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2014
CORPO À MOSTRA:
TEXTOS
ecos do dizer no corpo1
Manuela Lanius2
1
Trabalho apresentado nas Jornadas Clínicas da APPOA: Corpo e discurso em psicanálise,
novembro de 2014, em Porto Alegre.
2
Psicanalista; Membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA); Doutoranda em
Psicanálise: Clínica e Pesquisa (UERJ) e Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS).
E-mail: manuelalanius@gmail.com
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Olinda foi uma paciente que buscou tratamento para as crises de angús-
tia que vinham lhe ocorrendo e que a levava às emergências de hospitais a
cada semana. No momento inicial de seu tratamento, Olinda dedicava-se à
descrição das crises acometidas no corpo, e que findavam com a perda dos
sentidos. Foi após o estabelecimento da transferência e a entrada na livre as-
sociação ou, em outros termos, no giro do discurso do mestre para o discurso
da histérica, no qual um sujeito dividido causado pelo desejo interroga o que
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o constitui, e produz um saber acerca de seu sintoma, que Olinda trouxe para
a sessão o seguinte sonho:
Ela narra:
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Manuela Lanius
3
“Relevant: pertinente. Mas também, em Eissler: o detalhe ‘revelador’ no sentido do lapso reve-
lador” (Lacan, [1958-1959]2002, p. 424).
4
Alusão ao título da obra de Clarice Lispector: A hora da estrela, na qual a personagem principal,
Macabéa, tem seu principal evento da vida, justamente quando atropelada – sua morte. Previa
mais que a cartomante a quem consultava: “Desculpai-me mas vou continuar a falar de mim
que sou meu desconhecido, e ao escrever me surpreendo um pouco pois descobri que tenho
um destino. Quem já não se perguntou: sou um monstro ou isto é ser uma pessoa? […] Quero
antes afiançar que essa moça não se conhece senão através de ir vivendo à toa. Se tivesse a
tolice de se perguntar “quem sou eu?” cairia estatelada e em cheio no chão”. É que “que sou
eu?” provoca necessidade. E como satisfazer a necessidade? Quem se indaga é incompleto”
(Lispector, p.15-16, 1998).
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tida, o olho que não lhe devolve uma imagem de si, um excesso de nada.
Freud ([1926]2010) em Inhibición, síntoma y angustia, anunciou que a an-
gústia é originada por uma invasão abrupta da carga pulsional, desvincula-
da de quaisquer redes representacionais que poderiam contê-la e que, por
esse fato, se manifesta em sua face mais avassaladora, o afeto é mantido,
enquanto a ideia subjaz recalcada. Deixou evidente que o corpo reage a um
sinal de perigo iminente através da angústia. Aqui, a angústia é descrita como
signo de que o eu está ameaçado, seja por exigências internas ou externas.
A angústia é, pois, potencializada pela pulsão escópica. O sujeito é ar-
rebatado por um espetáculo que o ilude acerca do desejo que imagina pro-
vocar no Outro. O que o sujeito, na alcova de espelhos, pode enxergar é que
é desejado, resplandece-se com esta fascinante imagem, ao que de súbito
está capturado pelo olhar que não vê; ignora para onde mira o olhar do Outro.
Sem enxergar seu reflexo reluzente aos olhos do Outro, o sujeito sucumbe
à angústia. Sua posição, aliás, deixa de ser a de sujeito, mas a de objeto a
(Lacan, [1962-1963]2005).
De acordo com os estudos de Costa, o corpo recoberto pela linguagem
é o que confere a ele o erotismo, uma vez que a linguagem faz operar uma
função de velamento que constrói uma erótica. “Quando esta função de vela-
mento não acontece, o Real provoca angústia” (2012, p.67).
Olinda perde os sentidos ao se deparar com o Outro, que lhe invade o
corpo, quando não há mais portas e cortinas de anteparo ao olhar. Contudo,
há um ponto ambíguo que se revela no sonho: esse corpo à mostra não é
visto, e por não ser visto é atropelado. Há, pois, a solicitação de um olhar que
a localize numa posição subjetiva, que lhe devolva uma imagem de quem é.
O evento corporal, a crise de angústia, desencadeia-se com o episódio
da sobrinha, mobilizando uma correspondência ainda ilegível para Olinda;
correspondência que foi remetida à escuta/leitura de quem supunha como
leitor, enquanto alteridade. Foi esta suposição que permitiu que o Isso se
lesse, se escutasse no lapso.
A cena que se revela no sintoma é a cena fantasmática montada no
registro escópico. A imagem de um pai que sai em busca da extração do ouro
da Serra Pelada, a deixa desprovida de recursos para resguardar o que lhe
era precioso: seu corpo, sua sexualidade, caindo lograda do que pode lhe
dar um pai. A função de interdição do pai se mostra precária e a objetalização
de seu corpo denuncia a inconsistência da interdição, deixando-a desampa-
rada perante o enigma do desejo do Outro. Seu corpo, assim, dissolve-se na
angústia. Se a angústia é um afeto que não engana, ela demarca o limite do
significante, este que engana, se faz passar por outro, submete-se à dialética
e coloca em cena algo da verdade subjetiva.
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num local tão evidente que mostrava-se a todos, sem que isso pudesse ser
reconhecido.O lapso, como entendeu Lacan, confere um efeito de verdade
para aquele que o faz e/ou o escuta. Apresenta efeito de verdade, ou seja, a
ele é atribuído um valor de verdade, visto que a verdade jamais consegue ser
dita, fica sempre semidita. De acordo com Soler, o lapso é privilegiado como
porta de entrada do inconsciente. “O riso arrancado de surpresa, indica que a
combinatória dos uns de alíngua – digamos: a cifração do humorista – abriu
a porta do inconsciente” (Soler, 2012, p.67).
Pereira (2008) em O conto machadiano, uma experiência de vertigem,
trabalhou o efeito de revelação do sujeito e a passagem que o chiste coloca
em exercício. Pereira recordou o deslocamento e o esgotamento do sentido
exposto por Lacan ([1957-1958]1999), quando ele trouxe este viés pela ho-
mofonia em francês com o “pas-de-sens”, escutado ao mesmo tempo como
sem sentido e como passo de sentido.
Lacan situou o lugar do analista como o que não responde à demanda
imaginária de compreensão, uma vez que não é disso que se trata numa
análise, mas de manter-se no caminho da incompreensão do senso comum,
suspensão de um saber a priori. Deste modo, possibilita-se que o sujeito ve-
nha a interrogar seu sintoma no que isto quer lhe dizer. O passo a mais mo-
vimenta o desejo e ultrapassa o repetido gozo. Em nosso trabalho de escuta,
as ressonâncias verbais e o rumor das palavras dominam o semântico, como
diria Manoel de Barros (2010).
REFERÊNCIAS:
BARROS, Manoel de. Encontros. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2010.
BLANCHOT, Maurice. O livro por vir. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
BORGES, J. L. [1944] A biblioteca de Babel. In: ______. Ficções. São Paulo: Cia das
Letras, 2007, p. 69-79.
COSTA, Ana. Rasura e angústia: a função do velamento do corpo. In: COSTA, Ana;
RINALDI, Doris. (Org.) A escrita como experiência de passagem. Rio de Janeiro: Cia
de Freud, 2012, p. 67-74.
FREUD, Sigmund. Inhibición, síntoma y angustia (1926 [1925]). In: ______. Obras
Completas. Buenos Aires: Amorrortu Editores, 2010, v.XX, p. 71-161.
LACAN, Jacques. Função e campo da fala e da linguagem [1953]. In: _____. Escritos.
Rio de Janeiro: JZE, 1998, p.238-324.
_____. O seminário sobre “A carta roubada” [1956]. In: _____. Escritos. Rio de Janei-
ro: JZE, 1998, p. 13-68.
_____ . A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud [1957]. In: _____.
Escritos. Rio de Janeiro: JZE, 1998, p. 496-536.
_____. O seminário, livro 5: as formações do inconsciente [1957-1958]. Rio de Janei-
ro: JZE, 1999.
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Recebido em 28/03/2015
Aceito em 05/06/2015
Revisado por Deborah Nagel Pinho
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TEXTOS
AMOR AO PAI1
1
Trabalho apresentado na Jornadas Clínicas da APPOA: A escrita do sexual, em outubro de
2013, Porto Alegre.
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Psicanalista; Membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA); Mmbro do Institito
APPOA; Membro da equipe do Centro Lydia Coriat de Porto Alegre; Mestre em Psicologia Social
e Institucional pela UFRGS. E-mail: gersonsmiech@gmail.com
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Os filhos de Hans
Vendo Hans brincar com seus filhos imaginários de novo, eu lhe dis-
se ‘Alô, seus filhos imaginários ainda estão vivos? Você sabe muito
bem que um menino não pode ter filhos’.
Hans: ‘Eu sei. Antes eu era a mamãe deles, agora eu sou o papai
deles’.
Eu: ‘E quem é a mamãe das crianças?’
Hans: ‘Ora, a mamãe, e você é o vovô delas’.
Eu: ‘Então você gostaria de ser do meu tamanho, e de ser casado
com a mamãe, e então você gostaria que ela tivesse filhos.’
Hans: ‘Sim, é disso que eu gostaria, e então a minha vovó de Lainz
será a vovó deles’ (Freud, [1909]1987, p.104).
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falo, pelo traço comum. É o que torna possível a transmissão da potência viril
através da linguagem (Pommier, 1987).
A referência ao lugar simbólico e nomeante do pai é atribuída por La-
can ([1955-1956]1988) ao significante Nome-do-Pai. No seminário sobre As
psicoses, Lacan afirma “que a função de ser pai não é absolutamente pen-
sável na experiência humana sem a categoria do significante” (Lacan, [1955-
1956]1988, p.329). O Nome-do-Pai indica um lugar de enunciação que intro-
duz em sua linha de conta a procriação, a interdição do incesto, a relação do
significante à lei, a função de nomear, e a ordenação na linhagem e na série
das gerações.
As conotações significantes do pai estão longe de se confundir com as
do genital e da potência fálica. Seu acento não está colocado na sua potên-
cia, mas no meio de assumir subjetivamente esta potência. Com isto, não se
trata de assumir a realidade sexual da concepção, mas do que permite ao
sujeito reconhecer esta realidade como sua.
A origem do termo Nome-do-Pai reporta à religião. Como a paternida-
de de Deus é espiritual e não carnal, a noção de Nome-do-Pai não se situa
no plano da potência falófora, mas num plano puramente simbólico, mar-
cando uma diferença em relação ao pai freudiano de Totem e tabu (Freud,
[1913]1987), que gozava com todas as mulheres.
Porge (1998) assinala uma diferença entre o modo como Freud e Lacan
articulam a relação entre o pai e a religião na psicanálise. Enquanto Freud
interpreta a existência de Deus como substituto do pai da horda primeva,
Lacan faz o inverso e importa um termo religioso para analisar o Édipo a
partir dele. Nesse sentido, o Nome-do-Pai está mais próximo de Deus do que
do pai da horda primitiva. Ele permite dessexualizar o pai, de modo que sua
função significante permita que o recurso estruturante na potência paterna
intervenha como uma sublimação. E, desde esta condição sublimatória, é
possível enlaçar a noção de pai à civilização como um todo, mais do que à
religião propriamente dita.
Segundo Porge (1998), ao mesmo tempo em que introduz o significante
Nome-do-Pai como elemento teórico da psicanálise, Lacan desdobra o lugar
paterno a partir da referência aos três registros, formulando as noções de pai
real, pai simbólico e pai imaginário. Estes dois eixos teóricos para referenciar
a função paterna se farão presentes em seu ensino, simultaneamente, sem
estarem totalmente separados ou unificados entre si e sem que um absorva
o outro em sua formulação. Esta questão repercutirá em seus últimos semi-
nários sobre a articulação entre o plural, nomes do pai, e o singular Nome-do-
Pai, os quais irão se manter.
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Paternidade e sexuação
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Nessas fórmulas, quem se alinha do lado mulher fica sem poder perten-
cer a uma classe fechada, pois não há um traço comum que as especifique.
Em função disso, não se poderia escrever A mulher ou As mulheres. Por isso,
Lacan escreve A mulher, barrando o Ⱥ. Como não há delimitação de um con-
junto fechado, deixa de existir o motivo para a suposição da exceção, ou seja,
de ao menos um ou uma que não esteja marcado pela castração, que escape
à função fálica. O que se escreve com uma dupla negação: ∃x Φx.
Passemos, agora, à parte inferior do quadro das fórmulas da sexuação,
proposto por Lacan ([1972-1973]1985). Do lado masculino, vemos que o su-
jeito barrado ($), marcado pela castração, tem como ponto de mira o objeto
causa de seu desejo, o objeto a, no campo da parceira feminina do outro lado
da barra vertical. O homem se endereça a um recorte no corpo da compa-
nheira: cabelos, voz, pernas, seios ou outra coisa qualquer. Para que possa
visar ao objeto causa de seu desejo, é preciso que ele possa se apoiar no falo
do seu lado, que constitui sua base de sustentação, “Φ”.
Se o falo só se apresenta enquanto falta para um sujeito, “– φ”, um ho-
mem só pode encontrar esta sustentação a partir do olhar do Outro, de sua
companheira do outro sexo. É ela quem vai garantir que uma das formas de
representação imaginária do falo está no campo dele. Para tanto, é neces-
sário que uma mulher suporte visar ao falo no campo de seu parceiro, o que
supõe que ela própria se reconheça faltante (Laznik, 2003). Por este motivo,
também podemos observar uma seta que parte do lado feminino em direção
ao falo, Φ, do lado masculino.
Para representar que uma mulher não está toda no gozo fálico, Lacan
([1972-1973]1985) traça duas flechas que partem de A mulher. Uma delas
visa o falo e atravessa a barra que separa o lado feminino do lado mascu-
lino. A outra aponta para S(Ⱥ), o significante da falta no Outro.
Laznik (2003) assinala duas condições do desejo masculino para se erigir.
Primeiro, para se sustentar em sua falicidade é preciso que o homem possa
ver no olhar dela que ele tem, ou seja, que ela o admira. Em segundo, para
que possa sustentar, com seu órgão, seu desejo por uma mulher, visar nela um
objeto que cause o seu desejo e com isso operar um recorte no corpo feminino.
A partir do que foi colocado a respeito das fórmulas da sexuação, pro-
ponho retomar as interrogações que vínhamos examinando a respeito das
questões em jogo no momento em que um homem se candidate a ocupar o
posto de pai.
No seminário XXII, RSI, Lacan propõe o seguinte:
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REFERÊNCIAS
DE NEUTER, Patrick. Mal-estar na paternidade. Revista da Associação Psicanalítica
de Porto Alegre, Porto Alegre, n.27, p.57-77, set. 2004.
FLESSLER, Alba. El niño en análisis y el lugar de lós padres. Buenos Aires: Paidós, 2008.
FREUD, Sigmund. Sobre as teorias sexuais das crianças [1908]. In:______. Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Ja-
neiro: Imago, 1987, v.9.
______. Análise de uma fobia de um menino de cinco anos [1909]. In:______. Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Ja-
neiro: Imago, 1987, v.10.
______. Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância [1910]. In:______. Edi-
ção standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de
Janeiro: Imago , 1987, v.11.
______. Totem e tabu [1913]. In:______. Edição standard brasileira das obras psicoló-
gicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago 1987, v.13.
______. ‘Uma criança é espancada’: uma contribuição ao estudo da origem das per-
versões sexuais [1919]. In:______. Edição standard brasileira das obras psicológicas
completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1987, v.17.
______. Moisés e o monoteísmo: três ensaios [1939]. In:______. Edição standard bra-
sileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
1987, v.23.
LACAN, Jacques. O seminário 3: As psicoses [1955-1956]. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1988.
______. O seminário 4: A relação de objeto e as estruturas freudianas [1956-1957].
Publicação para circulação interna da Associação Psicanalítica de Porto Alegre, Porto
Alegre, 1992.
______. O seminário 20: Mais, ainda [1972-1973]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.
______. O seminário 22: R.S.I. [1974-1975]. Inédito (CDROM – Obra de Jacques
Lacan).
LAZNIK, Marie Christine. O complexo de Jocasta. Rio de Janeiro: Companhia de
Freud, 2003.
POMMIER, Gérard. A ordem sexual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1987.
PORGE, Erik. Os Nomes do Pai em Jacques Lacan. Rio de Janeiro: Companhia de
Freud, 1998.
THOMAS, Jèrome. As crianças tupinambás e sua educação no século XVI: ternura,
dor, obediência. Revista Brasileira de História da Educação, Maringá-PR, v.14, n.1
(34), p.23-47, jan./abr. 2014.
Recebido em 29/03/2015
Aceito em 20/06/2015
Revisado por Maria Ângela Bulhões
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TEXTOS
JOGADORES VORAZES1
Paulo Gleich2
Resumo: O texto faz uma breve apresentação do universo dos jogos eletrônicos,
conhecidos como videogames, muito presentes na cultura contemporânea, mas
pouco nos escritos de psicanalistas. Parte de um fato recorrente na clínica – o
uso massivo que pacientes, especialmente adolescentes, fazem desses jogos –
para interrogar sua possível função na passagem adolescente. Para isso, toma
como caso a narrativa da série de jogos Assassin’s Creed, muito popular entre
adolescentes, na qual se desdobram temas como a castração, a filiação e a trans-
missão.
Palavras-chave: videogame, adolescência, filiação, castração.
HUNGRY GAMERS
Abstract: The present text brings a short introduction to the universe of electronic
games, also known as video-games, very popular in contemporary culture, but not
so much in psychoanalytic writings. Starting from a recurring fact in the clinic – the
massive use by many patients, especially teenagers, of these games –, it intends
to interrogate its possible function in the adolescent passage. For that matter, it
takes as a case the narrative of the game series Assassin’s Creed, very popular
amongst teenagers, in which themes such as castration, filiation and transmission
are unfolded.
Keywords: video-game, adolescence, filiation, castration.
1
Trabalho apresentado na Jornada de Abertura da APPOA: Discursos a flor da pele, abril de
2014, em Porto Alegre.
2
Jornalista e psicanalista, Membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA); colu-
nista do caderno PrOA do jornal Zero Hora. E-mail: p_gleich@yahoo.com
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uma categoria de jogos que se vale, assim como os jogos de azar, das fra-
quezas humanas para capitalizar. Mas não é sobre esse aspecto que gostaria
de me debruçar neste momento, e, sim, deslocar a análise para o conteúdo
dos jogos. Como é um universo muito amplo, gostaria de tomar como recorte,
a partir de um jogo como caso, uma interrogação sobre o papel dos jogos na
cada vez mais prolongada travessia da adolescência.
A adolescência tem essa característica de ser igual e diferente a cada
geração. Igual em termos da operação subjetiva que nela se opera, diferen-
te nas roupagens que ela assume. Trata-se de um período de necessária
ruptura com o heimlich, que, para o adolescente, passa a ser cada vez mais
unheimlich2. São frequentes as queixas dos pais sobre “essa adolescência
de hoje”, que não entendem, esquecendo-se de que é essa justamente uma
das marcas da adolescência: fazer-se não ser entendido por eles, habitar um
universo estrangeiro, procurar significantes que os representem para outros
significantes que não os familiares.
A queixa dos pais sobre o que os filhos fazem – por exemplo, ficar tran-
cado no quarto, jogando videogames – comporta a nostalgia da própria ado-
lescência, carregada de tintas mais brilhantes graças ao recalque, mas tam-
bém a ferida narcísica, por seus filhos não fazerem o que faziam ou, no mais
das vezes, aquilo que gostariam de ter feito em sua própria adolescência.
Por que não encontram mais os seus amigos na rua? Por que não vão mais
a festas e eventos sociais, por que não lêem mais, por que não se dedicam
a algo criativo e produtivo? Enfim, a pergunta de muitos pais é a tradução de
sua inconformidade com o fato de seus filhos não gozarem segundo suas ex-
pectativas. Dificilmente um pai vai se queixar de seu filho por ele passar muito
tempo lendo ou praticando esportes, mesmo que essas atividades ocupem
as mesmas horas que os jogos. Há um desconhecido nesse mundo habita-
do pelo filho que produz um estranhamento, que dentro do heim introduz o
estranho.
Mas o que será que os adolescentes encontram nesse universo ao qual
se dedicam com tanto afinco? Não podemos nos contentar em simplesmente
colocar o videogame na série dos gadgets da lógica capitalista para positivar
2
Heimlich em alemão significa caseiro, familiar; unheimlich, seu contrário: estranho, estrangeiro.
Esse último termo, conforme Freud trabalha em O estranho ([1919]1982), comporta também seu
contrário, sendo portanto um estranho familiar.
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o objeto e com isso tamponar a falta e a angústia que ela evoca. Penso que
ambas as dimensões dos videogames, por um lado o jogo, por outro a narra-
tiva, são elementos importantes na passagem adolescente.
Lembremos alguns elementos disso que se convencionou chamar ado-
lescência. Contardo Calligaris (2001) resgata, em seu livro sobre a adoles-
cência, o termo “moratória”, de Erik Erikson. Os adolescentes são prisioneiros
desse limbo entre infância e vida adulta, sem que nem eles, nem seus pais
saibam como e quando conseguirão sair dele. Por um lado, os pais esperam
que seus filhos tenham sucesso e sejam autônomos, por outro, têm cada vez
mais dificuldades em sustentar os ensaios – e frustrações – necessários para
que isso seja possível. Dizem “vai”, mas mantêm a rédea curta, seja com res-
trições, seja com a sedução do conforto de permanecer mais um pouquinho
no quentinho do lar. Exigem crescimento e independência, mas demandam
que as coisas não mudem muito, gozam com a condição de dependência dos
filhos (e sua própria destes, claro). Assim, a saída de casa, real ou metafori-
camente, vai se estendendo ad infinitum, às vezes fazendo com que pais e
filhos saiam da casinha. Ninguém sabe muito bem quando termina essa mo-
ratória, não há regras ou rituais que estabeleçam um momento de “virada”. O
trabalho de produzir a passagem à adultez recai sobre o adolescente, perdido
entre a nostalgia da infância, sustentada também pelos pais, e pelo ideal de
realização – profissional, amorosa – que talvez lhe garantiria a condição de
“adulto independente”.
Já não são mais considerados crianças, ainda não têm os direitos dos
adultos, e não sabem muito bem quando de fato isso acontecerá. Enquanto
isso, tentam desdobrar as questões que esse tempo lhes coloca: o que é ser
homem ou mulher? Quais são os limites e possibilidades desse corpo dife-
rente e dessa condição que começa a se inaugurar com o fim da infância?
Enfim, se recolocam a pergunta sobre a castração – essa mesma pergunta
que, antes, na infância, as crianças vão tentar, também na brincadeira e na
fantasia, desdobrar. Porém, não valem mais as respostas dos pais ou de
quem até então ocupava lugar de saber. Vão procurá-las em novos ideais,
nas identificações com seus pares, nas tribos, nos livros, jogos, músicas e...
nos videogames. Não à toa são jogadores tão vorazes – mas não apenas
jogadores: também leitores, espectadores, navegadores, namoradores. Ten-
tam construir com aquilo a que têm acesso ficções que lhes darão suporte
para entender e ingressar na tal “vida adulta”, já que ninguém responde satis-
fatoriamente a essa pergunta, e que as respostas familiares vêm carregadas
com o peso das paixões edípicas e narcísicas que ambientam o lar.
Junto com a reedição do complexo de Édipo, o adolescente também
reedita o movimento exploratório da primeira infância, quando os bebês ad-
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quirem autonomia para se deslocar. Essa nova autonomia, mesmo que re-
lativa, aliada à necessidade de explorar outros cômodos que não os bem
conhecidos do Heim3, os leva a percorrer caminhos até então desconhecidos,
caminhos estrangeiros aos da família, não raramente produzindo nos pais o
mesmo assombro que provocam os bebês que se aproximam de lugares “pe-
rigosos” da casa ou do entorno. Essa exploração não se restringe, evidente-
mente, ao espaço físico. O afã exploratório encontra um de seus lugares nos
jogos: em muitos é possível explorar mundos, mais ou menos fantásticos,
sem necessariamente seguir uma missão ou linha narrativa preestabelecida.
São os universos virtuais chamados “mundo aberto” ou “caixa de areia” –
uma alusão à possibilidade de criação de pequenos mundos da infância. O
GTA V, que citei no início, é um deles: reproduz uma versão fictícia de Los
Angeles, com vários bairros – dos mais ricos aos mais pobres –, nos quais
é possível circular livremente, interagir com os transeuntes, observar cenas
cotidianas que se desenrolam ao redor.
Explorar a cidade e suas possibilidades de encontro, seus perigos e
novidades é cada vez atividade mais restrita, quando não impossibilitada nos
centros urbanos, não só do Brasil. A ameaça da violência ligada ao imaginário
paranoico em torno do espaço comum restringe cada vez mais sua circulação
aos espaços vigiados, de certa forma ainda sob o olhar dos pais – o clube, o
shopping, as festas às quais são levados e trazidos. Não que isso seja cau-
sa da afinidade à exploração de universos virtuais; além disso, é importante
situar que esses são geralmente mais diversos, mais fantásticos que as vizi-
nhanças às quais teriam acesso. Em alguns jogos com essa característica,
é possível inclusive fazer contato com outros jogadores, trocar estratégias e
recursos, encontros e desencontros, fazer amigos. O mundo virtual – e aqui
não apenas os games – oferece uma certa solução de compromisso entre as
demandas de pais e seus filhos: o adolescente segue sob o olhar dos pais
(para tranquilidade destes), mas também longe, porque eles não sabem mui-
to bem o que seu filho está fazendo ali.
A adolescência entra pelos olhos, como lembra Ricardo Rodulfo (2004),
o que aponta para a preponderância do imaginário nesta época de tantas
reedições – do Édipo, do estádio do espelho, da relação com o Outro. O
3
“Lar”, em alemão. Ver nota anterior.
141
semblante está em jogo de uma forma inédita, o que se evidencia pelas al-
terações na forma do vestir, do falar, do comportamento... Daí a voracidade
dos adolescentes por tudo que é da ordem das aparências, para revestir a
fragilidade simbólica e órfã do Outro familiar, enquanto buscam avidamente
novos discursos, que lhes deem sustentação após a queda que sofreram.
Mas não é só de rupturas que tratam os games: eles também põem em
cena a continuidade, já que esses jogos não são deixados para trás com os
outros brinquedos da infância. Assim como filmes e músicas, também os ga-
mes são apreciados desde os primórdios: mudam os estilos e os gostos, mas
segue-se jogando. Há adolescentes que pertencem a uma segunda geração
de gamers, para os quais jogar não está em descontinuidade com o familiar,
pelo contrário: é um elo lúdico entre gerações, assim como tradicionalmente
são os esportes, como o futebol ou outra atividade cultural da qual se com-
partilha, como um certo traço de pertença. Um paciente que decide tornar-se
desenvolvedor de jogos diz que teve contato com o videogame “no colo do
pai”...
Enfim, esses são só alguns elementos para pensar a complexidade
das relações possíveis entre adolescentes e videogames. Para adentrar
um pouco mais nesse território, trago como “caso” Assassin’s Creed, uma
popular série de jogos que conta com vários títulos, e que também se es-
tendeu para outras mídias: existem livros e quadrinhos, curtas-metragens
de animação, há um filme em estado de produção. A saga foi desenvolvida
para o público adulto, mas acabou se tornando muito popular entre adoles-
centes. São histórias que se passam simultaneamente em dois tempos, no
presente e no passado, porém com vistas ao futuro: há uma missão a ser
cumprida, nada menos que o futuro da humanidade está em jogo.
A série narra a luta milenar entre duas ordens adversárias: de um lado
os “assassinos”, do outro os “templários”. O personagem principal da saga
pertence à ordem dos assassinos, originária da união dos deuses com huma-
nos – como os pais idealizados da infância, semi-deuses. Os assassinos – os
“mocinhos” – são defensores da liberdade dos humanos, já os templários
lutam pelo controle dos sujeitos através da dominação e da opressão. Os
templários são, no mundo moderno, dirigentes políticos e de grandes corpo-
rações, elemento bem afim às narrativas contemporâneas.
O personagem principal, presente em todos os jogos da saga, é Des-
mond Miles, um descendente dos assassinos que vive nos dias de hoje. Des-
mond foi criado em uma fazenda isolada do resto do mundo, treinado para
seguir o destino familiar de lutar contra os templários. Aos 16 anos, porém, se
rebela contra a situação em que vive: crê que aquilo tudo é uma bobagem,
considera seus pais paranoicos, quer ver como é o mundo “de verdade”.
142
Abandona o lar e se muda para Nova Yorque, esse lugar onde “ninguém me
conhece, posso ser o que quiser”. Mas o sossego do desgarramento não é
duradouro: alguns anos depois, é obrigado a se reencontrar com suas ori-
gens quando é capturado por templários. Estes querem obter, através da
“memória genética” de Desmond, informações sobre como obter as “peças
do Éden”, artefatos criados pelos deuses, que têm o poder de controlar a
humanidade – enfim, o próprio falo materializado. É esse o objeto da disputa
entre ambas as ordens ao longo de toda a história. Quem o detém, pode fazer
uso dele para sua causa, seja ela a defesa das liberdades individuais ou a
dominação dos sujeitos.
Nas mãos dos templários, Desmond é conectado a uma máquina cha-
mada Animus, como vocês sabem, “alma” em latim. Esse dispositivo per-
mite acessar informações de seus ancestrais, que estão gravadas em seu
DNA. Mas não são meros dados genéticos que ele contém, é a história dos
antepassados que está gravada, de forma indelével, no corpo dele. Através
do Animus, Desmond pode reviver essas histórias, experienciá-las. No início
tem medo de revivê-las, as bloqueia. Mas ao longo do processo vai também
voltando a se conectar com seu passado, com a história que havia renegado
ao deixar para trás a família.
A maior parte do jogo é justamente dedicada à revivescência dessas
memórias: o jogador encarna, em cada título da série, um antepassado de
Desmond, na época histórica em que aquele viveu. Depois de iniciado o pro-
cesso, acessar e reviver as memórias passa a não ser mais apenas para
obedecer a seus captores, e com isso manter-se vivo. Desmond se vê toma-
do pelas lembranças, que pouco a pouco se confundem com sua vida atual e
reescrevem sua história. Passa a querer se apropriar da história de seus an-
tepassados, para poder libertar-se dessa “carga” que corre em seu sangue,
mesmo contra sua vontade. Já não há volta atrás para o estado de tranquila
ignorância que vivia quando deixou a casa dos pais.
Será a semelhança com uma análise mera coincidência? A máquina
com a qual ele acessa suas memórias é, inclusive, semelhante a um divã.
Enquanto mergulha em suas revivescências, é acompanhado por uma com-
panheira que monitora silenciosamente o resgate de suas memórias, apenas
ocasionalmente fazendo-se ouvir para o ajudar a entender aquilo que ele está
acessando.
A narrativa de Desmond se reduplica na narrativa de seus antepas-
sados, ambos – Desmond e seu ancestral – passam por um processo de
apropriação de sua história. Penso que essa estrutura é paradigmática da
passagem adolescente: vai de um primeiro momento em que os persona-
gens vivem uma determinada relação com a casa, a família, a cidade, para
143
144
145
Não é certamente sinal de saúde que uma sociedade seja tão ob-
cecada pelos significantes do próprio passado, preferindo exorcizá-
los e mantê-los indefinidamente vivos como fantasmas, a dar-lhes
sepultura, e que ela tenha tanto medo dos significantes instáveis do
presente a ponto de não conseguir enxergá-los senão como porta-
dores da desordem e da subversão. […] por isso, os adultos que se
servem dos fantasmas do passado apenas como espantalho para
impedir que as próprias crianças se tornem adultos, e que se ser-
vem das crianças apenas como álibi para encobrir a própria incapa-
cidade de enterrar os fantasmas do passado, é preciso lembrar que
a regra fundamental no jogo da história é que os significantes da
continuidade aceitem trocar de lugar com os significantes da des-
continuidade, e que a transmissão da função significante é mais
importante que os próprios significados (Agamben, 2008, p.106).
146
REFERÊNCIAS
AGAMBEN, Giorgio. O país dos brinquedos: reflexões sobre a história e sobre o jogo.
In:_______. Infância e história: destruição da experiência e origem da história. Belo
Horizonte, UFMG: 2008.
CALLIGARIS, Contardo. Adolescência. São Paulo, Publifolha: 2001.
FREUD, Sigmund. Das Unheimliche [1919]. In:______. Studienausgabe, Bd. IV. Psy-
chologische Schriften. Frankfurt am Main: Fischer, 1982.
LACAN, Jacques. O seminário, livro 18: de um discurso que não fosse semblante
[1971]. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor: 2009.
RODULFO, Ricardo. El psicoanálisis de nuevo. Buenos Aires, Eudeba: 2004.
Recebido em 30/03/2015
Aceito em 24/07/2015
Revisado por Joana Horst
147
O ATENDIMENTO DE UMA
TEXTOS FAMÍLIA: da privatização do dano
à palavra e ao efeito da escrita1
Jorge Broide2
1
Trabalho apresentado nas Jornadas Clínicas da APPOA: Corpo e discurso em psicanálise, em
novembro de 2014, em Porto Alegre.
2
Psicanalista, analista institucional, membro da APPOA, professor do Curso de Psicologia da
PUC/SP, da Escola de Sociologia e Política de São Paulo e do Centro de Estudos Psicanalíticos.
Mestre em Psicologia Clínica pela PUC de Campinas e Doutor em Psicologia Social pela PUC
de São Paulo. Autor de Psicanálise nas situações sociais críticas: violência, juventude e periferia.
Uma abordagem grupal (Juruá Editora Psicologia), entre vários artigos publicados em diferentes
livros e revistas. Coordenador da Coleção Biblioteca Juruá Práxis Psicanalítica da Juruá Editora
Psicologia. E-mail jorgebro@uol.com.br
148
I Introdução
C “ ena 9 – Ler, escrever, contar, falar. Nazira (avó de Nawal) está morrendo.
Nazira: Nawal! (Nawal, de 16 anos, vem correndo)
Segura minha mão! Nawal!
Nawal, tem coisas que a gente tem vontade de dizer no momento da
morte. Coisas que a gente gostaria de dizer às pessoas que a gente amou,
que nos amaram... dizer a elas... para ajudá-las uma última vez... armá-las
para a felicidade!... Faz um ano já, uma criança saiu do teu ventre e desde
então você anda com a cabeça nas nuvens. Não caia, Nawal, não diga sim.
Diga não. Recusa. Teu amor foi embora, tua criança foi embora. Ele fez um
ano. há apenas alguns dias. Não aceita Nawal, não aceita nunca. Mas para
recusar é preciso saber falar. Então se arma de coragem e trabalha duro! Es-
cuta o que uma velha mulher que vai morrer tem pra te dizer: aprende a ler,
aprende a escrever, aprende a conta, aprende a falar. Aprende. É a tua única
chance de não se parecer conosco. Promete isso pra mim.
Nawal Te prometo.
Nazira: Vão me enterrar daqui a dois dias. Vão me colocar na terra, com
a cara virada pro céu, sobre o meu corpo eles vão lançar um balde d’água,
mas eles não vão marcar nada sobre a pedra, pois nenhum deles sabe es-
crever. Você, Nawal, quando você souber, volta e grava meu nome sobre
a pedra: “Nazira”. Grava meu nome, pois eu cumpri as minhas promessas.
Estou indo embora Nawal. Para mim, está terminando.
Nós todas, nossa família, as mulheres de nossa família, estamos presas
numa teia de raiva há tanto tempo: eu estava com raiva da tua mãe e tua
mãe estava com raiva de mim e também de você, você está com raiva da tua
mãe. Você também vai deixar pra tua filha a raiva como herança. É preciso
quebrar o fio. Então aprende. Depois vai embora. Pega a tua juventude e
toda a felicidade possível e deixa a aldeia. Você é o sexo deste vale, Nawal.
Você é a sensualidade dele e o cheiro dele. Leva com você e te extirpa disso
aqui como a gente é extirpada do ventre da mãe. Aprende a ler, a escrever, a
contar, a falar: aprende a pensar. Nawal. Aprende!” (Mouawad, 2013)
II O caso
149
150
crises disse-me que não voltaria mais, e não voltou. Segui atendendo a mãe
e a irmã, que mora em São Paulo, e esporadicamente, outros membros da
família.
A mãe relata que o filho mais velho havia sido morto pela polícia (pela
equipe do DOI CODI, de Sérgio Paranhos Fleury), numa emboscada, no
período da ditadura. A família não falava do crime. Tinham muito medo, até
pelo fato de serem estrangeiros. Quando seu filho foi assassinado no meio
da rua com dezessete tiros, desarmado e com o corpo jogado no porta-malas
de um carro, seu filho menor (meu analisante) tinha cinco anos. O mais velho
era adorado por ele. Nunca falaram sobre o caso. No dia da morte, quando
apareceu a foto do irmão na televisão anunciando que haviam matado um
“terrorista”, o pai o levou ao quarto e disse: “dorme”.
A mãe começa a falar sobre seu filho morto: “Doutor, o senhor está me
fazendo falar e me fazendo chorar depois de 40 anos...” Fala da injustiça e do
que a família passou quanto a humilhação e acusações. Diz que tinha muito
medo, eram vigiados. A filha maior (na época com 14 anos) relata nas ses-
sões como era seguida no ônibus todos os dias, quando ia para a escola. A
mãe queria preservar os filhos. Traz à consulta, inclusive, uma carta de des-
pedida do filho quando este estava na clandestinidade, dizendo que tentaria
sair do país indo para algum país da América Latina. Os outros filhos e netos
souberam somente agora da existência dessa carta. Pergunto a ela se quer
justiça. Ela quer, e o processo se inicia. Ela relata que havia recebido uma
indenização por parte do Estado a partir de uma ação que o ex-marido havia
ganho, quando do início do processo de reparação dos crimes da ditadura.
Havia recebido uma quantia em dinheiro.
Ligo para Paulo Vannuchi, ex-ministro de Direitos Humanos do Gov-
erno Lula. Ele imediatamente acolhe o caso e recebe algumas vezes a mãe.
Inicia-se um lento caminho de elaboração, até que ele propõe que se realize
no consultório um encontro entre a família e os companheiros sobreviventes.
Surpreendentemente, ele havia sido da mesma célula que o rapaz (ele e mais
dois que ficaram presos por muitos anos). Do encontro participaram a mãe,
as duas filhas e o filho de uma delas. Um dos resultados do encontro é a
decisão da família, por sugestão de Paulo Vanucchi, de entrar com o pedido
de anistia política, sem reparação financeira, junto à Comissão de Anistia do
Ministério de Justiça.
A cerimônia se deu há cerca de um ano, no auditório da Faculdade de
Educação da USP, com a presença do Reitor, do ex-diretor do Colégio de
151
IV A força da teoria
152
V Concluindo
Quando a mãe do jovem assassinado foi falar com o psicólogo que aten-
dia a família, ele disse que era melhor não comentar sobre o caso com o en-
tão menino, agora paciente. O padre lhe dissera que ela não deixava o filho ir
embora. A psicanálise nos diz que é através do ato analítico que o luto pode
ser elaborado, e que, nesse caso, o luto tem que ser público e na letra da lei,
na escrita, que faz litoral entre o íntimo e o público. Anistia é a palavra escrita
na lápide de Nazira. Nawal, agora uma velha senhora de 80 anos, com a letra
da anistia inscrita na lápide de seu filho, coloca a si e a sua família na cultura.
Agora o morto pode ir embora.
153
REFERÊNCIAS
BRASIL, V. Vital. Dano e reparação no contexto da Comissão da Verdade: a questão
do testemunho. Revista anistia política e justiça de transição. Governo Federal. Minis-
tério da Justiça, jan.-jun. 2009.
FREUD, S. Duelo y melancolia [1917]. In ______. Obras completas. Buenos Aires:
Amorrortu Editores, 1986, Vol. XIV.
LACAN, J. O seminário, livro 18: de um discurso que não fosse semblante [1971]. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
MOUAWAD, W. Incêndios. Tradução de Angela Leite Lopes. Rio de Janeiro: Cobogó,
2013.
Recebido em03/04/2015
Aceito em 09/05/2015
Revisado por Clarice Sampaio Roberto
154
ENTREVISTA
FREUD, NOVA VERSÃO1
Elisabeth Roudinesco
1
Tradução da entrevista: Patricia C. Ramos Reulliard, professora da UFRGS.
155
155
APPOA: Qual foi o método de trabalho que você utilizou para esta
biografia?
Roudinesco: Na verdade, eu decidi, por assim dizer, “desinterpretar”
completamente todas as interpretações psicanalíticas sobre Freud.
Isso porque, de um lado, havia a representação de um monstro feita
pelos antifreudianos radicais. Para eles, Freud tinha se tornado um nazista,
um incestuoso, que dormia com sua irmã, um marido horrível, um fascista.
Enfim, é esse o tipo de imagem fabricada nesse discurso e no Livro negro da
psicanálise, de Catherine Meyer. Em quinze anos de batalha freudiana, aca-
baram por fabricar um estereótipo totalmente negativo de Freud, totalmente
inexistente. E, do outro lado, os psicanalistas contrapunham a isso uma visão
completamente engessada de Freud, que continuava sendo o Freud da ju-
ventude deles, o de Jones.
A isso se adicionam todas as interpretações das escolas analíticas. Há
uma visão ferencziana de Freud, uma kleiniana, uma lacaniana, seja de sua
vida ou de sua obra. Os lacanianos, por exemplo, têm uma tendência a ver
nele e a lhe atribuir os conceitos lacanianos. Assim como os kleinianos ten-
dem a considerar que Freud teve uma infância terrível, ou seja, uma infância
kleiniana. Eles são pré-edipianos. Eles forçaram... Eu diria que eles têm uma
visão a-histórica de Freud.
Na verdade, essa é a característica comum a todas essas correntes:
elas têm uma visão a-histórica de Freud, uma visão psicanalítica, e interpre-
tam sua obra e sua vida em função da perspectiva psicanalítica que adotam.
Por exemplo, os partidários de Ferenczi estão convictos de que Freud foi
molestado em sua infância por sua avó. Digo mais: algumas revisões foram
feitas pelas escolas analíticas, que adoram Freud, mas que interpretam sua
vida e obra em função dessas representações.
Viu-se isso também com os grandes pacientes de Freud. Existe, para
o homem dos lobos, uma interpretação kleiniana de que ele era psicótico,
156
uma neofreudiana de que era neurótico, uma lacaniana, e assim por diante.
E ninguém sabe quem é o verdadeiro homem dos lobos. Não sabem quem é
Serguei Pankejeff. Interpretam-se os casos e repetem-se há anos os grandes
casos de Freud, mas os outros continuam desconhecidos.
Tampouco se conhece a vida de Freud. Os psicanalistas não conhecem
nada: eles apenas repetem as coisas já conhecidas. E reproduzem boatos.
Por exemplo, até hoje, há psicanalistas certos de que, chegando aos Estados
Unidos, Freud disse: “Eles não sabem que lhes trazemos a peste”. Isso foi
inventado por Lacan! Pode ser engraçado, mas ao mesmo tempo é grave,
pois por essa mesma lógica também disseram que, ao deixar a Áustria, Freud
teria declarado: “Eu recomendo a Gestapo a todos!” Ele jamais escreveu tal
coisa, isso é impossível: assinar um papel e zombar da Gestapo não é Freud.
Esse boato se espalhou. Há também outros rumores. Sobre sua cunhada,
por exemplo. Os psicanalistas dizem que não é relevante saber se Freud teve
ou não um caso com a cunhada. Por que não é relevante? Claro que é! Se
Freud mentiu sobre sua sexualidade, isso é perturbador! Ora, ele não mentiu:
basta ler sua correspondência para saber.
E, no mais, os psicanalistas não leram, ou leram muito pouco, a corres-
pondência de Freud. Eles vão buscar nessa correspondência o que confirma
suas ideias. Ao invés de ler Freud com um novo olhar – procurar saber quem
era, como agiu, etc. –, lê-se a sua obra a partir de uma perspectiva psicana-
lítica preestabelecida. Então, por exemplo, isso também leva à ideia de que
“Freud fez uma autoanálise”. Mas não! O próprio Freud diz “minha autoaná-
lise com Fliess”. Quando lemos as cartas, não há autoanálise: Freud explora
as teorias de Fliess, e depois as deixa de lado.
Existem ainda lendas psicanalíticas sobre o malvado Breuer, que não
compreendeu nada da sexualidade, e o Freud bonzinho, que compreendeu
tudo. Em que mundo?! Breuer compreendeu perfeitamente bem, porém não
tinha a mesma concepção de Freud.
E para tudo é assim. Outro exemplo são as discussões sobre a gênese
da pulsão de morte. Ela viria da guerra? Viria da morte de sua filha? Freud
já tinha respondido que ela não veio de nada disso, mas que era algo que
estava no ar. Porém, cada escola psicanalítica explica: sua filha morreu, logo,
a pulsão de morte. Houve a guerra, logo, a pulsão de morte. Não, não e não!
A pulsão de morte foi progressiva: era uma teoria que já existia e Freud gra-
dativamente elaborou essa noção a partir dos anos 1913-14, em um debate
com Sabina Spielrein. Não foi por acaso.
Tudo é percebido assim entre os psicanalistas: em dado momento,
Freud inventa algo do nada. Foi assim com a homossexualidade. Freud não
tem absolutamente nenhuma teoria da homossexualidade. Ele muda cons-
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normal que uma criança fosse um perverso polimorfo. Foi principalmente isso
que causou polêmica. E quando se afirma que ele foi o primeiro a discutir
a sexualidade infantil... Bom, existem mil livros sobre a sexualidade infantil
contemporâneos a Freud. Há psicanalistas que creem que ele foi o primeiro.
Mas não! Ele apenas fala diferente. Aliás, ele fala de tudo de forma diferente.
Porém, ele fala do que se falava em sua época. De toda forma, é interessan-
te. É verdade que essas histórias são fascinantes. Com efeito, mostro que,
a partir dos anos 1920, o freudismo clássico é questionado pelas teorias
kleinianas, mas também mostro como Freud se defende, como participa das
discussões. Ele pode ser dogmático outras vezes, mas, nesse caso, ele se
opõe a Melanie Klein com argumentos – e não apenas para defender sua
filha. Ele diz: “não se pode analisar as crianças na primeira infância, porque
seu inconsciente não está formado; portanto, é perigoso”. Ele não estava
errado. No entanto, não ganhou essa batalha. Em outras palavras, as teo-
rias kleinianas se impuseram para analisar as crianças na primeira infância
com a técnica da massa de modelar, entre outras. Nessa fase, ao invés de
analisar diretamente as crianças, Freud acreditava ser necessário fazê-lo
por intermédio dos pais. O caso do pequeno Hans, por exemplo, mas não
apenas este.
Todos analisavam os próprios filhos na época. Eles se questionavam
muito. Jones fez seus filhos serem analisados por Melanie Klein, os filhos de
Melanie Klein foram analisados pela própria. É preciso dizer isso e é o que
eu faço. E, na verdade, havia um questionamento geral. Hoje, o que se her-
dou disso? Para mim, tanto Freud quanto Melanie Klein tinham razão. Hoje
sabemos que o inconsciente das crianças não está formado, não se deve
fazer interpretações a qualquer custo. Nisso Freud estava certo. Não se pode
identificar o autismo aos três meses de idade, não é algo evidente. Porém,
ao mesmo tempo, a genialidade de Melanie Klein foi dizer: “Atenção, é pre-
ciso tratar das crianças o mais cedo possível, não se deve esperar”. Então,
atualmente, deve-se tanto a Anna Freud – com suas nurserys, suas clínicas
para as crianças – quanto a Melanie Klein, que considerava ainda assim que
a mãe era perigosa. Em outras palavras, em 1920, abandona-se o assassi-
nato do pai pela onipotência da mãe. Essa não é a posição de Freud, mas
as duas são interessantesPortanto, eu exponho que se herda uma dialética
permanente de combate no interior do movimento psicanalítico, e que não se
deve ser dogmático. Eu narro a fundo esses anos que são muito envolventes.
Depois, em seguida, trato do período nazista, de como Freud não previu
o perigo para a Áustria, como ele não queria ver. Ele não acreditava na ane-
xação da Áustria pela Alemanha. Durante muito tempo, negou essa possibi-
lidade. Pensava que a Igreja católica e que o governo austríaco iam resistir.
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amor pelos animais, seu consumo de cocaína durante um longo período. Ele
é muito fascinante.
Atualmente se conhece quase tudo sobre sua vida, então fiz uma esco-
lha e me dei conta, antes de escrever o livro, de que mais ninguém conhecia
Freud, que ele estava recoberto de camadas e que ninguém o conhecia re-
almente. Que ninguém conheça a vida de Lacan, isso é aceitável. Não havia
nada, a minha biografia foi a primeira. Mas que ninguém conheça a vida de
Freud em 2010... Era preciso voltar a ele novamente. É isso. Portanto, não
posso afirmar que prefiro Freud a Lacan. É mais fácil, é um clássico. E quan-
do converso com historiadores, Freud está no panteão da cultura ocidental
para as pessoas sérias, e não Lacan. São casos muito diferentes: Lacan é
um moderno; Freud, um clássico.
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res e ter uma relação amorosa com Anna. Elas vivem juntas a vida inteira
e Anna cria os filhos de Dorothy. E o que Freud diz disso? Diz que é uma
família a mais então. Há também a família ampliada de seus discípulos, e
a grande amiga de Freud, Lou-Andreas Salomé. Existe uma linda troca de
cartas entre ela e Anna. Nelas, Anna conta as dificuldades que enfrenta em
sua análise. Enfim, hoje em dia tudo isso é conhecido e é o que precisa ser
reavivado.
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sofre por isso, pois... enfim. Então, logo após, apoiou o nazismo. Bem, ele
era antissemita, mas não de maneira perceptível. Freud havia notado que
Jung era antissemita, mas não se preocupa muito antes de 1914. Discorro
longamente sobre isso. Depois isso se torna impossível. No entanto, Freud
queria sair do gueto vienense, do gueto judeu. Seu sonho era que um não
judeu encabeçasse o movimento.
Quem ocupa o lugar de Jung é Jones, que será o discípulo mais político
de Freud. Ele mantém uma distância: na verdade, Jones serve muito mais a
uma causa do que a um homem. Dessa forma, ele é capaz de criticar Freud.
Diversas vezes aponta seus erros. Por exemplo, a respeito do nazismo, Jo-
nes é muito mais lúcido. Ele colabora, mas é muito mais consciente. Ele está
convencido de que a Áustria será anexada. Tem certeza, em 1914, de que os
aliados ganharão a Guerra e Freud duvida disso, convencido de que os impé-
rios são eternos. Em 1915, a coisa piora. Jones diz que o futuro da psicaná-
lise será na Inglaterra ou nos Estados Unidos. Freud diz que não é verdade.
Jones é pragmático, político; ele se envolve muito com o movimento. É muito
mais eficaz do que Jung.
Há, ainda, Ferenczi e Rank, que são os dois filhos queridos. Freud gosta
muito deles. Ele gosta de todo mundo. Existia muito carinho entre eles. É uma
linda história.
Já Lacan não tem nada a ver. Ele não é nem um pouco parecido. São
outros quinhentos. Realmente, é a querela dos antigos e modernos. De certa
forma, podemos dizer que a vida de Lacan se parece muito mais com a de
Marguerite Duras.
É isso!
171
RECORDAR,
REPETIR, INTRODUÇÃO DO NARCISISMO1
ELABORAR
Sigmund Freud
Clássicos a gente lê e relê. Isso é coisa para quem talvez esteja num
momento de se dirigir a referências de base ou numa posição que não é bem
a mesma de outrora. É também, como neste caso, para quem de início sen-
tiu falta de fundamentação nas mal traçadas linhas em que Freud anuncia o
principal da paranoia a Fliess, ou gente que não esperava que Jung botasse
em suas mãos o livro de Schreber e o levasse a incubar por alguns anos a
escrita que ia se tornar, desde 1914, um marco em sua obra.
Como clássico, Zur Einführung des Narzissmus, de S. Freud, insta a
leitura. Se o leitor de língua portuguesa, instigado por este clássico, resolve
não seguir Lacan e decide, portanto, não ler este texto em alemão, quais
alternativas tem? A primeira é partir para uma versão em português. Qual
cuidado requer então a apresentação de tal versão deste texto de Freud? O
de que ela passe pela prevalência de uma espécie de antídoto a rompantes
narcísicos: o enquadre institucional.
Cerca de cem anos depois de ter sido escrito, Introdução do narcisismo
vem a público através da APPOA, em português. No quadro desta instituição,
três tradutores dirigiram seu olhar à literalidade deste escrito: uma alemã,
um bilíngue e um brasileiro. Criaram-se, nesse meio de cultura, as condições
1
Texto originalmente publicado em 1914. Título original: Zur Einfürhung des Narzissmus. Tra-
dução de Luís Fernando Lofrano de Oliveira, Max de Araujo Götze e Sofia Schneider, publicado
pela APPOA em 1995.
172
para que esta tradução fosse realizada. Associados ao pé da letra, entre ca-
fés, tensões e risadas, estes tradutores revezaram-se no que precisava e
persistiram em reunir olhares heterogêneos para fazer o texto em português
prevalecer a diversidades, desencontros e pequenas diferenças. O resultado
de tal associação é o texto que se segue.
2
O. Rank (1911).
173
3
Verifique, para estas exposições, a discussão do “fim do mundo” na análise do senador Schre-
ber.
174
4
Vide os parágrafos correspondentes em meu livro Totem e tabu
5
Vide Ferenzci (1913a)
6
Há dois mecanismos deste fim do mundo: quando todo o investimento de libido flui sobre o
objeto amado e quando todo investimento reflui ao eu.
175
uma energia não sexual das pulsões do eu? A fundamentação de uma ener-
gia psíquica unitária não economizaria todas as dificuldades da separação
de energia pulsional do eu e libido do eu, libido do eu e libido de objeto? So-
bre a primeira questão observo: é uma suposição necessária a de que uma
unidade comparável ao eu não existe de início no indivíduo; o eu deve ser
desenvolvido. Mas as pulsões autoeróticas são primordiais; algo deve então
acrescentar-se ao autoerotismo, uma ação psíquica nova, para configurar o
narcisismo.
A convocação a responder à segunda pergunta de maneira resoluta
deve despertar em cada psicanalista um notável mal-estar. Defendemo-nos
contra o sentimento de abandonar a observação por querelas teóricas es-
téreis, porém não podemos nos subtrair da tentativa de um esclarecimento.
Certamente representações como a de uma libido do eu, energia pulsional do
eu e assim por diante não são nem especialmente apreensíveis de maneira
clara, nem suficientemente ricas em conteúdo; uma teoria especulativa das
relações em questão quereria antes de tudo obter um conceito precisamente
circunscrito para sua fundamentação. Apenas suponho que isto é justamente
a diferença entre uma teoria especulativa e uma ciência construída sobre a
interpretação da empiria. A última não invejará da especulação o privilégio
de uma fundamentação lisa, logicamente incontestável, porém de bom grado
contentar-se-á com pensamentos básicos pouco representáveis, que desa-
parecem nebulosamente, os quais ela espera apreender mais claramente no
curso de seu desenvolvimento e, eventualmente, também está pronta para
trocá-los por outros. Estas ideias não são pois o fundamento da ciência, so-
bre o qual tudo repousa; este é, antes de tudo, somente a observação. Tais
ideias não são o alicerce, mas a parte superior de toda construção, e podem
sem dano ser substituídas e desmontadas. Vivenciamos o mesmo em nossos
dias novamente na física, cujas concepções básicas sobre matéria, centros
de força, atração e assim por diante são pouco menos precárias do que os
correspondentes da psicanálise.
O valor dos conceitos de libido do eu e libido de objeto está em que
provêm da laboração dos caracteres íntimos de processos neuróticos e psi-
cóticos. A separação da libido em uma própria do eu e uma atrelada aos
objetos é uma continuação indispensável de uma primeira suposição que
separou pulsões sexuais de pulsões do eu. Ao menos a análise das neuroses
de transferência puras (histeria e compulsão) me obrigou a isto, e sei apenas
que todas as tentativas de dar conta destes fenômenos por outros meios fun-
damentalmente fracassaram.
Na falta total de uma teoria da pulsão que, de algum modo, oriente, é
permitido, ou melhor, indicado primeiramente submeter qualquer suposição
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178
II
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7
Conforme Sobre os tipos de adoecimento neurótico (1912c)
181
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III
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em seu juízo, procura reconquistá-la na forma nova do ideal do eu. O que ele
projeta à sua frente como seu ideal é o substituto para o narcisismo perdido
de sua infância, na qual ele era seu próprio ideal.
É natural investigar as relações desta formação de ideal com a subli-
mação. A sublimação é um processo concernente à libido de objeto e con-
siste em que a pulsão se lança sobre um outro alvo, afastado da satisfação
sexual; nisto, o acento repousa sobre o desvio do sexual. A idealização é
um processo com o objeto, através do qual este é, sem alteração da sua
natureza, engrandecido e psiquicamente elevado. A idealização é possível
tanto no âmbito da libido do eu como também no da libido de objeto. Assim,
por exemplo, a superestimação sexual do objeto é uma idealização do mes-
mo. Por conseguinte, enquanto a sublimação descreve algo que ocorre com
a pulsão, e a idealização descreve algo que ocorre junto ao objeto, ambos
devem ser mantidos separados conceitualmente.
A formação do ideal do eu é frequentemente confundida com a sublima-
ção da pulsão, prejudicando a compreensão. Quem trocou seu narcisismo
pela veneração de um elevado ideal do eu não precisa, por isto, ter consegui-
do a sublimação de suas pulsões libidinais. Com efeito, o ideal do eu exige tal
sublimação, mas não pode obrigá-la; a sublimação permanece um processo
particular, cuja indução pode ser estimulada pelo ideal, mas cuja execução
permanece absolutamente independente de tal estimulação. Encontram-se
justamente nos neuróticos as maiores diferenças de tensão entre a formação
do ideal do eu e a dimensão da sublimação das suas pulsões libidinais primi-
tivas, e torna-se geralmente muito mais difícil convencer o idealista do para-
deiro inconveniente de sua libido do que a pessoa simples, que permaneceu
modesta em suas aspirações. A relação da formação do ideal e da sublima-
ção com a causação da neurose é também uma relação totalmente diferente.
A formação do ideal aumenta, como já ouvimos, as exigências do eu, e é o fa-
vorecimento mais intenso do recalcamento; a sublimação apresenta a saída
através da qual a exigência pode ser cumprida sem levar ao recalcamento.
Não seria de admirar se achássemos uma instância psíquica particular
que cumpre a tarefa de vigiar a garantia da satisfação narcísica que pro-
vém do ideal do eu, e nesta intenção, observa incessantemente o eu atual e
mede-o com o ideal. Se uma tal instância existe, pode ser-nos impossibilitado
descobri-la; podemos apenas discerni-la como tal e temos o direito de dizer
que o que chamamos de nossa consciência moral cumpre esta caracterís-
tica. O reconhecimento desta instância possibilita-nos a compreensão do
chamado delírio de atenção ou mais, corretamente, de observação, o qual
se destaca tão nitidamente na sintomatologia dos adoecimentos paranoi-
des, e talvez possa também acontecer disperso em uma neurose de trans-
188
8
Apenas como conjetura, acrescento que a formação e fortalecimento desta instância observa-
dora poderia abranger também o surgimento tardio da memória (subjetiva) e do fator temporal, o
qual não é válido para os processos inconscientes.
189
9
Não posso aqui decidir se a separação desta instância censora em relação ao restante do eu
está apta para fundamentar psicologicamente a divisão filosófica entre uma consciência e uma
consciência de si.
190
191
tes e mesmo belas; e, por outro lado, o acúmulo de feiuras, atrofias de órgão
e defeitos, nas classes inferiores de nossa sociedade, não contribui em nada
para a frequência de adoecimentos neuróticos em seu meio.
As relações do sentimento de si com o erotismo (com os investimentos
libidinais de objeto) deixam-se apresentar formalizadas da seguinte maneira:
precisa-se diferenciar dois casos – se os investimentos amorosos são ade-
quados ao eu ou, ao contrário, experienciaram um recalcamento. No primeiro
caso (no emprego da libido adequado ao eu), o amar é avaliado como qual-
quer outra atividade do eu. O amar em si, como ansiar, carecer, reduz o senti-
mento de si; ser amado, encontrar correspondência no amor, possuir o objeto
amado, torna a elevá-lo. No caso da libido recalcada, o investimento amoroso
é sentido como grave diminuição do eu, é impossível a satisfação amorosa,
e o novo enriquecimento do eu somente será possível através da retirada da
libido dos objetos. O retorno da libido de objeto ao eu, a sua transformação
em narcisismo, apresenta, por assim dizer, novamente um amor feliz, e, por
outro lado, também um amor feliz real corresponde ao estado originário, no
qual libido de objeto e libido do eu não são diferenciáveis entre si.
A importância do assunto e a impossibilidade de alcançar-se uma visão
geral do mesmo justificariam, então, o acréscimo de algumas outras proposi-
ções sem ordenamento determinado:
O desenvolvimento do eu consiste num afastamento do narcisismo pri-
mário e gera uma intensa aspiração no sentido de reconquistá-lo. Este afas-
tamento acontece por meio do deslocamento da libido para um ideal do eu
imposto de fora, a satisfação acontece através do cumprimento deste ideal.
Simultaneamente, o eu emitiu os investimentos libidinais de objeto. Ele
fica empobrecido em favor destes investimentos, assim como do ideal do
eu, e enriquece-se novamente através das satisfações de objeto, bem como
através do cumprimento do ideal.
Um componente do sentimento de si é primário, o resto do narcisismo
infantil; uma outra parte provém da onipotência confirmada pela experiência
(o cumprimento do ideal do eu); e, uma terceira, da satisfação da libido de ob-
jeto. O ideal do eu impôs difíceis condições à satisfação libidinal nos objetos,
rechaçando, por meio de seu censor, uma parte da mesma como incompatí-
vel. Lá onde não se desenvolveu um ideal assim, o anseio sexual correspon-
dente ingressa inalterado na personalidade como perversão. Ser novamente
seu próprio ideal, também no que concerne aos anseios sexuais, como na
infância, é o que os seres humanos querem alcançar como a sua felicidade.
A paixão consiste num transbordamento da libido do eu sobre o objeto.
Ela tem a força de suspender recalcamentos e restabelecer perversões. Ela
eleva o objeto sexual ao ideal sexual. Já que sucede, no tipo de objeto ou de
192
193
VARIAÇÕES
OS NÚMEROS
IMAGINÁRIOS DE LACAN
1
Psicanalista; Membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA) e da Asso-
ciation Lacanienne Internationale (ALI). Responsável pelos seminários e oficinas de To-
pologia da APPOA. Autora do livro Topologia e clínica psicanalítica (Redes Editora, 2013).
E-mail: ligia@victora.com.br
194
195
2
http://pt.wikipedia.org/wiki/N%C3%BAmero_hipercomplexo (Consulta em:
04/04/2015)
196
Quando o número for negativo, ou seja, menor que zero (x < 0), então a
equação não tem raízes reais. (x = ± √-n).
Bem, Lacan em diferentes ocasiões serve-se desses números para
tratar da identificação do sujeito com o seu nome próprio. Vamos ver o
porquê.
A função de nomeação foi atribuída historicamente a Deus, quem, con-
forme a Bíblia teria dado nome a todas as coisas. Nomear é tradicionalmen-
te função do pai, embora pouco a pouco a tendência jurídica seja de que
os pais – ou somente a mãe, na falta daqueles – escolham o sobrenome
do filho. Conforme Lacan (1961-62), no seminário A identificação, a nome-
ação – “função simbólica universal do nome do pai” (lição VIII, 17/01/1962,
p.1415) está ligada ao chamado significante do Nome-do-pai – que vem a
ser o organizador de toda rede de significantes. Ela estaria na base das
identificações e seria fundamental para o nascimento do futuro sujeito no
campo simbólico.
Durante todo o seminário A identificação, Lacan (1961-62) se baseia na
organização sugerida por Freud ([1921]1997, p.133) na obra Psicologia de
grupo e análise do ego (capítulo VII, intitulado também Identificação). Con-
forme a lógica freudiana a “mais remota expressão de um laço com outra
pessoa” poderia ser dividida em três fases, resumidamente:
1) identificação com o pai, do tipo anaclítico, por incorporação.
2) identificação por regressão, copiando um traço do Outro, tomado
como objeto.
3) identificação por infecção mental, ou pelo desejo de colocar-se na
mesma situação que o outro.
No seminário A identificação Lacan (1961-62, lição VII, 10/01/62, p.1402)
retoma a partir do dito segundo “tipo” – melhor seria dizer “tempo” – já que
estes se sucedem, e até coexistem no mesmo sujeito.
197
3
Tradução e grifos da autora.
198
que houve uma marca, dada pelo pai. Esta pode servir como interdição ao
corpo da mãe (seria um não, dito pelo pai ao filho).
E quando o sujeito se dá conta de que é Um? Para demonstrar essa
assimilação do nome próprio, Lacan (1961-62, p.1408) parte do Cogito car-
tesiano. Utiliza-se da operação – Cogito, ergo sum. Diz ele que, se o cogito
representa o nascimento da ciência enquanto método, ele atesta, também,
sobre o nascimento do sujeito como coisa pensante, pois é um raciocínio
que ocorre quando alguém passa a pensar em si mesmo como ser – ou Um
diferente dos outros.
Descartes ([1637]1973), em O discurso do método, dividia o sujeito em
duas partes: Res cogitans, a mente ou o intelecto, e Res extensa – a parte
material do corpo humano. O cogito tem a ver com essa divisão mente-corpo.
Daí Penso, logo sou. Lacan inverte essa premissa porque, segundo ele, só
depois de pensar em si mesmo como sendo Um é que o Ser se estabelece
après-coup. O eu sou já estava ali, para algo poder pensar!
Então, quando eu penso, me dou conta de que eu já era antes de poder
pensar. Seria como o olhar do simbólico, que fixa o real preexistente a pos-
teriori. É a mesma lógica do nó borromeano de Lacan: o simbólico abre um
buraco no campo do real, fixando-o só então como já existente. Assim:
Pode ser lido “eu sou, logo penso, logo sou, logo penso...” Onde a con-
junção “logo” equivale na equação ao sinal de adição (+). Vamos estabelecer
no final do terceiro termo um ponto-limite nesta sequência, que poderia ser
infinita.
Como escrever isso matematicamente? Lacan propõe que se dêem va-
lores para as expressões:
Eu penso = 1
Equivaleria a dizer: – Eu penso em mim como sendo Um: uma unidade
de ser.
E qual seria o valor atribuído ao ser anterior à nomeação? Poderia ser
(-1), já que se refere a uma falta de ser? Ou um zero, um vir-a-ser – se é que
199
se pode pensar um ser antes de ter sido nomeado. Porém, a falta de que
se trata aqui é uma falta absoluta – algo inacessível como o Zero absoluto.
Então, Lacan propõe: [i = (√ -1)] (raiz quadrada de menos um). Onde (i) é a
unidade imaginária. (Lacan, 1961-62, p.1409). Lembrando que não dá para
levar ao pé da letra, ou ao pé do número: este é mais um arranjo da álgebra
lacaniana. O logo (ergo), que seria uma implicação (=>), fica notado por La-
can como uma adição (+).
Eu sou = i
200
4
Relatório do Congresso de Roma Fonction et champ de la parole et du langage.
201
REFERÊNCIAS
DEFOE, Daniel. Robinson Crusoe: A aventura de um náufrago numa ilha deserta
[1719]. São Paulo: Cia. das Letras, 1999.
DESCARTES, René. Discurso do método [1637]. Rio de Janeiro: Editora Abril, 1973.
FREUD, Sigmund. Obras completas [CD-R]. São Paulo: Ed. Imago, 1a Edição [1997].
LACAN, J.-M. Obras completas e Escritos [CD-R] Buenos Aires: Escola Freudiana de
Buenos Aires, 1a Edição, [s. d.].
VÍCTORA, Ligia Gomes. O ser e o Zero. Correio da APPOA. Porto Alegre, n..221,
p.39-52, mar. 2013.
VÍCTORA, Ligia Gomes. O infinito na psicanálise, parte 1: o infinito dos filósofos. Cor-
reio da APPOA. Porto Alegre, n. 221, p.67-76, mar. 2013.
VÍCTORA, Ligia Gomes. O infinito na Psicanálise, parte 2: os novos infinitos nas ma-
temáticas. Correio da APPOA, Da formalização da psicanálise através das matemáti-
cas. Porto Alegre, n. 221, p.77-98. Março, 2013.
Recebido em 29/03/2015
Aceito em 06/06/2015
Revisado por Marisa Terezinha Garcia de Oliveira
202
VARIAÇÕES
FREUD NA TABACARIA
Michael Plastow1
1
Analista de escola: Membro da The Freudian School of Melbourne, School of Lacanian Psycho-
analysis; Psiquiatra infantil; chefe do setor de Psiquiatria Infantil no Alfred Child and Youth Mental
Health Service, em Melbourne, Austrália; Autor de inúmeros artigos no campo da literatura psica-
nalítica, psiquiátrica e acadêmica, também publicou em 2014 o livro What is a Child? Childhood,
Psychoanalysis, and Discourse (O que é uma criança? Infância, Psicanálise e Discurso). Há sete
anos co-dirige em Melbourne o seminário A psicanálise e a criança. Email: plastow@internode.
on.net
203
se esse enigma é mortal, tal como indicado pelo destino daqueles que não o
conseguiram revelar?
Deixemos então que este poema nos conduza, guiados até o enigma
apontado pelo próprio poeta:
204
Estamos acostumados a escutar que Freud teria dito que “às vezes um
charuto é só um charuto”; mas será que ele o disse mesmo? Esta citação
só apareceu nos anos 1970, e somente em inglês. E parece pouco provável
que Freud tenha usado essa expressão pela primeira vez nos anos 1970! De
todo modo, pouco importa se Freud a disse ou não, já que ele falou de tantas
outras formas sobre a exceção. Afinal, a proposição “às vezes um charuto é
só um charuto” articula ambos, tanto a regra universal quanto a sua exceção,
proveniente, talvez, de uma corrupção da seguinte frase de Rudyard Kipling:
“E uma mulher é só uma mulher, mas um bom charuto é uma Fumada” (Ki-
pling, [1885]1983, p.15).
Afora a relação recíproca entre um homem e uma mulher, e a satisfação
sexual que desse encontro pode ser obtida, há outra coisa, uma outra dimen-
são que é articulada como uma Fumada. No entanto, se um bom charuto é
uma Fumada, é bem sabido que também é mais um prego no caixão.
Outro mito psicanalítico é de que Freud manteve relações sexuais com Min-
na Bernays, que o acompanhava com frequência em suas viagens. Elisabeth
Roudinesco (2005), em sua introdução a um volume da correspondência de via-
gem de Freud intitulada Nosso coração se inclina em direção ao sul, relata que:
205
2
Trata-se de uma carta a Martha Freud, escrita em 1 de setembro de 1900.
206
Qual então deve ser a palavra? Bem, seja ela qual for, é algo Além do
princípio do prazer.
Jung e Swales, e sem dúvida todos nós, empenhamo-nos em domes-
ticar o nosso próprio “e assim por diante”, este excesso que nos assola. O
sexual, empenhado em prover este excesso com um objeto, tenta dar-lhe
um significado. Todavia, por mais que se tente traduzi-lo em um êxtase
doméstico, por mais amantes que se tenha, alguma coisa permanece. Um
impulso e um enigma permanecem. O que fazer com eles? Pessoa, nova-
mente:
207
Se nós mesmos temos que morrer, e antes perder aqueles que nós
amamos, é mais fácil se submeter a uma lei sem remorsos da na-
tureza, ao sublime Άνάγκη [Necessidade], do que uma chance que
pode talvez ter escapado (Freud, [1920]1955, p.45).
Mas assim seria mais fácil? Nós nos rebelamos contra isso, pois nada
parece natural em relação à morte, da qual tentamos fugir com sistemas arti-
ficiais de suporte à vida. Pessoa sucumbe, mas com a finalidade de produzir
alguma coisa, para escrever. De novo o poeta:
Freud permite que uma tal rota de fumaça perdure. Escondido atrás des-
ta trilha de fumaça de charuto − uma tela ou cortina de fumaça, talvez uma
recordação encobridora −, há uma rota que o leva até um reino dos sentidos,
da sensualidade. A sensualidade do Sul, e assim por diante. Sete palmos ao
sul, talvez.
208
Adeus Esteves. Mas o adeus ao familiar dá para uma rua diferente. Ade-
����
us Sigmund, adeus…
REFERÊNCIAS
BECKETT, Samuel. Murphy [1938]. London: Picador, 1973.
FREUD, Sigmund. Beyond the Pleasure Principle [1920]. In: ______. The standard
edition of the complete psychological works of Sigmund Freud. London: Hogarth,
1955, v.18.
______. Notre cœur tend vers le Sud: Correspondance de voyage, 1895-1923. Paris:
Fayard, 2005.
KIPLING, Rudyard. The Betrothed [1885]. In: _______. Selected Poems. London:
Penguin, 1983.
JONES, Ernest. Sigmund Freud Life and Work, Volume One: The Young Freud 1856-
1900. New York: Basic Books, 1953.
LACAN, Jacques. Le Savoir du psychanalyste. Séminaire 1971-1972. Paris: Éditions
de l’Association Lacanienne Internationale (Publication hors commerce), 2008.
209
______. L’insu que sait de l’une-bévue s’aile a mourre. Séminaire 1976-1977. Pa-
ris: Éditions de l’Association Lacanienne internationale (Publication hors commerce),
1998.
PESSOA, Fernando. Carta a Ophélia Queiroz, 29-XI-1920 [1920]. In: ______. Obra
poética e em prosa, Volume II. Porto: Lello & Irmão, 2006.
______. Tabacaria [1928]. In: _______. Obra poética e em prosa, Volume I. Porto:
Lello & Irmão, 1986.
ROUDINESCO, Elisabeth. Préface à l’édition française: Voyager avec Freud. In:
FREUD, S. Notre cœur tend vers le Sud: Correspondance de voyage, 1895-1923.
Paris: Fayard, 2005.
Recebido em 13/10/2013
Aceito em 15/05/2015
Revisado por Joana Horst
210
II DIREITOS AUTORAIS
IV REFERÊNCIAS E CITAÇÕES
Lista das obras referidas ou citadas no texto. Deve vir no final, em ordem alfa-
bética pelo último nome do autor, conforme os modelos abaixo. Quando forem citadas
mais de uma obra de um mesmo autor, essas deverão estar ordenadas por ano de
publicação de forma crescente.
OBRA NA TOTALIDADE
PARTE DE OBRA
ARTIGO DE PERIÓDICO
ARTIGO DE JORNAL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
DOCUMENTO ELETRÔNICO
FREUD, Sigmund. Obras completas [CD-R]. São Paulo: Imago. 1ª edição [1997].
NOME: _______________________________________________
ENDEREÇO:___________________________________________
E-MAIL: ____________________________________________
Data: ______/_____/2015