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– NACHTMUSIK I E II (1981/2003)*
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cujas aparições no desenrolar da peça recortem momentos da Trata-se aqui de uma simetria real, pois as duas pulsações baseiam-
forma, assinalados por uma outra dimensão que não o ritmo (a -se em números ímpares [no exemplo acima: 7 e 5]. A simetria será,
estrutura harmónica, por exemplo). pelo contrário, virtual quando um dos números for par:
5 3 2 5 1 4 4 1 5 2 3 5
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Terceira leitura regulares, um baseado em valores muito próximos, o outro em va-
Isolar um momento do desenrolar simultâneo das quatro camadas; lores bastante afastados:
digamos, a terceira semínima a contar do início:
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Redundância e processo criativo [Nachtmusik II] de correspondências não ocorre, ao longo de toda a peça, senão em
Todos os aspectos que acabo de mencionar tiveram igualmente a momentos raros e breves, como uma espécie de simplificação má-
sua importância na estruturação de Nachtmusik II. Mas não se trata, xima das tensões entre as diferentes dimensões.
de modo algum, de uma versão para orquestra ou de uma ‘orques- Tanto quanto o aprofundamento do conhecimento dos fenó-
tração’ de Nachtmusik I. menos acústicos pode fecundar a criação musical, também a ma-
Em Nachtmusik II a ordem de encadeamento dos grupos de dois nipulação mais ou menos sofisticada desse conhecimento, quan-
sons e o seu registo não são os mesmos, e a sua função é totalmente do elevada a substância e finalidade de uma peça, não é mais, em
diferente. Enquanto em Nachtmusik I eles eram, quase sem interrup- meu entender, do que a recusa e portanto a incapacidade de fazer
ção, uma espécie de durchgehende Hauptstimme [voz principal contí- surgir e assumir plenamente um gesto criador. Como se nos com-
nua], aqui [em Nachtmusik II] poder-se-ia dizer que eles formam um prazêssemos em re-‘compor’ uma série de harmónicos naturais,
fio condutor subterrâneo, destinado mais a desencadear desenvol- ‘vestindo -os’ com os requintes da análise acústica. Uma espécie de
vimentos harmónicos e/ou os diferentes tipos de construção meló- pseudo -naturalismo…
dica – isto no plano dos ritmos e das sequências de intervalos. O aspecto provavelmente mais importante da composição de
Para o conjunto das obras de ‘A Criação’ compus um certo nú- Nachtmusik II foi a multiplicidade de categorias de relações entre
mero de matrizes melódicas, cada uma delas baseada numa e por as diferentes dimensões sonoras, o que, em certas passagens da
vezes em duas espécies de intervalos. (As três Einspielungen consti- obra, pode chegar até àquilo a que eu chamaria uma ‘antifonia de
tuem nomeadamente o máximo desenvolvimento da totalidade parâmetros’, no sentido de que cada parâmetro vai incarnar uma
dessas matrizes.) Gestaltung e um processo de desenvolvimento que, a priori, não têm
Nachtmusik II é atravessada em toda a sua extensão por um fluxo minimamente em conta a inevitável interacção do conjunto das di-
melódico cujo recorte e distribuição instrumental se regem por pro- mensões e a sua integração na globalidade do discurso.
porções oriundas de diversos ciclos de pulsações regulares. Embora Não há um princípio unificador de todas as dimensões ao mes-
tenham sido utilizadas as doze notas da escala cromática, também mo tempo, mas sim uma unidade de concepção na multiplicidade
é verdade que as quatro notas ausentes de Nachtmusik I têm quase de métodos e sua permutabilidade de uma dimensão para outra.
sempre uma presença nitidamente menos forte que as outras oito.
A proliferação de linhas melódicas confiadas na maior par-
te dos casos a solos, a divisão quase permanente da orquestra em
várias formações de câmara e a intervenção de grupos instru-
mentais massivos (ou mesmo de tuttis) são outros tantos tipos de
escrita diversos que se organizam num contraponto de ‘complexos
tímbricos’. A simultaneidade de vários grupos de câmara consti-
tui igualmente essa espécie de contraponto, onde o desenrolar das
diferentes ‘vozes’ está ordenado verticalmente segundo pontos de
sincronia, pontos estes que demarcam espaços intermédios onde o
desenvolvimento horizontal predomina sobre o ajustamento verti-
cal. Estes pontos de sincronia são também determinados por certos
ciclos de pulsações regulares, ou por zonas desses mesmos ciclos
tornadas autónomas.
Voltemos uma última vez aos 23 pares de pulsações regulares.
É evidente que, se nos referirmos à série de harmónicos naturais,
cada par corresponderá a um intervalo determinado, uma vez que
(como todos sabem) as frequências, por exemplo, dos 19º e 16º har-
mónicos estão numa relação de 19/16. No plano da composição, no
entanto, uma tal correspondência par-intervalo não poderia – no
meu caso – ser mais do que um caso particular e pontual de rela-
cionamento de duas dimensões sonoras. A utilização deste género
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