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Geografia de Moçambique:

um olhar a partir da Geografia portuguesa


Iberografias 13 2017

Rui Jacinto
Assistente Convidado
Universidade de Coimbra
CEGOT – FLUC
rui.jacinto@iol.pt

Lúcio Cunha
Professor Catedrático
Universidade de Coimbra
CEGOT – FLUC
luciogeo@ci.uc.pt

Introdução décadas que nos separam do final dos


anos setenta, onde se distinguem ciclos
A evolução do conhecimento geográ-
mais curtos que correlacionam a história
fico sobre Moçambique só pode ser
recente da Geografia de Moçambique
plenamente apreendida se levarmos em
com a trajetória política do país.
consideração, além das vicissitudes histó-
Sem nos alongarmos em considerações
ricas e das dependências socioeconómi-
sobre tempos muito recuados é a partir
cas, os sucessivos enquadramentos (geo)
de meados do seculo XIX que a Geografia
políticos do país desde os mais remotos se afirma como ciência e alcança popula-
tempos coloniais. Esta reflexão não pode ridade, facto que não se pode dissociar da
descurar, também, a génese da Geografia difusão das Sociedades de Geografia nem
moderna, a evolução dos contextos cien- das viagens de exploração que estas Socie-
tíficos que a moldaram ao longo dos dades vão patrocinar, sobretudo às regiões
tempos nem a relação estreita e cúmplice, mais remotas dos continentes menos
embora nem sempre pacifica, com a conhecidos. Com este quadro em pano
Geografia portuguesa. de fundo e focando-nos em Moçambique
A Geografia de Moçambique é baliza- são de destacar alguns acontecimentos
da por duas datas incontornáveis: a ocorridos no final do século XIX pelo seu
institucionalização em 1969 do Curso de contributo para o impulso e reconheci-
Geografia na, então, Universidade de mento granjeados pela Geografia em
Lourenço Marques (Decreto Lei nº Portugal, que trouxeram informações
44530, de 20 de junho) e a proclamação relevantes sobre esse distante território
da independência do país, em  25 de então vinculado a Portugal. Os dados de
junho de 1975. Estas datas ajudam a cunho geográfico captados no decurso
definir três fases marcantes da Geografia das viagens empreendidas para desbravar
moçambicana, com escalas temporais o sertão africano, designadamente as
bem distintas: (i) o longo período, que se destinadas a fazer a ligação entre a costa
arrastou até 1969, que antecede a institu- (ocidental, do Atlântico) e a contra-costa
cionalização do Curso de Geografia; (ii) o (oriental, do Índico), além dos objetivos
período curto, breve mas intenso, com- científicos que as haviam justificado,
preendido entre o arranque da Geografia
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serviram outros fins, designadamente de


e os anos de rutura, imediatos à inde- natureza política e administrativa.
pendência da atual República de Moçam- O inquestionável serviço prestado
bique; (iii) o período posterior, de quatro pela Geografia aos interesses geopolíticos
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de Portugal em África coincidiu com os bique não é alheia à guerra e à violência,


primórdios da moderna Geografia e o que merecem a devida atenção enquanto
dealbar da exploração de África. Os estu- objeto de estudo pela permanência e
dos geográficos mais sistemáticos sobre as recorrência de conflitos, pela expressão
colónias portuguesas também foram territorial das suas consequências (deslo-
incrementados devido à pressão política cados, urbanização forçada, etc.) e pelo
internacional exercida sobre Portugal, uso desta ciência pelos estados-maiores
por causa do seu projeto colonial. Ao das diferentes partes em conflito. Mais
ditar a partilha de África e o desenho recentemente, as grandes empresas trans-
arbitrário das fronteiras africanas, a nacionais, sobretudo as ligadas à explora-
Conferência de Berlim (1885) acaba por ção dos recursos mineiros ou aos programas
suscitar problemas quanto aos limites extensivos dos agronegócios, continuam
fronteiriços e à soberania territorial, acir- a tomar suas decisões estratégicas com
rando ambições e interesses antagónicos base nos estudos sobre o território, com o
entre as potencias coloniais. É o que apoio de uma Geografia, que tanto em
acontece com Inglaterra, quando reclama termos globais como a nível regional e
de Portugal o vasto território entre Ango- local, recorre a sistemas de informação
la e Moçambique, num conflito imposto geográficos cada vez mais sofisticados,
pela sua ambição de pretender ligar o com vista à escolha do onde, do porquê
Cairo à cidade do Cabo por caminho de ali e do melhor modo de domínio territo-
ferro, diferendo que ficará conhecido por rial.
Mapa Cor de Rosa (1890) e que haveria A presente reflexão sobre a evolução
de ter profundas consequências politicas dos temas nucleares que se albergam sob
em Portugal. o vasto manto da Geografia foi precipitada
A Geografia sempre representou um pela proximidade do 50º aniversário da
conhecimento estratégico, o que lhe institucionalização do primeiro Curso de
havia de conferir um estatuto de verda- Geografia no ensino superior em Moçam-
deiro instrumento de poder, que levou bique. A viagem de mais de um século
muito mais tarde, Yves Lacoste a vaticinar que vamos empreender para apresentar o
que “a geografia serve antes de mais para contributo da Geografia para a leitura e
fazer a guerra”. No que a Moçambique interpretação do território moçambicano
diz respeito, esta frase tem um significado será assim estruturada:
bem real pois há muito tempo que guerra, – Viagem à contra-costa em demanda dos
violência, política e Geografia andam a antecedentes da Geografia de Moçam-
par. Tensões e conflitos militares, em bique, procurando entre os estudos
Moçambique, sobreviveram a todas as elaborados num momento do projeto
mudanças e ruturas politicas, das mais colonial português os que apostaram
antigas às mais recentes, da queda da no (re)conhecimento do território para
monarquia em Portugal (1910), aos melhor o ocupar e administrar;
conflitos episódicos que degeneraram e – O ensino da Geografia de Moçambique
atingiram o seu auge com a mortífera e em Portugal, jogado entre a semântica
dolorosa guerra colonial (1964-1974). duma Geografia Colonial e duma
Mesmo depois da independência a Geografia das Regiões Tropicais, assi-
violência não terminou, prolongando-se nalando a importância do legado dos
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com uma guerra civil “pela democracia” mestres por contextualizar a génese da
(1976-1992) que antecedeu um novo Geografia de Moçambique, institu-
período de “hostilidades militares”, cionalizada em 1969, e a relação que
depois de 2012. A Geografia de Moçam- manteve com a Geografia de Portugal;
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– Contributo da Geografia e da investi- passando a contar, também, com a


gação para o desenvolvimento (Geoide) preciosa colaboração das Sociedades de
como contributo para o diálogo e a Geografia, que começavam a proliferar
cooperação visando uma nova Geogra- no mundo. Estas agremiações, então na
fia. moda, foram cruciais para afirmarem a
popularidade e o reconhecimento cientí-
fico da Geografia. Os primórdios da Geo-
1. Viagem à contra-costa: o projeto
grafia de Moçambique, então vinculada à
colonial português e os primórdios dos
da Geografia de Portugal, radicam neste
estudos geográficos sobre Moçambique
ambiente, onde se pode desbravar a sua
O conhecimento geográfico sobre história mais longínqua. A este quadro
Moçambique foi, desde tempos recuados, geral devemos juntar outros fatos, de
um processo lento de acumulação de natureza diversa, fundamentais para
informações que evoluiu ao sabor das contextualizar o seu percurso mais
solicitações que se colocavam à admi- remoto, em que se destacam o papel
nistração colonial e dos progressos regis- científico, quiçá político, da Sociedade
tados pela Geografia, cujos préstimos de Geografia de Lisboa, as viagens e
foram pertinentes para o (re)conheci- explorações coloniais e a envolvente (geo)
mento e administração do território. política onde se enredaram as pretensões
Estas razões, mesmo implícitas, acabarão portuguesas em África.
por estar igualmente presentes quando se Sociedade de Geographia de Lisboa. A
institucionalizou a Geografia em 1969, Sociedade de Geografia de Lisboa, criada
ainda que (re)posicionada em virtude de em 1875, surge “no contexto do movi-
alterações nas referências teóricas e nas mento europeu de exploração e coloni-
mudanças sociopolíticas em Portugal e zação” com o objetivo de “promover e
em Moçambique. auxiliar o estudo e progresso das ciências
Geografia e viagem: (re)conhecer o geográficas e correlativas”. Como as suas
território para melhor o ocupar. Antes congéneres1, além de financiar expedições,
de a Geografia ser reconhecida como teve um importante papel “científico”, ao
ciência e de os geógrafos serem pro- publicar mapas, divulgar técnicas, fomen-
fissionais encartados, o conhecimento tar pesquisas e coletar dados de relevo
geográfico era construído de maneira para o progresso do conhecimento geo-
empírica e quase informal. A viagem, gráfico. Além do impulso que deu à
independentemente das motivações que Geografia, colocando Portugal em linha
a originava, foi importante nesta com o movimento de difusão das Socie-
evolução, como atestam as obras de dades de Geografia no mundo, em-
Ptolomeu, Ibn Batuta ou Humboldt. Ao penhou-se, desde o início, na exploração
longo dos séculos a descrição da Terra científica e na divulgação do continente
não dispensou a cartografia, os mapas africano. É de sublinhar, entre os tra-
nem a fotografia, a partir da sua invenção, balhos e relatórios que patrocinou ao
em 1826, técnicas de produção de longo do tempo, o que publicou sobre
imagens que a Geografia incorporou no
1
Em 1830 foi fundada, em Londres, a Sociedade
seu discurso, escrito e visual, como na Geográfica Real. Seguiram-se muitas outras, de
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cultura visual que lhe está associada. que referiremos a Sociedade Brasileira de Geo-
A partir de meados do século XIX o grafia, criada em 1838, a Sociedade Americana de
Geografia, em Nova Iorque, em 1852, e a National
rumo da Geografia é muito influenciado Geographic Society, a mais conhecida, em Washin-
pela evolução daquelas ferramentas, gton, no ano de 1888.
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Moçambique, em 1881, na sequência da grafia de Lisboa promoveram, posterior-


comunicação apresentada por Joaquim mente, a coberto de viagens de cunho
José Machado, na Sociedade de Geografia cientifico, várias explorações a Angola e a
de Lisboa, em sessões que tiveram lugar Moçambique, preocupados com essa
em de dezembro de 1880. “terra de ninguém” que se situava entre as
Viagens e explorações coloniais. A rela- costas daqueles dois territórios, onde se
ção da Europa com África alterou-se no destacaram as levadas a cabo por Serpa
início do século XIX, terminando com Pinto (1877-1879), Brito Capelo (1877-
uma enorme pressão sobre Portugal, país -1885), Roberto Ivens (1877-1885),
de parcos recursos, para reagir de maneira Henrique Dias de Carvalho (1884-
adequada a esta nova dinâmica interna- -1888), Francisco Newton (1880-1907)
cional. É neste contexto que se intensi- ou José Pereira do Nascimento (1888-
ficou a organização de explorações, quer -1911). Estas viagens, realizadas no
de âmbito comercial quer de carácter rescaldo das Conferências de Bruxelas e
científico-geográfico, como as empreen- de Berlim, ocorreram num contexto
didas por Joaquim Rodrigues Graça geopolítico bem determinado, quando se
(1843), Frederick Welwitsch (1852- promoveu uma política mais ativa de
-1860) ou a concretizada por José Anchie- penetração e ocupação do continente
ta, em Angola, durante cerca de trinta africano. Tais viagens não deixaram de,
anos2. O Governo e a Sociedade de Geo- concomitantemente, carrear abundante
informação de cariz geográfico sobre os
2
Entre a vasta literatura sobre as viagens realizadas
sertões africanos por onde se entendia o
neste período aos sertões africanos transcrevemos domínio português, designadamente o
duas passagens: interior moçambicano.
(i) “Parecia também conveniente que esta diligência
tivesse o seu princípio antes pelo rio Sena e
(Geo)política e pretensões portuguesas
Moçambique do que por Angola, ou por Benguela. em África. Após a Conferência de Bruxelas
O sertão que vai descobrir-se está mais chegado à (1876), a Conferência de Berlim, que
costa Oriental, e, por conseguinte, mais próximo
àquele rio e àquela provocação e capital; os negros decorreu entre Novembro de 1884 e
dessa parte são indubitavelmente mais disciplinados, Fevereiro de 1885, terminou com os
mais bravos e mais valentes; e havendo algum representantes plenipotenciários dos 14
obstáculo que romper, convém que agente esteja
fresca e vigorosa, para resistir e aplanar qualquer países presentes a assinarem o Acto Geral
dificuldade que da parte dela possa oferecer-se; o que e, em simultâneo, a Convenção de
não se conseguiria se a expedição fosse começada
pela costa ocidental de Benguela. Porque, quando
Reconhecimento dos Limites de Acção
chegasse à contracosta, vinha a esse tempo a gente já da Associação Internacional Africana e o
estropiada, cansada, provavelmente desbastada e Livro das Propostas e Projectos, que
bem diminuída, e como tal incapaz de resistir e
vencer os embaraços que os negros dessa costa
haviam sido discutidos durante o
suscitassem” (“Observação sobre a viagem de Angola encontro”. Foram abordadas seis questões
à costa de Moçambique”, feita no final do século fundamentais relativas aos interesses
XVIII, por José Maria Lacerda (Albuquerque, 1989;
p. 73). coloniais na África Central: “liberdade
(ii) Moçambique era colónia boa para “fazer África”, do comércio na bacia do Congo e seus
refere Alexandre Lobato, acrescentando: “o estado afluentes; interdição ao comércio de
das povoações refletia com eloquência o estado
econômico. Nada se fazia para durar por ser
desnecessária casa de pedra e cal. O UEM estava
disposto a gastar em África apenas alguns anos de costa oriental, isto é absolutamente certo e seguro,
vida”. (…) “O procedimento português em África e tanto para o litoral como para o sertão. Pelo con-
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no Oriente confirma a tese que, fundamentalmente, trário, os régulos negros eram considerados verdadei-
o que interessava era o substrato à concorrência ros reis, reverenciados e respeitados, e cumpriam-se e
estrangeira no comércio ultramarino. (…) Chegados observavam-se inteiramente seus usos e costumes
aos portos de África, os Portugueses não políticos e administrativos” (Alexandre Lobato,1951;
consideravam suas as terras e as gentes e, quanto à p. 136)
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escravos; neutralidade dos territórios na na questão colonial um dos pontos


bacia do Congo; navegação no Congo e críticos do nacionalismo português: é em
no Níger; condições essenciais a serem torno dela que, em grande parte, se pensa
seguidas nas novas ocupações no a identidade do país e se refaz a sua
Continente Africano; e por último, quais memória, se traçam os caminhos a
as ocupações já efectuadas que seriam percorrer e se calculam as hipóteses de
consideradas como efectivas”3. No sobrevivência nacional num mundo em
decurso das movimentações geopolíticas transformação” (Alexandre, 1996: 196).
que haviam de conduzir à partilha de O debate da relação que Portugal deve
África e ao desenho arbitrário das fron- estabelecer com África permanece incon-
teiras africanas, o governo britânico clusivo até aos nossos dias, mesmo depois
apresentou um Ultimato a Portugal, em da entrada na União Europeia. O tema,
1890, que ficaria para a história como o hoje como naquele final de século, conti-
Mapa Cor de Rosa. Tinha implícito o nua na agenda política portuguesa, desper-
insanável conflito de interesses motivado ta emoções pela grande carga simbólica
pelo interesse da Inglaterra querer ligar o que assume, onde coração e razão nem
Cairo à cidade do Cabo, por caminho de sempre encontram um justo equilíbrio4.
ferro, decisão que colidia com a “a pre- A pressão externa começou por colocar o
tensão de  Portugal exercer soberania país perante a necessidade de dinamizar
sobre os territórios entre Angola e em Moçambique uma administração
Moçambique, nos quais hoje se situam a eficaz, com capacidade de controlar e
Zâmbia, o Zimbábue e o Malawi, numa desenvolver um território vasto, o que
vasta faixa de território que ligava o implicava forte organização e disponibi-
Oceano Atlântico ao Índico”. O litígio lidade em mobilizar capitais, públicos e
em torno do referido Mapa Cor de Rosa, privados, de que o país, objetivamente,
além das profundas consequências em não dispunha. Oliveira Martins, um dos
Portugal, terá repercussões diretas nas inconformados da geração de 70, exprime
fronteiras externas e na (re)organização assim o seu sentimento crítico: «Como
da geografia interna de Moçambique. quer que seja, para fazer alguma coisa
num ponto, seria mister pôr de parte os
Administrar: implantar uma adminis-
domínios vastos e as tradições históricas,
tração mais eficaz em todo o território
concentrando num lugar os recursos e as
moçambicano. O projeto colonial portu-
forças disponíveis, se caso os há. Alienar
guês nunca foi pacífico nem politicamente
mais ou menos claramente, além do
consensual do ponto de vista interno,
Oriente, Moçambique, por enfeudações
sobretudo a partir da segunda metade do
a companhias, abandonar protectorados
século XIX, quando “o sistema interna-
irrisórios e domínios apenas nominais, e
cional conheceu dois grandes movimentos
congregar as forças de uma política sábia
de fundo: a recomposição do mapa
e sistemática na região de Angola – eis aí
político europeu, designadamente pela
o que talvez não fosse ainda inteiramente
emergência de duas novas potências, a
impolítico” 5.
Alemanha e a Itália, e a partilha de África,
que leva rapidamente à formação dos 4
Lembremo-nos de Rumo de Portugal. A Europa ou
modernos impérios coloniais”. (…) o Atlântico? (Joaquim Barradas de Carvalho,
“Durante todo o século XIX, mas sobre- 1974) ou, noutro registo e noutro contexto, A Nau
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de Ícaro seguido de Imagem e Miragem da


tudo no seu último quartel, esteve sempre Lusofonia (1999), onde Eduardo Lourenço faz
algumas reflexões a este propósito.
3
www.socgeografialisboa.pt/historia/exploracoes- 5
O colonialismo pragmático advogado por Olivei-
cientificas/. ra Martins levá-lo-ia a escrever em “O Brasil e as
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A administração colonial, sobretudo para evocar Mouzinho de Albuquerque,


em Moçambique, debatia-se com a em jeito de homenagem, num texto dado
necessidade de exercer uma efetiva ocupa- à estampa pela Sociedade de Geografia de
ção em todo o território, de pacificar os Lisboa (Mouzinho de Albuquerque: sua
povos que se rebelavam contra o jugo acção em Moçambique, 1902).
português e de combater o crónico António Enes, um civil que já havia
desequilíbrio orçamental que constituía desempenhado outros altos cargos públicos,
um fardo para as contas do estado. Altos foi um dos sócios fundadores da Socie-
dirigentes do Estado foram enviados com dade de Geografia de Lisboa. Mouzinho
a missão de enfrentar estes árduos proble- de Albuquerque foi um militar de carreira
mas, onde destacaremos António Enes e que granjeou prestígio pela condução das
Mouzinho da Silveira, por terem elabo- chamadas “campanha de pacificação”
rado relatórios, enquanto administradores (1894-1895) destinadas a “subjugar” as
na varanda do Índico, que estão impre- populações locais à administração colo-
gnados duma geograficidade que os nial portuguesa, que culminariam, em
transforma em fontes importantes para a Chaimite (1895), com a captura do
Geografia de Moçambique. imperador nguni Gungunhana. Estamos
A Geografia de Moçambique primor- perante personalidades a quem foram
dial e embrionária que encerram obriga a confiadas missões que mostram as
destacá-los no âmbito deste trabalho por preocupações reinantes à época, dois
confirmarem, também neste caso, que a modos distintos de abordar a adminis-
Geografia é, antes de mais, um saber e tração colonial, baloiçando entre uma
um instrumento de poder, sempre usado
versão mais civil e outra mais musculada
pelos poderes dominantes em proveito
ou, mesmo, militar.
próprio. Por estas razões, os devemos
revisitar para uma análise critica: Moçam-
bique, relatório apresentado ao Governo, 2. O ensino da Geografia de Moçam-
em 1893, elaborado por António Enes; bique em Portugal: da Geografia
Moçambique 1896-98, escrito por Mou- Colonial à Geografia das Regiões
zinho de Albuquerque, em 1899. Na Tropicais
sequência do trágico desaparecimento
deste militar, Aires de Ornelas usou-o O século XX foi conturbado, percorri-
do por guerras mundiais, regionais e
Colónias Portuguesa”: «É possível que em breves
anos os vapores corram no Congo e no Zambeze
locais, pela descolonização em África e
com caixeiros e missionários, Bíblias e fardos de por mudança nos paradigmas onde se
algodão, para irem comunicar com as feitorias alicerçavam, em termos teóricos e meto-
francas estabelecidas no interior, ao longo dos
rios; e o que aconteceu já com o Congo, venha dológicos, as diferentes áreas de saber.
também a repetir-se com o Zambeze. Éramos Portugal, Moçambique e as respetivas
senhores de duas chaves da navegação fluvial
africana: fomos forçados a franquear já uma delas
Geografias não ficaram imunes a tais
à navegação e ao comércio estrangeiro; sê-lo-emos alterações nem foram indiferentes aos
a franquear a outra, se antes disso não passar a ventos de mudança que haviam de alterar
febre um tanto excessiva que mais uma vez impele
a Europa para a África. O domínio histórico do radicalmente o quadro das (inter)depen-
litoral não nos dá o direito de proibir ou de taxar dências onde se movimentavam. Entre o
com alfândegas as feitorias do interior.» Em breve
início do século XX e 1974-75, com o 25
só a bandeira seria portuguesa tanto em Angola
de Abril em Portugal e a consequente
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como em Moçambique, restando-nos – sempre


segundo Oliveira Martins – a «condição de independência de Moçambique, também
guardas das costas de África […] provavelmente
ruinosa para nós, sem ser proveitosa para mudou o modo de ensinar e de fazer
ninguém» (Alexandre, 1996, p. 196). Geografia, que passou a ser menos escolás-
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
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tica e a ter um envolvimento mais ativo da Geografia aumenta e é criada, em


dos geógrafos na investigação e na ação. 1926, a disciplina de Antropogeografia
A partir da segunda metade do século geral, que faz adivinhar a influência da
assiste-se a um reforço deste tipo de inter- obra com o mesmo nome de Friederich
venção, mais alinhado com a preocupação, Ratzel; foi ainda “desdobrada a disciplina
então em voga, duma Geografia mais de Geografia de Portugal e Colónias em
ativa e aplicada e com geógrafos mais duas, Geografia de Portugal e Geografia
envolvidos na elaboração e implementação Colonial Portuguesa. A par destas altera-
das políticas públicas, bem evidente ao ções, foi instituída a especialização em
nível do ordenamento do território e do Ciências Geográficas, continuando, no
planeamento do desenvolvimento regio- entanto, a Geografia a estar associada à
nal e local. Esta tendência havia de levar História, nos cursos de Licenciatura”.
à institucionalização da Geografia nas A alteração da Lei Orgânica da Faculdade
universidades, o que aconteceu “não de Letras, já durante o Estado Novo,
tanto na lógica interna do conhecimento (Decreto de 25 de fevereiro de 1930),
científico”, pois “deve ser sublinhado o determina que fossem ministradas, no
facto de a geografia aparecer nos progra- Curso de Geografia, entre outras, as
mas do ensino primário e secundário e a disciplinas de Geografia Colonial Portu-
correspondente necessidade de formar pro- guesa e a História dos Descobrimentos e
fessores” (Gama, 2011, p. 219). da Colonização Portuguesa. Foi estipula-
do, posteriormente, que a Licenciatura
Semântica, pressupostos e conteúdos: em Geografia devia contemplar, nos 4º e
da Geografia Colonial à Geografia das 5º ano, as cadeiras de Geografia das
Regiões Tropicais. Os planos de curso Regiões Tropicais I e II e de História da
que estruturaram o ensino da Geografia Expansão Portuguesa (Decreto de 30 de
nas Universidades portuguesas denun- fevereiro de 1957). A Geografia das
ciam os interesses materiais, políticos e Regiões Tropicais veio, assim, substituir a
ideológicos, mesmo quando não explici- Geografia Colonial, “designação mais
tados, que acompanharam a sua evolução consentânea com os tempos de descolo-
ao longo do século XX. Embora já exis- nização e das independências após a
tisse o ensino de “matérias que fundamen- segunda Grande Guerra” (Gama, 2011,
tavam aspectos correlativos dos futuros p. 239).
estudos geográficos”, o quadro legislativo Os novos programas curriculares para
mostra que a Geografia só alcança verda- os Cursos de Geografia surgidos com o
deira alforria com o advento da República, advento da democracia, em 1974, procuram
em 1910, e a subsequente reorganização conjugar o novo quadro político com a
do ensino superior. Em 1911 são “extintos “Nova Geografia”, tão discutida nos países
o Curso Superior de Letras em Lisboa e a europeus, mais progressiva cientifica-
Faculdade de Teologia na Universidade mente e pedagogicamente mais prática e
de Coimbra” e são criadas as Faculdades mais dinâmica. A posição relativamente a
de Letras de Lisboa e Coimbra (Oliveira, África e à Geografia Tropical também
2003, p. 23). muda radicalmente por preconceito
A exemplo do que acontecia nas ideológico ou por rejeição natural a uma
universidades francesas, a Geografia ficou opção que havia sido imposta, que
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incluída nas Faculdades de Letras, sendo evoluiu para uma guerra traumatizante e
aquela data o verdadeiro início dos estu- que acabaria dolorosamente com o
dos universitários de Geografia em Portu- “regresso das caravelas”. A África acabaria
gal (Gama, 2011, p. 220). A importância por ser trocada pela aproximação à
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Rui Jacinto & Lúcio Cunha 56

Europa, solução política e estratégica que Fernandes Martins e Orlando Ribeiro,


serviu de contraponto a um retorno fundadores das primeiras escolas de
rápido e precipitado, opção que mudaria Geografia, sediadas nas Universidades de
a Geografia portuguesa e o modo de Coimbra e de Lisboa. Os conteúdos
olhar e nos relacionarmos com os espaços ministrados nas suas aulas revelariam
africanos6. como o ensino foi sustentado por um
A primeira alteração oficial do plano conhecimento indireto e incipiente da
da licenciatura em Geografia ainda realidade moçambicana, que os dois
mantém a Geografia das Regiões Tropicais últimos Professores só colmataram mais
(4º ano) e remete a História da Expansão tarde.
Portuguesa para disciplina de opção Além de Paiva Boléo, cuja obra
(vertida num Decreto Lei de 15 de maio comentaremos mais adiante, Alfredo
de 1978). Uma reforma posterior do Fernandes Martins e Orlando Ribeiro
plano de estudos do Curso de Geografia foram os geógrafos que realizaram mais
de Coimbra, realizada em 1992, em trabalho de campo em Moçambique,
sintonia com os tempos que se viviam, fazendo missões científicas num deter-
extingue a Geografia das Regiões Tropi- minado contexto histórico de Portugal e
cais e cria uma disciplina de Geografia da de Moçambique, que se começa a esgotar
Comunidade Europeia. nos anos sessenta do século XX. O legado
A história da moderna Geografia destes geógrafos foi importante por terem
ensinada nas Universidades portuguesas esboçado um certo modo de olhar o
revela facetas úteis para enquadrar a mundo que se esconde, imenso e miste-
evolução da Geografia em Moçambique. rioso, em cada um dos Países Africanos
Em primeiro lugar, o contexto sociopolí- de Língua Oficial Portuguesa. Os seus
magistérios foram referência para sucessi-
tico e ideológico que orientou a evolução
vas gerações de estudantes que influen-
da Geografia em Portugal, do pragma-
ciaram pela palavra, escrita e falada, através
tismo que levou à criação duma Geografia
das suas lições e do que publicaram, onde
Colonial Portuguesa, posteriormente,
esboçaram mapas mentais e uma cultura
transvertida em Geografia das Regiões
territorial que perdurou no imaginário
Tropicais. Por outro lado, a importância
coletivo. É neste tempo e neste universo
dos mestres, onde pontificou uma mítica
geográfico que estão ancorados os laços
trindade constituída pelos Professores
primordiais e longínquos das filiações,
Aristides de Amorim Girão, Alfredo
dependências e afastamentos que conti-
6
Vozes insuspeitas, como a de Joaquim Barradas de nuam a persistir entre as Geografias de
Carvalho, refere: “Portugal terá de escolher. Se Portugal e de Moçambique.
rumar para a Europa – esta Europa tão do agrado
dos tecnocratas – Portugal perderá a independência O legado dos mestres e a Geografia de
de novo, chegará a mais curto ou a mais longo
prazo à situação de 1580. Na Europa do Mercado
Moçambique ensinada em Portugal.
Comum, e numa futura hipotética, Europa Aristides de Amorim Girão, Orlando
política, a economia dos grandes espaços forjará Ribeiro e Alfredo Fernandes Martins
uma Península Ibérica unificada, e seguramente
com a capital económica em Madrid, que de foram geógrafos do seu tempo, persona-
capital económica se transformará, a mais curto lidades distintas, cujo modo próprio de
ou a mais longo prazo, em capital política. (…)
Assim, perante a encruzilhada, pronunciamo-nos
estar na vida influenciou a maneira de ver
o mundo, ensinar e fazer Geografia. Se o
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pelo Atlântico, como única condição para que


Portugal reencontre a sua individualidade, a sua primeiro não teve qualquer experiência
especificidade, a sua genuinidade, medieva e
renascentista” (Joaquim Barradas de Carvalho, africana, Alfredo Fernandes Martins e
1974, p. 64). Orlando Ribeiro tiveram contactos com
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
57 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

Moçambique, que acabariam por deixar como: “fases da colonização portuguesa”;


expressos nos respetivos legados escrito distribuição e extensão de Portugal
ou oral, transmitidos nas suas aulas. Ultramarino”; “portugueses e luso-des-
Aristides de Amorim Girão (1895- cendentes em países estrangeiros” (Girão,
-1960), um dos pioneiros da Geografia 1941; 2.ª edição: 1949-50, pp. 483-492).
portuguesa, fruto desta e das suas Sem fazer qualquer referência à Geografia
circunstâncias, acabou por construir uma das Províncias Ultramarinas, deixa plas-
interpretação de África sobretudo a partir mado com eloquência é a sua visão sobre
da bibliografia, tendo transmitido uma esta problemática: “as condições determi-
visão do “mundo português” sem a nantes e influentes da expansão ultrama-
distância crítica relativamente à posição rina e a feição humanitária da colonização
veiculada pelo discurso ideológico do portuguesa, que tanto se dirigia aos terri-
regime. A sua leitura dos vastos espaços tórios como às almas, se por um lado
africanos, patente nas Lições de Geografia explicam a capacidade única que teve o
Humana (1936) e retomada em Geografia povo português de perpetuar-se noutros
Humana (1946), expressa uma geografi- povos, no dizer de Gilberto Freyre
cidade de pendor determinista, um tanto (O Mundo que o Português criou),
ingénua, condicionada e “conservadora” explicam também este facto consolador:
se atendermos à maneira como contesta, que seja ainda possível fazer a viagem por
recupera ou alinha com certas explicações. mar de Lisboa até à Índia e à China,
Nestas publicações, inclui perto de 100 sempre a ver terras, ilhas, cabos e portos
estampas, fora de texto, para ilustrar o que nós baptizamos, e até mesmo a ouvir
mundo onde, então, se vivia. Mesmo que falar a nossa maviosa língua” (p. 486).
se leve em consideração a dificuldade no A proximidade ideológica com o regi-
acesso a imagens e o caracter didático das me também se percebe numa passagem
obras, é elucidativo que resumam os do Atlas de Portugal dedicada a Moçam-
principais países da atual CPLP a apenas bique: “A província de Moçambique, na
10 fotos, no caso do Brasil, 11 de Angola sua grande extensão Norte-Sul, vem
e 1 de Moçambique. A única imagem de confirmar a lei dos litorais (António
Moçambique, curiosamente, é a de um Sardinha) a que obedeceu a expansão dos
rancho de mais duma dezena de negros, Portugueses no mundo, de tal maneira
enquadrado por um capataz branco, que é possível viajar ainda hoje por mar
fazendo a ceifa do trigo, no Vale do da Europa ate a Índia sempre a ouvir falar
Limpopo, que quase poderia ser no a língua de Camões. (…) Desempenhou
Alentejo, assim legendada: “a cultura do sempre o papel de intermediário entre o
trigo, “cereal da civilização”, desempenha Ocidente e o Oriente, como sucedeu
actualmente no mundo um papel unifor- com o cajueiro (Anacardium occidentale),
mizador da superfície: em regiões muito planta de origem brasileira que os Portu-
distantes e de características bem distin- gueses ali introduziram e depois difun-
tas, as formas de ocupação do solo reve- diram por todo o Oriente, a ponto de ser
lam às vezes aspetos paisagísticos muito conhecido nas ilhas da Malásia por «fruto
semelhantes” (Estampa LXXXIV, p. 318). de Portugal». Se há uma civilização luso-
A sua Geografia de Portugal, onde faz tropical (Gilberto Freire), que fortemente
considerações alinhados com o discurso marcou a fisionomia e ligou os destinos
iberografias 13 2017

do regime sobre “a extensão e a eficiência das terras marginais de três grandes


da colonização portuguesa”, termina com Oceanos, poderá talvez apontar-se essa
um capítulo dedicado a “Portugal e aos planta como o seu melhor símbolo
portugueses no mundo”, aborda temas vegetal” (Girão, 1941; 2.ª edição, 1958).
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
Rui Jacinto & Lúcio Cunha 58

Alfredo Fernandes Martins (1916- da conferência que proferiu na Semana


-1882), geógrafo arguto e peculiar, do Ultramar realizada em Coimbra. Não
começou por construir a sua ideia de são conhecidos textos que deem conta
África a partir da literatura de viagens, das missões que realizou, designadamente
das descrições de grandes aventureiros, a Moçambique8, onde fez muito trabalho
onde pontificavam Saint-Exupéry e de campo durante várias temporadas.
Hemingway. O ideal romântico que o Depois de ter sido nomeado adjunto da
caracterizava foi alimentado por estes Missão de Geografia Física e Humana do
companheiros de jornada e outros viajan- Ultramar (Diário do Governo, n.º 160,
tes, marinheiros e demais aventureiros. O de 10.07.1961), coadjuvando Orlando
coração acabaria superado pela razão Ribeiro, em 1961 esteve em Angola
quando, por dever de ofício, foi obrigado (Luanda) e Moçambique (distritos de
a fazer leituras mais “científicas” para Moçambique e Niassa), fazendo na região
preparar as aulas de Geografia Colonial e de Nampula o “reconhecimento de níveis
as missões que empreendeu a Angola e de erosão correlacionados com duas
Moçambique. No ano de 1942-43 come- gerações de formas de tipo Inselberg”.
çou a dar aulas práticas de Geografia Nos anos seguintes continuou a
Colonial Portuguesa e a partir de 1950- trabalhar em Moçambique, onde “prosse-
-51 as respetivas teóricas, continuando a guiu no reconhecimento dos níveis de
regência da Geografia das Regiões Tropi- erosão da região de Nampula, esteve no
cais, cadeira que lhe havia de suceder. planalto dos Macondes e, no intento de
Após o precoce trabalho O clima de estabelecer correlações, percorreu o litoral
Inhambane (1938) publica ensaios sobre moçambicano ao norte de Porto Amélia”
os trópicos e a Geografia Colonial, como (1962). Em 1964 visitou a região de
a Geografia Humana do Brasil (1944), a Quelimane, “preocupado com problemas
Grandeza, declínio e novas possibilidades de morfologia litoral e, no seu caminho
da borracha brasileira (1944) e Alguns para Nampula, buscou outros elementos
reparos à classificação das colónias dos níveis já reconhecidos nas campanhas
proposta por Hardy (1944). Publica, anteriores”. Em 1965 percorre a “região
ainda, O condicionalismo geográfico na costeira entre Porto Amélia e Pebane,
expansão portuguesa (1964)7, resultado então de novo preocupado com temas de
morfologia litoral e da evolução da costa
7
Escreveu: “se a terra-pátria não dava, salvo raras
excepções, nem frutos, nem matérias primas de animais domésticos e as plantas cultivadas. Vão o
apreço e grande valia no mercado contemporâneo, café do velho mundo para o continente americano,
se nem sequer as grandes vias comerciais coevas e da terra do pau-brasil trazemos o cacau para
tracejavam o território nacional, importava então África; e logo a vinha do mundo mediterrâneo
que se pudesse levar aos mercados distantes o será encaminhada para as baixas latitudes; e o
produto desejado e de bom preço, para desta coqueiro é levado das margens do Índico a
guisa compartilhar da riqueza que ostentavam espalhar-se pelo mundo tropical; o trigo iniciava a
aqueles que mais bem situados estavam no viagem e o milho vem da América para o
concerto euro-asiático e euro-africano. (…) continente europeu e a cana-de-açúcar fará longa
A epopeia estava lançada: havia o ímpeto, a posi- jornada de arquipélago em arquipélago, de costa a
ção, a área de influência, os homens à altura da costa do Atlântico.” (Martins, in Campar et al.,
missão e o navio excelente. Mobilizamos tudo: 2006: 172).
homens e coisas e espécies da ementa agrícola 8
No âmbito da Missão de Geografia Física e
europeia e tropical. Viajam os homens: conti- Humana do Ultramar fez trabalho de campo em
nentais, ilhéus, negros e todos viajando para ir diversas regiões de Moçambique em 1961
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cada vez mais longe, a outra terra achada, onde se (Nampula), 1962 (Nampula, Planalto dos
fixarão, e donde talvez os filhos irão partir um dia Macondes, Litoral de Porto Amélia), 1964
para outra terra então achada ou que nessa hora (Quelimane), 1965 (Porto Amélia e Pebane) e
mereceu o empenho da colonização. E vão os 1966 ((); Moçambique (da Foz do Rio Molocué à
hábitos e os usos, e os costumes, e as alfaias, e os Baía de Condúcia).
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
59 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

contemporânea” e, em 1966, “os process- Terras Portuguesas, 1953), importa


os de pesca indígenas” e “da morfologia destacar Problemas Humanos de
litoral desde a foz do rio Molocué à baía África (1954-1989)10, texto angular,
de Condúcia” (Curriculum Vitae, 1967). refeito e várias vezes reeditado, incluí-
António Gama havia de referir que dos como outros dispersos em Origi-
“Alfredo Fernandes Martins atravessou nalidade da expansão portuguesa
estes tempos não sem dilemas e expressou- (1994), livro organizado e legendado
os na escrita e na palavra”. Quando a por Suzanne Daveau, editado com o
Geografia das Regiões Tropicais substitui patrocínio da Comissão Nacional para
a Geografia Colonial, “designação mais as Comemorações dos Descobrimentos
consentânea com os tempos de descolo- Portugueses, onde compilou seis arti-
nização e das independências após a gos dispersos, fundamentais para
segunda Grande Guerra”, que lecionou apreciar o pensamento do autor sobre
durante vários anos, não deixou de se estas matérias11. A tudo isto importa
confrontar com os dilemas dum cidadão, juntar o relatório da Missão da
“militante de esquerda da sua época, Geografia à Guiné (1947) e da Missão
dividido entre uma perspectiva civiliza- de Geografia da Índia (1956)12.
dora da colonização e o sonho de liberda-
de que as independências, como expressão
10
Incluído em Ensaios de Geografia Humana e
regional (1970, pp. 265-290), onde retoma o
dos sonhos de libertação dos povos essencial de Aspectos e problemas da Expansão
colonizados” (Gama, 2011: 240). portuguesa (1954; 1955; 1962) e Problemas
humanos de África, publicado no âmbito dos
Orlando Ribeiro (1911-1997) foi o Colóquios sobre problemas humanos nas Regiões
geógrafo português que mais investigou, Tropicais, 1961.
viajou e escreveu sobre territórios fora do 11
Orlando Ribeiro (1994) – Originalidade da
expansão portuguesa, Porto, Figueirinhas. Compila
Continente, percorrendo em diferentes seis artigos: Aspectos e Problemas da Expansão
momentos a Madeira e Porto Santo Portuguesa (1954), Apresentados como lição
(1947, 1948), Açores (1953, 1958), inaugural do Curso de Férias da Faculdade de
Letras de Lisboa, em Julho de 1954; “Um povo na
Guiné (1947), Cabo Verde (1951, 1952), Terra”, Portugal. Oito séculos de História ao
S. Tomé e Príncipe (1952), Goa, Damão serviço da valorização do homem e da aproximação
e Diu (1955, 1956), Angola (1935; 1960, dos povos, Lisboa, Comissariado Geral de Portu-
gal para a Exposição Universal e Internacional de
1961, 1962, 1963) e Moçambique Bruxelas de 1958; O Infante e o mundo novo,
(1960, 1961, 1962, 1963)9. O seu pensa- Conferência proferida a 25 de Março de 1960 na
Universidade de Lisboa; Originalidade da Expan-
mento sobre matérias relevantes para a são Portuguesa, Conferência proferida na Socie-
Geografia de Moçambique espraia-se por dade de Geografia de Lisboa, em 14 de maio de
vários trabalhos, dispersos no tempo e no 1956, inaugural da Semana do Ultramar, profe-
rida naquela Sociedade, em 14 de Maio de 1956;
espaço, que nesta sucinta apresentação Reflexões em torno da Expansão Portuguesa,
estruturamos em três eixos que se comple- Conferência proferida no Liceu Pedro Nunes,
mentam: Lisboa, em 16 de Março de 1960; Panorama da
Expansão Portuguesa, súmula das lições proferidas
– Expansão portuguesa e problemas hu- no primeiro Curso Universitário de Férias no
manos de África. Além de textos curtos, Ultramar, organizado pela Universidade de Lisboa
mas significativos, como Vocação colo- em Lourenço Marques e Luanda, em Agosto e
Setembro de 1960.
nial (Palestra que passou na Rádio 12
Reeditado pela Comissão Nacional para as Come-
Nacional em 1 de Outubro de 1944) morações dos Descobrimentos Portugueses,
Lisboa, 1999, com Prefácio de Fernando Rosas e
e Casa Grande e Senzala (reproduzido Introdução de Suzanne Daveau, com o título Goa
iberografias 13 2017

em Gilberto Freyre, Um Brasileiro em em 1956. Relatório ao Governo. Sobre o Oriente,


particularmente Goa. Algumas observações de
geografia tropical, por Pierre Gourou (1956),
9
Referências e passagens retiradas de: http://www. Goa, por Norberto Krebs (1956), Inquérito das
orlando-ribeiro.info/home.htm. aldeias de Goa (1956).
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
Rui Jacinto & Lúcio Cunha 60

Geografia portuguesa e iconografia colonial: mapas e símbolos

Mapa desenhado por Alfredo Fernandes Martins.


Protótipo instalado no Departamento de Geografia da Universidade de Coimbra, serviu de
modelo ao mapa mural localizado na entrada do Portugal dos Pequenitos, obra da iniciativa
de Bissaya Barreto, com projeto do arquiteto Cassiano Branco, inaugurada em 8 de junho de
1940. Concebida segundo o espírito nacionalista do Estado Novo, para quem Portugal ia do
“Minho a Timor”, converteu-se num parque temático que constitui, hoje, conforme explica a
página da Instituição, uma “representação etnográfica e monumental dos atuais países africanos
de Língua Oficial Portuguesa, do Brasil, de Macau, da Índia e de Timor, envolvidos numa
vegetação própria destas regiões.”

Sociedade de Geografia de Lisboa: ornamento Finisterra, Revista Portuguesa de Geografia,


iberografias 13 2017

em ferro na porta de entrada Capa do número 1.º (1966). Fundada por


Orlando Ribeiro, tem desde o primeiro
número a esfera armilar como tema prin-
cipal da capa
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
61 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

– Geografia de África e da Zona Inter- – Geografia da Expansão Portuguesa.


tropical. O livro escrito em colabora- Com este título que deu às lições que
ção com Suzanne Daveau, La Zone proferiu no Primeiro Curso Univer-
Intertropicale Humide (Paris, A. Colin, sitário de Férias no Ultramar, em
1973), destinado fundamentalmente 1960, tratou dos seguintes temas:
a estudantes de Geografia, como escre- A génese e os instrumentos da expan-
veu Philippe Pinchemel no prefácio, é são; As Ilhas Atlânticas; O Oriente:
“uma autêntica geografia cultural dos Goa; Brasil: o Recôncavo da Baía;
trópicos húmidos, descreve uma im- A mestiçagem. Problemas africanos;
pressionante sedimentação histórica Reflexos em Portugal.
de civilizações autóctones e de coloni- – Problemas Humanos de África. A Con-
zações sucessivas”, onde “os aspectos e ferência que proferiu em Lourenço
problemas do Brasil e das antigas Marques e Luanda, naquele mesmo
colónias portuguesas têm a impor- ano, com esta designação, que apro-
tância que merecem”. São ainda deste funda ideias anteriormente publicadas,
período os artigos em que Orlando terá uma versão final, incluída nos
Ribeiro analisa os traços fundamentais Ensaios de Geografia Humana e Regio-
do pensamento geográfico de um dos nal (1970), onde havia de colocar a
grandes Mestres da Geografia das seguinte observação: “é a reconstituição
Regiões tropicais, Pierre Gourou. de uma conferência proferida em
– Fracasso da colonização e destinos do Lourenço Marques e em Luanda em
Ultramar. Volta ao tema em circuns- 1960, antes de a apresentar na série de
tâncias especiais, num contexto socio- colóquios onde foi publicada, no ano
político que havia mudado, para seguinte. Suscitou, como era meu
fechar o ciclo ultramarino, tendo como desejo, reações diversas, de adesão e de
pretexto a descolonização e o retorno repúdio, mas não indiferença: concor-
para, em jeito de balanço, testamento dando ou não, creio que todos
ou, se quisermos, dum certo ajuste de aceitaram a plena e dolorosa sinceri-
contas com a história, publicar dois dade com que comuniquei ao público
livros. Um primeiro em que colige no as reflexões do meu regresso aos
volume Destinos do Ultramar (1975) estudos africanos, interrompidos em
uma série de artigos, publicados no 1947” (Ribeiro, 1989).
Diário de Notícias, entre 24 de – Problemas da investigação científica
Setembro e 28 de Outubro de 1974, colonial: em torno da Universidade e da
“redigidos ao correr da pena, sobre investigação científica. Conferência
resultados de alguns anos interpolados proferida no dia 17 de Setembro de
de viagens e de muitos de reflexão” e 1963, no Salão de Festas do Liceu
um outro, mais reflectido para tentar Salazar, publicada no Boletim da
explicar A Colonização de Angola e o Sociedade de Estudos de Moçambi-
seu fracasso (1981). que (Lourenço Marques, 136, 1963,
A passagem de Orlando Ribeiro por p. 5-14). Retoma ideias apresentadas
Moçambique teve três momentos que, a no Colóquio na Junta de Investigações
nosso ver, são importantes para contex- Científicas Coloniais (Problemas da
tualizar o processo que conduzirá à insti- investigação científica colonial, 1950)
iberografias 13 2017

tucionalização, em 1969, da Geografia e incluídas em Variações sobre Temas


em Moçambique na, então, Universidade de Ciência, 1970); voltaria ao tema no
de Lourenço Marques: artigo publicado no Diário de Notícias
(Lisboa, 28 de Outubro de 1974 e
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
Rui Jacinto & Lúcio Cunha 62

incluído em Destinos do Ultramar, século XX, pela “Junta de Investigações


1975), intitulado Descolonização, do Ultramar (a partir de 6 de Novembro
ensino e ciência, onde antecipa alguns de 1973), logo depois Laboratório Nacio-
cenários que acabariam por ocorrer. nal de Investigação Cientifica Tropical
Além do artigo Ilha de Moçambique (31 de Dezembro de 1979) e, na forma
(1976), a passagem do autor por Moçam- atual, Instituto de Investigação Científica
bique ainda proporcionou a publicação Tropical, o IICT (desde 8 de Abril de
póstuma, em reedição, Orlando Ribeiro 1982, por decreto que seria regulamentado
– Cadernos de Campo, Moçambique com outro de 19 de Abril de 1983)”
1960-1963, que tem na contra-capa uma (Amaral, 1983, p. 327).
fotografia de Orlando Ribeiro e de O património acumulado por estes
Fernandes Martins conversando na base organismos, herdeiros dum saber e dum
de um inselberg em Moçambique (1961),
espólio admirável, e que haviam conse-
edição organizada por João Sarmento e
guido sobreviver ao 25 de Abril, acabaria
Eduardo Brito-Henriques (2013; Edições
por ser desmembrado com a extinção do
Húmus – Centro de Estudos Africanos
Instituto de Investigação Científica Tro-
da Universidade do Porto).
pical (IICT), em 31 de Julho  de  2015,
pelo decreto-lei n.º 141/2015, decorrente
3. Geografia, investigação e desenvol- da intervenção da Troika e da crise e
vimento (Geoide): dos primórdios da austeridade que, supostamente, a moti-
investigação geográfica em Moçambique vou. O património reunido sobre a inves-
à cooperação para uma nova Geografia tigação tropical foi repartido entre a
Os comentários do ponto anterior, Universidade de Lisboa e a Direção Geral
em muitos casos, resultaram de missões do Livro, Arquivos e Bibliotecas, ficando
realizadas com o apoio das Junta das as competências na área da investigação
Missões Geográfica e de Investigação divididas pelo Instituto Superior de
Coloniais, criada em 7 de Janeiro de Agronomia (na área do saber tropical) e
1936 e reorganizada em 1945, com o pela Faculdade de Letras da Universidade
objetivo de promover a observação direta, de Lisboa (na área de história); a tutela
o trabalho de campo e a elaboração de do Arquivo Histórico Ultramarino acaba-
relatórios sobre os territórios ultrama- ria por ser entregue à Direção Geral
rinos. Tendo por objetivo promover a do Livro.
investigação nos territórios de além-mar,
aquela entidade governamental sucedeu à
Commissão de Cartographia, criada em Antecedentes dos estudos geográficos em
19 de Abril de1883, herdeira da Com- Moçambique: cartografia, atlas, mono-
missão Central Permanente de Carto- grafias. O projeto colonial português,
graphia, que havia sido instituída por em qualquer das suas fases, sempre pecou
decreto de 17 de Fevereiro de 1876, “no por défice de conhecimento detalhado
Ministério dos Negócios da Marinha e dos territórios, de estudos técnicos apro-
Ultramar, com as suas secções de Geo- fundados e, a partir de determinado
grafia, História Etnológica e Arqueologia, momento, de recursos humanos cada vez
Antropologia e Ciências Naturais. Acom- mais qualificados. O (re)conhecimento
do território moçambicano foi demorado,
iberografias 13 2017

panhou, portanto, a constituição da


Sociedade de Geografia de Lisboa”, criada resultando o conhecimento geográfico
em Janeiro de 1876. A herança da tradi- que foi sendo adquirido pela acumulação
ção destes estudos foi continuada no de levantamentos cartográficos, da edição
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
63 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

de atlas e de publicação de algumas Gago Coutinho havia de publicar um


monografias temáticas ou regionais. “Relatório da Missão Geodésica da África
Oriental, 1907-1910”, em 1911, e anos
Cartografia. A Comissão de Carto-
mais tarde, em 1921, um “Álbum de
grafia, criada em 1883, havia de sobreviver
fotos da Missão Geodésica da África
sob várias designações até 2015, data da
Oriental, 1907-1910”.
extinção do Instituto de Investigação
Atlas. A Geografia de Moçambique,
Científica Tropical (IICT). A importância
no final do século XIX, tinha um carácter
estratégica da sua atuação para o conhe-
francamente elementar, devido à parca
cimento geográfico de Moçambique está
informação disponível e incipiente por
bem patente no seguinte texto: “Moçam-
assentar num empirismo metodológico,
bique foi o primeiro país a ser objecto de
se levarmos em consideração a norma e o
operações geodésicas com vista à sua
padrão que viria a alcançar décadas
cobertura trigonométrica regular e de
depois. A partir de então foram sendo
cadastro, para o que foi criada a Missão
divulgados alguns trabalhos, relevando
Geodésica da África Oriental, chefiada
atlas que passaram a constituir uma
por Gago Coutinho, considerada a pio-
modalidade que se havia popularizado.
neira das missões científicas. Por Portaria
Os mapas incluídos passaram a ser cada
Ministerial de 18 de Janeiro de 1907, foi
vez mais detalhados e de melhor quali-
criada a Missão Geodésica da África
dade, mostrando que os levantamentos
Oriental para, sob a direcção do Primeiro
feitos no âmbito das Missões Geodésicas
Tenente da Armada Gago Coutinho,
e Geográficas estavam a dar resultados.
serem definidas as linhas de fronteira de
Estas edições forneciam, além uma
África Oriental (Moçambique) com as
visão do conjunto do Império, o estado
colónias vizinhas inglesas e alemãs. Esta
da arte em cada ramo científico bem
missão funcionou durante quatro cam-
como as características e especificidades
panhas e seus trabalhos foram interrom-
geográficas de cada uma das suas parcelas,
pidos em 1910, mas foi cumprida cabal-
designadamente as de Moçambique.
mente, não só no referente às delimitações
Subliminarmente, a mensagem que pas-
das fronteiras com as colónias vizinhas,
savam oscila entre a exaltação patriótica e
como também na observação de uma
a propaganda colonial, enfatizando a
cadeia geodésica ao longo da costa desde
dimensão desmesurada que o Império
a fronteira sul até ao farol do Bazaruto,
tinha atingido. Passamos em revista algu-
sendo Gago Coutinho, nesses trabalhos,
mas obras representativas deste percurso:
coadjuvado por Sacadura Cabral, Dias de
(i) Geographia e estatística de Portugal e
Carvalho, Vieira da Rocha e Jorge Cas-
colónias com um atlas. A Geografia de
tilho” (Santos, 2012; 2014)13. O próprio
Portugal da autoria de Gerardo
Augusto Pery14, publicada em 1875, é
13
“Os seus trabalhos foram continuados pela
Missão Geográfica de Moçambique (MGM)
criada em 1932. Durante cerca de 40 anos a e respectivos cálculos. Várias décadas passadas,
operar no campo, esta missão estabeleceu uma estas infraestruturas geográficas são ainda de uma
estrutura geodésica, que apoia a cartografia exis- importância fundamental pois, para além de
tente, constituída por uma rede de triangulação cobrirem geograficamente o território Moçambi-
com cerca de 900 vértices, 16 bases e 16 estações cano, são facilmente convertíveis nos sistemas de
de Laplace, uma rede de nivelamento geométrico coordenadas usados pelos actuais sistemas de posi-
com cerca de 6000 marcas e uma rede gravimétrica cionamento e navegação, como o GPS” (Santos,
iberografias 13 2017

com mais de 1300 pontos. Em 1973, por motivos 2012; 2014).


histórico-políticos termina a sua actividade de 14
Gerardo Pery (1835-1893) pertencia a uma
campo sem ter concluído a cobertura do país. Em família de origem francesa, cuja linhagem militar
gabinete, a MGM, procede à inventariação e o levaria a abraçar o exército, onde prestou serviço
organização de parte da documentação recolhida como cartografo. A excelência do seu trabalho
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
Rui Jacinto & Lúcio Cunha 64

uma obra relativamente extensa, em- interior, é em toda a África ao sul do


bora descritiva, construída em moldes Equador o que apresenta maior
modernos com recurso a estatísticas e extensão de planícies litorais, sulcadas
inclui um capítulo breve, de algumas de caudalosos rios, como o Zambeze,
páginas bastante elementares, onde se que se tornaram as vias naturais de
descreve Moçambique. penetração no continente. Lourenço
(ii)Atlas com mapas de Moçambique. (a) Marques é uma cidade-porto, cujo
Atlas Colonial Português (1914), o pri- vasto hinterland abrange não apenas a
meiro e mais antigo Atlas das colónias, Província, mas ainda se estende ao
composto por 22 cartas impressas a Transval e outras regiões da União
cores, dobradas a meio e publicado Sul-Africana e as Rodésias. Nesse
pela Comissão de Cartografia inte- porto se articulam, de maneira muito
grada no Ministério das Colonias. (b) curiosa, as comunicações por terra
Atlas Missionário Português (1962), com as ligações por mar. E o mesmo
editado pela Junta de Investigações do pode dizer-se da cidade da Beira, que
Ultramar15. (c) Atlas de Portugal, constitui também uma das grandes
elaborado por Amorim Girão (1941, encruzilhadas terrestres, marítimas e
2.ª ed. 1958), onde, a par dos mapas, aéreas da Africa do Sul. Escala
se faz a uma elucidativa descrição de obrigatória que foi em todos os
Moçambique: “O seu território, ape- tempos no caminho da Índia, Moçam-
sar de bem integrado nos planaltos bique atrai ainda hoje numerosos
africanos pela sua zona montanhosa Indianos e Goeses, que lhe dão já um
certo ar oriental”.
está patente nos mapas de diferentes parcelas do Monografias. Após a fase de levanta-
Continente publicados pelos serviços carto-
gráficos; pertence-lhe ainda a tentativa de editar mentos cartográficos e de recolha de
uma primeira Geografia de Portugal estatisti- informação avulsa e relativamente espon-
camente documentada. Um dos seus filhos havia tânea, o estado português sente a necessi-
de protagonizar uma história curiosa que o
relaciona com Moçambique: João António Pery dade de promover a sua sistematização,
de Lind (1861-1930) foi destacado como gover- tratamento e organização. A partir dos
nador da Companhia de Moçambique, que tinha anos 30, paralelamente a uma política
concessão do governo português, por um período
de 50 anos (1892-1942), sobre os territórios de mais ativa de colonização e fomento,
Manica e Sofala. O impulso de João Pery de Lind interna e de além-mar, desencadeia vários
dado a este território, no corredor da linha férrea
vinda do porto da Beira, levou a população,
inquéritos e monografias para cobrirem
especialmente os agricultores da povoação de diferentes domínios económicos, sociais
Chimiala, cujo nome, entretanto, havia mudado e regionais (p. ex. Inquéritos agrícolas). A
para Mandingos, a atribuir a este lugar, em 1916,
o nome de Vila Pery. João António Pery de Lind opção estratégia e política que impulsou
teve, pois, a honra de, em vida, ver o seu nome a elaboração deste surto de monografias
ligado a uma importante terra como reconheci- foi respaldada, academicamente, pelas
mento pela sua obra. Vila Pery passou a designar-
se Chimoio, em 12 de Junho de 1975, nome ciências sociais que prosseguiam esta
porventura derivado dum clã local, proclamação linha de investigação: foram desenvolvidos
que ocorreu durante um comício popular orien- trabalhos deste tipo pela agronomia,
tado pelo primeiro presidente de Moçambique,
Samora Machel. etnografia, antropologia e geografia (Rio
15
De referir outros já elaborados no período pó de Onor e Vilarinhos de Furnas de Jorge
colonial: Atlas sócio-cultural de Moçambique, da
autoria de Cahen, Waniez & Brustlein (2002);
Dias foram modelo para várias gerações
iberografias 13 2017

Atlas da Lusofonia, editado pelo Instituto Portu- de estudantes).


guês da Conjuntura Estratégica, que teve o Os trabalhos de índole monográfico,
volume dedicado a Moçambique, lançado em
2005 (Coordenção: Pedro Cardoso e Francisco inspirados em Vidal de la Blache e supor-
Proença Garcia). tados teoricamente pelos seus discípulos
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
65 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

Moçambique em obras da Geografia portuguesa

Fonte: Pery , Gerardo A., 1875 Fonte: Girão, Amorim, 1941; 1958

da geografia francesa, dominaram o 1950, (ii) Moçambique, da autoria de José


arranque do ensino e da investigação da de Oliveira Boléo, editado em 1951 pela
Geografia em Portugal, tanto em Coimbra Agência Geral do Ultramar (Ministério do
como em Lisboa, podendo apontar-se Ultramar, Divisão de publicações e
como trabalhos exemplares desta fase as biblioteca. Moçambique: pequena mono-
seguintes teses: Alto Trás-os-Montes grafia (1961), versão condensada daquele
(Virgílio Taborda, 1932) e O esforço do trabalho, acabaria por ter uma larga
Homem na Bacia do Mondego (Alfredo difusão, com duas edições posteriores, em
Fernandes Martins, 1940). Enquadram-se 1966 e 1968.
nesta linha de pesquisa os guiões de A obra de Oliveira Boléo marca uma fase
16

inquérito elaborados por Orlando Ribeiro, da Geografia de Moçambique, além de


enquanto bolseiro do Instituto para a Alta representativa duma época e dum certo
Cultura, “preparados para o estudo modo de fazer Geografia, acabou por
geográfico dos territórios”: Inquérito de cristalizar e projetar uma leitura de
geografia regional (1938; 2.ª ed. 1947) e
Inquérito do Habitat Rural (1939). 16
José de Oliveira Boléo (Fatela, Fundão, 2 de
Fevereiro de 1905 – Lisboa, 28 de Junho de 1974).
É nesta linha de investigação científica, Tirou o Curso de Ciências Históricas e Geográficas
dominante numa determinada fase das na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,
ciências sociais e da geografia, que devemos onde teria sido docente de Geografia e obtido
doutoramento com a tese “Sintra e o seu Termo.
iberografias 13 2017

enquadrar alguns trabalhos publicados Estudo Geográfico”, publicado em 1940. A


sobre Moçambique, de que destacamos: (i) importância da sua obra para compreendermos os
Moçambique, de Moura-Braz, publicado primórdios da Geografia de Moçambique levam-
nos a incluir a sua relativamente longa bibliografia
pela Sociedade de Geografia de Lisboa, em sobre este território num apartado dedicado ao
legado dos mestres.
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
Rui Jacinto & Lúcio Cunha 66

Moçambique no pós-guerra, visão que micas socioeconómicas e governanças no


havia de perdurar. litoral norte de Moçambique (Província
de Cabo Delgado) (Medeiros, 2012).
Geoide: Diálogo e cooperação para O diálogo que tem existido entre
uma nova Geografia. A investigação siste- geógrafos de Portugal e de Moçambique
mática de cariz geográfico sobre Moçam- tem sido esparso e esporádico, assegurado
bique, feita por geógrafos obedecendo por algumas teses orientadas e defendidas
aos métodos da sua ciência, feita de modo em Portugal, feitas por geógrafos moçam-
sistemático e com recurso a trabalho de bicanos sobre o seu país ou a participações
terreno, só vai acontecer a partir de 1960, em algum encontro ou seminário.
sob impulso das Missões de Geografia Apesar do que foi dito acerca do
Física e Humana do Ultramar (Amaral, desenvolvimento da Geografia nos tem-
1983, p. 328). Destacam-se, neste con- pos coloniais e pós-coloniais, o desenvol-
texto, as viagens realizadas, fundamen- vimento da investigação em Geografia
talmente, por Alfredo Fernandes Martins Física nos Países Africanos de Língua
e Orlando Ribeiro. Oficial Portuguesa ainda permanece rela-
Depois da monografia Moçambique, tivamente desconhecida entre as comuni-
elaborada por Oliveira Boleo (1951), “a dades geográficas dos restantes países que
Geografia Física de Moçambique foi comunicam no mesmo idioma. Como
estudada pelo menos, por Alfredo Fer- foi dito, por um lado, a institucionalização
nandes Martins e Raquel Soeiro de Brito. da Geografia ocorreu, nestes países, rela-
Em termos de publicações registe-se o tivamente tarde e de forma não genera-
trabalho pioneiro de Martins (1938) lizada; por outro lado, a instabilidade
sobre o clima de Inhambane e de R. S. subsequente às independências, que foi
Brito (1965) sobre os aspectos físicos particularmente grave e conflituosa nos
gerais do país. Alguns trabalhos desenvol- casos de Moçambique e de Angola,
vidos nesta época deram origem, já dificultou tanto a evolução e o desenvol-
depois do processo de independência de vimento normal das ciências como a
Moçambique, a importantes trabalhos, inserção dos geógrafos destes jovens
como a tese de doutoramento de Maria países nas diferentes redes que se iam
Eugénia Moreira (1979) sobre os aspectos formando no seio da comunidade geo-
geomorfológicos do Rio Umbeluzi“ gráfica internacional.
(Cunha, et al., 2016, p. 81). As relações entre as escolas de
A fundação da moderna geografia Geografia de Portugal e do Brasil têm-se
moçambicana ocorre no momento em intensificado nos últimos anos (Cunha e
que os geógrafos tinham vínculo a Jacinto, 2012) e com elas, também de
Portugal. Além dos nomes atrás citados, certo modo, as relações com os PALOP, e
os trabalhos que se publicam são de dois particularmente com Moçambique, ainda
tipos: resultam de teses de Doutoramento, que relativamente mais tímidas e mesmo
juntando-se à de Maria Eugénia Moreira pontuais. A ténue relação da Geografia
as realizadas por Maria Clara Mendes portuguesa com a de Moçambique tem-
(Maputo antes da independência: geo- se materializado, sobretudo, na orientação
grafia de uma cidade colonial; 1979) e de dissertações de mestrado e de teses de
por Celeste Alves Coelho (A study of doutoramento ou através da participação
iberografias 13 2017

suspended sediments and solutes from de investigadores moçambicanos em


river Don. Aberdeenshire; 1979); artigos alguns eventos científicos, tanto em
e publicações tais como Beira, cidade e Portugal como no Brasil. No entanto
porto do Índico (Amaral, 1969) ou Dinâ- estamos perante uma cooperação cientí-
Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa
67 Rui Jacinto & Lúcio Cunha

fica que importa aprofundar a partir de Carvalho, Joaquim Barradas de (1974). Rumo
múltiplas parcerias que se venham a de Portugal. A Europa ou o Atlântico?
estabelecer, permitindo uma melhor e Lisboa, Livros Horizonte.
Dias, Luiz Fernando de Carvalho (1954).
mais eficaz integração dos geógrafos dos
Fontes para a história, geografia e comér-
dois países nas redes internacionais de cio de Moçambique (séc. XVIII). Anais
investigação já existentes. Por outro lado da Junta das Missões Geográficas e de
é de todo interesse aproveitar a diversidade Investigações do Ultramar; vol. 9, tomo 1,
de contextos naturais, ambientais, sociais Lisboa.
e culturais dos dois países para concretizar Enes, António (1893; 4.ª ed., 1971). Moçam-
bique. Relatório apresentado ao Governo.
estudos comparativos que permitam
(Apresentado em 1893). Agência Geral
debater conceitos, aferir metodologias e do Ultramar, Imprensa Nacional, Lisboa.
experimentar distintas técnicas de análise. García Álvarez, Jacobo & Garcia, João Carlos
Existe, pois, um longo caminho a (coord.; 2014). História da Geografia e
percorrer no aprofundamento destas Colonialismo. Lisboa, CEG.
relações de cooperação, de modo a que Machado, Joaquim José (1881). Moçambi-
elas contribuam e se integrem verdadei- que: comunicação à Sociedade de Geogra-
hia de Lisboa nas sessões de 6, 13 e 22 de
ramente numa Comunidade de Geó-
Dezembro de 1880. Lisboa: Casa da Socie-
grafos dos Países de Língua Portuguesa” dade de Geographia.
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iberografias 13 2017
revista de estudos ibéricos

Centro de Estudos Ibéricos

Número 13
Ano XIII
2017
COORDENAÇÃO DESTE NÚMERO
Rui Jacinto
Alexandra Isidro

CAPA E CONCEPÇÃO GRÁFICA


Via Coloris

IMPRESSÃO
Pride Colour, Lda. - Guarda

EDIÇÃO
Centro de Estudos Ibéricos
Rua Soeiro Viegas, 8
6300-758 Guarda
cei@cei.pt
www.cei.pt

ISSN: 1646-2858
Depósito Legal: 231049/05
Dezembro 2017

Os conteúdos, forma e opiniões expressos nos textos são exclusiva responsabilidade dos autores.
Iberografias 13 2017 Índice

5 Imaginar territórios de esperança: investigação & cooperação para o desenvolvimento –


Rui Jacinto

I. As Novas Geografias dos Países de Língua Portuguesa. Moçambique

I.I. Breve história: testemunhos e apontamentos


11 Memórias (ou lembranças?) do Curso de Geografia da Universidade de Lourenço-Marques
(1969-1975) – Maria Eugénia Soares de Albergaria Moreira
17 A Geografia moçambicana: percurso e tendências atuais – Aniceto dos Muchangos
21 O “meu” curso de Geografia na Universidade de Lourenço Marques (1972/73-1974/75) –
António de Souza Sobrinho
31 Memórias de um espaço e de um tempo – Isabel Boura
37 Ilha do Inhaca, do Unhaca ou do Ynhaqua: um esboço de recordações – Maria Helena Dias
41 Apontamento para a História da Cartografia de Moçambique – Maria Helena Dias
49 Geografia de Moçambique: um olhar a partir da Geografia portuguesa – Rui Jacinto & Lúcio
Cunha
71 Institucionalização, ensino e investigação da Geografia em Moçambique – Eliseu Savério
Sposito, José Maria do Rosário Chilaúle Langa & Rui Jacinto

I.II. Investigação recente: o estado da arte


103 Desenvolvimento sustentável e desenvolvimento rural no contexto de pobreza em Moçam-
bique – Cláudio Artur Mungói
119 O direito ao território: ensaio sobre a problemática na exploração dos recursos naturais em
Moçambique – Elmer Agostinho Carlos de Matos
137 O impacto do discurso das “descobertas” dos recursos minerais no despovoamento rural de
Moçambique – Inês M. Raimundo & José A. Raimundo
153 Migrantes moçambicanos na África do Sul urbana: informalidade e estratégias de sobrevivên-
cia – Ramos Cardoso Muanamoha
160 O crescimento urbano, a urbanização e a fecundidade em Moçambique: uma análise
conceptual e teórica – Rogers Hansine
173 Tempo de viagem e distância para avaliação da acessibilidade da população a unidade sani-
tária mais próxima: uma contribuição para a planificação das infraestruturas nas áreas rurais
de Moçambique – Paulo Alberto Covele
iberografias 13 2017

186 Avaliação da qualidade de dados de população e de óbitos dos Censos demográficos de


Moçambique – Serafim Adriano Alberto
203 Influência socioeconómica na variação geográfica do comportamento preventivo da malária
nas áreas urbanas de Moçambique – Boaventura M. Cau
II. Foto(Geo)grafia: imaginar o território

II.I. Rumores do mundo


215 Lucília Caetano – Espaços Industriais: memórias revisitadas
227 Maria Eugénia Soares de Albergaria Moreira – Ilhas – num desfile de paraísos, refúgios,
aconchegos e degredos
250 Judite Medina do Nascimento – Geografias do Olhar: território, vivências e apropriações
256 Maria Encarnação Beltrão Sposito – fotos, grafias, janelas, portas, tons, tramas e gente
264 Maria Auxiliadora da Silva – Paris e Salvador. Um Olhar
279 Maria Adélia de Souza – Território Brasileiro: Usos, memórias, incertezas...

II.II. Poéticas do olhar


293 Fragilidade | Construir Olhar Construir – Susana Paiva
295 Por uma sociologia da descolonização do olhar – Jenniffer Simpson
297 Entre o peixe vermelho e o peixe preto – Notas para reflexão sobre o olhar no texto
poético mais recente – Margarida Gil dos Reis
299 O olhar feminino na organização e re-imaginação do território – Clara Moura Lourenço
301 Geo-grafando afetos, preenchendo brancos (territórios) – Marie Ange Bordas
305 Trazer o inconsciente do real à superfície da imagem – Luísa Ferreira
309 Geograficidade na Paisagem-fotografia – Flora Sousa Pidner

III. Prémio Eduardo Lourenço 2017


315 Prémio Eduardo Lourenço 2017 – Fernando Paulouro Neves
317 Álvaro dos Santos Amaro
320 Eduardo Lourenço
322 Arnaldo Saraiva
327 Fernando Paulouro das Neves
331 Jorge Gaspar

337 Palavras à procura da Beira – Fernando Paulouro Neves


Uma mão cheia de terra
Reserva de imaginário
E, no entanto, a Jangada move-se…
Da “ilha sem barcos” ao coração da Europa
O prodígio das “Perfeitas coisas”
Quando as palavras voam à procura do mundo
Uma escrita feita da matéria dos sonhos

IV. CEI. Atividades 2017


367 I. Ensino e Formação
371 II. Investigação
374 III. Eventos e Iniciativas de Cooperação
379 IV. Edições

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