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INTERÉTNICAS
RELAÇÕES RACIAIS E RETÓRICAS DE IDENTIDADE
RESUMO
As migrações internacionais ganham corpo a partir do surgimento e consolidação dos
Estados-Nação e em seu estágio atual são fortemente impulsionadas pela circulação do
capital, fase mais recente do processo de globalização. No contexto nas migrações
internacionais pode-se observar como as identidades dos grupos imigrantes são
reconstruídas na nova terra, onde também aflora os vários mecanismos de solidariedade
étnica que, na verdade, funcionam como estratégias ante um estado de permanência
definitivo que outrora se apresentava como provisório. O trabalho tem o caráter teórico,
mas lançará mão de exemplos empíricos explorados pelos vários autores que o
subsidiarão, tais como Stuart Hall, Abdelmalek Sayad, Marcelo Ennes e outros. A partir
destas leituras foi possível compreender quais elementos contribuem para que os
imigrantes redefinam suas identidades frente aos novos parâmetros vividos na sociedade
de imigração.
PALAVRAS-CHAVE: Imigração; Identidade; Solidariedade Étnica.
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Texto apresentado como trabalho final à disciplina “Identidade e Relações Interétnicas” ministrada no
NPPA/UFS pelo Profº. Dr. Frank Marcon no primeiro semestre de 2011.
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1. INTRODUÇÃO
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A globalização é tratada com o sentido que nos traz Anthony Giddens: “A globalização não é, portanto,
um processo singular, mas um conjunto complexo de processos. E estes operam de uma maneira
contraditória ou antagônica” (GIDDENS, 2000, p. 23).
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tentativa de se observar como eles reconstruíram suas identidades dentro desse processo
de migração internacional.
Sugere-se que toda imigração acompanha uma reconfiguração identitária não só
por parte dos imigrantes, mas em alguma medida da sociedade que o recebe. As grandes
metrópoles são espaços onde é possível observar o quanto estas trocas simbólicas entre
imigrantes e naturais afetam suas identidades.
2. A JORNADA DA IMIGRAÇÃO
Decidir por imigrar não é tão simples quanto pode parecer algumas vezes. O
mundo conhece esses movimentos desde os tempos mais remotos, acentuados com o
passar do tempo pelo desenvolvimento dos meios de transportes que tornaram as
distâncias entre os diversos pontos da terra mais brandas, ou seja, elas não seriam um
empecilho para o deslocamento. Há inúmeras possibilidades de se analisar a jornada da
migração de um país para o outro, mas é sob a ótica do trabalho, da necessidade de
obtê-lo que queremos entender como se processa esta jornada.
O trabalho é que faz nascer o imigrante de acordo com as concepções do
sociólogo francês Abdelmalek Sayad (1998). Ele estuda a presença de imigrantes
argelinos na França em um período que esse país viveu forte expansão econômica. Não
há como dissociar o imigrante do trabalho. Sayad nos diz que a imigração está
diretamente relacionada com o trabalho e o imigrante “é essencialmente força de
trabalho provisória [...], temporária, em trânsito”, portanto, “o trabalho faz nascer o
imigrante, se o trabalho morre, morre também o imigrante passando a viver um estado
de não-ser (SAYAD, 1998)”.
Se o imigrante está diretamente relacionado com o trabalho podemos afirmar que
sua jornada começa na busca de uma melhor condição de vida que só pode ser garantida
a partir do trabalho. A acentuada globalização influencia muito nesse movimento de
busca pelo trabalho de forma que algumas “barreiras” são derrubadas aumentando o
fluxo de pessoas que orbitam em torno desse propósito com a expectativa de melhorar
de vida. Às vezes é uma decisão que tem que ser tomada as pressas, em outros cada
passo é calculado meticulosamente, porém, é certo que todo processo de imigração é um
processo de ruptura. O primeiro passo já foi dado: sair do lugar de origem, o próximo é
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Este ponto será analisado a partir do que Stuart Hall (2003) escreve pensando
sobre o que ele chama de diáspora caribenha na Grã-Bretanha. O exemplo de Hall nos
possibilita enxergar como ocorre a reconstrução da identidade do imigrante no seu novo
lugar de morada, que agora deixa de ser provisório e passa a ser definitivo.
Stuart Hall não está preocupado em sistematizar a imigração caribenha para Grã-
Bretanha ou Estados Unidos, mas foca sua atenção na relação entre “terra de origem” e
“pertencimento” para uma construção da identidade caribenha na diáspora. Ele observa
que há uma tentativa de deixar viva a identidade caribenha face ao novo contexto e m
que estas pessoas se estabelecem, porém, é notório que esta identidade se torna múltipla,
como acontece com o surgimento de uma identidade barbadiana:
Neste caso específico dos barbadianos na Grã-Bretanha, Hall alega que o contato
com diversos outros grupos caribenhos e com outras identidades negras britânicas
proporciona uma redefinição do “ser barbadiano” e mais, os que retornaram à Barbados
sentiram falta da vida metropolitana que estavam acostumados a levar, isso nos leva a
pensar no que faz o imigrante sentir-se como parte do local de assentamento quando
retorna (provisória ou definitivamente) ao seu local de origem. Há um sentimento de
deslocamento, típico do atual processo de globalização como afirma Hall (2005) em
outra obra.
Os mitos fundadores citados por Hall trazem a tona uma questão muito
importante: a essencialização da identidade, ela passa a ter um caráter permanente, não-
transitório e a expectativa de retorno sempre reforçará esta identidade imutável, que
encontra refúgio na tradição. Mas o que se constata é outro caminho tomado pelos
imigrantes caribenhos, onde, essa “história está marcada pelas rupturas mais
aterradoras, violentas e abruptas” (HALL, 2003, p. 30); é o caminho da “fusão”, do
“entrelaçamento de diferentes elementos culturais africanos e europeus”. É a
hibridização, uma mescla de elementos culturais caribenhos com outros metropolitanos
que originam uma nova identidade caribenha, a identidade caribenha na diáspora.
Agora, sujeitos antes separados convivem juntos “espacial e temporalmente”, uma
verdadeira “zona de contato” que permite uma “interação” entre ambas as partes. Essa
hibridização também acontece no Caribe, pode-se ver no exemplo de Hall ao constatar
que em Trinidad, o Oriente e o Ocidente são representados em complexas relações de
tradução cultural. As “Rainhas do Carnaval Indiano, pão indiano, velas Diwali
brilhando na escuridão de São Fernando”, etc., são objetos dessa tradução cultural em
Trinidad.
Os places de passage se encaixam na análise da identidade imigrante caribenha
porque essa nova identidade não pode ser encarada como oposta as outras identidades,
ou seja, elas não têm um ponto de ruptura, mas são lugares de passagem onde se vem e
se vai dependendo da situação em que se contra o imigrante.
Em uma das vertentes da globalização pós-70 observamos o desmantelamento
“dos modelos culturais a partir da nação”, como fornecedora de uma identidade cultural
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alguns fenômenos, dentre eles a solidariedade étnica. Antes de discorrer sofre esse
fenômeno vamos pincelar alguns pontos sobre “etnicidade” e “grupos étnicos” que
servirá de reforço para melhor compreensão do que está posto neste ponto de discussão.
As categorias de “etnicidade” e “grupo étnico” podem ser entendidas a partir das
concepções desenvolvidas por Fredrik Barth e apresentadas por Philippe Poutignat e
Jocelyne Streiff-Fenart no livro “Teorias da Etnicidade”. Barth,
coagidos e tomam a cultura como sua referência e estabelecem uma fronteira, o grupo
étnico se sobressai. Em suma, Barth foca na ideia de fronteira como sendo o motor que
faz surgir os grupos étnicos.
De posse desse entendimento é possível apreciar dois exemplos de solidariedade
étnica entre grupos de imigrantes no Brasil. O primeiro caso foi estudado há algum
tempo, os sírios e libaneses em São Paulo estudados por Oswaldo Truzzi (1995) em sua
obra “Patrícios sírios e libaneses em São Paulo”. Ao traçar as trajetórias sociais do final
do século XIX até meados de 1960, Truzzi destaca que sírios e libaneses ao prosperar
economicamente ajudavam seus “irmãos” facilitando sua vinda ao Brasil para que
também pudessem trabalhar e ascender socialmente.
O segundo é um caso estudado mais recentemente, os chineses no estado de
Pernambuco abordado pelo antropólogo Marcos Silva (2008). Em seu trabalho ele
constatou a presença de alguns mecanismos de ajuda mútua entre seu grupo no campo
econômico pernambucano; entre os principais estão a contratação pelos comerciantes
chineses de seus próprios “companheiros” imigrantes em seus estabelecimentos. Outro
mecanismo apontado por ele estava na prática freqüente de auxílio aos que
manifestassem interesse em migrar para o Brasil.
vindo para o Brasil na busca de melhores condições de vida que só poderia ser obtido a
partir do trabalho e que também possibilitaria o enriquecimento. Assim, nasce o
imigrante japonês, é também o trabalho que o origina.
Como qualquer grupo de imigrante que chegava ao Brasil3 os japoneses també m
tornaram-se alvo de debates principalmente acerca de como aconteceria a formação da
raça brasileira com a introdução desses novos elementos. Há diversas fontes que pode m
atestar os intensos debates que preocupavam os nacionais quanto à questões como
mistura e assimilação, preocupações estas que não se restringiam somente aos
japoneses, mas a outros grupos de imigrantes (ENNES, 2001).
O que talvez agravasse em relação aos japoneses eram características físicas e
culturais muito mais diferentes que outros imigrantes. Mesmo os próprios japoneses
enfrentaram inúmeras dificuldades em relação à alimentação e outros aspectos da nova
terra
A começar pelas refeições - pão com mortadela servidas nos trens que
os conduziam até as fazendas. As casas nas colônias das fazendas
nada tinham de semelhante com as que moravam no Japão. A
alimentação também continuava a causar problemas, já que não
existiam verduras e legumes e sua dieta restringia-se a arroz, carne
bovina ou de peixe salgado e banha de porco.
Essas características, embora pareçam sem importância, revelam na
verdade conflitos vivenciados em decorrência de seu ethos inscrito em
seus hábitos alimentares (ENNES, 2001, p. 54).
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Mesmo os europeus eram alvo de discussão. Esse ou aquele italiano não servia por diversos motivos.
Isso prova que mesmo os europeus brancos deveriam ser selecionados antes de aportarem no Brasil
(LAZZARI, 1980).
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Município do oeste paulista surgido a partir da implantação de uma colônia japonesa no início do século
XX.
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Como nosso objetivo não é tratar especificamente do processo imigratório dos japoneses para o Brasil
recomenda-se consultar Ennes (2001) e bibliografias anteriores.
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Neste sentido, é possível afirmar que suas identidades foram redefinidas, reconstruídas ou
negociadas no sentido que demonstra Jeffrey Lesser (2001). Em alguns momentos se é mais
japonês, em outro brasileiro e em outro brasileiro e japonês ao mesmo tempo ou nipo-japonês.
Vai depender do contexto ou cenário para que esta ou aquela identidade seja ativada, situação
também observada no caso de Pereira Barreto, onde “qual ser japonês é, ao mesmo tempo,
ser brasileiro, e ser brasileiro é, igualmente, ao mesmo tempo, ser japonês” (ENNES,
2001, p. 161).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A jornada da imigração é dolorosa para aquele que deixa sua terra em busca de
melhores condições de vida. É exatamente neste ponto que nasce o imigrante, o trabalho
é seu motor principal. É o trabalho quem o concebe. Assim como não é simples imigrar,
também não é simples entender como acontece a reconstrução identitária do imigrante
no seio da sociedade de imigração. Sabe-se que ela não será a mesma vista, por
exemplo, a partir de uma identidade cultural, como no caso nos negros caribenhos na
Grã-Bretanha. Estes imigrantes puderam redefinir suas identidades no contato com
novos elementos culturais tanto da Grã-Bretanha como da própria África, onde ocorreu
a primeira diáspora.
Por outro lado, a condição diaspórica ou de imigração pode propiciar o
desenvolvimento de mecanismos de solidariedade étnica como no caso dos sírios,
libaneses, chineses e japoneses no Brasil. No sentido de preservar sua cultura, de se
defender e de ajudar uns aos outros frente às dificuldades vivenciadas no lugar que não
é mais provisório, estes reproduziram laços mútuos muito fortes.
Enfim, mesmo “fechando-se” em colônias, os imigrantes, tal como os japoneses
em Pereira Barreto, construíram relações com os brasileiros que permitiram uma
redefinição identitária e, onde eles se sentiam brasileiros e japoneses ao mesmo tempo.
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7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
TRUZZI, O. Patrícios sírios e libaneses em São Paulo. São Paulo: HUCITEC, 1995.