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DIÁLOGOS ENTRE CARTOGRAFIA E ARTE:
DESCONSTRUÇÕES CARTOGRÁFICAS NA
OBRA DE JORGE MACCHI
Resumo: O presente artigo tem como objetivo reforçar a possibilidade de diálogo entre cartografia e arte
contemporânea. Pensando nos mapas artísticos como objetos que ampliam a percepção espacial e superam as
visões materiais e objetivas do espaço, busca-se compreender como esses mapas transmitem aspectos intangíveis
da relação humana com o espaço geográfico. A partir da análise de obras selecionadas do artista plástico argentino
Jorge Macchi pretende-se uma reflexão teórico-metodológica sobre a aproximação entre o conhecimento
geográfico e os mapas produzidos pela perspectiva das artes plásticas, contribuindo assim para discussões no
campo da geografia cultural.
Palavras-chave: Cartografia; Arte Contemporânea; Jorge Macchi; Mapas.
Até aqui os teóricos utilizados nos Figura 1. Mapa de Lopo Homem II. Adriana
Varejão (fonte: site da artista)
forneceram argumentos para entender
como a produção artística tem se Diante do exposto, o interesse dos
interessado pela linguagem cartográfica e artistas no mapa parece estar no seu poder
como a percepção espacial se diferencia no comunicativo, representacional e
fazer cartográfico científico e no artístico. universal. A desconstrução cartográfica
Mas o que os artistas têm a nos dizer pelos artistas parece propor um jogo de
sobre isso? símbolos que confunde nossas orientações
A renomada artista brasileira e nos liberta de uma única interpretação
Adriana Varejão comenta a presença do do espaço. Ao extrapolar o rigor e a
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precisão da cartografia científica, os mapas intenção era ampliar as possibilidades de
artísticos ampliam as possibilidades de interpretação das obras, com uma
interpretação e reinventam a própria interferência mínima da intencionalidade
forma como percebemos o espaço. do artista na construção da mesma. Ou
A questão que permanece é como a seja, buscou-se um método que valorizasse
Geografia enquanto ciência pode utilizar uma troca entre obra/artista e
os mapas artísticos como instrumentos espectador/pesquisador.
que nos auxiliam na compreensão do Esse tipo de abordagem foi
espaço. Como interpretar esses mapas? possibilitado através da metodologia
Quais os caminhos metodológicos apresentada por Hawkins (2010) de
possíveis para essa interpretação? Em compreensão da arte, por parte do
seguida tentaremos refletir sobre essas espectador, não apenas como um ato
questões apresentando algumas intelectual, mas também como experiência
contribuições à partir da análise da obra sensorial corpórea, ou seja, a partir do uso
de Jorge Macchi. do corpo como “instrumento de pesquisa”.
Influenciada sobretudo pelo
Notas teórico-metodológicas ________ conceito de “Argument of the Eye” de
Daniel Cosgrove (1984) e pela
Os estudos associados à iconologia fenomenologia de Merleau-Ponty, Harriet
e a semiótica ou a filosofia pós- Hawkins, professora da Royal Holloway,
estruturalista e a hermenêutica são alguns Universidade de Londres, realiza uma
dos exemplos que nos direcionam para o análise numa instalação da artista plástica
entendimento dos materiais cartográficos. Tomoko Takahashi. Hawkins (2010)
Conforme mencionado anteriormente, a descreve as sensações corpóreas e as
busca pelo método para a análise das obras trocas intersubjetivas entre o
de Jorge Macchi se deu posteriormente ao sujeito/espectador e a obra/artista, sem
contato com as mesmas. Depois de uma desconsiderar a história cultural do
tentativa de aproximação com a observador.
Hermenêutica de Hans-Georg Gadamer, Dessa maneira a instalação de arte
partiu-se em busca de outra abordagem é investigada de forma imersiva através da
metodológica, já que o objetivo não era o sensibilidade espacial da pesquisadora, que
de encontrar uma verdade em relação aos explora o relacionamento entre o corpo
objetivos do artista. Ao contrário, a que ocupa os espaços e os objetos que os
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compõem, criando uma “experiência da por John B. Harley (1989) no artigo
experiência” (HAWKINGS, 2010). A Deconstructing the Map. A partir da
pesquisadora pontua que essa prática não filosofia Derridiana, Harley assume a
objetiva negar os esforços da iconografia e cartografia como linguagem e os mapas
da semiótica sobre as obras1, mas explorar como textos gráficos, aplicando essa
as relações corpóreas com a arte. Apesar perspectiva dentro dos estudos da história
das obras que serão analisadas a seguir da cartografia.
não estarem relacionadas à arte de Harley (1989) também encara os
instalação, essa “metodologia incorporada” mapas como representações de poder,
(HAWKINGS, 2010) parece ir de recorrendo a outro pós-estruturalista, o
encontro as sensações despertadas no filósofo francês Michel Foucault. Ao
contato com as obras de Jorge Macchi. assumir que a natureza dos mapas está
A autora destaca que o método relacionada a representações de poder e
proposto tem sido pouco explorado dentro assumindo os mesmos como textos
da Geografia. Segundo Hawkins (2010), gráficos, Harley (1989) critica a ênfase na
outras áreas do conhecimento tem objetividade dos métodos científicos
explorado o valor dessas “metodologias tradicionais da cartografia. É nessa mesma
incorporadas”. Os mapas de Macchi direção que pretende-se caminhar aqui.
possibilitaram uma oportunidade para
ampliar o uso do método proposto em A cartografia sensitiva de Jorge
estudos de geografia cultural. Entretanto Macchi ___________________________
é importante destacar que o uso da
metodologia incorporada de Hawkins não O artista plástico Jorge Macchi
descarta o atravessamento de outros nasceu na capital argentina em 1963 e
métodos. Assim como a arte dispensa o estudou na Escuela de Bellas Artes de
rigor científico para a representação do Buenos Aires tornando-se um dos grandes
espaço, a interpretação da mesma como expoentes da arte contemporânea latino
material de pesquisa geográfica requer americana. O trabalho de Macchi é
mais flexibilidade em relação ao método. marcado pela maneira como conjuga
Outra perspectiva fundamental diversas linguagens e recursos como
presente no decorrer deste ensaio é noção música, vídeo, instalações, pinturas e
de desconstrução do filósofo pós- desenhos. Diversas sensações são
estruturalista Jacques Derrida, articulada provocadas e alcançam o espectador
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através desses recursos e de temas impressões do artista pelos lugares
cotidianos da vida urbana. percorridos.
Como já mencionado, o mapa tem As informações sobre as obras que
papel de destaque entre os materiais serão analisadas adiante foram obtidas
utilizados pelo artista. Como geógrafo, através do site oficial do artista e do livro
diante da exposição, me senti desafiado a Music Stand Still (2011). A análise que
pensar a cartografia e seus produtos veremos à seguir teve como fontes
através da visão de um artista plástico. As informações recolhidas durante a
abstrações espaciais, simbólicas e exposição, a percepção pessoal sobre as
sentimentais de Macchi, instigam uma obras e diálogos com amigos presentes. A
reflexão sobre a possível desconstrução da escolha de pesquisar o menor número de
cartografia tradicional pela arte informações possíveis sobre a obra partiu
contemporânea. A linguagem cartográfica da necessidade de conversar com as obras
na obra de Macchi abre possibilidades com o menor número de interferências.
para não só descrever ou transpor o Essa escolha metodológica coincidiu
espaço em mapas, mas para a criação de posteriormente com a “metodologia
cartografias subjetivas e sentimentais, que incorporada” de Hawkins (2010)
revelam aspectos intangíveis do espaço. mencionada na seção anterior.
A aproximação com a obra do Antes de iniciar é relevante
artista se deu a partir de uma viagem à destacar a relação do artista com o seu
cidade de Buenos Aires, capital da lugar. Assim como o conceito geográfico
Argentina em 2016. Em visita ao Malba, de paisagem estava intimamente
Museo de Arte Latinoamericano de relacionado com a produção artística dos
Buenos Aires, se encontrava em exposição séculos XVI, XVII e XVIII, podemos
a mostra Perspectiva. Sem conhecimento verificar na arte de Jorge Macchi uma
prévio da obra do artista, a primeira aproximação com o sentido de lugar.
impressão da mostra foi a de um mapa de Sobre Buenos Aires, seu lugar de origem,
Buenos Aires de aproximadamente três Macchi nos diz:
metros de altura, com alguns percursos
traçados e alguns locais marcados por Buenos Aires es además la ciudad de
pontos, que eram associados a uma série la cual surgen muchas de mis
de materiais como fotografias, objetos e imágenes y obsesiones. No es una
“Meadia Map Watch” analisava mapas COSGROVE, Denis. Cultural Cartography: Maps
and Mapping in Cultural Geography. In: Annales
através de diversos opostos como de Geográphie. N. 660-661. 2008/2.
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