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Rev. Pol. Púb. e Seg. Soc.

| 2018/2

O RACISMO INSTITUCIONAL E A CONVIVÊNCIA FAMILIAR DE CRIANÇAS E


ADOLESCENTES

Vanessa Cristina dos Santos Saraiva 1

Resumo:

O estudo realiza uma análise entre os conceitos: convivência familiar, família, racismo e os
limites enfrentados para a materialização desse direito quando problematizamos a
realidade de adolescentes negros abrigados. Objetivamos compreender em que medida as
relações racistas repercutem na qualidade dos serviços ofertados e de que maneira atinge a
população usuária. Pressupomos que não somente os determinantes econômicos interferem
nessas relações, sendo importante considerar outros aspectos tais como os que se
desdobram a partir das desigualdades sociais tendo como expressão maior o racismo
estrutural e institucional.

Palavras-chave: Direito à Convivência Familiar, Infância e Adolescência, Racismo


estrutural e institucional, Negação de direitos.

INTRODUÇÃO

No Brasil a população negra (composta por pretos e pardos autodeclarados)


corresponde a 54% dos dados de acordo com o IBGE/2014, sendo que a população negra é a
maior vítima de todas as formas de violência. O processo de genocídio da população está em
curso desde o período pós-abolição e se expressa de distintas formas. Verificamos isso
quando percebemos que grande parte das famílias negras vive em espaços urbanos e/ou
rurais distanciados dos centros urbanos, com ausência de informações e com dificuldade de
ter acesso a bens e serviços de qualidade (saúde, educação, saneamento básico, internet,
tecnologias, etc.), o que as torna mais vulneráveis. Diante disso, é impossível desconsiderar
a existência de um processo de negação de direitos e de genocídio. E isso nos demonstra o
quão urgente, importante e necessário é problematizar esses aspectos.

1
Assistente Social. Atuou como Professora Substituta da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro 2018-
2019. Atuou na Prefeitura Municipal de Duque de Caxias entre 2015-2017 em Abrigo Institucional e Conselho
Tutelar. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (PPGSS/UERJ). Mestre em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Especialista em Políticas Sociais e Intersetorialidade pelo Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e
do Adolescente Fernandes Figueira Fiocruz. Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa e Extensão em Direitos
Humanos, Infância, Juventude e Serviço Social (NUDISS) – UFF. Email: vancristinasaraiva@gmail.com

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Objetivamos diante disso, compreender a gênese desse projeto genocida à brasileira,


bem como avaliar os impactos que essa dinâmica provoca nas relações sociais, no acesso aos
serviços na atualidade. Além disso, almejamos construir uma proposta de reflexão
antirracista e que se contrapõe as desigualdades sociais violências e negação de direitos.
Para viabilizar nosso estudo adotaremos a revisão bibliográfica de autores que têm pensado
a formação social brasileira, o período colonial, o escravismo, a invisibilização do genocídio
a partir do pacto democrático racial. Assim como, os impactos que essa formação
civilizatória que nega os direitos reverbera na atualidade em face da população negra. Nesse
sentido, procuramos incorporar as elaborações de autores com Quijano, Moura, Mazzeo,
Carneiro, Almeida e outros. Tudo isso na tentativa de elucidar nossos anseios. A nossa
hipótese é que diante desse marco civilizatório capitalista e racista as crianças e adolescentes
negros, bem como suas famílias têm uma situação de desigualdade agravada, pois mesmo
diante de um momento histórico que têm concretizado a regulamentação de leis e normas
que assegurem direitos, esses são negados a essas famílias cotidianamente a partir de um
processo genocida, tendo o Estado um instrumento fundamental nessa dinâmica.
Para compreender essa dinâmica buscaremos relacionar os impactos dessa formação
social sobre a situação de crianças e adolescentes que permanecem em cumprimento de
medida “protetiva” de acolhimento institucional, as dificuldades de viabilizar o acesso aos
direitos desse segmento, sobretudo, o de convivência familiar e comunitária. Tal campo de
atuação perpassado por inúmeras complexidades nos conduz a realizar uma série de
questionamentos dessa realidade social, do espaço socioprofissional do Assistente Social e
das demandas apresentadas pelos usuários cotidianamente. Mas esses questionamentos
exigem a compreensão de qual sociedade estamos inseridos, os pressupostos econômicos,
políticos e culturais que perpassam essa realidade, as particularidades do processo de
formação sócio-histórico brasileiro e os impactos dessa dinâmica no decorrer do processo de
trabalho do assistente social nessa área de atuação. Ou seja, se faz necessário situar todas
essas determinações, a situação dessas crianças e adolescentes nos marcos do capitalismo na
Era da Financeirização.
Isso porque, no cotidiano de atuação profissional (de Assistentes Sociais e outros
profissionais) nos deparamos com indivíduos concretos, reais, que enfrentam condições
materiais de vida cheias de limitações e privações para se inserirem produtivamente de
acordo com as exigências da sociedade atual (classista, racista, perpassada pelo patriarcado e
desigualdade) e que dependem, para sua sobrevivência, dos bens e serviços que são

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ofertados pelo Estado (que historicamente atende as exigências da burguesia) e outras


instituições públicas e privadas. No processo empírico podemos constatar a existência
dessas condições de vida e os padecimentos que provocam em milhares de indivíduos,
sobretudo, no segmento negro e pauperizado, historicamente, o condicionando a um lugar
não digno na estrutura sócio econômica, tendo em vista que a base dessas relações está o
modo de produção capitalista (MPC).
Cabe ao Estado, nessa dinâmica, uma função crucial de apoio ao capital no processo
de enfrentamento dessas crises cíclicas. Por isso, esta instituição assume o papel de
mediador dos interesses particulares em função dos interesses do conjunto da sociedade/
interesse geral, sem deixar que se perceba que esse Estado é atravessado por interesses
particulares, interesses de classe que se alçam a universais. Ao mesmo tempo, a classe que
detêm a propriedade dos meios de produção, que são a base da estrutura social do processo
produtivo no MPC, se apresenta para o resto da sociedade como imprescindível para o
funcionamento social, colocando-se acima dos demais indivíduos e ocupando os aparelhos
do Estado para alcançar seus propósitos e aspirações, revestidos de interesses universais.
Nesse sentido conseguimos compreender as ações adotadas por este Estado
atravessado por interesses econômicos e de classe. As medidas adotadas pelos governos
transitam entre tentativas de solucionar questões pertinentes ao processo produtivo, podendo
chegar à instituição de um modelo diferente de regulação social, tal como ocorreu na
Reestruturação Produtiva na década de 1970, para manter as taxas de crescimento e para que
as necessidades da acumulação fossem atendidas. Quanto a classe trabalhadora esse Estado
se torna crucial para controlar, pacificar e imobilizar socialmente a população com vistas a
evitar posturas subversivas, questionadoras e insurgentes que possam derrubar tal modelo.
Mesmo assim, no decorrer da história e mesmo diante desses limites, os sujeitos
conseguiram, mediante intenso processo de lutas de classes, conquistar direitos que estavam
inteiramente vinculados à situação de vida insalubre em que estavam situados tanto na vida
doméstica, quanto no campo do trabalho. E a maior expressão desse intenso processo de
lutas sociais, se consubstanciou no estabelecimento das políticas sociais, as quais passaram a
sofrer influências decorrentes das oscilações do MPC. Baseada na análise de Mandel
(1982), Behring, afirma que a política social é também integrante de um conjunto de
medidas adotadas pelo capital para enfrentar as crises cíclicas inerentes ao modelo
capitalista de produção. Por isso é tensionada, permeada de contradições, por atender ao
mesmo tempo o capital e o trabalho (BEHRING, 2003).

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Nesse sentido nos debruçar sobre essa temática se coloca como tarefa importante,
pois é um mecanismo que propicie visibilidade e tangencie a importância de lutar,
conquistar direitos efetivamente para a população negra e modificar essa realidade
excludente, violadora e desigual. É preciso pautar a luta antirracista, a implementação de
políticas sociais, assim como das ações afirmativas sempre na perspectiva de reparação
social e acesso efetivo da população negra aos direitos.

I. RACISMO ESTRUTURAL E INSTITUCIONAL: elementos importantes para


análise da realidade brasileira

Dialogar a respeito do racismo estrutural e suas diferentes expressões tais como o


racismo religioso, o preconceito, a discriminação, a negação do direto a vida, o genocídio
direcionado a juventude negra, a imobilização econômico-social, na atualidade demanda que
sejam retomados alguns pressupostos, os quais estão inteiramente vinculados a formação
sócio-histórica do Brasil, à época, ainda uma colônia de Portugal. É nesse sentido que
partimos da denominada “aventura” marítima, protagonizada pelos países integrantes da
Península Ibérica, porém buscando realizar uma crítica desses processos a partir de uma
perspectiva decolonial. Porém compreendemos que esses processos são reproduzidos
atualmente a partir de uma visão eurocêntrica (QUIJANO, 2015).
Todavia é fundamental evidenciar que a falência do modelo de produção feudal, a
fome provocada pelo baixo desenvolvimento das forças produtivas e, além disso, o fato
desses países estarem voltados para o mar os obrigou a buscar novas alternativas de
sobrevivência em diferentes espaços territoriais ao mesmo tempo em que o capitalismo
inicia um processo de universalização do sistema (MOURA, 1994; MAZZEO, 1997,
ALMEIDA, 2017; PRADO JÚNIOR, 1942).
Assim, Portugal ao desbravar os mares “descobriu”2 o Brasil e o intitulou enquanto
colônia da coroa portuguesa. Passou a adotar uma série de medidas para desenvolver a terra
recém-descoberta, precisando para isso, incorporar o escravismo, haja vista que não existia
mão-de-obra/ corpo de trabalhadores aptos a atividade laborativa. Além de força de trabalho
os escravizados eram também mercadorias que pontencializavam o comércio da grande
empresa colonial, tendo em vista o tráfico negreiro. Nesse sentido, é necessário compreender

2
O uso das aspas é para sinalizar que não concordamos com a ideia de descobrimento, haja vista que na
chegada dos europeus já existiam povos originários nesse território com organização política, social e
econômica próprias.

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que o escravismo é resignificado3 pelo capital para que o sistema conseguisse ser expandido
e iniciar o ciclo lucrativo de forma plena. Ou seja, a escravidão se tornou mecanismo
funcional ao capital, à obtenção de lucros e a universalização do sistema (PRADO JÚNIOR,
1942; SANTOS NETO, 2015).
Exemplo de aumento de lucratividade é o caso do Brasil. Nosso país foi um dos
maiores importadores da mão-de-obra escrava. Contudo, é fundamental perceber que esse
segmento antes de se tornarem escravos por mediação das ações eurocêntricas e violentas os
africanos que não eram apenas de um único grupo étnico, tinham suas famílias, suas
particularidades e especificidades, mecanismos de comunicação próprios, formas de ver e
compreender o mundo. A partir do escravismo o negro (nomenclatura criada pelo homem
branco que o escravizou) adquire um status de objeto, uma coisa, uma peça, um utensílio
que foi “jogado” em um continente diferente para se tornar um valor de troca fundamental
da engenharia capitalista. O negro em diáspora forçada perde sua identidade, sua capacidade
de organização social, seu direito de cultuar seus deuses mediante imposição de uma cultura
cristã de base eurocêntrica e de uma violência epistemicida (CARNEIRO, 2005;
ALMEIDA, 2011).
Ou seja, o negro, para o colonizador, não passava apenas de uma mercadoria, a qual
não poderia sofrer nenhum tipo de intervenção a não ser do seu proprietário. E visando
otimizar a capacidade trabalho desse negro castigos físicos e diferentes mecanismos de
humilhação eram largamente adotados naquele período. Existem alguns questionamentos
sobre uma possível ausência de reação ou resistência do povo negro diante do escravismo.
Segundo Nascimento (1978) é falaciosa essa afirmação, pois o banzo / melancolia, os
suicídios, as fugas, as organizações quilombolas tais como a de Zumbi e de Dandara e a
reação dos donos de escravos que aplicavam castigos mais cruéis e até mesmo executavam
um grande número de escravizados, já nos evidenciam que ocorreu sim uma resistência
organizada por esse segmento, mas silenciada pela história contada por homens brancos,
sexistas e racistas (CARNEIRO, 2005; NASCIMENTO, 1978; MOURA, 1994).
O que devemos levar em consideração é o fato de que as relações desse tipo (escravo
como sinônimo de mercadoria) seguiram inalteradas por anos. Mas a situação parecia que
3
Em outras organizações sociais, no decorrer da trajetória da humanidade, sempre existiu formas de
escravização, porém apresentando sentidos e objetivos diferentes. Em Atenas alguns escravos eram utilizados
para formar as forças policiais. Outros eram usualmente empregados em atividades artesanais e, por conta de
suas habilidades técnicas, tinham uma posição social de destaque. Em certos casos, um escravo poderia ter uma
fonte de renda própria e um dia poderia vir a comprar a sua própria liberdade. Em outros termos, o escravismo
nos Marc os do capitalismo passa a ser adotado como formas de impulsionar os lucros e tudo isso marcado por
uma intensa violência.

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iria se modificar em 1845 com a proibição da Inglaterra de que o tráfico negreiro


continuasse ocorrendo. Contudo, essa lei não era respeitada, pois afetava o desenvolvimento
da empresa colonial. Ou seja, a lei de proibição do tráfico negreiro se tornou apenas uma
letra morta e os escravos continuavam a ser comercializados clandestinamente (MAZZEO,
1997).
No Brasil é somente em 1850 que a Lei Eusébio de Queirós4 é concebida com a
finalidade de modificar essa realidade. Mesmo assim, o tráfico negreiro perdurou por anos,
bem como as formas de tratamento violador e desumano sobre os negros. Isso porque a
mão-de-obra escrava era extremamente importante para o desenvolvimento do Brasil no
campo econômico, pois esta estava inserida em distintas áreas de trabalho: na área agrícola,
na construção, no trabalho doméstico, no artesanato. Ou seja, com a inserção do negro para
atuar nas plantações, na construção de igrejas, casarões, fortes, foi potencializado o
desenvolvimento da riqueza do Brasil. Mas como já sinalizamos anteriormente: o escravo
era resistente ao tratamento desumano direcionado a esse segmento, e, prontamente eles
tentavam resistir a tudo isso por meio de organização de fugas e suicídios. E como o lucro
não deveria ser impedido os castigos eram cada vez mais adotados como forma de
domesticar, passificar, adoecer e enfraquecer qualquer possibilidade de organização política
contra o sistema escravocrata.
Ao mesmo tempo, existia uma preocupação central a respeito da condição do país
ainda como colônia de Portugal e da necessidade de se realizar uma revolução anticolonial
com vistas a assegurar a emancipação política do Brasil com o protagonismo da burguesia
latifundiária. Assim, constrói-se um aparelho de Estado (soberania, povo, delimitação de
território, instituição jurídica, legislativa, forças armadas, funcionalismo público) que busca
atender as necessidades desse segmento e que mantivessem afastadas quaisquer posturas
radicais, incluídas àquelas que prejudicassem o desenvolvimento do país. Nesse sentido,
conseguimos compreender o porquê da condição do negro no Brasil ser um assunto
secundarizado e invisibilizado há anos. Era necessário manter o status quo vigente mesmo
que prejudicasse os escravos. A lógica é ampliar a bases de funcionamento do capital e
lucrar!

4
A Lei Eusébio de Queirós (Lei nº 581), promulgada dia 4 de setembro de 1850, visava a proibição do tráfico
de escravos no Brasil. A lei foi elaborada pelo político brasileiro Eusébio de Queirós Coutinho Matoso da
Câmara (1812-1868), durante o Segundo Reinado.

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Nosso país consegue, posteriormente, se emancipar de Portugal e seguir “livre”5 das


amarras que essa relação preconizava. A situação do negro no Brasil também se modificou
com a falaciosa abolição da escravidão gradual e tardia em 1888. O Brasil foi o último país a
libertar a população escrava. E só o fez porque o escravismo havia se tornado atividade que
provocava prejuízos ao modelo produtivo. Ou seja, o escravismo deixa de atender as
necessidades de acumulação. De acordo com Fernandes (1964) a abolição ocorreu, porém
não conseguiu destituir antigos agentes do trabalho escravizado, bem como não consegue se
estabelecer medidas que visariam a proteção do trabalho livre que o segmento ex-escravo
passaria a realizar. Vale ressaltar que a inserção do negro no circuito do trabalho era uma
possibilidade que logo fora desconsiderada com a chegada da mão-de-obra imigrante. O
processo de imobilização social e genocídio da população negra já estavam em curso
(MOURA, 1994; NASCIMENTO, 1978).
Diante disso, podemos ponderar que as relações raciais estabelecidas a partir do
Estatuto colonial (MOURA, 1994), e percebidas como desumanas, desrespeitosas,
violadoras para com o povo negro não se alteraram, mas sim se reordenaram, e se
mantiveram avançando no tempo, tendo a desigualdade econômica como a grande marca
desse processo, o qual foi tangenciada com a falsa Abolição. A Abolição significou a
instauração de uma base para a emersão da discriminação 6 e do racismo e não de uma
verdadeira libertação dos escravos. Moura (1994) acrescenta que em relação a dinâmica
racial perpetuou-se o estabelecimento de mecanismos de imobilização de ascensão social de
filhos gerados entre negros e brancos, os chamados mestiços, os mantendo em condição de
subalternidade, sujeição e inferioridade por anos. Para Fernandes a abolição era de caráter
cruel, pois introjetou na subjetividade do negro a possibilidade de se tornar igual ao antigo
senhor, de que seria incorporado na sociedade e que poderia ter acesso a uma série de
direitos que antes lhe era negado. E tudo isso, foi potencializado pelo mito da democracia
racial (FERNANDES,1964; FANON, 1961).
O mito da democracia segundo Chauí (2000) trata-se de uma pactuação entre a
burguesia brasileira e o aparelho do Estado (ainda em constituição) para disseminar
(nacional e internacionalmente) a ideia de que não houve no Brasil nenhum tipo de relação
racista ou de discriminação. Se diferenciando das relações raciais e violentas que se
desenvolveram nos Estados Unidos por exemplo. A ideia de que todos são iguais, de que

5
O termo livre é destacado, por compreendermos que o capitalismo no Brasil sempre foi marcado por laços de
dependência com a Europa. Ou seja, é uma utopia a ideia de liberdade.
6
Uma breve pesquisa nos mostra que discriminar é o ato de ação ou efeito de separar, segregar, pôr à parte.

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todos são brasileiros ou humanos busca dissolver, diluir, amenizar e escamotear as


atrocidades que ocorreram no Brasil ao mesmo tempo em que se vende a ideia do Brasil
como lugar pacífico, bom para residir, realizar negócios ou passear. A base dessas
ideologias é o capitalismo que busca novos nichos de lucratividade, tendo em vista que o
escravismo não existia mais.
É nessa conjuntura que os direitos são regulamentados no Brasil de forma paulatina.
É necessário compreender que esses direitos, como o da infância e adolescência são
resultado de conquistas e lutas dos trabalhadores e que se realizam na sociedade capitalista.
Ou seja, o capitalismo se (re) produz ao mesmo tempo em que é tensionado a conceder
direitos aos trabalhadores, mas sem deixar de apresentar estratégias que busquem suprimir
os direitos conquistados.
Isso nos auxilia a compreender o porquê que a regulamentação de direitos sociais
nas Constituições, conforme aconteceu no Brasil, não significou sua automática
materialização, embora não deixa de ser uma estratégia importantíssima para que esses
direitos sejam efetivamente ofertados pelo Estado. É importante compreender também o fato
de que esses direitos são, por vezes, contraditórios, pois são forjados no âmbito da sociedade
capitalista. Além disso, que esses direitos são materializados no âmbito de instituições cuja
natureza é atender as necessidades de uma sociedade que reafirma continuamente a
importância de se proteger e resguardar a propriedade privada.
É por isso que nos deparamos com uma realidade social que nos evidencia que a
existência de leis, de normativas e de diretrizes no âmbito jurídico não resulta em mudanças
imediatas na realidade. É um movimento dialético entre lutas, avanços e retrocessos.
Contudo o que conseguimos analisar é que apesar dessas normativas o segmento negro e
pauperizado segue sem conseguir acessar efetivamente tais direitos. O campo da infância e
adolescência é exemplo disso, pois tem avançado de forma significativa, tendo a
regulamentação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, como exemplo
importante na luta pelos direitos de crianças e adolescentes, mas que ainda enfrenta entraves
sociais, culturais, políticos e econômicos para se materializar de forma plena. A discussão
sobre a redução da maioridade penal7, a disseminação de que a punição ainda é a melhor
forma de doutrinar crianças e adolescentes, a ausência ou parcos recursos orçamentários, o

7
Essa é uma discussão que tem se desenrolado ao longo de muitos anos no Brasil e que adquiriu visibilidade a
partir da regulamentação do ECA na década de 1990. Envolve convicções muito enraizadas sobre
responsabilidade individual de crianças e adolescentes que podem ser ou não considerados praticantes de ato
infracional. Essa discussão, em resumo, gira em torno o que seria melhor para o Brasil: manter a maioridade
penal em 18 anos ou reduzi-la para 16 anos de idade?

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número reduzido de conselhos tutelares diante da grande demanda populacional nos


territórios são alguns exemplos sobre entraves enfrentados, contudo, não são os únicos
limites para a materialização e acesso dos direitos de crianças e adolescentes no Brasil
(COUTINHO, 1996, ALMEIDA, 2018).
Um desses entraves é a dificuldade de ultrapassar a configuração de dois tipos de
infância no Brasil: uma branca, com maiores recursos financeiros, heteronormativa e outra
negra, pobre e que não se enquadra na ideia de normatividade da sociedade brasileira. O
movimento que o Estatuto faz é de tentar desconstruir essa barreira entre dois tipos de
infância, todavia não consegue e percebemos o quanto é complicado essa dualidade.
Configuram-se dois tipos de atendimento a essa público a partir de uma sociedade que não
abandonou valores morais cristãos e de uma norma jurídica na qual a instituição que a
representa atende sempre a necessidade de se resguardar a propriedade privada. No caso da
infância negra e pobre resta a criminalização, constante vigilância, doutrinação e idealização
de um futuro perpassado por dificuldades, violência ou a morte ( ALMEIDA, 2018).
Não desejamos neste breve estudo desconsiderar o quanto foi importante a
materialização dessa normativa. O Estatuto da Criança e do Adolescente é a lei que
pressupôs mudanças nas formas de atendimento em espaços institucionais, valorizou o
discurso da infância e adolescência, freou as destituições de poder familiar e o
desmembramento das famílias, propôs um novo modo de realizar os processos de adoção e
se constituiu enquanto norma com a participação popular. Ou seja, implementou a Doutrina
da Proteção Integral, a qual preconiza do dever da família, do Estado e da sociedade no
cuidado com crianças e adolescentes; o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) buscando a
atuação conjunta de vários órgãos e instituições na perspectiva da promoção, prevenção e
defesa de direitos. Tudo isso almejando abandonar as práticas da Era do Menorismo8 e por
isso que o ECA deve ser defendido, resguardado e protegido das ações do pensamento
conservador que invadiu as instâncias e instituições políticas que constroem as leis e as
materializam. Entretanto, não devemos deixar de problematizar que apesar do caráter de ser
norma garantista, esta possui limites que precisam ser problematizados (SARAIVA, 2018).

8
Saraiva (2018) trabalha esse conceito e afirma que a partir desse processo de institucionalização de demandas
do segmento de trabalhadores na orbita do Estado e da regulamentação do Código de Menores de 1927 a
política direcionada para a infância, naquela época, passa a se constituir tendo como pressupostos: inserção da
criança no espaço de trabalho; a visão da infância pobre como incapaz e perversa; o poder absoluto do juiz
sobre a família e a criança; o abrigamento e internamento como forma corretiva e positiva, haja vista que as
famílias eram consideradas incapacitadas para realizar o cuidado; a visão higienista e repressora; a necessidade
de se zelar pela nacionalidade e pelos futuros cidadãos. Tudo isso, passou a caracterizar e compor a
denominada Era do Menorismo.

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O racismo é uma chave de interpretação para atual realidade desigual enfrentada pela
população negra, assim como o universo das crianças e adolescentes. Diz respeito a uma
crença na existência de raças inferiores ou superiores a outras. E em nossa compreensão
trata-se de relação de poder verticalizada mediada por uma necessidade de subordinar,
subjugar e inferiorizar o outro (negro) e de dar continuidade ao projeto eugênico genocida à
brasileira.
Os estudos de Guimarães (1995) nos auxiliam a compreender tal fenômeno, pois
afirmam que o mito da democracia racial foi o grande impulsionador do racismo no Brasil.
Para o autor, os brasileiros sentem orgulho de a nação ter sido forjada pela mistura de três
raças, fato que impossibilitou a vivência de segregação ou conflitos tal como ocorreu nos
Estados Unidos ou em África. Além disso, esse mesmo mito fomentou a prática de
embranquecimento fato que dilui a ideia de que o racismo é direcionado aos negros, haja
vista que esse povo miscigenado, compõe a nação brasileira onde todos são “iguais”. Dessa
maneira, segundo Guimarães (1995), o mito democrático racial serve como mecanismo de
escamoteamento do racismo cotidiano e sua face violenta mascarada, mas que perdura desde
o período pós - abolição, atingindo a população negra.
Na contemporaneidade o racismo apresenta diferentes expressões (nas relações
interpessoais, no âmbito institucional, no espaço da religiosidade, na divisão de territórios-
racismo ambiental, por exemplo) podendo ser visualidade em diversos espaços (unidades de
saúde, escolas, prisões, universidades, lugares de formação profissional, redes sociais, mídia
falada e escrita, etc). Mas no caso desse estudo verificamos que o conceito do racismo
institucional, é o mais adequado para compreender a realidade de crianças, adolescentes, as
alterações do ECA e sua parca efetividade no que diz respeito a garantia de convivência
familiar. Processo este que culmina na elaboração de novas leis.
Vale ressaltar que o termo Racismo Institucional foi elaborado por militantes do
grupo Black Panther - Panteras Negras na década de 1960. Esse grupo, que tinha ligações
com Malcon X, lutou pelos direitos civis, sociais, políticos e por igualdade racial nos
Estados Unidos e são conhecidos por terem uma postura mais radicalista diante das
atrocidades cometidas pela sociedade norte-americana. As ações desse grupo se
diferenciavam, por exemplo, das ações de Martin Luther King que baseou sua luta no
diálogo e na realização de marchas pelos direitos. Os Black Panther realizavam ações
organizadas, planejadas e por vezes armadas, na busca por melhores condições de igualdade
e contra as leis segregacionistas e mortais norte americanas. É necessário ressaltar que esses

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movimentos fazem parte de um processo de resistência diante de tantas ações violentas


(mortes, prisões, estupros) e segregacionista vivenciadas pela população negra norte-
americana, além de não se configurar como única forma de ação diante das violências. O
maior exemplo de ações pacificas nesse campo foram as caminhadas pelos direitos civis nos
Estados Unidos na década de 60 organizadas por Martin Luther King e a permanência de
Nelson Mandela na prisão por anos resistindo e controlando ações violentas na África do Sul
(GELEDÉS, 2017).

Jurema Werneck em relatório intitulado Racismo Institucional: uma abordagem


conceitual e que foi elaborado em parceria com a ONU, Geledés (Instituto da Mulher Negra)
e Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA) se inspira nas elaborações dos
Panteras Negras e as absorve para compreender as relações nos serviços de saúde.
Posteriormente definiu o racismo institucional como um modo de subordinar o direito e a
democracia às necessidades do racismo. A autora na obra Racismo institucional e a saúde da
população negra afirma que o racismo

é a dimensão mais negligenciada do racismo, desloca-se da dimensão


individual e instaura a dimensão estrutural, correspondendo a formas
organizativas, políticas, práticas e normas que resultam em tratamentos e
resultados desiguais. É também denominado racismo sistêmico e garante a
exclusão seletiva dos grupos racialmente subordinados, atuando como
alavanca importante da exclusão diferenciada de diferentes sujeitos nesses
grupos (p. 54-55, 2016).

O termo foi forjado também buscando conceituar as relações estabelecidas nas


estruturas de organização da sociedade e nas instituições: “trata-se da falha coletiva de uma
organização em prover um serviço apropriado e profissional às pessoas por causa de sua
cor, cultura ou origem étnica (GUIA DE ENFRENTAMENTO, p. 11).” Para Eurico (2013),
pesquisadora da política de infância e adolescência na cidade de São Paulo o racismo
institucional possui duas dimensões: a política- programática e das relações interpessoais. A
primeira se expressa por meio das ações que inviabilizam a formulação de políticas públicas
que atenderiam as particularidades étnico-raciais; enquanto no segundo caso, se expressa no
decorrer das relações estabelecidas entre gestores, trabalhadores e usuários das políticas.
Uma relação discriminatória, porém sofistica, pois demanda análise cuidadosa e olhar crítico
para compreender o que está sendo estabelecido. E isso aliado a discriminação racial ou
étnico-racial cujo significado é a exclusão, restrição ou preferência baseada em raça acirra

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desigualdades. É uma vulnerabilidade programa pelo Estado que subalterniza cada vez mais
a população negra (WERNECK, 2016; EURICO, 2013).
Pensando a vulnerabilidade programada e o racismo na ausência de elaboração de
normas ou na elaboração de planos, programas, projetos e leis que não atendem
necessariamente as necessidades desse segmento conseguimos compreender o porquê que
mudanças nas leis como o ECA no que tange a convivência familiar não impactarem
positivamente sobre a vida de crianças e adolescentes integrantes da população negra.
Dados do CNJ de 2017 afirmam a existência de 47 mil crianças longe do convívio
familiar ou comunitária e estão vivendo em abrigos que ainda não possuem infraestrutura
adequada, onde ocorrem violências de diferentes graus e com alta rotatividade de
profissionais se pensarmos nas instituições públicas que têm sofridos os ataques da Ofensiva
Neoliberal e a propositura de efetivação de políticas de austeridade desde a implementação
desse mesmo projeto a partir dos anos de 1970 no bojo da Reestruturação Produtiva
(HARVEY, 1993; MANDEL, 1982; CHESNAIS, 1996).
Àqueles que sofrem os grandes impactos dessa dinâmica de acumulação são as
crianças e adolescentes pretos e pardos que correspondem a 64% nos abrigos institucionais.
Além disso, é importante ressaltar que todas as crianças e adolescentes são objeto de
proteção, promoção e prevenção de violação de direitos segundo o Estatuto, contudo,
àquelas integrantes da população negra, geralmente, são objetos do eixo de defesa do SGD
mediante a materialização de ações dos órgãos públicos judiciais; ministério público,
especialmente as promotorias de justiça, as procuradorias gerais de justiça; defensorias
públicas; advocacia geral da união e as procuradorias gerais dos estados; polícias; conselhos
tutelares; ouvidorias e entidades de defesa de direitos humanos incumbidas de prestar
proteção jurídico-social.
É importantíssimo evidenciar o processo de constituição do SGD. Esse consolidou-se
a partir da Resolução 113 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(CONANDA) de 2006. O início do processo de formação do SGD, porém, é fruto de uma
mobilização anterior, marcada pela Constituição de 1988 e pela promulgação do ECA, como
parâmetro para políticas públicas voltadas para crianças e jovens, em 1990. O sistema é
formado pela integração e a articulação entre o Estado, as famílias e a sociedade civil como
um todo, para garantir que a lei seja cumprida, que as conquistas do ECA e da Constituição
de 1988 (no seu Artigo 227) não seja mais uma letra morta.

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De forma articulada e sincrônica, o SGD estrutura-se em três grandes eixos


estratégicos de atuação: Defesa, Promoção e Controle. Essa divisão nos ajuda a entender em
quais campos age cada ator envolvido e assim podemos cobrar de nossos representantes suas
responsabilidades. Os atores que compõem o Sistema de Garantia dos Direitos são os
Conselheiros tutelares, promotores e juízes das Varas da Infância e Juventude, defensores
públicos, conselheiros de direitos da criança e adolescente, educadores sociais, profissionais
que trabalham em entidades sociais e nos Centros de Referência da Assistência Social
(CRAS), policiais das delegacias especializadas da criança e adolescente, integrantes de
equipes técnicas das Varas da Infância e Juventude, membros de entidades de defesa dos
direitos humanos de criança e adolescentes, Assistentes Sociais, Psicólogos, Advogados,
pedagogos, educadores sociais. Ou seja, àqueles que atuam com a política da infância e
adolescência (BRASIL, 1990).
A partir do exposto, compreendemos que essas crianças e adolescentes negras são
criminalizadas e penalizadas por um sistema que deveria protegê-las a partir de um processo
de abrigamento massivo. O caráter retrógrado de tudo isso é que fica evidenciado que o
ranço conservador e a moral cristã que permeavam as ações realizadas no âmbito da política
social da infância e adolescência na Era da Menoridade não conseguem efetivamente ser
superados, mas sim, refuncionalizados mediante as novas necessidades de acumulação:
manter lucros, pacificar grupos sociais, doutrinar segmentos para o mercado de trabalho e
para não questionamento dessa ordem social ainda no momento de construção da
subjetividade desse segmento (DONZELOT, 1980).
As crianças e adolescentes integrantes da população negra são rotuladas como
àquelas que cometeram ato infracional, cujas famílias são acompanhadas pelos conselhos
tutelares por “negligência”, as quais possuem dificuldades em acessar e manter os filhos nas
escolas e cujos filhos estão “resguardados” nos abrigos institucionais. Além disso, grande
parte dessas famílias negras vive em espaços urbanos e/ou rurais com ausência de
informações e acesso a bens e serviços de qualidade (saúde, educação, saneamento básico,
etc.), o que as torna mais vulneráveis. É necessário considerar ainda que essa dinâmica
territorial faz parte da dinâmica do racismo socioambiental o qual afirma que é um
movimento que visa “a imposição desproporcional – intencional ou não – de rejeitos
perigosos às comunidades de cor”. Ou seja, é compreender que as características e os seus
modos de vida da população negra como exóticos, pouco evoluídos ou distantes do
progresso e do desenvolvimento, se tornando assim passíveis a um desenvolvimento,
modernização, intervenção por parte do Estado (SILVA, 2012).

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Ou seja, como podemos verificar trata-se de segmentos cujos direitos foram


violados, cuja situação de vulnerabilidade e risco social é acirrada cotidianamente pelo
racismo estrutural e suas expressões. Nesse sentido, as últimas alterações no ECA, as quais
problematizam a questão do acesso à tecnologia, que reafirmam a importância da primeira
infância ou de aleitamento materno não conseguem modificar efetivamente a realidade de
crianças e adolescentes negros que vivem nos abrigos, que estão fora da escola devido a
violência, àqueles que se encontram aguardando na fila da adoção, para atendimento médico
que atendam as especificidades da população negra, que já foram vítimas de todas as formas
de violência, pois na verdade, não se criaram políticas públicas que atendessem realmente
essas necessidades e que buscassem mudar efetivamente essa realidade. A perspectiva é do
enfrentamento das situações e não eliminação desses aspectos. Uma situação grave que
precisa ser modificada urgentemente (CNJ 2017; IPEA, 2016).

II. CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA: limites e possibilidades

De acordo com o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária (2006)


conviver, desenvolver e se tornar adulto ao lado da família biológica, extensa ou afetiva é
um direito de todas as crianças e adolescentes. A legislação brasileira reconhece e preconiza
a família “enquanto estrutura vital, à humanização e à socialização da criança e do
adolescente, espaço ideal e privilegiado para o desenvolvimento integral dos indivíduos
(PNCFC, 2006)”. Ou seja, o acesso ao direito de convivência familiar e comunitária
contribui para um positivo desenvolvimento dos sujeitos ainda em construção da identidade,
subjetividade e de aspectos biopsicossociais do corpo. É um momento de construção de
afetividades, de fortalecimento de laços familiares, de memórias, de passagens de valores,
hábitos e costumes das famílias, de identificação do grupo familiar, é possibilidade de saber
sobre a origem do grupo familiar, no qual faz parte a partir da particularidade das famílias. E
tudo isso futuramente influencia a vida dos sujeitos já em processo de massificação de
subjetividade. Certamente, não podemos esquecer que esse espaço familiar é contraditório,
perpassado por conflitos e que pode também ser gerador de violências, contudo, o que o
PNCFC preconiza que esse espaço de organização social é também espaço de
potencialidades.
Mesmo sabendo da importância da convivência familiar, a trajetória da infância no
Brasil revela que as famílias, sobretudo negras e pobres, encontram inúmeras dificuldades

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para proteger e educar seus filhos sem interferência do Estado. Tais limitações têm
vinculação com o período colonial que além de escravizar e violentar de diferentes formas
os negros, também os impediam de constituir famílias. A ideia de família para esse
segmento era inexistente. E essa dinâmica se desdobrou, permanecendo até os dias de hoje.
Na atualidade esse processo se expressa nas limitações financeiras das famílias (que nada
impedem o convívio familiar) foram traduzidas historicamente (e continuam sendo) pelo
Estado como “incapacidade” da família de orientar, cuidar e permanecer com seus filhos,
mas jamais pelas desigualdades sociais e raciais enraizadas no Brasil, as quais são
potencializadas na sociedade do capital. Disso, podemos avaliar que o Estado é um dos
maiores violadores dos direitos dessas famílias, crianças e adolescentes (RIZZINI, 2004;
BRASIL, 1988; 1990).
Tal discurso justificou a construção por este Estado de políticas públicas paternalistas
voltadas para o controle, monitoramento, vigilância, segregação e contensão social da classe
trabalhadora. Esse mesmo tipo de política também foi direcionado à infância, sendo
denominado como Doutrina da Situação Irregular como abordamos anteriormente. Essa se
expressava, sobretudo, pelo abrigamento massivo de crianças e adolescentes oriundas de
famílias negras e pobres em grandes instituições totais. A marca desses lugares era a da
violência, destruição de vínculos familiares, doutrinamento forçado para o mercado de
trabalho e internalização de modos de agir, destruição das individualidades gerando um
impacto negativo na subjetividade dos abrigados. O modelo estava mais parecido com um
modelo prisional do que um modelo protetivo, tendo em vista a proibição de receber visitas
de familiares, constante vigilância e a desconsideração do discurso dos abrigados de forma
constante. Tinha caráter punitivo tanto para as famílias quanto para as crianças e
adolescentes, sobretudo, famílias negras e pobres embora essa discussão não fosse pautada
naquele momento (ALTOÉ, 2008).
É nesse momento que a criança pobre passa a ser denominada enquanto menor.
Sujeito sem direitos e que permanecia “protegido” em grandes instituições como a Fundação
Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), e as Fundações Estaduais (FEBEM’s) que
incorporavam um modelo também inspirado na política de segurança nacional da Ditadura
Militar. Esse modelo foi abandonado quando a Doutrina da Proteção Integral foi instaurada.
A Doutrina da Proteção Integral foi inaugurada através do art. 227 da Constituição Federal
de 1988 e preconiza o dever o Estado, da família e da sociedade com os cuidados com
crianças e adolescentes, rompendo com o tratamento discriminatório, desumano e
aprisionador da infância. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), lei 8.069 de 1990

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reafirma o rompimento com a proposta da Situação Regular e necessidade de que o projeto


Doutrina da Proteção Integral seja realizado.
Todavia, as dificuldades permanecessem mediando a materialização das normativas
de caráter mais progressista. Dentre elas estão a permanência do ranço conservador do
período em que a Doutrina da Situação Irregular estava em vigência, bem como as práticas
discriminatórias / racistas nos dias de hoje (RIZINNI, 2004; 2009).
E por isso que ações como o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária
(PNCFC) passa a ser problematizado e discutido no sentido de tentar superar essas
limitações. É somente no ano de 2006 que o plano é regulamentado após intenso processo de
lutas, aprofundamento teórico até que pudesse atingir um consenso. No entanto, apresentou
algumas lacunas precisando que fossem preenchidas. Por esse motivo no ano de 2009 novo
texto foi elaborado, apostando em outros elementos importantes para problematizar esse
debate a fim de assegurar que esse direito fosse garantido e o grande de número de
acolhimentos fosse reduzido no país, bem como os índices de pessoas que sofreram processo
de institucionalização em algum momento da vida (BRASIL, 2006).
O plano tem como objetivo favorecer nas três esferas públicas, guardadas as
atribuições e competências específicas, o desenvolvimento pleno das famílias e a proteção
aos vínculos familiares e comunitários. Em outros termos propõe uma metodologia de
trabalho com as famílias e as crianças e adolescentes em acompanhamento pelos órgãos do
SGD e com possibilidade de acolhimento na perspectiva de criar mecanismos de
autonomização das famílias em vulnerabilidade econômica, rompimento de ciclos de
pobreza e violência. Enfim, se propõe a não acolher e assegurar o viver em família.
Apresenta como diretrizes

a centralidade da família nas políticas públicas; a primazia da


responsabilidade do Estado no fomento de políticas integradas de apoio à
família; reconhecimento das competências da família na organização
interna e na superação de suas dificuldades; respeito à diversidade étnico-
cultural, à identidade e orientações sexuais, à equidade de gênero e as
particularidades das condições físicas, sensoriais e mentais; fortalecimento
da autonomia da criança, do adolescente e do jovem adulto na elaboração
de seu projeto de vida; garantia dos princípios da excepcionalidade e
provisoriedade dos programas de famílias acolhedoras e de acolhimento
institucional; reordenamento dos programas de acolhimento institucional;
adoção centrada nos interesses da criança e do adolescente e controle social
das políticas públicas (PNCFC, 2006, p. 69, grifus nossos).

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O desenvolvimento da criança e do adolescente é citado na norma e são


referenciados como período perpassado por processos biológicos, psicoafetivos, cognitivos e
sociais que exigem uma série de condições do ambiente em que estejam inseridos, bem
como do papel essencial desempenhado pela família. A norma reafirma que a família é o
principal núcleo de socialização da criança e por isso deve ser valorizado / preservado. A
relação afetiva estabelecida com a criança e os cuidados que ela recebe na família e na rede
de serviços, sobretudo nos primeiros anos de vida, têm consequências importantes sobre sua
condição de saúde e desenvolvimento físico e psicológico. Sobre outro ângulo de análise
desse plano podemos afirmar que a não permanência nesse espaço familiar ou a retirada
abrupta desse convívio pode gerar danos irreversíveis na vida dessas crianças e adolescentes.
Logo, é preciso evitar esses rompimentos (BRASIL, 1990; 2006; ALTOÉ, 2008).
Como podemos verificar a convivência familiar e comunitária para a criança e o
adolescente está reconhecida na CF 88 e no ECA, assim como a ideia de desnaturalização do
conceito de família ideal, nuclear e que não vivencia conflitos. Partimos do pressuposto de
que família é espaço contraditório, pois ao mesmo tempo em que é potencializador,
promovedor de possibilidade de desenvolvimento biopsicológico da criança e do
adolescente, pode ser também violador, adoecedor. A riqueza está contida nessa contradição,
tendo em vista que as relações sociais que se desenvolvem naquele espaço podem ser
renovadas, repensadas, reprocessadas, não é algo estático. A normativa preconiza que a
família é dotada de autonomia, competências e geradora de potencialidades. Como seus
membros a família está em constante evolução: seus papéis e organização estão em contínua
transformação. Este ponto é de fundamental importância para se compreender o
investimento no fortalecimento e no resgate dos vínculos familiares em situação de
vulnerabilidade, pois cada família é potencialmente capaz de se reorganizar diante de suas
dificuldades e desafios. Ou seja, trabalhar com a família é respeitar seu espaço, seus hábitos,
formas de vida e de se relacionar e isso se coloca como alternativa fundamental ao
acolhimento massivo (BRASIL, 1988; 2006).
Porém, o fortalecimento da família e o não acolhimento devem ser apoiados e
potencializados por políticas de apoio sócio familiar com mediação do poder público. Ou
seja, a família não pode ser culpabilizada ou criminalizada pela condição de vida que possui,
ou ser taxada como a única responsável pelo sucesso ou não de seu grupo familiar. Tal
postura é moralizadora e de teor conservador por desconsiderar a realidade brasileira, as
inflexões sofridas no campo político-social, as marcas do racismo estrutural e os impactos
gerados sobre as famílias. Não podemos esquecer que a família, lugar de proteção e cuidado,

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é também lugar de conflito e pode até mesmo ser o espaço da violação de direitos da criança
e do adolescente. Devemos compreender ainda que essa dinâmica pode ocorrer em todas as
famílias e não somente no caso de famílias pobres, negras e que residem em favelas ou áreas
periféricas da cidade (BRASIL, 2006).
Embora apresente alguns limites, o surgimento do PNCFC em 2006 ocorre em mais
uma tentativa de tentar assegurar o direito das crianças e adolescentes serem criados em
ambiente familiar e reduzir os índices de acolhimento no Brasil e por isso é tão importante.
No entanto, esse é um desafio diário que gestores e profissionais que atuam no cotidiano das
instituições devem enfrentar. É necessário criar mecanismos que subsidiem a sobrevivência
dessas famílias: políticas habitacionais, de geração de emprego e renda, saúde, educação,
lazer, alimentação, ações afirmativas e etc.
Uma breve análise sobre a realidade brasileira, a partir dos dados desenvolvidos por
órgãos e instituições que compõem o sistema de garantia de direitos como o Conselho
Nacional de Adoção, de Justiça e o Módulo Criança e Adolescente do Rio de Janeiro, nos
leva a inferir que esse direito não está sendo assegurado, embora todas as normativas
estejam sendo reelaboradas, redefinidas, reatualizadas a fim de que este direito seja
efetivado. Mas porque essa realidade não é modificada? Além da desigualdade econômica,
os altos índices de pobreza, de analfabetismo, de violência, desnutrição, mortalidade infantil,
baixa escolarização e tantos outros é necessário considerar outro elemento nessa dinâmica: o
racismo institucional. Em sociedades como o Brasil coexistem expressões e posturas
preconceituosas com discursos que propagam uma igualdade por mediação da ideia
falaciosa de democracia racial (harmonia entre os povos: negros, indígenas e o colonizador
no processo de construção da Nação brasileira) e que acabam escondendo o racismo, o
preconceito, a discriminação e os índices de violações de direitos desse segmento (CHAUÍ,
2000; ALMEIDA, 2018).
É importantíssimo compreender que o pacto democrático racial estabelecido ainda no
período de transição da Era Colonial para a Era Republicana ainda não se rompeu. Os dados
evidenciados pelo IBGE/Condições de vida e desigualdade social (2018), Mapa da
Violência (2016), das Desigualdades Sociais (2018), as reatualizações do ECA como a Lei
do menino Bernado e a 12.010. Nova Lei de Adoção e do levantamento Nacional de
Crianças e Adolescentes nos mostram que não basta criar novas leis ou redefinir as
existentes. É necessário pensar o perfil da população que se encontra em situação de
vulnerabilidade, tendo como marca comum a negação de direitos e agir sobre essas

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demandas de forma efetiva e não apresentar uma política que busque apenas se apresentar
para a população em sua modalidade básica, parca e pobre.
Os dados do IBGE (2014) nos mostram também que no Brasil a população negra
(composta por pretos e pardos) corresponde a mais da metade da população brasileira. São
54% de pessoas que se autodeclararam pretas ou pardas de acordo com o IBGE/2014, sendo
que este segmento é a maior vítima de violência. Os maiores índices de homicídios por
armas de fogo estão concentrados na juventude negra e parda na faixa de quinze a vinte e
nove anos de idade (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2016).
Além disso, de acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Unibanco e IBGE da
população total (dentro ou fora da escola) de adolescentes com idade entre quinze a
dezessete anos 16% eram pretos ou pardos enquanto 10% eram brancos. O Ministério da
Saúde informa que das mortes na primeira semana de vida, 47% foram de crianças pretas e
pardas e 38% de crianças brancas. As principais causas da mortalidade infantil entre
crianças negras são as malformações congênitas, prematuridade e infecções perinatais.
Grande parte das famílias compostas por pessoas pretas ou pardas vivem em espaços
urbanos e/ou rurais com ausência de informações e acesso a bens e serviços de qualidade
(saúde, educação, saneamento básico, etc.), o que as torna mais vulneráveis. Por fim,
segundo o CNJ, existem atualmente 47 mil crianças e adolescentes abrigadas no Brasil,
sendo que na maioria são meninos (58,5%), pretos ou pardos (63,6%) e têm entre sete e 15
anos (61,3%). Ou seja, 47 mil crianças tendo o direito à convivência familiar negado e
sofrendo os impactos do acolhimento: destruição e desmembramento das famílias,
fragilidade psicológica daqueles que permaneceram em recolhimento, dificuldade para se
estabelecer laços afetivos, impacto no desenvolvimento escolar (ALTOÉ, 2008; CNJ, 2018).
O mais grave é o processo que desemboca nesses acolhimentos em massa, apesar da
existência de leis e normas que direcionam o fazer profissional para outro caminho. Os
motivos de acolhimento são negligência (84%), dependência de drogas ou álcool por parte
dos pais ou responsáveis (81%), seguida de abandono (76%), violência doméstica (62%),
violência sexual (47%), vivência de rua (39%), transtorno mental (37%), ausência por prisão
(32%), carência de recursos materiais (32%). Nesses casos, sobretudo, negligência e
carência de recursos o acolhimento não deveria ocorrer. É medida protetiva excepcional. Ou
seja, somente deve ser adota em último caso. E em casos como estes devem ser trabalhados
integrantes da família extensa para receber essa criança ou adolescente. Se realizarmos um
recorte de gênero e raça fica evidente o perfil dos acolhidos e suas famílias, assim como o
viés moralizador e criminalizador direcionado a este segmento por parte do Estado. De

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acordo com o IPEA e os dados do “Levantamento Nacional” de acolhidos mais de 63% das
crianças e adolescentes abrigadas são da raça negra (21% são pretos e 42% são pardos), 35%
são brancos e cerca de 2% são das raças indígena e amarela (CNJ, 2018).

CONCLUSÃO

O período pós-abolição no Brasil significou para a população negra um período de


enfrentamento de uma série de entraves e dificuldades para a sobrevivência. O racismo
estrutural permitiu que fossem criados mecanismos políticos, ideológicos, culturais com
mediação das instituições (Estado, a igreja, aparato jurídico e a família) que
impossibilitassem a ascensão, a circulação e a sobrevivência da população negra que
segundo o IBGE (2014) atualmente é composta por 54% de pessoas negras e pardas
autodeclaradas. Em outros termos: a população negra corresponde a mais da metade da
população e permanece sofrendo as armadilhas do racismo e as limitações de acesso aos
direitos devido o racismo estrutural e suas expressões mais significativas como o racismo
institucional, ambiental e discriminação.
Todo o aparato jurídico-legal (leis, normas e determinações) criado no espaço social
não considera as verdadeiras necessidades da população negra, os alijando, cada vez mais,
do acesso aos direitos (inclusive de viver em família) e das possibilidades de uma
emancipação humana plena nos termos marxianos. Verificamos que esse aparato é
constituído para atender não as necessidades da população, mas sim do capitalismo em
constante busca por altas taxas de lucratividade, manutenção e autoreprodução do sistema
produtivo mercantil.
Trata-se de estratégias de manutenção desse segmento em lugar de subalternidade,
imobilidade social, invisibilidade, pois a tática eugênica de embranquecimento da população
negra ex-escrava, disseminada desde o período pós-abolição com o apoio da ideia falaciosa
da democracia racial, fracassou. Outro aspecto importante nesse processo é o epistemicídio
que segundo Carneiro (2005) caminha ao lado do genocídio. Esse diz respeito a destruição
de conhecimentos, de saberes, e de culturas não assimiladas pela cultura branca/ocidental.
Em outros termos devemos pensar que são intercalados diferentes mecanismos para negar
que essa população tenha acesso aos direitos começando pelo direito à vida
(NASCIMENTO, 1978).

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Contudo, devemos ter olhar crítico para verificar que outros mecanismos de
imobilização e violência continuam sendo direcionados à população negra. Estes se
renovam, permanecem no âmbito das relações sociais, porém adotando novas roupagens. O
genocídio da população negra é um exemplo disso. Entendo o genocídio não somente como
o extermínio de forma letal da população negra, mas também nas práticas e ações forjadas
pelo Estado e realizadas por agentes públicos que imobilizam e impedem que estes tenham
acesso a saúde, educação, orientação jurídica, o direito à convivência familiar e comunitária
e etc.... Mas esse processo é aliado às deficiências econômicas que impactam o orçamento
das políticas de saúde, educação, assistência social, previdência social, infância e juventude.
Ou seja, são agrupados mecanismos que ultrapassam o uso da força e da violência
institucional estatal para dificultar o acesso da população aos direitos e isso acaba
provocando sua eliminação de forma sistêmica (NASCIMENTO, 1978).

Em se problematizando as políticas direcionadas à infância e adolescência, cuja


expressão maior é o ECA inferimos que as alterações realizadas na letra da lei, de forma
isolada, desarticulada, sem perspectiva intersetorial, e desconsiderando a herança de uma
sociedade escravagista, como é o caso do direito à convivência familiar e comunitária não
provoca mudanças significativas na realidade de crianças, adolescentes negros, pardos,
pobres e suas famílias. Se nos atentarmos para o direito à convivência familiar e comunitária
nos questionamos: ele está sendo garantido para quem? Para qual infância? Assim, é
importante ter consciência que colocado dessa forma desarticulada e sem ser problematizado
esse direito se expressa apenas como mais uma lei utópica, inatingível e irrealizável na
realidade social. Se transforma em mais uma normativa que se junta as outras tantas que
deve ser cumprida apenas!

Se nossas crianças e adolescentes negras e pardas, majoritariamente, são oriundos de


famílias pobres, chefiadas por mães-solo negras, são as que mais demandam atendimento
nos espaços do SGD, porque não problematizar formas de subsidiar o fortalecimento dessas
famílias com políticas de habitação, saúde, educação e ações afirmativas? Porque não
fortalecer o eixo de promoção e prevenção de vulnerabilidades e risco ao invés do eixo
defesa? É importante pensar nessas dimensões e investir, sobretudo, na educação
permanente de profissionais no horizonte de afastamento de processos culpabilizatórios e
criminalizadores dessas famílias.
É necessário criar as possibilidades reais para esse segmento (re) construir sua
consciência crítica e recuperar àquilo que lhes foi retirado: direito a identidade, a

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Dossiê Políticas Sociais e Questões Raciais
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ancestralidade, a viver de forma digna com acesso real as políticas sociais e ao lado de suas
famílias. Dito de outra forma: é importantíssimo ser radical e atuar na raiz da questão, se
colocar contra o racismo e a desigualdade, ofertar à população aquilo que ela realmente
precisa. Se o racismo estrutural e institucional, nesse caso, são os elementos que impedem
que os diretos sociais se concretizem para nossas crianças e adolescentes então é necessário
combater, criar formas de resistir e questionar essa realidade desigual e racista.

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Recebido em: 13 de Fevereiro de 2019


Avaliado em: 11 de Março de 2019
Aceito em: 03 de Abril de 2019

Title: LIMITS AND CHALLENGES FACED BY INSTITUTIONAL RACISM TO ENABLE


THE RIGHT TO FAMILY COEXISTENCE OF CHILDREN AND ADOLESCENTS

Abstract:

The study analyzes the concepts of family coexistence, family, racism and the limits faced for
the materialization of this right when we problematize the reality of sheltered black
adolescents. We aim to understand the extent to which racist relationships impact on the
quality of services offered and how it affects the user population. We assume that not only
the economic determinants interfere in the relations, it is important to consider other
aspects such as those that unfold from the social inequalities having as a major expression
the structural and institutional racism.

Keywords: Right to Familiar Coexistence, Childhood and Adolescence, Structural and


institutional racism, Denial of rights.

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