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As lágrimas de Portugal : império, identidade, raça

e destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

James D. S idaway
Marc us Power

Ó mar salgado, quanto do teu sal


São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram.
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar.1
FERNANDO PESSOA
Mensagem

Introdução: as lágrimas de Portugal?

Remapeamento do império Português

Qualquer tentativa de re(mapear) as ligações entre império e


identidade nacional portuguesa deveria começar com as obsessões
imperiais de Portugal do eminente escritor e poeta do século XX
Fernando Pessoa (1888-1935). Numa passagem de Mensagem,
Pessoa questiona o ‘mar salgado’ acerca do preço que Portugal pagou
‘para que fosses nosso, ó mar’. Em vez de procurarmos saber quanto
do mar é português (ou as lágrimas das crianças, mães e noivas
portuguesas) neste artigo tentamos explorar como a identidade
nacional portuguesa tem sido moldada por sonhos de travessias do
mar e de construção de impérios além-mar. Em particular, este artigo
é sobre a geopolítica imperial portuguesa. Queremos sugerir que o
nosso estudo crítico dos textos geopolíticos portugueses do século
XX permite reflexões vastas sobre impérios, ‘raça’, e o geopolítico.
No restante desta introdução, comporemos o cenário com um registo
Geografias pós-coloniais

da amplitude, duração, e significado do imperialismo português,


bem como uma explicação de como abordaremos conceptualizações
críticas das suas geopolíticas (secção 1.2). Na secção 2 começamos
a examinar as formas como a ditadura de direita (O Estado Novo),
se estabeleceu em Portugal no final da década de 20 do século XX
e se consolidou nos anos 30, e começou a elaborar uma geopolítica
imperial no sentido de consolidar o seu império africano e asiático no
contexto de uma proliferação alargada (através da Europa) de escritas
geopolíticas. Também merece a nossa consideração o conjunto
mais vasto de projectos arquitecturais e espectáculos de império
empreendidos pelo Estado Novo, dado que incorpora o momento
e o enquadramento no qual a geopolítica imperial portuguesa foi
formulada. Na secção 3, no entanto, centramo-nos sobre as formas
como a escrita geopolítica portuguesa foi re-trabalhada no novo
contexto global da época, após a Segunda Grande Guerra (e a
Guerra Fria). Posicionando-se como um bastião do anticomunismo
(de ‘liberdade’), a ditadura portuguesa e o seu império delapidado
sobreviveram até aos anos 70 do século XX. Neste clima fértil, a
geopolítica portuguesa atravessou algumas metamorfoses estranhas.
Primeiramente o nosso artigo analisa como esta se acomodou à
retórica ocidental da Guerra-fria de ‘liberdade’ (secção 3.1.) e traça
as manobras extraordinárias que operou, através da consideração de
ideias e reivindicações oficiais que foram feitas no Portugal imperial
acerca de uma civilização multiracial, lusotropical (Portugal nos
trópicos) única. (secção 3.2.), entre outras respostas a um crescente
anti-colonialismo e ao nascimento de movimentos de libertação
no império africano Português (secção 4). Nesta viagem julgamos
útil adaptar (bem como problematizar) as noções de Taylor2
de ‘transição geopolítica’. Ao explorarmos como a ‘transição
geopolítica’ foi erguida em Portugal, examinamos na secção 4 as
reconfigurações dos discursos geopolíticos que acompanharam a
dramática descolonização Portuguesa e a democratização após a
queda do Estado Novo em 1974. No entanto, os nossos interesses
em relacionar estes com as noções populares e oficiais da identidade
portuguesa também nos leva a considerar as continuidades e
reinscrições nas ‘narrativas geopolíticas portuguesas pós-coloniais’.

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

Com estas em mente, as nossas conclusões (secção 5) baseiam-se


no caso português de forma a rever as relações mais amplas entre as
tradições geopolíticas e imperialismo, incluindo algumas das suas
manifestações contemporâneas.
O exemplo português não é comummente usado nesta tarefa.
Aliás, Edward Said3 em ‘Culture and Imperialism’ defende que as
experiências imperiais Britânicas, Francesas e Norte-americanas têm
“uma coerência única e uma centralidade cultural especial” quando
comparadas com as experiências de outros impérios, incluindo os de
Espanha e Portugal. De acordo com Said4:
‘(…) a ideia de comando além-mar – saltando territórios
adjacentes para terras muito distantes – tem um estatuto
privilegiado nestas três culturas. Esta ideia relaciona-se
bastante com projecções, quer sejam na ficção ou na geografia
ou arte, e adquire uma presença contínua através da expansão,
administração, investimento e empenho propriamente ditos.
Há assim algo sistemático acerca da cultura imperial que não
é tão evidente em qualquer império como o é no Britânico ou
Francês, e de forma distinta, no Norte-americano.’
É muito possível que Said esteja errado quando considera que as
experiências imperiais estão menos centradas na cultura (e política)
metropolitana em Espanha do que em outras potências coloniais.
É certamente erróneo afirmar que estas foram menos significativas
em Portugal. Este é um Estado cujo hino nacional começa com as
palavras ‘heróis do mar, nobre povo’, cuja bandeira representa no
seu centro a esfera armilar, e cujas moedas e notas (antes de terem
sido substituídas pelas de euro) incluíam mapas do sul de África e
representavam exploradores. A companhia aérea portuguesa (ainda
estatal), refere-se à comummente designada ‘business class’ como
a ‘navigator class’, enquanto que funcionários do Estado, elites e
culturas mais populares ainda fazem inúmeras referências importantes
ao projecto nacional do império. Para além das obsessões imperiais
do ilustre escritor e poeta do século XX Pessoa, o texto clássico de
toda a tradição literária portuguesa, os Lusíadas do século XVI de
Luís de Camões, é uma história heróica de uma viagem imperial de
descoberta. Hoje Portugal é um país onde a música do fado (destino)

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Geografias pós-coloniais

popular, o sabor a piri-piri na gastronomia nacional, e o consumo


de chá com leite e chamuças (samoosas em Indiano), têm raízes
fundamentais nas experiências recentes do império. Tudo isto, e
noções mais vastas de portugalidade, atentam o legado de império
em moldes profundos. Um livro recentemente publicado de culinária
de encontros portugueses incorpora esta globalidade portuguesa e
representa-a a uma audiência anglófona como:
‘Esta colecção fascinante de 225 receitas autênticas é o
primeiro livro de culinária a englobar todo o mundo de
língua portuguesa (…) e as suas antigas colónias (…) As
receitas vão desde os aperitivos como o ‘Pastel com o diabo
dentro’ (de Cabo Verde), passando por pratos principais
como ‘Frango à Africana’ (de Moçambique) e ‘Cuscuz de
Camarão’ (do Brasil), até às sobremesas como ‘Pudim de
coco’ (de Timor)’5.
O livro de receitas inclui menus para festas religiosas e ocasiões
festivas, um glossário, uma selecção de encomendas por correio,
uma breve história das gastronomias, e um índice bilingue, que
colectivamente pretende ‘ajudar o chefe doméstico na criação de
refeições que celebrem o legado rico, diverso e delicioso da culinária
deste império antigo’ (contracapa). Neste artigo simplesmente
experimentamos ‘a discreta se bem que persistente’ sedução do
império português e dos seus resíduos ideológicos6. Ao analisar
os impactes de tal influência sedutora no Portugal contemporâneo,
começamos também por cartografar a influência contínua que estas
narrativas exercem sobre as identidades metropolitanas (pós)coloniais
e as suas imaginações espaciais. Isto porque, apesar de algumas
disciplinas das humanidades e ciências sociais terem renovado o
seu interesse crítico nos projectos (pós)coloniais de ordem variada
desde dos anos 80 do século XX, muito do trabalho escrito em inglês
continua-se a centrar nos impérios britânico, francês e holandês, e
em grau menor ao belga e alemão, com Portugal fora do mapa, como
um género de ‘império subalterno’7. Mais ainda, os estudos pós-
coloniais têm claramente criado as suas próprias (semi)periferias;
por avassaladoramente se centrarem no império britânico e nas suas
margens8.

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

No início dos anos 70 do século XX Portugal ainda reivindicava


ser não apenas o primeiro, mas o império europeu além-mar perpétuo
e divinamente escolhido. Na linha do que recentemente Medina9
caracterizou como ‘guerras longas, inúteis, injustas e dispendiosas
em África entre 1961 e 1974, cerca de um milhão de militares
portugueses serviram nos conflitos nos quais quase 8000 foram
dispensados, mais de 30 000 foram feridos e mais 9000 morreram
em combate10. O financiamento dos conflitos custaram a Portugal
sensivelmente metade do seu PIB e quase levaram o Estado Novo
à falência. Um em cada cinco homens adultos serviram nas forças
armadas durante a maior parte deste período e em conflitos que, quer
em termos da sua escala relativa e certamente na sua centralidade
para a política nacional, contraíram a dimensão da intervenção
simultânea dos Estados Unidos no Vietname. Estas articulações
com a guerra colonial em África conferiram uma ferida multilateral
na consciência nacional portuguesa cujas formas continuam a
ter importantes repercussões nos significados contestados de
pertença nacional11. Depois da Guerra decorreu um período de
catarse, reflectida nas ‘literaturas terapêuticas e testemunhais’ de
romances populares que ponderam de várias formas as cicatrizes
destas articulações de Portugal além-mar com o passado africano.
Retornaremos em algumas palavras a este tema mais adiante neste
artigo.
Ao construir uma defesa para as acções de Portugal durante a guerra
colonial, o Estado Novo apoiou-se num número de mitos da ‘Africa
portuguesa’, de uma Lusitânia-paraíso tropical, e numa mitologia
de defesa da cristandade ou do mundo contra o comunismo, o que
em conjunto serviu como pretexto importante para a intervenção
geopolítica portuguesa durante as guerras de libertação africana.
Apesar de existir um vasto conjunto de textos portugueses que se
referem a ‘geopolítica’, o âmbito e profundidade deste envolvimento
português não é amplamente reconhecido12. Apesar do material de
geopolítica escrito em português ter sido alvo de escrutínio crítico, na
forma de estudos da geopolítica brasileira desenvolvida e praticada
pelo regime militar (1964-90)13, à excepção de algumas citações de
material brasileiro em texto portugueses mais recentes, estes parecem

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Geografias pós-coloniais

operar em grande medida como esforços desligados. Certamente que


o material brasileiro circulava nos círculos conservadores e militares
que produziram a geopolítica portuguesa. É assim provável que esta
fosse uma via por onde a tradição geopolítica fluísse para Portugal.
No entanto, a falta de citações directas não nos deve surpreender,
pois o Brasil esteve ligado num projecto (póscolonial) de construção
da nação e Portugal esteve envolvido numa guerra colonial distante
e complexa e às suas manobras associadas. Onde o Brasil figura de
forma relevante na literatura portuguesa é como ponto de referência
da configuração ‘pluri-racial’ do império português, através da
chamada ‘geopolítica lusotropical’.

Uma interrogação geopolítica


A observação dos textos produzidos pelos oficiais militares
portugueses e outras figuras associadas à ideologia e política do
regime revela uma ligação explícita com a geopolítica formal,
particularmente no contexto dos dramas mais vastos da guerra
fria desde cerca de 1950 até ao início dos anos 70 do século XX.
Adicionalmente, esta ligação está longe de ser uma réplica passiva
da geopolítica alemã, italiana ou francesa anterior a 1945, ou
meramente uma versão local de uma narrativa da guerra-fria. Pelo
contrário, académicos, administrativos e oficiais, produziram uma
síntese original, certamente inspirada nas amplas tradições da
geopolítica que se desenvolveram na Europa entre as duas Guerras,
mas combinando-as com temas mais vastos da guerra-fria e narrativas
de política internacional. Neste artigo estamos especialmente
interessados em como esta síntese foi refractada através dos
discursos e tradições coloniais portugueses contemporâneos do
nacionalismo e historiografia colonial. Esta síntese de geopolítica
portuguesa será o principal foco no nosso artigo, pois tal como o
estudo de Ingram14 sobre a geopolítica contemporânea russa, a nossa
intervenção também é em parte: acautelado
‘um estudo de geopolítica formal (ou geopolítica), que
toma como objecto o pensamento geopolítico e as tradições
geopolíticas, e as relações entre intelectuais, instituições e o
contexto político e cultural como a sua problemática.’

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

Os anos 90 do século XX registaram uma profusão de interrogações


críticas da geopolítica, um tema que, tal como Smith15 assinalou, foi
até então: ‘ou escondido por geógrafos como um constrangimento
histórico ou protegido como o domínio privilegiado de intelectuais
de política internacional ‘realistas’’. Estas interrogações críticas
reflectem quer o sentido de uma conjuntura dinâmica global quer
o produtivo impacto teórico e político do estruturalismo. Assim, tal
como Agnew et al16 sintetizam:
‘(…) a geopolítica reapareceu na geografia política como
Critical Geopolitics: o estudo das formas como o pensamento
geopolítico entrou no entendimento prático dos políticos
e da massa pública e como a análise geopolítica formal
representa e comunica os aspectos essenciais da ‘imaginação
geopolítica moderna’.
Percebendo e abordando a geopolítica destas formas, torna-se
possível questionar um conjunto mais vasto de discursos geopolíticos,
para além da tradição formal que se designa de Geopolítica. Tal como
estabelecemos anteriormente, a nossa aplicação destas interrogações
funciona através de vários pontos de partida, se bem que um dos focos
principais é a construção e imaginação geopolítica de portugalidade.
No entanto, em primeiro lugar, as declarações propagandísticas
sobre o império e sobre o ‘lugar de Portugal no mundo’ dos regimes
autoritários de Salazar e Caetano (1926-1974) constituem um vasto
e prático discurso geopolítico. Neste sentido, temos em mente as
palavras de um dos artigos pioneiros de ‘Critical Geopolitics’17 que
reinterpretou a geopolítica como a prática discursiva através da
qual os ‘intelectuais da statecraft’ procuram ‘espacializar’ a política
internacional como um ‘mundo’ caracterizado por tipos particulares
de lugares, pessoas e dramas.
Tal como elaborações subsequentes de Critical Geopolitics, o
artigo de Ó Tuathail e Agnew chama a atenção para a forma como
os enquadramentos geopolíticos são construídos, reproduzidos
e consumidos como um processo activo por elites influentes no
contexto do aparelho do Estado e da ‘nação’ mais vasta. Assim
encontramos uma forma que auxilia a entrada na trajectória
complexa da geopolítica e império de Portugal. Para além disto, tal

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Geografias pós-coloniais

como Campell18 tem defendido (bem como o ponto de partida de


muitas geopolíticas críticas), em parte as ‘identidades nacionais’ são
constituídas através das representações populares e do consumo de
massas da política ‘internacional’. Adiciona-se então outro estrato
(imagi-nação geopolítica) à ideia de nação como ‘comunidade
imaginada’19: isto é, as ‘imaginações’ nacionais também são
mediadas através de mundos imaginados que estão para além e
expressam as fronteiras nacionais. Com isto em mente, queremos
defender o valor de questionar criticamente as imagi-nações
geopolíticas de Portugal e de re-mapear a forma como a geopolítica
se tem articulado com império e identidade nacional em Portugal.
Como é que a portugalidade se tem centrado em torno de um mundo
de lugares, pessoas e dramas imperiais e quais são as lições mais
vastas que se podem retirar da nossa interrogação crítica desta
abundante portugalidade? Tal como noutras tradições imperiais e
nacionais e em reformulações conservadoras de geopolítica20, em
Portugal tudo isto se tornou profundamente mesclado com ‘raça’.
Consequentemente, o nosso estudo de caso português levanta mais
questões sobre a forma como as formações raciais e a ‘observação
racial’21 foram centrais para a enunciação de teorias biopolíticas
e governamentais de espaços imperiais e como estas formaram
uma parte crucial das condições de possibilidade para os discursos
geopolíticos do século XX.

A geopolítica do Estado Novo

Uma reapreciação do ‘labirinto dos mitos’


O regime do Estado Novo em Portugal foi estabelecido no final
dos anos 20 do século XX após um golpe militar que provocou
a queda da cronicamente instável república portuguesa (1991-
1926). Quase cinquenta anos mais tarde o regime estabelecido
pelo Estado Novo caiu devido a um golpe de estado em Abril de
1974. Os acontecimentos de 25 de Abril de 1974 em Lisboa têm
sido bem documentados22 e são anualmente comemorados como
um dos feriados portugueses mais significativos. O golpe realizado

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

nesse dia por um grupo de jovens oficiais militares pertencentes ao


‘Movimento das Forças Armadas’ iria ter inevitáveis consequências
globais – independentemente do que representasse para Portugal,
para a conjuntura na vizinha Espanha (naquele que se revelou ser o
último ano da longa ditadura de Franco), para a Europa e no âmbito
mais alargado das narrativas Este-Oeste da guerra fria, e em parte
foi consequência da frustração dos militares portugueses com a
incapacidade do antigo regime encontrar soluções políticas para as
guerras de sublevação anticolonial que surgira no império português
de África.
Para Portugal e o seu império além-mar, o 25 de Abril assinalou
o fim de mais de 40 anos de domínio de direita. O antigo regime
não colocou qualquer resistência expressiva. Esta foi também a
primeira intervenção militar com sucesso desde a queda da primeira
república em 1926. Pouco tempo depois desta data a figura de
destaque do regime, António de Oliveira Salazar, que ocupou o
posto de primeiro-ministro desde 1932 até à sua reforma forçada, foi
sucedido por Marcello Caetano em 1968. A personalidade e regime
de Salazar foram características fundamentais do século XX em
Portugal. É no entanto agora reconhecido que a análise do seu regime
e do Estado Novo que ele estabeleceu tem sofrido frequentemente
do uso de ‘categorias políticas inapropriadas’23. Quaisquer que
sejam as caracterizações que melhor capturam a sua estrutura e
ideologia24 o regime era certamente representado em primeiro
lugar pela preponderância de Salazar, que continuou até aos anos
60, em segundo plano pela hegemonia dos latifundiários de capital
industrial e comercial, em terceiro pela ideologia dos elementos
mais reaccionários de um Catolicismo eclesiástico conservador, e
em quarto lugar pelo notório repudiável desrespeito pelas liberdades
civis associado a um desprezo pelo pluralismo político. No entanto,
tal como Newitt25 apontou:
‘O verdadeiro indício para a ideologia do regime não é
que este fosse católico, fascista ou multi-racial [rótulos
associados pelos seus apoiantes e críticos], mas que este
fosse intensamente nacionalista.’
No entanto, significativamente, este nacionalismo expressou-se e

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Geografias pós-coloniais

disseminou-se de múltiplas formas por via de um império. Aliás, para


alguns observadores, a cultura política portuguesa da era republicana
foi marcada por um ‘nacionalismo imperialista’, no qual nacional
e colonial se coligavam. Desta forma, as expressões de identidade
nacional portuguesa do século XX têm raízes coloniais profundas,
através das quais o império permite a imaginação da identidade
nacional, enquadrando uma visão de portugalidade e demarcando
a noção de centro metropolitano26. Tal como Robertson27 destaca
na sua análise de literatura da guerra colonial em Portugal, desde o
início da guerra anticolonial, a África ‘torna-se um espelho no qual
a face muda e sem dissimulação de Portugal é reflectida’. Uma outra
forma de pensar esta questão de contraste e reflexão no processo
da formação de identidade é reconhecer que ‘as imagens do centro
construídas por Portugal são sempre perseguidas pela periferia’28.
Elas são perseguidas ao ponto de em última análise o Estado Novo
não ter podido democratizar sem algum tipo de descolonização, e não
ter podido descolonizar enquanto permanecesse não democrático,
com a sua ideologia imperial intacta – pelo menos sem existir
alguma espécie de fractura profunda no regime, ou na ideologia
nacional-colonialista e no seu sistema político, ou em ambas. Tal
como o ditador Salazar ‘congelou’ a política portuguesa após a
Segunda Guerra Mundial (na qual Portugal permaneceu oficialmente
neutro), o regime apoiou-se crescentemente num número de temas
históricos e imperiais numa tentativa de fortalecer a sua hegemonia e
legitimidade: o que observadores críticos designam de ‘labirinto dos
mitos’29 ou se têm referido como a ‘metafísica do colonialismo’30.
Esta mitologia oficial ou metafísica celebrou a missão de civilização
de Portugal, através da construção de um enquadramento geopolítico
particular – uma amálgama vigorosa de temas históricos, religiosos e
geográficos e metáforas que inscreviam Portugal como base essencial
de civilização com uma grande missão e, adicionalmente, como uma
grande potência. Apesar destes re-incorporarem expressões anteriores
de missão (e messianismo), crescentemente o Estado Novo teve ao
seu dispor os aparelhos modernos ideológicos do estado como os
meios de comunicação social e a educação (bem como os modos
mais tradicionais da religião). Estes contribuíram para um aumento

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

na capacidade administrativa do estado para codificar e disseminar


uma geopolítica imperial, perpetuando a lenda de Portugal como
um centro da história mundial. O Estado Novo, em particular, foi
capaz de beneficiar (a partir do início dos anos 30) de um serviço
de transmissão imperial que por seu turno se espelhava de perto e se
articulava com redes de transmissão específica ‘locais’ estabelecidas
nas colónias31.
A própria Lisboa (apesar da tremenda pobreza de muitos dos seus
residentes) era energicamente promovida como a grande capital
do império32. Um exemplo emblemático disto mesmo é a série
de conferências, exposições e espectáculos que tiveram lugar em
Lisboa e no Porto nos anos 30 e 40. A uma escala mais abrangente
estes eventos liderados pelo Secretariado da Propaganda Nacional,
estavam associados a programas de renovação urbana que pretendiam
reabilitar infraestruturas locais nas áreas onde aconteciam, deixando
um legado físico duradouro que ainda hoje molda as paisagens
culturais urbanas de Portugal e que ainda são em grande medida uma
parte da economia da sua ‘cultura visual’33. Esta herança encerra
os motivos decorativos que ornam o interior e exterior de muitos
edifícios públicos, a totalidade de bairros construídos durante os
impulsos fascistas deste período, e as muitas estátuas, parques
públicos, jardins, castelos, palácios e igrejas cuidadosamente
restaurados pelo regime. Todos estes elementos testemunham as
tentativas do Estado Novo de enraizar e entalhar (no contexto das
políticas populares e imaginação cultural dos cidadãos portugueses)
no império um sentido de destino histórico de Portugal e continuam
a ilustrar como as práticas culturais salazaristas ainda moldam a
imaginação nacional do que significa ser português.
O culminar desta extraordinária década de propaganda imperial foi
em 1940 – o ano em que a maior parte da Europa tinha sido rendida
ao fascismo – com a organização em Belém da Exposição do Mundo
Português. Belém (Bethlehem em português) significa nascimento,
origens, e reivindica um destino divinamente predeterminado. Este
subúrbio de Lisboa nas margens do Tejo tornou-se desde então um
local (e vista) turístico fundamental para os visitantes que chegam
a Lisboa. Contém uma extraordinária concentração de ícones da

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Geografias pós-coloniais

exploração e descobertas portuguesas: um Padrão/Monumento dos


Descobrimentos Portugueses de meados do século XX (figura 1), o
Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém ambos do século XV,
construídos em estilo clássico, conhecido por género arquitectónico
Manuelino (devido a D. Manuel I, 1445-1521), rico em motivos
coloniais tais como cordame náutico, palmeiras tropicais, velas e
sextantes. Um novo centro de convenções - construído para albergar
um encontro da União Europeia – e um memorial nostálgico aos
mortos da guerra colonial que reforça o sentido de que este lugar
incorpora a missão histórica mundial de Portugal.
Outras exposições coloniais têm sido alvo de vários estudos
críticos34. Em comum com estes outros exemplos, as exposições
portuguesas partilham (embora reclamando sempre uma
singularidade portuguesa) características universais como caricaturar
grosseiramente as ‘culturas’ exibidas, incluindo a exposição de
pessoas. Dom António, por exemplo, ‘um rei do Congo [sic]’ e a
sua família foram exibidos às multidões na Exposição do Mundo
Português.35
Tal como em Espanha, as exposições apresentavam uma ‘narrativa
mitificada da história imperial36, ou representavam articulações
espectaculares da modernidade colonial. Ao glorificarem o
progresso tecnológico do capitalismo nos territórios além-mar,
muitas delas também podem ser entendidas como ‘fantasmagorias
populares de patriotismo e consumismo’37. No entanto, enquanto
que o resto da Europa estava a ser arrastada para o princípio da
Segunda Grande Guerra, em Portugal celebrava-se a abertura de
uma série de exposições sobre o mundo português e a sua história
imperial singular. Nestas exposições e conferências, determinados
idiomas dominavam a representação de culturas não europeias,
sem existir qualquer correspondência com a realidade da vida nas
colónias. No decurso de muitos destes acontecimentos públicos, o
Jardim do Ultramar em Lisboa bem como outros espaços públicos
e parques na capital eram palco de cocktails de gentes africanas,
juntas e apresentadas nos seus habitats ‘autênticos’ e ‘originais’,
por forma a disseminar uma visão de Portugal e do seu povo como
parte de um espaço protegido, no centro do império, ocupando

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

uma posição privilegiada a partir da qual se imagina e define o


sentido de identidade e pertença nacional. Para Salazar, o império

Figura 1 - O Padrão/Monumento dos descobrimentos Portugueses,


construído em 1961 em Lisboa para comemorar o aniversário dos cinco
séculos da morte do Infante D. Henrique.

era uma arma na arena diplomática, uma fórmula mágica para lidar
com as questões políticas complexas pelo menos até ele ter ficado

155
Geografias pós-coloniais

‘prisioneiro no labirinto por ele próprio construído’38.


O regime de Salazar construiu-se desta forma como o legítimo
herdeiro da ‘missão civilizadora’ incorporada por anteriores
exploradores como o Infante Dom Henrique e Vasco da Gama39.
Por sua vez, estas várias exposições e seminários foram geralmente
organizados por um conjunto de comissões e missões nacionais ou
‘tropicais’ (por exemplo o Secretariado da Propaganda Nacional, o
Instituto de Investigação Científica Tropical, a Agência Geral das
Colónias), todas elas sublinhando a continuidade histórica de cinco
séculos de expansão e ‘civilização’ portuguesa além-mar, apoiando-
se nos conhecimentos e arquivos da Sociedade de Geografia de
Lisboa. Estas agências procuravam dirigir a ‘lição de colonialismo’
aos povos portugueses e eram consideradas parte fundamental do
que Salazar se referia como o projecto de ‘colonização interna’ (na
discussão da ‘Exposição Colonial’ do Porto de 1934).
Em parte, podemos encontrar a génese de exposições coloniais
desta natureza na vontade de certos indivíduos e organizações chave
que agiram energicamente (manobrando entre as potências imperiais
mais vigorosas) de forma a marcar um lugar para Portugal em África
durante a inquietação que se seguiu ao Congresso de Berlim (talvez
de forma mais notável a Sociedade Geográfica de Lisboa, fundada
no último dia do ano de 187540) e a mais ampla racionalização e
crescimento do aparelho do Estado que constituiu o Estado Novo
de Salazar a partir dos anos 20. O Acto Colonial de 1930, na qual
o regime administrativo do império foi re-codificado, reorganizado
e de novo regulado nos princípios autoritários mercantilistas41, foi
um factor crítico (mais racional, mais sistematicamente explorador)
pertencente a uma vasta arquitectura de uma nova ordem no império
português. Para Salazar e os seus ideólogos, 1940 foi particularmente
importante pois os acontecimentos na Europa pareciam direccionar-
se indubitavelmente a favor do Eixo (dificultando o balancear
português), mas também porque por detrás de uma fronteira com
Espanha, segura pelo acordo de 1939, Portugal podia celebrar o
tricentenário (1640) da Restauração da Independência (de sessenta
anos de domínio castelhano), e contemplar novas glórias. A
preservação do império foi um factor importante que contribuiu para

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‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

a decisão de adoptar uma posição de neutralidade durante a Segunda


Guerra Mundial. Esta auto-preservação imperial foi tão importante
para a neutralidade portuguesa como quaisquer simpatias pró-Eixo
(que foram sempre mais pró-italianas do que pró-germânicas e
tanto geradas pelo confronto do Eixo pós-1941 com o bolchevismo
como pela empatia directa por Hitler). A neutralidade portuguesa
também serviu os aliados, dado que o Reino Unido pôde reivindicar
o tratado Anglo-português de forma a utilizar os Açores como uma
base Britânico-Americana e manter a Alemanha fora da península
Ibérica42. No início, Salazar argumentava que apenas as forças
britânicas podiam utilizar esta base, mas a impossibilidade de separar
estas forças das americanas e o seu valor como um posto intermédio
de reabastecimento e correio levou a uma pressão americana por
uma concessão. O presidente americano Roosevelt, com o apoio do
congresso e um conjunto influente dos media, autorizou o seu chefe
do estado-maior em Lisboa a negociar com Salazar. No início dos
anos 40, este era George Kennan – mais tarde colocado em Moscovo
onde se tornou famoso, em Julho de 1947, como autor de um texto
(primeiramente um ‘longo telegrama’, e de seguida um artigo em
Foreign Affairs), que alegou revelar as ‘fontes do comportamento
soviético’43. Como parte das suas negociações, Kennan concedeu
reconhecimento americano à soberania portuguesa de todo o
império. Assim, após alguns equívocos iniciais, os Açores foram
subsequentemente reconhecidos, quer por Portugal quer pelo seu
aliado Americano, como uma ligação ‘estratégica’ vital44.

A arte de não ser um Estado pequeno

O significado do império
A arte de cartografar e as telas de mapas representam uma
concentração de discursos geopolíticos, tal como mostram muitos
estudos de caso de, por exemplo, cartografias imperiais e geopolíticas
francesas, latino americanas e italianas45. Quando os mapas em
questão têm uma aparência e afirmação brilhante e perspicaz e são
expostos a audiências de massas, estas cristalizações geopolíticas

157
Geografias pós-coloniais

adquirem um significado especial. Em Portugal o processo de


propagar a mitologia geopolítica do império e de disseminar a
imagem de um centro metropolitano com dependências periféricas
teve lugar não apenas nas várias exposições coloniais, mas também
através de mostras em edifícios públicos e através das mensagens
poderosas contidas nos livros escolares. A este respeito, os livros
escolares produzidos durante o período do Estado Novo geralmente
consideravam o país e os seus líderes como posicionados no terceiro
ou quarto lugar do poder na liga das nações46.
O mapa reproduzido na figura 2 foi originalmente produzido como
parte integrante da ‘Primeira Exposição Colonial Portuguesa’ que
teve lugar no Porto em 1934. O seu subtítulo ‘Portugal não é um
país pequeno!’ reforça a expressão cartográfica e rejeita ansiedades
portuguesas sobre o lugar do país na ordem geopolítica. Ao contrário
de mapas revisionistas que apareceram na Alemanha e Japão ao
mesmo tempo – ou mapas portugueses anteriores como o Mapa Cor
de Rosa47 publicado em 1887 para reivindicar o território da África
austral do Atlântico ao Índico – tal mapa não constituía, claramente,
qualquer ameaça ou fonte de alarme para os outros poderes europeus.
Mostrava simplesmente que Portugal era já tão grande como estes
outros poderes imperiais, e ‘tão grande’ como qualquer poder da
Europa continental, não tendo necessidade de quaisquer novas
configurações ou anexações. O seu compilador, o prolífero Henrique
Galvão, estava certamente consciente do discurso geopolítico mais
vasto da Euro-África, ao qual se refere numa publicação de 1936
sobre ‘O império’, onde aponta que:
“A história de Portugal reflecte sucessivamente – com a
formação do reino (século XII) – a finalidade peninsular;
com a luta contra os Mouros – luta que assegurou à Europa
a defesa contra este elemento anti-europeu – a finalidade
europeia; e finalmente, com a nossa expansão marítima, a
finalidade mundial48.
Foi precisamente este sentido de missão e finalidade que Galvão
procurou popularizar em Portugal, escrevendo diversos textos
e monografias sobre o império e várias narrativas e romances
desenrolados em África (um dos quais recebeu o ‘prémio de

158
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

literatura colonial’). Galvão (1895-1970) era uma personagem


notável, originalmente um apoiante da ditadura do pós-1926,
ascendeu a posições de responsabilidade no aparelho do Estado Novo
– incluindo por várias vezes a governação de cidades em Angola, o

Figura 2 – “Portugal não é um país pequeno” (fonte: Henrique Galvão, 1934 ©


Arquivo Histórico Militar, Lisboa)

papel de Director da Emissora Nacional (1935-1941), a organização


da Exposição Colonial do Porto em 1934 e a co-cordenação da
‘secção colonial’ da Exposição do Mundo Português em 1940.49 No
entanto, escrevendo em 1936 – então como apologista do Estado
Novo – Galvão defendeu que Portugal representava um exemplo
de uma ‘civilização em equilíbrio’ e que o país tinha uma aptidão
especial para uma missão histórica, que ‘o nosso destino nos dá’50.
Desta forma, para Galvão, o poder imperial português resultaria em
ordem, mais ‘civilização’, e seria incutido de um espírito cristão que
via como resposta à:
“Falência da Europa face aos Estados Unidos, [que] insta
uma reorganização espiritual, política e económica, que
não pode constituir em si mesma – excepto através da

159
Geografias pós-coloniais

formação de um novo continente económico Euro-africano


para se opor ao continente económico americano. A nossa
posição geográfica e a extensão dos nossos domínios em
África, indica-nos como o lugar da revelação desta tarefa de
dimensão eminentemente europeia”.
Salazar partilhava esta posição e estava interessado em destacar
a continuidade com tradições nacionais de descoberta e exploração
anteriores e como tal, o mapa de Galvão de 1934 foi reeditado
nos anos 40 e ‘exibido prodigamente em escolas e outros serviços
públicos’51. O mapa foi também amplamente usado na Escola
Colonial, que originalmente foi criada dentro da Sociedade de
Geografia de Lisboa em 1926.
Outros oficiais militares e coloniais constataram que certos
aspectos do pensamento geopolítico de língua germânica podiam
ser útil e sistematicamente aplicados ao império português52. No
entanto, estas referências à geopolítica germânica são relativamente
insignificantes quando se considera a grandeza das codificações
geopolíticas do destino português e as meditações sobre a missão
e prática imperial53. Em suma, Portugal não teve a ‘necessidade’ de
simplesmente importar e replicar noções geopolíticas externas, da
mesma forma como (por exemplo) a escrita geopolítica alemã se
tornou influente em Itália, na Hungria, na Roménia ou em muitos
estados latino americanos. Portugal desenvolveu os seus próprios
discursos, que ao mesmo tempo pertencendo ao amplo zeitgeist
fascista e imperial, registavam uma singularidade e individualidade
considerável.
Certamente, como podia a singularidade do caso Português ser
ignorada quando o país deu existência ao mundo ao descobri-lo para
toda a humanidade? Porquanto de acordo com o estudo crítico de
Guimarães54 sobre a ideologia do Estado Novo:
‘A coerência do sistema suportava-se a si própria num
conceito geográfico muito particular, que imaginava que o
mundo só existia através da descoberta pelos portugueses.’
Assim, enquanto as elites proprietárias de terras e mercantis
continuavam a colher a maior parte dos benefícios, também Portugal
podia continuar a usar no palco mundial o seu destino único e

160
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

heróico, tendo desenvolvido um discurso geopolítico codificado


e uma prática geopolítica de império e neutralidade oficial,
manobrando (por vezes de forma precária) entre os Aliados e o Eixo:
vendendo matérias-primas essenciais a ambos55. À semelhança de
Franco, o regime de Salazar não capitulou (tal como muitas figuras
da oposição desejavam) após o eclipse do fascismo Europeu em
1945. Na verdade, Portugal foi capaz de se posicionar seguramente
(como um ‘bom’ Estado anti-comunista) na nova ordem mundial
pós-194556. Como resultado, as formulações geopolíticas imperiais
dos anos 20, 30 e 40, transformaram-se em formas novas e de certo
modo fascinantes.
Ao pensar no aparecimento de um ‘código geopolítico’ português
em desenvolvimento, é possível retirar vários temas recorrentes e
persistentes que se tornaram declaradamente evidentes nos discursos
geopolíticos portugueses do pós-1945. Possivelmente a questão
mais central e decisiva foi a concentração na preservação (na
verdade, consolidação) do império. O sentido de si próprio como o
centro histórico nevrálgico de um império marítimo remoto já tinha
constituído as bases de um centralismo rígido. No entanto, o declínio
económico relativamente longo e a ascensão de outros poderes
europeus significou que isto tinha sido afrontado. O Brasil tinha sido
perdido nos anos 20 do século XIX, quando políticas revolucionárias
europeias (na forma de ‘guerras napoleónicas’) agitaram brevemente
a ordem antiga da Península Ibérica. O que ficou foi o império
africano – a (re)partição de África no final do século XIX, que
deixou Portugal com os territórios de Angola e Moçambique na
África Austral, a Guiné na África Ocidental, e os arquipélagos de
Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe. Adicionalmente, Portugal
manteve alguns territórios relativamente pequenos na Ásia: Goa,
Damão e Diu, e ainda Macau e Timor-Leste. O código de Portugal
encerrava uma característica específica que era o ímpeto para a
integração do sistema Atlântico da NATO (Organização do Tratado
Norte Atlântico), do qual Portugal era um membro fundador.
Salazar tentou, sem sucesso, alargar a área incluída nas condições
do tratado da NATO, com vista a incluir o império português – tal
associação à NATO provocou uma série de debates nas forças

161
Geografias pós-coloniais

armadas portuguesas no que concerne o modo de integração de


Portugal na nova ordem: nenhuma das quais, no entanto, alterou a
centralidade do império na geopolítica do Estado Novo57. A pertença
à NATO também representou uma certa continuidade na orientação
portuguesa, nos termos a que se refere Teixeira58 como ‘uma aliança
permanente e privilegiada com um poder marítimo no Atlântico
que era tradicional na política externa de Portugal’, enquanto que
simultaneamente assinalava que o pólo principal desse poder se
tinha agora decididamente mudado para o outro lado do Atlântico.
Adicionalmente, a associação à NATO também colocou em marcha
uma rápida modernização técnica das forças armadas, e quando
os movimentos nacionalistas modernos começaram a contestar a
soberania portuguesa em África e em Timor (a partir do início dos
anos 60), as armas e material da NATO (e em certa medida algum
apoio diplomático) foram cruciais nas respostas portuguesas59.
No entanto, provavelmente a característica mais significativa da
estrutura geopolítica em funcionamento após 1945, é a de que a
linguagem e terminologia usada para definir ‘colónias além-mar’
foi depurada de forma a mascarar as realidades exploradoras do
império português, resultando em que estas possessões longínquas
fossem semanticamente fabricadas passando ao estatuto de serem
simplesmente ‘províncias ultramarinas’ de Portugal. Este acordo foi
formalizado em 1951, com a promulgação da revisão constitucional,
que substituiu o termo ‘colónias’ pelo de ‘províncias’. Nos moldes
do livro ‘Política Ultramarina de Portugal’, publicado uns anos mais
tarde pela Sociedade de Geografia de Lisboa60, em parte o termo foi
escolhido porque era visto como reflectindo o ‘princípio da união’
entre os vários espaços do império já há muito estabelecido, e por
isso, em concordância com a tradição e com:
‘a contracção de uma cooperação íntima entre todas as
populações que constituíam a nação e entre todas as parcelas
do território português.’
Na sua terminologia legalista peculiar, estes artigos sobre a renovada
revisão constitucional de 1951, expressam uma das reconfigurações
principais do imperialismo português depois de 1945. Esta pode ser
resumida na frase poética ‘integrar para não entregar’, repetida em

162
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

discursos oficiais a altura. De acordo com Figueiredo61, a correcção


introduzida em 1951, reinscreveu o ‘império colonial’, iniciando
uma ‘revolução’ verbal metódica, onde as palavras ‘império’ e
‘colónias’ subitamente desapareceram, o que não foi tarefa menor
dado que ‘estavam impressas em milhões de artigos de papelaria,
moedas e notas, instituições governamentais, marcas registadas e
nas nomenclaturas de interesse privados’. Figueiredo continua por
sugerir que esta revisão representou um tipo de regresso à noção
pré-republicana (pré-1911) de um império formalmente unitário:
mas um que tinha uma função contemporânea explícita. Tudo isto
queria dizer que Portugal podia mais tarde reivindicar que não era
um poder que devia (como todos os outros impérios europeus), em
última análise, ser forçado a descolonizar, porque, tal como Salazar
explicou numa entrevista em 1958:
‘Não há possessões portuguesas, mais pelo contrário pegadas
de Portugal disseminadas pelo mundo. Em Lisboa, em Cabo
Verde, em Angola, na Guiné, em Timor ou em Macau é
sempre a pátria62.’
À medida que as contestações ao colonialismo português
cresceram, este impulso de enfatizar a integração do império com
vista a evitar a sua desintegração foi-se tornando mais expressivo. Em
termos da representação de códigos e ordens geopolíticas genéricos,
este processo foi uma tentativa de deslocar a fractura geopolítica
potencial Norte-Sul em torno das questões da descolonização para
uma geopolítica Este-Oeste de anti-comunismo63. Por volta desta
altura começaram a aparecer uma série de artigos publicados em
revistas militares portuguesas, que eram escritos como parte de
programas de treino oficial para militares e oficiais da marinha.
Procuravam confrontar a questão da geopolítica portuguesa. Muitos
artigos (alguns escritos como parte de programas oficiais de treino
para militares e oficiais da marinha) apareceram em publicações
militares portuguesas neste tempo64. É difícil fazer justiça a todos estes
artigos mas é proveitoso e importante explorar o ensaio escrito por
Comprido em 1956, que re-trabalha algumas ideias antigas (a noção
da ‘Euro-África’, um ‘mundo-ilha’, e Portugal como ‘civilização
cristã’) bem como antecipa temas que também se estavam a tornar

163
Geografias pós-coloniais

características evidentes de um discurso geopolítico mais vasto


– a ideia de pontos estratégicos de estrangulamento (notavelmente
o Cabo da Boa Esperança) e de uma estratégia soviética coerente
(expansionista) para o domínio mundial, emanada do coração da
Ásia. Nestas narrativas, o destino histórico Atlântico de Portugal

Figura 3 – “Portugal ponte entre continentes”, poster preparado pelo


Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas em 1955
(Jurek Wajdowicz, Emerson Wajdowicz Sudios, Nova Iorque/UNDP).

tornou-o um centro (talvez mesmo o centro) do tratado atlântico – o


‘oceano da civilização ocidental’ tal como escritores portugueses
gostavam de designá-lo. Mais ainda, a dimensão da Euro-África

164
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

portuguesa oferecia ao Ocidente o acesso a minérios estratégicos e


escala para defesa em profundidade (caso a Europa, no pior cenário,
fosse ocupada pelos soviéticos). Comprido ainda destacou:
‘a possibilidade de mobilizar cerca de 1,5 milhões de negros
dos nossos territórios africanos, que assim que organizados
pelos oficiais e comandantes brancos constituem um potencial
humano de grande valor para fins militares’65
Finalmente, muitos destes textos geopolíticos sugerem que
Portugal controlava rotas arteriais para a Europa (através dos
Açores e da Madeira), incluindo assim um triângulo estratégico
vital no Atlântico, que compreende o poder importantíssimo do
‘mar luso-brasileiro’66 do Atlântico-Sul entre o Brasil e Angola.
O que é especialmente interessante sobre muitos destes textos é a
forma como eles inscrevem Portugal no centro deste arquipélago,
localizando o país dentro do mundo-ilha como no caso da visão de
Comprido.
Uma década mais tarde, Júnior67 podia escrever de forma idêntica
sobre a importante ‘dimensão extra-europeia de Portugal’ e sobre o
estatuto e valor estratégico global da sua ‘presença física e cultural,
integrada em quatro continentes’; tais discursos (e as variantes que
consideramos adiante na secção 3.2) continuaram a ser produzidos
pelo regime e pelos seus porta-vozes, justamente até ao colapso
de 197468. Ao olhar para trás é proveitoso contrastar estas noções
geoestratégias de arquipélago da guerra-fria, com outras escritas
subalternas do Atlântico, tal como a noção de Gilroy69 da ‘África
Negra’. Ao fazer esta revisita, Barkawi e Laffey70 exploram como
Gilroy destabiliza as narrativas geopolíticas convencionais:
‘Ao considerar o Atlântico Negro, nenhuma ligação
consistente pode ser estabelecida entre cultura, identidade
e lugar. O comércio de escravos criou uma diáspora negra
na Caraíbas, Estados Unidos e Reino Unido [e podemos
juntar Portugal, França, Bélgica e Holanda, e muitos outros
membros da União ‘Europeia’] que desenvolveram uma
variedade híbrida de culturas através da circulação de pessoas
e ideias entre as Américas, África e Europa.’
No entanto, um certo reconhecimento da natureza ‘híbrida’,

165
Geografias pós-coloniais

translocal e transatlântica da circulação de corpos, capital e culturas


foi antecipado 30 anos antes num discurso geopolítico português
de ‘lusotropicalismo’ – apesar de codificado em termos raciais e
imperiais, um discurso que Gilroy procura ultrapassar. O que surge
aqui é a noção de missão ultramarina portuguesa não racista (na
verdade anti-racista). Nos anos 60 esta ideologia adquiriu uma forma
mais desenvolvida e sexualmente explícita, em grande medida através
da promoção Estatal dos trabalhos do sociólogo brasileiro Gilberto
Freyre. No contexto da geopolítica crítica e relações internacionais,
vários académicos chamaram a atenção para o género (masculinidade
em particular) dos discursos geopolíticos71. É importante não
sobrestimar a coerência ou significado destas afirmações no caso
de Freyre. Motivos anti-comunistas mais tradicionais permaneciam
tão importantes quanto antes, especialmente depois do aparecimento
dos movimentos de resistência em Angola, Moçambique e Guiné
que se assemelharam ao apoio material dos anos 60 em Cuba, na
União Soviética (e nos seus satélites na Europa de Leste), e na China
comunista. Apesar de existirem muitos textos sobre o valor estratégico
dos territórios portugueses além-mar para a defesa do ‘ocidente
cristão’72, as ideias de Freyre permitiam uma outra oportunidade
no contexto dos discursos disponíveis ao regime português,
que se tornou particularmente importante na contra-ofensiva a
críticas liberais exteriores e ao aparecimento de movimentos anti-
colonialistas, em especial nas Nações Unidas – onde Portugal lutou
uma batalha determinada contra os radicalismo no Terceiro Mundo
e os estados comunistas.

O Lusotropicalismo: Portugal e as seduções do Império

‘Através do conhecimento directo e vivido dos trópicos, quer


no Este e em África ou na América (…) a ciência em que
[os portugueses] deram a sua contribuição como pioneiros,
tendo sido, em geral, a ciência do espaço-tempo (…) em
particular a ciência do espaço-tempo tropical (…) um novo
tipo de civilização começou para a qual uma caracterização
de lusotropical foi sugerida, em face do carácter simbiótico
singular da união do europeu com o tropical – união

166
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

que nenhum outro europeu chegou a ser tão intensa e


simbiótica.’73
No início dos anos 50 as fissuras e tensões no seio das várias leis
legislativas que codificaram e legitimaram o regime administrativo
do império estavam a começar a ser mais óbvias, existindo uma
pressão externa crescente para que o regime revogasse a Lei Colonial
de 1930 e outras peças cruciais de legislação imperial. A revisão da
constituição de 1951 reflectiu estas pressões e contradições externas
e internas. A sociedade colonial tornou-se então um espaço ‘pluri-
racial’ ou ‘pluri-continental’, reunido com o processo simultâneo
de artifício semântico que resultou em que ‘possessões coloniais’
fossem substituídas pela noção de ‘províncias ultramarinas’ de
Portugal. Foi neste contexto que o brasileiro Freyre codificou a sua
análise de ‘integração portuguesa nos trópicos’ (tal como o título
do seu livro de 1957)74, através da noção de lusotropicalismo.
Tendo introduzido o leitor à importância geopolítica dos trópicos,
especialmente em termos de determinar que potência se podia tornar
o ‘líder mundial’, Freyre explica como os portugueses já tinham
desenvolvido uma ‘civilização lusotropical’ única (o mais elevado
estádio de um alargado conjunto de ‘civilizações hispanotropicais’).
No contexto da sua visão de ‘espaços tropicais’ como possíveis
‘zonas de expansão’75 para as forças imperiais da União Soviética e
‘Anglo-americana’, Freyre76 notou que:
‘a organização das civilizações hispanotropicais num sistema
transnacional de cultura, economia e política aparece como
uma necessidade a que eu não me vou referir como geo-
política, como se as organizações resultassem de situações
chamadas naturais ou geográficas.’
No entanto a verão fortemente sexualizada da integração portuguesa
nos trópicos constituiu um texto geopolítico extraordinário, quer na
sua poética do original português, quer na tradução para inglês de
1961 – ambos produzidos sob os auspícios da Agência Geral do
Ultramar. A recomposição da ideologia colonial de Freyre apelou ao
regime numa altura em que este estava a procurar apoio filosófico para
as suas políticas e credibilidade para as mudanças constitucionais de
1951. Foi também apelativa na medida em que se agarrou a noções

167
Geografias pós-coloniais

antigas da singularidade da colonização portuguesa, representando


tudo como ‘científico’ e moderno. Tal como tem sido especificado
em trabalhos académicos de pendor crítico, as codificações de Freyre
forneceram um reportório ideológico para o regime, à medida que
este procurava ultrapassar o criticismo crescentemente sibilante de
anti-imperialistas nas Nações Unidas e noutros fora internacionais.
Também em Portugal e no ultramar proporcionou uma retórica
reconfortante para o regime e para os milhões de colonos portugueses
em África, pois os argumentos de Freyre foram usados para reforçar a
reivindicação de que Portugal estava destinado a ficar em África por
muito tempo e que o seu projecto era o de construir ‘novos Brasis’ –
novas civilizações tropicais em África baseadas nos traços especiais
portugueses de ‘mistura racial’. No entanto, a escrita de Freyre é
invulgar no que concerne ao formato específico que a construção
de género assume nos discursos geopolíticos dos seus textos. Ao
associar o estatuto semi-periférico de Portugal relativamente à
Europa (e o seu ‘atraso’ cultural e económico), e ao incutir um certo
tipo de valor civilizacional dinâmico e positivo, o lusotropicalismo
inscreveu a ilusão de permanência nos trópicos de Portugal num
vulgar conto de sedução produtiva:
‘Esta narrativa plausível de colonialismo português não
representa apenas os espaços colonizados pelos portugueses,
como tantos ‘vazios’ freudianos, como tantos ‘ventres’
queimados do sol’, mas – concomitantemente – e como
recentemente um crítico brasileiro de Freyre aludiu, todo
o processo oscila na disponibilidade sexual da ‘mulher
nativa’77.
Esta ciência de espaço-tempo tropical foi construída em torno
de uma noção de um tipo particular de simbiose racial. Para
Freyre a miscigenação era inseparável de ‘todo e qualquer esforço
português nos trópicos’78 enquanto que a civilização lusotropical
constituía ‘uma cultura comum e uma ordem social na qual homens
e grupos de diversas origens étnicas e culturais contribuem pela
interpenetração e ajuste de um certo número de uniformidades
(…) estabelecidas pela experimentação e experiência lusitanas.
Freyre foi capaz de se basear e construir uma adaptação original

168
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

nas mitologias do nacionalismo brasileiro. As suas referências


centram-se em torno da formação sócio-económica e racial do
que era o Brasil em meados do século XX e no sistema colonial
português, que ele defendia exibir alguns dos tabus ritualizados da
contaminação racial que se tinha desenvolvido em certas formas
de, por exemplo, o sul do Estados Unidos, o império britânico e a
África do Sul. Isto permitiu que Freyre projectasse alguns elementos
da sociedade colonial brasileira e portuguesa (particularmente a
extensão de relações sexuais ‘interraciais’) como uma realidade
singular e histórica com uma certa importância global. No entanto,
ao agir assim, ele coloca de lado algumas questões cruciais de
agência e poder, e evita uma ponderação cuidadosa das relações de
classe hierarquicamente racializadas, que de outros pontos de vista
(mais críticos ou subalternos) eram claramente óbvios. Reichmann79
aponta por exemplo, a forma como a discriminação racial é endémica
na sociedade brasileira ao mesmo tempo que a mistificação e
negação da diferença racial é comum, sustentada pela construção
social de uma identidade nacional brasileira super-racial. Apesar de
tudo, para Portugal, os fundamentos do lusotropicalismo tal como
identificados por Freyre (fusão cultural e hibridismo, miscigenação
e a suposta ausência de preconceitos raciais) permitiram ao regime
de Salazar uma outra forma de pensar o propósito geohistórico de
Portugal, baseado numa releitura parcial do património religioso e
cultural português e no re-centrar o país como a fonte de um campo
geopolítico e geocultural essencial: o mundo lusotropical. Tudo isto
procurou exprimir a singularidade e unidade de Portugal, ou (para
pedir emprestado um discurso mais tarde proferido por Caetano)
articular a ideia de que:
‘Nós somos um país pluri-continente e pluri-racial, com um
só espírito, um só governo e uma só bandeira.’80
Entre as demarcações ideológicas da guerra-fria, o luso-
tropicalismo foi imaginado em parte pelo Estado Novo com uma
política externa que seria primeiramente usada para defender a ideia
de um ‘bastião ibérico’ duvidoso de uma Europa democrática81. O
futuro da Europa podia apenas ser salvaguardado pela criação de
um espaço Euro-Africano, no qual Portugal era visto como tendo

169
Geografias pós-coloniais

trilhado um caminho, depondo magicamente o racismo onde quer


que as suas pegadas fossem encontradas. O Estado Novo não se
apropriava só do trabalho e ideias de Freyre; o trabalho de escritores
e poetas como António Vieira e Fernando Pessoa (que se debruça
sobre impérios e pós-impérios em construção) também era usado
pelo Estado Novo para justificar o sentido da missão imperial
de Portugal, de formas que marcam em termos culturais, a vasta
imortalidade ‘política e ideológica que silenciavam Portugal e o
seu império82. Curiosamente, Freyre83 termina o seu texto citando o
escritor modernista português Pessoa, que por seu turno recita uma
linha do ‘Os Lusíadas’, o poema épico escrito pela figura literária
portuguesa mais celebrada, o poeta-navegador do século XVI Luís
de Camões:
‘Fernando Pessoa disse que ainda estava reservado um
‘grande futuro’ para Portugal. Se por Portugal ele quis dizer
todo o complexo Lusotropical que tem nas terras portuguesas
da Europa as suas raízes principais, mas não exclusivas, a
visão do poeta apresenta alguma consistência sociológica’.
Obviamente que tudo isto sucedia numa altura em que este
supostamente agradável e alegre lusotropicalismo estava a ser
contestado por outras imaginações (nacionais) políticas, uma
contestação que em breve tomou a forma de uma guerra anti-colonial
em grande escala. O trabalho de Freyre, tal como a sua tradução
para inglês confirma, tornou-se parte de um esforço de propaganda
mais vasto e de escala considerável (inicialmente produziram-se
5000 exemplares do seu trabalho). Ocasionalmente, um conjunto
de textos para consumo doméstico84 misturou a ‘ciência’ racial
do lusotropicalismo com outras geopolíticas mais ‘clássicas’ tal
como no curso de extensão universitária produzidos por Neto bem
como em debates militares85, que eram acompanhados por vários
trabalhos publicados em inglês e destinados ao consumo externo,
especialmente nos círculos diplomáticos86.
Nestes, muitos dos mesmos temas surgem repetidamente,
formando uma espécie de intertexto geopolítico nacional-colonial.
Primeiramente, o lusotropicalismo em todos os territórios portugueses
era único, pois:

170
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

‘contrariamente ao que acontecia em muitos dos países que


se olhavam como paladinos da independência de pessoas, as
diferenças raciais ou religiosas nunca originaram qualquer
incidente ou medida discriminatória87.
Em segundo lugar, o que é indicativo nestes textos da visão
lusotropical construída por Freyre é a negação persistente que
Portugal era ‘colonialista’, incorporando várias tentativas de repelir
críticas às políticas de Portugal nas ‘Províncias ultramarinas’, através
da exploração de muitas inconsistências e contradições de outros
estados pós-coloniais. Ao proclamar vigorosamente a sua inocência
de tudo o que estava associado com a linguagem contaminada
do colonialismo, a ditadura começou gradualmente a implodir, a
voltar-se para si mesma através de uma viagem mais distante e mais
profunda pelo seu auto-elaborado labirinto de mitos.
Em terceiro lugar, vários textos que tentaram fundir geopolítica
clássica e lusotropicalogia eram caracterizados por um retrabalhar
banal de temas ligados aos espaços Euro-africanos e/ou a várias
migrações Este-Oeste/Norte-Sul, evidentes (por exemplo) na
classificação que Caetano faz da União Soviética como imperialista,
e na noção de Portugal como presente na ‘linha da frente’ contra o
imperialismo ou colonialismo soviético:
‘Hoje a segurança dos países não pode ser defendida nas
suas fronteiras. As nações estão integradas em espaços
mais vastos (…) A liberdade e independência dos países da
Europa Ocidental joga-se não apenas na Europa mas também
em África. É por isso que temos que defender a Guiné (…)
Certamente que no nosso interesse, mas também no interesse
da Europa Ocidental e dos próprios americanos.’88
A conspiração política global contra Portugal constituída pelas
resultantes guerras anti-coloniais de libertação de África, como
se para fortalecer a noção de apenas um governo e apenas uma
bandeira, foi acentuada por Caetano, que estava preocupado com
a ‘vasta organização dos países africanos, asiáticos e socialistas
[que] conspiram contra Portugal’89. Deste modo, enquanto que o
termo ‘geopolítica’ tende a ser evitado em grande parte da Europa
Ocidental e Norte América durante os anos 50 e 60, nas publicações

171
Geografias pós-coloniais

portuguesas a utilização do termo e a elaboração formal da geopolítica


era abundante. Em particular, o que aqui achamos como curioso e
importante são as formas como estes usos explícitos da geopolítica
implicavam a reprodução de certas alegorias geopolíticas anteriores à
guerra-fria – heartland, Euro-África, mundo-ilha. No entanto, aliado
a isto estão concepções novas de ‘espaços de trasnacionalidade’ pluri-
culturais90. Estas geopolíticas são articuladas com uma tendência
duradoura de nacionalismo português: a noção de um Estado
periférico com um destino marítimo global e uma ligação indelével
ao além-mar. Esta ideia antecedeu o Estado Novo, mas foi refinada
e amplificada por Salazar e os seus ideólogos. Sobre este tema o
trabalho de Madureira91 é bastante sugestivo, ao discorrer sobre a
construção da especificidade e diferença nacional e as relações com
as questões do espaço:
‘No período salazarista, as construções da ‘identidade’
portuguesa a que se adicionava um estatuto
inquestionavelmente hegemónico foram aquelas que
sublinharam uma ‘especificidade’ nacional, uma diferença
nacional específica. Esta característica de distinção da
identidade lusitana encontra a sua mais convincente expressão
no mito de que o sentido de nacionalidade dos portugueses
está (paradoxalmente) enraizado numa jornada espacial
temporalmente demarcada: as ‘viagens das descobertas’’
(itálico no original).
Uma das mais interessantes características do breve artigo de
Madureira é que, de uma forma claramente reconstruída, perdura
o enraizamento de nacionalidade em torno de império. Por outras
palavras, estas narrativas continuam a ter uma ressonância poderosa
na narração da pertença nacional portuguesa e por isso, tal como
Madureira indica, é importante reter:
‘a sedutividade discreta mas persistente que os resíduos
ideológicos do fragmentado império português exercem nas
narrativas (pós)coloniais metropolitanas.’92
Por forma a compreender como e qual o significado desta situação
para a pós-colonialidade e para a imagi-nação de Portugal, é
necessário (re)examinar o momento da fractura em 1974-75 e as

172
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

suas repercussões (geopolíticas). O golpe de 1974 foi um importante


ponto de viragem em termos de discursos da nação e identidade,
pois a disjunção dos territórios ultramarinos de Portugal destabilizou
a ideia de que Portugal era o centro a partir de onde a história se
fazia93. O período associado aos regimes de Salazar e Caetano tinha
‘criado as suas narrativas e histórias oficiais e sancionadas, que, com
o tempo, tinham adquirido um estatuto teológico; eram as escrituras
da nação94. Por forma a compreender como Portugal tem lidado com
a ausência de tais escrituras quase-teológicas, temos que abordar as
reacções complexas da fractura geopolítica do 1974-75 e as várias
reorientações que têm desde então sido produzidas.

Reacções, reorientações e
revolução: ‘a explosão total da revolta’
Reflectindo sobre a Grã-Bretanha na Irlanda, França na Argélia, e
Portugal em África, Ryan95 apontou como:
‘A integração de uma colónia no corpo político de um poder
metropolitano é inerentemente perigoso para o colonizador.
Expõe o poder colonizador a uma explosão total da revolta e
pode estimular descontentamento no resto da sociedade’.
Considerando as dificuldade que Portugal encontrou à medida
que tentou integrar as suas colónias no corpo da (geo)política
metropolitana, um ponto importante é pensar sobre a exposição
do colonizador face a estas iminentes explosões de revolta. Desta
forma, as imagens de ordem construídas por Portugal foram
novamente ‘perseguidas pela periferia’, pois as ‘províncias
ultramarinas’ abriram divisões e em última análise rebeliões
violentas, insurreições populares, e revoluções nacionalistas.
Claro está que, quando estas começaram a despontar através da
‘África portuguesa’, uma variedade complexa de lutas irrompeu,
envolvendo os povos de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo
Verde, São Tomé e Príncipe, e milhões de colonos portugueses e
recrutas. Estas histórias interligadas de resistência, colaboração e
subversão num espaço tão vasto como o do ‘Ultramar português’
são vastíssimas e, no entanto, apenas em parte estão documentadas.

173
Geografias pós-coloniais

Apesar de tudo, as escritas daqueles que viveram aspectos destas


camadas interrelacionadas de resistência, tais como Mondlane96 em
Moçambique, ou Cabral97 na Guiné, têm isto esculpido. Em resumo,
apesar da revolta de Timor em 1959 e da invasão indiana de Goa em
1961, terem certamente inquietado a visão de Salazar e dado alento
aqueles que em Portugal e nas ‘províncias ultramarinas’ procuravam
mudanças98, foi em África que os desafios mais substantivos e
manifestos emergiram. Em Moçambique por exemplo, a Frente de
Libertação de Moçambique (Frelimo), formada em 1962 no exílio
na Tanzânia, a partir de uma amálgama de grupos resistentes, lançou
uma guerra de guerrilha pela independência em 25 de Setembro de
1964. Em Angola, a sublevação nacionalista rebentou em Luanda
em 1961, ao que se seguiu uma rebelião no norte do país. Do meio
de uma miscelânea de políticas nacionalistas e divisões ideológicas
e etno-nacionais, surgiram três movimentos nacionalistas modernos:
o Movimento Popular de Libertação de Angola, a Frente Nacional
de Libertação de Angola e a União Nacional para a Independência
Total de Angola. Na Guiné, as hostilidades, lideradas pelo Partido
Africano de Independência da Guiné e Cabo Verde, começaram em
1963.
O início destes conflitos contra os movimentos de libertação
anticolonial que atravessaram a África lusófona não só teve
consequências devastadoras para Portugal, mas marcou ‘as últimas
convulsões dos sonhos imperiais portugueses’99. Derradeiramente
a perda de iniciativa militar das forças armadas portuguesas
(particularmente na Guiné), teve um papel importante em estimular
o derrube do regime em Lisboa por parte do Movimento das Forças
Armadas, dada a sua posição de recusa manifesta em aprovar
mudanças que resultassem no fim da guerra. No entanto, outros
factos estiveram em jogo, pois o antagonismo à perpetuação do
projecto colonial (à luz da sua desintegração em partes de Angola,
Guiné e Moçambique) não proveio somente de forças radicais, mas
estava também presente em facções da burguesia portuguesa e de
círculos liberais – que reconheciam a contradição crescente entre
o empenho do império e a integração na Europa. Em alguma da
literatura que se debruça sobre as causas do colapso do império

174
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

português, há uma tensão persistente entre o evidenciar a guerra


colonial como apressando o fim do império e o salientar a revolução
de Abril em Portugal como trazendo o fim da opressão100. Apesar de
tudo, em certa medida estas abordagens falham o intuito, pois não são
mutuamente exclusivas, especialmente quando o regime se encobria
nas vestes do império em tal medida que a desintegração imperial
iria ter sempre consequências fatais para a própria sobrevivência da
ditadura fascista de Portugal.
Desta forma, a fractura que levou ao golpe foi um processo longo.
Iniciou-se decisivamente no começo de 1974 com a publicação de um
texto capital intitulado ‘Portugal e o Futuro’, do general Spínola101,
comandante supremo das forças armadas e veterano heróico da
guerra colonial em África que serviu principalmente na Guiné-
Bissau. O livro reconheceu os problemas de segurança do longínquo
império e propôs de forma prudente mas clara, uma solução política
para a guerra colonial. Spínola rejeitou quer a independência quer o
status quo, defendendo em vez disso a criação de uma comunidade
lusitana (sob a bandeira portuguesa, claro está), incluindo o Brasil,
mas que seria ‘baseada na autonomia progressiva das suas partes’,
uma solução federal que incluísse ‘independência’ negociada
– ideias que apesar de já discutidas em Portugal, não podiam ser
comummente veiculadas de forma tão explícita e pública102. Esta
tentativa tão clara de fazer a quadratura do círculo questionou os
mitos da missão civilizadora que os apologistas do regime produziram
tão atarefadamente durante décadas. Spínola chamou a atenção para
o facto de que o regime estava agora enclausurado no labirinto
mitológico por si próprio fabricado. Apesar de Spínola, juntamente
com o seu superior general Costa Gomes (o oficial sénior associado
mais de perto com a publicação do seu livro), estar demissionário,
defendia-se que o livro de Spínola só poderia ter sido publicado
com a anuência de Caetano. Assim, nas palavras de Bruce103, a sua
publicação era uma forma de:
‘fazer voar um papagaio (…) abrindo uma discussão sobre
o futuro das relações de Portugal com os seus territórios
ultramarinos e o seu papel no mundo ocidental’
Depois do golpe triunfador de 25 de Abril os acontecimentos

175
Geografias pós-coloniais

precipitaram-se. Portugal retirou-se rapidamente das suas possessões


ultramarinas e no final de 1975 o que tinha sido o primeiro e o
mais duradouro império além-mar europeu tinha desaparecido (à
excepção de Macau, em virtude da relutância da China em absorver
este território nesta altura, que permaneceu um colónia portuguesa
até ao final de 1999). A retirada portuguesa trouxe transformações
fundamentais para as ex-colónias. Enquanto que Timor-Leste era
ocupado pela Indonésia (quebrando resoluções das Nações Unidas),
os outros ex-territórios portugueses converteram-se em novos
membros do sistema político internacional, estabelecendo de forma
célere um amplo conjunto de alianças diplomáticas e militares.
Angola e Moçambique, por exemplo, aderiram aos frontline states
– uma vasta aliança que tentava abertamente isolar o apartheid
na África do Sul – enquanto todos eles estabeleceram relações
próximas com a União Soviética e com outros estados ‘socialistas’
da Europa de Leste e através do Terceiro Mundo. Claro está que
muitos destes alinhamentos políticos foram forjados, de modo
embrionário, durante as lutas anti-coloniais entre 1961 e 1974. Estes
(re)ajustamentos foram acompanhados, em vários graus de empenho,
por uma reorientação ideológica, bem como pela criação de novos
sistemas constitucionais na linha Marxistas-Leninistas104.
O papel internacional de Portugal também se transformou.
Após a revolução, o ‘código geopolítico’ português evidenciou
numa primeira fase um grau de fluidez que é característico das
‘transições geopolíticas’. Para começar, muitas figuras militares
(seguindo a liderança do general Spínola) defenderam uma forma de
‘commonwealth’ que conteria ligações próximas entre Portugal e a
África lusófona. Neste contexto, apareceram vários textos expondo
o tema ‘repensando Portugal’105. No entanto, o ritmo de mudança
já não era mais definido e moldado por Lisboa e deste modo as
políticas penderam para a esquerda, enquanto que a perspectiva do
golpe gerar uma ampla revolução social tornou-se plausível. Só em
1976 é que a situação estabilizou. Até então pareceu possível que
Portugal se pudesse re-estabilizar sob uma hegemonia comunista
(dado o poder e força relativa do Partido Comunista Português) e
assim tentar desenvolver um código geopolítico muito diferente

176
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

(bem como uma ordem socioeconómica). No entanto, desde então


Portugal tem seguido rapidamente um regime económico e político
liberal e firmemente pró-capitalista.
Comparativamente, nos anos 80 e 90, Portugal teve um rápido
desenvolvimento económico106, beneficiando de uma localização
próxima de um dos centros globais na Europa ocidental. Esta
proximidade e interesse mútuo foram simbolizados pela adesão de
Portugal à Comunidade Europeia em 1986 e à Zona Euro, na sua
fundação em 2002. No entanto, a adesão à União Europeia baseou-se
na reinscrição de narrativas ‘identitárias’ portuguesas. Esta revisão
está bem patente na mudança subtil mas importante do tratamento das
descobertas, cuja suposta originalidade e primazia era tão celebrada
pelo Estado Novo. Deste modo, Madureira107, centrando-se numa
série de histórias dos Descobrimentos108 que foram publicadas em
meados dos anos 80, argumenta que:
‘num período de tempo relativamente curto a especificidade
‘mítica’ da imagem de um Portugal viajante transformou-se
(leia-se europeizou-se) numa reflexão da face tranquila da
Europa (…) Com a sua ‘especificidade’ (a sua diferença)
apagada, ao projecto colonizador de Portugal acoplou-se a
identidade europeia. A sua história colonial invulgar é em
última análise trocada por uma prevalente historiografia
comum. O diferente torna-se o igual, e as ‘descobertas’
portuguesas tornam-se parte e parcela de um ‘património’
europeu íntegro (ou integrado)’ (itálico no original).
Por outras palavras, tal como alguns intelectuais portugueses
decidiram argumentar, a integração europeia não deve constituir um
desafio à portugalidade, pois os portugueses são ‘superlativamente
europeus pois já o éramos quando a Europa se definiu na história do
mundo como o continente medianeiro109.
A reinscrição ou re-articulação está longe de ser total ou exclusiva,
pois também coexiste com a revisão de narrativas sobre o papel
de ligação de Portugal e com ecos dos argumentos lusotropicais
de Freyre. Por exemplo, entre as referências previsíveis da ‘nova
ordem mundial’, ‘globalização’, e outras categorias associadas com
o campo de conhecimento conhecido como ‘relações internacionais’,

177
Geografias pós-coloniais

um manual português neste domínio podia encerrar com citações de


Pessoa e referências ao legado heróico e duradouro dos navegadores
portugueses e aos papéis chave potenciais de uma comunidade
diversa:
‘(…) não apenas dos eurolusitânios, os afrolusitânios e
o brasileiros, mas também de outros luso-partilhantes,
tais como os indo-portugueses, os sino. Portugueses, os
timorenses, e outros luso-descendentes de outras diásporas
no Sul e no Este (…).’110
É notável ainda que as movimentações para a formalização de
uma Comunidade de Países de Língua Portuguesa desde meados dos
anos 90 têm sido expressas através de referências aos seus membros
principais – Portugal, Brasil, Angola e Moçambique – sobrepondo
(de forma algo complementar) a afiliação à proposta comunidade
lusófona às respectivas lealdades regionais (à União Europeia, ao
Mercosul, e à SADC111, respectivamente). A Timor-Leste também tem
sido atribuído um potencial semelhante, desde o final da lamentável
ocupação Indonésia. Portugal é assim a melhor ponte europeia para
estas regiões ‘dinâmicas’ emergentes. Deste modo, na EXPO ’98 em
Lisboa, a última exposição universal do século XX, Portugal reiterou
o seu empenho para com a Europa e para com uma Europa dinâmica
de negócios e comércio; no entanto, tudo isto foi conduzido em
parte no contexto do tema das ‘viagens de descoberta (imperial)’ dos
séculos XIV e XV (com algumas referências na diagonal ao império
mais tardio), destacando assim o papel de Portugal como ‘pioneiro’
europeu nas ligações e rotas comerciais. Uns anos mais cedo, na
conclusão de uma cimeira europeia em Belém (a propósito da qual
se construiu um novo centro de convenções ao longo dos ícones
coloniais da portugalidade), Portugal celebrou o culminar de 6 meses
de presidência das instituições europeias com o slogan ‘Capital da
Europa para seis meses, Capital do Atlântico para sempre!’.
Relativamente a estas reinscrições, a figura 3 (uma representação
do papel de Portugal nas Nações Unidas) reproduz um exemplo
admirável do reposicionamento mais vasto da portugalidade. As
velhas batalhas de oposição ao império português nas Nações Unidas
(e no terreno) desapareceram. Actualmente Portugal aparece como

178
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

parte de uma ‘ponte entre continentes’ no contexto do Programa de


Desenvolvimento das Nações Unidas. Um sextante, o conhecido
instrumento de navegação, sobrepõe-se a um mapa português antigo
da costa Atlântica da Europa, do Magreb e da África Ocidental. Para
ocidente, entre as linhas de latitude que marcam os trópicos, pode-
se entrever a costa do nordeste brasileiro. A bandeira portuguesa
com as suas esferas armilares e escudos movem-se desde o velho
continente em direcção ao ocidente. Sob o sextante está uma
fotografia Polaroid da nova ponte sobre o Tejo, financiada pela
União Europeia, que agora se encontra ao lado da velha Ponte 25 de
Abril (anteriormente Ponte Salazar). A ponte conduz-nos ao fundo
da página, que ostenta as bandeiras dos outros estados pós-coloniais
lusófonos. No entanto, uma das bandeiras (a da República Popular
de Angola) retém um emblema comunista de estilo soviético de
produção e abundância. Mais ainda, numa análise mais detalhada,
a bandeira de Moçambique representa uma AK-47 (uma arma de
assalto feita na União Soviética ou na China), o instrumento da
luta anti-colonial. Lembramo-nos então, apesar de ser através das
margens, da centralidade da violência que suporta a condição de
‘ponte’ de Portugal e as fracturas que esconde.

Conclusões: geopolítica e civilização


E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas que aqui vês
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português
PESSOA Mensagem

Este estudo do discurso geopolítico português começou com obra


de Pessoa, o mais destacado poeta modernista português112, que
serve também para liricamente nos encaminhar para as conclusões.
Numa tentativa de capturar o que designa como ‘o cânone
ocidental’, Bloom113 lista vinte e seis autores, entre os quais Pessoa.
A inclusão de Pessoa, cujo trabalho chave Mensagem – promovido
e disseminado pelos regimes de Salazar e Caetano e do qual são
retirados os excertos apresentados aqui – está, de acordo com Sousa

179
Geografias pós-coloniais

Santos114 entre ‘as mais bem conseguidas transformações estéticas


da ideia de império’ na escrita moderna. E pode assim servir para
nos recordar da importância do momento colonial na construção
mais vasta de modernidade ‘ocidental’.
Tais ‘inclusões’ de império, tão evidentes nas obras de Pessoa,
são alguns dos pontos-chave de uma posição declaradamente
póscolonial tal como elaborada nos estudos literários. Em resumo,
as teorias pós-coloniais mostraram não apenas que o conjunto de
princípios deve ser alargado de forma a incluir vozes e escritores
que até agora têm sido excluídos, mas também que a abordagem
aos princípios tradicionais deve ser substancialmente reestruturada.
Young115 expressa esta ideia sucintamente em termos históricos
amplos:
‘Não é [apenas] uma questão de remover o pensamento
colonial de um pensamento europeu, de o purificar, como
o sonho actual de suprimir o racismo. É uma questão de
reposicionar os sistemas de conhecimento europeu de forma
a demonstrar a longa história da sua operação como o efeito
do outro colonial, um reverso condensado na observação de
Fanon: ‘A Europa é literalmente uma criação do Terceiro
Mundo’’.
Desta forma, apesar do caso do discurso geopolítico português
representar um exemplo particularmente enfático e directo da
contínua existência dos motivos coloniais, uma releitura cuidada
de outras tradições geopolíticas ocidentais revela que os discursos
coloniais não têm sido menos evidentes. Em particular, algo idêntico
ao tipo de deslocação Norte – Sul / Este-Oeste, característico do
princípio geopolítico português dos anos 50-70, pode ser encontrado
a operar de forma mais vasta noutras formações ‘nacionais’
de discurso geopolítico, apesar de por vezes apenas como um
traço obstruído ou deslocado. Consideremos o caso da recusa do
império dos Estados Unidos, no qual o império dos Estado Unidos
(frequentemente informal, logo ‘escondido’) é contrastado com o
imperialismo territorial clássico das potências europeias. O nosso
argumento mais lato é que o pensamento sobre as ligações entre
imperialismo e geopolítica pode ajudar a alargar a nossa análise das

180
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

hierarquias e composições mútuas dos espaços geopolíticos e dos


processos em que:
‘(…) o imperial aponta a direcção para uma teorização mais
adequada do ‘internacional’ como um espaço distinto de
interacção social – um espaço no qual processos de constituição
mútua produzem as entidades que habitam o sistema
internacional. Tais processos históricos e contemporâneos
ocorrem geralmente no contexto de relações hierárquicas
internacionais, particularmente mas não exclusivamente no
caso das relações Norte-Sul, e é precisamente esta hierarquia
que império e imperialismo capturam. Reconfigurado desta
forma, a categoria de imperial é reveladora do carácter e
natureza da política mundial passada e presente’116.
Neste artigo, Portugal forneceu uma entrée, permitindo investigar
e especificar as relações das tradições geopolíticas, identidades e
imperialismo. De forma mais vasta, seguindo Barkawi e Laffey117,
queremos sugerir que ter uma preocupação pelo imperial pode levar
a uma compreensão mais apurada das relações de hierarquia que
estruturam os espaços políticos ‘internacionais’ ou globais. Este
momento imperial de geopolítica e codificação do que Gilroy118
apelida ‘a atracção da raça’ foi primeiramente elaborado:
‘(…) nas teorias geo-orgânicas, biopolíticas e governamentais
dos geógrafos alemães Freiderich Ratzel e Karl Haushofer e
no início do século XX pelo geopolítico sueco Rudolf Kellén
[‘primeiro’ responsável pelo uso do termo ‘geopolítica’] (…)
ajudando as [‘ciências raciais’] a reconceptualizar o Estado
como um organismo e a especificar as ligações necessárias
entre a nação e a sua área de influência. Investimos de
forma diferenciada nesta abordagem como consequência de
termos que enfrentar as suas associações históricas com as
de raciologia, bem como com o Hitlerismo e várias outras
tentativas de deduzir as formas ideais de governo a partir de
analogias orgânicas’.
No caso português (que tem as suas múltiplas associações
históricas com a ‘raciologia’), a atracção da raça tornou-se parte
de uma tentativa de codificar uma nova metafísica do colonialismo
para um regime moribundo. Presentemente, o império português

181
Geografias pós-coloniais

desapareceu do mapa, apesar da sua refulgência – tal como


ilustramos –estar viva nas narrativas identitárias contemporâneas.
Adicionalmente, entre diálogos renovados da defesa da civilização
e as guerras contemporâneas em todas as frentes, outros fantasmas
de discursos geopolíticos também estão a actuar, revivescendo a sua
origem imperial. Sem dúvida que eles estiveram em destaque em
Março de 2003 no conselho de guerra cujo anfitrião era o primeiro-
ministro português, José Manuel Durão Barroso, e os convidados
eram o trio formado pelo primeiro-ministro britânico Tony Blair, o
presidente americano George W Bush e o primeiro ministro espanhol
José Maria Aznar, num encontro que o Times apelidou de ‘windswept
outpost’i 119. Os resultados deste encontro da ‘coalition of the willing’
nos Açores portugueses do meio do Atlântico parecem entoar com
uma descrição de um anterior Pacto Atlântico – o de 1949 – o qual,
de acordo com o então primeiro-ministro Salazar, estabeleceu a
NATO como ‘o símbolo e expressão de uma nova cruzada: a da
defesa da civilização ocidental e cristã’120. Esta ‘cruzada’ deu muitos
problemas a Lisboa, Londres e Washington (o Vietname, Angola,
e Aden, entre muitas outras) nos anos subsequentes. A última
reincarnação de império, ‘civilização’ e geopolítica não é menos
contraditória.

Notas
1
Fernando Pessoa (1888-1935) é reconhecido como o mais conceituado
poeta moderno português. Quintanilha (1971) fornece-nos uma antologia
sua. 2 Taylor (1990 e 1993). 3 Said (1994: xxv). 4 Said (1994: xxv-xxvi).
5
Hamilton (2000: contracapa). 6 Madureira (1995: 28). 7 Feldman-Bianco
(2001: 479). 8 Hall (1996). 9 Medina (1999: 149). 10 Borges-Coelho
(2002). 11 Power (2001), Ribeiro (2002) e Sieber (2001). 12 Existe um
artigo em inglês sobre ‘geopolítica portuguesa’ (Roucek, 1964a), mas
dificilmente se pode considerar um esforço profundo. A obra de Parker
(1985) ‘Western Geopolitical Thought in the Twentieth Century’ não faz
qualquer uso de matéria sobre Portugal. Mais recentemente, e em sintonia
com um conjunto de estudos importantes de uma variedade de abordagens
(por exemplo argentinas, francesas, italianas, japonesas) com a geopolítica,
Sidaway (2000) apresenta uma análise clara de material português e
espanhol, na qual nos baseamos. Sidaway (1999) também considera o lugar

182
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

de Portugal nos discursos de segurança dos Estados Unidos na Guerra-Fria,


e analisa as reivindicações irredentistas (e desta forma aspectos das
narrativas identitárias portuguesas) no contexto de uma disputa de limites
com Espanha que perturbou o progresso suave de integração europeia na
Península Ibérica (Sidaway 2001). Também nos baseamos no trabalho de
Power (2001) sobre a comemoração portuguesa da Guerra Colonial, que
ele – nas pegadas dos estudos de Sharp (1993; 1998) do cinema e media
americanos como narrativas de ‘geopolítica popular’ – interpreta como
formas de ‘geopolítica popular’. 13 Hepple (1986 e 1992), Kelly (1984).
14
Ingram (2001: 1032). 15 Smith (2000: 366). 16 Agnew et al (2002: 7).
17
Ó Tuathail e Agnew (1992: 191). 18 Campell (1992). 19 Anderson (1983).
20
Anderson (1983). 21 Ver Agnew 2003, Dodds e Atkinson 2000, Kearns
2003, Natter 2003 e Tesfahney 1998. 22 Gilroy (2000: 39). 23 Graham e
Wheeler (1983) e Robinson (1979), por exemplo. 24 Newitt (1981: 183).
25
Muitas destas derivam da própria propaganda do regime (ver mais
adiante), outras dos seus críticos internos e externos. No final dos anos 30
e 40 do século XX, o Estado Novo tinha uma expressão fascista singular a
este respeito, simbolizado (entre outras coisas) pelo estabelecimento de
uma Legião Portuguesa paramilitar (oficialmente uma liga anti-bolshevique)
e um movimento de juventude fascista: a Mocidade Portuguesa. Ambas
organizações tinham os seus uniformes tipicamente fascistas, saudações,
estrutura e slogans. Para uma discussão mais alargada da ideologia do
Estado Novo ver Costa-Pinto (1992), Rosas (1992) e Wheeler (1993-94).
26
Newitt (1981: 183). 27 Ribeiro (2002) e Sieber (2001). 28 Robertson
(1990: 136). 29 Ribeiro (2002: 139). 30 Guimarães (1987). 31 Figueiredo
(1975). 32 Power (2000). 33 Ver Fernandes (2003) e Ferreira (1987).
34
Sapega (2002). 35 Por exemplo Coombes (1994), Gregory (1994) e
Mitchell (1988). 36 De acordo com a descrição de Saraiva (1990), este está
longe de ter sido o único caso de ‘exibições’ humanas em Portugal; outros
sujeitos coloniais foram exibidos em parques no centro de Lisboa.
37
Gristwood (1999: 6). 38 Buck-Morss (2000: 323). 39 Ribeiro (2002:
159). 40 Ribeiro (2002). 41 Devemos deixar de parte aqui a questão das
formas como a ideologia e prática colonial portuguesa se expressaram
através do ensino e estudo da geografia. Apesar da Sociedade de Geografia
de Lisboa aparecer como um local institucional chave e de muitos geógrafos
fazerem parte do campo discursivo geopolítico mais vasto que é o centro da
nossa análise, a história mais ampla da geografia académica portuguesa do
século XX está para além da nossa esfera. No entanto, mesmo uma
familiaridade superficial dos trabalhos de Orlando Ribeiro – o decano da
geografia moderna portuguesa – revela uma fixação com a identidade e

183
Geografias pós-coloniais

integridade de Portugal (ao estilo do geógrafo francês Vidal de la Blache).


42
Ver Clarence-Smith (1985) e Newitt (1981). 43
Sidaway (2000).
44
Kennan [Mr. X] (1947). Ver Sidaway (2000). Por exemplo Atkinson
45 46

(1995), Basset (1994) e Dodds (1993). 47 Carvalho (1997). 48 Ver o valioso


estudo de Nowell (1982). 49 Galvão (1936: 5). 50 Apesar disto, mais tarde
nos anos 40, o seu carácter rebelde ressurgiu e envolveu-se em várias
acusações polémicas contra outros oficiais coloniais, a quem acusou de
corrupção e incompetência. Eventualmente a sua incompatibilidade levou-
o ao conflito com o regime e em 1951 foi preso por tomar parte em
conspirações contra Salazar. Escapou da prisão em 1959 e tornou-se um
personagem altamente activo da oposição, implicado em várias conspirações
anti-Salazar durante um longo exílio na Argentina, Brasil, Venezuela e
capitais da Europa ocidental (de Figueiredo 1975, Raby 1988, Ventura
1994). Galvão permaneceu até ao fim um defensor de algum tipo de
federação colonial portuguesa – tema elaborado (entre outros assuntos) no
seu livro postumamente publicado A minha luta contra o Salazarismo e
Comunismo em Portugal (Galvão 1976). 51 Galvão (1936: 8). 52 Antonio
de Figueiredo, comunicação pessoal, 2 de Agosto de 1994. 53 Costa Santa
(1944). 54 É impossível para um artigo desta natureza fazer mais do que
produzir uma revisão de uma vasta literatura. Por exemplo, o catálogo da
Sociedade de Geografia de Lisboa contém milhares de artigos, relatórios e
monografias dos anos 30, 40, 50 e 60, que definiriam a categoria. Os
discursos e argumentos de Salazar deste período podem também fornecer
numerosos exemplos. 55 Guimarães (1987: 111). 56 Figueiredo (1975).
57
Sidaway (2000). 58 Teixeira (1992). 59 Teixeira (1992: 124). 60 Crollen
(1973), Minter (1972) e Power (2001). 61 Bahia dos Santos (1955: 152-
153). 62 Figueiredo (1975: 206-207). 63 Entrevista com Serge Groussard
originalmente publicada no Le Fígaro em 2 e 3 de Setembro de 1958.
Reimpresso em português como Salazar (1960a). 64 Sidaway (2000).
65
Por exemplo Comprido (1956), Crespo (1956), Pinto (1956), Prior (1951)
e Sanches (1963). 66 Comprido (1956: 241-242). 67 Comprido (1956:
232). 68 Júnior (1969). 69 Ver Oliveira (2000). 70 Gilroy (1993). 71 Barkawi
e Laffey (2002, p.113). 72 Por exemplo Dalby (1994), Sharp (1998) e
Weber (1994). 73 Chassin (1961), Crespo (1956) e Sanches (1963), por
exemplo. 74 Freyre (1961: 41). 75 Todas as citações apresentadas vêm da
versão inglesa, que foi claramente produzida para consumo externo como
parte dos esforços mais vastos da propaganda do regime (Freyre 1961).
76
Freyre (1961: 30). 77 Freyre (1961: 31). 78 Madureira (1995: 23).
79
Freyre (1961: 47-48). 80 Reichmann (1999: 35). 81 Caetano (1973: 71).
82
Ribeiro (2002). 83 Ribeiro (2002: 167). 84 Freyre (1961: 132). 85 Neto

184
‘Lágrimas de Portugal. ’: império, identidade, ‘raça’ e
destino nas narrativas geopolíticas portuguesas

(1963), por exemplo. 86 Silva (1964), por exemplo. 87 Por exemplo


Andrade (1961), Ministério dos Negócios Estrangeiros (1970), Salazar
(1960b, 1961 e 1962). 88 Andrade (1961: 48). 89 Caetano (1973: 12).
90
Caetano (1973: 41-42). 91 Sousa Santos (1993, p.136). 92 Madureira
(1995: 18). 93 Madureira (1995, p.28). 94 Ornelas (2001). 95 Ornelas
(2002: 147). 96 Ryan (1994: 156). 97 Mondlane (1969). 98 Cabral (1973).
99
Ver Gunn (1999). 100
Medeiros (2002: 93). 101
Medeiros (2002).
102
Spínola (1974). 103
Ver Oliveira (2000). 104
Bruce (1975: 105). 105 A
natureza e importância da transição resultante para a África do Sul em
particular foram alvo de estudo de outros trabalhos (Hanlon 1986, Sidaway
1992, Sidaway e Simon 1993). 106 Por exemplo Carvalho (1974) e Serrão
(1976). 107 Baer e Leite (1992). 108 Madureira (1995: 19-20). 109 Estas
revisões também são evidentes em muitos dos itens financiados ou
disseminados pela Comissão Nacional para as Comemorações dos
Descobrimentos. 110
Lourenço (1978: 223). 111
Maltez (2002: 340).
112
Comunidade de Desenvolvimento do Sul de África. A SADC foi fundada
em 1979 numa ‘Conferência de Coordenação de Desenvolvimento’ e
reconstituída em 1992 como uma ‘comunidade’ que procura a integração
regional. 113 Blanco (1995). 114 Bloom (1995). 115 Sousa Santos (1992:
92). 116 Young (1990: 119). 117 Barkawi e Laffey (2002: 111). 118 Barkawi
e Laffey (2002). 119 Gilroy (2000: 39). 120 Rozenberg (2003: 16). 121 Citado
em Teixeira (1992: 121).

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