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QUALIFICAÇÃO

1. Noção. A qualificação é uma operação necessária à aplicação de toda a norma


jurídica ao caso singular. De um modo geral, pode-se defini-la como a integração de um
caso numa categoria de casos designada através de um conceito. A especificidade da
problemática da qualificação em Direito Internacional Privado prende-se com a estrutura
particular das normas tipicamente utilizadas por este ramo do Direito: as regras de
conflitos de leis no espaço. Estas caracterizam-se por se socorrerem de conceitos-quadro
a fim de delimitarem o seu objeto. Esses conceitos designam ora uma categoria de
situações ou relações jurídicas (v.g. “obrigações contratuais” ou “direitos reais”), ora uma
categoria de questões jurídicas parciais (por exemplo, “validade formal” ou “capacidade
negocial”). A estatuição das regras de conflitos consiste no chamamento de normas de
Direito material, interno ou estrangeiro, para regular essas situações, relações e questões.
Na aplicação das regras de conflitos às situações concretas da vida suscitam-se
duas ordens de problemas. O primeiro é relativo ao alcance da referência feita pela regra
de conflitos à lei designada pelo elemento de conexão dela constante. Pergunta-se a este
respeito se se trata de uma referência aberta – hoc sensu dirigida ao conjunto das suas
disposições materiais – ou antes de uma referência seletiva – ou seja, de uma referência
que compreende apenas as normas que correspondam à categoria definida pelo conceito-
quadro da regra de conflitos. O segundo prende-se com a operação de qualificação
propriamente dita: cuida-se de saber quais os critérios que presidem à subsunção das
normas materiais da lei designada pela regra de conflitos no conceito-quadro desta (ou,
como alguns preferem dizer, à subsunção das situações jurídicas decorrentes da aplicação
dessas normas materiais no conceito-quadro da regra de conflitos).

2. Sentido e alcance da referência feita pelas regras de conflitos à lex causae.


Pelo que respeita ao primeiro problema, a referência feita por uma regra de conflitos à lex
causae – quer esta seja uma lei estrangeira, quer seja a própria lex fori – deve ser entendida
como uma referência seletiva, no sentido de que se dirige tão-somente àquela ou àquelas
das suas disposições que correspondam, pelo seu conteúdo e pela função que
desempenham no ordenamento a que pertencem, à categoria normativa visada pela regra
de conflitos, que o seu conceito-quadro exprime. Só esta solução é compatível com a
observância do juízo de valoração de interesses que subjaz à regra de conflitos, i. é, com
a razão de ser da atribuição de competência a certa lei para regular determinada matéria.

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É precisamente este o regime que se encontra consagrado no art. 15.º do Código
Civil português. Dispõe este preceito:

“A competência atribuída a uma lei abrange somente as normas que, pelo seu conteúdo
e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado na regra de conflitos.”

Portanto, a competência atribuída, por exemplo, à lei reguladora da sucessão mortis causa
abrange apenas as disposições dessa lei que, pelo seu conteúdo e função, tenham natureza
sucessória; o que não é o caso, por via de regra, das disposições reguladoras da
apropriação pelos Estados dos bens integrantes das heranças vagas sitos nos respetivos
territórios (como se infere, por exemplo, do disposto no art. 33.º do Regulamento (UE)
n.º 650/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de julho de 2012).

3. Objeto da qualificação e momentos em que se analisa. Do sistema de


referência à lex causae consagrado no art. 15.º do Código Civil nasce a conceção de
qualificação própria do Direito Internacional Privado português. A referência seletiva
implica, na verdade, que se averigue se as normas da lei designada pela regra de conflitos
potencialmente aplicáveis à situação privada internacional, pelo conteúdo e função que
têm nessa lei, integram – i. é, se subsumem – no regime do instituto visado na regra de
conflitos que para ela remete.
Assim, se é invocada num processo que decorre perante tribunal português uma
norma material de certo ordenamento jurídico e este é potencialmente competente, por
força de uma regra de conflitos vigente em Portugal, antes de aplicar essa norma material
o tribunal tem de verificar se, atentos o seu conteúdo e função, ela integra o instituto
visado na regra de conflitos: ou seja, tem de qualificá-la.
A qualificação incide, pois, sobre as normas materiais da lei designada
potencialmente aplicáveis à situação plurilocalizada, ou – o que para este efeito é o
mesmo – sobre as situações jurídicas decorrentes da aplicação dessas normas materiais.
Assim entendida, a operação de qualificação suscita três ordens de questões, que
correspondem aos três momentos em que é possível analisá-la: a) A interpretação dos
conceitos-quadro designativos do objeto da conexão das regras de conflitos
potencialmente aplicáveis; b) A caracterização do objeto da qualificação, i. é, do quid a
subsumir sob aqueles conceitos; e c) O apuramento da concreta apreensibilidade desse
quid pelos conceitos de conexão da regra de conflitos (a qualificação stricto sensu).

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4. A interpretação do conceito-quadro da regra de conflitos. O principal
problema que se coloca no primeiro momento da qualificação é o de saber se os conceitos-
quadro das regras de conflitos devem ser interpretados por referência ao Direito material
do foro, isto é, recorrendo aos conceitos homólogos desse Direito, ou com autonomia em
relação a ele; e neste caso até onde deve ir essa autonomia.
Ora, só esta segunda solução permite alcançar em algum grau a desejável
harmonia de julgados e assegurar a tutela da confiança nas situações plurilocalizadas: a
solução oposta implicaria muitas vezes excluir conteúdos normativos estrangeiros
desconhecidos da ordem jurídica do foro, com prejuízo para aqueles valores. Assim, por
exemplo, até recentemente, o divórcio pressupunha em Portugal a intervenção de uma
autoridade judiciária. Não se admitia o divórcio privado, nem que o casamento fosse
dissolvido por uma autoridade administrativa. Mas a Conservatória dos Registos Centrais
reconheceu efeitos a um divórcio de dois japoneses decretado pelo presidente de uma
Câmara Municipal japonesa, por aplicação da lei local. Do mesmo modo, deve entender-
se que à face do Código Civil vigente o conceito de filiação consagrado nos arts. 56.º e
57.º do Código não corresponde necessariamente ao que por tal se entende no Direito
material português, antes são reconduzíveis a essas regras de conflitos as normas
materiais estrangeiras sobre a filiação ilegítima, que o Direito português atualmente
desconhece.
Sendo as regras aplicáveis de fonte europeia, a autonomia dos conceitos nelas
utilizadas corresponde à jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União
Europeia desde o acórdão proferido em 14 de outubro de 1976, no proc. C-29/76, LTU c.
Eurocontrol, em que o Tribunal declarou:

“Para interpretar a noção ‘matéria civil e comercial’ para efeito da aplicação da


convenção de 27 de setembro de 1968, designadamente do seu título III, deve fazer-se referência
não ao direito de qualquer dos Estados-Membros em causa, mas, por um lado, aos objetivos e ao
sistema da convenção e, por outro, aos princípios gerais emanantes do conjunto dos ordenamentos
jurídicos nacionais.”

A interpretação autónoma das regras de conflitos subjaz também a diversos atos


normativos europeus em matéria de Direito Internacional Privado. Assim, por exemplo,
no art. 3.º, n.º 1, alínea d), do Regulamento n.º 650/2012 estabelece-se que o conceito de

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“disposição por morte” inclui “um testamento, um testamento de mão comum ou um
pacto sucessório”. A admissibilidade e validade material das disposições por morte é
submetida pelo art. 24.º, n.º 1, do Regulamento à lei aplicável à sucessão do autor da
disposição, se este tivesse falecido no dia em que fez a disposição. Podem, assim, ser
atribuídos efeitos nos Estados-Membros do Regulamento a testamentos de mão comum
válidos face à lei reguladora da sucessão, ainda que tais testamentos sejam desconhecidos,
ou até proscritos, pelo respetivo Direito material interno (como sucede no Direito
português, que os proíbe no art. 2181.º do Código Civil).

5. A caracterização do objeto da qualificação. Este é o problema que surge


quando o julgador se interroga sobre o conteúdo e a função social das regras materiais
potencialmente aplicáveis ao caso, a fim de determinar se as mesmas podem ser
chamadas a aplicar-se por força da regra de conflitos que remete para a lei a que
pertencem. Para responder a essa questão importa determinar quais as finalidades que as
normas em causa visam e, em particular, se estas são as mesmas que presidem ao instituto
a que alude o conceito-quadro da regra de conflitos de que se partiu. Só na hipótese
afirmativa será possível reconduzi-las a este e aplicar ao caso a lei por ela designada. A
caracterização jurídica das situações da vida privada internacional a regular ou das
normas que lhe são aplicáveis deve ser feita à luz da lei ou leis com que se acham conexas
e a que pertencem as normas que lhe são potencialmente aplicáveis; não da lex fori. É
justamente esta a estatuição fundamental do art. 15.º do Código Civil português: a
caracterização das normas materiais potencialmente aplicáveis faz-se à luz da lex causae,
devendo, para tanto, atender-se, como notámos, ao conteúdo e à função que as mesmas
exercem no ordenamento em que se inserem.

6. A qualificação stricto sensu. Feita a interpretação da categoria de conexão da


regra de conflitos e caracterizado o objeto (as normas materiais ou situações jurídicas) a
qualificar, resta decidir se este pode ser reconduzido à categoria própria da regra de
conflitos. Em conformidade com o sistema da referência seletiva, a ordenação dessas
normas nos quadros das regras de conflitos vigentes no Estado do foro depende de nelas
se verificarem as características fundamentais que se entenda informarem os conceitos
que delimitam estas regras. O critério que preside à qualificação em sentido estrito é o da
correspondência funcional entre as normas que disciplinam as situações da vida sub
judice nos ordenamentos com elas conexos e os conceitos-quadro das regras de conflitos

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do foro. Não basta, pois, ao julgador ater-se à caracterização jurídica dessas situações
perante os ordenamentos jurídicos em que se inserem as normas materiais suscetíveis de
lhes serem aplicadas: toda a qualificação em Direito Internacional Privado importa uma
reconstrução, à luz das categorias que delimitam as regras de conflitos do foro, dos
institutos jurídicos nacionais e estrangeiros que compreendam no seu âmbito as situações
decidendas. A última palavra nesta matéria pertence, pois, à lex fori. A qualificação que
aqui se preconiza é, em suma, uma qualificação lege fori operada na base de uma
caracterização lege causae das situações da vida a regular e das normas que as disciplinam
nos ordenamentos com elas conexos.

7. Conclusão. Em face do exposto, cumpre reconhecer que a qualificação em


Direito Internacional Privado não se resume a um silogismo. Com efeito, o julgador não
está estritamente vinculado à caracterização dos preceitos materiais aplicáveis feita à luz
de qualquer ordenamento jurídico. Pertence-lhe, pelo contrário, uma certa margem de
liberdade na averiguação da existência de um grau de correspondência suficiente entre as
normas materiais aplicáveis e o conceito-quadro da regra de conflitos. A qualificação
reclama, para tanto, um juízo de valor, a empreender pelo julgador com base na
ponderação da teleologia imanente aos preceitos jurídico-materiais em presença e das
finalidades prosseguidas pela regra de conflitos ao consagrar determinado elemento de
conexão para certa matéria.

BIBLIOGRAFIA

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D. M. Moura Vicente

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