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Paloma Vidal e as mulheres mais ao sul,

mais próximas de si mesmas


Mais ao sul. Em A duas mãos, livro que recebeu boas
resenhas de Beatriz Resende e Flávio Carneiro,
VIDAL, Paloma. as personagens femininas estão em destaque,
mulheres que tentam sobreviver em um mundo
Rio de Janeiro: Língua Geral, 2008. 128 p. adverso, quase sempre controlado por homens
ausentes, pouco preocupados em compreen-
dê-las. Como reação a esse abandono afetivo,
a esse distanciamento, surge um mecanismo
compensatório: a construção de um cenário
Escrever qualquer um consegue. Raros são que nunca se tornará real, mas que ameniza o
aqueles que produzem literatura de qualidade. desamparo (“Contradança”, “A ver navios”, “A
Isto é, conseguem dominar a linguagem, obtêm duas mãos”).
a contenção exata no desenvolvimento do Mais ao sul segue esse projeto, com vários
enredo e, sobretudo, o poder de impacto de acréscimos. Procurando retratar mulheres
um golpe bem encaixado no queixo do leitor. desenraizadas, habitantes de um mundo feérico
Cortázar comparava a literatura com o boxe: e que, por inúmeros motivos, proclamam que a
no romance, o escritor vence por pontos; no felicidade reside mais ao norte, Paloma Vidal,
conto, por nocaute. com coração pulsando mais ao sul, vai tecendo
Paloma Vidal (nascida em Buenos Aires, suas narrativas com tranquilidade, certa de que,
em 1975, e vivendo no Brasil desde os dois anos no momento adequado, haverá de atingir o
de idade) é uma dessas raras exceções. Os ponto exato, expor a fratura e a dor.
excelentes contos de A duas mãos (Rio de Na primeira parte do livro, o longo e
Janeiro: 7Letras, 2003) mostraram um pouco do dramático “Viagens” revela como esses temas
seu talento – confirmado agora com a estão à flor da pele, a sensação de que falta
publicação de Mais ao sul (Rio de Janeiro: Língua um chão para plantar raízes, as vidas
Geral, 2008). estraçalhadas pelas complicações da política

622 Estudos Feministas, Florianópolis, 18(2): 607-623, maio-agosto/2010


latino-americana: “Esse navio vai cruzar o Embalada pela nostalgia das delícias que
Atlântico até Barcelona, onde nossa amiga vai deixou de provar, abre as portas da casa e
morar, a milhares de quilômetros de distância derruba as fronteiras demarcadas pelo proibido.
de seu país, onde seu filho caçula foi seqüestrado Os contos de Mais ao sul, histórias repletas
e assassinado pelo regime militar”. A narradora, de aflição, relatos de mulheres que, de uma
que procura conter a ansiedade entre tantos forma ou de outra, aguardam pelo tempo de
escombros, se ocupa em relatar a recuperação partir ou de encontrar a si mesmas, constituem
de parte da história familiar que nunca compar- um daqueles momentos literários em que a voz
tilhou. Ao mesmo tempo, com as entranhas feminina se pronuncia com clareza, sem reter
corroídas pela tristeza, sabe que, independen- sentimentos, sem fazer concessões. Ao mesmo
temente do que possa descobrir, é preciso tempo, como que a lembrar as duas faces da
sobreviver no exílio constante, procurando por mesma moeda, em alguns momentos Paloma
um lugar onde possa se sentir em casa. Vidal reatualiza o mito de Cassandra, vidente
Os outros contos são mais curtos, poucas condenada a prever um futuro em que ninguém
páginas. Os mais significativos são três. Em “A acredita.
aula de tango”, os vínculos não nomeados Por último, cabe destacar uma caracterís-
estabelecem, através do interdito, a sensação tica da prosa de Paloma Vidal: a publicação
crescente de que é a falta que completa o de várias versões de seus contos, muitas vezes
destino dos personagens. “O retorno” relata/ suprindo parágrafos, alterando pequenos
reata a vontade de preencher esses vazios (“Deu detalhes, lapidando o texto. Exemplos desse
um passo adiante erguendo a mala e equilibrou- “work-in-progress” são “Desassossego” que,
se na soleira da porta, num limiar entre dois ligeiramente modificado, foi publicado com
mundos”), a luta sem quartel entre o desejado e outro título (“A espectadora”) na antologia A visita
o possível, o deslocamento entre os dois aero- (São Paulo: Barracuda, 2005); “Viagens”, que
portos construindo uma ponte entre o passado sofreu grandes mudanças depois de publicado
e o futuro. “Desassossego” é uma narrativa mais inicialmente em Paralelo – 17 contos da nova
tensa, intensa, a história de uma mulher que põe literatura brasileira (Rio de Janeiro: Agir, 2004);
“a mesa para o seu fantasma”, aceitando o “Mundos paralelos”, publicado em 25 mulheres
embate contra as forças que a ameaçam e, que estão fazendo a nova literatura brasileira
ao mesmo tempo, a acariciam: “Andou por (Rio de Janeiro: Record, 2004), que se transfor-
várias horas, sem vontade de se proteger, e só mou em “O retorno”.
voltou para casa quando seus pés o exigiram. Raul J. M. Arruda Filho
Naquela noite, esperaria seu fantasma como se Universidade Federal de Santa Catarina
espera um convidado, uma visita desejada”.

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