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Sumário
Editorial
2 Culinária na Roma Antiga,
Além da Alimentação
Entrevista
4 Julio Gralha debate sobre as
práticas alimentares no Egito
Antigo
Expediente
Coordenação e Direção
Profª. Drª. Maria Regina Candido
A alimentação está relacionada à Conhecido por sua excelência acadêmica e
Coordenação de Publicações compromisso com as pesquisas em
satisfação de uma das carências
Prof. Ms. José Roberto Paiva História Antiga, o NEA/UERJ teve a grata
Gomes
mais elementares do homem. Na
Roma Antiga, o ideal da culinária satisfação de ver os pesquisadores José
Edição tradicional era a dieta vegetariana, Roberto, Carlos Eduardo, Junio Cesar,
Prof Mestrando Carlos E. Campos condizente com o mos maiorum, o Marcos Davi e Pedro Vieira (colaborador),
costume dos ancestrais. sendo aprovados para o Doutorado do
Editoração Gráfica
Pág. 2 PPGHC/UFRJ, Mestrado do PPGH/UERJ
Profª Mestranda Tricia Carnevale
e Mestrado do PPGH/UFF. Pág. 8
Revisora
Profª. Msª. Alessandra Serra Viegas
A alimentação está relacionada à satisfação de uma das carências mais elementares do homem. Todavia, com as
transformações e as diferenciações das técnicas de preparação dos alimentos, houve uma distinção operatória e conceitual
entre alimentação e culinária, pois a ação de comer vai além do ato – essencial – de sobreviver. A necessidade e o gosto,
aliados, constituem os parâmetros da culinária. Mais do que os condimentos e as matérias-primas utilizadas, os modos de
cozinhar e de comer identificam uma sociedade: os homens não são apenas o que comem, mas também a maneira como
comem. Daí, a relevância do estudo deste tema em seus mais diferentes aspectos: produção, distribuição, preparo e
consumo dos alimentos; preferências e significação simbólica dos alimentos; hábitos culinários; proibições dietéticas e
religiosas; comportamentos à mesa, dentre outros.
O modelo dietético clássico baseava-se em três produtos agrícolas primordiais: o cereal, a vinha e a oliveira (a “tríade
mediterrânea”), dos quais derivavam respectivamente o pão, o vinho e o azeite. Na Roma Antiga, o ideal da culinária
tradicional era a dieta vegetariana, condizente com o mos maiorum, o costume dos ancestrais. Estes eram considerados
como frugais (frux, fruto), aproveitando quase todos os produtos da terra. As papas (puls) eram a base da alimentação,
quer como prato único, quer como acompanhamento. Feitas com grãos torrados e umedecidos e, depois, com farinha, elas
eram simplesmente cozidas em água e sal ou, às vezes, leite e melhoradas com favas, lentilhas ou hortaliças. Os frutos e
as saladas com ervas aromáticas faziam o gosto das mesas ricas, enquanto os substanciais pratos de leguminosas e as
sopas de ervas, mesmo as bravas, apaziguavam a fome do povo.
Se até ao século II a.C., a alimentação dos grupos sociais pouco diferiu, após a expansão romana, houve uma
crescente diferenciação. O regime frugal circunscreveu-se então aos camponeses e pobres. Difundiu-se o consumo de
carne, de peixe fresco e de pães e aumentou a importação de artigos destinados à ostentação nos banquetes. Escritos
antigos descrevem as festas luxuosas dos ricos, como o banquete de Trimalquião no Satyricon de Petrônio. Segundo
Juvenal (Sátira XII, 174-175), uma ocorrência frequente era que convidados sujassem o chão com vômito resultante dos
seus excessos. A boa mesa era privilégio de uma minoria que tinha condições de gastar pequenas fortunas em refeições
suntuosas. A elite romana estava mais aberta à novidade e ao exotismo culinário do que as outras camadas sociais. Os
gourmets de maior reputação, como Apício e Lúculo, eram aristocratas. A maior sensibilidade da elite às inovações neste
campo decorria da ostentação e do seu poder aquisitivo em contraste com o tradicionalismo e o baixo poder aquisitivo das
camadas populares.
Houve tentativas de refrear os excessos à mesa. No século II a.C., uma série de leis suntuárias (Orchia, Fannia,
Didia, Aemilia e Licinia) incidiam sobre os gastos da elite. Mas, ao longo do século I a.C. e à medida que as leis perdiam a
rigidez, os excessos aumentavam, voltando a ser reprimidos, sem sucesso, na época imperial. A defesa de uma
alimentação tradicional baseava-se na valorização simbólica de determinados alimentos, relacionados a uma vida saudável
e, por extensão, a uma sociedade menos viciosa. A
agricultura era vista como símbolo da civilização: o
homem produzia seus próprios alimentos dominando
a natureza graças ao processo de domesticação das
plantas. Contrariamente, a caça e a pecuária eram
próprias do espaço selvagem, da natureza. Assim, a
carne – de animais domésticos e, sobretudo, a da
caça – tinha, culturalmente, uma forte co no tação
“s elv agem ”, o que f avo recia s ua identificação
como alimento dos povos “bárbaros”, demandando,
Tipo: Mosaico de chão (opus tesselatum) em tesselas policromáticas,
figurativo em fundo branco. Proveniência: Decorava o triclinium (sala por isso, a sua oferenda como sacrifício aos deuses
de jantar) de uma rica casa particular em Diocaeserea / Sepphoris para ser consumida pelo homem civilizado.
(Tzippori em Israel). Período: Provavelmente, 2ª. metade do século
III. Referência bibliográfica: DUNBABIN, K. M. D. The roman Paradoxalmente, a carne era o alimento por
banquet; images of conviviality. Cambridge: Cambridge University
excelência do banquete, comensalidade relacionada à
Press, 2003, plate XII.
à civilidade urbana. Os
tratados médicos
reforçavam a relação entre
uma alimentação frugal e
uma sociedade sem vícios.
Para os antigos romanos,
saúde era sinônimo de
equilíbrio, que se
manifestava na relação do
homem com o mundo.
Doença e saúde indicavam
estados de alma. Na ótica
de filósofos como Sêneca, a
Tipo: Mosaico de chão (opus tesselatum) em tesselas policromáticas, figurativo em fundo branco.
doença seria um possível
Proveniência: Decorava uma exedra (sala de recepção) abobada, próxima ao peristylium (pátio com
reflexo de uma falta moral colunas) e defronte do triclinium (sala de jantar) de uma rica casa particular (“Casa do Triunfo de
propiciada por uma Dioniso”) em Hadrumetum (atual Sousse na Tunísia). Período: Início do século III. Referência
sociedade permissiva. bibliográfica: BLANCHARD-LEMÉE, M. et alii. Mosaics of Roman Africa; floor mosaics from Tunisia.
Na época imperial, os London: British Museum Press, 1996, p. 75, fig. 47.
RESUMO: A Mesopotâmia, berço de em fase de deciframento, temos um e o valor dos objetos deveria ser
uma sociedade original que se grupo significativo que trata da equivalente.
constituiu a partir do IV milênio a.C., culinária mesopotâmica.
inventou a escrita e com ela um rico, Os mensageiros ficavam sob a
complexo e refinado sistema cultural. Para os mesopotâmicos, realizar um responsabilidade e os cuidados da corte
Dentre quase meio milhão de banquete era uma grande que lhes recebia: eles deveriam receber
documentos escritos em sumério e demonstração de hospitalidade para cotas de vestimentas, óleo, carne,
acádico, já encontrados e em fase de cereais, prata e eram alojados em
com os convivas, que deveria ter uma
deciframento, temos um grupo casas requisicionadas da população
organização antecipada e uma rígida
significativo que trata da culinária local. Este local, chamado de bît
etiqueta a ser respeitada.
mesopotâmica.
napṭarim (literalmente, a casa do
A maioria das receitas culinárias anfitrião), era onde os estrangeiros
PALAVRAS-CHAVE: rituais,
termina com a expressão "Pronta para residiam e seu anfitrião era responsável
alimentação, Mesopotâmia.
servir", encerrando assim a função do pelos seus atos frente ao rei (Black;
As novas pesquisas no campo da cozinheiro e entrando em cena os George; Postgate, 2000). É, pois, na
história da alimentação foram convidados. Entretanto, os textos são casa de seu napṭarum (o anfitrião) que
impulsionadas pela nova história bastante lacunares sobre o ato de se os grupos de mensageiros se
cultural, assim, estudos sobre a alimentar. Raros relatam um banquete instalavam com seus serviçais, asnos e
significação simbólica dos alimentos, os palaciano ou uma simples refeição suas bagagens antes de entrar no
hábitos culinários e o comportamento à (Lion; Michel, 2003: 32-37). São os palácio (Charpin, 1988: 142).
mesa contribuíram para desvendar as textos literários e religiosos que nos
relações entre alimentação, cultura e trouxeram mais informações a respeito Quando embaixadores estrangeiros
estrutura social (Flandrin; Montanari, do banquete mesopotâmico. estavam presentes em refeições reais,
1998). o tratamento recebido por cada grupo
Os antigos mesopotâmicos era determinado pela posição
Cada sociedade e cada cultura praticavam a hospitalidade. As fontes hierárquica que possuíam aos olhos de
possuem uma cozinha original que documentais de caráter diplomático e seu anfitrião. A posição e o lugar
depende de suas preferências, seu administrativo, os mitos e as epopéias ocupados durante o banquete também
meio natural e sua economia. mencionam a conduta apropriada para eram expressões de diferenciação: ter
Conhecemos parcialmente o passado a recepção de um convidado, segundo direito a sentar-se numa cadeira era
culinário dos homens na pré-história, os hábitos da época: troca de indício de prestígio, ao contrário,
graças aos achados arqueológicos de apresentações e de palavras amistosas, aqueles que se sentavam no chão eram
resíduos alimentares, utensílios e oferecimento de vestimentas limpas e visivelmente menosprezados.
habitações. Mas, é somente com o novas, unção do corpo com óleos
Antes de passar à mesa todos
advento da escrita, no final do IV perfumados e bebidas e comidas em
deveriam lavar as mãos em água limpa,
milênio a.C., que podemos conhecer os abundância.
pois um provérbio sumério diz: "É uma
mais antigos sistemas de gostos e
Na corte mesopotâmica, os abominação levar à boca mãos
procedimentos tradicionais usados para
banquetes eram importantes impuras". Quando todos estivessem
a transformação dos alimentos: as
momentos de acordos políticos e acomodados iniciava-se o serviço. Os
receitas culinárias (Drachline; Petit-
consolidação de amizades, onde um serviçais traziam bandejas com iguarias
Castelli, 1984).
complexo e estrito protocolo deveria finamente preparadas, tudo regado a
A Mesopotâmia, berço de uma ser seguido. Os emissários dos reis não muita cerveja! Nas mesas, estavam à
sociedade original que se constituiu a eram somente encarregados de disposição dos convivas pratos, copos,
partir do IV milênio a.C., inventou a transmitir mensagens, eles também jarros, colheres, facas e os
escrita e com ela um rico, complexo e levavam os presentes. A troca de dons guardanapos, que eram colocados
refinado sistema cultural. Dentre quase e contra-dons testemunha as boas sobre o colo para evitar que os
meio milhão de documentos escritos relações diplomáticas entre dois alimentos sujassem as roupas. A
em sumério e acádico, já encontrados e Estados, a prática deveria ser recíproca documentação iconográfica e epigráfica
da antiga Mesopotâmia sobre os anunciava uma outra etapa, a do Archives Épistolaires de Mari I/2 -
banquetes privilegia a esfera do poder divertimento, com lutadores, Archives Royales de Mari XXVI. Paris:
ERC, 1988.
real e religioso (Joannès, 2001: 716). A saltimbancos, dançarinas e músicos. Os
partir dela sabemos da realização destes músicos seculares tocavam nas tabernas DRACHLINE, P.; PETIT-CASTELLI, C. A
com a finalidade de celebrar uma (As tabernas eram lugares de venda de Table avec Cesar. Paris: Éditions Sand,
1984.
importante vitória militar ou a cerveja e de prostituição, cf. O Código de
inauguração de um novo templo ou Hammu-rabi § 108-111) e em FLANDRIN, J.-L.; MONTANARI, M.
palácio. celebrações sociais. Os músicos dos História da Alimentação. Tradução de
Luciano V. Machado e Guilherme J. F.
palácios costumavam receber rações
A base da alimentação eram os Teixeira. São Paulo: Estação Liberdade,
alimentares e alguns templos mantinham 1998.
cereais (cevada e trigo), legumes
escolas de música. Além disso, a música
diversos, frutas – como a tâmara, maçã,
era, juntamente com a literatura, a GLASSNER, J.-J. La réception de l'hôte,
pêra, figo, romã, uva – cogumelos, ervas le vivre et le couvert. Dossiers
linguagem e a matemática uma das d'Archéologie. Dijon: Éditions Faton, n.
condimentares, carnes de animais de
disciplinas básicas do ensino formal 280, p. 44-47, 2003.
pequeno e médio porte: suínos, aves
mesopotâmico. Na iconografia
(codornas, passarinhos, patos, gansos, JOANNÈS, F. Dictionnaire de la
mesopotâmica há inúmeras referências a
das quais se consumiam os ovos), os Civilisation Mésopotamienne. Paris:
instrumentos musicais, que eram de três Robet Laffont, 2001.
animais de caça, peixes de água doce e
tipos: os instrumentos de corda (harpa,
salgada, crustáceos, mariscos e insetos, LION, B.; MICHEL, C. Un banquet à la
lira e alaúde); de sopro (flautas simples
leite, manteiga e outras gorduras cour assyrienne. Dossiers
e duplas de junco, madeira ou metal); e d'Archéologie. Dijon: Éditions Faton, n.
vegetais (sésamo e oliva), mel e
de percussão (tambores de vários 280, p. 24-31, 2003.
produtos minerais (sal e cinzas).
tamanhos e formas) (Pozzer, 2007).
Consumiam mais de 20 qualidades de POZZER, K.M.P. Uma História da Festa -
queijos, uma centena de tipos de sopas, A iconografia de baixos-relevos, os culinária e música na Mesopotâmia
Antiga. Textura - Revista de Letras e
cerca de 300 qualidades de pães, onde a objetos arqueológicos e a documentação
História. Canoas: Editora da ULBRA, n.
forma também variava (Pozzer, 2005). epigráfica revelam a importância social 11, p. 47-55, 2005.
do prazer à mesa no mundo
mesopotâmico. No imaginário babilônico, _____________. O Banquete do Rei e a
Política nos Tempos de Paz. In:
comer e beber juntos servia para Cerqueira, F.V.; Gonçalves, A.T.; Nobre,
fortalecer a amizade entre os iguais e C.K.; Silva, G.J.; Vargas, A.Z. Guerra e
para reforçar as relações entre o rei e Paz no Mundo Antigo. Pelotas:
Leeparq/UFPel, IMP, 2007. p. 139-152.
seus súditos. A partilha do alimento,
mais do que a própria composição da
refeição, era o mais importante. O que
fundava o banquete era esta Profª. Drª. Katia Maria
Além de comer, os babilônicos comensalidade entre os participantes e Paim Pozzer
também bebiam! A cerveja, considerada remetia a uma das expressões da
a bebida mais popular e mais antiga na solidariedade básica da comunidade
região (anterior ao III milênio a.C.), era (Glassner, 2003: 45). O banquete
um ingrediente fundamental em também era um ato político, ritualizado e
qualquer banquete na Mesopotâmia. sagrado. Com ele selavam-se acordos de
Esta bebida fermentada, à base de paz entre os homens e garantia-se a
cereais, era preparada a partir da proteção divina para que a vida na terra
maceração e fermentação da cevada e fosse mais próspera e mais feliz.
de tâmaras, segundo técnicas
Referências Bibliográficas Professora do Curso de História da
aprimoradas, de mais de 30 maneiras
diferentes: fabricava-se cerveja branca, Universidade Luterana do Brasil
BLACK, J., GEORGE, A.; POSTGATE, N. A
Concise Dictionary of Akkadian. (ULBRA), Doutora em História pela
vermelha, clara, escura, adoçada ao mel
Wiesbaden: Harrassowitz Verlag, 2000. Université de Paris I – Panthéon-
e perfumada com múltiplos aromas.
Sorbonne
Ao final da refeição, antes da CHARPIN, D.; JOANNÈS, F.; (pozzer@terra.com.br)
LACKENBACHER, S.; LAFONT, B.
sobremesa, era realizado um brinde, que
O Prof. Ms. José Roberto apresentou o projeto: "As Imagens da Citarista na Tirania dos Pisistratidas (561 a 510 a.C.)" e
obteve o segundo lugar no Doutorado em História Comparada da UFRJ; o Prof. Junio Cesar, "Interações Culturais entre
o Império Romano e a Sociedade Judaica do Século I d.C."; o Prof. Marcos Davi tratou do "Poder da Talassocracia da
Realeza Palaciana Minóico-Micênica no Mar Mediterrâneo (os povos do mar e as expansões micênicas)"; e o Prof.
Pedro Vieira, o tema "A Morte sobre Rodas: Gênero, Hierarquias Sociais e Práticas Mortuárias nos Enterramentos do
Norte da Bretanha nos Séculos IV - III a.C.".
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suas pesquisas e a certeza de que o NEA continua firme em seu objetivo de socializar o saber acadêmico e zelar pela
qualidade e confiabilidade de suas pesquisas.