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PALAVRA FIEL
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I
Amos Yong
- QUEM É O ^
. 1
U m a c a m in h a d a c o m os apóstolos
ESPIRITO
San to ?
UMA CAM INHADA CO M OS APÓSTOLOS
AM O S YO N G
PALAVRA FIEL
© 2019 Editora Palavra Fiel.
Todos os direitos reservados.
E-mail: editorapaIavrafiel@gmail.com
Quem é o Espirito Santo? Uma Caminhada com os Apóstolos
Copyright © 2011 by Amos Yong
Título Original: Who Is the Holy Spirit? A Walk with theApostles
Originalmente publicado pela Paraclete Press. Brewster, Massachusets.
Editor; Valmir Nascimento Milomem Santos
Tradutor: Wellington Carvalho Mariano
Revisão: Emily Gonçalves de Medeiros e Glória Hefzibá
Capa: Peterson Ferreira Sales Pedrozo
Diagramação: Glória Hefzibá
Conselho Editorial:
Valdeci do Carmo
Valmir Nascimento Milomem Santos
Wellington Carvalho Mariano
r Edição
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou
transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação)
ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora
Palavra Fiel.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Y 55q Yong, Amos.
Quem é o Espirito Santo: uma caminhada com os apóstolos/ Amos Yong -
Cuiabá: Palavra Fiel, 2019.
203p.
ISBN: 978-85-85-85187-01-9
1. Teologia. 2. Espirito Santo 3. Poder do Espirito Santo. 4. Missão de Jesus.
5. Pentecoste. 6. Meditação. 7 .1. Título.
CDU: 231.2
Prefácio à edição brasileira
com to d o o m eu am or.
SUMARIO
INTRODUÇÃO
Espírito Santo? 15
6 Comunhão no Espírito 4Ô
15
Parte T R Ê S A Economia do Espirito na Judeia
10 Economia do Espírito 68
16
Parte SEIS Os Gentios e o Espírito Santo
17
35 Bárbaros, Crentes e o Espírito da Hospitalidade 187
EPÍLO GO 191
G U IA DE ESTUDO DO L ÍD E R E PERG U N TA S P A R A
D ISCUSSÕ ES EM PEQUENOS GRUPO S 195
A G R A D EC IM EN T O S 209
B IB L IO G R A F IA SELECIO N A D A 213
18
INTRODUÇÃO
24
PARTE UM
26
em meu reino e assentariam sobre tronos, julgando sobre as
doze tribos de Israel” (Lucas 22:30).
Mas, parte do problema era que um dos Doze (Judas)
bavia desertado, e não mais estava entre eles. Entendendo sua
situação à luz de recursos escriturísticos (Atos 1:16-20; cf.
Salmos 69:25; 109:8), os onze remanescentes foram levados a
lançar sorte sobre dois irmãos escolhidos, que preenchiam os
rígidos critérios, a fim de se prepararem para seu reinado no
reino vindouro. Contudo, a ;pessoa “eleita”, Matias, jamais é
mencionada em Atos dos Apostolos. Todo este episódio reve
la que os discípulos não anteciparam que a renovação de Israel
assumiria um formato totalmente diferente.
Em resposta à pergunta acerca de quando o reino sur-
giria, Jesus disse: “Não vos pertence saber os tempos ou as
estações que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder. Mas
recebereis a virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós;
e sereis minhas testemunhas, tanto em Jerusalém como em
toda a Judéia, e em Samaria, e até aos confins da terra” (Atos
i:y-ô). Em certo sentido, a resposta de Jesus à pergunta deles
e não: os tempos e períodos da restauração do reino de Israel
permanecem desconhecidos, descansando apenas na auto
ridade do Pai. Contudo, durante este ínterim, os apóstolos
receberão poder do Espírito Santo, a fim de testemunharem
sobre a vida e o ministério daquele que proclamou e realizou
as obras do reino. Então, mesmo se a resposta direta à per
gunta dos discípulos for negativa, a resposta indireta é mais
complicada: enquanto nós podemos não saber quando a plena
restauração de Israel se dara, seremos, entretanto, capacitados
a proclamar os ensinamentos e realizar os feitos do próprio
Messias. Neste caso, a resposta real depende da extensão à
qual eles estão abertos a receber o reino e a vivê-lo através do
poder do Espírito.
O dom do Espírito Santo capacita os discípulos a
testemunharem até os confins da terra. Não como testemu
nhas genéricas, mas específicas às regiões geográficas, como
Jerusalém, Judéia, Samaria, e mesmo o coração do império,
a própria Roma. Em outras palavras, não apenas a Escritura
capacita o testemunhar dos discípulos acerca dos ensinamen
tos e das realidades do reino, mas o Espírito assim o faz a fim
de estabelecer o reino em meio ao presente governo imperial
27
de César e de seus governos regionais. Portanto, quando os
discípulos avançam para iproclamar o reino, eles o fazem com
a plena realidade do Império Romano os pressionando.
Certamente, havia várias visões, entre os primeiros
seguidores de Jesus, acerca do relacionamento entre o reino
de Deus e o império de Roma. Alguns descartavam qualquer
relação, dizendo que o reino divino tem a ver com o mundo
vindouro e, desta forma, não possui relação alguma com o Im
pério Romano. Outros acreditavam que o império era mais
amigável do que inimigo dos interesses cristãos, e talvez Lucas
tenha escrito, em parte, para convencer os líderes romanos de
que os cristãos não eram arruaceiros (antes, os judeus o eram),
ou mesmo que os cristãos eram, na verdade, cidadãos-modelo,
que mereciam todos os benefícios políticos dados aos prati
cantes religiosos por todo o império. E havia, provavelmente,
um terceiro grupo, que acreditava que os ensinos e feitos de
Jesus desafiavam as estruturas sociais, econômicas e políticas
da Roma imperial.
Os Atos dos Apóstolos também são os atos do Espíri
to Santo na igreja, atos que são subversivos dos impérios des
te mundo. A história da igreja primitiva deve ser entendida
como o estabelecimento e o surgimento de uma comunidade
que proclamava e incorporava a vida messiânica e os ensinos
de Jesus contra as estruturas cultistas, políticas e econômi
cas do Império Romano no primeiro século. Como, então, os
leitores contemporâneos de Lucas-Atos vivem, em meio aos
poderes deste mundo, onde quer que possam estar — quer
na China ou no Extremo Oriente, na Organização da Confe
rência Islâmica, na União Européia, nos Estados Unidos, ou
mesmo no império do mercado global consumista? O restante
deste livro nos levará a responder a estas perguntas de ma
neira concreta. Permita-me dizer, no momento, que a chave
para nosso entendimento reside precisamente na resposta de
Jesus à pergunta dos discípulos acerca de quando o reino seria
restaurado a Israel: no dom do Espírito Santo. O testemunhar
capacitador do Espírito é e continuará sendo central a como
os cristãos vivem fielmente em um mundo de muitos pode
res, por vezes, em conflito. Se as exigências sobre nossas vidas
são impostas pelos governos, pelos sistemas sociais ou pela
economia global, é o Espírito Santo quem capacita à respos-
28
ta adequada e apropriada que é sensível às variáveis de cada
situação. O Espírito que encazmente capacitou os atos dos
apóstolos durante a Pax Romana é o mesmo Espírito que está
disponível aos seguidores do Messias hoje.
29
A Promessa de Restauração do Reino de Israel e a Vinda
do Espírito!
Lucas 1:46-55, 67-79; 2:22-38
30
derosa na casa de Davi, seu servo.
Como falou pela boca dos seus san
tos profetas, desde o princípio do
mundo; Para nos livrar dos nossos
inimigos e da mão de todos os que
nos odeiam (1:68-71).
Zacarias também entendeu que a salvação prometida
a Israel envolveria o pacífico perdão de seus pecados (1:78-79)
— que necessariamente tinha que preceder a restauração de
Israel —, então, ele não necessariamente pensava que o rei
no messiânico envolveria uma revolução violenta. Contudo, a
redenção divina de Israel brilharia sobre aqueles que viviam
nas sombras da escuridão e os capacitaria mais uma vez, em
santidade e retidão.
Por último, quando Jesus foi apresentado no templo,
diz-se que Simeão estava “esperando a consolação de Israel”
(2:25), e Ana estava antecipando “a redenção de Jerusalém”
(2:38). Debaixo da inspiração do Espírito Santo, Simeão vem
para ver que a consolação e a restauração de Israel estão ne
cessariamente interligadas ao destino do restante do mundo:
Pois já os meus olhos viram a tua
salvação,
A qual tu preparaste perante a face
de todos os povos;
Luz para iluminar as nações, e para
glória de teu povo Israel (2:30-32).
Indubitavelmente, a prosperidade de Israel depende
de sua restauração e do viver em paz com seus vizinhos gen
tios.
Muitos leitores contemporâneos entendem estas re
ferências à redenção de Israel em termos espirituais. Afinal,
Jesus jamais destituiu o governo romano na Palestina, nem
estabeleceu o reino político de Javé sobre Israel. Na verdade,
não apenas o próprio templo foi lançado ao chão uma gera
ção depois (em 70 EC), mas existem outras passagens (a se
rem discutidas posteriormente) em Lucas-Atos que parecem
transferir as promessas da aliança dos judeus para os gentios.
Mas o nascimento de Jesus é apresentado por Lucas em
termos que claramente anunciam seu reino como ao menos
sobrepondo, se não substituindo, o reino de César. Por volta
31
do primeiro século, o aniversário de César era comemorado
como simbolizando as “boas novas” que o imperador trazia
a seus súditos por todo o império, e César era exaltado como
divino “Filbo de Deus,” “senhor,” “redentor,” e “salvador”,
através do culto do imperador. Jesus é anunciado precisamen
te nestes termos, como o “Filho do Altíssimo” (Lucas 1:32) que
restauraria o reino davídico. Então, mesmo se naqueles dias
seus pais estavam sob o governo do rei Herodes, da Judéia, e
do governador Quirino, da Síria, e mesmo se estivessem su
jeitos ao decreto de taxação de César Augusto, o nascimento
de Jesus trouxe a proclamação angélica acerca da chegada de
“um Salvador, que é o Messias, o Senhor” (2:11). Leitores do
Evangelho mal poderiam ter perdido o entendimento lucano
de que a chegada de Jesus desafiava a pressuposta divindade,
senhorio e estatura salvífica de César.
Esse histcirico nos ajuda a entender porque os discípu
los, apcis seguirem Jesus por três anos e escutando-o ensinar
acerca do reino por quarenta dias (Atos 1:3), ainda se inda
gavam se os tempos da restauração haviam finalmente che
gado. Se Jesus era o Messias, então, de acordo com o Antigo
Testamento — aludido por todo o Magnificat de Maria e pela
profecia de Zacarias —, Deus iria cumprir as promessas da
aliança. A Justiça seria exercida sobre os inimigos de Israel,
sobre os poderosos, orgulhosos e ricos regentes romanos e so
bre seus patronos aristocráticos (lideres políticos, religiosos e
culturais), que haviam conspirado para manter os operários
camponeses e proprietários de terra em pobreza (através de
uma elevada taxa de impostos, ás vezes de até 50 por cento
da safra total) e, assim, oprimiam as classes mais Saixas. Da
perspectiva de Maria, de José (um carpinteiro), e de outros no
último de^au da sociedade israelita, as boas novas — o euan-
gelion — da. chegada do Messias traziam consigo expectativas
materiais tangíveis. Se de fato Israel iria ser salvo de seus
inimigos. Deus precisaria suscitar o Messias para causar uma
imensa revolução.
Enquanto isso, pense, por um momento, acerca de
como as classes dominantes do primeiro século podem ter
reagido ás notícias, saindo da Palestina, de que o rei há muito
antecipado pelos judeus havia nascido. E se eles ouviram que
o reino de Jesus seria estabelecido sobre e contra o de César
32
e seus patronos, e aquela parte do levante que ocorrería en
volvendo o nivelamento dos ricos e poderosos e a exaltação
dos marginalizados socialmente? Mesmo se concebermos, no
momento, que o reino proclamado por Jesus era puramen
te espiritual, as expectativas messiânicas das pessoas comuns
combinadas aos medos das classes mais altas concernentes à
instabilidade de sua própria posição social teriam sido o bas
tante para causar um tumulto. E de se surpreender, portanto,
que os líderes religiosos judaicos — grupos como os cnefes dos
sacerdotes, escribas, fariseus e saduceus, que, diferentemente
dos partidos políticos mais modernos, eram tanto religiosos
quanto políticos — estavam preocupados o suficiente acerca
de como Jesus poderia frustrar seus próprios lugares na hierar
quia sociopolítica para liderarem a acusação que o executou?
O que está claro é que a promessa de restaurar o rei
no estava ligada à promessa do Espírito Santo. Veremos, mais
tarde, que, assim como o Espírito Santo operou na vida de
Jesus para trazer o reino, também capacitou seus seguidores
a anunciarem o reino. O que isto diz, então, acerca de nós,
hoje, que somos recipientes do mesmo Espírito? Talvez haja
um meio-termo entre pensar ou que o reino proclamado por
Jesus seja uma realidade espiritual localizada na vinda futu
ra, ou que fomos chamados para sermos revolucionários que
destituiríam os impérios dominantes de nosso mundo hoje.
Talvez este meio-termo envolva sermos abertos a receber a
capacitação do Espírito de maneira que também possamos
ser agentes que apressem o reino, que, em certos aspectos, já
está presente, mesmo que em outros aspectos ainda esteja por
vir. Talvez possam envolver nosso engajamento e desmantela
mento, pelo poder do Espírito, com as injustas estruturas que
mantêm o pobre empobrecido, conforme cantado por Maria.
Mais inimaginavelmente, talvez o Espírito capacite à reconci
liação de inimigos de maneira tal que a salvação venha atra
vés de inimigos tradicionais, como Zacarias profetizou, mas
através de pacificação justa em vez de destituição ou anulação
dos adversários históricos. Por que seria impossível imaginar
hoje, por exemplo, a paz entre judeus e palestinos, ou entre
israelenses e árabes? Não é possível que a vinda do Espírito
objetivasse completar a obra de restaurar a Israel, mas fazen
do-a, precisamente, ao incluir e reconciliar judeus e gentios
33
em vez de perpetuar suas divisões? Se assim o for, então, a
promessa de restaurar o reino ainda está em formação, pelo
poder do Espírito Santo.
34
Pentecoste — o Espírito Derramado sobre Toda Carne!
Atos 2:1—21
35
mil que foram batizados em resposta a este evento de Pente-
coste (Atos 2:41) — inaugurou um novo movimento que in
cluía pessoas de compromissos diversos com a fé judaica dos
arredores do mundo mediterrâneo.
A menção de cretenses (2:11) também teria quebra
do estereótipos acerca de quem estava “dentro” ou “fora” do
reino, especialmente dada a disseminada crença, promulgada
parcialmente pelos próprios cretenses, de que os cretenses
eram “sempre mentirosos, feras malignas, glutões preguiço
sos” (Tito 1:12). Claramente, as pessoas alcançadas neste novo
movimento de Jesus incluíam aqueles que teriam sido excluí
dos se os preconceitos prevalentes da época estivessem em
operação. Mas imagine quão diferente a história dos últimos
dois mil anos teria sido, caso aqueles da Arábia tivessem sido
plenamente incorporados no novo povo de Deus. Talvez a di
visão entre os filhos de Sara e Agar, entre os descendentes de
Jacó e Ismael, pudesse ter sido curada pelo poder do Espírito
de reconciliação. Talvez hostilidades hodiernas no Oriente
Médio tivessem sido evitadas se judeus, prosélitos ou gentios
da Arábia tivessem alimentado as novas relações trazidas e
efetivadas no Dia de Pentecoste.
É possível que o Dia de Pentecoste tenha, em parte,
restaurado as promessas a Israel, ao constituir um novo povo
de Deus, composto de judeus, mas não exclusivo de prosélitos
e gentios, que incluía uma diversidade de línguas, e incorpo
rava uma pluralidade de culturas e grupos de pessoas? A vida
palestina do primeiro século, em muitas maneiras como nossa
vida global hoje, era marcada pela suspeita acerca daqueles
que eram diferentes, que falavam outras línguas, e que repre
sentavam estilos de vidas estranhos. Foi obra do Espirito, con
tudo, superar estas barreiras, reunir aqueles que não se conhe
ciam, e reconciliar aqueles que poderiam, de outra forma, ter
vivido separados daqueles diferentes deles próprios.
O Pentecoste, desta forma, inaugura um Israel res
taurado e o reino de Deus, ao estabelecer novas estruturas e
relações sociais. Observe que o dom do Espirito não foi nega
do a nenhum dos 120 homens e mulheres que se reuniram no
cenáculo (Atos 1:14-15): as línguas de fogo divididas repousa
ram sobre cada um e capacitaram cada um ou a falar, ou a ser
ouvido em línguas estrangeiras (2:3-4). A fim de explicar o
36
fenômeno, Pedro cita o profeta Joel:
Os seus filhos e as suas filhas pro
fetizarão, os jovens terão visões, os
velhos terão sonhos. Sobre os meus
servos e as minhas servas derrama
rei do meu Espírito naqueles dias,
e eles profetizarão (zuy-iô; c f Joel
2:28-25).
Pedro claramente entendeu que, ao passo que a antiga
era judaica era patriarcal em caráter, a restauração de Israel
apresentaria igualdade de macho e fêmea: ambos profetiza
riam sob o poder do Espírito. Ao passo que a antiga aliança
apresentava a liderança de anciãos, o resino restaurado envol
vería a capacitação de homens e mulheres de todas as idades.
Independente de quais eram as estruturas que previamente
sancionaram o sistema social da escravidão, o derramar do
Espírito havia sido e seria, indiscriminadamente, sobre livres
e escravos, de fato transformando-os em iguais. Em tudo isso,
a obra do Espírito era anunciada em línguas desconhecidas,
não as línguas convencionais do status quo.
Efetivamente, a restauração do reino através do poder
do Espírito na verdade derrubou o status quo. Conforme Ma-
rias e Zacarias já haviam predito, aqueles no fundo da escada
social — mulheres, jovens e escravos — seriam recipientes do
Espirito e veículos da capacitação do Espírito. As pessoas pre
viamente divididas por língua, etnicidades, cultura, naciona
lidade, gênero e classe seriam reconciliadas, nesta nova versão
do reino. Potencialmente, “toda carne” seria inclusa dentro
deste reino dos últimos dias (Atos 2:17).
Estas características continuam a marcar a igreja
como a comunhão do Espírito Santo? A igreja ainda é uma
presença universal que reconcilia comunidades judaicas e
gentias divididas por vários motivos? A igreja ainda fala nas
línguas do Espírito, que conjuntamente proclama a renovação
de Israel (desta forma, preservando a singularidade da aliança
com os judeus) e a introdução do reino (desta forma, abrindo
as promessas de Deus ao mundo), ou permanecemos cativos
às línguas, estruturas e convenções divisivas dos impérios des
te mundo? Nossa oração deve ser “Venha, Santo Espírito!”,
de sorte que o derramar proclamado do Espírito sobre toda
37
carne possa realmente encontrar seu cumprimento em nosso
tempo.
38
PARTE DOIS
43
5
Arrependimento como/e o Dom do Espirito Santo
Lucas 3:1-20; 19:1-10
44
cobradores de impostos e guardas imperiais. A maioria deles
era de judeus pagos para trabalhar para a estrutura política,
religiosa e social. Então, eles teriam sido vistos como traidores
do seu próprio povo, uma vez que se sustentavam às custas
daqueles nas classes mais baixas. A pregação de João tam-
bém os comoveu ao arrependimento, e diretamente insistiu
que os cobradores de impostos não deveriam “pedir mais do
que estava ordenado” e os soldados “não deveriam extorquir
dinheiro de ninguém através de ameaças e falsas aeusações”,
mas se satisfazerem com seus salários (3:13-14). As marcas de
um arrependimento genuíno seriam manifestas em atos con-
eretos de honestidade, integridade e hospitalidade. Uma vez
realizados tais atos, estes seriam respostas eontraculturais que
produziriam verdadeiros descendentes de Abraão (3:8), re-
conciliando'Os com seus compatriotas israelitas, separados, e
renovando as promessas pactuais de Deus.
A mensagem do ministério de João é claramente vista
e estendida no ministério de Jesus. Lucas posteriormente fala
sobre Zaqueu, o rico chefe dos publicanos (19:2, ênfase minha),
e seu encontro com Jesus. Se motivado pelo arrependimen-
to ou pela necessidade de defender suas ações diante de uma
multidão hostil, Zaqueu disse: “eis que eu dou aos pobres me-
tade dos meus bens; e, se nalguma coisa tenho defraudado
alguém, o restituo quadruplieado” (19:8). Agora, conforme o
pagamento quádruplo de Zaqueu cumpria as exigências mais
precisas da lei em vez das mínimas (compare Ex. 22:1 com Lv.
6:5; Nm. 5:7), isso trouxe a declaração de Jesus: “Hoje veio sal
vação a esta casa, pois também este é filho de Abraão” (Lc.
19:9). A disposição de Zaqueu em fazer reparos não apenas
o traz de volta à comunhão com o povo a quem ele havia lu
dibriado, mas também, de fato, salva, restaura e renova uma
comunidade partida por ganância, desconfiança e rixas. Se
muitíssimos cobradores de impostos tivessem se arrependido
de seus pecados, como Zaqueu, e se tornassem reconciliados
com o povo, eles eessariam de serem enganadores, e isso, por
sua vez, solaparia a economia imperial que favorecia a elite.
Em outras palavras, a mensagem de arrependimento
e batismo para o perdão de pecados, pregada tanto por João
(em Lucas) quanto Pedro (em Atos), cura comunidades, re
concilia aqueles que, de outra forma, estavam alienados uns
45
dos outros, e renova a aliança feita com Israel, mesmo quando
ela ameaça destituir os sistemas deste mundo. Assim sendo,
no caso de João, os corações das pessoas estavam “em grande
expectativa, e pensando todos [...] se porventura seria o Cris
to” (Lc.3:i 5). Talvez eles ainda pensassem que era impossível
produzir estes atos de arrependimento em separado da plena
restauração do reino messiânico. A resposta de João foi que o
Messias viria e os batizaria “com Espírito Santo e fogo” (3:16).
As dimensões políticas da pregação de João não deve-
riam ser subestimadas. No final desta passagem, Lucas men
ciona que João foi preso por Herodes, e posteriormente ouvi
mos que ele foi decapitado por Herodes, que ficou chateado
que João o havia repreendido por tomar Herodias, a mulher
de seu irmão, como sua própria mulher. Mas Lucas também
deixa claro que João intrepidamente o repreendeu, “por todas
as maldades que Herodes havia feito” (3:19). Ainda que não
nos sejam contados quais os tipos de maldades (Herodes da
Galileia, também conhecido como Herodes Antipas, não deve
ser confundido com Herodes, o Grande, seu pai, que reinou
sobre a Judéia quando Jesus nasceu e publicou o decreto para
assassinar os infantes nos arredores de Belém), é seguro con-
jecturar que a pregação de João ameaçava a própria estrutura
do Império Romano conforme havia sido construída na Pales
tina daquela época.
Aqui, temos uma mensagem revolucionária que insta
va as massas a mudarem suas alianças de César para o Messias
vindouro, e que era caracterizada não apenas por mudanças
nos corações, mas também por vidas mudadas. Se a econo
mia imperial era afirmada sobre o apoio da elite aristocráti
ca, dependente do poder do exército imperial, e ativada pela
desonestidade dos agentes de coleta do império, então a nova
economia messiânica enfatizava o dar em vez de acumular ou
tomar, a honestidade em vez da trapaça ou da extorsão, e a in
tegridade em vez da ilegalidade e das falsas alegações. Assim,
ao passo que a salvação forjada por César era gozada apenas
pelos poucos da elite que traíam a confiança das massas, a
salvação do Messias batizaria todos os que invocassem o nome
do Senhor em uma nova economia marcada pelo perdão de
pecados e débitos e por uma nova comunidade, o Israel res
taurado e o povo reconstituído de Deus.
46
Arrependimento genuíno precipitaria renovação do
povo de Deus. Causaria novos relacionamentos, interações e
conversas, e isto inspiraria as pessoas que trabalharam sob o
governo romano a uma forma totalmente nova de vida. Não
e apenas Herodes da Galileia que é ameaçado, mas também
toda a hierarquia imperial, como representada por Tibério
(o seguindo imperador, de 14 a 37 EC); Poncio Pilatos da Ju
deia (que governou de 26 a 36 EC); Eilipe, irmão de Herodes
(que governou sobre Itureia e Traconites de 4 AEG a 34 EG);
Lisânias (que reinou em Abilene, norte da Galileia, de 28 a
cerca de 37 EG); e a liderança político-religiosa representada
por Anás e Gaifás (todos mencionados em 3:1-2). Não é de se
surpreender que aqueles que viram Jesus aceitar Zaqueu res
mungaram que “entrara para ser hospede de pecador” (15:7).
Observadores com discernimento teriam previsto que a pre
gação do batismo de arrependimento e perdão de pecados
desmantelaria a hierarquia imperial, destituiria o sistema de
classes e frustraria o estado existente das coisas. Não era sem
razão, então, que os poderes políticos executaram Batista, e
que as elites religiosas seguiram o exemplo, mais tarde, com
seu primo.
Uma pergunta para nós, hoje, especialmente nós que
estamos na parte elevada da economia do mercado global, é
se faríamos alguma coisa diferente: nós abraçaríamos e então
viveriamos as “boas novas” do reino vindouro, ou lutaríamos
para preservar o status quo e nosso próprio lugar nele? Se o
Espírito Santo fosse convencer nossos corações como o de Za
queu, nossa resposta pode muito bem também se estender à
nova economia da salvação, a fim de reconciliar as pessoas,
opor e corrigir as injustas estruturas de nosso mundo, e trazer
a cura a muitas nações.
47
Comunhão no Espírito
A tos 2:41-47
48
envolvia o ensino, a comunhão, o partir do pão e as orações.
Talvez o partir do pão aqui referido fosse uma extensão do
ritual instituído por Jesus na última ceia, mas cuja significân-
cia, a comunidade apostólica ainda precisava compreender.
Esse ritual acontecia diariamente nos vários lares, por meio
do compartilhar das refeições, mas também deve ter sido pra
ticado no templo.
Observe, também, que o arrependimento e o perdão
de dívidas, pregados por João, Jesus e Pedro, são vividos de
uma maneira bastante concreta. As pessoas compartilhavam
o que tinham, e os mais abastados vendiam o que fosse neces
sário, a fim de suprir as necessidades de outros da comunida
de. Aqui, o exemplo estabelecido por Zaqueu parece ter sido
multiplicado muitas vezes. A “alegria e singeleza de coração”
(2:46) das pessoas reflete o viver em simplicidade e liberali
dade, ao invés de serem calculistas e buscarem seus próprios
interesses. Tais práticas comunais por estes primeiros segui
dores de Jesus persistiram por um tempo (vide Atos 4:32-37),
embora não saibamos por quanto tempo. Está claro, contudo,
3
ue aqueles que se arrependeram e foram batizados em nome
e Jesus para o perdão de pecados se viam chamados para in
corporar o Caminho de vida exemplificado pelo Messias, Je
sus, e experimentado e ensinado por seus discípulos mais ínti
mos. A restauração de Israel não foi um mero acontecimento
espiritual. O derramar do Espírito Santo pelo Jesus ascendido
estabeleceu um novo corpo comunal, que forneceu uma forma
alternativa de vida para aqueles sob o senhorio de César.
Não confunda este estilo de vida judaico-cristão pri
mitivo com certo tipo de socialismo ou comunismo. As crí
ticas de Karl Marx foram direcionadas ao industrialismo que
ele viu na Inglaterra da metade do século dezenove, quando os
trabalhadores eram forçados a vender seu trabalho pelo valor
de mercado (que era insuficiente para suprir suas necessida
des diárias), não permitindo, então, que mantivessem seus lu
cros (os quais eram embolsados pelos mercantes capitalistas).
A solução de Marx era distribuir tanto a propriedade privada
51
A Missão de Jesus Cristo, o Ungido
Lucas 4:14-30
52
narrativa do Evangelho, de fato libertou cativos, abriu olhos
cegos e libertou oprimidos. A última interpretação pode nos
levar a pensar que as “Boas Novas” estavam limitadas a quatro
grupos de pessoas.
Em vez disto, deveriamos ver estas referências como
incluindo o amplo espectro de habitantes entre as classes mais
baixas da Palestina do primeiro século. Eram pessoas realmen
te pobres, cegas e oprimidas, e o ministério de Jesus era para
elas e por elas. Além disso, havia outros, como os leprosos, os
espiritualmente empobrecidos (incluindo cobradores de im
postos, tal como Zaqueu), e os oprimidos pelo demônio, aos
quais o evangelho era direcionado. Todos estes eram pessoas
de scatus baixo, zero ou desprezível na sociedade greco-roma-
na — que constituía cerca de 55 por cento da população, que
vivia sob o julgo do governo imperial, a elite sociorreligiosa e
a aristocracia possuidora de terras — e era para estes pobres
que a mensagem messiânica era particularmente relevante.
A partir desta perspectiva, o ministério messiânico é a
boa nova de maneira concreta. Para os cegos, ela significava a
abertura de olhos e o dom da visão (vide Lc. 7:21-22; 18:35-42);
para aqueles em prisão ou que eram oprimidos, ela significava
libertação, comumente entendida em termos de libertação de
opressão demoníaca; e para o pobre, ela significava sua liber
tação da prisão ou mesmo da dívida (a palavra para “liberta
ção” podendo ser também traduzida por “perdão”). Com estes
elementos combinados, o ministério de Jesus ungido pelo Es
pírito causaria “o ano aceitável do Senhor” (4:15).
Entendido de acordo com as promessas messiânicas
dos profetas hebreus, incluindo Isaías, que está sendo citado
nesta passagem, este “ano do Senhor” teria sido tomado como
uma referência ao Ano do Jubileu, anunciado na Torá.^ Havia
três fatores-chave do ano do Jubileu (o quinquagésimo ano
apc)S sete ciclos de sete anos): (1) débitos seriam cancelados;
(2) escravos seriam libertos; e (3) a terra seria devolvida a seus
proprietários originais. O pronunciamento de Jesus de que
“hoje se cumpriu esta escritura em vossos ouvidos” (4:21) erá,
portanto, recebido com gozo por seus ouvintes, aqueles do
lado inferior da sociedade.
3 O seguinte resume 0 que é descrito como o Ano do Jubileu em
Lv. 25:8-12 e Dt. 15:1-7.
53
o ministério público de Jesus não resultou direta
mente, em sentido algum, em uma implementação literal do
programa do jubileu. Contudo, o estabelecimento da comu
nidade messiânica primitiva (Atos 2:42-47) de fato criou um
modo alternativo de vida que instituiu o Espírito, se não a
letra das prescrições do jubileu. Ao passo que não nos é dito
explicitamente que as dívidas econômicas foram canceladas,
já temos visto que o sistema socioeconômico foi radicalmente
reestruturado na comunidade apostólica, precisamente a fim
de fornecer alívio aos necessitados. Tão importante quanto,
a declaração do perdão de pecados renovou o pacto com Is
rael e criou uma comunidade radicalmente igualitária, em um
sentido no qual todos eram reconhecidos pecadores diante
de Deus e, contudo, eram absolvidos e exonerados de seus er
ros, sendo, deste modo, igualmente aceitos na comunhão do
Espírito.
A comunidade messiânica primitiva entendia que a
proclamação de Jesus das boas novas aos pobres intencionava
realizar a renovação de Israel e o estabelecimento do reino (o
ano aceitável do Senhor). Porque o poder do mesmo Espírito
que ungiu Jesus havia sido derramado sobre eles, os discípulos
perceberam que suas vidas seriam uma extensão do ministério
de Jesus. Avance, então, para hoje. Não deveriamos abraçar a
unção do Espírito em nossas vidas, ao seguirmos os passos dos
discípulos? O poder do Espírito está presente agora para nos
capacitar a trazermos as boas novas aos pobres e a colocar
mos em prática o evangelho para os oprimidos e para aqueles
em prisão. Isto envolveria não apenas declarar aos pobres que
seus pecados são perdoados, e não apenas alimentar, prover
vestimenta e recursos ao pobre, por mais importante que tais
coisas sejam. Mas ele tainbém deve envolver o que os crentes
messiânicos primitivos faziam: reestruturar nossas próprias
vidas e comunidades de maneira que as linhas entre os ^ue
têm e os que não têm sejam vencidas, de sorte que ninguém
precise necessitar de algo!
Observe, ainda, como Jesus tenta liderar seus discípu
los a verem o ano aceitável do Senhor como sendo não apenas
para eles, enquanto judeus, mas também para outros. Em cer
to sentido, a multidão estava dizendo que, se o ano do Senhor
tinha realmente chegado, então por que Jesus não realizou
54
mais das obras messiânicas na cidade de Nazaré, em particu
lar, e na região da Galileia, em geral (Lc. 4:23)? A resposta de
Jesus foi extraída dos ministérios de Elias e Eliseu: que um foi
enviado a uma viúva gentia (a região de Sidom ficava fora do
territcirio judaico, naquela época), ao passo que o outro foi
enviado a um leproso sírio. Se a unção do Espírito significa
va boas novas aos pobres, não se limitava aos judeus. Antes,
o evangelho do reino também era para os gentios, incluindo
aqueles nos setores mais baixos do mundo social: as mulheres,
os leprosos e os impuros.
Com estes dizeres, nem mesmo a calorosa recepção
inicial de Jesus pelos galileus pode mantê-lo em boa posição
com os líderes e membros locais da sinagoga nazarena. Eles
“se encheram de ira” (4:28) e tentaram assassiná-lo. (De algu
ma forma, Jesus escapou para continuar a obra de restaurar
o reino, mas somente por um curto período de tempo). Às
vezes, talvez sejamos como aqueles nazarenos arrogantes que
pensavam serem merecedores da presença e do poder do Espí
rito Santo, mas não outros, que estão alem do escopo do amor
redentor de Deus.
55
8
56
do lado inferior da história. Na verdade, os profetas haviam
predito que, no ano de redenção de Javé, “os coxos saltarão
como cervos” (Is. 35:6)!
Como tal, Pedro entendeu a presença manifesta de Je
sus através do Espirito como uma ocasião para mais uma vez
convidar a multidão de israelitas a se arrepender e receber o
perdão de pecados (3:12, 15). Mas o que Jesus havia insinuado
aos nazarenos na sinagoga, Pedro, agora, explicitamente de
clara: “e venham assim os tempos do refrigério pela presença
do Senhor, E envie ele a Jesus Cristo, que já dantes vos foi
pregado. O qual convém que o céu contenha até aos tempos
da restauração de tudo, dos quais Deus falou pela boca de to
dos os seus santos profetas, desde o principio” (3:19-21). Em
outras palavras, a restauração de Israel estava, de alguma for
ma, ligada á renovação de todas as coisas em Deus, ainda que
(conforme veremos posteriormente, em Atos 10) o próprio
Pedro não tenha entendido plenamente as implicações desta
obra redentora, nesta época.
Agora, assim como foram os lideres religiosos que per
seguiram a Jesus, também foram os lideres religiosos de Jerusa
lém (inicialmente) que perseguiram os discipulos. Mais espe-
cificamente, foi o mesmo grupo de lideres político-religiosos
— “Anás, o sumo sacerdote, e Caifás, e João, e Alexandre, e
todos quantos havia da linhagem do sumo sacerdote” (compa
rar At. 4:6 com Lc. 3:2 e Jo. 18:13-24) — que participaram do
julgamento e crucificação de Jesus, não muito tempo antes,
que agora liderava a inquisição contra os apóstolos. Natural
mente, havia outros, particularmente o partido dos saduceus,
que não acreditaram na possibilidade de ressurreição e que
provavelmente discordaram das reivindicações teológicas de
Pedro, concernentes a Jesus ter sido ressuscitado dentre os
mortos (At. 4:1-2). Contudo, nós não devemos subestimar as
preocupações da liderança judaica de que toda esta pregação
acerca do senhorio e da messianidade de Jesus (3:20) ameaçava
destituir a hierarquia religiosa-política, próxima ao topo no
qual eles mesmos estavam posicionados.
Interessada em preservar seu lugar na escada social,
política e econômica, a hierarquia política estava demasiada
mente preocupada acerca do poder e da autoridade que eles
viam manifesta na pregação apostólica e que estava atraindo
57
milhares a uma nova maneira de vida, bem ali, em Jerusalém.
Seus piores temores pareciam estar se desdobrando: eles ha
viam matado, com o auxílio dos romanos, o homem de Na
zaré que pregava acerca do ano aceitável do Senhor, realizava
as obras do reino e também ajuntava milhares de seguidores;
mas esta mensagem e estes feitos haviam, agora, reaparecido
entre seus companheiros, desprovidos de educação formal.
Era precisamente em nome de Jesus que o aleijado havia sido
curado, e apenas em e através de seu nome — não no de César!
— que tal cura e redenção (salvação) estavam sendo declara
das a todos debaixo do céu (4:10, 12).
E importante, aqui, seguir a dica fornecida por Lu
cas para observarmos que “salvação”, em Lucas e Atos, quase
nunca se refere primariamente ao que acontece após a morte,
mas significa, literalmente, completude e saúde. À cura deste
homem envolveu não apenas a cura de sua deficiência, mas
também sua integração a vida comunal judaica, conforme re
presentada por sua entrada no templo. Ademais, ele não mais
seria um mendigo, mas agora poderia fazer contribuições
como membro de sua sociedade. Em cada uma destas formas,
as boas novas da salvação tinham relevância não para o pós-
-vida, mas para a vida aqui e agora.
Alem disso, assim como as curas que Jesus realizou, a
cura do deficiente na Porta Formosa acabou por ter poten
cialmente implicações políticas drásticas. A política de cura
não apenas expunha a descrença da liderança religiosa; mais
desconcertantemente, para aqueles interessados em preservar
o sistema de classes, que mantinha as massas esmagadas sob o
pé imperial e aristocrático, a comunidade apostólica reconhe
cia e proclamava que a hierarquia religiosa estava entrelaçada
às autoridades políticas, e uma era dependente dos mecanis
mos da outra. Se as autoridades haviam sido informadas acer
ca das orações da comunidade perseguida, eles sabiam que os
seguidores de Jesus reconheciam apenas um: “O Soberano, tu
fizeste o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há!” (4:24), e que
eles associavam a descrença dos líderes judaicos à descrença
do governo imperial, e vice-versa:
Por que bramaram os gentios,
e os povos pensaram coisas vãs?
Levantaram-se os reis da terra, e os
5«
príncipes se ajuntaram a uma, con
tra o Senhor e contra o seu Ungido
(4:25-26; cf. Ps. 2:1-2).
Mesmo em meio à perseguição, a comunidade messiâ
nica inexperiente pedia mais ousadia, mais curas e mais sinais
e maravilhas (4:30-31), e talvez mesmo seus oponentes sentis
sem que estas orações estavam sendo ouvidas.
Então, assim como a liderança religiosa e as autorida
des imperiais se recusaram a acreditar na proclamação mes
siânica de Jesus, eles também, agora, perseguiam aqueles que
pregavam a restauração do reino em nome de Jesus. Assim
como as forças que tinham preferido sua desonestidade e in
justiça (aos custos das massas) sobre os caminhos do reino
messiânico, esses mesmos poderes, agora, também emprega
vam os mecanismos mundanos de ameaças políticas (4:17-21),
éo
Cura Carismática como Sinal do Reino
Lucas 5:12-26; 6:6-11; 7:1-10; 8:40-56
61
ser reintegrado na comunidade.
A pencope é seguida imediatamente pela história do
paralítico que foi baixado pelo teto por seus amigos na presen
ça de Jesus (Lc. 5:17-26). Enquanto Lucas sugere que o homem
foi incapaz de ver Jesus em razão da multidão, em linguajar
contemporâneo, este paralítico ou homem encarnado tinha
um problema de acessibilidade. A cura de Jesus está entrela
çada a seu pronunciamento de perdão de pecados. Enquanto
já temos visto que o perdão de pecados envolve a libertação
de todas as dívidas e necessariamente precede a renovação de
Israel, neste caso, Jesus pronunciou absolvição também em
relação a Deus (5:20-21). A declaração do perdão de pecados
servia não apenas a funções existenciais e terapêuticas, mas
também espirituais e teológicas relacionadas à cura física des
te homem. A cura é, portanto, um sinal não apenas do poder
de Deus de restaurar os corpos humanos, mas também de Je
sus como representante da promessa messiânica de trazer a
redenção, a reconciliação e a liberação há muito associada ao
ano aceitável do Senhor.
De mesma importância é o fato de que Jesus curou
este homem porque sabia que ele estava rodeado de fariseus
e mestres da lei (5:17). Esta é a primeira vez no Evangelho de
Lucas que os fariseus são mencionados. Ao questionarem a
autoridade de Jesus para perdoar pecados (5:21), os fariseus
indubitavelmente também estavam expressando ceticismo
sobre este ser aquele que iria renovar e restaurar Israel. A cura
deste paralítico frisou as interconexões entre cura e perdão.
Mais importante, ela colocava as poderosas obras de Jesus na
esfera publica da vida social e religiosa judaica, e sinalava as
pessoas (e a seus líderes religiosos) que Deus estava presente
neste homem para realizar a redenção de Israel. Deste mo
mento em diante, no Evangelho de Lucas, as hostilidades en
tre Jesus e os líderes religiosos se intensificaram.
A próxima cura, aquela do homem com uma mão
mirrada (Lc. 6:6-11), acontece na sinagoga, no sábado. Lucas
havia acabado de contar a violação de Jesus das leis sabáti-
cas diante dos interrogadores farisaicos (6:1-5). Novamente,
Jesus sabe que está sendo observado e, contudo, diz ao ho
mem: “Levanta-te, e fica em pé no meio” (6:8), desta manei-
ra,, garantindo que suas interações com o homem sejam feitas
em plena vista. Ao passo que seus oponentes estão buscando
trazer acusações contra ele, Jesus lhes indaga: “É lícito nos
sábados fazer bem, ou fazer mal? Salvar a vida, ou matar?”
(6:5, ênfase minha). Jesus vira as mesas, ao associar os propó
sitos do sábado com as intervenções salvadoras de Deus. A
fim de cumprir as intenções divinas para o descanso sabático,
então, Jesus realiza a obra salvadora de Deus, não por perdoar
seus pecados, mas ao restaurar a mão mirrada. Então, apesar
de os judeus acreditarem em Javé como Salvador, eles estavam
despreparados para a manifestação de Javé na forma de Jesus.
Em vez disto, a aparição de Jesus como o mediador da salvação
divina (cf 1:47; 2:11) enfurecia os escribas e fariseus.
A salvação de Deus está, também, pelo presente inter-
-relacionado ao descanso sabático, estabelecido para garan
tir que os ritmos humanos sejam trazidos em sintonia com
aqueles da criação de Deus. A salvação manifesta nesta cura é
um sinal do reino vindouro, que cumpre as intenções de Deus
para causar o shalom do sábado.
As próximas duas curas acentuam que, enquanto, em
geral, Jesus direcionou seu ministério aos pobres e de classe
baixa da sociedade palestina, também interagia com a elite
regente, quando as oportunidades se apresentavam. Tanto o
centurião em Capernaum (Lc. 7:1-2) quanto Jairo, o líder da
sinagoga (7:41), eram patronos que serviam como agentes en
tre o governo imperial e as massas. O status de elite do centu
rião está claramente identificado, como também o está o fato
de ele ser um benfeitor para os judeus em termos de seu amor
por eles e de lhes ter construído uma sinagoga (7:5). (Patro
nos do primeiro século eram aqueles, como o centurião, que
forneciam mercadorias e serviços para seus clientes e, em tro
ca, incorriam débitos de lealdade a seus patrocinadores). Ao
passo que ele estava em uma posição de fazer exigências dos
carpinteiros de classe mais baixa, tal como Jesus, o centurião
reconheceu a autoridade de Jesus e agiu com reverência para
com ele — primeiro, ao enviar amigos para interceptor Jesus,
e, então, a não agir com presunção com Jesus (7:6-7). Mas,
mesmo quando o centurião contradizia as convenções sociais
de sua época, ao agir mais como um cliente do que um patro
no, Jesus, por sua vez, também parecia intencionar quebrar
expectativas sociais, ao entrar na casa de gentios (7:6). Então,
63
Jesus expressa espanto com a fé do centurião, e realiza a cura
do escravo. Em suma, esta narrativa é menos acerca do cria
do curado do que é sobre as promessas de Deus de estender
a aliança aos gentios. Isto antecipa a expansão do evangelho
a Cornélio, em Atos, mesmo quando coloca o poder de cura
de Deus em meio aos domínios sociais e políticos das vidas
humanas.
A cura da filha de Jairo (Lc. 8:40-42, 49-56) futura
mente revela as implicações sociais das ações salvadoras de
Deus. A restauração da menina acontece somente após uma
interrupção envolvendo uma mulher com hemorragia. Contu
do, Jesus explicitamente define esta ressurreição como sendo
salvadora: “Não temas. Crê somente, e será salva” (8:50). A sal
vação da menina também foi iminentemente a de sua família.
A orientação de Jesus aos pais para que dessem à menina algo
para comer (8:55) simboliza não apenas a nutrição de comida
doadora de vida, mas também as práticas sustentadoras de
vida de comerem juntos como uma atividade social. Ambos
os casos, envolvendo Jairo e o centurião, então, revelam como
seus encontros com Jesus causaram uma transformação das
relações normais entre clientes e patronos que governavam as
interações do primeiro século entre elites religiosas e milita
res e suas clientelas.
Ultima para nossos propósitos, porém, não menos
importante em relação aos atos de cura de Jesus, é a cura da
mulher que vivia com hemorragia (e, portanto, era impura)
or doze anos e que havia sido reduzida à penúria. Estas “três
g olas fora” — mulher, impura e pobre — não a desencoraja
ram de se espremer entre a multidão para tocar Jesus, durante
o processo do qual seu estado de contaminação tornava ri
tualmente impuro tudo aquilo com o que ela tivesse contato.
Como com o leproso que vimos acima, sua cura física estava
incompleta, em separado da confirmação social de Jesus de
sua purificação. O diálogo que se seguiu resultou em uma fir-
mação tripla (8:48), rebatendo as “três bolas fora”: sua digni
dade e status foram restaurados no tratamento de Jesus a ela
como “filha” (de Abraão; c f 1:55); ela fora fisicamente curada,
mas agora também socialmente redimida e feita sã (comple
ta); e ela recebeu o dom da^az, não apenas em termos de sua
condição física, mas também em termos de agora ser aceita
64
quando, até aqui, havia sido rejeitada e marginalizada. Este
reconhecimento público era um componente essencial à cura
de Jesus, dado o “pecado” da mulher de contaminar a multi-
dão em razão de sua condição hemorrágica.
Não temos espaço para explorar as muitas outras
curas de Jesus registradas no Evangelho de Lucas. Meu pon
to primário em toda essa discussão é acentuar a significância
mais ampla, social e política, dos atos de cura de Jesus. Em
cada caso, as curas são sinais anunciando a invasão do reino
de Deus, seja em termos de liberação de pecados ou débitos,
reconciliação com a comunidade, restauração da dignidade
social ou reordenação das relações sociopolíticas. As curas
de Jesus realizaram outras funções, além de corrigir corpos
quebrados: elas tanto anunciavam a restauração final de Is
rael quanto constituíam a chegada do descanso sabático úl
timo. Contra este histórico, é menos surpreendente que as
curas apostólicas em nome de Jesus posteriormente (ex., em
Atos) tanto participaram do início do dia aceitável do Senhor
como, simultaneamente, instigavam certos tipos de reações
hostis dos líderes religiosos expressas previamente contra o
próprio Jesus.
Retornado ao presente, então, devemos refletir sobre
o fato de que há mais para a cura divina do que interven
ção biomédica. Como seres completos sociopsicosomáticos,
nossa saude exige tanto cura física quanto remediação psi-
coespiritual, incluindo reconciliação com Deus. Seres huma
nos são criaturas sociopolíticas e econômicas tais que a saúde
holística também envolve resolução de relacionamentos in
terpessoais, reintegração em comunidades e restauração do
valor humano vis-a-vis às percepções de outros. Na medida
em a medicina ocidental bifurca nossos corpos do restante de
nós, ela só pode consertar alguns de nossos sintomas, mas não
pode trazer a cura plena; nossas melhores práticas médicas
permanecem, exceto sinais parciais do reino. O que seguido
res de Jesus capacitados pelo Espírito podem fazer, hoje, para
redimir e transformar nossos sistemas de saúde em todos os
níveis — medicina, acessibilidade, seguro, e assim sucessiva
mente — de maneira que a cura possa, mais uma vez, anunciar
o ano do Senhor?
As curas carismáticas de Jesus foram sinais do reino
65
precisamente porque Jesus recusou se alinhar às convenções
sociais de sua epoca. Ele repetidamente atravessou limites so
ciais, religiosos e teológicos — tocando em leprosos, perdoan
do pecados, declarando o limpo impuro, interagindo com os
patronos de Israel de maneira diferente de um cliente, e assim
por diante —, como também agiu sob a capacitação do Espí
rito Santo para anunciar e estabelecer o dia do Senhor. En
quanto houvesse alguns da hierarquia regente que estivessem
abertos a abraçar a nova ordem mundial de Jesus, a maioria
dos líderes religiosos, da aristocracia dona de terras e da elite
imperial teria se sentido ameaçada a perder seu lugar no sis
tema social.
Estamos, hoje, plenamente comprometidos com o
tipo de comunidade plena e transformadora que é o reino
de Deus? E, se sim, como nossas ações podem ser subversi
vas aos atuais poderes dominantes? Se não estivermos presos
em manter nosso próprio lugar na ordem social, poderemos
nos tornar agentes melhores do poder carismático do Espírito
para trazer sinais de cura do reino vindouro.
66
PARTE TRES
E c o n o m ia do E s p ír ito
Atos 4:32-5:11
70
(4:32), sob o senhorio de Cristo e a liderança apostólica. Eles
haviam recebido a hospitalidade graciosa de Deus, e agora vi-
viam da abundância divina contra a violência, a injustiça e a
iniquidade do império e de suas agências de execução.
O Espírito Santo está operando de maneiras seme
lhantes hoje? Existem comunidades de fé que são sinais da
mutualidade e da amizade do reino vindouro? Estes tipos de
comunidades eclesiásticas, por sua própria existência, cons
tituem uma crítica profética ao egoísmo, à injustiça e à vio
lência que caracterizam as estruturas falidas deste mundo,
como também uma ameaça de destruição da forma do mun
do de fazer negócios. Talvez a testemunha presente da igreja
ao mundo esteja silenciosa porque estamos dominados por
nosso individualismo, materialismo e consumismo, em vez
de cativados pela abnegação de Cristo e dos exemplos como
Barnabé. Mas, se plenamente abraçarmos o poder do Espírito
Santo, em vez disto, cessaremos de comprometer o evangelho
com nosso egoísmo e, na verdade, incorporaremos as boas no
vas aos confins da terra.
71
11
72
cava lhe mostrar sua gratidão). O problema com o anúncio
de Jesus de perdão, contudo, era que isto tinha permanecido
como prerrogativa do sacerdócio, realizado de acordo com os
protocolos dos sacrifícios do templo. Jesus, na verdade, havia
minimizado o ministério do templo e, ao comparar e con
trastar a mulher pecadora com um respeitado fariseu, ambos
minimizavam o estabelecimento religioso e questionavam a
autorretidão de Simão. (Na verdade, a fala de Jesus a Simâo,
“aquele a quem pouco é perdoado” [7:47], tecnicamente sugere
que Simão tem poucos pecados que precisam de absolvição,
mas, em realidade, comunica que, de seus muitos pecados,
apenas poucos foram reconhecidos por ele como necessitando
perdão!)- No final, então, a declaração de Jesus de que “a sa
bedoria é justificada por todos os seus filhos” (7:35) prefigura
sua justificação pública da mulher pecadora e sua denúncia
pública e condenação da hierarquia religiosa.
Um episódio semelhante acontece, mais tarde, quan
do Jesus “ensinava no sábado, numa das sinagogas” (13:10).
Neste caso, Jesus curou uma mulher espiritualmente oprimi
da pelo diabo que estivera, então, encurvada por dezoito anos.
Contudo, a imagem contrastante é a do líder indignado da si
nagoga, que objetou que tal feito tivesse sido realizado no sá
bado. A resposta de Jesus foi direcionada à liderança religiosa
como um todo, que servia como guardiã social e cultural: “hi
pócrita!” (13:15). Aqui estava uma “filha de Abraão” (13:16) que
estava pronta para receber seu descanso sabático, ainda que
contra toda a hierarquia, que parecia determinada a evitar
a chegada do dia aceitável do Senhor. Eles pareciam dema
siadamente preocupados com as convenções tradicionais para
abraçar a obra do Espírito de realizar a plena restauração de
Israel, especialmente quando isso incluía e envolvia as classes
mais baixas e os habitantes pobres da terra.
A parábola posterior de Jesus, sobre o fariseu e o co
brador de impostos (18:9-14), confirma o rebaixamento dos
orgulhosos e a exaltação dos humildes pelo Espírito. O fariseu
via a si mesmo como superior em pelo menos três níveis: mo
ralmente, porque ele era diferente dos ladrões, trapaceiros,
adúlteros ou cobradores de impostos; religiosamente, porque
ele jejuava duas vezes por semana; e economicamente, porque
ele pagava o dízimo fielmente. Mas foi o autoconfesso peca-
73
minoso cobrador de impostos que — como Zaqueu — “desceu
justificado para sua casa, [...] porque qualquer que a si mesmo
se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humi
lha será exaltado” (18:14). Na verdade, Jesus caracteriza o reino
vindouro como pertencente àqueles que são como crianças
(18:15-17). Isto reflete o tipo de humildade manifesta entre os
crentes primitivos, uma vez que ninguém que considerava a
si mesmo melhor que os outros teria ficado confortável entre
aquela comunidade de iguais. Como crianças não exigem a
hospitalidade que busca seus próprios interesses, assim agia a
comunidade de iguais, florescendo através da mutualidade e
da hospitalidade de pessoas como Barnabé e outros dos pri
meiros seguidores de Jesus.
Jesus estava pregando e convidando pessoas para um
novo Israel, constituído pela aliança e pela hospitalidade gra
ciosa de Deus. Naquele descanso sabático final, representando
o reino vindouro, dívidas e pecados seriam perdoados, as pes
soas seriam feitas completas, e os pobres seriam redimidos das
margens da sociedade e restaurados ao centro. O ministério
público de Jesus sob o poder do Espírito estava aterrorizador
aos poderes de sua época porque ele ameaçava desvendar toda
a estrutura hierárquica estabelecida pelo Império Romano. A
renovação de Israel destituiría o status quo e produziría uma
comunidade de iguais na qual os pecadores eram perdoados
assim como os líderes religiosos; na qual os pobres, doentes
e endemoninhados eram restaurados e reconciliados com
aqueles que eram prósperos; e na qual cobradores de impostos
desprezíveis, mas arrependidos, e crianças, pouquíssimo valo
rizadas, representavam personagens centrais do reino.
Eu imagino se somos mais como Simão, o fariseu, e
o líder da sinagoga, ou como a mulher pecadora e a mulher
encurvada: estamos dispostos a sermos “rebaixados” de nossos
status mais altos, ou devemos ser “exaltados” de nossos lugares
mais baixos? Também imagino se poderiamos ter nos conten
tado em ouvir, como a mulher pecadora, “vá em paz” (7:50),
ou se teríamos, talvez, dado os próximos passos de formar e
então morar em tais comunidades de paz, perdão, boas-vin
das e hospitalidade. Não deveriamos ficar felizes ou satisfeitos
meramente com nossas salvações “individuais”. Afinal, é obra
do Espírito, através de Cristo e seu povo, renovar Israel; salvar
74
um povo novo e peculiar de Deus; e introduzir o pleno reino
de retidão, justiça e paz (shalom). E esta obra salvadora en
volve a dimensão coletiva de nossas vidas, não apenas nossos
seres solitários.
75
12
Espírito e Perseguição:
A Política de Restauração
Atos 5:12-42; 12:1-25
76
a graciosa cura de Deus inclusive quando ele andava e cobria
aqueles que estavam enfermos (5:15}.
O que poderia ter sido mais urgente, entretanto, era
a pregação dos apóstolos. Em particular, os líderes religiosos
— incluindo o sumo sacerdote e “o conselho e todo o cor
po de aneiãos de Israel” (5:21) — estavam preocupados que os
apóstolos estivessem “determinados a lançar o sangue desse
homem [Jesus] sobre nós” (5:28). A isto, Pedro e os apósto
los responderam em uníssono, reiterando a aeusação acerca
de “Jesus, ao qual vós matastes, suspendendo-o no madeiro”
(5:30)-
O sabio Gamaliel (que pode ter sido professor de Pau
lo; 22:3) comparou este movimento de massa a dois outros,
cuja notoriedade indubitavelmente permanecia nas mentes
dos líderes judaicos (5:36-37). Teudas reuniu cerca de quatro
centas pessoas, e Judas, o galileu, também liderou uma revolta
em massa (documentada pelo historiador judeu Josefo) em
reação ao governo tirânico de Arqueleu (que reinou na Judeia
de 4 AEG a 6 EG) e à exorbitante política de taxação de Quiri-
no (da Síria). Este detalhe também pode explicar porque Tia
go, o irmão de João, foi executado pelo Rei Herodes Agripa
(Agripa I, que reinou na Judéia de aproximadamente 37 a 44
EG). De acordo com a Mishnah Sanheãrin (9:1), decapitação ou
execução pela espada eram reservadas não somente para assas
sinos, que Tiago claramente não era, mas também para após
tatas — aqueles que ameaçavam a segurança e a estabilidade
da região, o que a liderança de movimento de Jesus ameaçava!
No caso de Herodes, também é útil saber que ele era bastante
popular com os judeus (At. 12:3), em parte porque ele visava
melhorar o scatus quo dos judeus vis-à-vis seus regentes roma
nos. Não é difícil imaginar que ele, também, talvez depois de
prolongadas discussões com os lideres religiosos, veio a en
xergar o emergente movimento de Jesus como uma ameaça
política e não foi desencorajado por nenhum dos argumentos,
ao estilo dos dados por Gamaliel, de tentar acabar com esta
insurreição. Ele não apenas matou Tiago, mas também lançou
Pedro na prisão.^
5 As “vítimas inocentes” da política de Herodes, contudo, podem
ter sido os soldados (e suas famílias) que perderam suas vidas pelo fato
de eles terem perdido seu prisioneiro, Pedro (12:19).
77
Em meio a esta perseguição, os seguidores primitivos
de Jesus oravam fervorosamente (12:5, 12) e continuavam a
proclamar as boas novas do perdão de pecados. Em resposta
a violência decretada sobre Jesus, “O Deus de nossos pais res
suscitou a Jesus [...] Deus, com a sua destra, o elevou a Prínci
pe e Salvador, para dar a Israel o arrependimento e a remissão
dos pecados” (5:^o-3i). Então, contra as ameaças dos líderes
religiosos, os apostolos, em vez disso, seguiram nos passos de
seu líder e Salvador, oferecendo arrependimento e perdão de
pecados. Assim como Jesus havia sofrido uma morte desonro
sa e amaldiçoada em um madeiro, os apóstolos estavam “rego
zijando-se de terem sido julgados dignos de padecer afronta
pelo nome de Jesus” (5:41). Em vez de resistir à violência de
seus opressores de maneira semelhante, os primeiros seguido
res de Jesus ofereciam o dom do Espírito Santo. Estas respos
tas subvertiam os valores do império com os valores do reino.
O fim da vida de Herodes reflete a subversão das “boas
novas” da Pax Romana. Como representante do senhor César,
ele mediava os benefícios salvadores do Império Romano em
termos de distribuir comida aos necessitados, incluindo pes
soas de Tiro e Sidom (12:20); mas assim, também, agiam os
primeiros seguidores de Jesus. A diferença era que Herodes
recebia glória para si (12:20), ao passo que aqueles que abra
çavam a messianidade de Jesus se importavam uns com os
outros como uma comunidade de iguais. Então, “no mesmo
instante feriu-o o anjo do Senhor, porque não deu glória a
Deus e, comido de bichos, expirou [um registro confirmado
em outras palavras por Josefo]. E a palavra de Deus crescia e se
multiplicava” (12:23-24).
Através da oração e da pregação, então, os leitores de
Lucas recebem uma visão de uma forma não violenta de re
sistência, de um modo que introduzia o reino vindouro nos
passos de Jesus, o profeta capacitado pelo Espírito de Deus.
O poder do Espírito não produziu rebeliões armadas, como
aquelas lideradas por Teudas e Judas, o galileu, entre outras
(vide 21:38). Em vez disto, inspirava a proclamação de um
Messias que trazia cura para 0 corpo, realizava reconciliação
social entre classes de pessoas que haviam estado previamente
alienadas e separadas uma das outras, oferecia perdão de pe
cados, e libertava as pessoas da opressão (social e espiritual).
78
Aqueles que recebiam seu convite e eram obedientes em an
dar em seu caminho de vida eram “nascidos de novo” em um
Israel restaurado, um povo renovado de Deus, comunidade e
comunhão de iguais.
Os judeus muito ansiavam por tal renovação de Is
rael, mas não esperavam que ela adotasse essa forma. O mes
mo pode ser dito daqueles entre nós, hoje, que se consideram
seguidores de Jesus. Podemos pensar em arrependimento,
em perdão e no dom do Espírito Santo de maneiras bastan
te individualizadas. Isso também pode explicar porque nosso
testemunhar da ressurreição de Jesus é, as vezes, silenciado,
sem potencial socialmente explosivo. E isso também pode ser
o motivo porque experimentamos muito menos perseguição
por nossa ré do que os primeiros seguidores do Messias.
79
13
0 Espírito e a Paixão de Cristo:
Política da Paz
Lucas 22:31-23:56
ôo
coisas com a intenção direta de destituir o status quo religioso
e político. Por contraste, Jesus era totalmente não culpado das
acusações contra ele. Contudo, estas acusações foram trazidas
porque os líderes religiosos sentiram que ele estava prestes a
derrubar o status quo, ainda que não conseguissem entender
como ele planejava fazer isso. Desta forma, em resposta às
acusações fabricadas de traição e sedição, Lucas é cuidadoso
ao nos dizer que Jesus não proibia o pagamento de impostos a
César (Lc. 20:25), ^ enquanto ele, de fato, instigava o povo, não
estava buscando causar uma rebelião armada, confbrme eles
temiam. Então, enquanto Jesus mesmo afirmou ser o Filho
messiânico de Deus e rei dos judeus — desta forma, levando
a inscrição: “Este é o rei dos judeus”, na cruz (23:38) —, sua
inocência é reconhecida e declarada repetidamente em várias
fases de seu “julgamento”: por Pilatos (três vezes), por Hero-
des Antipas, por um dos criminosos na cruz, pelo centurião
ao pé da cruz, e, implicitamente, por José de Arimatéia, que
não concordou com o processo de acusação contra Jesus feito
pelo concilio. Previsivelmente, Jesus também é proclamado
como o “Justo” pelos apóstolos, posteriormente (At. 3:14).
Ironicamente, enquanto Gamaliel comparou os após-
tolos aos insurrecionistas Teudas e Judas, o galileu, Jesus foi
executado no lugar de Barrabás, “O qual fora lançado na pri
são por causa de uma sedição feita na cidade, e de um homi
cídio ” (Lc. 23:15, 25). Contra a violência de Barrabás e outros
aspirantes a messias, contudo, Jesus advogava um caminho de
paz (19:42; c f 1:75; 2:14). Sim, aquele era um tempo de cri
se, conforme simbolizado pela espada, a que Jesus chamou a
atenção (22:36). Mas, enquanto os discípulos pensavam que
isto significava que era chegado o tempo de libertar Israel
do governo imperial, eles não haviam entendido o que Jesus
queria dizer. Em resposta à produção de duas espadas para
a tarefa que eles acreditavam estar iminente, Jesus exclama
em exasperação: “Basta!” (22:38); e à resposta violenta contra
Judas e a multidão, ele ordena: “Deixai-os, basta!” (22:51), e
promove cura e paz, em vez disso. Mesmo quando ele é satiri
zado, zombado e espancado (22:63-65; 23:11, 35-36, 35), Jesus
se recusa a retaliar.
Após o Pentecoste, os discípulos claramente haviam
aprendido a imitar as abordagens não violentas de Jesus. En-
81
quanto eles não conseguiam manterem-se acordados, quando
ele se preparava, através da oração, para confrontar a oposi
ção, repetidas vezes, mais tarde, não buscaram a espada, mas a
oração e o poder do Espírito (At. 4:24-30; 12:5). A determina
ção de Jesus de ser obediente ao Pai, inclusive obediente até à
morte na cruz, forneceu um modelo para a própria resistência
não violenta dos discípulos. Desta forma, a repetida oferta
dos discípulos de perdão de pecados em sua pregação era um
reflexo da resposta de Jesus, tanto em sua vida quanto em sua
morte: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc.
23:34).
Já vimos que Jesus, bem como João, antes dele, oferece
o perdão de pecados em nome do Pai, bem antes de sua morte
(3:3; 5:20; 7:47-48). Deve ser observado que, diferente dos de
mais escritores neotestamentários, Lucas não possui conceito
algum da morte de Jesus como uma substituição ou satisfação
pelos pecados. Antes, Jesus claramente esperava morrer como
um inocente em um confronto político com as autoridades —
e ele morreu! —, mas também esperava que Deus vindicasse a
missão de sua vida (renovar e redimir Israel) e sua messiani-
dade através de uma ressurreição dentre os mortos (5:22; 18:33;
22:69). apóstolos entenderam a morte, ressurreição e exal
tação de Jesus como sendo central à disponibilidade de per
dão de pecados. O plano de Deus para a renovação de Israel,
por conseguinte, parecia envolver a demonstração de Jesus de
um caminho de paz; sua execução, apesar de sua inocência, a
vindicação divina de Jesus como messias através da ressurrei
ção; e a consequente oferta de paz, reconciliação e vida abun
dante — o descanso sabático último, o ano do jubileu e o dia
aceitável do Senhor —, através do perdão de pecados cometi
dos contra Deus e seu inocente Messias.
Jesus viera, cheio do poder do Espírito, para restaurar
e renovar Israel e estabelecer o reino de Deus. Em sua paixão e
morte, parecera a seus discípulos que seu plano fora frustrado.
Mas ^ode ter havido alguns, incluindo José de Arimatéia, que
intuíam o contrário. José não seguiu seus colegas membros do
concilio, aparentemente porque, diferente deles, ele “esperava
o reino de Deus” (23:51; como Simão e Ana, antes dele), e reco
nheceu, ainda que fracamente, que a vida, o ministério e mes
mo a morte de Jesus apontavam para seu início em seu meio.
82
o caminho adiante para Israel não era através da espada, mas
da incorporação da paz, da retidão e da justiça exibidas na
vida do Messias. Tudo isso pedia não passividade em face da
oposição, mas dependência fiel de Deus. Após o Pentecoste,
os discípulos finalmente pareceram ter entendido! Aqueles
de nós, hoje, que foram e são recipientes do dom do Espírito
Santo, devem, então, viver os valores e manifestar as práticas
do reino que Jesus veio para estabelecer. Devemos ser como os
primeiros discípulos, que seguiram no caminho de Jesus, vi
veram sua visão e carregaram seu fardo — assim como Simão
de Cirene o fez (23:26). Devemos ser tão culpados hoje quanto
Jesus e seus primeiros discípulos foram de ameaçar destituir
o scatus quo, de livremente perdoar os pecados dos outros e
de antecipar uma nova ordem mundial de shalom em meio a
um mundo de violência. Devemos orar para não ignorarmos
a obra do Espírito Santo ou estarmos por demais presos nos
reinos deste mundo quando deveriamos estar avançando o
reino de Deus.
83
M
84
to gtego diz somente que elas estavam sendo negligenciadas
na diakonia cotidiana, melhor traduzido simplesmente como
“serviços” ou “distribuição”; é somente a resposta dos Doze
— que distinguiam entre a “palavra de Deus” e “servir mesas”
(6:2) — que leva a tradução de diakonia como “distribuição de
comida”. Contudo, isso não parece certo; logo de início, no
nível sociocultural, a preparação, a distribuição e o servir da
comida teriam sido responsabilidade das mulheres. Futura
mente, jamais se diz que os sete homens que são escolhidos
para supervisionar esta questão assumiram o trabalho de dis
tribuição de comida; em vez disto, com dois deles (Estevam
e Filipe; At. é:S-8:ô), nos é contado como estes pregavam a
palavra com poder.
Parece que Atos 6 reflete os desafios de manter uma
comunidade de iguais que confronta qualquer comunidade
multicultural, muTtiétnica e multilinguística. A tendência hu
mana leva a nos reunirmos com outras pessoas com experiên
cias e históricos semelhantes; não há nada inerentemente er
rado com isto. Contudo, este movimento palestino estava sob
uma liderança palestina (isto é, de fala aramaica), e isso, por
sua vez, levou, provavelmente de maneira inadvertida, à mar-
ginalização das viúvas helenistas — “estrangeiras residentes”
que não tinham família ou apoio social da participação ativa
na provisão do serviço cotidiano e nas atividades da comu
nidade. A resposta apostólica foi designar e capacitar líderes
que falavam grego (os nomes dos sete são todos helenistas),
para assegurar que tais práticas e comportamentos exclusivis
tas e injustos fossem corridos e que estas viúvas fossem cuida
das de maneira adequada. Um destes líderes cheio do Espirito
era Nicolau, “prosélito de Antioquia” (At. 0:5).
Nicolau e sua família podem ter visitado Jerusalém
no dia de Pentecoste com outros judeus da diáspora da A n
tioquia e da região circunvizinha. Eles haviam se juntado à
comunidade apostólica, e suas habilidades de liderança foram
reconhecidas e confirmadas. Em toda probabilidade, estes
judeus antioquinos e prosélitos não tinham outros parentes
que permaneceram em Antioquia. E provável que as várias
comunidades de fala grega e hebraica, conectadas por crenças
religiosas comuns, práticas e aspirações, encontraram causa
comum com a vis ao ar apostólica ainda que falassem línguas
85
diferentes. Ainda assim, era previsível que a perseguição da
comunidade messiânica em Jerusalém levasse a uma dispersão
dos fiéis, e que muitos destes convertidos simplesmente retor
nasse a suas casas (ou segundas casas, no caso dos judeus da
diáspora) e trouxessem as boas novas com eles.
Isso é exatamente eomo o evangelho chegou a Antio-
quia, através de Nicolau e outros antioquinos. Este foi um
importante desenvolvimento, pois a comunidade messiânica
primitiva desde Antioquia era amplamente reconheeida no
primeiro século como a terceira maior cidade no Império Ro
mano (além de Roma e Alexandria), com uma população de
aproximadamente meio milhão de habitantes. E ali que estes
crentes messiânieos primeiro vieram a ser conhecidos como
chrisríanos, ou seguidores do ungido, o Messias (11:26), ainda
que este nome não tenha se enraizado como um autoenten-
timento cristão até o segundo século. (A palavra christianos
somente ocorre duas vezes em outros lugares no Novo Testa
mento: em Atos 26:28, nos lábios de Agripa II, que pergunta a
Paulo: “Por pouco me queres persuadir a que me faça eristão!”,
e em 1 Pedro 4:16, que diz: “Mas, se padece como cristão, não
se envergonhe, antes glorifique a Deus nesta parte”).
Provavelmente, por algum tempo, durante a segun
da década da existência desta comunidade messiânica, uma
fome mundial (o grego original é oikoumenen) se estabelece.
Ao menos, isto é o que Àgabo, o profeta, predisse (11:27-28).
Esse aparte de Lucas aconteceu “durante o reinado de Cláu
dio” (que data de 41-54), e é confirmada pelas referências em
textos extrabíblicos uma seca, um tanto severa, que devastou
as safras de grãos do Egito durante os anos 45-47. De fato,
enquanto a seca pode ter sido local no Egito, ela teve impli
cações “globais”, não apenas para aquelas regiões do mundo
(imperiál) conhecido que eram dependentes da exportação
do grão egípcio (como eram os habitantes da Palestina), mas
também para aquelas comunidades da diáspora que estavam
relacionadas àquelas que foram fortemente atingidas pela es
cassez de grão e pela inflação resultante dos preços dos grãos
(como era o caso dos judeus da diáspora em relação aos seus
parentes “no seu país”).
Os eristãos antioquinos responderam a esta necessi
dade enviando alívio aos seus irmãos e irmãs judeus através
8É
de Barnabé e Saulo, e isto parece ser confirmado pelo pró
prio Saulo (Paulo) (vide Gl. 2:1-10, esp. v. 10). Ao passo que
o evangelho de Jesus, o Messias, havia deixado a igreja “mãe”,
os ministérios das igrejas “filhas”, tal como a de Antioquia,
estavam agora fluindo de volta ao lar. Estes desenvolvimentos
sugerem que a missão cristã resiste a qualquer tipo de men
talidade hierárquica, patriarcal ou “colonial”, e enfatiza, em
vez disso, uma mutualidade e reciprocidade entre “enviar” e
“receber” igrejas.
Em certo sentido, pouco mudou em dois mil anos, ex
ceto que o “império” do capitalismo de mercado substituiu o
Império Romano do primeiro século. O que resta agora, como
outrora, são a marginalização dos “excluídos” culturais e lin
guísticos em qualquer situação, as sempre presentes necessi
dades dos pobres em todo o mundo (tanto dentro quanto fora
das comunidades cristãs), alterando comunidades migrantes e
mesmo refugiadas (talvez fugindo da perseguição de um tipo
ou do outro), e as instabilidades suportadas por uma econo
mia política volátil (com implicações globais comensuradas
com a economia global e com processos de globalização, como
nossa atual dependência do petróleo continuamente nos lem
bra). Entretanto, podemos aprender uma lição bastante im
portante dos crentes messiânicos primitivos, que permanece
aplicável à nossa época: que liderança e ministério eficazes de
vem representar e respeitar as perspectivas e línguas do povo
que precisa ser servido. Isto não é mais do que uma extensão
do princípio de Pentecoste, em que o evangelho foi anunciado
à multidão em suas próprias línguas, pelo poder do Espíri
to Santo. Os líderes apostólicos reconheceram a importância
deste princípio, ao envolverem helenistas de fala grega em sua
“equipe de liderança”, e, assim, “a palavra de Deus se espalha
va” (At. 6:7).
Isso parece ter sido transferido ao ministério inicial
de Antioquia, onde “grande número creu e se converteu ao
Senhor” (11:21). Os ministérios de Barnabé e Saulo acrescen
taram ao sucesso do estabelecimento da igreja em Antioquia.
Na análise final, o princípio de Pentecoste permitiu aos líde
res apostólicos afirmar a iniciativa, a agência, e os ministérios
distintos da igreja antioquina em seus próprios termos, e pa
receu bom ao Espírito Santo que isto, por sua vez, produzisse
87
uma “missão reversa” de abençoar, partindo de Antioquia às
igrejas na Judeia. É precisamente isto o que o Espírito Santo
continua a fazer, hoje, em meio a um mundo marcado pelas
desigualdades entre o Ocidente e os demais, e pela pobreza
especialmente nas nações em desenvolvimento do Sul Glo
bal. Africanos e asiáticos, que uma vez foram recipientes de
missionários do mundo ocidental estão, agora, vindo como
missionários à Europa e à América do Norte, trazendo o evan
gelho com eles a terras secularizadas. O Espírito permanece
operando em lugares multiculturais, reconciliando e, contu
do, preservando as muitas línguas e idiomas dos povos.
68
Pobreza e Posses:
Uma Vida Cheia do Espírito e a Economia Global
Lucas 12:13-34; 16:10-31; 18:18-30; 20:45-21:4
89
que são impossíveis aos homens são possíveis a Deus” (18:27),
e, ao receberem o Espírito Santo, crentes simples, como Bar-
nabé, lideraram o caminho na demonstração da possibilidade
de viver a generosidade e a hospitalidade abundante de Deus.
O problema, naturalmente, era que a maioria dos seres
humanos e, como os fariseus que Lucas denunciava, “amante
de dinheiro” (16:14). Ananias e Safira fracassaram em ouvir as
advertências de Jesus acerca da ganância; sobre as necessida
des básicas de vida; e sobre tentar servir a Deus e a Mamom.
Claro, a maioria dos ouvintes de Jesus presumia que fortuna,
riqueza e posses eram sinal da benção divina resultante de
sua obediência à aliança (cf. Dt. 28:1-14). Contudo, Jesus esta
va lembrando-os que as promessas da aliança de Deus foram
feitas com um povo não merecedor, que eram, no geral, os
pobres, os oprimidos e os marginalizados. Na verdade, estes
eram aqueles a quem as boas novas do reino estavam sendo
proclamadas (Lc. 4:18; 7:22), e era precisamente os pobres, os
doentes e os endemoninhados (At. 5:16) que estavam respon
dendo à proclamação do reino.
Que o novo povo de Deus incluía estas pessoas mar
ginalizadas, lideradas por homens indoutos (4:13), foi aludido
no início no Evangelho de Lucas. Maria (no M agnificat) havia
9>
PARTE QUATRO
Deixando a Judeia?
Um Excurso Teológico
i6
97
17
Julgamento sobre Jerusalém:
0 Espírito e a Redenção de Israel
Lucas 13:1-5, 31-35; 19:41-44; 20:9-19; 21:5-38
9Ô
de guerras e insurreições (21:5), quando Jerusalém será rodea
da por exércitos (21:20) e “será pisada pelos gentios” (21:24;
cf. 23:28-31). Esta devastação, na verdade, se deu por volta de
104
Não pode ser coincidência, então, que foi Filipe, um
judeu helenista, quem primeiro levou o evangelho aos samari-
tanos, em vez dos apóstolos, que, apesar da perseguição, per
maneceram em Jerusalém (Atos 8:i). A o passo que os apósto
los ainda estavam por demais focados na redenção de Israel
em um sentido exclusivo, Filipe pode ter simplesmente se
guido a visão judaico-helenista de Estevam de que a verdadei
ra adoração de Deus não está limitada a qualquer templo ou
local sagrado (7:48-50), e concluído que a presença de Deus
estava também disponível aos samaritanos, que se reuniam
em outro local sagrado. Portanto, enquanto os samaritanos
haviam previamente rejeitado a Jesus, eles agora receberam
Filipe, que simplesmente estendeu, sob o poder do Espírito, o
ministério de Jesus a pobres, enfermos e oprimidos (8:6-12).
Não nos é dito que Filipe rejeitou quaisquer das práti
cas e crenças samaritanas, em sua interação com os habitantes
de Samaria. O que foi definitivamente rejeitado, em especial
pelos apóstolos Pedro e João, que vieram para fornecer supor
te adicional a Filipe, foi o desejo ganancioso pela autoridade
e as intenções pecaminosas de Simão, o mágico, que buscou
“alcançar o dom através do dinheiro!” (At. 8:20). A genero
sidade de Deus, conforme temos visto, não opera de acordo
com a economia do mundo de troca e pagamento; antes. Deus
livremente concede o Espírito, ainda que, no caso dos sama
ritanos, o dom tenha vindo através das mãos dos apóstolos.
O resultado, Lucas nos conta, é que “as igrejas em toda a Ju-
déia, e Galiléia e Samaria tinham paz, e eram edificadas; e se
multiplicavam, andando no temor do Senhor e consolação do
Espírito Santo” (9:31).
Desta forma, a missão em Samaria foi um ^asso in
termediário entre o caminhar do evangelho da Judeia e suas
redondezas e os confins da terra, e isso já estava assinalado na
narrativa do Evangelho. Enquanto no Evangelho de Mateus
Jesus proibiu os Doze de evangelizar os samaritanos (Mt. 10:5),
este embargo não é encontrado no registro de Lucas. Em vez
disto, Jesus “mandou mensageiros adiante de si; e, indo eles,
entraram numa aldeia de samaritanos, para lhe prepararem
pousada” (Lc. 9:52).
Posteriormente, em seu caminho para Jerusalém, en
quanto deixava Samaria do outro lado da região (17:11), ele
105
encontrou e curou dez leprosos, um dos quais era samaritano.
Enquanto Jesus claramente reconheceu este samaritano como
um “estrangeiro” (17:18) — allomenos, significando alguém que
não é filho de Abraão, conforme os judeus entendiam ser —,
ele também afirmou, claramente: “Levanta-te, e vai; a tua fé
te salvou” (17:19). Então, apesar dos outros nove leprosos (ju
deus) terem sido fisicamente curados e socialmente reabilita
dos (a cura da lepra permitia que a pessoa fosse reintegrada à
comunidade), somente este samaritano foi declarado salvo e
plenamente curado. Ao menos em um sentido, o samaritano
se mostrou com mais discernimento acerca da missão de Jesus
do que seus compatriotas judeus.
Enquanto a possibilidade de salvação dos samaritanos
teria chocado a muitos judeus, os próprios ensinos de Jesus
os preparava a questionar suas suposições e autoconfiança re
ligiosas. Observe que Jesus disse a famosa parábola do bom
samaritano (10:29-37) resposta à tentativa do advogado
judeu de justificar a si mesmo ao perguntar: “Quem é o meu
próximo?”. Esta própria pergunta foi motivada por sua per
gunta original acerca de como herdar a vida eterna, e a famosa
resposta de Jesus foi que se exigia amar a Deus plenamente e
amar nossos próximos como a nós mesmos (10:25-28).
Todo este episódio é tão sugestivo hoje, para os cris
tãos que pensam acerca do pluralismo religioso, como era há
dois mil anos, para os judeus, pensando nos samaritanos, nos
outros religiosos e naqueles que eles acreditavam estar ende-
moninhados. Isto sugere (1) que pode haver aqueles em ou
tras “fés”, como o samaritano, que realmente amam a Deus
e a seus próximos mais do que aqueles do nosso meio, que
pensam que temos acesso à graça salvadora de Deus e que as
outras pessoas, portanto, podem estar mais próximas da vida
eterna do que nós estamos; (2) que nós podemos, na verdade,
ser capazes de aprender algo importante com aqueles perten
centes a outras fés, a quem pensavamos, previamente, estarem
desprovidos de verdade, assim como este advogado judeu es
tava sendo ensinado pelo bom samaritano; (3) que aqueles de
outras fés possam, na verdade, ser instrumentos usados por
Deus para nossa própria salvação (saúde e cura), assim como
o homem que caiu entre os salteadores recebeu sua salvação a
partir desse próximo samaritano. A parábola de Jesus acerca
106
do bom samaritano, portanto, não apenas destruiu as suposi
ções dos judeus do primeiro séeulo aeerca deles mesmos e dos
samaritanos, como também antecipou que o modelo que o
evangelho iria por fim chegaria a Samaria, e que os samarita
nos estariam entre os membros do novo povo de Deus.
A derrubada destas suposições não estava alinhada ao
radical mundo novo que o Espírito de Deus traria e causaria
através de Jesus e daqueles que seguissem seus passos? Ainda
que os próprios apóstolos não tenham liderado o caminho a
Samaria, eles seguiram Filipe, que foi capacitado pelo Espírito
Santo para realizar exorcismos, curar os enfermos e pregar as
boas novas do reino do Messias. Então, Deus confirmou este
ministério ao não negar seu próprio ser, o Espírito Santo, in
clusive aos desprezados samaritanos!
loy
19
0 Espírito Encontra o Eunuco Etíope:
Redimindo a Deficiência
Atos 8:26-40; c£ Lucas 14:1-24
108
CO “Não peques mais, para que não te suceda alguma coisa
pior” (Jo. 5:14) —, como também com sua doença, cegueira,
surdez e mudez associadas a espíritos maus e a cura destes
problemas através de exorcismos se encaixam nas suposições
judaicas do primeiro século acerca da deficiência.
Contudo, a visão inclusiva de Lucas da redenção de
Israel e do reino de Deus se revela mesmo no caso de pessoas
há muito marginalizadas em razão de suas várias deficiências.
Assim como Jesus havia aceitado os socialmente desprezados
e o homem de pequena estatura, Zaqueu (vide nossa discussão
acima, no capítulo 5), Filipe aceita o eunuco, questionado por
questões raciais e por questões de deficiência física. Sim, em
muitos outros casos, Jesus e os apc)Stolos curaram os enfermos
e os “deficientes” pelo poder do Espírito. Contudo, nestes dois
casos, Jesus pronunciou a chegada da salvação à casa de Za
queu (Lc. 15:5) e Filipe batizou o eunuco (At. 8:38) sem qual
quer revogação de suas condições físicas.
A aceitação do eunuco começou a cumprir a promessa
de Javé de incluir os eunucos na redenção final de Israel (Is.
56:3-5). Talvez não coincidentemente, o eunuco estava lendo
acerca desta restauração final, quando Filipe se aproximou ao
lado de sua charrete. Como alguém sem o prospecto de ter
filhos, o eunuco talvez imaginasse o destino e o legado desta
figura sobre a qual ele estava lendo e que também morreu sem
descendentes (At. 8:32-33). A tradição etíope traça as origens
da igreja naquela região ao testemunho deste eunuco. Com
sua conversão, Lucas não apenas antecipa a levada do evan
gelho aos confins do mundo conhecido, mas também clara
mente afirma que a diversidade de línguas, culturas e raças no
reino vindouro inclui diferenças representadas pelos corpos
humanos.
Os prciprios ensinos de Jesus prefiguravam a inclusão
de pessoas como o eunuco. Em Lucas 14, Jesus ceia na casa de
um fariseu. Esta é uma das muitas cenas de refeição no Evan
gelho de Lucas, com refeições sendo socialmente ocasiões de
finidoras acerca de quem era considerado como estando “den
tro” ou “fora” da comunidade de alguém. Por um lado, Jesus
cura o homem com hidropisia, uma deficiência causada pelo
excesso de fluidos corpóreos e inflamação (edema) causada
por sede insaciável. Por outro lado, a intenção de Jesus era
109
desafiar o entendimento dos fariseus do propósito do sábado
(14:3-5) e, então, contrastar suas convenções e valores sociais
com aqueles do reino vindouro. O protocolo para as relações
do primeiro século entre clientes e patronos claramente defi
nia as regras de quem convida quem, onde cada um se senta,
o que se espera em troca por tais convites, e assim por diante.
As duas parábolas de Jesus, a da festa de casamento e a do
banquete escatológico, intencionavam ensinar humildade em
vez de promover o scatus social, destruir as regras de recipro
cidade de “eu te convido e você me convida”, e advertir seus
ouvintes que o reino incluiria aqueles no fundo em vez daque
les no topo da hierarquia social, política e religiosa.
Os pontos principais dos ensinos de Jesus são confir
mados poderosamente por sua inclusão dos pobres, aleijados,
mancos e cegos ao redor daquela grande mesa do banquete
(14:13, 21). Estes eram os párias que não tinham statm c que
eram incapazes de reciprocar a “generosidade” do anfitrião.
Por essa mesma razão, as convenções sociais teriam ditado,
para início de conversa, que eles educadamente recusassem o
convite, de sorte que Jesus insiste que eles precisam ser com
pelidos a participar do banquete e carregados, se necessário
(14:23). O que é verdadeiramente impressionante acerca desta
parábola é a presença de pessoas com deficiências claramente
reeonhecidas em um banquete escatológico do reino. Então, ao
passo que a cura realizada por Jesus de pessoas com deficiên
cias teria confirmado certos pronunciamentos proféticos de
que cegos, aleijados e surdos seriam curados no vindouro Dia
do Senhor, neste caso, a inclusão de Jesus de tais pessoas da
maneira como elas são no grande banquete retoma outros temas
proféticos acerca do reino futuro, envolvendo o florescimento
de todas as pessoas não por serem fisicamente curados, mas
precisamente porque o estigma social de nossas deficiências
não mais nos divide (cf Jr. 31:8-9; Mq. 4:6-7; S f 3:19). Em
suma, a restauração e a redenção de Israel incluiriam pessoas
como o eunuco e Zaqueu, não “curados” para que eles pudes
sem se conformar a nossos padrões sociais de beleza e dese-
jabilidade, mas precisamente como um testemunho ao poder
de Deus de salvar todos nós, pessoas “normais”, de nossas pró
prias atitudes discriminatórias, de nossas ações inospitaleiras
e de nossas formas de vida social e política excludentes.
o Espírito Santo ainda deseja realizar hoje que o que
foi realizado há dois mil anos com o eunuco etíope? Aqui, te-
mos a redenção e a restauração de alguém excluído geografica
mente, racialmente e fisicamente. Há um enorme avivamento
acontecendo hoje no continente africano, e, em muitos senti
dos, os números crescentes dos cristãos africanos hoje podem
se contar entre a posteridade deste oficial etíope! Mas, em um
sentido bastante real, ainda estamos esperando o dia em que a
hospitalidade do Espírito Santo será plenamente manifesta na
igreja de sorte que as pessoas com deficiências — aquelas com
diferenças físicas, sensoriais e intelectuais — serão capazes de
contar a si mesmas como descendentes deste eunuco deficien
te. Existem alguns indícios de que isto está acontecendo, por
exemplo, nas comunidades UArche, onde membros principais
(que são pessoas com deficiências) e assistentes auxiliam uns
aos outros de formas mutualmente transformadoras. Nossa
oração deve ser que mais de nós sejamos inspirados pelo Espí
rito de Deus para intencionalmente formarmos comunidades
plenamente inclusivas que serão redentoras com as boas novas
para todas as pessoas, tanto as pessoas com quanto as pessoas
sem deficiências.
20
115
21
llé
de vida, e “perdemos” os ganhos do mundo. (Estes são os ter
mos econômicos de Lucas 9:25).
Sabemos que Paulo continuou a trabalhar como fa
bricante de tendas, o que ajudava seus empreendimentos mis
sionários (At. 18:3). Mas mesmo se a conversão de Paulo não
tenha significado deixar para trás a fabricação de tendas, ela
significava considerar “por perda todas as coisas, pela exce
lência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo
qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como
escória, para que possa ganhar a Cristo” (Fp. 3;8). Sem dúvi
da, Ananias (não a mesma pessoa que mencionamos anterior
mente e que é citada em Atos 5) também advertiu a Paulo que
o chamado de Deus exigiria não apenas romper seus laços com
o mundo, mas também estar preparado para sofrer pelo amor
do evangelho (At. 9:16). Em suma, ao passo que a conversão
a Cristo pode ou não envolver o abandono da vocação de al
guém, a advertência de Jesus permanece oportuna em relação
ao custo do discipulado: “Assim, pois, qualquer de vós, que
não renuncia a tudo quanto tem, não pode ser meu discípulo”
(Lc. 14:33).
O terceiro elemento é uma radicalização do segundo:
a conversão exige abandonar tudo o que alguém tem, mes
mo sua própria família. Se o trabalho de alguém sustentava
as necessidades materiais de alguém, então a família e paren
tes eram a rede de suporte mais ampla, quando as provisões
eram insuficientes. Estar pronto a abandonar a família, além
da vocação e de posses, seria suicida, em uma economia de
camponeses. Contudo, era isso que a conversão exigia. Isso
vai muito além de simplesmente não dizer adeus (9:61); antes,
significa estar preparado para ser colocado contra seu paren
te mais próximo, caso ele esteja indisposto a seguir a Jesus
(12:52-53; 14:26).
Não sabemos muito acerca da família imediata de
Paulo, exceto que ele parece ter tido uma irmã (e família) em
Jerusalém (At. 23:16). Contudo, nós também sabemos que ele
havia se comprometido com a causa de manter a fé judaica,
e isto estava expresso em seu trabalhar intimamente com ou
tros judeus helenistas zelosos e que pensavam como ele, para
preservar a aliança. Mas a conversão a Cristo o colocou contra
estes grupos judaicos com quem havia previamente se alinha-
117
do (9:25). Seguir a Jesus de fato causou divisão e separação a
suas antigas alianças (Lc. 12:51-52).
Entretanto, a conversão para o caminho de Jesus não
o deixou sozinho. Em vez disto, ele trouxe uma nova família,
um novo povo de Deus, unido em lealdade ao Messias. Aqui
estava uma nova parentela, manifesta incialmente na comuni
dade de iguais reunidas ao redor do ensino dos apóstolos, do
partir diário do pão, a fim de que nada faltasse a ninguém (At.
2:42-47; 4:32-35). Conforme vemos, Paulo simplesmente car
regou a mensagem apostólica para fora de Jerusalém e Judéia
e, no processo, estabeleceu muitas congregações e assembléias
ao redor do império romano. Assim sendo, abandonar tudo,
até mesmo a família, pelo amor de Cristo, de fato resultou no
ganho de muito mais, inclusive de uma família estendida que
consistia de excluídos e estrangeiros.
Por fim, a conversão não significava apenas renunciar
o mundo para uma nova identidade e comunidade, mas tam
bém trazia e causava um novo propósito: o da proclamação do
reino (Lc. 5:26, 60, 62). O discipulado radical se exige em ra
zão do compromisso radical preciso para sustentar a obra do
reino. Em vez de buscar a aprovação do mundo (14:7-14) ou
ser consumido pelas exigências do mundo (14:18-20), a obra
do reino nos convida a abrir mão de nossos próprios objeti
vos, a fim de restaurar, renovar e redimir Israel e estabelecer o
reino de Javé. Paulo sabia, desde o início de seu encontro com
Jesus, que havia sido recomissionado pelo Deus de Israel para
levar as Boas Novas “diante dos gentios, e dos reis e dos filhos
de Israel” (At. ^:i5). A proclamação do reino, então, inevita
velmente incluía esta dimensão política.
A noção de conversão de Lucas envolve não mera
mente a salvação de almas, mas tamhém discipulado e com
promisso radical. A cruz não é entendida meramente como
uma expiação substitutiva penal pelos pecados da humanida
de. Em vez da morte de Jesus exemplificar o triunfo de Deus
sobre o problema do pecado e da culpa humanos, a cruz sim
boliza o caminho do Messias, sua disposição de confrontar
os sistemas enganadores e injustos deste mundo, inclusive a
ponto de morrer. Mais precisamente, a cruz é o caminho da
vida ao qual se convida a conversão do cristão: “Se alguém
quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua
118
cruz, e siga-me” (Lc. 5:23).
O que o Espírito Santo está fazendo hoje? Nada dife
rente do que ele fez com as vidas de Pedro, Levi e Paulo: ele
está chamando pecadores, capacitando a renúncia de todos os
laços que nos emaranham com os sistemas do mundo, capaci
tando à proclamação do evangelho e sustentando a fidelida
de no caminho de Jesus, inclusive até a morte, se necessário.
A conversão de Paulo sinalizava a morte de alguém devoto a
uma visão paroquial das promessas pactuais de Deus e a res
surreição de alguém agora inspirava trabalhar pela redenção
dos judeus e gentios em Cristo, através do poder do Espírito
Santo.
119
22
123
PARTE SEIS
126
tante em razão de sua função na narrativa lucana mais ampla,
e pelo fato de que ela revela um Deus que “não trata as pessoas
com parcialidade” (10:34), e um Espírito que não faz distinção
(11:12). Aqui estava um homem cuja vida manifestava todas
as características da piedade judaica: “Ele e toda a sua famí-
lia eram piedosos e tementes a Deus; dava muitas esmolas ao
povo e orava continuamente a Deus” (10:2); mais especifica'
mente, também se diz que ele era “honesto [do grego dikaios,
significando “reto” ou “justo”] e temente a Deus, que tem boa
reputação em toda a nação judaica” (10:22). A resposta de Pe
dro a Cornélio foi que “Deus ouviu sua oração e lembrou-se
de suas esmolas” (10:31).
Como é que um gentio pode ser uma pessoa de oração
separado da revelação específica dada aos judeus ou através
de Cristo? É possível que Cornélio tenha sido uma pessoa ho
nesta ou reta mesmo antes de ouvir o evangelho? Deus escuta
as orações de todas as pessoas, mesmo se elas forem feitas sem
o conhecimento do nome ou da pessoa de Jesus? A resposta
tradicional é que Deus ouviu a oração de Cornélio e, conse
quentemente, enviou Pedro para proclamar o evangelho para
ele e sua casa. Mas isto significa que a única maneira que Deus
responde as orações daqueles que lhe invocam é enviando um
missionário e que, portanto, todas as pessoas não evangeliza-
das jamais buscaram a Deus? Ainda que respondamos afir
mativamente às duas perguntas, isto não explica como Cor
nélio poderia ter sido um homem honesto ou reto que amava
a Deus (conforme manifesto em suas orações constantes) e,
para todos os efeitos, amava seu próximo como a si mesmo
(conforme testificado pelo povo judeu; c f Lc. 10:27).
Uma resposta mais plausível seria ver que o Deus que
não mostra parcialidade é o Deus que também julga impar
cialmente, condenando pecadores não arrependidos, “mas de
todas as nações aceita todo aquele que o teme e faz o que é
justo” (At. 10:34-35). Temer a Deus e fazer o que é justo não
é uma realização meramente humana; antes, estas são obras
do Espirito Santo, que pairava sobre o abismo no início da
criação (Gn. 1:2), que, é o sopro de vida de toda criatura e ser
humano (Jó 34:14-15; Sl. 104:25-30; Gn. 2:7), e de cuja presença
nin ^ém pode jamais escapar com sucesso (Sl. 139:7-10). O
Espirito que Lucas diz ter sido derramado sobre toda carne
127
é o mesmo Espírito de quem Paulo escreve, que continua a
gemer com a criação e conosco em antecipação da redenção e
da reconciliação de codas as coisas no amor de Deus em Cristo
(Rm. 8:22-23, 26-27, 3^-39).
Desta forma, e possível que os não evangelizados não
estejam além das operações do Espírito de Deus? E possível
que as orações dos não evangelizados também subam como
um memorial diante de Deus e que Deus tenha suas próprias
maneiras de lidar e aceitar aqueles que constancemence o bus
cam, mesmo em separado dos missionários? Isso não significa
que devemos cessar e desistir da grande comissão. Antes, de
vemos responder aos estímulos do Espírito para avançarmos
simplesmente porque tal pode ser um dos meios escolhidos
por Deus para responder às orações daqueles que invocam
o seu nome para a salvação. A obediência de Pedro lhe deu
a oportunidade de declarar o perdão de pecados a Cornélio
(10:43), o que lhe assegurou de que suas orações tinham de fato
sido respondidas.
No caso de Cornélio, Pedro não foi o único instru
mento de evangelismo; em vez disto, Cornélio também foi um
instrumento para a conversão de Pedro. Este líder dos após
tolos tinha seguido o chamado de Filipe a Samaria e então
ministrou em Lida e Jope, e seu ministério itinerante o levou
a ficar na casa de Simão, um curtidor (At. 9:43). Esta pro
gressão mostra que ele agora estava aberto ao menos para se
associar com aqueles previamente considerados impuros (cur
tidores, por profissão, viviam em violação das leis judaicas de
pureza). Entretanto, foi necessária uma visão — repetida três
vezes — do Espírito de Deus, que, Lucas diz, continua a falar
através de visões (2:17) — para convencer Pedro de que as leis
proibindo associações com os gentios tinham sido superadas
em Cristo (10:28). Além disso, também foi necessário o derra
mamento do Espírito sobre Cornélio e sua casa, para revelar
que tais associações eram, agora, não apenas com conhecidos
e vizinhos, mas também com aqueles a quem “Deus concedeu
arrependimento para a vida [...]” (11:18). Pedro se converteu
de ser meramente um pregador de paz em Jesus (10:36) para
ser um que incorporava e vivia a paz de Jesus para todas as
pessoas — mesmo para aqueles a quem ele previamente consi
derava impuros — pelo poder do Espírito Santo.
128
Por fim, observe qjue Cornélio era um centurião, um
oficial romano militar e publico de alto escalão. Contudo, Pe
dro veio a ele “pregando as boas novas por meio de Jesus Cris
to” (10:36). Estas eram as boas novas que reconciliavam não
apenas judeus e gentios, mas também inimigos. O testemunho
de Pedro convenceu outros crentes judeus céticos (11:2-3), ao
menos naquele momento, de que a comunhão judaico-cristã
era de fato possível. O momento divisor de águas levaria, pos
teriormente, à declaração do apostolo Paulo de que judeus e
gentios: “tem acesso ao Pai, por um só Espírito. Portanto, vo
cês já não são estrangeiros nem forasteiros, mas concidadãos
dos santos e membros da família de Deus” (Ef 2:18-15). Entre
tanto, a pergunta ainda permanece: era isso que Jesus antevia
em sua pregação do evangelho do reino e renovação de Israel?
129
24
Trabalho do Reino:
Restaurando Israel — Chamando as Nações!
Lucas 6:12-15; 5:1-6; 10:1-24
132
25
“Expulsem o Maligno!”:
Á Feitiçaria e o(s) Espirito(s)
Atos 13:1-12; 15:8-20
136
26
137
do mundo (4:5-6), Jesus rejeitou a proposta e confiou nas pro
messas de Javé de lhe conceder as nações (vide Sl. 2:8). Ele
estava se preparando para um ataque frontal contra as forças
do diabo, uma batalha para neutralizar a armadura e armas do
diabo e saquear o reino das trevas (Lc. 11:22).
Tão logo venceu as tentações do diabo, Jesus se enca
minhou, pelo poder do Espírito, a soltar os cativos, libertar os
oprimidos e proclamar o ano aceitável do Senhor (4:18-19). E
os asseclas do diabo perceberam que sua aparição antecipava
o tormento e a destruição deles (4:34; 8:36). Jesus primeiro ex
pulsou demônios em Cafarnaum e, então, nas regiões circun-
vizinhas da Galileia (4:41; 6:18), antes de atravessar o lago para
a região gentia de Gerasa (8:22, 26). O endemoninhado que
ele encontrou estava possesso por milhares — Legião (8:30)
— de espíritos malignos. Talvez ele fosse o bode expiatório
expulso da comunidade (para os túmulos e o ermo) cuja vida
representava a desordem (expressa em sua escuridão) experi
mentada pelo povo geraseno em razão da opressão que eles
sofriam sob o governo romano, os impostos e a exploração
(simbolizados pelos guardas, correntes e algemas com as quais
ele estava preso; 8:29). Neste caso, a expulsão da Legião para o
abismo denotava a derrota do domínio e da tirania imperial,
e estabelecia a autoridade e o poder universais de Jesus para
além dos limites de Israel.
Mais especificamente, a libertação do demoníaco
anunciava a chegada do reino. Gonforme Jesus disse poste
riormente: “Mas se é pelo dedo de Deus que eu expulso demô
nios, então chegou a vocês o Reino de Deus” (Lc. 11:20). En
quanto Belzebu domina sobre seu reino de demônios (11:15),
Jesus ameaça transformá-lo em um deserto pelo anúncio da
chegada do rei Javé sobre a nação restaurada de Israel e o
mundo renovado dos gentios; e enquanto o diabo busca man
ter seu controle opressivo sobre o mundo (seu castelo, 11:21),
Jesus chega pelo poder do Espírito a fim de redimir e restau
rar o mundo e seus habitantes a seu devido dono.
Então, por um lado, o diabo e seus asseclas afligem
o mundo fisicamente (conforme refletido em sua responsa
bilidade por casos específicos de ataques epiléticos e mudez;
9:38-39; 11:14). Por outro lado, as obras do diabo debilitavam
famílias e comunidades inteiras. Dentro do horizonte do rei-
13 s
no em Lucas, era o caso do reino das trevas versus o reino da
luz (c£ At. 2Ó:i 8), com as batalhas sendo lutadas em todos os
níveis, alcançando desde o nível da Roma imperial, a lideran
ça judaica, as autoridades regionais (como aquelas em Gera-
sa), e as comunidades locais (como aquela da ilha de Chipre,
sob a liderança do procônsul Sérgio Paulo e seu conselheiro
Barjesus, At. 13:6) ao nível de cada família e cada pessoa. Jesus
veio pelo poder do Espírito, para declarar e estabelecer o rei
no; cabia aos que eram libertos em cada nível, contudo, abra
çar os representantes do reino ou arriscar serem reinvadidos
pelos principados e poderes sete vezes mais malignos do que
os de outrora (Lc. 11:26).
Semelhantemente, hoje cabe a nós discernirmos, se
guindo a orientação do Espírito Santo, quando encontrarmos
um problema de epilepsia (ou doença mental ou esquizofre
nia), ou surdez, ou mudez, ou depressão econômica, ou opres
são política, ou, talvez, simultaneamente com quaisquer das
acima ou mais, se espíritos malignos estão envolvidos. Inde
pendente da situação, devemos sempre estar alertas à presen
ça e atividade do demoníaco, quando existe oposição ao reino
de Cristo, sua retidão, paz, e shalom. Desta forma, o apóstolo
Paulo escreveu: “pois a nossa luta não é contra pessoas, mas
contra os poderes e autoridades, contra os dominadores deste
mundo de trevas, contra as forças espirituais do mal nas re
giões celestiais” (E f 6:12). As vezes, a batalha é perdida por-
?[ue aqueles que entram nela não o fazem pelos motivos certos
ex., os filhos de Ceva) e não estão, portanto, com Cristo, mas
contra Cristo (Lc. 11:23). Outras vezes, os seguidores de Jesus
como o Messias podem simplesmente carecer de fé (5:40-41;
Lucas omite a menção de que os discípulos negligenciaram a
oração ou o jejum, conforme indicado em Mc. 5:2^. Contudo,
quando designado adequadamente por Cristo e capacitado
por seu Espírito, o reino avança em meio a registros de que:
“Senhor, até os demônios se submetem a nós, em teu nome!”
(Lc. 10:17).
Isto significa que nós também podemos ser agentes
da renovação de Israel e da chegada do reino, libertando os
oprimidos, nos opondo aos poderes das trevas em controle
dos portões dos castelos, e mesmo resistindo às formas opres
sivas e destrutivas do império. Não é de se surpreender que
139
“mesmo os demônios creem — e tremem” (Tg. 2:19). Por que
eles não creriam e tremeríam? As vidas de muitos, sem men
cionar os reinos deste mundo, atualmente sob a influência do
maligno (1 Jo. 5:19), estão em jogo. E o mesmo Espírito que
ungiu Jesus para ir “por toda parte fazendo o bem e curando
todos os oprimidos pelo diabo, porque Deus estava com ele”
(At. 10:38), continua a capacitar as obras dos seguidores de
Jesus boje, de sorte que, através delas, Jesus, que foi estar com
o Pai, possa fazer coisas ainda maiores do que ele fez em carne
(Jo. 14:12).
140
27
A Obra Universal do Espírito
Atos 13:13-15:35
141
“alegraram-se e bendisseram a palavra do Senhor” (13:48) e,
conforme prometido por Pedro no Dia de Pentecoste (2:38),
“foram cheios de alegria e do Espírito Santo” (13^2). O perdão
de pecados, a retidão, a paz, e a alegria, manifestos na vida
de Cristo, e a superação do reino das trevas em seu nome,
estavam todos disponíveis a qualquer um que acreditasse e
estivesse disposto a receber — judeus e gentios. Mais precisa
mente, é a reconstrução da casa de Davi, a restauração de Is
rael, que é o meio através do qual os demais do mundo podem
ser salvos (15:16-17).
Mas, assim como os líderes judeus resistiram ao minis
tério de Jesus e dos apóstolos em Jerusalém, e assim como os
judeus helenistas, que eram zelosos pelo ministério do tem
plo, rejeitaram o ministério de Estevam, também os líderes
|udeus e gentios em Antioquia na Psídia e Icónio se opuseram
a mensagem de Paulo (13:45, 50; 14:2, 5, 19). A liderança gentí-
lica pode ter ficado preocupada com a perda de patronagem
em seus templos locais ou em transtornar o culto a César. Os
judeus, por outro lado, podem ter sido alertados pela facção
da Judéia que veio a Antioquia, dizendo: “Se vocês não forem
circuncidados conforme o costume ensinado por Moisés, não
poderão ser salvos” (15:1). Talvez eles estivessem enciumados
(13:45) promessas da aliança de Moisés e Davi esti
vessem sendo estendidas aos gentios sem qualquer exigência
de guardar a lei mosaica ou passar pela circuncisão, o sinal da
aliança (15:5, 24). Mais adiante, se de fato a renovação de Is
rael agora incluía a salvação dos gentios, então, já não poderia
mais haver punição aos opressores de Israel, e, sem tal julga
mento, não naveria vindicação de Israel conforme o povo es
pecialmente selecionado por Deus. Tal aceitação incondicio
nal e mesmo eleição dos gentios como parte do povo de Deus
(13:48; 15:7) não ameaçava desfazer a própria aliança?
Paulo se via sendo amadurecido em duas frentes.
Deus, que o havia chamado ‘Aara ser uma luz aos gentios [...]
e a’ trazer salvação aos confins da terra” (13:47, fazendo alu-
são a Is. 49:6), tinha lhe capacitado pelo Espírito a pregar as
boas novas àqueles que estavam sem a lei. Então, por exem
plo, quando pregando aos camponeses dos vilarejos em Lis
tra, Paulo falou acerca do Criador do mundo, que também
provia para suas criaturas (14:15-17). Era este Deus que, agora.
142
intencionava derramar sobre eles, de maneira extravagante,
o perdão incondicional de pecados e a vida eterna em seu rei-
no (14:15-17). Contudo, esta mensagem parecia, aos líderes e
puristas judeus, por demais descontinuada das promessas da
aliança feitas a Moisés e Davi. Não havia mais necessidade do
sacerdócio e de sacrifícios no templo, e as próprias bases da
lei agora pareciam ser minimizadas.
Acontece que as coisas estavam, de fato, tão “ruins”
conforme eles pensavam que estavam. Não apenas Deus
escolheu os gentios (13:48; 15:14), mas Deus também consi
derou adequado conceder aos gentios o Espírito Santo, para
limpar seus corações pela fé e não mais fazer distinção entre
judeu e gentio (15:8-5). Ainda mais, Pedro insistia que, em vez
de os gentios participarem na salvação prometida aos judeus,
era o contrário — que a salvação dos gentios era a norma, e
que mesmo os judeus serão “salvos pela graça de nosso Senhor
Jesus, assim como eles [gentios] cambem” (15:11, ênfase acrescen
tada). E em vez discernir estes desenvolvimentos como estan
do em consonância com as Escrituras, os profetas agora são
lidos (retrospectivamente, parece) como concordância com a
ação de Deus de salvar os gentios (15:15).
Apesar de os judeus estarem somente agora entenden
do a generosidade de Deus, ela sempre fora parte do plano de
Deus, desde o início (15:18, 21). Entretanto, através de tudo
isso, os líderes apostólicos vieram a perceber, através do Es
pírito Santo (15:28), que, enquanto os gentios poderiam ser
salvos conforme eram (sem plenamente se converter para se
tornarem judeus e sem serem circuncidados), o estilo de vidas
dos gentios também não deveria quebrar a lei mosaica — isto
é, não deveríam cometer imoralidade sexual, mas manterem
a si mesmos afastados das impurezas proibidas a todos aque
les que viviam em meio ao povo de Deus (15:20-21; c f Lev.
17:8). Contudo, estas eram diretivas motivadas socialmente,
uma vez que, do contrário, os convertidos judeus não serão
capazes de interagir com os crentes judeus. A conclusão teo
lógica mais importante era que seguir o Messias não resultava
em desconsideração pela lei, mas em experimentar o poder
salvador da lei na vida de Jesus.
Não é de se surpreender que houvesse tanta oposição
a Jesus e aos líderes apostólicos em Jerusalém, no início, e ago-
M3
ra com Paulo e outros que estavam levando o evangelho aos
gentios. A decisão tomada pelos apóstolos neste concilio em
Jerusalém foi tão radical que, para todos os efeitos, legitima
va a forma não judaica de discipulado messiânico. Os judeus
que estavam comprometidos com as promessas da aliança não
podiam facilmente encontrar uma forma de permanecer fiéis
a suas tradições enquanto, ao mesmo tempo, adotavam a vida
e os ensinos de Jesus em sua comunidade. De fato, parecia que
Deus sabia que isto aconteceria, e que esta própria rejeição
seria a ocasião para a obra salvadora do Espírito entre os gen
tios (13:46).
14 4
28
Parábolas da Obra do Espírito no Mundo
Lucas 13:16-30; 15:1-32
145
igualmente escolhidos como eleitos de Deus e recipientes das
bênçãos trazidas pela renovação de Israel.
O retrato de Lucas dos judeus não é, por vezes, fácil
de engolir. Ainda que os judeus parecessem ter rejeitado o
evangelho e, através disto, aberto a porta para os gentios, isso
significa que a aliança de Deus com os judeus fora revogada?
A resposta, extraída do mesmo texto de Lucas, deve ser um
enfático não. A citação de Tiago do profeta Amós, no concilio
em Jerusalém, foi:
(...) reconstruirei a tenda caída de
Davi. Reedificarei as suas ruínas, e a
restaurarei, para que o restante dos
homens busque o Senhor (At. 15:16-
17 ).
Os gentios não substituem os judeus; antes, os gentios
são capacitados a usufruir do arrependimento precisamente
em razão da construção da cada de Davi — a restauração e a
renovação de Israel. A parábola do filho pródigo, desta for-
ma, nos mostra a grande paciência, persistência e o amor de
Deus pelo perdido, marginalizado e, mais importante, pelo
rejeitado e estrangeiro. O tempo havia chegado, com o envio
de Jesus como o Cristo, para renovar a aliança com os judeus
e, ao mesmo tempo, estender seus benefícios aos gentios. Esta
era a obra inacreditável do Espírito naqueles últimos dias —
aproximar os gentios que não apenas estavam longe, mas tam-
bém cortados das promessas de Deus, e reconciliar judeus e
gentios de sorte que fossem um único e novo povo de Deus.
Contudo, havia um perigo para os judeus. Conforme Paulo
havia advertido os judeus em Antioquia na Psídia: “Era ne-
cessário anunciar primeiro a vocês a palavra de Deus; uma vez
que a rejeitam e não se julgam dignos da vida eterna, agora
nos voltamos para os gentios” (At. 13:46). Na verdade, a pala-
vra do reino e da vida eterna era, precisamente, que a restau-
ração de Israel incluía a renovação do mundo, então, aqueles
judeus que rejeitavam essa mensagem gradualmente se viram
sendo “deixados para trás” enquanto os gentios estavam alcan-
çando 0 reino vindouro.
A s próprias admoestações de Jesus acerca destas ques
tões não pareciam ter sido ouvidas. Em um momento, lhe fi
zeram uma pergunta que era debatida entre os judeus de sua
146
época: se seriam muitos ou poucos os que herdariam o reino
e as promessas da aliança de Deus (Lc. 13:23). Sua resposta en
fatizou que seus ouvintes deveriam se empenhar em receber
a salvação, uma vez que ela não estaria acessível para sempre
(13:24-25). O fracasso em se arrepender, agora, pode levar à
exclusão do grande banquete posteriormente, e seus lugares
tomados pelos muitos que “virão do oriente e do ocidente, do
norte e do sul, e ocuparão os seus lugares à mesa no Reino de
Deus” (13:25). Portanto, apesar de os profetas terem prometi
do que o dia da restauração de Israef também traria bênçãos
para todos os povos da terra, Jesus estava preocupado que seus
ouvintes iriam, por fim, perder o reino. A pergunta importan
te não era quantos seriam salvos, mas como alguém poderia
ser salvo. Podemos ver como a advertência de Paulo a seus ou
vintes judeus e cristãos judeus era consistente com a própria
mensagem e com o ministério de Jesus.
Mas, mesmo em meio a advertências urgentes, nós
encontramos razões para sermos otimistas. Ao falar na
sinagoga no sábado (Lc. 13:10), Jesus contou duas parábolas, da
semente de mostarda e da massa fermentada, que indicavam a
vinda do reino todo-inclusivo (de judeus e gentios), que fora
lançada por acontecimentos aparentemente insignificantes,
como a cura de uma mulher deficiente (13:18-21). Assim como
a pequena semente de mostarda se tornou uma grande árvore
para todos os pássaros, e assim como o fermento se espalha
por toda a refeição, com a vinda de Jesus e, então, do dom
do Espírito Santo, o poder invisível de Deus, mas não menos
ativo, estava crescendo e cultivando o reino. A conclusão é
que, por mais que as coisas pareçam desoladoras, o reino está
inexoravelmente em operação, realizando as intenções salva
doras de Deus.
Então, enquanto não devemos descartar as advertên
cias acerca de sermos excluídos do reino vindouro, também
não devemos nos preocupar ou ficarmos ansiosos acerca dele.
Se Deus advertiu os judeus e também espera pacientemente
por eles, assim Deus também admoesta todas as pessoas a se
voltarem a ele, mesmo enquanto esperando pacientemente
por eles. De fato, Deus ama o mundo de tal maneira que ele é
visto se regozijando, juntamente com os anjos no céu, por um
pecador que se arrepende (15:7, 10). E alguma surpresa, por-
147
tanto, que o Deus que sequer negou a si mesmo, seu próprio
Espírito, tenha derramado seu Espírito sobre toda a carne?
14 8
PARTE SETE
153
30
Jesus, 0 Protofeminista!:
A Unção de Mulheres
Lucas 6:1-3; 10:38-42; 24:1-12
156
31
Lucro, Poder, Política e Louvor
A tos 16:16-40
157
portanto, os açoitou e prendeu, e os prenderam de maneira
mui segura.
Confinados, sangrando e temerosos acerca do que
o futuro lhes reservava, Paulo e Silas, contudo, resistiram,
não de acordo com as convenções de prisioneiros imperiais
falsamente acusados, mas de acordo com a política do reino
vindouro: com oração, adoração c canto! E de maneira seme
lhante a quando Deus enviou um anjo para libertar Pedro da
prisão, enquanto a igreja estava intercedendo por ele (12:5-11),
assim. Deus agora envia, em resposta à oração e aos louvores
de seus servos, um terremoto que solta as amarras de todos
os prisioneiros. Percebendo nitidamente a iminente ruína do
carcereiro — que, se não se matasse, provavelmente teria que
pagar com sua própria vida por permitir que os prisioneiros
escapassem — Paulo, de alguma Forma, convenceu os demais
prisioneiros a ficarem no local e garantiu ao carcereiro: “Esta
mos todos aqui” (16:26).
O carcereiro, talvez tendo ouvido o testemunho da pi-
tonisa sobre a salvação do Deus Altíssimo disponível através
de Paulo e seus companheiros, indagou: “O que devo fazer
para ser salvo?” (16:30). A resposta foi: “Creia no Senhor Je
sus, e serão salvos, você e os de sua casa” (16^1). Ele e sua casa
acreditaram e foram salvos — assim como foram os parentes
de Lídia (16:15), Cornélio (11:14), posteriormente. Crispo
de Corinto(iô:8) — com as primícias de seu arrependimen
to, sendo que ele os levou para sua casa e lavou suas feridas
(16:33). Naquela mesma noite, o carcereiro e sua casa foram
todos batizados, como era a prática desde o dia de Pentecoste
(2:37-41), e o carcereiro pode ter se juntado a Lídia para se
tornar um dos membros fundadores da igreja em Filipos.
No dia seguinte, os indiferentes magistrados ordena
ram à polícia que soltasse Paulo e os outros. Contudo, Paulo
insistiu que a ilegalidade de se açoitar publicamente um ci
dadão romano (ele mesmo) não deveria ser coberta com uma
soltura privada. (Não existe indicação se a tentativa de Paulo
de comunicar sua condição de cidadão no dia anterior foi aba
fada pela multidão). Tendo garantido uma desculpa pública,
Paulo, por sua vez, não prestou contra-acusações — será que
ele perdoou seus opressores? —, mas prosseguiu em direção à
região da Tessalônica.
150
Em um nível, podemos ler esta passagem e concluir
que o Espírito Santo é mais poderoso que do o espírito pito-
nista; que o Espírito Santo inspira a oração e o louvor como
respostas adequadas em nossas mais escuras e difíceis horas de
necessidade; que o Espírito Santo sempre está em operação,
mesmo através das mais inesperadas circunstâncias de nossas
vidas, para trazer salvação ao perdido. Tudo isto é correto e
é verdade. Ademais, contudo, podemos observar os seguintes
pontos sobre a presença e a atividade do Espírito em meio às
pressões da vida imperial:
• O Espírito Santo não tolera a exploração dos pobres (mes-
mo aqueles em servidão via uso das artes da adivinhação), es-
peciahnente pelos ricos;
• As práticas do reino, incluindo a oração e o canto, não são
apenas expressões de piedade pessoal, mas também demons-
trações publicas da capacitação do Espírito dos seguidores de
Jesus que estão no mundo, mas que não são do mundo;
• O Espírito está interessado não apenas em salvar almas
para a eternidade, mas em formar novas comunidades de cura
e reconciliação a partir de todas as casas que adotarem as boas
novas de Jesus e o reino.
Além disto, devemos observar que a cidadania im
perial fornece outro local para a obra do Espírito Santo de
redimir Israel c restaurar o reino. Note que Paulo, o cidadão
romano, respondeu de uma maneira que resultou não apenas
na sâlvação literal do carcereiro da morte, mas também em
vida eterna para ele e toda a sua casa; e Paulo foi, então, capaz
de confrontar os magistrados acerca de sua falta de supervisão
e talvez até mesmo acerca do etnocentrismo e de sentimentos
antijudaicos que marcavam a comunidade filipense. Em suma,
a cidadania terrestre traz consigo não apenas direitos, mas
também responsabilidades, e estas, não menos que a oração e
o louvor, são veículos da obra do Espírito.
159
32
léo
dia, e isto Deus fornece, seja de maneira miraculosa, através
da multiplicação dos pães e peixes (ex. Lc. 9:13-17), ou através
da mutualidade, generosidade e reciprocidade da comunida
de apostólica (At. 2:44-47; 4 '32~ 37 )- Âqui, clamamos pela eco
nomia da graça divina, em vez de um “conserto” temporário
de nosso mercado econômico de câmbio.
Terceiro, a oração tem a ver com o perdão de peca
dos e de dívidas tanto nossas, quanto dos outros. A partir de
Deus, vemos o perdão de pecados; com relação aos outros, nós
perdoamos as dívidas que eles nos devem. Isto é consistente
com a mensagem do perdão divino de ;pecados, proclamada
por Jesus e pelos apóstolos, como também com o ministério
capacitado pelo Espírito de Jesus para estabelecer o Ano do
Jubileu, apresentando a soltura dos cativos e daqueles oprimi
dos, e a proclamação do Dia do Senhor ao pobre (Lc. 4:18-19).
Os primeiros seguidores de Jesus não apenas oravam acerca
do perdão de pecados e dívidas, mas também encarnavam sua
mensagem através da venda de propriedades privadas para a
provisão das necessidades da comunidade.
Por fim, a oração nos mantém afastados das provas e
tentações e nos preserva em meio à perseguição (prevista por
Jesus em 12:12-19, ^ experimentada por seus seguidores, tal
como Paulo e Silas em Filipos). Isto reflete a interconectivida-
de da dimensão vertical (nossa orarão endereçada ao Pai ce
lestial) e da dimensão Horizontal (publica epolítica) de nossas
vidas. Em cada um destes casos, a Oração do Pai Nosso não é
meramente pessoal e individualizada, mas também tem a ver
com a esfera do reino e, portanto, interage com os aspectos
políticos, econômicos e sociais da vida no aqui e agora.
Jesus dá continuidade a seu exemplo de como ou o que
orar com um ensino acerca do Pai, a quem devemos orar. Duas
lições são enfatizadas: primeiro, se amigos compartilharem o
que têm em tempos de necessidade, então o Pai no céu estará
muito mais disposto a abrir a porta quando nela batermos
(Lc. 11:5-10); segundo, se os pais humanos sabem como dar
bons presentes aos seus filhos — peixes em vez de cobras, ovos
em vez de escorpiões —, “quanto mais o pai que está no céu
dará o Espírito Santo a quem o pedir!” (11:13). O dom do Es
pírito a toda a carne não apenas reflete outro bom dom de
Deus, mas é o próprio Deus, dado para a renovação de Israel e
16 1
para a salvação do mundo.
Jesus também nos diz, através da parábola da viúva c
do juiz iníquo (16:1-8), quando orar: sempre! O contexto mais
amplo desta parábola diz respeito á vinda do reino (17:20-37).
Talvez na época da escrita de Lucas houvesse dúvidas acerca
do retorno iminente de Jesus e da chegada do reino (cf. 2 Pe.
3:3-13), e ele, portanto, inseriu esta parábola neste momento,
apresentando o convite de Jesus “parar orar sempre e nunca
desanimar” (18:1). Esta histc)ria, de uma viúva injustamente
oprimida, pode ter estado nas mentes de Paulo e Silas, quan
do estiveram presos em suas celas em Filipos, também injusta
mente espancados e presos. A resposta de Deus a Paulo e Silas
foi imediata, assim como Jesus indicou que a justiça de Deus
não se atrasaria (18:7-8).
Mais importante, as orações dos justos e oprimidos
são por justiça — mencionada três vezes na parábola (18:3, 5,
7). A justiça é prometida por Deus na restauração de Israel
(contra seus inimigos), como boas novas para os pobres e os
marginalizados (contra a aristocracia rica), e como liberação
dos cativos (de seus opressores). Para os eleitos ansiando pela
eleição de Israel, pela liberação do cativeiro, e das algemas da
pobreza, Jesus responde: “Acaso Deus não fará justiça a seus
escolhidos, que clamam a ele dia e noite?” (18:7). Se as cortes
humanas fazem cumprir o pagamento de débitos (incluindo
aqueles devidos por viúvas a seus credores), então, o Dia do
Senhor trará a justiça para todos, de acordo com o cálculo
misericordioso de um Deus gracioso e doador de dons.
Então, como devemos orar? Talvez, no fim, o Espírito
interceda por nós, dentro de nós, e através de nós, em ante
cipação de toda a criação (Bmi. 8:19-27). Nós, que ansiamos
que a justiça de Deus sej a revelada, apenas o ansiamos porque
o Espirito já foi derramado em nossos corações como um pa
gamento inicial do reino divino por vir. Nossas orações pela
paz e pela justiça, então, constituem parte da obra do Espirito
Santo para estabelecer a shalom no mundo hoje.
162
33
O Espírito Vira o Mundo de Cabeça para Baixo
A tos 17 :1-10 :21
163
tios’” (i6:é; que ecoa as instruções de Jesus de sacudir a poeira
do pé diante daqueles que rejeitam o evangelho — cf. Lc. 5:5;
10:11). Os equívocos judeus continuaram, acerca do Messias,
conforme os judeus de Corinto persistiram; “Este homem está
persuadindo o povo a adorar a Deus de maneira contrária à
lei” (At. 18:13). Quando viram que o caso deles contra Paulo
havia sido sumariamente dispensado, eles, por sua vez, se vol
taram contra o líder da sinagoga, Sóstenes (18:17), talvez um
convertido como o líder prévio. Crispo (18:8), ou talvez al
guém que não havia saído em pleno apoio aos judeus em suas
acusações contra Paulo.
Existem, também, inconfundíveis continuidades en
tre o evangelho e as crenças e práticas judaicas tradicionais.
Paulo arrazoou com os judeus a partir das Escrituras (17:2;
18:5), persuadindo alguns mesmo enquanto levando outros a
confirmar o que fora dito através dos textos sagrados judaicos
(17:11). Em Cencreia, Paulo cumpriu um voto (provavelmen
te de nazireu) e cortou seu cabelo (18:18),’°“’ mesmo quando
buscava participar da festa (Páscoa) em Jerusalém (18:21). A
decisão de Gálio, o procônsul de Acaia, de não presidir sobre
disputas intramurais judaicas (18:14-15), esclarece que, mes
mo neste estágio, o caminho de Jesus ainda era considerado
mais uma ramificação do que uma fé distinta do judaísmo.
Na verdade, o entendimento de Gálio do cristianismo como
outra ramificação judaica é confirmado pelo decreto do Im
perador Gláudio, por volta de 40 EG, exigindo que todos os
judeus deixassem Roma (18:2), em razão dos distúrbios eivis
relacionados às disputas intramuros judaicas acerca de Gris-
to. Em suma, a conversão a Jesus não necessariamente exige
rejeição ao judaísmo.
Era este também o caso para os gentios? De um lado, a
proclamação de Paulo no Areópago — que pode ter sido a ea-
pital cultural e filosófica do mundo antigo — sugere não ape
nas que os atenienses adoravam o Griador dos ceus e da terra,
ainda que de maneira deseonhecida (17:23-24), mas também
que os poetas pagãos deram testemunho a este Deus desco-
10 Paulo pode ter feito um voto de nazireu que se estendeu por um
período de tempo, durante o qual ele não cortou seu cabelo (Nm. 6:1-21).
Nós sabemos que Paulo realmente guardava a lei (ex.. Atos 21:18-26),
incluindo o rito de circuncisão, que foi efetuado em Timóteo (16:3).
164
nhecido (17:28). Ademais, o ato divino de dispersar os gentios
ao redor da face da terra era “para que os homens o buscassem
e talvez, tateando, pudessem encontrá-lo, embora não esteja
longe de cada um de nós” (17:26). Nós já tínhamos visto, pre
viamente, Paulo se aproximar dos pagãos, ao enfatizar Deus
como o Criador do mundo (em Listra; 14:15-17), o que está em
consonância com a declaração de Pedro de que “Deus não tra
ta as pessoas com parcialidade, mas de todas as nações aceita
todo aquele que o teme e faz o que é justo” (10:34-35). Resu
mindo, deve-se ver a cultura gentílica e mesmo a religiosidade
como antecipando o cumprimento pelo Deus revelado como
o Pai de Jesus Cristo.
Paulo também disse: “No passado Deus não levou em
conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo
lugar, se arrependam. Pois estabeleceu um dia em que há de
julgar o mundo com justiça, por meio do homem que designou.
E deu provas disso a todos, ressuscitando-o dentre os mortos”
(17:30-31). Lucas, então, observa que a menção da ressurrei
ção — que permanece central à mensagem do evangelho, quer
para judeus ou gentios (17:3,18) — não foi bem recebida pelos
filósofos atenienses racionalistas e céticos (17:32). Por último,
havia a reivindicação subjacente acerca da majestade de Jesus
(17:7), que, apesar de não agir de maneiras politicamente re
volucionárias por seus seguidores, era claramente subversiva
tanto em simbolismo religioso quanto em autoridade impe
rial de César. Em síntese, deve-se também ver a cultura gen
tílica e a religiosidade não como sendo cumpridas por Cristo,
mas como sendo ab-rogadas pelo evangelho.
Os empreendimentos missionários de Paulo nestes
dois capítulos confirmam que o evangelho de Jesus Cristo
mantém tanto continuidades quanto descontinuidades com
as culturas e as religiosidades judaica e gentia. A redenção
da cultura pelo Espírito exige uma preservação do antigo, em
certos aspectos, mas também um repúdio a antigas crenças e
práticas, em outros aspectos. Se a obra do Espírito trouxe e
causou renovação, restauração e reapropriação de tudo o que
era bom e verdadeiro nas esferas sociais, culturais e religiosas
da vida humana, ela também pode ser vista a partir de ou
tra perspectiva, em que a vinda do Espírito virou o mundo
de cabeça para baixo em cada um dos domínios do esforço
165
humano. Continuidade ou descontinuidade, quando e como?
Estas são as indagações que exigem contínuo discernimento
da presença e da atividade do Espírito.
léS
34
0 Espírito e a Nova (Des)Ordem Mundial
Lucas 6:17-49
167
reino vindouro? Enquanto posteriormente Jesus resumiria os
mandamentos mais importantes em amar a Deus e a seu pró
ximo (Lc.ioray), aqui, ele segue as bênçãos e maldições ao di
zer: “Amem os seus inimigos, façam o bem aos que os odeiam,
abençoem os que os amaldiçoam, orem por aqueles que os
maltratam. Se alguém lhe bater numa face, ofereça-lhe tam
bém a outra. Se alguém lhe tirar a capa, não o imj?eça de tirar-
-Ihe a túnica. Dê a todo o que lhe pedir, e se alguém tirar o que
pertence a você, não lhe exija que o devolva” (6:27-30). Jesus,
mais adiante, esclarece que tais práticas do reino represen
tam contrastes adicionais à maneira como o mundo funciona.
Mesmo os pecadores (leia-se: pagãos e gentios) amam aqueles
169
35
o Espirito e a Intersecção do Dinheiro com a Religião
A tos 15 :18 -4 1; 20:17-38; Lucas 15:45-48; 20:20-26
170
renomado centro do mundo antigo. O mais importante é a
testemunha do escrivão que foi bem sucedido em acalmar a
multidão, em parte por lembrá-los que, em relação a Paulo
e seus compatriotas. Gaio e Aristarco (que haviam sido de
tidos pela multidão), “vocês trouxeram estes homens aqui,
embora eles não tenham roubado templos nem blasfemado
contra nossa deusa” (19:37). Então, enquanto Paulo realmente
contrastava o Deus vivo com os ídolos inanimados feitos por
mãos de artífices (19:26), a ênfase aqui parece estar mais na
incapaeidade da arte humana de portar a majestade da dei-
dade do que em ser rudemente desdenhoso. O que deve ser
enfatizado é que a abordagem cristã não era desrespeitosa da
religião dos efésios e que o evangelismo se dava menos por
destruir a fê dos outros do que testemunhar a Jesus Cristo
(19:17). Isto parece ser confirmado pelas próprias lembranças
de Paulo de que sua atitude e suas práticas ministeriais eram
marcadas pela humildade, transparência (acontecendo não
apenas em público, mas também de casa em casa), e um foco
em Deus e no reino vindouro (20:19, 20, 25, 27).
Não se deve subestimar que o alvoroço que eclodiu
em Efeso foi preeipitado em grande parte pelo impacto do
evangelismo cristão sobre a economia religiosa da area. Re
corde-se que as conversões em massa após o incidente com
os sete filhos de Ceva (vide cap. 25 acima) havia resultado na
queima de pergaminhos e outras parafernálias relacionadas
ao oculto, totalizando “cinquenta mil dracmas" (19:19). Isto
levou Demétrio e outros dos principais prateiros, cujos ne
gócios eram a produção de templos de Artemis, a observar
que o crescimento do Caminho (do Messias) ameaçava suas
próprias subsistências econômicas (19:27).
Claro, não era apenas o culto de Ártemis que mescla
va questões religiosas a econômicas. Quando Jesus entrou no
templo de Jerusalém, ele “começou a expulsar os que estavam
vendendo” (Lc. 19:45). Como a casa de oração tinha se tornado
um “covil de ladrões” (19:46)? Duas considerações merecem
ser registradas. Em primeiro lugar, porque o templo havia se
tornado um centro internacional para a diáspora judaica do
primeiro século, ele forneeia sistema de câmbio de maneira
que muitos visitantes pudessem comprar os animais sacrifi-
ciais necessários para observar os ritos religiosos judaicos e as
171
celebrações festivas. Em segundo, a liderança religiosa e cul
tural judaica na Palestina conseguia manter o templo aberto
e em funcionamento em parte por concordar em coletar e pa
gar um imposto do templo às autoridades romanas. Isto era
justificado como uma concessão legítima a fim de ou evitar o
fechamento do templo ou ceder o controle local do templo à
hierarquia romana.
A limpeza do templo feita por Jesus indicava o fato
de que as exigências práticas desenvolvidas com o passar do
tempo se transformaram em corrupção dos ritos religiosos em
razão da ganância econômica. Talvez sua expulsão daqueles
compradores e vendedores, assim como também dos cambis
tas e mercadores (mencionados em Mc. 11:15-16), equivalesse
a um exorcismo que buscava possibilitar novamente o tipo
de oração religiosa autêntica que capacitaria discernimento
da época da visitação divina sobre a cidade e as pessoas (Lc.
19:44). Contudo, nenhum dos registros paralelos deste inci
dente nos outros evangelhos diz algo acerca daqueles que co
letavam o imposto do templo. Quando indagado acerca do
pagamento de impostos, na esperança de enganar Jesus como
um insurrecionista, Jesus observou que a moeda trazia a ima
gem do imperador — para ser mais específico, estava escrito o
seguinte, no denário romano: “Tibério César, filho do divino
Augusto” —, e então respondeu: “Deem a César o que é de
César e a Deus o que é de Deus” (20:25). estes ouvin
tes judeus, o mandato era inequívoco: a autoridade política
cuja imagem estava estampada na moeda deveria ser honrada
através do pagamento de impostos. (Observe que, em 2:1-5,
Lucas não repreende José e Maria por irem se registrar em sua
cidade natal, um processo político diretamente relacionado
às políticas de taxação de Roma). Mas a autoridade divina
cuja imagem estava estampada em suas vidas (criadas à ima
gem de Deus) deveria ser honrada através da apresentação de
seus próprios corpos “como sacrifício vivo, santo e agradável
a Deus, este é o culto racional de vocês” (Rm. 12:1).
Os acontecimentos em Efeso nos convidam a pensar
mais acerca tanto do encontro contemporâneo cristão com
outras religiões quanto do complexo inter-relacionamento
entre religião e economia. Vale observar que, às vezes, o zelo
evangelístico exibido por Paulo, que queria dirigir-se à multi-
172
dão e defender seus colegas de trabalho contra os arruaceiros
efésios, deveria por vezes ser moderado por uma postura pa-
ciente, não provocativa e respeitosa. Quando somos convida
dos por pessoas de outras fés, certos protocolos apropriados
devem ditar cursos de ação que sejam reverentes e corteses, ao
invés de vez de agressivos ou confrontacionais. A recomenda
ção do escrivão é tão importante que quaisquer tensões inter-
-religiosas deveriam ser resolvidas através dos canais judiciais
corretos.
As interconexões entre religião e economia não são
menos palpáveis boje do que eram em Éfeso e Jerusalém, há
dois mil anos. A maioria das instituições religiosas é isenta
de impostos, o que suscita todos os tipos de indagações
complexas acerca do relacionamento entre igreja e estado,
mesmo quando existe uma mentalidade consumista para
produtos religiosos tais como música cristã, filmes e assim su
cessivamente, que são “grandes negé>cios” no mercado global.
Em suma, a nossa fé hoje pode ser ou estar ainda mais com
prometida pelo sistema capitalista do que o culto a Artemis
ou a economia do templo judaico do primeiro século?
Neste contexto, as palavras do apóstolo Paulo são dig
nas de serem relembradas — “Não cobicei a prata nem o ouro
nem as roupas de ninguém” (Atos 20:33) —’ mesmo quando
a citação de Paulo das palavras de Jesus devam ser abraça
das e emuladas: “Há maior felicidade em dar do que receber”
(20:35). Ambas estas palavras apontam um caminho para fren
te, acerca de como devemos manter nossa fé religiosa livre
de contaminação econômica. Mais importante, ambas pala
vras viveram a partir da hospitalidade graciosa, abundante e
transbordante de Deus, que derramou seu Espírito sobre toda
carne a fim de que seja possível a nós participarmos e esten
dermos o dom de Deus de Si mesmo, a salvação interminável,
sempre perpetuadora e continuamente multiplicadora inten
cionada para a redenção de Israel e a renovação do mundo. Na
verdade, os estilos cristãos de vida que refletem estes valores
seriam subversivos em nossa época das economias religiosas e
políticas, e nossas persistentes práticas da ética de Jesus real
mente colocam as convenções das práticas econômicas con
temporâneas de cabeça para baixo.
173
PARTE OITO
176
com a intensificação dos sentimentos pró-judaicos e anti-ro-
manos na região (lembre-se, isto se deu provavelmente não
mais que uma década antes da rebelião em 66 EC), Félix esta
va esperando uma propina de Paulo em troca de sua liberda
de, e tanto Félix quanto Festo buscavam eles mesmos cair nas
graças dos judeus (24:26-27). Entretanto, nenhum conseguia
encontrar falha em Paulo, e ele foi declarado inoçente quatro
vezes: por Cláudio, Festo e Agripa (23:29; 25:18; 26:31-32), sem
mencionar pelos fariseus também (23:9), uma sequência de
acontecimentos talvez intencionada por Lucas como um pa
ralelo dos repetidos pronunciamentos da inocência de Jesus.
Naturalmente, os líderes judaieos acusam Paulo não
apenas de profanar o templo, mas também de ser “perturba
dor, que promove tumultos entre judeus pelo mundo todo.
Ele é o principal cabeça da seita dos nazarenos” (24:5). Cer
tamente, a mensagem de Paulo havia provocado multidões de
judeus por todo o mundo mediterrâneo. Mas por quê?
“Estou sendo julgado por causa da minha esperança
na ressurreição dos mortos” (23:6), Paulo declara, em certo
ponto, diante do sinédrio, que era composto por saduceus
conservadores (legalistas da Torá que não acreditavam na res
surreição porque ela não estava nos cinco primeiros livros da
Bíblia; c f Lc. 20:27) ^ pelos fariseus mais progressistas (que
aceitavam a ressurreição a partir de outras passagens bíblicas).
Paulo reiteraria esta alegação, enfatizando que a esperança da
ressurreição era antecipada pela maioria dos judeus, embasa-
da nas promessas da aliança feita a seus ancestrais, e que essa
esperança havia sido cumprida em Jesus.
Mas, por que a declaração de Paulo de que a esperança
de Israel culminou em Jesus de Nazaré causou tanta conster
nação entre seus eompatriotas judeus? A questão era que se
Jesus havia ressuscitado dentre os mortos, então ele não ape
nas era o Messias prometido, mas o fim da era também havia
chegado (ver 2:17). Um Messias ressurreto também significa
va que a renovação de Israel estava prc)xima e que, conforme
prometido a Abraão (Gn. 12:3) e reiterado pelos profetas, tal
restauração incluía Israel como sendo uma bênção aos gen
tios. Se a ressurreição de Jesus havia aeontecido, então tal se
deu pelo poder do Espírito Santo, e o mesmo poder do Espí
rito estava presente para trazer cumprimento às promessas
17 7
da aliança, mesmo aos confins da terra. Assim sendo, Paulo
continuou a associar a esperança de Israel e a ressurreição a
seu envio para proclamar o evangelho aos gentios." A ressur
reição significava boas novas não apenas para indivíduos e
corpos mortos/enterrados, mas também para a comunidade
humana: os pecados seriam perdoados e as pessoas seriam re
conciliadas umas com as outras. Conforme Paulo esclareceu
em outro lugar, a morte e a ressurreição de Jesus significavam
a criação de um novo povo de Deus, consistindo de judeus e
gentios (Efésios 2:11-22). Paulo foi perseguido por seus compa
triotas judeus porque ele não apenas acreditava na esperança
de Israel, mas também buscava concretizar o pleno escopo das
promessas da aliança entre os gentios. O proprio Jesus havia
prometido a seus seguidores que eles seriam perseguidos e que
alguns deles até mesmo teriam a oportunidade de testemu
nhar o evangelho diante de reis e governadores (Lucas 21:12).
Mas ele também os havia encorajado a serem corajosos em
seus testemunhos: “Quando vocês forem levados às sinagogas
e diante dos governantes e das autoridades, não se preocupem
com a forma pela qual se defenderão, ou com o que dirão,
pois naquela hora o Espírito Santo lhes ensinará o que devem
dizer”” (12:11-12).
O relato de Lucas do testemunhar de Paulo mesmo
enquanto em prisões reflete a contínua capacitação do Espí
rito Santo nas circunstâncias mais calamitosas. Isto era um
cumprimento do que o Espírito derramado sobre toda a carne
realizaria (Atos 2:17-18): a capacitação de servos e servas — li
teralmente escravos e aqueles aprisionados — para profetizar
em nome do Senhor. O dom do Espírito era para capacitar a
levada do evangelho além da Judéia e Samaria “para os [gen
tios nos] confins da terra” (i:ô). O aprisionamento de Paulo
não o impediria de sua eventual chegada em Roma, o centro
simbólico do mundo dos gentios; na verdade, era precisamen
te o desdobramento dos acontecimentos de sua prisão que le-
varam seu apelo a César e sua jornada a Roma. Desta forma, a
11 Então, não apenas Paulo repetidamente associa sua perseguição
a suas crenças acerca da ressurreição de Jesus (Atos 24:14-15, 21; 25:15;
26:6-8, 23; 28:20), mas ele também insiste, em resposta, que esta esperan
ça estava entrelaçada com o destino, o futuro, e a restauração de Israel e
dos gentios (22:15, 26:17-20, 23; c£ 9:15; 13:47; 18:6).
178
prontidão de Paulo para testemunhar acerca de Jesus, mesmo
ao ponto de morte (25:11), e seu sucesso em fazê-lo, permanece
o tema central deste última quarta parte do livro de Atos.*""
Mesmo hoje, a própria experiência da “paixão” de Pau
lo |)ode ser um modelo para nós. O que é impossível em nossa
própria força pode ser realizado pelo poder do Espírito San
to. Quando formos perseguidos por nossa fé, o Espírito irá,
contudo, capacitar nosso testemunhar; então, mesmo se nossa
testemunha for rejeitada, estamos plantando as sementes do
evangelho que germinarão na redenção de Israel e na salvação
do mundo. No fim, então, nossa história não é somente nossa;
antes, é nossa participação, através do Espírito, na história da
vinda de Jesus para salvar o mundo, conforme profetizada a
Abraão e proclamada aos profetas antigos.
180
compatriotas, em uma nova jornada marítima a caminho de
Roma, sob a custódia de Júlio, “um centurião da coorte au
gusta” (27:1). Esta narrativa marítima corresponde bem com
os épicos de naufrágio na tradição da literatura greco-roma-
na. Contudo, em toda ela, Paulo, o santo homem, permanece
a personagem principal. Por volta do meio da jornada, ela é
perfurada pela ameaçadora admoestação — que não foi ouvi
da — acerca da perda da carga, do ;próprio navio e até mesmo
de muitas vidas (27:10). Então, apos dias balançando de um
lado para o outro, sendo castigados pela tempestade predita,
e após sofrerem perda de carga e da armação do navio, Paulo
reaparece com uma palavra de exortação e consolo, efetiva
mente dizendo que, apesar dos marinheiros terem ignorado
sua advertência. Deus tem negócios inacabados com Paulo
e, por conseguinte, nenhuma pessoa perderia sua vida. Este
encorajamento foi mediado por um anjo, cuja autoridade os
marinheiros pagãos teriam reconhecido mesmo se não enten
dessem as referencias a Javé ou ao Deus de Jesus Cristo.
Se Paulo é a personagem principal, o poder salvador
de Deus (sõcêría, que é palavra raiz para a palavra soteriologia
— a doutrina da salvação) é o tema principal desta sequência
de acontecimentos. Dentro do contexto mais amplo de Lucas,
a salvação de Deus era exigida a fim de garantir a chegada
segura de Paulo em Roma, para testemunhar a César (27:24;
c f 15:21; 23:11). Entretanto, a caminho de Roma, a salvação de
Deus é expressa através de Paulo aos pagãos. Lucas observa,
em meio aos golpes da tempestade no navio, que eles “tinham
passado muito tempo sem comer” (27:21), e, por fim, “fora per
dida toda a esperança de salvamento” (27:20). Foi durante esta
época de completa desolarão que a promessa de Deus veio:
“nenhum de vocês perdera a vida; apenas o navio será des
truído” (27:22). Posteriormente, após não mais do que duas
semanas no mar e sentindo que a terra estava muito distante,
alguns dos marinheiros pensaram em abandonar o navio fa
zendo uso do barco salva-vidas; contudo, Paulo advertiu: “Se
estes homens não ficarem no navio vocês não poderão sal-
var-se” (27:31). Naquela mesma manhã, ele encorajou: “Agora
eu os aconselho a comerem algo, pois só assim poderão so
breviver [sõtêna]; nenhum de vocês perderá um fio de cabe
lo sequer” (27:34). No fim, Lucas registra Deus como sendo
18 1
verdadeiro em sua promessa: “Dessa forma, todos chegaram a
salvo [diasõthênai] em terra” (27:44).
Parte da mensagem teológica comunicada por meio
deste conto trata do poder divino sobre os elementos do cos
mo. No mundo antigo, pensava-se que as forças controlando
os mares pertenciam aos deuses (no melhor cenário) ou a seres
espirituais hostis (no pior cenário). Portanto, quando Jesus e
as vidas dos discípulos estavam ameaçados pela tempestade
enquanto atravessavam o lago, Jesus “levantou e repreendeu
o vento e a violência das águas” (Lucas 8:24). A palavra que
descreve a autoridade de Jesus sobre a tempestade e ventania,
epetimêsen (“repreender”), é a mesma palavra utilizada ante
riormente no Evangelho para descrever como Jesus confron
tou o endemoninhado na sinagoga em Cafarnaum (4:35). O
demônio foi exorcizado na sinagoga, enquanto, no lago, Jesus
venceu o poder do caos, conforme os ventos e as ondas, “tudo
se acalmou e ficou tranquilo” ao seu comando (8:24). Desta
forma, Jesus Cristo, o ungido pelo Espírito Santo, revela o
poder de Deus para domar até mesmo as forças destrutivas da
natureza. Apesar de nenhuma imediata calmaria da tempes
tade ter acontecido para Paulo, o poder salvador de Deus não
estava menos presente a todos naquela trágica viagem.
Desta forma, vemos a cura e o poder doador de vida
dos dons da natureza registrados mesmo em meio ao naufrá
gio. Após duas semanas se desesperando contra os ventos e as
ondas, Paulo encorajou os 276 a bordo a comerem: “Todos se
reanimaram e também comeram algo” (27:36). O Deus que sal
vou toda a tripulação e os passageiros (prisioneiros também)
da tempestade mostrou-se como “O Deus que fez o mundo e
tudo que nele há” (17:24), incluindo a comida que nutre aque
les que estavam desesperados por suas próprias vidas. Paulo
não estava realizando uma celebração da eucaristia, ainda que
muitos dos elementos do rito sacramental estivessem presen
tes. Contudo, o ato de comer envolve consumir a bondade
da criação e receber, através dos dotes da natureza, o poder
salvador do Espírito de Deus.
1Ô2
3»
0 Espírito e a Eucaristia
Lucas 5:10 -17 ; 22:14-23; 24:13-35
16 3
Jesus. Primeiro, o pão partido e o cálice servido são símbolos
do corpo ferido e do sangue derramado de Jesus, e servem
como um lembrete dele ter doado sua vida como selo da nova
aliança e pagamento inicial em antecipação do reino de Deus
(22:18, 20). Segundo, “lembrar” também sugere que a celebra
ção da refeição pelos seguidores de Jesus iria, de fato, recons
tituir os membros de seu corpo partido. O resultado seria que
Jesus, que é lembrado, também é o Jesus que está presente
no meio daqueles que celebram o derramar de sua vida pelos
outros.
Contudo, a alimentação dos cinco mil homens, além
e mulheres e crianças, antecipa que a doação de Jesus de si
mesmo a outros é senão um modelo para seus seguidores. Ao
passo que a natureza miraculosa da alimentação não deve ser
subestimada, a bênção, o partir e o doar do pão e do peixe por
Jesus são senão parte da sequência maior de acontecimentos
na qual seus discípulos estão envolvidos em servir a multidão.
Os discípulos tinham inicialmente sugerido a Jesus que dis
pensasse a multidão, talvez de volta para a cidade de Betsaida
(9:10), para encontrar repouso e alimento. Mas, como Jesus
havia especificamente dito a eles para não levarem comida ou
dinheiro em sua missão (9:3), agora ele retratava a provisão de
Deus, em que envolveu os discípulos. Eles receberam ordens
de organizar a multidão, então foram liberados para servi-los,
e, por fim, juntaram aquilo que sobejara (9:14-17).
A alimentação deste enorme número de pessoas reve
la a mesa toda inclusive que Jesus colocou diante da multidão.
Ao passo que as leis judaicas de pureza estavam preocupadas
com o comer com os impuros (por qualquer razão que seja),
não há preocupação alguma transmitida no texto, de Jesus ou
seus discípulos, por comerem com impuros e com mulheres
(que geralmente comiam separadamente, em refeições em
eventos públicos). Isto reflete os hábitos de Jesus ao se ali
mentar, conforme transmitidos no restante da narrativa do
Evangelho. Jesus comia não apenas com os seus discípulos e os
fariseus, mas também com coletores de impostos e pecadores.
Mais importante, a mesa aberta de Jesus antecipava o gran
de e final banquete do reino, que ele esperava celebrar tanto
com seus discípulos (22:15) quanto com os pobres, aleijados,
cegos e mancos (14:13,21). Em outras palavras, enquanto Jesus
184
comeu a última Páscoa somente com os doze apóstolos (que
incluía entre eles Judas, seu traidor), ele também desenvolveu
um modelo inclusivo de práticas alimentares que abraçavam
aqueles que, do contrário, poderiam não ter sido convidados
para a refeição.
Podemos ver que os primeiros seguidores de Jesus
continuaram suas práticas de eomunhão aberta. Eles conti
nuaram a partir o pão juntos, lembrando-se de Jesus no pro
cesso (Atos 2:42, 46; 20:7). Que a mesa do Senhor deveria ser
aberta até mesmo aos gentios foi confirmada em uma visão a
Pedro, que o levou a entrar na casa de Cornélio e comer com
ele (10:48). Desta forma, era o próprio Paulo, um apóstolo aos
gentios, confortável com o partir o pão e em comer com os
pagãos daquela desastrosa viagem.
Entretanto, o poder redentor simbolizado no comer
juntos é adicionalmente intensificado quando consideramos
o cálice e o pão celebrando o corpo partido e doador de vida
de Jesus, derramado por amor do mundo. Consequentemente,
a mesa aberta é uma ocasião não apenas para lembrar-se da
morte de Jesus, mas também para reencenar uma vida vivida
pelos outros. A refeição é possível em razão do serviço que
possibilita o comer junco. Conforme os discípulos serviam a
multidão do interior, eles também serviam aqueles da diás-
pora reunidos em Jerusalém após o Dia de Pentecostes, assim
como serviam os líderes como os diáconos helenistas judeus
(6:3-6) à enorme população de viúvas e outros que eram mais
vulneráveis dentro da comunidade inexperiente.
O partir do pão juntos era um ponto alto possível
pelos atos de serviço anteriores e posteriores à refeição, rea
lizados por aqueles que estavam compromissados em seguir
os passos de Jesus, que deu a si mesmo plenamente a outros
no poder do Espírito. E o mesmo Espírito continua presente
e ativo entre crentes em Jesus, tornando-o presente e capa
citando o reconhecimento dele em cada ocasião em que sua
ceia é celebrada, capacitando o serviço doador de vida e a
renovação do mundo e fornecendo esperança de sua vida de
ressurreição a todos que estão desesperadamente necessitados
de salvação. Isto aconteceu em e através de Paulo, em uma
embarcação lotada de pagãos, e continuará a acontecer até os
confins da terra, easo estejamos abertos a sermos conduítes
185
do Espírito, que foi derramado sobre toda a carne.
186
39
Bárbaros, Crentes e o Espirito da Hospitalidade
Atos 28:1-31
18 7
como anfitriões de um mundo carente. Neste caso, contudo, é
Paulo quem é o carente e é o convidado de descrentes. Ao pas
so que é importante desenvolver uma teologia de hospitalida
de que subscreva como os seguidores de Jesus devem ser recep
tivos aos descrentes, também é essencial que reflitamos mais,
a fim de desenvolvermos uma teologia de convidados que nos
capacite a receber a hospitalidade de estranhos e pessoas de
outras fés. Isto nos capacitará a sermos doadores, como tam
bém recebedores. Durante o percurso, podemos aprender a
apreciar que nosso testemunhar através do poder do Espírito
envolve não apenas falar acerca das coisas do evangelho, mas
também receber a hospitalidade de outros. Em suma, nosso
testemunho nasce não somente no que dizemos, mas também,
talvez de maneira mais importante, em como vivemos, como
interagimos com os outros e também em como somos capazes
de receber os dons de outros.
Durante o curso da história, Lucas conta, na verdade,
sobre a restauração de Jesus do reino de Israel, exceto que isso
tinha começado a acontecer de uma maneira que era comple-
tamente inesperada para a maioria dos judeus. Ao passo que
os judeus tinham a esperança que o Messias os livraria das
mãos dos romanos e restauraria a terra e o templo para eles,
para Paulo, a “esperança de Israel” (28:20) tinha a ver com a
ressurreição de Jesus, o nascimento do reino, e o início da
nova era, na qual a renovação de Israel incluiria também a sal
vação dos gentios. Na medida em que os judeus resistiam à ex
tensão das misericórdias salvadoras de Deus aos gentios, neste
mesmo nível, eles também rejeitavam os mensageiros — os
apóstolos, incluindo Paulo —, que tentavam persuadi-los do
contrário. Então, enquanto Paulo mantinha esta testemunha
com firmeza, persistindo mesmo após ter chegado a Roma,
onde ele continuou receber convidados durante sua prisão
domiciliar, os resultados foram mistos. Por um lado, alguns
creram (28:14), tnas, por outro, a obstinação dos judeus levara
Paulo a proclamar “que esta salvação é destinada aos gentios;
eles ouvirão” (Atos 28:28).’^
13 Mas não há juscificativa para pensar em Lucas como sendo
antissemítico ao concluir Atos desta maneira. Antes, de acordo com as
operações providenciais milagrosas de Deus, foi precisamente a persegui
ção dos seguidores judeus do Messias que levou originalmente à condu-
188
Entrementes, as vidas daqueles que seguem a Jesus
como Messias continuarão a provocar discussão, conforme os
judeus em Roma disseram: “que por todo lugar há gente falan
do contra esta seita” (Atos 28:22). Contudo, tal balbúrdia não
será porque os cristãos estão quebrando a lei, conforme Pau
lo repetidamente havia provado a inocência dos cristãos de
quaisquer transgressões. Ao invés disto, a consternação conti
nuará uma vez que qualquer fala acerca de um reino vindouro
de Deus e quaisquer tentativas de viver da maneira do reino
irão inevitavelmente confíitar com os objetivos imperiais de
reinos mundanos — e quando isso acontece, a violência que
marca a humanidade caída irá mais uma vez surgir e trazer
problemas.
Mesmo quando isto acontece, o Espírito, que foi der
ramado sobre toda a carne, continuará a inspirar e capacitar
às obras pacíficas, curadoras e reconciliadoras de Jesus, a fim
de encerrar o reino de Deus nos corações e nas vidas dos seres
humanos. A ressurreição de Jesus dentre os mortos pelo Espi
rito foi o primeiro ato da vindicação de Deus dos justos e a
inicialização do que se materializaria no reino, e isto tem sido
seguido por Jesus derramando deste mesmo Espírito sobre
todos — judeus e gentios — em prol da salvação do mundo.
Lucas não nos conta o que aconteceu com Paulo, mas clara
mente nos informa que ele jamais cessou de “pregar o reino de
Deus e ensinar a respeito de Jesus Cristo, abertamente e sem
impedimento algum” (28:31). Ele simplesmente continuava a
viver pelo poder do Espírito como uma testemunha ao Cristo
vivo. Os próximos capítulos do livro de Atos, se tivessem de
ser escritos, contariam mais a respeito de homens e mulheres,
talvez até mesmo entre nós, hoje, que também são capacita
dos pelo Espírito de Deus a proclamar e representar o reino
de Deus até os confins da terra.
191
ções sociais que perpetuam o racismo, sexismo e capacitismo,
entre outros regimes discriminatórios. Entretanto, devemos
ser inspirados a saber como o mesmo Espírito que capacitou
Jesus e os primeiros cristãos a confrontarem os principados
e poderes de sua época é o mesmo Espírito que permanece o
dom de Deus para capacitar toda a carne hoje.
Isto não quer dizer que embarcamos em qualquer cau
sa popular política, econômica ou social a fim de nos “com
prometer com essas questões”. Isto significa que devemos vi
ver fielmente com outros que estão buscando seguir a Jesus,
de maneira que possamos ser nutridos nas práticas virtuosas
que o Espírito utilizará em nossos relacionamentos com o
mundo. Isto quer dizer que precisamos continuar a discernir
como o Espírito pode inspirar a igreja para uma fidelidade
contínua em um mundo pluralista e complexo.
O pior cenário é que o nosso testemunhar de Cristo
acabará em martírio, mas, mesmo assim, isto será capacitado
pelo poder do Espírito. Quando menos, continuaremos a ser
perseguidos, se nenhuma outra razão além do nosso testemu
nhar apresentar um contraste total ao mundo, semelhante
aos primeiros seguidores do Messias, que foram acusados de
ser “sectários” (ou “hereges”, a partir de haireseos — Atos 24:5;
24:14; 26:5; 28:22). Estas são manifestações do poder do Espí
rito que nos capacitam a questionar o status quo e as conven
ções das sociedades em que vivemos, a resistir às políticas de
conformidade que nos são impostas, e a desenvolver formas
alternativas de conversa que exponham a violência subjacente
às economias deste mundo.
No mínimo, conforme nosso caminhar com os após
tolos durante 0 livro de Atos, com olhares regulares de volta
ao Terceiro Evangelho, tem mostrado, continuaremos a nos
surpreender acerca de como o Espírito opera em nossos cora
ções para mudar o mundo. Durante o caminho, teremos a me
mória de Jesus para nos guiar, e sua presença, no poder do Es
pírito Santo, para nos inspirar. E o Espírito, que realmente foi
derramado sobre toda a carne, continuará a fazer através de
nós o que foi feito através dos apóstolos — virar o mundo de
cabeça para baixo — se, de fato, estivermos abertos e formos
obedientes aos seus encorajamentos. E é somente enquanto
seguirmos os ventos do Espírito nestes atos de testemunha
192
que continuaremos a participar na obra de Jesus para renovar
Israel e, através disto, redimir e salvar o mundo. Voltado para
este fim, nossa oração somente pode ser: “Ora vem. Senhor
Jesus”, enquanto continuamente esperamos e discernimos os
renovados ventos de seu Espírito no mundo.
19 3
GUIA DE ESTUDO DO LÍDER E PERGUNTAS
PARA DISCUSSÕES EM PEQUENOS GRUPOS
195
durante o primeiro século. Vivemos em meio um imperialis
mo ou em outra espécie de império ocidental moderno nos
dias de hoje? Quais os prospectos para um cristianismo cheio
do Espírito sob estas condições?
CAPÍTULO 2
Revise a canção de Maria — historicamente conhe
cida como Magnificat —, em Lucas 1:46-55, e discuta como a
canção interage com o público ou com a leitura pública de
Lucas-Atos que estamos empreendendo.
O que “a consolação de Israel” (Simeão, em Lucas 2:25)
c “a redenção de Jerusalém” (Ana, em Lucas 2:38) significa
para os judeus do primeiro século? O que estes termos signi
ficam para nós hoje?
Como Jesus desafiou o senhorio de César naquela épo
ca? Como o senhorio de Jesus é um desafio mesmo para os
cristãos cheios do Espírito hoje?
CAPÍTULO 3
Por que as referências geográficas na narrativa do Pen-
tecostes são importantes?
As filhas que profetizam e os jovens tendo visões são
importantes para a vida da igreja hoje? Por que ou por que
não?
A expressão “sobre meus escravos” também pode ser
traduzida “sobre meus servos” — qual a significância desta di
ferença na tradução na história de dois mil anos do cristianis
mo e hoje?
C A P ÍT U L O 4
Quais os aspectos públicos da figura davídica ou mes
siânica, e como o sermão de Pedro acentua o cumprimento de
Jesus desces desígnios carismáticos?
De que pecado específico a multidão percebeu que
precisava se arrepender, pecado este que Pedro jprometeu ser
perdoado (dica: veja Atos 2:23 e 36)? Como voce pensa que a
mensagem de Pedro te atingiria, caso você fizesse parte da
multidão naquele Dia de Pentecoste?
Existem dimensões públicas do perdão de pecados
hoje? Por que, ou por que não?
156
CAPÍTULO 5
Quais eram as consequências do arrependimento na
mensagem de João Batista? Como tal pregação e seus efeitos
dão certo (ou errado) no mundo atual?
Quais as consequências do arrependimento para Za-
queu?
Quais seriam os efeitos posteriores de tais ações no
mundo de hoje? Por que nós temos, no geral, espiritualizado
e individualizado a mensagem de arrependimento e perdão?
Que tendências, se houver alguma, mesmo os cristãos cheios
do Espírito precisam mudar?
CAPÍTULO 6
Atos 2:41-47 tem sempre sido apresentado como um
ideal que tem motivado várias formas de experimentos com
a vida comunal na história do cristianismo. A passagem pode
funcionar como tal ideal para nós hoje? Por que, ou por que
não?
Quero chamar esta mensagem de comunhão do Es
pírito, enquanto outros querem chama-la de comunismo,
utilizando a terminologia de Marx. Quais as semelhanças e
diferenças entre Lucas e Marx?
O compartilhar e a distribuição mútua de mercado
rias a todos os que necessitam é uma prática de vida viável
para os dias de hoje? Por que, ou por que não?
CAPÍTULO 7
Descreva os aspectos espirituais e políticos do minis
tério ungido pelo Espirito de Jesus.
Como o ano do jubileu do Antigo Testamento e o
“ano aceitável (do favor) do Senhor” que Jesus proclamou vie
ram a ser representados na comunidade cristã primitiva? Por
que estes conceitos são tão difíceis para nossos ouvidos con
temporâneos?
O que significa dizer que o Espírito que operou atra
vés de Jesus também foi derramado e dado a seus seguidores?
CAPÍTULO 8
Como a história de Lucas sobre o homem curado no
portão do templo (Atos 3) continua seu tema da restauração
19 7
de Israel? Que papel as Escrituras veterotestamentárias exer
cem, em outro lugar no desenrolar desta tese lucana?
Por que os líderes do templo estavam interessados em
preservar o status quo? Como a cura deste homem no portão
do templo ameaça os interesses dos líderes?
Quais as implicações econômicas e políticas da men
sagem lucana para o cristianismo carismático de nossa época?
CAPÍTULO 9
Por que ou como estamos condicionados a enfatizar
os aspectos médicos destas curas milagrosas de Jesus, e não
suas dimensões públicas? Quão legítimas são as dimensões
públicas apresentadas neste capítulo?
A sociedade palestina do primeiro século estava es
truturada de acordo com as relações entre patrono e cliente,
assim como entre os patronos centuriões e as pessoas (seus
clientes) que eles protegiam. Como o ministério de Jesus anu
la ou ao menos ameaça desmantelar tais estruturas hierárqui
cas?
As curas modernas nos círculos cristãos são sinais da
vinda do reino de Deus? Se este for o caso, como estes sinais
podem mudar nossa perspectiva sobre ou mesmo nossas prá
ticas acerca do ministério da cura?
CAPÍTULO lo
Aqui vemos uma segunda representação da comunhão
do Espírito (Atòs 4:32-35); compare e contraste com o primei
ro relato (Atos 2:42-47).
Compare e contraste Barnabé com Ananias e Safira.
A punição para o casal foi desnecessariamente injusta, à luz
da tese sendo argumentada neste c ^ ítu lo e neste livro?
Barnabé não é apenas uma figura incomumente gene
rosa, e não é apenas um detalhe na história de Lucas (somente
dois versículos são devotados a ele)? Ou Lucas está tentando
apresentar um ponto teológico normativo e ético? Por que
tendemos a acreditar na primeira afirmação acerca de Barna
bé, ao invés da segunda?
CAPÍTULO 11
Existe muita fala acerca de Jesus se relacionando com
198
coletores de impostos, prostitutas e outros párias sociais.
Quais pessoas ou classes seriam equivalentes a estes, em nosso
mundo?
Nós somos mais suscetíveis a ter empada com Simão,
o fariseu, ou com a mulher pecadora? Com os líderes da sina
goga, ou com a mulher encurvada e aleijada? Por que e quais
são as implicações de nossas proclividades? E possível que, no
mundo de hoje, os discípulos liderados pelo Espírito de Jesus
pratiquem sua visão de um mundo sem hierarquias ou classes
sociais?
C A P ÍT U L O 12
A maioria de nós tem tempo para fazer estudos bí
blicos tais como este e não está sendo perseguida por nossa
fé. Nós podemos permanecer em solidariedade e oração com
nossos irmãos e irmãs ao redor do mundo que estão atual
mente experimentando o tipo de perseguição que a leitura
deste capitulo nos diz que aconteceu aos discípufos?
Fale sobre Herodes como um representante de senhor
e Salvador César, e como a narrativa de Lucas reflete o que
significa entender o senhorio e a salvação de Cristo.
Como entendemos a resistência não violenta dos dis
cípulos em nossa época? Quais são as implicações políticas de
tal postura para o discipulado cristão vital?
CAPÍTULO 13
A paixão de Jesus não é única dele? Nós podemos real
mente seguir os passos de Cristo em seu sofrimento?
Em que nível a não violência cristã é uma imitação do
fundador do Caminho?
Por que o perdão é central a uma ética carismática de
não violência, ou uma forma de pacifismo? Como tal perdão é
possível no mundo real?
C A P ÍT U L O 14
Como as experiências de imigrantes nos Estados Uni
dos, em especial desde 1965, iluminam o que aconteceu em
Atos 6 entre as congregações de fala grega e as de fala hebrai
ca?
Por que é importante tratar qualquer vácuo de lide
rança para que líderes carismáticos, que representem os inte-
19 9
resses das pessoas às quais estão liderando, sejam designados?
Quais as implicações deste princípio em nosso mundo con
temporâneo multicultural, multiétnico e globalizado?
Antioquia era originalmente um “campo missionário”,
para missionários de Jerusalém, mas a igreja de Antioquia veio
ao resgate de sua i^ ej a-mãe em época de necessidade da igre
ja de Jerusalém; nos, do Ocidente Anglo-americano estamos
prontos para receber a assistência ministerial de igrejas do sul
global, c^ue nós antigamente considerávamos nossos campos
missionários? Quais as implicações deste empreendimento
missionário “reverso”?
CAPITULO 15
Por que os ensinos de Jesus sobre riqueza e pobreza
são tão desconfortáveis para muitos de nós?
Considere a história do homem rico e de Lázaro: o
único ponto desta história é que muitos de nós, que somos
mais abastados, deveriamos compartilhar com os mais neces
sitados?
E com relação ao princípio do jubileu, no pano de
fundo da visão de Lucas da renovação de Israel? Existem algu
mas dimensões econômicas estruturais para a restauração de
Israel e o reino vindouro?
CAPÍTULO 16
Estevam conta a história do Israel antigo a partir de
uma perspectiva judaica helenista. Quais as implicações polí
ticas de tal registro (pense acerca de como a história dos EUA
pode ser contada a partir da perspectiva de um expatriado
estadunidense)?
Por que outros judeus helenistas — “homens livres”,
Lucas os chama (Atos 6:5) — são tão opostos à mensagem de
Estevam (pense acerca de como os refugiados de um pais sob
ocuparão podem ter um interesse pessoal na restauração de
seu pais)? Como este incidente envolvendo Estevam estabele
ce as tensões que veremos no restante do livro de Atos?
Por que a teologia, o ministério e a vida de Estevam
são tão importantes para a expansão, capacitada pelo Espíri
to, do evangelho aos gentios? Podemos apreciar seu sacrifício
hoje, dois mil anos após seu martírio?
CAPÍTULO 17
Como Estevam entendeu o papel do templo, e como
este entendimento era ameaçador para os líderes do templo?
Qual foi a atitude de Jesus para com Jerusalém, e quais as im
plicações de sua “teologia de Jerusalém” para nós, hoje?
O autor de Quem é 0 Espírüo Santo? segue eruditos, tais
como N. T. Wright, em ver o legado do ministério de Jesus
como relacionado a redirecionar o nacionalismo judaico: a
ênfase em um caminho de paz evita a destruição, ao passo
que o nacionalismo excessivamente zeloso culmina na ira de
Roma — testemunha a destruição que se desenrolou dentro
de uma geração após a morte de Jesus. Fale acerca das im
plicações desta mensagem para entender 0 registro de Lucas
(acreditado pela maioria como tendo sido escrito não muito
depois da destruição e Jerusalém, em 70 EC) e o que isto sig
nifica para nós hoje.
C A P ÍT U L O 18
Como a expansão do evangelho para Samaria e a re
cepção do evangelho pelos samaritanos chateiam a cosmovi-
são judaica dos primeiros seguidores de Jesus?
Revise toda a passagem devotada ao bom samaritano
(Lucas 10:25-37): quais as implicações desta narrativa para as
pessoas que nós não consideramos serem cristãos legítimos?
E legítimo ver os samaritanos como os “outros
religiosos” aos judeus? Quais as implicações de nossa resposta
a esta pergunta para o entendimento inspirado pelo Espírito
e a interação com pessoas de fés não cristãs hoje?
C A P ÍT U L O 19
Por que é legítimo, a partir de uma perspectiva bíbli
ca, classificar o eunuco sob a categoria de “deficiência”, e quais
as implicações desta classificação?
Como o eunuco, Zaqueu, o anão, também é aceito
como discípulo de Jesus como ele é, sem qualquer cura mila
grosa ou ajuste. Você fica confortável com pessoas portadoras
de deficiências representando o evangelho?
Existem pessoas com deficiências presentes no ban
quete escatológico de Jesus (Lucas 14:15—24). Quais as implica
ções de tais imagens para nossa teologia de deficiência? Nossa
teologia da salvação? Nossa teologia do pós-vida?
CAPÍTULO 20
O apóstolo Paulo possuía algum tipo de deficiência?
Como poderiamos entender sua vida, ministério carismático,
e teologia centrada no Espírito se ele tivesse?
Como Estevam, Paulo também foi um judeu helenisti-
camente informado. Por que isto foi importante para alguém
a quem Deus levantou para ser apóstolo aos gentios?
Com a introdução ao ministério de Paulo, a ideia de
que a restauração de Israel incluía os gentios entra em foco.
Por que isto era uma noção estranha para os judeus do pri
meiro século?
CAPÍTULO 21
Temos comumente entendido a conversão em termos
espirituais e individuais. Mas quais os aspectos públicos ou
políticos de conversão nos relatos do evangelho discutidos
nesse capítulo?
Um dos aspectos mais desafiadores da conversão é a
substituição na (ou “entre os membros da”) família de Deus.
Quais as implicações disto para as relações familiares bioló
gicas?
A conversão não é sobre garantir um lugar no céu no
pós-vida? Por que Jesus fala, ao invés disto, acerca de orientar
nossas perspectivas cheias do Espírito para o reino vindouro
de Deus?
CAPÍTULO 22
Há muito temos nos maravilhado com o milagre bio
lógico envolvido na ressurreição dos mortos do filho da viúva
de Naim. Agora, quais os aspectos públicos desta ressurreição
que temos ignorado? Como a ressurreição de Tabita também
foi a revitalização de toda uma comunidade?
Vimos, neste capítulo, que os relatos de ressurreição
também são, como as curas, sinais do reino. Quais as imç)lica-
ções destes relatos para a vida e o ministério contemporâneos
cheios do Espírito?
CAPÍTULO 23
No que Lucas parece estar mais interessado: contar
sobre a salvação de Cornélio ou sobre a percepção de Pedro da
inclusão dos gentios no plano redentor de Deus? Quais dicas
textuais voeê pode forneeer para sua resposta?
Deus “não trata as pessoas com parcialidade” (Atos
10:34): quais as implicações desta afirmação para a tese deste
livro acerca da obra do Espírito no mundo mais amplo?
Podemos falar de Cornélio como sendo instrumental
na conversão de Pedro? Por que, ou por que não?
C A P ÍT U L O 24
Se a restauração de Israel era divinamente intencio-
nada desde sempre para incluir os gentios, temos indicação o
bastante disto no evangelho de Lucas da vida, do ministério e
dos ensinos de Jesus?
Por que a proclamação de Jesus sobre a paz é tão im
portante para um livro sobre as dimensões políticas do disci-
pulado liderado pelo Espírito?
Em nossas vidas e nosso ministério, hoje, dizer que o
evangelho é para os gentios não parece dar muita força ou ter
muito efeito, provavelmente porque a maioria, se não todos
nós, somos gentios. Como podemos traduzir, nos dias de hoje,
este impulso central, a fim de que ele se engaje de maneira
significante com nosso mundo, nosso tempo e nossa situação?
CAPÍTULO 25
Como a história de Bar-Jesus ilumina as dimensões
políticas do mundo espiritual? Alguns diriam que há uin peri
go em espiritualizar o domínio político de demonizar nossos
oponentes políticos; se assim for, como devemos proceder?
Exorcismos também são sinais do reino vindouro?
Você acredita que existam outros sinais físicos do reino (im-
pending) de Deus?
Alguns dizem que um dos maiores motivos por que
o evangelho se espalhou rapidamente por todo o sul global
é que a maioria das tradições religiosas indígenas e culturais
possuem cosmologias e cosmovisões que são bastante seme
lhantes às do Novo Testamento (por exemplo, envolvendo
espíritos maus em relacionamento com a cura). Você enxerga
perigos no excesso de ênfase deste ponto? O que pode ser im
portante, ao invés disto, ao enfatizar os aspectos púhlicos de
203
ministérios de libertação?
CAPITULO 26
Quais os aspectos públicos das tentações e do encon
tro de Jesus com Satanás no deserto?
Um número de eruditos bíblicos sugere que o ende-
moninhado geraseno havia internalizado o opressivo governo
da Roma imperial. Discuta o mérito desta tese.
Quais as implicações políticas, se houver alguma, da
substituição do reino do diabo pelo reino de Deus na vida e
no ministério de Jesus, cheio do Espírito?
CAPÍTULO 27
Disseram aos judeus que eles “serão salvos pela graça
do Senhor Jesus, assim como eles los gentios] também” (Atos
15:11). Isto pode ser análogo a cristãos ouvindo que “serão sal
vos através da graça do Senhor Jesus, assim como eles [insira
qualquer grupo considerado opressor do cristãos aqui] tam
bém”. Quão absurdo, ou não, é este paralelo?
Os seguidores judeus de Jesus queriam que os gentios
se tornassem assim como os judeus (isto é, serem circunci-
dados) a fim de serem “salvos”. Quais as nossas suposições e
expectativas hoje para que os não cristãos sejam salvos?
Qual é o peripo de enfatizar em demasia a universali
dade da obra do Espirito? Como a ênfase na particularidade
da obra do Espírito pode auxiliar para resolver esta tensão, e
o que isto significa para a missão cristã hoje?
C A P ÍT U L O 28
Temos comumente espiritualizado e internalizado a
história do filho pródigo. Quais as vantagens de ler a história
em termos da renovação de Israel como incluindo os gentios?
Existem muitos ou poucos que serão salvos? Quais as
implicações de nossas respostas para esta pergunta?
O que aconteceu com os judeus que não adotaram o
programa de Deus de renovação de Israel e redenção do mun
do? O que pode acontecer conosco hoje se não aceitarmos e
recebermos o programa de redenção capacitado pelo Espírito
de Deus?
CAPÍTULO 29
Entre os escritores do evangelho, o papel das mulheres
204
é mais proeminente nos escritos de Lucas. Quais as implica-
Sões do que ele diz em Atos para nossas visões acerca das mu-
leres no ministério hoje? O que mais pode restar a ser feito
sobre esta questão?
O Espírito Santo ainda fala através de visões e sonhos
hoje? Quais os desafios e as possibilidades inerentes à nossa
resposta?
Timóteo era de etnia mista (mãe judia e pai grego).
Como a vida dele pode fornecer discernimento em nossas ex
tensas experiências de hibridismo e interracialidade hoje?
CAPÍTULO 30
Você fica confortável em identificar Jesus como um
“protofeminista”? Por que, ou por que não? Certifique-se de
interagir com a testemunha lucana em detalhes, em sua res-
posta.
O que significa seguir o Cristo inspirado pelo Espírito
em relação a nossas atitudes e ações acerca das mulheres em
um mundo dominado pelos homens?
Existe diferença entre o ministério de mulheres e seu
papel em contextos não ministeriais, tal como o lar? Como
podemos responder a esta pergunta à luz de Lucas e Atos?
CAPÍTULO 31
Como a história da pitonista quebra todos os tipos de
crenças cristãs estereotipadas acerca da adivinhação?
Elabore o que o autor chama de “políticas de oração e
louvor”, conforme exemplificadas na prisão de Fili^pos.
Quais as implicações do engajamento político, hoje,
para um cristianismo renovado pelo Espírito? Quais as “polí
ticas de cidadania”, à luz das experiências do apóstolo Paulo
em Filipos?
CAPÍTULO 32
Como você se sentiria pronunciando a oração do Pai
Nosso (conforme Lucas a registra) como um modo de engaja
mento político? Discuta cada linha neste sentido.
A versão de Lucas da oração do Pai Nosso conclui com
a promessa de que Deus honrará toda oração autêntica ao dar
seu Espírito; pense mais, agora, sobre as dimensões públicas e
políticas do derramamento do Espírito sobre toda carne.
205
Nós comumente pensamos na justiça e na justificação
em termos individuais; como a parábola da viúva e do juiz
expande estes horizontes? Esta e uma expansão legítima da
doutrina tradicional da justificação?
CAPÍTULO 3^
No Areopago, Paulo citou poetas e filósofos pagãos.
Quais as implicações disto para nosso engajamento com a cul
tura e as tradições filosóficas?
Há algumas décadas, H. Richard Neibuhr apresentou
um paradigma quíntuplo de Cristo em relação à cultura:
• Cristo contra a Cultura. A história é a estória de uma igreja
ou cultura cristã nascente e uma civilização pagã morrendo.
• Cristo da Cultura. A história é a estória do encontro do Espí
rito com a natureza e a cultura humana.
• Cristo acima da Cultura. A história é um período de prepara
ção sob a lei, a razão, o evangelho e a igreja para uma comu
nhão última da alma com Deus.
• Cristo e Cultura em Paradoxo. A história é o tempo da batalha
entre a fé e a descrença, um período entre a doação da pro
messa da vida e seu cumprimento.
• Cristo Transformando a Cultura. A história é a estória dos
grandes feitos de Deus e da resposta humana a eles. Cristãos
que adotam esta visão vivem de alguma forma menos “entre
os tempos” e de certa forma mais no “agora” divino do que os
seguidores listados cima. Eles estão mais preocupados com a
possibilidade divina de uma renovação presente do que com
conservar o que foi dado na criação ou se preparar para o que
será dado na redenção final.
Discuta as visões à luz de nosso capítulo.
A obra redentora do Espírito inclui tradições cultu
rais, filosóficas e mesmo religiosas do mundo? Por que, ou
por que não? Se sua resposta rbr afirmativa de alguma forma,
como?
CAPÍTULO 34
“Ame seus inimigos”. Isto é fácil? Isto é mais fácil em
um nível interpessoal ou em um nível político? Isto é possível,
politicamente?
“Perdoe nossas dívidas assim como perdoamos as dí-
206
vidas dos outros”. Isto é fácil? Isto é mais fácil em um nível
interpessoal ou em um nível político? Isto é possível, politi
camente?
Temos tradicionalmente pensado acerca da metáfora
lucana de “virar o mundo de cabeça para baixo” (Atos 17:6)
em termos de sua cristianização; e se agora pensarmos acerca
disto em termos da obra do Espírito nos domínios de valores
sociais, arranjos econômicos e estruturas políticas? Esta e uma
conclusão válida desta metáfora?
CAPÍTULO 35
O que podemos aprender, a partir do encontro entre
o cristianismo e a religião de Ártemis, para as relações inter-
-religiosas em nossa época?
Como a economia de Éfeso tem implicações religio
sas? Quais as implicações econômicas para a missão capacita
da pelo Espírito nos dias de hoje?
Como a economia e a religião estão unidas em nosso
mundo? No cristianismo? Isso é bom, mal ou inevitável?
CAPÍTULO 36
Para Paulo, qual era a relação entre a ressurreição de
Jesus e a restauração de Israel?
Existem quaisquer relações públicas ou políticas para
a nossa crença atual na ressurreição como a obra do Espírito?
Deveria haver relações?
Paulo estava disposto a ser martirizado por sua cren
ça na ressurreição de Jesus (e restauração de Israel); pelo que
estamos dispostos a ser martirizados hoje? Deveriamos estar
dispostos a sermos martirizados por alguma coisa?
CAPÍTULO 37
E apropriado pensar que existem dimensões cósmicas
no derramamento do Espírito, conforme sugerido neste capí
tulo? Por que, ou por que não? A “salvação” e tão óbvia quanto
a segurança física, conforme sugerido pelos vários usos da pa
lavra grega soteria em Atos 27? Quais as implicações disto para
a missão, se há alguma?
A repreensão de Jesus aos ventos e ondas (Lucas 8:24)
sugere que ele está operando sob autoridade semelhante
quando ele repreende os espíritos maus. Quais os prós e con-
207
tras de vermos as forças naturais como paralelas a principados
e poderes?
CAPÍTULO 38
Como a mesa da comunhão também era um empreen
dimento sociopolítico e econômico na cultura palestina do
primeiro século? O que podemos aprender acerca dos com
promissos teológicos e visão dos seguidores do movimento de
Jesus a partir de suas maneiras de comer?
Por que e como nossa prática da Ceia do Senhor ou
Eucaristia também tem ramificações públicas e políticas hoje?
Quais as implicações missionais dos períodos da re
feição no mundo de hoje? Descreva os contornos de uma ma
neira liderada e cheia do Espírito de comer em um mundo
pluralista.
CAPÍTULO 39
Como as interações de Paulo com os “bárbaros” mal-
teses desafiam nossos paradigmas missionários hoje?
Como podemos ser melhores anfitriões na esfera pú
blica de nosso mundo multiétnico, multicultural e multir-
religioso? E como podemos ser melhores convidados nestes
mesmos ambientes?
O que significa, para nós, acrescentar um capítulo
vinte e nove ao livro de Atos e continuar a história do Espíri
to sendo derramado sobre toda carne?
208
AGRADECIMENTOS
209
metz, Gail Trzcinski, e Alma Yong.
Também tive alunos, em meu seminário Kenewal and
Policies, durante o semestre de verão de 2009 na Kegent Univer-
sicy School of Divinity, que leram e interagiram com a versão
manuscrita deste livro. Aprecio especialmente os seguintes
alunos por suas observações criteriosas que melhoraram o li
vro: Mary Fast, Timothy Lim Teck Ngern, Hunter Hanger,
Nicholas Daniels, e Theresa Demby.
Sou grato também aos seguintes amigos e colegas,
cada um dos quais especialistas no campo de estudos do Novo
Testamento, em geral, e em Lucas-Atos, em particular, por
seus comentários em um rascunho anterior deste manuscrito:
Michelle Lee-Barnewall, Thomas E. Phillips, James B. Shelton,
e Martin W. Mittelstadt. Como esta é minha primeira tenta
tiva de escrever na área de interpretação bíblica, a opinião e
a crítica de tais foram muito úteis para me impedir, de outra
maneira, de cometer erros ofensivos ao me aventurar fora de
meu campo de treinamento (teologia e estudos religiosos) e
tentar uma interpretação responsável destes textos lucanos.
Obviamente, nenhuma das pessoas supracitadas deve
ser responsabilizada pelas visões expressas neste livro, e quais
quer infelicidades que permanecem são resultado de minha
própria obstinação. Agradeço mais uma vez a Lil Copan, da
Paraclece, por me auxiliar a conceber o livro e esclarecer o es
copo geral e a abordagem. Eu também recebi muita duda dos
editores da Press, em especial de Jon Sweeney e Jefr Reimer.
Cada um deles foi inestimável em me ensinar a escrever me
lhor para um público não acadêmico. Por último, embora não
menos importante, Sr. Mercy Minor, Sr. Madeleine Cleverly,
Karen Minster, e outros na Press que trabalharam diligente
mente na produção e publicidade deste projeto, eu sou grato
por seu profissionalismo.
Como sempre, Patty Hughson e sua equipe de em
préstimo entre bibliotecas na Kegent University foram indis
pensáveis em me ajudar a conseguir os livros e artigos de que
precisei para este estudo, uma lista bem mais longa do que
aparece na bibliografia selecionada que segue. As palavras
não podem expressar o débito que tenho com minha esposa.
Alma, pelo que ela faz no cotidiano para me deixar livre para
ler e escrever. Neste caso, ela foi um membro fiel da escola
dominical e suportou pacientemente as muitas horas de fins
de semana (especialmente domingos a tarde) — meu “tempo
livre” devotado a compromissos eclesiásticos — durante o ca
lendário de 200Ô, quando eu rascunhei a primeira versão do
manuscrito do livro. Uma esposa mais maravilhosa nenhum
homem tem, e eu certamente não sou merecedor.
Por fim, este livro é dedicado a Alyssa, minha filha
mais velha, que na época em que o livro sair da gráfica estará
concluindo seu primeiro ano na faculdade, um ano antes do
esperado. Minha garotinha está em transição, ao sair de casa,
mas o mundo que em breve a receberá também pertence ao
Espírito Santo — portanto, eu a envio para fazer a diferença
neste mundo com orações, dedicando-lhe a graça e o poder do
Espírito, e com todo meu amor!
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