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Sextafeira, 13 de julho de 2012 18h03
Gestão do transporte em indústrias de pequeno e médio portes no Brasil: o que este tipo de
embarcador deseja?
Autoria de GUILHERME SILVEIRA MARTINS, OSMAR VIEIRA, RICARDO SILVEIRA MARTINS
Encontrar o nível de serviço adequado aos requisitos dos embarcadores, de forma a satisfazer o cliente sem incorrer em custos
desnecessários, ainda é um desafio para muitas empresas que atuam com transporte de cargas. Isso é especialmente válido quando
os embarcadores são de um segmento importante, mas que tem recebido pouca atenção nos estudos de logística: pequenas e médias
empresas (Holter et al., 2008). Assim, neste artigo são apresentados os resultados de um estudo com 400 embarcadores de pequeno
porte que buscou analisar os fatores que impactam na decisão de contratação e na satisfação em relação aos serviços de transporte.
A gestão do transporte nas organizações implica decisões sobre como movimentar materiais e produtos acabados entre diferentes
pontos de uma determinada rede de negócios. No escopo mais amplo da logística, as expectativas quanto ao desempenho do serviço
de transportes se tornaram mais complexas. Não é mais suficiente apenas se preocupar com o deslocamento eficaz de matérias
primas e de produtos acabados entre pontos geográficos distintos. A expectativa das empresas é pela incorporação de outros
atributos do serviço, tais como o cumprimento dos prazos, a transparência de custos e o desenvolvimento de serviços apropriados e
integrados com fornecedores e clientes.
O risco de a atividade de transportes comprometer a qualidade de toda a logística e a estratégia de toda uma cadeia aumenta à
medida que as decisões de contratação do transporte estão centradas diretamente no preço do frete. Esse risco ocorre quando as
decisões operacionais se sobrepõem aos fatores estratégicos. Dessa forma, o embarcador passa a não reconhecer ou a minimizar o
valor proporcionado pelo transporte e tende a tratálo meramente como custo.
Para empresas de pequeno e médio portes, o transporte geralmente implica nos maiores custos da logística, segundo Ng., Ferrin e
Pearson (1997), o que potencializa o risco de restringir as decisões de transporte ao nível meramente operacional. Além do mais, é
um processo repetido muitas vezes no cotidiano das empresas, tanto na compra de materiais quanto na distribuição de seus
produtos. Este contexto torna crítica a gestão dos transportes para as empresas de menor porte, pois, ao mesmo tempo em que
normalmente não há uma gestão especializada, os pequenos e médios negócios têm pouco poder de barganha no mercado, dado o
volume de suas operações (Holter et al., 2008). No contexto brasileiro, as pequenas e médias empresas (PMEs) possuem
importância destacada, pois representam 99,2% das empresas registradas, geram 57,2% dos empregos formais e respondem por 20%
do Produto Interno Bruto (PIB) (Sebrae, 2007).
Aspectos metodológicos
Este estudo é uma pesquisa empírica, de caráter exploratório, que procurou caracterizar as necessidades e expectativas dos
embarcadores quanto aos serviços das empresas de transporte rodoviário, no contexto específico da realidade brasileira.
A unidade de análise da pesquisa referese às empresas da indústria de transformação com até cem funcionários, tendose por base o
Cadastro de Estabelecimentos Empregadores (CEE) do Ministério do Trabalho. As unidades de observação foram os empresários e
gerentes envolvidos no processo de planejamento e gestão do transporte.
As empresas pesquisadas, componentes da amostra de 400 unidades localizadas em Minas Gerais, foram caracterizadas pelo setor de
atuação dentro da indústria de transformação. Conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), do Conselho
Nacional de Classificação, utilizada pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1, os setores e respectivas
atividades econômicas contempladas foram: Alimentos, Vestuário e Calçados, Químico, Medicinal e Farmacêutico, Móveis,
Metalurgia, Tecnologia e Bens Industrializados Intermediários e Diversos.
Gestão do transporte em indústrias de menor porte
Agrupamentos de embarcadores conforme comportamentos identificados na gestão do transporte
Para a formação dos agrupamentos (clusters) de comportamentos padronizados de embarcadores, foi utilizada a técnica de Análise
Fatorial. Os clusters formados tiveram as características apresentadas na Tabela 1.
Na questão específica dos segmentos de clientes, foram testadas algumas hipóteses com relação a diferenciais de nível de serviço.
Primeiramente, buscouse identificar se o prazo de atendimento variava de acordo com o segmento do cliente. Como pode ser
observado na Tabela 2, através dos coeficientes de correlação é possível verificar que todos os clusters apresentam correlação
negativa entre percentual de venda para indústrias e tempo de atendimento. Este resultado aponta que os prazos de atendimento são
menores para clientes de maior porte. Nesse sentido, a indústria exige melhor nível de serviço e é atendida nesse quesito pelos
fornecedores.
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Por outro lado, verificaramse correlações majoritariamente positivas entre o prazo de atendimento e o percentual de clientes para
pequeno varejo e consumidor final, o que indica um aumento no prazo de atendimento, à medida que o percentual de clientes
classificados como pequeno varejo e consumidores finais aumenta. Uma possível explicação para esse fenômeno é a possibilidade de
fragmentação desses clientes, com baixo volume por pedidos individuais, com impacto no nível de serviço, levando a um prazo de
atendimento superior à medida que o percentual desses clientes se intensifica.
Buscouse também verificar a correlação entre volumes financeiros negociados e prazo para atendimento do pedido dos clientes. A
correlação entre as duas variáveis indica que existe uma relação inversamente proporcional entre o volume do pedido de compra de
suprimentos e o prazo de atendimento por parte do fornecedor. Dessa forma, quanto maior o volume do pedido, menor o tempo de
entrega. Ou seja, o nível de serviço aumenta quando estão sendo negociados maiores volumes financeiros. A exceção é o Cluster 3
(Varejo geral, cliente final e empresas industriais), no qual a relação é diretamente proporcional, ou seja, os prazos aumentam à
medida que o volume do pedido se eleva (Tabela 3).
Quanto à mesma relação para os prazos e volume de pedidos fornecidos aos clientes pelas empresas estudadas, os resultados não
seguem a mesma tendência. Neste caso, os prazos de atendimento das empresas aumentam à medida que aumenta o volume por
pedido, o que pode ser observado na correlação positiva entre as variáveis.
Características da contratação dos serviços de transporte
Foram investigadas as formas de relacionamento das empresas com fornecedores e clientes no mercado, via necessidades de
transporte. As empresas geralmente usam o sistema de compras FOB (Tabela 4), isto é, responsabilizamse pelo pagamento do frete
para receber matériasprimas e demais materiais e componentes. Esta realidade é mais presente para empresas do Cluster 5
(atacadistas, grande varejo e indústrias nacionais).
Assim como na compra de matériasprimas, as empresas estudadas são responsáveis por arcar com o transporte na maior parte dos
casos (48,6%) na venda de seus produtos (Tabela 5). Apesar de esta característica ser comum a todos os clusters, pode ser notada
mais fortemente nas empresas do Cluster 3, no qual 54,8% das empresas arcam com os custos de transporte, independentemente do
volume comprado. Já no que diz respeito às empresas que condicionam a responsabilidade do transporte em função do volume da
compra, estão mais presentes no Cluster 1 (empresas industriais e de distribuição em todo o território).
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Ou seja, há predomínio do frete FOB na compra e CIF nas vendas, implicando que a empresa, geralmente, paga duplamente pelos
fretes, o que torna ainda mais significativos os custos com transporte em relação ao preço final.
Além da responsabilidade pelo custo do transporte, buscouse verificar também os critérios utilizados pelas empresas na contratação
das transportadoras. A maior parte das empresas faz uso diário do serviço de transporte. Das empresas que optam por contratar as
transportadoras quando da necessidade de embarque da carga, grande parte se concentra no Cluster 2 (varejo local). As empresas
que utilizam como critério a disponibilidade das transportadoras estão fortemente presentes no Cluster 1 (empresas industriais e de
distribuição em todo o território). Já as empresas que escolhem as transportadoras com base no histórico de relacionamento, podem
ser encontradas em todos os agrupamentos, particularmente nos Clusters 4 (varejo de todo o território) e 5 (atacadistas, grande
varejo e indústrias nacionais), que são aqueles também de maior frequência (Tabela 6).
Independentemente da diferença entre agrupamentos, há que se ressaltar que é possível que empresas tendam a escolher as
transportadoras com base no histórico de relacionamento, indicando haver acompanhamento de desempenho e preferência pelas
transportadoras já conhecidas. Outro fator de escolha é a disponibilidade da transportadora, indicando minimizar a importância do
transporte no processo de negócio, pois a sua necessidade já é conhecida desde a venda, mas o planejamento de embarque não é feito
e, então, há que se contentar com o serviço que estiver disponível no momento necessário.
Destacase a forte concentração de empresas que utilizam diariamente o serviço de transportes no Cluster 5 (atacadistas, grande
varejo e indústrias nacionais). Há concentração de empresas que utilizam o serviço de transporte mais de uma vez por semana no
Cluster 2 (varejo local), e por fim, as empresas que utilizam semanalmente o serviço de transporte são expressivas no Cluster 3
(varejo geral, cliente final e empresas industriais).
Avaliação geral dos serviços de transporte pelos embarcadores
Conhecer o que o cliente valoriza é o primeiro passo para buscar a sua satisfação e se diferenciar da concorrência. Em uma prestação
de serviço, como no caso de contratação de transporte, a satisfação do cliente pode ser medida pela diferença entre a importância que
ele atribui ao serviço e a avaliação do mesmo. Isso é reforçado pelo fato de as empresas acompanharem mais de perto aqueles fatores
que mais impactam no seu negócio. Desta forma, buscouse nesta seção conhecer quais eram os atributos do transporte mais
importantes para os embarcadores e, na sequência, qual era o desempenho das prestadoras de serviços logísticos nestes atributos. Os
resultados, portanto, apontam para gaps (lacunas) entre o que o embarcador espera de um serviço logístico e o que lhe é entregue. Os
resultados estão na Tabela 7, onde é possível verificar que os atributos relativos à Confiabilidade têm maior importância para as
empresas estudadas, seguidos de perto por aqueles relativos à Segurança.
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Na última coluna da tabela (RES) é possível verificar os pontos de melhoria na prestação de serviço de transporte, segundo a
percepção dos embarcadores. Destacase um forte gap nos atributos de Preço e de Relação com o Cliente. Dentro do aspecto Preço, a
lacuna mais aguda diz respeito às políticas de descontos das transportadoras, seguida pelo preço do frete. Mesmo com pouca
importância relativa, os embarcadores estão insatisfeitos com os preços dos serviços.
Quanto à Relação com o Cliente, as empresas indicam que a solução de problemas é ineficiente. Além disso, são inadequados os
sistemas de rastreamento da carga. Apesar das particularidades, vale destacar que a avaliação, em nenhum dos atributos, foi
condizente com as importâncias atribuídas pelos entrevistados, o que indica a necessidade de atuação das transportadoras a fim de
reduzir esta distorção. Em muitos casos o problema pode ser solucionado com uma melhor comunicação entre as partes, de forma a
alinhar as expectativas acerca do serviço prestado.
Todavia, os valores apresentados servem também para estimar uma avaliação geral do serviço prestado, considerando a importância
dos elementos e suas avaliações. Neste caso, a satisfação das empresas em relação ao serviço prestado pelas transportadoras é 86%, o
que parece ser bastante relevante.
Considerações finais
A pesquisa com 400 embarcadores de pequeno porte trouxe resultados interessantes; alguns esperados, outros instigantes. Foi
identificado que a indústria exige (e recebe) um melhor nível de serviço de seus fornecedores em comparação a outros elos da cadeia.
Por outro lado, há elevação no prazo de atendimento quando os clientes são o pequeno varejo e/ou o consumidor final. Uma possível
explicação para este fenômeno seria o fato de esses clientes demandarem serviços de carga fracionada e estarem bastante
pulverizados geograficamente.
Porém, não houve esta comprovação quando do cruzamento das variáveis volume de pedido e prazo de atendimento. Muito pelo
contrário, pois houve constatação de que os prazos de atendimento das empresas aumentam à medida que aumenta o volume por
pedido. Ou seja, os resultados indicam que a liderança e a capacidade de coordenação das empresas focais ditam o nível de serviço na
cadeia de negócios. E isso não é questão de volume. As empresas da amostra demonstraram que quando atendem a clientes
industriais utilizam um maior nível de serviço de transporte, por exigência dos clientes que acompanham o desempenho dos
fornecedores em vários aspectos, inclusive no alinhamento da logística com as estratégias de negócios.
Dessa forma, entendese que os embarcadores gerenciam o transporte a partir do nível de serviço que prevalece na cadeia na qual a
empresa está inserida, e têm menos impacto neste gerenciamento questões como frequência da demanda, volume financeiro dos
produtos a serem movimentados e outros fatores. As empresas tendem a apenas responder ao nível de exigência e, por isso, não
usam o transporte, e talvez a logística, como oportunidade para criar diferenciais competitivos.
Em outras palavras, as empresas não reconhecem possibilidades de diferenciação perante os concorrentes e frente aos clientes pela
logística, em geral, e pelo transporte, em particular. Assim, para obter os serviços necessários, tendem a comprálos dos
transportadores prontamente disponíveis, sem preocupação com transações futuras e com critérios mais rigorosos e sistemáticos
para seleção e avaliação do serviço. É o caso típico recorrente em gestão de PMEs, em que os gestores tendem a manter o foco da
gestão voltado mais para a eficácia do que para a eficiência e a predileção excessiva do aproveitamento de oportunidades em
detrimento do planejamento.
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Assim, as ações estratégicas mais impactantes quanto ao desenvolvimento da contribuição dos transportes ao nível competitivo das
empresas deverão advir de uma nova situação. As ações serão mais eficazes à medida que as empresas reconhecerem possibilidades
concretas de diferenciação perante os concorrentes, originadas no transporte e na logística.
As empresas poderiam gerenciar o transporte de forma planejada e priorizar ações colaborativas e parceiras com transportadores,
com avaliação dos ganhos a serem auferidos deste melhor relacionamento. Ações que buscam o desenvolvimento gerencial, com
treinamentos e trabalhos de sensibilização temáticos em logística, podem promover estes resultados, que devem ser transversais às
áreas funcionais nos seus subsistemas (suprimentos, produção e distribuição) e nas suas atividades primárias (transporte, estoques,
informações e localização).
Porém, quanto à avaliação dos serviços, conforme alguns atributos, as empresas indicaram como o mais importante a Confiabilidade,
seguido da Segurança, da Relação com o Cliente e do Preço. Em linhas gerais, demonstraram satisfação com os serviços disponíveis
no mercado, com aprovação do serviço prestado pelas transportadoras em 86%, o que parece ser bastante relevante.
Por outro lado, os embarcadores indicaram haver gap entre a importância do serviço para os seus negócios e a avaliação do serviço
disponível nos itens mais valorados.
Parece haver uma contradição entre o fato de os embarcadores considerarem satisfatório o serviço prestado pelas transportadoras e
os gaps encontrados entre a importância e a satisfação. Contudo, uma explicação pode residir no fato de os embarcadores serem mais
rigorosos na avaliação dos fatores que mais impactam no seu negócio. Em termos gerenciais, os resultados apontam que as empresas
de menor porte parecem não estarem satisfeitas com o serviço de transporte disponibilizado para elas. O papel das transportadoras
pode ser desenvolver processos logísticos mais aplicados à realidade de empresas desse porte, bem como melhorar o canal de
comunicação com as mesmas, de forma a alinhar as expectativas do cliente e o nível de serviço oferecido.
Referências
HOLTER, A. R., GRANT, D. B., RITCHIE, J. e SHAW, N. A framework for purchasing transport services in small and medium size
enterprises. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, V. 38, no 1: pp 2138, 2008.
NG, B., FERRIN, B. G. e PEARSON, J. N. The role of purchasing/transportation in cycle time reduction. International Journal of
Operation and Production Management, v. 17, no 62, pp. 574591, 1997.
Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas. Boletim Estatístico das Micro e Pequenas Empresas. Disponível
em http://www.sebrae.org.br – Acesso em 13 de outubro de 2007.
Ricardo S. Martins
Professor do Centro de PósGraduação e Pesquisa em Administração (Cepead)/Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Extensão em Logística (NIPELOG/UFMG).
martins@cepead.face.ufmg.br
Tel.: (31) 87179564
Osmar Vieira de Souza Filho
Professor Convidado dos programas de PósGraduação em Logística da Fundação Dom Cabral e do IEC – PUCMINAS.
Pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Extensão em Logística (NIPELOG/UFMG).
osmar.br@gmail.com
Tel.: (31) 25310914
Guilherme S. Martins
Mestre e doutorando em Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (SP), na linha de pesquisa de Gestão de Operações
e Competitividade.
mr.gsmartins@gmail.com
Tel.: (11) 84143266
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