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DIREITO À EUTANÁSIA: UMA ANÁLISE DO CASO TERRY SCHIAVO À LUZ DO


PENSAMENTO DE ROBERT ALEXY

RIGHT TO EUTHANASIA: AN ANALYSIS OF TERRY SCHIAVO CASE IN THE


LIGHT OF THOUGHT ROBERT ALEXY

Bruno Camilloto Arantes*


Mestre em Direito pela UFMG
Especialista e Bacharel em Direito pela UFOP
Professor Assistente II do Departamento de Direito da UFOP

Henrique Gonçalves Neves*


Bacharel em Direito pela UFOP
Pós-graduando em Direito Público pelo Centro de Atualização em Direito

RESUMO
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1 INTRODUÇÃO

O direito à eutanásia tem sido um tema muito controverso, estando no cerne de


vários debates sobre o direito à vida, o direito à morte, o direito à liberdade de cada indivíduo
se autodeterminar. O presente artigo procura trabalhar os aspectos concernentes à eutanásia de
modo a esclarecê-los, e estimular a comunidade acadêmica a promover debates mais
profícuos e intensos, posto que esta temática envolve, quiçá, os direitos mais importantes do
homem.
Assim, nas linhas abaixo, contém a análise do caso Terry Schiavo sob a luz do
pensamento do alemão Robert Alexy. A referida análise, muito mais que uma tentativa de por
fim a um conflito entre princípios jurídicos que emerge quando se busca no poder judiciário
um provimento judicial que autorize a prática da eutanásia, é a tentativa de encontro de uma
justificação legal, racional e principiológica para o exercício deste direito.

2 EUTANÁSIA

2.1 Eutanásia e suicídio assistido: definições e distinções

Cabe, inicialmente, tecer considerações que possam delimitar o objeto de estudo. A


eutanásia traz ínsito um conteúdo médico, ético-religioso, cultural, sociológico e jurídico, vez
que está intimamente ligada à vida dos seres humanos.
Portanto, neste primeiro momento, é importante definir o que seja a eutanásia e
distingui-la de outros procedimentos que com ela se assemelhem e possam conduzir à
incompreensão e/ou a uma percepção incorreta, resultando em uma análise e conclusão
totalmente errôneas.
Etimologicamente, a palavra eutanásia deriva dos vocábulos gregos eu (boa) e
thanatos (morte), podendo ser traduzido, assim, como “boa morte”, “morte apropriada”,
morte piedosa, morte benéfica, fácil, crime caritativo, ou simplesmente, direito de matar. O
termo eutanásia, historicamente, teve diversos significados, sendo entendido sob diversas
perspectivas. Mas, atualmente, a nomenclatura eutanásia vem sendo utilizada como a ação
médica que tem por finalidade abreviar a vida de pessoas.
A eutanásia, então, configura-se como óbito de uma pessoa, que se encontra
padecendo de grave doença, sem chances de cura ou de melhora do quadro clínico, promovida
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por um médico, com o consentimento daquela. Portanto, o médico, por meio de uma ação ou
omissão, faz o uso, ou omite-se, de um meio adequado e eficiente que conduza o paciente
incurável e em estado grave de sofrimento à morte. (SÁ, 2005, pg. 38-39)
A eutanásia foi dividida em duas modalidades: a eutanásia ativa e a eutanásia
passiva, que assim podem ser distinguidos, nas palavras da professora Maria Fátima Freire de
Sá (2005, pg. 39):

Há dois elementos envolvidos na eutanásia, que são a intenção e o efeito de ação. A


intenção de realizar a eutanásia pode gerar uma ação, daí tem-se “eutanásia ativa”,
ou omissão, ou seja, a não-realização da ação que teria indicação terapêutica naquela
circunstância – “eutanásia passiva” ou ortotanásia. Em outras palavras, a eutanásia
ativa seria uma proposta de promover a morte mais cedo daquela que se espera, por
motivo de compaixão, ante o sofrimento insuportável.

É importante se observar que em ambos os casos a conseqüência é a morte do


paciente incurável e em estado de grave sofrimento. O que diferencia essas práticas é que,
enquanto na eutanásia ativa o médico adota certos procedimentos que irão conduzir o paciente
ao óbito de modo mais célere, na outra, o médico se omite de adotar procedimentos
terapêuticos, aguardando que sobrevenha a morte.
Por fim, observa-se a existência do suicídio assistido, que ocorre quando “a
pessoa que sofre de moléstia incurável solicita interferência de terceiros para levá-la à morte”
(WANDERMUREN, 2005, pg. 28). Esta distinção foi bem explicitada por Dialas Costa
Ribeiro (citado por SÁ, 2005, pg. 40), escrevendo que “na eutanásia, o médico age ou omite-
se [...]. No suicídio assistido, a morte não depende diretamente da ação de terceiro. Ela é
conseqüência da ação do próprio paciente, que pode ter sido orientado, auxiliado ou apenas
observado por esse terceiro.”

2.2 A eutanásia sob a ótica do Cristianismo

É notório que o Cristianismo é a religião que mais caracteriza a sociedade


ocidental. E negar tal fato, é negar a influência que ela desempenha em nosso modo de vida e
de pensar, na história, literatura, filosofia, arquitetura e artes.
A Igreja Católica Apostólica Romana considera a vida humana como sendo “o
fundamento de todos os bens, a fonte e a condição necessária de toda a atividade humana e de
toda a convivência social”. Assim, pode-se notar quando da análise da eutanásia sob a ótica
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cristã a clara posição contrária à esta prática, conforme consta na Declaração da Sagrada
Congregação para a Doutrina da Fé, datada de 05 de maio de 1980, que:

Por eutanásia, entendemos uma ação ou omissão que, por sua natureza ou nas
intenções, provoca a morte a fim de eliminar toda a dor. A eutanásia situa-se,
portanto, ao nível das intenções e ao nível dos métodos empregados.

Trata-se, com efeito, de uma violação da lei divina, de uma ofensa à dignidade da
pessoa humana, de um crime contra a vida e de um atentado contra a humanidade.
Entende, pois, que se cria uma presunção de que todos os seguidores dos dogmas e
preceitos cristãos serão, também, opostos qualquer prática eutanásica, não se sujeitando,
tampouco autorizando a sujeição de qualquer pessoa a qual é representante legal, à adoção de
medidas eutanásicas. Mas, deixe-se claro que, trata-se de uma mera presunção, podendo
aquela pessoa ser a favor da eutanásia, mesmo sendo seguidora da fé cristã.

2.3 Aspectos jurídicos da eutanásia


2.3.1 A eutanásia no Direito Brasileiro

A eutanásia, nas suas diversas formas, vem sendo tratada no Direito pátrio como
homicídio, ainda que privilegiado. Tal previsão legal está contida no art. 121, §1º, do Código
Penal, donde se depreende que o ato de tirar a vida de outrem que se encontre em grande
sofrimento pode ser considerado motivo de relevante valor moral, motivo pelo qual aquele
que pratica o delito terá sua pena reduzida.

Homicídio simples
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou
moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação
da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (BRASIL, 2009)

O problema que se percebe é que essa consideração jurídica da eutanásia no direito


brasileiro oferece lacunas e imprecisões que acabam por concentrar a eutanásia menos no
paciente que será destinatário do procedimento eutanásico do que no agente que realiza o
procedimento. Ora, a letra legal que prevê a causa de redução de pena quando do
cometimento do homicídio privilegiado leva em consideração o sentimento do agente para
com o paciente, e não o estado de saúde em que este se encontra, tampouco sua vontade. Ou
seja, ao agente é habilitado “dar” a morte sob a legítima eutanásica a qualquer classe de
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enfermos, desde que se comova e sinta compaixão com o paciente acometido de grave
doença, e assim será acobertado pela causa de redução de pena.

2.3.2 A eutanásia no Direito comparado

Jonathas Lucas Wandermuren (2005, pg. 30), analisando a legislação de países como
Alemanha, França, Espanha, Estados Unidos e Holanda, constata que na “Alemanha, a
eutanásia é considerada homicídio solicitado ou homicídio a pedido, e está regulada no art.
216 do Código Penal, que estabelece pena de seis meses a cinco anos a quem praticá-la”. No
entanto, a modalidade passiva pode ser permitida caso o paciente claramente manifeste sua
vontade de morrer.
Na legislação francesa, a “prática da eutanásia é considerada assassinato e punida
como homicídio voluntário – crime previsto no Código Penal. A posição espanhola é bem
claramente exposta no comentário de José Luis de La Cuesta Armazamendi 1 (citado por
WANDERMUREN, 2005, pg. 30), que assim aduz:

À luz do Código Penal (espanhol), consideram-se despenalizadas tanto a eutanásia


passiva (a não-prolongação artificial da vida), como a eutanásia ativa indireta
(auxílio à morte com abreviação da vida, através de tratamentos paliativos que
antecipem a morte), se se conta com a vontade séria e inequívoca do doente”.

Depreende-se, pois, da citação acima que a legislação espanhola aporta-se na


autonomia da vontade do paciente para poder determinar qual a consideração e consequência
jurídica será atribuída à eutanásia.
Desde 2001, quando o senado holandês aprovou a lei da eutanásia, é autorizada neste
país o direito à sua prática. A referida lei autoriza que, em certas circunstâncias, médicos e
enfermeiras ajudem um paciente a morrer, mediante o preenchimento de requisitos
estabelecidos previamente, são eles: a) o paciente deve ter longa relação com o médico que
praticará a eutanásia; b) o pedido deve ser feito de forma voluntária; c) o paciente deve estar
acometido de doença incurável e com dores insuportáveis; d) deve haver parecer de um
segundo médico sobre o caso.
No que diz respeito aos Estados Unidos, a questão da eutanásia não é pacífica. Após
a decisão da Suprema Corte determinando que o assunto deveria ser decidido pelos Estados, o
Estado de Oregon, em 1997, legalizou a eutanásia. Determinou a legislação que “as pessoas
que buscassem a eutanásia deveriam ser doentes terminais com menos de seis meses de vida e
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Revista Jurídica Consulex, nº 114.
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fazer dois pedidos orais e um por escrito, após convencer dois médicos de que seu desejo é
sincero e a decisão é voluntária e imutável” (BUZACLO, 2006, pg. 220).
Ao final desta breve análise legislativa, percebe-se que o que prevalece nas referidas
legislações é a proibição e condenação à prática da eutanásia em sua modalidade ativa,
atenuando-se no tocante à modalidade passiva, já que em certos casos ela pode ser autorizada.
Vê-se que nas legislações em que se reconhece o direito à prática da eutanásia são
estabelecidos requisitos que levam em consideração o estado de saúde do paciente, a
manifestação de sua vontade e o ponto de vista médico.

3 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO


JURÍDICA DE ROBERT ALEXY

Robert Alexy, no primeiro parágrafo da introdução à sua obra Teoria da


Argumentação Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação
Jurídica (2008, pg. 33), expõe que “em um grande número de casos, a decisão jurídica que
põe fim a uma disputa judicial, expressa em um enunciado normativo singular, não se segue
logicamente das formulações das normas jurídicas que se supõem vigentes, juntamente com
os enunciados empíricos que se devam reconhecer como verdadeiros ou provado”.
Com a finalidade de facilitar a compreensão do exposto, impõe explicitar a distinção
entre norma e enunciado normativo para o autor. Assim, entende Alexy que “norma é o que
está ordenado, proibido ou permitido, ao passo que um enunciado normativo é a expressão
verbal de uma norma. Nos exatos termos de Alexy, ‘uma norma é o significado de um
enunciado normativo’ é ‘aquilo que um enunciado normativo expressa’ (BUSTAMANTE,
2003, pg. 106). Nesse sentido, o enunciado normativo singular “contém uma proposição ou
determinação sobre o que está ordenado, proibido ou permitido a determinadas pessoas”
(ALEXY, 2008, pg. 37). Já no que diz respeito à idéia de enunciados empíricos, extrai-se que
estes são “determinadas regras que regem de fato, isto é, são seguidas em medida suficiente,
ou que os resultados singulares produzidos de acordo com determinadas regras correspondem
às convicções normativas realmente existentes (ALEXY, 2008, pg. 186).
Realizadas estas breves considerações conceituais, retomam-se às ideias de Alexy,
que expõe os motivos da não logicidade das decisões jurídicas, citando quatro razões: “a
imprecisão da linguagem do Direito, a possibilidade de conflito de normas, a possibilidade de
haver casos que requeiram uma regulamentação jurídica [...], a possibilidade, em casos
especiais, de uma decisão que contrarie a literalidade da norma” (ALEXY, 2008, pg. 36).
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Diante do problema da fundamentação lógico-racional das decisões jurídicas,


entendeu Alexy a possibilidade de estabelecer critérios capazes de indicar a racionalidade de
decisões fundadas em juízos de valor, valendo-se para tanto de um catálogo de regras,
extraídas de uma Teoria do Discurso Prático Racional Geral, juntamente com um catálogo
adicional de regras válidas especialmente para fundamentação de valorações jurídicas
(BUSTAMANTE, 2003, pg. 105).
Na esteira desse entendimento, Robert Alexy elabora sua tese do caso especial,
estabelecendo o entendimento de que o discurso jurídico é um caso especial do discurso
prático geral, como se verá no próximo capítulo.

3.1 A tese do caso especial


3.1.1 Os limites do discurso prático geral

Primeiramente, convém explicitar o que se deva entender por discurso. Assim,


Robert Alexy, expõe:

Os discursos são o conjunto de ações interconectadas nos quais se comprova a


verdade ou correção das proposições. Os discursos em que se trata da correção das
proposições normativas são discursos práticos. O discurso jurídico [...] pode-se
conceber como um caso especial do discurso prático geral que ocorre sob condições
limitadas, como a lei, a dogmática e o precedente (ALEXY, 2008, pg. 183).

Estruturando sua teoria sobre o Discurso Prático Racional, Alexy elabora diversas
regras e formas, com vistas a realizar a já referida correção das proposições normativas.
Assim, criaram-se categorias de regras e formas que, neste trabalho, apenas se fará menção.
São elas: as regras fundamentais, as regras da razão, as regras sobre a carga da argumentação,
as formas de argumento, as regras de fundamentação e as regras de transição.
Alexy aduz que os seguimentos das regras que se indicaram e a utilização das formas
de argumento que se descreveram aumentam certamente a probabilidade de alcançar um
acordo racional nas questões práticas, mas não garantem que se possa obter um acordo para a
questão. Prossegue, expondo que as regras da razão só podem ser cumpridas parcialmente e
que o ponto de partida do discurso são concepções normativas historicamente dadas e, por
isso, mutáveis. Assim, o autor elabora sua Teoria do Discurso Prático Racional abordando,
ainda, a possibilidade e a impossibilidade discursiva e, ao final, conclui:

Regras como estas (as regras do discurso prático geral), e também as regras
jurídicas estabelecidas por meio de procedimentos regulados por elas, são
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necessárias e razoáveis, ao passo que a possibilidade de alcançar soluções


vinculantes no discurso prático é limitada. Os limites do discurso prático geral
fundamentam a necessidade de regras jurídicas. Com isso se produz a transição para
o discurso jurídico. (ALEXY, 2008, pg. 208). (acréscimo em parênteses nosso)

3.1.2 O discurso jurídico como caso especial do discurso prático geral

Em um primeiro momento, cabe observar a questão de como se distingue a


argumentação jurídica da argumentação prática geral. Ao que Alexy aponta que a
argumentação jurídica se caracteriza pela vinculação ao direito vigente. Nesse sentido,
importa observar que as disputas jurídicas não submetem todas as questões à discussão, posto
que essas disputas são feitas com algumas limitações (ALEXY, 2008, pg. 210).
Desse modo, constata-se que a argumentação jurídica ocorre sob uma série de
condições limitadoras. Observar-se, por exemplo, a limitação da argumentação jurídica por
regras processuais. Assim, a peculiaridade desse processo argumentativo está nos vínculos
institucionais, tais como a lei, o precedente e a dogmática (PEDRON, 2005, pg. 72).
Alexy embasou sua tese do caso especial, principalmente, nos seguintes
fundamentos: “(1) na referência das discussões jurídicas a questões práticas, isto é, sobre o
que pode ser feito ou omitido, e (2) na discussão dessas questões sob o prisma da pretensão da
correção [...] a discussão jurídica (3) se faz sob condições de limitação do tipo mencionado
(ALEXY, 2008, pg. 211).
O primeiro fundamento é confirmado pelo autor, que aduz que “há a argumentação
jurídica referente à solução de questões práticas” (ALEXY, 2008, pg. 211).
No tocante ao segundo ponto, importa observar que o aspecto em comum do discurso
jurídico com o discurso prático geral é que em ambos se trata da correção de enunciados
normativos. Expôs-se que a pretensão que se coloca no discurso jurídico se distingue da
colocada no discurso prático geral, isso por que no discurso jurídico “não se pretende que o
enunciado normativo afirmado, proposto ou ditado como sentença seja só racional, mas
também que no contexto de um ordenamento jurídico vigente possa ser racionalmente
fundamentado” (ALEXY, 2008, pg. 211). A pretensão levantada em relação ao enunciado
jurídico é a de que ele seja racionalmente fundamentável sob a consideração de certas
condições limitadoras.
No capítulo de introdução da obra trabalhada, Alexy põe a questão de “o que
significa ‘racionalmente fundamentável sob a consideração dessas condições limitadoras?’”.
E indica que a resposta será obtida após a análise das teorias no Campo da Ética Analítica, de
Stevenson, Hare, Toulmin e Baier, da Teoria Consensual da Verdade de Habermas e da
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Teoria da Argumentação de Perelman, em que os resultados serão resumidos na já citada


Teoria do Discurso Prático Racional Geral. Ainda, expõe que a referida é formada por cinco
grupos de um total de vinte e duas regras, explicitamente formuladas, assim como um quadro
de seis formas de argumentos. Importa explicitar que, segundo Alexy, a utilidades dessas
regras e formas não deve ser nem superestimada nem subestimada, e trata-se de um grupo de
regras e formas cuja adoção deve ser suficiente para que o trabalho fundamentado na
argumentação possa estabelecer a pretensão de correção. Prosseguindo, o autor esclarece que
as regras do discurso prático não prescrevem de quais premissas devem partir os participantes
do discurso. O ponto de partida é formado por convicções normativas, assim como pelas
informações empíricas dos participantes. Conclui-se, dessa maneira, que as regras do discurso
indicam como se pode chegar a enunciados normativos fundamentados com base no ponto de
partida mencionado (ALEXY, 2008, pg. 45-47).
Ao final, esclarece Robert Alexy que a tarefa da Teoria do Discurso é:

propor regras que, de um lado, sejam tão fracas, isto é, tenham tão pouco conteúdo
normativo que pessoas com concepções normativas totalmente diferentes possam
estar de acordo com elas mas que, por outro lado, sejam tão fortes que uma
discussão pautada nelas possa ser qualificada como “racional” (ALEXY, 2008, pg.
47).

No que diz respeito às limitações do discurso jurídico, estas já foram mencionadas, e


são a sujeição à lei, a consideração obrigatória dos precedentes, o enquadramento na
dogmática elaborada pela Ciência do Direito, bem como as regras do ordenamento processual.
Por fim, pode-se perceber que “o raciocínio jurídico situa-se no campo da razão
prática e que [...] o discurso jurídico ainda necessita de outras regras específicas para ser
eficientemente controlável, pois as disputas jurídicas ocorrem debaixo de certas condições
especiais, como vinculação ao direito positivo vigente” (BUSTAMANTE, 2003, pg. 104)

3.1.3 Fundamentações jurídicas e valorações

As ideias bem como o título deste sub-item encontram-se na obra Teoria da


Argumentação Jurídica, e assim podem ser sintetizadas:
(a) Alexy expõe que quando uma decisão não se seguir logicamente nem das normas
pressupostas nem dos enunciados solidamente fundamentados, tampouco puder ser
fundamentada definitivamente com as regras da metodologia jurídica, restará ao intérprete a
escolha entre várias soluções, a partir de normas jurídicas, regras metodológicas e enunciados
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de sistemas jurídicos. Sendo que tal escolha determinará qual enunciado normativo singular é
afirmado. Desse modo, na base de tal ação de preferir (escolher) está a enunciação da
alternativa eleita como melhor em algum sentido e, portanto, uma valoração ou juízo de valor.

(b) Alexy, partindo das premissas de que “toda decisão jurídica toca nos interesses de pelo
menos uma pessoa” e “a questão de se a limitação aos interesses de uma pessoa é justificada
também pode ser sempre apresentada como uma questão moral”, chega ao ponto de que “ não
se trata da tese principal de que as valorações necessárias se devem considerar sempre como
morais, mas apenas de que elas são sempre relevantes moralmente”. Assim, ao final, conclui
que “o aplicador do direito deve orientar em um sentido juridicamente relevante de acordo
com valorações moralmente corretas” (ALEXY, 2008, pg. 40).

3.2 Sobre a relação entre Direito e Moral à luz da Teoria da Argumentação de Robert
Alexy

Abordando a relação entre Direito e Moral no pensamento de Robert Alexy, Flávio


Quinaud Pedrón (2005, pg. 72-73) ensina que “tal relação se coloca ao nível de uma teoria da
argumentação jurídica que compreende a argumentação jurídica incluída dentro de um gênero
maior, a argumentação moral”. Assim, se entende que a primeira pode ser tratada como caso
especial da segunda.
Na perspectiva de Alexy, os princípios teriam um duplo aspecto, que os colocaria
simultaneamente como elementos do universo do Direito e da Moral. Isso por que, poderia
haver uma conexão entre os princípios jurídicos e uma dimensão de moralidade, sendo que
entre os princípios utilizados para a resolução de um caso concreto houvesse a consideração,
também, de um juízo moral. Desse modo, se afirmaria a relação de Direito e Moral no que diz
respeito à pretensão de correção das decisões judiciais.
Portanto, valendo-se dessas considerações, só se poderia afirmar a possibilidade de
correção de uma decisão se demonstrada uma consonância da aplicação dos princípios com
uma teoria moral. Nessa esteira, infere Pedrón que o Direito pode ser compreendido como
subordinado à Moral, tendo em vista a necessidade de se completar o discurso jurídico com
regras da teoria da argumentação moral, ou por que os princípios jurídicos guardam em si
uma dimensão de moralidade.
No entanto, levanta-se a questão de como solucionar as controvérsias que envolvam
um conflito entre princípios (jurídico-morais)? Para resolver este problema, Robert Alexy
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propõe um método para a solução das colisões entre princípios que será objeto de análise no
capítulo IV.

3.3 Síntese da relação do discurso jurídico como discurso prático geral

Ao final de sua obra, Robert Alexy (2008, pg. 274-281) ressalta quatro aspectos que
demonstram a vinculação do discurso jurídico com o discurso prático geral. São eles: (1) a
necessidade do discurso jurídico em virtude da natureza do discurso prático geral, (2) a
coincidência parcial com a pretensão de correção, (3) a coincidência estrutural das regras e
formas do discurso jurídico com as do discurso prático geral e (4) a necessidade de
argumentação prática de tipo geral no âmbito da argumentação jurídica.
Limitar-se-á a tecer apenas breves considerações acerca dos referidos aspectos, posto
que não é objetivo precípuo deste trabalho aprofundar na vinculação dos já citados discursos.
No que toca o primeiro ponto, R. Alexy esclarece que a necessidade do discurso jurídico
surge da debilidade das regras e formas do discurso prático geral, sendo que esta debilidade
decorre de três razões: as regras do discurso não prescrevem de que premissas devem partir os
participantes do discurso; todas as etapas da argumentação não estão fixadas e algumas regras
do discurso só podem ser cumpridas de maneira aproximada. Prosseguindo, explicita que as
razões pelas quais as normas jurídicas surgidas do processo da legislação não solucionam
todos os problemas. Dessa maneira, as razões são: a vagueza da linguagem do Direito; a
possibilidade de conflitos normativos; a possibilidade de casos que exijam uma regulação
jurídica e a possibilidade de decidir em casos especiais contra a literalidade da norma.
Com relação à coincidência parcial com a pretensão de correção, o autor aduz que
esta pretensão não “se refere à necessidade absoluta de racionalidade dos enunciados
normativos em questão, mas à sua fundamentabilidade racional no âmbito do ordenamento
jurídico vigente. A racionalidade da argumentação jurídica, na medida em que é determinada
pela lei, é por isso sempre relativa à racionalidade da legislação” (ALEXY, 2008, pg. 276).
No que diz respeito ao terceiro ponto, têm-se coincidências estruturais das regras e
formas de ambos os discursos. Primeiro, as regras e formas da justificação interna submetem-
se ao princípio da universalidade, assim, esse mesmo princípio constitui o fundamento tanto
do discurso prático geral como do discurso jurídico. Segundo, em ambas as formas de
discurso são necessárias regras de presunção racional, visto que o saber empírico necessário
frequentemente não pode ser adquirido com a certeza devida. Terceiro, a Ciência do Direito
dogmática pode ser entendida como a institucionalização estável do discurso prático sob a
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condição de existência de um ordenamento jurídico. Quarto, o fundamento do uso do


precedente é constituído pelo princípio da universalidade e da inércia; por isso, também os
princípios práticos gerais servem de fundamento para esse uso. Além desses, existem mais
dois pontos coincidentes que não serão citados2.
A necessidade de argumentação prática de tipo geral no âmbito da argumentação
jurídica é o aspecto mais ressaltado sobre a vinculação entre ambas as formas de discurso.
Isso por que a argumentação jurídica depende normalmente da argumentação prática geral.
No que concerne à questão da dependência, deve ficar claro que essa dita dependência não
significa que a argumentação jurídica seja idêntica à argumentação prática geral, tampouco
que se possa reduzir aquela a esta. A argumentação prática geral necessária no discurso
jurídico ocorre segundo formas especiais e segundo regras especiais e sob condições
especiais. Logo, a argumentação jurídica pode por isso ser vista como uma forma especial da
argumentação prática geral, que é exigida por razões práticas de tipo geral.

3.4 Considerações finais

Ao final de sua obra, Robert Alexy (2008, pg. 279) constata que a argumentação
jurídica se desenvolve segundo formas, de acordo com determinadas regras e sob certas
condições, e permanece dependente da argumentação prática geral, de modo que essa
dependência consegue amenizar as debilidades do discurso prático geral, mas não eliminá-las.
Alexy verifica que sua Teoria da Argumentação Jurídica inadequada àqueles que
procuram em uma teoria um procedimento que garanta a segurança do resultado. Isso por que
afirma que nem nas Ciências Naturais se pode falar da formação de uma segurança definitiva,
e vai além esclarecendo que o simples fato de não se poder alcançar segurança, não pode ser
visto como razão para se negar à Ciência do Direito seu caráter de ciência ou de atividade
racional.
Ainda, aduz que o caráter de ciência não é constituído pela produção de segurança,
mas pelo “cumprimento de uma série de condições, critérios ou regras” (ALEXY, 2008, pg.
279).
Com relação à pretensão de correção, esclarece que o discurso jurídico inclui as
regras e formas do discurso prático geral e, desse modo, constituem um critério de correção
para as decisões jurídicas, já que na argumentação jurídica são necessários argumentos

2
Vide ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da
Justificação Jurídica. 2º edição. Reimpressão. São Paulo: Landy, 2008. Pg. 276-278.
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práticos gerais. No entanto, a teoria do discurso jurídico também padece dessas inseguranças
do discurso prático geral como critério hipotético de correção de enunciados normativos,
tornando inútil a teoria do discurso como critério de correção, levando ao ponto de que um
juízo sobre a correção de uma decisão tenha sempre um caráter provisório, portanto, podendo
ser refutado (ALEXY, 2008, pg. 280).
Ao final das considerações que acima foram tecidas, verificou-se que a Teoria da
Argumentação Jurídica, por si só, não é capaz de fundamentar a efetivação do direito de
eutanásia no Ordenamento Jurídico Brasileiro, isso por que não se trata apenas de racionalizar
a decisão jurídica que conceda um provimento judicial no sentido de que autorizar a prática da
eutanásia. Sua justificação no âmbito jurídico brasileiro depende de uma teoria que tenha o
condão de resolver as colisões entre princípios e regras que inevitavelmente surgirão ao se
debater acerca da autorização ou proibição da medida eutanásica. Por isso, encontramos na
obra Teoria dos Direitos Fundamentais, também de autoria de Robert Alexy, a proposta de
um método capaz de solucionar os conflitos normativos que surgirão. Assim, o capítulo V
deste trabalho utilizará tudo o que até agora foi exposto e, ainda, a fórmula da ponderação
elaborada por Robert Alexy com vistas a buscar uma justificativa racional, principiológica e
normativa para a autorização do exercício do Direito Brasileiro.

4 A FÓRMULA DE PONDERAÇÃO E A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

4.1 Princípios, ponderação e argumentação jurídica

Inicialmente, cabe retornar à vinculação existente entre a Teoria da Argumentação


Jurídica e o modelo de ponderação proposto pelo autor.
Como vimos no capítulo anterior, a teoria da argumentação tem como paradigma a
teoria do discurso racional, de acordo com o qual um enunciado normativo é correto quando
pode ser o resultado de um procedimento argumentativo regulado por regras – regras estas
que compõe o chamado Código da Razão Prática que, nas palavras de Thomas Bustamante
(2003, pg. 104), é um “conjunto de regras procedimentais sobre a construção de discursos de
justificação de decisões e pautas normativas que garante um mínimo de racionalidade nas
conclusões obtidas”. Nesse sentido, seria impensável realizar a tarefa de fundamentação de
enunciados de preferência condicionada que se estabelecem diante de cada colisão de direitos
se se prescindisse da referida teoria da argumentação. Desse modo, o modelo de ponderação,
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ao vincular a lei de ponderação à teoria da argumentação jurídica racional, proporciona um


critério para se decidir os casos de colisões entre princípios.

Segundo Thomas Bustamante (2006, pg. 86), nem os princípios e nem as regras
regulam por si mesmos a sua própria aplicação. Explica, ainda, que o nível dos princípios e
das regras expressam o lado passivo do sistema jurídico, sendo completados com o nível da
argumentação jurídica, que corresponde ao lado ativo da fundamentação de decisões jurídicas
e possui a tarefa de dizer como, sobre a base dos dois primeiros níveis, é possível uma decisão
racionalmente fundamentada.
Surge um problema quando da aplicação dos princípios, fazendo nascer a
necessidade de regras argumentativas específicas para a argumentação jurídica em geral,
momento no qual inaugura-se a teoria da argumentação jusfundamental. Esse caso especial
da teoria da argumentação jurídica está substancialmente caracterizada por ter incorporado a
denominada máxima da proporcionalidade.

4.1.1 A máxima da proporcionalidade

A máxima da proporcionalidade desponta como o principal comando para otimizar


princípios jurídicos, sendo uma regra que diz como se deve ponderar, ou seja, é uma
ferramenta metodológica que visa a garantir a racionalidade da denominada técnica da
ponderação. Nessa esteira, a argumentação jusfundamental se diferencia da argumentação
jurídica ordinária pelo fato de colocar a máxima da proporcionalidade no centro da dogmática
dos direitos fundamentais.
Quando se depara com uma colisão de princípios, o intérprete deverá valer-se de um
critério hermenêutico de ponderação dos valores jusfundamentais a que Alexy denomina
máxima da proporcionalidade. Analisando-a, verifica-se que três regras de argumentação
compõem essa ferramenta metodológica: (1) a exigência de adequação, (2) a exigência de
necessidade e (3) a proporcionalidade em sentido estrito.
As duas primeiras regras decorrem do caráter de “princípios como mandados de
otimização com relação às possibilidades fáticas”. Dessa maneira, a exigência de adequação
estabelece que “a relação entre o meio empregado e o fim atingido, mede seus efeitos a partir
de hipóteses comprovadas ou altamente prováveis” (CADEMARTORI, 2006, pg. 137). Pela
regra da adequação “se M1 não é adequado para fomentar o fim F, exigido pelo princípio P 1,
então M1 não é exigido por P1 (M1 é indiferente para P1). Em tais situações, se M1 afeta de
15

alguma maneira um outro princípio P2, M1 está proibido por P2” (BUSTAMANTE, 2006, pg.
88). Já a exigência de necessidade “estabelece que a medida empregada deve considerar,
sempre, o meio mais benéfico ao destinatário” (CADEMARTORI, 2006, pg. 137). Constitui-
se, dessa maneira, sua regra: “Se há dois meios (M 1 e M2) para fomentar um fim F, exigido
pelo princípio P1, sendo que cada um deles promove o fim na mesma medida, mas M 1
interfere na realização do princípio P2 em maior medida que M2, então deve ser empregado o
meio M2 (BUSTAMANTE, 2006, pg. 88-89).
A regra da proporcionalidade em sentido estrito se segue da relativização dos
princípios jurídicos ante as possibilidades normativas. Tem-se que os motivos que
fundamentam uma medida que restrinja de alguma maneira um direito fundamental devem ter
peso suficiente para preponderar sobre o direito fundamental afetado por ela, encontrando
condições de justificar a sua restrição, portanto, é esta a função dessa regra, justificar a
restrição de um princípio que interfira na satisfação de um outro princípio.
Nota-se, pois, que a regra da proporcionalidade em sentido estrito trata-se de uma
estrutura formal de aplicação de princípios constitucionais, que somente permite controlar a
restrição e a otimização de princípios depois que o intérprete tenha atribuído os pesos
específicos aos princípios colidentes (BUSTAMANTE, 2006, pg. 89).
O que se pode perceber do exposto é que enquanto as regras de adequação e de
necessidade consideram as possibilidades fáticas advindas do caso concreto, a regra da
ponderação em sentido estrito, considera as possibilidades jurídicas.

4.1.2 A Máxima da Proporcionalidade e a Lei de Ponderação (ou Sopesamento)

Como fora aduzido acima, a regra da proporcionalidade em sentido estrito versa


sobre a otimização dos princípios em face das circunstâncias jurídicas de cada caso,
expressando a otimização dos princípios que atuam em sentido contrário, que se dá por meio
da Lei de Ponderação (ou Sopesamento) de princípios.
Nesse sentido, a Lei de Ponderação pode assim ser expressa:

“Quanto maior é o grau de não satisfação ou de afetação de um dos princípios, tanto maior
deve ser a importância da satisfação do outro” (BUSTAMANTE, 2006, pg. 89-90).

De outro modo, também pode ser demonstrada:


16

“Quanto maior for o grau de interferência em um princípio [Pi], maior deve ser a
importância em se realizar um outro [Pj]” (GUERRA, 2006, pg. 55).

Analisando a referida lei, T. Bustamante (2006, pg. 90) verifica que a “ponderação
ou pesagem deve-se fazer em três planos sucessivos: no primeiro plano, ‘há de se definir a
intensidade da intervenção’; no segundo, é necessário ‘saber a importância dos fundamentos
justificadores da intervenção’; no terceiro, realiza-se a ‘ponderação em sentido específico e
estrito’. Nesse último estágio, trata-se de uma valoração dos pesos relativos dos princípios
jurídicos em tela, a fim de se estabelecer a relação de precedência condicionada entre eles”.
Nos últimos anos, esse modelo de ponderação tem sido sofisticado, culminando com
uma fórmula de ponderação que estabeleceu um modelo aritmético de pesagem dos princípios
colidentes, cuja finalidade é tornar mais explícitas as escolhas envolvidas no processo de
argumentação jusfundamental e as formas de restrição do âmbito de aplicação dos princípios
jurídicos.

4.2 A Fórmula de Ponderação

Valendo-se das considerações e explicitações acerca da fórmula da ponderação


tecidas com eximia propriedade por Thomas Bustamante (2006, pg. 76-107) e por Marcelo
Lima Guerra (2006, pg. 53-71), bem como de todo o conteúdo desenvolvido por Robert
Alexy em sua obra Teoria dos Direitos Fundamentais, convém apontar o que se segue.
O ponto de partida da Fórmula de Ponderação (ou de Peso) é a Lei de Ponderação.
Assim, R. Alexy estabeleceu um modelo aritmético capaz de representar a estrutura do
método de ponderação. Nesse sentido, com a finalidade de se obter o peso relativo de cada
princípio colidente, o referido método vale-se do grau de interferência no princípio
restringido, do grau de importância do princípio precedente, dos pesos abstratos dos
princípios jurídicos e da confiabilidade das premissas utilizadas. Em outras palavras, a Lei de
Ponderação leva em conta a interferência que a realização de um dos valores em conflito
causa no outro, bem como a interferência que sofrerá o primeiro com a omissão em realizá-lo,
em nome da defesa ou realização do segundo.
Observa-se, pois, que a solução de eventual conflito entre princípios ou valores
haverá de consistir na tentativa de se atribuir pesos ou grandezas distintas, de modo a
estabelecer qual o mais preponderante na situação em que eles entram em conflito. É
importante ressaltar que a referida fórmula é necessária para que o operador do direito possa
17

graduar a restrição e a realização dos princípios jurídicos, vez que a fórmula de subsunção
mostra-se insuficiente para este propósito. Desse modo, importa para a Fórmula da
Ponderação valer-se de um modelo aritmético apto a fornecer um parâmetro para graduar a
intervenção de um princípio P1 e a satisfação do seu princípio contrário (P2).
Como dito acima, a fórmula de ponderação vale-se de alguns pontos para se chegar
ao peso relativo de cada princípio colidente. Assim, tratar-se-á brevemente de cada um deles
para, ao final, aportar-se na estrutura da Fórmula de Ponderação.
Deve-se observar que na aplicação da tão tratada fórmula, voltada a determinar qual
dos valores ou princípios em rota de colisão deve ser considerado mais relevante, será
necessário argumentar acerca:

(a) da interferência que a realização de um (princípio) causa no outro e, vice-versa, a


interferência que a realização do segundo causa no primeiro dos valores em conflito. Ou, nas
palavras de Thomas Bustamante (2006, pg. 93), da intensidade de intervenção em um
princípio e a importância da satisfação do princípio colidente, que unidos chega-se ao peso
relativo dos princípios.
(b) do “peso abstrato” dos valores em conflito. Nesse ponto, deve-se notar que cada um dos
valores em conflito, considerados em abstrato, possuem um determinado peso ou relevância,
que podem, inclusive, ser diferentes, sendo que este dado há de ser levado em consideração
no cálculo que haverá de ser feito para aplicação da lei de ponderação.
(c) de quais evidências disponíveis para fundamentar, racionalmente, as considerações ao grau
de interferência, vez que as afirmações produzidas quanto a este aspecto do problema são
afirmações descritivas, a exigir o suporte de evidências empíricas. O que se trata aqui é do
grau de segurança (ou de confiabilidade) das premissas empíricas utilizadas na argumentação.
Constituiu esse ponto, o que Alexy denominou de segunda lei da ponderação que dita que
“quanto mais intensa for um intervenção em um direito fundamental, tanto maior deve ser a
certeza das premissas que a sustentam” (tradução livre) (BUSTAMANTE, 2006, pg. 94).

Feitas as considerações devidas sobre dos elementos contidos na fórmula da


ponderação, segue-se para sua estrutura, que assim pode ser demonstrada:

Wi,j = Wi . Ii. Ri
Wj . Ij . Rj
18

Da fórmula acima transcrita nada se pode inferir, caso não seja decifrado o
significado de cada um de seus elementos. Desse modo, segue abaixo o significado de uma
das partes da fórmula, que nada mais são do que expressões formais das variáveis da Fórmula
de Alexy.

Ii = o grau de interferência que a conduta C (voltada a realizar o princípio Pj) causa em Pi


Ij = o grau de interferência que a omissão da conduta C (voltada a realizar o princípio Pi)
causa em Pj
Wi = o peso abstrato de Pi
Wj = o peso abstrato de Pj
Ri = as evidências sobre a interferência em Pi (e o peso abstrato de Pj)
Rj = as evidências sobre a interferência em Pi (e o peso abstrato de Pi)
Wi,j = o peso relativo de Pi (e de Pj), resultado a ser atingido com o uso da fórmula

Explicitados os elementos da referida fórmula, há de se notar que é essencial à sua


aplicação prática a atribuição de “grandezas” a cada uma das variáveis. Em melhores
palavras, uma argumentação racional sobre cada um dos pontos tidos como necessários
objetos de uma discussão sobre a preponderância de um princípio sobre o outro deve ser
capaz de atribuir a cada um destes pontos valores.

Com o fim de superar essa necessidade, Robert Alexy sugere a adoção de um modelo
triádico, em que tais grandezas consistam nos valores sério (s), moderado (m) e leve (l). Tais
valores consistirão nas grandezas a serem atribuídas às referidas variáveis da Fórmula de
Ponderação. É importante perceber que o modelo proposto evita as incertezas e os exageros
de uma metrificação dos princípios constitucionais e classifica e organiza a restrição e o
cumprimento ótimo dos princípios segundo categorias compreensíveis.

Para facilitar o manuseio da fórmula, o autor sugere a atribuição de valores


numéricos a tais grandezas, preferindo valores baseados em uma escala de progressão
geométrica. Sugerindo, pois, a seguinte equivalência:

(l) = 20 = 1 (m) = 21 = 2 (g) = 22 = 4


19

Feitas as devidas considerações, inferir-se-á que, da aplicação da fórmula de


Ponderação, três espécies de resultado podem ser obtidos:
(a) se o resultado for maior que 1, é de ser considerado preponderante o princípio
correspondente à primeira letra na expressão [Wi,j], ou seja, o princípio Pi;
(b) se o resultado for menor que 1, é de ser considerado preponderante o princípio
correspondente à segunda letra na expressão [Wi,j], ou seja, o princípio Pj;
(c) se o resultado for igual a 1, então terá sido impossível decidir, racionalmente, a
preponderância de um princípio sobre o outro. Esse resultado é denominado caso de empate, e
refere-se à margem de ação do legislador, ou seja, àqueles casos em que o comportamento
escolhido pela lei não é considerado nem obrigatório nem proibido pelos princípios
constitucionais colidentes (BUSTAMANTE, 2006, pg. 93).

4.3 A situação ideal de aplicação da Fórmula da Ponderação

Importa, ainda, esclarecer qual a área específica de aplicação da Fórmula da


Ponderação. Nesse sentido, convém apontar que os sub-princípios que compõem a máxima da
proporcionalidade não se aplicam todos, necessária e simultaneamente, em cada caso em que
se precise decidir sobre a correção de determinada ação ou medida, na perspectiva dos
princípios constitucionais. Assim, a questão, às vezes, pode ser decidida já com o uso da
adequação ou, sendo esta insuficiente, recorrendo-se à exigibilidade. Para ser necessário o uso
da proporcionalidade em sentido estrito impõe-se que esteja configurada uma situação
extrema, suficientemente já delimitada pelo uso anterior (e sem sucesso) da adequação e
exigibilidade. Nessa situação limite, incapaz de ser resolvida com a adequação e a
exigibilidade, é que encontra aplicação da Fórmula de Ponderação, ou seja, a adoção do
critério da proporcionalidade em sentido estrito, pois somente um dos princípios poderá ser
realizado in concreto, sendo imperioso determinar qual deles o será, por ter maior peso
relativo (GUERRA, 2006, pg. 64-65).

5 O CASO TERRY SCHIAVO

Theresa Marie Schindler-Schiavo, mais conhecida como Terry Schiavo, nasceu na


Filadélfia, em 3 de dezembro de 1963 e faleceu em Pinellas Park, Flórida, em 31 de março de
2005. O caso Terri Schiavo foi uma longa batalha judicial ocorrida nos Estados Unidos da
América, que girou em torno da prática ou não da eutanásia, e envolveu Michael Schiavo, o
20

marido de Terry, Robert and Mary Schindler, pais de Terry, diversos juízes do Estado da
Flórida, a Suprema Corte Americana, o governador do Estado da Flórida, o Presidente dos
Estados Unidos, além de diversos segmentos da sociedade.
Nos idos de 1990, Terry Schiavo sofreu uma parada cardíaca que a conduziu à falta
de oxigenação do cérebro e, como consequência, ocasionou uma severa lesão cerebral
irreversível, sendo posteriormente diagnosticado estado vegetativo permanente. As causas da
parada cardíaca não são precisas, apenas cogitando-se que possam estar associadas a algum
distúrbio alimentar.
Dessa forma, em permanente estado vegetativo, passou Terry Schiavo a ser
alimentada por tubos. No início, Michael, Robert e Mary Schindler uniram esperanças e
esforços buscando tratamentos reabilitatórios, sendo que Michael iniciou um curso de
enfermagem para aperfeiçoar-se nos cuidados de sua esposa, segundo próprio testemunho
judicial. No entanto, em fevereiro de 1993, Michael e Terry ganharam em uma ação judicial,
proposta contra um médico de Terry, aproximadamente um milhão e meio de dólares. E, em
meados de 1993, Michael, “guardião legal” de Terry, ingressou no judiciário com um pedido
de “Do Not Ressucitate – DNR”, que é um documento no qual consta a vontade de que
determinada pessoa, ao sofrer uma parada cardíaca ou respiratória não receba procedimentos
de ressuscitação, ou não seja submetida a procedimentos de prolongação da vida. Alegava
Michael S. que Terry já havia se manifestado no sentido de não se submeter àquele tipo de
tratamento, caso se encontrasse naquele estado. Muito se discutiu se Michael pretendia a
retirada da sonda de alimentação e hidratação em virtude da vontade de Terry e dos diversos
laudos médicos que atestavam que não havia quaisquer possibilidades de melhora ou
tratamentos, ou se ele estava somente interessado na quantia em dinheiro que acabara de
receber na ação judicial.
Neste momento, iniciou-se todo o conflito entre Michael Schiavo (marido) e Robert e
Mary Schindler (pais). Toda a batalha judicial, que durou quinze anos, girou em torno da
guarda legal de Terry, da quantia recebida a título de indenização e da remoção dos tubos que
a alimentavam, sendo que, por ordem judicial, se chegou a removê-los por três vezes e, logo
em seguida, foram recolocados.
O caso Terry Schiavo foi muito longo e complexo, com muitas decisões judiciais pró
e contra as pretensões de Michael Schiavo, e com a ocorrência de diversos fatos durante a
batalha judicial, tal qual o possível envolvimento de Michael com Jodi Centonze, ocorrido
enquanto ele ainda se encontrava casado com Terry.
21

Ao final, após quinze anos de disputas judiciais e até intervenções governamentais e


presidenciais, uma ordem judicial determina que sejam retirados os tubos que alimentação e
hidratação de Terry, que veio a falecer em 31 de março de 2005.

6 ANÁLISE DO CASO DO TERRY SCHIAVO À LUZ DO PENSAMENTO DE


ROBERT ALEXY

De início, cabe serem feitas algumas considerações, para que esta análise e a
proposta dos autores possam ser compreendidas com maior clareza. No capítulo anterior, foi
feito um breve histórico do caso Terry Schiavo, relatando, de modo sucinto, os principais
acontecimentos. Impende esclarecer que não se intenta realizar uma relato biográfico da vida
de Terry, constando todos os momentos de sua vida, mas somente utilizar as questões factuais
e jurídicas que foram levantadas para que possa analisá-los sob o prisma de um pensamento
jurídico. Por outro lado, utilizaremos o estudo do caso norte-americano como um exercício de
direito comparado quando, então, será feita uma análise do referido caso dentro do
ordenamento jurídico brasileiro.
Como tratado no capítulo III, a proposta de Robert Alexy com sua Teoria da
Argumentação Jurídica é a questão da possibilidade de se fundamentar logicamente as
decisões judiciais. Assim, propôs Alexy uma série de critérios capazes de indicar a
racionalidade de decisões fundadas em juízos de valor, com a criação de um catálogo de
regras que deveriam ser seguidas com o fito de se obter decisões judiciais racionais.
Todo o caso Terry Schiavo ocorreu nos Estados Unidos, sendo que foi naquele local
onde se desenvolveu todos os debates girando em torno da sociedade civil, toda a disputa
judicial, toda a colheita de provas, oitiva de testemunhas, pareceres médicos, tudo submetido
ao Direito norte-americano (de matriz diferente da brasileira – Common Law) e, ao final, a
sentença que determinou a retirada dos tubos de alimentação. Esclarecemos o leitor que o
presente artigo não se fundou nos autos originais do processo não sendo possível, portanto,
uma análise final sobre a correção da decisão judicial que determinou a retirada dos tubos.
Todavia, através da bibliografia secundária nos foi possível acessar elementos
considerados suficientes para proceder a avaliação da decisão judicial dentro da proposta
teórica de Alexy, isto é, a pesquisa reconstruiu os argumentos e as situações fáticas (da
melhor forma possível) para, aplicando a teoria da ponderação, estabelecer um grau de
objetividade e correição da sentença final. Logo, a presente análise se valeu das informações
22

obtidas em livros, artigos e sites que tratam sobre o caso Terry Schiavo, com uma seleção
criteriosa e rigorosa por parte dos pesquisadores.
É cediço que o caso Terry Schiavo foi uma disputa judicial norte-americana, e para
que possamos desenvolver o trabalho proposto, deverá ser realizado um transporte dos dados
factuais e, em alguma medida, jurídicos para essa análise, que não terá somente por base o
pensamento de Robert Alexy, mas, também, aspectos do Direito Brasileiro. A presente análise
utiliza a Fórmula da Ponderação e busca justificar racionalmente uma decisão judicial pondo
fim à colisão dos princípios envolvidos.
Ao se deparar com uma colisão de princípios o intérprete deve valer-se de um
critério hermenêutico de ponderação de valores fundamentais denominado por R. Alexy de
máxima da proporcionalidade. É de observar que três são as regras de argumentação que
compõem essa ferramenta metodológica: (1) a exigência de adequação, (2) a exigência de
necessidade e (3) a proporcionalidade em sentido estrito.
O que deve ficar claro é que, para que se chegue ao ponto de sopesar princípios, com
a utilização da ponderação em sentido estrito, a qual é traduzida pela Fórmula de
Ponderação, deve-se não ter logrado êxito na solução do caso concreto utilizando-se da
adequação e da necessidade.
Desta maneira, quando da utilização da primeira regra, a exigência de adequação,
devemos, primeiramente, definir quais os princípios e suas finalidades que estão em jogo.
Desse modo, se compreenderá que o direito à vida e o direito à liberdade são os dois
princípios, sendo que a finalidade do direito à vida é a
manutenção/preservação/conservação/respeito da vida do ser humano, e a finalidade do
direito à liberdade é a garantia de uma vontade livre, de livres escolhas, de autodeterminação
do destino. Entende-se, pois, que o meio para que seja o direito à vida satisfeito é
conservando-se os tubos de alimentação em Terry Schiavo, meios aptos à manutenção da vida
de Terry. Já no que concerne o direito à liberdade, o meio utilizado para ver sua finalidade
atendida é com a retirada dos tubos de alimentação, que conduziriam Terry ao óbito, mas
atenderiam à possível vontade dela de não se ver submetida àqueles procedimentos, optando
pela morte.
O que acontece é que ambos os meios são aptos a realizar as finalidades exigidas
pelos princípios em jogo, portanto, são meios exigidos pelos princípios. Todavia, a realização
de um meio para a satisfação da finalidade exigida por um dos princípios, interfere no outro
princípio, e vice-versa. Deste modo, não é impossível solucionar este caso concreto somente
23

com a utilização da adequação, posto que a aplicação dos dois princípios está em rota de
colisão.
Passando, então, para a segunda regra, tem-se que se ater para o fato de que ela exige
que a “medida utilizada deve considerar sempre o meio mais benéfico ao destinatário”. Ora, o
que se tem neste caso é que somente há um meio de satisfazer o princípio do direito à vida, e
somente um de satisfazer o princípio do direito à liberdade. Ainda mais, impede saber o que é
meio mais benéfico para Terry Schiavo, o que não foi determinado. Portanto, resta claro que a
regra da exigência de necessidade não é suficiente para solucionarmos a colisão de princípios
em jogo.
Aportando-se na chamada situação ideal de sopesamento, passaremos a analisar o
caso Terry Schiavo utilizando a Fórmula de Ponderação, visando-se chegar a uma solução
para o conflito de princípios que se entende surgido quando das disputas acerca da retirada
dos tubos de alimentação.
Primeiramente, devemos advertir o leitor que numa leitura positivista/legalista do
ordenamento jurídico brasileiro não é admitido nenhuma das modalidades de eutanásia (ativa
ou passiva). Logo, dentro dessa ótica, caso a eutanásia seja praticada, seu autor deverá ser
responsabilizado nos termos da norma insculpida no art. 121, §1º do Código Penal: homicídio
privilegiado. Todavia, com o marco teórico adotado, entende-se pela possibilidade de se obter
um provimento judicial, principiologicamente justificado, que autorize que ação de retirada
dos tubos de alimentação, com a conseqüente morte da paciente, não seja enquadrado neste
tipo penal, de modo a isentar os praticantes da eutanásia de qualquer responsabilidade penal.
Portanto, pelo exposto, iniciaremos explicitando quais princípios estão em rota de
colisão: o direito à vida e o direito à liberdade.
Tecendo breves comentários acerca destes. Tem-se que o direito à vida, nas palavras
de Paulo Gustavo Gonet Branco (2009, pg. 393) é “pressuposto elementar de todos os demais
direitos e liberdades [...]”. Consta na Convenção Americana dos Direitos Humanos – o Pacto
de San José –, de1969 (Ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 2002), em seu artigo 4º,
que “toda pessoa tem o direito de que se respeite a vida. [...] esse direito deve ser protegido
pela lei e, em geral, desde o momento da concepção [...] ninguém pode ser privado da vida
arbitrariamente”. Guilherme Peña de Moraes (2008, pg. 31) aduz que se encontra no direito à
vida uma perspectiva referente ao direito ao próprio corpo que “é pertencente à integridade
física do organismo, assegurado pela proibição de tratamento que contrarie a dignidade da
pessoa humana”.
24

O direito à liberdade, no entendimento de G. P. de Moraes (2008, pg. 37), é derivado


do princípio autonomístico da determinação individual, não somente a “liberdade de querer”,
exteriorizada pelo poder de escolher entre várias possibilidades, mas também a “liberdade de
atuar”, externada pelo poder de fazer tudo o que se quer, removidas quaisquer coações ilegais,
ilegítimas e ilícitas. Importa frisar que a perspectiva do direito à liberdade como
autodeterminação do indivíduo. Aqui, o exercício do direito de liberdade será tratado sob o
aspecto do indivíduo como “proprietário” de seu próprio corpo, sendo a pessoal responsável
por seu destino, por seu próprio corpo, para dispor de si e agir conforme sua vontade livre e
consciente.
Tendo-se, então, o conflito de princípios desponta o momento em que deverá ser
utilizada a Fórmula da Ponderação, nos moldes do que foi tratado no item 4.3. Deste modo, há
que se preencherem cada uma das variáveis da fórmula criada por Alexy, para que, ao final, se
possa obter o resultado e determinar qual princípio deverá prevalecer.
A primeira variável que se trabalhará será a simbolizada pela letra W, que representa
o peso abstrato dos princípios em conflito. Neste momento da aplicação, entendemos que o
direito à vida e o direito à liberdade possuem o mesmo peso abstrato, já que são pressupostos
concretizadores do princípio da dignidade da pessoa humana, e ambos encontram-se situados
topograficamente no mesmo local em nossa Carta Magna (Art. 5º, caput), ao que se atribui a
ambos o grau sério (s), correspondente na escala aritmética ao valor 4.
Preenchida uma das variáveis da fórmula, se passa para a segunda, que diz respeito
ao grau de interferência que a realização (ou omissão) de um princípio causa no outro
princípio colidente. Tal variável é simbolizada pela letra I, e representa o peso concreto dos
princípios. Primeiramente, vamos tratar do direito à vida. Deve-se relembrar que o pleito
circunda a retirada ou não dos tubos que alimentavam Terry Schiavo. Assim, a satisfação do
princípio do direito à vida, manifesto por meio da manutenção dos tubos, resultaria na
continuação da vida de Terry sobre uma cama, sendo alimentada artificialmente. Ainda,
possivelmente, a satisfação de tal princípio interferiria no princípio colidente, já que, se
realmente Terry tivesse se manifestado no sentido de que não queria se submeter àquela
natureza procedimento, estaria sendo violada sua liberdade de autodeterminação e de livre
escolha. Todavia, essa possível vontade somente foi expressa pelo marido de Terry, alegando
que ela havia dito que não pretendia sujeitar a procedimentos de prolongação da vida. No que
diz respeito ao princípio colidente, o direito à liberdade, tem-se que a sua satisfação
implicaria na retirada dos tubos alimentares e a conseqüente morte de Terry Schiavo. Deste
modo, a satisfação deste princípio interferiria de modo decisivo no princípio colidente, já que,
25

após sua satisfação, não haveria possibilidade de reversibilidade da decisão. Ainda mais,
deve-se levar em consideração o fato de que Terry não deixou qualquer documento
confirmando sua vontade livre de não se submeter àqueles procedimentos. Ao final, entende-
se que, com a satisfação do direito à vida (e a omissão do direito de liberdade) Terry estará
viva, e a qualquer momento, poderão os tubos alimentares serem retirados. No entanto,
satisfeito o princípio do direito à liberdade, com a conseqüente morte de Terry, tal decisão
será irrevogável. Portanto, no seio do que foi exposto, entende-se que à variável Iv,
concernente ao princípio do direito à vida, será atribuído o grau sério, cujo valor aritmético é
4. E, à variável Il, concernente ao princípio direito à liberdade, será atribuído o grau médio,
cujo valor aritmético é 2.
Por fim, parte-se para a última variável, simbolizada pela letra R, que trata das
evidências disponíveis para fundamentar, racionalmente, o grau de interferência dos
princípios em conflito ou o grau de confiabilidade das premissas empíricas utilizadas na
argumentação. Deste modo, inicialmente, tratar-se-á das evidências tocantes ao direito à vida.
Temos como evidências que suportam a satisfação do direito à vida, a constante luta dos pais
de Terry para que não fossem retirados os tubos de alimentação. Segundo eles, Terry era
seguidora da fé católica, evidência que pressuporia sua não aceitação de procedimentos
eutanásicos. Ainda, a despeito das alegações do seu marido, Terry Schiavo não deixou
qualquer documento manifestando sua não aceitação a procedimentos de prolongação da vida.
Deve-se levar também em consideração que Terry se encontrava em estado vegetativo, ou
seja, impossível de manifestar sua vontade. Durante o curso da batalha judicial, aconteceram
diversos fatos escusos. Tem-se que Terry e Michael ganharam uma ação judicial milionária
em fevereiro de 1993 e em meados do mesmo ano Michael ingressou no judiciário com um
pedido de retirada da sonda de alimentação e hidratação. Além do que, durante o curso do
processo, se envolveu com outra mulher, sendo que estava casado com Terry e era seu
“guardião legal”. Muitos fatos, pouco claros, levam a considerar que as evidências utilizadas
para sustentar a satisfação do princípio do direito à vida são médias, motivo pelo qual se
entende que se deve atribuir o valor 4.
Agora, passa-se para as considerações acerca das evidências concernentes ao
princípio do direito à liberdade. Nesta variável, pode-se levar em consideração,
primeiramente, a existência de diversos laudos médicos atestando que Terry se encontrava em
estado vegetativo permanente, sem chances de cura, sem perspectivas de melhora e sem a
existência de qualquer tratamento. Ainda, haveria a suposta vontade de Terry em não se
submeter àqueles procedimentos, que expressa por seu marido Michael Schiavo. Todavia, tal
26

manifestação de vontade de Terry não foi documentada, sendo somente alegada por Michael.
Além disso, os pais de Terry a contestavam alegando ser Terry católica e contrária a práticas
eutanásicas. Portanto, as evidências que sustentam o referido princípio são estas, que acredita-
se não serem totalmente fortes e decisivas para se afirmar que havia uma vontade livre e
consciente de Terry em não se submeter àqueles procedimentos. Dessa maneira, entende-se
que à esta variável deve ser atribuído do grau médio, com valor aritmético correspondente a 2.
Por fim, preenchidas as variáveis, convém inseri-las na fórmula de ponderação:

Wv,l = Wv . Iv. Rv Wv,l = 4.4.2 Wv,l = 2


Wl . Il . Rl 4.2.2

Como se pode perceber, a aplicação da fórmula de ponderação resultou no valor peso


relativo 2. Ou seja, aplicando-se a fórmula de ponderação, visando-se solucionar a colisão dos
princípios do direito à vida e do direito à liberdade, obteve-se o resultado maior que 1, que
determina que o princípio do direito à vida prevaleça.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final do que foi exposto, pode-se perceber que a Fórmula da Ponderação é um


instrumento hábil a por fim ao conflito entre princípios. É óbvio que essa Fórmula está longe
de assegurar uma plena objetividade nas decisões sobre princípios em conflito, até porque,
cada um das variáveis pode ser preenchida por meio da argumentação, não havendo uma
prévia tarifação do valor a que se deva atribuir a cada uma delas.
É certo que a racionalidade que ampara as decisões em que se opera a ponderação de
princípios é aquela racionalidade própria do discurso prático, em geral, e do jurídico, em
particular. O que se verifica é que Alexy se apoia em uma argumentação racional para
empregar corretamente sua Fórmula, que passa a ser um critério de fundamentação racional
de decisões sobre a preponderância de um princípio sobre outro.
Nota-se que o mérito da Fórmula de Alexy é estruturar os “lugares” da argumentação
sendo, contudo, ter a pretensão de resolver a questão sobre a racionalidade da argumentação
prática geral e da jurídica em especial de forma definitiva. Com isso, evita-se a manipulação
retórica das decisões, por tornar evidente sobre o que se deve discutir e onde estão as
incertezas inelimináveis (GUERRA, 2006, pg. 68).
27

Verifica-se, também, que com tal Fórmula, resta de modo inequívoco, demonstrada a
total impossibilidade de se estabelecer uma rígida hierarquia entre valores constitucionais,
sendo descartada uma hierarquia absoluta e pré-estabelecida entre princípios, já que o grau de
interferência concreta de um princípio em benefício do outro e as evidências sobre isso podem
dar um peso concreto maior àquele de menor peso abstrato.
Como visto, procedeu-se com o sopesamento de princípios com a aplicação da
Fórmula da Ponderação em tese, ou seja, este procedimento se deu fora de um processo
judicial posto que não dispunhamos dos autos processuais. Mesmo assim foi possível a
aplicação da fórmula obtendo-se o resultado da prevalência do princípio do direito à vida
sobre o direito à liberdade. Todavia, como exposto, tal prevalência poderia ser a inversa,
desde que vigorassem outras condições factuais, embasando um outro corpo argumentativo,
de modo a preencher as variáveis com outros valores.
Percebe-se, pois, que analisado o caso Terry Schiavo sob a ótica da Fórmula de
Ponderação de Robert Alexy, e tendo em vista os aspectos concernentes ao direito brasileiro,
o resultado da ponderação não fundamentou uma autorização judicial de retirada dos tubos de
alimentação e hidratação de Terry. E, caso retirado fossem, incorrer-se-ia no crime de
homicídio privilegiado.
No entanto, apesar do resultado obtido, entende-se ainda pela possibilidade de
obtenção de um provimento judicial que autorize a eutanásia, obtido por meio da aplicação do
pensamento de Robert Alexy. Mas, mediante condições fáticas favoráveis, que viabilizem, por
meio de argumentos racionais, o preenchimento das variáveis de modo a prevalecer o
princípio do direito à liberdade.

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