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INICIAÇÃO EM
ELETROCARDIOGRAFIA
INICIAÇÃO EM
ELETROCARDIOGRAFIA
Edição do Autor
PELOTAS – 2000
PROJETO EDITORIAL
EDUCAT
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
João Carlos Hosni
CAPA
Luis Fernando Giusti
107p.
CDD 150
Agradecimentos
Às futuras colegas Lana Silva Meireles e Laura Amaral Barboza que revisaram
o texto e fizeram sugestões para aperfeiçoar a didática e a diagramação do livro.
Aos colegas Leonardo Carelli e Fábio Valente Gomes por sua imprescindível
colaboração e em especial ao colega Prof. Edgar Schramm por seu trabalho de revi-
são.
INTRODUÇÃO
Ao final deste trabalho você estará apto a diagnosticar os principais problemas que
podem ser identificados em um eletrocardiograma e a entender a linguagem de interpretação
dos mesmos.
Este não é um livro definitivo. Estaremos sempre dispostos a ouvir sugestões e reali-
zar as modificações necessárias para tomar seu conteúdo mais inteligível a todos os que dese-
jam ter sua Iniciação em Eletrocardiografia.
hosni@zaz.com.br
SUMÁRIO
Extra-sístoles ...........................................................................................................................82
Extra-sístoles ventriculares.......................................................................................................85
Extra-sístoles na intoxicação digitálica ....................................................................................85
Extra-sístoles supra-ventriculares.............................................................................................85
Taquicardia ventricular.............................................................................................................86
Os seres multicelulares vivem graças à perfeita distribuição dos nutrientes em suas célu-
las, que é feita pelo sistema circulatório. Esse sistema também retira os produtos tóxicos forma-
dos na geração da energia que as mantém vivas. Todo processo vital depende, em maior ou me-
nor quantidade, de sais minerais tais como o sódio, o magnésio, o cálcio e o potássio além dos
estímulos nervosos, autonômicos ou não, e também do controle hormonal.
O organismo humano contém água e sais minerais e isso o torna um condutor eletrolíti-
co o que permite que a eletricidade gerada pela contração muscular possa ser captada e registrada
na superfície do corpo por aparelhos específicos: em nosso caso o eletrocardiógrafo é o aparelho
que registra a corrente elétrica gerada pela contração do coração.
Com o paciente em repouso, respirando lentamente, o eletrocardiograma é o registro da
atividade elétrica das células miocárdicas e, também, de qualquer alteração elétrica produzida em
decorrência de alterações circulatórias, hormonais, iônicas e, até, da estimulação nervosa.
A oxigenação celular insuficiente é decorrente, de um modo geral, de uma semi-obstrução
coronariana, ou seja, de uma artéria coronária que, por algum motivo, está estreitada, não deixan-
do passar sangue em quantidades suficientes para o perfeito funcionamento do miocárdio (defici-
ência de oxigenação).
Essa última situação chama-se insuficiência coronariana e ela se manifesta clinicamente
com um tipo de dor que chamamos de angina.
A circulação coronariana insuficiente também pode ser causa de arritmias.
Quando uma coronária se oclui completamente ocorre a morte do tecido muscular por ela
irrigado. A oclusão de uma coronária gera o que chamamos infarto do miocárdio. Este pedaço de
miocárdio, que morreu por falta de circulação, não produz corrente elétrica. Forma-se então uma
zona eletricamente inativa (área de necrose, infarto, zona inativa são sinônimos).
Algumas doenças como o hipertireoidismo e as alterações eletrolíticas afetam o correto
metabolismo cardíaco e isso irá alterar o traçado do eletrocardiograma.
O tripanosoma (doença de Chagas) destrói o miocárdio e sua primeira manifestação no
coração é um retardo na velocidade de condução do estímulo elétrico através do ramo direito do
feixe de Hiss (bloqueio de ramo).
Quanto maior a quantidade de massa muscular, maior a quantidade de corrente elétrica
gerada por sua contração. Por isso a hipertrofia do miocárdio produz um aumento na corrente
elétrica formada a cada contração (aumenta a amplitude dos QRS).
Alguns medicamentos como a digoxina e a quinidina produzem alterações no funciona-
mento elétrico desse músculo e isso pode ser notado no traçado do eletrocardiograma (arritmias e
alterações na repolarização).
O acima citado, e qualquer outra alteração do metabolismo cardíaco, produz alterações no
registro gráfico do funcionamento elétrico cardíaco (eletrocardiograma).
CONCLUSÃO
O QUE É O ELETROCARDIOGRAMA
Para que o coração funcione adequadamente, a sua contração tem que ser coordenada, ou
seja, o músculo tem que se contrair e relaxar por partes e não todo ele ao mesmo tempo. Se os
átrios se contraíssem ao mesmo tempo em que os ventrículos a diferença de quantidade de massa
muscular entre átrios e ventrículos impediria que os átrios se esvaziassem para dentro dos ventrí-
culos. Por isso existem zonas que iniciam o estímulo elétrico, fibras musculares especializadas
em conduzir esse estímulo para todo o músculo cardíaco e zonas que retardam o percurso dessa
corrente elétrica de uma parte da musculatura para outra. Além disso, o coração recebe inervação
do sistema nervoso simpático e parassimpático. O simpático, através da liberação de adrenalina e
noradrenalina, faz aumentar a freqüência cardíaca quando necessário. O parassimpático, através
da liberação de acetilcolina, reduz a freqüência cardíaca. O controle desses sistemas situa-se no
bulbo, no assoalho do quarto ventrículo (no cérebro) e é auxiliado pelos pressoreceptores (recep-
tores de pressão) situados na aorta ascendente, croça da aorta e nos seios carotídeos. Toda vez
que essas estruturas sofrerem estiramento ou forem pressionadas, elas enviarão essa informação
aos centros bulbares, via 9 0 e 10 0 pares cranianos que, por sua vez, determinarão uma diminui-
ção da freqüência cardíaca. A isso se chama reflexo de Bainbridge. Esse mecanismo é útil na
reversão de taquicardias supraventriculares paroxísticas.
O hipotálamo e o sistema límbico também participam do ajuste do débito cardíaco nas di-
versas situações do dia a dia (refeições, estresses físicos e emocionais, fumo, álcool, etc.).
A hiperpotassemia pode causar a falta de resposta do miocárdio aos estímulos elétricos, e
a sensibilidade das células a esse íon varia de região para região do coração. As células mais sen-
síveis a hiperpotassemia são as células atriais que, nesta situação deixam de se contrair mas o
nódulo sinusal segue funcionando. Por isso, na hiperpotassemia (potássio acima de 8 meq/l),
poderemos ter um ritmo ventricular comandado pelo nódulo sinusal, com o estímulo passando
diretamente do nódulo sinusal para o nódulo Átrio Ventricular, e para os ventrículos, sem haver
contração atrial. Nesses casos o eletrocardiograma registra um ritmo ventricular relativamente
normal, mas não há evidências de ondas P, pois as células atriais, em sua maioria, estão inexcitá-
veis e não existe contração atrial. Esse ritmo chama-se ritmo sinuventricular e pode, portanto, ser
causado por uma hiperpotassemia.
Com potássio em torno de 5 meq/l ou mais a onda T vai ficando alta e simétrica e em tor-
no de 7 ou mais, existe um retardo da condução intraventricular que se registra como um alarga-
mento do QRS (bloqueio de ramo).
CAMINHOS DO
ESTÍMULO ELÉTRICO
O estímulo se inicia no
VEIA CAVA
AORTA nódulo sinusal (ou de Keith e
SUPERIOR Flack) que é uma estrutura locali-
RAMO ES- zada na porção mais alta do átrio
QUERDO direito, na junção da veia cava
superior. O nódulo está localizado
NÓDULO HEMI-RAMO
SINUSAL
logo abaixo do epicárdio e, em
POSTERIOR
60% das vezes, recebe um ramo da
artéria coronária direita, que é
desproporcionalmente grande e ao
NÓDULO redor da qual as fibras do nódulo
JUNCIONAL se dispõem.
Em 1963, James, descreveu três
FEIXE DE HISS
feixes que partem do nódulo sinu-
RAMO DIREITO
sal , chegando ao nódulo atrioven-
HEMI-RAMO tricular, denominados de feixe
ANTERIOR
internodal anterior, médio e poste-
FIBRAS DE PURKINGE
rior.
O feixe internodal anterior fornece um ramo que leva o estímulo ao átrio esquerdo. A
velocidade de condução elétrica medida nesses feixes preferenciais é de 1,8 metros por segun-
do.
O estímulo originado no nódulo sinusal chega ao nódulo átrio ventricular (nódulo
juncional) que, normalmente, é a única ponte de ligação elétrica entre os átrios e os ven-
trículos.
A função do nódulo A-V é retardar o estímulo elétrico que vem dos átrios para os
ventrículos, de modo que os átrios possam esvaziar-se completamente antes da contração dos
ventrículos.
O nódulo A-V tem nomes diversos tais como “região” atrionodal, região nodal propri-
amente dita, região nódulo-hissiana, junção atrioventricular que englobaria as três anterior-
mente citadas, entretanto, do ponto de vista eletrofisiológico e, também do ponto de vista prá-
tico e tradicional, permanece a denominação nódulo AtrioVentricular (nódulo A-V) ou, sim-
plesmente, nódulo juncional.
A arborização e a desorganização das fibras do nódulo vai cedendo lugar a um conjun-
to de canais ou cordões celulares, que vão formar o Feixe de Hiss que se origina da região
inferior do nódulo A-V e, estruturalmente é diferente do tecido do nódulo A-V.
O Feixe de Hiss é composto pelas células de Purkinge que são as mais largas células
do coração (com 70 a 80 micras de diâmetro) com inúmeros discos intercalares. Os "dis-
cos intercalares" são estruturas que ligam uma célula a outra, permitindo que o estímulo
elétrico passe mais rapidamente de uma para outra célula. Nesse tecido a velocidade de
condução pode atingir até 4 metros por segundo.
O Feixe de Hiss percorre o septo, por dentro de seu corpo fibroso central,
em estreito contato com as válvulas mitral e tricúspide (essa relação anatômica po-
de estar relacionada à gênese de arritmias), e vai em direção a ponta do coração. Esse
feixe dá origem a dois ramos principais: o direito e o esquerdo. O ramo esquerdo, por
sua vez, se bifurca em dois: o hemifascículo anterior esquerdo e o posterior esquer-
do que, na base dos músculos papilares correspondentes, no ventrículo esquerdo, se dis-
tribuem, sob o endocárdio, em uma rede de Fibras de Purkinge. O ramo direito segue,
sem se bifurcar, até a base do músculo papilar direito onde se transforma também na re-
de de fibras de Purkinge.
Existem também outras vias de condução do estímulo dos átrios para os ven-
trículos, são as chamadas vias acessórias tendo sido descritas três delas (e que podem
estar relacionadas com arritmias). A primeira seria um feixe curto, denominado feixe de
“by pass" (ponte) formado, principalmente, por fibras oriundas da via de condução in-
ternodal posterior. Essa via de condução acessória passaria por fora do nódulo A-V, pe-
netrando em uma região inferior do feixe de Hiss, fazendo uma ligação mais curta entre
o átrio e o ventrículo.
A segunda via acessória seria constituída pelas chamadas fibras de Mahaim que
fariam uma comunicação da parte mais profunda do nódulo A-V com o miocárdio do
septo interventricular superior, de maneira independente dos ramos do Feixe de Hiss,
ocasionando o encurtamento do espaço P-R.
Uma outra via acessória seria o feixe de Kent, que está presente em alguns re-
cém nascidos até os seis meses de idade. Esse feixe é composto por fibras acessórias e
comunica o átrio com o ventrículo, passando por fora do feixe de Hiss, e fazendo uma
legítima ligação direta atrioventricular. Quando o feixe de Kent continua a existir na
idade adulta, ele é responsável por algumas formas da síndrome de Wolf-
Parkinson-White. Na síndrome de WPW e em outras síndromes de pré-exitação ven-
tricular, também podem participar as outras vias acessórias.
DERIVAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS
O eletrocardiógrafo possui vários fios elétricos, cujas pontas (eletrodos ex-
ploradores) são colocadas em locais estratégicos do corpo de modo a poder ver a
“onda de despolarização” de vários ângulos.
aVL
aVR
D1
D2 D3
aVF
Você não pode inverter os fios que ligam os braços, mas não precisa ter o mesmo
cuidado com os fios das pernas. Se você inverter os fios das pernas ou colocá-los na
mesma perna o traçado não irá mudar.
A derivação D I, cujo eletrodo que "espia" está colocado no pulso esquerdo "vê"
o coração por cima e pela esquerda, face lateral alta.
A derivação D II é colocada ligando-se o braço direito com a perna esquerda do
paciente, e espia o coração por baixo e pela esquerda (face inferior).
A derivação D III é colocada ligando-se um fio no braço esquerdo e na perna es-
querda, assim possibilitando ver o coração por baixo e pela direita (também face inferi-
or).
As derivações DI, DII e DII são chamadas derivações bipolares “standard” (pa-
drão).
Outros eletrodos são colocados de modo a ver o coração por cima e pela esquerda
(aVL), por baixo (aVF) e por cima e pela direita (aVR). Essas são chamadas derivações
unipolares dos membros (ou das extremidades).
Essas seis derivações formam o conjunto de derivações do plano frontal.
Para obter um traçado de boa qualidade devemos ter alguns cuidados com o
paciente, que deve estar confortavelmente posicionado, sem sentir frio ou medo para
evitar tremores musculares e não deve movimentar-se para que a única atividade mus-
cular (elétrica) seja a do coração. Em algumas situações teremos que pedir-lhe que
pare de respirar por alguns segundos, de modo a evitar oscilações da linha de base.
Os eletrodos do aparelho deverão fazer o melhor contato possível com a pele,
de modo oferecer o mínimo de resistência à passagem da corrente elétrica. Para isso
basta molhar com água a pele limpa do paciente. O uso de pasta condutora é desne-
cessário. E, além disto, após o uso ela seca e cria uma crosta de oxidação sobre o
eletrodo formando uma camada isolante. Também estraga rapidamente as borrachas
dos eletrodos precordiais.
Os eletrodos deverão ser colocados sobre estruturas ósseas ou tendinosas (so-
bre a tíbia e na face anterior dos punhos) e longe de músculos de modo a evitar o re-
gistro de tremores musculares.
O aparelho deverá estar calibrado corretamente: ou seja, cada salto de 10 mm
da agulha registradora deverá corresponder a captação de 1 mV e deverá estar corre-
tamente aterrado, para evitar interferência da corrente elétrica alternada. Se o aparelho
estiver funcionando com baterias não será necessário o uso do fio terra.
A figura acima representa os seis eixos formados pelas derivações frontais. Para
determinar o eixo elétrico do coração pegue a maior onda R ou S que você vir em D1, D2
ou D3 e a coloque sobre o eixo da derivação que lhe corresponde. Faça o mesmo com a
maior onda R ou S que você visualizar em aVR, aVL ou aVF e coloque-a sobre o eixo
que lhe pertence.
O eixo elétrico do coração em estudo estará situado entre os eixos que possuírem
as maiores ondas R ou S, pendendo para o lado do eixo que tiver a maior das duas
ondas selecionadas.
Pessoas brevilíneas, gestantes ou com aerogastria tem, geralmente, o eixo elétrico
desviado para a esquerda, até – 30 graus. Os longilíneos, geralmente apresentam eixo elé-
trico verticalizado ou até desviado para a direita até +120 graus.
A determinação do eixo elétrico é um dos parâmetros que usamos para o diagnóstico
da hipertrofia de ventrículo esquerdo, de ventrículo direito e do hemibloqueio anterior es-
querdo.
Desvios em torno de – 60 graus podem significar bloqueio do hemifascículo anterior
esquerdo do feixe de Hiss (comum) e desvios acima de +120 graus podem significar hi-
pertrofia de ventrículo direito, infartos de parede lateral alta, bloqueio do hemifascículo
posterior esquerdo (raro) ou síndrome de Fallot.
D1 D2 D3
Eixo elétrico em torno de 30 graus = normal. Se você tivesse usado o maior R (ou S) de
D1, D2, D3 e o maior R (ou S) de aVR, aVL, aVF teria chegado à mesma conclusão
D1 D2 D3
À direita temos um eixo elétrico horizontalizado como pode acontecer nos brevilí-
neos, nas grávidas e nas hipertrofias de ventrículo esquerdo.
TETRALOGIA DE FALLOT
D1
aVR
Nessa patologia, além da estenose
pulmonar acontece uma CIV impor-
tante, de modo que a pressão no ven-
trículo direito é igual a do ventrículo
aVL esquerdo e isso provoca a hipertrofia
do VD que origina esse grande desvio
do eixo elétrico para a direita.
Nas derivações precordiais existe uma
grande onda R em V1 e quase nada de
S e a transição para V2 é súbita, for-
aVF mando um RS.
Nas precordiais restantes encontrare-
mos um predomínio da amplitude da
onda S com relação a onda R.
LATERAL
SEPTAL
ANTERIOR
Guarde na memória a figura acima. Isto é importante para lembrar que partes
do coração cada derivação eletrocardiográfica está “enxergando”.
Se você tiver ondas Q patológicas em D2 e D3 e aVF poderá dizer que existe
zona inativa (infarto) em parede inferior (ou diafragmática). Se as ondas Q patológicas
estiverem em V1 e V2 a zona inativa é em parede anterior. Se estiverem em V1, V2,
V3 e V4 diz-se que existe zona inativa em parede ântero-septal. Se as ondas Q patoló-
gicas situarem-se de V3 a V6 fala-se de zona inativa em parede septo-lateral. Se as on-
das Q patológicas aparecerem de V1 a V6 fala-se em zona inativa ântero-lateral ou zo-
na inativa anterior extensa. Se existir uma imagem invertida dos QRS normais de V1,
V2 e V3 poderemos estar frente a um infarto em parede posterior.
DEXTROCARDIA
Mas, antes do estudo do ECG, vamos à praia. Vamos imaginar que estamos em uma
praia de mar e entramos na água até os joelhos. A princípio o mar esta completamente parado,
não há um só movimento e a água está uma planura só. Agora, de repente, uma massa de água
se eleva e vem, crescendo, em nossa direção. É uma onda que se eleva do nível de repouso da
água, sobe e vem nos bater na barriga. Ela quebra logo atrás de nós e reflui, volta para o mar
de novo, levando consigo aquela água que, antes nos batia pelos joelhos e, olhando para bai-
xo, podemos ver nossos pés na areia. A seguir vem outra onda, acima do nível do mar, rebenta
atrás de nós e, novamente, reflui, descobrindo nossos pés, deixando por instantes, no local
onde estamos, a água abaixo do nível de repouso. O nível de repouso é a linha de base.
Imaginem que podem abrir uma janela no tórax de um paciente. Quero que esse orifí-
cio seja feito na altura do quinto espaço intercostal esquerdo, no encontro deste espaço com a
linha axilar anterior. Por ali vocês conseguem espiar dentro do tórax.
Imaginem-se olhando para dentro desse tórax. Vocês podem ver o coração se contrair.
Olhem primeiro só os átrios. Vocês estão vendo o átrio direito iniciando a contração que pros-
segue até a completa contração do átrio esquerdo e, logo a seguir, enxergam que o átrio direito
já está relaxando e a seguir vêem que, também, o átrio esquerdo está relaxando. Da mesma
forma vocês vêem os ventrículos se contraindo. E assim continuam vendo contração (sístole),
relaxamento (diástole), uma após a outra.
Peço que se concentrem mais ainda, pois vão passar a "enxergar" as ondas elétricas
que, percorrendo o miocárdio, provocam essa contração. Imaginem que vocês têm uma linha
horizontal (linha de base ou isoelétrica) na frente dos olhos (como lá na praia). Imaginem que,
com o olho colocado nessa janela imaginária pode-se “olhar” dentro do tórax, e "ver" a onda
elétrica que se inicia no nódulo sinusal e percorre os átrios da direita para a esquerda, ou seja,
de um ponto mais distante para um ponto mais próximo do olho de vocês (como a onda do
mar que vem). Eu quero que vejam essa onda elétrica, que vem em direção ao olho de vocês,
deformar aquela linha horizontal que imaginaram antes (como a água parada, antes que a onda
viesse). E, quero mais, quero que imaginem que toda onda elétrica que vem em direção ao
olho que espia, seja imaginada como uma onda que deforma aquela horizontal "para cima"
(como as ondas do mar) formando o que chamamos uma onda positiva e quero que imaginem
que toda onda elétrica que se afasta do olho espião seja imaginada como uma onda que de-
forma a horizontal "para baixo", dando uma onda negativa (como a onda que voltando para o
mar leva, com ela, mais água do que trouxe).
Aqui, convém deixar registrado que, em eletrocardiografia, essa onda de despolariza-
ção chama-se "vetor de despolarização", e corresponde ao percurso seguido por cargas elétri-
cas (positivas seguidas de negativas) que percorrem o miocárdio. Esse conjunto de cargas
positivas e negativas, que vai despolarizando o miocárdio, leva o nome de "dipolo"; para mai-
ores esclarecimentos aconselho consultar a bibliografia citada ao final deste livro, pois daqui
em diante não usaremos mais esses termos.
Nos átrios a onda elétrica vem da direita para a esquerda e de cima para baixo, ou se-
ja, vem em direção ao "olho espião" colocado na posição que determinamos e, lembrem, a
eletricidade percorre a massa muscular atrial com uma velocidade de 1,2 a 1,8 metros por
segundo. Isso é uma onda relativamente lenta, se lembrarmos que nos ventrículos essa onda
tem uma velocidade de 4 metros por segundo. Lembrem ainda que a massa muscular atrial é
relativamente pequena se comparada com a massa muscular dos ventrículos e que a quantida-
de de eletricidade gerada é diretamente proporcional a quantidade de massa muscular que a
produz.
Na despolarização dos átrios, espiando por essa janela, que tipo de onda vocês verão?
Verão uma onda positiva (acima da linha de base) (porque ela vem em direção ao “o-
lho espião” = eletrodo explorador) pequena e lenta (arredondada) devido a sua baixa veloci-
dade de condução.
Quando ligamos os fios do eletrocardiógrafo da maneira correta para formar o que se
chama "Derivação D I" (ou, simplesmente D1) o eletrodo explorador (olho espião) fica situa-
do no braço esquerdo. Nessa derivação, braço direito/braço esquerdo (D 1), a despolarização
dos átrios "SEMPRE" irá provocar uma onda P positiva mas, como em medicina e no amor
"nem sempre, nem nunca" esse "sempre" tem duas exceções. A primeira é mais comum: a
onda P, que é o nome que damos a onda de despolarização atrial, pode aparecer negativa se,
quem efetuou o eletrocardiograma, trocou os fios do braço esquerdo pelo direito e vice-
versa. Quando isso acontece é como se nós estivéssemos "olhando' a onda de despolarização
pelo outro lado do tórax, com a onda se afastando de nosso "olho espião" e isso irá formar
uma onda negativa.
A segunda situação em que a onda P aparece negativa em D I é bem mais rara e a-
contece quando o paciente tem o que chamamos "dextrocardia", isto é, o coração está anato-
micamente invertido e, por isso, tem o nódulo sinusal do lado esquerdo e, na verdade, o que
seria átrio direito situa-se do lado esquerdo e o ventrículo que bombeia sangue para os pul-
mões também.
Para evitar erros na interpretação de um eletrocardiograma, a primeira coisa que
se faz é identificar a onda P em D I. Como explicado acima ela tem que ser positiva ou...
estaremos frente a uma de duas exceções. Da mesma forma a onda T em D I deve ser positiva
sempre que for normal. Ondas T negativas em D I significam patologia.
Existindo onda P e, se cada uma delas for seguida pelas ondas que significam a despo-
larização dos ventrículos (complexo QRS), estaremos frente a um ritmo sinusal que é o nor-
mal.
Vamos continuar nosso ensino da mesma maneira, espiando pela janela imaginária
que colocamos no tórax de nosso paciente e vendo a despolarização chegar ao nódulo atrio-
ventricular. Quando essa onda elétrica chega ali, devido a estrutura histológica do nódulo A-V
(células estreitas, curtas, com múltiplo direcionamento e entrelaçamentos), a velocidade de
condução da onda de despolarização sofre uma diminuição para cerca de 2 cm/seg e, já que o
papel continua correndo, veremos após a onda P o registro de um trecho de linha isoelétrica.
No adulto normal o tempo transcorrido do início de P ao início do QRS é de 0,2 seg que cor-
responde a 5 mm. Não vemos a onda correspondente a repolarização dos átrios porque ela
ocorre ao mesmo tempo em que ocorre a despolarização dos ventrículos e, por isso, fica mas-
carada dentro das ondas provocadas pela despolarização dos ventrículos (QRS). Se tivermos
uma situação em que a onda P não despolariza os ventrículos (bloqueio atrioventricular) cer-
tamente também não veremos a onda de repolarização atrial porque a maior parte dos apare-
lhos não é tão sensível a ponto de captar e registrar uma onda tão pequena e lenta como seria a
onda de repolarização atrial.
Uma vez que a onda de despolarização vence a resistência do nódulo A-V, ela acelera
e chega a uma velocidade de até 4 m/seg. nas grandes células de Purkinge que compõe o Fei-
xes de Hiss, seus ramos e arborizações que vão a todo o miocárdio ventricular.
Com nosso "olho de ver ondas elétricas" colocado na mesma posição, estaremos
“vendo a eletricidade" chegar na região inferior do septo por dentro do feixe de Hiss, sem
despolarizar musculatura até aí e, então, saltar para fora do Feixe de Hiss e começar a despola-
rizar o septo pelo lado do ventrículo esquerdo em direção ao ventrículo direito.
PLANO HORIZONTAL
PLANO FRONTAL
Deflexão
intrinsecóide
PONTOS A DECORAR:
Onda P representa a despolarização atrial, mede no máximo 2,5 mm de largura (dura-
ção de 0,10 seg) por 2,5 mm de altura (2,5 mV de amplitude) é uma onda lenta (arre-
dondada)
Espaço P-R maior que 0,2 seg (5 mm) caracteriza variados graus de bloqueio atrioven-
tricular (BAV).
Duração do QRS normal não deve exceder 0,1 seg. (2,5 mm). Complexos QRS mais
largos que 2,5 mm expressam algum retardo na condução intraventricular do estímulo
elétrico. Larguras de QRS de 2,5 a 3 mm caracterizam os hemibloqueios de ramo, largu-
ras de QRS iguais ou maiores que 3 mm definem os bloqueios completos de ramo.
Amplitude do QRS nas derivações dos membros não deve ser maior que 20 a 25 mm
em cada uma delas e não deve ser maior que 25 a 30 mm em qualquer das precordiais.
Valores maiores que esses podem caracterizar hipertrofia ventricular.
HIPERTROFIAS ATRIAIS
A hipertrofia atrial pode ser conseqüência das seguintes patologias, por ordem
de freqüência:
1 - hipertrofia de átrio esquerdo como resultado de uma estenose valvular mi-
tral.
2 - hipertrofia de átrio direito como conseqüência de hipertensão pulmonar da
DBPOC.
3 - associada com patologias congênitas, por exemplo, hipertrofia de átrio di-
reito resultante de comunicação interatrial.
4 - hipertrofia de átrio esquerdo pode ser conseqüência de hipertrofia ventricu-
lar esquerda que, por sua vez, foi secundária a hipertensão arterial.
FIBRILAÇÃO ATRIAL
Não conseguimos visualizar ondas P. Isso acontece porque a musculatura dos átrios
não está contraindo como um todo, mas existem grupos de fibras musculares se contraindo de
maneira descoordenada e desorganizada não realizando sístole/diástole. Estas ondas levam o
nome de ondas f (minúsculo). A linha de base parece “tremida” e o ritmo dos ventrículos é
irregular, a distância entre os QRS sempre é diferente e no caso também é taquicárdico. Os
complexos QRS não são alargados (com imagem de bloqueio de ramo) e por isso podemos
afirmar que o marcapasso se origina acima dos ventrículos. Se não existe onda P, os átrios
não estão contraindo mas existe atividade elétrica neles e algum estímulo, de repente tem
intensidade suficiente para vencer o bloqueio imposto pelo nódulo A-V e estimular os ventrí-
culos. Isso explica porque na fibrilação atrial o ritmo ventricular sempre é irregular.
As ondas f podem ter amplitude bem maior que as apresentadas no traçado acima. Também
no mesmo traçado podemos encontrar ondas f de grande amplitude e mais adiante a amplitu-
de diminui a ponto de vermos apenas uma linha isoelétrica (ou minimamente irregular) como
no traçado abaixo. Em alguns pontos desse traçado até “parece” que existem ondas P. O Dr.
Enéas relata que ondas f de grande amplitude correspondem a uma fibrilação atrial relativa-
mente recente e que ondas f de baixa amplitude correspondem a fibrilação atrial “antiga”,
mas não tenho essa correlação em minha prática.
Sempre que se obtém um ECG devemos estar atentos para o conforto do paciente de
modo que ele não esteja tremendo por frio ou medo ou com o corpo contraído pelo receio de
levar um “choque” pois se isso acontecer a linha de base ficará irregular e nos atrapalhará no
diagnóstico correto como exemplificamos no traçado abaixo. Observem que as irregularidades
da linha de base são “apiculadas” e bem diferentes das ondas f de fibrilação atrial que são
“arredondadas”. Esse tipo de onda é produzido por tremor muscular do paciente e se sobrepõe
às ondas “f” da fibrilação atrial.
R-R
Este traçado é do mesmo paciente mostrado acima e que realmente está com fibrilação
atrial, mas só podemos afirmar que ele “parece estar fibrilado” porque os espaços R-R são
completamente irregulares. Para obter um bom traçado, com boa definição de linha de base,
lembrar sempre do conforto do paciente que precisa estar descontraído para não gerar este tipo
de artefato.
Observe a irregu-
laridade da linha
de base e da dis-
tância entre os
Velocidade normal = 1500 mm/min QRSs. Você não
consegue discernir
ondas P. trata-se
certamente de
fibrilação atrial,
mas se tiver dúvi-
da se esta taqui-
cardia é sinusal,
ou devida a um
flutter atrial ou
fibrilação atrial
faça ...
o papel correr no
dobro da veloci-
dade (3.000
mm/min) e então
perceberá com
Velocidade dobrada = 3000 mm/min
mais facilidade a
linha de base para
concluir que o
paciente é porta-
dor de uma fibri-
lação atrial com
resposta ventricu-
lar irre-gular ta-
quicárdica.
V1
Segmento ST e onda T
deformados por digital
V2 Ondas f
V3
Se você acha que não existem ondas P, continue a interpretação observando a largura
dos QRS e a distância entre eles.
Os QRSs tem uma largura normal, mas a distância entre eles é completamente irregular. En-
tão estamos frente e a uma arritmia.
Observe a linha de base. Ela está “ondulada” as vezes um pouco mais ondulada, as
vezes um pouco menos. Qual é a situação onde os QRS tem morfologia normal, mas não
existem ondas P antes de cada QRS e a linha de base apresenta-se como acima?
O ECG acima registra uma fibrilação atrial com ritmo dos ventrículos originando-se
acima do nódulo juncional o que determina a largura normal dos QRSS, pois o estímulo se-
gue as vias normais de condução.
Observe o segmento ST. Ele tem uma concavidade que grosseiramente imita uma co-
lher. Quando o segmento ST imita uma colher a maior possibilidade é que este paciente esteja
tomando digital. Este medicamento é quase sempre usado nas situações de fibrilação atrial.
Então certamente não erraremos se dissermos “sinais de impregnação digitálica”.
Se existissem três ondas P para um QRS diríamos “resposta ventricular três para um”,
se fossem quatro Ps para um QRS seria “quatro para um”.
Também podemos observar que o formato das ondas P não está dentro dos padrões
da normalidade, pois elas têm 1,5 mm de largura mas tem mais que 2,5 mm de amplitude
(altura). Isso pode significar “hipertrofia de átrio direito”.
No coração normal a despolarização dos átrios acontece da direita para a esquerda e de cima
para baixo fazendo com que a onda P se inscreva positiva nas derivações em que a onda de
despolarização vai de encontro ao eletrodo explorador. No ECG acima encontramos ondas P
negativas em D2, D3, aVF e de V3 a V6. Tal fato só pode acontecer se a despolarização iniciar
em algum local oposto ao nódulo sinusal e o estímulo percorrer os átrios em sentido inverso, ou
seja, de baixo para cima e da esquerda para a direita. Neste ECG o estímulo se origina no nódu-
lo juncional (AV). Nesses casos é típico o espaço PR curto. A onda P fica “encostada” no QRS
porque não existe o retardo imposto pelo nódulo AV. Neste eletro também existe hemibloqueio
do fascículo anterior esquerdo do feixe de Hiss.
BLOQUEIOS ATRIOVENTRICULARES
RITMO JUNCIONAL
BLOQUEIOS ATRIOVENTRICULARES
O retardo fisiológico imposto pelo nódulo A-V não deve ser maior que 0,2 seg o que é i-
gual a 5 mm com velocidade normal do papel que é de 1500 mm/min.
Quando a distância que vai do início da onda P ao início do complexo QRS é maior que 5
mm mas todas as ondas P tem um complexo QRS correspondente nós dizemos que existe
um “bloqueio átrio ventricular de primeiro grau”.
No traçado acima a distância do início de P ao início do QRS é de 5,5 mm ou de 0,22 seg.
Quando existe BAV de primeiro grau devemos estar atentos para evitar o uso de drogas que
possam transformá-lo em um BAV total.
Existem situações
nas quais não con-
seguimos boa visu-
alização de todas as
ondas que compõe
a despolarização
normal. O caso ao
lado “parece” ser
de um BAV de
primeiro grau com
freqüência ventri-
cular de cerca de
110 bpm. quando
observado na velo-
cidade usual do
papel (1500
mm/min) e com a
padronização nor-
mal (N).
Mas aumentando a
velocidade do papel
P para 3000 mm/min
e a sensibilidade do
aparelho para 2N
visualizamos ondas
P (setas) que não
estavam visíveis
P dentro do QRS antes e nosso diag-
nóstico muda para
taquicardia atrial
com cerca de 215
bpm com BAV
total (completo ou
de terceiro grau).
Existem ondas P
“escondidas” den-
tro dos complexos
QRS.
Essas situações
fazem com que seja
ideal que próprio
médico realize o
ECG.
Nas derivações assinaladas por uma seta observe a distância do início de P ao início do
QRS.
Analisando apenas este aspecto que interpretação você faria?
Espaço PR maior que 5 mm mas todas as ondas P são seguidas de QRS. Conclusão: ritmo
sinusal. BAV de primeiro grau.
P-R
Nestas derivações observamos ondas P distanciadas do QRS mas cada uma delas é sempre
seguida de QRS configurando um bloqueio átrio ventricular (BAV) de primeiro grau num
paciente em uso crônico de betabloqueador como antihipertensivo. Neste caso impõe-se a
retirada do medicamento e sua substituição por outro agente anti-hipertensivo para evitar que
aconteça o que vemos abaixo.
V1
V2
Resposta : BAV total. Ritmo ventricular bradicárdico com cerca de 37 bpm. Se este paciente
estiver sintomático (muito cansaço, sonolência excessiva) além da retirada do medicamento
poderá ser necessária a instalação de um marcapasso provisório (até que a situação seja rever-
tida).
Obs.: a configuração e a largura das ondas P nos traçados desta página permitem supor “hiper-
trofia de átrio esquerdo”. Nas derivações acima (V1 e V2) existem ondas Q patológicas signi-
ficando zona inativa (infarto antigo) em parede anterior.
mas, de repente, uma onda P (seta) deixa de ser conduzida pelo nódulo juncional, como
podemos ver no ECG a seguir. Este é um acontecimento que pode ocorrer de maneira iso-
lada ou cíclica.
Este tipo de bloqueio pode acontecer a qualquer tempo, não obedecendo a um padrão
determinado mas também pode repetir-se ciclicamente, por exemplo, a cada 4 ou 5 comple-
xos normais uma onda P deixa de ser conduzida. Quando este BAV se repete de maneira
cíclica ele é descrito como BAV periódico de segundo grau 4 para 1 ou 5 para 1, dependendo
da quantidade de QRS normais e das ondas P bloqueadas.
Os intervalo PR podem ser constantes, com tempo normal de condução A-V, mas es-
ta arritmia se acha associada com maior freqüência ao BAV incompleto de primeiro grau.
Este tipo de bloqueio de segundo grau, também denominado Mobitz tipo II ou BAV
intermitente, poderá determinar um prognóstico mais grave que o BAV tipo Mobitz I se
estiver associado ao infarto agudo do miocárdio.
Os bloqueios AV podem ser produzidos por vagotonia, intoxicação digitálica, quini-
dina, uso de betabloqueadores, alguns antiarrítmicos, infecções agudas, na febre reumática
indicando miocardite, miocardite diftérica, anomalias congênitas, insuficiência coronariana
crônica ou infarto agudo do miocárdio causado por oclusão da coronária direita que é a prin-
cipal responsável pela irrigação do nódulo A-V.
Um bloqueio AV que determine bradicardia severa poderá produzir síndrome de Sto-
kes-Adams e até a morte por fibrilação ventricular. Em pessoas idosas uma bradicardia de 40
a 50 bpm poderá ser suficiente para determinar hipóxia cerebral e todas suas conseqüências.
Nesse tipo de BAV o espaço PR vai se tornando progressivamente maior porque a refratariedade
do nódulo juncional aumenta gradativamente, até que uma onda P “não passa”, como podemos
ver abaixo. Esse fato, geralmente é cíclico, isto é, se repete por um período de tempo.
1 2 3 4 p
Observe nos dois primeiros P-QRS que os espaço PR é normal, no terceiro complexo o
espaço PR é um pouco maior, no quarto já constitui um BAV de primeiro grau e, a seguir a onda
P aparece sozinha e depois normaliza outra vez.
O nódulo AV vai se tornando mais refratário a cada sístole, o que aumenta progressiva-
mente o espaço PR até que acontece o BAV total com ausência de sístole ventricular e uma
grande pausa diastólica. Este tempo de interrupção é necessário para que o nódulo A-V recupere
suas condições normais e recomece a transmitir o impulso. O primeiro PR que segue a pausa tem
um intervalo normal e a seguir, de novo, o tempo de condução AV vai aumentando até que ocor-
ra novo bloqueio A-V. De um modo geral este acontecimento se repete a cada 3 a 6 sístoles ven-
triculares.
Marca-passo artificial
Ritmo juncional
Não é um ritmo sinusal. Olhe de novo e observe que as ondas P são negativas em D2, D3,
aVF, e de V3 a V6. Isto acontece porque o estímulo está sendo gerado em um local oposto ao
nó sinusal e este local é o nó juncional (AV) e neste caso o caminho da corrente elétrica é
percorrido em sentido inverso, de baixo para cima, o que provoca a inversão das ondas P.
Trata-se, na realidade, de um verdadeiro ritmo juncional.
O QRS normal deve ter menos que 2,5 mm de largura (ou seja, menos que 0,10 seg de
duração). Quando os QRSs aparecem mais largos que isso é porque existe algum impedimento
ao trânsito normal da corrente elétrica através de um ou mais ramos do Feixe de Hiss. Diz-se
então que existe um Bloqueio de Ramo que pode ser do ramo Direito ou do ramo Esquerdo do
feixe de Hiss, dos dois ramos, do Hemi-Ramo Anterior Esquerdo (é comum) ou do Hemi-
Ramo Posterior Esquerdo (é raro).
Quando os QRSs aparecem mais largos que o normal devemos identificar em qual
ramo é o bloqueio. Esse alargamento do QRS provoca um entalhe no traçado do QRS e esse
entalhe faz com que, em alguma derivação, o complexo QRS fique parecendo uma letra M
maiúscula. Para identificar um bloqueio completo de ramo esquerdo ou direito devemos pro-
curar em qual derivação está acontecendo um QRS parecido com letra M. A formação de “M”
acontece porque primeiro despolariza o ventrículo cujo ramo de condução não está bloqueado
e, com retardo, despolariza o ventrículo do ramo bloqueado, ou seja, acontecem dois QRSs
quase sobrepostos.
Se o QRS aparece com formato de M e com largura de 3 mm ou mais (duração de
0,12 seg. ou mais) nas derivações precordiais direitas (V1, V2 ou V3) podemos afirmar que
existe Bloqueio Completo de Ramo Direito do Feixe de Hiss.
Se o QRS aparece com formato de M e com largura de 3 mm ou mais (duração de
0,12 seg.) nas derivações precordiais esquerdas (V4, V5 ou V6) podemos afirmar que existe
Bloqueio Completo de Ramo Esquerdo do Feixe de Hiss.
Em algumas situações é difícil encontrar um QRS semelhante a uma letra M nessas
derivações. Nesses casos nós temos que usar a imaginação para “ver” a letra M ou buscá-la
nas derivações do plano frontal que “espiam” essas áreas e que são principalmente as deriva-
ções aVR e D3 (ramo direito) e aVL e D1 (ramo esquerdo).
Noutras situações, mais raras, encontramos uma deformação de QRS que imita uma
letra W. A letra W é um M de cabeça para baixo. Se aparecer um W em V1, V2 ou V3 (pre-
cordiais direitas) podemos afirmar que o bloqueio é do ramo esquerdo. Se aparece um W em
V4, V5 ou V6 podemos dizer que o bloqueio é de ramo direito. O mesmo vale para as deriva-
ções do plano frontal (D1, D2, D3, aVR, aVL, aVF).
No ECG da página seguinte pode-se ver claramente a deformação do QRS parecendo
um letra M em V2 e V3 e nas derivações D3 e aVR, com um pouco de boa vontade, pode-se
“imaginar” um QRS com formato de letra M.
Interpretaríamos o eletro assim: ritmo sinusal regular com 75 bpm. Bloqueio Comple-
to de Ramo Direito do Feixe de Hiss.
Imagine o M
Imagine o M
O ECG ao lado
mostra um caso
de Bloqueio
Completo de
Ramo Esquerdo
do Feixe de
Hiss.
Alguns pacien-
tes podem apre-
sentar BCR em
um ECG e não
apresentá-lo em
outro.
Para exemplifi-
car o acima
citado mostra-
mos o ECG de
um paciente que
apresentava
BCREFH quan-
do fazia inspira-
ção profunda e
voltava ao tra-
çado normal
quando expira-
va, como se
pode ver ao
lado. Na verda-
de o bloqueio
aparece com o
aumento da
freqüência car-
díaca e desapa-
rece com a di-
minuição da
mesma.
RSr
rSr
rSR
RR
rR
W em aVR M em V6
Acima estão vários formatos de QRS nos bloqueios de ramo. Quando um dos ramos do feixe de Hiss
retardar a passagem da corrente elétrica o QRS se apresentará alargado (QRS com 2,5 mm de largura é
hemibloqueio de ramo; QRS com 3 mm ou mais de largura é bloqueio completo de ramo). Alguns deles
ficarão idênticos a uma letra M. Para definir se é um bloqueio de ramo direito ou esquerdo procure o M
e observe em qual derivação está o M. A localização do M em D1, aVL, V4, V5 ou V6 indica BREFH.
A localização do M em aVR, V1, V2, V3 indica BRDFH. Um W é um M invertido (imagem em espe-
lho). Um W em aVR, ou V1, V2, V3 indica BRE. Um W em D1, aVL, V4, V5, V6 indica BRD.
Os complexos QRS
apresentados neste
ECG são mais largos
que o normal, estando
a sua largura máxima
em torno de 2,5 mm.
Nenhum deles tem
mais que 2,5 mm.
Nesta situação em que
a largura dos QRS não
atinge mais de 2,5 mm
mas tem mais que 2
mm nós dizemos que
existe um hemiblo-
queio de ramo.
Na sua imaginação
faça um entalhe no
topo da R de D1 e veja
a letra M.
Aprofunde o entalhe
em D3 e veja o W
De novo, imagine a
letra M no topo do
QRS de aVL
hemibloqueio de ramo
esquerdo.
D1
V1
Hemi Bloqueio Anterior Esquerdo – é determinado pelo eixo elétrico em torno de menos
60 graus e presença de ondas S de V1 até V6. O QRS poderá, ou não, estar alargado.
D2 V2
V3
D3
aVR
aVL
aVF V6
Esta figura foi obtida recortando-se os QRSs das derivações do plano frontal (D1, D2, D3,
aVR, aVL e aVF) e das derivações precordiais do eletro da página anterior, que foram então
aplicadas sobre seus respectivos eixos de modo a facilitar a visualização do eixo elétrico nos
dois planos. Isto que fizemos, “recortar e colar”, deve ser feito sempre em sua imaginação
quando você tiver que determinar o eixo elétrico de um coração. Em muitas páginas deste
livro você encontrará estas figuras. Exercite mentalmente o “recortar colar” para determinar
os eixos elétricos até que isso se torne automático na sua mente.
Veja como o bloqueio do fascículo anterior do ramo esquerdo do feixe de Hiss faz com que o
eixo elétrico no plano frontal fique desviado para cerca de menos sessenta graus e que, nas
precordiais, o eixo fique completamente voltado para a região posterior, para trás. Isso aconte-
ce porque o estímulo não passa pelo hemi-ramo anterior esquerdo porque que ele está bloque-
ado.
Obs. : se você não lembra dos “caminhos do estímulo elétrico” volte na página 5.
Este ECG tem QRSs com 2,5 mm ou mais de largura em todas as derivações. Com um
pouco de imaginação você pode “ver” o M em D1, e aVL, bem como em V6.
Você já sabe que isso caracteriza um bloqueio de ramo esquerdo. Também
parece que existe zona inativa em face anteroseptal (ou até face lateral).
Mas quando existe bloqueio completo de ramo esquerdo a recomendação é “não di-
zer mais nada” porque o BCREFH altera a despolarização e o eixo elétrico de maneira que não
podemos afirmar a existência de zona inativa.
ISQUEMIA / INFARTO
ST LONGO
ONDA T PLANA
ONDA T IN-
VERTIDA E
SIMÉTRICA
ST DESCENDENTE
DEPRESSÃO DE ST
ONDA T
DIFÁSICA
1 2 3 4
1 – Ponto J, ST e T normais.
2 - depressão de st significa isquemia (corrente de lesão) subendocárdica
3 - elevação de ST significa isquemia (corrente de lesão) subepicárdica depressão deSTt.
4 - Ondas Q patológicas são aquelas que tem mais que 0,03 seg. de duração (1 milímetro)
e cuja amplitude corresponde a 1/3 ou 1/4 da onda R naquela derivação. Para ter significa-
do de infarto a onda Q patológica deve aparecer em mais de uma derivação.
QT
O ECG acima não mostra sinais evidentes de isquemia, mas é de um paciente com queixas
típicas de dor anginosa. Acreditando na clínica realizamos ergometria que está na página se-
guinte.
EXTRA-SÍSTOLES VENTRICULARES
ECG mostra possível zona inativa (ZI) anterior. Isquemia septo-lateral. Cine: coronária direita
é dominante e ocluída no terço proximal, suas porções distais se opacificam tardiamente por
circulação colateral inter e intracoronariana. Coronária esquerda com lesão de 50 % no tronco,
descendente anterior com lesão segmentar de 80% no terço proximal junto à origem do grande
ramo diagonal que apresenta lesão de 80% no terço proximal, artéria circunflexa com lesão de
90% no terço proximal. Ventrículo esquerdo com volume diastólico aumentado e acinesia
inferior.
Ondas Q puras de V1 a V3
Ondas Q puras indicam zona inativa (infarto) e sua localização mostra as paredes afetadas (V1
a V3). A onda R de V4 deveria ser maior mas certamente não é maior porque houve destrui-
ção de massa muscular também em V4. O ponto J e o segmento ST não estão desnivelados,
portanto não existe isquemia atual. Interpretaríamos este ECG assim: ritmo sinusal com 55 a
60 bpm. Zona inativa ântero-lateral.
Realizada a cineângio que mostrou aterosclerose severa da artéria descendente anterior e mo-
derada da coronária direita. - VE com volume diastólico aumentado e acinesia ântero- apical.
Lesão excêntrica de 60 a 70 % no 1/3 proximal da coronária direita.
AVL
V5
Devido ao quadro
clínico e às altera-
ções eletrocardiográ-
ficas o paciente foi
hospitalizado e evo-
luiu para o infarto.
aVF V6
Masculino, 65 anos, normotenso, com queixas típicas de angina. O eletrocardiograma mostra eixo
elétrico em torno de menos 30 graus, ritmo sinusal com cerca de 60 bpm. A largura dos QRS é normal.
O ponto J não se apresenta desnivelado com relação à linha de base em nenhuma das derivações. O
segmento ST é anormal (retificado) em quase todas as derivações. A onda T é francamente anormal em
V2, V3 e V4 (invertida e simétrica) indicando isquemia ântero-septal. Estes achados eletrocardiográ-
ficos somados a sintomatologia do paciente, impõe que se continue a investigação e foi nosso critério
dispensar a ergometria passando logo a cineângio que constatou lesões severas em três coronárias.
D1 D2 D3
Paciente sexo feminino, 67 anos, hipertensa compensada com atenolol 100 mg/dia, com
queixas típicas de dor anginosa aos esforços leves, tais como estender a cama, varrer a casa
ou caminhar uma quadra em passo normal. O ECG acima foi registrado com a paciente
assintomática e pode ser interpretado como “Ritmo sinusal com 55 bpm (1500/27=55,5),
zona inativa ântero-septal (onda Q pura em V1, mínimas ondas R em V2 e V3), sugestivo
de isquemia em face lateral (retificação de ST de V4 a V6 e ondas T difásicas em V5 e
V6)”.
Acreditando na clínica encaminhamos a paciente a uma ergometria que está na pró-
xima página.
D1 D2 D3
D1 D2 D3
Paciente com sintomas típicos de angina , ECG registrado em momento que o paciente estava
sem dor mostra ST retificado em D1 (D1 vê a parte lateral alta de VE), inversão de ondas T
em D2, D3 e aVF (derivações que vêem a parede diafragmática do coração) e inversão de T
de V4 a V6 (parede lateral). O ECG permite supor isquemia em faces diafragmática e lateral.
Isto é suficiente para darmos o próximo passo na investigação que é a realização da cineangi-
ocoronariografia. A realização, ou não, da ergometria depende do bom senso na avaliação
clínica dos sintomas relatados.
Observe o ECG acima seguindo a seqüência ensinada. Verifique se existe onda P po-
sitiva em D1. Não consegue vê-la? Procure em outras derivações. Em D2, D3, aVL e aVF a
linha de base é ondulada e também não se visualizam ondas P. O espaço entre os QRS é vari-
ável. Trata-se de uma fibrilação atrial. O ritmo ventricular é irregular com 60 a 75 bpm. A
largura dos QRSs é normal? Sim, então não existe bloqueio de ramo. Observe o ponto J o
segmento ST e a onda T em D2, D3, aVF (derivações da face inferior): existe infradesnivelo
de ponto J e inversão de T = isquemia.
Observe as precordiais. Existem ondas Q puras de V1 a V4 = infarto. Observe o ponto
J/ST/T: existe supradesnivelo de ponto J/ST de V1 a V4 = infarto ântero-lateral em fase
aguda.
Em V6 observa-se infradesnivelo do ponto J e do segmento ST = sugere isquemia em
face lateral. Este ECG foi obtido duas horas após o início da precordialgia.
ECG da paciente da página anterior 15 dias após o episódio agudo mostra fibrilação atrial,
ritmo dos ventrículos com cerca de 75 a 85 bpm., ondas Q patológicas de V1 a V5 e falta
de uma onda R “normal” para V6. Também aparecem ondas Q em D1, aVL , isto faz supor
que a área de necrose ampliou para a face lateral caracterizando um “infarto ântero-lateral”
também chamado infarto anterior extenso.
Persiste o supradesnivelamento de ST nestas derivações. Esta alteração do segmen-
to ST desaparece, em geral, cerca de quatro a oito semanas (dois meses) após o episódio de
infarto agudo sem outras complicações.
Quando, após um infarto, o segmento ST se mantém supra-desnivelado por mais de
dois meses, nos permite supor que na área infartada formou-se um aneurisma.
Este ECG mostra eixo elétrico verticalizado. Ritmo sinusal com cerca de 75 bpm. A amplitude
dos QRS permite supor hipertrofia de VE. A falta de ondas R de V1 a V3 faz pensar em zona
inativa ântero-septal. A inversão e simetria das ondas T de V4 a V6 mais o infradesnivelamen-
to de ST em V5 e V6 sugerem isquemia septo-lateral. A inversão de T em D1 e aVL sugere
que a face lateral alta também está comprometida e a inversão de T em D2 e aVF faz pensar
no comprometimento da face inferior na ponta do VE.
Todos os traçados desta página correspondem às derivações periféricas D1, D2, D3, aVR,
aVL e aVF respectivamente. O traçado acima não tem alterações patológicas.
D2 D3 aVF
D2, D3 e aVF são as derivações que vêem o coração por baixo, sua face diafragmática. Note
o supradesnivelamento de ST nestas derivações. Estão começando a aparecer ondas Q nestas
derivações. O infradesnivelamento que existe em D1 também pode ser visto, algumas vezes,
em V5 e V6 e significa um certo grau de isquemia da parede lateral. Estas alterações são típi-
cas de infarto que aconteceu há algumas horas.
D2 D3 aVF
Infarto em face inferior (ou diafragmática) antigo (cicatrizado) demonstrado pela presença de
ondas Q patológicas em D2, D3 e aVF e ondas T normais
V1 As alterações de ST/T
D1 devidas a isquemia e a
D1 V1 digital são diferentes.
A digoxina é um dos
fármacos que altera
caracteristicamente o
eletrocardiograma. As
alterações produzidas
D2 V2 podem ser vistas no
segmento ST que se
deforma ficando seme-
D2 V2 lhante a uma colher
vista de perfil. É o caso
do ECG ao lado que
apresenta alterações de
ST/T principalmente
D3 V3 em D2, D3, aVF, e de
V4 a V6.
O espaço PR também é
prolongado pela digo-
D3 V3 xina que, em casos de
toxicidade pode causar
bloqueio átrio-
ventricular.
No caso ao lado o espa-
aVR V4 ço PR está no limite
máximo da normalidade
(5 mm). A freqüência
cardíaca também é re-
duzida pela digoxina.
aV Interpretaríamos este
V4 ECG assim: “Eixo ver-
ticalizado. Ritmo sinu-
V5 sal regular com 65 bpm.
AVL Espaço PR limítrofe.
Alterações de ST/T
sugestivas de impreg-
nação digitálica.”
Pacientes que tomam
aV
digoxina geralmente
V5 também tomam furo-
semida ou outro espoli-
AVF V6
ador de potássio. Na
hipopotassemia os si-
nais de impregnação/
intoxicação podem
acontecer mesmo com
doses terapêuticas de
digoxina.
Prof. Me. João Carlos Hosni, Iniciação em Eletrocardiografia, 107 p.
81
Sem nenhuma dificuldade você pode observar ondas Q patológicas em D2, D3, e aVF. Estas
derivações “vêem o coração por baixo”, sua face inferior. Isto indica infarto (zona inativa)
em face diafragmática. Nas derivações V1 e V2 você encontra ondas R e não encontra ondas
S. Se você virar a página de cabeça para baixo e contra a luz você verá que, na verdade, essas
ondas R são ondas Q. Isto significa que a corrente elétrica está vindo em direção a V1 e V2 e
praticamente nenhuma corrente elétrica vai em direção a região dorsal do coração porque
aconteceu um infarto na face posterior deste coração. Se colocar um espelho sobre elas, verá
o mesmo (imagem em espelho). O ponto J e o segmento ST nestas derivações não estão na
linha isoelétrica. Por isso podemos supor que o infarto ainda não está bem cicatrizado, ou
seja, está “em evolução” mas não podemos afirmar há quanto tempo.
EXTRA-SÍSTOLES
P Extra-sístoles supra-
ventriculares não
tem imagem de blo-
queio de ramo e são
quase idênticas às
sístoles sinusais
Extra-
sístoles
As ondas P vem seguidas de QRS nas sístoles de origem sinusal. Nestas derivações registram-
se extra-sístoles que se repetem de maneira intercalada a cada sístole sinusal. Isto constitui
uma “arritmia rítmica” que tem a denominação de extra-sistolia em bigeminismo. Extra-
sístoles em bigeminismo são típicas da intoxicação digitálica, mas também podem aparecer
sem que o paciente faça uso de digital.
V4
14 28
mm mm
EXTRA-SÍSTOLES SUPRAVENTRICULARES
V5
P NORMAL P INVERTIDA
TAQUICARDIA VENTRICULAR
HIPERTROFIA DE
VENTRÍCULO ESQUERDO
É importante lembrar que em pacientes muito magros a amplitude dos QRS é maior
mesmo que não haja hipertrofia. Isso acontece devido a proximidade do coração à parede
torácica. O contrário também é verdadeiro. Em gordos ou em enfisematosos os complexos
tem a amplitude diminuída devido a camada de isolante (gordura ou ar) interposta entre o
coração e os eletrodos.
DETERMINE O EIXO
Para interpretar o ECG da página anterior (e qualquer outro) responda as seguintes perguntas:
Tem onda P? Tamanho e forma de P?
Cada onda P é seguida de QRS?
O intervalo PQ é normal?
Qual o eixo elétrico?
Amplitude dos QRS é normal?
Qual a largura do QRS ?
Existe desnivelamento do ponto J?
O segmento ST é normal ?
A onda T é normal ?
O intervalo QT é normal para a freqüência cardíaca?
E, sempre, devemos lembrar que o quadro clínico do paciente pode nos dar algum subsídio
para tirar mais conclusões do exame.
O ECG da página anterior mostra um ritmo sinusal (cada onda P é seguida de QRS)
com 60 a 65 bpm (velocidade do papel = 1500, dividida pela distância em milímetros que
existe entre dois QRS).
O eixo elétrico está em torno de –30 graus (pegue a maior onda R de D1, D2, e D3 e
coloque sobre o respectivo eixo de derivação. Faça o mesmo com a maior onda R que houver
em aVR, aVL e aVF. O eixo elétrico estará situado entre estas duas derivações.
A forma e largura das ondas P (com mais de 2,5 mm e entalhadas ou difásicas em al-
gumas derivações) permite supor hipertrofia de átrio esquerdo.
A largura dos QRS é normal, mas sua amplitude permite dizer que existe hipertrofia
de ventrículo esquerdo (reveja os critérios diagnósticos para hipertrofia de VE).
O ponto J apresenta desnivelamento, mas este não é maior que 1,5 mm em ne-
nhuma derivação, por isso não temos este critério para isquemia.
A onda T apresenta-se invertida ou difásica (mas não é simétrica) em algumas deriva-
ções. Ondas T invertidas ou difásicas podem significar isquemia, mas também aparecem na
sobrecarga e na hipertrofia de VE e este é o caso de nosso paciente (hipertenso severo e com
hipertrofia de VE). Considerando os dados clínicos podemos supor que ele seja portador de
isquemia relativa do miocárdio secundária a situação clínica existente (hipertrofia e hiperten-
são) podendo ou não haver comprometimento coronariano. Quando não há critérios para
isquemia, mas as Ts são invertidas diz-se que existe padrão de sobrecarga de VE.
O intervalo QT corrigido para freqüência cardíaca está dentro do padrão de normali-
dade (veja tabela de intervalos QT corrigidos).
Neste paciente é imperativo reduzir a pressão arterial gradativamente, se possível para
níveis “normais” e, com o transcorrer do tempo reavaliar com eletrocardiograma e, se o paci-
ente, apesar da redução dos níveis pressóricos apresentar dores sugestivas de angina, indicar
realização de cateterismo cardíaco sem realizar ergometria prévia.
D1 D2 D3
Na época em que atendemos este paciente, nossa cidade não dispunha da cintilografia
miocárdica que, se pudesse ter sido realizada, provavelmente mostraria ser desnecessária a
cineângio.
V1
Observe o QRS V3
ONDA alargado no início ONDA P
DELTA da onda R.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DECCACHE, W. Arritmias cardíacas. Livraria Atheneu S. A., Rio de Janeiro, 1971. 301p.
GERMINIANI, h., Diagnóstico e terapêutica das arritmias cardíacas, Fundo Editorial Bik-
Procienx, São Paulo, 1978. 406p.
PHIBBS, B., The cardiac arritmias, The C. V, Mosby Company, Saint Louis, E. U., 1973.
205p.
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Setembro – 2000