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Nada está na Bíblia por acaso. Não há uma só palavra sequer que esteja aqui registrada
em vão. Na porção do texto em que acabamos de ler, Paulo trata de dizer o que o
amor não é: ele não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não procura
os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal. É interessante perceber o
que o próprio apóstolo já havia utilizado estas mesmas palavras no decorrer de sua
carta aos coríntios, exatamente criticando a forma como eles estavam tratando uns
aos outros. Eles eram tudo o que o amor não é.
O amor não é algo que fazemos ou deixamos de fazer. O amor é o que somos. 1Co 13
não é um manual onde lemos o que fazer para aprender a amar, mas uma descrição do
que devemos ser, em nossa essência. O amor tem a ver com o nosso caráter, com a
nossa personalidade.
Todas as palavras usadas por Paulo possuem algo em comum: todas elas estão
relacionadas com a maneira de lidar com as coisas boas que acontecem na vida. Já
ouvimos muitos sermões sobre lidar com as coisas difíceis da vida (doenças,
desemprego, morte, decepções), mas precisamos ser estimulados pela Palavra de Deus
a também vigiarmos diante do sucesso. A inveja é a reação pecaminosa diante do
sucesso dos outros, enquanto a presunção, a arrogância e a grosseria são reações
pecaminosas a qualquer sucesso pessoal.
O que é a inveja? A inveja é a dor que sentimos com a prosperidade de outra pessoa. É
a percepção dolorida e ressentida da vantagem de outra pessoa acrescida do desejo de
possuir a mesma vantagem. A vantagem pode estar relacionada a bens materiais (Gn
26.14 – os filisteus invejavam a riqueza material de Isaque) ou posição social (30.1 –
Raquel tinha inveja de sua irmã Lia e vice-versa). Em o Novo Testamento, a inveja é
tratada como algo que contamina o homem (“a inveja... que vem de dentro e
contamina o homem, Mc 7.22,23). É chamada de obra da carne (Gl 5.21) e de
característica de uma vida não regenerada (“Nós, também, outrora éramos néscios,
desobedientes, desgarrados, escravos de toda sorte de paixão e prazeres, vivendo em
malícia e inveja, odiosos e odiando-nos uns aos outros” – Tt 3.3).
A inveja é uma forma de hostilidade. Jonathan Edwards diz: “Em vez de se alegrar com
a prosperidade dos outros, o homem invejoso ficará incomodado com ela”. Na
verdade, a inveja consiste no desejo de ver nossos rivais perderem o que tem. A
história de José e seus irmãos mostra como a inveja pode levar a outros pecados
igualmente graves. José foi atirado dentro de uma cova profunda e escura, sendo
vendido por seus irmãos, que invejavam seus sonhos e sua reputação diante de seu
pai. Outro exemplo é a história de Hamã, o agagita, que era o segundo homem mais
importante no reino da Pérsia, ficando atrás somente do rei Assuero. Contudo, Hamã
ficou profundamente ressentido quando judeu Mordecai se recusou a prestar-lhe a
honra que ele julgava merecer. O invejoso, não contente com sua posição de honra,
arquitetou um plano para derrubar Mordecai. Então, o rei decidiu escolher o próprio
Mordecai para ser honrado e, por conta disso, a inveja de Hamã o fez imaginar um
nefasto plano para matar Mordecai.
Os coríntios eram culpados por este tipo de inveja. Em uma comunidade com
acentuadas diferenças sociais e teológicas, aqueles irmãos eram tentados a ter um
espírito de competição em termos de dons espirituais. Ao invés de pensarem na
diversidade de dons com uma expressão da multiforme graça de Deus, haviam críticas
mútuas e um menosprezo mútuo pelos vários dons que o Senhor havia distribuído
entre os membros de seu corpo.
Amar é não fazer nada por ambição egoísta ou presunção, mas com humildade,
reconhecendo que os outros são mais importantes que nós. Somos provados quando
outra pessoa recebe um elogio ou progride de alguma maneira: enquanto a pessoa
amorosa se alegra com quem está alegre, a invejosa não consegue ter este mesmo
prazer.
Vangloriar-se é um pecado da língua em que usamos nossas palavras para garantir que
as pessoas reparem como somos importantes. Lewis Smedes assim define a vanglória:
“ela é a nossa agência particular de publicidade, nossa pequena campanha para
divulgar uma imagem de nós mesmos”. Sabendo que a boca fala do que o coração está
cheio (Mt 15.18), é nítido, portanto, que a vanglória não é um pecado verbal, mas um
problema cuja origem está no coração.
Paulo deixa evidente que os coríntios tinham problemas em amar desta forma. Alguns
deles se vangloriavam por causa de sua sabedoria (1Co 3.18, 14.2) ou se vangloriavam
por causa de sua pretensa espiritualidade (1Co 14.37). Em dado momento, Paulo os
chama de arrogantes: “Vocês são arrogantes” ou “Vocês estão inchados de orgulho”
(1Co 5.2). A raiz do problema espiritual deles (e nosso) é a falta de amor. Por que
morremos de inveja quando alguém consegue algo que deseja? Por que queremos
tantos elogios por nossos feitos? Por que tratamos com grosseria determinadas
pessoas?
IV. O AMOR DE JESUS É HUMILDE E SERVIDOR
Precisamos mais do amor de Jesus. Precisamos do amor de Jesus por nós e em nós. Os
Evangelhos nos mostram como Jesus ama e, certamente, temos duras e necessárias
lições para aprender. Em João 13, Jesus fecha as portas de seu ministério público e
volta as suas atenções para os seus discípulos. Jesus sabia que era chegada a hora (v.
1), ou seja, o Salvador já estava sob a sombra da cruz.
O v. declara também que o Senhor amou com amor eterno. Há uma linha do tempo
neste verso: passado, presente e futuro, e Jesus amou os discípulos em todo este
desenrolar. Jesus amou, fazendo milagres, multiplicando pães, andando sobre as
águas, ensinando a Palavra. Jesus continuaria a amá-los, vertendo seu sangue no
Calvário, e salvando os eleitos da ira vindoura. Mas agora, no presente, haveria uma
lição a ser ensinada.
Jesus não ensinava apenas por palavras, mas também por ação. Afinal, o amor é assim:
“Filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obras e em verdade” (1Jo 3.18).
Jesus estava sendo uma parábola viva do que é amar sem ser invejoso, presunçoso, arrogante
ou grosseiro. Há aqui um exemplo de humildade e cortesia. Notem que o texto é construído de
forma cuidadosa e precisa: Jesus sabia qual o momento em que estava e tinha consciência de
quem ele é (v. 1 e 3). Ele sabia que é Deus e que voltaria para o Pai, mas assume uma condição
servil. Irmãos, com bem menos que isto, somos tentados a pensar que somos bons demais
para servir: somos bacharéis, doutores, mestres, mas todos somos chamados para servir.
Ninguém é grande demais pra servir no Reino de Deus.
Enquanto a inveja quer os outros de joelhos, o amor se coloca de joelhos para servir. O lava-
pes não é um sacramento instituído por Cristo, mas um exemplo claro de como deve ser o
nosso amor.
Muitas vezes estamos ocupados demais para servir. Não queremos ouvir nossos irmãos com
seus problemas e dificuldades, mas amar como Jesus ama é ser solicito em ajudar.