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Por detrás desse terceiro está o de sempre, o amor, o sexo, o filho, o nascimento, a
morte, alguns sentimentos profundos; junto a isso, uma percepção das coisas ao redor
em conflito comigo no mundo. Ultimamente tenho tido a impressão de que tenho que
me blindar para poder existir, mas sempre sou afetado e tenho mesmo que ser afetado,
e fico então me movendo nesse caos, nessa massa informe que sou eu entre as
coisas, as pessoas e o mundo, os medos, tudo enfim. Tá uma desordem total.
Todos os meus discos são e serão sempre um disco só. É claro que muda a
sonoridade, a tônica de cada um, o gesto, mas são todos discos de amor. Me coloco
assim na vida e tudo que vejo é a partir desse equilíbrio tenso entre meu prazer egoísta
e a minha relação com as pessoas que amo. O “Amarelo”, ele é mais íntimo e mais
sereno. Mas é sempre um amor realista, no fundo não sou nada romântico, sou bem
realista e objetivo. Gosto do amor realizado.
Sim, as capas, não sei tanto falar sobre elas. Sei que desde que com a minha banda
Isadora, com quem lancei meu primeiro disco, “A eletrônica e musical figuração das
coisas”, e que tinha uma capa com imagens abstratas; e que quando resolvi fazer um
disco solo, o “Amarelo”, foi um exercício de perder a vergonha, porque eu tinha banda
antes porque não queria colocar meu nome na frente; e então, terapeuticamente,
resolvi também me colocar de corpo inteiro nu na capa. Me coloco como personagem
de mim mesmo, na verdade sou tímido e reservado. É por isso que nas capas me
exponho mais, posso fazer o que eu quiser, porque ali é tudo mentira ou verdade
inventada, é, como disse meu filho, meu outro eu.
A faixa-título tem um toque político, mas romanceado. Foi uma forma leve de
falar sobre o tema? Em tempos de crise o amor é uma das tábuas de salvação?
Caramba, cada faixa é um mundo. Poderia ficar falando horas sobre cada uma. Eu não
sei. Todas giram em torno de uma circularidade que vai desde o nascimento passa
pelo sexo e a morte retorna ao nascimento. Esse ciclo é um sem fim difícil de entender.
Envolve nossa mãe, nossos filhos, nossos amantes, envolve o profano do sexo com o
sagrado da família, o que temos de animal ao que temos de social, tudo num todo
indistinto que compõe pra mim a desrazão que é a nossa vida, ao mesmo tempo nada
e tudo parecem fazer sentido, fico desorientado e gosto. A sonoridade é obra do Chico
Neves, esse super produtor, um homem muito especial, com quem passamos uma
semana gravando; para além de uma experiência profissional, de gravação de disco,
foi uma experiência afetiva e de aprendizado intensa. Toda a família do Chico, a
Marcia, o Theo, a Andrea, tudo, os almoços, jantares, os vinhos, a canjica, os chás,
tudo compõe o disco pra mim, estão lá quando ouço as canções. Eu disse a ele que só
queria as sujeiras. Eu disse o que queria para o Chico — que queria os sons do
ambiente, os ruídos, as respirações, o não HD, tudo que pudesse trazer as impurezas,
porque tenho pavor da assepsia da alta definição — , porque a vida é áspera, arranha.
Porque o que há de mais vital é sujo, o nascimento, o sexo; como disse Santo
Agostinho, nascemos entre fezes e urina. Eu queria isso. O amor também é áspero se
vivido plenamente. Se for assim, precisamos de mais amor, não do amor fofo do “mais
amor por favor”, isso é coxice, recuso; disse isso tudo ao chico, mas disse também
para ele fazer o que quisesse o mais experimental que fosse. E eu amei o som.
Acontece com ele uma coisa que aconteceu também na master do “Babies”, que foi ele
quem fez, que quando chega o som eu nem sei o que dizer, se gostei ou se não,
porque aquilo não estava dentro das possibilidades que poderia esperar, aí fico sem
saber, mas vou ouvindo e preciso de um tempo para assimilar; se torna algo
surpreendente, porque ele contribui para o seu trabalho com algo que você sequer
supunha que poderia ser e que vem da sensibilidade dele e da maneira como ele ouviu
o seu som. Esse disco foi também um trabalho de desapego meu em relação a isso.
Não tive controle nenhum da gravação, edição, mix e master e normalmente tenho;
dessa vez, com exceção dos arranjos, que fizemos eu e o Exército de Bebês (e os de
orquestra o maestro Mário Ferraro), ficou tudo com o Chico. Eu amei a sonoridade, me
sinto um sortudo por ter um disco produzido pelo Chico, pelo som e por tudo mais que
disse.
Os vídeos dos bastidores trazem uma atmosfera intimista, que segue a linha das
suas canções, né?! Como foi o processo de gravação do álbum?
Então, foi isso que eu falava. Ficamos uma semana na casa do Chico, perto de Belo
Horizonte. O estúdio é na casa dele no meio do mato. A família dele é muito
acolhedora. Ele também. Trabalhamos muito. Fomos eu, os músicos do Exército,
Pedro Fonte, Guilherme Lirio, Iuri Brito e Thomás Jagodá, o Mário Ferraro, que ia reger
o quarteto de cordas, a Ana Rovati para fazer as fotografias e filmar e o Felippe César
Marins, da Lala Filmes, que registrou em vídeo o processo de gravação. Gravamos as
bases em três dias, as cordas e sopros em dois. E na tarde de sexta eu gravei todas as
vozes, ficando rouco no final. Ficávamos de manhã até meia noite no estúdio.
Ouvíamos umas gravações que o chico colocava antes de ir embora. Voltávamos para
a pousada do Renato, ali pertinho, no breu da estrada de terra. Foi super astral. Melhor
impossível. Graças a essas pessoas das quais me cerquei, tudo gente boa e fodões
naquilo que fazem. Foi uma delícia.
Uma ultima questão. Você vai liberar algum single antes? Iria aproveitar pra
incluir na matéria!
Já liberei “Fui fiel”, regravação do Pablo. E também já liberei “Eu quero ser sua mãe”,
com o clipe da Letícia Pires. Mas o single do lançamento do disco vai ser “É claro que
eu queria”, que também vai ganhar um clipe filmado pela Ana Rovati, com o bailarino
Uátila Coutinho. Eu te libero o disco todo!