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ISSN 1413-389X Trends in Psychology / Temas em Psicologia – 2015, Vol.

23, nº 3, 635-647
DOI: 10.9788/TP2015.3-09

Homofobia na Escola: As Representações


de Educadores/as

Elaine de Jesus Souza1


Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade Federal de Sergipe,
São Cristóvão, SE, Brasil
Grupo de Pesquisa Gênero, Sexualidade e Estudos Culturais da Universidade Federal
de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil
Joilson Pereira da Silva
Núcleo de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade Federal de Sergipe,
São Cristóvão, SE, Brasil
Claudiene Santos
Departamento de Biologia da Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil
Líder do Grupo de Pesquisa Gênero, Sexualidade e Estudos Culturais da Universidade
Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil

Resumo
A análise das representações sociais dos/as docentes acerca da homofobia constitui um caminho promis-
sor para estimular a reflexão e a busca de conhecimentos mais coerentes acerca da amplitude dessa vio-
lência que, de modo sutil ou manifesto, ocasiona sofrimentos na vida de jovens que não se enquadram
no padrão heteronormativo. Portanto, essa pesquisa qualitativa teve como principal objetivo analisar as
representações sociais de educadores/as da educação básica acerca da homofobia na escola. Para tanto,
foi empregado o método de análise de conteúdo categorial temática e o instrumento constituiu-se de um
questionário e entrevista semiestruturada realizados com sete docentes do ensino fundamental maior.
Os resultados obtidos revelaram que as representações dos/as docentes acerca da homofobia englobam
uma variedade de pensamentos, crenças, ideias pré-estabelecidas e contradições. Pois, além de con-
cepções reducionistas, que definem a homofobia somente como uma aversão ou preconceito contra os
homossexuais, sobretudo, devido à carência dessa temática na formação inicial e continuada, também
houve algumas concepções mais amplas, que indicam as práticas sutis da homofobia. Assim, esse estudo
evidencia a necessidade de mais pesquisas nesse campo, que além da análise das representações de edu-
cadores/as, os cursos de formação docente abordem, de modo significativo, os temas diversidade sexual
e homofobia, possibilitando intervenções e ações que auxiliem no combate à homofobia (re)produzida
no espaço escolar.
Palavras-chave: Homofobia, escola, representações sociais.

Homophobia in School: Representations of Educators

Abstract
The analysis of social representations of teachers about homophobia constitute a promising way to sti-
mulate reflection and the search for more coherent knowledge about the extent of this violence that, of
subtle or manifest way, cause unnecessary suffering in the lives of young people who do not frame in

1
Endereço para correspondência: Conjunto Caçula Valadares, Rua D, 60, Simão Dias, SE, Brasil 49480-000.
E-mail: elaine.js.sd@hotmail.com, joilsonp@hotmail.com e claudienesan@gmail.com
636 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

heteronormative standard. Therefore, this qualitative study aimed to analyze the social representations
of teachers of basic education about homophobia in the school. To this end, we employed the thematic
categorical content analysis method and the instrument consisted of a questionnaire and semi-structured
interviews conducted with seven greater elementary school teachers. The results revealed that the repre-
sentations of teachers about homophobia include a variety of thoughts, beliefs, pre-established ideas and
contradictions. Because, beyond of conceptions reductionist that define homophobia only as an aversion
or prejudice against homosexuals, primarily due to the lack of this theme in the initial and continued
training, there was also some broader conceptions, which indicate the subtle practices of homophobia.
Thus, this study highlights the need for more research in this field, that in addition to the analysis of re-
presentations of educators, teacher education courses address, significantly, the themes sexual diversity
and homophobia, enabling interventions and actions that assist to combat homophobia produced and
reproduced in the space school.
Keywords: Homophobia, school, social representations.

Homofobia en la Escuela: Las Representaciones de Educadores

Resumen
El análisis de las representaciones sociales de los maestros sobre la homofobia es una forma promete-
dora para estimular la reflexión y la búsqueda del conocimiento más coherente sobre el alcance de esta
violencia, de manera sutil o evidente, causar sufrimiento innecesario en la vida de los jóvenes que no
se ajustan al estándar heteronormative. Por lo tanto, este estudio tuvo como objetivo analizar las repre-
sentaciones sociales de los maestros de educación básica sobre la homofobia en la escuela. Para ello, se
utilizó el método de contenido categorial temático. Los resultados revelaron que las representaciones de
los maestros sobre la homofobia abarcan una variedad de pensamientos, creencias, ideas preestablecidas
y contradicciones. Porque además de la reducción de las concepciones que definen la homofobia sólo
como una aversión o el prejuicio contra los homosexuales, sobre todo debido a la falta de este tema en la
formación inicial y continua, también hubo algunas concepciones más amplias, que indican las prácticas
sutiles de homofobia. Así, este estudio pone de relieve la necesidad de más investigación en este campo,
además del análisis de las representaciones de los educadores, los cursos de formación del profesorado
que abordan, de manera significativa, los temas de la diversidad sexual y la homofobia, permitiendo
intervenciones y acciones que ayuden a combatir la homofobia producido y reproducido dentro de la
escuela.
Palabras clave: Homofobia, escuela, representaciones sociales.

O estudo das Representações Sociais de clusão da diversidade sexual e enfretamento da


educadores/as acerca da homofobia, aliado a homofobia demandam além do envolvimento
outras ações interventivas, pode colaborar com significativo dos/as educadores/as para a for-
a desestabilização das práticas preconceituosas mação de cidadãos/ãs críticos/as e conscientes,
e discriminatórias que são manifestadas contra a adoção de uma postura pluralista e democrá-
a diversidade sexual, nas diversas instâncias so- tica. Destarte, a colaboração ativa dos/as do-
ciais, inclusive na instituição escolar. centes, através da promoção de medidas peda-
Em consonância com os Parâmetros Cur- gógicas que favoreçam o reconhecimento e o
riculares Nacionais (PCN; Secretaria de Edu- respeito à diversidade sexual na escola, pode
cação Fundamental, 1999) e o Programa Brasil contribuir para o combate as várias formas de
Sem Homofobia (Conselho Nacional de Com- violação dos direitos humanos dos grupos de
bate à Discriminação [CNCD] & Ministério da Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis e Tran-
Saúde, 2004), destaca-se que o processo de in- sexuais (LGBT).
Homofobia na Escola: As Representações de Educadores/as. 637

Nessa perspectiva, ressalta-se que entre às ao investigar a violência homofóbica no Bra-


medidas públicas de combate à homofobia, uma sil evidenciou, no país, um cenário de intensa
das principais iniciativas ocorreu em 2004 quan- opressão a que milhões de pessoas são submeti-
do a Secretaria Especial de Direitos Humanos das cotidianamente de forma direta ou indireta.
lançou o Brasil Sem Homofobia, um programa Desse modo, um problema tão grave e que afeta
de combate à violência e à discriminação contra tantos jovens permanece invisível nas diversas
LGTB e de promoção da cidadania homossexual instâncias sociais e é colocado entre as últimas
(CNCD & Ministério da Saúde, 2004). Tal pro- prioridades das esferas públicas (Prado & Jun-
grama tem como principal objetivo: “. . . pro- queira, 2011).
mover a cidadania de gays, lésbicas, travestis, Nesse viés, salienta-se a necessidade de
transgêneros e bissexuais, a partir da equipara- promover ações interventivas que permitam des-
ção de direitos e do combate à violência e à dis- construir práticas homofóbicas e, é indispensá-
criminação homofóbicas, respeitando a especifi- vel analisar a percepção dos sujeitos envolvidos
cidade de cada um desses grupos populacionais” na mudança de comportamento, principalmente,
(CNCD & Ministério da Saúde, 2004, p. 11). educadores/as, que perpetram ou são alvos de
Os Ministérios e Secretarias do Governo homofobia.
Federal do programa Brasil sem Homofobia as- A homofobia pode ser entendida como uma
sumiram o compromisso de combater a homo- forma de preconceitos e/ou discriminações (e
fobia, através da promoção de uma mudança de demais violências daí decorrentes) contra indi-
comportamento da sociedade brasileira em rela- víduos ou grupos sociais que não se enquadram
ção à LGBT, estabelecendo políticas inclusivas no padrão heterossexual em função de sua orien-
que impulsionem a aceitação e o respeito à di- tação afetivo-sexual e/ou identidade de gênero
versidade (CNCD & Ministério da Saúde, 2004). pressupostas e, neste conceito estão incluídos a
Contudo, para colocar em prática o que preconi- lesbofobia, a gayfobia, a transfobia, bifobia, ou
za esse documento são necessárias intervenções seja, a “LGBTfobia” em geral (Secretaria de Di-
sociais significativas e a formação inicial e con- reitos Humanos, 2012).
tinuada de profissionais, isto é, ações de diversas Dessa forma, o conceito homofobia visto
esferas sociais que possibilitem o reconhecimen- de forma abrangente, passa a englobar os pre-
to da diversidade e a garantia de seus direitos. conceitos e discriminações perpetrados contra
A instituição escolar exerce função primordial, lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais
pois através de seus membros pode multiplicar e outras formas de diversidade sexual, em de-
conhecimentos imprescindíveis para a descons- corrência dos seus comportamentos, estilos de
trução de preconceitos e discriminações. vida e aparências divergentes dos padrões he-
Entre as pesquisas realizadas no Brasil acer- teronormativos impostos. E, portanto, envolve
ca da homofobia, a de maior impacto foi a condu- elevado grau de violação dos direitos humanos
zida pela Organização das Nações Unidas para a de tais indivíduos e/ou grupos sociais. Assim, o
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em conceito de homofobia não se restringe e centra-
13 capitais brasileiras e no Distrito Federal con- -se somente no indivíduo e na sua “reação anti-
tando com uma amostra de 16.422 estudantes, -homossexual”, mas se estende além, visto que,
241 escolas, 4.532 pais e 3.099 educadores/as e envolve aspectos culturais, educacionais, políti-
funcionários de escolas (Abramovay, Castro, & cos, institucionais, jurídicos, antropológicos que
Silva, 2004). Tal pesquisa evidenciou os efeitos demandam a reflexão, crítica e denúncia acerca
da falta de formação no campo da sexualidade e da imposição de normas sexuais e de gênero
a amplitude da rejeição da diversidade sexual no (Junqueira, 2009; Rios, 2009).
âmbito escolar (Abramovay et al., 2004; Nardi, Tosso (2012, p. 236) acrescenta que “. . . el
2010). concepto homofobia, se alude no sólo al recha-
Outra relevante pesquisa foi a coordena- zo a las personas homosexuales, sino también al
da pela Fundação Perseu Abramo (FPA) que rechazo a las personas bisexuales y transexuales,
638 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

tengan esa orientación sexual o solamente apa- grupos e nas transformações sociais (Jodelet,
renten tenerla”. 1989/1993) que permitem superar preconceitos.
Embora o presente trabalho adote o termo Cabe enfatizar que: “. . . preconceitos são,
homofobia nessa perspectiva ampla, cabe expor portanto, atitudes, e como tais se constituem em
que Herek (2000) emprega o termo preconceito julgamentos antecipados que têm componentes
sexual para se referir a todas as atitudes negati- cognitivos (as crenças e os estereótipos), afeti-
vas com base na orientação (afetivo) sexual, isto vos (antipatias e aversões) e disposicionais ou
é, contra grupos ou indivíduos com identidades volitivos (tendências para a discriminação)”
sexuais (lésbicas, gays, bissexuais) e de gênero (Lima, 2011, p. 459). Assim, percebe-se que os
(travestis e transexuais) distintas da norma hete- preconceitos (manifestos ou sutis) criados em
rossexual. Assim, tal preconceito também atin- torno da diversidade sexual que caracterizam a
ge sujeitos heterossexuais que são rotulados de homofobia, provém, na maioria dos casos, do
lésbicas, gays ou bissexuais por adotarem com- desconhecimento que ocasiona representações
portamentos e/ou papeis divergentes do modelo precipitadas e arbitrárias. Logo, percebe-se que a
heteronormativo. Como os outros tipos, o pre- ausência da experiência e da reflexão, que cons-
conceito sexual abarca três características prin- tituem as bases do indivíduo, pode caracterizar
cipais: é uma atitude (uma avaliação ou julga- ou promover as distintas nuances do preconceito
mento) negativa que é dirigida a um grupo social (Chochík, 2006).
e seus membros e, envolve também antipatia e Nesse caminho, aponta-se a existência de
hostilidade. duas formas de expressão do preconceito: ma-
Para Moscovici (2010) “. . . todos os nossos nifesto ou sutil. O primeiro refere-se às formas
‘preconceitos’, sejam nacionais, raciais, gera- abertas e ativas manifestadas de modo evidente
cionais ou quaisquer que alguém tenha, somente através de atitudes negativas, denominado pre-
podem ser superados pela mudança de nossas conceito manifesto ou flagrante. O segundo é o
representações sociais da cultura, da ‘natureza preconceito sutil, uma nova forma de expressão
humana’ e assim por diante . . .” (p. 66). caracterizada por um discurso camuflado ou ve-
Assim, por intermédio da teoria das repre- lado que encobre os reais sentimentos e crenças
sentações sociais, investiga-se, nesse trabalho, acerca de determinado indivíduo ou grupo social,
de que forma os conhecimentos, vivências e não obstante a sutileza, disfarçada de tolerância
concepções dos/as educadores/as ancoram a ho- perpetua as desigualdades sociais (Fleury & Tor-
mofobia. res, 2010; Lima & Vala, 2004; Silva, 2010).
Por conseguinte, Chaves e Silva (2011) Dessa forma, a homofobia consiste em um
apontam que: fenômeno complexo e variado que envolve dis-
. . . a teoria das representações sociais ofere- tintas formas de preconceitos (sutis ou mani-
ce um excelente suporte às investigações na festos) e discriminações expressas em diversos
medida em que pauta a sua investigação a âmbitos sociais, por meio de violências psicoló-
partir do conhecimento do sujeito ou grupo gicas (agressões verbais, distinções, exclusões,
estudado, e como esse conhecimento orienta restrições ou preferências) e violências físicas
as suas práticas cotidianas. (p. 348) que anulam e prejudicam o reconhecimento e o
As representações sociais constituem siste- exercício pleno da cidadania por parte da diver-
mas de interpretação que orientam e organizam sidade sexual. A gravidade da homofobia não
as comunicações e comportamentos sociais, pois consiste somente nas práticas de violência físi-
determinam nossa relação com o mundo e com ca, mas também nas manifestações da violência
os outros. E, desse modo, intervêm em diversos psicológica presente nos insultos, nas piadas,
processos, tais como no desenvolvimento indi- na linguagem cotidiana, entre outras manifesta-
vidual e coletivo, na difusão e assimilação de ções que violam direitos humanos básicos e es-
conhecimentos, bem como na definição de iden- senciais de um indivíduo que é julgado inferior
tidades pessoais e sociais, na manifestação dos apenas por sua identidade sexual e/ou de gênero
Homofobia na Escola: As Representações de Educadores/as. 639

ser contrária às normas sociais impostas de for- A concepção da heteronormatividade, com-


ma arbitrária (Borrilo, 2009; Louro, 1997; Rios, partilhada e (re)produzida pela escola, além do
2009). parco conhecimento sobre as questões que per-
Nesse contexto, a manutenção de crenças, passam a homofobia nesse âmbito, contribuem
opiniões, preconceitos e práticas que compõem para a ocorrência de preconceitos, discrimina-
as representações de educadores/as, reforçam as ções e diversas violências contra homossexuais,
violências homofóbicas perpetradas contra indi- bissexuais, transgêneros, entre outros. A omis-
víduos que não se enquadram no “convencional”, são de um assunto tão importante, que neces-
ou seja, no padrão heterossexual denominado sita ser debatido e abordado no espaço escolar,
heteronormatividade (Louro, 2001). Entretanto, pode ocasionar práticas homofóbicas (Cavaleiro,
as representações sociais apesar de terem cará- 2009; Louro, 2009).
ter convencional e prescritivo (Moscovici, 2010) Dessa forma, o silenciamento e a negação
também podem possuir caráter construtivo que da homofobia no âmbito escolar podem corrobo-
admite reconstruções (Jodelet, 1989/1993), des- rar em práticas de omissões, discriminações, co-
sa forma, as representações sociais podem ser nivências com as múltiplas formas de violência
utilizadas para transformar palavras, categorias, cotidianas, que se manifestam pelo afastamento,
assuntos (como a diversidade sexual) em algo desprezo e segregação dos indivíduos discordan-
familiar e significativo. tes da norma heterossexual hegemônica. Então,
Destaca-se que as representações sociais cria-se uma enorme resistência em demonstrar
podem ser utilizadas para expressar alteridade, simpatia com indivíduos que possuem orienta-
lutando pela compreensão, interpretação e cons- ções afetivo-sexuais distintas do padrão hete-
trução de um mundo que envolve uma diversi- ronormativo, ou simplesmente que não se en-
dade de sujeitos que ocupam o espaço público. quadram nos arbitrários estereótipos de gênero
Portanto, surge a necessidade de defender essa (padrão masculino ou feminino binários criados
vida em comum, que é frequentemente ameaça- pela sociedade). Visto que, em geral, para os ho-
da por variados tipos de desigualdades, precon- mofóbicos é como se a homossexualidade fosse
ceitos e outras violências. Para isso, ressalta-se a “contagiosa”, logo, qualquer aproximação pode
extrema relevância de recuperar o pensamento, a ser interpretada como uma adesão a tal identida-
palavra e a construção de saberes sociais, como de ou prática sexual (Louro, 2000).
formas de sustentar a democracia e a cidadania, Nesse viés, é perceptível que além das di-
em que a diversidade de indivíduos e grupos so- ferenças individuais, a principal influência para
ciais consiga usufruir plenamente seus direitos o desenvolvimento de preconceitos é a possi-
sejam sexuais, socioculturais, políticos, entre bilidade de ter ou não experiências e realizar
outros (Jovchelovitch, 2008). reflexões acerca de si mesmo e sobre os outros
É perceptível a complexidade do tema nas relações sociais, que podem ser facilitadas
homofobia tanto para os/as pesquisadores/as que ou dificultadas pelas diversas instituições sociais
estudam as violências na escola, quanto para os/ que permeiam os processos de socialização. En-
as docentes, visto que envolve educação para a tão, as representações acerca do conhecimento
sexualidade, estudos sobre gênero e diversidade do mundo dependem da qualidade da ação das
sexual, orientação e identidade sexual, bem instituições, como a família, escola, mídia, ou
como inclusão/exclusão. Portanto, analisar as seja, da forma como elas tratam e (re)produzem
representações acerca desse tema é um enorme assuntos polêmicos, como a diversidade sexual
desafio, levando-se em consideração a amplitude (Chochík, 2006).
de questões polêmicas que o tema engloba, e Lima (2011) depreende que, independen-
também por ser um assunto tão velado na escola te das estratégias ou medidas empregadas para
(e na sociedade de um modo geral), mas, que ao combater as diversas manifestações preconceitu-
mesmo tempo apresenta uma diversidade de opi- osas, é preciso se atentar para a urgência e com-
niões, crenças e conceitos (Koehler, 2009). plexidade dessa tarefa. A intervenção necessária
640 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

ao enfrentamento das discriminações advindas damental nas relações da escola, como sujeito
do preconceito demanda uma articulação de ativo, capaz de intervir e transformar (Koehler,
meios, parcerias e ações para evitar que os indi- 2009) a realidade social, começando pela re-
víduos sejam alijados de determinados direitos construção de suas representações sociais, atra-
e passem por privações como ter acesso restrito vés dos processos de ancoragem e objetivação,
aos recursos materiais e simbólicos, somente por que permitem a substituição das ideias e crenças
possuírem uma marca grupal, objetiva ou impin- preestabelecidas por saberes novos, dinâmicos e
gida, socioculturalmente desvalorizada. Ou seja, em favor da diversidade (Jodelet, 1989/1993).
o simples fato de julgar a identidade sexual e/ Por isso, elencar as representações sociais
ou de gênero de determinado indivíduo já leva à dos/as docentes acerca da homofobia constitui
criação de estereótipos que culminam em várias um caminho promissor para estimular a reflexão
práticas homofóbicas. e a busca de conhecimentos mais coerentes acer-
Dessa maneira, é urgente a necessidade de ca da amplitude dessa violência que, de modo
uma formação inicial e/ou continuada que sensi- sutil ou manifesto, ocasiona tantos sofrimentos
bilize os/as docentes para acolher essa diversida- na vida de jovens que não se enquadram no pa-
de de sujeitos e adotar estratégias para impedir drão heteronormativo.
(ou ao menos reduzir) quaisquer tipos de pre- Nesse sentido, este trabalho tem como ob-
conceito e discriminação. A escola deve ser um jetivo: analisar as representações sociais de edu-
ambiente de reflexão e cidadania, em que preva- cadores/as da educação básica (ensino funda-
leçam os direitos humanos (Cavaleiro, 2009) e a mental maior) acerca da homofobia. Para tanto,
formação de cidadãos/ãs críticos/as. a pesquisa buscou responder as seguintes ques-
Scardua e Souza (2006) assinalam que a tões norteadoras: (a) Quais os principais conte-
análise, compreensão e reconstrução das repre- údos das representações sociais de educadores/
sentações sociais pode ser um instrumento fun- as acerca da Homofobia? (b) Como os conheci-
damental para a descrição e explanação dos sa- mentos e vivências dos/as educadores/as anco-
beres e conhecimentos socialmente elaborados ram a homofobia na escola?
e difundidos. Sendo assim essenciais para lidar
com eventos, assuntos, indivíduos e grupos con- Método
siderados estranhos e indefinidos que não se en-
quadram nos padrões socioculturais dos grupos Essa pesquisa qualitativa foi realizada em
mais numerosos, como é o caso da homossexu- uma escola pública do município de Simão Dias
alidade e de outras identidades sexuais distintas (Sergipe). A escolha desse lócus deve-se à escas-
do modelo heteronormativo. sez de estudos acerca dessa temática no interior
Dessa forma, enfatiza-se a necessidade de de Sergipe. Os/as participantes da pesquisa fo-
intervenções para que ocorram mudanças nas ram sete professores/as do ensino fundamental
normas socioculturais e em representações que maior (6º ao 9º ano), das disciplinas de Portu-
reforçam as violências contra LGBT e estimu- guês, Matemática, Ciências, Geografia, História,
lam sentimentos e práticas homofóbicas. É ne- Inglês e Educação Física. Essa escolha justifica-
cessário questionar e problematizar que histo- -se por corresponderem às disciplinas obrigató-
ricamente a heterossexualidade é tida como a rias e que devem abordar os temas transversais
norma ou padrão, bem como reconhecer a exis- de modo interdisciplinar, inclusive a questão da
tência e a manutenção da homofobia e compre- sexualidade e da diversidade sexual.
ender a existência de distintas relações sociais Nessa direção, cabe expor os principais da-
que são construídas na própria escola, apontan- dos sociodemográficos dos/as docentes partici-
do a importância de (re)conhecer as múltiplas pantes, destacando os nomes fictícios adotados
identidades sexuais e de gênero como parte das na pesquisa. A saber: a professora de Português,
profundas mudanças na sociedade. Portanto, Camila, tem 23 anos de idade, possui experiên-
o/a educador/a pode ser um/a protagonista fun- cia de mais de 2 anos na educação básica e sua
Homofobia na Escola: As Representações de Educadores/as. 641

religião é católica; Roberta é graduada em Ma- Empregou-se a análise de conteúdo catego-


temática, tem 41 anos, e experiência docente de rial temática para analisar as informações obti-
21 anos, também é católica; o professor de Ciên- das. Desse modo, foram discriminadas as uni-
cias, Antônio, tem 33 anos e atua na área da edu- dades de sentido do texto, ou seja, as principais
cação há 14 anos, é católico; Lúcio, professor de opiniões, crenças e tendências encontradas nas
Geografia, tem 30 anos e atua na profissão há 3 respostas dos questionários e das entrevistas, e
anos, católico; a professora de História, Claudia posteriormente, essas unidades foram agrupadas
tem 49 anos e experiência docente de 23 anos, em categorias de análise (Bardin, 2011) facili-
sua religião é evangélica; Samuel, professor de tando a compreensão das principais representa-
Inglês tem 30 anos, com cerca de 4 anos de atu- ções dos/as educadores/as acerca da homofobia
ação na área e é católico; e por fim a professora na escola.
de Educação Física, Talita, tem 24 anos e atua De modo sintético, pode-se dizer que análise
há 4 anos como docente, é católica categorial temática, feita após a transcrição inte-
Vale ressaltar que os/as participantes da gral dos questionários e das entrevistas, começa
pesquisa lecionam em uma escola pública esta- com a divisão do texto em alguns temas prin-
dual localizada no interior sergipano, porém, a cipais. Após, a delimitação dos temas, busca-se
maioria reside na capital do Estado. Embora seja determinar as características associadas ao tema
de pequeno porte, a escola A conta com aproxi- central, visando extrair os significados associa-
madamente 300 alunos/as matriculados/as e um dos a cada tema (Bardin, 2011). E desse modo,
quadro de 15 funcionários, entre professores/as, foram delimitadas as categorias que permitem
equipe diretiva e pessoal de apoio. Nessa escola descrever os principais resultados da pesquisa.
funciona a modalidade de ensino fundamental
menor (3º ao 5º ano) e maior (6º ao 9º ano), e Resultados e Discussão
existem na instituição sete docentes licenciados/
as nas disciplinas de ensino obrigatórias. A esco- Os resultados obtidos foram agrupados em
la costuma realizar semanas especiais com pales- duas categorias: “Representações acerca da
tras acerca de temas de interesse dos/as adoles- Homofobia: o que dizem os/as docentes?”,
centes, contudo, ainda não focaliza a questão da que engloba as principais crenças e opiniões que
diversidade sexual, entre outros motivos devido constituem os conteúdos das representações dos/
à falta desses temas durante a formação inicial e as docentes acerca da homofobia; e “Homofo-
continuada dos/as docentes, o que contribui para bia no Espaço Escolar: vivências de educado-
representações ancoradas em crenças preestabe- res/as”, que inclui as principais vivências dos/
lecidas. as educadores/as acerca da homofobia na escola.
Para coleta de informações foi elaborado
um instrumento constituído por um questioná- Representações Acerca da Homofobia:
rio para auxiliar na entrevista semiestruturada, O que Dizem os/as Docentes?
ambos desenvolvidos com base na bibliografia As representações dos/as docentes acerca
estudada (Dinis, 2012; Madureira, 2007; Silva, da homofobia evidenciaram contradições, pois
2010; Tosso, 2012). apesar do desconhecimento acerca da amplitude
Inicialmente, o projeto foi enviado e apro- dessa violência, revelaram algumas concepções
vado pelo Comitê de Ética. Posteriormente, foi mais amplas e outras reducionistas. As respos-
solicitada a autorização das escolas para os/as tas reduzem a homofobia apenas à aversão ou
educadores/as participarem da pesquisa. Os/as preconceito contra os homossexuais, o que pode
docentes assinaram termos de consentimentos ser compreendido pelo entendimento literal do
livres e esclarecidos, bem como foi aplicado um termo e pela falta de conhecimentos acerca des-
questionário com questões abertas e fechadas so- ses temas durante a graduação ou na ausência de
bre homofobia na escola e, em seguida, realiza- formação continuada. As seguintes unidades te-
das as entrevistas semiestruturadas. máticas mostram as principais concepções dos/
642 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

as educadores/as acerca do conceito de homo- em torno desse conceito. O que confirma que
fobia: as representações constituem um fenômeno psi-
“Aversão a homossexuais” (Prof.ª Roberta). cossocial que está ancorado tanto na esfera pú-
“Medo de assumir o que realmente possa blica quanto nos processos que possibilitam aos
ser, devido ao preconceito da família e da indivíduos construir suas identidades, criando
própria sociedade” (Prof. Antônio). símbolos e se abrindo para a diversidade atra-
“Prática de intolerância contra pessoas” vés dos núcleos positivos de transformação que
(Prof. Lúcio). decorrem da efetiva objetivação do conhecimen-
“Preconceito contra homossexuais, aversão to “novo”, ou em contraponto ancoram-se em
ou discriminação seja de formas sutis ou núcleos resistentes à compreensão da realidade
não” (Prof.ª Claudia). além das normas. É desse modo que a visão dos
“Medo do semelhante, atualmente termo usa- grupos sociais acerca de determinado objeto
do para descrever o preconceito e a violên- (nesse caso a homofobia) expressam as contra-
cia contra os homossexuais” (Prof. Samuel). dições em que foram produzidas (Jovchelovitch,
“É uma aversão aos homossexuais” (Prof.ª 2008; Minayo, 2008).
Talita). Nas entrevistas, quando indagados/as acer-
É necessário esclarecer que embora o ca de suas concepções, vivências e práticas acer-
conceito de homofobia tenha sido empregado ca da diversidade sexual e da homofobia, os/as
inicialmente para se referir a um conjunto de docentes revelaram as seguintes concepções,
emoções negativas (aversão, desprezo, ódio ou opiniões e crenças acerca da homofobia:
medo) em relação à homossexualidade, essa “É o preconceito, né que se tem contra o ho-
noção foi alargada para englobar as múltiplas mossexualismo, né é aquela aversão que as pes-
faces da violência homofóbica. Ao superar o soas têm contra a prática do homossexualismo e
entendimento limitado e centrado exclusivamen- que...” (Prof.ª Claudia).
te nos sentimentos e atitudes de indivíduos, co- A homofobia é complicado porque é uma
meça-se a pensar o enfrentamento da homofobia coisa que nos deparamos diariamente na so-
a partir de medidas e políticas públicas que pro- ciedade, né? O preconceito com as pessoas
movam mudanças significativas nas instituições, homossexuais... Porque eu sou católica e con-
como a escola. Assim, a homofobia é representa- cordo em eles adotarem um filho, porém não
da como um fenômeno psicológico e social que concordo que eles casem . . . (Prof.ª Camila)
está ancorada nas complexas relações estabeleci- “Então, eu acho que a homofobia . . . é um
das entre uma estrutura psíquica e uma organiza- preconceito como outro mesmo qualquer. É
ção social normativa que considera a heterosse- . . . porque a gente tem agressões a negros,
xualidade como ideal no campo afetivo-sexual. aos nordestinos, bem como homossexuais”
No âmbito social e escolar, outras manifestações (Prof. Samuel).
insidiosas exercem suas violências cotidiana- “Homofobia é quando uma pessoa rejeita
mente (como nos insultos, piadas e ironias), pois né, tem uma aversão à questão dos homos-
esta outra face da homofobia, mais eufemística e sexuais” (Prof.ª Talita).
de cunho social, ancora-se na atitude de desdém Homofobia, na verdade são pessoas que se
constitutiva de uma forma habitual de aprender e sentem incomodadas com essas pessoas que
de categorizar o outro (Borrilo, 2009, 2010; Jun- tem uma condição de vida diferente daquilo
queira, 2009), ou seja, uma forma normatizante que prega a sociedade, né? Um sujeito que
de representar as diferenças de modo hierárquico não gosta de estar em lugares que tenham
e assimétrico, no caso da diversidade sexual. esse tipo é... essas pessoas que tem uma op-
As representações dos/as docentes denotam ção sexual diferente da deles. (Prof. Lúcio)
um conjunto de pensamentos, crenças e ideias Os discursos acima englobam as represen-
pré-estabelecidas em torno da homofobia, ou tações reducionistas acerca da homofobia, que
seja, é marcante a presença de normatizações foram apreendidas também nos questionários,
Homofobia na Escola: As Representações de Educadores/as. 643

visto que, de um modo geral, a maioria dos/as pressupõe uma hierarquização entre quem tolera
educadores/as compreendem a homofobia so- e quem é tolerado e não resulta em garantia de
mente na dimensão do preconceito, aversão e direitos e inclusão.
rejeição aos homossexuais. É visível que a ideia O preconceito sutil constitui uma forma
literal do termo homofobia ainda prevalece de- de expressão dos julgamentos antecipados que
vido à falta de informações atualizadas acerca pode ser considerada o produto da propagação
de um tema tão relevante para o âmbito escolar. de uma “cultura igualitária” (Fleury & Torres,
Em decorrência do desconhecimento, o uso de 2010). Dessa maneira, entende-se que: “. . . O fe-
termos inadequados (“homossexualismo”, “con- nômeno se adequou a novos valores, novas ide-
dição”, “opção sexual”) foi recorrente nas falas ologias, novas normas sociais, produzindo uma
dos/as docentes. Além disso, a influência da re- nova modalidade de pensamento e expressão do
ligião também pôde ser vislumbrada nas repre- preconceito que atende a essa nova realidade”
sentações. (Fleury & Torres, 2010, p. 79).
Apesar da mudança de tom, subsiste a ho- É justamente porque quase ninguém admite
mofobia enraizada nas crenças e dogmas religio- ter preconceitos que, com frequência, ouvimos
sos, contudo, ao invés de lançar os sodomitas na as pessoas dizerem: “Não tenho preconceito,
fogueira, agora, sob o viés do preconceito sutil, mas não gosto de homossexuais”. O que eviden-
a homofobia cognitiva e a liberal preconizam a cia contradições, pois embora quase ninguém as-
complacência, compaixão e a tolerância, para suma ter preconceitos, já que esse termo remete
que na melhor das hipóteses os/as homossexuais a ignorância e a intolerância, os discursos reve-
(e outros que fogem às normas) sejam “curados/ lam os pré-julgamentos, ainda que expressos de
as” ou possam viver na abstinência. Assim, a modo sutil ou latente (Fleury & Torres, 2010).
hostilidade da Igreja e de outras instâncias so- Em contraponto, quando os/as educadores/
ciais (inclusive a escola) acerca da diversidade as foram indagados/as se a homofobia deve ser
sexual é, atualmente, muito mais sutil, visto que considerada crime, 100% afirmaram que sim,
as práticas homofóbicas não se referem somente justificando, de um modo geral, que esta cons-
à condenação ou rejeição dos/as homossexuais, titui uma forma de preconceito e discriminação
mas promovem o indiferencialismo subjacente que causa sofrimentos físicos e psicológicos aos
ao liberalismo contemporâneo (Borrilo, 2010). indivíduos não heterossexuais.
Isso caracteriza a homofobia cognitiva ou so- “Sim. Pois devido termos uma sociedade
cial a qual, apesar de incentivar a tolerância e o muito preconceituosa, faz com que evite o
respeito, não problematiza a marginalização da máximo esse tipo de atitude” (Prof. Antô-
diversidade e muito menos se incomoda com a nio).
manutenção das diferenças de direitos humanos. “Sim. Pois devemos respeitar todos inde-
De modo semelhante, a homofobia liberal envol- pendente da orientação sexual” (Prof.ª Ca-
ve uma forma de privação da liberdade de ex- mila).
pressão sexual no espaço público (Borrilo, 2009; “Sim, todo atentado à vida humana, tem que
Tosso, 2012). ser considerado crime” (Prof. Lúcio).
Nesse sentido, destaca-se a homofobia libe- “Acho que qualquer forma de discrimi-
ral que engloba o preconceito sutil, camuflado, nação e preconceito, se extrapolada com
velado, e é caracterizada pela aceitação aparente violência física ou psicológica e que cause
das pessoas homossexuais, pois “permite-se” sua constrangimento a vítima, deve ser crime”
existência desde que não manifestem as caracte- (Prof. Samuel).
rísticas e comportamentos contrários às normas “Sim, já que temos livre arbítrio para esco-
sexuais e de gênero no espaço público. Assim, a lher o que queremos ser, isso tem que ser
tolerância à diversidade sexual reitera a manu- respeitado” (Prof.ª Roberta).
tenção da norma (Borrilo, 2009; Tosso, 2012), “Sim. A liberdade do homem é algo sagrado
pois, como assevera Furlani (2009), a tolerância e essencial, para a vida ninguém tem o di-
644 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

reito de interferi na escolha do outro, usan- vens que diferem do padrão heterossexual. Tais
do da violência seja física ou psicológica” representações podem ser notadas nos discursos
(Prof.ª Claudia). abaixo:
“Sim, porque ninguém tem o direito de “. . . já vi insultos, humilhações já me
agredir uma pessoa por causa da sua esco- deparei com essas situações diariamente.
lha sexual” (Prof.ª Talita). Em questão de diversidade sexual, a homo-
A homofobia envolve diferentes práticas de fobia e o preconceito, que nos deparamos
preconceito e discriminação manifestadas em diariamente com a sociedade, infelizmente”
diversos âmbitos sociais, por meio de segrega- (Prof.ª Camila).
ções, desigualdades e privações que prejudicam “A gente sempre presencia, né? É... um
o reconhecimento e o exercício pleno da cidada- assunto que a gente acaba, às vezes, brin-
nia por parte da diversidade sexual. Portanto, é cando, né? Entre aspas. Mas sempre tem o
inegável que a homofobia representa um ato vio- preconceito por trás. Até, até eu mesmo, às
lento e criminoso não somente quando envolve vezes, brinco” (Prof. Samuel).
agressões físicas, mas também à medida que vio- “. . . na escola. Não, assim mais brigas, né?
la direitos sexuais e humanos de um indivíduo Assim, eu não prestava muita atenção, mas
julgado inferior apenas por sua identidade sexu- chamava, né? Normal, ‘bicha’, ‘não sei o
al ser divergente das normas sociais impostas de que’, aí ele revidava” (Prof. Lúcio).
modo arbitrário (Borrilo, 2009; Rios, 2009). “[Casos] de homofobia não. A gente vê, . .
Em face do desconhecimento e/ou precarie- . às vezes os coleguinhas: ‘Ah, é viado! É
dade da formação inicial e continuada de docen- isso, é aquilo...’, mas algum caso esporádi-
tes diante da complexidade da homofobia, urge co, um ou outro, intervém... Em sala de aula,
intervir nessa realidade a fim de superar o silên- durante o intervalo, né? (Prof.ª Roberta).
cio e a negação em torno desse assunto polêmi- . . . As piadinhas sempre existem, né por-
co que abriga uma gama de crenças, opiniões e que nem precisa ele saber que realmente a
conceitos tanto no discurso acadêmico quanto no pessoa é assumida, se ele... de vez em quan-
senso comum (Koehler, 2009; Louro, 1997). do com algum professor, aí a gente ... por
longe você percebe aquelas piadinhas, né?
Homofobia no Espaço Escolar: . . . Que ainda existe né, a gente sabe que
Vivências de Educadores/as o preconceito ainda existe, de forma sutil,
Acerca das vivências e práticas relativas à mas existe! (Prof.ª Claudia)
homofobia na escola, os/as docentes revelaram Embora a homofobia constitua uma violên-
ter presenciado situações de preconceitos e, so- cia psicológica e social, a maioria das pessoas
bretudo agressões psicológicas. No entanto, é ainda não a representa como tal. Contudo, deve-
perceptível que alguns/mas professores/as ainda -se atentar que quando tais violências são inte-
não entendem a gravidade dos insultos e apeli- riorizadas sob a forma de injúrias, afirmações
dos pejorativos. A agressão física é reconhecida desdenhosas, insultos, condenações morais ou
como uma forma grave de homofobia, contudo, atitudes compassivas ocasionam graves conse-
por vezes os/as docentes banalizam as violên- quências na vida de jovens não heterossexuais.
cias verbais e psicológicas e, em alguns casos Pois, estes para evitar os preconceitos acabam
até participam das agressões preconceituosas, tendo que lutar contra seus desejos, tentando re-
consideradas por eles/as “brincadeirinhas”. Foi jeitar sua própria sexualidade, e então, experien-
ressaltada a influência da formação sociocultural ciam sofrimentos, como sentimentos de culpa,
tradicionalista na ocorrência e manutenção da ansiedade, vergonha, depressão, o que os leva à
homofobia e de outras formas de preconceitos exclusão social e em alguns casos até ao suicí-
que permeiam a sociedade e o ambiente esco- dio. Desse modo, a interação entre os aspectos
lar, dessa forma tais práticas de homofobia sutil psicológicos e sociais deve ser questionada para
ocasionam graves consequências na vida de jo- se compreender melhor os elementos constantes
Homofobia na Escola: As Representações de Educadores/as. 645

que facilitam, estimulam ou banalizam a homo- diversidade sexual e por atitudes preconceituo-
fobia (Borrilo, 2010). sas, tais como apelidos pejorativos, piadinhas,
Ainda com relação às violências homofóbi- que podem ser denominadas Homofobia indireta
cas manifestadas no cenário escolar, os/as pro- (Borrilo, 2009; Chochík, 2006; Rios, 2009; Sil-
fessores/as relataram as seguintes ocorrências va, 2010).
que salientam a presença do bullying homofó- De modo contraditório, as representações
bico ocasionado, na maioria dos casos, pelo pre- dos/as professores/as acabam sinalizando a am-
conceito “sutil”. plitude da homofobia. Visto que, as práticas ho-
“E eu vi inúmeras vezes causando a questão mofóbicas envolvem desde as discriminações
de constrangimento com a questão dos co- diretas e intencionais que remetem à rejeição
legas, brigas, intrigas verbais entre ambas dos indivíduos não enquadrados na heteronor-
as partes, agressões mesmo com palavrões matividade, caracterizando também a homofo-
e tudo” (Prof. Antônio). bia psicológica, até as discriminações indiretas
. . . a gente sempre presencia os próprios ou não intencionais que podem ser representa-
colegas, os próprios meninos. Mangando, das pela homofobia cognitiva ou social. Porém,
né. Fazendo bullying com os colegas, só independente de suas facetas, a homofobia con-
pelo fato de ele parecer ser homossexual, siste em um fenômeno individual e sociocultural
porque na verdade quando crianças não complexo que engloba preconceitos e discrimi-
são homossexuais ainda, né? Mas pelo jei- nações contra sujeitos com identidades sexuais
to, pelas atitudes. (Prof. Samuel) e de gênero não normativas e, portanto, sempre
. . . aí eu tinha um aluno, que por sinal ele ocasiona a violação de direitos humanos funda-
tinha sido meu aluno desde a segunda série, mentais, tais como respeito, igualdade, liberdade
E... aí você percebia não por parte dos co- de expressão, entre outros (Borrilo, 2009; Rios,
legas, mas... assim... pessoas de outras tur- 2009; Rodrigues, 2011).
mas, que tinha sim aquela pressão, além do Visto que: “. . . À semelhança de qualquer
bullying que fazia, você percebia que tinha outra forma de intolerância, a homofobia articula-
pessoas que se afastavam, que criticavam. -se em torno de emoções (crenças, preconceitos,
(Prof.ª Claudia) convicções, fantasmas...), de condutas (atos, prá-
. . . E a prática assim dentro da escola, es- ticas, procedimentos, leis...) e de um dispositivo
sas brincadeiras, que eu acho que são pio- ideológico (teorias, mitos, doutrinas, argumentos
res até do que às vezes até uma agressão fí- de autoridade...)” (Borrilo, 2010, pp. 34-35).
sica que machuca, mas depois cicatriza com Assim, pode-se notar que a homofobia “. . .
o tempo, mas a verbal que a palavra em si, é está tão arraigada na educação que, para superá-
pro resto da vida né fica na sua consciência. -la, impõe-se um verdadeiro exercício de des-
(Prof.ª Talita) construção de nossas categorias cognitivas . . .”
O bullying homofóbico constitui os precon- (Borrilo, 2010, p. 87). Para tanto, pode-se partir
ceitos, discriminações e agressões verbais que da promoção de conhecimentos que levem ao
são manifestados na escola contra alunos/as não questionamento dessa violência e a reconstrução
heterossexuais ou que fogem aos estereótipos de dos saberes e práticas que compõem as represen-
gênero. Destarte, salienta-se que uma das faces tações dos/as docentes.
do preconceito é resultante do processo de so-
cialização que impõe normas acerca dos papeis e Considerações Finais
características de cada indivíduo. Existem várias
nuances de preconceito (nesses casos, sexuais), Pôde-se notar que a homofobia é um fenô-
que podem ser expressas, de forma mais eviden- meno complexo e, portanto, não possui somente
te através da rejeição e discriminação direta, ou uma causa, visto que suas variadas práticas (di-
de modo sutil, representada por violências psi- retas ou indiretas) são ocasionadas, reforçadas e
cológicas caracterizadas pela não aceitação da mantidas por diversos fatores históricos e socio-
646 Souza, E. J., Silva, J. P., Santos, C.

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Ademais, esse estudo evidencia a necessi- mofobia: Programa de combate à violência e à
dade de mais pesquisas nesse campo, que edu- discriminação contra GLTB e promoção da ci-
dadania homossexual. Brasília, DF: Ministério
cadores/as e pesquisadores/as de diversas áreas
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se interessem por essas temáticas, busquem (in)
formações significativas que auxiliem no com- Dinis, F. N. (2012). Educação e diversidade sexual:
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xidade de elementos que os constituem. Ade- turos gestores de pessoas. Curitiba, PR: Juruá.
mais, destaca-se a necessidade de investimento Furlani, J. (2009). Direitos Humanos, Direitos Sexuais
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dessas temáticas (a exemplo do que já ocorreu
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