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Os princípios da antropologia teatral de Eugenio Barba na


construção da personagem e a utilização da metodologia do
alvo de Declan Donnellan na montagem: Rojas Rosas .

Camila Rodrigues Vaz Chaves

Orientador: Fernando Mencarelli

RESUMO

Partindo da concepção do espetáculo Rojas Rosas, o presente artigo visa apresentar


como os conceitos da antropologia teatral de Eugenio Barba podem auxiliar na criação
do personagem, e como esta prática facilita a concepção da cena dramática baseada na
metodologia do “Alvo” de Declan Donnellan, permitindo encontrar reações particulares
das personagens e estéticas que fujam do realismo.

PALAVRAS-CHAVE: Antropologia teatral. Metodologia do alvo. Declan Donnellan.


Personagem.

Este artigo pretende abordar como o trabalho prático a partir dos conceitos da
antropologia teatral de Eugenio Barba pode ser utilizado como auxiliar na metodologia
do “alvo” de Declan Donnellan através da construção de personagem. E para explicar
como essa correlação pode se dar utilizarei como exemplo o processo de criação do
espetáculo Rojas Rosas, baseado na obra Misterio del ramo de rosas de Manuel Puig,
em que participei como atriz juntamente com Camila Flávio, sob a direção de Adélia
Carvalho.

 
 

Sendo assim, introduzirei explicando a metodologia do alvo e a antropologia teatral


através da experiência prática que obtive com cada uma dessas pesquisas, experiências
essas que serviram como processo de preparação e investigação para a elaboração do
espetáculo que teve como proposta a correlação de ambas teorias.

1. A metodologia do “alvo” de Declan Donnellan.

Participei junto à atriz Camila Flávio, minha companheira de cena do espetáculo Rojas
Rosas, do Estúdio Fisções, projeto de pesquisa orientado pelo professor Luiz Otávio
Carvalho, que teve como objetivo formar artistas cênicos através do estudo da ação
física utilizando a metodologia do “Alvo” proposta por Declan Donnelan. Tomando por
base a conceituação de Bonfitto:

Reconheço, como primeira característica fundamental, o fato da ação


física ter sido considerada e nomeada inúmeras vezes por Stanislavski
como uma ação psico-física. Ou seja, no processo de sua execução as
ações devem desencadear processos interiores, agindo dessa forma
quase como “iscas”. (BONFITO, 2009, p.25)

Dessa maneira, observando a necessidade das ações em cena desencadearem processos


interiores para a formação das ações físicas, utilizamos o conceito de alvo para alcançar
esse objetivo. O “alvo” foi criado por Donnellan para que o ator não se sinta bloqueado
em cena pensando no que deve fazer ou saber, mas sim agindo a partir de algo externo a
ele, o que seria o “alvo”, e assim, através da prática física, o ator é capaz de desencadear
processos interiores.

“Não sei o que estou fazendo”. Este é o mantra de todo ator


bloqueado, e é uma armadilha pela qual qualquer um pode escorregar.
[...] A estrutura da oração é importante. A palavra “eu” se repete. [...]
Mas esta queixa, em aparência razoável, tem ignorado completamente
algo crucial. [...]A atenção que deveria ir a nosso “algo”, se
transforma em pessoal, se reverte no “eu”. [...] Resulta crucial
comprovar que as demandas do “saber” e do “eu” não podem ser
resolvidas se não tratamos antes com o inominado. Assim,
começaremos com esse “algo” tão abandonado que nem sequer tem

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ainda um nome. A esse inominável o batizarei O ALVO. [...]Devemos


enfrentarmo-nos com o alvo antes de fazê-lo com o “eu” ou com o
“saber”. (DONNELLAN, 2007, p.22 e 23)1

Para compreender melhor a teoria do alvo, pode ser lido neste artigo o Anexo 1, que é
um trecho do relatório final da Iniciação Científica que realizei, vinculada ao Estúdio
Fisções, em que apresento um pouco mais a teoria.

Através dessa experiência, descobrimos como a metodologia do “alvo” permite gerar


confiança no ator, já que tem como objetivo desbloqueá-lo. E como também objetiva
limpar o desnecessário na cena, possibilita criar partituras claras para o espectador.
Conscientes dessas vantagens é que escolhemos essa metodologia para compor as cenas
do espetáculo Rojas Rosas, que como dito anteriormente, servirá de guia para o
esclarecimento das teorias deste artigo e também como exemplo prático de uma maneira
de criar a partir delas.

2. A antropologia teatral de Eugenio Barba

A escolha de Barba para a elaboração do espetáculo se deu pela experiência de ambas as


atrizes participarem da matéria Atuação Cênica C, que foi ministrada pela professora – e
diretora do citado espetáculo – Adélia Carvalho, em que experimentamos, através de
diversos exercícios, os “princípios-que-retornam”, que são: o cotidiano e o
extracotidiano, o equilíbrio em ação, a dança das oposições, a incoerência coerente e
virtude da omissão, a equivalência, e um corpo decidido. Todos estes termos são
chamados por Barba de “bons conselhos” aos atores, ao concluir sua pesquisa na
antropologia teatral:

Vários atores e dançarinos, de lugares e épocas distintas e


independentemente das formas estilísticas de suas próprias tradições,
                                                                                                                       
1
Tradução da autora do original: “No sé lo que estoy haciendo”. Éste es el mantra de todo actor
bloqueado, y abre una trampa por la que cualquiera puede resbalarse. […] La estructura de la oración es
importante. La palabra “Yo” se repite. […] Pero esta queja, en apariencia razonable, ha ignorado
completamente algo crucial. […] La atención que se debía a nuestro “algo”, su cuota personal, ha

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compartilham princípios semelhantes. A primeira tarefa da


antropologia teatral é rastrear esses princípios-que-retornam.
Os princípios que retornam não provam a existência de uma “ciência
do teatro” ou de algumas leis universais. São apenas “conselhos
particularmente bons”, indicações que têm uma grande chance de se
tornarem úteis para a prática cênica” (BARBA, 2012a, p.14).

Assim, ao longo da matéria Atuação Cênica C, trabalhamos os princípios-que-retornam


da seguinte maneira: experienciamos formas de andarmos e agirmos em cena
extracotidianamente, diferente da maneira como agimos em nosso dia-a-dia que é
influenciada por nossa cultura; fizemos também um treinamento diário, o que
proporcionou certo domínio técnico em nossos corpos; trabalhamos as possibilidades
individuais de como alterar o equilíbrio no jogo cênico, este “equilíbrio de luxo” exige
alto custo de energia e também nos permite atingir o corpo extracotidiano e dilatar a
presença cênica.

Ainda para dilatar a presença, buscamos maneiras de gerar tensões entre forças
contrapostas, trabalhando, por exemplo, a pressa interna, porém revelada em um corpo
que precisa agir de maneira tranquila. Ou o oposto, o corpo que possui agilidade, mas
que não carrega nenhuma necessidade de pressa ou tensão. Experimentamos também o
conceito de “sats”, que é a suspensão da energia:

No comportamento físico, a passagem da intenção à ação constitui um


típico exemplo de diferença de potencial.
No instante que precede a ação, quando toda a força necessária se
encontra pronta para ser liberada no espaço, mas como que suspensa e
ainda presa ao punho, o ator experimenta a sua energia na forma de
sats, preparação dinâmica. O sats é o momento no qual a ação é
pensada-executada por todo o organismo, que reage com tensões
também na imobilidade. Existe um empenho muscular, nervoso e
mental já dirigido a um objetivo. É a extensão ou retratação da qual
brota a ação. (BARBA, 2012b, p.79)

O sats, que é o impulso e o contra-impulso juntos, mesmo que ainda não trabalhado
dentro do jogo cênico, que é seu principal objetivo, foi uma preparação, uma
experimentação para estarmos desenvoltas diante da possibilidade de trabalhar

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oposições em cena e dilatar a presença cênica. Experimentar variações rítmicas também


fez parte do processo, que propicia domínio corporal e retenção de energia, facilitando a
criação de corpos diferenciados. E para trabalhar o corpo-decidido, afim de alcançar
ações precisas – porque o corpo já decidiu realizá-las –, treinamos a intenção e o
impulso.

Todo este processo possibilitou uma formação atoral que nos permitiu acessar corpos e
energias diferenciados com fluidez. E que foi fundamental como preparação pré-
expressiva das atrizes, sendo a pré-expressividade conceituada por Barba da seguinte
maneira:

O conceito de pré-expressividade pode parecer absurdo ou paradoxal,


já que não leva em consideração as intenções do ator, seus
sentimentos, sua identificação com o personagem, suas emoções, ou
seja, toda a psicotécnica [...] A psicotécnica leva o ator a querer
expressar, mas o “querer expressar” não determina o que ele tem que
fazer. Na verdade, a expressão do ator deriva – ainda que apesar dele
mesmo – das suas ações, do modo como ele usa a sua presença física.
É o fazer e o como é feito que determina o que a pessoa expressa.
De acordo com a “lógica do resultado”, o espectador vê um ator que
expressa sentimentos, ideias, pensamentos e ações, ou seja, o
espectador vê a manifestação de uma intenção e de um significado.
Essa expressão é apresentada aos espectadores em sua totalidade:
então ele é levado a identificar o que o ator está expressando com o
como ele expressa.
Naturalmente é possível analisar o trabalho do ator a partir dessa
lógica. No entanto ela leva a uma avaliação geral que muitas vezes
não facilita a compreensão de como aquele trabalho foi realizado no
nível técnico, ou seja, através do uso do corpo e da sua fisiologia.
A compreensão do como pertence a uma lógica complementar à lógica
do resultado: a lógica do processo. (BARBA, 2012a, p.227)

A lógica do processo proposta pela antropologia teatral é proporcionar a dilatação da


energia do ator, possibilitar a ele ser uma presença em cena, este é o maior foco da pré-
expressividade. E todo esse trabalho pré-expressivo vivenciado ao longo da matéria
Atuação Cênica C teve forte influencia na utilização dos conceitos da antropologia
teatral de Barba no resultado expressivo, como será apresentado neste artigo.

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3. A importância dessas experiências para a montagem Rojas


Rosas

Observamos no Estúdio Fisções que a pesquisa de Declan Donnellan segue a linha de


estudos de Konstantín Stanislavski, já que Stanislavski propõe o trabalho do ator a partir
das tarefas que o texto dramatúrgico apresenta. E Donnellan também, pois baseia a
reação no contexto em que está inserida a situação, e em seus exemplos as situações
surgem a partir da dramaturgia.

Como a construção do espetáculo Rojas Rosas foi proposta a partir de um texto


dramático, nos propusemos a trabalhar a utilização do texto tal qual esses criadores-
pensadores: observando as situações propostas na peça e separando as subunidades que
a compõe, pois objetivávamos criar a cena de maneira clara e coerente com o texto
através da metodologia do “Alvo”.

Este é um rico trabalho para nos aprofundarmos no contexto, criarmos com coerência, e
para descobrirmos cada vez mais as minúcias do texto. Porém, como experienciamos os
conceitos da antropologia teatral de Eugenio Barba depois de um ano em que já
estávamos integrando o Fisções, observei após essa experiência que o domínio dos
“princípios-que-retornam”e o trabalho com eles - principalmente em relação ao que se
nomeia “cotidiano e extracotidiano”, que nos incitava a agir de maneira diferente da
habitual - me permitia fugir do óbvio durante a criação da personagem. E, como
consequência, me auxiliava a alcançar o artístico/artificial2, o que não ocorria com
facilidade ao construir cenas sem o trabalho pré-expressivo como no primeiro ano do
Estúdio Fisções, já que tínhamos somente como influência, ou matriz geradora, o texto
dramático.

Considerando que a dramaturgia utilizada apresentava personagens com distúrbios e,


como consequência disso, propunha diversas alucinações, pretendíamos criar cenas que

                                                                                                                       

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Utilizo aqui o termo: “artístico/artificial” como oposto de cotidiano ou habitual. Como no seguinte
trecho de Eugenio Barba: “...As técnicas extracotidianas tendem à informação: literalmente põem-em-
forma o corpo, tornando-o artístico/artifical, porém crível.” (BARBA, 2012, p.30).

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fugissem do cotidiano, alcançando o artístico/artificial, e personagens que fossem


complexas e permitissem diversas leituras sobre sua maneira de ser, agir e pensar.

Dessa forma, apostamos para a concepção do espetáculo na utilização das duas


referências: os conceitos da antropologia teatral de Eugenio Barba para nos auxiliar na
etapa de preparação, que nos deu elementos para criar a personagem fundada na
corporeidade, nos permitindo fugir do cotidiano; mas também a metodologia do “Alvo”
de Declan Donnellan, para trabalhamos o texto e a maneira de reagir a partir dele de
forma coerente.

4. O processo de criação

Iniciamos o processo de criação do espetáculo partindo da antropologia teatral de


Eugenio Barba, mais especificamente de um dos seus conceitos: o treinamento. Assim
como coloca Barba, o treinamento é uma sequência individual de exercícios para serem
repetidos constantemente pelo ator com a finalidade de atingir sua virtuose a partir da
técnica.

[...] é possível construir uma série de exercícios que a pessoa pode


aprender e repetir assim como se repetem os vocábulos de uma língua.
No começo eles serão repetidos mecanicamente, como os vocábulos
de uma língua estrangeira que se deseja aprender. Em seguida serão
absorvidos, começarão a “aparecer por si só”. Aí então o ator terá que
escolher. Ele pode fazer pouquíssimos exercícios. Os exercícios
podem ser repetidos não só em ordem diferente, mas também podem
ser feitos com um ritmo diferente, em direções diferentes, de forma
introvertida ou extrovertida, acentuando uma fase do exercício ou
outra.[...]Com os exercícios de treinamento, o ator coloca à prova a
sua capacidade de alcançar uma condição de presença total, a mesma
condição que terá que reencontrar no momento criativo na
improvisação e do espetáculo. (BARBA, 2012a, p.290).

A escolha pelo uso do treinamento individual se deu não só com o intuito de atingir a
presença “total” e uma certa virtuose, mas principalmente pelo objetivo de utilizá-lo
como base para a criação das nossas personagens, como será apresentado adiante.

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4.1 Do treinamento individual à criação da personagem

Criamos um treinamento individual que foi repetido diariamente como forma de


aquecimento corporal para todos os dias de ensaio. E sua construção se deu da seguinte
maneira: escolhemos utilizar seis movimentos de oito tempos, que juntos formaram uma
sequência de 48 tempos que trabalhavam conceitos fundamentais para os princípios-
que-retornam: equilíbrio, força, resistência, direção espacial, agilidade, ritmo, atenção e
planos (alto, médio e baixo).

Mas como tínhamos o objetivo de que o treinamento servisse de base para a construção
das personagens, a criação dos movimentos da sequência se deu pela escolha de cada
atriz de seis verbos utilizados por suas personagens ao longo da peça, cada verbo
correspondendo a um movimento da sequência.

A utilização dos verbos do texto na sequência física nos auxiliou a conectar, identificar
e pensar na personagem, já que eram verbos usados com frequência por ela ao longo de
toda a dramaturgia. Porém, como nos propusemos a criar partindo dos conceitos
fundamentais dos princípios-que-retornam, os movimentos da sequência, por mais
ligados que estivessem aos verbos e a maneira como apareciam e se repetiam no texto,
foram elaborados de forma que fugissem do ilustrativo. Esta fuga foi interessante para a
sequência porque sua intenção era explorar ao máximo as possibilidades corporais, visto
que o treinamento serviria como base de desenvolvimento e repertório para a criação de
todos os movimentos da personagem, e também foi o aquecimento cotidiano para os
ensaios.

A personagem principal que represento na peça se chama Délia. É uma enfermeira


marcada por diversos fracassos, e, por exemplo, sente muita vergonha de não possuir
bons modos para comer em uma mesa. Dessa forma, escolhi como os verbos que mais
se repetiam ou marcavam suas ações ou características: comer, servir, queixar-se,
contestar, cuidar e acompanhar. Assim, criei movimentos diversos que me remetiam a
esses verbos, mas sempre influenciada pela peça. Então percebi como a sequência já
demarcava a construção de minha personagem: os movimentos criados me cansavam e
me causavam fadiga, mas não eram muito grandiosos, pois tinham a característica de
trabalhar a contenção. E a contenção marcou a personagem em toda a elaboração
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cênica, pois não permitia reações grandiosas. Na maioria das vezes pedia contenção, o
que marca principalmente a maneira dela agir em sua profissão de enfermeira: paciente
e ardilosa, para conseguir com pequenas ações atingir grandes resultados. O que faz
com que as ações pequenas sejam grandes e cansativas porque são bem calculadas.

Como a diretora do espetáculo possui uma pesquisa de criação a partir dos orixás para
atingir princípios orgânicos do trabalho do ator, incorporamos a sua pesquisa ao
processo de criação do treinamento individual, com o intuito de explorar ainda mais as
personagens. O que se deu da seguinte forma: escolhemos dois orixás, sendo estes os
que mais se relacionassem com a personagem. Então observamos as imagens de cada
um (suas oposições, posição das pernas e dos braços, torções) para criarmos a partir das
imagens dois movimentos, um para cada orixá,e então acrescentarmos esses
movimentos à sequência do treinamento.

Entre os orixás, escolhi Oxossi, pelo jeito ardiloso, ligeireza, astúcia e comodidade, que
marcam a personalidade da personagem Délia. E depois, escolhi Ossâim, porque é o
orixá da medicina e da saúde, que cria ilusão e traz paz, o que reflete a profissão que a
personagem realiza ao longo de toda a peça.

Observei que os movimentos a partir dos orixás foram influenciados mais pelo estudo
das características dos orixás do que pela leitura da peça. E dessa vez, foram
movimentos maiores, com menos contenção. O que foi interessante para minha
sequência. Pois como Délia é uma personagem complexa, ela carrega a contenção mas
nem sempre consegue ser contida, principalmente quando pensa e realiza em seus
pensamentos3 todos os desejos que vela em seu cotidiano. E então esses exercícios me
permitiram encontrar momentos em que a personagem se descontrola e extrapola um
pouco os limites que pretendia, não sendo sempre a personagem contida, sem nenhuma
transformação ao longo da peça.

Ao acrescentarmos os movimentos dos orixás à sequência, a criação do treinamento


individual foi finalizada. Este treinamento foi executado durante todo o semestre de
                                                                                                                       
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 Pensamento aqui se refere a dois momentos da peça em que os pensamentos da personagem Délia são
encenados no espetáculo.  

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diversas maneiras: primeiramente oito vezes seguidas em oito tempos; depois cinco
vezes seguidas em oito e quatro tempos, intercalando-os; então em oito, quatro e dois
tempos, também intercalando. Acrescentamos ainda o tempo 1, que era somente o
impulso do movimento; adicionamos também a sequência de 16 tempos ao treinamento;
e por fim fizemos a sequência de oito tempos cantando as músicas que utilizamos na
peça. Essas modificações tiveram como finalidade manter nossa atenção e presença
ativas a cada ensaio, já que o treinamento era complexo de se executar, e ainda com
modificações, era cada vez mais desafiante. A execução dos movimentos em tempos
variados nos permitiu compreender ainda mais os detalhes de cada movimento. E como
utilizaríamos os movimentos da sequência como base de criação da linha de ações da
personagem, como será apresentado adiante, esse processo nos foi extremamente
importante.

Dessa maneira, observo como o início do processo de criação de Rojas Rosas une os
dois referenciais teóricos: utilizamos o conceito de treinamento, baseado em elementos
estruturais para efetivação dos “princípios-que-retornam”, mas mantivemos todo o
tempo como ponto de partida a sequência de movimentos criada com os verbos do
texto, ou seja, a partir da influência dos contextos contidos na cena, tal qual propõe
Donnellan. O que nos permitiu encontrar possibilidades de criação de nossas
personagens: tanto elaborando seu jeito de ser, como possibilitando formas de como
poderia agir em cena.

4.2 A construção da linha de ações da personagem

Começamos a construção do primeiro esboço da peça criando as cenas do texto a partir


dos contextos que a dramaturgia propunha. Porém, para a criação da linha de ações da
personagem ao longo da cena utilizamos somente os movimentos que fazíamos no
treinamento individual, ou seja, cada ação que fazíamos derivou dos movimentos do
treinamento.

A princípio fizemos movimentos grandiosos, pois os realizamos exatamente como eram


na sequência, e depois conseguimos diminuí-los de acordo com o que a cena

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demandava. E em algumas cenas trabalhamos com a utilização de movimentos repetidos


de outras cenas, o que nos permitiu já começarmos a criação com movimentos menores.
E ainda, com o intuito de ganharmos outras possibilidades de movimentação, dividimos
os movimentos da sequência em pequenas partes, o que gerou impulsos diferenciados
para realizá-los e assim, uma diversificação dos movimentos existentes.

Dessa maneira, a construção do primeiro esboço da peça me permitiu ter certo tipo de
movimentação que começou a demarcar os modos, por exemplo, de pegar e andar da
minha personagem. E esses modos me fizeram acessar sua energia. Então, já ao realizar
as primeiras criações, tive a personagem demarcada, e ao longo de toda a construção
cênica pude aprofundar ainda mais, o que facilitou a transformação da linha de ações da
personagem em uma sequência de reações, como será apresentado adiante.

Novamente observo como se uniu a antropologia de Barba com a metodologia de


Donnellan na concepção de Rojas Rosas: a construção da cena se deu a partir do texto
dramático e das situações propostas nele, tal qual fizemos ao longo da experiência com
o Fisções ao seguir a metodologia do “Alvo”; mas as ações da cena partiram de
elementos estruturantes dos “princípios-que-retornam” contidos no treinamento
individual, que são conceitos da antropologia teatral. O que me permitiu encontrar a
personagem com facilidade e ainda trouxe estética diferenciada para as cenas, ao
mesmo tempo em que elaborávamos um esboço concreto que já nos permitia visualizar
a cena pronta.

Ao elaborarmos o esboço de todo o espetáculo, percebemos a transformação das


personagens dentro do que construímos, e começamos assim a criar diversas reações
dentro da partitura. Mas, como um todo, a peça ainda era um esboço para ser trabalhado
dentro da metodologia do alvo.

Para a compreensão da criação de toda a peça, vale ressaltar quatro momentos na


dramaturgia em que há uma mudança do tempo e espaço das cenas, pois acontecem
alucinações ou pensamentos das personagens. O primeiro momento é uma alucinação da
paciente, ela vê e dialoga com sua irmã morta. Assim, nesse momento, a atriz deixa de
ser enfermeira e se transforma na irmã da paciente, enquanto que a paciente se
transforma em si mesma, porém jovem. No terceiro momento, a paciente delira com sua
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filha, então a atriz novamente deixa de ser a enfermeira para se tornar a filha da
paciente. No segundo e no quarto momento, é a enfermeira quem sonha ou imagina que
está com sua mãe, então a outra atriz deixa de ser a paciente para se tornar a mãe, e
somente no segundo, a enfermeira está jovem e não em sua idade atual.

Nas alucinações e pensamentos em que fizemos a personagem em outra circunstância


ou idade, a construção da cena foi simples porque buscamos criar com os mesmos
movimentos do treinamento individual, como feito anteriormente, porém podíamos ser
mais vigorosas porque estávamos mais jovens. Já nos outros dois momentos, criei as
personagens ao longo da improvisação, no momento da elaboração das cenas, visto que
essas personagens aparecem em trechos curtos e dessa forma permitiram uma
construção um pouco menos minuciosa que a da enfermeira. Sendo assim, o processo
foi simples, mas um pouco oscilante, já que ao longo das improvisações houve
alterações até chegar ao ponto que desejávamos.

Assim, a criação dessas personagens é mencionada neste artigo, porém ele se foca em
trabalhar a construção da personagem “enfermeira”, visto que foi a personagem eleita
para ser criada através dos movimentos inventados a partir dos verbos do texto. Dessa
forma, após a construção da personagem enfermeira é que se deu a montagem de sua
partitura de reações, já que objetivei alcançar a personagem para depois criar a
sequência de reações. O que aconteceu de forma diferente no processo de criação das
outras personagens, pois as reações foram criadas junto com a personagem.

4.3 Ação, reação e a montagem a partir da metodologia do alvo

Ao longo da elaboração do primeiro esboço, vários movimentos foram criados como


reação à outra personagem ou a outros alvos, mas não todos, já que diversas vezes
criamos partituras individuais para depois juntarmos na cena. E mesmo quando
juntávamos, apareciam diversas reações, mas a partitura como um todo não era uma
sequência de reações. E foi o processo de transformá-la em uma sequência de reações
que nos proporcionou sairmos do esboço para a cena de fato.

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Como dito anteriormente, após o esboço completo do espetáculo, começamos a


observar a transformação das personagens e isso nos incitou a criar diversas reações.
Após algumas repetições da partitura, também transformamos diversos movimentos em
reações, mas sempre buscando não modificá-los demais, ou no caso de ser necessário,
manter a raiz do movimento (de onde vinha, para qual direção, qual é seu formato–
torção, flexão, extensão). Para então, por fim, repassar toda as cenas pausadamente,
refletindo quais movimentos não eram reações e transformando-os em uma.

Percebi que foi fácil transformar o primeiro esboço em uma sequência de reações, visto
que foi criado a partir do texto e das situações e falas propostas por ele. E ao mesmo
tempo, como foi construído a partir da movimentação do treinamento individual,
ganhou reações específicas da personagem logo no início, pois reagi partindo de
movimentos específicos que se tornaram próprios da personagem e não da atriz. Além
de adquirir estéticas variadas ao longo das circunstâncias que a peça apresenta através
das movimentações que apareceram.

Dessa forma, noto como a construção da personagem e do primeiro esboço da peça,


influenciados tanto pelo contexto quanto pelo treinamento individual, fizeram-se
fundamentais na finalização da construção cênica, com a transformação das ações em
uma sequência de reações. Pois, dessa maneira, a sequência de reações proposta pela
metodologia de Donnellan sofreu forte influência da preparação das atrizes com os
“princípios-que-retornam” de Barba. E assim as reações se fizeram complexas, vindas
das personagens e não das atrizes, o que fez o jogo cênico vivo, criativo e capaz de
atingir o extracotidiano com facilidade.

Conclusão

A antropologia teatral auxilia a criar corpos e energias diferenciados e extracotidianos


enquanto que a metodologia do “Alvo” ajuda na precisão do ator em saber ao que deve
reagir e também na criação de cenas claras e objetivas. Esses benefícios, como mostrado
ao longo de nossa experiência prévia à criação do espetáculo Rojas Rosas, já nos eram
conhecidos, mas o que deu força à essa construção cênica e também à concepção deste

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artigo foi como se mostrou um processo muito produtivo a opção por trabalhar os
conceitos da antropologia teatral de Eugenio Barba relacionado à utilização da
metodologia do Alvo de Declan Donnellan.

Primeiramente observo como a união das duas referências foi fundamental no processo
de construção da personagem. A criação do treinamento individual em relação ao
contexto da peça me permitiu encontrar a personagem enfermeira, alcançar sua energia
e seu corpo, logo às primeiras improvisações para a concepção das cenas. O que me
proporcionou criar a personagem antes do processo de construção da sequência de
reações, sendo assim, quando atingi esta etapa, reagi com movimentos e características
particulares da personagem, enriquecendo, dessa forma, o trabalho cênico.

Observo também que, como a construção do treinamento partiu de fundamentos dos


“princípios-que-retornam”, a personagem atingiu reações estilizadas, que definiram-na e
marcaram a estética da peça. O que auxiliou a construção do artístico/artificial na
criação cênica, tanto da peça, quanto do modo de agir da personagem.

Comparando a enfermeira às outras personagens criadas, que não obtiveram o mesmo


processo de construção, noto como as últimas foram mais difíceis de serem alcançadas e
oscilavam a cada passagem da cena, até encontrarmos o ponto que desejávamos para
sua concepção. Exigiram maior tempo de elaboração, enquanto que a enfermeira foi
criada de forma fluida e logo ao princípio de nossas criações cênicas já apresentava
características físicas e psicológicas, visto que a criação dos movimentos (físicos) da
sequência do treinamento se deram a partir dos verbos que a paciente mais executava,
repetia ou desejava executar (psicológico).

Observei também que muitas vezes que trabalho partindo de uma dramaturgia, crio
minhas primeiras improvisações a partir das falas que esta dramaturgia apresenta, o que
muitas vezes me acarreta ficar presa somente às falas e propondo poucas situações e
reações além das que o texto sugere. E ao longo do processo de Rojas Rosas, mesmo
criando sempre partindo das situações que o texto oferecia, propomos com facilidade
diversas circunstâncias, características para as personagens, disposições de cenário e
modificações de estética. E considerando que havia momentos de alucinação propostos

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pela dramaturgia, desejávamos encontrar estéticas diferenciadas ao longo da peça, para


distinguir as alucinações das cenas em que aconteciam no “tempo real”.

Sendo assim, constato que a utilização destas referências juntas foi fundamental para a
concepção e o enriquecimento da peça Rojas Rosas, pois proporcionaram o trabalho
minucioso e complexo que a dramaturgia exigia pelas trocas de ambientação,
personagens e situações que apresenta. E também intensifico a importância dessa
experiência para a formação das atrizes, pois além de proporcionar uma construção
complexa partindo de uma experimentação, abrangeu em nosso repertório de criação
cênica a possibilidade de unir referências diferenciadas para o benefício de um mesmo
processo, como se deu na elaboração deste espetáculo, sem que se tornasse confuso ou
contraposto.

Assim, ressalto como a experiência ao longo da universidade nos proporcionou concluí-


la com um trabalho acadêmico e de experimentação, a partir de desejos, pesquisas e
curiosidades individuais, enriquecendo possibilidades de criação, conhecimento e
experimentação na metodologia do “Alvo” de Declan Donnellan, assim como na
antropologia teatral de Eugenio Barba.

Referências:

• BARBA, Eugenio. A arte secreta do ator: um dicionário de antropologia


teatral. Eugenio Barba, Nicola Sevarese; tradução de Patrícia Furtado de Mendonça. -
São Paulo: É Realizações, 2012 a. (A arte do ator)
• ________. A canoa de papel – Tratado de antropologia teatral. / Eugenio
Barba; tradução de Patrícia Alves Braga. -3ª edição – Brasília: Teatro Caleidoscópios &
Editora Dulcina, 2012 b. 240p.
• BONFITTO, Matteo. O ator-compositor: as ações físicas como eixo: de
Stanislavski a Barba. São Paulo, Perspectiva, 2009.
• CARVALHO, Luiz Otávio. Falar, no teatro dramático, é (re)agir. In Caderno
de encenação / publicação do curso de graduação em teatro. – v.1, n.7 (ago. 2008)-. -
Belo Horizonte: Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, 2008.
• DONNELLAN, Declan. El actor e la diana. Tradução: Ignacio García May, 2ª
edição. Editorial Fundamental, Madri, 2007.

15  

 
 

• STANISLAVSKI, Konstantín. El trabajo Del actor sobre sí mismo en el proceso


creador de la vivencia.. Traducción Jorge Saura. Alba Editorial, s.l.u., Barcelona.
Primera edición: abril 2003.

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Anexo 14

Donnellan propõe seis regras para a metodologia do alvo que serão aqui
mostradas e explicadas. E para orientar a compreensão do que é um alvo exemplificarei
as regras através de um quadrinho da turma da Mônica (figura 1):

Figura 1
                                                                                                                       
4
CHAVES, C.R.V. O alvo. In: Relatório final da iniciação científica “Proposta Metodológica com
Exercícios Práticos para a Formação de Artistas Cênicos”. 2012. Relatório (Iniciação Científica) –
Curso de Graduação em Teatro - Escola de Belas Artes da UFMG, Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de Minas Gerais. Orientador: Luiz Otávio Carvalho Gonçalves de Souza. Cap.2, p.6-9.

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No quadrinho acima, podemos observar uma sequência de reações: no primeiro quadro,


o Cebolinha chateia e zomba a Mônica, assim o Cebolinha é o primeiro alvo do
quadrinho, pois provoca a Mônica executar a primeira reação, que é a de ir pegar o
Cebolinha. A segunda reação ainda está no primeiro quadro que é a reação do
Cebolinha de correr da Mônica, assim, a Mônica brava atrás dele é seu alvo, que o
provoca a correr.

No segundo quadro a ponte é o alvo da Mônica que reage temendo passá-la. No terceiro
quadro, observamos através do último quadro que o alvo da Mônica foi o Cebolinha que
a provocou a dar a volta para pegá-lo do outro lado. E no último quadro, o alvo continua
sendo o Cebolinha que a provoca a concluir sua reação: ameaçá-lo carregando-o e
questionando “quem é a gorducha?”.

Assim como vimos no quadrinho da turma da Mônica acima, em cena não pode haver
uma ação sem alvo, cada pequena reação deve ser provocada por um alvo. E esta é a
primeira regra da metodologia: “Sempre há um alvo”. E através dele é que o ator clareia
a compreensão do espectador que o assiste, pois não faz nada que seja desnecessário e
prejudique o desenvolvimento de uma cadeia de reações. Nas palavras do próprio
Donnellan:

Tudo o que um ator pode interpretar são verbos, e isto é ainda mais
significativo quando cada um destes verbos tem um alvo por trás. Este
alvo é um tipo de objeto, direto ou indireto, uma coisa específica vista
ou sentida, e, até certo ponto, necessitada. A concreção do alvo trocará
de momento em momento. Há muito que eleger. Mas sem o alvo, o
ator não pode fazer absolutamente nada, porque o alvo é a fonte de
toda a vida do ator. Quando somos conscientes, estamos sempre
presentes com algo, com o alvo. E quando a mente consciente já não
está presente com nada em absoluto, nesse ponto exato deixa de ser
consciente. E um ator não pode interpretar a inconsciência.
(DONNELLAN, 2007, p. 27)5

                                                                                                                       
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Tradução da autora do original: “ Todo lo que un actor puede interpretar son verbos, pero, y esto es aún
más significativo, cada uno de estos verbos debe tener una diana detrás. Esta diana es un tipo de objeto,
bien directo o indirecto, una cosa específica vista o sentida, y, hasta cierto punto, necesitada. La
concreción de la diana cambiará de momento en momento. Hay mucho donde elegir. Pero sin la diana, el
actor no puede hacer absolutamente nada, porque la diana es la fuente de toda la vida del actor. Cuando
somos conscientes, estamos siempre presentes con algo, con la diana. Y cuando la mente consciente ya no
está presente con nada en absoluto, en ese punto exacto deja de ser consciente. Y un actor no puede
interpretar la inconsciencia (DONELLAN, 2007, p.27).

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E ressaltando, como colocou Donnellan, que o alvo é o objeto do verbo, ou seja, o


objeto da reação realizada pelo ator, dessa forma o ator não pode interpretar um verbo
intransitivo, pois é um verbo sem alvo. Por exemplo, o ator não pode morrer, ele pode
“lutar pela vida” ou “dar boas vindas à morte” que é quando passa a ter um alvo.

A segunda regra desta metodologia é: “O alvo sempre existe fora e a uma distância
moderada”. O alvo pode ser real ou imaginário mas deve estar a uma distância do ator.
Na figura 1, o quadrinho da Mônica, por exemplo, podemos notar que o alvo da Mônica
não é ela mesma, assim como o alvo do Cebolinha também não é ele mesmo.

O que sucede, no entanto, se o alvo parece estar dentro do cérebro,


como quando temos uma dor de cabeça profunda? Como podemos localizar
isto no exterior?
Seja qual seja nossa dor, por mais íntima que resulte a agonia, sempre
haverá diferença entre o paciente e sua dor. E a gente que sofre grandes dores
lhe dirá que se sentem separadas delas. Quanto mais intensa é uma
enxaqueca, mais parece que existem só duas entidades no mundo, a dor e o
sofredor. O mal estar pode invadir o cérebro, mas permanece fora da
consciência. Sempre há uma distância básica. (DONELLAN, 2007, p.28)6

“O alvo existe antes que necessitamos dele”, esta é a terceira regra. Para Donnellan,
descobrir o alvo é mais útil que inventá-lo, sendo assim, se pensamos até mesmo no
alvo sendo o futuro, resulta melhor ao ator encontrar o seu desejo para o futuro do que
criar um futuro. Na figura 1, notamos que antes das reações, houve a provocação do
alvo, dessa forma a Mônica não corre atrás do Cebolinha porque criou que ele está lhe
provocando, mas sim porque vê ou percebe primeiro a sua provocação.

A quarta regra desta metodologia é: “O alvo é sempre específico”. Ou seja, o alvo não
pode ser uma generalização, porque deve ser visualizado pelo ator, então deve ser
específico. Como vimos na figura 1, os alvos foram específicos: o Cebolinha chateando,
a Mônica brava, a ponte feita de tronco de árvore e, por último, o alvo foi imaginário,
que continuava ser o Cebolinha chateando, mas a Mônica já não mais o tinha diante os
                                                                                                                       
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Tradução da autora do original: “¿Qué sucede, sin embargo, si la diana parece estar dentro del cerebro,
como, digamos, cuando tenemos un dolor de cabeza profundo? ¿Cómo podemos localizar esto en el
exterior? Sea cual sea nuestro dolor, por muy íntima que resulte la agonía, siempre habrá diferencia entre
el paciente y su dolor. Y la gente que sufre grandes dolores te dirá que se sienten extrañamente separados
de ellos. Cuanto más intensa es una migraña, más parece que existan sólo dos entidades en el mundo, el
dolor y el sufridor. El malestar puede invadir el cerebro, pero permanece fuera de la consciencia. Siempre
hay una distancia básica. (DONELLAN, 2007, p.28).

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olhos, porém, ainda assim é possível notar que o alvo era específico e não uma
generalização.

A quinta regra é que “O alvo se transforma constantemente”, assim, por mais que
novamente o ator reaja ao mesmo alvo, seu alvo deverá ter transformado para também
transformar sua reação. Retornando a figura 1, observamos que primeiramente a Mônica
reage ao Cebolinha que a chateia, e depois retorna a reagir ao Cebolinha que a chateia,
mas é importante considerar que houve uma transformação: a Mônica nos últimos
quadrinhos reage ao Cebolinha que a chateia do mesmo modo, mas que agora se
encontra seguro pela ponte que a Mônica não tem coragem de atravessar. Assim a
reação da Mônica continua ser a de correr, porém também transformada, ela agora
necessita de mais agilidade e esperteza para recuperar a distância que o Cebolinha
tomou dela, desconsiderando o caminho da ponte.

A sexta e última regra é: “O alvo está sempre ativo”. Assim como vimos nas regras
anteriores, o alvo tem que provocar, por isso precisa estar sempre ativo, fazendo algo. E
como coloca Donnellan se faz mais importante ao ator se perguntar: “O que é que o alvo
me obriga a fazer?” do que “O que estou fazendo?”, que como vimos é a pergunta que o
leva a bloquear-se.

Donnellan ainda chama a atenção para os alvos secundários, que novamente se torna
fácil observar através do quadrinho. Quando a Mônica encontra a ponte de tronco de
árvore, a ponte torna-se seu alvo, pois lhe faz dar a volta, mas é seu alvo secundário,
pois ela dá a volta não só porque está reagindo ao tronco, mas principalmente porque
está reagindo ao Cebolinha, que é o seu alvo primário, e se encontra do outro lado da
ponte.

E Declan ainda faz uma última ressalva:

O alvo não é um objetivo, nem um desejo, nem um plano, nem uma


razão, nem uma intenção, nem um motivo. Os motivos surgem do
alvo. Um motivo é uma forma de explicar porque faço as coisas. O
“porque” faço coisas pode resultar interessante. Mas perguntar

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“porque” constantemente pode atar o ator com fortes nós.


(DONELLAN, 2007, p.33).7

Dessa forma, através deste capítulo podemos compreender o que o alvo é, o que não é, e
o que uma cena precisa ter para estar dentro da metodologia do alvo. E utilizando estas
informações contidas no livro de Declan Donnellan é que iniciamos nossas pesquisas no
Estúdio Fisções.

                                                                                                                       
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Tradução da autora do original: “La diana no es un objetivo, ni un deseo, ni un plan, ni una razón, ni una
intención, ni un foco, ni un motivo. Los motivos surgen de la diana. Un motivo es una forma de explicar
por qué hago las cosas. El “por qué” hago cosas puede resultar interesante. Pero preguntar “por qué”
constantemente puede atar al actor con recios nudos.” (DONELLAN, 2007, p.33).

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