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Resumo
Este texto propõe uma investigação da dinâmica psíquica do suicídio a partir do desnudamento do
Eu na melancolia. O suicídio foi considerado sob a perspectiva da identificação melancólica com
o objeto perdido, investigando também o estatuto do objeto em questão. A partir da psicanálise,
buscou-se desvendar alguns pontos da problemática que envolvemo o ato suicida e destacar o
insuportável que afeta o sujeito nessa experiência, tendo como resultado o apagamento da sub-
jetividade e a passagem ao ato como último recurso.
luntários pelas proposições que decorrem estiver matando também um objeto com
da vida em sociedade. Durkheim assinala- o qual se identificou, e, em segundo lugar,
va também que o bem-estar ou a felicidade se não estiver dirigindo contra si mesmo
do indivíduo somente é possível se houver um desejo de morte que era voltado para
equilíbrio entre suas expectativas, suas exi- outra pessoa. A descoberta regular de tais
gências e os meios socialmente acordados. desejos inconscientes de morte no suicida
E m L u t o e m e l a n c o l i a , Fr e u d não deve surpreender, nem impressionar
([1917/1915] 2010) buscou desvelar, como uma confirmação as nossas de-
através da investigação psicanalítica, os duções, pois o inconsciente de todos os
possíveis desfechos do conflito psíquico vivos está pleno de tais desejos de morte,
que conduzem ao sofrimento e suas im- inclusive em relação a pessoas amadas.
plicações no processo de subjetivação,
introduzindo a discussão do suicídio como Para entender o suicídio através do
um ato, uma possível válvula de escape olhar instigante da psicanálise, é neces-
para o mal-estar na civilização. sário esquadrinhar a dinâmica própria
Busca-se no tipo clínico melancólico do ato suicida. Cassorla (1984), em seu
uma ampliação do entendimento do fra- livro O que é suicídio, afirma que as ideias
casso no trabalho psíquico empreendido suicidas, apesar de ainda constituírem um
frente à tarefa de lidar com as perdas da tabu no imaginário popular, já emergiram
vida, o que resulta em autoacusações em algum momento na vida da maioria
dirigidas ao próprio Eu, objetalizado con- das pessoas, visto que a pulsão de morte
tra si próprio. Paradoxalmente, em uma está sempre presente em todos os seres
tentativa de destruir o objeto odiado de humanos.
sua identificação inconsciente encontra Suicídio é a morte de si mesmo, e há
na própria morte a solução para o conflito que discuti-la em sua ampla significação,
psíquico. permitindo compreender o ato em suas
A psicanálise compreende o suicídio manifestações de autoagressividade e
como um enigma. O desencadeamento do heteroagressividade. Assim, o objetivo
ato é enigmático. No entanto, deste trabalho1 foi investigar a dinâmica
psíquica do suicídio, tal como é elucidada
[...] ele traz consigo a questão da vida e por Freud ([1917/1915] 2010), a partir
da morte para o sujeito, tendo em vista do desnudamento do Eu na melancolia.
que, no ato suicida, o sujeito encena o Nesse sentido, o suicídio pôde ser con-
seu próprio desaparecimento (Ansermet siderado na perspectiva da identificação
2003, p. 180). melancólica com o objeto perdido, caben-
do investigar também qual é o estatuto do
Desvendá-lo, exige investigar os pro- objeto em questão.
cessos de constituição psíquica intricados Sabe-se que esse é um problema que
nessa dinâmica, priorizando os pressupos- parece não ter solução satisfatória. No
tos dos conteúdos inconscientes e procu- entanto, as contribuições da psicanálise
rando desvendar, no campo da dinâmica privilegiam a ideia do conflito psíquico
psíquica, a expressão das tensões pulsio- como base da constituição subjetiva e de
nais que levam o sujeito ao ato suicida. seus destinos pulsionais. Acreditamos,
De acordo com Freud ([1921] 2011,
p. 136):
1. Este texto faz parte da pesquisa para trabalho cientí-
fico de conclusão de curso de graduação em psicologia,
Talvez ninguém encontre a energia psí- de caráter qualitativo e descritivo, realizado a partir
quica para se matar, se, primeiro, não de revisão bibliográfica integrativa do tema de estudo.
percebe tomado por essa perda, tratando canibalesca com o objeto, incorporado
a si mesmo como objeto, o Eu encami- pela ingestão e subsequentemente tomado
nha-lhe toda a hostilidade originalmente como algo próprio do sujeito; na verdade,
endereçada ao mundo exterior. tomado como aquilo que lhe é o mais pró-
prio, e paradoxalmente, o mais estranho.
É exclusivamente esse sadismo que solu- Desse modo, os primeiros processos
ciona o enigma da tendência ao suicídio, de identificação descritos por Freud se arti-
que torna a melancolia tão interessante e culam durante a vigência do complexo de
tão perigosa. Tão imenso é o amor de si Édipo, a partir do qual o garoto toma a mãe
mesmo do ego (self-love), que chegamos a como objeto de desejo e o pai como seu
reconhecer como sendo o estado primevo ideal identificatório. Duas configurações
do qual provém a vida instintual, e tão psíquicas são assim descritas: com a mãe
vasta é a quantidade de libido narcisista vigora um investimento objetal primário
que vemos liberada no medo surgido de direto; com o pai uma identificação, na
uma ameaça à vida, que não podemos qual ele é tomado como modelo. Durante
conceber como esse ego consente em sua o declínio do complexo de Édipo, essas
própria destruição (Freud, [1917/1915] configurações convergem estabelecendo,
2010, p. 185). assim, uma identificação ambivalente com
o pai, ou seja, mesclada com componentes
A análise da melancolia abre caminho de amor e ódio.
para pensar o enigma do suicídio a partir Em síntese, Freud esclarece que, em
da psicanálise, ajudando a esclarecer o sua primeira emergência, a identificação
percurso martirizante do Eu. O Eu só pode constitui a mais primordial forma de liga-
matar a si próprio se puder fazer com que ção afetiva a um objeto, através da introje-
o investimento de objeto retorne sobre si, ção do objeto no Eu. Essa introjeção, como
ou seja, tratando-se sadicamente como é possível inferir a partir do que já se disse,
objeto, dirigindo contra si a hostilidade é própria da melancolia, que está na base
que seria originalmente voltada para o de fenômenos como a autodepreciação
objeto perdido. Na melancolia, as autorre- do Eu e a autocrítica, além das amargas
criminações expressam essa hostilidade de recriminações dirigidas contra si próprio.
forma clara, trazendo uma preciosa lição Vê-se, assim, que o ressentimento ali-
clínica acerca do suicídio: mentado contra o pai pode eventualmente
eclodir sob a forma de uma vingança con-
[...] a retirada dessas acusações do objeto tra ele. No entanto, a identificação conduz
amado e direcionadas para o Eu é pilar na esses investimentos psíquicos ao retorno
reflexão psicanalítica acerca da melan- sobre a sua própria raiz, ou seja, o Eu.
colia e na construção de considerações Dessa forma, a melancolia revela
sobre o suicídio (Cremasco; Brunhari, um Eu dividido em duas partes, e uma
2009). se enfurece com a outra. Uma parte de
si, transformada pela introjeção, detém
Da constituição do Eu à identifica- o objeto perdido; a outra parte se torna
ção melancólica com o objeto perdido depositária da consciência moral, uma
O processo descrito por Freud ([1921] instância crítica2 erigida no Eu.
2010) como identificação foi por ele
considerado como a forma mais antiga
de constituição de um laço afetivo com o 2. Os desdobramentos acerca do conceito dado a essa
“instância crítica” postulada por Freud em questão,
Outro. A primeira forma de identificação a posteriori, foi destacada em sua obra O Eu e o Id
destacada por Freud foi a identificação ([1925/1923] 2011). O agente foi nomeado de supereu.
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Dordania de Souza Resende
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Psicóloga clínica em prevenção de emergências
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melancolia: seguindo as trilhas das primeiras ela- Consultora em recrutamento e seleção.
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