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Mariana Nascimento
Índice:
5. Bibliografia…......…………………………………………………………………p.16
1
Nota introdutória sobre o papel das artes gráficas no mundo da arte
contemporâneo
2
I - A ambiguidade política do termo vanguarda
A Hierarquização da vanguarda
“The task of self-criticism became to eliminate from the specific effects of each art any and
every effect that might conceivably be borrowed from or by the medium of any other art. Thus
would each art be rendered “pure” and in its “purity” find the guarantee of its standards of
quality as well as of its independence. Purity meant self-definition, and the enterprise of self-
criticism in the arts became one of self-definition with a vengeance.”2
1
GREENBERG, Clement, The collected essays and criticism, edited by Jonh O’Brian,Chicago,
University of Chicago Press, p. 85
2
GREENBERG, Clement, The collected essays and criticism, edited by Jonh O’Brian,Chicago,
University of Chicago Press, p. 86
3
Por fim, Greenberg concebe a história da arte segundo uma lógica evolutiva: a arte está
em constante movimento e a arte de vanguarda constitui o último termo numa sequência
lógica de relações de causa-efeito num longo processo evolutivo. De facto, o imperativo
viria da História – da época conjugada com um momento particular, numa tradição
artística específica.
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transformação histórica, imbuída de carga política, da escola de belas artes de Paris num
sistema de propaganda, politizado e de esquerda. A própria especificidade do meio
artístico em que se produz: o cartaz, implica desde logo uma forma diferente de
engajamento artístico diversa da pintura.
« En outre, fruit des regards croisés de deux disciplines souvent opposées, l’histoire d’art et
l’histoire, cette exposition assume pleinement la tension qui la traverse, et qui a fait reposer nos
choix sur le croisement de la signification historique et de la qualité visuelle, afin qu’elle puisse
se donner d’abord à voir, et pas d’abord à lire. Elle est une lecture documentée de ce moment
particulier de l’histoire contemporaine où l’art et le politique, la création et les luttes sociales et
politiques furent intimement mêlés, étroitement entrelacés : oú les images n’ont pas seulement
été les témoins des luttes mais leurs lieux et leurs armes. Elle est structurée par une chronologie
qui mêle volontairement des événements de natures très différentes, sociaux, politiques,
artistiques, certains très locaux, certains mondiaux. Car ce qui est apparu sous nos yeux
progressivement nous a déplacés. Ainsi la notion de « contexte », si chère aux historiens, a
disparu au profit de celle de « contemporanéité » ; tandis que, pour l’historien de l’art, la notion
d’ « ouvre » s’est effacée derrière ce que en 1968, Michel Foucault nomma «l’archive. » 3
A especificidade do cartaz
3
ARTIÈRES, Philippe et DE CHASSEY, Eric, catálogo da exposição Images en lutte la culture visuelle
de l'extrême-gauche en France, 1968-1974 [exposição no Palais des Beaux-Arts, Paris, de 21 de
Fevereiro a 20 de Maio 2018] organização Philippe Artières e Eric de Chassey [prefácio de Jean-Marc
Bustamante], p. 10
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os cartazes desta época, mas também um modo de produção diferente: colectivo e não
autoral.
Talvez seja isso o que distingue também a pintura mural do cartaz, o cartaz é efémero,
não é assinado e é muitas vezes uma obra colectiva ao passo que a pintura mural se
torna frequentemente um gesto autoral, autográfico. A apropriação do cartaz e da
pintura mural pela indústria de consumo cultural massivo, opõe-se assim ao cartaz
artesanal, produto de uma prática, com um ponto de vista artístico. Esta ambiguidade
que se torna evidente no cartaz político também, problematiza ainda a viabilidade de
uma apreciação estética valorativa dos vários cartazes, que talvez se torne mais clara
aquando do estudo de caso das associações.
4
ARTIÈRES, Philippe et DE CHASSEY, Eric, catálogo da exposição Images en lutte la culture visuelle
de l'extrême-gauche en France, 1968-1974 [exposição no Palais des Beaux-Arts, Paris, de 21 de
Fevereiro a 20 de Maio 2018] organização Philippe Artières e Eric de Chassey [prefácio de Jean-Marc
Bustamante], p. 34
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A inscrição das práticas artísticas no espaço urbano
O direito à arte
Podemos assim partir do Atelier para uma análise mais alargada da relação própria do
cartaz e com a cidade, integrando mais firmemente os cartazes produzidos nos seus
campos de acção, produção e relação social e artística. Regressando ao binómio
dicotómico entre arte do cartaz e a pintura tradicional, repensemos a especificidade do
cartaz como forma artística urbana: o cartaz serve para ser afixado, nas ruas. De facto,
tanto o cartaz como a pintura mural são formas de apropriação do espaço público em
graus diversos de marginalidade, mas que reivindicam o direito à cidade com Lefebvre
já antes pensara na sua obra “Le Droit au Ville”:
L'être humain a aussi le besoin d'accumuler des énergies et celui de les dépenser, et même de les
gaspiller dans le jeu. Il a besoin de voir, d'entendre, de toucher, de goûter, et le besoin de réunir
ces perceptions en un « monde ». A ces besoins anthropologiques élaborés socialement (c'est-à-
dire tantôt séparés, tantôt réunis, ici comprimés et là hypertrophiés) s'ajoutent des besoins
spécifiques, que ne satisfont pas les équipements commerciaux et réels plus ou moins
parcimonieusement pris en considération par les urbanistes. Il s'agit du besoin d'activité créatrice,
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d'œuvre (pas seulement de produits et de biens matériels consommables), des besoins
d'information, de symbolisme, d'imaginaire, d'activités ludiques. A travers ces besoins spécifiés
vit et survit un désir fondamental, dont le jeu, la sexualité, les actes corporels comme le sport,
l'activité créatrice, l'art et la connaissance sont des manifestations particulières et des moments,
surmontant plus ou moins la division parcellaire des travaux. 5
“L’écriture murale, ce mode qui n’est d’inscription ni d’élocution, les tracts distribués
hâtivement dans la rue et qui sont la manifestation de la hâte de la rue, les affiches qui n’ont pas
besoin d’être lues mais qui sont là comme un défi à la toute loi, les mots de désordre. »6
Assim, estes artefactos que invadem as ruas interessam principalmente pela sua
carga política: como um acto de desafio, uma presença artística, que vale por isso
mesmo, por estar presente, ocupar um espaço ilícito e por o reivindicar como seu. A não
assinatura do cartaz torna este acto de reivindicação um acto colectivo, uma questão de
classe. Se a pintura fechada nas galerias é uma interacção restrita, o cartaz, e a pintura
mural estabelecem uma interacção obrigatória com o público, ao se pôr na rua, embora
convenha não esquecer que há uma tendência autográfica na pintura mural, do graffiti
que acaba também por se desviar do tipo de engajamento social que o artista estabelece
com o público, e com a cidade. Finalmente, o cartaz apresenta-se habitualmente como
obra de arte efémera destinada à deterioração ou ao arrancamento.
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Talvez seja exactamente por este caracter efémero e marginal do cartaz que podemos
pensar o conceito de Arte Modesta, proposto por Hervé di Rosa, na verdade a própria
ideia de conceito é desmontada desde logo pelo autor, em cujo manifesto lemos:
“L’art modeste n’est ni un concept ni un mouvement. C’est un regard ; Il montre ce que l’on ne
regarde pas. »
Ainda assim este olhar que seria a arte modesta põe em questão uma séria de
problemas, o próprio termo modéstia, do latim “modestia, modestus, modus” que
significaria modo, medida, sentido de honra, mesura moderada: torna ambíguo o valor
artístico concedido à obras visadas por este olhar.
Talvez na verdade com o termo modéstia Hervé di Rosa não se dirija às formas
de arte, objecto do seu olhar, mas sim ao próprio olhar do colecionador, do museólogo,
da perspectiva a adoptar pelos museus de arte e pelos colecionadores: em vez do
faraónico mediático e da autoridade pseudo-especializada, Hervé di Rosa propõe uma
colecção mais singela mas ao mesmo tempo menos canónica.
O Estatuto de artista
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em Nova Iorque em 69. Este movimento visaria desvia a arte de uma concepção
formalista virada em torno da descrição dos métodos artísticos e explicitação de padrões
estéticos, impondo uma nova ideia de prática artística, que concedesse aos artistas a
condição de trabalhador passível de se organizar colectivamente e engajado
politicamente contra a proeminência capitalista do mercado de arte.
« In 1969 an anonymous letter circulated in the New York art world, declaring, "We must
support the Revolution by bringing down our part of the system and dearing the way for change.
This action implies total dissociation of art making from capitalism." It was signed, simply, "An
art worker."' A nameless, self-described art worker issues a utopian call, implying that how art is
made and circulated is of consequence within the political sphere. The urgent plea suggests that
art work is no longer confined to describing aesthetic methods, acts of making, or art objects—
the traditional referents of the term—but is implicated in artists' collective working conditions,
the demolition of the capitalist art market, and even revolution. » 7
It all started with a kidnapping. On January 3, 1969, the artist Vassilakis Takis marched into
New York’s Museum of Modern Art, unplugged his kinetic piece Tele-sculpture (1960), and
retreated to the MoMA garden with the piece in his hand. (…) Takis, who had witnessed first-
hand the student/worker revolt in Paris in May 1968, the individual discontent to a larger, shared
7
BRYAN WILSON, Julia, Art Workers, Radical Practice in the Vietnam War Era, University of
California Press, Calofornia, 2009, p.1
8
BRYAN WILSON, Julia, Art Workers, Radical Practice in the Vietnam War Era, University of
California Press, Calofornia, 2009, p.13
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artística, que realmente envolvessem a população no mundo da arte, reenviando os
objectos artísticos para a cidade:
"the first in a series of acts against the stagnant policies of art museums all over the world. Let us
unite, artists with scientists, students with workers, to change these anachronistic situations into
information centres for artistic activities."9
Por outro lado, somos obrigados a pensar o valor estético dos artefactos artísticos,
organizados na perspectiva, não só da AWC, mas dos vários colectivos de produção
artística que surgiram um pouco por toda a parte, a partir dos anos 70, bem como o seu
grau efectivo de acesso à população. Efectivamente estes "colectivos", muitas vezes,
foram, e continuam a ser, compostos, pelo menos parcialmente, por pessoas com
formação artística e universitária, que desempenham já papeis de renome dentro das
próprias instituições. Mesmo a visibilidade que as associações autodidatas de produção
de cartazes, adquirem passa frequentemente por laços institucionais.
9
BRYAN WILSON, Julia, Art Workers, Radical Practice in the Vietnam War Era, University of
California Press, Calofornia, 2009, p.14
11
mesmo modo, a "arte bruta" ou "outsider art", muitas vezes se sedia na repetição dos
efeitos de formas já repetidas, perdendo o interesse estético inicial.
Um dos exemplos mais flagrantes do esforço contínuo por transportar a arte para a
cidade, será sem dúvida o festival “Raia: Tráfico de Edições e Afins” que reúne
editores, artistas gráficos, impressores e artesão para dar a conhecer e vender edições
literárias, discos, artefactos gráficos e enfim cartazes. O festival “conjuga a tradicional
feira de edição e a arte gráfica” estimulando diálogo entre o público os artistas e os
editores, a quem as obras produzidas são adquiridas directamente. Desde logo há um
mote que enuncia o propósito do festival: “A Raia é dos pequenos editores e dos artistas
gráficos, sem intermediários ou apoios institucionais.” Compreendemos assim a
importância de uma feira que visa pôr o grande público a par do que se passa no mundo
da pequena edição de objectos de natureza gráfica e literária.
A raia é fronteira, linha de divisão ou limite. É por isso lugar de risco, de transposição, de
desafio. É limiar e é margem. É um espaço de possibilidades. Os livros aqui apresentados
aproximam-se dos limites da condição de livro. De serem livros, por permitirem o desempenho
da função básica de ver/ler o que está inscrito nas suas superfícies. De não serem livros, por tal
função básica não existir, e não passarem de referências a livros.10
Raia por si só é desde logo um nome significativo, jargão para a fonteira, zona, por
onde durante a ditadura se saltava ao muro, por onde passava o contrabando, e por onde
fugiam os exilados políticos, sociais, económicos. Assim o festival mesmo inserindo os
cartazes numa óptica de mercado “aqui mesmo de mercado popular”, não deixa de
conter uma carga política forte, que as actividade circundantes (leituras, lançamentos,
exposições e concertos) não deixam escapar, como projecto feito pela população para a
população.
Sobre a última edição, de dezembro de 2018, Júlio Henriques escreveu um texto que
talvez explicite por fim a relação que se estabelece nos tempos que correm entre artista
e população e simultaneamente a relação ética (ou moral) que se defende, tanto na
prática artística como na integração dos seus objectos no mercado.
10
FIGUEIREDO CARDOSO, Catarina, Apresentação da exposição Se Isto É Um Livro in, Raia - Tráfico
de edições, Outubro de 2017.
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Júlio Henriques começa por tratar, a cada vez mais estranha percepção do público geral
contemporâneo a arte contemporânea e da percepção artística.
« Le concept « d’art contemporain » s’impose au début des années 1970 à la place du mot «
avant-garde », mot qui appartenait alors à l’un des adversaires de la guerre froide en cours, la
gauche communiste. Il ne signifie pas « tout l’art d’aujourd’hui » mais désigne une théorie
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contexte, afin d’en changer le sens, de désorienter le « regardeur ». La caractéristique de l’AC est
de n’avoir aucune limite ! Absolument tout peut devenir de l’AC, selon la formule
duchampienne : « est de l’art ce que l’artiste déclare tel ». Tout, excepté l’Art. La quête de la
beauté et de l’harmonie a, selon les théoriciens, l’inconvénient de provoquer blessures
narcissiques et inégalité. Les critères esthétiques ne s’appliquent pas à l’œuvre d’AC. (…) Ni
même les critères liés à l’essentialité, la pérennité, la présence ou l’aura. 12
Júlio Henriques apoiando-se no texto de Kerros justifica assim um estatuto novo que o
artista da ARTE CONTEMPORÂNEA® reclama para sim mesmo, o artista da AC diz-
se artista plástico, nunca pintor, escultor ou gravador”, a obra, pintura ou escultura
transforma-se em peça. Os objectos produzidos pela ARTE CONTEMPORÂNEA®
integram-se rapidamente nos processos financeiros do sistema capitalista naquilo que
Júlio Henriques caracteriza como “Financial Art” arte especulativa e monetária com
cotização na bolsa virada para um público elitizado. Deste modo, o caracter chocante
aparentemente subversivo dos objecto da ARTE CONTEMPORÂNEA®, torna-se um
sucedâneo do mercado artístico capitalista que desprovendo os objectos da sua carga
política, interioriza o grotesco e chocante como legitimação desse mesmo mercado, ao
exibir a crítica conceptual no mercado capitalista esta torna-se desprovida de
significação servindo apenas a manutenção desse mesmo sistema. Júlio Henriques
reprende ainda uma outra citação do artista plástico Damian Hirst: “As pessoas podem
gozar com a arte, mas não podem gozar com o mercado. Todos os mercados são
sérios.”.
Finalmente em defesa das correntes artísticas que se distanciam deste modelo de suposta
regressão cultural, revirando-se também para os objectos da exposição/feira “Raia:
tráfico de edições”, Júlio Henriques cria um termo novo para designar o conjunto de
objectos sediados ainda na prática oficinal, do trabalho manual. Sustentando a sua tese
numa orientação própria da História da arte que se estabelece numa linguagem sensível
e elaborada: e onda a obra de arte deve persegui o domínio da linguagem visual e da
12
KERROS, Aude, L’Imposture de l’art contemporain. Une utopie financière, Eyrolles, Paris, 2016, P. 16
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prática autónoma da criação manual artística que implicaria simultaneamente o
reconhecimento de um património anterior.
O caracter social das associações que difundem estas práticas pressente assim uma
necessidade popular de expressão criativa, bem como assegura o acesso à livre fruição
13
HENRIQUES, Júlio, apresentação da exposição é novo mas nada fica: Louvor do artesanato em arte,
in Raia - Tráfico de edições, dezembro de 2018
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artística. Compreendemos assim uma outra forma de valorização da arte, particular no
campo da edição artesanal e da produção de cartazes.
Bibliografia :
BLANCHOT, Maurice, Écrits politiques, 1953-1993. Édité par Éric Hoppenot. Paris,
Gallimard, 2008
BRYAN WILSON, Julia, Art Workers, Radical Practice in the Vietnam War Era,
University of California Press, Calofornia, 2009
HENRIQUES, Júlio, apresentação da exposição Tudo é novo mas nada fica: Louvor do
artesanato em arte, in Raia - Tráfico de edições, dezembro de 2018
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