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DA RELAÇÃO ANGULAR DO PROCESSO·

ALFREDO DoLCINO MOTTA**

"Todos esses vínculos acabam por constituir um


complexo de relações jurídicas unidas e amalgama-
das em razão da finalidade compositiva do proces-
so civil, e que tem o nome de relação processual."
(Marques, José Frederico. Manual de direito
processual civil.)

1. Objetivo e limite; 2. A construção histórica do conceito


de relação processual; 3. Pretensão, ação, processo, proce-
dimento e relação processual; 4. Relação processual: con-
ceito, características, sujei/os, marcos; 5. Conclusão.

1. Objetivo e limite

Tem o presente trabalho o escopo primacial de tecer algumas considerações


acerca da natureza das relações que se estabelecem no processo e, em parti-
cular. no processo civil. O tema, já se observa, não é novo, não encerra qual-
quer novidade no campo doutrinário; elegemo-lo, todavia, para demonstrar
nosst interesse pelo estudo estrutural do direito processual civil. E, ao dizer-
mos estrutural, não estamos, em hipótese alguma, afastando todo o vasto con-
teúdo humanístico que deve presidir às construções processuais, e em que,
para nós, avulta a do direito de as partes litigantes serem igualitariamente tra-
tadas. Temos, assim, que a pesquisa da estrutura do direito processual civil,
longe de transformá-lo em algo puramente mecanicista, estará, em verdade,
contribuindo para uma maior certeza na aplicação das próprias normas
processuais.
Inconteste se torna o fato de que o direito processual já obteve, graça5
à sistematicidade de seus conceitos fundamentais, maioridade como ciência
autônoma - o que não quer dizer, por outro lado, não guarde ele relações
com as demais disciplinas jurídicas.
Ora, ao repisarmos o já proclamado caráter científico do direito processual,
temos em mente a própria conceituação do conhecimento científico. Em que
consiste, afinal, tal sorte de conhecimento? O que o singulariza em face de
outros campos do saber e fazer humanos, como, por exemplo, o artístico
e o técnico?
B a moderna epistemologia que, ultrapassando a noção clássica de que a
ciência seria qualquer conhecimento dotado de método e objeto próprios, nos

• O presente trabalho, apresentado ao Curso de Direito Processual promovido pelo Centro


de Atividades Didáticas do INDIPO, em 1982, mereceu nota máxima e está sendo publi-
cado por decisão do Conselho Editorial da Revista de Ciência Política.
•• Advogado.

R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 25(3): 132-141, set./dez. 1982


ensina ser o discurso científico um todo, um corpus, constituído por concei-
tos, princípios e definições devidamente articulados entre si. Desse modo,
podemos concluir, ainda que precariamente, ser a ciência um saber caracte-
rizado pela coerência de sua linguagem conceitual. (A técnica poderia, por
sua vez, ser definida como a aplicação dos postulados científicos, o momento
prático da ciência, enquanto o fazer artístico teria a identificá-lo ser um tra-
balho capaz de trazer consigo mais de um significado, vale dizer, uma lin-
guagem polissêmica ou plurívoca, em contraposição à linguagem unívoca da
ciência.) Mas, para que essa linguagem cieniífica possa aspirar a foros de
cientificidade, mister se faz construa-se ela coerente e consistentemente, isto
é, de tal sorte que suas definições não confUtem umas com as outras.
Em apoio à epistemologia, vem o método estrutural (o estruturalismo, ou
os vários estruturalismos hoje existentes) confirmar que a consistência de um
determinado conhecimento científico pode ser testada por sua redução a mo-
delos, através dos quais fique evidenciada a estrutura do seu objeto. Assim,
discute-se muito, atualmente, se é a possibilidade da redução de um objeto
a modelos que confere o status scientiae a um dado conhecimento. Sem pre-
tendermos estender-nos em tal polêmica (de resto, nos faltaria a devida com-
petência para fazê-lo), julgamos que o método estrutural contribui para a rati-
ficação do caráter científico de um determinado saber. E é justamente o
modelo (tão apregoado pelo estruturalismo) que manifesta, à evidência, a es-
trutura, id est, o solo subjacente sobre o qual se constrói a fundamentação
de qualquer ciência.
~, portanto, devido às articulações que se entretecem entre seus vários
institutos, garantindo-lhe, desse modo, sistematicidade, e devido, ainda, ao
estreito relacionamento que se estabelece entre todas as suas definições e con-
ceitos, que o direito processual se nos impõe como ciência, a merecer, assim,
dos juristas, o mais acurado e profundo estudo.
A perfeita caracterização da natureza da relação processual insere-se. por-
tanto, no amplo quadro das preocupações dos doutrinadores em tornar sempre
mais coerente e consistente a construção científica do direito processual. Essa
caracterização - refrisemo-lo - vem sendo, pois, estabelecida desde o sé-
culo XIX graças aos estudos de alguns dos maiores mestres da ciência pro-
cessual; contudo, e ainda de conformidade com o fim a que nos propusemos
no limiar desta exposição, outro objetivo não temos senão o de aplicar um
enfoque estrutural à ciência processual, enfoque esse que, como temos insis-
tido, irá reforçar, ratificar e acentuar, ainda mais, a cientificidade de que
se reveste o estudo do direito processual.
Tal, portanto, o nosso objetivo, que, por si só, já se acha balizado; tal,
enfim, o objetivo que, ao termo das presentes linhas, desejamos venha a ser
razoavelmente colimado.

2. A construção histórica do conceito de relação processual


Durante muito tempo foi o direito processual considerado um simples apên-
dice do direito material, melhor dizendo, o direito processual não passaria
de um conjunto (as mais das vezes não-sistemático) de fórmulas capazes de
dar concreticidade ao que se pleiteava em juízo. Disso é ainda resquício o
emprego, totalmente indevido, por certo, das expressões direito substantivo
e direito adjetivo (a primeira, para designar o direito material; a segunda, o
direito processual), como a traduzir a idéia de acessoriedade que estaria a ca-

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racterizar este último ramo do direito. Assim, só depois de um longo e paciente
trabalho doutrinaI é que as normas processuais foram assumindo caráter ver-
dadeiramente ontológico, isto é, puderam ser tomadas em si mesmas, sem que
estivessem deterministicamente vinculadas ao direito material.
Como resultado desse esforço em tomar cada vez mais autônomos (sem
excluir, repitamos, a interdependência com outros princípios jurídicos) os con-
ceitos do direito processual, tivemos a formulação do direito de ação como
direito independente da pretensão deduzida em juízo, formulação essa que se
constitui numa das maiores conquistas da doutrina jurídico-processual, por-
quanto enfatiza a possibilidade de em muitos casos haver ação sem que haja,
por outro lado, qualquer direito, qualquer pretensão a ser protegida.
Destarte, e ainda como conseqüência do avanço da ciência processual (e
aqui nos cabe manifestar o entendimento de que, embora haja um direito
processual civil e um direito processual penal, o certo é que, por seus postu-
lados e princípios comuns, podemos falar na unidade dessa mesma ciência
processual), chegamos a uma noção de processo agora desvinculada da even·
tual procedência, ou não, do pedido feito em juízo. Desse modo, podem ocor-
rer nulidades processuais a obstar o prosseguimento da relação processual,
sem que se haja atingido o mérito da pretensão esposada, o que vem, por-
tanto, a confirmar a autonomia do direito processual em face do direito
material.
Cabe-nos, neste passo, frisar que, quando nos referimos à autonomia, não
estamos negando a interdependência existente entre o direito material e o
direito processual, porquanto, sem este último, aquele jamais poderia opera-
cionalizar-se, o que vem a acentuar, por outro lado, o próprio caráter de ins-
trumentalidade do processo.
Outro grande triunfo da ciência processual seria o do estabelecimento, em
termos teóricos precisos, da natureza, da essência mesma da relação proces-
sual, o que só veio a ocorrer, insistamos, em decorrência do próprio desen-
volvimento desta nossa ciência.
Mas desde quando podemos falar em relação processual? Como essa noção
ganha um caráter efetivamente coerente dentro do direito processual?
Estudando-se a história do direito, compreendemos que, durante largo lapso
de tempo (quando, a rigor, ainda não se podia falar em direito, uma vez que
inexistia um poder - o Estado, como sociedade politicamente organizada -
capaz de dirimir litígios), as contendas se resolviam, se é que assim podemos
dizer, entre os próprios litigantes; ou melhor, os participantes de uma relação
conflituosa não tinham a mediá-los qualquer outro poder, o que ensejava a
que, quase sempre, o mais forte fizesse prevalecer suas razões. Se pudéssemos
referir-nos, nessa época, a uma pretensa relação processual (quando ainda não
há processo, porque não há direito; e ainda não há direito, porque ainda não
há Estado), esta, como dissemos, haveria de se realizar entre os próprios con-
flitantes, sem a presença de qualquer autoridade que, superior a ambos, pu-
desse mediar e decidir o litígio. Teríamos, assim, sendo A e B os protagonis-
tas do conflito,

A B

em que A procura, por suas próprias mãos (o regime da autotutela) fazer


valer sua· pretensão, enquanto B procura defender-se, opondo-se ao deside-
rato de A.

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Com o advento do Estado, como instituição capaz de regular as relações
entre as pessoas, como ente afinal criado pela vontade coletiva e a que, como
sustenta Rousseau, em seu Contrato social, os particulares entregam uma par-
cela de sua liberdade, então começam a ser criados mecanismos, de início
bem incipientes, é certo, voltados para disciplinar conflitos de interesses. Assim
é que, desde o Código de Hamurábi, verdadeira conquista jurídica para o
tempo, pois limitava a retaliação do ofendido à gravidade que este sofrera
- a famosa lex talionis "olho por olho, dente por dente" - até os monu-
mentos jurídicos criados pelos romanos, de que nos dá testemunho, por exem-
plo, o admirável Corpus Iuris Civilis, continuamos a assistir às profundas mo-
dificações por que vai passando o direito, modificações essas que se caracte-
rizavam por uma sempre maior intervenção do Estado como tutor dos direitos
dos seus súditos.
Em Roma, por exemplo, havia, como remédio para a solução de conflitos,
o iudicium, em que as partes litigantes levavam sua questão à apreciação do
praetor, que, em seguida, a encaminhava, através de uma fórmula, ao iudex,
que afinal resolvia o litígio. O iudicium romano seria retomado na Idade Mé-
dia, por Bulgaro, do que nos dá notícia José Frederico Marques.! Mas o certo
é que, então, não se manifestava uma maior singularização das normas pro-
cessuais, levadas que eram, praticamente, à conta de simples fórmulas, cujo
conteúdo e natureza estavam ainda longe de ser tratados como autênticos ins-
titutos jurídicos.
E será no século XIX, quando, como decorrência da própria visão-de-mundo
romântico dominante expressa-se toda uma preocupação em se defender e pro-
clamar a vitória do individualismo (em oposição às muitas limitações sofridas
pelos direitos individuais no tempo do absolutismo), que a ciência processual
atingirá, com efeito, sua maioridade, seja através da formulação de alguns dos
seus mais importantes conceitos (o de ação e processo, principalmente), seja
através do estudo e da formulação da natureza da relação processual, indivi-
dualizando-se, assim, as funções dos três sujeitos que nela tomam parte.
O século XIX, em que também Hegel chegara a antever a idéia de relação
processual, expressa na sua Filosofia do direito, o século XIX assiste ao enten-
dimento, exposto por Bulow e Wach, de que a relação processual seria de
natureza triangular, o que pode ser apresentado na figura a seguir.

A'---____________ ~N

Aí, o processo, o actum trium personarum, desenvolver-se-ia numa teia de


atos envolvendo, reciprocamente, autor e juiz, juiz e réu e autor e réu.

) Marques, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo, Saraiva, 1974.
v. 1, 377 p.

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Que crítica, que avaliação podemos fazer dessa concepção, na verdade das
mais importantes, porquanto busca estabelecer uma estrutura para a relação
processual afastando-a dos simples formalismos que até então a caracterizavam?
Com efeito, a relação que se estabelece entre autor (que denominamos de
agerius) e réu (que chamaremos de negidius) pertence ao domínio do conflito,
do litígio propriamente dito. Uma vez transposto tal litígio para o âmbito ju-
dicial, as relações que aí passam a se desenvolver têm lugar entre o autor e o
juiz (o iudex) e o juiz e o réu - e não mais, como no estágio do simples
litígio, entre autor e réu, sendo este último o posicionamento de Kohler, hoje
não mais aceito pela doutrina, e que, em termos estruturais, pode ser assim
representado:

A N

Daí por que se deve afirmar, como o faz, por exemplo, entre nós, José
Frederico Marques, que a ação é proposta contra o Estado, uma vez que é
dele, Estado, que se reclama o cumprimento da tutela jurisdicional; é ao Es-
tado que o autor manifesta seu pedido, que, ao ser ou não atendido, confirma
a independência, a autonomia da relação processual relativamente ao pedido
formulado. Diga-se, portanto, que o autor propõe ação contra o Estado (por-
quanto, como vimos, é deste que o autor solicita a tutela jurisdicional), em
face do réu, uma vez que será justamente quanto a este que o Estado exer-
cerá seu imperium de restabelecer a ordem jurídica, caso venha o réu a ser
responsabilizado pela lesão de direito alegada pelo autor.
Cremos, portanto, ser a da angularidade a melhor posição acerca da natu-
reza estrutural da relação processual, porquanto tal entendimento, defendido,
entre os autores brasileiros, por, verbi gratia, Hélio Tomaghi, um dos maiores
especialistas contemporâneos de direito processual penal, já situa autor e réu
na esfera propriamente jurídica, não restritos, como afirmamos anteriormente,
ao campo do puro litígio.
Em termos estruturais, poderíamos assim representar a chamada teoria da
angularidade da relação processual:

A""""--------_ _ _ _ _ _ _ _ _ ~N

ou, no caso de haver mais de um sujeito ativo (litisconsórcio ativo) e mais


de um sujeito passivo (litisconsórcio passivo):
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-----------------------~-- - --

di A A~ _ _ _ _ _ _ _ _ __ - - - - -_ _ _ _~N NI NU

Novos enfoques tem continuamente recebido a noção de relação processual,


todos eles no sentido de pretender imprimir um cunho de sempre maior cien-
tificidade ao direito processual civil. Assim é que Goldschmidt, citado por
José Frederico Marques,2 não aceita a idéia do processo como relação proces-
sual, mas sim como situação jurídica, uma vez que, segundo aquele consagrado
autor, os direitos e obrigações dos sujeitos processuais, normalizados por re-
gras de cunho substancial, vêm a se transformar, em juízo, em situação de
expectativa de uma futura sentença, o que, ainda para Goldschmidt, repre-
sentaria a situação jurídica. Esta tese foi, todavia, repelida por Liebman, igual-
mente mencionado por José Frederico Marques,3 que considera ter o ponto
de vista goldschmidtiano delineado a estrutura da res in iudicium deducta, e
não a do processo.
Por seu turno, Jaime Guasp4 concebe o processo como instituição, posicio-
namento esse que é rejeitado por José Frederico Marques, que afirma corres-
ponder tal entendimento ao de relação jurídica complexa, o que, por sinal,
o próprio Jaime Guasp concorda ser inadmissível.
O tema da relação processual tem, por sua riqueza de tratamentos teóricos,
merecido, ao longo dos tempos (notadamente a partir da centúria passada),
diferentes abordagens, o que confirma a preocupação dos processualistas civis
- e dos processualistas em geral - em tomar sempre mais orgânico, siste-
mático, coerente e consistente o discurso de sua ciência.
Analisadas, ainda que muito perfunctoriamente, algumas dessas concepções
teóricas, afirmamos nossa preferência - o que não significa menosprezo em
relação às demais - pelo ponto de vista que confere o caráter de estrutura
angular à relação processual (no que dissentimos respeitosamente, por exem-
plo, de José Frederico Marques, adepto da teoria da triangularidade). Temos,
pois, que nosso posicionamento teórico, respaldado, por sua vez, no ensina-
mento de insignes doutrinadores da ciência processual, como o já citado Hélio
Tornaghi, é o que melhor caracteriza a atuação (comportando seus direitos,
ônus, deveres e obrigações) dos sujeitos da relação processual, sobretudo por-
que afirma situar as relações entre o autor e o réu no âmbito da lide ou
litígio, e não do processo propriamente dito.

2 Id. ibid.
3 Id. ibid.
4 Guasp, Jaime. Apud Marques, José Frederico. op. cito

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3. Pretensão, ação, processo, procedimento e relação processual
Todo discurso que se pretenda verdadeiramente científico deve pautar-se pela
rígida formulação de conceitos coerentes, o que evitará baralhamento de no-
ções, como muitas vezes se verifica na construção do corpus teórico de um
determinado conhecimento.
No estudo que ora estamos desenvolvendo, cumpre-nos, em especial, esta-
belecer distintamente as definições de pretensão, ação, processo, procedimento
e relação processual. Assim é que pretensão é a faculdade subjetiva de se re-
clamar de outrem o cumprimento de uma determinada obrigação, como a de-
fine Pontes de Miranda, ipsis verbis: 5 "Pretensão é a posição subjetiva de
poder exigir de outrem alguma prestação positiva ou negativa." Assim, pode
haver casos em que haja pretensão, sem que se tenha exercido qualquer ação.
O só ajuizamento desta não basta, por seu turno, para que se constitua a
relação processual, que só se terá por efetivamente instaurada com a citação
válida do réu, seja para a contestar, excepcionar e/ou reconvir.
Por sua vez, ação é o direito público subjetivo (porque impetrado contra
o Estado), autônomo, porém conexo a uma pretensão, uma vez que o pedido
de tutela jurisdicional tem por escopo satisfazer a pretensão geradora da lide;
é, ainda, abstrato, porquanto independente da procedência ou não do pedido.
Ajuizada a ação, conforme preceitua o art. 263 do Código de processo civil,
"considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada
pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara. A pro-
positura da ação, todavia, só produz, quanto ao réu, os efeitos mencionados
no art. 219 (tomar prevento o juízo, induzir litispendência e fazer litigiosa a
coisa; e, ainda que ordenada por juiz incompetente, constituir em mora o de-
vedor e interromper a prescrição), depois que for validamente citado". Ajuizada
a ação, esta considerar-se-á exercida, venha ou não a ser acolhido o pedido
do autor.
Ação e processo não se confundem; este é um conjunto de atos jurídicos,
cuja forma e interdependência são reguladas por normas processuais, que dis-
ciplinam, ainda, a atuação recíproca dos sujeitos do processo - sua legiti-
mação e capacidade, seus direitos, ônus e obrigações.
O processo, porém, só terá validade uma vez atendidos certos pressupostos,
por isso mesmo chamados pressupostos de validade processual, e não, rigoro-
samente, pressupostos de existência, porque o processo, em si mesmo, pode
existir, ainda que se ressinta dos pressupostos de validade, que variarão se-
gundo a natureza específica do processo - seja de conhecimento, de execução
ou cautelar. Para José Frederico Marques,6 tanto os pressupostos de validade
como os de existência "... não passam de pressupostos de admissibilidade
da tutela jurisdicional para a composição da lide". Assim, são pressupostos
processuais (que, segundo Chiovenda, formam, com as condições da ação e o
mérito, o chamado trinômio processual), por exemplo, a legitimatio ad pro-
cessum, a competência e a ausência de fatos impeditivos.
Por outro lado, o processo se distingue do procedimento, porquanto este
representa a marcha, a sucessão dos atos jurídicos componentes do processo.
B, pois, o procedimento que, por manifestar formal e extrinsecamente os atos
processuais, revela o próprio processo. Temos, assim, que, enquanto o processo
é o conjunto de atos jurídicos que se dirigem para a consecução do seu obje-

Pontes de Miranda. Tratado das ações. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 1970.
t. 1, p. 52.
6 Marques, José Frederico. op. cit.

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tivo - a compOSlçao da lide ou litígio, com a declaração da procedência


ou não do pedido do autor - o procedimento é o próprio processo em anda-
mento, vale dizer, o fenômeno jurídico capaz de exteriorizá-lo.
Assim, por ser de natureza eminentemente jurídica é que não podemos apli-
car o termo processo aos procedimentos que têm lugar no âmbito administra-
tivo, quando se trata de se atingir um determinado fim colimado pela adminis-
tração, o que explica por que, neste último caso, deva aludir-se a procedimen-
tos administrativos, e não a processos.
Por fim, a relação processual é o complexo de vínculos - no que se in-
cluem direitos, ônus, deveres e obrigações reciprocamente considerados - que,
determinando as funções de cada sujeito processual, torna interdependentes as
partes integrantes do processo, o actus trium personarum.

4. Relação processual: conceito, características, sujeitos, marcos


Complexo de vínculos que estabelecem interdependências entre as três fi-
guras participantes do processo - autor, juiz e réu - , definindo-lhes as fun-
ções e atribuindo-Ihes direitos, deveres, ônus e obrigações, a relação proces-
sual caracteriza-se, inicialmente, por ser de natureza de direito público, por-
quanto o conjunto de seus liames promana das normas informadoras do direito
processual civil, um dos ramos do direito público. Ademais, a relação proces-
sual é autônoma, uma vez que não se acha subordinada à existência de uma
relação de direito material; vale dizer, a relação processual não pressupõe que
haja, com efeito, uma pretensão a ser efetivamente atendida.
Por outro lado, a relação processual é unitária (conquanto seja composta
de uma gama, de uma pluralidade de atos), ou seja, todos os seus atos se
orientam num mesmo sentido, id est, a causa final do processo, a composição
secundum ius da lide ou litígio.
A relação processual caracteriza-se, ainda, por sua complexidade, porquanto
não é constituída de um único direito ou obrigação, mas, sim, de uma série
de vínculos jurídicos coordenados em função do objetivo ou finalidade do
processo.
A derradeiro, a relação processual identifica-se por seu caráter de progres-
sividade, vale dizer, seus atos vão-se sucedendo paulatinamente, um após ou-
tro, obedecendo a uma seqüência imposta pelas normas jurídico-processuais,
até que o Estado, através do Poder Judiciário, se manifeste acerca da proce-
dência ou não do pedido. E é justamente dentro das características da relação
processual que vamos encontrar o seu traço de angularidade, característica que,
no nosso modo de entender, melhor nos apresenta a estrutura mesma da re-
lação processual.
Mas o que vem a ser a estrutura?
Entendemos por estrutura o conjunto de nexos sistematicamente entrosados
que possibilita a articulação entre as diferentes partes de um determinado
objeto, seja ele físico ou puramente conceitual. :E: tão patente o caráter verda-
deiramente estrutural em que se manifesta a natureza angular da relação pro-
cessual, que basta suprimamos-lhes um de seus pólos, um de seus sujeitos,
para que, simplesmente, a relação processual não mais subsista. Assim, se omi-
tirmos, por exemplo, o autor (o agerius) , a relação processual não se perfaz,
o mesmo ocorrendo se dela alijarmos o juiz (o iudex) , ou ainda o réu (o
negidius) , o que, como igualmente afirmamos, desnatura a relação processual,
impedindo, destarte, a formação do actus trium personarum em que se mate-
rializa o processo.

Relação angular 139


o caráter estrutural - de natureza angular - da relação processual, sobre
se constituir em elemento cognoscitivo dos mais importantes para a coerente
construção teórica do que se entende por relação processual, é, ainda, tema
de reflexos igualmente práticos, uma vez que a correta aplicação dos postu-
lados em que se esteia a relação processual contribuirá para que ela possa
efetivamente desenvolver-se, com vistas ao atingimento do escopo final do pro-
cesso, a composição do litígio.
Tendo estudado que a relação processual disciplina os direitos, deveres,
ônus e obrigações das partes integrantes do processo, cabe-nos tentar analisar,
nesse passo, quais os seus sujeitos. Assim é que, de início, temos o autor,
que vimos denominando de agerius, consoante lição do Prof. Affonso Pernet.
Situa-se, pois, o autor, no pólo ativo da relação processual, o sujeito que
toma a iniciativa de provocar a atuação do Poder Judiciário, o qual, por sua
vez, não pode agir senão quando chamado a dirimir uma controvérsia, tudo de
conformidade com o princípio ne procedat iudex ex-of/icio. Não basta, toda-
via, que o pedido comporte, em si mesmo, foros de veracidade ou verossi-
milhança; cumpre, ainda, demonstre o autor possuir legitimação, tanto no que
respeita à causa propriamente dita (legitimatio ad causam) como ao próprio
processo (legitimatio ad processum), o que, não acontecendo, acarretará ao
autor a carência de ação.
Já no pólo passivo da relação processual se encontra o réu (o negidius),
aquele em face de quem (e não contra quem) é impetrada a ação. Assim
como ocorre relativamente ao autor, o réu, para poder participar da relação
processual, terá de demonstrar ser detentor de legitimidade para a ação e
para o processo, as legitimationes ad causam e ad processum, a que há pouco
nos referimos.
No ápice da relação processual se posiciona o juiz (o iudex), parte desin-
teressada no litígio, e a quem, como órgão jurisdicional que é, incumbe mani-
festar-se acerca da procedência ou não do pedido.
Desses direitos de ação (do autor) e de defesa (do réu), promanam, assim,
não apenas outros direitos subjetivos processuais, que autor e réu vão exer-
citando ao longo do processo, mas, ainda, e como igualmente já acentuado,
deveres, ônus e obrigações, estabelecendo-se, desse modo, os vínculos ent:e o
sujeito ativo e passivo do processo, sujeitos esses cuja atuação e intervenção
têm a regulá-las os imperativos jurídicos formulados pelas normas processuais.
Por seu turno, o poder jurisdicional de que se acha investido o juiz é fulcro,
de igual modo, de poderes que o magistrado vai exercendo no evolver do
processo.
Assim, ação, defesa e jurisdição representam as fontes polarizadoras funda-
mentais da relação processual, cada uma delas identificada por traços espe-
cíficos que subjetivam e individualizam o emprego dos imperativos jurídicos,
aglutinados na relação processual. E são justamente essas três posições fun-
cionais, representadas pelos três sujeitos integrantes de todo processo - autor,
juiz e réu - , que conferem ao processo civil a sua natureza de relação jurídica.
Detenhamo-nos, por último, no estudo dos marcos balizadores da relação pro-
cessual: o seu início e o seu término.
Sabemos, pois, que a relação processual se instaura com a citação válida
do réu, que passa, a partir de então, a integrar o actus trium personarum
em que se constitui o processo. Indeferida, por outro lado, a petição inicial,
com fulcro num dos motivos elencados no art. 295 do Código de processo
civil, a relação processual não çhega a prosperar, nem sequer a existir, tendo
o autor exercido, tão-somente, o ius postulandi.

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A relação processual atinge o seu término com a declaração do Estado acerca
da procedência ou não do pedido, ou seja, na sentença, que Pontes de Mi-
randa7 define como "a prestação jurisdicional, objeto da relação jurídica pro-
cessual", ou, ainda, com o término do processo sem que haja julgamento de
mérito, nas hipóteses configuradas no art. 267 do Código de processo civil.

5. Conclusão
A par do seu interesse conceitual, que tem ajudado o direito processual
a se afirmar, cada vez mais, como conhecimento eminentemente científico,
porquanto fundamentado na coerência e inter-relacionamento de seus conceitos
e princípios, o problema da relação processual também se reflete, como já o
afirmamos por mais de uma vez no presente trabalho, na vida prática, uma
vez que, se não regularmente constituída, o que só ocorrerá com a citação
válida do réu (o negidius), não poderemos sequer aludir a relação processual,
nem, por conseguinte, a processo.
Assim, a perfeita conceituação da relação processual como complexo de
nexos jurídicos que especificam e individualizam as atuações, interdependen-
tes, dos sujeitos do actus trium personarum, e, ainda, o entendimento de sua
verdadeira natureza estrutural, vale dizer, a sua angularidade, revelada pelo
fato de que o autor impetra uma determinada ação contra o Estado (de quem
reclama a satisfação de uma pretensão resistida) em face do réu (o pólo pas-
sivo da relação processual) são questões a cuja solução os estudiosos do di-
reito processual civil se têm afincadamente dedicado, de modo a tornar sempre
mais coerente e consistente o discurso de sua ciência.
Porém, como igualmente já o acentuamos, o direito não é um saber distan-
ciado da realidade; ao contrário, a ciência jurídica procura afinar seus con-
ceitos, princípios e definições com a própria evolução da sociedade, sociedade
em que tem sempre mais prevalência a observância dos direitos do homem
contra toda sorte de arbítrio. Desse modo, o conhecimento da relação pro-
cessual, do seu estabelecimento, de sua existência, de sua validade, é, de igual
modo, da maior importância para o advogado militante, visto ser imprescin-
dível saiba ele, corretamente, quais os direitos, as obrigações, os ônus e os
deveres decorrentes da interação que se verifica entre os sujeitos da relação
processual, a legitimação (para a causa e para o processo) tanto do autor
quanto do réu.
Seja, pois, do ponto de vista estritamente conceitual (científico, portanto),
seja, ainda, sob o ângulo de sua utilidade, o tema da relação processual abriga
questões e aspectos (de que, certamente, não soubemos tratar com o devido
engenho e arte neste modesto trabalho) que só vêm a ratificar a magnitude
da ciência processual civil como um dos mais importantes continentes do
universo científico jurídico. Era o que pretendíamos demonstrar, repetimos,
nesta modestíssima exposição.
Bibliografia
Marques, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo, Saraiva, 1974, v. 1,
377 p.
Novo código de processo civil. Rio de Janeiro, Gráfica Auriverde, 1974. 331 p.
Pontes de Miranda. Tratado das ações. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1970.
t. 1, 371 p.
Tomaghi, Hélio Bastos. A Relação processual penal. 1945.
7 Pontes de Miranda. op. cit.

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