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Contratos de direitos autorais

CONTRATOS DE DIREITOS AUTORAIS

Doutrinas Essenciais Obrigações e Contratos | vol. 4 | p. 885 - 911 | Jun / 2011


DTR\2012\1337
___________________________________________________________________________
Eduardo J. V. Manso
Advogado em São Paulo.

Área do Direito: Constitucional; Civil

Sumário:
- A) Introdução - B) Direito patrimonial do autor - C) Contratos de direitos autorais - D)
Contrato de edição - E) Forma do contrato de edição - F) Objeto e conteúdo do contrato de
edição - G) Obra encomendada - H) O contrato de cessão de direitos autorais - I)
Limitações do contrato de cessão de direitos autorais - J) Distinções entre o contrato de
edição e o de cessão de direitos autorais - L) Conclusões

Revista dos Tribunais RT 467/24 set./1974

A) Introdução

1. O conjunto de normas jurídicas que têm por objetivo dar proteção à obra humana,
nascida de sua superior atividade intelectual e que se consubstancia em uma criação do
espírito, e que visam a tutelar os interesses do autor em suas relações com essa obra e
com terceiros, padece de tamanha polêmica doutrinária que até mesmo seu próprio nome
ainda não encontrou um denominador comum.

Assim é que, para determinada corrente, trata-se de um “direito autoral”; para outra, de
“direitos intelectuais”; há quem o chame de “direitos do autor”; outros, de “copyright”;
para outros, trata-se de “direito de propriedade literária, artística e científica”, enquanto há
quem o chame de “direitos autorais”. Cada denominação procura refletir uma tendência
doutrinária, buscando situar mais definitivamente a natureza jurídica desse direito que
todos afirmam, sem divergência, ser o mais nobre de todos.

2. Por não caber no âmbito deste trabalho, tais temas não serão versados aqui, porque o
objetivo central deste estudo é estranho à discussão, e as conclusões que se puderem tirar
destas linhas serão aplicáveis tanto se tomada esta ou aquela posição nos debates.

O que há de inconteste e resulta do exame dos fatos que ocorrem nas relações entre os
autores e suas obras e destes com terceiros, é que esse direito abrange um complexo de
situações jurídicas que têm, umas vezes, reflexos de caráter patrimonial e, outras, de
caráter não patrimonial.

Em razão da possibilidade (que, devido às conquistas da tecnologia, se torna praticamente


inesgotável) de uma utilização econômica das obras protegidas por esse direito, de um
lado, e, de outro, em virtude da estreita ligação que há entre tais obras e a própria

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personalidade de seu autor (muitos chegam mesmo a afirmar que essas obras são
verdadeiras manifestações da própria personalidade de seus criadores), é comum
afirmar-se que se trata de um complexo de faculdades de ordem patrimonial e de ordem
moral (expressão admitida por influência do Direito francês, que a usa quase sempre em
oposição ao “físico”, “real”). Disso surgiram as expressões “direito patrimonial” e “direito
moral”, para designarem tais aspectos desse direito tão recente e tão pouco estudado
entre nós. Tais expressões, embora não sendo de melhor conceituação técnica, acham-se
consagradas mundialmente, não implicando tal aceitação uma tomada de posição
favorável ao chamado conceito do “direito dúplice”, através do qual alguns pretendem
definir a natureza jurídica de tal ramo do Direito, concepção esta, aliás, vencedora em
muitos países, que a aplicaram em suas legislações: basta ler o § 2.º do art. 1.º da Lei de
11.3.1957, de França: “Ce droit comporte des atributs d’ordre intellectuel et moral, ainsi
que des atributs d’ordre patrimonial, qui sont detérminés par la présente loi”. Nosso Direito
interno também aderiu a essa conceituação, visto que o art. 21 da Lei n. 5.988, de (…)
14.12.1973, assim dispõe: “Art. 21. O autor é titular de direitos morais e patrimoniais
sobre a obra intelectual que produziu”.

3. Não obstante a evidente impropriedade do termo “moral”, para definir relações de


ordem não patrimonial que existem entre o autor e sua obra, ou entre estes e terceiros, a
locução “direito moral” (ou “direitos morais”, como querem outros, pensando em melhor
indicar as várias maneiras como se manifestam as faculdades – positivas e negativas –
dele decorrentes) acha-se universalmente consagrada. Refere-se ela, basicamente, às
faculdades personalíssimas, de que gozam os autores, de ligar (ou não) seu nome à obra,
de fazer respeitar sua pessoal e específica qualidade de “autor” e de respeitar a inteireza e
integridade da própria obra. É assim, um conjunto de faculdades estreitamente ligadas à
própria personalidade do autor e que, por isso, também são consideradas, por muitos,
como “direitos de personalidade”, sendo, como tal, perpétuos, inalienáveis e
imprescritíveis. O que não impediu que nosso legislador de 1916 proclamasse, sem
qualquer restrição, acessibilidade do próprio direito à paternidade da obra, considerado
como o mais significativo dos chamados “direitos morais” (v. art. 667 de nosso CC, pecado
esse expurgado de nosso Direito Positivo pela citada Lei n. 5.988, de 1973, cujo art. 28
considera os direitos morais do autor inalienáveis e irrenunciáveis.

4. Embora seja geral a aceitação de que o “direito moral”, como manifestação de um direito
da personalidade, é um direito absoluto, no sentido de que vigora “erga omnes”, de
maneira total e sem qualquer prévia determinação de sujeitos passivos, estando a
sociedade (nela incluído o próprio Estado) obrigada ao seu mais irrestrito respeito, é sabido
que autores há que negociam sua “autoria” (v., a propósito, reportagem na revista “Veja”
de 12.4.1972, n. 188), ou que a renunciam em benefício de outrem. Essa verdade, a
despeito de contrariar a natureza do chamado “direito moral”, existe de fato e nenhuma
legislação a extirpará. Melhor seria, pois, que fosse acolhida pelo Direito Positivo, com a
promulgação de rígidas e claras normas de ordem pública, visando, pelo menos, a
resguardar a integridade da obra literária, artística ou científica, o que poderia dar-se, até
mesmo, contra a vontade de seu próprio criador, que muitas vezes aceita alterações em
sua criação por força de necessidades econômicas – que lhe não são amparadas pelo
Estado.

Por isso, talvez, é que Denis de Freitas, do Reino Unido, um dos mais vibrantes

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especialistas de nossa matéria, afirma, com muita segurança: “Aucun droit individuel n’est
absolu. L’individu est un membre de la societé, et à tout moment la portée et le contenu de
ses droits personnels doit refléter les vues actuelles de la societé. Ceci a naturellement été
déjà dit maintes fois, mais il est nécessaire de le répéter parce que les auteurs – et ceux qui
parlent en leur nom – ne font pas toujours preuve d’objectivité: ils adoptent parfois
l’attitude selon laquelle ces droits sont d’origine divine, quils sont nécessaires, inaliénables
et intangibles. Il n’en est pas ainsi. Par contraste avec autres droits de propriété, le droit
d’auteur, tel qu’il est reconnu maintenant, a une très courte histoire dont le trait essentiel
est que la nature même du droit de propriété litteraire a évolué de façon constante” (in
“Revue Internationale du Droit d’Auteur”, janeiro de 1972, pág. 34).

5. Dessa forma, não seria inteiramente impróprio dizer-se que, mesmo quanto aos
chamados “direitos morais”, poder-se-iam estabelecer relações negociais, de ordem (ou
pelo menos de efeitos) econômica, patrimonial. Também não é, entretanto, objetivo deste
trabalho, uma análise dessa possibilidade e, muito menos, os meios jurídicos que poderiam
ser utilizados para sua formalização. A criação, porém, de um órgão estatal, para o
financiamento de publicações de autores novos, mediante prévia seleção de comissão
técnica, de atuação permanente, tal como parece que ocorrerá com a criação do Conselho
Nacional do Direito Autoral, que está previsto na Lei n. 5.988, de 1973 (arts. 116 e segs.),
poderá resultar na minoração do problema referente à defesa moral do autor e de sua obra,
os quais existem em razão da pobre situação econômico-financeira desses autores. O
Fundo de Direito Autoral, que será constituído com “o produtor da autorização para a
utilização de obras pertencentes ao domínio público” (art. 120), principalmente terá como
primeira finalidade “estimular a criação de obras intelectuais, inclusive mediante
instituição de prêmios e de bolsas de estudos e de pesquisa” (art. 119).

B) Direito patrimonial do autor

6. A despeito de toda a nobreza, de toda a mistificação que envolve os direitos chamados


“morais”, a verdade é que somente após o aparecimento de uma efetiva possibilidade de
exploração econômica das obras de engenho é que o Direito passou a conferir aos autores
tais prerrogativas, hoje universalmente amparadas pelas legislações de todos os povos,
até mesmo nos países socialistas. E não será grande exagero afirmar-se que o próprio
direito “moral” do autor nasceu e incorporou-se no Direito Positivo de alguns povos, por
reflexos estritamente patrimoniais, máxime quando se atenta para o fato de que esse
caráter “moral” torna-se mais vivo e reclama proteção cada vez maior em razão direta das
violações do direito patrimonial, terminando por destacar-se do estritamente “moral” para
ingressar no jurídico. Antes da existência positiva desse direito de utilização econômica da
sua obra, que, por sua vez, nasceu da possibilidade técnica de reproduções em escalas
industriais, o aspecto “moral” das relações entre o autor e sua obra, e desses com
terceiros, apenas dizia respeito ao direito comum de propriedade física da obra (“corpus
mechanicum”). Sua violação, da mesma forma, era reparada pela lei penal comum. O
aspecto estritamente moral, no entanto, ficava a cargo da própria Moral, e as sanções, por
conseguinte, tinham alcance meramente moral. “Le droit existait mais à l’état abstrait,
sans sanction pratique”, confirma Marie Claude Dock (“Étude sur le Droit d’Auteur”, Paris,
1963, pág. 40) examinando a existência do direito autoral na velha Roma, quando era total
a ausência de textos legislativos a respeito.

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7. Daí por que se pode afirmar, juntamente com Robert Plaisant (“Juris Classeur –
Propriété Litteraire et Artistique”, fasc. 2, pág. 3) que “le premier artisan du droit d’auteur
fut donc Gutenberg”, porque foi, em verdade, com o aparecimento da tipografia, que se
tornou economicamente viável a exploração das obras do espírito humano, do gênero
literário (verdadeira locomotiva de todas as demais obras de engenho, para o efeito da
proteção legal). O que é confirmado por uma boa parte dos tratadistas como o fez Plínio
Bolla em estudo publicado em homenagem a M. Plaisant (“Mélanges Marcel Plaisant”,
Sirey, Paris, 1960, pág. 207): “É à invenção da arte de imprimir que nós devemos os
primeiros traços do direito do autor, sob a forma de privilégios atribuídos pelo soberano, rei
ou república”.

8. A reprodução, por isso, é o principal elemento do direito patrimonial do autor da obra


que a doutrina italiana, abreviadamente, designa pela expressão “Opera dell’ingegno”
(para indicar a “obra intelectual do engenho humano”).

9. De Gutenberg aos satélites artificiais, essa utilização da obra de engenho vem exigindo,
cada vez mais, a organização do trabalho e do capital, de distribuição e “marketing”, de tal
forma que ao autor resta quase que exclusivamente a atividade criadora, pela
impossibilidade, até certo ponto geral, de ser reunida em uma só pessoa todas aquelas
condições para uma atividade comercial das mais complexas do mundo moderno, e que
constitui um dos mais importantes ramos da Indústria, qual seja, a “indústria editorial”.

Em razão dessa, complexidade de atividades que o mundo de hoje exige para o maior êxito
de uma exploração de obra de engenho, e, enfim, pela própria natureza das obras de
espírito (cujo principal escopo, em verdade, é serem divulgadas), o direito patrimonial do
autor é, ao contrário do direito moral, perfeitamente alienável, caráter que até mesmo
chega a identificar o próprio direito autoral: É corrente, entre os que lidam com tal matéria,
dizer “direitos autorais” (pagar direitos autorais, receber direitos autorais etc.) para indicar
a remuneração dessa exploração econômica. Dizem – “direitos autorais”, como no direito
anglo-americano se dizem “royalties” (expressão que também traz em si aquela
etimológica indicação da própria origem de tais direitos, que no princípio eram atribuídos
aos autores como verdadeiros privilégios reais).

Contrariamente, pois, ao direito moral, a nota característica do direito patrimonial do autor


é sua alienalibilidade, sua prescritibilidade, sua penhorabilidade; é sua negociabilidade. E é
esse aspecto do direito autoral que tem levado inúmeros juristas a considerá-lo verdadeiro
direito real, estando assim consignado em algumas legislações, como esteve na nossa
(Código Civil (LGL\2002\400), no Livro II. “Do Direito das Coisas”. Título II. “Da
Propriedade”, Capítulo VI, “Da Propriedade Literária, Artística e Científica”, arts. 649 a
673). E, não obstante atualmente os partidários dessa concepção apaguem-se dia a dia,
ainda há os que recalcitram na sua afirmação, como faz Pierre Recht (da Bélgica), membro
da Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores – CISAC – como
o próprio nome de sua recente obra indica: “Le droit d’auteur, une nouvelle forme de
propriété”, edição conjunta de Paris e de Gembloux, de 1969.

C) Contratos de direitos autorais

10. Como se viu, a rigor, pode haver contratos referentes a direitos autorais, tanto com
relação aos direitos “morais” (contratos esses que, em verdade, existem de fato e, via de

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regra, são verbais), quanto aos direitos “patrimoniais”. E, por mais paradoxal (ou imoral)
que possa parecer, os contratos que visam a transmissão de direitos morais (que por
natureza são inalienáveis dado o seu caráter personalíssimo) são os que produzem a mais
ampla alienação de direitos autorais, porque transferem ao adquirente a própria autoria da
obra, sua paternidade, única e “ultima ratio” daqueles direitos, de tal modo que o
adquirente recebe até mesmo novo “status”: o de “autor”. Em virtude dessa absoluta
alienação (em que o autor de fato age como essas mães que entregam o filho
recém-nascido, sem mesmo ver-lhe as feições), a qual se reveste de uma cínica
imoralidade, os contratos concernentes à transferência dos direitos morais são como as
bruxas do poeta: ninguém vê, ninguém crê, mas que “los hay, los hay”. São negociações
obscuras protegidas pela falta de escrúpulos de quem adquire e proporcionadas pela
miséria de quem entrega. A noite é seu cenário, a escuridão seu selo. Deles não cuidará
este trabalho, especialmente por impossibilidade material de seu exame objetivo, que
pudesse apresentar cunho científico.

11. Já os contratos relativos à exploração econômica da obra de engenho, e que derivam


da faculdade exclusiva que as legislações atribuem aos autores, como emanação desse
“direito patrimonial”, existem de maneira clara e objetiva, com o “imprimatur” do Direito e
da Moral e sua extrema (poder-se-ia dizer infinita) variedade de formas resulta da infinita
variedade de meios de utilização comercial e industrial da obra de espírito.

A reprodução – atividade estritamente técnica e que nos dias de hoje somente é rentável
em escala industrial – é o principal aspecto dessa possibilidade de utilização econômica da
obra. Os meios de reprodução, graças aos progressos da tecnologia, tornam-se, dia a dia,
mais complexos, carreando para os autores sempre novas e diversificadas formas de
exploração pecuniária de sua obra, e trazendo para o Direito novos problemas que
demandam agora soluções de ordem internacional, visto ser verdade que o mundo é uma
“pequena aldeia”.

12. Segundo a exploração que se pretende fazer da obra, o contrato que ligará o autor e o
empreendedor terá forma e conteúdo diversos. Assim também, o gênero a que pertence a
obra determinará a espécie de contrato apropriado, bem como o próprio estatuto pessoal
do autor interferirá na formulação do instrumento mais adequado (como no caso de autor
assalariado). A própria causa eficiente da obra será relevante para a elaboração de um
contrato correto, como se dá nos casos de obra criada sob encomenda.

De tal forma é imprevisível a possibilidade de exploração das obras de engenho, que é


praticamente impossível catalogarem-se os diversos contratos que poderão regular as
relações jurídicas resultantes dessa exploração.

13. Dada essa dificuldade quase intransponível, o presente trabalho se restringirá as obras
literárias e aos dois tipos fundamentais de contratos que regem a sua exploração
econômica: o contrato de edição e o contrato de cessão de direitos autorais.

D) Contrato de edição

14 “Mediante o contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir mecanicamente e


divulgar a obra científica, literária, artística, ou industrial, que o autor lhe confia, adquire o
direito exclusivo a publicá-la, e explorá-la.” É o que dizia nosso Código Civil

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Contratos de direitos autorais

(LGL\2002\400), no art. 1.346, consignando, pois, a tipicidade do contrato de edição, o


que o art. 57 da Lei 5.988, de 1973, repete quase integralmente.

O exame do texto legal nos informa que o contrato de edição, além de ser consensual,
bilateral e virtualmente oneroso, é um contrato de natureza mista: é contrato comercial,
do ponto- de-vista do editor, e civil, do ponto-de-vista do autor. É, ainda, um contrato
celebrado “intuito personae”, isto é, os direitos e obrigações que as partes outorgam-se
mutuamente não podem ser transferidos a terceiros, sem autorização da outra parte, sob
pena de sua plena resilição (salvo os casos em que tais contratos se transferem como
elementos integrantes de estabelecimento comercial, na hipótese da própria transferência
desses estabelecimentos). Por fim, é um contrato de prestações correlativas, visto que, em
geral, admite-se sua resolução quando ocorrer excessiva onerosidade para uma das
partes, desde que isso não advenha por culpa de qualquer espécie dessa mesma parte.

15. Trata-se do mais específico e adequado instrumento para regular a exploração


econômica da obra literária, posto que, por ele, a principal obrigação que o editor assume
é a de divulgar essa obra, enquanto para o autor, além da percepção de remuneração
correspondente, verá seu primeiro interesse de escritor atendido, qual seja, o da difusão
de sua própria criação intelectual.

Uma das mais marcantes características desse contrato é que ele tem, por natureza,
duração limitada, quer quanto ao tempo de sua vigência, quer quanto ao número de
edições a que se obriga o editor. Mesmo quando silencia quanto a esse aspecto, sua
duração se limita ao tempo necessário para que o editor publique uma única edição. A Lei
n. 633, de 22.4.1941, italiana, limita, ela própria, a um máximo de 20 anos (art. 122) para
“validade do contrato”, exceção feita apenas para os contratos que versarem sobre
enciclopédias, dicionários, quanto a obras literárias. Também neste passo a recente Lei n.
5.988 manteve-se fiel ao Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), afirmando, por seu art. 59,
que o “contrato versa apenas sobre uma edição; se não houver cláusula expressa em
contrário”.

16. É um contrato, virtualmente oneroso, já que o editor somente não estará sujeito ao
pagamento da remuneração do direito de exploração que ele lhe confere, se o autor
expressamente renunciar a ela, ou deixar de exercer seu direito a essa arrecadação. E isso
é assim porque mesmo que o contrato seja verbal (o que é possível no Brasil, a despeito de
todas as inconveniências daí resultantes), ou mesmo que nele não tenha ficado estipulada
“a retribuição pelo seu trabalho”, a remuneração será determinada por arbitramento a
cargo do Conselho Nacional de Direito Autoral (art. 60 da Lei n. 5.988, de 1973, também
repetida do art. 1.353 do CC).

17. A temporalidade intrínseca do contrato de edição e sua onerosidade virtual, conferem


a essa espécie uma semelhança muito acentuada com o instituto da locação. Com efeito, o
autor, na qualidade de titular exclusivo do direito de utilização econômica da obra literária,
ao transferir para o editor, temporariamente e mediante uma remuneração previamente
estabelecida, não perde essa titularidade, da mesma forma que o proprietário que aluga
seu bem recebe aluguéis e detém o domínio.

E) Forma do contrato de edição

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18. Considerando-se que a obra de engenho não se confunde com sua representação física
(“corpus mechanicum”), isto é, que a criação intelectual em si mesma (que é o verdadeiro
objeto do direito autoral), é um bem incorporal (“corpus mysticum”) que pode ser
reproduzido indefinidamente, sem perder sua essência, nem sua identificação, e
sabendo-se que o direito exclusivo de reproduzir de que o autor goza é total, não se
restringindo a uma única e determinada maneira de exploração, as legislações modernas
de outros países estabelecem, como condição “sine qua non” para sua validade, a forma
escrita. Não obstante o autor não possa dispor da obra, “no todo ou em parte, enquanto
não se esgotarem as edições a que tiver direito o editor” (art. 69 da lei, ainda uma vez
repetindo o Código Civil (LGL\2002\400), art. 1.349), essa restrição somente se aplicará
àquela determinada e específica maneira de explorar a obra que tenha sido objeto do
contrato de edição. Portanto, o autor de um romance que tenha celebrado um contrato da
edição da obra unicamente em fascículos de jornal, estará livre para firmar com outro
editor a edição dessa mesma obra em formato de livros. Ou poderá contratar sua nova
edição em outra língua; ou sua transformação em obra de outro gênero literário. A
Suprema Corte italiana, conforme decisão publicada pela revista “Il Diritto di Autore”,
1956, pág. 38, afirma que “il titolare dei soli diritti di pubblicazione “en périodique” (a
puntate o a dispense) di un’opera litteraria viola il diritto di pubblicazione “en librairie” (in
volume) quando pubblichi l’opera per intero su un periodico mensile appartemente ad una
collana i cui volumi contengono ciascuno un romanzo completo, essendo irrelevante, ai fini
della distinzione tra pubblicazione “en périodique” e “en librairie”, la periodicità dei volumi
ed il fatto che gli stessi contengano materiale secondario (romanzi in appendice, giochi
ecc)”, informa-nos Vito Mangini (“Contratto di Edizione” – in “Rivista di Diritto Civile”, n. 4,
1959, pág. 353).

O contrato de edição, portanto, pode referir-se a todos os direitos de utilização que


pertencem ao autor com exclusividade, ou referir-se apenas a um, ou alguns desses
direitos. Tudo isso recomenda que o contrato de edição seja celebrado por escrito, motivo
que levou a maioria das legislações modernas a inserir, como condição da própria validade
de tais contratos, a sua forma escrita, tal como, de resto, estava previsto nos anteprojetos
de Código de Direito do Autor e Direitos Conexos, oferecidos à apreciação do nosso
legislador, que, todavia, optou pelo silêncio a esse respeito, mantendo assim a validade de
contratos de edição celebrados oralmente.

F) Objeto e conteúdo do contrato de edição

19. Como se viu, o contrato de edição entre outras notas características, possui a de ser
um misto de contrato comercial, do ponto-de-vista do editor, e civil, do lado do autor.

Por essa peculiaridade, tais contratos apresentam objetivos diferentes, quando


examinados com olhos de editor ou com os de autor. Mas uma finalidade única resulta de
sua própria natureza: a publicação da obra. Tanto o editor, como o autor, somente
celebram esse tipo de contrato visando, precipuamente, a publicação da obra. Para o
editor, a publicação tem como primeira finalidade a retribuição de sua própria atividade
empresarial, ao passo que para o autor, além da remuneração de sua atividade criadora,
visa, de imediato, a difusão de sua própria imagem criadora, de suas idéias, de sua
mensagem.

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E desses objetivos paralelos, não conflitantes, nasce o próprio conteúdo do contrato de


edição: o autor assume, como obrigação principal, a transferência total ou parcial, para o
editor, de seu direito exclusivo de reproduzir a obra, além da de fazer respeitar, por
terceiros, essa transferência; o editor, em contrapartida, assume a obrigação essencial de
publicar ou de fazer publicar aquela obra.

Dado que o objetivo primordial do autor, no contrato de edição, é a divulgação de sua obra,
a obrigação principal do editor é a publicação. Donde a conclusão de que o objetivo e o
conteúdo do contrato de edição se resumem na publicação da obra, que há de obedecer em
qualidade, quantidade e extensão, ao que o contrato estabelecer, afastando, com isso,
qualquer possibilidade de interpretação extensiva de suas cláusulas. Se o contrato falar
expressamente em uma edição, o autor respeitará o direito que o editor terá de explorar,
plenamente, essa edição, enquanto este há de limitar a ela sua atuação, mesmo que a
impossibilidade de reeditar a obra lhe acarrete prejuízos enormes em razão de eventuais
lucros cessantes. Mesmo que outro editor, após esgotada a primeira e única edição
permitida pelo contrato, venha a colher os frutos do trabalho de lançamento do autor
perante o público, nada poderá reclamar o primeiro editor, que terá, simplesmente, feito a
semeadura, para que outro efetuasse a colheita.

O editor, pois, assume o risco desse empreendimento, não somente quanto aos resultados
próprios dele, como quanto às possíveis utilizações futuras, por terceiros, do lançamento e
publicidade que tiver feito, por ocasião da edição que lhe fora primeiramente autorizada. É
comum, para se prevenirem contra esse risco, adotarem os editores cláusulas
estabelecendo a preferência para futuras edições, circunstância em que os autores
cautelosos também restringem tal preferência ao atendimento de igualdade de condições
com eventuais concorrentes. Tais cláusulas, não obstante a completa omissão de nossa
legislação específica a respeito de sua possibilidade jurídica, têm plena validade
especialmente em razão de princípios gerais de direito, posto que, a despeito de
constituírem uma relativa restrição da liberdade de contratar, por parte do autor,
asseguram um equilíbrio justo em função da atividade empresarial do editor, e os juízes,
que devem retirar muito mais do Direito, que da Lei, o fundamento de suas sentenças, hão
de dar-lhe a mais eficaz guarida, para obediência aos mais elementares ensinamentos de
eqüidade. Através de uma interpretação analógica (fala-se de “analogia juris”) tais
cláusulas são perfeitamente possíveis, tendo em vista que é perfeitamente válido contratar
obras futuras, mediante um contrato de total preferência sobre elas (hipótese que se não
confunde com a de contratação de obras por encomenda). Nos contratos de obras futuras,
o editor goza da opção para editar obras do autor, durante um certo prazo, ou
relativamente a um certo número de obras, desde que as futuras obras do autor pertençam
ao mesmo gênero daquela cujo contrato acolheu a cláusula de preferência. A França pelo
art. 34 da Lei de 11.3.1957 limita essa preferência ao prazo de cinco anos e a um número
máximo de cinco obras, enquanto a Itália confere prazo de 10 anos para tais contratos (art.
120 da Lei de 1941, hoje vigente). No Brasil, a Lei n. 5.988, de 1973, embora incluindo o
instituto no capítulo referente à cessão de direitos, a hipótese se aplica aos contratos de
edição. Ora, se é possível essa preferência por obras que ainda sequer têm uma existência
ideal na mente do autor, muito razoável é que a mesma preferência possa ser exercida
quanto a uma obra já editada, especialmente quando o editor deseja exercê-la em virtude
do êxito de sua própria edição. A preferência pela reedição da obra, por não repugnar,

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assim, ao espírito que deve nortear os contratantes, e não estando defesa em lei, a
despeito do que dispõe o art. 1.152 do CC, há de entrar naquele rol de aplicabilidade de que
fala o Prof. Washington de Barros Monteiro, no seu idôneo “Curso”, in “Direito das
Obrigações”, tomo 2, ed. 1959, pág. 120.

G) Obra encomendada

20. O art. 1.347 de nosso CC, assim como o art. 58 da Lei n. 5.988, de 1973, estabelecem
que pelo contrato de edição “pode o autor obrigar-se à feitura de uma obra literária,
científica, ou artística, em cuja publicação e divulgação se empenha o editor”. A disposição,
todavia, além de ambígua, é tecnicamente imperfeita. Uma análise apressada do texto
pode levar-nos a entender que nossa lei somente permite que o autor prometa uma só
obra ao editor, o que não é verdade. E parece amenizar a obrigação do editor, dizendo que
este apenas “se empenha” na publicação e divulgação da obra encomendada.

O simples fato de um editor encomendar ao autor a feitura de determinada obra – que, sem
essa encomenda, provavelmente não viria a lume – reforça aquela fundamental obrigação
que o editor assume, nos contratos de edição, de publicar. Nenhuma razão jurídica poderá
afastar o editor dessa obrigação essencial, posto que, não publicando a obra
encomendada, poderá o autor exigir-lhe judicialmente a publicação. O editor, pelo contrato
de edição, assume obrigação de fazer, cuja execução pode ser forçada por meio de ação
cominatória, inclusive por intermédio de terceiros, às expensas do editor inadimplente.
Assim, este não poderá simplesmente “empenhar-se” na publicação da obra
encomendada, visto que, só por se tratar de obra encomendada, não há mudança nas
regras do contrato de edição.

Pode um editor encomendar ao mesmo autor mais de uma obra, e não apenas uma como
parece limitar a nossa lei. É comum, entre nós, a encomenda de obras didáticas, que por
sua natureza, são seriadas segundo o grau de ensinamentos que visam: um professor de
português, portanto, pode obrigar-se a redigir os livros de todas as séries, sendo cada um
deles uma obra distinta.

O Importante é que o contrato de encomenda de obra não se destaca do contrato de edição


do qual é verdadeiro preâmbulo como também o pode ser dos contratos de cessão de
direitos autorais. Destacado de um contrato de edição ou de um contrato de cessão de
direitos autorais, ele não tem vida própria, porque suas cláusulas seriam inócuas e “a
norma jurídica que não tenha eficácia é como o fogo fátuo, que não queima”.

O contrato de encomenda não se confunde com o de obras futuras, não obstante ambos
versem sobre obras ainda não criadas. O contrato de obra futura, que nossa legislação
contempla em seus dispositivos, referentes à cessão dos direitos autorais (art. 54) tem
contornos diferentes e suas conseqüências são diversas. No contrato de encomenda, o
autor visa a atender basicamente a um interesse do editor: este lhe dá toda a orientação,
traça-lhe as linhas mestras da obra. O autor executa idéias alheias e muitas vezes não
passa de mero trabalhador intelectual que não pode sequer merecer o título de “autor”.
Robert Plaisant, examinando a hipótese em seu “Le Droit des Auters et des Artistes
Executants” (Paris, 1970, pág. 98), com base na jurisprudência dominante em França,
chega mesmo a afirmar: “Si l’intéressé ne fait qu’exécuter selon la technique du métier un
travail dont les éléments originaux lui ont été indiques par la personne qui passe la

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Contratos de direitos autorais

commande, l’exécutant n’est pas auteur”.

No contrato de encomenda, a importância do “corpus mechanicum” é fundamental para a


titularidade dos direitos autorais. Via de regra, quando o “corpus mechanicum” incorpora
em si mesmo a obra (“corpus mysticum”) não se destinando, em princípio, à reprodução
(como no caso das obras plásticas) o autor conserva os direitos autorais sobre sua criação,
salvo pacto contrário, expresso. Muito embora seja tal posição doutrinária aceita com
grande tranqüilidade pelos estudiosos da matéria, nem sempre se incorpora no Direito
Positivo, tal como se dá, agora, entre nós: A Lei n. 5.988, de 1973, no seu art. 80 estipula
exatamente o contrário: “Art. 80. Salvo convenção em contrário, o autor de obra de arte
plástica, ao alienar o objeto em que ela se materializa, transmite ao adquirente o direito de
reproduzi-la, ou de expô-la ao público”. Tal disposição parece em conflito com a do art. 38
da mesma lei: “A aquisição do original de uma obra, ou exemplar de seu instrumento ou
veículo material de utilização, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais
do autor”. A disposição do art. 80 inspira-se na lei britânica de 5.11.1956 (4 and 5
Elizabeth’s Act, ch.74) que no art. 4.º, alínea 3, estabelece: “Não obstante o disposto nos
números anteriores, quando uma pessoa encarregue que se fotografe, pinte ou desenhe
um retrato ou se faça uma gravação e pague ou esteja de acordo em pagar por ela, em
moeda ou seu equivalente pela obra realizada em cumprimento dessa encomenda, a
pessoa que encomendou tal obra será titular de qualquer direito de autor que existe sobre
a mesma, em virtude desta disposição legal”. E essa disposição é praticamente repetição
do que já ditava o “Copyright Act” de 1911 – Seção 5, subseção “a”, conforme nos conta
André Françon (em seu “La Propriété Littéraire et Artistique en Gran-Bretagne et aux
États-Unis”, Paris, 1955, pág. 56), a qual é aplicada, todavia, com muita limitação pela
jurisprudência inglesa, arremata esse jurista.

Ao revés, quando a obra (“corpus mysticum”) destina-se naturalmente à reprodução


(como no caso de obras literárias), o contrato de encomenda carrega consigo a licença
(quando for de edição) ou transferência da titularidade (quando se tratar de cessão dos
direitos autorais) para sua utilização econômica. Nesta hipótese, nulo será o contrato de
encomenda que vedar ao encomendante a utilização econômica da obra (“corpus
mysticum”), posto que a encomenda de obra literária tem como finalidade intrínseca e
básica essa exploração. O contrato, porém, poderá restringir essa exploração a uma ou
algumas formas de exploração, a um prazo, ou a uma quantidade. Nunca, todavia, excluirá
a possibilidade da exploração.

De tal forma, apenas a interpretação das cláusulas contratuais é que dará a exata noção da
titularidade dos direitos de autor, indicando se tal encomenda foi introdutória de um
contrato de edição, ou de um contrato de cessão de direitos autorais.

21. O contrato de obra futura, ato contrário, não é um termo introdutório de outro
contrato. Por ele, desde já se fixam as normas que regerão as futuras obras do autor,
desde logo estabelecendo as condições contratuais. Na medida em que essas obras vão
surgindo, as normas do contrato prorrogam-se até elas e aplicam-se “ex nunc” No entanto,
se pelo contrato de encomenda o autor se obriga a produzir determinada obra sob pena de
estar sujeito a reparação de prejuízos do editor, pelo contrato de obras futuras esta
obrigação não existe. Deste nasce, tão-somente, a plena preferência do editor por novas
obras do autor, que, todavia, não está obrigado a criá-las, ou, se as criar, não estará

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Contratos de direitos autorais

obrigado a dá-las à divulgação. Por isso os doutrinadores franceses costumam denominar


os contratos que versam sobre obras futuras como “contrat de préférence” (cf. Henri
Desbois, “Le Droit d’Auteur en France”, Dalloz, Paris, 1966, págs. 587 e segs.).

As obrigações, pois, que as partes assumem através do contrato de encomenda e do de


obra futura, são distintas, assim para o autor, como para o editor. Num há obrigação dê
divulgar e publicar: tanto o autor, como o editor a assumem; no outro, essa obrigação
dependerá da vontade das partes: o autor pode não criar a obra, como pode criá-la e não
querer divulgá-la; o editor pode não editá-la, com o que desonerará o autor, ficando este
livre para publicá-la por intermédio de outro editor. Ao contrato de obra futura, aplicam-se
preferentemente as regras da prelação, visto que por ele o autor confere ao editor
verdadeira preferência, o que não ocorre com o contrato de encomenda, pelo qual o autor
transfere ao editor uma exclusividade temporária, se o contrato final for de edição, ou
definitiva, se o contrato por fim for o de cessão. Por esse motivo é que se costuma afirmar
que o contrato de encomenda encerra verdadeiramente uma “louage d’ouvrage”, já que o
autor se obriga à feitura da obra, não obstante goze da mais ampla liberdade de ação (o
que o distingue, na essência, do contrato de locação de serviços e do contrato de emprego
de trabalhador intelectual assalariado).

H) O contrato de cessão de direitos autorais

22. A legislação brasileira, ora vigente, também conferiu a essa espécie de contrato uma
tipificação, o que não acontecia no sistema do Código Civil (LGL\2002\400), muito embora
ele devesse ser a correspondência legal da conceituação que o direito estritamente
substantivo dera ao direito autoral. Com efeito, incluindo nosso Código Civil
(LGL\2002\400) tal direito entre os direitos reais, consignando-o como “propriedade
literária, científica e artística, e como tal tratado pela legislação penal desde o Código
Criminal de 16.12.1830, era de se esperar que, no Direito das Obrigações, fossem
reguladas, como foi feito com os demais direitos reais, as relações que dessa “propriedade”
nascessem quanto à sua aquisição, conservação e extinção. Poderia, ou deveria o
intérprete concluir que o legislador, assim agindo, quis apenas confirmar a conceituação de
um direito real, que deve, portanto ser tratado como tal pelas demais regras atinentes às
obrigações decorrentes do Direito das Coisas?

A despeito desse silêncio legal, e não obstante a dúvida que esse silêncio ocasionou, o
certo é que o Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro deixava clara a possibilidade de
realização de tal contrato, como se infere das regras dos arts. 659 e 667.

O art. 659 estabelecia que a cessão pode ser não só da obra (evidentemente referindo-se
ao “corpus mechanicum” e em especial quanto às obras de artes plásticas), mas também
de “direitos do autor”, reservando simplesmente, para o autor, o direito de modificá-la,
como manifestação direta do direito moral, que é de regra inalienável, quando não
expressamente referido no contrato.

Pelo art 667 – ao qual já se fez referência acima – o autor podia ceder até mesmo o seu
direito de “ligar o nome a todos os seus produtos intelectuais”, sobre o qual Antônio
Chaves, no seu clássico “Proteção Internacional do Direito Autoral de Radiodifusão” (São
Paulo, Ed. Marajó, 1.ª ed.), tece amargas críticas: “embora favorecido pela lei, esse pacto
é contrário à moral, porque constitui uma mentira capaz de enganar a sociedade com

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Contratos de direitos autorais

relação à personalidade do comitente” (ob. cit., pág. 307). Para o emérito professor de São
Paulo, o art. 667 é fruto de lamentável engano visto que, conforme já assinalara Piola
Caselli, “a ingerência intelectual do comitente na criação da obra pode, em determinadas
circunstâncias, ter relevo a ponto de guindá-lo ao posto de um verdadeiro co-autor,
quando não ao de autor exclusivo, pela sua importância predominante” (ob. cit., pág. 306).

Dessa forma, o que o art. 667 de nosso CC deveria ter regulado seria à renúncia da
paternidade de obra encomendada, quando o executor da encomenda não tivesse tido
senão ínfima participação mecânica na elaboração da obra, hipótese já examinada por
Robert Plaisant de que se deu notícia atrás.

A despeito, no entanto, de toda a autoridade do querido Prof. Antônio Chaves, o art. 667,
posta de lado a imoralidade de que a norma se reveste, previa, mesmo, a cessão
(alienação total) do direito a paternidade, sem restringir essa faculdade a casos de obras
de encomenda, ou a qualquer outro caso de obra criada sob o comando de outra pessoa,
aplicando-se, portanto, a qualquer tipo de obra, indistintamente.

A alienabilidade do direito moral que o autor tem de ligar seu nome à obra – pelo menos
para os países signatários da Convenção de Washington, datada de 22.6.1946, que é,
portanto, 30 anos mais nova que o art. 667 de nosso CC – não é um intocável tabu. Tais
países, como o Brasil (que ratificou a Convenção de 1949 e que, pelo Decreto n. 26.675, de
18.5.1949, a promulgou, incorporando-a ao nosso Direito Positivo), têm que admitir que “o
autor de qualquer obra protegida, ao dispor de sua obra por venda, cessão ou por qualquer
outra maneira, conserva a faculdade de reclamar a paternidade da obra e a de opor-se a
toda modificação ou utilização da mesma, que seja prejudicial à sua reputação como autor,
a menos que por seu consentimento anterior, contemporâneo ou posterior a tal
modificação, haja cedido ou renunciado a essa faculdade de acordo com as disposições da
lei do Estado em que se celebra o contrato” (art. 11 da Convenção citada, e que não está
grifado no original). Cumpre notar, porém, que essa cessão somente seria viável quando
se tratasse de obra ainda inédita. Hoje, felizmente, essa discussão toda é meramente
histórica. Não só foi abolida a licitude da venda da paternidade da obra como o contrato de
cessão de direitos autorais acha-se regulado tipificadamente no capítulo V da citada Lei n.
5.988, de 1973.

23. O termo “cessão” é de significado plúrimo, visto que em determinados contratos


equivale a “venda”, em outros a “dação em pagamento”; ou equivale a “locação” ou a
“doação” e, até mesmo, às vezes, equivale a verdadeira “procuração em causa própria”
(sentido em que, de certa forma, os romanos a conheceram). Cessão, pois, é
simplesmente modo de cumprimento de uma obrigação de vender, de locar, de dar em
pagamento etc.

24. A cessão, portanto, é a alienação que resulta do cumprimento de prévia obrigação. A


rigor, pois, não se poderia falar na existência de um contrato de cessão de direitos autorais,
como espécie, posto que, também no contrato de edição, ocorre uma cessão, isto é, uma
transmissão de direitos do autor para o editor. Por isso é que algumas legislações (como a
da Argentina – Lei n. 11.723, de 28.9.1933, modificada pelo Decreto legislativo n. 12.063,
de 2.10.1957) preferem abandonar qualquer espécie de eufemismo, para dizerem, clara e
diretamente, venda: “De la Venda”, é o título da seção da lei argentina que abre os arts. 51

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Contratos de direitos autorais

a 55, após ter dito, em outro lugar, “De la Edición”, quando trata especialmente deste tipo
de contrato.

A própria Convenção de Washington fala diretamente em venda, no art. 11, acima


transcrito, para estabelecer uma distinção (que não consegue, por sinal) entre aquele
instituto e a cessão (tomada esta no sentido de “autorização”).

A despeito de toda sistematização que a codificação francesa procurou dar ao direito


autoral através de sua Lei de 11.3.1957, e apesar da reconhecida clareza dos textos
franceses, e talvez por excessiva regulamentação (contra a qual se insurgira Ripert no seu
“Déclin du Droit”), lá também se estabelece confusão desses conceitos, pois na própria
definição do contrato de edição fala-se em “cessão”, como está no art. 48: “Le contrat
d’édition est le contrat par lequel l’auteur d’une oeuvre de l’esprit ou ses ayants droits
èdent à des conditions déterminées à une persone appelée éditeur…”

“O legislador francês parece que não transpôs para o domínio do direito de autor a
disposição que contém o estatuto das patentes: não fez a distinção entre cessão e
concessão”, afirma Henri Desbois (ob. cit., pág. 552) que é notoriamente contrário à
possibilidade de cessão-venda dos direitos autorais, pelo menos no tradicional sentido e
com os normais efeitos do instituto da compra e venda.

E, em verdade, essa distinção entre “cessão” e “concessão” é a verdadeira “pedra de


toque” da questão: através do contrato de edição, o autor concede autorização para que o
editor reproduza sua obra, ao passo que no contrato de cessão, de que tratamos, ou seja,
da cessão-venda (cessão pura e simples, como querem os franceses), o autor transmite ao
cessionário até mesmo o “direito de autorizar a reprodução”.

André Huguet (“L’Ordre Public et les Contrats d’Exploitation du Droit d’Auteur”, Paris,
1962), como a maioria de seus conterrâneos, e apoiado pela jurisprudência dominante,
admite a coexistência, na legislação francesa de 1957, do contrato de edição e do contrato
de “cessão pura e simples”, inobstante considere hipócrita essa situação, que enfraquece a
pretendida proteção pública que a lei visa a dar ao autor, através de normas também de
ordem pública. Reconhece Huguet que, nesse particular, a lei francesa é repleta de
contradições, das quais vem a maior dificuldade para a realização de contratos de cessão
total dos direitos autorais. “Em direito comum, diz ele, uma cessão, feita em termos gerais,
obriga a uma interpretação extensiva. Evitar isso foi o que pretendeu o legislador. Não é
suficiente que o contrato exprima a intenção do autor, de ceder o conjunto de seus direitos;
ainda é preciso que os modos de exploração desses direitos sejam enumerados, posto que
somente esses modos expressos é que serão transmitidos” (ob. cit., pág. 126). E
prossegue: “Se novos processos técnicos de comunicação direta ou indireta tornam-se
utilizáveis, em conseqüência de descobertas científicas futuras, tais processos
imprevisíveis não poderiam ser transferidos”. E, por fim, arremata: “Résumons la
maladresse des dispositions legales: la cession totale du droit d’exploitation incorporelle de
l’auteur sur son oeuvre, est licite, à condition que soient prévus tous les modes
d’exploitation…” (ob. cit., pág. 128), o que está confirmado pelo Tribunal de Grande
Instance, de Paris, por sua 3.ª Câmara: “É de princípio, em matéria artística ou literária,
que o titular dos direitos conserva todos aqueles dos quais não dispôs em termos precisos
e não equívocos” (decisão de 17.10.1970, publicada pela “Revue International du Droit

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Contratos de direitos autorais

d’Auteur” janeiro de 1971, pág. 188).

Foi com base nesses princípios, que a lei brasileira sobre direitos do autor (n. 5.988, de
1973) dispôs no § 2.º do art. 53: “Constarão do instrumento do negócio jurídico,
especificadamente, quais os direitos objeto da cessão, as condições de seu exercício
quanto ao tempo e ao lugar, e, se for a título oneroso, quanto ao preço da retribuição”.
Essa especificação, que se fará no contrato de cessão celebrado sempre por escrito
(mesmo art. 53, “caput”), refere-se àqueles “modos de exploração” de que fala o citado
Huguet. E a interpretação do contrato de cessão, por força do que dispõe o art. 3.º dessa
Lei n. 5.988, há de ser estrita (o mencionado art. 3.º diz “interpretam-se restritivamente”,
não atendendo assim ao conselho de Carlos Maximiliano, que recomenda a expressão
“estrito.”), no sentido de que ao intérprete não será permitido atribuir ao cessionário
outros modos de utilização da obra além dos previstos (ainda que genericamente) no
contrato; nem devolver ao cedente parte dos direitos cedidos.

25. Nos Estados Unidos da América, porém, onde o direito do autor tem como fundamento
primeiro o direito de copiar (“copyright”), está em formação controvertida teoria (dita “da
indivisibilidade dos direitos autorais”), segundo a qual somente poderá haver cessão dos
direitos autorais se estes forem transferidos em sua integridade, havendo mero contrato
de licença (outro nome para o contrato de edição) se o autor reservar para si parte
daqueles direitos, hipótese em que o autor continua o “titular legal dos direitos autorais”.
É o que nos informa Barbara Ringer em relatório que fez à “Revue International du Droit
d’Auteur”, dando-nos conta de que, com base nessa teoria, a Suprema Corte
Norte-americana decidiu que “o direito subsidiário de ceder, vender e autorizar a
representação pública de filmes cinematográficos no mundo inteiro tinha um alcance
suficientemente grande para englobar a distribuição pela televisão” e, isso, a despeito de
uma cláusula pela qual o autor reservou-se “todos os direitos sobre os modos de expressão
que poderiam ser descobertos doravante” (Revista cit., outubro de 1971, pág. 70).

Dessa forma, como também informa Barbara Ringer (ob. cit., ibidem), no Direito
americano, para que se possa falar, com propriedade, em contrato de cessão dos direitos
autorais, é preciso que haja transferência de todos os direitos de que o autor é titular, em
virtude da aplicação dessa teoria da indivisibilidade de tais direitos.

26. Assim, quer no sistema romanístico do direito autoral, quer no anglo-saxão (que tem
por base a “common law”), a cessão de direitos autorais, no sentido de absoluta disposição
deles, por parte do autor, é lícita, ocorrendo, em favor do cessionário, efetiva sub-rogação
nas faculdades que “ab origine” pertenciam ao autor, transformando-se aquele em legítimo
sucessor deste, até mesmo para o exercício de ações de que este era o titular para
salvaguarda de seus direitos. Por isso o art. 47 da Lei n. 5.988, de 1973, estatui: “Para os
efeitos desta lei, consideram-se sucessores do autor seus herdeiros até o segundo grau, na
linha reta ou colateral, bem como o cônjuge, os legatários e os cessionários”.

I) Limitações do contrato de cessão de direitos autorais

27. Os direitos autorais adquirem-se, originariamente, com o simples ato de criação da


obra quando exteriorizada. Marcel Waline (“L’Individualisme et le Droit”, Paris, 1949, pág.
155) chega a sugerir que tais direitos sejam chamados “direitos da criação”, considerando
que o verdadeiro fundamento jurídico de todos eles é o ato-fato criador de “um valor

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Contratos de direitos autorais

econômico de interesse social”. Esse jurista neles inclui, no entanto, os chamados “direitos
industriais”, os “direitos comerciais”, que ele toma por espécies de que os “direitos da
criação” seriam o gênero. A obra, que é aquele “valor econômico de interesse social”,
verdadeira “coisa incorporal”, como pretende Tullio Ascarelli (v. notadamente “Teoria da
Concorrência e dos Bens Imateriais”), admite relações de compra e venda que se perfazem
através do contrato de cessão pura e simples, com a mais ampla e irreversível transmissão
dos direitos a ela concernentes, tanto quando o “corpus mechanicum” a encerre por inteiro
(como nas artes plásticas), como quando o “corpus mysticum”, apto às mais variadas
formas de reprodução, é que é o objeto do negócio.

28. Dadas as características de tais direitos, todavia, que os afastam do conceito de


propriedade comum, e considerando que a exploração da obra deriva diretamente do
progresso da tecnologia e, mais, que essa exploração é totalmente atribuída, com absoluta
exclusividade, ao autor, o contrato de “venda” com a mais ampla cessão dos direitos
autorais sofre, naturalmente, certas limitações: limita-se, primeiramente, aos expressos
direitos cedidos; depois, ao tempo de duração de tais direitos, e, finalmente, ao próprio
direito moral do autor.

29. a) Quanto aos direitos cedidos, a limitação se faz com relação aos modos de exploração
da obra. Genericamente, duas são as formas de explorar a obra de engenho, conforme seja
sua natureza, tratando-se de obra literária: por reprodução e por representação. Tanto a
reprodução, como a representação, por sua vez, também podem dar-se por modos tão
diversos e imprevisíveis como o próprio desenvolvimento tecnológico, de tal forma que
somente aqueles conhecidos no momento da celebração do contrato é que podem,
validamente, ser objeto de cessão.

30.A reprodução consiste na fixação sonora ou visual da obra, que permite sua
comunicação indireta ao público. É a cópia da obra, no sentido anglo-americano de tais
direitos (“copyright”), feita num documento escrito ou impresso segundo um sistema de
notação inteligível (cf. Eugen Ulmer, in “Le Droit d’Auteur”, revista de fevereiro de 1972,
pág. 47). Esse também é o sentido da alínea 1 do art. 9.º da Convenção de Paris, conforme
o Ato de Estocolmo. É suficiente que a obra possa tornar-se perceptível aos sentidos por
intermédio de um meio mecânico, de maneira indireta. De tal forma, a reprodução
constitui-se na primeira fixação da obra, dispensando-se uma produção de certa
quantidade de exemplares dessa cópia. Não sendo efêmera essa fixação, há uma
reprodução no sentido técnico, para efeitos de direitos autorais. Por esse motivo é que a
Áustria, conforme relatório feito por Walter Dillenz (in “Revue International du Droit
d’Auteur”, junho de 1971, pág. 62) encarregou um Grupo de Trabalho para rever a sua
legislação sobre direitos autorais, entendendo esse grupo que a gravação de dados em
memória de computador eletrônico é verdadeira reprodução da obra, e, por isso,
dependerá de prévia autorização do autor, não obstante se possa alegar que tais registros
sejam feitos, em princípio, para uso privado. Por isso também é que o “video tape” de jogos
de futebol é verdadeira reprodução de obra criada de improviso nos campos de futebol,
muito embora ninguém, até hoje, tenha atentado para o fato, no Brasil (na Itália, nas
vésperas das Olimpíadas de 1960, o assunto suscitou polêmica, conforme nos conta
Marcello Berluchi, na revista “Corti de Brescia e Venezia”, Giuffrè, Milão, vol. XII, de 1959,
pág. 22). Neste particular, a Lei n. 5.988, de 1973 (arts. 100 e 101), instituiu o que
chamou “direito de arena”, que, todavia, não se limita a regular a utilização econômica da

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Contratos de direitos autorais

fixação do espetáculo, mas o faz também quanto à sua própria transmissão, o que é alterar
um pouco os conceitos de “direitos conexos” (representação) e esquece-se de outro
fundamento mais adequado para o fato que é o direito à própria imagem.

31. Tantas sejam as formas pelas quais uma obra pode ser reproduzida, tantas deverão ser
as menções expressas no contrato de cessão, posto que apenas essas explicitamente
consignadas é que integrarão o patrimônio do cessionário, permanecendo no do autor
todas as que não figurarem no rol do contrato. Se este disser que a cessão se faz para que
a reprodução se dê por impressão gráfica, não poderá o cessionário reproduzir por
reprografia, fotografia, cinematografia etc. Dentro, porém, da reprodução gráfica, o
cessionário gozará da mais ampla liberdade de utilização econômica da obra, salvo se o
contrato expressamente fizer alguma restrição.

É principio tranqüilamente aceito pela doutrina, e que integra certas legislações, que o
autor conserva para si, com toda a exclusividade que a lei lhe confere, todos os direitos que
não estejam expressamente mencionados no contrato. E não será necessário esforço
muito grande de interpretação para se encontrar esse princípio em nossa lei sobre direitos
autorais. A lei italiana de 1941, porém, deixa isso claro no seu art. 19, dizendo: “Os direitos
exclusivos, previstos nos artigos precedentes, são independentes entre si. O exercício de
um deles não exclui o exercício exclusivo de cada um dos demais. Esses direitos terão
como objeto a obra em seu conjunto e em cada uma de suas partes”. Aplicando tal norma,
decidiu a Corte de Cassação italiana, em 2.7.1953, como nos informa Mário Fabiani (“Il
Diritto d’Autore nella Giurisprudenza”, Cedam, Pádua, 1972, pág. 62): “Invero, il diritto di
autore è un complesso di diritti e facoltà i quali fatta eccezione del cosí detto diritto morale
di paternità che, essendo indissolubilmente legato alla personalità intellettuale dell’autore,
è per sua natura inalienabile e imprescrittibile – possono ben formare oggetto di distinte
convenzioni private, o meglio, di distinti contratti di cessione, a meno che non si tratti di
facoltà che siano “ex re ipsa” conseguenziali o necessariamente aceessorie, indiscutibile
essendo il contenuto economico del diritto alla diffusione, come di quelli alla pubblicazione
e alla vendita dell”opera”.

Por isso é que repugna aos meios jurídicos do mundo inteiro a evolução da chamada teoria
da indivisibilidade, atrás referida, que ganha corpo nos Estados Unidos da América,
segundo a qual o autor poderia até mesmo ceder direitos que ainda não ingressaram em
sua esfera de interesses, por não serem de exercício viável no tempo da celebração do
contrato, em face da não existência do meio técnico da reprodução da obra (como no caso
da televisão que atraiu para si contratos de divulgação e exploração de obras
cinematográficas).

32. Quanto à representação, que visa, fundamentalmente, “a comunicação direta da obra


ao público”, conforme definição fornecida pelo art. 11 do “dahir” n. 1.69.135, de
29.7.1971, do Marrocos, é a mais antiga forma de divulgação, dela se originando os
chamados “direitos vizinhos” ou “direitos conexos”, que beneficiam os artistas intérpretes
ou executantes.

O contrato de representação, no Brasil, mereceu especial acolhida, no tocante à


representação dramática, embora, com muita parcimônia, nos arts. 1.359 a 1.362 do CC
nada regulando, porém, quanto ao contrato em si mesmo, do ponto-de-vista de direitos

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Contratos de direitos autorais

autorais propriamente ditos, ao lado de específica regulamentação conferida pela


legislação trabalhista.

Dada a própria natureza da representação, os contratos que lhe digam respeito não podem
ser celebrados como atos de disposição, isto é, não pode o autor, por seu intermédio,
desfazer-se de seus direitos autorais de representação da obra. Tais contratos constituem
verdadeiros atos de administração, tendo em conta que a representação não passa de uma
forma de exercício do direito de comunicação direta da obra ao público. Tal comunicação,
porém, não se dá com aquela alienação que envolve tanto os contratos de edição como, os
de cessão de direitos autorais.

Como ato de administração, o contrato de representação não implica a autorização para


publicação da obra através de qualquer modo de reprodução, visto que, por ele, o autor
não se despoja de seus direitos de exploração da obra por via de reprodução. “O autor
autoriza a utilização de sua obra por um modo de exploração determinado, num território
limitado e por um tempo, em princípio, indeterminado, mas que não excede jamais, de
fato, alguns anos”, afirma André Schmidt, no seu “Les Sociétés d’Auteurs-SACEM-SACD –
Contrats de représentation” (Paris, 1971, pág. 70). O contrato de representação de uma
obra, através de uma encenação teatral, não autoriza sua representação televisual, ou
cinematográfica, nem sua fixação em discos fonográficos (o que já o tornaria um contrato
misto de representação e de reprodução).

O autor que autoriza determinada forma de representação não se torna um cedente dessa
mesma forma de representação; apenas concede uma licença para que o seu direito de
comunicar diretamente a obra ao público seja exercido por outrem, não raro mais
habilidoso para essa tarefa.

De tal forma é restrita ao que expressamente se contém no contrato, a exploração


econômica de uma obra literária, artística ou científica, que o autor, mesmo encenando ele
próprio sua peça, não se despoja de seus direitos autorais de representação. A Propósito,
é recente uma decisão do nosso STF, no recurso extraordinário n. 68 190, de 9.4.1973,
originário do Estado do Maranhão, em que esteve envolvido o nome do conhecido
humorista José Vasconcelos, cuja ementa reza: “O fato de a peça teatral ter sido encenada
pelo próprio autor, como ator e executor, mediante remuneração por espetáculo, não
exclui seu direito correspondente à propriedade literária e musical, se o contrário não foi
estipulado”. Nesta hipótese, o autor reúne em si mesmo duas qualidades jurídicas: a de
autor, que detém os direitos de exploração de sua obra (por reprodução ou
representação); a de artista intérprete, que deve ser remunerado por sua interpretação.
Tamanha é a independência existente entre tais direitos, que não se pode estender a uma
concessão os efeitos de uma cessão ou vice-versa. Mesmo um contrato de edição, ou de
cessão de direitos autorais de obra dramática não confere ao beneficiado o direito de
representá-la, ainda quando o executante seja o próprio autor da obra em questão, salvo
se isso se der em local privado, sem haver pagamento de intérpretes, ou de ingresso no
recinto.

33. b) O contrato de cessão de direitos autorais limita-se, também, quanto ao tempo de


duração. Não obstante esse contrato transfira para o cessionário, de forma irretratável e
irrevogável, todos aqueles direitos de reprodução expressamente previstos nele, essa

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Contratos de direitos autorais

transmissão de direitos tem duração limitada no tempo, visto que tais direitos são
protegidos pela lei apenas durante determinado período que, via de regra, se estende a
uma certa quantidade de anos após a morte do autor. A cessão, portanto, será válida
apenas enquanto houver proteção dos direitos autorais. No Brasil, tal proteção vai a 60
anos após a morte do autor, se os sucessores deste não forem o cônjuge, os pais ou seus
filhos. A maioria dos países, porém, concede tal proteção até 50 anos após a morte do
autor, havendo os que a defiram até 80 anos, como a Espanha. No Brasil, se o autor deixar
cônjuge, pais ou filhos, estes gozarão da proteção legal enquanto viverem, disposição esta
enxertada em nosso Código Civil (LGL\2002\400) pela Lei n. 3.447, de 23.10.1958, que o
eminente Pedro Vicente Bobbio chamou de profanação, por destruir aquele “monumento
de sabedoria e de lógica jurídica”, não trazendo, em verdade, beneficio aos autores RT
281/34). O que está mantido na atual lei (arts. 29 e segs.).

Essa duração limitada dos direitos autorais é que leva os tratadistas a repelirem a
conceituação da nossa matéria como direito de propriedade, tendo em conta que esta, por
natureza, é perpétua, em princípio.

No entanto, a limitação quanto ao tempo dos contratos de cessão, somente poderá


referir-se à própria limitação legal. Se o contrato contiver qualquer limitação de tempo, o
autor não celebrou nem quis celebrar um verdadeiro contrato de cessão, visto que essa
limitação indicará, claramente, sua intenção de conservar em seu patrimônio a titularidade
desses direitos, para dela usar quando estiver expirado o prazo contratual. E, por isso,
apesar da nominação dada ao contrato e a despeito das demais cláusulas dele, tal acordo
será mera concessão, mero contrato de edição, estando evidente que as partes tiveram por
objeto a exploração temporária da obra, o que repugna ao conceito de cessão pura e
simples.

34. c) Finalmente, o direito moral do autor também limita os efeitos do contrato de cessão.
Por certo, quando o autor transfere para o cessionário o seu direito de exploração
econômica da obra, por via de reprodução, não está transmitindo – salvo previsão
expressa no próprio contrato – o direito que lhe assiste de traduzir a obra, ou de divulgá-la
em outros países. Assim, a cessão feita para reprodução em determinada língua somente
produzirá efeitos para essa língua e, mais precisamente, no país explicitamente indicado
no contrato. (Não obstante a Lei n. 5.988, de 1973, considere, no art. 30, n. II, o direito de
tradução como patrimonial, na verdade ele é um direito moral, visto que não há tradução
que não implique a alteração da obra, especialmente na adaptação para os modismos da
língua em que será vertida).

Essa divisibilidade da obra, que não se desnatura por isso, é outra nota que a distingue,
claramente, da propriedade comum: um proprietário de imóvel, quando o vende, transfere
para o comprador todos os seus direitos sobre o bem, não conservando para si qualquer
espécie de faculdade de explorá-lo, visto que a propriedade imobiliária, como bem jurídico,
é indivisível, como são inseparáveis dele todas as maneiras atuais e futuras de sua
exploração, por mais imprevisível que possa ser a evolução tecnológica de uma exploração
dessa natureza. A futura descoberta de jazida mineral, em terreno vendido inicialmente
para uma atividade pastoril, não opera qualquer conseqüência no negócio da compra e
venda, não assistindo ao alienante nenhum direito quanto àquela futura exploração
mineral.

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Contratos de direitos autorais

No que se refere aos direitos autorais, todavia, isso não ocorre: o autor continuará detentor
de todos os direitos de exploração econômica não previstos no contrato, ou que não sejam
sequer previstos no atual estado da tecnologia.

E, por último, a cessão do direito autoral não transmite ao cessionário, salvo pacto
contrário, devidamente consignado no instrumento de cessão, qualquer direito de
modificar a obra, de resumi-la, de ampliá-la, de atualizá-la, devendo o cessionário
mantê-la na mesma integridade com que a recebeu. E, de outro lado, o autor detém para
si, mesmo no silêncio do contrato, todos esses direitos de alterar sua própria obra,
especialmente quando isso possa influir direta ou indiretamente em sua honra e reputação
de autor. Essa reserva de que goza o autor, porém, esbarra no direito adquirido pelo
cessionário, que aquele há de respeitar, indenizando este, quando o exercício de tal
reserva acarretar, para o cessionário, prejuízos patrimoniais. Isso era o que previa o art.
659, segundo período do “caput”, e art. 1.350, e parágrafo, do CC, e que agora, está mais
explicitamente regulado pelo art. 25 (ns. V e VI), e § 2.º, da Lei n. 5.988, de 1973.
Tratando-se, porém, de artigos jornalísticos, goza a redação de uma certa autonomia para
modificar a obra original, conforme estuda Luigi Filippo Paolucci, na “Rivista di Diritto
Civile”, n. 2 de 1970, pág. 194 e segs.: “I giornali sono considerati opere collettive e il
potenziale contrasto fra gli autore degli articoli e le redazioni è risolto a completo vantaggio
di queste ultime. Negli articoli da pubblicare fírmati, sono ammesse tutte le modificazioni di
forma richieste dalla natura e dai fini del giornale, senza pregiudizio del diritto morale di
autore. Nel caso di contributi anonimi poi, ove l’esigenza di conformità alle linee direttive
del giornale è molto sentita, la libertà di adattamento si estende alla riduzione e
soppressione di parti”.

J) Distinções entre o contrato de edição e o de cessão de direitos autorais

35. Sendo, como são, essencialmente diversos, os dois tipos de contrato, aqui rapidamente
examinados, hão de produzir efeitos jurídicos distintos.

Resultam esses efeitos, evidentemente, das obrigações que as partes assumem nesses
instrumentos, em decorrência das quais diversos são seus próprios e recíprocos direitos
(“jus et obligatio sunt correlata…”).

“Com o contrato de edição o autor transfere a um editor o exercício de uma parte de seu
direito de autor, que é a faculdade de impressão e de venda, conservando, no entanto, a
titularidade de todos os seus direitos. Quando, em vez, aliena para outrem, de forma
definitiva e sem limites, todos os seus direitos de utilização econômica da obra, por uma
remuneração “una tantum”, pratica uma verdadeira e propriamente dita venda, pela qual
a titularidade do direito patrimonial do autor é transferida para outrem, permanecendo o
autor unicamente titular dos direitos morais inalienáveis”, afirma Vito Mangini (ob. cit.,
pág. 352), informando, ainda, que a “substancial diversidade dos dois contratos, de edição
e de venda, já fora analisada e reconhecida com autoridade, há muito tempo, por De
Gregório (“Contratto di Edizione”, Roma, 1913), e mais recentemente, por Grego (“I Diritti
sui beni immateriali”, Turim, 1948)”.

36. Pelo contrato de cessão, o cedente obriga-se a entregar a coisa (bem incorporal, como
entende Tullio Ascarelli, em sua obra citada antes, acompanhado de autorizada doutrina),
ao cessionário, transferindo seus direitos patrimoniais a este. O cessionário, por seu turno,

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Contratos de direitos autorais

assume a responsabilidade de pagar o preço avençado, não importando a forma pela qual
o fará. Mesmo que esse preço venha a ser estipulado com base em resultados de vendas da
obra, o contrato não deixará de encerrar uma total alienação de todos os direitos
patrimoniais nele referidos, hipótese em que, por inadimplência do cessionário em pagar
ao cedente, este poderá pleitear e obter a resilição do contrato (tal como acontece com
qualquer compra e venda, em que o preço não tenha sido pago como previsto no ato da
transmissão da propriedade). As normas do contrato de compra e venda, adaptadas em
razão da especial natureza do bem a que se refere o tipo em estudo, têm plena aplicação
ao instrumento de cessão de direitos autorais, motivo por que o nosso Código Civil
(LGL\2002\400) não o contemplou como espécie nominada, por ter incluído tais direitos
entre os direitos reais e a atual lei sobre o assunto limita-se a poucas normas específicas.
Efetivada a tradição desse bem (em geral representado pelos originais da obra, podendo,
no entanto, ter outra forma existencial, como fitas gravadas etc.), pode o alienante exigir
o preço, completando-se a execução do contrato com o pagamento respectivo e a
conseqüente quitação. Nenhuma outra relação jurídica permanecerá vigorante entre as
partes, salvo, evidentemente, aquelas que possam nascer (futuras, portanto) de vícios,
como a evicção, por exemplo. Serão, no entanto, novas relações, que nascem “extra
pactum”, e não decorrem diretamente do próprio contrato de cessão em si mesmo, como
acontece, de resto, com qualquer outro contrato de cessão de bens, ou de direitos.

O cessionário, por seu lado, não assume qualquer obrigação que não seja a de pagar o
preço estipulado, além, é claro, de estar obrigado, em razão da peculiaridade do bem que
adquire, a respeitar a inteireza da obra, em obediência àqueles mencionados direitos
morais do autor, que lhe não são transferidos.

Paul Roubier, examinando hipótese análoga, referente às patentes de invenção, afirma que
“as principais obrigações do licenciado são: de uma parte, a obrigação de explorar; de
outra parte, a obrigação de pagar uma remuneração ao titular da patente”, acrescentando
que “a concessão de uma licença não atenta ao direito de monopólio em si mesmo; o
licenciado não é posto no lugar do titular da patente, como se daria, se fosse um
cessionário. E tira a conclusão de que, no contrato de licença, paralelo ao nosso Contrato
de edição, há um “alto grau de caráter positivo, no sentido de que o titular da patente
concede o gozo de um direito de exploração que faz parte do conteúdo econômico da sua
patente” (“Le Droit de Propriété Industrielle”, Recueil, Sirey, Paris, 1954, tomo II/262 e
seg.).

E essa noção de “concessão”, como característica do contrato de edição, de caráter


altamente positivo, é a nota predominante na distinção entre os dois contratos: o de edição
apenas concede ao editor a possibilidade de gozo dos direitos de autor. O contrato de
cessão que, como o de compra e venda, é de natureza amplamente negativa, no sentido de
que o comprador pode opor sua compra, sua aquisição, a todos, inclusive ao próprio
vendedor, não opera uma mera transferência de faculdade, mas transmite o próprio direito
que, evidentemente, encerra essa faculdade de utilização econômica da obra.

O cessionário assume, integralmente, a posição de cedente, passando a ser o verdadeiro


titular do direito de ação, contra eventuais turbadores de sua titularidade, ou contrafatores
da obra, que passou para o seu patrimônio, discutindo-se, apenas, se ele assumiria esse
papel quando houvesse violação do direito moral.

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Contratos de direitos autorais

Com o contrato de edição, o editor assume, como obrigação essencial, a de publicar (ou de
explorar a obra, como afirma Paul Roubier, quanto às patentes) ou de fazê-la publicar,
enquanto o autor adquire o direito de ver sua obra divulgada. No contrato de cessão, pode
o cessionário deixar de publicar a obra, que esta obrigação não é inerente a esse tipo de
contrato, o qual, no entanto, poderá estipular, em suas cláusulas, tal obrigação, como
condição de sua perfeição.

L) Conclusões

37. Dadas as conseqüências absolutamente diferentes que nascem da celebração de um ou


de outro tipo de contrato, devem as partes procurar redigi-los com o máximo de cuidado,
procurando prever todas as possibilidades técnicas de exploração da obra, a fim de que não
venham, no futuro, sentir-se prejudicadas, dando origem a demoradas e dispendiosas
contendas judiciais que não obstante a reconhecida inteligência e dedicação de nossos
magistrados, nem sempre logram alcançar a efetiva justiça buscada pelos demandantes.

Se para o autor há inconvenientes expressivos em que firme um contrato de cessão pura e


simples de direitos autorais, visto que, assim, se despoja de toda a possibilidade de
exploração econômica de sua obra, quanto aos modos de exploração previstos no
respectivo instrumento de cessão, para o cessionário há sempre o risco de estar adquirindo
obra que lhe não traga o suficiente rendimento, não retribuindo, dessa forma, o capital de
sua empresa.

Se para o editor há sérios inconvenientes em firmar um simples contrato de edição, visto


que poderá (se tal instrumento não lhe der ampla cobertura quanto a edições futuras)
estar lançando um autor desconhecido, para que outro editor, futuramente, colha os frutos
desse lançamento – o autor também correrá o risco da empresa, visto que, via de regra,
tais contratos são feitos para remunerar o autor com base nos resultados das vendas, de
tal forma que há, mesmo, quem diga que tais contratos encerram verdadeiras sociedades,
entre autores e editores.

Parece aplicar-se, na hipótese, o chavão político: “cada obra deverá ter o contrato que
merece”, não obstante André Huguet (ob. cit., pág. 27) afirme: “O contrato de cessão pura
e simples é mais grave, mais perigoso para o autor, que o contrato de edição: em cada um
desses contratos, o autor subscreve as mesmas obrigações, sem ter, em contrapartida, as
mesmas vantagens, pois o contrato de cessão pura e simples não acarreta para o
cessionário a obrigação de publicar”.

E, em verdade, para o autor, não poderá haver maior prejuízo do que permanecer inédito.

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