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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

FACULDADE DE LETRAS

Tales Moreira de Carvalho

ANA CRISTINA CESAR

AUTOBIOGRAFIA
BIOGRAFIA
AUTOFICÇÃO

SILÊNCIO E NÃO DITO & NÃO SENSO

BELO HORIZONTE

2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

FACULDADE DE LETRAS

Tales Moreira de Carvalho

ANA CRISTINA CESAR

AUTOBIOGRAFIA
BIOGRAFIA
AUTOFICÇÃO

SILÊNCIO E NÃO DITO & NÃO SENSO

Projeto apresentado como requisito para


desenvolvimento da Monografia II.

Orientadora: Profa. Dra. Constancia Lima Duarte.

BELO HORIZONTE

2015
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................3
1.2 Justificativa...................................................................................................................................3
1.3 Objetivos......................................................................................................................................8
2 REFERENCIAL TEÓRICO................................................................................................................9
3 METODOLOGIA.............................................................................................................................11
4 PLANO DE ORGANIZAÇÃO.........................................................................................................13
5 CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO.................................................................................................14
REFERÊNCIAS...................................................................................................................................16
ANEXO................................................................................................................................................18
3

1 INTRODUÇÃO

“Frente a frente, derramando enfim todas as


palavras, dizemos, com os olhos, do silêncio
que não é mudez.” Ana Cristina Cesar.

Posso derrubar ou erguer o mito


a esmo.( CESAR, 2013 P.165)

Talvez quando escreveu esses dois versos, aos dezessete anos, não possuísse consciência de
seu poder de verdade. Insegura e tímida, não obstante dotada de extrema inteligência e da
sede do saber, Ana Cristina Cesar nascera para brilhar. Antes mesmo de aprender a escrever,
brincava fazendo o gesto da escrita, como se estivesse escrevendo de fato. A caneta
imaginária em mãos. Gesto que nunca abandonou, mesmo após a alfabetização, como disse
seu amigo e também poeta em diversas entrevistas, Armando Freitas Filho.
É possível que nesses dois momentos, o da infância e da adolescência, já estivesse refletindo
futuros poemas. Sua mãe relata que na época em que ainda era menininha, como ainda não
sabia escrever, ditava seus poemas. Relação paradoxal na infância: primeiramente fingia
escrever com a caneta imaginária, momento de silêncio; em seguida, ou pouco tempo depois
ditava os poemas para a mãe, que transcrevia para o papel. Paradoxal porque é incomum uma
criança se amparar no silêncio e na reflexão.
A infância geralmente é época de muito barulho; não que ela não o fizesse, mas desde sempre
fora discreta, desse modo sua melhor relação fora com a palavra. Isso de modo algum já
sinalizaria uma patologia clínica na menina; como se pudéssemos explicar a partir desse ponto
um caráter voltado ao trágico. Não, ela apenas era mais quieta; não obstante se desenvolveu
como qualquer pessoa. Claro que sua inteligência era a cima da média, assim como sua
sensibilidade; de modo que se aprofundou na vida intelectual e poética.
Tão logo adquiriu habilidades de leitura e escrita, Ana Cristina se tornou uma leitora ávida;
descortinando o mundo nos livros, e em volta de si. Por essa época começou a escrita de
diário e poesia simultaneamente; não obstante os separasse.
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Ana Cristina Cesar (Doravante Ana C.) foi poeta, escritora e tradutora. Nasceu em 2 de junho
de 1952 e ergueu o mito do poeta romântico em torno de si, suicidando-se em 29 de outubro
de 1983. Desse modo, juntou-se ao grande filão de poetas/escritores que deixaram esta vida
pelas próprias mãos; somente para citar alguns: Vladimir Mayakovsky, Sylvia Plath (inclusive
essa foi uma das escritoras que Ana Cristina traduziu intensamente), Florbela Espanca,
Virginia Woolf, dentre muitos outros. É considerada por Ítalo Moriconi, Flora Sussekind,
Maria Lúcia de Barros Camargo, entre outros, como a melhor poeta da geração mimeógrafo.

Por uma Geração

Mimeógrafo foi um dos nomes dados à um grupo não muito coeso de poetas e
escritores/artistas em geral pelo modo com que publicavam seus livros. Eles usavam o
mimeógrafo para os imprimirem em edições independentes e em pequenas tiragens, que
vendiam por conta própria.
Esse tipo de máquina somente conseguia imprimir pequenas tiragens, e era o meio mais
barato. O único que esses poetas conseguiam custear, porque estavam excluídos do processo
editorial. De modo que outra denominação para essa geração foi o de poesia marginal. Apesar
desse nome “marginal”, os poetas acoplados em torno dessa poesia geralmente não eram
marginais, como sugere a acepção do termo. Essa geração teve seu apogeu nos anos 70/80;
seus principais representantes foram Chacal; Cacaso; Paulo Leminski; Francisco Alvim; Ana
Cristina Cesar; entre outros.
Há uma polêmica em torno de um pertencimento da poeta ou não a esse grupo, visto que a
poesia marginal realizava uma poética autobiográfica que no geral utilizava uma linguagem
coloquial, sem grandes preocupações artísticas. “Não importa a elaboração artística,
composição é jogo rápido, pulo, flagra, take, mas sempre a serviço de uma expressividade
neo-romântica, “sincera” e coloquial, desse ego que escreve e que “se escreve” todo tempo”
(SUSSEKIND, Flora. 2004.P117). Ana C. de fato pertencia a essa geração, entretanto, dela se
diferenciava em vários aspectos. Apesar de a autora supramencionada ter adotado o caráter
autobiográfico dos diários e das cartas, há nela uma ambivalência entre o real e o literário;
aspectos da vida privada inseridos na obra, como que em um jogo, tentam confundir fatos
ficcionais e biográficos. Em suma, há uma tensão constante entre ficcionalização e confissão.
Ana C. possuía consciência dessa poética autobiográfica dos anos 70 e brinca com isso,
operando em seus escritos uma desmontagem do diário e da carta. Além desses aspectos, ela
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estaria inserida nessa geração, segundo Heloísa Buarque de Hollanda, por uma questão
geracional.

2 OBJETIVOS

Refletir sobre a poesia-prosa de Ana Cristina Cesar, expondo os seguintes aspectos:


 Autobiografia / Biografia/Autoficção.
 Silêncio e não dito;
 Não senso;
CORPUS

O Corpus será exclusivamente retirado de Poética (2013), que como já referido reúne quase
toda obra poética da poeta, exceto Antigos e Soltos: poemas e prosas da pasta rosa (2008),
devido à sua grande extensão; apenas uma pequena parte de Antigos e Soltos foi incluída em
Poética. Começarei o Corpus citando o tema e os poemas correspondestes; nesse caso
particular, o livro Luvas de pelica (1980), desse modo estarei formando o desenho do referido
triângulo, como demonstrado na capa do Projeto. Assim, iniciarei pela ponta. A seguir,
passarei para os vértices. Primeiramente, o tema do silêncio e não dito, e concluindo com o
não senso. O procedimento será o mesmo. Não obstante, apresentarei os poemas. Terminado o
triângulo como já mencionado anteriormente, apresento os dois poemas cuja análise será dos
três assuntos trabalhados concomitantemente.

AUTOBIOGRAFIA/BIOGRAFIA/AUTOFICÇÃO:
Esse tema será um caso à parte em que prefiro utilizar um de seus livros lançados em edição
independente a escolher três poemas. A saber, o livro é Luvas de pelica (1980). É o exemplo
máximo, a meu ver, para exemplificar esse tópico. Poderia utilizá-lo para os três, tomando-o
como objeto de minha pesquisa, mas o interesse aqui não é abordar um livro específico, e sim
focalizar a obra da poeta como um todo.

SILÊNCIO & NÃO DITO:


Sumário P90- Fisionomia P230- Objeto encontrado I P254
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NÃO SENSO:
Recuperação da adolescência P17- Casablanca P20- Final de uma ode P21

O TRIÂNGULO EM ANÁLISE:
Três cartas a Navarro P316- P77

Tendo em vista principalmente objetivos didáticos, a fim de melhor expor a poesia-prosa de


Ana C., já que muitos ainda não conhecem, ou não captaram ao menos a “chave” para fruírem
uma leitura tanto quanto mais agradável, tentarei apresentá-la em forma de triângulo, cuja
ponta será a Autobiografia / Biografia/ Autoficção, e os vértices o Silêncio e não dito e Não
senso, como representado na capa deste Projeto. O Silêncio e não dito e o Não senso estão
nessa relação de vértices do mesmo triângulo porque tenho como hipótese que um causa o
outro na literatura de Ana. Por isso eles se representam em linha reta; é uma linha que vai e
volta. Ou seja, o Silêncio e não dito causa um vazio, uma ausência de sentido e por isso, Não
senso. Já o Não senso assusta, causa estranhamento, e assim, provoca silêncio.
É necessário explicitar que seus poemas também são muitas vezes considerados herméticos,
devido ao intenso trabalho com a linguagem. À primeira vista parece que as palavras foram
colocadas ao acaso, à maneira surrealística. Isso seria o não senso, que será objeto dessa
pesquisa. Certos críticos interpretam como se as palavras fossem escolhidas aleatoriamente;
outros buscam significados ocultos, as entrelinhas, que a própria Ana C. já argumentou em
diversas entrevistas, não existem. O que de fato existe em sua poesia são os silêncios e os não
ditos. Esses espaços devem ser preenchidos pelo leitor. Isso condiz com o posicionamento
crítico de Ana C. que prefere um leitor ativo a um passivo. Ela acha que o leitor deve puxar os
significantes a cada leitura, fazendo associações, as mais diversas possíveis. Que o leitor
pense, reflita. Dentro do corpo do texto, os signos deixam uma abertura para que o leitor
complete com a sua interpretação. Nem todas as associações possíveis foram previstas pela
autora. Como conta em seu depoimento no curso de LITERATURA DE MULHERES NO
BRASIL, em 1983, referindo-se ao significado de pato em seu último livro

Tem esse jogo... porque é um livro que tem várias... Como é que eu podia
dizer?... Eu não sei porque falei muito de pato. [...] Acho que pode pegar
esse significante e puxar por vários lados... Pato é uma porção de coisas, é
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pathos, é um certo drama que você vive... [...] Pato é uma coisa meio
ridícula, não é? É um bicho meio ridículo. [...] Ele não afunda na água. Às
vazes quando você lê um texto você pode cair que nem um patinho. [...]
Sabe, tem aquela música do João Gilberto também, o pato (cantando), sabe?
Pato, por acaso é um significante que puxa muitos outros. Acho que agente
pode puxar. Quanto mais puxar, melhor, não é? Ele migra...
Público: Não estaria caindo na entrelinha?
Ana C: Não, não é entrelinha isso. Acho que isso é puxar o significante, é
diferente. A entrelinha quer dizer: tem aqui escrito uma coisa, tem aqui
escrito outra, e o autor está insinuando uma terceira. Não tem insinuação
nenhuma, não. Fala em pato, você puxa as associações que você quiser com
aquilo. Eu posso lembrar de várias, mas não vou chegar nunca na verdade de
meu texto. Não vou dizer nunca para você, que para mim, o símbolo pato
significa... Dá pra você puxar. Então, [...]
(CESAR.1999.P.263,264)

Assim sendo, para a própria Ana não é interessante em seu texto e em literatura, no geral, que
procuremos o sentido original; o que o autor quis dizer, mas dentro do texto, o que os signos
nos permitem inferir. Ou, até mesmo, o que os signos nos permitem produzir em nível de
sentido. Principalmente quando se trata de poesia.
A seguir apresento uma breve síntese biográfica da pessoa por trás do mito.

Ana Cristina Cruz Cesar nasceu [...] no Rio de Janeiro, filha de Waldo
Aranha Lenz Cesar e Maria Luiza Cesar. Sua estréia literária ocorreu muito
cedo: em 1959 tinha as primeiras poesias publicadas no “Suplemento
Literário” do jornal carioca Tribuna da Imprensa. Licenciada em Letras pela
[...] (PUC) do Rio de Janeiro. [...] mestre em comunicação[...] exerceu
intensa atividade jornalística, editorial e como tradutora de importantes
autores estrangeiros, entre os quais a poeta Sylvia Plath. Escreveu para
diversos jornais e revistas, integrou a antologia 26 poetas hoje, de 1976,
publicou Luvas de pelica, Cenas de abril e Correspondência Completa, em
edições independentes, e Literatura não é documento, pesquisa sobre a
literatura no cinema, em 1980. Em 1982 lançou A teus pés. Após sua morte
em 29 de outubro de 1983, a reunião de seus escritos inéditos deu origem a
três obras, organizadas por Armando Freitas Filho: Inéditos e dispersos
(prosa e poesia), de 1985, Escritos da Inglaterra (ensaios sobre tradução e
literatura), de 1988 e Escritos no Rio (artigos, textos acadêmicos e
depoimentos), de 1993. Em 1998 a Editora Ática iniciou o relançamento de
suas obras completas com A teus pés. (CESAR, 1999, p.462)

Segundo a citação acima, ela exerceu intensa atividade crítica e ensaística. Porém, será
objetivo desta monografia focalizar sua poesia-prosa, pois ambos estão atrelados, já que,
como diria Caio Fernando Abreu na contra-capa de A teus pés:

Fascinada por cartas, diários íntimos ou o que ela chama de “cadernos


terapêuticos”, Ana C. concede ao leitor aquele delicioso prazer meio
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proibido de espiar a intimidade alheia pelo buraco da fechadura. Intimidade


às vezes atrevida, mas sempre elegantíssima. Intimidade dentro de um
espaço particular, onde não há diferença entre poesia e prosa, entre
dramático e irônico, culto e emocional, cerebral e sensível. (CESAR, 1982)

Ainda, é necessário salientar que embora o objetivo seja focalizar sua poesia-prosa, pretendo
recorrer quando for preciso à sua crítica, bem como à Correspondência Incompleta (1999).
Esse livro se constitui em uma seleção de cartas da autora que compreende o período de 1976
a 1980. Além da introdução, das notas, do epílogo e da cronologia, Correspondência
Incompleta é dividido em quatro sessões, de acordo com as interlocutoras a quem Ana C. se
dirige, conforme a seguinte ordem: Clara de Andrade Alvim; Heloisa Buarque de Hollanda;
Maria Cecilia Londres Fonseca; Ana Candida Perez. As três primeiras foram suas professoras,
e Ana Candida, sua amiga desde os tempos da faculdade.

Segundo Armando Freitas filho, um dos organizadores desse livro, comentando na introdução
sobre o caráter dessas cartas assinadas pela escritora: “Ela se confessa, sim, mas faz (fala de)
literatura o tempo todo. Em muitos e extensos momentos dessa correspondência, ouvimos
trechos de sua dicção poética de teor tão peculiar. Verdadeiros exercícios prévios do que mais
tarde ela iria transportar para os seus textos literários (FILHO, in CESAR, 1999, P9).
Desse modo podemos perceber que além da própria intimidade, há também discussões a
respeito de literatura concomitantemente a certo fingimento. Ela até mesmo sugere a Ana
Candida que publicassem um dia a correspondência trocada como ficção. Ou seja, possuía
consciência de que as cartas não eram inocentes.

3 METODOLOGIA

“Você está errado: não é o romance da longa vida


que começa. Não foi nossa razão que deu com
os burros n’água.” Ana Cristina Cesar.

Esta pesquisa será predominantemente uma pesquisa bibliográfica, acerca de um objeto


contemporâneo; de modo que me apoiarei nessa base para destrinchar meu tema. Pretendo
expor a poesia de Ana C. segundo uma tríade interligada que observo na fabulação de sua
literatura, à saber: Autobiografia/Biografia/Autoficção; Silêncio e Não dito & Não senso.
9

Sendo assim, fiz um levantamento da fortuna crítica a seu respeito. Após cotejar esse material
com a bibliografia geral acerca dos assuntos a serem tratados, refletirei, buscando conjugar a
bibliografia geral com a específica, bem como com o Corpus previamente selecionado que
apresentei no tópico 2, Objetivos.

A OBRA

A poeta questiona a Literatura desde seu primeiro livro. Embaixo do título, Cenas de Abril
(1979), aparece a palavra “poesia”. Isso somente merece destaque porque esse livro contêm
diversos textos em prosa: páginas de diário; um verbete; poemas em prosa; um conto, e até
mesmo textos inclassificáveis, como “Guia semanal de ideias”. Dessa forma, evidencia-se a
problematização diante de uma classificação de gêneros na modernidade. Esse assunto não
será explorado em minha pesquisa, embora tenha sido pensado pela escritora em questão.
Tanto que ela joga com esse signo, já em seu primeiro livro, problematizando
propositadamente as definições acerca da Arte. Pode-se pensar em Marcel Duchamp, com sua
“Fonte”, de 1917, que revolucionou os meios artísticos, criando o ready made. A “Fonte”, ou
seja, um mictório sem qualquer trabalho artístico transposto para um salão e sendo exposto
como tal. Embora a princípio tenha sido uma brincadeira, após a morte de seu criador,
estabeleceu-se o conceito e a partir desse momento qualquer objeto que o autor/artista rotule
com um nome passa a figurar com o nome dado. Isso gerou certa problemática que Ana C.
pontua como referido.
Esse livro foi lançado em edição independente. Na verdade, todos dessa autora publicados em
vida o foram, exceto o último, A teus pés (1982), que reúne os anteriores, mais uma seção de
inéditos, e foi lançado pela BRASILIENSE. Após Cenas de Abril (1979), veio
Correspondência Completa (1979). Aspecto intrigante foi em seu lançamento constar segunda
edição; em vez de primeira. Esse título, Correspondência Completa, é uma ironia porque esse
livro se trata de uma única correspondência, endereçada a my dear. Nessa carta é interessante
a narradora se colocar como escritora e dramatizar a dificuldade de fazer literatura, quando
pensa nos leitores. Para isso usa de dois arquétipos: Gil que a lê para desvendar segredos e
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não perdoa o hermetismo; no outro polo, Mary, que a lê como literatura pura e não entende as
referências mais óbvias (CESAR. 2013. P.50). Fica claro, no entanto não é explicitado, que
uma leitura melhor estaria no meio de ambas.
Luvas de pelica (1980), o último de seus livros em edição independente, foi lançado na
Inglaterra. É como se fosse um diário, contudo não há menção há datas específicas, a não ser
“Dia seguinte”; “cinco dias”; menção a tempo transcorrido. Luvas de pelica, composto por
vários blocos separados, como se fossem estrofes, misturam em si prosa e verso. Há menção à
escrita de cartas, como se alguns dos blocos que seguissem fossem cartas, mas permanece
suspenso no ar, é um vazio. É curioso seu conteúdo; se em Correspondência Completa a carta
termina assinada por Júlia, fechando vestígios de identificação entre autor e narrador, embora
a voz narrante seja mulher; em Luvas de pelica além do sujeito do texto ser feminino, há
diversas correspondências. Não é objetivo de este projeto enumerá-las, nem acrescentaria
muito para a Literatura um estudo como esse: averiguar até que ponto a vida influenciou a
arte neste ou naquele poeta. O que importa aqui, é que independente da vida que levou, a
artista, no caso, Ana Cristina, soube muito bem realizar a escrita de si.
O conjunto de inéditos de A teus pés (1982) a alçou definitivamente à fama. O projeto estético
que vinha desenvolvendo há anos atingira seu apogeu. A forma com que misturava poesia e
vida, encenando o segredo, sem o revelar e brincando com o desejo, certa maneira de brincar
com o erotismo a torna como que musa sex simbol daquela época. Deixava/deixa os leitores
estupefatos, pois além do conteúdo, sua sintaxe contribui para esse efeito, posto que
fragmentada; repleta de cortes abruptos; colada de vozes, que retomam outros textos, quer
seja da tradição, ou até mesmo de conversas que escutou. Não há limites para essa retomada;
vale tudo, desde marchinhas de carnaval à textos da tradição em outra língua, por exemplo, o
francês. Essas práticas todas podem ocorrer em um único poema; isso causa estranhamento.
Logo após a sua morte houve uma grande comoção. No entanto, parece que nos anos
seguintes a mídia foi abafando a obra dessa autora magnífica. Talvez por causa do seu
suicídio que pôs fim a uma carreira que seria, como foi no curto espaço de tempo em que
esteve presente, no mínimo, brilhante, ela foi elidida do ensino fundamental e médio. Não a
vemos nos livros de Literatura de escolas. É estranho e injusto, mas necessário admitir: nosso
país ainda é extremamente machista. Quase não se tem notícias de escritoras mulheres antes
de Cecília Meireles. Atualmente é que se está resgatando-as. Contudo, escritoras brasileiras
suicidas parece ainda ser tabu nesse país, já que no meio acadêmico há dezenas, senão
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centenas de Monografias, Dissertações e Teses sobre Ana C.. Se há tantos trabalhos assim na
academia, porquê a autora não figura nos livros das escolas?
Até os livros sobre Ana C. eram difíceis de serem encontrados pela via comercial, e muitos
estavam esgotados. Inclusive sua obra toda estava esgotada até o ano passado. Somente uns
poucos eram comercializados em sebos, e na Estante Virtual, via online.
Mas no ano passado a situação finalmente mudou. Sua obra saiu do Limbo em que estivera
por tantos anos; aproximadamente 30 e foi reeditada pela COMPANHIA DAS LETRAS que
lhe deu um tratamento especial com a colaboração de Armando Freitas Filho, seu curador,
nomeado pela própria Ana em carta.
Em novembro sai Poética (CESAR, 2013), que reúne toda obra publicada da autora, incluindo
Inéditos e dispersos (1985) e parte de Antigos e Soltos: poemas e prosas da pasta rosa
(2008).

FORTUNA CRÍTICA

Os principais estudos sobre ela são: um misto de ensaio e biografia de Italo Moriconi (1996),
seu amigo e importante crítico.

 Ana Cristina Cesar: O sangue de uma poeta

O livro de Flora Sussekind (1995):

 Até segunda ordem não me risque nada: os cadernos, rascunhos e a poesia em vozes
de Ana Cristina Cesar.

O primeiro por enquanto continua esgotado, mas há possibilidade de comprar o segundo no


site da Livraria Cultura. Atribuo isso ao fato de sua obra ter sido relançada.
Os livros de Annita Costa Malufe (2006), poeta que se dedica a estudar Ana C:

 Territórios dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar - No capítulo “O Silêncio, os


espaços vazios”.
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É muito interessante que a autora do livro, Annita Malufe, comece esse capítulo abordando o
estilo fragmentado da maioria dos poemas de Ana C, que parecem parataxes colocadas ao
acaso, à maneira surrealística. Em seguida analisa precisamente o poema “Sumário”, um dos
mais aleatórios de seus poemas; entretanto, como o próprio título já indica tudo se trata de um
pode vir a ser.

Apesar disso, de nesse caso o título justificar a fragmentação do poema; poder-se-ia perguntar
e quanto aos outros? Na resposta a chave para a compreensão de boa parte do fazer poético de
Ana Cristina Cesar: a fragmentação encontrada em seus textos são saltos, silêncios produzidos
intencionalmente; manipulando o não dito a autora deixa brechas, espaços em branco para que
o leitor complete, contribuindo para a sua significação. Isso vai ao encontro a seu pensamento
crítico que prefere um leitor ativo a um passivo.

A cada leitura, uma nova atualização acontece; nunca lemos do mesmo modo. O campo de
virtuais do texto está pronto, à espera de um leitor que o atualize.

 Poéticas da Imanência: Ana Cristina Cesar e Marcos Siscar.

É interessante observar que há um contraponto na medida em que Annita retira A poética de


Ana Cristina Cesar de sua dissertação e Poéticas da Imanência de sua tese de doutorado
(MALUFE, 2011). No capítulo “Um silêncio povoado”, ela retoma o assunto, acrescentando
que as virtualidades do texto literário estão presentes nele, rodeando-o; não importa qual seja
a realidade circundante. Embora a pesquisadora Malufe não seja o objeto de minha pesquisa,
é válido ressaltar que em seu doutorado foi expandido o tema das poéticas de Ana C, dessa
forma contribuindo para seus estudos.

“Os virtuais seriam como encaixes mutantes, ou ganchos moduláveis, rodeando os atuais,
como milhares de “pontas soltas” deixadas no texto para que arranjos imprevistos possam
acontecer nas leituras” (MALUFE, 2011, p.152); de modo que o leitor (ativo) produza
significações e povoe de sentidos os silêncios e os espaços em branco, não ditos deixados pela
autora.

O livro da doutora professora Maria Lucia de Barros Camargo (2003):


13

 Atrás dos olhos pardos.

O livro de Carlos Eduardo Siqueira Ferreira de Souza (2010):

 A lírica fragmentária de Ana Cristina Cesar: autobiografismo e montagem.

No capítulo 1, Carlos discute os conceitos de pós-moderno, moderno e não moderno na


poesia, alegando que o termo pós-moderno é discutível, já que diversos traços característicos
que definiriam esse termo, como ironia, polissemia, a forma aberta, fragmentação, colagem,
despersonalização, intertexto, pastiche, etc. também poderiam ser classificatórios do moderno.
Realizar uma distinção entre poesia moderna e não moderna seria mais simples. A poesia
moderna se define pela despragmatização da palavra poética. Aqui, ela abole qualquer relação
entre representação e realidade. Ana C dizia: “a poesia não representa, ela apresenta”
(CESAR, 1999). Inclusive o próprio signo se volta sobre si, constituindo seu próprio sentido,
e não a uma realidade exterior a si. Por outro lado, a poesia não moderna sempre busca
expressar a realidade de certa época; há uma correspondência análoga entre o signo e a
realidade circundante. Ou seja, Ana está na vertente de quem cria realidades no texto; não lhe
interessa meramente qualquer representação. Essa na verdade, já foi abolida e superada; o que
importa na produção do texto é o signo, sua força de real, de tocar o outro. Desse modo o
interlocutor se torna peça chave nessa obra, posto que a voz (vozes) se dramatiza para o outro.
São dois aspectos, portanto, o de apresentar realidades, e não copiar o real. E o outro,
dramatizar para o interlocutor, confundindo-o com sua voz (vozes).

Souza (2010), também ressalta que críticos como Silviano Santiago, Ítalo Moriconi, Heloisa
Buarque de Hollanda e Cacaso, buscaram sistematizar a denominada “poesia marginal”,
produção poética da década de 70; elencaram como principais aspectos a estreita relação entre
poesia e vida e o fato de a poesia ser mais próxima do coloquial, etc. Entretanto, somente
esses elementos não bastariam para defini-la. Por isso, é questionável a existência de um
movimento literário nos anos 70. Ainda mais porque os autores que pertenceriam a esse
movimento possuíam projetos estéticos muito heterogêneos.
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Tratando de Literatura em geral; ao buscar um suporte Teórico no qual me apoiar a fim de


trabalhar com sua poesia-prosa, selecionei alguns textos e livros. Os textos de Barthes (2003)
sobre “O silêncio”, que estão no livro:

 O Neutro

Barthes (2003) encontra no vocábulo “Silêncio” duas acepções: silere que seria um tipo de
estado intemporal das coisas (sem som) antes de existirem e depois de desaparecerem; esse
silêncio estaria mais perto da divindade, no entanto, transforma-se em aporia porque a torna
incognoscível, já que silêncio, pureza, bondade e liberdade a caracterizariam, segundo
Boehme. Dessa forma não poderia se revelar nem a si mesma por ser sua essência constituída
de silere. A outra acepção de “Silêncio” analisado por Barthes (2003): taceo que é associada
ao silêncio verbal, silêncio de fala. Posteriormente, elas se misturam e se tornam sinônimos,
exceto poeticamente (tout se taisait).

Há ainda, de acordo com Barthes (2003, p. 52), várias possibilidades de manipular o silêncio;
observo a possibilidade de utilizá-lo como técnica na poesia para criar efeitos de sentido e
comprovo isso lendo os poemas de Ana Cristina Cesar. Observem-se os procedimentos:

 Dissimulação: ser que se cala e não se deixa adivinhar;

 Dissimulação “negativa”: dizendo pelo signo não; “sinais enganadores, parecer


diferente do que realmente se é” (2003, p.52);

 Dissimulação positiva: dizer-se, através da afirmativa, diferente do que se é.

Claro, sempre falando e calando. A poeta faz precisamente isso em seus poemas; poemas-
prosas; diários-poemas; cartas-poemas. Assim procedendo, constrói o segredo no texto,
mediante o uso da linguagem. Assim, pretendo utilizar das formas de manipular o silêncio, de
acordo com Barthes, tentando aplicar as três formas de dissimulação na poesia-prosa da
escritora.
15

O ensaio A decadência da ilusão ou a morte da biografia, de Marcio Markendorf (2010)


apresenta uma idéia interessante. Após a morte do autor, nada mais natural que se seguisse a
morte da biografia. Compreendendo que “a vida vê-se completamente ágrafa”
(MARKENDORF, 2010, p. 24-25), podemos afirmar que mesmo as partes de cunho
autobiográficas nos textos de Ana C. podem ser entendidos somente como ficção.

“A narrativa biográfica é um artifício mínimo contra a falta de sentido máxima do mundo”


(MARKENDORF, 2010, p. 19-20). Ou seja, “qualquer biografia a respeito de um sujeito só
pode ser compreendida como ficção” (MARKENDORF, 2010, p. 24).

O livro de Eurídice Figueiredo, Mulheres ao espelho: autobiografia, ficção, autoficção


(2013), apresenta um compêndio teórico acerca dos temas apresentados no título. O maior
problema apresentado quanto a autoficção, a escrita de si, tem sido o grande surto de
teorização em torno desse vocábulo. Principalmente na França, onde o termo surgiu; ao que
tudo indica por causa do grande problema, como bem apontou Antoine Compagnon, do
demônio da Teoria, em seu livro de título homônimo. A despeito disso, esses teóricos
concordam ao menos no aspecto de que a autoficção têm como características serem
narrativas descentradas, fragmentadas e com sujeitos instáveis. O texto da poeta
supramencionada apresenta todas essas especificidades, como será explorado na Monografia.
Ao estudar esse livro percebo que Ana faz uma autoficção na medida em que encena o
segredo e a impossibilidade de dizê-lo. Busca aguçar o desejo do interlocutor semeando
pequenos fragmentos de sua vida, apenas para enganá-lo, para que ele tente buscar
correspondência entre vida e texto. Mas como ela mesma disse em seu Depoimento: “A
intimidade... não é comunicável literariamente” (CESAR. 1999. P259).
Os conceitos sínteses principais em que me deterei são: não senso, como é trabalhado por
Gilles Deleuze (2013) em Lógica do sentido; quando abordar o silêncio e o não dito, espero
utilizar do livro As formas do silêncio, de Eni Orlandi (2013); para o assunto
Autobiografia/Biografia/Autoficção, pretendo utilizar algumas das noções reunidas por
Eurídice Figueiredo, bem como algumas das concepções contidas em Ensaios sobre
autoficção(2014), livro organizado por Jovita Maria Gerheim Noronha. Nesse livro há artigos
sobre os principais teóricos da autoficção.
Assim sendo, a monografia se fará em formato de triângulo, pois tenho como hipótese que seu
fazer poético se constitui predominantemente sob três pilares que formariam o desenho do
16

referido triângulo cuja ponta seria a Autobiografia/Biografia/Autoficção. Essa


Autobiografia/Biografia/Autoficção, como buscarei verificar mais detalhadamente, tende a se
despersonalizar, a se constituir por uma coleção de vozes que daria existência aos outros dois
lados do triângulo: o Silêncio e o não dito e o Não senso.
Vale salientar que além da bibliografia geral, me apoiarei na bibliografia sobre a poeta em
questão. Ainda, devo declarar que devido à impossibilidade de se comprovar a hipótese
aventada, dado que Ana Cristina já faleceu; e que apesar de nos restar os manuscritos, seus
rascunhos, é praticamente impossível estabelecer exatamente em que medida esses fatores
contribuíram na constituição de seu fazer poético, a hipótese levantada foi sugerida
unicamente com objetivo de expor sua poesia-prosa sob a ótica proposta.

A despeito disso, possuo como objetivo, na pesquisa de mestrado, investigar até que ponto
essa hipótese triangular procede; pois mesmo que não seja possível determinar precisamente
em que medida o procedimento da Autobiografia/Biografia/Autoficção, a poesia-em-vozes,
motivou o procedimento do Silêncio e do Não Senso, ou esses àquele, talvez seja possível
obter algumas indicações de como se estabelece essa relação triangular. Inclusive se há
possibilidade de admiti-la.
Para tanto, além do estudo de sua obra, seria imprescindível realizar uma visita guiada ao
Instituto Moreira Salles, onde estão conservados seus manuscritos. Por isso o desejo de uma
bolsa e estudos, e também para adquirir os livros mencionados, bem como outros que a
pesquisa indicar.

4 PLANO DE ORGANIZAÇÃO

“descuido não (concentração) lembrar da caretice


que você não gosta” Ana Cristina Cesar.

1. Introdução: justificar a escolha da poesia de Ana Cristina Cesar como tema de minha
monografia; meus objetivos e a minha metodologia; contextualizar a época, com uma
pequena biografia da autora, para em seguida dar prosseguimento ao desenvolvimento.

2. Desenvolvimento: sintetizar as características da Autobiografia / Biografia/


Autoficção, seguindo a historiografia a respeito da autoficção exposta em Mulheres ao
17

espelho; da poesia em vozes, do corte e colagem (pastiche), como os autores que


estudam Ana C leem-na; as características da autoficção que repercutem na obra da
poeta; como produz a escrita de si. Dessa forma, iniciarei a forma do triângulo,
começando por sua ponta. Em seguida, partirei para o Silêncio. Nesse tema do
silêncio, provavelmente utilize do livro As formas do silêncio, de Eni Orlandi (2013).
Terminarei o triângulo com o Não senso, apoiando-me em Deleuze (2013). Cada um
desses assuntos/temas será dividido em uma sessão em que analisarei três poemas,
focalizando o tópico correspondente. Ao fim das três sessões, analisarei mais dois
poemas, a fim de verificar como eles ocorrem simultaneamente em um mesmo poema.
À exceção do tema Biografia/Autobiografia/Autoficção, cuja análise será feita a partir
do livro Luvas de pelica (1980).

3. Conclusão: há ainda muito por se estudar da referida autora, esta é apenas uma
pequena contribuição. A reflexão continua em processo; não se trata de uma
conclusão. Ainda mais porque sua obra finalmente foi reeditada e relançada; de modo
que espero que o interesse por essa escritura aumente continuamente.

5 CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO

Novembro:
Releitura das obras Correspondência Incompleta e Crítica e tradução, ambos de Ana, como
já explicado. Essas releituras me auxiliarão na redação e reflexão de minha monografia.
Participação na reunião do grupo de pesquisa organizado e presidido por Maria Zilda.
Dezembro:
Leitura (fazendo as devidas anotações e fichamentos para facilitar a posterior redação) dos
livros1 Lógica do sentido, de Deleuze.

1
Referi-me a livros, entretanto, na monografia delimitarei quando é livro inteiro e quando são
capítulos; quais foram utilizados/estudados. As Participações nas reuniões do grupo de pesquisa
organizado e presidido por Maria Zilda serão mensais ou quinzenais, conforme a demanda.
Exceto em julho, pois são férias. Meus encontros com Maria Zilda serão mensais, ou não
ocorrerão, de acordo com a necessidade.
18

Participação na reunião do grupo de pesquisa organizado e presidido por Maria Zilda.

Ano de 2015:
Janeiro:
Férias, e reescrita do Projeto.
Fevereiro:
Reescrita do Projeto.
Março:
Leitura (fazendo as devidas anotações e fichamentos para facilitar a posterior redação) do
livro Uma voz vinda de um outro lugar, de Maurice Blanchot.
Participação na reunião do grupo de pesquisa organizado e presidido por Maria Zilda.
Encontro com a orientadora, Maria Zilda, quando necessário.
Participação na reunião do grupo de pesquisa organizado e presidido por Maria Zilda.

Abril:
Leitura (fazendo as devidas anotações e fichamentos para facilitar a posterior redação) 2 do
livro Atrás dos olhos pardos, de Maria de Barros Camargo.

Junho:
Territórios dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar.

Julho:
. Territórios dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar

Agosto:
O desejo na poesia de Ana Cristina Cesar

Setembro:
A lírica fragmentária de Ana Cristina Cesar: Autobiografismo e montagem. Redação final.

2
O cronograma seguirá o mesmo padrão, de modo que indicarei apenas o nome dos livros e o mês
correspondente, sendo assim omitirei o restante, visto que essas informações se encontram nas
Referências.
19

Setembro:
Revisão, releitura sucinta dos textos.

Outubro:
Reescrita, se for preciso.

Outubro:
Revisão, e reescrita, se necessário.

Novembro:
Defesa.

REFERÊNCIAS

“Acordei com coceira no hímen. No bidê com


espelhinho examinei o local. Não surpreendi
indícios de moléstia. Meus olhos leigos
na certa não percebem que um rouge
a mais tem significado a mais.”
Ana Cristina Cesar.

ARAÚJO, André Luís de. Ana Cristina Cesar: o devir de um corpo. 2004, 119f. Dissertação
(Mestrado) - Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2004.

BARTHES, Roland; CLERC, Thomas; BENEDETTI, Ivone Castilho. O neutro: anotações de


aulas e seminários ministrados no Collège de France, 1977-1978. São Paulo: Martins Fontes,
2003.

BLANCHOT , Maurice. Uma voz vinda de outro lugar. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.

CAMARGO, Maria Lúcia de Barros. Atrás dos olhos pardos: uma leitura da poesia de Ana
Cristina Cesar. São Paulo: ARGOS. 2003.

CESAR, Ana Cristina. Antigos e soltos: poemas e prosas da pasta rosa. São Paulo: Instituto
Moreira Salles, 2008.

______.A teus pés. São Paulo: Brasiliense, 1982.

______. A teus pés. 2.ed. São Paulo: Ática. 2002.


20

______. Correspondência Incompleta. Rio de Janeiro: Aeroplano. 1999.

______. Crítica e tradução. São Paulo: Ática. 1999.

______. Inéditos e dispersos. 3.ed. São Paulo: Ática. 1998.

______. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo: Ed. Perspectiva. 2013.

ECO, Umberto. Como se faz uma tese. São Paulo: Ed. Perspectiva. 2012.

______. Obra Aberta. São Paulo: Ed Perspectiva. 2013.

FIGUEIREDO, Eurídice. Mulheres ao espelho. Rio de Janeiro: EdUERJ. 2013.

HOLLANDA, Heloisa Helena Oliveira Buarque de. ANO 60 CESAR. Disponível em


https://www.youtube.com/watch?v=mpE3v_wJJUk acessado em 02/02/15.

LIMA, Regina Helena Souza da Cunha. O desejo na poesia de Ana Cristina Cesar. São
Paulo: Annablume. 1993.

MALUFE, Annita Costa. Poéticas da Imanência: Ana Cristina Cesar e Marcos Ciscar. Rio de
Janeiro: 7 Letras, 2011.

______. Territórios dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar. São Paulo: Annablume, 2006.

MARKENDORF, Marcio. A decadência da ilusão ou a morte da biografia. Revista


Rascunhos Culturais, Coxim/MS, v.1, n.1, p. 13-32, jan./jun. 2010.

MORICONI, Italo. Ana Cristina Cesar: o sangue de uma poeta. Rio de Janeiro: Relume-
Dumará: Prefeitura, 1996.

NORONHA, Jovita Maria Gerheim. Ensaios Sobre a Autoficção. Belo Horizonte: UFMG,
2014.

ORLANDI, Eni. As formas do silêncio. Campinas: Ed. UNICAMP. 2013.

SOARES, Raimundo Nonato Gurgel; SOUSA, Ilza Matias de. Luvas na marginalia: o
narrador pos-moderno na poetica de Ana Cristina Cesar. 1996. 197p. Dissertação (mestrado) –
Departamento de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 1996.

SOUZA, Carlos Eduardo Siqueira Ferreira de. A lírica fragmentária de Ana Cristina Cesar:
autobiografismo e montagem. São Paulo: Educ. 2010.

SUSSEKIND, Flora. Até segunda ordem não me risque nada: os cadernos, rascunhos e a
poesia em vozes de Ana Cristina Cesar. 2.ed. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007.
21

FORTUNA CRÍTICA

Os principais estudos sobre ela são: um misto de ensaio e biografia de Italo Moriconi (1996),
seu amigo e importante crítico.

 Ana Cristina Cesar: O sangue de uma poeta

O livro de Flora Sussekind (1995):

 Até segunda ordem não me risque nada: os cadernos, rascunhos e a poesia em vozes
de Ana Cristina Cesar.

O primeiro por enquanto continua esgotado, mas há possibilidade de comprar o segundo no


site da Livraria Cultura. Atribuo isso ao fato de sua obra ter sido relançada.
Os livros de Annita Costa Malufe (2006), poeta que se dedica a estudar Ana C:

 Territórios dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar - No capítulo “O Silêncio, os


espaços vazios”.

É muito interessante que a autora do livro, Annita Malufe, comece esse capítulo abordando o
estilo fragmentado da maioria dos poemas de Ana C, que parecem parataxes colocadas ao
acaso, à maneira surrealística. Em seguida analisa precisamente o poema “Sumário”, um dos
mais aleatórios de seus poemas; entretanto, como o próprio título já indica tudo se trata de um
pode vir a ser.

Apesar disso, de nesse caso o título justificar a fragmentação do poema; poder-se-ia perguntar
e quanto aos outros? Na resposta a chave para a compreensão de boa parte do fazer poético de
Ana Cristina Cesar: a fragmentação encontrada em seus textos são saltos, silêncios produzidos
intencionalmente; manipulando o não dito a autora deixa brechas, espaços em branco para que
o leitor complete, contribuindo para a sua significação. Isso vai ao encontro a seu pensamento
crítico que prefere um leitor ativo a um passivo.
22

A cada leitura, uma nova atualização acontece; nunca lemos do mesmo modo. O campo de
virtuais do texto está pronto, à espera de um leitor que o atualize.

 Poéticas da Imanência: Ana Cristina Cesar e Marcos Siscar.

É interessante observar que há um contraponto na medida em que Annita retira A poética de


Ana Cristina Cesar de sua dissertação e Poéticas da Imanência de sua tese de doutorado
(MALUFE, 2011). No capítulo “Um silêncio povoado”, ela retoma o assunto, acrescentando
que as virtualidades do texto literário estão presentes nele, rodeando-o; não importa qual seja
a realidade circundante. Embora a pesquisadora Malufe não seja o objeto de minha pesquisa,
é válido ressaltar que em seu doutorado foi expandido o tema das poéticas de Ana C, dessa
forma contribuindo para seus estudos.

“Os virtuais seriam como encaixes mutantes, ou ganchos moduláveis, rodeando os atuais,
como milhares de “pontas soltas” deixadas no texto para que arranjos imprevistos possam
acontecer nas leituras” (MALUFE, 2011, p.152); de modo que o leitor (ativo) produza
significações e povoe de sentidos os silêncios e os espaços em branco, não ditos deixados pela
autora.

O livro da doutora professora Maria Lucia de Barros Camargo (2003):

 Atrás dos olhos pardos.

O livro de Carlos Eduardo Siqueira Ferreira de Souza (2010):

 A lírica fragmentária de Ana Cristina Cesar: autobiografismo e montagem.

No capítulo 1, Carlos discute os conceitos de pós-moderno, moderno e não moderno na


poesia, alegando que o termo pós-moderno é discutível, já que diversos traços característicos
que definiriam esse termo, como ironia, polissemia, a forma aberta, fragmentação, colagem,
despersonalização, intertexto, pastiche, etc. também poderiam ser classificatórios do moderno.
Realizar uma distinção entre poesia moderna e não moderna seria mais simples. A poesia
moderna se define pela despragmatização da palavra poética. Aqui, ela abole qualquer relação
23

entre representação e realidade. Ana C dizia: “a poesia não representa, ela apresenta”
(CESAR, 1999). Inclusive o próprio signo se volta sobre si, constituindo seu próprio sentido,
e não a uma realidade exterior a si. Por outro lado, a poesia não moderna sempre busca
expressar a realidade de certa época; há uma correspondência análoga entre o signo e a
realidade circundante. Ou seja, Ana está na vertente de quem cria realidades no texto; não lhe
interessa meramente qualquer representação. Essa na verdade, já foi abolida e superada; o que
importa na produção do texto é o signo, sua força de real, de tocar o outro. Desse modo o
interlocutor se torna peça chave nessa obra, posto que a voz (vozes) se dramatiza para o outro.
São dois aspectos, portanto, o de apresentar realidades, e não copiar o real. E o outro,
dramatizar para o interlocutor, confundindo-o com sua voz (vozes).

Souza (2010), também ressalta que críticos como Silviano Santiago, Ítalo Moriconi, Heloisa
Buarque de Hollanda e Cacaso, buscaram sistematizar a denominada “poesia marginal”,
produção poética da década de 70; elencaram como principais aspectos a estreita relação entre
poesia e vida e o fato de a poesia ser mais próxima do coloquial, etc. Entretanto, somente
esses elementos não bastariam para defini-la. Por isso, é questionável a existência de um
movimento literário nos anos 70. Ainda mais porque os autores que pertenceriam a esse
movimento possuíam projetos estéticos muito heterogêneos.
Bibliografia Geral
Tratando de Literatura em geral; ao buscar um suporte Teórico no qual me apoiar a fim de
trabalhar com sua poesia-prosa, selecionei alguns textos e livros. Os textos de Barthes (2003)
sobre “O silêncio”, que estão no livro:

 O Neutro

Barthes (2003) encontra no vocábulo “Silêncio” duas acepções: silere que seria um tipo de
estado intemporal das coisas (sem som) antes de existirem e depois de desaparecerem; esse
silêncio estaria mais perto da divindade, no entanto, transforma-se em aporia porque a torna
incognoscível, já que silêncio, pureza, bondade e liberdade a caracterizariam, segundo
Boehme. Dessa forma não poderia se revelar nem a si mesma por ser sua essência constituída
de silere. A outra acepção de “Silêncio” analisado por Barthes (2003): taceo que é associada
ao silêncio verbal, silêncio de fala. Posteriormente, elas se misturam e se tornam sinônimos,
exceto poeticamente (tout se taisait).
24

Há ainda, de acordo com Barthes (2003, p. 52), várias possibilidades de manipular o silêncio;
observo a possibilidade de utilizá-lo como técnica na poesia para criar efeitos de sentido e
comprovo isso lendo os poemas de Ana Cristina Cesar. Observem-se os procedimentos:

 Dissimulação: ser que se cala e não se deixa adivinhar;

 Dissimulação “negativa”: dizendo pelo signo não; “sinais enganadores, parecer


diferente do que realmente se é” (2003, p.52);

 Dissimulação positiva: dizer-se, através da afirmativa, diferente do que se é.

Claro, sempre falando e calando. A poeta faz precisamente isso em seus poemas; poemas-
prosas; diários-poemas; cartas-poemas. Assim procedendo, constrói o segredo no texto,
mediante o uso da linguagem. Assim, utilizei, como veremos, das formas de manipular o
silêncio, de acordo com Barthes, tentando aplicar as três formas de dissimulação na poesia-
prosa da escritora.

A fim de tratar da autoficção, utilizo o ensaio A decadência da ilusão ou a morte da biografia,


de Marcio Markendorf (2010), bem como o livro de Eurídice Figueiredo, Mulheres ao
espelho: autobiografia, ficção, autoficção (2013); e também o livro organizado por Jovita
Maria Gerheim Noronha, Ensaios Sobre a Autoficção, que reúne diversos ensaios assinados
pelos principais teóricos do tema.
Os conceitos sínteses principais em que me detenho são: não senso, como é trabalhado por
Gilles Deleuze (2013) em Lógica do sentido; quando abordar o silêncio e o não dito, espero
utilizar do livro As formas do silêncio, de Eni Orlandi (2013); para o assunto
Autobiografia/Biografia/Autoficção, pretendo utilizar algumas das noções reunidas por
Eurídice Figueiredo, bem como algumas das concepções contidas em Ensaios sobre
autoficção(2014), livro organizado por Jovita Maria Gerheim Noronha. Nesse livro há artigos
sobre os principais teóricos da autoficção.
Assim sendo, a monografia se fará em formato de triângulo, pois tenho como hipótese que seu
fazer poético se constitui predominantemente sob três pilares que formariam o desenho do
referido triângulo cuja ponta seria a Autobiografia/Biografia/Autoficção. Essa
Autobiografia/Biografia/Autoficção, como buscarei verificar mais detalhadamente, tende a se
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despersonalizar, a se constituir por uma coleção de vozes que daria existência aos outros dois
lados do triângulo: o Silêncio e o não dito e o Não senso.
Vale salientar que além da bibliografia geral, me apoiarei na bibliografia sobre a poeta em
questão. Ainda, devo declarar que devido à impossibilidade de se comprovar a hipótese
aventada, dado que Ana Cristina já faleceu; e que apesar de nos restar os manuscritos, seus
rascunhos, é praticamente impossível estabelecer exatamente em que medida esses fatores
contribuíram na constituição de seu fazer poético, a hipótese levantada foi sugerida
unicamente com objetivo de expor sua poesia-prosa sob a ótica proposta.

A despeito disso, possuo como objetivo, na pesquisa de mestrado, investigar até que ponto
essa hipótese triangular procede; pois mesmo que não seja possível determinar precisamente
em que medida o procedimento da Autobiografia/Biografia/Autoficção, a poesia-em-vozes,
motivou o procedimento do Silêncio e do Não Senso, ou esses àquele, talvez seja possível
obter algumas indicações de como se estabelece essa relação triangular. Inclusive se há
possibilidade de admiti-la.
Para tanto, além do estudo de sua obra, seria imprescindível realizar uma visita guiada ao
Instituto Moreira Salles, onde estão conservados seus manuscritos. Por isso o desejo de uma
bolsa e estudos, e também para adquirir os livros mencionados, bem como outros que a
pesquisa indicar.

4 PLANO DE TRABALHO

“descuido não (concentração) lembrar da caretice


que você não gosta” Ana Cristina Cesar.

4. Introdução: justificar a escolha da poesia de Ana Cristina Cesar como tema de minha
monografia; meus objetivos e a minha metodologia; contextualizar a época, com uma
pequena biografia da autora, para em seguida dar prosseguimento ao desenvolvimento.

5. Desenvolvimento: sintetizar as características da Autobiografia / Biografia/


Autoficção, seguindo a historiografia a respeito da autoficção exposta em Mulheres ao
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espelho; da poesia em vozes, do corte e colagem (pastiche), como os autores que


estudam Ana C leem-na; as características da autoficção que repercutem na obra da
poeta; como produz a escrita de si. Dessa forma, iniciarei a forma do triângulo,
começando por sua ponta. Em seguida, partirei para o Silêncio. Nesse tema do
silêncio, provavelmente utilize do livro As formas do silêncio, de Eni Orlandi (2013).
Terminarei o triângulo com o Não senso, apoiando-me em Deleuze (2013). Cada um
desses assuntos/temas será dividido em uma sessão em que analisarei três poemas,
focalizando o tópico correspondente. Ao fim das três sessões, analisarei mais dois
poemas, a fim de verificar como eles ocorrem simultaneamente em um mesmo poema.
À exceção do tema Biografia/Autobiografia/Autoficção, cuja análise será feita a partir
do livro Luvas de pelica (1980).

Conclusão: há ainda muito por se estudar da referida autora, esta é apenas


uma pequena contribuição. A reflexão continua em processo; não se trata de uma
conclusão. Ainda mais porque sua obra finalmente foi reeditada e relançada; de
modo que espero que o interesse por essa escritura aumente continuamente

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