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This paper is about the political culture that was shared by republicans, in the context of
the propaganda. We used as primary sources the most important manifesto published by
the movement in Rio de Janeiro – the 1870’s manifesto – and we analyzed, as well, the
republican newspapers that circulated in the province of Minas Gerais, highlighting one
of them: O Movimento, which was distributed all over the province.
Keywords: republicanism, political culture, press.
1
Este trabalho é um dos resultados da pesquisa financiada pelo CNPq e pela Fapemig. Uma versão
em inglês deste texto foi apresentada no Congress of the Latin American Studies Association, em
Toronto, Canadá, em outubro de 2010.
2
Artigo recebido em 26/3/2011 e aprovado em 20/9/2011.
3
Professora-associada do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de
Juiz de Fora, doutora em História Social pela UFRJ, bolsista de produtividade do CNPq e pesquisa-
dora do Programa do Pesquisador Mineiro (PPM) – Fapemig/MG.
E-mail: claudia.viscardi@ufjf.edu.br
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Cette recherche traite de la culture politique partagée par les républicains dans le context
de la propagande républicaine. À cette fin, nous avons utilisé comme source principale
le plus important manifeste publié par le mouvement à Rio de Janeiro – le manifeste de
1870 – et avons fait une analyse des journaux républicains qui ont circulé dans la province
de Minas Gerais, avec une emphase sur eux: O Movimento.
Mots-clés: républicanisme, culture politique, presse.
______________________________________
4
BENDIX, Reinhard. Construção nacional e cidadania. São Paulo: Edusp, 1996. p. 39.
5
Id., p. 91, 104 e 324.
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mesma forma como se processou nas nações mais prósperas. Suas particularida-
des devem ser levadas em conta.
O Brasil se enquadra nessa categoria. Seu processo de modernização se deu
sob a inspiração das experiências europeias de mudança, aliadas às suas mais
consolidadas tradições. Portanto, entender a modernização brasileira implica
não só vinculá-la ao contexto europeu ou norte-americano, mas igualmente levar
em conta as suas próprias tradições.
Com base nas prerrogativas anunciadas, acredita-se que o processo de cons-
trução de cidadania, que ocorreu paralelamente à expansão do Estado Nacional
no Brasil, deve ser analisado a partir de sua própria trajetória política, sem que
as relações e os intercâmbios culturais com experiências prévias sejam descarta-
dos. Igualmente, não se acredita que o melhor caminho seja o marcado pelo tom
evolucionista, ou seja, a partir da avaliação de sua distância ou proximidade em
relação ao modelo francês, britânico ou mesmo estadunidense. Se assim o fosse,
tal processo de modernização só poderia ser entendido pela lente da ausência:
ausência de povo, ausência de riqueza, ausência de cidadania, de nação, entre
outras.
Entende-se que o Brasil, ao final do século XIX, teve muitas de suas tradições
abaladas pela introdução de duas mudanças específicas: a abolição e o regime
republicano. Ambos os eventos propiciaram condições para que o processo de
modernização tivesse início no País. A abolição viabilizou a construção da cida-
dania, e a República, implantada a partir da difusão e da consolidação dos prin-
cípios liberais, permitiu a expansão da autoridade pública, resultante da extensão
dos direitos políticos.
É sabido que, quanto mais se amplia o número de direitos, mais aumenta
a intervenção do Estado na sociedade.6 A partir da abolição e da introdução
do regime republicano, foram formalmente sistematizados os instrumentos de
ampliação das liberdades políticas, mantendo-se as liberdades civis já previstas
pela Carta de 1822, com ligeiras modificações. E o federalismo permitiu a expan-
são e a descentralização da autoridade política. Acredita-se que essa combinação
entre a ampliação de direitos políticos e a descentralização conferiu ao País os
requisitos básicos para a sua modernização.
6
QUIRINO, Célia G.; MONTES, Maria L. Constituições brasileiras e cidadania. São Paulo: Ática,
1987. p. 31.
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Id., p. 28.
8
PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália Moderna. 3. ed. Rio de
Janeiro: FGV, 2002. p. 101.
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DIEHL, Astor A. A cultura historiográfica brasileira: do IHGB aos anos 1930. Passo Fundo:
EDIUPF, 1998. p. 94.
13
SCHWARCZ, Lilia. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil,
1870-1930. São Paulo: Cia. das Letras, 1993. p. 31.
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que a Escola de Direito de São Paulo assumira uma vertente mais liberal e a Escola
de Recife estivera mais próxima ao darwinismo social.14
Ambas as instituições haviam sido criadas em 1828, mas, cerca de 40 anos
depois, se diferenciaram em termos teóricos. A de Recife, que tinha em Tobias
Barreto seu teórico de maior expressão, era mais voltada para o estudo dos filó-
sofos alemães e dos darwinistas sociais, e a de São Paulo voltava-se menos para
as discussões filosóficas e atuava mais como formadora de quadros políticos para
o País.15
Além desses trabalhos mais focados no pensamento político e cultural da
geração de 1870, há igualmente uma gama de estudos sobre como se processou
o movimento político da propaganda republicana, do qual faziam parte muitos
desses intelectuais formados nesse ambiente.
Durante muitos anos, os estudos sobre a propaganda republicana no Brasil,
além de pouco numerosos, eram regionalizados. Destacam-se trabalhos sobre o
movimento republicano paulista, fluminense e rio-grandense.16 Muito embora
o regime monárquico fosse centralizado, os historiadores que se voltaram para
o estudo da fase final do regime, com o objetivo de estudar a origem do federa-
lismo, tiveram uma tendência a abordar o tema sob uma perspectiva estaduali-
zada, provavelmente impactados pelo que se sucedeu após 1889.
Esse panorama começou a ser mudado recentemente, com a publicação de
trabalhos que discutem o pensamento republicano nacional a partir de novos
fundamentos, como a busca da vinculação do pensamento republicano às prá-
ticas e aos interesses políticos de seus principais protagonistas17 e às referências
culturais populares existentes no período, as quais teriam fundamentado as teo-
rias da geração de 1870.18 Como são ainda poucos os trabalhos, estudar o movi-
14
Id., p. 25.
15
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. p. 17-18.
16
Para o caso paulista: CASALECCHI, José Ênio. O Partido Republicano paulista: 1889-1926. São
Paulo: Brasiliense, 1987. Para o caso fluminense: FERREIRA, Marieta de M. (Org.). A República na
velha província: oligarquias e crise no Estado do Rio de Janeiro (1889-1930). Rio de Janeiro: Rio
Fundo, 1989. Para o rio-grandense: LOVE, Joseph. O regionalismo gaúcho. São Paulo: Perspectiva,
1975.
17
ALONSO, Ângela. Ideias em movimento: a geração de 1870 na crise do Brasil-Império. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2002. p. 35.
18
MELLO, Maria T. C. de. A República consentida: cultura democrática e científica no final do
Império. Rio de Janeiro: FGV/Edur, 2007. p. 12.
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STARLING, Heloísa; LYNCH, Edward C. República/republicanos. In: FERES JR., João (Org.).
Léxico da história dos conceitos políticos do Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 2009. p. 225-245.
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Esses dados foram levantados em pesquisa realizada na imprensa republicana mineira.
23
COSTA, Maria E. V. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 5. ed. São Paulo: Brasi-
liense, 1991. p. 273.
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24
BARBOSA, Francisco de A. (Org.). João Pinheiro: documentário sobre a sua vida. Belo Horizonte:
APM, 1966. p. 99-101.
25
Correio do Machado, Machado p. 1, 20 maio 1888.
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26
O Colombo, Campanha, p. 3-4, 7 jul. 1878.
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A Monarquia era igualmente vista como uma excentricidade. “Pois uma ins-
tituição qualquer que não se adapte à índole e às condições sociológicas de um
povo é um corpo estranho no organismo social que mais cedo ou mais tarde será
por ele expelido.”27 Tal excentricidade distanciava o Brasil do conjunto de países
que compunham as Américas, restando ao País submeter-se às influências das
antigas nações europeias, vistas pelo jornal como antiquadas. Entre as antigas
nações não se enquadrava a França, que, ao lado dos Estados Unidos, constituía-
se em modelo de boa administração.
Essa admiração pelos federalistas americanos e pelos líderes mais proemi-
nentes da Revolução Francesa manifestava-se por meio da adoção de pseudôni-
mos pelos articulistas mineiros, os quais remontavam aos principais líderes de
ambas as revoluções: a francesa e a estadunidense. Além do que, várias reporta-
gens sobre esses movimentos eram publicadas nos jornais mineiros, todas com
o fim de enaltecer os avanços por eles provocados. O grande feito dos franceses
era objeto de comemoração das publicações de 14 de julho, data da Revolução. O
exemplo a seguir explicita uma dessas comemorações:
A república brasileira saúda fraternalmente a sua irmã imorredoura, a patriótica e
lendária França. [...] os fatos que temos notado da nossa história política nos demons-
tram cabalmente que a monarquia não se molda à índole brasileira, porque ela é
corruptora, enfraquece os sentimentos, dilapida caracteres e o brasileiro patriótico
como é aspira à independência, a altivez de espírito que só no governo republicano
pode ter, porque é responsável perante o povo.28
27
O Movimento, Ouro Preto, ano I, n. 2, 30 jan. 1889.
28
Por Vaz de Lima: O Movimento, Ouro Preto, ano I, ed. 26, 14 jul. 1889.
29
GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. São Paulo: Cia. das Letras, 1987. cap. 3.
30
O Colombo, Campanha, 1o fev. 1874.
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O Movimento, Ouro Preto, ano I, ed. 29, 6 ago. 1889.
35
O Movimento, Ouro Preto, ano I, v. 32, 29 ago. 1889.
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O Movimento, Ouro Preto, ano I, n. 15, 30 abr. 1889.
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Conclusões
Ao longo deste artigo, procurou-se analisar de que forma os republicanos
foram aos poucos edificando uma nova cultura política, que se configurava como
uma alternativa às mazelas pelas quais se sentiam vitimados no contexto monár-
quico. Optamos pela análise de duas modalidades diferentes de documentos. A
primeira trata-se do mais importante manifesto, carta fundadora do movimento
republicano, que, embora publicado na Corte, destinava-se a unificar o discurso
de um conjunto vasto de adeptos do novo regime.
O manifesto tinha caráter inaugural do movimento e expressava bem o pata-
mar sobre o qual se edificariam, mais tarde, os pilares de uma nova alternativa
política. Daí seu caráter ambíguo em relação às principais propostas que dividiam
a Nação: a abolição e a laicização do Estado. Tais propostas, que convidavam o
País a se inserir na modernidade liberal europeia, eram vistas ainda com descon-
fiança pelos atores republicanos, que compartilhavam desses valores e ao mesmo
tempo carregavam dentro de si o peso das relações paternalistas que haviam fun-
damentado, durante séculos, a cultura política monárquica brasileira. Daí que o
silêncio em relação a essas questões se explica não só pelo receio em não angariar
apoio suficiente para a nova causa, mas, sobretudo, por serem muitos republica-
nos adeptos da escravidão e contrários a um Estado liberal inteiramente laico.
O silêncio sobre esses dois temas expressa bem o período de transição pelo
qual passava o País. Como nos lembrou Bendix, citado anteriormente, toda tran-
sição para a modernidade implica a coexistência de valores ambíguos, alguns
relativos ao passado que se quer deixar e outros afetos ao futuro que se quer
anunciar.
A segunda modalidade de documentos analisados inclui jornais de outra
província, do interior do Brasil, em um período posterior, ou seja, quase 20 anos
após a fundação do movimento. Muito embora Minas Gerais fosse uma unidade
política de grande importância para o Reino, o relativo distanciamento em rela-
ção à mobilização antimonárquica que se processava na Corte fazia com que os
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