Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
RESUMO
2
1 INTRODUÇÃO
2 EUTANÁSIA
por um médico, com o consentimento daquela. Portanto, o médico, por meio de uma ação ou
omissão, faz o uso, ou omite-se, de um meio adequado e eficiente que conduza o paciente
incurável e em estado grave de sofrimento à morte. (SÁ, 2005, pg. 38-39)
A eutanásia foi dividida em duas modalidades: a eutanásia ativa e a eutanásia
passiva, que assim podem ser distinguidos, nas palavras da professora Maria Fátima Freire de
Sá (2005, pg. 39):
cristã a clara posição contrária à esta prática, conforme consta na Declaração da Sagrada
Congregação para a Doutrina da Fé, datada de 05 de maio de 1980, que:
Por eutanásia, entendemos uma ação ou omissão que, por sua natureza ou nas
intenções, provoca a morte a fim de eliminar toda a dor. A eutanásia situa-se,
portanto, ao nível das intenções e ao nível dos métodos empregados.
Trata-se, com efeito, de uma violação da lei divina, de uma ofensa à dignidade da
pessoa humana, de um crime contra a vida e de um atentado contra a humanidade.
Entende, pois, que se cria uma presunção de que todos os seguidores dos dogmas e
preceitos cristãos serão, também, opostos qualquer prática eutanásica, não se sujeitando,
tampouco autorizando a sujeição de qualquer pessoa a qual é representante legal, à adoção de
medidas eutanásicas. Mas, deixe-se claro que, trata-se de uma mera presunção, podendo
aquela pessoa ser a favor da eutanásia, mesmo sendo seguidora da fé cristã.
A eutanásia, nas suas diversas formas, vem sendo tratada no Direito pátrio como
homicídio, ainda que privilegiado. Tal previsão legal está contida no art. 121, §1º, do Código
Penal, donde se depreende que o ato de tirar a vida de outrem que se encontre em grande
sofrimento pode ser considerado motivo de relevante valor moral, motivo pelo qual aquele
que pratica o delito terá sua pena reduzida.
Homicídio simples
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou
moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação
da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (BRASIL, 2009)
enfermos, desde que se comova e sinta compaixão com o paciente acometido de grave
doença, e assim será acobertado pela causa de redução de pena.
Jonathas Lucas Wandermuren (2005, pg. 30), analisando a legislação de países como
Alemanha, França, Espanha, Estados Unidos e Holanda, constata que na “Alemanha, a
eutanásia é considerada homicídio solicitado ou homicídio a pedido, e está regulada no art.
216 do Código Penal, que estabelece pena de seis meses a cinco anos a quem praticá-la”. No
entanto, a modalidade passiva pode ser permitida caso o paciente claramente manifeste sua
vontade de morrer.
Na legislação francesa, a “prática da eutanásia é considerada assassinato e punida
como homicídio voluntário – crime previsto no Código Penal. A posição espanhola é bem
claramente exposta no comentário de José Luis de La Cuesta Armazamendi 1 (citado por
WANDERMUREN, 2005, pg. 30), que assim aduz:
fazer dois pedidos orais e um por escrito, após convencer dois médicos de que seu desejo é
sincero e a decisão é voluntária e imutável” (BUZACLO, 2006, pg. 220).
Ao final desta breve análise legislativa, percebe-se que o que prevalece nas referidas
legislações é a proibição e condenação à prática da eutanásia em sua modalidade ativa,
atenuando-se no tocante à modalidade passiva, já que em certos casos ela pode ser autorizada.
Vê-se que nas legislações em que se reconhece o direito à prática da eutanásia são
estabelecidos requisitos que levam em consideração o estado de saúde do paciente, a
manifestação de sua vontade e o ponto de vista médico.
Estruturando sua teoria sobre o Discurso Prático Racional, Alexy elabora diversas
regras e formas, com vistas a realizar a já referida correção das proposições normativas.
Assim, criaram-se categorias de regras e formas que, neste trabalho, apenas se fará menção.
São elas: as regras fundamentais, as regras da razão, as regras sobre a carga da argumentação,
as formas de argumento, as regras de fundamentação e as regras de transição.
Alexy aduz que os seguimentos das regras que se indicaram e a utilização das formas
de argumento que se descreveram aumentam certamente a probabilidade de alcançar um
acordo racional nas questões práticas, mas não garantem que se possa obter um acordo para a
questão. Prossegue, expondo que as regras da razão só podem ser cumpridas parcialmente e
que o ponto de partida do discurso são concepções normativas historicamente dadas e, por
isso, mutáveis. Assim, o autor elabora sua Teoria do Discurso Prático Racional abordando,
ainda, a possibilidade e a impossibilidade discursiva e, ao final, conclui:
Regras como estas (as regras do discurso prático geral), e também as regras
jurídicas estabelecidas por meio de procedimentos regulados por elas, são
8
propor regras que, de um lado, sejam tão fracas, isto é, tenham tão pouco conteúdo
normativo que pessoas com concepções normativas totalmente diferentes possam
estar de acordo com elas mas que, por outro lado, sejam tão fortes que uma
discussão pautada nelas possa ser qualificada como “racional” (ALEXY, 2008, pg.
47).
de sistemas jurídicos. Sendo que tal escolha determinará qual enunciado normativo singular é
afirmado. Desse modo, na base de tal ação de preferir (escolher) está a enunciação da
alternativa eleita como melhor em algum sentido e, portanto, uma valoração ou juízo de valor.
(b) Alexy, partindo das premissas de que “toda decisão jurídica toca nos interesses de pelo
menos uma pessoa” e “a questão de se a limitação aos interesses de uma pessoa é justificada
também pode ser sempre apresentada como uma questão moral”, chega ao ponto de que “ não
se trata da tese principal de que as valorações necessárias se devem considerar sempre como
morais, mas apenas de que elas são sempre relevantes moralmente”. Assim, ao final, conclui
que “o aplicador do direito deve orientar em um sentido juridicamente relevante de acordo
com valorações moralmente corretas” (ALEXY, 2008, pg. 40).
3.2 Sobre a relação entre Direito e Moral à luz da Teoria da Argumentação de Robert
Alexy
propõe um método para a solução das colisões entre princípios que será objeto de análise no
capítulo IV.
Ao final de sua obra, Robert Alexy (2008, pg. 274-281) ressalta quatro aspectos que
demonstram a vinculação do discurso jurídico com o discurso prático geral. São eles: (1) a
necessidade do discurso jurídico em virtude da natureza do discurso prático geral, (2) a
coincidência parcial com a pretensão de correção, (3) a coincidência estrutural das regras e
formas do discurso jurídico com as do discurso prático geral e (4) a necessidade de
argumentação prática de tipo geral no âmbito da argumentação jurídica.
Limitar-se-á a tecer apenas breves considerações acerca dos referidos aspectos, posto
que não é objetivo precípuo deste trabalho aprofundar na vinculação dos já citados discursos.
No que toca o primeiro ponto, R. Alexy esclarece que a necessidade do discurso jurídico
surge da debilidade das regras e formas do discurso prático geral, sendo que esta debilidade
decorre de três razões: as regras do discurso não prescrevem de que premissas devem partir os
participantes do discurso; todas as etapas da argumentação não estão fixadas e algumas regras
do discurso só podem ser cumpridas de maneira aproximada. Prosseguindo, explicita que as
razões pelas quais as normas jurídicas surgidas do processo da legislação não solucionam
todos os problemas. Dessa maneira, as razões são: a vagueza da linguagem do Direito; a
possibilidade de conflitos normativos; a possibilidade de casos que exijam uma regulação
jurídica e a possibilidade de decidir em casos especiais contra a literalidade da norma.
Com relação à coincidência parcial com a pretensão de correção, o autor aduz que
esta pretensão não “se refere à necessidade absoluta de racionalidade dos enunciados
normativos em questão, mas à sua fundamentabilidade racional no âmbito do ordenamento
jurídico vigente. A racionalidade da argumentação jurídica, na medida em que é determinada
pela lei, é por isso sempre relativa à racionalidade da legislação” (ALEXY, 2008, pg. 276).
No que diz respeito ao terceiro ponto, têm-se coincidências estruturais das regras e
formas de ambos os discursos. Primeiro, as regras e formas da justificação interna submetem-
se ao princípio da universalidade, assim, esse mesmo princípio constitui o fundamento tanto
do discurso prático geral como do discurso jurídico. Segundo, em ambas as formas de
discurso são necessárias regras de presunção racional, visto que o saber empírico necessário
frequentemente não pode ser adquirido com a certeza devida. Terceiro, a Ciência do Direito
dogmática pode ser entendida como a institucionalização estável do discurso prático sob a
12
Ao final de sua obra, Robert Alexy (2008, pg. 279) constata que a argumentação
jurídica se desenvolve segundo formas, de acordo com determinadas regras e sob certas
condições, e permanece dependente da argumentação prática geral, de modo que essa
dependência consegue amenizar as debilidades do discurso prático geral, mas não eliminá-las.
Alexy verifica que sua Teoria da Argumentação Jurídica inadequada àqueles que
procuram em uma teoria um procedimento que garanta a segurança do resultado. Isso por que
afirma que nem nas Ciências Naturais se pode falar da formação de uma segurança definitiva,
e vai além esclarecendo que o simples fato de não se poder alcançar segurança, não pode ser
visto como razão para se negar à Ciência do Direito seu caráter de ciência ou de atividade
racional.
Ainda, aduz que o caráter de ciência não é constituído pela produção de segurança,
mas pelo “cumprimento de uma série de condições, critérios ou regras” (ALEXY, 2008, pg.
279).
Com relação à pretensão de correção, esclarece que o discurso jurídico inclui as
regras e formas do discurso prático geral e, desse modo, constituem um critério de correção
para as decisões jurídicas, já que na argumentação jurídica são necessários argumentos
2
Vide ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da
Justificação Jurídica. 2º edição. Reimpressão. São Paulo: Landy, 2008. Pg. 276-278.
13
práticos gerais. No entanto, a teoria do discurso jurídico também padece dessas inseguranças
do discurso prático geral como critério hipotético de correção de enunciados normativos,
tornando inútil a teoria do discurso como critério de correção, levando ao ponto de que um
juízo sobre a correção de uma decisão tenha sempre um caráter provisório, portanto, podendo
ser refutado (ALEXY, 2008, pg. 280).
Ao final das considerações que acima foram tecidas, verificou-se que a Teoria da
Argumentação Jurídica, por si só, não é capaz de fundamentar a efetivação do direito de
eutanásia no Ordenamento Jurídico Brasileiro, isso por que não se trata apenas de racionalizar
a decisão jurídica que conceda um provimento judicial no sentido de que autorizar a prática da
eutanásia. Sua justificação no âmbito jurídico brasileiro depende de uma teoria que tenha o
condão de resolver as colisões entre princípios e regras que inevitavelmente surgirão ao se
debater acerca da autorização ou proibição da medida eutanásica. Por isso, encontramos na
obra Teoria dos Direitos Fundamentais, também de autoria de Robert Alexy, a proposta de
um método capaz de solucionar os conflitos normativos que surgirão. Assim, o capítulo V
deste trabalho utilizará tudo o que até agora foi exposto e, ainda, a fórmula da ponderação
elaborada por Robert Alexy com vistas a buscar uma justificativa racional, principiológica e
normativa para a autorização do exercício do Direito Brasileiro.
Segundo Thomas Bustamante (2006, pg. 86), nem os princípios e nem as regras
regulam por si mesmos a sua própria aplicação. Explica, ainda, que o nível dos princípios e
das regras expressam o lado passivo do sistema jurídico, sendo completados com o nível da
argumentação jurídica, que corresponde ao lado ativo da fundamentação de decisões jurídicas
e possui a tarefa de dizer como, sobre a base dos dois primeiros níveis, é possível uma decisão
racionalmente fundamentada.
Surge um problema quando da aplicação dos princípios, fazendo nascer a
necessidade de regras argumentativas específicas para a argumentação jurídica em geral,
momento no qual inaugura-se a teoria da argumentação jusfundamental. Esse caso especial
da teoria da argumentação jurídica está substancialmente caracterizada por ter incorporado a
denominada máxima da proporcionalidade.
alguma maneira um outro princípio P2, M1 está proibido por P2” (BUSTAMANTE, 2006, pg.
88). Já a exigência de necessidade “estabelece que a medida empregada deve considerar,
sempre, o meio mais benéfico ao destinatário” (CADEMARTORI, 2006, pg. 137). Constitui-
se, dessa maneira, sua regra: “Se há dois meios (M 1 e M2) para fomentar um fim F, exigido
pelo princípio P1, sendo que cada um deles promove o fim na mesma medida, mas M 1
interfere na realização do princípio P2 em maior medida que M2, então deve ser empregado o
meio M2 (BUSTAMANTE, 2006, pg. 88-89).
A regra da proporcionalidade em sentido estrito se segue da relativização dos
princípios jurídicos ante as possibilidades normativas. Tem-se que os motivos que
fundamentam uma medida que restrinja de alguma maneira um direito fundamental devem ter
peso suficiente para preponderar sobre o direito fundamental afetado por ela, encontrando
condições de justificar a sua restrição, portanto, é esta a função dessa regra, justificar a
restrição de um princípio que interfira na satisfação de um outro princípio.
Nota-se, pois, que a regra da proporcionalidade em sentido estrito trata-se de uma
estrutura formal de aplicação de princípios constitucionais, que somente permite controlar a
restrição e a otimização de princípios depois que o intérprete tenha atribuído os pesos
específicos aos princípios colidentes (BUSTAMANTE, 2006, pg. 89).
O que se pode perceber do exposto é que enquanto as regras de adequação e de
necessidade consideram as possibilidades fáticas advindas do caso concreto, a regra da
ponderação em sentido estrito, considera as possibilidades jurídicas.
“Quanto maior é o grau de não satisfação ou de afetação de um dos princípios, tanto maior
deve ser a importância da satisfação do outro” (BUSTAMANTE, 2006, pg. 89-90).
“Quanto maior for o grau de interferência em um princípio [Pi], maior deve ser a
importância em se realizar um outro [Pj]” (GUERRA, 2006, pg. 55).
Analisando a referida lei, T. Bustamante (2006, pg. 90) verifica que a “ponderação
ou pesagem deve-se fazer em três planos sucessivos: no primeiro plano, ‘há de se definir a
intensidade da intervenção’; no segundo, é necessário ‘saber a importância dos fundamentos
justificadores da intervenção’; no terceiro, realiza-se a ‘ponderação em sentido específico e
estrito’. Nesse último estágio, trata-se de uma valoração dos pesos relativos dos princípios
jurídicos em tela, a fim de se estabelecer a relação de precedência condicionada entre eles”.
Nos últimos anos, esse modelo de ponderação tem sido sofisticado, culminando com
uma fórmula de ponderação que estabeleceu um modelo aritmético de pesagem dos princípios
colidentes, cuja finalidade é tornar mais explícitas as escolhas envolvidas no processo de
argumentação jusfundamental e as formas de restrição do âmbito de aplicação dos princípios
jurídicos.
graduar a restrição e a realização dos princípios jurídicos, vez que a fórmula de subsunção
mostra-se insuficiente para este propósito. Desse modo, importa para a Fórmula da
Ponderação valer-se de um modelo aritmético apto a fornecer um parâmetro para graduar a
intervenção de um princípio P1 e a satisfação do seu princípio contrário (P2).
Como dito acima, a fórmula de ponderação vale-se de alguns pontos para se chegar
ao peso relativo de cada princípio colidente. Assim, tratar-se-á brevemente de cada um deles
para, ao final, aportar-se na estrutura da Fórmula de Ponderação.
Deve-se observar que na aplicação da tão tratada fórmula, voltada a determinar qual
dos valores ou princípios em rota de colisão deve ser considerado mais relevante, será
necessário argumentar acerca:
Wi,j = Wi . Ii. Ri
Wj . Ij . Rj
18
Da fórmula acima transcrita nada se pode inferir, caso não seja decifrado o
significado de cada um de seus elementos. Desse modo, segue abaixo o significado de uma
das partes da fórmula, que nada mais são do que expressões formais das variáveis da Fórmula
de Alexy.
Com o fim de superar essa necessidade, Robert Alexy sugere a adoção de um modelo
triádico, em que tais grandezas consistam nos valores sério (s), moderado (m) e leve (l). Tais
valores consistirão nas grandezas a serem atribuídas às referidas variáveis da Fórmula de
Ponderação. É importante perceber que o modelo proposto evita as incertezas e os exageros
de uma metrificação dos princípios constitucionais e classifica e organiza a restrição e o
cumprimento ótimo dos princípios segundo categorias compreensíveis.
marido de Terry, Robert and Mary Schindler, pais de Terry, diversos juízes do Estado da
Flórida, a Suprema Corte Americana, o governador do Estado da Flórida, o Presidente dos
Estados Unidos, além de diversos segmentos da sociedade.
Nos idos de 1990, Terry Schiavo sofreu uma parada cardíaca que a conduziu à falta
de oxigenação do cérebro e, como consequência, ocasionou uma severa lesão cerebral
irreversível, sendo posteriormente diagnosticado estado vegetativo permanente. As causas da
parada cardíaca não são precisas, apenas cogitando-se que possam estar associadas a algum
distúrbio alimentar.
Dessa forma, em permanente estado vegetativo, passou Terry Schiavo a ser
alimentada por tubos. No início, Michael, Robert e Mary Schindler uniram esperanças e
esforços buscando tratamentos reabilitatórios, sendo que Michael iniciou um curso de
enfermagem para aperfeiçoar-se nos cuidados de sua esposa, segundo próprio testemunho
judicial. No entanto, em fevereiro de 1993, Michael e Terry ganharam em uma ação judicial,
proposta contra um médico de Terry, aproximadamente um milhão e meio de dólares. E, em
meados de 1993, Michael, “guardião legal” de Terry, ingressou no judiciário com um pedido
de “Do Not Ressucitate – DNR”, que é um documento no qual consta a vontade de que
determinada pessoa, ao sofrer uma parada cardíaca ou respiratória não receba procedimentos
de ressuscitação, ou não seja submetida a procedimentos de prolongação da vida. Alegava
Michael S. que Terry já havia se manifestado no sentido de não se submeter àquele tipo de
tratamento, caso se encontrasse naquele estado. Muito se discutiu se Michael pretendia a
retirada da sonda de alimentação e hidratação em virtude da vontade de Terry e dos diversos
laudos médicos que atestavam que não havia quaisquer possibilidades de melhora ou
tratamentos, ou se ele estava somente interessado na quantia em dinheiro que acabara de
receber na ação judicial.
Neste momento, iniciou-se todo o conflito entre Michael Schiavo (marido) e Robert e
Mary Schindler (pais). Toda a batalha judicial, que durou quinze anos, girou em torno da
guarda legal de Terry, da quantia recebida a título de indenização e da remoção dos tubos que
a alimentavam, sendo que, por ordem judicial, se chegou a removê-los por três vezes e, logo
em seguida, foram recolocados.
O caso Terry Schiavo foi muito longo e complexo, com muitas decisões judiciais pró
e contra as pretensões de Michael Schiavo, e com a ocorrência de diversos fatos durante a
batalha judicial, tal qual o possível envolvimento de Michael com Jodi Centonze, ocorrido
enquanto ele ainda se encontrava casado com Terry.
21
De início, cabe serem feitas algumas considerações, para que esta análise e a
proposta dos autores possam ser compreendidas com maior clareza. No capítulo anterior, foi
feito um breve histórico do caso Terry Schiavo, relatando, de modo sucinto, os principais
acontecimentos. Impende esclarecer que não se intenta realizar uma relato biográfico da vida
de Terry, constando todos os momentos de sua vida, mas somente utilizar as questões factuais
e jurídicas que foram levantadas para que possa analisá-los sob o prisma de um pensamento
jurídico. Por outro lado, utilizaremos o estudo do caso norte-americano como um exercício de
direito comparado quando, então, será feita uma análise do referido caso dentro do
ordenamento jurídico brasileiro.
Como tratado no capítulo III, a proposta de Robert Alexy com sua Teoria da
Argumentação Jurídica é a questão da possibilidade de se fundamentar logicamente as
decisões judiciais. Assim, propôs Alexy uma série de critérios capazes de indicar a
racionalidade de decisões fundadas em juízos de valor, com a criação de um catálogo de
regras que deveriam ser seguidas com o fito de se obter decisões judiciais racionais.
Todo o caso Terry Schiavo ocorreu nos Estados Unidos, sendo que foi naquele local
onde se desenvolveu todos os debates girando em torno da sociedade civil, toda a disputa
judicial, toda a colheita de provas, oitiva de testemunhas, pareceres médicos, tudo submetido
ao Direito norte-americano (de matriz diferente da brasileira – Common Law) e, ao final, a
sentença que determinou a retirada dos tubos de alimentação. Esclarecemos o leitor que o
presente artigo não se fundou nos autos originais do processo não sendo possível, portanto,
uma análise final sobre a correção da decisão judicial que determinou a retirada dos tubos.
Todavia, através da bibliografia secundária nos foi possível acessar elementos
considerados suficientes para proceder a avaliação da decisão judicial dentro da proposta
teórica de Alexy, isto é, a pesquisa reconstruiu os argumentos e as situações fáticas (da
melhor forma possível) para, aplicando a teoria da ponderação, estabelecer um grau de
objetividade e correição da sentença final. Logo, a presente análise se valeu das informações
22
obtidas em livros, artigos e sites que tratam sobre o caso Terry Schiavo, com uma seleção
criteriosa e rigorosa por parte dos pesquisadores.
É cediço que o caso Terry Schiavo foi uma disputa judicial norte-americana, e para
que possamos desenvolver o trabalho proposto, deverá ser realizado um transporte dos dados
factuais e, em alguma medida, jurídicos para essa análise, que não terá somente por base o
pensamento de Robert Alexy, mas, também, aspectos do Direito Brasileiro. A presente análise
utiliza a Fórmula da Ponderação e busca justificar racionalmente uma decisão judicial pondo
fim à colisão dos princípios envolvidos.
Ao se deparar com uma colisão de princípios o intérprete deve valer-se de um
critério hermenêutico de ponderação de valores fundamentais denominado por R. Alexy de
máxima da proporcionalidade. É de observar que três são as regras de argumentação que
compõem essa ferramenta metodológica: (1) a exigência de adequação, (2) a exigência de
necessidade e (3) a proporcionalidade em sentido estrito.
O que deve ficar claro é que, para que se chegue ao ponto de sopesar princípios, com
a utilização da ponderação em sentido estrito, a qual é traduzida pela Fórmula de
Ponderação, deve-se não ter logrado êxito na solução do caso concreto utilizando-se da
adequação e da necessidade.
Desta maneira, quando da utilização da primeira regra, a exigência de adequação,
devemos, primeiramente, definir quais os princípios e suas finalidades que estão em jogo.
Desse modo, se compreenderá que o direito à vida e o direito à liberdade são os dois
princípios, sendo que a finalidade do direito à vida é a
manutenção/preservação/conservação/respeito da vida do ser humano, e a finalidade do
direito à liberdade é a garantia de uma vontade livre, de livres escolhas, de autodeterminação
do destino. Entende-se, pois, que o meio para que seja o direito à vida satisfeito é
conservando-se os tubos de alimentação em Terry Schiavo, meios aptos à manutenção da vida
de Terry. Já no que concerne o direito à liberdade, o meio utilizado para ver sua finalidade
atendida é com a retirada dos tubos de alimentação, que conduziriam Terry ao óbito, mas
atenderiam à possível vontade dela de não se ver submetida àqueles procedimentos, optando
pela morte.
O que acontece é que ambos os meios são aptos a realizar as finalidades exigidas
pelos princípios em jogo, portanto, são meios exigidos pelos princípios. Todavia, a realização
de um meio para a satisfação da finalidade exigida por um dos princípios, interfere no outro
princípio, e vice-versa. Deste modo, não é impossível solucionar este caso concreto somente
23
com a utilização da adequação, posto que a aplicação dos dois princípios está em rota de
colisão.
Passando, então, para a segunda regra, tem-se que se ater para o fato de que ela exige
que a “medida utilizada deve considerar sempre o meio mais benéfico ao destinatário”. Ora, o
que se tem neste caso é que somente há um meio de satisfazer o princípio do direito à vida, e
somente um de satisfazer o princípio do direito à liberdade. Ainda mais, impede saber o que é
meio mais benéfico para Terry Schiavo, o que não foi determinado. Portanto, resta claro que a
regra da exigência de necessidade não é suficiente para solucionarmos a colisão de princípios
em jogo.
Aportando-se na chamada situação ideal de sopesamento, passaremos a analisar o
caso Terry Schiavo utilizando a Fórmula de Ponderação, visando-se chegar a uma solução
para o conflito de princípios que se entende surgido quando das disputas acerca da retirada
dos tubos de alimentação.
Primeiramente, devemos advertir o leitor que numa leitura positivista/legalista do
ordenamento jurídico brasileiro não é admitido nenhuma das modalidades de eutanásia (ativa
ou passiva). Logo, dentro dessa ótica, caso a eutanásia seja praticada, seu autor deverá ser
responsabilizado nos termos da norma insculpida no art. 121, §1º do Código Penal: homicídio
privilegiado. Todavia, com o marco teórico adotado, entende-se pela possibilidade de se obter
um provimento judicial, principiologicamente justificado, que autorize que ação de retirada
dos tubos de alimentação, com a conseqüente morte da paciente, não seja enquadrado neste
tipo penal, de modo a isentar os praticantes da eutanásia de qualquer responsabilidade penal.
Portanto, pelo exposto, iniciaremos explicitando quais princípios estão em rota de
colisão: o direito à vida e o direito à liberdade.
Tecendo breves comentários acerca destes. Tem-se que o direito à vida, nas palavras
de Paulo Gustavo Gonet Branco (2009, pg. 393) é “pressuposto elementar de todos os demais
direitos e liberdades [...]”. Consta na Convenção Americana dos Direitos Humanos – o Pacto
de San José –, de1969 (Ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 2002), em seu artigo 4º,
que “toda pessoa tem o direito de que se respeite a vida. [...] esse direito deve ser protegido
pela lei e, em geral, desde o momento da concepção [...] ninguém pode ser privado da vida
arbitrariamente”. Guilherme Peña de Moraes (2008, pg. 31) aduz que se encontra no direito à
vida uma perspectiva referente ao direito ao próprio corpo que “é pertencente à integridade
física do organismo, assegurado pela proibição de tratamento que contrarie a dignidade da
pessoa humana”.
24
após sua satisfação, não haveria possibilidade de reversibilidade da decisão. Ainda mais,
deve-se levar em consideração o fato de que Terry não deixou qualquer documento
confirmando sua vontade livre de não se submeter àqueles procedimentos. Ao final, entende-
se que, com a satisfação do direito à vida (e a omissão do direito de liberdade) Terry estará
viva, e a qualquer momento, poderão os tubos alimentares serem retirados. No entanto,
satisfeito o princípio do direito à liberdade, com a conseqüente morte de Terry, tal decisão
será irrevogável. Portanto, no seio do que foi exposto, entende-se que à variável Iv,
concernente ao princípio do direito à vida, será atribuído o grau sério, cujo valor aritmético é
4. E, à variável Il, concernente ao princípio direito à liberdade, será atribuído o grau médio,
cujo valor aritmético é 2.
Por fim, parte-se para a última variável, simbolizada pela letra R, que trata das
evidências disponíveis para fundamentar, racionalmente, o grau de interferência dos
princípios em conflito ou o grau de confiabilidade das premissas empíricas utilizadas na
argumentação. Deste modo, inicialmente, tratar-se-á das evidências tocantes ao direito à vida.
Temos como evidências que suportam a satisfação do direito à vida, a constante luta dos pais
de Terry para que não fossem retirados os tubos de alimentação. Segundo eles, Terry era
seguidora da fé católica, evidência que pressuporia sua não aceitação de procedimentos
eutanásicos. Ainda, a despeito das alegações do seu marido, Terry Schiavo não deixou
qualquer documento manifestando sua não aceitação a procedimentos de prolongação da vida.
Deve-se levar também em consideração que Terry se encontrava em estado vegetativo, ou
seja, impossível de manifestar sua vontade. Durante o curso da batalha judicial, aconteceram
diversos fatos escusos. Tem-se que Terry e Michael ganharam uma ação judicial milionária
em fevereiro de 1993 e em meados do mesmo ano Michael ingressou no judiciário com um
pedido de retirada da sonda de alimentação e hidratação. Além do que, durante o curso do
processo, se envolveu com outra mulher, sendo que estava casado com Terry e era seu
“guardião legal”. Muitos fatos, pouco claros, levam a considerar que as evidências utilizadas
para sustentar a satisfação do princípio do direito à vida são médias, motivo pelo qual se
entende que se deve atribuir o valor 4.
Agora, passa-se para as considerações acerca das evidências concernentes ao
princípio do direito à liberdade. Nesta variável, pode-se levar em consideração,
primeiramente, a existência de diversos laudos médicos atestando que Terry se encontrava em
estado vegetativo permanente, sem chances de cura, sem perspectivas de melhora e sem a
existência de qualquer tratamento. Ainda, haveria a suposta vontade de Terry em não se
submeter àqueles procedimentos, que expressa por seu marido Michael Schiavo. Todavia, tal
26
manifestação de vontade de Terry não foi documentada, sendo somente alegada por Michael.
Além disso, os pais de Terry a contestavam alegando ser Terry católica e contrária a práticas
eutanásicas. Portanto, as evidências que sustentam o referido princípio são estas, que acredita-
se não serem totalmente fortes e decisivas para se afirmar que havia uma vontade livre e
consciente de Terry em não se submeter àqueles procedimentos. Dessa maneira, entende-se
que à esta variável deve ser atribuído do grau médio, com valor aritmético correspondente a 2.
Por fim, preenchidas as variáveis, convém inseri-las na fórmula de ponderação:
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se, também, que com tal Fórmula, resta de modo inequívoco, demonstrada a
total impossibilidade de se estabelecer uma rígida hierarquia entre valores constitucionais,
sendo descartada uma hierarquia absoluta e pré-estabelecida entre princípios, já que o grau de
interferência concreta de um princípio em benefício do outro e as evidências sobre isso podem
dar um peso concreto maior àquele de menor peso abstrato.
Como visto, procedeu-se com o sopesamento de princípios com a aplicação da
Fórmula da Ponderação em tese, ou seja, este procedimento se deu fora de um processo
judicial posto que não dispunhamos dos autos processuais. Mesmo assim foi possível a
aplicação da fórmula obtendo-se o resultado da prevalência do princípio do direito à vida
sobre o direito à liberdade. Todavia, como exposto, tal prevalência poderia ser a inversa,
desde que vigorassem outras condições factuais, embasando um outro corpo argumentativo,
de modo a preencher as variáveis com outros valores.
Percebe-se, pois, que analisado o caso Terry Schiavo sob a ótica da Fórmula de
Ponderação de Robert Alexy, e tendo em vista os aspectos concernentes ao direito brasileiro,
o resultado da ponderação não fundamentou uma autorização judicial de retirada dos tubos de
alimentação e hidratação de Terry. E, caso retirado fossem, incorrer-se-ia no crime de
homicídio privilegiado.
No entanto, apesar do resultado obtido, entende-se ainda pela possibilidade de
obtenção de um provimento judicial que autorize a eutanásia, obtido por meio da aplicação do
pensamento de Robert Alexy. Mas, mediante condições fáticas favoráveis, que viabilizem, por
meio de argumentos racionais, o preenchimento das variáveis de modo a prevalecer o
princípio do direito à liberdade.
8 BIBLIOGRAFIA
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Teoria & Direito Público. Tradução
Virgílio Afonso da Silva da 5º Edição alemã. São Paulo: Malheiros Editora. 2008.
BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Sobre o conceito de norma jurídica e a função dos
enunciados empíricos na argumentação jurídica de Friedrich Müller e Robert Alexy. In:
Revista de Direito Constitucional e Internacional, v.11, n.43, p.98-109, abr./jun., 2003.
28
CARVALHO, Gisele Mendes de. Ainda sobre a eutanásia: é possível justificar o homicídio
piedoso mesmo sem contar com o consentimento da vítima? In: Boletim IBCCRIM, v.14,
n.169, p.13, dez., 2006.
FINDLAW: Terri Schiavo Case: Legal Issues Involving Healthcare Directives, Death, and
Dying. Estados Unidos da América. <http://news.findlaw.com/legalnews/lit/schiavo/>.
Acesso em: 10 abr. 2010.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.
Curso de Direito Constitucional. 4º Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria dos Direitos Fundamentais.
Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008.
TOMASEVICIUS, Eduardo Filho. Direito Civil entre a vida e a morte. In: Revista da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, n.100, p.433-471, jan./dez., 2005.
SÁ, Maria de Fátima Freire de. Direito de morrer: eutanásia, suicídio assistido - 2. ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 2005. 154p.
_______. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 9º Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado.
2007.