva, contribuindo para o respeito aos estudantes
enquanto sujeitos ativos em sociedade. Diante disso, o objetivo deste trabalho foi
analisar a política de educação especial desenvolvida em uma escola da cidade de 705
João Pessoa-PB, a fim de verificar se a formação dos professores atuantes com
estudantes com deficiência atendem as necessidades dos mesmos e se está de
acordo com o que é previsto em nível nacional, através dos principais dispositivos
legais e orientações para formação de professores inclusivos. Para isso, foi realizado
um questionário com os professores, sendo submetidos a análise, buscando
responder a seguinte pergunta: a formação inicial e continuada dos docentes vem
atendendo as necessidades dos alunos? Os resultados revelaram que a formação
inicial e continuada dos sujeitos envolvidos nesta pesquisa não vem possibilitando um
fazer pedagógico inclusivo, assim deixando lacunas do ponto de vista da
aprendizagem e não atendendo as metas do PNE.

Palavras-chave: Educação. Inclusão. Respeito às diferenças.

1 INTRODUÇÃO

Embora a defesa pela inclusão seja amplamente acatada entre os


professores, infelizmente, ainda não é possível afirmar que todos os estudantes
estão com este direito garantido nas escolas brasileiras, sejam elas públicas ou
privadas. Neste sentido, destacamos que a situação dos estudantes com
deficiência é particularmente grave, tendo em vista existir diferenças em seus
processos de aprendizagem que exigem saberes específicos (ainda delegados
à Educação Especial numa perspectiva inclusiva).
Diante disto, este trabalho preocupou-se especialmente com a formação
docente, pois os resultados de pesquisas demonstram que a inclusão depende,
ainda, muito do professor, pois é sobre este que recai a responsabilidade maior
em oportunizar ao aprendiz os instrumentos teórico-metodológicos para que o
mesmo faça parte do processo de construção do conhecimento, sem sofrer
nenhum tipo de discriminação (SANTIAGO, 2011).

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Na Educação Básica, a queixa principal do professor é de não sentir-se
preparado para lidar com a inclusão dos estudantes com deficiência. Diante
disso, perguntamo-nos se, de fato, o problema está na formação inicial, ou
seja, se os cursos de licenciatura não têm sido capazes de formar professores
inclusivos. Com esta preocupação buscamos analisar a formação dos docentes
da rede municipal de João Pessoa-PB, tendo como locus investigativo uma
escola de ensino fundamental, com número significativo de educandos com
deficiência e todos os professores graduados. 706
Nossa hipótese inicial é de que maioria dos cursos de formação docente
não possuem componentes curriculares que possam garantir este viés
formativo e, que existe, também, uma lacuna nas questões conceituais e
metodológicas relativas às deficiências: visual, auditiva, intelectual e
físico/motora, pouco ou nada discutida ao longo dos cursos. Assim, fica
evidente que esta escassez de informação pode ser traduzida nas dificuldades
que os professores enfrentam para incluir seus alunos com deficiência,
principalmente, porque se sabe que estes estudantes requerem adequações
curriculares específicas (BRASIL, 2003) e estratégias metodológicas inclusivas
(BRASIL, 2010), para as quais o docente precisa desenvolver habilidades.
O próprio PNE (2014-2024) prevê no terceiro bloco de metas,
especificamente as metas 15, 16, 17 e 18 ações para que outras metas sejam
garantidas, e reconhece que está na formação docente a base “para o sucesso
de uma política educacional que busque a qualidade referenciada na
Constituição Brasileira” (MEC, 2014:12). Assim, o novo Plano Nacional de
Educação identifica avanços significativos na política inclusiva, considerando
especialmente os estudantes público alvo da Educação Especial, mas,
reconhece, no entanto, que “apesar de todo esse esforço, há ainda um grande
desafio para promover a universalização, com acessibilidade ao ambiente físico
e aos recursos didáticos e pedagógicos” e que tais necessidades estão
intimamente relacionadas à formação docente (MEC, 2014; 25).

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2 DELINEANDO O CAMINHO METODOLÓGICO: A FORMAÇÃO DE
DOCENTES ATUANTES NA EDUCAÇÃO BÁSICA UMA ANÁLISE CRÍTICA
REFLEXIVA

Esta etapa teve como referência a pesquisa de natureza qualitativa,


conforme sugere González Rey (2005), trazendo como características principais o
seu caráter explicativo e exploratório. Para tanto, fez uso da pesquisa de campo,
que segundo Marconi & Lakatos (2011, p. 69) é “[...] utilizada com o objetivo de 707
conseguir informações e/ou acerca de um problema para o qual se procura uma
resposta, ou de uma hipótese que se queira comprovar [...]”. O campo utilizado foi
uma escola municipal de João Pessoa, aqui identificada como N. B. A análise se
pautou na análise de conteúdo que, segundo Berelson (1984; 16), trata-se de
uma técnica de pesquisa que “visa uma descrição do conteúdo manifesto de
comunicação de maneira objetiva, sistemática e quantitativa”.
O objetivo foi identificar as principais dificuldades enfrentadas pelos
docentes no tocante à inclusão de estudantes com deficiência na educação
básica. Todos os professores da escola N.B. foram convidados a participar
voluntariamente da pesquisa, mas, apenas seis docentes se dispuseram a
responder o questionário estruturado, contendo 29 (vinte e nove) questões que
versavam sobre políticas inclusivas e estratégias metodológicas para incluir
estudantes com deficiência na escola.

2.1 CATEGORIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

A partir da utilização da técnica de análise do conteúdo, os questionários


respondidos foram analisados com todo rigor científico, passando esse processo
por três fases principais: pré-exploração do material; seleção das unidades de
análise e finalmente, a categorização (CAMPOS, 2004).
Os dados da pesquisa realizada foram categorizados e analisados sobre
três eixos principais: 1) Perfil profissional dos sujeitos; 2) Principais dificuldades
encontradas no trabalho pedagógico em sala de aula e, 3) Conhecimentos acerca
da inclusão da pessoa com deficiência na escola.

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2.1.1 Perfil Profissional dos Sujeitos:
Sobre o perfil profissional dos sujeitos, identificamos o seguinte:

Quadro I: Graduação, idade e tempo de atuação docente


Sujeitos Formação - Idade Tempo de Atuação
Graduação
na Docência
S1 Pedagogia 46 anos 28 anos 708
S2 Pedagogia 41 anos 18 anos
S3 Pedagogia 31 anos 10 anos
S4 Pedagogia 29 anos 07 anos
S5 Pedagogia 37 anos 10 anos
S6 Artes Visuais 55 anos 33 anos
Fonte: Tabela elaborada pelos autores.

Quadro II: Pós-Graduação


Sujeitos Pós-Graduação
S1 Especialização em Gestão Escolar
S2 Especialização em Educação em Direitos Humanos e mestrado
profissional em linguística e ensino
S3 Especialização em Arte e Cidadania
S4 Especialização em Linguagem
S5 Não Possui Especialização
S6 Especialização em psicopedagogia e mestrado incompleto em
educação
Fonte: Tabela elaborada pelos autores.

Quanto à idade, verificamos nas tabelas acimas, que variam entre 29 (vinte
e nove) a 55 (cinquenta e cinco) anos de idade. Portanto, é importante precisar
que as idades dos sujeitos pesquisados apresentam-se em fase adulta e com
possíveis amadurecimentos pessoais para o trabalho com a docência, traduzindo
ainda maior experiência com a diversidade dos alunos, pois há um tempo de
atividade docente entre 7 e 33 anos.

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No que diz respeito à formação dos professores, percebe-se que 100%
possui graduação, atendendo ao previsto na meta 15 do PNE. Além disso,
83,33% possui especialização, e ainda, 33% está cursando mestrado, índices
melhores que os esperados pela meta 16 do PNE, o que indica docentes
preocupados com a formação, buscando melhorar o nível de conhecimento e
qualificação profissional. Portanto, de modo geral, é possível identificar que 100%
dos docentes pesquisados apresentam subsídios formativos necessários para
atuarem enquanto docentes, no entanto, o fato de terem formação não pode ser 709
entendido como a garantia de que os professores possuam formação compatível
com as demandas da inclusão, logo, uma formação adequada.
Com tal preocupação, algumas respostas dadas pelos docentes no
questionário possibilitaram identificar elementos específicos da formação inicial
dos docentes, especialmente no que diz respeito ao currículo do curso de
graduação e a presença ou a ausência de disciplinas que asseguraram o contato
com o debate sobre a inclusão de estudantes com deficiência na educação
básica.
Nossas análises permitiram identificar as seguintes disciplinas: educação
especial, alfabetização e letramento, letramento e inclusão, educação e inclusão.
E, embora, estas disciplinas sejam citadas, também é possível identificar na fala
dos educadores que as mesmas não foram suficientes, especialmente quando
levamos em conta a diversidade e especificidade que marca as diferentes
deficiências, o que entra em desacordo com a meta 4 do PNE que prevê não só o
acesso dos estudantes com deficiência à educação básica e ao atendimento
educacional especializado, mas, “a garantia de sistema educacional inclusivo”
(MEC, 2014,11).

2.1.2 Sobre as principais dificuldades encontradas no trabalho


pedagógico em sala de aula

Nesta categoria buscou-se analisar todas as informações colocadas no


questionário que, em alguma medida, apontavam para as dificuldades referentes
ao trabalho pedagógico em sala de aula. A partir das análises, destacamos

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algumas falas bastante ilustrativas: S1 destaca que a principal dificuldade é
“Grande quantidade de alunos, estrutura física e falta de recursos”; S2 destaca
que a principal dificuldade é “elaborar atividades para alunos com deficiência
mental”. E, para S3, S4, S5 e S6 as dificuldades principais são indisciplina; falta
de participação da família e formação e preparação precária para atuar na
educação inclusiva.
Como se pode perceber, os professores pesquisados apontam para
questões cruciais na prática docente. Neste estudo, destacamos aquelas que se 710
vinculam diretamente à inclusão de estudantes com deficiência, o que reforça a
ideia de que os mesmos não tiveram em suas formações iniciais e continuadas os
referenciais teórico-práticos necessários à proposta inclusiva, o que reforça o
grupo de metas 3 do PNE, que destaca a formação docente como principal
instrumento para efetivação de uma política inclusiva (MEC, 2014).

3 Sobre conhecimentos acerca da inclusão da pessoa com deficiência


na escola

No terceiro e último eixo que organiza este estudo, interessou-nos saber


os conhecimentos que os professores detinham acerca da inclusão da pessoa
com deficiência. Nesse quesito buscamos dados da experiência, do contato, bem
como da formação. A partir das análises realizadas elaboramos o quadro a seguir:

Tabela I: Convivência com pessoas com deficiência na escola


Sujeitos Contato com estudantes com Contato com estudantes
deficiência com deficiência em sala de
aula
S1 Sim Sim
S2 Sim Não
S3 Sim Sim
S4 Sim Sim
S5 Sim Sim
S6 Sim Sim
Fonte: Tabela elaborada pelos autores.

Como podemos perceber todos os sujeitos pesquisados já tiveram


contato ou estão tendo contato com estudantes com deficiência na escola em

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que os mesmos atuam. Desta forma, é possível perceber que a presença dos
estudantes com deficiência já é algo comum as escolas e, por conseguinte, os
professores entrevistados não são de todo leigos acerca da temática, pois o
contato direto com os indivíduos com deficiência deixa informações, impressões
ou saberes a respeito do assunto, o que pode ser algo positivo para a efetivação
de uma prática inclusiva, mas, que não chega a ser suficiente, como destaca o
PNE (2014) quando afirma que “deve-se assegurar a implantação, ao longo
deste PNE, de salas de recursos multifuncionais e fomentar a formação 711
continuada de professores para o atendimento educacional especializado nas
escolas” (MEC, 2014: 24).
A partir desta realidade, solicitamos informações sobre as deficiências
mais presentes na experiência dos professores e obtivemos os seguintes
resultados:

Gráfico I: Demonstrativo das necessidades educacionais especificas presentes


em sala de aula.

Fonte: Gráfico elaborado pelos autores.

Como podemos perceber, seis especificidades de trabalho pedagógico em


sala de aula foram apresentadas pelos docentes. Com maior representatividade,
temos a deficiência intelectual, que exige um conjunto de saberes para que de

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fato se possa promover a inclusão destes estudantes. Por outro lado, pela
variedade apresentada, fica evidente que é necessário um vasto conhecimento
dos docentes acerca das deficiências. A falta de saber científico sobre o assunto
é evidente nas respostas dadas pelos docentes e faz-se sentir na maneira como
os professores classificam as deficiências, citando, por exemplo, o TDAH
(Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) ou a disortografia
(transtorno de aprendizagem) entre as deficiências.
Desta forma, entende-se, portanto, que como demonstrado na discussão 712
da categoria I, os professores necessitam de qualificação específica na área,
aspectos defendidos pelo novo PNE no conjunto de metas voltados à formação
docente e mais especificamente na meta 16 que explicita a condição
indispensável de se “garantir a todos(as) os(as) profissionais da educação básica
formação continuada em sua área de atuação, considerando as necessidades,
demandas e contextualizações dos sistemas de ensino” (MEC, 2014:11), pois só
a experiência e o contato não resolvem as lacunas sentidas pelos educadores na
formação inicial.
Ainda, se buscou saber como os professores viam a presença de
estudantes com deficiência em sala de aula. Para estas repostas, fizemos uma
categorização entre semelhantes abordagens.

“Importante, tanto para a criança portadora da deficiência quanto


para os demais colegas para que aprendam a lidar com o
diferente.” (S2).

“Um desafio em conciliar a aprendizagem da turma incluindo-os


para favorecer sua aprendizagem.” (S4).

“É muito complicado, pois acredito que falta preparação dos


professores para não deixá-los sem atenção adequada.” (S1).

Buscamos também identificar, segundo os professores, quais eram as


principais dificuldades enfrentadas pelos estudantes com deficiência em sala de
aula e quais os benefícios que a inclusão promovia nesse contexto. No que diz
respeito às dificuldades, os docentes citaram: preconceito, discriminação e a não
aceitação por parte dos colegas, além da falta de apoio especializado para os
desafios cotidianos. Já com relação aos benefícios, o único aspecto destacado

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pelos professores foi à socialização, o que revela uma baixa expectativa com
relação às questões de aprendizagem de estudantes com deficiência.
Nas respostas dadas pelos professores foi possível também identificar
que a inclusão é significada de modo mais ou menos independente, mas, esses
significados a respeito do assunto são construídos em suas práticas cotidianas e
acabam influenciando os modos de agir destes sujeitos. Em linhas gerais, sub-
categorizamos as respostas dadas, de modo que foi possível construir duas
visões a respeito da inclusão de estudantes com deficiência: 1. visão 713
assistencialista\integradora; 2. Visão política de direitos.
Para ilustrar a primeira visão, observemos a de S1, quando coloca que a
inclusão é “fazer com que a pessoa com deficiência seja inserida”. E, ainda,
quando S2 diz: “é acolher; possibilitar a interação com os outros alunos”. Nessas
falas se identifica na força das expressões “fazer, acolher, possibilitar”, a ideia de
que são as pessoas sem deficiência - perfeitas, capazes - que realizam uma ação
externa sobre os sujeitos com deficiência - os imperfeitos, incapazes. Logo, uma
ideia assistencialista da inclusão.
Para ilustrar a segunda visão (de direitos), destacamos a fala de alguns
professores: “inclusão é sentir-se parte integrante e participativo no processo de
aprendizagem” (S3); “é ter direitos respeitados” (S4); “é ter participação efetiva na
sociedade” (S5).
Percebe-se, portanto, que embora, haja uma política declaradamente
inclusiva no nosso país, com um PNE voltado para a efetivação de tal política,
devendo ser adotada pelos estados e municípios brasileiros, na prática, há muitos
entraves, sendo o principal deles vinculado à precária formação docente que
impacta as ideias a respeito do assunto e as possibilidades de construção de
práticas inclusivas, com recursos materiais, estratégias, métodos que promovam
a acessibilidade para os diferentes sujeitos, aspectos já reconhecidos pelo PNE.
Ficou evidente na pesquisa junto aos docentes da escola N.B. que há
saberes específicos necessários à construção de uma prática inclusiva, ainda
desconhecidos pelos professores entrevistados, sem os quais a inclusão de
estudantes com deficiência fica inviabilizada.

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Seguindo com a categorização, interessou-se saber sobre como os
profissionais se julgam quanto suas práticas em respeito à inclusão, ou seja, se
estes se consideram inclusivos ou não. Conforme podemos verificar 83% dos
profissionais se consideram inclusivos. Contudo, mesmo assim, todos apontam
dificuldades na prática da inclusão e consideram relevante saber mais sobre
como trabalhar com a diversidade do público atendido, tendo em vista os 200 dias
letivos. Além de “[...] metodologias específicas; conhecimento sobre as
deficiências e estratégias para o professor ser um efetivo mediador [...]”. 714
Por fim, preocupamo-nos em verificar mais diretamente os conhecimentos
que os professores detinham acerca das deficiências e se as diferenciavam dos
outros grupos de distúrbios/transtornos/dificuldades diversas. Os resultados
podem ser vistos no quadro abaixo:

Quadro III: Saberes profissionais sobre os estudantes públicos alvo da Educação


Especial

Sobre o TEA – Transtorno “[...] que tem dificuldades específicas quanto à


do Espectro Autista: comunicação e socialização; que se fecha em seu
mundo interagindo quando algo lhe interessa;
distanciamento da realidade; portador de autismo [...]”.
Sobre as Altas “[...] que apresenta conhecimento além da sua idade;
Habilidades/Superlotação: nível alto de intelectualidade; inteligência incomum;
facilidade de compreender sozinho [...]”.
Sobre a deficiência “[...] limites biológicos no desenvolvimento da
intelectual: cognição; que apresenta dificuldade no
entendimento e compreensão; dificuldade de
aprender; que têm distúrbios mentais [...]”.
Sobre a deficiência “[...] limitação no funcionamento físico/motor;
físico/motora: dificuldade de locomoção; falta de habilidades com
as mãos; não conseguem coordenar os músculos
[...]”.
Sobre a deficiência auditiva: “[...] que escuta parcialmente ou não escuta;
dificuldade para ouvir; aluno que precisa de um
intérprete [...]”.
Sobre a deficiência visual: “[...] não enxerga (total ou parcial); dificuldade de
enxergar; problema em entender o que ver [...]”.
Sobre dificuldades de Apresentam: “[...] dificuldade de compreensão e
aprendizagem: assimilação de determinados
conteúdos/competências; dificuldade de
aprendizagem em áreas específicas; dislexia;
deficiência de percepção; disfunção cerebral mínima;

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aprende em ritmo lento [...]”.
Sobre dificuldades “[...] não consegue assimilar o que é ensinado;
na
aprendizagem: memória super curta; problemas emocionais,
comunicacionais e comportamentais; dificuldade no
entendimento; dificuldade para aprender [...]”.
Sobre transtornos/distúrbios ”[...] tem oscilação comportamentais, de humor,
de comportamento: podendo apresentar agressão sem causa aparente;
comportamento anormal; não consegue regras de
convívio social; brincalhão; hiperatividade; não entende
normas e regras [...]”.
Fonte: Quadro elaborado pelos pesquisadores.
715

Neste momento de análise fica evidente que as concepções docentes


postas a partir de um imaginário social, referente às necessidades específicas
dos alunos em sala de aula, ainda, são vistas como normativas patológicas, o
que de certa forma traz um alerta quanto ao distanciamento do fazer pedagógico
e à construção do ideal inclusivo como previsto no novo PNE.

3 POR UMA FORMAÇÃO DE PROFESSORES INCLUSIVOS:


ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Conforme se pode notar, na pesquisa de campo feita na Escola


Municipal N.B, fica clara a incipiente formação docente para realizar a inclusão,
demonstrando que a formação de 100% dos professores em nível superior e de
mais de 80% de professores com título de especialista, há lacunas
consideráveis quanto ao atendimento à diversidade, especialmente no tocante
à Educação Especial que não são sanadas pela formação inicial, e que
denunciam a necessidade premente de educação continuada, como prevê o
PNE na meta 14 (MEC, 2014).
De modo geral, quando os dados levantados são confrontados com os
referenciais na área, ou seja, com os documentos que orientam a formação
docente numa perspectiva inclusiva, tais como: as Adequações Curriculares e
Estratégias Metodológicas para inclusão; a LDB 9.394 (1996), as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001),
a Política Nacional de Educação Inclusiva (2008), e o Decreto N.º 7.611 (2011),

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que versa sobre o Atendimento Educacional Especializado, e constituem
documentos subsidiários do PNE (2014-2014), é possível identificar as falhas
presentes nos cursos de formação inicial (licenciatura) quando não oferecerem
aos futuros docentes uma formação que proporcione atuar na Educação Básica
a partir dos saberes necessários para inclusão de estudantes com deficiência,
e as consequências desta precariedade na prática docente dos professores da
Educação Básica.
Portanto, acreditamos ser preciso uma reformulação mais direcionada 716
nos cursos de formação de professores, mas, também o compromisso das
redes estaduais e municipais de ensino na proposição de formação continuada,
como previsto na meta 16 do PNE, com o objetivo de que estas acompanhem
as aspirações atuais de paradigmas metodológicos educacionais para os
estudantes publico alvo da Educação Especial, pois só assim a inclusão será
efetivada com qualidade e atenderá as premissas legais delineadas no novo
plano.
Assim, analisamos que a discussão sobre a formação dos professores,
numa perspectiva inclusiva, será de grande relevância a ser abordada em
trabalhos futuros, tendo em vista, que a discussão desta temática será de
grande importância para o desenvolvimento educacional da comunidade
escolar e logicamente não se esgota nesta pesquisa.

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ASSÉDIO MORAL SOFRIDO POR PROFESSORES DA REDE PÚBLICA DE
PERNAMBUCO: PRÁTICA, PREJUIZOS E INFRINGÊNCIA DE PRINCIPIOS
CONSTITUCIONAIS E ADMINISTRATIVOS.

Elenilza Ferreira de Melo | Wedja Celina Nascimento da Costa | Dayvison Bandeira de


Moura

RESUMO: O presente artigo trata do fenômeno do assédio moral através de sua


caracterização no âmbito da rede pública de ensino do estado de Pernambuco. A
metodologia utilizada foi a Pesquisa Bibliográfica e Análise Documental. Com este 718
caráter exploratório foi analisando os prejuízos causados a saúde física e psíquica e
ao desempenho profissional dos docentes, consequentemente, desrespeitando os
princípios da dignidade a Pessoa Humana, art. 1º, III e 5º V,X da Constituição Federal,
além do desperdício do dinheiro público, implicando também, o explicito desrespeito
aos princípios da Administração Pública da Impessoalidade e da Moralidade
Administrativa. Assim destaca a necessidade do estabelecimento de políticas públicas
de melhoramento das condições de trabalho dos profissionais em Educação, pelas
quais a Administração Pública se adeque como serviços próprios do Estado, ou seja,
essenciais, e, portanto, indispensáveis a uma sociedade livre, democrática de Direito.

Palavras-chave: Assédio Moral; Educação; Dano Moral, Currículo.

INTRODUÇÃO

O fenômeno do assédio moral tem se revelado uma pratica perniciosa


nas relações hierárquicas e sua presença na sociedade atual tem configurado
danos irreparáveis as vítimas de tal processo.

Pode-se afirmar que o assédio moral é tão antigo quanto às relações de


trabalho. Estas relações, quase sempre são desiguais, onde há alguém na
posição de mando e outro na posição de subordinação, obediência. Segundo
Carvalho, é sem dúvida, o tema Assédio Moral é um dos mais recorrentes na
Justiça do Trabalho.

Em Educação, relações de assédio moral na rede pública de ensino


podem ter consequências mais graves, pois não se lida com a produção de um
bem material, mas sim com a formação de pessoas. Esta prática pode afetar o
desempenho profissional dos docentes, afetando sua saúde física e
psicológica, com efeitos irreversíveis, além dos prejuízos aos discentes. Estes
docentes necessitam estar bem emocionalmente e fisicamente para exercer a

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função de educador, que não é só transmitir conteúdos programáticos, mas
também formar alunos e alunas como cidadãos. Por isso, a necessidade de se
discutir os danos morais e suas consequências ao trabalhador em educação.

No que diz respeito à metodologia empregada, foi utilizada a


metodologia de análise documental, feita a partir de documentos selecionados,
no caso fontes secundárias: livros e artigos de referência à temática de
interesse, em conformidade com as concepções de Cellard, (2008), e Pesquisa
719
Bibliográfica, em consonância com Gil (2007).

DESEENVOLVIMENTO: CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL

Segundo o dicionário Houaiss (2001), assediar é perseguir com


proposta; sugerir com insistência; ser importuno ao tentar obter algo; molestar.
A origem da palavra é latina – Obsidiere, que significa pôr-se diante, atacar,
sitiar.

Hirigoyen (2002, p.65) psiquiatra francesa e uma das pioneiras a estudar


o tema e que deu nome ao fenômeno, conceitua assédio moral como sendo:

Assédio moral é toda e qualquer conduta abusiva


manifestando-se sobretudo, por comportamentos, palavras,
gestos, escritos, que possam trazer dano ä personalidade, ä
dignidade ou ä integridade física e psíquica de uma pessoa,
pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de
trabalho.
A Cartilha do Sindicato da categoria (2009, p.4) conceitua deste modo o
assédio moral: é quando as trabalhadoras e trabalhadores são expostos a
situações de humilhação e constrangimento durante a jornada de trabalho.

Os conceitos acima expostos levam a compreensão que o assediador


tem propósitos bem definidos ao atacar sua ou suas vítimas: Interfere nas
condições de trabalho. Nega o direito de o trabalhador exercer sua função
dignamente, isola-o do convívio com os amigos, marginaliza-o dentro do seu
ambiente de trabalho, podendo usar de expedientes vexatórios, violência
verbal, atentando diretamente contra a integridade psíquica da pessoa, com o
intuito de promover desestabilização emocional. Procura demonstrar que a
pessoa é desequilibrada e não tem condições de exercer determinada

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atividade no trabalho, levando-a a pedir demissão ou transferência do local de
trabalho, fazendo com que a própria pessoa passe a acreditar que não é
capaz, sentindo-se inferior, podendo achar que o melhor é desistir da profissão,
da vida.

No Brasil, o tema assédio moral ganhou folego após publicação da


dissertação de mestrado da medica do trabalho Margarida Barreto. Para ela, o
assédio moral provoca danos à dignidade do trabalhador e, por consequência
720
surgimento de distúrbios psíquicos, incidência ao uso de álcool.

A citada afirmou ainda: “Quem assedia o faz de forma pensada para


humilhar e discriminar a vítima. Não é algo irracional, mas pensado’.

Por isso a necessidade de discussão e reflexão sobre os impactos do


assédio moral na saúde dos trabalhadores em educação e seus prejuízos à
Administração Pública. O que estamos vivenciando nas últimas décadas é a
crescente deterioração das relações de trabalho, geradas por uma série de
fatores e demandas, tornando a relação laboral cada vez mais complexas.

DA INOBSERVÂNCIA DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: Dos Direitos


Fundamentais.

A positivação dos Direitos Humanos no ordenamento jurídico é


contemplada com a terminologia Direitos Fundamentais os quais, segundo
Costa Machado, “são originados da dignidade inerente ao humano, pois
atualizam potencialidades essenciais ao Ser” (MACHADO, 2011, p.15)

Neste diapasão, a prática do assédio moral significa desrespeito a


Princípios e Direitos Fundamentais, em especial, o fundamento da Dignidade
da Pessoa Humana e a garantia da Inviolabilidade da intimidade, da vida, da
honra e da imagem das pessoas, consagradas na Constituição Federal (artigos
1º, III e 5ºX) razão pela qual se impõe a análise mais aprofundada destes
institutos.

DA DIGNIDADE HUMANA

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Machado nos ensina que:

“A dignidade da pessoa humana é o valor fonte de todos os


direitos fundamentais. Esse valor, que se apresenta como
fundamento e fim ultimo de toda a ordem política, busca
reconhecer não apenas que a pessoa é sujeito de direitos e
créditos diante dessa ordem, mas que é um ser individual e
social ao mesmo tempo”. (MACHADO, 2011, p.5)

O afirmado acima a despeito de sua clareza e propriedade representa um 721


ideal de difícil concretização, pois como Canotilho nos ensina:

“A densificação do sentido constitucional dos direitos, liberdade


e garantias é mais fácil do que a determinação do sentido
especifico do enunciado “dignidade da pessoa humana”. [...]
Nesta perspectiva, tem-se sugerido uma “integração
pragmática” dos direitos fundamentais. Em primeiro lugar,
afirmação da integridade física e espiritual do homem como
dimensão irrenunciável da sua individualidade autonomamente
responsável. Em segundo lugar, garantia da identidade e
integridade da pessoa através do livre desenvolvimento da
personalidade. Refletindo o imperativo social do estado de
direito, aponta-se para a libertação da “angustia da existência”
da pessoa mediante mecanismos de socialidade. [...] Reafirma-
se, em quarto lugar, a garantia e defesa da autonomia
individual através da vinculação dos poderes públicos a
conteúdos, formas e procedimentos do estado de direito.
Finalmente, realça-se a dimensão igualdade-justiça dos
cidadãos, expressa na mesma dignidade social e na igualdade
de tratamento normativo, isto é, igualdade perante a lei e
através da lei”. (CANOTILHO, 2003, pp.248,249)

Vislumbra-se assim uma dificuldade na conceituação do tema, mas isso


não impede que tais princípios sejam balizadores das políticas sustentadoras
do Estado Democrático de Direito e, para isto é necessário que o Estado vele e
zele pela garantia dos mesmos.

DA INVIOLABILIDADE DA INTIMIDADE, DA VIDA, DA HONRA E DA


IMAGEM DAS PESSOAS

Conforme a própria Constituição Federal define a imagem e honra como


elementos caracterizadores do indivíduo na sociedade, e dele não poderá ser

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privado, indo além, quando determina que qualquer dano decorrente de sua
violação deverá ser reparado mediante indenização, conforme transcrição do
artigo e seus incisos abaixo:

Artigo 5º, V – é assegurado o direito de resposta, proporcional


ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou ä
imagem. [...] X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação.
722

Portanto, é inadmissível a prática de assédio moral no âmbito da


Administração Pública num Estado Democrático de Direito, onde tais garantias
estão protegidas constitucionalmente. Em especial, quando tais práticas são
contumazes em um ambiente onde são oferecidos serviços essenciais à
população, próprios do Estado, no caso especifico, a educação.

DOS PRINCIPIOS DA ADMINISTRAÇAO PÚBLICA

Faz-se mister esclarecer a luz da doutrina majoritária a classificação e a


importância dos Princípios da Administração Pública e do Serviço Público para
seus usuários em detrimento daqueles que os prestam com a rigidez
constitucional a que se obrigam por estarem, em nome do Estado, a servir a
sociedade. Como ensina Meireles:

[...] Na Administração Pública não há liberdade nem vontade


pessoal. Na Administração Pública só é permitido fazer o que a
lei autoriza. A lei para o particular significa “pode ser assim”;
para o administrador público significa “deve fazer assim”.
(MEIRELES, 2003, p.89).

Com tal definição pode-se concluir que o administrador público não pode
agir ao seu bel prazer em seu ambiente laboral. Suas ações deverão estar
pautadas na lei e zelo dos interesses sociais e assim, seguiremos com a
definição de serviço público:

“todo aquele prestado pela Administração ou por seus


delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer

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necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou
simples conveniências do estado”. (MEIRELES, 2008, p. 333).
E no mesmo diapasão, o referido autor, afirma que o serviço público ou
de utilidade pública são:
“sintetizados, modernamente, em cinco princípios que a
Administração deve ter sempre presentes, para exigi-los de
quem os preste: o princípio da permanência impõe
continuidade no serviço; o da generalidade impõe serviço igual
para todos; o da eficiência exige atualização do serviço; o da
modicidade exige tarifas razoáveis; e o da cortesia traduz-se
em bom tratamento para com o público. Faltando qualquer 723
desses requisitos em um serviço público ou de utilidade
pública, é dever da Administração intervir para restabelecer seu
regular funcionamento ou retomar sua prestação”.
(MEIRELES, 2008, p. 338).

Completando o raciocínio da necessidade da conscientização, pela


pessoa que abraça a carreira de Servidor Público, de que o seu papel é servir ä
sociedade, isto é, dar retorno com bons serviços prestados à coletividade, pois
eu salário advém dos impostos pagos pelos contribuintes, que não podem se
furtar de tal obrigação. Reafirmado por Di Pietro: “todo serviço público visa
atender à necessidade pública”. (DI PIETRO, 2008, p. 96).

Mais ainda, quando à essencialidade do serviço é a Educação,


sobretudo, a sua indispensável importância para o crescimento social e,
portanto, a grande responsabilidade de quem o presta. Ressalta-se a crucial
observância a ser exercida pelo estado para com seus servidores, os quais
atuando em seu nome estão formando os cidadãos do futuro da nação. Tudo
com base nos princípios constitucionais para a Administração pública.

DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
Para Helly Lopes Meireles os Princípios básicos da Administração
Pública estão consubstanciados em doze regras de observância permanente e
obrigatória para o bom administrador: legalidade, impessoalidade, moralidade,
finalidade, publicidade, eficiência, razoabilidade, proporcionalidade, ampla
defesa, contraditório, segurança pública, motivação e supremacia do interesse
público. (MEIRELLES, 2003, pp. 88,89). Especialmente, para este artigo é

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importante aprofundar os princípios da moralidade, impessoalidade e eficiência,
pois jugamos que sua observância inibiria a disseminação da pratica do
assédio moral no âmbito da administração pública, em particular, no âmbito
escolar.

Pelo princípio da moralidade administrativa, não bastará ao


administrador o estrito cumprimento da legalidade, devendo ele, no exercício
de sua função pública, respeitar os princípios éticos da razoabilidade e justiça,
724
pois a moralidade, a partir da Emenda Constitucional nº 19 de 1998, é
pressuposto de validade de todo ato da administração pública.

Todos os princípios estão impregnados pelo princípio da legalidade


estrita, e segundo o artigo 37, caput da nossa Constituição Federal nos diz que:

“significa que o administrador está, em toa a sua atividade


funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do
bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena
de praticar ato invalido e expor-se a responsabilidade
disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”. (MEIRELLES, p.
89)

Portanto, vale salientar a importância da responsabilização do


assediador nas esferas administrativas, civil e penal: aquele que insiste em
desrespeitar a nossa Constituição, usando o espaço público para praticar atos
lesivos ao servidor público e à sociedade deve sofrer as respectivas sanções já
previstas legalmente.

Pois se assim não fosse caberia perguntar: como cobrar energicamente


o respeito a tal princípio se o próprio Estado faz pouco caso na aplicabilidade
da probidade aos seus servidores? Como professores da rede pública,
respeitada a devida moralidade, poderiam se sentir devidamente respeitados,
incólumes, dignos, resguardados e protegidos, pelo próprio Estado para
exercerem suas funções com dignidade e eficiência?

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O princípio também significa que o agente deve proceder de acordo com
a moral administrativa, que é o conjunto de regras que deveriam nortear a
conduta no ambiente institucional de onde se origina a pratica administrativa.

O impõe aos agentes públicos uma conduta; ética perante os


administrados, sendo-lhes vedada qualquer atitude maliciosa, destituída de
boa-fé, que acarrete ou possa acarretar algum dano aos servidores e à
sociedade. (MELLO, 2006, p.115).
725

DA IMPESSOALIDADE DO ADMINISTRADOR

Seguindo a linha de raciocínio do professor Helly Lopes Meirellles,


quando a impessoalidade ou finalidade descrita no artigo 37, caput da
Constituição Federal:

“nada mais é que o clássico da finalidade, o qual impõe ao


administrador público que só pratique o ato para o seu fim
legal. E o fim legal; e unicamente aquele que a norma de
Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato,
de forma impessoal”. MEIRELLES, 2003, p. 93)

Tudo isto também, devendo ser aplicado no âmbito da administração,


para os seus servidores.
Corroborando com o raciocínio José Afonso da Silva nos ensina que:

“O Princípio ou regra da Impessoalidade da Administração


Pública significa que os atos e provimentos administrativos
são imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao
órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o
funcionário. Este é um mero agente da Administração Pública,
de sorte que não é o autor institucional do ato. Ele é apenas o
órgão que formalmente manifesta a vontade estatal. Por
conseguinte, o administrado não se confronta com o
funcionário x ou y que expediu o ato, mas com a entidade que
cuja vontade foi manifestada por ele. É o que a “primeira regra
do estilo administrativo é a objetividade”, que está em estreita
relação com a impessoalidade. Logo, as realizações
administrativo-governamentais não são do funcionário ou da
autoridade, mas da entidade pública em nome de quem as
produzira”. (SILVA, 2007, pp. 667,668)

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Portanto, cabendo aqui, uma reflexão que todo funcionário público que
pratique atos arbitrários, contrários ao que está preconizado na Lei, o Estado
deverá responder objetivamente e recorrendo do seu servidor a
responsabilização pelo seu ilícito praticado.

DA EFICIÊNCIA

Segundo Silva o princípio da eficiência exige que a atividade 726


administrativa seja:

“exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o


mais moderno princípio da função administrativa, que já não se
contenta em ser desempenhada apenas com legalidade,
exigindo resultados positivos para o serviço público e
satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de
seus membros”. (SILVA, 2003, P. 98)

Podemos concluir que a mera aprovação no certame, apesar de


necessário, não; e suficiente para que tais profissionais cultivem a consciência
da dimensão do que seja um servidor público, sendo necessário ações de
caráter educativo, com formações continuadas para que o mesmo incorpore os
valores carreados pelos princípios da administração pública.

DO DANO MORAL

Segundo Gomes (apud PRATA, 2008, p.507) dano é a diminuição ou


subtração de um bem jurídico, a lesão de um interesse.

Para Cahali o dano moral é definido em contraposição aos danos


patrimoniais:

[...] é possível distinguir, no âmbito dos danos, a categoria dos


danos patrimoniais, de um lado, dos danos extrapatrimoniais,
ou morais, de outro: respectivamente, o verdadeiro e próprio
prejuízo econômico, o sofrimento psíquico ou moral, as dores,
as angustias e as frustrações infligidas ao ofendido.
(CAHALI,2002, pp. 20, 21)

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Ainda o mesmo autor utilizando os próprios elementos do dano moral
discorre sobre sua caracterização:

[...] Como provação ou diminuição daqueles bens que tem um


valor precípuo na vida do homem e que são e a paz, a
tranquilidade de espirito, a liberdade individual, a integridade
individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados
afetos. Classificando-se desse modo, em dano que afeta a
“parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc) e dano
que molesta a “parte afetiva do patrimônio moral”(dor, tristeza,
saudade etc); dano moral que provoca direta ou indiretamente 727
dano patrimonial (cicatriz deformante etc) e dano moral puro
(dor, tristeza etc) (CAHALI, 2002, p. 22)

Segundo o espanhol José Maria Garcia Callejo (apud: PRATA, 2008, p.


511) “a configuração do assédio moral no trabalho não exige prova de dano
psicológico, já que o atentado à dignidade do trabalhador é suficiente para
caracterizá-lo”.

Em matéria de prova processual, tudo ficaria a depender do resultado de


um laudo pericial. Enquanto que a Constituição da República garante a
dignidade de todos os trabalhadores, independentemente de sua maior ou
menor capacidade de resistência psicológica.

Em Batalha, há vários conceitos sobre o dano moral. Dos conceitos


estabelecidos, segundo a autora, o que melhor se enquadra no problema do
assédio moral, em se tratando de servidor público é o apresentado por Yussef
Cahali:

Tudo que molesta a alma, ferindo-lhe os valores inerentes à


personalidade reconhecidos pela sociedade, qualifica-se como
dano moral, evidenciado pela dor, angústia, sofrimento, tristeza
[...], desprestígio, desconstrução, descrédito da privacidade,
desequilíbrio psíquico, traumatismos emocionais, depressão,
desgastes psicológicos e constrangimento moral. (BATALHA,
2009, p. 54)

No parágrafo seguinte, a autora ainda nos revela que há uma


cristalização do dano, quando na privação ou diminuição dos bens que tem
valor precípuo na vida humana que são paz, tranquilidade, liberdade,
integridade física, honra e demais afetos à reputação a dano que molesta a

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parte afetiva do patrimônio moral, dor, tristeza, saudade. Dano moral que
provoca direta ou indiretamente o dano patrimonial e o dano moral puro: dor,
tristeza. (BATALHA, 2009, p.54)

CLASSIFICAÇAO DO DANO MORAL

A classificação entre empregado e empregador se dá nos moldes de


uma relação de sujeição hierarquizada, de subordinação. O empregador 728
manda e o empregado obedece. Essa relação é uma das que mais se propicia
a violação à dignidade da pessoa humana.

Para Carvalho quando as espécies de assédio moral, as classifica em:

Vertical descendente (praticado pelo próprio empregador ou


um de seus superiores hierárquicos), horizontal simples e
coletivo (praticado por um ou mais colegas de serviço,
respectivamente) e vertical ascendente (praticado por um ou
mais subordinados contra o superior hierárquico).

Para o referido autor, afirma que o tipo de assédio moral mais frequente
na relação laboral é o vertical descendente, em razão da própria organização
do trabalho, maior competitividade, objetivando maior lucro e menos custos.

Portanto, o Estado, que funciona pautado na Lei, isto é, respeitando-a,


não pode fazer vista grossa a tal desmando dentro das instancias públicas de
ensino, quando existe lei especifica que veta a pratica de assédio moral no
âmbito da Administração Pública estadual.

CONCLUSÃO

A evolução dos fatos e dos valores sociais são constantes, por isto, o
Direito deve acompanhar tais transformações. É com essa visão dinâmica da
sociedade que o Direito se renova e vai adaptando-se a cada caso concreto e
precisará de mecanismos jurídicos para solucionar as demandas.

Por isso, este artigo nos direcionou para um problema que envolve as
escolas públicas de Pernambuco, servidores públicos, em particular

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professores submetidos a situações constrangedoras no próprio ambiente de
trabalho. Pois acreditamos que só o Direito será capaz de fazer o combate
eficaz à pratica do assédio moral nas escolas públicas, pelo seu caráter de
“coercitividade”, já que ações de conscientização, campanhas educativas,
formação de professores, não são suficientes para coibir este tipo de prática.

Por fim espera-se que este artigo contribua para uma discussão fecunda
sobre o assédio moral na relação de trabalho nas escolas públicas. Para isto é
729
imprescindível que a Secretaria de educação do Estado, Sindicato da
categoria, fiscalizem, chamando a responsabilidade seus servidores e para
isto, não permitir o desrespeito aos princípios Constitucionais da dignidade da
pessoa humana, da inviolabilidade da intimidade, da vida, da honra e da
imagem. É assegurar também o respeito aos princípios da Administração
Pública, da impessoalidade e da moralidade. Infringir tais princípios é negar a
atuação do Estado e mais a garantia de uma sociedade justa e igualitária.

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Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


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resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
237-1438-3
A COMPREENSÃO DE ACADÊMICOS ACERCA DA BASE NACIONAL COMUM
CURRICULAR

Ana Cláudia da Silva Rodrigues, UFPB | Anne Karoline Cantalice Sena, UFPB |
Adriege Matias Rodrigues, UFPB

RESUMO: O tema a ser tratado neste trabalho refere-se à implantação de uma Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) no Brasil. O objetivo consistiu em analisar quais
as compreensões dos acadêmicos em formação do Curso de Pedagogia acerca deste
documento. Para tanto, a abordagem da pesquisa escolhida foi a qualitativa, que se 731
enquadra no tipo Estudo de Caso (EC), na perspectiva de investigar a BNCC como um
acontecimento contemporâneo. Para uma melhor compreensão do fenômeno
investigado, subsidiaram nossa discussão teóricos como: Macedo, Akkari, Ball, entre
outros. O instrumento utilizado para coleta de dados foi um roteiro de entrevista
semiestruturado. Os sujeitos investigados foram 15 alunos e alunas do curso de
Licenciatura em Pedagogia. A partir da conclusão da investigação destaca-se uma
ausência na compreensão dos acadêmicos em formação acerca da Base Nacional
Comum Curricular, por não apresentarem uma interação fundamentada em relação a
este documento, ou seja, não apresentam visões de recontextuzalização.

Palavras-chave: BNCC. Formação. Recontextualização.

INTRODUÇÃO

Atualmente, assume-se considerável proeminência nos debates sobre


as políticas educacionais, mais precisamente sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) e sua implantação no contexto brasileiro. A partir disso,
adotou-se como objeto de estudo tal documento, o qual foi aprovado em
dezembro de 2017. Sua efetivação em 2019 norteará as ações pedagógicas,
por ser um “documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e
progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem
desenvolver” (BRASIL, 2017, p.7) no decorrer da Educação Básica, baseada
por “princípios éticos, políticos e estéticos” (BRASIL, 2017, p.7). Com isso,
objetivamos analisar quais as compreensões dos acadêmicos do curso de
licenciatura em Pedagogia do CE/UFPB acerca da Base Nacional Comum
Curricular.

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Nesse contexto, as propostas no terreno político são sempre marcado
por articulações entre uma pluralidade de demandas, e as que envolvem o
campo educacional não se diferenciam. Desde 1988, essas propostas são
articuladas por micropolíticas que não abrangem com firmeza os contextos
educacionais, ao não propiciarem as adequações necessárias para o
desenvolvimento ativos dos alunos. Assim, precisa analisar “o
desenvolvimento, a formação e a realização dessas políticas do contexto de
influência até práticas e efeitos, passando pelo contexto de produção do texto 732
político” (BALL, 2006, p.21).
Os motivos da criação de políticas educacionais vão muito além
do espaço escolar ao envolver o “Contexto da Influência” (BALL, 2012) ao
“Contexto dos Resultados” (BALL, 2012), interferindo os pedagogos a
recontextualizarem os elementos que precisam ser colocados na matriz
curricular que favoreçam sua prática pedagógica. Com a criação da BNCC
essa adequação tornou-se bem mais difícil de ser executada, ao está
selecionada baseada em propostas que não veem de encontro com as
realidades dos espaços escolares.
Ressalta-se que a BNCC ao nortear as matrizes curriculares escolares,
orienta a formulação do Projeto Pedagógico dos cursos de licenciaturas da
UFPB, permitindo maior articulação deste. Com a Base espera-se que todo
mundo saiba quais são os elementos fundamentais que precisam ser
ensinados nas Áreas de Conhecimento: na Matemática, nas Linguagens e nas
Ciências da Natureza e Humanas. Segundo seus autores esta servirá para
definir os principais “direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento”
(BRASIL, 2017, p.12) nas áreas de conhecimento da Educação Básica; onde
se espera que esta se torne um instrumento de gestão que ofereça subsídios
para formulação e reformulação das propostas curriculares; além de se
esperar que a BNCC seja um dispositivo para (re) orientar as políticas de
avaliação da Educação Básica. Nesse sentido, é de suma importância analisá-
la, uma vez que baseará todas as propostas curriculares.
Buscando analisar com mais clareza o objeto de estudo, definiu-se que
este trabalho se enquadra no tipo Estudo de Caso (EC), que tem como

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característica o método qualitativo e que contribui para “[...] nosso
conhecimento dos fenômenos individuais, grupais, organizacionais, sociais,
políticos e relacionados” (YIN, 2010, p. 24). Além de que o EC “investiga um
fenômeno contemporâneo em profundidade e em seu contexto de vida real,
especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não são
claramente evidentes” (YIN, 2010, p. 39).
Os interlocutores dessa pesquisa foram quinze acadêmicos do Curso de
Pedagogia da Universidade Federal da Paraíba, matriculados no primeiro, 733
quarto, quinto, sexto, oitavo e nono período do curso. A escolha dos
entrevistados foi a partir da necessidade de analisar a compreensão destes
futuros pedagogos sobre a BNCC, a qual foi uma decisão política apresentada
a priori como uma necessidade de organização do currículo no Brasil.

A BNCC E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS

As políticas “não lhe dizem normalmente o que fazer, elas criam


circunstâncias nas quais a gama de opções disponíveis para decidir o que
fazer são estreitas ou alteradas ou metas ou resultados particulares são
definidos” (BALL, 1994, p. 19). Nesse sentido, Ball (2008) apresenta um “ciclo
de políticas” constituído por cinco contextos: Contexto de Influência, Contexto
da Produção de Texto, Contexto da Prática, Contexto dos Resultados e
Contexto da Estratégia política, na intenção de explicar com mais clareza a
natureza complexa e controversa das políticas educacionais.
Nesses contextos, “a política é feita pelos e para os professores; eles
são atores e sujeitos, sujeitos e objetos da política. A política é escrita nos
corpos e produz posições específicas dos sujeitos” (BALL, 2012). Os
professores são os atores na política, sua atuação se dá através da aceitação,
contestação, luta ou recusa quanto à produção de textos na política.
A política da influência vai além da política como ideologia ou
ideacionais, ela vai ser uma política também em forma de matéria, sendo vista
também como interesse pessoal ou na maximização da utilidade, onde
possibilita uma escolha de qual política ser trabalhada e qual ser descartada.

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A política da produção de texto vai existir uma variância de quem escreve
pra quem interpreta e aplica, devido a alguns fatores, pois quem elabora os
textos geralmente escrevem sobre uma escola utópica, e quem recebe a
produção do texto precisa decodifica-lo, ou seja, interpretá-lo para a sua
realidade.
A interpretação da política e a sua recriação acontece no contexto da
prática, nesse mesmo contexto são produzidos efeitos e consequência de
acordo com a política, no qual gera mudanças em seus atores. 734

(...) Políticas serão interpretadas diferentemente uma vez que


histórias, experiências, valores, propósitos e interesses são
diversos. (...) Partes podem ser rejeitadas, selecionadas,
ignoradas, deliberadamente mal entendidas, réplicas podem ser
superficiais etc. (...) Interpretações diferentes serão contestadas,
uma vez que se relacionam com interesses diversos (...) (Bowe
et al., 1992, p. 22)

Portanto, a implementação de políticas educacionais, deve acontecer de


acordo com as interpretações de cada professor, onde o que levado em conta
é o que eles pensam e acreditam.
O debate em torno de uma base comum que oriente os docentes como
“grandes protagonistas dessa transformação” (BRASIL, 2017, p.5) vem deste
os anos de 1980. Iniciado com a Constituição, seguindo com a LDB (1996), a
efetivação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), culminando para a
elaboração do Plano Nacional de Educação (2010). Tomando como base o Art.
26 da LDB, nota-se que: Os currículos da educação infantil, do ensino
fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser
complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento
escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e
locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos.
Com efeito, em 16 de setembro de 2015, foi apresentada pelo Ministério
da Educação a 1ª versão da proposta de uma BNCC para consulta pública até
15 de maio de 2016, ainda no governo Dilma. Seu processo de produção e

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organização reúne membros de associações científicas representativas das
diversas áreas do conhecimento de Universidades públicas, o Conselho
Nacional dos Secretários de Educação (Consed), a União Nacional dos
Dirigentes Municipais da Educação (Undime), além de representantes
privados, provenientes do “Contexto da Influência”.
Em 03 de maio de 2016 foi apresentada a segunda versão para debates
públicos, em seminários estatuais entre 23 de junho a 10 de agosto do mesmo
ano. No entanto, em 2017 as propostas requeridas não foram apresentadas na 735
terceira versão, a qual se constitui como “um documento de caráter normativo
que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que
todos os alunos devem desenvolver” (BRASIL, 2017, p.7) ao longo da
Educação Básica.
Nesse modelo de escolarização, “o currículo é cada vez mais pensado
sob a forma de uma padronização, e formulado em competências disciplinares
e transversais” (AKKARI, 2011, p.23). Assim, as políticas educacionais
apresentam-se deficitárias ou inexistentes em proporcionar qualidade no
ensino ofertado, uma vez que não levam em consideração os atores dessas
políticas.
Ball indica que o foco da análise de políticas deveria incidir sobre a
formação do discurso da política e sobre a interpretação ativa que os
profissionais que atuam no contexto da prática fazem para relacionar os textos
da política ao ato. No caso específico da BNCC, eles serão o que
desenvolverão a partir de 2019 os direitos e objetivos de aprendizagem
essenciais a cada aluno, baseado em conteúdos, habilidades e competências
nela estipulados. Portanto, precisa analisar “o desenvolvimento, a formação e
a realização dessas políticas do contexto de influência até práticas e efeitos,
passando pelo contexto de produção do texto político” (BALL, 2006, p.21).
Com base nessa perspectiva, os pedagogos devem estar preparados
para promover as perspectivas estipuladas na Base Nacional Comum
Curricular em seu “Contexto da Prática”, uma vez que este documento será
necessário na hora de pensar um Projeto Político-Pedagógico e as propostas

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curriculares, mesmo não sendo formulado e adequado a realidade escolar de
professores, estudantes e comunidade, mas as demandas mercadológicas.

DISCUTINDO A BNCC A PARTIR DA COMPREENSÃO DE ACADÊMICOS

A formação inicial de professores vem sendo bastante discutida no


âmbito educacional. Tendo a compreensão de que essa formação é o passo
inicial para as ações pedagógicas e educativas e que precisa de políticas 736
efetivas que possibilite uma formação de qualidade que beneficie a educação
como um todo. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - (LDB) – 9394/96 em
seu Art. 61 garante direitos e estabelece diretrizes sobre a formação docente:

A formação de profissionais da educação, de modo a atender


aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e
as características de cada fase do desenvolvimento do
educando, terá como fundamentos: I- a associação entre
teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em
serviço; II- aproveitamento da formação e experiências
anteriores em instituições de ensino e outras atividades.

Essa formação precisa contemplar a relação da teoria e prática,


dialogando a partir das políticas direcionadas ao cenário. Atualmente estamos
para implementar a BNCC e esse Currículo Nacional precisa estar em debate
dentro das instituições formadoras, permitindo que os acadêmicos tenham
essa relação com as políticas educacionais que regem nossa educação.
Carneiro (2003) em uma leitura crítico compreensiva da LDB corrobora
que:

A formação do professor constitui aspecto angular da


educação básica. O ideal é que se tenham docentes com
formação avançada para atuar num nível de educação onde
são definidos os valores e as condições básicas para o aluno
apreender o conhecimento mínimo e laborar a visão
estratégica imprescindível a compreender o mundo, intervir na
realidade e agir como sujeito crítico (p.150).

As mudanças que estão para serem implementadas no setor


educacional proporcionarão alterações também na formação inicial e

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continuada dos professores. Daremos ênfase à formação inicial dos
professores, em específico do curso de pedagogia, a partir do que os
acadêmicos em formação compreendem por Base Nacional Comum Curricular,
pois nossa grande preocupação é como está sendo ofertada essa formação,
tendo em vista que essa reforma afetará diretamente a escola, desde o Projeto
Político Pedagógico.
Para que isso ocorra é necessário conhecermos a participação desses
acadêmicos em eventos, discussões, seminários que trazem momentos de 737
reflexão e de conhecimentos sobre essa Base Nacional que será norteadora
das ações que perpassarão as atividades das escolas.
As discussões e debates sobre as políticas e reformas que vêm sendo
implementadas se faz necessário para que os acadêmicos em formação
consigam ter dimensão dos documentos legais que regem e que orientam as
ações pedagógicas e educativas em sala de aula e na escola como um todo, a
não compreensão disso, leva a uma implementação sem conhecimento, ou
melhor uma simples reprodução sem compreensão do que de fato os
documentos vem trazendo e o que pode ser feito a partir da realidade local.

Grande quantidade de acadêmicos que ainda não participaram de


eventos extracurriculares, pode ocasionar um efeito da “padronização
curricular sobre agência do professor e sobre seu papel ativo como mediador
(recontextualizador) das políticas” (BRIANT; DOHERTY, 2012), pela análise
menos concreta das disciplinas, as quais precisam dialogar com as propostas
presentes no projeto ao apresentar a ementa. Os que participaram apontam
que:

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Sim. Assim, a gente... eu já participei dos congressos
CONEDU há dois anos atrás, em Natal e em João Pessoa, e
os dois tiveram palestras referentes a reforma curricular. Era
muito discutido que como é trabalhado a base nacional, do
que é trabalhado e do quanto que se precisa de uma
reforma pra se levar em consideração o contexto que a
escola está inserida, porque a gente acaba adotando
muitas ideias que não vem do contexto que a gente está
inserido e elas não dão certo, porque a gente não da
para pegar uma lei, ou uma norma e dizer ela como
padrão, porque cada estado, cada comunidade tem uma 738
relevância cultural, social, econômica diferente, tem suas
particularidades (Acadêmica, 5° período)

Compreender essas reformas curriculares que estão ocorrendo em


nossa educação, mais precisamente compreender a Base Nacional Comum
Curricular necessita que esses acadêmicos tenham um entendimento acerca
das próprias políticas, como sendo um ciclo continuo que envolve uma serie de
questões, como o próprio contexto de influência que a mesma passa a ser
pensada, segundo Mainardes (2006, p. 5) “onde normalmente as políticas
públicas são iniciadas e os discursos políticos são construídos. É nesse
contexto que grupos de interesse disputam para influenciar a definição das
finalidades sociais da educação e do que significa ser educado”.
Quando os professores resolvem traçar seus planos de curso atrelados
a essa discussão da BNCC, propicia a esses acadêmicos relacionar esse
documento com todas as discussões e embates que são realizados no
contexto de aprendizagem, com a possibilidade de traçar um percurso das
políticas, assim como, seus avanços e retrocessos.
Com este documento espera-se que “ajude a superar a fragmentação
das políticas educacionais” (BRASIL, 2017, p.8). Sendo assim, o conhecimento
aprofundado dos futuros pedagogos é essencial para conhecer essas
perspectivas e atuar sob elas, desenvolvendo as competências e habilidades
anuais que favoreçam os perfis dos educandos.

Sim. Então, eu estou pagando inclusive uma disciplina do


sétimo período que é Currículo e Educação, e ai nós estamos
analisando as etapas da BNCC enquanto educação infantil e
ensino fundamental. Então a gente tá vendo ai as mudanças,

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o que é que a gente pode mudar ou não. Eu creio que seja
positiva por um lado, mas ao mesmo tempo ela se torna um
pouco superficial. Eu acho que falta atender alguns mínimos
detalhes que ela deixa passar, a questão da sexualidade, né,
que ela vai deixar de trabalhar agora na última versão. Então
eu acho que isso aí foi, é um ponto negativo (Acadêmico, 6°
período)

Sim. Então, eu tive uma disciplina que abordava muito as


questões das políticas públicas de educação e como estava
nessa fase de transcrição da BNCC, a gente via um pouco
disso, mas não detalhadamente. Eu sei que foram três
versões, estamos na terceira versão, que ela tem dois anos
739
para ser implementada nas escolas, e que ela... o principal
objetivo dela é ter uma base para todas as escolas do Brasil,
mas aí dependendo de cada região as escolas vão trabalhar
as suas peculiaridades (Acadêmica,3° período)

Observamos o quanto essa aproximação cria um nível de compreensão


e de desenvolvimento profissional. É o processo abordado por Ball de recusa
ou de aceitação a partir da leitura, análise e dos debates que vão se ampliando
essas concepções e compreensões sobre o documento curricular.

Formação pode estimular o desenvolvimento profissional dos


professores, no quadro de uma autonomia contextualizada da
profissão docente. Importa valorizar paradigmas de formação
que promovam a preparação de professores reflexivos, que
assumam a responsabilidade do seu próprio desenvolvimento
profissional e que participem como protagonistas na
implementação das políticas educativas. (NÓVOA, 1995, p.29)

O que precisamos deixar claro aqui, é que esses textos políticos


representam a política. E essas representações podem ser variadas, seja a
partir da própria leitura do documento oficial, ou a partir de leituras de outros
autores sobre os textos oficiais, o que pode gerar contradições, tendo em vista
que são leituras de outras pessoas, com outras visões sobre determinado texto
(MAINARDES, 2006). Esse diálogo em sala de aula abre um leque de
possibilidades e compreensões sobre como analisar e realizar uma leitura
coerente sobre esses documentos, essas políticas que auxiliaram no
planejamento educacional. Assim, “Os textos políticos são o resultado de
disputas e acordos, pois os grupos que atuam dentro dos diferentes lugares da

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produção de textos competem para controlar as representações da política”
(Bowe et al.,1992).
Desse modo, segundo Ball (1992) é a prática que possibilitará um
diferencial, pois a política não será simplesmente implementada, ela será
recriada, a partir da interpretação da mesma “recriação e onde a política
produz efeitos e consequências que podem representar mudanças e
transformações significativas na política original” (MAINARDES, 2006; p. 7).
Levantamos um questionamento pertinente para que os acadêmicos 740
pudessem refletir sobre a temática. Qual o papel da escola, compreendendo
que essa Base acarretará mudanças,

O papel da escola? Ela é um local onde vamos formar


cidadãos críticos, um local de formação, é sistematizado,
porque está ali com uma intencionalidade. Então é muito
importante para criança ter bons professores pra formar
(Acadêmico, 3° período).

A escola tem um papel muito importante na sociedade, pois é


neste espaço que existe a troca de conhecimentos entre
professor e aluno. É neste local que os educadores vão além
de se repassar os conteúdos, eles têm a possibilidade de
transformar esses sujeitos em pessoas consciente e
responsáveis para mudar a realidade que vive (Acadêmico, 7°
período).

A escola é um espaço de formação de identidade, é um


espaço também de transmissão de cultura, de identidade
também, é um espaço não só de construção de conhecimento,
é de construção da pessoa como cidadã, como um ser social
(Acadêmico, 2° período)

A partir das respostas nos questionamos, será que a Base Nacional


Comum Curricular possibilitará todas essas questões colocadas pelos
acadêmicos? Tendo em vista que em seu processo de implementação,
agentes sociais privados aparecem buscando interferir com “perspectivas de
maior controle sobre os currículos'' (MACEDO, 2014, p.1533). De acordo com
Macedo (2014):

Fundações ligadas a conglomerados financeiros como Roberto


Marinho, Victor Civita, Airton Senna e Lemann, empresas

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como Natura, Gerdau e Volkswagen, grupos educacionais
como CENPEC e “movimentos” como o Todos pela Educação
são alguns dos exemplos (p.1533).

Tomando-se o Instituto Natura como exemplo, lê-se:

O instituto Natura apoia a concepção De um Currículo Nacional


por meio do diálogo entre parceiros, profissionais da educação
e o Ministério da Educação, contribuindo para o movimento de
catálise entre os projetos já existentes e a produção de uma
solução inovadora para a construção da proposta curricular. 741

Nesse sentido, as dimensões de suas propostas representam interesses


financeiros que perpassam no espaço escolar, ao nortear questões
curriculares, influenciando o processo de ensino-aprendizagem, por sua
abrangência interdisciplinar. Assim, a BNCC não está voltada para as
perspectivas de formação de identidade, por estar desenvolvida por um
modelo top-down de política, que não abrange com firmeza as perspectivas
regionais em consonância com as globais.
No que refere-se ao reconhecimento dos discentes enquanto futuros
profissionais é constituída ao longo da vida num processo inacabado, contínuo
e mutável. Nesse sentido, os "estudantes deveriam ser estimulados, nessa
perspectiva, a explorar as possibilidades de perturbação, transgressão e
subversão das identidades existentes" (SILVA, 2000, p.100), para que possam
respeitar as dimensões multiculturais nos espaços escolares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ancorados na discussão atual da reforma educacional, buscamos


dialogar neste trabalho a partir das compreensões dos acadêmicos sobre a
Base Nacional Comum Curricular, entendemos que esse debate e leitura do
material deve ser realizado ainda durante essa formação, tendo em vista as
mudanças que essa política acarretará nas escolas.
A realidade que nos deparamos não é tencionada, muito embora saibamos
que isso demanda um processo de compreensão dos próprios docentes

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formadores, mas no que se trata do próprio contato com o documento oficial
nas narrativas ficou explicito que ainda é muito pouco.
Em suma, não temos uma definição concreta, no sentido de
posicionamento sobre o material que estará sendo implementado nas escolas
no ano de 2019, mas a partir das narrativas e leituras realizadas de outros
materiais que não o oficial, notamos uma inconsonância quanto ao processo
de recontextualização dos futuros pedagogos, pela falta de aprofundamento
deste material. 742

REFERÊNCIAS

AKKARI, Abdeljalil. Internacionalização das políticas educacionais:


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comum curricular. Brasília, DF, 2016. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wpcontent/uploads/2018/06/BNCC_EI_EF_11
0518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em 15 ago. 2018
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CARNEIRO, Moaci Alves. LDB Fácil: Leitura Crítico-compreensiva artigo a artigo.


9.ed Petrópolis: Vozes, 2003. 150p.

MACEDO, Elizabeth. Base Nacional Curricular Comum: novas formas de


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Curriculum, 2014, v. 12, n. 03.

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SILVA, T. T. Identidade e diferença. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2000 p. 73-102.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4. ed. Porto Alegre:
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A REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO NA DÉCADA DE 1990 E A
POLÍTICA EDUCACIONAL: FORMAS DE CONTROLEDA FORMAÇÃO
INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES

Analice Czyzewski | Maria Terezinha Bellanda Galuch | Cleonice Aparecida


Raphael da Silva

RESUMO: Neste artigo refletimos sobre a reforma do Estado brasileiro a partir da


década de 1990, objetivando compreender os fundamentos legais que normatizam e
atuam como meio de controle da formação inicial e continuada de professores e 744
também dos indivíduos em geral. Para compreendermos como são elaboradas as
políticas educacionais para a formação de professores, buscamos elementos na
Resolução n.º 2/2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação
superior em cursos de licenciatura, bem como para a formação continuada de
professores. Observa-se que a Política Educacional não está restrita à legislação;
abarca questões como o planejamento, o financiamento e a influência de organismos
internacionais. Nesse sentido, afirma-se que os objetos e objetivos da reforma
educacional e das políticas dela derivadas são ações distintas, porém interligadas, que
respondem a um contexto sócio- histórico.

Palavras-chave: Reforma do Estado. Formação inicial e continuada de professores.


Teoria Crítica da Sociedade.

INTRODUÇÃO

Neste texto apresentamos reflexões sobre a reforma do Estado 84


brasileiro a partir da década de 1990, de modo a revelar os fundamentos legais
para a formação inicial e continuada de professores, evidenciando que a cada
crise sua o sistema capitalista busca reconfigurações em diversos setores da
sociedade, para atender às novas demandas e conservar a base que o
caracteriza. Para compreendermos as políticas educacionais com vistas à
formação de professores, buscamos elementos na Resolução n.º 2, de 1º de
julho de 2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação
inicial em cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para

84
De acordo com Mézaros (2002), o Estado é um sistema de comando político do capital
indispensável para formar e manter as estruturas reprodutivas e de funcionamento do sistema
capitalista. Tem papel “[...] constitutivo e permanentemente sustentador – deve ser entendido
como parte integrante da própria base material do capital” (MÉZAROS, 2002, p.124-125). O
Estado assegura a coesão ao operar como suporte político, jurídico e administrativo.

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graduados, cursos de segunda licenciatura, bem como para a formação
continuada de professores (BRASIL, 2015). Esse entendimento se faz
necessário para compreendermos como são elaboradas as políticas
educacionais para a formação de professores, as quais atuam como agentes
de controle da sociedade industrial desenvolvida no processo de formação cujo
poder crítico da razão foi perdido (MARCUSE, 1967).

A REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO E AS REFORMAS EDUCACIONAIS 745


A PARTIR DA DÉCADA DE 1990

As décadas de 1970 e 1980 foram um período de crise econômica no


qual ocorreu o desmonte do Estado-Providência nos países centrais. A reforma
do Estado foi tomada como uma das alternativas para superar a tensão, com
vistas ao livre mercado, advogando-se por um “[...] Estado menos proprietário e
interventor na economia e na previdência social, mas não necessariamente
Estado politicamente fraco” (TOLEDO, 2002, p. 82). Os países periféricos,
respondendo à crise, alinharam-se aos países ricos, retirando estrategicamente
o Estado da área social, inclusive da educação, pelo fato de isso se constituir
parte da Política Social. Dito de outra forma, o Estado assegura o Estado
mínimo, com o objetivo de constituir um Estado mínimo para a classe
trabalhadora e um Estado máximo para o capital (PAULO NETTO, 1993), ou
seja, “[...] como todas as instâncias sociais devem se submeter à lógica do
mercado, faz-se necessário um Estado forte para disseminar essa lógica por
toda a sociedade” (CARCANHOLO, 2002, p. 28).
No Brasil, na década de 1980, buscou-se o apoio de empresários,
lideranças sindicais e intelectuais, sendo que a execução ocorreu na década de
1990, com políticas de ajuste estrutural. Essa adesão foi permeada por um
processo de debates em busca de consenso e de coalizão política para
sustentar a proposta que tinha como principal meta reduzir o “custo Brasil”,
para alcançar as condições de inserção do país na economia globalizada. A
bandeira para esse projeto assentou-se na desregulação estatal para viabilizar,

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por meio da livre iniciativa, a expansão do capital. As políticas decorrentes
visaram à

[...] diminuição da participação financeira do Estado no


fornecimento de serviços sociais (incluindo a educação, saúde,
pensões e aposentadorias, transporte público e habitações
populares) e sua subsequente transferência ao setor privado
(TORRES et al., 1997, p.115).

A partir da década de 1990, o Brasil concentrou esforços para redefinir o


746
papel do Estado, com vistas a uma suposta modernização e uma melhoria do
quadro econômico e social, implementando um conjunto de reformas voltado à
redução da participação do Estado nas políticas sociais, campo do qual a
educação é componente constituinte. Essa reforma, considerada condição para
a superação da crise econômica, veio dar resposta à necessidade de
alinhamento às exigências da economia mundial, uma vez que o capitalismo,
sob a forma de organização social, desde sua gênese, passa por sucessivos
embates, quer sejam econômicos, quer sejam sociais, quer sejam políticos, em
estreita relação entre si. As respostas a esses embates, geralmente,
apresentam-se como avanço, todavia, via de regra, são manifestações do
‟poder repressivo do todo” (MARCUSE, 1967, p. 31). Nas palavras de Netto e
Braz (2009, p. 163),
As crises são inelimináveis porque expressam o caráter
contraditório do modo de produção capitalista – em si mesmas,
elas são a demonstração cabal de que esse modo de produção
é constituído e dinamizado por contradições e só se
desenvolve com a reprodução e a ampliação dessas mesmas
contradições.

Diante da estagnação econômica, na década de 1990, para a


recuperação das taxas de lucro, as soluções aventadas pautaram-se na ampla
reestruturação produtiva do sistema que não se restringiu ao âmbito da
produção de mercadorias. Essa lógica passou a fazer parte da vida cotidiana
dos sujeitos, atingindo, inclusive, os processos educativos conduzidos pelas
instituições escolares de diferentes níveis, sob a justificativa de que “A
educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”
(BRASIL, 1996, p.1), observando-se, assim, ‟o transplante de necessidades

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sociais para individuais” (MARCUSE, 1967, p. 29), já que essa passa a ser a
crença não apenas da escola, mas também dos próprios indivíduos.
A flexibilização nos processos produtivos demandou a formação de
trabalhadores polivalentes, que pudessem operar diversos mecanismos para
manter o fluxo da produção.

[...] criou-se, de um lado, em escala minoritária, o trabalhador


‛polivalente multifuncional’ da era informacional, capaz de
operar máquinas com controle numérico e de, por vezes, 747
exercitar com mais intensidade sua dimensão mais ‛intelectual’
(sempre entre aspas). E, de outro lado, há uma massa de
trabalhadores precarizados, sem qualificação, que hoje está
presenciando as formas de part-time, emprego temporário,
parcial, precarizado, ou mesmo vivenciando o desemprego
estrutural (ANTUNES, 2005, p. 32).

Esse cenário de reestruturação produtiva e, por conseguinte, de nova


configuração do tempo e do espaço dos sujeitos, dando novos contornos,
inclusive, às relações entre pessoas, a educação escolar foi convocada a
adequar e a flexibilizar as ações e as práticas pedagógicas no sentido de
atender às políticas públicas educacionais já alinhadas à sociedade industrial
desenvolvida cujas fronteiras físicas e ideológicas se expandem. Os países
capitalistas, guardadas suas peculiares posições de importância e de
participação na economia, no geral, passaram a pautar-se em estudos e
pareceres técnicos emitidos por organismos internacionais para orientar a
implementação de reformas educacionais ajustadas à lógica do mercado
mundial. Como signatário, o Brasil colaborou com o pleito do ajuste estrutural
proposto pelo capital.
Uma vez incluído nesse pacote de reformas e propostas, o Estado
diminui sua participação na área educacional que se torna um solo fértil para os
investidores do chamado “terceiro setor”, ou “terceira via”, “[...] estimulando a
privatização da educação como um serviço e não como um direito social”
(MELO, 2005, p. 407). Esse contexto remete à reflexão de Marcuse sobre a
forma de controle exercida pelo Estado. Segundo o autor:
O govêrno de sociedades industriais desenvolvidas e em fase
de desenvolvimento só se pode manter e garantir quando
mobiliza, organiza e explora com êxito a produtividade técnica,

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científica e mecânica à disposição da civilização industrial. E
esta produtividade mobiliza a sociedade em seu todo, acima e
além de quaisquer interêsses individuais ou grupais
(MARCUSE, 1967, p. 25).

Com o objetivo de ajustar a educação à esfera social, as reformas


educacionais no Brasil, seguindo a mesma direção seguida pelo Estado,
buscaram respaldos técnico e teórico em documentos derivados de
Conferências Internacionais. “Os anos de 1990 registram a presença dos
748
organismos internacionais que entram em cena em termos organizacionais e
pedagógicos, marcados por grandes eventos, assessorias técnicas e farta
produção documental” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 97).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n.º 9.394, de 20 de


dezembro de 1996 (LDB/1996), ao estabelecer a organização da educação
nacional, destaca no Art. 8º que ‟a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de
ensino” (BRASIL, 1996a), consubstanciando as condições legais necessárias à
reforma.

Neste cenário, delineou-se a reforma educacional, cujo vetor


principal foi uma nova organização do sistema nacional, que se
caracterizou pela municipalização do provimento do ensino
fundamental, pela implantação de parâmetros curriculares e de
um sistema de avaliação institucional comum para todo o país
(KRAWCZYK; VIEIRA, 2008, p. 52).

Estabelecida via legislação, efetivou-se a descentralização das


obrigações do Estado que passou a operar em “regime de colaboração” com os
entes federados. Na América Latina, a descentralização é uma característica
das reformas educacionais, sendo que no Brasil atingiu também a distribuição
dos recursos financeiros para custear a educação. A Lei n.º 9.424, de 24 de
dezembro de 1996, dispôs sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), perfazendo
um processo de redistribuição dos recursos vinculados à quantidade de alunos
matriculados em cada município (BRASIL, 1996b).

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A reflexão sobre a reforma do Estado brasileiro permite-nos afirmar que
se trata de uma reforma de limites globais que adotou medidas no intuito de dar
respostas à crise do capital. Mediante essa demanda, o Estado construiu as
políticas públicas para suprir as supostas necessidades da sociedade.

As políticas públicas são regulamentadas por um conjunto de


princípios, diretrizes, objetivos e normas de caráter permanente
e abrangente, que direcionam a ação do poder público. [...]
Ocorre que as políticas públicas não são vias de mão única, 749
em que o Estado atua sobre a sociedade, mas meios pelos
quais a sociedade pode interferir nas agendas dos estados
(NOMA; BARBIERI, 2017, p. 28).

Isso se aplica também às políticas educacionais que, desencadeadas


pelo Estado, organizam os processos educativos institucionalizados. Essa
reflexão nos conduz ao entendimento de que a Política Educacional brasileira
buscou adequar-se a uma complexa relação de interdependência e de
influência que combina lógicas do capital em âmbitos global, nacional e local.
Nesse contexto, a formação inicial e continuada de professores também
passou por ajustes e adequações.

A ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NACIONAL E AS DIRETRIZES


CURRICULARES NACIONAIS PARA A FORMAÇÃO INICIAL E
CONTINUADA NOS CURSOS DE LICENCIATURA

A educação nacional organizou sua estrutura a partir de dois marcos


regulatórios, que são subsequentes e complementares – a Constituição
Federal de 1988 (CF/1988) (BRASIL, 1988) e a LDB/1996, que se constituem
como bases legais que normatizam e definem a organização da educação. A
CF/1988 representou a efetivação de um processo histórico de luta pela
democracia social, política e econômica; consolidou os direitos sociais e abriu
possibilidade de participação dos cidadãos nos processos de tomada de
decisão. A educação passou a vigorar como direito de todos sob o princípio da
gestão democrática. De acordo com Dourado (2007), as mudanças decorrentes

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do quadro sócio-político-econômico alteraram os conceitos e objetivos da
educação.
A LDB/1996, de forma complementar, resguardou os princípios
constitucionais e estabeleceu e regulamentou as diretrizes e bases para
funcionamentos dos sistemas de ensino em todas as esferas da federação.
Apesar das incongruências que podem ser observadas no contexto e na
aprovação desses marcos regulatórios, eles são fundamentais para a
compreensão do funcionamento e da organização da educação e da Política 750
Educacional.
A Política Educacional compreende “ideias, expectativas e tendências de
ação na esfera pública”, sobretudo ações governamentais, ou seja, as políticas
educacionais expressam a multiplicidade de fatores de um dado contexto
histórico; em sentido amplo, a política pública está ligada ao governo em ação
(VIEIRA, 2007). A compreensão acerca dessa dinâmica possibilita a
visualização da educação de seus processos na esfera da macro e da micro
estruturas do sistema de ensino.
A educação é parte da Política social e integra-se a um projeto de
formação para a sociedade em geral. Neste estudo, compreende-se a
educação “[...] enquanto prática social que se dá nas relações sociais que os
homens estabelecem entre si, nas diversas instituições e movimentos sociais,
sendo, portanto, constituinte e constitutiva dessas relações” (OLIVEIRA;
MORAIS; DOURADO, 2007, p. 2). Dessa forma, a escola ao desempenhar sua
função social estreitamente vinculada à formação dos sujeitos deve organizar-
se para “[...] articular as concepções, a organização dos processos e dos
conteúdos educativos na escola e, mais amplamente, nas diferentes esferas da
vida social, aos interesses de classes” (FRIGOTTO, 1999, p. 25).
Assim, pode-se afirmar que a função social da escola adequou-se ao
que é fundamental para a manutenção da hegemonia da sociedade industrial
desenvolvida, embora sua racionalidade dá mostras de que seu objetivo sua
manutenção implica igualmente a permanência da desigualdade, todavia sob a
crença de que a possibilidade de consumo significa igualdade entre os
homens. Ao assumir a oferta de uma formação que se pauta pelos princípios

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da flexibilidade, competitividade e eficácia, obscurece a formação que poderia
contribuir para a observação crítica das contradição e para a visualizar a
possibilidade de ruptura social.
No que tange à formação inicial e continuada de professores também
houve adequação às mudanças decorrentes do processo da reforma do
Estado. As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em
Pedagogia (DCNCP), aprovada em 15 de maio de 2006, ampliou as funções do
profissional formado nesse curso de licenciatura (BRASIL, 2006). Essa 751
ampliação possui uma representação ambígua; por um lado, existe a
ampliação dos espaços de atuação do pedagogo para além da docência,
contemplando-se a gestão educacional e a área de serviços com consultorias e
produção de materiais didáticos; por outro lado, atende às demandas
exclusivas do setor produtivo. Uma vez que a reforma do Estado possibilitou a
entrada dos setores privados e das organizações não governamentais na área
da educação, pode-se observar que a flexibilização dos processos produtivos
transpõe-se como possibilidade de “novos mercados”, colocando a educação
no setor de serviços a ser explorada como mercadoria; dessa forma, há um
esvaziamento no sentido da função do pedagogo com relação à formação
humana, pois passou a privilegiar os aspectos técnicos e instrumentais.
É tarefa dos cursos de formação inicial promover as bases teóricas e
práticas para ofertar uma formação que integra a docência, a gestão, a
avaliação dos sistemas e das instituições de ensino, a elaboração, a execução
e o acompanhamento de programas e atividades educativas (FERREIRA,
2006). A Resolução CNE/CP n.º 2 de 2015 destaca a importância da formação
dos profissionais do magistério para a educação básica como fator
indispensável para o projeto da educação brasileira e reconhece a
“abrangência e a complexidade da educação em geral e da educação escolar”.
Dentre os princípios destacados para a formação dos profissionais do
magistério encontra-se “[...] a articulação entre a teoria e a prática no processo
de formação docente, fundada no domínio dos conhecimentos científicos e
didáticos, contemplando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão” (BRASIL, 2015, p. 4).

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As diretrizes também definem a estrutura curricular para a formação
inicial. Em linhas gerais, os cursos de licenciatura em Pedagogia deverão
cumprir 3200 horas de trabalho acadêmico com duração mínima de quatro
anos. Desse montante, 400 horas destinam-se ao estágio curricular
supervisionado na área de formação e atuação na educação básica. De
acordo com o Art. 13 § 6º, “O estágio curricular supervisionado é componente
obrigatório da organização curricular das licenciaturas, sendo uma atividade
específica intrinsecamente articulada com a prática e com as demais atividades 752
de trabalho acadêmico” (BRASIL, 2015, p.12). Além do estágio supervisionado,
deverão ser ofertadas 200 horas destinadas a atividades teórico-
práticas,objetivando:

[...] a familiarização com o exercício da docência e da


organização e gestão pedagógica, a participação em pesquisas
educacionais, as opções de aprofundamento de estudos e a
realização de trabalhos que permitam ao graduando articular,
em diferentes oportunidades, idéias e experiências,
explicitando reflexões, analisando e interpretando dados, fatos,
situações, dialogando com os diferentes autores e teorias
estudados (BRASIL, 2006, p.13).

No entanto, mesmo que a relação teoria-prática seja enfatizada, ainda


prevalece a oferta de um currículo pautado no

[...] esquema de superioridade dos conhecimentos disciplinares


sobre os conhecimentos didáticos metodológicos de ensino,
sendo o processo formativo vigente fragmentado em disciplinas
estanques, sem interlocuções transversais [...] tem-se então, o
conhecimento da ciência isolado do conhecimento pedagógico-
educacional [...] (LIBÂNEO, 2013, p. 96).

É por meio dos elementos presente no contexto histórico que


podemos visualizar a atual Política Educacional, sua estrutura e seu
funcionamento. Dessa forma,

A racionalidade financeira é a via de realização de uma política


educacional cujo vetor é o ajuste aos desígnios da globalização
através da redução dos gastos públicos e diminuição do
tamanho do estado, visando a tornar o país atraente ao fluxo
do capital financeiro internacional (SAVIANI, 2016, p. 205).

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As questões tratadas até aqui possibilitam-nos retomar a reflexão sobre
os marcos regulatórios da educação nacional, ou seja, a CF/1998 e a
LDB/1996, que, aprovadas sob a bandeira democrática, apresentaram-se como
avanços na área social. Todavia portam incongruências gestadas no próprio
contexto sócio-histórico na busca de adequar e ajustar o Estado às normativas
e às prescrições da economia mundial, retirando recursos e investimentos da
área social para consolidar a ideologia do Estado mínimo.
753
CONCLUSÃO

A Política Educacional não está restrita à legislação, abarca questões


como o planejamento, o financiamento e a influência dos organismos
internacionais. Nesse sentido, as políticas em educação são amplas;
“Abrangem, pois, desde a sala de aula até os planos de educação de largo
espectro” (VIEIRA, 2007, p. 58); expressam as decisões do poder público nas
diferentes esferas – União, Estados e Municípios – regulamentadas via
legislação.
No que tange às reformas educativas, a política social que orienta as
políticas educacionais caracteriza-se pela implantação de programas
focalizados, de cunho compensatório, com duração limitada e complementar,
em um esforço para manter na escola aqueles que estão em risco social, por
conta da exclusão do mercado de trabalho. “[...] Assim, a universalidade das
políticas foi transformada no rebaixamento das necessidades humanas à sua
expressão emergencial, objetivando atenuar as despesas do Estado” (NOMA;
BARBIERI, 2017, p. 35).
Com as reflexões apresentadas no decorrer deste texto, podemos
afirmar que os objetos e os objetivos da reforma educacional e das políticas
dela derivadas não são neutros ou meramente técnicos; é na tessitura do
conjunto de fatores econômicos, políticos e sociais que os percebemos como
ações distintas, mas interligadas e respondem ao contexto sócio- histórico de
dado período.

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simples. RBPAE, Porto Alegre, v. 23, n.1, p.53-69, jan./abr. 2007.

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“AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE NA PERSPECTIVA DO
EXAME NACIONAL DE AVALIAÇÃO DO MAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
BÁSICA (ENAMEB): TECENDO REFLEXÕES SOBRE OS DISCURSOS
DESSA POLÍTICA NA FORMAÇÃO E TRABALHO DOS PROFESSORES
BRASILEIROS”

Thais de Souza Dias da Rosa, ProPEd/UERJ

RESUMO: Na atualidade, os países da Iberoamérica vêm debatendo e expandindo


756
políticas de avaliação do desempenho direcionadas à docência. Estas por sua vez
buscam não somente avaliar o trabalho dos professores, mas também certificar e
significar os seus currículos de formação inicial / continuada. A partir da leitura do
Projeto de Lei Nº 6114/09 que prevê a instituição e desenvolvimento do “Exame
Nacional de Avaliação do Magistério da Educação Básica” (ENAMEB) em território
brasileiro, trago para análise alguns discursos presentes nessa proposta, dentre eles:
articulação dos conteúdos avaliados com uma base nacional comum de currículo para
a Educação Básica e relação da certificação docente com a qualidade da formação
inicial e suas atualizações pedagógicas. O objetivo desse artigo é refletir os possíveis
desdobramentos desse exame na formação e carreira do magistério, apoiada nas
contribuições da hegemonia trazidas pela Teoria do Discurso de Ernesto Laclau e
Chantal Mouffe (2015) em conjunto com trabalhos desenvolvidos nas áreas de
currículo e avaliação.
Palavras-chaves: políticas de currículo; avaliação do desempenho; docência;
Enameb.

INTRODUÇÃO
Os sistemas educativos, de modo particular na América Latina, têm
padecido, nos últimos vinte anos, de uma série de políticas que
formalmente se ostentam como políticas de qualidade a partir das
quais se multiplicaram os programas e mecanismos de avaliação em
todos os níveis e campos do sistema de ensino. (BARRIGA, 2014,
p.147)

Como já apontado por Barriga na epígrafe desse artigo, em meio a


multiplicidade de programas e mecanismos de avaliações presentes na
América-Latina desde a década de 90 para o alcance da qualidade na
educação, a avaliação do desempenho docente é uma temática que vem
ganhando projeção no Brasil, sobretudo nas políticas direcionadas a formação
e ao trabalho dos professores.

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Dentre as propostas para a avaliação do professorado brasileiro,
encontra-se o Projeto de Lei (PL) de número 6114/09 que prevê a instituição e
desenvolvimento do “Exame Nacional de Avaliação do Magistério da Educação
Básica” (ENAMEB). Este por sua vez é um texto legislativo originário do
Senado Federal, com autoria do senador Wilson Matos da Silva, 85 filiado ao
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), representando o estado do
Paraná (PR). Seu conteúdo já foi aprovado pela Comissão de Educação (CE)
da Câmara Federal e está em trâmite (caráter conclusivo) na Câmara dos 757
Deputados do Congresso Nacional. No momento, a análise do teor das
propostas avaliativas aguarda o parecer da permanente Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) do Senado Federal.
Em linhas gerais, esta política visa [...]” aprofundar uma tendência
observada no cenário internacional em benefício da qualidade da educação.”
(BRASIL, 2007, p.04) A tendência citada encontra afinidade com as demandas
de “capacitação / certificação da formação inicial e continuada dos professores”
e “avaliação do desempenho docente” para o alcance da qualidade na
educação, identificadas no documento: Miradas sobre la educación en
Iberoamerica: Desarrollo profesional docente y mejora de la educación, da
86
Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), 2013.
Embora não discuta tais demandas neste trabalho, julgo importante
trazê-las para a contextualização da discussão proposta. Ao fazer parte dos
Estados-nação membros da OEI, o Brasil acaba por se aproximar com os
discursos desse organismo internacional em prol da avaliação do desempenho
docente, ressignificando os em suas propostas avaliativas, dentre elas: o
ENAMEB.

85
Professor. Proprietário e reitor do Centro Universitário Cesumar (atuante na área de
Educação à Distância- EAD, com ofertas de cursos para graduação e pós-graduação). Exerceu
02 (dois) mandatos no Senado Federal como 1º suplente do senador Álvaro Dias, durante os
meses de abril a julho do ano 2007 e agosto a dezembro de 2014.
86
Organismo internacional de caráter governamental para a cooperação entre os países Ibero-
americanos, nos campos da educação, ciência, tecnologia e cultura, no contexto do
desenvolvimento integral, da democracia e da integração regional. As nações da Península
Ibérica e da América Latina, cujas populações falam português e espanhol , fazem parte da
OEI , sendo composta por: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba,
República Dominicana, Equador, El Salvador, Guiné Equatorial, Guatemala, Honduras, México,
Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Portugal, Porto Rico (protetorado dos Estados Unidos),
Espanha, Uruguai e Venezuela.

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Nessa perspectiva entendo que o “discurso não se reduz a linguagem,
mas abarca o conjunto da vida humana social significativa, incluindo a
materialidade das instituições, práticas e produções econômicas, políticas e
linguísticas.“ (LOPES, 2012, p.21) A autora ainda chama atenção para o fato
de que “é pelo discurso também concebido como prática, que significamos e
somos significados.” (p.21)
É válido ressaltar que ao considerar os discursos do ENAMEB como
práticas de significação, me distancio de visões estruturantes e totalizantes 758
baseadas em fundamentações sólidas, aproximando-me do pensamento pós-
estruturalista, ao compreender que “não há como representar plenamente o
todo social, significar a sociedade de uma vez por todas”. (LOPES, 2012, p.21)
Dessa forma, “entender a ação política [...] é entende-la a priori como uma
articulação não naturalizada, não essencialista que fixa provisoriamente os
sentidos das relações sociais” (CRITCHLEY, 2008, p.146, tradução livre). 87
A escolha desta política para a realização deste trabalho é devido à
crescente centralização da avaliação nas propostas educacionais voltadas para
a docência e sua correspondência (direta e/ou indireta) com processos de
acreditação /certificação dos currículos de formação inicial / continuada,
verificação das habilidades e competências para o alcance dos objetivos
estipulados pelos sistemas de ensino , incentivos salariais , avanços verticais /
horizontais , exoneração da carreira mediante resultados avaliativos e
responsabilização docente para o alcance da qualidade na educação.
Assim, tenho por objetivo fazer uma problematização acerca dos
discursos desta política para a avaliação dos professores brasileiros, refletindo
sobre os seus possíveis desdobramentos nos currículos de formação
inicial/continuada e na carreira do magistério. Desse modo, discuto alguns
pontos presentes no ENAMEB, utilizando a metodologia da análise documental
ao “[...] identificar informações factuais nos documentos a partir de questões e
hipóteses de interesse” (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI,2009, p.3).
Para a análise dos discursos selecionados e a discussão dos seus
sentidos, utilizo ao longo do texto, trabalhos realizados nos campos de
87
Tradução livre devido a indisponibilidade do livro em Língua Portuguesa.

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currículo e avaliação, dentre eles: Lopes e Macedo (2011), Pereira, Costa e
Cunha (2015), Bonamino e Sousa (2012), juntamente com as contribuições da
Teoria do Discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe (2015), sobre a
constituição da hegemonia.
No campo do currículo é notável a expansão de trabalhos que
focalizam a discussão da avaliação docente, como é o caso do artigo: “Políticas
de currículo e avaliação para a docência no espaço Iberoamericano” (DIAS,
2016). Neste é apresentado uma reflexão do discurso de centralidade da 759
formação/trabalho docente como garantidora da aprendizagem dos alunos /
alcance da qualidade educacional, identificado nos textos políticos da OEI e
UNESCO, no período de 2001 a 2013. Apoiada na Teoria do Discurso de
Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, a autora faz uma análise dos processos de
articulação discursiva em defesa da avaliação do professorado na Ibero-
América, dando ênfase ao significante “desempenho”, como foco dos
procedimentos avaliativos. Nessa perspectiva, as competências (por exemplo:
aprender a aprender)88assumem importância como modelo de organização
curricular dos cursos de formação inicial/continuada dos professores.
Ao longo deste trabalho, Dias (2016) argumenta que os organismos
internacionais vêm defendendo a produção de políticas de avaliação no esforço
de verificar não somente a atuação dos professores em sala de aula, mas
também os conteúdos curriculares dos cursos de formação inicial / continuada
do magistério. Entre as conclusões, a autora chama a atenção para a projeção
de novos papéis na docência marcados pela responsabilização. Estes por sua
vez, oriundos do controle da formação e trabalho dos professores.
Em relação aos limites desse texto é importante colocar que por ser
ainda uma política de avaliação em discussão (embora já aprovada,
aguardando o parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania -
CCJC), não foi possível trazer para análise e debate artigos, dissertações e

88
Competência ao meu ver, influenciada pelos 4 pilares da educação (“aprender a conhecer”;
“aprender a fazer”; “aprender a conviver” e “aprender a ser”) da UNESCO. Estas por sua vez,
estão presentes no Relatório Delors. Para mais detalhes, recomendo a visita ao link:
http://unesdoc.unesco.org/images/0010/001095/109590por.pdf Acesso: 04 out.2018

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teses que focalizam o ENAMEB em si, a fim de enriquecer e adensar a
discussão aqui realizada. –

RELAÇÕES DO ENAMEB COM O CONHECIMENTO E SUAS ARTICULAÇÓES


COM A CENTRALIZAÇÃO DO CURRÍCULO, CULTURA, QUALIDADE NA
EDUCAÇÃO E TRABALHO DOCENTE

O Exame Nacional de Avaliação do Magistério da Educação Básica


(ENAMEB) é uma política de avaliação que tem por objetivo: 760

Aferir o desempenho dos docentes no exercício efetivo do magistério,


suas habilidades e competências para ajustamento à evolução do
conhecimento e para compreensão de temas externos ao âmbito
específico de sua profissão, relativos à realidade nacional e
internacional e a outras áreas do saber. (BRASIL, 2009, p.06)

Compreendo que o objetivo desta proposta avaliativa se encontra


articulado (ainda que indiretamente) com a acreditação/certificação e
formulação dos currículos de formação inicial/continuada da docência, na
medida em que ressalta a necessidade de ajustamento do conhecimento (não
somente dos temas ligados ao campo pedagógico, mas também de outras
áreas do saber, como as tecnologias, por exemplo) para a aprimoração do
trabalho dos professores e melhorias no ensino.
Embora o trecho destacado afirme a necessidade da evolução dos
saberes em uma lógica evolucionista, o ENAMEB não deixa explícita a
concepção de conhecimento que defende. A partir da leitura desta política,
entendo que os conteúdos a serem avaliados entram em consonância com a
perspectiva instrumental, na medida em que “[...] deve ser capaz de ser
traduzido em competências, habilidades, conceitos e desempenhos passíveis
de serem transferidos e aplicados em contextos sociais e econômicos fora da
escola.” (LOPES, MACEDO, 2011, p.74)
Em relação aos conhecimentos a serem futuramente avaliados por esse
exame é dada ênfase na verificação dos conteúdos, metodologias didáticas
(como ensinar?), neurociência e habilidades. Estas, por sua vez, são colocadas
de forma vaga no texto, não tendo uma definição precisa de quais saberes
seriam esses.

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Em contrapartida, pude observar a articulação do ENAMEB com os
conteúdos curriculares previstos na Base Nacional Comum (BNC). Esta
encontra-se presente no Art. 3, parágrafo 4:

As provas do ENAMEB terão uma parte geral, comum ao conjunto de


participantes, de acordo com as respectivas etapas ou modalidades
de exercício docente, articulada com a base nacional comum dos
currículos da educação básica, e uma parte específica, de modo a
atender às peculiaridades dos Estados e regiões do País. (BRASIL,
2009, p.12) 761

No artigo acima, a articulação do ENAMEB com a verificação dos


conhecimentos, habilidades e competências previstas na organização da Base
Nacional Comum Curricular (BNCC)89 para a Educação Básica é explícita
(ainda que na elaboração desta proposta avaliativa não houvesse o termo
“curricular” incorporado à BNC90). A relação entre a centralização curricular em
uma base única (tanto em sua parte comum quanto na diversificada) com o
exame analisado, trazem para reflexão a avaliação e sua conexão com a
centralização do currículo, nas diferentes modalidades de ensino.
Considero que a centralidade da avaliação nas políticas educacionais
voltadas para o magistério é intimamente articulada com os modos de se fazer
e pensar o currículo / trabalho dos professores. Dessa forma, encontra-se em
disputa e discussão quais os conteúdos que devem estar presentes nos cursos
de formação e, consequentemente, os sentidos a eles atribuídos. Para Lopes
(2004):
Os sistemas de avaliação centralizada nos resultados articulam-se ao
currículo por competências e configuram uma cultura de julgamento e
de constantes comparações dos desempenhos, visando controlar
uma suposta qualidade (p.114).

89
Convém sublinhar que em 2009, mesmo ano da consolidação do ENAMEB como Projeto de
Lei de Nº 6114/09, “a defesa de diretrizes curriculares nacionais e de bases comuns para o
currículo foi retomada e [...] o MEC lançou o Programa Currículo em Movimento, com ampla
participação de membros da comunidade acadêmica do campo do currículo. “ (MACEDO,
2014, p.1534) Para mais informações sobre este programa, recomendo o link:
http://portal.mec.gov.br/programa-curriculo-em-movimento-sp-1312968422 Acesso: 04 out.
2018
90
Esta sigla refere-se ao modo que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) era
denominada no período de elaboração do ENAMEB.

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A partir da consideração da autora sobre os sistemas de avaliação,
entendo que a centralização dos procedimentos avaliativos na docência se dá
mediante a busca pela qualidade da educação, realizada através da verificação
da eficácia, fiscalização e controle dos conteúdos disciplinares, entrando em
compatibilidade com o pensamento curricular de Ralph Tyler. Este por sua vez
[...] “se baseia na definição de metas / objetivos e de formas de verificação de
sua consecução, secundada pela proposição de experiências que facilitem seu
domínio” (LOPES, MACEDO, 2011, p.44). 762
Convém sublinhar que a avaliação concebida nos princípios tylerianos
ainda pode ser percebida nos documentos educativos contemporâneos, pois
“diferentes aspectos da racionalidade tyleriana estão até hoje presentes em
várias propostas curriculares. A estrutura: objetivos/experiências de
aprendizagem / avaliação91é talvez ainda a mais utilizada” (LOPES; MACEDO,
2011, p. 50).
No tocante as dimensões culturais trazidas pelo ENAMEB concordo com
as concepções de Lopes e Macedo (2011) ao compreender o currículo como
um discurso que é produzido no entrelaçamento de diferentes discursos sociais
e culturais. Ao reiterar os sentidos discursivos postos pelas sociedades, esta
política de avaliação acaba por atribuir novos significados as culturas e
consequentemente, aos conteúdos curriculares, a partir daquilo que se
pretende ser alcançado.
Por ser desenvolvido em cooperação com os sistemas de ensino da
União, Distrito Federal, Estados e Municípios brasileiros, os seguintes
discursos me chamaram a atenção na leitura do ENAMEB:

É indispensável que a formação recebida por tais profissionais seja


objeto de uma avaliação nacional sistemática e periódica. Trata-se de
estabelecer uma porta de entrada para o exercício profissional do
magistério que assegure o nível da formação recebida e sua
permanente atualização. (BRASIL,2009, p.04)

91
É considerada tanto para a verificação da qualidade de ensino dos sistemas educativos da
Educação Básica, quanto para a acreditação e certificação dos docentes atuantes e/ou
ingressantes no magistério e a avaliação dos currículos das instituições de ensino superior, por
advento dos resultados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) e em
breve também, pelo Exame Nacional de Avaliação do Magistério da Educação Básica
(ENAMEB).

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A existência de um exame nacional de certificação constituirá um
marco de padrão de qualidade para ingresso na carreira, bem como
induzirá positivamente à melhoria da qualidade dos cursos de
formação inicial. (BRASIL,2009, p.04)

Nos fragmentos selecionados percebo a relação da certificação docente


com a qualidade dos currículos de formação inicial e suas atualizações
pedagógicas ao longo da carreira, mediante processos de avaliação do
desempenho.
763
Sendo a qualidade um termo recorrente nas políticas educativas,
principalmente naquelas que relacionam e defendem que as [...] “iniciativas de
avaliação associam-se à promoção da qualidade do ensino” (BONAMINO;
SOUZA, 2012, p.375), duas questões se colocam para reflexão: 1) que sentidos
de qualidade estão sendo produzidos por esses discursos? 2) Quais sujeitos
pretendem atingir?
Por intermédio das leituras da Teoria do Discurso de Ernesto Laclau e
Chantal Mouffe (2015) e de trabalhos do campo curricular que operam com este
referencial teórico-metodológico, dentre eles , o artigo: “Sentidos de qualidade
nas políticas de currículo” (2003-2012), das autoras Danielle Matheus e Alice
Casimiro Lopes (2014) , considero o termo “qualidade” como um significante
vazio (particular que se pretende universal e, portanto, hegemônico) ao ser
legitimado pelo seu amplo alcance, na medida em que todos defendem a
qualidade na educação, independentemente da situação social, econômica,
cultural, dentre outros. Para Laclau e Mouffe, a hegemonia é interpretada “[...]
como uma operação discursiva que aspira à universalização de um discurso
específico, buscando fixar sentidos, de forma a alcançar a plenitude que falta ao
social.” (COSTA; PEREIRA, 2013 apud PEREIRA, COSTA, CUNHA, 2015,
p.465) Desse modo , os processos hegemônicos são sempre provisórios,
precários e contingentes , na medida em que “os diferentes sentidos atribuídos
aos significantes precisam ser permanentemente negociados em condições
específicas” (PEREIRA, COSTA, CUNHA, 2015, p.465)
Em relação ao trabalho docente, o ENAMEB prevê “[...] o
desenvolvimento de planos de carreira que de fato contemplem a valorização do

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magistério a partir da dimensão que lhe é mais importante: sua competência
profissional.” (BRASIL, 2009, p.4)
Apesar de não estar explícito o que este exame compreende por
“competência”, entendo-a indiretamente relacionada com a responsabilização e
fortemente marcada pela performatividade. A primeira delas ocorre quando os
resultados avaliativos “revelam o lugar que os profissionais da educação ocupam
nesta, ora como vilões que são chamados à responsabilização, ora como heróis,
que merecem ser premiados e gratificados” (PASSIONE, 2014, p.427) Já a 764
segunda, mostra-se presente quando “os desempenhos (de sujeitos individuais
ou organizações) servem como medidas de produtividade e rendimento ,ou
mostras de “qualidade” ou ainda “momentos” de promoção ou inspecção”
(BALL,2002,p.04)
Ao defender uma valorização da carreira docente via competências (lê-
se alcance dos resultados estipulados, seja pela avaliação e/ou objetivos
previstos nas habilidades e competências da Base Nacional Comum Curricular
da Educação Básica) esse discurso do ENAMEB aproxima-se da lógica
gerencialista. Esta por sua vez, vez conquistando cada vez mais espaço nas
políticas educacionais, ao permitir não somente a regulação do trabalho dos
professores, mas também a prestação de contas à sociedade (accontability)
mediante a divulgação dos resultados avaliativos, que no caso deste exame
serão:
[...] encaminhados aos sistemas de ensino de modo detalhado que
demostre o desempenho e os níveis de domínio dos conteúdos., por
áreas do conhecimento, dos respectivos docentes para fins de
planejamento e execução de programas de formação continuada”
(BRASIL, 2009, p.16)

Por fim, convém sublinhar que a participação docente no ENAMEB


possuí caráter voluntário e gratuito. Entretanto, os sistemas educativos poderão
utilizar os resultados dessa avaliação para processos de seleção dos
professores, bem como a inserção destes em programas de avaliação dos
conhecimentos (para a otimização da formação) e critério para progressão na
carreira.

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CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
Por ser uma política que ainda será colocada em prática no Brasil, não
considero ser possível fechar esse trabalho em considerações finais
Desse modo, ressalto a relevância e o adensamento das discussões
sobre o ENAMEB no campo curricular brasileiro, pois entendo que o
conhecimento dessa proposta avaliativa pode auxiliar a compreender os
possíveis efeitos nos encaminhamentos presentes e/ou futuros da docência,
não somente a nível local, mas também nacional. 765

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PEREIRA, Talita Vidal; COSTA, Hugo Heleno Camilo.; CUNHA, Érika Virgílio
Rodrigues da Cunha. Uma base à Base: quando o currículo precisa ser tudo.
Revista Educação Pública. Cuiabá, v. 24, n. 56, p. 455-469, maio/ago. 2015.
Disponível em:
http://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/educacaopublica/article/view/23
77 Acesso: 04 out. 2018
SÁ-SILVA, Jackson R.; ALMEIDA, Cristóvão D. de; GUINDANI, Joel F.
Pesquisa documental: pistas teóricas e metodológicas. Revista Brasileira de
História & Ciências Sociais, ano. 1, n. 1, jul.2009, p-1-15. Disponível em:
https://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:O1Ays_cPopQJ:schola
r.google.com/+an%C3%A1lise+documental+metodologia&hl=pt-
BR&as_sdt=0,5&as_vis=1 Acesso: 04 out.2018

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


curriculares no PNE (2014-2024) e desdobramentos (neo)conservadores: tensões, desafios e
resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
237-1438-3
REFLETINDO SOBRE A PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE NO
CURSO DE QUÍMICA-LICENCIATURA NA CIDADE DE CARUARU-PE

Geysiele Gomes Lima | Girleide Tôrres Lemos

RESUMO: Este trabalho se insere no debate sobre a contribuição do projeto de


interiorização das universidades na construção da profissionalização docente.
Trazemos neste trabalho as primeiras discussões do projeto de pesquisa que tem
como um dos seus objetivos identificar as motivações que levaram os estudantes
escolher o curso de Química-Licenciatura, e a partir destas discutir como o 767
componente curricular de Estágio Supervisionado tem contribuído para sua
profissionalização docente. Para tanto, realizamos a discussão sobre o conceito de
profissionalização docente a partir dos estudos de Bourdoncle (1991), entre outros,
articulados aos estudos de Libâneo (2013) sobre a Abordagem Crítico-Social dos
Conteúdos. Fizemos um estudo exploratório com os graduandos do curso que estão
nos períodos finais normativos do curso. A partir das primeiras análises, fomos
levados a refletir que o ingresso dos licenciando foi marcado por interesses que em
sua maioria não adivinha do interesse pela docência, mas o interesse estava na
identificação com a área de química. Contudo, ao serem indagado se ao concluírem o
curso pretendiam ser docentes, tivemos a maioria das justificativas apontando pelo
interesse em desenvolver a profissão docente.

Palavras-chave: Profissionalização docente. Curso de Química-Licenciatura.


Formação docente em Química.

INTRODUÇÃO

Este trabalho se insere no debate sobre a contribuição do projeto de


interiorização das universidades na construção da profissionalização docente.
Tomamos como referência o curso de Química-Licenciatura, no Centro
Acadêmico do Agreste, Universidade Federal de Pernambuco, localizado na
cidade de Caruaru-PE.
Trazemos neste trabalho as primeiras discussões do projeto de pesquisa
que tem como propósito identificar as motivações que levaram os estudantes
escolher o curso, e a partir destas discutir como o componente curricular de
Estágio Supervisionado tem contribuído para sua profissionalização docente.
Para tanto, realizamos a discussão sobre o conceito de profissionalização
docente a partir dos estudos de Bourdoncle (1991), entre outros, articulados
aos estudos de Libâneo (2013) sobre a Abordagem Crítico-Social dos

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Conteúdos. E por fim, apresentamos os primeiros dados da pesquisa, em
relação as seguintes perguntas: a) o curso de química licenciatura foi a sua
primeira escolha de formação? Por que colocar licenciatura em química? b)
Você pretende seguir a profissão de professor? Nas quais traremos argumento
que remetem a profissionalização docente no curso de Química-Licenciatura.

PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE
768

Inicialmente, cabe tratarmos do conceito de profissão, pois é a luz das


discussões desse conceito que derivam os estudos sobre profissionalização.
Atualmente o termo profissão revela-se num debate sociológico complexo e
ambíguo em relação a seu significado. Teóricos como Barbosa (1993) e
Gonçalves (2006) realizaram estudo sobre a sociologia das profissões e trazem
considerações significativas para um entendimento mais geral sobre esse
debate.
Barbosa (1993) apresenta um panorama das produções teóricas na área
da sociologia das profissões, buscando enfatizar a importância da estruturação
da sociedade em que a profissão se situa, destacando o caráter de
estruturação específica que as profissões promovem no mundo social em
sociedades organizadas em torno de princípios administrativos seguindo uma
racionalidade burocrática.
Com base nesses princípios, o conceito de profissão estava baseado na
visão funcionalista, tendo como uma de suas referências teóricas Parsons,
defendendo que “as profissões são sistemas de solidariedade cuja identidade
se baseia na competência técnica de seus membros, adquirida nas instituições
educacionais e científicas” (BARBOSA, 1993, p. 4). Definindo como profissões
aquelas que atendessem aos seguintes critérios: treinamento técnico formal
com validação do treinamento e da competência do indivíduo; domínio da
racionalidade cognitiva; domínio de uma certa tradição cultural; controle da
profissão sobre o uso responsável dessas qualificações. Estes critérios se
baseiam na centralidade ao conhecimento, tornando as universidades e
instituições de pesquisa o centro da estrutura institucional das profissões.

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Já os estudos de Gonçalves (2006) apontam que os estudos da
sociologia das profissões, no âmbito do movimento revisionista e crítico das
teses funcionalistas, enfatizam questão da natureza, dos modos de
funcionamento e das consequências dos mercados profissionais aspectos que
passavam a integrar as agendas de investigação sobre as profissões. Temos
como uma das referências desses estudos o teórico Eliot Freidson.
De acordo com Bonnelli (1998), Freidson tem sido identificado como um
dos teóricos dos interacionistas simbólicos, embora que o mesmo não se 769
caracterize como tal. Essa caracterização se deu ao fato de que o teórico se
contrapõe:
À visão parsoniana dos sistemas, mas também se distingue de
uma perspectiva que enfatiza a ação social em si, sem focalizar
seus elos e sua inserção em ordens sociais mais amplas. Ele
concebe profissão como uma relação que está inserida na
estrutura ocupacional (ibidem, 28).

Contrário do sentido de profissão parsoniana, Freidson (1998) defende o


entendimento da “autonomia profissional como um atributo relevante para o
poder de uma profissão” (BONNELLI, 1998, p. 18). Este entendimento
questiona a visão funcionalista de que as profissões convivem
democraticamente umas com as outras, trazendo para o debate sobre as
profissões o conceito de poder profissional. Como esclarece Bonnelli (1998,
p.25):
No que se refere ao poder profissional, Freidson analisa as
vantagens conferidas pelo monopólio do conhecimento e pelo
gatekeeping92, e os constrangimentos introduzidos pelos limites
à dominação profissional. Embora identifique como a estrutura
do controle sofre mudanças em decorrência de novas
regulamentações conclui que elas não afetam o controle
profissional. Dentro de certos limites, os profissionais são
capazes de selecionar o trabalho que fazem e decidir como
fazê-lo. O controle sobre o trabalho ou a autonomia técnica é o
poder profissional mais decisivo. Sua autonomia tem sido
preservada. O segundo aspecto mais importante do poder
profissional é o gatekeeping, pelo qual os profissionais
exercem um controle institucionalizado sobre recursos que,

92
Para Bonnelli (1998, p.25) gatekeeping é o poder exercido por profissionais, por exemplo, o
poder dos professores de avaliar o desempenho de alunos, de aprova-los ou reprova-los, de
selecioná-los para participar de sua equipe de pesquisa, de fornecer cartas de recomendação
para bolsas etc.

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mesmo quando regulamentados, possuem uma margem de
flexibilidade para seu julgamento (grifos nossos).

Nestes aspectos, para ser caracterizado como profissional não bastaria


apenas o treinamento técnico e domínio da racionalidade cognitiva, como já
apontava a visão parsoniana, caberia o entendimento de que o profissional
decide sobre a ação do seu trabalho e defini como fazê-lo, preservando sua
autonomia. Para Freidson:
As profissões são focalizadas apenas como uma ocupação 770
mais forte, evitando-se a reprodução do significado ideológico
do termo, que procura criar barreiras sociais separando
ocupação de profissão. Seu empenho é voltado para
estabelecer ocupação como um conceito sociológico tão
importante quanto os conceitos de classe e de organização
(BONNELLI, 1998, p. 26).

Recentemente Freidson (1998), que tem desenvolvido uma teoria do


profissionalismo, entende a profissão como uma ocupação, que se distingue de
outras ocupações em virtude do “conhecimento e competência especializados
necessários para a realização de tarefas diferentes numa divisão de trabalho”
(Ibidem, p. 40). Estes conhecimentos seriam a base da profissionalização, que
de acordo com Freidson (1998, p. 98):
Poderíamos definir a profissionalização como um processo
pelo qual uma ocupação organizada, geralmente, mas nem
sempre por legar uma competência esotérica especial e cuidar
da qualidade de seu trabalho e de seus benefícios para
sociedade, obtém o direito exclusivo de realizar um
determinado tipo de trabalho, controlar o treinamento para ele e
o acesso a ele e controlar o direito de determinar e avaliar a
maneira como o trabalho é realizado.
Tomando a teoria do profissionalismo que entende a profissão como
uma ocupação que se distingue de outras ocupações em virtude do
“conhecimento e competência especializados necessários para a realização de
tarefas diferentes numa divisão de trabalho” (FREIDSON, 1998, p. 40). As
profissões compreendem manifestações do princípio ocupacional, onde o
poder profissional delimitaria os conhecimentos necessários para a forma de
trabalho, de formação e de atuação e estes conhecimentos seria a base da
profissionalização:
Poderíamos definir a profissionalização como um processo
pelo qual uma ocupação organizada, geralmente, mas nem
sempre por legar uma competência esotérica especial e cuidar

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da qualidade de seu trabalho e de seus benefícios para
sociedade, obtém o direito exclusivo de realizar um
determinado tipo de trabalho, controlar o treinamento para ele e
o acesso a ele e controlar o direito de determinar e avaliar a
maneira como o trabalho é realizado (FREIDSON, 1998, p. 98).

Neste sentido, a profissionalização é o processo de racionalização


técnica que dota o profissional de uma base de conhecimentos necessários ao
exercício de sua profissão. Vale ressaltar que esta base de conhecimento
integra a arena onde são delimitadas áreas de jurisdição remetendo a um 771
conjunto de conhecimentos específicos requeridos de uma profissão e de suas
atividades de trabalho (ABBOTT, 1998).
Esse processo não se restringe apenas aos conhecimentos e as
capacidades que determinada atividade profissional, pois implica nas relações
estabelecidas entre as atividades desenvolvidas por esses profissionais e os
elementos políticos de negociação de estratégias individuais e coletivas. Estes
elementos refletem na autoridade atribuída as atividades desenvolvidas pelo
grupo ocupacional frente às decisões que atribuem legitimidade as atividades
desenvolvidas por esse grupo.
Para Bourdoncle (1991), a profissionalização abrange três tipos de
processos: profissionalidade, profissionismo e profissionalismo. O primeiro
processo “vai remeter para a natureza mais ou menos elevada e racionalizada
dos conhecimentos e das capacidades utilizados no exercício profissional”
(Ibidem, p. 76), a exemplo do professor que no exercício da profissão apela
para os saberes necessários para o desenvolvimento da sua prática.
O segundo processo diz respeito ao “estado dos militantes e ativistas da
profissão que, apoiando-se sobre estratégias e uma retórica comum, procuram
fazer reconhecer o valor do serviço que estão a prestar e aumentar a sua
autonomia, seu controlo e seu monopólio de exercício” (Ibidem, p. 76). O
terceiro processo designa “as estratégias colectivas de transformação da
actividade em profissão” (Ibidem, p. 76).
Dito isto, Imbernón (2009) alerta que o docente como profissional
domina “uma serie de capacidades e habilidades especializadas que o fazem
ser competente em determinado trabalho e que, além disso, o ligam a um

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grupo profissional organizado e sujeito a controle” (ibidem, p. 27). Desta forma,
entendemos que para ser professor necessita dispor de uma base de
conhecimentos necessários ao exercício de sua profissão. O que nos levou a
buscar refletir como o Curso de Química-Licenciatura tem contribuído para a
construção desse conjunto de conhecimentos.

QUÍMICA-LICENCIATURA CAA-UFPE: O QUE TRAZ O PPC DO CURSO


QUANTO AS DISCIPLINAS DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO 772

Para Torres93 (2017) o Estágio Supervisionado, acontece na


formação inicial dos professores, sendo um momento de aproximação com a
realidade escolar, em que o licenciando, futuro professor, poderá praticar as
teorias aprendidas ao longo do curso de licenciatura, tendo sempre a busca de
uma relação teoria e prática aprendida na universidade, bem como, no campo
de estágio.
De acordo com o Conselho Nacional de Educação (CNE/CP 01/2015
art.13ª), o Estágio Curricular Supervisionado é um componente curricular
obrigatório, presente nos cursos de licenciatura, totalizando assim, uma carga
horária de quatrocentas horas (400). Contudo, no projeto de Estágio Curricular
Supervisionado do Curso de Química-Licenciatura do CAA/UFPE temos a uma
carga horária total de 405 (quatrocentos e cinco) horas, que serão
desenvolvidas a partir do sexto até o nono período do Curso, em quatro blocos
de atividades pedagógicas práticas que constituem os seguintes componentes
curriculares: a) Estágio Curricular Supervisionado I (90 h, sexto período); b)
Estágio Curricular Supervisionado II (105 h, sétimo período); c) Estágio
Curricular Supervisionado III (90 h, oitavo período); d) Estágio Curricular
Supervisionado IV (120 h, nono período).
A organização destes componentes curriculares segue a orientação da a
Resolução Nº 12/2008 do Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e
Extensão (CCEPE) da Universidade Federal de Pernambuco, constitui um

93
Graduando do Curso de Química-Licenciatura no CAA, que vem desenvolvem o trabalho de
Conclusão de Curso discutindo sobre a contribuição das disciplinas de Estágio Supervisionado
para a construção da Identidade Docente.

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conjunto de atividades pedagógicas, de caráter formativo e pré-profissional,
desenvolvidas com discentes e docentes nas escolas do Ensino Básico ou em
outros ambientes educativos, com acompanhamento e supervisão obrigatória
da instituição formadora responsável por este componente curricular de, no
mínimo, 25% do total da carga horária prevista para o estágio. Dessa forma, o
estágio supervisionado passa a ser uma atividade imprescindível para a
formação acadêmica dos licenciandos, possibilitando assim, uma maior
aproximação com o ambiente escolar em que o mesmo estará inserido. 773

METODOLOGIA

Nesse trabalho, temos como proposito identificar as motivações que


levaram graduandos a escolherem o curso Química-Licenciatura, e a partir
destas discutir como o componente de Estágio Supervisionado tem contribuído
para sua profissionalização docente. Uma vez que, esse objetivo deriva de uma
pesquisa94 que está em desenvolvimento e tem dentre os seus objetivos
analisar como as disciplinas de estágio e metodologia do ensino em química
contribuem para a formação dos professores Química.
Para desenvolvermos nossos estudos e reflexões, fizemos a opção
político-epistemológica pela Abordagem Qualitativa Metodológica. Uma vez
que o campo empírico se constitui de diferenças e especificidades, tanto em
relação aos objetivos previstos no PPC do curso para os componentes de
Estágio Supervisionado. Bem como, quanto as subjetividades dos licenciandos
em torno das suas aprendizagens ao longo do curso. De acordo com Minayo
(2010, p. 21), a Abordagem Qualitativa:
Além de permitir desvelar processos sociais ainda pouco
conhecidos referentes a grupos particulares, propicia a
construção de novas abordagens, revisão e criação de novos
conceitos e categorias durante a investigação. Caracteriza-se
pela empiria e pela sistematização progressiva de
conhecimento até a compreensão da lógica interna do grupo ou
do processo em estudo.

94
Projeto de Pesquisa Formação Inicial e Continuada dos Professores de Química e Ciência
de Caruaru-PE.

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Deste modo, a Abordagem Qualitativa alinha-se aos pressupostos da
Abordagem Crítico-Social dos Conteúdos, uma vez que busca “investigar as
condições e formas que vigoram no ensino e, ao mesmo tempo, os fatores
reais (sociais, políticos, culturais, psicossociais) condicionantes das relações
entre a docência e a aprendizagem” (LIBÂNEO, 2013, p. 53). O que na
formação dos licenciando caracteriza-se enquanto a materialização da
profissionalização docente, ou seja, a formação dos professores de química.
Nosso campo de pesquisa é o Campus do Agreste- UFPE localizado na 774
cidade de Caruaru, Agreste de Pernambuco. Especificamente o Curso de
Química-Licenciatura que tem um total de 350 alunos matriculados. Para o
desenvolvimento deste trabalho, fizemos um estudo exploratório no intuito de
identificar quais motivações levaram os graduandos a se matricularem no
curso. Tivemos como sujeitos, os graduandos do curso que estão nos períodos
finais normativos do curso (mais precisamente alunos dos componentes de
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)1 e TCC2). Sendo ao todo distribuídos
35 questionários e destes foram devolvidos 24.
Com este propósito, aplicamos questionários que conteve 7 perguntas
diretas a serem justificadas pelos alunos que já cursaram os componentes de
Estágio Supervisionado. Para esse trabalho trouxemos as respostas em
relação a: a) o curso de química licenciatura foi a sua primeira escolha de
formação? Por que colocar licenciatura em química? b) Você pretende seguir a
profissão de professor?
A partir dos questionários respondidos, realizamos a leitura e fomos
identificando que argumentos eram apresentados para justificar as motivações
tanto para a escolha do curso, bem como, em relação a profissão docente.
Para tanto, realizamos a leitura flutuante dos argumentos apresentados no
questionário, para Bardin (2011), essa leitura torna possível a apropriação dos
conceitos referentes ao que está sendo pesquisado. No nosso caso, buscamos
identificar como os argumentos dos graduandos se aproximada dos estudos
sobre profissionalização docente.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

É importante ressaltar que os sujeitos de pesquisa fazem parte, dos


últimos alunos que ingressaram no curso por meio do vestibular tendo o Enem
como segunda parte da adesão, a parti de 2015 a universidade federal de
Pernambuco passou a ter uma única fase, tendo a nota do Enem classificatória
no Sisu (Sistema de Seleção Unificada). Essa pontuação é devido a ideia tipo
por alguns, que os alunos vindos por meio de vestibular, teriam mais certeza do 775
curso ao qual pretendem seguir, já que mesmo antes de fazer o exame de
admissão é necessário indicar a área da graduação, em contraposto é notório a
fama e a correria do Sisu, onde os alunos que não conseguiram uma
pontuação elevada, entram na “dança das cadeiras” para encaixar uma
graduação menos disputadas, sendo que nesse cenário, as licenciaturas
seriam as cadeiras que sobram ou que a concorrência por uma vaga seria
menor, demostrando que os cursos voltados para a docência tem uma
discriminação antes mesmo do conhecimento da ementa dos cursos.
Levando em consideração a ressalva anterior, no primeiro momento da
pesquisa buscamos identificar as motivações que levaram os graduandos a
escolher o curso de Química-Licenciatura. Quando indagados sobre o motivo
do porquê escolherem esse curso, foi percebido algumas temáticas recorrentes
nas justificativas, tais como: a) identificação com a matéria; b) a interferência
seja dos pais ou dos professores; c) a escasseies de profissionais formados em
Química e lecionando nesta área.
Outras justificativas também eram apontadas, com menos recorrência,
tais como, a condição financeira também pontuado pelos entrevistados. O que
remete ao entendimento de que a interiorização das Universidade Federais
pode contribuir para que estudantes mais carentes pudessem cursa o ensino
superior de qualidade.
O que foi perceptível nessa primeira questão é que em todas esses caso
de certa forma houve uma influência externa que mediou a tomada de decisão
dos discentes no momento da escolha do curso, como Lemos (2016) já
pontuava, que a questão identitária é simultaneamente social e subjetiva, ou

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seja que cada sujeito irá se identificar com a sua profissão não só baseada
nos seus desejos e sonhos mas também a partir de um convívio social e o
meio onde está inserido.
Ainda sobre as justificativas apontadas pelos graduandos, sobre a escolha
do curso, dois casos se destacaram-se se posto em comparação. Neles os
graduandos responderam que o curso foi a sua primeira opção, contudo as
justificativas são diferentes. Em uma das respostas justificou-se que “sempre
foi meu desejo cursar tal graduação, isso foi alimentado no ensino médio por 776
meus professores”. O que leva a interpretar que não ser apenas a área que
interessava, mas que a profissão docente lhe chamava atenção, lhe despertava
interesse o que poderia levá-lo a buscar um curso de profissionalização
docente.
Na outra resposta, o graduando pontuou que “nunca tive professor de
química de verdade e eu sempre quis saber se a química vai muito além de
cálculos e fórmulas, elas estão em tudo em nossa volta”. Observamos que o
interesses deste graduando estava em conhecer mais a área, o que leva a
pressupor que a escolha pelo curso de Química-Licenciatura poderia trazer
formações para esta área. O que sugere que a curiosidade do graduando em
saber, conhecer mais, da química poderia ir muito além do que já tinha visto no
seu ensino médio.
Partindo para a segunda, na qual indagamos se os graduandos
pretendiam seguir profissão de professor, tivemos achados que se remeteram
em sua maioria pelo interesse desenvolver carreira na docência. O que frente
as primeiras perguntas já nos levaram a algumas indagações: Qual ou quais
disciplinas ou atividades levaram os graduandos, que antes não tinha interesse
pela docência, querer carreira docente? Esta pergunta vem orientando nossas
atividades na pesquisa e estava nos levando a fazer um levantamento com os
alunos que apontaram as disciplinas que de alguma forma contribui para que
eles tivessem interesse pela docência. Dados que ainda estão em faze de
coleta de dados a partir de questionários abertos.
Em vistas das respostas dos graduandos sobre seu interesse e seguir
carreira docente, em que apenas uma dos destes alegou que não tinha

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interesse. Organizamos as justificativas em temáticas, foram elas: a)
identificação com o curso; b) carência de professores formados em Química-
Licenciatura para trabalhar na educação básica. Sendo que, em sua maioria a
mais recorrente foi a identificação com o curso, muitos pontuaram que essa
identificação veio através das vivencias e experiências adquirias no decorre da
formação inicial, nas disciplinas de ensino, tais como as metodologias e os
estágios supervisionados.
O que nos leva a refletir que, as motivações para que os graduando ao 777
concluírem o curso seguir na carreira docente, poderá ter sido fruto de
experiência construídas no contexto da formação inicial, em que os licenciando
puderam ir construindo a identificação não só profissional mais também social
e individual com a profissão docente. O que pode ter levado a justificar que o
fato de ter a falta de profissionais na área, também seja importante que ao se
ter a interiorização, curso voltado para a formações dos professores tenham
ganhou espaço.
Se comparamos essas duas temáticas, apontadas para justificar o
interesse em ter uma carreira docente, percebemos que houve uma mudança,
mesmo não sendo as suas escolhas iniciais, os entrevistados nos contam que
ao longo da formação houve uma maturação e crescimento em suas
perceptivas quanto as motivações que levaram a escolha do curso. Com esses
dados, e levantado algumas considerações que mesmo tendo identificação
com a matéria química, a questão da docência só veio com o tempo, como a
identidade profissional de cada sujeito, destacar-se então que as interações
sociais e profissionais durante a formação inicial puderam de alguma maneira
ter influenciado os graduando na construção com a identificação com a
profissão docente.

CONSIDERAÇÕES

A partir das primeiras análises, deste projeto de pesquisa que está em


desenvolvimento, fomos levados a refletir que o ingresso dos licenciando foi
marcado por interesses que em sua maioria não adivinha do interesse em ter

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formação para a docência, mas que o interesse estava na identificação com a
área de química. Contudo, ao serem indagados pelos interesses em seguir
carreira docente, tivemos a maioria das justificativas apontando pelo interesse
em desenvolver a profissão docente. O que nos levou a pressupor que no
curso de formação inicial os graduando de alguma forma foram levados a ter os
primeiros contatos e experiências como a profissionalização docente, tanto
pelo currículo do curso, quanto por programas de ensino e extensão voltado
para o ensino. 778
Ao longo dos estudos que vimos desenvolvendo com os estudantes do
curso, está se tornando perceptivo algumas mudanças em relação ao que
motivou os graduandos a ingressar no curso e como eles estão entendendo o
seu lugar de professor em formação. Necessário assim, considerar que sempre
estaremos num processo contínuo de aprendizagem com a vivência e as
experiências, caracterizando como é nossa prática, e como nos vemos e nos
afirmamos em nossa profissão,
Por fim, é importante ressaltar que está pesquisa reforço nosso interesse
em desenvolver um grupo de estudo e pesquisa que terá como foco o estudo
sobre a formação inicial e continuada dos graduandos no curso de Química-
Licenciatura. Visto nesse trabalho que as a percepção de carreira e profissão
mudou no decorre do curso para os pesquisados, pode subentender assim que
o percurso dos dez períodos normativos do curso traz experiencias a serem
investigadas. O entendimento como professores em formação necessita de
reflexão.

REFERÊNCIAS

ABBOTT, A. The system of professions: an essay on the division of expert


labour. Chicago: University of Chicago, 1988.
BARBOSA, M.L.O. A sociologia das profissões: em torno da legitimidade de um
objeto. Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais, Rio de Janeiro,
n. 36, p. 3-30, 1993.
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. 5. ed. Revisão atualizada. Tradução: Luis
Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2011.

Anais do VIII Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Políticas


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resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
237-1438-3
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CURRÍCULO, CONHECIMENTO E CULTURA NA PRÁTICA DOCENTE DA
EDUCAÇÃO BÁSICA: NAS ESCOLAS DO CAMPO MULTISSERIADAS

Maria Aparecida Dantas Bezerra | Maria José Alves de Souza | Nair Alves dos
Santos Silva | Rozineide Iraci Pereira da Silva

RESUMO: Este artigo tem como objetivo identificar o reconhecimento de sua cultura
contemplando uma proposta curricular diferenciada na educação do campo nas salas
multisseriadas, possibilitando a adaptação do currículo a cultura do discente para
prática docente na educação básica. Diante da compreensão de que a educação do 780
campo das escolas multisseriadas devemos pontuar que toda prática pedagógica
findar-se na visão de uma proposta curricular, sendo possível afirmar que a identidade
da Educação do Campo deve ser construída a partir de uma cultura produzida por
relações da realidade e existência humana. Têm-se como fundamentos teóricos
autores que auxiliam na discussão da prática docente relacionadas ao currículo das
escolas do campo, como Miguel Arroiy e as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais
da Educação Básica de 2010. Utilizo-se como metodologia a pesquisa de campo de
cunho qualitativo. Neste sentido, estudou-se a organização do currículo na prática
docente da educação básica nas escolas do campo multisseriadas, respondendo as
inquietações dos docentes sobre o que ensinar e aprender na proposta curricular da
modalidade da educação no/ do campo. Esse estudo tornou a realização da pesquisa
de campo possível aferindo, que há uma necessidade da construção de um currículo
que atenda a vinculação da realidade conforme a cultura dos discentes do campo.
Palavras-chave: Escolas do Campo. Prática. Docente. Currículo. Cultura.

INTRODUÇÃO

Nota-se que a escolha desta temática está embasada nas


inquietações dos docentes sobre o que ensinar e aprender, nas práticas
educativas correlacionadas a proposta curricular nas escolas do campo
multisseriadas, na qual, seja uma possível reflexão do currículo para conteplar
o conhecimento e cultura da comunidade escolar, nas formações continuadas
de docentes nos dias de estudo e planejamento.
Mediante a esta problemática, observou-se que o currículo da educação
do campo nas salas multisseriadas na formação dos docentes tornou-se um
eixo temático central nos projetos políticos pedagógicos, nas propostas dos
sistemas de ensino, no PNE, nas pesquisas, na teoria, na prática pedagógica e
na formação inicial e permanente do docente.
Na realidade, as indagações sobre currículo presentes nas escolas do
campo multisseriada a teoria pedagógica deve mostrar a relevancia de que os

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currículos não são conteúdos prontos que devem ser passados aos discentes,
e sim, são uma construção e seleção de conhecimentos e práticas
pedagógicas produzidas em contextos concretos e em dinâmicas sociais,
intelectuais, políticas e culturais.
Esse trabalho esta dividido em três parte, sendo elas: Introducão;
Desenvolvimento, que aborda a seguinte temática: Um Olhar Sobre as Escolas
do Campo Multisseriada, A Proposta Curricular na Formação da Prática
Docente, Contribuições das Teorias De Antonio Flavio Moreira , Vera Maria e 781
Miguel Gonzáles Arroyo, Na Proposta do Currículo, Conhecimento, Direitos E
Cultura, onde explora detalhadamente a realidade de uma classe multisseriada
e por fim a conclusão desses estudos de campo, bibliográficos, utilizando
alguns autores, Miguel Arroiy, Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica de 2010 dentre outros.
Sendo assim, tem sido relevante uma pesquisa de campo de cunho
qualitativo e bibliográfico, para englobar na proposta curricular os
conhecimentos, atitudes, valores do campo, considerando os saberes
acumulados das experiencias de vida dos nossos discentes onde estão
arraigado este processo, constituindo instrumentos de observações a partir dos
saberes que precisam ser ampliados, tornando-se flexivos à realidade dos
sujeitos, onde se faz necessário ter como objetivo a identificação do
reconhecimento de sua cultura contemplando uma proposta curricular
diferenciada na educação do campo nas salas multisseriadas, possibilitando a
adaptação do currículo a cultura do discente para prática docente.

DESENVOLVIMENTO

1.1 UM OLHAR SOBRE AS ESCOLAS DO CAMPO MULTISSERIADA

Quando nos deparamos com a filosofia deste olhar na escola do campo


observamos que a função da Escola do Campo Multisseriada esta pautada em
uma função social, no processo de formação do sujeito, transferindo a
relevância do conhecimento científico para associar o conhecimento empírico,
para que todos possam frequentar a escola, de maneira que as diferencias

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sociais possam ser diminuidas, não sendo um espaço de reprodução das
desigualdades, considerando as atividades teóricas e práticas inseridas no
currículo.
Neste sentido, é importante ressaltar que desde 2010, a educação do
campo é considerada uma modalidade de ensino, de acordo com a Resolução
CNE/CEB n.º 04, de 13 de julho de 2010, que estabeleceu as Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica.
Percebe-se que as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a 782
Educação Básica de 2010 estabelecem, em sua Seção IV, artigo 35, que:

Art. 35 Na modalidade de Educação Básica do Campo, a educação


para a população rural está prevista com adequações necessárias às
peculiaridades da vida no campo e de cada região, definindo-se
orientações para três aspectos essenciais à organização da ação
pedagógica:
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos estudantes da zona rural;
II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural (BRASIL, 2010a,
p. 12).

Pudemos constatar que o currículo das escolas do campo das turmas


multisseriadas vem ocorrendo mudanças diante das indagações feitas pelos
docentes que ali perpassam, deixando explicito que se não estiver esta
organização curricular, irá afeta a organização do nosso trabalho e do trabalho
dos discentes. A organização do nosso trabalho é respaldada pela
organização escolar que, por sua vez, é inseparável da organização curricular.

1.2 A PROPOSTA CURRICULAR NA FORMAÇÃO DA PRÁTICA DOCENTE

Quando falamos em currículo lembramos de planejamento, conteúdo,


metodologia, objetivo, dentre outros, onde todos esses elementos buscam
atender as orientações das Diretrizes Curriculares. A palavra currículo esta
associada às distintas concepções que derivam dos diversos modos de como a
educação é concebida, bem como das influencias teóricas que a afetam. É

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importante ressaltar que diferentes fatores socioeconômicos, políticos e
culturais contribuem para o conceito de currículo.
Diante dos desafios enfrentados pelos docentes na educação básica nas
escolas do campo multisseriada, em detrimento da proposta curricular e sua
prática, fica explicito que o currículo da modalidade da educação do campo têm
sido ao longo dos anos discultidos numa ótica da pedagogia de competências
ou habilidades, assim, a efetivação dele em práticas cotidianas nas salas de
aula nas escolas rurais, precisa articular a consolidação de uma concepção de 783
uma educação que seja pensada para realidade dos discentes do campo.
Sendo assim, currículo são os conteúdos a serem ensinados e
aprendidos, as experiências de aprendizagem escolares a serem vividas pelos
discentes, os planos pedagógicos elaborados por doscentes, escola, e
sistemas educacionais, os objetivos a serem alcançados por meio do processo
de ensino, e os processos de avaliação que terminam por influírem nos
conteúdos e nos procedimentos selecionados nos diferentes graus da
escolarização.
Podemos entender currículo na concepção da escola do campo como
as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em
meio a relações sociais, e que contribuem para construção das identidades de
nossos discentes. É assim, o conjunto de esforços desenvolvidos com
intenções educativas. É importante também ressaltar o papel do docente, no
processo curricular sendo fundamental de grandes artífices, queira ou não, da
construção dos currículos que se materializam nas salas de aulas. Assim,
caracterizase a prática pedagógica na formação do docente como uma síntese
das dimensões estrutural, que se orienta dos valores e objetivos de formação
humana.
Pensada nessa direção, a formação dos professores da escola do
campo prescinde a reflexão coletiva com outros parceiros envolvidos nesse
espaço singular, para construírem novos pensares e fazeres, transformando as
suas ações para atender aos interesses dos grupos sociais a que essas
práticas estão sendo vivenciadas.
Segundo Araújo e Silva:

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A formação deve levar em consideração liberdade de consciência
para o diálogo e para as decisões em conjunto, o que implica em
desvendar a realidade e se organizar para transformá-la, sintetizando
os interesses dos grupos sociais, o que compreende a lógica
freireana do ser para ser mais, onde o democrático, o participativo, se
aprende na prática. (ARAÚJO E SILVA, 2011, p. 36)

Assim, caracterizase a prática pedagógica na formação do docente


como uma síntese das dimensões estrutural, que se orienta dos valores e
784
objetivos de formação humana. Sabemos que a escola do campo multisseriada
precisa prepara-se para bem socializar os conhecimentos escolares e facilitar o
processo do discente a outros saberes. O currículo possui o potencial de
tornar as pessoas capazes de compreender o papel que devem ter na
mudança de seus contextos imediatos e da sociedade em geral, bem como de
ajudá-las a adquirir os conhecimentos e as habilidades necessária para que
isso aconteça. Concebemos o conhecimento escolar como uma construção
especifica da esfera educativa, não como uma mera simplificação de
conhecimento produzido fora da escola. O conhecimento escolar tem ainda
característica própria que o distinguem de outras formas de conhecimento.

1.3 CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS DE ANTONIO FLAVIO MOREIRA ,


VERA MARIA E MIGUEL GONZÁLES ARROYO, NA PROPOSTA DO
CURRÍCULO, CONHECIMENTO, DIREITOS E CULTURA

O texto “Currículo, Conhecimento e Cultura”, de Antonio Flavio Moreira e


Vera Maria Candau, trata de elementos que servem de reflexão sobre as
questões consideradas significativas no desenvolvimento do currículo nas
escolas. Ele ainda analisa a estreita veiculação que existe entre a concepção
de currículo e as de Educação. Entretanto, aborda a preocupação dos
pesquisadores no que diz respeito às relações entre currículo e conhecimento
escolar encontra partida com as relações entre currículo e cultura. Em suma,
apresenta a construção do conhecimento escolar como característica da escola
democrática que reconhece a multiculturalidade e a diversidade como
elementos constitutivos do processo ensino aprendizagem.

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Em “Educando e Educadores seus Direitos e o Currículo”, de Miguel
Gonzáles Arroyo, existe uma abordagem sobre o currículo e os sujeitos da
ação educativa na qual os educando e educadores ressaltam a importância do
trabalho coletivo dos profissionais da Educação para a construção de
parâmetros de sua ação profissional. Nele, os educandos são situados como
sujeitos de direitos ao conhecimento e ao conhecimento dos mundos do
trabalho. Existe também, ênfase quanto à necessidade de se mapearem
imagens e concepções dos alunos, para subsidiar o debate sobre os currículos. 785
O texto apresenta a proposta de se desconstruir visões mercantilizadas
de currículo, do conhecimento e dos sujeitos do processo educativo. Ele traz
critica ao aprendizado desenvolvido por competência e habilidades como
balizadores da catalogação de alunos desejados e aponta o direito à educação,
entendido como o direito à formação e ao desenvolvimento humano pleno.
Com relação ao texto Currículo Conhecimento e Cultura, podemos
constatar que questões referentes ao currículo tem sido freqüentemente alvo
da atenção de autoridade, professores, gestores, pais, estudantes e membros
da comunidade. E nós enquanto grupo concordamos com a preocupação
desses segmentos, uma vez que todos devem participar das decisões sobre o
que devem ser ensinado nas salas de aula.
Referindo-se ao texto Educandos e Educadores: seus Direitos e o
Currículo, refletir sobre currículo é uma missão da escola. O texto mostra a
importância do processo ensino aprendizagem, no qual os educadores refletem
sobre a forma de ver dos educandos, do conhecimento e os processos de
ensinar e aprender.
Portanto, o que ensinamos, a forma como ensinamos, que ordens
utilizaram a seqüência que seguimos as lógicas utilizadas e o tempo e espaço,
são condicionamentos de nossa docência, que realizamos como profissionais.
Os docentes, são condicionados pelos conhecimentos a serem
aprendidos e, sobretudo, pelas lógicas e tempos predefinidos em que terão de
aprendê-los. Os discentes não são apenas uma produção escolar, nem se quer
dos currículos e da docência e da administração. Eles chegam com identidades
de classes, raça, etnias, gêneros, território, campo, cidade, periferia. E sobre

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essas imagens construímos as imagens de discentes definimos funções para
cada escola e priorizamos ou secundarizamos conhecimentos e competências.
Arroyo, Caldart e Molina (2008) pontuam um campo de possibilidades de
diferentes sujeitos com direitos iguais, cuja educação deve abranger as
identidades e diferenças socioculturais dos camponeses. Nessa perspectiva, é
construída uma nova concepção de educação do campo, voltada para o
atendimento da diversidade.
O novo paradigma por uma educação do campo como espaço da 786
diversidade cultural e de sujeitos possuidores de direitos propõe que:

A educação desses diferentes grupos tem especificidades que devem


ser respeitadas e incorporadas nas políticas públicas e nos projetos
políticos pedagógicos das escolas do campo. Por isso, o campo e a
cidade ou o rural e o urbano são apreendidos como dois polos de um
continuum com especificidades que não se anulam e nem se isolam,
mas acima de tudo, articulam-se (MELO, 2011, p. 42).

É preciso que essa nova concepção de educação do campo aconteça na


práxis, contribuindo para a formação do cidadão, pois o que se tem observado
são propostas ambíguas do que seja, de fato, uma educação no e do campo,
sem 33 efetividade no que concerne à identidade social e cultural da população
atendida pela educação do campo.
Arroyo, Caldart e Molina reforçam que:

Não basta ter escolas no campo; queremos ajudar a construir


escolas do campo, ou seja, escolas com um projeto político-
pedagógico vinculadas às causas, aos desafios, aos sonhos, a
história e a cultura do povo trabalhador do campo (ARROYO;
CALDART; MOLINA, 2008, p. 27).

É notório que os debates atuais têm levado o educador a repensar suas


ações diante dos dilemas da sociedade contemporânea. Esse repensar refere-
se a todas as áreas de atuação e campos do conhecimento, seja nas escolas
das grandes cidades, seja nas escolas das pequenas comunidades rurais.

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CONCLUSÃO

Diante desse contexto, constatamos que a escola do campo deve


considerar, no processo ensino-aprendizagem, o conhecimento empírico do
estudante, ou seja, ela deve trabalhar a proposta curricular adaptando-se a sua
realidade e usá-la de forma mais significativa, visto que o discente traz consigo
uma rica bagagem de conhecimento. E tudo isso deve ser considerado na
construção do currículo, facilitando assim, o melhor desenvolvimento do
787
mesmo.
Constatamos que a situação social vivenciada deve esta atrelada ao
currículo na formação dos professores e alunos na educação, destacando-se,
primeiramente, na imposição, por parte da política pública municipal, dessa
modalidade de preparação do trabalho educacional dos docentes em suas
prática.
Para compreendermos esta trajetória e temática da proposta curricular
da educação do/no campo, realizamos a pesquisa de campo de cunho
qualitativo na qual, tem como principal resposta o posicionamento do currículo
dos docentes nas salas multisseriadas, em relação às práticas educativas dos
docentes que trabalham e residem na escola do campo. Assim, estudamos a
Educação do Campo com base da proposta curricular na prática dos docente
das salas multisseriadas da educação do campo.
Compreendemos que neste trabalho há muito que se avançar no que
tange à forma de construir uma práxis pedagógica no currículo da educação
do campo orientando seu papel baseado na realidade local, bem como na
experiência docente, que o trabalho em classes multisseriadas da Educação
Básica no campo tem um longo caminho a percorrer, a começar pelas
condições adequadas de funcionamento nas instituições rurais. Vê-se essa
tarefa como um desafio, fazendo-se necessária uma maior reflexão sobre como
conceber uma educação básica do campo, voltada aos interesses e ao
desenvolvimento sociocultural e econômico das populações que habitam no
campo e trabalham nele, atendendo às suas diferenças históricas e culturais
para que vivam com dignidade.

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Considerando a realidade das turmas multisseriadas no campo, pode-se
ponderar sobre essas turmas com um olhar que remete à necessidade de uma
prática educativa que possa atender aos discentes dentro dessa nova
perspectiva de educação. Destaca-se que a proficuidade nessa maneira de
organismo do ensino está no fato de o discente poder mediar a inter-relação
entre as diferentes faixas de idade e de conhecimentos, tornando o fazer
pedagógico mais dialógico, fortalecendo o respeito pelo outro, a valorização
das diversidades e o entendimento de que é preciso partir da unidade para o 788
todo.
Em vista jugamos que cada escola do campo multisseriada tem sua
singularidade diferente e que deve ser construido coletivamente o currículo
considerando a realidade de cada escola do campo, fundamentando-se na
cultura dos discente possibilitando a prática pedagógica do docente em seu
contexto escolar diante da política educacional da educação básica.

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DIMENSÕES DAS NECESSIDADES FORMATIVAS DE PROFESSORES
DOS ANOS INICIAIS DA ESCOLARIZAÇÃO BÁSICA PARA ENSINAR
CIÊNCIAS DA NATUREZA

Clévia Suyene Cunha de Carvalho95

RESUMO: Este artigo apresenta resultados de uma pesquisa sobre as necessidades


formativas de professores/as dos anos iniciais da escolarização básica para ensinar
790
Ciências da Natureza. Assume a abordagem qualitativa caracterizada como estudo
descritivo-analítico e foi realizada com 69 professoras da rede municipal de ensino de
João Pessoa/PB, no ano de 2017. Analisa as necessidades formativas como elemento
fundante para o processo de construção da profissionalização docente e, desta forma,
identifica a formação continuada como estratégica para essa construção. Situa a
alfabetização científica como perspectiva norteadora para o ensino das Ciências da
Natureza nos anos iniciais do ensino fundamental que tributa para formação cidadã e
constata um conjunto de saberes que se apresentam como necessidades formativas
em face da fragilização dos processos de formação. Identificam-se dimensões destas
necessidades e se conclui que os processos de formação continuada têm
negligenciado a área das Ciências, por conseguinte, as necessidades formativas
reveladas pelos/as 69 professores/as Essa negligência compromete o processo de
profissionalização docente para o ensino na área, com implicações negativas para a
aprendizagem dos conceitos e correspondentes habilidades das Ciências da Natureza,
o que demanda a reconfiguração da política de formação continuada proposta para
esse grupo docente.

Palavras-chave: Formação Docente. Necessidades Formativas. Profissionalização


Docente. Ensino. Ciências da Natureza.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século XX observa-se que o professor ganha


centralidade na política educacional brasileira e esse lugar de destaque dado
ao professorado atravessa os anos iniciais século XXI. Não se quer dizer que
em outros momentos históricos essa categoria não estivesse colocada no
âmbito das discussões educacionais porque isto é impossível. No entanto, da
última Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional publicada em 1996 até
o ano de 2016 é notório que o atendimento a população escolar no nível da
educação básica foi ampliado conforme as estatísticas educacionais oficiais.

95
Pedagoga, Dra em Educação, Coordenadora pedagógica na SEDEC/PMJP

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Apesar dos avanços quanto à expansão da escola observada na
contemporaneidade não se pode omitir que ainda persistem problemáticas em
torno do atendimento e da qualidade do ensino.

No sentido da ampliação do direito de está na escola e aprender, as


políticas de currículo e de formação de professores estiveram em destaque; o
currículo da educação básica sofreu modificações; foi preciso formar mais
professores Este olhar para o/a professora se faz necessário porque não há
791
sucesso em nenhuma reforma educativa ou inovação pedagógica no contexto
da escola quando não se presta atenção aos professores e professoras. No
que se refere às políticas educacionais ouvir os/as professoras, olhar e
considerar suas demandas de trabalho, as contradições que envolvem sua
prática profissional, tratar de suas necessidades formativas como elemento de
política é condição sene qua non para qualquer processo de reforma
educacional, curricular ou qualquer inovação educativa escolar. O
reconhecimento do papel profissional do professore é fulcral para o trabalho
curricular com as crianças: as atividades pedagógicas com os conceitos
escolares (científicos), dentre eles, os oriundos das Ciências da Natureza
depende em boa medida das mediações didáticas que faz um/a professor/a.

A partir desta compreensão foi abordamos a análise das necessidades


formativas de professores/as para ensinar Ciências da Natureza. É do campo
do trabalho docente, de sua práxis, que o debate sobre as necessidades
formativas deve emergir e ser problematizada com referencia para a
profissionalização do ensino. A perspectiva da alfabetização científica que se
discute para o ensino anos iniciais da escolarização básica está diretamente
relacionada à questão da formação do/da professor/a que atua neste nível de
ensino.

No estudo desenvolvido sobre as necessidades formativas de


professores para ensinar Ciências da Natureza nos anos iniciais do ensino
fundamental (AIEF), como parte de pesquisa doutoral empreendida através da
linha de pesquisa ‘Educação, Representações e Formação Docente, foi
indagado : o que sabem professores/as dos anos iniciais do ensino

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fundamental para ensinar Ciências da Natureza? O que dizem os/as
professores/as sobre o que aprenderam em suas trajetórias formativas para
ensinar Ciências da Natureza? O que eles/elas consideram como
necessidades formativas? Foram estas algumas das questões que nortearam
uma investigação doutoral. Trata-se de um estudo fundamentado
epistemologicamente em elementos do materialismo histórico-dialético,
apoiado no seguinte tripé: a teoria histórico-cultural, o paradigma da
profissionalização docente e o movimento teórico da alfabetização científica. 792
Caracteriza-se como um estudo descritivo-analítico de natureza qualitativa. A
pesquisa empírica foi realizada no ano de 2016/2017 em escolas da rede
municipal de ensino de João Pessoa/PB, abrangendo 14 escolas dos anos
iniciais da escolarização básica e 69 professoras. A esta amostra foi aplicado
um questionário respondido on line e fisicamente em algumas dessas escolas.
Os procedimentos de análise de conteúdo de Bardin (2011) permitiram
interpretar os dados e sistematizar os resultados.

O ENSINO DAS CIÊNCIAS DA NATUREZA NOS ANOS INICIAIS: A


PERSPECTIVA DA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA

O conhecimento das Ciências da Natureza, seus conceitos, métodos, as


habilidades lógicas e lógico-linguísticas transversalmente favorecem a
apropriação dos conceitos físicos, químicos e biológicos que fazem parte do
universo de conhecimentos que constitui o direito de aprendizagem de toda
criança matriculada nos anos iniciais do ensino fundamental. É esse universo
como direito possibilita a alfabetização científica.

O ensino das Ciências Naturais nos anos iniciais tem um significado


importantíssimo para a formação dos/as alunos/as que estão matriculadas nas
escolas neste início do século XXI. São crianças e adolescentes que estão
situados num mundo em que a ciência e os produtos que dela se originam, os
recursos tecnológicos, estão presentes no cotidiano de suas vidas. Neste
sentido, a atividade de ensino numa perspectiva de alfabetização científica é

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estratégica para a formação de um cidadão capaz de se mover numa
sociedade notadamente marcada pelo conhecimento científico e suas
tecnologias.

Carvalho (2010) explica que, em suas pesquisas para os anos iniciais do


Ensino Fundamental, é importante que se ensine às crianças mais do que
conceitos pontuais. É, preciso ensinar-lhes a pensar cientificamente,
apresentando-lhes situações-problema para que se devolvam intelectualmente,
793
construam hipóteses, busquem explicações, tomem consciência dos
fenômenos naturais que afetam as suas vidas, garantindo-lhes a possibilidade
de reconstruir, através do processo de ensino-aprendizagem, o conhecimento
socialmente trazido da vida cotidiana por meio do alcance de uma nova
qualidade desse conhecimento referenciada nos conceitos científicos
socialmente usados em contextos diferenciados.

O ensino de Ciências da Natureza praticado na escola brasileira revela


pouco avanço em relação ao domínio, pelos alunos/as, das competências
científicas (PISA, 2011) atualmente requeridas para alunos que concluem o
Ensino Fundamental. No entanto, há de se considerar que a formação de tais
competências já deve está plantada pedagogicamente nos primeiros anos
desse nível de escolarização conforme se observa nos documentos
curriculares (Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de
Nove Anos, 2013; Base Nacional Comum, 2017) notadamente, quando se
refere ao componente curricular das Ciências da Natureza.

Para o alcance da formação de competências científicas desde os anos


iniciais da escolarização básica a perspectiva da alfabetização científica
(Sasseron e Carvalho, 2011 e 2009) configura uma estratégia para educação
em ciências. Nossa posição é a de que essa perspectiva tende a garantir a
apropriação dos conceitos científicos (ou conceitos escolarizados) do campo
das Ciências da Natureza com potencialidades para o desenvolvimento nos/as
alunos/as das habilidades cognitivas e cognitivas-linguísticas que garantem a
apropriação dos conceitos e os seus usos com responsabilidade ética e
ecoplanetário.

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Neste sentido, a alfabetização científica é assumida aqui como um
caminho pedagógico para os anos inicias do Ensino Fundamental de nove
anos. Não obstante a polissemia em torno da expressão ‘alfabetização
científica’, Sasseron e Carvalho (2011, 2008) explicam que há uma
convergência para uma compreensão de que há um saber sobre ciência, seus
modos de produção que precisa ser disfrutado por todas as pessoas para
nortear a relação delas com a sociedade de modo que elas possam se situar
no mundo de forma mais autônoma, com a capacidade de decidir e tomar 794
posições frente à realidade da qual participam. Identificamos na perspectiva da
alfabetização científica ((SASSERON e CARVALHO, 2011) elementos da pedagogia
de Paulo Freire., ao mesmo tempo que consideramos que ela pode dialogar
com as contribuições da pedagogia histórico-crítica. (GERALDO, 2009).
O debate propositivo da educação em Ciências, pela via da alfabetização
científica, recoloca e ascende o tema da formação, dos saberes, da
profissionalização docente para atuação AIEF.. Pensar a formação do/da
professor/a que ensina Ciências da Natureza nos AIEF exige considerar as
necessidades formativas desse grupo profissional e nisto reside uma grande
responsabilidade para as universidades e centros de formação de professores

ENTRE AS NECESSIDADES FORMATIVAS E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE:


A FORMAÇÃO CONTINUADA.

Analisar tais necessidades é tarefa complexa, pois envolve uma a relação


de dependência com os valores, a subordinação ao contexto em que se
determinam e a multiplicação dos agentes sociais que as podem expressar,
para si e para outrem, (Rodrigues ; Esteves, 1993, p. 19) precisa ser
considerada. É possível indicar que o referido conceito está imerso num
amalgama de possibilidades relacionadas às necessidades sentidas por um
indivíduo que pode ser imediata ou prospectiva e de natureza diversa:
biológica, material, afetiva, espiritual, acadêmica, profissional.

A abordagem que fazemos das necessidades formativas de


professores/as que atuam nos anos iniciais da escolaridade, referente ao
ensino das Ciências da Natureza se respalda na compreensão de que as

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análises dessas necessidades podem contribuir para a planificação de ações
mais racionais e adequadas aos interesses formativos e de desenvolvimento
profissional deste grupo do magistério. Atendê-las através de processos de
formação continuada é estratégico para motivar e mobilizar este profissional
para superação de eventuais lacunas, problemas e dificuldades presentes e
sentidas no processo de ensino das Ciências da Natureza. A identificação
destas necessidades formativas revela comprometimento diferenciado da
definição de uma política educativa de desenvolvimento profissional para 795
professore/as das redes públicas de ensino que atuam nos anos iniciais da
escolaridade básica, tributário da profissionalização do ensino.

Qualquer que seja a ordem e a natureza das necessidades formativas


evocadas por professores/as, elas refletem lacunas na formação inicial desse
professor/a, as quais se evidenciam com os desafios da prática pedagógica
demandados pelo contexto pedagógico escolar (micro) e pelo contexto
socioeducativo (macro) no qual estão inseridos. Dessa forma, não podem ser
desconsideradas pelas ações de políticas de formação continuada, pelo seu
significado no processo de profissionalização da docência (Ramalho e Núñez,
2011) e de construção de uma boa educação em Ciências.

AS DIMENSÕES DAS NECESSIDADES FORMATIVAS DE PROFESSORES


EM ATUAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DA ESCOLARIZAÇÃO

As possibilidades existem no campo teórico-metodológico do ensino das


Ciências da Natureza que podem corroborar para uma prática pedagógica mais
inovadora e um ensino profissionalizado voltado para a alfabetização científica
das crianças dos AIEF, não estão chegando às professoras por via da
formação continuada, é uma primeira constatação.

Isto é um indicador de que do ponto de vista de políticas de formação de


professores a profissionalização docente para o ensino das Ciências da
Natureza tem sido obstaculizada. É o que se constata por meio da tabela 1 que
apresenta o índice de consideração/tratamento/abordagem de conteúdos das

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Ciências da Natureza nos processos de formação continuada ofertado pela
Prefeitura Municipal de João Pessoa, através da Secretaria de Educação:

Tabela 1 Abordagem do ensino das Ciências da Natureza na formação continuada

Quantidade de
(%)
professoras

Menos de 25% 41* 62,1%


796
25% 13 19,6%

50% 6 9,0%

75% 5 7,5%

100% 1 1,5%
Total 66 100,0%

Fonte: Pesquisa empírica realizada pela autora.


* Treze professoras informaram 0%.

Observa-se que 62,1% das professoras afirmam que menos de 25% da


formação é dedicada as Ciências da Natureza. Este é um percentual muito
significativo que interpretamos como ausência de uma política de formação
para profissionalizar o professor dos AIEF, que os impede de cumprir
didaticamente com os objetivos de formação em Ciências da Natureza
definidos nos marcos regulatórios do currículo, seja nacional ou em marcos
regulatórios internacionais. Vê-se que o desafio é grandioso para se consolidar
os direitos de aprendizagem para educação em Ciências dos/as alunos dos
AIEF. A realidade encontrada no município de João Pessoa no ensino de
Ciências da Natureza parece ir de encontro com a relevância da formação
continuada para que o/a professor/a atualizado/a atenda aos objetivos
proclamados pela política curricular atualmente em voga para o ensino de
Ciências.

A partir da tabela 2 evidencia-se uma das dimensões das necessidades


formativas identificadas, as quais incidem sobre quatro aspectos:

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conhecimentos específicos da disciplina, conhecimentos didático pedagógicos,
Experimentos/atividades práticas e recursos tecnológicos.

Tabela 2 Conhecimentos para melhor ensinar Ciências da Natureza

Sub-Categorias Sim Não

Conteúdos especificados 40 (60,6%) 26 (39,4%)


Novas tecnologias e recursos materiais 16 (24,2%) 50 (75,8%) 797
Experimentos/Atividades práticas 10 (15,2%) 56 (84,8%)
Conhecimento Didático-Pedagógico 9 (13,6%) 57 (86,4%)
Conteúdos sem especificação 9 (13,6%) 57 (86,4%)
Total de ocorrências – 84 ocorrências
Total de participantes da pesquisa – 66 professoras

Fonte: Pesquisa empírica realizada pela autora.

De acordo com os dados obtidos verifica-se que o domínio do conteúdo,


isto é, o conhecimento conceitual, se configura como a necessidade mais
preeminente para as professoras e é, certamente, o obstáculo mais
preocupante (60,6%) para melhor ensinar Ciências da Natureza. As
professoras indicaram até três conteúdos que elas consideravam que precisam
dominar com mais propriedade.

Esse fato é de extrema gravidade porque por este viés há como se


identificar o precário domínio das professoras, em geral, a respeito dos
conceitos inerentes às Ciências da Natureza. Este é um problema com dupla
face, ou seja, atinge docentes e discentes: a baixa proficiência em Ciências da
Natureza. Essa deficiência é constatada nos anos finais do ensino
fundamental, conforme revelam os dados das avaliações SAEB/INEP. Este é
um problema com dupla face: a baixa proficiência em Ciências da natureza
atinge, além dos alunos/as, as professoras, levando a se questionar a
formação inicial do coletivo docente que atua na rede municipal de ensino de
João Pessoa/PB.

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Outras ocorrências (13, 6%) indicaram conteúdo, no entanto, não
especificaram os tipos de conceitos, fatos, fenômenos, princípios, leis, ou seja,
os conhecimentos como uma dimensão dos conteúdos escolares de acordo
com a tipologia de conteúdos discutidos por Libâneo (1994), Zabala (1998) e
Weissmann, (1998). Conforme o conteúdo das respostas fica claro que quando
as respondentes citam os “conteúdos” estão se referindo aos conhecimentos.

Os conteúdos procedimentais (e também os atitudinais) não recebem


798
nenhuma referência nos registros que integram as 84 ocorrências de
respostas. Isto é um indício forte que confirma que as habilidades (em Ciências
da Natureza) que indicam procedimento lógico de natureza cognitiva e
cognitiva-linguística como observar, identificar, comparar, classificar, descrever,
relatar, escrever relatórios de trabalhos experimentais, etc., não é considerada
como um conteúdo procedimental, ou sequer como conteúdo conceitual que se
relaciona com as “estratégias de aprendizagem e raciocínio” como as indicadas
por autores como POZO E CRESPO ( 2009, p. 49).

Incluídos no rol de saberes manifestos como necessários para melhor


ensinar, em segundo lugar aparecem às novas tecnologias, 24,2%, e os
conhecimentos didático-pedagógicos como outro grupo importante de
saberes, com 13,6%. No caso das novas tecnologias, há subjacente a
compreensão das professoras que vivendo em uma sociedade marcada pela
era digital, da qual não é possível recuar, a escola não tem como não tratar da
inclusão das novas tecnologias como conteúdo, como recurso que potencializa
a aprendizagem, isto já é suficiente para tratar as novas tecnologias como uma
dimensão do saber profissional. Esta é uma demanda posta para a escola e
que, possivelmente, pela ausência com a qual essa temática vem sendo
tratada pelos processos de formação inicial e/ou continuada dos docentes,
surge, então como uma necessidade formativa das professoras, sem o qual
fica impossível, na atualidade, falar de inovação pedagógica no âmbito da sala
de aula.

O fato é que esse é um conteúdo manifesto como uma necessidade


formativa das professoras pesquisadas que se configuram num bloco de

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saberes/conhecimentos que devem responder às demandas contemporâneas
de formação. Como afirma Gatti e Barreto (2009, p. 130) “disciplinas do bloco
[demandas contemporâneas] são muito variadas, não chegando a caracterizar
um padrão”, uma referência das autoras aos cursos de formação inicial dos
professores dos anos iniciais.

No caso dos saberes didático-pedagógicos, ele aparece em menor


proporção, certamente, porque as professoras são originárias do curso de
799
Pedagogia, na sua quase totalidade, e essa área do conhecimento é, junto
como os fundamentos da educação, uma área relativamente bem contemplada,
conforme literatura sobre o assunto. Embora, no caso da(s) didática(s),
disciplina de formação profissional relacionada com a prática escolar, ou seja,
aquelas realizadas na escola propriamente dita, ainda são insuficientes e,
como afirma Gatti et al (2011, p 93) “ não há consistência de uma
profissionalização, sem a constituição de uma base sólida de conhecimentos e
formas de ação”, isto é, conhecimentos profissionais.

Acerca dos conteúdos conceituais especificados pelas respondentes os


quais se caracterizam como necessidades formativas, sua representação está
organizada na figura de palavras a seguir:

FIGURA 1 Conteúdos especificados para melhor ensinar ciências

Fonte: Elaborado pela autora a partir de pesquisa empírica

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Ainda sobre esse mapeamento dos conhecimentos que as professoras
revelaram como necessidade para melhor ensinar Ciências, se destaca que os
15,2% de ocorrências manifestas sobre experimentos atividades práticas,
destacamos que em outro contexto do inquérito, mas com o mesmo propósito
de busca em relação às necessidades formativas desse grupo de professoras,
“fazer experimentos” se constituiu como um conteúdo procedimental
reconhecido pelas professoras, embora, essa dimensão dos conteúdos
escolares não pareça um conteúdo pelo qual as professoram transitam e fazem 800
uso em seus planos de trabalho, como um saber profissional devidamente
apropriado.

Sobre a segunda dimensão dessas necessidades formativas de


professores procuramos investigar se os conteúdos procedimentais estão
presentes ou são considerados quando se ensina Ciências da Natureza, e se o
procedimento lógico da classificação, compreendido pela pesquisa como uma
habilidade cognitiva se apresenta assimilada/apropriada pelas professoras para
poder ensinar vários conceitos das Ciências da Natureza que dependem, para
sua apropriação, desse procedimento ou habilidade. Quanto à questão dos
conteúdos inquerimos se os conteúdos procedimentais são reconhecidos como
conteúdos que devem ser ensinado; sobre a classificação investigamos se a
classificação é uma reconhecida como um conteúdo de ensino e se as
professores têm apropriado essa habilidade para poder ensinar?

Sobre o reconhecimento da dimensão procedimental dos conteúdos


escolares conforme a acepção de (Sacristan, 1998, Zabalza 1998, 1999,
Libâneo 1994, 2005, 2010), inferimos pelos dados obtidos que há uma
fragilidade no reconhecimento do que é um conteúdo procedimental, sendo
visível a prioridade do ensino são os conceitos desvinculado dos
procedimentos ou das habilidades.

Os conceitos se revelam na ação de acordo com a concepção


psicopedagógica da teoria histórico cultural. Na base do desenvolvimento de
habilidades estão os conteúdos, e estes se expressam nas habilidades que os
estudantes irão formar. Essa é uma discussão que precisa ser aprofundada

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nos cursos de formação de professores, a dimensão dos conteúdos escolares
(conceitos, procedimentos e atitudes) e a questão das operações mentais do
processo de aprendizagem destes conteúdos parecem necessitar de
ressignificação nos processos formativos.

Gráfico 1 – O ensino de procedimentos como prioridade de ensino

801

45,5%

54,5%

Não Sim

Fonte: Pesquisa de empírica realizada pela autora.

Pelos dados do gráfico acima o percentual de professoras que afirmam


priorizar o ensino de conteúdos procedimentais, 54,5% não representa de fato
que esse tipo de conteúdo é ensinado, pois quando se pediu para que esses
conteúdos fossem exemplificados apenas 25% do percentual dos 54,5%
indicaram um conteúdo procedimental aceitável para as Ciências da Natureza.
Pelos dados há clareza dos professores quanto ao que são procedimentos de
ensino, um conhecimento específico do campo da didática estudada em cursos
de formação inicial de professores. Disto decorre o percentual de professoras
que no ensino de conceitos das ciências da Natureza não priorizam o ensino
de procedimentos correlatos a estes conceitos é maior do que os 45,5%
revelados.

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Tabela 3 – O ensino de procedimentos como prioridade de ensino

Quantidade
Categorias de (%)
professoras

Exemplifica estratégias de ensino 18 50,0%


Exemplifica conteúdos procedimentais priorizados em aula 9 25,0%
Não exemplificaram apresentaram outro tipo de resposta 9 25,0%
Total 36 100,0% 802
*Total de respondente: 66 ** Trinta professoras não reponderam.
Fonte: Elaborado pela autora a partir de pesquisa empírica

De acordo com a tabela 3 concluímos que há subjacente uma


compreensão de procedimentos relacionada ao como fazer, estratégias e
recursos que utilizam para nas aulas, 50% dos que responderam a essa parte
do inquérito exemplificaram dessa forma:

Exemplo após estudarmos sobre as alimentação saudável, separei os alunos em


dupla e eles construíram a pirâmide alimentar, conforme seus entendimentos.(Cravina)

Durante a apresentação eles tiveram a oportunidade de rever e fazer mudanças.


Geralmente faço pesquisas e planejo de acordo com cada assunto que vou introduzir,
portanto levo para a sala de aula figuras, cartazes, materiais recicláveis, enfim tudo
que facilitará a compreensão e aprendizagem deles.(Margarida)

“Através de recursos audiovisuais, textos informativos, pesquisas, recorte e colagem,


produção textual e exercícios.” (Gerbra)

As falas dessas professoras trazem indícios de uma compreensão restrita


quanto ao significado de procedimentos, elas vinculam procedimentos a algo
que se faz e que se ver, se manipula, se observa, e não como algo que
também ocorre no nível da abstração a partir de um movimento do
pensamento. Os 25% de professoras que declaram priorizar o ensino de
procedimentos (tabela 3)certamente são professoras que em outra situação do

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inquérito indicaram/listaram conteúdos procedimentais relacionados às
Ciências da Natureza destacando procedimentos que se configuram como
procedimentos lógicos, como habilidades cognitivas (Jorba, 2000; Libâneo,
2016; Carvalho, 2016), quais sejam: observar, identificar, comparar, classificar,
explicar, argumentar, etc.

Os conteúdos procedimentais que receberam destaque mais evocados se


referem as habilidades de observar com muita evidência; verifica-se também a
803
presença da habilidade de descrever e classificar. As duas primeiras
considerada pré-requisito para a a habilidade de classificação. Outro
procedimento que merece uma discussão é fazer experimentos que também
surgiu na primeira dimensão de necessidades que tratamos, como um saber a
ser aprendido para melhor ensinar Ciências da natureza.

FIGURA 2 Conteúdos Procedimentais

Fonte: Elaborado pela autora a partir de pesquisa empírica

Essas dimensões de necessidades formativas apresentadas pelas


professoras configura um indicativo de que essas necessidades incidem sobre
as dimensões de necessidades estudadas por Carvalho e Gil-Perez, 2011,
quais sejam: a) Adquirir conhecimentos teóricos; b) Saber analisar criticamente
o “ensino tradicional sobre aprendizagem de Ciências; c) Saber preparar
atividades; d) Saber dirigir o trabalho dos alunos; e) saber avaliar; f) saber
associar ensino e pesquisa didática”. Também às articulamos ao quadro de

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saberes profissionais, disciplinares e curriculares sistematizados por Tardif
(2002).

CONSIDERAÇOES FINAIS

A melhoria da qualidade do ensino nos anos inicias da educação básica


está atrelada entre outros fatores à formação, à aprendizagem da docência e
ao desenvolvimento profissional docente. Sem uma política de formação
continuada que parta das necessidades formativas em nível de rede de ensino 804
a profissionalização do trabalho docente é comprometida.

Os saberes apontados pelas professoras e identificados como


necessidades formativas estão em acordo com as lacunas que se observam
nos cursos de formação inicial de professores para os anos iniciais, discutidos
por estudos do campo educacional e integram um quadro de saberes que os
teóricos do ensino das ciências da natureza já classificaram, com a indicação
de que, o bom ensino, no campo das ciências da natureza, demanda o domínio
desse conjunto de saberes de forma articulada e orgânica.

As Ciências da Natureza estando ausente dos processos de formação


continuada como revelaram os dados, se negligencia não só a perspectiva da
alfabetização científica contemplada nas orientações curriculares vigentes, mas
se desconsidera um conjunto de necessidades formativas – conceituais,
metodológicas, tecnológicas, entre outras - , em relação a essa área de
conhecimento que é objeto de ensino nas salas de aula dos anos iniciais.
Neste caso, pode-se dizer que na rede municipal de ensino de João Pessoa, as
práticas de formação continuada não tributam para desenvolvimento histórico,
dinâmico e complexo da profissão orientada para a profissionalização docente.
Constitui demanda urgente um novo modelo de formação continuada
centrado nas necessidades formativas e, em primeira instância, no movimento
da ressignificação dos conhecimentos, das habilidades, dos valores e da ética
profissional, pela via da articulação da Ciência com a prática e vice-versa, de
modo que um modelo de trabalho docente possa tomar corpo, no âmbito da
rede de ensino, como atividade subjetiva e objetiva própria da docência.

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237-1438-3
CONCEPÇÕES DE AUTONOMIA CURRICULAR NAS POLÍTICAS
CURRICULARES NACIONAIS PARA AS ESCOLAS DO CAMPO

Girleide Tôrres Lemos | Lucinalva Andrade Ataíde de Almeida

RESUMO: Nosso trabalho se insere no debate entorno da autonomia nas práticas


curriculares dos professores. Entendemos que a autonomia se constitui como
processo de decisão individual e coletiva em respostas as demandas instituídas na
sociedade. Dentre estas, temos as demandas voltadas as orientações presentes nas 807
políticas curriculares para as escolas, seja através de Leis e Resoluções, bem como,
em Propostas Curriculares nas modalidades de ensino. Frente a isso, buscamos
analisar, concepções de autonomia curricular que estão presentes nas políticas
curriculares nacionais para as escolas do campo. Para tanto, partimos dos estudos de
Pacheco (2000, 2003), entre outros, no que se refere a autonomia curricular, a partir
das concepções de autonomia de orientação, de processo e relativa para analisar nas
políticas curriculares as orientações voltadas as práticas curriculares dos professores.
A partir das análises pudemos identificar que as políticas curriculares se remetiam as
concepções: a) Autonomia de orientação frente as políticas curriculares instituídas nos
sistemas de ensino; b) Autonomia de processo, que corresponde as orientações
estabelecidas pela administração das instituições em relação a organização e o
planejamento das aulas. O que sugere que as políticas curriculares influenciam a
autonomia da prática curricular dos professores.

Palavras-chave: Autonomia curricular. Políticas curriculares. Escola do Campo.

INTRODUÇÃO

Partimos do entendimento de que a autonomia se constitui como


processo de decisão individual e coletivo que se estabelece nas relações
sociais, como processo de construção subjetiva dos sujeitos frente às
diferentes situações sociais que são situadas num contexto social, histórico,
político e cultural, constituindo-se como prática social.
Em sendo a autonomia expressão da prática social, tomamos a
autonomia curricular, a partir do lugar-tempo das escolas do campo,
especificamente nas políticas curriculares para as escolas do campo. Para
tanto, tecemos como objetivo para este trabalho: analisar as concepções de
autonomia curricular presentes nas orientações das políticas curriculares
nacionais para as escolas do campo. Tomamos como referência os estudos de

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Pacheco (2000, 2003), Contreras (2012) entre outros, sobre autonomia
curricular, com o intuito de a partir das concepções trabalhadas por Pacheco
fazer as análises das políticas.
Assim, o texto tem a seguinte organização: discussão teórica sobre
autonomia curricular, na sequência apresentamos como realizamos a análise
das políticas e trazemos os nossos achados e por fim apresentamos
considerações entorno das concepções de autonomia curricular identificadas.
808
AUTONOMIA CURRICULAR

A autonomia é tratada por Pacheco (2000) como expressão do


desenvolvimento curricular, ou seja, a construção processual do currículo
enquanto planejamento e vivência e nessa construção os professores são um
dos sujeitos de decisão curricular. Nessa direção, ele explica que:
Entendemos por autonomia curricular do professor, não
propriamente um mecanismo de exclusão da normatividade do
sistema educativo, mas sim um suporte devidamente
territorializado e privilegiado das práticas curriculares
quotidianas. Mais do que uma matriz de construção da
cidadania, a autonomia curricular do professor dignifica o seu
papel como ator social, uma vez eu deve ser vista como um
padrão de assunção de um determinado projeto de identidade
social.

A autonomia curricular significa, nesses termos, uma prática que se


constrói num processo de disputa e conflito na elaboração das práticas
curriculares, dentre os sujeitos envolvidos nessas práticas o professor é um
dos principais agentes de decisão curricular sobre o que poderá ser
desenvolvido em resposta as influências das normatizações externas, tais
como as políticas curriculares.
Mesmo estando às práticas dos professores inscritas em um contexto
que lhe são oferecidos dentro de padrões pré-determinados pela instituição
educacional, a exemplo da política curricular, há nesse cotidiano uma margem
a criações criativas. E essa margem que “o sistema educativo e curricular deixa
nas mãos dos professores é o campo no qual eles desenvolvem sua

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profissionalização” (SACRISTÁN, 2000, p.168), e nesta o desenvolvimento das
práticas curriculares dos professores.
Ainda sobre a autonomia curricular, Pacheco esclarece que ao exercer
autonomia o professor expressa uma prática deliberativa sensível a
normatização, e “não a imposição de uma prática de regulação silenciadora
das capacidades e perspectivas curriculares dos professores, enquanto atores
dinâmicos nas tomadas de decisão” no desenvolvimento curricular (PACHECO,
2000, p. 179). Ou seja, sendo o professor um dos sujeitos de decisão 809
curricular, a autonomia curricular do professor expressaria o que os
professores estariam decidindo, de forma pontual, em resposta do
desenvolvimento curricular.
Assim, uma autonomia curricular que compreenderia a autonomia como
status ou como atributo perpassa uma autoridade unilateral do especialista
estabelecendo-se a partir do controle sobre as atividades docente. A este
controle justifica-se a necessidade de aplicação das demandas externas ao
cotidiano dos professores, tais como as políticas curriculares que não deverão
sofrer ingerência dos professores. Justificando assim uma dependência dos
professores as diretrizes técnicas que racionalizam o trabalho do professor,
como esclarece Contreras (2012, p. 2013):
Os processos de racionalização do trabalho do professor, a
separação da concepção e da execução não significam apenas
um dependência dos professores em relação às diretrizes
externas, mas este processo de dependência externa se
produz necessariamente ao preço da coisificação dos valores e
das pretensões educativas.

Assim, uma “autonomia ilusória”, aos professores espera-se que


executem as prescrições que regulamentam suas atividades docentes
apoiadas nas “formas burocráticas que dominam as relações institucionais”,
exigindo com isso um aumento da prescrição indiscutível dos resultados
(Ibidem, p. 213).
Contudo, no desenvolvimento curricular, o currículo é interpretado dentro
do contexto de vários condicionalismos que, corresponde “a um conjunto de
intenções, situações no continuum que vai da máxima generalidade à máxima
concretização, traduzidos por uma relação de comunicação que veicula

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significados sociais e historicamente válidos” (PACHECO, 2003, p. 18). Uma
vez que, o desenvolvimento curricular compreende processo dinâmico e
contínuo que envolve diferentes momentos, desde a justificação do currículo
até à sua avaliação e passando, também, pelos momentos de elaboração da
proposta curricular e vivência dessa proposta.
Desse modo, o desenvolvimento curricular compreende ao mesmo
tempo tanto a construção das intencionalidades do currículo, ou seja, do
planejamento ou elaboração do currículo, quanto compreende a aplicação. 810
Sendo com isso, “um processo complexo e dinâmico que equivale a uma (re)
construção de decisões de modo a estabelecer-se, na base de princípios
concretos, uma ponte entre a intenção e a realidade, ou melhor, entre o projeto
socioeducativo e o projeto didático” (PACHECO, 2000, p. 49).
Nesse processo, a decisão curricular do professor é interpretada como
exercício da autonomia curricular, à medida que os professores participam das
construções dessas decisões. É considerado que “embora os professores não
tenham uma intenção moral consciente com respeito ao seu trabalho”
compreende-se que as atividades podem trazer consequências que são morais
(CONTRERAS, 2012, p. 85).
Destaca-se também o compromisso profissional dos professores diante
dos diferentes pontos de vistas que ele constrói do contexto institucional e da
realidade em que está situado. Nesse sentido, Contreras (2012, p. 87) explica
que:

Esta consciência moral sobre o seu trabalho traz emparelhado


a autonomia como valor profissional. Apenas a partir da
assunção autônoma de seus valores educativos e de sua forma
de realiza-los na prática pode-se entender a obrigação moral.
Não poderíamos falar se não de uma obrigação como uma
ética profissional que não fosse a sua.

A ética do professor pautar-se-ia, com isso, pelo equilíbrio entre a


independência de juízo e da responsabilidade social frente ao compromisso
dos professores no desenvolvimento das suas atividades educativas. Essas
atividades compreendem a prática de uma ética que requer “juízos
profissionais contínuos sobre a propriedade das ações”, posto que esses juízos

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“podem ser modificados e adaptados porque as situações e circunstâncias,
bem como o alunado, também variam, e são igualmente autônomos” (Ibidem,
p. 87).
A relação contínua, supracitada, é abordada como sendo as relações de
disputas entre os projetos social e didático, e nesse processo envolveria a
construção permanente da autonomia curricular do professor, em resposta às
demandas do desenvolvimento curricular. Posto que, a proposta curricular
construída e desenvolvida pelo professor apresentaria certos níveis de 811
autonomia curricular. Nesse sentido, Pacheco (2000) aponta que a autonomia
curricular pode ser percebida a partir de concepções, sendo elas:

a) Autonomia de orientação, que parte de referências que orientem a


prática curricular do professor;
b) Autonomia de processo, nesta o professor tem autonomia
estabelecida pela administração da instituição escolar em relação
a organização e planejamento das aulas;
c) Autonomia relativa, as práticas dos professores são influenciadas
normativamente pela instituição escolar, mas no desenvolvimento
das suas práticas os planos pré-estabelecidos são passíveis de
reconstruções a partir das necessidades particulares de cada
professor.

Nos estudos de Pacheco (2000, 2003), temos uma ênfase sobre


desenvolvimento da autonomia curricular dos professores, pois ele chama a
atenção para a influência que as decisões dos professores frente a política
curricular podem trazer para o desenvolvimento do currículo na instituição
escolar. O que sugere que mesmo podendo exercer uma autonomia relativa
em resposta às políticas curriculares os professores estariam diante de
elementos que poderá favorecem a um condicionamento das práticas
curriculares dos professores no desenvolvimento curricular, pautado pelas
políticas curriculares instituídas.

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Nessa direção, Contreras (2012, p. 99) afirma que a prática do
professor, que envolve o ato de ensinar, “é um trabalho irremediavelmente
cheio de condicionantes, muitos deles também plenamente justificáveis, dada a
natureza social, pública, da educação”. Tomando as práticas curriculares como
expressão dessas práticas dos professores, elas estariam sendo tecidas
ancoradas no exercício da autonomia docente, em resposta as condições
estabelecidas no cotidiano escolar, tais como os contextos das políticas
curriculares. Diante disto, sentimos a necessidade de identificarmos que 812
concepções de autonomia curricular aparecer nas políticas curriculares para a
escolas do campo.

POLÍTICAS CURRICULARES NACIONAIS PARA AS ESCOLAS DO CAMPO

As políticas curriculares nacionais para as escolas do campo foram


constituídas a partir das mobilizações dos Movimentos Sociais do Campo, que
através de Encontros Regionais, Nacionais e Internacionais, Fóruns e
Conferências passam a defender o projeto de educação que tratasse das
especificidades do território camponês, fundamentado no Paradigma da
Educação do Campo. Essas mobilizações influenciaram na constituição de
políticas curriculares pautadas pelo trato das diferenças socioculturais,
políticas, econômicas e epistêmicas dos povos camponeses.
Tomamos como corpus de análise, para este trabalho, os seguintes
documentos: Lei nº 9.394/96 Diretrizes e Bases da Educação; Resolução Nº
01/2002 Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo; Resolução Nº 02/2008 Diretrizes Complementares, Normas e
Princípios para o Desenvolvimento de Políticas Públicas de atendimento da
Educação Básica do Campo.
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), no que diz respeito às
escolas do campo nos Artigos 23, 26 e 28, podemos identificar a presença de
orientações que visam tratar do atendimento as escolas do território camponês.
Dentre estas, no caput do Artigo 23 da LDB, encontra-se a garantia da

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organização do calendário escolar para o território rural de acordo com suas
peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas.
O Artigo 26 da referida Lei orienta que o currículo, além de atender à
base comum nacional, deverá adequar-se a cada “sistema de ensino e
estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas
características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da
clientela” (BRASIL, 1996).
No caput do Artigo 28 da LDB, encontra-se a garantia de um sistema de 813
ensino que organiza e planeja um currículo adequando às diferenças
socioculturais do campo, requerendo do sistema de ensino um currículo
adequado às suas especificidades. Tal orientação é reforçada quando
identificamos a seguinte disposição no mesmo caput “na oferta de educação
básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as
adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de
cada região” (BRASIL, 1996). Observamos que neste dispositivo encontra-se
uma das primeiras orientações quanto à organização do currículo das escolas
do campo, trazendo nos incisos I ao III, um detalhamento quanto ao trato das
especificidades do território rural no currículo, dispondo sobre a garantia de:

conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às


reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
organização escolar própria, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas; adequação à natureza do trabalho na zona rural
(BRASIL, 1996).

A partir dessas orientações é instituído nos sistemas municipais de


educação do Brasil, o programa Escola Ativa, em que foram ao todo 3.106, dos
5.565 municípios brasileiros atendidos por meio do Plano de Desenvolvimento
da Educação (PDE). É importante registrar que esse programa não tomou
como referência as especificidades e diferenças das escolas localizadas no
campo, e sim se pautou por uma única proposta curricular que atendesse a
todos os municípios.
Frente a essa política curricular, proposta no programa Escola Ativa,
tivemos mudanças nas políticas educacionais e curriculares para as escolas do

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campo através da luta dos movimentos sociais do campo pelo direito à
educação, que teve como marco a I Conferência Nacional “Por uma Educação
Básica do Campo”, realizada em 1998. O que desencadeou uma série de
ações e mobilizações vindas a forçar o Estado a estabelecer políticas
educacionais e curriculares que tratassem das especificidades e diferenças das
escolas do campo.
Em consequência desse contexto é apenas a partir dos anos de 2002,
que temos constituído no país uma política educacional e curricular específica 814
para escolas do campo, agora fundamentado em alguns princípios da
Educação do Campo, pautado pelos movimentos sociais camponeses.
Apresentadas nas Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas escolas
do campo (Resolução CNE/CEB n° 01/2002 -), e nas Diretrizes
complementares normas e princípios para o desenvolvimento de políticas
públicas de atendimento da Educação Básica do Campo (Resolução CNE/CEB
nº 2/2008).
A partir destas Diretrizes estabelece-se que as escolas localizadas no
território camponês deverão ser organizadas levando em consideração a sua
vinculação às questões inerentes à realidade deste território, para tanto devem
ancorar-se na temporalidade e nos saberes próprios dos estudantes. Neste
viés, esclarece o Artigo 7:

É de responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino,


através de seus órgãos normativos, regulamentar as
estratégias específicas de atendimento escolar do campo e
a flexibilização da organização do calendário escolar,
salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos e tempos
de aprendizagem, os princípios da política de igualdade
(BRASIL, 2002).

Observamos, nesse enunciado, uma mudança quanto ao sentido de


organização do sistema municipal de ensino. Posto que até então, na LDB,
orientava-se que os sistemas municipais deveriam adaptar e adequar o
currículo estabelecido pelas políticas curriculares nacionais (oficiais) as
realidades das escolas do campo, estas tomadas a partir do programa Escola
Ativa.

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Por sua vez, nas Diretrizes dá-se abertura a possibilidade dos sistemas
municipais de ensino constituir suas propostas curriculares, quando se orienta
que “é de responsabilidade dos sistemas de ensino regulamentar as
estratégias específicas de atendimento escolar do campo”, o que trouxe
consequências na organização das propostas pedagógicas dos municípios,
que passariam a tomar como referência na constituição das suas políticas
curriculares o contexto das escolas do campo e suas especificidades.
Para Tafarel e Molina (2012, p. 574), o “grande diferencial destas 815
políticas (Diretrizes) reside não apenas na participação dos movimentos na sua
concepção e na sua proposta de execução, mas, prioritariamente, nos objetivos
formativos que as conduzem”. Assim, uma política curricular que considere a
posição epistêmica dos sujeitos do campo, que tomam as especificidades e
diferenças do campo a partir das relações de solidariedade, de igualdade, de
respeito, de coletividade e de alteridade (LEMOS, 2013).
Quanto ao trato das especificidades do território camponês no currículo
da escola do campo, podemos identificar no caput do Artigo 7 inciso I que “a
organização e o funcionamento das escolas do campo respeitarão as
diferenças entre as populações atendidas quanto à sua atividade
econômica, seu estilo de vida, sua cultura e suas tradições” (BRASIL, 2008). O
que sugere que no âmbito micro dessas políticas curriculares, no contexto das
escolas, serão consideradas as propostas particulares de cada instituição,
respeitando organização do currículo de cada escola com base na autonomia
curricular dessas escolas na organização e vivência desse currículo.
Nessa direção, estamos entendendo a autonomia curricular enquanto
possibilidade em que a escola, a partir dos sujeitos que a constituem, realiza a
produção do currículo local através de um movimento relacional, ou seja, entre
a política curricular (oficial) e o contexto que envolve os diferentes sujeitos,
interesses e valores na escola. Desse modo, espera-se “que a escola e, em
particular, os professores se assumam como elementos estratégicos de
decisão curricular, capazes de garantirem a promoção das especificidades
locais e de estimularem uma autêntica vivência democrática” (MORGADO,
2006, p. 54). Com isso, as práticas curriculares expressam o respeito das

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diferenças e especificidades dos sujeitos camponeses, favorecendo assim a
gestão local do currículo96.
No que lhe diz respeito às orientações quanto às práticas curriculares
dos professores, identificamos que tanto a Resolução nº01/2002 quanto a
Resolução nº02/2008 fazem referência ao Artigo 13 da LDB que trata das
incumbências do professor:

I Participar da elaboração da proposta pedagógica do 816


estabelecimento de ensino;
II elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta
pedagógica do estabelecimento de ensino;
III zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de
menor rendimento;
V ministrar os dias letivos e horas aula estabelecidos, além de
participar integralmente dos períodos dedicados ao
planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
VI colaborar com as atividades de articulação da escola
com as famílias e a comunidade (BRASIL, 1996).

Neste caput podemos observar que as práticas a serem desenvolvidas


pelo professor tomem como referência o que estamos denominando de
responsabilidades atribuídas aos saberes-fazeres dos professores. E orienta-se
que as práticas curriculares dos professores estejam em diálogo com as
orientações previstas nas propostas curriculares nos sistemas de ensino, bem
como, que suas práticas sejam articuladas as demandas da comunidade
escolar.

CONCLUSÕES

Assim, pudemos identificar que as políticas curriculares se remetiam a


diferentes concepções: a) Autonomia de orientação; b) Autonomia de
processo. Uma mais voltada as orientações destinadas a construção de um
sistema de ensino que tomasse como referência as diferentes características
culturais, sociais, políticas e econômicas de cada região. E uma outra volta

96
Conceito desenvolvido por Leite (2003) para problematizar a construção de projetos
curriculares que deem sentido à instituição escolar.

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para as atividades nas instituições escolares, principalmente trazendo
orientações quanto a construção das propostas curriculares de cada escola e
como os professores poderiam desenvolver a organização e o planejamento
das aulas nas suas respectivas salas.
A primeira concepção, autonomia de orientação, está voltada a
necessidade de as políticas curriculares instituídas nos sistemas de ensino, de
cada região, levem em consideração a adequação das metodologias as
características do território camponês. Também chama a atenção para 817
regulamentação, nos sistemas de ensino, de estratégias de ensino específicas
a organização e o funcionamento das escolas do campo. Referindo-se as
propostas curriculares construídas nos municipios e estados, voltadas para as
escolas do campo no Ensino Fundamental e Médio, estaremos organizadas a
partir das características de cada região.
Na segunda concepção, autonomia de processo, que corresponde as
orientações estabelecidas pela administração das instituições em relação a
organização e o planejamento das aulas. Temos orientações que se reportam a
necessidade de os professores participarem da elaboração das propostas
pedagógicas nas instituições escolares, tais como o projeto Político
Pedagógico da Escola. Bem como, chama a atenção a necessidade de os
planos de aula dos professores estarem guiados pela proposta da instituição
escolar.
Com isso, pudemos analisar que as concepções identificadas sugerem
que as políticas curriculares influenciam a autonomia da prática curricular dos
professores através do que poderá estar orientando a Proposta Curricular
adotado pelo sistema de ensino, bem como, no Projeto Político Pedagógico
Escolar. Pois, a autonomia envolve decisões dos professores – que nunca são
unilaterais –, logo, precisamos compreendê-las enquanto uma autonomia
relativa como uma ação desenvolvida num contexto de tensão entre os
contextos que influenciam a construção das suas práticas curriculares dos
professores no cotidiano escolar.

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A REESTRUTURAÇÃO DO CURRÍCULO DO CURSO DE GEOGRAFIA DA
UFPB: CONCEPÇÕES E PROPOSTAS DE PROFESSORES
FORMADORES97

Mayara Praddo Venturine da Silva

RESUMO: As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores


no Brasil ensejaram uma série de mudanças no currículo das licenciaturas,
especialmente com a separação dos cursos de licenciatura e bacharelado, a
ampliação da formação pedagógica, a criação das práticas curriculares e dos estágios 819
supervisionados. Diante dessas mudanças, o presente trabalho analisa as concepções
e propostas de professores formadores sobre a reestruturação do currículo do Curso
de Geografia da UFPB. Os sujeitos da investigação são professores que integram o
Núcleo Docente Estruturante (NDE) e atuam no processo de concepção, consolidação
e contínua atualização do novo projeto pedagógico do curso de licenciatura, aprovado
em 2015. A abordagem qualitativa adotada na pesquisa foi baseada em duas técnicas
a saber: 1) análise bibliográfica e documental; 2) realização de entrevistas
semiestruturadas com dois professores formadores. Os resultados mostram que
muitos desafios são enfrentados pelos professores formadores após as mudanças no
currículo da licenciatura, sobretudo com a falta de maior articulação entre os saberes
pedagógicos e os saberes geográficos. A fala dos entrevistados reforça a visão de que
ainda há uma cultura bacharelesca enraizada no curso de Geografia da UFPB.
Palavras-chave: Currículo. Formação de professores. Ensino de Geografia. Diretrizes
Curriculares Nacionais. Projeto Pedagógico de Curso.

INTRODUÇÃO

Após convocação do Ministério da Educação e Cultura (MEC), as


instituições de Educação Superior apresentaram propostas para a elaboração
das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) que, lançadas em 2002, deram
subsídios à reformulação dos currículos dos cursos de graduação. Constituídas
por um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos a serem
observados na organização institucional e curricular de cada estabelecimento
de ensino, as DCNs aspiravam assegurar aos alunos uma formação teórica e
prática de melhor qualidade (BRASIL, 2002).

97
Esse trabalho apresenta alguns resultados da pesquisa aprovada no Edital 2018 do
Programa de Licenciatura (PROLICEN/UFPB) e desenvolvida sob a orientação do Prof. Dr.
Lenilton Francisco de Assis, do Departamento de Metodologia de Ensino e do Programa de
Pós-graduação em Geografia da UFPB.

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Como novidades, as DCNs de 2002 propunham a separação entre
bacharelado e licenciatura, a oferta de 400 horas de prática como componente
curricular (a serem vivenciadas ao longo do curso) e de 400 horas de estágio
curricular supervisionado (a ser ofertado na segunda metade do curso).
Após emendas e reformulações, em 2015 o MEC lança novas DCNs por
meio da Resolução CNE/CP nº 2/2015, na qual amplia o tempo mínimo de
formação dos profissionais do magistério da educação básica (de 2800 para
3200 horas) e reafirma a carga horária já definida para as práticas curriculares 820
e para os estágios supervisionados (BRASIL, 2015).

Diante da nova legislação, justifica-se o interesse de analisar as


concepções e propostas de professores formadores sobre a reestruturação do
currículo do Curso de Geografia da UFPB. Os sujeitos da investigação são
professores que integram o Núcleo Docente Estruturante (NDE) e atuam no
processo de concepção, consolidação e contínua atualização do novo Projeto
Pedagógico do Curso (PPC) de licenciatura que, aprovado em 2015, constitui-
se no objeto da presente pesquisa.

Buscou-se investigar se as concepções formativas do novo PPC


permitem superar o paradigma da racionalidade técnica e contribuir para
fortalecer a identidade profissional docente, especialmente com a ampliação
das disciplinas pedagógicas, das práticas curriculares e dos estágios
supervisionados.

Assim, cabe questionar: Será que o novo PPC apresenta uma base
curricular voltada a fortalecer a relação teoria-prática na formação de
professores de Geografia?

METODOLOGIA
A abordagem qualitativa adotada na pesquisa foi baseada em duas
técnicas a saber: 1) análise bibliográfica e documental; 2) realização de
entrevistas semiestruturadas com professores formadores. Segundo Lüdke e
André (1986, p. 34), a entrevista semiestruturada se desenrola a partir de um
esquema básico, porém não aplicado rigidamente, que permite ao entrevistador

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fazer as necessárias adaptações. É o tipo de entrevista mais adequado para o
trabalho de pesquisa que se faz atualmente em educação.

Nesse sentido, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com dois


professores do Núcleo Docente Estruturante (NDE), a fim de identificar o perfil
acadêmico dos docentes e suas concepções e propostas sobre o novo
currículo do curso de Geografia.

Antes de apresentar os resultados das entrevistas, convém ressaltar que 821


se entende o currículo como um campo político e pedagógico que define os
conhecimentos a serem desenvolvidos nas instituições oficiais de educação.
Materializado em um documento, é por meio do currículo que a escola e a
universidade se organizam e funcionam. De acordo com Apple (2013, p. 71):

O currículo nunca é apenas um conjunto neutro de


conhecimentos, que de algum modo aparece nos textos e nas
salas de aula de uma nação. Ele é sempre parte de uma tradição
seletiva, resultado da seleção de alguém, da visão de algum
grupo acerca do que seja conhecimento legítimo. É produto das
tensões, conflitos e concessões culturais, políticas e econômicas
que organizam e desorganizam um povo.

Pensar no currículo é saber que ele não é neutro, porque ele regula o
processo de ensino aprendizagem, está envolvido por fatores internos e
externos que se entrelaçam na prática pedagógica e no conhecimento
educacional. Segundo Sacristán (2013, p.20):

Desde suas origens, o currículo tem se mostrado uma invenção


reguladora do conteúdo e das práticas envolvidas nos processos
de ensino e aprendizagem, ou seja, ele se comporta como um
instrumento que tem a capacidade de estruturar a escolarização,
a vida nos centros educacionais e as práticas pedagógicas, pois
dispõe, transmite e impõe regras, normas e uma ordem que são
determinantes.

Percebe-se, então, como é importante o envolvimento dos professores


seja na construção, seja na revisão do currículo. É um documento de
construção e de ação coletiva que não pode ser menosprezado ou
negligenciado, mas alvo de reflexões permanentes.

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Partindo dessa ideia, propõe-se analisar as concepções e propostas de
professores formadores sobre a reestruturação do currículo do curso de
Geografia da UFPB. Ciência abrangente por princípio, a Geografia requer a
articulação de saberes complexos e de análises multiescalares para dar conta
da espacialidade presente na vida dos alunos, nas suas relações entre a
sociedade e a natureza, entre o seu lugar e o mundo (CALLAI, 2006;
VESENTINI, 2006).
822
Para tanto, é fundamental uma formação crítico-reflexivo do professor de
Geografia (CAVALCANTI, 2012) que não restrinja a prática do professor ao
“repasse” de conteúdo do livro didático. É preciso que o docente de Geografia
também produza pesquisa e conhecimento na atividade educativa, pois, de
acordo com Pimenta (1999, p. 28):

Um curso de formação inicial poderá contribuir não apenas


colocando à disposição dos alunos as pesquisas sobre a
atividade docente escolar (configurando a pesquisa como
princípio cognitivo de compreensão da realidade), mas
procurando desenvolver com eles pesquisas da realidade
escolar, com o objetivo de instrumentaliza-los para a atitude de
pesquisa nas suas atividades docentes. Ou seja, trabalhando a
pesquisa como princípio formativo na docência.

Assim, o professor não será apenas um usuário do conhecimento que é


produzido por outros pesquisadores, mas também um produtor do
conhecimento escolar, ou seja, um professor-pesquisador (BORTONI-
RICARDO, 2008) que se dispõe a produzir conhecimentos a partir da
compreensão e análise das adversidades que ocorrem durante a sua prática,
com o intuito de melhorá-la.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Docentes que integram o NDE do Curso de Geografia da UFPB se


lançaram no desafio de propor uma formação teórico-prática que proporcione
aos futuros professores uma compreensão epistemológica e pedagógica sobre

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como operar o raciocínio geográfico com crianças e jovens da educação
básica. Partindo desse desafio, eles formularam o novo PPC da licenciatura
que foi aprovado em 2015. Ainda defasado em relação às DCNs de 2002, o
velho currículo era essencialmente voltado para o bacharelado, ao ponto de
condicionar a formação do professor à conclusão primeira da formação como
técnico-pesquisador.

O projeto pedagógico de 1998 que ainda está vigente, com as últimas


823
turmas, tem como proposta formar tanto o profissional geógrafo (bacharel)
quanto o professor de geografia (licenciado). Esse projeto formativo dá pouca
atenção à prática e aos saberes docentes, pois ao ofertar os saberes
disciplinares, nos três primeiros anos do curso, e os saberes pedagógicos, só
no final, a velha matriz também reforçava a separação entre teoria e prática,
entre universidade e escola. Esse sistema 3+1, segundo Assis e Silva (2016),
foi alvo de inúmeras críticas por discentes concluintes do curso, por não se
sentirem devidamente preparados para exercer a profissão docente.

Tardif (2001, p. 119) também se opõe a essa concepção tradicional da


relação teoria-prática na formação de professores e alerta:

Segundo essa concepção, o saber está somente do lado da


teoria, enquanto a prática ou é desprovida de saber ou portadora
de um falso saber baseado, por exemplo, em crenças,
ideologias, ideias preconcebidas etc. Além disso, ainda segundo
essa concepção tradicional, o saber é produzido fora da prática
(por exemplo, pela ciência, pela pesquisa pura etc.) e sua
relação com a prática, por conseguinte, só pode ser uma relação
de aplicação. É exatamente essa concepção tradicional que
dominou, e domina ainda, de maneira geral, todas as visões da
formação dos professores tanto nas universidades do hemisfério
Norte quanto nas universidades do hemisfério Sul: os
professores são vistos como aplicadores dos conhecimentos
produzidos pela pesquisa universitária, pesquisa essa que se
desenvolve, a maioria das vezes, fora da prática do ofício do
professor.

O novo PPC da licenciatura foi aprovado pela Resolução do


CONSEPE/UFPB Nº 08/2016, após ser elaborado em parceria entre o
Departamento de Geociências e o Centro de Educação. Na nova matriz ficou

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estabelecido que o curso seria noturno, com carga horária de 3015 h/a ou 201
créditos, sendo o tempo mínimo de conclusão em nove períodos e tempo
máximo de catorze semestres ou sete anos (UFPB, 2016).

Diante do novo PPC, investigamos as concepções e propostas de dois


professores formadores que doravante serão chamados de P1 e P2. Eles
apresentam o seguinte perfil acadêmico: O P1 possui pós-doutorado em
Educação e atua como docente há mais de 30 anos, sendo 10 anos dedicados
824
à educação básica. O P2 possui doutorado em Geografia e atua no ensino
superior há 9 anos. Na educação básica, lecionou por 3 anos.
O P1 tem formação e atuação na área de ensino da geografia, tendo
ministrado, por muitos anos, disciplinas como Prática de Ensino, Estágio
supervisionado, e Metodologia do Ensino de Geografia. Atualmente, é membro
do NDE e tem larga experiência de ensino, pesquisa e extensão no campo da
Educação Geográfica.

O P2 atua na área da Geografia Física, foi membro do NDE durante a


reformulação dos atuais projetos da licenciatura e do bacharelado e coordenou
Programas de Iniciação à Docência como PIBID e o Prodocência.

Quando perguntados sobre a separação da licenciatura e do


bacharelado, tanto o P1 quanto o P2 confirmaram ser a favor dessa separação.
Contudo, o P2 ponderou:

São cursos com objetivos de formação diferenciados, apesar da


pouca clareza, por parte principalmente dos professores
formadores, os quais pouco ou nada fazem para diferenciar os
cursos em suas práticas e metodologias de ensino. Observo que
a cultura bacharelesca ainda é predominante no curso de
licenciatura. A formação do profissional professor de geografia
na UFPB ainda é pouco discutida no âmbito do currículo, da
prática como componente curricular das disciplinas e da
avaliação, ou seja, existe um imenso vazio de discussão/reflexão
entre nós professores formadores. (P2)

Tanto o P1 quanto o P2 acreditam que a matriz de 1998, cujo currículo


possibilita ao aluno concluir o bacharelado e complementar a formação com as
disciplinas da licenciatura, não forma adequadamente o professor. É uma

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concepção curricular que está desatualizada, há mais de uma década, sendo
ainda baseada na chamada formação 3+1 que, segundo o P2:

É uma formação frágil e desarticulada, pois a formação inicial do


professor é prejudicada e também acredito, segundo os relatos
dos alunos, que as práticas de ensino (estágios supervisionados)
não dão conta ou são insuficientes para garantir a qualidade na
formação dos professores. (P2)

No que tange às suas avaliações e expectativas com a formação dos


825
ingressos no novo curso de licenciatura do projeto pedagógico de 2015, o P2
coloca como relativamente positiva em termos de atendimento às DCNs de
2015. No entanto, ele ressalta que o PPC tem mais pontos negativos do que
positivos, como elenca a seguir:

POSITIVOS: 1) Maior flexibilização entre os componentes, isto é,


sem pré-requisitos entre os componentes. Somente um
componente exige pré-requisito; 2) Maior clareza e regras mais
definidas para o componente TCC e os conteúdos
complementares flexíveis e 3) Flexibilização no formato do TCC
(a critério do discente: formato de monografia convencional ou
de artigo). NEGATIVOS: 1) Competências e habilidades mal
definidas; 2) Perfil do corpo docente não explicitado no
documento; 3) Componentes com ementas e bibliografias bem
semelhantes e 4) Reduzido número de componentes que tratem
da educação geográfica ou de sua relação direta com os demais
campos da geografia e da formação inicial docente. (P2)

Este último ponto é, inclusive, reiterado pelo P1 quando diz:


Ainda falta maior integração entre os componentes pedagógicos
e os específicos, além disso, existe pouco direcionamento para a
especificidade da formação do professor, ou seja, apenas alguns
professores encaminham seus conteúdos nas disciplinas
específicas para a formação do professor. (P1)

Este é um grave problema enfrentado nos cursos de licenciatura que,


mesmo tendo seus projetos pedagógicos revistos e adequados às novas
diretrizes, continuam, nas práticas dos professores formadores, a não
possibilitar a integração da teoria acadêmica com a prática escolar e a
construção de saberes docentes (TARDIF, 2002). Por isso, o P2 reafirma:

Acredito que [o currículo] possibilita muito mais a construção dos


saberes geográficos (mais ainda de modo muito fragmentado!)

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do que os saberes pedagógicos. Penso também que não ocorre
a ligação/contextualização entre esses saberes, pois a prática
como componente curricular nas disciplinas não está sendo
efetivada ou direcionada para formação do professor de
geografia. (P2)

Sabemos que apenas os saberes geográficos não são suficientes para


formar um bom professor, pois, cada vez mais, a docência se configura como
uma atividade complexa, construída por múltiplos saberes teórico-práticos
(específicos, pedagógicos e experienciais) ao longo da formação inicial e 826
continuada. Sobre isto Pimenta (1999, p. 27-28) afirma:
Os saberes pedagógicos podem colaborar com a prática.
Sobretudo se forem mobilizados a partir dos problemas que a
prática coloca, entendendo, pois, a dependência da teoria em
relação à prática, pois esta lhe é anterior. Essa anterioridade, no
entanto, longe de implicar uma contraposição absoluta em
relação a teoria, pressupõe uma íntima vinculação com ela.

Embora o novo currículo da licenciatura reserve 400 horas para o


estágio supervisionado e 400 horas para a prática como componente curricular,
os entrevistados não vislumbram mudanças na visão “prática” que ainda
predomina sobre o estágio supervisionado ao ponto de ressignificá-lo como
prática teorizada e teoria praticada (ASSIS; SILVA, 2016). De acordo com
Pimenta e Lima (2012, p. 34), o estágio tem de ser teórico-prático, uma
atividade de instrumentalização da práxis, ou seja, “uma atitude investigativa,
que envolve a reflexão e a intervenção na vida da escola, dos professores, dos
alunos e da sociedade”.
Nesse sentido, o P1 comenta:

Em relação ao Estágio, o mesmo pode ser melhorado, quando


tivermos um programa institucional em conjunto com as
secretarias municipais e estaduais de Educação, onde o
professor da escola, que recebe o estagiário, poderia ter horas
para frequentar a universidade e participar do planejamento e
gestão junto ao professor supervisor do Estágio. Sobre as
práticas como componente curricular, penso que também não é
consenso sua definição entre os professores. O currículo é
pesado e muito disciplinar. Existem poucas atividades
diversificadas para uma formação mais ampla do professor. (P1)

Essa formação mais ampla e centrada na prática é um dos principais


desafios postos por Nóvoa (2007, p. 14) para a formação do professor na

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atualidade. Segundo este autor, “há um déficit de práticas, de refletir sobre as
práticas, de trabalhar sobre as práticas, de saber como fazer”.

Apesar das críticas, os professores formadores acreditam que pode


acontecer melhoras se de fato houver um maior engajamento da gestão e dos
professores formadores, como enfatiza o P2:

Pode melhorar se, de fato, a gestão e os professores formadores


assumirem o curso de licenciatura, no sentido da compreensão
dos seus objetivos e de suas especificidades, além também de 827
contextualizarem mais os conteúdos geográficos de suas
disciplinas com o saber e o fazer pedagógico. (P2)

Nessa perspectiva, os entrevistados ainda apontam que existe um certo


distanciamento entre os conhecimentos da Geografia acadêmica e da
Geografia escolar, especialmente pelo fato de muitos professores formadores
não terem trabalhado na escola básica. De acordo com a fala do P2, essa
aproximação da Geografia acadêmica com a Geografia escolar sé dá de forma
bastante pontual, a saber:

[...] Acredito que os meus alunos têm pouca oportunidade de


experimentar/vivenciar essa relação, salvo algumas exceções,
as quais são pontuais: participação em projetos de iniciação à
docência (PIBID) e de extensão, além das práticas realizados
por poucos professores formadores, pois muitos dos meus
colegas não são sensíveis a essa relação, visto que, privilegiam
muito mais o saber acadêmico (as vezes puramente técnico)
sem relação/sem compromisso/sem contexto com a formação
docente. Ainda é reinante a cultura bacharelesca no nosso curso
de licenciatura! (P2)

Outro ponto de destaque foi o papel da pesquisa na formação do


professor. Há consenso de que ela se apresenta como prática fundamental de
compreensão e reflexão da própria ação docente e uma ferramenta para
superar o paradigma da racionalidade técnica e da imitação de modelos de
como ensinar que ainda coexiste em muitos cursos de formação de
professores (PIMENTA; LIMA, 2012). Sobre esse tema, o P1 ressalta:

A pesquisa é fundamental para o ensino. Aliás, pode se pensar


na pesquisa como uma metodologia, um recurso ou
procedimento de apoio ao ensino, seja na universidade seja na
escola básica. Em relação à colaboração entre professores,

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seria uma prática muito boa para ambos, mas sabemos das
dificuldades para realizar. Em geral, essa relação tem ocorrido
por meio dos alunos que estão pesquisando na universidade,
como no PIBIC e na pós-graduação.

Por fim, o P2 teceu críticas e sugestões levando em consideração o


curso de Geografia da UFPB, a respeito de questões muito presentes nas falas
de alunos, de políticos e consultores educacionais, como a questão da
universidade pública continuar não preparando bem o professor para o
828
exercício profissional na escola, que o professor se forma no cotidiano da
prática escolar e não na teoria da universidade, destacando a seguinte opinião:

Atualmente, é possível afirmar que ocorreram mais retrocessos


do que avanços, no tocante aos documentos oficiais e de
políticas públicas para o ensino básico e, de modo especial,
para a formação de professores. Ao considerar o atual contexto
político do Brasil, marcado pelo desmonte do Estado e pelo
esfacelamento dos serviços públicos e das garantias sociais
historicamente conquistadas, o cenário das políticas públicas
educacionais, sobretudo, aquelas voltadas para a formação
inicial docente, não é positiva, no sentido de sua continuidade e
expansão a exemplo do PIBID, além de outros Programas
como o PRODOCÊNCIA que foi integralmente interrompido.
Acredito que a universidade pública ainda não prepara bem o
profissional docente. Essa afirmação é muito genérica e só
deve ser levada em consideração quando trato da UFPB e de
modo muito particular do Curso em que atuo como docente [...]

O P1, de forma breve, também comentou a respeito dessas questões


reforçando que, apesar das perspectivas de avanços, o atual cenário político
denota retrocessos e riscos na formação do professor de Geografia da UFPB,
como ficou nítido nos depoimentos dos dois professores envolvidos na
pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados mostram que muitos desafios são enfrentados pelos


professores formadores após as mudanças no currículo do curso de Geografia
da UFPB, sobretudo com a falta de maior articulação entre os saberes
pedagógicos e os saberes geográficos.

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A fala dos entrevistados reforça a visão de que ainda há uma cultura
bacharelesca enraizada no curso de Geografia da UFPB, pois muitos
professores não se identificam com a licenciatura e não trabalharam na escola
básica. Logo, privilegiam o saber acadêmico, dificultando assim a articulação
teoria-prática e do saber-fazer docente.

É preciso maior engajamento dos professores formadores para conhecer


o projeto pedagógico e as especificidades da licenciatura. Assim, poderão
829
fortalecer a luta em defesa da formação e da profissão docente com qualidade
(na universidade e na escola), diante dos flagrantes retrocessos e ameaças
que vêm ocorrendo no cenário atual das políticas educacionais que podem tirar
do profissional da geografia seu principal campo profissional – a docência
escolar.

REFERÊNCIAS

APPLE, Michael W. A política do conhecimento oficial: faz sentido a ideia de


um currículo nacional? In: MOREIRA, Antonio Flavio; TADEU, Tomaz. (Orgs.)
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Educação na Sociedade Contemporânea (COBESC). Campina Grande-PB:
UFCG, 2016. p 1-13.

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de 2002. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
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graduação plena. 2002.

______. Resolução CNE/CP nº 2, de 19 de fevereiro de 2002. Institui a


duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de
formação de professores da Educação Básica em nível superior. 2002

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______. Resolução CNE/CP nº 2, de 9 de junho de 2015. Institui as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais
do Magistério da Educação Básica. Brasília: MEC/Conselho Nacional da
Educação, 2015.

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. O Professor-pesquisador: introdução à


pesquisa qualitativa. São Paulo. Parábola Editorial. 2008.

CALLAI, Helena Copetti. Estudar o lugar para compreender o mundo. In: 830
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos (Org.). Ensino de Geografia: práticas e
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CAVALCANTI, Lana de S. O ensino de geografia na escola. São Paulo:


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LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens


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NÓVOA. António. Desafios do trabalho do professor no mundo


contemporâneo. Livreto publicado pelo Sindicato dos Professores de São
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PIMENTA, Selma Garrido. Formação de professores: identidade e saberes da


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831

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A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR NA VISÃO DE DOCENTES E
LICENCIANDOS DE LÍNGUA PORTUGUÊSA: PESQUISA EXPLORATÓRIA

Nathalia Niely Tavares Alves de Melo | Denise Lino de Araújo

RESUMO: Após homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o


ensino fundamental (EF), em dezembro de 2017, o Brasil encontra-se em um período
de recepção ao novo documento, como também de (re)elaboração dos currículos
municipais e estaduais. Considerando que o currículo é um elemento complexo e
imprescindível da dinâmica escolar e que influencia o planejamento e ação docente,
os professores serão levados a modificar ou ressignificar elementos de sua prática 832
docente, e por isso, parece ser relevante conhecer suas representações sobre a
BNCC de EF e o ensino de língua. Assim, através da aplicação de um questionário
online com quinze sujeitos - licenciandos e professores do ensino fundamental II -,
vinculados à geração de dados de uma pesquisa exploratória mais ampla, objetivou-se
(1) identificar qual a opinião desses sujeitos a respeito da BNCC de ensino
fundamental e (2) inferir qual a perspectiva de currículo e de língua estes sujeitos
mobilizam ao falar sobre currículo de ensino de língua. O trabalho fundamenta-se
teoricamente em Silva (2017) e Macedo (2013), quanto aos estudos de currículo, e em
Moscovici (2007) quanto aos estudos sobre representação. Os resultados preliminares
apontam que os sujeitos participantes têm suas representações baseadas em
concepções tradicionais de currículo e de ensino de língua.

Palavras-chave: BNCC. Currículo. Representação Social. Ensino de língua


portuguesa.

INTRODUÇÃO

O artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases, determina a existência de um


padrão qualitativo para elaboração dos currículos de ensino na educação
básica. Desde 1997 essa padronização se dava por meio dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) para os ciclos correspondentes ao ensino
fundamental e das Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM) para
os anos finais da escolarização. No entanto no ano de 2010 iniciou-se a
discussão nos âmbitos políticos e educacionais visando a elaboração de uma
Base Nacional Comum Curricular (BNCC), havendo após o lançamento de três
versões preliminares a homologação da versão final em 20 de dezembro de
2017.
A partir de então, obtém-se novos documentos normativos para
elaboração e prática dos currículos de escolas de ensino básico de todo o

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Brasil, por isso, o cenário atual é de recepção à BNCC e atualizações dos
currículos municipais e estaduais, bem como nos livros e materiais didáticos.
Compreende-se aqui, que a BNCC não se constitui um currículo, mas se
configura enquanto o documento de caráter normativo que rege, a partir de
então, a elaboração dos currículos de todo o país. A definição de currículo que
embasa este trabalho é de “um artefato sócio educacional que se configura nas
ações de conceber/selecionar/produzir, organizar, institucionalizar,
implementar/dinamizar saberes, conhecimentos, atividades, competências e 833
valores” (Macedo, 2013, p.24), de forma que essa sistematização esteja
engajada na formação de sujeitos por meio do processo de ensino e
aprendizagem.
Considerando a complexidade do currículo e o atual cenário de
mudanças no âmbito curricular no Brasil, percebe-se que os professores de
ensino fundamental têm se deparado com um novo documento que
possivelmente acarretará mudanças em seu planejamento e prática docente.
Assim sendo, este artigo tem como objetivos (1) identificar qual a opinião
desses sujeitos a respeito da BNCC de ensino fundamental e (2) inferir qual a
perspectiva de currículo e de língua estes sujeitos mobilizam ao falar sobre
esses temas.
Para isso, consideramos aqui que as opiniões individuais são
constituintes das representações sociais, de forma que estas opiniões são
partilhadas com outros sujeitos resultando na construção de conceitos
socialmente aceitos (MOSCOVICI, 2007). Logo, conhecer as opiniões dos
docentes e licenciandos de língua portuguesa, implica conhecer os conceitos e
representações que tem perpassado a trajetória desses sujeitos a respeito do
tema currículo e sobre as propostas curriculares para o ensino de língua
portuguesa.
Para isso, o ponto de partida foi a aplicação de um questionário on-line
composto por 21 questões relacionadas à formação acadêmica e profissional
dos indivíduos, à proposta curricular da BNCC e ao ensino fundamental II, a fim
de traçar um perfil dos sujeitos focalizados. Embora a BNCC homologada
corresponda a todo o ensino fundamental, o foco deste trabalho situa-se na

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disciplina de língua portuguesa para os anos finais desse nível de ensino.
Desta forma, os sujeitos da pesquisa são professores atuantes ou em formação
para lecionar do 6º ao 9º ano, escolhidos a partir de três grupos previamente
contatados: licenciandos, professores do ensino fundamental da rede particular
e professores do ensino fundamental da rede pública, constituindo, por fim, um
coletivo de quinze participantes, sendo cinco representantes de cada grupo.
O tópico a seguir, corresponde ao desenvolvimento da pesquisa, intitula-
se Teorias de currículo e a BNCC de ensino fundamental, nele apresentamos 834
as teorias de currículo: Tradicionais, críticas e pós-críticas; os tipos de
currículo: prescrito, oculto e real; bem como a análise dos dados obtidos para
cumprimento dos objetivos elencados.

TEORIAS DE CURRÍCULO E A BNCC DE ENSINO FUNDAMENTAL

TEORIAS DE CURRÍCULO: TRADICIONAIS, CRÍTICAS E PÓS-CRÍTICAS

Os estudos de currículo têm adquirido cada vez mais relevância e


motivado a produção de pesquisas, isso porque se constitui como um elemento
sistematizador do ensino e pode ser definido enquanto

Todas as atividades que se organizam e se envolvem


visando determinada formação, operacionalizadas via
seleção, organização, formulação, implementação,
institucionalização e avaliação de saberes, atividades,
valores, competências, mediados pelo processo de
ensinar/aprender. (MACEDO, 2013, p. 38)

No entanto, o conceito de currículo passou por mudanças em relação à época


e às concepções teóricas desde que foi considerado um campo de estudos.
Podemos dividir essas concepções em três grupos: Tradicionais, críticas e pós-
críticas.

De acordo com Silva (2017, p 12), na teoria tradicional, o currículo é


perpassado por uma tecnicidade e é visto como sendo a “especificação precisa
de objetivos, procedimentos e métodos para obtenção de resultados que
possam ser precisamente mensurados”. Desta forma, o currículo é sempre um

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jogo de escolhas entre conhecimentos e saberes para obtenção de resultados
esperados. Essa teoria pautava-se num modelo econômico e tinha como ideal
a noção de eficiência e para isso, Bobbit, o autor do conceito citado (apud
SILVA 2017, p 12), baseava-se nos estudos de Frederick Taylor que apontavam
para a administração científica, assim, queria que:

O sistema educacional fosse capaz de especificar


precisamente que resultados pretendia obter, que
pudesse estabelecer métodos para obtê-los de forma 835
precisa e formas de mensuração que permitissem saber
com precisão se eles foram realmente alcançados. (idem,
p. 23)

Assim como afirmou Silva (2017), Bobbit assinalava, em sua teoria, a


cientificidade da educação, e isso se daria através de um mapeamento das
habilidades necessárias à aprendizagem, assim, o currículo deveria orientar as
habilidades a serem desenvolvidas e planejar e elaborar instrumentos de
medição para aferir se houve aprendizagem de maneira esperada. O currículo,
nessa concepção, é visto como uma ação mecânica, burocrática e técnica,
considerado apenas no nível prescritivo, ou seja, como aparato documental
que organiza previamente os conteúdos e traça o percurso do processo de
aprendizagem (SACRISTÁN, 2000).

No tocante ao ensino de língua portuguesa, por exemplo, Silva (2017),


afirma que no currículo tradicional, as aulas de língua se resumiam à leitura
das obras clássicas e artísticas das heranças clássicas grega e latina, e ao
domínio dessas línguas. A teoria tradicional de currículo, quanto ao ensino de
língua, aproximava-se de uma linguística histórica e clássica, sobretudo no
aprendizado das letras clássicas, privilegiando o estudo diacrônico da língua,
considerando-se que “a linguística do século XIX desenvolvia-se como
linguística histórica, com grande empenho dos neogramáticos e comparatistas
que buscavam as leis gerais que subjaziam todas as línguas” (MARCUSCHI,
2008, p. 26).

Os currículos tradicionais, no entanto, a escola não se mostrava


ideologicamente situada, tendo como base o hegemônico, e desconsiderando
as diferenças que constituem a escola. A partir dessa visão, surge a

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necessidade de tornar a escola um espaço mais crítico e democrático, tendo
com base as teorias críticas, que se pautam em considerar o currículo como
um campo de questionamento, experiência e de resistência, considerando
valores socialmente construídos e a participação ativa do aluno no processo de
aprendizagem (SILVA, 2017, p.54).

Nessa concepção, o currículo não é neutro, inocente e desinteressado de


conhecimentos e não é organizado por processos de seleção filosófica, mas
836
caracteriza-se por sua dimensão social (SILVA, 2017, p. 46), resultando na
valorização de um currículo não considerado anteriormente nas teorias
tradicionais: o currículo oculto. Esse currículo define-se como “aquele
transmitido implicitamente, mas não mencionado pela escola e que se fazia de
tal forma poderoso, pois podia propiciar controles sociais, lutas ideológicas e
políticas, provocadoras de mudanças sociais” (OLIVEIRA, 2008), sendo assim,
considera-se agora que a aprendizagem não deriva apenas do aparato
documental que rege o ensino, mas que ocorre a partir da dimensão interativa
das ações na escola e em sociedade.

Já as teorias pós-críticas de currículo se baseiam nas relações de


multiculturalidade, identidade e poder. Deste ponto de vista, o currículo abarca
as diferenças que compõem a sociedade e as consideram um processo
linguístico e discursivo, de modo que a diferença é “discursivamente produzida”
(SILVA, 2017, p. 87).

Desta forma, iniciando nas teorias críticas e continuando nas pós-críticas,


as teorias da análise do discurso, sociolinguística, sociointeracionismo e outras
passam a ser contemplados dentro do currículo para o ensino de língua
portuguesa de maneira interdisciplinar, correlacionados a fatores sócias,
históricos e culturais. A análise do discurso, por exemplo, “põe em cena a
questão de que não se pode reduzir o linguístico nem ao social, nem ao
psicológico, pois a linguagem é, ao lado de integralmente linguística,
integralmente histórica” (MARCUSCHI, 2008, p. 42).

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A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR
Desde a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, assegurava-se a produção
de uma base curricular de caráter normativo que garantisse que o ensino no
Brasil fosse regido por parâmetros que permitissem ao ensino ser mais
igualitário, e que ao mesmo tempo, houvesse abertura aos estados e
municípios a considerarem as realidades locais e regionais em seus currículos.
Até o ano de 2017, essa parametrização dava-se por meio dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e Orientações Curriculares para o 837
Ensino Médio (OCEM), contudo, desde 2010 se discute a elaboração de uma
base curricular. Em 2015, foi posta para consulta pública, pelo MEC, a primeira
versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), ocasião esta em que
professores e profissionais da educação discutiram o documento e sugeriram
modificações que fossem de importância para o ensino. Em 2016 e 2017,
foram lançadas a segunda e terceira versões, respectivamente, só havendo
uma versão homologada em 20 de dezembro de 2017, que é diferente das
demais.
A partir de então, o cenário educacional do Brasil é de adaptação ao
novo documento que tem caráter normatizador. Esta mudança tem motivado a
alteração dos currículos municipais e estaduais, livros didáticos e da própria
ação docente, já que a BNCC se ancora na teoria das habilidades e
competências, e no tocante ao ensino de língua portuguesa, segue uma
perspectiva enunciativo-discursiva.
Considerando esse cenário, empreendemos uma pesquisa mais ampla,
da qual este artigo focaliza apenas a visão de currículo dos professores e
licenciandos de língua portuguesa, bem como suas opiniões sobre a BNCC e o
ensino de língua, conforme exposto na seção a seguir.

O QUE PENSAM OS PROFESSORES SOBRE A PROPOSTA CURRICULAR


DA BNCC?

Para levantamento dos dados utilizados na pesquisa, foi disponibilizado


online um questionário composto por 21 questões. Através do google forms

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coletamos as respostas de quinze sujeitos colaboradores - professores e/ou
licenciandos de língua portuguesa - que foram organizados em três grupos:
licenciandos de Letras, professores da rede particular de e professores da rede
pública de ensino.
A primeira seção do questionário refere-se à formação acadêmica e a
experiência profissional dos sujeitos colaboradores que já estão lecionando.
Dentre os quinze sujeitos que responderam à pesquisa, identificamos a
seguinte distribuição no que diz respeito à formação: mestres (13,3%), 838
especialistas (33,3%), graduados (20%) e licenciandos (33,3%). Ter 33% de
licenciandos e de Professores deu ao grupo de sujeitos uma homogeneidade
que permitiu à pesquisa ser conduzida de modo mais equilibrado, em nossa
interpretação. Quanto ao tempo de experiência docente, lecionam há mais de
dez anos (26%) e os que lecionam há 4-10 anos (33,3%), e os que ainda não
atuam na prática docente (33,3%).

No formulário, o questionamento inicial diz respeito ao conhecimento dos


sujeitos sobre currículo. Ao serem indagados sobre as disciplinas que
cursaram ao longo da formação que contemplassem o tema currículo, 86%
responderam que haviam cursado disciplinas sobre essa temática na
graduação, mestrado ou formação continuada. Logo, o grupo participante da
pesquisa não desconhece os estudos sobre currículo, tendo acesso em
disciplinas como: Organização do Trabalho e do Ensino, Planejamento e
Avaliação, Didática, ou em disciplinas específicas sobre currículo.
Uma outra questão consistia na seguinte pergunta: “O que é currículo
para você?”, e nela, foram obtidas variadas respostas. Num primeiro conjunto,
colocamos duas das respostas que fogem ao escopo da discussão pretendida
com a coleta de dados, pois, consideravam o currículo enquanto apresentação
para o mercado de trabalho ou carta a ser entregue nas empresas. Mesmo os
participantes estando integrados ao cenário educacional (em formação ou na
prática docente), estas respostas relacionam o termo o termo currículo ao
mercado de trabalho, sinalizando certo desconhecimento dos estudos sobre
currículo enquanto sistematizador da atividade docente. Todavia, essas

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respostas não são excluídas de nossos dados porque integram um certo saber
exposto por dois dos colaboradores e apontam para a polissemia do termo.
Dentre os participantes, 86% apresentam o currículo enquanto
documento, não considerando sua vertente prática. De maneira bastante
recorrente, os participantes atrelaram o termo a prescrição, definindo-o
enquanto conhecimento, saberes, disciplinas, conteúdos, informações e
parâmetros governamentais. Tal ponto de vista se ancora nas considerações
de Silva (2017) que aponta essa perspectiva como respaldada por uma 839
concepção tradicionalista de currículo, cujo foco é a lista os conteúdos e
métodos para obtenção de resultados objetivados previamente,
desconsiderando as dimensões reais e ocultas do currículo, quando
considerado enquanto ação.
Apenas 14% das respostas sinalizaram para as dimensões críticas do
currículo, definindo-o enquanto “capacidade de envolvimento em práticas
educacionais” e “Matriz de objetos de conhecimento, real ou oculta”. Estas
parecem considerar as vivências do aluno, de modo que não consideram o
currículo como apenas um conjunto de normas ou um aparato documental,
mas sim como uma instância mais complexa que se situa também na ação
docente.
Como se pode observar, as respostas à questão sobre “o que é currículo
para você?” dirigida a licenciando e a professores das redes pública e particular
de ensino, que atuam no ensino fundamental, dividem-se em três grupos que
apontam para conceituações diferentes, porém, entendidas nesta pesquisa
como amalgamadas e indissociadas uma vez que circulam em “falas” e nos
discursos e ações, e aqui aparecem como uma resposta a uma questão
conceitual. Assim sendo, para o grupo de colaboradores currículo é documento
- que diz respeito ao perfil de um cidadão e que integra situações de seleção
para o mercado de trabalho, e que diz respeito ao conjunto de normas, listas e
procedimentos elaborados por terceiros (especialistas, provavelmente) para
serem implantados na escola. Além disso, currículo é também ação docente,
discente, na prática pedagógica.

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O questionário já mencionado apresentava ainda questão sobre sobre
os referenciais curriculares que norteiam a prática docente. Esta pergunta foi
dirigida apenas aos professores em atuação, 66% do percentual de
colaboradores, e eles citaram o Livro didático (20%) e os documentos
reguladores (53%), como a Lei de diretrizes e bases, os Parâmetros
Curriculares Nacionais e a Base Nacional Comum Curricular, apenas uma
resposta sinalizou para o planejamento docente a partir das necessidades de
aprendizagem específicas do aluno. 840
Tal constatação demonstra que na situação na qual atuam os
professores colocam em ação currículos produzidos por agentes da esfera
educacional como os autores de livros didáticos e dos documentos reguladores
do ensino, o que nos faz pensar em aplicação situada, claro, pois não
concebemos os professores como profissionais não reflexivos, isto faz sentido
quando correlacionado com a pergunta anterior cuja resposta (53%%) aponta
para currículo como documento norteador e quando aponta para prática
(0,6%), inferimos como prática de um projeto curricular elaborado por terceiros
Essa inferência tem por base as respostas a outra pergunta do
questionário. Quando indagados sobre a participação na elaboração de algum
Projeto Político Pedagógico (PPP), 80% dos participantes afirmaram nunca
haver participado dessa elaboração, o que permite a suposição de que os
professores são mais habituados apenas implentar os currículos já produzidos
e que o conhecimento sobre esse objeto o vê mais como documento do que
como planejamento de ações a longo prazo.
No tocante à BNCC, o questionário apresentava duas perguntas: “Você
já acessou o conteúdo da BNCC?” e “Você acompanhou a elaboração da
BNCC através do portal disponibilizado pelo MEC?”. Para primeira questão
60% dos colaboradores afirmaram que já havia acessado a BNCC, contudo,
apenas 13% deles havia acompanhado a elaboração do documento pelo portal.
Dentre a pequena porcentagem que acessou a plataforma do MEC no período
de elaboração e discussão da Base, nenhum colaborador afirmou ter
participado das discussões ou contribuiu com a elaboração do documento.

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Ao serem indagados a respeito dos possíveis benefícios que a
homologação da BNCC traz para o ensino no Brasil, as opiniões dos
participantes ficaram divididas. Dentre as respostas obtidas, 26% afirmaram
não saber opinar, ou por não ter acessado a BNCC, ou devido à não ter havido
ainda modificações na escola em que leciona. Um participante sinalizou para o
fato de que há muitos problemas a serem resolvidos no ambiente escolar, não
podendo ser resolvido apenas com a mudança de currículo:
841
Ainda tenho dúvidas desse benefício, pois o problema da
educação brasileira não está unicamente ligado ao currículo.
Temos muitos outros problemas a serem resolvidas como:
formação de professores, melhores condições de trabalho,
plano de cargos e carreira, insfraestrutura das escolas, dentre
outros.

Do total, 40% se posicionaram de forma negativa em relação à BNCC,


não acreditando que esse documento trará benefícios para o ensino no país.
Para eles, o documento restringe a prática do professor e as disciplinas a
serem ministradas, não é adaptável à estrutura político e cultural do país, é
contraditório em relação à realidade das escolas brasileiras, é excludente e
pode acarretar perdas à educação. Nas palavras dos participantes: “Acho q
nao temos a educaçao político e cultural para submeter uma geraçao a ideia do
novo curriculo.” e “é excludente”.
Apenas 0,6% dos participantes considera a BNCC enquanto a abertura
para um ensino mais contextualizado, pois, propõe novos desafios, e,
principalmente por padronizar o ensino para todos os estados brasileiros com a
possibilidade de complementação com elementos regionais e locais: “direciona
as práticas docentes a contemplar um ensino mais contextualizado”.

A partir dos dados, percebe-se que não há um consenso entre os


participantes da pesquisa sobre os impactos da BNCC no ensino fundamental
II. Possivelmente, as opiniões apresentadas se relacionem ao fato de que,
entre os professores que responderam às perguntas, apenas um sinalizou
haver mudanças na escola após a homologação da BNCC no tocante ao uso
de tecnologias, os outros afirmaram que permanecem com sua prática

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inalterada. Possivelmente, após uma consolidação das determinações da
BNCC, alteração dos currículos estaduais e municipais, bem como as
mudanças nos livros didáticos, essas opiniões possam encaminhar-se numa
outra direção.
O último ponto do questionário diz respeito ao ensino de língua
portuguesa no ensino fundamental II. Os participantes foram questionados
quanto ao que deveria ser ensinado nesse nessa fase da educação básica. A
resposta mais recorrente (40%) é que se deve investir esforços no ensino da 842
gramática, como sendo parte essencial da construção do aprendizado de
língua portuguesa. De mesma forma, foram citados leitura (33%), escrita
(26%), assim como ensino de gêneros textuais variados (13%). Esse currículo
proposto pelos professores se apega à tradição do ensino de língua
portuguesa, sendo poucos sujeitos (20%) os que apresentam inovação ou
estabelecimento de relações entre o aprendizado e as situações sociais,
culturais e políticas que constituem o ambiente escolar. Apenas um participante
sinalizou quanto “A inclusão de recursos tecnológicos mais diversificados”,
afirmando ser uma modificação já realizada após a homologação da BNCC.
Assim, os professores participantes, em sua maioria parecem apegar-se
ao tradicional, tanto na organização curricular, focando no currículo apenas
prescritivo, como também, no ensino de língua portuguesa.

CONCLUSÃO

A partir dos dados analisados, conclui-se que os professores e


licenciando de língua portuguesa apresentam maior recorrência em considerar
o currículo com base na teoria tradicional e no modelo prescritivista. As
respostas ao questionário, em sua maioria, relacionam o currículo aos
documentos parametrizadores do ensino como a Lei de Diretrizes e Bases,
Parâmetros Curriculares Nacionais, livros didáticos e atividades. Esses dados
são ainda mais perceptíveis quando observados os termos usados para
descrever o termo currículo: conhecimento, documento, saber, disciplina,
conteúdos, normas, aprendizados e informações. Estas respostas evidenciam

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o tradicionalismo e o prescritivismo que se sobressai na visão dos professores
e licenciandos ao conceituar currículo. Dentre os colaboradores da pesquisa,
apenas 13% consideram o currículo na perspectiva de ação docente e os
currículos real e oculto.
Quanto à BNCC, apenas 60% dos participantes acessaram ao
documento, de mesma forma que também 60% afirmam não saber se esse
documento trará benefícios ao ensino. Foi sinalizado também o uso de
Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) que recebem uma 843
valorização na BNCC, inclusive no ensino de língua portuguesa, ao inovar na
apresentação de novos gêneros do ambiente virtual como vlog, fanfics,
booktuber, etc. No entanto, a BNCC também foi considerada como uma
limitação à prática do professor.
Em síntese, os professores têm opiniões distintas a respeito da BNCC
de ensino fundamental, de forma que é possível encontrar respostas que
pontuam os benefícios, assim como outras que a consideram uma “perda” para
o ensino. Desta maneira, é perceptível que os participantes da pesquisa, que
ainda se encontram em fase de recepção e adaptação ao documento, não
apresentam um consenso a respeito da proposta curricular da BNCC.
Por fim, quanto ao ensino de língua portuguesa, os participantes
apresentam uma visão que se situa na tradição x inovação, apresentando uma
visão por vezes tradicionalista. A perspectiva adotada pelos participantes
afasta-se um pouco do posicionamento enunciativo-discursivo apontado pela
BNCC, não sendo citado elementos discursivos, interação, aspectos sociais e
culturais relacionados ao uso da língua.
Assim, por fim, conclui-se que maioria dos professores e licenciandos
têm uma visão tradicional sobre os elementos de currículo, considerando-o
apenas enquanto prescrição, assim como também apresentam um
posicionamento que se ancora no tradicional no tocante ao ensino de língua
portuguesa, baseando-se com mais frequência na gramática, leitura e escrita,
sem que seja citado o aspecto discursivo. Quanto à BNCC, o documento que
norteia atualmente a elaboração dos currículos, 40% ainda não acessou ao
documento, enquanto os que acessaram não apresentam um consenso sobre

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os seus impactos no ensino ou afirmam não saber opinar, sugerindo, assim,
que ainda são poucos os impactos desse documento em sua prática docente.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base


Nacional Comum Curricular. Brasília, DF, 2016.
CORREA, Manoel Luís Gonçalves. Linguagem e comunicação: visões da
844
linguística moderna. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
MARCUSHI, Luís Antônio. Produção textual, analise de gêneros e
compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
MACEDO, Roberto Sidnei. Currículo: Campo, conceito e pesquisa. 6 ed.
Petrópolis: Vozes, 2013.
MOREIRA, Antônio Flávio B. Currículos e programas no Brasil. 4 ed.
Campinas: Papirus, 1999.
______. Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura.
Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
______. Currículo: Questões atuais. 18 ed. Campinas: Papirus, 2012.
MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia
social. 11 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
OLIVEIRA, Zélia Maria Freire de. Currículo: um instrumento educacional,
social e cultural. Revista Diálogo Educacional. Curitiba, v. 8, n. 24, p. 535-548,
Maio-Agosto de 2008.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às
teorias do currículo. 3 ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.

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O TEMPO CURRICULAR ENQUANTO MARCA DISCURSIVA NA
PROFISSIONALIDADE DE PROFESSORAS DOS ANOS INICIAIS DO VALE
DO IPOJUCA-AGRESTE /PE

Priscilla Maria Silva do Carmo, UFPE/CE | Lucinalva Andrade Ataíde de


Almeida, PPGE/UFPE/CE-CAA

RESUMO: Compreendemos o tempo curricular, como marca discursiva constitutiva da


profissionalidade de professoras nos anos iniciais do ensino fundamental, uma vez
que através dele, os fazeres da profissão podem ser pensados em sua dimensão
política com os processos de ensino e de aprendizagem. Sendo assim, objetivamos 845
compreender como a tessitura de profissionalidade de professoras, vem sendo
atravessada pela organização do tempo curricular, enquanto uma marca discursiva.
De modo específico, queremos identificar como os fazeres nas secretarias de
educação, possibilitam que as professoras dos anos iniciais, imbriquem o tempo
curricular ao desenvolvimento da sua profissionalidade. Para atender aos objetivos,
dialogamos com a análise de discurso Pêchetiana, uma abordagem teórico-analítica
que opera no entrelaçamento: língua, história e sujeito. Os procedimentos de coleta e
produção dos dados foram as entrevistas com as professoras lotadas nas secretarias
de educação, que desenvolvem suas atribuições ligadas aos anos iniciais e a
formação continuada. Como resultados, emergem nos discursos destas professoras
enunciados que relacionam o tempo curricular a formação continuada, como espaço-
tempo oportuno para que os saberes da profissão possam ser pensados e planejados.

Palavras-chave: Tempo Curricular. Profissionalidade de Professoras. Anos Iniciais.

INTRODUÇÃO

Este trabalho constitui-se desdobramento de nossa pesquisa de


doutorado, que encontra-se em andamento, em que investigamos as marcas
discursivas do cotidiano escolar na tessitura da profissionalidade de
professoras experientes nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Esta
pesquisa também vem sendo ampliada com as discussões sobre cotidiano,
discursos e profissionalidade de professoras, empreendidas pelo grupo de
pesquisa Discursos e Práticas Educacionais / Universidade Federal de
Pernambuco - UFPE / Centro Acadêmico do Agreste - CAA.

Ao discutirmos sobre o cotidiano escolar, dialogamos com Esteban


(2012) ao afirmar ele que “pode ser vivido como tempoespaço de interações,
interlocuções e interpelações múltiplas, em que sujeitos, coletivamente,

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deslocam fronteiras e questionam limites em seus encontros e confrontos”
(p.142). Neste direcionamento, o cotidiano vai deixando de ser simplesmente
associado à rotina, passando a ser “lócus” privilegiado no qual acontecem
interlocuções, construção de alternativas e proposições. Se configurando como
rede de potencialidades onde diferentes sujeitos, grupos, conhecimentos, atos,
valores, significados, representações, experiências, vão gerando possibilidades
de conhecimentos, (ESTEBAN, 2012), e mediante a uma construção curricular,
vão também se construindo e fortalecendo suas especificidades locais. 846

Mediante este entendimento de cotidiano, vamos percebendo que a


profissionalidade dos professores dos anos iniciais pode ser reinventada
no/com o cotidiano escolar. E sendo essas professoras pensantes/praticantes
de currículos, é possível tomar o termo currículo, na sua forma plural, tendo em
vista a multiplicidade de sentidos e de práticas que o envolvem, a fim de que,
ele possa dar conta de textos políticos enquanto propostas de vir a ser, mas
também de um cotidiano que demanda invenção, ousadia, tomada de
decisões, que se revela através de marcas discursivas, no desenvolvimento da
profissionalidade das professoras.
Dentre as marcas discursivas, tomamos o tempo curricular, para fins de
investigação, pois acreditamos que a maneira como ele é “distribuído,
organizado, e utilizado” (SANTIAGO, 1999, p. 48) pelas professoras, durante o
desenvolvimento da aula, é também formativo de sua profissionalidade, uma
vez que “é com ele e nele que a escola funciona” (SANTIAGO, 1999), podendo,
dessa forma, garantir as aprendizagens dos estudantes nos anos iniciais do
Ensino Fundamental.
Assim, apresentamos como objetivo para este trabalho, compreender
como a tessitura de profissionalidade de professoras nos anos iniciais do
Ensino Fundamental, vem sendo atravessada pela organização do tempo
curricular, enquanto uma marca discursiva do cotidiano escolar. De modo
específico, direcionamos nossa investigação para identificar como os fazeres
nas secretarias municipais de educação, em 16 (dezesseis) municípios do
Agreste de PE, possibilitam através de suas ações, que as professoras nos

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anos iniciais do ensino fundamental imbriquem o tempo curricular ao
desenvolvimento da sua profissionalidade.

Para subsidiar nossas análises e compreensões, recorremos a


abordagem de orientação qualitativa da Análise de Discurso - AD, na
perspectiva francesa, tendo suas bases em Pêcheux (1990) e aqui no Brasil,
nas contribuições das pesquisas de Orlandi (2012). Esta escolha se deu por
entendermos que esta que a AD melhor possibilitaria as aproximações com as
847
marcas discursivas do cotidiano da escola.

Enquanto campo de pesquisa, tomamos 16 dezesseis municípios,


localizados nos municípios do Vale do Ipojuca, Agreste de Pernambuco. Como
procedimento de coleta e produção de dados, entrevistamos 16 (dezesseis)
professoras lotadas nas secretarias de educação dos respectivos municípios, e
que estavam desenvolvendo atribuições relacionadas a orientação do ensino
nos anos iniciais do Ensino Fundamental e/ou a formação continuada dos
professores.

Sendo assim organizamos este trabalho em três seções, sendo a


primeira referente a revisão de literatura sobre o tempo curricular e a
profissionalidade de professoras no cotidiano. No segundo momento
apresentamos como nos discursos das professoras lotadas nas Secretarias de
Educação - SEDUC, o tempo curricular emerge como atravessamento no
desenvolvimento da profissionalidade de professoras. Por fim, tecemos
algumas considerações acerca dos achados iniciais desta pesquisa.

DESENVOLVIMENTO

Tomamos a profissionalidade do/a professor/a como a profissão em


ação, aquelas atividades pensadas, planejadas que este grupo profissional
realiza quanto as especificidades da sua profissão no cotidiano da escola. Esta
profissionalidade é tecida em movimentos formativos não lineares que põe em
diálogo a formação que a professora recebeu na educação básica
(AMBROSETTI, ALMEIDA, 2009), ao observar a maneira como seus

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professores (as) exerciam à docência, os valores e as normas que foram sendo
institucionalizados neste cotidiano, considerando ainda as suas histórias de
vida, bem como as motivações que o/a levaram a fazer tal escolha profissional.
A tessitura da profissionalidade também se dá na imbricação entre a
formação acadêmica (licenciatura) com o cotidiano da escola, espaços
formativos onde através do entrelaçamento teórico-prático, o/a professor/a em
formação tem a oportunidade de (re) construir
848
conhecimentos sobre a instituição escolar como organização,
funcionamento e resposta social, de modo que possa construir
uma visão de totalidade da escola, vá identificando os
problemas profissionais, escolares e de ensino através do
contato direto com a realidade concreta e a base teórica
disponível e atual (SANTIAGO; BATISTA NETO, 2006, p.32)

Esta aproximação entre o cotidiano da escola e os conhecimentos


acadêmicos construídos durante a licenciatura, possibilitam aos professores
em formação reelaborarem as crenças, representações construídas
anteriormente frente aos fazeres do magistério, e a partir de um referencial
teórico refletir acerca das suas possibilidades de atuação na docência.
Contribuindo na tessitura de uma profissionalidade reflexiva (SILVA, 2015),
onde os fazeres no cotidiano da escola, possam ser compreendidos como
situados historicamente, imbricados aos fundamentos sócio-antropológicos da
educação.
Ou seja, há uma complexidade em tecer-se professora nos anos iniciais,
e esta complexidade está em perceber que os fazeres desenvolvidos por este
grupo profissional não estão isolados em um cotidiano de uma escola que
atende a um público específico, mas estabelecem relações com as teorias
pedagógicas, com as tendências pedagógicas que se hibridizam num espaço
temporalizado, histórico e são materializadas em profissionalidades, que se
pluralizam em práticas pedagógicas também plurais.
O tecer-se professora está em relação com o olhar para os seus fazeres
profissionais, o pensar sobre e com eles, considerando a sua inserção em uma
prática curricular que é pensada-vivida num cotidiano de escola e por assim
ser, revela posicionamentos políticos diversos e divergentes, anseios de uma

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comunidade, projetos de sociedades nem sempre comuns, e modos outros de
pensar e vivenciar o ato educativo.
A tessitura da profissionalidade de professoras é assim, marcada pelo
diálogo entre espaços formativos: escola onde foi formado/a, a instituição de
ensino superior e o cotidiano da escola onde desenvolve suas atribuições na
relação que estabelece com os estudantes, colegas de profissão mais
experientes, gestores, famílias dos estudantes, com as políticas educacionais e
curriculares. Neste sentido, “o outro”, conforme André (el al, 2017) exerce papel 849
fundamental na constituição desta profissionalidade que é processual e relativa
as especificidades do processo de possibilitar ao outro, o aprender.
E por ser relacional, a profissionalidade de professoras vai entrelaçar-se
com as tensões das práticas cotidianas, sejam elas, as diferenças e a
diversidade do grupo de estudantes e famílias com os quais lidam as
professoras, seja a presença de gestões políticas partidárias que exercem suas
atribuições revelando nem sempre interesse no desenvolvimento de políticas
públicas que viabilizem o ensino, a aprendizagem, e consequentemente o
melhor desenvolvimento dos fazeres das professoras.
Estas tensões são importantes, pois podem provocar a tessitura de uma
profissionalidade reflexiva (SILVA, 2015), uma vez que, ao estabelecer
estratégias didáticas quanto aos fazeres profissionais, as professoras
compreendam que mesmo inseridas num cotidiano escolar local, a sua
profissionalidade, está inscrita em um movimento com um social, que revela
aproximações com o político mais global (Estadual, Federal, Municipal).
Esta consciência pode resultar ainda em uma profissionalidade pensada,
planejada, que requer sistematização dos conhecimentos teórico-práticos
construídos frente ao exercício profissional nos anos iniciais. E neste
direcionamento, o cotidiano da escola passa a ser pensado para além de um

lugar de incompetência, de repetição, de falta de


conhecimento vamos perceber que, ao nos aproximarmos
dele e ao tentarmos estuda-lo, o que nos surpreenderá,
talvez, é como neste espaço-tempo é possível encontrar
esperança, a vontade de fazer, a criação de possibilidades,
a busca de alternativas, a discussão, a memória de tantas
propostas feitas e desfeitas, a crença na utopia! (MACEDO,
et al, 2011, p.17)

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O cotidiano escolar, um dos espaços onde a profissão docente é
pensada-vivida, constitui-se aberto aos fazeres docentes-discentes plurais, é
formativo das aprendizagens dos estudantes, mas também é nele que as
professoras e professores tecem possibilidades de se constituírem como tal, de
tecer possibilidades quanto as especificidades das suas atribuições ao longo
de uma carreira profissional.
Neste sentido, o desenvolvimento da profissionalidade de professoras 850
nos anos iniciais do ensino fundamental estará atravessado por marcas que
vão constituindo o discurso, enquanto uma prática cotidiana a ser fixada, a
fazer sentido em sua relação com o exterior que cerca essa profissionalidade
em desenvolvimento. Interessa-nos aqui perceber a relação existente entre a
tessitura de profissionalidade de professoras - considerando o movimento
docente-discente-conhecimento - construídos num tempo escolar, destinado ao
desenvolvimento das aprendizagens: o tempo curricular (SANTIAGO, 1990).
O tempo curricular, partindo das contribuições de Santiago (1990),
constitui-se instrumento de organização e funcionamento da escola. Através
dele, o movimento de transmissão e ampliação do saber é realizado. O tempo
curricular, nesta pesquisa é tomado como uma das marcas discursivas desta
profissionalidade tecida no cotidiano; “é o lastro onde se desenvolve todo o
trabalho que reúne e traz consigo a possibilidade [...] de instalar o projeto
pedagógico” (p.50) institucional e neste projeto que reúne ações coletivas e
intencionais, desenvolvem-se os fazeres das professoras no cotidiano escolar.

Dentro deste projeto pedagógico e também político (GADOTTI, 1994;


VEIGA, 2002) da escola, situam-se os fazeres das professoras nos cotidianos
das salas de aulas. Tais fazeres pensados, planejados, que têm por finalidade
a garantia do aprendizado dos estudantes, são materializados num tempo
curricular que, inclusive, pode possibilitar a organização das estratégias de
ensinos pertinentes a serem desenvolvidas nesse cotidiano.

Sendo assim, quando as professoras planejam as aulas a serem


desenvolvidas nos anos iniciais, elas estão lidando com a organização deste
tempo destinado às aprendizagens. Isso porque, de acordo com Santos (2016),

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o tempo é estruturante de toda a atividade docente dentro da sala de aula, visto
que elas [as salas de aulas] são condicionadas por limites temporais, como o
exemplo dos horários escolares que intencionam controlar “os tempos”
destinados a aprender em sala de aula, o tempo do intervalo, o da chegada e o
da saída.

Ao investigar a tessitura de profissionalidade de professoras no cotidiano


da escola sem isolá-lo dos contextos sociais mais amplos da sociedade, mas
851
entendendo-o como uma discursividade, aberta às transformações, não se
rende ao prescrito nos documentos oficiais -, iremos perceber como o
funcionamento das marcas discursivas podem revelar a multiplicidade de
situações vivenciadas pelas professoras nas escolas públicas, apontando para
como esse grupo profissional foi/vai desenvolvendo sua profissionalidade, em
meio às oscilações e às incertezas (IMBERNÓN, 2011) do espaço formativo
não apenas dos estudantes, mas também dos fazeres das professoras.

Sacristán (1999), acrescenta a esta discussão que as escolas enquanto


“postos de trabalho” (p.72) dos/as professores/as foram/são organizados antes
da existência dos seus atores, contudo, para se compreender como se
desenvolve esta profissionalidade de professoras no cotidiano, é interessante a
compreensão de como este espaço físico que é temporalizado, no cotidiano da
escola, atravessa a tessitura da profissionalidade deste grupo profissional,
revelando as possibilidades de tecer-se professora.

Por mais que historicamente a escola tenha se construído mediante


rituais por vezes “sacros”, intocáveis, quanto a sua organização e distribuição
do tempo e do espaço, em relação a sua estrutura, vale refletirmos como em
meio a este processo, a função de ensinar, que de acordo com Roldão (2005),
constitui-se o cerne das atividades docente vai se desenvolvendo. Como a
(des) organização construída histórica e socialmente pode atravessar os
fazeres das professoras nos anos iniciais do ensino fundamental?

E quando falamos na (des) organização do cotidiano da escola, nos


remetemos aqui aos critérios sob os quais os horários das aulas são
construídos, a distribuição dos estudantes nas turmas considerando suas

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idades, as filas e “rezas” antes de começar o momento da aula, a chamada
(controle da frequência dos estudantes), a organização dos turnos, a
distribuição da merenda, a existência de um tempo destinado ao conselho de
classe, ao atendimento as famílias, tendo em vista comunicar como está se
dando as aprendizagens dos estudantes, dentre outros, que constituem as
atividades rotineiras do cotidiano escolar.

Contudo, apesar desta aparência fechada quanto a rotina e organização


852
do tempo na escola, vale registrar que “a organização escolar na qual o
trabalho [dos/as professores/as] é desenvolvido tampouco é um mundo
fechado; ela não é autônoma, mas participa de um contexto social mais global
no qual está inscrita” TARDIF; LESSARD (2009, p.44/grifos nossos). Quanto ao
que os autores chamam de não autonomia da escola, preferimos com Libâneo
(2009) dizer que a escola por não ser organismos isolados, mas que compõem
um sistema escolar, dependendo da gestão e das políticas públicas, possuem
“autonomia relativa” (p.334).

Esta autonomia relativa das escolas, esta relacionadas aos recursos que
asseguram os salários dos professores/as, as compras de materiais de apoio
as atividades dos/as professores/as, as condições de trabalho, a formação
continuada, distribuição da carga horária, aos recursos para manutenção da
estrutura física da escola. Estas questões mencionadas, sinalizam que os
fazeres dos/as professores/as mantém não só relação com a estrutura da
unidade escolar onde desenvolvem seu trabalho, mas com o sistema de ensino
que deveria estar “a serviço dos objetivos do ensino e especialmente da
qualidade cognitiva dos processos de ensino e aprendizagem” (LIBÂNEO,
2009, p. 335).

Contudo, vale lembrar que os/as professores/as em geral, não


participam do planejamento e da organização da estrutura física da escola,
bem como da organização didático pedagógica dos ambientes escolares, eles
chegam nas escolas, e as normas, regras, quanto a rotina e distribuição do
tempo escolar, estão institucionalizadas, cabendo ao grupo profissional,
desenvolver suas atribuições neste espaço-tempo.

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A profissionalidade das professoras nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, é materializada numa prática docente, que se inscreve num
tempo escolar. O tempo exerce função de controle, de organização, requer
como outras dimensões do ato educativo, ser planejado, cuidado, a fim de que
a escola possa cumprir sua função social.

O tempo da escola é apresentado por SANTOS; ALMEIDA (2018) como


um tempo socialmente construído e institucionalizado. Tem suas
853
especificidades, diferindo de outros tempos, pois é permeado por um currículo
que além de nortear as práticas na escola, deve atender as necessidades, os
anseios e as expectativas dos sujeitos que ocupam a comunidade escolar.

Acerca deste tempo da escola, onde se desenvolvem as atribuições do/a


professor/a, Santiago (1999), denomina tempo curricular, registrando que:

para compreender a escola na sua totalidade, nas suas


relações internas e externas, e nela o trabalho dos
sujeitos educador-educando, o tempo curricular é tomado
como situação real onde e quando se concretizam as
relações pedagógicas; onde e quando se dá o trabalho
educador-educando. (p. 49)
O tempo curricular não é apenas o cronológico, aquele que coordena e
define as semanas de avaliação, o prazo para o preenchimento das
cadernetas, as horas -aulas, o término e começo do ano letivo, mas trata-se de
um tempo no espaço da escola para dedicar-se ao desenvolvimento das
aprendizagens dos estudantes e também das professoras, pois quando estas
se debruçam sobre como tornar as aprendizagens dos estudantes possíveis,
através do planejando das estratégias de ensino, também estão usando este
tempo como formativo, utilizando-o a favor de sua profissionalidade e
produzindo sentidos frente ao comprometimento que tem com os estudantes,
com a escola, com a comunidade.

RESULTADOS INICIAIS

Tendo em vista, a marca discursiva do tempo curricular e seu


atravessamento na tessitura de profissionalidade de professoras nos anos

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iniciais do Ensino Fundamental, ao analisar os dados produzidos com as
entrevistas com um professora lotada nas 16 (dezesseis) SEDUC do Agreste
de Pernambuco, foi possível identificar o enunciado formação continuada como
recorrente em todas as entrevistas.

A formação continuada foi apresentada pelas professoras entrevistadas


como momento importante, onde as professoras que desenvolvem sua
profissionalidade nos anos iniciais tem para (re)pensar as demandas que
854
emergem no cotidiano escolar e seus fazeres neste espaço.

Na maior parte dos municípios, as formações continuadas acontecem


apenas duas vezes por ano, com formadores que não compõe o quadro de
servidores públicos daquele município, mas são convidados pela SEDUC. O
que nos faz pensar que mesmo que mesmos os formadores externos tenham
uma proposta de trabalho interessante, há possibilidades de não atenderem as
expectativas dos professores/as quanto as suas necessidades mediante o
exercício do magistério nos anos iniciais, considerando que são eles/as que
estão atuando as políticas cotidianamente nas salas de aulas dos municípios e
nem sempre os formadores tiveram ou tem esta vivencia ou desenvolvem
pesquisas nesta área.

Em apenas três municípios, foi identificado uma proposta de formação


continuada mensal, onde a secretaria, através de um grupo de professores da
rede, habilitados em conhecimentos pedagógicos e específicos de cada área
dos componentes curriculares, acompanham as professoras quanto as
possibilidades de planejar e vivenciar o tempo curricular, nos anos iniciais.
De acordo com as professoras entrevistadas na SEDUC, o tempo
destinado as aprendizagens dos estudantes são planejados pelas professoras
experientes nos anos iniciais, através da carga horária destinada às aulas
atividades. Apenas um município ainda não remunera as professoras quanto a
este tempo de formação. Os demais o fazem e acreditam que a aula atividade,
vem constituindo tempo oportuno a troca das experiências profissionais,
inclusive se estendendo as redes sociais, onde o professorado, continuam

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partilhando como vem conduzindo o processo de ensino e aprendizagem,
focando nas estratégias de ensino vividas por elas, nas aulas.

Ainda quanto a esta marca discursiva do tempo curricular, apenas um


município alegou conseguir acompanhar como o tempo destinado as
aprendizagens dos estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental vem
sendo organizado, distribuído e utilizado pelas professoras. Esta professora
entrevistada colocou que este acompanhamento vem se dando via secretaria,
855
através dos professores que desenvolvem funções técnicas, tendo suas
atribuições ligadas ao ensino e planejamento. Eles visitam as escolas
quinzenalmente e observam como e se o cronograma e o plano de ensino
construído e planejado nas aulas atividades estão acontecendo. Quais as
dificuldades enfrentadas pelas professoras e organizam nas escolas, quais os
ajustes possíveis a serem feitos considerando as necessidades dos estudantes
e das professoras.

CONCLUSÕES

Por fim, consideramos que investigar a tessitura da profissionalidade,


tomada como a profissão em movimento no cotidiano escolar dos anos iniciais,
precisa ser considerada as relações macro que a envolve, visto que os fazeres
deste grupo profissional não acontece de modo descolado das políticas
educacionais e curriculares pensadas-vividas tanto para a formação continuada
das professoras quanto para a Educação Básica.
A profissionalidade das professoras, se envolve com as dimensões
políticas, econômicas, culturais, que atravessam o cotidiano escolar, que por
sua vez, interferem sobre os saberes-fazeres deste grupo profissional. Neste
sentido, os fazeres dos/as professor/as é individual por receber as marcas de
sua formação, história de vida, suas subjetividades, contudo é também coletiva,
visto que imbrica outras práticas do social.
Mas, a profissão pensada-vivida num cotidiano escolar específico, é
interpelada pelo social, através das políticas de formação continuada
direcionada aos professores/as, as políticas para a Educação Básica, mas
também por outras questões como a presença gestora no cotidiano da escola,

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o vínculo empregatício que as professoras estabelecem com os municípios
onde desenvolvem a profissão. Todas estas, são sinais de presença de um
contexto de influência que situa a tessitura da profissionalidade das
professoras no entremeio dos aspectos individuais e coletivos.

REFERENCIAS

856
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857

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TECNOLOGIA DE GESTÃO EDUCACIONAL NO ÂMBITO DO
PROGRAMA ESCOLA CIDADÃ INTEGRAL

Aline Oliveira Costa | Elizama Barbosa Silva | Francisca Pereira Salvino

Resumo: O artigo objetiva analisar aspectos da Tecnologia de Gestão Educacional


(TGE), considerando o contexto de implementação do Programa Escola Cidadã
Integral na cidade de Campina Grande/PB, que decorre de parceria entre a Secretaria
Estadual de Educação (SEE/PB) e o Instituto de Corresponsabilidade pela Educação 858
(ICE). Consiste em uma análise documental, que toma como referencial teórico
principal as análises de redes de política de Stephen Ball (2014). O referido Programa
teve início em 2016 com apenas duas escolas em Campina Grande, ampliadas para
11 em 2018 de um total de 100 no Estado. Seu modelo de gestão inspira-se no
projeto americano da Escola Charter ou Escola da Escolha como ficou conhecido no
Brasil, a exemplo de vários outros países da América Latina. O ICE assessora redes
de ensino de 17 estados brasileiros, todos alinhados ao mesmo projeto, configurando
uma rede de governança que se instaura com a participação do Estado, porém
extrapolando as fronteiras do Estado-nação. Conclui-se que a TGE opera com um
currículo centrado no desenvolvimento psicossocial e no protagonismo estudantil,
impondo aos educadores uma condição de trabalho com pouca autonomia, uma vez
que predomina a seguinte situação: os docentes devem se “alinhar” ao sistema, o que
é verificado e controladopor meio de uma rigorosa e contínua avaliação; os docentes
estão sujeitos à transferência, mesmo sendo concursados, bem como à demissão, nos
casos em que trabalhe em regime de prestação temporária de serviço.

Palavras-chave: Redes de política. Gestão.Educação integral.

INTRODUÇÃO

No âmbito da educação integral, mais do que uma tecnologia a gestão


educacional deve se constituir em processo de sensibilização, pertença,
compartilhamento, mobilização de pessoas, ações e recursos em prol do bem-
estar de comunidades escolares e de redes de ensinar-aprender. Ou seja, de
micro espaços de políticas que devem se integrar aos macros, objetivando o
bem-estar das sociedades, o que pressupõe combinação/integração entre
desenvolvimento econômico e humano. Neste destacando-se a constituição
identitária do ser, a liberdade e a autonomia de pensar e agir, a valorização da
vida de cada sujeito, o reconhecimento e respeito às diferenças, dentre outros

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aspectos. Nessa perspectiva, a gestão educacional deve primar por uma
técnica competente em torno da operacionalização dos sistemas em termos de
financiamentos e controles contábeis; condições materiais e rotinas de
trabalho. Para aquém e além disso, a gestão educacional deve primar pela
formação e pelas relações humanas e sociais entre docentes e discentes,
destes entre si, destes com as demais pessoas das comunidades escolares e
da sociedade como um todo.
Revisitando diferentes momentos da história da educação brasileira, 859
facilmente se constata a prevalência de modelos administrativos
hierarquizados, centralizados e concentrados, exercidos por sujeitos
“mandantes” e não como gestores de processos educativos, que eram
seguidos por docentes também autoritários. Constata-se também que a partir
de 1990 e de projetos de reforma da educação e da gestão educacional, as
posições dos sujeitos gestores e professores foram gradativamente se
deslocando do tipo da hierarquia autoritária para a base, muito mais na direção
do desprestígio, do esvaziamento da sua autoridade, o que difere de
autoritarismo, do que no sentido de uma gestão compartilhada, embora muito
se tenha propagandeado sobre sua profissionalização.
A partir dessas considerações, este artigo objetiva analisar aspectos da
Tecnologia de Gestão Educacional (TGE), considerando o contexto de
implementação do Programa Escola Cidadã Integral na cidade de Campina
Grande/PB, que decorre de parceria entre a Secretaria Estadual de Educação
(SEE/PB) e o Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE). Consiste
em uma análise documental, com recurso de entrevista e participação em roda
de conversa com professores que atuam no referido programa. Toma como
referencial teórico principal as análises de redes de política de Stephen Ball
(2014), procurando responder se a TGE se constitui enquanto um novo modelo
de governança, que favoreceà gestão compartilhada, uma vez que propõe
operacionalizar um currículo centrado no desenvolvimento psicossocial e no
protagonismo do estudante. Para tanto, inicialmente abordam-se significados
de gestão e redes de políticas; na sequência descrevem-se o que é a TGE e

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analisam-se dados acerca de sua operacionalização; e, por fim, a conclusão,
respondendo as questões que nortearam a pesquisa.

GESTÃO EDUCACIONAL EM TEMPOS DE REDES DE POLÍTICA

A gestão educacional é entendida como um campo de atuação que tem


por responsabilidade planejar, equipar, implementar e avaliar as políticas nas
instituições, organizando o funcionamento de redes de ensino e de escolas nos 860
aspectos administrativos, financeiros, pedagógicos e relações. Segundo Afonso
(2010), a gestão pode ser centralizadora, controladora, produtivista,
competitiva, ou de outra forma, democrática, autônoma, participativa, que tenha
compromisso com os interesses da coletividade. O autor ressalva que a gestão
não é neutra, mas articulada com o sistema econômico e político; com os
modos de pensar/agir das populações e dos gestores. Ou seja, é uma
construção histórica, resultante das transformações políticas, econômicas,
sociais e culturais, devendo ser situadas como tais.
Para os paradigmas mais recentes, segundo Vieira (2012), as mudanças
no contexto sócio educacional, incluindo a gestão, têm a influência da
globalização e do neoliberalismo, a partir de três ações decisivas, a saber: o
processo de avanço das tecnologias de informação; a atuação de organismos
multilaterais nas políticas públicas, bem como a reestruturação do Estado no
Brasil pós 1985 com o fim da Ditadura Militar e a redemocratização do país.
A partir dessas ideias, a descentralização passa a ser um princípio que
direciona ou delega poderes do centro dos sistemas (governantes), do ponto
de vista da hierarquia, para a ponta (escolas, gestores,
pais/mães/responsáveis, estudantes e outros). Segundo Casassus (1995),
como resultados da Reforma do Estado e da educação surge um novo modelo
de gestão, com objetivos de desburocratização, descentralização, aumento na
competitividade e enfoque no cidadão como corresponsável pelos processos e
resultados educacionais. Nesse sentido, Cabral Neto (2009) defende a
responsabilidade e a liderança de gestores, mas também o protagonismo de

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alunos, pais e professores nas tomadas de decisões, no planejamento das
ações e na realização deste.
No contexto da década de 1990, intensificou-se o discurso em torno da
gestão democrática, contemplada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), Lei nº 9.394/1996 (BRASIL, 1996), ficando a critério dos
sistemas de ensino definir as normas de gestão democrática do ensino público
na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades. Prevaleceu o
modelo de gestão colegiada, procurando, contudo, garantir a existência de 861
conselhos escolares e a autonomia dos profissionais da escola na gestão
pedagógica. Essa medida foi ratificada com a Lei nº 9.424/1996, que criou o
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (FUNDEF), estabelecendo mecanismos de
arrecadação e distribuição de recursos financeiros automaticamente
executados por agentes bancários, sem autorização dos governantes
(presidentes, governadores e prefeitos). Além disso, o Programa Dinheiro
Direto na Escola (PDDE) determinou que recursos destinados a financiamento
de alimentação escolar, manutenção da estrutura física das escolas e outros,
fossem destinados diretamente às escolas e geridos por conselheiros
presididos pelos gestores.
Segundo Lima (2001), a gestão assumiu o discurso de comunidades e
agentes parceiros, convertendo o cidadão educando e ou seus responsáveis à
condição de clientes dos serviços educacionais. Como consequência, tem-se
que a educação reduz sua condição de direito a ser garantido pelo Estado para
serviço que qualquer empresa pode oferecer. Essa versão é contestada, uma
vez que a gestão deve dar suporte à qualificação e à formação humana e
política do cidadão, não se rendendo às práticas produtivistas do mercado.
Segundo Silva (2018) a gestão verdadeiramente democrática é de suma
importância para a escola, devendo assumir o seu papel social na garantia da
qualidade. Sobre isso, Silva (2018, p. 151) afirma que a possibilidade de uma
administração democrática no sentido de sua articulação, na forma e conteúdo,
com os interesses da sociedade como um todo, tem a ver com os fins e a
natureza da coisa administrada. No caso da Administração Escolar, sua

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especificidade deriva, pois: a) dos objetivos que se buscam alcançar com a
escola; b) da natureza do processo que envolve essa busca. Esses dois
aspectos não estão de modo nenhum desvinculados um do outro.
A partir de 2007 e do “Movimento Compromisso Todos pela Educação”,
lançado à sociedade brasileira em paralelo ao Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE), percebem-se novas formas de gestão educacional com forte
apelo à pactuação e à parceirização entre instituições púbicas e privadas,
criando as condições para o que Ball (2006) denomina de redes de políticas. 862
Consequentemente, há mudança nos modos de governança do Estado,
partindo do discurso de que é necessária uma gestão pública mais
colaborativa, como também um maior incentivo para que os setores públicos e
privado, incluindo neste o filantrópico, articulem-se em busca de uma ação
pública competente, eficiente e benéfica a todos. Nesse sentido, caracteriza-se
a governança como uma gestão compartilhada, que envolve diferentes setores
para a solução de problemas sociais e educacionais sem a restrição dos limites
do Estado-nação. Como enfatiza Ball (2014, p.29), “redes políticas são um tipo
de rede social novo, envolvendo tipos específicos de relações sociais, de fluxos
e movimentos. Eles constituem comunidades de políticas baseadas em
concepções compartilhadas de problemas sociais e suas soluções”. Nesse
cenário, faz-se necessário analisar como essas redes se constituem, qual seu
modus operandi e como afetam a gestão.

A TECNOLOGIA DE GESTÃO EDUCACIONAL (TGE) NA EDUCAÇÃO


INTEGRAL

A Tecnologia de Gestão Educacional (TGE) teve origem no Brasil com


Marcos Magalhães em 2004 no Recife, quando o engenheiro resolveu fazer
uma parceria com empresários para restaurar o Colégio Pernambucano, onde
havia estudado. Para isto, inspirou- se no projeto americano da Escola Charter
ou Escola da Escolha como ficou conhecida. Em 2018 esse modelo havia sido
adotado em 17 estados, dentre os quais a Paraíba onde teve início em 2016.
Em 2018 conta com 100 escolas, sendo 11 na Cidade de Campina Grande

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com os programas de ensino médio Escola Cidadã Integral e Escola Cidadã
Integrada (combina formação geral e profissional) (PARAÍBA, 2018).
A TGE é uma elaboração externa, a qual as redes de ensino, escolas e
sujeitos devem se alinhar com vistas à harmonização dos processos
administrativos e pedagógicos (ICE, 2016). Os gestores (operacionais,
financeiros e pedagógicos) têm a responsabilidade de coordenar as diferentes
áreas escolares, integrar os resultados e educar a todos a partir de
competências, planejadas e operacionalizadas por meio de plano de ação, 863
programa de ação, registros e relatórios (ICE, 2016). Em síntese, a TGE rege-
se pela consciência de que, pelo método, adapta-se cada realidade; de que se
educa pelo trabalho, pelo fazer, valorizando mais a prática do que a teoria; de
que o ciclo virtuoso que consiste na relação entre comunidade, estudantes,
gestor secretaria de educação e investidores sociais (parceiros), que garantem
os recursos para a obtenção de resultados.
A TGE é orientada em 7 cadernos/módulos 98 de formação continuada
para operacionalização do Programa Escola Cidadã Integral. No módulo I (ICE,
2016, p. 7), a TGE é definida como “a arte de integrar tecnologias específicas
e educar pessoas, de modo que, no contexto da Escola da Escolha, educar
pessoas significa criar um ambiente educacional onde todos, gestores e
educadores, sintam-se estimulados a aprender e a pôr em prática seus
conhecimentos a serviço do estudante e seu Projeto de Vida”. O Modelo
Pedagógico e a TGE são indissociáveis e constituem o organismo que torna
possível transformar a visão e a missão da escola em efetiva e cotidiana ação.
O ICE toma por base as referências de Antonio Carlos Gomes da Costa
e o modelo de relação de ajuda desenvolvido por Robert Carkhuff, detalhado e
aprofundado por Clara Feldman e M. L. de Miranda de 1983. A proposta pauta-
se nos seguintes princípios e conceitos da liderança servidora: I) delegação
planejada (crença no potencial do outro, responsabilização gradual e equipe);

98
São os seguintes módulos: I) Introdução às bases teóricas e metodológicas do modelo da
Escola da Escolha; II) Modelo pedagógico e princípios básicos; III) Modelo pedagógico:
conceitos; IV) Modelo pedagógico e metodologias de êxito da parte diversificada do
currículo de ensino médio; V) Modelo pedagógico e metodologias de êxito: práticas
educativas; VI) Modelo pedagógico: ambiente escolar; e VII) Modelo pedagógico:
instrumento e rotinas.

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II) pedagogia da presença; III) educação para o trabalho; IV) os quatro pilares
da educação (saber, fazer, conviver e ser); V) protagonismo (autonomia,
solidariedade, competência); e VI) educação interdimensional. Defende os
conceitos de descentralização, enquanto distribuição de responsabilidades, e o
ciclo de melhoria contínua, que consiste em planejar (estabelecer objetivos e
metas), executar (realizar plano e processo), avaliar (analisar resultados) e
ajustar (executar ações corretivas quando necessário).
Para analisar a TGE no contexto da prática, contamos com a 864
colaboração de 6 profissionais, identificados de acordo com Quadro 5 a seguir,
mantendo-se o sigilo dos nomes:

IDENTIFICAÇÃO FUNÇÃO QUE EXERCE TEMPO NO


PROGRAMA
Assessora Regional Coordenador Pedagógica do Programa Escola Cidadã 7 meses
3ª Integral na 3ª Gerência Regional de Ensino da Paraíba
GRE/PB
Diretor de escola Diretor de Escola – Bairro José Pinheiro 6 meses

Diretor Regional da Diretor Regional da Associação de Professores de -


APLP Licenciatura - APLP99
Professora/Campina Professora do Programa em regime de prestadora de 7 meses
Grande 1 serviço temporário em Campina Grande/PB.
Professora/Campina Professora do Programa em regime de prestadora de 7 meses
Grande 2 serviço temporário em Campina Grande/PB.
Professor/Esperança Professor do Programa em regime de prestadora de 7 meses
serviço
temporário na cidade de Esperança/PB.
Quadro 5 – Identificação e perfil dos participantes da pesquisa
Fonte: As autoras.

Os 3 primeiros participaram por meio de entrevista. Os relatos dos


professores ocorreram durante uma “mesa temática” sobre o Programa Escola
Cidadã Integral, promovida no Centro de Educação da Universidade Estadual
da Paraíba UEPB) por ocasião de um curso de formação Promovido pelo
Programa de Residência Pedagógica. Segundo os entrevistados o Programa
foi criado em 2015, sendo implementado a partir de janeiro de 2016 com
apenas duas escolas núcleos em Campina Grande/PB, a saber: Escola

99
Declarou ser professor há 18 anos e presidente da APLP há 1 ano.

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Estadual Nenzinha Cunha Lima (Bairro José Pinheiro) e Escola Estadual Dr.
Hortêncio de Sousa Ribeiro (Bairro Catolé). Sobre o tipo de parceria firmado
entre a SEE/PB e o ICE e sua participação na gestão das escolas, os
entrevistados afirmam o seguinte:

ENTREVISTADO TIPO DE PARCERIA


Assessora Não existe um contrato e sim uma parceria. O ICE é um dos
Regional 3ª fundadores do projeto de educação integral. Eles acompanham
GRE/PB todas as escolas do MEC na Paraíba e em outros estados. O 865
corpo diretivo da escola é escolhido através de processo seletivo e
a permanência desses gestores dá-se através de avaliações
diárias e de um monitoramento constante e não necessariamente
de uma escola do ICE.
Diretor de escola Bom, não diria parceria. Quem direciona o modelo escola cidadã é
o Estado, para isso trouxe uma empresa privada de fora, sem fins
lucrativos, que trouxe o suporte pedagógico que é o modelo escola
cidadã. Na paraíba é a Escola Cidadã Integral, e em outros é a
Escola Cidadã da Escolha, mudou so o nome, mas a concepção é
a mesma. Esse instituto trouxe para as escolas um modelo
pedagogico de gestão de escola, a partir do principio de escola
integral, então, o modelo pedagogico e de gestão é desse instituto.
Não diria parceria, diria que é o suporte. Pois, parceria é o que eu
faço e o outro faz, suporte é quando eu quero fazer e contrato
alguém. Então, o Governo do Estado direcionou para esse instituto
a execução da escola integral a partir do modelo do mesmo.
Diretor Regional A APLP nunca teve acesso a esse contrato. Os professores e
da APLP gestores fazem a seleção (efeitos ou prestadores de serviço),
ficando os melhores. A convocação, nomeação ou contração nem
sempre respeita a ordem de aprovação e classificação. A APLP
não tem controle de nada, pois é o ICE que controla tudo com
palmatória.
Quadro 6 – Parceria SEE/PB e ICE
Fonte: As autoras

Apesar das várias buscas e tentativas, não obtivemos melhores


informações sobre o tipo de contrato firmado entre a SEE/PB e o OCE. O
Diretor Regional da APLP (2018), explicou que, mesmo o professor
trabalhando em regime efetivo, tendo estabilidade no emprego e sendo lotado
na escola onde o Programa for adotado, ele é submetido a processo seletivo
para permanecer na escola, não participando ou não sendo aprovado é
transferido. Como é comum os professores trabalharem em mais de uma
instituição, devido aos baixos salários e a gratificação para dedicação exclusiva
à escola ser de apenas R$ 1.000,00, a maioria prefere pedir transferência.

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Segundo o Diretor, além dessa gratificação, quem adere ao Programa recebe
uma outra gratificação pela dobra da carga horária no valor de R$ 950,00. O
Diretor disse que a APLP ainda não dispõe de estudo sobre o Programa,
portanto não sabe precisar, mas garante que a maioria dos professores em
exercício nessas escolas trabalham como prestadores de serviço temporário,
exemplificando que na Escola Estadual Prof. Anésio Leão que também aderiu
ao Programa, dos trinta e um professores apenas cinco são efetivos.
Acrescentou que para estes a remuneração é o salário mínimo, mais uma 866
gratificação de R$ 600,00, mais um terço da gratificação referente à dobra da
carga horária. Durante a “mesa temática” os professores participantes
confirmaram essa informação. Segundo a Professora/Campina Grande I
(2018), de fato houve seleção na escola em que trabalha, mas a considerou
como “fantasma”, pois não tiveram acesso aos resultados e sabe-se que a
ordem de aprovação não é respeitada, ou seja, são contratados quem os
diretores querem. Em relação ao contrato, relatou “não é bem um contrato, é
tipo um termo que você assina, aceitando permanecer na escola por 40hrs, um
termo de compromisso. Nem fotografar, nem levar uma cópia a gente teve
direito a fazer, só assinar” (PROFESSORA/CAMPINA GRANDE I, 2018). Esse
depoimento foi confirmado pelos outros dois participantes.
Quanto aos recursos, o Programa é financiado parte com verbas do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização
dos Profissionais da Educação (FUNDEB), por exemplo, remuneração dos
profissionais, parte com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE) e parte do Estado. Com isto, as redes políticas têm o
propósito de auto-organização, com uma nova forma de governança e novas
autoridades, havendo assim uma transferência de políticas, em que o Estado
sede o poder, enquanto a empresa oferece recursos para os setores escassos
e problemas complexos, tais como os da educação. Como afirma Ball (2014, p.
31), “podemos ver isso nas formas que os serviços públicos estão cada vez
sendo entregues por meio da mistura de alianças estratégicas, de acordos de
trabalho conjunto, de redes, de parcerias e muitas outras formas de
colaboração através das fronteiras setoriais e organizacionais”.

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Os interesses que movem essas relações nem sempre são declarados
verdadeiramente. Como assevera Borges (2016), a filantropia pode ser usada
para fins, tais como: o honesto desejo por um mundo melhor, a “lavagem de
consciência”, o tráfico de influência e até a lavagem de dinheiro. Os benefícios
mais evidentes e imediatos se dão por meio de isenções fiscais e imunidades
tributárias educacionais concedidas pelos governo a essas fundações. No
caso, o ICE é financiado por instituições como Instituto Natura e Itáu, Jeep e
outras, que ao doarem recursos a instituições sem fins lucrativos como o ICE, 867
recebem isenções de impostos. Todavia não encontramos dados sobre esses
procedimentos. Além disso, Borges (idem) defende que as grandes empresas
têm interesse na formação de funcionários/trabalhadores para seus próprios
quadros, o que pode ser atendido por meio da educação pública.
Dentre as diversas questões da pesquisa, destacamos a avaliação de
estudantes e professores. Conforme a Assessora Regional da 3ª GRE/PB
(2018), trabalha-se para desenvolver as habilidades de nossos Estudantes,
para isso, a parte diversificada trabalha com: Estudos Orientados, Aulas de
nivelamento, Tutorias, Projeto de Vida/Pós-Médio, Protagonismo Juvenil,
Avaliações Semanais e entre outros projetos o nosso ponto chave e a mais
querida entre os alunos: A ELETIVA. Tudo isso foi muito trabalhado e pensado
para refletir diretamente na BNCC e ter como devolução um jovem autônomo,
competente, solidário, com uma excelência acadêmica e pronto para os
desafios do séc. XXI. Os docentes passam por uma formação inicial para
adquirir o modelo da escola em tempo integral e por mais várias formações
pedagógicas ao longo de cada ano. Já os demais profissionais são avaliados
através de formações continuadas promovidas pela gestão. Os profissionais
são cientes dos sonhos e do projeto de vida de dos alunos e sabem da
importância do trabalho de cada um.
Segundo os Professores participantes, o aluno tem bastantes
autonomia, todo o projeto é voltado pensando no aluno. O professor adquire
responsabilidades para além das suas disciplinas e da carga horária de 40
horas, devendo cumprir com toda a proposta, com atividades como tutorias,
projeto de vida, clubinhos e estudos orientados, atendendo aos alunos quando

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solicitados por estes, inclusive em horário de intervalos e almoços. Assim,
cumprem uma carga horária excedente que ainda inclui planejar e corrigir
atividades fora da escola.
O protagonismo estudantil é operacionalizado principalmente por meio
do projeto “Parlamento Estudantil” e “Projeto de vida”. No primeiro, alunos
líderes tomam decisões em assembleias sobre os problemas escolares. No
segundo, os alunos escolhem professores como tutores a quem cabe contribuir
para que o aluno reflita sobre problemas pessoais e possíveis projetos para 868
curto e longo prazo. Os Professores relataram que são procurados pelos
alunos com problemas bastante graves (pobreza extrema, assédio de diversas
ordens violência doméstica, por exemplo). Relataram também que essa tutoria
costuma causar angústia por que nem sempre eles ou a escola têm como
ajudar o aluno. Uma das Professoras disse que faz o possível para ajudar o
aluno, mas evita envolver-se emocionalmente para preservas sua saúde
mental. Quanto à avaliação institucional com relação ao professor, ela é
realizada pelos alunos a cada bimestre por meio de fichas com as seguintes
alternativas: Que bom (está indo bem), Que tal (razoável), Que pena (não
realiza um bom trabalho). Nos casos em que os professores recebem “Que
pena”, ele é convidado pela coordenação, recebe a comunicação quanto à
avaliação e orientado a se “alinhar” ao Programa. Segundo os Professores, a
avaliação é realizada sem a presença do professor e apenas em alguns casos
ele pode se justificar e ou se defender. A Professora/Campina Grande II (2018)
relata que “no final das contas, é poder demais ao aluno, a gente fica
totalmente sob submissão”. Os Professores afirmaram que o Programa é muito
bonito, mas na prática as escolas são precárias e não dispõem da estrutura
necessária para algumas atividades básicas, como as refeições e higiene
pessoal após prática de esportes, por exemplo. Percebem-se diferenças
significativas entre os relatos dos gestores, do sindicalista e dos professores,
sendo que estes tendem a confirmar os depoimentos do Diretor da APLP.
Inclusive, quando os gestores foram questionados sobre aspectos negativos do
Programa, afirmaram que não havia.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ICE assessora redes de ensino de 17 estados brasileiros, todos


alinhados ao mesmo projeto da Escola Charter ou Escola da Escolha dos
Estados Unidos com conexão é diferentes países, configurando uma rede de
governança que se instaura com a participação dos Estados, porém
extrapolando as fronteiras destes e dos Estados-nação. Apesar da dificuldade
para obtenção de dados i informações, os relatos são de que a TGE opera com 869
um currículo centrado no desenvolvimento psicossocial e no protagonismo
estudantil, impondo aos educadores uma condição de trabalho mis precárias
do que a dos professores efetivos em termos de remuneração e de autonomia,
uma vez que predomina a seguinte situação: a maior parte dos docentes não é
concursada; a remuneração é, em média, metade da remuneração de um
professor efetivo; frequentemente excedem a carga horária de 40 horas do
contrato; o projeto curricular segue os cadernos da TGE e os docentes devem
se “alinhar” ao sistema, tanto no tocante às atividades quanto aos dias e
horários de execução; os docentes são controlado por meio de uma rigorosa e
contínua avaliação; os docentes estão sujeitos à transferência, mesmo sendo
concursados, bem como à demissão, nos casos em que trabalhe em regime de
prestação temporária de serviço.
Assim sendo, a Gestão escolar no Programa Escola Cidadã Integral
pressupõe o protagonismo e a autonomia do estudante em detrimento do
protagonismo e autonomia docente. As perguntas a serem feitas são as
seguintes: professores sujeitados, contribuem devidamente com a formação se
discentes autônomos? Uma formação integral não deveria pautar-se na
dialogicidade entre os diferentes sujeitos numa perspectiva mais igualitária?
As mudanças no âmbito educacional, parecem se mover para obtenção
de crescimento e expansão do mercado e da sua lógica de funcionamento, de
modo que as redes de políticas educacionais estabeleçam formas de
filantropias e ampliação do terceiro setor, dando maior legitimidade à gestão.
Diferentemente, uma gestão democrática valoriza a autonomia e a
participação ao pensar os problemas, as perspectivas as tomadas de decisões,

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os projetos e as ações, buscando a qualidade com ação coletiva da
comunidade escolar. A gestão democrática como instrumento de participação e
autonomia, é um processo contínuo que visa a transformação das identidades,
das instituições e da sociedade. A gestão democrática é compartilhada como
prática política que tem como marca principal a responsabilização de toda a
sociedade. Em relação à participação, ocorre como uma participação de auto
sustentação e não restrita a determinados segmentos da escola.
870

REFERÊNCIAS

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resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
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GT 7 - POLÍTICAS CURRICULARES E A
EDUCAÇÃO NOS ESPAÇOS NÃO ESCOLARES

A PERSPECTIVA UTÓPICA DO CURRÍCULO DE PRAXIS NO CONTEXTO


DO MST
Ernandes de Queiroz Pereira
872

RESUMO: Este trabalho tem como objetivo discutir o currículo de práxis no contexto
do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, no que tange a um projeto de
educação alicerçado nas matrizes pedagógicas de pensamento crítico/emancipatório.
Esta proposta inspirada na Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire defende que o
educando é sujeito construtor de conhecimento, na ação dialógica, como princípio
gerador do processo de ensino-aprendizagem significativo. Assim, a perspectiva de
currículo de práxis se sustenta numa ação pedagógica articulada entre os campos do
saber elaborado e das experiências concretas, de maneira a favorecer a construção
do conhecimento significativo. A proposta de discussão deste trabalho faz parte das
reflexões tecidas no curso de Doutorado em Educação: Currículo da PUC - SP, e
revela as possibilidades educativas que têm como princípios formar sujeitos
anunciadores do seu próprio mundo. A metodologia adotada é de caráter qualitativo
através de levantamento bibliográfico, documental e pesquisa de campo, através de
entrevista semi – estruturada, observação direta e diário de campo, coletados em
áreas de assentamentos rurais do Cariri paraibano organizadas pelo MST.

Palavras–chave: Currículo de práxis; Construção de conhecimento; MST

INTRODUÇÃO

A perspectiva abordada por Tomás Morus (2010) na sua obra intitulada


“A Utopia” escrita em 1516 aponta como o “não-lugar” ou “lugar que não
existe”. Nesta concepção, o utopismo se remete não apenas a esse lugar
inexistente, mas também a qualquer outra maneira de enxergar o mundo e a
vida como algo irreal, contrário as relações concretas. O livro faz a descrição
de um Estado imaginário, no qual não há propriedade privada nem dinheiro, há
sim, preocupação com a felicidade coletiva e a organização da produção.
Neste sentido, a utopia fica condicionada ao campo da imaginação, do
idealismo sem relação com a realidade concreta. Para Szacki (1972, p. 03):

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Na linguagem cotidiana a palavra utopia significa, no mais das
vezes, fantasia, projeto cuja realização é impossível. Esta
compreensão da palavra não parece ser útil para analise
cientifica da utopia como um fenômeno social – ela faz um
julgamento de valor, já de saída, antes mesmo que se comece
a estudar a questão.

Rompendo com a concepção utópica de Tomas Morus (2010) como o


lugar idealizado e descolado da realidade, o termo é abordado por outros
autores no sentido de antecipação à um projeto em construção. A Esperança 873
que crê em outro mundo possível no futuro, apontando uma outra sociedade,
uma vez que se opõe ao modelo existente, mas pensando a viabilidade de
realização do projeto utópico. Esta perspectiva é destacada por Szacki (1972,
p.08) como sinônimo de ideal moral e social, e utópico é todo aquele que
percebe o mal e busca meios de curá-lo.
O sentido de ruptura com a ideia do horizonte inalcançável aponta
caminhos para um outro mundo possível no dizer de Boff (2005. Ao argumentar
sobre essa possibilidade de reencantamento do humano como indicativo para
transformar as condições existentes, Boff (2005, p.193/94) nos diz que: “está
em nossas mãos permitir que a humanidade e a terra alcancem estágios mais
avançados de interação e de comunhão de todos, com o universo e com a
fonte originária de todo o ser.”
Em face dos desafios que se encontra o mundo e da barbárie que se
amplia na sociedade e da negação de direitos, impostos aos que se encontram
as margens da sociedade, as palavras de Boff revelam a urgente necessidade
de ação dos seres humanos.
Nesta perspectiva Freire (1996, p.30) também nos diz: “a minha raiva,
minha justa ira, se funda na minha revolta em face da negação do direito de
“ser mais” inscrito na natureza dos seres humanos”, revela a necessidade e a
urgência de se indignar e assim, reacender as esperanças, construindo
veredas alternativas para romper com os grilões da moral utilitarista,
individualista, competitiva, consumista, que escraviza e torna os humanos, no
dizer de Boff (2005), seres agalinhados (Conformistas, acomodados, servos,

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coisas, ser menos), impedindo de serem águia (conscientes, críticos,
autônomos, ser mais) .
As pistas que Boff (2005) e Freire (1989) apontam reforçam a ideia de
que a utopia impulsiona o caminhar e constrói experiências enquanto projeto
de transformação. A esse respeito Szack (1972, p. 22) também salienta que o
sentido utópico se refere:
O mudo que se encontra, não se satisfaz com as possibilidades
atualmente existentes: sonhar, antecipar, projetar,
experimentar. É justamente este ato de desacordo que dá vida 874
a utopia. Ela nasce quando na consciência surge uma ruptura
entre o que é, e o que deveria ser; entre o mundo que é, e o
mundo que pode ser pensado.

Desta feita, utopia implica num caminho escolhido para caminhar, ao


propor o rompimento com uma situação que está posta e que deveria ser
diferente, mas está acontecendo. É uma alternativa a ser escolhida como
projeto em permanente construção e contrário ao utopismo como lugar
inexistente ou horizonte ideal deslocado da realidade.
Esta convicção aponta a perspectiva de uma sociedade aberta para um
processo em construção, reconhecendo os problemas e os conflitos de ordem
econômica, política e social, sem no entanto, perder a crença na possibilidade
de uma outra sociabilidade.
Essa concepção utópica recusa o determinismo, recusa a concepção
acabada e fechada, mas sim, aceita a perspectiva histórica do ser humano,
aberto a novas possibilidades como alternativa para transformar as situações
existenciais, uma vez que como sujeitos históricos e não passivos não apenas
estão no mundo, mas com o mundo.
O princípio da esperança acena pistas para um realismo utópico no
sentido de se antecipar um processo aberto, de modo que trata - se de esperar
na ação, como alternativa de mudanças a partir do momento atual, mas sem
perder de vista o futuro. É neste sentido que Wanderley (2010, p. 117) ressalta
o realismo utópico. O sentido do real como:

Ciente dos limites, contradições, transformações, com efeitos


positivos e negativos que as situações mundiais demonstram.
É preciso, pois, aprender – a conhecer, a fazer, a viver junto, a

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ser – sempre com maior empenho e vontade política para
melhor resistir, denunciar, propor.

Já a concepção utópica apontada pelo referido autor destaca:

Utópico no sentido de tentar compor os sonhos de asas e


raízes, traduzindo o inédito viável freireano em todas as
latitudes e longitudes, detectando os sinais dos tempos,
antecipando metas e caminhos”.

Esta abordagem de Wanderley (2010) traz elementos importantes para


compreender o sentido do inédito viável, como dimensão humana, curiosa e 875
criativa, própria do sentido de existência humana, superando a condição animal
determinista. A curiosidade e a criatividade é o caminho do desvelamento da
realidade para a transformação, de modo que o sujeito com sentido de
existência é impulsionado a descobrir e transformar novas paisagens dentro do
seu próprio mundo.
A própria experiência existencial é um terreno fértil para novas
descobertas e para novos espaços de criação e reinvenção de um mundo em
movimento. Neste sentido, o mundo como espaço prenhe de possibilidades
situa o ser humano como sujeito histórico, social, inacabado, mas em
permanente processo de construção e transformação.

O cultivo da perene utopia de que um outro mundo é possível, acende a


chama das ideias do inédito viável, daquilo que ainda não é, mas pode ser, da
utopia, no sentido da esperança em ação e não do simples esperar, mas como
um processo em permanente construção numa perspectiva libertadora,
histórica e crítica, com vistas à construção de um outro mundo.

O MST: POR UM OUTRO MODELO SOCIETÁRIO

No atual modelo societário, em diferentes lugares, em especial nos


países periféricos ou semiperiféricos, como é o caso dos países da América
Latina tem emergido importantes iniciativas nos espaços da sociedade civil,
que se coloca em posição contrária a globalização hegemônica num processo
de lutas contra as condições de marginalidade, mas que além da resistência ao
modelo de sociedade, propõe uma sociabilidade alternativa.
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Essas iniciativas de reivindicação e disputas no espaço público e da
sociedade para efetivar e ampliar a agenda de políticas públicas, é travada
principalmente pelos movimentos sociais que lutam por diferentes bandeiras:
etnias, gênero, meio ambiente, direitos sociais, terras etc. Neste aspecto,
Restrepo (1990, p. 89) destaca a importância dos movimentos sociais enquanto
espaços de criação e participação na sociedade civil.
A constituição da identidade das classes subalternas,
através dos movimentos sociais, reveste-se de uma
876
importância adicional porque eles são espaços de criação
de uma sociedade civil participativa, democrática,
inexistente nas classes populares do continente.

E mais, para este autor “a construção democrática na América Latina


não é uma tarefa somente política, de transformação dos partidos e do Estado,
mas também social, de transformação das relações de poder existente na
sociedade civil”.
Já Calado (1999, p. 01) sinaliza alguns aspectos para dar um conceito
desses agentes sociais organizados que lutam pela construção da democracia.
Ele diz que “os movimentos sociais são Organizações coletivas empenhadas
na luta em defesa de seus interesses econômicos e sócio-culturais, buscando
construir sua identidade de forma processual, tendo como referência oposta a
conduta dos que eles situam como seus adversários ou inimigos”.
Calada (1999) sinaliza algumas características próprias dos movimentos
sociais, tais como: a) Zelam pelos valores que o inspiram e lhe dão cara
própria; b) Enfrentam uma multiplicidade de obstáculos externos em relação
aos quais cumpre traçar uma estratégia de enfrentamento; c) Perseguem
determinado alvo, objetivos ou mesmo projeto alternativo; d) Detêm capacidade
de organização e de mobilização.
Essas marcas ajudam a traçar um perfil do que podemos compreender
como movimentos sociais. São características essenciais assumidas pelos
movimentos e direcionadas ao compromisso de atuar junto aos setores
marginalizados da sociedade, que têm como horizonte uma sociedade
democrática, de maneira que os movimentos sociais são sujeitos políticos e
não sujeitos pedintes.

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Nesta perspectiva, Wanderley (2009, p.08) atribui importância
significativa aos movimentos, uma vez que segundo o autor “os Movimentos
sociais podem contribuir para a democratização dos sistemas políticos, pela
mudança nas regras de procedimento e nas formas de participação política,
pela difusão de novas formas de organização e, sobretudo, pela ampliação dos
limites da política”.
No Brasil, o Movimento dos trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
demonstra fortes estratégias de atuação. A estrutura organizativa do 877
movimento à nível nacional foi sendo construída em distintas regiões do Brasil.
Nesse processo construtivo, a ocupação de terras funciona como uma
estratégia básica para atingir os objetivos. À medida que se ocupa um
latifúndio, gera-se um fato político, pressionando os órgãos governamentais a
negociarem com o movimento.
No processo de atuação, o Movimento tem demonstrado habilidade
política que tem permitido construir alianças e articulações com outros
movimentos e entidades organizadas da sociedade civil, dialogando com os
complexos sistemas de relações da sociedade, conquistando importantes
espaços na atual conjuntura política brasileira. Na análise de Caldart (2004,
p.347),
Trata-se de uma raiz que se multiplica em diversas raízes,
e que por isso mesmo tem maior potencialidade de tornar-
se projetiva, cultivando os pressentimentos de futuro. [...]
um esforço (ação permanente) de manter cada pequena
família sem-terra vinculada à grande família [...] de todo o
país.

O poder de organização, de incorporação de novos militantes e


simpatizantes do MST tem contribuído para uma atuação mais ampla, o que o
diferencia dos outros movimentos e faz com que ele esteja presente em
praticamente todos os Estados do Brasil. A esse respeito Fernandes (2000, p.
222) salienta “para conquistarem seus direitos, dimensionaram a luta pela terra
em luta por educação, por moradia, por transporte, por saúde, por política
agrícola, em fim por uma vida digna”.

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Assim, os aspectos orgânicos do Movimento revelam as suas
estratégias de atuação para o engajamento dos militantes na construção de
uma nova hegemonia ou contra – hegemonia, através do ato político. Nas
palavras de Boff (2005, p.98), “é a capacidade de desprender-se de si mesmo
para captar o outro em sua situação concreta e dispor-se a estar ao seu lado,
se alegrando com ele, sofrendo com ele, jamais deixando só na sua pena”.
O MST enquanto espaço criativo, no qual os intelectuais orgânicos
atuam junto aos setores marginalizados da sociedade, provocando a motivação 878
e participação de uma prática contra – hegemônica, afim de uma sociedade
democrática coloca o MST como protagonista na luta pela reforma agrária e
por mudanças gerais na sociedade.
De acordo Stédile (1999, p. 31), o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem - Terra não se limita apenas à luta pela reforma agrária. Na sua pauta de
reivindicações, levantou três bandeiras de lutas prioritárias, que são: “[...] terra,
reforma agrária e mudanças gerais na sociedade”. Essas diretrizes fazem com
que o movimento dialogue com vários setores da sociedade e construa, ao
longo da sua trajetória, relações capazes de fortalecer o movimento e ampliar a
luta, conquistando territórios em praticamente todas as regiões do país.
A trajetória de resistência e de luta que o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra retomou, entendido neste trabalho como uma prática utópica
e contra – hegemônica, abriu novos caminhos que alimentam o sonho de
concretizar um projeto social que traz esperança de melhores condições de
vida e de trabalho aos que se encontram às margens da sociedade.
Juntamente com o MST, retomou-se também um projeto de uma vida digna
para as famílias que se encontravam excluídas da terra em todo o Brasil.

O CURRÍCULO DE PRÁXIS DO MST

O sentido da intencionalidade emancipatória do sujeito tem como base


os princípios e pressupostos de uma educação que liberta e transforma,
alicerçado na ação-reflexão, na troca de saberes, no diálogo entre as culturas e
nas experiências cotidianas desses sujeitos presentes na teia de relações que

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vem carregada de possibilidades de sistematizar e elaborar um conhecimento
já vivenciado nas experiências práticas. A ausência do movimento dialético que
separa a teoria da prática, como ilustra (Severino 2001, p. 46) “seria
meramente contemplativa e com tal, ineficaz sobre o real; a prática desprovida
da significação teórica, seria pura operação mecânica, atividade cega”
Para que a educação resulte na criação e transformação, é preciso que
a construção do conhecimento elaborado perpasse os caminhos do diálogo
entre o saber do mundo e o conhecimento científico, e que os caminhos em 879
construção apontem possibilidades de uma formação humana para a
emancipação em todas as suas dimensões e que possibilite uma visão de
homem e sociedade emancipatória.
A perspectiva do currículo de práxis traz em seus conteúdos e em sua
ação, as possibilidades de pensar criticamente as relações societárias e que
organicamente, seja capaz de interpretar e sistematizar as culturas,
construindo o que Sacristan (1999,p.26) denomina de nexo entre a cultura
subjetivada e a cultura objetivada. Segundo o autor é necessário: Construir e
inventar a cultura transformada pedagogicamente para que a educação seja
instrumento para a liberdade e autonomia do sujeito para que expresse - se
como protagônico.
Num processo contra-hegemônico, a perspectiva de currículo de práxis
pauta-se numa proposta protagônica de educação, no sentido de formar um
sujeito anunciador do seu próprio mundo, visto que esta concepção curricular
se apoia na elaboração de uma cultura que toma as experiências existenciais
concretas como elementos construtores de um conhecimento que emancipa e
liberta. A esse respeito Severino (2001, p. 76): afirma:

A educação também pode implementar processos e discursos


contra-ideológicos, desvelando a dinâmica da sociedade a
sujeitos das classes subalternas, possibilitando-lhes apropriar-
se do saber sistemático e denunciando as relações de poder.
Adequadamente trabalhado pela educação, o conhecimento
leva a conscientização do significado das relações sociais.
Assim, a educação atua na formação de grupos dominados ao
gestar sua consciência de classe e instrumentalizá-los para
uma práxis política mais adequada.

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Isso acena uma proposta educacional de emancipação das classes
subalternas, e que de fato o educando também passa a ser considerado sujeito
construtor de conhecimento numa relação de diálogo no processo de ensino-
aprendizagem. Neste processo, o sujeito constrói o conhecimento sobre a
realidade e vai se construindo dentro da sua própria realidade existente.
Ao discutir a perspectiva dialética do currículo Gimeno Sacristán (2000)
configura como um projeto construído coletivamente e que é desenvolvido por
uma prática constante de deliberação e negociação no contexto da ação 880
educativa, como uma prática social feita pelos seus agentes, marcada por uma
complexidade social, incerta, mutante, à forma de um processo.
Assim, é preciso problematizar a realidade, motivando o educando a se
envolver com as suas próprias experiências, no sentido de evidenciar e
fortalecer a sua ação protagônica. O currículo de práxis propõe envolver o
educando que se encontra em processo de formação, desvelando
possibilidades de superação de um currículo padronizado para todas as
realidades e amplia o diálogo, através da articulação entre o conhecimento
elaborado e as experiências práticas.

Neste sentido, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST


expressa um projeto de educação contrario as ideias da classe dominante, de
maneira que defende um projeto político/pedagógico emancipatório numa
perspectiva protagônica de educação, no sentido de formar um sujeito
anunciador do seu próprio mundo. Conforme Caldart (2004, p. 97) o projeto de
educação do MST almeja:

Sujeitos de reflexão permanente sobre as práticas, extraindo


delas as lições de pedagogia que permitem fazer (e
transformar) em cada espaço, e do seu jeito, o movimento
pedagógico que está no processo de formação da identidade
dos sujeitos Sem Terra, como está sendo na formação dos
sujeitos humanos de modo geral

As propostas de educação popular inspiradas no pensamento de Paulo


Freire são referências para o projeto politico/pedagógico do MST que aponta
uma proposta educacional utópica, de emancipação das classes populares

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oprimidas, e que de fato nesta prática, o educando também é considerado
sujeito de conhecimento significativo.
Quando dizemos projeto de educação do MST, estamos nos
referindo à combinação entre luta pelo acesso à escolarização
e o processo de construção de uma pedagogia adequada aos
desafios da realidade especifica onde atuamos e do projeto
social e histórico mais amplo que nos anima e sustenta. (MST,
2001, p. 127).

Ao discutir a perspectiva libertadora e dialética de educação, Freire


881
(1989, p. 46) configura como um projeto construído coletivamente e que é
desenvolvido por uma prática pedagógica permanente no contexto da ação
educativa, como uma prática social feita também pelos educandos:
A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e
libertadora, terá dois momentos distintos. O primeiro, em que
os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e
comprometendo-se, na práxis, com sua transformação; o
segundo, em que, transforma a realidade opressora, essa
pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia
dos homens em processo de permanente libertação.

Nesta perspectiva pedagógica, o educando é encarado como sujeito


cognoscente, construtor de conhecimento e também construtor da sua
emancipação. Um sujeito que reflete a sua própria realidade e se sente
estimulado a transformar as condições de subalternidade. Assim, por
excelência, o projeto educativo do MST, tanto no espaço escolar, como em
outras esferas sociais confere a possibilidade de implementar propostas
pedagógicas capazes de contribuir para a construção de conhecimento que vai
além dos muros escolares.
As propostas e práticas de educação crítico/emancipatória do MST
assumem, assim o papel de ponte que dá acesso à liberdade, rompendo com
as práticas “bancárias” de educação, na esperança de transformar as
condições sociais vigentes a partir do exercício pedagógico. Este projeto de
educação está para além dos muros escolares, é uma possibilidade educativa
alargada para outros espaços de práticas e relações sociais, principalmente
nos momentos de lutas e conquistas vivenciadas nos acampamentos e

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assentamentos, uma vez que para o MST, a prática educativa que impulsiona o
cultivo da utopia não acaba quando a terra é conquistada.
Se, de um lado, o acampamento representa momentos de luta em que
os trabalhadores buscam o mesmo objetivo - conquistar a terra. O
assentamento é fruto da organização dos trabalhadores, é resultado de meses
e até anos de luta, em que famílias inteiras passam acampadas, morando sob
barracas de lonas, expostas à chuva, ao frio, ao calor e à fome. É, portanto, a
materialização de um dos primeiros momentos de conquista, mas não o fim da 882
luta, pois, mesmo após o acesso a terra, é preciso continuar a organização e a
luta para se conseguir viver e sobreviver do trabalho na terra. São novos
desafios que vão surgindo a cada dia.
Nesta perspectiva, a fixação no assentamento após a desapropriação e
a emissão de posse da terra, representa a construção do inédito viável, o
momento de transição, em que os trabalhadores saem da condição de
excluídos da terra e passam a habitar uma terra, que até então, era do negócio,
era um instrumento de propriedade privada a serviço de interesses particulares,
e assume agora a posição de terra do trabalho, um instrumento de uso coletivo
direcionado à produção de bens, capazes de suprir as necessidades das
famílias assentadas, mas sem perder a identidade de ser Sem - Terra,
enquanto movimento em permanente luta
.
CONCLUSÃO

Na ação pedagógica são vivenciadas diversas práticas sócio-políticas


que propiciam a aprendizagem dos agentes sociais, para contestação e
reivindicação de direitos ou para construção de alternativas na atual estrutura
social. Nos espaços da sociedade civil, o MST denuncia as injustiças e se
reconhece com potencial de enfrentar os desafios postos pela classe
dominante, de maneira que os excluídos ao serem vitimas do modelo injusto e
desumano de sociedade que se apresenta nas relações de trabalho, de
apropriação das riquezas, da concentração fundiária se rebelam contras as
condições de dominação e exploração.

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237-1438-3
Nesta perspectiva, o cultivo da utopia na educação está para além de
interesses particulares, para além de uma lógica individualista e competitiva e
passa a ser entendida e experimentada com vista à concretização de uma
prática que expresse e afirme a identidade, os saberes, as culturas e o modo
de ser e de conviver com a realidade.

REFERENCIAS
883
BOFF, Leonardo. Virtudes Para um outro mundo possível, vol. I:
hospitalidade: direito e dever de todos. Petrópolis Rio de janeiro, 2005.
CALADO, Álder Júlio Ferreira. Educação popular nos movimentos sociais:
potencializando a relação macro-micro no cotidiano como espaço de exercício
da cidadania. In: MELO NETO, José Francisco; SCOCUGLIA, Afonso Celso.
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Universitária/UFPB, 1999.
CALDART, Roseli Salete. Pedagogia do movimento sem terra. 3ed, São
Paulo: Expressão Popular, 2004.
FERNANDES, Bernardo Mançano. A formação do MST no Brasil. Petrópolis:
Vozes, 2000.
FERNANDES, Bernardo Mançano; STEDILE, João Pedro. Brava gente: A
trajetória do MST e a luta pela terra no Brasil. São Paulo. Fundação Perseu
Abramo, 1999.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
-------------------- Pedagogia do oprimido. 39 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1989.
MORUS, Tomás. A Utopia. Porto Alegre: L e PM, 2010.
RESTREPO, Luis Alberto. A relação entre a sociedade civil e o Estado:
elementos para uma Fundamentação teórica do papel dos movimentos sociais
na América Latina. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(2): 61-100,
2.sem, 1990.
GIMENO SACRISTÁN, J. Poderes instáveis na Educação. Porto Alegre:
Artes Médicas Sul. 1999.

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________________.O currículo: os conteúdos do ensino ou uma análise
prática. In GIMENO SACRISTÁN, J. e PÉREZ GÓMEZ, A. Compreender e
transformar o ensino. Porto Alegre: Artmed, 2000.
SEVERINO, Antonio Joaquim. Educação, sujeito e historia. São Paulo: Olho
D’Água, 2001.
SZACKI, Jerzi. As utopias ou A Felicidade Imaginada. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1972.
WANDERLEY, L. E. W. Existe sociedade civil contra-hegemônica?. In: 884
Vera Chaia; Eliel Machado. (Org.). Ciências sociais na atualidade - tempo e
perspectiva. 1a. ed. São Paulo: Paulus, 2009.
WANDERLEY, Luiz Eduardo W. Educação Popular: Metamorfoses e Veredas.
São Paulo: Cortez, 2010.

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CURRÍCULOS DA ESCOLA FORMAL E PRÁTICAS DE ESPAÇOS NÃO-
ESCOLARES: TENSÕES, ARTICULAÇÕES E PROCESSOS DE
SUBJETIVAÇÃO

Gilberto Moreira100

RESUMO: Este estudo tem por objetivo analisar a forma de como as tensões e
processos de articulação/negociação entre os discursos de educação escolar e da
educação popular incidem sobre os processos de (re)constituição de identidades de
jovens da região metropolitana e do sertão pernambucanos. Utilizando o instrumental
analítico da Teoria do Discurso, evidenciamos a abrangência do discurso educacional 885
em diferentes possibilidades e a forma de como seu currículo atravessa a decisão dos
jovens em relação a seus investimentos sociais. O discurso educacional se constitui
em vários discursos que se articulam, se opõem e se recriam em uma dinâmica
ontológica sobre a formação da identidade juvenil. O currículo escolar formal ao
mesmo tempo diverge e se complementa pelas práticas e discursos de espaços não
escolares de ensino. Nesse ambiente de disputas hegemônicas, marcado por
constantes antagonismos e transformações, os sujeitos se fixam em posições
temporárias. Esse é um cenário em que rupturas se preenchem e se recriam a todo
instante. A decisão dos estudantes sobre suas trajetórias escolares e laborais está à
mercê dessa tensão, mas tem sua fragilidade e sua impossibilidade ocultadas pela
lógica neoliberal que prega uma suposta possibilidade de escolha de ser quem se é.

PALAVRAS-CHAVE: Discursos. Educação escolar. Espaços não escolares de


educação. Identidades.

INTRODUÇÃO

A ideia de que é preciso ir à escola para “ser alguém na vida” chega aos
filhos da classe popular junto com as cantigas de roda. Mas, para “ser alguém
na vida” é preciso reconstruir-se e permitir-se disciplinar o corpo. A educação
se distribui naquilo que se permite e naquilo que se impede a determinadas
classes/grupos sociais e as possibilidades de rompimento com um discurso
voltado à formação laboral e ao apelo de uma ascensão social nem sempre é
colocada como alternativa. Por outro lado, a noção da Educação Popular, que
Streck (2012) descreve como um movimento de resistência cultural, social,
política e econômica, possibilitaria aos indivíduos buscarem a identificação com
valores relacionados à sua condição particular e à sua comunidade. Seria esse
100
Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Programa de Pós-Graduação em Educação
– PPGEdu. gilbertomoreira@hotmail.com.br. O presente trabalho foi realizado com apoio do
CNPq, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil.

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então o caminho para driblar as disparidades e ir ao encontro do que prometem
os discursos de “liberdade”? Seria essa a garantia de resistência ao
subemprego prematuro?

Tais questões fundamentam uma pesquisa que teve início em


2014, quando explorei o tema da evasão escolar por jovens da
capital e do sertão pernambucano que participavam de
instituições não escolares de ensino. Os resultados apontaram
diferentes motivações para o prolongamento e para a
interrupção do processo formal de escolarização. Em 2017 886
essa pesquisa foi retomada e aprofundada, dando origem ao
presente estudo, que analisa o discurso pedagógico dessas
instituições e como as tensões e articulações entre os
discursos de educação escolar e da educação popular incidem
sobre os processos de (re)constituição de identidades de seus
jovens educandos.
Em anos recentes, assistimos à expansão de campis de universidades
federais, universidades estaduais e instituto federais em algumas cidades do
interior do estado de Pernambuco. Essa tentativa de combater as
desigualdades sociais através da educação formal já daria, por si, razão ao
desenvolvimento de estudos sobre a subjetivação de indivíduos que se
encontravam em uma fase de “transição” ao fim do nível médio. Os eventos
políticos que culminaram com o golpe parlamentar de 2016 e as intenções de
reconfigurar não apenas essa expansão do acesso, mas toda a sistemática
normativa do ensino médio no país, ampliaram a necessidade da análise
desses efeitos e da dinâmica de fixação de identidades temporárias desses
jovens estudantes. Dessa forma, o presente estudo é realizado e publicado em
um momento de transição político-ideológica, com vistas a promover um
recorte de movimento, um registro de tensão entre discursos e possíveis
aproximações (in)conclusivas.

FUNDAMENTOS E MÉTODOS

Nossa abordagem metodológica tenta escapar do modelo de análise de


identidades e relações entre os sujeitos como algo particular e estático. Os
estudos pós-estruturalistas, como a teoria do discurso, são a base conceitual e

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teórica de nossa investigação. Eles põem em xeque a noção das instituições e
dos contextos moldadores do discurso como totalidades fechadas. Assim, os
discursos produzidos pelos indivíduos e instituições aqui analisados se
constituem como entidades atravessadas por contradições ontológicas e
antagonismos transformadores de uma estrutura material que se desloca, se
divide, se reconstrói, mas nunca se fecha (LACLAU, 1993).
Para a teoria do discurso, atores sociais, como as instituições
educacionais, adquirem um caráter político ao incorporarem, em suas ações, 887
práticas em territórios nos quais a contingência histórica se sobrepõe a uma
suposta ordem definitiva nunca alcançável (BURITY et al. 2015). A educação
como discurso, então, compreende um sistema de articulações e disputas pelo
controle da transformação ou manutenção de construções identitárias em prol
de uma determinada ordem social. São “discursos educacionais”, que
(re)formam identidades e subjetividades, promovem deslocamentos e
influenciam, assim, a construção da realidade social. Por outro lado, a ideia de
uma educação feita pelo povo e para o povo pode ser compreendida como
aquela que tenta cumprir as expectativas daquela parte desprivilegiada da
comunidade (plebs), que deixa de ser atendida pelo poder governante e que
anseia tornar-se a “única totalidade legítima” (populus) (LACLAU, 2013).
Foram três as instituições de educação não escolar que compuseram
nossa pesquisa: o Grupo Comunidade Assumindo Suas Crianças (GCASC), o
Centro Cultural Grupo Bongar - Nação Xambá (as duas localizadas,
respectivamente, nos bairros de Peixinhos e São Benedito, em Olinda - PE) e a
Fundação Cultural Cabras de Lampião (sediada na cidade de Serra Talhada,
no sertão pernambucano). Além das entrevistas e atividades em grupo
realizadas com coordenadores e educandos das instituições, estive presente
em ações e eventos promovidos pelos diferentes espaços ao longo de todo o
primeiro semestre de 2017 e acompanhei as postagens em redes sociais, blogs
e páginas da internet de cada instituição. Os três espaços dizem estar
estatutária e/ou ideologicamente comprometidos com os princípios da
educação popular e foram escolhidos por conta da diversidade da natureza de
suas ações e pela disponibilidade que demostraram ter para esta pesquisa.

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Os onze educandos participantes da pesquisa podem ser considerados
“jovens” dentro de suas faixas etárias. Apesar de não havermos feito qualquer
restrição em relação à situação econômica ou social dos indivíduos e mesmo
sem que lhes fosse perguntado, muitos deles se declararam espontaneamente
ou se fizeram perceber como sendo oriundos de uma família humilde, de baixa
condição financeira. Todos são participantes ativos de suas instituições e já
concluíram ou estão concluindo o ensino médio em escolas públicas. A seleção
dos educandos seguiu a orientação dos próprios coordenadores das 888
instituições após a apresentação de nossa proposta de estudo.
O tratamento das informações segue uma abordagem que visa
compreender os discursos que articulam os sentidos de suas próprias lógicas.
A teoria pós-estruturalista do discurso afirma o caráter sempre já discursivo da
realidade que se investiga, trazendo à tona sua contextualização e analisando
os elementos simbólicos, políticos e linguísticos que caracterizam a condição
ontológica dessa realidade (OLIVEIRA et al, 2013). Associamos esse modelo à
“abordagem das lógicas”, que enfatiza a contingência radical e incompletude
estrutural dos sistemas de relações sociais. A preocupação não é apenas a de
perceber a existência de determinado fato, mas compreender os motivos de
sua existência, sua contingência e sua historicidade. Tenta-se destacar a
construção e o caráter político da objetividade social para articular conceitos e
lógicas que possibilitem a análise das relações e dos processos sociais
(GLYNOS; HOWARTH, 2007).

EDUCAÇÃO, PADRÕES HEGEMÔNICOS E DISPUTAS PELO CURRÍCULO

Para analisar a forma de como as tensões e articulações entre os


discursos de educação popular e da educação escolar formal incidem sobre os
processos de (re)constituição de identidades de estudantes da capital e do
sertão de Pernambuco, assumimos a educação como um campo de
enunciação e produção discursiva e cultural (LOPES; MACEDO, 2011).
Falamos, assim, de algo tão antigo quanto o próprio ser humano. A “escola”, na
forma como a conhecemos, entretanto, é algo muito mais recente. A grande

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discrepância histórica entre a menção ao ato educativo e a sua formatação em
um sistema escolar, porém, não apaga o imbricamento desses dois termos,
que se confundem. O que legitima o conhecimento escolar para a sociedade,
em detrimento de outras esferas educacionais, é exemplo de luta discursivo-
hegemônica.
O que se ensina em uma instituição educacional, independentemente de
seu grau de formalidade, é considerado, dentro de uma lógica social, como
legítimo ou, no mínimo, válido. Nesse sentido, a elaboração de um currículo 889
torna-se uma verdadeira arena de lutas, na qual muitos são os interesses sobre
a discussão do que se considera necessário a estabelecer-se como um
conhecimento a ser gerado/transmitido. Nessa discussão, fronteiras políticas e
de identidades são construídas, mas sempre de maneira não definitiva. Como
síntese de elementos culturais e campo de produção cultural, o currículo torna-
se o espaço de constituição de propostas político-educacionais elaboradas e
sustentadas por agentes dinâmicos, com interesses diferentes e contraditórios.
Assim, constitui-se como terreno de articulação hegemônica, cuja articulação é
permanentemente passível de “renegociação” (LOPES, MACEDO, 2011).
Em nossas observações, percebemos que os espaços não escolares
levam certa “vantagem” em relação à escola, ao se apoiarem em estruturas
menos rígidas e pouco submeterem-se ao cumprimento de obrigações e
exigências de ensino normatizadas. Menos sujeitos ao poder de silenciamento
ou à política de conveniência em seus currículos/práticas, precisam atender
menos às normas governamentais e mais à comunidade a qual servem. Por
outro lado, necessitam lutar bem mais por sua própria sobrevivência e sofrem
de uma condição de grande fragilidade. Vários foram os relatos de dificuldades
financeiras, ameaças de grupos de ideologia distinta e das pressões de
representantes do próprio poder público desafeitos a campanhas pelos direitos
humanos.
Ao se comprometer com a tarefa de preparar novas gerações para a
construção histórica da sociedade, a educação toma a responsabilidade do vir-
a-ser do sujeito e da tradução das expectativas culturais e políticas de seu
projeto de sociedade. A educação assume o papel de recalcar as outras

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alternativas possíveis a esse sujeito, protegendo-o e, ao mesmo tempo,
reprimindo formas de investimento afetivo consideradas nocivas à ordem
social. Constitui-se discursivamente, assim, a partir da falta, da diferença entre
presente e futuro e da inscrição na ordem do significante conforme o momento
histórico e os interesses dominantes de um determinado contexto
(ANDREOZZI, 2005).
Durante as observações nos espaços não escolares de educação,
percebi que há uma maior possibilidade de oitiva dos jovens, um sentimento de 890
solidariedade ante seus conflitos e mesmo a busca de solução de alguns de
seus problemas específicos. Ao se aproximarem mais da comunidade e
estarem a ela mais criteriosamente vinculados, os espaços de ensino não
escolares estão mais próximos das realidades e conflitos de seu público. Esse
vínculo não descaracteriza a presença de uma ideologia e filosofia de ação e
nem torna impossível a existência de propostas, currículos, agendas e
objetivos específicos. Os interesses e opiniões dos indivíduos participantes de
espaços de educação não escolar, entretanto, estão sujeitos a tensões e
divergências para com os discursos apresentados por esses próprios espaços.
Dentro de um âmbito discursivo, a educação formal e a educação não escolar
parecem partilhar mais equivalências do que diferenças.
Em casos mais específicos, observamos determinações e proibições
bastante pontuais. Os participantes de um dos projetos, por exemplo, usam
uma camiseta como uniforme. Nela, há a identificação da instituição e do
próprio projeto, algo que lhes garante algum resguardo de segurança, uma vez
que, segundo o depoimento de alguns desses jovens, eles devem acessar
áreas consideradas de risco em suas comunidades. A necessidade de
identificação do jovem nessas áreas pode ser perfeitamente alegada pela
instituição que estabelece o uso desse uniforme. Por outro lado, por que essa
mesma alegação não poderia ter origem na escola formal? Se a disciplina
objetiva a produção de corpos dóceis, mais propensos ao aceite das regras,
não é por ela se dar em um âmbito menos hierárquico e burocrático que ela
perderá sua essência normatizadora.

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Na escola, por outro lado, a fala dos estudantes espelha um discurso
que acusa um suposto “déficit de qualidade”: um imaginário de deficiência a ser
combatido. Pergunto, por exemplo, a um dos jovens, que tipo de referência ele
guarda da escola. Sua resposta me falou de “um lugar alegre”, do qual não
teria o que reclamar. Tento aprofundar a pergunta, questionando se a
referência que ele mantinha da escola era a de um lugar bom e ele me fala: “é,
não tão bom quanto deveria ser, mas... bom”. Insisto um pouco mais e peço
que ele me explique o que esse “não tão bom quanto deveria ser” realmente 891
significa. Ele, então, me diz: “porque, assim, é como sempre falam, ‘não
investem muito na educação’. Não tem aquele total aprendizado como é pra
ter, entende? Mas tem o aprendizado, vamos dizer assim, o mínimo que dá pra
aprender e a gente aprende...” (grifos nossos). Observo o emprego de
dispositivos linguísticos que explicitam a intenção de não tomar a origem desse
discurso para si. A atemporalidade, mostrada através da expressão “é como
sempre falam”, e o próprio uso da forma verbal na terceira pessoa, tanto nessa
frase quanto em “não investem em educação”, evidenciam uma tentativa de
generalização que pode ser compreendida como reflexo dos mitos e/ou lógicas
fantasmáticas das quais nos falaram Glynos e Howarth (2007).
No Brasil, percebe-se uma centralização das políticas curriculares
apoiadas nos princípios neoliberais, que enfraquece a ação de professores,
alunos e comunidade como atores desse processo. A noção de “qualidade da
educação” constitui-se como ponto nodal que organiza os discursos
pedagógicos e justifica a necessidade das reformas curriculares. Essa noção
de qualidade é um significante vazio que lutas hegemônicas tentam preencher.
Nesse processo, a ineficiência do sistema educacional forma um exterior
constitutivo, e observam-se cadeias de equivalências específicas que se
articulam no sentido desse preenchimento. Discursos como o da diferença vêm
provocando uma rearticulação em algumas cadeias antagônicas em defesa de
conteúdos universalistas, apresentados como garantia de qualidade da
educação e ferramenta de igualdade social. Por outro lado, discursos
conservadores se lançam sobre o domínio de conteúdos disciplinares
universais ou de saberes socialmente organizados. Os discursos pedagógicos

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trazem posições de sujeitos que lutam por hegemonia nas novas enunciações
curriculares e a compreensão dessas lutas permite “configurar a resposta do
campo a suas circunstâncias presentes e sociais” (MACEDO, 2009; 2014). A
educação, assim, se constitui num fértil terreno de disputas hegemônicas, que
pode ser ilustrado pelos eventos de matriz político-ideológica que ocorrem em
nosso país durante a confecção do presente trabalho.

SOBRE OS DISCURSOS DOS ESPAÇOS NÃO ESCOLARES DE ENSINO 892

Os discursos dos três espaços não escolares de ensino aqui analisados


são a forma como cada uma das instituições se apresenta dentro de um
cenário de tensões, de preenchimentos de espaços sociais não suturados e de
estabelecimento de práticas que constituam e legitimem sua própria existência.
Em uma dessas instituições, se atenta para o discurso da família, para a
preservação do discurso de cidadania dentro de um espaço bem delimitado e
para o discurso de uma identidade comunitária que teria voz contra um poder
dominante. Em outra, o discurso da religiosidade está incorporado a práticas
que remetem ao respeito à ancestralidade, aos símbolos, à elevação através
da disciplina e da prática. Na terceira, o discurso do regionalismo faz uma
leitura própria da História, dos símbolos regionais de resistência, força e
coragem. Nessas duas últimas instituições, inclusive, percebe-se o quanto o
conhecimento é valorizado como arma de resistência. Através da arte, da
expressão e da apropriação de elementos culturais e históricos, combatem-se
discursos antagônicos formados por lógicas discriminatórias.
Esses espaços não escolares, por outro lado, demonstram claramente
não apenas um interesse em estabelecer modelos disciplinares semelhantes
ao de uma instituição formal, mas estabelecem, indiretamente, um vínculo
muito significativo com as escolas. Ao exigirem que seus participantes estejam
cursando ou já tenham concluído o ensino formal obrigatório, os espaços não
escolares produzem um discurso que legitima e apropria valores característicos
da escola formal. Além dessa exigência, em todas as instituições não escolares
investigadas detectamos discursos de respeito a horários, ao padrão de

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vestimenta e à forma de comportamento. Vimos que há um tratamento
hierarquizado e reverente aos educadores (professores), bem como metas a
serem cumpridas de acordo com as propostas de cada instituição.
As instituições não escolares deixam claras suas propostas, suas
posições políticas e suas formas de atuação sobre os constitutivos de
identidade daquelas que dela participam. Ao ingressar nesses espaços, o
indivíduo estará tacitamente aceitando e submetendo-se aos elementos que
influenciarão sua forma de pensar, de agir e, principalmente, desejar/decidir. 893
Valores, ideias e perspectivas serão igualmente oferecidos e absorvidos em
maior ou menor grau. A grande diferença, entretanto, está em seu poder de
participação. Além de buscar as instituições que mais favorecem seus próprios
interesses, o participante terá nelas uma possibilidade infinitamente maior de
interferir em seus discursos. Mesmo com um currículo estruturado, uma
ideologia concreta e uma tradição seguida em essência, a fluência de suas
práticas faz com que o ambiente interno dessas instituições seja muito mais
favorável às articulações, aos enfrentamentos, às transformações do que o
ambiente discursivo da escola formal.
Esses aspectos nos levam a esboçar alguma análise quanto a uma
possível disputa hegemônica entre os espaços escolar e não escolar de
educação. Percebemos que os discursos mais se complementam e se
articulam do que se conflitam pela disputa de um território emergente. É o
caso, por exemplo, de não receber de qualquer jovem a informação de que a
prática de seu espaço não escolar colabora para o desinteresse em seus
estudos formais. Ao contrário, os discursos dessas instituições pregam a
importância do conhecimento, da formação/certificação e dos valores que lhes
seriam transmitidos pela escola. O discurso do espaço não escolar, assim, não
se opõe ao discurso formal da escola: a ele se articula. Ao mesmo tempo, esse
discurso não nos parece neutro, ingênuo ou acrítico à realidade política e ao
cenário atual da escola formal. Ao se posicionarem em relação à exigência de
direitos, cobranças de políticas públicas e imposições de ideologias próprias a
sua área de atuação, os espaços não escolares de ensino criam campos de
conflito capazes de lhes garantir o poder de conquistar, de resistir e de buscar

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a subversão de certas ordens sociais. Ou seja, ações capazes de garantir
espaços de luta na disputa hegemônica e de garantir sua própria existência.
Em meio a esse jogo do poder, é mais que provável que a crítica às políticas
públicas acabe resvalando nas políticas públicas de educação. Nesse caso, o
vínculo, a articulação e o complemento dos discursos desses dois ambientes,
mesmo sem se oporem ou se polarizarem, formam um círculo cujo fechamento,
em prol de sua existência e manutenção, nunca será realizado. Isso traduzido à
fala dos jovens entrevistados denuncia: a escola não é ruim, mas sempre 894
poderá ser bem melhor.

AS FANTASIAS DE “SER ALGUÉM” E AS IDENTIFICAÇÕES COM A


EDUCAÇÃO (NÃO/ESCOLAR)

Havendo minimamente ilustrado os ambientes escolar e não escolar em


termos de discrepâncias e similitudes, aprofundaremos nossa atenção agora
para a figura dos educandos. Em um primeiro momento, buscamos saber como
essas próprias pessoas discursam sobre suas próprias condições em relação
aos espaços que partilham. Nesse sentido, se há um imaginário social de
“juventude” como fase de transição para a idade adulta, esse conceito não
esgota a pluralidade de uma identidade atravessada por categorias de várias
ordens. São, na verdade, “juventudes”, melhor compreendidas como
construções históricas e culturais do que como um mero dado cronológico
(ABRAMO, 2005; CARRANO, 2012; TOSTA, 2015). Laclau e Mouffe (2015)
acrescentam a condição de consumidor a essa construção social da juventude.
Nela, criam-se necessidades específicas para o jovem, que o impulsionam a
buscar uma autonomia financeira. O problema é que a própria sociedade não
tem condições de lhe prover tal autonomia, já que fatores como as crises
econômicas e o desemprego o colocam em uma condição de ainda maior
vulnerabilidade (p. 249, grifo nosso). O novo discurso publicitário e o apelo ao
consumo de modelos estéticos e técnicos mobilizam as identificações de
jovens de diferentes condições socioeconômicas. Valores que estabelecem
determinadas configurações de desejo (de consumo) são difundidos em rede,

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em estratégias de reestruturação econômica e geopolítica hegemônicas (BLOJ,
2010; DAYRELL, CARRANO, 2014; TOSTA, 2015).
Falas espontâneas dos entrevistados, revelaram que todos eles
dependem de um trabalho que lhes remunere para poder se manter no futuro.
Ao mesmo tempo, todos são movidos pela lógica de que é preciso estudar
“para ser alguém na vida”. Ou, a lógica de que só através da educação eles
terão a oportunidade de atingir um patamar mínimo de condição o social, de
reconhecimento de sua existência e de seus valores. Querem ser sujeitos que 895
produzam e consumam o tanto que lhes garanta esse “ser alguém”. Para Burity
(2010), a educação torna-se a “salvação” da desqualificação laboral e da
marginalidade. Essa alegação revelaria vários outros discursos em torno de um
imaginário social de referência de superioridade/inferioridade, baseado em uma
maior capacidade produtiva daqueles que supostamente detêm maiores
quantidades de um saber escolarizado (p. 22-26).
A tendência à idealização é um elemento peculiar da fantasia. O sujeito
constituído a partir de sua negatividade, de sua falta, busca sua completude ao
tentar fixar uma identidade positiva. Esses processos de identificação, da
busca por uma identidade completa, são dialéticos e inesgotáveis e levam o
sujeito a experimentar diferentes configurações sociais em termos de papéis,
posições ideológicas e práticas de consumo. Da incapacidade de realização
plena se realimentariam os processos de identificação e se originaria o desejo
(GLYNOS; STAVRAKAKIS, 2008, p. 261).
A fantasia do “ser alguém” através da educação é enunciada por nossos
entrevistados tanto nos sonhos de sua realização/concretização, quanto no
medo de sua não realização ou perda. Finalmente, observamos que a família
ganha um destaque especial nas influências e decisões do vir a ser. São vários
os elementos enunciadores de discursos que atravessam e subjetivam os
jovens. A tensão, articulação e o antagonismo entre os discursos são também
elementos (re)configuradores de identidades, que nos levam a perceber que
não basta compreender o processo de produção das “fantasias”, “sonhos” e
“desejos” que movem esses indivíduos. Esses são significantes que vagam
pelo imaginário social, suportam discursos, criam e recriam as mais diversas

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lógicas, afetam subjetivações e deslocam tantas e tantas identidades. O
importante é lembrar que essa dinâmica é, antes de tudo, hegemônica e
representa interesses, ações políticas e nunca neutras ou isentas.

CONCLUSÕES

Se inúmeros discursos e lógicas no âmbito do senso comum tentam


estabelecer determinadas identidades a serem incorporadas pelo sujeito (o 896
“alguém” a ser na vida), a tentativa de nomear as identidades das instituições
se dá pelos mesmos caminhos. Assim, se a escola formal é tida como
“repressora”, o espaço não escolar de educação é “libertador”. Se a escola
formal representa “o” modelo hegemônico, o espaço não escolar de ensino
abriga o propagado ideal de resistência. Há de fato muito a ser revisto nesses
conceitos. Não digo aqui que a escola formal não represente esse ideal de
universalismo social, cuja normatividade atropela as particularidades do sujeito.
Não digo tampouco que essa postura se isente de interesses sociopolíticos
contingentes e que conflitos não haja no ambiente escolar. Percebemos, sim,
tensões. A escola é imaginariamente representada como um espaço conflitivo
e incompleto pelos jovens que, em sua maioria, conseguem expressar que ela
“poderia ser melhor”. A referência desse lugar melhor: o espaço não formal de
ensino. O lugar que acolhe, que trata das diferenças, que permite um contato
mais direto com seus modelos de Outro.
Os espaços não formais de ensino estudados aqui não rejeitam ou
mesmo se opõem à escola. Apoiam os seus métodos quando se tornam,
também, lugares de disciplina e recalque. São espaços que disputam a
atenção dos jovens. Jovens que incorporam seus discursos, que dão
significância a suas ações e que as expandem por outros ambientes, inclusive
a escola. Cria-se, assim, uma espécie de adversidade entre os dois espaços,
mas não de inimizade. Ao ser atingida pelo discurso do espaço não escolar, a
escola formal não apenas torna-se capaz de subverter de sua ordem, mas
também de ter seu próprio discurso transformado e autorreconstituído.

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O encontro entre os discursos da escola e do espaço não escolar
aparentam condicionar profundamente o olhar dos jovens e movê-los ao apelo
do “ser alguém”. Os jovens deixam claras suas esperanças de que todo o
investimento nas ações educativas de ambos os espaços lhes trarão
possibilidades de mudança. Todos eles expressam o desejo pelo
prolongamento de suas carreiras escolares, pois veem nelas a possibilidade de
se enquadrarem no imaginário social do “ser alguém”. São influenciados por
discursos diversos e impulsionados pelo medo de “não serem”. Ou, pelo medo 897
de continuarem a ser o que um imaginário social lhes faz crer que já são.

REFERÊNCIAS

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CURRÍCULO COMO PRÁTICA CULTURAL: UMA REFLEXÃO SOBRE
CURSINHOS POPULARES ANARQUISTAS DE SÃO PAULO

Alcidesio Oliveira da Silva Junior, UFPE

RESUMO: Mais do que uma transmissão de conteúdos, o currículo emerge como uma
prática cultural capaz de produzir novas subjetividades e identidades diversas, em
oposição às hegemonias que regem a atual sociedade. Esta pesquisa tem como
objetivo analisar as práticas pedagógicas e curriculares de dois cursinhos populares
organizados por anarquistas em São Paulo à luz dos Estudos Culturais: o Cursinho
Livre da Sul – Arriba Lxs Que Luchan! e o Cursinho Livre da Lapa. Percebemos nestas 899
vivências que uma cultura rebelde e autônoma é trabalhada, inspiradas no
Anarquismo, e que são capazes de produzir novas perspectivas emancipatórias e
libertárias visando o seu fortalecimento na arena política que é o currículo.

Palavras-chave: Anarquismo. Cultura. Currículo. Educação popular. Estudos


Culturais.

INTRODUÇÃO

Imersos em uma sociedade capitalista que visa de maneira voraz a formação


de novos braços que aumentem a produtividade e os lucros das grandes
empresas, conduzida por processos de manutenção de um poder hegemônico
que oprime a classe trabalhadora e os povos marginalizados, uma ideia de
uma educação emancipadora sempre esteve presente na reflexão dos
movimentos revolucionários, conscientes de que uma nova conformação de
mente, e de corpos, é necessária para que processos subversivos e
revolucionários sejam desencadeados no meio do povo.

Se de um lado, historicamente, a educação sempre esteve ligada à


Igreja e ao Estado, que deveria, pelo menos no campo discursivo trazer o bem-
estar da sociedade como um todo, a partir do momento em que foi dada a
oportunidade do poder privado assumi-la, pela ineficácia de alcance da
educação pública e gratuita, um novo fosso se abriu, aprofundando as
desigualdades sociais e a falta de acesso aos meios de ascensão da classe
trabalhadora.

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Conscientes deste cenário, o movimento anarquista vivenciou diversas
experiências de educação popular e libertária no século XVIII, como A Colmeia
de Sébastian Faure e o Orfanato Prévost de Paul Robin, ambas na França; no
século XIX como na Escola Moderna organizada por Francisco Ferrer y
Guardia em Barcelona/Espanha, bem como nas dezenas de outras Escolas no
Brasil impulsionadas pela chegada dos imigrantes italianos, espanhóis e
portugueses na primeira década da República. Hoje em dia, o movimento
anarquista ainda estende a sua influência no campo da educação popular, 900
como na Escola Paideia na região de Mérida, na Espanha, bem como
influência direta nas Escolas do Movimento Freinet, entre outras instituições de
viés mais libertário.

Nestas experiências, bem mais que um conteúdo formulado em


disciplinas para o ensino dos alunos e alunas, há algo que rompe com o que
está escrito nos livros ou desenhado nos quadros: a importância, para os
anarquistas, de que novas práticas, valores, atitudes e comportamentos fossem
ministrados, em uma educação cotidiana de renovação e substituição gradual
do pensamento burguês, oprimido e subserviente. Assim, o currículo adquiriu
uma funcionalidade de ressignificação das práticas culturais nestes ambientes,
pelo encontro emergido entre a cultura capitalista habitual dos alunos e alunas
e as diferenças apresentadas pelos anarquistas, dando um novo sentido às
relações sociais. Esta pesquisa tem como objetivo analisar as práticas
curriculares de dois cursinhos populares organizados por anarquistas.
Tomamos aqui como perspectiva teórica os Estudos Culturais, pelo amplo
debate a respeito da cultura como espaço de poder e de significação, onde as
significações e narrativas são negociadas, fixadas, transformadas.

O primeiro é o Cursinho Livre da Sul – Arriba Lxs Que Luchan!, fruto das
lutas secundaristas de 2015 quando os/as estudantes ocuparam escolas em
todo o estado de São Paulo como forma de impedir a reorganização da rede
estadual, que iniciou suas aulas no dia 14 de maio de 2016 e animado por
professores e militantes do Bloco de Lutas de São Paulo. O outro é o Cursinho
Livre da Lapa, cujo slogan é “Pré-universitário, autogerido e popular”, que
surge no início do ano de 2015 na tradicional Casa Mafalda, reduto de

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militantes anarquistas e libertários, e é inspirado na educação anarquista da
Argentina e na Escola Moderna de Francisco Ferrer y Guardia.

Esta pesquisa justifica-se por abordar uma temática que lança o olhar
para novas práticas curriculares e pedagógicas, transformando o espaço
escolar em um local de potencialidades revolucionárias e libertadoras,
conduzindo a experiências de emancipação individual e coletiva. Aqui,
pretendemos traçar caminhos que inspirem outras pesquisas sobre educação
901
anarquista, caminho pouco abordado na Academia.

ANARQUISMO E EDUCAÇÃO: ENTRELAÇAMENTOS

É fundamental compreender que para o Anarquismo, ideologia que


arrebata em luta a classe trabalhadora e os povos oprimidos desde o século
XVIII, a educação tem um papel destacado na formatação de uma nova
consciência, esta revolucionária, a fim de produzir rupturas no seio da
sociedade que desemboquem em auto-organização popular e autonomia,
caminhando rumo à destruição do Estado e seu braço econômico: o
Capitalismo.

Para o anarquista italiano Errico Malatesta:

O anarquismo nasceu da revolta moral contra as injustiças sociais.


Quando apareceram homens que se sentiram sufocados pelo
ambiente social em que eram obrigados a viver, que sentiram a dor
dos demais como se ela fosse a sua própria, e quando estes homens
se convenceram de que boa parte do sofrimento humano não é
consequência inevitável das leis naturais ou sobrenaturais
inexoráveis, mas, ao contrário, que deriva de realidades sociais
dependentes da vontade humana e que podem ser eliminados pelo
esforço humano, abria-se então o caminho que deveria conduzir ao
anarquismo. (MALATESTA, 2009, p. 4).

Alguns princípios, portanto, são condições indispensáveis para a luta


travada pelos anarquistas visando a destruição das desigualdades sociais e a
escravidão estatal: a abolição da propriedade privada; a abolição do governo, o
que inclui as monarquias, as repúblicas, os parlamentos, os exércitos, as
políticas e toda instituição coercitiva; a auto-organização social por meio de
associações livres e federalistas; a garantia do bem-estar das crianças e os

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incapazes de suprirem suas necessidades básicas; a guerra às religiões, às
rivalidades e aos preconceitos patrióticos, bem como a abolição das fronteiras;
e a reconstrução da família longe da opressão física, econômica e religiosa
(Idem, 2009).

Estas considerações iniciais sobre o que é o Anarquismo e seus


princípios servem para que nos atentemos quanto à indispensável necessidade
do movimento em investir nas práticas educacionais que proponham esta
902
renovação das mentalidades. Entendendo a educação burguesa,
especialmente em ambientes formalizados como a escola e a Universidade,
como um braço do Estado, os anarquistas compreendem a não possibilidade
de, através destes instrumentos, ocasionar uma ruptura necessária para o fim
das opressões. Daí o surgimento de diversas experiências libertárias que se
espalharam pelo mundo desde o século XVIII.

Segundo Passetti e Augusto (2008):

Na sociedade disciplinar, a escola anarquista foi a resposta ao


monopólio da educação pelo Estado, sob a forma de ensino nacional,
laico e/ou confessional, como direito e obrigação de cada cidadão. Na
atual sociedade de controle, o inventor de liberdades atualiza a
educação anarquista como espaço de experimentação que sacode o
imobilismo, subvertendo a docilidade, a disciplina e a obediência
escolares (PASSETI; AUGUSTO, 2008, p. 10).

Assim, “a educação anarquista instiga o combate, reconhece as


intempestividades e provoca liberações” (PASSETTI; AUGUSTO, 2008, p. 10),
fomentando novas disposições e rebeldias diversas frente às opressões
cotidianas do Estado e do Capitalismo. Mais do que um conteúdo a ser
transmitido, as propostas educacionais libertárias vivenciam o cerne da luta e
das esperanças de um futuro justo e igualitário através das práticas correntes e
da cooperação mútua presente nas escolas.

Para tanto, a construção de um poder popular surge como emergencial


neste contexto. Em seu livro “Criar um povo forte”, Felipe Corrêa (2010, p. 12-
13) reproduz um trecho da entrevista que o chileno Victor Toro, dirigente do
Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR) concede à revista Punto Final
em 1973:

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Concebemos o poder popular como um poder independente do
governo atual [...], como um poder autônomo que unifica o conjunto
de setores sociais (operários, estudantes, camponeses, empregados,
pequenos comerciantes) de uma determinada comuna, tomando esta
com a organização celular de toda cidade ou região. [...] A tarefa da
classe operária é destruir o Estado capitalista e para isto deve
desenvolver o poder popular, que progressivamente deverá enfrentar
o poder dos patrões. [...] O poder popular não se cria por vontade de
ninguém. Nasce e se fortalece ao calor da luta.

Visando caminhos rumo a este poder popular, poderíamos citar algumas


práticas educacionais anarquistas que cravaram suas potencialidades na
903
história. Não pretendemos aqui nesta pesquisa detalhar estas vivências, pois
nosso foco é outro, porém achamos de muita valia referenciarmos para que
novos estudos com destaque nestas práticas surjam na Academia.

Em 1880, inspirado pela Educação Integral de Mikhail Bakunin, o


pedagogo Paul Robin inicia seus experimentos libertários no Orfanato Prévost
na França. Várias atividades em regime de coeducação de gênero, uma
inovação para a época, eram praticadas pelas crianças: imprensa na escola,
boxe, canto, teatro, aprendizagem dos cuidados com a higiene, natação,
ciclismo, alimentação variada, entre outras diversas oficinas de trabalhos
manuais (ANTONY, 2011). Entre 120 a 180 internos foram alcançados durante
os 14 anos de gestão de Robin, interrompidos abruptamente por uma
campanha de conservadores na região que espalharam boatos a seu respeito.

Anos mais tarde, em 1904, outra experiência anarquista chamada La


Ruche (A Colmeia) coordenada pelo militante Sébastian Faure surge na
França, especificamente na região campestre de Rambouillet, uma área com
uma fauna e flora riquíssima para desfrute da comunidade. Segundo Passetti e
Augusto (2008, p. 78):

Era preciso coragem para inventar “La Ruche”, uma escola


autogestionária, uma “cooperativa integral”, como Faure gostava de
chamá-la. Nela, a autonomia da criança era valorizada e oposição à
concepção capitalista de criança como adulto em miniatura; estava
voltada para fortalecer a coragem dos pequenos.

De maneira livre e autogestionada, a Colmeia educava suas crianças


distante dos padrões autoritários das outras escolas, conformando uma prática
que objetivava a ajuda mútua, o cooperativismo, a solidariedade, sem
hierarquia e sem castigos físicos, trazendo docilidade e leveza às diferenças

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entre os alunos e alunas que viviam com seus pais e mães na comunidade
(GALLO, 1995).

Uma outra experiência que eclode em Barcelona, em 1904, é a Escola


Moderna. De orientação anarquista e coordenada pelo pedagogo Francisco
Ferrer y Guardia, a escola trabalhava com princípios de autogestão,
coeducação social e de gênero, laicidade, perspectivas anticapitalistas e anti-
estatais, desviando-se dos misticismos religiosos da Espanha em função do
904
chamado racionalismo científico (FERRER Y GUARDIA, 2014). Vale ressaltar
que após o assassinato político do seu fundador, em 1909, centenas de
Escolas Modernas surgem no mundo, inclusive no Brasil, com forte inspiração
de Ferrer y Guardia.

RELAÇÕES DE PODER: CULTURA E CURRÍCULO

Muitas são as perspectivas debatidas a respeito do currículo entre os


pesquisadores, professores e estudantes das diversas áreas da educação,
todos e todas voltados para reflexões que permeiam o conteúdo a ser incluído
na matriz escolar e sua eficácia no processo de aprendizagem na sala de aula.
Percorrendo linhas mais conservadoras ou mais progressistas, os profissionais
da educação voltam-se para este que é um dos objetos de maior disputa pelos
agrupamentos de poder. Mas por que tanto interesse na disputa destes
conceitos? Segundo Moreira (2004, p. 11), o currículo “constitui significativo
instrumento utilizado por diferentes sociedades tanto para desenvolver os
processos de conservação transformação e renovação dos conhecimentos
historicamente acumulados como para socializar crianças e jovens segundo
valores tido como desejáveis.”

Assim, questões referentes a sua disposição e conformação são de


extrema importância nos debates pedagógicos. Nesta pesquisa, adotamos o
entendimento de Tomaz Tadeu da Silva em seu livro “Documentos de
Identidade” ao compreender que, na verdade, não estamos falando de diversas
“teorias” do currículo, mas de verdadeiros “discursos”. E qual seria a diferença,

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de acordo com o autor? Para ele, a teoria pressupõe que um objeto já existe,
no caso, o currículo, e que a teoria apenas entra em cena para explica-lo,
descrevê-lo ou descobri-lo. É algo preexistente. Quando falamos de “discursos”
curriculares, entendemos que são estes mesmos que produzem as noções de
currículo através da palavra, dos elementos linguísticos. Nós conformamos,
adequamos, ou melhor, damos origem as propostas curriculares através do
discurso, da palavra, visualizando menos uma ontologia e mais a história no
processo de criação dos conteúdos escolares (SILVA, 2017). Porém, o autor 905
ainda recorre ao termo “teoria” em seus estudos, pois ainda é difícil que este
seja desprendido destes debates. Para Silva (2017, p. 14):

A questão central que serve de pano de fundo para qualquer teoria do


currículo é a de saber qual conhecimento deve ser ensinado. De uma
forma mais sintética a questão central é: o quê? Para responder a
essa questão, as diferentes teorias podem recorrer a discussões
sobre a natureza humana, sobre a natureza da aprendizagem, ou
sobre a natureza do conhecimento, da cultura e da sociedade. As
diferentes teorias se diferenciam, inclusive, pela diferente ênfase que
dão a esses elementos. Ao final, entretanto, elas têm que voltar à
questão básica: o que eles ou elas devem saber?

Poderíamos aqui trabalhar a diferenciação entre as teorias tradicionais,


críticas e pós-críticas do currículo, diluindo melhor suas características e
elementos de oposição. Porém, escolhemos nos ater às problematizações que
circundam a relação entre o currículo e a cultura, na erupção de artefatos
novos diversos que permeiam a aprendizagem, e que nos dará condições para
analisarmos o nosso atual objeto de estudo.

De antemão, é importante trazermos as contribuições de Foucault sobre


a relação intrínseca entre o saber e poder nas relações que estão enredadas
entre os indivíduos. Para o autor, o poder é resultado de diversos instrumentos
discursivos de poder (FOUCAULT, 2008) e que estes se manifestam nos
espaços de controle do corpo, das mentes, visando uma docilização dos
sujeitos. Entre estes espaços, para o filósofo, temos as instituições escolares
que através de enunciados diversos, agenciam e submetem os corpos às
instâncias hegemônicas da sociedade (Idem., 1986).

Assim, o currículo escolar, como os componentes de saber e as práticas


cotidianas, bem como o que é excluído da grade curricular, conformam um

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discurso visando o atendimento a comportamentos esperados pelo poder
legitimado para fiscalizar o andamento destes processos educacionais, no
caso, o Estado. Saber e poder, portanto, se unem para a manutenção de uma
ordem, no jogo de discursos que sustentam práticas normativas e
disciplinadoras. Portanto, o currículo, agitado por estes discursos, torna-se um
artefato cultural a gosto dos agrupamentos de poder interessados na
sustentação dos seus interesses. Para Giroux & McLaren (1999, p. 139), “a
vida escolar deve ser conceituada não como um sistema unitário, monolítico e 906
inflexível de regras e relações, mas como uma arena fortificada em que
sobejam contestações, lutas e resistências”. Os autores ainda reforçam que “no
contexto de um currículo como forma de política cultural, a meta primordial da
educação é criar condições para o fortalecimento do poder individual e a
autoformação dos alunos como sujeitos políticos” (Idem., p. 139-140).

É importante entendermos que trabalhar o currículo como uma prática


cultural é ir além do chamado currículo formal, que compreende todos os
conteúdos, atividades, dinâmicas escolares, objetivos pedagógicos, etc., que
estão contidos no plano de ensino de determinada instituição. A cultura
dominante, adentrando na escola, está presente em diferentes níveis,
expressando-se também na disposição das cadeiras em sala de aula, na forma
como os professores e professores gostam de ser tratados, nos rituais em sala
de aula, nos horários da escola, nas relações de gênero, na hierarquia, nas
regras, nos nomes escolhidos para determinadas atividades, entre tantos
outros elementos que poderiam ser listados. De acordo com Sacristán (2000, p.
16), “as funções que o currículo cumpre como expressão do projeto de cultura
e socialização são realizadas através de seus conteúdos, de seu formato e das
práticas que cria em torno de si”.

Dialogando com esta perspectiva, Vorraber (2002, p. 43) assinala que o


currículo constitui “um conjunto articulado e normatizado de saberes, regidos
por uma determinada ordem, estabelecida em uma arena em que estão na luta
visões de mundo e onde se produzem, elegem e transmitem representações,
narrativas, significados sobre as coisas e seres do mundo.” Assim, estão em
jogo determinações diversas de significados que regem a sociedade,

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conduzem os pensamentos, moldam subjetividades e fomentam identidades.
Para Bhabha (1998), no campo cultural há conflitos e lutas por imposição de
significados. Logo, o currículo, como artefato cultural, eleva-se como uma
arena onde as narrativas duelam na composição dos sujeitos e na disposição
de uma ordem conveniente para determinados grupos de poder.

EDUCAÇÃO ANARQUISTA: NOVOS OLHARES PARA UM CURRÍCULO DE


PRÁTICAS CULTURAIS
907
Surgido das lutas secundaristas de 2015, o Cursinho Livre da Sul –
Arriba Lxs Que Luchan!, localizado na Zona Sul da Grande São Paulo,
desponta em vivências cotidianas que resistem às práticas hegemônicas
educacionais vigentes. Antes de mais nada, antenado às práticas linguísticas
que reproduzem os binarismos de gênero, o cursinho já expressa em seu nome
a diversidade que busca representar. A escolha da neutralidade de gênero no
“Arriba Lxs que Luchan” sinaliza que lá todas as identidades de gênero são
aceitas, são abraçadas, são convocadas para a luta, para as barricadas contra
o sistema (ou cis-tema, como os/as militantes LGBTQ’s costumam
problematizar em torno da predominância da cis-normatividade). Para Butler
(2010, p. 39), tal apontando revela “matrizes rivais e subversivas de desordem
de gênero”.

Entre os princípios do cursinho, temos as insígnias clássicas do


Anarquismo: autonomia, autodisciplina, horizontalidade, ação direta/autogestão
e anticapitalismo. Tais elementos revelam a disposição discursiva que sustenta
as práticas pedagógicas em sala de aula. Não há neutralidade, não há currículo
oculto. Há práticas contra-hegemônicas que atuam em aliança com os
conhecimentos padrão em sala de aula, já que trata-se de um cursinho pré-
vestibular, na formatação de um currículo cultural que destoa das
normatividades impostas pela cultura capitalista.

Ao tratar da horizontalidade em seu Jornal Arriba Lxs que Luchan!, o


Cursinho Livre da Sul destrói as barreiras construídas entre os alunos e alunas
e professores ao propor que:

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237-1438-3
Apesar de haver educadorxs e educandxs, incentivaremos que xs
alunxs possam dar aulas juntos com os professores, diminuindo
assim a fronteira que separa xs professores dos alunos. A
horizontalidade diz respeito também ao fato de que todxs devem
participar igualmente na construção do cursinho e nas tomadas de
decisão. A nossa instância de decisão e discussão será as reuniões
de planejamento coletivo que fará parte do horário da aula. Cada um
precisa construir as decisões que está envolvido, assim decidimos
sobre aquilo que construímos. (Disponível em
https://arribalxsqueluchan.noblogs.org/files/2017/03/arriba-lxs-que-
luchan.pdf)

908
Tal princípio dialoga tanto com o fortalecimento do poder individual e
autoformação dos alunos como sujeitos políticos (GIROUX & MCLAREN, 1999)
quanto com o pensamento anarquista, marcado pela participação direta dos
sujeitos nos acontecimentos que atuam diretamente sobre eles. Nas diversas
experiências anarquistas ao longo da história, como nas já citadas neste artigo,
como naquelas que beberam destas águas, como o Movimento Zapatista,
Movimento Freinet e os curdos libertários na Síria, as práticas de democracia
direta através das Assembleias Populares são visivelmente postas em prática,
contrariando as hegemonias vigentes onde a verticalidade do poder é
demarcada, silenciando outras vozes, especialmente as dissonantes.

No Cursinho, os estudantes atuam diretamente nas reuniões de


planejamento que ocorrem toda semana e que está inclusa na sua grade de
horários, nas comissões de organização, comunicação e financeira, que
oxigenam o cotidiano do espaço, e na Assembleia Geral que acontece uma vez
por mês e que delibera pautas gerais, além da posição política coletiva. Vale
ressaltar que não há cargos de direção no Cursinho Livre da Sul, pois todas e
todas são coordenadores que atuam diretamente no andamento da escola.
Percebemos as novas práticas de ressignificação cultural (Bhabha, 1998) do
dia a dia da escola. Se nas hegemonias existe obediência, disciplinamento dos
corpos, silenciamento e homogeneidade, nesta experiência vemos uma nova
produção cultural de inspiração anarquista no currículo da escola, como uma
contra-esfera pública na erupção de outros discursos (GIROUX & MCLAREN,
1999).

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Nestas práticas culturais e curriculares presentes, há uma outra vivência
de independência do Estado. No Cursinho Livre da Sul – Arriba Lxs que
Luchan! há um princípio de que a autonomia financeira produz a autonomia
política. Assim, os alunos e alunas, bem como toda a equipe pedagógica,
trabalham incessantemente para o sustento financeiro do projeto, através da
participação em eventos e venda de materiais em banquinhas, dentre outras
atividades que objetivam arrecadar dinheiro para que o Cursinho continue
independente do Estado e das organizações privadas que queiram reger o 909
conteúdo e as vivências no espaço. Para os anarquistas, sempre foi muito cara
a independência frente a estas instituições que legitimam a submissão dos
corpos, a escravização das mãos para o trabalho, bem como das mentes
visando a acomodação ao sistema vigente. Tal reflexão dialoga bastante com
Moreira & Silva (1999, p. 28) ao dizerem que “o currículo é, assim, um terreno
de produção e de política cultural, no qual os materiais existentes funcionam
como matéria-prima de criação, recriação e, sobretudo, de contestação e
transgressão”.

No Cursinho Livre da Lapa, também surgido em 2015 na Casa Mafalda


em São Paulo, os princípios elencados se assemelham ao projeto
anteriormente aqui citado. Entre eles, temos: autonomia, anticapitalismo,
horizontalidade, valorização das minorias políticas, conhecimento crítico,
federalismo, ação direta e apoio mútuo (Disponível em:
http://lapalivre.wixsite.com/cursinho/blank-cq27e).

Como forma de alterar as estruturas sociais vigentes, de predominância


heteronormativa, masculina e branca, o projeto abre vagas onde a prioridade
centra-se nas pessoas não-brancas, mulheres e LGBT’s, bem como estudantes
vindos e vindas de escolas públicas. Importante entendermos que os espaços
educacionais, inseridos em uma macroesfera política, é também marcado por
disputas de poder, de narrativas e de significações, buscando os benefícios
dos grupos mais privilegiados. Segundo Veiga-Neto (2003, p. 73), “tais forças
estão distribuídas difusamente por todo tecido social”. Assim, “o poder se
manifesta em relações de poder, isto é, em relações sociais em que certos

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indivíduos ou grupos estão submetidos à vontade e o arbítrio de outros”
(MOREIRA & SILVA, 1999, p. 28-29).

Imagem 1: Grade horária de disciplinas para os alunos e alunas do Cursinho Livre da Lapa

910

Fonte: Site do Cursinho Livre da Lapa. Disponível em: < http://lapalivre.wixsite.com/cursinho/resume>

Acesso em 27 out. 2018.

A imagem acima mostra que os conteúdos teóricos trabalhados junto


aos alunos e alunas são os mesmos que são cobrados no Vestibular, porém,
além destes conhecimentos científicos, o Cursinho Livre da Lapa organiza-se
de forma que os princípios libertários sejam vivenciados de maneira fluida no
cotidiano do projeto. Para tanto, por exemplo, também são marcadas reuniões
mensais de gestão e Assembleias bimestrais para que a horizontalidade
anarquista seja vivida ao máximo: a participação de todos e todas,
principalmente os estudantes, na condução dos processos pedagógicos que
atuam diretamente sobre suas vidas.

Como entre seus princípios estão o apoio mútuo, também uma das
motivações anarquista, o projeto desenvolve estratégias de resoluções de
conflitos, como um grupo de discussão sobre gênero, a caixinha de sugestões
para que as pessoas se manifestem de maneira anônima suas inquietações e a
Comissão de Mediação Pedagógica que trata diretamente com os envolvidas e
envolvidas para a resolução harmoniosa de problemas que surgem no decorrer
das vivências. Assim, um cultura contra-hegemônica é colocada em prática, em
uma arena de poder, de disputa contra os individualismos e competitividades
do sistema capitalista.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Aqui, não pretendemos encerrar esta discussão tão rica das


experiências dos anarquistas com os Cursinhos Populares em São Paulo. Tais
vivências sinalizam fortemente para a concepção e prática de um currículo
contra-hegemônico, em suas mais variadas facetas: quanto à classe, ao
gênero e à raça. Um currículo este inserido em uma grande arena onde
relações de poder estão em disputa visando a conformação de sujeitos e
911
subjetividades, bem como identidades individuais e/ou coletivas.

Em uma sociedade demarcada pelo individualismo, meritocracia,


competitividade, opressão de classe, gênero e raça, os anarquistas rompem à
luz da aurora espalhando sua rebeldia, suas contestações, suas potências de
liberdade, apontando para dispositivos revolucionários que atuam diretamente
sobre os corpos e mentes, trincando as paredes de vidro que nos cercam, até a
destruição da ordem patriarcal e capitalismo que estamos inseridos. Como bem
dizem Passetti & Augusto (2008, p. 13), “a vida libertária é composta de
inacabadas batalhas por liberdades”. Portanto, estas vivências
contemporâneas atestam o vigor do anarquismo e que suas proposições
revolucionárias para a educação continuam sendo o que temos de mais
inovador e desafiador em um sistema movido por relações de força tão
assimétricas.

REFERÊNCIAS

ANTONY, M. Os microcosmos: Experiências utópicas libertárias,


sobretudo pedagógicas: “Utupedagogias”. São Paulo, Imaginário, 2011.
BHABHA, H. K. O local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998.
BUTLER, J. Problemas de gênero. Feminismo e subversão de identidade.
Tradução de Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
CORRÊA, F. Criar um povo forte. São Paulo: Faísca, 2010.
FERRER Y GUARDIA, F. A Escola Moderna. São Paulo: Biblioteca Terra
Livre, 2014.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 4. ed. Petrópolis: Vozes,
1986.
_______. A ordem do discurso. 16. ed. São Paulo: Loyola, 2008.

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GALLO, S. Educação Anarquista: Um paradigma para hoje. Piracicaba:
UNIMEP, 1995.
GIROUX, H.; MCLAREN, P. Formação do professor como uma contra-esfera
pública: A Pedagogia radical como uma forma de política cultural. In: SILVA, T.
T. da; MOREIRA, A. F. (orgs). Currículo, Cultura e Sociedade. São Paulo:
Cortez, 1999. Cap. 5. p. 125-153.
MALATESTA, E. Anarquismo e anarquia. {S.l.]: Faísca, 2009
MOREIRA, A. F. Currículo: questões atuais. 10.ed. Campinas: Papirus, 2004.
PASSETTI, E; AUGUSTO, A. Anarquismos & Educação. Belo Horizonte:
Autêntica, 2008.
SACRISTÁN, J. G. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ªed. Porto
912
Alegre: ArtMed, 2000.
SILVA, T. T. da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do
currículo. 4. ed. Belo horizonte: Autêntica, 2004
SILVA, T. T. da; MOREIRA, A. F. Sociologia e Teoria Crítica do Currículo: uma
introdução. In. _____________ (orgs). Currículo, Cultura e Sociedade. São
Paulo: Cortez, 1999. Cap. 1. p. 7-37.
VEIGA-NETO, A. Foucault e a educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
VORRABER, M. C. Ensinando a dividir o mundo: as perversas lições de um
programa de televisão. Campinas, SP: Revista Brasileira de Educação, nº 20,
Mai/ago, 2002.

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EDUCAÇÃO DOMICILIAR NO BRASIL: ENTRE A LEGALIDADE E O
DESCONHECIMENTO

Ariana da Silva Barros, UFAL | Edna Cristina do Prado, UFAL

RESUMO: O presente artigo consiste em um estudo sobre o ensino domiciliar com


objetivo de compreender e ao mesmo tempo divulgar o movimento de educação
domiciliar, também conhecido como “homeschooling” que vem crescendo
gradativamente no Brasil e em vários outros países. Foi realizado um levantamento
exploratório sobre o “homeschooling” no mundo e no Brasil, a partir de seus principais 913
conceitos e da legislação pátria. Foram consultados os bancos de dados digitais:
Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações - BDTD, Scientific Eletronic
Library Online – SCIELO, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior – CAPES e o Repositório Institucional da Universidade Federal de Alagoas –
RIUFAL. Na intenção de mensurar a quantidade de trabalhos explorando o tema no
Brasil. Chegou-se à conclusão de que ainda é um tema muito incipiente no país.
Desse modo, esse artigo foi construído com base nos 21 (vinte e um) trabalhos
encontrados sobre o tema, principalmente sobre os voltados para a parte pedagógica,
pois a maioria dos trabalhos volta-se para o direito e a legislação.

PALAVRAS-CHAVE: “Homeschooling”. Educação domiciliar. Brasil.

1 INTRODUÇÃO

“Homeschooling”, educação domiciliar, educação familiar


desescolarizada são alguns dos nomes que os pesquisadores utilizam para
denominar a educação no ceio familiar, fora das instituições escolares. Uma
modalidade de ensino que não é nova, já que poderia ser vista nos anos 60,
70, 80, mas é uma modalidade de ensino que foge aos padrões da atualidade.
Atualmente a educação domiciliar é algo estranho para a maioria da
sociedade, algo que foge ao padrão seguido por sua maioria, mas é um
assunto em destaque mundialmente, já que, em alguns países como nos
Estados Unidos da América – EUA, a modalidade de ensino domiciliar (familiar)
é legalizada.
Segundo Andrade (2000) em 2017 já existia 1,5 milhões de crianças
praticando o “homeschooling”, visivelmente um número grande, mas que

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representa somente 4% da população americana. Mesmo assim, os EUA se
tornou o país pioneiro e referência de “homeschooling” para os outros países
que possuem interesse em legalizar a educação domiciliar.
Em vários países, assim como no Brasil, existem movimentos em luta
para legalizar a educação familiar, movimentos liderados por pais que já
praticam “homeschooling”, que lutam pela legalização e reconhecimento de tal
prática, sustentando-se na premissa da livre escolha do modo de educação
para seus filhos. 914
Isto posto, o presente artigo resulta de uma pesquisa bibliográfica com
base em artigos, teses e dissertações, disponibilizadas em ambientes virtuais,
destacando-se o site da Associação Nacional de Educação Domiciliar – ANED,
uma das maiores fontes sobre o tema no Brasil.

2 A EDUCAÇÃO DOMICILIAR NO MUNDO

O movimento “homeschooling” surgiu entre 1960 a 1970 com o objetivo


de confrontar a educação escolarizada, tanto do sistema público como do
sistema privado.
Há quem afirme que a educação domiciliar aconteceu muito antes dos
anos 60, conforme Alexandre (2016), “as crianças eram educadas no seio
familiar antes do século V a.C.”.
Costa (2015, p. 90) destaca a gênese do “homeschooling”:
As décadas de sessenta e setenta do século vinte foram marcadas
por severas críticas ao sistema educacional norte-americano, fato
esse que desencadeou um crescimento vertiginoso do movimento
pela home education. As obras de John Holt e Illich contribuíram
significativamente para a construção de proposições teóricas
utilizadas para questionar a capacidade da escola moderna
desenvolver processo de ensinagem eficaz e suficientemente capaz
de estimular nos seus alunos a curiosidade e o desejo pela
aprendizagem.

Para Illichi (1985) a escolarização é uma forma de confundir as pessoas,


levando-os a confundir ensino com aprendizagem, diploma com competência e
obtenção de grau com educação. Passando essa visão para toda uma
sociedade.

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A escolarização obrigatória polariza inevitavelmente uma sociedade;
e também hierarquiza as nações do mundo de acordo com um
sistema internacional de castas. Países cuja dignidade educacional é
determinada pela média de anos-aula de seus habitantes estão
sendo classificados em castas, classificação que está intimamente
relacionada com o produto nacional bruto e é muito mais dolorosa
que esta última. (ILLICH, 1985. p. 24)

Conforme citação acima de Illich (1985), grande influenciador do


“homeschooling”, em seu livro “Sociedade sem Escolas” comenta que em
meados de 1970 já discutia com seus colegas pesquisadores a função da 915
escola e sua influência na sociedade, para eles as escolas eram
desnecessárias, sendo inviável a educação universal:
Não é possível uma educação universal através da escola. Seria mais
factível se fosse tentada por outras instituições, seguindo o estilo das
escolas atuais. Nem as novas atitudes dos professores em relação
aos alunos, nem a proliferação de práticas educacionais rígidas ou
permissivas (na escola ou no quarto de dormir), nem a tentativa de
prolongar a responsabilidade do pedagogo até absorver a própria
existência de seus alunos vai conseguir a educação universal.
(ILLICH, 1985. p. 14)

Na Europa Ocidental e no Brasil essa prática era realizada, mas à


medida que os sistemas dos governos foram crescendo, as infraestruturas
foram aumentando, a educação domiciliar foi sendo extinta e nos anos 60
voltou como forma de movimento social “homeschooling” inicialmente nos EUA
por meio dos pais que entram em confronto com o sistema de educação
obrigatória e buscam o direito de educar seus filhos em casa.
Segundo a Associação Nacional de Educação Domiciliar – ANED
(2010), o movimento “homeschooling” acontece em mais de 60 países, em
algum deles a educação domiciliar é legalizada. Segundo Alexandre (2016),
Finlândia, Suécia, Suíça, Portugal, Japão, Chile, México e Itália são exemplos
de países que praticam o “homeschooling”, percebe-se que são países de
todos os cinco continentes.
Os motivos pelos quais os pais optam pela educação domiciliar são
vários: de cunho religioso, por questão de segurança, preconceito, violência,
compromisso com o desenvolvimento integral dos filhos, entre outros, são
motivos que tornam o movimento pela educação domiciliar cada dia maior.
(ANDRADE, 2014)

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3 A EDUCAÇÃO DOMICILIAR NO BRASIL

No Brasil não existem muitas fontes de pesquisa, a maior fonte de


pesquisa sobre educação domiciliar no Brasil é o site da Associação Nacional
de Educação Domiciliar – ANED.
Está claro no site da associação que para eles a educação domiciliar é
uma modalidade de ensino, eles não são contra a escola, mas são, antes de 916
tudo, a favor de que a família possa escolher como educar seus filhos:

A principal causa defendida pela ANED é a autonomia educacional da


família. Não nos posicionamos contra a escola, mas entendemos que,
assim como os pais têm o dever de educar, têm também o direito de
fazer a opção pela modalidade de educação dos filhos. Defendemos,
portanto, a prioridade da família no direito de escolher o gênero de
instrução a ser ministrado aos seus filhos. (ANED 101, 2014)

Segundo uma pesquisa realizada pela ANED (2016), no Brasil existem


cerca de 5 (cinco) mil famílias praticantes da educação domiciliar, mas afirma-
se existir mais famílias, pois muitas se escodem com receio de sofrer
penalidades por parte dos governantes, já que a educação domiciliar não é
permitida no Brasil.
Andrade (2014) realizou uma pesquisa com os familiares brasileiros
praticantes da educação familiar e chegou à conclusão de que existem cinco
razões pelas quais os pais praticantes da educação domiciliar se mobilizem em
busca dessa modalidade de educação:
1ª razão – Compromisso com o desenvolvimento integral dos(as)
filhos(as)
O movimento social pela educação familiar desescolarizada é um
movimento de pais profundamente comprometidos com o bem-estar e
o futuro dos seus filhos, e que leva em conta não apenas a
instrução de seus filhos, com vistas ao alcance destes objetivos,
mas o desenvolvimento deles em toda a sua integralidade. [...]
2ª razão – Instrução cientifica e preparação para a vida adulta
Os pais homeschooling acreditam que são capazes de instruir
seus filhos de um modo mais eficaz do que o sistema escolar
vem fazendo, levando em conta a instrução científica e a preparação
para a vida adulta. [...]
3ª razão – Valores e princípios cristãos
O Movimento Social Homeschooling é um movimento que, de modo
geral, acredita que os valores tradicionais da civilização cristã

101
https://www.aned.org.br/pages. Acesso em 06 de setembro de 2018.

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ocidental são bons e devem ser respeitados, e muitos não abdicam,
de maneira alguma, do que entendem ser sua prerrogativa de direito
natural perante o Estado ou a Sociedade Civil, qual seja, de educar
seus filhos segundo seus próprios princípios, valores e crenças.
[...]
4ª razão – Proteção
No âmbito do Movimento Social pela Educação Familiar
Desescolarizada há um número significativo de pais que acreditam
firmemente que a escola, dito de maneira geral e considerando todo o
sistema de ensino, tornou-se um lugar de risco à integridade
física, moral, psíquica e espiritual de seus filhos, e que ela perdeu
quase que completamente, se não completamente, o seu caráter
original de formação integral da pessoa humana e de socialização
salutar. [...] 917
5ª razão – Exercício de um Dever-Direito fundamental
O movimento Social Homeschooling é um Movimento que, além de
querer preservar a integridade física, mental e espiritual dos seus
filhos, entende que é dever dos pais, além de um direito,
preservar os direitos fundamentais de seus filhos, os quais
reconhecem que vêm sendo desrespeitados sistematicamente pelas
escolas e pelos sistemas escolares. Este direito é um direto humano
fundamental, como argumentam os líderes mundiais do Movimento
EFAD, e todos os pais esclarecidos na doutrina jurídica. (grifos
nosso)

Outro destaque para a pesquisa de Andrade foi a renda familiar dos pais
praticantes de “homeschooling”. A maioria dos entrevistados, 35% possue
renda familiar entre seis a dez salários mínimos, somente 7%, quatro pais,
possuem renda familiar de até dois salários mínimos. Dessa maneira, observa-
se que essa maioria de pais praticantes do “homeschooling” possue um
elevado poder aquisitivo, o que lhes permite a prática dessa modalidade de
ensino a seus filhos.
Já para Barbosa (2016, p.162), o “homeschooling” no Brasil, não seria
uma opção de escolha, já que, uma parte da população não teria condições
financeiras para realizar tal modalidade de ensino:
Pode-se afirmar que, no caso brasileiro, uma resolução inicial
necessária ao processo de regulamentação do ensino em casa é
considerada em parte crítica e obstáculo à sua efetivação: o
reconhecimento de que a possibilidade de escolha e prática do
homeschooling não se revela para todos, sendo limitada à
determinada parcela da população que apresente condições para
realizá-la. [...] Ou seja, os pais com menos recursos não possuem
tanta “opção” de escolha, sendo mantidos fora desse sistema.

Barbosa (2016, p.163) destaca que a regulamentação do


“homeschooling” no Brasil, pode acarretar outros problemas como
investimentos e criação de políticas públicas para atender a uma pequena

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parte da população:
[...] surgem as críticas quanto ao investimento de recursos públicos
para atender a educação no âmbito privado (das famílias); nesse
quesito estaria a possibilidade de atendimento de determinadas
classes (com certo poder aquisitivo) em detrimento de outras (da
grande maioria) que, no caso do Brasil, foram historicamente
marginalizadas. Sob essa perspectiva, o agravamento da situação se
daria caso as famílias que optam pelo ensino em casa passem a soli-
citar subsídios públicos (quer seja em termos de auxílio financeiro ou
de requisição de serviços e materiais), a exemplo do que já acontece
em alguns países.

918
Dadas as argumentações acima, Barbosa (2016) questiona se a
regulamentação do “homeschooling”, não seria uma valorização dos bens
privados sobre os bens públicos, haja vista, que iria beneficiar o individual em
detrimento ao coletivo.
Costa (2015, p.109) deixa claro sua opinião sobre o “homeschooling” no
Brasil em sua afirmação:
A Escola tem o papel de garantir ao cidadão a socialidade,
sociabilidade, a formação ética e moral. Nessa seara afirma-se que
os pais que optam pela educação domiciliar retiram de seus filhos o
direito de escolher se querem ou não freqüentar a escola, direito esse
personalíssimo e irrenunciável. Além disso, pode-se afirmar que tal
prática deslegitima o Estado no que tange à prestação e a
fiscalização do serviço público de educação, uma vez que o
homeschooling no Brasil constitui prática pedagógica
comprovadamente contrária ao Estatuto da Criança e do Adolescente
e a doutrina da proteção integral.

Mesmo considerada ilegal, como visto acima, tem surgido uma nova
modalidade de educação domiciliar, é a chamada “Unschooling” que consiste
em não trazer a escola para dentro de casa, cria-se uma relação de
informalidade entre aprender/ensinar fugindo do paradigma escolar.

4 A LEGISLAÇÃO PÁTRIA

É imprescindível falar sobre a legislação brasileira a iniciar pela Carta


Magna, lei maior do país. Nela consta uma seção no capítulo III da Educação,
da cultura e do desporto, essa seção é dividida em dez artigos que versam
sobre a educação no Brasil, nenhum desses artigos fazem uma abordagem
sobre a educação domiciliar e/ou “homeschooling”.

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O art. 205 fala que a educação é direito de todos apontando o Estado e
a família como responsáveis por esse direito com a colaboração da sociedade,
deixando claro que o objetivo da educação é o pleno desenvolvimento da
pessoa e sua qualificação para o exercício da cidadania e do trabalho.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, lei nº 9394/96
reconhece que o processo educativo não acontece somente nas instituições
escolares, estando em seu texto que o processo educativo acontece de forma
abrangente: na vida familiar, no trabalho, na convivência humana, nas 919
instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da
sociedade civil e manifestações culturais. Mas o §1º do artigo 1º traz o objetivo
dessa lei que é disciplinar a educação escolar, predominantemente, por meio
do ensino em suas instituições. Observa-se que a palavra
“predominantemente” deixa brecha para e que a educação possa ser realizada
por outro meio, não sendo obrigatoriamente em instituições.
Outro destaque na LDB é o seu artigo 6º que detalha um dever atribuído
aos pais, especificamente, o dever de matricular seus filhos a partir de 4
(quatro) anos de idade na educação básica.
O art. 5 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8069/90)
reafirma a obrigação dos pais de matricular seus filhos ou pupilos na rede
regular de ensino, no art. 129 inciso V, além da obrigatoriedade da matricula
reza a obrigatoriedade de acompanhar a frequência e o rendimento escolar.
Dessa maneira, nota-se em duas leis a obrigatoriedade no dever dos
pais de matricular seus filhos em uma instituição de ensino.
Partindo para o Código Civil Brasileiro de 2002 em seus dois artigos:

Art. 1.565. [...] § 2o O planejamento familiar é de livre decisão do


casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e
financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de
coerção por parte de instituições privadas ou públicas.
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: [...] IV – sustento,
guarda e educação dos filhos

O § 2º do art. 1.565 deixa a família livre para tomar decisões e


responsabiliza o Estado para proporcionar recursos educacionais e financeiros
as famílias na atuação dos seus direitos. Já o art. 1.566 dispõe sobre o dever
de “sustento, guarda e educação dos filhos.

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Ainda no Código Civil, a educação dos filhos menores aparece como
competência dos pais, conforme Seção II (Do Exercício do Poder Familiar), art.
1.634, inciso I:
Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
I – dirigir-lhes a criação e educação;

Como visto acima, o Código Civil não torna obrigatório a matrícula dos
filhos, ele deixa claro que a educação é de responsabilidade dos pais, mas não
obriga a matrícula em instituições. 920
O Código Penal Brasileiro (lei 7209/84) tem um artigo que também reza
sobre a educação dos filhos como responsabilidade dos pais. O art. 246 diz
que se os pais deixarem, “sem justa causa, de prover à instrução primária de
filho em idade escolar: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.”
Alexandre (2016, p.4) faz um comentário sobre o código acima citado:

Infelizmente, por um olhar superficial sobre o tema e por uma análise


assistemática da legislação de regência da educação, o Ministério
Público brasileiro tem atuado no sentido de responsabilizar os pais
homeschoolers no crime de abandono intelectual, previsto no art. 246
do Código Penal brasileiro.

Após análise da Constituição Federal, leis e códigos que regem os


cidadãos brasileiros é perceptível que não existe nenhum impedimento e/ou
regulamentação sobre a educação domiciliar, está claro o poder e a
responsabilidade dos pais em educar os seus filhos com o auxílio do Estado.
Recentemente, em 12 de setembro de 2018, o Supremo Tribunal
Federal negou a prática do “homeschooling” no Brasil. Segundo Papu (2018), a
maioria dos ministros chegou à conclusão de que a Constituição Federal não
veda a prática da educação domiciliar, mas cabe ao Congresso Nacional julgar
e regulamentar tal prática.
O ministro Alexandre de Moraes em seu voto ressaltou que o caso
precisa passar pelo Parlamento para uma melhor regulamentação e
fiscalização para que a evasão escolar mascarada seja evitada. Já o ministro
Enrique Ricardo Lewandowski, afirma que não há razão para retirar a criança
da escola por insatisfação de alguns com a qualidade de ensino, a solução
para ele é captar mais recursos e investir na qualificação profissional dos

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professores (PAPU, 2018).

5 A PRODUÇÃO NACIONAL ACERCA DA EDUCAÇÃO DOMICILIAR

Realizando buscas de trabalhos em plataformas virtuais para um melhor


entendimento do assunto, verificou-se que são poucos os trabalhos sobre a
temática nas bases digitais brasileiras. Foram consultados os sites da
Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações - BDTD, da Scientific 921
Eletronic Library Online – SCIELO, da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Repositório Institucional da
Universidade Federal de Alagoas – RIUFAL.
Iniciando pelo site da BDTD realizou-se busca utilizando o descritor
“educação domiciliar”. Foram disponibilizados 4955 (quatro mil novecentos e
cinquenta e cinco), mas trabalhos observados os primeiros trabalhos percebeu-
se que eles faziam uma abordagem sobre educação em saúde, visita
domiciliar, cuidados domiciliar com idosos, internação domiciliar, entre outros
em sua maioria voltados para a saúde, fugindo do tema abordado. Para uma
melhor obtenção do resultado fez-se necessário realizar uma busca avançada
utilizando o mesmo descritor como título, aparecem 6 (seis) trabalhos, mas
somente um aborda o assunto de fato, os outros cinco falam sobre educação
em saúde, educação hospitalar domiciliar seguindo a linha dos temas citados
acima nas primeiras observações. Com o descritor “homeschooling” 11 (onze)
resultados são disponibilizados, mas somente 4 (quatro) se referem ao tema
investigado, os demais versam sobre educação em saúde e visita domiciliar.
Na base Scielo utilizando os mesmos descritores: primeiro “educação
domiciliar”, 166 (cento e sessenta e seis) trabalhos foram disponibilizados,
observados um a um, somente três desses são realmente artigos sobre o tema,
uma diferença grande, os outros trabalhos falam sobre acompanhamento
domiciliar de enfermeiros, atendimento domiciliar em saúde, entre outros. Em
seguida utilizando o segundo descritor: “homeschooling”, 17 (dezessete)
trabalhos foram disponibilizados, desses 8 (oito) falam sobre o assunto no
Brasil, 1 (um) faz a abordagem do tema em Lisboa, os outros são escritos em

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língua estrangeira, mais precisamente são 4 (quatro) escritos em inglês, sendo
1 (um) escrito no Canadá e os outros nos Estados Unidos da América, os 4
(quatro) trabalhos restantes escritos em espanhol, dois fazem uma abordagem
sobre o “homeschooling” na Espanha, os outros 2 (dois) dizem respeito ao que
acontece na Bolívia e no Chile sobre o tema desse artigo.
No Repositório Institucional da Universidade Federal de Alagoas –
RIUFAL, utilizando os dois descritores nenhum resultado foi encontrado, o que
mostra a atualidade do tema e a necessidade de um maior estudo sobre ele no 922
estado de Alagoas.
Continuando a busca no acervo do site da Capes por trabalhos com o
primeiro descritor “educação domiciliar”, somente 5 (cinco) resultados, sendo
(2) dois desses trabalhos que foram encontrados, são os mesmo encontrados
no site da Scielo, já com o “homeschooling”, 2.305 (dois mil trezentos e cinco)
trabalhos foram disponibilizados, dos quais os 50 (cinquenta) primeiros
observados estão escritos em inglês, percebeu-se a necessidade de realizar
uma outra busca, dessa vez avançada, com o objetivo de filtrar melhor esse
resultado, utilizou-se o descritor “homeschooling” como assunto, 122 (cento e
vinte e dois) trabalhos foram disponibilizados, desses somente 5 (cinco)
escritos em português e os mesmos encontrados na busca com o primeiro
descritor e nos sites Scielo e BDTD, os outros todos escritos em inglês.
Durante a coleta foram encontradas duas associações sem fins
lucrativos que trabalham em prol da educação domiciliar. A Associação
Nacional de Educação Domiciliar – ANED foi criada em 2010 por grupos de
famílias que já praticavam a educação domiciliar e têm o objetivo de apoiar
outras famílias que queiram realizar essa prática, divulgar a educação familiar,
promover a defesa do direito da família à educação domiciliar, promover a
cooperação das famílias. A segunda associação encontrada é a Associação
Brasileira de Defesa e Promoção da Educação Familiar - ABDPEF, fundada em
2017. Segundo o site da associação, seu objetivo é prestar consultoria jurídica
para as famílias que buscam a educação domiciliar, preparando-as para o
confronto com o sistema público e realizando as suas defesas em prol da
educação domiciliar.

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No site da Associação Nacional de Educação Domiciliar - ANED foram
encontrados 11 (onze) trabalhos acadêmicos, sendo divididos em 6 (seis)
trabalhos de conclusão de curso de graduação, 1 (um) trabalho de conclusão
de pós graduação Lato Senso, 2 (duas) dissertações de mestrado e 2 (duas)
teses de doutorado, também está disponibilizado no site 14 (catorze) artigos e
1 (um) Ebook (livro eletrônico). Já o site da Associação Brasileira de Defesa e
Promoção da Educação Familiar - ABDPEF possui uma aba com o nome
“artigos”, mas o que está disponibilizado nessa aba são textos que fazem uma 923
abordagem sobre o “Homeschooling” no Brasil e a legislação.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Educação domiciliar ainda é um assunto a ser muito estudado e


discutido. Não foi catalogado nenhum estudo mais aprofundado, voltado para
as vantagens e desvantagens pedagógicas que a modalidade de ensino possa
trazer. A maioria dos estudos sobre o tema faz uma abordagem voltada para o
direito dos pais de exercerem tal modalidade de ensino.
Por enquanto no Brasil o “homeschooling” ainda não é legalizado,
principalmente com a decisão atual do Supremo Tribunal Federal, mas ao
mesmo tempo afirmou que cabe ao Congresso Nacional regulamentar tal
prática, dessa maneira, entende-se que ainda há possibilidade da educação
domiciliar ser praticada legalmente no Brasil.
Contudo, ainda existe muito o que ser pesquisado e analisado sobre o
tema, ressaltando ser um tema de suma importância para a educação,
discutido mundialmente e que, portanto, deve ser problematizado nos cursos
de formação docente.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, Alexandre Magno Fernandes Moreira. A situação jurídica do ensino


domiciliar no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n.
2929, 9 jul. 2011. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/19514>. Acesso em: 11
ago. 2017.

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ALEXANDRE, Manoel Morais De Oliveira Neto. Quem tem medo do homeschooling?:
o fenômeno no Brasil e no mundo. Brasília: Câmara dos Deputados, Consultoria
Legislativa, 2016. 22p.
ANDRADE, Édison Prado de. A educação familiar desescolarizada como um direito da
criança e do adolescente: relevância, limites e possibilidades na ampliação do direito à
educação. 2014. 121f. Tese (Doutorado em Direito) - Faculdade de Direito.
Universidade de São Paulo. São Paulo. 2014.
Associação Nacional de Educação Domiciliar – ANED. < https://www.aned.org.br/>.
Acesso em 10 de setembro de 2018.
BARBOSA, Luciane Muniz Ribeiro. Homeschooling no Brasil: ampliação do Direito à
Educação ou via de privatização?. Educação & Sociedade, v. 37, n. 134, p.153-168,
2016.
924
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 11
ago. 2017.
BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providência. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 11 ago. 2017.
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Fixa diretrizes e bases da
educação nacional. Disponível em:<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 14 ago. 2017.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 5240.
Relator: Ministro Luiz Fux. Data de Julgamento: 20/08/2015. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10167333>.
Acesso em: 14 de agosto de 2017.
CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 22 nov. 1969. Disponível
em:<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/OEA-Organiza%C3%A7%C3%A3o-
dos- Estados-Americanos/convencao-americana-de-direitos-humanos-1969-pacto-de-
san-jose-da- costa-rica.html>. Acesso em: 13 ago. 2017.
COSTA, Fabrício Veiga. Homeschooling no Brasil – Uma análise da
constitucionalidade e da legalidade do projeto de lei 3179/12. Belo Horizonte: Editora
D’Plácido, 2016.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. 10 dez. 1948. Disponível
em:< http://www.direitoshumanos.usp.br/dh/index.php/Declara%C3%A7%C3%A3o-
Universal-dos-Direitos-Humanos/declaracao-universal-dos-direitos-humanos.html>.
Acesso em: 13 ago. 2017.
PAPU, Amanda. MOURA, Rafael Moraes. Cury, Teo. Supremo Tribunal Federal proíbe
prática do ensino domiciliar no país. O Estado de São Paulo. Disponível em:
<https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,stf-nao-autoriza-pratica-do-ensino-
domiciliar-no-pais,70002499740>. Acesso em: 16 de setembro de 2018.

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O CURRÍCULO DE PRÁXIS NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES
DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DE UMA CIDADE SEGURA PARA AS
MULHERES

Fabiana do Nascimento Costa Silva

RESUMO: O trabalho tem como objetivo analisar a manifestação do currículo de


práxis nas relações de gênero, a partir das experiências de políticas públicas que
buscam assegurar uma cidade segura para as mulheres, construída a partir do 925
currículo de práxis dialogado entre a política pública, uma cidade segura para as
mulheres e as mulheres da comunidade em processo de emancipação. Destacamos
esse processo de construção na cidade de Caruaru, na qual o debate tem ido
diretamente as comunidades e estabelecido um diálogo aberto com as mulheres, no
intuito de identificar as reivindicações e necessidades para de fato, consolidar políticas
que atendam as mulheres. Para a realização deste trabalho foi feita uma pesquisa
bibliográfica e documental. Partiu-se da análise dos princípios educativos
estabelecidos entre a cidade segura para as mulheres em diálogo com as mulheres
das comunidades. A pesquisa revela desafios a serem enfrentados para superar os
limites no tocante a uma cidade segura, pois além da precariedade das políticas
públicas, novas instâncias de lutas e conquistas aparecem como estratégicas para
desenvolver ações alicerçadas na mobilização e luta das próprias mulheres e no
diálogo com o poder público que tem o dever de garantir uma cidade segura para
todas.

Palavras-chaves: Currículo de Práxis. Mulheres. Educação Emancipatória.

INTRODUÇÃO

A relação dialógica como princípio gerador da democracia e da


igualdade de gênero se revela como ferramenta indispensável entre o poder
público e a comunidade. Sobretudo, a política pública voltada para as mulheres
deve estar fundamentada numa prática educativa libertadora, capaz de romper
com a histórica opressão imposta as mulheres pela força patriarcal machista.
A educação emancipatória contribui para refletir sobre as relações de
gênero na sociedade, na qual o diálogo como ação indispensável e de respeito
aos/as diferentes ressalta que cada pessoa no dizer freireano tem o direito de
dizer a sua palavra, de ter o direito de fazer opções e deve ser respeitado pelas
suas escolhas. O convívio com os/as diferentes não nos coloca diante de uma

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condição inferior, mas sim, numa condição humana de respeito e de tolerância,
entendendo o princípio da humanidade como desejo de emancipação e de
direitos.

Entretanto, a violência contra a mulher é um fenômeno recorrente e


podemos percebê-lo de um modo geral, pois, ela encontra-se enraizada desde
os espaços familiar a outros espaços da sociedade.

E mais, as crenças religiosas tem deixado ao longo da história, a mulher 926


em condição inferior em relação ao homem, criando assim, um modelo de
prática social e cultural que podemos chamar de patriarcalismo, que atinge
todas as classes sociais, ligando as questões que envolvem relação de poder
entre homens e mulheres, relações essas onde as mulheres são submetidas
aos homens tanto no espaço público, como no privado. Mesmo com diversas
mudanças, esse patriarcado, como é definido a esse tipo de estrutura, segue
nas relações familiares e sociais até os dias atuais. Nesse contexto, de acordo
com Carol Patemam (1993, p. 167):

O poder natural dos homens como indivíduos (sobre mulheres)


abarca todos os aspectos da vida civil. A sociedade civil como
um todo é patriarcal. As mulheres estão submetidas aos
homens tanto na esfera privada quanto na pública". Sendo
assim, atualmente as mulheres ainda lidam com a herança
cultural deixada por esta estrutura. (PATEMAN, 1993, p.167)

Relatos das desigualdades de gêneros são identificados no antigo


testamento/sagradas escrituras, onde a mulher aparece como resultado da
doação do homem na qual lhe foi tirada uma costela para a criação da mulher.
Nessa relação à mulher ocupa papel submisso, devendo ser obediente, sendo
propriedade do pai, dos irmãos, e após o casamento, passava para a
submissão ao seu marido. Ou seja, sempre controlada por algum homem. E
mais, a erotização da mulher vista como sedutora e pecadora, a condena como
responsável pelos próprios atos de violência que lhe atinge. Desta forma, o
machismo é um exemplo claro disto, é disseminador de crenças que justificam
a relação de dominação entre os sexos, relações essas que na maioria das
vezes tornan-se abusivas e violentas.

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Também é possível identificar condições machistas e de submissão da
mulher no período clássico da racionalidade grega, onde apenas os filósofos
homens brancos pensava e direcionava a organização da sociedade. Cabia a
mulher o papel submisso de cuidar do lar e ser geradoras dos/as filhos/as,
sendo negada a sua participação em decisões políticas, de modo que eram
acusadas de serem sexo frágil e se entregarem facilmente ao sentimento, não
agindo racionalmente.
927

A EDUCAÇÃO EMANCIPATÓRIA NAS RELAÇÕES DE GÊNERO

A perspectiva de superar as condições de opressão, de passividade, e de


injustiças ganha tônica com a ocupação de espaços de lutas do movimento
feminista. As ações políticas por direitos e igualdade podem ser inspiradas pela
formação de uma consciência crítica e emancipatória. Nesse caso, Freire
contribui de forma significativa para inspirar, propor e orientar práticas
libertadoras, como é o caso da luta das mulheres. Pois, de acordo com o seu
pensamento:

É impossível pensar, pois na superação da opressão, da


discriminação, da passividade ou da pura rebelião que elas
engendram, primeiro, sem uma compreensão crítica da
História, na qual, finalmente, essas relações interculturais se
dão de forma dialética, por isso, contraditória e processual.
Segundo, sem projetos de natureza político-pedagógica no
sentido da transformação ou da re-invenção do mundo.
(FREIRE, 1995, p. 32)

Os processos educativos propostos por Freire, assumem uma dimensão


ampla, podendo ser vivenciados em diversos espaços como no âmbito escolar
ou em outros espaços da sociedade civil. Essa dimensão aberta para a prática
educativa está voltada para processos libertadores das mulheres que se
encontram em condições de opressão. Reconhecer-se oprimido segundo Paulo
Freire, é condição fundante para o processo de libertação, pois, ao reconhecer-
se dominado, o oprimido pode buscar alternativas para a sua libertação.

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Nesta perspectiva, o movimento de mulheres ganha mais evidência e
participação na luta por direitos e igualdades de gênero no período do processo
da redemocratização no Brasil. No ano de 1985 foi criada a primeira Delegacia
da Mulher no Brasil, localizada no Estado de São Paulo.

Em 1988 a Constituição Federal assegura alguns direitos às mulheres


bem como a outros setores sociais. Em agosto de 2006 foi sancionada a Lei
11.340, intitulada como “Lei Maria da Penha”, essa Lei foi criada para coibir e
928
punir a violência praticada contra mulheres no Brasil.

São inúmeros os desafios enfrentados pelas mulheres no processo de


superar a opressão que as proíbem de assumir o protagonismo da sua história,
pois a violência contra as mulheres manifesta-se através de várias formas e
com diferentes níveis e pode ser caracterizada como violência de gênero,
doméstica, patrimonial, moral, física, sexual, psicológica entre outras. Vale
salientar que essas diversas formas de violência podem ser observadas em
vários espaços, sejam elas no âmbito público ou privado, na área urbana ou
rural.

Podemos considerar a violência doméstica, como uma das mais


perversas, entre os outros tipos de violência, em função das sequelas deixadas
nas vítimas, causando-lhe transtorno emocional que pode perdurar por muito
tempo e/ou às vezes, por toda a vida, pois as mulheres vítimas vivem em
estado de medo e esse medo passa a ser um sentimento comum no cotidiano
dessas mulheres. De acordo com Miller (1999, p.08)

A mulher vítima do abuso emocional vive em constante estado


de medo: o que o homem fará a seguir? Com medo de “baixar
a guarda”, ela não pode sequer desfrutar de momentos
tranqüilos – um filme ou uma noite com amigos – sempre
cautelosa, sabendo o que ele pode fazer com um mínimo de
provocação. (MILLER, 1999, p. 54).

O espaço público urbano deveria ser um lugar onde as mulheres


pudessem ter a liberdade de ir e de vir sem qualquer tipo de constrangimento,
mas, infelizmente isso não acontece e esse lugar tem sido o cenário das
principais práticas de violência urbana na atualidade.

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Diante deste contexto, se faz necessário criar, recriar, inventar,
reinventar possibilidades de diálogo e de ação entre o poder público e as
mulheres, vítimas de processos discriminatórios e opressores. A cidade segura
para as mulheres busca referencial em processos educativos críticos e
emancipatórios como possibilidade de refletir a realidade e através do currículo
de práxis, alicerçado numa educação dialógica, onde se estabelece o direito de
cada pessoa dizer a sua palavra e de forma coletiva apontar caminhos para
efetivar uma política pública de interesse e de superação da desigualdade de 929
gênero.

Assim, para concretização das práticas educativas emancipatórias a


partir do currículo práxis que tem como base o diálogo, entre a teoria e as
experiências cotidianas das pessoas, se faz necessário novos caminhos de
reconhecimento e de luta para um fazer educativo emancipador nas relações
de gênero. Vale destacar que os princípios e pressupostos de uma educação
que liberta e transforma, alicerçado na ação-reflexão, na troca de saberes, no
diálogo entre as culturas e nas experiências cotidianas presentes na teia de
relações vem carregada de possibilidades de sistematizar e elaborar um
conhecimento já vivenciado nas experiências práticas.

A perspectiva do currículo de práxis traz em seus conteúdos e em sua


ação as possibilidades de pensar criticamente as relações vivenciadas entre
homens e mulheres e que organicamente seja capaz de interpretar e
sistematizar as culturas, construindo o que Sacristan (1999) denomina de nexo
entre a cultura subjetivada e a cultura objetivada. Segundo o autor é
necessário: Construir e inventar a cultura transformada pedagogicamente para
que a educação seja instrumento para a liberdade e autonomia.
São caminhos que acenam para um fazer educativo de emancipação
das mulheres, e que de fato as mulheres também sejam reconhecidas e
construtoras de conhecimento e autonomia para a sua vida, numa relação
permanente de diálogo no processo emancipatório. Neste processo cada
pessoa constrói o conhecimento sobre a realidade e vai se construindo dentro
da sua própria realidade.

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A CIDADE SEGURA PARA AS MULHERES E O CURRÍCULO DE PRÁXIS
NAS RELAÇÕES DE GÊNERO

Os problemas sobre a segurança das mulheres nos espaços urbanos e


públicos são recorrentes, de modo que inúmeros casos de práticas violentas se
apresentam nesse cenário diariamente. Obviamente, essas questões têm
chamado à atenção da sociedade e do poder público e apontado a
necessidade de reagir contra essa barbárie que afeta o público feminino. Com
930
isso, alguns governos têm reconhecido o problema e assumido o compromisso
de construir políticas públicas que promovam debates sobre a segurança
urbana para as mulheres e junto à comunidade, estendido a discussão para
diagnosticar as necessidades e criar estratégias de ação no combate a
violência.

Em especial, destacamos esse processo de construção na cidade de


Caruaru, na qual o debate tem ido diretamente as comunidades e estabelecido
um diálogo aberto com as mulheres, com intuito de identificar as reivindicações
e necessidades para de fato, consolidar políticas que atendam as mulheres
caruaruenses.

Assim, no ano de 2009, foi criado a Secretaria Especial da Mulher na


Cidade de Caruaru-PE, compreendendo a necessidade da criação de políticas
públicas que assegurem os direitos das mulheres, combatendo a violência
doméstica e a desigualdade de gênero, além de articular políticas públicas
voltadas para as mulheres e fortalecendo assim, a participação sociopolítica
das mulheres e com isso construir uma cidade segura e mais feliz para todas
caruaruenses.

Em março de 2010, foi apresentado a Câmera Legislativa o I Plano


Municipal de Políticas para as Mulheres de Caruaru, o plano foi elaborado a
partir de propostas das mulheres caruaruenses com objetivo de transformar
essas vidas, promovendo a igualdade, combatendo os tipos de preconceitos e
promover a inclusão social.

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Assim, entendemos que com a execução do Plano Municipal é possível
ter a oportunidade de lutar e construir uma cidade mais justa e segura. De
acordo com o Plano Municipal, o município de Caruaru tem como objetivo
enfrentar e prevenir todas as formas de violência contra as mulheres, assim
como consta em suas ações no documento oficial do Plano:

Dar prioridade à inclusão das mulheres vítimas de violência


doméstica e sexista em programas de profissionalização,
moradia, alfabetização, trabalho e geração de renda, bem
como de seus (as) filhos (as) em creches públicas; Prevenir o 931
assédio sexual e moral nas instituições privadas e públicas,
inclusive no trabalho doméstico através de campanhas de
conscientização e criação de um canal de denúncia gratuito e
sigiloso. (I PLANO MUNICIPAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS
PARA AS MULHERES DE CARUARU-PE, 2010).

Em especial, a nossa abordagem trata de uma política pública voltada


para as mulheres, como uma prática de educação libertadora, pois esta política
vem se preocupando em trabalhar de forma dialógica o fortalecimento
sociopolítico, valorizando a mulher no âmbito político e social, criando
possibilidades de assegurar direitos e construir uma sociedade marcada pela
igualdade de gênero. Em busca de construir uma cidade segura para as
mulheres caruaruenses, o Plano Municipal aborda também as seguintes ações:

Apoiar e estimular a criação de associações/grupos de


mulheres que tenham como objetivo reunir, mobilizar,
incentivar, divulgar encontros e programas sociais, dialogar
com o poder público e promover direitos no campo e na cidade;
Garantir diálogo do Poder Público nas associações, grupos,
comunidades, promovendo reuniões e debates sobre os
direitos das mulheres, política, políticas públicas, gênero,
violência doméstica, participação coletiva, feminismo e
machismo, incluindo a participação dos homens, na
perspectiva de conscientiza-los sobre as temáticas, seguindo
calendário previamente definido e divulgado. (I PLANO
MUNICIPAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS MULHERES
DE CARUARU-PE, 2010).

Neste sentido, o currículo de práxis propõe envolver as educandas que


se encontram em processo de formação, desvelando possibilidades de
superação de um currículo padronizado para todas as realidades e amplia o

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diálogo através da articulação entre a política pública e as experiências
práticas.

Percebe-se no documento uma proposta de luta, de reconhecimento e


de diálogo, características indispensáveis para uma educação crítica,
emancipatória. A perspectiva dialógica que promove o encontro entre pessoas,
também é um tempo de possibilidade de superação à medida que a
participação democrática se abre para ouvir e buscar na própria história de vida
932
das mulheres referenciais para implementação de uma política pública.

Assim, o espaço urbano reflete as divisões de papéis tradicionais entre os


gêneros, que reservam à mulher o âmbito doméstico e ao homem os espaços
públicos. Ou seja, as cidades ainda reproduzem relações de poder e
dominação entre gêneros. Essas desigualdades levam o poder público a
reconhecer a necessidade de criar iniciativas para envolver as próprias
mulheres na criação de cidades mais seguras, nas quais assumem o seu
protagonismo como pessoas ativas no seu processo histórico, capaz de mudar
uma realidade e recriar a sua história a partir de uma construção democrática
com igualdade e sem violência.

Infelizmente, ainda não podemos considerar que temos uma cidade


segura. Pois a violência urbana se manifesta por todos os lugares e engana-se
quem acredita que o fenômeno dessa violência está restrito aos grandes
centros e capitais. Esse problema pode ser observado também em pequenas
cidades em todo o país, onde as manchetes dos jornais mostram diariamente
um aumento no número de violência, o que deixa as populações apreensivas.

Constantemente os meios de comunicação apontam que a violência


urbana está atrelada à pobreza e a miséria, uma vez que esta estaria
relacionada à desigualdade social e a falta dos direitos básicos, tais como:
saúde, moradia, segurança e educação de qualidade, e os crimes são
decorrentes da situação de pobreza e de exclusão do mercado de trabalho.
Contudo, entendemos que a pobreza e a desigualdade social não é a principal
causa da violência, mas são apontados como fatores que estimulam a violência

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e a criminalidade nas áreas urbanas. De acordo com Leonardo Boff (2005, p.
154):

Com frequência ocorre o fato lamentável de que os interesses


do poder dominante prevalece sobre o respeito do outro e da
sua legitimidade. Aventuram-se justificativas ideológicas para
legitimar tais violações: a mulher, porque tem mais sentimento
que razão, o negro por causa da cor da pele, o muçulmano
porque é terrorista virtual. Continuam a se fazer então a
distinção entre o humano e o pseudo-humano como se fazia no
tempo da colonização para poder oprimir sem má consicência.
(BOFF, 2005, p. 154) 933

Este pensamento também apresentado por Paulo Freire, aparece na sua


obra ao discutir a importância do diálogo entre as pessoas que defendem
interesses diferentes, mas não menos importantes. Sobretudo Freire destaca a
significativa relevância que a prática educativa deve adotar como princípio
democrático libertador, de respeito e de construção coletiva. Para Paulo Freire
(1995, p. 16/17):

Isso não deve significar, porém que as diferenças de opções


que marcam os distintos discursos devam afastar do diálogo os
sujeitos que pensam e sonham diversamente. Não há
crescimento democrático fora da tolerância que, significando,
substantivamente, a convivência entre dessemelhantes, não
lhes nega contudo o direito de brigar por seus sonhos. O
importante é que a pura diferença não seja a razão de ser
decisiva para que se rompa ou nem sequer se inicie um diálogo
através do qual pensares diversos, sonhos opostos possam
concorrer para o crescimento dos diferentes. (FREIRE, 1995,
p.16/17)

Através dessa relação dialógica e de respeito aos/as diferentes,


destacamos relevância do Plano Municipal de Políticas Públicas para as
Mulheres na cidade de Caruaru – PE, que tem apresentado preocupação no
seu currículo de práxis, uma vez que se refere à construção de uma sociedade,
baseada em direitos e respeito às mulheres. Isso se tornou evidente através
das visitas as comunidades como prática dialógica entre o setor público e a
comunidade, que estabeleceu uma relação de falas e de escutas, com o
objetivo de ampliar os espaços de participação, dialogando e ouvindo os
anseios das mulheres da cidade de Caruaru, para numa perspectiva de

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coletividade e respeito às propostas oriundas das pessoas interessadas
diretamente sejam reconhecidas e contempladas no Plano Municipal de
Políticas Públicas para as Mulheres.

Neste contexto, para construir uma cidade segura para as mulheres, é


preciso repensar a maneira de encarar a violência urbana para garantir que
todas as mulheres tenham sua liberdade, e assim o seu direito de ir e vir
respeitado. Espera-se do poder público uma maneira de atuar que assegure
934
direitos. Entende –se que o poder público deveriam agir mais sobre as causas
sociais que incentivam esse tipo de criminalidade, bem como devem garantir a
implantação da iluminação pública e sua manutenção, fazendo o serviço
chegar a todas as ruas, becos, praças e avenidas; aumentar o número de
policiamento como também o número de delegacias da mulher com
atendimento 24 horas, com capacitação específica para policiais sobre direitos
humanos; criar políticas inclusivas de moradia e investir na educação pública
de qualidade e igualitária e assim contribuir no combate ao machismo,
construindo uma cidade justa, segura, igualitária e feliz.

CONCLUSÃO

Procuramos neste trabalho analisar os importantes aspectos da


implementação de políticas públicas, voltadas para os espaços urbanos,
visando à emergência de termos uma cidade segura para mulheres. Em
especial, a análise procurou refletir de que forma o currículo de práxis no
contexto das relações de gênero a partir da política pública, uma cidade segura
para as mulheres pode estar pautada numa perspectiva educativa dialógica
para processos de libertação de pessoas em condição de opressão. E mais,
apresentamos também as necessidades de construir essas políticas e assim
reconhecer os problemas sociais das comunidades, sejam eles nos espaços de
iluminação pública, de transporte, educação, policiamento e moradia.

Neste sentido, a nossa abordagem teve a preocupação de provocar


reflexões e debates acerca de uma temática de significativa relevância

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acadêmica e social, pois há uma necessidade urgente de se combater práticas
abusivas contra as mulheres e que tenta impor a condição de submissão às
mesmas. Assim, essas reflexões, ainda embrionárias deixam margens para
novas discussões e contribuições para a denúncia e o anúncio de outros
caminhos para análise e possíveis motivações para a intervenção.

Entendemos que as experiências educativas, se pretendem de fato


serem libertadoras devem se abrir para o diálogo entre o poder público e a
935
comunidade como possibilidade de construção coletiva, na qual o encontro
entre as pessoas possa resultar no reconhecimento de direitos, assim, construir
a partir da formação de uma consciência crítica meios de serem protagonistas
da sua própria história.

REFERÊNCIAS

BEISIEGEL, Celso de Rui. Política e Educação Popular: a teoria e a prática de Paulo


Freire. 4ª ed. Brasília: Líber Livro, 2008.
BOFF, Leonardo. Virtudes para um outro mundo possível, vol. I. Hospitalidade:
direitos e dever de todos. Petrópolis: Vozes, 2005.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
BRASIL. Decreto Lei 11.340 de 7 de Agosto de 2006. Lei Maria da Penha: Coíbe a
violência doméstica e familiar contra a mulher. Brasília: Secretaria Especial de Política
para as Mulheres, 2008.
FREIRE, Paulo. Política e Educação. 2ª Ed. São Paulo: Cortez, 1995.
GIMENO SACRISTÁN, J. Poderes instáveis na Educação. Porto Alegre: Artes
Médicas Sul. 1999.
________________.O currículo: os conteúdos do ensino ou uma análise prática. In
GIMENO SACRISTÁN, J. e PÉREZ GÓMEZ, A. Compreender e transformar o
ensino. Porto Alegre: Artmed, 2000.

MILLER, Mary Susan. Feridas Invisíveis: abuso não-físico contra mulheres. São
Paulo: Summus, 1999.
PATEMAN, Carol. O contrato sexual. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
I PLANO MUNICIPAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS MULHERES DE
CARUARU-PE, 2010.

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GT 8 – POLÍTICAS CURRICULARES PARA A
GESTÃO ESCOLAR

O PAPEL DO GESTOR ESCOLAR NA IMPLEMENTAÇÃO DO CURRÍCULO


DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE OLINDA.

Lyza Gennifer Moreira de Barros, UPE/Campus Mata Norte | Doriele Silva de 936

Andrade Costa Duvernoy, UPE.

RESUMO: Esta pesquisa tem como problemática o papel do gestor escolar e a


implementação do currículo na rede municipal de ensino da cidade de Olinda, em
Pernambuco, na qual o processo de formação continuada em rede foi analisado
sinalizando carência da dimensão pedagógica. Os cursos oferecidos para o referido
segmento compõe uma das etapas do processo eleitoral nas instituições escolares.
Esse processo de formação continuada foi iniciado em 2014 com a oferta do primeiro
curso destinado à função de gestor(a) escolar e esta iniciativa tem sua continuidade
em 2018 com a oferta do segundo curso. Nosso trabalho tem como objetivo analisar o
programa de formação continuada para gestores escolares e identificar demandas do
exercício desta função no cotidiano escolar na dimensão da gestão curricular. Trata-se
de uma pesquisa exploratório-descritiva, de abordagem qualitativa, valendo-se de
estudo bibliográfico e análise documental. Realizamos uma revisão de literatura com
aporte documental, tendo como principal referência os documentos que norteiam a
formação continuada para gestores desta rede de ensino. Nessa perspectiva,
constatamos que os módulos temáticos, desenvolvidos durante as formações,
abordam exclusivamente as seguintes dimensões: administrativa, financeira,
avaliativa, democrática e pedagógica. Esta etapa da pesquisa sinaliza uma carência
do tema currículo enquanto dimensão da gestão escolar na formação continuada para
gestores.

Palavras-chaves: Currículo, Gestão escolar, Formação continuada.

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa trata do exercício da função de gestores(as) escolares na


rede municipal de ensino da cidade de Olinda, em Pernambuco, na qual são
oferecidos cursos para os gestores como uma das etapas do processo eleitoral
nas instituições escolares. Nossa pesquisa é realizada no quadro de um
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, nível Mestrado, e busca investigar
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o papel do(a) gestor(a) na construção e implementação do currículo no
cotidiano escolar. Como busca investigar a relação existente entre o dirigente
escolar e o currículo, visando perceber como se dá a participação do(a)
diretor(a) na implementação deste documento que norteia a prática escolar.
Neste sentido, destacamos a dimensão pedagógica da gestão escolar como
centro de sua atuação “pautada nos princípios que não são intrínsecos a
gestão como concebia a gestão clássica, mais são princípios sociais visto que
a gestão da educação se destina à promoção humana 937
(FERREIRA&AGUIAR,2000).
A problemática originada do problema inicial fez emergir os seguintes
questionamentos que subsidiarão esta pesquisa: Qual a concepção de gestão
curricular dos gestores escolares? Como se dá a participação dos(as)
diretores(as) escolares na construção do currículo? Qual estratégia
metodológica pode ser utilizada para fortalecer a relação gestão-currículo?
Como se dá o processo de formação continuada para gestores(as)? Quais os
princípios que norteiam a prática dos dirigentes da escola?
Nesta ação, tem-se como objeto teórico para essa investigação a
gestão curricular na escola pública e como objeto empírico o papel do gestor(a)
escolar no processo de implementação do currículo na rede municipal de
ensino de Olinda. A cerca do objeto teórico, a gestão da escola pública, que
tem como princípio a Gestão Democrática definido pela constituição de 1988 e
normatizada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 9394/96, Lück
(2000) afirma que através deste princípio a escola “cria ambientes
participativos, cria uma visão de conjunto associada a uma ação de
cooperativismo, promove um clima de confiança, valoriza as capacidades e
aptidões dos participantes, associa esforços, quebra arestas, elimina divisões e
integra esforços, estabelece demanda de trabalho centrada nas ideias e não
em pessoas, desenvolve a prática de assumir responsabilidades em conjunto”.
Estes aspectos precisam estar presentes em todo entorno da função do
dirigente escolar e são decisivos especificamente na vivência de um currículo
que apresente significado para comunidade a qual atende.

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Diante das demandas explicitadas, este projeto mostra sua relevância,
pois visa investigar o exercício da função do diretor escolar reconhecendo o
significado da sua atuação no contexto educacional. Destaca-se ainda, por
fortalecer a formação continuada para este segmento, na perspectiva de uma
prática de gestão escolar com foco no currículo e nos processo de ensino
aprendizagem com base na autonomia e na participação, favorecendo uma
relação de proximidade e pertencimento entre os segmentos que compõe a
comunidade escolar. 938
A pesquisa está constituída em duas fases, sendo a primeira fase
composta por uma pesquisa exploratória e uma diagnose dos cursos de
formação destinados aos gestores da rede Municipal de Ensino de Olinda no
período de 2014 a 2018. A segunda fase da pesquisa (prevista para 2019) será
guiada pela abordagem da pesquisa-ação e buscará identificar as ações de
gestão curricular no cotidiano desses gestores para um mapeamento das
demandas formativas dos gestores no que se refere à gestão curricular. Temos
como objetivo analisar o programa de formação continuada para gestores
escolares e identificar de que maneira tais essas ações de formação
contemplam a gestão curricular.

DESENVOLVIMENTO

Trata-se de uma pesquisa exploratório-descritiva, de abordagem


qualitativa, valendo-se de estudo bibliográfico e análise documental.
Realizamos uma revisão de literatura com aporte documental, tendo como
principal referência os documentos que norteiam a formação continuada para
gestores desta rede de ensino.
A gestão escolar é atualmente orientada como estratégia de articulação
entre o Plano Municipal de Educação e o Projeto Político Pedagógico da
Escola. Assim, é preciso superar o modelo burocrático, que situa o secretário
de educação e o(a) gestor(a) da escola apenas como gerenciadores de rotina
e enfatizar os processos democráticos e participativos do cotidiano escolar.
Neste sentido, o caráter transformador que está subjacente ao conceito de

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gestão da educação precisa estar refletido em todas as dimensões dessa
prática: financeira, humana, material, patrimonial e pedagógica.
A formação do gestor escolar no Brasil tem como marco o processo de
redemocratização do país nos anos 80. (BARRETO, 2007), assim como o
processo de descentralização (TEIXEIRA; MALINE, 2012), e a gestão
democrática, afirmada pelo art. 2º da Lei de diretrizes e bases da Educação
(Lei 9.394/1996) como um dos principados da educação nacional. Esses
processos são considerados como frutos da luta dos profissionais da educação 939
pelo destaque do papel e formação do gestor escolar para tomada de decisões
e ações na escola. Desde modo, a gestão escolar passou a ser considerada
como um eixo importante para garantia da qualidade na educação, como
aponta Barreto (2007).
No cotidiano pedagógico, o currículo é o documento norteador da prática
escolar, e é a partir disso que esta pesquisa situa o papel e a formação do
gestor para a implantação e implementação do currículo escolar. É preciso
considerar o currículo além do simples aglomerado de conteúdos e objetivos de
aprendizagem. Nesse sentido, a gestão curricular, enquanto dimensão
reflexivo-prática presente no cotidiano do gestor escolar, leva em consideração
que o currículo serve para produzir “formas de melhor organizar experiências
de conhecimento dirigidas à produção de formas particulares de subjetividade”
(SILVA, 2012, p. 187).
Desta forma, entra no rol da administração da escola, tudo que diz
respeito ao processo pelo qual se busca alcançar os fins educacionais
estabelecidos. Por conseguinte, é objeto de estudo da administração, em igual
medida, tanto a coordenação do esforço humano envolvido, quanto à
organização e racionalidade do trabalho que se realiza para atingir os
resultados desejados (PARO,1997).
Neste sentido, o caráter transformador que está subjacente ao conceito
de gestão da educação precisa estar refletido em todo processo, em todas as
dimensões dessa prática: financeira, de pessoal, de material, de patrimônio e
pedagógica. A dimensão pedagógica da gestão escolar, tem o papel
privilegiado de desenvolver ações que viabilizam sua finalidade e traz para si a

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incumbência de transformar em realidade o desenvolvimento do cidadão que
se quer formar. Para tanto, delineia um aspecto comum aos conceitos de
currículo que é o da organização, prévia ou não, de experiências e situações
de aprendizagens realizadas por docentes e redes de ensino de forma a levar a
cabo um processo seletivo, que contará com novas definições, parciais e
localizadas historicamente (Lopes,2011).
Esse contexto faz emergir o seguinte questionamento: Qual o papel
do(a) diretor(a) escolar na construção do currículo enquanto norteador da 940
prática escolar? Essa inquietação funciona como fio condutor dessa pesquisa
que tem por objetivo investigar a prática da gestão curricular em escolas da
rede municipal de ensino de Olinda, na busca de analisar a participação
dos(as) diretores(as) escolares na implementação do currículo da educação
básica.
Para tanto, a base teórica do projeto está pautada na gestão
democrática escolar, sendo os autores de referência para iniciar o estudo Luck
(2001), Paro (1996, 2001) e Freire(1981, 1993, 2003), Inspirada especialmente
na participação e na perspectiva da escola cidadã composta de processos
dinâmicos construídos coletivamente pelo conhecimento e pela afetividade,
constituindo-se em espaço de criação e vivência. Faz parte do aporte teórico os
conceitos de Currículo apresentados por autores como Lopes(2011),
Macedo(2011). O cotidiano escolar tem uma dimensão política que não pode
ser negligenciada. Este espaço é ocupado por sujeitos com circunstâncias
pessoais, papéis e responsabilidades distintas. Na perspectiva, de fortalecer a
dimensão pedagógica da gestão, nos perguntamos: Como as políticas
curriculares podem dialogar com as práticas culturais na qual a escola está
inserida? Quais estratégias metodológicas podem ser desenvolvidas para
superar o modelo burocrático de gestão escola/empresa, que tem como base o
poder central, e fortalecer o papel do diretor como articulador dos processos de
aprendizagem na escola com a finalidade de construir a cidadania?
A gestão da escola cidadã requer a reconstrução do paradigma
de gestão, para além da cidadania positivista, radicado na especificidade do
ato pedagógico, essencialmente dialético, dialógico, intersubjetivo, o que

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implica em agir na especificidade das ações educacionais, colocando a
questão da cidadania e da autonomia como processos indissociáveis e pré-
requisitos para o resgate da escola pública de qualidade.
Esses elementos constituem nosso objeto teórico, que nos permitiram
questionar a dimensão “gestão curricular” na formação continuada oferecida
aos gestores da rede municipal de Olinda, mais precisamente, buscamos saber
se os cursos de formação de gestores para as escolas da referida rede
contemplam temáticas voltadas à gestão curricular na educação básica. 941

CONCLUSÃO

Ao falarmos em gestão da escola pública, é fundamental destacar a


relevante constituição de 1988, e a lei de Diretrizes e bases da Educação, Lei
nº 9394/96(Brasil, 1996), que definem alguns princípios educacionais, dentre
eles a gestão democrática da educação, de modo que envolva todos os
segmentos da comunidade escolar e local na discussão dos rumos
educacionais.

A gestão democrática da educação precisa instrumentalizar a escola e o


município de forma a garantir as condições necessárias ao sucesso de sua
prática educativa. Ela apresenta-se como um suporte para o desenvolvimento
de um currículo em que a escolha dos conteúdos e das metodologias deixa de
ser uma tarefa aleatória, neutra e mecânica, passando a ser uma escolha
comprometida e qualificada. Importante destacar que assim como não existe
um currículo pronto (modelo) que esteja adequado à realidade de cada
município e de cada escola, da mesma forma, o município e a escola não
terão, de início, as condições necessárias, tornando imperativo que os gestores
educacionais estabeleçam metas para criar estas condições nas quais ele
desenvolverá seu efetivo exercício.
A gestão escolar constitui uma das áreas de atuação profissional
na educação destinada a realizar o planejamento, a organização, a liderança, a
orientação, a mediação, a coordenação, o monitoramento e a avaliação dos
processos necessários à efetividade das ações educacionais orientadas para a

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promoção da aprendizagem e formação dos alunos. Para tanto, “É preciso e
até urgente que a escola vá se tornando um espaço escolar acolhedor e
multiplicador de certos gostos democráticos como o de ouvir os outros, não por
puro favor, mas por dever, o de respeita-los, o da tolerância, o do acatamento
às decisões tomadas pela maioria a que não falte, contudo o direito de quem
diverge de exprimir sua contrariedade” (FREIRE,1995). Esse espaço acolhedor
pautado na teoria freireana estabelece condições favoráveis para construção
de um processo educativo multicultural que tem seu norte no currículo. 942
O currículo constitui-se no conjunto organizado das atividades de
ensinar e aprender que se processam na escola. É o conjunto de todas as
experiências do aluno que ocorrem sobre a influência da escola. Consiste em
uma última instância, em um modo de pensar o processo educacional, uma
forma de promover a educação no interior da escola (Goodson,1999). É, pois,
uma concepção, um modo de ver e organizar o processo pedagógico que
objetiva superar a fragmentação das grades de disciplinas, da orientação
programática e do conteudismo como valores em si, no norteamento das
experiências educacionais oferecidas aos alunos (lück, 2009).
É possível observar nas escolas a ocorrência do enfraquecimento do
currículo em nome do projeto pedagógico e da metodologia de projetos, que
passaram a receber uma orientação mais distanciada mais operativa da
organização do processo de formação e aprendizagem dos alunos. Portanto,
desafios especiais se apresentam ao diretor escolar, na busca de
estabelecimento da unidade do processo educacional, mediante o
fortalecimento do seu currículo como agente integrador de todas as
experiências educacionais promovidas pela escola, a partir do seu
reconhecimento de que o currículo constitui-se em um referencial teórico que
possibilita uma visão globalizada do ensino em oposição à fracionada (lück,
2009).
Para a realização desse estudo, será feita uma pesquisa qualitativa de
abordagem sócio-histórica. A escolha por esse tipo de investigação se justifica
pelo fato dessa perspectiva, segundo Freitas (2002, p.26), valorizar “os
aspectos descritivos e as percepções pessoais”, focalizando “o particular como

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instância da totalidade social, procurando compreender os sujeitos envolvidos
e, por seu intermédio, compreender também o contexto”. Assim, a abordagem
sócio-histórica volta seu olhar para todos os membros da situação em suas
interações e influências múltiplas.
Os sujeitos e lócus dessa investigação serão os(as) diretores(as) das
escolas municipais de ensino de Olinda. Tal escolha foi baseada em alguns
critérios: tratar-se de um município que nos últimos16 anos vivenciou práticas
de gestão que fortalecem a participação, como a eleição para dirigentes e para 943
conselheiros escolares, a construção das diretrizes curriculares com ampla
participação da rede em 2010, por estar iniciando o processo de reconstrução
do currículo no ano letivo em curso. Pertencer a referida rede de ensino
também foi um fator relevante para mencionada escolha.
A coleta dos dados deverá ser realiza por meio da pesquisa exploratória
e do grupo focal, a qual permite ao investigador participar da investigação,
tornando-se um sujeito ativo durante o processo investigativo (INNOCÊNCIO,
2005 apud FREITAS, 2002). Para tanto, deverão ser usados os seguintes
instrumentos:
- Questionários exploratórios com os(as) diretores(as);
- Análise documental;
- Oficinas com os gestores com a temática gestão, currículo e a dimensão
pedagógica da administração escolar.
A coleta dos dados será da aplicação do questionário exploratório para
compor o perfil dos sujeitos que são objeto da pesquisa e de oficinas com
gestores escolares da rede municipal de ensino de Olinda para identificar as
demandas necessárias ao exercício da função frente a implementação do
currículo escolar.
Os dados coletados deverão ser submetidos as seguintes categorias de
análise:
1. Concepção dos(as) diretores escolares sobre a gestão: saber do dirigente
escolar qual a concepção por ele adotada para o exercício da sua função, em
quais conhecimentos teóricos, experiências sociais, culturais e históricas ele se
baseia, e em que contextos esses conhecimentos foram construídos.

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2. Atuação dos(as) diretores(as) escolares reflexão das práticas de gestão.
2.1 -Dimensões da gestão: No exercício da função de dirigente escolar
qual(quais) a(s) dimensão(ões) da gestão apresenta(m)-se com maior ênfase
na sua prática?
2.2 -A relação gestão-currículo: Como se dá a participação da direção da
escola no processo de construção do currículo?
O levantamento histórico-documental nos permitiu observar que a Rede
Municipal de Ensino em análise ofereceu em 2014 o primeiro curso de 944
formação destinado a professores(as) candidatos a assumirem a função de
gestor(a) escolar. Na ocasião, o município vivenciava a primeira eleição
unificada para gestores de escola. A etapa inicial do referido processo eleitoral
foi composta por um curso de formação para os(as) candidatos(as), elaborado
pela secretaria de educação de acordo com os conteúdos estabelecidos pelo
decreto Nº276/11 que regulamentou todo processo eleitoral do ano de 2014.
Com a carga horária de 40h/a, o curso foi organizado em estrutura modular,
que contemplou as seguintes dimensões da Gestão Escolar: recursos
humanos, pedagógica, legislação, planejamento e avaliação. O organograma
de execução e a matriz curricular, foram deferidos pela Secretaria Municipal de
Educação, sendo exigida a frequência mínima de 90% da carga horária
estabelecida. O índice de reprovação no curso foi baixíssimo, correspondendo
apenas a dos cursistas desistentes. Os módulos do curso estão indicados no
quadro 1:

1. Sensibilização
2. Legislação
3. Dimensão da Gestão, Recursos Humanos
4. Dimensão Pedagógica da Gestão Escolar.
5. Avaliações Externas e processo de Ensino aprendizagem.
6. Gestão Democrática, Controle social e avaliação.
7. Planejamento: Projeto Político Pedagógico e Plano de Gestão
8. Gestão Escolar, Financeira e Administrativa.

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resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
237-1438-3
Quadro 1: Módulos ofertados no Curso para gestores. Edição 2014.. Fonte: A
autora (2018)

O segundo curso de formação vivenciado em 2018, também como etapa


inicial do processo eleitoral para gestores(as) regulamentado por um novo
Decreto Nº 022/18, apresentou algumas alterações em relação a primeira
oferta. Com uma carga horária ampliada para 100 h/a, sendo72h/a de aulas
945
presenciais e 28h/a de procedimentos avaliativos, nesta segunda experiência
de formação em rede, o curso exigiu frequência mínima de 75h e uma prova
avaliativa com nota mínima 7,0 para aprovação nas 10 disciplinas apontadas
no quadro 2:

1: Administração como Ciência e as Racionalidades da Administração /


Dimensões Filosófica,Psicológica, Comunicativa, Histórica e Quântica em
Administração.

2: O que a Física Quântica tem a ver com a Administração? / Liderança:


Psicologia da Gestão ou Gestão Psicológica?

3: Escolas do Pensamento Administrativo / Flexibilização Organizacional

4: Liderança e Estratégia

5: Políticas Públicas em Educação

6: Planejamento e Avaliação Educacional / Avaliações Externas

7: Gestão democrática e coordenação do trabalho pedagógico da escola

8: Gestão Escolar por Resultados

9: Aplicação e Prestação de Contas de Recursos Escolares de Administração


Direta

10: Operacionalização de Sítios Oficiais – Lançamento, Consulta e Uso de


Dados Educacionais e Sociais

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.Quadro 2: Módulos ofertados no Curso para gestores. Edição 2018. Fonte: A
autora (2018)

Podemos observar que assim como na oferta realizada em 2014, a


segunda oferta, realizada em 2015, também não sinaliza temáticas envolvendo
o currículo e mais especificamente a gestão curricular, no que concerne aos
processos de sua implantação ou de sua implementação. Outro elemento que
946
nos chamou atenção é que foram disponibilizadas vagas para docentes da
rede que manifestaram interesse na formação, mesmo não estando inscritos no
processo eletivo. Destacamos ainda, que o índice de reprovação e de
desistência foram significativos: de um total de 207 inscritos 38 foram
reprovados na prova avaliativa e 46 foram desistentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS OU CONCLUSÕES

Analisando os documentos de organização de ambos os cursos, sendo


estes dois momentos, ações centrais de formação para gestores em rede, fica
clara a carência da dimensão pedagógica na formação continuada do(a)
gestor(a) escolar. Os dois cursos privilegiaram temáticas voltadas para
administração, liderança, políticas públicas, gestão democrática, gestão por
resultados, prestação de contas e uso de dados educacionais.
No entanto, entendemos que o exercício desta dimensão da gestão
escolar no atual universo educacional brasileiro, demanda estudo, debate,
reflexão e informação acerca do que os estudantes aprendem, e como
aprendem, assim como a relação entre o currículo normatizado e o currículo
que emerge do cotidiano escolar. Com isso, esta pesquisa aponta para
necessidade de fortalecer a gestão curricular enquanto temática de formação
continuada para gestores escolares.

REFERÊNCIAS

BARRETO, Maria do Socorro Vieira. A formação continuada de gestores escolares


em dois municípios mineiros: do PROCAD ao PROGESTÃO. 2007. 249 f.

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Dissertação (Mestrado em Educação)- Faculdade de Educação, UNB, Brasília, 2007.
Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/33533500.pdf. Acesso em: fev.2018.

________. Concepções e Processos Democrático da Gestão Educacional. 5ª Ed.


Petrópolis, RJ. Editora Vozes, 2011.

TEIXEIRA, Beatriz de Basto; MALINI, Eduardo. Formação de diretores: exigência à


melhoria da gestão escolar. In: III Congresso Iberoamericano de Política e
Administração Escolar, 2012. Zaragoza, Espanha. Anais eletrônicos... Zaragoza,
947
ANPAE, 2012. Disponível em:
http://www.anpae.org.br/iberoamericano2012/Trabalhos/BeatrizdeBastoTeixeira_res_in
t_GT3.pdf. Acesso em fev. 2018.

SILVA, Tomaz Tadeu. Currículo e Identidade Social. Territórios contestados. In SILVA,


T.T. (org). Alienígenas em Sala de Aula: uma introdução aos estudos culturais em
educação. 10ª ed. Petrópolis- RJ: Vozes, 2012.

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GT 9 – POLÍTICAS CURRICULARES E AS
PERSPECTIVAS EPISTEMOLÓGICAS

NOVOS RUMOS PARA O ENSINO DE SOCIOLOGIA NA ESCOLA CIDADÃ


INTEGRAL TÉCNICA

Givanilton de Araújo Barbosa102


948
RESUMO: No Brasil, o ensino de Sociologia na escola básica é caracterizado por
sua intermitência. Pensando nisso, é necessário afirmar justificativas potencialmente
relevantes para a permanência da Sociologia nas práticas curriculares do Ensino
Médio da escola de tempo integral. Este estudo analisa a inserção da disciplina
Sociologia no currículo do Ensino Médio da Escola Cidadã Integral Técnica no
Estado da Paraíba, reavendo subsídios teóricos e metodológicos para a docência e
aprendizagem. Com uma metodologia qualitativa sem desconsiderar dados
quantitativos, pesquisa bibliográfica e de campo, justifica-se a importância de
repensar a discussão concernente a construção de uma sociologia escolar levando
em conta a trajetória da disciplina na educação básica. Por fim, a pesquisa vem se
revelando enriquecedora por revisitar a legitimação da Sociologia nos espaços
escolares por via das novas demandas educacionais, neste caso, da escola de
tempo integral fundamentada no protagonismo juvenil para o processo formativo dos
sujeitos em sociedade.
Palavras-chave: Docência. Sociologia escolar. Ensino Médio. Juventude.
Currículo integral

INTRODUÇÃO

A Educação brasileira nos últimos anos vêm passando por mudanças


consecutivas, assim, é o Plano Nacional de Educação lançado no ano de 2014,
como uma mudança estrutural, prevê 20 metas para serem implementadas, de 2014
a 2024. Nesse caso, a meta 6 visa oferecer a Educação em tempo integral em, no
mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos(as)
alunos(as) da Educação básica.
102
Bacharelando e licenciado em Ciências Sociais; givaniltonbarbosa10@gmail.com; membro do
grupo interdisciplinar de pesquisa em cultura, sociedade e ambiente do programa de pós-graduação
em Antropologia, todos na Universidade Federal da Paraíba.

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Nesta perspectiva, por meio do programa institucional de Iniciação à Docência
(PIBID) na disciplina Sociologia voltada para o ensino médio, ocorreu a oportunidade
pela qual de aproximação ao modelo de ensino integral, assim, ocasionando-me
uma série de inquietações. Pensando nisso, foi levado em conta a continuidade do
estudo de pesquisa qualitativa, consulta bibliográfica e de campo a fim de enfatizar o
saber emergente de uma Sociologia escolar, por sua vez, com práticas curriculares
na escola de tempo integral.
O artigo objetiva apresentar resultados parciais da pesquisa que visa analisar 949
a inserção da disciplina Sociologia do ensino médio da escola cidadã integral técnica
do Estado da Paraíba, por sua vez, tal modelo curricular adota pilares fundamentais
para a formação completa dos sujeitos como o protagonismo juvenil e projeto de
vida. Portando, nesta oportunidade são discutidos breve histórico do ensino da
Sociologia na educação média brasileira como também seus respectivos autores
que defenderam tal disciplina, por conseguinte, são apresentandos os principais
aspectos da estrutura curricular da escola de tempo intengral.
Com base nos pressupostos teóricos e metodológicos da Sociologia e com o
advento e permanência da disciplina nas práticas curriculares da escola de tempo
integral, o que se pretende é analisar o fazer sociológico como modalidade de
ensino da escola média de tempo integral no processo formativo dos sujeitos em
sociedade. Para isto, com base em pressuposto teóricos penso que é necessário
levar em conta a trajetória do ensino da Sociologia na educação básica brasileira,
forma pela qual de evidenciar as contribuições significativas ao saber escolar.
Desta maneira, Sarandy (2011, p. 3) elabora questionamentos que possibilita
estranhar o próprio conhecimento sociológico acentuando “qual a natureza do
conhecimento sociológico? O ensino da sociologia na escola média deve ser o
ensino de uma ciência, como um conjunto de conhecimentos acumulados sobre
determinados fenômenos sociais? Ou o ensino da sociologia se define por promover
a emancipação dos sujeitos? Quais os melhores caminhos para operacionalizar o
ensino da disciplina? O autor completa que, “tais perguntas dizem respeito
diretamente às questões de ensino e suas respostas são capazes de indicar
distintos direcionamentos”.

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Ou seja, podemos relacionar esta discussão com o ensino da Sociologia na
escola de tempo integral, pois novos rumos podem ser tomados do currículo
convencional para o currículo de tempo integral, assim, é de suma importância a
continuidade deste estudo, forma pela qual de analisar e refletir criticamente tal
objeto de estudo como resistência e permanência na atualidade.
Nesta perspectiva, vale reiterar que estudo analisa a inserção da disciplina
Sociologia no currículo do ensino médio da escola cidadã integral técnica no Estado
da Paraíba, reavendo subsídios teóricos e metodológicos para a docência e 950
aprendizagem. Com uma metodologia qualitativa sem desconsiderar dados
quantitativos, pesquisa bibliográfica e de campo justifica-se a importância de
repensar a discussão entorno da construção de uma sociologia escolar (BODART;
AZEVEDO; TAVARES, 2018, p.3 ) considerando a sala de aula um laboratório de
questionamentos das construções sociais estabelecidas históricamente, senso
comum e ciência, relações de exclusão e exploração, preconceito, intolerância,
violência levando em conta a trajetória da disciplina na educação básica.

DESENVOLVIMENTO

Nesta perspectiva, vale destacar breves apontamentos que caacterizaram os


primeiros passos do ensino da Sociologia na educação brasileira. Por via desta, no
Brasil o contexto do ensino de sociologia na escola básica caracteriza-se por sua
intermitência e descontinuidades (VARGAS, 2014, p. 4), no entanto, desde o final do
século XIX lutas e debates constantes põe a disciplina e seu ofício em contramão à
institucionalização permanente. Esse aspecto intermitente pode fazer parte de
politicas educacionais de grupos de interesses com base em um projeto educacional
hegemônico.
Desse modo, a história do ensino das Ciências Sociais no Brasil, de acordo
com Chacon (1977), iniciou-se por volta de 1827, assim, os conhecimentos de
Sociologia eram lecionados nas primeiras faculdades de Direito de Recife, São
Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Ouro preto/Belo Horizonte. Na Bahia haviam
professores que defendiam a separação de Sociologia e Direito. Em Fortaleza
também aconteceu este movimento de defesa da separação da Sociologia do
Direito.

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A Sociologia era defendida dentro das Ciências Sociais, assim, enominada
Sociologia do Direito, através de contribuições esporádicas, a ciência sociológica
voltava-se aos estudos de compreensão da sociedade, temas sobre fato social e
suicídio com base no sociólogo Durkheim eram estudados no Direito criminal. Outro
ponto importante eram os estudos sobre a Sociologia do Estado no Direito
administrativo com base nas teorias de Max Weber.
Na verdade, a preocupação da época era a formação de uma elite que iria dar
novos rumos aos estudos acadêmicos no Brasil (CHACON, 1977), neste sentido, 951
polos de estudos eram direcionados à formação de bacharéis em Direito,
Administração pública, Economia e Sociologia. O objetivo era formar juristas,
administradores e Estadistas para suprir as necessidades de formação da nova
estrutura do Estado brasileiro da época. Esta mesma época muitos juristas
brasileiros se formaram na faculdade de Direito em Coimbra.
No que tange a escola básica, o ensino de Sociologia é datado por volta de
1890 (SARANDY, 2011, p. 9), após a fundação da república. Com uma nova
concepção de pensamento político voltado à Educação brasileira especificamente a
escola básica, neste momento destaca-se o prévio estágio de preocupação da
formação de professores para dar início a alfabetização a população da época.
Segundo Bodart (2018, p. 461) o ensino da Sociologia escolar é marcada por
sua quase ausência no currículo ao longo do tempo, tendo sido obrigatória no
currículo nacional apenas entre 1925 e 1942 e retornando apenas a partir de 2008.
A quase ausência da Sociologia no Ensino Básico e a inexistência do
reconhecimento da comunidade científica do ensino de Sociologia enquanto um
campo de pesquisa foi suficiente para configurar uma situação de desestímulo à
produção de material didático, assim como ao desenvolvimento de cursos
licenciaturas em Ciências Sociais.
Assim, a partir de 1942, os estudos continuaram em algumas universidades,
como também o período militar a partir de 1964 foi marcado por restrições aos
estudos de Sociologia na educação escolar tornando-a incerta. Já no período de
redemocratização por volta de 1985 iniciam-se diversas reivindicações
principalmente nas regiões sudeste e sul para o retorno do ensino da Sociologia na
escola básica (SILVA, 2007; MORAIS, 2009; VARGAS 2014)

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No entanto, para Silva (2007), o período da década de 1930 aconteceu um
considerável nível de institucionalização. O ensino de Sociologia é defendido e
implementado no período da Escola Nova através do ensino Normal – curso voltado
para a formação de professores. Fernando de Azevedo (1951) e Florestan
Fernandes (1954) se manifestaram em defesa do ensino de Sociologia na escola
secundária, aponta uma pergunta chave e resposta para justificar a inclusão do
ensino de sociologia.
Na década de 30, os intelectuais da época já discutiam a importância do ensino 952
de Sociologia no pocesso formativo dos sujeitos em sociedade. Neste sentido,
também já problematizavam, a qual seria a importância pedagógica da sociologia no
ensino médio e na formação da juventude. Por sua vez, a Sociologia representaria a
forma mais construtiva de divulgação dos conhecimentos sociológicos e um meio
ideal para atingir as funções que a ciência precisa desempenhar na educação dos
jovens na vida moderna (FERNANDES, 1954, p. 89-90).
Outro fator importante de ser discutido é pelo fato de que o ensino das Ciências
Sociais (Sociologia) no ensino médio seria uma condição natural para a formação de
atitudes capazes de orientar o comportamento humano no sentido de aumentar a
eficiência e harmonia de atividades baseadas em uma compreensão racional das
relações entre os meios e os fins em qualquer setor da vida social (FERNANDES,
1954), tendo em vista dois objetivos educar as novas gerações para as tarefas de
liderança administrativa, econômica e política e criar recursos para a solução
racional e pacífica dos problemas sociais da atualidade.
Com a expansão urbana e a industrialização se refletiram na composição das
camadas dominantes e na forma de seleção de suas elites. Estas revelaram certas
capacidades, com referência à situação de interesses em formação, e deram algum
relevo a preocupações práticas, de cunho intelectual.
Para desenvolver o pensamento racional, crítico, reflexivo e científico está na
condição da escola ofertar dispositivos eficientes para ativar capacidades do
educando para o exercício de direitos e deveres, na formação de uma nova
concepção de dignidade e do valor da pessoa humana (FERNANDES, 1954, p. ).
Mas também é responsabilidade da escola, neste caso, da escola pública preparar
habilitar o educando e a educanda para dirigir organizações políticas e

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administrativas que exige competências técnicas ou para escolher os que se
candidatam para aquele fim. É preciso instruir os indivíduos para ocupar posições
em uma estrutura social internamente diferenciada e democrática participativa.
O ensino de Sociologia, tal obrigatoriedade foi estabelecida pela Lei nº 11.684,
de 02 de junho de 2008, depois de muitos anos de debates, de avanços e
retrocessos, e de quase quarenta anos de banimento desta disciplina dos currículos
escolares (VARGAS, 2014, p. ). Esta mesma lei de 2008, alterou o artigo 36 da LDB
que previa apenas que se propiciasse ao aluno, nos currículos de ensino médio, o 953
domínio de conhecimentos de sociologia. A partir de então, a sociologia seria
obrigatória em todas as séries do ensino médio.
Por um lado, tem sido objeto de verdadeiro culto, por uns, é levada a
instrumento fundamental na estratégia de emancipação das classes subalternas de
nossa sociedade ou, ao menos, tida como meio garantido para a construção da
cidadania (SARANDY, 2011, p. 3). A continuidade do processo de
institucionalização, legitimidade e consolidação social da sociologia como disciplina
obrigatória do ensino médio, torna a via principal para garantir sua permanência.
Sarandy (2001, p. 6) afirma que tornar o ensino das Ciências Sociais
(Sociologia) um projeto intelectual e político depende de uma construção e
essencialmente da capacidade de construir sistematicamente, dialogar e defender o
ofício na teoria e politicamente. No que tange a condição juvenil atual. Já Dayrell e
Reis (2007) discutem que há demandas e necessidades de compreender práticas e
manifestações do novo modo de ser jovem nos processos de socialização, a qual
colocando em questão o sistema educativo e posturas pedagógicas.
Resultados e discussões
Metodologicamente o artigo toma como base observações a partir da
experiência no Programa Institucional de Iniciação a Docência PIBID em Sociologia
no curso de licenciatura em Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba no
ano de 2017. Consequentemente, a inquentação e ao mesmo tempo motivação de
estudar intrinsecamente a inserção da Sociologia na escola de tempo integral como
também suas práticas curriculares da escola de tempo integral, caracterizada cidadã
integral técnica e oposta as práticas pedagógicas do currículo da escola
convencional.

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Desse modo, o estudo pode possibilitar acesso e acompanhar os processos
da inserção da disciplina sociologia na escola de tempo integral, como também,
forma pela qual de desenvolver análises críticas das novas práticas curriculares da
tal disciplina, visto que o ensino de Sociologia é obrigatório nas três séries do ensino
médio. Por outro lado, encontra-se o interesse também revisitar artigos e livros
tematizando a história das Ciências Sociais na educação básica brasileira e o
possível desenvolvimento de uma Sociologia escolar que pense a realidade da
escola, dos sujeitos em sua localidade. 954
De acordo com levantamento realizado do site da secretaria de Educação do
Estado da Paraíba, objetivando cumprir o plano nacional de educação (PNE 2014 a
2024) desde 2014 as escolas cidadãs integrais técnicas vem sendo pensadas e
implementadas buscando contemplar todas as regionais de ensino do Estado. A
presente pasta também define que as práticas curriculares ou escolas integrais
trazem em seu modelo inovações e propostas que buscam fazer um divisor de
águas na história da educação do Estado, e tem como objetivo formar cidadãos
autônomos, solidários e competentes, indivíduos protagonistas, agentes sociais e
produtivos que possam contribuir com o mundo atual e suas necessidades.
Dentro dessa proposta, a secretaria de educação afirma que as escolas em
tempo integral possuem um conteúdo pedagógico voltado para uma educação de
excelencia, formação para a vida e formação para as competências do século XXI.
Além das disciplinas da base comum curricular (BNCC), oferta disciplinas
diversificadas como disciplinas eletivas, projeto de vida, pós-médio e estudo
orientado, e que, a escola cidadã integral técnica segue o mesmo modelo que a
escola cidadã integral, mas tendo como diferencial os cursos técnicos para atuação
no mercado de trabalho.
Desta forma, a secretaria de Educação de Estado afirma que, visando a
formação integral dos jovens e tendo como foco principal o estudante e o seu
projeto de vida, buscando assim desenvolver os pilares essenciais para a formação
dos sujeitos que possam contribuir com a sociedade a partir de sua autonomia, das
diferentes competências e sendo solidários, baseado no incentivo ao
desenvolvimento do protagonismo juvenil. Além do modelo pedagógico diferenciado,
que busca a formação do cidadão em sua totalidade, são ofertados cursos
profissionalizantes e atividades em diversas aréas como esporte, arte, cutura e música.

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A experiência do pibid se deu no ano 2017 na escola cidadã integral técnica
localizada na avenida Hilton Souto Maior, bairro de Mangabeira VII. Funciona das
07:00 às 17:00 H, com média de 300 alunos, o perfil socioeconômico caracterizava-
se em classe média residentes em bairros mais distantes como também alunos de
baixa renda residentes no entorno da escola.
Foi constatado um considerável índice de evasão escolar, segundo
informações da escola, pelo fato do currículo integral impossibilita discentes
conciliar os estudos com estágio profissional em programas de aluno aprendiz nas 955
empresas e outras formas de acesso a trabalho e geração de renda. Ou seja, o
índice de evasão ocorre principalmente com estudantes de famílias de baixa renda,
assim, muito cedo o jovem busca vínculo empregatício para gerar renda a fim de
suprir suas próprias necessidades financeiras e complemento financeiro para com a
família.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo, utiliza-se do contexto que se insere a disciplina de


Sociologia, neste caso, na escola cidadã integral técnica do Estado da Paraíba,
levando em conta as práticas curriculares fundamentadas no protagonismo juvenil e
projeto de vida no processo formativo dos sujeitos em sociedade. Assim, a partir da
experiência no pibid sociologia na escola de tempo integral pude acompanhar
mudanças das práticas docente como também práticas pedagógicas voltadas para
os procedimentos metodológicos e material didático diferenciadas da escola
convencional.
Já a pesquisa bibliográfica tornou possível a revisitação do processo histórico
de luta e resistência do ensino da sociologia na educação básica brasileira,
constatando-se a meu ver que ainda há a demanda emergente de construir uma
sociologia escolar em sala de aula, a fim de buscar legitimação, reconhecimento nos
espaços escolares, como também, apontamentos para que os discentes estudem
sua própria realidade com base nas teorias científicas sociológicas, antropológicas e

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da Ciência Política no processo formativo de estranhamento e desnaturalização das
condições sociais construídas socialmente.
Desta forma, a experiência no pibid Sociologia tornou-se significativa por
possibilitar formação acadêmica profissional, meio pelo qual de refletir sobre a teoria
e prática docente em sala de aula no que concerne as Ciências Sociais licenciatura
plena. É também oportunidade de repensar que educação queremos. Outro fator
significativo se deu no engajamento da universidade para proporcionar qualidade no
ensino e aprendizagem na formação dos licenciados, assim, contribuindo no 956
processo de institucionalização, legitimação e consolidação do ensino de Sociologia
no ensino médio.
Portanto, levando em consideração a perspectiva do currículo da escola cidadã
integal técnica (escola de tempo integral) há a demanda de revisitar o ensino da
Sociologia, por meio desta, dialogando com o contexto dos discentes mas sem fugir
do rigor conceitual, teórico e metodológico, podendo possibilitar o processo formativo
reflexivo e crítico levando em conta o senso comum dos sujeitos e, por outro lado,
significar o teor científico no pocesso formativo da imaginação sociológica, criando
possibilidades e capacidades dos discentes ver, reaver e analisar sua posição social,
enxergar expectativas de mudanças individual e coleta e assimilação de ações
significativas para uma sociedade mais justa.
Portanto, partindo dos pressupostos teóricos e metodológicos e desafios
pragmáticos revisitados vale destacar a seguinte pergunta, quais são os novos
rumos para o ensino de sociologia na escola cidadã integral técnica? Por fim, a
pesquisa vem se revelando enriquecedora por revisitar a legitimação da Sociologia
nos espaços escolares por via das novas demandas educacionais, neste caso, da
escola de tempo integral fundamentada no protagonismo juvenil e projeto de vida
para o processo formativo dos sujeitos em sociedade.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Fernando de. Princípios de Sociologia: pequena introdução ao


estudo de Sociologia geral. Ed. Melhoramentos. 5ª Ed. São Paulo, 1951.

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237-1438-3
BODART, Cristiano das Neves. Prática de Ensino de Sociologia: As Dificuldades
dos Professores Alagoanos. MEDIAÇÕES, LONDRINA, V. 23 N. 2, P. 455-491,
MAI./AGO. 2018.

BODART, C. N; AZEVEDO, G. C e TAVARES, C. S. O PROCESSO DE


REINTRODUÇÃO DA SOCIOLOGIA NO ENSINO MÉDIO BRASILEIRO E OS
CURSOS DE CIÊNCIAS SOCIAIS (1984-2008). Encontro Estadual de ensino de
Sociologia 6º ENSOC. O ensino de Sociologia no contexto das reformas
educacionais: balanços e resistências. 20,21 e 22 de setembro de 2018, UFRJ
campus praia vermelha.
957
BRASIL, Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2014). Meta 6, 2014.

CANÁRIO, Rui. A escola: das “promessas” às “incertezas”. Educação Unisinos;


volume 12, número 2, maio-agosto 2008.

CHACON, Vamireh. História das ideias sociológicas no Brasil. Universidade de


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DAYRELL, Juarez; REIS, J. B. Juventude e escola: reflexões sobre o ensino da


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FERNANDES, Florestan. O ensino de sociologia na escola secundária brasileira.


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LEITURA E ESCRITA DE SI: NARRATIVAS DE RESISTÊNCIA EM TEMPOS
DE PADRONIZAÇÃO E CONTROLE CURRICULAR
Sabrina Mendonça Ferreira | Dilcelene Quintanilha de Resende Cordeiro | Ana
Lúcia Pinheiro de Bejarano

RESUMO: Neste trabalho trazemos reflexões tecidas em pesquisas com estudantes e


professores da educação básica, evidenciando movimentos de resistência aos
processos de controle e de padronização que incidem sobre os modos de fazer e de
pensar dos praticantespensantes do cotidiano escolar, por meio de políticas públicas
959
de currículo. Nos processos investigativos em foco, as narrativas são entendidas como
objeto de estudo e procedimento metodológico, posto que dão pistas dos processos
de formação que estão em curso e neles intervêm, admitindo que, enquanto lê e
escreve sobre si e sobre seu fazer, o sujeito pensa e pode reelaborar suas formas de
ser, fazer e pensar. No texto, fazemos a defesa da docência como ato de resistência e
de criação cotidiana, sendo possível, então, considerar que a pesquisa interessada no
que acontece no dia a dia da escola é de significativa relevância para desinvisibilizar
práticas emancipatórias que contrastam com o cenário neoconservador que vai sendo
pintado, permitindo esperançar, agir com a esperança de que outro mundo é possível:
mais democrático, menos desigual, mais solidário.
Palavras-chave: Padronização. Controle. Narrativas. Resistência. Currículo.

INTRODUÇÃO

Quem se inquieta com o comum, o ordinário, o cotidiano, e faz dele seu


lócus de pesquisa, encontra desafios de natureza teórico-epistemológica e
metodológica, pois a complexidade, a engenhosidade das artes de fazer e de
pensar dos praticantespensantes (OLIVEIRA, 2012) podem ser invisibilizadas
pelos métodos hegemônicos que buscam linearmente causas e
consequências, atos e resultados.

As pesquisas que permitiram as reflexões presentes neste trabalho


foram tecidas nos/dos/com os cotidianos de escolas públicas nas regiões
Metropolitana, Norte Fluminense e Serrana do Estado do Rio de Janeiro. Com
a emergência de encontrar interlocutores para a pesquisa com o cotidiano,
recorremos à obra A Invenção do Cotidiano, de Michel de Certeau (1994)
consistente e original esboço de uma “ciência das práticas cotidianas”, em que

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se reinventa o lugar do sujeito ordinário, desinvisibilizando a criatividade e a
astúcia que caracterizam suas “maneiras de fazer”, indissociáveis de suas
“maneiras de pensar”.

Também elegemos contribuições de Boaventura de Sousa Santos


(2007) para pensarmos, nesse trabalho, sobretudo, a abissalidade do
pensamento moderno ocidental; às de Toni Negri (2017) para tecermos
considerações pertinentes sobre a noção do comum como modo de produção
960
na nossa sociedade, e demais autores que nos ajudam a compreender tanto
leitura e a escrita de si como resistência, quanto à fertilidade do cotidiano.

SABERES E SABORES: CRIAÇÃO NA FERTILIDADE DO COTIDIANO

Quando optamos por realizar nossas pesquisas nos/dos/com os


cotidianos de escolas públicas, o fizemos como uma intencionalidade:
contrariar os discursos demeritórios sobre a docência como exercício de
reprodução, de execução de currículos e programas previamente definidos,
seguindo rígidos padrões de avaliação (também aprioristicamente fixados) para
manter o controle de todo o processo educativo.

Acreditamos que há, nas escolas, criação cotidiana de práticaspolíticas


que reconhecem a possibilidade de diálogo entre conhecimentos científicos e
seus outros; há ineditismo, participação e solidariedade, contrariando a lógica
arrogante de um regime cognitivo injusto.

Percebemos, como Freire (1996, p. 21), que a ideologia fatalista,


imobilizante, que anima o discurso neoliberal anda solta no mundo. Com ares
de pós-modernidade, insiste em convencer-nos de que nada podemos contra a
realidade social que, de histórica e cultural, passa a ser ou a virar “quase
natural”. É certo que práticas de reprodução, de seleção, de controle, também
são produzidas nos cotidianos escolares, mas vai nos interessar aquilo que
contraria a tendência reguladora do ambiente escolar.

Nas pesquisas em andamento, que inspiram tais reflexões, com a


intenção de compreender os modos de fazerpensar dos professores no
cotidiano escolar, encontramos pistas das métis (DÉTIENNE &VERNANT,

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2008) das professoras, inteligência fértil em astúcias. Cheia de surpresas,
abundante em invenções. Nas reuniões de planejamento, nos Conselhos de
Classe, na hora do cafezinho, nos encontros no corredor, nos cursos de
formação em serviço, encontramos a prática dos anônimos, especificando
melhor, das professoras anônimas que cotidianamente criam, com seus alunos
e alunas, possibilidades de olhar a vida de outros pontos de vista. Como nos
ajuda a pensar Sampaio (2008, p.54), são sujeitos encarnados que trazem
consigo suas histórias pessoais (e profissionais) e que cotidianamente 961
constroem a história da escola onde atuam (e estudam).

Suas práticas ordinárias são muitas vezes desqualificadas pelo discurso


da melhoria da qualidade da educação que, utilizando resultados produzidos
pela lógica mercantilista, culpabiliza aqueles e aquelas que não cumprem as
metas estabelecidas.

As consequências de tornar hegemônica esta visão reducionista da


professora como incompetente, incapaz de pensar o que faz, porque
desqualificada, se desdobram. Uma delas é a intensa corrida para a construção
da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), recentemente aprovada, que
determina o conteúdo de ensino na educação básica para que, acreditam seus
idealizadores, a despeito da (dês)qualificação das professoras, todos os alunos
aprendam a mesma coisa de Norte a Sul do país.

Outra consequência é a avalanche de projetos e programas


salvacionistas que se multiplicam diariamente, todos sustentados na ideia de
que é preciso dizer o que e como ensinar, porque a classe docente é apenas
capaz de executar, quando bem capacitada, o que os especialistas pensam.
Um sem número de sistemas estruturados de ensino (Dom Bosco, PH,
Positivo, Equipe1, apenas para citar aqueles que aparecem na primeira página
numa simples consulta no Google, a ferramenta de busca mais usual na
Internet) passaram a vender seus produtos às redes públicas de ensino nos
últimos anos, assegurando que dinheiro público chegue às empresas privadas.

Como que completando um tripé, há ainda uma outra consequência: o


acirramento da política de avaliação também da educação básica, expondo sua

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vocação como instrumento de poder e controle das professoras, de seus
modos de ensinar, seus modos de fazerpensar.

Mencionando apenas estes três movimentos coordenados e integrados


à política pública curricular que está a se implantar, paulatinamente, nas
escolas de educação básica brasileiras, podemos ter a ideia de que foram
pensadas, com detalhes, as estratégias de padronização e controle das ações
docentes no cotidiano escolare que, dificilmente os docentes delas escaparão.
962
Entretanto, como nos ajuda Certeau e seu grupo de pesquisa, somos
desafiados a pensar não nas políticas de currículo, mas nos usos que delas
fazem os praticantespensantesdo cotidiano escolar. Lendo a segunda parte do
tomo II do livro A Invenção do Cotidiano (CERTEAU, 1994), encontramos, nos
registros feitos pela pesquisadora Giard sobre seu processo de aprendizagem
da arte de cozinhar, uma reflexão que muito nos inquieta e nos encoraja a
buscar pistas da criação cotidiana, ainda que muitas sejam as investidas para
cerceá-la:nas práticas ordinárias de preparar os alimentos: “a tradição e a
inovação se entrelaçam” (1994a, p.212), sem que um elemento seja mais ou
menos relevante que o outro.

Pensando com a leitura feita, entendemos que, assim como o sabor de


um prato é irrepetível, ainda que se siga o livro de receitas, uma aula é também
um acontecimento único, ainda que se exija o cumprimento da BNCC. Sabores
e saberes se tecem de muitos fios, alguns da tradição, outros da inovação,
sempre em práticas de criação.

Aos poucos, fui descobrindo (...) o prazer de manipular a


matéria-prima, de organizar, de combinar, modificar e inventar.
(...) Tive que tentar explicar a mim mesma a natureza, o sentido
e o modo de tudo isto, na esperança de compreender porque
este prazer me parece tão próximo do ‘prazer do texto’, por que
teço um parentesco tão íntimo entre a escrita dos gestos e a
escrita das palavras... (GIARD, 1994a, p. 214)

Em pesquisa e sem desprezar-nos a nós mesmas como


praticantespensantes destas pesquisas feitas com outras professoras, vamos
deixando, no texto, pistas do nosso processo de compreensão do cotidiano
escolar como lugar de invenção e reinvenção de nós mesmas, enquanto

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professoras e pesquisadoras, desmistificando a docência como um mero
exercício repetitivo de ações ocas de conhecimento. A pesquisa vai nos
mostrando culturas, histórias, memórias e corpos em jogo quando nos
propomos a aprenderensinarpesquisar: Que estratégias escolher? Como
utilizar? Quantas combinações a fazer? As respostas dadas a essas perguntas,
cotidianamente, não podem estar prescritas numa base comum; são
inventadas, criadas nas operações cotidianas das praticantes, donas de uma
coerência interna, invisível, mas real. Não fosse assim, em todos os lugares o 963
sabor de uma aula, seus aromas, os saberes dela resultantes seriam os
mesmos. Sem variações. A disponibilidade de conhecimentos, bem como sua
restrição, provocam a criatividade, e surge a espetacular e irreprisável aula!

A aparente insignificância do cotidiano escolar guarda em si a


complexidade das artes de fazer e de pensar das professoras e nos diz da
insuficiência dos instrumentos de análise e danatureza rudimentar das
categorias já conhecidaspara lidar com a estética, a polêmica e a ética da
operatividade que cria cotidianamente o inusitado.

Quando criam/usam/bricolam com os produtos que lhes são dados a


consumir (BNCC, métodos, provas padronizadas, entre outros) suas práticas
cotidianas, “anônimas e inomináveis”, os praticantespensantesmostram que a
inteligência, a imaginação, a memória emaranhadas nas astúcias e táticas
habitam o cotidiano, o lugar do comum.

LEITURA E ESCRITA: A POTENCIALIDADE DO COMUM NO COTIDIANO

“Dois peixinhos estão nadando juntos e cruzam com um peixe


mais velho, nadando em sentido contrário. Ele os cumprimenta
e diz:
– Bom dia, meninos. Como está a água? Os dois peixinhos
nadam mais um pouco, até que um deles olha para o outro e
pergunta:
– Água? Que diabo é isso?

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(David Foster Wallace – passagem conhecida como “Isto
é água”. Discurso de abertura de colação de grau em 2005 da
Kenyon College).

A questão central da passagem acima nos interessa


epistemologicamente, tendo em vista que a realidade mais óbvia costuma ser,
não raramente, difícil de ser foco de nosso reconhecimento ou de nossa
atenção como digna de ser investigada. Leitura e escrita são modalidades
964
cotidianas de um mesmo sistema de linguagem – água em que estamos
mergulhados. Quando, nos estudos do cotidiano, nos dispomos a interrogar o
que “passa quando nada se parece passar”, como aponta José Machado Pais
(1993), é no intuito mesmo de “encontrarmos condições e possibilidades de
resistência que alimentam a sua própria rotura” (p. 108).

Assumimos que, através de leituras e escritas de si, é possível contribuir


para a superação de invisibilizações e silenciamentos na produção/criação de
narrativas de resistência intrínsecas aos ambientes escolares. Em outras
palavras, é possível, a partir de relatos de resistências, nos movermos no
sentido de ressignificar acontecimentos e experiências das biografias de
docentes e discentes – praticantespensantes do cotidiano escolar.

Afirmando a necessidade de uma sociologia mais atenta às questões do


cotidiano, Maffesoli (2008, p. 5) lembra-nos que “cada um de nós é o que é
porque conta uma história, verdadeira ou falsa”. Poder contar essa história
merece nossa atenção justamente por compreendermos que nenhum
tempoespaço de narrativa é neutro. Nesse sentido,assumimos a decisão
política de estar ao lado dos que resistem ao que se entende por hegemônico
no mundo ocidental capitalista.

Estamos de acordo com o proposto em narrativa por Delory-Momberger


(2014) quando afirma que fazer o relato de uma vivência que não é ainda
história, alivia a carga que pesa inteiramente porque inarticulada. A autora
explica que estamos dispostos a:

Tornar pública essa história e cessar de fazer de seus


próximos, testemunhas impotentes, espantadas de uma fala

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muda. Universalizar a narrativa no sentido em que nossas
histórias nos pertençam só em parte, em que elas são
originárias de mundos compartilhados e participam da
construção das realidades sociais às quais somos ligados e
que nos religam aos outros. (p. 28)

Escolhemos o desafio de lidar com as narrativas nas nossas pesquisas


pela potência que apresentam no uso de métodos de histórias de vida para a
compreensão das experiências vividas. Narrativas podem existir quando e
porque há escuta, explica-nos Kramer (2014, p. 51-52), dizendo que: 965

Graças à escuta pode haver diálogo (...), presença, encontro,


vínculo, formas de relação que caracterizam a vida em
comunidade. (...) Uma educação humana, com presença,
vínculo e escuta, requer tempo e espaço para narrativas de
crianças, jovens e adultos (alunos, pais ou profissionais). Isso
exige acolher e dar atenção aos que envelhecem com saúde,
doença, memória ou esquecimento. O reconhecimento do que
nos deram e ensinaram pode mobilizar nossos conhecimentos,
afetos e agir ético, pode nos ajudar a resistir aos contextos
mais duros e a responder de forma responsável, com dignidade
e alegria.

Leitura e escrita conformam narrativas nos/dos/com o cotidiano escolar.


Enquanto práticas escolares, relacionam-se hegemonicamente com tentativas
de estabelecimento de currículos únicos, com fórmulas aparentemente
universais de educação escolar, com respostas a sistemas globais de
avaliação, com o controle desejado pelos modelos neoliberais de gestão.
Nesse sentido, resistimos quando assumimos possibilidades de praticar leituras
e escritas que transgridam normas arbitrariamente definidas quando estas não
dão conta da complexidade inerente ao cotidiano. Oliveira (2008, p. 53-54)
afirma a esse respeito:

As práticas cotidianas, no entanto, para além de seus aspectos


organizáveis, quantificáveis e classificáveis, em função daquilo
que nelas é repetição, é esquema, é estrutura, são
desenvolvidas em circunstâncias, ocasiões, que definem
modos de usar as coisas e/ou as palavras. Os utensílios, as
formas discursivas bem como as regras gerais do estar na
sociedade são, no cotidiano, marcados pelas operações de que
foram objeto.

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Interessa-nos assim, leituras e escritas que, enquanto práticas
educativas da vida cotidiana são desenvolvidas contra-hegemonicamente.
Interessa-nos os praticantes da vida cotidiana (Certeau, 1994) que criam
modos de ler e escrever buscando resistir ao descontextualizado, ao imposto
autoritariamente, ao retrocesso na diversidade cultural peculiar aos espaços
escolares.

Na terra fértil do cotidiano, confrontamos o individualismo, o pensamento


966
unicamente prospectivo e voltamos os olhos para o que está sendo criado a
despeito dos pedidos formais do sistema escolar. Não é raro que leituras e
escritas tidas como de resistência sejam produzidas coletivamente ou para a
exposição coletiva do hoje. Para Maffesoli (2008, p.9): “No individualismo, o
que está em jogo é o futuro. Na pessoa, o que está em jogo é o instante eterno.
A conseqüência da pluralização é a multiplicação das grandes emoções
compartilhadas”. Em outra obra, diz o referido autor:

(...) a vida cotidiana é essa “centralidade subterrânea”, esse


ponto nodal, ao qual se pode não dar atenção, que se pode
esquecer ou negar, mas que nem por isso deixa de constituir o
húmus a partir do qual irá crescer toda a vida individual. [...] (a
vida cotidiana é) Rede sutil, complexa, na qual cada elemento,
objeto, assunto, situações anódinas, eventos importantes,
pensamento, ação, relações, etc., só funciona enquanto ligado
ao todo e só faz sentido dentro e pela globalidade. É isso que
se percebe, de uma maneira mais ou menos consciente, na
valorização contemporânea do cotidiano. Sente-se em
correspondência com os outros, participa-se, com os outros, de
um conjunto mais vasto. (Maffesoli, 1995, p. 65)

Assim sendo, relevamos, a partir desse entendimento de rede acima


exposto, a noção de comum para pensarmos então leituras e escritas comuns,
para o comum necessário, a nosso ver, aos processos de resistência que
vimos evocando aqui por meio de narrativas de si. Explica-nos Negri (2017, p.
227) a esse respeito:
O comum é concebido como extensão funcional da
propriedade privada ou como instituição participativa e
democrática da capacidade de apropriação pública. A nossa
proposta não é considerar o comum como um terceiro gênero
de propriedade, mas como modo de produção. (...) Ora,
parece-nos que o comum constitui um fundo ontológico, o

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produto da atividade laboral humana no processo histórico.
(significa) Que o comum é sempre uma “produção”. É natureza
regulada ou transformada ou simplesmente produzida. Logo, o
comum é um recurso somente enquanto é um produto do
trabalho humano e, portanto, no regime capitalista, atravessado
imediatamente por relações de poder. Na era do trabalho
cognitivo, o comum subsume e evidencia as qualidades do
trabalho cognitivo.

Negri explica que a luta de classe se desenvolve em torno do comum e


que quando consideramos o comum como modo de produção, descrevemos o
967
resultado da passagem da fase industrial para a fase cognitiva do trabalho
produtivo. Duas figuras do comum assim aparecem: “Uma é a do comum
submetido à extração capitalista de valor, a outra é um comum como
expressão das capacidades cognitivas e produtivas da multidão”. (p. 234)
Dessa última ressaltamos, para concluir por ora, a potencialidade nela
existente para pensarmos práticas curriculares cotidianas que tenham como
objeto, o comum e, de forma especial nesse trabalho, leituras e escritas de si
que, produzidas com vistas ao comum, dêem conta de fazer resistência ao
hegemonicamente estabelecido no nosso sistema escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Modismos, senso comum, várias são as qualificações dadas aos textos


produzidos pelo professor e que expressam o seu dia a dia. Santos (2007 p.71)
nos diz que “o pensamento moderno ocidental é um pensamento abissal” que
separa o mundo em duas porções, onde a dialética não vigora: o mundo “deste
lado da linha” e o “do outro lado da linha”.

A divisão é tal que “o outro lado da linha” desaparece como


realidade, torna-se inexistente e é mesmo produzido como
inexistente. Inexistência significa não existir sob qualquer modo
de ser relevante ou compreensível. [...] A característica
fundamental do pensamento abissal é a impossibilidade da co-
presença dos dois lados da linha. O universo “deste lado da
linha” só prevalece na medida em que esgota o campo da
realidade relevante: para além da linha há apenas inexistência,
invisibilidade e ausência não-dialética. (SANTOS, 2007, p.71)

Convivemos com o império da objetividade que coloca do outro lado da


linha a subjetividade que está presente nas leituras e escritas de si. O

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conhecimento que se produz lá, do outro lado da linha é o conhecimento da
experiência e da resistência. Experiência que se dá no fazer cotidiano nas
escolas. Num mundo cambiante, com micro revoluções constantes e com uma
diversidade de pensamentos, como se manter em um único modo de fazer e
pensar o dia a dia da escola?

Como abordar as ações que atravessam o cotidiano escolar que não


estão apresentadas nos currículos escolares tendo em vista a abissalidade do
968
pensamento ocidental no cotidiano escolar? Com resistência! De onde vem a
resistência? Vem da subversão cotidiana nos espaçostempos das escolas,
resistência que vai sendo construída no dia a dia e provocando mudanças,
“mudanças minúsculas” engendradas através dos diálogos e conversas nas
redes de conhecimento. Ouvir a voz do professor, do estudante, ler e escrever
(o que estão dizendofazendo) sobre os acontecimentos vividos,
experienciados, torna possível a mudança.

Isso indica nossa necessária vivência coletiva em todos os


contextos e nas práticas neles realizadas, não só pela
organização de grupos/ forças sociais, mas principalmente
porque os outros estão em nós encarnados, pelos diálogos
travados com textos, pelas conversas tidas com praticantes
dos cotidianos, para permitir que o virtual se atualize e se
mostre. (ALVES, 2010, p.1200)

Onde está a resistência? De acordo com Santos (2007, p 73), “O outro


lado da linha compreende uma vasta gama de experiências desperdiçadas,
tornadas invisíveis, assim como seus autores”. Para nós, o conhecimento se dá
na troca e no coletivo, nas sutilezas apreendidas dos movimentos invisíveis
que vão se mostrando nas nossas narrativas. Narrativas essas, desvalorizadas
pelas maneiras de fazer hegemônicas. Ao criarmos as nossas
maneirasdefazer, ao lermosescrevermos as nossas histórias, resistimos. A
resistência está aí.

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resistências. | De 5 a 7 de dezembro de 2018 - João Pessoa | Paraíba | Brasil | ISBN 978-85-
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ENTRE TEXTOS E CONTEXTOS – DIZERES HEGEMÔNICOS: O DISCURSO
DA SUPOSTA “NEUTRALIDADE” DA ESCOLA

Hugo Alexandre de Araújo, CE/UFPB | Walquíria dos Santos Lima, CE/UFPB |


Maria Elizete Guimarães Carvalho, UFPB

RESUMO: O presente artigo propõe uma discussão de caráter científico sobre os


elementos que fortaleceram a construção do anteprojeto de Lei Escola sem Partido
fundamentado na defesa contra os supostos abusos cometidos pelos docentes em 971
suas aulas, que violam as garantias legais democráticas previstas na Constituição
Federal (1988). Tendo em vista a gravidade dos argumentos utilizados para validar o
projeto, nosso objetivo consiste em analisar os elementos discursivos e discorrer sobre
a legitimidade de tais argumentos, promovendo, posteriormente, uma reflexão a partir
das discussões sociológicas sobre a Escola e o campo do currículo (ALTHUSSER,
1985; BOURDIEU, 1982). Tal defesa da “Escola neutra” emerge do contexto
neoliberal e da (re) significação das instituições públicas resultando nas disputas no
campo simbólico com ações sistemáticas tal como é a proposta de neutralidade
curricular escolar.

Palavras-chave: Escola Sem Partido; Neoliberalismo; Currículo; Ideologia.

1 INTRODUÇÃO: DISCURSOS, PODER E HISTORICIDADE

Organizado em 2004, o programa Escola Sem Partido (ESP) vem


suscitando intensos debates entre os pesquisadores da Educação e os sujeitos
– sociedade civil – que o vivenciam nos espaços escolares públicos. Seus
preceitos e princípios fundamentam-se na defesa contra os supostos abusos
cometidos pelos docentes em suas aulas que violam as garantias legais
previstas na Constituição Federal (1988).
Fundamentam-se, ainda, nos pressupostos teóricos e pedagógicos da
escola tradicional, em que os agentes educacionais eram considerados
neutros, legitimados como transmissores do conhecimento acumulado e de
regras, configurando-se como modelo a ser seguido.
Tal movimento conta em sua organização com um sistemático material
composto por textos informativos, cartazes, anteprojetos de leis e uma arguição

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jurídica a favor de sua constitucionalidade. Nosso objetivo consiste em
identificar quais os principais elementos utilizados em seus discursos para,
posteriormente, problematizá-los e contextualizá-los ao momento histórico
profundamente marcado pela conjuntura neoliberal.
Dois caminhos reflexivos foram percorridos para contrapor a tese do
currículo neutro nos espaços escolares: 1º) uma leitura da Escola como
instrumento de reprodução da ideologia dominante (ALTHUSSER, 1985;
BOURDIEU, 1982) e; 2º) uma análise histórica das relações entre as 972
transformações do sistema produtivo e as funções sociais e econômicas das
instituições escolares (ANTUNES, 2001; GENTILLI, 1998; RODRIGUES, 2011).

2 PROPOSTAS E DISCURSOS DO PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO

Intitulada como a lei contra o abuso da liberdade de ensinar, seu


programa prevê o combate a “doutrinação” política e ideológica que ofende a
consciência autônoma do estudante e destoa com a “neutralidade” do Estado,
isto é, fere a própria democracia. Assim, dizem seus defensores: “a pretexto de
“construir uma sociedade mais justa” ou de “combater o preconceito”,
professores de todos os níveis vêm utilizando o tempo precioso de suas aulas
para “fazer a cabeça” dos alunos sobre questões de natureza político-
partidária, ideológica e moral”. 103 (grifo nosso)
É a partir de tal colocação que o anteprojeto de lei propõe ações de
censura e controle punitivo aos docentes que, em sua visão, ultrapassam os
limites democráticos constitucionalmente impostos. Entre suas proposições
está a fixação nas salas de aula de um cartaz contendo os deveres dos
professores para que os alunos possam exercer sua “cidadania” exigindo seus
direitos. De forma sucinta, o instrumento exige do professor a neutralidade em
relação as opiniões, concepções ou preferências, a não incitação a
participação política, a transmissão de conteúdos de “forma justa” e a garantia
dos direitos dos pais na educação moral dos filhos.

103
Todos os trechos referentes aos argumentos dos representantes da Escola Sem Partido
foram retirados do site: https://www.programaescolasempartido.org/ (acessado em 21/10/2018)

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Segundo o programa, seus fundamentos constitucionais e legais são: a
dignidade humana; a neutralidade política e religiosa do Estado; o pluralismo
de ideias e de concepções pedagógicas; a liberdade de aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; a liberdade de
consciência e de crença; a proteção integral da criança e dos adolescentes;
direito do estudante de ser informado sobre os próprios direitos, visando o
exercício da cidadania e; com muita ênfase, o direito dos pais sobre a
educação moral e sexual dos filhos. 973
O que nos chama atenção são os argumentos jurídicos, ou melhor sua
apropriação semântica, ao nosso ver distorcida, do aparelho legal –
Constituição Federal (1988), Leis de Diretrizes e Bases da Educação (1996),
Estatuto da Criança e Adolescente e a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos. No parecer do representante da OAB, Miguel Nagib (2008), a
constitucionalidade do projeto advém do dever da família, do Estado e da
sociedade a proteção integral das crianças e adolescentes (CF, art. 227 de
1988) e da garantia da inviolabilidade de consciência e crença (CF, art. 5 de
1988).
Nas questões morais – de cunho religioso e sexual – este modelo de
Escola neutra respeitaria os acordos internacionais da Convenção Americana
sobre Direitos Humanos ao prever a liberdade de consciência religiosa (CADH,
art. 12, 4) e a própria Carta Magna federal ao tornar “inviolável a intimidade, a
vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (BRASIL,
CF. art. 5, 1988). Disto decorre a interpretação do não cabimento ao Poder
público de “antecipar etapas, estabelecer padrões de comportamento,
naturalizar ou estigmatizar atitudes no campo da sexualidade” (NAGIB, 2018, p.
7)
Os mecanismos de controle, vigia e punição dos professores
transgressores, é uma marca característica do anteprojeto. Seja na
identificação do “trabalho de inculcação e cooptação [que] se desenvolve entre
quatro paredes e portas fechadas, o que inviabiliza qualquer controle

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hierárquico efetivo, ou no uso do termo “obedientes professores””. (NAGIB,
2018, p. 2) (grifo nosso)
O ataque aos profissionais da educação continua na apropriação do
argumento de autoridade utilizada em um dos materiais divulgados no portal
virtual remetendo aos dizeres de Max Weber:

Em uma sala de aula, a palavra é do professor, e os estudantes


ao silêncio. Impõem as circunstâncias que os alunos sejam 974
obrigados a seguir os cursos de um professor, tendo em vista a
futura carreira; e que ninguém dos presentes a sua sala de aula
possa criticar o mestre. É imperdoável a um professor valer-se
dessa situação para buscar incutir em seus discípulos as
suas próprias concepções políticas, em vez de lhes ser útil,
como é seu dever, através da transmissão de
conhecimentos e de experiência científica. (grifo nosso)

A breve exposição dos discursos vinculados ao ESP mobiliza-nos a


problematizar, a partir das discussões sociológicas sobre a Escola e o campo
do currículo, dois pontos: 1º) a possibilidade de ausência de ideologia nas
instituições escolares; 2º) a existência, ou não, de conhecimentos neutros e
como ensiná-los de “forma justa”.
Contra a tese da neutralidade curricular escolar, nossos argumentos
coadunam com os escritos dos críticos-produtivistas Althusser (1985) e
Bourdieu (1982) evidenciando o aspecto inerente a Escola enquanto meio de
reprodução da cultura dominante (ideologia).

2.1 A INSTITUIÇÃO ESCOLAR E OS MECANISMOS DE REPRODUÇÃO

A emergência da Escola pública gratuita sob a tutela dos Estados


nacionais ao longo do século XIX elevou as questões pedagógicas a uma
pauta importante nas agendas políticas. As funções e os impactos das
instituições educacionais sobre os indivíduos foram objetos de estudos em
diferentes campos do saber – sociológico, histórico, antropológico, entre outros.
A interseção entre as políticas educacionais e as diretrizes político-econômicas

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evidenciam as disputas e conflitos em torno do controle dos currículos
escolares.
Numa perspectiva curricular dita “tradicional”, a Educação escolar
contribui para a manutenção da Sociedade ao construir vínculos entre os
sujeitos capazes de consolidar a imprescindível coesão social.
Reservadas aos domínios privados e domésticos, Durkheim atribui papel
secundário as instituições educacionais estatais. Segundo o sociólogo,
975
A educação é então concebida como uma coisa essencialmente
privada e doméstica. Quando adotamos este ponto de vista,
tendemos de forma natural a reduzir a intervenção do Estado ao
mínimo possível. Ele deveria, dizemos, limitar-se a servir como
auxiliar e substituto das famílias. (DURKHEIM, 2011, p. 62)

É nesta perspectiva que Émile Durkheim ressalta a importância do


Estado em garantir, ao lado da família, os mecanismos de socialização que
transforma o ser egoísta individual em ser social. Quanto aos limites da ação
educativa do Estado e das escolas, assim diz o autor:

De fato, não cabe ao Estado criar esta comunhão de ideias e


sentimentos sem a qual não existe sociedade; ela deve se
constituir por si só, e a única coisa que ele pode fazer é
consagrá-la, mantê-la e torná-la mais conscientes para as
pessoas [...] A escola não deve ser coisa de um partido, e o
professor faltará ao seu dever se usar a autoridade da qual
dispõe para embarcar os seus alunos a bordo de suas parciais
visões pessoais, por mais bem fundadas que elas lhe possam
parecer (DURKHEIM, 2011, p. 64)

No excerto acima, podemos identificar claramente os usos pelo projeto


ESP do arcabouço teórico da sociologia clássica como argumento de
autoridade. Entretanto, esta abordagem não dá conta de explicar toda a
complexidade do fenômeno educativo. Primeiro, porque não visibiliza as
contradições e relações sociais desiguais, bem como, não evidencia os
conflitos/disputas entre os grupos no campo cultural. O resultado, portanto, é a
naturalização da cultura – normas sociais – com sua pretensa universalidade.
Tais aspectos são problematizados pela teoria crítico-reprodutivista de
Althusser (1985) e Bourdieu (1982) ao pensarem a Escola enquanto instituição

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social que reproduz no campo ideológico as relações de produção
material. Desta forma, o ponto de partida é conceber a cultura enquanto
construção sócio-histórica atrelada às estratégias de dominação de um
segmento social sobre o outro.
Na tese de Louis Althusser, para a reprodução dos meios de produção e
das relações de trabalho (infraestrutura) faz-se necessário reproduzir ao nível
da superestrutura a ideologia da classe dominante. Tal acepção concebe o
Estado enquanto aparelho repressivo que garante a exploração da classe 976
dominada e resguarda a mais-valia aos dominantes.
Neste viés, as contribuições do pensador às teorias de Karl Marx
residem na compreensão doutros mecanismos de controle: os chamados
Aparelhos Ideológicos do Estado (religião, Escola, família, entre outros). Tais
instrumentos “funcionam principalmente através da ideologia, e
secundariamente através da repressão seja ela bastante atenuada,
dissimulada ou mesmo simbólica”. (ALTHUSSER, 1985, p. 70)
A função elementar dos AIE’s é impor o sistema simbólico de
significações e sentidos dos dominantes capaz de naturalizar e,
consequentemente, invisibilizar a exploração. Althusser destaca a ação
silenciosa da Escola neste processo ao

[...] se encarregar das crianças de todas as classes sociais


desde o Maternal, e desde o Maternal ela lhes inculca, durante
anos, precisamente durante aqueles em que a criança é mais
“vulnerável”, espremida entre o aparelho de Estado familiar e o
aparelho de Estado escolar, os saberes contidos na ideologia
dominante (o francês, o cálculo, a história natural, as ciências, a
literatura), ou simplesmente a ideologia dominante em estado
puro (moral, educação cívica, filosófica). (ALTHUSSER, 1985, p.
79)

Cabe-nos, contra o conhecimento neutro proposto pela ESP, uma nítida


exposição do caráter político dos saberes escolares e das intencionalidades
dos sujeitos envolvidos, nas palavras de autor (ALTHUSSER, 1985, p. 80).

É pela aprendizagem de alguns saberes contidos na inculcação


maciça da ideologia da classe dominante que, em grande
parte, são reproduzidas as relações de produção de uma
formação capitalista, ou seja, as relações entre exploradores e

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explorados, e entre exploradores a exploradores. Os
mecanismos que produzem esse resultado vital para o regime
capitalista são naturalmente encobertos e dissimulados por
uma ideologia da Escola universalmente aceita, que é uma
das formas essenciais da ideologia burguesa dominante: uma
ideologia que representa a Escola como neutra, desprovida
de ideologia (uma vez que é leiga), onde os professores,
respeitosos da “consciência” e da “liberdade” das
crianças que lhe são confiadas (com toda confiança) pelos
“pais” (que por sua vez são livres, isto é, proprietários de seus
filhos), conduzem-nas à liberdade, à moralidade, à
responsabilidade adulta pelo seu exemplo, conhecimento,
977
literatura e virtudes “libertárias”. (grifos nosso)

Logo, uma Escola sem ideologia, ou dita como neutra, mascara sua
própria ideologia. Este processo de dissimulação pode ser melhor
compreendido à luz das colocações de Pierre Bourdieu (1982).
Também considerado crítico-reprodutivista, o sociólogo analisa os
mecanismos de reprodução da ideologia dominante através da violência
simbólica ao impor como legítimas um conjunto de significações capazes de
dissimular as relações de força que estão em sua base. Este processo de
imposição é produzido por uma ação pedagógica (AP) mediante um arbitrário
cultural.
A cultura, desta maneira, é um elemento arbitrário, pois resulta da
seleção de significações próprias de um grupo ou classe que passa a impô-la.
A condição para o exercício de toda e qualquer ação pedagógica está no
ocultamento de sua verdadeira função: reproduzir a ideologia dominante. Desta
forma,
A ideia de uma ação pedagógica “culturalmente livre”, que
escaparia ao arbitrário tanto naquilo que ela impusesse como
na maneira de impô-la, supõe um desconhecimento da verdade
objetiva da ação pedagógica, em que se exprime a verdade
objetiva de uma violência cuja especificidade reside naquilo
que ela consegue fazer esquecer como tal (BOURDIEU, 1982,
p. 30)
Assim, enquanto espaço de ação e autoridade pedagógica, um dos
aspectos elementares da Escola é sua ação de dissimulação e naturalização
da ideologia dominante. Logo, a tese da ESP, a partir dos contrapontos
explorados por Althusser e Bourdieu, é incoerente. Visto que, é impossível

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destituir das instituições escolares seus traços ideológicos. Fica mais que claro,
a ideologia de grupos neoconservadores em manter, sob suposta neutralidade,
seus modos de compreender, explicar e significar a realidade. Mas, de onde
vem esse discurso? A contextualização histórica sobre as mudanças nas
estruturas do capital é um caminho para compreendermos a emergência do
anteprojeto.

978
3 PRECARIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO: A RESSIGNIFICAÇÃO DO
CURRÍCULO ESCOLAR

As mudanças nas concepções curriculares escolares estão diretamente


relacionadas às transformações nas estruturas econômicas e políticas do
capitalismo após os tumultuados anos 1970. O historiador Pablo Gentili (1998)
ao estudar os processos de reconstrução e crescimento econômico europeu no
pós-guerra (1945), categorizou dois momentos distintos: um de acelerado
desenvolvimento e expansão, outro de retração e “crise do capital”.
Nas primeiras décadas posteriores à Segunda Guerra Mundial, a
expansão econômica (aumento no acúmulo de riquezas) foi acompanhada de
notáveis avanços científicos e tecnológicos mobilizando, em decorrência, o
sentimento de “confiança” e de “progresso”. Segundo Gentili (1998, p. 82)

Depois das sombrias fases de involução econômica como


produto das experiências bélicas, e dos efeitos, em algumas
regiões arrasadores, da grande depressão de 1929-1933, a
prosperidade material pareceu atingir um nível quase milagroso
e uma extensão aparentemente ilimitada. O PIB mundial
chegou a crescer a uma média anual de 4,9% no contexto de
uma não menos impressionante expansão do comércio
internacional marcada por uma surpreendente variação no
volume de exportações de mercadorias que atingiu um
crescimento médio anual de 7%.

Este período é marcado pela presença do Estado como fomentador do


bem-estar social, onde as estruturas governamentais garantiam a aliança entre
burocratas, empresários e sindicatos – o pleno emprego através de uma
extraordinária estabilidade. Cabe salientar, a existência do “fantasma” do
socialismo, demandando, em decorrência, ações significativas de assistência

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pública estatal, exigindo, em decorrência disto, um modelo de Estado atuante
no planejamento, na administração e na modernização da economia.
Nesta conjuntura, o sistema de ensino público assume a missão de
integrar os projetos nacionais desenvolvimentistas. Por um lado, há uma
notória expansão das instituições escolares, por outro um ingresso massivo
das populações anteriormente excluídas.
Entretanto, o aumento produtivo e a “falsa” ideia de enriquecimento da
população mostrou indícios de suas rachaduras. A concentração desigual de 979
renda provocou impactos socialmente devastadores e, logo, as expectativas e
valores esperançosos no progresso, desmoronaram.
Tal contexto resultou a passagem do Estado protetor e provedor de
política públicas, mediante dos direitos sociais e individuais, ao Estado mínimo
e da flexibilização da legislação trabalhista. A precarização da força humana de
trabalho foi um indício da posterior “onda” neoconservadora.
Por este viés, problematizando a precarização do trabalho numa ordem
neoliberal, Ricardo Antunes (2001) caracteriza a década de 1970 como um
período de “crise do capital”, cujas raízes estão no processo destrutivo dos
países centrais do capitalismo que assistiram uma crescente desmontagem de
parques industriais e a consequente “onda” de desemprego. Os modelos de
produção taylorista/fordista abrem espaço para o toyotismo elevando,
inevitavelmente, a competitividade intercapitalista. Disto, regiões inteiras são
pouco a pouco eliminadas do cenário econômico mundial.
No que diz respeito aos modelos de produção, podemos sintetizar as
características do toyotismo nos seguintes aspectos: sua vinculação da
produção à demanda, a heterogeneidade produtiva, o trabalho operário
coletivo, o princípio just in time – o melhor aproveitamento possível do tempo
de produção -, o processo produtivo horizontal e na crescente terceirização da
fábrica.
Os principais traços das mutações no setor produtivo foram a
desregulamentação, a flexibilização e a terceirização cujos resultados
culminam na destruição e/ou na precarização da força humana do trabalho.

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A (des) regulação neoliberal – privatizante e antissocial – se sobrepõe
ao antigo modelo de regulação social democrático que dava sustentação ao
chamado estado de bem-estar social. Propõe-se, em contrapartida, o Estado
mínimo e o mercado livre de sua intervenção – princípios estes formadores do
neoliberalismo.
A “ditadura” do capital, desta forma, desprovido de orientação
humanamente significativa potencializa-se como força destrutiva das relações
humanas e da natureza. Tudo é medido pelo seu valor de troca. Assim 980

[...] destrói-se força humana que trabalha, destroçam-se os


direitos sociais; brutalizam-se enormes contingentes de
homens e mulheres que vivem do trabalho; torna-se predatória
a relação produção/natureza, criando-se uma monumental
“sociedade do descartável”, que joga fora tudo que serviu como
“embalagem” para as mercadorias e o seu sistema, mantendo-
se, entretanto, o circuito produtivo. (ANTUNES 2001, p. 38)

Inter-relacionadas a tais mudanças, estão as intensas mutações nos


próprios movimentos trabalhistas e dos sindicatos. A década de 1970 afetou
tanto a materialidade da classe trabalhadora quanto o seu ideário (campo
simbólico). Alguns elementos são indicados por Antunes (2001): a) o
desmoronamento do Leste europeu e a tese do fim do socialismo atingiu o
campo ideológico da classe trabalhadora; b) o desmoronamento da esquerda
tradicional aproximou-a do ideário social-democrático, ou seja, integrou-a na
burocratização e institucionalização; c) a expansão do neoliberalismo impôs
uma reestruturação produtiva, privatizações aceleradas, enxugamento do
Estado, políticas fiscais e monetárias sintonizadas com os organismos
hegemônicos mundiais do capital.
Nesta nova engenharia produtiva aprofunda-se a subordinação do
trabalho ao capital, surgindo, então, uma nova empresa enxuta e um novo
trabalhador, agora, como subproletariado fabril ou serviços. Para o
pesquisador, inclusive, a própria classe trabalhadora se divide entre alguns
setores do trabalho intelectual e alguns setores desqualificados e precarizados.
A cisão entre os trabalhadores acarreta na formação da nova classe média

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urbana atuante ideologicamente na sustentação do neoliberalismo e no ataque
a tudo que é público - tal como a Escola.
De igual forma pensa Alberto Tosi Rodrigues (2011) sobre a “nova” crise
do capitalismo mundial representada pelos eventos do petróleo (1973 e 1979)
que elevou imensamente os preços dos barris, provocando, por conseguinte,
uma onda inflacionária nos países desenvolvidos. Segundo o autor (p. 90),

Com a crise energética, com a onda inflacionária e alguns 981


outros problemas que não cabe aqui detalhar, houve
significativa queda de arrecadação de impostos nesses países
e o Estado passou a ter dificuldades financeiras para arcar com
os compromissos sociais assumidos nas décadas anteriores.
De que modo fornecer educação, saúde e outras políticas de
bem-estar aos cidadãos sem os correspondentes recursos
financeiros que havia na época da prosperidade? Era a
chamada “crise fiscal do Estado”.

Retomemos as questões educacionais. Quais serão, então, os impactos


desta conjuntura econômica nos currículos escolares? É deste contexto
histórico que emerge o discurso de ataque a tudo que é público - funcionários e
instituições - e de fracasso do sistema escolar. Faz-se, então, necessário rever
as funções social e econômica da Escola, estreitando, a vista disso, seus
vínculos com as demandas do mercado privatizante.
As tendências neoliberal e neoconservadora passam a impor sua
ideologia, sendo esta, travestida de neutralidade e de necessidade. Na
primeira, os conceitos de tradição e moralismo subsidiam a investida contra
uma Escola desvirtuada (partidária) e exigem um retorno a um tempo curricular
idílico (sem doutrinação). Na outra, a improdutividade das instituições é
responsável pela má formação dos cidadãos aptos ao mercado de trabalho,
exigindo, em contrapartida, um ensino com percursos profissionalizantes
tecnicistas.
É a partir destes discursos que situamos a emergência do anteprojeto
Escola Sem Partido. Foi do interstício dos anos 1970, caracterizado por uma
profunda transformação nas estruturas econômicas, que ocorreram as batalhas
pela hegemonia das instituições sociais de controle e manutenção. À guisa da

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perpetuação dos privilégios, os grupos dominantes empreendem ações
sistemáticas tal como é a proposta de neutralidade curricular escolar.
Nesse contexto, ocorre um aprofundamento dos pressupostos da
pedagogia tradicional, que se transfiguram, apresentando-se com outra “face” e
mecanismos de disciplinamento, abrindo espaço para o processo de
ressignificando do currículo e do espaço escolar.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 982

Diante do exposto, consideramos que o espaço escolar não é neutro.


Sendo o currículo uma construção de caráter ideológico, a partir da separação
de determinados conteúdos para atingir os objetivos de quem detém o poder, o
qual não está desvinculado da ideologia.
Ora, se o espaço escolar é plural, como falar em neutralidade se os
participantes desse espaço são diferentes, sendo a diversidade que dinamiza
as relações sociais que ali se processam? Freire (2005) ensina, em sua
Pedagogia da Autonomia, sobre a autonomia do professor, sobre sua
capacidade de mobilizar saberes e não de transferi-los. Em sua compreensão,
ensinar exige: “respeito aos saberes do educando, criticidade, estética e ética,
corporeificação das palavras pelo exemplo, risco, aceitação do novo e rejeição
de qualquer forma de discriminação, assim como, reflexão crítica”. (OLIVEIRA,
M. O. M.; DANTAS, T. R.; SILVA, A. P. C., 2016, p. 208). Nesse contexto de
ensinar e de apreender, não existe espaço para o estereótipo da figura do
professor que detém o conhecimento e se posiciona como único informante.
Compreende-se, então, que o currículo precisa ser percebido em uma visão
mais ampla. (OLIVEIRA, M. O. M.; DANTAS, T. R.; SILVA, A. P. C., 2016, p.
213), e que contribui para a produção de subjetividades.
Na verdade, os argumentos para implantação da ESP advêm da
necessidade de colocar o posicionamento ideológico de determinado grupo,
com objetivos bem traçados para reprodução da ideologia dominante e
manutenção do poder.
Em contradição a tais argumentos e considerando o currículo como um
espaço de disputas, para sua realização, a escola precisa configurar-se como

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democrática, mobilizar saberes, refletindo sobre o ato de conhecer, sobre o ato
de produzir conhecimento e sobre o sujeito que o produz. A escola não pode
ressentir-se dessa multifuncionalidade.

REFERÊNCIAS

ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológico de Estado: nota sobre os


aparelhos ideológicos de Estado (AIE). Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985.
983
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FRIGOTTO, G. (Orgs.). A cidadania negada: políticas de exclusão na
educação e no trabalho. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001, p. 37-50.
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Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998.
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de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora, 1982.
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perspectivas de final de século. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 76-99
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Municipal e Estadual do Movimento Escola Sem Partido. Disponível em: <
https://www.programaescolasempartido.org/parecer>. Acesso: 05/11/18.
OLIVEIRA, M. O. de M.; DANTAS, T. R.; SILVA, A, P. Educação de jovens e
adultos, currículo e direitos humanos: diálogos necessários. In: SILVA, A. M.
M.; COSTA, G. S.; LIMA, I. M. S. O. (Orgs.). Diálogos sobre educação em
direitos humanos e a formação de jovens e adultos. Salvador: EDUFBA,
2016. p. 202-223.

RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. Rio de Janeiro:


Lamparina, 2011. p. 93-130.

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POLÍTICAS EM REDE E AS DIFUSÕES DE REFORMAS CURRICULARES
NO BRASIL: UMA ANÁLISE TOPOLÓGICA

William de Goes Ribeiro, UFF

RESUMO: A atual difusão de reformas educacionais no Brasil, com a centralidade na


questão curricular, tem gerado inúmeros encontros, seminários, publicidade, materiais
de divulgação, dentre outras tecnologias e artefatos, bem como deslocamentos 984
produzidos com “o apoio” de empresas, fundações e organizações. O objetivo é
analisar a contribuição de Stephen Ball para este contexto de produção curricular. Este
texto propõem uma metodologia de análise de políticas que atenda aos fluxos culturais
e discursivos. Toma a ideia de etnografia de rede como um instrumento mais
topológico para pensar a política. O argumento é que as políticas em curso operam em
espaços-tempos não totalmente apreensíveis, demandando atenção à questão do
contexto. Faz-se pertinente entender como as tecnologias se renovam em uma
configuração em que nos encontramos bem fragilizados por políticas que tiram
proveito dos medos e desejos do público, incentivam a promoção de valores
duvidosos, buscam a sujeição em um formato padronizador para “o bom trabalhador”.
.Palavras-chave: políticas em rede. Etnografia de rede. Políticas curriculares.
Topologia. Currículo.

INTRODUÇÃO

A atual difusão de reformas educacionais no Brasil, com a centralidade


na questão curricular, tem gerado inúmeros encontros, seminários, publicidade,
materiais de divulgação, instrumentos para “implementação” da política, dentre
outras tecnologias e artefatos, bem como deslocamentos produzidos com “o
apoio” de empresas, fundações e organizações. Conforme ressaltam a
Fundação Lemann e o Movimento pela Base Nacional Comum (doravante,
MBNC), o objetivo é garantir a qualidade da política, o que compreende a
implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Nesse contexto,
tanto a maneira de interpretar “a situação educacional” do país, com os
problemas e soluções e/ ou a busca delas para resoluções, articulam o que
poderíamos chamar de uma rede política público-privada (MACEDO, 2014), a
qual tem difundido a defesa de uma unidade essencial para o currículo como
um caminho inexorável e promissor, tudo em nome da necessária

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transformação. A ideia é seguir os rastros de almejados padrões internacionais
de desempenho e de expectativas de aprendizagem, segundo modelos
privados de gestão, já que, nessa perspectiva, o nosso grande entrave gerador
de desigualdades é o modelo curricular atual104.

Segundo a pesquisadora Paula Louzano, o atual modelo curricular é o


grande problema a ser superado, o que vem gerando graves desigualdades.
Para ela, nos falta clareza e objetividade para se definir o que deve ser
985
aprendido e ensinado nas escolas. Quer dizer, a BNCC contribui para suprir a
lacuna, nos colocando de acordo com proposições curriculares internacionais
supostamente bem-sucedidas. Tal reorganização do currículo, portanto,
segundo esta abordagem, garantirá o que todos terão direito de aprender. “Se
a Base é a mesma, as oportunidades também serão”, anuncia uma recente
propaganda do governo Michel Temer, cotidianamente difundida nas principais
vias de comunicação. Sendo assim, celebra o grupo MBNC, organização não
governamental do qual o Instituto acima mencionado e a referida pesquisadora
fazem parte: “O Brasil tem Base! começa a valer a política que determina o que
todos os alunos têm o direito de aprender” 105.

Todavia, a centralização curricular e um conjunto de medidas políticas


de reforma não é nada consensual entre pesquisadores do campo, tampouco
apresenta elementos evidentes para serem definidos como necessários. Há
muitos debates na literatura acadêmica em diversos países que tem apontado
e discutido vários problemas, o que não tem sido explicitado (ANPEd, 2015),
alguns bem antigos no Brasil, como menciona Alves (2014). Macedo (2014)
destaca que, seguindo a linha de tempo do próprio MEC, não se trata de uma
discussão nova, remonta à constituição de 1988. No entanto, pelo menos duas
questões dissonantes têm ficado de fora: o movimento contrário à centralização
orquestrado pelos profissionais de educação; a decisão do Conselho Nacional
de Educação em defesa de diretrizes gerais em vez de uma normatização
central para todas as escolas (o que aponta que outras interpretações para a

104
Ver: https://veja.abril.com.br/educacao/jogamos-o-nivel-la-
embaixo/https://veja.abril.com.br/educacao/jogamos-o-nivel-la-embaixo/. Acesso em:
18/10/2018..
105
Ver: http://movimentopelabase.org.br/.

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legislação podem ser feitas). Avolumadas pesquisas, com distintos referenciais
teórico-metodológicos, tem trazido a questão à baila, desconstruindo e/ ou
debatendo o que tem sido anunciado como trivial ou dado (ROCHA e
PEREIRA, 2016).

Por limite do texto, não retomarei o debate para explicitar cada um dos
elementos, o que até seria pertinente. Mas aponto que, em seu conjunto, estes
trabalhos ressaltam os jogos de poder e de linguagem que são ocultados em
986
defesa de uma política globalizada. Levando tais elementos em questão, este
estudo pretende analisar uma rede política que vem sendo articulada em nome
de um projeto centralizador para o país. A partir de um think tought (espécie de
líder pensante) como Paulo Lemann e a sua fundação, pretendo mapear esta
rede, em concordância com um grupo de pesquisadores que buscam analisar
as políticas fora dos ditames estado-nação e de lei gerais que acabam
contraditoriamente obscurecendo a compreensão do neoliberalismo (COLLIER,
2011). Esta é uma tentativa de aproximação teórico-metodológica ao que foi
proposto por Ball (2014) como “etnografia de rede”. Em alguma medida
próxima dele, também inspirado em Foucault, esta análise se desloca para a
ideia da topologia, mais distante de algum volume de pesquisas que tem
trabalhado com a governamentalidade de maneira mais determinista. Ao
trabalhar com uma abordagem discursiva em um registro próximo de reflexões
do “último Foucault”, alguns elementos deste referencial também são
desconstruídos ao longo do estudo.

Este texto está organizado da seguinte forma: em um primeiro momento,


destaca o contexto de difusão das reformas educacionais com base na defesa
da centralização curricular; a seguir propõe uma metodologia de análise de
cunho mais topológica para pensar as políticas curriculares; a seguir tece
algumas considerações, compreendendo que o trabalho está em curso inicial
de exploração do projeto de pesquisa, o qual busca estudar e compreender o
que políticas em rede mobilizam ou vem pondo em prática a partir da ideia de
uma BNCC.

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DIFUSÃO DAS REFORMAS EDUCACIONAIS E A CENTRALIDADE DO
CURRÍCULO

O cenário das políticas educacionais no Brasil tem articulado nos últimos


anos uma defesa em torno da centralização curricular como um caminho
inexorável (MACEDO, 2014; RIBEIRO e CRAVEIRO, 2017). Além das
menções recorrentes à legislação, com uma interpretação questionável,
conforme discute Alves (2014), uma das principais justificativas é que falta
987
clareza e objetividade às escolas brasileiras em torno do que se deve ensinar e
aprender.

Como vimos antes, este é um dos destaques em uma recente entrevista


concedida por Paula Louzano à Associação Nova Escola, associação esta
apoiada pela mantenedora Fundação Lemann. Na referida entrevista, o atual
modelo curricular brasileiro é duramente criticado e acusado de ser o cerne
gerador das desigualdades educacionais106 (cabe lembrar que a pesquisadora
e a mencionada fundação são, ambos, integrantes do MBNC 107).

Considerando o grupo um elemento relevante na política em curso,


destaco algumas questões. Para justificar a reforma curricular, eles elaboram e
se amparam no seguinte argumento, não muito distante do que vem noticiando
o governo Temer nas propagandas em grande rede de circulação: estudantes
de escolas públicas e privadas estarão submetidos ao mesmo instrumento
balizador, o que contribuirá para reduzir as desigualdades educacionais. O
discurso mobiliza uma série de tecnologias, valores e uma cultura voltada para
a excelência, para a meritocracia e para a competitividade (com equidade!).

Tal discurso se articula recontextualizando o que entendemos como uma


educação global (BALL, 2014), cujos princípios centralizadores e suas
tecnologias de mensuração de desempenho (MILLER, 2014) são

106
Ver: https://gestaoescolar.org.br/conteudo/79/paula-louzano-fala-sobre-modelos-
curriculares-no-brasil-e-no-mundo.
107
Um grupo de apoiadores que inclui especialistas (profissionais da educação) que desde
2013 espera facilitar a adoção da BNCC, defendendo que se trata de um passo crucial para
promover a equidade no sistema educacional brasileiro. A instituição conta hoje com mais de
60 integrantes, apoiando e disseminando pesquisas e insumos técnicos que visam, segundo
eles, qualificar o debate. Para mais informações, ver: http://movimentopelabase.org.br/.

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questionáveis, uma vez que têm gerado efeitos prejudiciais em nome da
normatização. É claro que, em tal perspectiva, uma educação de qualidade
passa, indubitavelmente, pela produção de uma Base Nacional Comum
Curricular (BNCC), o que, aliás, estava sendo buscado pela Fundação Lemann
desde 2012108, conforme informações no endereço eletrônico. Em muitos
países a questão é levantada (ANPEd, 2015), contrariando a concepção
supostamente necessária, bem como a aposta na garantia de direitos de
aprendizagem e de qualidade para todos. 988

O campo do currículo tem destacado que o debate em torno da


centralização curricular não é novidade no Brasil (ALVES, 2014; MACEDO,
2014; RIBEIRO e CRAVEIRO, 2017), mas ganha desdobramentos atualmente
com o novo Plano Nacional de Educação (PNE) (BRASIL, 2014).
Recentemente, o documento intitulado BNCC, não entendida como uma
essência, mas um nome relevante nesta política centralizadora de Estado
(CUNHA e LOPES, 2017), foi homologado pelo governo Michel Temer,
anunciando a centralidade da política em competências e habilidades. A
novidade nesta homologação é que ela está “sob nova direção”, isto é, vem se
dando em meio a um conturbado contexto político (após o golpe que gerou o
impeachment da até então presidenta Dilma Rousset) no qual articulações
políticas se reorganizam pela disputa curricular (FREITAS, 2016).

Em diálogo com autores de diferentes países, temos questionado de


distintas maneiras esta aposta e desconstruído seus pressupostos, por
exemplo: garantias de direitos de aprendizagem; a abordagem de
competências e habilidades pré-estabelecidas; a falsa dicotomia
“conhecimentos para fazer algo” e “conhecimentos em si”; a ideia da suposição
do comum; a perspectiva do nacional como homogêneo; a própria ideia de
Base como lista de elementos a serem seguidos (CUNHA e LOPES, 2017;
MACEDO, 2014, 2015, 2016b, 2017; RIBEIRO e AZEVEDO-LOPES, 2017).
Dentre as questões em jogo, questiona-se um discurso que exclui o
imponderável e o imprevisível da relação educacional, subsumindo educação a

108
Ver: https://fundacaolemann.org.br.

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ensino e pondo, por intermédio de novas e antigas estratégias, a diferença para
a margem.

Na Universidade XXXX, unidade XXXX, temos discutido a questão por


intermédio de três distintos grupos de pesquisa, mas articulados por parcerias
(XXXXXX; XXXXXXXX; XXXXXXXX). O resultado desses estudos tem gerado
publicações em revistas especializadas (OCULTO) e participações em eventos
relevantes na área, como o último encontro do GT de Currículo da ANPEd
989
(OCULTO), o XII Colóquio Internacional Sobre Questões Curriculares, o VI
Seminário Vozes da Educação 20 anos (OCULTO) e o IX Seminário
Internacional as Redes Educativas e as Tecnologias. Temos mantido um
diálogo com autores como Ball, Laclau, Foucault, Derrida, principalmente, bem
como pesquisadores em currículo (Lopes e Macedo, dentre outros), o que tem
contribuído para pensar o currículo de uma maneira ampla, entendido como
prática de significação e discursiva, efeito iterativo e performativo de relações
de poder.

Nesse contexto, Ball (2014) tem buscado responder à dimensão de uma


educação global, operando de uma maneira outra em relação às tradicionais
abordagens estadocêntricas para pensar as políticas educacionais. Ele
desenvolve atualmente pesquisas em que o referencial teórico-metodológico
busca atender à fluidez em que a política se dá, como atuação, tanto em redes
políticas, globais e locais, quanto nas escolas (BALL, MAGUIRE e BRAUN,
2016), indo além do reconhecido “ciclo de políticas”. O referido autor trabalha
com a ideia de que as políticas globais atuam de uma maneira dinâmica, o que
implica a revisão dos instrumentos de análise. O sociólogo alerta a respeito das
lacunas no campo das políticas educacionais e enfatiza que a política atua em
múltiplos contextos; tanto precisa dos congressos, seminários, encontros,
eventos, quanto da rede social, utilizando-se de espaços virtuais diversos,
como Blogs, páginas do Facebook, Twiter, dentre outros para se constituir uma
heterogênea comunidade política. Apostando na potência desta perspectiva,
procuro através do que o citado sociólogo chama de etnografia de rede,
mapear alguns elementos importantes da atual reforma, como: atores-chave
em destaque, articulações público-privadas, abordagens educacionais etc.

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A METODOLOGIA PROPOSTA E O DESLOCAMENTO TOPOLÓGICO

Stephen Ball tem se tornado uma referência para a discussão no campo


da Sociologia da Educação, cujas contribuições vêm se dando no âmbito do
que denomina de sociologia das políticas, quer dizer: a apropriação de teorias
e métodos sociológicos para analisar processos políticos e seus efeitos
990
(LOPES e MACEDO, 2011b). Conforme ressaltam as autoras, suas
publicações são de grande interesse para o campo do currículo. A abordagem
do ciclo de políticas (BALL, 1994; OLIVEIRA e LOPES, 2011; MAINARDES,
2006), por exemplo, tem sido reconhecida na pesquisa curricular, possibilitando
analisar o fluxo da política através de seus múltiplos contextos (de influência,
de produção de documentos e da prática, por exemplo). Tal trabalho permite
operar com os textos políticos como efeitos de um processo de atuação e
transformação (CRAVEIRO, 2014), uma vez que significa considerar a
hibridização e a recontextualização na política, resultado de múltiplas disputas
e circulação de ideias. Nessa perspectiva, políticas são ao mesmo tempo texto
e discurso, uma vez que elas procuram representar as demandas sociais e
essas representações atuam como produção discursiva, dando sentido (s) aos
textos oficiais. No entanto, o que nos interessa na ocasião são outras
contribuições, mais recentes, a partir das quais buscaremos um diálogo com o
autor para compor a metodologia e as formas de análise dos resultados.

Ao mesmo tempo em que as contribuições de Stephen Ball para pensar


a política curricular são reconhecidas (BALL e MAINARDES, 2011; MACEDO,
2016a), vem sendo feitas ponderações e críticas que apontam problemas,
como, por exemplo, a centralidade que o contexto de influência assume ao ser
tomado como “o início da política”. Lopes e Macedo (2011b) destacam ainda
que não há elementos suficientes para se compreender a hibridização na
teoria. Para além do ciclo, o sociólogo inglês tem explorado diversos aspectos
da política, trabalhando com a etnografia de distintas formas em uma
abordagem heurística. Em uma publicação recente no Brasil, em conjunto com
mais dois pesquisadores (BALL, MAGUIRE e BRAUN, 2016), o autor defende

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que a política na escola se dá por um processo de atuação de elementos
heterogêneos e não pela leitura dicotômica produção x implementação, algo
relevante para o campo, o qual destaca o problema (LOPES e MACEDO,
2011a). Em 2014, publica no Brasil uma obra com o título Educação Global SA:
novas redes políticas e o imaginário neoliberal na qual procura explicitar um
método de análise de política ajustado ao contexto atual da educação, cada
vez mais global (BALL, 2014). A partir disso, destaca uma enorme lacuna no
campo de análise das políticas educacionais, estas presas ao Estado-Nação e 991
a política-como-governo. Segundo argumenta, nos faltam ferramentas e
perspectivas para uma sociologia mais cosmopolita; seja em relação à análise
de redes, seja no que tange aos métodos etnográficos, falta-nos formas de
identificar e conectar iniciativas locais e globais, compreendendo o que
colocam em prática.

Nessa perspectiva, a ideia é fazer uso das mídias, bem como de


etnografias de eventos, como dados, considerando que novas formas de
governo demandam novas formas de fazer e pensar a pesquisa: páginas da
internet e documentos, vídeos, powerpoints, páginas do Facebook, Blogs,
Twiters, participação em reuniões e eventos, usos de buscas e entrevistas,
dentre outros instrumentos que possibilitam construir a rede política e colocá-la
disponível à análise. Com tais instrumentos, se busca um acesso mais vivo e
amplo para o social com foco na espacialização das relações. A rede, para o
sociólogo, “é um modo chave e um dispositivo analítico de políticas” (BALL,
2014, p. 28). Ou seja, trata-se, conforme defende, de um tipo de social novo,
envolvendo tipos específicos de relações sociais, de fluxos e de movimentos
que constituem “comunidades de políticas”, geralmente articuladas por
concepções compartilhadas de problemas sociais e de soluções propostas.

No entanto, cabe destacar que trabalhar com a metodologia proposta


não nos isenta de problemas, como o próprio autor ressalta. Ball destaca
alguns, como a utilização do dispositivo construir o resultado. Outro problema
que ele salienta está na definição da proposta: trata-se de uma metáfora, de
um método ou de uma teoria com poder explicativo? Embora consideremos
estes e outros problemas a serem levantados, reconhecemos como potente a

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etnografia de rede, por acreditar que ela possa ser capaz de demonstrar os
efeitos das redes, ou o trabalho que as redes fazem em termos de processo de
política e de governança (BALL, 2014). Em concordância com o pesquisador, a
política precisa de uma circulação de ideias, de publicações, de defesas, o que
sugere – conforme procuro argumentar - uma visão mais topológica da política
(COLLIER, 2011; MACEDO, 2016a) 109.

Conforme sabemos, no Brasil, apesar de pouco estudadas, redes


992
políticas vêm sendo tecida em torno de interesses educacionais em nome de
uma BNCC. A ideia de que precisamos produzir mais uma reforma vem se
dando por intermédio de uma projeção central para o currículo, este entendido
como um produto que conduzirá a eficiência e eficácia do sistema escolar.
Torna, portanto, a política da centralização curricular um elemento
indispensável. Como dito antes, a aposta é que o “novo formato” irá garantir
“direitos de aprendizagem e desenvolvimento” de todos os alunos por
intermédio da definição dos ditos “conteúdos mínimos”, contribuindo para a
redução da desigualdade. Nesse contexto, conforme ressalta Ball (op. cit.), o
programa Todos pela Educação, fundado por presidentes de diversas
empresas brasileiras, dentre elas Dpaschoal, Grupo Gerdau, Itaú, Bradesco,
Santander, tem desenvolvido metas para a educação brasileira, introduzido
ferramentas para monitoramento de desempenhos, inclusive com a
contribuição de peritos norte-americanos e brasileiros.

Assim como o sociólogo sugere, temos estudado as novas filantropias, a


partir das quais se exige uma via de retorno do público em termos de
resultados (BALL, 2014; RIBEIRO e AZEVEDO-LOPES, 2017). Conforme o
estudo, não há mais espaços para filantropia “paz e amor”, a ideia agora
envolve a cobrança de resultados, o que borra as fronteiras entre o público e o
privado e gera uma maneira nova de sociabilidade, como salienta Macedo

109
Em linhas gerais, “topologia” é uma tentativa de se diferenciar de análises políticas
“euclidianas”. Nelas, o espaço, o contexto e a estrutura são fixados, gerando uma
sistematização. A meu ver, diferentemente, temos “o pensamento” como enfoque – o que
possibilita o entendimento de que a estrutura é desestruturada. Em função dos limites do texto,
bem como da necessidade de mais estudos para aprofundar a questão, incluindo a
potencialidade dos referenciais para emplacar a pesquisa na superação de dualidades e
determinismos, pretendo voltar à discussão em outro momento.

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(2014). Esta autora tem contribuído para mapeamento e desconstrução das
propostas colonizadoras em jogo. Em torno da BNCC, em nome dela,
instituições como Fundação Civita, Instituto Ayrton Senna, Fundação Lemann,
dentre outros grupos ligados a empresários com poder de legitimidade e
articulação epistêmica têm produzido a política junto aos Estados, contribuindo
para a disseminação de valores como uma “cultura da excelência” ou de
maximização de desempenhos, conforme a análise de Ribeiro e Azevedo-
Lopes (op. cit). Seja através da cultura do desempenho, seja a partir da cultura 993
da testagem, conforme Miller (2014), a política nesse modelo depende de uma
série de elementos, dentre eles, os empreendedores e defensores. Na obra já
mencionada, por intermédio da metodologia adotada, Ball (2014) identifica
alguns Think Tanks, espécie de empreendedores de políticas, ou seja,
promotores comerciais de ideias e soluções para serem comercializadas. Ele
também destaca o trabalho de um Thought Leader, uma espécie de líder
pensante, isto é, uma autoridade em um campo especializado (no caso do seu
trabalho destaca James Tooley).

Nosso grupo de pesquisa tem acompanhado publicações de Paulo


Lemann e de suas fundações, analisando sua perspectiva educacional, bem
como a maneira como ele tem penetrado nas discussões das políticas
educacionais e curriculares. Além de se configurarem como mantenedores de
revistas educacionais, as fundações produzem novas formas de sociabilidade
nas quais o imponderável da relação educacional é posta à margem, como
discute Macedo (2014). Especificamente, sugerimos pesquisar a rede política
por distintas vias, compreendendo o que tem posto em prática em nome das
políticas educacionais. Portanto, a partir deste referencial teórico-metodológico,
temos a intenção de buscar compreender como uma rede se articula em torno
de políticas globais no Brasil, cuja perspectiva de reforma tem sido analisada
como imaginário neoliberal (BALL, 2014), mas que – a meu ver – depende
ainda de rever a forma como trabalhamos com o neoliberalismo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este texto propõem uma metodologia de análise de políticas que atenda


aos fluxos culturais e discursivos. Analisa, em um momento preliminar de
trabalho, a ideia de etnografia de rede como um instrumento mais topológico
para pensar a política. O argumento é que as políticas em curso operam em
espaços-tempos não totalmente apreensíveis, demandando mais atenção para
a questão do contexto. Concordo que há muito a ser feito no que tange às
994
pesquisas em políticas educacionais, caso tenhamos em mente uma
abordagem que vise a compreensão dos fluxos e de outros espaços.
Entretanto, acredito que em vez de nos fragilizar, as lacunas podem
potencializar um processo de pesquisa que visa contribuir com os estudos em
currículo. Penso ser pertinente entender como as tecnologias se renovam no
momento em que nos encontramos bem fragilizados por políticas que tiram
proveito dos medos e desejos do público, incentivam a promoção de valores
duvidosos, buscam a sujeição e o governo dos indivíduos, ou seja, a captação
da subjetividade para um formato padronizador para um “bom trabalhador”.

REFERÊNCIAS

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CURRÍCULOS E IMAGENS E POLÍTICAS COTIDIANAS E...: OU SOBRE
OUTRAS/NOVAS PERSPECTIVAS EPISTEMOLÓGICAS

Carlos Eduardo Ferraço110 | Marco Antonio Oliva Gomes111

RESUMO: O artigo tem como objetivo problematizar os cotidianos escolares em


imagens, a partir de intercessores e conceitos da Filosofia da diferença de Deleuze e
Guattari. Para tanto, assume como referência os dados-imagens-grafites produzidos
durante as pesquisas que desenvolvemos com os cotidianos de escolas públicas de
997
Vitória/ES, Brasil. O texto assume que para falar dos cotidianos escolares em
imagens, de modo a potencializar o intempestivo, a produção de sentidos e a
multiplicidade dos conhecimentos, é preciso investir em uma outra atitude de pesquisa
que considere o caos, o acaso e a permanente abertura e complexidade dos
cotidianos escolares como potências para a constituição de um plano de imanência e
para a criação de conceitos. O artigo sustenta a ideia de impossibilidade de se eleger
imagens que seriam consideradas as mais representativas para se falar do currículo.
Palavras-chave: Imagem-representação. Imagem-sensação. Clichê. Cotidiano
escolar.

INTRODUÇÃO OU SOBRE O CAMPO PROBLEMÁTICO: PESQUISA COM


OS COTIDIANOS E CURRÍCULOS

Neste texto, partimos da ideia de que a construção de nosso campo


problemático para a discussão das relações entre os cotidianos escolares, os
currículos e as imagens insurge com os movimentos, as tensões e os
desdobramentos produzidos com as pesquisas “Currículos, culturas e
cotidianos escolares" e "Currículo, cotidiano escolar e clichê", nas quais
tivemos como interesse comum problematizar as imagens produzidas pelos
sujeitos praticantes dos cotidianos das escolas, decorrentes dos usos que
faziam dos textos curriculares prescritivos.

110
Carlos Eduardo Ferraço é professor associado da Ufes. Desenvolve pesquisas em currículo.
Coordena o GRPEs/CNPq Currículos, cotidianos, culturas e redes de conhecimentos. Membro
da Diretoria da Associação de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e da
Associação Brasileira de Currículo (ABdC). Autor de artigos, livros e capítulos de livros
publicados em periódicos e editoras de circulação nacional. E-mail: ferraco@uol.com.br
111
Marco Antonio Oliva Gomes é professor adjunto da Ufes. Pesquisador do GRPEs/CNPq
Currículos, cotidianos, culturas e redes de conhecimentos, desenvolvendo investigações nos
campos do currículo, da formação de educadores e dos processos inclusivos. É autor de
artigos científicos e capítulos de livros publicados em periódicos e editoras de circulação
nacional. E-mail: paramarcoantonio@uol.com.br

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Os diferentes movimentos teórico-metodológicos experienciados nos
cotidianos das escolas pesquisadas nos forçaram a pensar a pesquisa em
educação e, por efeito, as relações entre os cotidianos escolares, os currículos
e as imagens para além do modelo hegemônico pautado, sobretudo, nos
princípios de objetividade e de busca pela verdade. Com isso, defendemos
que, para falar dos cotidianos escolares e seus currículos em imagens de modo
a favorecer o exercício do pensamento que difere, é preciso investir em uma
outra atitude de pesquisa que considere o caos cotidiano como potência para a 998
constituição de um plano de imanência. Para Deleuze e Guattari (1992, p. 68),
"[...] o plano de imanência toma do caos determinações, com as quais faz seus
movimentos infinitos ou seus traços diagramáticos". Assim, a intensidade dos
movimentos caóticos vividos em nossas pesquisas com os cotidianos das
escolas nos impôs a necessidade de questionar as amarras conceituais que
acreditavam, por exemplo, que haveria um "modo certo" de se pensar o uso
que os educadores faziam das propostas curriculares e, ainda, que a esse
modo corresponderia um outro "modo certo" de se entender e conceituar as
imagens produzidas por eles com os referidos usos, como nos ajuda a pensar
Clareto (2011, p. 19-20),

[...] destituída dessa imagem de segurança, de busca da verdade,


como a pesquisa se move? Pelo menos três possibilidades. Uma,
continuamos presos à imagem da bolha e a perseguimos como a um
ideal [...]. Duas, ficamos à deriva neste mar indecifrável, selvagem,
que não se submete à bolha nem à imagem da bolha [...]. Três, a
pesquisa se move no movente da pesquisa e se propõe não a
resolver problemas, mas a problematizar; não se propõe a
representar o mundo, mas inventá-lo. O que isso implica? Implica,
talvez, na constituição de valores outros, de uma ética outra que se
constitua na imanência das águas quentes-frias-claras-escuras. Sem
imagens. Com o intempestivo. Sem representações. Com a
multiplicidade.

Pensar as possíveis relações entre imagens e cotidianos escolares em


nossas pesquisas vai ao encontro do que a autora considera como uma
maneira de se opor ao modelo hegemônico de se entender a pesquisa em
educação como solucionadora de problemas, favorecendo a criação de
movimentos de resistência pela sustentação do campo problemático afeto às

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multiplicidades e ao intempestivo. Com a ajuda de nossos intercessores
teóricos, buscamos nos esquivar não só da representação-clichê, tão frequente
nas pesquisas solucionadoras de problemas mas, sobretudo, das conclusões
prescritivas que, pretensamente, cumpririam a função de corrigir e/ou aprimorar
os erros, as falhas e as ausências detectadas com a realização da pesquisa.

A pesquisa como solucionadora de problemas costuma proceder por


caminhos que colocam o método em sua centralidade: bases teórico-
metodológicas são evocadas para constituir aquilo que se chama de 999
questão a ser investigada. Há que se ter uma questão para se
realizar uma investigação [...]. Empreendimento investigativo que
carrega a questão como estandarte e as bases teórico-metodológicas
como suporte do estandarte [...]. Há uma busca por apontar
caminhos, soluções, prescrições ou, no mais dos casos, críticas a
situações vivenciadas em um campo empírico (CLARETO, 2011, p.
21).

Como argumenta Clareto (2011), o sentido atribuído a "problemático"


não se refere à "resolução de problemas", a algo "defeituoso" nem a "resultado
duvidoso", mas se aproxima do pensamento deleuziano de "acontecimento que
vai de dando junto a encontros". Problemático como o que resiste ao modelo
hegemônico, como aquilo que se metamorfoseia e se hibridiza para não se
deixar nem nomear nem capturar em sua complexidade. Problemático como o
exercício de se diferenciar na singularidade.

O campo problemático [...] é resistência: aos processos instituídos de


pesquisa, aos modos-bolha de existir. Resistência precária submersa
nas águas múltiplas. Resistência: existência monstruosa, híbrida...
[...] Existência no labirinto das águas. Experiência no labirinto. Sem
saída. Sem entrada. Só entre [...]. O problemático, enquanto
acontecimento que se dá por meio de encontros, é estar nas águas.
Não águas abstratas tratadas abstratamente, mas cada água em sua
complexa multidão. Cada água em sua singularidade. Acontecimento.
Inigualável, inequiparável. Singularidade. Invenção de si e do mundo
(CLARETO, 2011, p. 223).

Voltando, então, à discussão da construção de nosso campo


problemático, vamos perceber movimentos de resistência e de aposta nas
multiplicidades desviantes que produzem linhas de fuga ou de
desterritorialização, em meio aos usos que estudantes e educadores fazem dos
currículos prescritivos, a despeito de todas as tentativas de orientação, visando

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ao controle do que se passa em sala de aula. Por se tratar de movimentos
tecidos em meio à complexidade das redes cotidianas dos saberes-fazeres
curriculares, também encontramos movimentos de afirmação nesse sentido,
isto é, linhas de segmentaridade/estratificação que afirmam práticas
prescritivas, defendendo modelos supostamente adequados para trabalhar as
prescrições.
Nessa discussão, faz-se necessário considerar que não estamos
entendendo esses movimentos como situações isoladas e dicotômicas. Trata- 1000
se, sempre, de movimentos rizomáticos que acontecem por dentro uns dos
outros, que se proliferam e se ramificam em linhas, sempre pelo meio, uma vez
que, como afirmam Deleuze e Guattari (1996, p. 37), "[...] um rizoma não
começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-
ser, intermezzo. A árvore impõe o verbo 'ser', mas o rizoma tem como tecido a
conjunção 'e... e... e...'".

Oposto a uma estrutura, que se define por um conjunto de pontos e


posições, por correlações binárias entre estes pontos e relações
biunívocas entre estas posições, o rizoma é feito somente de linhas:
linhas de segmentaridade, de estratificação, com dimensões, mas
também linha de fuga ou de desterritorialização como dimensão
máxima segundo a qual, em seguindo-a, a multiplicidade se
metamorfoseia, mudando de natureza (DELEUZE; GUATTARI, 1996,
p. 32).

Assim, a partir dos movimentos rizomáticos experienciados durante a


realização de nossas pesquisas, problematizar os cotidianos escolares e seus
currículos em imagens implica, antes de tudo, considerar como potentes para
nossas análises os diferentes entendimentos, usos e produções dessas
imagens nesses cotidianos. Ou seja, se estamos trabalhando com o conceito
de rizoma e de multiplicidade, é preciso problematizar os variados sentidos
dados às imagens curriculares das escolas como decalques e representações
e metáforas e ilustrações e sensações e..., buscando escapar da pretensão de
definir ou eleger que sentidos de currículo deveriam ser considerados como os
mais adequados.

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DO CLICHÊ À IMAGEM-SENSAÇÃO: A FORÇA DO ACASO, DO
ENCONTRO E DA EXPERIÊNCIA CURRICULAR

No livro Francis Bacon: lógica da sensação, Deleuze (2007a) refere-se


ao clichê como "modos de ver", isto é, "representações ilustrativas ou
narrativas", que compõem o que o autor chama de figuração.

Há, em primeiro lugar, dados figurativos. A figuração existe, é um fato 1001


[...]. Somos bombardeados por fotos que são ilustrações, jornais que
são narrações, imagens-cinema, imagens-televisão. Há clichês
psíquicos assim como clichês físicos, percepções já prontas,
lembranças (DELEUZE, 2007a, p. 91-92).

Com o pensamento de Deleuze (2007a), interessa-nos, então,


problematizar as imagens-representação dos sujeitos das escolas, como
possibilidades de escapar dos clichês, valendo-nos da força ético-estético-
política que move a invenção dos currículos nos cotidianos das escolas da
pesquisa, pois, como pondera Deleuze (2007b, p. 31),

As situações cotidianas e mesmo as situações-limite não se


assinalam por algo raro ou extraordinário [...]. Vemos, sofremos mais
ou menos uma poderosa organização da miséria e da opressão. E
justamente não nos faltam esquemas sensório-motores para
reconhecer tais coisas, suportá-las ou aprová-las, comportamo-nos
como se deve, levando em conta nossa situação, nossas
capacidades, nossos gostos. Temos esquemas para nos
esquivarmos quando é desagradável demais, para nos inspirar
resignação quando é horrível demais, nos fazer assimilar quando é
belo demais [...]. Mesmo as metáforas são esquivas sensório-
motoras, e nos inspiram algo a dizer quando já não se sabe o que
fazer: são esquemas particulares, de natureza afetiva. Ora, é isso um
clichê. Um clichê é uma imagem sensório-motora da coisa. Como diz
Bergson, nós não percebemos a coisa ou a imagem inteira,
percebemos sempre menos, percebemos apenas o que estamos
interessados em perceber, ou melhor, o que temos interesse em
perceber, devido a nossos interesses econômicos, nossas crenças
ideológicas, nossas exigências psicológicas. Portanto, comumente,
percebemos apenas clichês.

Pesquisar as complexas relações entre currículo, cotidiano escolar e


clichê implica problematizar, permanentemente, as imagens produzidas pelos
sujeitos praticantes dos cotidianos das escolas com as quais realizamos
nossas pesquisas, sobretudo aquelas que afirmam lugares-comuns e forjam

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estereótipos produzindo, assim, teorias práticas que têm por principal objetivo
harmonizar as condições de indeterminação, abertura e incompletude que se
manifestam nessas redes de imagens.
De modo geral, interessa-nos problematizar os cotidianos das escolas
durante os processos de tessitura dos conhecimentos curriculares, com a
intenção de potencializar, com os sujeitos praticantes, as redes curriculares
que agenciam processos inventivos em favor de uma escola afeta aos
movimentos de expansão da multiplicidade e da diferença nas vidas dos seus 1002
praticantes entendendo, como defende Guerón (2011, p. 12), que "[...] não
existem grandes investigações sobre o clichê".
Guerón (2011, p. 14-15) também infere que, ao definir o que é clichê,
Deleuze, mesmo estando em pleno estudo filosófico do cinema, em momento
algum menciona o próprio cinema. Ou seja, para o autor, o clichê é parte
fundamental da nossa experiência cotidiana do real – constitui inevitavelmente
esta – e não algo que diz respeito exclusivamente ao cinema e a outros
mecanismos de produção de imagens.
No livro O que é a filosofia? Deleuze e Guattari (1992, p. 194) defendem
a filosofia como algo que poderia nos levar a colocar em análise “nossas
verdades” e, quem sabe, suspender as certezas e os dogmatismos das
opiniões que buscam consensos. Ao insistirem na luta contra o clichê, afirmam:
"Mas não se luta contra os clichês perceptivos e afetivos se não se luta
também contra a máquina que os produz".
Ao analisarmos a força dos textos de Deleuze (2000, 2006, 2007a,
2007b, 2009) e de Deleuze e Guattari (1992, 2008a, 2008b), encontramos o
vigor do tema da imagem-sensação em contraste com o clichê e, ainda, a
possibilidade de se pensar em uma luta diferenciada e maior da arte, da
filosofia e da ciência contra os efeitos da informação, da opinião e da
comunicação na produção dos clichês. No texto Do caos ao cérebro do referido
livro O que é a filosofia?, os autores observam que

[...] a arte, a ciência, a filosofia [...] traçam planos sobre o caos. Essas
três disciplinas não são como as religiões, que invocam dinastias de
deuses, ou a epifania de um deus único, para pintar sobre o guarda-
sol um firmamento, como as figuras de uma Urdoxa de onde derivam
nossas opiniões. A filosofia, a ciência e a arte querem que rasguemos

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o firmamento e que mergulhemos no caos (DELEUZE; GUATTARI,
1992, p. 259-260).

Para Deleuze e Guattari (1992), ao mergulharem no "mundo do caos"


para enfrentá-lo, o filósofo, o cientista e o artista trazem coisas diferentes.
Segundo os autores, "O que o filósofo traz do caos são variações [...]. O
cientista traz do caos variáveis [...]. O artista traz do caos variedades" (p. 260).
Assim, para eles, a luta contra o caos implica uma afinidade com o inimigo, até
porque uma outra luta maior teria que ser travada contra a opinião que, a todo
1003
tempo, pretende nos proteger do caos.

Num texto violentamente poético, Lawrence descreve o que a poesia


faz: os homens não deixam de fabricar um guarda-sol que os abriga,
por baixo do qual traçam um firmamento e escrevem suas
convenções, suas opiniões; mas o poeta, o artista abre uma fenda no
guarda-sol, rasga até o firmamento para fazer passar um pouco do
caos livre e tempestuoso [...]. Então, segue a massa dos imitadores,
que remendam o guarda-sol, com uma peça que parece vagamente
com a visão; e a massa dos glossadores que preenchem a fenda com
opiniões: comunicação.

As ponderações feitas por Deleuze e Guattari (1992) acerca das


relações entre o clichê, a opinião, a informação e a comunicação levaram-nos
ao que Larrosa (2004) chama de destruição da experiência. Como infere o
autor (2004), a experiência, como condição de se pensar e de se ser tocado
pelas coisas que nos passam, está cada vez mais escassa, na medida em que
vivemos em um mundo bombardeado pelo excesso de opiniões e de
informações, aliado à sensação de que nos falta tempo.

A cada dia passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase


nada nos passa. Dir-se-ia que tudo o que passa está organizado para
que nada nos passe [...]. Nunca se passaram tantas coisas, mas a
experiência é cada vez mais rara. Em primeiro lugar pelo excesso de
informação. A informação não é experiência. E mais, a informação
não deixa lugar para a experiência, é quase o contrário da
experiência, quase uma antiexperiência [...]. Em segundo lugar, a
experiência é cada vez mais rara pelo excesso de opinião. O sujeito
moderno é um sujeito informado que além disso opina. Para nós, a
opinião, como a informação, converteu-se em um imperativo [...]. Em
terceiro lugar, a experiência é cada vez mais rara por falta de tempo.
Tudo o que se passa, passa demasiadamente depressa, cada vez
mais depressa. E, com isso, reduz-se a um estímulo fugaz e
instantâneo que é imediatamente substituído por outro estímulo ou
por outra excitação igualmente fugaz e efêmera (LARROSA, 2004, p.
154-159).

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Buscando, então, estabelecer algumas relações entre, por um lado, as
discussões de Larrosa (2004) sobre nossa sensação de falta de tempo e os
excessos de informação e de opinião como situações inibidoras da experiência
e, por outro, as discussões de Deleuze e Guattari (1992) em termos dos
desdobramentos da opinião, da informação, da comunicação na criação e
fortalecimento dos clichês, damo-nos conta, em um primeiro momento, da
possibilidade de se pensar a experiência (Larrosa, 2004) como uma alternativa
para se colocar sob suspeita os clichês. Mas, que significaria usar a 1004
experiência como potência para extirpar os clichês produzidos nos cotidianos
das escolas?
Seguindo as pistas deixadas por Larrosa (2004, p.161), temos que o
"sujeito da experiência" se define não tanto por sua atividade, mas por sua
receptividade, por sua disponibilidade, por sua abertura. Trata-se de um sujeito
que, como na discussão de Deleuze e Guattari (1992), se colocaria em fluxo,
aberto ao caos e ao imprevisível, à incerteza da vida. Um sujeito descentrado,
que busca (com)por e não (im)por. Larrosa (2004, p. 161) diz:

O sujeito da experiência é um sujeito ex-posto. Do ponto de vista da


experiência, o importante não é nem a posição (nossa maneira de
pôr-nos), nem a o-posição (nossa maneira de opor-nos), nem a im-
posição (nossa maneira de impor-nos), nem a pro-posição (nossa
maneira de propor-nos), mas a exposição, nossa maneira de ex-por-
nos, com tudo o que isso tem de vulnerabilidade e de risco. É incapaz
de experiência aquele a quem nada lhe passa, a quem nada lhe
acontece, a quem nada lhe sucede, a quem nada lhe toca, nada lhe
chega, nada lhe afeta, a quem nada lhe ameaça, a quem nada lhe
fere.

Então, problematizar as imagens dos sujeitos praticantes das escolas,


como possibilidades de fabricação-deformação dos clichês das imagens-
representação em direção à produção da imagem-sensação, significou, em
um primeiro movimento de nossa pesquisa, exercitar um dado modo de nos
constituir como sujeitos da experiência (Larrosa, 2004), que não seria o
sujeito da informação, da opinião ou da comunicação, que não seria o sujeito
do saber ou do julgar, um sujeito firme, autodeterminado, impávido,
inatingível, erguido, anestesiado, apático, definido pelo seu saber, por seu
poder e por sua vontade, mas um sujeito que se transforma, receptivo,

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aceitante, interpelado, que perde seus poderes precisamente porque aquilo
do qual faz experiência se apodera dele. Larrosa (2004, p.160) defende que

A experiência, a possibilidade de que algo nos passe ou nos


aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto
que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para
pensar, para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar
mais devagar e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais
devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o
juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação,
cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar
sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar os outros, 1005
cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e
espaço.

Sendo assim, um primeiro movimento realizado em nossas pesquisas,


levando em conta a proposta de Larrosa (2004) de nos permitir a experiência,
aconteceu no sentido de exercitar, com os sujeitos envolvidos em nossas
pesquisas, encontros para que pudéssemos conversar sobre as teorias
práticas curriculares produzidas por eles com os usos que faziam das
propostas curriculares prescritivas. Nossa intenção foi afirmar uma atitude
filosófica que pudesse nos levar a problematizar, coletivamente, nossas
verdades, nossas metáforas, nossos clichês, nossas imagens-representação
cheias de certezas-violências, buscando intensificar uma atitude poética diante
da vida e, com isso, produzir rasgos nos guarda-sóis que usamos para nos
proteger do caos e das ameaças da diferença e da multiplicidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nossa prática de pesquisa, potencializar esses encontros-conversas


com os educadores e estudantes pressupôs favorecer tentativas de
aproximação-mobilização das relações vividas com eles, isto é, pensar com
eles e não pensar sobre ou para eles. Essa atitude de pensar com o outro nos
tem levado à pista deixada por Certeau (1994, 1996), em termos do uso que
ele fazia das conversas em suas pesquisas.
Giard (1996), ao se referir a esse uso, destaca a preocupação que ele
tinha em, ao conversar com os sujeitos ordinários, tentar estabelecer uma
condição de empatia fora do comum, ao mesmo tempo em que não dedicava

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uma atenção diretiva. Sempre encorajando as pessoas a falar, buscava escutá-
las, atestando a riqueza das palavras ditas. O próprio Certeau (1994, p. 50)
acreditava que

As retóricas da conversa ordinária são práticas transformadoras ‘de


situações de palavra’, de produções verbais onde o entrelaçamento
das posições locutoras instaura um tecido oral sem proprietários
individuais, as comunicações de uma comunicação que não pertence
a ninguém. A conversa é um efeito provisório e coletivo de
competências na arte de manipular ‘lugares comuns’ e jogar o
inevitável dos acontecimentos para torná-los habitáveis. 1006

Esta busca por estabelecer uma proximidade com o "Outro" na pesquisa


não resulta em uma abordagem pessoal, individualista, mas, como já dito, vai
ao encontro das singularidades do que se passa entre as pessoas, daquilo que
insurge e acontece no meio, intermezzo, privilegiando as relações que se
estabelecem nos/com os encontros e, com isso, mais uma vez, apostando em
uma pesquisa que, como defende Clareto (2011), se constituiu como
acontecimento e invenção de si e do mundo.
Nessa aposta de pesquisa, consideramos que as tensões e os embates
vividos em meio ao caos cotidiano favorecem diferentes situações de
problematização dos clichês pressupondo, mais uma vez, a potência das
experiências que se constituem como uma atitude ético-estético-poética de
devir diante das falas-gestos que mutilam as imagens-representação e
investem nas imagens-sensação.
Intuímos, aqui, que é através dos devires que conseguiremos nos livrar
dos clichês. Como falam Deleuze e Guattari (2008b, p. 89), "[...] o que nos
precipita num devir pode ser qualquer coisa, a mais inesperada, a mais
insignificante. Você não se desvia da maioria sem um pequeno detalhe que vai
se pôr a estufar, e que lhe arrasta".
No referido livro Francis Bacon: lógica da Sensação, Deleuze (2007a)
mostra como Cézanne conseguiu escapar do clichê em sua pintura, na medida
em que dava uma interpretação inteiramente intuitiva de objetos reais em sua
natureza morta.
Nisso ele é inimitável. Seus imitadores copiam suas toalhas de mesa
de dobras rígidas, os objetos sem realidade de seus quadros. Mas
eles não reproduzem os potes e as maçãs, pois não são capazes.
Não se pode imitar o verdadeiro caráter maçãnesco. Cada um deve

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por si mesmo criar um novo e diferente. Caso se pareçam com os de
Cézanne, nada significam [...]. Clichês, clichês! Não se pode dizer
que a situação tenha melhorado depois de Cézanne. Não apenas
houve multiplicação de imagens de todo tipo, ao nosso redor e em
nossas cabeças, como também as reações contra os clichês
engendram clichês (DELEUZE, 2007a, p. 93).

Considerando, então, a possibilidade de reagir contra as imagens-


representação e os clichês, empenhamo-nos em desencadear, durante a
realização de nossas pesquisas, diferentes processos que pudessem
potencializar maneiras de se escapar das rostificações curriculares, isto é, de 1007
se desfazer dos rostos que são criados, cotidianamente, nos currículos
grudando as pessoas em identidades fixas, em rótulos. Como atestam Deleuze
e Guattari (2008a), as rostificações cumprem a função de fazer o
reconhecimento de cada um, inscrevendo-o no conjunto do quadriculado da
máquina abstrata, rejeitando aqueles rostos que nos parecem suspeitos, pois
não estão de acordo com os nossos modelos de normalidade.

Rosto de professora e de aluno, de pai e de filho, de operário e de


patrão, de policial e de cidadão, de acusado e de juiz [...]. A máquina
abstrata de rostidade assume um papel de resposta seletiva ou de
escolha: dado um rosto concreto, a máquina julga se ele passa ou
não passa, se vai ou não vai, segundo as unidades elementares. A
correlação binária dessa vez é do tipo 'sim-não'. O olho vazio do
buraco negro absorve ou rejeita, como um déspota parcialmente
corrompido faz ainda um sinal de aquiescência ou de recusa. Um
certo rosto de professora é percorrido por tiques e se cobre de uma
ansiedade que faz com que chegue ao ponto de 'não dá mais'
(DELEUZE; GUATTARI, 2008a, p. 44).

Deleuze e Guattari (2008a) inferem que a máquina abstrata de rostidade


produz relações binárias entre o que é aceito em uma primeira escolha e o que
não é tolerado em uma segunda ou terceira escolha. Exemplificam (2008a, p.
45), "Ah, não é nem um homem nem uma mulher, é um travesti: a relação
binária se estabelece entre o 'não' de primeira categoria e um 'sim' de categoria
seguinte".
A relação binária estabelecida, nesses casos, pela máquina abstrata de
rostidade pode pressupor, sob certas condições, uma tolerância ou, ainda,
indicar que se trata de um inimigo que é necessário extinguir a qualquer preço.
Para os autores (2008a, p. 45),
Compreende-se que, em seu novo papel de detector de desvianças,
a máquina de rostidade não se contenta com casos individuais, mas

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procede de modo tão geral quanto em seu primeiro papel de
ordenação de normalidades. Se o rosto é o Cristo, quer dizer o
Homem branco médio qualquer, as primeiras desvianças, os
primeiros desvios padrão são raciais: o homem amarelo, o homem
negro, homens de segunda ou terceira categoria [...]. O racismo
procede por determinação das variações de desvianças, em função
do rosto Homem branco que pretende integrar em ondas cada vez
mais excêntricas e retardadas os traços que não são conformes, ora
para tolerá-los em determinado lugar e em determinadas condições,
em certo gueto, ora para apagá-los no muro que jamais suporta a
alteridade (é um judeu, é um árabe, é um negro, é um louco..., etc).
Do ponto de vista do racismo, não existem as pessoas de fora. Só
existem pessoas que deveriam ser como nós, e cujo crime é não o
serem. 1008

Retomando, então, a fala de Deleuze e Guattari (2008b, p. 89) sobre a


força do que nos precipita num devir, isto é, algo inesperado, insignificante, um
pequeno detalhe que nos toma de surpresa, que nos arranca de nossos
lugares de acomodação, vamos nos dar conta da impossibilidade de se ter
protagonistas individuais para as ações que visam a superar o racismo, o
preconceito, a rostidade ou o clichê. Não há intencionalidade de pesquisador
que consiga fazer isso. Precisamos, sempre, também contar com o acaso!

REFERÊNCIAS

ALVES, Nilda. O Espaço-Tempo Escolar como Artefato Cultural nas Histórias


dos Fatos e das Idéias. Acervo: Revista do Arquivo nacional. Rio de Janeiro, v.
18, p. 15-34, 2005.
ALVES, Nilda. Decifrando o pergaminho: o cotidiano das escolas nas lógicas
das redes cotidianas. In: OLIVEIRA, Inês Barbosa de; ALVES, Nilda (Org.).
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Janeiro: DP&A, 2001. P. 13-38.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano 2: morar, cozinhar.
Petrópolis: Vozes, 1996.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano: as artes de fazer. Petrópolis:
Vozes, 1994.
CLARETO, Sônia Maria. Na travessia: construção de um campo problemático.
In: CLARETO, Sônia Maria; ROTONDO, Margareth Sacramento; VEIGA, Ana
Lygia Vieira Schil da (Org.). Entre Composições: formação, corpo e educação.
Juiz de Fora: Editora UFJF, 2011.
DELEUZE, Gilles. A Imagem-Movimento: cinema I. Lisboa: Assírio & Alvim,
2009.
DELEUZE, Gilles. Francis Bacon: lógica da sensação. Rio de Janeiro: Zahar,
2007a.
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DELEUZE, Gilles. Diferença e Repetição. Rio de Janeiro: Graal, 2006.

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DELEUZE, Gilles. Conversações. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2000.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia.
Volume 3. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2008a.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia.
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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia.
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In: CAMARGO, Maria Rosa Rodrigues Martins de; LEITE, César Donizetti
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GUIMARÃES, César. Imagens da Memória: entre o legível e o visível. Belo
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LARROSA, Jorge. Linguagem e Educação depois de Babel. Belo Horizonte:
Autêntica, 2004.

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GT 10 – POLÍTICAS CURRICULARES E
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO PARA A FORMAÇÃO


DE PROFESSORES DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UFPB

Nathália Fernandes Egito Rocha | Maraiane Pinto de Sousa | Gessica Mayara


de Oliveira 1010

RESUMO: Este trabalho se origina de algumas vivencias no estágio supervisionado V


da Universidade Federal da Paraíba-campus I e em um projeto de extensão, que
desenvolve atividades pedagógicas dentro de canteiros de obras da construção civil,
numa perspectiva popular de Educação de Jovens e Adultos. Através deste texto,
temos por objetivo refletir sobre a importância do estágio supervisionado na educação
de jovens e adultos (EJA) para a formação de professores do curso de pedagogia da
UFPB, Campus I. Metodologicamente o trabalho se caracteriza segundo Gonsalves
(2003) como qualitativo, bibliográfico e de campo. Nosso lócus de pesquisa se deu um
canteiro de obras do Projeto Escola Zé Peão, uma experiência educativa que é
resultado de uma parceria entre a Universidade Federal da Paraíba (UFPB-Campus I)
e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil do Mobiliário de
João Pessoa (SINTRICOM). Além do Zé Peão nossas analises se deram também em
uma escola da Rede Municipal de Ensino de João Pessoa/PB. Nossa ancoragem
teórica está baseada em autores como Santos (2013, 2015) Laffin (2012), Pimenta e
Lima (2004), entre outros. Em nossas analises foi possível perceber que o estágio
supervisionado da UFPB não oferece uma formação inicial solida em relação a EJA,
compreendendo através do fluxograma do curso que só é ofertado uma disciplina
obrigatória referente a esta modalidade de ensino e que só é ofertado o estágio
supervisionado para os alunos que optarem por fazer sua área de aprofundamento na
educação de jovens e adultos.

Palavras-chave: Formação de professores/as. EJA. Estágio supervisionado. UFPB.

INTRODUÇÃO

Este trabalho se origina da experiência em um estágio docência em


duas turmas de Educação de Jovens e Adultos da cidade de João Pessoa/PB.
A partir destes estágios realizados no último período do curso de Pedagogia da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB) foi possível identificar a importância
da experiência em sala de aula e da aproximação com esse público que por
muitas vezes passa despercebido dentro do curso.

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A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN
9.394/96) que traz em seu título V os níveis e modalidades de educação e
ensino em uma seção específica para a Educação de Jovens e Adultos (seção
V, artigos 37 e 38), a EJA é compreendida como uma modalidade da educação
básica, nas etapas fundamental e médio, destacando que requer um
tratamento e atendimento as suas particularidades, o que nos remete a pensar
na formação docente para esta modalidade de ensino. Segundo Laffin (2012),
as Diretrizes Curriculares Nacionais alertam para a necessidade de formação 1011
de professores com questões relativas “à complexidade diferencial desta
modalidade de ensino”. A autora destaca ainda que poucas são as instituições
que oferecem tal formação, ficando a cargo das redes de ensino oferecer este
tipo de formação. Esse episódio resulta em professores sem formação
específica para atuar com os sujeitos da EJA. Pensando nesta questão
elegemos como objetivo geral deste trabalho refletir sobre a importância do
estágio supervisionado na educação de jovens e adultos para a formação de
professores do curso de pedagogia da UFPB, Campus I.
Metodologicamente o trabalho se caracteriza segundo Gonsalves (2003)
como qualitativo, bibliográfico e de campo. Nosso lócus de pesquisa se deu um
canteiro de obras do Projeto Escola Zé Peão, uma experiência educativa que é
resultado de uma parceria entre a Universidade Federal da Paraíba (UFPB-
Campus I) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil
do Mobiliário de João Pessoa (SINTRICOM), o projeto Zé Peão desenvolve
atividades pedagógicas em canteiros de obras com trabalhadores da
construção civil, numa perspectiva popular de educação de jovens e adultos.
Além do Zé Peão nossas analises se deram também em uma escola da Rede
Municipal de João Pessoa/PB.
Portanto, partindo dos pressupostos teóricos de Laffin (2012), Pimenta e
Lima (2004) e Santos (2015), pelo quais destacamos que Projeto Escola Zé
Peão, se configura em um suporte complementar de conhecimentos e
embasamentos teóricos acerca da educação de jovens e adultos, para o curso
de Pedagogia da UFPB. Desta forma, através da experiência na Escola Zé
Peão percebemos que esse projeto, além de dar a oportunidade de os alunos

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atuarem como educadores em salas, promove, ainda, a autonomia do
professor, desenvolve formação específica continuada entre outras ações
didático-pedagógicas específicas. Além disso em nosso estagio em uma escola
Municipal de João Pessoa nos possibilitou perceber a importância da
aproximação dos alunos do curso de pedagogia com esses sujeitos,
considerando que a alfabetização desse público cabe ao profissionais da
pedagogia. Ressaltamos que o estágio supervisionado não supre todas as
necessidades dos alunos em relação a esse público, pois o tempo que nos é 1012
disponibilizado para estar dentro desses espaço é pouco para as necessidades
desta modalidade de ensino.

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO DA UFPB PARA A EDUCAÇÃO DE


JOVENS E ADULTOS

O estágio supervisionado V na Educação de Jovens e Adultos (EJA) é


componente obrigatório do currículo do curso de pedagogia para os alunos que
optarem pela área de aprofundamento na EJA. Entendemos o estágio como
um espaço de práxis. Concordamos com Pimenta e Lima (2005, apud
PIMENTA E GONÇALVES, 1990) que a finalidade do estágio é propiciar ao
aluno uma aproximação da realidade em que ele futuramente vai trabalhar,
porque é destro da escola, a partir do estágio que vamos ter nossa primeira
experiência com um espaço que futuramente será nosso espaço de trabalho e
que aquela pratica que encontramos lá, futuramente será nossa pratica.
Ressaltamos então que a teoria não se separa da prática durante o estágio,
mas que ambos se complementam para propiciar uma melhor formação ao
discente.
Mas não podemos desconsiderar a fragilidade que o Estágio
Supervisionado enfrenta, as dificuldades que os alunos enfrentam com o tempo
para realização das atividades. A experiência
de estágio vivenciada na rede municipal, como requisito de atividade no
componente “Estágio Supervisionado V – Educação de Jovens e Adultos” foi
pertinente ao que tange à necessidade de conhecer a prática relacionada com
as discussões e leituras.

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Para isso, utilizamos mecanismos de observação e análise da escola
desde de sua estrutura física até sua estrutura pedagógica, com o objetivo de
realizar a leitura da escola. Isso também acontece na sala de aula, onde
realizamos no estágio, neste caso o Ciclo II, uma vez que no início do estágio o
momento de observação das aulas possibilita o acompanhamento do trabalho
da professora colaboradora e sua metodologia, a dinâmica da sala de aula, o
ritmo dos alunos e a relação professor e aluno.
Neste sentido, compreendemos que o estágio se caracteriza 1013
como um componente curricular indispensável para a formação do pedagogo,
pois é a partir dele que os alunos que ainda não exercem a função de
professor têm sua primeira experiência em sala de aula, as autoras Pimenta e
Lima (2004) destacam que

Como componente curricular, o estágio pode não ser uma completa


preparação para o magistério, mas é possível, nesse espaço,
professores, alunos e comunidade escolar e universidade
trabalharem questões básicas de alicerce, a saber: o sentido da
profissão, o que é ser professor na sociedade em que vivemos, como
ser professor, a escola concreta, a realidade dos alunos nas escolas
de ensino fundamental e médio, a realidade dos professores nessas
escolas, entre outras. (p. 100).

Desta forma, o estágio é quem nos dá uma primeira visão do que é essa
realidade do professor, embora não estejamos lá para copiar um modelo de
professor e nem para procurar uma receita pronta de como ministrar uma aula,
mas “O exercício de qualquer profissão é prático, no sentido de que se trata de
aprender a fazer ‘algo’ ou ‘ação’. A profissão de professor também é prática. E
o modo de aprender a profissão, conforme a perspectiva da imitação, será a
partir da observação, imitação, reprodução” (PIMENTA e LIMA, 2005, p. 07),
por isso, quando vamos a escola temos a possibilidade de ver como é, mesmo
que de uma forma bem inicial, o trabalho do professor, como é a realidade dos
alunos, pois muitas vezes nos prendemos muito aos estudos na universidade e
acabamos de certa forma nos distanciando da prática pedagógica.
Entendendo então a importância do estágio para a formação do
Pedagogo, o curso de Pedagogia da UFPB nos proporciona, através de uma
disciplina obrigatória, ter nosso primeiro contato, no caso de quem ainda não é

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professor, com os alunos da EJA. É importante ressaltar que embora a
educação de jovens e adultos (alfabetização) esteja inserida na área de
atuação do Pedagogo, na grade do curso de Pedagogia da UFPB, de forma
obrigatória, temos apenas uma disciplina relacionada a EJA durante o curso
que é o componente “EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS” cursado apenas
no 4º período e algumas disciplinas optativas, mas que ficam a cargo dos
alunos cursa-las ou não. Vejamos o fluxograma do curso de Pedagogia e os
componentes que são ofertados de acordo com a resolução nº 64/2006 do 1014
CONSEPE:

Imagem 01: Fluxograma do curso de Pedagogia diurno - Resolução Nº


64/2006

Fonte: Resolução nº 64/2006

Observamos a partir do fluxograma do curo de pedagogia que temos


apenas uma disciplina obrigatória relacionada a EJA cursada no 4º período e
depois apenas no 8º período na área de aprofundamento, na qual do aluno
deve optar entre duas áreas – Educação de jovens e adultos ou educação

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especial- quando o aluno opta por uma dessas áreas ele acaba por não cursar
a outra área, sendo que as duas são de mesma importância para a formação
do pedagogo.
Concordamos com Santos (2013) que a Educação de Jovens e Adultos
como modalidade vem sendo pouco explorada no curso de Pedagogia da
UFPB, “tendo em vista que os/as alunos/as nos primeiros períodos do curso
não tem a oportunidade de conhecer essa modalidade como disciplina, assim
ao se depararem com ela no final do curso – ressaltando que isso acontece 1015
apenas no caso daqueles (as) que optam pela área de aprofundamento em
EJA” (p. 11). Desta forma, os alunos que não optam por essa área acabam
ficando sem tempo para cursa-la depois e isso acaba comprometendo sua
formação, entendendo que a EJA é “uma modalidade que requer um maior
entendimento de todo o aparato histórico, sociológico, político, ideológico e
filosófico, que em dois períodos não conseguem dar conta das necessidades
que esse processo de conhecimento exige (p.11-12).
Sendo assim compreendemos a importância do estágio supervisionado
nessa modalidade de ensino e dos projetos de extensão da UFPB. No caso do
Projeto de Extensão da Escola Zé Peão ressaltamos que ele deveria ser um
dos projetos voltados para o estágio no curso de Pedagogia “ por ser um grande
contribuídor na formação de educadores/as de Jovens e Adultos é o Programa
Escola Zé Peão, criado na década de 90 e que forma educadores/as para
desenvolverem atividades de cunho pedagógico” (SANTOS, 2013, p. 12).

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO V – EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Como mencionamos no tópico anterior, realizamos o Estágio no Ciclo II,


de uma escola da Rede Municipal de João Pessoa/PB. Ao iniciarmos a
disciplina, realizamos leituras e discussões acerca do estágio, com o
cronograma de atividades, roteiros de observação da escola, da sala de aula e
um roteiro de análise da estrutura pedagógica. Isso nos possibilitou conhecer
melhor a escola e sua dinâmica, no que se refere a sala de aula, o roteiro
oferece a construção de uma análise mais objetiva e direcionada, pois exige o

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registro do conteúdo de aula, metodologia, planejamento, organização, material
didático e relação entre alunos e professor.
Desse modo, o momento de planejar as regências parte também das
condições da escola, ritmo dos alunos, das necessidades que foram
encontradas no período de observação. Para tanto, para conhecermos os
alunos e identificar em que nível de leitura e escrita eles se encontraram,
pedimos que cada um escrevessem um pouco da sua história. A partir disso, a
construção das regências contou com o apoio da professora responsável do 1016
componente e como dispositivo de direcionamento, o planejamento das
atividades, em que foram elaboradas a partir do contexto dos alunos em
relação com a especificidade escolar foi primordial para o seguimento das
aulas. Desse modo, salientamos, também, a importância do planejamento,
visto que é um apoio ao desenvolvimento com direção e sequência.
Tivemos como temática Identidade e Memória, trabalhando biografia,
autobiografia, para identificar as características e as partes do gênero textual
autobiografia (contexto histórico, identidade, cronologia do tempo, marcadores
de tempo, fatos importantes, realizações, onde estudou/estuda, o que mais
gosta). Após expor aos alunos a temática, explicamos o que as características
da biografia e apresentamos a biografia de Carolina Maria de Jesus, levamos
um cartaz com as informações, assim como sua obra Quarto de Despejo Diário
de Uma Favelada.
Os alunos expressaram muito interesse, a partir disso pedimos para que
eles desenvolvessem sua autobiografia, tivemos um resultado significativo,
muitos relaram os sonhos, contaram suas histórias, e se sentiram escritores,
destacando a vida da autora. Com isso, trabalhamos leitura, escrita, memória,
identidade, história, relacionamos o contexto dos alunos com a especificidade
escolar. Mas não conseguimos realizar todas as atividades por conta do tempo
e atividades da escola, com isso avançamos as propostas.
Destarte, foi possível perceber que o Estágio Supervisionado propicia o
contato com a práticas, porém, o tempo em que os alunos permanecem na
escola, principalmente em sala, não permite uma sondagem mais ampla do
universo escolar. Entendemos que é necessário que momentos como o Estágio

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sejam contemplados com mais componentes, os alunos(as) estagiários(as)
necessitam de mais experiencias que consolidem em práticas pertinentes.
Para tanto, o Estágio se configura como eixo estruturante do
pedagogo(a), principalmente na prática emancipadora de educação, em que os
alunos precisam participar do processo de desenvolvimento, assim como no
processo de reflexão. Segundo Freire (2014) a educação critica busca romper
com a concepção bancária, reprodução de conhecimento, com o objetivo da
emancipação. Desse modo, destacamos a necessidade de mais atividades 1017
como o Estágio no Curso de Pedagogia da UFPB, essas experiências somam
na formação do profissional, que ao chegar em sala de aula possam
reconhecer o universo escolar com base na sua formação.
No tópico abaixo dissertaremos sobre o projeto escola Zé Peão e como
ele vem contribuindo e pode contribuir para a formação dos professores do
curso de Pedagogia da UFPB.

A EXPERIÊNCIA DO PROJETO ESCOLA ZÉ PEÃO E SUA CONTRIBUIÇÃO


PARA OS PROFESSORES DO CURSO DE PEDAGOGIA

O projeto Escola Zé Peão, embora tenha sido criado nos anos 90, se
tornou programa no ano de 2012, quando então o governo federal assumiu seu
financiamento. No início do ano letivo o programa abre inscrição para que os
alunos dos cursos de licenciatura possam se inscrever para atuarem como
professores nos canteiros de obras. Após a inscrição existe uma formação com
todos os inscritos e a partir dessa formação é que são selecionados os alunos
que serão posteriormente professores nos canteiros.
Os coordenadores do projeto, juntamente com a coordenadora
pedagógica visitam no início do ano os canteiros de obras e fazem as parcerias
com os empresários para que as escolas possam funcionar nos próprios
prédios que se encontram em construção. Os vários alunos, dentre eles os do
curso de pedagogia são encaminhados para esses canteiros somente após
passar por toda essa formação e estarem bem preparados para atuar com
esse público.

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Desta forma, o processo de formação desses professores se dá de duas
formas, uma no início do ano com a formação inicial que dura 40 horas
semanais e tem o objetivo de preparar esses discentes e discutir assuntos
relacionados ao mundo do trabalho da construção civil na perspectiva da
Educação de Jovens e Adultos. De acordo com Santos (2013, p. 15) essa
formação é organizada em quatro módulos:

1. São trabalhadas as identidades dos sujeitos perpassando 1018


entre: operários, estudantes, sindicato, a EJA e o Programa
Escola Zé Peão;
2. As metodologias aplicadas em EJA através dos métodos de
ensino;
3. Visa conteúdos específicos de planejamento de
alfabetização em uma perspectiva de proposta de educação
popular;
4. Debruça-se na prática pedagógica em si, em que se
organizam espaços para que os/as educadores/as possam
vivenciar e colocar na prática o que apreendeu dos elementos
estudados na formação inicial.

Após serem selecionados, os alunos que são encaminhados aos


canteiros passam pela segunda formação, que é a formação continuada, que
dura o ano inteiro, no qual são abordados os planejamentos pedagógicos
semanais, sistematização das experiências nas salas de aula que buscam
refletir sobre as dificuldades e avanços encontrados em sala de aula e ainda
tem as visitas pedagógicas da equipe do zé peão que são feitas aos canteiros
de obras.
Ressaltamos aqui a importância dessa formação inicial e continuada
oferecida pelo Zé Peão para nossa formação durante o estágio supervisionado,
embora o Zé Peão não faça parte oficialmente como um programa de estágio,
mas enquanto discentes do curso de pedagogia e professoras do Zé Peão
fizemos o nosso estagio supervisionado V a partir da área de aprofundamento
no Zé Peão e foi possível ver a diferença entre um estágio com formação e
continuidade dos demais estágios supervisionados do curso de Pedagogia. Em
alguns relatos durante o curso de Pedagogia, alguns alunos destacam que os
estágios não permitem uma continuidade e eles se sentem “jogados” em uma
realidade que eles ainda não conhecem, especialmente no estágio da EJA, já

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que cursamos apenas um componente relacionado a ela e mesmo assim
ficamos apenas na teoria e não temos nenhum contato com os sujeitos.
O projeto escola zé peão além de proporcionar essa continuidade, pois
estivemos lá todos os dias mantendo um relacionamento diário com os alunos,
ainda tivemos a oportunidade de passar por essa formação inicial e continuada,
o que enriqueceu ainda mais nosso processo de formação com esses alunos.
Concordamos com Laffin (2012) que a formação inicial para atuar com as
turmas de EJA é um requisito principal, assim como a formação em exercício, 1019
já que os próprios documentos, como as Diretrizes Curriculares de Pedagogia
(2005) e da Formação de Professores da Educação Básica (2001) não
constituem a EJA como necessidade específica dessa formação, desta forma
essa formação acaba ficando a cargo do próprio professor em sua busca diária
por uma maior qualificação para atuar com esse público.
Consideramos que o curso de Pedagogia da UFPB deixa um pouco a
desejar no sentido da formação inicial para a atuação com a EJA, mas que
através de projetos de extensão como a escola zé peão é possível suprir essas
necessidades, embora o projeto se encontre atualmente passando por
momentos difíceis que arriscam a sua continuidade, esperamos que ele
continue e possa está assim ajudando e capacitando cada vez mais os alunos
dos diversos cursos de licenciatura da UFPB.

CONCLUSÃO

Consideramos, diante do exposto que a educação de jovens e adultos


ainda passa por grandes desafios a serem enfrentados no que tange a
formação inicial e também continuada dos profissionais que atuam nesta área.
Através do fluxograma do curso de Pedagogia da UFPB percebemos que a
formação destes futuros professores em relação a Educação de Jovens e
Adultos ainda deixa muito a desejar, pois durante todo o curso só se tem uma
maior proximidade com a área e até mesmo com os sujeitos da EJA quem tem
a oportunidade de optar pela área de aprofundamento da EJA.
Essa escolha produz lacunas na formação do docente, dado que o
Estágio não dispõe de tempo considerável para uma maior vivência no espaço

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escolar. E a EJA com os seus desafios, para espaços pertinentes de formação
crítica, precisa de docentes, essencialmente, conscientes da dinâmica dessa
modalidade, da vivencia social dos sujeitos que a compõe. No entanto, como já
exposto acima, nos parece que o programa Zé Peão, com suas duas etapas de
formação de professores, dá mais suporte aos conhecimentos teóricos e
práticos da EJA do que o próprio curso de Pedagogia da UFPB. Concordamos
com Santos (2013, p. 16) que o programa zé peão “deveria ser uma
oportunidade a ser somada na formação de todos os graduando, mas isso 1020
infelizmente ainda é uma utopia, já que são poucos os alunos que podem
participar do Programa, seja por questões de vagas oficiais para educadores,
seja por falta de conhecimento e/ou interesse. Portanto concluímos que a
participação no programa escola Zé Peão nos proporcionou uma formação
diferenciada da oferecida nos estágios do curso de Pedagogia da UFPB, nos
possibilitando enxergar de forma diferente e educação de jovens e adultos,
entendendo que ensinar não é algo mecânico, mas uma troca de
conhecimentos, foi uma experiência riquíssima, na qual esperamos que todos
os alunos do curso possam um dia vivencia-la.

REFERÊNCIAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 58 Ed. Rio de Janeiro. Editora Paz e Terra.
2014.
GONSALVES, Elisa Pereira. Conversando sobre iniciação a pesquisa científica. 3
ed. Campinas, SP: Editora Alínea, 2003.
LAFFIN, Maria Hermínia Lage Fernandes. A construção da docência na educação de
jovens e adultos. Revista Currículo sem Fronteiras, v.12, n.1, pp. 210-228, Jan/Abr
2012.
PIMENTA, S. G. e LIMA, M, S. Estagio diferentes concepções. In: estagio e
docência. 6º ed. São Paulo: Cortez, 2011.
PIMENTA, S. G. e LIMA, M. Porque o estágio para quem não exerce o magistério:
o aprender a profissão. In: PIMENTA, S. G. e LIMA, M. Estagio e docência. São
Paulo, Cortez, 2004.
SANTOS, Mirinalda Alves Rodrigues dos. BARBOSA, Vilma de Lurdes. FORMAÇÃO
DE PROFESSORES PARA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO CURSO DE
PEDAGOGIA E NO PROGRAMA ESCOLA ZÉ PEÃO: um estudo comparativo. Anais
do colóquio internacional de pesquisa em educação superior, 2013, p. 1-18.
SANTOS, Mirinalva Alves Rodrigues dos. O Ensino Religioso e o Programa Escola
de Zé Peão: interfaces e articulações no currículo, 2015. 155 f. Dissertação
(Mestrado em Ciências das Religiões)- Universidade Federal da Paraíba, João
Pessoa, 2015

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EDUCAÇAO PATRIMONIAL: O ENSINO NA EJA

Wedja Celina Nascimento da Costa | Elenilza Ferreira de Melo | Dayvison Bandeira de


Moura

RESUMO: Este artigo trata da Educação Patrimonial na atual agenda de ensino no


Brasil. Com base na pesquisa que foi utilizada concluímos que a Educação Patrimonial
no Ensino de Educação de Jovens e Adultos (EJA) se mostra ausente e isso pode ser
resultado de uma condição que impõe dificuldades na difusão da cultura brasileira,
incluindo a preservação de espaços históricos e prédios, paisagens naturais e objetos 1021
em geral. Neste cenário, estudantes do EJA – Educação de Jovens e Adultos –
passam a ficar também de fora do ensino da Educação Patrimonial em seu currículo,
sendo imprescindível uma legislação específica para inserir a Educação Patrimonial
em todas as instituições de ensino. O ensino da Educação Patrimonial é importante
para que a consciência histórica da nação seja preservada. Assim, o objetivo geral
desse artigo é apresentar bibliograficamente qual o conceito de patrimônio e sua
importância no ensino de todas as classes sociais. Da pesquisa depreende-se que
mesmo sendo evidente a ausência do ensino da Educação Patrimonial a Jovens e
Adultos que estão fora do padrão educacional nacional, a inserção desta temática é
essencial para preservação da memória cultural do país. A metodologia utilizada foi a
Pesquisa Bibliográfica.
Palavras-chave: Educação Patrimonial. Ensino. Educação de Jovens e Adultos. EJA

INTRODUÇÃO

Este artigo trata da Educação Patrimonial e o ensino na EJA. A


Educação Patrimonial ainda está ausente no ensino brasileiro e ocupa espaços
incertos na construção das políticas do país. Com a criação do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), na década de 1930, a
Educação Patrimonial passou a ser associada à unidade nacional; neste
sentido, o imaginário brasileiro e a preservação do patrimônio material foi
alcançando espaço. Para compor essa unidade nacional, no Brasil foi criado o
Programa Mais Educação na tentativa de articular a Educação Patrimonial com
os inúmeros processos de “patrimonialização” cultural que vigoram no Brasil.
Desse modo, para promover ações educativas que identifiquem as referências
culturais da nação e fortaleçam os vínculos das comunidades com seu
patrimônio natural e cultural, foram propostas oficinas de Artesanato Popular,
Práticas Circenses, Capoeira e Educação Patrimonial.

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Nesse cenário, é essencial que haja um reconhecimento das formas de
apropriação dos bens culturais, tanto materiais como imateriais, sendo
importante a inclusão da Educação Patrimonial no EJA para conhecer as
atividades humanas no meio natural e a valorização do patrimônio local. O
tema deste artigo pode trazer novos rumos para o ensino da Educação
Patrimonial em todas as entidades de ensino, principalmente na educação de
jovens e adultos considerados excluídos do padrão educacional. A pergunta
norteadora deste estudo é: qual a importância de se colocar no currículo 1022
nacional de ensino o estudo do patrimônio cultural brasileiro? A hipótese da
pesquisa é que diante do atual cenário educacional brasileiro e da quantidade
de importantes patrimônios existentes é indispensável que na agenda
educacional seja inserida o tema Educação Patrimonial em todas as
instituições escolares.

METODOLOGIA

A construção deste artigo foi efetivada com pesquisas e


consultas em trabalhos científicos, sites, revistas e obras de autores que
escreveram sobre o tema com o propósito de tornar o estudo relevante. Utilizar
a pesquisa bibliográfica tem em vista determinar a importância atribuída a um
tema ou objeto a ser pesquisado. E isso baseando-se em estudos e/ou
pesquisas já realizados e consolidados pela Academia e, preferencialmente,
figure de credibilidade nesta. Desta maneira, a identificação e seleção de
fontes em acervos disponíveis em sítios virtuais, bibliotecas desempenham
relevância no processo de busca. Isso se apresenta como uma possibilidade
importante.

Portanto, com base na pesquisa bibliográfica se enfoca será


dimensionado as possibilidades e parâmetros para realizar outra pesquisa,
parafraseando o autor Dane (1990). Com essas orientações, considera-se as
mesmas como passo inicial para a elaboração de qualquer pesquisa, segundo
Webster e Watson (2002) que com isso ampliam a compreensão dessa
metodologia. Ainda, é possível relacionar essa ponderação e associá-la à

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concepção de (GIL, 2007), quando adverte que a revisão bibliográfica estar
atrelada a identificação de artigos, livros, dissertações e ou teses que
mantenham imbricação entre objeto de estudo a ser ampliado nas fontes
consultadas. Logo, a leitura de resumos e de palavras-chave revela-se
enquanto elementos que guiarão a busca em fontes bibliográficas que irão
subsidiar à leitura. E esta atenderá a um caráter exploratório.

DESENVOLVIMENTO
1023
1. A CONCEPÇÃO DE PATRIMÔNIO EM GERAL

O patrimônio, de acordo com MELO & CARDOZO (2015) é conceituado


como sendo tudo aquilo de que se tem em posse, o que é acumulado durante a
vida, sendo imaterial e materialmente em consequência do trabalho. Desse
modo, no decorrer da vida o ser humano fabrica a mobília de sua casa, compra
veículos e, em suma, monta suas condições individuais e familiares de vida. No
decorrer do tempo e na transição das gerações os pais transmitem aos filhos
seus valores éticos, como fé para seguir a vida, honestidade, perseverança,
trabalho, entre outros. A este agrupamento de valores é dado o nome de
patrimônio moral.

Patrimônio é entendido como a concretização da produção histórico-


social da humanidade, e, consequentemente, precisa ser socializado, o que é o
propósito da educação patrimonial (MELO; CARDOZO, 2015). A Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) dividem
o patrimônio cultural em três tipos: Sítios, Monumentos e Edificações.

HEYMANN et al (2016) afirmam que o significado de Patrimônio vai além


das duas classificações como patrimônio material e imaterial, em termos
mundiais, segundo informa a UNESCO e o Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) no Brasil. Para compreender o patrimônio como um
tópico sócio-histórico é necessário imergir nas relações sociais essenciais que
existem na sociedade brasileira e no domínio de classe que traça
principalmente esta sociedade.

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Segundo HEIMANN et al (2016), em todos os seus contornos, o
patrimônio resulta das ações humanas a serem herdadas pelas próximas
gerações, sejam elas planejadas em edifícios ou em um complexo urbano de
natureza histórica, ou sejam no aspecto imaterial, projetadas nas tradições,
modos de fazer, de construir instrumentos musicais ou artefatos, de fabricar
alimentos, de obras de arte corporais e outras manifestações.

SANTANA (2012), diz que a concepção de patrimônio, vista como


1024
construção cultural, se expandiu bastante nas últimas décadas, incluindo
aspectos intangíveis ou imateriais, seguindo as revisões essenciais do tema
patrimônio cultural na atualidade.

O universo da arte, em cumplicidade com o patrimônio cultural tem


trazido significativas colaborações, sobretudo quanto à dimensão harmônica da
questão patrimonial. O ponto de entrave do conceito de arte não é dado pela
categórica diferença, mas pela atribuição de valor. Por exemplo, obra de arte é,
segundo Santana:

um complexo monumental e até uma cidade inteira, e podem


considerar-se obras de arte em si mesmas as coisas que
constituem aqueles conjuntos (edifícios religiosos e civis,
públicos e privados, ruas, praças, parques, pontes, estátuas,
fontanários, etc.). No extremo oposto da escala dimensional,
podem ser arte as miniaturas ou gravuras que ornamentam as
páginas de um livro, as pedras preciosas, as moedas, etc.
(SANTANA, 2012, p.143).

Para PIO (2017) quando o uso do patrimônio é feito como marca da


singularidade, os bens que são tombados passam a ser percebidos como traço
da modernização econômica e social ou mesmo como um sinônimo de
inovação. A inter-relação entre programas estratégicos e o investimento feito
pelas cidades na área de marketing e o papel cada vez mais significativo do
turismo cultural objetivam também tornar mais visível ou criar a personalidade
das cidades. Nesse cenário, a gestão dos municípios busca articular entre os
objetos de preservação do patrimônio, o progresso evolutivo da infraestrutura
da região e a instalação de equipamentos culturais.

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Ao se falar em patrimônio, lida-se com identidades, histórias e
memórias que são conceitos interligados, dos quais os conteúdos são
estabelecidos e transformados ao longo do tempo. A ideia de patrimônio é
assim confundida com a de propriedade herdada. O processo pelo qual o
patrimônio é formado é o de colecionar peças, mantendo-as distantes do
circuito das atividades econômicas, sujeitas a uma especial proteção ao olhar
dos humanos. O valor dessas peças é estipulado pelas tradições e pelos mitos
(OLIVEIRA, 2015). 1025

2. O PATRIMÔNIO CULTURAL: MATERIAL E IMATERIAL

Quando se fala em patrimônio, duas diferentes ideias surgem:


patrimônio coletivo e patrimônio individual. O primeiro refere-se a objetos
pertencentes à memória coletiva dos diferentes grupos de uma comunidade.
Vale ressaltar, no entanto, que é um conjunto de bens que se refere à
coletividade, sendo passível de frequentes mudanças, com diferentes
interesses conflitantes, que, de certa forma, irá contribuir para que determinado
bem seja valorizado como sendo coletivo ou não, dependendo dos conflitos e
da geração. O segundo se refere aos bens individuais transmitidos aos
herdeiros, podendo ser materiais, de valor comercial alto (empreendimento,
imóvel, automóvel, etc.) ou de valor comercial baixo, mas de alto valor
emocional, como livros, fotos, diários, discos autografados, imagens religiosas,
dentre outros (ARAÚJO, 2013).

REZENDE & SILVA (2013), argumentam que Patrimônio Cultural hoje é


considerado como um conjunto de objetos materiais e imateriais que foram
deixados por nossos antepassados e que, em uma concepção de
sustentabilidade, devem ser transmitidos aos nossos descendentes, sendo
acrescentados novos conteúdos e novos significados. Araújo (2013), aduz que
o patrimônio cultural passou a ser entendido a partir dos sítios arqueológicos,
das estruturas e objetos herdados do passado providos de valores culturais,
artísticos e históricos, como também dos monumentos arquitetônicos,
passando ainda a integrar todos os objetos que retratavam os aspectos

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culturais de um grupo social ou de uma sociedade. Esses objetos podiam ser
guardados em três categorias: bens imóveis e móveis (que representassem
uma vasta importância para o patrimônio cultural das populações); centros
monumentais (que tivessem uma considerável quantidade de bens culturais) e
os edifícios (dos quais o efetivo e principal destino fosse o de expor e
conservar os bens culturais móveis). Após a ampliação do conceito, todos os
demais documentos internacionais e as convenções passaram a considerar o
tema patrimônio, aderindo a esta nova interpretação nas abordagens às 1026
demandas culturais.

Todos os bens culturais e naturais, imateriais e materiais,


demonstrações eruditas ou populares, monumentos, são apontados como
patrimônio cultural desde que tenham uma referência à identidade, à memória
e à ação dos vários elementos étnico-culturais, formadores da pátria brasileira
(ARAÚJO, 2013).

Na visão de SONCINI (2017), o conceito de Patrimônio Cultural Imaterial


está associado à expansão do conjunto de práticas, manifestações e
expressões humanas conhecidas no universo da cultura. Este conceito resulta,
consequentemente, na expansão dos fatos da realidade sobre os quais a
política de patrimônio se refere e pelo qual este tipo de bem cultural justifica.
Em termos mais tangíveis, significa que as ações e os procedimentos para a
proteção e para o reconhecimento do patrimônio material, valor conferido aos
monumentos, sítios arqueológicos, conjuntos arquitetônicos, tem uma
substancial diferença das ações necessárias para o reconhecimento e proteção
do patrimônio imaterial que inclui técnicas artesanais, saberes culinários,
celebrações, dentre outros.

SONCINI (2017), ressalta que é importante apontar especificidades de


cada patrimônio e analisar documentos de identificação de bens culturais
imateriais reconhecidos no Brasil para diagnosticar possíveis riscos aos quais
estariam submetidos, e às respectivas proposições de conservação e proteção
no âmbito da política de reconhecimento do patrimônio cultural deste país.

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No intuito de entender o que justifica o reconhecimento desta sucessão
de manifestações como patrimônio cultural, acredita-se ser oportuno
apresentar parte das discussões sobre o conceito de cultura. Em recentes
estudos contemporâneos, a concepção de cultura é vista como o sistema de
significações por meio do qual, necessariamente, uma lícita ordem social é
estudada, comunicada, vivenciada e reproduzida. Nessa corrente de
pensamento, é possível acrescentar que a cultura é como um universo das
necessidades e sua área é o domínio das necessidades, aquelas mesmas que 1027
estabelecem a sobrevivência orgânica, social e psíquica (SONCINI, 2017).

O autor acima citado revela que é possível até mesmo adotar o adjetivo
cultural como sendo o que responde a uma necessidade, ou seja, qualquer
necessidade de acordo com um sentido e um valor. Esta definição é muito útil
para compreender a expansão do universo de manifestações consideradas
patrimônio, uma vez que o patrimônio cultural imaterial abrange tanto
manifestações que necessariamente não seriam produzidas como tal em
abordagem mais restrita, quanto expressões artísticas mais habitualmente
reconhecidas como do universo da cultura.

Na visão de REIS (2015), a identificação do patrimônio seria traçada em


padrões científicos de análise, reunidos a categorias vivenciais e sensitivas,
indicadas como imprescindíveis para que seja criado uma relação afetiva de
todos com o patrimônio de sua cidade.

No Brasil, a prática de tombamento é constituída em termos jurídicos,


em uma medida de natureza preservacionista por meio da inscrição de um
objeto em um, ou mais de um, dos registros de tombo e suas implicações. Os
registros em livros de inscrição dos bens tombados apontam a maneira como é
classificado o patrimônio material da cidade, estado ou país, podendo
diversificar de um lugar para outro, tanto a quantidade de livros, quanto os tipos
utilizados.

O patrimônio cultural material é constituído por qualquer objeto tangível


como: museus, construções antigas, vestimentas, ferramentas, adereços,
objetos pessoais, patrimônio arqueológico e paleontológico, cidades históricas,

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edifícios militares e religiosos, jardins, documentos, cerâmica, monumentos,
esculturas, instrumentos musicais e outros objetos que representem a
capacidade de apropriação do ser humano ao seu espaço ambiental e ao modo
de organização da vida cultural, social e política (REZENDE; SILVA, 2013).

3. EDUCAÇÃO E CULTURA NACIONAL: LEITURAS DA MODERNIDADE

Existe um ordenamento jurídico que faz o Brasil ficar ao lado de outros 1028

países que costumam adotar um ideário liberal e individualista, o que é,


inclusive, traduzido na grande quantidade de regulamentos e leis que há no
país. No entanto, o Brasil é uma nação em que as relações pessoais ainda são
profundamente importantes e, consequentemente, há a combinação de uma
sistematização individualista, formal e burocrática da vida social com uma
maneira informal e pessoalizada de solucionar os problemas que a própria
modernidade coloca no cotidiano (SILVA, 2014).

No entendimento de Silva (2016), educar passa a ser função de todo o


Estado, na busca de interlocuções com inúmeros setores da sociedade, como
a cultura, a memória regional, os movimentos e atores sociais.
Simultaneamente, temáticas e ações próprias de vários outros segmentos do
estado que passam a circular pela escola pública, formam uma grande
quantidade de projetos e agenciamentos culturais que são espalhados pelas
instituições de ensino.

Ortiz (2013), diz que outra influência interna que esclarece e fornece
ênfase da cultura nas políticas de escolarização pode ser vista na educação
patrimonial. A reorganização do grande campo cultural, artes e educação
patrimonial formam o significado das memórias e do patrimônio cultural como
conteúdo desta política, levando em consideração o respeito e a promoção da
diversidade cultural e às inúmeras produções estéticas como diretrizes. Ao ser
valorizada as expressões culturais, parâmetros de ação pedagógica são
estabelecidos, os quais são orientados pela suspensão das monoculturas que
ainda são derivadas das mudanças sociais vivenciadas na passagem para o

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século XIX. Por outro lado, a influência da Unesco é revelada tal como
acontece nas demais ações patrimoniais no Brasil.

Em prol da diversidade cultural, Silva (2016), revela que foi criado no


Brasil em 2010 o Programa Mais Educação, instituído pelo Decreto nº
7083/2010 e pela Portaria Nº 17/2007. Este programa é parte integrante do
Plano de Desenvolvimento da Educação e assume textualmente diretrizes
político-culturais, uma concepção de respeito pedagógico às desigualdades
1029
culturais. Nesse programa, as atividades propostas de planejamento
evidenciam o articulado interesse entre a educação patrimonial e os inúmeros
processos de patrimonialização cultural presentes no Brasil.

Segundo Silva (2016), o objetivo da introdução da educação patrimonial


no Programa Mais Educação é impulsionar a aprendizagem das culturas locais
e dos conteúdos da territorialidade para as experiências escolares. Desta
forma, é dada ênfase à investigação das referências e práticas culturais
presentes na escola e em seu entorno, evidenciando, pelo menos no marco
documental, interesse investigativo pelas culturas brasileiras. A pesquisa de
referências culturais é uma metodologia que foi desenvolvida pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) como ferramenta para
patrocinar ações de registro e efetuar um censo demográfico mais extenso das
manifestações culturais do país.

4. EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E DIVERSIDADE CULTURAL À LUZ DA EJA

A Educação de Jovens e Adultos tem a função de absorver os excluídos


por idade, distorção e ano, num curso escolar que continua a reproduzir
excluídos. Entretanto, evidencia-se no Brasil a progressiva quantidade de
analfabetos absolutos (jovens e adultos), cuja a maioria apresenta um precário
domínio da escrita e da leitura, assinalando de forma oficial, como o
analfabetismo funcional é propagado nas escolas, retratando um perverso
contexto para adultos e jovens que já se encontram fora do sistema de ensino
regular (CORTE, 2016).

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Souza (2015), ressalta que no Brasil, a história da EJA é marcada por
uma relação de domínio que historicamente é determinada entre as classes
populares e a elite, manifestando-se em documentos oficiais que tratam a EJA
como um favor e não como estabelecimento de um direito. Nesse sentido,
mostra-se um aspecto de que a escolarização de adultos e jovens é algo ínfimo
que se destina à cidadãos inferiores. Esse julgamento faz fomentar o
preconceito contra esse público, visto como culturalmente inferior, marginal e
incompetente. 1030

Na Visão de Corte (2016), é importante ressaltar que a educação é


responsável pela libertação do ser humano das condições sociais de
dominação. Nesse entendimento, ela deve dar a possibilidade a uma
consciência crítica que favoreça a exibição dos contrastes sociais e a
capacidade de exercer a cultura efetivamente humana em oposição à indústria
cultural.

No Brasil de hoje Corte (2016), diz que ainda se vê a incapacidade


formativa da educação vigente, assinalando, portanto, que na Educação a crise
é gerada pela crise da formação cultural, promovida pela sociedade capitalista
que faz alienar as pessoas nas suas verdadeiras condições de vida, até
mesmo os que tenham sido escolarizados.

Assim, a educação é voltada para a ilusória formação do sujeito que


finda por contribuir para a deformação da consciência (perda da consciência
individual pela massificação). A educação nega o acesso aos reais bens
culturais, deixando, desse modo, emergir sentimentos desumanos e mais
cruéis já registrados na história da humanidade, fruto da perda da subjetividade
humana, seguida da incapacidade de solidariedade, respeito e amor ao
próximo, demonstrando como a cultura de massa faz regredir o esclarecimento
em favor da mera ideologia, o que mostra que a escola é uma entidade
controlada pela indústria cultural. A ilusória formação dos sujeitos é vista na
Educação de Jovens e Adultos, tendo em vista que a cultura é banalizada por
ela. Os estudantes recebem um certificado apenas por frequentarem a escola
(CORTE, 2016).

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Acrescenta Silva (2015), que a relação entre o patrimônio e a
educação foi orientada pela construção imaginária do nacional, comprovando
representações eurocêntricas de patrimônio, principalmente a partir dos
restantes traços de materiais do período colonial. A educação patrimonial
aparece em meio aos debates a respeito da necessidade de se aprofundar o
conhecimento e a preservação do patrimônio cultural e histórico.

Nesta nova ordem social globalizada, cultura, patrimônio e educação


1031
passam a ser mediadores de expectativas de rentabilidade, lucro e
desenvolvimento, bem como estas práticas são envolvidas em novos
processos de organização (SILVA, 2016).

CONCLUSÃO

O artigo tratou da Educação Patrimonial e o ensino na EJA.


Aparentemente, nos dias atuais lidamos com a iniciativa da sociedade na
preservação do patrimônio a partir da realização de ações de cunho educativo
e de seus próprios pressupostos e de ações de grupos sociais para evitar o
risco de descaso, abandono e desvalorização do patrimônio nacional. Esse
movimento busca cobrar do Estado normas e diretrizes que contribuam para
conscientização da comunidade escolar no intuito de colocar em pauta a
Educação Patrimonial como disciplina regular de ensino.

Percebe-se que, desde então, o que vem ocorrendo é que as atividades


de vários setores do patrimônio nacional estão priorizando a parte econômica
ao invés de valorizarem o legado existente no país. Atualmente, o patrimônio
nacional está mais associado a critérios econômicos muitas vezes devido a um
desenvolvimento integral. Não há uma defesa do patrimônio nacional
considerado um bem memorável que possa trazer para gerações futuras o
interesse na preservação. O patrimônio constitui um elemento fundamental e a
área de Educação é um campo capaz de articular projetos que fortaleçam a
importância da preservação dos bens materiais e imateriais existentes no país.

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A Educação Patrimonial deve estar diretamente inserida no rol das
disciplinas escolares para conscientização geral, provocando interesse em
todas as classes sociais da necessidade da patrimonialização. É preciso que
haja uma intervenção mais eficaz no conhecimento do patrimônio nacional para
que vínculos histórico-culturais sejam concretizados. Nesse sentido, é
importante levar em consideração que o patrimônio nacional pertence à
comunidade que estabelece laços vitais com seus bens culturais fazendo
cumprir uma função social, uma vez que os vínculos da comunidade com seu 1032
patrimônio cultural não são estabelecidos apenas na esfera econômica.

REFERÊNCIAS

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patrimônio imaterial e cultural no Brasil e em Portugal tendo as Feiras como
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Perspectivas. Disponível em:
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A ESCOLARIZAÇÃO DE ADOLESCENTES RESIDENTES EM
INSTITUIÇÕES DE ACOLHIMENTO EM JOÃO PESSOA/PB: CONEXÃO
COM A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS A PARTIR DO PNE (2014-
2024)

Daiane Lins da Silva Firino | Roberta Maria Aguiar do Nascimento

RESUMO: Crianças e adolescentes são protegidos pelo Estatuto da Criança e do


Adolescente. O Acolhimento Institucional é previsto neste como uma medida protetiva
aplicada quando se esgotam todas as possibilidades de permanência deles junto à 1034
família, passando então a viverem sob a tutela do Estado em Instituições de
Acolhimento que devem garantir o seu desenvolvimento integral e assegurar todos os
seus direitos. Um desses direitos é a educação. Diante disso, este artigo tem o
objetivo de apresentar uma pesquisa sobre a situação escolar de adolescentes, entre
15 e 17 anos, residentes em Instituições de Acolhimento da cidade de João
Pessoa/PB e analisar o que é proposto, a partir do PNE (2014-2024), para solucionar
os problemas encontrados. Os dados foram coletados através de consulta às referidas
instituições, sendo essa pesquisa exploratória, descritiva e quanti-qualitativa. Os
achados revelaram um percentual elevado de adolescentes, dentro da faixa etária
citada, com distorção idade/ano e alguns analfabetos. Isto posto, o PNE atual
apresenta soluções que se conectam com a Educação de Jovens e Adultos, visto que
as metas relacionadas a correção do fluxo escolar e alfabetização, para a faixa etária
referida, estão no âmbito desta modalidade.

Palavras-chave: Acolhimento; Adolescentes; distorção idade/ano; EJA; PNE.

INTRODUÇÃO

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA- Lei 8.069/90) visa


proteger os direitos básicos destes. Dessa forma, quando há ameaça ou
violação de direitos, por parte da sociedade, do Estado, dos pais ou
responsáveis, ou ainda, através da própria conduta da criança e do
adolescente o ECA prevê medidas de proteção.
O Acolhimento Institucional é uma dessas medidas de proteção, listada
no art. 101 do ECA, e é aplicada quando estão esgotadas todas as
possibilidades da criança e do adolescente permanecerem junto à família.
Consequentemente, possui caráter provisório, excepcional e deve envidar
esforços no sentido de restabelecer a convivência familiar no menor tempo
possível (BRASIL, 1990). Não sendo possível o retorno para a família natural
ou extensa ou ainda a colocação em família substituta, ao completar 18 anos, o

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adolescente é desligado do serviço de acolhimento e deixa de estar sob a
tutela do Estado.
Conforme as Orientações Técnicas para Serviços de Acolhimento para
Crianças e Adolescentes, as Instituições de Acolhimento devem buscar o
desenvolvimento das potencialidades dos/as mesmos/as; realizar cuidados de
qualidade, condizentes com os seus direitos e suas necessidades físicas,
psicológicas e sociais; e propiciar o desenvolvimento integral, o fortalecimento
da cidadania, autonomia e inserção social dos/as acolhidos/as (BRASIL, 2009). 1035
Os direitos das crianças e adolescentes acolhidos são garantidos
através da “articulação da coordenação das instituições com a política de
saúde, educação, esporte e cultura na rede local”, proporcionando atendimento
“individualizado e personalizado, com estratégias metodológicas condizentes
com as necessidades” de cada um deles/as (BRASIL, 2009, p. 21).
Dentre os direitos assegurados está o direito à educação que é previsto
na Constituição Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(Lei 9.394/96) e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Este último, entende
a educação como elemento essencial e indispensável para a proteção integral
da criança e do adolescente, estando assegurado esse direito em seu art. 53. A
Constituição Federal e a LDB apontam a responsabilidade do Estado de
promover esse direito através da educação escolar que deve visar “o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1996, art. 2º).
Ainda segundo a LDB, os sistemas de ensino deverão assegurar,
gratuitamente, àqueles que “não tiveram acesso ou não puderam dar
continuidade aos seus estudos na idade própria, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses,
condição de vida e trabalho, mediante cursos e exames” (art. 37). Também
estabelece a possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso
escolar, de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do
aprendizado (art. 24) e de reclassificação do alunado, mediante avaliação (art.
23).

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Mesmo sendo garantido através dessas legislações o direito à educação
as crianças e adolescentes que chegam aos serviços de acolhimento trazem as
marcas das desigualdades sociais. Geralmente, são advindas de um contexto
de vulnerabilidade social aonde são alienadas desse direito humano básico que
é público, subjetivo e indispensável para sua proteção integral e para sua
cidadania, autonomia e inserção social.
Enquanto pedagoga do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), lotada no
setor de Acolhimento Institucional e Familiar (SAIF) da 1ª Vara da Infância e 1036
Juventude da Comarca de João Pessoa/PB, uma das autoras deste artigo,
sentiu a necessidade de mapear como estava a situação escolar dos/as
adolescentes acolhidos/as e analisar o que propõe o Plano Nacional de
Educação (2014-2024) para a correção do fluxo escolar e do analfabetismo,
visando compreender a real situação da escolarização destes/as, os desafios a
serem enfrentados e buscar meios de assegurar o direito à educação deles/as
através de toda a rede de proteção da criança e do adolescente, bem como
junto aos sistemas de ensino.
Diante disso, o objetivo deste artigo é apresentar a situação escolar de
adolescentes, entre 15 e 17 anos, residentes em Instituições de Acolhimento
da cidade de João Pessoa/PB e analisar o que é proposto no PNE (2014-2024)
para solucionar os problemas encontrados. Esse grupo etário foi escolhido,
pois, durante a coleta de dados, todas as instituições que trabalhavam com
adolescentes, nessa faixa etária, mencionaram a dificuldade de inserir os
mesmos em projetos, programas e atividades devido a baixa escolaridade, bem
como porque esse grupo está em via de desligamento institucional e precisa
que seja dada uma atenção especial à questão da escolarização.
Para a realização da pesquisa aqui descrita foi solicitado os seguintes
dados às Instituições de Acolhimento: relação do nome dos acolhidos, idade,
ano que estava matriculado em 2017, rede de ensino (pública –
municipal/estadual – ou privada), nome da escola. Algumas, repassaram os
dados de forma verbal, em reunião na 1ª Vara da Infância, que foram
registrados em uma tabela. Outras, enviaram os dados através de ofício.

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Os dados apresentados neste artigo foram coletados no ano de 2017 e
são referentes aos adolescentes, entre 15 e 17, por serem o público-alvo das
Políticas de Educação de Jovens e Adultos e o grupo etário que apresenta uma
problemática específica referente a escolarização diante da eminência do
desligamento institucional ao completar os 18 anos. Porém, as instituições
enviaram dados de todas as crianças e adolescentes que estavam acolhidos
naquele ano. A análise foi feita com base na Análise de Conteúdo (AC) de
Bardin (2011) seguindo as seguintes etapas do método: a pré-análise, a 1037
exploração do material coletado e em seguida o tratamento dos resultados. Os
dados foram tabulados, categorizados e feitos os cruzamentos necessários.
Duas categorias foram elencadas: estudantes de escolas municipais e
estudantes de escolas estaduais. Essa divisão foi realizada para, a partir do
conhecimento da rede de ensino na qual estavam matriculados/as os/as
acolhidos/as, ser possível focalizar as ações e solicitar providências à rede de
ensino responsável pelo respectivo grupo de estudantes. Nas análises não
foram contemplados os dados da rede particular por se tratar de bolsas
concedidas e não uma oferta permanente. Para compreender o nível de
escolaridade dos acolhidos os dados ainda foram separados por nível de
ensino (Fundamental e Médio) e contabilizados os que frequentavam a EJA e
programas de correção de fluxo.
Não temos, neste artigo, pretensão de teorizar sobre os achados, mas
de expor uma situação que precisa ser visibilizada para que políticas
específicas e ações sejam discutidas e direcionadas para esse público de
adolescentes em situação de Acolhimento Institucional e assim, estes tenham o
direito à educação respeitado e garantido, conforme preconiza a legislação.

DISTORÇÃO IDADE/ANO E ANALFABETISMO: PROBLEMAS A SEREM


SUPERADOS PELOS/AS ADOLESCENTES ACOLHIDOS/AS

Em 2017, em João Pessoa, havia nove (9) instituições de acolhimento


que possuíam um total de noventa (90) acolhidos, sendo 40 meninas e 50
meninos. Dentre os acolhidos, havia trinta e sete (37) crianças e cinquenta e
três (53) adolescentes. Dessa forma, 59% dos acolhidos eram adolescentes.

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Destes, 55% (29) estavam dentro da faixa etária de 15 a 17 anos, sendo treze
meninas e dezesseis meninos.
Dos adolescentes, com a faixa etária especificada, nove tinham 15 anos,
sendo três meninas e seis meninos; onze tinham 16 anos, sendo sete meninas
e quatro meninos; e nove tinham 17 anos, sendo três meninas e seis meninos.
Dois deles eram analfabetos e vinte e sete, um índice de 93%, apresentavam
distorção idade/ano. Apenas dois adolescentes, uma menina e um menino,
dessa faixa etária, estavam com a escolarização compatível com a idade. 1038
Isso é comum entre adolescentes que estão sob medida protetiva de
Acolhimento Institucional, segundo Paula, Camargo e Lauschner (2014), pois
vieram de uma situação de vulnerabilidade, onde o direito à educação estava
sendo violado, e quando chegam ao Acolhimento ainda enfrentam o
preconceito dentro dos estabelecimentos escolares devido a associação entre
adolescentes em medida sócio-protetiva e em cumprimento de medidas
socioeducativas.
Mediante essa associação os/as adolescentes são discriminados/as
dentro do ambiente escolar, fazendo com que “as relações aluno-escola, aluno-
professor e aluno-aluno fiquem fragilizadas e até mesmo expostas, provocando
insegurança nesses jovens em situação de acolhimento, fazendo com que os
mesmos se sintam como se não pertencessem aquele lugar” (PAULA,
CAMARGO E LAUSCHNER, 2014, p. 4). Isso aprofunda ainda mais a
defasagem escolar que já trazem consigo quando chegam às Instituições de
Acolhimento.
Esse atraso escolar é perceptível tanto nos adolescentes que
frequentam a rede municipal, quanto entre os que frequentam a rede estadual
de ensino de João Pessoa. No quadro abaixo, estão distribuídos os/as
adolescentes da rede municipal e estadual, estando o ensino médio
representado pela sigla EM e o ensino fundamental pela sigla EF. Os dados
estão divididos por sexo, sendo F utilizado para feminino e M para masculino.

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Quadro – Distribuição dos/as adolescentes acolhidos/as, entre 15 e 17 anos,
na rede estadual e municipal de ensino de João Pessoa.

ACOLHIDOS/AS ESTUDANTES DA REDE ESTADUAL


Não Fundamental I Fundamental II Ensino Alumbrar EJA
alfabetizados (regular) (regular) Médio (EM)
(ler e escrever)
F M F M F M F M F M F M
0 0 2 0 4 1 1 2 1 1 1
ACOLHIDOS/AS ESTUDANTES DA REDE MUNICIPAL
Não Fundamental I Fundamental II EJA 1039
alfabetizados (regular) (regular) (EF I e II)
(ler e escrever)
F M F M F M F M
1 1 0 1 3 3 0 7
Fonte: Dados retirados da relação disponibilizada pelas Instituições de Acolhimento,
2017.

Observa-se, no quadro, que a quantidade de acolhidos/as


matriculados/as na rede estadual e na rede municipal é equivalente. Há 13,
sendo 8 meninas e 5 meninos, matriculados na rede estadual e 14, sendo 3
meninas e 11 meninos, matriculados na rede municipal.
Segundo a LDB atual, é competência do município ofertar a educação
infantil e com prioridade o ensino fundamental, podendo atuar em outros níveis
de ensino (art. 11). Já o estado, deve assegurar o ensino fundamental e
oferecer, com prioridade, o ensino médio (art. 10).
Dessa forma, o ensino médio, inclusive na modalidade EJA, em João
Pessoa, é ofertado apenas pelo estado que também oferta o ensino
fundamental I e II, conforme as Diretrizes Operacionais para o Funcionamento
das Escolas Estaduais 2018. Este, com a finalidade de corrigir a distorção
idade/ano de estudantes do ensino fundamental desenvolve o projeto Alumbrar
que integra estudantes matriculados no 6° ou 7° ano e que tenham entre 13 e
17 anos. A prefeitura de João Pessoa oferta a educação infantil, ensino
fundamental I e II, regular e na modalidade EJA.
Dos adolescentes que estão matriculados na rede estadual de ensino
observa-se, a partir do quadro acima, que todos são alfabetizados; a maior
parte, 69%, está matriculada no ensino fundamental I e II e no Alumbrar, que

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se destina a conclusão do ensino fundamental; apenas quatro estão no ensino
médio e um deles está cursando na modalidade EJA. Este adolescente que
estava na modalidade EJA tinha apenas 17 anos, porém foi matriculado nesta,
pois não havia escola estadual que funcionasse o ensino médio regular noturno
próximo a instituição em que estava acolhido.
Na rede municipal, a maior parte dos/as acolhidos/as se encontrava na
Educação de Jovens e Adultos e no fundamental II regular, 13 deles, conforme
quadro acima. Dos que estavam na EJA, um estava no ciclo II (final do 1040
fundamental I), três no ciclo III (6° e 7º ano) e três no ciclo IV (8° e 9° ano).
Havia apenas um acolhido matriculado no fundamental I regular. Dois
adolescentes não sabiam ler e escrever, estando ambos matriculados na EJA.

O PNE (2014-2024): METAS E ESTRATÉGIAS VOLTADAS PARA A


CORREÇÃO DA DISTORÇÃO IDADE/ANO, DO ANALFABETISMO E A
CONEXÃO COM A EJA

A partir dos dados apresentados, percebe-se que medidas urgentes


precisam ser adotadas para diminuir a defasagem escolar dos/as adolescentes
acolhidos/as e combater o analfabetismo, assegurando o direito à educação
dos/as mesmos/as. A maior parte deles/as ainda estava frequentando o ensino
fundamental, em ambas as redes de ensino, quando deveriam já estar no
ensino médio, visto que os dados são referentes aos acolhidos entre 15 e 17
anos.
O alto índice de distorção idade/ano não é uma realidade apenas entre
os estudantes oriundos de Instituições de Acolhimento, mas de todo o alunado
da rede pública de ensino, municipal e estadual, da Paraíba, conforme dados
do Indicador Educacional “Taxa de Distorção Idade-Série”112, elaborado pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
a partir do censo escolar 2017.

112
O Indicador de Taxa de Distorção Idade-Série permite avaliar o percentual de alunos que
tem dois ou mais anos de idade acima do recomendado em determinada série (a idade
estabelecida para ingresso no ensino fundamental é de seis anos). Assim como os outros
Indicadores Educacionais do Censo Escolar 2017, esses dados estão disponíveis para
consulta no Portal do Inep, na seção Dados.

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De acordo com o referido indicador, em 2017, no âmbito da Paraíba,
37,4% dos estudantes do ensino fundamental e 41% do ensino médio, na rede
estadual, apresentavam distorção idade/ano. Já na rede municipal, esses
índices eram de 28% no ensino fundamental e 64,8% no ensino médio.
Focalizando a análise apenas nas escolas de João Pessoa, observou-se que,
na rede estadual de ensino, 41,9% dos estudantes dos anos finais do ensino
fundamental apresentavam defasagem escolar, sendo esse percentual na rede
municipal de 34,2%. No ensino médio, ofertado pela rede estadual na cidade 1041
de João Pessoa, havia 40,6% do alunado com atraso escolar 113.
Sendo a distorção idade/ano e o analfabetismo problemas nacionais, o
Plano Nacional de Educação (PNE) atual, sancionado através da Lei 13.005 de
25 de junho de 2014, com vigência até 2024, apresenta metas e estratégias
voltadas para sua superação. O PNE apresenta dez diretrizes, vinte metas e
duzentas e cinquenta e quatro estratégias que estão relacionadas com a
melhoria da qualidade da educação, universalização do atendimento escolar,
promoção de uma gestão democrática, valorização dos profissionais da
educação, financiamento e avaliação da educação. Destas, quatro metas e
suas estratégias se referem, diretamente, ao enfrentamento da distorção
idade/ano e do analfabetismo voltado para estudantes acima de 15 anos.
A meta 3 tem relação direta com a correção da defasagem do fluxo
escolar e os sujeitos da pesquisa apresentada nesse artigo. Ela estabelece
que, até 2016, seria universalizado o atendimento escolar para toda a
população de 15 a 17 anos e até 2020 a elevação para 85% da taxa líquida de
matrículas no ensino médio114. Dessa forma, nela está implicada a adoção de
medidas para que no ensino fundamental, regular ou Educação de Jovens e
Adultos, haja a correção da distorção idade/ano visando que até 2020 os
adolescentes cheguem com 15 anos no ensino médio (GRACINDO, 2011).
Portanto, ações voltadas para atingir essa meta beneficiarão os/as
adolescentes acolhidos/as, pois a maior parte está matricula no ensino

113
Dados retirados do site http://portal.inep.gov.br/web/guest/indicadores-educacionais. Acesso
em: 04/10/2018.
114
Taxa de Escolarização Líquida representa a razão entre o número de matrículas de alunos
com idade prevista, no caso do ensino médio de 15 a 17 anos, para estar cursando
determinada etapa de ensino e a população total na mesma faixa etária.

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fundamental. Porém, conforme o Observatório do PNE 115, a parcial dessa meta
não foi atingida. Em 2015, na Paraíba, o percentual de jovens de 15 a 17 anos
na escola era de 80,3%, abaixo da média nacional que era de 84,3%.
Duas estratégias desta meta falam diretamente da distorção idade/ano:
“Manter e ampliar programas e ações de correção de fluxo do ensino
fundamental, por meio do acompanhamento individualizado do(a) aluno(a) com
rendimento escolar defasado e pela adoção de práticas como aulas de reforço
no turno complementar, estudos de recuperação e progressão parcial, de forma 1042
a reposicioná-lo no ciclo escolar de maneira compatível com sua idade” (3.5); e
“fomentar programas de educação e de cultura para a população urbana e do
campo de jovens, na faixa etária de quinze a dezessete anos, e de adultos,
com qualificação social e profissional para aqueles que estejam fora da escola
e com defasagem no fluxo escolar” (3.10) (BRASIL, 2014). Vale ressaltar, a
importância da estratégia 3.13 que prevê a implementação de “políticas de
prevenção à evasão motivada por preconceitos ou quaisquer formas de
discriminação, criando rede de proteção contra formas associadas de exclusão”
(BRASIL, 2014), pois muitos(as) adolescentes acolhidos/as desistem de
frequentar a escola devido os preconceitos sofridos no ambiente escolar,
conforme visto acima.
Outras estratégias também são propostas para o alcance da referida
meta: mudanças no currículo do ensino médio e nas práticas pedagógicas de
forma a integrar teoria e prática e ser flexível e diversificado (3.1, 3.2, 3.3, 3.4,
3.12); avaliação certificadora integrada ao ENEM116 e ao Saeb117, possibilitando
aferição de conhecimentos e habilidades adquiridos dentro e fora da escola
(3.6); busca ativa da população de 15 a 17 anos fora da escola (3.9);
distribuição territorial e oferta nos turnos diurnos e noturnos das escolas de
ensino médio para atender a demanda (3.11).

115
Lançado em 2013, o Observatório do PNE é uma plataforma de advocacy e monitoramento
pelo Plano Nacional de Educação (PNE) que tem como objetivo contribuir para que ele se
mantenha vivo e cumpra seu papel como agenda norteadora das políticas educacionais no
País. Dados disponíveis no site: http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/3-ensino-
medio/indicadores. Acesso em: 08/10/2018.
116
Exame Nacional do Ensino Médio.
117
Sistema nacional de avaliação da educação básica.

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A meta 7 também propõe melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem,
porém essa melhoria, embora voltada para o educando, está centrada no
esforço para que as escolas alcancem um bom desempenho nas avaliações
nacionais e internacionais e atinjam as médias nacionais do Ideb 118. Apenas
uma estratégia nessa meta (7.12) se refere a distorção idade/ano e propõe o
desenvolvimento e incentivo de tecnologias educacionais e práticas
pedagógicas inovadoras.
Nos dados apresentados no quadro da seção anterior, observou-se que 1043
dois adolescentes, de 15 a 17 anos, não sabiam ler e escrever. Para essa
situação, o PNE estabelece em sua meta 9 a elevação da “taxa de
alfabetização da população com quinze anos ou mais para noventa e três
inteiros e cinco décimos por cento(93,5%) até 2015 e, até o final da vigência
deste PNE, erradicar o analfabetismo absoluto e reduzir em cinquenta por
cento a taxa de analfabetismo funcional”. Segundo dados do IBGE 119, o que foi
estipulado para ser alcançado em 2015 ainda não foi atingido, pois, em 2017, a
taxa de analfabetismo no Brasil era de 7,0%, o que representava 11,5 milhões
da população, acima de 15 anos, que ainda não sabiam ler e escrever. Na
Paraíba, havia 16,5% de analfabetos na faixa etária especificada.
Percebe-se que, nas estratégias para o alcance dessa meta (9.1, 9.2,
9.3), a responsabilidade de alfabetizar e proporcionar a continuidade dos
estudos para os que estão fora da faixa etária, a partir dos 15 anos, recai sobre
a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Segundo Gracindo (2011), as políticas
educacionais, a partir da década de 1990, “ao priorizarem financiamento e
ações para os estudantes de sete a 14 anos, encaminharam adolescentes para
a EJA” (p. 142) e esse direcionamento permaneceu até hoje, mesmo com a
ampliação da obrigatoriedade da oferta da educação básica dos 4 aos 17 anos,
conforme a mesma.
Diante disso, os sistemas de ensino deveriam realizar esforços para
assumir progressivamente os estudantes de 15 a 17 anos em suas redes
regulares de ensino, conforme propôs a Conferência Nacional de Educação

118
Índice de desenvolvimento da educação básica.
119
A sigla significa: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Os dados apresentados
foram retirados do site: https://www.ibge.gov.br/.

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(CONAE) realizada em 2010. Uma das diretrizes para as políticas de EJA,
elaborada na referida CONAE, estabelecia o atendimento de adolescentes de
15 a 17 anos, obrigatoriamente, na rede regular de ensino devendo esta adotar
práticas direcionadas para essa faixa etária e buscar acelerar a aprendizagem
e inclusão desse grupo em atividades de profissionalização (GRACINDO,
2011).
Mesmo com os apontamentos realizados pela CONAE citada, o PNE
atual foi aprovado com a previsão da inclusão dos adolescentes de 15 a 17 1044
anos, analfabetos e com distorção idade/ano, na modalidade EJA e não na
rede regular de ensino, conforme descrito acima. Isso indica que, até o final da
vigência do atual PNE, as políticas e práticas voltadas para a defasagem
escolar e alfabetização desse grupo estarão, prioritariamente, no âmbito da
Educação de Jovens e Adultos.
Diante da necessidade de profissionalização do público da EJA, o PNE
aponta a necessidade de articulação desta com a educação profissional,
conforme a meta 10 que prevê “no mínimo, 25% das matrículas de educação
de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada à
educação profissional” (BRASIL, 2014). Isso se coaduna com as necessidades
dos/as adolescentes acolhidos/as, pois além de estar tendo direito à
escolarização também estarão se preparando para o momento do
desligamento institucional, onde deverão ter autonomia e um projeto de vida a
seguir, sendo a profissionalização muito importante nesse processo.
Isto posto, a estratégia 10.1 busca a diminuição da defasagem escolar
por meio da criação de um programa nacional que integre conclusão do ensino
fundamental e formação profissional inicial. A 10.4 visa a ampliação de
oportunidades profissionais de jovens e adultos com baixo nível de
escolaridade. A 10.9 prevê para o alunado da EJA um programa nacional de
assistência social, financeira e psicopedagógica, contribuindo para o acesso,
permanência, aprendizagem e conclusão com êxito da escolarização. E, por
fim, a 10.11 diz que devem ser implementados mecanismos de reconhecimento
de saberes de jovens e adultos trabalhadores.

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CONCLUSÃO

Diante do exposto, ao longo deste artigo, foi possível verificar que quase
todos/as os/as adolescentes que residem em Instituições de Acolhimento
localizadas na cidade de João Pessoa/PB, entre 15 e 17 anos, matriculados na
rede pública de ensino (municipal e estadual), apresentam distorção idade/ano
e alguns não sabem ler e escrever. Devido a esse atraso escolar e aos déficits
na escolarização dos/as mesmos/as as coordenações das Instituições têm
1045
recorrido à Educação de Jovens e Adultos (EJA) e ao programa de correção do
fluxo escolar, Alumbrar, para sanar essa situação.
Mediante isso, buscou-se compreender como no atual Plano Nacional de
Educação (PNE), com vigência até 2024, estão propostas metas e estratégias
para o enfretamento desses dois problemas: a distorção idade/ano e o
analfabetismo entre os/as adolescentes de 15 a 17 anos. Analisar o que
propõem essas metas e estratégias foi importante, pois a partir delas foi
possível vislumbrar como serão direcionadas as políticas educacionais e
curriculares nos sistemas de ensino para resolver ou amenizar tais problemas,
visto que estes fazem parte de todo o sistema educacional brasileiro, conforme
os dados retirados do site do Observatório do PNE e do IBGE apresentados ao
longo do texto.
Dessa forma, verificou-se que, de forma direta, há quatro metas e várias
estratégias do PNE que tratam da distorção idade/ano e da alfabetização de
adolescentes na faixa etária especificada. Várias ações são previstas para o
alcance dessas metas, dentre elas, o acompanhamento individualizado;
estudos de recuperação; aulas de reforço no contraturno; acompanhamento
psicopedagógico; progressão parcial; busca ativa dos que estão fora da escola;
melhorias, flexibilidades e adaptações no currículo escolar e nas práticas
pedagógicas, inclusive com utilização de tecnologias educacionais e integração
da teoria e da prática; políticas de prevenção à evasão e combate à
discriminação e violência motivada por preconceitos; melhor distribuição
territorial das escolas e oferta de turmas diurnas e noturnas; e a integração da
escolarização com a qualificação profissional.

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Ainda observou-se que, mesmo diante dos encaminhamentos contrários
da CONAE (2010) antes da aprovação do atual PNE, a responsabilidade pela
alfabetização e correção da distorção idade/ano, da faixa etária já especificada,
recai sobre a Educação de Jovens e Adultos que deve se articular com a
educação profissional e assegurar o acesso, permanência, aprendizagem e
conclusão com êxito da escolarização, bem como a inserção social e produtiva
do público-alvo desta modalidade.
1046
REFERÊNCIAS

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Tradução: Luís Antero Reto e Augusto


Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASIL. Lei n.13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de
Educação – PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
DF., 26 jun 2014. Disponível em:
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm>.
BRASIL. Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do
Adolescente. Brasília: DF, 1990.
BRASIL. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Brasília: DF, 1996.
MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME.
Secretaria Especial dos Direitos Humanos/PR. Orientações técnicas: serviços
de acolhimento para crianças e adolescentes. Brasília, DF, junho de 2009.
PARAÍBA (Estado). Diretrizes (2018). Diretrizes operacionais para o
funcionamento das escolas estaduais 2019. João Pessoa: Secretaria de Estado
da Educação, 2018.
PAULA, Daiane Fernandes Giorgi de; CAMARGO, Simone Patricia Batista de;
LAUSCHNER, Mirella Cristina Xavier Gomes da Silva. A importância da rede
escolar em Curitiba–PR: a luta pela igualdade de direitos para crianças e
adolescentes em acolhimento institucional. In: REDOR, 18°, 2014, Recife.
Anais...Recife: Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2014. p. 1-11.
GRACINDO, Regina Vinhaes. Educação de Jovens e Adultos e o PNE 2011-
2020: Avaliação e perspectivas. In: DOURADO, Luiz Fernandes (org.). Plano
Nacional de Educação (2011-2020): avaliação e perspectivas. 2ª.ed. Belo
Horizonte: Autêntica Editora, 2011. p. 137-153.

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O TRABALHO DE CAMPO EM GEOGRAFIA E AS TRANSFORMAÇÕES
ESPACIAIS NA CAPITAL FEDERAL DO BRASIL: UM INSTRUMENTO DE
ENSINO NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA MODALIDADE DE
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – PROEJA

Jesiel Souza Silva, UnB¹


1047
RESUMO: O trabalho de campo em Geografia contribui para o aprimoramento das
habilidades discentes com relação à leitura e interpretação de documentos e
instrumentos geográficos e/ou cartográficos, como mapas e cartas, possibilitando aos
alunos a oportunidade de aliar os conceitos teóricos à prática. O objetivo deste
trabalho é entender a importância do trabalho de campo para o ensino de
geografia a partir de um trabalho de campo realizado em Brasília/DF, com alunos
do curso Técnico em Administração do PROEJA – do IF Goiano, Campus Rio
Verde. Os resultados do trabalho permitiram aos alunos entender a própria formação
de Brasília, considerada uma cidade-parque, a partir de quatro escalas distintas: a) a
bucólica; b) a monumental; c) a residencial; e, d) a gregária.

Palavras-chave: Brasília. Aula de Campo. Prática Pedagógica.

INTRODUÇÃO
A formação do conhecimento geográfico é resultado de diversos
processos e metodologias desenvolvidas e utilizadas ao longo dos anos.
Dentre elas, destacam-se as atividades de campo, realizadas em diferentes
espaços, onde o professor tem o papel de auxiliar o aluno através da
investigação do espaço para que ele possa ser uma parte essencial do
processo de percepção do espaço, compreensão da dinâmica espacial e
análise dos fenômenos propostos no estudo.
“A Geografia como ciência da sociedade e instrumento de análise
espacial precisa estar presente nas práticas de ensino de forma efetiva,
modificando o foco no qual os conhecimentos geográficos são evidenciados
transformando o status quo da memorização” (DE LA FUENTE, 2012, p, 23).
Assim, o trabalho de campo deve ser essencial na prática do professor de
Geografia, pois, além de auxiliar na compreensão da dinâmica espacial,
possibilita a apreensão do conhecimento de temáticas que são essenciais a

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uma análise espacial, assim como contribui para um olhar crítico voltado as
contradições da sociedade e transformações dos espaços.
Cioccaria (2013, p. 19) destaca que o trabalho de campo contribui “para
que o professor (re) signifique as metodologias de ensino, assim como
estabeleça parcerias efetivas com os alunos, que, respondendo às
expectativas, constroem seus significados”.
Conforme Souza e Pereira (2007), várias expressões são
frequentemente utilizadas para se referir a esse tipo de atividade, a saber: aula 1048
de campo, pesquisa de campo e outras. Segundo esses autores,

O trabalho de campo é entendido como toda e qualquer atividade


investigativa e exploratória que ocorre fora do ambiente escolar, é um
tipo de atividade que é na maioria das vezes muito bem aceita pelos
alunos, em função da possibilidade de sair da rotina escolar de sala
de aula, e é um instrumento didático importante no ensino de
Geografia, uma ciência que se encarrega de explicar os fenômenos
resultantes da relação sociedade/espaço (SOUZA; PEREIRA, 2007,
p. 2).

O espaço para o desenvolvimento de um trabalho de campo pode ser os


mais diversos, desde espaços mais próximos até espaços mais longínquos,
dependendo do objetivo e da proposta de análise espacial.

O próprio espaço onde o aluno vive, ou seja, seu bairro, sua


cidade, representa um recorte interessantíssimo para análise em
um trabalho de campo. O aluno tendo a possibilidade de
observar a paisagem urbana identificando suas transformações,
sua dinâmica, e se perceber como parte e também produtor
deste espaço, contribuirá assim para sua formação enquanto
cidadão (SOUZA E PEREIRA, 2007, p. 03).

Cioccari (2013, p. 18) traz importantes contribuições sobre a relevância


do trabalho de campo em Geografia, também para possibilitar “uma maior
convivência com os alunos, no sentido de troca de experiências e de
aproximação nos diálogos que contemplam o relato do dia a dia de cada um”,
fazendo com que a confiança estabelecida entre professor e aluno seja “bem
diferente e explícita que a relação e a confiança que aconteciam apenas nas
salas de aula”, proporcionando “ao aluno uma vivência com o professor de
maneira prática, em que as trocas entre eles se tornam cada vez mais
aprimorada”.

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É válido destacar que “na perspectiva didática crítico-social a educação
escolar é o processo de conhecimento do aluno, mediado pelo professor”
(SOUZA; CHIAPETTI, 2012, p. 5), já que “a educação é um procedimento de
construção pessoal e social, que se dá na interação com o cotidiano, nas
relações que as pessoas estabelecem com a natureza e com a sociedade e
suas estruturas políticas, sociais e econômicas” (SOUZA; CHIAPETTI, 2012, p.
5). Assim, este artigo objetiva entender a importância do trabalho de campo
para o ensino de geografia a partir de um trabalho de campo realizado em 1049
Brasília/DF, com alunos do curso Técnico em Administração do Programa
Nacional de Integração da Educação Básica com a Educação Profissional na
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA) do Instituto Federal
Goiano, Campus Rio Verde.
O currículo do curso Técnico em Administração do Programa Nacional
de Integração da Educação Básica com a Educação Profissional na
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA - do Instituto
Federal Goiano, Campus Rio Verde, tem como diretriz a formação humana
e também a profissional. Ou seja, busca formar cidadãos e trabalhadores
que compreendam a realidade para além de sua aparência fenomênica de
forma a conceber o homem como um ser histórico-social, que age sobre a
natureza procurando satisfazer suas necessidades e produzindo
conhecimentos que a transformam e a si próprio.

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho trata-se de uma pesquisa descritiva. Na formulação deste


artigo, em um primeiro momento foi realizada uma pesquisa bibliográfica
acerca da importância do trabalho de campo e também da cidade de
Brasília/DF.
O município de Rio Verde se localiza na região Sudoeste do Estado de
Goiás. A cidade de Rio Verde, onde residem os alunos que participaram da
pesquisa, dista-se de Brasília, cerca de 430 quilômetros. Aquela localidade
está aproximadamente a 220 km da capital do Estado, Goiânia.

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O trabalho de campo foi desenvolvido em três etapas distintas e
sequenciais, a saber: a) a primeira, conhecida como aula pré‐campo; b) a
segunda, como trabalho de campo; e c) a última, como pós‐campo. Essas
etapas serão discutidas no desenvolvimento do artigo.
A visita se deu no mês de novembro de 2017, com a participação de 15
alunos, e teve como principal objetivo compreender a análise do planejamento
urbano de Brasília a partir das escalas de Lúcio Costa, com o tema o
“Planejamento Urbano e a Concepção Urbanística de Brasília”. A aula foi 1050
fundamental para a formação prática e teórica dos discentes, devido à riqueza
dos dados coletados a partir da prática da observação do espaço ter sido
essencial para a ampliação dos conhecimentos dos alunos, indo além daqueles
adquiridos a partir da teoria em sala de aula.

DESENVOLVIMENTO

Numa intenção de associar teoria e prática no processo ensino


aprendizagem, alguns cuidados devem ser percebidos em todas as fases do
trabalho de campo, para que o mesmo não se transforme em passeio ou
excursão. Para isso é necessário ter um cuidado para que a prática a campo
não se resuma apenas na observação da paisagem, mas que contribua para as
mais diferentes análises das relações espaciais de maneira clara e objetiva,
fazendo com que a teoria seja percebida na realidade.
Esse importante instrumento didático tem sido utilizado de forma ampla
pelos professores de Geografia, sejam no Ensino Fundamental ou Médio, como
um importante recurso educacional no processo de aprendizagem, pois
também favorece a análise escalar do ambiente. Porém, o processo de
planejamento do trabalho de campo precisa ser claro e desenvolvido de acordo
com a proposta pedagógica. Assim, “o trabalho de campo precisa ser
previamente planejado dentro de uma proposta pedagógica viável, para que o
mesmo possa ter êxito e alcance o resultado desejado” (SOUZA; PEREIRA,
2007, p. 3).

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Já que “um trabalho de campo para ser eficaz em sua proposta deve ser
precedido de uma discussão em sala de aula, levando os alunos discutir a
temática que será problematizada em campo” (SOUZA; PEREIRA, 2007, p. 4),
na fase pré‐campo foram realizadas pesquisas bibliográficas acerca do
trabalho de campo, buscando a eficiência da aula a partir do que se veria a
campo. A partir desse referencial teórico, foram colhidas informações pelos
discentes sobre a realidade do espaço a ser estudado no decorrer das fases de
preparação e realização do trabalho de campo. Para Souza e Ferreira (2007, p. 1051
4), o estudo teórico prévio tem a finalidade de construir “um embasamento
conceitual e metodológico” que viabiliza “uma maior aprendizagem”.
Desse modo, foram discutidos em sala elementos sobre as
transformações espaciais de Brasília e sua formação como capital do país.
Essa aula foi fundamental para compreender melhor o espaço a ser analisado,
sobretudo a partir do seu projeto de construção até hoje, destacando
elementos que fizeram de Brasília uma cidade moderna e povoada, com
diversas formas e funções socioeconômicas. Assim, várias ilustrações foram
visualizadas em sala de aula, a fim de contribuir para um melhor entendimento
dos alunos quanto ao espaço analisado, considerando que, para Severo (2014,
p. 1), a configuração urbana de uma cidade resulta “de diversas ações e
processos que desenham sua ocupação ao longo do tempo”.
Com o intuito de contribuir com a questão espacial dos alunos, diversos
mapas e imagens aéreas de Brasília foram disponibilizados para os alunos em
sala de aula a fim de demonstrar a dinâmica física, social e econômica de
Brasília. As Figuras 1 e 2 representam algumas dessas imagens analisadas em
sala de aula e mostram o Lago Paranoá, ao centro, além das asas Sul e Norte
do Plano Piloto de Brasília, na forma de um avião, como projetado pelo
arquiteto e urbanista Lúcio Costa (1902-1998).

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Foto 01: Brasília nos anos de 1960 - Foto 02: Brasília hoje - vista aérea de Brasília,
Primeiros anos de Brasília, nos traços de de seu Plano Piloto
Lúcio Costa

1052

Fonte: Revista Época Fonte: Revista Época

Brasília foi planejada para ser a nova capital do país, com um projeto
ambicioso e construído, entre 1956 e 1960, durante o governo do presidente
Juscelino Kubitschek. Para Oliveira (2008, p. 6), a construção de Brasília no
interior do Brasil foi resultado de um dos discursos mais bem articulados do
Estado moderno. Conforme o autor, “a ideia de Brasília transcendeu a questão
da estratégia de segurança do núcleo do poder e se transformou na forma de
materialização de uma questão de nacionalidade e desenvolvimento nacional”.
Lauande (2007) assevera que uma cidade é resultado de um processo
econômico e social e nasce de uma vontade política, não sendo resultado de
um fato casual.
O projeto de integração do país por intermédio de rodovias apressou
a construção de uma nova capital e, como bem se sabe, a
mentalidade desenvolvimentista era a principal característica do
período JK cujo carro-chefe era a indústria automobilística. Para
Lúcio Costa a industrialização significava a própria redenção da
sociedade, levando-a criar, de forma intencional, uma cidade que viria
a privilegiar o deslocamento por automóveis. Os dois trechos
utilizados abaixo comprovam o envolvimento de Lúcio Costa com o
pensamento da época (LAUANDE, 2007, p. 1).

A partir de sua construção, Brasília foi povoada por trabalhadores de todo o


país, com representação cultural de todas as regiões brasileiras, percebidas na

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própria diversidade cultural da cidade. Para Severo (2014), desde sua criação foi
planejada através dos traços de Lúcio Custa e, ao longo dos anos, a cidade
conheceu os efeitos do processo de urbanização em seu território.
Tendo em vista que o Plano Piloto de Lúcio Costa, em 1957, foi a
origem da ocupação territorial da nova capital e, consequentemente,
do Distrito Federal, tomamos este documento como um importante
instrumento de planejamento urbano. A partir de então, com a
intenção de conter o crescimento da cidade e conceber uma política
de criação e ordenação de núcleos urbanos periféricos no Distrito
Federal, buscou-se a implementação dos Planos Diretores que são
instrumentos básicos da política territorial e de orientação aos 1053
agentes públicos e privados que atuam na produção e gestão das
localidades urbanas (SEVERO, 2014, p. 12).

Severo (2014) destaca que o Distrito Federal era um lugar de que se


apresentava como uma grande oportunidade de várias pessoas recomeçarem a
vida, com a construção de uma nova cidade, passando a noção de que seria
diferente dos locais de origem de várias pessoas.
Contudo, não foi isso que aconteceu, e a população, a maioria de
trabalhadores, que por aqui ficaram, foram marginalizados e passaram a
viver nas áreas periféricas do Plano Piloto. As cidades satélites, como
foram chamadas as áreas periféricas, constituíam outras cidades bem
diferentes da qual estava sendo construída (SEVERO, 2014, p. 01).

Porém, ao longo dos anos, a cidade passou por grandes transformações,


conforme afirmado por Severo (2014), sendo necessária a criação de vários planos
com o objetivo de ordenar o crescimento do Distrito Federal, que não foi pensado e
planejado junto com a construção de Brasília, fazendo nascer uma cidade diferente
da que foi planejada e criando a necessidade de se pensar na Brasília real que
exigia um planejamento que transcendesse seu plano original.

Pretendia-se constituir em Brasília um aglomerado urbano peculiar e


distinto de todos os demais, pois, tinha-se um espaço “vazio” que seria
possível ser organizado em busca de não se cometer os problemas que
vinham sendo detectados em outros aglomerados urbanos. Porém, no
processo de urbanização de Brasília, o planejamento só começa a
aparecer na década de 70, exceto, quando falamos do Plano Piloto de
Lúcio Costa – 1957, como sendo a origem da ocupação territorial
(SEVERO, p. 13).

Em sala, foram discutidas as principais transformações socioeconômicas


de Brasília, destacando-se os índices de população, como número de

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habitantes, densidade populacional, gênero, faixa etária etc.; de saúde; de
economia, como PIB, PIB per capita; de educação; etc.
Nesta aula, também foram repassadas aos alunos as principais
orientações relacionadas à segurança e ao vestuário adequado para o
desenvolvimento e participação na atividade. O transporte foi custeado pela
própria instituição de ensino através da diretoria de extensão.
Para desenvolvimento da aula a campo, utilizaram-se alguns materiais,
como: máquina fotográfica, pranchetas e cadernetas para anotações e diversos 1054
tipos de mapas (geológico, hidrográfico, político e rodoviário).
Já na fase de campo, os alunos tiveram contato com a realidade para
observação e estudo do que haviam discutido em sala de aula. O trabalho de
campo da disciplina de Geografia teve como tema “as transformações
espaciais na capital federal do Brasil”, o que permitiu discutir o planejamento
urbano e a interação dos fenômenos sociais e naturais da capital federal do
Brasil. Munidos de mapas e ilustrações da cidade, os alunos puderam
visualizar o que foi discutido em sala de aula.
No decorrer da visita constatou‐se a presença das quatro escalas
distintas, a saber: a) a bucólica; b) a monumental; c) a residencial; e, d) a
gregária. Para Azevêdo et al. (2014, p. 5), o conjunto urbanístico de Brasília se
estrutura em quatro escalas, sendo que cada uma delas possui características
específicas, aferindo diferentes interações humanas. Não é apenas um
conceito situado em um plano abstrato, mas também “conceito ‘operacional’
quando as normas de preservação do conjunto urbano tombado foram
pautadas na construção de parâmetros de uso e ocupação específicos para
cada uma das escalas constituintes do Plano Piloto”.
A caracterização de Brasília a partir das diversas escalas favoreceu aos
alunos correlacionar o espaço urbano com suas formas e funções. Durante o
percurso, foram abordados temas de suma importância para a compreensão da
formação urbana de Brasília e sua concepção urbanística, destacando as
influências positivas e negativas na relação entre a capital do País e as cidades
satélites no entorno de Brasília.

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A visita se deu em alguns dos principais locais de Brasília, desvendando
as quatro escalas de sua concepção urbanística, de acordo com o decreto nº
10.829, de 14 de outubro de 1987, que regulamenta o art. 38 da Lei nº 3.751,
de abril de 1960, sendo:
a) a escala monumental, que foi concebida para conferir a marca de efetiva
capital do País, configurado no Eixo Monumental, desde a Praça dos Três
Poderes até a Praça do Buriti, (COSTA, 1987) com a presença do Palácio do
Planalto (Figura 03) e do Supremo Tribunal Federal, Congresso Nacional 1055
(Figura 04); Palácios do Itamaraty e da Justiça, etc;

A partir de uma grande esplanada estão dispostos os edifícios que


abrigam a alma político-administrativa do país e do governo local, que
representa a dimensão coletiva da cidade. A ocupação do solo na
escala monumental é feita a partir de um eixo único, que tem
claramente um foco que representa os três poderes do estado,
ocupado por edifícios monumentais centralizados (Praça dos Três
Poderes). A relação de proporção entre as áreas edificadas e as não
edificadas, o contraste entre os extensos vazios urbanos e os
imponentes edifícios, com excepcional qualidade artística, confere a
monumentalidade do lugar (AZEVÊDO, et al, 2014, p. 06).

Figura 03: Palácio do Planalto Figura 04: Congresso Nacional ao Fundo

Fonte: Autor Fonte: Autor

b) a escala residencial, que proporciona uma nova maneira de viver,


específica de Brasília, configurada ao longo das alas Sul e Norte do Eixo
Rodoviário Residencial com a presença das Superquadras (COSTA, 1987)
(Figuras 05 e 06);
O eixo residencial representa o homem no nível individual de sua
existência, onde ele possa viver com boa qualidade, possibilitando-o
de usufruir, na forma plena, dos momentos de descanso e do

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convívio social mais íntimo. [...]A superquadra é uma das faces
humanas da cidade as quais os críticos mais contumazes, por uma
capacidade limitada ao intransitivo, não conseguem vislumbrar
(LAUANDE, 2007, p. 01).

Figura 05: Alunos visitando a Super Quadra Figura 006: Alunos visitando a Super Quadra
306 305

1056

Fonte: Autor Fonte: Autor

c) a escala gregária, representa o centro de Brasília, em torno da


intersecção dos eixos monumental e rodoviário, configurada na Plataforma
Rodoviária e nos setores de Diversões , Comerciais, Bancários, Hoteleiros,
Médico-Hospitalares, de Autarquia e de Rádio e Televisão Sul e Norte
(COSTA, 1987). Para Azevêdo et al (2014, p. 06), esta escala é considerada o
coração da cidade” A plataforma rodoviária é o principal elemento que integra
de forma simbólica o Plano Piloto com as cidades satélites e o que melhor
sintetiza a sua função agregadora. (Figuras 07 e 08);

Figura 07: Escala Gregária Figura 08: Escala Gregária

Fonte: Museu Virtual de Brasília Fonte: Museu Virtual de Brasília

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d) a escala bucólica confere à Brasília o caráter de cidade-parque,
configurada em todas as áreas livres, contíguas a terrenos atualmente
edificados ou institucionalmente previstos para edificação e destinadas à
preservação paisagística e ao lazer, destacando a cobertura vegetal do cerrado
nativo, e o acesso público à orla do Lago Paranoá (COSTA, 1987). Azevedo et
al (2014, p. 06) destaca que a escala bucólica “o que faz de Brasília uma
cidade aberta, sem limites espaciais, um genuíno exemplo do espírito de época
moderno. Nesta escala os vazios se tornam intencionais, ou seja, são vazios 1057
projetuais”. Para estes autores a escala bucólica está presente de forma
distinta nas escalas do Plano Piloto de Brasília, a saber:

1) através das densas áreas arborizadas que formam um cinturão


verde em torno das superquadras; 2) com o paisagismo como
elemento de composição e integração entre a arquitetura e outras
artes (escultura, pintura, painéis), fazendo-se de elo entre o interior e
o exterior dos edifícios; 3) como elemento de composição volumétrica
a partir dos cheios e vazios (áreas non aedificandi), como no caso do
canteiro central do eixo monumental, que deve estar sempre gramado
e não edificado; 4) com a presença do céu como "moldura" para os
edifícios institucionais.

Após o trabalho de campo, foi realizada uma aula para discutir os


elementos teóricos, vistos a priori em sala, e os elementos práticos, vistos em
campo no decorrer da aula in loco. Para Cioccari (2013), o trabalho de campo
deve ser entendido como indispensável para a prática do ensino de Geografia,
mas não suficiente, já que o retorno à sala de aula após a realização do
trabalho de campo é fundamental para a retomada de conteúdo ou até mesmo
para avaliação do aprendizado do aluno. Como instrumento de avaliação da
participação dos alunos no trabalho de campo, foram utilizados três
instrumentos, a fim de avaliar a percepção e participação dos alunos no campo,
a saber: a) a apresentação oral dos temas discutidos em sala e em campo; b)
debate em sala de aula; e, c) a confecção de relatórios.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As atividades de campo em Geografia têm se mostrado fundamentais no


processo ensino de Geografia. Em qualquer pesquisa geográfica, o trabalho de

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campo é indispensável. Da mesma forma, o trabalho de campo é um
importante instrumento para o ensino de Geografia, pois, quando bem
planejado, oferece condições para uma melhor compreensão e entendimento
da realidade do espaço estudado a partir da teoria vista em sala. Porém, a fase
de planejamento do trabalho de campo é imprescindível, pois é nessa fase que
o profissional vai levantar os dados a serem a serem explorados na aula de
campo.
Os resultados do trabalho permitiram aos alunos entender a própria 1058
formação de Brasília, considerada uma cidade-parque, a partir de quatro
escalas distintas: a) a bucólica, configurada pelas várias áreas de lazer e faixas
arborizadas, como parques públicos, praças, jardins, orla do Lago Paranoá,
dentre outras; b) a monumental, formada pelo eixo monumental, que vai desde
a Praça dos Três Poderes até a Praça do Buriti e se caracteriza pelas
construções com uma arquitetura moderna que abriga a vida política-
administrativa do Brasil; c) a residencial, representada por um modo de viver
em superquadras nas Asas Sul e Norte, e; d) a gregária, que representa a
escala de convívio, representada pelos setores comercial, de autarquias,
bancário, hoteleiro, de diversões e cultura, médico-hospitalar, etc.
Assim, pautado nas bases curriculares do referido curso, o trabalho de
campo em Geografia se apresenta como um instrumento de suma importância
na formação humana e profissional discente, procurando auxiliar na
compreensão da realidade espacial auxiliando no entendimento das formas e
funções que estão disponíveis no espaço construído e/ou alterado pelo
homem. Pois é neste palco de realizações histórico-sociais que se dão as
relações entre os diversos sujeitos e as relações destes com a natureza.
Conclui-se que o trabalho de campo em Geografia é indispensável para
o ensino da própria disciplina. A observação das diversas paisagens
possibilitou o desvendar de novos espaços geográficos, permitindo ao aluno
analisar as transformações espaciais através da apropriação do espaço pelo
homem.

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REFERÊNCIAS
AZEVÊDO, Gabriela.; NEVES, Carolina; LIRA, Flaviana. A paisagem do Plano
Piloto de Brasília em suas escalas. Anais do III Encontro da Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo. Anais...
São Paulo, Enanparq, 2014, p. 1-13.
CIOCCARI, C. C. Ensino de Geografia e o trabalho de campo: construindo
possibilidades de aprendizagem sobre o espaço urbano e rural em Júlio
de Castilhos, RS. 2013. 91 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal 1059
de Santa Maria. Santa Maria - RS. 2013.
COSTA, L. 1987. Brasília Revisitada. Brasília: Diário Oficial do Distrito
Federal – Decreto Nº 10.829. Disponível em: <www.sehab.df.gov.br>. Acesso
em 25 de set. de 2018.
DE LA FUENTE, A. R. de S. O Trabalho de Campo em geografia: múltiplas
dimensões espaciais e a escolarização de pessoas surdas. 2012. 160 f.
Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal de Uberlândia,
Instituto de Geografia, Uberlândia–MG, 2012
LAUANDE, F. O projeto para o Plano-piloto e o pensamento de Lúcio
Costa. 2007. Disponível em: <www.vitruvius.com.br> Acesso em 12 de set. de
2018.
OLIVEIRA, Rômulo Andrade de. Brasília e o paradigma modernista:
planejamento urbano do moderno atraso. 2008. Dissertação (Mestrado em
Planejamento Urbano e Regional) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
SEVERO, Denise de Sousa. Planejamento urbano no Distrito Federal: o
caso de Ceilândia. Monografia – Universidade de Brasília, Instituto de
Ciências Humanas, Departamento de Geografia. Distrito Federal, Brasília 27 de
agosto de 2014. 73 f.
SOUZA, J. C. de. PEREIRA, R. M.; Uma reflexão acerca da importância do
trabalho de campo e sua aplicabilidade no ensino de Geografia. Revista
Mirante, Goiânia, 2. ed., v. 01, Revista de Ensino de Geografia, Uberlândia,
v. 3, n. 4, p. 3-22, jan./jun. 2012.

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SOUZA, S. O. ; CHIAPETTI, R. J. N. O Trabalho de Campo como estratégia ao
ensino de Geografia. Revista de Ensino de Geografia, Uberlândia, v. 3, p. 3-
22, 2012.

1060

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EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: FORMANDO O SUJEITO DE
DIREITOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Walquíria dos Santos Lima, CE/UFPB | Maria Elizete Guimarães


Carvalho, UFPB | Hugo Alexandre de Araújo, CE/UFPB

Resumo: Pretende-se, nesse trabalho, refletir sobre a importância da Educação em


Direitos Humanos – EDH – para a formação do sujeito de direitos na Educação de
1061
Jovens e Adultos - EJA. Esse sujeito educacional, invisibilizado historicamente, foi/é
vítima de um processo educativo excludente e aligeirado, de políticas públicas que
pouco contribuem para sua formação e participação na sociedade atual. Nesse
contexto, é importante repensar, reinventar a formação educacional para essa
população, considerando-a como sujeitos que tiveram seus direitos humanos negados,
lembrando da indivisibilidade entre os direitos, ou seja, quando um direito é negado, os
demais também o são. Assim, considerando a educação como direito subjetivo de
todo cidadão e a EDH como proposta para a efetivação da cidadania ativa, devendo
estar presente no currículo escolar, e fundamentalmente na EJA, refletiremos com
estudiosos, como Bobbio (2004), Carbonari (2006), entre outros, que contribuirão para
a discussão. A compreensão de que a educação desenvolve-se ao longo da vida,
desde que as situações de aprendizagem sejam incentivadas, coloca a EDH no centro
do processo educativo para EJA, para a formação do sujeito de direitos e de deveres.

Palavras-chave: Educação em Direitos Humanos; Formação educacional; Sujeitos da


EJA.

INTRODUÇÃO

Refletir sobre a formação de jovens e adultos, considerando os direitos


humanos e a Educação em Direitos Humanos - EDH –, é imprescindível para a
compreensão do processo de negação histórica a que esses sujeitos foram
submetidos e as conquistas alcançadas. Dessa forma, é articulando esses
conceitos que produzimos a discussão a seguir.
Justapostos aos ideais de democracia e desenvolvimento da paz, os
direitos humanos foram concebidos para proteção da humanidade, sendo
compreendidos como elementos universais, indivisíveis, interdependentes e
inter-relacionados, resultando dessa compreensão que a inexistência e/ou
ineficácia de um prejudica a existência e concretude do outro. É nesse sentido

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a prescrição do artigo 5º da Declaração e Programa de Ação de Viena: “Todos
os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-
relacionados”. Em face disso, “A comunidade internacional deve tratar os
direitos humanos de forma global, justa e equitativa, em pé de igualdade e com
a mesma ênfase”. [...]. (DECLARAÇÃO, 2011, p. 4).
Bobbio (2004) corrobora com essa visão quando afirma: “[...] sem
direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem
democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos 1062
conflitos” (BOBBIO, 2004, p.1). Então, o reconhecimento e proteção dos
direitos humanos são condições para a democracia, assim como seu
tratamento justo e equitativo, resultando em que um serve de subsídio para o
outro e como que em um movimento cíclico, todos se complementam.
Discutindo a necessidade de reconhecimento e proteção aos Direitos
Humanos, chegamos a questão de seus fundamentos. Bobbio (2004) comunga
com a ideia de que justificá-los é uma das formas de reconhecê-los, chamando
nossa atenção para a cautela na busca desses fundamentos para não
adotarmos o iludido discurso do ‘fundamento absoluto’ considerando que se
uma única justificativa for eleita, corremos o risco de não a questionar.
A busca de fundamentos que justifiquem os direitos humanos é hoje
infundada, tendo em vista que tal busca perpassa algumas dificuldades. A
primeira delas se refere à imprecisão de categorizá-los, pois ao tentar defini-los
interpretações subjetivas podem vir à tona e com isso termos avaliativos e
concepções ideológicas podem agir como forças contrárias aos direitos
humanos. A variabilidade e heterogeneidade são também elementos que
impossibilitam essa fundamentação, pois os direitos podem variar de acordo
com as transformações históricas e anseios da própria humanidade. Vejamos:

[...] Direitos que foram declarados absolutos no final do século


XVIII, como a propriedade de sacre et inviolable, foram
submetidos a radicais limitações nas declarações
contemporâneas. O que prova que não existem direitos
fundamentais por natureza. O que parece fundamental numa
época histórica e numa determinada civilização não é
fundamental em outras épocas e em outras culturas. (BOBBIO,
2004, p. 18).

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Dessa forma, direitos que foram exaltados em um contexto histórico-
social podem não o ser daqui a mais algum tempo. Esse argumento fortalece a
ideia da ausência de um único fundamento ou de direitos fundamentados na
natureza humana já que a natureza do indivíduo é diversa e apta a constantes
transformações.
Percebamos então quão dinâmico é o processo de constituição dos
direitos humanos que não devemos falar em um fundamento absoluto, mas em 1063
fundamentos, é o que percebemos ao parafrasear Bobbio (2004) quando diz
que ‘os direitos não nascem todos de uma vez e nem de uma vez por todas’,
pelo contrário surgem das necessidades dos homens no contexto em que
vivem.
Podemos afirmar que enfrentamos uma crise de fundamentos, porém o
principal problema da humanidade atualmente não reside em justificar os
direitos que já estão postos, mas protegê-los, não no sentido de resguardá-los
e sim torná-los efetivos.
Nesse espaço de justificativa e concretização dos Direitos Humanos,
muitos direitos são desconsiderados, negligenciados, implicando na
quebra/divisão/enfraquecimento da cadeia/círculo de direitos, lembrando dos
princípios afirmados na Declaração de Viena.
Ora articulando essa discussão com o direito à Educação em Direitos
Humanos (EDH) como estratégia pedagógica a favor da Educação de Jovens e
Adultos (EJA), propugnamos pela sua concretização na escola, uma vez que
se justifica como direito, estando relacionada ao direito à educação. A EDH traz
como proposta pedagógica a prática cidadã e a conscientização das pessoas
acerca de seus direitos e deveres, podendo contribuir para a formação do
sujeito de direitos jovens e adultos da EJA, pois os ensina a perceberem a si e
aos outros enquanto seres humanos dotados de dignidade, direitos e deveres
que precisam ser valorizados. Podemos então afirmar que a Educação em
Direitos Humanos poderá assumir um papel de fundamental importância para a
formação desse sujeito de direito que é o educando da EJA.

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Nesse sentido, questionamos como as orientações curriculares para a
EJA poderiam dialogar com a proposta pedagógica da Educação em Direitos
Humanos, ressaltando-se que a EDH orienta para a vivência cidadã, para a
prática democrática e para a humanização dos sujeitos.
A partir desse olhar, e embasados pela concepção contemporânea de
interdependência, universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos,
discutiremos a Educação em Direitos Humanos como uma estratégia curricular
de formação em prol do desenvolvimento de saberes e aprendizagens de 1064
afirmação e defesa da cidadania dos educandos jovens e adultos.

EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: PROPOSTA PEDAGÓGICA


FAVORÁVEL À CONSTRUÇÃO DO SUJEITO DE DIREITOS DA EJA

Educar em e para os direitos humanos significa promover processos


educativos em favor do desenvolvimento da pessoa humana, sensibilizando as
pessoas para a condição de ‘ser humano’ inerente a todo e qualquer indivíduo.
Porém, antes é preciso que o próprio indivíduo se perceba humano, pois “só se
educa em direitos humanos quem se humaniza e só é possível investir
completamente na humanização a partir de uma conduta humanizada”
(BALLESTRERI apud SILVEIRA, 2007, p. 487).
Pois, e em consonância com o Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos (BRASIL, 2007), a Educação em Direitos Humanos configura-se não
só como aprendizagem cognitiva, mas, para além dela, considera “o
desenvolvimento social e emocional de quem se envolve no processo ensino-
aprendizagem (Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos –
PMEDH/2005)”. Nessa compreensão, “a educação deve ocorrer na
comunidade escolar em interação com a comunidade local”.

[...] a educação em direitos humanos deve abarcar questões


concernentes aos campos da educação formal, à escola, aos
procedimentos pedagógicos, às agendas e instrumentos que
possibilitem uma ação pedagógica conscientizadora e
libertadora, voltada para o respeito e valorização da
diversidade, aos conceitos de sustentabilidade e de formação
da cidadania ativa. (BRASIL, 2007, p. 31).

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Ao escolher os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) como
público-alvo desse processo de educar em direitos humanos, assumimos
responsabilidade com essa humanização, tendo em vista a omissão das
políticas públicas para a EJA, que só tardiamente - na década de 1940 –
passaram a preocupar-se com essa clientela educacional. Tal atraso histórico
contribuiu para que a condição de seres humanos desses educandos fosse
tolhida, já que o direito à educação se constitui um dos direitos essenciais à
dignidade e humanidade das pessoas, possibilitando ao indivíduo o 1065
desenvolvimento de habilidades e saberes que o torna capaz de desfrutar dos
demais direitos.
Destarte afirmamos que os alunos da EJA foram durante longo tempo
vítimas de um processo de exclusão educacional que ocasionou a
fragmentação de seus direitos, fato compreendido com fundamento no princípio
contemporâneo que rege os direitos humanos, lembrando que um direito
negado tem implicações na efetivação de outros direitos. Assim, proporcionar o
direito a uma educação que contemple, efetive e (re) afirme a condição de
sujeito de direitos dos alunos jovens e adultos constitui-se dívida histórica e
princípio ético. Tal princípio é posto por Carbonari (2007) como um
racionalismo ético que fundamenta um novo ‘modelo de educação’, uma nova
pedagogia que considere e defenda o sujeito vítima enquanto sujeito ético,
detentor de direitos e ser vivente, que precisa ter sua dignidade valorizada, e
porque não dizermos reparada. Embora não seja apenas

[...] na escola que se produz e reproduz o conhecimento, [mas]


é nela que esse saber aparece sistematizado e codificado. Ela
é um espaço social privilegiado onde se definem a ação
institucional pedagógica e a prática e vivência dos direitos
humanos. Nas sociedades contemporâneas, a escola é local
de estruturação de concepções de mundo e de consciência
social, de circulação e de consolidação de valores, de
promoção da diversidade cultural, da formação para a
cidadania, de constituição de sujeitos sociais e de
desenvolvimento de práticas pedagógicas. (BRASIL, 2007).

Analisando esse contexto, surge a preocupação com a formação do


sujeito de direitos da EJA. E essa perspectiva de formação encontra na
Educação em Direitos Humanos uma forma de concretização, sendo possível

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despertar nos alunos jovens e adultos a compreensão de sua condição de
sujeito educacional historicamente violada, fazendo-os enxergar a si e aos
outros como sujeitos ativos mesmo quando vitimizados.
Nesse cenário, a formação docente em direitos humanos é relevante
para a ação e prática pedagógica em EDH, sendo através dessa ação que se
expressam os sentidos e pressupostos subjacentes ao currículo, e em que são
demonstradas “as interações e interrelações entre proposta curricular e prática
docente”. (OLIVEIRA; DANTAS; SILVA, 2016, p. 2016). 1066

Como um sistema dinâmico, o currículo é construído no tempo


e no espaço, dentro de certas condições, a partir de um
determinado contexto social, moldando-se em diversas
realidades e processos múltiplos e adaptando-se à própria
dinâmica da prática escolar, de forma que a sua construção só
pode ser entendida se vier atrelada às condições reais de
desenvolvimento, ou seja, condições políticas, estruturais,
administrativas, materiais e pedagógicas. (OLIVEIRA;
DANTAS; SILVA, 2016, p. 217).

Ressaltamos que a EDH situa-se e é decorrente do direito humano


fundamental à educação, afirmando-se que a garantia do direito à educação
torna acessível os demais direitos, inclusive o direito a EDH para EJA,
enquanto sua negação traz consigo a privação de direitos e a perpetuação da
pobreza. (SACAVINO apud SILVEIRA, 2007). Se o currículo da EJA
contemplar ações e orientações em Educação em Direitos Humanos
incentivará atitudes democráticas e cidadãs, comportamentos e posturas
solidárias, contribuindo para a formação do sujeito de direitos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, em seu art.
XXVI trata a educação como um direito de todos:

1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será


gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A
instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-
profissional será acessível a todos, bem como a instrução
superior, está baseada no mérito.
2. A instrução será orientada no sentido do pleno
desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento
do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades
fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a
tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais

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ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas
em prol da manutenção da paz. (BRASIL, 2008, p.13).

No direito a educação como direito de todos está inscrito o direito à


educação de jovens e adultos, que encontra na EDH a possibilidade de
fortalecimento por propor, a cada indivíduo, o reconhecimento do seu papel na
efetivação dos direitos e deveres de cidadão.
O processo formativo pressupõe o reconhecimento da pluralidade e da
alteridade, condições básicas da liberdade para o exercício da crítica, da 1067
criatividade, do debate de ideias e para o reconhecimento, respeito, promoção
e valorização da diversidade.
Mas para que essa possibilidade seja realizável precisamos adotar uma
pedagogia dialógica que desperte a sensibilidade de discentes e docentes para
esse novo paradigma pedagógico que ora se apresenta: “a educação em
direitos humanos”. Pois, como ensina Freire (2000, p. 119), “O ser humano é,
naturalmente, um ser de intervenção no mundo razão de que faz a história.
Nela, por isso mesmo, deve deixar suas marcas de sujeito e não pegadas de
puro objeto”. Nesse sentido, somente na condição de cidadão é que o jovem e
adulto da EJA poderá marcar a história, a partir das contribuições de uma
Educação em Direitos Humanos.
Compreendemos que por muito tempo, ou melhor, desde o início da
Modernidade, com reflexos e permanências na prática pedagógica atual, a
educação consistia na transmissão dos conteúdos apresentados pelo educador
e assimilados pelo educando. Essa metodologia surgida com a Escola
Tradicional, e denominada por Freire (2005) como “educação bancária”, não
permitia que o aluno desenvolvesse uma visão crítica da realidade, ficando,
assim, como mero receptor das ideias e conceitos do seu mestre. Em
contrapartida, além de outras propostas, destacamos a pedagogia freireana da
autonomia, posta em prática no Brasil no início dos anos 1960 e que marca a
educação até o momento presente. Tal proposta fundamentava-se na prática
dialógica desenvolvida nos Círculos de Cultura, como tentativa de alfabetizar o
oprimido a partir de elementos da sua cultura e do seu contexto, ao mesmo
tempo em que o despertava para uma consciência política transformadora.

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Em conexão com a pedagogia freireana, temos a Educação em Direitos
Humanos, que tem como proposta despertar para a consciência crítico-ativa do
papel que cada pessoa desempenha na construção da sociedade, seja
questionando as temáticas que fazem parte da realidade, seja participando do
processo de sua transformação, tomando como referência os valores de
dignidade humana, igualdade na diversidade, tolerância e respeito à vida.
Esses princípios regem os direitos humanos e foram historicamente
construídos, utilizando a escrita e o diálogo como instrumentos de 1068
fortalecimento e transformação social. Segundo Andreopoulos (2007, p. 122),
“estudantes fortalecidos tornam-se conscientes de sua própria participação na
criação do conhecimento e da sua própria capacidade crítica para
conceitualizar e reconceitualizar suas experiências de realidade”; situação que
os estimulam a assumir uma posição de empoderamento e superação perante
as dificuldades e/ou violações dos direitos de cidadania.
Dessa forma, a Educação em Direitos Humanos (EDH) trabalha para
que o direito à dignidade humana seja protegido e promovido em todos os
segmentos da sociedade e assim a conquista da cidadania seja efetivada, não
pelo direito ao voto, mas para que todos os cidadãos sejam respeitados nas
suas diferenças e limitações. A proposta aqui não é a da alfabetização e sim a
do letramento, considerando-o como a inserção e co-atuação do indivíduo na
sociedade.
É nessa perspectiva que a EDH pode contribuir para a formação de
sujeitos de direitos da EJA.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Partindo do pressuposto de que a formação do sujeito de direitos nas


salas de EJA implica em um trabalho educativo preocupado com a realidade
dos alunos, seu lugar na sociedade, sua história de participação e/ou exclusão,
destacamos a Educação em Direitos Humanos como um instrumento que
possibilita a realização de processos educativos em favor da cidadania, do

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respeito à dignidade humana e da condição de sujeito de direitos dos
educandos jovens e adultos.
Nas palavras de Paulo Freire, “Ninguém liberta ninguém, ninguém se
liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” (FREIRE, 2005, p. 58),
identificamos o caráter emancipador que envolve e direciona os trabalhos com
a EDH. Lembramos, ainda, que assim como ensina Freire, ninguém pode ser
responsável por libertar o outro, o ser humano só pode libertar-se a partir da
sua busca pelo conhecimento e reconhecimento da necessidade de lutar por 1069
esta libertação. Esse processo de reconhecimento e de busca de garantias de
direitos que incita o desejo de libertação/autonomia é um dos princípios
norteadores da Educação em Direitos Humanos, trazendo em sua essência um
mister de indignação, comprometimento e atitude diante da realidade, podendo
ser construída/ensinada aos alunos da EJA, em seu cotidiano curricular.
Assim, para promover os processos de indignar-se e comprometer-se
implica, muitas vezes, irmos até os momentos de dor, para olharmos a
realidade e percebê-la enquanto ser indignado, comprometido e atuante; estes
são os instrumentos utilizados pela EDH que permitem ao educando da EJA
desenvolver sua capacidade de agente emancipado e transformador de sua
realidade. A EDH pode despertar os educandos da EJA para uma nova visão
sobre os direitos humanos, levando-os a perceber que tais direitos contribuem
para o reconhecimento de sua dignidade e de sua condição de sujeitos de
direitos.
De acordo com a orientação da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, a aprendizagem deve ser compreendida para além da
escolarização, como “a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as
nações e grupos raciais ou religiosos” (BRASIL, 2006, p. 44). Salientamos,
então, a importância de educar em e para os direitos humanos como forma de
promoção de uma cultura da paz, de efetivação da dignidade humana e de
fortalecimento da formação dos sujeitos da EJA.

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para o século XXI. São Paulo: EDUSP, 2007.
BALLESTRERI, Ricardo. Cidadania e Direitos Humanos: um sentido para a
educação. In: SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al (Orgs.). Educação em
direitos humanos: fundamentos teórico-metodológicos. João Pessoa:
Editora Universitária, 2007. 1070
BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. Cidadania e direitos humanos.
Disponível em:
<www.iea.usp.br/artigos/benevidescidadaniaedireitoshumanos.pdf Maria
Victoria> Acesso em: 10/05/2011.
BOBBIO, Noberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. 9. Ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
BRASIL. Direitos Humanos: documentos internacionais. Brasília:
Presidência da República/SEDH, 2006.
BRASIL. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos / Comitê
Nacional de Educação em Direitos Humanos. – Brasília: Secretaria Especial
dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, Ministério da Justiça,
UNESCO, 2007.
BRASIL. Direitos Humanos: a realidade do país aos 60 anos da Declaração
Universal. Brasília: Presidência da República/SEDH, 2008.
BRASIL.
CARBONARI, Paulo Cesar. Sujeito de direitos humanos: questões abertas e
em construção. In: SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al (Orgs.). Educação em
direitos humanos: fundamentos teórico-metodológicos. João Pessoa:
Editora Universitária, 2007.
CARVALHO, Maria Elizete Guimarães; MACEDO, Geralda. (Orgs.). Educação
escolar do campo e direitos humanos. João Pessoa: Editora Universitária da
UFPB, 2010.
CARVALHO, Maria Elizete Guimarães (Org.). História, educação e direitos
humanos. João Pessoa, Editora Universitária da UFPB, 2011.

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DECLARAÇÃO E PROGRAMA DE AÇÃO DE VIENA. Conferência Mundial
sobre Direitos Humanos. Viena, 1993. Disponível em: www.cedin.com.br.
Acesso em: 10.08.2011.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2005.
OLIVEIRA, M. O. de M.; DANTAS, T. R.; SILVA, A, P. Educação de jovens e
adultos, currículo e direitos humanos: diálogos necessários. In: SILVA, A. M.
M.; COSTA, G. S.; LIMA, I. M. S. O. (Orgs.). Diálogos sobre educação em 1071
direitos humanos e a formação de jovens e adultos. Salvador: EDUFBA,
2016. p. 202-223.
PIOVESAN, Flávia. Concepção contemporânea de direitos humanos. In:
HADDAD, Sérgio; GRACIANO, Mariângela (Orgs.), A educação entre os
direitos humanos. Campinas, SP: Autores Associados; São Paulo, SP: Ação
Educativa, 2006.
SACAVINO, Susana. Direito humano à educação no Brasil: uma conquista para
todos? In: SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al (Orgs.). Educação em direitos
humanos: fundamentos teórico-metodológicos. João Pessoa: Editora
Universitária, 2007.
TAVARES, Celma. Educar em direitos humanos, o desafio da formação dos
educadores numa perspectiva interdisciplinar. In: SILVEIRA, Rosa Maria
Godoy, et al (Orgs.). Educação em direitos humanos: fundamentos teórico-
metodológicos. João Pessoa: Editora Universitária, 2007.
ZENAIDE, Maria de Nazaré Tavares et al. Direitos humanos: capacitação de
educadores: fundamentos culturais e educacionais da educação em direitos
humanos. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2008, v.2.

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AS PERCEPÇÕES DA EJA SOBRE A TEMÁTICA LGBT A PARTIR DO
OLHAR DAS EDUCANDAS

Taízze Nascimento Melchiades 120 | Eduardo Jorge Lopes da Silva121

RESUMO: O presente artigo tem por temática central a diversidade de orientação


sexual, existente no ambiente escolar, entre as educandas da Educação de Jovens e 1072
Adultos (EJA). Trata-se de um recorte do plano de trabalho, em nível de iniciação
científica (UFPB-PIBIC-2017-2018), que objetivou, entre outras coisas, conhecer as
formas de preconceito sofridas no espaço escolar pelos LGBTs e as ações
pedagógicas de inclusão escolar para esse mesmo segmento da EJA. A abordagem
da pesquisa foi de cunho qualitativo. Os sujeitos foram educandas da modalidade em
foco, de cinco escolas públicas municipais, dos Ciclos I ao IV. Foram aplicados 85
questionários, do tipo que combinou perguntas abertas e fechadas (RICHARDSON,
2017). A análise dos resultados foi realizada com base na técnica de Análise de
Conteúdo, preconizada por Bardin (2011). Os resultados mostram incoerências entre
as afirmações das educandas sobre a temática LGBT e pouca aceitação, podendo ser
justificada pela pouca aproximação com o tema devido às escolas pouco ou quase
nunca abordarem este assunto.

Palavras chave: LGBT. Educação de jovens e adultos. Inclusão.

INTRODUÇÃO

Há uma diversidade de orientação sexual existente no ambiente escolar.


Essa diversidade é possível de se constatar a partir da sigla LGBT (sigla mais
usual para LGBTTIS – lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis,
transgêneros, intersexus e simpatizantes), de acordo com Gorisch (2013) e
Junqueira (2009).

120
Bolsista de Iniciação Científica da Universidade Federal da Paraíba/CNPq (PIBIC-2018-
2019). Licencianda do Curso de Pedagogia – Educação do Campo/Centro de Educação.
Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Educação de Jovens e Adultos e Diversidade –
GEPEJAD . E-mail: taizzemelchiades@gmail.com
121
Doutor em Educação. Professor lotado no Departamento de Fundamentação da
Educação/Centro de Educação e permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação,
ambos na Universidade Federal da Paraíba. Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas
Educação de Jovens e Adultos e Diversidade – GEPEJAD/CNPq. Coordenador do Projeto
Escola Zé Peão/Centro de Educação/UFPB. E-mail: eduardojls@ce.ufpb.br

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Ao se pensar na inclusão escolar, tradicionalmente, pensa-se na
inclusão de pessoas com uma dada deficiência física ou intelectual; torna-se
imprescindível, também, incluir as pessoas que fazem parte do segmento
LGBTs da Educação de Jovens e Adultos (EJA), pois, no espaço escolar, as
chacotas, as piadas e o bullying provocam ações homofóbicas capazes de
levar certos educandos a uma série de problemas, tais como: dificuldade de
aprendizagem, comportamento introspectivo e/ou antissocial, podendo chegar
a extremos, como, por exemplo, o suicídio. Portanto, é necessário pensar 1073
sobre ações político-pedagógicas no espaço escolar, de modo que possam,
além de incluir essa população, também criar uma cultura de respeito à
diversidade de orientação sexual e combate à homofobia. Elegemos a EJA,
pois entendemos que é uma modalidade especial em que se encontra uma
ampla diversidade de cor, etnia, orientação sexual, cultural, gênero, faixa etária
etc., e por entendermos que o silenciamento desta discussão pode contribuir
para ampliar a violência contra os LGBTs.
Segundo dados do Relatório 2015, do GGB, a violência contra a
população LGBT não escolhe cor, idade, classe social e profissão. Em 2015, a
vítima mais jovem tinha 13 anos, pardo, do município de Rio Claro, São Paulo.
Na Paraíba, foram 7 assassinatos. De acordo com esse mesmo relatório, dos
318 assassinatos, 58% eram memores de 29 anos e 21% eram menores de 18
anos, portanto, uma população que deveria estar entre o ensino fundamental e
o ensino médio da educação básica nacional. Outro dado alarmante é com
relação ao perfil dos agressores/assassinos, ou seja, dos 94 criminosos
identificados, 16 % eram menores de 18 anos e 87% eram menores de 29
anos. Logo, um perfil de assassinados e assassinos relativamente jovem e em
idade escolar e/ou produtiva.
Daí, ressaltamos a relevância social da escola, como lócus privilegiado
da inclusão também da população LGBT e do combate à homofobia. Mas, não
apenas isso justificaria a realização desse projeto, se não fosse, ainda, nossa
inserção no campo escolar da educação básica, que se faz por meio de visitas
com os educandos da educação superior. Nessas visitas, observamos os
educandos da EJA, as piadas que são ditas, para aqueles/as que se mostram

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ou assumem aparentemente “estereótipos” que “fogem ao padrão
heteronormativo”. São brincadeiras, aparentemente inocentes, mas que
denunciam um dado discurso com conteúdo homofóbico e de uma violência
simbólica que agridem as vítimas destas brincadeiras. Por outro lado, também
observamos que muitos educadores normatizam essas “brincadeiras”, e muito
menos, problematizam. É notório a falta de leitura crítica que poderia ser
exercida em sala de aula, de forma a transpor exemplos como estes, em
conteúdos didático-pedagógicos que visionariam ações de inclusão e respeito, 1074
podendo também sanar essa violência dentro do contexto escolar.
Nesse sentido, apresentamos a seguinte questão-problema: quais as
formas de preconceitos sofridas por aqueles/as que apresentam orientação
sexual diferente do padrão heteronormativo? E, como objetivo central, temos
em vista conhecer as formas de preconceito sofridas no espaço escolar pelos
LGBTs e as ações pedagógicas de inclusão escolar para esse mesmo
segmento da EJA, em escolas públicas municipais de João Pessoa-PB.
Considerando a natureza do problema, optamos por uma pesquisa
fundamentada no paradigma qualitativo. Segundo Flick (2009, p. 20), “a
pesquisa qualitativa é de particular relevância ao estudo das relações sociais
devido à pluralização das esferas da vida. [...]. Essa pluralização exige uma
nova sensibilidade para o estudo empírico das questões”. E, decorrente do que
estamos pretendendo investigar, a inclusão da população LGBT na EJA da
rede pública municipal de João Pessoa-PB configura-se como uma das
pluralizações, segundo nossa compreensão, a partir desse autor.
O ambiente natural da investigação foram cinco escolas públicas
municipais de educação, situadas em João Pessoa/PB, das 61 (sessenta e
uma) que ofertam turmas de EJA, as quais foram: Escola Municipal de Ensino
Fundamental João Monteiro da Franca (EMEF JMF), bairro Jardim Veneza;
Escola Municipal de Ensino Fundamental Lions Tambaú (EMEF LT), bairro
Bancários; Escola Municipal Damásio Barbosa da Franca (EMEF DBF), bairro
Varadouro; Escola Municipal de Ensino Fundamental Luiz Mendes Pontes
(EMEF LMP) e Escola Municipal de Ensino Fundamental Ubirajara Targino
Botto (EMEF UTB), ambas situadas no bairro do Cristo Redentor.

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Inicialmente, foram feitos três procedimentos: primeiro, as visitas às
turmas de EJA das escolas selecionadas; em seguida, a apresentação dos
objetivos da pesquisa para confirmação da participação das escolas através da
emissão de carta de anuência; e, então, a submissão do Projeto de Pesquisa
ao Comitê de Ética em Pesquisa da UFPB (aprovada pelo Parecer N o
2.143.499, CAAE: 67011917.2.0000.5188, de 28 de junho de 2017).
No período de setembro a dezembro de 2017, foram aplicados e
analisados 85 (oitenta e cinco) questionários. Todos os questionários tiveram 1075
como respondentes pessoas do sexo feminino, conforme plano de atividade, da
pesquisa PIBIC-UFPB (2017-2018), intitulada A INCLUSÃO ESCOLAR DA
POPULAÇÃO LGBT NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS. Os
questionários foram elaborados com base nos objetivos selecionados neste
projeto, totalizando 20 (vinte) questões. Por questões éticas, as educandas
tiveram suas identidades preservadas, sendo apresentadas nesta pesquisa
apenas pelas iniciais do nome, idade e Ciclo no qual encontravam-se
matriculadas.
A análise dos resultados foi realizada a partir da técnica de Análise de
Conteúdo (A.C.) preconizada por Bardin (2011), com base nos seguintes
procedimentos: pré-análise, exploração do material e o tratamento dos
resultados, a inferência e a interpretação. No rumo das orientações de
Bardin (ibidem), na fase da pré-análise trataremos de selecionar os
documentos a serem analisados e a formulação das hipóteses e dos objetivos,
leitura flutuante, para se estabelecer o primeiro contato com a documentação
(vale ressaltar que os dados obtidos por meio do questionário foram
compreendidos como gênero de documentos); em seguida, e não menos
importante, estes documentos deverão atender à regra da exaustividade, assim
compreendida:
Regra da exaustividade: uma vez definido o campo do corpus
(entrevistas de um inquérito, respostas a um questionário,
editoriais de um jornal [...] entre tal e tal data [...] etc.), é preciso
ter-se em conta todos os elementos desse corpus. [...], não se
pode deixar de fora qualquer um dos elementos por esta ou
aquela razão [...]. (BARDIN, 2011, p. 126-127, grifos da autora)

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Considerando as orientações de Bardin (2011), buscaremos identificar as
categorias presentes no conteúdo dos discursos registrados nos documentos a
analisar, para podermos realizar as inferências em cima das variáveis identificáveis
no objeto desta pesquisa.
Dos 85 questionários, foi possível classificá-los em duas categorias
temáticas: Formas de preconceito sofridas (ou não) no espaço escolar
(Opinião quanto a um homem gostar de outro homem e uma mulher gostar de
outra mulher, Formas de preconceitos dos colegas com as pessoas LGBTs; O 1076
uso do banheiro por pessoa Trans, conforme sua identidade; Interação com
pessoas LGBTs na escola; Reação a piadas de “bichas” ou “sapatão”) e As
ações pedagógicas de inclusão escolar da população LGBT (O tema da
sexualidade na escola da EJA e Interesses sobre temas LGBT na escola).

FORMAS DE PRECONCEITO SOFRIDAS (OU NÃO) NO ESPAÇO


ESCOLAR
Nesse item abordaremos sobre as formas de preconceitos sofridas pelos
LGBTs no espaço da escola. As informações foram reunidas em quadros,
inclusive com a transcrição de perguntas abertas respondidas pelas educandas
da EJA.

OPINIÃO QUANTO A UM HOMEM GOSTAR DE OUTRO HOMEM E UMA


MULHER GOSTAR DE OUTRA MULHER
Quanto a opinião sobre um homem gostar de outro homem e uma
mulher gostar de outra mulher, as educandas da EJA emitiram as seguintes
respostas:

Quadro 1 – Respostas das educandas


Frequência Dados qualitativos (Respostas Abertas)
Respostas Fechadas Quantidade Falta de Deus (M, 40 anos, Ciclo II,
EMEF DBF)

Doença 4
É fora do padrão natural da vida (R, 37
Normal 50

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Não Sabe 21 anos, Ciclo IV, EMEF LT)
Responder
Outros 8
É o gosto da pessoa (J, 15 anos, Ciclo II,
Em branco 2 EMEF LMP)

TOTAL 85
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Embora o quantitativo de respostas marcadas como normal seja 1077


majoritário (50), 4 respondentes assinalaram que a homossexualidade é uma
“Doença”. Quanto a esta polêmica, no dia 20 de setembro de 2017, a Justiça
Federal do Distrito Federal permitiu, em caráter liminar, que psicólogos
poderiam tratar gays e lésbicas como doentes e fazer terapias de “reversão
sexual” sem sofrer nenhum tipo de censura por parte do Conselho Federal de
Psicologia (CFP). Esse tipo de tratamento é proibido por meio de uma
resolução editada pelo CFP em 1999, já que, desde 1990, a homossexualidade
deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial da Saúde (VEJA,
2017).
Nesse mesmo dia, foram aplicados questionários em uma das escolas
selecionadas. A notícia saiu na mídia e em todos os jornais, provocou debates
e questionamentos no Brasil inteiro, logo, também, foi assunto discutido no
espaço escolar, e que pode ter influenciado as respostas.
Esse evento mostra o quanto essa questão ainda não foi superada,
inclusive, entre magistrados e profissionais da saúde.

FORMAS DE PRECONCEITOS DOS COLEGAS COM AS PESSOAS LGBTS


Em relação as formas de preconceitos dos colegas com as pessoas
LGBTs, as educandas da EJA expressaram as seguintes respostas:

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Quadro 2 – Respostas das educandas
Frequência Dados qualitativos (Respostas Abertas)
Respostas Fechadas Quantidade Fazem brincadeira de mal gosto (H, 18 anos,
Ciclo IV, EMEF LMP)

Agride fisicamente 2
Nunca vi aqui na escola (J, 22 anos, Ciclo IV,
Não agride 36 EMEF UTB)
Agride Verbalmente 24
1078
Não Sabe 22 Eles falam: olha, lá vai a bichinha ou a
Responder sapatão (L, 17 anos, Ciclo IV, EMEF JMF)
Outros 1
TOTAL 85

Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Constatou-se nesse item que 24 das questionadas assinalaram “ver


agressões verbais entre os colegas”, com isso, pode-se observar como a
homofobia é velada e marginalizada no âmbito escolar. Tratamentos
preconceituosos, medidas discriminatórias, ofensas, constrangimentos,
ameaças e agressões físicas e/ou verbais têm sido uma constante na vida
escolar e profissional de jovens e adultos LGBT. Essas pessoas se veem
desde cedo cercadas de piadas, brincadeiras, apelidos, insinuações,
expressões desqualificantes – poderosos mecanismos de silenciamento e
exclusão. Por meio dessa pedagogia, estudantes aprendem a “mover as
alavancas sociais da hostilidade contra [a homossexualidade] antes mesmo de
terem a mais vaga noção quanto ao que elas se referem” (SULLIVAN, 1996, p.
15 apud JUNQUEIRA, 2009, p. 29).

O USO DO BANHEIRO POR PESSOA TRANS, CONFORME SUA


IDENTIDADE

Quando questionadas sobre o uso do banheiro por pessoa Trans,


conforme sua identidade, as respostas foram as seguintes:

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Quadro 3 – Respostas das educandas
Frequência Dados qualitativos
Respostas Quantidade Sim, por que todos nós temos os mesmos
Fechadas direitos (P, 32 anos, Ciclo II, EMEF LMP)
Sim 58
Não 23 Não é confortável (R, 37 anos, Ciclo IV,
EMEF LT) 1079
Branco 4

Deveria ter banheiro pra eles (M, 26 anos,


TOTAL 85 Ciclo IV, EMEF LMP)
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

A educanda P, 32 anos, do Ciclo III da Escola Municipal Lions Monteiro


da Franca, em seu registro explica sua opinião diante ao uso de banheiro por
pessoas Trans conforme a identidade: “Sim, por que todos nós temos os
mesmos direitos”.
Entender que o sujeito tem uma identidade e deve ser respeitada, nada
mais é que ocupar lugares que lhes representem enquanto homem ou mulher,
garantindo seu direito igualitário enquanto cidadão. A emissora Globo
reproduziu uma novela no período de julho a setembro de 2017, cuja trama
trouxe o caso do personagem Ivan, homem trans, que precisou encarar muitas
questões como lidar com a família, amigos e com o preconceito, por assumir
sua identidade de homem, mesmo estando em um “corpo feminino”. Este fato
tem saído da escuridão e tem sido apresentado à sociedade como uma
realidade evidente.
Acerca da questão Junqueira (2009, p. 25), faz a seguinte observação:
“Nas escolas, não raro, enfrentam obstáculos para [...] fazerem uso das
estruturas das escolas (os banheiros, por exemplo) e conseguirem preservar
sua integridade física”.

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Como seres humanos somos inconclusos e nossa inconclusão perpassa
por um ser homem/mulher para além do nosso biológico, como também do
respeito e da tolerância à diversidade.

INTERAÇÃO COM PESSOAS LGBTS NA ESCOLA


Em relação a interação com pessoas LGBTs na escola, as educandas
responderam o seguinte:
1080
Quadro 4 – Respostas das educandas
Frequência Dados qualitativos
Respostas Fechadas Meu convívio quando tiver aqui vai ser
Quantidade amizade e respeito (P, 32 anos, Ciclo
II, EMEF LMP)
Sim 57
Não 24
Não tem diferença (C, 35 anos, Ciclo
Branco 4 II, EMEF LT)
TOTAL 85
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Quanto a pessoas LGBT na escola, 57 assinalaram interagir, 24, Não


interage, e, 4, deixaram em Branco o questionário.
Embora o tema LGBT e Sexualidade venha sendo discutido nos últimos
anos, essa discussão ainda não ganhou a relevância necessária. Entendendo a
escola como parte fundamental na construção do ser humano, como o lugar de
debate em busca do conhecimento e maior esclarecimento sobre a temática
LGBT, uma vez que ela é um dos espaços onde acontece as primeiras
descobertas da sexualidade, identidade e orientação sexual.
A partir desse número de interação dos educandos podemos confirmar a
importância da escola para se discutir o assunto e, assim, motivá-los para
combater os discursos homofóbicos e preconceituosos.

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REAÇÃO A PIADAS DE “BICHAS” OU “SAPATÃO”
Ao questionamos sobre a reação a piadas que envolvem “bichas” e
“sapatão”, as educandas expressaram as seguintes respostas:

Quadro 5 – Respostas das educandas


Frequência Dados qualitativos
Respostas Fechadas Quantidade Se eu gostar defendo com todas
as minhas forças (I, 57 anos, Ciclo 1081
Tanto faz 11
IV, EMEF JMF)
Acho engraçado 6
Não acho engraçado 28
Defender o colega 39
Branco 1
TOTAL 85
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Constatou-se nesse item que 39 educandas assinalaram “procurar


defender o colega” contra piadas agressivas e preconceituosas; outras 28
assinalaram “não acham engraçadas” as piadas. Ainda assim, 6 delas
assumem achar engraçado.
Um dado complementar a essa questão são as respostas de 11
educandas que respondem “tanto faz”, o que nos leva a inferir uma possível
normalização dessas brincadeiras e xingamentos.
Contudo é tarefa social da escola e dos professores não silenciar esses
tipos de violências, pois cabe à escola e ao educador educar para uma cultura
de paz, tolerância e respeito à diversidade sexual.

AS AÇÕES PEDAGÓGICAS DE INCLUSÃO ESCOLAR PARA O


SEGMENTO DA EJA
Nesse item abordaremos sobre as ações pedagógicas realizadas pela
escola para incluir a população LBGT. As informações foram reunidas também

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em quadros. Os resultados seguem apresentados em quadros, do mesmo
modo do item anterior.

O TEMA DA SEXUALIDADE NA ESCOLA DA EJA


Ao questionarmos como a escola discute a temática sexualidade, as
educandas registram as seguintes respostas:

Quadro 6 – Respostas das educandas 1082


Frequência Dados qualitativos
Respostas Fechadas Quantidade Ainda não vi, mas acharia bom
ter palestra (J, 26 anos, Ciclo
Palestra/Convidados 11
IV, EMEF JMF)
Debate em sala de aula 15
Diretamente com o 8 Normalmente falamos mas não
professor/Corpo escolar teve nenhuma palestra ainda
Não discute 40 (D, 30 anos, Ciclo III, EMEF
DBF)
Branco 11
TOTAL 85
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Diante dos resultados, 40 assinalaram que a escola não discute a


sexualidade, como expõe a educanda D, 30 anos, ciclo III, da escola Damásio:

“Normalmente falamos mas não teve nenhuma


palestra ainda”.

É esperado que a educação sexual transmita a sexualidade a partir de


um enfoque sociocultural, ampliando a percepção do mundo do aluno e
ajudando-o a aprofundar e refletir sobre suas opiniões (SUPLICY, 1983). Para
Ribeiro (2009), só informar não basta, é preciso apresentar atitudes positivas
(...) para perceber a sexualidade como algo positivo.
A sexualidade está presente na vida dos seres humanos, é algo do qual
não se pode desvincular, principalmente quando se trata da vida de jovens e

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adultos. Com ela, surgem dúvidas, questionamentos, que muitas vezes não
são tratados dentro do contexto familiar e que se repercutem na escola, espaço
onde essas manifestações da sexualidade são frequentemente vivenciadas.
Por isso, cabe à escola perceber que tal assunto não deve ser silenciado, e
que, ao invés disso, deve desempenhar o papel de levar informação.

INTERESSES SOBRE TEMAS LGBT NA ESCOLA


Quanto aos interesses das educandas em se discutir temáticas LGBTs 1083
na escola, obtivemos as seguintes respostas:

Quadro 7 – Respostas das educandas


Frequência Dados qualitativos
Respostas Fechadas Quantidade Seria muito bom, só assim eles se
sentiriam mais seguros. (I, 57 anos,
Sim, tenho interesse 59
ciclo IV, EMEF JMF)
Não tenho interesse 18
Branco 8
TOTAL 85
Fonte: Sistematização dos pesquisadores a partir dos dados obtidos da aplicação dos
questionários, 2017.

Constatou-se que 59 educandas têm interesse por temas LGBTs,


revelando a necessidade de se debater tais questões no espaço escolar. Esta
discussão é um meio de, além de combater a homofobia, também retirar este
tema do silenciamento e da invisibilidade.
A temática precisa ser debatida nas escolas porque educandos estão
sendo vítimas de agressões verbais por assumirem sua orientação sexual
diferente da hétero. Meyer (2009, p. 226) em seus estudos assevera que “[...]
algumas dessas relações no recreio escolar [ações homofóbicas] e descreve,
com três exemplos, como agressões físicas e verbais são utilizadas como
recurso ou estratégia para (re)estabelecer, reiterar e subverter relações de
poder de gênero nesse espaço”.

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A escola é um ambiente onde qualquer aluno DEVE se sentir seguro.
independentemente de sua identidade de gênero e orientação sexual.

POSSÍVEIS CONCLUSÕES

Considerando que o preconceito contra os LGBTs seja uma realidade


presente e frequente em certas escolas, concluímos que há a necessidade de
ações pedagógicas de inclusão e combate à homofobia. Esta pesquisa não 1084
apresentou respostas definitivas. O que temos são mais questionamentos, por
exemplo: por que a escola encontra tantas barreiras para discutir esse tema?
Por que na modalidade EJA, mesmo sendo um espaço de diversidade de faixa
etária, cultura, raça, cor etc., ainda se encontram tantas lacunas quanto às
ações de inclusão dos LGBTs?
O que se evidenciou, tanto a partir dos dados apresentados, como de
escutas, durante aplicação dos questionários, foi que a escola ainda não se
encontra acessível para acolher essa temática e necessita, ainda, ampliar o
esclarecimento social sobre este assunto, bem como romper com culturas
binárias, para compreender que o ser humano possui uma diversidade que não
se pode encaixar em rótulos: gay, lésbicas, hétero, homo, trans etc. Estes
rótulos, por sua vez, fracionam a condição humana, geram disputa de poder e,
consequentemente, preconceitos que segregam, estereotipam e sequelam o
outro.
Portanto, cabe à escola despertar para os avanços da sociedade e
incluir essa realidade, como elemento do processo de humanização
educacional, inclusive escolar, trazer informações e esclarecimentos, a fim de
alcançar a todos e todas através da inclusão. Para isso, pensar a inserção do
tema homofobia em seu currículo torna-se imprescindível e urgente.
Dessa forma, o respeito à diversidade será protagonista e a escola
cumprirá com seu papel social de promover, entre outras tantas coisas, o
respeito e a tolerância entre os seres humanos, independentemente de sua
condição sexual, de gênero, cor, etnia.

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REFERÊNCIAS

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reto e


Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.

GORISCH, Patrícia Cristina Vasques de Souza. O reconhecimento dos


direitos LGBT como direitos humanos. 2013. 102 f. Dissertação (Mestrado
em Direito Internacional)-Universidade Católica de Santos, Santos, 2013.

GRUPO GAY DA BAHIA. Assassinatos de LGBT no Brasil: o que eu fiz.


1085
Relatório 2015, Salvador, 2015.

JUNQUEIRA, Rogério Diniz (Org.). Diversidade Sexual na Educação:


problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade:
UNESCO, 2009.

MEYER, Dagmar E. Estermann. Corpo, Violência e Educação: uma abordagem


de gênero. In: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (Org.). Diversidade Sexual na
Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília:
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade: UNESCO, 2009.

RIBEIRO, M. Conversando com seu filho sobre sexo. São Paulo: Academia
de Inteligência, 2009.

RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. 4. ed.


Rev. ampl. e atualizada. São Paulo: Atlas, 2017.

SUPLICY, M. Conversando sobre sexo. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 1983.

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EDUCAÇÃO DO CAMPO, APARATOS LEGAIS E CURRÍCULO

Maraiane Pinto Sousa | Severino Bezerra Silva

RESUMO: Este trabalho se configura como um recorde da pesquisa do Trabalho de


Conclusão de Curso (TCC), do Curso de Pedagogia Presencial, da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB). Dessa forma, compreendemos a necessidade de
aprofundar o estudo na perspectiva do currículo, destacando o fio que sustenta a
Educação do Campo e seu currículo, visto que essa modalidade de ensino é
permeada de especificidades e necessidades. Para isso, apresentamos os aparatos
legais da Educação do Campo e as orientações que sustentam o currículo de acordo 1086
com a realidade do Campo. Nossa pesquisa se caracteriza como documental, sendo
adequada aos nossos objetivos. Nesse sentindo, de acordo com Gonsalves (2011,
p.34), é necessário compreender, inicialmente, o que é um documento. Gonsalves
(2011) assegura que as pesquisas podem ser classificadas a partir de diversos
critérios, daí enfatizarmos a pesquisa segundo a natureza de dados. Quanto à
natureza dos dados, esta pesquisa se caracteriza como qualitativa. Com base nos
estudos de Michel (2015, p.40), a pesquisa qualitativa “se propõe colher e analisar
dados descritivos, obtidos diretamente da situação estudada”. O estudo aponta para a
necessidade de aprofundar a pesquisa, uma vez que há supervalorização do urbano
em detrimento ao campo, com isso percebemos que é imprescindível que o currículo
paras as escolas do campo esteja em consonância com o cotidiano da escola e onde
ela está localizada, como forma de valorizar a cultura dos sujeitos e suas
especificidades.

Palavras-chave: Educação do Campo. Aparatos legais. Currículo. Especificidade do


Campo. Cultura.

INTRODUÇÃO

Este trabalho se configura como um recorde da pesquisa do Trabalho de


Conclusão de Curso (TCC), do Curso de Pedagogia Presencial, da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Dessa forma, compreendemos a
necessidade de aprofundar o estudo na perspectiva do currículo, destacando o
fio que sustenta a Educação do Campo e seu currículo, visto que essa
modalidade de ensino é permeada de especificidades e necessidades. Para
isso, apresentamos os aparatos legais da Educação do Campo e as
orientações que sustentam o currículo de acordo com a realidade do Campo.
Diante disso, julgamos necessário apresentar o contexto dos
movimentos sociais em defesa da educação, educação do campo e respeito a
sua diversidade e características e o currículo. Segundo Arroyo (1999) há

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questionamentos em volta do currículo e sua vinculação com o contexto e
cotidiano da escola e sua cultura, ainda ressalta a imposição da educação
básica com currículo da escola urbana para a escola do campo.
Compreendemos que essa ação descaracteriza e desvaloriza a cultura do
campo, com isso, é pertinente o destaque dos documentos que oferecem base
para a legitimação da adequação do currículo com o cotidiano escolar e local.
Nossa pesquisa se caracteriza como documental, sendo adequada aos
nossos objetivos. Nesse sentindo, de acordo com Gonsalves (2011, p.34), é 1087
necessário compreender, inicialmente, o que é um documento. Para isso, é
preciso “superar a ideia de que documento é apenas o escrito oficialmente,
guardado nos arquivos governamentais”. Torna-se relevante destacar que a
pesquisa documental se aproxima da bibliográfica. Ambas se diferenciam pela
natureza de suas fontes. A primeira se refere aos estudos sobre um
determinado assunto. Gonsalves (2011, p. 34) acentua que a pesquisa
documental trata da recorrência “a materiais que ainda não receberam
tratamento analítico, ou seja, as fontes primárias”.
Gonsalves (2011) assegura que as pesquisas podem ser classificadas a
partir de diversos critérios, daí enfatizarmos a pesquisa segundo a natureza de
dados. Quanto à natureza dos dados, esta pesquisa se caracteriza como
qualitativa. Com base nos estudos de Michel (2015, p.40), a pesquisa
qualitativa “se propõe colher e analisar dados descritivos, obtidos diretamente
da situação estudada”.
Dessa maneira, o trabalho destaca os aspectos legais, assim como o
contexto histórico da educação do campo, os movimentos sociais, educação no
e do campo, bem como o currículo como e a dinâmica cultural do campo, uma
vez que a LDB/9.394/96 disserta e assegura o contexto local como primordial
para o desenvolvimento da educação. Para tanto, seguiremos no
desenvolvimento do trabalho destacando as características do campo.

EDUCAÇÃO DO CAMPO
Entender a educação do campo é revestir-se dos fios que tecem a sua
dinâmica, de modo que essa roupagem ofereça para os sujeitos um espaço

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constituído, de fato, fundamentado na realidade. E esta realidade, no campo, é
peculiar, com sujeitos únicos com uma realidade plural. Essa pluralidade
constitui em seu sentido a diversidade.
A Constituição Federal de 1988, como documento regente da sociedade
brasileira, em seu Art. 6, apresenta a educação como um direito social; e, no
Capítulo III, Art. 205, considera-a como direito de todos, dever do Estado e da
família. Já a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº
9.394/96, em seu Art. 28, discorre sobre a oferta da educação básica para a 1088
área rural, enfatizando a adequação da escola à realidade da área rural, desde
o seu currículo até a organização didática. Outro documento acrescentado às
propostas apresentadas da LDB é a Resolução CNE/CEB nº 1, de 2002, que
institui as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo. Ressaltamos o seu parágrafo único, em que diz:

A identidade da escola do campo é definida pela sua


vinculação às questões inerentes a sua realidade, ancorando-
se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na
memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e
tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais
em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por
essas questões à qualidade social da vida coletiva do país.
(2002, p.01)
Como vimos, a escola possui sua identidade, e a escola do campo não
pode desconsiderar as suas peculiaridades ao pensar o currículo, o seu
calendário, bem como a sua oferta. Em 2010, no final do governo de Luiz
Inácio Lula da Silva, entrou em vigor o Decreto nº 7.352/2010, que dispõe tanto
sobre a educação do campo como também sobre o Programa Nacional de
Educação da Reforma Agrária (PRONERA). Por sua vez, o Plano Nacional de
Educação (PNE 2014), na Meta 8, busca atender à EC com o objetivo de
elevar a escolaridade.
Esses documentos oferecem a base para compreendermos as
necessidades das escolas consideradas, caracteristicamente, como do campo.
Com a educação ancorada em leis, é possível realizar a organização das suas
modalidades de forma mais contundente. E isso é preciso ser reforçado nos
espaços de discussões da educação. A EJA e a EC são modalidades que

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possuem sustentação no sentido legal, pedagógico e social. Não podemos
desconsiderar a realidade social dos sujeitos dentro da escola, sendo relevante
que as escolas municipais, estaduais e federais estejam de acordo com os
princípios que regem a educação brasileira, destacando o currículo, o respeito
aos contextos em que os alunos estão inseridos, e, para além disso, o respeito
e a efetivação desse direito.
Até o presente momento, destacamos os documentos de nível nacional.
Mais adiante, apresentaremos o Plano Estadual de Educação da Paraíba PEE 1089
(2015 – 2025) e o Plano Municipal de Educação do Municipal de Educação de
Santa Rita – PB PME (2015 – 2025), com o objetivo de verificar como esses
documentos pensam a educação do campo e oferecem suporte aos
municípios, uma vez que são documentos norteadores da educação em todos
os seus níveis e modalidades.
Com isso, o PEE (2015-2025), o PNE (2014-2024) e o PME (2015 –
2025) de Santa Rita – PB amparam, de forma acentuada, a educação do
campo, e apontam que a população rural da Paraíba, em 2010, era constituída
de 25% da totalidade populacional – de acordo com o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE, 2010). Elencando metas para o desenvolvimento
dessa modalidade de ensino, buscam ampliar a oferta, garantir a permanência
e melhorar a qualidade da educação do campo. O PEE, em sua estrutura
pretende, ainda, realizar parcerias com projetos que tenham como objetivo
estudar a educação básica do campo.
Esse plano apresenta, categoricamente, algumas ações desenvolvidas
na Paraíba alusivas à Educação do Campo. Dessa forma, o PEE (2014, p. 67)
destaca:
Na Paraíba, várias ações em educação do campo vêm sendo
desenvolvidas como resultado da luta dos Movimentos Sociais
do Campo tais como: O Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária (PRONERA), iniciado em 1999, com o curso
de Magistério - Normal de Nível Médio (convênio
INCRA/MDA/UFPB – campus de Bananeiras /MST e, em
seguida, cursos de Alfabetização de Jovens e Adultos
(convênio INCRA/MDA/UFPB/UFCG/CPT, MST); Escolarização
– 1º segmento do Ensino Fundamental – (em parceria com a
UFPB, a UFCG e a UEPB); Cursos Técnicos de Agropecuária
com habilitação em Agroindústria, Agricultura, Zootecnia (IFPB,
UFPB, UFCG, UEPB); Curso de Magistério em Educação do

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campo (Curso Normal de Nível Médio (UFPB); Curso Técnico
em Enfermagem (UFPB); Cursos de Licenciatura em História e
Pedagogia (UFPB) e Serviço Social (UFCG), Medicina
Veterinária (UFCG) e Agroecologia (IFPB, UFPB e UEPB).

A partir disso, percebemos a importância dos movimentos sociais na


constituição das propostas da Educação do Campo, das suas ações e
distribuições, dentro do Estado; e, em âmbito municipal, do PME de Santa Rita
– PB. A partir da análise realizada, não encontramos, de forma sistemática,
informações, sobretudo sobre o contexto local. Desse modo, é imprescindível 1090

destacar que as ações mencionadas acima não são ações exclusivas do


Estado, enquanto instância responsável, mas sim atividades realizadas por
meio de instituições, principalmente da Universidade. O Estado, em seu Plano,
não apresenta propostas efetivas para a EC, tampouco para a EJA. Dentro do
PEE, no entanto, é possível perceber ações que acontecem de forma isolada,
sem o incentivo da esfera estadual. O PME é muito semelhante ao PNE,
realizando complementações no que concerne ao município. Entretanto
estabelece metas e estratégias em torno da EC. Dessa maneira, destacamos,
no Plano, a estratégia 1.8, que qual busca

Fomentar o atendimento das populações do campo e das


comunidades indígenas e quilombolas na educação infantil nas
respectivas comunidades, por meio do redimensionamento da
distribuição territorial da oferta, limitando a nucleação de
escolas e o deslocamento das crianças, de forma a atender às
especificidades dessas comunidades, garantindo consulta
prévia e informada, assegurando a Educação Infantil calendário
apropriado e planejamento de atividades educativas que
contemplem a diversidade das crianças que se encontram em
sala de aula, como as advindas das comunidades quilombolas
e outras expressões de multiculturalidade. (p. 4)

Dessa forma, a partir do PME não foi possível obter muitas informações
sobre a Educação do Campo. Porém o nosso objetivo, neste capítulo, é
apresentar os marcos legais da EC. A seguir, apresentaremos os movimentos
sociais e as iniciativas que privilegiaram essa modalidade como pauta de luta,
resistência e contestação.

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MOVIMENTOS DO CAMPO

Segundo Arroyo (1999 p.24), os Movimentos Sociais do campo


apresentam, em sua dinâmica, a existência de um movimento pedagógico. Ele
defende a renovação pedagógica a partir dos movimentos sociais, num
contexto caracterizado pela existência de governos populares. Ainda, ressalta a
necessidade de tratar o aluno como sujeito, possuidor de história e diferença. A
pluralidade está no gênero, na cor, na raça, na classe social, sendo necessário 1091
“tratar o aluno como gente”. E essa gente tem rosto, voz, direito; possui
identidade, que não pode ser negada no processo de educação.
Um marco na educação do campo foi a “I Conferência Nacional: por uma
educação básica do campo”, realizada no ano de 1988. Consideramos esse
momento como espaço para a garantia na defesa da educação do campo,
como oportunidade para expor o campo e a sua existência. A negação da sua
existência se constitui, em princípio, em negação de direitos. Essa conferência
resultou na produção dos cadernos intitulados Por uma Educação Básica do
Campo, material estruturante para o nosso trabalho. De acordo com Arroyo
(1999), os educadores e as educadoras presentes na conferência conhecem os
problemas para os quais buscam resolução. Mais do que isso, entendem que a
imagem marginalizada atribuída ao povo do campo dá-se em decorrência da
falta de projetos que atendam às suas reais necessidades.
Isso pode ser mais aprofundado em uma outra pesquisa. Esses
posicionamentos, porém, já nos direcionam para o conhecimento de um
caminho percorrido em um espaço permeado pela reivindicação. Como
exemplo disso, destacamos a conferência supramencionada, que resultou do
Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (ENERA),
realizado em 1997. Promovido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), recebeu apoio da Universidade de Brasília (UNB), do Fundo das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF), da Organização das Nações Unidas
para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB).
Na esfera religiosa, é imprescindível ressaltar o papel desenvolvido pela
Comissão Pastoral da Terra (CPT), cujos princípios caracterizadores da

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Teologia da Libertação contribuem, demasiadamente, para a luta pela terra,
sendo permeada de um sentido popular. Destacamos, aqui, a sua contribuição
para o desencadeamento de movimentos populares, sociais e de
trabalhadores. De acordo com Menezes (2007), a contribuição da CPT e da
Teologia da Libertação oferece base à organização do MST, o qual se
fortaleceu na luta empreendida pelos trabalhadores do campo. Fernandes
(1999, p. 56) acentua a resistência do MST frente aos discursos que
asseguram a impossibilidade de utilização de terras para a reforma agrária. E 1092
sublinha que “os trabalhadores sem-terra seguiram lutando, ocupando terra”.
Essas instituições e movimentos oferecem espaço e apoio na defesa de uma
educação básica do campo, com o respeito e a valorização da relação que os
sujeitos do campo possuem com a terra. Os valores da escola devem estar em
consonância com a carga cultural que não se encontra na escola, fazendo-se
necessário adequar-se o currículo à realidade do povo campo e ao processo
em que eles vivem fora da escola. Essa relação é imprescindível para se
compreender a especificidade do campo, a sua dinâmica temporal, a relação
com o trabalho e sua a cultura, e também com a terra. Desse modo, entendem-
se as diversidades significativas existentes no contexto de atuação dos povos
do campo.

A ESCOLA NO E DO CAMPO

A educação no campo – conforme apresentado anteriormente –, em sua


base, deve levar em consideração a realidade dos seus sujeitos. Para isso,
Kolling; Nery e Molina (1999) destacam, como fator imprescindível na
educação básica do campo, “que leve em conta a cultura, as características, as
necessidades e os sonhos dos que vivem no e do campo”. Desse modo,
devemos ter essa compreensão acerca daqueles que vivem no campo e dele
tiram seu sustento.
Para esses estudiosos Kolling; Nery e Molina (1999, p. 26), a abordagem
acerca da educação do campo incide sobre a educação direcionada aos
trabalhadores e trabalhadoras do campo: “sejam camponeses, incluindo os
quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os diversos tipos de

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assalariados vinculados à vida e ao trabalho do meio rural”. Eles destacam a
necessidade de construção, nessas escolas, de um projeto político-pedagógico
que respeite a cultura desse povo, os seus desafios e a sua história, de forma
que exista o reconhecimento da importância da construção de escolas no e do
campo.
Na compreensão desses autores,

Entende-se por escola do campo aquela que trabalha desde os


interesses, a política, a cultura, a economia dos diversos
1093
grupos de trabalhadores e trabalhadoras do campo, nas suas
diversas formas de trabalho e de organização, na sua
dimensão de permanente processo, produzindo valores,
conhecimentos e tecnologias na perspectiva do
desenvolvimento social e econômico igualitário dessa
população. A identificação e a inserção geográfica na própria
realidade cultural do campo são condições fundamentais de
sua implementação (KOLLING; NERY e MOLINA, 1999, p. 63).

Assim, o que não podemos desconsiderar, a partir do posicionamento


apresentado anteriormente, é a necessidade de adequação das propostas
pedagógicas das escolas do campo à sua realidade. O currículo precisa
atender a essas demandas, a essas adequações, uma vez que a cultura é eixo
estruturante da educação, como espaço de valorização dos sujeitos que a
possuem.
Caldart (2002, p.27) evidencia que “os sujeitos da educação do campo são os
sujeitos do campo”. Nesse sentido, a educação é feita por sujeitos que
precisam encontrar a sua realidade no currículo, no projeto político-pedagógico
da escola, bem como nas discussões sobre a educação do campo.
Segundo Fernandes (1999, p. 98), há diferenças entre escola do campo
e escola no campo. E explica: enquanto a escola no campo representa um
modelo pedagógico ligado a uma tradição ruralista de dominação, por sua vez,
a escola do campo representa uma proposta de construção de uma pedagogia
que toma como referências as diferentes experiências dos seus sujeitos, os
povos do campo.
Entende ele que, para a discussão e a compreensão desses conceitos, é
essencial estabelecer, igualmente, diferença entre a educação do campo e a
educação rural. Nessa acepção, “enquanto a Educação Rural é um projeto

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externo ao campesinato, a Educação do Campo nasce das experiências
camponesas de resistência em seus territórios” (FERNANDES, 1999 p. 41). Ao
compreender esses conceitos, assumimos a defesa, o respeito à diversidade, à
cultura, à realidade e à história do povo do campo. Campo, este, que é plural,
com sujeitos vivendo num coletivo.

A educação como prática da liberdade, ao contrário daquela


que é prática da dominação, implica a negação do abstrato,
isolado, solto, desligado do mundo, assim como também a 1094
negação do mundo como uma realidade ausente. A reflexão
que propõe, por ser autentica, não é sobre este homem
abstração nem sobre este mundo sem homens, mas sobre os
homens em suas relações com o mundo. Relações em que
consciência e mundo se dão simultaneamente. Não há uma
consciência antes e um mundo depois e vice-versa. (FREIRE,
p. 98)

Em vista disso, é necessário haver uma compreensão acerca da


educação no e do campo, para que a organização pedagógica não negue a
realidade desses alunos. Entendemos como sendo necessária a relação com o
mundo a partir dos contextos social, cultural e econômico dos sujeitos do
campo que estão envolvidos no sistema educacional .

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o exposto, consideramos que a Educação do Campo


necessita de estudos aprofundamos no campo do currículo, para que a
educação crítica, reflexiva e emancipatória seja objetivo, mas também a base
para o desenvolvimento educacional e dos sujeitos que nele estão inseridos. A
adequação do currículo da escola do campo deve estar de acordo com o seu
cotidiano. As especificidades do campo devem ser respeitas pelas politicas
públicas, visto que no Art. 26 da LDB/9.394/96 é assegurado que:
Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do
ensino médio devem ter base nacional comum, a ser
complementada, em cada sistema de ensino e em cada
estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida
pelas características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e dos educandos.

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Isso reforça a obrigatoriedade da adequação curricular. Porém,
ressaltamos o questionamento de Arroyo (1999), quanto ao pensamento de
qual currículo estamos discutimos e quais são os aspectos culturais que estão
sendo defendidos. O Estado possui um papel preponderante na efetivação das
disposições legais acerca dessa adequação. Isso pode ser um estudo futuro,
com mais ênfase na construção do currículo e o pensamento das escolas do
campo.
A partir da realização desta pesquisa, de acordo com Kolling; Néry e 1095
Molina (1999), compreendemos que a educação possui o sentido de formação
humana, com o objetivo de formar sujeitos que sejam agentes de intervenção
social na própria realidade. Como resultado do que foi trabalhado, de acordo
com o objetivo geral, conhecer a realidade da dinâmica educativa e a oferta de
uma determinada modalidade, ou de modo geral, é importante para que
possamos compreender que a educação brasileira concorre com a violência
mais cruel, que é a ausência plena do papel do Estado.

REFERÊNCIAS

ARROYO, Miguel Gonzales. A Educação Básica e o Movimento Social do Campo. In:


ARROYO, Miguel Gonzales; FERNANDES, Bernardo Mançano. A educação básica e
o movimento social do campo por uma educação básica do campo. Brasília:
1999. p.13-53

FERNANDES, Bernardo Mançano. Por uma Educação Básica do Campo. In:


ARROYO, Miguel Gonzales; FERNANDES. Bernardo Mançano. A educação Básica e
o movimento social do campo. Brasilia: 1999. p.53-86.

______. Lei Nº 9394/96 que institui as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.


Disponível em:
https://www.google.com.br/search?q=ldb&oq=ldb&aqs=chrome..69i57j0j35i39j0l3.1429
j0j7&sourceid=chrome&ie=UTF-8. Acesso em: 07/08/2018.

______. Educação de Adultos em Retrospectiva 60 anos de CONFINTEA. In:


IRELAND, Timothy Denis; SPEZIA, Carlos Humberto (Orgs). Brasilia. 2014.

______. Documento Nacional Preparatório à VI Conferência Internacional de


Educação de Adultos CONFINTEA. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal/194-secretarias-112877938/secad-
educacao-continuada-223369541/14240-confitea-documento-base. Acesso em:
25/10/2018.

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______ Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.
Disponívelem:http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download
&alias=13800-rceb001-02-pdf&category_slug=agosto-2013-pdf&Itemid=30192. Acesso
em: 25/10/2018.

_____ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE). Disponível em:


https://cidades.ibge.gov.br/. Acesso em: 25/10/2018.

______ Plano Nacional de Educacional. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm. Acesso em:
07/08/2018.
1096
_____Parâmetros Curriculares Nacionais. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso em: 07/08/2018.

_____ DECRETO Nº 7.352, DE 4 DE NOVEMBRO DE 2010. Disponível em:


http://portal.mec.gov.br/docman/marco-2012-pdf/10199-8-decreto-7352-de4-de-
novembro-de-2010/file. Acesso em: 07/08/2018. .

CALDART, Roseli Salete. Por uma educação do campo: traços de uma identidade
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Mônica Castagna (Org.). Por uma educação do campo. Petrópolis: Vozes, 2004. p.
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construção. In: KOLLING, Edgar Jorge; CERIOLO, Paulo Ricardo; CALDART, Roseli
Salete. Educação do Campo: Identidade e Políticas Públicas. Brasília: 2002. p. 25-
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______. Sobre Educação do Campo. In: SANTOS, Clarice Aparecida. Campo,
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MICHEL, Maria Helena. Metodologia e Pesquisa em Ciências Sociais. Ed. Atlas,


2015.
GONSALVES, Elisa Pereira. Conversando sobre iniciação à pesquisa científica. 5.
Ed. Campinas, SP. Editora Alínea, 2011.
PARAÍBA. Conselho Estadual de educação da Paraíba. Plano estadual de educação
(2015-2025). João Pessoa, 2015.
SANTA RITA. Câmara Municipal. Plano municipal de educação de Santa Rita (PB).
Santa Rita, 2015.

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GT 11 – POLÍTICAS CURRICULARES E
ENSINO RELIGIOSO

NOTAS PARA UM PROJETO PEDAGÓGICO EM CIÊNCIAS DA


RELIGIÃO: COMPONENTES E OBJETIVOS PARA AS
1097
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS

Mailson Fernandes Cabral de Souza122

Resumo: As Ciências da Religião se configuram como um campo de estudos


(trans)interdisciplinar, caracterizando-se como um ponto de intersecção de estudos
acerca do fenômeno religioso, sendo um importante contributo para o desenvolvimento
de pesquisas sobre a temática religiosa no país. Além disso, a área representa o
campo do saber responsável por fornecer os conteúdos pedagógicos para o ensino
religioso não confessional na rede de escolas públicas. Frente ao novo momento de
institucionalização da área – em especial com as portarias CNE/CES nº 3 de 1 de
março de 2018 e CNE/CES nº 6, de 26 de abril de 2018 –, surgiu a necessidade, por
parte de docentes e pesquisadores da área, de se pensar as diretrizes curriculares
nacionais para os cursos de graduação (licenciatura), com o intuito de oferecer uma
orientação comum aos programas, e seus respectivos docentes, sobre o perfil,
funcionamento e objetivos desses cursos. Em razão disso, torna-se fundamental a
criação de um projeto pedagógico para que se possa aprofundar a reflexão sobre os
conteúdos pertinentes as graduações em Ciências da Religião, a fim de se oferecer
uma proposta sólida de formação teórica, metodológica e prática aos discentes que
compõe os cursos, habilitando-os ao trabalho docente e de pesquisa. A presente
comunicação traça um esboço de proposta pedagógica para as diretrizes curriculares
da área.

Palavras-chave: Ensino Religioso. Currículo. Projeto Pedagógico.

INTRODUÇÃO

Esta comunicação é fruto de algumas reflexões iniciadas no grupo de


trabalho – coordenado pelo professor Gilbraz Aragão – criado na última

122
Mestre em Ciências da Religião (UNICAP). E-mail: mailsoncabral@yahoo.com.br

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assembleia de 2017 da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Teologia e Ciências da Religião (ANPTECRE) com o intuito de pensar e
oferecer sugestões para a formulação de diretrizes curriculares para os cursos
de graduação em Ciências da Religião, em especial, os cursos de licenciatura,
pois estes devem formar os professores de ensino religioso.
O grupo de trabalho foi dividido em quatro eixos a fim de melhor
colaborar na construção de diretrizes curriculares: 1) aspectos/componentes
dos projetos pedagógicos; objeto/objetivos dos cursos na área perfil dos 1098
egressos das licenciaturas; 2) competências e habilidades dos formandos
estrutura curricular e carga horária; 3) eixos didáticos e conteúdos curriculares;
4) metodologias, estágios curriculares, atividades complementares e trabalhos
de conclusão. Fiquei incumbido de elaborar um primeiro esboço do primeiro
eixo para o grupo e submetê-lo à discussão. O texto que se segue é um
desdobramento dessa discussão em que procuro traçar um panorama histórico
sobre a presença do ensino religioso no Brasil e de como as Ciências da
Religião podem fornecer uma base epistemológica para a prática dessa
disciplina de forma não confessional, respeitando o princípio da laicidade.
Tendo isso em vista, apresentamos alguns pontos que deveriam caracterizar
as licenciaturas em Ciências da Religião a fim de garantir uma formação sólida
para os discentes.

1 ENSINO RELIGIOSO: UM PANORAMA

No contexto educacional brasileiro, a presença do ensino religioso


esteve marcada, em seu início, pelo modelo colonial português. A educação
religiosa era uma questão de cumprimento de acordos entre a Igreja Católica e
a coroa portuguesa, estando a educação sob a tutela dos jesuítas
(JUNQUEIRA, 2011). Somente com o estabelecimento das reformas
pombalinas e a expulsão dos jesuítas do país, em 1759, a educação se tornou
responsabilidade do Estado, que tomava por diretriz os ideais iluministas.
Apesar disso, o ensino nesses novos moldes era restrito à elite:
O ensino da religião nesta fase passa pelo crivo da Inquisição e
caracteriza-se como catequese dirigida aos índios, escravos e

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ao povo como um todo, pois a elite brasileira é educada nas
escolas da Coroa (Portugal) (JUNQUEIRA, 2011, p. 37).

O modelo de ensino da religião era entendido como meio de


evangelização dos não cristãos, o que não conflitava com os projetos do
império e nem com os da aristocracia. Com a proclamação da República, em
1889, a liberdade de culto foi constitucionalmente garantida a todo e qualquer
grupo religioso e a educação ministrada nas escolas da rede pública passou a
ser de caráter leigo. Todavia, o que se impôs, na prática, foi um modelo de 1099
cooperação e aproximação entre Estado e religião, privilegiando o catolicismo
(LEITE, 2011).
Essa perspectiva proselitista perdurou até o processo de
redemocratização do Brasil123. Com o advento da Constituição de 1988, o texto
constitucional passa a regulamentar a presença do ensino religioso:
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino
fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum
e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e
regionais. § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa,
constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas
de ensino fundamental (BRASIL, 1988).

A inscrição histórica do ensino religioso em um discurso confessional


produziu os seus efeitos: na sua regulamentação, o inciso 1º do artigo 210 não
estabelece se ele deve ser de caráter confessional ou não, nem lança diretrizes
para o seu funcionamento. Essa lacuna de diretrizes marca a ambiguidade e a
disputa por significação acerca do papel da religião no espaço público,
trazendo à tona o confronto entre posicionamentos ideológicos divergentes,
visto que o efeito de imprecisão desse artigo produz um espaço disputa pelos
sentidos que o ensino religioso pode tomar – confessional ou não confessional
– e os critérios para demarcá-lo (SOUZA; AZEVEDO, 2017).
Tendo em vista contexto democrático que se estabeleceu no Brasil, a
laicidade seria o princípio que, ao menos em tese, deveria orientar o ensino
religioso. A laicidade assegura que a filiação religiosa não se constitui como
prerrogativa para o direito à cidadania, e o poder público fica imobilizado pela

123
Na Constituição de 1934, o ensino religioso torna-se de caráter facultativo, mas de oferta
obrigatória por parte da escola, permanecendo, no entanto, o seu caráter confessional.

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abstenção de assumir uma religião oficial ou dogma civil. Há, dessa forma, uma
dissociação entre lei civil e normas religiosas: passa-se a organizar a vida
política do Estado sem a prerrogativa de um fundamento transcendente
(SOUZA, 2017). Esse princípio emerge como conceito basilar para as
formulações em torno do conteúdo do ensino religioso, oferecendo um
operador lógico para diminuir o caráter vago do artigo 210.
A fim de preencher essa lacuna, constará na formulação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), sancionada em 20 de 1100
Dezembro de 1996, que o ensino religioso deverá possuir as seguintes
características: não produzir ônus para os cofres públicos, facultativo,
confessional ou interconfessional (ALVES; JUNQUEIRA, 2011). Como se pode
observar, o ensino religioso ainda não se distancia de um sentido confessional.
Será com a revisão do artigo 33 da LDB que ele perderá o seu caráter
teológico e passará a ser compreendido como uma área do conhecimento,
ficando vedada qualquer forma de proselitismo ou de doutrinação religiosa no
âmbito escolar.
Art. 33 – O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui
disciplina dos horários normais em escolas públicas de ensino
fundamental, fornecendo, sem ônus para os cofres públicos, de
acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por
seus responsáveis, em caráter: I – confessional, de acordo com
a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado
por professores ou orientadores religiosos preparados e
credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas;
ou II – interconfessional, resultante de acordo entre diversas
entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração
do respectivo programa (BRASIL, 1996).

Em um novo texto, aprovado no ano seguinte, a Lei n. 9.475/97, a LDB


passa a considerá-lo como uma disciplina básica na formação do cidadão e a
expressão sem ônus para os cofres públicos é retirada (ALVES; JUNQUEIRA,
2011):
Art. 33 – O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte
integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina
dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurando o respeito a diversidade cultural
religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo: I
– Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos
para a definição dos conteúdos do ensino religioso e
estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos

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professores. II – Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil,
constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a
definição dos conteúdos do ensino religioso (BRASIL, 1996).

Essas modificações seguem um movimento de redefinição dos


fundamentos epistemológicos e pedagógicos do Ensino Religioso, para acolher
as tradições e grupos religiosos e não religiosos que integram a complexa e
diversa sociedade brasileira. (ARAGÃO; SOUZA, 2016). O Ensino Religioso,
conforme a proposta da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) do
1101
Ministério da Educação, tem por objetivo traduzir pedagogicamente os
conhecimentos transversais das Ciências da Religião, ciências humanas e
sociais, articulados em eixos curriculares que tratem do ser humano e sua
transcendência, dos conhecimentos simbólicos e espirituais, das práticas éticas
religiosas e não religiosas.
Para esclarecer essa proposta e recuperar sincronicamente os modelos
de Ensino Religioso que foram se desenhando no cenário histórico brasileiro,
Passos (2007) fala de uma trajetória catequética-confessional, de uma
teológica ou interconfessional e, por último, de um modelo fundamentado nas
Ciências da Religião:
O modelo catequético é o mais antigo, está relacionado,
sobretudo, a contextos em que a religião gozava de hegemonia
na sociedade, embora ainda sobreviva em muitas práticas
atuais que continuam apostando nessa hegemonia, utilizando-
se, por sua vez, de métodos modernos. Ele é seguido do
modelo teológico que se constrói num esforço de diálogo com a
sociedade plural e secularizada e sobre bases antropológicas.
O último modelo, ainda em construção, situa-se no âmbito das
Ciências da Religião e fornece referências teóricas e
metodológicas para o estudo e o ensino da religião como
disciplina autônoma e plenamente inserida nos currículos
escolares. Ele tem por meta lançar as bases epistemológicas
para o ER, deitando suas raízes e arrancando exigências do
universo científico dentro do lugar comum das demais
disciplinas ensinadas nas escolas (PASSOS, 2007, p. 54).

Pensar o ensino religioso de forma não proselitista, considerando o


fenômeno religioso como parte da experiência humana, é fundamental na
construção de uma educação que respeita a laicidade e a liberdade religiosa.
Em tempos em que a intolerância e o desrespeito a diversidade de crenças a
construção de uma cultural de paz, torna-se substancial construir espaços de

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convivência e tolerância. Nesse contexto, o ensino religioso pode ser uma
ferramenta valiosa no conhecimento da história das diferentes tradições
religiosas e ajudar a aclimatar as relações interpessoais e as possibilidades de
diálogo com o outro no âmbito escolar (ARAGÃO; SOUZA, 2016).

2 AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO COMO BASE TEÓRICO-METODOLÓGICA


DO ENSINO RELIGIOSO 1102

As Ciências da Religião se configuram como um campo de estudos


(trans)interdisciplinar que, surgido no contexto brasileiro no final dos anos
1960, tem-se expandido fortemente desde o início dos anos 2000.
Diferentemente da grande parte das pós-graduações no Brasil, os programas
de Ciências da Religião tiveram o seu surgimento de forma independente das
graduações na área, que só apareceram posteriormente aos cursos stricto
sensu.
O nascimento da área se dá, inicialmente, sob a forte influência da
Teologia da Libertação e do movimento ecumênico, então em voga no contexto
latino-americano124 (1960-1980). O intuito, nesse período, era conferir um
estatuto de cientificidade e identidade para os estudos de religião no âmbito
das Ciências Humanas. Dessa forma, pretendia-se estudar fenômeno religioso
fora dos moldes da teologia tradicional e trazê-lo para o âmbito da universidade
brasileira que, dada a influência do positivismo, teria excluído o fenômeno
religioso do centro de suas discussões e pesquisas (SOUZA, 2018).
Na área, as interfaces das ciências humanas (História, Antropologia,
Psicologia, Sociologia, Filosofia, etc.) são mobilizadas para a análise do
fenômeno religioso, a fim de se obter uma abordagem multidimensional da
religião. No Brasil, as Ciências da Religião podem ser caracterizadas como um
ponto de intersecção de estudos acerca do fenômeno religioso, sendo um
importante contributo para o desenvolvimento de pesquisas sobre a temática
religiosa e seus desdobramentos históricos e socioculturais no país (SOUZA,
124
Foi no campo das Ciências Sociais que as CR, inicialmente, encontraram o seu grande
ponto de apoio para as primeiras reflexões e pesquisas.

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2018).
Além disso, a área também representa o campo do saber responsável
por fornecer os conteúdos pedagógicos para o ensino religioso não
confessional na rede de escolas públicas do país. Isso porque As Ciências da
Religião se desdobram em estudos de religiões e religiosidades que dialogam
com a crítica psicossocial e resguardam uma abertura para os diferentes
significados das experiências religiosas. As Ciências da Religião tratam dos
fenômenos religiosos situando e comparando processualmente suas diversas 1103
tradições, buscando os significados dos textos espirituais. Elas apontam para o
conhecimento da realidade que subsiste entre e além de todas as religiões e
convicções. Estando os seus métodos alcançados, sobretudo, em uma atitude
transdisciplinar perante o conhecimento (ARAGÃO; SOUZA, 2018).
Atualmente esse campo está se desenvolvendo, no país, em 26 cursos
de graduação, normalmente licenciaturas, segundo o reconhecimento do
Ministério de Educação e Cultura – MEC, bem como em 12 programas de pós-
graduação reconhecidos e recomendados pela CAPES/MEC. As diretrizes
curriculares das graduações estão em processo de discussão, mas o
Documento da Área de Ciências da Religião e Teologia já esclarece que:

O/A pós-graduando/a em Ciência(s) da(s) Religião(ões)


pesquisa o fato religioso, a experiência religiosa, os
fenômenos, as experiências, os conteúdos, as expressões, os
textos, as tradições, as linguagens, as culturas religiosas e as
tradições de sabedoria, considerados em perspectiva externa,
em diálogo com outros saberes acadêmico-científi cos, com
ênfase em investigações de natureza qualitativa e quantitativa,
podendo também ser de natureza teórica ou aplicada, a partir
de abordagens teórico-metodológicas próprias das escolas que
constituem o campo de estudos da(s) religião(ões), suas
subáreas [Epistemologia das ciências da religião; Ciências da
linguagem religiosa; Ciências empíricas da religião: Ciência da
religião aplicada; Teologia fundamental-sistemática; História
das teologias e religiões; Tradições e escrituras sagradas;
Teologia prática] e disciplinas auxiliares. O perfil do egresso de
cursos de pós-graduação em Ciência (s) da (s) Religião (ões)
deve considerar a formação de habilidades para que o/a
concluinte seja capaz de, enquanto pesquisador/a e/ou
docente, analisar o fato religioso, os fenômenos religiosos e/ou
as linguagens religiosas, desenvolvendo aproximações
históricas e comparativas, sistemáticas e hermenêuticas das
práticas e experiências religiosas humanas e das suas

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instituições sociais. O/A pós-graduado/a em Ciência (s) da (s)
Religião (ões) deve estar preparado para atuar como
pesquisador/a, como docente e/ou como analista dos saberes
e conhecimentos sobre/das práticas religiosas de uma ou de
várias tradições, atuar na formação de docentes para a
educação básica e/ou de nível superior de atuar como
profissional especializado, consultor/a, assessor/a e/ou
mediador/a em questões relacionadas à religião no espaço
público (CAPES, 2016).

E se o que caracteriza as Ciências da Religião é essa abertura não


reducionista e transdisciplinar para as diferentes experiências religiosas, tal 1104
abordagem proporcionaria ao ensino religioso um campo de referência para o
estudo da religião, visto que serviria como base para a compreensão do
pluralismo religioso, o respeito às diferentes tradições de fé e a preocupação
político-cultural com o diálogo inter-religioso. Esses valores, direcionando a
prática do ensino religioso, forneceriam elementos importantes na formação
dos educandos no respeito à liberdade religiosa e no combate a intolerância
religiosa.
Sob esse viés, compreendo que o docente em ensino religioso também
necessita de uma sólida formação para construir pontes entre o estudo dos
diferentes saberes religiosos e sua tradução para o contexto de sala de aula.
Pensando nisso, a seguir, apresentarei o esboço de uma proposta pedagógica
para as licenciaturas em Ciências da Religião.

3 NOTAS PARA UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA

Frente ao novo momento de institucionalização da área – em especial


com as portarias CNE/CES nº 3 de 1 de março de 2018 e CNE/CES nº 6, de 26
de abril de 2018 –, surgiu a necessidade, por parte de docentes e
pesquisadores da área (que compõe o GT de diretrizes para a área, no âmbito
da ANPTECRE), de se pensar as diretrizes curriculares nacionais para os
cursos de graduação (licenciatura), com o intuito de oferecer uma orientação
comum aos programas, e seus respectivos docentes, sobre o perfil,
funcionamento e objetivos desses cursos.
Em razão disso, tornou-se fundamental a criação de um projeto

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pedagógico para que se possa aprofundar a reflexão sobre os conteúdos
pertinentes as graduações de Ciências da Religião, a fim de se oferecer uma
proposta sólida de formação teórica, metodológica e prática aos discentes que
compõe os cursos, habilitando-os ao trabalho docente e de pesquisa.
Abaixo, segue um esboço de alguns direcionamentos para o projeto:
a) Articular ensino e pesquisa na formação discente. Objetiva-se, com
isso, que o desenvolvimento da pesquisa competente e atualizada sobre o
fenômeno religioso contribua para a excelência no campo do ensino em seus 1105
diferentes níveis. A integração entre pesquisa e ensino proporciona ao trabalho
do professor um repertório fundamental, uma vez que possibilita a articulação
entre os conteúdos específicos da área a serem ensinados e as teorias e
práticas didáticas e pedagógicas.
b) Estimular a autonomia intelectual e analítica do discente para o
estudo do fenômeno religioso. O intuito é que, na formação do cientista da
religião, possam-se desenvolver as competências necessárias para expor e
debater, tanto no contexto de sala de aula como em outros espaços em que o
formando venha exercer sua atividade profissional, sobre problemas
relacionados ao campo religioso brasileiro, envolvendo seus aspectos
históricos e socioculturais.
c) Promover habilidades e competências para que o cientista da religião
possa elaborar estratégias didático-pedagógicas voltadas para o ensino
religioso.
Proporcionar a construção de uma identidade acadêmica e profissional para o
discente, isto é, fornecer subsídios didáticos e epistemológicos para formação
do perfil do cientista da religião.
d) Proporcionar ao discente o conhecimento da bibliografia clássica e
contemporânea produzida em Ciências da Religião, com abertura para as
contribuições de outras áreas disciplinares que se ocupam do estudo da
religião. Com isso, visa-se a formação de um profissional com uma base
interdisciplinar de conhecimento, sem que isso signifique uma perda a
referência teórica de seu campo.

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e) Promover uma formação curricular e epistemológica interdisciplinar,
direcionando um olhar analítico-metodológico não confessional para as
religiões, entendidas como fenômenos sociais e psicológicos de característica
plural. Nesse contexto, deve-se promover uma formação curricular e
epistemológica distinta da(s) formação(ões) proposta(s) na área de Teologia,
garantindo a pluralidade do repertório e das abordagens do/a cientista das
religiões.
1106
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta comunicação, fiz um breve panorama do ensino religioso no


Brasil, mostrando seu percurso histórico e percalços, assim como também foi
mostrado como as Ciências da Religião podem servir como campo
epistemológico para a disciplina, assegurando o princípio da laicidade. Por fim,
foram expostos os direcionamentos para um projeto pedagógico das
licenciaturas em Ciências da Religião.
Diante do que foi exposto, espero ter demonstrado como as Ciências da
Religião podem contribuir para o estudo das religiões em nível escolar e para a
construção de uma cultura de paz, sendo para isso indispensável assegurar ao
cientista da religião uma sólida formação em sua área.

REFERÊNCIAS

ARAGÃO, G. S.; SOUZA, M. F. C. Trajetórias e modelos do ensino religioso.


Paralellus, v. 7, p. 425-438, 2016.
______. Transdisciplinaridade, o campo das Ciências da Religião e sua
aplicação ao Ensino Religioso. Estudos Teológicos, v. 58, p. 42-56, 2018.
ALVES, L. A. S.; JUNQUEIRA, S. A elaboração das concepções de ensino
religioso no Brasil. In: JUNQUEIRA, S.; WAGNER, R. (Org.). O ensino
religioso no Brasil. Curitiba: Champagnat, 2011. p. 55-84.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
______. Lei n. 9.394, de 20 de Dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 dez. 1996.
______. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Ministério da Educação,
dezembro de 2017.

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CAPES/MEC. Documento da Área Teologia. Brasília, 2016. p. 9. Disponível
em: <http://www.capes.gov. br/component/content/article/74-dav/caa2/4643-
teologia> . Acesso em: 23 jan. 2018.
JUNQUEIRA, S. A presença do ensino religioso no contexto da educação. In:
JUNQUEIRA, S.; WAGNER, R. (Org.). O ensino religioso no Brasil. Curitiba:
Champagnat, 2011. p. 27-54.
LEITE, F. C. O Laicismo e outros exageros sobre a Primeira República no
Brasil. Religião & Sociedade, Rio de Janeiro, vol.31, n.1, p. 32-60. jun. 2011.
PASSOS, João Décio. Ensino religioso: construção de uma proposta. São
Paulo: Paulinas, 2007.
SOUZA, M. F. C. Laicidade e liberdade religiosa no Brasil: situando a discussão
1107
entre religião e política. Interações - Cultura e Comunidade, Belo Horizonte,
v. 12, p. 77-93, 2017.
SOUZA, M. F. C. Problemas metodológicos em ciências da religião: uma
estranha familiaridade. Interações - Cultura e Comunidade. v. 13, p. 73-93,
2018.
SOUZA, M. F. C.; AZEVEDO, N. P. G. Embates sobre o ensino religioso no
Brasil: uma análise discursiva. Intersecções. Revista de Estudos sobre
Práticas Discursivas e Textuais, v. 3, p. 79-92, 2017.

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POLÍTICAS DE CURRÍCULO: TENSÕES, AVANÇOS, RETROCESSOS E
PERSPECTIVAS FUTURAS NO ENSINO RELIGIOSO

Mirinalda Santos 125

RESUMO: Este artigo traz uma abordagem reflexiva diante do cenário atual, cujos
princípios conservadores, estão desenvolvendo e deliberando políticas de currículo no
campo da educação, principalmente para o componente curricular, Ensino Religioso. É
nesse sentido, que esse artigo tem como objetivo refletir e perceber o Ensino Religioso
como componente curricular que possa contribuir para o combate a intolerância 1108
religiosa nas escolas, através das bases científicas na área da(s) Ciência(s) da(s)
Religião(ões). Metodologicamente esse estudo é bibliográfico e documental com
delineamento explicativo de concepções que a refletir acerca dessas questões.
Acreditamos, portanto, que é responsabilidade do Ensino Religioso superar cada vez
mais as lacunas enfrentadas nas escolas em uma perspectiva não confessional e não
prosélita em que suas práticas metodológicas e pedagógicas possam incluir temas
emergentes que precisam ser debatidas de acordo com as mudanças e diversidades
religiosas que encontramos no contexto escolar.

Palavras-chave: Políticas de currículo. Educação. Ensino Religioso. Ciência(s) da(s)


Religião(ões). Diversidade.

INTRODUÇÃO

Os debates acerca do Ensino Religioso no Brasil se intensificam nos


estudos tanto do campo da Educação, como na área da(s) Ciência(s) da(s)
Religião(ões) que assumem perspectivas divergentes, nos quais tornam as
reflexões acerca desse componente curricular como emergentes diante da
conjectura política a qual estamos situados. Isto, diz respeito aos avanços e
retrocessos que o Ensino Religioso está transitando, no que compreende as
políticas de currículo as quais a ele se destinam e que estão referenciando a
construção da sua identidade e da sua permanência nas escolas públicas.
No momento atual, os movimentos das políticas de currículo destinados
ao Ensino Religioso destacam-se a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
na qual estabelecem objetivos e conteúdos a serem seguidos e aplicados na
educação básica. O projeto de lei 867/2015 “Escola Sem Partido” no qual foi
125
Doutoranda e Mestra pelo Programa de Pós-graduação em Ciências das Religiões na
Universidade Federal da Paraíba (PPGCR/UFPB). Graduada em Pedagogia pela mesma
instituição. Email: mirirodrigues2@gmail.com

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apresentado na Câmara dos Deputados pelo parlamentar deputado Izalci do
Partido da social Democracia Brasileira (PSDB) do Distrito Federal, caso seja
aprovado, a educação básica passa ter o caráter moral e cívica e o Ensino
Religioso nesse documento se apresenta como confessional.
No entanto, esse componente curricular nas discussões da esfera
jurídica, nas quais consideramos visões retrógradas, em que se julgou no ano
de 2017 a favor, especificamente, com seis (6) votos a cinco (5) o Ensino
Religioso confessional nas escolas públicas. Diante de tal afirmativa, identifica- 1109
se essa decisão jurídica como uma consolidação do acordo Brasil- Santa Sé
cujo acordo, é relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil que foi
firmado na Cidade do Vaticano no ano 2008 e aprovado pela câmera por meio
do decreto de n. 7. 107/2010.
Em virtude disso, se faz necessário nesse artigo, problematizar e
apresentar de que forma o Ensino Religioso se configura como mecanismo de
disputas nas políticas de currículo globais e locais, cujo viés, são
antidemocráticos se utilizam dos conhecimentos produzidos nesse componente
curricular para manter as relações de poder e de controle da sociedade. Tendo
em vista que o Ensino Religioso se apresenta como uma educação propícia
para devidos fins conservadores que se pretende estabelecer no contexto das
relações sociais que estamos inseridos.
Para fazermos discussão acerca dessa perspectiva, trazemos as
reflexões teóricas críticas do campo do currículo, nesse sentido, fazemos
interlocução com Paulo Freire (2001 e 2004); Michel Apple (2001 e 2003) que
nos fazem pensar as políticas educacionais e seus desdobramentos no campo
do currículo. Além desses referenciais teóricos, utilizamos as concepções para
darmos suporte reflexivo acerca do Ensino Religioso no campo da(s) Ciência(s)
da(s) Religião(ões), assim congregam nossas discussões com os autores
Soares (2015); Oliveira (2005), entre outros autores que contribuem na
discussão de um Ensino Religioso que trabalha o respeito em suas práticas
didáticos, metodológicos e pedagógicos a diversidade cultural religiosa, não
religiosa como também as dimensões das espiritualidades que envolvem esse
campo do saber.

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Assim, esse artigo está dividido em dois momentos. No primeiro
momento, trazemos as discussões acerca das políticas de currículo no
contexto atual, bem como estão sendo pensadas e deliberadas para o Ensino
Religioso. E, por fim, foram abordadas algumas perspectivas que contribuem
para a construção de uma educação que luta pela resistência de ser autônoma,
democrática, cidadã, crítica e transformadora e que o Ensino Religioso é um
componente curricular que corrobora com essa concepção de educação, uma
vez que tem bases formativas na(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões). 1110

2. O ENSINO RELIGIOSO E AS TENDÊNCIAS CONSERVADORAS NAS


POLÍTICAS DE CURRÍCULO

O Ensino Religioso, diante seu construção histórica formativa no campo


educacional sempre foi mantido como um mecanismo de relações de poder
entre, a igreja (católica) e a política. Entretanto, com o avançar do tempo essas
relações foram sendo (re)significadas sinalizando para novas formas de
controle social. Isso porque, no cenário político atual surge uma grande
representatividade de um grupo religioso (evangélicos) que estão atuando e
deliberando políticas públicas curriculares, principalmente, no campo da
educação.
E a grande problemática de ter esses grupos a frente dessas ações são
a forma que se pensam e de como querem que a educação seja conduzida,
principalmente quando nos direcionamos para o Ensino Religioso. Uma vez
que esses grupos querem impor suas convicções religiosas como únicas e
legítimas nos currículos escolares para que nossos educandos possam
apreender esses conteúdos conservadores no viés de uma única religião.
Nesse sentido, esse componente curricular de acordo com o seu histórico de
propostas educacionais confessionais e prosélitas se torna um condutor para
inserção de convicções e doutrinações religiosas.
Não obstante, Michel Apple em seu livro: Educando à direita: mercados,
padrões, Deus e desigualdade (2003), denomina esses grupos de “Populistas
autoritários - fundamentalistas religiosos e evangélicos conservadores que

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querem um retorno a (seu) Deus em todas as nossas instituições” (APPLE,
2003, p. 13). Apple (2003), apesar de partir da realidade estadunidense,
podemos considerar que seus estudos se aplicam aos novos movimentos
políticos que estão se instalando e se fortalecendo no Brasil.
Essa é uma das categorias de análises apresentada por Apple (2003),
que nos faz refletir como esses grupos conseguiram se ascender novamente
no contexto internacional como também nacional nos quais utilizam do senso
comum para estabelecer dispositivos de controle da sociedade, para o autor 1111
esses grupos são vozes poderosas e conservadoras que estão fazendo e
ditando nas nossas escolas (APPLE, 2003). À exemplo disso, temos o Projeto
de Lei 867/2015 Escola Sem Partido. Cuja política de currículo é em defesa
aos próprios interesses ideológicos, políticos religiosos de um único grupo que
tem a pretensão de oprimir e silenciar qualquer senso crítico desenvolvidos na
escola.
E, o Ensino Religioso é pensado para legitimar práticas educativas
proselitistas e confessionais, nesse sentido, o conservadorismo religioso é
posto nas políticas de currículo destinada a esse ensino, que são pensadas e
aplicada em nosso ensino com a intensão de negar, silenciar, desqualificar e
violentar simbolicamente o outro enquanto pessoa diante da sua identidade e
subjetividade religiosa, inclusive as de matrizes afro-brasileira. Isso acontece
e/ou pode acontecer de forma indireta e direta a partir de deliberações dessas
políticas públicas educacionais.
Para nós estudiosos do campo da educação, nos deixa preocupados
com os futuros que serão conduzidos essas políticas curriculares no contexto
educacional. Muito se deve refletir e discutir acerca do modelo educacional que
está se instalando no Brasil, em que temos incorporado modelos de políticas
públicas que ao invés de promover a inclusão nos diversos seguimentos
educacionais está provocando efeito contrário, o de exclusão. Assim, as
politicas públicas educacionais são utilizadas e disseminadas por meio de
documentos oficiais para poder estabelecer os conhecimentos que legitimam,
hegemonizam e hierarquizam determinados conhecimentos a ser ensinados
nas escolas e impondo o que os educandos devem aprender, tantos nos

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currículos oficiais como também dos currículos ocultos, pois “ [...] ensinam um
currículo oculto que parece unicamente voltado á manutenção da hegemonia
ideológica das classes mais poderosas da sociedade”. (APPLE, 2001.p.81).
Uma vez que para esses grupos, a educação com senso crítico é uma
“perigoso” para um seguimento de governo que negocia manobras políticas
que tendem a ter o controle social, nesse sentido à escola e os conhecimentos
que são produzidos nelas são importantes para dar voz em clamor à mudança
da situação de inferioridade que se encontram, e a partir do momento que 1112
determinados seguimentos sociais oprimidos tomam consciência disso, menos
os grupos opressores conseguem controla-los.
Assim, Paulo Freire em seu livro Pedagogia do Oprimido que neste ano
completa 50 anos da existência de sua obra, propõe uma educação libertadora,
por isso que no contexto político atual, o autor volta a ser uma ameaça, uma
vez que Freire (2001) com concepções humanísticas e libertadoras nos deixa o
legado de que: “Não haveria oprimidos, se não houvesse uma relação de
violência que os conforma como violentados numa situação objetiva de
opressão” (FREIRE, 2001, p. 23). Nesse sentido, o sujeito oprimido deve tomar
consciência compreendendo o contexto das relações sociais em que ele está
inserido e refletir, agindo para uma possível mudança.
É com esse olhar que nos direcionamos para a um tema que para o
campo da educação é considerado desafiador que é o preconceito e
intolerância religiosa nas escolas. Nesse sentido, enquanto um espaço
educativo necessita criar trabalhos pedagógicos em conjunto para a promoção
do respeito, do reconhecimento de si e do outro, enquanto diferentes com
individualidades, subjetividades e identidades em termos de suas crenças
religiosas ou não religiosas. Defendemos que o Ensino Religioso é espaço que
promove o debate acerca dessa questão, uma vez que existem práticas que
silenciam, negam e violentam o/a outro/a, a religião deve ser discutida sim,
principalmente no espaço escolar, contribuindo assim, com as perspectivas de
promoção de uma educação de qualidade.
Diante de tais concepções o Ensino Religioso não pode ser pensado
como um componente curricular confessional, pois uma vez que o educador

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desse ensino deve ter características tais como: a mente clara e aberta, olhos
críticos, escutar depois ouvir, serem preocupados com a política, respeitar a
diversidades (culturais, religiosas, entre outros). E a relação dialógica proposta
nesse componente curricular compreende a tomada de consciência de
determinados seguimentos religiosos que são oprimidos em uma sociedade é
excludente, fóbica e que sempre teve como religião legitimada, a cristã.
Utilizando da concepção de diálogo de Freire (2004, p. 42), o diálogo é
entendido como uma prática da liberdade, assim: 1113

Quando tentamos em uma adentramento, no dialogo como


fenômeno, humano se revela algo que já poderíamos dizer ser ele
mesmo: a palavra, mas ao encontrarmos a palavra, na analise do
dialogo, como algo mais que um meio para que ele se faça, se nos
impõe busca, também, seus elementos constitutivos. Esta busca, nos
leva a surpreender nela duas dimensões; ação e reflexão de tal forma
solidárias, uma interação tão radical, que sacrificada, ainda que, em
parte uma delas, se ressente, imediatamente a outra, não há palavra
verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira
seja transformar o mundo.

Com essas perspectivas de educação dialógica e libertária que o Ensino


Religioso enquanto componente curricular não pode ser mais visto como “terra
de ninguém” ao mesmo tempo “terra de todos”, nos são impostos nesse ensino
convicções que são utilizados para hegemonizar práticas discriminatórias e
excludentes nos conhecimentos escolar que são construídos nele. Pois,
pensar na manutenção das políticas e práticas curricular voltados para um
ensino confessional, é ir em contra todo o processo histórico de militância do
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER) em prol do
Ensino Religioso que considere e respeite as diferenças religiosas.
Além disso, não se pode desconsiderar as perspectivas dos cursos de
Ciência(s) da(s) Religião(ões) no Brasil, cujas bases científicas dão suportes na
formação inicial e continuada dos profissionais que lecionam e/ou lecionarão o
Ensino Religioso. Assim, acreditamos que no cenário atual, precisamos nos
fortalecer enquanto uma área de conhecimento que não ser mais admitidos no
contexto escolar perspectivas conservadoras nesse ensino, uma vez que
estamos respaldados na na Constituição Federal de 1988, bem como na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB9394/96, atualizada no ano 1997). Nos

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quais Consideram o Ensino Religioso em uma perspectiva de promoção do
respeito a diversidade cultural religiosa, como questão emergente e deve ser
inserido, refletido e debatido no currículo escolar para a promoção ao combate
de preconceitos e discriminações no que se refere ao campo das religiões.

3. O ENSINO RELIGIOSO E ALGUNS DESDOBRAMENTOS PARA


RESISTÊNCIAS FUTURAS
Diante da nossa preocupação acerca das formas de resistências que 1114
podem ser pensadas a favor de cumprir um Ensino Religioso plural e voltado
para o diálogo inter-religioso, nos debruçamos em uma questão que
acreditamos que seja extrema importância e indispensável para as discussões
do campo curricular que é a formação de educadores, tanto inicial como
também continuada, uma vez que a formação de educadores é algo que
precisa ser constantemente pensado e direcionado para atender os debates
atuais que emergem nas políticas curriculares.
Nessa perspectiva, direcionamos para a formulação recente de Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCNs) dos cursos de Ciência(s) da(s) Religião(ões) no
Brasil, cujo documento está voltado para a formação de licenciados aptos para
lecionar o Ensino Religioso. Bem como a nova resolução 2/2015 das Diretrizes
Curriculares Nacionais – DCNs, que no seu capítulo V nos faz (re)pensar e se
preocupar e dar novos sentidos e ressignificações na formação docente inicial
e continuada a nível superior, assim, de acordo com Dourado (2015, p. 37):

[...] as novas DCNs definem que o(a) egresso(a) da formação inicial e


continuada deverá possuir um repertório de informações e
habilidades composto pela pluralidade de conhecimentos teóricos
e práticos, resultado do projeto pedagógico e do percurso
formativo vivenciado cuja consolidação virá do seu exercício
profissional, fundamentado em princípios de interdisciplinaridade,
contextualização, democratização, pertinência e relevância social,
ética e sensibilidade afetiva e estética, de modo a lhe permitir: o
conhecimento da instituição educativa; a pesquisa; atuação
profissional no ensino, na gestão de processos educativos e na
organização e gestão de instituições de educação básica. Nessa
direção, o projeto de formação deve abranger diferentes
características e dimensões da iniciação à docência.

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Diante de tal afirmativa, os currículos do Ensino superior precisam dar
outros significados para contemplar a essas novas exigências para a
construção de uma educação preocupada com os conteúdos teóricos e
práticos contribuindo para uma práxis educativa significativa. Nesse sentido,
partimos do pressuposto de que não podemos reformular o currículo sem que
possamos refletir dos conteúdos que precisam ser incorporados para o viés de
uma relação entre conteúdos-sujeito, assim é necessário ter um pensamento
crítico ao adotar determinados conhecimentos, e estar em constantes 1115
indagações que congregam com as discussões teóricas acerca do currículo,
promovendo o exercício crítico teórico curricular para potencializar a
construção de um currículo que percebe e considere o educando a partir das
suas especificidades, como Tomaz Tadeu da Silva em seu famoso livro
“Documentos de identidade” o currículo se evidencia pelo caráter de se
preocupar com os conhecimentos a serem ensinados, aprendidos e
apreendidos pelos educandos, nos levando a pensar: “O que eles ou elas
devem saber? Qual conhecimento ou saber é considerado importante ou válido
ou essencial para merecer ser considerado parte do currículo?”(SILVA 2012,
p.15).
Diante disso, a partir dessas questões a serem consideradas no campo
do currículo, nos remetemos para os currículos dos cursos de Ciência(s) da(s)
Religião(ões), fazendo com que nos levem a refletir sobre como está
acontecendo e/ou como deveria acontecer às discussões e práticas elaboradas
no Projeto Pedagógico Curricular da área para o Ensino Religioso atendendo
as perspectivas das novas políticas públicas de educação básica, que visa uma
visão social da educação de sujeitos que possibilita a apropriação dos
conhecimentos nos espaços escolares e para que pudesse colocar no centro
as múltiplas dimensões reflexivas da prática do docente. É nesse sentido que
essa nova reformulação das DCNs contribuem no (re)pensar criticamente na
formação de formadores.
Diante desse pressuposto, subtende-se que os cursos a nível superior
inclusive a área da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões), ao elaborarem
coletivamente o Projeto Pedagógico Curricular, discutem, analisam e

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sistematizam as matrizes curriculares para a elaboração de propostas
pedagógicas para atender as necessidades específicas do processo de ensino-
aprendizagem. Ao direcionarmos nosso olhar para o Ensino Religioso,
sabemos que requer uma reflexão mais aguçada, no que diz respeito às
práticas didáticas – pedagógicas curriculares de um ensino que as doutrinas
religiosas proselitistas não possam influenciar na sua elaboração, bem como
deve atendendo a demanda das políticas curriculares do Ensino Religioso.
Para Candau (1996, p. 17) “[...] a Didática tem por objetivo o ‘como 1116
fazer’, a prática pedagógica, mas este só tem sentido quando articulado ao
‘para que fazer’ e ao ‘por que fazer’”. Assim, podemos afirmar que esse
componente curricular requer uma formação sólida e contínua, que haja
reflexões constantes sobre a prática cotidiana, buscando assim, sempre driblar
as implicações e os desafios encontrados acerca dessa modalidade. Conforme
Oliveira (2005, p. 16):

[...] de acordo com a legislação nacional (LDBEN n. 9.394/96, art.72)


para as demais áreas do conhecimento, a formação de docentes para
a disciplina de Ensino Religioso, indubitavelmente deveria passar
pela formação em nível superior, em cursos de licenciatura de
graduação plena.

Percebe-se aqui a preocupação com a formação docente para o


educador de Ensino Religioso. O fato é, que a militância e prol desse ensino
em se ter uma formação inicial para esses educadores é nos cursos de
Ciência(s) da(s) Religião(ões), na modalidade licenciatura, devido a visão
ontológica que esse curso oferece a respeito das questões religiosas, dessa
forma, acredita-se que a(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) contribui para
embasar teoricamente os educadores para ir em contra as práticas
confessionais e prosélitas, tendo como objetivo, discutir a diversidade religiosa,
bem como sua complexidade, propondo o entendimento social no âmbito
educacional diante das religiões, das religiosidades, na compreensão do
sagrado, das espiritualidades, nos quais essas questões estão presente, no
espaço, no tempo, na cultura, na história, entre outros momentos em que se
manifestam e se validam em diversos seguimentos, podendo ter em nossos

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gestos, nos símbolos, nas expressões sociais, nos ritos, nos mitos, entre
outros. De acordo com Silva (2011, p. 14):

Numa sala de aula há uma grande diversidade, não só religiosa, mas


também étnica cultural, social e de gênero. Essa diversidade se
estende ao campo das opiniões e formas de pensamento. Diferentes
elementos influenciam no convívio entre pessoas. Há convergências
e divergências. É o semelhante e o diferente interferindo nas
relações. Ter espaço garantido para a particularidade dentro da
diversidade, desenvolver um processo de “escuta” e “olhar” para o
outro, para o diferente e acolhê-lo, não é uma tarefa simples e fácil 1117
para o professor de Ensino Religioso. Ter bem claro os seus
contornos identitários é fator fundamental para o diálogo inter –
religioso.

Assim, o Ensino Religioso pretende mostrar que não há apenas uma


religião a ser a única e verdadeira e que devemos considerar as demais
religiões existentes no contexto social que vivemos, contrapondo a quaisquer
apologias de cunho religioso. No entanto, é preciso ampliar os conhecimentos
para as novas perspectivas que inserem no campo das discussões do Ensino
Religioso, como fomentar a compreensão a cerca dos não religiosos, do
ateísmo, das espiritualidades, dos novos movimentos religiosos, etc.
Culminando assim, a interdisciplinaridade e transdiciplinaridade diante
das temáticas que constituem a diversidade cultural, promovendo uma
educação que sinalize a essa diversidade em suas práticas pedagógicas. Por
isso, é necessário que o educador de Ensino Religioso possa ter uma formação
inicial que contemple essas necessidades e tenha a visão de levar o educando
a refletir acerca do seu modo de agir e pensar frente às questões que
envolvem a o campo da religião e suas vertentes.
É nessa perspectiva, que nos detemos aqui uma conversa para os
educadores, os pesquisadores e afins que se inquietam e lutam para um
Ensino Religioso efetivo nas escolas. Buscamos aqui evidenciar pontos que
consideramos importantes para contribuir na área da(s) Ciência(s) da(s)
Religião(ões) que tem em seus fundamentos uma visão integrada e totalitária
com outros campos do saber (GRESCHAT, 2014), sendo assim, a visão
orgânica da área corresponde a interdisciplinaridade dialogando com a
Filosofia, a Antropologia, a História, etc. No entanto, de uma forma mais

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genérica, e também de forma mais enfraquecida, a(s) Ciência(as) da(s)
Religião(ões) também dialoga com a Educação.
É nesse quesito que encontramos a primeira problemática desse curso
que diz respeito à ausência de discussão consistente para uma abordagem da
área comprometida com a educação, mais precisamente articular seus
conhecimentos com os saberes específicos da Pedagogia, embasando-se
teoricamente e metodologicamente. Recentemente, tivemos uma válida
publicação do autor Afonso Maria Ligorio Soares (2015), que é uma das 1118
referências intelectuais reconhecido na área que volta seu olhar para a
importância da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) no Ensino Religioso, nessa
publicação intitulada “A contribuição da Ciência da Religião para a formação
de docentes ao Ensino Religioso”, ele sinalizava para que á área voltasse seu
olhar para o Ensino Religioso de forma peculiar, uma vez que esse ensino
necessita de um embasamento científico/acadêmico para descaracterizá-lo do
jogo de interesse políticos e religiosos.

Nesse sentido, a Ciência da Religião só tem a ganhar se souber


aprender da Filosofia da Religião a rica discussão que vem sendo
feita nas últimas décadas, do ponto de vista do conteúdo, sobre a
categoria experiência/espiritualidade. Por outro lado, o estreitamento
dos laços entre Ciência da Religião e Pedagogia poderá, do ponto de
vista formal, aprofundar a vinculação do Ensino Religioso com a
noção de “transposição didática”, aqui entendida como passagem do
“saber a ensinar” para os “objetos de ensino”. (SOARES, 2015, p.50)

De acordo com o autor, refletir a partir de diferentes abordagens sobre o


ponto de vista do Ensino Religioso da necessidade de uma área vinculada aos
saberes importantes para as práticas educacionais, assim como ele aponta
para a Filosofia e para a Pedagogia. No entanto, defendemos aqui, que a
Pedagogia para a(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) vai além dessa visão de
“transposição didática” como o autor menciona, dessa forma, podemos dizer
ser uma visão limitada, pois a Pedagogia pode contribuir de forma muito mais
significativa na área se for considerada os fundamentos e tendências
pedagógicas educacionais que nela se constitui.

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CONCLUSÃO

Diante do exposto, a pretensão dos nossos estudos apresentados neste


artigo não é de se limitar e nem finalizar as reflexões e discussões do Ensino
Religioso e o currículo escolar. Bem como as implicações e controvérsias
desse componente curricular no campo das políticas públicas de currículo.
Nesse sentido, acreditamos, portanto, que é importante esse ensino estar em
constantes discussões no cenário político nacional e regional, pois muito se 1119
tem a avançar tanto nas legislações e principalmente nas práticas teóricas,
metodológicas e pedagógicas que o envolve.
Diante disso, compreendemos que é de suma importância fazer
interlocuções ente o campo da educação e da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões)
para poder fortalecer as discussões acerca desse ensino, bem como construir
formas de práticas didáticas, metodológicas e pedagógicas que contribuem
para o desenvolvimento de uma educação plena, cidadã, crítica que luta a
favor do combate do preconceito, discriminação que gera a violência por
intolerância religiosa. Assim, por fim, identificamos que o caminho a ser
percorrido para resistir a essas formas de conservadorismo religioso é através
do diálogo interdisciplinar dos referidos campos do saber.

REFERÊNCIAS

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Cortez/Instituto Paulo Freire, 2003.
CANDAU, Vera Maria (Orgs). Rumo a Uma Nova Didática. 8ª edição. Vozes.
Petrópolis, 1996.
DOURADO, Luiz Fernando. Diretrizes curriculares nacionais para a formação
inicial e continuada dos profissionais do magistério da educação básica:
concepções e desafios. Educ. Soc., Campinas. V, 36, n.º 131, p. 299-324,
Jun., 2015.
FREIRE, Paulo.Pedagogia do Oprimido. 39.ed. Rio de Janeiro. Paz e Terra,
2001.
______. Educação como Prática da Liberdade, Rio de Janeiro, Ed. Paz e
Terra
GRESCHAT, Hans-Jürgen. O que é ciência da religião? São Paulo: Paulinas,
2014.

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OLIVEIRA, Lilian Blanck de. A formação de Docentes para o Ensino Religioso
no Brasil.: leituras e tessituras. Curitiba, Revista diálogo Educacional, v. 5,
n.16, p. 247-267, 2005.
SILVA, Marinilson Barbosa da. Em busca do significado do ser professor de
Ensino Religioso. João Pessoa: Ed. Universitária UFPB, 2011.
SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do
currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2012.
SOARES, Afonso Maria Ligorio. A contribuição da Ciência da Religião para a
formação de docentes ao Ensino Religioso. Revista REVER∙ Ano 15. Nº 02.
Jul/Dez., p. 45-54., 2015.
1120

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POR UMA APRENDIZAGEM TRANS-RELIGIOSA

Gilbraz Aragão126

O Ensino Religioso é compreendido como educação sobre a


religiosidade humana, devendo tratar pedagogicamente do conhecimento
1121
espiritual que existe entre e para além de todas as tradições místicas,
religiosas e não religiosas, tematizando os seus conteúdos simbólicos nos
espaços e tempos sagrados, bem como os valores - e antivalores - que as
espiritualidades, na prática, desenvolvem através da história. Trata-se, então,
de comparar criticamente e interpretar os fatos - também religiosos - nos seus
contextos históricos, em busca de significados mais profundos para esse
patrimônio cultural da humanidade que são as espiritualidades filosóficas e
religiosas.
Como área de conhecimento produtora desses conteúdos que são
traduzidos e aplicados pelo Ensino Religioso, afirmam-se cada vez mais as
Ciências da Religião. Elas se desdobram em estudos de religiões e
religiosidades que dialogam com a crítica psicossocial e resguardam uma
abertura para o significado mais refinado das experiências humanas de
transcendência. As Ciências da Religião, em nosso entendimento, tratam dos
fenômenos religiosos situando e comparando processualmente as suas
diversas tradições, buscando os significados mais profundos dos textos
espirituais. Elas desenvolvem um conhecimento relacional e envolvente,
apontando sempre para o mistério da realidade que subsiste entre e além de
todas as religiões e convicções. Esses métodos são alcançados, sobretudo,
quando fincados em uma atitude transdisciplinar perante o conhecimento.
A transdisciplinaridade pode ser concebida como uma modelização de
sistemas complexos de conhecimento, apoiada em uma metodologia que
comporta a compreensão de níveis de realidade e percepção e os integra pela

126
Professor e pesquisador no campo dos estudos de religião na UNICAP, coordenador do
Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife: www.unicap.br/observatorio2

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lógica do Terceiro Incluído. Enquanto modalidade para organizar o campo dos
estudos de religião, ela se desdobra em uma atitude transcultural e uma
mística trans-religiosa. Em um mesmo nível de realidade, religiões diferentes
seriam possivelmente antagônicas e excludentes, mas se considerarmos outro
nível ao menos, surge um “Terceiro” que, incluído, as pode reconciliar. Trata-se
da base antropológica que constitui a todos e exige uma hospitalidade e
comunhão ética, ou da altitude mística para cujo silêncio e sonho comum
colaboram os sons diferentes de todas as tradições espirituais. 1122
Os desafios à humanidade globalizada, segundo os pensadores da
complexidade127 e da sua metodologia transdisciplinar128, pedem que
levantemos a imaginação acima dos limites abafados da postura disciplinar e
busquemos uma visão integral e arejada do conhecimento. O que aponta,
analogicamente, para a busca de uma espiritualidade trans-religiosa129, que
fomente, sobretudo em espaços comunitários de educação, o diálogo entre
tradições de sabedoria e filosofia, em nossa cultura pluralista e para o âmbito
democrático e republicano em que vivemos.
A transdisciplinaridade operacionaliza uma nova forma, complexa, de ver
e entender a natureza, a vida e a humanidade (ARAGÃO, 2006). Ela engendra
uma lógica ternária para administração de controvérsias e estimula a
construção do saber através de campos inter ou transdisciplinares. Isso porque
busca a unidade do conhecimento, entre e além das disciplinas científicas,
incluindo a nossa subjetividade e as sabedorias tradicionais, para ajudar a

127
O pensamento complexo, ou epistemologia da complexidade, é um ramo da filosofia da
ciência que vê o mundo como um todo indissociável e propõe uma abordagem multidisciplinar
e multirreferenciada para a construção do conhecimento, contrapondo-se à causalidade linear
por abordar os fenômenos como totalidade orgânica (Cf. MORIN, 1990).
128
Desde a metade do século XX surgiram conceitos estabelecendo pontes entre as disciplinas
científicas. A pluridisciplinaridade diz respeito ao estudo de um objeto de uma mesma e única
disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo. A interdisciplinaridade diz respeito à
transferência de métodos de uma disciplina para outra. A transdisciplinaridade diz respeito
àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das disciplinas e além de
qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual um dos
imperativos é a unidade do conhecimento (Cf. SOMMERMAN, 2006).
129
Espiritualidade trans-religiosa não se refere a uma religião genérica e superficial, que
pudesse pairar no ar dos valores, sem inserção comunitária e sem assumir nenhuma
vestimenta cultural. Trata-se de ter um rosto próprio e corpo cultural concreto, mas
desenvolvendo místicas que vão além da própria referência teológica de crenças e ritos, rumo
a uma dimensão maior e aberta, de experiência espiritual comum entre e além das religiões,
incluindo as vivências pós-religiosas (Cf. BARROS, 2015).

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encontrar sentido na existência. A transdisciplinaridade reivindica a
centralidade da vida em toda discussão, propondo uma mudança na
compreensão do conhecimento: como relação entre sujeitos e objetos, atenta
ao contraditório em tudo, mas aberta à sua superação em outros níveis de
realidade - pela inclusão de um Terceiro termo lógico.
A metodologia transdisciplinar (NICOLESCU, 2000) considera a
realidade, bem como os sujeitos do seu conhecimento, como uma teia intricada
e composta por níveis, interligados por um Terceiro que se deve incluir: os 1123
termos da lógica formal - A, não-A e T - e seus dinamismos são, portanto,
associados por um triângulo onde um dos ângulos situa-se em um nível de
realidade e os dois outros em outro nível de realidade. O terceiro dinamismo, o
do estado T, exerce-se então em outro nível, onde aquilo que parece desunido
(onda ou corpúsculo) está de fato unido (como a física observou no quantum,
por exemplo). Esta é a lógica do Terceiro Incluído, calcada nas descobertas da
nova física e com abrangência sempre mais ampla.
A física quântica, enquanto novo paradigma de ciência, mostrou a
coexistência entre pares de contraditórios mutuamente exclusivos
(NICOLESCU, 2002). Com base nessa constatação, busca-se compreender
mais amplamente a realidade, superando o princípio de identidade e
contradição pelo de complexidade; demonstrando que, em outros níveis da
realidade, verdades contrapostas podem se explicar ou conviver. Essa
percepção corrobora e desenvolve a epistemologia das controvérsias130,
ensaiada por algumas filosofias da alteridade e do conhecimento.
A vida se manifesta na complexidade das relações, que, contudo, são
estudadas separadamente pelas ciências clássicas hegemônicas: exatas,
biológicas e humanas. Mas a interdependência é um princípio que sustenta a
vida mundo afora: o sagrado, o amor, a espiritualidade, o estético e outros
“objetos” desprezados pela ciência tradicional agora precisam ser incorporados
em nossas reflexões científicas, sob pena de estarmos mutilando a ciência

130
Um exemplo de como o diálogo entre a história da filosofia e a ciência cognitiva podem levar
a bons resultados na reflexão sobre o conhecimento é Marcelo Dascal: estudando as disputas
teóricas na entrada dos tempos modernos, ele esboçou uma cultura epistemológica das
controvérsias, que interessa muito às Ciências da Religião (Cf. PONDÉ, 2001).

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(BATESON, 2000). Negar a interdependência entre ciência e cultura significa
negar o sujeito, apagando o sentido da vida.
A transdisciplinaridade, justamente, enfatiza o conhecimento como
relação entre sujeito e objeto, buscando ultrapassar as contradições de forma
analética (a partir do que é anterior e está além) e ternária (pela inclusão de um
Terceiro lógico, entre e além), observando sempre a partir da intersecção,
entre, através e além, das disciplinas científicas. Precisamos associar as
sabedorias das antigas tradições simbólicas de interioridade aos princípios 1124
culturais e científicos modernos e pós-modernos, que exploram o mundo
objetiva e intersubjetivamente. Assim, também no diálogo das tradições de
sabedoria espiritual com as ciências, deve-se incluir um mistério que está na
realidade e escapa às nossas observações, está entre e além das suas
apreensões, e exige de todas uma reverência mística - para a qual até grandes
cientistas já despertaram.
A transdisciplinaridade não descarta as disciplinas científicas, mas está
entre, através e além delas. A transdisciplinaridade transgride as fronteiras de
cada ciência disciplinar e constrói um novo conhecimento “através” das
ciências, um conhecimento integrado em função da humanidade, resgatando
as relações de interdependência. Isso tem consequências para a pesquisa das
religiões e religiosidades (ARAGÃO, 2009). O novo modelo de conhecimento,
complexo e transdisciplinar, gerou a lógica do Terceiro Incluído que, debruçada
sobre o fenômeno das religiões e as contradições que surgem do seu
pluralismo, remete à busca de um outro nível de realidade, àquela ética do
amor, que pode religar crentes doutrinalmente antagônicos em uma fé que se
faz silêncio místico ou atitude de cuidado pelos outros e pelo nosso meio e
permite o acesso ao sagrado, aos portais para o mistério da vida e da
realidade, acesso à zona de resistência misteriosa que religa sujeito e objeto.
Por aí passa a experiência do divino, por entre e para além das religiões.
Os fundamentos metodológicos transdisciplinares e dialogais podem
ajudar no avanço dos métodos das Ciências da Religião, que surgiram como
campo de conhecimento aberto à complementariedade das disciplinas
científicas e alicerçado em uma epistemologia das controvérsias. Trata-se de

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uma área acadêmica (CRUZ, 2004) que busca esclarecer a experiência
humana do sagrado. Sobre a base da história das religiões desenvolveu-se um
estudo comparativo, que aborda as religiões e seus fenômenos com
questionamentos sistemáticos e categorias morfológicas, interpretando e
aprofundando o sentido dos testos nos seus contextos. Tais estudos de religião
(PASSOS; USARSKI, 2013), esforçam-se para apreender o mundo dos fatos
religiosos de tal modo que transpareçam linhas fundamentais dessa
experiência - contraditória, posto que humana -, sobretudo fazendo uso da 1125
fenomenologia e da hermenêutica.
O uso dessas metodologias privilegiadas, contudo, pode e deve se
ampliar, tendo em vista um desenvolvimento mais integral das Ciências da
Religião, em correspondência com uma compreensão mais íntegra da
espiritualidade humana, que se desenvolve também na dimensão objetiva da
realidade (do “ele”, onde pode ser estudada pela autopoiese cognitiva e pelo
empirismo) e na dimensão intersubjetiva/social (do “eles”, onde pode ser
estudada pela autopoiese social e pela teoria dos sistemas): Fenomenologia e
hermenêutica são metodologias para produção de conhecimento desde
“dentro” do “eu” e do “nós”, que precisariam se conjugar com as perspectivas
desde “fora”, dos estruturalismos e das etnometodologias - afora a necessidade
de se relacionarem também, mais integralmente, com as metodologias de
conhecimento do mundo físico, natural e social (ARAGÃO, 2011).
No Brasil, esse campo das Ciências da Religião está se desenvolvendo
em 26 cursos de graduação, normalmente licenciaturas, segundo o
reconhecimento do e-MEC131, bem como em 12 programas de pós-graduação,
reconhecidos e recomendados pela CAPES/MEC 132. O campo de
conhecimento133 das Ciências da Religião recebe colaborações teóricas e
estudantes das áreas de ciências sociais e ciências da comunicação, das
disciplinas de sociologia, antropologia e psicologia, bem como de filosofia,

131
http://emec.mec.gov.br/
132
http://www.capes.gov.br/
133
O debate epistemológico sobre os estudos de religião no Brasil é marcado por uma tendência mais de
campo interdisciplinar, que aqui desenvolvemos, ou mais de estrutura disciplinar (PASSOS, USARSKI,
2013). Acreditamos que as tensões entre uma influência mais histórico-fenomenológica nas “Ciências da
Religião” e outra mais antropológico-hermenêutica na “Ciência das Religiões”, devam ser administradas
criativamente.

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linguística e teologia - exigindo, contudo, que os seus respectivos aportes
metodológicos sejam redimensionados epistemologicamente com base na
comparação empírica dos fatos e na busca hermenêutica de significados,
através de uma lógica dialogal - pois as Ciências da Religião se articulam em
torno da cultura epistemológica das controvérsias (PONDÉ, 2001).
De modo que pesquisadores daquelas diversas áreas são bem-vindos
ao campo inter e transdisciplinar das Ciências da Religião e podem produzir
trabalhos com enfoques desde as suas disciplinas, bastando que se abram 1126
para a transmigração de métodos e a complementariedade metodológica, ou,
ao menos, coloquem-se questões atingíveis fenomenologicamente (DREHER,
2003; BRANDT, 2006; GIORGI, 2008) e trabalháveis hermeneuticamente
(PADEN, 2001; TERRIN, 2003; GEFFRÉ, 2011), em torno da ideia de sagrado.
Enquanto a história das religiões constitui a base das Ciências da
Religião, a pesquisa sistemática das religiões deve mostrar semelhanças e
diferenças de fenômenos análogos sobre o sagrado em diversas religiões e
apresentar a hermenêutica dos “textos” que se tornaram sagrados, em seus
contextos históricos e culturais. As relações entre religião e suas condições
contextuais são então aclaradas por distintas disciplinas. Assim, por exemplo, a
sociologia da religião ocupa-se das relações recíprocas entre religião e
sociedade, incluindo também a dimensão política. A psicologia da religião
dedica-se a processos religiosos que devem ser compreendidos a partir da
peculiaridade do elemento psíquico. A geografia das religiões investiga as
relações entre religião e espaço, sendo que este se entende não apenas em
sentido físico, mas também cultural, e une-se à história comparada das
religiões, conformando o núcleo aberto, complementar e interseccional, das
Ciências da Religião, em que se processa e reflete sobre as controvérsias da
construção e/ou manifestação do(s) sagrado(s).
As ciências da linguagem, junto com a antropologia, aportam
colaborações destacadas para a descrição e interpretação dos fatos religiosos,
como construtos humanos e códigos simbólicos. Assim também, a filosofia
participa do campo de conhecimento das Ciências da Religião, desde que não
reduza teoricamente o religioso a mero epifenômeno e busque sistematizar os

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fatos religiosos com maiores preocupações de objetividade. E a teologia, então,
como auto interpretação de uma tradição religiosa (ARAGÃO, 2015), pode
participar na medida em que se compreende como ciência que desenvolve as
razões de mitos, ritos e interditos dos caminhos de fé - o que implica tanto a
caracterização dos objetos teológicos como símbolos, quanto a redescoberta
de conteúdos racionais em narrativas míticas. A teologia entra como reflexão a
partir de uma experiência humana de revelação religiosa - e não como “Ciência
da Revelação”, que pudesse partir ou atingir o divino em-si, para além da sua 1127
experimentação como mistério da realidade, em-relação.
E se o que caracteriza as Ciências da Religião é esse voltar à natureza
e aos fenômenos, porque muitos discursos filosóficos e teológicos e até mesmo
ditos científicos, pela psicossociologia, tornaram-se por demais teóricos e auto
referenciados, compreendemos que a temática do pluralismo religioso e a pre-
ocupação político-cultural com o diálogo inter-religioso, potencialmente
trabalhadas pelo Ensino Religioso, constituem hoje um dinamismo que exige e
permite que circunscrevamos o campo das pesquisas sobre religiões pelos
balizadores da comparação fenomenológica e da interpretação hermenêutica -
haja vista que as religiões estão se reconfigurando em nossa era de mudanças
e precisam ser redescritas, e necessitam também de mútuas traduções em
nosso tempo de comunicações e diálogos, mas também de fundamentalismos
ideologizantes e terroristas.
E aqui entramos em uma aplicação das Ciências da Religião que ganha
cada mais relevo entre nós, o Ensino Religioso, que passou a ser entendido
como um componente curricular responsável por assegurar o conhecimento e
respeito da diversidade religiosa, e foi encontrando nas Ciências da Religião a
área de conhecimento responsável pelos seus conteúdos. O Ensino Religioso
assumiu a responsabilidade de oportunizar o acesso aos saberes e
conhecimentos produzidos pelas diferentes culturas e cosmovisões religiosas e
pós ou não-religiosas, enquanto patrimônios culturais da humanidade. Busca,
então, desconstruir significados e experiências colonialistas, reconstruindo
atitudes de valoração e respeito às diversidades. O Ensino Religioso que se
afigura instiga a problematização das relações de saberes e poderes de caráter

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religioso, não tem mais a ver com a expansão de Igrejas nem com a educação
religiosa, mas com a formação cidadã.
O Ensino Religioso, conforme a proposta da Base Nacional Comum
Curricular do Ministério da Educação, traduz pedagogicamente em processos
de aprendizagem os conhecimentos transversais das Ciências da Religião,
articulados em unidades temáticas que tratam de identidades e alteridades, do
humano e sua transcendência; manifestações religiosas, conhecimentos
simbólicos e espirituais; e das crenças religiosas e filosofias de vida, práticas 1128
éticas religiosas e não religiosas (BRASIL, 2017, p. 432).
Segundo tal concepção, a religião deve ser tratada na escola como
objeto de estudo que contribui com a formação geral do cidadão, em um
exercício de ciência a ser feito com os estudantes sobre as religiosidades e
espiritualidades em suas expressões simbólicas e valorativas. Trata-se de uma
educação “sobre” a religião e “da” espiritualidade, que difere da educação
“para” a prática religiosa - o que compete às confissões religiosas e vivências
familiares.
Longe de se embasar no ensino de uma religião ou das religiões na
escola, o Ensino Religioso em nosso Estado laico se justifica pela necessidade
de formação de cidadãos críticos e responsáveis, capazes de discernir a
dinâmica dos fatos religiosos que permeiam a vida em âmbito pessoal, nacional
e mundial. As diferentes crenças e expressões religiosas, bem como a
ausência delas por convicções filosóficas, são aspectos da realidade que
devem ser socializados e abordados como questões socioculturais, que
contribuem na fundamentação das nossas ações.
O Ensino Religioso deve tratar pedagogicamente das atitudes de
descentramento, abertura e cuidado para além de si, que existem entre e para
além de todas as tradições religiosas e filosóficas, deve resgatar os valores
humanos que as espiritualidades podem trazer para a educação.
Para esclarecer essa proposta e recuperando sincronicamente os
modelos de Ensino Religioso que foram se desenhando no cenário histórico
brasileiro, devemos falar de uma trajetória catequética-confessional, de uma
teológica ou interconfessional e, finalmente, de um modelo fundamentado nas

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Ciências da Religião, que parte da história e geografia comparadas dos fatos
religiosos, buscando interpretá-los hermeneuticamente em um campo
transdisciplinar que aprofunda os significados do que as culturas experimentam
como sagrado (PASSOS, 2007).
Passamos, então, de uma cosmovisão unirreligiosa e plurirreligiosa para
a trans-religiosa que se deve cultivar na escola hoje, desafiada a ajudar a
comunidade a pensar sempre mais globalmente e a agir cada vez mais
localmente, em vista de favorecer vivências mais terapeutizadas e 1129
emancipatórias de espiritualidade. Não se trata mais de transmissão de
doutrinas ou mesmo de reflexões de uma antropologia teológica
interconfessional, tecida por acordos eclesiais, mas do desenvolvimento de
processos republicanos de aprendizagem crítica sobre espiritualidades
religiosas e não religiosas da humanidade.
Nessa tradução pedagógica dos conteúdos produzidos pelas Ciências
da Religião, as religiosidades particulares e as histórias das religiões são
transcendidas pela procura por uma visão sistemática, uma morfologia das
experiências do sagrado capaz de abarcar as diversidades e, ao mesmo
tempo, captar a singularidade de cada fato religioso. Desdobra-se, a partir
disso, uma visão trans-religiosa de mística humana (BARROS, 2015), em
sintonia com uma metodologia transdisciplinar de fazer ciência.
A interdisciplinaridade é a observação da realidade realizada pela
transferência de conhecimento de uma disciplina para outra e, em um nível
mais avançado, a transdisciplinaridade é a observação da realidade realizada
na interseção dos conhecimentos disciplinares, enfatizando a centralidade da
vida e a compreensão de conhecimento como relação, buscando a unidade do
conhecimento entre e além das disciplinas científicas. Produzir conhecimentos
nas Ciências da Religião e traduzi-los para o Ensino Religioso,
transdisciplinarmente, significa romper com o conteudismo abstrato e
fragmentado e gerar processos de aprendizagem colaborativos e
compromissados, através de projetos de pesquisa das vivências espirituais - e
de engajamento no seu esclarecimento e terapeutização.
Além de favorecer o diálogo inter-religioso, o jeito transdisciplinar de

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pesquisar a realidade lança uma nova luz sobre o sentido do sagrado. Uma
zona de absoluta resistência ao conhecimento liga o sujeito e o objeto, os
níveis de realidade e os níveis de percepção. Mística deriva desse mistério, do
respeito a esse ilimitado em todo conhecimento. Espiritualidade é religação
com essa dimensão sagrada, profundo e sutil, de toda a realidade: em nosso
interior, na natureza e na história, na face do outro. As tradições religiosas e
filosóficas formalizam caminhos para a experiência espiritual, conforme as
possibilidades e limites de cada cultura. E o Ensino Religioso é, deve ser 1130
agora, uma aprendizagem analítica desses conhecimentos espirituais da
humanidade.
Como resultado do exercício da lógica ternária e/ou trinitária, o Ensino
Religioso, no contexto de complexidade da nossa “aldeia global”, deve se abrir
para as dimensões de pedagogia espiritual que existem entre e além de todas
as tradições religiosas, deve resgatar os valores humanos e a abertura mística
que as espiritualidades, religiosas e não religiosas, podem trazer para a
educação dos estudantes. Trata-se ainda, já na produção de conhecimentos no
âmbito das Ciências da Religião, de desenvolver uma atitude desconstrutiva e
informativa que compara criticamente e interpreta os fatos nos seus contextos
históricos, mas também de cultivar abertura reverente para o mistério da
realidade, em uma postura formativa e construtiva, ajudando para que as novas
gerações possam optar com mais liberdade sobre o significado da
transcendência na vida.
Religião não se ensina propriamente na escola, mas se pode e deve
refletir aí sobre esse fenômeno humano, em busca de significados mais
profundos para o que é experimentado como sagrado em cada cultura. Todas
as pessoas têm direito ao esclarecimento das crenças da humanidade. O
Ensino Religioso deve, então, avaliar e interpretar as notícias religiosas em
seus contextos, estudar as religiões como questão e não como dado.
O professor, nessa perspectiva ou modelo, precisa compreender a
situação social e religiosa dos/as educandos/as a fim de construir com eles
conteúdos programáticos contextuais para o Ensino Religioso. O docente
precisa interagir criticamente com o contexto concreto das religiões na vida

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dos/das educandos/as em seus aspectos desumanizadores e opressivos,
promovendo uma tomada de consciência desmistificadora das religiões. Mas o
Ensino Religioso deve promover também uma ação educativa esperançosa,
em que o anúncio e a utopia desempenham um papel reconstrutivo e
transformador das religiões.
Esse é o modelo pedagógico que corresponde ao espírito de nosso
tempo e ele pode ser alimentado pelas pesquisas das Ciências da Religião,
mormente quando este campo de conhecimento se organiza em bases 1131
transdisciplinares e cultiva a dialógica mais do que a dialética, a sapiência mais
do que o racionalismo.
Este artigo procurou evidenciar que uma postura transdisciplinar e uma
lógica ternária, baseada no Terceiro Incluído e na Trindade Radical, ajuda a
criar conteúdo dialógico no campo das Ciências da Religião e a traduzir
pedagogicamente, em processos de aprendizagem libertários, tais
conhecimentos espirituais para o Ensino Religioso.

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