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Contra os Murmurantes
por
Para solucionar esta dúvida, há que começar por distinguir aquilo que
nos une aos que negam que o mundo tenha sido desde sempre
daquilo que nos separa desses mesmos.
Se se entende que algo além de Deus possa ser desde sempre, como
se fosse possível algo eterno além d'Ele sem ser feito por Ele mesmo,
tal hipótese implica um erro digno de abominação não somente por
parte da fé mas também por parte dos filósofos, que afirmam e
demonstram que tudo o que de alguma maneira é não pode ser senão
porque é causado por Aquele que possui o ser em grau máximo e
perfeito.
Se, por outro lado, se entende que algo seja desde sempre sendo,
ademais, causado por Deus em tudo o que é, então há que perguntar
se tal afirmação se pode sustentar. Se se diz que é impossível, será
ou porque Deus não pode fazer algo que seja desde sempre, ou
porque tal não pode ser feito em si mesmo, ainda que de seu o
pudesse fazer Deus.
Com o primeiro sentido estão todos de acordo: sem dúvida Deus pode
fazer algo que seja desde sempre, em razão de sua infinita potência.
Resta averiguar, portanto, se é possível que seja feito algo que
sempre tenha sido.
No primeiro sentido se pode dizer que, antes de o anjo ter sido feito,
não podia ser feito, por não ter sido precedido de nenhuma potência
passiva, já que não foi feito de matéria prévia. E, contudo, Deus
podia fazer o anjo, e podia fazer que o anjo fosse feito, porque o
fez, porque o anjo foi feito.
No segundo sentido, diz-se que algo não se pode fazer por repugnar à
razão, assim como não se pode fazer que a afirmação e a negação
sejam simultaneamente verdadeiras, ainda que, segundo alguns,
Deus o possa fazer. Outros, no entanto, dizem que Deus não poderia
fazer tais coisas, porque tais coisas não são nada.
E todavia é claro que Deus não pode fazer que tais coisas sejam
feitas, porque a proposição que afirma isto se destrói a si mesma.
Se porém se afirmar que Deus pode fazer que tais coisas sejam
feitas, não é herética a afirmação, conquanto seja, como julgo,
falsa, assim como o afirmar que o passado não tenha sido traz em si
uma contradição.
Se se excluem, não pode ser senão por uma de duas razões, ou por
ambas : ou porque é necessário que a causa agente preceda em
termos de duração a seu efeito, ou porque é necessário que o não-ser
preceda em duração ao ser, pois que a criação de Deus foi feita do
nada. Em primeiro lugar, portanto, deve-se mostrar que não é
necessário que a causa agente, ou seja, Deus, preceda em duração a
seu efeito, se assim Ele o quiser.
Não se pode objetar contra esta razão que Deus é causa agente
voluntária, porque não é necessário que a vontade preceda em
duração a seu efeito, e nem sequer o agente voluntário, a não ser
que obre a partir de deliberação, o que de modo algum convém
digamos de Deus.
Mas um agente que produz somente a forma pode fazer que a forma
por ele produzida seja tanto tempo quanto ele próprio, como se vê
claramente no caso do sol ao iluminar. Logo, com muito mais razão
Deus, que produz toda a substância da coisa, pode fazer que seu
efeito seja em cada momento em que Ele seja.
E, assim, é claro que não repugna à razão dizer que a causa agente
não precede a seu efeito em duração, porque Deus não pode fazer
que sejam coisas que repugnam à razão.
Resta agora ver se repugna à razão que algo feito nunca tenha não
sido, por ser necessário que seu não-ser preceda em termos de
duração a seu ser, dado que se afirma ter sido feito do nada.
Mas tal em nada repugna à razão, o que se mostra pelo que diz
Anselmo no Monologio , cap. 8, quando expõe o modo por que a
criatura se diz feita do nada. “A terceira interpretação”, diz ele,
“pela qual se diz que algo é feito do nada, deve-se a
compreendermos que algo de fato é feito, sem no entanto existir
algo de que seja feito.”
Em sentido semelhante se diz que quem se entristece sem causa se
entristece por nada. Segundo este sentido, portanto, se se entende o
que acima se disse — que, salvo a própria suma essência, todas as
coisas que dela própria procedem são feitas do nada, isto é, não são
feitas de algo — não se segue nada de inconveniente.
Claro está, pois, que em nada repugna à razão dizer que algo é feito
por Deus e que nunca não tenha sido.
Houvesse qualquer coisa que lhe repugnasse, seria assombroso que
não a tivesse visto Agostinho, pois teria sido uma via eficacíssima
para refutar a eternidade do mundo, a qual ele impugna com muitas
razões nos livros 11 e 12 d' A Cidade de Deus . Como, então, deixou
passar totalmente esta?
Notas: