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F lávi o Go m es

T e rr a e campo ne s e s ne gros

A rtístico N acional
o legado da pós-emancipação

A escravização em determinadas áreas contrapartida, investir no conhecimento

e
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do continente africano, o tráfico atlântico e sobre a matéria-prima das experiências
o trabalho compulsório no Brasil são temas da escravidão e pós-emancipação amplia
bem conhecidos. Ainda mais agora com o possibilidades de abordar processos, legados
interesse crescente em história da África e de lutas, patrimônios culturais e direitos em
dos afro-brasileiros que mobiliza intelectuais, torno do destino e da cidadania (uma quase
editores e a legislação educacional nos ficção) de milhares de pessoas, antepassados e
níveis municipais, estaduais e federais. descendentes (Cunha & Gomes, 2007:7-15).

do
Pouco conhecemos, porém, sobre a pós- Ao destacarmos algo de permanência de

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emancipação: e o cotidiano e sociabilidades um dado passado – com ou sem escravidão,
em áreas rurais? Já sabemos do pensamento distante ou mais próximo –, vale mencionar
das elites, dos parlamentares, dos higienistas as formas camponesas, origens e dimensões
e dos reformadores urbanos. E também das delas, no caso aquelas constituídas nas franjas
formas de controle, legislação, coerção e das fronteiras agrárias em expansão, nas
criminalização (Cunha, 2002; Chalhoub, áreas de sertões ou de plantation (Palacios,
1996). Mas não muito sobre vivências e 2004; Costa, 1992). O que representaram 375
expectativas de homens e mulheres comuns. camponeses e comunidades rurais no Brasil?
Quem eram os pobres livres?1 Enfatizar Paradoxalmente, a forma camponesa mais
permanências ou não mudança para os anos conhecida para o período da escravidão
ou décadas que se seguiram à Abolição pode são as comunidades de escravos fugidos.
ser uma armadilha. Aquela que vitimiza Quilombos e mocambos são as denominações
protagonistas e inviabiliza interpretações históricas no Brasil colonial e pós-colonial
a respeito das ideologias da nação nos para grupos de fugitivos.3 Mais recentemente
séculos XX e XXI, das políticas públicas, o termo remanescente de quilombos apareceu
do pensamento social hegemônico e do como uma categoria jurídica na Constituição
papel da raça ou da ideia sobre ela.2 Em Brasileira de 1988, no artigo 68 dos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias
Processo de descascar a
mandioca e de produção
1. Muitos estudos importantes não consideraram a questão de farinha, Comunidade
dos descendentes de africanos e de escravos para pensar a 3. Ver Flávio Gomes, verbetes “quilombos” e da Tomásia no Baixo
experiência dos homens livres pobres no período colonial e “quilombolas”, em Motta (2005:381-382). Para um Tocantins (PA)
Foto: Flávio Gomes, 1997
pós-colonial. Ver Mello e Souza (1992) e Franco (1983). panorama de estudos históricos a respeito, ver Reis &
2. Para o século XIX, ver Lima, 2003: 31-87. Gomes (orgs.), 1996.
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(ADCT) e no artigo 216 da Cultura. Como Dos colonos,
uma garantia do direito possessório de terras camponeses negros e
ocupadas e herdadas por antepassados, o
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positivistas no Gurupi-
artigo 68 promulgou: “aos remanescentes Turiaçu
das comunidades dos quilombos que estejam
ocupando suas terras é reconhecida a Setores camponeses se formaram a partir
propriedade definitiva, devendo o Estado das senzalas, dos mocambos e de roceiros
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emitir-lhes os títulos respectivos”. Já o livres. Para várias regiões há evidências de


artigo 216 (parágrafo quinto) definiu sobre como escravos e quilombolas faziam circular
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o tombamento de “documentos” e de produtos de sua economia agrária. E mesmo


“sítios detentores de remanescências de articulações econômicas onde essa produção
antigos quilombos” (Exaltação & Gomes, camponesa alcançava tabernas, feiras e vilas
2005:398). Considerando tempos e espaços, em áreas rurais e semiurbanas (Gomes,
entre os quilombos históricos (não raramente 2007:147-170). De um modo geral, as fontes
fossilizados na legislação colonial ou em históricas a respeito são raras, quando não
determinadas interpretações historiográficas) indiretas. Nas senzalas tudo era clandestino
do

e as comunidades remanescentes (“descobertas” e, nos quilombos, os registros aparecem em


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por antropólogos, flagradas em etnografias fontes produzidas pela repressão.


e emergentes do discurso dos movimentos Para o Maranhão – nas áreas do Gurupi-
sociais) falta conhecer os processos históricos Turiaçu – conhecemos detalhes de um
da constituição de um campesinato negro e as campesinato que articulava mocambos e
formas de culturas dos mundos rurais. senzalas, dando origem às comunidades
Neste artigo abordamos o legado da negras rurais e ao acesso a terra ainda
376 terra e os sentidos da liberdade em várias na escravidão. Como funcionava? Alguns
experiências que envolveram escravos, produtos que complementavam a economia
libertos e outros setores sociais rurais. de quilombos – servindo como moeda de
Do Maranhão à Bahia, alcançando o Vale troca – vinham das roças e da economia
do Paraíba e Campos dos Goytacazes, própria daqueles que permaneciam nas
no sudeste escravista, com camponeses, senzalas, estabelecendo alianças, ampliando
indígenas, positivistas, abolicionistas e bases econômicas, autonomia e proteção.
libertos. E atravessando fronteiras da Embora permeadas por tensões, surgiam
Amazônia e da memória, com descendentes redes de trocas nas fazendas, nos povoados,
de quilombolas. Na perspectiva dos nas feiras e nas vilas. Na província
desafios das políticas públicas atuais, a maranhense, reclamava-se desse circuito
reflexão de fundo que oferecemos é pensar mercantil, porque a “desgraça é maior” nas
aquilombamentos como formas camponesas lavouras, uma vez que “os escravos furtam
da escravidão e da pós-emancipação – na o algodão dos senhores e vão vender aos
longa duração – e como significados de mascates ou aos fazendeiros vizinhos,
acesso, posse e controle sobre a terra. geralmente os fazendeiros compram aos
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escravos dos vizinhos o algodão furtado trocas mercantis ou reencontrar seus
fingindo supor que provém das pequenas parentes que continuavam nas fazendas. No
roças dos vendedores ou de compra por Maranhão, dizia-se que “reconcentram-se ao

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estes feita”. Além disso, “é quase geral quilombo bem providos de armamentos e
acoitarem escravos fugidos uns dos outros; munição, e dos escravos que podem recrutar
desfrutando-lhes o serviço que querem aos lavradores, que lhes não dão apoio”.
prestar pelo alimento e promessa de Assim, os escravos de lavradores que não

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compra ou proteção”.4 Tal cenário, ao invés apoiassem – por meio de comércio, proteção
de atípico, revela as margens estreitas que ou mesmo negligência ou pouco interesse em

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aproximavam as comunidades de senzalas capturá-los – seriam alvos da “sedução” no
e as comunidades de fugitivos. Em Viana, sentido de ir para o quilombo. Com ou sem
próximo à fazenda Santa Bárbara, dizia-se a conveniência e omissão de determinados
haver um pequeno quilombo com escravos, fazendeiros, alguns quilombolas, além de
que descobertos ainda nas matas da fazenda, realizarem trocas mercantis, pernoitavam nas
estariam fazendo farinha para seguirem senzalas ou acampavam nas próprias terras
em direção a um dos grandes quilombos de grandes fazendas. Com maior destaque,

do
localizados no rio Turiaçu. Em 1865 foi assim foi definida a fazenda Santa Bárbara:

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noticiado que o líder do quilombo chamado “pode, sem medo de errar, qualificar-se de
São Benedito do Céu tinha um plano de um outro quilombo pela indisciplina, falta
invadir a fazenda Santa Bárbara à noite para de repressão, sua situação em caminho dos
cometer assassinatos, insatisfeito que estava negros fugidos com quem os escravos estão
com as atitudes senhoriais para com aqueles em contato diariamente no tempo da seca.
que permaneciam nas senzalas. Desde muito É este o conceito que goza essa fazenda há
tempo – segundo depoimentos – quilombolas muitos anos”. Algumas fazendas podiam ser 377
do São Benedito do Céu obtinham sal e classificadas como um verdadeiro quilombo
ferramentas com escravos e lavradores locais. não só porque seus escravos mantinham
Sobre a invasão, os quilombolas “desistiram contatos com os quilombolas, mas também
porque um clube com escravos da fazenda pela insubordinação cotidiana e pressão aos
com que entretêm relações decidiu-se o senhores. Por exemplo: por mais autonomia,
contrário, com o fim de não comprometer os ditando o tempo do trabalho nas lavouras,
escravos da fazenda”.5 cultivando roças, comercializando produtos
Habitantes dos quilombos – em e realizando batuques e festas religiosas com
determinados períodos – podiam fazer maior frequência.6
grandes deslocamentos, fosse para efetuar Era vigorosa a economia camponesa dos
mocambos do Gurupi-Turiaçu – conforme
os relatos das expedições enviadas para
4. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro (doravante ANRJ), IJ1
218, Ofícios (1842-1844), Ofício de 7/04/1843. destruí-los ao longo do século XIX. Em
5. Arquivo Público do Estado do Maranhão (doravante
APEMA). Série: Juízes de Paz/Chefe de Polícia (1845-1887),
Correspondência de 9/03/1865. 6. ANRJ, IJ1 754. Idem, Ofícios (1863), Ofício de 4/11/1863.
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1853, sobre as suas localizações: “tem tecnologia com a racionalização do trabalho
bonitas matas, terra fresca todo de massapés agrícola; 4) fim do castigo físico aos escravos;
arenoso, misturada de massapés barro, e 5) legislação estipulando uma taxação
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próprio para a cultura de cana e arroz, e para as alforrias proporcional à faixa etária.
abundante de caça”. E também: “é abundante Concluía afirmando: “em pouco tempo
de peixes e nas margens povoadas de caça estariam todos os escravos libertos, tendo
e aves”. Na ocasião, anotaram-se nesses ainda os estabelecimentos dos fazendeiros
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mocambos: “63 casas espalhadas em uma para continuarem nos trabalhos da lavoura,
área de 200 braços quadrados, que se tornava para os quais seriam contratados como
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impossível de cerco, existe nestes lugares colonos”. Defendia a ideia de uma gradual
muita mandioca, batata, cará, macaxeira, colonização com a população ex-escrava,
enfim muita abundância de mantimento em incluindo os quilombolas. Para Brandão
diferentes roças”.7 Em 1864, assim se referia à Jr., os quilombos do Maranhão não se
economia mercantil quilombola: “comerciam desenvolviam mais por causa da condição de
com os pretos fugidos todos os mascates e “foragidos” de seus habitantes. Ainda assim
negociantes colocados nos centros, visto que tinham plantações de milho, arroz, mandioca,
do

tendo eles de comprar, e vender gêneros e muitos chegavam a comercializar algodão


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aos escravos de muitas fazendas, que estão com fazendeiros em troca de ferramentas
em contato com os negros fugidos, estes e armas. Para o positivista, o “costume” de
com aqueles se associam nas suas digressões alguns fazendeiros “venderem fazendas e
noturnas como oportuna ocasião para tais outros gêneros aos foragidos estende-se
empresas sem risco de serem conhecidos; também àqueles que vivem nas fazendas dos
assim não lhes é possível evitar qualquer seus senhores; e esse mau costume induz os
378 gênero de comércio com eles”.8 escravos a roubarem aos seus senhores, para
Talvez tenha sido pensando nesse trocar por cachaça, fazendas etc., em casa
cenário rural que, de forma original, o desses vendilhões, sedutores de escravos”.
positivista Francisco Antônio Brandão Como contraponto propunha: “não seria mais
Júnior, ao escrever, em 1865, a obra A justo que o governo tratasse de empregar
escravatura no Brasil, precedida d’um artigo sobre esses homens como colonos, livrando-os
agricultura e colonização no Maranhão, sugeriu por este meio, de um castigo bárbaro, que
a transformação de quilombolas em colonos. só serve para excitar os brancos contra esses
No seu projeto de colonização-emancipação infelizes, e estes a se ocultar constantemente
propunha: 1) legislação taxando “ordenado” nas matas”. Ele mesmo admitia que alguns
aos escravos; 2) fim da compra e venda mocambos, pelos seus muitos anos de
de cativos; 3) introdução de máquinas e existência, possuíam uma população de
terceira e até quarta geração: “E aqui
7. APEMA. Fundo: Secretaria do Governo, Grupo: Diferentes perguntamos a quem entregam os escravos
Particulares, Série: Correspondência, Ofício de 10/10/1853.
8. APEMA. Série: Chefes de Polícia/Presidentes, Caixa nº 18,
descendentes de outros que fugiram há quinze
Ano: 1864, Ofício de 08/08/1864. ou vinte anos. – Sem dúvida que ao primeiro
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senhor que, com os seus velhos documentos Piauí, quando a revolta dos índios aldeados
de possessão, provar que há trinta ou quarenta gueguês foi comandada por um negro fugido.
anos fugiu-lhe uma escrava de nome Joana, e E posteriormente noticiou-se que ali havia

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que segundo a legenda do prisioneiro, deve dois quilombos, nas matas do Poti – próximos
ser, sem dúvida, a mãe ou avó do sobredito de Campo Maior – que atacavam os currais
cujo!...” O argumento principal de Brandão (Barbosa, 1984:188-189). Pioneiro foi o
Jr. era em torno do controle sobre o trabalho estudo de Karasch detalhando as estratégias

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e a economia quilombola.9 dos grupos indígenas xavante e caiapó,
Certamente fragmentos de experiências na capitania de Goiás. Eram inimigos dos

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mais extensivas que devem ter surgido quilombolas, porém, em 1760, os xavantes
em várias partes e se desdobrado na pós- juntaram-se aos quilombos, havendo
emancipação. A propósito, no Maranhão – miscigenação de negros fugidos com mulheres
atual Estado da federação que ainda mantém indígenas (Karasch, em Reis& Gomes,
preponderantemente a maioria da sua 1996:225 e ss.). Na Capitania da Bahia, a
população em áreas rurais –, existem presença de microssociedades indígenas hostis
centenas de comunidades negras rurais e à ocupação colonial tanto aproximou índios

do
pioneiras entidades de luta pela terra dessas e quilombolas como produziu rivalidades e

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populações (Gomes, 2005:129-324). disputas. É o que sugeriu o estudo clássico
de Stuart Schwartz (1987), abordando a
utilização de tropas de indígenas para invadir
Dos sertões baianos de quilombos. Também como trabalhadores
indígenas quilombolas de fazendas que avançavam as fronteiras
agrárias, escravos, africanos e crioulos se
Sob o aspecto de formas camponesas, tornavam vítimas de ataques indígenas. Em 379
os quilombos não foram cenários exclusivos Camamu, em 1719, chegaram denúncias de
de escravos e africanos. Assunto ainda que o “gentio bárbaro que se acha aldeado
pouco conhecido no Brasil, muitos dez ou doze léguas distante da mesma vila
quilombos se formaram conjuntamente com havia por vezes roubado as suas fazendas, e
indígenas (escravizados ou livres fugidos de matado muitos escravos seus tantos negros
aldeamentos), africanos e crioulos. Sabemos como mulatos e um moço branco”.10 Pouco
que os fatores geográficos interferiram sabemos sobre as alianças e colaboração
na localização e estabilidade de algumas entre índios e quilombolas – muitas vezes os
comunidades. Para além dos conflitos e mesmos personagens – na proteção de suas
confrontos – negros fugidos aliaram-se a comunidades ou em trocas mercantis e acesso
grupos indígenas, formando comunidades. aos mercados locais de feiras e entrepostos.
Podemos citar o ocorrido em 1778, no Ou mesmo os sentidos culturais articulados e

10. Ofício para a Câmara da Vila do Camamu, 6/07/1719,


9. Para estas citações, ver Francisco Antônio Brandão Júnior transcrito em: Documentos Históricos, 73:135-136. Rio de
(1865: 77, 78, 86 ). Janeiro: Imprensa Nacional, 1965.
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inventados no presente ou no passado, como e Mato Grosso do século XVIII.
no século XVII, na região baiana de Jaguaribe, E as alianças entre indígenas e
quando indígenas, europeus e africanos quilombolas? Em 1733, no sul da Bahia, em
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se refugiaram para aderir à Santidade Ilhéus, investigações revelaram, para uma


(Metcalf, 1999). mesma área, a existência tanto de aldeias de
Como estratégia de ocupação agrária, a “gentio bárbaro que infesta os distritos dos
existência de microssociedades indígenas em rios Una, Poxi e Patipe” como de “um grande
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determinadas áreas podia – ao mesmo tempo mocambo de negros fugidos antiquíssimo”.


e de forma paradoxal – ajudar e dificultar o Em Rio de Contas e Jacobina – sertão ao
e
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surgimento de quilombos mais populosos e norte da Capitania –, em 1736, falava-


estáveis. Em áreas de sertão ocupadas por se de um “poderoso mocambo” na região
grupos indígenas, quilombolas poderiam “estabelecido há muitos anos com trato
buscar proteção logística, uma vez que a e comunicação” com indígenas, africanos
penetração colonial e mesmo de capitães do e crioulos. Diria o provedor da Fazenda
mato e de expedições punitivas se tornavam Real: “no sertão que medeia entre as minas
ainda difíceis. De outro modo, indígenas da Jacobina e as do rio das Contas há um
do

podem ter percebido o quanto a existência de grande mocambo de negros fugidos que se
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mocambos próximos as suas aldeias acabava tratam e comunicam com o gentio bárbaro,
por atrair a repressão colonial. Destruir donde saem a fazer alguns roubos e insultos
mocambos e perseguir indígenas podia se aos moradores vizinhos, e passageiros do
constituir um só objetivo para expedições que tem chegado a este governo repetidas
punitivas que adentravam determinados queixas, e porque o dito mocambo se vai
sertões. Também aldeamentos indígenas engrossando pondo-se com poder tão
380 acabavam servindo para intimidar e reprimir a formidável que dará grande cuidado”.12
formação de quilombos.11 Segundo Schwartz Bem antes, em 1704, do distrito do Brejo,
“aldeias indígenas inteiras eram mobilizadas junto do Paramirim mandava-se “extinguir
para servir como tropas antimocambos e, os mocambos, aprisionar os negros e
praticamente, todos os esforços militares de reduzir os índios maracazes, cucuruís,
vulto empreendidos contra quilombos baianos araxás e caboclos que têm domésticos”.
incluíram auxiliares índios” (Schwartz, A propósito – embora necessitando de
1987 e 2003; Gomes, 2002; e Arruti, mais investigações – há indicações de
1997). Repressão antimocambos significava que o grupo indígena avá-canoeiros tem
mobilização de tropas de índios para ataques como etnogênese a miscigenação de índios
ou a formação de aldeamentos nas áreas carijós (aldeados) com quilombolas baianos
ocupadas pelos quilombos. Isso aconteceu em
Palmares no século XVII e nas áreas de Goiás 12. Ordem enviada para o Capitão da Conquista do Gentio
bárbaro, José Duarte Pereira, 26/01/1733 transcrito em:
Documentos históricos, vol. 75, p. 133-134 e Portaria enviada
11. Documento transcrito em: Documentos interessantes para para o provedor-mor da Fazenda Real, 1º/03/1736 transcrito
a história e costumes de São Paulo. Correspondências Diversas, em: Documentos históricos. Portarias, Ordens, Regimentos
vol. XIV:246-247, 1895. (1734-1736), vol. 76, p. 335.
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(Viana, 1935; Toral, 1984/85). Em 1783, “gentio bravo”. Com o sistema de diretórios,
da região de Geremoabo noticiava-se que os os índios “domesticados” e suas aldeias
índios que lutavam contra a perseguição de foram transformados em vilas camponesas.

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bandeirantes – índios mongoiós – tinham Produziam e vendiam farinha de mandioca
se aliado a grupos quilombolas. Durante para os mercados locais. Quanto ao chamado
uma expedição punitiva foram encontrados: “gentio bravo”, nessa região havia os pataxós,
“... um arco de guerra e de caça do gentio os maxacalis, os botocudos e os mongoiós,

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homem; o mesmo do gentio mancebo; o estes últimos aliados dos quilombolas em
mesmo do gentio menino; doze flechas, um Geremoabo, em 1783. Havia diferenças étnicas

e
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colar, um pandeiro de suas folganças, uma entre esses grupos indígenas, embora fossem
tanga de mulher, uma cinta das mesmas, todos do tronco linguístico gê. Em termos
uma compostura de guerreiro, um ídolo, de estrutura econômica, os mongoiós e os
imagem do fogo ou do sol, sobre que havia maxacalis se dedicavam à agricultura, enquanto
ainda uma machadinha ou acha de pedra os pataxós e os botocudos se baseavam mais na
com que os índios cortam os paus donde caça e na pesca (Barickman, 1995).
tiram mel e um surrão contendo fragmentos Enfim, parte da construção do sonho da

do
de algum vaso de barro”. E houve quem terra foi feita com ocupações – entre conflitos

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afirmasse que tais alianças entre quilombolas e solidariedades – entre negros e indígenas.
e indígenas acabaram por criar “sérios
embaraços às entradas e bandeiras do ciclo
baiano” (Moura, 1972:108). Talvez, porque O abolicionismo e as
entre fins do século XVII e meados do século senzalas do sudeste
XVIII, quando o problema dos quilombos se escravista – Campos
tornava alarmante – isso vale para a Bahia, dos Goytacazes e 381
Minas Gerais, Pará e Mato Grosso –, as Paraíba do Sul
populações indígenas locais ainda deviam
ter a memória da escravização. Isso sem Podemos também pensar as formas
contar os milhares de índios que viviam em de ocupação agrária a partir da cultura de
aldeamentos controlados pela Coroa, em protesto escravo. É o que pode suscitar
consequência do desaparecimento gradual do episódios de aquilombamentos ocorridos
cativeiro indígena, que começa na segunda no sudeste escravista nas últimas décadas
e na terceira década do século XVIII. Já em da escravidão. O primeiro acontece em
meados do século XVII, diversas regiões do Campos dos Goytacazes, norte do Rio de
sertão baiano foram desbravadas e colonizadas Janeiro, com o quilombo da Loanda, situado
em virtude das constantes incursões contra no interior de uma fazenda do mesmo
“índios bravios”. nome, nas margens do rio Paraíba. Falecida a
Nas áreas sul da capitania – região de proprietária, os escravos (e mesmo libertos)
Porto Seguro – havia no final do século XVIII que ali trabalhavam resolveram se aquilombar.
tanto aldeias de “gentio manso” como as de Insatisfeitos com a possível e depois
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concretizada venda, ocuparam a fazenda e aquilombamento, pois ocupavam os prédios
expulsaram os administradores. João Ferreira da fazenda, assumindo o direito de serem
Tinoco, que havia comprado a propriedade livres e trabalhar para si. Para as autoridades
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dos herdeiros não conseguia tomar posse, e fazendeiros, um aquilombamento que


posto rechaçado pelos aquilombados desde influenciava negativamente outras senzalas
1877. Em janeiro de 1878, o Monitor Campista da região. O tempo passava e a população
publicou um anúncio de venda da fazenda da solicitava providências para pôr fim àquele
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Loanda em que destacava “testada 700 braços “mau exemplo”.15 As autoridades se


e meio légua de fundos ou 160 alqueires justificavam, alegando que não dispunham de
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de terras no seu todo, apropriadas para a força policial suficiente para novas diligências.
cultura de cana, e pastagens nas terras planas Misturavam-se conflitos, acordos, confrontos,
e nos altos e montanhosos para a cultura acomodações e impasses.
de mandioca e café”.13 O interessante é Em meados de 1880, o suplente do
que não havia menção alguma a respeito delegado de polícia de Campos, Luiz Carlos
de escravos serem vendidos juntamente ou de Lacerda (um liberal que mais tarde se
de uma ocupação ilegal. Ainda em 1877, o tornaria o líder do abolicionismo “radical”
do

chefe de polícia, por ordem do presidente da região), acompanhado por apenas


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de província, comandou pessoalmente uma seis soldados, prendeu 53 aquilombados


expedição punitiva com mais de 50 soldados. da fazenda da Loanda, que, segundo
Ao chegar à fazenda foi recebido pelos informações, estavam armados e municiados.
escravos, que disseram com “franqueza que Saiu publicado no Monitor Campista que “com
não [se] entregavam e que estavam prontos tão bem calculado plano, que sem haver
para a luta”.14 Ao contrário de uma invasão, disparar-se nem um tiro, capturou-se toda a
382 as autoridades optaram pelo cerco visando gente que estava no quilombo, sendo cinco
cortar o abastecimento. A ideia era minar a homens, compreendidos os dois cabeças,
disposição de eles se manterem aquilombados e 18 mulheres e as crianças em número de
na fazenda. Com o objetivo de desocupar a 28 de 14 anos de idade para baixo [...]”.16
propriedade, optava-se por vencê-los pela Qual teria sido o “tão bem calculado plano”
fome e pelo cansaço. Mas os aquilombados do suplente de delegado para “destruir” o
resistiram bom tempo ao bloqueio. De 1877 quilombo da Loanda em 1880, desocupando
a 1880, fazendeiros de Campos desfrutaram a fazenda sem encontrar oposição dos
da vizinhança daquela ocupação. Outro escravos, e isso com somente seis praças? O
fato interessante foi que, enquanto alguns mesmo aquilombamento, na fazenda desde
aquilombados construíram ranchos nas 1877, resistira às expedições punitivas com
matas, outros, ao que se sabe, continuaram numerosos soldados. Em 1880, a maior
a morar nas próprias senzalas. Um peculiar parte dos aquilombados capturados –

13. Monitor Campista, 4 de junho de 1878. 15. Jornal da Província, 18/09/1879.


14. ANRJ, IJ 1, maço 493, Ofício de 18/09/1877. 16. Monitor Campista, 5 e 6 de julho de 1880.
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conforme o noticiário – era de mulheres e nas matas “havia um quilombo de muitos
crianças. Havia apenas cinco homens. Será pretos fugidos que eram coadjuvados pelos
que os aquilombados, sem condições de escravos das Três Barras”. Começaram então

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garantirem sobrevivência, uma vez cercados a enviar pequenas tropas – com lavradores e
na fazenda, optaram por se entregar, pelo feitores – para atacar o quilombo, capturando
menos provisoriamente? Ou havia mais aqui ou acolá quilombolas. Certa vez, porém,
homens na fazenda que escaparam quando “ao passarem pela lavoura das Três Barras,

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houve a batida policial? O “apadrinhamento” foram atacados pela negraria das Três Barras
pode ter feito parte da economia política em número maior de cem pessoas entre

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dos aquilombados, que, talvez, se viram homens e mulheres, todos armados de foices
sem recursos para continuar a enfrentar as e machados”. Os escravos que trabalhavam
forças policiais. Em 1877, quando houve a nas lavouras tomaram “da escolta o chefe do
expedição frustrada comandada pelo chefe quilombo que ia preso para dar conta dos
de polícia Cavalcanti de Albuquerque, o outros escravos fugidos” e também prenderam
presidente da província, Francisco Antônio o “capataz e negro de confiança que ia
de Souza, determinou que o cerco da fazenda coadjuvando a escolta” e “gritaram todos

do
fosse reforçado “com força e paisanos, até em voz alta que iam matar por ser contra

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que os pretos se rendam [por] faltas de os parceiros”. Depois se retiraram gritando
recursos”. Isolar quilombos das infinitas redes “mata, mata, ficando infelizmente em poder
de proteção e cumplicidades que os cercavam dos agressores” o tal capataz, “não se sabendo
era uma das estratégias para exterminá-los. se está vivo ou morto”.17
Embora com poucas evidências sobre Fato extraordinário, surpreendente,
esse episódio do quilombo da Loanda, em deixou senhores e autoridades em
1880, é possível analisar como escravizados sobressalto. Cativos trabalhando na 383
e aquilombados – muitas vezes os mesmos lavoura reagiram violentamente (quiçá
personagens – tentavam defender uma inesperadamente) contra uma expedição
comunidade e a economia própria, ameaçadas antimocambo, libertaram o “chefe
com a morte do dono e venda da propriedade do quilombo” que ia preso e, ao que
(Gomes, 2006:248-306). parece, justiçaram um “preto capataz”,
Outro episódio ocorrido nos últimos responsabilizando-o pelas denúncias e
anos da escravidão, envolvendo a colaboração por se tornar guia contra os quilombolas.
entre quilombo e senzala ajuda a entender não Considerando os vários contextos em torno
só os sentidos e os significados da liberdade da constituição de formas camponesas que
ainda durante a escravidão, mas também conectava a economia própria dos escravos
possíveis legados na pós-emancipação. Este assenzalados e a economia quilombola,
fato se deu em Paraíba do Sul, em 1882. interpretamos esse episódio no sentido de
Próximo à fazenda das Três Barras, alguns
17. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (doravante
lavradores capturaram escravos fugidos de APERJ). Fundo SPP, Coleção 166, documento 43, Pública
suas propriedades e souberam por eles que Forma de 4/09/1882.
Te r ra e campone se s ne g ros. . .
uma cultura camponesa – às vésperas da informações de quilombos históricos. Mas
Abolição – de acesso e controle sobre a terra há registros contemporâneos de numerosas
por meio de suas conexões mercantis – seja comunidades negras rurais, algumas das quais
A rtístico N acional

aquela de roças e lotes destinados pelos reivindicando a terra com os dispositivos


senhores, seja aquela onde se estabeleciam os legais de remanescentes de quilombos.
quilombolas, nas franjas de terras devolutas Mas uma indagação permanece: o que
de propriedades agrárias. O aquilombamento acontecia com as populações livres pobres
Flá vio G om es

como uma extensão das senzalas? Pode ser. nas franjas de áreas em expansão econômicas
Os cativos que permaneciam nas senzalas das e/ou voltadas para o mercado interno?
e
P atrimônio H istórico

Três Barras podem ter avaliado que interesses Não foram poucas as regiões escravistas
compartilhados estavam sendo ameaçados onde a população negra livre tinha razoável
na ocasião da repressão local. Quando autonomia econômica, ainda durante a
decidiram atacar a expedição, tentavam escravidão (Schwartz, 2001; Palácios,
proteger as relações sociais e econômicas 1987 e 1998). Podiam ser proprietárias
extensivas que agenciavam. de pequenos lotes de terra e se engajar
Para a região de Paraíba do Sul, Vale do no cultivo de gêneros alimentícios para o
do

Paraíba cafeeiro, está bem documentado o abastecimento. Ainda são poucos os estudos
R evista

costume de fazendeiros destinarem lotes de que acompanharam as populações de


terras às famílias escravas. Mais de 1/3 dos libertos e ex-escravos e as suas expectativas
plantéis estavam organizados em núcleos de ocupação de terra imediatamente
familiares, que se mantinham no tempo, pós-abolição (Guimarães, 2006; Machado,
mesmo com as partilhas das heranças. Famílias 1993; Castro & Rios, 2005; Slenes, 1996;
escravas extensivas se tornavam estáveis Fraga Filho, 2006). Ou ainda durante a
384 e chegavam a três gerações, possuindo escravidão, por meio de terras destinadas
roças – economia própria – organizada pelo às roças legadas por gerações de famílias
parentesco. Tais evidências bem poderiam de escravos e depois libertos, ocasionando
ser investigadas para outras áreas do Vale do conflitos com antigos senhores no pós-1888.18
Paraíba e do Brasil, ou seja: as comunidades De qualquer modo, importantes estudos
escravas que possuíam a tradição de cultivo agrários mais recentes têm apontado novas
de roças com base numa organização familiar direções no entendimento do conflito agrário
consolidada em várias gerações (Fragoso & nos séculos XVIII e XIX, tanto do ponto de
Florentino, 1987). Certamente, experiências vista da legislação quanto das expectativas de
que se tornaram fundamentais na fazendeiros, lavradores, sitiantes e as formas
pós-emancipação, especialmente para o acesso de ocupações de setores sociais diversos
a terra. No Vale do Paraíba – ao contrário (Motta, 1998).
de Campos dos Goytacazes – não há muitos
registros de quilombos mais duradouros. 18. Sobre a economia própria dos escravos, além de Ciro
Flamarion S. Cardoso (1987), ver, entre outros, Bert J.
Mesmo sendo uma área de plantation e com Barickman (1996); Carlos Magno Guimarães (1989); Maria
uma cultura escrava com destaque, não há Helena Pereira Toledo Machado (1988) e Eduardo Silva (1989).
Retorno da caçada, Comunidade em Itamaoari, fronteira do Pará com o Maranhão. Foto: Flávio Gomes, 1997

Processo de descascar a mandioca e de produção de farinha, Comunidade da Tomásia no Baixo Tocantins (PA). Foto: Flávio Gomes, 1997
Te r ra e campone se s ne g ros. . .

Dos remanescentes parceiros” e que tinham “fugido do engenho


e dos fragmentos da havia sete semanas”. Lembrou os nomes
de alguns e seus respectivos senhores,
A rtístico N acional

memória em Cametá
inclusive “um preto inglês que dizia ter
Mais raras têm sido abordagens que vindo com o General das Armas”. O líder
cruzem registros de antigos quilombos era Pascoal, “que dizia ser escravo de um
nos séculos XVIII e XIX com evidências padre”. A quilombola Magdalena disse não
Flá vio G om es

contemporâneas de comunidades negras ter aderido à fuga coletiva, mas lá estava


remanescentes delas, articulando narrativas “por ordem do administrador da fazenda
e
P atrimônio H istórico

de documentos de repressão policial, [...] em um retiro, acompanhada de um


noticiário da imprensa, etnografias e preto velho por causa de uma criança, que
memória oral. Conseguimos isso para tem enchido de bobas” quando foi abordada
algumas regiões da antiga província do por alguns parceiros “que já andavam
Grão-Pará, onde diversas expedições fugidos” e que “lhe disseram que fosse com
punitivas contra mocambos foram enviadas, eles” para o mocambo. Inicialmente com
sendo produzida extensa correspondência receio, “porque não tinha cometido crime
do

de autoridades policiais. E realizamos algum e tinha muito doente a sua filha”,


R evista

etnografias em vários povoados rurais. mesmo assim os “acompanhou ao sítio


Desvelam-se narrativas, imagens e onde estavam os outros [quilombolas] e
descrições do passado e reconstruções de onde tinham já uns tijupares em terras do
memórias e identidades atuais. engenho”. Teria permanecido aí “senão seis
No século XIX são abundantes os dias” com tais “parceiros fugidos”, quando
registros – correspondência policial e acabou presa. Na ocasião do ataque ao
386 noticiário da imprensa – de quilombos mocambo, muitos quilombolas andavam
nas áreas de Cametá, Mocajuba, Baião, “pelos matos a fazer madeira para uma
Igarapé-Miri, Barcarena, Moju e Oeiras, trincheira, que já principiaram, e com
áreas que formam o rio Tocantins, na [que] queriam cercar o rancho”. Alguns
parte baixa. Em Mocajuba, em 1823, por tinham “espingardas lazarinas, chumbo e
ocasião de um ataque, houve “renhido muito pouca pólvora”, enquanto outros
combate no mocambo a que eles se portavam “terçados”. Sobre a vida no
acoitavam” com quase 20 mortos e a prisão mocambo revelou que se alimentavam de
da “rainha do mocambo”. Mocambos “carne, salsaparrilha e farinha” trazida por
destruídos com habitantes capturados seus parceiros “não sabe aonde”, embora
e interrogados, onde emergem relatos revelasse que andavam “roubando” algumas
a respeito das redes comerciais e de canoas. Já a quilombola Hilária fez outras
solidariedades, articulando Belém aos revelações. Como Magdalena, ela tinha sido
vários rios e povoados circunvizinhos. também capturada no mocambo “situado
A quilombola Magdalena contou que nas terras do Engenho de Mocajuba”.
estava no “mocambo” com “vinte [de] seus Havia, porém, fugido desde julho de
Te r ra e campone se s ne g ros. . .
1822, pois sua “senhora a tinha presa de de Mocajuba”, que os convidaram a “vir-se
ambos os pés havia ano e meio”. Tinha a unir a eles” num quilombo onde tinham
sua própria versão quanto à “sedução” e de “uns tijupares”. Havia, portanto, dois

A rtístico N acional
ter sido guiada até o mocambo. Segundo grupos de quilombolas que se uniram.
ela “passado um dia, encontrava logo nesta Um do Jaguarari e outro de Mocajuba. A
cidade [Belém] dois seus parceiros que narrativa de Hilária encontrar-se-ia agora
andavam fugidos”. Estes a levaram para com aquela de Magdalena. Vários pequenos

Flá vio G om es
um sítio detrás da Fazenda de Jaguarari grupos de fugitivos e suas estratégias,
“onde se achavam já amocambados dez fugas coletivas e contatos dos fugidos com

e
P atrimônio H istórico
parceiros dela”. Escapando aqui ou acolá, cativos nas senzalas e em “quitandas” nas
encontraram numa “montaria” (pequena áreas de porto de Belém e a realização de
canoa) o preto Pascoal e “que então se comércio de regatões.
uniu aos parceiros dela respondente, [e] Sobre os quilombolas de Mocajuba,
foram para o quilombo de Jaguarari”. soube-se depois que os “rolos de panos”
Permaneceriam ali dois meses até serem roubados e achados nos seus mocambos
perseguidos. Por ocasião do ataque, foram “arrematados” em haste pública.

do
acabariam se dispersando “fugindo Hilária e Magdalena conheceram o “castigo

R evista
então cada um para onde pôde”. Hilária, público”, pois a Junta Provisória que
por exemplo, com mais três parceiros então governava a Província do Grão-Pará
“estiveram onze dias sem sustento em uma desejava que servisse de “exemplo e
capoeira de canavial”. Depois roubaram demonstração de severidade” quanto
a “montaria de um tropeiro e vieram à punição de “semelhantes crimes”.
nela para as imediações da cidade, onde Ordenou-se inclusive “suspender num
andaram muito tempo sem paragem posto na Praça do Pelourinho, a cabeça 387
certa, ora no mato, ora pelos igarapés, de um dos pretos mortos no ataque ao
vindo de noite aos portos da cidade, mocambo”. Outros fugitivos presos foram
onde as pretas lhe compravam peixe, e processados e punidos. Além da punição
eles iam comprar patacas e meias patacas exemplar, o interesse maior era obter
de farinha”. Indagada sobre nomes e – com investigações e interrogatórios –
locais daqueles que mantinham comércio “alguns indícios, ou presunções das pessoas
com os fugitivos, Hilária preferiu calar. que os auxiliavam com armas, ou outros
Alegava que “não sabia aquém” e que socorros”. O preto Pascoal, acusado como
“nunca saía da montaria”. Certa vez o “rei” do mocambo – foi processado em
mesmo “saindo o preto Jacinto a terra separado. Os mocambos de Mocajuba não
vender açaí fora preso nas quitandas” e desapareceriam, mas se tornariam, sim,
os demais fugitivos trataram de escapar. invisíveis, unindo-se ou dispersando vários
Hilária andava em companhia do preto grupos de fugitivos que se estabeleciam na
Pascoal em sua montaria [canoa] quando região. Podiam articular mocambos com
encontraram com os “fugidos do Engenho “tijupares e trincheiras”, produtores de
Te r ra e campone se s ne g ros. . .
farinha com pequenos grupos de fugitivos capturados pelo “tuxaua principal da tribo
que pescavam, colhiam açaí e castanha. Nas dos indígenas” da região. Com pagamento e
ilhas, furos e igarapés – contando com o “sustento de farinha e carne e aguardente”,
A rtístico N acional

“auxílio” de regatões, tapuios, escravos e autoridades utilizavam em algumas ocasiões


desertores – podiam estar sendo gestadas índios aldeados para perseguir fugitivos
microcomunidades camponesas que nas regiões do Tocantins. Segundo as
integravam – na medida do possível – suas autoridades, em 1854, ataques sistemáticos
Flá vio G om es

práticas econômicas às paisagens locais.19 aos mocambos em Mocajuba estavam


Na década de 1850, com a onda dispersando os fugitivos. Grupos maiores
e
P atrimônio H istórico

de repressão aos mocambos levada a e mais estáveis em termos de estrutura


cabo pelas autoridades do Grão-Pará, os econômica tinham sido forçados a migrar e
mocambos de Mocajuba reapareceram se dividir, abandonando roças. A migração
na documentação. Em 1851, trocas de desses fugitivos era permanente. Estavam
correspondência policial já alardeavam “obrigados a se entregar ou mudar de
sobre o “infeliz resultado” de diligências lugar”. Descobriu-se que havia mocambos
enviadas contra os “mocambos das matas “dentro de um lago coberto de alvorados
do

de Mocajuba”. O fracasso agora teria de paus, e de caranaes, e outros espinhos,


R evista

sido motivado “em razão dos negros raízes, atoleiros”. Naquele contexto,
existirem em um lugar bastante feio autoridades e fazendeiros de Mocajuba
de atacar-se com facilidade, e os ditos chegaram a lembrar que os mocambos
estarem prevenidos”. Revidaram mesmo o existentes ainda eram remanescentes
ataque, atirando contra a tropa, e depois daqueles atacados em 1823, quando da
escaparam pela floresta. Aos soldados foi captura do “rei” Pascoal. Entre os anos de
388 ordenado: “queimar as casas em número 1855 e 1859, os mocambos de Mocajuba
de 10, quebrar os fornos e destruir o que acabaram atacados sistematicamente
encontrarem, e retirou-se [a tropa] ficando com muitos gastos e despesas para os
roças unicamente”. Em fins de 1853, falava- cofres públicos. Na década de 1880, esses
se “de um formidável quilombo no lugar mocambos de Mocajuba continuaram
de Mocajuba, não muito distante da capital fazendo parte do noticiário da imprensa
dessa província”. Uma expedição punitiva e da correspondência policial. Os
com “150 praças dos diversos corpos aí mocambos – ao que parece – já tinham
existentes” foi preparada. No início do se misturado às várias comunidades
ano seguinte, três escravos e um desertor camponesas da região. Um fugitivo preso
“evadidos do mocambo de Mocajuba” foram em 1881 revelou que, fugido há mais de
três anos, ficou “homiziado” no “mocambo
19. Arquivo Público do Estado do Pará (doravante APEPA). de Mocajuba”. Ali, andara “amasiado” com
Códice 755 (1823), Ofício de 19/03/1823; Códice 749
(1823); Auto de averiguações de 21/03/1823 e Ofício a escrava Ana. Posteriormente, retirou-
de 16/05/1823; Códice 764 (1823-1828), Ofício de
22/03/1823; e Códice 754 (1823), Ofícios de 24/03, 02/04/
se do mocambo por causa do medo das
e 30/05/1823. mortes e espancamentos que lá ocorriam
Te r ra e campone se s ne g ros. . .
devido às rixas. Uma das quais motivada prolongamento acompanhando as margens
por alguém que “havia tocado fogo em um do igarapé Putiri. A base econômica – com
rancho que não lhe pertencia”. Os mortos os vários povoados locais – é a farinha,

A rtístico N acional
eram enterrados “em um cemitério... existindo ali cerca de 20 casas de forno
dos escravos ali fugitivos”. Em 1884, a organizadas por grupos de parentesco e
denúncia era que os fugitivos de Mocajuba famílias extensivas. Produz-se também
ameaçavam alguns “botes” que desciam arroz e milho. Em Icatu, verificaram-se as

Flá vio G om es
para realizar negócios, causando prejuízos características de população de “caboclos”,
econômicos para alguns fazendeiros.20 uma mistura com indígenas. Segundo a

e
P atrimônio H istórico
Com a Abolição, esses mocambos tradição oral, o povoado teve como origem
desapareceram, pois não mais se podia um pequeno grupo de negros fugidos
falar em escravos fugidos. Mas a tradição por volta de meados do século XIX,
camponesa de produção de farinha e trocas havendo contatos com grupos indígenas
mercantis continuou. Atualmente, nessas circunvizinhos. Depois da Abolição, a
áreas do Baixo Tocantins (especialmente população aumentou bastante, por causa
entre os municípios de Mocajuba, dos contatos entre “regatões”, seringueiros

do
Cametá e Baião) existem dezenas de (até mesmo imigrantes portugueses),

R evista
microcomunidades negras rurais. Ali libertos etc. Bem vizinho ao núcleo urbano
encontramos muitos antigos moradores do município de Mocajuba, localiza-se
que, nos fragmentos de suas memórias, o povoado do Arraial. No período da
localizaram “lugares” e “pessoas” do passado escravidão e imediatamente na pós-
quilombola e da economia camponesa.21 emancipação era o lugar em que residiam
Partindo do município de Mocajuba os “negros”. Atualmente, representa
(margem direita do rio Tocantins), mais um bairro rural anexo à sede do 389
destacam-se dois povoados. O primeiro é município de Mocajuba. Ali encontramos
o de Icatu, que fica situado próximo aos os moradores negros e mestiços mais
rios Tauaré e Tauarezinho, e para alcançá- “antigos” da região, muitos deles filhos de
lo, é necessário descer o igarapé Putiri. É escravos e libertos.
um povoado em um formato semicircular, Imagens reconstruídas sobre a
com casas dispostas num extenso escravidão aparecem em algumas memórias
em Icatu e Arraial. No Icatu, dizem os mais
20. APEPA. Caixa 149 (1851), Ofícios de 8/03 e 21 e velhos que as avós contavam histórias de
23/06/1851; Códice 1251 (1854), Ofício de 11/01/1854;
Caixa 183 (1854) Ofícios de 14/01 e 10/02 de 1854; que “eram escravas e tinham sido roubadas
Documentação em Caixas (Ano: 1854), Ofício de por negros fugidos”. Outros afirmam
12/01/1854; Códice 10A (1855), Ofício de 19/09/1855;
Caixa 201 (1856), Ofício de 18/02/1856, Documentação em que ouviram histórias de que ali no rio
Caixas (Anos: 1858-1859), interrogatórios de 17/02/1858, Tauarezinho “moravam muitos índios”.
Caixa 225, Ofício de 16/02/1861 e Documentação em Caixas
(Ano: 1884), Ofício de 29/09/. Ver também periódico Treze de Também relatam a existência de “um
Maio, 23 de outubro de 1855.
21. Pesquisas etnográficas realizadas com recursos da Fundação
mocambo”, que, segundo os “mais antigos”,
Ford (1996 e 1997) e do CNPq (2002-2004). ficava numa ilha do igarapé Putiri. Depois
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da Abolição, esses quilombolas se mudaram município e ter a população negra (e por
para a beira do igarapé e constituíram certo a história de um antigo quilombo),
novas casas. Contam mais, que eles sempre ficou praticamente segregado. As festas e
A rtístico N acional

festejavam o “dia 13 de maio” e que até os bailes da “cidade” só eram frequentados


“pouco tempo”, a “festa do Putiri” era por “brancos”, que impediam a entrada dos
considerada a “festa dos pretos”, e a “festa “pretos”. Havia no Arraial muitas festas,
do Icatu” era a “festa dos caboclos”. Essa como banguês, reis e rainhas e samba de
Flá vio G om es

divisão teria ocorrido por causa da forte cacete (Gomes, 2006b).


miscigenação, envolvendo negros (libertos Nos complexos registros das memórias
e
P atrimônio H istórico

e quilombolas), índios e seringueiros nessas comunidades negras, não aparecem


mestiços. Imagens da pós-emancipação apenas fragmentos de narrativas sobre
surgiram em algumas memórias no povoado fugas de escravos, mas também migrações,
do Arraial, em Mocajuba, ao lembrarem postos de trocas e feiras, desertores
o “sofrimento” da escravidão e as festas militares, conflitos e alianças com
do “13 de maio”, que marcavam as suas populações indígenas, experiências dos
memórias. Depois da Abolição – segundo anos imediatamente pós-1888 e histórias de
do

alguns depoimentos – o povoado do Arraial, “raptos” pelas frentes de expansão agrária de


R evista

por ser próximo do “centro” (sede) do meados do século XX.

390

Feira do Juaba, município de Cametá (PA). Foto: Flávio Gomes, 1997


Te r ra e campone se s ne g ros. . .
Considerações finais e a prosperidade. Ou a sua inversão: negros
analfabetos, miseráveis, despreparados
Precisamos conhecer as formas a indicar problemas sociorraciais no

A rtístico N acional
camponesas no pós-Abolição e nas futuro.22 Poucas possibilidades de pensar
primeiras décadas do século XX. E os as experiências e expectativas da pós-
aquilombamentos. Quais desapareceram emancipação articulando fronteiras
e quantos se multiplicaram ou ainda econômicas e agrárias abertas e a migração

Flá vio G om es
migraram e se fundiram a outros setores de microssociedades camponesas (roceiros,
rurais, tornando-se mais ou menos libertos, negros e mestiços). Interessante

e
P atrimônio H istórico
invisíveis? E as populações de libertos, é que, para o passado, os quilombos
egressas do cativeiro? Estabeleceram novas foram definidos (legislação da época e
bases de ocupação rural ou mantiveram determinada interpretação historiográfica)
aquelas antigas? Lembro-me agora que somente como unidade da resistência
ao assistir, há anos, à exibição do último escrava; e para o presente, as denominadas
episódio de uma telenovela, Sinhá moça, comunidades remanescentes aparecem muitas
avaliei a imagem cristalizada que ainda vezes nas etnografias como espaços da

do
nos cerca sobre emancipação, acesso a reminiscência cultural, quase fósseis. As

R evista
terra e destino da população negra no atuais comunidades negras rurais – vale
alvorecer do século XX. Na cena final, dizer que muitas não necessariamente
surgia a representação de duas gigantescas originadas dos quilombos históricos, mas
filas – paralelas e em sentidos contrários combinadas entre eles e complexos espaços
– em direção à fazenda (no período pós- agrários23 (vilas, feiras, entrepostos de
1888). A de chegada era de imigrantes trocas mercantis etc.) conectados por
europeus em direção ao trabalho livre, vários setores rurais na escravidão e na 391
supostamente racional e capitalista. pós-abolição – para algumas definições
Naquela de saída, surgiam ex-escravos e jurídicas e tipologias das políticas públicas
libertos, ao mesmo tempo gratificados, não são consideradas povos da floresta,
expulsos, indesejados ou obtusos, que não são alinhados como trabalhadores
rumariam para as cidades à procura de rurais e mesmo contempladas na pauta
emprego. Imagem caricaturada, mas contemporânea dos movimentos sociais
também indicativa de como literatos de luta pela terra (o Movimento dos
do passado e intelectuais do presente Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST,
perceberam e continuam percebendo o e outros). Embora algumas tenham sido
que muitos estudos históricos chamariam mais recentemente agraciadas pelas
de “transição”. Imagens que cristalizaram políticas públicas do Incra, MEC, SEPPIR
projetos de nação que se tornaram e projetos de distribuição de renda, a
hegemônicos e memórias históricas de
22. Para estudos mais recentes sobre mobilização racial no
silêncio e negação. Mitos dos imigrantes pós-emancipação, ver Petrônio Domingues (2003).
radicais, inventando a história do trabalho 23. Ver João José Reis (1996).
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esmagadora maioria continua excluída de passado, formas de políticas públicas
uma dimensão mais abrangente de história afirmativas e de reparação histórica.24
e reconhecimento. E muito mais coisas, de todos os lados
A rtístico N acional

A formação de um campesinato negro e interesses. Sendo a definição de


no Brasil tem origens diversas: terras remanescentes de quilombos tanto
herdadas de quilombolas/escravos fugidos abrangente como operacional, muitas
e seus descendentes da escravidão; doações comunidades enfrentam problemas de
Flá vio G om es

de senhores ou ordens religiosas a ex- reconhecimento nos órgãos públicos


escravos; terras compradas por libertos e também de respeito (ou a falta de)
e
P atrimônio H istórico

e herdadas pelos seus descendentes; quanto às demarcações não obedecidas


terras conseguidas do Estado em troca de por setores agrários interessados em suas
participação em guerras (do Paraguai, por terras e territórios. Há morosidade nas
exemplo) ou ainda de inúmeras migrações titulações definitivas das terras e também
de libertos e suas famílias no período alguns equívocos por parte de estudiosos
imediatamente pós-emancipação (Reis e movimentos sociais no tocante às
& Gomes, 2007). Em vários lugares são interpretações jurídicas. Dimensões da
do

conhecidas por diferentes denominações: memória histórica, de reconstruções do


R evista

populações tradicionais rurais negras, passado e do presente, de cidadania e de


comunidades negras rurais, bairros rurais direitos constitucionais podem (e devem)
negros, terras de preto (Gomes, 2005:467) ser articulados. As narrativas acima – não
e terras de santo. Devem ser incluídas nessa necessariamente “verdades históricas” –
lista de denominações as comunidades de podem oferecer (apenas) um entendimento
senzalas, que seriam comunidades negras mais complexo sobre as formas camponesas
392 formadas ainda na escravidão – com do passado – da escravidão e dos anos
desdobramento na pós-emancipação – até imediatamente posteriores – no que
os dias atuais. Cativos e libertos de um diz respeito às conexões entre senzalas,
mesmo proprietário ou de um conjunto de quilombos, vilas, trocas mercantis e
proprietários compõem essas comunidades, indígenas. Investigações históricas sobre
organizadas por grupos de trabalho, as experiências camponesas do passado
vizinhança, famílias, compadrio e base podem sugerir a ampliação da definição dos
religiosa (Almeida, 1990 e 1996). quilombos históricos e das comunidades
O debate atual sobre as comunidades negras atuais. Isso pode ajudar (esperamos)
negras rurais é complexo. Não cabem
definições a-históricas e nem etnografias
24. Entre os principais estudos (antigos e novos) sobre
improvisadas. E não há espaço para comunidades negras rurais e remanescentes de quilombo,
certezas e verdades, absolutas e definitivas. ver, entre outros, Rosa Elizabeth Acevedo Marin e Edna M.
Ramos (1993); José Maurício Arruti (2002); Maria de Lourdes
Estão em jogo lutas seculares pela terra, Bandeira (1988); José Jorge de Carvalho (1996); Neusa M.
Mendes de Gusmão (1996); Ilka Boaventura Leite (1996);
tradições de uso e manejo dela, direitos Anita M. de Q. Monteiro (1985); Renato da S. Queiroz (1983);
constitucionais, reconhecimento do Valdélio Santos Silva (1999); Jean-François Véran (1999).
Te r ra e campone se s ne g ros. . .
tanto nas pesquisas no campo da educação, espaço branco: estudo antropológico deVila Bela. São Paulo:
Brasiliense, 1988.
da sociologia, da linguística, da geografia BARBOSA, Tanya Maria Brandão. O escravo na formação
e da antropologia, quanto nos impasses

A rtístico N acional
social do Piauí. Perspectiva histórica do século XVIII.
das políticas públicas emergentes. Os Dissertação de mestrado. Recife: UFPE, 1984.
BARICKMAN, Barry. “‘Tame Indians’, ‘Wild
vários significados dos quilombos e dos Heathens’, and settlers in Southern in the Late
remanescentes de quilombos podem não Eighteenth and early Nineteenth Centuries”. The
Americas, 51(3):325:368, 1995.
ser, necessariamente, uma invenção do BARICKMAN, Bert J. “‘A bit of land, which they call a

Flá vio G om es
presente, pois precisamos conhecer mais roça’: slave provision grounds in the Bahia Recôncavo,
1780-1860”. Hispanic American Historical Review,
sobre as experiências ao longo do século

e
74(4):649:687, 1996.

P atrimônio H istórico
XX e antes da Constituição de 1988.25 BRANDÃO JÚNIOR, Francisco Antônio. A escravatura
Também a ressemantização alardeada como no Brasil precedida d’um artigo sobre agricultura e colonização
no Maranhão. Bruxelas, 1865.
categoria antropológica não precisa excluir CARDOSO, Ciro Flamarion S. Escravo ou camponês?
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