Sei sulla pagina 1di 17

6

Estudo etnobotânico junto à Unidade Saúde da Família Nossa Senhora dos


Navegantes: subsídios para o estabelecimento de programa de fitoterápicos na Rede
Básica de Saúde do Município de Cascavel (Paraná)

1 2 1 1
NEGRELLE, R.R.B. *; TOMAZZONI, M.I. ; CECCON, M.F. ; VALENTE, T.P.
1
Laboratório OIKOS, Dep. Botânica, Universidade Federal do Paraná. Cx. P. 19023. Curitiba, PR. CEP 81531-970
2
Curso de Farmácia, Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. R. Carlos de Carvalho, 3496.
Cascavel, Paraná. CEP 85801 – 130. *negrelle@ufpr.br (autor p/ correspondência)

RESUMO: Realizou-se estudo etnobotânico visando gerar subsídios para o estabelecimento de


programa de uso de fitoterápicos na Rede Básica de Saúde do Município de Cascavel/PR.
Aplicaram-se entrevistas semi-estruturadas a 50 famílias pertencentes a área de abrangência da
Unidade Saúde da Família Nossa Senhora dos Navegantes. Durante as entrevistas, além de
informações sobre condições sócio-econômicas dos entrevistados, foram registradas as seguintes
informacões sobre as plantas utilizadas: nome comum, parte usada, modo de preparo e
administração. Adicionalmente, efetuou-se análise comparativa dos dados obtidos nas entrevistas
com os constantes na literatura pertinente, de modo a identificar incongruências e informações
complementares. Dentre as famílias entrevistadas, 96% indicaram fazer uso de plantas medicinais
em função de conhecimento herdado de antepassados. Um total de 271 citações etnobotânicas
foram registradas, englobando 75 morfoespécies, sendo 63 identificadas em nível específico, 7
em nível genérico e 5 não foram associadas a um taxon específico. As espécies citadas em
maior número de entrevistas foram Mentha sp. (37 entrevistas) e Cymbopogon citratus (DC) Stapf
(30); Rosmarinus officinalis L. (26), Plectranthus neochillus Schlechter (24), Artemisia absinthium
L. (22), Foeniculum vulgare Mill (22) e Tanacetum vulgare L. (22). A maioria dos entrevistados
relatou não buscar orientação médica para o uso de plantas medicinais. Isto representa um fator
de preocupação que deve ser considerado pelos atores sociais do setor de saúde bem como por
aqueles envolvidos na educação comunitária, dado que 80% do total das espécies registradas
neste estudo apresentam registro de toxicidade e contra-indicações de uso conforme literatura
consultada. Apresentam-se recomendações para diferentes atores envolvidos nesta problemática.

Palavras-chave: plantas medicinais, atenção primária à saúde, plantas tóxicas

ABSTRACT: Ethnobotanical study near by the Family Health Care Unit of Nossa Senhora
dos Navegantes: subsidies for the establishment of the program of phytotherapics in the
Public Health System of the municipality Cascavel, Parana State, Brazil. An ethnobotanical
survey was carried out aiming to provide basis for the establishment of a phytotherapy program
within the Health Care System at Cascavel Municipality (Parana State, Southern Brazil). Semi-
structured interviews with 50 families that were registered at the Nossa Senhora Navegantes
Family Health Care Unit were performed. During the interview, besides the general information
about socio-economic conditions of the interviewee, the following information about the plants
used was recorded: vernacular name, part used, preparation and mode of administration. Additionally,
a comparative analysis of the interview and literature data was performed, searching inconsistency
and complementary information. Ninety six percent the interviewed families reported the phytoterapic
usage as a heritage/ familiar knowledge. Two hundred seventy one ethnobotany references were
recorded. Seventy five morphospecies were reported, being 63 identified in specific level, 7 in
generic level, and 5 that were not associated to a specific taxon. Mentha sp. (37 interviews) and
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf (30); Rosmarinus officinalis L. (26), Plectranthus neochillus
Schlechter (24), Artemisia absinthium L. (22), Foeniculum vulgare Mill (22) and Tanacetum vulgare
L. (22) were the most cited species. The majority of the interviewees indicated that they do not
seek medical orientation for the use of medicinal plants. Eighty percent of the recorded species
have been reported by the scientific literature as toxic or with usage restrictions. This represents

Recebido para publicação em 24/05/2005


Aceito para publicação em 10/05/2006

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


7

a factor of risk that should be considered by the Health System and by those involved in the
community health education. Recommendations for the different social actors in this scenary are
presented.

Key words: medicinal plants, primary health attention, toxic plants

INTRODUÇÃO totalidade destes Municípios, os resultados da


A medicina tradicional - conceituada como implantação do programa são avaliados como
práticas baseadas em crenças, sendo parte da satisfatórios tanto para os profissionais como para
tradição de cada país, onde passa de uma geração a os usuários do Sistema Público de Saúde. No
outra - tem sido difundida pela Organização Mundial Município de Vitória, chegou-se a obter uma economia
de Saúde (OMS) como um pilar essencial nos em torno de 300% na produção própria de
cuidados primários de saúde (vide World Health medicamentos fitoterápicos cientificamente
Assembly (WHA) Res. 29.72 -1976; WHA Res. 30.49- comprovados (Espírito Santo, 2003). Em Curitiba,
1977 e WHA Res. 44.34, 1991). A partir desta base, 81,90% das unidades de saúde já faziam a utilização
estabeleceu-se um programa mundial com a finalidade da fitoterapia como opção terapêutica em
de utilizar e avaliar os métodos da chamada “medicina 2001(Curitiba, 2003).
tradicional” (Akerele, 1988). Adicionalmente, na Entretanto, como apontado por Leite (2000),
Conferência Internacional de Cuidados Primários em o interesse por parte de gestores municipais na
Saúde, sob o tema “Saúde para todos no ano 2000”, implantação de programas de uso de fitoterápicos na
foi incentivada a valorização das terapias tradicionais, atenção primária à saúde, muitas vezes aparece
entre elas a fitoterapia, sendo estas reconhecidas associado apenas à concepção de que esta é uma
como recursos possíveis para a viabilização do objetivo opção para suprir a falta de medicamentos na
proposto, como uma forma mais fácil e economicamente impossibilidade de disponibilização destes, já que na
viável de aumentar a cobertura de atenção primária à maioria das vezes contabilizam-se os ganhos em
saúde nos países onde a estrutura de serviços é custos gerados pela utilização dos fitoterápicos. Para
insuficiente (OMS/UNICEF, 1979). A Conferência esta autora, além da viabilidade econômica e da ação
Internacional sobre Conservação de Plantas terapêutica que tem sido comprovada para muitas
Medicinais adotou a Declaração de Chiang Mai das plantas utilizadas popularmente, a fitoterapia
“Salvem as Plantas que Salvam Vidas”, colocando as representa parte importante da cultura de um povo
plantas medicinais, o seu uso racional e sustentável e que não pode ser desconsiderada. Assim, a utilização
sua conservação no cenário político e de interesse de plantas medicinais tem sido muitas vezes
da saúde pública (Akerele, 1988). considerada como um fato desvinculado da
No Brasil este tema tem sido discutido em assistência à saúde como um todo e vista como
diversas oportunidades desde a 8a Conferência simples medicação. No entanto, segundo Hufford
Nacional de Saúde, quando foi recomendada a (1997), sistema de saúde que adota a fitoterapia deve
introdução das práticas tradicionais de cura popular incorporar um conjunto de atitudes, valores e crenças
no atendimento público de saúde (Conferência que constituem uma filosofia de vida e não meramente
Nacional de Saúde, 1986). Seguindo esta orientação, uma porção de remédios.
na 10a Conferência Nacional de Saúde, ocorrida em Neste contexto, o saber popular poderia ser
Brasília em 1996, deliberou-se incorporar as terapias utilizado como base para a pesquisa científica sobre
alternativas e práticas populares no Sistema Único plantas medicinais, contribuindo com os profissionais
de Saúde (SUS). Nesta mesma oportunidade, da área de saúde no sentido de buscar subsídios
incentivou-se a introdução da fitoterapia e da para a introdução de espécies em programas de
homeopatia na assistência farmacêutica pública, fitoterapia na rede de atendimento básico de saúde.
propondo-se o emprego de normas para sua utilização Poderia ainda contribuir para o sistema local de saúde
após ampla discussão com os profissionais de saúde e ajudar a desenvolver o potencial econômico inerente
e especialistas (Eldin & Dunford, 2001). às plantas de valor medicinal (Akerele, 1988).
A partir destas recomendações, gerou-se um Assim como as plantas podem representar
crescente interesse de gestores municipais de saúde remédios poderosos e eficazes, o risco de intoxicação
na implantação de programas de fitoterapia em causada pelo uso indevido das mesmas, deve ser
unidades de saúde como alternativa medicamentosa sempre levado em consideração. A observância às
de vários municipios brasileiros, como por exemplo, dosagens prescritas e o cuidado na identificação
Vitória (ES), Curitiba (PR); Londrina (PR), Campinas precisa do material utilizado pode evitar uma série de
(SP) e João Pessoa (PE); entre outros. Para a quase acidentes (Lorenzi & Matos, 2002). Desta forma, a

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


8

identificação das plantas utilizadas pela população, Rede Básica de Saúde do Município de Cascavel/
a fonte de obtenção destas e indicações de uso, PR. Especificamente, visou-se realizar estudo
poderiam revelar possíveis problemas existentes etnobotânico de modo a identificar a utilização de
nesse processo, ao mesmo tempo poderiam indicar plantas medicinais na realidade da população da área
a potencialidade existente nas comunidades para de abrangência do projeto, contemplando: a)
produzir localmente plantas medicinais a serem Identificação de espécies ainda não citadas na
utilizadas na rede municipal de saúde. literatura como medicinais ampliando o escopo das
O uso de ervas medicinais, muitas delas possibilidades fitoterapêuticas; b) Comparação do
cultivadas no próprio quintal, é uma prática secular emprego de plantas medicinais pela população
baseada no conhecimento popular e transmitida estudada com o descrito na literatura, de modo a
oralmente, na maior parte das situações. Numa identificar incongruências e riscos de utilização
população com baixo acesso a medicamentos, inapropriada; c) a partir da análise dos dados obtidos,
agregar garantias científicas a essa prática apresentar recomendações a distintos atores sociais
terapêutica poderia trazer diversas vantagens. Desta visando subsidiar o planejamento e introdução do uso
forma, a implantação de um programa de produção, de fitoterápicos na Rede Básica de Saúde do
cultivo, elaboração e distribuição de plantas Município de Cascavel/ PR.
medicinais na atenção básica à saúde poderia garantir
à população o acesso a medicamentos, diminuindo
custos e valorizando o saber popular. MATERIAL E MÉTODO
Especificamente para o Município de
Cascavel, o modelo de atenção à saúde desenvolvido Local do estudo
prioritariamente caracteriza-se pelo atendimento O estudo foi desenvolvido em Cascavel,
clínico medicamentoso, centrado no tratamento/cura município localizado no Terceiro Planalto, na região
de doenças. Em virtude deste modelo apresentar extrema do Oeste Paranaense (24º 58' Sul; 53º e 26'
sérias limitações, buscou-se alterá-lo de forma a Oeste). Este Município conta com 266.604 mil
incorporar a esse a prática de vigilância à saúde habitantes (IBGE, 2004), sendo a maioria deste
baseado no perfil epidemiológico da população local. concentrado na área urbana. Cerca de 93% deste
Para tanto, como uma das estratégias para o alcance contingente populacional é constituído basicamente
desse objetivo, o município aderiu à implantação do por migrantes gaúchos e catarinenses, predominando
Programa de Agentes Comunitários de Saúde e do a cultura italiana, alemã, polonesa e portuguesa.
Programa Saúde da Família, os quais se caracterizam Em Cascavel, a rede pública de saúde que
pela identificação precoce das condições de risco oferece serviços na atenção primária é composta por
nas quais as famílias estão inseridas, dando ênfase 31 Unidades de Saúde, sendo 23 na área urbana e 8
na prevenção de doenças (Tomazzoni, 2004). na área rural. Dentre estas, para o desenvolvimento
Desde então, a equipe de saúde local vem desta pesquisa, selecionou-se a Unidade de Saúde
interagindo com a comunidade nos cuidados básicos da Família (USF) Nossa Senhora dos Navegantes,
e educação para a conquista da saúde. Suas ações localizada no Distrito de São João, distante
estão direcionadas ao núcleo familiar com especial aproximadamente 15 Km do perímetro urbano. Esta
atenção aos grupos de maior risco de adoecer ou Unidade de Saúde foi implantada em junho de 2002,
morrer, dentro de uma base territorial definida. As com o objetivo de oferecer serviços de saúde 8 horas
ações a serem realizadas pela equipe de saúde por dia, dentro da lógica do Programa Saúde da Família
baseiam-se nos problemas e potencialidades de que consiste no desenvolvimento de estratégia que
saúde identificados nos territórios, contribuindo para busca atribuir maior capacidade de resposta às
a construção e a consolidação de um modelo necessidades básicas de saúde da população de sua
assistencial em saúde que atenda as necessidades área de abrangência. Adicionalmente, busca gerar
dos indivíduos de forma integral. Neste contexto, a novas políticas setoriais, afirmando a
inserção de um programa de uso fitoterápicos na Rede indissociabilidade entre os trabalhos clínicos e a
Básica de Saúde do Município tem sido visualizada promoção da saúde conforme apontado em Brasil
como uma alternativa bastante atrativa e promissora (2001).
tanto para o gestor quanto para para os profissionais A escolha desta USF para a realização desta
e usuários do Sistema Público de Saúde, como pesquisa deveu-se a esta comunidade de usuários
apontado em Tomazzoni (2004). possuir residência fixa e apresentar interesse pelo
Nesta perspectiva, o presente estudo teve tema “fitoterapia”, demonstrado por lideranças
como objetivo ampliar o conhecimento sobre a relação comunitárias no desenvolvimento de trabalhos
da comunidade de Cascavel com o uso de plantas anteriores em prol do resgate e valorização da cultura
medicinais, visando gerar subsídios para o daquela população, conforme Tomazzoni (2004).
planejamento e introdução do uso de fitoterápicos na A área de abrangência da USF Nossa

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


9

Senhora de Navegantes, corresponde a 12 profissão, 58% declararam serem agricultores e 30%


comunidades rurais denominadas: Alto Bom Retiro; eram donas de casa (“do lar”).
Jangadinha; Cerro Verde; Nossa Senhora dos
Navegantes; Rio Diamante; Peroba; Gramadinho; Rio
Quarenta e Sete; Jangada; Rio Saltinho; Jangada TABELA 1. Incidência de indivíduos representativos
Taborda e São Mateus. No total, esta USF presta de diferentes faixas etárias em levantamento
atendimento a 1550 habitantes, distribuídos em 452 etnobotânico realizado junto aos usuários da Unidade
famílias. A densidade populacional entre as de Saúde da Família Na Sra dos Navegantes, Cascavel-
comunidades é bastante diversificada sendo PR (dez. 2003 a fev. 2004).
Gramadinho o maior núcleo populacional com 71
familias e Rio Saltinho o menor (8 famílias). A maior
parte da população atendida pela USF é representada
por indivíduos adultos (> 21 e < 60 anos) (59,74%). O
restante dessa população está configurado por
10,77% de bebês (< 1 ano), 22,33% de criança,
adolescentes e jovens (1 até 21 anos) e 7,16% de
indivíduos idosos (> 60 anos).
Durante o desenvolvimento dessa pesquisa,
a USF contava com a seguinte equipe de profissionais:
1 médico clínico geral; 1 enfermeiro; 1 assistente
social; 1 cirurgião dentista; 2 auxiliares de
enfermagem; 1 técnico em higiene bucal; 1 auxiliar
de cirurgião dentista; 6 agentes comunitários de
saúde; 1 motorista e 1 zeladora.
Coleta de dados
População amostral Para descrição das características da
O universo amostral correspondeu a 50 amostra populacional, assim como para coleta de
famílias que foram identificadas como usuárias da informações sobre as espécies vegetais utilizadas
USF Nossa Senhora de Navegantes e selecionadas na terapêutica popular, executou-se pesquisa
pela técnica de amostragem estratificada proporcional exploratório-descritiva envolvendo levantamento
conforme Costa Neto (1977). Nesta técnica a bibliográfico e levantamento junto às comunidades
determinação do tamanho da amostra é definida pela alvo. A coleta de dados foi realizada no período de
proporção do número de famílias da população versus dezembro 2003 a fevereiro de 2004.
a quantidade de famílias em cada estrato (cada A abordagem feita aos entrevistados foi em
comunidade). Desta forma, de um total de 452 famílias, forma de diálogo seguindo um roteiro básico que foi
selecionou-se 50 distribuidas proporcionalmente em previamente avaliado por meio de pré-teste, em dois
relação ao número de famílias registradas por aspectos fundamentais: a validade e a confiabilidade.
comunidade da área de abrangência desta USF. No Além da informação sobre a identificação pessoal
âmbito de cada comunidade, estas famílias foram (nome completo, endereço, idade, sexo, escolaridade),
selecionadas aleatóriamente, por meio de sorteio durante o diálogo foram anotados dados etnobotânicos
simples. A entrevista foi realizada com o membro da (plantas medicinais utilizadas, modo de uso, finalidade
família que estava presente e se disponibilizava para e fonte de obtenção deste conhecimento). A coleta
tal atividade. destes dados se deu de modo informal, possibilitando
No total, a amostra populacional englobou uma maior flexibilidade no contato entre entrevistador
indivíduos entre 19 e mais de 70 anos, sendo 82 % e entrevistado.
destes do sexo feminino (Tabela 1). Com relação à Após apresentação e explanação inicial
escolaridade, apenas 2% dos entrevistados referiram acerca do objetivo da pesquisa, e desde que tivesse
ter concluído o ensino médio, 2% não eram havido concordância em participar do estudo proposto,
alfabetizados e 10% informaram apenas saber ler e a entrevista era iniciada. No decorrer da entrevista
escrever. No que diz respeito à religião, 92% quando se fez necessário foram feitas algumas
informaram ser católicos. Quanto à procedência, 94% intervenções pertinentes a fim de solicitar
indicaram ser da região Sul, sendo que destes, 50% esclarecimento de aspectos importantes relacionados
do estado do Paraná. Quanto ao tempo de ao objetivo da pesquisa. Finalizada a entrevista, foi
permanência na comunidade, 62% dos indivíduos procedido relato da comunicação verbal de todas as
amostrados explicitaram residir há mais de 10 anos questões abordadas pelo entrevistado. A opção por
na mesma localidade e 18% informaram residir há esta forma de registro teve como objetivo evitar o
mais de 30 anos. Quando perguntados sobre a constrangimento do entrevistado frente ao uso de

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


10

gravador, que poderia contribuir para a omissão de que utiliza. Além desta fonte de obtenção, também
informações importantes. foram indicados o comércio (farmácia - 6%), amigos
Para facilitar a aproximação e por entender (42%) e a Pastoral da Saúde (6%).
que o entrevistado se sentiria mais seguro com a Nenhum entrevistado indicou a utilização de
presença de uma pessoa que já lhe fosse familiar, foi plantas medicinais sob orientação médica. Referenciaram
solicitado, durante a entrevista, o acompanhamento o uso como advindo de indicação de amigos e parentes
do Agente Comunitário de Saúde responsável pela (92%), livros especializados (2%), autoconhecimento
visita domiciliar mensal àquela família. Isto possibilitou (8%), muitas vezes reunindo todas estas alternativas.
estabelecer um vínculo de confiança entre o Um padrão de respostas semelhante foi obtido com
entrevistador e o entrevistado o que foi fundamental relação à dosagem, evidenciando-se que a maioria
para o aprofundamento dos aspectos pesquisados. segue recomendações de amigos e parentes (54%).
A duração de cada entrevista variou de acordo Dentre os entrevistados, 10% relataram não se
com cada entrevistado, dependendo da sua importar com a dosagem “uma vez que planta não
disponibilidade e número de citações apresentadas, faz mal à saúde”. A totalidade dos entrevistados não
chegando ao máximo de 2 horas e mínimo de 40 apresentou registro de casos de envenenamento ou
minutos. intoxicação por plantas na família. Isto tanto pode
Realizou-se adicionalmente a coleta e ser devido à real falta de ocorrência destes processos
herborização das plantas citadas. O material coletado, no âmbito da comunidade pesquisada como pode
a partir da citação do nome vulgar, foi agrupado em representar não relação, por parte destes entrevistados,
morfoespécies com base em semelhanças entre causa e efeito durante um episódio indesejável
morfológicas as quais foram identificadas em nível de ocorrido no passado .
espécie, sempre que possível. A identificação do Um total de 271 citações etnobotânicas foram
material coletado seguiu os padrões da taxonomia registradas junto aos entrevistados, englobando 75
clássica, feita com base em caracteres morfológicos morfoespécies, sendo 63 identificadas em nível
florais e utilizando-se, quando possível, vários específico, 7 em nível genérico, 5 não foram associadas
exemplares. As determinações foram efetuadas pelos a um taxon específico (Tabela 2). A maioria dos
autores através de chaves analíticas e comparações entrevistados citou mais de uma espécie da qual faz
com materiais depositados no Herbário UPCB do uso medicinal. A média de citações de plantas
Departamento de Botânica da Universidade Federal medicinais por questionário foi de 6,36 (valor máximo =
do Paraná. 22, valor mínimo = 0, moda = 4).
A família Asteraceae foi a que englobou maior
Análise de dados número de espécies citadas (16 spp), seguida por
As indicações de uso popular foram Labiateae (14 spp), Amaranthaceae (4 spp),
substituídas por têrmos técnicos correspondentes, Verbenaceae (3 spp) e Apiaceae, Juglandaceae,
como por exemplo, para “contra febre” utilizou-se Malvaceae, Rutaceae e Zingiberaceae (2 spp). As
“antipirético”; “para dor de dente” utilizou-se demais famílias tiveram apenas citação de uma
“odontálgico”; “para pedra nos rins” utilizou-se espécie cada, integralizando 30,6% do total
“litolítico”. No caso da indicação ser “ serve para tudo” amostrado.
utilizou-se o têrmo “genérico”. As espécies citadas em maior número de
As informações etnobotânicas coletadas entrevistas foram Mentha sp. (37 entrevistas) e
foram analisadas comparativamente ao exposto em Cymbopogon citratus (DC) Stapf. – capim limão (30).
distintas fontes impressas e eletrônicas, no sentido Outras espécies citadas em relativamente expressivo
de identificar incongruências quanto à indicações de número de questionários foram: Rosmarinus officinalis
usos e também riscos de utilização inapropriada. L. (26), Plectranthus neochillus Schltr. (24), Artemisia
Entre as fontes consultadas, cita-se: USFDA (2005); absinthium L. (22), Foeniculum vulgare Mill (22) e
PLANTAMED (2005); HERBMED (2005); Martins et Tanacetum vulgare L. (22) (Tabela 2).
al. (2000); Conceição (1987); Teske & Trentini (1997); Foram registradas 40 propriedades
Almeida (1993); Albuquerque (1990) e Corrêa (1984). terapêuticas distintas relacionadas ao uso doméstico
das espécies citadas, ressaltando-se que muitos
entrevistados mencionaram buscar assistência
RESULTADO E DISCUSSÃO médica em casos de enfermidades consideradas mais
A quase totalidade (96%) dos indivíduos graves.As propriedades terapêuticas mais freqüentemente
entrevistados (n = 50), independentemente de sexo citadas foram: digestiva (76%), calmante (43%),
ou idade, indicou fazer uso de plantas medicinais, antigripal (37%), analgésica (30%), antibiótica (22%),
eventual (54%) ou freqüentemente (46%), quando diurética (20%) e hipotensora (20%). A grande maioria
utilizam remédios caseiros. 86% dos entrevistados das espécies (35) estava associada a apenas uma
indicaram o cultivo doméstico de plantas medicinais indicação de uso. As demais foram associadas desde

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


11

2 até 7 distintas utilidades terapêuticas. As espécies que aproximadamente 26% constam na literatura
com maior número de indicações terapêuticas (7) como abortivas e/ou não recomendadas durante a
foram Mentha sp., Rosmarinus officinalis e Tanacetum gravidez ou lactação (p.ex. Foeniculum vulgare Mill;
vulgare (Tabela 2). Rosmarinus officinalis L.). Cerca de 20 espécies
Para a quase totalidade das espécies citadas pelos usuários são indutoras de reação
citadas, o chá foi a forma de uso referenciada pelos alérgica e/ou fotossensibilização dérmica (p.ex.
entrevistados. Para apenas 2 espécies – Mentha Artemisa vulgaris L.; Salvia officinalis L.). Várias
viridis (L.) L. e Solidago chinensis Meyen- indicou-se outras espécies são referenciadas na literatura como
a tintura como única forma de emprego e, nestes promotoras de hepatotoxicidade aguda (p.ex.
casos, associado a atividade analgésica e/ou Chelidonium majus L.- indutora de hepatite aguda,
emoliente para tratamento externo de machucaduras. conforme Pittler & Ernst, 2003); degeneração do
Em poucos outros casos, citou-se adicionalmente sistema nervoso, alucinações e convulsões (p.ex.
ao emprego do chá o uso da mesma planta para Artemisia absinthium L.), forte ação depressora do
emplastro (p.ex. Aloe vera L.) ou como erva- sistema nervoso central (p.ex. Mentha suaveolens
desidratada misturada ao chimarrão (p.ex. Lavandula Ehrl, segundo Moreno et al., 2002) e de formação de
sp.). A dose administrada variou de acordo com a tumores malígnos na bexiga e fígado (p.ex.
indicação, desde uma dose diária até várias ingestões Symphytum officinale, conforme Sousa et al., 1991).
ou aplicações por dia. A ingestão do chá desta última espécie, e também
Na maior parte das citações (96%), indicou- de Tanacetum vulgare L., de Passiflora (folha) e de
se exclusivamente a folha como parte utilizada no Petiveria alliacea, é totalmente desaconselhada face
preparo do chá ou outra forma de uso. A folha à alta toxicidade destas (Conceição, 1987; Martins
juntamente com o caule assim como casca, flor, seiva, et al.; 2000; UFSDA, 2005).
semente e raiz configuram-se entre outras partes Também, registraram-se algumas discrepâncias
menos freqüentemente citadas como utilizadas pelos entre as indicações de uso, forma de preparo e
entrevistados (Tabela 2). Com relação ao uso das dosagem registrados junto à comunidade estudada
plantas, mesmo estas sendo cultivadas pelos e os citados na bibliografia consultada (Tabela 2).
entrevistados, verificou-se que nem sempre estes Neste aspecto, salientam-se aquelas cuja indicação
souberam informar com precisão sobre sua indicação de uso e/ou parte usada difere da registrada na
terapêutica, informando que “ouviram falar que fazia literatura consultada, como por exemplo, Artemisia
bem para esta ou aquela doença”. Muitos tinham a alba Turra (com várias indicações de uso, exceto
planta na horta ou quintal, mas não tinham certeza “calmante”); Celosia cristata (extrato alcoólico das
da sua indicação. sementes referenciado como com atividade anti-
A partir da bibliografia consultada, pode-se glicêmica em Vetrichelvan et al., 2002); Pfaffia
averiguar que aproximadamente 80% das plantas, glomerata (Spreng.) Pederson ( o extrato aquoso da
citadas como de uso terapêutico pela população, raiz é citado por Freitas et al. (2004) como
apresenta algum tipo de toxicidade ou contra- potencialmente protetor da mucosa gástrica entre
indicação de uso (Tabela 2). Vale salientar que esta outras e, segundo Sanches et al. (2001), o extrato
porcentagem pode estar subestimada em virtude de metanólico da raíz apresenta atividade anti-
não haver informação disponível para várias das hiperglicemiante).
espécies citadas. A ausência de informação não As indicações discrepantes tanto podem ser
necessariamente significa ausência de toxicidade ou novas e corretas formas de uso quanto podem
contra-indicação, mas pode estar associada à falta representar erros frequentemente cometidos quando
de estudos a esse respeito. Considere-se também, da identificação de determinada espécie. Este erro
que dada à insuficiência de estudos farmacológicos de identificação pode estar associado ao uso do
e toxicológicos específicos para grande parte destas nome vulgar dado que este não é um indicador seguro
espécies, a indicação de toxicidade pode estar sendo da correta identificação de uma espécie. Várias
superestimada por ser advinda apenas de indicação espécies botânicas, muitas vezes de gêneros e/ou
empírica. De qualquer modo, evidencia-se a carência famílias distintas, são referenciadas por um mesmo
de estudos específicos a esse respeito assim como nome vulgar sem no entanto terem os mesmos
a necessidade de alertar potenciais usuários sobre princípios ativos, como por exemplo “erva cidreira” –
essa possibilidade de toxicidade e efeitos colaterais. nome vulgar referenciado tanto para Cymbopogon
Dentre as espécies com indicação de citratus (DC) Stapf (Poaceae) quanto para Lippia alba
toxicidade ou contra-indicação de uso, ressalta-se (Mill) N.Br. (Verbenaceae) e Melissa officinalis L.
(Labiateae).

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


12
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005).
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.

13
14
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.

15
16
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.

17
18
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.
TABELA 2. Espécies vegetais referenciadas como medicinais em levantamento etnobotânico realizado junto a usuários da USF Na Sra Navegantes (Cascavel,
Paraná / dez.2003 a fev.2004), ordenadas alfabeticamente por família botânica, sendo FA = frequência absoluta (n= 50 entrevistas). Indicação de toxicidade, se
não citada a fonte, provém de USFDA (2005), sendo nc= nada consta nas fontes consultadas. Indicação de uso medicinal em negrito = não referenciada nas
fontes consultadas. Nomes científicos conforme Missouri Botanical Garden (2005). (cont.)
Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.

19
20

Adicionalmente, ao analisar-se a relação em muitas das Euphorbiaceae que são utilizadas


nome vulgar versus espécie identificada observa-se como medicinais são potentes mitogênicos que foram
que os entrevistados podem estar utilizando de detectados como agentes causadores de câncer
maneira inadvertida determinadas espécies que são nasofaringeal e câncer esofágico (USFDA, 2005).
morfologicamente semelhantes a outras corretamente Toxinas pirrolozidínicas mutagênicas, encontradas no
indicadas como medicinais. Ao avaliar-se as chá de confrei e em várias outras ervas medicinais,
indicações de usos das espécies citadas, isto parece foram detectadas como hepatocarcinogênicas em
estar acontecendo com várias espécies, como por ratos e causadoras de cirrose hepática e outras
exemplo, Artemisia alba Turra (em lugar de A. patologias em humanos (Schoental, 1968; Ames et
absinthium L.), Plectranthus neochilus Schltr.(em al., 1990). Várias espécies medicinais estão
lugar de Plectranthus barbatus Andrews). associadas a grave hepatoxicidade, como explicitado
Por outro lado, várias espécies citadas em Pittler & Ernst (2003).
apresentam indicação científica de usos importantes A não consonância das indicações de uso,
que não foram mencionados pela população forma de preparo e dosagem registrados junto à
entrevistada, como por exemplo Ficus carica L. comunidade estudada em relação àquelas citadas
(aitividade imunoestimulante registrada por Dai et al., na bibliografia consultada, deve servir também de
2000; atividade anti-cancerígena, identificada por Yin referencial para estudos adicionais no sentido de
& Chen, 1997 e Meng et al., 1996); Juglans regia L. ampliar as possibilidades de uso das espécies
(segundo Erdemoglu et al., 2003, o extrato etanólico indicadas ou mesmo comprovar a ineficácia ou
da folha apresentou atividade antinflamatória em impropriedade da citada utilização.
estudos pré-clínicos; extrato aquoso potencialmente
hipoglicemiante, conforme Sachdewa et al., 2003) e
Hibiscus rosasinensis L. (anticarcinogênico, segundo Recomendações
Sharma et al., 2004 e Sharma & Sarvat, 2004; tônico capilar, Considera-se relevante para o Serviço
conforme Adhirajan et al., 2003; anticolesteremiante e Público de Saúde do município de Cascavel, a adoção
hipoglicemiante, de acordo com Sachdewa & do uso de plantas medicinais como uma solução
Khemani, 2003 e Sachdewa et al., 2003). prática para os problemas básicos de saúde. A
No transcorrer do presente estudo, percebeu- implantação desta prática, além de promover melhoria
se que a utilização de plantas na terapia popular, pela da qualidade de saúde integral da população envolvida,
comunidade de usuários da USF N a Sr a dos valoriza o saber popular, reforçando laços sociais e
Navegantes é bastante difundida e presente. A culturais. Um projeto desta natureza poderia ser
transferência do conhecimento botânico nesta implantado de forma gradativa, em uma perspectiva
comunidade, aparentemente, segue os padrões de interdisciplinar e com participação comunitária,
comunidades tradicionais, não havendo indicativos de seguindo as diretrizes do documento elaborado em
bloqueios ou rupturas neste processo na população 2001 pelo Ministério da Saúde, que autoriza a prática
avaliada. Entretanto, o uso sem orientação médica de uso de fitoterápicos no sistema público de saúde.
apropriada é um fator de preocupação que deve ser Nesta perspectiva e frente aos resultados
considerado pelos atores sociais do setor de saúde obtidos, apresenta-se um conjunto de recomendações
bem como por aqueles envolvidos na educação a distintos atores sociais relacionados ao Sistema
comunitária, dada a incidência de espécies com Público de Saúde e uso de plantas medicinais do
registro de toxicidade e contra-indicações de uso. Município de Cascavel:
Assim como as plantas podem representar remédios
poderosos e eficazes, o risco de intoxicação causada - Gestor Municipal de Saúde
pelo uso indevido das mesmas, deve ser sempre a) Discutir a problemática associada ao uso
levado em consideração. A observância às dosagens de fitoterápicos junto ao Conselho Municipal de
prescritas e o cuidado na identificação precisa do Saúde.
material utilizado pode evitar uma série de acidentes b) Promover cursos de capacitação para
como apontado por Lorenzi & Matos (2002). adequada utilização de fitoterápicos pelos profissionais
A falsa idéia de que tudo que é “natural é de saúde envolvidos na atenção básica à saúde.
bom”, ou mais especificamente como indicado pelos c) Gerar programas de divulgação sobre uso
entrevistados de que “planta não faz mal à saúde”, adequado e indevido de plantas medicinais.
deve ser esclarecida junto à comunidade de usuários d) Elaborar material informativo que possa
da USF assim com de outros locais. Estudos ser distribuído à população.
epidemiológicos em várias partes do mundo têm e) Elaborar estratégias de intervenção
demonstrado que certos produtos naturais podem pertinentes ao problema diagnosticado.
representar, cumulativamente, risco carcinogênico
aos humanos (Falk, 2000). Alguns ésteres presentes

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


21

- Profissionais de Saúde REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA


a) Buscar capacitação para promover
adequada orientação sobre plantas medicinais ADHIRAJAN. N. et al. In vivo and in vitro evaluation of hair
principalmente em relação a dosagens, interações, growth potential of Hibiscus rosa-sinensis Linn. Journal
formas de preparo. of Ethnopharmacology, v.88, n.2-3, p.235-9, 2003.
AKERELE, O. Medicinal plants and primary health care:
b) Buscar conhecer contra-indicações e
an agenda for action. Fitoterapia, n.5, p.355-63, 1988.
reações adversas das plantas usualmente ALBUQUERQUE, J.M. Plantas tóxicas no jardim e no
empregadas pelos usuários. campo. Belém: FCAP/ Serviço de Documentação e
c) Realizar atividades educativas junto aos Informação, 1990. 120p.
grupos organizados das comunidades de abrangência ALMEIDA, E.R. Plantas medicinais brasileiras. São
da USF onde atuam. Paulo: Hemus, 1993. 341p.
d) Promover discussões relativas ao tema AMES, B.N.; PROFET, M.; GOLD, L.S. III. Nature’s
com a equipe interdisciplinar da USF e com o chemicals and synthetic chemicals: comparative
Conselho Local de Saúde. toxicology. Proceedings of the National Academy of
Sciences of the United States of America, p.271-80,
e) Valorizar o saber popular e a cultura local.
1990.
BLUMENTHAL, M. (Ed.). The complete german
- Usuários commission e monographs: therapeutic guide to herbal
a) Evitar o uso de plantas somente com base medicines. Austin: American Botanical Council, 1998.
no nome vulgar. 684p.
b) Buscar a correta identificação botânica e BRASIL. Guia prático de saúde da família. Brasília:
informações sobre uso das plantas. Ministério da Saúde Departamento de Atenção Básica,
c) Usar plantas medicinais sob orientação 2001. 128p.
de um profissional de saúde. CONCEIÇÃO, M. As plantas medicinais no ano 2000:
dicionário de plantas medicinais. 3.ed. Brasília: Editerra,
d) Cultivar as plantas medicinais em locais
1987. 282p.
apropriados para o consumo. CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 8., 1986,
e) Buscar informações sobre contra- Brasília. Anais... Brasília: Ministério da Saúde, 1986.
indicações e toxicidade das plantas. 430p.
f) Participar dos grupos de atividades CORRÊA, M.P. Dicionário das plantas úteis do Brasil e
educativas da USF, sobre o uso de fitoterápicos. das exóticas cultivadas. 2.ed. Rio de Janeiro: Ministério
de Agricultura/ IBDF, 1984. 6v.
- Pesquisadores COSTA NETO, P.L.O. Estatística. São Paulo: Edgard
a) Realizar pesquisas no sentido de Blücher, 1977. 266p.
CURITIBA. Secretaria Municipal de Saúde. Programa
preencher as lacunas de conhecimento existentes em
de fitoterapia. Disponível em: <http://.www.
relação às plantas aqui relatadas e outras de uso plantasmedicinais.org/saúde/arquivo 000013.html>.
popular comum e corrente. Acesso em: 08 nov. 2003.
b) Divulgar informações cientificas sobre uso DAI, W.J. et al. Effects of fig (Ficus carica) polysaccharide
adequado, toxicologia e contra- indicações de uso de on cellular immune function in mice. Chinese Traditional
plantas medicinais em veículos de fácil entendimento and Herbal Drugs, v.31, p.355-6, 2000.
pela população em geral. ELDIN S.; DUNFORD, A. Fitoterapia na atenção
c) Desenvolver projetos de extensão primária à saúde. São Paulo: Manole, 2001. 163p.
relacionados ao uso de fitoterápicos em parceria com ERDEMOGLU, N.; KUEPELI, E.; YESILADA, E. Anti-
inflammatory and antinociceptive activity assessment
a Secretaria de Saúde Municipal.
of plants used as remedy in Turkish folk medicine.
Journal of Ethnopharmacology, v.89, n.1, p.123-9, 2003.
ESPÍRITO SANTO. Secretaria Municipal de Saúde.
AGRADECIMENTO Programa de Fitoterapia. Disponível em: <http://
Os autores agradecem a comunidade usuária .www.vitória.es.gov.br/secretarias/saúde/fito1.htm>.
da USF Na Sra dos Navegantes, localizada no Distrito Acesso em: 19 nov. 2003.
de São João em Cascavel (Paraná), pela FALK, R.H. Society and risk. Hamburg: University of
disponibilidade em participar desta pesquisa. Hamburg, 2000. Disponível em: < http://www.biologie.
Agradecem também a Dra Maria de Lourdes Centa, uni-hamburg.de/b-online/library/falk/Risk/risk.htm>.
Acesso em: mai. 2005.
Dra Solange Ribas Zaniolo; Dra Lia Rieck; Dra Vanilde
FREITAS, C.S. et al. Involvement of nitric oxide in the
Citadini-Zanette e aos revisores anônimos pela leitura gastroprotective effects of an aqueous extract of Pfaffia
crítica e valiosas sugestões apresentadas. glomerata (Spreng) Pedersen, Amaranthaceae, in rats.
Life Sciences, v.74, n.9, p.1167-79, 2004.
HERBMED. Herb list. Disponível em: <http://www.
herbmed.org/>. Acesso em: abr. 2005.

RRev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.


22

HUFFORD, D.J. Folk medicine and health culture in (Amaranthaceae). Acta Scientiarum, v.23, n.2, p. 613-7,
contemporary society. Primary Care, v.24, n.4, p.723-41, 2001.
1997. SCHOENTAL, R. Toxicology and carcinogenic action of
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. pyrrolizidine alkaloids. Cancer Research, v.28, p.2237-
Censo Demográfico 2000. Estimativa para 2004. Rio 46, 1968.
de Janeiro: IBGE, 2004. SHARMA, S.; SARWAT, S. Effect of Hibiscus rosa sinensis
LEITE, S.N. Além da medicação: a contribuição da extract on hyperproliferation and oxidative damage
fitoterapia para a saúde pública. 2000. 114p. Dissertação caudes by benzoyl peroxide and ultraviolet radiation in
(Mestrado em Saúde Pública) - Departamento de Saúde mouse skin. Basic & Clinical Pharmacology &
Materno-Infantil, Faculdade de Saúde Pública, Toxicology, v.95, n.5, p.220-5, 2004.
Universidade de São Paulo, São Paulo. SHARMA, S.; KHAN, N.; SULTANA, S. Study on prevention
LORENZI, H.; MATOS, F.J. A. Plantas medicinais no of two-stage skin carcinogenesis by Hibiscus rosa
Brasil: nativas e exóticas. São Paulo: Instituto Plantarum, sinensis extract and the role of its chemical constituent,
2002. 512p. gentisic acid, on the inibition of tumor promotion response
MARTINS, E.R. et al. Plantas medicinais. Viçosa: Editora and oxidative stress in mice. European Journal of
da UFV, 2000. 220. Cancer Prevention, v.13, n.1, p.53-63, 2004.
MENG, Z.M. et al. Studies of chemical constituents of SOUSA, M.P. et al. Constituintes químicos ativos de
Ficus carica . Journal Chinese Pharmaceutical plantas medicinais brasileiras. Fortaleza: UFC,
University, v.27, n.4, p.202-4, 1996. Laboratório de Produtos Naturais, 1991. 416p.
MISSOURI BOTANICAL GARDEN. W 3 Tropicos. TESKE, M.; TRENTINI, A.M. Herbarium: compêndio de
Disponível em: <http:// www. mobot.mobot.org/w3T/ fitoterapia. 3. ed. Curitiba: Herbarium Laboratório
search/vast/html>. Acesso em: abr. 2005. Botânico, 1997. 317p.
MORENO, L. et al. Pharmacological properties of the TOMAZZONI, M.I. Subsídios para a introdução do uso
methanol extract from Mentha suaveolens . Ehrh. de fitoterápicos na Rede Básica de Saúde do Município
Phytotherapy Research, v.16, n.S1, p.10-3, 2002. de Cascavel/PR. 2004. 119p. Dissertação (Mestrado em
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE-OMS. Fundo das Enfermagem)-Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
Nações Unidas para Infância-UNICEF. Relatório da USFDA - United States Food and Drug Administration.
Conferência Internacional Sobre Cuidados Primários FDA poisonous plant database. Disponível em: <http://
de Saúde. Alma-Ata - URSS, 1978. Brasília: OMS- www.cfsan.fda.gov/~djw/plantox.html>. Acesso em: out.
UNICEF, 1979. 64p. 2005.
PITTLER, M.H.; ERNST, E. Systematic review: hepatotoxic VETRICHELVAN, T.; JEGADEESAN M.; DEVI, B.A. Anti-
events associated with herbal medicinal products. diabetic activity of alcoholic extract of Celosia argentea
Alimentary Pharmacology and Therapeutics, v.18, n.5, Linn. seeds in rats. Biological & Pharmaceutical
p.451-71, 2003. Bulletin, v.25, n.4, p.526-8, 2002.
PLANTAMED. Plantas e ervas medicinais e WORLD HEALTH ASSEMBLY. Resolution 29.72 Health
fitoterápicos. Disponível em: <http://www.plantamed. manpower development. Handbook of Resolutions, v.
com.br>. Acesso em: abr. 2005. 2, p.1.7.2, 1976.
SACHDEWA, A.; KHEMANI, L.D. Effect of Hibiscus rosa WORLD HEALTH ASSEMBLY. Resolution 30.49
sinensis Linn: ethanol flower extract on blood glucose Promotion and development of training and research in
and lipid profile in streptozotocin induced diabetes in traditional medicine. Handbook of Resolutions, v.2,
rats. Journal of Ethnopharmacology, v.88, n.2-3, p.235- (2.ed.), p.1.5; 1.7, 1977.
9, 2003. WORLD HEALTH ASSEMBLY. Resolution 44.34
SACHDEWA, A. et al. Effect of Aegle marmelos and Traditional medicine and modern health care. Handbook
Hibiscus rosa sinensis leaf extract on glucose tolerance of Resolutions, v.2 (2.ed.), p.1.15.4,1991.
in glucose induced hyperglycemic rats. Journal of YIN, W. P.; CHEN, H. M. New coumarin compound with
Ethnopharmacology, v.89, n.1, p.61-6, 2003. anticancer activity. Chinese Traditional and Herbal Drugs,
SANCHES, N.R. et al. Evaluation of antihyperglycemic v.28, p.3-4, 1997.
potential of Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen

Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.9, n.3, p.6-22, 2007.

Potrebbero piacerti anche