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Alguns aspectos
da teoria da percepção de
Jean Piaget
Arq. bras. Psic. apl., Rio de Janeiro, 29 (2): 31-42, abr.fjun. 1977
dinava-se: a) à distinção entre processos sensoriais e perceptivos, estes corrigindo
os prirpeiros; e b) à vinculação da experiência sensorial à experiência passada, ou
seja, à memória. Por oposição, Hering propunha hipótese de base essencialmente
neurológica. Negava a existência de juízos corretivos e proclamava a impossi-
bilidade do conhecimento prévio influir significativamente no ato perceptivo.
Neste caso fornecia, como argumento principal, a inoperância do conhecimento
do percebedor como fator de redução das ilusões ótico-geométricas. No caso da
ilusão de Muller- Lyer, por exemplo, o fato de sabermos rigorosamente iguais as
duas linhas propostas para comparação não impede que sejam percebidas como
desiguais. Para Hering, o fator de correção perceptiva era de natureza neural.
Piaget filiou-se à tradição fixada por Helmholtz, como, de resto, a quase
totalidade dos teóricos da percepção. A consagração da hipótese da constância, tal
como a propôs Helmholtz, foi quase geral. Logicamente tal consagração implicava,
também, a aceitação de uma teoria binária, ou seja, de uma teoria que postulava a
existência hierarquizada de processos sensoriais e perceptivos. A rigor, apenas o
gestaltismo de Berlim constitui exceção, optando pela perspectiva proposta por
Hering. A constância era aqui explicada como um fenômeno de reestruturação do
campo perceptivo semelhante ao da transposição de um conjunto não-somativo,
isomorficamente representado por eventos de natureza neurocerebral. Apenas dois
pontos possibilitavam uma diferenciação entre a perspectiva de Hering e a dos
gestaltistas: em primeiro lugar, a não-conceituação do processo neurofisiológico
como fator de determinação do processo perceptivo; em segundo lugar, a admis-
são, por Hering, da sensação como fenômeno distinto da percepção. Para o gestal-
tismo, a relação entre os processos perceptivos e os fenômenos neurofisiológicos
não é de natureza causal no sentido dos últimos determinarem os primeiros. Na
verdade, entre as duas ordens de fenômenos ocorreria apenas um paralelismo,
definido por Wertheimer como isomorfismo.
Em função dos métodos de interpretação ou de análise utilizados, ou seja,
dos tipos de explicação propostos para cobrirem os fenômenos perceptivos, ainda
distingue Piaget entre os métodos que defluem de urna perspectiva genética mas
não estrutural (associacionismo); os que decorrem de uma posição estrutural mas
não genética (gestaltismo); e, finalmente, o seu método, que será genético e estru-
tural e mobilizará conceitos puramente relacionais, de tal modo que não façam
apelo a entidades, faculdades ou fatores além das próprias relações e das coordena-
ções possíveis. Tal método relacional é concebido por Piaget como sendo capaz de
preencher as duas funções básicas que se exigem de um método científico, quais
sejam: 1. a de descrever, e 2. a de explicar. Enquanto método descritivo, atingirá a
formulação de leis; enquanto método explicativo, permitirá deduzi-las e, como
conseqüência, conferir a elas a condição de necessidade. A perspectiva genética
mas não estrutural acima mencionada, representada, como se assinalou, pelo asso-
ciacionismo, foi basicamente definida' através de três conceitos-chaves: 1. o de
discriminação, desenvolvido sobretudo por James; 2. o de exercício, no sentido de
uma progressiva eficácia nos desempenhos discriminativos; 3. o de contexto,
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trabalhado por Titchener, segundo o qual o significado de uma sensação conse-
cutiva a uma série de estímulos é conferido por essa série de estímulos à qual ela
se associa.
No que conceme ao gestaltismo, identificado por Piaget como sendo uma
perspectiva estrutural mas não genética, obviamente o que o caracteriza é o des-
taque concedido ao sentido estrutural ou gestáltico da percepção. A percepção
lidará com conjuntos não-somativos nos quais o significado dos componentes será
determinado pela sua posição no próprio conjunto. A referência ao aspecto
não-genético será adequada na medida em que ela se aplique ao conjunto de leis
que regem a atividade perceptiva. Neste caso, será válido considerar-se o gestal-
tismo como um nativismo nomológico. Finalmente, convém conceder destaque à
posição fenomenológica assumida por essa corrente, dado que é essa posição que
nos permite compreender adequadamente os procedimentos de redução a que ela
se entrega.
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hipóteses a serem testadas e o controle rigoroso de variáveis envolvidas. De apli-
cação extremamente difícil nos primeiros meses de idade, não obstante pro-
porcionou informações altamente significativas em relação à constância e à
causalidade perceptiva. No que se refere aos estágios, Piaget não os considera a
nível perceptivo. Não se exclui, contudo, a variável evolutiva. De fato, ela estará
presente como uma variável adicional coordenada com outras variáveis situa-
cionais. Mas não há nada que se pareça com as fases seqüênciadas que se regis-
tram no estudo da inteligência. O método genético-comparativo, todavia, tem
aqui plena aplicação. A ele se devem informações preciosas sobre o modo de
construção dos mecanismos que promovem a atividade perceptiva. A ele ainda
devem-se creditar os dados relevantes sobre a maneira como se cumpre a
percepção no estágio sensório-motor e nos estágios operacionais, dados que
permitem a Piaget considerar as pesquisas de Bruner como expressivas de uma
suposição não-explicitada, envolvendo sempre um percebedor adulto. Vale assi-
nalar que graças ao método em questão pôde Piaget distinguir entre fenômenos
que aumentam de importância com a idade ou, inversamente, diminuem de
significado com o desenvolvimento. Tais mudanças apontaram sobretudo a nível
de pesquisa das ilusões ótico-geométricas. Por outro lado, graças, ainda, aos pro-
cedimentos comparativos e genéticos, detectou Piaget fenômenos que se con-
servam inalteráveis ao longo das idades, sugerindo a intervenção de variáveis
fisiológicas não-adquiridas ou, como prefere, a intervenção de condições de
equilibração. Aos fenômenos ilusórios que diminuem com a idade denominou-os
Piaget de primários, considerando-os como expressivos dos efeitos de campo. Os
que aumentam com a idade, subordinou-os às atividades perceptivas responsáveis
por comportamentos exploratórios. Definem-se, então, como secundários. Sobre
as razões que poderão justificar a rejeição de estágios no desenvolvimento
perceptivo, sugere Wohlwill que a principal se apóia na idéia de que nesse nível as
transformações são basicamente quantitativas.
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'. analogia entre a posição de Piaget e a de Von Weisacker prolonga-se com a clássica
conceituação proposta por Bergson, para quem perceber é detectar as possibili-
dades de uso de um objeto, ou seja, saber apropriar-se dele para efeito de execução
de um ato. A conceituação eminentemente prática de Bergson reaplicou-se no
domínio da memória e, mais especificamente, no do reconhecimento, pois que
reconhecer é rever num objeto sua disponibilidade instrumental, conceituação que
foi ampla e irrestritamente subscrita por Piaget como forma típica de memória no
estágio sensório-motor.
A importância concedida às atividades motoras no processamento per-
ceptivo aparece sublinhada, também, pelos pesquisadores soviéticos que se situam
na perspectiva de Pavlov. Especialmente Léontiev e Zaporozhetz são os nomes que
convém sejam aqui mencionados, ambos distinguindo entre as ações do sujeito
sobre o objeto e as reações de orientação e exploração por ele também condu-
zidas. Estas, em suas formas iniciais, seriam incondicionadas. Na percepção, as
ações sobre os objetos, as manipulações, desempenhariam papel relevante face a
associações dos dados cinestésicos com os recolhidos pelos receptores que operam
a distância.
O caráter construtivo da percepção é enfaticamente apontado por Piaget, e
isso o mantém próximo de Bruner. No caso de Bruner, o sentido construtivo é
demonstrado pelos efeitos decorrentes da intervenção de pressões motivacionais.
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Tais efeitos respondem ou por categorizações imediatas ou por eventuais distor-
ções que distanciam o objeto de sua representação perceptual. A percepção por
comparação com o sonho não será, para Bruner, a realização de um desejo, mas
representará certa solução de compromisso que, de qualquer modo, atestará a
participação construtiva do percebedor. Precisamente esse caráter construtivo da
percepção é que leva Piaget a rejeitar a posição assumida pelos empiristas. De fato,
enquanto para os empiristas - e logicamente para os associacionistas - a per-
cepção é meramente receptiva, para Piaget ela se revela eminentemente ativa e
construtiva. Esse caráter, que em Bruner se subordina às pressões motivacionais,
em Piaget reflete o mecanismo de assimilação dos esquemas previamente estru-
turados, os quais tanto podem funcionar isolada, como coordenadamente. Assi-
nale-se que as convergências conceituais não cessam e, antes, se continuam com
Hebb. Em Hebb, a percepção é conceituada como processo de preparação de
respostas. Tais respostas tanto poderão ser explicitadas quanto implícitas, ou seja,
tanto exteriorizadas quanto simbólicas e, portanto, internas. Pois em Piaget esta
será, também, a função da atividade perceptiva. Cabe-lhe, essencialmente, a
detecção de certos sinais que funcionarão como detonadores de atividades ou de
operações não necessariamente imediatas.
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o gestaltismo; c) fmalmente, a dimensão genética que, no gestaltismo, está indis-
cutivelmente recusada no que se refere, como já se assinalou, aos princípios ou leis
que regem a percepção.
Acerca das diferenças entre percepção e pensamento, Piaget basicamente
as reduz a duas: 1. enquanto os processos perceptivos se revelam de natureza
gestáltica, ou seja, não-aditiva - condição aprovada pelo próprio Piaget - os
processos do pensamento revelam-se de estruturação aditiva ou somátiva;
2. enquanto os processos perceptivos são irreversíveis, precisamente a reversi-
bilidade constituirá a propriedade mais significativa do pensamento. É claro que
muitas outras diferenças são apontadas e, na verdade, em 1969 Piaget examinou
14 modos de diferenciação dos dois processos. De qualquer modo, as duas
diferenças acima indicadas marcam a distância a que ele se situa em relação ao
gestaltismo. Três outras diferenças surgem, assinaladas por Wohlwill, em relação
à redundância, à seletividade e à contigüidade. No que diz respeito à redun-
dância, observa Wohlwill que os processos perceptivos se revelam dotados de um •
grau maior. A redundância surge reduzida ao nível da inteÍigência operacional.
No que concerne à seletividade, registra-se que ela é mais trabalhosa no domínio
da percepção. Ao nível do pensamento, a presença de dados irrelevantes é
menos perturbadora. Finalmente, no que toca à contigüidade, a distância espaço-
temporal é menos significativa no plano da inteligência operatória.
Entrementes, se há discordâncias consideráveis entre os dois processos, há,
por igual, semelhanças que não nos podem escapar, e Piaget e Morf as apresentam
em clássico trabalho sobre o isomorfismo parcial entre as estruturas lógicas e as
estruturas perceptivas. Pelo menos três semelhanças são aí consideradas; os para-
lelos entre a percepção de agrupamentos e o conceito de classe; entre a invariância
da percepção expressa sob a forma de constância e a da conceituação revelada sob
a forma de conservação; e entre a percepção de relações e a representação con-
ceitual das relações em nível simbólico. De qualquer modo, ainda Piaget e Morf
assinalam, na percepção, a ausência das operações fundamentais da lógica: a rever-
sibilidade, a aditividade, a transitividade e a inversão, exceto em sentido limitado e
apenas aproximado.
Ainda quando estejam excluídos os estágios a nível perceptivo, isso não implica
~I que não se processem desenvolvimentos ao longo das idades. De fato, tais desen-
volvimentos são claros e indiscutíveis. No começo, por exemplo, nem há um
sujeito perceptivo, empírico, nem um objeto perceptualizável. Tampouco se
poderá admitir a existência de um espaço homogêneo e enquanto concebido como
contendo objetos. Apenas, no que se refere ao espaço, ocorrem regiões hetero-
gêneas, todas centradas no próprio corpo, tanibém não concebido como objeto.
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Inicialmente, há um espaço bucal. A boca constituirá o centro do mundo durante
largo período. Há o espaço visual. Há o espaço tátil, etc. São, assim, espaços
descontínuos e destituídos de coordenação entre si. São egocêntricos no sentido
técnico de que se reveste este conceito. Nos dezoito meses que se seguem ao
nascimento, a criança alcança o espaço geral que engloba todos os espaços parti-
culares e contém todos os objetos, convertidos não mais em objetos fugazes,
evanescentes, mas em objetos sólidos e permanentes, compreendendo-se entre eles
o próprio corpo. Ocorre, então, algo de parecido com uma revolução copernicana,
no sentido kantiano dessa expressão. De fato, acontece uma descentração total,
com referência ao espaço egocêntrico. De um período marcado pela presença de
processos perceptivos sem percebedor, alcança-se uma fase caracterizada pela pre-
sença de processos já individua1izados ou personalizados.
A conquista da experiência de objetos permanentes obtida no estágio sen-
sório-motor supõe aquisições relevantes e paralelas, tais como: a) a da localização;
e b) a da organização do espaço. Esta, por sua vez, supõe a possibilidade de se
perceberem relações do tipo superior-inferior, direita-esquerda etc. Antes dessa
conquista, como já se assinalou, o mundo exterior não é senão urna série de
quadros móveis que aparecem e desaparecem. Todavia, tais quadros despojam-se de
substancialidade e revelam-se sem continuidade e, sobretudo, sem localização. A
aquisição da experiência de objetos permanentes obedece a uma série de etapas
ordenadas, com aquisições parciais baseadas em processos de assimilação. A
posição assumida por Piaget é totalmente oposta às de Stuart Mill e Meyerson.
No que se refere a Meyerson, a explicação proposta exclui a intervenção do
fator historicidade. Na verdade, para Meyerson a permanência dos objetos é
urna aquisição imediata, ou seja, um dado sem gênese. Obviamente, Piaget não
poderia assumir tal posição. Quanto a Stuart Mill, sua oposição é centrada na
rejeição da explicação empirista, de tipo humano, que se revela peculiar ao pen-
samento inglês.
No estágio sensório-motor, Piaget distingue seis fases. É na segunda que se
formam os primeiros esquemas definidos como resultado de duas atividades que
se associam e se integram. Tais esquemas enriquecem-se e se tornam progres-
sivamentecomplexos, culminando em uma espécie de lógica da ação. Como
conseqüência, o universo estrutura-se em termos de espaço, tempo e causali-
dade, esboçando-se as futuras categorias que lhes correspondem nos estágios
posteriores. A aquisição de esquemas implica que diante de um objeto ocorram
duas possibilidades: a primeira é a de que o objeto possa ser assimilado, ou seja,
que ele esteja em condições de integrar-se no esquema, revelando-se, então, o
seu significado semelhante ao de outros objetos já conhecidos; a segunda é a de
que o objeto resista ao processo de assimilação. Surge como algo indefinível,
estranho. Neste caso, ocorre gerar-se no sujeito certo estado de ansiedade só
redutível face à formação de um novo esquema capaz dtt absorver, por cate-
gorização, o objeto a identificar-se. É nesse sentido que Piaget atribui aos fatos
afetivos a condição ativadora.
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6. A percepção nos estágios operacionais
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do próprio. Obviamente, ocorre um avanço considerável quando o p,ercebedor
abandona o primeiro estágio e ingressa no segundo. Tal avanço mede-se em
termos de sistema de referência. No primeiro estágio o próprio percebedor é
sempre o centro de apreensão dos objetos, numa espécie de primeira versão da
conversão do sujeito empírico em sujeito epistêmico. No segundo, outros cen-
tros surgem como possíveis, diversificando-se os ângulos perceptuais. A aquisi-
ção da permanência e do espaço homogêneo e contínuo permite ainda, progres-
sivamente, a admissão de outros pontos de referência, tais como o da direita ou
esquerda e o do superior ou inferior. Prevalece, assim, a perspectiva genética
que define a posição de Piaget.
A diversificação progressiva dos sistemas de referência constitui um ponto
de clivagem entre a psic'ologia genética e estrutural de Piaget e a teoria percep-
tiva que se propõe com o gestaltismo. Para os gestaltistas, sempre o ato per-
ceptivo supõe um ponto de referência e este se impõe ao percebedor em termos
de pura e simples aplicação das leis propostas inicialmente a nível perceptivo.
As condições de proximidade ou de semelhança são, aqui, consideradas como
básicas. As opções disponíveis pelo percebedor só se revela concretizáveis em
casos caracterizados por certo grau de ambigüidade. De qualquer modo, exclui-
se do gestaltismo a idéia de um processo histórico comportando fases na adoção
de ângulos de apreensão do real.
Através de experimentos com sujeitos situados entre 4/5 anos e 12/15 anos,
distinguiu Piaget dois padrões bastante diversificados de fenômenos perceptivos:
a) os que resultam de efeitos de campo ou de centração que não supõem qual-
quer movimento de olhar e são visíveis em um único campo de centração; b) os
que supõem deslocamentos de olhar no espaço ou de comparações no tempo,
todos orientados por uma exploração ativa do sujeito. Os que supõem desloca-
mentos desenvolvem-se com a idade, quer quanto ao número, quer quanto à
qualidade. Em outras palavras, os que exprimem atividades exploratórias reve-
lam-se subordinados aos diversos estágios pelos quais avança o sujeito. Por outro
lado, tais atividades mostram-se eficientes na correção das ilusões ótico-geomé-
tricas que se produzem como efeitos de campo. Não obstante, como assinala
Piaget, ao produzirem novas aproximações elas, por igual, podem responder por
novos erros sistemáticos que aumentam com a idade. O exemplo dado é o da
ilusão dos pesos (pesos iguais com volumes diferentes). Os erros que aí se regis-
tram são maiores aos 10/12 anos do que aos 5/6 anos de idade. Tal ilusão, inclu-
sive, não se observa com deficientes mentais profundos.
No que se refere aos fenômenos perceptivos resultantes de efeitos de campo,
eles permanecem qualitativamente inalteráveis em todas as idades. Segundo Piaget,
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eles produzem percepções aproximadamente adequadas, face ao caráter probabi-
lista de que se revestem. Não obstante, respondem sempre por deformações
parciais. Embora qualitativamente inalteráveis, quantitativamente esses efeitos se
reduzem sob a ação corretiva das atividades perceptivas. Tais atividades, na medida
em que não se produzam, são responsáveis pela vivência do sincretismo perceptivo
descrito por Claparede.
Piaget destaca-se, na psicologia contemporânea, como um dos nomes que mais têm
pesquisado a causalidade, quer em seus níveis perceptivos, quer em seus aspectos
conceituais. Ao seu lado, Michotte representa o outro grande nome a se men-
cionar, em face das contribuições realmente clássicas que lhe devemos. Uma
terceira referência caberia aos gestaltistas cujas contribuições revelam-se próximas
das de Michotte. Michotte adotou a perspectiva fenomenológica. Por outro lado,
trabalhou com situações defmidas como de causalidade ilusória. A ele devemos os
estudos centrados sobre os efeitos de lancement, entrainement e déclenchement.
Basicamente, a posição de Michotte é a de que o fenômeno da causalidade é
perceptivo.
Piaget assume posição diferente. Geneticamente, distingue dois períodos na
evolução da causalidade: o primeiro, caracterizado pela centralização da causali-
dade no próprio sujeito; o segundo, caracterizado por uma objetivação e espe-
cialização da causalidade. Neste período, qualquer objeto poderá ser percebido
como causa de modificações produzidas em qualquer outro objeto. No primeiro
período, o fenômeno é defmido como de naturezanão-perceptiva, mas, na
realidade, subordinado à inteligência sensório-motora. Revela-se, nessa altura,
como um fenômeno tátil-cinestésico. Mesmo quando, na fase posterior, a causali-
dade vincula-se à percepção, ela permanece como sendo um fenômeno originaria-
mente sensório-motor.
É o próprio Piaget quem assinala que, em sua fase inicial, a causalidade
revela-se como um fenômeno mágico-fenomenista. Fenomenista no sentido de
.
Hume e mágico na acepção de Maine de Biran, para quem a causalidade estaria
ancorada na experiência de esforço do próprio sujeito, projetando-se objetiva-
mente após processo evolutivo. O que distingue a posição de Piaget relativamente
à de Maine de Biran é que, para Piaget, áinda quando a causalidade seja apreendida
por um sujeito, não é apreendida por um sujeito consciente de sua própria
condição de sujeito oposto e antagonizado a um mundo de objetos.
Piaget propõe várias objeções contra a teoria de Michotte. Tais objeções
ressaltam o fato de que a chamada causalidade perceptiva visual é caracterizada
por impressões de choque, de pressão, de resistência, etc. Tais impressões são de
origem tátil-cinestésica, posteriormente traduzidas em linguagem visual. A causali-
dade tátil-cinestésica não está, pois, subordinada à percepção visual, como pre-
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tendeu Michotte. Ela depende da ação inteira. Segue-se, pois, que é o esquema-
tismo sensório-motor que determina os mecanismos perceptivos. A posição de
Piaget recorda obviamente a de Berkeley na questão da percepção de profun-
didade, desde que, para Berkeley, a profundidade seria, também, um fenômeno
não-visual.
Bibliografia
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_ _ & Morf, A. Les préinférences perceptives et leurs relations avec schernes sensori-
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génétique). Paris. PUF, 1958.
Vinh-Bang. La rnéthode clinique et la recherche en psychologie de I'enfant. In: Bresson, F.
& de Montrnollin, M., ed. Psychologie ef épisfémologie génétiques, Thémes Piagetiens. Paris
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Wohlwill, Joachirn F. Frorn Perception to Inference: A Dirnension of Cognitive Developrnent.
In: Eliot, John, ed. Human Development and Cognifive Processes. New York, Holt, 1971.
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