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Persuadere: uma história social da propaganda


Guilherme Nery ATEM
Doutor em Comunicação e Cultura (ECO-UFRJ)
Professor Adjunto da UFF / RJ

Resumo:
Este artigo pretende montar um panorama histórico das formas de Publicidade e
Propaganda no Ocidente, a partir do conceito de persuasão (persuadere). Para isso,
recorreu-se ao estudo das diferentes épocas históricas passadas, cada qual com seu contexto
sócio-cultural, bem como com suas formas de difusão de bens de consumo. Se, por um
lado, os termos Publicidade e Propaganda são datados na História, não existindo desde
sempre, por outro lado, mesmo sem esses nomes já havia formas de se anunciar os produtos
que chegavam às cidades, mesmo na Antigüidade. Das formas retóricas de se anunciar
oralmente a existência de um produto às formas tecno-semióticas de se disputar o mercado
consumidor, muita coisa muda: os contextos sociais, os valores morais, os meios de
expressão etc. Entretanto, apesar de se expressar de modos tão distintos, talvez o espírito
persuasivo do comércio seja o mesmo.

Palavras-chave:
História da Propaganda – Persuasão – midiatização

Introdução
A publicidade se revela integrada com o sistema econômico e – como o Jornalismo,
só que de outro modo – cria e transforma as nossas pautas culturais, nossos hábitos e
preferências, nossas modas, nossas formas de consumo. Ela nos oferta referenciais,
parâmetros (consumistas e individualistas) para a existência cotidiana. Em um mundo no
qual as referências e o sentido parecem ter-se explodido e fragmentado, a marca, através da
sua sustentação identitária pela publicidade, surge como “ilha de sentido” – porto-seguro
que nos da a sensação efêmera e frágil de estabilização afetiva. Neste artigo, trabalha-se
com o sentido originário, em latim, da palavra persuadere: per (através de) + suad (suave).
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Ao longo da História ocidental, houve diversas formas de se anunciar os bens de


consumo produzidos. Passaremos em revista a essas formas, de modo conciso e um tanto
superficial, no curto espaço deste artigo. Neste artigo, não usaremos a distinção conceitual
entre “publicidade” (mais comercial) e “propaganda” (mais ideológica). Serão aqui tratadas
como sinônimas. Além disso, o texto básico de apoio é o livro de Norberto Anaut, Breve
historia de la publicidad.
Na Antigüidade clássica, as figuras do arauto grego e do pregoeiro romano
comunicavam a existência de produtos em voz alta, nas feiras das cidades. Na Idade Média,
a figura do pregoeiro ganha a função de serviçal, tanto da Igreja Católica como dos
senhores feudais. Ali, a publicidade (ainda anterior ao próprio nome) era mantida, pela
força da oralidade, também nas feiras públicas. No Renascimento, surgiria a palavra
Propaganda, ligada à propagação da fé católica. Até ali, a divulgação oral e escrita da
existência de bens de consumo se apoiava na exploração da racionalidade da compra,
visando às necessidades.
Na Modernidade, a Revolução Industrial marcaria o Ocidente com as garras do
Capitalismo de produção, exigindo formas intensas de venda da produção excessiva. Na
Contemporaneidade, as técnicas publicitárias trocariam o discurso informativo pelo
discurso persuasivo, apoiando-se na exploração do inconsciente, visando aos desejos de
inclusão social. Hoje, podemos ver como o discurso publicitário se espalhou por todas as
instâncias da nossa vida, até quase se confundir com a própria vida.

A Antigüidade
Há quem garanta que o primeiro persuasor foi a serpente do paraíso, que soube
seduzir Eva a comer a maçã. O desejo já estava ali. Talvez por isso os publicitários digam
até hoje que não criam desejos – apenas os satisfazem...
Alguns historiadores falam de um “primeiro anúncio escrito”, em papiro, que
informava sobre a fuga de um escravo, e prometia recompensa a quem o capturasse: meia
peça de outro por uma informação segura; uma peça de ouro inteira para sua captura. Esse
anúncio tem uns 3.000 anos, e foi encontrado nas ruínas de Tebas, cidade do Egito. Se não
se pode falar em “publicidade” na Antigüidade, pode-se pelo menos pensar naquelas
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formas arcaicas de se anunciar bens e produtos. Se pensarmos que não há linguagem isenta
de persuasão, podemos pesquisar a história das técnicas discursivas de venda.
Em Babilônia parece ter havido anúncios comerciais escritos em tabuletas de tijolo
cru (em caracteres cuneiformes). Anúncios verbais – orais e/ou escritos – poderiam ser
chamados de “publicitários” (avant la lettre), por já trazerem um sentido comercial,
econômico em si. A distinção entre objeto/produto (valor-de-uso/natural) e bem/mercadoria
(valor-de-troca/não-natural) não invalida o fato de haver práticas comerciais dependentes
de publicização. Mas é claro que o grau de importância da “publicidade” no mundo antigo
ainda era muito pequeno.
É só na polis grega (em torno de VI a.C.) que as redes de distribuição de mercadorias
se estenderão pela Europa e Oriente Médio. Fala-se de cartazes, escritos em papiros ou
pergaminhos, que eram afixados nos chamados áxons (postes de pedra ou de madeira,
talhados quadrangularmente), ou nos chamados hyrbos (colunas cilíndricas) – antepassados
dos outdoors...
Institucionalizou-se kérux (do arauto grego), uma evolução do antigo grito que
anunciava mercadorias1. Na sua origem, o arauto grego foi um “funcionário do poder
governamental”: transmitia notícias e editos, convocava e dissolvia assembléias, mas
também anunciava as mercadorias dos produtores, em praça pública: “Para os olhos
brilhantes e as bochechas coradas, para uma beleza eterna depois da juventude, a mulher
que sabe compra os perfumes de Escliptoe a preços bastante razoáveis, que valem pela
virtude adquirida” (Anaut, 1990, p. 20).
O arauto grego tornou-se, em Roma, o pregoeiro (de praeco): ele gritava informações
que vinham do Senado, mas também anunciava a oferta de mercadorias: “De um escravo:
ouve perfeitamente com as duas orelhas, vê perfeitamente com os dois olhos; eu lhes
garanto sua frugalidade, sua probidade, sua docilidade; ainda sabe um pouco de grego”
(Anaut, 1990, p. 21). O contexto urbano, em Roma, era o da República (Res-Publica: coisa
pública), equivalente um pouco diferenciado da Polis grega (origem da Tá Politikà). Ali, o

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Diz-se que a palavra slogan teria vindo do antigo gaélico sluagh-ghairm, que era um grito de
guerra da antiga Escócia.
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pregoeiro deveria ter as virtudes de uma voz forte, potente, marcante e clara. A eloqüência
verbal também o distinguia. O mais famoso, em Roma, foi Stentor.
Além dos pregões, havia também mensagens escritas: o álbum, os alba (pintar de
branco uma tabuleta ou uma parede, e por cima reescrever, em vermelho ou em preto uma
nova mensagem a ser tornada pública – permitindo reutilizar indefinidamente o suporte
físico dos anúncios políticos ou comerciais, semelhante tecnicamente ao palimpsesto
grego). Seu uso principal era o das mensagens políticas oficiais, mas também era permitido
para o comércio e o anúncio de espetáculos em circos: “Viajante! Veja daqui a taberna de
Allí Sarinus. Visite-a e saúde!” (Anaut, 1990, p. 22). Os governantes proibiam que qualquer
um escrevesse ali, nos alba, qualquer mensagem sem autorização. Nos cantos dos alba
aparecia: “Que ninguém escreva aqui. A desgraça caia sobre o candidato cujo nome seja
escrito aqui nesta parede. Tomara que perca a eleição!” (Anaut, 1990, p.22). Hoje, temos
frases do tipo: “Proibido colar cartazes!”.
Havia também o libellus, menos formal que os alba, mas mais acessível a todos, e
mais comercial: era um papiro que continha o texto escrito, vendendo a mercadoria; era
colado nas colunas ou paredes dos lugares mais movimentados das urbes (cidades). Muitas
vezes, os libellis eram usados para denunciar comerciantes inescrupulosos, ou os devedores
eternos.
Tinha-se também os grafitos: mais informais ainda. Até hoje, costuma-se dizer que
um grafito é “um grito na parede”. Em geral, revela uma expressão de resistência a algum
tipo de poder repressivo. Na Antigüidade Clássica (Grécia e Roma), havia a exigência de
publicização das idéias. Para alguns antigos, a origem desta exigência era divina (Anaut,
1990, p. 24): “mensageira de Júpiter, sob o nome de Fama (Virgílio), ou de Renome
(Homero)”. Para os escritores antigos, era a “anunciadora de cem vozes”, servindo tanto
para anunciar ações gloriosas dos heróis como para exaltar os benefícios de algumas
mercadorias.
Ao que parece, segundo o historiador M. Galliot (apud Anaut, 1990, p. 42), a
propaganda impressa em baixo relevo já era usada na Grécia antiga, pelas cortesãs que
passeavam pelas ruas enlameadas pelas chuvas com suas sandálias cujas solas traziam
gravada a frase “Siga-me”. Assim, deixavam seu convite sedutor impresso pelas ruas. A
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techné do discurso verbal se consolidava: dialética; retórica; sofística; silogística. A


persuasão (peithó, em grego; persuadere, em latim) estava, desde então, colada ao discurso,
verbal ou visual.

A Idade Média
A partir do século III d.C., o Império Romano se encontra em decadência. Com gastos
crescentes, o governo apela para a excessiva taxação da população – o povo estava
seqüestrado pelo Estado. Sua recente fraqueza na dominação dos mares significava uma
crise de sua política de comércio exterior. Roma, então, se volta ao mercado interno,
escorando-se numa economia de subsistência (produção e consumo internos).
Foi só a partir do século VI d.C. que se viu a retomada de uma economia monetária e
mercantil. Aos poucos, a classe urbana se especializava, dando lugar a burguesia citadina,
dedicada ao comércio e ao artesanato. Invasões e guerras arrefeceram, dando mais
segurança à circulação comercial entre as cidades. Grandes cidades emergiram, como
Gênova, Veneza e Pisa.
As feiras populares chegavam a durar quatro meses (sendo preparadas ao longo do
resto do ano), atraindo mercadores de toda parte. Crescia o novo burgo, e seus comerciantes
burgueses como a nova classe urbana. Essa burguesia nascente imitaria (das antigas
aristocracias) o apego aos valores do conforto, do refinamento, do exercício dos desejos de
consumo.
Norberto Anaut diz que, ao longo da Idade Media (séc. IV a séc. XIV), a publicidade
oral (avant la lettre) atingiu seu máximo desenvolvimento. Na primeira fase medieval (Alta
Idade Média, do séc. IV ao séc. X, mais ou menos), a Igreja Católica ter-se-ia apropriado
do pregoeiro como medium. A Igreja tornava públicas as notícias oficiais, que trovadores e
viajantes reproduziam alhures. Na segunda fase medieval (Baixa Idade Média, do séc. X ao
séc. XIV, mais ou menos), as feiras populares teriam usado o pregoeiro de modo laico.
Resumidamente, pode-se dizer que os pregões sempre estiveram submetidos a algum poder
instituído – seja o da Igreja Católica, seja o das Casas Reais.
Segundo Anaut, o pregão medieval seria o protótipo dos meios de informação
pública, financiados por anunciantes. A importância dos pregoeiros, já no século XIII, era
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tal, que eles criaram um dos mais importantes grêmios ou associações da Europa medieval.
A Baixa Idade Média teve suas corporações comerciais. Associações e corporações teriam
gerado o Estatuto de Ética Profissional do Pregão de Paris, que dizia: “É proibido
desprestigiar a mercadoria de um colega, ou atrair a atenção de um possível cliente antes de
ele ter abandonado a tenda vizinha” (Anaut, 1990, p. 37).
Norberto Anaut diz: “Quando as aglomerações mercantis dão origem às grandes
cidades, a marca passa a ser o signo iconográfico que, ante o alto grau de analfabetismo,
identificará os ofícios (ateliês) dos distintos mercadores” (Anaut, 1990, p. 37-38). Serviam
ainda como referências dentro da crescente confusão urbana. Tornavam-se cada vez mais
presentes, nas ruas e esquinas, cartazes com as marcas dos comerciantes, tentando chamar a
atenção dos passantes.
Em 1762, o governo de Londres tentava ordenar a colocação daqueles cartazes, que já
ali atrapalhavam o trânsito de pessoas e carroças (berço da chamada mídia exterior). Teria
sido, provavelmente, muito por conta desses cartazes excessivos que se começou a dar
nomes oficiais às ruas e a numerar as casas. No final da Idade Média, as técnicas de
produção de cartazes já eram razoavelmente complexas – letreiros em madeira ou em
metal.
A mesma insígnia medieval que identificava cada comerciante na porta de seu
estabelecimento começou a ser utilizada – por regulamento das associações comerciais – na
rotulagem dos produtos, a fim de identificar suas distintas origens, estabelecendo a
correlação entre o produto e seu fabricante (certificando sua qualidade e garantindo sua
origem). Obviamente que seria daí que sairia o atual conceito de marca, num contexto de
múltiplas e inúmeras opções para um mesmo produto.

O Renascimento
Em 1480, William Caxton fez um dicionário bilíngüe (inglês-francês), para auxiliar os
comerciantes em suas viagens – como pedir informações sobre lugares, pousadas, lojas etc.
Em 1492, surge a primeira patente de propriedade intelectual de um livro (cerca de 42 anos,
apenas, após Gutenberg). Ou seja, Gutenberg foi precursor tanto da imprensa quanto da
publicidade moderna.
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Para enterrar de vez a Idade Média, o Renascimento traria a Reforma Protestante


(Lutero), a Revolução Científica (Copérnico, Kepler, Bruno, Galileu, Newton), a
Revolução da Prensa Gráfica (Gutenberg), as expansões marítimas (política, comércio,
transportes), etc. Na economia, desenvolve-se o espírito de empresa e a progressiva
importância da busca do lucro. A produção de bens de consumo era incentivada tanto pelos
Estados como pelos comerciantes e a população. Havia ali novos instrumentos econômicos,
como seguros, ações, letras de câmbio, sistema bancário, por exemplo.
Já no século XVI é possível encontrarmos anúncios charlatanescos, utilizando
técnicas orais e retóricas (Anaut, 1990, p. 56)
Senhores que aqui estão, olhem atentamente, que não os irei enganar.
Vejam as ervas que a maga de Salerno traz a este país, a esta terra. Após
treze dias de tratamento, estareis curados de enfermidades e feridas, de
todas as febres, das crises de gota e do inchaço do corpo. Se meu pai e
minha mãe, em perigo de morte, me pedissem a melhor erva que eu lhes
pudesse dar, eu lhes daria estas.
Em 1597, tentando responder à Reforma de Lutero (1517), o Papa Clemente VIII
criou uma congregação para a defesa da fé, levada avante pelo Papa Gregório XV, 25 anos
depois. Em 1633, o Papa Urbano VIII batiza-a de Congregatio de Propaganda Fide
(Congregação para a Propagação da Fé), ou simplesmente La Propaganda, cuja missão era
salvas as almas pagãs. Vê-se bem que nunca houve propaganda sem ideologia, e vice-versa.
Do ponto-de-vista técnico, a propaganda oral dava lugar, paulatinamente, à
propaganda impressa. Segundo Norberto Anaut, o primeiro meio publicitário impresso teria
sido o Si Quis (Se Alguém, a fórmula com a qual se começava o texto dos anúncios),
grudados em paredes e colunas. Nos primeiros impressos, os anúncios eram basicamente
informativos – listas de produtos e seus preços, com alguns detalhes explicativos dos
produtos (um ancestral do hard sell). O formato do Si Quis era 13,6 cm de largura por 7,6
cm de altura.
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A Modernidade
Em 1611, surgem as Oficinas de Informação Comercial – um tipo de classificados, de
oferta e procura, para consulta do público comum. Em 1629, a França cria o Bureau
d’Adresses, em formato de classificados com listas de endereços comerciais, que trazia em
seu folheto de lançamento a seguinte razão de sua invenção (anúncio metadiscursivo): “Do
mesmo modo que é impossível desejar aquilo que não se conhece, o conhecimento das
coisas nos induz a desejá-las (...) o qual aumentará visivelmente o comércio” (Anaut, 1990,
p. 64). Foi ainda no século XVII que surgiu a primeira publicação francesa a conter uma
seção de avisos publicitários (na Gazette de France) – Eaux de Forges usava a figura do
Rei ou o testemunho da ciência para vender seu produto. Anunciavam-se casas para aluguel
e até mesmo dromedários!
A imprensa necessitou do suporte da publicidade para se sustentar. Com o aumento
dos impostos sobre o papel e sobre a impressão de jornais e revistas, tornava-se quase
inviável a atividade da imprensa. Repassar o custo para o leitor-consumidor seria suicídio
comercial. Daí a injeção de dinheiro, vinda da publicidade.
Na França de 1716, Jean du Gonne cria Les affiches de Paris, um meio publicitário
que reproduzia semanalmente os cartazes espalhados em vias públicas – anúncios, decretos,
editos, licitações, comunicados eclesiásticos etc. Datam de cerca de 1742 os anúncios
criados por Benjamin Franklin, o qual se destacou na publicidade da sua época por conta da
explícita importância que dava à diagramação, sempre usando títulos grandes e deixando
em torno dos textos razoáveis espaços em branco (pensando em deixar o texto “respirar”).
Abandonando de vez a economia feudal, a Europa se industrializava a passos largos, a
partir do século XVIII. A produção e a circulação de bens de consumo migravam em peso
do setor primário da economia (agricultura, pecuária) para o setor secundário (fábricas,
indústrias). Após alguns séculos de acumulação primitiva de capital (desde o séc. XV), as
classes burguesas, dominantes, possuíam enormes reservas de moedas. Investiam ali em
fábricas. A dominação que criara o servo medieval recriava o proletário, no inicio da
Modernidade (ou Modernidade sólida).
A produção de bens de consumo se expandia, se acelerava e se distribuía em larga
escala. Os produtos ganhavam uma uniformidade nunca vista antes. Aos poucos, a fábrica
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exigia mais e mais especialização do trabalho. As cidades cresciam, explodiam


demograficamente, por conta da migração dos trabalhadores (que vinham do campo para as
fábricas). A liberdade individual tornava-se a palavra-de-ordem daquela Modernidade
sólida, com seu Capitalismo de produção. A economia reproduzia a tendência geral do
mundo moderno – valorização do individuo e idéia de progresso.
O excesso de produtos deveria ser escoado, tornado excesso de consumo. Como fazer
com que todos os dias enormes quantidades de pessoas procurassem e comprassem os
mesmos produtos, os produtos do mesmo fabricante? Era preciso produzir a demanda por
bens de consumo, tanto quanto se produziam os próprios bens de consumo. Não é à toa que
o surgimento do consumidor – como personagem social largamente difuso – se deu no
século XVIII. Entretanto, a tecnologia fabril só conseguia produzir mercadorias em larga
escala, e depois a fábrica teria que dar um jeito de vendê-las. Essa lógica chegaria ao seu
ponto máximo com o fordismo, no inicio do século XX (como se verá mais à frente). Foi
no início do século XIX (1835) que os periódicos passaram a diversificar suas seções
temáticas (esportes, moda etc).
Acompanhando a expansão capitalista, o século XIX viu o surgimento das primeiras
agências de propaganda do mundo. Inicialmente, essas agências eram parte de empresas
(fabricantes). Só mais tarde é que ganhariam sua autonomia administrativa. Surgiram,
assim – R.F. White & Son (Inglaterra, 1836), Volney Palmer (EUA, 1841), Société
Générale des Annonces (França, 1845), Haasenstein und Vogler (Alemanha, 1855), Agence
Nationale de Publicité (França, 1856 – sócia da Editora Hachette e dona da France Presse),
Rafael Roldós Viñola & Companhia (Espanha, 1857), Manzoni Pubblicità (Italia, 1863).
Ao longo do século XIX, o Capitalismo de produção se expande, se acelera
brutalmente2. Quantidades imensas de bens produzidos reduziam o preço unitário de cada
produto. O resultado do barateamento dos custos de produção foi o barateamento do preço
final ao consumidor. Com isso, as camadas populares passaram a ter acesso aos bens de
consumo que antes eram restritos às elites (aristocracia e alta burguesia). Para alguns (mais

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As estatísticas mostram que é preciso derrubar 62.860 árvores para produzir a polpa vegetal
necessária para uma única edição de domingo do New York Times (Anaut, 1990, p. 97 – nota 10).
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integrados), uma democratização via consumo. Para outros (mais apocalípticos), uma nova
forma de dominação, agora via consumo.
Na França, Charles Duveyrier comprava grandes espaços publicitários em veículos
informativos e depois repartia esses espaços entre seus clientes (anunciantes). Duveyrier
chegou a administrar cerca de 200 escritórios de publicidade em toda a França, podendo ser
considerado o primeiro profissional de mídia – pois já trabalhava a partir da relação entre as
variáveis de poder aquisitivo do leitor, tiragem e preço por exemplar do periódico. Ele
racionalizou ao extremo a escolha dos veículos em que se deveria anunciar (custo X
beneficio).
George Rowell, nos EUA, seguiria o exemplo de Duveyrier. Ele publicava, ainda, a
American Newspaper Directory (1869) e depois a Printer’s Ink (1889), visando facilitar aos
seus clientes a escolha do veículo no qual anunciar. Como se vê, a publicidade moderna já
estava escrevendo a sua própria história.
O século XIX viu o assustador crescimento urbano, a explosão demográfica, a
revolução nos transportes, a aceleração e o excesso no cotidiano das cidades. Imersos em
um ambiente cada vez mais caótico, as formas de publicidade de bens de consumo tiveram
que se desenvolver (basicamente com os cartazes de rua) – diagramação, tipologias,
coloridade, argumentação etc. A cidade se tornava colorida, iluminada. Foi no século XIX
(1840, em Londres primeiro) que se começou a colar anúncios em veículos de transporte
urbanos, no caso dali, os bondes e as charretes (antecipando o busdoor).
No fim do século XIX – período já chamado de Modernidade líquida –, alguns
cartazes já eram iluminados (antecipando os atuais frontlights). Resultado do crescimento
urbano, ou privatização dos espaços públicos? Provavelmente ambas as coisas. O aumento
da velocidade dos transportes urbanos fez os cartazes multiplicarem seu tamanho (origem
do outdoor e das empenas). Ali, os anúncios de rua já deveriam ser pensados para serem
lidos rapidamente, de passagem, pelos transeuntes da urbe. A Modernidade esfacelava toda
forma de solidez, objetiva e subjetiva (ver os estudos sociológicos da Escola de Chicago).
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A Contemporaneidade
Em História da Propaganda, pode-se considerar o início da era contemporânea na
virada do século XIX para o século XX. Isso porque aquela foi a época da visível transição
de um discurso publicitário mais informativo para um mais persuasivo.
Em 1867, surge nos EUA a Carlton & Smith, que mais tarde seria transformada em J.
Walter Thompson. Em 1869, também nos EUA, aparece a Nicholas W. Ayer & Son,
agência que introduziria mudanças revolucionárias no mercado publicitário:
1- Estabelece contratos com o anunciante, por tempo de serviço ou por empreitada;
2- Estabelece a remuneração da agência por comissão (inicialmente de 8%, depois 12,5% e
por fim 15% já em 1893); e
3- Inclui a criação publicitária nos serviços da agência (em 1880), hoje provavelmente o
serviço mais glamourizado.
Dessas mudanças seriam derivadas novas técnicas de construção dos anúncios
(persuadere). Clareza, concisão, beleza da arte gráfica, argumentação mais sólida,
demonstração dos benefícios apregoados etc.
Em 1898, a agência norte-americana Lord & Thomas contrata a dupla de criação
formada por John Kennedy e Claude Hopkins, cuja diretriz era a da venda rápida e
agressiva. Mais tarde, Hopkins (autor do livro A ciência da propaganda) defenderia que o
consumidor necessita de razões para apoiar suas decisões de compra. Para isso, o Unique
Selling Proposition (USP, ou Argumento Exclusivo de Venda) se tornaria a exigência
básica em criação publicitária.
Em 1900, segundo Norberto Anaut, o volume investido em publicidade nos EUA foi
de U$ 540 milhões (11 vezes maior do que em 1865), e havia lá 12 mil empresas de
propaganda. Ainda segundo o autor, em 1986 a publicidade norte-americana já investia R$
102 bilhões. Os EUA possuiriam 6% da população mundial, mas investiriam 55% da verba
mundial de propaganda. Do mesmo ano de 1900, data um anúncio do Le Petit Journal
vendendo seu próprio sucesso: “A tiragem mais impressionante do mundo, 950.000
exemplares por dia” (Anaut, 1990, p. 90 – nota 6). Interessante notar que há tanto tempo
este argumento de quantidade vem sendo usado para atribuir qualidade ao que se anuncia
(argumento mais emocional do que racional).
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No inicio do século XX, as agências de propaganda já ofereciam diversos serviços de


assessoramento aos seus clientes. Pesquisa, planejamento, execução e acompanhamento.
Desenvolveram-se novas técnicas de administração de contas. Em 1912, o teórico francês
Arren criou o conceito de A.I.D.A. – Atenção, Interesse, Desejo e Ação. Em 1915, a J. W.
Thompson incluía o apelo erótico na publicidade.
A publicidade sugestiva abrandaria o valor objetivo do produto (seu valor-de-uso),
considerado muito seco, pouco sedutor, por apontar para as necessidades mais do que para
os desejos. Isso levou à exploração da identidade das marcas, mais do que a simples
exposição dos produtos (maior peso no valor simbólico). De informativa a publicidade se
tornava persuasiva. Os publicitários deveriam transformar consumidores potenciais em
consumidores efetivos.
Na década de 1920, um imigrante que chegara aos EUA transformaria o fazer
publicitário. Seu nome era Edward Barnays, e ele era um sobrinho de Freud. Partindo das
idéias de seu tio, Barnays redirecionou a publicidade – do tradicional apelo racionalizante
às necessidades (sempre limitadas) para o novo apelo aos desejos (sempre ilimitados). Ele
já sabia que não se compra a partir de decisões racionais, e sim a partir de impulsos da
ordem do desejo reprimido (exatamente a tese do economista Thorstein Veblen, em A
teoria da classe ociosa). Como sobrinho de Freud, um “gênio a serviço do mal”.
Contratado por uma indústria de cigarros, Barnays deveria criar novos consumidores
– as mulheres. Até ali, fumar era privilégio social dos homens. Agora, ele explorava o
desejo feminino (latente) de emancipação social, com relação aos homens. Barnays tratou o
cigarro como vetor simbólico (não como produto para ingestão de nicotina, claro!), como
símbolo fálico de poder e autonomia. Durante um desfile de moda feminina, ele fez as
modelos surgirem lindas, e fumando. Edward Barnays estava reconfigurando a imagem
social da mulher. Resultado: o público consumidor feminino passou a buscar no cigarro seu
símbolo de independência e charme. Ele dobrou o numero de fumantes.
A partir da década de 1930, o Marketing se tornaria a ciência da administração da
imagem de marca, ou “o negócio-total” (segundo Peter Drucker). Se o produto não vale
tanto quanto a marca, a marca vale pelo que ela significa. A partir dali, Marketing,
Publicidade e Semiótica tornaram-se inseparáveis (ver as obras recentes de Andrea
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Semprini, Ugo Volli e Clotilde Perez). Ou seja, as marcas significam, mas também nos
significam.
Em pouco tempo, o tradicional paradigma que levava da produção ao consumo daria
lugar ao novo paradigma que leva atualmente do consumo à produção. Com as novas
tecnologias informáticas, passamos à era pós-fordista (ou toyotista), da produção sob
demanda. Primeiro vende-se algo, para só depois acionar a sua produção fabril. Estoques
mínimos reduziram os custos de produção, mas o preço final continuaria alto, por causa do
valor simbólico (sempre crescente) atrelado ao bem de consumo. O novo Capitalismo é
imaterial, cognitivo e semiótico. Em suma, a sua base é a publicidade.

Conclusão
Vivemos na era do Capitalismo Semiótico (ou Semiocapitalismo). Suas regras de
funcionamento parecem tão naturalizadas no imaginário social, que nem mesmo nos damos
conta da sua presença ostensiva. É isso que faz deste novo Capitalismo uma instância, ao
mesmo tempo, discreta (porque diluída no cotidiano apressado) e gritante (porque presente
em cada esquina das nossas ruas e em cada dobra das nossas subjetividades).
Sob uma aparente interface amigável de democracia, jaz uma “democracia de
mercado”, tão sedutora quanto redutora. Em outras palavras, uma “democracia de mercado”
é uma contradição nos próprios termos, e jamais deveria basear-se numa participação
restrita daqueles que nela têm poder aquisitivo para consumir.
É claro que a exclusão socioeconômica continua afetando a maior parte das pessoas,
mas o novo Capitalismo encontrou um novo modo de dominar a todos os que não são
miseráveis, sem que eles se sintam agredidos – a dominação pela inclusão (via consumo).
Não é à toa que recebemos créditos financeiros e empréstimos com facilidade crescente. A
nova inclusão tornou-se a chave para a nova sujeição. A alternativa a ela é a exclusão (a
cruz ou a espada?). Ou seja, o poder do capital financeiro nos diz alegremente – ou eu
ganho, ou você perde. Se der cara eu ganho, se der coroa você perde. E nós nos sentimos
alegres incluídos.
Os consumidores médios – os que não estudam nem problematizam a sociedade de
consumo da qual fazem parte e a qual sustentam – nem querem saber o sentido de seu
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consumo. Querem mesmo e consumir, não para pensarem nem se tornarem revolucionários,
mas para continuarem sendo eles mesmos – um pouquinho melhorados. Não se movem de
si, mas para si.
Algumas questões pedem para ser aqui mencionadas. Por que eu deveria lutar para
mudar uma sociedade que me oferece tudo aquilo que eu quero? Eu quero ser excluído do
mundo dos bens, ou quero ser incluído sem me importar com o que isso significa? Por que
devo pensar na coletividade, se devo correr atrás do meu prejuízo? Se posso consumir, por
que não devo fazê-lo imediatamente? Se posso consumir os bens mais caros, por que devo
contextualizar meu consumo em relação àqueles que mal conseguem consumir?
Se a História da Publicidade e da Propaganda tiver que ser uma mera descrição
diacrônica da sucessão de estados-de-coisa nessa área, isso significa que não haverá
qualquer real discussão. Será um mero discurso de acompanhamento, por parte de
(pseudo)intelectuais que abriram mão da sua maior potência e da sua função social mais
instigante – o pensamento crítico sobre a realidade empírica que nos afeta. Para estes,
qualquer tentativa de crítica deve ser moralismo tolo – eles mesmos exercendo, na prática,
um moralismo invertido (a regra que exalta e comemora a falta de parâmetros para tudo).
Se essa História puder ser menos extensiva e mais intensiva, aí sim teremos a abertura
radical de um imenso leque de análises possíveis. Contra os fracos moralistas, Nietzsche
dizia: “Preferem eles um punhado de certezas, a toda uma carroça de belas possibilidades”.

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